20
ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E TEIAS SOCIAIS NAS PRÁXIS DE ENSINO DE GESTÃO AMBIENTAL DE UMA EQUIPE DISCENTE POTIGUAR Área temática: Gestão Ambiental & Sustentabilidade Benedito Ferreira da Silva Neto [email protected] Samara Mírian Nobre de Castro [email protected] Rosa Adeyse Silva [email protected] Resumo: Pela primeira vez na história da humanidade, não por efeito de armas nucleares, mas pelo descontrole da produção e tecnologia, podemos destruir toda a vida do planeta. Logo, é urgente a necessidade de promoção de uma conscientização ambiental em todos os níveis do ensino e sociedade, seja urbana ou rural. O grupo universitário PET – Gestão Social corrobora essa importância enquanto pertencente a uma entidade de domínio público, já que tem como uma de suas principais frentes de mobilização a realização de oficinas de Gestão Ambiental nos assentamentos rurais do semiárido potiguar. Em face da problemática exposta, o presente estudo visa analisar, por meio de uma pesquisa quantitativa survey aplicada aos assentados da zona rural de Upanema (RN), como se tem dado as experiências do grupo PET da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, em um panorama geral, a transmissão de saberes sobre a Gestão Ambiental tendo como base um planejamento ecopedagógico inteligente é intensamente profícua, embora ainda existam muitos e complexos desafios, como a utilização de uma infraestrutura adequada e que corresponda às necessidades das práxis de ensino. Palavras-chaves: Educação ambiental; Ecopedagogia; Gestão Ambiental e Educação no Campo ISSN 1984-9354

ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

  • Upload
    lamthu

  • View
    215

  • Download
    1

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E TEIAS SOCIAIS NAS PRÁXIS DE ENSINO DE GESTÃO

AMBIENTAL DE UMA EQUIPE DISCENTE POTIGUAR Área temática: Gestão Ambiental & Sustentabilidade

Benedito Ferreira da Silva Neto

[email protected]

Samara Mírian Nobre de Castro

[email protected]

Rosa Adeyse Silva

[email protected]

     

Resumo: Pela primeira vez na história da humanidade, não por efeito de armas nucleares, mas pelo descontrole da

produção e tecnologia, podemos destruir toda a vida do planeta. Logo, é urgente a necessidade de promoção de uma

conscientização ambiental em todos os níveis do ensino e sociedade, seja urbana ou rural. O grupo universitário PET –

Gestão Social corrobora essa importância enquanto pertencente a uma entidade de domínio público, já que tem como

uma de suas principais frentes de mobilização a realização de oficinas de Gestão Ambiental nos assentamentos rurais

do semiárido potiguar. Em face da problemática exposta, o presente estudo visa analisar, por meio de uma pesquisa

quantitativa survey aplicada aos assentados da zona rural de Upanema (RN), como se tem dado as experiências do

grupo PET da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo

demonstrou que, em um panorama geral, a transmissão de saberes sobre a Gestão Ambiental tendo como base um

planejamento ecopedagógico inteligente é intensamente profícua, embora ainda existam muitos e complexos desafios,

como a utilização de uma infraestrutura adequada e que corresponda às necessidades das práxis de ensino.

Palavras-chaves: Educação ambiental; Ecopedagogia; Gestão Ambiental e Educação no Campo

ISSN 1984-9354

Page 2: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

2

1. INTRODUÇÃO

Conforme os olhares de Santos (2013), Singer (2012), Wilson (2013) e Sales e Ayres (2010), vivemos a era da Internet of things e da alta tecnologia em rede. Na concepção de Gadotti (2005), em contrapartida, pela primeira vez na história da humanidade, não por efeito de armas nucleares, mas pelo descontrole da produção e tecnologia, podemos destruir toda a vida do planeta. Vivemos uma era do exterminismo, em que mais do que produção, o ponto nevrálgico do status quo corresponde à destruição (GADOTTI, 2005).

Logo, é urgente a necessidade de promoção de uma conscientização ambiental em todos os

níveis do ensino e sociedade, visto que, na concepção de Jacobi (2003), a postura de dependência e de

desresponsabilização da população é decorrente da desinformação, da falta de consciência ambiental e

crítica e de um déficit de práticas comunitárias baseadas na participação e no envolvimento dos

cidadãos para a construção de um novo padrão de sociedade.

No Brasil, de acordo com a Lei nº 7.995, de 27 de abril de 1999, cap. 1, art. 2, a educação

ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de

forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-

formal (BRASIL, 1999).

O grupo universitário PET – Gestão Social corrobora essa importância enquanto pertencente a

uma entidade de domínio público, já que tem como uma de suas principais frentes de mobilização a

realização de oficinas de Gestão Ambiental nos assentamentos rurais do semiárido potiguar. O introito

principal do grupo universitário, nesse aspecto, é estimular a conscientização da população no que

concerne a problemática crise ecológica que enfrenta o mundo hodierno.

Face a problemática exposta, o presente estudo visa analisar, por meio de uma pesquisa

quantitativa survey aplicada aos participantes da oficina, como se tem dado as experiências do grupo

PET da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) na zona rural de Upanema/RN na visão

dos assentados. Dentre os objetivos específicos, merece destaque fazer um breve estudo sobre a

Educação Ambiental e a Ecopedagogia; analisar a influência do gênero e da idade na conscientização

ambiental e do relacionamento entre os sujeitos na busca pelo desenvolvimento sustentável.

2 REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 EDUCAÇÃO NO CAMPO E RURALIDADE: INTRODUZINDO CONCEITOS E INTELECTOS

Page 3: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

3

Antonio e Lucini (2007) comentam que a consolidação das práticas educativas ao longo da

história surge das necessidades de diferentes grupos sociais em acessar a educação, já que, conforme

Oliveira (2004), as práticas educativas se constituíram quase sempre em atividades societárias restritas

às classes superiores e elitizadas, principalmente no Brasil, onde a ideologia educacional foi sempre

pautada no autoritarismo pedagógico (FREIRE, 1989).

Soma-se a esta concepção a falta de um ethos científico próprio e a utilização de um método

europeu tipicamente clássico de buscar a produção do conhecimento (OLIVEIRA, 2004). Assim,

Souza (2008) ressalta a importância de uma inserção mais significativa da discussão sobre a educação

do campo na agenda política, já que a sociedade civil organizada desempenha papel preponderante

nesse processo de ressignificação da educação nos mais diversos espaços geográficos (SCHEINVAR,

2001).

Leite (1999), Antonio e Lucini (2007) e Calazans (1993) falam sobre o grande êxodo rural que

aconteceu no início do século XX, o que veio a reduzir drasticamente a população do campo no Brasil.

Para Calazans (1993), cria-se, a partir de então, uma concepção educativa de fixação do homem no

campo como uma perspectiva romantizada e vocacionada, de onde as pessoas encontrariam na zona

rural sua felicidade e aprenderiam a ler, escrever e a exercer técnicas agrícolas e evitariam a

superlotação urbana crescente.

Para Souza (2008), a concepção de educação do campo valoriza os conhecimentos da prática

social dos camponeses e enfatiza o campo como lugar da construção de novas possibilidades de

reprodução social e de desenvolvimento sustentável. No entanto, a qualidade da educação brasileira no

campo esteve sempre em relação assimétrica com a urbana, pois conforme Leite (1999, p. 14):

A educação rural no Brasil teve por retaguarda ideológica o elitismo acentuado do processo educacional aqui instalado pelos jesuítas e a interpretação político-ideológica da oligarquia agrária, conhecida popularmente na expressão: “gente da roça não carece de estudos. Isso é coisa de gente da cidade”.

Daltro (2007) chama a atenção para a intrínseca relação entre a educação do campo e os

movimentos sociais, já que estes, como é o caso do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra

(MST), demandam do Estado a oferta de educação pública no campo, o que pressiona a atuação estatal

nesses espaços (SOUZA, 2008).

Souza (2008, p. 5) salienta que “é preciso mencionar a diferença primordial entre educação do

campo e educação rural, tal como posta no debate acadêmico e político na atualidade”, sendo a

Page 4: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

4

expressão “Educação no Campo” muito mais ampla e adequada a realidade dos camponeses (onde se

podem incluir moradores, indígenas, quilombolas etc.)

Compondo um dos vieses teóricos da educação no campo, a educação ambiental é tida como

fundamental no meio rural, já que, conforme Fernandes, Silva e Guerra (2013), a agricultura moderna

tem demonstrado insustentabilidade, pois existem áreas tão degradadas e desertificadas devido à falta

de consciência ambiental que não conseguem mais nem aceitar o exercício da atividade agrícola, dado

o nível de condenação.

Entende-se que o campo também necessita da conscientização ecológica e está sujeito a

impactos ambientais negativos devido à ação de agentes externos, sendo, geralmente, o homem sua

principal ameaça (SOARES, 2007).

Silva (2004) chama a atenção para a presença de um mosaico complexo de reflexões e

significações no que tange a nomeação da educação pautada, dentre outros, nos ideais cognitivos da

ecologia, o que se corrobora na utilização de múltiplos termos e identidades, como a ecopedagogia nos

estudos de Avanzi (2004); a Educação Ambiental na visão de Dias (2004) e Reigota (2009); a

Educação Ambiental Crítica abordada por Guimarães (2004); a alfabetização ecológica explanada por

Munhoz (2004) e a Educação Ambiental voltada para a Gestão Ambiental defendida por Quintas

(2004). Sauvé (2004) complementa essa noção ao afirmar que:

Cuando se aborda el campo de la educación ambiental, uno se puede dar cuenta que a pesar de su preocupación común por el medio ambiente y el reconocimiento del papel central de la educación para el mejoramiento de la relación con este último, los diferentes autores (investigadores, profesores, pedagogos, animadores, asociaciones, organismos, etc.) adoptan diferentes discursos sobre la EA y proponen diversas maneras de concebir y de practicar la acción educativa en este campo. Cada uno predica su propia visión y se ha incluso visto erigirse «capillas» pedagógicas que proponen la manera « correcta » de educar, « el mejor » programa, « el » método adecuado

2.1 EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM TEMPOS DA “SOCIEDADE DE RISCO” DE

BECK (1992)

Embora Dias (2004) saliente que os impactos no meio ambiente tenham iniciado há mais de

10.000 mil anos antes de cristo, Cuba (2010, p. 3) comenta que, mais expressivamente, “a Revolução

Industrial é a marca do capitalismo que, ao modificar o sistema de produção, consegue aumentar a

margem de lucro do capitalista, promovendo uma enorme poluição do ar, dos rios, do solo, etc”. Este

Page 5: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

5

período histórico foi o ponto mais significativo para toda a problemática ambiental que se enfrenta na

atualidade (CUBA, 2010).

Medina (1997), Dias (2004) e Cuba (2010) falam que o termo Environmental Education ou

“Educação Ambiental” foi pioneiramente utilizado em 1965, na Conferência de Educação da

Universidade de Keele, Grá-Bretanha. O protoconceito seguiu uma linha cognitiva de alusão à

cidadania, em que todos deveriam adquirir uma consciência crítica em relação aos impactos societários

no nível ambiental. Na visão de Dias (2004, p. 523):

A EA é um processo permanente no qual os indivíduos e a comunidade tomam consciência do seu meio ambiente e adquirem conhecimentos, valores, habilidades, experiências e determinação que os tornem aptos a agir e resolver problemas ambientais, presentes e futuros.

Quadros (2007, p. 20) fala que “Educação ambiental, antes de tudo, é ampliar os horizontes da

consciência ingênua e compartimentalizada para a realidade que está exposta à nossa volta”.

Observada essa necessidade de ampliação, é preciso salientar que existe uma vertente conceitual

equivocada que considera a Educação Ambiental como uma ferramenta meramente prescritiva e

ecológica, postergando o seu potencial de integração e interdisciplinaridade com as outras áreas

científicas (MINC, 1993).

No que tange ao avanço do capitalismo frente os impactos ambientais, Reigota (2010) defende

que “o pensamento ecologista, como uma das vertentes do pós-modernismo, colocou em xeque as

crenças laicas relacionadas com o progresso industrial e científico, como as inerentes à melhoria da

qualidade de vida da população”.

Na concepção de Jacobi (2003), o acesso à informação para a atuação cidadã e crítica é

sumariamente necessária para tornar a educação ambiental uma ação socialmente transformadora, em

que a co-responsabilização dos indivíduos torna-se ponto nevrálgico para promover uma nova lógica

de desenvolvimento – a do desenvolvimento sustentável.

Sabendo que esse desenvolvimento sustentável nunca foi realidade plena, Beck (1992) analisa

o impacto do acidente de Chernobyl, que aconteceu em 1986 na antiga União Soviética, e considera

que vivemos em uma risk society ou “sociedade de risco”, pois, para o autor (2009, p. 04):

Incalculable risks and manufactured uncertainties resulting from the triumphs of modernity mark the conditio humana at the beginning of the twenty-first century. Existing and orienting oneself in this world, therefore, increasingly involves an understanding of the confrontation with catastrophic risks (“the new historical character of the world risk society”). This

Page 6: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

6

confrontation is a self-confrontation with the institutional arrangements from which the threats proceed (“theory of institutional contradictions”) and with the logic peculiar to the associated conflicts. Those who enjoy the benefits of risks are not the ones who have to bear the costs (“antagonism of risk”).

Assim, os riscos oriundos da sociedade moderna são incalculáveis (principalmente na

perspectiva de longo prazo) e das mais variadas nuances: desde riscos ambientais a riscos genéticos

(JACOBI, 2009). Neste processo, a educação ambiental como ferramenta pedagógica de auxílio à

transformação de condutas e reforma de valores na sociedade de riscos desempenha papel fundamental

na manutenção do equilíbrio ecológico.

Ao acreditarem na existência de uma crise ecológica, por sua vez, Caride e Meira (2001, p.

211) comentam que “existe uma necessidade de enxergar a crise ambiental para além da mera adição

de problemas de ordem biofísica ou natural, para compreendê-la como um fenômeno complexo, de

interações múltiplas e de evolução indeterminada”.

2.3 ECOPEDAGOGIA, CIDADANIA PLANETÁRIA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

A ecopedagogia, que consiste em um termo cunhado por Gutiérrez e Prado (2000) para se

referir a um estilo de pedagogia preocupado, dentre outras coisas, com a problemática ecológica, tem

seus pilares ideológicos no tripé Educação, Sociedade e Natureza. Esses pilares referem-se,

basilarmente, à pedagogia freireana, à complexidade e ao holismo, respectivamente para se referir a

um tema que passará a ser cada vez mais comum nas discussões sobre educação (GADOTTI, 2005;

AVANZI, 2004).

Na dimensão educação do tripé, entra em cena a noção teórica de autonomia de Freire (1996),

pois conforme Zatti (2007), “Freire formulou uma proposta educacional que procura transformar o

educando em sujeito, o que implica na promoção da autonomia”. A autonomia seria, portanto, a

capacidade de o indivíduo formular para si próprio os princípios e as análises críticas em relação ao

meio em que vive e tudo que nele acontece, sendo o contrário uma espécie de heteronomia (FREIRE,

1996; ZATTI, 2007).

No que se refere à vertente natureza, Avanzi (2004) comenta que o conceito chave é o holismo,

principalmente em se tratando dos estudos de Leonardo Boff e Fritjof Capra. Fala-se num “equilíbrio

ambiental” atingido por meio de uma nova maneira de se relacionar com a terra, com foco na

Page 7: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

7

tolerância, no respeito, na igualdade social, cultural, de gênero e aceitação da biodiversidade

(GUTIÉRREZ E PRADO, 2000; AVANZI, 2004).

No viés da sociedade, o conceito chave para entender esse conjunto harmônico e relacional

consiste na Teoria da Complexidade, de Morin (2000), onde Avanzi (2004) comenta que os pontos

mais substanciais referem-se à recusa a um conhecimento geral e seguro que encubra as dificuldades e

dúvidas do processo de compreensão e a busca por ajustes entre ordem e desordem.

Um conceito importante da Ecopedagogia é a noção de “cidadania planetária” que, conforme

Pereira (2007), é uma expressão adotada para definir um conjunto de ações, princípios, valores,

atitudes e comportamentos, que cada cidadão, habitante da Terra, deve ter para contribuir à sua

manutenção, o seu cuidado constante”. Assim, todos devem manter uma certa identidade coletiva ao

adquirir a noção de que todos são sujeitos pertencentes a um mesmo cosmos. Uma das observações

mais clássicas sobre a planetariedade é a Gadotti (2000, p. 135) ao propor que:

A cidadania planetária sustenta-se na visão unificadora do planeta e de uma sociedade mundial. Ela se manifesta em diferentes expressões, “nossa humanidade comum”, “unidade de diversidade”, “nosso futuro comum”, “nossa prática comum”, “cidadania planetária.

Ao criar a expressão homônima “Pedagogia da Terra” para se referir à Ecopedagogia, cinco

anos depois, Gadotti (2005, p. 02) explana que: A ecopedagogia não é uma pedagogia a mais, ao lado de outras pedagogias. Ela só tem sentido como projeto alternativo global onde a preocupação não está apenas na preservação da natureza (Ecologia Natural) ou no impacto das sociedades humanas sobre os ambientes naturais (Ecologia Social), mas num novo modelo de civilização sustentável do ponto de vista ecológico (Ecologia Integral) que implica uma mudança nas estruturas econômicas, sociais e culturais. Ela está ligada, portanto, a um projeto utópico: mudar as relações humanas, sociais e ambientais que temos hoje. Aqui está o sentido profundo da ecopedagogia, ou de uma Pedagogia da Terra.

Assim, por possuir esse caráter mais holístico de enxergar o processo de conscientização e

reformulação de valores sociais, a Ecopedagogia é vista por autores como Pereira (2007), Gadotti

(2005), Keim (2004) e Avanzi (2004) como uma lógica mais apropriada do que a da Educação

Ambiental, que concebe todo o processo através de uma visão mais segmentada e apartada da

dimensão social.

Gutiérrez e Prado (2000), quem sintetizaram a “protonoção” da Ecopedagogia, juntamente com

Avanzi (2004) tecem críticas a Educação Ambiental ao falarem de um tratamento acrítico com que a

EA trata o desenvolvimento sustentável.

Page 8: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

8

Além do mais, ao promover a ressignificação de valores na sociedade sem contextualizar a

problemática com as desigualdades econômicas e sociais, entende-se que existe uma miopia no

processo de reformulação que apenas corrobora e mantém a lógica instrumental e hegemônica dada ao

desenvolvimento no mundo hodierno (SETTI, 2015). Assim, ao comentar sobre o viés social na

ecopedagogia, Keim (2004) ressalta a importância do habitus, do campo, do capital cultural e das

relações, que são tão importantes no processo de ensino-aprendizagem.

Face o exposto, por considerar a Ecopedagogia um conceito mais holístico, atual e adequado, o

presente estudo vai optar por usar essa nomenclatura em substituição à noção da Educação Ambiental

(EA).

3 MATERIAS E MÉTODOS

Tendo como base a explanação de Bourdon (1989) ao afirmar que a pesquisa quantitativa é

válida quando os elementos de uma população possuem características similares entre si, o estudo

utilizou o método quantitativo survey que, na visão de Freitas et al (1998, p. 02) “utiliza dados ou

informações quantitativas sobre características, ações, opiniões de determinados grupos de pessoas”.

Logo, quanto ao método, a pesquisa é caracterizada como quantitativa.

Quanto aos objetivos, a presente pesquisa é reconhecida como descritiva, já que procura

identificar e analisar quais as opiniões são manifestadas em uma população que mantem vínculos

relativamente próximos (FREITAS ET AL, 1998). Na percepção de Gil (2008), a pesquisa descritiva

caracteriza-se também pela padronização na obtenção dos dados, que geralmente são coletados através

da utilização de questionários.

Quanto aos procedimentos técnicos, a pesquisa é caracterizada como um levantamento survey,

pois baseada em Fink (2013), a obtenção dos dados foi obtida diretamente através de um questionário

auto-administrado aplicado pessoalmente junto a população total do estudo, caracterizando assim, um

censo (GIL, 2008).

Foi aplicado um questionário de 22 perguntas junto ao total de 50 dos 50 participantes de uma

oficina de Gestão Ambiental realizada pelo Programa de Educação Tutorial (PET) Conexões de

Saberes – Gestão Social em 2014 no complexo de assentamentos 4S (São Sebastião, São Manoel, São

Pedro, Sabiá e Sombreiro) localizado no Rio Grande do Norte, semiárido brasileiro. Por motivos de

Page 9: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

9

adequação ao problema de pesquisa, das 22 questões, somente 8 (oito) efetivamente interessaram ao

presente estudo.

É válido ressaltar que 5 dos 7 questionamentos utilizaram uma escala Likert de valores, que é a

análise psicométrica mais utilizada quando se pretende analisar a opinião, variando o nível de

concordância com as afirmações propostas num julgamento de 1 a 5 escores (DALMORO E VIEIRA,

2008). Assim, o assentado que marcava 1 reconhecia que achava ruim a afirmação (não concordava

em nada); 2 quando achava regular; 3 quando julgava bom; 4 quando julgava muito bom, ou seja,

quando considerava a afirmação excelente (máximo de concordância) (Tabela 1).

Tabela 1 – Exemplo de afirmações das quais os participantes da oficina precisaram julgar

Afirmação (exemplo) O material disponibilizado foi suficiente para a realização da oficina.

1 2 3 4 5

X

Fonte: Elaborado pelos autores (2015)

Após a aplicação dos questionários no término da oficina, que teve duração de 2 domingos (5

horas no total), os dados foram tabulados e utilizou-se uma análise gráfica percentual por meio de

gráficos setoriais (pizza) para descrever as percepções dos participantes sobre a experiência de

educação ambiental voltada para a Gestão Ambiental.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.1 O PET CONEXÕES DE SABERES - GESTÃO SOCIAL E O ASSENTAMENTO 4S (RN)

O Programa de Educação Tutorial consiste numa ação do MEC nas universidades que atua com

o objetivo de complementar a formação universitária em todo Brasil. Silva, Andrades e Moraes (2009,

p. 02) complementam que:

O Programa de Educação Tutorial (PET) é um programa composto por grupos tutoriais de aprendizagem regidos pela Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação (SESu/MEC). Busca propiciar aos alunos sob orientação de um professor tutor condições a realização de atividades extracurriculares. Essas atividades têm como objetivo oferecer aos alunos uma formação ampla e favorecer a instrução acadêmica de ensino superior.

Page 10: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

10

O PET Gestão Social consiste num desses programas de tutoria, estando situado na

Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA) – Campus central, em Mossoró, Rio Grande do

Norte, como complementação às atividades de ensino, pesquisa e extensão do bacharelado em

Administração da referida universidade. O grupo conta atualmente com 1 tutora (professora com título

de doutorado), 12 bolsistas e 3 voluntários (todos alunos da graduação em Administração).

O PET de Administração da UFERSA tem como uma de suas frentes de mobilização a

Agricultura Familiar da região de Mossoró e seus grupos de estudos têm como objetivo romper com a

lógica instrumental da administração como orientadora única das ações de gestão, nesse sentido

estando em relação direta e harmônica com o perfil do egresso pretendido na missão da universidade

em que está situado (UFERSA, 2015). Conforme disponibilizado na página da equipe hospedada no

portal da UFERSA:

O grupo tem como objetivo analisar a dimensão cultural do processo de gestão da agricultura familiar e suas implicações na sustentabilidade da propriedade assim como sua inserção no mercado e geração de renda, a fim de encontrar formas de reduzir as assimetrias sociais e econômicas entre os demais agentes do agronegócio.

No complexo de assentamentos 4S (São Sebastião, São Manoel, Sabiá e Sombreiro), o grupo

tem realizado uma série de capacitações junto aos assentados. A maioria dos camponeses mora nas

suas respectivas propriedades desde o processo de acampamento da zona rural, precisamente nas

proximidades do Upanema (RN).

As oficinas aconteceram em escolas rurais disponibilizadas pelo poder público do município de

Upanema (RN). A infraestrutura na percepção de 50% dos alunos é a necessária para a realização das

atividades (nível máximo de concordância sobre a afirmação - excelente). No entanto, em alguns dos

locais notou-se a falta de água, o que acarretou prejuízos no processo de aprendizagem (gráfico 1).

Gráfico 1 – Visões dos participantes sobre a infraestrutura dos locais das oficinas de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Page 11: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

11

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Dentre as várias oficinas realizadas pelo grupo no assentamento, a mais bem avaliada e

apropriada na visão dos moradores foi a de Gestão Ambiental, onde os assentados tiveram dois

encontros de discussão sobre a temática que acabaram concentrando a maior parte dos esforços na

discussão que culminou na conclusão axiomática dos próprios participantes de que a Gestão Ambiental

só é possível de ser alcançada através da conscientização ambiental (imagem 1).

Imagem 1 – Registro de alguns dos participantes da oficina de Gestão Ambiental do PET Gestão Social no assentamento 4S (RN)

Fonte: registro dos autores (2015)

Page 12: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

12

Assim, os graduandos que ministraram a oficina basearam-se nos princípios da ecopedagogia

para reformular os padrões de comportamento dos assentados e deles próprios, atuando como

“pedagogos universitários” na busca pela conscientização da dimensão ambiental.

4.2 PERFIL ETÁRIO E DIVERGÊNCIAS DE GÊNERO NA PARTICIPAÇÃO DA

OFICINA

A pesquisa revelou uma tendência de participação maior dos jovens na oficina de Gestão

Ambiental, já que 62% dos participantes possuem menos de 20 anos de idade. Este resultado entra em

desacordo com a perspectiva de Cabral et al (2006) que concluiu que a terceira idade possui uma

maior preocupação no que se refere à educação ambiental e à sustentabilidade (gráfico 2).

Já no que se refere ao perfil de gênero predominante na participação da oficina, observou-se

que mais de 80% dos participantes são mulheres, o que vem a demonstrar um engajamento feminino

na participação do processo de conscientização ambiental no espaço geográfico locus da pesquisa

(gráfico 3).

Gráfico 2 - perfil etário dos assentados participantes da oficina de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

Almeida e Martins (2015) analisam os papeis de gênero no envolvimento da dimensão

ambiental e consideram que, na sociedade atual, o homem continua a preocupar-se muito mais com

fatores econômicos e políticos e a mulher, geralmente, por questões mais complexas e profundas. Os

autores explanam que (2015, p. 16):

Page 13: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

13

O homem tem representado e lutado por questões referentes ao seu modo de vida na terra, na discussão política e econômica, procurando afirmar seu papel principal nas decisões a serem tomadas. Enquanto isso, a mulher tem se preocupado e representado questões voltadas à proteção da natureza, à educação e à saúde.

Viezzer, Rodrigues e Moreira (1996, p. 11) também tratam da temática e destacam:

Como bem salientou Paulo Freire durante a Jornada de Educação Ambiental na Rio-92, ao lembrar “a luta pelo verde” : “sem homem e mulher o verde não tem cor”. Na mesma oportunidade, as educadoras e educadores vindos do mundo inteiro para participar dessa Jornada incluíram no Tratado de Educação Ambiental (Tratados das ONGs, 1994) o compromisso de aprender a “partilhar entre homens e mulheres a produção de bens e a manutenção da vida” como um dos itens da aprendizagem permanente de quem acredita na possibilidade de “sociedades sustentáveis e responsabilidade global”.

De todo modo, percebe-se a necessidade de que os homens tenham atenção redobrada para a

conscientização ambiental na contemporaneidade, visto que o paradigma da crise ecológica não exclui

gênero no que tange a culpabilização das degradações, sendo comum tanto homens quanto mulheres

constituírem condutas de irresponsabilidade social (VIEZZER, RODRIGUES E MOREIRA, 1996;

ALMEIDA E MARTINS, 2015).

Gráfico 3 – Perfil de gênero dos participantes da oficina de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Fonte: Dados da pesquisa (2015)

É preciso salientar também que, no que se refere à participação nas oficinas do grupo PET

Gestão Social, os homens tendem a serem menos participativos e receptivos à aquisição do

conhecimento, mas a oficina de Gestão Ambiental representou uma composição fora do comum em

relação às outras temáticas ministradas, o que possui correspondência lógica com os estudos de

Viezzer, Rodrigues e Moreira (1996) e Almeida e Martins (2015).

Page 14: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

14

4.3 PLANEJAMENTO DAS OFICINAS E EXPECTATIVAS DOS PARTICIPANTES

Todas as oficinas ministradas nos assentamentos rurais pelo PET - Gestão Social possuem uma

metodologia pedagógica, sendo cada encontro planejado por ações e atividades pré-estabelecidas

(embora muitas vezes os percursos acabem se invertendo para facilitar o processo de ensino-

aprendizagem).

Dessa forma, um ponto de inflexão interessante consiste na percepção dos participantes sobre o

grupo PET ter cumprido o planejamento pré-estabelecido no primeiro dia dos encontros. Questionados

sobre este aspecto, 54% dos participantes concordaram que o planejamento foi cumprido do início ao

fim, enquanto que apenas 4% e 2% respectivamente considerou que o percurso planejado foi

distorcido ao longo da oficina (regular e ruim) (gráfico 4).

Gráfico 4 – Visão dos participantes em relação ao cumprimento do planejamento pré-estabelecido da oficina de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Fonte: Dados da pesquisa (2015)

Fusari (2015) defende que o planejamento deve ser concebido, assumido e vivenciado no

cotidiano da prática social de quem ensina, como um processo de reflexão. Assim, percebe-se que é

interessante e indispensável que o grupo continue a realizar essa prática, de maneira a aumentar esse

percentual de satisfação máxima e otimizar a transmissão da conscientização ambiental para os

moradores rurais que participam da ação e chamar a atenção de outros que ainda não se envolveram.

Outro viés de análise possibilitado pela pesquisa consistiu na observação das expectativas dos

participantes em relação à oficina. Dos assentados, 50% julgou excelente o atendimento da oficina às

Page 15: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

15

expectativas que possuía, o que representa um percentual considerável (gráfico 5). No entanto, ainda

percebe-se que quase metade (48%) considera a afirmação sobre o atendimento às expectativas “Muito

bom” ou “Bom”, o que denota a necessidade de constante melhora nas práticas ecopedagógicas

utilizadas.

Gráfico 5 – Expectativas dos participantes da oficina de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Fonte: Dados das pesquisas (2015)

Assim, no que tange ao planejamento das ações nas oficinas, existe certa linearidade na

satisfação dos assentados, já que são raras, mas não menos importantes, as insatisfações extremas

(ruim ou regular). Quanto às expectativas, o grupo tem trabalhado também com retornos significativos,

o desafio principal é alargar o raio de satisfação dos participantes para a excelência.

4.4 APLICABILIDADE COTIDIANA E TEIAS SOCIAIS NO CAMPO: REFLEXOS

DAS OFICINAS NA VISÃO DOS ASSENTADOS

Para Lopes (1999, P. 137), “o conhecimento cotidiano das classes populares é situado como

eixo central do processo de ensino-aprendizagem, como é o caso de autores referenciados na Educação

Popular”. Assim, é essencial que esse conhecimento do cotidiano esteja presente na pedagogia e que o

conhecimento oriundo da pedagogia também tenha aplicabilidade prática nesse mesmo cotidiano, num

processo de mútuas trocas de saberes entre espaços.

Tendo em mente esta perspectiva, analisou-se a visão dos assentados sobre a aplicação

cotidiana dos conhecimentos adquiridos da oficina de Gestão Ambiental ministrada sob a luz da

Page 16: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

16

ecopedagogia, onde se observou que 58% dos participantes da oficina concordam que aplicaram as

noções de conscientização da dimensão ambiental na prática (gráfico 6).

Gráfico 6 – Visões sobre a aplicabilidade cotidiana dos conhecimentos adquiridos na oficina de Gestão Ambiental na visão dos assentados do 4S (RN) em 2014

Fonte: Dados da pesquisa (2015)

Por último, mas não menos importante, a pesquisa também procurou analisar a influência da

prática pedagógica na dimensão social, já que Gadotti (2005), Avanzi (2004), Gutiérrez e Prado (2010)

e Pereira (2007) afirmam que a ecopedagogia, diferente da Educação Ambiental, auxilia no processo

de reconstrução de identidades e teais sociais no campo.

Nesse prisma, ao responderem sobre se a realização da oficina havia facilitado o processo de

relacionamento entre os assentados, 50% dos participantes julgou excelente a afirmação e outros 26%

consideraram muito boa. Assim, percebe-se que as proposições iniciadas por Gutiérrez e Prado (2010)

parecem, de fato, manterem conexão lógica com a realidade do locus pesquisado (gráfico 7).

Gráfico 7 – Visões dos participantes sobre as teias de relacionamentos oriundos das oficinas de Gestão Ambiental no assentamento 4S (RN) em 2014

Page 17: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

17

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

É preciso ter em mente que o processo de relacionamento dos participantes é perceptivelmente

deteriorado em função da disputa de recursos e interesses entre os assentados e as autoridades

governamentais e até entre eles próprios, o que corrobora a importância da utilização das práticas

ecopedagógicas na estabilização de interesses conflitantes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As práticas ecopedagógicas na contemporaneidade correspondem a um instrumento válido na

busca pelo imenso desafio em que consiste a conscientização da dimensão ambiental no nível

societário. Cientes disso, as práticas de ensino precisam estar cada vez mais adaptadas a essa nova

realidade.

O estudo demonstrou que, em um panorama geral, a transmissão de saberes sobre a Gestão

Ambiental tendo como base um planejamento ecopedagógico inteligente é intensamente profícua,

embora ainda existam muitos e complexos desafios, como a utilização de uma infraestrutura adequada

e que corresponda às necessidades das práxis de ensino.

As experiências do Grupo PET – Gestão Social tem demonstrado a informação interessante de

que é possível fazer a diferença tendo para tal recursos limitados e organização na troca de

conhecimentos entre a universidade e o ambiente externo, algo que deveria, mas nem sempre acontece

com efetividade.

Page 18: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

18

Outras pesquisas podem apontar quais os principais desafios de aplicação da ecopedagogia no

ensino, assim como qual outro estilo pedagógico está sendo repassado nas escolas públicas e

particulares: se é o chamado “ambientalismo superficial” ou uma proposta mais interessante e

consistente como a ecopedagogia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BECK, U. Risk society. London: Sage Publications, 1992.

BOURDON, Raymond. Os métodos em sociologia. Tradução de Lólio Lourenço de Oliveira. São Paulo: Ática, 1989.

CALAZANS, M.J.C. Para compreender a educação do Estado no meio rural: traços de uma trajetória. In: THERRIEN, J.; DAMASCENO, M.N. (Org.). Educação e escola no campo. Campinas: Papirus, 1993.

CARIDE, J. & MEIRA, P. (2004). Educação Ambiental e Desenvolvimento Humano. Lisboa: Instituto Piaget

DALMORO, Marlon. VIEIRA, Kelmara Mendes. Dilemas na construção de Escalas do tipo Likert: o número de itens e a disposição influenciam no resultado? In: ENCONTRO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO – ENANPAD, 32. ed. Anais... Rio de Janeiro, RJ: 2008.

DALTRO, R. R. Movimentos sociais e educação do campo. In: Vidya, v. 27, n. 2, p. 33- 42, jul/dez., 2007. Disponível em: http://sites.unifra.br/Portals/35/Artigos/2007/Vol_2/V-Movimentossociais.pdf. Acesso em: 12. abr. 2015.

DIAS, Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e práticas. 7.ed. São Paulo: Gaia, 2004.

FERNADES, R. R., SILVA A. A., GUERRA, M., Agroecologia, desenvolvimento rural sustentável e educação ambiental na escola de campo. Disponível em < http://www.sertao.ifrs.edu.br/site/midias/arquivos/2013311105741464artigo_agroecologia,_desenvolvimento_rural_sustentavel_e_educacao_ambiental_na_escola_do_campo.pdf>. Acesso em: 15 abr. 2015, 15:16:32.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (coleção Leitura)

FUSARI, J. C. O Planejamento do Trabalho Pedagógico: Algumas Indagações e Tentativas de Respostas. Série Idéias, n. 8. São Paulo: FDE, 1998. (p.44-53)

Page 19: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

19

GADOTTI, Moacir. Pedagogia da terra. São Paulo: Peirópolis, 2000.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008

LEITE, S.C. Escola rural: urbanização e políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 1999.

LOPES, A. R. C. Conhecimento escolar: ciência e cotidiano. Rio de Janeiro, RJ: Ed. UERJ, 1999.

MEDINA, Naná Mininni. Breve Histórico da Educação Ambiental. In: Educação Ambiental caminhos trilhados no Brasil, org. Padua, Suzana M.; Tabanez Marlene F. Brasília: Instituto e Pesquisas Ecológicas, 1997; p. 265-269.

MINC, C. Educação ambiental. Caderno Cedes, nº 29, 1999.

MORIN, Edgar; LE MOIGNE, Jean-Louis. A Inteligência da Complexidade. São Paulo: Petrópolis, 2000.

Oliveira, Marcos Marques de. As origens da educação no Brasil da hegemonia católica às primeiras tentativas de organização do ensino. Ensaio: aval.pol.públ.Educ., Dez 2004, vol.12, no.45, p.945-958.

PEREIRA, Franciele Guedes S. Ecopedagogia: Um modismo ou uma nova teoria da Educação Ambiental 2009. Disponível em: http://www.pucpr.br/eventos/ /educere2007/anais> Acesso em: 13. abr 2015.

Reigota, M. O que é educação ambiental. 2ª ed. Brasiliense, São Paulo, 2009

SANTOS, Victor. A internet das coisas e a TAR: onde está o homem? Revista Temática, João Pessoa, v. 9, n. 10, p.1-15, maio 2013. setembro, 1991. Disponível em <http://www.ubiq.com/hypertext/weiser/SciAmDraft3.html>. Acesso em 04. Fev. 2015.

SETTI, G. A. M. A hegemonia neoliberal e o capitalismo contemporâneo. Revista Urutágua - Acadêmica Multidisciplinar, Maringá, n. 5, 2004. Disponível em: < http://www.urutagua.uem.br/005/ 04eco_setti.htm.>. Acesso em: 12 abr 2015.

SILVA, T. L. G; ANDRADES, B; MORAES, M. L. A. Educação Tutorial em Cena: Uma Perspectiva dos Tutores de Porto Alegre. X Salão de Iniciação Científica – PUCRS. Rio Grande do Sul, 2009.

SINGER, Talyta. Tudo conectado: Conceitos e representações da Internet das Coisas. 2012. Disponível em: <http://www.simsocial2012.ufba.br/modulos/submissao/Upload/44965.pdf>. Acesso em: 02 fev. 2015.

Page 20: ECOPEDAGOGIA E RURALIDADE: GÊNERO, IDADE E · PDF file... (UFERSA) nesse local com o uso da ecopedagogia. O estudo demonstrou que, ... Industrial é a marca do capitalismo que, ao

XI CONGRESSO NACIONAL DE EXCELÊNCIA EM GESTÃO 13 e 14 de agosto de 2015

20

SOARES, N. B. Educação ambiental no meio rural: estudo das práticas ambientais da escola Dario Vitorino Chagas – comunidade rural do Umbu – Cacequi/RS. Monografia (especialização). Universidade Federal Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, 2007.

ZATTI, V. Autonomia e educação em Immanuel Kant e Paulo Freire. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007. Disponível em: http://www.pucrs.br/edipucrs/online/autonomiaeeducacao.pdf. Acesso em: 13. abr. 2015.