61
Departamento de Geografia Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas Universidade de São Paulo Geomorfologia II Construção do Conhecimento na Geomorfologia - Brasil Prof. Dr. Fernando Nadal Junqueira Villela

Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

  • Upload
    doananh

  • View
    228

  • Download
    2

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Departamento de Geografia

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

Universidade de São Paulo

Geomorfologia II

Construção do Conhecimento na Geomorfologia - Brasil

Prof. Dr. Fernando Nadal Junqueira Villela

Page 2: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

GEOLOGIA

Page 3: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

No Brasil, as ciências geológicas iniciaram-se em fins do séc. XVIII, com objetivos principalmente voltados à mineração

José Bonifácio de Andrada foi um dos maiores mineralogistas de sua época, descrevendo alguns minerais no Estado de São Paulo

Com a vinda da corte portuguesa para o Brasil, foram trazidos engenheiros de minas que muito ajudaram a entender a geologia brasileira: W. L. Von Eschwege, encarregado das regiões auríferas de MG, e L. W. Warnhagen, responsável pela reorganização da Fábrica de Ferro de Ipanema

A. Von Humboldt, J. E. Pohl, F. Von Martius, J. B. Spix e até mesmo Charles Darwin também contribuíram imensamente para os estudos da paisagem brasileira, em que se incluem diversas observações geológicas válidas até os dias atuais

Page 4: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Esta 1ª fase corresponde às grandes expedições naturalistas no território brasileiro, que, embora de grande valor, não foi sistemática

Dentre as principais contribuições há os trabalhos de Jean Louis R. Agassiz e Charles Frederick Hartt

Ambos fizeram inúmeros levantamentos, junto com outros autores, sobre a constituição e estrutura geológica do país, além de haver raciocínios sobre a evolução das paisagens envolvidas

Page 5: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Foram melhor investigados o Maciço Atlântico, as Bacias Sedimentares, o centro-oeste brasileiro e a região nordeste

Após 1870, expedições estrangeiras financiadas por universidades e a Comissão Geológica do Império iniciou a 2ª fase de levantamentos geológicos sistematizados no país; esta, embora de duração curta (1875-1877), permitiu a pesquisadores como Hartt, Orville Adalbert Derby e G. Branner a produção de inúmeros trabalhos científicos, inclusive a edição do primeiro mapa geológico institucional brasileiro

Foram criadas posteriormente a Seção de Geologia e Mineralogia do Museu Nacional (1877), a Escola de Minas (Ouro Preto, 1876), a Comissão Geográfica e Geológica da Província de São Paulo (1886) e a Comissão de Estudos das Minas de Carvão de Pedra do Brasil (1892), culminando com a criação do Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil em 1907, retomando pesquisa sistemática da geologia nacional e pondo fim às chamadas Comissões

Page 6: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 7: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 8: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A 3ª fase de desenvolvimento dos conhecimentos geológicos do país foi intimamente ligada ao Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil no séc. XX, sob o comando de O. Derby, sucedido por Gonzaga de Campos e depois por Euzébio Paulo de Oliveira

Na déc. de 30 houve distinção entre a pesquisa pura, sob encargo do Serviço Geológico e Mineralógico transformado em Divisão de Geologia e Mineralogia, e a pesquisa aplicada, passada a Departamento Nacional de Produção Mineral

Em São Paulo foi criado o Instituto Geográfico e Geológico de São Paulo, além da Escola Politécnica e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas

Muitos trabalhos foram essenciais ao conhecimento da ciência geológica e geologia econômica do Brasil, a exemplo das pesquisas de Israel C. White (“Coluna White”), John Casper Branner (“Geologia do Brasil” e edição do 1º mapa geológico de conjunto do território brasileiro), Luís Flores de Moraes Rego, Alberto B. Paes Leme, Viktor Leinz, Othon Henry Leonardos (“Atlas Geológico do Brasil”, com Avelino I. de Oliveira), Guilherme Florence, Chester Washburne e outros, desde a fase da Comissões Geológicas até a criação do Conselho Nacional do Petróleo, que culminaria na criação da Petrobrás em 1953

Page 9: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Ruy O. Freitas, Sérgio Stanislaw do Amaral, Setembrino Petri, Fernando F. M. de Almeida, V. Fúlfaro, Kenitiro Suguio, Y. Hasui, Rocha-Campos e muitos outros aprofundaram os estudos nos mais variados campos da geologia brasileira, assim como instituições voltadas à pesquisa geológica como o IG, IPT, DNPM, CPRM, Projeto Radambrasil, Petrobrás, CVRD, CSN, etc

Page 10: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 11: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Geocronologia e Estratigrafia da Bacia Sedimentar do Paraná

Page 12: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Em determinado momento do Fanerozóico, houve a formação no continente sul-americano de uma grande área rebaixada, por um processo de subsidência, em que o mar invadiu a costa oeste da América do Sul (a Cordilheira dos Andes ainda não existia)

Esta área formou uma grande calha de acumulação, cuja deposição de sedimentos em camadas concordantes a discordantes deram origem às rochas sedimentares atualmente existentes

Era a Bacia Sedimentar do Paraná, depressão preenchida por detritos marinhos e continentais, que testemunhou um dos melhores registros mundiais da sequência de eventos do supercontinente de Gondwana

A Bacia do Paraná, além do Paraguai e Argentina, alcança os estados brasileiros do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul

Page 13: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 14: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 15: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Ao longo da rodovia SC-438, na Serra do Rio do Rastro, no sul do Estado de Santa Catarina, próximo à cidade de Lauro Müller, ocorre um dos melhores conjuntos de afloramentos da coluna estratigráfica da borda sudeste da Bacia do Paraná, representando uma das colunas clássicas da estratigrafia do Gondwana mundial

Esta coluna foi descrita pela primeira vez pelo geólogo americano Israel C. White, em 1908, quando da publicação do Relatório Final dos levantamentos desenvolvidos durante o período de 1904 a 1906, para a “Comissão de Estudos das Minas de Carvão de Pedra do Brazil”

“Coluna White”

Page 16: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 17: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 18: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 19: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2
Page 20: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

O roteiro geológico da Serra do Rio do Rastro foi cuidadosamente implantado ao longo da rodovia SC-438, sinalizado por um conjunto de 17 marcos de concreto com a caracterização das feições mais significativas da geologia em cada ponto, descritas pelo CPRM

Page 21: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

01: Zona de contato entre os folhelhos sílticos cinzas pertencentes à Formação Rio do Sul (R), do Grupo Itararé, e os arenitos sigmoidais do Membro Triunfo (T) da Formação Rio Bonito, Grupo Guatá , representando a progradação deltaica do Rio Bonito sobre as fácies de prodelta do Grupo Itararé. Ambiente: sub-aquoso (Rio do Sul) passando a deltaico fluvial (Triunfo). Idade: Permiano Inferior (± 250 milhões de anos) 02: Sequência de siltito argiloso cinza, bioturbado, gradando no topo para arenitos claros com ondulações truncantes, pertencentes ao Membro Paraguaçu da Formação Rio Bonito do Grupo Guatá, representando ambiente marinho raso da Formação Rio Bonito

Page 22: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

03: Pacote de arenitos claros, marinhos (m), bioturbados e retrabalhados por ondas, do Membro Paraguaçu, recobertos, através de superfície erosiva, por arenitos fluviais do Membro Siderópolis (f) da Formação Rio Bonito, Grupo Guatá. Ambiente litorâneo que progradou sobre a sedimentação marinha do Membro Paraguaçu 04: Arenitos argilosos do Membro Siderópolis, com estratificação tangencial representando a fácies marinha praial da Formação Rio Bonito, Grupo Guatá. Nota-se na porção superior do perfil parte da “camada de Carvão Bonito”, explotada em grande escala na região. Esta camada de carvão representa as turfeiras associadas a barreiras litorâneas

Page 23: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Conteúdo fossilífero da Formação Rio Bonito: restos vegetais como impressões de plantas da flora Glossopteris e palinomorfos, encontrados nos carvões e rochas associadas (Idade: Permiano Inferior)

Page 24: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

05: O afloramento originalmente associado a este ponto, com a exposição da camada de carvão Barro Branco, foi minerado, não mais sendo possível portanto observá-lo

06: Pacote de siltitos e folhelhos arenosos, amarelados, bioturbados, representando o ambiente marinho raso da Formação Palermo, Grupo Guatá, transgressivos sobre a Formação Rio Bonito. Ambiente marinho transgressivo, sob influência de ondas e marés, que cobrem o ambiente deltaico lagunar da Formação Rio Bonito

Page 25: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Conteúdo fossilífero da Formação Palermo: troncos fósseis silicificados Dadoxilon e palinomorfos

Page 26: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

07: Folhelhos escuros,betuminosos, da Formação Irati - Membro Assistência, do Grupo Passa Dois, representando ambiente subaquoso restrito, de águas calmas (lagunar?), abaixo do nível da ação das ondas. Idade: Permiano Superior 08: Contato por falha entre arenitos e siltitos (com mergulho contra a falha) da Formação Teresina (?) e folhelhos escuros (horizontais) da Formação Serra Alta. Formação Teresina indica ambiente marinho de águas rasas e agitadas, dominado por ondas e ação das marés

Page 27: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Conteúdo fossilífero da Formação Irati – Membro Assistência: répteis Mesosaurus brasiliensis e Stereosternum tumidum, além de restos vegetais, peixes, crustáceos e palinomorfos

Page 28: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

09: Espessa seqüência de folhelhos e siltitos cinza-escuros com laminação plano-paralela, com esparsas concreções calcáreas, da Formação Serra Alta, Grupo Passa Dois, representando, à semelhança da Formação Irati, uma deposição em ambiente de águas calmas abaixo do nível das ondas 10: Zona de contato transicional entre os folhelhos e siltitos violáceos com concreções calcáreas da Formação Teresina (T), Grupo Passa Dois, e arenitos avermelhados do Membro Morro Pelado da Formação Rio do Rasto (RR), Grupo Passa Dois, representando o início do ciclo progradante da bacia sedimentar. Deposição da Formação Rio do Rasto atribuída inicialmente a um ambiente marinho raso que transiciona para depósitos de planície costeira (Membro Serrinha) e passa posteriormente à implantação de uma sedimentação flúvio-deltaica (Membro Morro Pelado). Idade: Permiano Superior – Triássico Inferior

Page 29: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Conteúdo fossilífero da Formação Serra Alta: restos de peixes, pelecípodes, conchostráceos e palinomorfos

Conteúdo fossilífero da Formação Teresina: restos de plantas, lamelibrânquios e palinomorfos

Page 30: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Conteúdo fossilífero da Formação Rio do Rasto: restos de plantas, pelecípodes, conchostráceos, palinomorfos, anfíbio Labirintodonte e rincossauros como Scaphonix fischeri (primeiro vertebrado descrito para o Mesozóico brasileiro e o primeiro réptil Triássico descrito para a América do Sul) e Scaphonix sulcognathus

Page 31: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

11 e 12: Sequência de folhelhos cinza-escuros, intercalados com espessas camadas de arenitos, Membro Serrinha, Formação Rio do Rasto, Grupo Passa Dois, representando a progradação dos lobos sigmoidais sobre os depósitos argilosos

13: Lobos sigmoidais representados por bancos de arenitos do Membro Morro Pelado, no topo, progradando sobre siltitos argilosos, na base, pertencentes ao Membro Serrinha, Formação Rio do Rasto, Grupo Passa Dois

Page 32: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

14 e 15: Contato aplainado, ao nível da estrada, entre a Formação Botucatu (escarpa) e o Membro Morro Pelado da Formação Rio do Rasto. Condições climáticas gradativamente mais áridas. Idade Jurássico-Cretáceo. Aqüífero Guarani.

16: Arenitos com estratificação cruzada acanalada de grande porte da Formação Botucatu, Grupo São Bento, representando a implantação de um amplo ambiente desértico na Bacia. Contato entre os arenitos eólicos da Formação Botucatu e as rochas vulcânicas básicas da Formação Serra Geral, ambas pertencentes ao Grupo São Bento. Sucessão de derrames de lavas, correspondendo ao encerramento da evolução gonduânica da Bacia do Paraná

Page 33: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

17: Afloramento de rochas vulcânicas básicas da Formação Serra Geral, Grupo São Bento

Os estudos da Coluna White ajudaram a entender a história geológica do Estado de São Paulo

Page 34: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Geologia do Estado de São Paulo

Fonte: M. C. Toledo – Instituto de Geociências

Page 35: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A Geologia do Estado de São Paulo pode ser dividida em duas áreas distintas: Embasamento cristalino: ocorre na região litorânea,

Serra da Mantiqueira, Vale do Ribeira e arredores de São Paulo, formado por rochas de idade pré-cambriana, de origem metamórfica e magmática

Região centro-oeste: interior do Estado formada predominantemente por rochas sedimentares e secundariamente por rochas magmáticas extrusivas e subvulcânicas

Page 36: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Estudos geocronológicos e estratigráficos indicam que a porção mais antiga do território paulista é representada pelas rochas ígneas e metamórficas na porção sudeste. Tais rochas, agrupadas em unidades denominadas de Complexos Cristalinos ou Complexos Ígneos e Metamórficos, apresentam idades superiores a 570 milhões de anos, isto é, são rochas pré-cambrianas que se formaram em condições severas de pressão e temperatura e não possuem conteúdo fossilífero conhecido

Page 37: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Já as rochas sedimentares no Estado apresentam assembléias fossilíferas de ambientes marinhos e fluviais durante as deposições da Bacia do Paraná

As rochas sedimentares mais antigas, excluídas as metassedimentares, são arenitos esbranquiçados afossilíferos e folhelhos escuros ricos em fósseis, constituindo respectivamente, as formações Furnas e Ponta Grossa, integrantes do chamado Grupo Paraná. São sedimentos de origem marinha e sua idade é devoniana (cerca de 400 milhões de anos)

Page 38: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Concomitante à invasão do mar durante os períodos Carbonífero e Permiano (entre 350 e 260 milhões de anos atrás) ocorreu uma grande glaciação no hemisfério Sul que, como subproduto, produziu rochas de origem glacial na Bacia do Paraná. As rochas deste período, incluindo tilitos, diamictitos, alguns arenitos, varvitos e folhelhos, compõem o denominado Grupo Tubarão. Os “varvitos de Itu” datam desse período

Page 39: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Após a glaciação houve o recuo do mar e o ambiente de bacia transformou-se gradualmente em continental. A fase transicional, de planície de maré, é representada por folhelhos e calcários clásticos com fósseis da Formação Irati. A fase seguinte, já com maior influência continental, é representada por folhelhos, siltitos, argilitos e calcários de origem fluvial denominados Formação Estrada Nova ou Corumbataí. Sobre elas depositaram-se arenitos e folhelhos de origem continental constituindo a Formação Rio do Rastro. Estas formações compõem o Grupo Passa Dois de idade permiana (260 a 230 milhões de anos)

Page 40: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A tendência à continentalidade acentuou-se com a formação de grandes espessuras de arenitos de origem fluvial/eólica (Fm. Pirambóia) e posteriormente desértica (Fm. Botucatu). Nesta época (cerca de 200 a 230 milhões de anos) deve ter tido início a abertura do Oceano Atlântico com a separação da América do Sul e África. A violência do fenômeno produziu grandes fendas (rifts) na superfície dos continentes por onde houve ascensão de magmas basálticos

Page 41: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Os grandes derrames de basalto e diques e sills de diabásio assim formados na Bacia do Paraná recebem o nome de Formação Serra Geral. Juntamente com as duas anteriores, esta unidade faz parte do Grupo São Bento

Após a grande perturbação tectônica, nova calmaria voltou a se instalar na região, propiciando a deposição de arenitos continentais do Grupo Bauru (Cretáceo, cerca de 135 milhões de anos)

Page 42: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Ainda como decorrência dos processos tectônicos relacionados à abertura do Atlântico, instalaram-se ao largo da costa brasileira outras importantes bacias sedimentares que foram sendo gradativamente submersas. Atualmente, acumulam-se nessas bacias grandes espessuras de sedimentos (até 11 km na Bacia de Santos) e nelas se localizam as maiores jazidas de petróleo conhecidas no país (Bacia de Campos e Bacia de Tupi)

Page 43: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Paralelamente, a área continental adjacente foi soerguida (formando-se assim a Serra do Mar), e nela se instalaram algumas bacias alongadas menores, em depressões originadas por falhas de abatimento, orientadas em direção paralela à faixa litorânea: as Bacias de Taubaté e de São Paulo, que foram sendo preenchidas por sedimentos clásticos variados, originando arenitos, siltitos, argilitos e folhelhos

Page 44: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Mais recentes são os sedimentos do cordão litorâneo (áreas submersas ou praias, lagunas etc.), bem como as pequenas bacias aluvionares que se formam ao longo do curso dos rios. Em ambos os casos a deposição dos sedimentos é recente, com idades máximas da ordem de algumas centenas ou dezenas de milhares de anos

Page 45: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

GEOMORFOLOGIA

Page 46: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

No Brasil, as primeiras observações geomorfológicas são oriundas de uma fase predecessora em que se destacam trabalhos desde a primeira metade do século XIX até a época das Comissões Geológicas, havendo maior sistemática somente após 1910

A mais importante síntese que documenta os conhecimentos sobre o relevo brasileiro nesta 1ª fase encontra-se nos escritos de O. A. Derby, inseridos na “Geographia do Império do Brasil” (edição portuguesa)

Assim, há associação direta com a produção geológica do mesmo período, sem haver levantamentos geomorfológicos propriamente ditos

Page 47: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Inaugurando a 2ª fase, de cunho geográfico e geológico, Miguel Arrojado Ribeiro Lisboa publicou trabalho sobre o oeste paulista e o sul do Mato Grosso (1909) e Roderic Crandall divulgou pesquisas realizadas no nordeste (1910)

No entanto, somente na década de 30 é que haveriam publicações essencialmente geomorfológicas, a exemplo das observações sobre a gênese do relevo do Estado de São Paulo de Luiz Flores de Moraes Rego (“Notas sobre a geomorfologia de São Paulo e sua gênese”). Este interpretou em escala regional o relevo paulista como produto da interação de processos de peneplanação e de epirogênese, fato que destacou o papel da drenagem regional na macro compartimentação geomorfológica do Estado de São Paulo, como é conhecida até os dias atuais

Page 48: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

No entanto, estes trabalhos eram ainda dominados pelo paradigma do “Ciclo Geográfico” de William Morris Davis

As pesquisas apresentavam perfis, cortes e sucessões geológicas, com croquis e pequenos levantamentos de campo, com grande importância para a geomorfologia estrutural do território brasileiro

R. Maack, P. Denis, P. Deffontaines, A. Du Toit, F. Passarge, C. Washburne e J. C.

Branner figuram entre as pesquisas de autores estrangeiros, enquanto que as contribuições brasileiras podem ser citadas pelos trabalhos de Teodoro Sampaio (a exemplo de sua participação no “Dicionário Histórico, Geográfico e Etnográfico do Brasil”, de 1922), E. Backheuser, Euzébio de Oliveira, A. B. Paes Leme, Alberto R. Lamego, O. H. Leonardos e Delgado de Carvalho (“Fisiografia do Brasil”, de 1923)

Page 49: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A 3ª fase de estudos geomorfológicos no país somente se processou após a criação das primeiras faculdades de filosofia e após a fundação do Conselho Nacional de Geografia, mais tarde culminando na criação do IBGE

Esta fase se iniciou com a publicação do famoso artigo de Emmanuel De Martonne (1940) a respeito dos “problemas morfológicos do Brasil tropical atlântico”, tendo-se desenvolvido também pelas atividades de Francis Ruellan, Fábio Macedo Soares Guimarães e Aroldo de Azevedo

A esta fase também estão associados brasileiros como Fernando Flávio Marques de Almeida, João Dias da Silveira (1ª tese de doutoramento em geomorfologia, intitulada “Estudo geomorfológico dos contrafortes ocidentais da Mantiqueira”), Orlando Valverde, Ruy Osório de Freitas, Alfredo José Porto Domingues, João José Bigarella, Aziz Nacib Ab’Sáber, Antônio Teixeira Guerra, Pedro Pinchas Geiger, Hilgard O’Reilly Stenberg, Elina de Oliveira Santos, Victor Antônio Peluso Júnior, Gilberto Osório de Andrade, Manuel Correia de Andrade, Carlos de Castro Botelho e outros com estudos já anteriores, como Octavio Barbosa

É importante citar também os trabalhos de Preston E. James, John L. Rich e, sobretudo, Pierre Monbeig

Page 50: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Em 1956, foi realizado o XVIII Congresso Internacional de Geografia no Rio de Janeiro, em que realizaram-se intensas observações sobre o relevo brasileiro por Jean Dresch, Jean Tricart, Pierret Birot, André Cailleux, Carl Troll, René Raynal, Max Derruau, Jacqueline Beaujeau-Garnier, Paul Fénelon, André Journaux, Paul Macar, P. Mortensen, James Lester King, I. P. Guerasimov e outros

O mais notável conjunto de observações publicado deve-se ao pesquisador francês Jean Tricart, que fomentou inclusive estudos geomorfológicos na Universidade da Bahia (com Milton Santos, Nilda Guerra de Macedo e Tereza Cardozo da Silva, do Laboratório de Geomorfologia e Estudos Regionais)

Vitte, 2011

Page 51: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Na déc. de 50 os trabalhos geomorfológicos viriam pôr em cheque o paradigma davisiano, enfrentando obstáculos em oposição à geologia, mais avançada em termos de conhecimento do território, e pelas referências de modelos teóricos guiados por pesquisas estrangeiras, incompatíveis com a realidade tropical brasileira, que acabavam por não propiciar avanços significativos sobre a gênese do relevo nacional

Assim, estudos regionais com preocupações genéticas foram desenvolvidos por Almeida e Ab’Sáber, com influência das reflexões de Lester King e Von Engeln, que assimilou a obra de Walther Penck (1924) em seus trabalhos

Page 52: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Já antes da déc. de 1960, as pesquisas de Jean Tricart chamaram a atenção para a descoberta dos materiais das formas de relevo e seu significado paleoclimático, a exemplo da publicação “Divisão morfoclimática do Brasil Atlântico Central”, em 1959

Isto influenciou de forma definitiva as pesquisas geomorfológicas no Brasil, com marcante desenvolvimento da geomorfologia climática

Outro fato marcante para a consolidação da geomorfologia brasileira foi a vinda de Lester King ao Brasil, a convite do IBGE. Este publicou artigo em 1956 intitulado “Problemas geomorfológicos do Brasil Oriental”, que forneceu elementos para as suas teorias da pedimentação e da pediplanação demonstradas em livro de 1967, que influenciaram grandemente as pesquisas geomorfológicas no Brasil

Page 53: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Somam-se às concepções morfoclimáticas os estudos associados à Biogeografia, especialmente no tocante ao Quaternário

Os diversos biomas do país possuem relação intrínseca com os substratos rochosos, as formas de relevo e os climas dominantes. As barreiras geográficas produziriam mosaicos completamente diferenciados no território nacional quanto à fauna e à flora, fazendo com que imensas peculiaridades paisagísticas apontassem caracterizações regionais diversas

Exemplos desta linha de pensamento são os trabalhos de Erhart (1956), em relação à teoria bio-resistásica, as pesquisas de Haffer (1969), sobre pássaros na Amazônia e menção aos refúgios como exemplo de especiação, as inúmeras pesquisas realizadas por Paulo Emílio Vanzolini no campo da Biogeografia e os trabalhos de João José Bigarella sobre as flutuação climáticas e os significados geomorfológicos envolvidos

Page 54: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Nesse sentido pesquisavam-se materiais que recobrem a parte emersa da crosta, provenientes da alteração das rochas por intemperismo (físico, químico, biológico) e que podiam ter sido remanejadas e/ou retrabalhadas sobre a superfície – as formações superficiais

Estas testemunhariam processos pedogenéticos e morfogenéticos responsáveis pela evolução e dinâmica da superfície terrestre, indicando a autoctonia ou aloctonia dos materiais, que por outro lado apontavam processos pedogenéticos e morfogenéticos responsáveis pela evolução e dinâmica da superfície terrestre (balanço morfogênese-pedogênese)

A evolução da superfície ao menos desde o Terciário Superior se daria entre a oscilação de períodos úmidos, de biostasia, em que predominaria o entalhamento da drenagem e a pedogênese, e períodos secos, de resistasia, predominando a atuação da morfogênese e o aparecimento de paleopavimentos detríticos

Page 55: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Desta maneira, haviam considerações sobre a compartimentação do relevo, gênese e composição dos materiais, influência da estrutura e composição da geologia e preocupações com a sucessão fitogeográfica; seriam agregadas mais tarde relações estratigráficas, paleontológicas, geoquímicas, pedológicas e biológicas no entendimento da gênese e evolução do relevo

Um marco conceitual pode ser destacado em 1969: o clássico artigo de Ab’Sáber “Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário”, considerando a análise do relevo em três níveis que se interagem mutuamente (compartimentação topográfica, estrutura superficial e fisiologia da paisagem)

Tal concepção voltou-se à evolução das formas ocorrida durante o Quaternário e pressupõe uma análise fisiológica da paisagem, em que observa-se, ao longo da sucessão temporal, a atuação dos fatos climáticos não-habituais, a ocorrência de processos espasmódicos, a hidrodinâmica da área e os processos biogênicos e químicos inter-relacionados

Page 56: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A produção de dissertações e teses também marca a solidificação de linhas de pesquisa em geomorfologia, cujas interpretações remetem aos estudos do Quaternário: • Antônio Christofoletti (1968): “A geomorfologia de Campinas” • Margarida Penteado (1969): “Geomorfologia do setor centro-

ocidental da Depressão Periférica Paulista” • May Christine Modenesi (1971): “Contribuição à Geomorfologia da

Região de Itu-Salto” • Lylian Coltrinari (1974): “Contribuição à geomorfologia da região de

Guaratinguetá-Aparecida” • Olga Cruz (1974): “A Serra do Mar e o litoral na área de

Caraguatatuba/SP” • May Christine Modenesi (1984): “Significado dos depósitos

correlativos quaternários em Campos do Jordão: implicações paleoclimáticas e paleoecológicas”

A tese de livre docência de Aziz Ab’Sáber, (“O papel das regiões de circundesnudação na compartimentação do relevo brasileiro”), de 1969, marca o papel das depressões periféricas na macrocompartimentação do relevo brasileiro, apontando o modelo bio-resistásico e a tectônica terciária no escalonamento dos aplainamentos

Page 57: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

As produções em conjunto e individuais de Ab’Sáber, João José Bigarella, Maria Regina Mousinho de Meis, Jorge Xavier da Silva e outros também demonstram a construção do paradigma da geomorfologia climática brasileira

Figuram associações do relevo a estudos morfoestratigráficos e paleoclimáticos, envolvendo alternância de períodos mais secos, de aplainamento da superfície e abertura de vales, e períodos mais úmidos, de incisão fluvial, com tempos de marcada estabilidade das vertentes e desenvolvimento de solos, em contraposição aos depósitos correlativos formados em tempos de maior predominância da morfogênese

Além disso, há um entendimento cronológico da elaboração das superfícies em pedimentos e pediplanos

Page 58: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Também entram nestes trabalhos a conceituação do termo colúvio (material transportado por gravidade), pois este na opinião de alguns seria mais adequado para explicar a gênese de pavimentos (detríticos) sobre as superfícies

São exemplos de trabalhos sobre o complexo de rampas de colúvio aqueles realizados por Maria R. Mousinho de Meis, Josilda Rodrigues e Ana Luíza Coelho Netto

Contudo, embora com interpretações diferentes, ainda se seguia o modelo bio-resistásico na evolução do relevo, o que levou pesquisadores como José Pereira de Queiroz Neto a questionar as proposições de Ab’Sáber e Bigarella, a exemplo de sua tese defendida em 1969 (“Interpretação dos solos da Serra de Santana para fins de classificação”). Esta propunha, pela análise estrutural da cobertura pedológica, importante papel da erosão biogeoquímica e pedogênese na escultura do modelado

Vitte, 2011

Page 59: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Na década de 70, a concepção sistêmica na Geografia enunciada por G. Bertrand e desenvolvida no Brasil por professores como Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro atrelaram as pesquisas e a cartografia geomorfológica ao entendimento de unidades de paisagem, assim como conceitos de zona, domínio e região ligados ao caráter morfoclimático

Além disso, durante o governo militar vigente os levantamentos geomorfológicos foram adequados à exploração dos recursos naturais e potencialização das regiões do território nacional no Projeto Radambrasil

A temática ambiental também influi na Geomorfologia, a exemplo da problematização do papel da ciência nas alterações ambientais promovidas pela sociedade moderna (a exemplo do que foi discutido na Conferência de Estocolmo-1972)

Produções de caráter agronômico-ambiental, como “La Eco-Geografia y La Ordenación del Medio Natural”, de J. Tricart e J. Kilian, e “Ecodinâmica”, de J. Tricart, são exemplos de trabalhos que nortearam pesquisas brasileiras voltadas à conservação e geomorfologia aplicada

Page 60: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

A partir de então, a especialização e o desenvolvimento tecnológico marcarão um descompasso entre as concepções na gênese e evolução do modelado de relevo, sobretudo em sua espacialização, havendo resultados mais voltados ao viés teórico-metodológico e outros de caráter mais pragmático

Pode-se também destacar teses como o “Estudo e Cartografia Geomorfológica da Província Serrana – MT”, de Jurandyr L. S. Ross (1987), “Relações solo-relevo na porção centro-oriental do estado de São Paulo”, de Archimedes Perez Filho (1988), “Trajetória da natureza: um estudo geomorfológico dos areais de Guaraí/RS”, de Dirce A. Suertegaray (1988), “Sistemas de transformação pedológica em Marília, SP: B latossólicos e B texturais”, de Selma S. de Castro (1990), “O papel da erosão geoquímica na evolução do modelado da Bacia de Taubaté –SP”, de Heloísa F. Filizola (1993) e “Etchplanação em Juquiá (SP)”, de Antônio C. Vitte (1998), entre muitas outras

MAPA GEOMORFOLÓGICO DO ESTADO DE SÃO PAULO ROSS & MOROZ - 1997 1:500.000

Page 61: Edificação Conhecimento da Geomorfologia do Brasil - Aula 2

Atualmente, as questões ambientais norteiam a produção geomorfológica nacional

Há incorporação de técnicas mais avançadas no estudo da gênese e evolução do modelado, de caráter multi e interdisciplinar (a exemplo das técnicas de sensoriamento remoto, datações absolutas e relativas, verificações de assinaturas geoquímicas, interações pedo-geomorfológicas, etc)

As explicações mais voltadas à gênese das superfícies ainda utilizam o paradigma da pediplanação, embora haja incorporação da influência da estrutura geológica e do paradigma da neotectônica

As alterações antrópicas no modelado de relevo, sobretudo nas áreas urbanas, ainda carecem de aplicação na aproximação e aparato teórico-metodológico desenvolvidos na geomorfologia brasileira, cujos trabalhos pioneiros não foram incorporados às políticas públicas vigentes