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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO LUIZ CARLOS FREDERICK ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES SÃO PAULO 2012

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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

LUIZ CARLOS FREDERICK

ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA

DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES

SÃO PAULO

2012

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LUIZ CARLOS FREDERICK

ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA

DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES

Dissertação apresentada ao Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) sob a orientação da Prof. Dra. Ângela Maria Martins, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação.

SÃO PAULO

2012

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LUIZ CARLOS FREDERICK

ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA

DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em

Educação da Universidade Cidade de São Paulo, como

requisito exigido para a obtenção do título de Mestre.

Área de Concentração: Data da defesa: Resultado: _______________________ BANCA EXAMINADORA:

Profª Dra. Ângela Maria Martins ____________________________________ Universidade Cidade de São Paulo

Profª Dra. Margaréte M.B. Rosito ____________________________________ Universidade Cidade de São Paulo Profª. Dra. Maria Isabel de Almeida __________________________________ Universidade São Paulo

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DEDICATÓRIA

Especialmente a minha esposa e companheira Marlene por todo o apoio, solidariedade, suporte, paciência e, principalmente por ter me ajudado tanto nesta construção, ela também foi educadora de jovens e adultos em Sumaré/SP e continua sendo educadora popular no seu verdadeiro significado. Dedico igualmente à preciosa Ana Dandara, “filhota” querida, que com carinho e muitas perguntas é parte deste trabalho; ela por tantas vezes me acompanhou nas idas e vindas à UNICID.

Ao meu querido e saudoso pai, Ludovico que partiu para a eternidade no dia 09 de dezembro de 2011, véspera da comemoração dos Direitos Humanos, ao longo de dois anos ele não deixou de bancar com quase um quarto do valor total da mensalidade, tirando da sua aposentadoria de trabalhador. Ele teve pouca escola, mas ensinou a ler o mundo. Dedico com o mesmo carinho a minha querida mãe, Ester por toda a sua amorosidade, ela segue a pedagogia de Paulo Freire no exercício do diálogo e de uma educação emancipadora, ela é uma artesã na confecção da boniteza de seus tapetes de suas artes e da ternura.

Com carinho dedico aos meus irmãos, cunhados e sobrinhos: a Luci por ensinar a valorizar o conhecimento que vem dos pequenos, a Malvina por mostrar os caminhos da garra, a Mary por quebrar tabus e ser uma “ensinante” dialógica, a Estela, professora Universitária e historiadora que tanto tem ensinado com sua meiguice e sabedoria, obrigado por ter me ajudado na revisão desta dissertação, foram horas e horas de dedicação. Ao Mano por ter imprimido centenas e centenas de materiais, documentos e bibliografias... Sem este mutirão de esforços, seria tudo muito mais difícil.

Na pessoa do Cloiff, representando os cunhados, agradeço a força e o apoio incentivador. E representando os sobrinhos, sou grato a Luciane pelo incentivo e por socializar a sua prática pedagógica com os jovens e adultos, seus educandos em Canta Galo/PR.

Dedico muito especialmente ao mestre e pedagogo da libertação Paulo Freire, sem ele a nossa educação não teria a boniteza, a exuberância que brota de quem acredita na força histórica dos pobres. Dedico com a mesma força aos coordenadores e educadores (as) do MOVA da AVIB que muito nos ensinam com seu testemunho, a eles (as) a minha reverência pelo trabalho cotidiano e pelo profetismo carregado de esperança; e aos educandos a certeza de que a “verdadeira sabedoria vem dos considerados últimos da história”.

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AGRADECIMENTOS

À professora Doutora Ângela Maria Martins pela orientação,

compreensão, paciência, dedicação e por tudo o que me ensinou neste percurso, mostrou o caminho da liberdade e da autonomia. Ás professoras Maria Isabel e Margaréte que fizeram parte da banca de qualificação e muito contribuíram para consolidar a pesquisa.

A todos os professores e professoras do Programa de Mestrado da UNICID por tudo o que representam; agradecimento especial também ao Professor Luiz Silva, professor de Estatística que tanto contribuiu, à Sheila, Cláudia e a todos da Universidade que sempre nos cercaram de profissionalismo, carinho e solidariedade. Aos colegas e amigos de curso, como a Lígia, Marco Antonio, Wesley, Rosana, Aírton, Roberto, Valéria, Rodrigo, Simone e todos (as) que no caminho nos ensinaram que a formação deve ser permanente e contínua.

Devo muito aos coordenadores, educadores e educadoras da AVIB. Este grupo é a razão desta pesquisa... Obrigado de coração a Lili, Laurita, Rogério e a cada um dos educadores por me ajudarem tanto, as entrevistas foram importantes... Mas, o testemunho, a coerência e a teimosia em construir um mundo sem analfabetos é um referencial grandioso. A minha gratidão a todos (as) da família AVIB, não é a toa que esta entidade é uma referência importante em Guaianases, Cidade Tiradentes e região. Agradeço a todos da AVIB na pessoa da Monici presidente da ONG por todo apoio. Gratidão também à Mônica e à Vânia que sempre foram solícitas, colocando à disposição relatórios, documentos e materiais que me ajudaram na elaboração do que se referia à organização e articulação da Entidade.

Ao querido amigo e irmão, Pe. Rafael Lopes Villasenor, missionário, profeta das CEBs, do MOVA e das pastorais sociais. Ele foi o grande incentivador para que entrasse na aventura do Mestrado em Educação, mostrou o caminho das pedras e ao fazer o seu mestrado foi provocativo: “você também precisa continuar estudando”! O Rafael me presenteou com um artigo/testemunho sobre a sua experiência como educador do MOVA/SP na favela Heliópolis, bem como no resgate do MOVA em Guaianases.

Ao Robert Cabanes, doutor e pesquisador da USP, da Faculdade de Paris, que estuda os problemas urbanos, de mobilidade social a mais de 10 anos; e tem sido um parceiro importante na pesquisa à partir das periferias. Ele leu parte desta dissertação e fez apontamentos importantes.

Ao amigo Anesino, o Adão dos Santos, poeta e educador do MOVA/SP, a Norma educadora do MOVA/SP e a todas as guerreiras desta causa libertária.

Aos compadres Manoel e Néia por todo incentivo e por ensinarem os caminhos da educação libertadora, junto aos seus alunos e seus filhos.

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À família Moroni: Paulo, Modhu e Bárbara pelo testemunho de amizade e por mostrarem os caminhos do Bangladesh.

Aos amigos Arnaldo, Antonia e filhos pela valentia e coerência na çluta

do povo e ser inspiração que um mundo de paz e fraternal é possível.

Aos amigos da Associação de Leigos Xaverianos pela ousadia na construção de um caminho missionário que possibilita a construção do sonho de Conforti: fazer do mundo uma só família, baseada na paz, justiça e solidariedade. Dedico também a todos os xaverianos, irmãos dos pobres.

Aos companheiros Geraldo Estevo e Gentil, referências da luta pela terra e da educação popular em Hortolândia e região.

Á família Pilarski: Geraldo, Aieda e Christian, que vivem os ideais ameríndios com espírito missionário, profético e solidário em terras americanas.

O meu reconhecimento aos estudiosos e pesquisadores do MOVA/SP, são tantos que através da pesquisa fui conhecendo: as educadoras Kunrath e Abbonízio que representam a nova geração; e os consagrados: Pedro Pontual;, Moacir Gadotti, Vera Barreto, Romão, Maria José do Vale Ferreira entre outros.

A minha querida sogra, Dona Olésia, mulher de garra, alfabetizanda das letras e do mundo que muito me inspirou.

Ao companheiro sempre vereador Beto Custódio, educador por excelência, defensor da causa dos Direitos Humanos. Dedico também aos amigos parlamentares: Simão Pedro, Edinho Silva e Paulo Teixeira que fazem do parlamento um espaço de participação e de promoção da cidadania.

Aos mestres do povo: Alberto Panichella - missionário dos lascados, meu padrinho da luta: o camarada mais apaixonado pela causa do povo que conheço em todo planeta; Antônio Lopes – o profeta e educador dos educadores; ao Tonhão – educador sábio e que tem como ponto de partida, o chão da vida; o Renato parceiro do MOVA, assessorou os grupos da AVIB no governo Marta, como representante do NAE 11, também mestre e articulador das sextas socialistas; Renata – a profetiza da causa das mulheres; Cristina do Barro Branco – evangelizadora do ecumenismo e da política; a Irmã Cida – missionária do povo negro e dos pequenos.

E com igual reconhecimento dedico esta pesquisa aos companheiros

(as) que são educadores populares fazendo história com o povo onde vivem nos diversos segmentos sociais e em diferentes frentes à serviço da causa libertária: Cacá Lopes, Dorival, Nilma de Belo Horizonte, João Corso, José Martins, Edson Barbosa, Matteo Raschietti, Luiz Carlos Paixão, Emídio Alves, Ludimar Rafagnin, Pe. Edmilson Turozi de Oliveira, Feliciano Gabriel dos Santos, João Carlos Corso, Aldo Bonna, João Galvino, Marcelino Felix, Vilson Mileski, Marcelino de Hortolândia, Elaine Silva,

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Antenor Barbosa, Maguila, Edson Magrão, Clodoaldo, Richard, Bruno, Tita Reis, Pedro Testi, Benê, Irmão Luís de Cascavel, Robson, Ivandir, Dorvino, Israel, Valdir, Japonês, Tomé, José Correia, Patrícia Simões, Donizete, Elzeli, Pe. José Carlos, Vanderlei, Grimaldo, Naídes, Alberto Rodrigues, Romilda, Pastor Abnildo, Toninho Mineiro, Afonso, Dona Rosa, Eliseu, Claudionor, Mário e Raimundo Bonfim do Heliópolis, Dona Lina, Índio, Ricardo, Dona Aurelina, Helder, João da Cruz, Pedro Monteiro, Irmã Clara, Padre Edmilson, Elifas, Atanácio, Demília, Patrícia Kelly, Júnior, Dona Lina, Domingos, Déia, Lúcia, Marcos Cunha, Pedro Bala, Elza, Zé Raimundo, Joana, Ednaldo, Dulcelene, Ricardo, Adalberto Vieira, Patrícia, Ireldo, Tatiane, Cleide e tantos (as) que exercem a educação popular com tanta maestria e solidariedade.

Aos companheiros educadores da EMEF Luiz Roberto Mega: Débora coordenadora, Sandro, Andréia Honorato, Aguiar, Hermes, Luciane, Wanderly, Benjamim, Edelson, Vilma, Valdenice, João Carlos, Selma, Simone, Fátima, Greicy, Roberto, Sandra, Roberta, Eliene, Áurea, Andreia, Débora, Angélica, Luciane diretora, Bete coordenadora, Cristiane, Uilian, Beth, Patrícia, Adriane, Maria de Fátima, Marinês, Edna, Benélia, Itaicy, e todos (as) que muito me incentivaram.

Aos companheiros educadores da E.E. Nancy de Oliveira Fidalgo: Geraldo Santana, Edilson, Neves, Samuel, Paulo, Mirian, Itamar, Silvani, Djalma e todo o grupo pelo apoio e consideração.

A eterna gratidão aos que hoje participam da morada eterna, mas continuam sendo memória viva na luta do povo: Seu José Monsueto, um dos educadores patriarcas do MOVA em Guaianases, Pe. Zé Pedro, Geraldo Peron, Pe. Emilio Paloschi, Nei Caetano, Honório Arce, Pe. Pedro Lamanna e tantos (as) que são referências na educação de jovens e adultos, na educação popular e na consciência cidadã!

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“Paulo Freire foi sempre assim: um educador conectivo, um homem de diálogo, um criador com os outros. Por isso, por ele, uma frase tão conhecida foi primeiro praticada e depois, escrita: ‘ninguém educa ninguém, mas também ninguém se educa sozinho...’ por Carlos Rodrigues Brandão.

O educador, Brandão (2002), no prefácio de SOUZA, Inês (org). PAULO FREIRE, Vida e Obra, assim terminou sua apresentação: “Não resisto a me despedir sem trazer uma passagem de um escrito de Paulo Freire que há muitos anos(tantos assim?) incorporei a um livro que se chamou o educador: vida e morte. Paulo Freire escreveu isto:

Os profetas não são homens ou mulheres desarrumados, desengonçados, barbudos, cabeludos, sujos, metidos em roupas andrajosas e pegando cajados. Os profetas são aqueles ou aquelas que se molham de tal forma nas águas da sua cultura e da sua história, da cultura e da história do seu povo, dos dominados do seu povo, que conhecem o seu aqui e o seu agora, e, por isso, podem prever o amanhã que eles mais do que adivinham, realizam. Eu diria aos educadores e educadoras, ai daqueles e daquelas que pararem com a sua capacidade de sonhar, de inventar a sua coragem de denunciar e de anunciar. Ai daqueles que, em lugar de visitar de vez em quando o a manhã, o futuro, pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e com o agora, se atrelam a um passado de exploração e de rotina.

Resgate do testemunho do filho de Freire, Lutgartes, Costa, in: SOUZA,

Inês. PAULO FREIRE, vida e obra, 2002.

Não se pode negar a sua amorosidade pelos homens, pelo mundo, pela boniteza das mulheres, como costumava dizer, pela boniteza dos rios, pela boniteza da vida, pela boniteza de um dia um homem do povo saber ler e escrever. A educação, dizia ele, é um ato político, e sendo político implica em uma escolha: ou se é a favor dos opressores ou se é a favor dos oprimidos. O ato político também é amoroso, pois implica num gosto numa escolha num porque, p. 341.

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RESUMO

Este estudo tem como propósito analisar o programa de formação continuada de educadores do MOVA/SP que atuam em Guaianases, zona leste de São Paulo. Discuto aspectos históricos e políticos do surgimento do MOVA/SP e, a partir deste contexto, analisa-se a estrutura e a dinâmica do programa de formação continuada de educadores populares que atuam na Organização Não Governamental (ONG) Associação dos Voluntários Integrados no Brasil (AVIB), com vistas a verificar o que pensam os educadores acerca desse processo formativo. Utilizou-se o método qualitativo. As principais fontes desta pesquisa são as referências bibliográficas que tratam da questão da alfabetização e do MOVA/SP, os documentos oficiais e entrevistas. Foram aplicados questionários a vinte e dois educadores da AVIB, visando coletar dados sobre a importância da formação continuada recebida para subsidiar sua prática. Apresentam-se concepções acerca da alfabetização como um processo político e pedagógico na visão de Paulo Freire, Álvaro Vieira Pinto e Enrique Dussel. Examinam-se também experiências de alguns movimentos que trabalharam a questão da alfabetização de jovens e adultos, com ênfase na criação do MOVA/SP, que tem sua gênese no final dos anos de 1980 e que vigora até os dias de hoje, quando se tornou uma política de governo. Problematiza-se sobre a formação continuada do MOVA/SP, seus pressupostos político-pedagógicos e suas características, para posteriormente compreender como esta formação ocorre entre os educadores da AVIB. Concluiu-se preliminarmente, que o programa da AVIB é um processo permanente de reflexão e mobilização dos sujeitos, nas situações sociais e formativas onde estão inseridos.

Palavras chave: MOVA/SP; formação de educadores populares; formação continuada; educação de jovens e adultos.

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ABSTRACT

This study has as purpose to analyze the continued formation program educators MOVE/SP that act in Guaianases, East zone of São Paulo. Discuss historical and political aspects of the emergence of MOVE/SP and, from this context, analyzes the structure and dynamics of continuous training programme of popular educators who work in non-governmental organization (NGO) Association of Volunteers integrated into Brazil (AVIB), with views to verify what they think the educators of this formative process. Used the qualitative method. The main sources of this survey are the bibliographical references that deal with the issue of literacy and MOVE/SP, official documents and interviews. Questionnaires were applied to twenty-two educators of AVIB, aiming to collect data about the importance of continuing training received to subsidize its practice. Presents concepts about literacy as a political process and pedagogical in vision of Paulo Freire, Álvaro Vieira Pinto and Enrique Dussel. Also examined experiences of some movements that worked the issue of literacy of young people and adults, with an emphasis on creation of MOVE/SP, which has its genesis in the late 1980 and which exists to this day, when he became a Government policy. Problematize the continued training of MOVE/SP, their political-pedagogical assumptions and their characteristics, to further understand how this formation occurs between AVIB educators. Conceived, it was preliminarily found that the program of AVIB is a permanent process of reflection and mobilization of subject, in social situations and training where they are entered.

Keywords: MOVE/SP; training of educators; continuing training, youth and adult education.

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LISTA DE SIGLAS

AEC – Associação de Educação Católica

AVIB – Associação dos Voluntários Integrados no Brasil

CEAT – Centro de Atendimento ao Trabalhador

CEBI – Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos

CEBs – Comunidades Eclesiais de Base

CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CDHU – Companhia de Desenvolvimento de Habitacional e Urbano do Estado

de São Paulo

CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação

Comunitária

CEPIS – Centro de Educação popular do Instituto Sedes Sapientiae

CEU – Centro Educacional Unificado

CIEJA – Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos

CPC – Centros Populares de Cultura

DRE – Diretoria Regional de Ensino

EDA – Educação de Adultos

EJA – Educação de Jovens e Adultos

FUMCAD – fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

IPF – Instituto Paulo Freire

IPJ – Instituto Paulista da Juventude

ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

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MCP – Movimento de Cultura Popular

MEB – Movimento de Educação de Base

MST – Movimento Sem Terra

MOVA/SP – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos de São Paulo

MOVA/Brasil – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos do Brasil

MOVA/Sudeste – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos Sudeste

NAE – Núcleo de ação Educativa

NAF – Núcleo de Apoio à Família

NAMA – Núcleo Alternativo das Mulheres

PAF – Programa Ação Família

PC do B – Partido Comunista do Brasil

PMSP – Prefeitura Municipal de São Paulo

PT – Partido dos Trabalhadores

PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica/São Paulo

ONGs – Organizações Não Governamentais

PNE – Plano Nacional de Educação

PROALFA – Programa de Alfabetização

SMADS – Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social

SME – Secretaria Municipal de Educação

SMPP – Secretaria Municipal de Participação e Parceria

SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

SESC – Serviço Social do Comércio

UNAS - União dos Núcleos e Associações do Heliópolis.

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LISTA DE TABELAS

TABELA I – Local de funcionamento dos grupos de alfabetização...................83

TABELA II – Faixa etária dos educandos do MOVA/AVIB.............................. 84

TABELA III – Gênero dos educandos do MOVA............................................. 85

TABELA IV – Inserção no mercado de trabalho.............................................. 85

TABELA V a – Perfil dos educadores do MOVA/AVIB: a prevalência

de gênero........................................................................................................ 86

TABELA V b – Tempo que é educador do MOVA/AVIB.................................. 87

TABELA V c – Exercício de outra atividade na educação............................... 88

TABELA V d – Escolaridade dos educadores............................................... 89

TABELA VI – Aproximação dos educadores com o MOVA/AVIB.................... 90

TABELA VII – Envolvimento dos educadores com a AVIB............................. 91

TABELA VIII – Envolvimento dos educadores em fóruns da educação

Popular....................................................................................................... 92

TABEL IX – Outros meios utilizados na busca de formação.......................... 93

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Sumário

INTRODUÇÃO............................................................................................. 16

CAPÍTULO I - ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM

PANORAMA NECESSÁRIO.......................................................................... 21

1.1. Concepções sobre o conceito de alfabetização................................... 21

1.2. A alfabetização e a educação de Jovens e Adultos na década de 1960:

algumas experiências............................................................................ 27

1.3. O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP) no

cenário de alfabetização....................................................................... 34

1.4. A retomada do MOVA/SP como programa da Secretaria Municipal de

Educação da Prefeitura de São Paulo.................................................. 43

1.5. O MOVA/SP se expande em outras cidades e estados do Brasil........ 45

CAPÍTULO II – PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DO MOVA/SP:

PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E PEDAGÓGICOS E SUA EXECUÇÃO..... 48

2.1. Análise do Projeto Político-Pedagógico do MOVA/SP.......................... 48

2.2. Caracterização do processo de formação de educadores populares:

contribuição de estudiosos da educação popular para o MOVA/SP............... 51

2.3. A formação do MOVA/SP...................................................................... 55

2.4. Caracterização do processo de formação oferecida pela Secretaria

Municipal de Educação................................................................................... 64

CAPÍTULO III – A AVIB E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE

EDUCADORES.............................................................................................. 72

3.1. Caracterização do bairro de Guaianases/SP e da Associação dos

Voluntários Integrados no Brasil (AVIB)......................................................... 72

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3.2. Análise do programa de formação de educadores do MOVA/SP da AVIB:

Estrutura e dinâmica....................................................................................... 79

3.3. O que pensam os educadores populares a respeito da formação

continuada proporcionada pela AVIB.............................................................. 82

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 113

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 118

ANEXO A: Decreto da Criação do MOVA/SP............................................... 125

ANEXO B: Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP........................... 127

ANEXO C: Carta aberta à população de SP em defesa do MOVA/SP....... 128

ANEXO D: Projeto Político Pedagógico do MOVA/SP............................... 129

ANEXO E: Questionário dirigido aos educadores da AVIB....................... 135

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INTRODUÇÃO

Este estudo nasceu no contexto de minha atuação como professor de

escola pública e simpatizante do Movimento de Alfabetização de Jovens e

Adultos (MOVA/SP), que tive contato em 1991 e 1992 no seu início, quando

atuava como agente pastoral e social na Favela Heliópolis; e posteriormente

acompanhei as dificuldades do movimento, desta vez em Guaianases, bairro

da zona leste, quando Paulo Maluf desconstruiu as políticas públicas de

alfabetização na cidade de São Paulo, mas os grupos organizados resistiram e

continuaram fazendo acontecer a educação de jovens e adultos nos moldes do

MOVA/SP, mesmo sem o aporte municipal. Assim, a questão do MOVA/SP

tornou-se uma temática instigante e me desafiou a compreender como os

educadores que trabalham neste campo constroem suas práticas pedagógicas,

quando estão reunidos em processos de formação continuada.

Como aponta Martins (2000), discutir apenas aspectos documentais de

programas de governo, como no caso do MOVA/SP, pode implicar na

realização de análises parciais de dinâmicas pedagógicas quando educadores

atuam em seu cotidiano, pois exclui a voz destes atores. Neste sentido, a

intenção deste trabalho é ampliar o debate sobre questões de formação

continuada de educadores populares que trabalham com a alfabetização de

jovens e adultos.

Assim, pretende-se primeiramente, com base na análise da literatura e

de documentos oficiais, discutir aspectos históricos e políticos do surgimento

do MOVA no município de São Paulo, e, a partir deste contexto, analisar a

estrutura e a dinâmica do programa de formação continuada de educadores

populares que atuam na entidade Associação dos Voluntários Integrados no

Brasil (AVIB), com vistas a verificar o que pensam os educadores deste

processo formativo.

A pesquisa discute num primeiro momento, as características do

MOVA/SP, observando a trajetória histórica da política educacional mais

recente na elaboração de programas de educação de jovens e adultos e no

combate ao analfabetismo. Não foi possível realizar tal estudo sem recorrer ao

trabalho do educador Paulo Freire - uma das maiores referências bibliográficas

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para a compreensão e realização dessa tarefa. Assim, é preciso considerar que

o MOVA/SP organizou-se a partir de experiências de educação popular que

aconteciam em diferentes bairros da cidade, nas quais as propostas de Paulo

Freire já eram debatidas e utilizadas. Quando implantado oficialmente, o

Movimento percorreu um longo caminho de consolidação até tornar-se uma

política de governo.

Neste sentido, o texto está estruturado em três capítulos. O primeiro

trata da alfabetização de jovens e adultos, apresentando três concepções

acerca da alfabetização, que se complementam, pois são educadores que

compreendem a alfabetização como um processo político e pedagógico: Paulo

Freire, Álvaro Vieira Pinto e o filósofo Enrique Dussel. O estudo se fundamenta,

ainda, em estudos realizados sobre o tema. Na seqüência, relata algumas

experiências de movimentos que trabalharam a questão da alfabetização de

jovens e adultos na década de 1960, tais como: o Movimento de Cultura

Popular de Recife; a “Campanha” Pé no Chão Também se Aprende a Ler da

cidade de Natal; o Movimento de Educação de Base; a experiência de Angicos

e a experiência de Paulo Freire com os trabalhadores camponeses do Chile,

enquanto esteve exilado, de 1964 a 1969.

Neste mesmo capítulo, descrevo o MOVA/SP, formulado e

implementado na cidade de São Paulo no final dos anos de 1980, que nasceu

das experiências de alfabetização desenvolvidas pelos Movimentos Populares,

sobretudo em parceria com a Administração Popular e Democrática instaurada

a partir de 1989, na tentativa de responder à necessidade de enfrentar a

situação de analfabetismo que caracteriza uma parcela significativa da

população de jovens e adultos da cidade de São Paulo. O MOVA/SP foi criado

pelo Decreto-lei 28.302, de 21 de novembro de 1989, assinado pela Prefeita

Luísa Erundina de Sousa (1989-1993).

Com as mudanças da gestão municipal e a não efetivação do MOVA/SP

como um programa de governo, houve muitas dificuldades, o que, porém, não

impediu a continuidade de suas ações, mesmo nos governos de Paulo Maluf e

Celso Pitta, entre os anos de 1993-2000. A retomada do MOVA/SP como

programa de governo, ocorreu em 2000, com a eleição de Marta Suplicy. No

ano seguinte, tornou-se política pública, tendo suas diretrizes definidas pela

Secretaria Municipal de Educação, construindo um Projeto Político Pedagógico

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em parceria com Organizações Não Governamentais (ONGs). Apresento

também como o MOVA/SP foi sendo construído em outras cidades e estados

do Brasil por meio da Rede MOVA/Brasil, e sua articulação na região sudeste,

abrangendo São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.

O segundo capítulo trata da formação continuada do MOVA/SP, seus

pressupostos políticos-pedagógicos e sua implementação, com base na

caracterização do processo de formação continuada de educadores populares,

como vem sendo oferecida pela Secretaria Municipal de Educação.

A formação de educadores populares é um dos eixos do MOVA/SP e por

consequência do MOVA/Brasil, considerando-se que todas as instâncias do

programa são espaços de apropriação e construção de conhecimento: a

mobilização que ocorre nas entidades para formalizar o convênio; os encontros

no interior das próprias organizações; a participação nos Fóruns Municipais e

Regionais do MOVA/SP; as reuniões pedagógicas e os encontros de formação

de educadores e coordenadores desenvolvidos pela Secretaria Municipal de

Educação.

O terceiro capítulo analisa o processo de formação continuada

promovido pelos educadores da AVIB, entidade que busca incorporar a

proposta de Paulo Freire, entendendo que a formação de educadores é um

processo fundamental na efetivação de práticas que possibilitem a

transformação social. Para Freire (1997, p. 43):

A formação enquanto ato de conhecimento, não apenas deve centrar-se no ensino de conteúdos, deve desafiar o educando a aventurar-se no exercício de não só falar da mudança do mundo, mas com ela realmente comprometer-se. Por isso, para mim um dos conteúdos essenciais e qualquer programa de formação é o que possibilita a discussão à natureza mutável da realidade natural como a história e vêem homens e mulheres como seres não apenas capazes de se adaptar ao mundo, mas, sobretudo de mudá-lo. Seres curiosos, atuantes, falantes, criadores.

O programa de formação continuada dos educadores do MOVA da

AVIB, propõe-se a levar em conta a realidade social, política e cultural de seus

educadores e educandos, dialogando com os diferentes desafios e

experiências vividas por estes protagonistas, contextualizada na visão de

educação popular, que apresenta exigências aos educadores, sobretudo no

campo da competência científica e da sensibilidade para trabalhar com a

realidade dos educandos.

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Neste sentido, a educação popular é entendida no referido programa,

como um processo permanente de reflexão e mobilização dos objetivos dos

próprios sujeitos, nas situações sociais onde estão inseridos. A prática

educativa não se pode se prender à burocratização escolar, desde que seus

atores compreendam seu papel político e construam um processo permanente

de interação com os outros sujeitos que buscam, da mesma forma, apropriar-

se da construção do conhecimento no sentido das proposições de Paulo Freire.

O FOCO DO ESTUDO

Esta pesquisa tem como propósito compreender o que os educadores

do MOVA/SP pensam a respeito de seu processo de formação continuada

realizada pela AVIB, no Bairro de Guaianases em São Paulo, na tentativa de

verificar se estes educadores sentem-se preparados para enfrentar a Educação

de Jovens e Adultos em toda sua complexidade.

Nesta perspectiva, apresenta como objetivos: discutir aspectos históricos

e políticos de estruturação do MOVA no município de São Paulo, como

contexto mais geral no qual o programa de formação continuada vem sendo

implementado; caracterizar o Programa de formação continuada no que diz

respeito à sua Proposta político-pedagógica e sistemática de implementação;

buscar apreender a opinião de educadores populares sobre o processo de

formação continuada.

O foco do estudo estará centrado, portanto, na análise de ação

específica de uma ONG que, dentre outros trabalhos, atua com grupos de

alfabetização de jovens e adultos na periferia de São Paulo, especificamente

no bairro de Guaianases.

Tenho clareza, conforme as considerações de Luna (1995), que o

processo de pesquisa é dinâmico e o pesquisador deve estar atento à

realidade que estuda e ser sempre sensível às alterações que ela pode exigir.

Para Maia (2000), uma das principais características dos estudos qualitativos é

a flexibilidade apresentada ao pesquisador. Nesses termos, a pesquisa ocorreu

com a intenção de acrescentar possíveis novas perguntas e questionamentos

no decorrer do estudo (Martins, 2001), partindo da ideia que o conhecimento é

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algo inacabado, uma construção contínua e, portanto, aberto a novos

elementos nesse processo.

As principais fontes do estudo foram as referências bibliográficas que

tratam da questão da alfabetização e do MOVA/SP, os documentos oficiais e

as entrevistas. Os Documentos Oficiais analisados são referentes ao

MOVA/Brasil e MOVA/SP, além de fontes coletadas junto à Secretaria

Municipal de Educação de São Paulo e à Prefeitura do Município de São Paulo.

Foram aplicados questionários a 22 educadores que atuam nos grupos de base

na AVIB e aos 03 coordenadores, com vistas a coletar dados sobre a

importância da formação continuada recebida para subsidiar sua prática. O

questionário apresentava os seguintes objetivos:

- Discutir a importância que os educadores atribuem ao momento

semanal de formação continuada.

- Analisar seu comprometimento com o processo formativo.

- Verificar o que esta formação tem contribuído para o trabalho efetivo

com os educandos do MOVA/SP nas bases onde atuam.

- Analisar como ocorre essa formação: quais referenciais teóricos são

priorizados e estudados; qual metodologia é adotada no processo formativo.

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CAPÍTULO I

ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM PANORAMA

NECESSÁRIO.

1.1. Concepções sobre o conceito de alfabetização

Apresento três concepções acerca da alfabetização que se

complementam: a visão do professor Paulo Freire, do educador Álvaro Vieira

Pinto e do filósofo Enrique Dussel. Antes, convém elucidar que estes

educadores têm a compreensão que alfabetizar não é um processo neutro e

apolítico, ao contrário, a ação de alfabetizar apresenta implicações políticas

que contribuem para um caminho de transformação social, política, econômica

e cultural.

No Congresso Brasileiro de Alfabetização, de 14 a 16 de setembro de

1990, Ano Internacional da Alfabetização, educadores reunidos em São Paulo

apresentaram várias proposições a respeito da situação da alfabetização no

Brasil e das políticas públicas que deveriam ser implementadas, quando se

afirma que “as políticas de alfabetização precisam envolver ações permanentes

e sistemáticas relacionadas a programas de educação básica, de maneira a

garantir sua qualidade” (Gadotti, Romão, 2001, p.109).

O documento acima citado entende que o conceito de analfabetismo

carrega consigo preconceitos e incorreções, pois, usualmente, o analfabeto

tem sido colocado como uma pessoa desqualificada para o exercício da

cidadania, um mal a ser extirpado, sem que haja a compreensão que ele é um

sujeito de direitos. Para tanto, o analfabeto deve ser reconhecido como,

Cidadão participante da sociedade, produtor de cultura e que, por sua condição de classe, sexo, raça e portador de deficiência, tem sido privados do direito à aquisição dos códigos da leitura e da escrita e de conhecimentos que ampliam suas possibilidades de participação e transformação social. Deve-se superar o conceito restrito de que alfabetizado é o ‘indivíduo capaz de ler e escrever um bilhete simples’. Estar alfabetizado é integrar à vida de qualquer cidadão a condição de leitor, escritor e comunicador, bem como garantir o acesso a outros conhecimentos que ampliem sua inserção crítica e participativa na sociedade (Gadotti, Romão, 2001, p.109).

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Nesta compreensão, a alfabetização é concebida como um processo

educacional que vai além da leitura e da escrita, da superação e da ausência

de formação e de aquisição de conhecimento. É uma questão de política

pública, que exige dos governos um projeto estruturado para responder às

expectativas de uma educação de adultos que permita alcançar o exercício da

cidadania, garantindo assim, o cumprimento previsto na última Constituição

Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB,

1996), e no Plano Nacional de Educação (PNE, 2001) que assegura a

educação pública e gratuita como um direito de todos.

Para Paulo Freire1 (1991), o analfabeto é aquele que vive nas periferias,

nas ocupações, favelas ou cortiços das grandes cidades. Vive geralmente de

subemprego, dedicando-se a profissões que não exigem habilitação específica

e tem consciência que precisa saber ler e escrever. Porém, isto não basta, pois

por si só não altera as condições de moradia e de vida, estas condições só se

alteram pelas lutas coletivas dos trabalhadores por mudanças estruturais da

sociedade.

Segundo Freire (1991, p. 118), a questão principal, na alfabetização,

Não é de natureza técnica. As questões principais na alfabetização são de natureza político-ideológico e científica a que se juntam aspectos técnicos necessários. O ponto de partida é a decisão, a vontade política de fazer, a arregimentação dos recursos e a formação rigorosa dos educadores e das educadoras.

Freire (1987) constata que o analfabetismo aparece numa visão ingênua

ou astuta como a manifestação da incapacidade do povo de sua pouca

inteligência, de sua preguiça. A partir desta visão, a alfabetização, “se rende ao

ato mecânico de depositar palavras, sílabas e letras nos alfabetizandos. Este

depósito é insuficiente para que os alfabetizandos comecem a afirmar-se, uma

vez que, em tal visão, se empresta à palavra um sentido mágico” (p. 15).

O autor observa que, geralmente os textos das cartilhas de alfabetização

nada têm a ver com a experiência dos alfabetizandos, pois estes adultos são

1 Paulo Freire, pernambucano, nasceu em Recife, em 19 de setembro de 1921 e falecido em 02 de maio de 1997, conhecido mundialmente como educador, pensador, filósofo e militante da educação; e uma referência importante na educação de jovens e adultos. O MOVA/SP foi criado em 1989 quando ele exerceu a função de Secretário Municipal de Educação na cidade de São Paulo, no Governo Luiza Erundina. Freire é autor de mais de 25 livros; foi professor nas Universidades de Harvard e Genebra, na Universidade Estadual de Campinas e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

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tratados de maneira paternalista, às vezes infantil, como passivos, receptores

das letras. Paulo Freire (1987, p.18), se contrapõe a esta visão deturpada e

apresenta uma concepção crítica, em que,

O analfabetismo nem é uma chaga, nem uma erva daninha a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta. Não é um problema estritamente linguístico, nem exclusivamente pedagógico, metodológico, mas político, como a alfabetização por meio da qual se pretende superá-lo proclamar sua neutralidade, ingênua ou astutamente, não afeta em nada a sua politicidade intrínseca.

Os alfabetizandos deverão lidar com outro aprendizado: o de escrever a

sua vida, ler a sua realidade, daí a importância de tomar a história nas mãos

para fazer e reescrever os acontecimentos importantes que marcaram a sua

existência. E acrescenta que

(...) a primeira experiência prática que a concepção crítica da alfabetização se impõe é que as palavras geradoras com as quais os alfabetizandos começam sua alfabetização como sujeitos do processo sejam buscadas em seu universo vocabular mínimo, que envolve sua temática significativa (Freire, 1987, p. 21).

A partir desta perspectiva, o analfabeto é colocado como aquele a quem

foi negado o direito de ler, ninguém é analfabeto por escolha, mas como

consequência das condições objetivas em que se encontra.

O processo de alfabetização, assim, deve ser visto como uma ação

cultural para a libertação, em que o educando assume um papel de sujeito em

relação ao educador. Entretanto, para que haja esse processo de alfabetização

e para que seja um ato de conhecimento, é necessário estabelecer uma

relação de diálogo autêntico em que os alfabetizandos “assumam desde o

começo mesmo da ação, o papel de sujeitos criadores, aprender a ler e

escrever já não são, pois memorizar sílabas, palavras ou frases, mas refletir

criticamente sobre o próprio processo de ler, e escrever e sobre o profundo

significado da linguagem” (Freire, 1987, p. 59).

Assim, aprender a ler e escrever envolve ação e reflexão. O significado

de dizer a palavra é carregado de profundidade, é o direito de expressar-se e

expressar o mundo, de criar e recriar. Pois o ato de conhecer para Freire, 1987,

p. 60,

Envolve um movimento dialético que vai da ação a reflexão sobre ela e desta a uma nova ação. Para o educando conhecer o que antes não conhecia, de se engajar num autêntico processo de abstração por meio do qual reflete sobre formas de orientação no mundo, em que se sobrepõem momentos de sua cotidianidade.

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O autor sublinha que o processo de alfabetização deve relacionar o ato

de transformar o mundo ao ato de pronunciá-lo. Ao referir-se ao diálogo

educador-educando, este não tem nada a ver, “de um lado com o monólogo do

educador ‘bancário’, de outro, com o silêncio espontaneísta de certo tipo de

educador liberal, o diálogo engaja ativamente a ambos os sujeitos do ato de

conhecer, educador-educando e educando-educador” (Freire, 1987, p. 61).

Da mesma forma, Álvaro Vieira Pinto2 (2001) aponta a necessidade de

superar a visão ingênua do analfabetismo, colocando-a apenas como objeto do

conhecimento. A sua visão de educação e, especificamente, de alfabetização

de adultos dialoga com Paulo Freire, pois, para o autor, não se pode limitar a

alfabetização como se tratasse de um processo de transmissão de uma técnica

para ensinar a ler e escrever. Trata-se de produzir uma mudança na

consciência do educando, mudança na qual o conhecimento de leitura é

apenas um dos aspectos. Assim, coloca-se como sujeito da alfabetização o

próprio analfabeto que constrói possibilidades de alcançar a sua transformação

pessoal e da realidade em que está inserido. Ainda, na visão do autor, Pinto,

2001, p. 99),

O primeiro passo para a constituição da autoconsciência crítica do trabalhador, da qual decorre necessariamente a aquisição da linguagem escrita, está em fazê-lo tornar-se observador consciente de sua realidade; destacar-se dele para refletir sobre ela, deixando de ser apenas participante inconsciente dela. Tecnicamente, esse resultado é alcançado mediante a apresentação ao educando adulto de imagens de seu próprio meio de vida, de seus costumes, suas crenças, práticas sociais, atitudes de seu grupo. Com isso, o alfabetizando se torna espectador e pode discutir sua realidade, o que significa abrir o caminho para o começo da reflexão crítica, do surgimento de sua autoconsciência.

É necessário, assim, partir da visão do analfabeto como ser humano e

não do analfabetismo, pois este é um conceito abstrato. Deve-se considerar

que o cidadão adulto analfabeto é sujeito de uma política pública perversa, que

não prioriza sua inserção social no mundo do conhecimento.

O analfabetismo, nesta compreensão, é visto como uma questão que

foge do problema individual, do interesse ou desinteresse em ler e escrever ou 2 Álvaro Vieira Pinto é um dos principais estudiosos brasileiros da educação de jovens e adultos. Nasceu em 1909 e faleceu em 1987; filósofo e educador destacado trabalhou temáticas importantes relacionadas à ciência, tecnologia, cultura, trabalho e educação. Foi um dos fundadores do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) que tem o seu surgimento no contexto da mobilização popular que buscava combater ao analfabetismo adulto. Dentre suas obras mais importantes, destacam-se: A Ideologia do Desenvolvimento Nacional, Consciência e Realidade Nacional e Sete Lições sobre Educação de Adultos.

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alfabetizar-se no sentido abrangente. Deve ser compreendido como uma

questão que exige uma postura ativa dos governos no sentido de possibilitar

um projeto de educação que considere o alfabetizando como sujeito de direitos

educacionais capaz de contribuir na superação da exclusão social em que

muitos estão submetidos.

Assim, a erradicação do analfabetismo não se realiza simplesmente com

campanhas de alfabetização, estas podem até ajudar, porém, o que poderá

fazer a diferença é a construção de políticas públicas que resgatem a pessoa

em situação de analfabetismo, possibilitando que esta assuma um papel de

protagonismo e autonomia na busca de superação deste problema que tem se

agravado com o passar dos anos. Constatamos que, em pleno século XXI,

ainda temos dados alarmantes que denunciam o pouco investimento na

educação de jovens e adultos, apresentando assim um grande desafio a ser

enfrentado.

Neste mesmo entendimento, Dussel3 (1977a) destaca que o latino-

americano deve ser identificado como indígena, como negro escravizado, como

mulher violentada, como criança empobrecida, como um “ser negado” ao longo

da história de colonização e dominação coordenada pela Coroa Espanhola e

Portuguesa. Neste viés o sujeito pode ser compreendido como aquele que é

excluído da alfabetização, em que se nega o direito à educação, à escola, a

alfabetizar-se numa concepção dialógica, onde o alfabetizando é também

sujeito do processo de formação e alfabetização.

Segundo Dussel, o ser negado é propriamente o ponto de partida da

filosofia da libertação, que busca refletir sobre o oprimido e o marginalizado

pelo sistema opressor do centro. Dussel (1977a, p. 62) enfatiza o significado da

relação face-a-face entre o pai e o filho, professor e aluno, em que há

necessidade de escutar o outro como exigência para que ocorra a verdadeira

educação que leva à libertação, quando afirma que,

Saber ouvir o discípulo é poder ser mestre, é saber inclinar-se diante do novo; é ter o próprio tema do discurso pedagógico. O autêntico

3 Trata-se de Enrique Dussel, nascido em Mendonza na Argentina em 1934. Tem uma longa história de luta pela libertação latino-americana, tendo sido inclusive vítima de um atentado à bomba do governo militar argentino, em 1975 exilou-se no México. É considerado um dos principais nomes da nova filosofia latino americana, chamada da libertação, que tem as suas origens na década de 80, praticamente no mesmo período em que emergiu a Teologia da Libertação. Este pensador tem trabalhado e cunhado categorias próprias, no sentido de resgatar a autonomia e o protagonismo da filosofia ameríndia.

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mestre primeiro ouvirá a palavra objetante, provocante, interpelante daquele que quer ser outro. Somente o que escuta com paciência, no amor de justiça é a esperança do outro como libertador, na fé de sua palavra, somente ele poderá ser mestre.

Contradizendo a educação dominadora, o autor afirma que a educação

libertadora se funda e vai se delineando na medida em que se ouve a palavra

do outro,

Ouvir a voz do outro como Outro significa uma abertura ética, um expor-se pelo outro que ultrapassa a mera abertura da totalidade ao outro, esta abertura é, silêncio, mas não silêncio interior à fala, e sim silêncio da própria fala, silêncio do mundo, aniquilamento e disponibilidade ao outro como outro. (Dussel, 1977a, p.63).

Registre-se que Paulo Freire (1983b, p. 39) pensa na mesma direção, ao

afirmar que o aluno, o discípulo, aquele que se coloca numa atitude de

alfabetização, deverá praticar atitudes de resgate do outro, numa postura de

seu reconhecimento. Ele destaca que todos têm direito à pronúncia da palavra

e esta pode levar à liberdade e à consciência, quando afirma:

Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos, e em que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem. Em que para ser-se funcionalmente, autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não contra elas. Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: Os homens se educam em comunhão, mediatizadas pelo mundo.

Corroborando com esta proximidade entre Dussel e Freire, Pazello,

(2007, p. 18) afirma que o ouvir o outro, categoria cunhada por Dussel nada

mais é do que a dialogicidade de Freire, que apresenta a educação como

prática de dominação como a imperante no mundo hodierno. Para este autor,

Dussel vai nos apresentar o filicídio cometido pelo Pai-Estado que, ao mesmo tempo, reprime machistamente a mãe-cultura popular. Em sendo a mãe libertada, sê-lo-á o filho também e, por conseguinte, o pai, ou seja, a cultura popular e estado ligados para receberem anadia-leticamente o novo, o criador, a criança (podemos acrescentar, o jovem e adulto em que é negado a alfabetização).

Outra categoria cunhada por Dussel é a pedagógica que também

dialoga com Paulo Freire, pois esta pedagógica é vista “como parte da filosofia

que pensa a relação face-a-face do pai-filho, mestre-discípulo, médico,

psicólogo-doente, filósofo-não filósofo, político-cidadão” (Dussel, 1977b, p.

153).

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É importante também discutir mesmo que brevemente a ética da

libertação em Dussel, que tem como ponto de partida a participação

comunitária na busca de novos consensos que se dão na relação dialógica

entre o educador e educando. Para Pazello (2007) a ética da libertação em

Dussel, “pauta-se pela validade anti-hegemônica da comunidade das vítimas”

(p. 9).

O conceito de “ser negado” de Dussel pode ser utilizado na análise das

pessoas que estão em processo de alfabetização. Aplicado numa perspectiva

dialógica, este conceito sugere que o alfabetizando deve ser ouvido, pois tem o

direito à pronúncia da palavra, na mesma direção apontada por Paulo Freire.

Assim, o outro negado de Dussel é neste contexto, o oprimido proclamado por

Freire, na Pedagogia do Oprimido. Desta maneira, a alfabetização se faz no

diálogo entre o alfabetizador e o alfabetizado e seus colegas de estudo,

mediados pela realidade em que vivem.

1.2. A alfabetização e a educação de Jovens e Adultos na década de 1960:

algumas experiências

Apresento algumas experiências que foram importantes no processo de

alfabetização de adultos na linha de educação popular: o Movimento de Cultura

Popular (MCP) de Recife; a “Campanha Pé no Chão Também se Aprende a

Ler de Natal"; O Movimento de Educação de Base (MEB); as 40 Horas de

Angicos e a experiência de Freire junto aos trabalhadores do Chile, quando

este esteve exilado.

O Movimento de Cultura Popular ocorreu na Prefeitura de Recife em

1960, quando Miguel Arraes assumiu a Prefeitura. Projetado com o objetivo de

combater o alto índice de analfabetismo da população, o movimento agregou

universitários, intelectuais de esquerda e artistas que, ao constituir-se em

entidade jurídica, assumiu uma identidade para além da alfabetização

funcional, promovendo ações com vistas à conscientização popular.

Este Movimento de Cultura, segundo Góes (1980), procurava sintetizar,

no mesmo espaço, o esforço do movimento popular com o do movimento de

cultura popular; modos de ação que transcendem a característica de mera

doação de bens culturais produzidos internamente pelo movimento e, a seguir,

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oferecidos à comunidade como produtos acabados em relação aos quais só

cabe o ato de consumo. É importante destacar que Paulo Freire foi colaborador

do Movimento de cultura popular nos seus dois primeiros anos de

funcionamento.

Para Paiva (2003, p. 265) este movimento carregava dentro de si uma

característica marcada pela conscientização, valorização popular e politização,

pois

A valorização das formas de expressão cultural do homem do povo e estímulo ao desenvolvimento de sua capacidade de criação funcionava no MCP, como a própria condição de diálogo entre a intelectualidade e o povo: partia-se da arte para chegar à análise e à crítica da realidade social. A intelectualidade participante devia libertar-se de todo espírito assistencialista e filantrópico e, sem querer impor diálogo. Buscava-se assim, a autenticidade da cultura nacional, a valorização do homem brasileiro, a desalienação da nossa cultura; pretendia-se fazer arte com o povo, ampliar a discussão dos problemas nacionais, dinamizar a forma comunitária de vida através do incentivo às manifestações coletivas de arte.

Assim, este movimento tornou-se referência para outras cidades e

estados do país, destacando-se entre outras atividades, as praças de cultura,

que tinham uma infraestrutura interessante: parques infantis, bibliotecas,

apresentações teatrais, exposições de arte, apresentações de filmes, palestras

com assistência médica e jurídica, contudo, permanecia aproximadamente 20

dias apenas em cada local e surge, então, a necessidade da instalação de

núcleos de cultura popular que se fixassem nos bairros periféricos. Os Centros

Populares de Cultura e outros movimentos afins, iniciados na década de 1960,

tiveram como base a efervescência política e cultural vivida naquela época.

Entendia-se que esta educação de adultos deveria estar focada na formação

de pessoas que fossem protagonistas de sua cultura numa perspectiva

transformadora do seu meio social e da realidade.

Outra experiência interessante ligada à questão da alfabetização ocorreu

na Prefeitura de Natal em 1962, na segunda gestão de Djalma Maranhão. De

acordo com Abbonízzio (2007), quando se passou a atender à grande

demanda de analfabetos adultos, através da campanha que levou o nome “De

Pé no Chão também se Aprende a Ler”. Ocorria quando os estudantes

secundaristas voluntários iam até os bairros ou comunidades retiradas para

trabalhar a alfabetização. No ano seguinte, o projeto foi estendido ao ensino

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profissionalizante, quando se lançou a campanha “De Pé no Chão Também se

Aprende uma Profissão”, que atendeu centenas de jovens e adultos.

Destaco também a importante atuação do MEB que foi criado em

convênio firmado entre a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e

o Governo Federal em 1961 para desenvolver atividades radiofônicas que

atenderiam as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e logo foram estendidas

para áreas subdesenvolvidas das outras regiões do país. Para Wanderley

(1984), os objetivos da parceria entre a Igreja e o governo eram entre outros:

ampliar o contingente eleitoral (que era uma prática da política populista);

responder aos apelos da UNESCO para realização de campanhas de

alfabetização; restringir o poder político das oligarquias agrárias através de um

programa educacional destinado ao homem do campo. Neste caso, a parceria

com a Igreja Católica passa a ser uma boa opção para controlar

ideologicamente as massas rurais, as quais estavam sofrendo assédios de

grupos de esquerda, pois aquela seria capaz de dar uma educação

conveniente para esta estratégia.

Ainda, segundo Wanderley (1884, p. 46)

As atividades do MEB que se iniciam com uma finalidade basicamente alfabetizadora passa para uma educação de base compreendendo conscientização e politização, valorização da cultura popular, instrumentação de comunidades, organização do povo, animação popular. Transmitiam noções de saúde e estudava-se o trabalho agrícola em três aspectos: técnicas de trabalho agrícola, sistemas de relações no trabalho agrícola; organização da comunidade para a produção e o trabalho em cooperação.

Com o advento do regime militar, o programa passa por dificuldades

financeiras, onde houve o fechamento de várias escolas radiofônicas e o MEB

passou por um período de retração. A perda das características adquiridas no

período entre 1962-1964 e sua nova orientação permitiram a aceitação

novamente do apoio oficial. Na avaliação de Paiva (2003), a mudança de

orientação observou-se imediatamente no material didático, que passou a se

chamar “Mutirão” e não mais “Viver é lutar” que segundo os militares incitava à

luta armada.

Assim, os recursos recebidos após a reorientação até eram suficientes

para manter as escolas sobreviventes, porém, o MEB encerrou as atividades

compreendendo que não era possível reproduzir as ideologias dos militares.

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A experiência de Angicos é outra que merece destaque. Localizada na

região do agreste potiguar, realizou-se em 1963 com a utilização do método de

alfabetização criado por Paulo Freire. Tal experiência, segundo Abbonízio

(2007), foi realizada por estudantes em sua maioria ligados a Juventude

Universitária Católica (JUC), a partir da coleta das palavras geradoras

pesquisadas junto aos alfabetizandos. Além disso, outro tema importante era a

compreensão antropológica de cultura, através da visualização de imagens que

representavam cenas compostas por natureza e criações humanas. Com esta

reflexão, buscava-se compreender que o ser humano, ao modificar a natureza,

produzia cultura.

Segundo Beisiegel (1982), as 40 horas de Angicos, como ficou

conhecida essa experiência por se tratar literalmente de 40 horas de

alfabetização, teve o apoio do Presidente João Goulart que criou o Programa

Nacional da Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, nos termos do

Decreto 53.465 de 21 de janeiro de 1964, mediante o emprego do “método

Paulo Freire” 4. Alguns dias depois do decreto presidencial, Paulo Freire foi

designado para compor a Comissão Especial de Alfabetização, sob a

presidência do ministro da Educação Paulo de Tarso; posteriormente, Freire é

chamado a exercer as funções de coordenador do programa em todo o país.

Para Paiva (2003), no início de 1964, Freire e sua equipe preparavam-

se para verificar os índices de regressão da aprendizagem com o grupo de

Angicos e dava início à nova turma de alfabetização em Quintas, bairro de

Natal – Rio Grande do Norte. Devido à mudança de Governo, os níveis de

regressão não foram verificados e o trabalho em Quintas não se iniciou.

Conforme Galvão, Soares (2006, p.45), “a interrupção desse processo se deu

com o Golpe Militar de 31 de março de 1964, quando muitos desses

movimentos foram extintos, e seus participantes, perseguidos e exilados”.

Ao tratar “o método de alfabetização de adultos” sistematizado pelo

educador Paulo Freire, Beisiegel (2004) afirma que Freire tinha 15 anos de

4 “Método Paulo Freire” como ficou conhecido, passou a ser utilizado de diferentes maneiras por muitos dos que achavam que a alfabetização deveria ter como ponto de partida a leitura de mundo feita pelos adultos, assim a alfabetização era realizada a partir de palavras geradoras que surgiam de coletas e averiguações realizadas junto aos alfabetizandos.

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experiência acumulada no tocante à alfabetização de adultos tanto em áreas

rurais e áreas urbanas.

Na visão de Freire (1983a, p. 97), era necessário que houvesse em

nosso país:

Uma educação que possibilitasse ao homem a discussão corajosa de sua problemática, de sua inserção nesta problemática, que advertisse dos perigos de seu tempo, para que, consciente deles, ganhasse a força e a coragem de lutar, ao invés de ser levado e arrastado à perdição de seu próprio “eu”, submetido às prescrições alheias. Educação que o colocasse em diálogo constante com o outro, que o predispusesse a constantes revisões, a análise crítica de seus “achados”, a certa rebeldia, no sentido mais humano da expressão, que o identificasse com métodos e processos científicos.

Para explicitar como se caracterizava o método em questão, Freire

(2005, p. 47), afirmou:

Contradizendo os métodos de alfabetização puramente mecânicos, projetávamos levar a termo uma alfabetização direta, ligada realmente à democratização da cultura e que servisse de introdução; ou, melhor dizendo, uma experiência susceptível de tornar compatíveis sua existência de trabalhador e o material que lhe era oferecido para aprendizagem. (...) Pensávamos numa alfabetização que fosse ao mesmo tempo um ato de criação, capaz de gerar outros atos criadores; uma alfabetização na qual o homem, que não é passivo nem objeto, desenvolvesse a atividade e a vivacidade da invenção e da reinvenção, características dos estados de procura... Procurávamos uma metodologia que fosse um instrumento do educando, e não somente do educador, e que identificasse – como fazia notar acertadamente um sociólogo brasileiro – o conteúdo da aprendizagem com o mesmo de aprender.

Sobre a aplicabilidade desta prática educativa, o próprio Paulo Freire

divide o trabalho em cinco fases: a primeira fase diz respeito a um

levantamento das palavras utilizadas no cotidiano das pessoas que se

pretendia alfabetizar através de reuniões e encontros informais. Neste universo

vocabular, “não só se retêm as palavras mais carregadas de sentido existencial

e, por causa disto, as de maior conteúdo emocional, senão também as

expressões típicas do povo: formas de falar particulares, palavras ligadas à

experiência do grupo, especialmente à experiência profissional” (Freire, 2005,

p. 48).

A segunda fase se refere à seleção das palavras, chamadas de palavras

geradoras. A seleção obedece aos seguintes critérios: riqueza silábica,

dificuldades fonéticas e conteúdo prático da palavra, sendo que este último

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implica em procurar o maior compromisso possível da palavra numa realidade

de fato, social, cultural e política, pois para Freire (2005, p.50),

A melhor palavra geradora é aquela que reúne em si a porcentagem mais alta de critérios sintáticos (possibilidade ou riqueza fonética, grau de dificuldade fonética complexa, possibilidade de manipulação de conjuntos de signos, de sílabas, etc.), semânticos (maior ou menor intensidade de relação entre a palavra e o ser que designa). Poder de conscientização que a palavra tem potencialmente, ou conjunto de reações socioculturais que a palavra gera na pessoa que a utiliza.

Esta fase termina com a seleção das palavras geradoras, para ter um

universo linguístico mínimo e estas são escolhidas, conforme Freire (1987, p.

67),

Em função de seu conteúdo pragmático, enquanto signos linguísticos que correspondem a um entendimento comum numa área de uma cidade, numa região de um país. Em função de suas dificuldades fonéticas que devem ser propostas, gradualmente aos alfabetizandos. Escolhidas as 17 palavras geradoras, o passo seguinte será codificar 17 situações familiares aos alfabetizandos. Não será demasiado reafirmar que as palavras geradoras devem ser introduzidas nas codificações de suas dificuldades fonéticas.

Assim, se a palavra favela é uma palavra geradora, a codificação deve

representar aspectos da realidade favelada. A pedagogia que Paulo Freire

defende é concebida na prática como uma pedagogia marcada pela utopia e

esperança, porque, pretendendo estar a serviço da libertação das classes

oprimidas, se faz e se refaz na prática social, “denúncia e anúncio nesta

pedagogia não são palavras vazias, mas compromisso histórico... tomam corpo

quando as classes dominadas os assumem, assim como a teoria da ação

transformadora, se efetiva quando é igualmente assumida por aquelas classes”

(Freire, 1987, p. 70).

A terceira fase consiste na criação de situações típicas do cotidiano dos

sujeitos que estão sendo alfabetizados. São situações problemas e seu

desenrolar alimentava os debates que tendem a conduzir o grupo à

conscientização para que possa alfabetizar-se. São situações locais que

possibilitam uma análise de problemas nacionais e nelas vão sendo colocados

os vocábulos geradores que podem englobar a situação toda ou referir-se a um

dos elementos da situação apresentada.

Na quarta fase, os coordenadores de debates construíam suas fichas

indicadoras, que ajudam os coordenadores de debate no seu trabalho de

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sistematização. Tais fichas são simplesmente subsídios para os coordenadores

e não um relato rígido e fechado.

Na quinta fase, os coordenadores elaboravam fichas com as famílias

fonéticas das palavras geradoras e o material em forma de diapositivos ou

cartazes. A partir deste momento iniciava- se o efetivo trabalho de

alfabetização.

Freire (2005) aponta que a grande dificuldade estava na preparação dos

quadros dos coordenadores, não tanto pela questão técnica ou de

procedimentos, mas, sobretudo na capacidade do diálogo que deve existir

entre os educadores e educandos.

Descrevo também sucintamente a experiência de Paulo Freire vivenciada

no Chile. Conforme o relato de um educador chileno, Guilhermo Willianson

(1996), com a chegada de Paulo Freire naquele país em 1964 para viver como

exilado, uma vez que fora perseguido pelo regime militar, a educação chilena

foi enriquecida por sua crítica à educação tradicional, sendo corresponsável

pelos programas de alfabetização de jovens e adultos e pelo programa de

reforma agrária, uma vez que os camponeses eram envolvidos também no

processo de conscientização de seus direitos.

Freire permaneceu lá até 1969, convivendo e aprendendo com os

educadores daquele país. A sua estadia foi profícua, pois produzia escritos

naquele contexto. Para Willianson (1996, p.186), a obra Pedagogia do

Oprimido,

Implica um avanço em sua elaboração teórica e onde coexistem categorias de origem cristã, por exemplo, a ideia do diálogo e influências marxistas, a noção de classe social e a divisão em opressores e oprimidos. O próprio autor considera que sua obra resulta da radicalização de seu pensamento, produto de dois fatores principais: o distanciamento de seu país e de seus dominantes; a distância crítica de sua prática no Brasil, ao poder analisá-la do exterior; o distanciamento da direita como resultado de sua experiência na prisão; a prática chilena que o radicalizou sem transformá-lo num ‘aventureiro louco’, já que era uma sociedade altamente politizada.

As políticas chilenas implementadas para o setor agrário, a reforma

agrária, a organização dos camponeses e a própria alfabetização de adultos

criaram um espaço político, educativo e cultural muito propício, o que

possibilitou a efetivação do “método Paulo Freire” utilizado pelos camponeses

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chilenos. De acordo com o autor, “nesse contexto, a proposta metodológica de

Freire, que havia começado a se praticar no Nordeste, pode ser experimentada

em outro contexto histórico e popular, de forma maciça e apoiando o processo

de transformação de uma estrutura agrária arcaica” (Willianson, 1996, p.186).

Para Freire (1987), a experiência do Chile trás à tona a experiência de

camponeses que participavam de problemas de alfabetização em áreas de luta

pela reforma agrária, que escreviam palavras com seus próprios instrumentos

no chão dos caminhos que os conduziam ao trabalho. Segundo o relato de um

camponês chileno, “antes da reforma agrária, meu amigo, disse ele, eu nem

sequer pensava, nem eu nem meus companheiros, porque não era possível,

vivíamos sob ordens. tínhamos apenas que obedecer a elas, não tínhamos

nada que dizer” (p. 73.) Assim, a alfabetização possibilitava uma estreita

vinculação às lutas por democratização no campo e outras lutas populares.

1.3. O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP) no

cenário de alfabetização

As eleições municipais de 1988 apresentaram um novo quadro na maior

cidade do país, São Paulo, quando a assistente social Luiza Erundina, tendo o

advogado Luiz Eduardo Greenhalgh como vice, venceram a disputa pela

Prefeitura da cidade de São Paulo, tendo sido a primeira vez que o Partido dos

Trabalhadores assumia o governo da cidade.

A chegada de Erundina à Prefeitura do município de São Paulo tem sido

objeto de pesquisa de sociólogos, historiadores e outros estudiosos, que em

geral, classificam esta etapa como um acontecimento histórico importante, não

somente pela eleição em si, mas também pelo significado do seu governo.

Para Abbonízio (2007), desde o acontecimento do golpe militar de 1964,

com exceção de Mário Covas, todos os prefeitos nomeados pelo governo

estadual representavam setores conservadores. Com o retorno das eleições

diretas, a população da cidade de São Paulo elegeu Jânio Quadros em 1985,

aliás, o mesmo havia sido o primeiro prefeito eleito em 1953, durante o

intervalo democrático de 1945-1964. Na sucessão municipal de 1988, o

candidato que esteve à frente nas pesquisas de opinião era Paulo Maluf,

representante dos setores também conservadores, porém, nas semanas que

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antecederam as eleições ocorreu uma virada na intenção do eleitorado, sendo

eleita Luiza Erundina de Souza. Oriunda das classes populares, nordestina,

assistente social e atuante nos movimentos sociais, havia trabalhado como

alfabetizadora de adultos e passou a representar a possibilidade de construção

de um governo popular, baseado na aliança do Partido dos Trabalhadores (PT)

com a classe trabalhadora, os movimentos sociais, os intelectuais de esquerda,

os sindicatos e os setores progressistas da Igreja Católica e das oriundas do

Protestantismo histórico.

A participação popular tornou-se a marca adotada na administração da

Prefeitura de São Paulo nos anos 1989-1992, conforme uma das diretrizes que

consta no documento da Prefeitura Municipal de São Paulo, do chamado

governo popular e democrático que tinha como meta, “estimular a criação de

canais democráticos institucionais, que possibilitem à população se

apropriarem efetivamente das informações, através de um processo educativo,

dirigido à produção de decisões sobre a totalidade das problemáticas da

cidade”(PMSP 1990,p.2). A gestão possibilitou a implantação de instrumentos

de participação popular, introduzindo novos atores no processo decisório,

respeitando a autonomia dos movimentos sociais e abrindo canais de

participação da população e fortalecendo a democratização das informações.

Neste cenário de fortalecimento das forças populares, de uma proposta

política que resgatava a participação da sociedade civil, e, sobretudo, com a

indicação do educador Paulo Freire para a Secretaria da Educação Municipal,

houve o início de um processo que culminou na criação do movimento de

alfabetização em parceria com os movimentos sociais, chamado de Movimento

de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP). Inicialmente, segundo

Gadotti (2001), sob a coordenação do também educador Pedro Pontual, em

estreita colaboração com os movimentos populares ligados à alfabetização de

adultos, criando-se assim o Fórum dos Movimentos Populares de Alfabetização

de Jovens e Adultos, como tratarei adiante.

A escolha de Paulo Freire como Secretário Municipal da Educação,

representou um marco importante, simbolicamente refletia o anseio de

mudanças que os educadores progressistas esperavam. Na compreensão de

Gadotti (1992), esta novidade correspondia às expectativas da militância

petista e dos aliados, respondendo positivamente à unanimidade de setores da

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educação. Sua trajetória estava ligada não somente à valorização da educação

para todos, mas em particular à educação de jovens e adultos e à atuação da

sociedade civil na denominada educação emancipatória, imbuída na

construção de uma educação libertadora, visando a contribuir para a

transformação social.

A pesquisadora Abbonizio (2007) aponta que quando Luiza Erundina

assumiu a Prefeitura de São Paulo, em 1989, o atendimento voltado à

educação de jovens e adultos em fase de alfabetização ocorria no âmbito do

Programa Educação de Adultos (EDA), que estava vinculado à Secretaria do

Bem Estar Social. O processo de mudança da responsabilidade da questão da

alfabetização desta Secretaria para a Educação transcorreu a partir de muitos

debates, um momento importante deste diálogo ocorreu com a realização do I

Simpósio de Educação de Jovens e Adultos em 1º de abril de 1989, em que se

tirou um fórum permanente das entidades de alfabetização de adultos,

diferentemente do programa coordenado pela Secretaria do Bem Estar Social.

Assim, a Secretaria da Educação estreitou a relação com os movimentos

populares ligados a alfabetização de jovens e adultos, em que se observou que

existiam diversas experiências bem sucedidas neste campo, o que ajudou no

processo de construção do MOVA/SP.

Para exemplificar este processo de mudança estrutural que começou a

ser colocado em prática, damos voz ao próprio Freire (2001, p.80), quando

definiu o programa de formação permanente dos professores e educadores e o

programa de alfabetização de jovens e adultos como sua prioridade mais

importante:

O educador é o sujeito da sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la através da reflexão sobre o seu cotidiano; a formação do educador deve ser permanente e sistematizada, porque a prática se faz e refaz; a prática pedagógica requer a compreensão da própria gênese do conhecimento, ou seja, de como se dá o processo de conhecer... Esse programa de formação dos educadores teve como eixos básicos: a fisionomia da escola que se quer, enquanto horizonte da proposta pedagógica; necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas do conhecimento humano; a apropriação pelos educadores dos avanços científicos do conhecimento humano que possam contribuir para a escola que se quer.

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Em 19895, em regime de parceria entre a PMSP e os movimentos de

alfabetização, nascia o MOVA/SP. Ao tratar da criação do MOVA/SP como um

programa que resgatava a cidadania dos mais pobres e excluídos, Freire

(2005, p. 10) apontava:

Sim, nós criamos o MOVA, Movimento de Educação de Adultos de São Paulo. Mas, com uma diferença do que se fez em 63. Nós partimos do respeito absoluto aos movimentos populares. Então, nós fizemos convênios com os movimentos populares da periferia de São Paulo, mais de cento e cinquenta movimentos, assinamos convênio com cada uma dessas sociedades e repassamos as verbas para elas capacitarem seus educadores. Criamos um Conselho formado por eles e por nós, uma espécie de órgão pensador da política de educação. Nós trabalhamos seguindo muita gente, não necessariamente Paulo Freire, nem João, nem ninguém. A exigência é que fosse aplicada uma pedagogia progressista. O que importava era saber se o educador tinha uma cultura dialógica e aberta, respeitosa com o povo. No fundo, cada educador é um método. Não tem que estar bitolado.

Assim, o MOVA/SP origina-se a partir dos grupos populares que

desenvolviam trabalhos de alfabetização e, juntamente com outros setores -

Universidades e Igrejas criaram 2000 núcleos para atender 60.000 pessoas. Os

objetivos eram: reforçar e ampliar o trabalho dos grupos populares que já

trabalhavam com a questão, possibilitar aos educandos uma leitura crítica da

realidade, desenvolver a consciência política e reforçar o incentivo à

participação popular e à luta pelos direitos sociais do cidadão.

O educador Pontual (apud Macena 2009, p. 6) ajuda a compreender em

que contexto o MOVA/SP tem o seu surgimento, ao afirmar:

Quando Paulo Freire assumiu a Campanha Nacional de Alfabetização no Ministério da Educação no Governo João Goulart, ele afirmou que aquela experiência deveria ser conhecida, mas nunca ser levada como modelo, porque como o próprio Paulo Freire dizia as condições históricas de 64 para 89 eram outras, a época era de Ditadura Militar. Houve diversas mudanças; tivemos um início de um processo de democratização, alterações no plano econômico social, cultural. Já a conjuntura em que nós assumíamos o Governo da Cidade de São Paulo em 1.989 era outra e por isso, o MOVA tinha que ser pensado, com originalidade, tinha que ser pensado ‘inventivamente’ como gostava de dizer Paulo Freire, de acordo com a leitura da realidade daquele momento e das necessidades que justificavam a existência do MOVA.

Quando o MOVA/SP foi criado, havia uma estimativa de cerca de um

milhão de jovens e adultos sem escola e dois milhões e meio de jovens e

adultos com menos de quatro anos de estudo. O Documento “O que é o

5 Conferir ANEXO A, Decreto Municipal da criação do MOVA/SP.

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MOVA/SP” (PMSP/SME (1989) apresenta o analfabetismo como fruto da

distribuição desigual de renda no país, pois, temos uma agenda de governo

não comprometida com as necessidades sociais e econômicas da população,

em seu sentido amplo, restringindo-se às questões formais da democracia

política.

Ao analisar o referido Documento, Abbonizio (2007) afirma que o

governo municipal assume a tarefa, naquele momento, de tornar-se promotor

de políticas públicas de caráter popular, com disposição para reparar um direito

historicamente negado de acesso à educação das populações excluídas,

situadas principalmente nas periferias da cidade,

Posiciona-se, portanto como uma administração que promoverá acesso aos bens materiais e aos bens culturais à população pobre, uma vez que esses bens só são acessíveis e desfrutáveis pela classe dominante. O pacto para o enfrentamento do analfabetismo na cidade de São Paulo realizado junto aos movimentos populares denota a opção política feita pela Secretaria. Não há menção, neste documento, à participação de universidades, tampouco de empresas. Aqueles que compartilharão junto à Prefeitura a tarefa de alfabetização dos adultos são os mesmos agentes confrontadores e pressionadores dos governos, ou seja, são aqueles que, ao mesmo tempo em que levantam a bandeira da eliminação do analfabetismo e da insuficiência de políticas públicas para esse setor, realizam trabalhos de alfabetização em suas comunidades (Abbonízio 2007, p, 44).

Para Torres, (2001) o surgimento do MOVA/SP é uma experiência

interessante, pois possibilitou a parceria entre movimentos sociais que lutaram

pela defesa da mulher, da moradia, da alfabetização de jovens e adultos em

conjunto com a Secretaria de Educação, apontando “a presença simbólica e

prática de Paulo Freire à frente de uma equipe na Secretaria da Educação”

(p.26).

Observa-se que a criação deste projeto de educação não tinha como

objetivo simplesmente o resgate de suprir as dificuldades da não alfabetização,

do ensinar a leitura e a escrita, mas eram outras questões de cunho social e

político que estavam colocadas naquela conjuntura. A educadora Kunrath

(2006) evidencia que a denominação de movimento de alfabetização, “traz em

si a noção de mobilização, engajamento dos grupos organizados da sociedade

civil, do constante movimento de participação dos grupos que desenvolvem

alfabetização de jovens e adultos” (p. 4).

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Quando o MOVA/SP foi criado, a PMSP/SME (1989, pp.9-10) tinha este

objetivo geral:

Possibilitar ao educando jovem e adulto o processo construtivo de ampliação do próprio conhecimento através da intervenção sistemática do educador e a vivência com os colegas, numa relação dialógica. Sendo assim, na formulação dos princípios e diretrizes metodológicos não poderão faltar os subsídios da educação libertadora, do modelo construtivista-interacionista do conhecimento e dos modernos estudos sobre a linguagem.

A proposta do MOVA/SP foi pensada como uma grande parceria entre a

sociedade civil organizada e o poder público, o que implicava em objetivos

comuns e divisão de responsabilidades. Para favorecer o diálogo das entidades

conveniadas com o Poder Público, garantindo uma participação efetiva dos

envolvidos no processo de alfabetização foi criado o Fórum Geral dos

Movimentos de Alfabetização. Segundo Pontual (1996), a criação deste fórum

ocorreu no Simpósio de Educação de Jovens e Adultos, organizado pela

Secretaria Municipal de Educação em 01 de abril de 1989, quando se entendeu

a importância da instância do Fórum para representar os movimentos de

alfabetização de toda a cidade, como espaço de discussão de

encaminhamentos sobre a construção e o funcionamento do MOVA/SP. Para o

melhor funcionamento desta instância, decidiu-se pela necessidade de criar os

Fóruns Regionais e assim passaram a existir também os Fóruns

regionalizados: Região Sudeste, Região Sul, Região Norte, Região Leste 1 e

Leste 2, Região Centro e Região Oeste.

O Fórum MOVA era a arena onde Secretaria Municipal e Movimentos Populares construíam suas relações. O maior limite deste Fórum era a dificuldade na constituição de um espaço de negociação horizontal e ou de deliberação conjunta sobre todas as questões que envolviam a parceria. O processo lento de tomada de decisões contrariava a todos, secretaria e entidades conveniadas. Por parte da Secretaria, as questões administrativas corriam com pouca agilidade por conta do ordenamento jurídico e pouco permeável. Do lado dos movimentos populares, o processo amplo e demorado de consultas, que o próprio movimento exigia para a tomada de decisões, também tornava o processo moroso. Acrescenta-se a isso o fato de algumas entidades tomarem uma postura passiva em relação às determinações da secretaria (Pontual, 1996, p. 131).

No Fórum Geral dos Movimentos, aprovou-se a Carta de princípios do

MOVA/SP que aponta as diretrizes do programa, no que se refere à linha

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político-pedagógica como na questão da parceria entre a municipalidade e os

movimentos de alfabetização6.

Esta parceria é enaltecida por outro educador, ao referir-se à questão,

Gadotti (2001), afirma que o MOVA/SP é um dos raros exemplos de parceria

entre a sociedade civil e o poder público, acrescentando que essa relação nem

sempre é harmoniosa, pois as tensões e conflitos fazem parte do processo e

torna-se uma condição necessária para um trabalho que é fruto de uma

construção. Ele assinala que o MOVA/SP não impôs uma única orientação

metodológica, pois o método Paulo Freire procurou, antes, garantir o pluralismo

com uma condição: não aceitar métodos pedagógicos anticientíficos e

filosóficos autoritários ou racistas. A concepção que prevaleceu no desenvolver

das experiências do MOVA/SP foi à concepção libertadora de educação.

Gadotti (2001) acentua que o que estava sendo feito não se confundia

com as campanhas de alfabetização, pois as experiências fracassadas de

muitas campanhas de alfabetização que aconteceram na América Latina e no

próprio Brasil levou a evitar o termo “campanha”, acrescentando assim a

palavra “continuidade” e “movimento em processo”, sendo construída, por isso

a ideia de fazer com que o MOVA/SP se tornasse uma política educacional e

não simplesmente um programa de um determinado governo que é sempre

passageiro.

Portanto, o MOVA/SP pode ser caracterizado como um referencial no

processo de alfabetização de jovens e adultos da cidade de São Paulo, pois ao

longo de décadas este movimento tem se consolidado nos diferentes bairros da

cidade, apresentando-se como um movimento que acontece nas bases

populares, é o que pode ser confirmado na compreensão de Ribeiro (2009),

quando acentua que com a Constituição Federal de 1988 e o fim da Fundação

Educar, o Ministério da Educação desobriga-se de atender o direito de ensino

fundamental de adultos, repassando tal responsabilidade aos municípios e aos

estados. Neste contexto, surgem diversas experiências voltadas à

alfabetização e sob a orientação dos próprios municípios em parceria com as

universidades, ONGS e os movimentos populares. Um destaque dessa

realidade é a experiência do MOVA/SP. Apresento a seguir, como este

6 Ver ANEXO B sobre a parceria entre o município e o MOVA/SP.

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programa foi sendo assimilado até tornar-se posteriormente numa política de

governo municipal, dentro das tensões e dificuldades que fazem parte de sua

trajetória.

Segundo Pontual (1996), o MOVA/SP sofre um grande abalo com a não

continuidade do PT no governo da cidade de São Paulo. No ano de 1993, com

a eleição de Paulo Maluf e posteriormente Celso Pitta em 1997, a parceria da

Prefeitura com a sociedade civil foi extinta enquanto programa ligado à

Secretaria de Educação. Houve a substituição do MOVA/SP por outro projeto

de alfabetização, com novas parcerias, não mais com as ONGs, e sim, com os

empresários da construção civil, lançando mão de metodologias e concepções

pedagógicas diferentes das aplicadas até então. Tal ação municipal passou a

se chamar de Programa Municipal de Alfabetização de Jovens e Adultos,

(PROALFA). Ocorreu um verdadeiro desmonte e desconstrução do MOVA/SP.

Este novo programa municipal funcionou com apenas sete classes durante o

ano de 1994 e previa mais oito classes no ano seguinte, conforme Pontual

(1996), enquanto o MOVA ao longo deste mesmo período, garantiu pelo menos

200 núcleos funcionando, dos mil núcleos existentes durante o governo

Erundina.

O próprio movimento de alfabetização fez uma autocrítica quando

observava que durante o período em que a parceria com a Prefeitura estava

garantida, não se conseguiu estruturar de forma a garantir mecanismos

legislativos e jurídicos para que o MOVA tivesse sua continuidade e

principalmente a relação de parceria entre estado e sociedade.

O MOVA/SP passa por oito anos de árduos trabalhos para manter-se em

ação. Na avaliação de Kunrath (2006), neste período, buscaram-se alternativas

de financiamento e subsistência, porém, o número de classes e de educandos

diminuiu significativamente. As ONGs buscam dirigir a própria formação dos

educadores, o planejamento das atividades didáticas e a elaboração da

proposta político-pedagógico.

Algumas ONGs vinculam-se aos Institutos tais como o Instituto Brasileiro

de Estudo e Apoio Comunitário (IBEAC) e outras, com universidades

executoras do Programa de Alfabetização Solidária e o voluntariado. Conforme

o relato da coordenadora do Fórum Municipal do MOVA/SP, Iraci Ferreira Leite,

(apud Macena 2009): “Paulo Freire desejava que nos núcleos do MOVA fosse

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desenvolvida uma pedagogia progressista baseada no diálogo. É com esse

espírito que continuamos no MOVA. Apesar do governo Maluf e Pitta terem

acabado com o programa, mas não com o nosso trabalho, que permaneceu

com ou sem ajuda financeira” (p.10).

Um dos espaços de formação para educadores e coordenadores de

jovens e adultos de 1994 a 2001 foi oferecido pela Associação Católica do

Brasil do Departamento de Educação Popular sendo que os encontros

aconteciam mensalmente com duração de 8 horas e era aberta a toda cidade.

Descrevo o relato de Villaseñor 7 sobre sua atuação como educador do

MOVA/SP durante a gestão de Erundina, e, em continuidade, como voluntário

no governo Paulo Maluf:

A minha experiência no MOVA como educador começou na comunidade de Heliópolis em julho de 1992 e foi até novembro de 1995 através da União dos Núcleos e Associações do Heliópolis (UNAS). Que no começo era conveniada com a Prefeitura do Município de São Paulo; convênio encerrado em dezembro de 1992, ao término do mandato da prefeita Luiza Erundina. Quando Paulo Maluf assumiu a prefeitura de São Paulo, um dos primeiros atos do governo foi acabar com as políticas públicas que combatiam a exclusão social, encerrando toda e qualquer iniciativa popular da administração anterior, entre elas estava o MOVA. Sem convênio com o governo foi tudo mais difícil, mas houve continuidade dos trabalhos de educação popular da maioria dos educadores, agora sendo realizado como voluntários da comunidade... as dificuldades com a falta de material pedagógico, infraestrutura, entre outros, aumentaram, mas a vontade política da comunidade e dos educadores de erradicar o analfabetismo e de construir uma sociedade mais justa e fraterna continuou firme. A minha experiência de voluntário durante três anos (1993-1995) na educação popular de Alfabetização de Jovens e Adultos no Heliópolis foi muito gratificante, porque muitas pessoas que entravam no programa sem saber ler e escrever, concluíram o ensino fundamental e alguns até fizeram uma qualificação profissional ou faculdade. Foi uma bonita experiência de troca de conhecimentos, os adultos aprendiam com a gente e nós aprendíamos com eles (2001, p.1).

Veremos mais adiante que a experiência do MOVA/SP inspirou a

construção de tantos outros movimentos de alfabetização que se constituiu nos

estados e municípios brasileiros, com características próprias, porém mantendo

a proposta político-pedagógica de educação popular emancipadora e

libertadora.

7 Rafael Lopes Villaseñor é padre da Congregação dos Missionários Xaverianos e atua na zona leste, periferia da Cidade Tiradentes. É mestre em Ciências da Religião pela PUC/SP e doutorando em Ciências Sociais também pela PUC/SP. Atuou como educador do MOVA/SP por vários anos no Heliópolis; e como animador e incentivador em Guaianases.

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1.4. A Retomada do MOVA/SP como programa da Secretaria Municipal de

Educação da Prefeitura de São Paulo

Na gestão de 2001 – 2004, o PT volta à administração da capital

paulista, neste período, as ações de escolarização para jovens e adultos

compreenderam: os cursos de Educação de Jovens e Adultos – EJA para o

ensino regular e Suplência, o programa Centro Integrado de Educação de

Jovens e Adultos – CIEJA e a reconstrução do MOVA/SP, que ocorreu quando

representantes dos movimentos de alfabetização do Fórum do MOVA/SP,

procuraram a nova Secretaria de Educação da então Prefeita Marta Suplicy

para propor o resgate da parceira com os movimentos de alfabetização de

jovens e adultos, retomada em setembro de 2001.

Assim, segundo Kunrath (2006), a operacionalidade do programa ficou a

cargo das organizações conveniadas que organizam as classes de

alfabetização, seguem o termo de convênio, que determina um número mínimo

de 20 educandos matriculados e frequência mínima diária de 15 educandos. A

idade para frequentar uma sala do MOVA/SP é de 14 anos em diante. Definiu-

se também que as atividades aconteceriam quatro vezes por semana, ficando

as sextas-feiras para a formação pedagógica com os educadores e

coordenadores.

Os educadores são denominados de monitores oficialmente para que

não haja implicância jurídica, pois a remuneração não segue o piso da

categoria profissional, uma vez que a proposta era o repasse de R$ 600,00 por

sala, deste montante é tirado uma ajuda de custo ao alfabetizador. Tal

nomenclatura é utilizada em documentos, porém no cotidiano do MOVA/SP

utiliza-se a denominação educador.

Assim como na sua primeira versão oficial, na reconstrução do

programa, privilegiou-se os espaços de participação e autonomia do

movimento de alfabetização, bem como da própria Secretaria, quando se

reorganizou o Fórum Municipal do MOVA/SP e os Fóruns Regionais. Para

Kunrath (2006), o Fórum Municipal foi a instância de negociação e diálogo

permanente entre o movimento e a SME. As plenárias aconteciam com o

objetivo de articulação, planejamento, participação e avaliação das práticas e

experiências quanto ao cotidiano, às questões pedagógicas; e a formação dos

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educadores e coordenadores, geralmente ocorria a cada três meses. Foram

também reeditados os Fóruns Regionais divididos em sete espaços de

discussão para possibilitar o diálogo com as Coordenadorias de Educação, que

representavam os interesses da Secretaria.

Os locais de funcionamento das salas e dos núcleos situam-se o mais

próximo possível da residência dos educandos, dos salões de Igrejas, quer

Católica ou Evangélica ou dos Centros Espíritas, garagens, sedes de ONGs ou

outros espaços. A maioria desses espaços está localizada nas periferias, nos

bairros, nas favelas, em comunidades onde as escolas não conseguem atender

os educandos.

Na avaliação de Abbonizio (2007), houve uma significativa ampliação

dos convênios e dos números de educandos atendidos: o ano de 2002 encerra-

se com 899 turmas de alfabetização funcionando, no ano seguinte passa-se a

1144 e em 2004 atinge-se 1170 turmas, com 24.609 educandos matriculados.

Com a mudança de gestão na cidade de São Paulo em 2005, quando

José Serra assumiu a Prefeitura da cidade de São Paulo, novamente o

MOVA/SP enfrenta dificuldades, porém manteve-se o programa e a parceria da

municipalidade com a sociedade civil, não com todo o estímulo anterior. Esta

continuidade tornou-se possível pela força e pressão do Fórum Municipal do

MOVA/SP e dos Fóruns Regionais organizados nas diferentes regiões da

cidade. Por conta das dificuldades enfrentadas pelo MOVA/SP, os movimentos

sociais ligados à questão da alfabetização e educação popular 8, segundo

relato de Abbonízio (2007, p. 80),

Organizaram um ato público pró-MOVA/SP em 29 de junho no primeiro ano de governo Serra em frente à Câmara dos Vereadores de São Paulo. No mesmo dia, alguns integrantes do Fórum Municipal foram recebidos por representantes da atual administração, que se comprometeram em não deixar nenhum aluno do MOVA/SP sem aula, mediante o remanejamento das salas já existentes e com poucos alunos ou pelo encaminhamento dos alunos desalojados para as escolas da rede pública municipal.

Graças ao acúmulo histórico do MOVA/SP que foi consolidando sua

atuação nas diferentes regiões da cidade de São Paulo, sua força mobilizadora

e de pressão popular, o governo municipal sancionou a lei 14058 de 11 de

8 Ver ANEXO C, sobre o Ato Pró Mova ocorrido em 29 de junho de 2005.

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outubro de 2005, quando o MOVA/SP tornou-se um programa de alfabetização

permanente no município de São Paulo.

O educador Pontual, (apud Macena 2009), contribuiu neste resgate

histórico do nascimento e desenvolvimento do MOVA/SP e também apontou

alguns desafios considerados importantes na atual conjuntura. Ele afirma que a

sociedade passou por uma mudança significativa nestes últimos 20 anos,

destacando a realidade do mercado de trabalho, o desemprego, o surgimento

de novas formas de geração de trabalho e renda, o que exige associar os

programas de alfabetização e pós-alfabetização a um programa e qualificação

profissional para esta nova realidade. Ele acentua, também, as mudanças no

campo da tecnologia, da informação, da Internet e da difusão do conhecimento,

o que permite dialogar e pensar, por exemplo, na necessidade da inclusão

digital e do acesso às redes que criam múltiplas possibilidades de

conhecimento, e, sobretudo, na necessidade de associar este movimento a um

conjunto de ações e de programas culturais que permitam fazer do MOVA/SP

um espaço também de constituição e reconstituição permanente dos setores

populares.

1.5. O MOVA/SP se expande em outras cidades e estados do Brasil

MOVA/BRASIL

O MOVA se move em Brasília, Tentando encontrar o

caminho Para

existir, Enquanto possível, Mas, na verdade querendo, Nem ter existido, Porém, são tantos os desafios a cumprir, Desafio não só de letrar, Mas. Sim de permitir a leitura do mundo, Para que este letrado possa o mundo de fato mudar, Surgem sempre outros não saberes, Que existem ou exigirão outros MOVAs. E estes MOVAs dir-se-ão presentes, No ato, na luta de ensinar a construir, Um mundo onde não haja exclusão, Para que não seja necessário o MOVA, Ou outro MOVA haver, Só não precisaremos de MOVA, Quando não o letramento, Quando não o pão, Quando a cultura de um ser,

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Não seja diferença a se ver, E não faça diferença nenhuma Quando o acesso à informática, Seja a necessidade de alguém, Só não precisaremos de MOVA, Quando a liberdade e a igualdade, De fato no mundo existir.

(Sandice, Anesino, 2009, p.226). Desde sua gênese o MOVA/SP teve grande repercussão tanto no

município de São Paulo, como em outras localidades do estado e em outros

estados. Sua proposta de fortalecimento dos movimentos populares e sua

contribuição no combate ao analfabetismo e na construção de uma sociedade

cidadã que possibilita aqueles aos quais é negado o direito à educação e à

leitura do mundo são consideradas marco na educação de jovens e adultos.

A experiência do MOVA/SP mobilizou movimentos que trabalhavam a

questão da alfabetização de adultos, educadores populares, grupos,

associações, organizações comunitárias nos mais diferentes estados

brasileiros, o que fez surgir o Projeto MOVA/Brasil.

Segundo Santos (2010), o Projeto MOVA/Brasil foi elaborado levando

em consideração os princípios do Movimento de Alfabetização de Jovens e

Adultos (MOVA/SP). A referência de Paulo Freire foi seguida e continua sendo

importante em muitas cidades e bairros do país, associando o governo local, as

organizações não governamentais e os movimentos sociais. Assim o MOVA/SP

foi inspirando organizações que acrescentavam o nome da cidade ou estado,

como por exemplo, MOVA/Porto Alegre, MOVA/RS ou identificando um

conjunto de municípios, como MOVA/ABC (região da Grande São Paulo). Ao

referir-se a um conjunto de estados, aplicou-se o nome MOVA/Brasil. A história

deste projeto ocorre,

Desde 2001, com o objetivo de fortalecer o trabalho de alfabetização e da

EJA, os educadores que participam dos programas de alfabetização e que

comungam dos mesmos objetivos vêm se organizando por meio da Rede

MOVA/Brasil. O Projeto MOVA/Brasil faz parte da coordenação dessa

rede, por meio de representantes das regiões Nordeste e Sudeste, e está

sempre presente nos Fóruns Sociais Mundiais, Fóruns Mundiais de

Educação e Fóruns sociais Brasileiros (Santos 2006, p.11).

O MOVA/Brasil como projeto nacional foi organizado em três fases e

está em curso uma quarta fase como descreve Santos (2006, p. 12):

1º Fase (agosto de 2003 a outubro de 2004): o projeto foi aplicado em cinco estados: Bahia, Ceará, rio Grande do Norte, Rio de Janeiro com

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12.167 inscritos. A 2º Fase (novembro de 2004 a julho de 2005): envolveu seis Estados: Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Sergipe. Nessa fase foram inscritos 14.440 educandos. A 3ª fase (agosto de 2005 a agosto de 2006) aplicados nos seis estados da fase anterior: Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, rio de Janeiro, São Paulo e Sergipe, com 23.301 alunos inscritos. Em 2006 iniciou-se um novo convênio (4º Fase do projeto) cujos objetivos é a integração do Projeto MOVA/Brasil e fomento ao cooperativismo (Movimento Nacional dos Catadores de Resíduos Sólidos). Nessa fase, participam os seguintes Estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Alagoas. As metas são: atender 25.000 alfabetizandos, com início em agosto de 2006 e com 1000 turmas distribuídas nos estados; realizar a formação inicial e continuada de 75 coordenadores (polos e locais) e 1000 alfabetizadores.

O MOVA/Brasil tem contado com diferentes parcerias governamentais

ou outras instituições que trabalham com a questão da alfabetização de jovens

e adultos, as principais são com a Petrobrás, com a Federação Única dos

Petroleiros e o Instituto Paulo Freire. Estas parcerias ocorrem em nível nacional

e são reproduzidas e ampliadas nos estados e municípios onde são

desenvolvidas as ações contando com a participação de entidades, governos

locais e sindicatos que ajudam na concretização dos objetivos traçados,

possibilitando a cessão do espaço físico, a composição dos coordenadores e

educadores e o custeio das atividades de formação e funcionamento dos

grupos de alfabetização.

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CAPÍTULO II

PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DO MOVA/SP:

PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E PEDAGÓGICOS E SUA

EXECUÇÃO.

2.1. Análise do Projeto Político-Pedagógico do MOVA/SP

Como ponto de partida deste tópico que tratará da formação continuada

de educadores do MOVA/SP, enfatizo a compreensão de Tardif (2002), quando

aborda que são muitos os momentos formativos que mobilizam os educadores,

tais como: os saberes que são adquiridos ao longo da vida em outros espaços

formativos como a experiência familiar, profissional, fruto da participação social,

religiosa, política e cultural.

Neste sentido, torna-se necessário valorizar os mais diversos momentos

de formação. Brandão (2003) acentua a necessidade da mobilização dos

educadores populares em buscar a formação permanente também nos outros

movimentos sociais que, do mesmo modo, cultivam a dimensão formadora e

transformadora.

Na Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP, conforme o Fórum

Municipal do MOVA/SP (1990, p.1-2), definiu-se a necessidade de uma

parceria efetiva entre a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo e o

Fórum dos Movimentos de Alfabetização, quando se afirmou que:

A linha político-pedagógica do MOVA/SP será objeto de elaboração conjunta pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, resguardando a estes últimos a liberdade de adequarem tais propostas em sua realidade específica. O mesmo se aplica à elaboração de material didático, pedagógico e metodológico. Liberdade para que os movimentos escolham seus monitores e supervisores, de tal modo que sejam preservados os princípios centrais do projeto político-pedagógico estabelecido em conjunto pelos movimentos e pela Secretaria Municipal de Educação. Eventuais casos que se chequem frontalmente com tais princípios serão objeto de parecer por parte da Secretaria Municipal de Educação quando dos cursos de capacitação, pareceres estes que serão encaminhados às entidades em questão para sua auto avaliação e decisão (...) assegura-se a autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de formação específicos e atividades paralelas. Parceria também na formação dos monitores:

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os movimentos desejam participar ativamente, com o corpo e com a cabeça, na formação de seus monitores, e desejam, portanto que seja criado mecanismo de parceria com a SME para os trabalhos pedagógicos de formação dos monitores. Os movimentos desejam garantir os princípios da educação crítica, participativa e libertadora independentemente da atual administração, tendo em vista sua compreensão de que o MOVA-SP nasce na atual gestão, mas que deverá existir e crescer independentemente dela.

Conforme Santos (1996), na proposta de parceria entre a SME e os

movimentos sociais ligados à alfabetização deve haver clareza quanto ao

campo específico de ação de cada ator social, algumas vezes os dois campos

se complementam. Assim, cabia ao governo apoiar financeira e materialmente

os grupos populares, fomentar novos núcleos de alfabetização onde não

existiam e auxiliar na elaboração da orientação político-pedagógica,

possibilitando também a formação para os educadores envolvidos. Já ao

movimento compete pensar e realizar a ação alfabetizadora.

O referido autor entende que os movimentos sociais que já trabalhavam

à alfabetização de jovens e adultos exerciam uma prática educativa dentro das

características da educação libertadora, em que as palavras política e

pedagogia estavam associadas, tal união deixava clarividente que todo ato

pedagógico é também um ato político, sendo desnecessária a dissociação

entre educar e conscientizar, assim,

Numa relação dialógica definiram os diversos itens a serem aprofundados para explicitar a concepção de educação, a saber: que ser humano pretendia educar; que visão da Teoria do Conhecimento adotar; qual a função do educador; como o educando é visto nesse processo; e por fim, qual o conceito de alfabetização. Outra preocupação dos integrantes do MOVA/SP foi estabelecer as diretrizes sobre o processo metodológico de alfabetização. Nesse sentido, a preocupação dos parceiros era de concretizar da maneira mais clara possível uma metodologia que fosse coerente com os princípios adotados. Assim, refletiram e apontaram caminhos sobre os seguintes pontos: começar a alfabetização priorizando a produção de textos coletivos, explicitando os diferentes níveis de conhecimento da leitura e escrita apresentadas pelos alunos adultos respeitando as variedades linguísticas existentes. Foi a elaboração da metodologia concatenada com os princípios político-pedagógicos que propiciaram um novo fazer educativo construído pelos educadores das entidades e da SME na relação de parceria (Santos, 1996, p. 37-38).

Quanto à concepção metodológica que o Projeto político-pedagógico tem

explicitado desde a origem do MOVA/SP, apresenta-se como o seu ponto de

partida a prática concreta do educando, pois para Ferreira (1996) é a partir das

necessidades práticas que se motiva a busca do conhecimento teórico, o que

supõe a identificação dos fatos e situações significativas da realidade imediata.

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Num segundo momento teoriza-se sobre a prática, indo para além das

aparências imediatas através da reflexão, do estudo, da discussão, do estudo

crítico, buscando conhecer melhor o tema problematizado e num terceiro passo

voltar à prática para transformá-la, apropriando-se de referenciais teóricos mais

elaborados e agindo de maneira mais eficaz. A mesma autora afirma que:

É fundamental ao educador, buscar o aprofundamento do próprio referencial teórico atual, fazendo a leitura do mundo e dos textos, como diz Paulo Freire: adicionando novas informações, com estudo, pesquisa bibliográfica e de campo, discussões, confrontando as teorias dos diversos autores, confrontando a nossa própria teoria com a teoria dos colegas e dos autores dos livros. Num processo ativo, construtivo, crítico e criativo vamos formando a nossa própria síntese, um novo referencial teórico integrado e coerente... portanto, a teorização não é um processo de imposição de ideias alheias ou do pensamento já elaborado por especialistas e cientistas renomados. Por outro lado, a teorização não é um processo meramente pessoal. É ao mesmo tempo pessoal e coletivo (Ferreira, 1996 p.53-54).

Passo a elucidar aspectos importantes do Projeto Político Pedagógico,9

que a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, em parceria com os

movimentos de alfabetização e com o Fórum MOVA/SP construíram em 2001

na ocasião da retomada do MOVA/SP como um programa do governo

municipal, quando ocorreu a eleição da Prefeita Marta Suplicy. A PMSP/SME

(2001, p.1) declara suas ideias, afirmando seu compromisso:

A cidade de São Paulo convive hoje com um processo de empobrecimento crescente de seus habitantes, com o desemprego que se torna estrutural com índices de violência, com as sequelas da corrupção, o desrespeito aos direitos dos trabalhadores a um salário digno, à saúde, ao lazer. E, par agravar, enfrenta uma situação de escolaridade bastante deficiente e um alto índice de analfabetismo absoluto e funcional.

O projeto pedagógico afirma também a importância dos educadores

populares em chegar onde os jovens e adultos mais precisam, fortalecendo os

movimentos onde atuam e impetrar o mais próximo da população graças à

capilaridade desses núcleos. Estas considerações são fundamentais para o

poder municipal, pois a parceria com os trabalhadores populares de educação,

desde os tempos de Paulo Freire muito contribuem para que o MOVA/SP

aconteça.

9 Conferir ANEXO D na íntegra sobre o Projeto Político-pedagógico elaborado pela PMSP/SME em

2001.

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O MOVA/SP definiu seus objetivos gerais com o propósito de colaborar

com o poder público na tarefa de diminuir o analfabetismo, e ser um programa

de participação popular, conforme a descrição do Projeto Político pedagógico:

Contribuir com o poder público na diminuição do analfabetismo no município de SP, em consonância com as diretrizes e eixos norteadores da política educacional de educação, a saber: qualidade social da educação, democratização da gestão e democratização do acesso e permanência; contribuir par o pleno desenvolvimento da pessoa humana; Diminuir o índice de analfabetismo na cidade de São Paulo; desenvolver a cidadania ativa como participação na vida social, econômica, política e cultural da sociedade; interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos ou privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicações (PMSP/SME, 2001, p. 4).

Ao descrever a metodologia a ser utilizada pelo MOVA/SP, a

PMSP/SME (2001, p. 39), afirma que esta será baseada na ação-reflexão,

numa articulação entre teoria e prática. Quanto aos conteúdos e à avaliação,

deve-se levar em consideração:

O conhecimento prévio dos educandos inclusive os valores éticos, manifestações artísticas, religiosas e as experiências já vividas; resgatar a autoestima dos educandos; respeitar o ritmo e os níveis dos educandos; abordar o conhecimento com totalidade articulada; a partir da visão do ser humano como sujeito histórico, resgatar a história de vida dos educandos e relacionando-as com as lutas sociais de seu tempo; estabelecer um processo avaliativo com base na ação-reflexão-ação.

Ao referir-se ao projeto político, Freire (2001, p. 45), defendia que este é

carregado de ideologia, pois,

Tem que ver com que conteúdos ensinar, a quem, a favor de que, de quem, contra que, contra que, contra quem, como ensinar. Tem que ver com quem decide sobre que conteúdos ensinar, que participação tem os estudantes, os pais, os professores, os movimentos populares na discussão em torno da organização dos conteúdos programáticos.

2.2. Caracterização do processo de formação de educadores populares:

contribuição de estudiosos da educação popular para o MOVA/SP

A educação popular é vivenciada desde os anos de 1960, conforme

apresentado no capítulo anterior, quando se abordou a importância do

Movimento de Cultura Popular de Recife, a Experiência de Angicos, o

Movimento de Educação de Base ligada a Igreja Católica, a Campanha Pé no

Chão Também se Aprende a Ler, os grupos de alfabetização de camponeses

que aplicavam o método Paulo Freire, o papel das Comunidades Eclesiais de

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Base, a atuação da Teologia da Libertação, os grupos ecumênicos. E nas

últimas décadas, a forte presença dos movimentos sociais reivindicatórios que

tem contribuído para o fortalecimento desta vertente educacional, a educação

popular.

Esta prática de educação tem a sua origem nas ações desenvolvidas

pelos mais diferentes programas, campanhas e projetos populares ligados

principalmente às questões de alfabetização de jovens e adultos, tendo como

um dos seus objetivos a promoção da consciência e da cidadania.

Cabe ressaltar que o MOVA/SP desde o seu início, tem se caracterizado

como um programa que se identifica com a proposta de educação popular.

Apresento brevemente a concepção de educação popular segundo

alguns autores. De acordo com Freire, (apud Gadotti 2001, pp.16-17),

educadores e grupos populares, descobriram que

Educação popular é sobretudo o processo permanente de refletir a militância; refletir portanto, a sua capacidade de mobilizar em direção a objetivos próprios. A prática educativa, reconhecendo-se como prática política se recusa a deixar-se aprisionar na estreiteza burocrática de procedimentos escolarizantes. Lidando com o processo de conhecer, a prática educativa é tão interessada em possibilitar o ensino de conteúdos às pessoas quanto em sua conscientização... a educação popular pode ser socialmente percebida como facilitadora da compreensão científica que grupos e movimentos podem e devem ter acerca de suas experiências. Esta é uma das tarefas fundamentais da educação popular de corte progressista, a de inserir os grupos populares no movimento de superação do saber de senso comum pelo conhecimento mais crítico, mais além do “penso que é”, em torno do mundo e de si no mundo e com ele.

Outro autor que trabalha com propriedade a questão da educação

popular ao longo de décadas é o educador Carlos Rodrigues Brandão (1984)

concebe a educação popular como, “um processo sistemático de participação

na formação, fortalecimento e instrumentalização das práticas e dos

movimentos populares, com o objetivo de apoiar a passagem do saber popular

ao saber orgânico, ou seja, do saber da comunidade ao saber de classe da

comunidade”(p.131). Acrescenta, ainda, que podemos identificar o educador

popular como um articulador, um organizador, animador, um intelectual

orgânico no sentido gramsciano, superando a ingenuidade e o espontaneísmo.

Um teórico também importante nesta temática é o educador Luiz

Eduardo Wanderley (1985), quando distingue três orientações da educação

popular no Brasil: a educação popular com a orientação de integração,

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entendendo que é papel do Estado sob a hegemonia das classes dominantes

popularizar a educação com o objetivo de incluir as pessoas no capitalismo

dependente; o segundo sentido é a orientação nacional-desenvolvimentista

visando à implantação de um capitalismo autônomo, nacional e popular, onde

se distribui os benefícios do progresso social e econômico sem um

questionamento do sistema; e a outra vertente de educação popular tem uma

orientação de libertação no estímulo das potencialidades do povo através da

conscientização, da capacitação e de ampla participação social.

Entendo que o MOVA/SP tem se identificado com esta última orientação,

conforme apontada por Wanderley (1985), na medida em que desde a sua

origem, visava contribuir para o desenvolvimento da consciência política dos

educandos e educadores envolvidos e para o pleno exercício dos direitos

sociais do cidadão, com o objetivo de incentivar a participação popular e o

fortalecimento dos movimentos sociais, atendendo, assim com o objetivo maior

de ajudar na leitura do mundo e da palavra, com vistas à transformação das

estruturas socioeconômicas e culturais.

Conforme sistematizou Di Giorge (1987), as principais características de

um processo educativo de educação popular são: valorização da cultura

popular, participação dos educandos na formulação dos objetivos e dos

métodos, afirmação do caráter político da educação, ênfase na metodologia,

proposta de partir sempre da realidade de vida dos participantes, ligação entre

a aprendizagem e a organização, entre reflexão e ação político-social das

camadas populares, dialogicidade, trabalho em grupo e incentivo a autoestima

e a desinibição, prioridade a organização de base.

Na citada obra, o autor enfatiza duas questões decorrentes tanto da

metodologia quanto da concepção que se tem do papel dos educadores,

1) O papel dos agentes que trabalham com a Educação Popular não deve ser o de elaborar uma teoria, ou fazer um conhecimento pronto para que os grupos populares possam resolver suas necessidades e problemas sociais, e sim o papel do agente é de incentivar e provocar esses grupos para a partir da discussão da sua realidade encontrar soluções e propor as ações necessárias. Trata-se de um mediador. 2) Não é papel dos agentes da Educação Popular levar os grupos populares a iniciarem a luta ou resistência frente às situações de opressão, pois de uma forma ou outra esses grupos resistem ou se opõe a essa dominação. Cabe então aos agentes contribuir para que esses grupos se dinamizem e encontrem outros meios de reivindicar, pressionar e conquistar melhorias para suas comunidades (Di Giorge, 1987, p.13).

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Outra questão importante a ser observada é a verificação de como a

educação popular é construída, se de fato pode ser caracterizada como uma

educação do povo e libertadora. Para Kunrath (2006), o grande critério que

define a educação popular é o fato de ser feita pelas camadas populares e,

principalmente, junto com elas. Pois a educação pensada para as classes

populares e que não leve em conta a participação e o protagonismo popular,

pode tornar-se uma educação para a massificação, onde o povo não se

assume como sujeito do processo de educação a partir de sua vida, do seu

cotidiano e de sua cultura.

Para explicitar a importância da educação popular como uma educação

para a liberdade, a educadora e estudiosa do MOVA/SP, Janis Kunrath, cita a

compreensão que Luiz Eduardo Wanderley apresentou em um seminário

realizado pelo Instituto de Estudos Especiais da PUC/SP, quando este afirmou:

O que é educação para a liberdade? É uma educação Popular. Uma educação feita pelas classes populares, pelo povo. Um camponês quando ensina ao filho como plantar uma roça, está fazendo educação popular. Um operário quando ensina um companheiro ou um filho a trabalhar numa fábrica está fazendo educação de alto nível, porque há muito engenheiro que estuda anos a fio e não sabe mexer com máquinas. Um sindicato, que se reúne para discutir o salário, está fazendo educação. Um partido político, ao discutir os rumos políticos do país, está fazendo educação. Toda vez que o operário, o camponês se reúnem para discutir os seus problemas e descobrir soluções, para passar uma técnica para o companheiro etc., está fazendo educação, informando e formando. Há muitos modos de fazer educação. A vida cotidiana é a maior escola. Só que essa educação é desprezada porque nossa sociedade valoriza a educação da escola, da universidade, da pós-graduação. Só os eleitos que chegam lá têm o saber. Mas não é assim, o povo tem o saber popular... A educação feita para o povo ou junto com o povo é a educação que os agentes educacionais, religiosos ou leigos, oferecem ao povo, para ajudá-los na sua luta e na sua caminhada pela libertação. É aquilo que faz a maioria de nós, classe média, que não somos do povo, mas queremos ajudá-lo nessa libertação (Kunrath, 2006, p. 63-64).

Portanto, a educação popular é entendida como um processo

permanente de reflexão e de mobilização dos objetivos dos próprios sujeitos

nas situações sociais. A prática educativa não se prende à burocratização

escolar, mas desde que os atores compreendam seu papel político, agem de

forma mais consciente. Assim, o educador precisa, no seu processo de

formação, ter um bom preparo, pois na pedagogia freiriana o educador é

responsável por ajudar os grupos com que atua a superar o senso comum.

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2.3. A formação do MOVA/SP

Observou-se anteriormente que o MOVA/SP se caracteriza como uma

educação de cunho popular, que visa alcançar as camadas mais

desfavorecidas de jovens e adultos, aqueles que não tiveram a oportunidade

de frequentar a escola formal e ocorre nos bairros e periferias da cidade de

São Paulo, com vistas à alfabetização e à leitura do mundo conforme a

proposta freiriana.

Antes de tratar a questão da formação dos educadores do MOVA/SP,

convém elucidar quem são estes educadores, como são apontados pelas

ONGs para o trabalho de alfabetização, quais os critérios que a Secretaria

Municipal de Educação prevê, e enfim, quais as exigências que são

necessárias para um educador-alfabetizador desenvolver com eficácia o

trabalho proposto.

Segundo Abbonízio (2007), os educadores do MOVA/SP são os

chamados monitores e os coordenadores pedagógicos. Os monitores são os

responsáveis pelo contato direto e imediato com os alfabetizandos, tendo a

tarefa do acompanhamento diário; devem possuir o Ensino Fundamental

completo ou experiência anterior comprovada em alfabetização de jovens e

adultos. Já os coordenadores pedagógicos são os responsáveis pelo

acompanhamento das atividades dos monitores ao longo da semana e pela

organização e condução da reunião pedagógica que ocorre às sextas-feiras;

exercem também o papel de formadores dos monitores e são o elo de ligação

do movimento local com a Diretoria Regional de Ensino (DRE) e as outras

instâncias da Secretaria de Educação; estes devem ter Ensino Médio ou

superior concluído, caso não tenham graduação, precisam comprovar

experiência anterior em educação de jovens e adultos.

Todavia, a questão da escolha de monitores sem escolaridade formal (o

antigo Magistério, ou o Ensino Médio ou até Pedagogia) tem provocado

inúmeros debates no âmbito educacional. O objetivo da pesquisa não é

aprofundar os prós e contras do perfil profissional destes educadores, mas

procurar compreender que estes educadores, estando inseridos no contexto da

comunidade onde acontece o MOVA/SP, possivelmente apresentam condições

de trazer a realidade local para o cotidiano da alfabetização, onde a linguagem

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utilizada poderá estar em sintonia com os participantes da alfabetização,

aumentando assim os vínculos de confiança e interação.

É interessante apontar que a escolha dos educadores acontece no

interior da própria ONG conveniada e esta se responsabiliza pelo processo de

seleção, admissão e desligamento dos seus monitores. Estes devem seguir as

orientações apontadas pela SME e pela própria ONG que, juridicamente,

responde pelo vínculo, entendido como uma prestação de serviço comunitário.

Os educadores assumem responsabilidades importantes junto aos

educadores e tutelados pela ONG que desenvolve o trabalho educativo,

cabendo-lhes o comprometimento em colocar-se à disposição de segunda a

quinta feira com os educandos, e, às sextas-feiras, para a formação continuada

(algumas vezes, aos sábados, quando convidados a participar de momentos

formativos promovidos pela própria ONG, pela SME ou pelos Fóruns do

MOVA/SP). Também são incumbidos de motivar a participação dos

alfabetizandos, garantindo a participação de pelo menos doze participantes.

A remuneração é outro ponto discutível, os monitores recebem uma

ajuda de custo, cerca de um salário mínimo, o que pode ser interpretado como

um trabalho que exige destes educadores um espírito de voluntariado e de

militância política.

Recorro a Romão (2001, p. 63) para explicitar a importância da

concepção do educador que não nasce pronto e, portanto, deve colocar-se

num processo permanente de construção, de formação e de interação com os

seus pares, abrindo-se para novos desafios,

Entendemos que o ser educador não nasce ontologicamente com a pessoa nem depende de um despertar mágico ou de uma iluminação súbita da consciência para um compromisso até então ausente de um projeto de vida. A língua portuguesa não dá conta de exprimir com precisão o que de fato ocorre na realidade: em vez de ser, é sendo. Ninguém é educador, alguém se torna educador (ou deseducador) no decorrer da existência, no incessante processo de estruturação/desestruturação dos equilíbrios pessoais e coletivos provisórios, na teia das relações sociais, no fluxo permanente das interações entre teoria e práxis.

A formação de educadores populares é um dos eixos do MOVA/SP,

considerando-se que todas as instâncias do programa são espaços de

apropriação e construção de conhecimento: a mobilização que ocorre nas

entidades para formalizar o convênio; os encontros no interior das próprias

organizações; a participação nos Fóruns Municipais e Regionais do MOVA/SP;

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as reuniões pedagógicas e os encontros de formação de educadores e

coordenadores desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Educação.

Quando Paulo Freire ocupou a Secretaria Municipal da Educação do

município de São Paulo, entre os anos de 1989 e 1990, ele dirigia-se aos

educadores do MOVA/SP utilizando diferentes formas de comunicação, dentre

elas os cadernos populares que a SME preparava e que se dirigia a todos os

educadores. Num destes cadernos de formação do MOVA/SP, Freire destacou

a importância da participação efetiva dos educadores que deveriam se

comprometer a participar do processo de formação permanente e de todo a

construção do movimento, quando afirmou:

Sabemos os educadores e educadoras que fazemos o MOVA/SP, da seriedade que um programa como este exige de quem dele participa, não importa o nível de sua responsabilidade. Sabemos da competência, sempre se provando, a ser posta a serviço do programa; sabemos também que um programa assim, demanda clareza política de todos nele engajados e vontade política de quem se acha ao nível de decisão (SME/PMSP, 1990, p.2).

Segundo Kunrath (2006), o MOVA/SP compreende a educação como

processo integral e contínuo, assim, a formação dos educadores deve ser

permanente, com vistas a estabelecer um compromisso com os educandos e a

sociedade, na busca de uma prática pedagógica que possibilite a criticidade, a

reflexão e a construção coletiva do processo pedagógico.

Num dos cadernos de formação proposto pela SME/PMSP (1990),

aponta-se que um dos caminhos para a formação do educador é o estudo em

profundidade das atividades cotidianas da alfabetização, que ocorre a partir de

atividades pensadas, planejadas e desenvolvidas de forma criteriosa e

pormenorizada levando em conta os aspectos cognitivos, afetivos e ideológicos

e o contexto que os educandos estão inseridos. Outro ponto destacado no

tocante à formação de educadores é a organização de uma infraestrutura em

pequenos grupos com uma coordenação pedagógica, num encontro semanal

para o estudo, socialização de experiências e a intervenção pedagógica do

coordenador, onde as práticas destes educadores são coletivamente

discutidas, tendo como referência os princípios políticos e metodológicos do

programa MOVA/SP.

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É importante apresentar também o fundamento da concepção

metodológica de formação de educadores e educandos. Segundo o documento

PMSP/SME (1992, pp.7-8), entendia-se a formação como:

A possibilidade de articulação coerente entre o processo educativo e o processo político-organizativo do ponto de vista dialético, considerando que o processo educativo também é organizativo; a busca da integralidade dos processos formativos considerando a vida humana e social como uma totalidade articulada e em movimento: o político-afetivo e cultural, abordados numa perspectiva interdisciplinar; possibilitar a apropriação do conhecimento universal produzido, na perspectiva crítica de que o conhecimento é histórico e que está em construção, reconstruindo-o.

Neste contexto, o processo formativo dos educadores populares

segundo Santos (1996), abrangia a formação inicial, a formação complementar,

a formação geral e a supervisão.

A formação inicial era realizada aos fins de semana com uma carga

horária de 48 horas, tendo como objetivo a capacitação inicial de todos os

monitores que atuariam com os grupos de alfabetização, com o objetivo de

introduzi-los numa visão dialógico-construtivista. As principais temáticas eram:

prática e concepção de educação, teoria do conhecimento, metodologia,

planejamento e avaliação.

A formação complementar tinha por objetivo atender às necessidades

imediatas encontradas pelos educadores no exercício cotidiano da prática

educativa e buscava aprofundar as questões respectivas a esta mesma prática.

Realizaram-se oficinas sobre tema gerador, níveis linguísticos, prática do

ensino interdisciplinar de matemática, língua portuguesa, história, geografia e

artes. Tais oficinas e cursos contavam com a participação dos supervisores.

O outro componente do sistema de formação era a formação geral. Esta

tinha por objetivo auxiliar educadores, educandos e supervisores a manterem-

se atualizados e a discutirem sobre as transformações ocorridas em nível mais

amplo. A cada três meses realizavam-se análises de conjunturas, além de

debates e simpósios sobre as mais diferentes situações que ocorriam na

cidade, no país, na América Latina e no mundo. Estas atividades eram abertas

também para os educandos que tinham a possibilidade de compreender e

entender o que estava ocorrendo para além do contexto do MOVA/SP ou da

educação.

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O último sistema de formação era a Supervisão. Os supervisores eram

apontados pelos educadores ou até sugeridos pelas ONGs. O trabalho destes

supervisores consistia no acompanhamento pedagógico dos educadores, eram

também o elo entre os grupos de base e a equipe do MOVA/SP. Estes

realizavam atividades de visitas e aproximação com os grupos. Reuniam-se às

sextas-feiras com os educadores e, quinzenalmente, com a equipe do

MOVA/SP. A cada dez grupos escolhia-se um supervisor para este

acompanhamento e assessoria quanto à formação pedagógica e permanente

dos educadores.

Dialogando com outros autores que tratam da formação de educadores

do MOVA/SP, percebe-se que há uma convergência na compreensão de que a

formação destes educadores deve ser permanente e continuada. Assim, os

educadores deverão fazer um processo que mobilize para a participação de

cursos, seminários, fóruns temáticos, congressos, estudo pessoal e coletivo,

pesquisa, troca de experiências e outras atividades de caráter formativo. Para

Barreto (2001), o educador ou o alfabetizador (termo utilizado pelo autor), tem

muitas perguntas antes de iniciar seu trabalho, o que não impede que haja uma

formação inicial, porém, outras questões emergirão na prática da alfabetização,

o que exigirá a garantia de um espaço para que estas perguntas sejam

apresentadas e debatidas. Assim, o processo não se esgota na formação

inicial, mas continua durante todo o processo, o que justifica a necessidade de

uma formação que seja contínua.

Ao tratar da importância da formação de educadores que concebem a

educação como um processo integral e contínuo além de permanente, o

Projeto Político Pedagógico do MOVA/SP, conforma PMSP/SP (2001, p. 4-6),

considera que:

A formação do educador de jovens e adultos pressupõe que ele se assuma enquanto sujeito da ação pedagógica. Isso implica agir sobre sua prática, decidindo coletivamente sobre a realidade de sua sala de aula e construindo um trabalho a partir dela, sempre tendo como referência a concepção de educação que anima esse processo. Assim, o seu procedimento será o de ação-reflexão e ação na articulação constante da prática e da teoria... o programa requer a garantia de um processo de formação permanente dos (as) educadores (as) de modo que se acompanhe a prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica.

Para Basualdo (1997), a formação de educadores do MOVA/SP

necessita ser um processo permanente de ação, onde se devem contemplar as

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problemáticas do cotidiano da entidade e também voltar-se para atividades

práticas que permitam o desenvolvimento do senso histórico e coletivo para

fins de transformação social.

A partir de 2002, tem ocorrido em toda a cidade de São Paulo a Semana

de Alfabetização no mês de setembro em datas próximas ao Dia Internacional

da Alfabetização, 08 de setembro. Esta proposta contempla atividades para

envolver todos os participantes do MOVA/SP de forma regionalizada,

possibilitando o envolvimento dos educandos, educadores, supervisores das

entidades conveniadas e das Diretorias de Ensino. Um dos objetivos da

Semana de Alfabetização foi trazer a possibilidade da expressão cultural e

artística dos educandos do MOVA/SP, assim como discutir temas em debate

na cidade e no país.

As atividades diárias em alfabetização não podem ser uma acumulação

linear, de fragmentos isolados de informações, mas um conjunto sistemático e

sequencial de ações orientadas por pressupostos claramente delineados e

assumidas. Ao tratar da importância da metodologia que se aplica no

MOVA/SP, Ferreira (1996, p. 52), afirma que:

A alfabetização exige um referencial teórico; toda prática já implica uma teoria que a fundamenta e não há prática neutra, ela é sempre política, supõe sempre uma visão de mundo, de sociedade, de homem. Supõe então um projeto histórico, uma teoria do conhecimento, opção por uma concepção de educação e uma concepção metodológica. Portanto, a teorização não é um processo de imposição de ideias alheias ou do pensamento já elaborado por especialistas e cientistas renomeados. Por outro lado, a teorização não é um processo meramente pessoal. É ao mesmo tempo pessoal e coletivo. O mais importante então, é aprender a teorizar, apropriando-nos dos métodos e técnicas de conhecimento e colocando-nos numa atitude de questionamento constante sobre os fatos, fazendo nossas análises, deduções e generalizações, recriando o objeto conhecido, integrando-o num todo orgânico, atingindo níveis cada vez mais altos de síntese.

Assim, é possível afirmar que, efetivamente, a formação contínua ocupa

um espaço muito importante na prática do MOVA/SP, pois sem um processo

de formação contínua e permanente, os educadores, coordenadores

pedagógicos e as próprias ONGs que são os principais protagonistas,

apresentariam dificuldades em levar adiante este trabalho. Porém, há

necessidade de uma avaliação contínua sobre o trabalho dos envolvidos na

prática, de forma a identificar os acertos e desacertos no caminho da

alfabetização de jovens e adultos.

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Apresento a seguir, sucintamente, a formação dos educadores a partir

da concepção do MOVA/Brasil, que também tem valorizado o espaço formativo

como importante na prática de seus educadores. Para Santos (2003), a

formação dos educadores ocorre em dois momentos distintos: a formação

inicial e a continuada. A primeira possibilita uma aproximação com os objetivos,

a estrutura de funcionamento, a metodologia utilizada e os instrumentos de

avaliação e acompanhamento do processo. O segundo momento destina-se à

formação continuada dos educadores, para que os mesmos possam refletir e

avaliar a prática pedagógica, numa dinâmica constante de ação-reflexão-ação,

assim, a formação continuada ocorre,

(...) por meio do acompanhamento do trabalho cotidiano, realizado pelo coordenador local na interlocução com os monitores, buscando a reflexão das suas intervenções junto aos educando. Tem como objetivo o relato do trabalho pedagógico, a análise do processo de aprendizagem e da dinâmica do grupo, a orientação para a organização do portfólio dos alunos, o acerto dos momentos de sua participação em sala de aula e de troca das suas impressões com os monitores, o planejamento e redirecionamento do plano de trabalho e da articulação com outros agentes para a intervenção na realidade local (Santos, 2003, p.31).

Outro aspecto importante da formação continuada de educadores do

MOVA/Brasil, acontece quando os coordenadores locais e educadores se

reúnem com os chamados coordenadores de polos para propiciar momentos

de troca de experiências formativas, estudos de temáticas abrangentes e de

interesse coletivo que possam responder às demandas específicas de cada

local. Nestes encontros, valoriza-se o registro e a sistematização da formação

recebida, onde são apontadas as dificuldades e os avanços enfrentados no

cotidiano das salas de alfabetização. Incentiva-se também a apropriação por

parte dos educadores de uma metodologia que leve em consideração os

saberes dos educandos na construção de novos conhecimentos. Outra tarefa

fundamental é a capacidade da pesquisa que deve ser uma constante na vida

e na prática dos educadores. Na visão de Santos (2003, p.31),

A capacidade de pesquisar, refletir sobre a atividade de ensinar e formular alternativas para o aperfeiçoamento do ensino é indispensável aos educadores. Trata-se de se estabelecer outra relação entre os sujeitos e o conhecimento que, por sua vez, redimensiona o papel dos educadores como mediadores da prática educativa.

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Apresento uma síntese das propostas levantadas no 4º e no 6º

Encontro Nacional da rede MOVA/Brasil quanto à formação de educadores.

Representam uma amostra interessante da preocupação que tem mobilizado

educadores do país todo. No 4º Encontro, ocorrido em Campo Grande, Mato

Grosso do Sul, entre os dias 9 a 11 de junho de 2004, com o tema:

“MOVA/Brasil na Política de Educação de Jovens e Adultos”, quatro propostas

que demonstraram a preocupação com a questão, MOVA/Brasil, 2004, p.2):

- Solicitar ao MEC a publicação de cinco obras de Paulo Freire: Educação como prática de Liberdade, Pedagogia do oprimido, Pedagogia da Esperança, Pedagogia da Autonomia e Educação em mudança em papel jornal para subsidiar a formação dos educadores populares; - Estabelecer parceiros com universidades públicas para formação continuada e em nível superior, gratuita e de qualidade, garantindo a formação dos educadores populares ao longo da vida numa vertente libertadora, definindo critérios e envolvendo-os na elaboração das propostas de formação; - Garantir a formação superior aos educadores do MOVA; - Formação política do educador popular de forma que haja aceitação e entendimento da necessidade de mudança para uma perspectiva libertadora, o que demanda: compromisso, participação nos encontros, clareza do conceito de alfabetização, formação cidadã e articulação teoria-prática.

No 6º Encontro Nacional que aconteceu em Fortaleza, nos dias 15, 16 e

17 de junho de 2006 com a temática: “MOVA/Brasil, interface com as Políticas

Públicas de EJA”, algumas propostas no tocante à formação de educadores

foram retomadas e outras ampliadas nas oficinas e na plenária geral,

demonstrando a importância da discussão, foram enfatizados os seguintes

pontos:

- Oferecer formação universitária para o educador alfabetizador, recuperando a sua valorização diante dos outros educadores do Ensino Fundamental e da EJA; - Garantir a elevação da escolaridade dos educadores populares através de parcerias, PROUNI, convênios entre o poder público, movimento social e as escolas públicas em nível de formação superior de forma gratuita para o educador, buscando formação em nível de graduação dos educadores populares através de parcerias com Universidades, considerando sua prática profissional e um currículo fundamentado na concepção de educação popular (MOVA/Brasil, 2006, p 3.).

Estas propostas são resultados da discussão das oficinas, momento de

formação, interação e troca de experiências que ocorre durante o encontro. O

coletivo dos MOVAS presentes são distribuídos em grupos para a reflexão de

temas pertinentes, e estas ideias foram apontadas na oficina de formação de

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educadores, sendo submetidas à discussão na plenária, em que resultaram

como propostas a serem aplicadas nas diversas realidades. A coordenação

nacional faz os devidos encaminhamentos.

O MOVA/Brasil se articula regionalmente. Relato, a seguir as

deliberações tiradas do 4º Encontro Regional do MOVA/Sudeste que se

realizou na cidade de Embu das Artes em 28 a 30 de agosto de 2009 e contou

com a participação de 11 cidades do estado de São Paulo como: Araraquara,

Mauá, Diadema, Embu das Artes, Guarulhos, Mauá, Osasco, Ribeirão Pires,

Santo André, São Bernardo e São Paulo e diversas cidades representando o

Estado do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Neste encontro, foram retomadas

várias discussões advindas como deliberações dos encontros nacionais e

adaptadas, ampliadas e mesmo acrescidas, referem-se às propostas quanto à

formação de educadores,

- Promover trocas de atividades nacionalmente baseadas nos três eixos: território (realidade local), mundo do trabalho e Projeto de Vida; - Criação de um curso de formação política para educadores populares com o objetivo de formar educadores críticos que desenvolvam atitudes transformadoras na educação; - Construir uma comissão de elaboração e encaminhamento para as Universidades Públicas de uma proposta de construção de curso universitário junto com os movimentos, voltado à educação popular; - Lutar pela criação de cursos de licenciatura com enfoque na EJA numa perspectiva da educação popular, que pense na formação cidadã, inclusiva e libertadora; - Provocar situação de reflexão para que os educadores da rede tenham uma visão crítica do sistema da educação brasileira (MOVA/Sudeste, 2009, p 1.).

Observa-se que as proposições resultantes dos encontros do

MOVA/Brasil nas mais diferentes instâncias tem sido encaminhadas para os

grupos de base e para as Coordenações que articulam o MOVA em cada

estado ou região. A questão da formação continuada tem sido objeto de

reflexão e avaliação constante, uma vez que existem iniciativas interessantes

que dão conta da realização deste desafio; outra questão que foi amplamente

objeto de discussão no último Encontro do MOVA/ Sudeste realizado em MG,

na Universidade Federal de Minas Gerais nos dias 05 a 07 de agosto de 2011,

foi à formação política. O Estado de São Paulo tem organizado encontros

semestrais em parceria com o Movimento Sem Terra (MST) em Guararema,

interior do estado, no sentido de possibilitar aos educadores populares a

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discussão de questões da conjuntura nacional, educacional e de políticas

públicas.

2.4. Caracterização do processo de formação oferecida pela Secretaria

Municipal de Educação

No item anterior tratou-se da importância da formação continuada para

uma maior efetividade do trabalho de educação popular e alfabetizador que os

educadores desenvolvem. Neste tópico, analisarei a caracterização do

processo de formação que a SME apresenta para o conjunto dos grupos de

MOVA/SP, vinculados como programa educacional da referida secretaria.

Alguns aspectos já foram apresentados anteriormente, porém cabe-nos um

aprofundamento para uma melhor elucidação deste processo.

Vale ressaltar que a formação de educadores, assim como o próprio

MOVA/SP, passou por diferentes processos e concepções ao longo de mais de

duas décadas de existência. Abordarei como a SME tratou a formação de

educadores no surgimento do movimento: na gestão da então Prefeita Luísa

Erundina e na retomada do MOVA/SP no governo Marta Suplicy, bem como, a

atual dinâmica da formação que é empreendida. Cabe recordar que houve um

vácuo governamental de oito anos, entre as duas gestões citadas, quando os

governos de Paulo Maluf e Celso Pitta não deram seguimento ao MOVA/SP.

Portanto, não houve orientação da Secretaria Municipal de Educação. Naquele

período o MOVA/SP continuou existindo, mesmo sem uma vinculação

governamental, pois o Fórum do MOVA/SP tratou de conseguir parceria e

apoio de Universidades, Igrejas e Organismos Internacionais para dar conta da

continuidade da prática educativa, bem como da formação de educadores.

Num dos primeiros cadernos do MOVA/SP confeccionados pela

Secretaria Municipal de Educação, quando surgiu o movimento, define-se o

que é o MOVA/SP, seus objetivos e sua funcionalidade, onde se apresenta

também a necessidade da formação continuada como uma das tarefas da

Secretaria. O caderno MOVA/SP da PMSP/SME (1989, p.10), define que,

O MOVA/SP é, pois a ação conjunta de movimentos populares e da SME buscando-se a viabilização de projetos populares de alfabetização de jovens e adultos. Através do convênio, a SME se propõe a cumprir três tarefas: 1º apoiar financeira e materialmente os grupos populares:

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2º criar novos núcleos de alfabetização nas áreas onde os movimentos populares ainda não assumem esta tarefa. 3º garantir a orientação político-pedagógica e a formação permanente dos educadores através de encontros sistematizados entre educadores dos movimentos populares e assessores pedagógicos da SME.

O mesmo material estabelece ainda, que, enquanto parceiros do

Programa, os educadores serão selecionados, principalmente pelo seu

compromisso político e pela sua disponibilidade para a capacitação

pedagógica.

Na Carta de Princípios de parceria do MOVA/SP (1990, p. 2), quanto à

formação dos monitores afirma-se que:

Dentro da linha político-pedagógico estabelecida em conjunto pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, assegura-se a autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de formação específicos e atividades paralelas. Parceria também na formação dos monitores: os movimentos desejam participar ativamente com o corpo e com a cabeça, na formação de seus monitores, e desejam, portanto, que seja criado mecanismo de parceria com a SME para os trabalhos pedagógicos de formação de monitores.

Pode-se afirmar, segundo Abbonízio (2007), que a formação dos

educadores do MOVA/SP era coordenada pela própria equipe técnica da

Secretaria de Educação, mantendo um programa específico de formação

destinado aos educadores e coordenadores que atuavam com o MOVA/SP. É

possível dizer que a formação oferecida naquele momento ocorria de forma

centralizada.

A título de ilustração apresentamos alguns materiais elaborados pela

Secretaria e que serviam de subsídio para a formação dos educadores.

Destacamos, entre outros, os seguintes títulos:

- O atendimento educacional de jovens e adultos trabalhadores no município de

São Paulo, elaborado em 1989;

- MOVA/SP (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de

São Paulo), outubro de 1989;

- Aos que fazem a educação conosco em São Paulo, em 1989;

- Projeto do movimento de Alfabetização e pós-alfabetização. 1989;

- Construindo a educação pública e popular. Vols. 1990/1991/1992;

- Construindo a avaliação do MOVA/SP, 1992;

- Sobre o processo metodológico de alfabetização, 1991;

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- Tema gerador e a construção do programa – uma nova relação entre currículo

e realidade, 1991.

A segunda experiência do MOVA/SP ocorreu no governo Marta Suplicy

(2001 -2004), uma vez que no intervalo de oito anos das gestões Paulo Maluf e

Celso Pitta respectivamente o MOVA/SP deixou de ter vínculo com a SME,

porém, dentro de uma dinâmica diferente, chamada de resistência, quando os

atores e protagonistas do referido movimento articularam parceria com

Universidades, Igrejas e outras Instituições, o que garantiu a sua continuidade.

Apresento como a SME organizou a formação de educadores.

Consultando o Projeto Político-Pedagógico no tocante à questão da formação,

afirma-se que: “o programa requer a garantia de um processo de formação

permanente dos educadores de modo que se acompanhe a prática educativa

dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica” (PMSP/SME, 2001, p.6). E

no termo de convênio, (PMSP/SME 2002), está claro que as atividades de

planejamento pedagógico e formação permanente de coordenadores/monitores

serão desenvolvidas por no mínimo três horas semanais às sextas-feiras em

local a ser fixado pelo Núcleo de Apoio Educacional (NAE), ouvindo-se a ONG

conveniada.

Baseando-se em Kunrath (2006), observa-se que a retomada do

MOVA/SP em 2001, apresentou mudanças quanto às parcerias da Secretaria

com as entidades e no processo de formação de educadores, que passou a

acontecer não mais de forma centralizada pela SME, assumindo outra

dinâmica viabilizada pelos Núcleos de Educação e realizada por cinco

Instituições assessoras que foram contratadas para esta tarefa. São elas:

Ação Educativa; Associação das Escolas Católicas – AEC; Instituto Sedes Sapientiae; Instituto Paulo Freire e Vereda. Foi firmado convênio com as cinco instituições assessoras para desenvolver a formação com os educadores. As instituições já estavam acompanhando o processo de reconstrução do MOVA na cidade. Para facilitar a participação dos educadores na formação, cada instituição assessora, assumiu a formação em um conjunto de NAEs, geograficamente próximos. A formação foi feita nas Coordenadorias de Educação sendo que a organização do calendário era flexível e também foi contabilizada a formação desenvolvida pelas próprias entidades conveniadas. Esta formação buscou atender as necessidades dos educadores nas suas regiões. Por isso houve flexibilidade para pensar e organizar a proposta de formação (p.41).

Para Abboonízio (2007), as cinco ONGs contratadas pela SME

encarregadas de possibilitar a formação de educadores, possuíam uma história

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ligada à educação de jovens e adultos e de assessorias a movimentos

populares e apresentavam como objetivo a formação pedagógica dos

educadores e coordenadores pedagógicos. Nestes encontros eram discutidos

entre outras temáticas: as várias concepções de educação, os princípios de

Paulo Freire de educação de adultos, os processos de aquisição da leitura e

escrita, alfabetização matemática, diagnóstico, avaliação e o projeto político-

pedagógico.

Além dos encontros entre os educadores, existiam iniciativas que

visavam integrar os educadores do MOVA/SP e os professores da Educação

de Jovens e Adultos (EJA), o que possibilitou a troca de experiências e

saberes, avaliado como interessante para os educadores concursados que

tiveram contato com educadores populares que atuavam no MOVA/SP. A

propósito, Campos (1998, pp. 14-15) traça um paralelo entre as peculiaridades

no trabalho docente realizado por professores do EJA e do MOVA/SP, onde

afirma:

De um lado temos os monitores do MOVA/SP com uma história marcada pelo engajamento nos Movimentos Populares e por isso tem um olhar diferente sobre a Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores, de outro lado temos os professores que compõem o quadro do Magistério da Secretaria Municipal de Educação e que, neste período, puderam fazer uma opção dentro do quadro do Magistério: a de trabalhar na Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores como professores da Secretaria da Educação.

Recorro a Kunrath (2006) para caracterizar as Instituições formadoras

que fizeram parceria com a municipalidade para atuar na formação dos

educadores do MOVA/SP: a Associação de Educação Católica (AEC), fundada

em 1945, tendo como objetivo a defesa da educação cristã à luz dos princípios

evangélicos que caracterizam uma sociedade justa e fraterna; O Concílio

Vaticano II (1962-1969); a Conferência de Medellín (1968) e os documentos da

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Este processo apontou

novas frentes de ação pastoral para as entidades que trabalhavam com a

educação. A AEC implementou diversos projetos e ações educativas voltadas

para a educação popular e subsidiou os movimentos sociais que trabalhavam a

questão da alfabetização. A referida instituição passou a atender as

Coordenadorias de Educação da zona sul (da Cidade Dutra até a Capela do

Socorro e Parelheiros), atingindo um universo de 210 educadores,

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disponibilizando oito formadoras para o trabalho de formação continuada de

educadores.

O Instituto Sedes Sapientiae contribuiu na formação dos educadores do

MOVA/SP através do Centro de Formação de Educadores Cida Romero. O

Instituto iniciou suas atividades no período da ditadura militar e teve um papel

de destaque na introdução dos estudos psicológicos no Brasil. Uma das

coordenadoras, Madre Cristina Sodré Dória, atuou na luta de resistência contra

o autoritarismo, acolhendo ex-presos políticos e exilados que retornavam ao

país e formou grupos de educação popular. O que mais se destacou foi o

Centro de Educação Popular da Sedes Sapientie (CEPIS), que assessorava os

movimentos sociais das periferias, contribuindo no processo de consciência e

politização, na linha de educação popular. O Centro Cida Romano assessorou

os educadores na zona Oeste, parte da sul e da zona Norte, abrangendo:

Pirituba, Perus, Ipiranga, Jabaquara e Vila Mariana, Santana, Tucuruvi, Vila

Maria, Tremembé e Jaçanã respectivamente.

Outra instituição, o Vereda, foi fundada em 1982 com o objetivo de

assessorar e acompanhar os trabalhos comunitários na linha da educação

popular teve uma importante colaboração de Paulo Freire que foi um dos seus

idealizadores. O grupo Vereda atuava acompanhando e apoiando os encontros

formativos realizados pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), pelo

Centro de Estudos Ecumênicos Bíblicos (CEBI) e pela Teologia da Libertação,

que são importantes no processo de consciência cidadã e participação popular.

A Entidade Vereda desenvolveu atividades formativas junto aos educadores do

MOVA/SP na Freguesia do Ó, Casa Verde, no Campo Limpo e M’ Boi Mirim.

Já o Instituto Paulo Freire é uma associação civil sem fins lucrativos,

criada em 1991, se constitui numa rede internacional que integra instituições,

grupos e pessoas em mais de 90 países, tendo como objetivo dar continuidade

e reinventar o legado do educador Paulo Freire. Segundo o site do Instituto10

este desenvolve projetos de consultoria, pesquisa, assessoria e possibilita

formação inicial e educação continuada sobre diversas temáticas, dentre elas,

educação de adultos, educação popular e cidadã. As ações fundamentam-se

10Instituto Paulo Freire. Disponível em: <http://www.paulofreire.org> Acesso em: 09 jun. 2011.

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nos princípios do trabalho coletivo, utilizando metodologia essencialmente

dialógica e inclusiva que considera a questão da diversidade, de gênero e

étnica. Tem como missão a construção de uma cidadania planetária, educando

para a transformação social inspirada no legado freiriano que privilegia o

diálogo e a promoção da cultura da paz e de uma vida sustentável e

humanizadora. O Instituto Paulo Freire desenvolveu capacitação junto aos

educadores do MOVA/SP, mesmo não participando desde o início deste

processo de formação aos educadores, porém foram envolvidos pela larga

experiência de Moacir Gadotti, entre outros na primeira edição do MOVA/SP.

Escolhi um trecho do relato de uma das educadoras do referido instituto

que prestava assessoria aos educadores da região leste, abrangendo a Cidade

Tiradentes e Guaianases, que é o objeto de pesquisa, uma vez que analisarei

no próximo capítulo, a formação continuada que ocorre entre os formadores do

MOVA/SP pertencentes à Associação dos Voluntários Integrados no Brasil

(AVIB), com atuação privilegiada em Guaianases. A educadora Maria Alice dá

este depoimento:

Na primeira formação, o pessoal fez uma atividade quem era uma carta, escrevendo sobre o seu processo de alfabetização, a sua experiência em educação, para a gente conseguir um perfil. Quando recolhemos e começamos a ler, eu percebi assim: pessoas que não estavam alfabetizadas, estavam ali e não tinham compromisso com o MOVA, era uma questão de salário, ter algum trabalho, alguma renda, várias coisas, aí então nessa parte de alfabetização nós montamos curso específico em julho, algumas oficinas, e foi mais na Cidade Tiradentes e Guaianases, que foi onde percebi que o problema maior estava lá. Conversei com todas as coordenadorias sobre esse levantamento, mas o problema maior estava em Guaianases. Nós não tínhamos horas de formação, então remanejei as horas e fiz esse curso de oficina de leitura e escrita específicas para os monitores (apud Abbonízio, 2007, p.69).

Segundo o site da Ação Educativa11, organização fundada na década de

1990, com a missão de promover os direitos educativos da juventude, visando

à democracia participativa, a justiça social e o desenvolvimento sustentável no

Brasil, presta assessoria e formação a grupos nos bairros, escolas e

comunidades da periferia, colocando-se como formadora nos campos da

educação, da juventude, da cultura e da mobilização social. No campo da

educação atua junto às escolas e programas educacionais com intervenção

11

Ação Educativa. Disponível em:< http://www.acaoeducativa.org.br/portal/> Acesso em: 9 jun. 2011.

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nas políticas públicas e dentre os seus programas, privilegia a educação de

jovens e adultos.

No decorrer do processo de formação dos educadores do MOVA/SP que

ocorreram com o apoio e a assessoria das cinco Instituições acima

caracterizadas em consonância com as Coordenadorias de Educação, foram

produzidos sob a supervisão da SME, oito cadernos de subsídios e apoio à

ação alfabetizadora. Conforme Abbonízio (2007), estes fazem parte da coleção

Círculos de Formação e foram colocados à disposição dos educadores em

2003:

1. Princípios Freirianos e o Sócio construtivismo;

2. Alfabetização: um desafio de milhões;

3. Mergulhados em números: a matemática na EJA;

4. Registro: Fazendo e Aprendendo;

5. Implicações Metodológicas da Prática Educativa;

6. Festa com arte: primeiro ano de reconstrução do MOVA/SP;

7. Saberes e Aprendizagens: um olhar sobre a avaliação;

8. Paulo Freire- Educação e Esperança.

Estes subsídios populares traziam textos voltados para os educadores e

algumas propostas de atividades para serem trabalhadas nas salas de

alfabetização. O objetivo maior era oferecer um suporte enquanto conteúdo e

metodologia visando contribuir na formação continuada dos educadores do

MOVA-SP.

Para Kunrath (2006), a existência do MOVA/SP se justifica pelo fato de

que se propõe atender os objetivos de alfabetizar jovens e adultos em São

Paulo; inseri-los no sistema escolar, possibilitando a continuidade da

escolarização e desenvolver a cidadania ativa como participação na sociedade

em vista de sua transformação social, política e cultural. Assim, pode-se dizer

que a formação dos educadores viabilizada pelas ONGs parceiras da

municipalidade estiveram em consonância com os objetivos do programa.

Ressalta-se a avaliação deste processo de formação continuada oferecida

pela SME através das entidades formadoras realizada pela educadora

Abbonízio (2007, p. 93) que estudou os dois momentos do MOVA/SP. Ela

afirma que:

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Na reestruturação do programa em 2000, já não se vê nos documentos oficiais referências aos movimentos populares... A dimensão da alfabetização, como um ato intrínseco à conscientização política do alfabetizando, perde lugar para a alfabetização para a consolidação de um direito educacional. A formação dos educadores, realizada pelas ONGs de consultoria e assessoria fica focada nos aspectos pedagógicos da alfabetização, a ausência de articulação política entre as entidades e a heterogeneidade das entidades conveniadas faz com que o discurso da conscientização política se perca nos fóruns.

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CAPÍTULO III

A AVIB E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE EDUCADORES

3.1. Contextualização: caracterização do bairro de Guaianases/SP e a

Associação dos Voluntários Integrados no Brasil (AVIB)

Faz-se necessário explicitar o porquê da escolha do bairro e dos atores

sociais em questão. Guaianases localiza-se no extremo da zona leste de São

Paulo e compreende os distritos do Lajeado e de Guaianases, cuja

subprefeitura leva o mesmo nome. Faz divisa ao norte com os distritos da Vila

Curuçá – São Miguel Paulista e Itaim Paulista, ao leste com Ferraz de

Vasconcelos e a oeste com José Bonifácio – Itaquera. Os 25 quilômetros, que

distanciam o bairro do centro da cidade, podem ser percorridos de trem ou de

ônibus.

Por estar muito próximo a São Miguel Paulista, um dos primeiros bairros

da capital, Guaianases nasceu da retaliação das grandes sesmarias e grandes

fazendas nos séculos XVII e XVIII, até chegar às chácaras no início do século

XX. Quando desmembradas do território de São Miguel, uma parte tornou-se

Guaianases e a outra foi chamada de Lajeado. De 1930 a 1939 vieram para

São Paulo 435.864 nordestinos, sendo que grande parte se estabeleceu em

São Miguel, Itaquera, Guaianases e Lajeado. Tendo em vista seu

distanciamento do centro, estes bairros foram tornando-se esquecidos e

marginalizados da cidade, com poucos equipamentos sociais. Há uma

população de 268.508 habitantes, dos quais 103.996 moradores do distrito de

Guaianases e 164.512 pertencentes ao distrito do Lajeado,12 29,50% das

pessoas residentes nestes distritos vivem nos setores censitários 5 e 6

(vulnerabilidade alta e muito alta), colocando Guaianases como o oitavo lugar

com um dos piores índices em relação à alta vulnerabilidade social.13

12Disponível em Nossa São Paulo, <htpp///nossasaopaulo.org.br/observatório/regiões> Acesso em: 15 ago. 2011. 13Disponível em: Índice paulista de Vulnerabilidade Social, <htpp///w.w.w. seade. gov.br>. Acesso em: 16 ago. 2011.

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A noção de vulnerabilidade social, neste caso especificamente crianças

e adolescentes, famílias ou comunidades, é entendida como uma combinação

de fatores que produz uma deterioração da qualidade de vida em consequência

da exposição de riscos. A vulnerabilidade de um indivíduo, família ou grupos

sociais refere-se à maior ou menor capacidade de controlar as forças que

afetam seu bem-estar, ou seja, a posse ou controle de ativos que constituem

os recursos requeridos para o aproveitamento das oportunidades possibilitadas

pelo Estado, mercado ou sociedade.

Em outra pesquisa de 2003,14 Guaianases e Lajeado foram apontados

como duas das áreas mais vulneráveis da capital, ao lado de jardim Ângela,

Grajaú, Pedreira, Campo limpo, Jardim São Luiz e Jardim Helena. O

mapeamento levou em consideração o acesso ou a falta dele da população a

equipamentos públicos como unidades de saúde, escola, lazer e cultura.

Ainda para compreender a realidade social e econômica de Guaianases,

vale recorrer à outra estatística15 que aponta: 60,2% dos chefes de família

ganham no máximo três salários-mínimos; mais de 15% dos moradores vivem

em favelas; as taxas de analfabetismo são altas, bem maiores que a média da

cidade; as taxas de defasagem escolar também são altas. Nesta mesma

pesquisa apontou-se que o bairro se posiciona entre os distritos com maior

número de homicídios, superando 85 para cada grupo de 100 mil habitantes.

Guaianases tem uma história de 150 anos; é constituído por migrantes

de diferentes lugares da cidade e de outras regiões do país que se

concentraram num território de 17 quilômetros quadrados. Tal fenômeno

ocorreu, sobretudo na década de 80, com as ocupações urbanas organizadas

pelo Movimento Sem Terra da zona leste, com os grandes complexos

habitacionais e atualmente com os programas do governo estadual, o da

Companhia de Desenvolvimento de Habitação e Urbano do Estado de São

Paulo (CDHU) e os condomínios populares. É considerado um bairro

dormitório, pois não possui indústrias de grande porte, o comércio é local, de

pequeno porte e a população se desloca para outras regiões de São Paulo ou

14 Tal estudo é resultado da pesquisa do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), coordenado pela Universidade de São Paulo sobre bairros vulneráveis em São Paulo, disponível em: <htpp///w.w.w. centrodemetropole.org. br>. Acesso em: 17 ago. 2011. 15 É uma pesquisa que apresenta dados do bairro, segundo a Fundação Seade, do ano 2000, disponível em: <htpp///w.w.w. seade.org. br>. Acesso em: 17 ago. 2011.

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para cidades vizinhas, como, Guarulhos, Osasco, Santo André, São Bernardo,

para trabalhar.

Também na década de 1980 nota-se uma efervescência dos

movimentos reivindicatórios e sociais que se organizam para conquistar a

moradia, saneamento básico, luz, pavimentação de rua, creche, áreas de lazer,

espaços de cultura, hospitais, postos de saúde e educação. Com as ocupações

massivas, crescem também significativamente as organizações populares,

ancoradas pelos setores progressistas da Igreja Católica através das

Comunidades Eclesiais de Base e das Pastorais Sociais. Com o crescimento

do Partido dos Trabalhadores e de um núcleo do partido Comunista do Brasil

(PCdoB), inúmeras ONGs são formadas no bairro.

Neste contexto, a Associação dos Voluntários Integrados no Brasil

(AVIB) surgiu em 1985, e foi idealizada pelo religioso italiano, Padre Jorge

Gagliani, comprometido com a defesa dos direitos das Crianças e

Adolescentes. Encontro um retrato desta história na literatura de cordel de

Cacá Lopes (2010, pp. 4-5):

No dia 03 de dezembro A data da fundação, Documentos assinados Após uma reunião. Registrados em um dos Cartórios da região. Dezenove nove cinco (1995) A AVIB foi criada, Distrito do Lajeado A semente foi plantada Com diversas parcerias Com o tempo foi ampliada. Pe. Jorge, um apaixonado Pela causa da criança, Defendia o adolescente Com muita perseverança Conviveu com a miséria Mas viu brotar esperança. Por ser Lajeado, um bairro De São Paulo, tão carente, Onde impera a violência Miséria sempre presente, O poder público demora A chegar pra essa gente...

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A ONG é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos,

democrática e pluralista que congrega projetos, movimentos e grupos que

lutam contra as formas de discriminação, de desigualdades e violação de

direitos. Visa à construção e manutenção de modos de vida sustentáveis, bem

como do pleno exercício da democracia. A AVIB define como sua missão:

democratizar o acesso às políticas públicas através dos serviços sociais de

qualidade, fortalecendo a autonomia, a mobilização social e a garantia de

direitos (LOPES, 2010).

A sede da Associação localiza-se no distrito do Lajeado,16 tido como um

dos mais complexos distritos dentre os 96 que compõe a cidade de São Paulo,

nos indicadores de violência, desemprego, nível de escolaridade, entre outros.

Vale ressaltar que a ausência ou insuficiência de recursos sociais nesta região

e a elevada demanda que se apresenta no distrito comprometem o

desenvolvimento social e psicológico da população - crianças, adolescentes e

famílias inteiras acabam se caracterizando em condições de altíssima

vulnerabilidade pessoal e social, conforme já explicitado. A ONG também atua

nos distritos de Guaianases, Cidade Tiradentes e São Miguel Paulista.

A AVIB desenvolveu e desenvolve ações17 que fortalecem o exercício de

proteção social e de solidariedade à população em geral, descritas abaixo:

a) “Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes” –

(ABRIGO). Foi o primeiro projeto desenvolvido pela Instituição; atendeu

diretamente, num período de 14 anos, 280 crianças e adolescentes de ambos

os sexos, na faixa etária compreendida entre zero a dezessete anos e onze

meses que se encontravam sem proteção integral e em situação de

vulnerabilidade pessoal e social, órfãs e vitimadas sexualmente. E em média

atenderam-se 1050 usuários indiretos (familiares) pelo mesmo período. A partir

de 2002 é celebrado o convênio com a Secretaria Municipal de

Desenvolvimento Social (SMADS), ampliando e qualificando o atendimento aos

usuários até o ano de 2010.

16 Rua Francisco Gil de Araújo, 135- Jardim Lourdes; site: <Htpp://www.avibbrasil.org.br> email: [email protected] 17 Esta descrição dos projetos da AVIB encontra-se no Plano de Trabalho do Programa Ação Família dirigida à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, encaminhado em 2011.

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b) “Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos” (MOVA/SP).

Segundo projeto desenvolvido pela ONG tem o objetivo de promover ações

educativas para contribuir com o processo de diminuição do analfabetismo e

proporcionar instrumentos para o pleno desenvolvimento humano, por meio de

um trabalho de alfabetização que valorize o lugar social dos educandos,

ajudando-os na leitura do mundo e das letras, conforme o ideário de Paulo

Freire. Esta atividade é realizada desde o final da década de 1990, com

voluntários do bairro, militantes dos movimentos sociais e das comunidades

católicas. A partir de 2001 iniciou-se a parceria com a SME.

c) “Núcleo de Apoio à Família” (NAF). Teve seu surgimento na garagem

das casas de muitos voluntários da Pastoral da Criança que se organizavam

pastoralmente ligados a Paróquia Sagrada Família, Diocese de São Miguel

Paulista, com o objetivo de minimizar o nível de desnutrição, bem como

promover o combate à violência doméstica e da infância. Atendia-se a mais de

50 crianças ao mês em situação de vulnerabilidade social e econômica, com

alimentação saudável, orientação sócio educativa e noções básicas de saúde.

Constituiu-se até hoje em um espaço de referência à família, à criança e ao

adolescente do bairro, no intuito de fortalecê-los com atividades

complementares que contribuam efetivamente com a garantia de direitos. O

seu início ocorreu há mais de duas décadas, e em 2006, a Associação passa a

oferecer condições para a celebração de convênios públicos com este espaço,

desenvolvendo projetos como:

d) “Agente Jovem”. Compreendido como a conjugação da Bolsa Agente

Jovem e da ação socioeducativa, promoveu atividades continuadas que

proporcionaram ao jovem, entre 15 e 17 anos, experiências práticas e o

desenvolvimento do protagonismo juvenil, fortalecendo os vínculos familiares e

comunitários e possibilitando a compreensão sobre o mundo contemporâneo

com especial ênfase à educação e ao trabalho.

e) “Tesoura Mágica”. Projeto financiado pelo programa Criança

Esperança foi um importante projeto de capacitação profissional na área

estética que atendeu 35 jovens com idade de 16 a 20 anos, proporcionando

vivências em ambientes de trabalho correspondente no final do curso.

f) “Programa Ação Família – Viver em Comunidade”. Em 2006 a AVIB

celebrou o convênio com a SMADS e suas respectivas coordenadorias o

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Programa Ação Família – Viver em Comunidade. Seu objetivo é a promoção do

fortalecimento, da emancipação e da inclusão social das famílias em situação

de risco e vulnerabilidade pessoal. Pactua o trabalho socioeducativo a

promoção do acesso aos serviços públicos, priorizando ações que visam ao

fortalecimento da família como agente transformador da sua comunidade. O

serviço presta atendimento para 1200 famílias/mês.

g) “Núcleo de Defesa e Convivência da Mulher Viviane dos Santos”.

Instituído com o propósito de combater, prevenir e enfrentar a violência

doméstica contra as mulheres. Foi implantado em 2004, a partir dos dados da

pesquisa realizada pelo Movimento de Mulheres Abra os Olhos Companheira.18

Atualmente localizado no distrito de Guaianases, o Núcleo de Defesa e

Convivência da Mulher Viviane dos Santos é estrutura fundamental de

prevenção e enfrentamento da violência contra a mulher. Promove a ruptura da

situação de violência e a construção da cidadania, por meio de ações globais e

regionais de atendimento interdisciplinar à mulher em situação de violência.

Articula os serviços governamentais e não governamentais integrantes da rede

de atendimento. Elabora estudos preliminares, encaminha e acompanha o

atendimento na rede de serviços, oferecem-se orientações gerais que

identifiquem a situação de violência contra a mulher, com vistas à denúncia;

bem como realiza acompanhamento psicológico, social e jurídico à mulher em

situação de violência: sexual, física, moral, patrimonial e psicológica

(esporádica ou de repetição) ocorrida no contexto de nenhuma relação

(cometida por desconhecidos), de relações de afeto e de confiança e/ou de

trabalho. Diante da desigualdade na divisão sexual do trabalho, oferece

serviços de natureza ocupacional e participa, além de outras iniciativas, do

Programa Roda da Cidadania da SMADS, uma cooperativa, denominada

Núcleo Alternativo das Mulheres (NAMA). O serviço chega a atender cerca de

300 mulheres ao mês.

h) “Programa: Jovens Urbanos”. Iniciativa da Fundação Itaú Social com

organização técnica do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura

e Ação Comunitária (CENPEC). Oferece para jovens de 16 a 21 anos das

periferias um programa-rede que articula questões da vida na cidade, a

18 Este movimento entrevistou 800 mulheres no distrito do Lajeado, onde se constatou um alto índice de violência sofrida pelas mulheres pesquisadas.

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escolaridade, a cultura e a tecnologia por meio de pesquisa, exploração,

experimentação, circulação e produção. As ações de formação dos jovens

abrem possibilidades de trânsito nos territórios urbanos, expandem as relações

e lançam novas perspectivas para as condições de vida da juventude. Os

jovens recebem assessoria para colocar em prática seus projetos de

intervenção na cidade. Atualmente este programa está em sua 6ª edição,

sendo a 4ª no Distrito do Lajeado com a participação da AVIB atendendo

diretamente a 60 jovens.

i) “Centro para a Juventude”. Situado no Jardim Fanganiello, bairro do

distrito Lajeado. A ação tem por objetivo atender jovens, de 15 a 18 anos e

onze meses que residam próximo ao equipamento, em situação de

vulnerabilidade social e econômica, por meio de orientação socioeducativa e

fortalecimento de lideranças comunitárias. A metodologia desenvolvida com os

jovens contempla os capitais: humano, social e produtivo, na perspectiva

promocional e de direitos. Constitui-se também em um espaço de referência à

família, no intuito de fortalecê-la por meio de um leque de atividades que

colaborem em seu desenvolvimento pessoal e social. Também são abordadas

questões relacionadas ao mundo do trabalho e opções de geração de renda.

j) “Núcleo Espaço do Saber I – Lajeado”. O projeto é idealizado para

fortalecer políticas públicas para crianças e adolescentes com a missão de

contribuir na erradicação do nível de violência infantil no distrito, em uma

parceria com a Secretaria Municipal de Participação e Parceria (SMPP),

através do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente

(FUMCAD). Atende no contra turno escolar, oferecendo atividades culturais,

recreativas, pedagógicas e reforço escolar, atendendo 43 crianças de 6 a 11

anos e 11 meses em seus diversos aspectos para o desenvolvimento integral

das crianças e adolescentes.

k) “Núcleo Espaço do Saber II – Cidade Tiradentes”. É desenvolvido por

um grupo de voluntários desde junho de 2010 com o objetivo de contribuir no

combate à questão da violência contra as crianças e adolescentes e contribuir

no exercício da cidadania. O projeto atende cerca de 30 crianças de 7 a 11

anos e 11 meses em período de contra turno escolar.

Considerando os princípios de parceria, a Associação pactua suas

relações com organizações, instituições, esferas governamentais e ainda

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mantém apoio de importantes parceiros como: Prefeitura Municipal de São

Paulo, através das Secretarias da Assistência e Desenvolvimento Social,

Educação, Cultura, Participação e Parceria; Governo do Estado de São Paulo,

através da Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho e a Secretaria

Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social; Associazione Amice Del

Brasile da Província de Macerata, Itália; Associação A Mulher e o Hip Hop;

Banco do Brasil; Itaú Social; Centro de Atendimento ao Trabalhador (CEAT);

Católicas pelo Direito de Decidir; Ericsson Telecomunicações; Instituto Polis;

Marcha Mundial das Mulheres; Pastoral da Criança; Serviço Social do

Comércio (SESC) e MESA BRASIL; Serviço Nacional de Aprendizagem

Comercial (SENAC); Universidade Cruzeiro do Sul; Universidade Camilo

Castelo Branco; Pontifícia Universidade Católica/SP; Espaço Cultural Professor

Paulo Freire; Instituto Paulista de Juventude (IPJ); Projeto Esperança; Paróquia

São Francisco de Assis e Paróquia Sagrado Coração de Jesus.

3.2. Análise do programa de formação de educadores do MOVA/SP da

AVIB: estrutura e dinâmica

O MOVA De manhã me levantei e comecei a pensar

Que poderia fazer para o MOVA, Que é um grande projeto

Para a vida melhorar.

Em Guaianases tem MOVA Que ajuda escrever e ler, alfabetizar,

A todos que na idade Não puderam estudar.

Ó senhores e educadores que criaram este projeto

A minha homenagem para o grande educador Hoje com alegria, quero lhes agradecer

A mulher ou homem que lutou por este movimento Dando oportunidade para todos aprender.

MOVA é um grande projeto,

Que nos dá cidadania Esperança de um país mais justo

E viva o grande educador Paulo Freire.

Hoje posso lhes dize Já sei ler e escrever veja o exemplo de vida

L u z i n e t e = Luzinete Este é o meu nome

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Viva o MOVA Da grande cidade de São Paulo

Projeto que não deve acabar Parabéns educadores e educadoras.19

O MOVA/SP é um dos principais programas da AVIB e tem uma história

de mais de doze anos em Guaianases. Promove ações educativas para

contribuir com o processo de combate ao analfabetismo em Guaianases,20

proporcionando elementos para o pleno desenvolvimento humano em

consonância com o pensamento de Paulo Freire.

Villaseñor (2011, p. 01) resgata a importância do trabalho de educadores

populares que atuavam na alfabetização de jovens e adultos de forma

voluntária, pois conforme relatado no primeiro capítulo, o MOVA/SP deixou de

ser uma política municipal durante os oito anos da gestão Maluf-Pitta, o que

exigiu dos grupos que trabalhavam a educação popular uma dedicação

totalmente voluntária:

Ao chegar e conhecer a realidade social do bairro de Guaianases tive a surpresa de encontrar alguns educadores, que apesar das dificuldades continuavam como voluntários dando aulas de alfabetização para jovens e adultos nos salões das Igrejas Católicas e em algumas associações de moradores. Tudo era feito de maneira precária e isolada, mas sem perder a ação pedagógica de Paulo Freire. A educação se desenvolvia com base na leitura da realidade do educando, a partir da qual se identificavam as situações significativas da realidade em que estava inserido.

Estes educadores, apoiados pela Paróquia Sagrada Família,21

organizaram em março de 1999 um grupo chamado de educação popular, que

19 Esta poesia foi composta por uma educanda do MOVA/SP da AVIB, Luzinete Francisca da Cruz e faz parte do Caderno: AVIB. 10 anos, poesia MOVA, 2005, Guaianases/SP. 20 Em Guaianases a taxa de analfabetismo é 7,7%, enquanto a média da cidade é de 4,88% das taxas de defasagem escolar, dados da Fundação SEADE, 2010, disponível em: <htpp///w.w.w.seade.org. br>. Acesso em: 22 ago. 2011. 21 A referida Paróquia, até o ano 2002, respondia por todo o Distrito do Lajeado, ou seja, atuava em um universo de quase 160 mil habitantes, acompanhando pastoralmente mais de 20 comunidades nos diferentes bairros. A Paróquia desenvolvia também trabalhos sociais por intermédio de duas Entidades: a Joílson de Jesus que existia desde o início dos anos 90, atendendo crianças e adolescentes, com destaque para as chamadas Casas dos Meninos, importantes para o desenvolvimento de centenas de adolescentes; a AVIB teve início atendendo crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social e posteriormente alargou a sua atuação com jovens, famílias empobrecidas, na defesa dos direitos humanos, da mulher vítima da violência e o trabalho com a educação popular, grupos de MOVA.

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atuava como MOVA/SP, cujo objetivo era socializar as experiências de

alfabetização de jovens e adultos, possibilitar uma maior articulação entre estes

educadores voluntários e desenvolver atividades de formação, conforme

descrito no depoimento de Villaseñor (2011, pp. 1-2):

Às sextas-feiras, houve formação pedagógica na Chácara Paroquial da Sagrada Família, com vários educadores voluntários, procurando trocar experiências e buscando parcerias com entidades da área da educação. O resultado foi positivo e participativo, realizado em conjunto com o saber da comunidade como matéria prima para a educação. Houve um salto na qualidade nos núcleos de alfabetização e educação popular do bairro de Guaianases. Em 2000, foi decisiva a participação e integração dos educadores no Fórum do MOVA/SP e do Fórum MOVA Leste, constituído como instância máxima do Movimento de alfabetização; considerado o espaço de formação, de planejamento, de decisão político-pedagógica sobre os rumos do MOVA/SP em seu diálogo com as bases do MOVA que acontecia em diferentes lugares da cidade.

Com a eleição de Marta Suplicy em 2000, o MOVA/SP foi retomado

como programa ligado à Secretaria Municipal de Educação conforme descrito

no primeiro capítulo. Neste contexto, a AVIB, que já desenvolvia trabalhos de

alfabetização de jovens e adultos, conseguiu o convênio em 2001, o que

possibilitou uma consolidação no trabalho desenvolvido. Atualmente a AVIB

atende 22 núcleos educativos, com uma média de 300 Educandos, 22

Educadores e 03 Coordenadores.

A formação continuada destes educadores ocorre de diferentes formas:

participação em seminários e oficinas promovidos pela Secretaria Municipal de

Educação através da Supervisão da Diretoria Regional de Ensino, atividades

formativas feitas pelos Fóruns do MOVA/SP e pelo Fórum da Leste. Outro

momento importante de formação tem sido as Semanas de Alfabetização. Em

Guaianases, em 2010, as atividades ocorreram de 13 a 17 de setembro no

Centro Educacional Jambeiro (CEU), com a participação de 04 ONGs

conveniadas com o MOVA/SP, dentre elas, a AVIB. A participação dos

educandos e educadores considerada significativa e no decorrer da semana

ocorreram diversas atividades pedagógicas, culturais e sociais. Contou-se com

sarau poético, apresentação de trava-línguas, de coral, de danças, de oficinas

culturais, teatros de fantoches, depoimentos de educandos e educadores sobre

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as práticas pedagógicas e as conquistas na compreensão da leitura das letras

e do mundo (PMSP/SME, 2010).

Entretanto, um ponto a ser examinado com mais atenção diz respeito à

formação continuada colocada às sextas-feiras, quando os educadores se

reúnem para estudo de temáticas importantes, trocas de experiências

pedagógicas, planejamento e cronograma de ações e compreensão do Projeto

Político Pedagógico a partir da realidade em que os grupos de base estão

situados, pois segundo Freire “uma destas exigências tem que ver com a

compreensão crítica dos educadores do que vem ocorrendo na cotidianidade

do meio popular. Não é possível a educadores e educadoras pensar apenas os

procedimentos didáticos e os conteúdos a serem ensinados aos grupos

populares” (PMSP/SME, 2003, p. 27).

No termo de convênio do MOVA/SP, afirma-se na sub cláusula primeira:

“As atividades de planejamento e formação permanente de coordenadores,

monitores serão desenvolvidas por no mínimo três horas semanais às sextas-

feiras em local a ser fixado pelo NAE, ouvindo-se a conveniada” (PMSP/SME,

2002).

Nestes encontros de formação organizados pela própria Entidade

Conveniada, os coordenadores têm a tarefa de planejar e articular esse

momento tendo como enfoque principal as questões de organização interna

mais específica, resolução de dúvidas e discussão sobre as demandas

específicas dos educadores.

3.3. O que pensam os educadores populares a respeito da formação

continuada proporcionada pela AVIB

O universo pesquisado, por meio de questionários,22 alcançou a

totalidade dos profissionais envolvidos no trabalho de alfabetização ligados à

ONG AVIB: 22 educadores e 03 coordenadores, destes 22 são mulheres e

somente 03 homens, ou seja, 82,5% são educadoras, o que caracteriza o

grupo como majoritariamente feminino.

22 Conferir questionários utilizados junto aos educadores da AVIB que se encontra no ANEXO E.

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Passo a utilizar algumas tabelas que ajudarão a elucidar a realidade dos

grupos do MOVA/AVIB, bem como a voz dos educadores populares.

TABELA I – LOCAL DE FUNCIONAMENTO DOS GRUPOS DE ALFABETIZAÇÃO

Onde funcionam os grupos do MOVA Frequência %

Espaço cedido pela Igreja Católica 9 40,5

Espaço das igrejas Evangélicas 1 4,5

Espaço cedido pelo Centro Espírita 1 4,5

Espaço cedido por ONGs 7 32,5

Utilização de garagens das residências 4 18,0

Total 22 100,0

O autor.

De acordo com a tabela I, 40,5% dos locais se encontram em salões das

comunidades católicas, 4,5% em Igreja evangélica e também 4,5% em Centro

Espírita. Num segundo plano, se observa que outros espaços são cedidos

pelas ONGs, parceiras no trabalho de alfabetização, como a Entidade Paulo

Freire, Espaço Cultural Carlos Marighela, Projeto Criança Feliz, a Associação

de Moradores da Vila 1º de Outubro e, na sede da própria AVIB, totalizando

32,5%. Há ainda a utilização das garagens residenciais dos educadores, que

somam 18,% dos espaços pesquisados.

Quanto à caracterização dos espaços onde funcionam os grupos do

MOVA/SP coordenados pela AVIB, observa-se o estreito vínculo da referida

organização com a Igreja Católica, pois, pelo próprio histórico apresentado no

terceiro capítulo, é notório que o MOVA em Guaianases se desenvolveu nas

comunidades católicas, contando com o apoio dos padres e das religiosas que

atuavam na Paróquia Sagrada Família – Lajeado, onde a maioria dos grupos

funciona, conforme o depoimento apresentado por Villaseñor (2011, p. 01),

quando resgatou a história do MOVA em Guaianases:

Os educadores que atuavam com a alfabetização de jovens e adultos eram militantes dos movimentos sociais e das comunidades, atuavam de forma voluntária, geralmente eram

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ligados as pastorais sociais, alguns trabalhavam como professores da rede e também se dedicavam à formação de jovens e adultos de maneira totalmente espontânea. Estes grupos aconteciam motivados pelo idealismo e porque contavam com o apoio da igreja, das comunidades e dos padres. Os encontros aconteciam nos salões das Igrejas Católicas e em algumas associações de moradores. Tudo era feito de maneira precária e isolada, mas sem perder a ação pedagógica de Paulo Freire.

Os dados sobre o local utilizado para a realização do MOVA/SP

demonstram que a educação popular tem acontecido em espaços

comunitários, ligados às Igrejas ou Associações que compreendem o papel

desta tipologia de educação não formal para a sociedade. Um facilitador,

observado também em outros estudos sobre a mesma temática, diz respeito à

proximidade dessas salas com o local de moradia dos educandos ao procurar o

MOVA/SP, como observado em Kunrath (2006, p. 28):

Os locais de funcionamento das salas/turmas situam-se o mais próximo possível da residência dos educandos, sendo em salões de igrejas, garagens, salões comunitários, sedes de organizações sociais, entre outros. A maior parte das salas/turmas está na periferia da cidade, nos bairros e nas favelas, nos becos e nas vielas. Elas estão localizadas, em sua maioria em comunidades onde as escolas da rede pública não conseguem atender os educandos e em suas áreas periféricas de grande exclusão social da cidade.

A tabela a seguir aponta a faixa etária dos educandos que frequentam

as salas do MOVA, formada por 50% de adultos acima de 40 anos, 31,8 % na

faixa entre 29 a 39 anos e outros 18,2%, entre 18 a 28 anos de idade.

TABELA II – FAIXA ETÁRIA DOS EDUCANDOS DO MOVA/SP

Prevalência de idade dos educandos Frequência %

De 18 a 28 anos 4 18,2

De 29 a 39 anos 7 31,8

Acima de 40 anos 11 50,0

Total 22 100,0

O autor.

As pessoas, que procuram uma sala de MOVA, identificam-se com a educação informal e, muitas vezes, são convidadas diretamente por um

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educador, um vizinho ou amigo que tenha passado pela experiência de alfabetização. É o que se pode confirmar no testemunho da educanda Maria Vanda dos Santos, segundo Macena (2009, p.11), na ocasião da comemoração dos 20 anos da existência do MOVA/SP:

Sou moradora da zona leste, estudante do MOVA há dois anos. É muito gratificante para nós que temos dificuldades para ler e escrever ter esta oportunidade. Hoje eu escrevo e leio. Eu tenho uma vizinha que ria muito da minha iniciativa de começar a estudar por causa da minha idade, mas eu sempre falei bem do Movimento de Alfabetização. Hoje ela também estuda no MOVA.

TABELA III – GÊNERO DOS EDUCANDOS DO MOVA

Quem participa do MOVA/SP Frequência %

A maioria é mulher 18 81,8

A maioria é homem 4 18,2

Total 22 100,0

O autor.

Quanto à prevalência de gênero dos educandos, é preponderante o

gênero feminino 81,8%; 18,2% de homens participam das salas do MOVA,

conforme demonstrado na tabela acima.

TABELA IV – INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO

Perfil dos educandos Frequência %

Sem trabalho 5 22,7

Sem trabalho, mas procurando 3 13,6

Trabalhando informalmente 9 40,9

Aposentado 3 13,6

Outra situação 2 9,1

Total 22 100,0

O autor.

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Quanto à questão profissional, conforme a Tabela IV, o perfil dos

educandos é formado por trabalhadores ligados à informalidade, 40,9%, além

de um número significativo de pessoas sem trabalho ou que estão buscando

uma colocação, 36,3%. Os demais dados apontam que somente 19,7% são

aposentados ou estão numa outra situação. Segue a tabela sobre o perfil

destes sujeitos em alfabetização nas salas do MOVA/AVIB. Tais dados

apontam a vulnerabilidade social discutida no início deste capítulo, conforme os

indicadores sociais da Fundação SEADE23 que reforçam a tese sobre a

situação de carência de políticas públicas em Guaianases.

Agora passo a discutir o perfil dos educadores do MOVA/AVIB. As

tabelas apresentadas são identificadas pelas letras a, b, c, d que tratam da

prevalência de gênero, tempo que é educador, exercício de outra atividade na

educação e escolaridade para ajudar na caracterização destes sujeitos

atuantes nos grupos de alfabetização da Instituição em questão.

TABELA V a – PERFIL DOS EDUCADORES DO MOVA/AVIB: A PREVALÊNCIA DE GÊNERO

Gênero

Frequência %

Mulheres

20 90

Homens

02 10

Total

22 100,0

O autor

A tabela V Perfil dos educadores do MOVA/AVIB, letra a, diz respeito à

prevalência de gênero, dado que a quase totalidade dos educadores, 90% é

mulher. Lanço mão de outra pesquisa elaborada pela SME/PMSP (1992, s/ p.)

que apresenta indicativos sugerindo uma alta superioridade da atuação das 23

Ainda para compreender a realidade social e econômica de Guaianases, vale recorrer a outras estatísticas: 60,2% dos chefes de família ganham no máximo três salários mínimos, mais de 15% dos moradores vivem em favelas, as taxas de analfabetismo são altas, bem maiores que a média da cidade e as taxas de defasagem escolar também são altas. Nesta mesma pesquisa, apontou-se que Guaianases está entre os distritos com maior número de homicídios, superando 85 para cada grupo de 100 mil habitantes. Disponível em: <www. Seade.org.br>. Acesso em: 20 set. 2011.

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mulheres como educadoras: “a maioria dos alfabetizadores eram mulheres cuja

única atividade remunerada era a participação no programa do MOVA/SP. Do

conjunto, 60% nunca haviam desenvolvido atividades educativas

anteriormente”.

Estudando outras experiências de grupos de MOVA, constatam-se

aproximações ainda mais significativas, como em Costa (2008, p. 65), que

analisa o MOVA de Guarulhos, grande São Paulo, quando o número de

educadoras é marcadamente superior:

Destacamos que no período de realização desta pesquisa, 92% dos alfabetizadores do MOVA/Guarulhos eram mulheres. Nos demais anos também pudemos observar essa característica do movimento: a maioria esmagadora dos sujeitos que dele participam como educadores populares são mulheres. Dentre os educadores a proporção é menor, conforme exposto.

A presença significativa de mulheres como educadoras do MOVA/AVIB

reforça a constatação de que são muito ativas nas CEBs, nos movimentos

sociais e nas lutas populares. Destaca-se, assim, seu importante papel nos

últimos tempos na promoção da igualdade, nas discussões de gênero e mesmo

na educação, na política, no sindicato e em outros setores profissionais, o que

tem contribuído para o resgate de sua importância na sociedade.

TABELA V b - TEMPO QUE É EDUCADOR DO MOVA/AVIB

Há quanto tempo é educador

Frequência %

Menos de 02 anos

04 18,0

De 03 a 04 anos

01 4,5

Acima de 5 anos

17 77,5

Total

22 100,0

O autor.

Conforme a tabela acima, dos 22 entrevistados, 17 deles estão acima de

05 anos no programa; dado extremamente significativo, pois a experiência

acumulada ao longo deste período possivelmente contribui para uma maior

interação com os educandos, uma vez que um processo em longo prazo facilita

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a interação e o ensino-aprendizagem. Outra questão é a construção de um

caminho de formação permanente feito por estes sujeitos.

Segundo Barreto, (2006) o trabalho de formação continuada demanda

tempo e continuidade. É difícil encontrar um formador de educadores populares

que considere possível uma autonomia razoável para o educador em menos de

um ano: “os trabalhos de formação que mais nos deixaram felizes em participar

de tal realização aconteceram em períodos superiores a dois anos de

encontros constantes e regulares” (BARRETO, 2006, p. 100).

TABELA V c - EXERCÍCIO DE OUTRA ATIVIDADE NA EDUCAÇÃO

Tem outra atividade na área de educação

Frequência %

Professor do Estado ou da PMSP

01 4,5

Trabalha em outra ONG

04 18,0

Tem alguma atividade em comunidade

17 77,5

Total

22 100,0

O autor.

Quanto a outros trabalhos ou atividades exercidas pelos educadores da

AVIB, a tabela V c aponta-nos que um percentual significativo de educadores,

quase 80%, desempenha atividades em comunidade, na maioria nas

Comunidades Eclesiais de Base. É interessante observar que 18% destes

educadores têm uma atuação em outra organização não governamental, o que

evidencia um comprometimento social e comunitário; uma das educadoras atua

como professora estadual na alfabetização de crianças.

Com base nas entrevistas realizadas, é possível considerar que o

conjunto de educadores da AVIB é formado por sujeitos comprometidos de

uma maneira ou de outra com as questões comunitárias e sociais; poucos são

militantes das causas sociais, políticas, de gênero ou de outras lutas por

igualdade.

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Por um lado, a questão da militância na política e nos movimentos

sociais não está presente no perfil destes sujeitos, como no contexto da

primeira edição do MOVA/SP, quando criado por Paulo Freire, na

Administração Erundina. Naquela oportunidade, prevalecia o perfil militante

social e político dos educadores. Por outro lado, o perfil dos educadores atuais

coincide com uma atuação comunitária e social; a remuneração não significa o

fator preponderante até porque os educadores trabalham praticamente como

voluntários, uma vez que recebem uma ajuda de custo de um salário-mínimo.

TABELA V d - ESCOLARIDADE DOS EDUCADORES

Grau de escolaridade

Frequência %

Ensino Médio

15 60

Curso Superior incompleto

07 40

Total

22 100,0

O autor.

A escolaridade dos educadores do MOVA/AVIB é outra questão

importante a ser considerada, conforme a Tabela V d, observa-se que 60% dos

educadores têm somente o Ensino Médio, outros 40% estão cursando o Ensino

Superior, todos matriculados em Pedagogia.

Dados de PMSP/SME (1992,s/ p.) apontam que o grau de escolarização

dos educadores do MOVA/SP ainda apresenta dados em que uma alta

porcentagem tem o Ensino Fundamental ou no máximo o Médio, conforme o

indicado a seguir: “13,9% possuem o Ensino Fundamental completo, 11,9% o

incompleto, 13,5% o Médio, 20,3% o Médio sem concluir, 22,1% possuem o

Magistério concluído ou não, 3,1% não declararam e 16% possuíam o nível

Superior completo ou incompleto”.

Para Kunrath (2006, p. 104), a questão da elevação de escolaridade dos

educadores do MOVA/SP é um problema muito presente:

Um dos desafios é que há muito tempo é uma reivindicação dos educadores populares, qual seja, a criação de mecanismos de elevação da escolaridade e profissionalização desses educadores. A maioria dos educadores que, ao ingressar em um programa de alfabetização não tinham concluído o ensino

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Médio, atualmente já o concluiu. Porém, a dificuldade é muito maior quando se pensa em um curso de nível superior, dado o quadro da educação superior que não dispõe de vagas nas Universidades públicas e ainda há a barreira dos processos seletivos, já conhecida por todos. Já o ingresso em Instituições privadas de ensino superior, tem a barreira financeira.

A elevação da escolaridade dos educadores do MOVA tem sido um

debate presente nos Fóruns do MOVA/SP, bem como nos Encontros Regionais

e Nacionais do MOVA/Brasil, numa perspectiva de valorização profissional dos

educadores. Para exemplificar essa preocupação, retomo uma das

deliberações tiradas no 6º Encontro Nacional de 2006: defender a necessidade

da formação universitária para o educador alfabetizador, a fim de recuperar a

sua valorização diante dos outros educadores e da EJA, bem como as

parceiras e convênios com as Universidades Públicas e Particulares.

O Boletim da Ação Educativa (2004, p. 9) analisa os limites relativos ao

incentivo à formação de educadores populares: “uma das tarefas pendentes da

educação de jovens e adultos é a formação inicial e continuada dos

educadores, pois são ainda tímidas as ações das universidades e

administrações públicas voltadas à preparação desses profissionais”. Assim, a

questão da escolaridade destes educadores merece uma atenção maior das

Instituições formadoras, bem como o incentivo das esferas governamentais no

sentido de subsidiar e apoiar a inserção dos educadores no mundo acadêmico.

Com a análise da parte II do questionário aplicado aos educadores do

MOVA da AVIB procurou-se identificar como ocorre o processo de formação no

interior da ONG. Para tanto continuarei utilizando algumas tabelas.

TABELA VI – APROXIMAÇÃO DOS EDUCADORES COM O MOVA/AVIB

Como ocorreu a aproximação Frequência %

Convidado por um educador 10 44,0

Convidado por um coordenador 5 24,0

Indicado pela ONG 1 4,0

Outro meio 6 28,0

Total 22 100,0

O autor.

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A aproximação dos educadores com o MOVA da AVIB ocorreu

principalmente por convite direto de outro educador totalizando 44%. Para

24%, o convite foi feito pela coordenação do projeto e, para 28% dos

educadores, a aproximação se deu por outro meio – como o incentivo do

próprio padre que acompanhava a comunidade, das irmãs ou dos

coordenadores das comunidades, o que denota uma profunda ligação e

sintonia do MOVA/AVIB com a caminhada das comunidades católicas.

TABELA VII – ENVOLVIMENTO DOS EDUCADORES COM A AVIB

Como os educadores se envolvem Frequência %

Participa das assembleias 8 36,0

Participa das assembleias formativas 8 36,0

Participa das atividades formativas ou culturais 4 18,0

Restringe-se à formação do MOVA 1 0,5

Tem envolvimento com outros projetos da AVIB 1 0,5

Total 22 100,0

O autor.

No que se refere às formas de participação na ONG, a tabela VII indica

que 36% dos educadores afirmam participar das assembleias, outros 36%

participam das atividades formativas, 18% se envolvem nas atividades festivas

ou culturais da entidade. E O,5%, ou seja, uma só pessoa participa apenas das

obrigações do MOVA se restringindo às atividades pertinentes à alfabetização.

Também O,5%, um educador apenas tem uma participação mais efetiva no

conjunto da entidade, militando em outros projetos da ONG, como na defesa da

causa da criança e adolescente, no trabalho com os jovens no apoio à luta das

mulheres vítimas da violência doméstica e outras atividades. Tal quadro

caracteriza o grau de inserção destes educadores no comprometimento com os

projetos da ONG.

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TABELA VIII – ENVOLVIMENTO DOS EDUCADORES EM FÓRUNS DA

EDUCAÇÃO POPULAR

Como os educadores se envolvem com outros grupos do MOVA

Frequência %

Tem contato com outros

Educadores do MOVA

14 64,0

Participa do Fórum da Zona Leste 08 36,0

Total 22 100,0

O autor.

Quanto ao grau de envolvimento com outros grupos de MOVA da região,

possível nas formações promovidas pela DRE, a tabela VIII indica que 64% dos

educadores têm contato ou intercâmbio com outros grupos do MOVA para

além da AVIB, sobretudo nas semanas de alfabetização, outros 36% participam

de reuniões no Fórum da Zona Leste.

O citado envolvimento com outros educadores que também trabalham

com o MOVA/SP é uma oportunidade de interação e de diálogo muito

importante para o exercício da capacitação pessoal e do grupo, conforme Pinto

(2001, p. 113):

A capacitação crescente do educador se faz, assim, por duas vias: a via externa, representada por cursos de aperfeiçoamento, seminários, leitura de periódicos especializados, etc.; e a via interior, que é a indagação à qual cada educador se submete relativa ao cumprimento de seu papel social. Uma forma em que se pratica com grande eficiência esta análise é o debate coletivo, a crítica recíproca, a permuta de pontos de vista, para que os educadores conheçam as opiniões de seus colegas sobre os problemas comuns, as sugestões que outros fazem e se aproveitam das conclusões destes debates.

É significativo o percentual apontado pelos educadores que participam

das atividades formativas e culturais, pois reforça a importância da formação

como uma atitude contínua, segundo Freire (1991, p. 32):

(...) ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde. Ninguém nasce educador. A gente se

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faz educador, a gente se forma como educador permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática.

Ficou evidente que os educadores em questão têm assumido

compromissos para além das atividades do MOVA, o que os caracteriza como

um grupo comprometido com o social e o comunitário. Porém, este quadro nem

sempre se confirma nas dissertações e nos relatos do MOVA/SP que

atualmente têm deixado de lado a identificação com a luta social, conforme

observado em Kunrath (2006, p. 91):

Dentre os elementos que se podem destacar como possíveis motivadores do esvaziamento na participação mais sócio-política dos educadores, coordenadores e entidades como um todo, está o fato de muitas instituições que participam do MOVA, o fazem pela possibilidade de receber recursos financeiros do município, esta pode ser uma forma de manter projetos funcionando na instituição.

TABELA IX – OUTROS MEIOS UTILIZADOS NA BUSCA DE FORMAÇÃO

Como os educadores buscam a

formação

Frequência %

Leitura de livros

11 49,5

Cursos de capacitação

07 32,5

Seminários ou outros eventos

04 18,0

Total 22 100,0

O autor.

Outra questão analisada pelos educadores em questão é como as

pessoas buscam a formação continuada utilizando outros meios. Apontou-se

que a maioria (49,5%) busca a formação na leitura de livros, enquanto outros

(32,5%) buscam cursos de capacitação e (18%) participam de seminários ou

eventos, conforme a tabela IX, pois o ideário freiriano possibilita esta busca,

conforme Freire (1983b, p. 83):

Para o educador dialógico, problematizador, o conteúdo programático da educação não é uma doação ou uma

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imposição, um conjunto de informes a ser depositado nos educandos, mas, a devolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo daqueles elementos que este lhe entregou de forma desestruturada.

Esta busca pessoal nos remete à experiência de Freire (1994, p. 120),

quando relata a sua trajetória:

O pensar sobre minha própria prática e a prática dos outros me conduzia, por ter sido um pensador crítico, profundamente curioso, a leituras teóricas que eram pela iluminação da prática em análise, explicando ou confirmando o acerto ou o erro cometido nela.

Observa-se, com base nas respostas dos educadores, que a formação

continuada é buscada individualmente por meio de leituras sobre temáticas que

ajudam no desenvolvimento nas salas do MOVA, mas, é significativo o que é

apontado pela minoria dos educadores, quando entendem que a formação

continuada também é buscada em cursos de capacitação, numa relação

dialógica e de troca de experiência com outros educadores.

Para Ferreira (1996), é muito importante que o educador busque o

aprofundamento do próprio referencial teórico atual, ‘fazendo a leitura do

mundo e dos textos’, como diz Paulo Freire, para poder acrescentar novas

informações, discussões, pesquisa de outros autores que trabalham a temática

da alfabetização de jovens e adultos, e confrontar as teorias e as práticas de

educação popular com o que é vivenciado e estudado por colegas e outros

educadores.

Ainda segundo Ferreira (1996, p. 57), cabe ao educador aprimorar a sua

competência técnica que passa pela apropriação da capacidade de estudar e

planejar ações pedagógicas a fim de contribuir no desenvolvimento dos

educandos:

A competência técnica do educador passa pela apropriação da capacidade de dirigir o pedagógico, como sujeito da construção do projeto pedagógico com seus educandos: passa pela apropriação da capacidade de planejar, selecionar atividades significativas, interessantes e variadas, teoricamente fundamentadas para atingir objetivos claramente especificados, proporcionando o conhecimento do educando através de estratégias de intervenção pedagógica. Passa pela apropriação da capacidade de observar as reações significativas, afetivas, culturais e ideológicas do educando durante o desenvolvimento

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das atividades pedagógicas; registrar as ocorrências significativas e continuamente avaliar os avanços do educando, avaliar o processo pedagógico e avaliar-se.

Passo a analisar o perfil dos coordenadores pedagógicos. Eles são

importantes para que o MOVA aconteça na base, favorecem o elo entre os

educadores e a Secretaria da Educação através da supervisão das Diretorias

Regionais de Ensino, bem como, acompanham o trabalho dos educadores,

visitando as classes e sendo os articuladores da formação continuada que

ocorre às sextas-feiras.

A pesquisadora Kunrath (2006, p. 25) afirma sobre o papel do

coordenador:

Para coordenar localmente o MOVA, o critério mínimo é que o coordenador tenha concluído o ensino médio ou superior, ou comprove experiência de no mínimo dois anos de trabalho com alfabetização de jovens e adultos. Cabe à organização ter coordenadores pedagógicos e administrativos conforme a necessidade, sendo que a cada grupo de sete salas é orientado que se tenha um coordenador pedagógico.

Quanto à prevalência de gênero, dos 03 coordenadores, 02 são

mulheres. Prevalece assim a reflexão feita quando se tratava da predominância

das mulheres no trabalho com educação popular e concretamente no MOVA, a

partir da experiência da AVIB.

Quanto à escolaridade dos coordenadores da AVIB, observa-se que os

03 protagonistas têm formação superior; as coordenadoras no campo das

Ciências Humanas, formadas em Pedagogia e Ciências da Religião e o

coordenador tem formação em matemática, o que enriquece o trabalho dos

grupos do MOVA. Devido à formação acadêmica, os coordenadores estão

teoricamente com maiores condições de contribuir na formação do conjunto

dos seus educadores.

No que se refere às atividades desenvolvidas por estes coordenadores,

registra-se que um deles atua na educação e os demais desenvolvem

trabalhos comunitários e pastorais. Uma das coordenadoras exerceu o

mandato de Conselheira Tutelar e a outra é religiosa, missionária de uma

Congregação que atua na região.

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O tempo de atuação como coordenadores do MOVA/AVIB é outro

aspecto analisado; os 03 estão engajados na AVIB e neste trabalho com o

MOVA há mais de cinco anos, o que os credencia na função que exercem. E

por atuarem no campo formativo, os coordenadores seguem a metodologia de

formação proposta para o conjunto dos educadores do MOVA, quando são

incumbidos de possibilitar a formação continuada. Para Ferreira (1996, p. 65):

Organizar uma infraestrutura de formação dos educadores em pequenos grupos com uma coordenação pedagógica, num encontro semanal, produtivo, de socialização das experiências entre os educadores e de intervenção pedagógica do coordenador, onde a prática do educador-alfabetizador é coletivamente discutida, tendo como referência, os princípios políticos e metodológicos da proposta pedagógica do projeto de alfabetização.

Os coordenadores seguem a metodologia de formação, para a qual há

um processo em construção, o educador não é ‘tábula rasa’, assim como os

educandos não o são, como afirma categoricamente Freire (1991, p. 100):

“ninguém nasce educador, a gente vai se fazendo... eu estava sempre fazendo

perguntas e não apenas a meus pais a mim também e me dava ao gosto de ir

mais além das respostas, elaborando a partir delas novas perguntas, agradava-

me arriscar”.

A metodologia adotada é aquela que rejeita o planejamento pronto, que

impede o educador de construir coletivamente a prática pedagógica

mediatizada pelo mundo, conforme Ferreira (1996, p.64):

Rejeitamos aquela prática tradicional de entregar ao educador um planejamento pronto do que deve ser feito. Entregar ao educador um pacote, embrulhado e amarrado, de aulas a serem dadas, com os conteúdos prontos e exercícios a serem preenchidos, mecanicamente, pelos educandos, é desrespeitar o educando, é "embrulhar" o próprio educador. É encher o educador de invólucros externos, destituindo-o da potencialidade intrínseca de pensar, desapropriando-o de seu próprio saber. Negamos, enfaticamente, o modelo técnico-burocrático, autoritário de Educação.

Passo agora a analisar as questões abertas feitas aos educadores. São

quatro perguntas que permitiram aos entrevistados discorrer livremente sobre

aspectos considerados importantes no processo de formação continuada. As

respostas foram agrupadas em 04 eixos:

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1º) Semana de Alfabetização;

2º) Pontos fortes nos encontros formativos de sexta-feira;

3٥) Pontos fortes nos encontros formativos de sexta-feira;

4º) Propostas para melhorar a formação continuada às sextas-feiras.

Os 22 educadores da AVIB avaliaram o que entenderam como

significativo em relação à proposta desta Semana. É importante acentuar que

as ideias foram agrupadas em 11 temas recorrentes analisados brevemente.

1º EIXO: ANÁLISE DA SEMANA DE ALFABETIZAÇÃO Opinião dos

Destaques observados pelos educadores: educadores

Participação e integração dos educandos 12

Utilização de oficinas como: “contação” de história, pintura e artesanato: 09

Integração com outros educadores de ONGs afins: 05

Relatos de práticas pedagógicas: 04

Depoimentos dos educandos sobre o processo de alfabetização: 03

Apresentações culturais: 03

Apresentação teatral da AVIB, poema de Drummond de Andrade: 03

Palestra: 02

Organização da Semana de Alfabetização: 01

Sessão cinema: 01

Festa de encerramento, forró envolvendo educadores e educandos: 01

Este eixo de análise diz respeito ao que mais chamou a atenção dos

referidos educadores na Semana de Alfabetização, que se realiza desde 2002

conforme exposto no segundo capítulo, sempre no mês de setembro, próximo

ao dia Internacional de Alfabetização. Analisar-se-á a 9º Semana - em

Guaianases, de 13/09/10 a17/09/10, no CEU Jambeiro (Centro Educacional

Unificado) - com participação das Entidades que desenvolvem o MOVA/SP em

Guaianases e Cidade Tiradentes, a saber: Associação dos Voluntários

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Integrados no Brasil, Conselho Comunitário da Vila Solange, Central de

Associação e Sociedade Popular e Núcleo Recreativo Mundo Encantado.

Para resgatar a proposta da Semana de Alfabetização, cito Kunrath

(2006) que discorre dobre a proposta desta atividade: o objetivo da Semana de

Alfabetização contemplava ações pedagógicas para envolver todos os

participantes do MOVA/SP sendo que havia abertura solene em nível municipal

e nos dias seguintes aconteciam atividades regionalizadas, que envolviam

educadores, educandos, coordenadores, supervisores das coordenadorias e

representantes das entidades conveniadas. Uma das principais tarefas era a

integração dos educadores e das diversas organizações por meio de oficinas

pedagógicas, palestras, debates sobre temáticas ligadas à educação,

exposições de trabalhos desenvolvidos nos núcleos, depoimentos de

educandos sobre a experiência de alfabetização, relato de prática,

apresentações culturais.

A maioria dos educadores citou a importância atribuída à participação e

integração dos educandos, pois todas as entidades que atuam com o

MOVA/SP na região estavam presentes, o que permitiu aos educadores e

alfabetizandos se integrarem para realizar as atividades conjuntamente.

O segundo ponto mais citado (por 09 educadores) disse respeito à

utilização das oficinas coordenadas e articuladas pelas ONGs presentes,

conforme PMSP/SME (2010, p. 15): “pintura de rosto, artesanato com palitos,

leitura e ‘contação’ de histórias, confecção de instrumentos utilizados na

capoeira, artesanato casinha de Abelha, artesanato ‘vagonite’ com fita e sem

fita em pano de prato e artesanato com peças de gesso”. A prática das oficinas

tem sido uma constante também na formação dos educadores do MOVA tanto

nos encontros de sexta-feira, bem como na formação oferecida pelas Diretorias

Regionais de Ensino em cada região. Discutirei na última questão aberta que

os educadores apresentam sugestões, propostas de aprimoramento e melhoria

com destaque para as oficinas que são constantemente reivindicadas para

justamente dinamizar e dar mais criatividade às ações pedagógicas e

formativas.

Outro ponto citado por 05 educadores trata da integração com outros

educadores de ONGs, pois a Semana de Alfabetização proporciona a interação

e troca de experiências entre os educadores; 04 educadores valorizam os

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relatos de práticas pedagógicas dos colegas que podem ajudar como

intercâmbio de experiências. Na ocasião apresentaram-se relatos de práticas

pedagógicas por meio de amostras, fotos, artes plásticas, teatros e

depoimentos.

Ainda segundo os temas recorrentes, 03 educadores apreciaram os

depoimentos dos educandos sobre o processo de alfabetização; cada entidade

deu voz aos jovens e adultos que brevemente apresentaram com emotividade

a trajetória pessoal de superação, leitura das letras e leitura do mundo. Esta

modalidade tem se tornado comum nos eventos, congressos e atividades

maiores, conforme o relato de Santos (2006, p. 41), quando relatou o 1º

Congresso de Alfabetizandos da cidade de São Paulo em 1990:

Esse evento procurou privilegiar a manifestação dos educandos que, em vários momentos, fizeram uso da palavra e apresentaram sua identidade cultural, discutindo os problemas em torno da alfabetização de adultos. Nele foi apreciado um texto base elaborado previamente a partir de uma pesquisa que procurou captar as expectativas e perspectivas dos educandos.

Outros 03 educadores destacaram as apresentações culturais e o teatro

“Trem café com pão” de Carlos Drummond de Andrade que contou com a

participação dos próprios educadores da AVIB. Conforme citado anteriormente,

as manifestações culturais e artísticas constituem um dos objetivos primordiais

da Semana de Alfabetização, favorecendo a integração e interação dos grupos

do MOVA/SP, onde todos se sentem parte de um coletivo maior.

A palestra sobre andrologia e alfabetização de Jovens e Adultos,

proferida pela Doutora Rosângela Figueiredo, professora da UNICAMP, foi

lembrada por 02 educadores como momento formativo importante. A

conferencista referendou Romão (2001, p. 75), quando afirmou:

Ambos, educador e educando, trabalharão o tempo todo: o primeiro como provocador, incentivador, sistematizador e avaliador; o segundo como provocado, descobridor, co-sistmatizador e co-avaliador/avaliado. E a avaliação não buscará a classificação das diferenças hierarquizadas, mas o diagnóstico de situações e desempenhos carentes de reforço, de novas provocações indutoras da correção e da retomada de rumos e estratégias.

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Os outros pontos, como organização da Semana, sessão cinema e a

festa de encerramento foram também lembrados pelos educadores.

O eixo de análise seguinte retrata um dos pontos centrais da pesquisa,

quando sistematizo a opinião dos educadores sobre os pontos fortes nos

encontros formativos de sexta-feira, também agrupados por temas recorrentes.

2º EIXO: ANÁLISE DE PONTOS FORTES NOS ENCONTROS FORMATIVOS

DE SEXTA-FEIRA

Destaques observados nos encontros formativos: Opinião dos educadores

Projetos desenvolvidos pelo conjunto de educadores 14

Troca de experiências entre os educadores 10

Debates e reflexões realizados 07

Participação dos educadores nas atividades de formação 07

Integração do grupo de educadores 05

Formação oferecida pela DRE 02

Planejamento de ações 02

Respeito às diferenças 01

Gestos de amizade e afetividade 01

Boa relação entre educadores e coordenadores 01

Atividades festivas entre educadores e educandos 01

Pontualidade dos encontros 01

A relação educador-educando 01

Reflexão sobre teoria e prática 01

Oficina de Informática 01

Contribuição com novas estratégias de alfabetização 01

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O principal destaque nos encontros de sexta-feira observados por 14

educadores, diz respeito aos projetos desenvolvidos pelo conjunto de

educadores ao longo do ano de 2010. Estes projetos foram pensados,

planejados e articulados pelos coordenadores em sintonia com os educadores.

Seguiu-se a seguinte metodologia: os 22 núcleos foram divididos em três

blocos temáticos; os educadores e os educandos estudaram a Constituição

Federal, a questão da mulher hoje, focando a violência doméstica e a Lei Maria

da Penha e os Direitos dos Povos Indígenas. Num primeiro momento, o

conjunto dos educadores participou coletivamente de oficinas temáticas e

palestras com assessoria de educadores da rede e formadores populares para

posteriormente estudar, aprofundar e desenvolver atividades nos respectivos

blocos. E numa sexta-feira no Espaço Paulo Freire, onde ocorrem as reuniões

formativas dos educadores, a grande plenária formativa reuniu todos os 22

núcleos do MOVA/AVIB, para a socialização das pesquisas e reflexões feitas

nas bases, através de teatros, encenações, músicas, poesias, exposições

culturais e artísticas.

O segundo ponto forte apresentado por 10 educadores diz respeito à

troca de experiências entre os educadores, o que tem sido uma prática comum

na formação continuada. Esse intercâmbio é apontado como extremamente

importante no processo de formação inicial, complementar e continuada nos

grupos do MOVA/SP. Vera Barreto in Kunrath (2006, p. 82) descreve como

esta troca de experiências tem marcado os momentos formativos:

A gente discutia um pouco o que eles traziam, experiências que já tiveram e ia montando essa pasta com coisas possíveis, mas a intenção da gente era também provocar isso com os educadores: traga o que você trabalhou. Por conta do tempo e também da dificuldade que você encontra nas pessoas trazerem um relato de fato do que elas fazem, chegaram vários que era muito mais uma coisa copiada de um livro, mas que revela que a pessoa achou aquilo muito bom, o que já era um indicador, mas eram poucas vezes que você sentia que esse educador pensou e achou que era legal, montou e fez.

Os debates e reflexões realizados e a participação dos educadores nas

atividades de formação foram lembrados por 07 educadores, o que confirma a

relevância das reflexões e discussões sobre os mais diversos assuntos

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pedagógicos e educacionais. Esta necessidade é apontada por Basualdo

(1997, p. 57):

A formação é um processo permanente de ação, devendo estar sempre inserida nas necessidades do cotidiano da entidade e voltada essencialmente para a melhor qualificação prática da ação. Isso não significa que ela deve ser imediatista e utilitarista, reduzindo-se ao atendimento de emergência: é um processo permanente e sistemático que deve ter um horizonte, um sentido histórico e coletivo e, fundamentalmente, um desejo compartilhado na transformação social.

A participação dos educadores neste processo formativo é uma

necessidade e corresponde a uma exigência desde o surgimento do MOVA/SP,

quando se definiu que os educadores estão em processo de formação

permanentemente, com obrigação de participar nos encontros formativos às

sextas-feiras, bem como quando convidados ou convocados pela Secretaria

Municipal de Educação, através das DRES. No Projeto político Pedagógico do

MOVA/SP, PMSP/SME (2001, p. 06), está muito clara a importância da

formação dos educadores: “o desenvolvimento do programa requer a garantia

de um processo de formação permanente dos/as educadores/as de modo a

que acompanhem a prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa

e crítica”. O mesmo documento enfatiza a necessidade de estabelecer um

processo avaliativo, dialógico e continuado nestes encontros formativos.

Outro ponto avaliado por 05 educadores destacou a integração do grupo

de educadores como elemento positivo no processo formativo. Esta avaliação é

corroborada por Ferreira (1996, p. 63), ao enfatizar o significado da interação e

integração entre os educadores em processo de formação:

No MOVA/SP, o educador-alfabetizador não está sozinho nesta tarefa. Apostamos no movimento coletivo de reflexão da prática, nos encontros de formação permanente do educador em pequenos grupos, no processo construtivo do pensar e do fazer pedagógico. Um caminho para a formação coletiva do educador é o estudo em profundidade das atividades cotidianas da alfabetização: a atividade planejada e desenvolvida pelo educador sendo discutida, dissecada, analisada pormenorizadamente. Que objetivos se pretendia, que resultados foram, de fato, atingidos? Como o alfabetizador se colocou nesta situação de conhecimento - cognitiva, afetiva e ideologicamente? A partir daí é possível seqüenciar novo

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tema, organizando novas atividades, sempre tendo em vista o planejamento global da alfabetização.

Esta integração entre os educadores em questão, bem como entre

coordenadores e educadores e estes com os seus educandos, é uma

característica buscada com insistência no cotidiano do MOVA/AVIB e nos

encontros formativos.

A formação oferecida pela DRE Guaianases foi citada por 02 educadores

- ocorre esporadicamente atualmente, percebe-se um significativo aumento

principalmente a partir de 2011. Fazendo um comparativo, baseando-se na

literatura do MOVA/SP, principalmente em Kunrath (2006), Abbonizio (2007),

constata-se que nos governos Erundina e Marta Suplicy a SME possibilitava

muito mais formação aos educadores e suas organizações.

Também citada por 02 educadores a questão do planejamento das ações

é um aspecto a ser considerado. Como apresentado anteriormente, os projetos

organizados no coletivo dos educadores têm sido assertivos, uma vez que

estes são planejados e posteriormente avaliados pelo conjunto dos

educadores, o que garante a participação e responsabilização do grupo como

um todo.

Os demais pontos destacados foram indicados uma única vez pelos

educadores, o que não diminui a sua relevância. Destacou-se o respeito às

diferenças; gestos de amizade e afetividade; boa relação entre educadores e

educandos; atividades festivas e recreativas, pontualidade nos encontros; a

relação educador-educando; reflexão sobre teoria e prática; oficina de

informática; contribuição com novas estratégias de alfabetização.

Teço alguns comentários especificamente sobre duas avaliações feitas

pelos educadores: a questão dos gestos afetivos entre o grupo e as atividades

festivas. Os gestos de amizade e afetivos e a dimensão festiva envolvendo os

educandos são a meu ver uma característica marcante do grupo. Esse tipo de

relação foi constatado por intermédio dos contatos como pesquisador, das

vezes que assisti aos encontros formativos, à apresentação dos projetos e

participação nas festas juninas, nas confraternizações e em outros momentos

coletivos.

A importância da manifestação dos gestos de amizade, solidariedade e

de afetividade é enaltecido por Freire (2000, p. 161):

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É digno de nota, a capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de querer bem e o gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido... é preciso, por outro, reinsistir em que não se pense que a prática educativa vivida com afetividade e alegria, prescinda da formação científica séria e da clareza política dos educadores ou educadoras.

A dimensão de festa, de fraternidade é igualmente significativa nos

grupos do MOVA/AVIB, onde há inúmeras atividades lúdicas, recreativas,

festivas, envolvendo a coletividade dos educadores, educandos e mesmo

familiares que participam da alegria e da socialização de “fraternura”.

Tradicionalmente ocorrem duas festividades maiores; a realização das festas

juninas, com quadrilha, forró e muita diversão e o encerramento das atividades

no final do ano. É a alegria, o colorido, o belo, a festa, a dança, a música, a

poesia, a literatura de cordel e outras manifestações artísticas e culturais que

são constitutivas do grupo em questão.

3º EIXO: ANÁLISE DE PONTOS FRACOS NOS ENCONTROS FORMATIVOS DAS SEXTAS-FEIRAS

Destaques observados pelos educadores da AVIB: Opinião dos educadores

Repetição de conteúdo 05

Falta de interesse de alguns educadores 05

Falta de pontualidade 04

Excesso de cobrança dos educadores 01

Falta de materiais pedagógicos 01

Poucas dinâmicas nos encontros 01

A DRE nem sempre respeita o calendário de formação da ONG

01

Os pontos fracos nos encontros formativos de sexta-feira são as

limitações percebidas pelos educadores. Tentarei interpretar os pontos

destacados. Os dois primeiros itens apontados igualmente por 05 educadores

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tratam da repetição de conteúdo e da falta de interesse de alguns educadores.

Cabe, assim, aos coordenadores um momento avaliativo profundo do conteúdo

programático, o que precisa ser acrescentado, alterado, se é o caso de investir

mais em oficinas temáticas - opção que aparece com frequência nas sugestões

classificadas na próxima tabela - ou mesmo a utilização de mais dinâmicas,

conforme também anotado por um dos educadores. Enfim, tudo concorre para

uma avaliação do próprio planejamento de ações e da metodologia

empreendida. A reflexão em Freire (2001, p. 80) pode ajudar a compreender

esta situação:

O educador é o sujeito de sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la. A formação do educador deve instrumentalizá-lo para que crie e recrie a sua prática por meio da reflexão sobre o seu cotidiano. A formação do educador deve ser constante e, sistematizada, porque a prática se faz e se refaz. O programa de formação de educadores terá como um dos eixos básicos: a necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas do conhecimento humano.

Quanto à falta de interesse de alguns educadores, seria necessária uma

pesquisa participativa, um acompanhamento do pesquisador de forma mais

sistemática e acurada para uma compreensão das causas deste desinteresse.

Poderão contribuir na reanimação dos educadores: a busca de novas formas

de motivar a participação, reuniões participativas, dinâmicas de grupos,

trabalhos em oficinas, envolvimento de todos, socialização das experiências

apontando os êxitos, fracassos e dificuldades em classe, estudo de novas

bibliografias, utilização das mídias modernas, presença de assessoria externa

tanto de educadores populares de outros grupos de MOVA, do Fórum do

MOVA/SP ou de outros Institutos, bem como a simples mudança de ambiente,

para sair do espaço corriqueiro de formação.

Outros 04 educadores apontaram a falta de pontualidade como um dos

problemas nos encontros de formação continuada. Pelos relatos, os encontros

têm uma duração mínima de três horas, tendo início às 19 horas no mesmo

espaço e esporadicamente em locais indicados pela DRE, o que pode ser um

grande facilitador. Para Barreto (2006, p. 101), a formação continuada exige

espaço e horário que sejam bem definidos: “é preciso garantir um lugar certo

para o grupo se reunir além da existência do material básico para qualquer

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atividade educativa. Esses aspectos somados à observância de um calendário

para a formação dão credibilidade ao processo”.

O atraso, a não pontualidade, é um problema a ser superado em

qualquer grupo humano. É compreensível algum atraso uma vez ou outra até

por conta do caos urbano, sistemas públicos de transporte ineficientes, ou

mesmo a dupla jornada de trabalho que impede a pessoa de chegar no horário

combinado, mas, quando constante o atraso pode se tornar um desrespeito

aos que chegam na hora definida coletivamente.

Os outros 04 pontos, não menos importantes, foram objeto de avaliação

uma única vez. Apontou-se o excesso de cobrança dos educadores, a falta de

materiais pedagógicos, poucas dinâmicas nos encontros e a DRE que nem

sempre respeita o calendário de formação da ONG.

No que se refere ao excesso de cobrança dos educadores e à tensão

provocada pela DRE quanto ao calendário, são questões com uma maior

complexidade, que exigem aprofundamento. Quanto à falta de materiais

pedagógicos e à falta de dinâmicas nos encontros, é preciso uma reflexão,

aliás, já explicitada em outros momentos desta pesquisa. Pois, como

observado em Ribeiro (1996, p. 81), há necessidade de uma opção pela

multiplicidade de materiais didáticos nas classes populares, como também nos

momentos formativos dos educadores:

A escola não tem desenvolvido a articulação das múltiplas formas de linguagem. Tem priorizado a linguagem verbal e escrita em detrimento da fala e da leitura e não tem trabalhado as outras formas de linguagem: a música, o teatro, a fotografia, figuras, objetos de escultura, pintura, desenho, filme, slide. Como podemos ler uma foto, um slide, uma pintura? Como expressar o pensamento, os sentimentos através de desenhos, recorte-colagem, dramatização, poesia e canto? Optamos pela multiplicidade destes materiais didáticos como ponto de partida para a expressividade oral e escrita e como codificações que possibilitam a leitura do mundo, através das decodificações que os alfabetizandos fazem.

A citação acima ajuda a colocar adequadamente a importância da

utilização de materiais pedagógicos de múltiplas formas, para em certa medida

poder contribuir na dinamização dos encontros, tornando-os cada vez mais

participativos e significativos.

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O último agrupamento de respostas trata das propostas para melhorar a

formação continuada com base nas entrevistas dos educadores da AVIB.

4º EIXO: ANÁLISE DE PROPOSTAS PARA MELHORAR A FORMAÇÃO CONTINUADA ÀS SEXTAS-FEIRAS

Destaques observados pelos educadores: Opinião dos educadores

Necessidade de mais momentos formativos 04

Oficinas temáticas 04

Oficinas de inclusão 03

Oficinas de artesanato 02

Incentivo da ONG para que os educadores façam Curso Superior

02

Curso de Libras 01

Oficina de Leitura 01

Utilização de mídias (DVD, filmes) 01

Cantinho de leitura em cada núcleo 01

Utilização de mais dinâmicas 01

Estudar a alfabetização de Jovens e Adultos 01

Maior inserção nos Movimentos Sociais 01

Fortalecimento do trabalho coletivo 01

Necessidade de mais informações 01

O primeiro aspecto apontado por 04 educadores destacou a

necessidade de possibilitar mais momentos formativos, ou seja, a formação é

um desafio a ser buscado constantemente. Kunrath (2006, p. 07) expressa a

necessidade da reflexão crítica:

Como apontamento de alternativas para contribuir na superação das dificuldades na formação dos educadores populares, é necessário possibilitar aos mesmos a apropriação de habilidades pedagógicas para que eles mesmos possam

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conduzir o processo de ensino aprendizagem, bem como, ter condições de refletir criticamente sobre questões sociais, políticas e econômicas. Isso seria pelo menos, uma tentativa d garantir que o trabalho desenvolvido por esses agentes populares tenha condições de assegurar que os objetivos educacionais traçados pelos programas/projetos/movimentos sejam alcançados.

Como já abordado abundantemente neste trabalho sobre a formação

continuada dos educadores do MOVA/SP na realidade de Guaianases, a

formação adquire uma exigência indispensável para que o processo da

educação popular possa acontecer coerente e eficazmente. Resgato Dussel

(1977b, p. 133) que tão bem expressa esta necessidade quando afirma com

propriedade que o mestre, o educador, assim como o discípulo, entendido

como educando, são sujeitos do aprender, e não depositários do

conhecimento:

(...) o mestre e o discípulo sempre têm algo a aprender (desde o nascimento até a morte)... nenhum discípulo é puramente discípulo; nenhum mestre é puramente mestre, também o que o mestre aprende, aprende-o a partir da novidade do projeto do jovem. Todo mestre deve ensinar mais do que simplesmente já dado anteriormente; deve ensinar de maneira crítica o modo como isso foi alcançado; não transmite o tradicional, mas revive as condições que o tornaram possível como novo, como único, como criação.

Outra questão acentuada por vários educadores é a necessidade de se

investir na formação através de oficinas temáticas, oficinas de inclusão de

artesanato, oficina de leitura e libras, o que indica a carência de oficineiros

especialistas nas diversas áreas para ajudar a enfrentar os desafios

pedagógicos. O MOVA/SP tem valorizado a importância da utilização das

oficinas nos encontros formativos dos educadores, conforme enfatizado por

Santos (1996, p. 39):

Tentando superar as dificuldades surgidas em salas de aula, foram realizadas oficinas que discutiram a pratica do ensino interdisciplinar da Língua Portuguesa, de matemática, de Geografia, de História, entre outros... as oficinas realizadas contavam com a participação dos servidores, pois eles também sentiam as dificuldades vividas pelos monitores.

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A questão da inclusão apresenta-se como um importante desafio a ser

discutido na educação formal e também na educação de jovens e adultos; e no

MOVA não tem sido diferente. Praticamente em todos os núcleos do

MOVA/AVIB há um educando com necessidade especial. Em um destes

núcleos, há uma especificidade interessante: metade dos educandos tem

alguma necessidade especial, exigindo assim ações pedagógicas

diversificadas. Segundo o relato da educadora que acompanha este grupo

específico, estes jovens e adultos passaram por várias escolas públicas, sendo

geralmente pouco notados, e no grupo do MOVA sentiram-se acolhidos e

respeitados no seu processo de alfabetização. Este exemplo ajuda a

compreender a necessidade de ter formação específica para lidar com

situações similares, o que justifica a importância das oficinas.

Outro aspecto explicitado por 02 educadores é a necessidade do

incentivo da AVIB para que os educadores façam Curso Superior. Tal

reivindicação tem sido apresentada nos Encontros Nacionais e Regionais do

MOVA/Brasil, conforme já relatado neste trabalho. O Governo Federal na

última década tem favorecido o incentivo à formação superior por meio do

PRO-UNI e de financiamentos educacionais. Mas, estas iniciativas não dão

conta de atender à realidade de tantos educadores que precisam da formação

superior. A AVIB dentro de suas possibilidades ajudou, concretamente com

uma bolsa de estudo, duas educadoras que cursaram Pedagogia.

A utilização de mídias modernas, proposta por um educador, é uma

discussão interessante, um desafio importante a ser alcançado; é uma

preocupação constante apontada nos relatórios dos últimos encontros

nacionais, estaduais, regionais e municipais do MOVA/Brasil e

consequentemente do MOVA/SP. Existem algumas tentativas de aproximação

com o mundo da informatização, das mídias digitais, mas ainda são iniciativas

tímidas e que precisam ser aprimoradas. Os educadores da AVIB têm

frequentado esporadicamente o laboratório de informática da DRE; são

incentivados a fazer parceria com os tele centros mais próximos dos locais de

alfabetização, mas encontram muitas dificuldades, uma vez que funcionam

somente até às 20 horas.

O cantinho de leitura em cada núcleo é outra preocupação indicada por

um dos educadores. Conforme visita aos núcleos, o que normalmente tem sido

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uma prática comum é a iniciativa dos educadores em promover a socialização

de livros didáticos, histórias em quadrinhos, enciclopédias, jornais, romances e

outros materiais colocados à disposição da classe pelo educador ou até a

organização de uma pequena biblioteca que os próprios educandos ajudaram a

organizar. Sem dúvida, esta reivindicação da criação de um cantinho de leitura

é muito importante, pois estimula o gosto pela leitura e o incentivo a iniciação

de sujeitos leitores.

A utilização de mais dinâmicas é uma sugestão importante para reforçar

a necessidade de aprimorar uma metodologia mais envolvente em

conformidade com um dos objetivos específicos do MOVA/SP, segundo

PMSP/SME (2001, p. 03), quando afirma que cabe aos educadores “alfabetizar

a partir de uma metodologia dialógica e conscientizadora, inspirada na

pedagogia libertadora”. Tal metodologia sugere envolvimento, participação,

dialogicidade, criatividade e dinâmica.

Estudar a alfabetização de jovens e adultos é outra proposta suscitada

por um educador. Ler, estudar e discutir em grupo ou coletivamente os escritos

de Paulo Freire, Álvaro Pinto e de outros educadores, pode ser um

encaminhamento oportuno para o cronograma de formação. Outra

possibilidade interessante com base nesta provocação poderia ser a formação

de grupos de estudo, que programassem momentos formativos para além dos

encontros de sexta-feira. A alfabetização de jovens e adultos é um assunto que

requer estudo e aprofundamento, Freire (1987, p. 111) aponta este desafio:

Para ser um ato de conhecimento, o processo de alfabetização de adultos deve, de um lado, necessariamente envolver as massas populares num esforço de mobilização e de organização em que elas se apropriem, como sujeitos, ao lado dos educadores, do próprio processo. De outro, deve engajá-los na problematização permanente de sal realidade ou de sua prática nesta.

Outro destaque sugerido por um dos educadores é a necessidade de

maior inserção nos Movimentos Sociais. O diálogo, interação e parceria com

outros movimentos de alfabetização, com um trabalho na educação popular,

deve ser uma constante; bem como a inserção nos movimentos locais atuantes

na reivindicação de questões sociais, conselhos populares de educação,

saúde, transporte e outros, permite que os educadores sintam-se partícipes

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dos problemas coletivos e assim possam despertar esta consciência nos seus

alfabetizadores. Este caminho de militância é incentivado por Arroyo (2001, p.

275):

Os educadores para Paulo Freire foram os movimentos sociais. O que fazer então para que o projeto popular seja educativo? Troca de experiências (mostrar o que já se faz o que já somos, as nossas lutas); temos importantes sujeitos coletivos educativos (os movimentos sociais), temos que explorar suas potencialidades, torná-los cada vez mais pedagógicos.

O fortalecimento do trabalho coletivo é lembrado por um educador. Esta

é uma tarefa imprescindível no processo de formação continuada do MOVA,

pois sem a participação de todos os envolvidos, o trabalho fica comprometido.

É o que afirma Ferreira (1996. p. 63) ao tratar desta questão: “(...) apostamos

no movimento coletivo de reflexão da prática, nos encontros de formação

permanente do educador... no processo construtivo do pensar e do fazer

pedagógico”.

E, por fim, um educador observou a necessidade de mais informações

nos encontros de formação às sextas-feiras. É importante observar, conforme

apontado por Ribeiro (1996, p. 82), que existe uma variedade de materiais,

documentos, escritos que podem contribuir tanto para o processo de formação

dos educadores, como no cotidiano, onde acontece a alfabetização de jovens e

adultos:

No mundo letrado de hoje, há uma enorme variedade de material escrito: os mais diferentes tipos de veículos de leitura (documentos pessoais, indumentárias com que nos vestimos, jornais, revistas, boletins, cartões, livros de literatura, livros científicos, livros didáticos) e há os diferentes tipos de conteúdos impressos (logotipos, logomarcas, anúncios de propaganda, rótulos, avisos, placas, bilhetes, cartas informais, comunicados formais, notícias, contos, bulas de remédios, provérbios, quadrinhas, parlendas, adivinhações, slogans, piadas, crônicas, poesias, cartuns, quadrinhos, gráficos estatísticos, ditados populares escritos nas carrocerias dos caminhões, receitas culinárias, frases escritas nas paredes das ruas, romances, textos informativos, literatura de cordel). São muitos os tipos de leitura que a vida social oferece ao usufruto.

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Portanto, o desafio colocado para o grupo de coordenadores e

educadores diz respeito ao exercício contínuo de momentos formativos,

conforme insistência no decorrer deste trabalho; e o exercício de socialização

de informações, o que está acontecendo no bairro, na cidade, no país e no

mundo e como fazer a leitura destas realidades para que o processo formativo

seja contínuo e permanente.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente dissertação busca compreender o que pensam os

educadores do MOVA da AVIB a respeito da formação continuada focalizando

os encontros que ocorrem às sextas-feiras no interior da própria ONG.

Faz-se necessário apontar algumas inquietações e desafios quanto à

formação destes educadores populares. A partir das entrevistas, observou-se

que existem muitas lacunas neste processo formativo, porque muitas vezes

esta formação mesmo sendo planejada e sistematizada pelo conjunto dos

educadores, pode trazer um esgotamento, apresentado como repetitivo na

opinião de vários educadores, o que exige uma avaliação do próprio

planejamento de ações e metodologia empreendida, conforme discutido no

terceiro capítulo, a partir da visão de Freire (2001) ao afirmar que o educador é

o sujeito e o protagonista de sua prática, cabendo a ele e ao grupo a

capacidade de criar e recriá-la através da reflexão sobre o cotidiano,

considerando a realidade de seus educandos, o contexto social onde está

inserida, a leitura que fazem do mundo, superando o senso comum em vista de

uma educação popular que contribua para a consciência cidadã dos

envolvidos.

Desta forma, cabe aos educadores, segundo ressaltado no Projeto

Político Pedagógico do MOVA/SP (ANEXO D), a capacidade de se assumir

enquanto sujeito de sua prática pedagógica, agindo sobre sua prática,

decidindo coletivamente sobre a realidade do grupo de alfabetização e do

processo formativo em curso, o que exige um movimento contínuo e

permanente, em vista de uma educação que seja participativa, ativa e crítica.

Outro limite tem sido a própria precariedade dos planejamentos de

formação, certa improvisação, aliado à falta de recursos financeiros e técnicos,

pois a Secretaria Municipal de Educação – por meio das Diretorias Regionais

de Ensino - não tem investido adequadamente neste processo, delegando às

Entidades Conveniadas esta tarefa.

Muitas vezes, a formação destes educadores carece de um processo

mais organizado e estruturado que dê conta de permitir uma continuidade. O

educador Santos, (1996), abordado no segundo capítulo, corrobora para esta

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compreensão, ao enfatizar que o processo formativo dos educadores do

MOVA/SP deve abranger a formação inicial, complementar e geral ou contínua.

A primeira atende o objetivo de capacitar inicialmente os educadores numa

visão dialógico-construtivista, desenvolvendo pressupostos educacionais

ligados a prática e concepção de educação, metodologia participativa,

planejamento e avaliação das práticas educativas; a complementar atende às

necessidades imediatas no exercício cotidiano, através de oficinas sobre o

tema gerador, prática do ensino interdisciplinar de matemática, língua

portuguesa, geografia, artes, história, o que não significa o oferecimento de

“receitas didáticas e pedagógicas” a serem aplicadas nas classes do MOVA,

mesmo considerando que muitos educadores necessitam de auxílio prático

para elaborar ou ter parâmetros de atividades que podem contribuir para o

melhor desempenho. O outro componente fundamental é a chamada formação

geral ou contínua, que possibilita aos educadores a atualização de temáticas

pertinentes ligadas à educação e outros assuntos correlacionados.

Neste sentido, vale resgatar a importância dada aos debates e análises

de conjuntura, nos primeiros anos do MOVA/SP, que aconteciam a cada três

meses e eram organizados pela Secretaria Municipal de Educação em sintonia

com o Fórum MOVA/SP para discutir as mais diferentes situações que

ocorriam na cidade, no país, na América Latina e no mundo. Eram atividades

abertas também para os educandos que tinham a possibilidade de

compreender questões para além do MOVA e da própria educação.

Ao longo da pesquisa, em especial no terceiro capítulo, procurei mostrar

como os educadores do MOVA ligados a AVIB se posicionam diante do desafio

da formação, como a compreendem e como a praticam. É notório o esforço do

grupo em questão para desempenhar atividades formativas que envolvem tanto

os educadores, como os educandos. Um destaque interessante observado

neste processo é a importância dada aos projetos desenvolvidos pelo conjunto

de educadores e coordenadores, lembrados por 14 destes atores, bem como a

troca de experiências, a integração e a interação entre os pares apontada

como relevante. Esta prática é referendada por Pinto (2001), quando acentua

que,

Uma forma em que se pratica com grande eficiência é o debate coletivo, a crítica recíproca, a permuta de pontos de vista, para

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que os educadores conheçam as opiniões de seus colegas sobre os problemas comuns, as sugestões que outros fazem e se aproveitam das conclusões dos debates, p. 113.

A realização das Semanas de Alfabetização que acontecem desde 2002

(já discutidos no terceiro capítulo), é um momento significativo desta interação

e integração, parte integrante do MOVA, uma vez que possibilita o diálogo das

diversas organizações que atuam na alfabetização de jovens e adultos e de

seus educadores; outro destaque acentuado neste mesmo capítulo diz respeito

à importância que estes educadores dão aos projetos articulados em conjunto

e sintonia também com os educandos, quando se apresentam em grandes

plenárias o resultado das atividades desenvolvidas, socializando as reflexões e

estudos sobre temas relevantes, através da exposição de cartazes, pequenos

documentários, vídeos, fotografias, slides, testemunhos, teatros, músicas e

poesias entre outros.

Há também que valorizar a busca pessoal e coletiva em vista da

formação superior, em que se constatou que 40% destes educadores estão

cursando Pedagogia, conforme evidenciado no perfil dos educadores da AVIB,

o que valoriza sobremaneira o esforço destes em buscar a elevação de sua

escolaridade, que tem sido uma reivindicação constante do MOVA/SP e do

MOVA/Brasil em todas as instâncias, para que o educador popular que atua na

alfabetização seja valorizado diante de outros alfabetizadores de jovens e

adultos da EJA bem como de outras experiências.

A rotatividade de educadores em que quase 20% destes estão há

menos de 02 anos no trabalho com o MOVA/AVIB é outra dificuldade a ser

enfrentada, pois alguns educadores não conseguem permanecer no programa

conforme gostariam, uma vez que a remuneração é baixa, cerca de um salário

mínimo.

Outra questão a ser considerada é a precariedade dos espaços onde

ocorre a alfabetização do MOVA. Os núcleos encontram-se próximo dos

educandos que é um grande facilitador, por outro lado, tais espaços muitas

vezes carecem de condições mais favoráveis: melhor iluminação, carteiras

mais confortáveis, espaço físico melhor organizado entre outras coisas. O que

se pode questionar é porque a Secretaria Municipal de Educação através das

Diretorias Regionais de Ensino não dispõe de uma verba complementar para a

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manutenção destes espaços comunitários, bem como porque não dispõe de

recursos para aquisição de bens duráveis que poderiam ser usados em vista

da melhoria dos equipamentos e também para a aquisição de livros, jornais e

materiais didáticos.

Para refletir sobre esta questão recorro a Paulo Freire quando aborda a

estética como uma espécie de bem espiritual, que ele chama de “boniteza”,

que resulta da capacidade como educador e educando de transformar o senso

comum em uma visão crítica, que pode mudar a realidade. Freire (1997, p.

50), na obra Pedagogia da Autonomia, fala da importância da boniteza das

escolas e da importância formadora dos espaços ao afirmar que:

É incrível que não imaginemos a significação do ‘discurso’ formador que faz uma escola respeitada em seu espaço. A eloquência do discurso ‘pronunciado’ na e pela limpeza do chão, da boniteza das salas, da higiene dos sanitários, nas flores que adornam. Há uma pedagogicidade indiscutível na materialidade do espaço.

O mesmo Freire, (1991, p. 22) ao falar deste termo, destaca que tratar

de “boniteza de lugar, requer outra boniteza, a do ensino competente, a da

alegria de aprender, da imaginação criadora tendo liberdade de exercitar-se a

da aventura de criar”. Assim, a questão da boniteza dos espaços em que se

realizam os grupos de alfabetização, aliada à boniteza da prática educativa,

mobiliza o processo de educação popular implementado pelos educadores do

MOVA/SP.

Ao analisar a voz dos educadores é possível estruturar algumas

indicações a respeito da necessidade do redimensionamento do processo

formativo ofertado pela AVIB, tais como: a utilização de uma metodologia mais

participativa, ampliando as dinâmicas de grupos, as oficinas temáticas e

promovendo maior aproximação com o mundo da informatização. É possível

verificar também a necessidade de favorecer momentos formativos para além

daqueles realizados semanalmente, tais como a participação em cursos de

formação organizados pelo Fórum MOVA/SP, pela própria Secretaria de

Educação, ou mesmo de iniciativas dos próprios educadores, ao propor grupos

de estudo e de pesquisa em busca de refletir, discutir e dialogar com outros

educadores populares e mesmo da rede municipal.

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A educação de jovens e adultos tem sido um capítulo importante da

educação brasileira, assim, a presente pesquisa constitui uma contribuição na

tentativa de compreender a relevância da formação de educadores populares,

defendendo-se a ideia de que esta questão deve estar contemplada nas

agendas governamentais e nos movimentos da sociedade civil organizada.

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TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis,

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TORRES, Carlos Alberto. Estado, Políticas Públicas e Educação de

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Jovens e Adultos Teoria, prática e proposta. São Paulo: Cortez, 2001.

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VALE, Edênio e QUEIRÓS, José J. (orgs). A cultura do povo. São Paulo:

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WILLIANSON, C.Guilhermo. Paulo Freire: 1964-1969 sua passagem pelo

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124

de FREIRE, Ana Maria Araújo, CISESKI, Ângela Antunes, TORRES, Carlos

Alberto, GUTIÉRREZ, Francisco, GERHARDT, Heinz Peter, ROMÃO, José

Eustáquio e PADILHA, Paulo Roberto. Paulo Freire uma bibliografia. São

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VALENTE, Ivan (Deputado Federal). Paulo Freire vive: hoje 10 anos depois.

Brasília: Câmara dos Deputados, 2007.

VILLASEÑOR, Rafael Lopes. Um breve ensaio sobre a experiência de

educação popular no MOVA/SP: 2011, mimeo.

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Htpp/// w.w.w. acaoeducativa.org.com; acesso em 09.06.11.

Htpp/// w.w.w. Seade.gov.br ; acesso em 16-08-2011.

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125

ANEXO A

DECRETO DA CRIAÇÃO DO MOVA/SP

GABINETE DO PREFEITO DECRETO

Institui o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos

da Cidade de São Paulo junto à Secretaria Municipal de

Educação e de outras providências.

LUIZA ERUNDINA DE SOUZA, Prefeita do Município de São Paulo, usando

das atribuições que lhe são conferidas por lei, e CONSIDERANDO o disposto

no artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que prevê a

eliminação do analfabetismo nos 10 primeiros anos da promulgação da

Constituição Federal de 1988;

CONSIDERANDO a existência no Brasil, segundo cálculos da UNESCO, de

mais de 20 milhões de jovens e adultos sem instrução e mais de 15 milhões de

semialfabetizados;

CONSIDERANDO que na Região Metropolitana da Grande São Paulo existe

um milhão de jovens e adultos sem escola e dois milhões e meio de jovens e

adultos com menos de 04 anos de estudo;

CONSIDERANDO que a educação de jovens e adultos constitui uma das

grandes prioridades da Secretaria Municipal de Educação, na atual gestão;

CONSIDERANDO que o ano de 1990 foi aclamado pela UNESCO como o "Ano

Internacional da Alfabetização";

DECRETA:

Art. 1º - Fica instituído junto à Secretaria Municipal de Educação o Movimento

de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de São Paulo –MOVA/SP.

Art. 2º - A Secretaria Municipal de Educação fica autorizada a firmar convênios

e acordos com entidades assistenciais, sociedades e associações

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regularmente constituídas, nos termos do disposto no artigo 3º da Lei n° 7.693,

de 06 de janeiro de 1972.

Parágrafo único - Poderão ser concedidos auxílios e subvenções a entidades

conveniadas, no valor a ser fixado no termo próprio, por classe de

alfabetização de adultos a ser criada.

Art. 3º - A Secretaria Municipal de Educação, juntamente com as entidades

conveniadas manterá permanente "FÓRUM dos Movimentos Populares de

Alfabetização de Adultos da Cidade de São Paulo", que estabelecerá as

diretrizes e princípios gerais do Movimento ora criado.

Art. 4º - As despesas com a execução deste decreto correrão por conta da

dotação orçamentária do código 16.30.08.42.1872.480.3132, da Coordenadoria

dos Núcleos de Ação Educativa - CONAE, do orçamento do exercício de 1990.

Art. 5º - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as

disposições em contrário.

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 21 de

Novembro de 1989, 436° da fundação de São Paulo. Decreto nº 28.302.

LUIZA ERUNDINA DE SOUZA, Prefeita

HÉLIO PEREIRA BICUDO, Secretário dos Negócios Jurídicos.

AMIR ANTONIO KHAIR, Secretário de Finanças.

PAULO REGLUS NEVES FREIRE, Secretário Municipal de Educação.

LADISLAW DOWBOR, Secretário dos Negócios Extraordinários

Publicados.

na Secretaria do Governo Municipal, em 21 de Novembro de 1989.

JOSÉ EDUARDO MARTINS CARDOZO, Secretário do Governo

Municipal.

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ANEXO B

Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP

Proposta aprovada pelo FÓRUM MUNICIPAL em 03 de setembro de 1990.

1. Parceria efetiva entre a Secretaria Municipal de Educação e o Fórum dos

Movimentos de Alfabetização na Composição do MOVA/SP.

2. A linha político-pedagógica do MOVA/SP será objeto de elaboração conjunta

pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, resguardando a

estes últimos a liberdade de adequarem tais propostas em sua realidade

específica. O mesmo se aplica à elaboração de material didático, pedagógico e

metodológico.

3. Liberdade para que os movimentos escolham seus monitores e

supervisores, de tal modo que sejam preservados os princípios centrais do

projeto político-pedagógico estabelecido em conjunto pelos movimentos e pela

Secretaria Municipal de Educação. Eventuais casos que se chequem

frontalmente com tais princípios serão objeto de parecer por parte da

Secretaria Municipal de Educação quando dos cursos de capacitação,

pareceres estes que serão encaminhados às entidades em questão para sua

auto avaliação e decisão final.

4. Dentro da linha político-pedagógico estabelecida em conjunto pela

Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, assegura-se a

autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de

formação específicos e atividades paralelas.

5. Parceria também na formação dos monitores: os movimentos desejam

participar ativamente, com o corpo e com a cabeça, na formação de seus

monitores, e desejam, portanto, que seja criado mecanismo de parceria com a

S.M.E. para os trabalhos pedagógicos de formação dos monitores.

6. Os movimentos desejam garantir os princípios da educação crítica,

participativa e libertadora independentemente da atual administração, tendo em

vista sua compreensão de que o MOVA/SP nasce na atual gestão, mas que

deverá existir e crescer independentemente dela.

7. Há o desejo de ampliação e generalização do trabalho de educação, e para

isto, entendem os movimentos ser fundamental o intercâmbio entre os

movimentos de alfabetização e entre os demais movimentos populares.

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ANEXO C

CARTA ABERTA À POPULAÇÃO DE SÃO PAULO EM DEFESA DA

EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – MOVA/SP

Em nosso país há anos sofremos com a ausência de políticas públicas

para educação de jovens e adultos pouco escolarizados, que representam as

camadas mais pobres da população. Essas pessoas, sem condições de

estudar e trabalhar, são obrigadas a escolher entre a sobrevivência e o estudo,

ficando desprovidas do direito à educação garantida pela Constituição Federal

de 1988.

O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos MOVA/SP tem

dentre seus objetivos, contribuir para a superação do analfabetismo na cidade

de São Paulo. Baseia-se nos princípios da educação libertadora de Paulo

Freire e atende regiões não contempladas pelas escolas da rede pública.

Infelizmente o programa MOVA/SP vem sofrendo com o fechamento de

salas pela atual administração. Os critérios utilizados são meramente técnico-

administrativos, uma vez que salas são fechadas conforme o número de alunos

(inferior a 15), sem levar em conta a realidade da periferia e o dia-a-dia do

aluno adulto trabalhador. Além disso, essa Administração tem se negado ao

diálogo com a coordenação do Fórum MOVA, rompendo com a possibilidade

de participação da sociedade civil organizada, princípio básico da democracia.

Nossos alunos são, em sua maioria, migrantes que procuram nesta

cidade melhores condições de vida. São trabalhadores, empregados e

desempregados, moradores de favelas e vilas, mulheres e homens das mais

variadas idades. Geralmente voltam à escola por terem muita vontade de

aprender a ler e escrever, contudo, mesmo que fatores como: a volta do

trabalho, o trânsito, a falta de alimentação dificultem o acesso aos núcleos de

alfabetização, a permanência é determinada pelo compromisso e força de

vontade. Para superar essas dificuldades os educadores preparam aulas com

conteúdos adequados à realidade das comunidades atendidas

Esse movimento não pode parar! Sem as salas do MOVA mais de

20 mil alunos ficarão desprovidos do direito à educação! Coletivo

organizador Coletivo organizador do ato pró-MOVA/SP - Junho de 200

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ANEXO D –

PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DO MOVA/SP- 2001

INTRODUÇÃO

Ao se propor a reativação do MOVA/SP, cuja experiência foi realizada

no período de 1989 a 1992, faz-se necessário, em primeiro lugar, destacar sua

validade no atual momento histórico que a cidade, o estado e o país estão

vivendo. Nos últimos dez anos ocorreram mudanças importantes que devem

ser consideradas ao se pensar um novo projeto MOVA, exigindo, inclusive, a

necessidade de se definir o que significa hoje formar pessoas jovens e adultas.

Na última década, ocorreram inúmeras e significativas transformações

econômicas, sociais, políticas e culturais, intimamente ligadas ao processo

técnico-científico dando a muitos a ilusão de que estamos vivendo num mundo

sem fronteiras, numa verdadeira aldeia global. Entretanto, estudos econômicos

e sociais tem demonstrado que o acesso às benesses da modernidade fica

restrito aos grandes bancos e às empresas transnacionais, a alguns Estados

hegemônicos e às grandes organizações internacionais. Eles revelam ainda,

que tem se acentuado a desigualdade na distribuição de renda e há um

processo indisfarçável de exclusão social. Nesse quadro, a predominância das

políticas neoliberais não aponta horizontes de muita esperança para a

população cuja maioria está mergulhada nas mais adversas condições de vida,

principalmente nos países ditos periféricos, como o Brasil.

A cidade de São Paulo convive hoje com um processo de

empobrecimento crescente de seus habitantes, com o desemprego que se

torna estrutural, com índices alarmantes de violência, com as sequelas da

corrupção, o desrespeito aos direitos do trabalho, a um salário digno, a saúde,

ao lazer. E, para agravar enfrentam uma situação de escolaridade bastante

deficiente e um alto índice de analfabetismo absoluto e funcional.

No que dizia respeito aos analfabetos, a dívida é grande e é de todos os

segmentos sociais. Segundo os dados do PNAD, de 1995 a população de 15

anos ou mais, no estado de São Paulo passou a ser 1.854.822, o que

representa uma diminuição de 16,56% em relação aos números do estado em

1991. Apesar da diminuição da taxa, houve um aumento absoluto de

analfabetos em São Paulo, e, na capital do Estado, estima-se que existam 400

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mil pessoas considerando-se o analfabetismo absoluto e funcional. Portanto, os

números do analfabetismo continuam alarmantes e exigem uma resposta

incisiva não só do estado, mas também da sociedade civil, de acordo com o

que estabelece o artigo 205 da Constituição Federal de 1988. Cabe ao setor

público estatal fundamentalmente e de forma complementar a sociedade civil,

realizar esforços prá valer os direitos destas pessoas à educação.

Em função dos fatores acima analisados, constatamos a atualidade

coma preocupação dos jovens e adultos e, mais do que isso, a urgência de

pensar estratégias para superar o analfabetismo jovem e adulto no município

de São Paulo. Ao lado das ações do poder municipal do ensino público regular,

será imprescindível o resgate do movimento de alfabetização de jovens e

adultos – MOVA/SP para ampliar o atendimento daqueles “que não tiveram

acesso ou continuidade de estudos do Ensino Fundamental ou Médio da idade

própria” (Artigo 37 da LDB 9394/96) e isso será feito considerando “as

características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho”

(1º do Artigo. 37 de LDB 9394/96).

Aproveitar a experiência dos educadores populares, fortalecerem o

movimento onde atuam e chegar mais próximo da população graças à

capilaridade desses núcleos são algumas considerações que fundamentam o

interesse da atual Administração Municipal pela parceria com os trabalhos

populares de educação existentes em nossa cidade, muitos deles desde a

gestão de Paulo Freire, e outros ainda anteriores aquele momento.

Iniciativas como esta responde ao apelo da V Conferência

Internacional de Educação de Adultos (CONFITEA V), organizada pela

UNESCO e realizada em Hamburgo, em julho de 1997, que em seu artigo 3º

diz o seguinte:

“por educação de adultos entende-se o conjunto de processos de aprendizagens formais e não formais, graças aos quais as pessoas cujo entorno social consideram adultos, desenvolvem suas capacidades, enriquecem seus conhecimentos e melhoram suas competências técnicas ou profissionais ou as reorientam, a fim de atender suas próprias necessidades e as da sociedade. A educação de adultos compreende a educação formal e permanente, a educação não formal, e toda gama de oportunidade de educação informal e ocasional existentes em uma sociedade educativa e multicultural, na qual se reconheçam os enfoques teóricos e os baseados na realidade”.

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2. Justificativa

Entende-se por projeto político-pedagógico um roteiro de ações para

alcançar metas comuns com base numa visão de mundo e numa concepção

educacional. O MOVA/SP baseado nas ideias de Paulo Freire, entende a

educação como um processo através do qual as pessoas tornam-se cada vez

mais plenas e, portanto, mais capazes de agir no mundo de forma crítica,

transformando-o em direção a uma sociedade mais justa, igualitária, solidária e

democrática.

A educação de jovens e adultos no MOVA/SP se caracterizará pelo

compromisso com um ensino de qualidade que, valendo-se das experiências

da educação popular, buscará responder às necessidades de conhecimentos

dos participantes do programa.

O compromisso com a qualidade se revelará, entre outras coisas,

através da garantia da formação inicial e continuada dos/as de jovens e adultos

que estarão trabalhando com a população, conforme os objetivos e princípios

subjacentes ao programa.

3. Princípio políticos pedagógicos subjacentes ao programa

MOVA/SP

O direito à educação deve ser assegurado a todas as pessoas pelo

poder público e, em casos especiais, de comprovada urgência, deve a

sociedade civil apoiar e complementar os esforços para a garantia desse direito

(art. 205 da Constituição Federal de 1988).

O MOVA construirá seu currículo a partir de temas nascidos das

questões vivenciadas pelas comunidades onde se inserem os núcleos. Contará

com educadores/as que partilhem a mesma realidade e têm dela uma visão

mais complexa que a de seus educandos.

- O reconhecimento de que o ser humano está em constante

transformação.

- Busca do aprimoramento das relações democráticas entre

educadores/as e educandos/das e entre os próprios educandos/as.

- O conhecimento é entendido como construção interacionista e

multidirecional, resultante da relação entre o sujeito e a realidade.

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- O respeito à diversidade cultural bem como ao ritmo e níveis de

aprendizagem dos/as educandos/as.

3. Objetivos gerais

Contribuir com o poder público na diminuição do analfabetismo no

município de São Paulo, em consonância com as diretrizes e eixos norteadores

da política educacional de SME/SP, a saber: Qualidade Social da Educação,

Democratização da Gestão e Democratização do acesso e permanência.

- Contribuir para o pleno desenvolvimento da pessoa humana.

- Diminuir o índice de analfabetismo na cidade de São Paulo.

- Desenvolver a cidadania ativa como participação na vida social,

econômica, política e cultural da sociedade.

- Interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos e

privados, atendendo a diferentes interações e situações de comunicação.

5. Objetivos Específicos

- Ampliar e instrumentalizar o trabalho dos grupos populares que já

desenvolvem ou venham desenvolver projetos de Educação de Jovens e

Adultos na cidade.

- Desenvolver e adotar regimes de parceria entre Instituições da

sociedade civil e SME, reguladas por convênios, para o desenvolvimento da

formação objetivada, respeitando-se a autonomia dos parceiros.

- Estimular e intensificar a integração de todos os sujeitos envolvidos

direta ou indiretamente no processo de alfabetização e educação de jovens e

adultos.

- Alfabetizar a partir de uma metodologia dialógica e conscientizadora,

inspirada na pedagogia libertadora.

- Desenvolver uma prática pedagógica através da qual os/as

alfabetizandos/as se apropriem da leitura, escrita, cálculo e Ciências Humanas,

assim como o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade e outras

linguagens.

- Refletir sobre elementos da prática educativa que possibilitem o

desenvolvimento da consciência crítica e auxiliem na formação de uma nova

ética nas relações dos seres humanos entre si e com a natureza.

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- Estimular reflexões sobre questões de gênero e etnia para a superação

de preconceitos e a melhoria das relações familiares e sociais.

- Possibilitar aos educandos/as e educadores/as do MOVA a utilização da

informática como forma de prepará-los e inseri-los nas exigências tecnológicas

do mundo atual.

6. Metodologia –

A formação do educador de jovens e adultos pressupõe que ele se

assuma enquanto sujeito da ação pedagógica. Isso implica agir e refletir sobre

sua prática, decidindo coletivamente sobre a realidade de sua sala de aula e

construindo um trabalho a partir dela, sempre tendo como referência a

concepção de educação que anima esse processo. Assim, o seu procedimento

será o de ação-reflexão e ação na articulação constante da prática e da teoria.

A concepção metodológica do Programa MOVA/SP fundamenta-se nos

seguintes princípios educativos.

- A busca de integridade dos processos formativos, considerando a vida

humana e social como uma totalidade e em movimento: o econômico, o social,

o político, o afetivo, abordado numa perspectiva inter e trans-disciplinar.

- Possibilitar a apropriação do conhecimento universal produzido, na

perspectiva crítica de que esse conhecimento é histórico e que está em

constante construção.

Para isso, o trabalho do MOVA/SP deverá:

- Partir dos conhecimentos já construídos pelos educandos no tocante ao

trabalho, aos valores éticos, às manifestações artísticas e religiosas, às

experiências vividas, e também à escrita e à matemática.

- Resgatar a autoestima dos/as educandos/as, valorizando suas

experiências afetivas e culturais, suas crenças e opiniões, sua modalidade

linguística, criando situações em que sejam estimulados a relatar, com

liberdade, essas experiências e opiniões e garantindo um ambiente de respeito

às diferenças.

- Respeitar o ritmo e os níveis de aprendizagem dos/das educandos/as,

aproveitando as possibilidades decorrentes dessas diferenças e enfatizando a

solidariedade e a cooperação entre os/as e entre estes/as e os/as

monitores/as.

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- Abordar o conhecimento como uma totalidade articulada.

- A partir da visão do ser humano como sujeito histórico, resgatar a

história de vida dos educandos relacionando-as às lutas sociais de seu tempo e

também propiciando momentos de estudo e reflexão sobre a história do país e

das sociedades humanas.

- Estabelecer um processo avaliativo dialógico e continuado, construindo

uma práxis pedagógica com base no movimento permanente de ação-reflexão-

ação sobre o trabalho realizado.

- Os instrumentos metodológicos consoantes com a prática que se quer

buscar no MOVA são os seguintes:

- Avaliação e planejamento

- Observação e registro

- Análise e sistematização das práticas

O desenvolvimento do programa requer a garantia de um processo de

formação permanente dos/as educadores/as de modo a que acompanha a

prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica.

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ANEXO E

QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AOS EDUCADORES DO MOVA/AVIB:

FORMULÁRIO DE PESQUISA -

PARTE I – CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE TRABALHO E DOS

EDUCANDOS.

1. 1. Onde funciona o seu grupo de alfabetização?

( ) Espaço cedido pela Igreja

Qual? ( ) Católica ( ) Evangélica

( ) Espaço cedido por outra Entidade

Qual?

( ) Garagem de alguma casa

( ) Outro espaço

1. 2. Qual a faixa etária dos educandos?

( ) de 18 a 28 anos

( ) de 29 a 39 anos

( ) acima de 40 anos

1. 3. Qual a prevalência de gênero?

( ) a maioria é mulher ( ) a maioria é homem

1. 4. Qual o perfil dos educandos?

( ) sem trabalho

( ) sem trabalho e procurando trabalho

( ) trabalhando informalmente

( ) licenciado do trabalho

( ) aposentado ( ) outra situação

PARTE II – SOBRE A ATUAÇÃO NO MOVA E ATIVIDADES DE FORMAÇÃO

2.1. Como ocorreu a sua aproximação com o MOVA da AVIB?

( ) foi convidado por outro educador

( ) foi convidado por um dos coordenadores

( ) indicado por outra ONG

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Qual?

2.2. Qual o seu grau de pertencimento a AVIB?

Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa

( ) participa das assembleias

( ) participa das atividades formativas

( ) participa das atividades festivas ou culturais

( ) a sua participação se restringe à atividades promovidas pelo MOVA.

( ) tem envolvimento com outros projetos da AVIB

Quais?

2.3. Qual o seu grau de envolvimento com outros grupos do MOVA para além

da AVIB? Observação: pode-se assinalar mais de uma alternativa

( ) tem contato ou intercâmbio com outros educadores do MOVA nas

semanas de alfabetização que ocorrem nas Subprefeituras

( ) participa de reuniões ou atividades do Fórum da Zona Leste

( ) Outras atividades ou parcerias.

Quais?

2.4. Qual a sua avaliação da última Semana de Alfabetização de setembro de

2010?

( ) muito boa

( ) boa

( ) regular

2.5. O que mais lhe chamou a atenção na Semana de Alfabetização?

Comente:

2.6. Por meio de quais canais de comunicação chegam a você as orientações

pedagógicas? Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa

( ) Correspondências da Secretaria Municipal de Educação,

( ) Correspondência da Diretoria Regional de Ensino de Guaianases

( ) Correspondência da Diretoria Regional de Ensino de São Miguel

( ) Da Coordenação do MOVA

( ) Orientações presenciais oferecidas pela Supervisão da DRE

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.2.7. Como são definidos os conteúdos estudados nas reuniões de sextas-

feiras? Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa

( ) Pela Diretoria regional de Ensino

( ) Pelo Fórum do MOVA/ Leste 2,

( ) Pela coordenação do MOVA/AVIB

( ) Pela coordenação do MOVA em conjunto com os educadores.

2.8. Cite 03 pontos fortes e 03 pontos fracos da formação continuada que

ocorre todas às sextas-feiras:

2.9.. Você busca a formação pedagógica em outros meios? Observação: Pode-

se ter mais de uma alternativa

( ) leitura de livros

( ) cursos de capacitação

( ) seminários ou outros eventos

SUGESTÕES PARA APRIMORAMENTO

PARTE III – DADOS PESSOAIS:

3.1. Nome

3.2. Escolaridade:

( ) Ensino Médio

( ) Superior completo

Curso?

Instituição?

( ) Superior incompleto

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Curso?

Instituição?

( ) Pós graduação ou especialização

Curso?

Instituição?

3.3. Exerce outra atividade ligada à questão da educação?

( ) professor (a) do Estado de SP ou da Prefeitura

( ) trabalha em outra Organização Não governamental

( ) tem alguma atividade em comunidade, Igreja, Pastoral, Ministério etc.

3.4. Há quanto tempo é educador (a) do MOVA pela AVIB?

( ) Menos de 02 anos,

( ) de 03 a 04 anos,

( ) acima de 05 anos.