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Psicologia e Educação 67 Vol. III, nº 1, Jun. 2004 Desenvolvimento Organizacional: dois casos e um Modelo de Intervenção Mira, M.R.* Duarte Gomes, A.** Resumo: O presente artigo centra-se sobre o processo de mudança e visa dar conta do percurso que foi seguido e das estratégias que foram adoptadas no quadro de intervenções levadas a cabo junto de duas organizações envolvidas num projecto de desenvolvimento organizacional. As duas têm como missão o ensino e/ou educação. Trata-se de um universidade (caso A) e de uma congregação religiosa (caso B). A intervenção teve em vista evidenciar as “boas práticas”, identificá-las e explicitá-las, ao longo do processo de mudança que foi co-construído. Palavras-Chave: Desenvolvimento organizacional, mudança e investigação-acção. Abstract: This article focuses on the change process and aims to give an account of the path taken and the strategies adopted in the programme of interventions carried out in two organizations involved in a project of organizational development. Both have teaching and/or education as their mission. Case A is a university and case B a religious establishment. The intervention aimed to show examples of “good practice”, identifying and explicating them throughout the co-constructed change process. _______________ * Mira, M.R., Instituto Politécnico de Coimbra, Escola Superior de Educação, Rua Heróis do Ul- tramar, Solum, 3030-329, Coimbra, Portugal. [email protected] ** Duarte Gomes, A., Universidade de Coimbra, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, Rua Colégio Novo, 3000-115, Coimbra, Portugal. [email protected] 1. Introdução A intervenção nas organizações e a ava- liação dos seus efeitos faz parte de uma já longa tradição em Psicologia (Cardy & Selvarajan, 2001). Contudo, se a relevân- cia das suas contribuições para o desem- penho organizacional é reconhecida e assumida no seio da literatura da especi- alidade (Sparrow & West, 2002), já o mesmo não se verifica quando o que está em questão é a prática de intervenção, as modalidades que esta pode adoptar, assim como a “caixa de ferramentas” (toolkit) de que se fazem acompanhar os profissionais que a levam a cabo (Hodgkinson & Herriot, 2002). Se na dita “caixa de ferramentas” - que o exercício profissional da Psico- logia nas Organizações requer - incluirmos teorias e modelos, conceitos e investiga- ção, métodos e instrumentos, que visam proporcionar respostas válidas e úteis para as questões que o contexto organizacional coloca, então, o consenso será bem mais difícil de obter, havendo que reconhecer a coexistência de diferentes perspectivas e orientações teóricas. Tal facto implica fazer opções e fundamentá-las. A referida “caixa de ferramentas” de que está equi- pado o profissional que intervém remete para o que Argyris (1999) designa por theory in use. E neste contexto, como sustenta o autor referido, é possível ob- servar que alguém que é conhecedor e

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Vol. III, nº 1, Jun. 2004

Desenvolvimento Organizacional: dois casos e um Modelo deIntervençãoMira, M.R.*Duarte Gomes, A.**

Resumo: O presente artigo centra-se sobre o processo de mudança e visa dar contado percurso que foi seguido e das estratégias que foram adoptadas no quadro deintervenções levadas a cabo junto de duas organizações envolvidas num projecto dedesenvolvimento organizacional. As duas têm como missão o ensino e/ou educação.Trata-se de um universidade (caso A) e de uma congregação religiosa (caso B). Aintervenção teve em vista evidenciar as “boas práticas”, identificá-las e explicitá-las,ao longo do processo de mudança que foi co-construído.Palavras-Chave: Desenvolvimento organizacional, mudança e investigação-acção.

Abstract: This article focuses on the change process and aims to give an accountof the path taken and the strategies adopted in the programme of interventions carriedout in two organizations involved in a project of organizational development. Bothhave teaching and/or education as their mission. Case A is a university and case Ba religious establishment. The intervention aimed to show examples of “good practice”,identifying and explicating them throughout the co-constructed change process.

_______________* Mira, M.R., Instituto Politécnico de Coimbra,

Escola Superior de Educação, Rua Heróis do Ul-tramar, Solum, 3030-329, Coimbra, [email protected]

** Duarte Gomes, A., Universidade de Coimbra,Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação,Rua Colégio Novo, 3000-115, Coimbra, [email protected]

1. Introdução

A intervenção nas organizações e a ava-liação dos seus efeitos faz parte de umajá longa tradição em Psicologia (Cardy &Selvarajan, 2001). Contudo, se a relevân-cia das suas contribuições para o desem-penho organizacional é reconhecida eassumida no seio da literatura da especi-alidade (Sparrow & West, 2002), já omesmo não se verifica quando o que estáem questão é a prática de intervenção, asmodalidades que esta pode adoptar, assim

como a “caixa de ferramentas” (toolkit) deque se fazem acompanhar os profissionaisque a levam a cabo (Hodgkinson & Herriot,2002). Se na dita “caixa de ferramentas”- que o exercício profissional da Psico-logia nas Organizações requer - incluirmosteorias e modelos, conceitos e investiga-ção, métodos e instrumentos, que visamproporcionar respostas válidas e úteis paraas questões que o contexto organizacionalcoloca, então, o consenso será bem maisdifícil de obter, havendo que reconhecera coexistência de diferentes perspectivase orientações teóricas. Tal facto implicafazer opções e fundamentá-las. A referida“caixa de ferramentas” de que está equi-pado o profissional que intervém remetepara o que Argyris (1999) designa portheory in use. E neste contexto, comosustenta o autor referido, é possível ob-servar que alguém que é conhecedor e

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experiente no uso da “caixa de ferramen-tas” pode, em simultâneo, revelar-se in-competente ou ter uma actuação ineficaz.Para evitar os impasses ou superar osparadoxos inerentes a qualquer práticaprofissional, é indispensável reflectir so-bre a própria prática e tendo em vistapromover a aprendizagem organizacionalé fundamental identificar teorias em usoou teorias implícitas, reformulá-las e testá-las empiricamente, como sugere Argyris.A este propósito, importa ainda sublinhara persistente tensão entre investigação eaplicação neste domínio. Como fazem notardiversos autores que têm dedicado maioratenção a esta questão, há um progressivoafastamento entre “teóricos” e práticos”,e, perante o fosso cada vez maior que vaisendo cavado entre uns e outros (relaci-onado com a adopção de diferentes cri-térios de eficácia nos campos de acçãorespectivos e com a dificuldade decompatibilizar rigor e relevância), algunsdesses autores chegam mesmo a falar de“cisma” entre ciência e prática ou entreinvestigação e aplicação (v.g., Anderson,1998; Anderson et al., 2001; Dunnette,1990; Hodgkinson, 2001).A tantas vezes mencionada distinção entreinvestigação fundamental e investigaçãoaplicada, assim como a relação entreconhecimento gerado pela investigação esua aplicação e o sentido atribuído a essarelação, parecem insuficientes ou poucoadequadas, para além de pouco convincen-tes, para permitir progredir e estabelecerum diálogo frutífero entre os diferentesstakeholders que se interessam pelasquestões aqui tratadas (v.g., Hodgkinson& Herriot, 2002). Com efeito, reduzir asorganizações a “objectos” de estudo ou tercomo expectativa que os interventores ouconsultores sejam os aplicadores de co-nhecimentos que os investigadores geramé não ter em conta a relevância do co-

nhecimento accionável (actionableknowledge), é passar ao lado de contribui-ções significativas para a eficácia dasorganizações que a Psicologia tem vindoa desenvolver, é não reconhecer a impor-tância do papel do “scientist practioner”ou “creative scientist” nas organizações,ou o valor acrescentado que para estas poderepresentar o conhecimento que aí geradoe gerido mediante um processo de“scholarly consultancy” (Dalgleish &Jacobs, 2002).O presente trabalho situa-se no prolonga-mento do que acaba de ser dito e visacontribuir para o seu aprofundamento.Através dos dois casos analisados e domodelo de intervenção aí apresentado, visaainda evidenciar que os contributos daPsicologia do Trabalho e das Organizaçõesnão têm que se limitar a aspectos técnicos,operacionais ou de curto prazo, já que amesma pode e deve ser chamada a dirigira sua atenção e a canalizar os seus es-forços para a gestão estratégica das orga-nizações e dos seus recursos humanos(Hodgkinson, 2001). Considerando, por umlado, que trabalhos que adoptam estaorientação têm sido pouco publicados,designadamente em Portugal, e, por outro,que as práticas e os valores, incorporadosnuma dada modalidade de intervenção, nãopodem pretender escapar à influência dacultura da sociedade em que a mesmaocorre (Cardy & Selvarajan, 2001), que-remos acrescentar que, também por isso,se justifica que encaremos a publicaçãodeste trabalho como um contributo parao desenvolvimento de uma área científicaque pode e deve adquirir maior expressãoe visibilidade no contexto português.O presente artigo centra-se sobre o pro-cesso de mudança e visa dar conta dopercurso que foi seguido e das estratégiasque foram adoptadas no quadro de inter-venções levadas a cabo junto de duas

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organizações envolvidas num projecto dedesenvolvimento organizacional. As duastêm como missão o ensino e/ou educação.Trata-se de um universidade (caso A) ede uma congregação religiosa (caso B). Aintervenção teve em vista evidenciar as“boas práticas”, identificá-las e explicitá-las, ao longo do processo de mudança quefoi co-construído.No seio da literatura dedicada à mudança,coexistem diferentes orientações teóricas.Distinguiremos e contraporemos duas: umadelas enfatiza o papel dos actoresorganizacionais e dos agentes de mudan-ça, assim como o papel central que nesseprocesso desempenham o poder e a lideran-ça (v.g., Reto & Lopes, 1991; Gélinas &Fortin, 1996; Boonstra & Gravenhorst,1998); outra acentua que a mudança re-sulta de um projecto e nele se esgota ourealiza, que a mesma necessita doenvolvimento de todos, particularmente dotopo estratégico, e, porque decorre de umplano e obedece a uma sequência pré-estabelecida, sustenta que é possível eviável operar a transformação das organi-zações e contribuir para o seu desenvol-vimento (v.g., Porras & Robertson, 1992;French & Bell, 1995; Sinangil & Avallone,2001). A primeira está mais atenta àmudança contínua e emergente, privilegiao sentido ascendente e admite que a mesmapossa ocorrer de forma espontânea, poden-do ter origem na base ou em qualquer umdos níveis da estrutura organizacional. Asegunda, pelo contrário, mais próxima dalinha de pensamento das teorias de desen-volvimento organizacional (DO), acentuaa necessidade de um projecto que viabilizea ocorrência de mudança, a qual se produzno sentido descendente, e para a qual oenvolvimento dos colaboradores é impres-cindível. Neste processo, cabe à liderançadefinir o quê e como mudar, assim comoquem vai mudar.

Uma outra orientação pode ser conside-rada no contexto do desenvolvimentoorganizacional, representando a estratégiade investigação e de intervenção contidano presente texto uma forma de contribuirpara a explicitar e aprofundar. Quinn(2000) desafia os que se interessam porestas questões a lançar um outro olharsobre a mudança e estimula-os a adoptaroutras práticas, a reformular certos con-ceitos e a não desistir do trabalho teórico,imprescindível a uma prática de interven-ção fundamentada. Neste sentido, a abor-dagem aqui adoptada realça a importânciade identificar as boas práticas, salientar oque se faz e se faz bem na organização,impulsionar energias e suscitar oenvolvimento dos colaboradores, levandoà consolidação do que já fazem bem ereforçando normas e procedimentos maisadaptados e eficazes através de um pro-jecto no qual todos se revêem. O papelde um consultor ou agente externo, nestecontexto, será o de diagnosticar as boaspráticas, dar-lhes visibilidade e transformá-las num projecto de intervenção no qualseja claro que o que se muda e a formacomo se muda não é imposta nem de cimapara baixo, nem de fora para dentro, masresulta da transformação do que já se fazem certos momentos ou em certos secto-res da organização.O modelo de intervenção que aqui éapresentado e proposto, porque tem comopropósito facilitar o desenvolvimento dasorganizações, promover a sua mudança ouestimular a sua aprendizagem, na expec-tativa de assim contribuir de forma rele-vante para o seu desempenho ou eficácia,insere-se num percurso há muito conhe-cido e consagrado no seio da Psicologiadas Organizações (v.g., Robertson, Callinan& Bartram, 2002) e encontra apoio numavasta literatura, com realce para a queespecificamente trata do desenvolvimento

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organizacional (v.g., French & Bell, 1995;Sinangil & Avallone, 2001; Mira, 2003).Ao lançar um olhar retrospectivo (sense-making, Weick, 1995) sobre os projectosaqui relatados, que tiveram início no anode 2000, afigurasse-nos mais claro porquefoi difícil, nessa época, antever as mudan-ças, as coincidências, os desafios e ascontradições que nos esperavam no decur-so da implementação dos dois projectosde mudança e de desenvolvimento orga-nizacional, levados a cabo em duas orga-nizações distintas. Os projectos ocorreramem contextos relativamente bemestruturados, nos quais o investigadorassume que o seu trabalho, o seu modode intervir, o seu estilo, as decisões toma-das e as posições adoptadas, se reflectemno sistema em que participa ou no seucampo de trabalho, sendo mesmo centraispara os resultados obtidos (Enriquez, 1992)e para os processos percebidos através deum processo de interpretação criativa(Morgan, 1989), operados por quem osdesencadeia ou neles participa, a queacresce o facto de o interventor e o in-vestigador serem a mesma pessoa.As duas organizações em estudo, umauniversidade pública (Caso A) e umacomunidade religiosa (Caso B), permiti-ram contrastar duas realidades distintas,sobressaindo na primeira o futuro –explicitação do projecto de desenvolvimen-to – e na segunda o passado –(re)descoberta dos valores fundadores.Tendo em vista compreender o modo comoas pessoas pensam nas organizações es-tudadas, como criam o conhecimento apartir da sua experiência e como usam esteconhecimento para se organizarem a sipróprias e aos outros (Strati & Nicolini,1999), privilegiou-se uma metodologia queenfatiza a importância da auto-reflexão eque para tanto se apoia na investigação-

acção, em particular nalgumas das suasversões, como a recherche-intervention(Enriquez, 1992), a action-science (Argyriset al., 1985) e a action-inquiry (Torbert,1991). A opção efectuada visa realçar aambiguidade ou as discrepânciasverificadas entre as teorias proclamadas oudeclaradas - espoused theories, como lheschama Argyris (1985) - e as teorias quesustentam a escolha ou a acção (theoriesin use) dos líderes, em processos de in-tervenção que visam a mudança organi-zacional. A explicação dos processosemergentes no estudo de casos (Argyris& Schön, 1978), imprescindível para iden-tificar o que há de oculto ou de menosexplícito na vida organizacional, permitecompreender os percursos, os avanços eos recuos, assim como o implícito oumascarado, inerente aos pedidos de mu-dança em cada uma das organizaçõesestudadas, que conduziram à implemen-tação de dois projectos levados a cabo porum elemento externo às duas organizações,durante o ano de 2000. Neste contexto,salientar as boas práticas existentes nasorganizações, transformá-las em projectosde intervenção, cuja concepção depende deum elemento externo e a capacidade deimplementação é garantida por um elemen-to interno da organização, fez parte daestratégia adoptada no trabalho aqui apre-sentado. Trata-se de três condições queconsideramos fundamentais para o êxitode um processo de mudança. E, em re-lação a essas condições, entendemos queo presente estudo acrescenta valor à lite-ratura da especialidade, quer do ponto devista conceptual, quer do ponto de vistametodológico. Tendo nele adoptado umaabordagem interpretativa e auto-reflexiva,tivemos em vista evidenciar a diversidadedas situações estudadas e realçar amultiplicidade dinâmica (Thatchenkery &Upadhyaya, 1996) que está presente na

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simultaneidade discursiva observada emcada uma das organizações e que contribuipara assegurar a continuidade, a mudançae a transformação dessas mesmas organi-zações.

2. Investigação–acção: Uma estratégia deinvestigação e de intervenção

Após a introdução efectuada, importadelinear uma estratégia de intervençãoreflectida e informada, formular um qua-dro conceptual que a sustente e fundamen-tar uma opção. Nesse sentido, passaremosa debruçar-nos, de forma mais detalhada,sobre a investigação-acção. Porque delafizemos uso e nela nos apoiámos paraintervir e para reflectir sobre a prática deintervenção que adoptámos, bem como aela recorremos para analisar os dois casosque adiante apresentaremos; porque deladecorrem várias implicações, quer sejamde ordem epistemológica, teórica oumetodológica; e porque a mesma pode serconcebida como um paradigma, umaperspectiva ou uma estratégia de investi-gação e de intervenção, em relação à qualnão há um consenso mas uma diversidadede posições e de orientações, dedicar-lhe-emos, agora, maior atenção.A investigação-acção, tal como o próprionome indica, remete para um duplo ob-jectivo: agir e investigar. Ou seja, remetepara uma mudança intencional e para umprocesso em que está presente a vontadede agir, produzindo alterações ou transfor-mações no objecto de estudo, assim comode reflectir sobre o conhecimento produ-zido no decurso da intervenção. Numaperspectiva que visa compatibilizar esseduplo objectivo e evitar dissociar conhe-cimento e acção, trata-se de agir, induzin-do ou suscitando mudanças numa deter-minada organização ou comunidade, e de

investigar, tendo em vista aumentar acompreensão do investigador, do cliente oude ambos (Hugon & Seibel, 1988; Barbier,1996). Não sendo recente – já nos finaisdos anos 40, Kurt Lewin a identificavacomo uma abordagem específica quepermitia gerar conhecimento sobre umdeterminado sistema social e, em simul-tâneo, mudá-lo –, a investigação-acção temvindo a ser desenvolvida e consolidada(Peters & Robinson, 1984; Checkland,1981; Checkland & Scholes, 1990; Argyris,Putnam & Smith, 1985; Barbier, 1996). Porvezes, é mesmo apresentada como cons-tituindo um paradigma ou uma estratégiade investigação (French & Bell, 1995), oque não tem impedido que a mesma sejaquestionada e que continue a gerar con-trovérsia, em particular no que respeita àvalidade, ou não, dos resultados obtidos,ao menor controlo sobre o ambiente emestudo e ao envolvimento ou à implicaçãoexcessiva do investigador (Dick &Swepson, 1997).A investigação-acção tem na sua origemo desejo de intervir e aspira a lidar comproblemas sociais complexos, sendo hojeamplamente reconhecida e utilizada, esendo a sua natureza cíclica consideradaadequada para lidar com a complexidadedos problemas intra-organizacionais. Domesmo modo, partilha da convicção queKurt Lewin expressou e assumiu de queconhecimento e acção, teoria e prática, sãoindissociáveis. Assim, Cooperrider &Srivastva (1987), entre outros, defendemque uma das barreiras que mais temcontribuído para limitar o alcance e opotencial da investigação-acção tem sidoo seu excesso de aproximação à “acção”,em detrimento da “teoria”. Por isso, ar-gumentam a favor de uma concepção deinvestigação-acção que procure, por umlado, gerar teorias e acrescentar valor aoconhecimento científico disponível e, por

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outro, contribua para desenvolver as or-ganizações. Neste contexto, insistem nanecessidade de devolver ao conhecimentoteórico o papel que lhe cabe na transfor-mação social e apelam para umaredefinição dos objectivos científicos dainvestigação-acção, de modo a aliar, deforma dinâmica, teoria e prática. Na linhado scientist-practioner, trata-se de conju-gar relevância e rigor, não aceitandoabdicar de uma nem de outro (Robertson,Callinan & Bartram, 2002).Um dos motivos que mais contribuiu paraa emergência e o desenvolvimento dainvestigação-acção é o reconhecimento deque um sistema social pode ser maisfacilmente compreendido se o investiga-dor fizer parte do sistema socio-técnico queestá a ser estudado. De igual modo, admite-se que este envolvimento poderá fomentara cooperação entre o investigador e aque-les que estão a ser alvo da sua interven-ção, bem como a troca de informações eum melhor equilíbrio ou compromissoentre investigação de qualidade e o desen-volvimento organizacional. É neste con-texto que alguns autores (v.g., French &Bell, 1995) sustentam que a investigação-acção constitui um paradigma de investi-gação, na medida em que repousa sobrepressupostos não positivistas ou pós-positivistas e visa agir e investigar de formaa aumentar a compreensão do investiga-dor, bem como dos vários actoresorganizacionais em presença. Por isso,inclui uma grande variedade demetodologias e, neste contexto, não pre-tendendo ser exaustivos, passaremos arealçar as contribuições de Checkland(1981), de Argyris (1985), de Schön (1974)e de Cooperrider & Srivastva (1987).A soft systems methodology (metodologiados sistemas flexíveis) constitui um sis-tema de investigação desenvolvido porCheckland (1981; 1990; 1992) que privi-

legia uma abordagem sistémica e nãonumérica, e, nas primeiras descrições doautor, aparece sob a forma de um processocomposto por sete etapas. Em primeirolugar, o investigador “mergulha” na situ-ação problemática (1), permitindo este totalenvolvimento avançar na definição doproblema e do seu contexto imediato (2),bem como nas definições centrais dossistemas relevantes (3). Posteriormente, ainformação recolhida propicia a constru-ção de modelos conceptuais (4) e a com-paração destes com a realidade (5), o quepermitirá identificar quais as mudançasplausíveis e desejáveis (6) que irão sus-tentar o plano de acção e orientar a suaexecução (7), tendo em vista mudar osistema de onde se partiu. Checkland(1990, 1992), em descrições posteriores,coloca a ênfase na realização de compa-rações entre a realidade e uma série demodelos conceptuais, propondo umamodalidade de investigação sustentada numprocesso dialéctico contínuo, no qual aalternância entre duas formas de activida-de permite melhorar cada uma delas. Emprimeiro lugar, o investigador deve-seenvolver no sistema a ser estudado eproceder a uma observação participativa(Lofland & Lofland, 1984). Deverá segui-damente procurar fazer uma descriçãodesse sistema, no que diz respeito às suasfunções mais relevantes, partindo do quefunciona no ambiente em estudo, do queeste tem de positivo e do que tenta fazerou já fez para mudar. Estamos perante oprimeiro momento da referida dialéctica,no qual o investigador confronta a reali-dade com a sua descrição da mesma,processo construtivo que termina quandoo investigador considera que o confrontoentre os vários tipos de informação dis-ponível permitem a descrição das funçõesessenciais do sistema. Num segundomomento, coloca-se ao investigador um

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outro processo dialéctico, orientado poruma construção lógica comparativa entrea descrição da realidade actual e a des-crição do que seria ideal, através do tra-balho realizado na explicitação das fun-ções essenciais do sistema, e não tanto naexperiência acumulada na primeira fase.Este sistema ideal é concebido como tendoem vista a forma ideal de transformar osinputs em outputs. Depois disto, deveráalternar estas descrições, até considerar queconseguiu desenvolver um modo de osistema operar de forma satisfatória oueficaz. A terceira dialéctica é entre o ideale a realidade. Neste momento, o investi-gador deve comparar o ideal com o siste-ma real, anotando as diferenças. Desteprocesso dialéctico resultarão propostas demelhoria da realidade vigente, o que, porsua vez, levará à acção, originando umanova dialéctica entre planos e realidade.É provável que cada ciclo da SSM (softsystems methodology) se repita váriasvezes, o que irá contribuir para o desen-volvimento de uma melhor compreensãodo sistema. Se, numa dada etapa do pro-cesso, se verificarem incertezas ou surgi-rem ambiguidades, pode-se voltar a umafase anterior. Deste modo, esta estratégiade investigação funciona por aproximaçõessucessivas e implica iterações, operadas deforma cíclica.Argyris (1973, 1980, 1983, 1985) temvindo a desenvolver um modelo que secaracteriza por ser, em simultâneo, umateoria dos sistemas sociais e um métodode intervenção. A ideia central destemodelo prende-se com o facto de, apesardos valores declarados, as pessoas segui-rem algumas regras que não são explíci-tas, regras estas que as impedem de secomportarem como deliberadamente dese-jariam. Daqui resultam processosinterpessoais e sistémicos nos quais seescondem vários problemas. Desta forma,

o comportamento de cada pessoa podelevar a que uma outra desenvolva regrasou se baseie em pressupostos acerca daprimeira que não são explícitos nemdeclarados. Estas regras orientam as diver-sas interacções que ocorrem, tanto numambiente grupal como num ambienteorganizacional. Basicamente, estametodologia visa identificar valores emutilização (in use) que se encontram in-corporados em processos ou rotinasorganizacionais, do mesmo modo queprocura facilitar a aprendizagem e ajudara lidar com essas regras não declaradasque impedem a troca directa de informa-ções. Segundo Argyris, é importante edecisivo que as pessoas envolvidas nainvestigação sejam francas e abertas, querem relação às próprias intenções, querquanto aos motivos que atribuem aosoutros. Apesar de a action science ser aquitratada como uma metodologia de inves-tigação-acção, é importante referir queArgyris (1980) defende que a forma comotradicionalmente a investigação científicacoloca as questões e para elas procurarespostas está repleta de contradiçõesinternas e que, por isso, a “ciência nor-mal” não é capaz de produzir informaçõesválidas, o que já não aconteceria com oque designa por action science. Estametodologia pode ser uma escolha adequa-da quando existem dinâmicas intra einterpessoais fortes, assim como quandosão fortes os indícios de utilização de regrasimplícitas. Contudo, trata-se de umametodologia que exige competências ouhabilidades interpessoais e capacidade deconfrontação, por parte do investigador, aocontrário da antes referida soft systemsmethodology, que é menos exigente no quediz respeito às aptidões interpessoaisrequeridas pela situação que se apresentacomo problemática.

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Numa orientação que se aproxima daanterior, Schön defende o que designa porreflective practitioner e pretende com issoqualificar um processo de investigação-acção específico. Trata-se de um processoindividual, baseado na experiência e naaprendizagem profissional, em que a re-flexão assume um papel relevante (Schön,1983, 1987, 1991). Hatten (2000) desen-volve e especifica alguns dos processos,assim como clarifica alguns dos conceitos,que a acção do reflective practitionercomporta. Incorpora ainda os contributospresentes na obra de Argyris & Schön(1974), designadamente os conceitos desingle e double loop learning, propõe umarevisão de alguns desses conceitos eacrescenta os de meta model for learninge reflective learning process model. Argyris& Schön (1974) entendem por single looplearning a confiança que é depositada numdado quadro referencial (fase 1). Numasociedade estabilizada, como aquela emque vivemos, na qual os sistemas sociaispermanecem mais ou menos constantes, ouapenas sofrem ligeiras oscilações, o conhe-cimento está instituído e é relativamenteestável, assim como os problemas são, nasua maioria, previsíveis ou predizíveis. Aresolução de problemas está padronizadae segue trajectórias já conhecidas ou emconsonância com experiências anteriores,assim como encontra soluções que sãoconsideradas como adequadas. Mas numasociedade que mude rapidamente, e em quenão se consiga prever o alcance e o sentidoda mudança, é importante a capacidade deanálise crítica, assim como a tomada dedecisões informadas ou fundamentadas.Esta capacidade resulta da combinação deexperiências, de análise crítica e de dife-rentes tipos de conhecimentos que tenhamsido desenvolvidos a partir de reflexõesprévias. A reflexão (fase 2) consiste noprocessamento da experiência e na

reavaliação de percepções. Daqui resultaráuma base para a transformação ou para aaquisição de novos conhecimentos, bemcomo para sustentar decisões acerca deacções futuras. A praxis (fase 3) refere-se a acções informadas, a comportamentosorientados ou finalizados, bem como aoestabelecimento de compromissos. Kemmis(1985) argumenta que a praxis é a formamais eloquente e socialmente significativada acção humana e que a mesma constituia base da ordem social. Segundo Schön(1991), o reflective practitioner participaactivamente na formação desta ordemsocial - que é uma ordem negociada eprecária - através da acção e do que estacontribui para a sua transformação. Oquestionamento e a mudança dosreferenciais utilizados na aprendizagem édenominado por um double loop learning(fase 4). Schön (1991) refere que estacapacidade é fundamental para a sobrevi-vência num meio profissional em que ateoria e a prática mudam rapidamente. Comefeito, há uma mudança acentuada nasexpectativas da sociedade quanto ao de-sempenho dos profissionais, bem como emrelação aos seus conhecimentos e aosresultados que são capazes de gerar. Esteautor refere que os problemas não seapresentam de uma forma em que basteresponder de forma lógica ou racional àsquestões colocadas, para se obter umaresposta satisfatória. As situações com quese confronta o profissional, mais do queproblemas (fase 5), emergem como situ-ações problemáticas, são confusas, ambí-guas ou incertas, podendo ser descritascomo “dilemas”. Para a resolução deproblemas, o mais importante é a situaçãodo problema (fase 6), ou seja, o processomediante o qual se dão nomes às coisas,que conduz a que seja prestada atençãoa certos aspectos (e não a outros) consi-derados relevantes, que encaminha a ac-

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ção para determinadas trajectórias e quecontextualiza a forma como se intervém.Isto está muitas vezes implícito nas acçõesempreendidas, faz parte do saber tácito,ou está incluído no conhecimento profis-sional. Trata-se de um conhecimento queé feito de muitos saberes fragmentados, oude muitos “pedaços de informação”. Es-tes, se forem explicitados, poderão con-tribuir para uma prática profissional maisinformada ou esclarecida. Mas a tarefa queconsiste em tornar explícito o saber queé tácito, ou que está implícito na práticaprofissional, exige esforço e, por isso, nãoé fácil de levar a cabo. Quando as acçõesque se levam a cabo para resolver osproblemas não produzem os resultadosesperados (i.e., os resultados previamentedefinidos ou consonantes com experiên-cias anteriores), acontece a desorientação(fase 7). Neste caso, é imprescindívelcontextualizar o problema e reflectir, deforma a criar uma mudança de paradigma(fase 8), que, posteriormente, irá determi-nar qual a acção subsequente (fase 9). Oesforço realizado através deste “saber-agindo” possibilita a adopção de “esque-mas” e a criação de “guiões” para a acção,que poderão ser tornados explícitos econscientemente reapreciados, reforçadosou modificados. A “reflexão-em-acção”(fase 10) ocorre quando se realizam in-vestigações acerca das acções levadas acabo, em qualquer momento depois de aexperiência ter terminado. Aquilo que podeser objecto desta reflexão depende docontexto e das pessoas envolvidas, quepodem ser múltiplas e diferenciadas. Nofundo, a prática do reflective practitioneré a do investigador que elabora uma novateoria e cujo teste pode ajudar a encontraruma solução para um determinado proble-ma. Neste contexto, contudo, investigaçãoe acção são indissociáveis - a construçãoda teoria não está desligada da acção. O

projecto de investigação é despoletado porum problema, que é contextualizado deacordo com as observações feitas nessemomento. A comparação desse problemacom o que vai emergindo do “saber-agin-do” pode conduzir ao reenquadramento doproblema inicial. O feedback que se obtémdo meio em que se intervém tambémestimula a reflexão, levando a que quemage ou intervém continue a reenquadrar,a experimentar e a transformar os esque-mas cognitivos que utiliza e o conheci-mento que gera, num processo cíclico.Neste contexto, o investigador pode aindautilizar um vasto leque de conhecimentosdisponíveis, apoiar-se no repertório derespostas existentes, reflectir sobre seme-lhanças e diferenças, formular novas hipó-teses e testá-las. Este percurso pode con-tribuir para identificar uma “metáforagenerativa”, que depois irá ser utilizadacomo base para o ciclo seguinte. Schönutilizou o termo “metáfora generativa” paradescrever a identificação de semelhançaspresentes em conceitos que inicialmentepareciam ser discrepantes oudissemelhantes. Quando as semelhanças setornam evidentes, estas metáforas podemser utilizadas para relacionar noções ouideias aparentemente desconexas ou queparecem não ter qualquer ligação entre elas.As referidas “metáforas generativas” pro-porcionam referenciais e linhas de orien-tação que permanecem constantes (fase 12)e que poderão revelar-se úteis para atomada de decisões e para o prossegui-mento da intervenção.Cooperrider e Srivastva (1987, 2000)apresentam uma modalidade de análiseorganizacional que designam deappreciative inquiry e que se distingue deoutras perspectivas de investigação-acçãojá apresentadas pela ênfase que coloca nainovação, e não tanto pela capacidade deresolução de problemas. O que chamam

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appreciative inquiry constitui uma perspec-tiva de investigação que se propõe comoobjectivo identificar, compreender e fomen-tar inovações nas actividades e nos pro-cessos organizacionais. A abordagem pro-posta visa utilizar o conhecimento parapromover um diálogo igualitário queconduza à eficácia e garanta a integridadeorganizacional. Neste contexto, eficáciaorganizacional é definida de uma formaparticular: congruência entre valoresorganizacionais (conjunto de práticas,normas, ideias e interesses - que nuncamudam e que os membros da organizaçãofazem questão de preservar - relativos àquestão “como é que nos devemos orga-nizar?”) e práticas organizacionais obser-vadas no quotidiano. O appreciativeinquiry remete para uma procura de co-nhecimento e para uma forma de teorizaçãoque incide sobre a acção colectiva inten-cional, ao mesmo tempo que visa ajudara criar uma visão normativa e uma von-tade colectiva, quer se trate de um grupo,de uma organização ou de uma sociedadeglobalmente considerada. Trata-se de umprocesso de investigação que realça ascapacidades simbólicas e que visa estimu-lar a capacidade inventiva, bem como ascapacidades sociais, tendo em vista expan-dir potencialidades, promover escolhasconscientes e contribuir para a evoluçãocultural. Nesse sentido, coloca uma sériede questões que não se enquadram numavisão positivista da ciência ou numa for-ma de investigação-acção estritamentepragmática, apenas orientada para a reso-lução de problemas. Contudo, os seusobjectivos são, ao mesmo tempo, cientí-ficos (numa concepção construcionista deciência) e pragmáticos (num sentido deinovação social), bem como normativos (nosentido em que procuram afirmar aquiloque a existência social realmente é, o quepode ser, e o que deve ser ou em que se

deve transformar). Neste sentido, a inves-tigação deve começar por destacar o queé digno de apreço (daí o nome e o sentidoa atribuir a “apreciativo”). Mais do quefalhas, discrepâncias ou deficiências,importa reter e salientar o que o sistemafaz e o que pode fazer. Por outras pala-vras, a ênfase recai sobre o que o sistemajá faz e faz bem, incentiva-o a fazer o quesabe fazer bem, a concentrar-se sobre oque pode fazer melhor e a tirar partidodo que faz melhor do que ninguém.Segundo os autores, a primeira tarefa doinvestigador consiste em identificar, des-crever e explicar as inovações sociais que,apesar de pequenas, servem para dar vidaao sistema e para activar as competênciase energias dos seus membros, enquantoactores que participam na construção etransformação das realidadesorganizacionais. Isto significa que o quedesignam por abordagem “apreciativa”parte do que existe, daquilo “que é”, eprocura uma compreensão dos factores edas forças da organização que servem paraevidenciar o seu potencial e encaminhá-la para um outro estádio, próximo do queseria o ideal em termos sociais e, que, porisso, poderia e deveria ser digno de apre-ço. Além disso, para ter significado, aciência deve gerar conhecimentos quepossam ser utilizados e, consequentemen-te, validados através da acção. Assim, umprocesso de investigação que gera conhe-cimentos utilizáveis e aplicáveis não deveser entendido como algo de utópico nemdeve estar limitado ou circunscrito a cír-culos académicos ou ser apresentado deuma forma que seja pouco relevante parao entendimento comum, para a linguagemquotidiana ou para aqueles a quem osconhecimentos possam ser úteis. Conce-bido nestes termos, o appreciative inquiryé pragmático e visionário. Pode ser“provocatório” ou incentivador, na medidaem que os conhecimentos gerados por um

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determinado estudo acrescentarem valor eforem assumidos pelos membros da orga-nização como um normativo, que sóacontece porque resulta de uma escolhaque fazem. Desta forma, o appreciativeinquiry pode contribuir para ajudar osmembros de uma dada organização amodelarem o mundo em que vivem e emque trabalham, construindo-o de acordocom os seus próprios objectivos e valores.Por fim, a investigação direccionada parao desenvolvimento do potencial da vidaorganizacional deve ser cooperativa. Arelação de cooperação entre investigadore membros da organização estudada é, aqui,encarada como essencial, tanto por razõesde ordem epistemológica, como por razõesde ordem prática e ética (Argyris, 1970;Habermas, 1971; Susman & Evered, 1978).Para finalizar este ponto, diremos que aperspectiva mais tradicional da investiga-ção-acção enfatiza que, antes de mais, estase dedica à análise de problemas, que ainvestigação deve ser “orientada para aacção” e estar “focada no problema”. Onosso esforço, aqui, consiste em tentargerar novas perspectivas acerca da con-duta da investigação organizacional, pers-pectivas estas que possam mostrar o tipode conhecimento necessário para compre-ender e transformar a complexidade dossistemas organizacionais (Torbert, 1983;Van Maanen et al., 1982; Smirchich, 1983;Argyris, 1970; Friedlander, 1977). Não seprocura com esta afirmação propor ousugerir que uma teoria possa corresponderà existência de uma verdade única ou auma única forma de atribuir sentido àrealidade (Tenkasi & Boland, 1993). Pro-cura-se, antes, contribuir para a clarifica-ção de conhecimentos e para o reconhe-cimento da importância da interdisciplina-ridade (Kolb, 1984) no seio da comuni-dade científica, onde coexistem diferentesorientações, que validam diferentes signi-

ficados da realidade, quando julgados deacordo com o conjunto de pressupostos ede objectivos do qual se parte.Do trabalho de elaboração teórica até aquirealizado ressalta a pluralidade de orien-tações que coexistem no seio da literaturadedicada à investigação-acção. Procurá-mos, por isso, sintetizar contribuições,articular conceitos e introduzir algumaclarificação conceptual neste domínio,assim como, através do percurso efectu-ado, também quisemos contribuir paraenriquecer a dita investigação-acção, quepassaremos a entender como uma estra-tégia de investigação e de intervenção,estratégia essa que consideramos inovado-ra e geradora de conhecimento accionávele/ou utilizável, sendo, por isso, relevantepara levar a cabo a tarefa que aqui nosocupa e para progredir em direcção aosobjectivos que para ela traçámos. De ummodo particular, a conceptualização deinvestigação-acção adoptada fornece pis-tas e orientações para intervir num meioque é o organizacional, onde asambiguidades, as incertezas e as incongru-ências fazem parte do seu funcionamentoquotidiano, mas onde igualmente aconte-cem coisas maravilhosas que surpreendeme deslumbram quem intervém. Assumir queesta é a realidade com que está confron-tado e com a qual importa saber lidar éum ponto de partida para quem intervém– e o faz para a mudar e com isso apren-der. Por outras palavras, e recorrendo aostermos utilizados por Weick & Sutcliffe(2001), importa não recuar perante oinesperado e imprevisível, mas antesaprender a geri-lo; e, face às inevitáveisfalhas ou acidentes de percurso, mais doque tentar reduzi-los ou eliminá-los, im-porta transformá-los numa oportunidadepara aprender. A selecção de um ou deoutro método constitui um risco quecompete ao investigador assumir. Esse risco

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é aqui assumido e baseia-se na convicçãode que a) o apreço a que o appreciativeinquiry se refere, e que nele está contido,representa um complemento viável àsformas convencionais de investigação-acção, sendo mais adequado para a ino-vação social do que para a resolução deproblemas; b) através da escolhametodológica (e de tudo o que a ela estáligado) que efectuamos, bem como dospressupostos que adoptamos e assumimos,acabamos por criar o mundo (enactedreality) que mais tarde descobrimos.

3. O contexto da intervenção

A presente investigação incidiu sobre doiscasos: uma universidade pública portuguesa(Caso A) e sobre uma província portugue-sa de uma congregação religiosa feminina(Caso B). Ambas atravessavam um perí-odo de intensa reflexão interna face àconcorrência das congéneres e ao aumentoda competitividade no sector do ensinosuperior, no primeiro caso, e à diminuiçãode vocações e consequente necessidade dereformular actividades, no segundo caso.Ambas as organizações assumem comoactividade nuclear o ensino e a formação,ainda que para diferentes níveis escolares.Do mesmo modo, ambas apresentam umajá longa história e dispõem de um quadronormativo próprio, dada a sua antiguida-de; apresentam um conjunto de efectivosalgo envelhecido; possuem grande dimen-são e estão dotadas de uma estruturapróxima do modelo de organização “fe-deral”, ainda que este último seja maisvisível no segundo caso do que no pri-meiro. As duas organizações têm órgãosde governo próprios e nelas a liderançacaracteriza-se por ser bastante hierarqui-zada e centralizada.

Dado o momento que atravessavam, asinstâncias de decisão decidiram contratarum consultor externo para delinear umprojecto de intervenção que ajudasse aexplicitar o projecto de desenvolvimentoa seguir, no primeiro caso, e a esclarecerse o modelo de acção educativa em vigor,no caso da segunda organização, cumpriaos objectivos que presidiram à sua criaçãoe se mantinha fiel aos valores fundadores.Contudo, apesar do quadro traçado sobreas características globais que aproximamas duas organizações, o pedido que ambasformularam e posteriormente formalizaramcomportava semelhanças mas tambémdiferenças. Dito de outro modo, haviadiscrepâncias nas preocupações manifes-tadas pelas Instâncias de decisão.No Caso A, o foco do problema reside noafastamento entre as competências e asqualificações do pessoal não-docente, faceao pessoal docente. Um conjunto de fun-cionários não-docentes, com uma idadealgo avançada, associada a baixas habili-tações ou qualificações académicas, refor-çadas pelo facto de no passado ter havidopouco investimento da organização nodesenvolvimento dos seus colaboradores,bem como na sua selecção, justificavam,na percepção dos Dirigentes, uma inter-venção global e a curto prazo que permi-tisse colmatar esta falha e que, ainda quenão resolvendo todos os problemas, pu-desse contribuir para, pelo menos, atenuaras suas consequências. As mudanças nosÓrgãos de Governo, decorrentes do recen-te processo eleitoral, e a vontade expressade iniciar um processo interno de mudan-ça que permitisse capacitar a organizaçãopara responder aos desafios actuais legi-timaram a emergência de um projectodireccionado para a formação e desenvol-vimento dos recursos humanos não-docen-tes, liderado por um dos dirigentes internoe apoiado por um consultor externo. Foi

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este o contexto no qual se negociou eformulou um projecto de intervenção quepretendeu, numa primeira fase, conhecera percepção dos Líderes e do público-alvoda mudança sobre os problemas, os cons-trangimentos, as oportunidades e as estra-tégias mais adequadas para os solucionar,ou minorar, numa perspectiva de curto emédio prazo.No Caso B, pretendeu-se identificar eexplicitar o “modelo” de Educação e/oude Acção Educativa dos vários colabora-dores, internos e externos, leigos ou re-ligiosos, de uma das Províncias Portugue-sas de uma Congregação Religiosa femi-nina, assim como os factores que facili-tavam ou dificultavam a realização de umProjecto educativo que, em linhas gené-ricas, correspondesse ao Modelo educativodesejável para as várias Instituições daProvíncia. É a análise da Missão da acçãoeducativa desta organização que motiva opresente estudo e que origina a designaçãoescolhida para a identificar – Carisma,dada a importância que atribui ao seu modode Fazer e ao seu modo de Ser. Trata-se de um modo de estar e de actuarespecífico (de um carisma) que a referidaCongregação deseja preservar. O proble-ma com que se confronta remete para asrelações entre estrutura e estratégia e podeser assim formulado: qual o equilíbrio entrea Missão/Vocação, condicionada pelaespiritualidade e pela Fé e a Prestação deum serviço, condicionado pelas actuais leisdo mercado. Sendo esta Congregaçãomovida pelo mesmo ideal missionário dasua fundadora e pelo desejo de colaborarna promoção humana e desenvolvimentointegral do indivíduo, tem desenvolvido asua acção no ensino, nos vários níveis deescolaridade, incluindo o ensino superior,bem como na acção social, na qual aMulher assume particular destaque.

Este estudo apoiou-se no trabalho quedecorreu no espaço de tempo compreen-dido entre 1993 e 2000, numa das uni-dades (casas) da Congregação. Este pros-seguiu o objectivo de direccionar a acti-vidade da Congregação para o desenvol-vimento integral do indivíduo, não redu-zindo a acção educativa ao modelo esco-lar, e adoptou a mesma abordagem aolongo do tempo: conceber e implementarprojectos de desenvolvimento socio-localnuma instituição, cuja tónica de realizaçãoera colocada no trabalho comunitário,avaliação anual e divulgação dos resulta-dos alcançados, ao nível intra e inter-organizacional, e fomentar momentos dereflexão interna, capazes de difundir eestender as boas práticas educativasidentificadas às outras instituições dacongregação.

4. Método

A metodologia utilizada foi semelhantepara os dois casos e foi conduzida em duasfases. Na primeira fase, a informação foirecolhida através de análise documental,reuniões com os Órgãos de Governo dasorganizações e entrevistas individualizadasa todos os dirigentes do topo da hierarquia(n = 42, no Caso A; n = 18, no Caso B).Estes dados foram submetidos a umaanálise do discurso (Gergen, 1985, 1992,1998; Gomes, Cardoso & Carvalho, 2000;Gomes & Kesti, 2000; Gomes & Mira, inpress). No Caso A, conduziram-se asentrevistas tendo por base um guião, que,basicamente, visava obter respostas paraas seguintes questões: problemas na G.R.H.e sua importância, objectivos e resultadosa atingir num projecto organizacional eindicadores de eficácia e critérios deavaliação organizacional. No Caso B, asquestões colocadas concentravam-se nas

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finalidades, objectivos e estratégias pre-sentes no modelo de acção educativa, nosseus valores e práticas. Na segunda fase,foi construído um questionário para oefeito, composto por questões fechadas, edistribuído aos diferentes níveis de chefia,no Caso A (n = 589), e aos docentes, noCaso B (n = 100). O tratamento a queforam submetidos os dados (análise dodiscurso e análise factorial em componen-tes principais) permitiu identificar os dis-cursos, clarificar orientações estratégicase fazer avançar o projecto de desenvol-vimento organizacional (Mira, 2003).

4.1 Design da intervençãoA concepção e o desenvolvimento dosprojectos de intervenção, nos dois casos,inseridos num estratégia de desenvolvimen-to organizacional e apoiados no quadro dereferência antes traçado, comportaramdiferentes fases, ciclos e sequências, comose indica na Figura 1.

No caso A, a intervenção foi desenhadatendo em vista contribuir para uma refle-xão estratégica sobre a formação e odesenvolvimento dos recursos humanos.Neste sentido, foi enfatizada a interacçãoentre os objectivos organizacionais e osobjectivos pessoais, que ficou expressa nasnecessidades de formação percepcionadaspelos funcionários em geral e nasidentificadas pelo quadro de pessoal não-docente e níveis de chefia que integrama organização. Neste contexto, definiram-se objectivos, planearam-se e executaram-se acções, avaliaram-se resultados, divul-garam-se e discutiram-se esses resultados,originando um novo ciclo formativo, cujasadaptações se apoiaram nos resultadosobtidos na primeira fase. Contudo, a análisedos resultados centrar-se-á sobre a fase quena Figura 1 se apresenta a tracejado.No caso B, apesar de a investigaçãorealizada focar a última fase do ciclo (quena Figura 1 se apresenta a tracejado), o

Figura 1: Design dos projectos de intervenção

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projecto decorreu no espaço de tempocompreendido entre 1993 e 2000, semprecom um objectivo – o de direccionar aactividade da Instituição para o desenvol-vimento integral do indivíduo e não re-duzir a acção educativa ao modelo escolar– e seguindo sempre a mesma metodologia– conceber e implantar projectos de de-senvolvimento socio-local, cuja tónica derealização era colocada no trabalho comu-nitário, e, ao mesmo tempo, avaliar edivulgar os resultados alcançados, ao nívelintra e inter organizacional, assim comoprovocar momentos de reflexão intensadentro da organização, capazes de difundire estender estas práticas educativas àsoutras unidades da organização.

5. Discursos coexistentes, convergentese divergentes

O que agora nos propomos fazer é sin-tetizar o trabalho realizado, procurandoexplicitar processos e resultados alcança-dos na intervenção levada a cabo e, aomesmo tempo, dando atenção à articula-ção de conceitos, assim como aos discur-sos que emergiram da análise efectuada àsrespostas dos participantes neste estudo.Para dar um sentido a esta exposição etornar inteligível para o leitor a análiserealizada, esta parte do texto será orga-nizado em torno das respostas a trêsperguntas: a) Quem somos e o que que-remos ser?; b) Onde estamos, para ondepretendemos ir e como vamos lá chegar?;c) O que fazemos e o queremos fazer? Emque nos apoiamos e o que gostaríamos dever partilhado?

Quem somos? O que queremos ser?A resposta a estas questões constituiu arazão de ser das intervenções realizadase motivou o pedido de apoio de um

consultor externo, tanto no Caso A (umauniversidade pública) como no Caso B(uma comunidade religiosa), no sentido deas ajudar a compreender e explicitar a suamissão ou vocação. Ser uma organizaçãoque tem por missão criar e difundir acultura, a ciência e a tecnologia, no pri-meiro caso, e transformar o mundo, ori-entando-o para uma vida autêntica, nosegundo caso, era algo claro, assumido eindiscutível, para qualquer um dosinterlocutores que estiveram presentes eparticiparam nas primeiras reuniões declarificação do pedido de intervenção.Quem somos? transformou-se numa ques-tão de fácil resposta e rapidamente ultra-passada nos primeiros minutos de traba-lho, embora, tanto numa organização comonoutra, a dúvida sobre se todos os colabo-radores partilhavam desta ideia subsistis-se. Esta dúvida inicial contribuiu paraorientar os primeiros passos da interven-ção. Noutros termos, a vontade de clari-ficação levou a que a pergunta Quem so-mos? fosse reformulada e transformada:Quem os nossos colaboradores acham quesomos? E Quem acham que deveríamosser?Cada uma das organizações estava a viverum momento especial, pois ambas tinhamacabado de sair de um processo eleitorale o corpo dirigente que constituía asInstâncias de decisão havia tomado possehá relativamente pouco tempo. No CasoA, a questão prendia-se com o destino doensino superior e, em particular, dasUniversidades no contexto nacional einternacional; no Caso B, a congregaçãoestava a preparar um encontro mundial dereflexão sobre o caminho a seguir, deven-do esse caminho ter em conta as origense a inspiração inicial, assim como osdesafios que o novo século colocava aomodelo de acção educativa preconizadopela congregação.

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O debate interno destas questões e osconstrangimentos externos enunciadossuscitavam movimentos de adesão ou derejeição a processos de mudança, frequen-temente animados por intensas emoções,nos quais o discurso de mudança tranquila- mais veiculado pelas Instâncias de de-cisão das duas organizações estudadas -se opunha a uma pluralidade e simulta-neidade de outros discursos: não mudar,mudar tudo, ou mudar de forma estraté-gica. Tratava-se, pois, de aproveitar estemomento favorável para mudar, visualizadonuma ténue abertura dos órgãos de deci-são, e de conduzir a organização no sen-tido do que alguns grupos consideravamser o caminho a seguir.Em organizações tão hierarquizadas comoas apresentadas, nas quais os centros dedecisão são controlados internamente, sãopouco permeáveis à interferência de ele-mentos externos na tomada de decisão, enas quais o poder hierárquico centralizadoassegura a partilha e a manutenção dopoder pelas coligações dominantes, man-tendo a estabilidade das forças de pressãoe protegendo-as de efeitos surpresa nanegociação dos interesses em jogo, não écomum aderirem à ideia de um agenteexterno poder animar um projecto dedesenvolvimento no qual se admite e desejaa clarificação da missão e a formulaçãode uma estratégia, mas onde igualmentepode ocorrer que no processo sejam ques-tionados aspectos tão delicados como osactores a envolver, o percurso a seguir, osobjectivos a alcançar e as estratégias aadoptar. Contudo, estes constrangimentosda envolvente e um discurso interno, aindaque subtil, mas com força suficiente paraser ouvido, defensor de mudanças profun-das nas práticas da organização, permitiua negociação do trabalho e a sua realiza-ção por um consultor. Merece, no entanto,ser realçado que, sem a presença de um

agente interno em cada uma das organi-zações (seu perfil, formação, conhecimen-tos e posição hierárquica ocupada naorganização), nada teria sido possívelefectuar. Quem traçou um rumo, limouresistências, dialogou com oposições enegociou, fomentou alianças e, sem sedesviar do seu propósito, garantiu ascondições internas para que estes doisprojectos vingassem, foram, sem dúvida,os dois agentes internos que, ainda que nãosendo chefias de topo, possuíam suficientecredibilidade e legitimidade para assumi-rem a liderança do processo.

Onde estamos, para onde pretendemos ire como vamos lá chegar?No Caso A, tratava-se de dotar os cola-boradores de competências capazes deresponderem aos desafios actuais e futu-ros, bem como de dar resposta às neces-sidades de afirmação externa da organi-zação e às pressões da competitividade;no Caso B, pelo contrário, tratava-se desaber se as competências actuais doscolaboradores permitiam manter vivo oespírito inicial da Congregação e transmi-tiam a sua forma especial de educar.No entanto, os valores que animam asrespectivas culturas, igualmente fortes,diferenciam-se. No caso A, observa-se umavalorização do Saber, no quadro do qualo Ser passa por demonstrar Saber e Terum código de conduta científica, que sepretende global, universal, homogéneo eobjectivo, e que restringe ou constrangea acção individual, bem como condicionao papel que um agente de mudança podedesempenhar. No caso B, a organizaçãovaloriza o Ser, no quadro do qual o Saberpassa por Saber Ser, uma opção de vidaindividual. Neste contexto, aceitam-setodas as diferenças inerentes à condiçãohumana, desde que saibam Ter uma con-duta orientada por um código religioso,

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sustentado nos valores e nos princípiosfundadores da congregação. Gnosia eCarisma foi assim que as designámos.Gnosia procura homogeneizar o código deconduta através de regras e procedimentoscomuns, conhecimentos universais e ob-jectivamente demonstráveis. Carisma,homogeneíza a sua acção pelos valoresinerentes aos princípios fundadores e àespiritualidade. Os primeiros têm de apren-der o código e demonstrarem que o sabemusar para serem aceites na comunidadecientífica. Os segundos aderem esponta-neamente e fazem desta adesão a sua vida.

O que fazemos e o queremos fazer? Emque nos apoiamos e o que gostaríamosde ver partilhado?As estratégias adoptadas pelos diferentescolaboradores sobre o caminho a seguirpelas organizações - ainda que fossepossível distinguir vários discursos, unsvalorizando a modernidade e outros acen-tuando a tradição - não colocavam emcausa os códigos de conduta, implícitos emcada uma delas. Por isso, foi possívelmudar. Importa perguntar: mudar em quê?Em certo sentido, mudar tudo o que nãolevasse à mudança. Dito de outro modo,mudar sem o líder mudar. As Instânciasde decisão não são eleitas para mudarem(serem mudadas); são eleitas e assumemos cargos de direcção para fazerem outrosmudarem. É como se dissessem: não estouaqui para mudar, vim para fazer mudar.Mas nestes processo cíclicos, em que opoder é protagonizado por um ou por outromembro da organização, esta muda, querseja fechando-se mais sobre si própria ereforçando as suas práticas de trabalho ea centralização do poder, quer seja abrin-do-se a inovações, viabilizando alteraçõese facilitando a emergência de estilos in-dividuais. Foi este o movimento queaconteceu nas duas organizações estuda-

das. Se atendermos ao projecto inicial deintervenção - o que foi planeado, deline-ado no tempo e com um fim bem definido-, podemos dizer que ocorreu mudança nossistemas. Assim, uma criou um centro deformação no qual envolveu centenas detrabalhadores e outra criou uma associa-ção de desenvolvimento vocacionada paraa concepção e execução de projectos deintervenção comunitária. No entanto, aspráticas não mudaram, o exercício do podermanteve-se igual, os problemas permane-ceram e a discussão sobre as suas pos-síveis soluções ainda continua.Por tudo o que foi dito, talvez seja maisfacilmente perceptível porque é que aproposta apresentada pelo consultor aosagentes internos de mudança foi no sen-tido de constituir um centro de formaçãointerno capaz de dotar os colaboradoresda organização de competências profissi-onais adequadas a novas e mais eficazesformas de organização do trabalho, bemcomo ao domínio das novas tecnologias,por um lado, e de repensar o modelo deacção educativa pela auscultação sobre omodo como as pessoas fazem e pensamcomo se deve fazer educação, por outro.De facto, a proposta foi prontamente aceitee não suscitou obstáculos junto das Ins-tâncias de decisão. A nossa interpretaçãodo sucedido é que tanto uma intervençãocomo outra não ameaçavam o que é nuclearnas duas organizações, antes permitiamintroduzir um conjunto de novas práticasque despoletavam oportunidades para umaclarificação do sistema e contribuíam paralevar os colaboradores internos a apropri-arem-se dos códigos implícitos incorpora-dos nas culturas dominantes – algo fun-damental para a aceitação dos membros:Saber/Ter conhecimentos, no primeirocaso, e Saber/Ter educação, no segundocaso. Esta interpretação surge reforçada seatendermos aos resultados da análise

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factorial a que foram submetidas as res-postas obtidas nos questionários que fo-ram dirigidos aos colaboradores das duasorganizações (Mira, 2003) e que aquiapenas serão objecto de uma breve men-ção. Assim, observa-se para os dois casosuma convergência entre o que é explicitadonos discursos dos líderes e o que é ex-presso nas respostas dos trabalhadores. Nocaso A, regista-se uma preocupação em Tere Mostrar Saber (exemplos de itens: saberresolver problemas, saber comunicar, sabertrabalhar em equipa), imprescindível aoexercício do poder ou à função de Lide-rança (saber delegar), o que justifica uminvestimento contínuo na formação indi-vidual e Valorização Pessoal (valorizaçãoprofissional, progredir na carreira, reali-zação pessoal). No caso B, sobressai umModo Especial de Educar (exemplos:promover o desenvolvimento integral dapessoa, educar em liberdade e responsa-bilidade, formar agentes transformadoresda sociedade), marcado pelaEspiritualidade (servir a Igreja) e que serevê na Orientação Inicial (difundir apedagogia de...).Se olharmos para o lado implícito damudança e para o que estes dois projec-tos de intervenção permitiram explicitar,para o que é tácito ou oculto e quecondiciona atitudes e comportamentos,podemos sustentar a afirmação de queocorreu mudança nas duas organizaçõesapresentadas. Não nos sistemas como umtodo, mas em pessoas e principalmentenos sub-sistemas cujos líderes (chefiasintermédias) quiseram e puderam mudar.Em síntese, as grandes transformaçõesocorreram nos sub-sistemas nos quais olíder era o agente de mudança interno,que acreditou ser capaz de promovermudanças profundas no sistema organi-zacional e que, por isso, fomentou eviabilizou o projecto inicial.

6. Conclusão

Para concluir, propomo-nos fazer umbalanço do trabalho realizado, nele espe-cificando o que conseguimos, o que comisso aprendemos, como articulamos o quefoi sendo feito ao longo do percursoefectuado, o que importa reter do esforçoempreendido, o que é agora possívelacrescentar e o que representa isso comocontributo, quer em termos da investiga-ção, quer em termos da acção ou inter-venção. O ponto de que partimos, o rumoque traçámos e a meta a que nos propu-semos chegar são importantes para estebalanço final. Não é que o fim, o que aindaqueremos fazer, o que permanece em abertoe o que resta aprender não sejam igual-mente importantes. O futuro e o que estápara além da meta é sempre gratificante,assim como o olhar prospectivo é atrac-tivo e desafiante. Contudo, o olhar retros-pectivo com que introduzimos o presentetrabalho regressa para acabar. Não é tantoum olhar para trás; será mais um olharpelo retrovisor, à semelhança do que ocorrecom quem anda ao volante e quer avançar;os movimentos que faz não são de quemestá parado mas de quem sabe que temque mexer e tem que olhar para percebero que se passa em redor, para decidir oque fazer e reparar nos efeitos que temo que faz, e, sem perder de vista o fima que quer chegar, abrir caminho e andar.Serve esta forma de concluir para dizerque partimos de uma prática (de interven-ção), ou seja, de um sítio um poucoafastado do lugar em que é mais comuminiciar-se um trajecto de investigação. Otrajecto e o projecto não pareciam fáceis.O desafio era grande, mas cedo percebe-mos que não seríamos os primeiros nemos únicos a fazer-lhe face. A descobertade que outros já por aí tinham passadoera inspiradora. Assim, começamos a

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entender o percurso e a ambição de Lewin(1951): se quer entender, tente mudar; oconhecimento dissociado da acção não fazsentido; perante o que está acontecer, tenhoalgo a dizer e vou fazê-lo. Weick (2001)deu alguns passos por esse caminho evislumbrou outras saídas para ele, acres-centando-lhe valor: como posso mudar, agirou intervir, se não souber quais os efeitosdo que faço?; como posso saber, se nãomexer e não perceber ou se não der umsentido ao que faço?; que acontece ao queeu faço (que sentido lhe atribuem)? Quinn(2000) fez mais perguntas: e se começasseonde Lewin ficou?; o que mudaria se aresistência à mudança fosse pensada deoutro modo? E, apoiando-se no apreço quenutre por uma linha de pensamento quefaz da acção positiva e de tudo o maisque há de positivo um ponto forte e umponto de partida (uma linha - appreciativeinquriy - em que Cooperrider (2000) sedestaca, que Thatchenkery (1992) e outrosprolongam, e que, mais uma vez, vai buscarinspiração a Kurt Lewin), mostra comopessoas simples são capazes de fazer coisasexcelentes, sendo que, para tal, é impres-cindível haver um líder com um projectoe com visão, que saiba rodear-se deconhecimento e o saiba gerir, assim comosaiba tirar partido do que existe, identi-ficando boas práticas, consolidando-as eapoiando-se neles para operar as mudan-ças que entende serem necessárias e de-sejáveis. Esta vontade de partir do queexiste, de nele querer intervir para omelhorar, de o confrontar com o conhe-cimento ou sobre ele agir de forma infor-mada, encontra em Schön (1991), tambémem Checkland (1992) e em Argyris (1973),mas sobretudo no primeiro, uma pista euma orientação para se exprimir e progre-dir. Com efeito, o profissional que inter-vém e que reflecte sobre a sua prática deintervenção, que gera conhecimento e o

partilha, que o confronta com a realidadesobre a qual se debruça e com isso apren-de, que publica e se expõe, e que em todoeste percurso assume riscos, age pensan-do, redefine, reformula e acrescenta valorao conhecimento disponível, submetendoà avaliação pública dos pares o seu con-tributo, aproxima-se do ponto de partidae aponta um caminho a trilhar.De facto, foi, como até aqui demos aentender, no seio desta corrente que nossituámos e que encontrámos um fio con-dutor; foi esta linha de investigação e deintervenção que adoptámos. O percursoefectuado permitiu avançar na clarificaçãoconceptual, assim como contribuiu paragerar conhecimento, orientar uma escolhae conferir-lhe sentido. Permitiu ainda –como era esperado - reflectir sobre a práticae enriquecê-la, proporcionando à mesmapontos de ancoragem e de referência. Ocontributo que representa o trabalho rea-lizado, quer em termos da investigação,quer em termos de intervenção, foi sendoexplicitado ao longo do texto aqui apre-sentado. A opção efectuada, que procurá-mos fundamentar, conduziu-nos a umaabordagem do processo de mudança que,situando-se no prolongamento da investi-gação-acção, pensamos ter vindoenriquecê-la e aprofundá-la, acrescentan-do-lhe valor. A análise dos casos ilustrae evidencia essa abordagem.O que agora nos propomos fazer é sin-tetizar os resultados e articular os concei-tos que entretanto fomos apresentando edesenvolvendo. Concluir sobre o que serealizou e apresentar de forma resumidao sentido da investigação implica criar ummomento no presente, entre a descobertado passado e do futuro, que justificou osprojectos realizados. Verificou-se que Seruniversidade, Ser conhecimento, Ser uni-versal ou Ser fermento, Ser igreja e Seruma comunidade educativa são valores

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encontrados nos vários discursos, partilha-dos pelos diversos colaboradores em di-ferentes momentos, que especificam aidentidade de cada uma das organizaçõesestudadas, mas que, em simultâneo, asaproximam, já que o que se É e o quese quer Ser não é questionado, só sendopossível abrir uma janela à mudança noespaço disponível e delimitado pelo Modode fazer. Uma cultura forte, indivíduosidentificados com a missão, vontade demudar e consciência de utilização depráticas desajustadas das exigências actu-ais, foi o que nos foi dado observar duranteo período de intervenção. Tudo isto nemsempre explícito ou declarado, mas paten-te nas atitudes e nos comportamentos doscolaboradores das duas organizações, as-pecto que permite sublinhar a importânciado implícito e do individual no processode mudança e que em muito contribui parao sucesso ou o fracasso de um plano dedesenvolvimento, por muito bemestruturado que este se encontre. Contudo,foram os projectos concebidos para actuarno sistema, a sua sistematização e plane-amento, que permitiram a emergênciagradual das vontades individuais, dosmedos e dos entusiasmos geradores de umdiscurso contínuo sobre o que se faz paraSer o que se É e sobre o que se deve fazerpara reforçar o que se quer Ser.Temos dois agentes de mudança internos,um consultor e dois sistemas em mudança,culturas igualmente fortes e duas identi-dades partilhadas. Como diferenciam assuas práticas? A primeira cria áreas dis-tintas do saber, órgãos colegiais, luta pelaautonomia científica, administrativa e fi-nanceira. A segunda privilegia o domespecial, o indivíduo e a sua forma únicade fazer. Numa e noutra são permitidascertas liberdades ao nível dos procedimen-tos, desde que estes não ameacem ascoligações dominantes, nem baralhem os

habituais jogos de interesse, em que se sabeà partida ou é bastante previsível quemganha e quem perde, pela negociaçãopolítica nos bastidores que levam a caboos grupos de pressão. Porque qualquer umadestas organizações comporta uma certamargem de incerteza, no interior da qualos actores organizacionais, individualmenteou em grupo, jogam e arriscam (ainda quenuma realidade de práticas aparentementeopostas, ou seja, o Caso A afoga-se nosprocedimentos e o Caso B perde-se na suaausência), é possível descortinar umaoportunidade para mudar e dispor demargem de manobra para intervir. Todasas práticas são passíveis de mudança, desdeque não contrariem o código estabelecido,implícita ou explicitamente, não ameacemas coligações dominantes nem se oponhamàs forças vigentes. O que se poderá mudardependerá do que for aceitável e nãoameaçador em cada momento para o grupodominante.Para finalizar esta parte do percurso, emque de alguma forma recapitulámos o quefizemos, procurando sintetizar e articularconceitos a que fomos recorrendo paraanalisar e discutir os dois casos apresen-tados, resta acrescentar algo que nos pareceessencial e que tem que ver com um outroresultado esperado de uma investigaçãoconduzida segundo a lógica da investiga-ção-acção: o conhecimento que foi gera-do. Para além do que foi sendo elaboradoe incorporado no presente trabalho, que-remos concluir assinalando a componenteteórica ou conceptual desta investigação.No seio da literatura dedicada à mudança,coexistem diferentes orientações teóricas.Como afirmámos na Introdução, há duasque sobressaem: uma delas enfatiza o papeldos actores organizacionais e dos agentesde mudança (vg., Enriquez, 1992; Crozier& Friedberg, 1977), assim como o papelcentral que nesse processo desempenham

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o poder e a liderança (cf., Reto & Lopes,1991; Boonstra & Gravenhorst, 1998);outra acentua que a mudança resulta deum projecto, que necessita do envolvimentode todos, particularmente do topo estra-tégico (vg., Porras & Robertson, 1992;French & Bell, 1995). A primeira está maisatenta à mudança contínua e emergente,privilegia o sentido ascendente e admiteque a mesma possa ocorrer de formaespontânea, podendo ter origem na baseou em qualquer um dos níveis da estruturaorganizacional. A segunda, pelo contrário,mais próxima das teorias de desenvolvi-mento organizacional (DO), acentua anecessidade de um projecto que viabilizea ocorrência de mudança, que se produzno sentido descendente, e para o qual oenvolvimento dos colaboradores é im-prescindível. No entanto, neste processo,cabe à liderança definir o quê e comomudar ou quem vai mudar. Com o pre-sente trabalho pretendemos contribuir paralançar um outro olhar sobre a mudança.Assim, importa identificar as boas práti-cas, salientar o que se faz e se faz bemna organização, impulsionar energias esuscitar o envolvimento dos colaborado-res, levando à consolidação do que já fazembem e reforçando normas e procedimentosmais adaptados e eficazes através de umprojecto no qual todos se revêem. O papelde um consultor ou agente externo, nestecontexto, será o de diagnosticar as boaspráticas, dar-lhes visibilidade e transformá-las num projecto de intervenção no qualseja claro que o que se muda e a formacomo se muda não é imposta nem de cimapara baixo, nem de fora para dentro, masresulta da transformação do que já se fazem certos momentos ou em certos secto-res da organização.O que emerge dos dois casos que foramanalisados permite acrescentar e enrique-cer o que acaba de ser sugerido. Com

efeito, o trabalho realizado leva-nos aconsiderar que o sucesso de um projectode mudança depende da reunião de trêscondições: existir um agente de mudançainterno, com poder formal e informal,alguém dotado de credibilidade e de le-gitimidade, bem como de motivação ouenergia, que por isso passa a estar emcondições de participar activamente nodesencadear de um processo e na concep-ção de um projecto que gera adesão eempenhamento por parte dos colaborado-res e que é aceitável e viável porqueformulado por um agente externo que seapoia no conhecimento e que tem em contaa cultura da organização. Foi este o pro-pósito desta investigação e o seu méritotem que ver com isto e com a atençãoprestada à missão e às práticasorganizacionais. Assim, e para concluir,este foi o triângulo em que assentou aestratégia de investigação e de interven-ção: existência de um agente de mudançainterno, apoiado por um consultor externocapaz de dar visibilidade às boas práticase transformá-las em projectos de desen-volvimento organizacional, que, a partir dedentro, transformam ou melhoram o quejá se faz bem. Estas são condições fun-damentais para a ocorrência de mudança,embora o alcance desta, a sua dimensãoe o seu impacto na organização possa sertanto maior quanto mais genuína oucredível for a adesão das Instâncias dedecisão à necessidade de mudar, não apenasfazendo mudar, mas assumindo-se comoparte integrante do processo de mudança.A mudança efectiva ocorreu nos sub-sis-temas liderados pelo agente interno demudança, porque nestes existiam as trêscondições enunciadas e o agente demudança era em simultâneo o líder quedispunha de um crédito que lhe permitiatransformar o sub-sistema de que era oprincipal responsável. No caso A, falamos

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de uma estrutura dentro da organização,no caso B, falamos de uma Instituição daCongregação. Assim, quer se trate deorganizações, departamentos, secções ougrupos, a mudança ocorre quando o líderpossui suficiente crédito idiossincrático queseja legitimador da sua acção como agentede mudança interno e da sua tomada dedecisão sobre a presença, ou não, de umconsultor externo, assim como possuiautonomia e poder institucional paraimplementar umas ou outras práticas. Emsuma, liderança com visão e com poderreconhecido internamente, do ponto devista formal e informal, estratégia e von-tade de mudar, conhecimento técnicointerno ou procurado no exterior e umprojecto formulado a partir do diagnósticodas práticas em vigor e do conhecimentonelas contido, eis as condições que seafiguram essenciais ao sucesso de proces-sos de mudança e de desenvolvimentoorganizacional, como revelam os dois casosque aqui foram objecto de estudo. Estesdois casos não permitem generalizar, as-sim como não foram concebidos nem

apresentados com o objectivo de provaruma “tese”. Permitem, contudo, ilustrar ummodelo de intervenção que foi sendoelaborado e co-construído, assim comopermitem mostrar que a intervenção situ-ada a nível estratégico - e não meramentetécnico, no sentido mais tradicional atri-buído a este termo - é viável e geradorade efeitos benéficos para as organizaçõese para os seus actores, e que, neste do-mínio, há contribuições relevantes daPsicologia que importa ter em conta. Nestesentido, a abordagem aqui proposta deveser entendida como um contributo parauma modalidade de intervenção que acres-centa valor ao conhecimento gerado sobreas organizações, a sua mudança e o seudesenvolvimento. As condições aqui refe-ridas ou o triângulo que o processo demudança envolve e que aqui fica esboça-do (como indica a Figura 2) apontam nosentido de superar uma certa concepçãode mudança e de modelos e práticas deintervenção. Este, contudo, é um aspectoque carece de posterior desenvolvimentoe aprofundamento.

Figura 2: Modelo de mudança (co)construído

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