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O novo agregador do marketing. www.briefing.pt Entrevista Novembro de 2010 35 “Portugal voltará a ser nesta campanha ou na próxima auto-suficiente em azeite”, diz Pedro Cruz, 44 anos, que quer pôr a marca Gallo no top 3 mundial e consolidar a liderança em Portugal, no Brasil, na Venezuela e em Angola e apostar em novos mercados Vamos ser auto-suficientes Pedro Cruz, ceo da Gallo Worldwide Hermínio santos jornalista hs@briefing.pt Briefing | Em Julho de 2009 foi criada a Gallo Worldwide e a quota de mercado em Portu- gal passou, num ano e meio, de 23,3% para 27,1%. Quais são as razões para este cres- cimento? Pedro Cruz | O crescimento deve-se a uma maior focaliza- ção, com uma equipa dedicada exclusivamente ao negócio do azeite o que permite ter maior volume de negócio. É óbvio que esse crescimento tem a ver com o mercado português, mas a maior parte dele veio dos mer- cados internacionais. Briefing | Houve uma maior fo- calização nos mercados inter- nacionais? PC | Houve uma maior focalização pois tudo aquilo que era negócio do azeite estava integrado numa companhia que tinha um portefó- lio muito mais alargado. A criação da Gallo Worldwide permitiu que a equipa se focalizasse no negócio do azeite, que tem especificida- des muito grandes face ao resto das outras categorias de produ- tos multifuncionais do portefólio da companhia anterior. Ramon de Melo >>>

Entrevista a Pedro Cruz

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Entrevista a Pedro Cruz

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O novo agregador do marketing.

www.briefing.pt Entrevista

Novembro de 2010 35

“Portugal voltará a ser nesta campanha ou na próxima auto-suficiente em azeite”, diz Pedro Cruz, 44 anos, que quer pôr a marca Gallo no top 3 mundial e consolidar a liderança em Portugal, no Brasil, na Venezuela e em Angola e apostar em novos mercados

Vamos ser auto-suficientesPedro Cruz, ceo da Gallo Worldwide

Hermínio santosjornalista

[email protected]

Briefing | Em Julho de 2009 foi criada a Gallo Worldwide e a quota de mercado em Portu-gal passou, num ano e meio, de 23,3% para 27,1%. Quais são as razões para este cres-cimento?Pedro Cruz | O crescimento deve-se a uma maior focaliza-ção, com uma equipa dedicada exclusivamente ao negócio do

azeite o que permite ter maior volume de negócio. É óbvio que esse crescimento tem a ver com o mercado português, mas a maior parte dele veio dos mer-cados internacionais.

Briefing | Houve uma maior fo-calização nos mercados inter-nacionais?PC | Houve uma maior focalização

pois tudo aquilo que era negócio do azeite estava integrado numa companhia que tinha um portefó-lio muito mais alargado. A criação da Gallo Worldwide permitiu que a equipa se focalizasse no negócio do azeite, que tem especificida-des muito grandes face ao resto das outras categorias de produ-tos multifuncionais do portefólio da companhia anterior.

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www.briefing.ptEntrevista

Briefing | Ao nível da gestão que desafios é que enfrentou neste último ano? Como é que mobilizou a empresa para crescer desta forma? Como é que motivou a sua equipa?PC | Começou naturalmente pela criação da equipa de ges-tão da companhia, temos a fe-licidade de ter uma companhia cheia de pessoas altamente mo-tivadas que viram isto como um desafio muito grande, quer pelas potencialidades de crescimento que o mercado nacional ainda tem quer também pela vertente internacional do negócio, que representa hoje dois terços da facturação da empresa.

Briefing | Falou das especifi-cidades do sector do azeite. Quer destacar algumas delas em relação ao portfolio de produtos que tinha o grupo?PC | Quando se fala de uma ca-tegoria de produtos onde o pre-ço varia com as amplitudes e com a frequência que acontece no mercado do azeite, isso traz necessidades de se gerir de um modo completamente diferente da categoria de outros produtos de consumo onde todas estas variáveis são mais estáveis e as margens com que se opera são maiores, o que permite acomo-dar variações de matéria-prima que são menos frequentes e com menor amplitude do que aquelas que ocorrem no sec-tor do azeite. Portanto há toda uma necessidade de estar fo-cado nas alterações de preço e de reagir rapidamente a essas alterações, coisas que noutras categorias não se torna tão ne-cessário.

Briefing | A Gallo sempre foi uma marca que apostou muito na comunicação, no marke-ting. De que forma é que isso ajudou a consolidar o valor da marca e também como é que estão a usar as redes sociais para projectar a modernidade da tradição Gallo?PC | A marca Gallo sempre es-teve muito ligada à portugali-

dade, sempre foi trabalhada do ponto de vista da comunicação de uma forma muito séria e per-sistente. Por trás disso tem uma coisa bastante mais importante que é o cuidado com o produto. Para nós é quase uma obsessão assegurar uma qualidade exímia do produto. Cada vez que um consumidor abre uma garrafa de azeite Gallo ele sabe exacta-mente que características orga-nolépticas terá nesse produto. Isso é uma coisa muito difícil de fazer em azeite, um produto natural. Portanto, toda a arte de saber lotear e misturar diferen-tes azeites para obter um de-terminado produto final é muito importante. Esta foi a área que faz com que o consumidor em Portugal e noutros mercados re-conheça essa qualidade e esteja disposto a continuar a comprar e a dar confiança à marca.

Briefing | E nas redes sociais, já estão a usar esse canal para promover a marca?PC | Temos de facto algumas ini-ciativas quer em Portugal quer no Brasil mas são muito explo-ratórias, ainda é muito difícil me-dir os resultados.

Briefing | Aliás, a marca tem um site próprio para o Brasil…PC | Exactamente. Devido quer ao léxico que é utilizado no Brasil quer às questões que os consumidores têm e ao maior conhecimento daquilo que é o azeite, entendemos que era ne-cessário ter um site específico para esse país.

Briefing | O consumidor bra-sileiro dever ser diferente do consumidor português. Ou não é?PC | São consumidores muito diferentes. O que procuram no produto também não são exac-tamente as mesmas coisas. O nível de conhecimento que têm do produto é diferente. O perfil organoléptico que é preferido em Portugal é diferente daque-le que é preferido no Brasil e portanto o azeite Gallo que se

“Uma marca que há cinco atrás não estava sequer nos 10 primeiros e que hoje pertence à liga dos cinco primeiros tem que continuar a ter a ambição de ser uma das três maiores marcas do mundo”

“Para nós é quase uma obsessão assegurar

uma qualidade exímia do produto e que cada vez que um

consumidor abre uma garrafa de azeite Gallo ele sabe exactamente

que características organolépticas é que vai ter nesse produto”

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encontra no Brasil não vai ser exactamente aquele que encon-tra aqui, como não é o mesmo que encontra na China ou na Venezuela. Nós tentamos co-nhecer o consumidor e disponi-bilizar em cada mercado aquilo que é mais relevante e preferido localmente.

Briefing | Em Portugal, como é que a marca olha para os con-correntes e para a sua con-solidação no mercado. é um mercado já esgotado?PC | Pensamos que o mercado português ainda tem potencial de crescimento. O consumo per capita é relativamente baixo face a outros países da bacia medi-terrânica – em Portugal existe um consumo per capita de seis quilos, os nossos vizinhos espa-nhóis terão 11, os italianos 14 e os gregos 21 – portanto ainda há aqui um grande potencial e acreditamos que é possível. Nos últimos anos temos assistido a uma pressão muito grande de preço e acreditamos ser possí-vel construir valor no mercado e fazê-lo desenvolver, aumentan-do o consumo em Portugal, pro-vavelmente não com o potencial que existe hoje noutros merca-dos. A nossa maior concorrên-cia neste momento são as mar-cas da distribuição e este é um panorama que não se vai alterar e cuja agressividade se vai, in-clusive, incrementar durante os próximos dois ou três anos.

Briefing | Tendo em conta o crescente peso das marcas brancas na grande distribui-ção, como é que a Gallo vai reagir a esse desafio?PC | Tudo tem a ver com a forma como nós olhamos para o con-sumidor e valorizar aquilo que nós entendemos ser relevante para ele. É relevante ter a certe-za que o produto que encontra na garrafa Gallo tem um sabor que o consumidor reconhece como tal, é uma coisa única, que mais ninguém oferece no mercado. Por outro lado, é saber que é uma marca que pelo seu

trabalho, consistência e forma como olha para a qualidade ob-teve o prémio de melhor azeite do mundo – e só uma marca em Portugal é que o teve, a Gallo. Consideramos isso uma mais-valia para que os consumidores acreditem que encontrarão uma coisa diferente, que mais nin-guém pode oferecer em Portu-gal. Isso para nós é um grande motivo de orgulho e acreditamos que é um trabalho de qualifica-ção do mercado do azeite que temos de continuar a fazer.

Briefing | A Gallo é a quinta marca mundial de azeites, está em 30 países e lidera em Portu-gal, Brasil, Venezuela e, even-tualmente, em Angola. Como é que vai chegar ao top 3?PC | Uma marca que há cinco atrás não estava sequer nos 10 primeiros e hoje pertence à liga dos cinco primeiros tem de continuar a ter a ambição de ser uma das três maiores marcas do mundo. É óbvio que os degraus daqui para a frente são maiores e o esforço que é necessário para conquistar qualquer posi-ção é muito maior do que aquele que tivemos até agora. Estamos em mercados de grande poten-cial de crescimento, como é o caso do Brasil, e acreditamos que ao desenvolver a marca noutros mercados com o mes-mo potencial, possamos lograr o objectivo de estar nas três maiores. Naturalmente que es-tamos a competir com marcas fundamentalmente italianas e uma espanhola. Pensamos que existe um espaço para um azeite português e para a marca Gallo que tem uma proposta comple-tamente diferente daquilo que está a ser proposto pelos outros nos mercados internacionais. Acreditamos que com muito tra-balho e muito investimento da nossa parte consigamos lá che-gar.

Briefing | Que argumentos é que a Gallo vai usar para ultra-passar essa concorrência?PC | Nenhuma destas empresas

“Pensamos que o mercado português ainda tem potencial de crescimento. O

consumo per capita é relativamente baixo

face a outros países da bacia mediterrânica –em Portugal existe um consumo per capita de seis quilos, os nossos

vizinhos espanhóis terão 11, os italianos 14 e os gregos 21 –

portanto ainda há aqui um grande potencial e acreditamos que é

possível”

Há um ano e meio aceitou o desafio da Unilever Jerónimo Martins para liderar a Gallo Worldwide, uma nova empresa criada especi-ficamente para o negócio do azeite e cujo objectivo era tornar a marca num player de referência a nível mundial. Mas o azeite não era um sector desconhecido para Pedro Cruz. Desde 2005 que já estava ligado, de uma forma consistente, ao negócio. Os seus conhecimentos na matéria levaram-no a exercer o cargo de pre-sidente da Federação Europeia de Associações de Azeite. Actu-almente preside à Casa do Azeite, associação patronal do sector que reúne 65 empresas. A Gallo Worldwide, que conta com mais de 100 colaboradores, é uma aposta ganha, como o provam o prémio de melhor azeite do mundo atribuído pelo Conselho Ole-ícola Internacional, o reforço de quota no mercado nacional e o aumento das exportações, que valem 70% da facturação (100 milhões de euros em 2009). Praticante de vela, casado, pai de três filhos, “nenhum faz vela mas todos gostam de azeite”, diz, Pedro Cruz entrou para a Unilever em 1990, como trainee. Ga-nhou experiência nos sectores alimentar e de produtos de higiene e limpeza do grupo e viveu uma experiência de expatriado duran-te dois anos, em Inglaterra, na área dos congelados. Formado em Gestão pelo Instituto Superior de Economia, em 1989, iniciou a sua carreira profissional na área bancária, tendo depois passado pelo sector químico antes de entrar na Unilever.

Em casa todos gostam de azeitePERFIL

obteve o prémio de melhor azei-te do mundo. Nenhuma destas empresas tem, se calhar, uma embalagem tão distintiva daqui-lo que se passa no mercado. Um exemplo: o Brasil tem mais de 200 marcas de azeite e portan-to é difícil ser diferente, mas a Gallo tem 27% de quota de mer-cado. Portanto, é esse trabalho de diferenciação que nós temos de continuar a fazer nos merca-dos onde estamos a entrar.

Briefing | A China é um deles. Quais são as outras apostas?PC | A China é uma das apos-tas, entre outras. Temos muitos países no sudoeste asiático e na América Central.

Briefing | Como é que tencio-nam conquistar o mercado chinês? Há uma estratégia de

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comunicação já definida? Es-tão já no terreno?PC | Na China, tal como em ou-tros mercados em que estamos a entrar, existe uma incógnita sobre se de facto terão potencial futuro ou não. Reconhece-se hoje que existe a possibilidade de virem a ser grandes merca-dos. Se isso se vai materializar ou não, ainda não é claro. Há vários indicadores que apontam para o facto de existir uma pos-sibilidade concreta mas há ou-tros que nos alertam para o fac-to de tal não se vir a consumar, como aconteceu noutros mer-cados asiáticos que se pensava que iriam ser grandes, como o do Japão ou da Coreia do Sul que, de repente, deixaram de ser tão interessantes. Portanto, temos que investir em vários mercados alternativos para po-der ter a certeza que algum de-les se tornará num mercado com potencial interessante.

Briefing | Como é que estão a fazer a abordagem ao merca-do chinês?PC | Estamos numa fase muito inicial. Neste momento esta-mos simplesmente numa fase de ganhos de distribuição e de conquista de pontos de venda. Ainda é muito cedo para falar em estratégia de comunicação. Temos distribuidores locais. Não temos um modelo fixo de abor-dagem ao mercado. Temos um modelo na China diferente da-quele que temos na Venezuela ou em Angola.

Briefing | A comunicação varia de mercado para mercado?PC | A nossa abordagem é sem-pre local. Nós tentamos conhe-cer em profundidade os consu-midores de cada mercado onde operamos e a comunicação e o posicionamento são desenvol-vidos com base nesse conhe-cimento específico. Não temos uma abordagem de homogenei-zação ou de ser tudo igual para todos os mercados. Optimiza-mos a nossa proposta em cada um dos mercados. É dessa for-

ma que temos vindo a construir, com o conhecimento local.

Briefing | Porquê a opção de não ter produção própria. Como é que é assegurada a qualidade do azeite Gallo?PC | A marca está no merca-do há mais de 90 anos. Temos todo um conhecimento do azei-te e das suas formas que nos levou a optar claramente por deixarmos a nós a possibili-dade de escolher o azeite em cada campanha. O azeite que seja produzido num determi-nado sítio pode ser muito bom num ano e mau no ano seguinte porque as condições climatéri-cas se alteraram. Hoje em dia temos olivais irrigados mas a ir-rigação apenas mitiga as varia-ções de quantidade e não as de qualidade. Como nós não que-remos estar reféns de termos essa produção, temos parcerias com muitos produtores de há muitos anos para nos ajudar a ter uma base de trabalho. Mas queremos ter a liberdade de, em cada ano, ter os melhores azei-tes para fazer os lotes de azeite Gallo que os consumidores re-conhecem e que são constantes durante a campanha e de cam-panha para campanha. Essa é uma mais-valia que só a Gallo tem porque possui um saber de loteamento que tem mais de 90 anos e que nós simplesmente sistematizámos de uma forma a garantir essa consistência de sabor organoléptico, tendo nós a liberdade de facto de comprar a cada momento os melhores azeites. Em cada campanha nós procuramos onde eles estão e vamos pelo país fora à sua pro-cura para fazer o Gallo que os consumidores conhecem.

Briefing | Já existe o azei-te gourmet, de sabores, com diferentes níveis de acidez e produtos derivados, como a pasta de azeitona. O que há para inventar no sector do azeite?PC | Eu penso que a inovação no sector do azeite ainda tem

“O sector do azeite foi deficitário durante

muitos anos - desde os anos 50 que Portugal

passou a ser deficitário. se as perspectivas mais optimistas se confirmarem nesta

campanha, que agora está a começar, ou então na próxima

Portugal será outra vez auto-suficiente. Quer dizer 60 anos depois

voltaremos a ser auto-suficientes quer para

consumo interno, quer para exportação”

“A nossa abordagem é sempre local. Nós tentamos conhecer em profundidade os consumidores de cada mercado onde operamos e a comunicação e o posicionamento

são desenvolvidos com base nesse conhecimento específico”

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