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7/24/2019 E Por Falar Em Cidades
1/3Sociedade e Cultura, v.11, n.2, jul/dez. 2008. p. 389 a 391
E por falar em cidades...FREITAG, Barbara. Teorias da cidade.Campinas (SP): Papirus, 2006. 190 p.
Clovis Carvalho BrittoDoutorando em Sociologia UnB
Atualmente a questo urbanatem assumido centralidade nos de-bates das cincias sociais, temtica que extrapola o campo da socio-logia e efetua um dilogo com outras reas do conhecimento a exemplo
da antropologia, histria, geografia, arquitetura e urbanismo, psicolo-
gia, poltica, arte e literatura. Nos ltimos anos, inmeras publicaes
acadmicas vm privilegiando a cidade, considerando-a como espao
por excelncia de sociabilidade e, partindo de perspectivas terico-me-
todolgicas interdisciplinares, contribuem de forma significativa para a
construo de um arcabouo terico sobre o fenmeno urbano.
No Brasil, uma das principais estudiosas dos processos presentes na
relao cidade e sociedade a professora Barbara Freitag, cuja biblio-
grafia na rea consiste em referncia obrigatria. De acordo com Nunes
(2005), Barbara transita pela temtica cidade com uma elegncia e
desenvoltura peculiar e, seu perfil intelectual, conseguiria efetuar uma
releitura dos textos fundadores e incorporar s discusses clssicas, no-
vos olhares produzidos na contemporaneidade.
De suas inmeras publicaes no campo da sociologia urbana, po-
demos destacar: Duas cidades entre a histria e a razo (1994), Global ci-
ties in informational societies (1997), Cidade e Literatura (1998), Cidade dosHomens (2002), Itinerncias Urbanas (2004), e Cidades e desenvolvimento
regional (2005).
Sua obra mais recente, Teorias da Cidade, assume a tarefa de guia,
oferecendo um panorama da reflexo sobre as cidades, ou seja, uma
arqueologia das vrias tentativas de conceituao da cidade como fen-
meno da vida em sociedade. Da a razo do ttulo no plural, ressaltada
pela autora ao dispor que no existe uma teoria nica para abranger
todas as cidades existentes em diversos perodos e localidades. Portan-
to, sua anlise parte das teorias consideradas representativas, elaboradas
por pensadores e crticos da questo urbana. Seu intuito foi construir
uma teoria das cidades com base na anlise das teorias desenvolvidasem diferentes pocas e contextos e que possibilitasse a compreenso
do urbano hoje, ontem e no amanh. O dilogo com essas teorias no
seguiu critrios cronolgicos e foi, necessariamente, interdisciplinar.
Para tanto, a organizao da obra foi efetuada com base em diferentes
correntes, escolas, que constituram o eixo-norteador dos captulos: as
escolas Alem, Francesa, Inglesa, Americana e a Latino-Americana.
A pesquisadora aponta a perspectiva metodolgica que a orientou:
o termo escola abrange um conjunto de tericos que pensam a questo
urbana e o fenmeno das cidades no contexto de sua cultura, de seu
tempo, de suas tradies filosficas e sociolgicas. Escola pressupe,
tambm, que esse grupo desenvolva afinidades de pensamento que pos-
sam ser expressas em uma teoria mais ou menos coerente e convergen-te, que possa ser compreendida por pensadores de outra escola. [...] No
se trata de uma teoria nica, como no privilegiei uma escola espec-
fica. Cada uma formula uma teoria sobre certo modelo de cidade, um
modelo tpico para um perodo histrico a ser definido (p. 12).
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Compete observarmos que as diferentes escolas
se desenvolveram de forma paralela e se relacionaram
entre si, influenciando-se mutuamente, fator que con-
tribuiu sensivelmente para o carter inter e multidisci-
plinar que salta aos olhos do leitor quando percorre os
itinerrios do pensamento sobre a cidade.
O livro, desse modo, ao privilegiar um enfoqueterico diversificado, no se destina exclusivamente
aos estudiosos da sociologia, mas aos estudiosos da
cidade, e quando falamos em cidade poderamos sus-
citar que atualmente a temtica de quase todos os
ramos da cincia, visto ter se tornado um objeto de
estudos privilegiado da modernidade. Portanto, no
poderamos deixar de destacar que a diviso dos cap-
tulos em escolas e a apresentao da trajetria social
dos pensadores com um resumo e anlise crtica de
suas principais formulaes, de modo didtico, con-
tribui para a visualizao das idias sobre a cidade,
constituindo em profcua fonte onde os pesquisadores
podero se beneficiar.
Os critrios de seleo dos pensadores, represen-
tantes de cada escola de pensamento, basearam-se,
segundo a autora, na excelncia dos trabalhos e na
antecipao de fenmenos que vieram a manifestar-
se no espao urbano. Assim, poderemos percorrer
obras consideradas fundadoras, referenciais no mo-
tivo ou formuladoras de novos rumos para os tra-
balhos. Georg Simmel, Max Weber, Walter Benja-
min e Ronald Daus, foram os autores selecionados
como representativos da Escola Alem. CharlesFourier, Georges Haussmann, Le Corbusier, Clau-
de Lvi-Strauss, Alain Touraine, Henri Lefebvre e
Manuel Castells, da Escola Francesa. A Escola An-
glo-Saxnica do Reino Unido foi representada por
Thomas Morus, Ebenezer Howard, Patrick Geddes,
Raymond Unwin e Peter Hall. E a Escola Anglo-
Saxnica Americana por Lewis Mumford, Richard
Sennett, Saskia Sassen e os integrantes da Escola de
Chicago (Robert Park, Ernest Burgess, Roderick
McKenzie e Louis Wirth).
A preciso da autora ao detectar nas trajetriassociais e nas obras pensamentos sobre as cidades, pro-
picia ao leitor efetuar aproximaes e distanciamen-
tos entre integrantes da mesma escola e entre escolas.
Como em um trabalho artesanal, os conceitos e m-
todos principais dos tericos foram urdidos um a um,
o que possibilita visualizarmos as configuraes resul-
tantes da trama das Escolas de Pensamento.
Percebemos que assim como a cidade, as teorias
apresentam especificidades, regras centrais e perifri-
cas, longas avenidas e becos sem sada e Freitag, ao
fim de cada captulo, tenta ilumin-las, desvendando
as complexas redes de idias. Esse mtodo de apre-
sentao dos tericos em blocos ou escolas permitiu
a autora definir algumas caractersticas marcantes de
cada linhagem de pensadores: os alemes estariam
mais preocupados com a essncia histrica da cida-
de, ao passo que os franceses, com poucas excees,
pertenceriam a uma linhagem racionalista. J a EscolaInglesa se pautaria em um carter pragmtico e uti-
litarista, e a Americana teria trazido novas reflexes,
considerando os desenvolvimentos macroestruturais
dos sculos XX e XXI.
A autora destaca seu objetivo central ao reunir no
livro essas diferentes abordagens e pontos de vista: a
formao de uma teoria integrada da cidade.
Continuando suas anlises, aponta as escolas
que mais influenciaram os tericos da cidade, urba-
nistas e arquitetos no Brasil e como essa influncia
se transformou em prticas educacionais, em proje-
tos de interveno urbana, em planejamento e rea-
lizao de cidades novas no Brasil (p. 125). Assim,
traa os itinerrios da repercusso do pensamento das
escolas e sua receptividade e modificaes no Brasil,
apresentando quatro tericos considerados inovadores
na oferta de caminhos alternativos para se pensar a
questo urbana: Milton Santos, Lcio Costa, Oscar
Niemeyer e Nestor Goulart Reis.
Da leitura do texto, importante ressaltarmos no
caso brasileiro a profunda articulao entre teoria e
prtica, geradora de novas vias para o urbano e para a
arquitetura, articulao que fornece caminhos alter-nativos para repensar e visualizar as cidades.
Por fim, no texto que encerra a obra, a auto-
ra tenta buscar respostas relativas ao modo em que
uma preocupao terico-prtica relativa questo
urbana contribuiria para a amenizao dos confli-
tos resultantes dos processos de megalopolizao nas
cidades latino-americanas: Cidade do Mxico, So
Paulo, Buenos Aires e Rio de Janeiro.
Ao percorremos Teorias da Cidade chegamos ao
final da leitura com duas certezas: da crescente im-
portncia da temtica cidade e suas mltiplas formasde tratamento; e de que, baseados no depoimento de
Barbara ao narrar sua trajetria, brevemente podere-
mos nos orgulhar de ter uma Escola Brasileira, cuja
autora indiscutivelmente j faz parte:
creio que permanecerei afiliada ao tema da cidade,
que a cada dia mais me fascina. Enquanto puder, es-
tarei formando pesquisadores, dando continuidade
s minhas pesquisas e oferecendo juntamente com
meus colegas conhecimentos cada vez mais exci-
tantes, conclusivos e envolventes sobre nossas cidades
(Freitag, 2005a, p. 21).
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