Direito Civil e Neoconstitucionalismo

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    Estatuto epistemolgico do Direito Civilcontemporneo na tradio de Civil Law

    em face do neoconstitucionalismoe dos princpios1

    Otavio Luiz Rodrigues Junior*

    resum: O Direito Civil clssico, na tradio de civil law,recebeu crticas por supostos compromissos com a inter-pretao jurdica alheia a valores e a elementos sociais. Oneoconstitucionalismo, a perda de dignidade da legislao e aexpanso exagerada dos princpios so elementos que colocamem debate a autonomia e o estatuto epistemolgico do DireitoCivil. A diferenciao especca de funes e a impossibilidadede aplicao pura e simples de princpios de Direito Pblicodevem ser tomados em considerao na leitura do Direito Civilcontemporneo.

    Palavas-chave: Princpios. Contratos. Casamento. Diviso defunes. Ativismo.

    1Estudo desenvolvido como atividade de estgio ps-doutoral em DireitoConstitucional na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, soborientao do Professor catedrtico Jorge Miranda.

    *Professor Adjunto de Direito Civil da Universidade Federal Fluminense. Ps-doutorando em Direito Constitucional pela Universidade Clssica de Lisboa. Doutorem Direito Civil pela Universidade de So Paulo. Advogado da Unio. Assessor deMinistro do Supremo Tribunal Federal.E-mail: [email protected].

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    1 INTRODUO

    A contempornea tradio jurdica de civil lawassenta-seem duas signicativas inuncias: uma de matriz francesa, coma Revoluo de 1789; e outra, de matriz alem, com a EscolaHistrica, cujo maior expoente foi Friedrich Karl [baro] vonSavigny, e, posteriormente, com o movimento pandectista.2Essasduas foras, que deram perl e feio ao que se entende hojepor civil law, desenvolveram-se paralelamente no sculo XIX e

    geraram consequncias bastante simtricas e, mesmo quando sedistanciaram, foram complementares.

    Se o positivismo exegtico uma contribuio francesa,no se pode negar aos alemes a fora dos conceitos jurdicoscomo categorias centrais do sistema sobre o qual se organizam oscurrculos acadmicos e se estrutura o pensamento dos juristas athoje, a exemplo do negcio jurdico, da obrigao e do contrato.3Seos historicistas lutaram contra a introduo do modelo francs deCdigo Civil na Alemanha, como no se permite esquecer a famosapolmica Savigny-Thibaut,4os pandectistas transformaram seus

    2MERRYMAN, John Henry; PREZ-PERDOMO, Rogelio.A tradio dacivil law:uma introduo aos sistemas jurdicos da Europa e da Amrica, p. 39-44, 97-104.

    3A despeito de todos os ataques a esse eixo da tradio jurdica de civil law, notvel seu sucesso at os dias atuais em obras doutrinrias de base, nos maisdiferentes pases. Veja-se, por exemplo, a recente publicao alem de Direito dasObrigaes de Jan Dirk Harke,Allgemeines Schuldrecht(Heidelberg: Springer,

    2010). Na abertura do livro, o autor adverte que, a despeito das sucessivasmudanas no Direito Civil, especialmente com a Lei de Modernizao do Direitodas Obrigaes, ainda possvel encontrar grandes simetrias com a tradioromanista clssica (p. 3). Se observado o sumrio da obra, essa assertiva conrmada pela conservao de categorias como relaes obrigacionais, deveresprestacionais ou resoluo obrigacional. Na dogmtica francesa contempornea,no Direito dos Contratos, por exemplo, ainda se toma o velho Code de 1804 comoroteiro para a exposio das matrias, como se pode ver do sumrio do livro deFrdric Leclerc,Droit des contrats spciaux(Paris: LGDJ, 2007).

    4Cf. SAVIGNY, Friedrich Karl von.De la vocacin de nuestro siglo para lalegislacion y la ciencia del derecho. Traduo do alemo por Adolfo G. Posada.Buenos Aires: Heliasta, 1977.

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    esforos de resgate do Direito Romano nas bases doBrgerliches

    Gesetzbuch(BGB) de 1896, em vigor desde 1900.A racionalidade, a estrutura e os princpios da tradio de

    civil law, em geral, e do Direito Civil, em particular, so tributriosdessa notvel influncia franco-germnica. As contestaes aessa tradio, porm, so hoje maiores do que nunca. John HenryMerryman e Rogelio Prez-Perdomo demonstram o impacto denovos movimentos, como o neoconstitucionalismo, a crtica teoriada separao de poderes e o ativismo judicial sobre as guas at ento

    tranquilas da centralidade do Direito Privado e doself restraint dosmagistrados, submetidos ao paradigma da legalidade.5

    No caso brasileiro, essas so as trs foras mais evidentesnesse processo de derruio dos antigos alicerces de nossa tradiojurdica. H, todavia, outros movimentos, como o realismo jurdico,oLaw and Economicse as teorias da argumentao. No DireitoConstitucional e no Direito Privado, os dois ltimos movimentosso mais fortemente sentidos. Comea-se a usar conceitos e

    ferramentas tpicas da anlise econmica do Direito e a se falarem ponderao ou sopesamento de princpios e valores, bem aogosto, respectivamente, dos escritos de Richard Posner e RobertAlexy. Experimentam-se, nesse cenrio, situaes de desagradvelsincretismo metodolgico, importao e apropriao inadequadasde conceitos e de categorias, tudo em nome de argumentaesgrandiloquentes, que, muita vez, escondem falcias, jogos depalavras ou vazios de fundamentao. A esse respeito, teve-se

    a oportunidade de comentar alhures e h aportes crticos designicativa originalidade de Joo Baptista Villela,6Lenio Luiz

    5MERRYMAN, John Henry; PREZ-PERDOMO, Rogelio.A tradio da civillaw: uma introduo aos sistemas jurdicos da Europa e da Amrica,p. 191-210,especialmente.

    6Cf. VILLELA, Joo Baptista. Variaes impopulares sobre a dignidade da pessoahumana. In: Superior Tribunal de Justia: doutrina. Edio comemorativa, 20anos, Distrito Federal, 2009. p. 559-581.

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    Streck,7 Juan Antonio Garca Amado8 e Antonio Junqueira de

    Azevedo.9

    O objetivo com este pequeno estudo no apenas reforar as

    crticas a esse processo, de resultados questionveis. Pretende-se,

    aqui, abordar, com as evidentes limitaes da natureza deste material,

    alguns problemas relativos ao uso das teorias neoconstitucionais,

    argumentativas e da anlise econmica no Direito Privado. Para

    tanto, so apresentadas questes relativas : a) anlise interna

    ou externa do fenmeno jurdico; b) utilizao inadequada de

    princpios e de valores como fatores de correo do Direito Civil; e

    c) necessidade de preservao do estatuto epistemolgico do Direito

    Civil. O texto propiciar o dilogo entre o Direito Civil e o Direito

    Constitucional, tendo como cenrio o estado da arte da tradio

    jurdica de civil law e sua conexo com esses problemas.

    2 DIREITO CIVIL E ANLISE INTERNA OUEXTERNA DO FENMENO JURDICO

    Muito se tem dito sobre a insuficincia do positivismo

    como Escola Jurdica, modelo terico ou como fornecedor de

    ferramentas para a interpretao do Direito.

    7 Citam-se duas obras essenciais para a compreenso do pensamento e das

    procedentes crticas do autor: STRECK, Lenio Luiz. O que isto: decidoconforme minha conscincia? Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010;_____. Verdade e consenso: Constituio, hermenutica e teorias discursivasda possibilidade necessidade de respostas corretas em direito . 3. ed., rev.,ampl. e com posfcio. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

    8Cf. GARCA AMADO Juan Antonio. Derechos y pretextos: elementos decrtica del neoconstitucionalismo. In: CARBONELL, Miguel (Ed.). Teora delneoconstitucionalismo: ensayos escogidos. Madrid: Trotta, 2007. p. 237-264.

    9 AZEVEDO, Antonio Junqueira de. O direito ontem e hoje: crtica ao neopositivismoconstitucional e insucincia dos direitos humanos.Revista do Advogado, v. 28,n. 99, p. 7-14, set. 2008.

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    No Direito Civil, para se restringir o objeto da anlise, as

    crticas so diversas e baseiam-se em argumentos que lhe atribuemdecincias, incorrees ou inadequaes, tais como: a) a eliminaodos valores do mundo normativo; b) a desconsiderao da vida real(rectius, dos fatos) na anlise dos fenmenos jurdicos; c) a xaodo juiz ao texto da lei, tornando-o um autmato repetidor das normaslegais, o famoso juiz bouche de la loide Montesquieau; d) a noobservncia das peculiaridades do caso concreto pelo magistrado,preso aos rigores formais; e) a perpetuao de injustias; f) a ofensa

    dignidade da pessoa humana; e g) a prevalncia da lei sobre aConstituio.

    Se forem esses os argumentos, estar-se- diante de incom-preenso do que seja o positivismo, especialmente, o kelseniano,ou de uma clara misticao.

    Primeiramente, Hans Kelsen no negou a existncia devalores ou a importncia dos fatos.10Ele faz essa clara advertncialogo no incio de sua Teoria Pura do Direito, de que se ocupa doestudo do fenmeno jurdico sob a ptica normativa (ou tomando-se por objeto a norma):

    Quanto a Teoria Pura empreende delimitar o conhecimento

    do Direito em face destas disciplinas, f-lo no por ignorar

    10 interessante destacar que houve um verdadeiro renascimento dos estudoskelsenianos na contemporaneidade, com trabalhos de grande qualidadetcnica. Em lngua portuguesa, citam-se: ROCHA, Joaquim Freitas da.Constituio, ordenamento e conitos normativos: esboo de uma teoriaanaltica da ordenao normativa. Coimbra: Coimbra Ed., 2008; DIAS, GabrielNogueira.Positivismo jurdico e a teoria geral do direito na obra de HansKelsen. So Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2010. Independentemente daadeso s ideias kelsenianas, importante discutir seu legado terico, sem apredisposio negativa de parte da doutrina, que o repudia sem ao menos ter sedebruado sobre suas obras. Na Alemanha, tem-se desenvolvido um movimentodenominado kelsenianismo democrtico, segundo o qual no se pode utilizardos postulados da teoria pura se no houver como pressuposto a existncia deum Estado Democrtico de Direito.

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    ou, muito menos, por negar essa conexo, mas porque intenta

    evitar um sincretismo metodolgico que obscurece a essnciada cincia jurdica e dilui os limites que lhe so impostos pela

    natureza do seu objeto.11

    Outro ponto digno de refutao, ainda neste tpico, a assertivade que o positivismo kelseniano confunde-se com o positivismoexegtico. Trata-se de evidente equvoco, como tem demonstradoparte da doutrina.12Mais que isso, h margem de discricionariedade

    11Transcreve-se o trecho na ntegra, por sua importncia para a compreenso dopensamento kelseniano: A Teoria Pura do Direito uma teoria do Direito positivo do Direito positivo em geral, no de uma ordem jurdica especial. [...] Como teoria,quer nica e exclusivamente conhecer o seu prprio objeto. Procura responder a estaquesto: o que e como o Direito? Mas j no lhe importa a questo de saber comodeve ser o Direito, ou como deve ele ser feito. cincia jurdica e no poltica doDireito. Quanto a si prpria se designa como pura teoria do Direito, isto signicaque ela se prope garantir um conhecimento apenas dirigido ao Direito e excluirdeste conhecimento tudo quanto no pertena ao seu objeto, tudo quanto no sepossa, rigorosamente determinar como Direito. Quer isto dizer que ela pretende

    libertar a cincia jurdica de todos os elementos que lhe so estranhos. Esse o seuprincpio metodolgico fundamental. Isto parece-nos algo de per si evidente. Porm,um relance de olhos sobre a cincia jurdica tradicional, tal como se desenvolveu nodecurso dos scs. XIX e XX, mostra claramente quo longe ela est de satisfazer exigncia da pureza. De um modo inteiramente acrtico, a jurisprudncia tem-seconfundido com a psicologia e a sociologia, com a tica e a teoria poltica. Estaconfuso pode porventura explicar-se pelo fato de estas cincias se referirem a objetosque indubitavelmente tm uma estreita conexo com o Direito. Quando a TeoriaPura empreende delimitar o conhecimento do Direito em face destas disciplinas,f-lo no por ignorar ou, muito menos, por negar essa conexo, mas porque intentaevitar um sincretismo metodolgico que obscurece a essncia da cincia jurdica edilui os limites que lhe so impostos pela natureza do seu objeto. (KELSEN, Hans.

    Teoria pura do direito, p. 1-2)12Nesse sentido: Da a pergunta: desde quando obedecer a uma lei nos seus mnimosdetalhes ser um positivista? Na verdade, confundem-se conceitos. Vejamos:positivismo uma coisa distinta, porque separava direito e moral, alm de confundirtexto e norma, lei e direito, ou seja, tratava-se da velha crena ainda presente noimaginrio dos juristas em torno daproibio de interpretar, corolrio da vetustaseparao entre fato e direito, algo que nos remete ao perodo ps-revoluofrancesa e todas as consequncias polticas que dali se seguiram. Depois veio opositivismo normativista, seguido das mais variadas formas e frmulas, que identicando (arbitrariamente) a impossibilidade de um fechamento semntico dodireito relegou o problema da interpretao jurdica a uma questo menor [...].(STRECK, Lenio Luiz. O que isto: decido conforme minha conscincia?, p. 83)

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    para o aplicador do Direito no positivismo. Trata-se da famosa

    moldura, dentro da qual o aplicador do Direito dispe de margensde escolha para exercer sua atividade. A moldura decorre daaceitao de que existem casos de indeterminao, intencionaisou no, no escalo normativo inferior:

    Sendo assim, a interpretao de uma lei no deve necessariamenteconduzir a uma nica soluo como sendo a nica correta, mas

    possivelmente a vrias solues que na medida em que apenas

    sejam aferidas pela lei a aplicar tm igual valor, se bem que

    apenas uma delas se torne Direito positivo no ato do rgoaplicador do Direito no ato do tribunal, especialmente.13

    Se o positivismo corresponderia a uma amarra ao juiz, aleitura dessa passagem desmente os crticos de Hans Kelsen.

    No h maiores contradies entre as posies de Hans Kelsene os vrios dos argumentos utilizados para criticar o Direito Civil,

    suas leis e o modo clssico de sua aplicao. Em certa medida, tudose resolveria de acordo com os esquemas da indeterminao e damoldura, presentes na Teoria Pura do Direito. O problema, comose percebe, no est em se imputar ao Direito Civil e tradio decivillaw o carter positivista de seus fundamentos.

    3 ProBLEMAS CoM o FATor DE CorrEoDO DIREITO: NORMAS CONSTITUCIONAIS,

    PrINCPIoS E ANLISE ECoNMICA NoDIREITO CIVIL

    Remanescem as questes relativas desconsiderao dosvalores e dos fatos como limitantes do Direito Civil na tradiode civil lawclssica.

    13KELSEN, Hans. KELSEN, Hans. Teoria pura do direito,p. 391.

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    Diz-se que o novo Direito Civil, tambm denominado

    Direito Civil constitucionalizado,14

    repersonalizado,15

    despa-trimonializado,16etc., voltou-se para princpios e valores por muitotempo esquecidos, a exemplo da dignidade da pessoa humana,da funo social do contrato, da funo social da propriedade. tambm sustentado que esse novo Direito Civil ocupou-se dosproblemas da sociedade contempornea, abrindo-se para as novasfamlias, para a funo social da propriedade e para a luta dosgrupos excludos.

    Seria esse o novo limiar de um Direito Civil humanista,pluralista, democrtico e social. Adjetivos, discursos hiperblicose armaes panetrias no faltam para descrever esse DireitoCivil ps-moderno. Muito bem. Mas, imprescindvel a realizaode delimitaes para se analisar toda essa enxurrada retrica emtorno dessa nova viso do Direito Civil.

    14Cf. BARBOZA, Heloisa Helena. O direito de famlia e o cdigo civil de 2002:

    algumas consideraes gerais.Revista Forense, p. 151-153.15A famlia ps-moderna passa, destarte, por uma repersonalizao das funes

    de seus membros. As mudanas socioeconmicas na histria contemporneaproporcionaram a necessidade de reviso de diversos institutos jurdicos,cujas premissas tiveram de ser necessariamente parcialmente alteradas. Assimsucedeu com a teoria da responsabilidade civil, quando se adotou a doutrinado risco da atividade. E, ainda, com o direito contratual, ante o surgimento doscontratos de adeso e a evoluo legislativa a que se chegou, com as chamadasclusulas negociais gerais. A introduo de um direito civil constitucional,primado em uma concepo principiolgica e menos normativa, indica osnovos rumos do direito privado e o realce que se passa a conferir pessoa e sua

    dignidade, como o elemento nuclear da relao jurdica. (LISBOA, RobertoSenise. Dignidade e solidariedade civil-constitucional no direito brasileiro.

    Revista de Direito Privado, p. 61, grifo do autor)16A chamada despatrimonializao do direito civil no signica a pretenso de se

    extrair do direito todo o seu contedo patrimonial, mas se apresenta como umaforma de funcionalizar o sistema, de forma que a produo e o desenvolvimentoeconmicos sempre estejam envolvidos o objetivo de uma maior justia social,atravs de uma melhor distribuio de riquezas, e com o respeito ao princpiofundamental da dignidade da pessoa humana. (GOMES, Daniela Vasconcellos.A evoluo do sistema do direito civil: do individualismo socialidade.Revistade Direito Privado, p. 56)

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    H aqui duas ordens distintas de consideraes.

    A primeira metodolgica. Como armado, nem o positivismokelseniano (ou foi) propriamente cego existncia de elementosfticos e valorativos. Renunciou, certo, ao seu estudo objetivo, mascompreende sua existncia e tem como prprio que outras cinciasdeles se ocupem. Mas no se busca aqui defender o positivismo. Anoo que se pretende enaltecer a de que se pode tomar o Direito(ou, mais amplamente, o fenmeno jurdico) sob duas perspectivas:uma internae outra externa.17

    A opo positivista kelseniana, por exemplo, interna. ODireito e seus conceitos, sua estrutura de ordenamento e de norma,as instncias de validade, eis o substrato dessa anlise interna.Mas e a Justia? A legitimidade? conveniente separar as coisas.Quando se diz algo como o novo Direito Civil busca os princpiose no a letra fria da lei ou ele se ocupa da Justia e no da Lei,faz-se uma brutal confuso entre o problema de o Direito ter um

    referencial externo (a Justia, a Legitimidade, o Bom, o Moral) decorreo de suas normas e a forma como o Direito estudado.

    No correto, por conseguinte, dizer que o Direito Civilclssico e a tradio de civil law, nele baseada, so contrrios avalores. Esse um raciocnio que subverte os termos da equao. adequado armar que se pode proceder anlise interna do Direito(e do Direito Civil, especialmente), sob a gide dos postuladoskelsenianos. Os valores, nesse caso, no seriam tomados como

    referenciais externos de correo do Direito, da mesma maneiracomo a ecincia econmica. ntido que o problema est em

    17Cf., a propsito, a leitura original desse problema apresentada em: VERONESE,Alexandre. Consideraes sobre o problema da pesquisa emprica e sua baixaintegrao na rea de Direito: a tentativa de uma perspectiva brasileira a partirda avaliao dos cursos de ps-graduao do Rio de Janeiro. In. MIRANDANETTO, Fernando Gama de (Org.).Epistemologia e metodologia do direito.Campinas: Millenium, 2010. p. 113-116.

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    fazer a escolha entre fatores de correo externos ou internos.

    Esse, realmente, o cerne do problema.Apreciem-se alguns exemplos.

    No art. 765 do Cdigo Civil brasileiro de 2002, arma-seque o segurado e o segurador so obrigados a conservar, noaperfeioamento e na execuo do contrato, a mais estrita boa-fe veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstnciase declaraes a ele concernentes. Se for realizada uma anliseinterna desse dispositivo, sob o mtodo kelseniano, no se utilizar,

    na interpretao da norma, de elementos sociolgicos, econmicosou de carter exclusivamente moral. No que o intrprete estejalimitado ou constrangido pela literalidade desse texto. Comovisto, h um espao de indeterminao, e o aplicador do Direito,dentro da moldura, pode optar por diversos sentidos. No casodo art. 765, h um reforo a essa abertura, que o uso da boa-fe da probidade (veracidade), conceitos jurdicos indeterminados eclusulas gerais que tornam ainda mais ampla a discricionariedadedo juiz no modelo kelseniano.

    possvel, contudo, fazer uso da anlise externa do mesmoart. 765 do Cdigo Civil brasileiro. Atualmente, dois modelos,com seus respectivos referenciais, so muito usados para esse m.Um deles o que se vale das ferramentas da Economia, oLawand Economics. A deciso sobre como interpretar a conduta dosegurado levaria em conta a ecincia econmica, por exemplo.

    Assim, o custo da deciso e seu efeito multiplicador teriam grandeimpacto no resultado da demanda. Da mesma forma, no exame deum caso de responsabilidade civil por dano moral, o desvalor doresultado da conduta (o dano in re ipsa) confrontado com o efeitode estmulo de condenaes muito elevadas para a constituioda famosa indstria do dano moral. No ltimo exemplo, oraciocnio empregado pelos tribunais no tem qualquer sosticaoeconmica, mas inegvel que prevaleceu a anlise externa na

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    18O quantum,a ttulo de danos morais, equivalente a at 50 (cinqenta) salriosmnimos, tem sido o parmetro adotado para a hiptese de ressarcimento dedano moral em diversas situaes assemelhadas (e.g.:inscrio ildima emcadastros; devoluo indevida de cheques; protesto incabvel). Precedentes.(STJ, EDcl no Ag. 811523/PR, Rel. Min. Massami Uyeda, 4 Turma, j. 25 mar.2008,DJe22 abr. 2008)

    19Cf. RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. A doutrina do terceiro cmplice:autonomia da vontade, o princpio res inter alios acta, funo social docontrato e a interferncia alheia na execuo dos negcios jurdicos.Revistados Tribunais, v. 93, n. 821, p. 80-98, mar. 2004.

    tomada de deciso, hoje consolidada nacionalmente, de limitar a

    um teto (bastante baixo) o quantum dessas indenizaes.18

    Certamente, os defensores da anlise econmica do Direito

    diro que seu modelo mais eciente. Veja-se, no se arma que mais justo, pois a Justia um fator to abstrato e inseguro que noserve como parmetroper separa fundamentar essas decises. Oque se faz aqui recorrer a uma anlise externa do Direito. Troca-se a Justia pela ecincia da deciso. Abandonam-se conceitosindeterminados como boa-f, que teria por si s uma pretensa

    tradio histrica e quase nada de utilidade prtica, como queremos adeptos desse modelo.

    Outro exemplo o conceito de quebra eciente dos contratos,que ganhou recentes estudos na doutrina brasileira. Aqui ca tambmevidenciada a substituio de modelos tericos. O Direito Civildesenvolveu o clssico princpio res inter alios acta nec nocet necprodest, mais conhecido como relatividade dos efeitos do contrato.

    Como uma evoluo dessa tradio, houve amplo desenvolvimentode estudos sobre os efeitos da funo social sobre os contratos e amitigao da exonerao do terceiro dos efeitos contratuais alheios.Uma das novas leituras desse princpio, que o mitigam, a doutrinado terceiro cmplice, que determina a responsabilizao do terceiroque interfere ilicitamente em relaes negociais alheias, induzindosua ruptura ou gerando danos aos contraentes.19

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    ntida a contraposio entre as duas formas de interpretar

    a atuao do tertiusno contrato. A anlise externa prope umasoluo pautada por ferramentas econmicas: seria de todo ruim

    essa atuao ou ela um mecanismo interessante de fomento s

    relaes entre agentes no mundo produtivo? Em artigo doutrinrio,

    encontra-se defesa veemente da anlise externa na interpretao

    desses vnculos, quando a quebra contratual produz efeitos

    mais vantajosos do que sua manuteno. A ecincia substitui a

    segurana jurdica. Mas aqui, como nos outros casos, recorre-se

    ao elemento externo o econmico como fator de correo da

    norma ou de aferio da correspondncia do fato que se pode

    chamar de vlido.20

    Existem, tambm, tentativas de superar o modelo civilista

    clssico pela captura do contedo axiolgico, em geral, do valor

    Justia, por predenies do que seja adequado socialmente ou

    conforme ao interesse coletivo, ao bem-comum ou dignidade da

    pessoa humana. H uma mirade de expresses que cabem nessaideia, sujeita a variantes, mas que encerra, na prtica, trs objetivos

    (no necessariamente concomitantes): a) a justia distributiva; b)

    a proteo das minorias; c) a quebra de tradies religiosas ou

    morais no campo dos costumes e da organizao das famlias ou

    da autodeterminao.21

    Os argumentos seguem quase sempre a lgica de buscar

    em elementos extranormativos o fator de correo de opes

    20 Cf. MATIAS, Joo Lus Nogueira; ROCHA, Afonso de Paulo Pinheiro. Afuno social do contrato, a quebra eciente e o terceiro ofensor. Disponvelem: . Acesso em: 20 dez. 2010.

    21Autodeterminao entendida como o poder de cada indivduo gerir livrementea sua esfera de interesses, orientando a sua vida de acordo com as suaspreferncias. (RIBEIRO, Joaquim de Sousa. O problema do contrato: asclusulas contratuais gerais e o princpio da liberdade contratual, p. 22)

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    legislativas ou de reformar o modo como a magistratura interpreta

    determinados dispositivos legais. No ltimo caso, h a velha tticado ataque ao espantalho; no caso, o espantalho o positivismo.O direito posto, na espcie, o Direito Civil, seria retrgado,ultrapassado, desconforme aos valores constitucionais, dignidadehumana e, por via de consequncia, no ampararia os direitos dos

    hipossucientes, de gnero ou das minorias.

    H, aqui, duas ordens de problemas. O primeiro e

    mais grave a sem-cerimnia com que se desfaz de textosnormativos com nenhuma indeterminao, inclusive de natureza

    constitucional. O caso mais notrio o da equiparao ao

    casamento das unies homossexuais.

    A Constituio de 1988 poderia ter sido omissa quanto ao

    casamento e unio estvel, como o exemplo da Constituio

    portuguesa e da Constituio espanhola, para se car em doiscasos prximos da realidade nacional. O reconhecimento

    da natureza conjugal dessas unies poderia operar no planolegislativo, por mera alterao do Cdigo Civil brasileiro,como se fez nos mencionados pases. Para isso, ter-se-ia ainda

    a facilidade de que o casamento no Cdigo Civil de 2002, comoo era em 1916, no tem uma denio legal e, por isso, no

    limita seus elementos subjetivos disparidade de sexos. Optou-

    se, como bem anota Carlos Alberto da Mota Pinto, por afastaros rigores do princpio pas de nullit sans texte, pois se teria

    como conseqncia, ento tida como absurda e inaceitvel,

    de considerar vlido o casamento entre pessoas de igual sexo[...]. Da que se tivesse excogitado a doutrina da inexistncia:

    nesses casos, a lei no prescrevia a nulidade por que o negcio

    era inexistente, e s o que existe pode ser nulo.22A doutrina de

    22PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil, p. 618.

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    Direito de Famlia tradicional arma que esse um elemento

    essencial do negcio jurdico.23

    Recorre-se ao argumento deque foi com base nessa diferenciao que se construiu a teoriado negcio jurdico inexistente, de Karl Salomo Zachariae vonLingenthal, cujo exemplo tpico seria um casamento entre doishomens, conforme o axioma quia coniuge non habet sexum.24

    Por outro lado, alguns civilistas contemporneos defendema possibilidade da instituio do casamento homossexual ouda equiparao desses vnculos ao regime da unio estvel.

    Os argumentos so os mais variegados, ora sob o imprio deferramentas da anlise interna do Direito, ora com argumentosextrados de fontes sociolgicas, realistas ou antropolgicas: a) aConstituio no veda o relacionamento entre pessoas do mesmosexo;25b) no necessrio equiparar as unies homossexuais unio estvel, por sua natureza absolutamente autnoma, oque dispensaria a associao com o pargrafo terceiro do artigo

    226;

    26

    e c) trata-se de reconhecimento da dignidade humana e

    23Embora os movimentos de contracultura pleiteiem o casamento homoafetivo,em nosso pas a pretenso encontra impedimento, vista do disposto no art.226 da Constituio da Repblica (NADER, Paulo. Curso de direito civil:direito de famlia, p. 38). No mesmo sentido: DINIZ, Maria Helena. Cursode direito civil: direito de famlia, v. 5, p. 35-36; VENOSA, Slvio de Salvo.

    Direito civil: direito de famlia, v. 6. p. 28-29.24 A doutrina reconhece a originalidade do pensamento de Karl Salomo

    Zachariae von Lingenthal e ainda h muitos adeptos de seu pensamento em

    relao aos matrimnios sem disparidade sexual: O criador da teoria do atoinexistente foi K.-S. Zachariae, que distingue, no mbito do Direito de Famlia,entre condies essenciais e de validade do casamento, e demonstra que afalta de um desses elementos essenciais provoca a inexistncia do matrimnio,no sua nulidade. [...] O pressuposto da diversidade de sexo no casamentono defeito, sanvel ou insanvel, desse contrato solene matrimonial, masrequisito essencial de sua prpria existncia. (AZEVEDO, lvaro Villaa.Cdigo civil comentado: negcio jurdico; atos jurdicos lcitos; atos ilcitos:artigos 104 a 188, p. 279-281)

    25LBO, Paulo.Direito civil: famlias, p. 68.26LBO, Paulo.Direito civil: famlias, p. 69.

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    dos direitos fundamentais previstos no art. 5oda Constituio

    de 1988.27

    No caso brasileiro, porm, h o bice da literalidade do texto

    constitucional. O 3 de seu art. 226 expresso ao armar que:

    Para efeito da proteo do Estado, reconhecida a unio estvel

    entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei

    facilitar sua converso em casamento. A Constituio poderia

    ter deixando para o legislador ordinrio resolver o problema da

    equiparao das unies homossexuais ao casamento ou unio

    estvel, um minus em relao quele. Ter-se-ia outro nvel de

    discusso por exemplo, a eventual distoro do contedo de uma

    categoria jurdica, que o casamento, para aambarcar hipteses

    de fato no compreendidas em sua feio histrica, para alm de

    ser discutvel a ampla liberdade de conformao do legislador a

    esse instituto jurdico, como defendeu, no caso portugus, Jorge

    Miranda. A relevncia desses ltimos argumentos, no Brasil, nem

    de ser encarecida. Tem-se aqui norma constitucional expressa. Odebate, sob o aspecto puramente normativo (e se estaria novamente

    sob a gide de uma anlise interna do Direito), resultaria mais

    simples, binrio at.

    Com a opo legtima e democrtica do constituinte em

    clausular a unio estvel como uma relao entre homem e mulher,

    no poderia nem mesmo o legislador ordinrio fazer essa mutao.

    No Brasil, porm, muitos tribunais ordinrios vm tomandodecises dessa natureza e, muito provavelmente, o Supremo

    Tribunal Federal, esforado em tcnicas como a interpretao

    27Cf. FERNANDES, Jacinta Gomes. Unio homoafetiva como entidade famliar:reconhecimento no ordenamento jurdico brasileiro.Revista Forense, v. 103,n. 394, p. 137-158, nov./dez. 2007; GIORGIS, Jos Carlos Teixeira. A relaohomoertica e a partilha de bens. Revista Forense, v. 98, n. 360, p. 35-50,mar./abr. 2002.

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    conforme, poder fazer a equiparao das unies homossexuais

    unio estvel ou at ao casamento.28

    Lus Carlos Martins Alves Jnior, com acerto, lembra que

    a homossexualidade uma questo eminentemente individual erestrita ao domnio da vida privada e da intimidade que mereceo respeito de todos.29 E precisamente esse reconhecimentoque exige a departio entre a interpretao axiolgica (?) e orespeito ao texto constitucional. A defesa do 3 do art. 226 no sechoca que a dignidade dos seres humanos atingidos pela opo do

    constituinte no caso em exame. Essa mistura entre a determinaonormativa, resultante de opes democrticas, e a hermenutica

    28UNIO CIVIL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO Ao possessria Reintegrao de posse Inadmissibilidade Relao homoafetiva comintuitu familiaeque descaracteriza comodato Impossibilidade de interpretaorestritiva do art. 226, 3., da CF Princpios e normas gerais constitucionaisque devem ser observados (TJRJ, Ap. Cv. n. 2008.001.2050-9, 13 Cm.Cv., j. 6/8/2008, v.u, Rel. Des. Jos de Samuel Marques,DORJ13 out. 2008,

    RT879/354). H, contudo, acrdos que no admitem esses superpoderesinterpretativos do juiz. Vejam-se alguns exemplos: Ainda que evidenciada,por longo tempo, a relao homossexual entre dois homens, a ela no se aplicamas disposies da Lei 8.971/94, sob alegao de existncia de unio estvel.Sobretudo por que, a Carta Magna, em seu art. 226, estabelece que a famlia,base da sociedade, tem especial proteo do Estado, consignando no 3 quepara efeito da proteo do Estado, reconhecida a unio estvel entre o homeme a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua converso emcasamento. Esse preceito constitucional, pois, tem por escopo a unio entrepessoas do sexo oposto e no elementos do mesmo sexo. Logo, nesse contexto,o reconhecimento e a dissoluo de sociedade de fato, cujo pleito objetiva aintegralidade dos bens do esplio do companheiro, que faleceu sem deixar

    descendentes ou ascendentes, exibe-se incabvel quando se verica que norestou demonstrada a contribuio ou o esforo na formao do patrimnio quese arma comum. (TJRJ, Ap. Cv. 10.704/2000, 3 Cm., j. 7/11/2000, Rel. Des.Antonio Eduardo F. Duarte,DORJ3 maio 2001,RT791/354); SUCESSO Unio homossexual Pretenso de habilitao na qualidade de herdeiro e meeirodo de cujus Inadmissibilidade Direitos atinentes unio estvel restritos aocompanheiro sobrevivente de unio entre homem e mulher Inteligncia doart. 226, 3, da CF. (TJSP, Agravo de Instrumento n. 266.853.4/8, 4 Cm.,j. 28 nov. 2002, Rel. Des. Rebello Pinho,RT812/220).

    29ALVES JNIOR, Lus Carlos Martins.Direitos constitucionais fundamentais:vida, liberdade, igualdade e dignidade, p. 100.

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    teleolgica, se fossem trocados os sinais, permitiria, em uma

    sociedade fortemente submetida a paradigmas morais (como asislmicas), que os valores religiosos servissem para interpretarteologicamente normas constitucionais que anussem com ocasamento homossexual, impedindo essas unies em nome deDeus. Entre a interpretao teolgica e a teleolgica, parausar de um trocadilho infame, estaria o sacrifcio de direitosassegurados literalmente na Constituio. O risco o mesmo,ainda que se no queira admitir.

    Esse modelo de utilizao discricionria e contra legemdos textos normativos, at mesmo da Constituio, d margema graves desvios lgicos. Invoca-se a Constituio, certosprincpios ou valores constitucionais, para desfazer de regrasde inquestionvel univocidade semntica. Esse abuso chega aoextremo de se voltar contra prpria Constituio.30Sobre isso,

    30

    Absolutamente corretas as observaes de Lenio Luiz Streck sobre esseproblema: Despiciendo assinalar que no cabe ao Poder Judicirio colmatarlacunas (sic) do constituinte (nem originrio e nem derivado). Ao permitirdecises desse jaez, estar-se- incentivando a que o Judicirio crie umaConstituio paralela, estabelecendo, a partir da subjetividade assujeitadorade seus integrantes, aquilo que indevidamente a critrio do intrprete noconstou no pacto constituinte. A resoluo das querelas relativas s unieshomoafetivas deve ser feita enquanto no for emendada a Constituio ouelaborada lei ordinria (a exemplo do que ocorreu na Espanha) no mbitodo direito das obrigaes, e no a partir do direito sucessrio ou do direitode famlia. H limites hermenuticos a que o Judicirio se transforme emlegislador.Veja-se que um dos argumentos utilizados ao menos no planoretrico para justicar as referidas decises o de que o Judicirio deveassegurar a unio estvel (portanto, equiparao ao casamento) de casaishomossexuais porque o Legislativo no pretende, a curto prazo, por nodispor de condies polticas para tal, elaborar legislao a respeito. Mas exatamente esse argumento que se contrape prpria tese: em umademocracia representativa, cabe ao Legislativo elaborar as leis(ou emendasconstitucionais). O fato de o Judicirio via justia constitucional efetuarcorrees legislao (ltragem hermenutico-constitucional e controlestricto

    sensude constitucionalidade) no signica que possa, nos casos em que a prpriaConstituio aponta para outra direo, construir decises legiferantes. AConstituio reconhece unio estvel entre homem e mulher. Isso no signica

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    adverte Konrad Hesse que no h realidade constitucional

    contra constitutionem.31

    O segundo problema est no abandono da anlise interna

    do Direito para se fazer toda sorte de abusos, em geral de carterjudicirio, em nome da justia distributiva ou de valores tidos comosuperiores, quase sempre originados do Direito Pblico. A norma desconsiderada e, com ela, as opes democrticas do legislador,em nome de uma interpretao mais favorvel aos hipossucientes.No se trata de utilizar de clusulas gerais, cnones hermenuticos

    ou de conceitos jurdicos indeterminados previamente colocadosao dispor dos juzes para favorecer grupos ou indivduos, por meiode uma prvia valorao feita pelo legislador, como so exemplos

    que, por no proibir que essa unio estvel possa ser feita entre pessoas domesmo sexo, a prpria Constituio possa ser colmatada, com um argumentokelseniano do tipo o que no proibido permitido.Fosse assim e inmerasno proibies poderiam ser transformadas em permisses.A Constituio de1988 tambm no probe ao direta de inconstitucionalidade de leis municipaisface Constituio Federal (o art. 102, I, a, refere apenas a possibilidade deargio que trate de leis federais e estaduais). E nem por isso torna-se possvelfalar em ADIn contra lei municipal em sede de STF. Os muncipes poderiamalegar que a Constituio originria violou o princpio da isonomia e que afalta de um mecanismo desse quilate viola direitos fundamentais, etc. Masnada disso pode ser colmatado por um ato voluntarista do Judicirio (veja-seque a ADPF acabou resolvendo o problema, ao admitir-se o sindicamento deleis municipais em face da Constituio sempre que no houver outro modode solucionar a querela; mas, insista-se: foi por via legislativa a alterao doestado da arte). Ainda para exemplicar: a legislao civil trata apenas daalterao do prenome. Isso no signica, entretanto, a partir da mxima o que

    no proibido permitido, que o Judicirio possa determinar a alterao doapelido de famlia, na hiptese de algum se sentir humilhado pelo sobrenomeque carrega, alegando, v.g., o princpio da dignidade da pessoa humana. Emsntese: no h um lado b da Constituio a ser descoberto axiologicamente.A resposta correta para o caso da unio estvel (homoafetiva) depende dealterao legal-constitucional. Veja-se, v.g,, o caso espanhol, em o problemafoi resolvido mediante a edio de lei. (STRECK, Lenio Luiz. Verdade econsenso: Constituio, hermenutica e teorias discursivas da possibilidade necessidade de respostas corretas em direito,p. 213-214)

    31 HESSE, Konrad. Grundzge des Verfassungsrechts der BundesrepublikDeutschland, p. 19.

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    dispositivos do Cdigo de Defesa do Consumidor, que orientam

    os aplicadores do Direito a interpretar as normas desses sistemasem favor dos consumidores.32Agir assim estender o alcancedesses vetores interpretativos para alm dos prprios limites oumesmo criar, assim do nada, princpios ou tcnicas que permitamtais prticas.

    Tem-se como exemplo decises judiciais marcadas pelasndrome de Sherwood. Os contratos de Direito Civil, em teseparitrios, so o mbito ideal para que os juzes se convertam em

    Robins dos Bosques e tirem dos ricos para dar aos pobres. Velhosaxiomas como opacta sunt servanda, que j foram devidamenteflexibilizados pelos inegveis avanos das teorias ligadas alterao de circunstncias, so antagonizados como se foramverdadeiros antemas. A interveno judicial nos contratos, quedeveria ser exceo, torna-se a regra.

    Uma das formas de anlise externa do Direito, a Escola

    de Law and Economics, tem sido a principal adversria dessadesconsiderao da rmeza dos contratos, fazendo-o no peloapego a velhos princpios de origem medieval, mas em face docusto econmico dessa entropia judiciria. A sociedade pagapor essas externalidades negativas, por meio da securitizao dorisco, do aumento das taxas de juros e do incremento dos custoscontratuais, que sero distribudos entre todos sob a forma demajorao dos preos de bens e dos servios. O Direito Civil

    clssico que, durante muito tempo, soube jogar com a rigidezdo pacta sunt servanda em contraponto aos mecanismos desoluo dos efeitos advindos da alterao de circunstncias,desde uma das primeiras tcnicas que foi a clusula rebus sicstantibus, torna-se mero espectador do embate entre a anlise

    32 Art. 47. As clusulas contratuais sero interpretadas de maneira mais favorvelao consumidor (Cdigo de Defesa do Consumidor).

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    econmica do Direito (ligada preservao da estabilidade da

    economia contratual) e os defensores da interpretao com basena sndrome de Sherwood.33

    4 DIREITO CIVIL, NEOCONSTITUCIONALISMOE APANPrINCIPIoLoGIA

    A tradio jurdica de civil law no passou inclume ao

    processo de constitucionalizao. Aqui se radicam diversastendncias, escolas ou pretensas escolas de pensamento jurdico

    e uma mirade de autores que utilizam o imenso guarda-chuva

    terico da constitucionalizao para sustentar a utilizao de novos

    fatores de correo das normas de Direito Civil, sua interpretao

    conforme o texto constitucional ou a aplicao direta de suas

    normas s relaes de Direito Privado.

    Muitas vezes, encontram-se em estado de confuso ou de

    justaposio argumentos baseados em Neoconstitucionalismo, ps-positivismo eDrittwirkung. tambm nesse campo que se manipula

    a teoria dos direitos fundamentais para releituras imprprias de certas

    categorias jurdicas ou de princpios, como o exemplo da funo

    social da propriedade. A teoria interna dos direitos fundamentais

    a mais comumente empregada para esses ns.

    No objetivo com este artigo analisar aprofundadamente

    todas essas dilataes da constitucionalizao e seus efeitos sobrea perda de referenciais tericos do Direito Civil contemporneo.

    Em outro lugar, fez-se o exame intensivo da ausncia de rigor

    tcnico em torno do que seja a constitucionalizao e sobre o uso

    equvoco da teoria dos direitos fundamentais em torno de uma

    33Cf. OTERO, Paulo.Instituies polticas e constitucionais. Coimbra: Almedina,2007. v. 1, p. 341, 459.

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    categoria privatstica nuclear, que a propriedade.34Importa, aqui,

    por agora, resumir alguns desses elementos de crtica dogmticacivilista contempornea: a) usa-se com extrema promiscuidade oconceito de constitucionalizao, sem que se saiba propriamentea que se refere, o que implica trazer para seus limites situaes oufenmenos jurdicos totalmente diferenciados ou incompatveis,como interpretao conforme Constituio, interpretao dodireito ordinrio sob a gide da supremacia constitucional, controlede constitucionalidade das leis, uso de princpios constitucionais

    para interpretar o Direito Privado, eccia dos direitos fundamentaisem relao aos particulares; b) os direitos fundamentais devemser compreendidos nos moldes da teoria externa, distinguindo-seentre seu contedo essencial e respectivos limites; c) no h comose admitir direitos fundamentais ilimitados; d) o exame da funosocial da propriedade, por exemplo, pressupe o reconhecimentoda distino entre propriedade e funo social.

    Parte dos atritos causados pela tentativa de colonizao do

    Direito Civil no marco da constitucionalizao decorrncia,para alm das razes sublinhadas alhures, da permanente buscapor um elemento de correo para o Direito. Nesse sentido, orecurso Constituio explicvel, embora seu barateamento peladogmtica brasileira tenha chegado a nveis intolerveis.

    Uma vez mais, deve-se recorrer dicotomia entre anlisesinternas e externas do fenmeno jurdico e a experincia

    constitucional alem bastante til para esse m.A dbcle do regime nacional-socialista em 1945 e a

    reconstruo do sistema judicirio alemo, em torno do TribunalConstitucional Federal, reforou o carter de centralidade

    34 Cf. RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Propriedade e constitucionalizao dodireito civil. In: WACHOWICZ, Marcos; MATIAS, Joo Lus Nogueira. (Org.).

    Propriedade e meio ambiente: da inconciliao convergncia. Florianpolis:Fundao Boiteux, 2010. v. 1, p. 118-142.

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    Grundgezets no ordenamento jurdico alemo. Aquilo que j se

    encontrava presente nas obras iniciais de Hans Kelsen converteu-sena busca pela centralidade do que os alemes chamam, literalmente,de direitos de base, direitos bsicos ou direitos-fundamento(Grundrechten), e que, em portugus, traduziu-se literariamentepor direitos fundamentais.

    Essa reconduo da ideia de Constituio para algo maisespecfico como os direitos fundamentais est na base demovimentos tericos que estabeleceram hierarquias entre as

    normas constitucionais. tambm da dcada de 1950 o pequenoensaio de Konrad Hesse, juiz do Tribunal Constitucional Federal,intitulado A fora normativa da Constituio (Die normativeKraft der Verfassung), de 1959, que representou a virada histricada ideia de Constituio como elemento de direo poltica doEstado para a Constituio como documento de eccia jurdica inre ipsa, dotado da potencialidade de produzir efeito determinante eregulador da realidade social e histrica,35ainda que haja eventuaisdescompassos com a realidade poltica, com os to conhecidosfatores reais de poder, de Ferdinand Lassale.36

    35 Essa capacidade de determinao e regulao ecaz da realidade da vidahistrica o que Konrad Hesse denomina de fora normativa da Constituio:

    Inwieweit es der Verfassung gelingt, diese Geltungzu gewinnnen, ist vielmehreine Frage ihrer normativen Kraft, ihrer Fhigkeit, in der Wirklichkeit

    geschichtlichen Lebens bestimend und regulierend zu wirken.(HESSE, Konrad.Grundzge des Verfassungsrechts der Bundesrepublik Deutschland,p. 17)

    36 Assim denidos pelo autor: Os fatores reais do poder que regulam no seiode cada sociedade so essa fora ativa e ecaz que informa todas as leis einstituies jurdicas da sociedade em apreo, determinando que no possamser, em substncia, a no ser tal como elas so (LASSALLE, Ferdinand. Que uma Constituio?, p. 18). certo, para ele, que os problemas constitucionaisno so problemas de direito, mas do poder; a verdadeira Constituio de umpas somente tem por base os fatores reais e efetivos do poder que naquele pasregem, e as Constituies escritas no tm valor nem so durveis a no serque exprimam elmente os fatores do poder que imperam na realidade social:eis os critrios fundamentais que devemos sempre lembrar. (LASSALLE,Ferdinand. Que uma Constituio?, p. 72)

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    Abandona-se o recurso chamada natureza das coisas

    (Natur der Sache) como fundamento (de forte contedo naturalista)de suas decises, quando no se pode apelar ao texto positivo dasnormas, e passa-se ao modelo de subordinao do ordenamentoaos direitos fundamentais. Com isso, abrem-se as portas ao mundodos princpios e, dada sua evidente abstrao, s tentativas desolucionar as colises entre eles e suas relaes com as normas,continentes de elementos mandatriosprima facie.

    Esse o debate da segunda metade do sculo XX e que seestende no incio do sculo XXI, no mais como um problemacircunscrito realidade jurdica alem, mas, em larga medida, jurisdio constitucional dos principais pases do mundocontemporneo.

    O Direito Natural renascido no aps-guerra teve seu momentocomo fator de correo do Direito Positivo. Ele uma ferramentamuito antiga de anlise externa do Direito e que, aps o trauma

    nacional-socialista, obteve o favor de nomes como o de GustavRadbruch.37

    O Tribunal Constitucional Federal alemo faz uso dos direitosfundamentais como ultima ratiodo processo de correo e de adequa-o do direito posto. No sem razo que aGrundgesetzd legitimidadeativa para provocar o Tribunal diretamente quando houver violaode direitos fundamentais, por meio da Verfassungsbeschwerde.38

    A ampliao do catlogo de direitos fundamentais, especialmentequando eles avanam por campos virgens como os do Direito Privado,fez abrir a caixa de Pandora aos juristas, em eterna busca pelo Graaldo fator de correo perfeito.

    37 Cf. RADBRUCH, Gustav. Introduo cincia do direito. Traduo de VeraBarkow. So Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 215-232.

    38 HESSE, Konrad. Grundzge des Verfassungsrechts der BundesrepublikDeutschland,p. 151.

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    Disso decorrem consequncias de variegado aspecto.

    O Direito Constitucional foi arrastado para dentro dorodamoinho de disputas privadas de relevncia duvidosa,com todos os desagradveis inconvenientes para si e para aConstituio, como o barateamento da dignidade e da importnciadas normas constitucionais, que se veem citadas em pequenosconitos individuais, como a cobrana de uma dvida ou a deniodos danos pelo abalroamento de automveis. Com isso, pe-se aperder a identidade do Direito Privado, forjada por sua antigae respeitvel histria.39

    A existncia de conceitos jurdicos indeterminados e clusulasgerais na Constituio, o que espervel dada sua natureza normativaespecca, campo frtil para a ao dos interessados no arbtrioe no abuso da discricionariedade judicial. Se foi possvel realizardemagogia judiciria com base em elementos do prprio DireitoCivil, agora isso feito com a invocao do texto constitucional.

    Assim, tem-se o inconveniente de se arrastar para oSupremo Tribunal Federal uma pletora de casos insignicantesou sem qualquer relevncia para a harmonia e a uniformidade daConstituio. Essa tambm uma possibilidade denunciada porKonrad Hesse: O Tribunal Constitucional cai, assim, no perigode converter-se no supremo tribunal dos conitos jurdico-cveise de assumir, dessa forma, um papel que a Grundgestez no

    lhe delegou. E, ainda em seus termos, os diversos obstculosprocessuais de acesso aos recursos dicilmente serviriam decontraponto eficiente a esse problema.40Alm disso, tem-se

    39 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht, p. 25.40No original:Das Bundesverfassungsgericht gert dabei in die Gefahr, zum

    obersten Gericht in Zivilrechtsstreitigkeiten zu werden und damit eine Rollezu bernehmen, welche das Grundsgestz ihm nicht bertragen hat. (HESSE,Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht, p. 25-26)

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    a abertura para o que se poderia chamar metaforicamente de

    toque de Midas constitucional, que a converso substancialde matrias eminentemente privadas em matrias constitucionais,como mero exerccio de poder do Tribunal Constitucional decontrole da jurisdio ordinria.

    Certos conitos que possuem notria conformao jurdica(exclusivamente, asseste-se) podem ganhar contornos jurdico-polticos com essa converso judicial, o que no conveniente paraos privados. Veja-se o uso disso pelos juzes nacional-socialistase seus deletrios efeitos.41

    No Brasil, a teoria argumentativa de Robert Alexy que mais empolgou a dogmtica nos ltimos quinze anos. Oapelo ponderao e ao sopesamento tornou-se frequente, atmesmo na soluo de casos de Direito Civil. A dignidade dapessoa humana tornou-se a chave para ponderar ou sopesardireitos fundamentais e seus princpios respectivos. um jogoperigosamente simplicado que envolve desde a desconsideraodas pautas axiolgicas do legislador em prol da ponderao a serfeita pelo juiz at o sincretismo metodolgico, colocando-se emuma mesma frase Robert Alexy e Ronald Dworkin, a despeito

    41 Ao mesmo tempo, a complacncia dos juzes alemes com os propsitosdo regime nazista sempre comparada desfavoravelmente resistnciamais bem-sucedida dos juzes italianos ao fascismo. Os juzes alemes, oargumento prossegue, optaram abertamente pela discricionariedade judicialem detrimento da certeza jurdica durante os anos 20, tanto para justicarsua utilizao de clusulas gerais como para seguir a teoria da escolalivre do direito, proposta por juristas. Os juzes italianos mantiveram suaabordagem tradicional de enfatizar a certeza jurdica e de exercer apenasum grau muito limitado de discricionariedade judicial. Quando veio aescurido, os juzes alemes foram incapazes de defender a ordem legalcom supedneo na importncia da certeza. Ao contrrio dos italianos, eleshaviam abertamente abandonado este princpio. (MERRYMAN, John Henry;PREZ-PERDOMO, Rogelio.A tradio dacivil law:uma introduo aossistemas jurdicos da Europa e da Amrica,p. 88)

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    da incompatibilidade de seus modelos tericos.42E, em justia a

    ambos os autores, muito do que se escreve a respeito de suas teorias destitudo de qualquer fundamento em seus textos.

    As teorias argumentativas e o chamado neoconstituciona-lismo, do modo como vm sendo utilizados no Direito, em geral,e no Direito Civil, em particular, tambm servem para derruira chamada dignidade da legislao.43 Problemas de elevadoalcance social deslocam seu frum deliberativo dos grupossociais organizados e de sua gora prpria, o Parlamento, para

    as sedes de juzos e tribunais, notoriamente deficitrios emtermos democrticos.44Alguns crticos contemporneos dessedeslocamento, como Juan Antonio Garca Amado, advertem que,muitas vezes, o emprego da chamada ponderao um artifciopara iludir e esconder as intenes de atores interessados no poderde mando, sem os desconfortos dos processos eleitorais.45

    42 Registre-se, apenas, o desconforto de serem encontradas citaes de Ronald

    Dworkin e Robert Alexy, especicamente sobre ponderao, conito, regras eprincpios, como se houvesse franca uniformidade de pensamento entre esses autores.(RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Dogmtica e crtica da jurisprudncia (ou davocao da doutrina em nosso tempo).Revista dos Tribunais, p. 83)

    43E no somente. At mesmo os positivistas de extrao anglo-americana so admitidosno rol dos que aceitam a perda da relevncia da legislao: Nossa expectativa deque a legislao esteja no centro da tradio positivista da jurisprudncia. Contudo,no caso, temos a legislao sendo apresentada como um aspecto contingente elosocamente perifrico da lei em uma das principais teorias positivistas do nossotempo. (WALDRON, Jeremy.A dignidade da legislao, p. 20-21)

    44 Cf. SUNSTEIN, Cass R. A Constituio parcial. Traduo de ManasssTeixeira Martins e Rafael Triginelli. Belo Horizonte: 2009. p. 186-196 (limites

    institucionais).45 Os termos por ele usados so extremamente duros, conforme traduo livre:

    [...] parece-me que muitas das teses do chamado neoconstitucionalismoou constitucionalismo dos direitos tornam extremamente funcionais a umajurisprudncia muito propensa extrapolao, demagogia e polticamais descarada, e a uma casta professoral ansiosa por legislar sem passarpelas urnas e muito dada aos jogos de mo, que transmutam prefernciaspessoais em postulados pseudocientcos, como de modo to perspicaz sev em Kelsen, sempre to insultado por seus colegas mais ambiciosos.(GARCA AMADO Juan Antonio. Derechos y pretextos: elementos de crticadel neoconstitucionalismo. In. CARBONELL, Miguel (Ed.). Teora delneoconstitucionalismo: ensayos escogidos,p. 263-264, traduo nossa)

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    H ainda o problema da principiolatria e a proliferao

    de princpios, como tem denunciado Lenio Luiz Streck comoo fenmeno do panprincipiologismo, de molde a facilitar oabandono de certos parmetros de segurana e de certeza jurdicapor uma discricionariedade judicial abusiva.46No Direito Civil,seguindo-se sua enumerao puramente exemplicativa, haveriaprincpios como: a) absoluta prioridade dos direitos da crianae do adolescente, cuja nalidade, em um universo jurdicocalcado no protagonismo judicial e no sujeito solipsista, seria o

    de permitir a determinao de certas polticas pblicas conforme apreferncia do intrprete, excluindo-se a condio de deliberaodemocrtica em benefcio da centralizao desses direitos nasescolhas dos juzes47; b) afetividade, de larga utilizao noDireito de Famlia contemporneo, cuja elevao a princpioescancara a compreenso do direito como subsidirio a juzosmorais (sem levar em conta os problemas relacionados peloconceito de afetividade no mbito da psicanlise, para falarapenas nesse campo do conhecimento).48

    No que se refere ao princpio da afetividade, impressiona avariedade de acepes que ele assume na doutrina. um claro exemplode que o rei est nu, mas sem que a haja uma criana corajosa, nomeio da multido, para o dizer. Se, como princpio, a afetividaderepresenta tudo o que dela se arma, ela nada representa. Vejam-sealguns exemplos dessa criatividade conceptual: a) afetividade como

    46STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: Constituio, hermenutica e teoriasdiscursivas da possibilidade necessidade de respostas corretas em direito, p.475-496 (especialmente).

    47 STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: Constituio, hermenutica eteorias discursivas da possibilidade necessidade de respostas corretas emdireito, p. 479-480.

    48 STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: Constituio, hermenutica eteorias discursivas da possibilidade necessidade de respostas corretas emdireito, p. 480.

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    meio de execuo da dignidade humana nas relaes familiares, com

    o objetivo de assegurar aos seus membros o direito a um ambientesadio e harmonioso, isto para que as crianas, seres humanos emformao, se desenvolvam como cidados dotados de valores ticose morais49; b) elemento caracterizador, em substituio vontade,das relaes jurdico-familiares;50c) na atualidade, a ideia de famliaest ligada de espao de realizao pessoal, no qual a afetividadese expande e a personalidade se desenvolve, independentementedo casamento institucional51. Na jurisprudncia, persiste idntico

    sincretismo terminolgico. Encontra-se o princpio da afetividadepara fundamentar: a) a formao de vnculos de parentesco, alm dosnaturais e legais, com base na chamada convivncia socioafetiva52;b) a indenizao por dano moral, em razo de ofensa afetividadeda pessoa, quando h disparo indevido do alarme contra furto emestabelecimento comercial.53

    49 CARDOSO, Alenilton da Silva. A funcionalizao social do direito privado.

    Revista Forense, p. 17.50 FERNANDES, Jacinta Gomes. Unio homoafetiva como entidade famliar:reconhecimento no ordenamento jurdico brasileiro.Revista Forense, p. 148.

    51 GONALVES, Camila de Jesus Mello. O reconhecimento de direitos ahomossexuais pelo Poder Judicirio: interpretao autorizada ou ativismojudicial?Revista Forense, p. 445.

    52 Nesse contexto, a liao socioafetiva, que encontra alicerce no art. 227, 6, da CF/88, envolve no apenas a adoo, como tambm parentescosde outra origem, conforme introduzido pelo art. 1.593 do CC/02, almdaqueles decorrentes da consanguinidade oriunda da ordem natural, de modo acontemplar a socioafetividade surgida como elemento de ordem cultural. Assim,

    ainda que despida de ascendncia gentica, a liao socioafetiva constituiuma relao de fato que deve ser reconhecida e amparada juridicamente. Issoporque a maternidade que nasce de uma deciso espontnea deve ter guaridano Direito de Famlia, assim como os demais vnculos advindos da liao.Como fundamento maior a consolidar a acolhida da liao socioafetiva nosistema jurdico vigente, erige-se a clusula geral de tutela da personalidadehumana, que salvaguarda a liao como elemento fundamental na formaoda identidade do ser humano. (TJRJ, REsp. 1000356/SP, Rel. Min. NancyAndrighi, 3 Turma, j. 25 maio 2010,DJe 7 jun. 2010)

    53 TJAP, Ap. n. 2.080/2005, Rel. Des. Carmo Antnio, j. 19 maio 2005, RF383/410.

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    So diversos os princpios que se invocam em Direito Civil,

    alm dos nominados. Mais que o abuso em sua invocao, tem-seo problema da confuso terminolgica, com conceitos jurdicosindeterminados, doutrinas, cnones hermenuticos e clusulasgerais que se convertem ou se reconvertem em princpios.

    De outro lado, existe a questo do uso inadequado dosprincpios em sua conexo com a tcnica dos direitos fundamentais.Tal desvio se opera em dois nveis: a) imputa-se ao Direito Civilo compromisso com valores socialmente ultrapassados, mas que,

    aps um exame perfunctrio na doutrina de cada perodo histrico, insubsistente e insusceptvel de comprovao. o caso doconceito de propriedade em sua correlao com os ordenamentosconstitucionais brasileiros de 1824-1988; b) a funo social, um dosprincpios mais fortemente manejados sem rigor terico, servede instrumento para diversas posies jurdicas incompatveis como ncleo essencial e com os limites do direito de propriedade. Emambos os casos, teve-se a oportunidade de demonstrar o erro da

    associao do Direito Civil clssico com interpretaes estreise ultraindividualistas do direito de propriedade, ainda que seobservado sob a ptica constitucional.54

    A dignidade da pessoa humana outra vtima dessa guerrapanprincipiolgica, seno a maior de todas. No h dvidasde que a dignidade da pessoa humana fundamento do EstadoDemocrtico de Direito, tendo conexo direta com a autonomiavital da pessoa e sua autodeterminao, como bem assinala JorgeMiranda.55D-se, contudo, sua banalizao e seu emprego comoreforo argumentativo, fundamento-berloque ou, como arma JooBaptista Villela, essa tornou-se um tropo oratrio que tende

    54 RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Dogmtica e crtica da jurisprudncia(ou da vocao da doutrina em nosso tempo).Revista dos Tribunais, So Paulo,v. 99, n. 891, p. 65-106, jan. 2010.

    55 MIRANDA, Jorge.Manual de direito constitucional, p. 199.

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    acidez absoluta.56Se tudo fundado na dignidade humana, nada,

    anal, o ser. Para no se esquecer que ela serve de fundamentodos discursos daqueles que defendem e dos que atacam o direitoao aborto e eutansia.57

    O quadro na jurisprudncia desalentador. A prova disso baseia-se em dados empricos. Em pesquisa realizada apenas em um peridicojurdico, aRevista dos Tribunais, compreendida entre 1995 e 2010,foram coletados 217 acrdos nos quais a expresso dignidadehumana encontrada como fundamento da deciso adotada58.

    O objeto desses julgados tambm muito diversicado: a)sade; b) relaes de trabalho; c) habeas corpus; c) mensurao

    56Conra-se a ntegra da citao: Dignidade da pessoa humana acabou por ganhar,assim, a propriedade de servir a tudo. De ser usado onde cabe com acerto pleno,onde convm com adequao discutvel e onde denitivamente no o seu lugar.Empobreceu-se. Esvaziou-se. Tornou-se um tropo oratrio que tende acidezabsoluta. Algum acha que deve ter melhores salrios? Pois que se elevem: umasimples questo de dignidade da pessoa humana. Faltam s estradas condies

    ideais de trfego? a prpria dignidade da pessoa humana que exige suamelhoria. O semforo desregulou-se em consequncia de chuvas inesperadas?Ora, substituam-no imediatamente. A dignidade da pessoa humana no podeesperar. ela prpria, a dignidade da pessoa humana, que se v lesada quandoa circulao viria das cidades no funciona impecavelmente 24 horas por dia.O inquilino se atrasou com os alugueres? Despejem-no o quanto antes: Fere adignidade da pessoa humana ver-se o locador privado, ainda que por um s dia,dos direitos que a locao lhe assegura. (VILLELA, Joo Baptista.Variaesimpopulares sobre a dignidade da pessoa humana. In: SUPERIOR TRIBUNALDE JUSTIA: doutrina,p. 562)

    57PRIETO LVAREZ, Toms.La dignidade de la persona: ncleo de la moralidad

    y el orden pblicos, lmite al ejercicio de libertades pblicas, p. 159.58 Os tribunais com os respectivos quantitativos de acrdos so os seguintes: 1)

    STF (23 ac.); 2) STJ (25 ac.); 3) TRF-1 Regio (4 ac.); 4) TRF-2aRegio(4ac.); 5) TRF-3 Regio (2 ac.); 6) TRF-4 Regio (6 ac.); 7) TRF-5 aRegio(2 ac.); 8) TJAC (3 ac.); 9) TJAP (4 ac.); 10) TJDF (8 ac.); 11) TJES (2 ac.);12) TJGO (3 ac.); 13) TJMA (1 ac.); 14) TJMT (3 ac.); 15) TJMS (6 ac.); 16)TJMG (10 ac.); 17) TJPA (4 ac.); 18) TJPB (1 ac.); 19) TJPR (5 ac.); 20) TJPE(1 ac.); 21) TJPI (3 ac.); 22) TJRN (5 ac.); 23) TJRS (7 ac.); 24) TJRO (5 ac.);25) TJSC (5 ac.); 26) TJSP (48 ac.); 27) TJMSP (1 ac.); 28) TAMG (5 ac.); 29)TAPR (1 ac.); 30) TARJ (1 ac.); 31) TARS (1 ac.); 32) TAcrim.SP (10 ac.); 33)1oTACiv.SP (6 ac.); 34) 2oTACiv.SP (2 ac.).

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    da pena; d) liberdade; e) direitos fundamentais; f) ordem pblica;

    g) descumprimento de preceito fundamental; h) jurisdio ecompetncia; i) violncia contra a mulher; j) priso preventiva;k) ampla defesa e contraditrio.

    5 CONCLUSO

    O Direito Privado tem sua Histria, sua metodologia, seus

    princpios e suas funes no que se poderia chamar de diviso dotrabalho entre as diversas provncias jurdicas. No adequado

    fazer o transplante desses elementos do Direito Pblico para oDireito Privado. O estatuto epistemolgico do Direito Privado no

    se coaduna com essa transposio, porque desnecessria e imprpria.

    Na raiz de todos os problemas acima descritos, est essa distoro,que, a cada dia, com o silncio de muitos civilistas, faz com que o

    Direito Privado assuma culpas histricas que no lhe pertencem e

    adote mtodos e princpios que no se ajustam aos seus ns.A entropia uma palavra de diferentes acepes, mas

    que signica, nas Cincias Biolgicas, a medida da desordem

    de um sistema. O Direito Privado entrpico nesse sentido. Acriatividade, a destruio, a transformao e a liberdade pautam

    a realidade que o Direito Privado tenta regular. O mundo das

    famlias, das empresas, dos negcios e da propriedade , assim esomente, um conjunto de regras adaptadas a esse modo entrpico

    de organizao das relaes sociais hbil (ou til) para responder

    s necessidades de seus atores.

    No clssico lme O poderoso chefo(ou O padrinho, em

    Portugal), de Francis Ford Coppola, o jovem (e futuro maoso)

    Vito Corleone um excelente empregado de uma pequena loja nobairro italiano. O dono visitado pelo maoso local, que exige

    um emprego para seu sobrinho. Apesar das objees, o dono do

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    estabelecimento cede s presses e comunica constrangido a

    Vito Corleone, pai de famlia e dependente daquele salrio parasobreviver, a perda de seu emprego. Em outra cena, o empregadorcorre e alcana Vito para lhe entregar uma caixa com alimentos,uma espcie de indenizao, recusada dignamente por ele.Assim, comea sua trajetria na vida do crime. lamentvel ecensurvel. Mas, sem maosos e esses elementos melodramticos,todos os dias pessoas so demitidas e contratadas por critriosextremamente subjetivos e por razes que nunca seriam captveis

    pelos princpios ou pelos parmetros do Direito Constitucional,por exemplo. Seria o caso de se exigir a aplicao do dever defundamentar as decises, presente na Constituio, para tais fatosda vida privada? Evidentemente que no. Prevalece, no mundoreal, a clusula Vito Corleone, para se usar de uma metforacinematogrca.

    O nepotismo prtica abolida do ambiente pblico. H o art.37, caput, da Constituio, com o princpio da impessoalidade,e a Smula Vinculante STF n 13, que probe o nepotismo naAdministrao Pblica. Ningum discute as vantagens dessemodelo na esfera estatal. O que dizer da gesto de grandesempresas privadas, baseadas no critrio dos laos de sangue?Quem contesta a sucesso familiar nos grupos econmicos? Noprograma jornalstico de maior audincia da televiso brasileira,que muitas vezes denunciou o nepotismo no Governo brasileiro,

    a bancada de ncoras ocupada por marido e mulher, assim comomuitos dos atores so lhos ou casados com colegas de prosso,diretores ou produtores da radiodifusora. Perderia em legitimidadea televiso por favorecer o nepotismo em seus quadros ou isso uma decorrncia do regime privado de sua organizao, pautadona liberdade dessas escolhas?

    Esses exemplos demonstram a falcia da transposiopura e simples de dois princpios constitucionais para o Direito

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    Privado. Essas escolhas so irracionais, entrpicas e de altssima

    subjetividade. E devem ser assim. Os efeitos so positivospara a sociedade. O mundo privado se constri e autodestri

    permanentemente. A televiso que abriga artistas em famlia

    obtm timos ndices de audincia. E, por outro lado, outra

    grande empresa de radiodifuso brasileira quase foi bancarrota

    pela administrao fraudulenta de uma instituio nanceira

    integrante de sua holding, a cargo de dezenas de parentes de seu

    acionista-controlador. Na esfera privada, essas escolhas no podem

    ser medidas pelos padres do Direito Pblico. O sucesso ou ofracasso desses empreendimentos que determinar a continuidade

    dos respectivos modelos. E, com essa destruio criativa,

    parafraseando Alois Schumpeter, embora em um sentido diferente,

    constroem-se novas riquezas e outras desaparecem.

    Antes que se tente confundir as teses aqui defendidas com

    um canto do cisne do Direito Civil Oitocentista ou com um

    apelo no estilo de Juliano, o Apstata, de retomada da religiopag, preciso registrar que no se desconhece a incompetncia

    do Direito Privado (e de seus estudiosos) em compreender as

    transformaes sociais e no oferecer mecanismos de adaptao

    aos novos tempos, por meio de novos institutos jurdico-privados.

    Foi essa miopia que permitiu o surgimento do Direito do Trabalho

    (com base nos contratos de locao de mo de obra), do Direito

    do Consumidor (sob a base contratual civilstica) e das leis de

    locao predial urbana.

    No se ignora que as relaes no mundo privado so

    marcadas, em diversos casos, pela assimetria entre as partes. O

    fenmeno da vulnerabilidade de diversos agentes inegvel, e

    eles no podem ser deixados entregues prpria sorte, como se

    a mo invisvel do mercado tudo fosse capaz de resolver. Os

    grandes grupos econmicos podem ser to nocivos aos privados

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    quanto o Estado, em muitas situaes.59No reconhecimento da

    entropia do mundo privado, no se deseja o retorno aos tempos de1929. A tragdia da crise econmica de 2008 uma prova de quea atuao regulatria(e portanto ex ante) foi inecaz, o que deumargem a diversos questionamentos judiciais, que levaro para ocampo da indeterminao. A autonomia privada no se ressenteda regulao ex ante. Ela mais do que necessria, porque deneas regras do jogo antes de seu incio.

    A posio aqui sustentada diz respeito a problemas de carter

    epistemolgico, da falta de rigor e de coerncia no desempenho dopapel (essencial) dos doutrinadores e na renncia s solues dosproblemas jurdicos com base em respostas que o Direito Privadopode e tem condies de oferecer. O risco est, ainda, no que advertiuKonrad Hesse, citando Alexis de Tocqueville, na perda da capacidadehumana de congurao responsvel e autnoma da prpria vida,60no por um Estado todo-poderoso e ditatorial, mas pelo Estadoexcessivamente protetivo, que acostuma os homens com sua mo

    bondosa, quando, na verdade, os escraviza em uma gaiola de ouro.Em Portugal ou na Alemanha, para se car com esses dois

    exemplos, muitos avanos na tentativa de adaptar a tradio de civillawe o Direito Civil clssico s exigncias de nosso tempo foramobtidos, apesar de alguns embaraos, sem que, para isso, se zessenecessrio abandonar dois mil anos de experincia jurdica61sem

    59Como salienta Jorge Reis Novaes em relao aos excessos da teoria da aplicaoimediata dos direitos fundamentais em relao aos privados. (Cf. NOVAES,Jorge Reis.Direitos fundamentais: trunfos contra a maioria, p. 68-116)

    60 HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht, p. 35.61 Embora, na prpria Alemanha, j se sintam os efeitos da crise histrica

    diviso de funes entre a doutrina e a jurisprudncia, pela qual competia aprimeira a tarefa de projetar a compreenso geral das normas individuais emrelao totalidade do Direito e assim dar em carter geral jurisprudnciaa ajuda necessria para que reita sobre as regras gerais tericas em suaaplicao em um caso concreto. (EHMANN, Horst; SUSTSCHET, Holger.

    Modernisiertes Schuldrecht:Lehrbuch der Grundstze des neuen Rechts undseiner Besonderheiten, p. 14)

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    qualquer vantagem para o Direito ou para a sociedade. Muitas das

    questes relativas ao Direito Civil, aqui expostas, so comuns aoDireito Constitucional, no que se refere ao abandono dos frunsde deliberao democrtica, da perda da dignidade da legislao eda busca pelo Santo Graal da judicializao de polticas pblicas ede agendas morais, que deveriam ser implementadas ou decididasnas esferas adequadas e legtimas. Nesse ponto, os dois elementosda tradio de civil lawse unem nas mesmas adversidades.

    Epistemlgical statute f cntempay Civil Lawbasedn its taditin and in view f necnstitutinalism and

    pinciples

    Abstact: Classical Civil Law, in agreement with its tradition,has received criticism for alleged commitments to otherlegal interpretations inconsistent with social values andelements. Neoconstitutionalism, loss of dignity of the law,and overexpansion of the principles are elements that contendthe autonomy and epistemological statute of Civil Law.Specic differentiation of functions and the impossibility ofunconditional and simple application of Public Law principlesmust be taken into consideration when reading contemporaryCivil Law.

    Key wds: Principles. Contracts. Marriage. Assignment of

    roles. Activism.

    REFERNCIAS

    ALVES JNIOR, Lus Carlos Martins. Direitos constitucionaisfundamentais: vida, liberdade, igualdade e dignidade. Belo Horizonte:Mandamentos, 2010.

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    AMAP. Tribunal de Justia. Ementa civil e processual civil. Danomoral. Disparo de alarme antifurto. Mercadoria revistada na presena deoutros consumidores. 1) Reconhece-se o constrangimento ao consumidorque no deu causa ao disparo de alarme de segurana indicador de furto,utilizado por loja de departamentos. 2) A indenizao por dano moral deveser compatvel com cada caso concreto, cujo quantumno deve destoarirrazoavelmente da mdia do que vem sendo decidido na esfera do PoderJudicirio local. 3) Recurso parcialmente provido. Apelao n. 2.080/2005.Rel. Des. Carmo Antnio. Rio Branco, 19 maio 2005.RF383/410.

    AZEVEDO, lvaro Villaa. Cdigo civil comentado: negcio jurdico;

    atos jurdicos lcitos; atos ilcitos: artigos 104 a 188. So Paulo: Atlas,2003. v. 2.

    AZEVEDO, Antonio Junqueira de. O direito ontem e hoje: crtica aoneopositivismo constitucional e insucincia dos direitos humanos.

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    proposta pelo lho biolgico dos pais afetivos em falsidade ideolgica.

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