Diss Pedro Hiane

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

    QUESTES DE MATEMTICA DA UFMS E ENEM: UMA

    ANLISE DA AVALIAO POR CONTEDOS E POR

    OUTRAS COMPETNCIAS

    CAMPO GRANDE MS 2011

  • PEDRO HIANE

    QUESTES DE MATEMTICA DA UFMS E ENEM: UMA

    ANLISE DA AVALIAO POR CONTEDOS E POR

    OUTRAS COMPETNCIAS

    Dissertao apresentada para a obteno

    do grau de Mestre em Educao

    Matemtica Comisso Julgadora da

    Universidade Federal de Mato Grosso do

    Sul, sob a orientao do Professor Dr.

    Jos Luiz Magalhes de Freitas

    CAMPO GRANDE MS 2011

  • BANCA EXAMINADORA

    __________________________________________________

    Prof. Dr. Jos Luiz Magalhes de Freitas Orientador UFMS

    _________________________________________

    Prof . Dr. Veronica Gitirana Gomes Ferreira UFPE

    _______________________________________

    Prof. Dr. Marcio Antonio da Silva UFMS

    _______________________________________

    Prof. Dr. Luiz Carlos Pais UFMS

  • DEDICATRIA

    A minha querida esposa Gldis, que me ajudou e incentivou nesta etapa acadmica. A meu

    filho Pedro Henrique, que em breve realizar a prova do ENEM e, que o esforo deste

    trabalho, sirva de exemplo para sua nova caminhada universitria. Ao meu pequeno Ncolas,

    que nasceu durante a realizao desta pesquisa e que me iluminou para a concluso dessa

    dissertao. A meus pais, razo da minha existncia.

  • AGRADECIMENTOS

    minha esposa Gldis e aos meus filhos Pedro Henrique e Ncolas, que entenderam minha

    ausncia na elaborao desta dissertao, nos diversos trabalhos e nas horas de estudos

    durante a realizao deste projeto.

    Ao Professor Dr. Jos Luiz Magalhes de Freitas, meu orientador, pelo apoio, pacincia,

    credibilidade e compreenso que me proporcionou.

    Aos Professores pela amizade, carinho e ensinamentos oferecidos.

    Aos meus colegas de turma e do Grupo de Pesquisa em Histria da Educao Matemtica

    Escolar, que cooperaram nas discusses realizadas enriquecendo este trabalho.

    Ao Fernando pelo apoio, ateno e contribuio.

    A todos que contriburam direta e indiretamente na realizao deste trabalho.

    A Deus pela presena nos momentos mais difceis.

  • RESUMO

    Esta pesquisa de mestrado tem como objetivo analisar as provas de Matemtica da UFMS,

    estruturadas para avaliar contedos especficos, e as do ENEM, que valorizam outras

    competncias e habilidades. Analisamos as provas da UFMS e do ENEM, de 1993, 1999,

    2001, 2005, 2008 e em particular a do ENEM de 2009 que provocou alteraes significativas

    no processo seletivo de alunos do Ensino Mdio, para ingresso nas Universidades Federais.

    Fizemos uma anlise dos vestibulares no Brasil, em seguida estudamos mudanas nos

    vestibulares da UFMS, a partir de 1993, bem como a implantao e as alteraes nas provas

    do ENEM. Alm das provas, examinamos documentos oficiais editados a partir de 1996,

    principalmente, a Fundamentao Terico-Metodolgica do ENEM e as Orientaes

    Curriculares para o Ensino Mdio, que implantaram reformas educacionais neste nvel de

    ensino. Para o embasamento terico da anlise utilizamos textos de Perrenoud sobre

    avaliaes, competncias e habilidades. Foi realizada uma abordagem metodolgica nos

    documentos pesquisados, inspirada na Anlise de Contedo, de Laurence Bardin. Foi possvel

    observar que as provas de matemtica dos vestibulares da UFMS, antes da implantao da

    LDB 9.394/96 e do ENEM, em 1998, visavam avaliar essencialmente a

    competncia/habilidade cognitiva relativa ao domnio de contedos matemticos. Verificamos

    que a partir de 2001, at a adeso ao SISU, o vestibular da UFMS comea a utilizar questes

    contextualizadas com mais frequncia, onde se busca medir tanto o conhecimento de

    contedos especficos quanto outras competncias e habilidades.

    Palavras-chave: ENEM. Avaliao. Contedos. Competncias.

  • ABSTRACT

    This Master thesis aims to analyze the mathematic entrance exams for UFMS, structured to

    rate specific contents, and ENEM, that value other skills and abilities. We analyze admission

    exams of UFMS and ENEM, 1993, 1999, 2001, 2005, 2008 and in particular the ENEM 2009

    that significantly changes the way to select high school students for admission into public

    universities. We did an analysis of entrance exams in Brazil, and then studied changes in the

    UFMS tests, from 1993, as well as the implementation and changes in ENEM exam. Beyond

    to the test, we examine the official documents published since 1996, mainly as ENEM

    theoretical-methodological and Curriculum Guidelines for High School, that implemented

    educational reforms in this level of education. For the theoretical basis of the analysis it was

    used Perrenouds texts about rates, skills and abilities. We performed a methodological approach in the documents searched, inspired by the Content Analysis of Laurence Bardin. It

    was observed that the entrance exam for UFMS math course, before the implementation of

    LDB 9.394/96 and ENEM in 1998, intended mainly to measure the competency / cognitive

    ability on the field of mathematical content. We found that from 2001 until joining the SISU,

    the admission UFMS test starts using contextual questions more often, where the aim is to

    measure knowledge of both specifically content competence skills and other abilities.

    Keywords: ENEM. Rates. Content. Skills.

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Anlise Vestibular UFMS 1993

    Tabela 2 Distribuio Dimenso Campo Vestibular UFMS 1993

    Tabela 3 Distribuio Dimenso Nvel Vestibular UFMS 1993

    Tabela 4 Anlise ENEM 1999

    Tabela 5 Distribuio Dimenso Campo ENEM 1999

    Tabela 6 Distribuio Dimenso Nvel ENEM 1999

    Tabela 7 Distribuio Dimenso Contextualizao ENEM 1999

    Tabela 8 Distribuio Dimenso Competncias ENEM 1999

    Tabela 9 Distribuio Dimenso Habilidades ENEM 1999

    Tabela 10 Anlise Vestibular UFMS 1999

    Tabela 11 Distribuio Dimenso Campo Vestibular UFMS 1999

    Tabela 12 Distribuio Dimenso Contextualizao Vestibular UFMS 1999

    Tabela 13 Anlise ENEM 2001

    Tabela 14 Distribuio Dimenso Campo ENEM 2001

    Tabela 15 Distribuio Dimenso Nvel ENEM 2001

    Tabela 16 Distribuio Dimenso Contextualizao ENEM 2001

    Tabela 17 Distribuio Dimenso Competncias ENEM 2001

    Tabela 18 Distribuio Dimenso Habilidades ENEM 2001

    Tabela 19 Anlise Vestibular UFMS 2001

    Tabela 20 Distribuio Dimenso Campo Vestibular UFMS 2001

    Tabela 21 Distribuio Dimenso Nvel Vestibular UFMS 2001

    Tabela 22 Distribuio Dimenso Contextualizao Vestibular UFMS 2001

    Tabela 23 Anlise ENEM 2005

    Tabela 24 Distribuio Dimenso Campo ENEM 2005

    Tabela 25 Distribuio Dimenso Nvel ENEM 2005

    Tabela 26 Distribuio Dimenso Contextualizao ENEM 2005

    Tabela 27 Distribuio Dimenso Competncias ENEM 2005

    Tabela 28 Distribuio Dimenso Habilidades ENEM 2005

    Tabela 29 Anlise Vestibular UFMS 2005

    Tabela 30 Distribuio Dimenso Campo Vestibular UFMS 2005

    Tabela 31 Distribuio Dimenso Nvel Vestibular UFMS 2005

  • Tabela 32 Distribuio Dimenso Contextualizao Vestibular UFMS 2005

    Tabela 33 Anlise ENEM 2008

    Tabela 34 Distribuio Dimenso Campo ENEM 2008

    Tabela 35 Distribuio Dimenso Nvel ENEM 2008

    Tabela 36 Distribuio Dimenso Contextualizao ENEM 2008

    Tabela 37 Distribuio Dimenso Competncias ENEM 2008

    Tabela 38 Distribuio Dimenso Habilidades ENEM 2008

    Tabela 39 Anlise Vestibular UFMS 2008

    Tabela 40 Distribuio Dimenso Campo Vestibular UFMS 2008

    Tabela 41 Distribuio Dimenso Nvel Vestibular UFMS 2008

    Tabela 42 Distribuio Dimenso Contextualizao Vestibular UFMS 2008

    Tabela 43 Anlise ENEM 2009

    Tabela 44 Distribuio Dimenso Campo ENEM 2009

    Tabela 45 Distribuio Dimenso Nvel ENEM 2009

    Tabela 46 Distribuio Dimenso Contextualizao ENEM 2009

    Tabela 47 Distribuio Dimenso Competncias ENEM 2009

    Tabela 48 Distribuio Dimenso Habilidades ENEM 2009

  • SUMRIO

    INTRODUO.................................................................................................................... 01

    1 TRAJETRIA E DEFINIO DO PROBLEMA DE PESQUISA............................. 03

    1.1 MINHA TRAJETRIA................................................................................................... 03

    1.2 DEFINIO DO PROBLEMA DE PESQUISA............................................................. 06

    2 VESTIBULARES.............................................................................................................. 11

    2.1 VESTIBULARES NO BRASIL....................................................................................... 11

    2.2 VESTIBULAR DA UFMS............................................................................................... 14

    2.3 ENEM............................................................................................................................... 17

    3 ELEMENTOS TERICOS E METODOLGICOS PARA ANLISE DE

    DOCUMENTOS.............................................................................................................

    22

    3.1 PROPOSTAS DE MUDANAS PARA O ENSINO MDIO ....................................... 22

    3.2 AVALIAO.................................................................................................................. 23

    3.3 COMPETNCIAS............................................................................................................ 27

    3.4 CONTEXTUALIZAO................................................................................................ 36

    3.5 PROCEDIMENTOS METODOLGICOS..................................................................... 38

    4 ANLISE DOS DOCUMENTOS E DAS PROVAS DOS VESTIBULARES UFMS

    E ENEM.................................................................................................................................

    42

    4.1 CATEGORIZAO........................................................................................................ 43

    4.1.1 Categoria 1 Dominar linguagens............................................................................. 44

    4.1.2 Categoria 2 Compreender fenmenos.................................................................... 45

    4.1.3 Categoria 3 Enfrentar situaes-problema............................................................ 46

    4.1.4 Categoria 4 Construir argumentao..................................................................... 47

    4.1.5 Categoria 5 Elaborar propostas.............................................................................. 47

    4.1.6 Categoria 6 Contextualizao.................................................................................. 48

    4.1.6.1 Contextualizao na Histria da Matemtica............................................................. 49

    4.1.6.2 Contextualizao nas prticas sociais atuais.............................................................. 51

    4.1.6.3 Contextualizao em outras reas do conhecimento.................................................. 52

    4.1.6.4 Pseudo-contextualizao............................................................................................ 53

    4.1.6.5 Contextualizao na prpria Matemtica................................................................... 54

    4.1.6.6 Questes no-contextualizadas................................................................................... 55

    4.2 FORMAS DE PROPOSIO DAS QUESTES........................................................... 56

  • 4.2.1 Questes de proposies mltiplas ou questes de somatria................................. 56

    4.2.2 Questes abertas.......................................................................................................... 57

    4.2.3 Questes descritivas..................................................................................................... 57

    4.2.4 Questes objetivas de mltipla escolha...................................................................... 57

    4.3 VESTIBULAR UFMS 1993............................................................................................ 59

    4.4 ENEM 1999...................................................................................................................... 63

    4.5 VESTIBULAR UFMS 1999............................................................................................ 73

    4.6 ENEM 2001...................................................................................................................... 77

    4.7 VESTIBULAR UFMS 2001............................................................................................ 101

    4.8 ENEM 2005...................................................................................................................... 108

    4.9 VESTIBULAR UFMS 2005............................................................................................ 117

    4.10 ENEM 2008.................................................................................................................... 122

    4.11 VESTIBULAR UFMS 2008.......................................................................................... 131

    4.12 ENEM 2009.................................................................................................................... 136

    5 CONSIDERAES FINAIS............................................................................................ 147

    6 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS............................................................................ 151

    ANEXOS................................................................................................................................ 154

  • INTRODUO

    Nesta pesquisa analisamos os enunciados das provas de Matemtica dos vestibulares da

    Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e do Exame Nacional do Ensino Mdio

    (ENEM), tendo como objetivo principal investigar as avaliaes por contedos se

    diferenciando daquelas que valorizam outras competncias e habilidades. Analisamos tambm

    os documentos oficiais, editados a partir de 1996, que implantaram reformas educacionais,

    estabelecendo o Ensino Mdio como etapa final da educao bsica, tendo como propsito

    aprimorar o educando em sua formao tica, autonomia intelectual e pensamento crtico, em

    sua preparao para a cidadania, para o trabalho e para a vida. Para definir as categorias desta

    dissertao, utilizamos as Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio, a Fundamentao

    Terico-Metodolgica do ENEM e principalmente as provas dos vestibulares da UFMS e do

    ENEM.

    Foi possvel observar alteraes significativas na elaborao das questes para o vestibular da

    UFMS, a partir da implantao de documentos oficiais em 1996 e da edio do ENEM em

    1998, que foi criado inicialmente para avaliar o desempenho dos candidatos que esto

    concluindo ou j concluram o Ensino Mdio, de carter voluntrio e, principalmente, dar um

    panorama sobre a qualidade da educao do Ensino Mdio, elaborando boletim de resultados

    por escola, com anlise do desempenho global do conjunto de concluintes do Ensino Mdio

    da Instituio. Aps uma dcada de sua implantao, o ENEM deixou de ser um instrumento

    de avaliao da qualidade do Ensino Mdio e passou a ter carter obrigatrio para candidatos

    com interesses no Ensino Superior, o que o tornou um novo tipo de vestibular, desviando

    assim do objetivo original deste exame.

    Para dar suporte s nossas anlises, fizemos uso do referencial terico de Philippe Perrenoud,

    tomando por base textos sobre avaliao, competncias e habilidades. Para a abordagem

    metodolgica dos documentos pesquisados utilizamos fragmentos da Anlise de Contedo, de

    Laurence Bardin, identificando categorias para a anlise dos dados da pesquisa.

    No primeiro captulo, fizemos um relato pormenorizado da minha trajetria como professor

    de Matemtica, focando em dois fatos que me interessavam como profissional: as mudanas

    no vestibular da UFMS, e ENEM que trouxe consigo os conceitos de interdisciplinaridade e

    contextualizao, com o intuito de medir e qualificar as estruturas responsveis pelas

    interaes ocasionadas a partir de competncias e habilidades pr-definidas em sua matriz de

    referncia e como foram definidos os objetivos do projeto de pesquisa.

  • No segundo captulo, apresentamos uma descrio da evoluo dos vestibulares no Brasil.

    Realizamos um breve levantamento histrico de como funcionavam os exames de seleo

    para ingresso em cursos superiores desde o perodo do Imprio, as denominaes de exames

    parcelados, exames de preparatrios, exames de madureza at a designao de exames de

    vestibulares. Pesquisamos sobre os exames dos vestibulares da UFMS, de 1993 at 2008 e,

    por fim, realizamos um estudo da prova do ENEM desde a sua implantao, em 1998, at a

    criao do novo ENEM em 2009, que surgiu com o objetivo de realizar uma avaliao ao

    final da Educao Bsica, que pudesse servir como modalidade alternativa ou complementar

    aos processos de seleo nos diferentes setores do mundo do trabalho e, assim, possibilitar a

    participao e a criao de condies de acesso aos programas do governo.

    O terceiro captulo destinado apresentao de nosso referencial terico e metodolgico de

    pesquisa. Fundamentamos nossa pesquisa nos aportes de Philippe Perrenoud para servir como

    suporte terico de anlise de temas como: avaliao, competncias e habilidades, pois tanto os

    vestibulares como a prova do ENEM visam aferir conhecimentos matemticos. Os

    vestibulares avaliam contedos matemticos se diferenciando das provas do ENEM, que

    visam avaliar tambm outras competncias e habilidades. Para apontar as alteraes

    curriculares no Ensino Mdio, apresentamos algumas propostas que induzem essas alteraes

    contidas nos documentos oficiais.

    Finalmente, no quarto captulo, analisamos as Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio

    e a Fundamentao Terico-Metodolgica do ENEM para definir as categorias de anlise.

    Examinamos os enunciados das provas dos vestibulares da UFMS e do ENEM para

    identificar caractersticas concernentes a contedos, competncias e habilidades que as

    diferenciam.

  • 1 TRAJETRIA E DEFINIO DO PROBLEMA DE PESQUISA

    O objetivo deste captulo relatar minha trajetria como professor de Matemtica, expor

    dificuldades observadas durante o exerccio do magistrio, descrever algumas inquietaes a

    respeito do ensino da Matemtica em relao s provas desta disciplina nos vestibulares da

    Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), bem como os motivos que me levaram

    a ingressar no curso de Mestrado em Educao Matemtica desta universidade e, finalmente,

    como foram definidos os objetivos do projeto de pesquisa.

    1.1 MINHA TRAJETRIA

    Inicialmente, farei um breve relato sobre minha trajetria at chegar ao magistrio. Minha

    primeira lembrana em relao Matemtica de quando eu tinha seis anos de idade. Nesse

    perodo, eu sabia de cor a tabuada at o nove, sabia somar e subtrair alguns nmeros.

    Lembro-me de um tio, que tinha armazm, e gostava que eu ficasse com ele no caixa para

    fazer as contas do troco. Estudei at a stima srie em escola pblica; finalizei o Primeiro

    Grau1 e cursei o Segundo Grau

    2 em escola particular. Sempre tive facilidade em Matemtica e

    a certeza que a minha profisso estaria vinculada rea de exatas. Minhas primeiras lies

    desta disciplina quem me ensinou foi meu pai, mas quem ajudava nas tarefas da escola era

    minha me. Lembro-me que quando eu estudava na quinta/sexta srie ela dizia que a

    Matemtica havia mudado, agora era moderna e ela no sabia ensinar daquela nova

    maneira. A partir da stima srie, eu no precisava mais dos ensinamentos de minha me,

    pois a Matemtica comeava a ficar difcil para ela e eu conseguia fazer as tarefas sozinho.

    Entretanto, minha me continuava como referncia para qualquer tipo de dvida. Porm, ela

    faleceu uma semana antes de eu prestar vestibular. Foram dois anos de tratamento da doena e

    de muitas dificuldades para conciliar meus estudos e afazeres de casa.

    Prestei vestibular para Engenharia Civil na UFMS. Nesta poca, as provas eram elaboradas

    pela Fundao Carlos Chagas e realizadas em quatro dias e ocorriam no incio de janeiro. O

    sistema de seleo era unificado, ou seja, provas iguais para todos os cursos. A prova de

    Matemtica continha quarenta questes objetivas e coincidia com o dia da prova de

    Geografia. Os alunos aprovados em Engenharia Civil eram divididos em duas turmas, uma

    1 A partir daqui utilizaremos Ensino Fundamental que corresponde ao Primeiro Grau.

    2 A partir daqui utilizaremos Ensino Mdio que corresponde ao Segundo Grau.

  • com incio no primeiro semestre e a outra no segundo semestre. Passei no primeiro vestibular

    que fiz aps a concluso do Ensino Mdio, para comear a estudar no segundo semestre.

    Como eu ficaria um semestre ocioso, fui convidado pelo Coordenador do colgio onde

    estudava para auxili-lo nas atividades pedaggicas.

    Com o incio das aulas na Universidade Federal, desliguei-me das atividades do colgio para

    me dedicar ao curso, j que, para concluir Engenharia Civil, o acadmico precisa empregar

    muitas horas de estudo para disciplinas bsicas como Clculo, Geometria Analtica, Vetores,

    Desenho, Clculo Numrico, lgebra, Fsica entre outras.

    Nesse mesmo semestre, comecei a dar aulas particulares, ministradas nas casas de estudantes

    do Ensino Fundamental e Mdio, aps as minhas aulas no curso de Engenharia Civil.

    Acredito que naquele momento comeou minha trajetria no magistrio. Naquela poca,

    ainda no existia a tecnologia da telefonia mvel para que mes ou alunos entrassem em

    contato para marcar as aulas. De incio, contava com alguns alunos fixos para as aulas

    particulares. Entretanto, com o passar do tempo e prximo do final do ano letivo, a quantidade

    de alunos foi aumentando, era a propaganda boca a boca. Quando chegava para ministrar

    aula na casa de um aluno, ouvia-o dizer que tinha um colega que tambm queria ter aula

    comigo e passava-me o telefone para entrar em contato. Terminava as aulas de Engenharia

    Civil um pouco antes das 17 horas e j tinha aula marcada entre 17h e 22h. E meu curso como

    ficou, afinal? Apesar desse trabalho extra, consegui ser aprovado em todas as disciplinas do

    primeiro semestre.

    Em 1986, comecei a trabalhar como professor em uma escola particular nos horrios vagos do

    meu curso universitrio, alis, sempre trabalhei em instituies particulares. Como currculo

    profissional, acredito que falta para mim a experincia em uma instituio pblica. Alm da

    escola, continuava com as aulas particulares. Em pouco tempo, passei a dar aulas no Ensino

    Mdio e em cursos preparatrios para o vestibular. Cursei Engenharia Civil at o sexto

    semestre, quando percebi que o tempo de dedicao a esse curso tinha ficado para segundo

    plano. A docncia j fazia parte de minha vida. Estava envolvido com a profisso e no tinha

    mais tempo para cursar engenharia. Muito jovem ainda, tive que tomar uma deciso muito

    difcil, pois envolvia meu futuro profissional: trancar o curso de Engenharia Civil e seguir

    carreira no magistrio. No me arrependo da deciso tomada, pois, alm de professor, fui

    coordenador, diretor e at proprietrio de escola.

    No ano de 1996, o governo federal implantou a Lei de Diretrizes e Bases da Educao

    Nacional (LDB n 9.394/96), onde se instituiu o Plano Decenal da Educao, que tinha como

    uma de suas metas obrigar todos os professores que lecionavam e no eram formados, a

  • conclurem um curso de licenciatura para continuarem a ministrar aulas na educao bsica.

    Como eu havia abandonado o curso de Engenharia Civil e no era formado em Matemtica,

    em 2003, finalizei o curso de Licenciatura em Matemtica pela Universidade para o

    Desenvolvimento do Estado e da Regio do Pantanal (UNIDERP). Em 2005, na mesma

    instituio, conclui o Curso de Ps-Graduao Lato Sensu em Matemtica para o Ensino

    Fundamental e Mdio.

    Em todo esse perodo na rea de ensino at os dias atuais, dois fatos me deixavam intrigado:

    as mudanas no vestibular da UFMS, assim como a implantao do Exame Nacional do

    Ensino Mdio (ENEM) introduzindo as questes que cobravam outros conhecimentos que

    estabeleciam relaes entre duas ou mais disciplinas, cujo objetivo principal de medir e

    qualificar as estruturas responsveis pelas interaes ocasionadas a partir de competncias e

    habilidades pr-definidas em sua matriz de referncia.

    Percebemos que a prova do ENEM, estruturada para avaliar diversas competncias e

    habilidades, se diferencia da prova de vestibular elaborada pela UFMS, pois esta consistia em

    uma avaliao por contedos. Sendo assim, todo item da prova visa aferir, necessariamente,

    tanto o contedo do saber escolar questionado, como a habilidade cognitiva indispensvel

    para a revelao do conhecimento de cada questo da prova. Apesar das competncias e

    habilidades avaliadas nas provas dos vestibulares da UFMS no terem sido explicitamente

    listadas em seus editais, possvel identific-las analisando cada um dos itens da prova.

    A valorizao de novas competncias pode ter induzido o surgimento de uma nova tendncia

    no ensino da Matemtica. A busca de uma maior compreenso dessa nova realidade me levou

    a esta pesquisa no Mestrado em Educao Matemtica da UFMS. Eu queria aprofundar meus

    conhecimentos sobre as variaes nas provas dos vestibulares, em particular a mudana de

    foco no ENEM (de anlise qualitativa do Ensino Mdio para instrumento avaliativo de acesso

    ao Ensino Superior), a incluso de questes que envolvem contextos diversos e contedos de

    outras reas, a insero gradativa das questes que avaliam competncias e habilidades nas

    provas da UFMS.

    1.2 DEFINIO DO PROBLEMA DE PESQUISA

  • Em fevereiro de 2008 fiz minha inscrio como aluno especial3 no Programa de

    Ps Graduao em Educao Matemtica da UFMS, na disciplina de Teoria dos Nmeros.

    Durante o primeiro semestre, participei dos seminrios de pesquisa promovidos pela

    coordenao do curso. No segundo semestre, novamente me matriculei como aluno especial,

    desta vez na disciplina Conceitos Fundamentais de Matemtica, ministrado pelo Professor Dr.

    Luiz Carlos Pais. Nesta poca, tive oportunidade de participar como membro do Grupo de

    Pesquisa em Histria da Educao Matemtica Escolar (GPHEME), coordenado por este

    professor, ocasio em que comecei a estudar a histria dos vestibulares no Brasil.

    Em maro de 2009, fui aprovado como aluno regular no Mestrado em Educao

    Matemtica da UFMS, sob a orientao do Professor Dr. Jos Luiz Magalhes de Freitas.

    Aps a primeira apresentao, meu orientador recomendou que eu elaborasse outro projeto de

    pesquisa voltado minha prtica docente. Segundo relatado em minha trajetria, o que mais

    me intrigava como professor de Matemtica eram as alteraes nos exames vestibulares da

    UFMS, desde o perodo em que comecei a lecionar at a incluso das questes

    contextualizadas do ENEM. Depois de fazer o levantamento do material que eu possua,

    observei que poderia fazer uma pesquisa sobre as provas dos vestibulares de Matemtica do

    Brasil.

    Como acadmicos da disciplina Aspectos Histricos e Culturais da Disciplina

    Escolar de Matemtica, fizemos uma coletnea de documentos antigos que poder servir

    como fonte de dados para futuros pesquisadores que pretendam estudar a evoluo da

    Educao Matemtica, no perodo compreendido entre o final do Imprio e incio da

    Repblica. A partir dessa coletnea, o meu levantamento histrico sobre os vestibulares no

    Brasil pde ser finalizado e tambm faz parte de um captulo dessa dissertao.

    Inicialmente, sob a orientao do Professor Jos Luiz, eu pretendia fazer um

    levantamento histrico do processo seletivo das faculdades criadas no Imprio. Porm, no

    teramos tempo hbil para concluir esse estudo, sobretudo pela dificuldade para coleta de

    dados. Resolvemos ento, pesquisar os vestibulares no Brasil, assunto que est apresentado no

    captulo 2 desta dissertao.

    3 aquele que se inscreve em disciplinas de Mestrado, sem vnculo efetivo com o Mestrado. Caso seja aprovado

    no Processo Seletivo ele poder requerer o aproveitamento de at duas disciplinas cursadas anteriormente como

    aluno especial.

  • Escrevemos nosso primeiro artigo para o XIII Encontro Brasileiro de Estudantes de

    Ps-Graduao em Educao Matemtica (EBRAPEM), que tinha como tema ENEM e

    Vestibular: anlise de mudanas nas provas de Matemtica na ltima dcada. Em princpio,

    tnhamos como objetivo analisar os ltimos dez anos de exames vestibulares, realizados em

    diferentes universidades pblicas e privadas, de vrios lugares do Brasil. Todavia, o estudo

    seria muito abrangente. Aps a coleta, conclumos ser necessrio ter um foco principal em

    relao s questes dos vestibulares. Com a proposta do governo federal de alterar o modelo

    de provas do ENEM, em 2009, optamos pelo recorte de anlise somente das provas deste

    exame e dos vestibulares da UFMS, tambm no perodo da ltima dcada.

    Ao reunir os dados coletados, observamos que tnhamos material de qualidade para mais de

    dez anos, ou seja, as provas dos vestibulares da UFMS (1993 a 2010) e todos os exames do

    ENEM, desde a sua implantao em 1998. Nesse momento, decidimos reformular o objeto de

    nossa pesquisa. A nova prova do ENEM, aplicada em 2009, contribuiu para a definio do

    nosso foco de pesquisa e definimos ento pesquisar as questes contextualizadas, j que

    confirmamos ser esta a forma escolhida para a maioria das perguntas da prova de Matemtica.

    Assim, o nosso objeto de pesquisa, inicialmente, ficou definido como: Processo seletivo para

    o ensino superior: uma anlise de mudanas nas provas de Matemtica da UFMS e ENEM

    em relao s questes contextualizadas.

    Apesar da riqueza do material coletado at aquele momento no havamos encontrado

    nenhum trabalho cientfico que analisasse as provas dos vestibulares ou as provas do ENEM,

    tendo como foco questes contextualizadas ou avaliao por contedos,

    competncias/habilidades. Aps intensa procura, nos deparamos com um trabalho de pesquisa

    que abordava este tema. A dissertao intitulada Do Ensino Mdio ao Superior: que ponte os

    une? Um estudo de provas de vestibular da Lngua Espanhola, da Professora Daniela Sayuri

    Kawamoto Kanashiro, defendida em 2007 na USP. Essa dissertao faz um estudo de provas

    de vestibular da Lngua Espanhola, analisando as questes em relao aos textos, elementos

    lingusticos, gramaticais e conhecimento lexical. Ainda que esta pesquisa no analisasse as

    questes de matemtica, serviu como fonte secundria e como parmetro para anlise de

    questes e subsdio de nossa pesquisa.

    Em nossos estudos de trabalhos sobre o tema, fizemos a leitura da dissertao do Professor

    Manoel Rodrigues de Paiva, defendida em 2003 na PUC-SP, intitulada A matemtica escolar

    e o ENEM (1998 2002): o aparecimento de uma nova vulgata? Esse trabalho traz uma

    anlise de influncias das provas do ENEM de 1998 a 2002 nos livros didticos do Ensino

    Mdio, em particular, na disciplina de Matemtica. A sua principal contribuio para nosso

  • trabalho foi a discusso das vrias concepes das noes de competncias e a apresentao

    de algumas crticas s provas do ENEM.

    Para dar continuidade na construo do nosso objeto de pesquisa, lemos tambm a tese de

    doutorado de Leila de Almeida de Locco, defendida em 2005 na PUC-SP, denominada

    Polticas pblicas de avaliao: o ENEM e a escola de ensino mdio. Nele estudou-se o

    ENEM como uma das polticas do Sistema Nacional de Avaliao, analisando a sua trajetria

    histrica, suas bases legais, a relao com o currculo, a articulao com o Ensino Superior e

    sua operacionalizao no estado do Paran. Esta tese contribuiu para a definio do nosso

    objeto de estudo, pois analisa se o ENEM, como poltica pblica de avaliao, est trazendo

    repercusses para a escola pblica do Ensino Mdio. O nosso interesse por esta pesquisa se

    deve anlise e estudo do significado da avaliao educacional, sua posio no conjunto das

    polticas pblicas nacionais e internacionais.

    Para ajustes necessrios qualificao de nossa pesquisa, realizamos tambm a leitura da

    dissertao Conhecimentos e concepes de professores de Matemtica que atuam no Ensino

    Mdio: influncia dos processos seletivos de acesso ao Ensino Superior, de Fabiana dos

    Santos Faria, defendida em 2010 na UFPE. Esse trabalho identifica conhecimentos e

    concepes mobilizados por professores do 3 ano do Ensino Mdio, com carter

    propedutico e analisa o ENEM diante das mudanas que o incluram como forma total ou

    parcial para ingresso dos alunos nas universidades pblicas federais.

    Aps vrias consultas, encontramos a dissertao A contextualizao do Ensino da

    Matemtica: um estudo de caso, da Professora Maria Betnia Fernandes Vasconcelos,

    defendida em 2008 na UFPB, que tambm contribuiu com a finalidade de nosso trabalho de

    pesquisa, que tem como um de seus focos a contextualizao. Esta pesquisa analisa o

    processo de contextualizao da Matemtica no Ensino Fundamental, a partir das concepes

    de que as situaes propostas constituem um dos elementos da construo de conceitos. Esta

    dissertao traz uma discusso sobre contextualizao, esclarecendo o seu significado no

    Ensino da Matemtica, alm de destacar as possibilidades de atuao positiva em sala de aula.

    Depois da qualificao, entre outros, analisamos quatro artigos que contriburam para a

    finalizao de nossa pesquisa. Primeiramente, realizamos um estudo detalhado do artigo da

    Professora Alice Casimiro Lopes, da UFRJ, publicado em 2003, intitulado Competncias na

    formao de professores no Brasil: o que (no) h de novo. Nosso interesse por esse artigo

    girou em torno da anlise de que o conceito de competncia, que j foi empregado ao longo

    da histria do currculo, particularmente na formao de professores. Embora seja relevante

    para ns estudar competncias e habilidades relacionadas avaliao, este artigo nos auxiliou,

  • com a anlise de que o conceito de competncia no novidade na teoria curricular, j tendo

    sido empregado em diferentes tempos e espaos educacionais.

    Da mesma autora, foi lido o artigo A performatividade nas polticas de currculo: o caso do

    ENEM, publicado em 2010. Este artigo busca mostrar a articulao dos efeitos da

    globalizao com as polticas de currculo e de avaliao. Alm disso, considera que a cultura

    da performatividade influencia dimenses locais da avaliao, com diferentes extenses e

    modos de avaliar, no necessariamente associados s mesmas finalidades dos exames

    centralizados. Conforme observamos, este artigo faz uma anlise dos objetivos da prova do

    ENEM:

    As marcas que situam o ENEM nas polticas que configuram a

    performatividade tambm podem ser identificadas nos objetivos explcitos

    do exame (Documento Bsico, p. 2). No se trata apenas de uma avaliao

    do sistema de educao bsica, como prev um dos objetivos do documento,

    mas esperado que o exame sirva como referncia autoavaliao do

    indivduo, com vistas s suas escolhas futuras, tanto em relao ao mercado de trabalho quanto em relao continuidade de estudos, bem como possibilite uma alternativa ou um complemento aos processos de seleo nos

    diferentes setores do mercado de trabalho e nos exames de acesso aos cursos

    profissionalizantes psmdios e ao ensino superior. (LOPES, 2010, p. 102)

    Este artigo destaca que os exames vestibulares so vistos como norteadores de contedos

    utilizados para ingressar no Ensino Superior (controlar os currculos do Ensino Mdio),

    enquanto a prova do ENEM estabelece as performances exigidas para a vida e para o trabalho.

    O artigo da professora Telma Mildner, da UFPE, publicado em 2002, sob o ttulo O ENEM

    como forma alternativa ou complementar aos concursos vestibulares no caso das reas de

    conhecimento Lngua Portuguesa e Literatura: relevante ou passvel de refutao? analisa

    as caractersticas de processos e sistemas de verificao de resultados educacionais, em

    contrapartida avaliao de resultados educacionais. Faz crticas ao sistema de avaliao da

    prova do ENEM e dos concursos vestibulares e sugere investigaes sobre a validade de

    contedos da prova do ENEM.

    Em fase de concluso de nossa pesquisa, encontramos a dissertao do Professor Jos

    Luciano Santinho Lima, defendida em 2011na UFSCAR, intitulada: Contextualizao e

    contedo das questes de Matemtica do ENEM e dos vestibulares da USP, UNICAMP e

    UFSCAR. Esta pesquisa analisa as mudanas nos vestibulares destas universidades, aps a

    implantao da prova do ENEM e a sua contextualizao.

    Porm, depois de idas e vindas aos documentos pesquisados e vrias conversas com

    meu orientador, o objeto sofreu alguns ajustes e ficou definido como: Questes de

  • Matemtica da UFMS e ENEM: uma anlise da avaliao por contedos e por outras

    competncias.

  • 2 VESTIBULARES

    Neste captulo, pesquisamos sobre os vestibulares no Brasil. Fizemos um breve levantamento

    histrico de como eram os vestibulares no perodo do imprio, as denominaes de exames

    parcelados, exames de preparatrios, exames de madureza at a denominao de exames de

    vestibulares. Pesquisamos sobre os vestibulares da UFMS a partir de 1993, as alteraes nas

    provas de Matemtica at 2009 e, finalmente, pesquisamos sobre a prova do ENEM, desde a

    sua implantao em 1998 at 2010.

    2.1 VESTIBULARES NO BRASIL

    A palavra vestibular vem do latim vestibulum, que significa entrada. Antigamente usava-se a

    expresso exame vestibular (exame de entrada). Com o passar do tempo, o termo

    vestibular foi designado para este tipo de prova.

    Em 1827, o Imperador Dom Pedro I criou os Cursos Jurdicos em So Paulo - SP e Olinda -

    PE. Nesse perodo, para que o estudante ingressasse nas faculdades, era necessrio realizar

    provas escritas e orais, denominadas Exames Parcelados. Cada faculdade selecionava os

    pontos a serem estudados pelos candidatos, dentro do conjunto de disciplinas. Um a um, os

    exames deveriam ser completados. A cada um deles, um certificado. De posse do conjunto de

    certificados, que atestavam a concluso das disciplinas, o candidato ganhava o direito de

    matrcula no Ensino Superior.

    Com a implantao do Colgio Pedro II, em 1838, na cidade do Rio de Janeiro, o aluno que

    terminasse os estudos obteria o Diploma de Bacharel de Letras. Com o diploma, o estudante

    no precisava fazer os Exames Parcelados para entrar nas academias do Imprio. Os alunos

    dessa poca tinham duas opes de ingressar no Ensino Superior: com a concluso do Ensino

    Secundrio Seriado, que no se difundia nessa poca, pois os alunos demoravam muito mais

    tempo para concluir essa modalidade ou realizar os exames parcelados e, ao trmino desses,

    abandonavam o Secundrio para se inscreverem no Superior. O caminho dos Exames

    Parcelados era muito mais rpido que o da seriao escolar secundria.

    Para se ter uma idia do que eram, naquela poca, os Exames Parcelados e os abusos e

    escndalos a que davam margem, basta ler o que escrevia, em 1839, o Ministro do Imprio no

    seu relatrio s Cmaras: no fixando os estatutos das nossas Faculdades de Direito, o tempo

    em que os alunos devem frequentar cada uma das aulas preparatrias dos Cursos Jurdicos

  • para poderem ser admitidos a exame, est sendo muito pouco, pois temos observado que

    vrios candidatos, no perodo de 2 meses, tm eliminado mais de trs Exames Parcelados.

    No Relatrio Ministerial, Dunshee de Abranches escreve: a iniciativa particular conseguia,

    s vezes, certas vantagens em algumas das denominadas aulas avulsas, espalhadas por todos

    os recantos da cidade do Rio de Janeiro, guisa de mercearias em que se vendiam exames a

    retalho aos candidatos matrcula nas Faculdades do Imprio.

    Com a Reforma de 1854, baixada pelo ministro Couto Ferraz, regulamentou-se, com todas as

    cautelas e providncias do mais meditado rigor, os Exames de Preparatrios. Assim que a

    comisso de exames, apesar de mais indulgente que severa, viu-se na dolorosa necessidade de

    reprovar 38 dos 48 candidatos que foram arguidos com 151 inscritos. Antes dessa reforma, a

    aprovao era quase o total dos inscritos. Em vez de melhorar, o Ensino Secundrio no

    tardaria a voltar aos dias calamitosos antes da Reforma de 1854, pois para alguns dirigentes

    da poca esse alto ndice de reprovao era sinal da m qualidade de ensino e no da rigidez

    imposta pelos exames.

    Em 1870, sem um motivo de ordem superior nem justificativa, eram abolidas as comisses do

    governo junto s mesas julgadoras. Permitindo a abertura de mesas de preparatrios em todas

    as provncias, tais como: Piau, Sergipe, Rio Grande do Norte e Esprito Santo. De acordo

    com o relatrio ministerial, nessas provncias compravam-se s vistas de todos, certificados

    de aprovaes, atraindo de todo pas uma verdadeira imigrao de estudantes, que assim

    conquistavam, em poucos meses, todos os documentos exigidos para a matrcula nas

    Faculdades. No Rio Grande do Norte e em Sergipe, to grandes irregularidades ocorreram que

    foi necessrio providenciar a suspenso dos exames nestes locais.

    Em 1890, com a Reforma Benjamin Constant, aboliram-se os Exames Parcelados e

    estabeleceu-se o curso seriado integral no Ensino Secundrio (hoje parte do Ensino

    Fundamental e o Ensino Mdio). Foram criados os exames de madureza no lugar dos exames

    parcelados. Este fato provocou reclamaes e protestos de inmeros estudantes, que se

    consideravam prejudicados por essa medida. Convencido dos obstculos que designara aos

    candidatos matrcula nos Cursos Superiores, obrigando todos os estudantes a irem ao Rio de

    Janeiro e exibirem as suas habilitaes nos estudos secundrios, o novo governo republicano

    decretou algumas concesses para que os alunos continuassem a prestar os Exames

    Parcelados.

    Em 1915, com a Reforma Carlos Maximiliano, surge pela primeira vez a palavra vestibular,

    tornando-se aos poucos um exame seletivo. No incio, o candidato realizava provas escritas e

    orais. Da at o incio da dcada de 1950, o vestibular no mudou muito, at que, em 1953, a

  • Escola Paulista de Medicina, hoje Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP), institusse

    o teste de inteligncia que, um ano mais tarde, sofreria uma mudana histrica, j que pela

    primeira vez adotaram-se os testes de mltipla escolha. Portanto, este passou a ser o modelo

    de prova seguido, com o aumento da demanda de candidatos na procura por Cursos

    Superiores.

    At a dcada de 1960, o exame de vestibular exigia apenas uma nota mnima para aprovao.

    Em 1964, foi criada a Fundao Carlos Chagas para seleo dos candidatos em So Paulo. As

    provas elaboradas por essa instituio so de mltipla escolha e processadas em computador.

    Entretanto, com o aumento do nmero de concorrentes, o vestibular passou a ser

    classificatrio. Nesse perodo, as provas das universidades federais eram todas realizadas no

    mesmo dia, o que impossibilitava o aluno de concorrer a mais de uma vaga em universidades

    do pas, a no ser pelo vestibular unificado (um mesmo vestibular para vrias instituies),

    que tambm surgiu nessa poca.

    Em 1968, candidatos aprovados com mdia mnima ficaram sem vagas, pois a quantidade de

    alunos aprovados foi maior que o nmero de vagas disponveis pelas instituies de ensino.

    Para solucionar o problema, o governo editou a Lei n 5.540 que instituiu o sistema

    classificatrio nos vestibulares. Em 1970, formou-se a Comisso Nacional do Vestibular

    Unificado para organizar o sistema de vestibulares no Brasil. A Universidade de So Paulo

    (USP) unificou o seu vestibular com a criao da Fundao Universitria para o Vestibular

    (FUVEST). Em 1977, o governo editou o Decreto n 79.298 que instituiu a exigncia mnima

    de conhecimento sob forma de redao. Outro fato marcante surgiu em 1989, quando o

    vestibular da FUVEST passou a exigir lista obrigatria de leitura, hoje presente nos

    vestibulares da maioria das universidades. Em 1996, o governo publicou a LDB 9.394/96, que

    em seu Artigo 45 estabelece que A educao superior ser ministrada em instituies de

    ensino superior, pblicas ou privadas, com variados graus de abrangncia ou especializao.

    A lei permite que cada entidade escolha o seu prprio sistema de ingresso.

    Verificamos tambm que algumas Instituies de Ensino Superior utilizam o vestibular

    agendado, em que o candidato escolhe a melhor data para realizar a prova. Outras instituies

    fazem uso do vestibular on line, ou seja, o candidato pode realizar a prova em seu local de

    trabalho ou sua casa utilizando a internet como ferramenta, conectado com um tutor

    distncia via Skype, na plataforma Moodle e outros ambientes informatizados.

    Outros tipos de provas surgiram: questes de somatrio, questes abertas, discursivas e, mais

    recentemente, as questes contextualizadas, muito utilizadas nas provas do ENEM.

  • 2.2 VESTIBULAR DA UFMS

    Os cursos preparatrios para vestibular de Campo Grande planejavam o seu calendrio para o

    ano letivo conforme a forma do vestibular e os tipos de provas adotados pela Universidade

    Federal de Mato Grosso do Sul, tendo como foco trs modalidades de curso: Extensivo (aulas

    durante o ano inteiro), o Semi-Extensivo (aulas a partir do segundo semestre) e o Intensivo

    (aulas com incio em dezembro e trmino durante o vestibular). Tambm aconteciam as aulas

    de vsperas, antes da prova de cada disciplina do vestibular. Podemos observar que, desta

    forma, os alunos com poder aquisitivo maior eram privilegiados, uma vez que aps o trmino

    do ano letivo em novembro, os que podiam pagar o Intensivo tinham melhores condies

    para realizar as provas, em comparao queles que concluam o Ensino Mdio e no tinham

    acesso a esses cursos.

    Durante o perodo em que o vestibular da UFMS permaneceu no modelo antigo, at o incio

    da dcada de 1990, os professores de cursinhos preparatrios lecionavam aulas com o intuito

    de preparar o aluno para o vestibular, onde entre outros recursos didticos preparavam

    simulados e davam dicas. Sendo assim, dar aulas de Matemtica era bem mais fcil que

    atualmente, pois os professores tinham um modelo a seguir. O vestibulando que tivesse bom

    desempenho na prova desta disciplina tinha grandes possibilidades de ser aprovado no

    vestibular, pois ela era critrio de desempate nas pontuaes idnticas. Portanto, nessa poca,

    todos os alunos estudavam muito os contedos de Matemtica.

    O modelo antigo de provas da UFMS perdurou at o ano de 1993, quando a instituio

    decidiu alterar os tipos de questes4, que deixaram de ser objetivas, na forma de mltipla

    escolha, e passaram a ter questes de proposies mltiplas (somatria), abertas e discursivas.

    Com essa alterao, o professor e muitas escolas tambm modificaram suas

    estruturas de ensino e avaliao. As provas de Redao e Lngua Portuguesa adquiriram maior

    valor com essas mudanas. O argumento utilizado, na poca, pela UFMS, era que, com essas

    modificaes, diminuiriam as possibilidades do vestibulando de chutar e colar, passando a

    ser realizado pela comisso do vestibular da Universidade Federal de Santa Catarina, nos

    moldes da UFPR.

    Em 1998, as questes de Matemtica comearam a ser elaboradas de forma a

    valorizar contextualizaes, de acordo com as provas do Exame Nacional do Ensino Mdio

    (ENEM).

    4 Verificar na pgina 48 categorizao em relao aos tipos de questes.

  • No ano de 2001, a UFMS alterou as datas das provas e passou a realizar o vestibular em duas

    etapas: sendo que as duas provas aconteciam em dias consecutivos, na primeira quinzena de

    dezembro. Desta forma, o Intensivo foi extinto nas escolas, pois no havia mais nexo manter

    um curso com durao de um ms que focava apenas os alunos que tinham recm concludo o

    Ensino Mdio. Nesta poca, no era obrigatrio que o concluinte do Ensino Mdio fizesse o

    ENEM. Para tentar ingressar na UFMS, o vestibulando tinha trs opes, j que as inscries

    dos exames e a realizao das provas aconteciam em meses diferentes: a) o ENEM podia ser

    usado como prova de Conhecimentos Gerais com 63 questes e uma redao; b) optar pela

    melhor nota entre as duas provas, caso tenha feito o ENEM e a prova de Conhecimentos

    Gerais do primeiro dia de provas da UFMS; c) caso no tenha optado pelo ENEM, o

    vestibulando era obrigado a realizar a prova de Conhecimentos Gerais da UFMS.

    A universidade modificou mais uma vez as datas das provas do vestibular para incio de

    dezembro, devendo ser realizadas em dois dias. Com essa alterao, as aulas de vspera

    tambm se extinguiram. Entretanto, as mudanas no pararam por a, as provas passaram a ter

    pesos e o vestibular deixou de ser unificado, no sendo mais elaborado igualmente para

    todos os cursos. Somente a prova de conhecimentos gerais, nos moldes do ENEM, que

    deveria ser feita por todos os candidatos. Os vestibulandos optam por trs reas do

    conhecimento: biolgicas, exatas e humanas. Em cursos mais concorridos, como o de

    Medicina, o candidato no precisava mais estudar Matemtica para fazer o vestibular, j que

    esta passou a ter peso somente nas reas de exatas. Por conseguinte, trabalhar esta disciplina

    passou a ser um ofcio mais difcil a todos os professores de Matemtica que preparam alunos

    para o vestibular. Para as provas do ENEM e dos vestibulares da UFMS, estudar Matemtica

    no Ensino Mdio no era mais encarado como prioridade para os alunos que tinham como

    meta obter resultados nas reas biolgicas ou humanas, que tinham como objetivo principal

    a aprovao no vestibular ou tirar uma boa nota no ENEM. A prova do ENEM era

    composta de uma parte objetiva (63 questes, com nota atribuda de 0 a 100 pontos) e uma

    redao (mesmo critrio de pontuao). De 2001 a 2004, por que, ento, o aluno estudaria

    Matemtica, se das 63 questes, em mdia por prova, eram cobradas 8 questes

    contextualizadas de Matemtica, enquanto que s a redao valia 100 pontos? O mesmo

    estava acontecendo com o vestibular da UFMS, onde as provas do processo seletivo eram

    realizadas em duas etapas e por rea de conhecimento.

    A partir de 2005, a prova de conhecimentos gerais da 1 etapa contava com 42 questes

    objetivas de mltipla escolha, valendo 1 ponto cada. Nesta fase do exame, alm da prova de

    conhecimentos gerais, havia uma prova de redao valendo 100 pontos no total, com carter

  • eliminatrio para quem no alcanasse 30 pontos, no mnimo. Novamente o aluno se

    indagaria: por que estudar Matemtica, se dentre as 42 questes eram cobradas apenas 6

    questes de Matemtica e s a redao valia 100 pontos? Aps quatro anos, a UFMS decide

    alterar o formato do seu vestibular, retirando a prova do ENEM que podia ser usada como

    prova de conhecimento gerais. A universidade alegou problemas de gerenciamento, j que os

    vestibulandos poderiam indicar at duas notas de ENEM anterior e, por essa razo em muitos

    casos, as listas de classificao dos candidatos aprovados tinham que ser modificadas,

    trazendo srios transtornos para a instituio.

    Sem a prova do ENEM, o vestibular da UFMS continuou a ser realizado em dois dias, sendo

    que a primeira prova (42 questes objetivas de conhecimentos gerais e uma redao) era igual

    para todos os vestibulandos. O exame no sofreu alteraes em relao aos pesos e reas do

    conhecimento.

    Entretanto, com todas as modificaes ocorridas no formato do vestibular da UFMS durante

    esses anos, ora usando o ENEM (exame eminentemente constitudo de questes que

    valorizam a articulao entre contextos e tambm entre reas do conhecimento, avaliando

    competncias e habilidades) ora no, havia um contrassenso, ou seja, a prova da Universidade

    Federal avaliava contedos programticos especficos, distante das articulaes envolvendo

    contextos, linguagens e reas de conhecimento.

    Com a implantao do atual modelo de prova do ENEM, em 2009, novas alteraes

    ocorreram, a UFMS o utilizou como primeira fase de seu vestibular e, em 2010, o novo

    formato do exame foi usado como fase nica, integrado ao SISU.

    2.3 ENEM

    Em 1996, o governo publicou a LDB 9.394/96, que em seu Artigo 35, determina que o Ensino

    Mdio seja a etapa final da educao bsica. Com essa identidade, este nvel de ensino

    passa a pertencer ao processo educacional considerado bsico para o desenvolvimento

    intelectual e pessoal do educando. Apesar de no ser obrigatrio para todos os brasileiros, sua

    oferta dever do Estado e, de acordo com a Lei, dever vincular-se ao mundo do trabalho e

    prtica social (Art 1 2) o que muda sua identidade em comparao Lei anterior n

    5.692/72, cujo 2grau se caracterizava por uma dupla funo: dar continuidade aos estudos ou

    habilitar para o exerccio de uma profisso tcnica. Na perspectiva da atual Lei, toda prtica

    educativa escolar dever sofrer transformaes.

  • O Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM), criado em 1998, pelo Instituto Nacional de

    Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (INEP), elaborado para avaliar o

    desempenho dos alunos que esto concluindo ou que j concluram o Ensino Mdio, um

    exame de carter individual, voluntrio, oferecido anualmente:

    O ENEM tem carter voluntrio e dele podem participar, mediante inscrio,

    os concluintes do ensino mdio, no ano de realizao do exame, e tambm os

    que j o concluram em anos anteriores, em qualquer de suas modalidades.

    direito do participante realizar o ENEM quantas vezes for de seu interesse.

    (BRASIL, 1998, p. 4)

    Muitas universidades adotaram o ENEM nos processos de seleo para o acesso ao Ensino

    Superior e, aps a sua aplicao, o INEP apresenta um relatrio pedaggico que constitui um

    valioso instrumento de avaliao, proporcionando uma imagem atualizada da educao

    brasileira. Inicialmente, o exame tinha como objetivo principal a avaliao da qualidade da

    educao no Ensino Mdio, mas com o passar dos anos, tambm se tornou prova de acesso ao

    Ensino Superior. Este exame tem como objetivo medir e qualificar as estruturas responsveis

    pelas interaes no Ensino Mdio, observando, especificamente, as competncias e

    habilidades bsicas desenvolvidas, transformadas e fortalecidas com a mediao da escola.

    At 2008, a prova do ENEM era composta de uma parte objetiva e uma redao. O total de 63

    questes objetivas, com uma nota global que variava de 0 a 100 pontos, contemplava as 5

    competncias e as 21 habilidades definidas na Fundamentao Terico-metodolgica do

    ENEM, sendo que para cada habilidade havia 3 questes, a partir de critrios pr-

    determinados. Essas questes eram estruturadas por mltipla escolha, contendo 5 alternativas

    cada e somente uma resposta correta. Uma nota de 0 a 100 pontos tambm era atribuda para a

    prova de redao que, assim como a parte objetiva, visava avaliar competncias diversas. Para

    tanto, a matriz de competncias foi devidamente adaptada, com o intuito de avaliar o

    desempenho do aluno como produtor de texto, demonstrando capacidade de reflexo sobre o

    tema proposto.

    De acordo com a fundamentao terico-metodolgica do ENEM, na qual observa-se a

    inteno de induzir novas abordagens envolvendo contedos e prticas no Ensino Mdio:

    O ENEM tem, ainda, papel fundamental na implementao da Reforma do

    Ensino Mdio, ao apresentar, nos itens da prova, os conceitos de situao-

    problema, interdisciplinaridade e contextualizao, que so, ainda, mal

    compreendidos e pouco habituais na comunidade escolar. A prova do

    ENEM, ao entrar na escola, possibilita a discusso entre professores e alunos

    dessa nova concepo de ensino preconizada pela LDB, pelos Parmetros

  • Curriculares Nacionais e pela Reforma do Ensino Mdio, norteadores da

    concepo do exame. (BRASIL, 2005, p. 8).

    O Ministrio da Educao (MEC) implantou mudanas neste exame a partir de 2009, que

    passou a ser utilizado como vestibular unificado para grande parte das universidades federais,

    estaduais e particulares do pas. Aps a sua introduo muitas alteraes aconteceram no

    cenrio educacional brasileiro, principalmente no Ensino Mdio. Atualmente, ainda persistem

    dvidas sobre a adoo dessa nova proposta em vrias unidades de ensino no Brasil.

    Para entender melhor, destacamos como uma das principais diferenas, o fato de que no

    antigo formato do ENEM no havia uma articulao direta com os contedos ministrados no

    Ensino Mdio nem a possibilidade de comparao de notas de um ano para outro.

    J com a reformulao do ENEM, a proposta de que o exame possa ser comparvel no

    tempo e aborde diretamente o currculo do Ensino Mdio, com o objetivo de aplicar quatro

    grupos de provas diferentes em cada processo seletivo, alm de redao e que privilegie as

    quatro reas do conhecimento: Linguagens, Cdigos e suas tecnologias (incluindo Redao);

    Cincias Humanas e suas tecnologias; Cincias da Natureza e suas tecnologias e Matemtica e

    suas tecnologias. Neste momento, com o novo ENEM, o MEC pode estar provocando uma

    reformulao do currculo do Ensino Mdio, que se encontra voltado para um amplo espectro

    de contedos. Com base nos dados do INEP, a proposta parece sinalizar para o Ensino Mdio

    outro tipo de formao, mais voltado para a soluo de problemas que envolvem uma

    diversidade de competncias e de habilidades.

    Um aspecto positivo de um exame unificado que o candidato no precisa se deslocar do

    municpio onde reside para realizar as provas dos vestibulares, economizando com gastos

    como viagens e taxas de inscries. Centralizar os exames seletivos certamente mais uma

    das aes do MEC visando democratizar o acesso a todas as universidades pblicas. No novo

    processo seletivo, a nota obtida no ENEM serve para pleitear uma vaga nas instituies de

    Ensino Superior que adotarem o exame como ferramenta de seleo, de maneira integral ou

    parcial e continua a ser referncia para uma auto-avaliao sobre o Ensino Mdio e qualidade

    do ensino e sua nota auxilia na seleo de bolsas de estudo no Programa Universidade para

    Todos (ProUni). Desta maneira, o MEC criou e gerencia o Sistema de Seleo Unificada

    (SISU) que um programa informatizado, para que as instituies pblicas de educao

    superior, participantes deste processo, selecionem os candidatos que fizeram o ENEM, de

    acordo com a nota obtida no exame para, em seguida, liberar a lista de aprovados em cada

    curso.

  • O novo ENEM mantm a caracterstica de ser um exame voluntrio, embora obrigatrio a

    todos que pleiteiam uma vaga no Ensino Superior por meio do SISU. Alunos concluintes do

    Ensino Mdio e pessoas que terminaram este nvel de ensino em anos anteriores, os chamados

    egressos, ainda podem realizar a prova. A novidade que a prova passa a valer tambm para

    certificao de concluso do Ensino Mdio, o que torna o ENEM uma oportunidade para

    cidados sem diploma nesse nvel de ensino, desde que, na data de realizao da prova

    tenham 18 anos, no mnimo e que obtenham as notas mnimas exigidas no edital do ENEM.

    As provas do ENEM so elaboradas por especialistas do INEP, o que exige domnio da

    tecnologia em avaliao educacional empregada, que especializada e complexa, e na qual o

    INEP possui experincia de mais de dez anos. Para calcular as mdias dos estudantes em cada

    uma das quatro grandes reas do conhecimento utilizada a metodologia da Teoria da

    Resposta ao Item (TRI), que procura medir o conhecimento a partir de testes aplicados

    anteriormente em um grupo de alunos selecionados, em que se verifica o nvel de

    conhecimento e o grau de dificuldade. Sendo assim, a TRI substitui a maneira tradicional de

    correo das provas, onde cada questo recebe uma pontuao e tem como resultado o escore

    padronizado, que a soma das pontuaes conferidas aos itens (ou questes), considerando

    acertos e erros que, na maioria das vezes, feito o clculo da mdia de acerto da prova e do

    desvio padro. A TRI no atribui o escore para cada aluno, pois:

    [...] possibilita a criao de uma medida (escala) para medir o conhecimento do indivduo. Tomando como exemplo uma prova do Enem de 45 questes: se duas pessoas acertarem 20 questes no sendo as mesmas 20 questes, dificilmente elas tero a mesma nota. No porque uma questo tenha peso maior que a outra, mas porque o sistema est montado de forma que quem acertou itens dentro de um padro de coerncia ter notas melhores. (Disponvel em: . Acesso em: 13 mar. 2011).

    A mdia obtida pelo estudante depende do nmero de questes respondidas corretamente (e

    tambm da dificuldade das questes que se erra ou acerta) e da consistncia da resposta. Desta

    forma, vrios candidatos podem acertar o mesmo nmero de questes em uma prova e obter

    mdias de desempenho diferentes. O ENEM tinha como objetivo principal a avaliao da

    qualidade da educao no Ensino Mdio, sendo de carter voluntrio. Mas com o passar dos

    anos, tambm se tornou prova de acesso ao Ensino Superior, alterando, desta maneira, os

    objetivos e interesses de cada candidato por este exame. A metodologia da Teoria da Resposta

    ao Item (TRI), que procura medir o conhecimento a partir de testes aplicados anteriormente

  • em um grupo de alunos selecionados, em que se verifica o nvel de conhecimento e o grau de

    dificuldade, pode influenciar os resultados finais deste exame, pois a metodologia da TRI

    necessita calibrar todas as questes aplicando pr-testes em um grupo de alunos selecionados.

    Por outro lado, o MEC pode utilizar a metodologia da Teoria da Resposta ao Item (TRI) no

    Sistema de Avaliao da Educao Bsica (SAEB) para medir o conhecimento dos alunos do

    Ensino Fundamental e aplicar testes em um grupo de alunos selecionados anteriormente, j

    que os objetivos individuais e coletivos so diferentes daqueles do ENEM. As diretrizes dessa

    prova isto , objetivos, contedos, enfim, o desenho so definidas pelo Comit de

    Governana:

    A TRI possibilita a comparabilidade entre provas diferentes. Existem instrumentos para medir peso, altura, distncia. Mas no h um instrumento que mea, de forma direta, o conhecimento. Ento, para medir o conhecimento de uma pessoa, h que faz-lo de forma indireta e essa forma a avaliao. Com a TRI, o que se pretende criar uma unidade de medida para o conhecimento. Se voc medir a altura de uma pessoa com uma trena ou com uma fita mtrica, ela ter a mesma altura. Assim deve ser com o conhecimento: qualquer que seja a prova, uma vez que o participante carrega o mesmo conhecimento, ele deve obter a mesma nota. (Disponvel em: . Acesso em: 13 mar. 2011).

    Ao aplicar a prova do ENEM 2010, foi constatado erro de impresso no caderno de

    questes da prova amarela de Cincias Humanas e suas Tecnologias e Cincias da Natureza e

    suas Tecnologias. Por este motivo, aproximadamente 9,5 mil candidatos que registraram o

    erro, tiveram que fazer outra prova. Foi grande o nmero de solicitaes para que o MEC

    anulasse o exame desse ano, para todos os candidatos. Entretanto, por questes de tempo e

    logstica, somente os 9,5 mil candidatos prejudicados refizeram a prova, em outra data. O

    principal motivo alegado pelo MEC para no reaplicar o exame para todos foi a utilizao da

    TRI, pois o conhecimento do candidato independe da prova aplicada, desde que em sua

    elaborao utilize-se os critrios desta teoria, por isso:

    [...] que as questes so calibradas em pr-teste, para que a prova seja tecnicamente slida. Tal como na balana: se ela mostra peso menor que o seu peso real, porque est desajustada. O peso independe da balana da mesma forma que o conhecimento independe da prova. (Disponvel em: . Acesso em: 13 mar. 2011).

  • O novo modelo de prova mantm a estrutura bsica, com nfase em habilidades e raciocnio

    que visam medir o conhecimento dos alunos por meio do enfoque interdisciplinar, agregando

    s habilidades medidas um conjunto de contedos formais mais diretamente relacionado ao

    que ministrado no Ensino Mdio. Mas sem abandonar as questes contextualizadas, que

    exigem do estudante outros tipos de habilidades e conhecimentos e no a mera memorizao

    de informaes.

    Aps pesquisar sobre os vestibulares no Brasil, decidimos analisar as provas da UFMS, no

    perodo de 1993 a 2008, bem como as provas do ENEM, foco principal de nossa pesquisa.

  • 3 ELEMENTOS TERICOS E METODOLGICOS PARA ANLISE DE

    DOCUMENTOS

    O presente captulo contm anlises de documentos, editados a partir de 1996, que

    determinam a insero de questes contextualizadas no ensino da Matemtica. Esses

    documentos so: Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio (PCNEM),

    Fundamentao Terico-Metodolgica do Exame Nacional do Ensino Mdio, Matriz de

    Referncia para o ENEM 2009, Orientaes Curriculares para o Ensino Mdio, Qualidade da

    Educao: uma nova leitura do desempenho dos estudantes da 3 srie do Ensino Mdio

    (SAEB), editais dos ltimos vestibulares da UFMS, contedo programtico do vestibular da

    UFMS (2009), documento bsico do ENEM, relatrio pedaggico ENEM (2007), Programa

    Nacional do Livro Didtico (PNLD), PCN+ e a Coleo Explorando o Ensino 2010.

    Concomitantemente, analisamos as questes de Matemtica dos vestibulares da UFMS, desde

    1993 at 2008, e as provas do ENEM, de 1998 a 2009.

    Em nossa pesquisa, utilizamos os documentos oficiais como fonte primria de dados, visto

    que pretendemos realizar uma anlise de contedo. De acordo com Laurence Bardin, a anlise

    de contedo um mtodo de decodificar os documentos encontrados para estudo, ou seja,

    fazer uma interpretao dos documentos examinados, transformando o que foi obtido em

    categorias que permitam descrever as caractersticas do contedo, assim descritos como:

    Um conjunto de tcnicas de anlise das comunicaes visando obter por

    procedimentos sistemticos e objectivos de descrio do contedo das

    mensagens indicadores (quantitativos ou no) que permitam a inferncia de

    conhecimentos relativos s condies de produo/recepo (variveis

    inferidas) destas mensagens. (BARDIN, 2009, p. 44).

    Nos procedimentos metodolgicos apresentamos as categorias criadas a partir das fontes de

    pesquisas e as tabelas contendo informaes da quantidade de questes analisadas para

    criao dessas categorias.

    3.1 PROPOSTAS DE MUDANAS PARA O ENSINO MDIO

    Aps a elaborao dos Parmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio, observando

    os princpios definidos na LDB 9394/96, o Ministrio da Educao definiu um novo perfil

    para o currculo, apoiado em competncias bsicas para a insero de nossos jovens na vida

  • adulta. Com a nova proposta, o Ministrio da Educao trouxe novas orientaes para a

    abordagem do conhecimento escolar, mediante a contextualizao, incentivando o raciocnio

    matemtico e a capacidade de aprender. Assim, tendo como focos importantes a

    interdisciplinaridade e a contextualizao, props a reorganizao curricular em reas de

    conhecimento, com o objetivo de facilitar o desenvolvimento dos contedos.

    De acordo com os Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio (PCNEM),

    observamos propostas de mudanas para o Ensino Mdio com a incluso da contextualizao:

    De certa forma, tambm organizam o aprendizado de suas disciplinas, ao

    manifestarem a busca de interdisciplinaridade e contextualizao e ao

    detalharem, entre os objetivos educacionais amplos desse nvel de ensino,

    uma srie de competncias humanas relacionadas a conhecimentos

    matemticos e cientfico-tecnolgicos. Referenda-se uma viso do Ensino

    Mdio de carter amplo, de forma que os aspectos e contedos tecnolgicos

    associados ao aprendizado cientfico e matemtico sejam parte essencial da

    formao cidad de sentido universal e no somente de sentido

    profissionalizante. (BRASIL, 2000, parte III, p. 4).

    As Orientaes Curriculares Nacionais para o Ensino Mdio criticam a distino existente

    entre o processo de ensino e o de aprendizagem, que deveriam ser indissociveis, mas que

    ainda aparecem assim identificados: a) o ensino como transmisso de conhecimento, por isso,

    baseia-se essencialmente na verbalizao por parte do professor. Historicamente est mais

    presente nas salas de aula; b) a aprendizagem como mera recepo de contedos vista como

    um acmulo de conhecimentos e, em outra corrente citada neste mesmo documento, tambm

    a transfere para o aluno, em grande parte como sua prpria responsabilidade, na medida em

    que ele se coloca como ator principal desse processo.

    Os conceitos de avaliao e de competncias propostos por Philippe Perrenoud (1999) sero

    utilizados como embasamento terico para analisarmos as provas da UFMS e do ENEM.

    3.2 AVALIAO

    Como nosso foco de pesquisa so as questes de vestibulares, e esta uma forma de avaliar o

    conhecimento do estudante, tomamos perguntas norteadoras extradas do livro Avaliao e

    Educao Matemtica, organizado por Regina Luzia Corio Buriasco. Neste livro encontramos

    uma definio do que avaliar. Avaliar calcular, atribuir valores, fazer estimativas

    sobre merecimento. [...] O que temos em mente quando avaliamos? O ensino ou a

    aprendizagem? E, mais especificamente, avaliamos o qu? (CURY, in BURIASCO, 2008, p.

  • 7). A cultura escolar descreve a aprendizagem do estudante por meio de sua avaliao. Para

    melhor compreendermos:

    A avaliao escolar surgiu como um mecanismo de manuteno da

    sociedade de classes. Pelo seu aspecto predominantemente quantitativo, ela

    usada para diferenciar, num processo competitivo, aquele que pode galgar os

    melhores lugares na sociedade. Por meio desse sistema avaliativo,

    naturaliza-se a falsa afirmao de que as chances so dadas a todos, mas s alguns sabem aproveit-las; sendo assim, camufla a desigualdade social que esse processo avaliativo aprofunda e legitima. (MOURA, PALMA, in

    BURIASCO, 2008, p.15)

    De acordo com a citao acima, pode-se considerar que o vestibular uma avaliao escolar

    competitiva, onde o candidato aprovado ter chances de obter melhores lugares na sociedade.

    A avaliao tradicionalmente associada, na escola, criao de hierarquias de excelncia.

    Perrenoud conclui que a avaliao pode servir para seleo:

    Os alunos so comparados e depois classificados em virtude de uma norma

    de excelncia, definida no absoluto ou encarnada pelo professor e pelos

    melhores alunos. Na maioria das vezes, essas duas referncias se misturam,

    com uma dominante: na elaborao das tabelas, enquanto alguns professores

    falam de exigncias preestabelecidas, outros constroem sua tabela a

    posteriori, em funo da distribuio dos resultados, sem todavia chegar a

    dar sistematicamente a melhor nota possvel ao trabalho menos ruim. (1999, p. 11)

    Segundo Perrenoud (1999), a avaliao no uma tortura medieval, uma inveno mais

    recente, que teve origem com os colgios por volta do sculo XVII e tornou-se indissocivel

    do ensino de massa a partir do final do sculo XIX, com a escolaridade obrigatria. Perrenoud

    define o verbo avaliar:

    Criar hierarquias de excelncia, em funo das quais se decidiro a

    progresso no curso seguido, a seleo no incio do secundrio, a orientao

    para diversos tipos de estudos, a certificao antes da entrada no mercado de

    trabalho e frequentemente, a contratao. Avaliar tambm privilegiar um

    modo de estar em aula e no mundo, valorizar formas e normas de excelncia,

    definir um aluno modelo, aplicado e dcil para uns, imaginativo e autnomo

    para outros. (1999, p. 9)

    Encontramos outra definio do verbo avaliar no livro Compreender e transformar o ensino,

    onde Sacristan e Gmes (1998) definem que: avaliar, no contexto escolar, relaciona-se

    operao de classificao, em razo pelo qual os seus mtodos e procedimentos esto

  • relacionados com a coleta de informaes que possibilitem a quantificao do processo de

    aprendizagem, tomando a avaliao, o sinnimo de medio. Segundo Locco (2005, p.28),

    avaliao construo e reconstruo; processo de colaborao, de anlise do discurso e

    busca da construo do consenso atravs da crtica e do trabalho com a diversidade de

    opinies e posies. Em sntese, avaliar aplicar/exercitar o senso crtico. Nesse sentido,

    segundo Demo (apud LOCCO, 2005, p.28), a avaliao um componente intrnseco,

    estrutural de todo o processo comprometido com a qualidade educativa: definindo qualidade,

    no como algo contrrio, oposto, apenas diferente de quantidade, mas como a dimenso

    histrica da intensidade, todo fenmeno qualitativo , desde logo, processo de (re)construo

    com marca humana.

    As polticas pblicas de avaliao no Brasil (SAEB, ENEM e ENADE), utilizam o

    instrumento de avaliao (prova) para avaliar o desempenho do aluno, a escola e o currculo.

    Em relao ao ENEM, observamos crticas sobre caractersticas de processos e sistemas de

    verificao de resultados educacionais, bem como de avaliao de resultados educacionais:

    ...o ENEM no caracteriza qualquer situao de resultados educacionais,

    embora a isso se pretenda, e os Concursos Vestibulares tambm no

    caracterizam uma situao de resultados educacionais, nem a isso se

    propem. Ambos, ENEM e Concursos Vestibulares consistem, decisiva e

    definitivamente, em situaes ou sistemas de verificao desses resultados,

    para classificao e seleo de concluintes e egressos do Ensino Mdio, no

    sentido de distribuio de vagas do Ensino Superior com aproveitamento

    total. (MILDNER, 2002, p. 52 grifos da autora)

    Mildner (2002) argumenta tambm sobre os Concursos Vestibulares:

    H tambm de se fazer notar, guisa da justia, que os Concursos

    Vestibulares jamais foram qualificados como Sistemas de Avaliao, em

    nenhuma instncia decisria ou por nenhum dentre os segmentos da

    sociedade civil e acadmica direta ou indiretamente com eles envolvidos ou

    por eles envolvidos. (MILDNER, 2002, p. 50 grifos da autora).

    E, para concluir sua argumentao, Mildner define avaliao como processo de descrio e

    julgamento de mrito e valor de um objeto educacional no sentido de fornecer informaes

    avaliativas relevantes que subsidiem de modo direto o processo de tomada de deciso relativo

    educao formal. A avaliao est relacionada a quatro variveis: o objetivo do objeto

    educacional avaliado, o programa proposto, os processos de implantao desse programa e os

    resultados e efeitos desse programa sobre a comunidade educacional. Mildner finaliza

    argumentando:

  • Enfim, qualquer situao ou sistema de Avaliao de Resultados

    Educacionais h de ter como objeto o processo pedaggico em seu todo e

    em seus componentes, no se restringindo verificao de resultados de

    aprendizagem. Ela se ocupar com a mesma intensidade e intencionalidade

    com os objetivos do processo pedaggico e o currculo (currculo proposto),

    os modos de ensino-aprendizagem e variveis processuais de professores e

    alunos (currculo implementado), bem como com resultados de

    aprendizagem (currculo atingido), em si mesmos e em suas articulaes.

    (MILDNER, 2002, p.47 grifos da autora)

    De acordo com Perrenoud, outra funo tradicional da avaliao a certificao: certificar

    aquisies em relao a terceiros. Um exemplo dessa certificao o diploma que garante

    que o seu portador recebeu uma formao adequada, o que permite contrat-lo sem fazer com

    que preste novos exames. Em todos os casos a avaliao no um fim em si. uma

    engrenagem no funcionamento didtico e, mais globalmente, na seleo e na orientao

    escolares (PERRENOUD 1999).

    Trabalhar sobre verdadeiras competncias, ou seja, elaborar uma avaliao cuja abordagem

    tem como foco principal competncias e habilidades pr-determinadas, uma caracterstica

    da prova do ENEM. De acordo com a matriz de referncia do ENEM, esse exame

    estruturado a partir de uma matriz que indica a associao entre contedos, competncias e

    habilidades bsicas prprias ao jovem e jovem adulto, na fase de desenvolvimento cognitivo e

    social correspondente ao trmino da escolaridade bsica. Segundo consta no documento

    ENEM 2002 Relatrio Pedaggico:

    A concepo de conhecimento subjacente a essa Matriz pressupe

    colaborao, complementaridade e integrao entre os contedos das

    diversas reas do conhecimento presentes nas propostas curriculares das

    escolas brasileiras de ensino fundamental e mdio [...]. O Enem busca

    verificar como o conhecimento assim construdo pode ser efetivado pelo

    participante por meio da demonstrao de sua autonomia de julgamento e de

    ao, de atitudes, valores e procedimentos diante de situaes-problema que

    se aproximem, o mximo possvel, das condies reais de convvio social e

    de trabalho individual e coletivo (BRASIL, p. 17).

    A abordagem por competncias, desde a escola e o colgio, no tem como objetivo principal

    facilitar uma avaliao, ao mesmo tempo, processual e cooperativa. Perrenoud (1999),

    apoiado nas palavras de Wiggins, entende que toda avaliao autntica por competncias

    precisa respeitar as seguintes caractersticas: a avaliao deve incluir questes

    contextualizadas; a avaliao aborda problemas complexos; a avaliao deve contribuir para

  • que os estudantes desenvolvam mais suas competncias; a avaliao exige a utilizao

    funcional de conhecimentos disciplinares.

    Portanto, avaliao todo e qualquer processo que mensura a educao formal recebida,

    quantitativa e qualitativamente, durante uma determinada poca, seguindo normas pr-

    estabelecidas por rgos e instrumentos especficos a cada etapa da escolaridade.

    3.3 COMPETNCIAS

    Para deixar mais claro alguns elementos tericos que estamos utilizando, retomamos alguns

    conceitos propostos por Perrenoud (1999). Primeiramente a noo de competncia:

    No existe uma definio clara e partilhada das competncias. A palavra tem

    muitos significados, e ningum pode pretender dar a definio. O que fazer,

    ento? Resignar-se Torre de Babel? Procurar identificar o significado mais

    comum em uma instituio ou em um meio profissional? Avanar e

    conservar uma definio explcita? Adotarei esta ltima posio, sem, por

    isso, afastar-me de um dos significados vigentes. (PERRENOUD, 1999, p.

    19 grifo do autor)

    Perrenoud afasta trs verses aceitveis da noo de competncias, mas que segundo ele no

    acrescentam muito para a compreenso dos problemas. Primeiro, quando se utiliza

    competncias para expressar os objetivos de um ensino em termos de condutas ou prticas

    observveis, ou seja, retoma-se a tradio da pedagogia do domnio ou das diversas formas de

    pedagogia por objetivos. De acordo com Perrenoud, essas abordagens no esto em absoluto

    superadas, desde que sejam dominados seus conhecidos excessos: behaviorismo sumrio,

    taxionomias interminveis, excessivo fracionamento dos objetivos, organizao do ensino

    objetivo por objetivo, etc. Finalizando:

    A assimilao de uma competncia a um simples objetivo de aprendizado

    confunde as coisas e sugere, erradamente, que cada aquisio escolar

    verificvel uma competncia, quando na verdade a pedagogia por objetivos

    perfeitamente compatvel com um ensino centrado exclusivamente nos

    conhecimentos. (PERRENOUD, 1999, p. 19)

    Segundo, quando observamos a oposio existente entre noo de competncia e de

    desempenho: o desempenho seria um indicador mais ou menos confivel de uma

    competncia, que medido indiretamente. uma rotina escolar desenvolvida tanto na

    lingustica quanto na psicometria. Sua nica virtude que ope disposies virtuais sua

  • atualizao, sem nada dizer do desenvolvimento desde a concepo at a maturidade. O fato

    de que a competncia, invisvel, s possa ser abordada por meio de desempenhos observveis,

    no acaba com a questo de sua conceitualizao. Poderamos acrescentar um verbo de ao

    que remetesse para a competncia adjacente, sem perguntar como ela funciona. Para afastar

    essa segunda verso, Perrenoud escreve:

    Porm essa forma de tautologia no suficiente, quando se quer formar em

    tais competncias. Precisa-se, ento, de um inventrio dos recursos

    mobilizados e de um modelo terico da mobilizao. Para isso, preciso

    formar uma idia do que ocorre na caixa-preta das operaes mentais,

    mesmo com o risco de que no passem de representaes metafricas no

    estgio das cincias da mente. (PERRENOUD, 1999, p. 20 grifos do autor)

    A terceira, concepo clssica de competncia, considera uma faculdade genrica, uma

    potencialidade de qualquer mente humana. Podemos dizer que uma competncia permite

    produzir um nmero infinito de aes no-programadas. Essa competncia, como Chomsky

    (apud PERRENOUD, 1999, p. 20) a concebe, seria a capacidade de improvisar e inventar

    algo novo, sem lanar mo de uma lista preestabelecida. De acordo com Perrenoud (1999),

    nesta perspectiva, a competncia seria uma caracterstica da espcie humana, constituindo-se

    na capacidade de criar respostas sem tir-las de um repertrio. Entretanto, na tica desse

    autor, existe uma confuso nos nveis de anlise:

    Os seres humanos certamente tm a faculdade, ancorada em seu patrimnio

    gentico, de construir competncias. Contudo, nenhuma competncia

    estimulada desde o incio. As potencialidades do sujeito s se transformam

    em competncias efetivas por meio de aprendizados que no intervm

    espontaneamente, por exemplo, junto com a maturao do sistema nervoso e

    que tambm no se realizam da mesma maneira em cada indivduo. Cada um

    deve aprender a falar, mesmo sendo geneticamente capaz disso. As

    competncias, no sentido que ser utilizado, so aquisies, aprendizados

    construdos, e no virtualidades da espcie. (PERRENOUD, 1999, p. 20 grifos do autor)

    Todavia, Perrenoud (1999) em sua primeira abordagem faz a seguinte explicao:

    So mltiplos os significados da noo de competncia. Eu a definirei aqui

    como sendo uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de

    situao, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles. Para

    enfrentar uma situao da melhor maneira possvel, deve-se, via de regra,

    pr em ao e em sinergia vrios recursos cognitivos complementares, entre

    os quais esto os conhecimentos. (1999, p. 7 grifos do autor)

  • De acordo com o Documento Bsico do ENEM, a Matriz de Competncias foi desenvolvida

    para estruturar este exame, a fim de definir claramente seus pressupostos e delinear suas

    caractersticas operacionais. Para embasar essa Matriz de Competncias, observamos vrios

    documentos oficiais como referncia:

    O modelo da Matriz contempla a indicao das competncias e habilidades

    gerais prprias do aluno, na fase de desenvolvimento cognitivo

    correspondente ao trmino da escolaridade bsica, associadas aos contedos

    do ensino fundamental e mdio, e considera como referncias norteadoras, o

    texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB), os

    Parmetros Curriculares Nacionais (PCN), os textos da Reforma do Ensino

    Mdio e as Matrizes Curriculares de Referncia para o SAEB. (BRASIL,

    1998, p. 6)

    Neste mesmo documento, encontramos uma definio de competncias e habilidades:

    Competncias so as modalidades estruturais da inteligncia, ou melhor,

    aes e operaes que utilizamos para estabelecer relaes com e entre

    objetos, situaes, fenmenos e pessoas que desejamos conhecer. As

    habilidades decorrem das competncias adquiridas e referem-se ao plano

    imediato do saber fazer. Por meio das aes e operaes, as habilidades aperfeioam-se e articulam-se, possibilitando nova reorganizao das

    competncias. (BRASIL, 1998, p. 6 grifos do documento)

    Na Fundamentao Terico-Metodolgica do ENEM, temos outra definio de competncia:

    Competncia o modo como fazemos convergir nossas necessidades e

    articulamos nossas habilidades em favor de um objetivo ou soluo de um

    problema, que se expressa num desafio, no redutvel s habilidades, nem s

    contingncias em que certa competncia requerida. (BRASIL, 2005, p. 21)

    De acordo com a Fundamentao Terico-Metodolgica do ENEM, a diferena entre

    competncia e habilidade, em uma primeira aproximao, depende do recorte do pesquisador,

    tal como:

    Resolver problemas, por exemplo, uma competncia que supe o domnio

    de vrias habilidades. Calcular, ler, interpretar, tomar decises, responder

    por escrito, etc., so exemplos de habilidades requeridas para a soluo de

    problemas de aritmtica. Mas, se samos do contexto de problema e se

    consideramos a complexidade envolvida no desenvolvimento de cada uma

    dessas habilidades, podemos valoriz-las como competncias que, por sua

    vez, requerem outras tantas habilidades. (BRASIL, 2005, p. 19)

  • E para reforar a diferena existente entre competncia e habilidade, valemo-nos de alguns

    questionamentos e observaes contidas neste documento, dessa forma, a competncia de ler

    distingue-se da habilidade de ler:

    Qual a diferena entre competncia e habilidade de ler? Saber ler, como

    habilidade, no o mesmo que saber ler como competncia relacional. Em

    muitas situaes (quando temos de ler em pblico, por exemplo), ou no

    sabemos ler, ou temos dificuldades para isso. Como coordenar as

    perspectivas do texto, dos ouvintes e do leitor? Todos conhecemos escritores

    brilhantes, mas que no so bons conferencistas. Na escola ocorr