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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA O enfoque do Direito Penal Econômico na atualidade sob o olhar do Supremo Tribunal Federal Por: Nynna Roberta Tussini Ferreira Orientador Prof. Jean Alves Rio de Janeiro 2014 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O enfoque do Direito Penal Econômico na atualidade sob o

olhar do Supremo Tribunal Federal

Por: Nynna Roberta Tussini Ferreira

Orientador

Prof. Jean Alves

Rio de Janeiro

2014

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O enfoque do Direito Penal Econômico na atualidade sob o

olhar do Supremo Tribunal Federal

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito e Processo Penal

Por: Nynna Roberta Tussini Ferreira

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, que proporcionam

minha continuidade na vida acadêmica.

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DEDICATÓRIA

Dedicado aos meus pais.

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RESUMO

O presente trabalho fará o percurso até os crimes econômicos.

Com uma breve exposição histórica, apontaremos os meios e as

circunstâncias dos quais adveio a ideia inicial de direito penal econômico.

Por ser um trabalho que tem por enfoque os crimes econômicos,

mencionaremos os princípios atinentes a este tema; traremos a noção de bens

jurídico-penais; e faremos considerações sobre o CADE.

O segundo capítulo tem por tema principal a política criminal,

atualmente tão discutida. Aqui trabalharemos as bases da criminologia, a

diferenciação de crime organizado e organização criminosa, trazendo ainda o

assunto mensalão.

Finalmente, o último capítulo é dedicado a esmiuçar os principais crimes

do direito penal econômico. É o ponto crucial do trabalho, em que apontaremos

as leis, fazendo considerações sobre cada crime, assim como jurisprudências,

demonstrando como o STF vem atuando nesses casos.

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METODOLOGIA

Para obtenção do material necessário à presente, usou-se de pesquisas

à livros e artigos virtuais.

Como trata-se de trabalho com foco na atuação do Supremo Tribunal

Federal, fez-se mister ainda, a pesquisa à jurisprudência, assim como

apontamentos quanto a esta, ao final da presente.

Reforça-se, entretanto, que visitas às bibliotecas da Pontifícia

Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO), e à Universidade Veiga de

Almeida (UVA), foram necessárias para que se recolhesse todo o aparato para

leitura e conclusões.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I - Ordem econômica 11

CAPÍTULO II - Política criminal 26

CAPÍTULO III – Estudo jurisprudencial do Direito Penal Econômico 46

CONCLUSÃO 95

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 97

ÍNDICE 100

FOLHA DE AVALIAÇÃO 63

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa a buscar um melhor entendimento acerca do

Direito Penal Econômico, discutindo-se alguns aspectos que o norteiam, assim

como a tutela dos delitos econômicos dentro da ordem econômica, e a atuação

do Supremo Tribunal Federal diante dos crimes mais comuns.

Direito Penal Econômico é o ramo do Direito Penal que cuida das

infrações contra a ordem econômica, que lesam bens jurídicos penais.

A base do crime econômico está na busca do enriquecimento indevido,

através dos crimes econômicos. Há quem correlacione tais práticas com o

crime organizado, já que encontra amparo em diversas formas de proliferação

e manutenção desses crimes, que contam com enorme logística. Isto porque,

os crimes de ordem econômica necessitam de uma reunião de agentes

engajados no fim de lesar a economia.

O bem jurídico tutelado é a economia; sendo, de um modo mais

abrangente, a segurança e a regularidade da política econômica do Estado.

Algumas características são bem peculiares aos crimes econômicos, e

de certa forma até os diferenciam dos demais crimes, como: modos de

infiltração de agentes com o fim de corrupção; adoção do modo empresarial;

intervenção em atividades econômicas de terceiros, visando obter alguma

vantagem, que traga rentabilidade; alcançar a confiança no meio, de modo que

possa interferir nos processos; e a transnacionalidade das células criminosas.

Assim, necessário que se tenha uma política preventiva e punitiva, que

de fato impeça e puna essas trangressões.

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Sob o prisma da política criminal, a criminalização de novas práticas,

em especial, das que surgem envolvendo atividades econômicas, apresenta-se

cada vez mais complexa e relativa, já que a criminalização não

necessariamente leva à punição do ato.

No primeiro capítulo abordaremos a ordem econômica em si, passando

pelos princípios que a norteiam, falando sobre os bens jurídico-penais, e

abordando brevemente questões sobre o CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica).

O segundo capítulo terá como foco a política criminal, que, como citado

acima, busca criminalizar, mas nem sempre encontra os meios eficazes de

punição efetiva. Incluímos neste capítulo algumas considerações sobre

criminologia, e ainda o tão atual caso do “mensalão”.

O capítulo final visa ao estudo jurisprudencial de alguns

posicionamentos do Supremo Tribunal Federal. Deste modo, tocaremos nos

pontos dos “crimes de colarinho branco” mais comuns. Serão tratados os

crimes contra a ordem econômica, contra as relações de consumo, e contra as

finanças públicas.

O “crime do colarinho branco” é um termo trazido por Sutherland, onde

quem comete o crime é alguém de notória respeitabilidade e conhecimento em

um certo meio negocial. Neste caso há um ilícito que envolve três áreas: penal,

cível, e administrativa.

Bem se sabe que muitas das vezes a impunidade das condutas

abrangidas, prevalece, o que, sem dúvida, serve como fomentador dessas

práticas criminosas.

Verifica-se ainda uma nova vertente, definindo os “White collar

criminals”, cuja elaboração vem de Klaus Tiedemann:

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“A principal característica do crime econômico deve

procurar-se menos na personalidade do delinqüente e na

sua presença às classes sócio-econômicas superiores, do

que na específica forma de sua atuação, e não no objeto

de seus atos.” (TIEDEMANN, Klaus. Aspects

criminologiques de La délinquance d’affaires – études

relatives à La recherche criminologique. Vol. Xv. Conseil

de l’Europe. 1997. p.10 apud SANTOS, Cláudia Cruz. O

crime de colarinho branco in Temas de Direito Penal

Econômico. 1ª Ed. RT. 2001. P.197.)

Buscando melhor entendimento sobre o tema estudado, e qual o

posicionamento do Supremo Tribunal Federal, é que se fez o presente.

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CAPÍTULO I

ORDEM ECONÔMICA

Devemos iniciar o estudo, trazendo à pauta os fundamentos da ordem

econômica, que encontram-se esculpidos no artigo 170, da nossa Constituição

da República, conforme:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do

trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim

assegurar a todos existência digna, conforme os ditames

da justiça social, observados os seguintes princípios:

I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante

tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental

dos produtos e serviços e de seus processos de

elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

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IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno

porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham

sua sede e administração no País.

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício

de qualquer atividade econômica, independentemente de

autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos

em lei.”

A noção de valorização do trabalho humano deve servir para orientar a

intervenção do estado, na economia, buscando a correta aplicação dos valores

sociais do trabalho.

Enquanto que a livre iniciativa diz respeito ao mercado capitalista.

Não vamos nos aprofundar nesta seara, pois tais princípios serão

vistos adiante.

1.1 – Noções históricas do Direito Penal Econômico

O direito comercial começou a surgir na Idade Média, tendo sido esta

fase, conforme ensinamento de Rubens Requião, que:

“...começa a cristalizar o direito comercial, deduzido das

regras corporativas e, sobretudo, dos assentos

jurisprudenciais das decisões dos cônsules, que atuavam

como juízes designados pela corporação para, em seu

âmbito, dirimirem as disputas entre comerciantes.”

(REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 8 ed.

São Paulo, 1977. V. I, p. 8-9)

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O desenvolvimento do capitalismo, representado pela Revolução

Industrial, caracterizou-se pela associação do capital e trabalho, voltados à

produção de mercadorias em grandes escalas. É neste momento que surge

um novo agente, o empresário administrador de indústrias, que passa a ter o

encargo de cuidar da gestão dos atos de comércio. A partir daí que o direito

comercial se renova, sendo conceituado como aquele “destinado a estabelecer

a disciplina jurídico-privada das empresas” (REQUIÃO, Rubens. Op. Cit.)

É também a partir deste momento histórico, que surge um novo tipo de

delinqüência, que apresenta características sociológicas bem próprias e

distintas, vindo a ser chamada de criminalidade do colarinho branco, cujas

classes sociais mais altas são afetas.

Em meados dos anos 80, quando a globalização estava em

efervescência, é que se inicia o surgimento de uma onda criminalizante que

visa a expandir a tutela penal para proteger os sistemas de produção, a

distribuição e comercialização de bens.

Tem-se aí a formação de um direito econômico, que trata-se:

“...disciplina normativa da ação estatal sobre as estruturas

do sistema econômico, criando-se as condições para o

aparecimento de um correlato direito penal econômico

para reforçar a tutela do funcionamento do sistema.”

(TORON, Alberto Zaccarias. Crimes de colarinho branco:

os novos perseguidos? Revista Brasileira de Ciências

Criminais. São Paulo: RT, 1999, n 28, p. 75)

Muitos dos pontos de atrito dizem respeito à estruturação de um novo

modelo de direito penal. O pontapé inicial da análise aponta que se trata, no

direito penal econômico, de uma interferência penal em um campo supra-

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individual, difuso, em que não se pode encontrar vítimas reconhecíveis, nem

admitir a ocorrência do dano real ao bem jurídico tutelado.

Defende-se, entre tantas posições, que deve-se limitar a aplicação

penal àquele direito penal nuclear, e os novos campos devem ser tutelados por

outras áreas do direito. Não obstante, existe uma ponderação irrefutável: o

processo de construção do direito penal econômico se mostra como uma tutela

do direito penal dos poderosos.

Mais recentemente se tem tido como atuação penal no ramo dos

interesses difusos, cabendo algumas considerações quanto à compreensão do

que se busca. Ou seja, falando-se em sentido amplo, ele tutelaria, na

concepção de Martinez-Buján Pérez, do conjunto de normas jurídico-penais

que protegem a ordem econômica, entendida esta como a regulação jurídica

da produção, distribuição e consumo de bens e serviços.

Em sentido estrito, estaria limitado a ser entendido como o conjunto de

normas jurídico-penais que protegem a ordem econômica, esta entendida

como sendo a regulação jurídica do intervencionismo estatal na economia.

Seja acautelando os desprovidos de riquezas financeiras, vítimas da

seletividade que os coloca no chamado “estado de vulnerabilidade ao poder

punitivo”, conforme afirmam Batista e Zaffaroni, dependentes de um

estereótipo criminal; ou os poderosos que sonegam impostos, lucram com

informações privilegiadas, ou se locupletam com verbas públicas, é a prisão

uma sanção que se reputa como única forma de punição capaz de gerar um

sentimento de justiça em toda a sociedade.

1.2 – Princípios em que se assenta a atividade econômica

Neste ponto, buscamos entender, de um modo geral, como funcionam

os principais pilares da atividade econômica. Ressaltando-se que não nos

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aprofundaremos, posto tal tema servir tão somente de complemento para a

presente pesquisa.

A ordem econômica será fundada na valorização do trabalho humano

e na livre iniciativa, e terá por fim assegurar a todos existência digna, conforme

os ditames da justiça social.

Com relação à chamada “existência digna”, tem-se o “mínimo

existencial”, que é um direito com duplo viés: ora aparece como direito

subjetivo, ora como norma objetiva; é capaz de compreender os direitos

fundamentais originários e os sociais, na sua forma mais essencial.

Há quem mencione ainda a reserva do possível. No entanto, sequer o

abordaremos, pois não se trata de um princípio de direito, mas sim de um

conceito heurístico aplicável aos direitos sociais.

1.2.1 – Legalidade

Conforme citado no início deste capítulo, o artigo 170 da nossa Carta

Magna nos apresenta os princípios basilares da atividade econômica nacional.

Contudo, iniciaremos tratando do princípio da legalidade.

Amplamente aceito pelas comunidades organizadas em Estado

Democrático de Direito, o princípio da legalidade, em nosso sistema pátrio,

encontra-se previsto no artigo 5º, incisos II e XXXIX, da Constituição da

República, e no artigo 1º do Código Penal.

Sua clássica concepção é a de que ninguém será obrigado a fazer ou

deixar de fazer algo senão em virtude de lei, e de que não há crime nem pena

sem prévia lei que os estabeleça. Representa, assim, em prerrogativa básica

de limite à intervenção estatal no Estado Democrático de Direito.

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Atualmente, tal princípio implica uma regra orientadora do nosso

Estado, visando proteger e respeitar os direitos e garantias individuais.

1.2.2 – Intervenção mínima e insignificância

Também conhecido como ultima ratio, cuida dos bens que merecem

atenção especial do direito penal, assim como visa a descriminalização. Assim,

tanto há os bens selecionados para permanecer sob a guarda do direito penal,

como sob o fundamento deste mesmo princípio, que o legislador deixa de dar

a atenção (leia-se punição) a certos bens que outrora eram de maior

relevância, retirando-os do nosso ordenamento.

Há que se mencionar, neste ponto, o princípio da insignificância, eis

que derivado do princípio da intervenção mínima.

O legislador deve ter em mente apenas as condutas realmente lesivas

que a conduta incriminadora pode prever. A insignificância (ou bagatela) surge

atuando como forma de interpretação restritiva do tipo penal, com o significado

sistemático de política criminal da regra nullun crimen sine lege.

Fundamenta-se também na idéia de proporcionalidade da pena em

relação à conduta infracional (tem-se aqui mais um princípio, o da

proporcionalidade). Assim, em se tratando de baixíssima lesividade ao bem

jurídico tutelado, ainda que se trate de uma pena mínima aplicada, esta

encontra-se desproporcional ao significado social do fato em si.

1.2.3 – Lesividade

Preceitua Nilo Batista, que tal princípio possui quatro funções

(proibições) principais, a saber: proibir a incriminação de uma atitude interna;

proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio

agente; proibir a incriminação de simples estados ou condições existenciais;

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proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem

jurídico.

Desta forma, nosso sistema jurídico deve estar atento à premissa de

que a privação de liberdade e a restrição de direitos de um indivíduo somente

podem ser justificados quando estritamente necessários, seja para a proteção

da sociedade, seja para a proteção de outros bens.

Observe-se que este princípio está intimamente ligado aos princípios

anteriormente citados, o da intervenção mínima e o da insignificância.

1.2.4 – Adequação social

Concebido por Hans Welzel, possui dupla função: restringir a

abrangência do tipo penal, ao mesmo tempo em que orientar o legislador sobre

que condutas devem ser coibidas, repensando em novos tipos penais e nos

que já podem ser retirados da órbita penal incriminadora.

Assim, serve como norte ao legislador. Da mesma forma que o

princípio da intervenção mínima, deve orientá-lo na seleção de condutas que

merecem ser proibidas ou impostas, possibilitando a revogação de outros tipos

penais já ultrapassados.

1.2.5 – Liberalismo econômico

Defende a total liberdade do indivíduo na escolha e orientação de sua

atividade econômica, independentemente da ação de grupos sociais ou do

Estado.

Esta liberdade traz em seu bojo a garantia da propriedade privada, o

direito de investir seu capital no ramo que considerar mais favorável, e fabricar

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e distribuir os bens produzidos em sua empresa, da forma que mais achar

conveniente à aferição de lucros.

1.3 – Bens jurídico-penais

Ao passo em que nossa legislação preconiza que a intervenção penal

não pode prescindir a lei, devem ser afastadas algumas teses positivistas que

sequer deixam claramente estabelecidas a preexistência do bem jurídico.

O modelo de infração como ofensa a bens jurídicos não se limita

unicamente ao âmbito político, ou ao âmbito criminológico. Consiste na

exigência material de que o ilícito atinja também a seara constitucional. Ou

seja, para que fique estabelecida a intervenção penal sobre determinado bem,

este deve estar, em primeiro lugar, previsto no âmbito constitucional.

A função do conceito de bem jurídico, no que diz respeito ao âmbito

constitucional, é de limitar o poder-dever de punir do Estado, buscar a correta

correspondência de um valor constitucional fundamental.

Zaffaroni cita a necessidade de se distinguir o bem jurídico tutelado, e

o bem jurídico lesado, no ponto em que a lei penal serve apenas para

descrever um comportamento que lesiona ou expõe a perigo de lesão

determinados bens.

Roxin defende a tese de que um “conceito de bem jurídico vinculante

político- criminal só pode derivar dos princípios cometidos e modelados na Lei

Fundamental.” (ROXIN, Klaus. Derecho Penal- parte general- teoria jurídica

Del delito. V. I. T. II. Barcelona: Editorial Bosh, 2005, p. 266 e seguintes)

Para Jakobs “as normas são a estrutura da sociedade, ou, dito de

outro modo, constituem-se na regulamentação do conteúdo daquelas relações

entre pessoas que podem ser esperadas, não se contando com o contrário”,

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ou seja, que as pessoas possam agir de um outro modo. Assim, “as normas

são um assunto social e sua estabilização é a estabilização da sociedade.”

Seguindo esta linha de pensamento, este autor sustenta que o delito é

a desautorização da norma, é a falta de lealdade ao ordenamento jurídico.

Conclui ele que “o fato e a pena, por conseguinte, se encontram no mesmo

plano: o fato é a negação da estrutura da sociedade, a pena a marginalização

dessa negação, ou seja, a confirmação de sua estrutura.” (JAKOBS, Gunter.

?Qué protege El derecho penal: bienes jurídicos o La vigência de La norma? 1ª

reimpressão. Mendoza: Ediciones Jurídicas Cuyo, 2002, p. 55 e seguintes)

Hassemer afirma que:

“...um direito penal nuclear circunscrito aos bens jurídicos

referentes ao ser humano e que coloca sob punição

apenas aqueles bens jurídicos da coletividade, que

podem ser concebidos precisamente e que por detrás

deles possam ser ainda percebidos interesses pessoais

(como no caso da periclitação do trânsito urbano, a busca

judicial da verdade ou no caso de posse de objetos

perigosos a comunidade) possuem outro tipo de pena do

que um direito penal que se apóia na proteção da

capacidade funcional dos órgãos de subvenção ou do

fluxo de capital ou que até mesmo permita a imputação

coletiva da maioria das pessoas, eventualmente das

direções.” (HASSEMER, Wilfrid. Direito penal libertário.

Trad. R. Greve. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 95)

As penas administrativas encontram-se limitadas a um “mal jurídico

que a Administração inflige a um administrado responsável por uma conduta

repreensível antecedente”, devem ser estas sanções consideradas como

penas sim, mas apenas em sentido técnico, pois não possuem as mesmas

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funções que o direito penal atribui à outras punições. (HASSEMER, Wilfrid. Op.

Cit.)

1.4 – CADE

Passamos agora a tecer breves considerações a respeito do Conselho

Administrativo de Defesa Econômica, conhecido como CADE.

Trata-se autarquia federal, vinculada ao Ministério da Justiça.

A Lei 4.137/62, em seu artigo 8º criou o Conselho Administrativo de

Defesa Econômica - CADE, com sede no Distrito Federal e jurisdição em todo

o território nacional. Suas atribuições foram modificadas pelo artigo 14, da Lei

8.158/91, que o classificou como "órgão judicante" da estrutura do Ministério

da Justiça. Atualmente, suas atribuições estão albergadas na Lei 8.884/94.

A Lei 12.529/2011 revogou dispositivos da Lei 8.884/94, e tratou de

regular sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem

econômica. Conforme nos informa o site da instituição:

“O CADE tem como missão zelar pela livre concorrência

no mercado, sendo a entidade responsável, no âmbito do

Poder Executivo, não só por investigar e decidir, em

última instância, sobre a matéria concorrencial, como

também fomentar e disseminar a cultura da livre

concorrência. Esta entidade exerce três funções:

§ Preventiva

Analisar e posteriormente decidir sobre as fusões,

aquisições de controle, incorporações e outros atos de

concentração econômica entre grandes empresas que

possam colocar em risco a livre concorrência.

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§ Repressiva

Investigar, em todo o território nacional, e posteriormente

julgar cartéis e outras condutas nocivas à livre

concorrência.

§ Educacional ou pedagógica

Instruir o público em geral sobre as diversas condutas

que possam prejudicar a livre concorrência; incentivar e

estimular estudos e pesquisas acadêmicas sobre o tema,

firmando parcerias com universidades, institutos de

pesquisa, associações e órgãos do governo; realizar ou

apoiar cursos, palestras, seminários e eventos

relacionados ao assunto; editar publicações, como a

Revista de Direito da Concorrência e cartilhas.”

(http://www.cade.gov.br/Default.aspx?1313151be120e079

cf. Visitado em 10/03/2014)

A Lei 12.529/2011 possui apenas um dispositivo que nos apresenta o

conceito de “infração contra a ordem econômica”:

“Art. 36. Constituem infração da ordem econômica,

independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma

manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir

os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:

I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre

concorrência ou a livre iniciativa;

II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;

III - aumentar arbitrariamente os lucros; e

IV - exercer de forma abusiva posição dominante.

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§ 1o A conquista de mercado resultante de processo

natural fundado na maior eficiência de agente econômico

em relação a seus competidores não caracteriza o ilícito

previsto no inciso II do caput deste artigo.

§ 2o Presume-se posição dominante sempre que uma

empresa ou grupo de empresas for capaz de alterar

unilateral ou coordenadamente as condições de mercado

ou quando controlar 20% (vinte por cento) ou mais do

mercado relevante, podendo este percentual ser alterado

pelo Cade para setores específicos da economia.

§ 3o As seguintes condutas, além de outras, na medida

em que configurem hipótese prevista no caput deste

artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem

econômica:

I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com

concorrente, sob qualquer forma:

a) os preços de bens ou serviços ofertados

individualmente;

b) a produção ou a comercialização de uma quantidade

restrita ou limitada de bens ou a prestação de um número,

volume ou frequência restrita ou limitada de serviços;

c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual

ou potencial de bens ou serviços, mediante, dentre

outros, a distribuição de clientes, fornecedores, regiões

ou períodos;

d) preços, condições, vantagens ou abstenção em

licitação pública;

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II - promover, obter ou influenciar a adoção de conduta

comercial uniforme ou concertada entre concorrentes;

III - limitar ou impedir o acesso de novas empresas ao

mercado;

IV - criar dificuldades à constituição, ao funcionamento ou

ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de

fornecedor, adquirente ou financiador de bens ou

serviços;

V - impedir o acesso de concorrente às fontes de insumo,

matérias-primas, equipamentos ou tecnologia, bem como

aos canais de distribuição;

VI - exigir ou conceder exclusividade para divulgação de

publicidade nos meios de comunicação de massa;

VII - utilizar meios enganosos para provocar a oscilação

de preços de terceiros;

VIII - regular mercados de bens ou serviços,

estabelecendo acordos para limitar ou controlar a

pesquisa e o desenvolvimento tecnológico, a produção de

bens ou prestação de serviços, ou para dificultar

investimentos destinados à produção de bens ou serviços

ou à sua distribuição;

IX - impor, no comércio de bens ou serviços, a

distribuidores, varejistas e representantes preços de

revenda, descontos, condições de pagamento,

quantidades mínimas ou máximas, margem de lucro ou

quaisquer outras condições de comercialização relativos a

negócios destes com terceiros;

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X - discriminar adquirentes ou fornecedores de bens ou

serviços por meio da fixação diferenciada de preços, ou

de condições operacionais de venda ou prestação de

serviços;

XI - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços,

dentro das condições de pagamento normais aos usos e

costumes comerciais;

XII - dificultar ou romper a continuidade ou

desenvolvimento de relações comerciais de prazo

indeterminado em razão de recusa da outra parte em

submeter-se a cláusulas e condições comerciais

injustificáveis ou anticoncorrenciais;

XIII - destruir, inutilizar ou açambarcar matérias-primas,

produtos intermediários ou acabados, assim como

destruir, inutilizar ou dificultar a operação de

equipamentos destinados a produzi-los, distribuí-los ou

transportá-los;

XIV - açambarcar ou impedir a exploração de direitos de

propriedade industrial ou intelectual ou de tecnologia;

XV - vender mercadoria ou prestar serviços

injustificadamente abaixo do preço de custo;

XVI - reter bens de produção ou de consumo, exceto para

garantir a cobertura dos custos de produção;

XVII - cessar parcial ou totalmente as atividades da

empresa sem justa causa comprovada;

XVIII - subordinar a venda de um bem à aquisição de

outro ou à utilização de um serviço, ou subordinar a

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prestação de um serviço à utilização de outro ou à

aquisição de um bem; e

XIX - exercer ou explorar abusivamente direitos de

propriedade industrial, intelectual, tecnologia ou marca.”

Em suma, deve o CADE buscar o equilíbrio entre os diversos elos da

cadeia da ordem econômica, fazendo detalhadas avaliações no mercado

concorrencial, e verificando abusos de poder de mercado, atuando de forma a

reprimir tais atos.

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CAPÍTULO II

POLÍTICA CRIMINAL

Quando tratamos de “infração penal”, não importa de que seara

estamos falando, faz-se imperioso que abordemos o tema título do presente

capítulo.

O Colóquio Internacional da AIDP sugere que haja responsabilização

penal da pessoa jurídica. Tal idéia encontra-se expressa no art. 173, §5º, da

Constituição Federal, conforme já citado. Contudo a aplicação da teoria das

normas constitucionais inconstitucionais, ante a individualização das penas e

aferição da culpabilidade, fulminam tal previsão em nosso sistema pátrio.

Saindo um pouco da seara do presente trabalho, faz necessário

discorrer brevemente sobre tal questão. Assim explica-se: não pode haver

norma constitucional originária inconstitucional. Isto porque não é possível

fazer controle de constitucionalidade de norma originária, conforme entende o

STF. No entanto, se uma norma constitucional derivada, ao criar emenda à

Constituição, não tiver fundamento de validade na própria Constituição, daí

então esta norma será sim inconstitucional.

As normas constitucionais derivadas podem ser inconstitucionais,

desde que violem as limitações ao poder de reforma.

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Tal entendimento é de aceitação majoritária no Brasil. Mas a doutrina

alemã entende que não podem existir normas constitucionais inconstitucionais,

porque as normas originárias e as derivadas são produzidas pelo Poder

Constituinte. Nesse sentido, o STF declarou inconstitucional a EC 03/93

(instituiu um tributo e permitiu sua cobrança no mesmo exercício financeiro) na

ADIN 939.

Apenas para encerrar a matéria, há uma outra corrente, defendida por

Otto Barchof, que entende que existem normas constitucionais

inconstitucionais, inclusive em se tratando das originárias, mas somente

quando violarem o direito suprapositivo (natural). Esta corrente não é aceita

pelo STF.

Voltando ao nosso tema, podemos observar diversos doutrinadores, e

defensores de correntes opostas, travando fortes batalhas em nome de uma

política criminal mais garantista, ressocializadora. Claro que isto é algo que

ainda deve perdurar por anos, até que se chegue a um ponto de aquiescência.

Neste capítulo traremos à pauta os pontos mais discutidos e

importantes no que diz respeito a alguns temas de importante estudo na área

do Direito Penal Econômico. Cuidaremos, de maneira sucinta, da criminologia,

crime organizado e organizações criminosas, abordando, por fim, o tema

“mensalão”.

2.1 – CRIMINOLOGIA, APRISIONAMENTO E FUNÇÕES DA

PENA

O objeto da criminologia é o crime em si, o criminoso, e os

mecanismos que o cercam, não se esquecendo da vítima, obviamente. Como

ciência empírica e interdisciplinar que é, se ocupa do estudo das variáveis

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principais do crime em cada caso, não somente como uma questão individual,

mas sim um problema social, de forma mais abrangente.

Sua finalidade é determinar a etiologia do crime, através da análise da

conduta e personalidade do sujeito ativo do crime, de forma a aplicar uma

pena em conformidade com a individualização e proporcionalidade, de acordo

com cada ocorrência.

A criminologia está no mundo do “ser”, ou seja, direito natural, é

baseada nos fatores exclusivamente criminológicos.

Atualmente usa-se, mais comumente, a concepção de que o criminoso

é pessoa normal. Em sede de ação penal são utilizados os chamados

prognósticos criminológicos, que são avaliações técnicas feitas naqueles que

se encontram encarcerados; são o exame criminológico, o exame de

personalidade, e o Parecer das Comissões Técnicas de Classificação.

Gustavo Bregalda Neves e Kheyder Loyola in Vademecum

Esquematizado, nos trazem uma classificação de criminosos, como o

criminoso habitual, o impetuoso, etc. Porém como não se trata do tema de

estudo do presente trabalho, não vamos aqui nos aprofundar.

Em se tratando de aprisionamento e funções da pena, iniciamos o

tema mencionando a imperiosa busca de se respeitar os direitos do preso. O

artigo 38 do Código Penal, e o artigo 41 da Lei 7.210/84 nos mostram seus

direitos, para que o apenado cumpra sua pena com dignidade, atendendo ao

objetivo principal e fundamental da pena, que é ressocializar.

Assim, Rogério Greco afirma que “...o Estado, quando faz valer o seu

ius puniendi, deve preservar as condições mínimas de dignidade da pessoa

humana.” (GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 5 ed. Niterói, RJ:

Editora Impetus, 2011. p. 125)

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Não podemos olvidar que a Constituição Federal, em seu artigo 5º,

prevê expressamente inúmeros direitos dos presos, buscando proteger sua

integridade física e moral.

Vejamos tais dispositivos:

“Art. 5º (...)

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de

assistência religiosa nas entidades civis e militares de

internação coletiva;

(...)

XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato

jurídico perfeito e a coisa julgada;

XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;

XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a

organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) a soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos

contra a vida;

XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem

pena sem prévia cominação legal;

XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

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XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos

direitos e liberdades fundamentais;

(...)

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado,

podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação

do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas

aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do

valor do patrimônio transferido;

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará,

entre outras, as seguintes:

a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens;

c) multa;

d) prestação social alternativa;

e) suspensão ou interdição de direitos;

XLVII - não haverá penas:

a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos

termos do art. 84, XIX;

b) de caráter perpétuo;

c) de trabalhos forçados;

d) de banimento;

e) cruéis;

XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos

distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o

sexo do apenado;

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XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade

física e moral;

L - às presidiárias serão asseguradas condições para que

possam permanecer com seus filhos durante o período de

amamentação;

(...)

LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão

pela autoridade competente;

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens

sem o devido processo legal;

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo,

e aos acusados em geral são assegurados o contraditório

e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas

por meios ilícitos;

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito

em julgado de sentença penal condenatória;

LVIII - o civilmente identificado não será submetido a

identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em

lei;

(...)

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por

ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária

competente, salvo nos casos de transgressão militar ou

crime propriamente militar, definidos em lei;

LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se

encontre serão comunicados imediatamente ao juiz

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competente e à família do preso ou à pessoa por ele

indicada;

LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os

quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a

assistência da família e de advogado;

LXIV - o preso tem direito à identificação dos

responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório

policial;

LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela

autoridade judiciária;

LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido,

quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem

fiança;

(...)

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro

judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo

fixado na sentença;

(...)

LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

assegurados a razoável duração do processo e os meios

que garantam a celeridade de sua tramitação.”

Podemos observar que a Carta Magna, por si só, já nos traz uma gama

de direitos dos presos, de modo que as outras leis citadas servem como

complemento.

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Fragoso elucida o fato de que o ambiente carcerário remonta a

diversos efeitos devastadores não só nos apenados, mas em seus familiares

também, que muitas vezes acabam por participar, de certa forma, daquele

ambiente. A prisão não provoca apenas o cerceamento da liberdade, mas

conduz à uma queda da dignidade e da moral do apenado. (FRAGOSO,

Heleno; CATÃO, Yolanda; SUSSEKIND, Elisabeth. Direitos dos Presos. Rio de

Janeiro: Forense, 1980, p. 9.)

Diante de tantas alternativas ao aprisionamento, com a imposição de

medidas diferentes do acautelamento em ambiente carcerário, os poderosos

dos crimes econômicos podem crer que, em raríssimos casos, haverá a prisão

em uma cela. O que, obviamente, é um fator que serve de certeza da

impunidade. Muitas das condenações são no sentido de devolver o montante

desviado, ou furtado de alguma forma, juntamente com alguma medida

alternativa. Ocorre que, como bem se sabe, o valor financeiro deveras já terá

sido utilizado (investido, escondido em paraísos fiscais, como queiram) pelo

agente, que não poderá devolver o total do montante. Fica aí o prejuízo à

Administração Pública em geral.

Muitos criminalistas defendem ideais que se encontram aquém de

políticas criminais que possam adotá-los.

Tanto as propostas defendidas pelo neoliberalismo penal, quanto as

trazidas pelo sistema punitivista, vêem o encarceramento como forma de

contenção da criminalidade, sendo aplicada em ambas classes sociais.

Sobre isso, Perez Del Valle:

“Sob a expressão criminalidade dos poderosos se

compreende a soma de fatos puníveis que são cometidos

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por pessoas com posições especiais e em uma situação

de poder fundada nessas posições para o fortalecimento

e a defesa deste poder e, portanto, desde abusos do

poder estatal mediante o genocídio, a tortura e os

excessos policiai, até os abusos vinculados à corrupção

política e econômica. Portanto o conceito de criminalidade

dos poderosos – em que pese discutível seu fundamento

– não poderia ser transladado diretamente ao âmbito da

criminalidade econômica; por outro, porque existe um

amplo espectro da criminalidade econômica cujos autores

não são pessoas poderosas.” (PEREZ DEL VALLE,

Carlos. Introdución al Derecho Penal Económico. In:

BACIGALUPO, Enrique (diretor). Derecho Penal

Económico. Buenos Aires: Hamurabi, 2004, p. 37-38)

Encerraremos citando as considerações de Renato de Mello Jorge

Silveira in Direito Penal Econômico como Direito penal de perigo:

“Hoje parece certa, assim, a necessidade de utilização,

como lastro referencial, da política criminal para o

embasamento da utilização do perigo no controle social. A

política criminal, hoje verdadeiramente tida como base à

imputação penal no complexo de relações da sociedade

moderna, encontra fronteira mais além. Chega a

mencionar e reconhecer um certo grau de

enfraquecimento da idéia de necessária lesividade ao

bem jurídico em casos pontuais em favor de uma

obrigatória proteção penal. Situações podem ser

percebidas em que isso é evidente, ainda que não

desejáveis ou queridas. O alerta, contudo, deve ser

sempre presente: a política criminal pode, mormente em

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casos supra-individuais, sustentar uma criminalização

antecipada, mas a isso não se confunde uma liberação

desenfreada deste grau de tutela. Tal previsão, sempre

de se combater. Um Direito Penal divorciado de um lastro

dogmático (e político criminal), com tendências

unicamente simpáticas à preferências de gestores

atípicos da moral ou populistas, perde seu norte e sua

legitimidade, gerando, unicamente, insegurança;”

(SILVEIRA, Renato de Mello Jorge. Direito Penal

Econômico como direito penal de perigo. São Paulo: RT,

2006, p. 183)

Atualmente vemos que a função da pena resume-se tão somente em

retirar o indivíduo das ruas, do convívio em sociedade.

2.2 – CRIME ORGANIZADO E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Iniciamos este subtítulo, citando a legislação concernente ao assunto.

A Lei 12.850/2013 trouxe um tipo penal específico para o crime organizado, e

definiu organização criminosa dentro do nosso ordenamento. Assim, em seu

art. 1º, §1º, temos que:

“§ 1o Considera-se organização criminosa a associação

de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada

e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que

informalmente, com objetivo de obter, direta ou

indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante

a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam

superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter

transnacional.”

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Até que entrasse em vigor esta lei, tínhamos o que nos previa a Lei

12.694/2012, que alterou a expressão “quadrilha ou bando” para associação

criminosa, e alterou o número de integrantes caracterizador do delito. Agora

não mais vigora tal lei.

Também temos o art. 288, do Código Penal, que nos aponta este

crime:

“Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o

fim específico de cometer crimes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.”

Antes da Lei 12.850/2013, a redação deste artigo, incluía a expressão

“em quadrilha ou bando”, após “pessoas”.

Sobre as questões concernentes à criminalidade organizada, cumpre

destacarmos:

“A criminalidade organizada, amplamente considerada,

não está ligada apenas à criminalidade econômica, em

sentido estrito, mas manifesta-se também nas atividades

políticas (nos esquemas de corrupção), no terrorismo, no

tráfico de drogas e de pessoas etc. As formas de

manifestação desse tipo de criminalidade sofrem

variações também no espaço em que se desenvolvem

nas realidades nacionais em que atuam. Na Itália, por

exemplo, a criminalidade organizada é comumente

identificada com a máfia ou outras organizações similares;

em Portugal, está associada aos crimes contra o mercado

financeiro; na Alemanha caracteriza-se basicamente pela

lavagem de dinheiro e corrupção, enquanto na Espanha

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tem uma identidade mais acentuada com o terrorismo”.

(PRADO, Luiz Regis. Direito Penal Econômico. 6 ed. São

Paulo: RT, 2014, p. 395)

A fim de elucidar possíveis dúvidas e evitar confusões conceituais,

vamos apontar algumas distinções entre “criminalidade organizada”,

“organizações ou associações criminosas”, e “crime organizado”.

Remonta-se o conceito de criminalidade organizada à um contexto

político, histórico, social, cultural. No cenário brasileiro é difícil encontrarmos

estudos acerca das características deste fenômeno.

Podemos citar algumas de suas características como a acumulação de

poder econômico, alto poder de corrupção e intimidação, e estrutura de

subordinação, do alto ao baixo escalão.

Zuñiga Rodríguez aponta que:

“Nos últimos tempos, a criminalidade organizada

caracterizou-se como especialmente complexa, o que

acabou conferindo a ela o perfil de uma “nova

criminalidade organizada”, notadamente distinta das

tradicionais formas de delinqüência coletiva: “sofisticação

dos meios, transnacionalização, profissionalização,

alianças com outros tipos de criminalidade organizada,

grande danosidade, camuflagem, adaptação ao meio etc.”

(RODRÍGUEZ, Zuñiga L. Criminalidad organizada y

Derecho Penal: dos conceptos de difícil conjunción. In:

Cuestiones actuales dês sistema penal: crisis y desafios.

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Lima: ARA, 2008, p. 288. In: PRADO, Luiz Regis. Direito

Penal Econômico. Op. Cit. P. 400)

As organizações ou associações criminosas costumam ser

conceituadas pelos elementos que as caracterizam.

A Convenção de Palermo, promulgada no Brasil através do Decreto

5.015/2004, define “grupo organizado” e seus elementos. Em seu art. 2º, nos

diz que entende-se por grupo organizado “grupo estruturado de três ou mais

pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o

propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na

presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um

benefício econômico ou outro benefício material.”

Esta Convenção nos mostra como elementos do grupo criminoso:

infração grave, grupo estruturado, bens móveis ou imóveis, produtos

proveniente da prática de crime, bloqueio ou apreensão de bens por decisão

de um tribunal ou autoridade competente, infração principal, entrega vigiada,

organização regional de integração econômica.

Já o crime organizado distancia-se bem dos conceitos de organização

criminosa, e criminalidade organizada.

“No Brasil, o crime organizado assume múltiplas feições:

está muito mais atrelado à atuação das gangues

fortemente armadas, voltada, sobretudo, ao tráfico de

drogas, e também a grupos esparsos, altamente

organizados para praticar crimes contra a Administração

Pública ou a ordem econômica, financeira ou tributária,

crimes eleitorais etc. Além disso, o país é considerado

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como o paraíso da lavagem de capitais.” (PRADO, Luiz

Regis. Direito Penal Econômico. Op. Cit. P. 410)

Na verdade, o crime organizado apresenta certa similaridade com a

organização criminosa, eis se tratar de estrutura formada por razoável número

de integrantes, organizados de modo a viabilizar a prática de determinados

crimes, continuadamente.

Temos, notoriamente, que este tema é afeito ao presente trabalho

devido às particularidades dos crimes do direito penal econômico, e diante das

formas de associação de pessoas para seu cometimento, é que se faz a ponte

com a modalidade de organização/ grupo/ crime organizados.

2.3 – BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O “MENSALÃO”

Abordaremos aqui alguns pontos sobre o escândalo do “mensalão”, o

caso mais importante da história do STF. Por não ser o tema central de nosso

trabalho, focaremos nos crimes atribuídos aos mensaleiros, algumas das

decisões dos juízes, e as penas que lhe foram impostas

Tal processo, foi iniciado em 2005. O STF recebeu duas ações

propostas por um advogado goiano e pela Associação dos Arrendatários

Financiados e Mutuários do Sistema Financeiro do Estado de Goiás, acusando

o ex presidente Luís Inácio Lula da Silva, por não ter tomado providências após

ter sido cientificado sobre o mensalão. Foi pedida a quebra de sigilo do ex

presidente e dos deputados envolvidos no escândalo e a devolução de 95

milhões de reais.

O caso foi arquivado sob os seguintes fundamentos: os ministros Ayres

Britto e Celso de Mello alegaram que o STF não tinha competência para julgar

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ação popular (ajuizada pelo advogado), nem ação civil pública (ajuizada pela

associação), contra o então presidente.

Após isso, o STF recebeu um pedido de liminar do PPS como meio de

garantir que o Congresso Nacional instaurasse a CPI do mensalão. O recurso

foi negado, conforme entendimento da ministra Ellen Gracie, de que a

instauração da comissão não era urgente, já que o Congresso encontrava-se

em período de recesso.

Os primeiros nomes envolvidos no caso foram José Dirceu e Roberto

Jefferson, que, após terem sido cassados, recorreram ao STF no intuito de

reaver seus mandatos na Câmara, alegando ter havido cerceamento de defesa

e irregularidades no processo, o que foi negado pelo órgão.

Em março de 2006, foi que a Procuradoria Geral da República, através

de seu procurador Antonio Fernando de Souza, ofereceu denúncia sobre o

caso. Foram denunciadas 40 pessoas, dentre eles, os já citados Dirceu e

Roberto, e Marcos Valério e seus sócios, a diretoria do Banco Rural, e

deputados, assessores, servidores públicos, e empresários que se

beneficiavam do esquema.

No entanto não se incluiu o nome de Lula entre os réus do processo,

afirmando-se não haver indícios da participação do ex-presidente. O STF teria

que ser provocado, neste caso pelo Ministério Público, afim de se obter

indícios mínimos da participação dele, para só então incluí-lo na lista de

envolvidos acusados. (até os dias de hoje, não houve a inclusão de Lula em tal

processo)

Dois bancos estavam envolvidos no caso, o Banco Rural e o BMG,

mas apenas contra o banco Rural foi dado prosseguimento como envolvido no

processo, e o caso BMG tramita à parte. Houve denúncia de fraude

envolvendo empréstimos do BMG ao PT e ao grupo de empresas de Marcos

Valério. A justiça havia denunciado diretores do BMG, José Genoino (que tinha

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foro privilegiado) e Delúbio Soares, Marcos Valério, sua esposa e seus sócios

Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Rogério Tolentino. Em 2010, Genoino

perdeu a prerrogativa de foro.

O STF, em agosto de 2007, por unanimidade, aceitou e julgou

denúncia por gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro contra a cúpula do

Banco Rural: Kátia Rabello, José Salgado, Ayanna Tenório e Vinícius

Samarane. Foram considerados suficientes os indícios do uso de notas frias

para a simulação de serviços. O Banco Rural teria omitido do Banco Central os

destinatários finais dos saques. Por decisão unânime, todos passaram então a

responder também por formação de quadrilha.

Houve ainda denúncias de lavagem de dinheiro contra os deputados

petistas Paulo Rocha e sua ex-assessora Anita Leocádia, João Magno,

Professor Luisinho, o ex-ministro dos transportes Anderson Adauto, e seu ex-

chefe de gabinete José Luiz Alves.

Foram incursos no crime de formação de quadrilha, integrantes da

cúpula do PP: Pedro Corrêa, José Janene e seu ex-assessor, João Claudio

Genu, e Pedro Henry.

Também foram denunciados por formação de quadrilha e lavagem de

dinheiro, os integrantes da cúpula do PP: Valdemar da Costa Neto, e os irmãos

Jacinto e Antonio Lamas. Valdemar e Jacinto também foram incurso no delito

de corrupção passiva.

Na mesma época, os ministros receberam denúncia contra o Bispo

Rodrigues, também por lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

O STF recebe denúncia de corrupção passiva contra o deputado

federal petista João Paulo Cunha, e de corrupção ativa contra Marcos Valério,

Cristiano Paz e Ramon Hollerbach. Segundo o processo, João Paulo teria

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recebido 50 mil reais de propina e desviou em proveito próprio 252 mil reais de

um contrato de publicidade da agência SMP&B.

Luiz Gushiken, acusado de orquestrar os desvios de recursos do

Banco do Brasil, em favor da quadrilha de Marcos Valério, foi julgado pelo

STF. Contudo, a Procuradoria, desistiu de pedir sua condenação, alegando

não ter colhido provas suficientes do envolvimento dele no caso.

A acusação de peculato contra Dirceu, Genoino, Soares e Sílvio

Pereira, foi rejeitada pelo STF, sob a égide que não houve demonstração

capaz de comprovar como o grupo teria contribuído com o desvio de recursos

envolvendo o fundo Visanet. Nesse mesmo momento, Marcos Valério e seus

sócios passaram a responder por peculato.

Roberto Jefferson, Emerson Palmieri, Romeu Queiroz, e Anderson

Adauto, foram julgados por corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro.

Segundo a denúncia, o partido teria recebido propina, enquanto Roberto

Jefferson era presidente, conforme intervenção de Adauto, que procurou

Marcos Valério para a retomada do esquema criminoso após a morte de José

Carlos Martinez, que antecedeu Roberto no PTB.

Com o julgamento em curso, em novembro de 2009, a defesa de

Marcos Valério afirmou que o relator do processo, Joaquim Barbosa, não teria

isenção suficiente para participar do julgamento, e requer seu impedimento.

(em setembro de 2011, o presidente do STF, Cezar Peluso, rejeitou esse

pedido.)

Em abril de 2010, o STF analisou 13 pedidos da defesa de Roberto

Jefferson, e Joaquim Barbosa lançou inúmeras críticas diante disso. Por

unanimidade, os ministros rejeitaram os 13 pedidos, que incluíam questões já

avaliadas pelo plenário, como a ausência de Lula, e o cerceamento de defesa

em razão de não terem sido ouvidas algumas testemunhas.

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Sabe-se que este processo ainda encontra-se tramitando, e ainda

faltam recursos a serem analisados.

Marcos Valério foi quem teve a maior pena, tanto em reclusão quanto

em multa. Foi condenado a 37 anos, 5 meses e 6 dias, e ao pagamento de

uma multa de 3,06 milhões de reais.

As condenações e as multas variaram de 27 anos a 12 anos, e as

multas de 2,79 milhões a 360 mil reais; assim como o tipo de pena, tendo

penas de reclusão e de restrição de direitos.

Foram absolvidos: Anderson Adauto, Anita Leocádia, Antonio Lamas,

Ayanna Tenório, Duda Mendonça, Geiza Dias, José Luiz Alves, João Magno,

Luiz Gushiken, Paulo Rocha, Professor Luizinho, Zilmar Fernandes. E Carlos

Alberto Quaglia teve seu processo desmembrado.

Recentemente, com a interposição de embargos infringentes, doze

condenados pediram a revisão de suas condenações. A revisão das sentenças

resultou na redução das penas para nove deles, e na absolvição de um, João

Claudio Genu.

O caso mensalão gerou enorme repercussão, diante do montante que

foi desviado. Verbas públicas foram empreendidas em empresas privadas, e o

dinheiro foi “lavado”. Agentes do governo, deputados, empresários, envolvidos

em um esquema de corrupção ativa, passiva, desvio de verbas, lavagem de

dinheiro, enfim. Por isso se fez necessário comentarmos sobre isto no

presente trabalho.

Eis aqui a mais remota e clássica forma de se praticar um crime de

direito penal econômico: são os poderosos do alto escalão quem os pratica.

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Fazendo uma breve apresentação do capítulo posterior, durante o

julgamento dessa ação Penal (n. 470), no STF, o Ministro Luiz Fux valeu-se de

uma expressão não muito difundida, “colarinho azul”, que retrata o oposto ao

conhecido crime do colarinho branco:

“O desafio na seara dos crimes do colarinho branco é

alcançar a plena efetividade da tutela penal dos bens

jurídicos não individuais. Tendo em conta que se trata de

delitos cometidos sem violência, incruentos, não atraem

para si a mesma repulsa social dos crimes do colarinho

azul”.

Observamos abaixo a ementa da ação penal que deu origem ao

mensalão:

“AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. PRELIMINARES

REJEITADAS, SALVO A DE CERCEAMENTO DE

DEFESA PELA NÃO INTIMAÇÃO DE ADVOGADO

CONSTITUÍDO. ANULAÇÃO DO PROCESSO EM

RELAÇÃO AO RÉU CARLOS ALBERTO QUAGLIA, A

PARTIR DA DEFESA PRÉVIA. CONSEQUENTE

PREJUDICIALIDADE DA PRELIMINAR DE

CERCEAMENTO DE DEFESA PELA NÃO INQUIRIÇÃO

DE TESTEMUNHAS ARROLADAS PELA DEFESA.” (AP

470 / MG - MINAS GERAIS

AÇÃO PENAL

Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA

Revisor(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI

Julgamento: 17/12/2012 Órgão Julgador: Tribunal

Pleno)

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Passemos então à análise jurisprudencial de alguns crimes do direito

penal econômico.

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CAPÍTULO III

ESTUDO JURISPRUDENCIAL DO DIREITO PENAL

ECONÔMICO

Inicialmente cabe ressaltar que não abordaremos aqui todos os crimes

do Direito Penal Econômico, mas os mais corriqueiros e mais conhecidos. São

os chamados “crimes do colarinho branco”. Trabalharemos aqui apenas com

os crimes contra a ordem econômica, contra as relações de consumo, e contra

as finanças públicas. Trata-se do ponto chave do nosso trabalho.

Sabemos que é dever do Estado garantir a livre iniciativa, o direito

reconhecido de explorar uma atividade econômica, mediante imposições de

sanções caso haja atos contrários a lei.

O Direito Penal Econômico busca reprimir dois tipos de livre

concorrência, que são a desleal, e a que envolve abuso de poder.

Iniciaremos com breves comentários acerca de cada tipo de infração,,

demonstrando a lei que a prevê, após, apontaremos o entendimento do

Supremo Tribunal Federal sobre tal injusto.

3.1 – Crimes do colarinho branco

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Como citado anteriormente, o termo “crimes do colarinho branco” ou

“white collar crime”, foi disseminado pelo sociólogo americano Edwin

Sutherland. Faz referência a um crime cometido por pessoa de alta

respeitabilidade e elevado status social.

Muitos dos delitos econômicos, em sentido amplo, costumam ser

identificados como crimes do colarinho branco, uma vez que os sujeitos ativos

aproveitam-se de suas posições sociais e profissionais para cometer crimes

que, quase sempre, lesam bens jurídicos transindividuais, gerando, muitas

vezes, resultados gravosos à sociedade.

São conhecidamente exemplos desse tipo de crime, os previstos

na Lei n. 9.613/1998 (Lavagem de Dinheiro), Lei n. 8.176/1991 (Crimes contra

a Ordem Econômica), Lei n. 8.137/1990 (Crimes contra a Ordem Tributária,

Ordem Econômica e Relações de Consumo), Lei n. 7.492/1986 (Crimes contra

o Sistema Financeiro Nacional), crimes previdenciários (arts. 168-A e 337-A,

CP), dentre outros. Cuidaremos aqui apenas dos crimes contra a ordem

econômica, contra as relações de consumo, e contra as finanças públicas, a

fim de que não nos extendermos demais no tema.

Apenas para fins de informação e complementação, é interessante

citarmos que há também um outro termo, “primo” do termo “crimes do

colarinho branco”. Como apresentamos no final do capítulo anterior, “crimes

do colarinho azul” ou “blue collar crime” são aqueles praticados por pessoas

economicamente menos favorecidas, ou seja, inversamente desprovidas de

posição social ou reconhecimento profissional. Geralmente praticam crimes

como furto, roubo, estelionato etc.

Danilo Andreato explica:

“A alusão ao colarinho azul deve-se à cor da gola do

macacão dos operários e trabalhadores de fábricas.

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Os operários eram chamados de blue-collar (colarinho

azul) em razão da cor dos uniformes. Os executivos, por

sua vez, não usavam macacões azuis, porém camisas

brancas, com colarinhos da mesma cor, razão por que

Sutherland opôs à criminalidade dos pobres (blue collar)

a white-collar criminality.” (ADREATO, Danilo. Crimes do

colarinho branco e crimes do colarinho azul in

http://daniloandreato.com.br/2013/03/27/crimes-do-

colarinho-branco-e-crimes-do-colarinho-azul/. Acesso em

01/04/2014)

Nesse sentido, há também o termo “cifra negra” (ou oculta da

criminalidade), empregado para demonstrar que o sistema penal só incide em

cerca de 20% dos casos em geral. Concepção trazida pelo abolicionismo

penal, termo surgido entre as décadas de 1970 e 1980, atribuído à

deslegitimação radical do sistema carcerário e da lógica punitiva.

Nesse caso, faz-se menção às infrações penais desconhecidas

oficialmente pela justiça criminal, e que não são investigadas nem punidas.

Segundo Antonio García-Pablos de Molina, “a ‘cifra negra’ alude a um

quociente (conceito aritmético) que expressa a relação entre o número de

delitos efetivamente cometidos e o de delitos estatisticamente refletidos.”

(MOLINA, García-Pablos. Criminologia. 5. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 42-43).

Voltando ao tema central, não é difícil concluirmos que os crimes de

colarinho branco não possuem a mesma visibilidade que os crimes comuns,

presenciados pelos cidadãos, muitas vezes em locais públicos, e que se

manifestam de forma grotesca.

Por fim, cita-se o fato de os meios de comunicação influenciarem direta

e expressamente nos casos de crimes de repercussão nacional e clamor

público, ainda mais em casos de crimes econômicos que geram grandes

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prejuízos. Pode-se até mesmo afirmar que estes meios formam o chamado

“controle social”, pois ao mesmo tempo que está apontando fatos e pessoas,

chega até mesmo a realizar investigações, a respeito do delito em tela.

Em que pese o importante papel que os meios de comunicação têm tido

em muitos casos de crimes do colarinho branco, não se pode desconsiderar

que a maior parte das atenções está, ainda, em cima dos crimes praticados

por indivíduos previamente estereotipados, quer dizer, aqueles que praticam

crimes comuns. Relaciona-se isto ao fato de a principal fonte de informações

da imprensa continuar sendo a polícia.

Demonstramos abaixo alguns julgados desse tipo de crime:

“HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O SISTEMA

FINANCEIRO NACIONAL. EVASÃO DE DIVISAS. CRIME

DE LAVAGEM DE DINHEIRO. PEDIDO DE

REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. DECISÃO

DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA – GARANTIA DA

ORDEM PÚBLICA E DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL.

EVASÃO DO DISTRITO DE CULPA. PERIGOSIDADE

DO AGENTE E RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA,

DADOS AFERÍVEIS PELO VASTO NÚMERO DE

PROCESSOS PENAIS A QUE RESPONDE O

PACIENTE, ALGUNS ALIÁS COM CONDENAÇÃO

TRANSITADA EM JULGADO. LAVAGEM DE DINHEIRO.

ALEGADA IRRETROATIVIDADE DA LEI N.º 9613/98.

ILEGALIDADE NÃO EVIDENCIADA. PEÇA

ACUSATÓRIA QUE ABARCA FATOS POSTERIORES À

VIGÊNCIA DA REFERIDA NORMA PENAL

INCRIMINADORA. RITO CÉLERE E SUMÁRIO DA VIA

MANDAMENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE DILAÇÃO

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PROBATÓRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO

CONFIGURADO.” (HC 114173 / RO - RONDÔNIA

HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. ROSA WEBER

Julgamento: 07/03/2014)

“EMENTA: I. Habeas corpus: prescrição inocorrente, no

caso, repelida, ademais, pela jurisprudência do Tribunal,

a denominada prescrição antecipada pela pena em

perspectiva. Precedentes. II. Habeas corpus: inviabilidade

para o exame da alegação de ausência de base empírica

para a denúncia, que a instrução do pedido não permite e

que, de qualquer modo, demandaria a ponderação dos

elementos de informação, à qual não se presta o

procedimento sumário e documental do habeas corpus.

III. Denúncia: inépcia: atipicidade da conduta descrita

(C.Pr.Penal, art. 43,I): suposta prática de operação de

câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de

divisas do país - delito previsto no art. 22 da L. 7.492/86

(Lei do Colarinho Branco)- em decorrência de cessão ou

transferência de "passe" de atleta profissional para

entidade desportiva estrangeira. 1. Não se irroga ao

paciente - simples procurador do atleta a ser cedido - a

participação em nenhuma "operação de câmbio", nem o

valor negocial do "passe" de um jogador de futebol pode

ser reduzido ao conceito de mercadoria e caracterizar

ativo financeiro objeto de operação de câmbio. 2. No

tocante à figura delineada na parte final do parágrafo

único do artigo 22 da L. 7.492/88, é manifesto que não

cabe subsumir à previsão típica de promover a "saída de

moeda ou divisa para o exterior" a conduta de quem, pelo

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contrário, nada fez sair do País, mas, nele, tivesse

deixado de internar moeda estrangeira ou o tivesse feito

de modo irregular. 3. De outro lado, no caput do art. 22, a

incriminação só alcança quem "efetuar operação de

câmbio não autorizada": nela não se compreende a ação

de quem, pelo contrário, haja eventualmente, introduzido

no País moeda estrangeira recebida no exterior, sem

efetuar a operação de câmbio devida para convertê-la em

moeda nacional. 4. Da hipótese restante - a de que a

parcela dos honorários do procurador do atleta não

declarada à Receita Federal se houvesse mantido em

depósito no exterior - objeto de incriminação na parte final

do parágrafo único do art. 22 da L. 7.492/86 -, só se

poderia cogitar se a denúncia se fundasse em elementos

concretos de sua existência, à falta dos quais adstringiu-

se a aventar suspeita difusa, da qual não oferece, nem

pretende oferecer, dados mínimos de concretude. IV.

Habeas corpus deferido, para trancar o processo em

curso contra o paciente.” (HC 88087 / RJ - RIO DE

JANEIRO HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE

Julgamento: 17/10/2006 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

Dispensável mencionarmos que o crime mais conhecido dentro dos

crimes do colarinho branco, é a lavagem de capitais. O sujeito que comete o

delito de lavagem de capitais, na maioria das vezes, pratica um crime

antecedente, com o fim de alcançar sua finalidade.

Sobre este crime, vejamos o que nos aponta Nucci:

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“O termo lavagem, em nosso entendimento, é

inapropriado. Decorrente da cultura norte-americana,

origina-se da década de 20, nos EUA, quando a Máfia

criou lavanderias para dar aparência lícita a negócios

ilícitos, ou seja, buscava-se justificar, por intermédio de

um comércio legalizado a origem criminosa do dinheiro

arrecadado. Em outros países, o delito é chamado de

branqueamento de dinheiro (Portugal, França e

Espanha). Nos EUA, porém, consolidou-se a

denominação lavagem de dinheiro (money laundering).”

(NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais

penais comentadas. 5 ed. São Paulo: RT, 2010, p. 868)

Este e outros delitos comumente conhecidos como crimes do colarinho

branco, sem dúvida mereceriam um capítulo à parte. No entanto, seria

demasiado extendido o presente trabalho, dada a gama de assuntos que

seriam indispensáveis de se abordar dentro deste contexto.

Entende o STF que:

“O crime de lavagem de dinheiro se materializara

mediante outras etapas, como a prática de fraudes

contábeis e a ocultação dos verdadeiros proprietários e

sacadores dos vultosos valores.” (AP 470/MG: embargos

de declaração – 11. Informativo 716)

“...consoante a legislação brasileira, o enquadramento

comolavagem de dinheiro não dispensaria a

ocorrência de crime antecedente.

(...)

Quanto à alegação de atipicidade da conduta dos

pacientes, sob o argumento de exigir-se a

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existência de delito anterior para a caracterização do

crime de lavagem de dinheiro, ressalta descrever-se, na

denúncia, que os capitais cuja ocultação/dissimulação

vem sendo perpetrada pelos pacientes originam-se de

organização criminosa.” (HC - 96007. Informativo 694)

“O crime de lavagem de dinheiro também é autônomo,

conforme reiteradamente tem proclamado a nossa

jurisprudência, e, conquanto exija o delineamento dos

indícios de cometimento de uma infração penal

antecedente, com ela não guarda qualquer relação

de dependência para efeito de persecução penal,

inclusive na hipótese de ocultação de valores oriundos de

sonegação tributária.” (RHC 119433 / DF - DISTRITO

FEDERAL RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS

CORPUS Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA

Julgamento: 25/03/2014)

“...condenado a 3 anos e 6 meses de reclusão, bem como

ao pagamento de 11 dias-multa, pela prática do crime de

lavagem de dinheiro — para substituir a pena

privativa de liberdade por duas restritivas de direito,

consistentes em: a) multa no valor de 300 salários

mínimos, a serem pagos a entidade sem fins lucrativos

indicada na execução; e b) prestação de serviços

comunitários, à razão de 1 hora de tarefa por

dia de condenação.” (AP 470/MG: embargos de

declaração – 19. Informativo 716)

Observa-se que o entendimento é no caminho de que a lavagem de

capitais precede outro crime, mas já há posicionamento de que este é, em

alguns casos, um crime autônomo.

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São comumente antecedentes à lavagem de dinheiro: a corrupção

ativa, a evasão de divisas, o estelionato, a quadrilha, a organização criminosa,

e o peculato, cometidos como meio de se garantir a “lavagem” do montante

envolvido.

Com relação à aplicação da pena, é sabido que os praticantes deste

tipo de delito, muitas vezes condenados à devolução do montante, não o

fazem, ou pelo valor já ter “desaparecido”, ou apenas devolvem uma parte. A

pena de pagamento de multa chega a ser, com o perdão da expressão, uma

piada, já que o valor da multa é sempre bem inferior ao prejuízo gerado aos

cofres públicos. Com isso, tem-se certo que o cumprimento de penas

alternativas é a “melhor” saída, com o fim de conscientizar o agente, de forma

que ele esteja mais próximo da realidade do país, e não venha a cometer tal

crime novamente (o que é uma utopia!).

3.1.1 – Crimes contra a ordem econômica

Os crimes contra a ordem econômica possuem sua repressão

expressa no art. 173, §4, da nossa Carta Magna, a saber:

“Art. 173 (...)

§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que

vise à dominação dos mercados, à eliminação da

concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.”

Importante iniciarmos tal ponto, citando, brevemente as mais

importantes legislações.

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A Lei 8.158/91, foi criada para dar celeridade aos procedimentos

administrativos da Lei 4.137/62, e transferiu à Secretaria Nacional do Direito

Econômico (SNDE), a investigação e proposição das medidas cabíveis nos

casos em que houvesse atos contra à livre concorrência; a Lei 8.137/90 trouxe

a definição dos crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as

relações de consumo; a Lei 8.884/94 transformou o Conselho Administrativo

de Defesa Econômica (CADE), em autarquia, conforme já foi visto

anteriormente.

Esta última lei citada, trouxe a criação ainda da Secretaria de Direito

Econômico (SDE), que veio para interferir nos atos dos agentes econômicos,

de uma forma geral, que pudesse suprir as necessidades do órgão ao qual

este pertence.

Os arts. 1º ao 4º da Lei 8.137/90 (crimes contra a ordem tributária e

contra as relações de consumo), nos trazem expressamente as condutas que

constituem crime contra a ordem econômica.

Leia-se:

“Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir

ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer

acessório, mediante as seguintes condutas:

I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às

autoridades fazendárias;

II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos

inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em

documento ou livro exigido pela lei fiscal;

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III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota

de venda, ou qualquer outro documento relativo à

operação tributável;

IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar

documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota

fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de

mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente

realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da

autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser

convertido em horas em razão da maior ou menor

complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao

atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista

no inciso V.

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza

I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre

rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para

eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;

II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou

de contribuição social, descontado ou cobrado, na

qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria

recolher aos cofres públicos;

III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte

beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela

dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição

como incentivo fiscal;

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IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o

estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto

liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;

V - utilizar ou divulgar programa de processamento de

dados que permita ao sujeito passivo da obrigação

tributária possuir informação contábil diversa daquela que

é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e

multa.

Art. 3° Constitui crime funcional contra a ordem tributária,

além dos previstos no Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de

dezembro de 1940 - Código Penal (Título XI, Capítulo I):

I - extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer

documento, de que tenha a guarda em razão da função;

sonegá-lo, ou inutilizá-lo, total ou parcialmente,

acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou

contribuição social;

II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem,

direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou

antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela,

vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem,

para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição

social, ou cobrá-los parcialmente. Pena - reclusão, de 3

(três) a 8 (oito) anos, e multa.

III - patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado

perante a administração fazendária, valendo-se da

qualidade de funcionário público. Pena - reclusão, de 1

(um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Art. 4° Constitui crime contra a ordem econômica:

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I - abusar do poder econômico, dominando o mercado ou

eliminando, total ou parcialmente, a concorrência

mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de

empresas;

II - formar acordo, convênio, ajuste ou aliança entre

ofertantes, visando:

a) à fixação artificial de preços ou quantidades vendidas

ou produzidas;

b) ao controle regionalizado do mercado por empresa ou

grupo de empresas

c) ao controle, em detrimento da concorrência, de rede de

distribuição ou de fornecedores.

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos e multa.”

Busca tutelar a livre concorrência e a livre iniciativa, tendo a figura do

empresário como sujeito ativo de tais condutas, tanto em sua condição de

pessoa física, quanto de pessoa jurídica.

Neste ponto, é importante trazemos aqui a definição de "empresário",

prevista no art. 966, do Código Civil:

“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce

profissionalmente atividade econômica organizada para a

produção ou a circulação de bens ou de serviços.”

A Lei 8.176/91, em seu art. 1º, também prevê as condutas que incidem

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em crime contra a ordem econômica, sendo:

“Art. 1° Constitui crime contra a ordem econômica:

I - adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo,

gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico,

hidratado carburante e demais combustíveis líquidos

carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas

na forma da lei;

II - usar gás liqüefeito de petróleo em motores de

qualquer espécie, saunas, caldeiras e aquecimento de

piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as

normas estabelecidas na forma da lei.

Pena: detenção de um a cinco anos.”

Imperioso citarmos que esta Lei instituiu o Sistema de Estoques de

Combustíveis, de forma que o art. 2º desta mesma Lei, também deve ser

citado:

“Art. 2° Constitui crime contra o patrimônio, na

modalidade de usurpação, produzir bens ou explorar

matéria-prima pertencentes à União, sem autorização

legal ou em desacordo com as obrigações impostas pelo

título autorizativo.

Pena: detenção, de um a cinco anos e multa.

§ 1° Incorre na mesma pena aquele que, sem autorização

legal, adquirir, transportar, industrializar, tiver consigo,

consumir ou comercializar produtos ou matéria-prima,

obtidos na forma prevista no caput deste artigo.

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§ 2° No crime definido neste artigo, a pena de multa será

fixada entre dez e trezentos e sessenta dias-multa,

conforme seja necessário e suficiente para a reprovação

e a prevenção do crime.

§ 3° O dia-multa será fixado pelo juiz em valor não inferior

a quatorze nem superior a duzentos Bônus do Tesouro

Nacional (BTN).”

Aqui o bem jurídico a ser tutelado é o patrimônio da União, no que diz

respeito aos bens e matérias primas a ela pertencentes.

Seguem alguns julgados sobre crimes contra a ordem econômica:

“Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO

ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO

FISCAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.

EXCEPCIONALIDADE. NEGATIVA DE AUTORIA.

ANÁLISE DE FATOS E PROVAS. VEDAÇÃO. RECURSO

ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS A QUE SE NEGA

PROVIMENTO. 1. O trancamento da ação penal por meio

de habeas corpus é medida excepcional, somente

admissível quando transparecer dos autos, de forma

inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da

conduta ou a extinção da punibilidade. Precedentes: HC

101754, Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen

Gracie, DJ de 24.06.10; HC 92959, Primeira Turma,

Relator o Ministro Carlos Britto, DJ de 11.02.10. 2. A

negativa de autoria do delito não é aferível na via do writ,

cuja análise se encontra reservada aos processos de

conhecimento, nos quais a dilação probatória tem espaço

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garantido. Precedentes: HC 114.889-AgR, Primeira

Turma, de que fui Relator, DJe de 24.09.13; HC 114.616,

Segunda Turma, Relator o Ministro Teori Zavascki, DJe

de 17.09.13. 3. In casu, o paciente foi denunciado como

incurso nas sanções do artigo 1º, inciso, I, c/c o artigo 11,

caput, ambos da lei 8.137/90 (sonegação fiscal). Isso

porque, na condição de analista fiscal da COPERSUCAR

– Cooperativa Produtora de Cana-de-Açúcar, Açúcar e

Álcool do Estado de São Paulo, teria, no período

compreendido entre 1º e 30 de abril de 2002, emitido

notas fiscais fraudulentas para simular a remessa de

mercadorias para fora do Estado de São Paulo e, por

conseguinte, recolher o Imposto por Circulação de

Mercadorias – ICMS com alíquota reduzida. A defesa

sustenta, contudo, que o paciente não teria praticado os

fatos descritos na peça acusatória, sob o argumento de

que sua admissão na empresa COPERSUCAR teria

ocorrido apenas em 26 de novembro de 2004. 4.

Destarte, a análise da participação, ou não do paciente

nos fatos descritos na denúncia prescinde do

revolvimento do conjunto fático-probatório, inviável na via

do writ. Ademais, consoante destacou o Ministério Público

Federal, “foi juntado aos autos informação do setor de

recursos humanos da COPERSUCAR atestando que o

vínculo empregatício com o recorrente compreende o

período entre setembro de 2002 e setembro de 2008, o

que está devidamente anotado na carteira de trabalho e

previdência social. Contudo, existem anotações na

Carteira de Trabalho no sentido de que o recorrente

mantinha vínculo empregatício com a COPERSUCAR, na

área de comércio exterior, desde o ano de 1999,

recebendo remuneração, constando, inclusive, alterações

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salariais” - sem grifos no original. 5. Recurso ordinário em

habeas corpus a que se nega provimento.” (RHC 118301

/ SP - SÃO PAULO

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. LUIZ FUX

Julgamento: 18/02/2014 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

“Ementa: PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS

CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO

CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS

CORPUS: CF. ART. 102, I, “D” E “I”. ROL TAXATIVO.

MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. INTERPRETAÇÃO

EXTENSIVA: PARADOXO. ORGANICIDADE DO

DIREITO. CRIMES DE SONEGAÇÃO FISCAL, DANO

QUALIFICADO, RESISTÊNCIA, CORRPUÇÃO ATIVA,

FALSIDADE IDEOLÓGICA, LAVAGEM OU OCULTAÇÃO

DE BENS, DIREITOS E VALORES. DOMÍNIO DE

MERCADO E CONCORRÊNCIA DESLEAL,

ADULTERAÇÃO DE COMBUSTÍVEL E QUADRILHA OU

BANDO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MEDIDA

EXCEPCIONAL. ACÓRDÃO DENEGATÓRIO DE HC

PROLATADO POR TRIBUNAL ESTADUAL.

IMPETRAÇÃO DE NOVO WRIT NO STJ EM

SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL.

IMPOSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

INEXISTÊNCIA. ORDEM DE HABEAS CORPUS

EXTINTA POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. O

trancamento da ação penal por meio de habeas corpus é

medida excepcional, somente admissível quando

transparecer dos autos, de forma inequívoca, a inocência

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do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da

punibilidade, circunstâncias não evidenciadas na hipótese

em exame. 2. In casu, colhe-se dos autos que o paciente

e outros treze acusados foram denunciados como

incursos nas sanções dos artigos 1º, inciso II, da Lei

8.137/90 (sonegação fiscal); 163, parágrafo único, inciso

II, do CP (dano qualificado); 329, §§ 1º e 2º, do CP

(resistência); 333, parágrafo único do CP (corrupção

ativa), por duas vezes; 299 do CP (falsidade ideológica);

1º, inciso VII, da Lei 9.613/98 (lavagem ou ocultação de

bens, direitos e valores); 4º, incisos I, alínea a, V e VI,

da Lei 8.137/90 (domínio de mercado e concorrência

desleal); 1º, inciso I, da lei 8.176/91 (adulteração de

combustível), por duas vezes; e 288 do CP (quadrilha ou

bando), na forma do artigo 69 do CP. 3. O Tribunal a quo,

mercê de não conhecer do recurso, consignou que, “na

vertente hipótese, em que se pretendia o trancamento da

ação penal por ausência de justa causa e inépcia da

denúncia, o Tribunal a quo examinou exaustivamente a

tese levantada pela defesa, concluindo em sólidas razões

pela existência de materialidade e suficientes indícios de

autoria por parte do ora paciente, apontando na peça

acusatória as passagens que conduzem a esse arremate.

Nesse contexto, as alegações trazidas na impetração

contrariam as premissas fáticas elencadas como

fundamento do aresto recorrido, circunstância que, sob

qualquer óptica, inviabilizaria seu exame por meio do

habeas corpus, que não permite o exame aprofundado do

acervo fático-probatório dos autos”. 4. O recurso cabível

contra acórdão denegatório de habeas corpus prolatado

pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais de

Justiça dos Estados ou do Distrito Federal e Territórios, é

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o recurso ordinário, a ser apreciado pelo Superior

Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 105, inciso II,

alínea a, da Constituição Federal. 5. “A impetração de

novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o

instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito

constitucional” (HC 116.481-AgR, Primeira Turma,

Relatora a Ministra Rosa Weber, DJe de 1º.08.13). 6.

Ademais, “não há nenhuma ilegalidade no acórdão do

Superior Tribunal de Justiça que, embora assente que

não conhece de habeas corpus porque impetrado em

substituição ao recurso ordinariamente previsto, examina

as questões postas com o fito de verificar a existência de

constrangimento ilegal apto a justificar a concessão da

ordem de ofício” (HC 116.389, Segunda Turma, Relator o

Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 14.05.13). 7. O

Superior Tribunal de Justiça não conheceu do habeas

corpus lá impetrado, sob o fundamento de que o writ é

substitutivo de recurso ordinário, tendo em vista ter sido

manejado contra decisão denegatória de HC na Corte

Estadual. Destaca-se que o STJ analisou a possibilidade

da concessão da ordem de ofício, tendo concluído que,

no caso sub examine, não há flagrante ilegalidade que

justifique a adoção desta medida. 8. A competência

originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer e

julgar habeas corpus está definida, taxativamente, no

artigo 102, inciso I, alíneas “d” e “i”, da Constituição

Federal, sendo certo que os pacientes não estão

arrolados em nenhuma das hipóteses sujeitas à jurisdição

desta Corte. 9. Inexiste, no caso, excepcionalidade que

justifique a concessão, ex officio, da ordem, porquanto

inaplicável o princípio da insignificância na hipótese sub

examine. 10. Habeas corpus extinto por inadequação da

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via eleita.” (HC 115701 / PE - PERNAMBUCO

HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. LUIZ FUX

Julgamento: 10/09/2013 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

“COMPETÊNCIA - CRIME CONTRA A ORDEM

ECONÔMICA - ADULTERAÇÃO DE COMBUSTÍVEL -

ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI Nº 8.176/91. O fato de, à

margem de certa portaria da Agência Nacional do

Petróleo, haver comercialização de produto derivado do

petróleo não implica a configuração de crime contra

serviço da citada autarquia especial.

Decisão: A Turma negou provimento ao recurso

extraordinário, nos termos do voto do Relator. Unânime.

Ausente, justificadamente, o Ministro Menezes Direito. 1ª

Turma, 26.05.2009.” (RE 459513 / SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO

Julgamento: 26/05/2009 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

“EMENTA: COMPETÊNCIA. Criminal. Ação penal. Crime

contra a ordem econômica. Comercialização de

combustível fora dos padrões fixados pela Agência

Nacional do Petróleo. Art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.176/91.

Interesse direto e específico da União. Lesão à atividade

fiscalizadora da ANP. Inexistência. Feito da competência

da Justiça estadual. Recurso improvido. Precedentes.

Inteligência do art. 109, IV e VI, da CF. Para que se

defina a competência da Justiça Federal, objeto do art.

109, IV, da Constituição da República, é preciso tenha

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havido, em tese, lesão a interesse direto e específico da

União, não bastando que esta, por si ou por autarquia,

exerça atividade fiscalizadora sobre o bem objeto do

delito.

Decisão: A Turma, por votação unânime, conheceu do

recurso extraordinário, mas lhe negou provimento, nos

termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente,

neste julgamento, os Senhores Ministros Eros Grau e

Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 16.12.2008.” (RE 513446 /

SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. CEZAR PELUSO

Julgamento: 16/12/2008 Órgão Julgador: Segunda

Turma)

Os crimes contra a ordem econômica amplamente praticados são:

sonegação fiscal, corrupção ativa, concorrência desleal, domínio de mercado,

lavagem de capitais, quadrilha, adulteração de combustível, apropriação

indébita, gestão fraudulenta, e peculato.

Sobre a sonegação fiscal é pacífico que não resta configurado tal crime

antes do lançamento definitivo do tributo, de forma que o pagamento integral

do crédito tributário constitui causa de extinção da punibilidade do agente,

conforme o artigo 9º, § 2º, da Lei 10.684/03.

A respeito deste crime, segue entendimento do STF:

“(...) A Súmula Vinculante 24 estabelece que “Não se

tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto

no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do

lançamento definitivo do tributo”. 2. Instaurada a

persecução penal em momento anterior ao lançamento

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definitivo do débito tributário, não há como deixar de

reconhecer a falta de justa causa para a ação penal. 3.

Circunstância que a jurisprudência majoritária do

Supremo Tribunal Federal tem como “vício processual

que não é passível de convalidação (HC 100.333, Rel.

Min. Ayres Britto, Segunda Turma)(...)” (HC 97854 / RJ -

RIO DE JANEIRO. HABEAS CORPUS. Relator(a): Min.

ROBERTO BARROSO. Julgamento: 11/03/2014

Órgão Julgador: Primeira Turma)

“É possível a incidência de tributação sobre valores

arrecadados em virtude de atividade ilícita, consoante o

art. 118 do CTN (“Art. 118. A definição legal do fato

gerador é interpretada abstraindo-se: I - da validade

jurídica dos atos efetivamente praticados pelos

contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da

natureza do seu objeto ou dos seus efeitos; II - dos

efeitos dos fatos efetivamente ocorridos”). Com base

nessa orientação, a 1ª Turma conheceu parcialmente de

habeas corpus e, na parte conhecida, por maioria,

denegou a ordem. Na espécie, o paciente fora condenado

pelo crime previsto no art. 1º, I, da Lei 8.137/1990 (“Art. 1°

Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou

reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer

acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir

informação, ou prestar declaração falsa às autoridades

fazendárias”) e sustentava a atipicidade de sua conduta,

porque inexistiria obrigação tributária derivada da

contravenção penal do jogo do bicho (Decreto-Lei

6.259/44, art. 58). O Min. Dias Toffoli, relator, assinalou

que a definição legal do fato gerador deveria ser

interpretada com abstração da validade jurídica da

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atividade efetivamente praticada, bem como da natureza

do seu objeto ou dos seus efeitos. Ressaltou que a

possibilidade de tributação da renda obtida em razão de

conduta ilícita consubstanciar-se-ia no princípio do non

olet. Assim, concluiu que o réu praticara sonegação

fiscal, porquanto não declarara suas receitas, mesmo que

resultantes de ato contravencional. O Min. Luiz Fux aludiu

ao caráter sui generis da teoria geral do direito tributário.

Acrescentou que seria contraditório o não-pagamento do

imposto proveniente de ato ilegal, pois haveria

locupletamento da própria torpeza em detrimento do

interesse público da satisfação das necessidades

coletivas, a qual se daria por meio da exação tributária.

Vencido o Min. Marco Aurélio, que concedia a ordem por

entender que recolhimento de tributo pressuporia

atividade legítima. Precedente citado: HC 77530/RS (DJU

de 18.9.98). HC 94240/SP, rel. Min. Dias Toffoli,

23.8.2011.(HC-94240).” (PROCESSO HC - 94240

INFORMATIVO Nº 637)

Vejamos o entendimento acerca de mais alguns desses crimes:

“Evidenciado que a querelada remeteu à clientela de

empresa congênere comunicados que visavam denegrir a

sua imagem e retirar-lhe os efetivos e os potenciais

clientes, tem-se, em tese, o crime de concorrência

desleal,devendo ser refutado o argumento de falta de

justa causa para a persecutio criminis.” (HC 82405 / SP -

SÃO PAULO

HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA

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Julgamento: 18/03/2003 Órgão Julgador: Segunda

Turma)

HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO

INDÉBITA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

REPROVABILIDADE DA CONDUTA. MAUS

ANTECEDENTES. INAPLICABILIDADE. ORDEM

DENEGADA. 1. Avalia-se a pertinência do princípio da

insignificância, em casos de pequenos furtos, a partir não

só do valor do bem subtraído, mas também de outros

aspectos relevantes da conduta imputada. Precedentes.

2. O cometimento de apropriação indébita de quantia

destinada ao próprio avô do paciente reveste-se de alta

reprovabilidade. 3. A existência de maus antecedentes

igualmente desaconselha a aplicação do princípio da

bagatela. Ressalva de entendimento pessoal da Ministra

Relatora. 4. Ordem denegada.” (HC 120016 / MG -

MINAS GERAIS HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. ROSA WEBER

Julgamento: 03/12/2013 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

“O crime de apropriação indébita previdenciária exige

apenas “a demonstração do dolo genérico, sendo

dispensável um especial fim de agir, conhecido como

animus rem sibi habendi (a intenção de ter a coisa para

si). Assim como ocorre quanto ao delito de apropriação

indébita previdenciária, o elemento subjetivo animador da

conduta típica do crime de sonegação de contribuição

previdenciária é o dolo genérico, consistente na intenção

de concretizar a evasão tributária”

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(HC 113418 / PB - PARAÍBA

HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. LUIZ FUX

Julgamento: 24/09/2013 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

“A tese de que o crime de gestão fraudulenta de

instituição financeira não poderia ser praticado mediante

a omissão dolosa apontada no acórdão embargado não

passa de uma mera opinião do condenado.”

(AP 470 EDj-décimos segundos / MG - MINAS GERAIS

DÉCIMOS SEGUNDOS EMB.DECL.JULG. NA AÇÃO

PENAL

Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA

Julgamento: 21/08/2013 Órgão Julgador: Tribunal

Pleno)

“Consoante a doutrina do tema, as expressões legais

“gestão fraudulenta” (art. 4º) e “fazer operar, sem a devida

autorização, ou com autorização obtida mediante

declaração falsa” (art. 16) não se confundem. “A gestão

fraudulenta caracteriza-se pela ilicitude dos atos

praticados pelos responsáveis pela gestão empresarial,

exteriorizada por manobras ardilosas e pela prática

consciente de fraudes” (in Mantecca, Paschoal - Crimes

contra a Economia Popular e Sua Repressão. São Paulo,

Saraiva, 1985, p.41). 13. O termo “fazer operar, sem a

devida autorização, ou com autorização obtida mediante

declaração falsa” visa coibir atividade não autorizada ou

cuja permissão adveio do fornecimento à autoridade

competente de documentação não autêntica para a

finalidade.” (HC 93368 / PR - PARANÁ

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HABEAS CORPUS

Relator(a): Min. LUIZ FUX

Julgamento: 09/08/2011 Órgão Julgador: Primeira

Turma)

Observamos em outros julgados, alguns habeas corpus com o fito de

trancar ação penal de muitos desses crimes, mas o STF entende que não deve

prosperar este tipo de remédio, sem que haja prova cabal e indiscutível de que

não houve crime, ou que reste comprovada a negativa de autoria.

3.1.2 – Crimes contra as relações de consumo

Previstos nas Leis 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), e

8.137/90, essas legislações nos apresentam uma gama de ações

diversificadas que incidem em crimes contra as relações de consumo.

Começaremos pelo estudo da Lei 8.078/90, a qual faremos um breve

comentário inicial.

Na elaboração desta lei, olvidou-se o legislador de empregar

terminologias mais técnicas e claras, de modo que utilizou-se de conceitos

amplos e indeterminados.

No que diz respeito à responsabilidade penal da pessoa jurídica, é de

vasto conhecimento que um ente administrativo, uma empresa, enfim, um

órgão que desempenhe atividade empresária, pode sofrer penalização, diante

de um ato considerado atentatório a legislação.

Leia-se o art. 61 desta Lei:

“Art. 61. Constituem crimes contra as relações de

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consumo previstas neste código, sem prejuízo do

disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas

tipificadas nos artigos seguintes.”

Do art. 63 ao 74 encontramos as ações consideradas criminosas por

parte do sujeito ativo.

O art. 63 busca proteger a transparência e a exatidão das informações

sobre a periculosidade de um determinado produto ou serviço. Aqui o sujeito

ativo e o fornecedor, e o sujeito passivo, obviamente e o consumidor.

Trata-se de crime de competência dos Juizados Especiais Criminais,

conforme Lei 9.099/95.

“Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a

nocividade ou periculosidade de produtos, nas

embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade:

Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.

§ 1° Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar,

mediante recomendações escritas ostensivas, sobre a

periculosidade do serviço a ser prestado.

§ 2° Se o crime é culposo:

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.”

Cabe-nos citar o conceito de consumidor, também previsto na lei em

estudo, em seu art. 2º:

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“Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que

adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário

final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade

de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja

intervindo nas relações de consumo.”

No art. 64 também encontramos o mesmo bem jurídico a ser tutelado.

Exige, no entanto, que o fornecedor não possua a vontade de retirar do

mercado tal produto vicioso e perigoso ao consumidor, ou seja, aqui é

necessário que haja dolo por parte do fornecedor.

“Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e

aos consumidores a nocividade ou periculosidade de

produtos cujo conhecimento seja posterior à sua

colocação no mercado:

Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único. Incorrerá nas mesmas penas quem

deixar de retirar do mercado, imediatamente quando

determinado pela autoridade competente, os produtos

nocivos ou perigosos, na forma deste artigo.”

O art. 65 busca proteger a vida e a saúde do consumidor, ou seja, sua

segurança.

“Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade,

contrariando determinação de autoridade competente:

Pena Detenção de seis meses a dois anos e multa.

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Parágrafo único. As penas deste artigo são aplicáveis

sem prejuízo das correspondentes à lesão corporal e à

morte.”

Sobre tal dispositivo, nos cabe citar o que afirma o ilustre Prof. Dr. Luiz

Regis Prado:

“O texto desse dispositivo é extremamente dúbio, uma

vez que permite extrair de sua redação várias

interpretações. De conseguinte, transgride-se o princípio

da legalidade, em sua vertente de taxatividade, que exige

que as normas sejam claras e perfeitamente delimitadas.

A infeliz expressão “alto grau de periculosidade” não

permite a identificação imediata do seu significado,

possibilitando, com isso, ampla margem de especulação

por parte do intérprete.” (PRADO, Luiz Regis. Direito

Penal Econômico. Op. Cit. P. 84)

Afirma ainda que a respeito de "serviços de alto grau de

periculosidade", temos um elemento normativo do tipo, e que há quem o

considere uma norma penal em branco. Seu posicionamento está no sentido

de que se trata de elemento normativo do tipo penal injusto.

O art. 66 também traz o mesmo tipo de tutela, trazendo- se aqui o

direito à informação verdadeira.

Além do fornecedor do serviço, quem subsidia a oferta também é

sujeito ativo deste tipo penal.

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Este dispositivo possui rol taxativo, não se podendo suprimir, em

alguns casos, uma extensão da legalidade material de sua redação.

“Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir

informação relevante sobre a natureza, característica,

qualidade, quantidade, segurança, desempenho,

durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.

§ 1º Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a

oferta.

§ 2º Se o crime é culposo;

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.”

Por fim, cuida-se de medida importante mencionar aqui o conceito de

produto e serviço, o qual se encontra esculpido no art.3º, §1 e §2, desta lei:

“§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material

ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado

de consumo, mediante remuneração, inclusive as de

natureza bancária, financeira, de crédito e securitária,

salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”

O art. 67 nos traz a tão conhecida figura da "propaganda enganosa",

figurinha repetida em tantos e tantos processos que versam sobre crime contra

o consumidor.

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“Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou

deveria saber ser enganosa ou abusiva:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.”

Em se tratando de ser a propaganda, a publicidade de um modo geral,

o principal meio de o fornecedor oferecer seus serviços, suas vantagens e

levar o consumidor a aquisição de seus serviços e produtos, é que o Código de

Defesa do Consumidor elaborou tal previsão.

Não se faz necessário mencionar que a propaganda deve ser

verdadeira...

Seu sujeito ativo é o agente responsável pela criação do anúncio,

quem promove sua publicidade, não sendo possível a responsabilização da

pessoa jurídica aqui.

O art. 68 também possui o mesmo bem jurídico tutelado, no entanto,

de forma indireta, também visa proteger o patrimônio do consumidor.

“Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou

deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se

comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde

ou segurança:

Pena - Detenção de seis meses a dois anos e multa:”

Temos, neste caso, que para que se configure tal ilícito, é necessário

que o anúncio tenha a possibilidade de induzir, persuadir o consumidor a

adotar determinada atitude que lhe venha a ser lesiva, de uma maneira geral.

No art. 69 encontramos um meio que busca garantir a efetiva

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aplicabilidade do que prevê o art. 36, pú, da mesma Lei. Assim, leiam-se os

citados artigos:

“Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e

científicos que dão base à publicidade:

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.”

“Art. 39 (...)

Parágrafo único. Os serviços prestados e os produtos

remetidos ou entregues ao consumidor, na hipótese

prevista no inciso III, equiparam-se às amostras grátis,

inexistindo obrigação de pagamento.”

No art. 70 vemos que a ação do sujeito ativo deve ser empregada com

dolo. Assim, deve haver a vontade de utilizar peça usada no conserto de

determinado produto.

“Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou

componentes de reposição usados, sem autorização do

consumidor:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.”

Cabe ressaltar que, caso o fornecedor incida em vantagem econômica,

em detrimento do prejuízo do consumidor, teremos o crime de estelionato,

configurando-se concurso formal desses crimes.

No art. 71 procurou o legislador evitar que o fornecedor de serviços e

produtos, diante de um consumidor inadimplente, lhe cobre de forma vexatória,

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que extrapole o seu exercício regular de direito. Ou seja, caso haja atitude

além do limite por parte do fornecedor, este age com abuso de direito.

“Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça,

coação, constrangimento físico ou moral, afirmações

falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro

procedimento que exponha o consumidor,

injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho,

descanso ou lazer:

Pena Detenção de três meses a um ano e multa.”

A dívida deve estar relacionada a uma relação de consumo. Do

contrário, o sujeito ativo não incidirá neste crime, mas poderá ser punido pelo

crime previsto no art. 345 do Código Penal, a saber:

“Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para

satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei

o permite:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa,

além da pena correspondente à violência.

Parágrafo único - Se não há emprego de violência,

somente se procede mediante queixa.”

Voltando a mencionar as ações sobre as informações do produto ou

serviço, o art. 72 foi criado buscando a aplicação do que prevê o art. 43, desta

mesma Lei, o qual afirma que "(...) terá acesso às informações existentes em

cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre

ele, bem como sobre as suas respectivas fontes."

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“Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às

informações que sobre ele constem em cadastros, banco

de dados, fichas e registros:

Pena Detenção de seis meses a um ano ou multa.”

Já o art. 73 busca garantir a aplicabilidade do art. 43, §3, que afirma:

"O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros,

poderá exigir sua imediata correção, devendo no arquivista, no prazo de 5

(cinco) dias úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das

informações incorretas."

“Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação

sobre consumidor constante de cadastro, banco de

dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser

inexata:

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.”

O tipo subjetivo da primeira parte, se trata de dolo direto, de

voluntariamente não realizar a correção dos dados. Na segunda parte, vemos

que a expressão "deveria saber" nos leva a um tipo doloso eventual. Não se

deve confundir tal expressão com a culpa, já que a culpabilidade só pode ser

configurada se for expressamente prevista.

Sobre isto:

“É equivocado, portanto, o posicionamento daqueles que

consideram que a expressão deveria saber configura

“uma situação subjetiva em que o sujeito não tem ciência

da incorreção, mas que se tivesse sido o normalmente

diligente poderia saber da inexatidão. Nesta hipótese o

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agente não sabe por que foi negligente, e, pois, portou-se

de forma culposa. Neste tipo, como em outros, está ínsita

uma forma culposa, pois presente na previsão legal uma

hipótese de carência de diligência.” (PRADO, Luiz Regis.

Direito Penal Econômico. Op. Cit. P. 119)

Por fim, o art. 74 tem por finalidade tornar efetiva a previsão do art, 50

desta Lei, que estabelece: "A garantia contratual é complementar à legal e será

conferida mediante termo escrito."

“Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de

garantia adequadamente preenchido e com especificação

clara de seu conteúdo;

Pena Detenção de um a seis meses ou multa.”

Sobre tal dispositivo, cita-se as seguintes considerações:

“Discute-se também se o artigo em tela deve ser objeto

de tratamento penal ou se basta sua regulamentação pelo

Direito Civil ou pelo Direito Administrativo. Para os

adeptos da primeira tese, a conduta ora analisada PE de

natureza penal, por se tratar de uma grave infração contra

a relação de consumo. Para aqueles que compartilham do

segundo entendimento, é de se repelir a política adotada

pelo legislador brasileiro, que vem inserindo no

ordenamento jurídico medidas de natureza penal na

tentativa de solucionar problemas sociais, atentando

contra princípios fundamentais do Direito Penal, em

especial o princípio da intervenção mínima.

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(...)

A sanção penal é a ultima ratio do ordenamento jurídico,

devendo ser utilizada tão somente para as hipóteses de

atentados graves ao bem jurídico.” (PRADO, Luiz Regis.

Direito Penal Econômico. Op. Cit. P. 119)

Passamos agora ao estudo da Lei 8.137/90, que em seu artigo 7º nos

fornece várias formas de crimes contra as relações de consumo.

“Art. 7° Constitui crime contra as relações de consumo:

I - favorecer ou preferir, sem justa causa, comprador ou

freguês, ressalvados os sistemas de entrega ao consumo

por intermédio de distribuidores ou revendedores;

II - vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem,

tipo, especificação, peso ou composição esteja em

desacordo com as prescrições legais, ou que não

corresponda à respectiva classificação oficial;

III - misturar gêneros e mercadorias de espécies

diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como

puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades

desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço

estabelecido para os demais mais alto custo;

IV - fraudar preços por meio de:

a) alteração, sem modificação essencial ou de qualidade,

de elementos tais como denominação, sinal externo,

marca, embalagem, especificação técnica, descrição,

volume, peso, pintura ou acabamento de bem ou serviço;

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b) divisão em partes de bem ou serviço, habitualmente

oferecido à venda em conjunto;

c) junção de bens ou serviços, comumente oferecidos à

venda em separado;

d) aviso de inclusão de insumo não empregado na

produção do bem ou na prestação dos serviços;

V - elevar o valor cobrado nas vendas a prazo de bens ou

serviços, mediante a exigência de comissão ou de taxa

de juros ilegais;

VI - sonegar insumos ou bens, recusando-se a vendê-los

a quem pretenda comprá-los nas condições publicamente

ofertadas, ou retê-los para o fim de especulação;

VII - induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de

indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a

natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de

qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação

publicitária;

VIII - destruir, inutilizar ou danificar matéria-prima ou

mercadoria, com o fim de provocar alta de preço, em

proveito próprio ou de terceiros;

IX - vender, ter em depósito para vender ou expor à

venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou

mercadoria, em condições impróprias ao consumo;

Pena - detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.

Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II, III e IX

pune-se a modalidade culposa, reduzindo-se a pena e a

detenção de 1/3 (um terço) ou a de multa à quinta parte.”

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Tal dispositivo protege os interesses econômicos e sociais do

consumidor. As infrações aqui previstas devem ser praticadas com dolo.

Alguns julgados que tratam destes crimes:

“Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE

INSTRUMENTO. CRIME CONTRA

AS RELAÇÕES DE CONSUMO. ATIPICIDADE DA

CONDUTA. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL.

AUSÊNCIA DE QUESTÃO CONSTITUCIONAL. SÚMULA

283/STF. Para reconhecer a atipicidade da conduta e

absolver o ora agravado, o Tribunal de Justiça do Distrito

Federal e dos Territórios se valeu da interpretação da Lei

nº 8.137/1990 e do Código de Defesa do Consumidor.

Hipótese, portanto, em que, para chegar a conclusão

diversa do acórdão recorrido, necessária seria a análise

da legislação infraconstitucional pertinente, procedimento

inviável em recurso extraordinário. Ademais, incide a

Súmula 283/STF: “É inadmissível o recurso

extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em

mais de um fundamento suficiente e o recurso não

abrange todos eles”. Agravo regimental a que se nega

provimento.” (AG.REG. NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO AI 717314 DF)

“Trata-se de agravo cujo objeto é decisão que negou

seguimento ao recurso extraordinário interposto contra

acórdão do Colégio Recursal da Comarca de São José

dos Campos/SP, assim ementado:

“CONSUMIDOR – PROPAGANDA ENGANOSA – Venda

de produto com alegado desconto que não ocorreu –

Indenização devida – Recurso não provido.”

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O recurso busca fundamento no art. 102, III, a, da

Constituição Federal. A parte recorrente alega violação ao

art. 5º, V, da Constituição.

A decisão agravada negou seguimento ao recurso, sob o

fundamento de que “para seu cabimento há necessidade

de existência de decisão que contrarie dispositivos da

Constituição, ou que tenha declarado a

inconstitucionalidade de tratado ou lei federal

além de que só se mostra o mesmo possível, se a

decisão hostilizada, julgou válida lei ou ato de governo

local contestado em face de lei federal”.

O recurso é inadmissível, tendo em vista que a parte

recorrente se limita a postular uma nova apreciação dos

fatos e do material probatório constantes dos autos.

Nessas condições, a hipótese atrai a incidência da

Súmula 279/STF:

“Para simples reexame de prova não cabe recurso

extraordinário.”

Diante do exposto, com base no art. 544, § 4º, II, b, do

CPC e no art. 21, §1º, do RI/STF, conheço do agravo

para negar seguimento ao recurso extraordinário.

Publique-se.” (ARE 769200 / SP - SÃO PAULO

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO

Julgamento: 13/09/2013)

Atualmente, os crimes amplamente cometidos pelas grandes

empresas são a propaganda enganosa, a cobrança por meios

constrangedores, e a omissão de informações aos consumidores.

Vemos que por se tratar de assunto em que, constantemente encontra-

se novas formas de burlar a legislação vigente no país, tanto por parte dos

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produtores e fornecedores de bens e serviços, como até mesmo por parte dos

próprios consumidores, muitos temas sobre isto possuem entendimentos

diversos.

Encontramos um julgado sobre a propaganda enganosa que merece

ter parte em destaque:

“(...)De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, é

direito básico do consumidor a informação adequada e

clara sobre os diferentes produtos e serviços (artigo 6º,

inciso III), bem como a proteção contra a publicidade

enganosa e abusiva (artigo 6º, inciso IV).

Toda informação ou publicidade veiculada pelo

fornecedor o vincula, obrigando-o a seu cumprimento,

consoante o artigo 30 do mencionado diploma legal.(...)”

(ARE 673182 / MG - MINAS GERAIS

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO

Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI

Julgamento: 24/06/2012)

É importante citarmos que o princípio da informação e da transparência

(arts. 4º e 6º, inc. II, do CDC), impõe regra indispensável na sistemática do

Código de Defesa do Consumidor, através do qual preconiza a obrigação do

fornecedor em prestar todas as informações acerca do produto e do serviço

colocado no mercado de maneira clara e precisa, sem omissões.

Ainda sobre este crime, o STF entende que não se fala em ofensa ao

princípio da proporcionalidade, se o ato impugnado revelou-se adequado e

necessário, no sentido de ter atingindo sua finalidade de proteção e defesa do

consumidor, tal qual estabelece o art. 5º, XXXII, da Constituição.

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3.1.3 – Crimes contra as finanças públicas

Temos oito artigos no Código Penal, que tratam sobre esta gama de

ilícitos penais.

Devemos iniciar o estudo deste tema, ressaltando a importância da Lei

10.028/2000, que operou inúmeras mudanças no Código Penal, dentre elas

introduzindo uma parte que trata dos delitos contra o bem jurídico finanças

públicas.

Passemos então ao estudo dos injustos penais ali previstos.

Começa no art. 359-A. Tal dispositivo nos traz uma conduta que

somente pode ser praticada pelo funcionário público responsável por ordenar,

autorizar ou realizar a operação de crédito. Temos o Estado como sujeito

passivo de tal injusto.

“Art. 359-A. Ordenar, autorizar ou realizar operação de

crédito, interno ou externo, sem prévia autorização

legislativa:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 2 (dois) anos.

Parágrafo único. Incide na mesma pena quem ordena,

autoriza ou realiza operação de crédito, interno ou

externo:

I – com inobservância de limite, condição ou montante

estabelecido em lei ou em resolução do Senado Federal;

II – quando o montante da dívida consolidada ultrapassa

o limite máximo autorizado por lei.”

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O art. 359-B nos traz uma norma penal em branco, pois para que saiba

se houve ou não a prática da conduta ali estabelecida, o intérprete deverá

saber qual é o limite estabelecido em lei. Leia-se:

“Art. 359-B. Ordenar ou autorizar a inscrição em restos a

pagar, de despesa que não tenha sido previamente

empenhada ou que exceda limite estabelecido em lei:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.”

Nos informa Nucci:

“veda este artigo que o agente público ordene ou autorize

a inscrição em restos a pagar (...) de despesa que ainda

não foi empenhada ou que, apesar de ter sido, excedeu o

limite estabelecido na lei. Logo, evita-se deixar para o ano

seguinte e, principalmente, para o outro administrador,

despesas que já não constem expressamente como

devidas e cujo pagamento há de se estender no tempo,

especialmente se não houver recursos para o

pagamento.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal

Comentado. 5 ed. São Paulo: RT, 2005, p. 1.106.)

O art. 359-C também nos traz conduta praticada por funcionário

público, onde o próprio Estado é o lesado.

“Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de

obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano

do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser

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paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste

parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha

contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.”

Segundo lição de Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini:

“...tipifica, assim, o legislador, a passagem desses

passivos (encargos e despesas já compromissadas e que

devem ser honradas até o final do exercício) para o

mandatário seguinte, cominando sanção de natureza

penal àquele que não respeitar os prazos e condições

legais de pagamento.

A Lei, nesse dispositivo, ocupa-se em precaver que atos

de gestores públicos não venham a comprometer, por

falta de recursos, o mandato de seus sucessores. Tratam-

se das denominadas heranças ficais, ‘que imobilizam os

governos no início do mandato, por terem de pagar

dívidas e/ ou assumir compromissos financeiros deixados

pelo antecessor.’” (GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI,

Alice. Crimes de responsabilidade fiscal. . São Paulo: RT,

2001, p. 46)

O art. 359-D, assim como o art. 359-B, nos traz uma norma penal em

branco, eis a necessidade de que haja complementação, por outra lei, sobre as

hipóteses em que as despesas são autorizadas.

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“Art. 359-D. Ordenar despesa não autorizada por lei:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.”

Assim, o agente público que autoriza despesa que transgrida alguma

das determinações legais, estará incidindo neste ilícito penal.

No art. 359-E, somente podem figurar como agente ativo os chefes do

Poder Executivo da União, dos Estados, o Distrito Federal, e os Municípios. Ou

seja, temos um delito de mão própria. O sujeito passivo é a Administração

Pública.

“Art. 359-E. Prestar garantia em operação de crédito sem

que tenha sido constituída contragarantia em valor igual

ou superior ao valor da garantia prestada, na forma da

lei:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.”

A norma penal buscou impedir a concessão de garantias que venham

a colocar em risco o patrimônio público, dada a inexistência de contragarantia

por parte de quem realiza a referida operação com o ente estatal, sendo

inferior o valor quanto ao da garantia prestada.

O art. 359-F nos remonta a uma conduta omissiva própria:

“Art. 359-F. Deixar de ordenar, de autorizar ou de

promover o cancelamento do montante de restos a pagar

inscrito em valor superior ao permitido em lei:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.”

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Mais uma vez, somente o funcionário público competente para aquela

atividade, é quem pode figurar como sujeito ativo deste ilícito penal. O sujeito

passivo é o Estado.

Importante ressaltar que, para que seja punível a conduta deste

funcionário, não poderá ele ter responsabilidade alguma sobre a inscrição, pois

do contrário estaria praticando a conduta prevista no art. 359-B.

Observa-se a necessidade de complementação da lei, no sentido de

fixar que limites deverão ser observados pelo agente estatal no empenho das

despesas públicas. Temos aqui mais uma norma penal em branco.

O art. 359-G preconiza a necessidade de “impedir que o administrador

aumente o comprometimento do patrimônio público com os gastos com o

pessoal ao final do mandato ou legislatura.” (PRADO, Luiz Regis. Direito Penal

Econômico. Op. Cit. P. 251)

“Art. 359-G. Ordenar, autorizar ou executar ato que

acarrete aumento de despesa total com pessoal, nos

cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato ou da

legislatura:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.”

Por fim, o art. 359-H cuida de prever um crime de mão própria, eis que

somente pode ser praticado por chefes do Poder Executivo da União, dos

Estados, o Distrito Federal, e os Municípios.

“Art. 359-H. Ordenar, autorizar ou promover a oferta

pública ou a colocação no mercado financeiro de títulos

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da dívida pública sem que tenham sido criados por lei ou

sem que estejam registrados em sistema centralizado de

liquidação e de custódia

Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.”

Apontaremos agora alguns julgados:

“Em 17/3/05, o Sr. Alberto Goldman representou contra a

Sra. Marta Suplicy, ex-prefeita de São Paulo, afirmando-a

incursa nos artigos 1º, incisos XVII e XX, do Decreto-Lei

nº 201/67 e 359-A do Código Penal (fls. 5 a 10).

Com base nessa notícia-crime foi instaurado inquérito

policial pela 1ª Delegacia de Polícia Civil, com o objetivo

de apurar eventual contratação de dívida acima dos

valores permitidos sem prévia autorização legal pelo

Município de São Paulo, em decorrência do programa

RELUZ, o que, em tese, poderia configurar crime de

responsabilidade e ato de improbidade administrativa (fls.

2/3).

Em 12/6/07, tendo em vista a posse da indiciada no cargo

de Ministro de Estado, foram os autos remetidos a este

Supremo Tribunal Federal (fl. 474).

Após a distribuição, o eminente Ministro Sepúlveda

Pertence encaminhou o feito ao Ministério Público

Federal que, em manifestação firmada pela

Subprocuradora da República, Dra. Cláudia Sampaio

Marques, e aprovada pelo Procurador Geral da

República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva Souza,

requereu o arquivamento do inquérito por atipicidade da

conduta (fls. 483 a 486).

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Em sessão realizada no dia 8/5/08, o Tribunal Pleno, à

unanimidade, considerando o parecer do Ministério

Público Federal, determinou o arquivamento do inquérito,

nos termos da ementa seguinte:

“Penal. Processo penal. Crime contra as finanças

públicas. Crime de responsabilidade de prefeito.

Programa RELUZ. Atipicidade da conduta. Precedentes

da Corte.

1. O pedido de arquivamento formulado pelo Ministério

Público, quando tem por fundamento a prescrição ou a

atipicidade da conduta, não vincula o Magistrado.

2. A Lei nº 11.131/05 alterou a Medida Provisória nº

2.185-31 para admitir que as operações de crédito

relativas ao Programa RELUZ não se submetam aos

limites ordinários de refinanciamento das dívidas dos

municípios.

3. A disposição legal está a indicar que referidas

operações são autorizadas por lei, afastando-se, assim, o

elemento normativo do tipo “sem autorização legislativa”

mencionado no caput do artigo 359 do Código Penal.

4. A previsão contida na Lei nº 11.131/05 autoriza

descaracterizar qualquer violação em torno dos incisos

VIII, XVII e XX do artigo 1º da Lei de Responsabilidade

Fiscal.

5. Inquérito arquivado” (fl. 508).

Essa decisão foi publicada no Diário de Justiça de 13 de

junho de 2008, conforme certidão de fl. 510.

Sucede que, o Ministério Público Federal, quando

intimado do teor da decisão proferida por esta Suprema

Corte, em manifestação firmada pela Subprocuradora da

República, Dra. Cláudia Sampaio Marques, e aprovada

pelo Procurador Geral da República, Dr.

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Antonio Fernando Barros e Silva Souza, requereu a baixa

dos autos à Divisão de Processamento de Inquéritos de

São Paulo, tendo em vista que a querelada não mais

exercia as funções de Ministra de Estado do Turismo,

desde 3/6/08, conforme decreto

publicado no Diário Oficial da União e, por essa razão

teria perdido o direito ao foro privilegiado neste Supremo

Tribunal (fls. 513/514).

Decido.

O requerimento formulado pela Ilustre representante do

parquet deve ser indeferido, pois, conforme demonstrado,

em sessão realizada em 8/5/08, o Tribunal Pleno, à

unanimidade, considerando o parecer do próprio

Ministério Público Federal, determinou o

arquivamento do feito, em julgamento anterior à data na

qual a querelada foi exonerada do cargo de Ministra de

Estado do Turismo. Por essa razão, não se justifica a

baixa dos autos à Divisão de Processamento de

Inquéritos de São Paulo.

Ante o exposto, indefiro o que requerido às folhas

513/514 e determino o arquivamento dos autos, após

certificado o trânsito em julgado.

Intime-se.” (Inq 2591 / SP - SÃO PAULO

INQUÉRITO

Relator(a): Min. MENEZES DIREITO

Julgamento: 01/08/2008)

“PENAL. CRIME DE ASSUNÇÃO DE OBRIGAÇÃO NO

ÚLTIMO ANO DO MANDATO OU LEGISLATURA (ART.

359–C DO CÓDIGO PENAL). 1. REPERCUSSÃO

GERAL DA QUESTÃO CONSTITUCIONAL.

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DESNECESSIDADE DE EXAME. ART. 323, PRIMEIRA

PARTE, DO REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL. 2. AUSÊNCIA DE

PREQUESTIONAMENTO: INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS

282 E 356 DO SUPREMO TRIBUNAL. 3. ELEMENTOS

DO TIPO PENAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL:

OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.”

(AGRAVO DE INSTRUMENTO: AI 774952 GO)

No caso destes crimes contra as finanças públicas, apesar de não

termos apontado aqui um maior número de julgados, com base nas pesquisas,

é capaz de chegarmos à uma conclusão.

Infelizmente é notório que tais práticas não são coibidas, nem

sentenciadas de maneira proporcional e adequada ao prejuízo causado.

Podemos até concluir que 95% dos casos terminam em arquivamento. Isso,

podemos relacionar à motivos de política criminal, senão os índices de

arquivamento não seriam tantos.

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CONCLUSÃO

Em meados do século XX, houve o despertar da delinqüência no que

diz respeito à criminalidade econômica e financeira.

A alcunha de “delinqüência (ou crime) invisível” dados a esses tipos de

crimes, é perfeitamente apropriado, pois são poucos que chegam ao

conhecimento das autoridades, e mesmo esses carecem de provas e

investigações, de modo bastante a que sejam devidamente punidos e coibidos.

Desta forma, temos por certo que os poucos casos que são punidos,

confirmam a alta probabilidade de impunidade, o que obviamente facilita sua

proliferação.

Para Bajo Fernandez:

“A criminalidade econômica possui dois efeitos. O efeito

ressaca, pois em um ambiente de forte concorrência, o

primeiro a cometer crime, força outros a fazer o mesmo. E

o efeito espiral, pois cada novo delinqüente é causa de

nova ressaca.” (BAJO FERNANDEZ, Miguel. La

delinqüência econômica: um enfoque criminológico y

político criminal. In Anuario de Derecho Penal y Ciencias

Penales. Tomo XLV, fascículo I, enero-abril, Madrid:

Ministerio de Justicia. MCMXCII, P.590. In OLIVEIRA,

Gesner; RODAS, João Grandino. Direito e economia da

concorrência. São Paulo: RT, 2013, p. 342.)

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Se pudermos comparar estes crimes aos crimes comuns (crimes

contra o patrimônio) não é difícil percebermos que os crimes relacionados ao

direito penal econômico geram danos causados à economia e ao país como

um todo, de forma imensamente e desproporcionalmente superiores aos

outros.

Observamos que muitos casos não são levados adiante, não são

investigados e punidos severamente. Sem esquecer de mencionar que as

penalidades (quando ocorrem) incidem em mais uma forma de dar uma

“resposta” à população, e de fato nos convencem de que o “crime compensa”.

Vimos inúmeros casos de arquivamento por falta de provas,

empresários, governantes, enfim, todo tipo de pessoa do alto escalão, com

poder político, cometer os crimes aqui mencionados, sem sofrer qualquer tipo

de retaliação por parte das autoridades competentes. Isso é o fator que os

impulsiona a continuar.

Concluímos que a globalização da economia trouxe alguns

personagens que figuram à frente do desenvolvimento econômico, em todas

as nações. Ocorre que estes sujeitos se aproveitam e abusam dos poderes e

do status que lhes é conferido, causando ofensividade em áreas que vão além

da seara econômica, na política, na social, e também na própria cultura de

toda uma nação.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO I

Ordem econômica 11

1.1 – Noções históricas do Direito Penal Econômico 12

1.2– Princípios em que se assenta a atividade econômica 14

1.2.1 - Legalidade 15

1.2.2 - Intervenção mínima e insignificância 16

1.2.3 - Lesividade 16

1.2.4 - Adequação social 17

1.2.5 - Liberalismo econômico 17

1.3 – Bens jurídico-penais 18

1.4 – CADE 20

CAPÍTULO II

Política criminal 26

2.1 – Criminologia, aprisionamento e funções da pena 27

2.2 – Crime organizado e organização criminosa 35

2.3 – Breves considerações sobre o “mensalão” 39

CAPÍTULO III

Estudo jurisprudencial do Direito Penal Econômico 46

3.1 – Crimes do colarinho branco 46

3.1.1 - Crimes contra a ordem econômica 54

3.1.2 - Crimes contra as relações de consumo 71

3.1.3 - Crimes contra as finanças públicas 86

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CONCLUSÃO 95

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 97

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