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ISSN 1519-1850 IIIREVISTAIII '" DE ESTUDOS TRIBUTARIOS Ano VII - 38 - Jul-Ago de 2004 Repositório Autorizado de Jurisprudência • Supremo Tribunal Federal - N° 29/2000 • Superior Tribunal de Justiça - N° 42/99 • Tribunal Regional Federal I a Região - N° 2 1/200 I Diretores Elton José Donato Milton Terra Machado Hebe Bonazzola Ribeiro Geraldo Bemfica Teixeira Editora-Chefe Melissa Folmann Conselho Editorial Alfredo Pereira Macedo - Aristeu Gil Alves - Armando Farah - Celso Luiz Bernardon - César Arlei Paludo Daimar Paulo Somm Dilson Gerent - Domiciano José da Cunha - José Mõrschbacher - Luciano Lemos Spader Paulo de Mello Aleixo - Paulo de Vasconcellos Chaves - Walmir Luiz Becker - Walter Diab - Zulmar Neves Colaboradores Adelino o. Soares - Adhemar Ferreira Maciel - A1an Martins - .Alcides Jorge Costa - Alex Nunes de Figueiredo -Alexandre Bleggi Araujo Alexandre Mussai Moreira - América Sede Freire Júnior - André Luiz Carvalho Estrella - André Santos Zanon - Antonio Marçal B. Figueiredo Antônio Souza Prudente - Armenio de Oliveira dos Santos - Arnaldo Süssekind - Arnaldo Wald - Carlos Alberto Del Papa Rossi Carlos Eduardo dos Reis - Carlos Henrique da Fonseca - Carlos Velloso - Célio Armando Janczeski - Chery! Berna Cláudio Drewes José de Siqueira - Cleiton Sacoman - Dalton Luiz DalJazem - Dâmares Ferreira - Daniel Carnio Costa Daniela Ribeiro de Gusmão - Dejalma de Campos - Dolizete Fátima Michelin - Éderson Garin Porto - Edgar N. Engel Neto Edilson Jair Casagrande - Eduardo Amorim de Uma - Eduardo Bomia - Eduardo Domingos Bottallo - Eduardo Marchetto - Elena Pacita Lois Garrido - Eliana Calmon - Enio Avila Correia - Eric M. de Castro e Silva - Evandro A. S. Grili - Fábio Bittencourt da Rosa - Fabio Luiz de Oliveira Bezerra Fábio Stefani - Fernando da Fonseca Gajardoni - Fernando Rister De Sousa Uma - Flavio Puig - Francisco de Assis e Silva - Fredie Didier Júnior Gabriel Pinós Sturts - Geraldo Brinckmann - Gervásio Recktenvald - Gilberto EtchaJuz ViJlela - Gilda Dalto Júnior Gonçalo Bonet Allage Guajará J. Oliveira - Gustavo Nygaard - Gustavo Saad Diniz Helder Martinez Dal Col- Henry Gonçalves Lummertz - Heron Arzua Horácio Villen Neto - Hugo de Brito Machado - Hugo de Brito Machado Segundo - Humberto Avila - Humberto Theodoro Júnior Icaro Silva Pedroso - fgor da Silva Rêgo - Ivan Cesar Moretti - James Marins - João Bellini Júnior - José Augusto Delgado José Eduardo Sabo Paes - José Eduardo Soares de Melo - José Levi Mello do Amaral Jr: -José Orlando Rocha de C2Irvalho José Renato Gaziero CeUa - José Vi/aço da Silva - Julio de Castilhos Ferreira - Leandro Bittencourt Adiers - Leandro Marins de Souza Leandro Paulsen - Leomar W2Iyerbacher - Leonardo Zehuri Tovar - Usandre Borges Fortes da Costa Figueira - Lucia Valle Figueiredo Luís Antônio Ucks Missel Machado - Luís Augusto da Silva Gomes - Luis Eduardo Schoueri - Luiz Fernando Maia Luiz Gustavo Santana de Carvalho - Luiz Henrique Pinheiro Bittencourt - Manuel de Freitas Cavalcante Júnior - Marcelo André Pierdoná Marcelo CarJin - Marcelo De Nardi - Marcelo Machado Berto/uci - Marcelo Mazon Malaquias - Marcilio Toscano Franca Filho Marco Antonio Piazza Pfitscher - Marco Aurélio Greco - Marco Túlio de Rose - Margere Rosa de Oliveira - Maria do Carmo Puccini Caminha Mauro Roberto Gomes de Mattos - Matias Angelo Gonzag<'l - Michele Oliveira Teixeira - Misabel de Abreu Machado Derzi Napoleão Nunes Maia Filho - Nelson Jobim - Nelson Luiz Pinto - Omar Augusto Leite Melo - Osiris de Azevedo Lopes Filho - Osmar Tognolo Paulo de Barros Carvalho - Paulo de Mello Aleixo - Paulo Olimpio Gomes de Souza - Paulo Roberto Coimbra Silva Paulo Valério Dal Pai Moraes - Rafael Pandolfo - Regiane Binhara Esturilio - Renata Schmidt Cardoso - Renato Scalco Isquierdo René Bergmann AviJa - René Izoldi Avila - Ricardo Conceição Souza - Ricardo Mariz de Oliveira - Ricardo Sordi Marchi Roberto Catalano Botelho Ferraz - Roberto Wagner Uma Nogueira - Rodrigo de Andrade M. Fernandes - Rodrigo Petry Rogério Dantas Mattos - Rogério Uma - Rogério Pires da Silva - Roque Antonio Carrazza - Roque Joaquim Volkweiss Rubens Miranda de Carvalho - Sacha Calmon Navarro Coelho - Sidney Stahl- Silvia Maria Benedetti Teixeira - Sílvio Dobrowolski Soares Feitosa - TaUana Maria Mello de Uma - Vanessa Minotti - Vanir Perin - Victor Humberto Maizman - Walter Godoy

DE ESTUDOS TRIBUTARIOS - bdjur.stj.jus.br · Luiz Gustavo Santana de Carvalho - Luiz Henrique Pinheiro Bittencourt - Manuel de Freitas Cavalcante Júnior - Marcelo André Pierdoná

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ISSN 1519-1850

IIIREVISTAIII

'" DE ESTUDOS TRIBUTARIOS

Ano VII - N° 38 - Jul-Ago de 2004

Repositório Autorizado de Jurisprudência • Supremo Tribunal Federal - N° 29/2000

• Superior Tribunal de Justiça - N° 42/99

• Tribunal Regional Federal I a Região - N° 2 1/200 I

Diretores Elton José Donato

Milton Terra Machado Hebe Bonazzola Ribeiro Geraldo Bemfica Teixeira

Editora-Chefe Melissa Folmann

Conselho Editorial Alfredo Pereira Macedo - Aristeu Gil Alves - Armando Farah - Celso Luiz Bernardon - César Arlei Paludo

Daimar Paulo Somm Dilson Gerent - Domiciano José da Cunha - José Mõrschbacher - Luciano Lemos Spader Paulo de Mello Aleixo - Paulo de Vasconcellos Chaves - Walmir Luiz Becker - Walter Diab - Zulmar Neves

Colaboradores Adelino o. Soares - Adhemar Ferreira Maciel - A1an Martins - .Alcides Jorge Costa - Alex Nunes de Figueiredo -Alexandre Bleggi Araujo

Alexandre Mussai Moreira - América Sede Freire Júnior - André Luiz Carvalho Estrella - André Santos Zanon - Antonio Marçal B. Figueiredo Antônio Souza Prudente - Armenio de Oliveira dos Santos - Arnaldo Süssekind - Arnaldo Wald - Carlos Alberto Del Papa Rossi

Carlos Eduardo dos Reis - Carlos Henrique da Fonseca - Carlos Velloso - Célio Armando Janczeski - Chery! Berna Cláudio Drewes José de Siqueira - Cleiton Sacoman - Dalton Luiz DalJazem - Dâmares Ferreira - Daniel Carnio Costa

Daniela Ribeiro de Gusmão - Dejalma de Campos - Dolizete Fátima Michelin - Éderson Garin Porto - Edgar N. Engel Neto Edilson Jair Casagrande - Eduardo Amorim de Uma - Eduardo Bomia - Eduardo Domingos Bottallo - Eduardo Marchetto - Elena Pacita Lois Garrido - Eliana Calmon - Enio Avila Correia - Eric M. de Castro e Silva - Evandro A. S. Grili - Fábio Bittencourt da Rosa - Fabio Luiz de Oliveira Bezerra Fábio Stefani - Fernando da Fonseca Gajardoni - Fernando Rister De Sousa Uma - Flavio Puig - Francisco de Assis e Silva - Fredie Didier Júnior

Gabriel Pinós Sturts - Geraldo Brinckmann - Gervásio Recktenvald - Gilberto EtchaJuz ViJlela - Gilda Dalto Júnior Gonçalo Bonet Allage Guajará J. Oliveira - Gustavo Nygaard - Gustavo Saad Diniz Helder Martinez Dal Col- Henry Gonçalves Lummertz - Heron Arzua Horácio Villen Neto - Hugo de Brito Machado - Hugo de Brito Machado Segundo - Humberto Avila - Humberto Theodoro Júnior

Icaro Silva Pedroso - fgor da Silva Rêgo - Ivan Cesar Moretti - James Marins - João Bellini Júnior - José Augusto Delgado José Eduardo Sabo Paes - José Eduardo Soares de Melo - José Levi Mello do Amaral Jr: -José Orlando Rocha de C2Irvalho

José Renato Gaziero CeUa - José Vi/aço da Silva - Julio de Castilhos Ferreira - Leandro Bittencourt Adiers - Leandro Marins de Souza Leandro Paulsen - Leomar W2Iyerbacher - Leonardo Zehuri Tovar - Usandre Borges Fortes da Costa Figueira - Lucia Valle Figueiredo

Luís Antônio Ucks Missel Machado - Luís Augusto da Silva Gomes - Luis Eduardo Schoueri - Luiz Fernando Maia Luiz Gustavo Santana de Carvalho - Luiz Henrique Pinheiro Bittencourt - Manuel de Freitas Cavalcante Júnior - Marcelo André Pierdoná

Marcelo CarJin - Marcelo De Nardi - Marcelo Machado Berto/uci - Marcelo Mazon Malaquias - Marcilio Toscano Franca Filho Marco Antonio Piazza Pfitscher - Marco Aurélio Greco - Marco Túlio de Rose - Margere Rosa de Oliveira - Maria do Carmo Puccini Caminha

Mauro Roberto Gomes de Mattos - Matias Angelo Gonzag<'l - Michele Oliveira Teixeira - Misabel de Abreu Machado Derzi Napoleão Nunes Maia Filho - Nelson Jobim - Nelson Luiz Pinto - Omar Augusto Leite Melo - Osiris de Azevedo Lopes Filho - Osmar Tognolo

Paulo de Barros Carvalho - Paulo de Mello Aleixo - Paulo Olimpio Gomes de Souza - Paulo Roberto Coimbra Silva Paulo Valério Dal Pai Moraes - Rafael Pandolfo - Regiane Binhara Esturilio - Renata Schmidt Cardoso - Renato Scalco Isquierdo

René Bergmann AviJa - René Izoldi Avila - Ricardo Conceição Souza - Ricardo Mariz de Oliveira - Ricardo Sordi Marchi Roberto Catalano Botelho Ferraz - Roberto Wagner Uma Nogueira - Rodrigo de Andrade M. Fernandes - Rodrigo Petry

Rogério Dantas Mattos - Rogério Uma - Rogério Pires da Silva - Roque Antonio Carrazza - Roque Joaquim Volkweiss Rubens Miranda de Carvalho - Sacha Calmon Navarro Coelho - Sidney Stahl- Silvia Maria Benedetti Teixeira - Sílvio Dobrowolski

Soares Feitosa - TaUana Maria Mello de Uma - Vanessa Minotti - Vanir Perin - Victor Humberto Maizman - Walter Godoy

DOUTRINA

Conferência: Responsabilidade Tributária à Luz do Novo Código CiviP

Dr. Aristeu Gil Alves

Conferencista: José Augusto Delgado

Ministro do Superior TI-ibunal de Justiça.

° Dr. JOSÉ DELGADO, com toda sua gentileza, dispôs-se a vir aqui; esteve, pontualmente, em seu tempo, embora tenha viajado a manhã toda. Nós até estamos exigindo demais dele, e isso valoriza a atenção e o apreço que ele tem por nós ao deslocar-se, deixar suas atividades e vir até Porto Alegre participar deste evento, dignificando, ainda mais, o nosso evento.

Dispensamos, também, a apresentação do Dr. JOSÉ DELGADO, Desembargador, aliás, Ministro do STJ. Conhecido, atuando na área tributária há muitos anos, seus votos são conhecidos, apreciados e admirados. Sua atuação antecede a sua presença, dispensa, inclusive, qualquer referência sobre a sua pessoa.

Nós nos sentimos honrados com o comparecimento dele e passamos logo a palavra, porque, como dissemos aqui, somos informais, diretos, estamos aqui num dia de trabalho, de estudos e, de uma maneira bastante informal, gostaríamos de que o senhor também se sentisse à vontade em nosso meio.

Dr. José Augusto Delgado

Já que fui colocado plenamente à vontade pela bondade do Dr. ARISTEU que está comandando estes trabalhos, vou me sentir realmente à vontade para conversar com todos os amigos gaúchos e de além, de outras terras, que aqui se encontram.

Ia falar de pé do local indicado, mas observei que fico muito distante de todos os senhores e penso que de distância do Poder Judiciário já estamos cansados. Devemos nos aproximar o máximo possível.

Trata-se de texto reproduzido literalmente a conferência proferida no XI Simpósio de Direito Tributário do IET - realizado nos dias 17 e 18 de novembro de 2003. na PUCRS, Porto Alegre/RS.

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Então, a mesa me permita que fale mais de perto com o auditório. Primeiramente, dizendo que não foi nenhum sacrifício, Dr. ARISTEU, porque me dirigi atendendo ao convite de meu amigo JOSÉ e de minha amiga TÂNIA, em nome do Instituto. Foi uma alegria muito grande.

Só peço desculpas pelos atropelos que tenha provocado, pela correria que tenha provocado.

Meus queridos amigos. Quantos minutos temos, para poder me organizar? Nós temos 60 minutos onde vamos pretender conversar com todos os senhores a respeito de um tema que tem sido constante preocupação de meus pensamentos jurídicos, atualmente. Todos nós temos consciência de que estamos em procedimento de reforma, de reforma das principais entidades jurídicas de nosso País.

Vamos relembrar que esses acontecimentos têm seu marco maior com a Constituição Federal de 1988. Depois, em 1992, tivemos a Lei Determinadora de Improbidade Administrativa. Em 1995, tivemos o Código de Defesa do Consumidor. Em 2001, nós tivemos a Lei de Responsabilidade Fiscal e, agora, em 2002, nós tivemos o novo Código Civil.

Eu considero estes "eventos jurídicos" [eventos entre aspas 1, estes estatutos jurídicos, como as grandes transformações que ocorreram do final do século XX para o início deste século XXI no nosso ordenamento jurídico.

E a consumação dessas transformações estão, agora, postas onde? Estão postas no novo Código Civil. O novo Código Civil, como todos temos conhecimento, entrou em vigor no dia 12 de janeiro e está produzindo seus efeitos, está revolucionando com mudanças que vêm introduzindo de 87 anos de costumes, de 87 anos de práticas, de 87 anos de seguimento de determinada orientação.

Vem o Código Civil, entra em vigor. Só tivemos um ano para o estudo do novo Código Civil, e ele introduz, a meu ver, a mais forte revolução já inserida no ordenamento jurídico, especialmente no brasileiro.

O que é que vamos destacar, em linhas gerais, no novo Código Civil, para depois entrarmos no seu relacionamento com o CTN e, especialmente, naquilo que se refere à reforma tributária.

Visualizo o novo Código Civil como tendo quatro grandes estruturas: primeiramente, a estrutura da valorização da eticidade. Vejam que isso aí é uma conseqüência do princípio da moralidade que foi posto na Constituição Federal de 1988 e em mais de 12 de seus outros incisos, vejam que isso é uma conseqüência de 1992, da Lei de Improbidade Administrativa, vejam que a eticidade que já estava presente no Código de Defesa do Consumidor, vejam que a moralidade que voltou depois da Lei Complementar nO 101, a Lei de Responsabilidade Fiscal, e vê que o novo Código Civil consagra a eticidade da relação do Direito Privado.

A segunda pilastra que sustenta o novo Código Civil qual é? A da chamada socialidade da lei. A socialidade de uma lei que regula relações

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privadas. Isto dando uma nova configuração, modificando, inteiramente, uma convicção privatística que nós tínhamos da relação do Direito Privado, uma concepção rigorosamente privada que nós tínhamos dessa relação, para uma conceituação toda voltada para a influência do social, para a presença do social.

Em conseqüência, não podemos mais pensar no contrato como sendo a manifestação de vontade. Temos que pensar no contrato como sendo uma conseqüência da função social que deve exercer. A propriedade foi muito mais fortalecida, agora, quanto à sua função social, enaltecendo aquilo que estava na Constituição Federal, enfim, todos os negócios jurídicos que são os negócios jurídicos obrigacionais e os negócios jurídicos não-obrigacionais; eles, hoje, só podem ser vistos com essa função de socialidade.

A terceira coluna do novo Código Civil é a coluna da chamada praticidade. Um código, um estatuto jurídico, pela primeira vez em nosso País, muito mais do que um Código Processual Civil, muito mais do que o Código Processual Penal, preocupado com a praticidade da aplicação da lei.

Observem que isto é um conteúdo de interpretação que nós não podemos deixar de fugir. Não podemos deixar de fugir deste conteúdo, porque é um ordenamento jurídico que está posto e está permitindo que a lei se torne eficaz e efetível. Todo o grande problema que nós estamos vivendo, hoje, é o problema da eficácia e da efetividade das leis. Nós temos as melhores leis no País, mas temos os piores processos de aplicação de sua efetividade e de sua eficácia.

E a quarta coluna? Vejam que eu já lhes falei de eticidade, de socialidade, lhes falei de praticidade. É de adicionar: operosidade. Um Código Civil, um estatuto de direito privado que seja operoso. Quer dizer, um estatuto que contenha cláusulas abertas, que contenha cláusulas indeterminadas e que convoca o juiz, através desse fenômeno da operosidade, para lhe complementar a lei.

A minha grande preocupação é que eu não sei se a nossa magistratura, se a magistratura brasileira, está preparada para essa missão de complementar a lei nas relações jurídicas e privadas e, conseqüentemente, nos outros ramos do Direito que se vinculam, que se relacionam com o novo Código Civil.

Por quê? Porque nós juízes, por exemplo ... Sou juiz há 38 anos e fui formado em uma cultura completamente diferente. Eu fui formado em uma cultura muito positivista, em que a gente deve aplicar a lei como a lei se apresenta, e dela ele tem os limites de interpretação estreitos. Hoje, o novo Código Civil, através das suas cláusulas gerais e de suas normas que permitem flexibilidade, ele traz o juiz para complementar, por exemplo, o que seja função social do contrato, onerosidade excessiva do contrato, o que seja perigo do contrato, o que seja excesso de prestação do contrato para determinar sua nulidade ou sua conformidade com as situações contratuais

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fixadas, com as classes contratuais fixadas. Tudo isso vai ficar a critério do juiz para definir.

Então, é dentro deste ambiente jurídico completamente modificador que nós vamos pensar no Código Tributário Nacional, na chamada responsabilidade tributária que está posta no Código Tributário Nacional.

Todos nós sabemos e é desnecessário explicar apenas por questão didática, por questão de exposição, que nós temos no Código Civil algumas regras legislativas apostas e que essas regras têm um conteúdo de lei complementar, algumas outras ficam naquela zona cinzenta, se estas regras são de lei complementar ou se são lei ordinária. Embora o Código Tributário Nacional seja originariamente uma lei ordinária, com a Constituição de 1988, passou para o nosso ordenamento jurídico como sendo uma lei complementar, pelo princípio da absorção e das elaborações de leis.

Então, nós sabemos que, em Direito Tributário, a palavra "respon­sabilidade" tem dois sentidos. Permitam, aqui, os nobres juízes, os nobres advogados, os operadores de Direito, os professores descer a determinados detalhes desnecessários, mas eu fui informado de que há estudantes no auditório, e, então, em homenagem aos estudantes, nós vamos pedir-lhes um pouco de paciência para revivermos conceitos que já são consagrados e que já sabemos que são conceitos, que eu chamo de conceitos da planície. Mas necessitamos reviver esses conceitos para os estudantes, para que eles possam entender a seqüência de nossa exposição.

No novo Código Civil, temos a palavra "responsabilidade" em dois sentidos: um sentido amplo e um sentido restrito. No sentido restrito, a palavra "responsabilidade" é aquela imposição que é atribuída ao contribuinte, aquele que está obrigado a recolher o tributo, aquele que está obrigado a fazer parte de seu patrimônio, a tirar uma parte do seu patrimônio e, tirando dinheiro do seu patrimônio, ou, então, até vende o seu patrimônio, ele é chamado pelo Estado para recolher o tributo. Enfim, é aquele que está relacionado diretamente com o fato gerador e também com a obrigação tributária.

Em um sentido amplo, vamos ver a palavra responsabilidade tributária como algo um pouco diferente. É aquela pessoa que não é contribuinte, que não foi partícipe diretamente do fato gerador, mas que com ele se envolveu, de modo direto ou indireto, teve apenas um envolvimento com o fato gerador, contribuiu por qualquer escala para a ocorrência do fato gerador, a lei permite que essa pessoa seja também chamada para esse campo de relação de obrigação tributária. A lei exige que essa pessoa assuma, também, essa posição de sujeito passivo tributário.

Alguns ordenadores chamam esse processo de técnica legislativa de tributação. Essa técnica legislativa de tributação, embora tenha sido coordenada por determinada doutrina, hoje está consagrada. Está tão consagrada que eu gostaria de lembrar-lhes de que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a emenda constitucional referente à substituição

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tributária, de uma vez por todas - na interpretação que, em apenas dois pronunciamentos, já transmitiu para o mundo jurídico -, pôs por terra quaisquer posições contrárias a esse entendimento referente à substituição tributária.

É uma interpretação para a qual eu tenho as minhas reservas, mas nós sabemos que, no nosso ordenamento jurídico, temos que ter órgãos que interpretam a Constituição e não vamos exigir a perfeição, não vamos exigir a perfeição das decisões do Supremo Tribunal Federal, nem vamos exigir a perfeição das decisões do Superior Tribunal de Justiça. São instituições feitas por homens que estão rigorosamente sobrecarregados de seus serviços. Então, é evidente que essas interpretações poderão surgir com falhas ou, então, elas poderão surgir em desacordo, muitas vezes, com o pensamento científico jurídico, mas surgem dentro de um componente de razoabilidade.

Fechando essa situação de que estes dois tipos de responsabilidade tributária que temos no Código Tributário Nacional, vamos observar que, com o título de "responsabilidade tributária", especificamente, o CTN dedica, sob esse título, os artigos 128 a 138 do Código Tributário Nacional. Dedica, especificamente, sob esse título de "responsabilidade tributária".

Essa responsabilidade tributária obedece, segundo uma corrente, a uma determinada classificação, a um determinado esquema. A respon­sabilidade tributária poderá ser por substituição, aquela definida no artigo 128, quer dizer, substitui o devedor tributário por outro que está relacionado com o fato gerador, mas que não praticou diretamente o fato gerador, mas apenas com ele está relacionado.

Ela pode ser por transferência, se transfere a alguém, em razão de qualquer vínculo, a responsabilidade tributária, alguém que não seja o contribuinte - regras dos artigos 129 a 138. Essas regras, por sua vez, passam por uma subdivisão. Essa responsabilidade passa a ser de terceiros, é a solidária, natureza solidária, com formato no 134. Essa responsabilidade passa a ser por infração pessoal que é a dos artigos 135 a 138, e passa a ser por sucessão que é dos artigos 130 a 133.

Então, observem, meus queridos amigos e, principalmente, meus queridos estudantes, que nós temos necessidade de decifrar os enigmas desse esquema. Se nós não decifrarmos os enigmas desse esquema, onde estão contidas as regras da responsabilidade tributária, nós não vamos bem entender o complexo dessas relações jurídicas, nem, também, a sua interpretação. E essas complexidades vão se atenuar como irão verificar, mais adiante, com a que vai ser afinada.

Vamos observar, ainda, que essa responsabilidade por sucessão tem ainda uma subsubdivisão. Primeiramente, é a responsabilidade por sucessão imobiliária, é a responsabilidade do artigo 130; é a responsabilidade por sucessão empresarial, que é subsidiária ou integral, do artigo 132 e 133; e a responsabilidade por sucessão pessoal propriamente dita, que é o artigo 131.

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Então, vejam que nós temos que identificar cada liame dessa responsabilidade e, além de identificar cada liame desta responsabilidade, temos que colocá-la dentro do contexto.

O tempo não nos permite que nós entremos aqui na análise específica de aspectos desse tipo de responsabilidade, das suas divisões, das suas subdivisões, das suas subsubdivisões, como também não é o motivo específico de nossa fala, não é o motivo específico de nossa palestra. O motivo específico de nossa palestra é mostrar se há alguma influência, ou não, do novo Código Civil nessa responsabilidade tributária.

As regras lá estão postas, como, por exemplo, a regra da respon­sabilidade por substituição, no artigo 128, como já lhes falei, em que a lei excluiu o contribuinte do pagamento do tributo, atribuindo essa responsabilidade a uma terceira pessoa, desde que vinculada ao fato gerador. Nós temos a regra posta na responsabilidade por transferência que, como já lhes disse, é a responsabilidade que é trazida para um terceiro, responsabilidade de modo solidário. Responsabilidade, por exemplo, dos pais pelos tributos devidos por seus filhos menores, a responsabilidade dos administradores dos bens de terceiro, a responsabilidade do inventariante pelos tributos devidos.

Ainda, um questionamento jurisprudencial, também na doutrina, a respeito dessa responsabilidade: se ela é rigorosamente solidária ou se essa solidariedade só surge quando há impossibilidade de o tributo ser cobrado do contribuinte realmente chamado por causa da relação jurídica. Nesse ponto, a doutrina e a jurisprudência sofrem variações.

Temos, por outro lado, a responsabilidade por infração, cuja regra máxima é pessoal, ela só atinge aquele agente que praticou a infração. Estou apenas fazendo uma síntese para ordenar o nosso pensamento.

Temos a responsabilidade por sucessão imobiliária cuja garantia do pagamento do tributo passa para o imóvel. O adquirente que adquiriu o imóvel, e o imóvel, conseqüentemente, passa a ser a garantia daquela responsabilidade. Uma espécie de um negócio jurídico hipotecário dentro do direito tributário. Temos a responsabilidade por sucessão empresarial que se divide em três situações: responsabilidade dos artigos 132 e 133 do Código Tributário Nacional; a situação de responsabilidade exclusiva da empresa, quando ela assume todo o ativo e passivo da empresa; a responsabilidade do adquirente de um fundo de comércio apenas pelos tributos devidos pelo alienante e, também, a responsabilidade subsidiária, durante um determinado prazo de seis meses, ou seja, aquele que adquire o Fundo de Comércio e fica responsável por determinados tributos e, também, aquele que alienou o fundo de comércio e fica também responsável pelos tributos ainda existentes.

Então, temos a responsabilidade por sucessão pessoal, que é a responsabilidade do adquirente ou remitente - remitente é aquele que faz o

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resgate da dívida. Também esse dispositivo trata dos chamados bens móveis, exclusivamente do meu entender.

Por fim, podemos verificar a responsabilidade dos tributos devido à morte. O fenômeno morte gera fenômenos tributários que podem ser divididos em três campos. Primeiramente, no fenômeno tributário dos tributos devidos até a morte cujo contribuinte é o de cujus, o responsável é o espólio. Esse tipo de responsabilidade é pessoal. O segundo tipo são os tributos devidos até a morte e não pagos pelo espólio até a partilha ou adjudicação, cujo contribuinte é o de cujus, novamente, cujos responsáveis passam a ser os sucessores e o cônjuge meeiro. Esse tipo de responsabilidade é pessoal dos sucessores e do cônjuge meeiro. Por fim, nós temos os tributos devidos após a morte.

Vejam bem que nós temos aí três fenômenos presentes. Vejam que se nascer é a coisa mais bela da natureza, a morte, embora seja a coisa mais triste da natureza, mas tanto o nascimento como a morte constituem-se grandes preocupações do Direito.

Vejam que o Direito protege o ser humano até mesmo antes de nascer, através do direito do nascituro e até com conseqüências tributárias do direito do nascituro. Mas, mesmo depois da morte, o direito continua a se preocupar imensamente com esse fenômeno de vida.

Depois dos tributos de vida após a morte, temos que o contribuinte continua sendo o espólio, sendo que a responsabilidade aí é do inventariante, e este tipo de responsabilidade é solidária.

Fechado esse esquema, a tese introdutória, vamos passar, agora, para o segundo esquema que representa a divisão de minha palestra nessas duas partes: a primeira parte de relembrar, muito rapidamente, de relembrar, apenas sinteticamente, essa estrutura da responsabilidade tributária do Código Tributário Nacional.

A segunda parte tem por finalidade verificar a responsabilidade tributária e o Código Tributário Nacional. Há algumas modificações importantes nessa responsabilidade tributária e o CTN? Vamos pinçar alguns artigos porque, infelizmente, não vai ser possível fazermos um estudo mais desenvolvido para apresentar a todos os meus queridos amigos.

Vamos pensar, primeiramente, no artigo 50 do Código Tributário Nacional. O que é que diz o artigo 50 do CTN, em uma redação mais aperfeiçoada do artigo 20 do Código Civil anterior?

O artigo 50 do Código Tributário Nacional diz expressamente: "Em caso" - eu peço que acompanhem a leitura e façam essa leitura com olhos voltados para a lei - da mesma maneira como nós, quando queremos amar uma pessoa amada, uma pessoa que nós queremos amar, como nós amamos nossos filhos, a minha esposa - eu já ia dizendo, as minhas mulheres, mas posso dizer, pois tenho esposa e netas -, mas a minha esposa, as minhas filhas, as minhas netas, nós olhamos, nós procuramos amar olhando nos

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olhos e penetrando no seu íntimo para bem descobrir o que existe nessas pessoas para que o processo de interação se realize.

E com a lei, se nós não fizermos esse processo de interação, nós nunca vamos entender a lei. Verifiquem que cada mensagem legislativa contém esperança, contém ódio, contém desespero, contém exigências fiscais, especialmente as leis tributárias. Não há quem goste de uma lei tributária. Até hoje eu não vi ninguém dizendo: "Essa lei tributária é boa", porque é sempre uma lei de exigibilidade. É uma lei que exige um comportamento de desembolso financeiro, e o cidadão, em regra, não gosta de desembolsar financeiramente. Então, nós temos que interpretar essas leis com o verdadeiro sentido que elas transmitem, porque elas são seres vivos. As leis têm mensagens que representam a vida do ser humano, especialmente quando esta lei está posta, quando esta lei está num código do direito privado que é chamado o código da cidadania, é chamada a "Constituição da cidadania". Não obstante a Constituição Federal ser chamada a Constituição Cidadã, não é a constituição da cidadania: é a Constituição do Estado, a Constituição da organização das entidades, são as regras que organizam o poder, é onde estão postos os direitos e as garantias individuais do ser humano, tanto nas relações do direito público, como nas relações do direito privado.

Mas o Código Civil não. O Código Civil é a lei que regula o nosso dia­a-dia, a nossa hora a hora, o nosso comportamento minuto a minuto. É uma lei que se preocupa, como já lhes disse, antes do nascimento do homem até depois da morte do homem, procurando regular, nos seus 2.046 artigos, todos esses momentos do homem, todos esses instantes.

Então, eu sempre digo que o Código Civil acompanha o homem em todos os seus passos, em todos os seus momentos. Quando nós dormimos, o Código Civil está ali dirigindo os nossos sonhos, está protegendo o nosso sono; quando nós caminhamos, o Código Civil está ali ao nosso lado; quando nós falamos com algum cidadão, com algum semelhante, o Código Civil está aí prestigiando aquela nossa mensagem; quando aqui eu lhes estou falando, o Código Civil está aqui regulando esse nosso relacionamento; quando os senhores estão aqui me ouvindo, o Código Civil está presente nesse nosso relacionamento; enfim, o novo Código Civil está em todos os momentos, em todos os segundos de nossa vida.

Então nós temos que entendê-lo, nós temos que examiná-lo, temos que interpretá-lo com o máximo de profundidade. Então, temos que ler todos os seus artigos com amor, para descobrir se realmente esse artigo tem amor ou não tem.

Então, o artigo 50 determina: "Em caso de abuso ... " - veja bem que nós já temos aí uma expressão de que nós não gostamos. O vocábulo "abuso" é um vocábulo antipático, o vocábulo "abuso" é um vocábulo que tem conteúdo ditatorial. Precisamos ter o máximo de cuidado e direito com essas expressões. O vocábulo "abuso" não é um vocábulo que imponha simpatia. Veja bem: uma pessoa abusada não é uma pessoa simpática. Um político

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abusado não é um político que recebe a reeleição de seus eleitores. Uma autoridade abusada é uma autoridade que comete abuso de autoridade. Então, aqui nós já temos, na lei, uma expressão para a qual nós devemos ter o máximo de cuidado. "Em caso de abuso da personalidade jurídica ... " - já podemos observar que a lei, quando regula a personalidade jurídica, nos artigos 20 e seguintes do novo Código Civil, ela já estipula determinados limites: a personalidade jurídica tem que atuar dentro dos limites fixados pela lei, sem poder ultrapassar aquelas regras por ela determinadas.

"Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizada pelo desvio da finalidade, ou pela confusão patrimonial" - 66 anos tem que estirar o braço, embora com óculos, eu com quatro olhos na cara, mas ... - " ... desvio da finalidade ou pela confusão patrimoniaL .. " . Então, observe que nós temos aí a interação do abuso pela lei, somente pela lei, sem interpretação jurisprudencial em três situações: " ... pelo desvio de finalidade, pela confusão patrimonial pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do ministério público quando lhe couber intervir no processo que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica".

Vejam que, aqui, o juiz vai ter que ser chamado para dizer o que é abuso de personalidade jurídica; o juiz vai ter que ser chamado para dizer o que é que ele compreende por desvio de finalidade; vejam que são termos abertos, são cláusulas abertas do legislado; o juiz vai ter que ser chamado para dizer o que entende por confusão patrimonial, porque a confusão patrimonial não está regulada em nenhuma norma do direito civil; ele vai, também, verificar quais são essas "certas e determinadas relações de obrigações". Por que o que é que a lei diz? "Para os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações ... " Então, o juiz é quem vai determinar quais são essas certas e determinadas relações de obrigações. Vejam aí a responsabilidade do juiz brasileiro neste momento.

Então, configurada essa construção do artigo 50 do novo Código Civil, que a doutrina está de modo certo dizendo que isso é a despersonalização da personalidade jurídica, a despersonalização da pessoa jurídica, qual é o efeito que nós vamos ter para o Direito Tributário?

A meu ver, vejam bem, são pensamentos ainda não solidificados, não são pensamentos para com os quais eu tenha compromisso jurisprudencial, porque eu sempre digo que, quando eu falo, eu falo como professor, eu falo daquilo que eu tanto gosto de fazer, também, que é discutir idéias, que é trazer o Direito para, com base nos informes dos amigos e dos meus semelhantes, procurar o aperfeiçoamento, mas sem nenhum compromisso jurisprudencial, porque, muitas vezes, determinados advogados descem à tribuna do Supremo Tribunal de Justiça, porque, no Supremo Tribunal de Justiça que eu conheço, se desce à tribuna, não se sobe à tribuna, pois lá é diferente, não se sobe à tribuna, lá se desce, e começa a ler um artigo meu. Então, eu esclareço que aquilo eu fiz com o conteúdo doutrinário, eu fiz para

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o mundo científico. Eu não escrevi aquele artigo com compromisso jurisprudencial. Perdoem que eu esqueci de desligar o celular.

Então, vejam bem. O que eu estou a lhes falar não tem nenhum compromisso jurisprudencial. Se a minha palestra estiver sendo gravada, e eu autorizo que seja gravada, em nenhum momento que pode ser invocada como sendoum compromisso jurisprudencial. É um compromisso puramente doutrinário, porque, muitas vezes, as teses doutrinárias, quando são harmonizadas, quando elas são colocadas para investigação em relação aos fatos, elas não se aproximam, e o juiz aí fica com o direito de fazer a escolha que melhor ele achar conveniente, até por circunstâncias de política judiciária.

Então, quando um juiz, especialmente um Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, fala sobre determinada tese em palestra, sobre determinado posicionamento, ele não está assumindo nenhum compromisso a respeito do julgamento. Ele está como professor. Eu sei que é muito difícil vocês fazerem essa separação, mas eu lhes peço que façam essa separação, para que nós não tenhamos, depois, uns dissabores de entendimento e não afirmarem que eu estou traindo os compromissos fixados em campo doutrinário.

Então, a respeito deste artigo 50, eu tenho entendido, juntamente com Ricardo Marins de Oliveira e outros autores, nós temos aqui em nossa pasta um trabalho até de Ricardo Marins de Oliveira sobre este assunto de que foi ampliado, por demais, o campo da chamada despersonalização da pessoa jurídica em campo tributário.

Com base nesse artigo 50, vamos pedir a Deus que os fiscais e os procuradores da Fazenda não o entendam com a devida extensão que realmente ele tem. Vão surgir imensas possibilidades e mesmo a firma estando em plena atividade, em momento mesmo em que a firma não tenha sido dissolvida, não tenha sido liquidada por culpa dos sócios, a firma em plena atividade e os sócios no exercício de seus direitos, ele vai ter a possibilidade de ser chamado para responder solidariamente. Quer dizer, o Fisco pode optar de não executar a empresa e executar o sócio. Vejam bem que eu estou lhes falando da solidariedade, não estou lhes falando de subsidiariedade, porque o artigo 50 do Código Tributário Nacional dá essa possibilidade, diferentemente da situação anterior.

Na situação anterior, a desconsideração da pessoa jurídica para fins tributários, diferentemente do que era para fins trabalhistas, era mais rígida. Se entendia que essa desconsideração da pessoa jurídica para fins tributários do regime anterior era mais restrita. Só poderia haver a despersonalização da pessoa jurídica para imprimir responsabilidade no sócio, o sócio assumindo responsabilidade em situações específicas em que se comprovasse, realmente, que o ato foi doloso do sócio e que a empresa não tinha condições de arcar com essas responsabilidades. Hoje, há uma corrente, e essa corrente merece muito a minha simpatia que, em face desse princípio do artigo 50, as coisas estão muito modificadas, e modificadas em benefício da fiscalização.

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A possibilidade de uma empresa - concluo desse ponto - a possibilidade de uma empresa ser desconsiderada a sua personalidade jurídica, ela continua a existir, o Fisco deixa-a de lado para ser chamada à responsabilidade, e essa responsabilidade ser exigida do sócio, aquele sócio que se apresenta com melhores condições patrimoniais. E essa respon­sabilidade será pessoal e solidária. O Fisco poderá excluir um ou outro, a mesma questão do aval. Há o princípio da solidariedade do aval que se cobra a dívida de quem melhor tiver condições de se cobrar.

A grande discussão que poderá surgir é se esse sócio vai poder exigir o direito de regresso contra a empresa. É possível esse sócio arguir o benefício de discussão? É possível esse sócio argüir o benefício de ordem? Há uma corrente dizendo que não, outra corrente dizendo que sim. Nós sabemos que, em Direito Tributário, o benefício de ordem praticamente inexiste. No campo da responsabilidade tributária do Código Tributário Nacional, não há benefício de ordem. Eu não conheço nenhuma inserção a esse posicio­namento. A prevalecer esse posicionamento de que não há benefício de ordem propriamente dito, vai prevalecer esta corrente que eu estou a lhes falar.

Vamos passar agora a um outro aspecto. Já estão observando a importância que tem o Código Civil para o CTN. É tanto que se afirma que o Direito Tributário é um direito de superposição. É um direito de superposição porque as entidades nele previstas nós vamos buscar onde? No Código Civil.

Observem, por exemplo, nós temos aqui o conceito de renda, o conceito de propriedade imobiliária, o conceito de direitos reais sobre imóveis, o conceito de operações de crédito, câmbio e seguro, o conceito de títulos e valores imobiliários, o conceito de transmissão causa mortis, o conceito de doação, o conceito de veículos, o conceito de prestação de serviços, o conceito de mercadorias, o conceito de propriedade territorial urbana, o conceito de ato oneroso, o conceito de produtos industrializados.

Todos esses conceitos, que são trabalhados ardorosamente pelo CTN, todos estes conceitos que o CTN apanha e faz a tributação com base nesses conceitos não são do Código Tributário Nacional são do Código Civil. Eles passam para o ambiente jurídico tributário com a mesma feição, com as mesmas características que estão no Código Civil. O CTN não pode alterá­los, não pode modificá-los, não pode ampliá-los, porque, se fizer qualquer ampliação, a jurisprudência vai e não o aceita por ser o CTN, no particular, um direito de sobreposição.

Ele acompanha os institutos de direito privados da maneira que eles foram construídos; eles não podem construir novos institutos.

Muito bem. Dentro desta filosofia, vamos observar o que diz o artigo 156, inciso 2, da Constituição Federal, com base na Emenda Constitucional na 3/93, lI, referente ao imposto de transmissão inter vivos. Diz lá o artigo 153, lI, da Constituição Federal, com redação da Emenda Constitucional nO 13/93, determina, no artigo 156, que: "Compete aos municípios instituir

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imposto sobre: II - transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso de bens imóveis, por natureza ou acessão física e direito reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direito à sua aquisição.

Todos esses conceitos que nós temos aqui: "transmissão inter vivos, ato oneroso, bens imóveis, acessão física, direitos reais sobre imóveis, garantia, cessão de direitos e sua aquisição", todos esses conceitos são conceitos de direito civil. E nós temos que trabalhar com eles com os limites que eles têm.

Vamos encontrar... Peço agora que acompanhem bem de perto o meu raciocínio do problema que eu vou-lhes colocar.

Nós temos agora o novo Código Civil definindo o que sejam bens imóveis no seu artigo 79.

Diz lá, expressamente: "São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente".

O que é que diz o artigo 156, lI, da Constituição Federal?

Os municípios poderão instituir impostos sobre transmissão inter vivos a qualquer título por ato oneroso de bens imóveis.

O que é que diz o Código Civil? "São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente".

Qual é a primeira conclusão que nós vamos firmar, agora, com o novo Código Civil? Que os municípios poderão criar tributos sobre bens imóveis. Está dito na Constituição Federal, no artigo 156, lI. E esse tributo, esse imposto, imposto de transmissão inter vivos, ele poderá incidir sobre qualquer imóvel, qualquer bem situado sobre o solo e tudo quanto se lhe incorporar, natural ou artificialmente.

É uma meditação para a qual eu lhes trago alongados pensamentos. Tudo que foi incorporado ao imóvel, artificialmente, passa a ser considerado imóvel. É a primeira conclusão a que se chega. Mas, a meu ver, não é uma conclusão verdadeira. Eu tenho muito medo dos equívocos jurídicos. Os equívocos jurídicos podem se transformar na verdade do amanhã e, depois que os equívocos jurídicos se transformam na verdade do amanhã, para você desconfigurar, para você fazer voltar, para você provar que essa verdade ainda existe, é muito difícil, porque, em regra, não há o chamado inconformismo dos cientistas do direito.

Os cientistas do direito, até por uma vaidade particular, quando chegam a determinada conclusão, procuram defendê-la, às vezes, derramando o próprio sangue para defender aquela conclusão a que ele chegou. É uma questão que existe não somente na ciência jurídica, mas também em todas as outras ciências. Os equívocos jurídicos podem criar imensas dificuldades para o amanhã.

Nós temos vários equívocos jurídicos, no meu entender já definidos e que hoje são verdades, e que a jurisprudência não transforma de maneira nenhuma. Por exemplo, eu lhes falei, a meu ver, num grande equívoco jurídico:

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a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre substituição tributária. No meu entendimento, é um grande equívoco jurídico, mas já está se transformando em uma verdade. Vejam os votos do Ministro DELGADO que diz: "Não obstante a ressalva do meu ponto de vista, mas eu acompanho, rigorosamente, a decisão do Supremo Tribunal Federal". Não obstante eu reconhecer, eu ter consciência de que é um equívoco jurídico, mas se transformou em uma verdade jurisprudencial.

Então, vamos ter cuidado da interpretação deste artigo 79 do Código Civil: nós não consideramos que tudo que se incorpora artificialmente ao imóvel é sujeito à tributação do imposto de transmissão inter vivos, porque, se assim o for, no momento em que eu incorporo ao meu imóvel uma antena de televisão, ele passa a ser incorporado ao imóvel e, se eu fixo essa antena de um cimento armado e que ela se incorpora ao imóvel, e ela pode até ser incorporada em uma estrutura de um pilar do imóvel, eu vou pagar a transmissão, eu vou pagar imposto de transmissão pela compra desta antena, por ter adquirido esta antena. Penso que não é bem assim.

Quando o novo Código Civil... Eu lhe chamo a atenção, porque nós sabemos a fúria tributária da União, dos Estados e do Município e das nossas autarquias. É um furor tributário que nós não podemos mais controlar de maneira nenhuma e, no momento em que há qualquer possibilidade, qualquer abertura da Lei, para esse furor tributário se tornar uma realidade, é lógico que vão se utilizar.

E os direitos da cidadania, com certeza, cada vez mais vão ser diminuídos e criar imensas dificuldades para que esses direitos sejam respeitados através de aviso ou através de pedido de entrega de prestação jurisdicional.

Não é bem assim. Penso que o tudo só pode ser incorporado, só pode ser fato gerador do imposto de transmissão inter vivos aquilo que se incorporar artificialmente ao imóvel, mas que vá compor a sua constituição global. Aquilo que vá representar um acréscimo ao imóvel, não àquelas partes acessórias do imóvel e que não são imóveis.

É diferentemente de outros conceitos. É diferentemente do conceito de navio para fins hipotecários. O navio, para fins hipotecários, é tido como imóvel, mas é tido como imóvel para uma definição legal. Precisamos ter um pouco de atenção para esta disposição.

O artigo 1.129 do novo Código Civil complementa este conceito. Vejam como o direito é belo, como o direito é cheio de mistérios. É por isto que há beleza no direito. Nós temos um artigo 79, vamos ter que ir para o artigo 1.129 do novo Código Civil. Então, meus queridos amigos, quem não ler, reler, não treler, não quatriler, não ler para frente e não ler para trás os 2.046 artigos do novo Código Civil, pelo amor de Deus, não venham me dizer que teve conhecimento do que seja o novo Código Civil. Tem que ler todo o novo Código Civil, do artigo 10 ao 2.046, reler, treler, depois ler para trás, depois

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ler partes e partes, para que possa entender. Porque há o chamado fenômeno de interligação das leis que existem e, hoje, nenhuma lei pode ser interpretada isoladamente.

Nós temos, hoje, dois fenômenos muito interessantes no nosso ordenamento jurídico: nenhum artigo de lei pode ser interpretado isoladamente; ele tem que ser interpretado dentro do ordenamento, você tem que ter uma visão do todo e, também, tem que abandonar o chamado positivismo jurídico. O artigo da lei não diz tudo. O que vai dizer são os princípios que o regem; os princípios estão acima da lei.

Por sinal, MELISSA tem um trabalho fabuloso a respeito do que eu acabei de ler. Uma prova de que eu leio o que você escreve. Um trabalho fabuloso mostrando isso, mostrando que o século XXI, já da metade do século XX para cá, já no século XXI, nós temos que homenagear os princípios. Eu tenho sempre dito aos meus alunos: se vocês aprenderem os princípios da matéria que eu estou ensinando - eu gosto muito de Processual Civil Tributária e Administrativa - se vocês aprenderem, lógico, Direito Civil que, há pouco tempo, eu dizia a TÂNIA e a JOSÉ, também, que quem não souber Direito Civil não sabe Direito Tributário, não sabe Direito Administrativo, não sabe Direito Penal, não sabe Direito nenhum.

Portanto, vejam bem, eu tenho um curso de especialização em Direito Civil, mas trabalho no ST J na área de Direito Público, por incrível que pareça. Porque eu entendo que é a base e acabei de lhes demonstrar há pouco tempo.

Então, hoje, o grande fenômeno é que temos que, primeiramente, homenagear os princípios. Então, eu digo aos meus alunos: "Aprendam os princípios da disciplina que hoje estou ensinando que eu estou satisfeito, aprovo todos vocês. Vocês estão aptos para o exercício profissional".

Primeiramente, os princípios. Os princípios comandam toda a orientação jurídica, e, depois, você passa a verificar a lei, a verificar o seu artigo, a verificar o que é o dispositivo legal, e procura ver se aquele dispositivo legal está de acordo com aquele princípio ou não. Por exemplo, o chamado princípio da dignidade humana. Eu não posso entender, hoje, que nenhuma regra jurídica, quer seja tributária, quer seja administrativa, do Direito Penal, Rural, Ambiental etc., ela possa ser interpretada sem que nós pensemos no princípio da dignidade humana e da valorização da cidadania.

Porque esses dois princípios estão onde? Estão no artigo 1 0, lI, m, da Constituição Federal. São os dois princípios maiores que nós temos a comandar todo o nosso comportamento.

Ao ler um artigo de lei, temos que pensar se este artigo de lei está valorizando a dignidade humana. Ao ler um artigo de lei, temos que pensar se ele está valorizando a cidadania, porque diz lá o artigo 1 ° da Constituição Federal: a República Federativa do Brasil, constituída pela União, Estados e Municípios e Distrito Federal, tem por objetivo fundamental: 1°) a soberania; 2°) a dignidade humana; 3°) a cidadania; e 4°) os valores sociais e o trabalho?

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E não é possível que o artigo 10 da Constituição Federal determine esses princípios e nós esqueçamos, o Estado se esqueça desse princípio; o eminente Ministro da Previdência Social se esqueça que os nossos velhinhos necessitam da obediência desses princípios, que as medidas provisórias que são expedidas também o Poder Público se esqueça de que, com as medidas provisórias, esses princípios necessitam ser respeitados, e que nós, operadores do Direito, nos esqueçamos, também, da interpretação do Direito Tributário, que esses princípios também precisam ser respeitados.

Mas vamos voltar ao que eu lhes dizia.

Então, eu vejo que nós temos que ver o artigo 79 do Código Civil, com o artigo 1.129. O artigo 1.129 do Código Civil, ele complementa o conceito. Diz: "O proprietário do solo ... ". O que é que diz o artigo 79? "São bens imóveis o solo" . E diz o artigo 1.129: "O proprietário do solo abrange o espaço aéreo e subsolo correspondentes em altura e profundidades úteis ao seu exercício". Essa profundidade é outro conceito aberto. Quem vai dizer o que é profundidade útil é o juiz. Vejam a responsabilidade da magistratura para aplicar o Código Civil de 2002. Quem vai dizer o que é profundidade útil é o juiz, porque a lei não diz o que é profundidade útil: " ... em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas por terceiro a uma altura ou profundidades tais que não tenha ele interesse algum em impedi-la". O juiz é que vai decifrar.

Então vejam que, dentro deste prisma que estamos enfocando, a responsabilidade tributária, quer em sentido restrito, quer em sentido amplo, ela só vai incidir sobre os imóveis a serem considerados os bens vinculados ao solo e tudo quanto se lhe incorporar, natural ou artificialmente, mas com esse critério de utilidade, critério que está posto neste artigo 1.129.

Nós temos, ainda, outro problema dentro deste campo. O artigo 80 do novo Código Civil traz um dispositivo muito interessante. Ele considera imóveis para os efeitos legais o direito à sucessão aberta. Então, a primeira leitura do artigo 156, os dois, a primeira leitura que se faz, uma leitura apressada, pode dar oportunidade para que se defenda de que pode o município tributar, imediatamente, a sucessão aberta, a transmissão de sucessão aberta, cessão de direitos hereditários, em face do artigo 80 do novo Código Civil, porque o artigo 80 considera imóveis para efeitos legais o direito à sucessão aberta.

Mas este fato jurídico, a meu ver, ele não abre espaço para ser considerado hipótese de incidência tributária e conseqüente respon­sabilidade. Por quê? Porque ele é fato gerador do imposto de transmissão causa mortis. E aí vem o princípio da bitributação e impede. Embora a lei não diga claramente, mas, pela conclusão da aplicação dos princípios a esse fenômeno, se chega a essa conclusão.

Não obstante a lei estar dizendo expressamente no novo Código Civil, no artigo 80, que a sucessão aberta é considerada, para efeitos legais, como um imóvel.

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Um sentido diferente nós temos com o artigo 80, I, do novo Código Civil. Considera como imóvel os direitos reais sobre imóveis. Tais fatos são considerados hipótese de incidência tributária, mas com exceção dos direitos reais de garantia, porque no CTN não há uma permissividade, nem pela Constituição, nem pelo CTN de, sobre direitos reais de garantia, incidir imposto de transmissão. Por quê? Porque, nos direitos reais de garantia, só vai haver a transmissão, quando de sua execução, quando da execução da hipoteca.

Mas nós tínhamos algumas novidades, porque o novo Código Civil ampliou quais são os direitos reais. Então, nós temos, hoje, como causa determinante da responsabilidade do pagamento do imposto de transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, observem bem, por ato oneroso para com o Fisco, em face de essas condições poderem ser transformadas por lei - nesse caso é a lei municipal determinadora do imposto de transmissão de imóveis - os direitos sobre imóveis seguintes: a transmissão inter vivos de propriedade: normal, não houve modificação (artigo 1.225, I, do novo Código Civil); do direito de superfície sobre imóvel. Vejam que esse direito de superfície sobre imóvel, até então, não vinha sendo uma preocupação das leis tributárias, mas, agora, o direito de superfície sobre imóvel passou a permitir que haja a tributação, que é o direito real do inciso II do novo Código Civil; o direito de servidão: a servidão transmitida pode ser também causa de incidência deste tributo; o direito de usufruto do imóvel, já o era; o direito de uso do imóvel também já o era; o direito de habitação­não era, mas pode, hoje, ser causa determinante deste tributo; o direito do promitente comprador do imóvel já o era, também hoje continua sendo.

Lendo-lhes repetindo, apenas para ordenamento, que o penhor, a hipoteca e a anticrese, embora sejam, pelo novo Código Civil, considerados direitos reais puros, são considerados direitos reais puros, é uma modificação que houve no Código Civil anterior, não são causas de incidência tributária, pois o artigo 156, lI, exclui-os expressamente.

Quero lembrar, também, que hoje a enfiteuse já não existe mais, e as rendas constituídas sobre imóveis já deixaram de ser um direito real sobre o imóvel para ser um tipo de contrato específico, para ser um tipo de contrato nominado no novo Código Civil.

Já lhes disse que artigo o 1.369 do novo Código Civil combinado com o 1.225, lI, criou o direito de superfície do imóvel. O que é esse direito de superfície do imóvel? É quando o proprietário pode conceder a outro o direito de construir, ou de implantar, em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada ou cartório de registro de imóveis.

Aí nós temos uma causa, hoje, determinante de incidência tributária, onde a responsabilidade pelos tributos, pela transação, passa a ser do superficiário, porque diz o artigo 1.371 do novo Código Civil, explicitamente:

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"O superficiário responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre o imóvel" .

Vamos lembrar também que esta concessão da superfície pode ser gratuita. O artigo 1.370 do novo Código Civil permite que esta concessão seja gratuita.

Não haverá, em regra, incidência de imposto, a não ser que seja um ato simulado. E a respeito de ato simulado eu lhes indico a obra de HELENO TAVEIRO - que saiu há pouco tempo e está no mercado livreiro - a respeito da simulação tributária - simulação, fraude, conluio - e o novo Código Civil, quando ele trata com muita profundidade desta questão.

O direito de superfície, essa cessão, essa concessão pode ser gratuita. Mas se realmente ela for gratuita. Se houver prova de simulação, se for para fins econômicos não-justificáveis, poderá haver tributação. Eu compreendo, aqui, que só poderá haver um direito de concessão de superfície, uma doação que um pai faz para o filho, que o filho faz para o pai, ou para um neto, ou para uma pessoa que serviu muito, serviu durante muito tempo aquela pessoa, então, há um fato a justificar. Precisamos ter o máximo de cuidado para que não abramos portas, para que o Fisco possa alegar esta simulação.

Nós vamos observar, também, que o artigo 1.248 do novo Código Civil permite a transmissão da aquisição de imóveis por acessão. Neste caso, pode haver hipótese de incidência tributária de imposto de transmissão inter vivos. Em qualquer uma das formas de aquisição de imóveis por acessão, por exemplo, porformação das ilhas (artigo 1.249), por aluvião (artigo 1.250), por avulsão (artigo 1.251), por abandono de álveo (artigo 1.252), por plantações ou construções (artigo 1.253).

Vamos pedir a Deus - esse aqui é um segredo que vai ficar entre nós, aqui entre um potiguar, eu sou do Rio Grande do Norte, e os meus amigos gaúchos. Um segredo. Vamos pedir a Deus que o Poder Público municipal não descubra essas causas de incidência tributária, por que se descobrirem ...

Nós temos, agora, uma outra questão que lhes coloco. Incide o imposto de transmissão de imóveis inter vivos, a título oneroso, quando bens ou direitos são incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica para realização de capital? Eu entendo que não. Já tem decisão a respeito - posso me manifestar -, não obstante existir uma corrente contrária. Como também entendo que não incide quando esses bens são transmitidos a terceiros e decorrentes de fusão, incorporação ou cisão, em que se extingue a pessoa jurídica e surge uma nova pessoa jurídica.

Nós temos um problema: é que a cisão não foi deferida pelo novo Código Civil. Nós temos a fusão e temos a incorporação deferidas no novo Código Civil. Nós temos a incorporação nos artigos 1.113 a 1.122 e nós temos a fusão no artigo 1.119.

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Embora o novo Código Civil fale em incorporação, fusão e cisão, embora estabeleça regras, define o que é incorporação no artigo 1.116, define o que é fusão no artigo 1.119, mas, embora fale em cisão, não define o que é cisão.

Há um julgado da Primeira Turma no qual eu participei em que eu fui voto-vencido, em que eu entendia que não havia, no caso, tributação na cisão - questão de ICMS, mercadorias que eram transmitidas. Eu entendia que havia tributação do ICMS na cisão, porque essa cisão era uma cisão desconfigurada. Mas o Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS entendeu diferentemente; entendeu que não havia prova de que a cisão era uma desconfiguração. E também nós tivemos uma dificuldade imensa, pois foi em sede de recurso especial e nós não pudemos penetrar na prova, nos elementos probantes, a não ser quando as conclusões são absurdas, quando já permeiam para a valoração da prova.

Neste campo, eu fiquei vencido, e foi um daqueles votos-vencidos que você é vencido com satisfação, porque a minha convicção não estava muito forte. Depois é que eu observei que a minha convicção não estava muito forte e dei graças a Deus ficar vencido, porque, realmente, cabia ao Fisco ter provado que a cisão era uma simulação. O que realmente houve foi um encontro de contas em que, na cisão, mercadorias de uma firma passaram para outra firma sem que tivesse havido realmente uma circulação da mercadoria, o fato gerador do ICMS. Mas é um problema que eu lhes deixo com essa conclusão: em face dos pensamentos aqui postos.

O tempo se aproxima, diria que só tenho cinco minutos, aqui pelos meus cálculos, então, nestes cinco minutos, permitam-me que eu lhes apresente aqui, de modo bem rápido, ao estilo do que faz o Jornal Nacional, quando dá as notícias sem nenhum comentário, não é verdade? BORIS CASOY ainda comenta, mas o Jornal Nacional não comenta. Joga a notícia, e você vai tirando as conclusões.

Bem rápidas, algumas observações que eu fiz aqui a respeito das pessoas jurídicas, dos sócios e das sociedades. Algumas novidades. Primeiramente, o novo Código Civil trata das cooperativas. O código velho não tratava das cooperativas. Nós temos, aí, uma grande novidade nas cooperativas.

Diz lá um determinado artigo, o artigo 1.094 do Código Civil, que fixa as características da cooperativa e, no artigo 1.095, diz: "A responsabilidade dos sócios pode ser limitada ou ilimitada, dependendo do contrato". E, quando trata da ilimitada, veja o que diz o § 2°: "É ilimitada a responsabilidade das cooperativas em que o sócio responde solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais".

Meus queridos amigos, eu penso que aqui houve um regresso muito grande para a valorização das cooperativas. Nós sabemos que, aqui no Estado do Rio Grande do Sul, as cooperativas passam por um processo de evolução muito grande, um processo crescente de valorização. Vejam que hoje, no

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momento em que vocês se associam em uma cooperativa, se vocês não observarem o contrato, se vocês não observarem que o contrato vai determinar que a sua responsabilidade é limitada, você passa a responder, automaticamente, de acordo com o novo Código Civil, por todos os tributos daquela cooperativa, tributos não pagos, de modo ilimitado e solidariamente. O CTN não trata deste assunto, mas você tem que buscar as regras do Código Civil.

Outro aspecto é que, se esse contrato estiver feito com a respon­sabilidade limitada, e o Fisco pretender desconstituir esta responsabilidade limitada por fatores que ele, o Fisco, poderá apresentar, e se o juiz reconhecer que, pela natureza da exploração das atividades da cooperativa, essa responsabilidade é ilimitada, especialmente as cooperativas produtoras, as cooperativas que negociam, que realizam altos negócios jurídicos. Deixo­lhes a preocupação com os senhores, esperando que me ajudem a firmar um pensamento a respeito.

Temos ainda: o novo Código Civil determina, no artigo 988, que "todos os bens e dívidas sociais constituem patrimônio especial do qual os sócios são titulares em comum". Vocês já imaginaram o que isso poderá resultar? Quais são as interpretações que poderão surgir desta colocação do artigo 988 do Código Civil para o CTN? "Os bens e dívidas sociais constituem patrimônio especial" - os bens e as dívidas sociais - "do qual os sócios são titulares em comum". Se os sócios são titulares em comum não somente do patrimônio, como também das dívidas sociais, as suas responsabilidades também são em comum, são responsabilidades também do mesmo nível, são responsabilidades sem privilégio.

Não é uma conclusão, eu estou lhes afirmando, porque não é este o meu pensamento. É uma palestra que eu dei em Belém do Pará a respeito deste tema: as sociedades e a responsabilidade de seus sócios. O meu entendimento é outro. Eu penso que isso aqui é apenas uma regra geral e que essa regra geral está posta para valorizar a tipicidade das tais sociedades e que necessita ser bem interpretada.

Agora, vem o artigo 989, cuidando das sociedades, as disposições gerais. "Os bens sociais respondem pelos atos de gestão praticados por qualquer dos sócios, salvo pacto expresso limitativo de poderes que somente terá eficácia contra terceiro que o conheça ou deva conhecer".

Quer dizer, os sócios, mesmo autorizados, devem ter o máximo de cuidado para praticar os atos de gestão, e os não autorizados também devem ter o máximo de cuidado, porque na prática qualquer ato de gestão de qualquer sociedade, não somente os seus bens sociais, passam a responder por todos os atos de gestão, e, conseqüentemente, o direito de regresso sobre eles é de modo ilimitado e de modo solidário. Solidariedade aí entre os sócios.

Eu penso e coloquei aqui. Observação: esta regra, no meu entender, não se aplica à responsabilidade tributária em face do artigo 123 do CTN,

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porque o artigo 123 do CTN diz: "Salvo disposição de lei em contrário" - e aqui nós temos uma disposição de em sentido contrário - "as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública". Então, esta regra não pode isentar, não pode determinar a responsabilidade do sócio, porque não há disposição em contrário.

O tempo não dá para que a gente medite, de modo mais aprofundado, sobre cada artigo, mas o artigo 960 diz: "Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem previsto no artigo 1.024, aquele que contratou pela sociedade".

Vejam que é uma regra geral, e que tenho absoluta certeza de que o Fisco vai se utilizar muito dessa regra para impor essa responsabilidade solidária e ilimitada.

Esses dispositivos que eu lhes afirmei, eles todos se aplicam às sociedade não personificadas. São regras da sociedade em comum.

Mas nós tínhamos, ainda, algumas regras que nós podemos destacar.

Por exemplo, das sociedades em nome coletivo. Nós temos, hoje, o artigo 1.039, que diz: "Somente pessoas físicas podem tomar parte na sociedade em nome coletivo" - pessoas jurídicas não podem -, respondendo todos os sócios, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais. Como não há o benefício de execução, temos que ter cuidado com essa determinação.

"Sem prejuízo da responsabilidade perante terceiros" - diz o parágrafo único - "podem os sócios, no ato constitutivo, ou por unânime convenção, limitar entre si a responsabilidade de cada um". Não vai prevalecer essa limitação para fins tributários.

Nas sociedades coligadas, destacamos aí dois artigos: o 1.097 e 01.177. Que são sociedades coligadas? São aquelas em que suas relações de capital são controladas, filiadas ou de simples participação, na forma dos artigos seguintes.

Então vêm as regras que determinam. Nessas sociedades coligadas, nós tínhamos que ver, hoje, temos que construir até onde vão as responsabilidades das sociedades coligadas. Essa responsabilidade é solidária? Essa responsabilidade é subsidiária? Essa responsabilidade é limitada à participação de cada sociedade que foi coligada? A lei não nos dá a solução para este caso. Estas soluções deverão chegar através dos entendimentos jurisprudenciais.

Responsabilidade dos contabilistas. Responsabilidade dos contadores. Em Direito Tributário, o novo Código Civil, dos contadores, das sociedades, artigo 1.177: "Os assentos lançados nos livros ou fichas do preponente, por qualquer dos prepostos encarregados de sua escrituração" - os contadores são prepostos - "produzem, salvo se houver procedido de má-fé, os mesmos efeitos como se o fossem por aquele".

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"No exercício de sua função" - diz o parágrafo único - "os prepostos" - que são os contadores - "são pessoalmente responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos, e perante terceiros solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos". Sonegação de imposto doloso. Sonegação dolosa de imposto, que o contador tem conhecimento e que concorda em não lançar na escrita aquele imposto, a pedido do contribuinte, dolosidade­sonegação dolosa. O contador vai responder, solidariamente, de acordo com a nova regra do Código Civil.

Aliás, tem um site, na Internet, Portal Contábil, que está chamando muito a atenção dos contadores a respeito deste artigo do novo Código Civil.

Eu termino lembrando-lhes que nós temos regras bem interessantes que precisam de meditação a respeito das regras postas para as sociedades em comum, em que diz o artigo 987: "A responsabilidade dos sócios, mesmo que a sociedade não esteja constituída por escrito, pode ser provada de qualquer modo". O Fisco vai poder provar, de qualquer modo, as sociedades irregulares, as sociedades comuns, mesmo que ela não esteja constituída por escrito.

E também diz o artigo 988: "Os bens sociais constituem patrimônio especial do qual os sócios são titulares em comum, gerando, também, responsabilidade em comum".

Diz ainda, o artigo 989: "Os bens sociais dessa sociedade respondem pelos atos de gestão praticados por qualquer dos sócios, salvo pacto expresso limitativo" - parece que não se aplica ao Direito Tributário.

"Nas sociedades em conta de participação" - observem que agora eu embalei, estou correndo, correndo para ver se termino - "somente o sócio ostensivo obriga-se para com as responsabilidades da sociedade perante terceiros". É o artigo 991, parágrafo único, para fins tributários. Porém a responsabilidade do sócio ostensivo pode ser provada, de qualquer modo, haja vista que a Constituição desse tipo de sociedade independe de qualquer formalidade. Se o sócio não-ostensivo participar de qualquer gestão, ele passa, também, a responder por esta responsabilidade. É o artigo 993 que determina expressamente os sócios não-ostensivos, cita uma parte das relações da sociedade com terceiros, passa a responder solidariamente pelas obrigações da sociedade.

Já observaram quantas vezes o novo Código Civil fala em "respon­sabilidade solidária"? Observem bem. É uma modificação que vai influir, a meu ver, muito para a responsabilidade tributária.

Para as sociedades personificadas, as chamadas, hoje, sociedades simples, aí vêm mais regras. O contrato social deverá estipular se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais (artigo 997, VIII). Mas vem um parágrafo único e desmancha tudo que é dito para fins tributários. Determina: "É ineficaz em relação a terceiros" - e o Fisco é terceiro - "qualquer pacto separado contrário ao disposto no instrumento do

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contrato". Então, tudo que foi dito lá é destruído neste parágrafo único em relação ao Fisco.

Nessa sociedade simples, vamos ter o máximo de cuidado, que há uma regrazinha bem peculiar. "As obrigações dos sócios começam imediatamente com o contrato, mesmo que a sociedade não esteja funcionando, se este não fixar outra data, e terminam quando liquidada a sociedade, se extinguir as responsabilidades sociais. Se as responsabilidades sociais demorarem dois, três, quatro anos para serem extintas, continua a responsabilidade dos sócios. Também, se houver lucros fictícios por esta sociedade, os sócios respondem pelos tributos de modo ilimitado e solidário pelos tributos que recaírem sobre estes lucros fictícios".

Outro, o artigo 1.012, a figura, hoje, do administrador, porque hoje nós temos o sócio, o sócio-gerente, temos o administrador e temos o gerente propriamente dito. Nós temos quatro figuras, hoje, das sociedades comerciais. O sócio, o sócio-gerente, o administrador que não é sócio, é apenas eleito para administrar, e temos o gerente propriamente dito. Todos estes que praticarem o ato de gestão respondem, solidariamente e ilimitadamente, pelos tributos decorrentes.

Nas sociedades em nome coletivo, já lhes falei na sociedade em comandita simples. Os comandidatos, as pessoas físicas, são responsáveis, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais. Os comanditários, obrigados somente pelo valor de sua quota. Porém, se o sócio comanditário praticar qualquer ato de gestão, passa, então, a responder de modo solidário e ilimitado pelas obrigações da sociedade (artigo 1.047).

A responsabilidade da sociedade limitada - algumas pequenas modificações para as quais lhes chamo a atenção - as famosas "Ltda.". Nós temos 92% das sociedades do Brasil, em forma de Ltda. A responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor das quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social, enquanto não for feito o capital social. É o artigo 1.052.

Todas as regras de responsabilidade aplicadas, que eu já lhes falei na sociedade simples, aplicam-se às sociedades limitadas, quer dizer, as responsabilidades foram aumentadas.

A responsabilidade dos membros do conselho fiscal - desta responsabilidade da sociedade limitada - o conselho fiscal, de acordo com o artigo 1.016, vai responder no mesmo patamar que respondem os admi­nistradores. Se as deliberações dos conselhos fiscais forem deliberações que infringem o contrato ou infringem a lei, o conselho fiscal que aprova as contas daquela sociedade, onde há tributos não pagos deliberadamente, os conselheiros fiscais vão responder, de modo ilimitado e pessoalmente, pelos tributos não pagos - artigo 1.080, combinado com o artigo 50 do novo Código Civil.

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Passa a haver o quê? Passa a haver a despersonalização da pessoa jurídica e passa a responsabilidade a ser do conselheiro fiscal. É bem verdade que tem que se provar aí o elo existente.

Essa responsabilidade na sociedade anônima é tão-somente pelas cotas integralizadas, aí nada foi modificado.

Temos que ter o máximo de cuidado, agora, no que se refere à responsabilidade quanto à sua alienação, porque, quando há alienação do estabelecimento, o novo Código Civil traçou limites específicos para esta alienação. Diz o artigo 1.142, depois de conceituar estabelecimento, que, "se ao alienante não restarem bens suficiente para sorver seu passivo, a eficácia da alienação do estabelecimento depende do pagamento de todos os credores ou do consentimento destes, de modo expresso ou tácito, em 30 dias a partir de sua notificação"; em caso de nulidade de alienação do estabelecimento, se os tributos não forem pagos, ou, então, se o Fisco não concordar que haja esta alienação sem o não-pagamento dos tributos.

Diz, ainda, o artigo 1.146: "O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo, solida­riamente obrigado pelo prazo de um ano" - não ex.istia esse dispositivo na legislação anterior - a partir de quanto? A partir "quanto aos créditos vencidos da publicação e quanto aos da data do vencimento". Isso é o que diz o artigo 1.146.

Outros e outros assuntos, meus queridos amigos, têm sido motivo de minha preocupação. Vejam bem, aqui, eu tenho, em 25 páginas, só de anotações destas minhas preocupações a respeito do que eu estou chamando de "relacionamento do CTN com o novo Código Civil", apenas destaquei algumas que me parecem mais preponderantes, que eu já tenho pensamentos mais ou menos firmados, alguns, como observaram, estão mais ou menos firmados, estou buscando elementos para que as minhas conclusões sejam tiradas.

Eu quero lhes agradecer o modo como fui ouvido, quero agradecer o convite que o Instituto me fez, quero lhes dizer que foi profundamente honroso. Peço ao eminente presidente que não fale mais que foi sacrifício de minha parte. Se a Gol não tivesse me trazido, eu teria vindo a pé ou nadando, eu não sei quais são os territórios daqui para Brasília, mas vim aqui com muita satisfação.

Eu só lhes peço é que me permitam relevar a minha admiração pelos encontros que estão celebrando na busca do aperfeiçoamento do Direito, porque, não obstante viver com o Direito há 43 anos, entre 38 de magistratura e mais cinco anos de formado, eu continuo a crer no Direito, e creio no Direito porque ele é feito pelos homens, e eu creio profundamente nos homens. Eu

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creio nas boas intenções da humanidade, eu creio nas boas intenções dos cidadãos, especialmente dos cidadãos que fazem esta terra gaúcha.

Muito grato.

Coordenador

Não preciso fazer comentários, pois vocês todos escutaram em silêncio, com respeito e admiração a uma brilhante palestra, brilhante conferência. Vejam, também, que ficaram muitos pontos em aberto para serem abordados, evidentemente, que o Ministro não os abordou até pela falta de tempo, pois talvez tivéssemos que levar a tarde aqui ouvindo a sua exposição, para que tivéssemos uma idéia completa sobre o tema que ele veio trazer.

Também, mais uma vez, a sua profundidade, a sua riqueza nos surpreende, porque vem trazer inúmeras nuances do novo Código Civil que, às vezes, a gente não está bem assenhorado da situação e pode ter surpresas.

Em face disso e porque certamente muitas dúvidas permaneceram, mas que não foram abordadas por falta de tempo, e porque nós temos mais dois trabalhos a realizar à tarde, eu peço que não façam mais chegar perguntas à mesa, porque nós não poderemos formulá-las, além do que, pela natureza própria desse módulo, que seria uma conferência, não é apropriada para a troca de idéias. Então, essa dinâmica de perguntas e debates será oportunizada nas duas palestras da tarde.

Então, por essas razões, eu sei que têm perguntas até muito interes­santes, porém, em face dessas razões, eu peço desculpas a todos que não serão formuladas.

Ministro José Delgado

Se me permite, o eminente presidente destes trabalhos, eu coloco o meu e-mail à disposição para discutirmos essas perguntas. O meu e-mail é [email protected].

As perguntas serão muito bem-vindas, só não prometo responder rapidamente, mas eu garanto que de um ano eu responderei.