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design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

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Elisangela Batista da Silva

OLHE BEM A CIDADE: Design emocional, place branding

e a marca de Belo Horizonte

Belo Horizonte 2014

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Elisangela Batista da Silva

OLHE BEM A CIDADE: Design emocional, place branding

e a marca de Belo Horizonte

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Design da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG) como requisito parcial para a obtenção de grau de Mestre em Design, na linha de pesquisa: Design, Cultura e Sociedade.

Orientadora: Profª. Drª. Rita Aparecida

Ribeiro.

Belo Horizonte Universidade do Estado de Minas Gerais UEMG

2014

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S586o Silva, Elisangela Batista da. Olhe bem a cidade : design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte [manuscrito] / Elisangela Batista da Silva. - 2014.

122 f. il. color. fots. ; 31 cm. Orientadora: Rita Aparecida Ribeiro Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Design. Bibliografia: f. 117-121 1. Desenho (Projetos) – Branding (Marketing) – Belo Horizonte - Teses. 2. Movimentos Sociais Urbanos – participação do cidadão – Belo Horizonte – Teses, 3. Espaços públicos – territorialidade humana – Belo Horizonte – Teses. I. Ribeiro, Rita Aparecida da Conceição. II. Universidade do Estado de Minas Gerais. Escola de Design. III. Título. CDU: 7.05(815.1) Ficha Catalográfica: Cileia Gomes Faleiro Ferreira CRB 236/6

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Ao meu pai,

que me ensinou, entre tantas coisas,

a amar esta cidade com suas histórias e casos.

À Luzia.

E a minha eterna mãe, por tudo!

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, aos meus amigos e benfeitores do Plano

Maior, pela oportunidade do trabalho, da aprendizagem e pelas pessoas que

encontrei durante esta jornada.

À minha querida orientadora e amiga, Rita Aparecida Ribeiro, que sempre

apoiou e incentivou o meu crescimento acadêmico e profissional.

Às minhas amigas Érika Savernini e Chris Veras, que sempre me apoiaram

e incentivaram na busca pelo conhecimento. E ao Maurício Gino, que me orientou

o caminho no momento certo.

À Miriam Moreira, prima, amiga, irmã, comadre, revisora, tradutora,

presente em todos os momentos.

Aos meus amigos e parceiros de mestrado Cris Ibarra e André Mol.

À Cintia Carvalho, pelo incentivo e apoio amigo.

À Flávia Coutinho, pela orientação precisa.

A todos entrevistados que contribuíram para a realização deste trabalho.

Aos professores Regina, Lia e Sérgio e todos os amigos que contribuíram

para a realização desta empreitada.

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RESUMO O presente estudo reflete sobre a construção da marca de uma cidade a partir de movimentos urbanos que dela se apropriam, tendo o design como ferramenta articuladora e motivadora de emoções. Nos dias atuais, vários países têm investido no place branding como ferramenta para criar esse diferencial. Entretanto, a participação do cidadão na constituição da imagem de uma cidade é fundamental. Como recorte, foi analisada a imagem da marca de Belo Horizonte, a partir dos anos de 1970/1980, quando surgiram movimentos espontâneos em prol do espaço público e pela memória da cidade; e nos anos de 2010 houve a retomada dessas mobilizações. Para compreender esse cenário, baseou-se nas teorias sobre a cidade e a sua imagem e o design aplicado no espaço público. Buscou-se compreender os conceitos e teorias sobre marca, branding e place branding. Recorreu-se também às teorias do design emocional e sua aplicação nos processos da construção de uma marca. Foram realizados levantamento e análise de alguns movimentos que sugerem a valorização da cidade, estimulando o sentimento de pertença dos cidadãos. Foi também feita pesquisa qualitativa acerca do significado e emoção sobre a cidade Belo Horizonte e entrevistas com articuladores de alguns movimentos urbanos que se apropriam da cidade. Constatamos que a imagem da marca de Belo Horizonte ainda está em processo de construção. Palavras-chave: Design. Cidade. Place Branding. Marcas. Emoção.

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ABSTRACT

The present study reflects on the construction of brand of a city through urban movements that appropriate this city, having the design as tool that is articulator and motivating of emotions. Nowadays, several countries have invested in place branding as tool to create this differencial. However, the citizen’s participation in the constitution of the image of a city is fundamental. In this study, we analyze the brand image of Belo Horizonte from the 1970/1980, when arise spontaneous movements in favor of public space and memory of the city. In the years 2010, reappear these mobilizations to understand this scenario, we based on the theories about the city and its image and the design apphied in public space. We sought to understand concepts and teories about mark, branding and place branding. We resorted also the theories of emocional design and its application in processes of building a brand. It was made analysis of some movements that suggest the appreciation of the city and stimulate the feeling of belonging of citizens. It was made, yet, a qualitative research on the meaning and emotion about Belo Horizonte interviews with articulators of some urban movements that appropriated of the city. We found that the brand image of Belo Horizonte is still under construction. Key words: Design. City. Branding of places. Brands. Emotion.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 - Marca país Barcelona .................................................................................... 28

FIGURA 2 - Telefone público em forma de Berimbau: Bahia ....................................... 30

FIGURA 3 - Anúncio da Arno dos anos de 1950 ............................................................. 38

FIGURA 4 - Anúncio da Maizena dos anos de 1959 ...................................................... 39

FIGURA 5 - Campanha Benetton Amamentar 1989 ....................................................... 40

FIGURA 6 - Logotipo da Apple tatuado ............................................................................ 41

FIGURA 7 - Coador de chá Te ò de Stefano Pirovano .................................................. 58

FIGURA 8 - Modelo básico de produtos emocionais ...................................................... 59

FIGURA 9 - Visão da empresa x visão do consumidor .................................................. 61

FIGURA 10 - Planta geral de Belo Horizonte 1895 ......................................................... 68

FIGURA 11 - Praça da Liberdade, 1905 ........................................................................... 70

FIGURA 12 - Praça Sete, 1927 .......................................................................................... 71

FIGURA 13 - Praça da Savassi, 1970 ............................................................................... 72

FIGURA 14 - Av. Afonso Pena, 1948 ................................................................................ 73

FIGURA 15 - Adesivo “Olhe bem as montanhas” .......................................................... 75

FIGURA 16 - Cartaz e camiseta do “I Encontro pela Revitalização da Praça da

Estação” ................................................................................................................................. 76

FIGURA 17 - Marca comemorativa dos 100 anos .......................................................... 78

FIGURA 18 - Infográfico dos conceitos-chave ................................................................. 80

FIGURA 19 - Ícone “pertencer” .......................................................................................... 80

FIGURA 20 - Ícone “acolher” .............................................................................................. 81

FIGURA 21 - Ícone “memória” ............................................................................................ 82

FIGURA 22 - Ícone “natureza” ............................................................................................ 83

FIGURA 23 - Ícone “afeto” .................................................................................................. 83

FIGURA 24 - Ícone “futuro” ................................................................................................. 84

FIGURA 25 - Ícone “Minas” ................................................................................................. 85

FIGURA 26 - Ícone “agito” ................................................................................................... 86

FIGURA 27 - Ícone “estresse” ............................................................................................ 87

FIGURA 28 - Ícone “estagnada” ......................................................................................... 87

FIGURA 29 - Gráfico de algumas regerências de Belo Horizonte ............................... 89

FIGURA 30 - Gráfico de outras referências de Belo Horizonte .................................... 89

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FIGURA 31 - Logotipo Coletivo Gentileza ........................................................................ 93

FIGURA 32 - Ação “Mudas por sonhos” ........................................................................... 94

FIGURA 33 - Sonho interpretado por MN, designer gráfico .......................................... 95

FIGURA 34 - Sonho interpretado por IT, designer gráfico ............................................. 96

FIGURA 35 - Storytelling ação “Sonhos por mudas” ...................................................... 97

FIGURA 36 - Embalagem das bombas de sementes ..................................................... 98

FIGURA 37 - Logotipo do coletivo “Desestressa BH” ..................................................... 100

FIGURA 38 - Banner explicativo do conceito de coletivo .............................................. 101

FIGURA 39 - Banner “Vem ser feliz em BH” .................................................................... 102

FIGURA 40 - Divulgação e passo a passo da ação de Natal ....................................... 103

FIGURA 41 - Chamadas para piquenique ........................................................................ 104

FIGURA 42 - Mapa de localização do parque do evento ............................................... 105

FIGURA 43 - Botons “Desestressa BH” ............................................................................ 106

FIGURA 44 - Proposta da ação “Ponto do Livro” ............................................................ 107

FIGURA 45 - “Ponto do Livro” Praça da Liberdade ........................................................ 108

FIGURA 46 - Passo a passo da ação “Ponto do Livro” .................................................. 109

FIGURA 47 - Missões “Imagina na copa” ......................................................................... 110

FIGURA 48 - Ação “Imagina na praça” e “Charrete Net” ............................................... 111

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADE Área de Diretrizes Especiais

AIDS Síndrome da imunodeficiência adquirida

AMA American Marketing Association

AMDA Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente

BH Belo Horizonte

IAB Instituto dos Arquitetos do Brasil

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

IEPHA-MG Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas

Gerais

MBR Minerações Brasileiras Reunidas

ONG Organização Não Governamental

UEMG Universidade do Estado de Minas Gerais

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SUMÁRIO1

1 INTRODUÇÃO......................................................................................... 12

2 A IMAGEM DA CIDADE E O DESIGN..................................................... 15

2.1 A imagem da cidade.............................................................................. 15

2.1.1 A imagem........................................................................................... 15

2.1.2 A cidade.............................................................................................. 16

2.2 Componentes da imagem..................................................................... 18

2.2.1 Globalização e identidade.................................................................. 18

2.2.2 O espaço urbano................................................................................ 21

2.2.3 O significado do espaço..................................................................... 24

2.3 O design na cidade................................................................................ 26

2.3.1 Influência do design na construção de marcos nas cidades.............. 31

3 PLACE BRANDING.................................................................................. 35

3.1 Conceitos sobre marcas........................................................................ 35

3.2 A marca: evolução................................................................................. 36

3.3 A marca: identidade e imagem.............................................................. 41

3.4 Branding: a gestão de marca................................................................ 43

3.5 Place Branding...................................................................................... 44

3.6 A marca aplicada a lugares e os seus cidadãos.................................. 47

3.7 Place Branding: valorização local e as ferramentas de design............. 50

4 O DESIGN EMOCIONAL......................................................................... 51

4.1 Por uma antropologia das emoções...................................................... 51

4.2 A emoção do consumo.......................................................................... 54

4.3 As teorias do design emocional............................................................. 56

4.4 O design emocional e a construção das marcas................................... 60

1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com a ABNT NBR 14724 de 17.04.2011.

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5 UM OLHAR SOBRE BELO HORIZONTE................................................ 66

5.1 Belo Horizonte....................................................................................... 66

5.1.1 Breve histórico.................................................................................... 68

5.1.2 Belo Horizonte: uma construção afetiva............................................. 69

5.1.3 Belo Horizonte: entre construções e desconstruções........................ 70

5.2 Anos 1970/1980: as primeiras mobilizações........................................ 74

5.3 Belo Horizonte: uma cidade centenária................................................. 77

5.3.1 Significado, emoção e referências de Belo Horizonte........................ 79

5.3.1.1 Pesquisa 01 – Qualitativa................................................................ 79

5.4 A retomada: anos 2010......................................................................... 90

5.5 Coletivos em Belo Horizonte................................................................. 92

5.5.1 Coletivo Gentileza.............................................................................. 92

5.5.2 Design................................................................................................ 96

5.5.3 Coletivo Gentileza & cidade............................................................... 98

5.5.4 Desestressa BH.................................................................................. 100

5.5.4.1 Design............................................................................................. 105

5.5.4.2 Desestressa BH & cidade................................................................ 106

5.5.5 O “Ponto do Livro”.............................................................................. 107

5.5.6 Projeto “Imagina na praça”................................................................. 109

5.5.6.1 Design............................................................................................. 111

5.5.6.2 Imagem de Belo Horizonte.............................................................. 111

5.5.7 Análise dos coletivos.......................................................................... 112

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................... 114

REFERÊNCIAS........................................................................................... 117

APÊNDICE.................................................................................................. 122

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1 INTRODUÇÃO

Esta dissertação propõe um estudo sobre a construção da marca da cidade

por seus cidadãos que por meio de movimentos urbanos apropriam e reivindicam

o direito à cidade e o papel do design nesse processo.

A criação de uma marca para representar um lugar tem sido recorrente nas

últimas décadas. O argumento do crescimento do mercado global tem estimulado

os países, cidades e localidades a buscarem soluções de marketing e identidade

como soluções imediatas de um reposicionamento.

Simon Anholt, teórico e autor de livros sobre branding aplicado a lugares,

foi o primeiro a relacionar que a gestão de produtos poderia ser aplicada à gestão

de marcas dirigidas a lugares, mas o assunto deu margem a várias

interpretações. Depois disso, o autor tem buscado identificar os equívocos

realizados por muitos para promover um local.

A gestão de marcas, nomeada como branding, trabalha os conceitos da

marca e os seus valores tangíveis e intangíveis. Uma marca não é um logotipo,

nem a sua identidade visual, nem mesmo o produto ou serviço oferecido, ela é o

conjunto de significados construídos pelos indivíduos, que geralmente estabelece

um relacionamento emocional. E uma cidade é um organismo vivo, muito mais

complexo do que uma organização, e exige atenção especial, não devendo ser

tratada como um produto.

Segundo Anholt (2010), a imagem de um país deve ser conquistada, não

construída. E a conquista de uma imagem inicia-se na forma pela qual os

cidadãos veem e sentem a sua cidade, pois eles são os principais atores, são

eles que vivenciam as cidades, e as cidades só existem por causa deles.

Os sentimentos por uma cidade estão conectados nas suas vivências, no

bem-estar de transitar nas ruas, entre monumentos e praças e/ou à maneira pela

qual o indivíduo integra-se aos aspectos sociais, econômicos, culturais e

simbólicos, às lembranças que a cidade produz no imaginário, possibilitando a

sua existência virtual, que extrapolam o tempo e o espaço.

E o design pode ser utilizado como o elemento de expressão dos atores

sociais em relação à cidades, pois apresenta as ferramentas necessárias para

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gerar representações e valores, estabelecendo vínculos significativos para as

pessoas. “As marcas elas precisam conectar-se com a cultura para alcançar o

coração das pessoas” (GOBÉ, 2010, p. 15). De acordo com Norman (2008), as

emoções verdadeiras e duradouras levam muito tempo para serem cultivadas,

elas acontecem em decorrência de uma interação prolongada. O que importa é a

história da interação, as associações que as pessoas têm com os objetos e as

lembranças que eles evocam.

O objeto de estudo proposto é a cidade de Belo Horizonte, que passa por

um processo de retomada da cidade como espaço de uso. Nos últimos anos

surgiram vários movimentos articulados pelos cidadãos que têm provocado

algumas mudanças na maneira das pessoas interagirem ou refletirem sobre a

cidade.

Alguns desses movimentos urbanos propõem a interação dos cidadãos e a

cidade com base no uso das praças, parques e ruas, quebrando a rotina da

cidade. Outros movimentos convocam a população a usar a cidade, questionando

algumas diretrizes estabelecidas pelo poder público.

O objetivo geral do trabalho é relacionar o design emocional na construção

da imagem da cidade por parte dos cidadãos, a partir de estudo de caso de

movimentos urbanos que possuem em sua gênese ações que motivem a

valorização da cidade e o pertencimento dos seus cidadãos.

Busca-se também: compreender a imagem da cidade e o seu contexto

urbano e a presença do design nesse ambiente; entender os conceitos de place

branding, percebendo como são aplicáveis ou não; identificar o que a cidade

significa e a sua relação emocional com o indivíduo; identificar e analisar as

expressões de valorização e pertença do cidadão a partir dos anos de 1970 e

1980, a retomada nos anos de 2010 por meio de movimentos urbanos, o papel do

design como motivador emocional nessa construção e o reflexo de todo esse

processo na construção da marca da cidade.

A metodologia utilizada parte da construção do referencial teórico sobre os

temas abordados sobre espaços urbanos, emoção, design e place branding.

Em seguida, fez-se o levantamento de alguns movimentos articulados

pelos cidadãos, que não tenham relação direta com órgãos públicos ou iniciativas

privadas.

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Por fim, realizou-se pesquisa qualitativa on-line com cidadãos, buscando as

suas percepções sobre o significado, sentimento e referências da cidade de Belo

Horizonte. Optou-se pelo método on-line por ser mais dinâmico, além de

propriciar ao entrevistado mais liberdade para expressar-se.

E a última etapa foi a análise de alguns movimentos que atuam em Belo

Horizonte. Para realizar essa análise, foram selecionados os coletivos urbanos,

Desestressa BH, Coletivo Gentileza e o Imagina na Praça. Esses movimentos

foram abordados sobre questões pertinentes sobre o movimento, a relação com a

cidade, o papel do design e o papel dessas marcas na formação da imagem da

cidade e, consequentemente, em sua marca.

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2 A IMAGEM DA CIDADE E O DESIGN

A imagem de uma cidade está relacionada à atuação dos seus atores nos

âmbitos sociais, culturais, ambientais e econômicos. São eles que a constituem

em seus vários aspectos, percebendo-a, vivenciando-a e concebendo-a a todo o

instante. E o design em suas competências e interdisciplinaridades torna-se parte

dessa construção.

2.1 A imagem da cidade 2.1.1 A imagem

A palavra imagem para a maioria das pessoas está relacionada à

representação visual de algo. Entretanto, Santaella e Nörth (2008) dividem o

mundo das imagens em dois domínios: o das representações visuais e o domínio

imaterial. As representações visuais abrangem os desenhos, pinturas, gravuras,

fotografia, cinema, televisão, vídeo, holografia e infográficas, todas tangíveis. Já o

segundo domínio, o imaterial, representa a mente, as visões, a imaginação,

esquemas e modelos mentais.

A tangibilidade das representações imagéticas depende de um processo

individual de leitura, de apreensão e de decodificação dos elementos existentes

do universo intangível do pensamento. Não existe separação entre ambos os

domínios, pois para a materialização do primeiro é necessária a estruturação

mental para a expressão das imagens em seus devidos suportes.

Portanto, a imagem é uma das formas de expressão do pensamento e

desempenha, desde os primórdios, papel de destaque na vida humana, que se

justifica também pelo aspecto orgânico, um dos primeiros contatos sensoriais do

homem com o mundo é por meio da visão.

As imagens visualizadas no cotidiano são primeiramente projeções

formadas no interior do cérebro, a partir do processo do aparelho ocular. No

entanto, a compreensão e assimilação dessas imagens dependem das relações

sociais e culturais que o indivíduo tem com o mundo. Para Flusser (2002, p. 9),

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“as imagens são mediações entre homem e mundo. O homem ‘existe’, isto é, o

mundo não lhe é acessível imediatamente. Imagens têm o propósito de

representar o mundo”. E são por meio dessas representações que o homem

decodifica o seu entorno criando conceitos, memórias para sua história.

2.1.2 A cidade

A Revolução Industrial é o marco de profundas mudanças na sociedade,

tanto econômicas quanto sociais. E é a partir desse momento histórico que a

sociedade passa a articular em torno do capital, da produção em massa e,

consequentemente, do consumo.

Lefebvre (2006) lembra que a cidade existe muito antes da industrialização.

O autor indica inicialmente a cidade política, que era dominada pelos arredores

agrários. Em seguida, surge a cidade comercial e os processos de troca

começam se estabelecer e a centralizar riquezas. Com o advento da indústria, as

cidades já estabelecidas irão se adequar à nova realidade urbana.

A indústria, a princípio, não está diretamente vinculada à cidade, pois é

geralmente implantada próxima de fontes de energia e matérias-primas, mas

aproxima-se da cidade para ficar perto do capital e da mão-de-obra. A indústria

começa a gerar concentrações urbanas que acompanham o capital. Segundo

Lefebvre (2006), o processo de industrialização e crescimento urbano tornam-se

inseparáveis e ao mesmo tempo conflitantes.

“As cidades são centros de vida social e política onde se acumulam não

apenas as riquezas, com também os conhecimentos, as técnicas e as obras

(obras de arte, monumentos)” (LEFEBVRE, 2006, p. 4). O autor apresenta a

cidade como uma obra, que se contrapõe e duela com sua natureza capitalista

moderna. A obra é valor de uso e o uso de uma cidade está relacionado às suas

ruas, praças, edifícios, monumentos, é a festa que oferece prazer, sem o objetivo

da troca. O valor de troca é o produto, comércio, consumo.

As cidades antes do advento das indústrias possuíam uma concentração

dos grupos de pessoas que cultivavam os costumes, culturas e conhecimento que

valorizavam o local. Lefebvre (2004) lembra que a realidade urbana propiciou a

perda de elementos da época anterior, das cidades antes da indústria, que

possuíam a imagem enaltecedora, espaços demarcados e dominados pelos

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17

monumentos, o sentido de pertencer e uma totalidade orgânica. A comunicação

era feita face a face, a troca de experiência entre os habitantes fazia parte do

cotidiano. Não existia o intercâmbio de valores tão intenso com outras cidades

como nos dias atuais. O estado tinha o poder de manter a nação unida, tanto

economicamente, como também no aspecto sociocultural.

O crescimento de uma nação está, também, diretamente implicado na

expansão do seu mercado consumidor, sendo criadas novas necessidades, novos

hábitos de consumo. Novos valores são aos poucos consumidos e a cultura

também é aos poucos modificada, as identidades que eram sólidas começam a

se fragmentar ou até mesmo se desfazer.

Como um conceito socioeconômico, a modernidade designa uma grande quantidade de mudanças tecnológicas e sociais que tomaram forma nos últimos dois séculos e alcançaram um volume crítico no final do século XIX: industrialização, urbanização e crescimento populacional rápidos; proliferação de novas tecnologias e meios de transporte; saturação do capitalismo avançado, explosão de um cultura de consumo de massa e assim por diante (SINGER, 2004, p. 95).

A cidade é absorvida pelo ritmo imposto pela modernidade: sinais,

cartazes, anúncios de publicidade, ruas, avenidas, prédios e monumentos

contribuem para uma nova estimulação sensorial. O final do século XIX é um

momento de inovações, novas tecnologias, produção em massa. A sociedade

urbana produz e consome em ritmo crescente e acelerado. O cotidiano altera-se,

esses novos elementos introduzidos alimentam os pensamentos e as imagens

imaginadas e produzidas pelos indivíduos contribuem para a realimentação

desses novos centros urbanos.

Uma imagem ou representação da cidade pode se prolongar, sobreviver às suas condições, inspirar uma ideologia e projetos urbanísticos. Dito de outro modo, o “objeto” sociológico “real”, neste caso, é a imagem e, sobretudo a ideologia (LEFEBVRE, 2004, p. 61).

A imagem de uma cidade é algo complexo de explicitar, pois ela abrange

dos aspectos físicos até os conceitos intangíveis elaborados por cada um de seus

atores. Portanto, as cidades estão sempre em construção, a sua imagem é

formada por identidades, espaços e significados que se interpolam e agregam

valores.

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18

2.2 Componentes da imagem

Segundo Lynch (2011), a cidade é o resultado de muitos construtores e

está sempre mudando a sua estrutura por motivos particulares. Ele ainda afirma

que não existe uma percepção na íntegra, mas sim fragmentada. A influência de

cada ator social é fundamental na construção da imagem da cidade e nesse

processo devem-se considerar três componentes: identidade, estrutura e

significado. Uma imagem ambiental pode ser decomposta em três componentes: identidade, estrutura e significado. É conveniente abstraí-los para análise, desde que não se perca de vista que sempre aparecem juntos. Uma imagem viável requer, primeiro, a identificação de um objeto, o que implica sua diferenciação de outras coisas, seu reconhecimento enquanto entidade separável. A isso se dá o nome de identidade, não no sentido de igualdade com alguma outra coisa, mas com o significado de individualidade ou unicidade. Em segundo lugar, a imagem deve incluir a relação espacial ou pragmática do objeto com o observador e outros objetos. E por último, esse objeto deve ter algum significado para o observador, seja ele prático ou emocional (LYNCH, 2011, p. 9).

Esses três pontos são abordados por Lynch principalmente do ponto de

vista físico e ambiental das cidades. Entretanto, pode-se ampliar essa análise e

considerar os aspectos humanos e sociais.

2.2.1 Globalização e identidade

A identidade tornou-se um assunto cada vez mais discutido na época atual.

Hall (2006) apresenta três concepções de identidade: a primeira é do sujeito do

Iluminismo, que tem como essência o “eu”, a identidade do indivíduo. A segunda,

o sujeito sociológico, que se baseia na identidade formada pela interação entre o

“eu” e a sociedade. E o terceiro é a fragmentação do sujeito, sujeito pós-moderno

que possui várias identidades que são formadas e transformadas em diferentes

momentos.

Segundo Canclini (2007), a globalização é indicada como elemento

homogeneizador, devido à quantidade e à rapidez como as transações comerciais

e a comunicação acontecem. Essa ideia de homogeneidade argumentada como

tendência sugere a iminência de integração global. Mas o autor adverte sobre

esse argumento de uniformidade por ela produzida, pois segundo ele não existe

Page 21: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

19

consenso sobre a sua “capacidade em reorganizar ou decompor a ordem social”

(CANCLINI, 2007, p. 41).

Hall (2006, p. 77) também considera o argumento da homogeneização das

identidades muito “simplista, exagerado e unilateral”. Segundo o autor, as

identidades nacionais continuam fortes, entretanto, as identidades locais têm mais

destaque.

A origem da globalização é situada por Canclini (2007) a partir da segunda

metade do século XX. De acordo com o autor, é importante entender a diferença

entre a transnacionalização da internacionalização para compreender melhor a

globalização. A internacionalização da economia e da cultura começa com as

navegações; as colonizações e a abertura comercial com o extremo oriente e com

a América Latina. Eram consumidos objetos e informações de outras localidades,

mas a maioria era produzida no próprio local, o que vinha de fora passava por

controles alfandegários que protegiam o seu país. O autor explica que a

transnacionalização é uma consequência da primeira. A partir da primeira metade

do século XX os fluxos, os movimentos, empresas e organizações não têm sede

exclusiva em determinada nação.

A globalização teve suas bases nesses dois processos, mas foi o

desenvolvimento das tecnologias de informação que engendrou processos

globais que proporcionam uma expansão para as mais diversas áreas

econômicas, culturais, sociais. Esse processo se deslancha principalmente com o

advento da informática e da internet. Hoje, os centros urbanos e as metrópoles

são receptores e emissores de informações, comportamentos, modas, ideias,

artefatos, etc.

O discurso da globalização compreende o avanço do capital e, por

consequência, o do consumo. De acordo com Harvey (1996, p. 307), o capital “é

um processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias

em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente

implicadas”.

Nesse sentido, pode-se considerar que a globalização impacta nas

identidades nacionais de três maneiras (HALL, 2006): desintegrando as

identidades; contribuindo no reforço da identidade local e particularista pela

resistência; e no surgimento de novas identidades híbridas, fragmentadas,

produzindo novas culturas: o multiculturalismo. A desintegração das identidades

Page 22: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

20

advém, entre outros fatores, do consumo de imagens mediadas pelos meios de

comunicação de outras culturas e pela exposição a influências externas. Também

segundo Thompson (2001) os meios midiáticos possuem importante papel nas

mudanças culturais, por ser um “multiplicador da mobilidade”, pois permitem que

os indivíduos conheçam e vivenciem eventos que acontecem em lugares

distantes e os estimulam a imaginar novas possibilidades às formas de viver

características em seus locais:

Os fluxos culturais entre as nações e o consumismo global criam possibilidades de “identidades partilhadas” – como “consumidores” para os mesmo bens, “clientes” para os mesmo serviços, “públicos” para as mesmas mensagens e imagens – entre pessoas que estão bastante distantes umas das outras no espaço e no tempo (HALL, 2006, p. 74).

O resultado é a produção de identidades fragmentadas, híbridas. Canclini

(2007, p. 108) cita o Brasil como uma “sociedade nacional mais disposta à

hibridação”. Isso se deve à maneira como foi colonizado e à sua história. O Brasil

é um país extenso em território, não possui uma etnia predominante, porém,

mantém a língua portuguesa como um elo desse vasto território. A miscigenação

é a base; a cultura africana, indígena e a europeia proporcionaram o

multiculturalismo e o sincretismo que fazem parte do cotidiano do brasileiro. São

várias identidades locais construindo uma imagem do país que é reconhecida

pelos outros países.

Em relação ao reforço da identidade local e particularista pela resistência

citada por Hall (2006), Castells (2002) também aborda os movimentos sociais,

políticos e urbanos voltados para o local como formas de construção de

identidades em contraponto aos princípios global. O autor cita três formas e

origens de construção de identidade: a) identidade legitimadora - introduzida

pelas instituições dominantes da sociedade na intenção de aumentar e

racionalizar sua dominação em relação aos atores sociais; b) identidade de

resistência - criada por atores que estão na situação de desvalorização ou

estigmatizadas pela lógica da dominação; c) identidade de projeto - quando os

atores sociais utilizam elementos culturais e constroem uma nova identidade que

os reposiciona na sociedade. A identidade de resistência leva à construção de

comunas ou comunidades.

Page 23: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

21

Esses movimentos, com o transcorrer do tempo, geram um sentimento de

pertença e, em muitos casos, uma identidade cultural. Castells (2002, p. 79)

apresenta a hipótese de que para que isso aconteça é necessária a mobilização

social: “as pessoas precisam participar de movimentos urbanos (não exatamente

revolucionários) pelos quais são revelados e defendidos interesses comuns, e a

vida é, de algum modo, compartilhada e um novo significado pode ser produzido”.

Esses movimentos têm como objetivos principais as necessidades urbanas de

condições de vida e consumo coletivo; a afirmação da identidade cultural local; e

a conquista da autonomia política e participação na qualidade de cidadão.

Possibilitam, assim, o fortalecimento da imagem da cidade e da cultura local.

A construção de identidades vale-se da matéria-prima fornecida pela História, Geografia, Biologia, instituições produtivas e reprodutivas, pela memória coletiva e por fantasias pessoais, pelos aparatos de poder e revelações de cunho religioso. Porém, todos esses materiais são processados pelos indivíduos, grupos sociais e sociedades, que reorganizam seu significado em função de tendências sociais e projetos culturais enraizados em sua estrutura social, bem como em sua visão de tempo e espaço (CASTELLS, 2002, p. 23).

De acordo com Bonsiepe (2011. p. 54), “a identidade não é tanto o que

cada um tem, mas vive no imaginário do outro. Identidades pertencem ao

I’imaginaire. Elas são artefatos de comunicação”. E são esses artefatos de

comunicação que representarão as visualidades produzidas pelo imaginário,

articulados em processos narrativos da identidade e, consequentemente, o

estabelecimento de imagens que representem a individualidade ou

particularidades citadas por Lynch. Castells (2000) lembra que identidades

organizam significados.

2.2.2 O espaço urbano

Segundo Certeau (2000, p. 202), existe uma oposição entre espaço e lugar

e o lugar remete à ideia de algo inerte, indica a configuração de posição,

enquanto o espaço é “o lugar praticado”. E cita o filosofo Merleau-Ponty, que

distinguia o espaço geométrico, análogo à referência de lugar, do espaço

antropológico que deriva de uma experiência, uma relação com o mundo. Assim,

Page 24: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

22

as ruas traçadas e planejadas são transformadas em espaço quando exploradas

pelos indivíduos, pela prática do lugar.

Para outros autores, porém, como Carlos (2007a, p. 17-18), “o lugar é a porção do espaço apropriável para a vida - apropriada por intermédio do corpo - dos sentidos - dos passos de seus moradores, é o bairro é a praça, é a rua e nesse sentido pode-se afirmar que não seria jamais a metrópole ou mesmo a cidade latu sensu, a menos que seja a pequena vila ou cidade - vivida/ conhecida/reconhecida em todos os campos. Para Lefebvre (2004, p. 53), o urbano não se define somente pelo aspecto

lugar de passagem ou de troca, mas como uma “realidade global implicado à

prática social”.

Não raro, a cidade vem sendo pensada ora como quadro físico (um simples mapa aberto na prancheta) ou como ambiente urbano (e, nessa dimensão, “naturalizada”), e em ambos os casos ignora-se o conteúdo da prática socioespacial, que lhe dá forma e conteúdo (CARLOS, 2007b, p. 19).

A imagem tangível do espaço urbano diz respeito, a princípio, à sua

elaboração ambiental. Porém, esses espaços só adquirem valores a partir do

momento em que as pessoas interagem e fazem uma leitura de seus atributos de

acordo com a própria vivência e valores pessoais. Criam-se, reinventam-se seus

espaços a todo o momento. Lefebvre (2004) discorre sobre a dinâmica da rua,

que possui seus prós e contras e sem ela não há vida urbana, pois a rua tem a

função informativa, simbólica e lúdica. Para o autor, a rua não é simplesmente um

lugar de circulação, é o lugar do encontro, do teatro espontâneo, do movimento, o

lugar da manifestação cultural dos atos públicos. “A colonização do espaço

urbano se efetua na rua pela imagem, publicidade, pelo espetáculo dos objetos:

pelo ‘sistema dos objetos’ tornados símbolos e espetáculos” (LEFEBVRE, 2004,

p. 31).

Um exemplo é a escadaria do Bonfim, em Salvador. O lugar é uma escada

que leva à porta de uma igreja, mas a prática social o transforma em espaço, o

lugar é absorvido pela festa do Bonfim e a lavagem tradicional dessa escadaria

transformou-se em uma das principais manifestações do estado da Bahia, uma

imagem que é consumida pelo mundo. Outro exemplo é a Praça Sete, em Belo

Horizonte, lugar onde milhares de pessoas passam todos os dias em ritmo

Page 25: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

23

acelerado, o que não impede a apropriação do seu espaço por uma diversidade

de grupos, são skatistas, artesãos, jogadores de xadrez, músicos, etc. Mas é também o lugar do consumo, dos desencontros, da individualidade.

Observa-se, assim, uma imposição do valor de troca sobre o valor de uso das

cidades. As ruas tornaram-se lugares de passagem, do transito caótico, da pressa

diária.

Nesta condição, o espaço se encontra, cada vez mais, dominado pela troca, na medida em que áreas antes desocupadas entram no circuito da troca ocupada por novas indústrias como a do turismo e lazer. Neste processo, a cidade transforma-se no espetáculo do consumo, as ruas redimensionam-se e ganham outro conteúdo que elimina o lúdico, pois se transforma em lugar de passagem. As grandes lojas de departamentos e os shoppings centers substituem o lazer, ou melhor, viram lazer (CARLOS, 2007b, p. 51).

As cidades buscam por posicionamento no mercado global e é isso tem levado várias cidades a empenharem-se como para atrair eventos internacionais, tornarem destinos turísticos e lugares de entretenimento. Nesse sentido, observa-se uma movimentação do poder público no sentido de revitalizar ou requalificar os espaço públicos com a finalidade mercantil, reforçando o valor de troca das cidades.

Deste modo, a renovação urbana, no momento atual, estabelece uma estratégia espacial de dominação em aliança com setores econômicos, que de uma lado revela a imposição do setor imobiliários como elemento dinâmico da economia, tornando patente a mobilização da riqueza fundiária e imobiliária, compreendida como extensão do capitalismo financeiro; e, de outro, as transformações recentes da economia capitalista, a entrada do setor da construção civil no circuito industrial moderno, associado ao desenvolvimento maciço da tecnologia em função da imposição dos novos padrões de realização da atividade econômica nas cidades mundiais (CARLOS, 2007b, p. 76-77).

De acordo com Peixoto (2009), as palavras reabilitação urbana e

requalificação correspondem a uma série de intervenções nos centros históricos

ou em áreas que se encontram em processo de deterioração. Geralmente essas

áreas não devolvidas para os seus habitantes e quando isso ocorre as pessoas

são dali expulsas naturalmente em um processo de gentrificação2.

2 Gentrificação é uma tradução da palavra inglesa “gentrification”, que significa o fenômeno de valorização de uma região ou bairro gerado pela renovação/revitalização de áreas degradadas.

Page 26: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

24

Entanto, não se pode esquecer de que é na rua ou por meio dela que os

cidadãos podem exercer o seu direito de apropriar das cidades.

2.2.3 O significado do espaço

A respeito do aspecto do significado prático ou emocional, Castells (2002,

p. 23) define “significado como a identificação simbólica por parte de um ator

social, da finalidade da ação praticada por tal ator”. As cidades são marcadas por

elementos significativos que constroem o presente e fazem reviver o passado.

Segundo Lefebvre (2004) a cidade e o fenômeno urbano não se restringem

a um único sistema de signos e significações, existindo vários, em diferentes

escalas.

a) Ao que se refere à vida cotidiana - objetos, produtos, da troca e do uso, da

mercadoria e do mercado, signos e significações do habitat e do habitar;

b) a sociedade urbana no seu todo - a semiologia do poder, da potência, da

cultura no seu todo ou em partes;

c) o do tempo e do espaço urbano particularizado - a semiologia das

características próprias de determinada cidade, de sua paisagem, sua

fisionomia e seus habitantes.

Cada elemento influencia de forma diferente o indivíduo ou os grupos. Essa

relação é estabelecida de acordo com a prática urbana, com a concepção de

espaço, bagagem cultural, relações de afetividade concebidas e vivências,

mesmo que de modo virtual.

Segundo Pesavento (2007), a cidade é um fenômeno representado pela

percepção de emoções, sentimentos, expressões de utopias, desejos e medos

que o viver urbano propicia. É quase impossível vivenciar um espaço urbano sem

experimentar algum tipo de reação ou emoção.

Lynch (2011) também discorre sobre essa multiplicidade e interação dos

indivíduos nas cidades.

Page 27: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

25

A cidade não é apenas um objeto percebido (e talvez desfrutado) por milhões de pessoas de classes sociais e características extremamente diversas, mas também o produto de muitos construtores que, por razões próprias, nunca deixam de modificar sua estrutura (LYNCH, 2011, p. 2).

Na contemporaneidade, vivenciar um espaço urbano não é

necessariamente uma interação face a face. No processo de construção de

significados das cidades, os meios midiáticos possuem papel preponderante na

criação e sustentação e fragmentação de imagens. Segundo Thompson (2001), a

interação, que antes acontecia face a face, passou a ser mediada pelos meios de

comunicação que alteram a organização espacial e temporal da vida social,

criando novas possibilidades de interação e ação nos modos de exercer o poder.

A comunicação de massa trabalha a produção, o armazenamento e a circulação

de mensagens que possuem significados para o receptor. A comunicação é

realizada em sentido único e é disponibilizada para elevado número de pessoas

ao mesmo tempo. E para concretizar essa difusão são utilizados vários meios

técnicos: a televisão, o rádio, cinema, jornais, revistas, etc.

Ferrara (2008) acredita que, com a difusão de meios de comunicação, os

espaços das cidades são vistos a distância, conhecem-se e elegem-se os lugares

dos sonhos. As metrópoles são dominadas pela imagem e transformam-se em

produtos imaginados, reproduzido para milhões de espectadores que consomem

esses espaços. Os indivíduos são transportados para Londres, Paris, New York,

Barcelona, Tóquio, entre outras. Vive-se um simulacro de emoções durante um

tempo determinado. A imagem estimulada desperta o desejo de experienciar

essas emoções imaginadas.

O espaço social assume definitivamente seu caráter midiático e esta nova manifestação supõe cuidadosa lógica de produção, tendo em vista a consequente e competente recepção pensada, planejada e determinada por aquela lógica. Assim a mediação que decorria das próprias características construtivas das espacialidades da cidade cosmopolita se transforma em mídia e programa comunicativo (FERRARA, 2008, p. 69).

Os aparatos midiáticos são responsáveis, também pela transmissão de

informações e imaginários a respeito da vida urbana (CANCLINI, 2007).

Proporcionam condições de veicular mensagens transnacionais. Thompson

lembra que os produtos midiáticos globalizados proporcionam aos indivíduos um

afastamento simbólico do seu cotidiano e permitem que passem a conceber

Page 28: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

26

maneiras de viver e condições de vidas muito diferentes da sua realidade diária.

Essas imagens consumidas servem de base para um julgamento das suas

condições de vida.

É importante ressaltar o ciberespaço, que de acordo com Castells (2000)

gera significativo número de comunidades virtuais. A tecnologia da informação

cria uma nova possibilidade de interação e de produção de espaços virtuais, nos

quais os atores sociais possuem acesso à informação, não somente assimilando

a informação sem uma forma direta de interação, o que acontecia com a

comunicação realizada pelos meios tradicionais da comunicação de massa. O

autor propõe também que para a maior parte dos atores sociais na sociedade em

rede o significado articula-se em torno de uma identidade que estrutura as demais

ao longo de tempo e do espaço. A evolução da tecnologia, a chamada web 2.0,

propicia a qualquer pessoa produzir os seus conteúdos e disponibilizá-los na

rede, por intermédio de blogs, redes sociais e outras pessoas que interagem com

o conteúdo veiculado em curto espaço de tempo.

As imagens que remetem à representatividade tangível do espaço de uma

cidade podem ser rapidamente acessadas de qualquer lugar do mundo via

satélites. São blogs, redes sociais e sites que compartilham informações,

vivências de atores sociais nos mais diversos locais do mundo. A identidade, os

espaços e os significados da cidade são construídos de maneira colaborativa. Se

na comunicação face a face essa construção era limitada a um tempo e espaço,

na rede esse processo é realizado sem limites, o indivíduo não precisa pertencer

fisicamente a um espaço para ter condições de interagir. E a vida cotidiana já

absorveu esses elementos e a sua intermediação na percepção dos espaços.

Portanto, a imagem da cidade é algo complexo e está diretamente

relacionado pelas ações e formas de interação dos atores sociais com os espaços

urbanos.

2.3 O design na cidade

Segundo Moraes (2008, p. 15), “uma disciplina como o design, pelo seu

caráter holístico, transversal e dinâmico, posiciona-se como alternativa na

aproximação de uma correta decodificação da realidade contemporânea”. E são

essas competências de design que podem transformar os centros urbanos a favor

Page 29: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

27

dos seus atores sociais, explicitando os seus anseios e necessidades, propondo

experiências que provoquem emoções e traduzem culturas e identidades.

As cidades são constituídas de artefatos e possuem vasto campo de

design. Cardoso (2012) considera como artefatos todos os objetos produzidos

pela atuação humana e os divide em duas modalidades: os móveis e os imóveis.

O autor questiona a existência de artefatos “imóveis”, pois até mesmo esses

objetos são passíveis de mudanças, seja de ordem tangível ou intangível.

Para o autor, existem seis fatores condicionados ao significado do artefato

que possuem a capacidade de alterar essa imobilidade. Três estão ligados à

materialidade do objeto: o uso, o entorno e duração. E os outros três dizem

respeito à percepção que os indivíduos fazem dele: o ponto de vista, o discurso e

a experiência. Nesse sentido, podem-se considerar os espaços urbanos como

artefatos que estão sujeitos à ação dos atores sociais, impregnados de

significados que narram, com base nas visualidades, as histórias de uma cidade.

Essas histórias normalmente evocam memórias e emoções.

Os projetos de design urbano sugerem uma mudança na concepção e experiência dos seus espaços, e entram no campo do urbanismo e do lazer. Também nos aspectos da Geografia, já que implicam mudanças nos status econômicos e culturais das cidades em um contexto global (JULIER, 2008, p. 159, tradução da autora)3.

Os projetos de design devem considerar todos os aspectos de vivência e

interação dos atores sociais com os espaços urbanos e a maneira como eles o

utilizam, seja nos movimentos diários ou nos momentos de entretenimento. Os

seus aspectos sociais, econômicos e culturais são preponderantes nos momentos

de análise do espaço a ser projetado ou reestruturado pelo design.

No design para cidades observam-se várias áreas de interdisciplinaridade:

na arquitetura dos lugares, no mobiliário urbano, nas intervenções urbanas, na

comunicação visual, nos movimentos urbanos.

Em uma cidade na qual já existem projetos urbanos Lynch (2011) sugere

que o design tem o papel de fazer uma reestruturação do ambiente, descobrir e

3 “Los proyectos de diseño urbano sugieren un cambio en la concepción y la experiência de lós espacios de la ciudade, y entran um el campo del urbanismo y um el ócio. También um el de la geografia, ya que implicam câmbios en el estatus econômico y cultural de las ciudades en un contexto global” (JULIER, 2008, p. 159)

Page 30: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

28

preservar as imagens fortes, propor soluções para as dificuldades, ressaltar as

identidades latentes. Jullier (2008) cita o caso de Barcelona, que é um exemplo

de cidade que teve a sua revitalização pautada pelo design. Muitas pessoas

ignoram essa faceta que se iniciou nos anos 1980 e 1990 e foi motivada por

sediar os Jogos Olímpicos de 1992. A infraestrutura da cidade estava descuidada

e esse descaso foi o resultado de quatro décadas de ditadura militar. O processo

de transição para a democracia despertou um reposicionamento ideológico,

cultural e estético da região. O design foi utilizado para posicionar e diferenciar a

cidade. A sua imagem foi revitalizada, o sentimento de pertencimento foi

reforçado com a criação da marca país, “Barcelona més que mai” (Barcelona mais

que nunca) (JULIER, 2008, p. 170) (FIG. 1). O seu novo design passou a fazer

parte do cotidiano e incentiva um orgulho cívico pela cidade, apresentando uma

nova Barcelona para os seus cidadãos e para os demais do mundo.

FIGURA 1 – Marca país Barcelona

Fonte: http://www.todocoleccion.net.

Lynch (2011) refere-se também a casos em que a proposta é de criação,

de renovação do espaço urbano. O designer deve considerar todos os elementos

que envolvem o lugar para desenvolver um projeto que acrescente e/ou desperte

para as qualidades do local.

Bonsiepe (2011) cita os esforços das chamadas novas cidades de design

que exibem as creative industries para comprovar seu caráter excepcional. As

novas cidades de design são assim chamadas por possuírem uma identidade

diferenciada que se manifesta nas creatives industries, que são setores da

indústria voltados para o entretenimento, moda, pesquisas de tendências, além da

Page 31: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

29

indústria tradicional. O autor resume explicando que, no geral, trata-se de

marketing de cidades para um determinado grupo social que possui condições de

usufruir determinado estilo de vida. Nesse sentido, o design é ferramenta utilizada

para reforçar o valor de troca da cidade.

De acordo com Julier (2008), vários aspectos devem ser considerados no

âmbito do design: a arquitetura, o intercâmbio das informações, o fluxo e o refluxo

da vida cotidiana.

Os mobiliários urbanos são geralmente artefatos integrados aos espaços

públicos e têm por objetivo oferecer serviços à população: seja na área do lazer,

da limpeza ou do descanso, entre outras. Estão diretamente ligados ao

desenvolvimento econômico, social e cultural da cidade. O dicionário de

urbanismo conceitua mobiliário urbano como:

Conjunto de elementos materiais localizados em logradouros públicos ou em locais visíveis desses logradouros e que complementam as funções urbanas de habitar, trabalhar, recrear e circular: cabinas telefônicas, anúncios, idealizações horizontais, verticais e aéreas; postes, torres, hidrantes, abrigos e pontos de parada de ônibus, bebedouros, sanitários públicos, monumentos, chafarizes, fontes luminosas, etc. (FERRARI, 2004, p. 240).

O design desses artefatos, além de atender aos aspectos da

funcionalidade, da acessibilidade, do conforto e da segurança dos seus usuários,

deve propor uma integração com elementos culturais e sociais para maior

interação entre os usuários. Muitos desses espaços tornam-se cenários de

apresentações culturais, de encontros, de trocas de experiências.

Os bancos, postes de iluminação e balaústres fazem mais do que servir como apoio ou assento para pedestres cansados: contribuem para redefinir a identidade urbana através de suas formas. São detalhes arquitetônico, mas que, também fazem parte de um tratamento gráfico da paisagem urbana. Sua missão é de comunicar (JULIER, 2008, p. 159, tradução da autora)4.

Segundo Montenegro (2005), os atributos materiais (cor, forma, textura) e

projetuais dos mobiliários dialogam com os seus usuários quando expressam a

identidade, aspectos da cultura local, comportamentos e anseios. Devem também 4 “Los bancos, farolas y barandillas hacían algo más que servir como asidero o asiento para los transeuntes cansados: contríbuian a redefinir la identidad urbana a través de sus formas. Eran detalles arquitectónicos, pero también parte de un tratamiento gráfico del paisaje urbano. Su misión era comunicar” (JULIER, 2008, p. 159).

Page 32: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

30

comunicar-se com a arquitetura e com a paisagem urbana. Nos anos 70,

conforme Cardoso (2010), um dos mobiliários urbanos no Brasil mais difundidos

foi a cabine telefônica, conhecida como orelhão. Esse mobiliário era durável,

barato e se tornou parte integrante em quase todas as cidades brasileiras. O

design, que inicialmente tinha uma forma padrão, depois começou a se

diversificar atendendo à identidade cultural de determinados lugares (FIG. 2).

Hoje, com a expansão da telefonia móvel, o orelhão virou um objeto quase

inexistente na paisagem urbana.

FIGURA 2 – Telefone público em forma de Berimbau: Bahia

Fonte: André Luis (http://blog-pt.hostelbookers.com).

As intervenções urbanas são manifestações localizadas que transformam o

cotidiano. São consideradas arte de rua por alguns. Elas são, na maioria dos

Page 33: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

31

casos, de caráter experimental e são normalmente realizadas em espaços

públicos, transformando-os em espaços comunicantes. São geralmente efêmeras,

durando exatamente o tempo em que acontecem. Em alguns casos os registros

perduram por mais tempo. Algumas intervenções são peças de teatro,

manifestações culturais itinerantes ou mesmo publicitárias. No caso das

expressões gráficas, desenhos, pinturas, grafites acontecem em espaços com

aspectos abandonados ou degradados como muros, viadutos, pontes, paredes

entre outros, ou áreas reservadas para esse intuito. Essas intervenções alteram a

paisagem e o cotidiano do espaço urbano, com o forte apelo visual e seus temas

que provocam emoções diversas nos transeuntes.

A paisagem urbana de uma cidade também é influenciada pela

comunicação visual estampada nos centros urbanos. São placas, anúncios,

cartazes que dizem muito a respeito do ritmo e dos desejos dos seus cidadãos.

Mas o bom fluxo de uma cidade depende do acesso às suas informações, que

devem ser claras e legíveis e devem atender, segundo Hollis (2001), às funções

básicas de identificar (placas, letreiros, marcas, etc.), informar e instruir (mapas,

diagramas, sinalização).

2.3.1 Influência do design na construção de marcos nas cidades

De acordo com Lynch (2011), são considerados marcos de uma cidade

elementos pontuais, considerados externos ao observador. São normalmente

representados por um objeto físico: edifícios, esculturas, monumentos, torres,

sinalização, lojas ou montanhas. Seu uso implica a sua distinção e evidência em

relação a expressiva quantidade de outros elementos.

Uma vez que o uso de marcos implica a escolha de um elemento dentre um conjunto de possibilidades, a principal característica física dessa classe é a singularidade, algum aspecto que seja único ou memorável no contexto. Os marcos se tornam mais fáceis de identificar e mais passíveis de serem escolhidos por sua importância quando possuem uma forma clara, isto é, se contrastam com o pano de fundo e se existe alguma proeminência em termos de sua localização espacial (LYNCH, 2011, p. 88).

Os marcos, na maioria das vezes, não surgem como tais, tornam-se

referências com o passar do tempo. De acordo com seu uso e relevância para os

Page 34: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

32

indivíduos, transformam-se em referências com significados históricos e

emocionais. Segundo Lynch (2011, p. 90), “quando uma história, um sinal ou

significado vem ligar-se a um objeto, aumenta o seu valor enquanto marco”. E o

design desempenha relevante papel nesse processo de significação, pois a partir

dele muitos desses marcos são ressaltados e tornam-se ícones para a cidade no

momento de projeção das imagens imaginadas. O autor cita o exemplo do Duomo

de Florença, que se destaca pela visibilidade e harmonia. Sua presença é tão

forte que é difícil pensar em Florença sem que esse grande edifício venha à

mente.

Ainda segundo o autor, “o ambiente conhecido por seus nomes familiares a

todos oferece material para as lembranças e símbolos comuns que unem grupos

e permitem que seus membros se comuniquem entre si” (LYNCH, 2011, p. 143).

Todas as cidades possuem os seus marcos, em vários casos são ícones

mundiais de referência, não é possível pensar em Paris sem a Torre Eiffel, New

York sem a Estátua da Liberdade, Belo Horizonte sem a Igreja da Pampulha.

Esses espaços foram apropriados e preenchidos com vivências, histórias, culturas

e símbolos e fazem parte da memória afetiva de seus cidadãos e são

reproduzidos como elementos referenciais de suas cidades.

Na visão de Cardoso (2012), os marcos da cidade passam por mudanças

de valores, função e significados de acordo com cada época. Sofrem a influência

do entorno e, apesar de suas aparências de imobilidades, são mutáveis.

No caso de Belo Horizonte, pode-se citar a Praça da Liberdade, que

passou por várias mudanças que alteraram a percepção com o passar dos anos.

A praça já foi o cenário do poder público, com o Palácio do Governo e suas

secretarias; teve o seu entorno alterado quando foi construído o Edifício

Niemeyer; e anos depois o edifício conhecido como Rainha da Sucata. Esses dois

edifícios não fazem parte da arquitetura original e destoam do conjunto. Durante

duas decadas abrigava em seu espaço a Feira Hippie, que hoje funciona na

avenida Afonso Pena. Após um processo de revitalização a praça faz parte de um

circuito cultural que abriga museus patrocinados por empresas privadas. Seu

espaço mudou muito durante esses anos, devido à ação dos atores sociais, poder

público e privado. Tome-se o exemplo da praça, mas sabe-se que todos os

artefatos de uma cidade estão sujeitos a mudanças, resultantes de interação

social.

Page 35: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

33

A metrópole pode ser contemplada como uma grande matriz espacial e visual, demarcada por indícios codificados visualmente. Esses indícios ou marcos precisam ser ajustados e reajustados de modo contínuo, porque a navegação de pessoas e coisas acarreta o desgaste dos caminhos percorridos. Do ponto de vista de cada usuário, situado dentro da malha, os marcos estão ali para facilitar a navegação. São interfaces (CARDOSO, 2012, p. 204).

As imagens desses marcos são registradas na memória dos cidadãos,

fazem parte da construção do cotidiano, com histórias, vínculos emocionais e

experiências vividas. Lynch (2011, p. 133) lembra que “essa imagem é o resultado

de um processo de mão dupla entre observador e observado, em que a forma

física externa sobre a qual o designer pode operar representa um papel

fundamental”. O design pode influenciar e intensificar essas relações entre objeto

e observador, produzindo símbolos, marcas, sinalização e produtos que irão

remeter aos marcos em qualquer lugar. Vários produtos são criados para

representar os pontos marcantes da cidade. Conforme Norman (2008), servem de

presentes e recordações. São cartões postais, souvenires de viagens que

reproduzem monumentos, prédios, esculturas, elementos marcantes da cultura

local. Esses objetos são considerados kitsch5 no mundo das artes e do design,

por remeter a uma cópia barata das obras existentes, mas são importantes como

símbolos, referências de lembranças associadas a experiências e sentimentos

vivenciados.

Esses exemplos imprimem a repercussão desses marcos na mente das

pessoas e o significado de identidade local que eles representam, remetendo a

experiências que preechem desejos.

Percebe-se, assim, que o design em sua interdisciplinaridade possui

ferramentas que podem proporcionar agregar valores à imagem da marca

aplicada a lugares. A tangibilidade de suas ações resulta em valores intangíveis

do bem-estar de viver, visitar e experienciar um lugar. Segundo Gobé (2010, p.

11), “design é mais do que o veículo pelo qual as marcas se expressam e se

conectam com seus clientes. [...] o design é um reflexo do ecossistema humano”.

A criação de uma marca voltada para uma cidade deve ser a junção dos

diversos elementos que a constituem, a sua identidade, os seus espaços urbanos

55 “O termo em seu sentido moderno foi cunhado por volta de 1860 e vem do alemão Verkitshen, que quer dizer trapacear, receptar, vender alguma coisa no lugar do que havia combinado. É uma negação do autêntico. Uma mercadoria ordinária” (MOLES, 2001, p. 10).

Page 36: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

34

e os significados a ela atribuídos e o design trabalhado de forma interdisciplinar,

seja na arquitetura dos lugares, no mobiliário urbano, nas intervenções urbanas,

na comunicação visual. Contribui de forma fundamental na formação da imagem

da cidade, na sua marca, conforme será visto no próximo capítulo.

Page 37: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

35

3 PLACE BRANDING O termo branding aplicado a países, cidades e lugares tem sido motivo de

muita discussão. Anholt (2007) ressalta que quando se trata do assunto marca no

contexto de países, cidades ou lugares, as pessoas tendem a pensar nas técnicas

de persuasão usadas para promover a “venda” do país. E maioria não gosta

disso. O autor ainda narra que um jornalista comparou a marca de lugares com a

marca de gado: a aplicação de um logotipo atraente, um slogan atrativo e a

comercialização do lugar como se fosse apenas um produto no supermercado

global. Anholt (2007) lembra que é importante compreender a diferença entre

marca/brand e branding para, assim, entender a proposta do place branding.

3.1 Conceitos sobre marca

A palavra marca, também conhecida como brand na versão inglesa, está

presente já há alguns séculos na vida das pessoas. As marcas fazem parte do

cotidiano, das ruas, da vida dos indivíduos. E é essa onipresença que alimenta os

conceitos sobre o que é uma marca. Costa (2011, p. 17) corrobora essa premissa:

“é verdade que todo o mundo sabe o que é uma marca, porque vivemos rodeados

de marcas e assediados por elas, mas a resposta à pergunta ‘o que é uma marca’

varia conforme a quem perguntemos”.

Anholt (2007), afirma que a maioria das pessoas pensa na marca como

sinônimo de publicidade, promoção, design gráfico ou relações públicas. Calder

(2006, p. 28) apresenta também essa questão “[...] se você perguntar o que é

marca, a resposta é frequentemente longa (às vezes, tem a extensão de um livro!)

e, geralmente, varia fortemente entre empresas, consultores e diferentes autores”.

O termo “marca”, como relembra Costa (2011, p. 20), refere-se à condição

essencial do ato de marcar: “uma marca é o sinal que deixa o ato de marcar, a

marcação de uma matriz ou um traço sobre uma superfície”. Esse sinal impresso

sobre alguma superfície, de forma intencional, comunica um significado para que

os indivíduos entrem em ressonância com esse elemento, vinculando-o a uma

Page 38: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

36

identidade. E é esse conceito que remete aos primórdios da marca, quando era

usada para identificar o gado.

A definição apresentada pela American Marketing Association (AMA)

aproxima-se do conceito nascente. “Marca é um nome, termo, símbolo, desenho

ou uma combinação desses elementos que deve identificar os bens ou serviços

de um fornecedor ou grupo de fornecedores e diferenciá-los dos da concorrência”

(KELLER, 2006, p. 2).

Para alguns autores, a marca apresenta também um aspecto mais

intangível. O designer francês Joël Desgrippes (GOBÉ, 2002) apresenta a

seguinte ideia sobre o assunto:

Criar marcas não diz respeito somente à onipresença, à visibilidade e às funções, mas também à ligação emocional com as pessoas na vida diária. É tão somente quando um produto ou um serviço provoca um diálogo emocional com o consumidor que realmente pode qualificar-se como marca (GOBÉ, 2002, p. 17).

Neumeier (2008, p. 149) acompanha o raciocínio quando afirma que “a

marca é um sentimento visceral de uma pessoal em relação a um produto,

serviço ou empresa. Ela não é o que você diz o que ela é. Ela é o que os outros

dizem que ela é”.

Portanto, pode-se concluir que a marca abrange esses diversos conceitos,

pois ela reúne os elementos tangíveis como o nome, logotipo e embalagem,

importantes para identificar o produto ou serviço. E também os aspectos

intangíveis, sua reputação perante os indivíduos.

3.2 A marca: evolução

Essa ampla compreensão sobre o conceito de marca pode ser atribuída à

sua evolução histórica. A primeira fase desse processo, segundo Costa (2011),

remete-se à necessidade de marcar, de criar uma identificação. Os sinais eram

basicamente funcionais, seja na lapidaria da construção civil da época, seja na

identificação do gado.

Após a invenção da moeda, a atividade comercial intensificou-se e tornou-

se importante identificar a origem e a responsabilidade pela circulação de

mercadorias. Surge, assim, a marca comercial.

Page 39: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

37

No período medieval, a marca torna-se obrigatória e possuía um

compromisso com a qualidade. “Graças a essa prática era possível verificar se as

mercadorias eram de boa qualidade e, caso contrário, a lei castigava os

infratores” (COSTA, 2011, p. 49).

A Idade Média é conhecida pelas guerras santas, as Cruzadas. E a marca

de identidade é, na heráldica, uma forma eficaz de diferenciar os amigos dos

inimigos no campo de batalha. De acordo com Costa (2011), o brasão,

normalmente posicionado no escudo, recebeu a função dos signos de

reconhecimento. Com o passar do tempo, os brasões tornaram-se uma marca de

nobreza e hierarquia, sendo transmitidos de forma hereditária, chegando a ser

usados como símbolos nacionais.

Marca de identidade é na heráldica uma espécie de equivalente do nome próprio – ou assinatura pessoal – e serve para identificar uma pessoa, uma família ou uma linhagem. Mas, ao mesmo tempo, pode ser marca de propriedade, como os brasões feudais ou nobres; marcas de posse, como as que agrupam os guerreiros; marcas de reconhecimento (que é a função das marcas de posse); marca hierárquica (uniformes, insígnias de graus, escudos); ou marcas corporativas (de grêmios ou ofícios) (COSTA, 2011, p. 57).

A Revolução Industrial, que aconteceu entre os séculos XVIII e XIX, foi um

marco para a sociedade. Cardoso (2010) realça que, a partir desse momento,

desencadearam-se novos processos de produção em grande escala a um custo

cada vez mais baixo. Nesse período nasceu a marca registrada e a confiança dos

consumidores foi despertada. “A marca não era mais do que uma garantia da

procedência do produto, mas para o patrimônio do comerciante a marca é ativo

que lhe permite atrair e conservar clientela” (COSTA, 2011, p. 65). Segundo o

autor, no princípio do século XX a marca passou a ser promovida e divulgada por

meio de anúncios publicitários, adquirindo, assim, novos valores. Começou dessa

maneira o processo de vender a marca associada ao produto (FIG. 3).

A publicidade se estendeu no exterior com os grandes cartazes e nas cidades com os anúncios luminosos e o neon. Depois vieram o rádio, o cinema... e o marketing, a contribuição mais importante do século XX para a história do comércio (COSTA, 2011, p. 67).

Page 40: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

38

FIGURA 3 – Anúncio da Arno dos anos de 1950

Fonte: http://historiasdefusca.blogspot.com.br.

Os meios de comunicação aproximaram ainda mais as marcas dos

indivíduos, fazendo parte do visual urbano e adentrando lares e o cotidiano.

Surgiu, então, uma nova cultura de valores e uma sociedade de consumo.

Após o período industrial, que Costa (2011) considera a partir da metade

do século XX, as marcas começaram a assimilar os atributos dessa nova cultura,

do imaterial, do intangível e dos valores. “Atualmente, a marca é um fenômeno

complexo (economia da informação, cultura de serviço, sociedade do

conhecimento)” (COSTA, 2011, p. 90).

Page 41: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

39

Semprini (2010, p. 26) divide essa era pós-industrial em etapas. Na

primeira fase, considera um período de aproximadamente 15 anos (1958-1973) -

as marcas substituem os produtos e acompanham o progresso do consumo de

massa. “Elas nomeiam, identificam, diferenciam. Elas acompanham as práticas de

consumo, mostrando como utilizar os novos produtos e garantindo a própria

qualidade” (FIG. 4). Marcas como Maizena, Bombril, Gillete, Pó-Royal, Xerox,

Leite Moça, entre outros, são exemplos que ainda estão presentes no cotidiano,

designando produtos como o amido de milho, esponja de aço, lâmina de barbear,

fermento em pó, fotocópia e leite condensado.

FIGURA 4 – Anúncio da Maizena dos anos de 1959

Fonte: http://www.unilever.com.br.

Nos 10 anos seguintes, a sociedade de consumo foi questionada em

função da crise do petróleo de 1973 e 1977, desacelerando a economia. De

acordo com Semprini (2010), as marcas atravessaram um período de estagnação.

Mas foi a partir dos anos de 1980 até o início dos anos 2000 que elas passaram

por mudanças em sua forma funcional e no seu papel no mercado. O uso da

publicidade é valorizado “na construção de um discurso de marca” (SEMPRINI,

2010, p. 29). Por exemplo, a comunicação da marca Benetton (FIG. 5) abordou

Page 42: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

40

assuntos polêmicos, como a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS),

racismo, trabalho infantil, entre outros, e assumiu papel de destaque nos debates

sociais.

FIGURA 5 – Campanha Benetton Amamentar 1989

Fonte: http://www.propagandashistoricas.com.br.

O quarto ciclo iniciou-se após o início do século XXI e foi marcado por

crises econômicas, avanços tecnológicos, novas formas de produção e de

consumo. Semprini (2010) ainda discorre sobre o alcance contemporâneo da

marca.

Enfim, pudemos constatar o quanto é importante, quando se analisa o lugar das marcas no espaço social, distinguir entre poder material e poder simbólico, entre poder econômico e poder de sedução, entre legitimidade comercial e legitimidade cultural (SEMPRINI, 2010, p. 35).

A marca tornou-se, de acordo com Semprini (2010) e Costa (2011), um

organismo complexo, que passou de signo a símbolo. A Apple é um exemplo de

marca que representa essa complexidade na sua essência. O signo da maçã

representa uma empresa de tecnologia que trabalha o conceito de inovação,

design e modernidade. Mas os seus valores intangíveis ultrapassam a

funcionalidade de seus produtos e alcança um simbolismo que atribui diversos

valores a quem exibe, abrangendo comportamentos, julgamentos, status e uma

série de valores imaginados pelo indivíduo (FIG. 6).

Page 43: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

41

FIGURA 6 – Logotipo da Apple tatuado

Fonte: http://obviousmag.org.

3.3 A marca: identidade e imagem

A marca, a partir de então, assumiu amplo aspecto e tornou-se campo de

estudo de disciplinas diversas, como o Design, a Psicologia, a Antropologia, entre

outras. Ela adquiriu uma imagem que reflete o imaginário de cada indivíduo. E é

essa imagem que motiva debates e estudos. De acordo com Costa (2011, p. 85-

86), “aprofundar-se na imagem da marca é, como dizíamos no princípio, penetrar

no imaginário social, na Psicologia cotidiana, no mundo pessoal das aspirações,

das emoções e valores”.

Costa (2011) ainda ressalta que a palavra imagem remete à ambiguidade.

O termo apresenta a “imagem como objeto material, representação física de

coisas, de objetos e produtos que se encontram em nosso ambiente e também o

conceito de “imagem como representação mental, produto sintético e intangível

da imaginação individual – e, por extensão, do imaginário coletivo” (COSTA,

2011, p. 86).

A marca moderna abrange dois aspectos: a imagem física (logotipo,

símbolos, embalagem, etc.), que é a representação física da imagem mental.

Para alguns autores (ANHOLT, 2007; COSTA, 2011; WHEELER, 2012), a

imagem física, perceptiva da marca, é chamada de “identidade da marca” e a

imagem mental, simbólica é considerada “imagem da marca”.

Page 44: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

42

De acordo com Heilbrunn (2004), a identidade da marca possui o atributo

de garantir o reconhecimento imediato da empresa, produto ou serviço. Anholt

(2007) lembra que esse aspecto é o cerne da concepção do produto, clara e

visualmente expresso. É o que o consumidor vê: a logo, o slogan, embalagem, o

design do próprio produto. É também o aspecto que torna tangíveis as aspirações

da marca.

A identidade da marca é tangível e faz um apelo para os sentidos. Você pode vê-la, tocá-la, agarrá-la, ouvi-la, observá-la se mover. A identidade da marca alimenta o reconhecimento, amplia a diferenciação, torna grandes ideias e significados mais acessíveis. A identidade da marca reúne elementos díspares e os unifica em sistemas integrados. (WHEELER, 2012, p. 14).

Segundo Aaker (1998, p. 212) “o papel do símbolo, [...] é de ser um

indicador [...] cujo resultado é um dispositivo mnemônico útil para o público-alvo”.

O autor também lembra que o símbolo em uma marca pode ser o condensador de

valores relativos ao conhecimento e às associações e resultará na qualidade

percebida e na lealdade.

Já a imagem da marca abrange, em seu contexto, aspectos da ordem do

intangível, reunindo em si propostas, conceitos, discursos, desejos, entre outros.

Nesse processo existe o que a organização deseja que a marca expresse. E

existe o consumidor, que sintoniza com a marca, criando para si uma imagem

mental sobre a marca.

À medida que a concorrência cria uma infinidade de opções, as empresas passam a buscar formas de estabelecer uma ligação emocional com os clientes, tornar-se insubstituíveis e desenvolver relações duradouras. Uma marca forte se destaca em um mercado. As pessoas se apaixonam pelas marcas, confiam nelas e acreditam em sua superioridade (WHEELER, 2012, p. 12).

Assim sendo, a imagem da marca abrange aspectos que vão além do

incentivo ao consumo. Elas criam um processo de identificação íntima com os

indivíduos, o que abre espaço para a utilização da marca em outras esferas não

comerciais, como, por exemplo, em organizações não governamentais (ONGs),

movimentos sociais, partidos políticos, entre outros. Calkins (2006, p. 2) afirma

que as “organizações que não visam lucros são marcas, grupos religiosos são

marcas e qualquer pessoa é uma marca”.

Page 45: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

43

No campo de estudo sobre a marca, é importante entender o conceito de

brand equity e brand purpose. Segundo Aaker (1998, p. 16), “brand equity é um

conjunto de ativos e passivos ligados a uma marca, seu nome e seu símbolo, que

se somam ou se subtraem do valor proporcionado por um produto ou serviço para

uma empresa e/ou os consumidores”. Esses ativos incluem a lealdade à marca,

conhecimento do nome e de seus símbolos, qualidade percebida e as

associações realizadas. Marcas como a Coca-Cola, Apple, Nike, entre outras,

possuem um valor de marca que impacta no patrimônio das respectivas

empresas.

Já o brand purpose citado por Anholt (2010) trata do conceito de cultura

corporativa ou branding organizacional. Coolidge (2006, p. 303) salienta que “a

marca deve refletir a cultura da organização e sua realidade. Se não for assim, a

marca é uma fraude”. Um branding é constituído também dos seus stakeholders,

ou seja, dos seus funcionários, clientes, colaboradores e a comunidade em seu

entorno.

3.4 Branding: a gestão de marca

A complexidade precisa ser organizada e gerenciada e esse processo de

gestão de marcas é conhecido como branding:

Branding é o conjunto de ações ligadas à administração das marcas. São ações que, tomadas com conhecimento e competência, levam as marcas além da sua natureza econômica, passando a fazer parte da cultura e influenciar a vida das pessoas. Ações com a capacidade de simplificar e enriquecer nossas vidas num mundo cada vez mais confuso e complexo (MARTINS, 2006, p. 8).

Costa (2011) e Aaker (1998) complementam a ideia de Martins (2006), ao

lembrarem que a gestão de marca é um aspecto importante na gestão de ativos

intangíveis. Seu simbolismo, significado, discurso emocional, as mensagens, a

identidade, a personalidade, a cultura, a reputação, o lado social são valores que

estão associados à imagem da marca. A marca é um reflexo da percepção dos

indivíduos.

De acordo com Wheeler (2012), por trás de toda marca de sucesso existe

uma estratégia que impulsiona o planejamento, o marketing e as vendas. Aaker

Page 46: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

44

(1998) lembra que esse posicionamento pode ser utilizado como uma maneira

pela qual a empresa deseja ser percebida. Ou seja, a comunicação da empresa

determina, por intermédio da sua gestão, como ela deseja ser vista.

Porém, “marca não é o que você diz que ela é. É o que os outros dizem

que ela é. A marca é uma espécie de ideal platônico. Um conceito compartilhado

pela sociedade para identificar uma classe específica de coisas” (NEUMEIER,

2008, p. 3).

Em seus estudos, Gobé (2002) apresenta o conceito de branding

emocional, cuja base está no caráter humano, nas experiências, no desejo de ir

além da satisfação material. Nessa linha de pensamento, o design é o ponto

fundamental para a gestão de marca.

Portanto, existem nesse processo de branding diferentes formas de

gerenciar uma marca, que pode ser sob os aspectos mercadológicos em seu

sentido mais direto, propondo um posicionamento do produto na mente do

consumidor, ou uma gestão que possui uma visão mais holística, que propõe a

gerência da marca no âmbito das aspirações, dos ideais e da experiência, em que

o consumo torna-se uma consequência do relacionamento marca e indivíduo.

3.5 Place branding

Place branding é o termo cunhado por Simon Anholt, um dos principais

consultores e teóricos sobre o tema. Trata-se do deslocamento de um conceito

até então pertencente a produtos e serviços e agora aplicado a nações, cidades e

lugares.

Anholt começou a escrever sobre o assunto em 1996 e a sua ideia inicial

era de que a reputação de países, que o autor estende para cidades e regiões,

possui similaridade com a imagem da marca de produtos e organizações. E essa

marca pode ser importante para a gestão de lugares.

Page 47: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

45

Hoje, o mundo é um mercado. O rápido avanço da globalização significa que cada país, cada cidade e cada região têm de competir com todos os outros pela sua parcela de consumidores do mundo, turistas, investidores, estudantes, empresários, eventos esportivos internacionais e culturais e pela atenção e respeito dos meios de comunicação internacionais, de outros governos, e as pessoas de outros países6 (ANHOLT, 2007, p. 1, tradução da autora).

De acordo com Anholt, os países precisam desenvolver uma reputação

favorável perante os outros países para tornarem-se competitivos na comunidade

global. Nesse aspecto, os países e cidades utilizam os seus nomes próprios como

marcas.

Conforme articulado anteriormente, uma marca possui o aspecto tangível e

a imagem mental. A tangibilidade, no caso de uma “marca-país”, é o próprio lugar,

o espaço físico, os aspectos sociais, políticos e econômicos. E não precisa ter

necessariamente um logotipo, pois, de acordo com o autor, essas técnicas não

possuem muita relevância para países.

A imagem da marca é mencionada como atributo fundamental para o

branding aplicado a lugares, pois os valores intangíveis creditados à marca pelo

público externo, no caso de produtos e serviços, são equivalentes à reputação

conquistada em relação a países, cidades e regiões. Aaker (1998, p. 236) enfatiza

que “a reputação de qualidade percebida é a base da vantagem competitiva

sustentável para muitos negócios”. E são esses ativos conjugados que tornam a

“marca-país” expressiva.

Já Kotler et al. (2006) defendem que para implementar uma imagem eficaz

de um lugar pode-se recorrer a três ferramentas: a) slogans, temas e

posicionamentos; b) símbolos visuais; c) eventos e realizações. Mas advertem

que essas ferramentas de promoção devem respaldar-se na realidade, pois elas

não solucionam problemas de base. Portanto, um anúncio com belas imagens e

slogans envolventes que não condizem com a realidade são ferramentas para

gerar uma imagem negativa do local em questão.

De acordo com Anholt (2010), usar as ferramentas de marketing só faz

sentido quando se abordam as ofertas de turismo ou de produtos de exportação e

6 “Today, the world is one market. The rapid advance of globalization means that every country, every city and every region must compete with every other for its share of he world’s consumers, tourists, investors, students, entrepreneurs, international sporting and cultural events, and for the attention and respect of the international media, of other governments, and the people of other countries” (ANHOLT, 2007, p. 1).

Page 48: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

46

serviços. Esses setores, quando bem comercializados, proporcionam benefícios

para a imagem da nação. Por exemplo, a marca I LOVE NY, que foi desenvolvida

em 1977 pelo designer gráfico Milton Glaser, em um momento crítico para New

York, pois a cidade passava por sérios problemas sociais e econômicos, foi

desenvolvida com a intenção de valorizar a cidade e alavancar o turismo. Hoje, é

considerada uma referência de marca de cidade. Sua proposta foi replicada em

outras cidades. Amsterdam, por exemplo, fez um trabalho de valorização da

própria imagem usando a marca I amsterdam em pontos estratégicos da cidade,

incentivando a fotografia desses lugares. O material captado foi publicado em um

livro sobre a cidade.

Entretanto, quando o assunto é promover a imagem do lugar, sua política,

cultura, educação e o seu povo, o uso do marketing pode gerar dúvidas. É

importante considerar que a imagem de um lugar é muito mais vulnerável que a

imagem de um produto ou serviço. Essa vulnerabilidade está relacionada a uma

série de valores ideológicos, educacionais, culturais, econômicos e sociais que

estão diretamente intricados com as formas de governança e com os seus

cidadãos. Aaker (1998) lembra que uma marca pode ter associações positivas ou

negativas, o que, no caso da imagem de um país, essas associações oscilam de

acordo com as políticas públicas e seus cidadãos.

Anholt (2010) reconhece que um país, para adquirir uma imagem positiva,

deve se concentrar em bons produtos, serviços, cultura, turismo, investimentos,

tecnologia, educação, negócios, pessoas, políticas, iniciativas e eventos. O autor

defende que os governos não devem tomar atitudes visando à gestão de imagem

ou somente à mudança dessa imagem. Essas ações não devem ser vazias, mas

com propósitos relevantes.

Além dos atributos da imagem da marca, Anholt (2010) apresenta outros

pontos importantes para o place branding:

a) Os lugares devem possuir uma relação clara, coordenada e comunicativa

com o mundo exterior, pautada em um engajamento produtivo entre

governo, empresas e sociedade civil. Esse processo deve ter harmonia dos

objetivos, projetos, comunicação e comportamento a longo prazo.

Page 49: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

47

b) A noção de brand equity: a reputação é considerada um ativo muito

valioso, que necessita ser gerenciado, mensurado e alimentado ao longo

do tempo.

c) Outro ponto fundamental é a ideia de brand purpose: a importância dos

grupos de pessoas em torno de uma estratégia comum pode criar uma

dinâmica importante para o progresso. O autor ressalta que a “a gestão de

marca é, antes de tudo, um projeto interno” (ANHOLT, 2010, p. 12,

tradução da autora)7.

d) A inovação sustentável e coerente em todos os setores da atividade

nacional que possam influenciar a opinião pública e, por conseqüência, a

mídia.

Esses aspectos, segundo o autor, devem ser entendidos e aplicados de

forma responsável pelos decisores políticos, pois, juntos, eles representam uma

nova abordagem para a maneira em que lugares precisam ser gerenciados na era

dos mercados globais.

3.6 A marca aplicada a lugares e os seus cidadãos

O branding aplicado a países, cidades e regiões não deve visar somente à

sua imagem externa, pois o processo da imagem possui como base os seus

cidadãos e como eles se relacionam com a sua cidade.

Já Place Branding surgiu como uma ampliação da ideia de Nation Branding, mas para lugares e não necessariamente países e estados. A partir desse conceito, é possível criar a imagem de algum lugar público, mas com a participação da iniciativa privada e da comunidade. Uma praça, uma rua, uma esquina, por exemplo, podem ter um branding próprio e, assim, elevar a taxa de desenvolvimento do lugar em que se situam (RODRIGUES, 2010, p. 50).

Uma boa reputação é fruto de um trabalho conjunto, investimento em

pessoas, educação, saúde, tecnologia, políticas públicas, turismo, iniciativas,

bons produtos por parte dos governantes. E os cidadãos possuem participação

ativa na formação dessa imagem. Lefebvre (2006, p. 107) lembra que “nem o

arquiteto, nem o urbanista, nem o sociólogo, nem o economista, nem o filósofo ou 7 “And that brand managenment is first and foremost an internal projet” (ANHOLT, 2010, p. 12).

Page 50: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

48

o político podem tirar do nada, por decreto, novas formas e relações. [...] Apenas

a vida social (a práxis) na sua capacidade global possui tais poderes”. E essa

atuação que é conduzida pelos comportamentos, experiências e interações

positivas ou negativas dos indivíduos com os lugares onde vivem é que constrói a

imagem da cidade.

Segundo Insch (2011, p. 8, tradução da autora), “subestimar a participação

que os moradores têm na formação e melhoria da marca de uma cidade poderia

minar os objetivos e intenções da estratégia de marca de uma cidade”8.

Pensando-se no papel primordial dos cidadãos nesse processo, deve-se

articular um place branding, não com o objetivo de promover exatamente

questões comerciais ou turísticas de uma localidade, mas que possua uma

proposta de criar laços e valores de pertencimento dos cidadãos. Essas ações

têm como consequência um somatório na imagem do país, agregando valores à

marca país.

Uma população feliz, orgulhosa de sua identidade, de seus mitos históricos e de sua herança, participativa nas questões políticas e culturais contemporâneas, é a melhor forma de disseminar um sentimento nacional que atravessa fronteiras e territórios. Um povo orgulhoso de seu país ajuda a construí-lo e mantê-lo. É o melhor divulgador da imagem de um país, tal como o boca a boca do universo da publicidade (RODRIGUES, 2010, p .87-88).

Um país, cidade ou região só terão sucesso se o conjunto de ações

empreendidas comunicarem uma construção sólida de valores que repercutam no

dia-a-dia dos cidadãos em sua maneira de ver e de se sentir bem em sua cidade

ou comunidade. Anholt (2010) reforça que a imagem de lugar não pode ser

construída ou inventada, mas sim conquistada.

Anteriomente citamos Barcelona como uma das cidades que foi

reestruturada pelo design. É importante também considerar que Barcelona foi

uma das cidades que passaram por um processo intenso de place branding e

tornou-se referência para muitas outras cidades e países. De acordo com Julier

(2008), tanto Barcelona como outras cidades espanholas sofreram com a ditadura

do general Franco, que só teve fim após a sua morte em 1975. A partir dos anos

de 1980 começou-se um processo de regeneração da cidade, que culminou na

8 “Undervaluing the stake that residents have in shaping and enhancing a city’s brand could undermine the aims and intentions of a city’s original brand strategy” (INSCH, 2011, p. 8).

Page 51: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

49

realização das Olimpíadas de 1992. No primeiro momento, segundo Capel (2007),

foi importante essa intervenção, pois toda a cidade e especialmente as áreas

periféricas estavam precárias, a malha urbana estava deficitária, trânsito e

transporte público caóticos, altos índices de poluição e poucos serviços públicos.

As ações foram realizadas de forma equilibrada, a estabilidade econômica e

política permitiram qualidade de vida para as famílias mais simples. Nesse

período desapareceram áreas de favelas que existiam na periferia.

Em 1986 foi concedida à cidade de Barcelona a sede das Olimpíadas de

1992, iniciando-se, então, uma nova etapa de urbanização.

Enfim, o urbanismo olímpico dos jogos de 1992 reflete de um modo geral a nova era: articulação de interesses privados, monumentalidade e projeção urbana. Mas Barcelona contava com um plano diretor, de âmbito metropolitano, gerado no contexto da redemocratização espanhola, e realizou a façanha de conjugar a natureza e exigências dos jogos com os objetivos fundamentais da gestão urbana (MASCARENHAS, 2013, p. 59).

Capel (2007) lembra que a preocupação em aumentar a competitividade

internacional e a visibilidade da cidade no cenário mundial coloca em segundo

plano os cidadãos e suas necessidades cotidianas.

A obsessão em converter a cidade em um polo global, atrair visitantes e potenciais investidores é perversa e, finalmente, contraproducente: acaba por esquecer os cidadãos comuns da cidade, que reagem contra o esquecimento, contra a falta de equipamentos de bairro, contra a arquitetura espetacular e irresponsável, contra a destruição do patrimônio construído, ou seja, a memória histórica, que executa a mesma a boca cheia retoricamente alusões à identidade e ao passado. (CAPEL, 2007, p. 25, tradução da autora)9.

E essa reação contribui para a construção de uma imagem local.

Demolição de prédios e de lugares que fazem parte da história do lugar torna-se

nesses casos recorrentes, homogeneizando a paisagem urbana. É importante,

nesses momentos, a mobilização popular, para evitar que a identidade do lugar

seja destruída. Capel (2007) defende a necessidade da participação e do diálogo 9 “La obsesión por convertir la ciudad en un polo mundial, en atraer visitantes y posibles inversores es perversa y, finalmente, contraproducente: acaba por olvidarse de los ciudadanos que viven cotidianamente la ciudad, y que reaccionan contra ese olvido, contra la falta de equipamentos de barrio, contra la arquitectura espectacular e irresponsable, contra el arrasamento del patrimônio construído, es decir de la memoria histórica, que realiza los mismos que se llenan la boca retoricamente de alusiones a la identidade y al pasado” (CAPEL, 2007, p. 25).

Page 52: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

50

com os cidadãos, uma vez que a construção de uma cidade não acontece

somente nos meios políticos e técnicos. Observa-se que ouvir a sua população e

conquistar um lugar de destaque no cenário mundial é ainda um desafio para

muitos países, pois para realizar um ideal de cidade, que seja condizente com os

sonhos de consumo é ainda, na maioria dos casos, um desafio que muitos

preferem ignorar.

3.7 Place Branding: valorização local e as ferramentas de design

O design, conforme já visto no capítulo anterior, é uma disciplina que,

utilizada com correção, pode proporcionar benefícios para todos. No contexto de

uma cidade, o design tem amplo alcance, seja no campo da estratégia, da

inovação, da estética, da forma e também na forma de expressão cotidiana.

A aplicação de marcas, cuja missão é valorizar, resgatar ou preservar a

cidade, é importante para formação da imagem local. Essas ferramentas podem

ser úteis nas ações de conscientização e para demonstrar o posicionamento dos

cidadãos em relação a determinadas questões. Neste caso, o desenvolvimento da

identidade visual é de extrema importância, pois é ela que irá sedimentar valores

intangíveis que possam destacar, valorizar, resgatar ou incentivar ações e

posturas da sociedade que poderão refletir posteriormente na “marca-país”. Para

Gobé (2010, p. 11), “As identidades emocionais ajudam a criar e equilibrar os

estímulos sensoriais e visuais certos que despertam sentimentos nas pessoas”.

Assim, o design é acionado para que a marca provoque sentimentos.

Semprini (2010) aborda a capacidade da marca de adaptar-se, transcender

para assumir uma variedade virtual infinita de conteúdos e discursos. “A marca

torna-se, assim, um dispositivo de alcance geral, um modo de organização e de

gestão da discursividade social” (SEMPRINI, 2010, p. 265).

Um exemplo são as marcas que conectam ideais de afetividade e

comportamentos nos grandes centros ou que representam movimentos urbanos.

Elas são consumidas e reproduzidas entre aqueles indivíduos que depositaram

nessas marcas os seus anseios e desejos e que buscam legitimar os seus ideais.

O próximo capítulo tratará da relação emocional da marca.

Page 53: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

51

4 O DESIGN EMOCIONAL

Pesquisar a identidade de um lugar, cidade ou país é ir além das suas

características físicas e sociais. É buscar o contexto das experiências e

memórias, a percepção dos cidadãos em relação ao seu entorno e,

principalmente, como os cidadãos dialogam afetivamente com esses espaços.

A afetividade simboliza o clima moral que envolve em permanência a relação do indivíduo com o mundo e a ressonância íntima das coisas e dos acontecimentos que a vida quotidiana oferece sobre uma trama descontínua, ambivalente e intangível por conta da complexidade de seu mosaico (BRETON, 2009, p. 113).

O entendimento e a apropriação desses atributos possibilitam ao design

uma interação mais efetiva com o ser humano em sua essência, estimulando as

mais diferenciadas emoções.

4.1 Por uma antropologia das emoções

Para melhor compreender o design emocional, é importante analisar como

se constituem as emoções humanas sob o prisma da antropologia das emoções.

Breton (2009) associa a emoção ao vínculo primordial da inserção do

homem no mundo; todos os acontecimentos e até as decisões mais racionais são

motivadas por sentimentos. A emoção faz parte da construção do indivíduo e da

sociedade desde os tempos remotos. As relações interpessoais, com os objetos,

espaços, cidades, sua cultura, entre outros, estão repletas de experiências e

memórias que são alimentadas por sentimentos mais diversos.

Segundo Lazarus (apud IIDA; BARROS; SARMET, 2008), a emoção já foi

considerada durante um período como um processo desprovido de razão, o que

resultou o posicionamento da emoção em segundo plano como algo prejudicial,

descontrolado. Breton (2009, p. 114) lembra que o “senso comum assimila

facilmente a emoção com a emersão da irracionalidade, com a falta de controle,

com a experiência de uma sensibilidade exacerbada”. Hoje vários autores e

estudiosos da emoção analisam o papel fundamental no desenvolvimento das

relações humanas.

Page 54: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

52

Damásio (2012) investigou pacientes neurológicos que tiveram a área

cerebral responsável pela emoção lesionada. Esses pacientes perderam não

somente a capacidade de sentir emoções como rir ou chorar, mas também a

capacidade de decidir. O autor demonstrou em seu estudo que a capacidade de

tomar decisões racionais está relacionada à capacidade de se emocionar.

Roberts (2005) cita o neurologista Donald Calne, que explica que a emoção leva o

individuo à ação, enquanto a razão leva a conclusões. Tais argumentos

apresentam a ideia de que a razão não existe sem a emoção. E é a inter-relação

entre esses dois elementos que impulsionam o ser humano.

Áreas de estudo como a Antropologia, Psicologia e Sociologia possuem

pesquisas que se dedicam ao entendimento da sociedade sob a ótica da emoção.

A Antropologia das Emoções parte, deste modo, do princípio de que as experiências emocionais singulares, sentidas e vividas por um ator social específico são produtos relacionais entre os indivíduos e a cultura e sociedade. A emoção como objeto analítico das Ciências Sociais pode ser definida, então, como uma teia de sentimentos dirigidos diretamente a outros e causada pela interação com outros em um contexto e situação social e cultural determinados (KOURY, 2005, p. 315).

A emoção faz parte da vida em sociedade e é construída desde o momento

do nascimento. Nos primeiros momentos de vida, o indivíduo é movido por

instintos inatos e aos poucos vai desenvolvendo características que absorve da

convivência com o seu entorno.

As emoções são classificadas por Damásio (2012) em emoções primárias

e emoções secundárias. As emoções primárias são constituídas dos processos

básicos em sentir as reações inatas, instintiva, pré-organizadas, ou seja, os seres

estão programados para reagirem de maneira mecânica, expressando

determinadas emoções quando diante de determinados estímulos, por exemplo,

sentir medo, desejo de fugir ao encontrar um animal ameaçador como um leão.

Já nas emoções secundárias o processo é refletido, advém de experiências

adquiridas, e não inatas, e baseia-se no aprendizado e na interação social. As

emoções nesse estágio são expressas de acordo com a bagagem individual, na

sociedade em que está inserido e em sua cultura.

Segundo estudos realizados por Damásio (2012), as emoções, assim como

a razão, têm as suas origens nos aspectos biológicos e neurobiológicos. Os

processos químicos, hormonais e a dinâmica fisiológica do cérebro respondem

Page 55: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

53

pelas manifestações emocionais. O autor lembra que em várias circunstâncias da

vivência dos atores sociais, as emoções são iniciadas após um movimento mental

de avaliação, que é voluntário. E de acordo com as experiências vivenciadas

existe amplo espectro de estímulos e situações que vão se associar aos

estímulos inatos para causar emoções. Bauman (2001) lembra que o homem,

antes mesmo de começar a articular racionalmente o melhor código de convívio,

já tinha história e costumes vividos por coletividade.

Contudo, se a lembrança das reações emotivas está sempre associada ao contexto de interação que as produziu, já temos o fato de que o sentimento não é sentido de forma abstrata nem independente de interações sociais específicas. Além disso, desde muito cedo o aprendizado da linguagem passa a mediar a experiência, de modo que se torna difícil separar o sentimento de sua percepção e expressão, mesmo que esta aconteça apenas para o próprio indivíduo (REZENDE; COELHO, 2010, p. 31).

Os homens, ao expressarem de maneira instintiva as suas reações e os

seus sentimentos, refletem no seu grupo de convívio comportamentos gerando

códigos, normas e maneiras de viver. Breton (2009) lembra que as manifestações

corporais e afetivas de um indivíduo trazem um significado que irá criar uma

ressonância mútua, a experiência de cada um possui o ponto inicial para a

experiência do grupo. E afirma que analisar as emoções sob o aspecto fisiológico,

reduzindo-as à atividade corporal, seria retirar do homem a consciência e autoria

do que vivencia.

A convicção de que os sentimentos têm uma natureza universal faz parte do senso comum ocidental, que os considera um aspecto da natureza humana marcado pelas ideias de “essência” – no sentido de uma universalidade invariável e de “singularidade” – como algo que provém espontaneamente do íntimo de cada um. Fazer uma “antropologia das emoções” é colocar em xeque essas convicções, tratando-as como “representações” de uma dada sociedade; construir as emoções como um objeto das ciências sociais é inseri-las no rol daquelas dimensões da experiência humana as quais, apesar de concebidas pelo senso comum como “naturais” e “individuais” - a exemplo da sexualidade, do corpo, da saúde e da doença etc. - estão muito longe de serem refratárias à ação da sociedade e da cultura (REZENDE; COELHO, 2010, p. 12).

As normas e maneiras para expressar as emoções mudam de sociedade

para sociedade, por exemplo, sentimentos relativos ao nascimento e à morte, que

fazem parte da vida de qualquer indivíduo, são expressos de formas diferentes no

Page 56: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

54

Ocidente e no Oriente. Cada cultura determina de forma natural as tradições que

ditam essas relações.

No entendimento de Breton (2009, p. 126), “para que um sentimento (ou

emoção) seja experimentado ou exprimido pelo indivíduo ele deve pertencer, de

uma forma ou de outra, ao repertório cultural de seu grupo”. Essas emoções

oferecem várias possibilidades de interpretações para os indivíduos sobre o que

sentem e percebem nas atitudes dos outros. De acordo com o sociólogo alemão

Georg Simmel (apud REZENDE; COELHO, 2010), a sociedade é formada pela

interação entre os indivíduos e essa interação é composta pela forma, ou seja, um

formato de existência, e pela motivação, conteúdo, interesse ou objetivo pelo

qual o indivíduo se envolve na interação: “as emoções são a matérias viva do

fenômeno social, a base que orienta o estilo das relações nutridas pelos

indivíduos, distribuindo os valores e as hierarquias que sustentam a afetividade”

(BRETON, 2009, p. 120).

A expressão do sentimento está diretamente ligada às regras do convívio

social, que acabam por delimitar onde, como e para quem se deve expressá-lo.

Nesse aspecto é importante refletir sobre a questão abordada por Rezende e

Coelho (2010) sobre o público e o privado. Muitos dos sentimentos percebidos de

maneira natural pertencem à ordem do privado e normalmente são verdadeiros,

enquanto os sentimentos expressos no âmbito público podem ser falsos, por

existir, em muitos dos casos, uma tensão entre o sentir e expressar os

sentimentos, que diverge do que é expresso pelo grupo. Nota-se que, para fazer

parte de determinado grupo, o indivíduo submete os seus pensamentos aos

pensamentos do grupo em questão.

4.2 A emoção do consumo

A esfera do consumo ultrapassa a barreira concreta dos produtos, da

utilidade funcional para adentrar o consumo de conceitos, de estilo de vida e de

valores intangíveis que preenchem a vida moderna. Bauman (2008) chama de

“sociedade de consumo” o encontro dos potenciais consumidores com os

potenciais objetos de consumo. De acordo com Martins (2004), a decisão de

compra envolve sentimentos como status, autoestima, poder e realização

Page 57: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

55

pessoal, mesmo as escolhas mais simples, como a escolha da cor de um objeto

de preferência.

Segundo Rezende e Coelho (2010), o consumo das mensagens

propagadas pelos meios de comunicação oferece recursos para os devaneios e

também pode constituir-se numa experiência de prazer. Um ideal de família feliz

encontra-se, para muitos, em um comercial de margarina.

O hedonismo é outro valor também presente nas sociedades ocidentais modernas, existindo em tensão com a tônica da contenção emotiva. A valorização do prazer assume formas diversas nas sociedades ocidentais modernas e se revela com nitidez em práticas de consumo, como as atividades esportivas, de lazer e a relação com a mídia (REZENDE; COELHO, 2010, p. 111).

A busca pelo prazer, pelas sensações é elemento explorado pela mídia

diariamente e tornou-se premissa básica da sociedade de consumo. De acordo

com Bauman (2008), o que mantém essa sociedade é a busca desenfreada pelo

consumo e a busca pela satisfação de desejos despertados. Mas o que sustenta

o processo é a não satisfação plena dos desejos, mas a constante criação de

novas necessidades que deverão ser satisfeitas com novos produtos.

As emoções evocadas estarão sempre na pauta da individualidade, mesmo

quando vivenciadas em grupos, e o consumo no século XXI estrutura-se da

mesma forma. Lipovetsky e Serroy (2012) realçam que a era hipermoderna

corresponde a uma nova fase da era do consumo, marcada pela individualização.

Se nos anos 70 os bens de consumo eram adquiridos para o bem-estar da

família, no momento atual o consumo é estabelecido essencialmente para o

indivíduo. Os indivíduos estão preocupados em adquirir em benefício próprio; as

suas escolhas giram em torno do seu conforto, da sua maneira de viver e da sua

maneira de comportá-las. O mundo do consumo modifica as estruturas de classe,

as marcas de luxo são conhecidas por praticamente todos os grupos sociais. “As

atividades e as paixões transcendem as diferenças sociais, criam “tribos”

transversais e diversificadas” (LIPOVETSKY; SERROY, 2012 p. 57). Consumir

um produto de determinada marca quase sempre faz com que o indivíduo seja

classificado de acordo com os valores dessa marca, criando, assim, tribos de

consumo.

Page 58: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

56

4.3 As teorias do design emocional

Os estudos sobre design emocional são relativamente recentes e

apresentam-se como área teórica que propõe a busca de metodologia, para o

desenvolvimento de produtos ou serviços, que se comunique com os sentidos das

pessoas. O design reconhece a importância dos fatores emocionais desde longa data. Contudo, não existiam instrumentos eficazes para operacionalizar esses fatores na prática do projeto. Assim, os resultados dependiam do talento e esforço de alguns projetistas ou de fatores não sistemáticos. Nos últimos anos, os pesquisadores da área começaram a criar técnicas visando associar certas características do produto com determinadas emoções (IIDA; BARROS; SARMET, 2008, p. 34).

Para Desmet e Hekkert (2009), a compreensão das emoções dos usuários

auxilia o designer a projetar já pensando nos efeitos emocionais que o produto

pode proporcionar. Os autores lembram que as iniciativas de pesquisa sobre a

emoção e design foram promovidas pela necessidade de desenvolver

ferramentas e técnicas que facilitassem a implementação de projetos focados na

emoção.

Nos estudos de Norman (2008) sobre a emoção e design ressalta-se como

alguns objetos evocam emoções positivas como o amor, o apego e a felicidade. E

sugere também que todas as nossas ações estão permeadas por emoções em

muitos casos inconscientes e são elas que guiam os comportamentos. Nos

estudos sobre a emoção realizados em conjunto com os professores Andrew

Ortony e William Revelle, Norman sugere três níveis de estrutura cerebral e faz

um paralelo com o design.

O nível visceral diz respeito à agilidade e a julgamentos rápidos; e o design

nesse nível está relacionado aos aspectos físicos com as formas, os sons e as

texturas, a aparência é o que importa. “O design visceral diz respeito ao impacto

inicial de um produto, à sua aparência, toque e sensação” (NORMAN, 2008, p.

56). Nesse momento visa ao contato primário com o objeto de desejo, o que ele

provoca de maneira imediata.

No nível comportamental observam-se a efetividade do uso e o prazer. O

êxito do produto sob o aspecto da função é avaliado nesse momento. O contato e

Page 59: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

57

a usabilidade do artefato são colocados em prática, ele deve atender a uma

necessidade.

O nível reflexivo apresenta o auge dos sentimentos, das emoções e da

cognição. A experiência e a vivência criam referências que se refletirão na

autoimagem, na satisfação pessoal e nas lembranças. Nesse estágio os

sentimentos são cultivados, são importantes as histórias de interação, as

associações que as pessoas possuem com os objetos e as lembranças evocadas.

Os aspectos de cultura e sociedade são fundamentais na construção da

autoimagem e da memória afetiva dos indivíduos. O nível reflexivo oscilará de

acordo com a cultura, experiência, grau de instrução. As relações são

estruturadas em longo prazo. A construção da identidade está ligada a esse nível.

Norman (2008) lembra que nos níveis visceral e comportamental existe o

afeto, mas sem os julgamentos implementados pela consciência e as

interpretações construídas de acordo com a bagagem de cada indivíduo. É o

processo da atração que desperta de maneira natural os instintos e sensações já

estabelecidas no psiquismo do ser.

Jordan (2000) desenvolveu um modelo de hierarquia das necessidades do

usuário. O modelo proposto coloca no primeiro nível a funcionalidade, o produto

deve atender primeiramente às questões da função. No segundo nível encontra-

se a usabilidade, o consumidor espera que o produto seja fácil de usar. Após

passar por esses dois níveis, o usuário deseja que o produto possa lhe

proporcionar algo mais. O autor refere-se à busca constante do ser humano pelo

prazer, ele não deseja somente ter o produto, mas uma interação com o mesmo.

E o resultado desse prazer com o produto pode ser mensurado nos seus

benefícios emocionais, hedônicos e de uso prático. Jordan (2000) utilizou as

pesquisas do antropólogo Lionel Tiger, que desenvolveu extenso estudo sobre as

questões do prazer, para listar os tipos de prazeres que o usuário busca no

processo de interação com o artefato.

Tiger classifica o prazer em quatro tipos: a) fisiológico; b) social; c)

psicológico; d) ideológico.

a) Prazer fisiológico está relacionado ao corpo e aos sentidos: o tato, o

paladar, o olfato, os sons e a percepção visual e inclui também o prazer

sensual.

Page 60: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

58

b) Prazer social resulta das interações entre indivíduos, as relações homem-

sociedade, o status e a autoimagem.

c) O prazer psicológico está relacionado às reações cognitivas e emocionais.

d) O prazer ideológico possui como base os valores morais, valores culturais,

os gostos pessoais e experiências. É a reflexão sobre a experiência e a

apreciação do entorno.

O conhecimento das emoções auxilia nas metodologias de design, pois

proporciona desenvolvimento de artefatos que dialoguem com os anseios

humanos, sejam eles de ordem primária, que se relacionem diretamente com o

inconsciente pelos aspectos físicos, ou de ordem social, que são construídas pela

organização reflexiva das vivências. Um coador de chá não é um objeto de

destaque, ele não ocupa lugar importante na cozinha, mas ele pode se tornar

interessante, prazeroso e até divertido quando o seu design estimula essa

proposta. Como, por exemplo, o coador de chá Te ò de Stefano Pirovano (FIG. 7),

que se torna divertido em seu processo de uso.

FIGURA 7 - Coador de chá Te ò de Stefano Pirovano

Fonte: www.alessi.com.

Desmet (2003) baseou-se nas teorias sobre as emoções, na universalidade

das suas formas inatas e em suas pesquisas elaborou um “modelo de produtos

emocionais” a partir da denominada Appraisal Theory (avaliação da relação de

Page 61: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

59

significado de um estímulo e sua relevância), para avaliar as reações das pessoas

no processo de uso dos produtos.

O modelo sugerido por Desmet (2003) apresenta quatro parâmetros

principais no processo de elucidar as emoções: a) a avaliação; b)

interesses/objetivos; c) produto; d) emoção (FIG. 8). Os três primeiros parâmetros

e a sua interação vão determinar se um produto provoca uma emoção e, em caso

afirmativo, qual é essa emoção.

FIGURA 8 - Modelo básico de produtos emocionais

Fonte: Desmet (2003).

a) Avaliação - teóricos cognitivos da emoção argumentam que uma emoção

envolve sempre uma avaliação. Ou seja, avalia-se como uma ação pode

prejudicar ou beneficiar uma pessoa. Não se trata de uma avaliação

intelectual, mas de uma resposta automática que o indivíduo produz a partir

do significado de um estímulo.

b) Interesses/objetivos - os interesses ou objetivos dos indivíduos são

considerados pontos relevantes no processo de avaliação. O significado de

um produto para o nosso bem-estar é determinado por um interesse ou

objetivo.

Page 62: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

60

c) Produto - as emoções derivam e envolvem uma relação entre o indivíduo e

um objeto. O estímulo pode ser um evento real ou um evento lembrado ou

imaginado. O estímulo que provoca a emoção não precisa ser

necessariamente o objeto em questão.

d) Emoção - a emoção é o resultado do processo expressa pelo usuário em

questão.

Desmet (2003) acredita que mais importante que conhecer as emoções

que são provocadas por um produto é entender como o produto se relaciona com

os interesses e como os indivíduos assimilam a informação, pois é essa

informação que irá apoiar o designer no desenvolvimento do projeto. Segundo o

autor, a emoção provocada pelo produto pode não estar relacionada ao objeto

propriamente dito, mas ao significado atribuído a ele pelo indivíduo.

Ao invés de suscitar uma emoção única, os produtos podem provocar várias emoções ao mesmo tempo, porque essas emoções são extraídas, não só pela estética do produto, mas também por outros aspectos, como a função do produto, marca, comportamento e associando significados (DESMET, 2003, p. 1, tradução da autora)10.

Entre os aspectos citados por Desmet (2003), a marca ocupa espaço de

destaque, pois ela representa, segundo Norman (2008, p. 81), as experiências

com um produto ou com a empresa: “as marcas têm tudo a ver com emoções”.

4.4 O design emocional e a construção das marcas

Martins (2004) lembra que a humanização das marcas não é uma

novidade. Na década de 1960 o publicitário e pesquisador David Ogilvy detectou,

por meio de pesquisa de mercado, que os consumidores percebiam traços de

personalidade que as identificavam, as marcas eram associadas a modernidade,

elegância, charme, simpatia, entre outros atributos que normalmente associam-se

a pessoas. Ogilvy nomeou as características emocionais da marca de personality

brand.

10 “Rather than eliciting one single emotion, products can elicit multiple emotions simultaneously because these emotions are elicited not only by the product’s aesthetics, but also by other aspects, such as the product’s function, brand, behaviour, and associated meanings” (DESMET, 2003, p.1).

Page 63: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

61

Em muitos casos as empresas não buscam esses valores emocionais.

Conforme Martins (2004), elas estão preocupadas em desenvolver o produto e o

conceito da marca, enquanto o consumidor compreende que o relevante da

marca são as suas características emocionais (FIG. 9). “Toda marca forte tem

uma essência emocional bem definida que gera um estado de realização elevado

no consumidor” (MARTINS, 2004, p. 20). É a imagem atribuída à marca que

constitui o seu valor.

FIGURA 9 - Visão da empresa x visão do consumidor

Fonte: Martins (2004).

Gobé (2010) afirma que as marcas, para satisfazerem as exigências do

consumidor, utilizam as ferramentas e o design, a cultura e a emoção para

destacarem-se de suas concorrentes. Lipovetsky e Serroy (2012) reconhecem o

poder das marcas que se tornaram objeto de discussões, de trocas e de coleções.

As marcas podem organizar uma nova forma de cultura.

Norman (2008, p. 81) também registra o aspecto emocional que as marcas

assumiram: “elas trazem consigo uma reação emocional que nos orienta em

direção a um produto ou nos afasta dele”. Segundo Gobé (2002), as marcas

evoluíram e os valores intangíveis tornaram-se mais importantes que os tangíveis.

Marcas como Coca-Cola, Apple e Nike são exemplos em que os seus valores

intangíveis ultrapassam os valores tangíveis. A Coca-Cola é uma marca

eminentemente emocional, ela não vende somente os seus produtos, mas

também conceitos. Gobé (2002) lembra que somente os produtos ou serviços não

Page 64: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

62

são suficientes para manter ou aumentar os consumidores, mas sim o aspecto

emocional: “Por emocional, quero dizer como uma marca se comunica com os

consumidores no nível dos sentidos e das emoções, como uma marca se aviva

para as pessoas, forjando uma conexão profunda e duradoura” (GOBÉ, 2002, p.

19).

Entrar em relação com as emoções das pessoas é criar laços, conectar

com os seus desejos e necessidades emocionais e para o desenvolvimento de

marcas emocionais é importante o conhecimento de como se organizam as

emoções.

A imagem emocional de uma marca está associada aos relacionamentos

estabelecidos, às motivações projetadas. Costa (2011, p. 85-86) preconiza que

“aprofundar-se na imagem da marca é, como dizíamos no princípio, penetrar no

imaginário social, na Psicologia cotidiana, no mundo pessoal das aspirações das

emoções e dos valores”. As marcas estão presentes nas experiências cotidianas

dos indivíduos, fazendo parte de suas vivências, expectativas e frustrações. O

autor lembra que a marca não é um produto exclusivo do design gráfico, mas de

amplas as disciplinas que estão interligadas na vida social da marca. De acordo

com Gobé (2010), o design humaniza a experiência e melhora a conexão entre

marcas e pessoas, conectando as suas experiências racionais, sociais e

viscerais.

Ainda citando Costa (2011), a marca evoluiu de marca/função a

marca/emoção. A marca deixou o seu papel funcional, de designação de um

produto ou serviço, para assumir aspecto de independência, apresentando

valores que dialogam com os sentimentos humanos. Escolher uma marca é

revelar a própria imagem. “A escolha está ligada à emoção que está no

inconsciente coletivo; quando esse sentimento é alcançado, a imagem da marca

nos transmite a sensação de autenticidade” (MARTINS, 2004, p. 28).

Tavares (1998) lembra que algumas marcas atuais repletas de significados

e valores originaram-se de simples produtos, que na maioria dos casos possuem

um ciclo de vida limitado por diversos fatores. A marca geralmente está

relacionada a gerações, as pessoas adultas costumam preferir as marcas de que

gostavam ou estão vinculadas a essas memórias afetivas da infância. Muitos

produtos são consumidos nessa linha de pensamento, é o sabão em pó que a

mãe usava, o biscoito que marcou a infância. Segundo Norman (2008, p. 68), “o

Page 65: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

63

nosso apego não é realmente com a coisa, é com o relacionamento, com os

significados e sentimentos que a coisa representa”.

Gobé (2002) traça quatro pilares essenciais para a estratégia de

desenvolvimento de marcas emocionais: a) relacionamento; b) experiências

sensoriais; c) imaginação; d) visão.

No pilar do relacionamento deve-se priorizar o respeito. Roberts (2005)

preleciona que o respeito é a estrutura fundamental para um relacionamento

duradouro. É um trabalho que propõe envolvimento dos consumidores, é uma

constante troca, de manter-se em contato, entendê-los.

Aaker (1998) considera a lealdade à marca a essência do brandy equity,

pois perpassa o aspecto do relacionamento marca-indivíduo. Nesse momento

encontram-se pessoas que realmente gostam da marca por vários motivos, sejam

baseadas em um conjunto de experiências ou na qualidade percebida, mas

normalmente a ligação é emocional, a que o autor chama de amizade com a

marca e é um caminho para a confiança que estreita mais esses relacionamentos.

As experiências sensoriais, como o som, as cores, o sabor, o tato e os

aromas, estão ligadas à maneira como os seres humanos interagem com o

mundo e são, em grande parte, mecanismos para despertar emoções.

Os sentidos falam com a mente na língua das emoções, sem palavras. As emoções alertam sobre a importância das descobertas de nossos sentidos, não só para nosso bem-estar, mas na verdade para nossa sobrevivência (ROBERTS, 2005, p. 105).

Expor as pessoas a experiências sensoriais é criar emoções que serão

registradas em sua memória e poderão ser acionadas e revividas a qualquer

momento.

A imaginação cria caminhos para despertar emoções no consumidor,

desde o seu projeto, venda e a relação de consumo. Desenvolver narrativas que

envolvam os indivíduos em um mundo que corresponda e incentive o seu anseio

é um caminho para estimular a emoção. Semprini (2010) localiza o imaginário em

um contexto pós-moderno, como uma ferramenta importante para atingir o

consumo. Segundo Roberts (2005), as histórias sustentam as marcas, a partir

delas se explica o mundo e atribuem-se valores àquilo que se ama. Elas dizem a

Page 66: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

64

respeito do passado, presente e futuro, exploram sonhos, mitos e ícones e

despertam a inspiração.

Semprini (2010) acentua a importância de se estudar a capacidade de a

marca gerar mundos possíveis, com construção de sentido organizado, no qual se

encontram elementos narrativos, fragmentos do imaginário, referências sociais,

elementos arquétipos e qualquer outro elemento que contribua para tornar o

mundo da marca significativo para o destinatário. A visão focaliza a marca no seu

processo de evolução no mercado, renovando e criando ressonância emocional

com o indivíduo.

As cidades são lugares de troca estipulada pela sociedade de consumo,

mas são também lugares de vivências e memórias e sentimentos. Portanto, pode-

se pensar que a imagem da marca de uma cidade é constituída pelos diversos

sentimentos a ela atribuídos pelos seus atores sociais.

Page 67: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

65

“[...]

Uma cidade se assemelha às outras,

porém se a amamos é única:

tem a forma de um coração

traz nosso aroma predileto

é a paina do travesseiro

em que repousa nossa fronte”.

Belo Horizonte bem querer.

Henriqueta Lisboa.

Page 68: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

66

5 UM OLHAR SOBRE BELO HORIZONTE

A memória, que os habitantes de uma cidade constroem cotidianamente ao longo de um determinado espaço-tempo, está relacionada às práticas sociais e às interações por eles vivenciadas. As passagens, os lugares, os pontos de encontro os locais de moradia configuram-se enquanto pontos de referência significativos, tanto em nível individual como em nível coletivo (LEMOS, 2007, p. 94).

5.1 Belo Horizonte 5.1.1 Breve histórico

O percurso histórico de uma cidade incide na sua imagem e identidade

construídas ao longo de sua história. Lemos (2010) sistematiza em cinco períodos

os aspectos históricos, a produção e as mudanças do espaço urbano da cidade.

O primeiro momento é a implantação da moderna cidade planejada pelo

engenheiro Aarão Reis; em seguida, o estabelecimento do projeto e a

composição da paisagem; o empenho em modernizar a capital e as primeiras

legislações de gestão dos espaços; a conturbação do centro e a consequente

expansão; a perda de identidade e os inúmeros processos demolição e renovação

do centro.

Com o advento da Proclamação da República, a população do Curral D’El

Rey motivada pelo Clube Republicano passou a defender a mudança de nome do

arraial. Diferentes nomes foram sugeridos, como Terra Nova, Santa Cruz, Nova

Floresta, Cruzeiro do Sul e Novo Horizonte. “Havia quem achasse que o que

melhor exprimia as características do lugar, com seu belo horizonte, e que

aflorava naturalmente à boca e aos sentimentos de todos os que o visitavam era

Belo Horizonte” (RABÊLO, 2013, p. 44). Mas o nome que acabou prevalecendo

foi Novo Horizonte. O governador do estado, João Pinheiro, aceitou a mudança

de nome, mas considerava o nome escolhido pouco expressivo e ao assinar o

Decreto número 36, de 12 de abril de 1890, foi determinado que o arraial Curral

D’El Rey passasse a denominar-se Arraial Belo Horizonte. Esse nome prevaleceu

até dezembro de 1893, quando foi adotado o nome de “Cidade de Minas” para a

Page 69: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

67

nova capital do estado. Em julho de 1901, voltou a prevalecer oficialmente o nome

de Belo Horizonte.

Belo Horizonte foi a primeira cidade planejada da República e ocupou o

espaço do vilarejo Curral D’El Rey. Aarão Reis foi o engenheiro responsável pela

pesquisa e escolha do melhor local para construir a capital de Minas, que até

então se chamaria “Cidade de Minas”. O plano de transferência da antiga capital colonial para a nova cidade assumiu um papel de destaque, na medida em que tinha como meta a inovação econômica e política, bem como o estimulo à modernização e ao desenvolvimento social (LEMOS, 2010, p. 24).

Várias cidades e regiões mais ricas e importantes economicamente que o

arraial disputaram a nova sede da capital. No entanto, o que foi importante para a

escolha da região foi a sua posição geográfica central, o que permitiria a ligação

entre as regiões do estado e a qualidade do seu clima, além da beleza natural.

A história da capital começa com a desapropriação dos moradores do

Curral D’El Rey, que foram removidos para lugares mais distantes. Para se

construir uma nova capital nos moldes desejados era necessária a demolição da

vila, que possuía características rurais que não condiziam com a nova proposta.

Lemos (2010) esclarece que os interventores Aarão Reis e posteriormente

Francisco Bicalho agiram como “higienistas sociais”. A nova capital foi inspirada

nos modelos urbanísticos de Washington de L’Enfant e na Paris de Haussmann.

O projeto inicial de Aarão Reis (FIG. 10) organizava a cidade em três

zonas: urbana, suburbana e agrícola. A hierarquização funcional da cidade

identificou uma discriminação social, “já que os operários e emigrantes sem

posses foram deslocados para a zona suburbana nos vetores norte e leste do

aglomerado” (LEMOS, 2010, p. 28).

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68

FIGURA 10 – Planta geral de Belo Horizonte 1895

Fonte: http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/.

A Cidade de Minas foi inaugurada em 12 de dezembro de 1897 e o poder

administrativo do estado foi transferido de Ouro Preto para a atual capital. A

cidade não estava completamente construída, somente existiam alguns prédios

para que a entrega se efetuasse no prazo. A construção da cidade delongou-se

ainda pela primeira década do século XX.

A cidade nesse período apresentava a imagem simbólica da ruptura com o

passado monárquico e representava o início de uma nova era. Com uma proposta

moderna, o projeto começou a ser estabelecido.

O projeto foi ao mesmo tempo moderno e conservador. Moderno pelas linhas urbanísticas e arquitetônicas, que colocaram a nova capital na vanguarda das mais inovadoras do mundo. E conservador, por manter inalterados os padrões de segregação e exclusão social dominante nos velhos centros urbanos. Para alguns historiadores, trata-se de um fenômeno de “modernização conservadora” (RABÊLO, 2013, p. 52).

Belo Horizonte sempre buscou uma imagem de cidade moderna, voltada

para o futuro, mas a formação da sua população e a maneira como ela foi

estruturada mantinha o perfil conservador, portanto, até nos dias atuais essa

dualidade é sentida por seus moradores que desejam uma cidade moderna, mas

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69

mantêm em seu cotidiano hábitos conservadores, enraizado nas tradições e na

sua mineiridade.

5.1.2 Belo Horizonte: uma construção afetiva

Lemos (2007, p. 95) sublinha que Belo Horizonte “não apresentou nos seus

primeiros anos uma consciência de cidade, visto que só a partir de um processo

de uso o viver no lugar seria erigido”. Uma cidade não é resultado somente de

planejamento urbano, da construção literal de suas ruas e avenidas para um

povoamento posterior, mas ela é essencialmente construída pelos atores que em

seu cotidiano vivem e preenchem os seus espaços socais, econômicos e

culturais.

Belo Horizonte nasceu como uma cidade de múltiplos sotaques. Milhares de imigrantes procedentes de várias partes do mundo – engenheiros, arquitetos, artistas, empresários e trabalhadores braçais – aqui chegaram para participar da construção da nova capital de Minas (RABÊLO, 2013, p. 200).

Os primeiros moradores da cidade planejada não tinham uma relação

efetiva e emocional com a cidade, pois em sua grande maioria eram nascidos em

outros lugares e vieram para a capital por uma imposição do estado. Portanto,

não possuíam laços com a cidade. Lemos (2010) cita que os dirigentes públicos

mandaram construir na Praça da Liberdade uma réplica do Pico do Itacolomi de

Ouro Preto para diminuir a saudade da terra natal (FIG. 11).

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70

FIGURA 11 – Praça da Liberdade, 1905

Fonte: curraldelrei.blogspot.com.

No entanto, existiram também aqueles que aqui chegaram e adotaram a

cidade como lar. Gomes (2011, p. 49) relata que Abílio Barreto, diamantinense

por nascimento, olhava para Belo Horizonte com “olhos enamorados”. Gomes

ainda cita a frase de Abílio Barreto: “amo Belo Horizonte com o mesmo

enternecido amor que dedico ao meu torrão natal – Diamantina”. Abílio Barreto foi

o pioneiro e personalidade fundamental para a preservação da memória histórica

da cidade ao escrever e publicar livros e documentos importantes.

5.1.3 Belo Horizonte: entre construções e desconstruções

A história de Belo Horizonte foi também marcada por demolições, com a

premissa do futuro e do progresso, construir e demolir até os anos de 1980 era

uma ação recorrente na capital mineira.

De acordo com Gomes (2011), já nas décadas iniciais da capital, o plano

original da cidade foi desconsiderado. Prédios construídos foram

sistematicamente demolidos, adulterados. O que ficou da história do arraial foi

somente a Igreja da Boa Viagem, que foi demolida para a construção da nova

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71

catedral em 1920. Rabêlo (2013) lembra que no período de 1921 a 1940 a cidade

passou por um período de crescimento.

Em 1922 comemorou-se o Centenário da Independência. A praça entre o

cruzamento entre a av. Afonso Pena e a av. Amazonas passou a se chamar

Praça Sete de Setembro e em 1924 o obelisco, conhecido por “Pirulito”, foi um

presente da cidade vizinha, Betim (FIG. 12). Em 1962 o obelisco foi retirado da

praça para ser abandonado em um lote próximo do Museu Abílio Barreto. Em

1963 foi transferido para a Praça da Savassi (FIG. 13). Após mobilização popular

o obelisco voltou, em 1980, para o seu local original. A praça tornou-se símbolo

de encontro e de manifestações das mais diversas.

FIGURA 12 – Praça Sete, 1927

Fonte: http://vejabh.abril.com.br.

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72

FIGURA 13 – Praça da Savassi, 1970

Fonte: acervo de João Góes (http://www.nasavassi.com.br.).

No final da década de 1930, iniciou-se na cidade um ciclo de construções

de prédios, os “arranha-céus”, reforçando a premissa de olhar para o futuro, para

o progresso (CHACHAM, 1996).

Nesse mesmo período, a vista panorâmica, que sempre provocou fascínio

na cidade, recebeu mais atenção daqueles que divulgavam a ideia do progresso

da cidade, a imagem da cidade começou a ser pautada, discutida. Detectou-se

uma preocupação com a aparência física, a cidade não possuía uma imagem que

a definisse.

Chacham (1996, p. 213) reporta que “certas imagens devem ser

preservadas. Ou eternizadas. Reinventadas. É o caso da ideia de cidade-jardim

ou cidade-vergel, possivelmente uma das mais duradouras ou pelo menos mais

revividas de que se tem notícias”. O termo Cidade Jardim foi durante anos

sinônimo de Belo Horizonte, que ficou conhecida pelo verde das ruas, praças e

jardins (FIG. 14). Essa imagem foi relativamente descontruída com o passar do

tempo. Nos anos de 1960 os fícus da av. Afonso Pena foram cortados para

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73

executarem-se as obras de expansão da avenida. As árvores cederam o seu

espaço para a expansão de ruas e avenidas.

FIGURA 14 – Av. Afonso Pena, 1948

Fonte: http://bhnostalgia.blogspot.com.br.

Os anos de 1940 e 1950 marcaram o processo de modernização. Novos

edifícios foram construídos. O conjunto arquitetônico da Pampulha é um marco

desse período, projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer. É a consolidação da

expansão da cidade além do perímetro urbano, assim como a Cidade Industrial.

Segundo Lemos (2007), a partir dos anos de 1960 a região da Savassi começou a

disputar o domínio do comércio e das atividades culturais.

O complexo da Pampulha, como salienta Rabêlo (2013), colocou Belo

Horizonte na vanguarda da arquitetura nacional e tornou-se uma das referências

da cidade. E a Igreja da Pampulha tornou-se um dos símbolos mais utilizados

para representar a cidade.

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74

Na década de 1960 continuou o crescimento populacional e econômico da

cidade e suas extremidades, que culminou na década seguinte na elevação de

Belo Horizonte à região metropolitana.

Entretanto, foi no final dessa década que se iniciou um período de

esvaziamento do centro da cidade. De acordo com Jayme e Trevisan (2012) e

Lemos (2010), esse processo foi resultante da transferência de moradias da

classe média para outras regiões, demolição de edifícios, redução de espaços

públicos e do surgimento de outras centralidades. A cidade tornou-se um lugar de

passagem.

As décadas de 1980 e 1990 foram marcadas por longos períodos de

estagnação econômica e recessão. Uma série de eventos marcou esse período,

descaracterizando espaços urbanos importantes como a Igreja São José, a

demolição do Cine Metrópole em 1982 e o avanço da extração de minério sobre a

Serra do Curral.

Nesse período, “Belo Horizonte vivenciava o dilema de ser e conservar-se

moderna. Destruir e construir como forma de não se expor à classificação do

passado e seus estilos, seus tempos, seus costumes” (MIRANDA, 2007, p. 76,

77). Porém foi nesse período que se começou a articular movimentos que

reivindicaram a cidade.

A partir do final dos anos 1980 e início dos 1990, o centro torna a ser valorizado, agora por sua importância histórica, mobilizando agentes públicos e sociedade civil na elaboração de projetos de requalificação urbana – com a restauração dos edifícios e das ruas – para que a região seja (re)apropriada pela população (JAYME; TREVISAN, 2012, p. 360).

Era necessário lutar pela preservação do patrimônio e da memória afetiva

da cidade.

5.2 Anos 1970/1980: as primeiras mobilizações

Para Kowarick (1986, p. 1), os movimentos urbanos começaram a ganhar destaque de pesquisa a partir dos anos de 1980. “Nele estão embutidas questões teóricas extremamente complexas, entre as quais o caráter das lutas (de classe) por eles desenvolvidas, suas (des)articulações com partidos políticos ou seus antagonismos com relação ao Estado”.

Page 77: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

75

Em Belo Horizonte, diversos movimentos surgiram a partir dos anos de

1970 e começaram a questionar as ações empreendidas pelo poder público e a

lutar pela preservação da memória e da identidade da cidade.

A partir desse período, Rabelo (2013) evidencia que se iniciou uma

participação ativa dos cidadãos e de vários órgãos, como o Instituto dos

Arquitetos do Brasil (IAB) de Minas Gerais, Associação Mineira de Defesa do

Meio Ambiente (AMDA); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), Instituto

Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG), entre

outros. Entretanto, Miranda (2007) destaca nesse processo dois estudantes de

Arquitetura, Ricardo Samuel de Lana e Manfredo Alves de Souzanetto.

Em 1969, o avanço da Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) sobre a

Serra do Curral foi um dos mais sérios atentados contra o meio ambiente. Rabêlo

(2013, p. 189) documenta que a serra era “símbolo de Belo Horizonte, sua

barreira natural reguladora do clima, segundo já observara Aarão Reis em seu

relatório com o projeto da nova capital”.

Na década de 1970 o adesivo “Olhe Bem as Montanhas” (FIG. 15), criado

pelo estudante e hoje artista plástico Manfredo Alves de Souzanetto, usando a

frase de um dos poemas de Carlos Drummond de Andrade, circulou nos carros da

cidade. Miranda (2007, p. 97) atesta que “o material instigava à reflexão por uma

consciência preservacionista pioneira em Belo Horizonte, que correlacionava meio

ambiente e patrimônio”.

FIGURA 15 – Adesivo “Olhe bem as montanhas”

Fonte: http://kgcbh.blogspot.com.br

Outra mobilização que ganhou destaque foi o resgate da Praça da Estação

que, segundo Miranda (2007), está relacionada à memória da cidade, pois foi

durante décadas o lugar da partida e da chegada, era o eixo funcional da cidade.

Estava relacionada a espaço de lazer e de prestígio.

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76

Em 1981, o IAB-MG informalmente tomou a iniciativa de realizar o I

Encontro pela Revitalização da Praça da Estação. O evento propôs o debate

sobre a importância da praça como identidade da cidade.

I Encontro pela Revitalização da Praça da Estação constitui-se em um marco da inclusão da participação social nas ações preservacionistas e da imposição do ideal cultural sobre o conceito de monumentalidade; que guardava relação direta com o caráter de excepcionalidade do patrimônio e que era difundido pelos órgãos oficiais de preservação. Assim sendo, ergue-se a região da Praça da Estação, formada por um primoroso conjunto em estilo eclético, ao status de patrimônio cultural municipal e, por conseguinte, à categoria de bem passível de preservação; por constituir-se em uma referência simbólica fundamentalmente ligada à identidade e memória dos belo-horizontinos (MIRANDA, 2007, p. 225).

Para e divulgar e auxiliar financeiramente a iniciativa, a arquiteta Liana

Valle, na época estudante de Arquitetura, desenvolveu cartaz e camiseta (FIG.

16). O desenvolvimento desse material contribuiu para a propagação da

mobilização entre a população.

FIGURA 16 - Cartaz e camiseta do “I Encontro pela Revitalização da Praça da

Estação”

Fonte: Miranda (2007).

Em entrevista cedida a Miranda (2007), Liana Valle fala da repercussão do

material.

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77

Era muito estudante que comprava. Ou quem achava bonito. Como a camiseta ficou bonita (na época o pessoal achava), então todo mundo queria. E depois que as pessoas, quem não era arquiteto ficava sabendo da briga, aí é que queria mesmo a camiseta. [...] Essa coisa da camiseta é uma vertente muito pop do movimento. Isso uniu todo mundo. Foi o grande negócio. Não ficou aquela coisa acadêmica de ficar discutindo lá em cima, aquela chatura. A gente não tinha esse perfil (VALLE apud MIRANDA, 2007).

Miranda declara que o material contagiou e envolveu a população na

causa. O IAB-MG apostou na mobilização social como maneira de pressionar o

poder público a reconhecer o direito à cidadania, à memória, valorizando o seu

patrimônio tangível e intangível.

Um dos resultados dessa mobilização em prol da cidade foi a aprovação,

em 6 de julho de 1984, da Lei número 3.802 (que surgiu em decorrência da

criação da Lei Orgânica Municipal), que organizou a proteção do patrimônio

cultural do município e, mediante seu artigo número 28, criou o Conselho

Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município.

A partir desses movimentos observa-se o uso do design. Mesmo sendo

realizado por não designers, ele cumpre o papel de ser elemento que identifica a

causa e mobiliza os indivíduos. Em ambos os casos a repercussão do movimento

ganhou notoriedade e assimilação da população que, a princípio, desconhecia a

proposta.

5.3 Belo Horizonte: uma cidade centenária

O foco desta pesquisa não é refletir sobre as marcas criadas pelo poder

público que normalmente atendem ao interesse de um mandato, no entanto, a

data de um centenário possui valor simbólico expressivo.

Par comemorar essa data, a Prefeitura de Belo Horizonte durante três

mandatos empreendeu ações de revitalização. Segundo Lemos (2010), no

momento em que a cidade aproximou-se da comemoração do seu centenário, o

poder público assumiu a responsabilidade de preparar a capital e propôs a

revitalização da sua área tradicional. O processo iniciou-se com a revitalização da

Praça da Liberdade e a transferência da Feira de Artes e Artesanato para a

Avenida Afonso Pena.

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78

Também foi lançada uma campanha para tornar essa data memorável.

Investiu-se em campanhas publicitárias para construir e/ou fortalecer um

sentimento de pertencimento e para tal foi lançada a marca BH100 (FIG. 17).

FIGURA 17 – Marca comemorativa dos 100 anos

Fonte http://www.mixbh.com.br

O calendário de eventos foi dividido em três temas que tinham por objetivo

resgatar a memória da cidade. Sentia-se a necessidade de preservar a memória,

eventos que pretendiam inserir a imagem da cidade no cenário internacional e

eventos de participação popular, para gerar a interação entre a cidade e cidadãos.

Segundo Silva e França (1998), a população participou dos acontecimentos, mas

não o associava à comemoração do centenário, mesmo com investimentos

massivos em mídia.

Mas apesar de todo o esforço, “o centenário não abriu outro momento da

vivência da cidade, não se estabeleceu uma outra rotina” (SILVA; FRANÇA, 1998,

p. 435). Segundo as autoras, o não pronunciamento do cidadão a respeito do

centenário estava preenchido de outros sentidos. O discurso convocava a

participação dos cidadãos de maneira ativa, ao mesmo tempo em que era

imposto um calendário de eventos. Retoma-se aqui a discussão de que a imagem

de uma cidade não pode ser imposta, O poder público deve proporcionar

condições favoráveis para a construção desse lugar, mas a consolidação dessa

marca advém da conscientização plena de seus cidadãos.

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5.3.1 Significado, emoção e referências de Belo Horizonte 5.3.1.1 Pesquisa 01 - Qualitativa

Essa etapa do projeto objetivou identificar alguns significados e emoções

que a cidade desperta e possíveis locais de referência da cidade. Para isso, foi

estruturado um questionário (APÊNDICE A) conciso com três perguntas

abordando o assunto pertinente. Utilizaram-se plataformas virtuais para

publicação e armazenamento de dados. Foram realizados 215 questionários

respondidos virtualmente. A divulgação da pesquisa foi feita por e-mail e via rede

social, no período de maio/2013 a dezembro/2013.

01 - Escreva uma palavra que expresse o significado de Belo Horizonte. 02 - Qual é a emoção que a cidade de Belo Horizonte desperta em você?

Nas respostas das questões 01 e 02 observou-se que muitas palavras

utilizadas para expressar o significado também são usadas para expressar a

emoção que a cidade desperta. Esse aspecto ressalta a intensidade que algumas

ideias possuem, elas se tornam uníssonas. A emoção e o que a cidade significa

para a maioria são uma coisa só.

Assim, as respostas das questões 01 e 02 foram analisadas em conjunto.

As palavras foram reunidas em grupos que apresentavam conceitos-chave em

comum (FIG. 18).

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FIGURA 18 - Infográfico dos conceitos-chave

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

FIGURA 19 – Ícone “pertencer”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

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81

Pertencer (FIG. 19): as palavras que foram enquadradas nesse conceito

são: lar (22)11, casa (19), família (3), pertencimento (2), minha, porto, ovo,

moradia origem, berço, afinidade, familiaridade.

Quando são atribuídos esses significados à cidade, compreende-se

inicialmente a relação que a cidade natal ou a cidade escolhida para morar

desperta em seus cidadãos. Mas a palavra lar especificamente remete ao

sentimento de harmonia, que geralmente está relacionado a afeto. Casa já é mais

abrangente, é lugar de habitação, moradia, mas mesmo assim é expresso de

forma carinhosa, não é simplesmente o lugar onde mora, conforme se observa

nas falas a seguir:

Não há lugar como a casa da gente.

Carinho pela minha cidade natal.

Faz parte de mim.

Sabe aquela sensação quando você chega em casa? Sensação de estar no melhor lugar do mundo. No seu canto. Mais ou menos isso. O meu lugar (Entrevistados on-line, 2013)..

FIGURA 20 – Ícone “acolher”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Acolher (FIG. 20): aconchego (23), acolhimento (15), tranquilidade (5),

hospitalidade, conforto (5), confiança (2), paz (4), segurança, quietude, equilíbrio.

Palavras como aconchego e acolhimento também são citadas em ambas

as questões. Elas representam o conceito de sentir-se bem, de uma cidade que

acolhe os cidadãos e faz sentir-se em casa aqueles que por aqui chegam.

11 Refere-se ao número de vezes que a palavra foi citada.

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Tranquilidade em uma cidade grande.

A emoção de sempre me sentir acolhida.

Aconchego. Tipo estar em casa.

Muuuuuito amor, acolhimento, carinho.

Mesmo sendo uma metrópole, me sinto bem onde quer que eu vá! É meu lar. De modo geral as pessoas são receptivas, acho que isso causa esta sensação de aconchego e proximidade (Entrevistados on-line, 2013).

FIGURA 21 – Ícone “memória”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Memória (FIG. 21): saudade (8), história, momentos, cotidiano, passado,

nostalgia (3).

Destacam-se as memórias e vivências que derivam das experiências

diárias, do cotidiano. A nostalgia e o saudosismo fazem parte das memórias,

expressam uma busca por algo que ficou no passado, uma experiência; e a

cidade como lugar de registro:

Lembrança da Infância, sentimento de transição de passado e futuro.

Lembrança e saudade.

Memórias, passado, história pessoa (Entrevistados on-line, 2013).

Page 85: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

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FIGURA 22 – Ícone “natureza”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Natureza (FIG. 22): montanhas (8), natureza (2), belo horizonte, relevo, o

nascente e o belo poente, céu, horizonte calmo, belo e tranquilo, cidade jardim,

luminosidade, horizonte, manhã, saudável, frio, calor, beleza (9), magnífica, linda

(3), charme, maravilhosa, serenidade e especial.

A beleza da cidade expressa em sua natureza ainda é citada como

significado da cidade. Suas montanhas e o belo horizonte, que foram os

motivadores do nome da cidade e de codinomes como “Cidade Jardim”,

continuam despertando emoções:

O belíssimo horizonte me desperta uma paz indescritível! Eu amo BH!

BH desperta a emoção de uma capital com traçados marcados pela beleza da natureza e ousadia do ser humano.

Aconchego pela segurança transmitida pelas montanhas e beleza dos ipês (Entrevistados on-line, 2013).

FIGURA 23 - Ícone “afeto”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

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Afeto (FIG. 23): amizade (7), alegria (24), vida (5), amor (9), felicidade

(12), carinho (7), paixão (2), encantamento (3), admiração, afeto, felicidade, união,

orgulho (2), satisfação (3), proximidade, cordialidade.

Nesse conceito destacam-se sentimentos que remetem a uma cidade

alegre, que desperta sentimentos de amor, felicidade e vida:

Profundo amor pela cidade Alegria de ser belo-horizontino Uma emoção no qual sei descrever, é um sentimento maravilhoso. Orgulho (Entrevistados on-line, 2013).

FIGURA 24 - Ícone “futuro”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Futuro (FIG. 24): modernismo, referência, metrópole (2), oportunidade (3),

progresso, trabalho e dignidade e exemplo, esperança (2), liberdade (5),

realização, eclética (2), pluralidade, multifacetado, diversidade, além, transição,

mudança.

O anseio de cidade moderna sempre fez parte da cidade e continua

fazendo parte das percepções dos cidadãos.

Inquietude, vontade de continuar avançando.

A emoção que BH me desperta é de uma cidade que está se modernizando e caminhando rumo ao progresso e ao desenvolvimento para ser uma cidade melhor pra se viver nos próximos 116 anos (Entrevistados on-line, 2013).

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FIGURA 25 – Ícone “Minas”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Minas (FIG. 25): capital, tradição (5), conservadora. roça grande (2),

interior urbano, a minha roça grande, roça, nem interior nem cidade grande. Em Belo Horizonte encontra-se a busca pelo moderno, mas sem perder o

seu ar de interior, das tradições de Minas. Para os entrevistados ainda é possível

sentir o sossego morando na capital.

Mineiridade sofisticada.

A tradição de cidade do interior do jeito mineiro de ser, de preservar os costumes de pessoas reservadas e conservadoras.

Belo Horizonte é uma cidade grande, mas que sentimos bem pequena. Por onde andamos encontramos pessoas conhecidas, muito fácil este encontro com as pessoas.

BH me desperta momentos que vivi nela, desde a infância até agora, onde cada parte da cidade são marcados por eles. Gosto dessa cidade por ter cara de cidade grande e ser pequena (pelo fato de encontrar pessoas que conheço onde quer que eu for). E também por preservar a parte "mineirinha" numa cidade que evolui e se torna tecnológica (Entrevistados on-line, 2013).

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FIGURA 26 – Ícone “agito”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Agito (FIG. 26): movimento (4), mundo (2), curiosidade, diversão, prazer,

agitação, boemia, bate-papo, botecos, bares (2), Galo, Cruzeiro e Natal.

O termo “agitada” reflete tanto o cotidiano de uma metrópole como também

o sentido de vida cultural e social agitada, movimentada.

BH me dá a melhor sensação, é um amor que não cabe no coração. É a cidade que me faz sentir como casa, quando você sobe a serra e vê aquele horizonte lindo, você quer abraçar a cidade toda ao mesmo tempo. Por ela você quer lutar, fica brava na rua, e te doi ver bagunçada. É parte de você e você é parte dela... E fechando, é como aquela música, Bondosa!

Eventos culturais constantes com um belo horizonte para a alma, em meio às montanhas da vida (Entrevistados on-line, 2013).

Apresenta também uma dicotomia entre sossego e agitação, tranquilidade

e estresse, roça e metrópole. Mas também exibe sentimentos dúbios:

Não me traz conforto nem paz, é inquietude e ansiedade. Mas desperta ainda curiosidade, vontade de abraçá-la como cidade, descobrir o regozijo e as compensações necessárias!

Belo Horizonte é um cenário de contemporaneidade, ao mesmo tempo de uma historia construída e desconstruída a cada instante. Espaço de conflitos de poder, espaço de correlação de forças (Entrevistados on-line, 2013).

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FIGURA 27 - Ícone “estresse”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Estresse (FIG. 27): tumultuada, panela de pressão, caos, correria, trânsito,

loucura, confusão, indefinição e inteligível, estresse, complicada.

FIGURA 28 – Ícone “estagnada”

Fonte: dados da pesquisa/ elaborada pela autora.

Estagnada (FIG. 28): provinciana, roça (2), descontentamento, atraso,

introspectiva, ex-belo horizonte, suja, decepção, “jeguice”, ilusão, feia e suja,

desespero (2), monotonia, melancolia, desconforto, nenhuma (2), tédio, sensação

de mundo pequeno, tristeza (3), preguiça (4), incerteza, não muito satisfatória,

medo, solidão (2).

Os significados e emoções negativas são questões presentes nas

metrópoles, ao mesmo tempo aparecendo termos que relacionam a cidade a

estagnação, monotonia.

O termo “roça” é usado tanto para expressar o sentimento de lugar

tranquilo, proximidade, tradições:

Page 90: design emocional, place branding e a marca de Belo Horizonte

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Eu nasci nesta cidade e ela tem uma coisa de roça, por mais que cresça, ainda se cumprimenta nas ruas dos bairros, ainda existe aquela coisa de tomar um cafezinho com pão de queijo com a família. Nossos costumes ainda são interioranos nas comidas, nos adornos das casas. Ainda temos os desfiles dos congados nas ruas... os padeiros que passam nas ruas, o som da catraca dos vendedores de biju. E as montanhas dão um ar de liberdade que poucas cidades ainda oferecem. [...] Gosto dessa cidade por ter cara de cidade grande e ser pequena (pelo fato de encontrar pessoas que conheço onde quer que eu for). (Entrevistado, 2013, grifo nosso).

E para outros a mesma palavra possui a conotação de um lugar que parou

no tempo, estagnado:

Uma palavra é pouco: Roça Grande. Tem as limitações de uma roça.

Um pouco de vergonha (pelas "tradições mineiras").

Tristeza: pela falta de educação daqueles que deveriam fazer deste lugar uma cidade, no seu sentido originário.

Frustração por ter a necessidade de ser um exemplo não cumprido. (Entrevistados on-line, 2013)

É interessante observar que as resposta que abrangem aspectos negativos

são bem menores que as positivas. Isso não que dizer que a cidade não os tenha,

mas que os positivos sobrepõem-se aos negativos em relação a significados e

emoções.

03 - Qual é a sua referência sobre Belo Horizonte?

Sobre essa questão obteve-se a resposta representada na FIG. 29:

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FIGURA 29 - Gráfico de algumas referências de Belo Horizonte

Nos 10% que responderam outros, 21 pessoas escolheu lugares diversos

na cidade conforme gráfico FIG 30:

FIGURA 30 - Gráfico de outras referências de Belo Horizonte

Fonte: elaborado pela autora.

Fonte: elaborado pela autora.

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De acordo com as respostas, a Praça da Liberdade e o conjunto

arquitetônico da Pampulha foram os mais citados como referência da cidade. Mas

vários lugares foram mencionados. Verifica-se uma diversidade de respostas,

principalmente na opção “outros”, que apresenta de forma mais clara como o

conceito de referência dos cidadãos está diretamente ligado a vivências e

experiências de cada pessoa. As respostas vão de um conceito mais abstrato “o

horizonte recortado” até as avenidas e bairros da cidade, não ficando circunscrito

somente aos marcos geralmente citados.

Uma das entrevistadas enviou e-mail com uma observação que explicita

esse fato.

Só uma observação: na questão dos lugares, para mim foi interessante porque percebi que o lugar muda de acordo com a fase da vida e interesses do momento. Apesar de ter respondido Praça da Liberdade, a Lagoa da Pampulha é hoje para mim uma grande referencia e faz três anos que virou um lugar afetivo muito importante (Entrevista por e-mail).

O significado e a emoção de Belo Horizonte, juntamente com os lugares,

são elementos efêmeros que mudam de acordo com a sociedade que atua

diretamente na construção dessas referências.

5.4 A retomada: anos 2010...

Blumer (1939) propõe que o comportamento coletivo refere-se a uma

atitude relativamente espontânea, não estruturada e que um número de

indivíduos age influenciando ou sendo influenciado por outros indivíduos.

Na atualidade têm crescido em todo o país os chamados coletivos urbanos,

que são movimentos sociais que utilizam como principal instrumento de

mobilização a internet e principalmente as rede sociais. Segundo Machado

(2007), o que articula tais coletivos são os conflitos, relações, processos políticos

e sociais que acontecem na sociedade e que influenciam o cotidiano dos atores

sociais. Os agenciamentos para a mudança social ocorrem sob novos contornos, nos quais interação, intenção, conexão, identidade e ação desempenham papéis cada vez mais fundamentais, fazendo com que os atores sociais tenham uma extensão e influência cada vez maiores, criando um ambiente propício à emergência de novas formas de ação coletiva (MACHADO, 2007, p. 279).

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Os coletivos urbanos geralmente não possuem algum tipo de hierarquia,

são compostos de voluntários que buscam defender seus ideais de forma criativa,

a partir de intervenções e apropriações e convidam a população para participar e

transformar a cidade.

A partir de 2010 vários movimentos reapareceram para resgatar a

cidadania e o seu direito à cidade. Pode-se classificá-los em duas linhas:

Os movimentos articulam-se com argumentos políticos em seus ideais,

convocando a população para lutar pelo seu direito à cidade, pela preservação do

patrimônio da história e memória da cidade e também pelo seu direito de uso.

Entre eles destaca-se o Movimento Praia da Estação, iniciado em 2010 como

uma forma de protesto ao Decreto-Lei número 13.798 de dezembro de 2009, que

proibia o uso da Praça da Estação pelo poder público municipal. A população foi

convocada para ocupar a praça e exercer o seu direito de uso do espaço. A

proposta foi usar os encontros para discutir questões pertinentes sobre a cidade.

Em um dos encontros da Praia da Estação surgiu a ideia de se criar um

espaço comum para artes e oficinas e que fosse aberto à população. Assim

surgiu o Movimento Espaço Comum Luiz Estrela, que se iniciou com a ocupação

do antigo casarão em ruínas da rua Manaus no bairro Santa Efigênia.

O Movimento Fica-ficus: Por uma BH mais verde 2013 articulou-se em

protesto contra a poda das árvores centenárias de Belo Horizonte, que fazem

parte de praças e avenidas como a av. Barbacena, Praça da Boa Viagem, av.

Bernardo Monteiro e região hospitalar. Infestadas pela mosca branca, a Prefeitura

optou pela poda em vez de tratar as árvores.

O Movimento Salve Santa Tereza (1996) luta pela preservação do bairro

Santa Tereza, que é considerado uma Área de Diretrizes Especiais (ADE).

O Movimento Verticalização da Pampulha NÃO (2010) objetiva a

preservação da região da Pampulha.

O Movimento Lagoinha Viva (2013) tem o intuito de revitalização

urbanística e cultural da região. A Lagoinha passou por uma série de demolições

e descaracterização e a mais recente luta começou em oposição à construção do

centro administrativo municipal, que era uma das ações previstas nas obras do

Projeto Nova BH. Esse projeto foi aprovado em março de 2014 e prevê uma

operação urbana consorciada com a construção e requalificação de diversos

pontos da cidade.

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Uma segunda linha são os movimentos urbanos, que se intitulam de

Coletivos, que se apropriam dos espaços públicos, envolvem a população com

temas de gentileza em torno de uma cidade melhor para viver, como, por

exemplo: Desestressa BH, Coletivo Gentileza, Engenheiros da Alegria, Imagina

na Copa, Faz Bem, Feira Grátis da Gratidão BH, We Love, entre outros. Na

próxima seção reproduzem-se as entrevistas de alguns participantes de coletivos

e analisa-se sua ação.

5.5 Coletivos em Belo Horizonte

5.5.1 Coletivo Gentileza

As reflexões sobre o coletivo iniciaram-se em 2011, quando GR (designer)

fez um curso de Coolhunting e tendência de comportamento e a partir desse

momento nasceu o desejo de fazer algo que mudasse o entorno. GR uniu-se a

mais duas amigas, T e L, que também possuíam o mesmo ideal para empreender

a iniciativa.

Vamos fazer alguma coisa... Aqui a gente resolveu, como tinha algo que nos chateava muito que era a forma como as pessoas relacionavam com a cidade e com o outro aqui em BH, que é o local onde a gente mora, que a gente resolveu criar o coletivo (Entrevistada GR, 2014).

Segundo GR, hoje existem vários grupos que utilizam o termo coletivo, mas

na época não existiam tantos. Para o início das atividades foi criada uma página

em uma rede social e estudos de caso e o lema de trabalho foi traçado no ideal

do grupo “A mudança que a gente quer para o mundo começa com as

microrrevoluções ‘nossas’ de cada dia.”

O coletivo começou a pensar ações que tinham Belo Horizonte como palco.

Segundo GR, uma das coisas que mais incomodam o grupo é a falta de cuidado

com a cidade, a correria do dia-a-dia que torna os indivíduos cada vez mais

individualistas. E para construir algo diferente o coletivo optou por realizar ações,

intervenções urbanas, divulgar informações e projetos que instiguem as pessoas;

e a gentileza foi escolhida como o agente desse processo.

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FIGURA 31 – Logotipo coletivo gentileza

Fonte: álbum Coletivo Gentileza: facebook.

A ideia é falar com o máximo de pessoas e a estratégia é não repetir muito

os lugares onde a ação já aconteceu.

A primeira ação do Coletivo foi realizada durante a Primeira Feira Grátis

Gratidão em BH na Praça Floriano Peixoto. A proposta era dar algo para as

pessoas e também receber algo, que não era necessariamente material. Nesse

projeto a ideia foi trocar 100 mudas por sonhos de uma Belo Horizonte melhor

(FIG. 32). A proposta seria o seguinte: a gente daria para pessoa a muda, mas em troca a gente queria que elas refletissem como é a cidade que elas gostariam de morar. A gente reclama tanto que BH é isso, BH é aquilo, mas como seria BH ideal para mim? Não sabíamos o que ia acontecer, então a troca seria essa: nos damos a muda e vocês dão o sonho para nós. Nós achamos que o sonho é algo muito importante, pessoal (Entrevistada GR, 2014).

As mudas foram distribuídas em aproximadamente duas horas. Teve

repercussão na mídia e em blogs.

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FIGURA 32 – Ação “Mudas por sonhos”

Fonte: álbum Coletivo Gentileza: facebook.

Os sonhos escritos pelas pessoas deixaram o grupo impressionado, tinha

desde ideais políticos até poesias. Segundo GR, as pessoas escreviam histórias,

coisas que elas sentiam, o que passavam em suas vidas. Eram pessoas de todas

as classes sociais, do mais simples ao mais abastado. Perfis e culturas diferentes

também.

Dos sonhos escritos foram escolhidos alguns e foram convidados alguns

designers para interpretar e ilustrar o material (FIG. 33 e 34), transformando-os

em wallpapers, fundo de tela de computador, tablet, celular e foi chamado na

página de gentileza para baixar. O material foi disponibilizado na fanpage do

Coletivo para o download.

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FIGURA 33 – Sonho interpretado por MN, designer gráfico

Fonte: álbum Coletivo Gentileza: facebook.

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FIGURA 34 – Sonho interpretado por IT, designer gráfico

Fonte: álbum Coletivo Gentileza - facebook.

5.5.2 Design

Segundo GR, o papel do design não é institucionalizado, ou seja, não é

articulado de forma consciente. Entretanto, ele está presente em todo o processo,

desde a concepção até a sua execução. Toda a experiência é pensada. São

levantados questionamentos e possíveis soluções, como, por exemplo: como a

gente gostaria que a pessoa se sentisse? Qual é o tipo de reflexão que

desejamos promover? A gente quer que as pessoas saiam dali e aconteçam o

que com elas? Será que a gente pode tocar a pessoa para ela fazer a diferença

em algum outro lugar?

Os detalhes também são pensados, os layouts, embalagens, as

mensagens. “É a gentileza do detalhe de fazer algo que é legal, é bonito, que é

legal para outro, então a gente pensa nas embalagens, pensa em tudo da forma

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mais bonita possível, o jeito de escrever as mensagens” (GR, 2014). O design é

usado como um encantamento, uma forma de tocar a pessoa, mostrar que houve

cuidado com ela, como sensibilização.

As redes sociais são utilizadas para divulgar as ações de gentileza. A

ferramenta de Storytelling12 (FIG. 35) é usada para narrar tudo o que foi feito. As

ações são registradas por fotos, para quem não esteve presente acompanhar a

história em detalhes, buscando passar as sensações.

FIGURA 35 – Storytelling “Ação sonhos por mudas”

Fonte: álbum Coletivo Gentileza - facebook.

Segundo GR, no ano passado foram realizadas algumas ações, como, por

exemplo, a Frutificando Gentileza. A ação aconteceu na Praça Duque de Caxias e

ofereceu maçã, mexerica e melancia para quem passava. A ideia era que as

pessoas devolvessem as sementes das frutas e deixassem uma mensagem

escrita sobre o que se poderia fazer para semear um mundo melhor. Em parceria

com o Laboratório, estudar o coletivo realizou a ação “Adocica”, que tinha como

objetivo conscientizar os motoristas no trânsito. Nessa ação foram distribuídas

balas para os motoristas como forma de aliviar o estresse. O coletivo participou

também do Museu do Instante na Praça da Liberdade, com a ação Bombas de

12 Storylelling - que está relacionada a uma narrativa e significa a capacidade de contar histórias relevantes.

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Semente (FIG. 36). As sementes foram coletadas na ação, frutificando gentileza.

As sementes foram envolvidas em argila e compostos orgânicos apropriados para

a germinação.

FIGURA 36 – Embalagens das bombas de sementes

Fonte: álbum Coletivo Gentileza - facebook.

Em 2013, mesmo com a realização dessas ações, o foco maior ficou na

internet. A pretensão em 2014 é realizar mais ações e usar o virtual como forma

de replicar e desdobrar ações, para a pessoa lembrar diariamente.

5.5.3 Coletivo Gentileza & cidade

Ações são realizadas em lugar público, em diferentes praças. É uma forma

de quem acompanha o coletivo ir a diferentes lugares, vivenciando a cidade.

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São momento de ir e ver, como é legal você ir para uma praça, acontece um evento, depois você limpa, o pessoal participa, se envolve. Acho que hoje, as pessoas... não sei se é porque eu estou no meio dessas pessoas que vivem a cidade, mas de um ano para cá, eu estou impressionada. Tá muito legal aqui em BH, tá todo mundo realmente, participando, usando e usufruindo, mas quando a gente começou era muito triste de não ver as pessoas, elas não faziam nada, as pessoas não aproveitavam nada, a gente queria criar oportunidade para aproveitar esse espaços, igual tem na Europa, que as pessoas fazem coisas. Nós tentamos criar essas oportunidades. Você começa a gostar mais da cidade. [...] Vivenciar a cidade é isso, a gente mostra uma possibilidade que a pessoa pode ver e querer replicar, fazer, sair, curtir o espaço (Entrevistada GR, 2014)

Qual a imagem que você tem de BH hoje?

A imagem que eu tenho hoje é bem diferente de um ano atrás, hoje eu vejo assim: Belo Horizonte como uma cidade que as pessoas gostam dela, que tem muito espaço para ser usufruído, que antes as pessoas não aproveitavam e hoje elas estão descobrindo, igual ao carnaval, as pessoas indo para a rua, o espaço é organizado pelas próprias pessoas, não tem uma mão da prefeitura. As pessoas estão querendo, muitas pessoas ficaram em BH para curtir os bloquinhos. Nossa BH está mudando. Belo Horizonte agora está se tornando a cidade que eu gostaria de morar. Que cidade que você gostaria de morar, eu queria morar na cidade que as pessoas gostam, eu só via as pessoas reclamando Belo Horizonte não tem nada, São Paulo é que tem isso e isso. Ou então não era tão boa quanto São Paulo no que diz a respeito de uma cidade grande e não tão boa quanto uma cidade do interior quando você quer falar em qualidade de vida. Então ficava ali no meio. Eu não acho. Eu já tive oportunidade de morar em São Paulo e eu não quis, porque eu quero estar em BH, é a cidade que eu nasci, que me afinizo, que tem as pessoas que eu gosto e a cidade que eu quero morar, então eu tenho que fazer alguma coisa por essa cidade. Para ela ser o que eu realmente espero, se tiver alguma coisa que eu não goste. Então eu vejo as pessoas fazendo isso, hoje eu vejo que é uma cidade agradável culturalmente, é onde as pessoas estão valorizando e tem muita coisa, tem tanta praça, tanto parque, tem tanta cultura, tem tanta gente que mexe com teatro, com dança, com música, o que falta, ou faltava era isso de ir para rua mesmo, de ser mais acessível, de aparecer (Entrevistada GR, 2014).

Que emoção a cidade lhe transmite?

É o aconchego para uma cidade, é aquela coisa de se sentir em casa, ela tem essa carinho do interior, apesar de ser uma cidade grande. Quando eu imagino Belo Horizonte, uma foto de um momento de Belo Horizonte, é, por exemplo, um sábado à tarde... numa pracinha, aquela coisa gostosa, eu vejo assim... é um aconchego... (Entrevistada GR, 2014).

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5.5.4 Desestressa BH

O Desestressa BH começou de maneira despretensiosa em 2010. Dois

amigos, JF (publicitária e designer) e AS (publicitário), incomodados com a vida

estressada da cidade, ônibus, trânsito decidiram tocar e cantar dentro dos ônibus

da cidade. O fato chamou muito a atenção das pessoas, que apresentaram

receptividade para a ação. E a partir de então a dupla começou a repetir a ação

com mais freqüência. Logo depois, começaram a realizar dinâmicas com os

passageiros, do tipo de olhar e sorrir para o seu vizinho.

FIGURA 37 – Logotipo do coletivo “Desestressa BH”

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

Após esse início, o coletivo passou por uma transformação. Começou com

duas pessoas, algumas começaram a seguir o movimento em suas ações e foram

convidados a constituírem uma equipe de conselheiros, que hoje conta com

aproximadamente 20 pessoas. Essa equipe é responsável por articular o

movimento em projetos diferentes, dando mais dinamismo.

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FIGURA 38 – Banner explicativo do conceito de coletivo

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

Algumas pessoas que deixaram o movimento em determinado momento

deram início a uma iniciativa própria, agindo como um agente multiplicador da

ideia. Cita-se como exemplo o Coletivo Faz Bem, que realiza essas mesmas

ações de cidadania em outras regiões.

O coletivo acredita na prática da gentileza, da boa convivência e no

princípio do amor, no contexto da vida conturbada da cidade (FIG. 39). Assim, o

coletivo tem atraído também o interesse da imprensa é já foi assunto de jornais,

revistas e blogs.

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FIGURA 39 – Banner “Vem ser feliz em BH”

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

Com a ideia de promover uma quebra na vida agitada dos cidadãos de

Belo Horizonte, o Desestressa BH desenvolveu outras ações, como o Natal na

Praça Sete, Faça um amigo hoje, Ação do dia dos namorados e o Piquenique do

amor, que já está sua quarta edição.

O coletivo realiza várias ações na Praça Sete. A escolha do local é

motivada por caracterizar o coração da cidade, o lugar onde centenas de

desconhecidos se cruzam a todo o instante. A escolha da Praça Sete tem o intuito

de propor uma quebra no ritmo dos transeuntes, fazer as pessoas pararem por

alguns instantes.

A Praça Sete é o coração da cidade, é o centro da cidade, é o lugar daquela cena de filme de abrir o sinal e as pessoas se cruzarem, tem uma carga fortíssima, social, histórica é tudo ali, e ao mesmo tempo as pessoas passam reto, elas estão de passagem. É o símbolo de correria, do olhando para o chão, com medo da bolsa, uma frieza. As pessoas do batente, que têm hora, vão bater ponto em algum lugar (Entrevistada JF, 2014).

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A ação de Natal é divulgada em rede social e qualquer pessoa interessada

pode participar. A partir de um passo-a-passo as pessoas interessadas são

instruídas sobre como funciona a ação (FIG. 40). As pessoas são convidadas a

comprar um presente e encontrarem-se nas proximidades da praça. E cada um

escolhe uma pessoa para presentear no meio da multidão. A ação acontece na

Praça Sete. O grupo se mistura no meio das pessoas e em dado momento é feito

um sinal e os participantes abordam e presenteiam os transeuntes, quebrando o

ritmo da cidade.

FIGURA 40 – Divulgação e passo a passo da ação de natal

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

O Piquenique do Amor é uma ação que acontece em praças ou parques da

cidade e convida a população a ter um momento tranquilo, de descanso, de

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socialização e cultura. Durante o evento sempre é realizada alguma intervenção

cultural, teatro, música.

O primeiro aconteceu na Praça do Papa, no dia da comemoração do dia

dos trabalhadores em 2013. O segundo aconteceu no dia 15 de agosto de 2013

no Parque Mangabeiras e reuniu aproximadamente 1.000 pessoas. A terceira

edição aconteceu na Praça do Papa no dia 14 de dezembro de 2013 e a quarta

edição no Parque das Mangabeiras em 06 de abril de 2014 (FIG. 41).

FIGURA 41 – Chamadas para piquenique

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

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FIGURA 42 – Mapa de localização do parque do evento

Fonte: álbum Desestressa BH - facebook.

5.5.4.1 Design

O design faz parte de todo o processo, como prática, mesmo não sendo o

seu uso formalizado. O grupo possui em sua formação diversos profissionais de

design, o que viabiliza, mesmo que intuitivamente, a sua prática.

O planejamento das ações em seus detalhes, a concepção do material

visual de divulgação (FIG. 42) na fanpage. Produção de botons com o logotipo do

coletivo, frases sobre o conceito do grupo (FIG. 43) são vendidos para ajudar nas

despesas básicas.

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FIGURA 43 – Botons “Desestressa BH”

Fonte: foto de Ricardo Lobato: álbum Desestressa BH - facebook.

5.5.4.2 Desestressa BH & cidade

Não tenho um conceito muito fechado, está em processo de construção, eu vejo a cidade em ebulição, vejo as pessoas muito ouriçadas, [...] envolvida, pessoas envolvidas em vários pontos distintos, que no final viram a mesma coisa, grande assim... O pessoal da música, o pessoal do Fora, Lacerda! Pessoal engajado, das artes, diversas ações de cidadania, está todo mundo nessa ânsia de colocar essa cidade em seu grau máximo de atividade, de ocupação e de respirar essa cidade.

Eu vejo que estamos no início ainda, não só de ocupação, de apropriação dela, mas de construção artística, de pensamento, de algo engajado. É como se nós fizemos parte de algo muito grande, mas que só vamos dar conta disso daqui muitos anos.

É uma explosão de tudo, de envolvimento social, de engajamento, de reflexão, discussão da cidade, de si mesmo, do outro, da arte, da música, do design, de tudo assim. Parece ser uma nova onda que está vindo, e está muito no início ainda. É um momento importante para cidade, é bom fica bem atento (Entrevistada JF, 2014).

Que emoção a cidade lhe transmite?

Belo Horizonte não é a minha cidade natal, mas é o meu lugar. Um dia escutei uma pessoa dizendo que o lugar da gente é o lugar que a gente escolhe, e o meu coração escolheu BH. A minha identificação é tão grande, que eu não nasci nela, mas ela me pertence, com se eu estivesse nascido. É um muito grande a emoção, o amor que essa cidade me causa (Entrevistadada JF, 2014).

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5.5.5 O “Ponto do Livro”

O Ponto do Livro é uma ação dos coletivos Desestressa BH, We Love e

Feira Grátis da Gratidão e foi inspirado no projeto paulista Parada do Ônibus, das

designers paulistas Helena Aranha e Helena Nabuco.

FIGURA 44 – Proposta da ação “Ponto do Livro”

Fonte: álbum Ponto do Livro - facebook.

A proposta é incentivar a leitura e a gentileza enquanto o cidadão espera

ônibus. O ponto está presente inicialmente em dois pontos de ônibus da Praça da

Liberdade, mas a intenção é lançar outros pontos pela cidade (FIG. 45). Os livros

são colocados em um display de plástico que fica fixo no ponto de ônibus. As

pessoas podem pegar livros para ler e doar espontaneamente. Os coletivos que

empreenderam a ação fazem a manutenção do ponto. Não existe algum tipo de

controle de quem pega ou deixa livro. É uma biblioteca pública e aberta.

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FIGURA 45 – “Ponto do Livro” Praça da Liberdade

Fonte: álbum Ponto do Livro - facebook.

Para esclarecer a proposta e o funcionamento do Ponto de Livro (FIG. 46),

um passo-a-passo foi elaborado com todas as etapas, além de incentivar a ação.

Em todos os pontos tem o passo-a-passo fixado.

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FIGURA 46 – Passo a passo da ação “Ponto do Livro”

Fonte: álbum Ponto do Livro - facebook.

5.5.6 Projeto “Imagina na praça”

O projeto Imagina na Praça é uma das missões que a estudante de design

Brenda Maia deve cumprir na cidade. Brenda faz parte do projeto nacional

Imagina na Copa, que surgiu em 2013 com a proposta de ressignificar o

recorrente comentário “se não está legal agora, imagina na copa”.

O objetivo é que até junho 2014 os jovens ressignifiquem a Copa do Mundo

como um marco dos jovens, transformando a sua cidade. Com esse intuito foram

realizadas oficinas com vários “capitães” pelo Brasil, que são jovens que têm a

tarefa de realizar as missões em suas cidades.

Para atingir o seu objetivo, o projeto foi dividido em três aspectos: ouvindo

história de pessoas que transformam a cidade, produzindo pequenos

documentários e exibindo-os em um canal de vídeo; promovendo oficinas para

preparar os jovens “capitães” para transformarem a sua cidade; e, por último, são

as missões para apropriar do espaço público.

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Os capitães devem cumprir as missões em suas cidades. Brenda uniu-se a

seu colega Paulon e criou o Imagina na Praça, para cumprir as missões; Imagina

na Faixa, Leve este Livro e Lancha comigo? (FIG. 47).

FIGURA 47 – Missões “Imagina na copa”

Fonte: http://imaginanacopa.com.br/missoes.

Para cumprir a missão a ação contou com o apoio da Charrete Net, que

passou por Belo Horizonte em abril. A Charrete Net é um projeto idealizado e

realizado pelo professor Gastão da Cunha Frota, da Universidade Federal de

Uberlândia, que tem como proposta levar a diversas localidades conhecimento,

interação, utilizando as ferramentas de comunicação virtual e as redes sociais.

O local escolhido, uma praça na região da Lagoinha, é um local

marginalizado, em que as pessoas passam correndo por medo da violência ou

por pressa mesmo.

A proposta não foi muito divulgada nas redes sociais, pois o objetivo era

atingir as pessoas que transitam nessa região vindo e indo para o metrô, os

moradores de ruas e usuários de drogas. A ação foi realizada no dia 4 de abril de

2014 e não reuniu muitas pessoas. O público que se beneficiou dessa ação foram

principalmente as crianças carentes que perambulam pela região (FIG. 48).

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FIGURA 48 – Ação “Imagina na praça” e “Charrete Net”

Fonte: álbum da Charretenet/facebook.

5.5.6.1 Design

O design está presente na forma de comunicar. O processo é pensado e

articulado de acordo com o seu público. O material gráfico é produzido de forma

clara e repassado para os capitães em forma de “gabaritos” para serem utilizados.

Existem as camisas, bottons, imãs de geladeira, adesivos, tudo muito

colorido, cada missão tem o seu material específico.

A iniciativa não tem fins lucrativos, mas tem fim nas pessoas, tudo é

pensado estrategicamente. No site Imagina na Copa comprovam-se o uso do

financiamento coletivo e o apoio de várias empresas que auxiliam o projeto a

acontecer.

5.5.6.2 Imagem de Belo Horizonte

A ideia que eu tinha antes que a cidade era ali dentro da avenida do Contorno, mas a cidade é muito grande, muito pouco explorada. Tem muita história legal em volta, lugares diferentes, lugares que a gente tem medo de ir, na Pedreira, no aglomerado Santa Lúcia, no Barreiro, a

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cidade é enorme e a gente conhece muito pouco. É muito lindo quando vemos praça cheia de gente (Entrevistada BM, 2014).

Que emoção a cidade lhe transmite?

Eu gosto muito de Belo Horizonte, eu gosto muito de andar. Eu fui no Rio de Janeiro esse dias, lá é lindo, mas não é aqui. Aqui é... não sei... eu sempre andei aqui, a minha vida inteira eu andei aqui, quando eu tiver um filho quero andar em Belo Horizonte com ele. Eu me sinto em casa, não tenho medo de ir ao centro, não tenho medo de andar na cidade, é a minha cidade. Quando todo mundo está na rua não é perigoso, então se todo mundo estivesse sempre ia ser muito legal. Aí dá vontade de falar com todo mundo, vamos, não tenha medo, vamos lá... Vamos usar a cidade, vamos parar de ficar em casa, a cidade é nossa. Se você não usa vem alguém e usa do jeito que ela quer, enquanto tiver gente é de todo mundo (Entrevistada BM, 2014).

5.5.7 Análise dos coletivos

O Desestressa BH, o Coletivo Gentileza e a missão Imagina na Praça

surgiram a partir de situações que incomodavam os seus idealizadores: estresse

urbano, trânsito caótico, falta de cuidado com a cidade, individualismo e medo.

Esses fatores foram mencionados na primeira pergunta desta pesquisa

como negativos. Entretanto, esses grupos foram em busca de soluções. E a

solução encontrada por todos foi a mobilização social, propondo ações que

inserissem as pessoas em outras experiências.

Percebe-se nesses movimentos o desejo latente de mudança, motivado

por sentimentos de pertencimento, e o desejo de construir e usufruir de uma

cidade melhor. E para alcançar o objetivo, esses movimentos articulam-se de

maneira horizontal e têm a criatividade como uma das principais ferramentas de

convocação para a causa defendida. Para tanto, o design está presente em todo

o processo. Para a articulação das propostas são utilizadas as ferramentas de

design, mesmo que não seja de forma institucionalizada, conforme as

entrevistadas revelam.

Tanto Desestressa BH como o Coletivo Gentileza possuem profissionais de

design em sua composição, mas dizem que não pensaram em design para

projetar e realizar os seus projetos, embora o design esteja presente em todas as

ações: na divulgação, nas informações usadas nas redes sociais, em todo o

processo de envolvimento. Gobé (2010) nomeia esse processo de pensamento

estratégico que traz à tona o “designer interior”. Já o Imagina na Copa, que possui

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113

uma proposta de âmbito nacional, deixa claro o pensamento estratégico do

design, assim o uso das ferramentas em todo o processo.

Em todos os coletivos existe associação emocional com a marca, seja um

piquenique no parque, usufruindo do ambiente, do convívio social com outras

pessoas e de momentos de cultura; seja a ação do Natal na Praça Sete ou livro

disponível no Ponto do Livro. A marca do Desestressa está associada a

momentos lúdicos, de tranquilidade ou de pausa que ficam registrados na

memória de quem os partilha, seja nos sonhos de uma cidade melhor registrados

pelo Coletivo Gentileza que foram transformados em expressões gráficas ou nas

bombas de semente que prometem mais verde para a cidade. Os coletivos provocam emoções nas pessoas que entram em contato com as suas propostas e podem ser transferidas para a cidade. Segundo Lefebvre (2006, p. 103), “o ser humano tem necessidade de ver, ouvir, tocar e degustar e a necessidade de reunir essas percepções num “mundo”. Essa reflexão do autor remete às necessidades sociais do ser humano que são inerentes à sociedade urbana. A proposta desses coletivos relaciona-se às teorias do design emocional propostas pelos autores Jordan (2000) e Norman (2008), que no primeiro nível relatam sobre aspecto fisiológico ou visceral e evocam o contato inicial, as primeiras sensações e estão relacionadas ao corpo. No segundo nível, comportamental ou prazer social é resultante das interações, o uso. E, por último, as teorias apresentam o prazer psicológico e ideológico que no nível reflexivo abrangem os aspectos emocionais, as experiências, valores morais e culturais. Assim, observa-se o design proporcionando condições para o alcance do

objetivo de levar momentos de tranquilidade, de gentileza para os cidadãos e,

sobretudo, proporcionam a apropriação dos espaços públicos, praças, ruas e

parques. Esses coletivos mostram para a população o direito à cidade, o direito

de uso, a apropriação do espaço público, transformando-os em lugares de

vivência.

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114

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Belo Horizonte foi considerada, em vários momentos de sua história, a

cidade sem memória, a cidade do tédio, era usual escutar a frase “em Belo

Horizonte não tem nada para fazer”. A partir desta pesquisa registra-se um

movimento emergindo de seus cidadãos que desejam retomar a cidade. A

vanguarda das décadas de 1970-1980 apresentou o caminho da mobilização, do

questionamento. E a geração dos anos 2000 está resgatando esse processo e

indo para as ruas. É uma apropriação legitimada pelo desejo de ter uma cidade

melhor, com histórias e vivências para contar.

Observam-se nos casos estudados o exercício do pertencimento, a

exposição do afeto sentido pela cidade. Isso não faz fechar os olhos para

questões que emergem nos grandes centros, trânsito caótico, estresse, violência

entre outros. Mas no meio dessa turbulência, alguém chega com o propósito de

quebrar o ritmo, de propor algo diferente e é bem aceito.

Outros sonham com as praças estrangeiras que as pessoas usam,

divertem-se e decidem ocupar a praça que está vazia e o inesperado acontece,

pessoas de diferentes classes e culturas misturam-se e interagem, trocam

experiência, perdem a vergonha de estar ali, de sentar e usufruir.

Nesse contexto, Lefebvre (2006) apresenta como um das definições de

cidade. Portanto, propomos aqui uma primeira definição da cidade como sendo projeção da sociedade sobre um local, isto é, não apenas sobre o lugar sensível como também sobre o plano específico, percebido e concebido pelo pensamento, que determina a cidade e o urbano (LEFEBVRE, 2006, p. 56).

Assim, é construído o sentido de cidade, a sua imagem vem sendo

articulada, os sentidos de lar, lugar acolhedor, aconchegante. Os sentimentos são

explicitados em movimentos diversos. O design apresenta-se como uma

ferramenta importante para que esses acontecimentos nesses encontros e

discussões sobre a cidade tornem-se lugares de expressão dos sentimentos.

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115

E o design é o facilitador desses processos, pois se transforma em

instrumento para dar visualidade a indignações, manifestos e declarações que

homenageiam e questionam a cidade e o viver a cidade.

Assim, estrutura-se a participação efetiva da população em construir a

cidade, construir a imagem da sua marca. A marca Belo Horizonte não se

expressa em um logotipo, mas nos vários logotipos que marcam esse momento

de mudança no modo de perceber e sentir e usar a cidade. Belo Horizonte não se

expressa por um único símbolo, mas por vários que são referências na história de

cada cidadão e na memória afetiva, criando laços, experiências e histórias.

No período carnavalesco, era comum as pessoas saírem da cidade

deixando-a à mercê de si mesma, esquecida, vazia. Nos últimos anos, esse

quadro começou a mudar. No carnaval 2014 apresentou-se um cenário diferente,

com sentido de legitimação de uso. Sem qualquer interferência ou organização do

poder público, surgiram blocos de vários pontos da cidade, alguns engajados com

os movimentos aqui citados, outros envolvidos no clima festivo. As avenidas e

ruas do centro e de bairros foram apropriadas, na cidade há muito não se exercia

esse uso pleno de suas ruas. O carnaval de BH está sendo chamado de carnaval

politizado, cujas letras de suas marchinhas chamam a atenção para as questões

políticas que precisam ser refletidas, e o seus cidadãos estão percebendo isso.

Pode-se dizer que essa construção está ainda nos primeiros passos, a imagem

da marca está em processo, sendo construída por diversas outras que

representam os movimentos urbanos, os coletivos. É place branding gestado

pelos cidadãos que faz a cidade acontecer.

Lefebvre (2006, p. 116) lembra que “o direito à cidade não pode ser concebido como um simples direito de visita ou de retorno às cidades tradicionais. Só pode ser formulado como direito à vida urbana, transformada, renovada”. Sabe-se que entre as pessoas comuns que têm participado dos movimentos urbanos talvez ainda voltem para sua vida rotineira, mas percebe-se um movimento de mudança imprimindo-se aos poucos nas pessoas, a partir do momento em que as praças da cidade estão mais movimentadas independentemente de naquele momento existir alguma atividade promovida por outrem. É uma transformação que só poderá ser constatada ao longo dos anos, mas pode-se dizer que o processo de mudança já esta a caminho.

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116

E considerando-se que a marca da cidade está em plena construção por

seus atores sociais, o assunto ainda merece ser analisado na linha dos

movimentos que se articulam politicamente, ocupando e questionando as

soluções do poder público que se articula principalmente no consumo da cidade

como produto, o lugar de troca.

O place branding gestado pelo cidadão é um dos caminhos para a

consolidação de uma marca que possui uma imagem que reflete uma cidade para

o cidadão, não somente com o sentido de troca, mas principalmente no seu

sentido de uso. Hoje Belo Horizonte apresenta-se com um lar, uma casa em

construção por seus cidadãos, que expressam os seus sentimentos que propõem

mobilizações por amor à cidade.

Assim, pensando nesse momento, propomos um logotipo que ilustra a

capa deste trabalho que reflete nossa percepção desse atual momento de Belo

Horizonte, sem pretensões de ser a marca da cidade, mas como reflexo das

imagens captadas pela presente pesquisa.

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APÊNDICE Apêndice A – O que significa BH para você?

7/23/2014 O que significa BH para você? - Google Forms

https://docs.google.com/forms/d/1rVG-RQsz5oJlooOI0tAnxTNie6fnrN_hC3ymAR7GQrA/edit 1/1

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O  que  significa  BH  para  você?*  Required

1.   1  –  Escreva  uma  palavra  que  expresse  o  significado  de  Belo  Horizonte?  *  

 

 

 

 

2.   2  –  Qual  é  a  emoção  que  a  cidade  de  Belo  Horizonte  desperta  em  você?  *  

 

 

 

 

3.   3  –  Qual  é  a  sua  referência  de  Belo  Horizonte?  *Mark  only  one  oval.

 a)  Praça  sete

 b)  Conjunto  Arquitetônico  da  Pampulha

 c)  Mineirão

 d)  Praça  da  Liberdade

 e)  Serra  do  Curral

 f)  Viaduto  Santa  Tereza

 g)  Praça  do  Papa

 h)  Praça  da  Estação

 Other: