Entrevista Peter Drucker

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Mentes que brilhamNum bate-papo indito,os supergurus Peter Drucker e PeterSenge discutem tendncias dos negcios e concordam: crucialmudar a mentalidade dominante nas empresas para construirum futuro melhor

Peter Senge: Se voc tivesse de indicar dois cenrios radicalmente diferentes no futuro

prximo, quais seriam?

Peter Drucker: Primeiro, muitos executivos provavelmente a maioria no permanecero

em seu emprego atual ou em sua rea de trabalho at a idade de aposentadoria tradicio-

nal. Eles deixaro o emprego muito mais cedo e talvez tambm se aposentem oficial-

mente mais cedo. No entanto, continuaro trabalhando mais ou menos em tempo inte-

gral at quase os 80 anos.

Em segundo lugar, medida que continuarem trabalhando, provavelmente at o fim

de sua vida, eles retornaro aos bancos escolares de uma forma ou de outra pelo menos a

cada trs anos. No quero dizer apenas ler um livro ou participar de um seminrio.

Significa voltar para a escola.

Acho que essas mudanas so previsveis e certas, mas pouqussimos executivos, sejam de

empresas, sejam de organizaes sem fins lucrativos, esto preparados para elas.

Senge: Concordo. Vi diversas pessoas nos ltimos anos darem incio a uma nova carreira

bem antes do que esperavam, e de uma maneira que elas nunca imaginaram. Muita

gente descobriu que o trabalho independente muito mais interessante, em alguns as-

pectos, do que sua carreira principal, sua primeira opo.

Um deles reconhecido como o pai da administrao

moderna; o outro, como o pai do aprendizado organizacio-

nal. Peter F. Drucker e Peter M. Senge h anos tm sido dois

dos maiores nomes do pensamento do management. Recen-

temente, eles se reuniram por mais de trs horas na casa de

Drucker para discutir um de seus temas favoritos: mudanas.

Eles deixaram para as empresas e os executivos recomenda-

es valiosas, como a necessidade de ter coragem de abando-

nar produtos, mesmo quando estes ainda tm bom desempe-

nho, em nome da inovao constante.

Ambos concordam em vrias tendncias de futuro, como

fortalecimento do mercado consumidor da terceira idade

e o surgimento de novas atividades econmicas poderosas,

tais como a criao de peixes em cativeiro.

Drucker: Quarenta anos atrs, todos falavam sobre

como a empresa e seu departamento pessoal to-

mariam conta da carreira dos funcionrios. Os ja-

poneses ainda acreditam nisso. Uma das coisas que

os profissionais tero de aprender que eles mes-

mos devero tomar conta de sua carreira. Precisa-

ro saber onde se posicionar e quando hora de

pedir demisso.

Liderana da inovaoSenge: As mudanas que experimentamos hoje se

aceleraro no futuro?

Drucker: A maioria das pessoas pensa que os lti-

mos anos foram de grandes mudanas. Na verda-

de, essa impresso se deve ao fato de os 30 anos

anteriores terem tido to pouca descontinuidade.

Estamos no ponto em que a transio muda de curso. Experimentamos duas grandes

transies nos ltimos 500 anos no Ocidente: uma a partir de Gutenberg e a outra a

partir da mquina a vapor. Nesses casos, depois de 40 ou 50 anos, houve uma mudana

total. Estamos justamente nesse ponto.

Em razo disso, todas as empresas tero de se transformar em lderes de mudana.

No possvel gerir a mudana; voc s pode estar frente dela.

Alm do mais, a revoluo da informao est apenas comeando a causar impacto. O

e-commerce uma mudana fundamental e ningum o previu. Acima de tudo, o e-commercetornar obsoleta a empresa multinacional na forma como hoje a conhecemos.

Ao mesmo tempo, posso dizer com certeza ou 90% de probabilidade que os novos

setores da economia que esto prestes a surgir no tero relao alguma com informao.

Biotecnologia, por exemplo. O mais importante entre os novos setores dos prximos 30

anos ser o de criao de peixes em cativeiro. Estamos evoluindo de caadores e coletores

dos oceanos para aqicultores. E h outros setores sondando terrenos que, tecnologica-

mente, no tm nada a ver com informao, mas muito com uma nova mentalidade.

Por ltimo, no tenho isso como certeza, porm bastante provvel que o nico fator

dominante em todos os pases desenvolvidos e em desenvolvimento sero as mudanas

demogrficas. Apenas no mundo de lngua inglesa ainda existe uma taxa de crescimento

populacional mais ou menos adequada para manter a populao, e somente por causa de

altos ndices de imigrao. No resto do mundo desenvolvido, no h gente jovem. Na

Itlia, a taxa de natalidade hoje apenas um tero do que era; no Japo, metade. E em

todos os pases, exceto Estados Unidos, Canad, Gr-Bretanha e Austrlia, o nmero de

pessoas abaixo dos 15 anos est em queda. um fenmeno sem precedentes. Ningum

tem experincia para lidar com essa situao. Isso significa que os jovens se tornaro mais

importantes e poderosos? Ou o pndulo tender para um grupo etrio bem mais velho,

acima dos 60?

Acho que dentro de dez anos, o mercado jovem (nos pases desenvolvidos) estar aca-

bado. Talvez nos afastemos da cultura, salvo nos pases de lngua inglesa, de extrema

juventude vigente nos ltimos 40 anos.

Existe uma lei antiga: o grupo populacional maior e de crescimento mais rpido que

determina a mentalidade e o estado de esprito de uma era. Desde 1950, em todos os

pases desenvolvidos, esse grupo tem sido o de 15 a 30 anos ou o de 12 a 25 anos. Hoje,

o grupo etrio de mais rpido crescimento o de mais de 55. E, por todas as analogias

histricas, esse grupo que estabelecer a mentalidade e o estado de esprito desta era.

Ningum sabe muito bem como ser isso.

Melhor idadeSenge: Tendemos a projetar quais sero as necessidades desse grupo de mais de 55 anos

pensando em seus integrantes como pessoas que um dia foram jovens, mas no so mais.

Em outras palavras, a cultura jovem dominou tanto a forma como raciocinamos que

tendemos a encarar os mais velhos como pessoas que perderam sua juventude, em vez de

como pessoas que, na verdade, esto entrando numa fase realmente fundamental da

vida. Um antigo ditado chins afirma que a mente humana s se torna interessante de-

pois dos 50 anos.

Drucker: Sim, mas as pessoas acima dos 55 hoje so bastante diferentes fsica e mental-

mente das pessoas dessa faixa etria no passado.

Quando eu nasci, mais de 90% da fora de trabalho, independentemente do pas,

exercia trabalho manual rduo para ganhar a vida. Esse ndice hoje caiu para 20% nos

Estados Unidos e o trabalho j no mais to pesado. Posso at contar uma histria

pessoal: meu bisav, que foi ministro do Trabalho na ustria, em 1910 deu uma meda-

lha de ouro para a siderrgica onde menos trabalhadores haviam morrido durante

aquele ano. A vencedora registrara 11 mortes para cada mil trabalhadores. O nico

risco ocupacional de hoje para a maioria das pessoas so hemorridas, que sabemos

como curar. Atualmente as pessoas mais velhas tm horizontes. Gostam de viajar, correm

Existe uma leiantiga: o grupopopulacionalmaior e decrescimentomais rpidoque determinaa mentalidadee o estado deesprito de umaera.Hoje,ogrupo etriode mais rpidocrescimento ode mais de 55

no parque, jogam tnis. Para meu pai, que tinha muito boa forma e viveu at os 91 anos, a

idia de jogar tnis aps os 55 anos era inconcebvel jogava-se at os 40. Portanto, esse

grupo etrio no nem um pouco tradicional, tanto fsica como mentalmente, e ainda no

o entendemos de verdade.

Abandono organizadoSenge: Se essa sua viso do futuro, o que as empresas e seus lderes devem fazer para

lidar com esse mundo de mudanas to rpidas e sem precedentes?

Drucker: A primeira coisa aceitar que preciso lidar com a mudana, e no acreditar que

isso algo que voc faz numa tarde de sexta-feira depois das 15 horas.

A segunda criar receptividade para a mudana, e h apenas uma forma de faz-lo:

construindo um sistema de abandono organizado de produtos.

Um sbio da Gr-Bretanha do sculo XVIII disse que nada concentra mais a ateno

de um homem do que saber que ser enforcado pela manh. No h nada que concen-

tre mais a ateno de um diretor do que saber que o atual produto ser abandonado

dentro de dois anos. De outra forma, ele no buscar a inovao, ir adi-la.

A inovao exige trabalho penoso; preciso investir cinco anos antes de ver qualquer

resultado. Enquanto isso, o diretor est sendo recompensado pelos resultados deste ano,

o que o leva a colocar mais dinheiro e recursos humanos na produo do velho produto

ou servio.

A cada trs anos, toda organizao, no apenas a empresarial, deveria avaliar seus

produtos, servios e polticas e se questionar: Se j no oferecssemos isso, sabendo o

que hoje sabemos, iramos oferec-lo?. Se a resposta for no, nem preciso fazer outros

estudos.

Senge: A questo bvia nesse caso : Por que isso to difcil para ns?. As pessoas

envolvidas com artes fazem uma boa abordagem dessa questo, porque nas artes voc

cria algo, abandona e segue adiante, cria algo e segue adiante, cria algo e segue adiante.

Mas, quando se trata de organizaes, de alguma forma essa dinmica muda completa-

mente. extraordinariamente difcil para as pessoas nas empresas at falar sobre abando-

no. Como voc disse, uma coisa falar que o negcio est morto e estamos perdendo

dinheiro pelo ralo. Mas muitas vezes, por causa do desperdcio de possibilidades criativas

que a manuteno de produtos ou servios exige, o momento certo de abandon-los

muito mais cedo.

Drucker: Claro, muito mais cedo. Como voc comeou e sobreviveu aos primeiros anos,

torna-se auto-sustentado. Mas comear muito difcil. Por exemplo: um rapaz que, aos

22 anos, inventou uma caneta e ergueu sua carreira em torno dela. Hoje ele est no topo,

mas ento algum jovem ainda mais ousado desenha algo que torna

obsoleta aquela caneta. O rapaz j passou mais tempo em torno de seu produto do que

com sua esposa e filhos. Essa sua criao, sua vida. H um apego emocional.

Senge: sua identidade.

Drucker: J encontrei vrias pessoas cuja personalidade est vinculada a seu produto. E isso

um problema.

No entanto, abandonar o produto fica mais fcil quando o processo iniciado e se aceita

que a hora de se livrar de um produto ou servio no quando ele j no apresenta bom

desempenho, mas quando algum diz que ele ainda tem uns bons cinco anos de vida.

Orientao para a criatividadeSenge: Eu tinha um bom amigo que era presidente de uma empresa de computadores

muito bem-sucedida. Em sua equipe havia um gnio da engenharia que ajudou a fundar

a empresa. Esse homem todo ano construa um novo barco a vela. Como ele era do

Estado de Minnesota, onde durante o inverno faz muito frio, trabalhava em suas horas

livres para construir o barco at a chegada do vero. Mas Minneapolis no tem um vero

muito longo, e ele punha o barco na gua em meados ou final de junho e velejava por

dois meses.

Ento, todos os anos em outubro, ele promovia uma festa e convidava todo mundo

para sua casa. Sabe o que ele fazia na festa? Queimava o barco. Dizia: A menos que eu

queime o barco, h sempre uma parte de mim que sempre vai tentar consert-lo. Eu

tenho de queim-lo, tenho de me livrar dele, de forma que essa parte de mim fique

disponvel para criar um barco novo.

Drucker: Tenho estudado bastante a msica e seus mestres. H uma carta de Beethoven

para o jovem Schubert na qual ele diz para o brilhante novato: No desperdice seu

tempo terminando alguma coisa se ela for muito penosa. Comece algo novo. Dois anos

depois, a coisa antiga se acabar por si mesma.

Senge: Parece-me que estamos a caminho de algo realmente fundamental. Pensei muito

sobre isso enquanto lia seu livro Desafios Gerenciais para o Sculo XXI. De fato h uma diferen-

a entre a orientao para a criatividade e a orientao para a soluo de problemas. Acho

que nossos empreendimentos esto dominados por uma tica da soluo de problemas.

Drucker: Em parte isso culpa dos cursos de administrao no podemos subestimar sua

influncia nas ltimas cinco dcadas. Soluo de problemas possvel ensinar.

Por outro lado, tambm culpa do fato de as mesmas empresas que havia em 1939

ainda dominarem em 1979. Assim, por 40 anos o trabalho era fazer manuteno, o que

soluo de problemas: se o telhado tem goteiras, troca-se uma ou outra telha ningum

constri uma casa nova.

Senge: Sua meno s faculdades de administrao bastante apropriada. Tambm acre-

dito que as razes do problema esto em todo o sistema educacional. Conforme voc

destaca, muito mais fcil ensinar respostas certas ou erradas. Dessa forma, as crianas

crescem pensando que a vida significa resolver problemas e encontrar a resposta correta.

Mudana de mentalidadeDrucker: A criatividade no anda escassa. O que acontece que a maioria das organizaes

se esfora para acabar com ela. H diversas excees, claro, mas, em geral grande parte

das empresas no est disposta a experimentar.

O pior caso o dos governos. Duas grandes fraquezas do governo so: primeiro, que

tudo tem de ser imediatamente nacional; e segundo, o governo simplesmente no con-

segue abandonar, porque acha muito difcil faz-lo.

Mas mesmo empresas pequenas acham bastante difcil experimentar. Eu digo a meus

clientes: No faa um estudo; v para a rua e teste. Ache um mercado no qual ser forte e

que seja suficientemente remoto, v em frente e teste. Em trs semanas d para saber dez

vezes mais do que qualquer estudo e por um custo muito menor.

As empresas relutam em fazer isso. Elas adoram o belo estudo de trs volumes com

montanhas de grficos de computador. Mas tudo que necessrio ir ao supermercado

mais prximo e tentar vender o produto para descobrir que ningum o quer.

Senge: Deve haver uma disposio de correr riscos e experimentar coisas. O que mais

preciso para estar frente da mudana?

Drucker: preciso difundir em toda a organizao a mentalidade de que a mudana

uma oportunidade e no uma ameaa. uma tarefa rdua.

Ento, deve-se abraar sistematicamente as mudanas. No comeo pode haver um

sucesso inesperado, o que geralmente o primeiro indicativo de uma oportunidade.

Depois, estudar as mudanas que j aconteceram.

H uma cartade Beethoven aojovem Schubertna qual ele dizpara o novato:No gasteseu tempoterminandoalguma coisase ela for muitopenosa.Comecealgo novo.Doisanos depois,a coisa antigase acabar porsi mesma

Em um livro que escrevi h 15 anos, indico as reas que estudar: demografia e tecnolo-

gia esto sempre presentes, mas as outras diferem de acordo com o tipo de negcio.

Pergunte-se: Ser isso uma oportunidade para ns?. Se aparenta ser uma, ponha uma

ou duas pessoas para trabalh-la. Vale a pena.

Ao mesmo tempo, preciso ser receptivo. Poucas pessoas sabem que a IBM j existia em

1934 ou 1935, quando advogados redigiram um pedido de falncia para a empresa. A IBM

estava quebrando por causa da primeira mquina de calcular Watson a projetara para os

bancos, mas em 1934 nenhum banco norte-americano a comprou. Ele no havia vendido

nem uma sequer.

Ento, em um jantar, sentou ao lado de uma mulher de meia-idade que ficou curi-

osa sobre o que ele fazia. Como ela nunca havia ouvido falar da mquina, Watson a

descreveu para ela. Precisamos de trs amanh mesmo, disse a mulher. Ele pergun-

tou por qu. Sou a bibliotecria-chefe da Biblioteca Pblica de Nova York e no

conseguimos manter o inventrio de nossos livros. Ento ele vendeu-lhe cinco no

dia seguinte e foi isso o que salvou a IBM. A histria real. preciso estar pronto

para esse tipo de coisa.

E essa deve ser a postura no topo, de algum que no teme o inesperado. A coisa mais

importante que eu tenho a dizer s pessoas no topo de organizaes que elas no esto

sendo pagas para ser inteligentes. Esto sendo pagas para ser corretas.

Senge: H um elemento no que voc est falando que completamente deixado de lado

no ensino formal de administrao. Devemos encontrar solues. Devemos fazer a m-

quina andar e corrigir problemas quando eles surgem. Mas, na verdade, ao criar algo,

muitos dos resultados mais importantes so os que no esto previstos. assim que reco-

nhecemos e lidamos com o inesperado. uma mentalidade bastante diferente. como

gostar do inesperado.

guru do management mais

aclamado de todos os tempos,

Peter Drucker dedica-se atualmente

a comandar a Drucker Foundation,

voltada para o gerenciamento de

organizaes sem fins lucrativos.Ele

autor de 31 livros, entre os quais

Desafios Gerenciais para o Sculo XXI(ed. Pioneira). Criador do conceito de

learning organization, Peter Sengefoi considerado pelo Journal of Bu-siness Strategy um dos maiores es-

pecialistas em estratgia de negcios

dos ltimos cem anos. professor do

Massachusetts Institute of Technolo-

gy (MIT) e escreveu A Quinta Disci-plina (ed. Best Seller) e A Dana dasMudanas (ed. Campus). Senge ser

um dos palestrantes da Expo Mana-

gement 2002, que ser realizada em

novembro em So Paulo pela HSMEventos Internacionais.

Drucker: Nos prximos 20 anos, isso se tornar absolutamente crucial,

porque haver vrias surpresas. Se cada surpresa for encarada como

ameaa, no resistiremos por muito tempo. No estou dizendo que toda

surpresa uma oportunidade, mas toda surpresa algo a ser tomado

com seriedade.

Sistema de subordinaoSenge: O problema que acontece em um grande nmero de corpora-

es que as pessoas imediatamente desdenham a maior parte das

surpresas como sendo irrelevantes.

Drucker: O sistema de subordinao que adotamos encoraja o desperd-

cio de oportunidades e surpresas, mas tambm relativamente simples

mudar.

Cinqenta anos atrs, um amigo e mentor inventou um sistema usa-

do em uma grande empresa que se tornou muito bem-sucedida por

causa dele. Todos os diretores, do mais alto ao mais baixo escalo, uma

vez por ms escreviam uma carta com um tema: o inesperado no o

que deu certo ou deu errado, mas o inesperado. Depois eles se reuni-

am e estudavam as idias com uma questo em mente: Isso nos diz

alguma coisa?. A grande maioria no dizia coisa alguma, eram apenas

pequenas histrias, mas havia trs ou quatro que eram relevantes. E a

partir delas essa empresa um laboratrio farmacutico transformou-

se de fabricante de commodities em uma das lderes mundiais do setor.

Tudo isso a partir de surpresas clnicas, como quando um mdico usa

um remdio em uma molstia para a qual ele no foi desenvolvido e

tem resultados surpreendentes.

preciso se concentrar no sucesso, especialmente no sucesso inespera-

do. Os problemas, na maioria, no podem ser resolvidos; apenas podemos sobreviver a

eles. Sobrevivemos aos problemas tornando-os irrelevantes em razo do sucesso.

Isso uma questo, acima de tudo, de alocar pessoas. O que aprendi a fazer pegar

uma folha de papel e listar oportunidades e riscos. Ento seleciono algumas prioridades

j que no se pode fazer tudo. Fao tambm uma lista das pessoas de melhor desempenho

e maior capacidade na organizao e tento combinar as duas listas.

Lies para os lderesSenge: Acho que esta uma das lies mais simples e bsicas para os lderes: descobrir

para onde a energia quer fluir e trabalhar com isso. s vezes h uma parte dentro de ns

tentando corrigir as pessoas que esto erradas em vez de construir algo que est tentando

acontecer.

No sei se voc j percebeu isso, em sua vida. Anos atrs, quando comecei a lecionar, vi

que eu tinha um hbito estranho quando estava diante de um grupo de pessoas. Dentre

25 pessoas atentas haveria uma de braos cruzados e cabea baixa. E em quem eu concen-

trava toda minha ateno? Na pessoa que estava desatenta.

Drucker: Todos tivemos de aprender isso.

Senge: Mas preciso ter conscincia do problema, ou seja, deixar a pessoa ficar l e

trabalhar com aquelas que esto realmente interessadas. uma das lies mais simples e

bsicas de todo tipo de liderana em qualquer ambiente: para onde a energia est tentan-

do fluir e como trabalhar com ela.

Drucker: Dizem que a distncia entre quem est no topo e quem est em posio mediana

uma constante. E terrivelmente difcil trabalhar com essa imensa mdia. Trabalhar os

poucos que esto no topo e levant-los faz com que o resto os siga, mesmo aqueles que

esto sentados de braos cruzados e cabea baixa.

Tenho feito um trabalho relativamente grande com escolas que funcionam, em sua

maioria pertencentes a parquias crists. A diferena bastante simples. Nas escolas

pblicas de hoje, concentramo-nos em problemas. As escolas paroquiais se concentram

nas crianas que querem aprender. Isso faz toda a diferena. E elas tornam possvel o

aprendizado para essas crianas. Elas foram, foram e foram os alunos. O resto da

classe vai atrs. No estou dizendo que fcil, mas funciona.

Tambm trabalhei com alguns maestros, como o falecido Georg Solti, que em cinco

anos chacoalhou a Orquestra Sinfnica de Chicago de sua confortvel mediocridade para

atingir padres internacionais. Perguntei-lhe como chegou a esse resultado. Ele respon-

deu: Analisei os 128 membros da orquestra, achei os 20 que mais se destacavam e busca-

vam a excelncia e trabalhei com estes ltimos. Claro, tive de demitir um segundo obo,

mas para a maioria dos outros, de repente, os padres, a viso haviam mudado.

Prazer no trabalhoSenge: Isso me leva a algo que voc mencionou anteriormente, quando disse que no h

escassez de criatividade nas organizaes. A questo : estamos prestando ateno cria-

tividade que est l, tentando faz-la frutificar? Ou estamos ocupados demais fazendo a

coisa toda se mexer?

Drucker: Em todas as organizaes, os executivos, na grande maioria, passam a maior

parte de seu tempo preocupados com a necessidade ou no de uma quarta cpia de um

relatrio e muito pouco tempo voltados para a utilidade daquele relatrio. Organizaes

tm uma gravidade, um peso que puxa constantemente em direo soluo de proble-

mas e mediocridade. preciso lutar contra essa fora 24 horas por dia.

Alm disso, no h muitas organizaes boas no que eu denomino explorao do

sucesso. Veja qual hoje a maior empresa de aparelhos eletrnicos de entretenimento

do mundo a Sony. Basicamente, tudo que ela sempre fez foi andar por a com um

Esta umadas lies maisbsicas para oslderes:descobrirpara onde aenergia querfluir e trabalharcom isso.Tentamos[erroneamente]corrigir aspessoas erradasem vez deconstruiralgo que esttentandoacontecer

gravador e explorar esse sucesso. Se criarmos isso dentro da organizao e o exigirmos

de todos, ento estamos criando receptividade para sermos um empreendimento con-

centrado em oportunidades e no em problemas.

E, acima de tudo, criamos prazer. Sei que no um conceito muito respeitvel do ponto

de vista acadmico, mas organizaes que realmente apresentam bom desempenho tm

prazer no que fazem. Sempre me perguntam como eu sei que tipo de organizao aceitar

como cliente. Quando entro pela porta, percebo em dois minutos se a empresa tem prazer

no que faz. Se ela no o tem, prefiro no oferecer meus servios. Mas um clima totalmente

diferente se a empresa gosta de seu trabalho e sente que amanh as coisas vo ser melhores.

Senge: Lembra que certa vez conversamos sobre o que diferencia as organizaes volunt-

rias das comuns? Tendemos a pensar que em uma organizao tradicional as pessoas

esto produzindo resultados porque a diretoria quer resultados, mas a essncia de uma

organizao voluntria que as pessoas produzem resultados porque elas querem os re-

sultados.

O que voc disse verdade. curioso o motivo pelo qual achamos to difcil entender

que, se as pessoas gostam realmente de seu trabalho, elas vo inovar, correr riscos, confiar

umas nas outras, porque todas esto realmente dedicadas ao que esto fazendo. E

divertido. Edwards Deming (um dos pais do conceito de qualidade total) costumava

mencionar o direito ao prazer no trabalho. Os norte-americanos consideravam isso mui-

to ingnuo, romntico. At hoje no entendo por que as pessoas acham essa idia to

estranha.

Drucker: No nem um pouco romntico puro realismo. Uma razo para essa mentalida-

de o legado de que o trabalho um fardo. incrvel quo rapidamente as pessoas se

acabam na aposentadoria; a maioria delas se deteriora.

O trabalho uma das duas dimenses do ser humano. A outra o amor e a famlia. S

tem bom desempenho quem ama o que faz.

No estou dizendo que preciso gostar de tudo que se faz, o que algo bem diferente.

Todo mundo tem de conviver com uma srie de coisas rotineiras. Os grandes pianistas

precisam exercitar trs horas de escalas todos os dias. E ningum poder dizer que eles

amam fazer isso. Eles tm de faz-lo. No divertido, mas eles gostam, porque mesmo

aps 40 anos eles ainda sentem seus dedos evolurem.

O mesmo vale para pessoas que encontrei nos negcios e que apreciam seu trabalho. A

rotina delas : isso tem de ser feito e eu gosto de faz-lo porque gosto de meu trabalho.

Essa a diferena, eu creio, no entre mediocridade e desempenho, mas entre uma

learning organization (organizao que aprende) aquela na qual todos crescem e ento o

processo muda e uma que talvez se saia muito bem, mas da qual ningum sente falta

depois das cinco da tarde.

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