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UNIVERSIDADE DO MINDELO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS, JURÍDICAS E SOCIAIS
Mindelo, 2015
CURSO DE LICENCIATURA EM PSICOLOGIA
RELATÓRIO DE ESTÁGIO EM PSICOLOGIA CLÍNICA E DA SAÚDE ANO LETIVO 2014/2015 – 4º ANO
Autor: Jenny Marina de Jesus Soares N.º 25 92
UNIVERSIDADE DO MINDELO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS, JURÍDICAS E
SOCIAIS
RELATÓRIO DE ESTÁGIO EM PSICOLOGIA
CLÍNICA E DA SAÚDE
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Universidade do Mindelo como parte de
requesitos para a obtenção do grau de
Licenciatura em Psicologia.
Discente: Jenny Marina de Jesus Soares - nº 2592
Orientador: Doutora Tereza Andrade
Mindelo, 2015
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao meu filho Marcelo,
por ser a força que me motiva todos os días.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente quero agradecer à Cáritas Diocesana de Mindelo pela oportunidade que me
deu principalmente a Dona Júlia por ter apostado em mim.
Agradeço aos meus país que sempre me apoiaram, naquilo que podiam.
À minha orientadora Dra. Tereza Andrade pela orientação e pelas experiências que me
transmitiu ao longo do proceso de estágio.
À professora Zaida pelos conhecimentos que trasnmitiu e por ter sido a única professora
que ficou conosco neste final de curso.
A todos os professores pelos quais eu passei (Mário; André; Albertino Graça; Dorisa; José
Pedro; Zilda; Zaida; Claudia; Maria do Carmo; Rosalina; Arminda; Norma; Augusto e em
especial Yelina Navaro) e com os quais aprendi muito.
Às minhas colegas de estágio Natasha, Nedilia, e Hirondina, pelas partilhas e pelo apoio.
E a todos os meus colegas de curso principalmente a Elga, Romina e Romira, pelas
experiências passadas juntas, e pela amizade desses 4 anos.
E a todos que de uma forma ou de outra, me apoiaram naquilo que podiam. Um muito
Obrigada.
“O principal objectivo da terapia psicológica, não é transportar o
paciente para um impossível estado de felicidade, mas sim ajuda-lo a
adquirir firmeza e paciência diante do sofrimento. A vida acontece num
equilíbrio entre a alegría e a dor. Quem não se arrisca para além da
realidade jamais encontrará a verdade.”
Carl Gustav Jung
Resumo
Este relatório descreve em grande parte, o processo de estágio nomeadamente, a
caracterização dos serviços onde este decorreu. Passa ainda a descrever as respectivas
intervenções e actividades realizadas nas enfermarias consoante as demandas de cada uma.
Os estudos de casos, e as avaliações psicológicas realizadas dos mesmos estão aqui
apresentados com as devidas fundamentações, compreensibilidades, e as respectivas
hipóteses diagnósticas.
Palavra Chaves: Avaliação Psicológica, intervenção, Hipotese Diagnóstica,
Comprensibilidade
Abstratc This report describes largely stage process including the characterization of services where
this took place. It goes further to describe the respective interventions and activities in the
wards depending on the demands of each. The case studies, and psychological evaluations
performed thereof are presented here with the necessary foundations, compreensibilidades,
and their diagnostic hypotheses.
ÍNDICE
Introdução ............................................................................................................................. 10
CAPITULO I - CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO .......................................... 11
História e Caracterização do Serviço de Saúde Mental em São Vivente ............................. 13
CAPITULO II - DESCRIÇÃO DA INTERVENÇÃO NO ESTÁGIO .......................... 16
Intervenção no Serviço de Saúde Mental ............................................................................. 16
Intervenção no Serviço de Pediatria ..................................................................................... 18
Intervenção no Serviço de Medicina .................................................................................... 19
CAPITULO III - APRESENTAÇÃO DOS ESTUDOS DE CASO ............................... 20
Apresentação do Caso 1 ....................................................................................................... 21
Fundamentação Teórica ........................................................................................................ 21
Estudo de Caso 1 .................................................................................................................. 26
Entrevistas ............................................................................................................................ 26
Compreensibilidade do Caso ................................................................................................ 36
Hipótese Diagnóstica ............................................................................................................ 39
Propostas de Intervenção ...................................................................................................... 39
Apresentação do Caso 2 ....................................................................................................... 40
Fundamentação Teórica ........................................................................................................ 40
Estudo de Caso2 ................................................................................................................... 43
Entrevistas ............................................................................................................................ 43
Compreensibilidade do Caso ................................................................................................ 49
Propostas de Intervenção ...................................................................................................... 50
Conclusão ............................................................................................................................. 53
Recomendações .................................................................................................................... 54
Referências Bibliográficas .................................................................................................... 55
Anexo ................................................................................................................................... 56
Apêndice ............................................................................................................................... 57
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 10
Introdução
O Âmago deste relatório, consiste em descrever toda a dinâmica do estágio curricular em
psicologia clínica e da saúde realizado no Hospital Dr. Baptista de Sousa, no quarto e
último ano do curso de psicologia, ministrada pela Universidade do Mindelo.
O estágio teve como objectivo integrar os conhecimentos adquiridos ao longo da formação,
e assimilar novos conhecimetos, nomeadamente, durante este processo que decorreu num
periodo de nove meses.
O presente relatório é constituido por três capítulos:
Um primeiro capítulo que descreve a instituição no geral e os serviços onde decorreu o
estágio. O segundo capítulo descreve as intervenções e actividades realizadas nas
enfermarías de cada serviço, e em cada uma, foram realizadas as devidas intervenções
consoante as demandas encontradas. Por último, um terceiro capítulo onde é apresentado
os dois estudos de casos com as devidas fundamentações, compreensões, e hipoteses
diagnósticas. Ainda nesta capítulo, encontra-se englobada a conclusão do respectivo
relátorio, e algumas recomendações principalmente em relação ao serviço de saúde mental,
onde a maior parte do estágio decorreu.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 11
CAPITULO I - CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO
História do Hospital Dr. Baptista de Sousa
A construção do hospital Dr. Baptista de Sousa iniciou-se em 1880 e a inauguração
decorreu dois anos depois 10 de Setembro de 1901, embora já funcionasse parcialmente
desde 1899. A medida que os anos foram passando, este foi se desenvolvendo e se
constituindo para atender a demanda e as necessidades da população.
Posteriormente, em 1933, instala-se um serviço adaptado da obstetrícia e em 1994 inicia o
funcionamento da enfermaria destinada a atender exclusivamente doentes de foro cirúrgico.
Os anos foram passando, e foi-se criando novos serviços. Também nessa época já
funcionava o laboratório das análises clínicas.
Assim sendo, antes da independência de Cabo Verde tiveram início as obras de
remodelação e ampliamento do novo Hospital de S.Vicente que só viria a ser inaugurado
após a Independência, onde recebeu o referido nome. Nos anos sessenta, com a era
tecnológica, surge o gabinete de Eletrocardiografia, em 1967, e o Hospital investe no
ensino e formação de profissionais, com a inauguração da escola de enfermagem no ano
1960. Quanto ao serviço de saúde mental, o interesse por este só se desperta nos anos 80.
Actualmente o HBS, é um dos hospitais centrais de Cabo verde e recebe para além das
pessoas da ilha, também, a demanda de pessoas das ilhas do Sal, Santo Antão e São
Nicolau.
Em Novembro de 2014, o Hospital adotou o Sistema de triagem de Mantchester nas
urgências. Essa triagem consiste numa seleção por prioridade estabelecida a partir de
pulseiras coloridas indicando o nível de urgência. Essa abordagem foi autorizada
internacionalmente.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 12
Objetivos da Instituição
Os objetivos do Hospital Dr. Baptista de Sousa, estão expostos no B. O – I serie – Nº 51 da
Republica de Cabo Verde – 19 de Dezembro de 2005.
Aos Hospitais centrais são atribuídos os seguintes objetivos:
Prestar cuidados de saúde especializados, curativos e de reabilitação, em regime de
urgência, consultas externas e atendimento;
Prestar apoios técnicos aos demais serviços e unidade de saúde;
Colaborar no ensino e na investigação científica em diferentes áreas de interesses
para o país, designadamente através da realização de internamento, de cursos e
estágios para profissionais de saúde;
Servir de centro de formação inicial e aperfeiçoamento para quadros de
paramédicos.
Princípios de funcionamento da instituição
A direção e a gestão dos Hospitais centrais devem subordinar os seguintes princípios
gerais:
A prestação de cuidados de saúde deve ser pronta e de qualidade, respeitando os
direitos dos doentes e apoiar-se numa visão interdisciplinar e global deste;
O pessoal de Hospitais centrais é obrigado a comprimento das normas e ética
profissional e deve tratar os doentes com maior respeito;
Os hospitais centrais devem por em prática uma política de informação que permite
aos utentes o conhecimento dos aspetos essenciais do seu funcionamento;
A actividade dos hospitais centrais deve desenvolver-se de acordo com os planos
aprovados e com linhas de ação governativas bem definidas.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 13
História e Caracterização do Serviço de Saúde Mental em São Vivente
A história do serviço de saúde mental em São Vicente, remonta os anos oitenta (1980).
Pode se dizer mesmo que o interesse por este serviço despertou nessa época. Embora em
Santiago, já existía um serviço de psiquiatría, e deslocavam periódicamente psiquiatras
para prestar serviço em São Vicente. Em 1980 o serviço de saúde mental em São Vicente
iniciou-se com um serviço ambulatório. Os primeiros técnicos a se deslocar para São
Vicente foram os espanhóis, os brasileiros e os cubanos.
Na época fazia-se avaliações psicológicas muito pontualmente, tendo em conta que a
população que mais recorria aos serviços eram pessoas que sofriam de transtornos
psicóticos, neuróticos, epiléticos entre outros.
A partir dos anos 1988 o serviço passou a ter um psiquiatra residente. Em 1996 inaugurou-
se a enfermaria de saúde mental. Trata-se de uma enfermaria de crise e de curta duração
(com a capacidade de nove camas e cujo o período de internamento é de media de quinze
dias). Com o passar dos tempos, passou a ter um corpo técnico com mais psiquiatras
residentes, mais psicólogos, enfermeiros etc. Tornou-se desnecessário a evacuação de
pacientes para Santiago diminuindo assim, os custos de deslocamento.
Ao longo dos anos a demanda foi aumentando devido a uma maior consciêncialização das
pessoas. Em termos de registos existe aproximadamente 8093 casos que já passaram pelo
serviço excepto os casos duplicados. Atualmente, o serviço dispõe de um corpo técnico,
com três psicólogos, três psiquiatras, quatro enfermeiros de turno, um enfermeiro chefe e
quatro auxiliares, que somando, da um total de catorze funcionários.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 14
Caracterização do Serviço de Saúde Mental
O serviço de saúde mental e psiquiatria do Hospital Dr. Baptista de Sousa, encontra-se
localizado na parte velha do hospital. O serviço é constituído por duas alas:
A primeira, onde funciona as consultas externas, constituída por quatro gabinetes de
atendimento, o gabinete do enfermeiro chefe, a sala de espera e uma casa de banho.
A segunda, onde funciona a enfermaria, que é uma ala maior, composta por um pequeno
pátio, uma sala onde se realizam as reuniões, ministram-se os seminários, entre várias
outras atividades e que também funciona como um espaço de lazer para os pacientes.
Possui um gabinete para os profissionais de serviço nomeadamente os enfermeiros de turno
e os auxiliares, e uma casa de banho para os mesmos.
A enfermaria tem uma copa onde os pacientes fazem as suas refeições, dois quartos, sendo
um para os pacientes do sexo masculino e o outro para os do sexo femenino, ambos com as
suas respetivas casas de banho.
Caracterização do Serviço de Pediatria
O serviço de pediatria é constituído por cinco salas, uma para a observação de crianças com
gastroentrites, duas para infeções respiratórias e outras duas dirigidas a situações de
isolamento.
No fundo do corredor, encontra-se dois gabinetes de atendimento, uma sala de reuniões e
uma sala onde fazem a triagem dos doentes. Na parte traseira da enfermaria onde se
encontram dois gabinetes destinados a consulta externa, existe um refeitório que também
serve de espaço de entretenimento das crianças. Ao lado do refeitório, tem acesso a um
quarto com cinco beliches e uma casa de banho. Esse quarto é destinado às acompanhantes
que se deslocam das outras ilhas. E fica afastado dos quartos das crianças.
Ao fundo do corredor da enfermaria existe um parque de diversões que de momento,
encontra-se, abandonado. Quanto ao corpo técnico, este possui nove médicos pediatras,
cinco enfermeiros de turno, um enfermeiro chefe, quatro serventes, uma uma copeira, e
uma educadora de infância.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 15
Caracterização do Serviço de Medicina
A nivel da estrutura, este serviço é constituido por um gabinete médico onde são realizadas
reuniões entre si. Existe um gabinete de enfermagem, e no mesmo espaço encontra-se o
serviço administrativo, e possui também um refeitório. Quanto às enfermarias, existem
cinco quartos sendo que quatro possuem oito camas e uma tem seis Logo, toda a enfermaria
tem a capacidade de suportar trinta e oito camas.
Em relação às enfermarias, dois quartos são para os pacientes do sexo masculino, dois são
para os do sexo feminino e o outro é dividido em seis compartições com capacidade de uma
cama destinada a patologias diversas. Também há um gabinete de enfermagem, uma sala de
procedimentos e de tratamentos, a sala de preparação de medicamentos, o espaço de troca
de vestuário dos técnicos de enfermagem, duas casas de banho para os pacientes, uma para
os homens e outro para as mulheres. Também possui um espaço destinado ao pessoal
auxiliar, uma arrecadação de resíduos hospitalares, e um gabinete destinado ao médico
director do serviço.
Quanto ao corpo técnico, o serviço dispõe de doze médicos que trabalham no período das
oito horas às quinze, e a maioria faz urgência. Possui um enfermeiro chefe, onze
enfermeiros que fazem escala, um auxiliar de enfermagem, uma assistente administrativa e
cinco auxiliares, entre eles os de limpeza. Nesta enfermaria as demandas mais encontradas
são as de doentes de abstinência alcoólica, sendo que a maioria é do sexo
masculino.Também, hipertensos, doentes de Acidentes Vasculares Cerebrais (AVC),
diabéticos, muitas vezes descompensados, casos de HIV, Pneumonias, diarreias, Infeções
respiratórias, Tuberculose entre outros.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 16
CAPITULO II - DESCRIÇÃO DA INTERVENÇÃO NO ESTÁGIO
As atividades realizadas no âmbito do estágio tiveram como finalidade por em prática,
procedimentos no campo da psicologia clínica e da saúde. Realçando o contacto com o
quotidiano da instituição, ganhando experiências, vivenciando a dinâmica laboral, e acima
de tudo aprendendo com os profissionais da área da psicologia e os demais.
O processo de estágio decorreu em três contextos: Na enfermaria de saúde mental, as
consultas externas, nas enfermarias de Pediatria e de Medicina.
Intervenção no Serviço de Saúde Mental
Fase inicial (período de adaptação)
O estágio, iniciou-se no dia 13 de Outubro, precisamente, no serviço de saúde mental.
Deu-se primeiramente o encontro com a orientadora do estágio cujo objetivo consistiu em
conhecer o plano e o processo de estágio em si.
Nos dias seguintes, foi-nos apresentado os técnicos do serviço entre eles, psicólogos,
psiquiatras e enfermeiros. Posteriormente fez-se uma visita guiada pelo serviço com o
objetivo de conhecer o espaço físico onde o estágio iria decorrer. Este período teve a
duração de um mês e, durante esse tempo, realizou-se seminários com a orientadora onde,
os primeiros tiveram como tema, “a avaliação psicológica”, uma vez que é o processo mais
importante a realizar durante o proceso de estágio, e também, como forma de consolidar os
conhecimentos adquirido ao longo dos anos de formação em relação ao referido tema.
E consoante a necessidade surgida nesse período e apresentada como prioritária, foi-se
trabalhando vários temas de extrema importância para o processo. Ainda nessa fase, e com
a autorização da orientadora do estágio, foi-nos ministradas algumas aulas de
psicofarmacologia por um psiquiatra do serviço.
Foi um período basicamente de observação, consulta das fichas dos pacientes internos, e de
seminários ministrados pela orientadora.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 17
Intervenção
Durante este período de estágio, participou-se das visitas médicas realizadas nas camas
cujo objetivo é ter conhecimento dos pacientes que se encontram nas enfermarias, fazer um
balanço breve do seu estado psicológico e também físico. Fez-se entrevistas clínicas aos
pacientes internos para conhecer melhor estes, através da triagem, conhecendo a dinâmica
pessoal dos pacientes, realizando exames psíquicos para conhecer o estado atual, avaliando
várias esferas como a perceção, a orientação, o discurso, a consciência etc.
Na entrevista clínica realizou-se o exame psíquico para conhecer a evolução dos pacientes
durante o internamento. Procurando saber, como reagem ao processo, para saber se estão
mais equilibrados ou se o seu estado evolui para melhoria ou não. Também, realizou-se
reuniões comunitárias. A reunião comunitária tem como objetivo, através da interação,
saber do estado dos pacientes, de como reagem e encaram o processo de internamento.
Realizou-se dinâmicas de relaxamento também para conhecer a opinião que têm em relação
a questões como a medicação, saúde, família entre outros. Realizou-se muitas dinâmicas
nas reuniões porém, em algumas ocasiões, essa atividade é deturpada pelos pacientes em
estado de desorganização e acabam por levar a interrupção da mesma. As actividades
ocupacionais foram realizadas semanalmente no âmbito da época natalícia, carnavalesca,
páscoa, e em outras ocasiões. Juntamento com os pacientes fez-se a decoração do espaço
de saúde mental. Pode-se dizer que as actividades ocupacionais têm efeitos calmantes para
os pacientes.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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Intervenção no Serviço de Pediatria
No contexto da pediatria realizou-se actividades como, visitas às camas prestando apoio
psicológico aos pacientes internos e aos que se encontram sobre observação médica, cujas
acompanhantes se encontram na espectativa de internamento.
Todas as terças feiras, passava-se uma ficha pessoal às acompanhantes para obter os dados
das crianças e conhecer as causas de internamento.
Quanto as actividades com as acompanhantes, fez-se dinâmicas de grupo e algumas sessões
de orientação. Com as crianças, as actividades foram realizadas a volta da ludoterapia, com
jogos, desenhos, pinturas, exposição de desenhos animados, de forma a amenizar o impacto
da hospitalização. Também em muitos casos houve necessidade de incutir nas mães uma
posição mais activa perante a falta de informação que estas têm durante o período de
internamento dos filhos. Foram feitas sessões de orientação, informação e devolução com
as acompanhantes, visto que essa parte consiste numa lacuna no serviço de pediatria.
De Dezembro a Fevereiro, houve muitos casos de acidentes domésticos principalmente
queimaduras e nessa línea realizou-se algumas actividades expositivas para sensibilizar as
acompanhantes a prevenção desses acidentes.
Foi realizado ainda nesse período sessões de devolução das doenças mais frequentes na
enfermaria da pediatria como (as bronquites, pneumonias, diarreias etc.) com o objectivo de
dar a conhecer às acompanhantes o que são essas doenças, dos riscos que elas acarretam e
de como preveni-las. Também já no final dos dias na enfermaria, realizou-se uma aula de
primeiros socorros ministrada por um bombeiro, direcionada aos acompanhantes das
crianças internadas cujos os temas foram:
Engasgamento, afogamento, queimaduras e fraturas. Foi uma actividade muito
interessante, houve muita aderência dos acompanhantes, dos estagiários de enfermagem do
serviço, dos enfermeiros e de estagiários de outras enfermarías.
A passagem por este serviço teve a duração de dois meses.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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Intervenção no Serviço de Medicina
Na enfermaria de medicina, as actividades foram realizadas duas a três vezes por semana
isso devido a casos pontuais que se encontravam no serviço. A intervenção, desenrolou-se a
volta do apoio psicológico e do aconselhamento dirigido a maior parte das vezes aos
utentes em abstinência alcoólica, e aos diabéticos. Esse apoio, foi dado na cama visto que
alguns dos utentes têm dificuldades em se manter de pé e até mesmo sentados.
A intervenção neste serviço não abrangeu todos os pacientes internados mas sim, aqueles
com uma maior necessidade de uma intervenção psicológica na maioria das vezes da
triagem que se fez através das visitas às camas dos pacientes.
Foi muito satisfatório dar o meu contributo nesta enfermaria, a equipa técnica deu-me o
apoio que precisei para poder fazer o meu papel. Foi um período proveitoso.
A passagem por este serviço teve a duração de um mês.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 20
CAPITULO III - APRESENTAÇÃO DOS ESTUDOS DE CASO
Justificação da escolha dos casos
A escolha do primeiro caso foi fácil. Isto porque foi um caso interressante de trabalhar e de
se discutir, através do qual, aprendi muito e pelo qual dediquei muito também.
Neste caso o vínculo terapêutico foi estabelecido de forma muito positiva e sólida,
facilitando assim o processo terapêutico.
O segundo caso, foi escolhido devido a necessidade sentida num dos contextos das triagens
realizadas durante o estágio na enfermaria da pediatria. Uma vez que se trata de uma mãe
que se encontrava nesta enfermaria com o filho à espera de uma evacuação, e senti que ela
carecia de apoio psicológico.
O meu empenho nestes casos consistiu em ajudar os pacientes a mobilizar recursos que os
permitisse lidar melhor com as suas dificuldades.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 21
Apresentação do Caso 1
Fundamentação Teórica
Conceito de Personalidade
Segundo Carver e Scheier (cit. in Baptista, 2008), a personalidade corresponde a um
processo e uma organização dinâmica e activa no interior do individuo.
É um conceito psicológico cujas bases são fisiológicas que respondem a uma força que
determina a forma como o individuo se comportará. Ela é constituída por padrões de
respostas recorrentes e consistentes e não se reflete apenas numa direção, mas sim em
várias, à semelhança dos sentimentos, pensamentos e comportamentos (Schultz e Schultz,
2002).
Conceito de Estrutura de Personalidade
De acordo com Hesnard (cit. in bergeret 1996), a estrutura do organismo resulta das
múltiplas correlações ontogénicas que se transformam para dar as correlações do adulto. E
que o termo estrutura implica uma disposição definida, segundo a qual as partes de um todo
estão disposto entre elas. Em certas teorias filosóficas ou psicológicas, entre as quais a
teoria da Gestalt, a estrutura torna-se um conjunto indivisível, percebido globalmente pelo
individuo em função da significação que tem para si. Assim, cada elemento só é válido em
relação ao conjunto.
Organização Limite ou Boderline
O que é próprio do estado limite, é apresentar-se do ponto de vista estrutural, e em todos os
pontos, como intermediário entre neurose e psicose. Sabemos que o específico da estrutura
neurótica assente num arranjo das condições de armistício no conflito latente que opõem o
Id ao Superego através do Eu. Este conflito só pode ser considerado genital e edipiano. A
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 22
estruturação psicótica por seu lado, corresponde a um conflito entre pulsões e realidades,
conflito de que o Ego se encontra excluído (Bergeret, 1996).
A organização limite não se situa em nenhuma destas dialécticas. Trata-se antes de mais, de
uma doença do narcisismo. Tendo ultrapassado o perigo da psicogénese de tipo psicótico, o
Ego não pôde, todavia, chegar a uma psicogénese de tipo neurótico; a relação de objecto
continuou centrada na dependência anaclítica em relação ao outro; o perigo imediato contra
qual todas as variedades de estados limites lutam é, antes de mais, a depressão (Bergeret
1996).
Segundo Coimbra de Matos (2002), nestas estruturas, as relações de objecto são marcadas
pela identificação narcísica ou projectiva e o outro é investido à sua imagem e semelhança,
como um duplo narcísico, um alter-ego em imagem espetacular. O outro é um duplo, uma
extensão de si próprio ou um instrumento. Isto é, algo ou alguém que o completa por não se
sentir inteiro. E uma das características nucleares da personalidade boderline é a ausência
de relações complementares. As relações, no boderline são de completação e não de
complementaridade (Matos, 2002 p. 26).
Personalidade Dependente
Segundo Bergeret (1996), personalidade dependente ou personalidade passiva, consiste
numa estrutura de personalidade caracterizada por uma excessiva dependência dos outros
para tomar decisões, baixa auto estima, medo do abandono, submissão e passividade as
vontades dos outros.
A necessidade de abstração, à dificuldade nas afirmações a rigidez moral, todos estes
factores parece poder explicar muito bem grande número desses casos. Isso pelo receio de
falhar perante o ideal parental (Bergeret, 1996). Segundo o autor, o caracter psicasténico foi
muitas vezes incluído entre os caracteres obsessivos. Porem muitos psicasténicos
reconhecem-se mais pelos seus comportamentos depressivos do que pelos aspectos
compulsivos. Os indivíduos com esta personalidade têm dificuldades em manter
relacionamentos, embora não haja dificuldades em estabelecê-los, e apresentam baixa
tolerância á frustração (CID-10).
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 23
O Ego Anaclítico
Os autores que se interessaram pela economia das organizações limites como w.d. Fairbain
(1952), Robert Knight (1954) cit. in Bergeret (1996), sempre insistiram, mais ou menos,
sobre a coexistência, no seio da personalidade limite, de dois sectores operacionais do Ego,
permanecendo um no quadro de uma clássica adaptação aos dados da realidade exterior e
funcionando outro num modo muito mais autónomo em relação a realidade, e
essencialmente fixado nas necessidades narcísicas internas. Esta dualidade de sectores
operacionais não pode ser confundida com uma verdadeira clivagem do Ego como se
encontra nas estruturas psicóticas.
Bergeret, (1996) mostra que não se trata, de forma alguma, de um estilhaçamento, mesmo
parcial, do ego, mas de uma reação defensiva nas actividades do ego, destinada a evitar,
precisamente, a ameaça de explosão, tal como (Freud 1938) cit in Bergeret, 1996 descreveu
em 1938, no seu artigo sobre a clivagem do Ego nos mecanismos defensivos.
O Ego deforma-se nalgumas das suas funções e vai operar em dois registos diferentes: por
um lado, num registo adaptativo em todo o campo relacional onde não existe para o
individuo qualquer ameaça, quer no plano narcísico como no plano genital, por outro, num
registo anaclitico, desde que surja uma ameaça de perda de objecto, na sequência de perigos
que se colocam tanto no plano narcísico como no genital (Bergeret 1996). Os sujeitos em
questão permanecem numa luta constante contra a depressão, resistem mal a frustrações
actuais que acabam por acordar as frustrações infantis significativas. Esses sujeitos são
frequentemente percebidos como «esfolados vivos» sentem-se mal estabelecidos,
permanecem frágeis e existe neles uma excessiva necessidade de compreensão, respeito,
afecto e de suporte (Bergeret, 1996).
Os Caracteres Narcísicos
Segundo Bergeret (1996), este caracter corresponde a uma adaptação relacional da
organização narcísica descrita nos estados limites. De facto como se descreveu inúmeras
vezes, a economia narcísica, ao nível em que se considera na organização limite, refere-se
sempre a uma dialéctica, quer dual quer triádica. Segundo o autor, economia funcional é
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 24
estruturalmente ultrapassada, mas a economia triangular edipiana ainda não foi atingida. E
a relação de objecto é sempre anaclítica.
A angústia que subtende todo o grupo de economia narcísica é um medo de perder um amor
e a proteção do objecto.
O Caracter Abandónico dos Caracteres Narcísicos
O caracter abandónico é aquele que reflete mais fielmente a angústia de perda de objecto
sem chegar até ao aspecto patológico da «neurose de abandono» descrita por Guex (1950)
cit in Bergeret, (1996). Os três pilares da variedade abandónica do caracter narcísico são a
angústia de abandono, a não valorização e a agressividade reactiva. O sujeito sente
dificuldades em afirmar-se e duvida facilmente das suas próprias capacidades de ser amado
e de enfrentar os outros.
A sua susceptibilidade está sempre em «vigília»; a mínima «falta», afectiva ou
materializada no tempo ou no espaço, poderá desencadear uma vivência hostil. A
ambivalência arcáica mantém-se bem viva e o mínimo fantasma de distância desencadeia-a
muito vivamente (Bergeret, 1996).
Parece evidente para a maioria dos autores, que estes mecanismos automáticos e brutais
remetem para fixações infantis, em relação as separações dos pais, num desmame, uma
entrega uma ama-de-leite ou a um internato onde, o tempo exacto da separação é avaliado
pela criança como indeterminado (Bergeret, 1996).
A Angústia Depressiva
Esta angústia surge quando o sujeito imagina que o seu objecto anaclítico corre risco de lhe
fazer falta, de lhe escapar. Segundo Bergeret, 1996 é uma angústia de perda de objecto, e o
anaclítico poderá soçobrar-se na depressão. O sujeito tem necessidade do outro ao seu lado.
Ele receia os perigos de grande aproximidade mas, não consegue resolver-se a permanecer
só. Isso porque a presença do outro o tranquiliza mesmo que não haja um desenvolvimento
afectivo onde a angústia de castração está sempre presente, visto que é uma angústia de
falta, dirigida ao outro que quando não é satisfeito, leva a uma reação depressiva ( Bergeret,
1996).
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 25
A Intimidade Afectiva e as Relações de Casal
Segundo Donal Winnicott pediatra e psicanalista inglês, (cit. in Passini, 1993), as pessoas
com dificuldades nos contactos pessoais são indivíduos envolvidos por uma dura couraça
que protege um núcleo central inseguro e mole. Cada processo de amadurecimento pessoal
consiste na aquisição de uma progressiva confiança em nós próprios (Passini, 1993). Só
nestas condições é que a pessoa poderá retirar a proteção sem medo e transformar a couraça
numa membrana periférica e permeável a trocas com os outros.
A flexibilidade de uma relação íntima depende de como funciona a dinâmica da relação
que por sua vez, está intimamente ligada às personalidades desta mesma. Segundo Passini
1993, o individuo na constante procura da metade que lhe foi negada por uma anatomia
nem sempre de acordo com a psique, vai para além da carne. E arrastando pela vida o que
Passini chama de uma «desnutrição afectiva», pode afectar a boa comunicação e a própria
sexualidade do casal.
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Estudo de Caso 1
Nome: G.H Idade: 55 anos Data de nascimento: 12/ 10/1960
Profissão: professor E.B.I Residência: Rª de Craquinha Estado Civil: Casado
Motivo da consulta:
Apresenta como queixa, problemas conjugais, (conflitos com a esposa) com episódios de
insónia, desmotivação pessoal e laboral. Segundo o paciente estas queixas vêm arastando
há alguns anos atrás.
Entrevistas
Durante o processo de avaliação psicológica realizei dez (10) entrevistas.
1ª Entrevista
G veio à consulta porque segundo ele ao longo dos anos, o seu relacionamento tem sido
muito problemático, de muita desconfiança por parte da esposa, conflitos e ofensas verbais.
Alega que esta situação vem se arrastando há anos e pensa seriamente em divorciar-se.
Segundo o paciente, não é a primeira vez que procura ajuda devido a esta situação. Alega
que antes do casamento, o relacionamento não estava bem e decidiram casar para ver se a
situação melhorava, mas refere que os conflitos se acentuaram mais.
Alega sentir-se perturbado, angustiado, tem insónias, e refere que a esposa só faz
cobranças. Diz que já não há diálogo entre eles há muitos anos e que a esposa vive
desconfiando que este tem outras relações extraconjugais. Afirma sentir-se muito mal, que
a situação tem afetado não só a sua vida pessoal e conjugal, mas também o trabalho pois
refere que não tem conseguido concentrar-se no mesmo, não tem vontade de estar dentro de
casa, prefere estar mais tempo na rua.
Ao perguntar-lhe como se sente com a situação, diz não aguentar mais e que já pediu
divórcio mas a esposa nega sempre dizendo que não casou para se divorciar. Alega não
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saber o que fazer perante a situação e que algumas vezes sente-se tão angustiado que já
pensou em pôr termo a vida. Senti isto como um pedido de ajuda. Segundo G, já não saem
juntos, as suas rotinas se desencontram porque trabalham em períodos diferentes e à noite
mal conversam ou então brigam. Ao questionar-lhe sobre os momentos agradáveis, este diz
que já não consegue lembrar-se de momentos bons com a esposa, embora diz que nem
sempre foi assim, que nos primeiros anos de relacionamento davam-se bem, Saiam juntos, e
agora cada um sai para o seu lado.
Senhor G, aparenta estar um pouco depressivo, demonstra ser uma pessoa muito passiva.
Por exemplo, é ele quem lava e passa as suas roupas, caso esteja na cozinha a esposa diz-
lhe para sair e segundo G, sai magoado e sem ripostar. Aparenta ser uma pessoa calma, não
demonstra raiva ao falar da situação e da esposa, e segundo ele está sem esperança para o
seu casamento pois alega não ver solução. Senti muita mágoa, muita angústia na forma e
no momento que fala da situação, pois aparenta viver acomodado alegando que o que sente
sempre é obrigação e menciona constantemente em divorciar-se ao longo de toda a sessão.
2ª Entrevista (Historia de Vida)
Senhor G chegou, cumprimentou-me, sentou-se e esteve muito a vontade.
Hoje, tive a necessidade de lhe pedir que falasse sobre a sua infância no sentido de colher
algum material que permitisse compreender melhor a sua problemática e personalidade.
Nesta sequência começou por suspirar dizendo: « ai, ai, a minha infância…!» ( sic ).
Diz que ficou órfão de mãe aos dois anos quando esta dava a luz a um outro filho, onde
ambos a acabaram por falecer. Após o falecimento da mãe, o pai entregou-o à avó paterna
que o criou, e afirma «minha avó foi minha mãe e meu pai» (sic). Pois refere que, o pai
nunca cuidou dele.
Os outros irmãos foram entregues a uma tia, tendo-se criado afastados uns dos outros. De
seguida diz “Eu gostaria de ter conhecido a minha mãe” (sic), o que foi dito acompanhado
de uma expressão triste e de um olhar melancólico. Não se recorda nada da mãe pois era
muito pequeno. Diz ainda que graças ao amor e o esforço da avó, conseguiu estudar, não
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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passou muita fome, embora a avó o castigasse muito, pois era muito rígida, mas que apesar
disso ela gostava muito dele e o chamava de «meu menino» (sic).
Conta que a sua infância foi muito dura porque apesar da ajuda da avó, não tinha mãe, não
tinha atenção do pai, alegando que este lhe parecia até mais distante que a própria mãe que
havia falecido. Ao dizer isto pedi-lhe que me explica-se melhor esta parte, ao que responde
dizendo que nem ele próprio sabia explicar bem isto, mas a verdade é que quando era
criança sentia a presença da mãe apesar de não a ter conhecido. Pois sentia uma presença
estranha principalmente quando se sentia triste. Já o pai sempre foi ausente, frio, um
estranho.
Relata que na adolescência, ajudava muito a avó nos trabalhos domésticos. Carregava
cargas, ia buscar água em locais muito distantes e ainda tinha um longo caminho todos os
dias para ir a escola. Acrescenta que tinha que ajudar a avó mesmo quando se sentia
cansado, porém, tinha de ser porque a avó era a única pessoa que se preocupava com ele, e
que o motivava a estudar, enquanto que o pai dizia-lhe para desistir da escola. Refere que
sentia uma tristeza enorme pela indiferença do pai e até hoje sente essa tristeza pois, não
lhe fala.
Alega não ter tido muitos amigos na infância e na adolescência, pois mal tinha tempo para
brincar e também porque os colegas viviam em zonas muito afastadas e caso percorresse o
caminho para ir ter com algum colega para brincar, ao regressar, levava uma sova da avó.
De seguida, perguntei-lhe da sua infância e adolescência responde que, ao olhar para trás,
para o seu passado, vê uma infância muito sacrificada, cansada, e lembra-se também da
avó. Acrescenta que lutou muito para ser alguém na vida. Sempre estudou, muitas vezes
com a ajuda de estranhos, e quando conseguiu uma vida estável, trouxe a avó para viver
com ele e ajudou-a sempre naquilo que podia. No final, acrescenta que nunca ninguém
falou da mãe para ele, nem mesmo a avó, e sempre teve vontade de saber quem ela era, e
como era. E houve uma época quando era mais jovem, ouviu falar de uma senhora na ilha
do Sal que conheceu bem a mãe desde criança e partiu para o Sal ter com essa senhora mas,
pela sua infelicidade, a senhora já era muito idosa e já não se lembrava bem das coisas.
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Quando disse isso, percebeu-se uma tristeza na voz do senhor G, algo que o transparecia
não só na voz como também no olhar.
Posteriormente, a avó veio a falecer num incêndio em casa e o pai culpa-lhe pela morte
dela e segundo ele, os aspectos que mais o magoa na vida até então, é esta acusação que o
pai fez e que continua fazendo. G afirma que e há dois anos atras entrou para a Igreja
Evangelista onde e é diácono há um ano. Ao questionar-lhe sobre esta função de diácono,
diz que encontra muitas vezes na Igreja e na sua função de diácono alivio, paz de espírito e
quando se sente angustiado é onde vai procurar paz e apoio. Diz “É onde procuro forças
para viver”. (Sic)
3ª Entrevista
Neste dia Chegou dizendo que se sente desmotivado, cansado da situação. Segundo G, a
esposa acusa-o de não ajudar com os deveres de casa, procura sempre motivos para
entrarem em desavenças, acusando-o, cobrando sempre dele.
Ao perguntar-lhe o que tem sentido ao longo desses anos, G diz que sente que entre ele e a
esposa já não existe amor, carinho companheirismo e sente que o seu casamento foi um
erro. Alega cansaço, sem forças para continuar na situação que se encontra, e que muitas
vezes, até tem medo de dormir com a esposa pois ésta segundo ele, é muito autoritária e
muitas vezes tem medo da forma como ela fala com ele. A forma como G refere a esposa
deixa a impressão de uma pessoa autoritária e intolerante.
G Pede ajuda alegando não saber o que fazer. Alegando que se encontra ainda nesta
situação conjugal pelo facto do filho se encontrar a estudar fora do país e não pretende
prejudicá-lo. De seguida questionei-lhe sobre a sua relação com o filho, ao que respondeu
que sempre foi boa e que ele nunca lhe deu muito trabalho. Remetendo de seguida para a
relação com a esposa onde sublinha alguns detalhes da relação como, por exemplo, o facto
de que cada um a ocupa dos seus afazeres. Diz actualmente, evitar conversar com a esposa
para que não surgem conflitos. No entanto, neste momento sentí a necessidade de mostrar-
lhe a importância de uma abordagem conjugal e da participação da esposa neste processo.
A partida, mostrou alguma resistência dizendo que não, que não valeria apena. Ao pedir-lhe
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 30
que explica-se, responde que sente que não existe outra solução a não ser o divórcio.
Afirmando que iria pedir definitivamente o divórcio, demostrando-se descredito e
desmotivado.
Disse-lhe que esta decisão cabe a ele e a esposa. Nesta sequência senti alguma mudança
em relação a ideia de divorciar-se, dando a impressão que passou a admitir outras
possibilidades de resolver o problema conjugal pois saiu da consulta disposto a falar com a
esposa.
4ª Entrevista
G apresentou-se menos angustiado, veio com um discurso menos pessimista, e menos
desesperançoso mostrando alguma disposição ao releve, de querer fazer algo em relação ao
seu casamento, pois em momento algum nesta sessão mencionou o divórcio. E Mostra-se
disponível a mudança.
Ao longo desta entrevista, esteve muito colaborante, no discurso não mencionou o
divórcio, embora salientando a falta de carinho por parte da esposa. Não mencionou nunca
em separar, embora queixando sempre que esta não o dá carinho, é fria e que em “casa o
silêncio invade as paredes” pois parecem dois estranhos partilhando o mesmo espaço.
Ao perguntar-lhe se abordou a esposa aproposito do que já havíamos conversado nas
sessões anteriores, acerca da sua participação no processo no sentido de ajudá-lo ou de lhes
ajudar, responde afirmativamente realçando que ela alega não poder vir as consultas, tendo
em conta que trabalha no período de tarde que coincide com o horário da consulta.
Entretanto apresentamos uma outra proposta como alternativo que é neste caso vir no
período de manhã no serviço de saúde mental, não recusou e comprometeu-se em aborda-la
no sentido desta segunda proposta.
Ao terminar a entrevista, G comenta que sai da consulta mais aliviado esperançoso e que
aquilo que mais deseja é ver melhorias no seu casamento, e poder concentrar-se nas suas
tarefas diárias alegando ter-se sentido desestabilizado, incapaz de agir perante os seus
problemas, e diz estar disposto a fazer algo.
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Universidade do Mindelo 31
5ª Entrevista
G chegou, cumprimentou-me e começou a falar. Esta foi uma sessão de cartasse.
Neste dia traz conteúdos mais pessoais. Esteve a vontade falou de si, dizendo que não teve
uma família, e que tinha tudo para não dar certo na vida pois não teve apoio. Falou das suas
vontades daquilo que mais teme, que é viver um casamento infeliz.
De seguida fez uma retrospectiva da sua vida, falou do seu pai, de como este o tratou mal
quando criança, não lhe deu afecto nem amor, não quis que ele estudasse, mas que ajudasse
a avó em casa. Depois remete outra vez a relação. Falou das actividades que antes fazia
sozinho e com a esposa, falou dos filhos, de como a casa é vazia sem eles, e de como sente
sozinho.
Diz que tem saudades dos barulhos que os filhos faziam, das brigas e desacordos, das
disputas entre eles, e que a casa ficou triste depois que cada um seguiu seu caminho e com
os problemas actuais, a casa parece ainda mais vazia. Neste momento, fez pausas e voltou
a falar de si. Remeteu a sua juventude pois diz que trabalhou muito quando jovem e que
sofreu por não ter tido um apoio paterno e por ter perdido a mãe ainda muito criança.
Neste momento particularmente ao falar do pai, Sentiu-se uma grande tristeza vinda dele, e
uma grande mágoa por não ter crescido com a mãe pois esta faleceu aos seus dois anos de
idade.
Pelo que percebi, trata-se de uma pessoa cujo presente esta imbuído, das experiências
anteriores como por exemplo a perda da mãe. Depois de ter colocado material significativo,
perguntei-lhe como se sentia, diz sentir mais leve, e pediu desculpas, alegando não me ter
deixado falar e ter falado sempre sozinho. Deixei o paciente a vontade dizendo-lhe e que
não havia problema nenhum.
6ª e 7ª Entrevista
Neste dia G veio muito abatido, desesperançado, um tanto depressivo alegando não ter mais
forças para a situação. Foi uma sessão apática sem grandes evoluções em termos verbais.
Porém em termos expressivos, utilizou expressões de profundo desalento, uma postura
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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corporal caída, e desanimada. Ao perguntar-lhe o que tinha acontecido para estar assim
desanimado, uma vez que na sessão anterior esteve aparentemente bem, diz que, tem vindo
a tentar conversar com a esposa, e pedindo que ela venha as consultas mas ésta, sempre tem
algo mais importante para fazer e não dá importância às consultas. Veio de novo com a
questão do divórcio dizendo que acha que será melhor para os dois.
Estas duas sessões foram direcionados com o objectivo de realçar a necessidade de trazer a
esposa a consulta para que seja necessário trabalhar o casal, caso contrário só se consegue
trabalhar com o senhor G. Senti a dinâmica desta sessão foi apática tal como ele se sentia.
Saiu dessas últimas sessões embora desanimado, e foi disposto a tentar trazer a esposa para
a consulta. Estas duas sessões foram mais diretivas no sentido de realçar a presença do
casal. E foi mais uma vez com este compromisso de trazer a esposa ao processo.
8ª Entrevista (entrevista ao casal)
G de 55 anos e M de 54 anos.
Neste dia, entraram, sentaram-se, as cadeiras já estavam assim dispostas, um ao lado do
outro. Durante algum tempo permaneceram em silêncio.
Apresentamo-nos a esposa tendo em conta que este é o primeiro contacto com ela. Apôs as
apresentações, contextualizamos a entrevista realçando que já há algum tempo, temos vindo
a realizar o processo terapêutico com o marido. Tendo em conta que ao longo deste
processo, tem emergido questões importantes relativamente ao relacionamento do casal,
achamos necessário, a presença da esposa neste processo como foi comunicado.
De seguida perguntamos ao senhor G, se gostaria de dizer algo ao que, começou a falar
dirigindo-se a esposa. Reforça explicando a esposa o motivo pelo qual veio a procura de
ajuda psicológica realçando a situação conjugal que tem vivenciado ao longo de vários
anos, das necessidades do próprio como por exemplo: A falta de atenção da esposa, falta de
carinho e amor, alegando ainda o facto de já não se falarem e não se relacionarem mais,
reforçando que tem vindo a esta consulta, a procura de ajuda.
Neste momento, perguntamos a esposa se tinha algo a dizer ou comentar relativamente ao
que o senhor G disse, ao que imediatamente respondeu alegando que o marido tem sido o
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 33
responsável por esta situação. Pois realça que o marido não da atenção em casa “não liga a
familia” (sic), reforçando esta ideia alegando que ele da mais atenção a estranhos do que a
família particularmente, a ela.
Diz ainda que o marido não é zeloso e não se preocupa com ela. A senhora M presentifica
experiências vivenciadas no passado acrescentando que o marido falhou. Ao pedir-lhe para
explicar um pouco mais sobre o assunto, ela responde com um exemplo: Dizendo que, o
marido chegou a acariciar outras mulheres (duas colegas de trabalho) a sua frente. Explica
que o marido acariciou uma delas passando-lhe a mão sobe os cabelos, e a outra no traseiro.
Neste momento, ele corta-lhe negando dizendo que não se lembra deste episódio. Senti a
esposa uma pessoa que rumina sempre aspectos do passado, busca e trá-los para os
conflitos recentes. Revive mágoas passadas mostrando guardar ressentimentos do marido.
Senti-a fria afectivamente em relação ao modo como dirige ao marido.
Neste momento, entraram em diálogo, acusando-se mutuamente, aspectos que o marido tem
vindo alegando sobre a relação com esposa. A senhora M reforçou ainda a questão do
marido não dar atenção em casa. Estas são as que ela mais refere. Foi o momento mais
intenso da comunicação entre eles pois discutiram, colocaram as mágoas que sentem em
relação ao outro. Provavelmente este momento poderá ter constituído uma oportunidade
para se comunicarem pois conseguiram apontar e tolerar as falhas de um, e do outro.
Tiveram espaço para se justificar e para se escutarem. Neste momento, estivemos quase que
invisível e parecia que o casal estava sozinho.
Neste dia, o papel do terapeuta foi mais de mediação. Com isto perguntamos o que pensam
fazer para melhorar as suas vidas em comum ao que respondem praticamente a mesma
coisa, ambos acabam por mencionar aspectos como prestar mais atenção ao outro, e fazer
menos cobranças. No entanto, percebemos que dirigiam-se um para o outro exigindo
mudança comportamental, durante praticamente toda a sessão.
No final concluímos devolvendo a compreensão tendo em conta a dinâmica e interação do
casal. E a informação obtida durante todo o processo aponta para uma possível dificuldade
comunicacional (padrões disfuncionais, com falsas interpretações, conteúdos e condutas
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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pouco assertivas criando uma bola de neve) mostrando que a comunicação é fundamental
para o funcionamento do casal.
Para terminar, sugerimos um próximo encontro e mostramos a necessidade de um
seguimento ao casal.
9ª Entrevista (vida sexual)
Neste dia comecei por perguntar ao senhor G como se sentia, este respondeu que estava
bem, que a situação em casa estava mais tranquila.
De seguida, tive a necessidade de pedir que falasse da sua relação com a esposa,
nomeadamente ao que este de imediato, retraiu as costas, ficou calado durante um tempo e
de seguida começou a falar.
Primeiramente iniciei pedindo que este falasse de si, dos relacionamentos anteriores, que
teve quando era mais novo ao que ele respondeu de imediato, sorrindo dizendo “Bom, por
acaso antes de casar tive algumas namoradas, algumas bem bonitas até” (sic).
De seguida questionei-lhe de como era a relação com essas namoradas e responde que era
boa. Refere ainda que de todas, teve uma que gostava muito mesmo e tiveram uns anos
crescidos juntos e segundo ele, essa namorada chegou a ficar grávida mas teve um aborto
espontâneo. Nessa época, segundo G, ele não se encontrava presente pois tinha viajado para
Cuba numa formação politica formação esta que segundo G durou um ano. Foi aí que ficou
sabendo do aborto. E quando regressou terminou o namoro com ela por medo da situação
se repetir. Mas alega que de todas as namoradas, esta o marcou muito e apesar de ter
terminado com ela, amava-a de verdade, e diz “fui covarde e abandonei-a” (sic). Ao
perguntar-lhe quando tempo esse relacionamento durou, ele diz que seis anos, e um tempo
depois começou a namorar com a esposa.
Posto isto, remeti-lhe para a intimidade com a esposa, e este suspira, e diz que antigamente,
eram mais íntimos, não tinham vergonha um do outro. Com isto pedi que esclarecesse essa
questão de vergonha um do outro e responde que, antes a esposa não tinha vergonha de
despir a frente dele, e agora tem. E diz que antigamente, quando ela ia tomar banho deixava
a porta da casa de banho destrancada e hoje em dia quando vai tomar banho tranca a porta.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 35
Questionei ao senhor G se faz o mesmo e responde que passou a fazer também porque
passou a sentir como um estranho para a mulher.
De seguida perguntei-lhe como é a intimidade com a esposa nomeadamente a vida sexual,
ao que este retraiu as costas dizendo de seguida que, há anos atrás, era normal, mas hoje em
dia passa mais de quinze dias sem ter relações sexuais com a esposa. Posto isto, perguntei-
lhe se quando tem relações, normalmente quem tem a iniciativa, responde que sempre é ele
que procura a esposa e na maioria das vezes é rejeitado e ela responde que já não quer
estas coisas. Dai que perguntei-lhe de seguida como sente após isso, diz sentir-se rejeitado,
incapaz de cativar a esposa para uma relação e quando é assim acaba por não insistir
durante semanas. G diz ainda que por passar semanas sem ter relações com a esposa, na
hora tem dificuldades em ter uma ereção quando tem, segundo ele, “aquilo vem muito
rápido” (sic). Ao perguntar-lhe propriamente o que queria dizer com “aquilo”, diz “eu
termino muito rápido” (sic) e diz isto um pouco sem jeito. Depois disto fez silêncio. Senti
essa dificuldade de ereção como uma reação, à situação. Neste dia trouce aspectos novos
da relação e que acabam por ir de enconta com a situação do casal.
10ª Entrevista
Nesta sessão Senhor G chegou aparentando-se bem disposto, com um ar alegre, e uma
postura relaxada. Cumprimentou-me e perguntou se eu estava bem, aspecto que nunca tinha
acontecido ao longo de todo o proceso. Ao que respondi-lhe que estava bem, agradecendo.
Nestas últimas entrevistas G presentou-se melhor vestido e perfumado.
Ao perguntar-lhe o motivo de toda aquela disposição ao que respondeu de imediato, que
estava mais relaxado porque, a situação em casa estava melhor, que nos últimos tempos, ele
e a esposa, estavam bem, não discutiam. De seguida perguntei-lhe se têm conversado e
responde que nos últimos dias têm conversado mas pouco, o que considerei bom uma vez
que muitas vezes não dirigiam um ao outro.
Posteriormente, G começou a falar do seu trabalho, de alguns projectos que tem pensado
em fazer em relação ao seu trabalho como professor, mas deixa sempre transparecer a
necessidade de ser aprovado pelos outros antes de avançar: por exemplo, diz que espera que
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o gestor e os outros professores gostam e aprovem o projecto caso contrário, não sabe se
consegue implementá-lo, e na forma como fala mostra mesmo a necessidade da aprovação
dos outros para seguir em frente. De seguida mostrou a preocupação que tem com os seus
alunos, e com alguns colegas que segundo ele estão passando por problemas semelhantes e
segundo ele, tem incentivado esses colegas a procurar ajuda como ele procurou. No
momento em que ele diz isso, perguntei-lhe como tem sentido com o processo e responde,
que sente-se melhor do que no início.
Compreensibilidade do Caso
Com base nos dados recolhidos e, particularmente, nos dados da história de vida pessoal e
familiar, verifica-se que G vem vivenciado situações e acontecimentos ligados a perdas,
algumas com valor traumatizantes e desestruturantes.
Como por exemplo, o falecimento da mãe aos seus dois anos de vida no momento em que
dava a luz a um filho a seguir a ele. Ia nascer um novo irmão.
O pai que afectivamente ausente, entrega-lhe, nesta altura, à avó (mãe deste) que por um
lado, apesar de lhe ter prestado cuidados, e algum afecto, por outro, foi castradora
penalizando-o. Pois, uma relação ambivalente. A culpa inculcada pelo pai, que apesar da
vivência de perda da avó e do valor traumatizante que encerra a morte da mesma, traduzida
pela acusação real da sua morte.
Apesar de não sabermos como foi essa relação primordial (relação materna) até o seu corte,
o que nos levaria a pensar essa relação como uma parte branca da vida dele. No entanto,
infere-se que tenha sido uma relação boa, e positiva isso porque diz que em pequeno sentia
a presença da mãe principalmente quando se sentia triste. Isso explica a angústia de perda
do objecto que vem implicando na sua estrutura de personalidade e na sua vida de relação.
Portanto, praticamente todas a relações objectais subsequentes. Para além dessa perda de
objecto (a mãe), também constitui uma ferida narcísica grande que norteia toda a sua vida,
principalmente com a esposa.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 37
Um exemplo também é o caso da relação com uma das primeiras namoradas pois a questão
do aborto foi vivenciado como uma perda, e cortou a relação com essa namorada. Esse
aborto foi como um ataque ao seu narcisismo e isto, está relacionado com a forma como
lida com esses objectos.
Em relação a avó, em termos de vínculo pode se dizer que o avó ajudou-o a crescer, ela foi
uma figura de gratificação, pois sente grato porque ela o ajudou. Mas em termos, afectivos
pode-se dizer que G cresceu vazio. Quanto à figura paterna, ele acabou por destitui-lo.
Primeiro pelo facto de tê-lo descartado e manteve-se ausente. Segundo, a culpa que lhe
atribui tem valor moral importante e significativo e procura de certa forma redimir-se dessa
culpa na religião que funciona como um escudo.
Não é que sente essa culpa mas, é uma ferida narcísica e está subjacente a isso, uma grande
angústia e sofrimento.
E vivencia essa culpa como uma carga que ele transporta por cima, subjacente a essa
angústia de perda do objecto paterno que nunca teve. Voltando à fase inicial, pode-se dizer
que a etapa de triangulação foi mal resolvida tendo em conta que os objectos importantes
não estavam presentes. E G demanda sempre essa relação. Por exemplo, na religião, pois
ele refere que é na religião que encontra forças e paz de espírito e também serve para espiar
a culpa que o pai lhe impõe.
No seu casamento, a relação que tem com a esposa é ambivalente e entretanto, ele precisa
da esposa pois ela tem um papel importante para a sua segurança nesta relação. E é óbvio
que surgem os conflitos tendo em conta que, a relação que estabelece com a esposa é oca e
as ferramentas que ele usa a seu favor como por exemplo a submissão, nem sempre são
favoráveis.
A própria vida dessa relação é ambivalente. De um lado ele com a sua passividade e do
outro a esposa autoritária. Como se G procurasse o oposto. E isso tem resultado em
conflitos pois, com a esposa já não consegue ter o controlo e no fundo, ele precisa dessa
esposa funcional. E embora esteja nesta relação, tem dificuldades de vinculação com a
mesma.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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G demostra uma personalidade dependente. As personalidades dependentes têm um fundo
narcísico e o narcísico, nesse caso G, sempre precisa do outro para se organizar.
A angústia do objecto em G é central e essa procura activa de vínculo, tem por detrás uma
falha narcísica.
As personalidades dependentes estão directamente ligadas às estruturas Boderline onde
existe esse movimento de aproximação e recuo. E tem muito a ver com a fragilidade
egóica, a falta de segurança básica que G vem apresentando. Com a morte da mãe, todo o
seu amparo desapareceu. O objecto de suporte de tudo desapareceu de uma forma brusca. E
se repararmos, na relação com a esposa, tem esses movimentos de avanço e recuo. G
apresenta uma estrutura Boderline de fundo e traduz-se numa personalidade dependente.
Pois se repararmos, os aspectos neuróticos estão na relação com a esposa.
Também, em termos relacionados à relação terapêutica, tem-se verificado movimentos mais
transferenciais e de identificação que tem sido muito úteis para o processo. Mostra-se mais
preocupado consigo mesmo, com o seu aspecto físico, melhor cuidado (vestes) e não tem
demostrado tanto essa busca activa de vínculo. Os pacientes boderline têm uma maior
capacidade para confiar e não exijam a constante demonstração do terapeuta de que estão a
salvo no consultório (Mcwilliams, 2005).
Em relação ao casal, senti outros aspectos que acabam de certa forma influenciar a
dinâmica desse relacionamento. Por exemplo, G ao falar da ausência dos filhos, sentiu-se
que esse vazio a que ele refere, é o seu vazio pessoal e que provavelmente o casal esteja a
vivenciar o chamado “do fenómeno, ninho vazio” que poderá estar associado a alguns
aspectos desta relação. Pois existe alguma dificuldade dos pais viverem sozinhos, após os
filhos seguirem suas vidas e fica esse ninho como o nome assim diz, “vazio”. E este casal,
desacostumado também, a viver sozinho vai ter que aprender porque a saída dos filhos
muitas vezes implica novas transações, renegociações e que muitas vezes não são bem
trabalhados. Notei também uma certa dificuldade comunicativa entre o casal e senti a
presença de alguns aspectos associados a personalidade de G, como por exemplo, alguma
submissão e passividade pela postura corporal que é notado não só nas sessões mas em
outras situações.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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A relutância que veio apresentando desde o primeira encontro, alegando querer divorciar-se
consistia, basicamente, num mecanismo defensivo que é a de negação pois por sentir-se tão
incapaz de resolver os seus conflitos conjugais, de certa forma agarrou-se a essa ideia como
se fosse uma bengala pois provavelmente para ele tentar uma outra solução exige mexer em
aspectos que lhe gera sofrimento que tem isolado, criando uma barreira.
Ao longo dos encontros foi surgindo outros mecanismos, como racionalização. Senti G
recorrer ao discurso do divórcio, como uma mecanismo defensivo, pois denega uma
possibilidade de mudança precisamente porque sente-se incapaz de resolver os problemas
conjugais de uma outra forma, pois não tem recursos pessoais para procurar uma outra
solução.
E quando mostra-se disponível a mudanças, consolida a nossa interpretação deste
argumento ter constituído um a denegação e que no fundo ao mesmo tempo constitui um
pedido de ajuda. Este mecanismo defensivo tem como núcleo de base a angústia.
G é uma pessoa cujo presente esta imbuído das experiências significativas anteriores e
essas experiências constituem as feridas narcísicas que tem em relação às perdas
significativas que teve na vida.
Hipótese Diagnóstica
Feita a discussão e análise do caso, pode-se dizer que o G E apresenta um transtorno de
Personalidade Boderline .
Propostas de Intervenção
Quanto as estratégias de intervenção, é importante, continuar o processo individual tendo
em conta que G é uma pessoa que precisa organizar alguns aspectos da sua personalidade
no sentido de conhecer melhor as suas características. De seguida proponho:
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
Universidade do Mindelo 40
A terapia de casal tendo em conta que a dinâmica dessa relação, que tem como
núcleo a personalidade do senhor G, em que questões conductuais podem ser
trabalhadas.
A Psicoterapia Psicodinâmica seria de grande valia neste caso a medida que é
importante conhecer a vida do paciente e a medida que dentro das necessidades
terapêuticas forem surgindo aspectos cognitivos e conductuais, pode ser usado a
Terapia Cognitivo- Comportamental.
E a Abordagem Existencialista, uma vez que G é vítima de um problema
existencial, ao perder o objecto de apego, é lançado a vida e cresce de certa forma
oco de afecto.
Apresentação do Caso 2
Fundamentação Teórica
O Stress
Segundo Paúl e Fonseca, (2001) o stress verifica-se quando há um desequilíbrio entre as
exigências ambientais e as capacidades de respostas do organismo (capacidades de coping).
Enquanto conceito relacional, o stress traduz esse desequilíbrio que varia com o estado
psicológico da pessoa, com as condições ambientais, físicas e com a interpretação/avaliação
individual que a pessoa faz das situações concretas e das percepções que possuem e
desenvolvem.
Do ponto de vista de Ogden (2000), é considerado stressor, o que é causado pelo ambiente
externo (por exemplo, problemas no trabalho, doenças) como stress a resposta ao
sofrimento. Sendo que o conceito de stress é visto como algo que envolve mudanças
biopsíquicas, fisiológicas, comportamentais e psicológicas. Lazarus e Launier (cit. in
Ogden 2000 p. 203) consideravam o stress como uma transação entre a pessoa e o meio
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ambiente. Dentro desta definição, o stress implica uma interação entre o stressor e o
sofrimento.
Reação Aguda ao Estresse
Transtorno transitório de gravidade significativa, o qual se desenvolve em um indivíduo
sem qualquer outro transtorno mental em resposta a excepcional stress físico e ou
mental.(CID- 10).
O stressor pode ser uma experiência traumática e esmagadora envolvendo séria ameaça à
segurança ou integridade do paciente ou de pessoa (as) amada (as) ou uma mudança
inusualmente súbita e ameaçadora na posição social, e ou nas relações do individuo. O risco
de esse transtorno se desenvolver é aumentado se exaustão física ou factores orgânicos
estão também presentes (CID-10). A vulnerabilidade individual e a capacidade de
adaptação desempenham um papel na ocorrência e gravidade das reações agudas a estresse.
Sinais de Stresse
Segundo Fonseca (2001), o stress surge a volta de sinais:
Emocionais: em que o indivíduo manifesta-se tenso, irritável, apresenta
sentimentos negativos, fragilidade emotiva, choro com episódios de ansiedade e
depressão.
Físicos: o indivíduo tem dificuldades de relaxar, apresenta cefaleias, fadiga, perda e
ganho de peso rapidamente.
Comportamentais: torna-se negligente consigo mesmo, tem perda ou excesso de
apetite, ineficácia crescente e sensação de afastamento.
Cognitivos: o indivíduo apresenta fraca concentração, distrações, esquecimentos,
pensamentos negativos, sentimentos de desânimo e injustiça.
Relacionais: o indivíduo perde a capacidade para lidar com as necessidades e
exigências das outras pessoas, torna-se impaciente e intolerante procurando evitar
companhia.
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O Impacto Hospitalar em Pais e Acompanhantes de Crianças
As vantagens da presença dos pais durante a hospitalização da criança são amplamente
visíveis e é de esperar que, no que respeita ao conforto da criança com a dor, elas sejam
bem evidentes. Porém tendo em conta o impacto que esta hospitalização causa aos pais,
assim estes reagem emocionalmente (Fernandes, 2000). Essa hospitalização acaba por gerar
no acompanhante ansiedade e expetativas, e uma vez sendo a mãe, os efeitos da
hospitalização do filho podem ser mais intensos.
Podem surgir diversas formas de sentimentos, que vão desde o empoderamento da total
responsabilidade pelo filho até a culpa da impossibilidade de fazer algo mais para ampara-
lo (Fernandes, 2000). A esse respeito, Nugent et al (1992) cit in Toledo 2012, acrescentam
que a doença da criança, com ou sem internação, constitui uma crise não só para ela, mas
também para a família como um todo. Muitas vezes a mãe não está pronta para lidar com
este evento, e mesmo aquelas que assim estão, necessitam de um apoio médico e
psicológico.
No quotidiano hospitalar, a mãe é quem na maioria das vezes, permanece acompanhando
seu filho durante a hospitalização. Dessa forma, a mãe, vivencia muitas vezes momentos de
crise, portanto devem ser ouvidas em suas dúvidas e dificuldades, anseios e preocupações e
sendo ela a principal cuidadora durante todo o processo de adoecimento, internamento e
cura, precisa adaptar-se a situação actual, o que é difícil.
Segundo Toledo (2012), ela sofre por não saber o que pode acontecer ao filho. Pelas
incertezas quanto à doença, e por temer que algo não dê certo, e o filho morra. E
desgastando mentalmente e psicologicamente pode acarretar efeitos nocivos a sua saúde ao
longo prazo.
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Estudo de Caso2
Nome: L.R Idade: 22 anos Sexo: Feminino
Residência: Santo Antão (Porto Novo) Escolaridade: 10º Ano
Filhos: 2 (um 2 anos, e o outro 7 meses).
Motivo da consulta
Apresenta isolamento, descuido com a higiene, e perda de apetite.
Estes síntomas iniciam-se um mês apos o internamento do filho.
Trata-se de uma mãe com um bebé de 7 meses internado na enfermaria de pediatria, que
aguardava uma evacuação devido uma obstrução da uretral, e senti que ela carecia de
suporte psicológico. Os primeiros contactos deram-se durante os dois meses de
internamento num dos contextos das triagens. Quanto aos instrumentos de psicodiagnóstico
foram básicamente entrevistas e observação directa.
Inicialmente, os primeiros contactos foram realizadas no serviço de pediatria e
posteriormente, no serviço de saúde mental até a evacuação. Isso como forma de levá-la a
sair daquele ambiente angustiante e depressivante, e onde há melhores condições em
termos de privacidade e conforto.
Entrevistas
Durante o processo de avaliação psicológica realizei cinco (5) entrevistas.
História Actual
L é mãe de D. L. R. um bebé de 7 meses que veio evacuado de Santo Antão com
problemas no aparelho urinário. Encontra-se internado na enfermaria de pediatria onde foi
diagnosticado, embora não especificado, (uretra obstruída). Pois aguarda evacuação para
Portugal. Para além desta criança, L tem outra de 2 anos. É primeira vez que vem a São
Vicente. O namorado tem a mesma idade que ela, e vive também em Santo Antão.
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O nosso primeiro contacto foi oi durante a triagem no serviço de pediatria onde percebi que
esta mãe carecia de apoio psicológico. Pois apresentava-se abatida, não interagia com
ninguém, não conseguía dormir, e em termos da higiene pessoal percebi, algum descuido.
Os primeiros dados relativos a criança e a mãe foram colhidos na sala de internamento
junto a cama do bebé.
Neste primeiro encontro L apresentou preocupações relativamente aos problemas de saúde
do filho e alguma angústia associado ao que ele tem, alegando que o filho nunca teve
problemas de saúde até então. Demostrou preocupações com a saúde da mãe e também
preocupações financeiras. L vive com a mãe e mais seis irmãos. A mãe tem problemas de
saúde e vive de uma pequena pensão social que recebe. L estudou até o 10º ano e desistiu
após ter ficado grávida do primeiro filho.
Ao perguntar-lhe como se sentia, L, permaneceu em silêncio e de seguida responde que está
preocupada com o filho e não sabe ao certo o que ele tem. No momento que diz isto, sentí
uma grande angústia da sua parte. De seguida fez silêncio e já não mais falou. No final
mostrei-lhe a minha disponibilidade dizendo-lhe que estaria na enfermaria duas vezes por
semana.
Entrevista (com a mãe de L)
Tive a necessidade de entrevistar a mãe tendo em conta que a mesma estava muito inibida,
no sentido de perceber melhor a situação clínica do bebé, a forma como ela está a vivenciar
a problemática do filho, a deslocação da sua residência para a ilha de São Vicente, a
situação de internamento do filho, a espetativa de evacuação para o estrangeiro e a angústia
que se encontra devido a evacuação. Daí que tive a necessidade em termos de recolha de
informação relevante, para a comprensão do problema no sentido de ajudar.
A mãe encontrava em São Vicente no sentido de lhe prestar algum apoio.
Uma das questões que eu coloquei à senhora foi no sentido de me explicar como é que L é,
ao que responde, que ela é uma pessoa muito fechada, fala pouco, apenas o necessário.
Perguntei-lhe como a tem percebido desde que vieram para São vicente, diz que L tem
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estado muito mais calada, mas sente que ela está a sofrer, só que ela não partilha este
sofrimento. Salienta que tem estado preocupada com L porque nos últimos tempos não tem
se alimentado. Pois teria que regresar a Santo Antão e que por este facto sente-se mesmo
preocupada.
Alega que L passa o dia inteiro no quarto da enfermaria sentada na cadeira com a cabeça
entre as pernas, quieta como sempre. Segundo a mãe, não sai do quarto, não se alimenta e
troca de roupa porque a mãe, insiste muito com ela.
Manifestei estar disponivel em apoia-la durante o tempo que em que estiver no hospital,
pelo menos, até a evocuação da criança para Portugal. Não tendo mais informações a cerca
da L e da situaçao vivenciada, encerramos este momento.
1ª Entrevista (com L)
Neste dia cheguei, cumprimentei-lhe. L levanta a cabeça com um ar cansado e retribui
bom dia em um tom muito baixinho, quase não se ouvia.
Perguntei-lhe como estava o filho, responde-me que este tinha chorado a noite toda, pois
tinha muita dor. De seguida perguntei-lhe se já tinha tido algum esclarecimeto
relativamente à doença do filho por parte da equipa médica, responde que não. Ao
perguntar-lhe porque não abordou os médicos sobre o assunto diz-me que tem medo, pois
tem receio que eles briguem com ela e de acharem que ela esteja desesperada.
No fundo tem medo que eles percam a paciência com ela.
Tendo em conta o ar cansado, as expressões angustiadas dela e apresença da mãe aqui,
sugeri-lhe que fosse para casa descansar um pouco. Porém disse que não acrescentando que
quería cuidar do filho ela própria. Neste sentido mostrei-lhe a importância do repouso, do
descançar, neste contexto para poder mobilizar mais forças e energias para continuar a
cuidar dele. Mostrando-lhe ao mesmo tempo que o alimentar-se bem e o dormir são
importantes pois a par do aspecto cansado, desgastado percebia-se também uma fraqueza
geral, uma debilidade, provavelmente asociado não só a um défice na alimentação, como
tambem do sono.
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2ª entrevista
Neste dia chega, cumprimenta-me com um tom de voz meio rouco e com a cabeça baixa,
sentou-se com uma postura encurvada e com a cabeça sempre baixa. Perguntei-lhe sobre o
filho e respondeu-me que ele se encontrava igual. Perguntei-lhe então como se sentía, pela
primeira vez, ela me respondeu com uma frase completa: “sinto-me triste, desanimada
sem vontade de fazer nada” (sic). Acrescenta ainda que não tem conseguido comer, que
sente como se tivesse um nó, na garganta e a comida não passa.
De seguida L perguntou se: “é grave quando evacuam uma pessoa?”(sic)
Cumcumintantemente a esta pergunta senti uma angústia e inquietação, talvez associado a
dúvidas que ela tem acerca da situação clínica do filho. Posto esta pergunta, expliquei-lhe
que em alguns casos, evacuam a pessoa muitas vezes por falta de recursos humanos
disponíveis, e tambem por que os cuidados que irá receber no outro pais são os melhores
devido muitas vezes a falta de equipamento especializado nessa área. Nesta sequência
manteve-se em silencio olhando para mim como se não acredita-se. Por detrás desta
incredulidade há uma angústia, uma insegurança e dúvida de não saber propriamente o
diagnóstico do filho. Até mesmo medo do que vai acontecer.
Perguntei-lhe então sobre o outro filho de 2 anos que se encontrava no momento em Santo
Antão e percebi que L lacrimejou e tentando disfarçar, baixou a cabeça.
Ficou em silêncio, dizendo de seguida que o outro filho tambem esta para ser evacuado, e
esclarece que o filho de dois anos, tem um problema numa válvula do coração e está a
espera de uma última consulta aquí para poder ser a evacuado. Percebi que L contia
bastante o choro dando a impressão mesmo que ia esplodir. Neste contesto, diz que tem
saudades do filho tendo em conta, que já havia algumas semanas que nao o via. Tendo
ficado com o pai e os avós paternos.
Num gesto de desespero, pregunta-me; “O que eu faço com duas crianças doentes?” (sic)
Percebendo o desespero dela, disse-lhe que teria que ter forças e que tudo ia correr bem.
E neste momento, terminamos a sessão.
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3ª Entrevista
Tendo em conta o desespero que havia sentido nas sessões anteriores, e por outro lado a
angústia associado a dúvida relativamente ao diagnostico do filho, resolvi procurar
informações relativamente a situação clínica do filho junto do medico asistente e da
enfermeira chefe. Espliquei-lhe que ele tem um problema na uretra (uma obstrução da
uretra), mais específicamente, dificuldades em dilatar e que é por este motivo que ele tem
dores e chora, sempre que faz xixi. E que a evacuação será no sentido de ele ser submetido
a uma cirurgia com o objectivo de desobstruir a uretra de forma que a urina passe
normalmente. Utilizei o computador mostrando-lhe algumas imagens ilustrativas de
cirurgias semelhantes, no sentido de ela perceber que não se trata de uma cirurgia
complicada.
Apos estes momentos sentí que L ficou um pouco mais aliviada agradecendo, terminamos a
sessão.
4ª Entrevista
Neste dia L chega triste, abatida e muito angustiada. Ao perguntar-lhe o que havia
acontecido, começou a chorar. Disse-lhe para estar avontade e que podía deixar sair para
fora tudo o que estava sentindo. Parou de chorar, ficou um pouco mais calmo e pergutei-
lhe o que havia acontecido ao que responde que o médico veio avisá-la que o filho ia ser
evacuado dentro de dias. Perguntei-lhe então, se não se tratava de um notícia boa,
respondeu que sim mas alega não saber o que fazer.
Diz sentir-se desorientada, pois acrescenta que em São Vicente não tem familiares e que
com o regresso da mãe e do namorado para Santo Antão, sente-se muito sozinha. Tendo em
conta essa angústia perguntei-lhe se haveria algo mais que a preocupa-se ao que respondeu
que tem medo de viajar com o filho mais novo, e deixar o outro que também estava
precisando dela.
Nesta sessão, senti que L se encontrava mesmo num estado de desespero e desorientação
pois colocava as mãos na cabeça, e suspirava. Senti neste momento, que a angústia dela
estava associada ao medo da morte dos filhos. Então comentei que tudo iria correr bem
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com os filhos e que compreendo que a situação nao é fácil mas que é importante acreditar,
ser positiva e que ela é capaz de suportar estas situações.
Neste contexto propus-lhe uma dinámica de relaxamento e de controle de respiração ao que
ela aderiu. Então passei explicar a dinâmica (Dinâmica de relaxamento do tónus muscular
de Jacobson).
Primeiro pedi-lhe que deitasse, e ficasse de forma mais confortável possível. De de
seguida pedi-lhe que fecha-se os olhos e concentra-se na minha voz.
Primeiramente sugeri que contraisse o braço direito e permanece-se por segundos assim.
Depois pedi-lhe que relaxasse e seguidamente, contraisse o braço esquerdo, passando pelos
menbros inferiores até chegar a face. Posteriormente, pedi-lhe que relaxa-se e que repeti-
se novamente, acompanhado do controlo da respiração. (inspirar puxando abdomen, e
expirar lentamente).
Finalizado a dinámica, perguntei-lhe como se sentía. L respondeu que se sentía-se melhor,
agradecendo.
E na verdade sentí-lhe menos angustiada e mais tranquíla.
5ª Entrevista
Neste dia L chega desanimada, com expressão muito triste e dando a inpressão que andou a
chorar. Sentou-se e manteve-se calada durante algum tempo.
Diz num tom de desalento que às vezes tem vontade de desaparecer, que não está
aguentando a situação. Ao perguntar-lhe se tinha andado a chorar diz que sim, dizendo
que já estava preparada para a viajem com o filho e na véspera foi-lhe comunicado que a
viajem foi adiada.
E o namorado não a tem ajudado muito dizendo-lhe para não acreditar no que os médicos
lhe dizem, e que com certeza ainda irão adiar novamente a viajem. Comentei, que
certamente a intenção do namorado não é desanima-la e que ele também esta angustiado
com a situação.
Neste momento tentei conter a angústia dela, tentando comprender o que se passa com eles.
Este foi o último encontro uma vez que quatro días depois, o filho é evacuado.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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Compreensibilidade do Caso
Com base na história actual e nas informações recolhidas, constata-se que L se encontra
numa situação potenciadora de stress (situação de internamento, doença dos filhos e
expectativa de evacuação para o exterior, dúvidas e incertezas, etc.). Portanto geradora de
grande sofrimento psíquico.
Pois, perante esta situação L encontra-se fragilizada e incapaz de mobilizar os seus
recursos internos e externos. Na verdade esta situação que encerra, em si, uma natureza
stressante, provavelmente tera sido avaliado cognitivamente como uma ameaça tendo em
conta, principalmente, o défice de informação relativamente à doença do filho e a própria
evacuação (tendo em conta o novo, o desconhecido). E é de realçar, também, que o
primeiro filho de 2 anos aguarda evacuação por um problema cardíaco.
Lazarus 1978 (cit. in Ogden 2000 p. 203) considera o stress como uma transação entre a
pessoa e o meio ambiente. Dentro desta definição, o stress implica uma interação entre o
stressor e o sofrimento.
O que foi sentido em praticamente todas as sessões atraves do desespero e sofrimento
manifestos. Esta avaliação cognitiva de ameaça poderá estar associado a uma expectativa
de perda que muito associado a uma angústia de morte, medo de perda e que foi sentido ao
longo das sessões.
Tudo isto fez-me pensar numa depressão a partida porque todo o espectro sintomatológico
lembra esta entidade diagnóstica. Porém, este panorama constitui uma resposta a avaliação
cognitiva feita à situação. É neste contexto que elaboramos como hipotese diagnóstica uma
reação aguda ao stress.
Relatório de Etágio em Psicologia Clínica e da Saúde
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Hipótese Diagnóstica
Feita a análise e discussão do caso, pode-se dizer que L apresenta uma Reação Agudo ao
Stress.
Propostas de Intervenção
Tendo em conta os dados obtidos no processo da avaliação psicológica, proponho:
A Psicoterapia de Apoio Breve.
A psicoterapia de apoio breve, corresponde à intervenção tipo que se pratica com sujeitos
normalmente bem adaptados que, mercê de circunstâncias inabituais, se encontram
temporariamente impossibilitados de utilizar os recursos internos e externos que lhes são
familiares (Leal, 2005).
Ao longo das entrevistas foi utilizado:
A sugestão e teve como objectivo produzir modificações na vontade expressa pela
paciente uma vez que L não vislumbrava situações alternativas e utilizei a minha
capacidade de avaliação para sugerir algum cenário alternativo.
A Securização, visto que ao longo das entrevistas tentei, tranquilizar L e reforçar as
suas capacidades de lidar com a situação.
Aconselhamento em que durante as entrevistas fiz recomendações em relação as
atitudes, e decisões da paciente com vista a reforçar aspectos saudáveis da sua
personalidade e reduzir os sintomas que apresenta.
A Educação em que usei a dinâmica de relaxamento utilizando uma técnica de
relaxação, e a técnica de controlo da respiração de modo a que L senti-se mais
relaxada, e menos ansiosa.
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A Terapia Cognitivo-Comportamental
Uma vez que L vê a situação como uma ameaça, e esta associado a uma expectativa de
perda, muito associado a uma angústia de medo da morte, trabalhar estas espetativas.
Na quarta entrevista, utilizei a discenssibilização sistemática de modo a aliviar a
ansiedade, pelo menos, a ansiedade associada a duvida em que L se encontrava. Também, a
descenssibilização tem efeitos cognitivo-comportamentais já que muitas vezes a tendência
nestes casos, é pensar em situações graves e de modo negativo, levando a comportamentos
disfuncionais.
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Reflexão Pessoal
Ao chegar nesta etapa final, e revisando todo o processo pelo qual passei, chego a
conclusão que o estágio me deu oportunidades e esperiências únicas as quais, nunca
esquecerei.
Tive a oportunidade, na prática, de obter novos conhecimentos, e o contacto com o
sofrimento do semelhante me fez sentir muito mais gente.
Também tive a oportunidade de reforçar os conhecimentos que já tinha adquirido durante
os anos de formação onde posso dizer que a minha bagagem sai mais rica. Tentei buscar
todos os conhecimentos já adquiridos e traze-los para a prática mas também, tive que ir em
busca de novos conhecimentos e abrir os meus horizontes.
Errei algumas vezes, mas aprendi com cada um deles e sempre tentei fazer melhor. Para
mim, a verdadeira psicologia clínica começou no dia em que entrei para o estágio no
Hospital Dr. Baptista de Sousa. Foi um tempo de aprendizado para toda a vida.
Durante este processo, despi-me de qualquer preconceito, aprendi a respeitar ainda mais o
trabalho dos profissionais da saúde, principalmente, na saúde mental. Estive com pessoas
inteligentes com as quais aprendi muito, principalmente com a minha orientadora.
Presenciei de perto a fragilidade e sofrimento do ser humano e nunca esquecerei frase dita
por um doente na enfermaria de saúde mental: « hoje sou eu que estou deste lado amanhã,
poderá ser você» (sic) frase dita num momento de profundo delírio mas carregada de
grande verdade.
Embora ciente do Atlãs que a psicologia é, e tendo a clara consciência de que o meu
trajecto no mundo desta ciência maravilhosa inicia agora, sinto que os objectivos do
estágio foram alcançados.
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Conclusão
Na minha ética pessoal, o Hospital Dr. Baptista de Sousa, é um local que permite o
estagiário de psicologia, abrir o seu horizonte de aprendizado. Isso porque em cada serviço
nomeadamente as enfermarías, as demandas sao diferentes permitindo assim, trabalhar de
forma abranger áreas diferentes da psicologia contribuindo para que o estágio seja o mais
completo possível.
Consoante as demandas de cada serviço, assim foi a minha intervenção.
Em cada emfermaria tentei implementar o máximo possível dos aprendizados ao longo
desses anos. Mas, a variedade de situações e casos encontrados, me mostraram a
necessidade de investir em mais conhecimentos nomeadamente através da bibliografia de
forma a entender melhor, os casos que acompanhei.
O estágio em si deu-me oprtunidades e experiências valiosas.
E a conclusão a que chego é que, a teoria é a base sem dúvida de uma boa prática e por
mais experiência que alguém possa ter numa área, a constante investigação, inovação, e
actualização é fundamental para uma boa prática neste caso, da ciência psicológica.
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Recomendações
Ao longo do estágio, percebi algumas situações que poderiam ser melhoradas, no serviço
de saúde mental, sendo assim, não poderia deixar de fazer alguma recomendação no sentido
de levar a mudanças.
E o que recomendo, é um maior engajamento dos profissionais de saúde, um trabalho
multidisciplinar, de forma a ajudar mais e melhor os pacientes internados, e de forma a
melhorar a qualidade do funcionamento deste serviço.
Seria importante também, uma melhoria na comunicação dentro do serviço, levando assim,
a um ambiente de trabalho mais saúdavel.
E visto que este serviço tem um papel de extrema importância no núcleo hospitalar, a
própia instituição, deveria lhe dar uma maior atenção.
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Referências Bibliográficas
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Bergeret, J. (1983): Psicologia Patológica, 3ª Edição, trad. Washigton Loyello, São
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Baptista, N. J. (2008): A sistemática dos relacionamentos Rev. PEC, Curitiba,
v.2, n.1, p.113-126, jul. 2001-jul. 2002
trad. Caetano, D. (1993). Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento
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Leal, I. (2005): Introdução às Psicoterapias, Lisboa, 1ª Edição, Fim de Século
Matos, A. C. (2002): O Desespero. Lisboa: Climepsi Editores
Mcwilliams, N. (2005): Diagnóstico psicanalítico. Portugal: Climepsi editores
Ogden, J. (2000): Psicologia da Saúde. Portugal: Climepsi editores
Paúl, C e Fonseca, A. (2001): Psicologia da Saúde. Lisboa: Climepsi editores
Passini, W. (1993): A Intimidade, o outro lado da afectividade. Portugal: Círculo de
Leitores
Schultz, D. e Schultz, E. (2002): Teorias da Personalidade. 7ª ed. Brasil: Thomson editora
Webgrafia
Toledo, et all (2012) Artigo Científico: Mães que Acompanham os filhos na Hospitalização
em: http://www.rbtc.org.br/detalhe_artigo.asp?id=138. 16/06/2015 / 16h: 15 mn
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Anexo
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Apêndice
1- Programa de Saúde mental
2- Programa de Pediatria
3- Ficha pessoal dos pacientes ( enfermaría de pediatría)
4- Programa de Medicina
5- Casuísticas
6- Fotos das actividades da Época Natalícia
7- Fotos das actividades Carnavalescas
8- Fotos das actividades de Páscoa
9- Fotos das actividades de primeiros socorros na enfermaría de pediatría
10- Palestras( a pedido da Câmara Municipal)
11- Apresentação de trabalho Cíentifico “Os Jovens Universitários e o Beber
Problemático”.