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VINHOS PERFEITOS PARA O INVERNO HARMONIZADOS COM OS PRATOS TÍPICOS DA ESTAÇÃO ANO IX - N O 93 - R$ 14,90 – € 4,00 ISSN 1808-3722 REVISTA ADEGA - ANO IX - Nº 93 - 2013 WWW.REVISTAADEGA.COM.BR PORTO VINTAGE 2011 A CERIMÔNIA QUE CONSAGROU A MAIOR SAFRA DE TODOS OS TEMPOS E A AVALIAÇÃO DE SEUS GRANDES VINHOS A REGIÃO DE CHAMPAGNE REVELA SEUS SEGREDOS CATA DE BERLIM SURPREENDENTE DESAFIO DO CHILE AOS ÍCONES DO VELHO MUNDO VINHO NA TELONA BASTIDORES DO MAIS TRADICIONAL FESTIVAL DE CINEMA SOBRE VINHO A VERDADEIRA IDENTIDADE DO VINHO DA BAIRRADA, SEGUNDO FILIPA PATO + DE 125 VINHOS SELECIONADOS E AVALIADOS

DE 125 VINHOS SELECIONADOS E AVALIADOS - Promovefaculdadepromove.br/bh/arquivos_up/documentos/adega 93 - artigo.pdf · A edição 2013 ocorreu entre os dias 31 de maio e 2 de junho

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VINHOS PERFEITOS PARA O INVERNO HARMONIZADOS COM OS PRATOS TÍPICOS DA ESTAÇÃO

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$ 14,90 – € 4,00

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PORTO VINTAGE 2011A CERIMÔNIA QUE CONSAGROUA MAIOR SAFRA DE TODOS OS TEMPOS E A AVALIAÇÃO DE SEUS GRANDES VINHOS

A REGIÃO DE CHAMPAGNE REVELA SEUS SEGREDOS

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CURIOSIDADE | p o r M Í R I A M A G U I A R

Antigo retrato do Duque d’Aumale, personagem do documentário Zucco

65Edição 93 >> ADEGA

As imagens vão se sucedendo, às vezes frenéticas, às vezes plácidas. No mundo da velocidade, da tecnologia, da urgên-cia, como encaixar a filosofia do amor à terra e às tradições, da paciência e todo

esse universo que gira em torno do ciclo anual de uma planta de resistência milenar – como é a videi-ra – em uma linguagem suportada pelos famosos “24 quadros por segundo”?

De repente, surge na tela um cenário bucólico de uma paradisíaca ilha grega, Santorini, de ape-nas 73 km2. Lá, em uma típica paisagem da “Arcá-dia”, um velho vinhateiro senta-se para descansar com seus arados puxados por cavalos, que riscam trilhas entre vinhas de grossos troncos antigos. Seria um quadro perfeito do Romantismo, se não fosse por um pequeníssimo detalhe: o agricultor fala ao celular.

Esta cena é do documentário Pelican’s Watch, da diretora grego-dinamarquesa Lea Binzer, que trata de uma pequena comunidade de vinhateiros de Santorini ameaçada de extinção face à demanda econômica por atividades turísticas mais rentáveis. O filme é uma das iniciativas que buscam revelar e reafirmar, com um apelo simbólico além-fronteiras, a importância da preservação de uma cultura ances-tral encarnada no cultivo da vinha e no compartilha-

Vinho em 24 quadros

por segundoHá 20 anos, o Festival Internacional da Uva e do Vinho Oenovideo celebra as produções de vídeo

e imagens que têm o vinho como mote

mento do vinho por aqueles que através dele consa-gram a sua identidade cultural.

Tocante e chocante, o documentário emocionou a todos pelo sensível tratamento das imagens, ritma-do pela obra da compositora grega Laoura Gini, e pelo tom de revolta dos vinhateiros da ilha. Segundo a diretora, mais do que emocionar, Pelican’s Watch tem o intuito e o compromisso de revelar a extrema insatisfação que corre nas veias de seus habitantes e confrontá-la com as imagens paradisíacas, corrente-mente associadas às ilhas gregas. Por isso, recebeu o troféu especial do o Festival Internacional da Uva e do Vinho Oenovideo 2013.

A cultura do vinho em filmes e imagensA agenda francesa de eventos em torno do vinho é frenética, são centenas de feiras, salões, degusta-ções, seminários, visitas guiadas a regiões e Châ-teaux, cotidianamente. Do mesmo modo, é intensa a produção cinematográfica. Além dos museus, ex-posições e espetáculos, Paris é a cidade mais ciné-fila do mundo: segundo pesquisa da World Cities Culture Report 2012 (um relatório da vida cultural em 12 das principais cidades mundiais), são 1010 salas de cinema na capital francesa contra 566 em Londres e 501 em Nova York. Vinho e cinema são, portanto, dois universos culturais e econômicos ex-

ADEGA >> Edição 9266

tremamente importantes para o país. Poucos sabem, no entanto, que, há 20 anos, as duas temáticas se reúnem anualmente em torno de um festival de cinema totalmente voltado ao registro do vinho, chamado Oenovideo.

A edição 2013 ocorreu entre os dias 31 de maio e 2 de junho em Carcas-sonne, França. Amantes e profi ssionais do vinho, cineastas, fotógrafos, produ-tores de vinhos de Minervois e imprensa especializada em vinhos e cinema reuniram-se para celebrá-lo na Tour de Trésau da Cité de Carcassonne, cidade medieval francesa com status de patrimônio mundial. Juntamente com o fes-tival, há oito anos, é realizada a exposição “Terroir de Imagens”, que reúne ampliações de 100 fotos de vinhas e vinhos. Neste ano, o tema escolhido para orientar a produção fotográfi ca, subdividida em duas categorias – profi ssionais e amadores – foi “Festejar e degustar o vinho nos cinco continentes”.

Obviamente que, dada a origem do festival e a sua realização prioritária na França (apenas três edições aconteceram na Suíça), predominam inscrições do próprio país, mas a participação internacional é crescente, assim como em tudo que se refere ao vinho. Nesta edição, especifi camente, dentre 26 fi lmes selecio-nados de um total de 114 inscrições, 14 eram de outros países, além da França: Alemanha, Inglaterra, Austrália, Argentina, Bélgica, Canadá, Croácia, Estados Unidos, Espanha, Itália, Grécia, Portugal e Suíça.

Vinho como inspiraçãoHá uma fl exibilidade quanto às origens das fotos e dos fi lmes em termos de autoria (regiões e profi ssionais), formatos (curta, média e longa metragem) e abordagens (fi cção, documentário, institucional), desde que o motivo princi-pal seja o vinho. A organização do festival comenta que o perfi l internacional cada vez mais se consolida e que, especialmente neste ano, mesmo as aborda-gens sobre o vinho francês são originárias, em parte, de um olhar estrangeiro sobre a sua vitivinicultura e infl uências em contextos exteriores.

É assim que temos um curta-metragem que versa sobre o legendário Grand Cru borgonhês Romanée-Conti, que também é um dos emblemas homenagea-dos pelo documentário biográfi co “L’Évangile selon Champlain” (“O Evangelho segundo Champlain”), sobre o canadense Champlain Charest, proprietário do Bistrô Champlain, em Quebec. O bordalês Château Lafl eur é outro vinho que dá tema e nome ao curta-metragem alemão “Lafl eur”, uma fi cção que retrata um encontro entre um amante de vinhos e uma sommelière para a degustação de um Château Lafl eur 1979 – que conquistou o prêmio de escolha do público do Oenovideo 2013.

Não mais por estrangeiros, mas por franceses, Bordeaux é tema de “La vente en primeur des vins Grands Crus Classés bordelais”, um documentário sobre a importante campanha anual de promoção e venda antecipada de vinhos da nova safra de Bordeaux – e venceu na categoria “melhor fi lme destinado aos profi ssionais”.

De pomposa produção inglesa, Red Obsession, escolhido como um dos me-lhores longas-metragens, é um fi lme que trata do fenômeno de infl ação dos vi-nhos de Bordeaux após o investimento do emergente mercado chinês nos vinhos da região. O fi lme mostra as imagens do sucesso e glamour dos bordaleses entre a elite chinesa, disposta a pagar uma fortuna por esses rótulos e é narrado por ninguém menos que o galã Russell Crowe.

O cineasta Christophe Barratier, um apaixonado por vinhos, presidiu o júri

“VINHOS MEDIEVAIS”Além dos fi lmes, o evento contou com mais duas atrações: a belíssima cidade medieval do Languedoc-Roussillon, sul da França, e os vinhos de Minervois. Originária do século VI a.C. do período neolítico, integrada ao Império Romano no século I e ao reino da França no século VI, a vila murada de Carcassonne foi palco de combates contra hereges, confl itos e batalhas históricas. A partir século XIX, a cidade prosperou em função de sua vitivinicultura e vida cultural, tornando-se Patrimônio Cultural da Humanidade.Carcassonne se situa dentro das demarcações de Minervois, um dos maiores vinhedos do Languedoc, vizinho de Corbières ao sul, de Saint-Chinian ao leste e de Carbadès a oeste, formado por cerca de 17.000 hectares de vinhas, distribuídos em 61 comunas. Os principais centros urbanos e comerciais de Minervois são as cidades de Narbonne e Carcassonne. Com uma produção total de cerca de 2 milhões de hectolitros, o vinhedo está dividido em cinco grandes sub-regiões, onde se encontram vinhas de perfi l mais oceânico ou continental, entre 50 m e 500 m de altitude. Assim como em outras denominações de origem do Languedoc, as cepas tintas predominantes e autorizadas para a produção de vinhos tintos e rosés na AOC Minervois são Carignan, Mourvèdre, Grenache, Syrah e Cinsault e, para os brancos, Grenache, Macabeo, Marsanne, Roussanne e Bourboulenc. Dentre elas, as varietais predominantes atualmente são a Syrah e a Grenache, o que, de acordo com Philippe Coste, presidente do Sindicato do Cru de Minervois, representa uma mudança de orientação, já que nos anos 1950, era a Carignan que dominava, totalizando 75% da viticultura da região. Antes predominava um vinho leve, sem complexidade e, atualmente, a preferência tem sido pela produção de vinhos ricos em frutas, com taninos macios e gastronômicos.

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A América do Sul esteve representada por dois fi l-mes: “Boom varietal: the rise of Argentine Malbec”, um fi lme norte-americano que fala da explosão de vendas dos Malbec argentinos nos Estados Unidos – e ganhou o prêmio de melhor imagem. E o outro país sul-americano representado foi o Chile, com o vídeo institucional “Santa Rita 120”, um fi lme de 2 minutos cujo desafi o é recriar o conceito de 120 vi-nhos, relacionando-os à independência chilena.

As sessões foram avaliadas por um júri presidi-do pelo cineasta Christophe Barratier, conhecido pelo grande público devido aos fi lmes Les Choris-tes (A voz do coração) e Faubourg 36 (Paris 36). Além de cineasta, Barratier é um connaisseur “ga-rimpador” de vinhos do sul da França, portanto a sua escolha para presidir o júri em Carcassonne não foi à toa. Segundo organizadores, o festival tem a intenção de mostrar a presença do vinho em origens e formatos variados, registrando a evolução do tema e de tudo aquilo que ele suscita em cada época e local. Barratier diz que busca encontrar algo que o comova, surpreenda tanto nos vinhos como no cinema. Ser interessante, bem feito não basta: “Que seja algo tocante ou chocante, que provoque emoções ou revoltas, e não apenas inte-resse.” E não seria essa a natureza do vinho?

Para os enófi los cinéfi los, o festival Oenovideo mostra que no mundo há muito mais do que os clás-sicos hollywoodianos e que o vinho pode ser celebra-do nas taças e nas telas pela sétima arte.

Com produções do mundo todo, o grande prêmio deste ano fi cou com um documentário sobre vinhateiros na ilha de Santorini, na Grécia

Carcassonne se situa dentro das demarcações de

Minervois, no Languedoc

VENCEDORES DO OENOVIDEO 2013

Troféu especial do grande júri“Pelican’s watch” – Lea Binzer

Melhor longa metragem“Red Obsession” – David Roach et Warwick“À la poursuite de Mme Li” – Anne-Marie Avouac

Melhor curta-metragem“Vendanges d’hiver” – Guilhem Connac

Prêmio de melhor imagem“Boom Varietal – The rise of Argentine Malbec” – Sky Pinnick

Prêmio de melhor cenário“Le vin, culture universelle” – Jorge Mazo

Melhor fi lme de “promoção”“Do Rias Baixas – A year of wine” – Ramses Rivera

Melhor fi lme destinado aos profi ssionais“La vente en primeur des vins grands crus classés bordelais” – Hervé Remaud, Mylène Jaillette, Christophe Villain

Menção especial do grande júri“Like the old vine” – Milka Barisic

Prêmio do público“A year in Burgundy” – David Kennard“Lafl eur” – Mathieu Charrière

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ADEGA >> Edição 9370

Fins do século XIX, o mundo passara por transformações. A França vivia o de-bacle da era pós-Napoleão. A monarquia era restaurada, mas logo voltaria a cair. Nessa época, um aristocrata se destaca-va: Henri d’Orleans, conhecido como Duque d’Aumale, um dos muitos filhos de Luís Filipe I, o último rei da França. Henri era dono de uma vasta fortuna, herdada desde muito cedo. Entre suas propriedades, por exemplo, estava o fa-moso Château de Chantilly, que ele res-taurou após a Revolução Francesa, e lá deixou a segunda maior coleção de pin-turas do país, depois do Louvre.Devido aos constantes conflitos da épo-ca, o duque viveu no exílio entre a Casa de Orleans, na Inglaterra, e a Sicília, onde ocupou uma fazenda abandona-da numa localidade chamada Zucco. Lá, passou a produzir vinho por volta de 1850. Com isso, trouxe um pouco de prosperidade à ilha italiana (empregan-do 4 mil fazendeiros), historicamente sempre muito pobre. O vinho Zucco,

como ficou conhecido, cresceu com uma aura de charme e mistério, por guardar segredos de uma aliança en-tre paixão pela vinicultura, savoir-faire francês e precioso estudo do terroir si-ciliano.E foi por acaso que a siciliana Lídia Riz-zo encontrou os vestígios para desven-dar essa lenda. “Nunca imaginaria que onde o grande chef François Vatel guar-dava o segredo do seu famoso creme de Chantilly, encontraria o segredo do vi-nho de Zucco”, afirma a cineasta que criou o documentário “Zucco, o vinho do filho do rei da França”, vencedor do prêmio da “Revista dos Enólogos”, no festival Oenovideo 2013.Pelas imagens de arquivos e pelas vozes de historiadores, biógrafos e descenden-tes de viticultores, vamos identificando vários fatos ocorridos na trajetória do vi-nho mundial e sua conexão com o lega-do referencial da França, que serviu de inspiração para o duque e tantos outros personagens da história. Segundo a ci-

neasta, Zucco foi um vinho notável até as primeiras décadas do século XX, mas sua história e importante contribuição para a vitivinicultura se perdeu e o objetivo de sua obra é incorporá-la à memória da Itá-lia, da França e do vinho. E não é que, dentre os relatos da biografia do duque, deparamo-nos com um dado surpreen-dente: ele também tinha terras no Brasil, no estado de Santa Catarina, onde produ-ziu açúcar de cana e cachaça.O filme mostra a multinacionalidade que está na alma do vinho de Zucco – um vinho de sobremesa de grande finesse, fruto da assemblage entre a cepa francesa Sémillon (que, em Bordeaux, botritizada, gera o Sauternes), as autóctones Catarrat-to Bianco e Perricone, a alemã Riesling e a espanhola Alicante, amadurecidas sob o intenso sol da Sicília.No final do século XIX, a devastação dos vinhedos franceses pela filoxera direciona o olhar do influente mercado inglês para o oeste da Sicília, onde se faz o vinho Marsala, e depara com a produção mais

ZUCCO – A HISTÓRIA DO GRAND CRU ESQUECIDO DA SICÍLIA

71Edição 93 >> ADEGA

modernizada de Zucco. O “moderno” ali significava justamente o oposto da indus-trialização, que permeava grande parte da produção regional. Segundo o enólo-go italiano Giacomo Ansaldi, o produtor francês introduz uma nova filosofia na produção de vinhos e no cultivo das vi-nhas. Isso pode ser constatado pelos regis-tros do estudo do solo e da criação de uma carta topográfica, com colorimetria e al-timetria geológica, bem como do estudo do clima e das influências geográficas que favoreciam a amplitude térmica propícia à viticultura no território de Zucco.

Resgate históricoNo filme, as imagens combinam a sim-plicidade e belo colorido bucólico da região mediterrânea com as ruínas do passado imperial greco-romano e a im-ponente sede do vinho de Zucco, que nada parecia dever ao perfeccionismo dos crus franceses. O Duque d’Aumale não poupou investimentos: canalizou a água para irrigação das vinhas e, se-

gundo o historiador Salvo di Matteo, transformou Zucco numa das mais be-las cidades sicilianas, à moda francesa. Tudo indica que ali era a sua “Pasárga-da”, onde produzia o vinho que tanto o deixava orgulhoso, mantinha uma re-lação calorosa com a população e usa-va como refúgio para se recuperar de algumas dores, como da perda de dois jovens filhos e, posteriormente, da espo-sa, em 1869. Quando adoeceu e acabou falecendo em 1897, foi para Zucco que ele se dirigiu: “Com a ajuda deste vinho reparador, eu lutarei.”Sobre os ombros dos trabalhadores ru-rais, antes de ser levado para o enterro na França, seu corpo foi transportado, ao longo das vinhas, dentre todos os caminhos que costumava fazer quando vivo. Considerando os benefícios que trouxe à região, a reputação do vinho de Zucco e a admirável personalidade de Henri d’Orleans, constante nos registros biográficos, é estranho constatar que poucos na região atualmente conhe-

cem a sua história. Após a sua morte, o Conde de Paris, Louis-Philippe-Ro-bert, herdou a propriedade e vendeu-a em 1923, dividida em cinco partes. A parte mais produtiva passou à família aristocrática Gangi, de Palermo, que continuou a fazer o vinho, mas já com outra orientação, privilegiando a produ-ção de vinhos à base de Moscato. Após as grandes guerras, a vitivinicultura foi sendo abandonada e atualmente, pelas mãos do Instituto Regional dos Vinhos e Azeites da Sicília, inicia-se um projeto de retomada da produção de vinhos de qualidade na fazenda de Zucco.O filme de Lídia Rizzo faz parte desse processo de renascimento, ao resgatar e projetar esse passado na tela do cinema, para além do silêncio dos museus, numa linguagem mais atual e acessível às no-vas gerações. É assim ela assina Zucco com a seguinte epígrafe: “Se você ig-nora o nome das coisas, até o mesmo o conhecimento delas desaparece.” (Carl Nilsson Lannaeus).