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JAMES VAN PRAAGH Em Busca do Perdão Descobrindo o amor

do Perdão - Martins Fontes · do Perdão Descobrindo o amor col. Em busca do perdão:miolo 7/3/09 12:16 PM Page 3. Introdução ... não poder contar com nenhuma ajuda amorosa, mas

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JAMES VAN PRAAGH

EmBusca

do

PerdãoDescobrindo o amor

col. Em busca do perdão:miolo 7/3/09 12:16 PM Page 3

Introdução

Para quem não me conhece, gostaria de começar contando umpouco da minha história e do meu trabalho, não apenas para meapresentar, mas também para explicar por que achei tão impor-tante escrever este livro sobre o perdão.

Minha mãe era uma irlandesa muito católica. Seu sonho eraque eu me tornasse padre. Nos nove primeiros anos de minhaformação escolar, cursei colégios católicos e cheguei a entrar paraum seminário em Nova York. No entanto, eu tinha muitos ques-tionamentos sobre a fé e a religião que me ensinavam. Desdecriança, nunca entendi o conceito de Deus. Havia uma contradi-ção assustadora entre a imagem de um velho bondoso que nosamava e a ideia de que, se fizéssemos alguma coisa errada, ele noscastigaria, jogando-nos no fogo do inferno.

Deixei Nova York e o seminário, e comecei a trabalhar emLos Angeles, querendo um dia escrever roteiros para a televisão.Tinha tido algumas experiências consideradas estranhas, quandocriança, que estão descritas no meu primeiro livro, Conversandocom os espíritos. Visões, revelações intuitivas. Mas nada que, atéentão, me fizesse pensar que possuía qualquer dom especial.Então, levado por uma amiga, conheci um médium que me disseque, num futuro próximo, eu estaria fazendo a mesma coisa queele: recebendo e transmitindo mensagens do outro lado.

Aquele encontro me deixou intrigado. Comecei a juntar as

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coisas, a ver com outros olhos algumas coincidências que me acon-teciam, as percepções que tinha e, claro, aquelas minhas expe-riências da infância. Tudo isso me fez estudar e praticar, dedica-damente, tentando desen vol ver minha intuição. Logo, estavausando minha sensibilidade aguça da para ajudar amigos e colegasde trabalho a entenderem a si mesmos e os problemas por queestavam passando. Entretanto, aos poucos, sem que eu pudessemais negar, outras habilidades foram se revelando.

Durante as conversas com essas pessoas que vinham me ver,seus entes queridos já falecidos traziam mensagens de consolo eauxílio. Descobri que eu podia ver os espíritos, ouvi-los e captarsuas sensações – dons denominados clarividência, clariaudição eclarissensibilidade.

Um mundo maravilhoso começou a se abrir para mim. Cadavez mais fui compreendendo que nascemos do amor, temos oamor sempre dentro de nós, estamos no mundo para espalhar o amor, para aprender com ele, crescer e reencontrá-lo em suaforma mais plena, na passagem para o outro lado da vida. Foi issoque todos esses anos de contato com o reino espiritual me ensi-naram de mais significativo.

Mas aprendi também que, como somos limitados em nossaforma física, podemos ferir, magoar e prejudicar nossos seme-lhantes, mesmo as pessoas mais próximas e queridas. E, comonos ensinaram a ver o mundo e a relação com os outros por essaótica da condenação e do castigo, carregamos ódios, ressenti-mentos, mágoas e culpas. A culpa, inclusive, foi sempre muitoestimulada por pessoas e religiões como um instrumento dedominação e poder. Tudo isso nos custa muito caro, nos maltra-ta, atrapalha nossa vida e nosso crescimento. Acima de tudo,ocupa nosso espaço interior, bloqueando a expressão do amor, emobiliza uma energia que poderia ser direcionada para gestos

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positivos de entrega, solidariedade e afeto. Por isso, resolvi escre-ver sobre o perdão, que certamente não é um gesto nem um pro-cesso fácil, mas que, uma vez interiorizado, tem um maravilhosoefeito libertador, essencial para nossa felicidade e nosso desen-volvimento espiritual.

Neste livro, vou repetir muitas vezes a forma como passei a vera vida – nossa passagem pelo mundo físico –, nossa relação comDeus e com as pessoas com quem convivemos. Vou dizer a vocêque o mesmo Deus que nos criou para o amor nos concedeutambém um dom fundamental para podermos nos reconciliarcom a vida e com as pessoas: o dom de perdoar. Vou falar aquidaquelas feridas antigas que você parece não ter forças para supe-rar. Das acusações que você se faz e que o torturam, muitas vezesparalisando o seu crescimento. Daquelas pessoas que você quertrazer de volta para o seu convívio, e dos seus entes queridos oumesmo conhecidos, que já partiram, com quem você gostaria deentrar em contato para reparar atos de omissão ou agressãocometidos contra eles quando ainda viviam. Vou falar de fazer aspazes com a sua consciência. De se livrar de culpas. De tornar omundo à sua volta mais hospitaleiro, sem a pressão de julgar nemde ser julgado. Um mundo no qual podemos buscar exercer oamor e encontrar nossa espiritualidade.

Tudo parte de uma nova compreensão. De um processo quepode ser difícil, longo, ter idas e vindas. De um desejo de resga-tar o que é de fato importante, o que é mais caro a você. De abriro seu coração. É por isso que também vou lhe oferecer um ins-trumento importante para curar as suas feridas e iluminar o seuíntimo, ajudando no exercício do perdão: a prática persistente dameditação.

Minha experiência pessoal, somada ao que vi acontecer cominúmeras pessoas, me convenceu de que a meditação pode efeti-

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vamente produzir transformações na vida. A meditação é comoum caminho no qual, distanciando-se de tensões e condicionamen -tos, podemos reencontrar, intacta, essa essência amorosa dentro denós. É uma prática que eleva nossa compreensão e nosso espíritoa um plano em que o perdão surge como um toque da luz.

Pode parecer talvez ingênuo, num cotidiano em que a pressa ea agressividade chegam a ser valorizadas, dizer que a vida reco-meça a cada ato de amor. Você pode sorrir, achar que é mais fácildizer do que fazer. Mas eu o estimulo a experimentar, todos osdias, expressar o amor, mesmo por meio de pequenos gestos.Você perceberá que, aos poucos, começará a sentir uma alegriaespecial, contagiando as pessoas e o ambiente em que vive.

Muitos me procuram para saber se seus parentes, amigos,companheiros e companheiras estão bem do outro lado. Os espí-ritos têm a mesma preocupação quanto a nós: querem nos ajudara ficarmos bem deste lado da vida. Porque é aqui que aprendemos.São as experiências terrenas que desenvolvem nosso espírito. Porisso, neste livro, você lerá mensagens dos espíritos estimulandoseus seres amados a abraçarem o perdão, mesmo nas situaçõesmais dolorosas. Peço a você que acompanhe estas histórias comcarinho e reflexão. São mensagens repletas de esperança de umavida nova que pode existir justamente porque se inicia dentro de você.

Desejo que, com a leitura deste livro e a prática da meditação,você se livre de culpas e de rancores e vá assumindo consigomesmo o amor misericordioso do Deus que nos criou, tornando-se cada vez mais capaz de compreender e perdoar. Minha expe-riência pessoal e o testemunho de muitos me fazem acreditar queisso lhe trará grande paz interior e contribuirá decisivamentepara o seu crescimento, sua felicidade e a construção de ummundo melhor.

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Nossa e scola abençoada

Quando eu era criança, me ensinaram que o demônio estariasempre à espreita, nos tentando. E que podia aparecer, de repente,como castigo decorrente de algum ato ou pensamento mau. Issome aterrorizava. Vivia me perguntando se já teria esgotado todoo meu crédito, quer dizer, se os pecados que cometera, desconta-das as boas ações, já haviam irremediavelmente me condenado àschamas eternas, incluindo aí sofrer tormentos inimagináveis.

Acho que todos nós que tivemos uma educação religiosa,mesmo as mais brandas, introjetamos algo parecido, seja em quegrau for. Bom, mau, vou para o céu, vou para o inferno. O feroz einsidioso medo do castigo – do demônio se apossando de nós e dasfiguras de autoridade nos julgando, condenando e punindo – abreo espaço onde se instala em nosso íntimo a culpa pelo que fizemosde errado.

Em casa ou na escola, a maneira como fomos educados – e,ainda, muitas vezes, como educamos os filhos – também sebaseava nessas noções. Recompensa e castigo. Os bons são pre-miados; os maus, condenados. Radicalizando, por vezes essascaracterísticas são entendidas como inatas: boa ou má índole –ele é mau, ele é bom. E assim dividimos as pessoas entre as que

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devemos imitar e as que devemos rejeitar. Talvez, num mundoassim, algumas pessoas sintam-se mais seguras e achem as coisasmais definidas. Já eu, desde criança, tinha uma forte sensação denão poder contar com nenhuma ajuda amorosa, mas sempre comum julgamento severo.

Li histórias da Bíblia, quando garoto. O Antigo Testamentome intimidava. Não conseguia aceitar que todas as pessoas emSodoma e Gomorra, indiscriminadamente, tivessem sido conde-nadas a morrer calcinadas. Não aceitava nem mesmo que a enor-me maioria fosse tão má, a ponto de não merecer outra chance. Naverdade, mesmo para os irrecuperáveis, fosse qual fosse seu crime,sofrer um castigo tão terrível me parecia cruel demais.

Mas o que mais me assustava e entristecia era o Dilúvio Uni -versal. Eu me perguntava que deus era aquele, capaz de extermi-nar homens e mulheres, crianças e bichos – esses últimos os maisinocentes e com os quais eu mais me identificava –, numa chaci-na planetária. Principal mente, porque a ira do Todo-Poderosofora despertada pelo fato de algumas pessoas terem escolhidooutro(s) deus(es) para adorar. Mas isso não seria um direitodelas? Ser diferentes? Acreditar em coisas diferentes? Ver omundo de maneira diferente?

Sim, já na época me perguntava, até intuitivamente: será quenenhuma dessas pessoas e animais merecia compreensão, quantoa suas escolhas de vida, e clemência, quanto ao que poderíamosconsiderar seus erros... Perdão? E logo de Deus, que devia ser afonte de toda a misericórdia? Que deveria estar em outro plano,distante das paixões e dos desejos de vingança tão humanos?

Eu, uma criança atemorizada com a possibilidade de minhaalma já estar comprometida por pecados imperdoáveis, tambémnão tinha a Deus para recorrer. Como esperar Sua benevolênciae compreensão, se Ele me aterrorizava, se Ele tinha surtos de ira,

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se era um exterminador, se ver a terrível face de Deus era suficien-te para alguém ser aniquilado. Uma face terrível, portanto, nãoum rosto acolhedor, um semblante terno e amoroso. Não era issoo que nos ensinavam?

Gostaríamos de ter sido educados por pessoas que, com de -licadeza e afeto, avaliassem conosco cada experiência, cada atopra ticado ou atitude assumida – pelo menos as mais importan-tes –, ajudando-nos a pensar o que aprendemos com cada uma.Hoje, com mais vivência, não levamos tão a sério nossos pecadosde infância. Entretanto, com uma formação que penetrou pro-fundamente em nossa consciência, que nos ensinou a ver omundo repartido entre o certo e o errado, o mais comum é man-termos o que o medo e a autorrecriminação nos inculcaram. Damesma forma como nos sentíamos e ainda nos sentimos julgadose condenados, também julgamos e condenamos. Da mesma formacomo nos deixamos atormentar por nossos arrependimentos eculpas, nos submetemos a mágoas e ressentimentos. O medodo demônio e o exemplo do Deus inclemente do Antigo Testa -mento podem ser coisas de criança, mas nunca desaparecem de tododo adulto.

Perdoar é difícil – a nós e aos outros. Sei que você vai me dizerisso. Sei disso, pela minha própria vida. É muito, muito difícil. Eé tão difícil assim porque nossa educação nos ensinou a julgar ea condenar, não a compreender e perdoar. Não a nos colocarmosna posição do outro, buscando entender seus motivos, mas a ten-tar forçá-lo para dentro de nossa forma de certo e errado, a julgá-lopelos nossos próprios critérios, projetando neles nossos senti-mentos e intenções.

O contato de todos esses anos com o reino espiritual me ensi-nou – e talvez possa ensinar a você também – que a vida terrenanão é um campo de testes, algo que atravessamos apenas para no

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final sermos salvos ou condenados. Todo ato que praticamos éum ato humano. Podemos aprender com tudo o que fazemos poraqui – e esse aprendizado é valioso por si só.

Então, tenho uma carinhosa sugestão para você. E é o que ini-cia este livro sobre o perdão. Vamos tentar pensar de maneiradiferente sobre a vida terrena, o que estamos fazendo aqui, deonde viemos, para onde vamos depois. Em vez de crime e casti-go, compreensão, perdão, amor.

Pense na Terra como nossa escola. Uma escola abençoadaonde nosso espírito ganha um corpo, em meio a um mundo demuita beleza e grandes contradições. Um milagre, sem dúvida. A vida é um milagre. Deus infinitamente generoso nos concede,aqui, uma oportunidade maravilhosa de nos conhecermos, decrescermos no amor por nós mesmos, pela Terra e por nossossemelhantes. De redescobrirmos a nossa essência, o que temos de fundamental.

Estamos aqui para aprender, para ter experiências que nos aju-darão a elevar nosso espírito e atingir, um dia, a plenitude. Todostemos falhas e imperfeições. Se eu ou você fôssemos perfeitos, nãoestaríamos aqui, mas em outro plano do Universo. Portanto, todostemos o que aprender aqui na Terra e é para isso que viemos aomundo.

Há outra coisa que gostaria que você guardasse em seu coração.A Terra e a oportunidade de desfrutarmos de uma materialidadefísica foram criadas por puro amor. Amor, sim! Você é amado! Amaior prova disso é que Aquele que tanto nos ama nos deu estecaminho para aprender, um caminho no qual elevar-se significadescobrir e assimilar o que há de melhor no mundo e nos outros.E esse Ser Supremo nos concedeu várias oportunidades de retor-nar à Terra e de viver diferentes existências – de experimentarsexos, raças, nacionalidades e credos diferentes –, para podermos

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aprender e nos desenvolver progressivamente. É bem diferentede acreditar que Deus nos tenha dado uma única chance direcio-nada para uma meta final – céu ou inferno – e que cada ato nossoseja sujeito a julgamento, com consequente prêmio ou punição.

Não consigo e nem quero mais conduzir minha vida como seestivéssemos aqui na Terra para nos julgarmos mutuamente, nempara trocarmos acusações amarguradas. Muito menos para con-denarmos ou sermos condenados. E prefiro acreditar que cadauma de nossas vidas é uma oportunidade de aprendizagem ecrescimento do que achar que temos apenas uma vida – umachance – voltada para um resultado final. A existência física nãoé fácil. Há sofrimento e dor, há desapontamentos e perdas. Mas,hoje, o que acredito e sei é que Deus nos ama – incondicional-mente! Nos ama, apesar de nossos erros, e mesmo com nossoserros, que tanto podem nos ensinar. Somos todos manifestaçõesdesse amor. É esse amor que precisamos reencontrar, de formaplena, em nosso íntimo e no Universo. E foi para fortalecer emnós este amor, para podermos reconquistá-lo e torná-lo progres-sivamente a tônica de nossa existência, que Deus nos concedeu odom de perdoar.

Um mundo onde podemos perdoar e ser perdoados é genero-so, não esconde demônios sorrateiros, nem causa feridas impos-síveis de serem curadas. Da mesma forma que o medo instalatanto a culpa como o ressentimento, que nos privam de oportu-nidades de vida e nos afastam de nossos semelhantes, o dom deperdoar desobstrui canais, para que possamos reencontrar o amorincondicional que nos deu origem e que nos abriga. E essa é agrande lição, afinal, o toque da luz, o início, o fim e o transcor-rer de tudo.

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Perdoar e ser perdoado

Foi numa tarde de primavera que Anne me procurou. Assimque entrou em minha casa, senti uma forte vibração que a acom-panhava necessitando manifestar-se. Também o rosto de Annetrazia marcas de sofrimento e a sua voz abafada me mostroualguém que procurava escapar de suas lembranças. Enfim, tudonela me comovia bastante.

Fiz minha oração de costume e me concentrei naquela atmos-fera ao redor de Anne. Não precisamos esperar muito.

– Há alguém aqui... é um homem... ele está dizendo que vemtentando se comunicar com você há muito tempo.

– Como ele é? – perguntou Anne. – Um homem alto, bonito. Ele diz que seu nome é... Robert...

Bob? – É o meu marido – Anne murmurou, hesitante. – Ele está dizendo que sente muito por ter feito você sofrer. – Ele sente muito? Mas a culpa foi toda minha. Eu... estava

tendo um caso com um colega de trabalho. Estava muito confu-sa. Contei tudo a ele. Pouco tempo depois, Bob teve um enfartee morreu. Não sei se conseguiríamos consertar as coisas entrenós, mas...

Anne não conseguiu mais falar. O choro sufocou a sua voz.Senti que ela precisava se tranquilizar, e nos minutos seguintesmentalizei uma luz acima de sua testa, começando a envolvê-la,banhando-a e consolando-a em sua dor. Pedi a ela que visuali-zasse essa luz e que respirasse lenta e profundamente. Só depois elapôde prosseguir.

– Bob está dizendo que não foi um bom marido. Diz que dei-xou de lhe dar atenção e que o casamento de vocês, de fato, nãoestava indo nada bem.

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– Não, não estava... Estava horrível! Houve momentos em queeu me sentia esmagada... Era quase como se ele... Não, não con-sigo dizer isso!

– Mas Bob sabe... que houve momentos em que você sentiaque era ele que a estava empurrando para outro homem... E eleacha que fez isso, sim, de certa maneira. Não de propósito, nãopor ter deixado de amar você... É isso que ele está dizendo. Quecontinua amando você!

– Ele... me perdoa? – Ele já a perdoou há muito tempo. Mas está precisando do

seu perdão também. Pelo que fez você passar. Ele reconheceque... que poderia ter tentado reconquistar você, mas que haviadesistido... de tudo.

Anne me olhava, buscando pôr em ordem suas lembranças eseus sentimentos.

– No íntimo, ele se sentia muito infeliz, Anne – tentei expli-car. – E não sabia como mudar. Você não tem culpa por ele termorrido.

– Mas eu não poderia tê-lo ajudado? – Bob pede para dizer que não... não muito... só ele poderia. E

é o que está fazendo agora. – Eu só queria saber se ele está bem. – Bob está rindo. Diz que está muito bem, sim. E que você

também vai ficar bem! Deixei que, através de mim, os dois trocassem mensagens sem

palavras – apenas sensações, bênçãos silenciosas, ondas de amorque começaram a fluir entre ambos. O rosto de Anne se abriu,sua voz ganhou um tom manso e agradável. E toda a dor queela carregava pareceu dissipar-se como vapor no ar. No fim,Anne sussurrou:

– Eu também perdoo você, Bob.

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Logo, Bob partiu, e Anne e eu fizemos uma oração juntos,agradecendo por aquele encontro.

Chega uma hora em que nosso coração quer se libertar. Ele jáestá pronto para isso, e nós também estamos prontos para reco-nhecer nossas próprias faltas, e não apenas as dos outros. Bastaum pouco de compreensão sobre o que nos feriu, ou sobre oponto de vista daquele que nos feriu, para começarmos a deixara dor ir embora. Às vezes, precisamos somente de uma pequenaajuda para retomar a via do amor. Para perdoar e pedir para serperdoado.

A herança

Cris era uma moça bonita, de aproximadamente 35 anos, queencontrei num dos workshops a bordo de um navio em cruzeiropelo Caribe. Ela se vestia de modo sofisticado mas discreto, etinha um jeito de falar culto, educado. Já havia reparado nelaantes, fazendo os exercícios de maneira compenetrada e me obser -vando com atenção enquanto eu falava, principalmente quandotransmitia mensagens do outro lado aos presentes no auditório.Tive a nítida sensação de que ela aguardava alguma coisa ansio-samente. Isso se confirmou quando, numa tarde em que o naviojogava um pouco mais do que de costume, uma senhora de cabelosbem-arrumados, expressão severa, surgiu diante de mim, cami-nhando pelo espaço entre as fileiras de cadeiras, até postar-se aolado de Cris.

– Está aqui presente uma senhora que se chama Clara, queveio conversar com a filha dela... Cris.

Falei olhando para a moça, que se levantou, mostrando emoção. – Sou eu! – apresentou-se Cris.

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– Clara está repetindo uma frase... “Diga a Cris que procure oPhill!” Isso faz sentido para você?

A moça assentiu com a cabeça... – Phill é meu irmão e a situação entre nós... está me fazendo

sofrer muito. Cris mostrava-se nitidamente embaraçada de estar falando de

sua vida privada em público. Assegurei-lhe que não entraríamosem pormenores constrangedores.

– Dissemos coisas terríveis um ao outro. Joguei uma dúzia deadvogados em cima do Phill... ele fez a mesma coisa. Tudo porcausa da herança.

– A herança da sua mãe. – Isso mesmo – assentiu Cris. – Clara está me dizendo que não deixou seus bens para os

filhos para que eles perdessem um ao outro. Essa situação aentristece muito.

– Eu sei! – exclamou Cris. – Eu também estou muito triste. – Clara está repetindo a frase. Ela quer que você procure seu

irmão. – Mas não será tarde demais? Estamos muito magoados.

Nunca poderia imaginar... nós éramos tão amigos... – Clara está dizendo que não vai permitir que o dinheiro faça

vocês perderem a noção do que é mais importante... do que é defato importante... Parece que, em vida, sempre deu valor demaisa isso e que talvez tenha transmitido a vocês esse apego a coisasmateriais... Mas ela vê tudo agora de uma maneira diferente.Clara está insistindo: “Não é tarde demais, Cris... Vá falar com oPhill! Por favor!”

– Ele não quer mais falar comigo. E eu também não sei quelhe dizer depois de tudo...

– Diga que o ama! – eu cortei.

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– Mas... – É o que sua mãe está me mandando transmitir a você. Não

fale de dinheiro com ele... Diga que o ama! E peça perdão portudo. É o que ele tem de fazer também!

Apesar de seu jeito contido, Cris estava bastante emocionada.Ainda lutava contra o orgulho, e pude imaginar, intuitivamente,quantas discussões e desentendimentos não haviam ocorridoentre ela e o irmão, para separá-los.

– Não depende apenas de mim! – Cris lamentou. – Clara está dizendo... que neste exato momento está colocan-

do no coração de Phill o mesmo desejo de acertar as coisas. Elavai cuidar para que ele seja mais receptivo. Clara sente que eleestá sofrendo tanto quanto você. Sua mãe está repetindo: “Falecom o Phill! Fale com ele, Cris!”

Cris não disse mais nada, apenas assentiu com a cabeça. Naquelemomento, senti que o pedido emocionado da mãe começou a ope-rar uma transformação no coração de Cris. Tempos depois, ela meescreveu muito grata e feliz por ter se reconciliado com o irmão.

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