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1 Reflexões sobre os Rumos da Administração Política Autoria: Elinaldo Leal Santos, Weslei Gusmão Piau Santana, Deise Danielle Neves Dias Piau RESUMO Como parte integrante dos Estudos Críticos em Gestão percebe-se um movimento no Brasil denominado de Administração Política Para o Desenvolvimento, constituído por um grupo de pesquisadores vinculados às escolas de administração. O movimento tem como princípios fundamentais a orientação para a emancipação do homem na sociedade e a manutenção de um comportamento crítico frente às mazelas do sistema capitalista. Diante disso, este ensaio tem por objetivo analisar as contribuições do conceito de Administração Política para o campo da Administração. Busca-se compreender qual a contribuição que a Administração Política poderá proporcionar para a sociedade? Como Administração Política pode contribuir para o avanço da ciência da Administração? Será possível delimitar o seu campo de atuação? Qual o percurso deve trilhar para consolidar-se como um campo do saber? Que tipo de relação existe entre Administração Política e as demais disciplinas de natureza normativas como a filosofia política, a economia política e a ciência política? O ensaio está estruturado em três seções: a primeira centra-se na discussão da delimitação do campo; a segunda estabelece relação entre o campo e as demais disciplinas normativas, sobretudo a filosofia, a economia e a ciência política; e por fim, uma percepção do futuro dessa disciplina como campo de conhecimento dentro da Administração. Para tanto, revisa alguns teóricos do pensamento econômico- administrativo-organizacionais, como: Smith (1776), Marx (1859), Marshall (1890), Keynes (1936), Tragtenberg (1974), Morgan (1979) e Santos (2004). O resultado aponta uma carência de uma disciplina dentro do campo que possa desenvolver a crítica perante a mainstream da ciência administrativa, especialmente no tocante à sua epistemologia e metodologia científica, sendo a Administração Política um caminho proposto para isso. O ensino e a pesquisa no campo dos estudos administrativos não podem, em hipótese alguma, ficar restritos ao pensamento funcionalista, cujas referências são os pressupostos teóricos da Escola Neoclássica da Economia. Embora saibamos que a hegemonia do funcionalismo irá perdurar por um bom tempo. Essa forma de analisar os fenômenos sociais limita a capacidade de compreender melhor o mundo. Por fim, ficou evidenciado que os estudos no campo da Administração Política têm que contemplar as diversas formas de gestão das relações sociais, independente do sistema econômico de produção ou do seu tempo histórico. Só assim, acreditamos que seja possível desenvolver um conhecimento que integra e engloba e não que exclui e fragmenta, evitando, com isso, uma visão desatualizada, doutrinária e sem criticidade da Administração.

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filosofia política e administração

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    Reflexes sobre os Rumos da Administrao Poltica

    Autoria: Elinaldo Leal Santos, Weslei Gusmo Piau Santana, Deise Danielle Neves Dias Piau

    RESUMO Como parte integrante dos Estudos Crticos em Gesto percebe-se um movimento no Brasil denominado de Administrao Poltica Para o Desenvolvimento, constitudo por um grupo de pesquisadores vinculados s escolas de administrao. O movimento tem como princpios fundamentais a orientao para a emancipao do homem na sociedade e a manuteno de um comportamento crtico frente s mazelas do sistema capitalista. Diante disso, este ensaio tem por objetivo analisar as contribuies do conceito de Administrao Poltica para o campo da Administrao. Busca-se compreender qual a contribuio que a Administrao Poltica poder proporcionar para a sociedade? Como Administrao Poltica pode contribuir para o avano da cincia da Administrao? Ser possvel delimitar o seu campo de atuao? Qual o percurso deve trilhar para consolidar-se como um campo do saber? Que tipo de relao existe entre Administrao Poltica e as demais disciplinas de natureza normativas como a filosofia poltica, a economia poltica e a cincia poltica? O ensaio est estruturado em trs sees: a primeira centra-se na discusso da delimitao do campo; a segunda estabelece relao entre o campo e as demais disciplinas normativas, sobretudo a filosofia, a economia e a cincia poltica; e por fim, uma percepo do futuro dessa disciplina como campo de conhecimento dentro da Administrao. Para tanto, revisa alguns tericos do pensamento econmico-administrativo-organizacionais, como: Smith (1776), Marx (1859), Marshall (1890), Keynes (1936), Tragtenberg (1974), Morgan (1979) e Santos (2004). O resultado aponta uma carncia de uma disciplina dentro do campo que possa desenvolver a crtica perante a mainstream da cincia administrativa, especialmente no tocante sua epistemologia e metodologia cientfica, sendo a Administrao Poltica um caminho proposto para isso. O ensino e a pesquisa no campo dos estudos administrativos no podem, em hiptese alguma, ficar restritos ao pensamento funcionalista, cujas referncias so os pressupostos tericos da Escola Neoclssica da Economia. Embora saibamos que a hegemonia do funcionalismo ir perdurar por um bom tempo. Essa forma de analisar os fenmenos sociais limita a capacidade de compreender melhor o mundo. Por fim, ficou evidenciado que os estudos no campo da Administrao Poltica tm que contemplar as diversas formas de gesto das relaes sociais, independente do sistema econmico de produo ou do seu tempo histrico. S assim, acreditamos que seja possvel desenvolver um conhecimento que integra e engloba e no que exclui e fragmenta, evitando, com isso, uma viso desatualizada, doutrinria e sem criticidade da Administrao.

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    1. Introduo A sociedade capitalista vem, ao longo do tempo, passando por sucessivas crises e mudanas analisadas por diferentes campos do conhecimento, com a finalidade de entender melhor a conjuntura dos processos. A Administrao, entretanto, pouco pronunciou a respeito das questes de ordem global, quer sejam questes conjunturais, quer sejam questes estruturais, tais como, as disparidades entre a riqueza e a pobreza, o desenvolvimento e o subdesenvolvimento, a distribuio e a concentrao, o acesso e a excluso. Talvez seja por falta de uma base terica que ajude a compreender tais fenmenos, ou ainda, por acreditar no mito da neutralidade quando diz respeito questo de ordem poltica. Se, a gesto for considerada como uma prtica social que contempla o envolto do poder poltico e social, a mesma no ser ser vista, apenas como um elemento de segunda grandeza, perante essa realidade, e sim, como um elemento primordial nas resolues desses problemas. Com base nesta premissa, observamos na literatura, decorrente dos Estudos Crticos da Escola de Frankfurt, um esforo por parte de pesquisadores das escolas de administrao do Reino Unido, em reconhecer gesto como elemento importante para entender questes decorrentes do sistema capitalista. A produo cientfica destes pesquisadores ficou conhecida como Estudos Crticos em Gesto (ECG), conforme relatam Fournier e Grey ([2000], 2007). No Brasil, tambm h uma tradio autnoma de estudos crticos em administrao, desenvolvidos principalmente a partir dos trabalhos de Alberto Guerreiro Ramos e Maurcio Tragtenberg (Caldas & Bertero, 2007; Paula, 2008). Como parte integrante dos Estudos Crticos em Gesto verifica-se um movimento no Brasil denominado de Administrao Poltica Para o Desenvolvimento, constitudo por um grupo de pesquisadores vinculados s escolas de administrao deste Pas. O movimento tem como princpios fundamentais a orientao para a emancipao do homem na sociedade e a manuteno de um comportamento crtico frente s mazelas do sistema capitalista. Diante disso, este ensaio, tem por objetivo analisar as contribuies do conceito de Administrao Poltica. Para tanto, propormos a reflexo de algumas indagaes: a) qual a contribuio que a Administrao Poltica poder proporcionar sociedade? b) como a Administrao Poltica poder contribuir para o avano da Administrao? c) ser possvel delimitar o seu campo de atuao? d) qual o percurso dever ser trilhado para consolidar-se como um campo do saber? e) que tipo de relao pode existir entre a Administrao Poltica e as demais disciplinas de natureza normativas como a filosofia poltica, a economia poltica e a cincia poltica? Para responder estas questes, consideramos pertinente retomar as discusses sobre a fundamentao epistemolgica e praxiolgica da disciplina Administrao Poltica como um campo necessrio de conhecimento. Discusso que j teve um ponto de partida nos trabalhos de Alberto Guerreiro Ramos (1962), Maurcio Tragtenberg (1974), Fernando Prestes Motta (1980). Partimos do pressuposto de que existe uma hegemonia da produo acadmica no campo da Administrao de base neoclssica e funcionalista (Caldas & Fachin, 2005), e que a Administrao Poltica, enquanto campo do saber da Administrao, necessita contemplar as diversas anlises da gesto das relaes sociais de produo, independente do tempo histrico e do sistema econmico de produo. Para desenvolver esta argumentao, o ensaio foi estruturado em trs sees. A primeira traz uma discusso sobre a dicotomia existente entre cincias naturais e cincias sociais, bem como, entre cincias normativas e aplicadas, com a finalidade de delimitar o campo de atuao da Administrao Poltica e a sua contribuio para o desenvolvimento da cincia

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    administrativa. Em seguida, estabelece uma relao entre a Administrao Poltica com as demais cincias normativas, sobretudo a filosofia, a economia e a cincia poltica, com vista a identificar as contribuies destas para a fundamentao da Administrao Poltica. E, por fim, uma percepo do futuro dessa disciplina como campo de conhecimento dentro da Administrao.

    2. Administrao Poltica e sua Delimitao Delimitar onde inicia e onde termina um determinado campo de conhecimento no uma tarefa fcil, principalmente, quando diz respeito a um campo do conhecimento cientfico. Pelo conceito dominante da cincia, o conhecimento caracteriza-se por ser sistemtico, metdico, exige demonstrao, submete-se comprovao, ao teste, visando estabelecer relaes de causas e efeitos. Conhecer significa dividir e classificar, para depois poder determinar relaes sistemticas entre sujeito e objeto. Entretanto, para o conceito emergente, descrito por Boaventura de Sousa Santos, Reginaldo Souza Santos, Fritjot Capra, Ilya Prigogine, entre outros, todo conhecimento cientfico natural e social; local e total; visa constituir-se em senso comum e busca o autoconhecimento. Para esses autores no existe dicotomia entre cincias naturais e cincias sociais. Esta distino assenta numa concepo mecanicista da matria e da natureza. Os avanos recentes da fsica e da biologia so exemplos para comprovar a discusso, colocam em questionamento o argumento da distino entre o orgnico e o inorgnico, entre seres vivos e matria e mesmo entre humanos e no humanos. Na viso de Boaventura de Sousa Santos (2010, p.85) necessria uma outra forma de conhecimento, um conhecimento compreensivo e ntimo que no nos separa e antes nos una pessoalmente ao que estudamos. Por essa concepo, s atravs de uma viso sistmica e ampla do conceito de cincia que poderemos avanar nas complexidades do mundo contemporneo. Se por essa definio no cabe mais discutir a distino entre cincias naturais e cincias sociais, por analogia e tambm no cabvel fazer distino entre campo terico (cincia) e o campo aplicado (ao/arte), como se um negasse o outro e no fosse possvel a totalidade dos saberes para compreender o fenmeno. Nesta anlise, concordamos com Mattos (2010) quando faz a critica a repetio estereotipada e eivada de mal entendidos da expresso relaes teoria-prtica, pois distorce, desvia e absorve, como um buraco negro no espao infinito das discusses acadmicas, muitos problemas cruciais para a administrao, escondendo, alm disso, uma energia enorme que da questo poderia advir para a caracterizao da rea. Este pensamento crtico tambm aparece em Santos, Ribeiro e Santos, (2009, p. 921) ao defenderem que: uma cincia que engloba a parte que observa, que expe e que explique (considerando o lado puro, cientfico), bem como, a parte emprica, aplicada, normativa ou artstica (que aconselha, que prescreve, que dirige). S assim, o conhecimento pode ser libertador do homem. O fazer cincia, hoje, requer muito mais do que observar, descrever e explicar; preciso propor. De forma particular, nos dirigimos quelas que so voltadas para o campo da produo, como a economia, a administrao, o direito, as finanas e as atuariais. Torna-se difcil, na atualidade, pelo paradigma dominante, delimitar o campo de atuao dessas cincias, haja vista que, para isso, preciso cumprir alguns condicionantes epistemolgicos, tipo a delimitao precisa de alguns elementos (objeto, mtodo, pressupostos/hipteses etc.). No caso especfico da Administrao, ela constitui um campo de

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    conhecimento sem uma identidade prpria, seja por falta de um aprofundamento epistemolgico ou pela prpria natureza multidisciplinar do campo. Para Santos (2004), existe uma impropriedade metodolgica de uma corrente de pensadores da administrao que, equivocadamente, definem a organizao como o seu objeto de estudo e deslocam as discusses para teorias das organizaes, estudos organizacionais, cincias das organizaes etc., quando pouco se fala em cincia administrativa. Embora as organizaes constituam o gnero que contm elementos essenciais da gesto, elas so espaos particulares nos quais habita o objeto central da administrao. Isso, quando entendido, permitido dizer que as organizaes podem constituir-se em objeto de pesquisa em administrao, mas nunca constituem em objeto que d status de cincia (Santos, 2004, p. 38). Se tomarmos como hiptese que o objeto de estudo da administrao seja a gesto e no a organizao, podemos entender que, enquanto campo disciplinar, a administrao ocupa-se do estudo das organizaes como um fenmeno social, voltando-se para preocupaes mais amplas, do que apenas a maximizao da eficincia produtiva. Desta forma, podemos classificar a Administrao Poltica como um campo da cincia administrativa que trata da gesto das relaes sociais de produo, distribuio e consumo em qualquer contexto e momento histrico do processo civilizatrio da humanidade, conforme definiram Santos et al (2009, p. 927). A melhor maneira de abordamos esta disciplina, como qualquer outra, conhecendo os problemas que ela se prope a investigar. Os problemas da Administrao Poltica possuem um elevado grau de generalidade e abstrao, que consistem em responder as seguintes questes: Como devemos organizar o sistema produtivo de uma sociedade? Como os agentes econmicos agem dentro desse sistema? Qual a melhor forma para distribuir a riqueza produzida neste sistema? Quem deve consumir a riqueza gerada por essa sociedade? Isto posto, verifica-se que os problemas da Administrao Poltica originam de uma reflexo que , sobretudo, normativa, por contraste dos estudos empricos feitos no campo do paradigma dominante do conhecimento cientfico, que prioriza as anlises descritivas e explicativas. Hurtig (1966), estudando a sociologia poltica, diz que a pergunta cabal est na questo de definir qual a soluo correta para os problemas econmicos e sociais existentes. No raro se pensa que, para cada um destes problemas, possvel, a homens de boa-vontade e de formao cientfica, definir uma soluo nica, puramente tcnica, que s a poltica, frequentemente, impede de adotar ou obriga a distorcer. Entretanto, ele chama a ateno para o fato de que a soluo dos problemas que uma sociedade defronta depende de escolhas polticas. Importa, por isso, valorizar a deciso poltica como objeto de estudo e afirmar a necessidade de uma anlise poltica de numerosos problemas incluindo problemas econmicos, e por que no, de gesto como problemas polticos, cuja soluo implica em escolha poltica. No podemos limitar os estudos da Administrao Poltica aos pressupostos dominantes do pensamento da Administrao, propostos inicialmente por Taylor e Fayol e prosseguidos por Peter Drucker, Henry Mintzberg, Michael Porter e outros. A Administrao Poltica, enquanto campo do conhecimento, trata da gesto das relaes sociais de produo, distribuio e consumo de uma dada sociedade. Deve incluir em suas anlises as diversas idias polticas. As idias no so apenas um reflexo passivo de interesses ou ambies pessoais, elas tm a capacidade de inspirar e guiar a prpria ao poltica e, assim, moldar a vida material. Isso significa dizer que possvel falar de Administrao Poltica liberal, conservadora, socialista,

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    nacionalista, anarquista, fascista, entre tantas outras, conforme demonstra o percurso histrico da humanidade. 3. Administrao Poltica e Outros Saberes Os fundamentos tericos sistematizados da Administrao Poltica que existe hoje na literatura esto estritamente enraizados no contexto histrico, social, econmico e poltico da sociedade liberal, especificamente, no campo do pensamento neoclssico da economia. Sobre isso, concordamos com a viso de Santos (2004), quando afirmou que:

    ... a cincia administrativa nasce com o advento da Escola Neoclssica da Economia, que surge com a crise do capitalismo do ltimo quartel do sculo XIX e incio do sculo XX, atravs do pensamento e obra de autores como William Petty, Leon Walras, Alfred Marshall, Artur Cecil Pigou, entre outros que constituram os fundamentos da microeconomia. Com as mudanas na organizao do capitalismo ocorridas ao longo do sculo XIX, com o aparecimento de mercados imperfeitos, mediante estrutura oligoplicas e monoplicas, a tradio clssica, mais voltada para o estudo da economia poltica do desenvolvimento, praticamente d lugar ao estudo do comportamento das unidades de produo e consumo, representadas pelos indivduos, famlias e empresas. Este o momento em que a lgica do valor trabalho orientadamente substituda pela lgica do valor utilidade, fundada na racionalidade dos fatores econmicos e na soberania do consumidor. Ento surge a economia pura baseada no mtodo dedutivo e do positivismo cientfico, abandonado-se, assim, toda e qualquer subjetividade na anlise dos aspectos econmicos, ou seja, de qualquer juzo de valor ou conotao tica (Santos, 2004, p. 23, 24).

    No entanto, no podemos considerar que esta seja a nica base terica para explicar as questes que dizem respeito Administrao. possvel, com base em outras linhas condutoras, encontrarmos tambm explicaes para os mesmos fenmenos, conforme apontou Maurcio Tragtenberg nas suas duas principais obras: Burocracia e Ideologia e Administrao, Poder e Ideologia. Nem tampouco, achar que a Administrao Poltica consiste em analisar um contexto histrico, em descrever as circunstncias polticas em que seus pensadores viveram. Isso algo que compete Histria. Ou simplesmente descrever teorias do pensamento administrativo, sem nenhuma anlise crtica e reflexiva do porqu dos processos de produo capitalista, como alguns autores fazem nos manuais de Teoria Geral da Administrao. Na verdade, isso constitui mais em uma abordagem doutrinria em defesa de uma determinada corrente de pensamento, do que uma organizao de um compndio terico. Para entender a proposta da Administrao Poltica, necessrio estabelecer a relao com outras disciplinas normativas, sobretudo com a filosofia, economia e a cincia poltica. Um bom ponto de partida para entender os fundamentos da Administrao Poltica pensar a sua distino frente Filosofia Poltica. Costa (2005) definiu Filosofia Poltica como a reflexo filosfica que discute qual a melhor maneira de organizar a nossa vida em sociedade. A Filosofia Poltica analisa conceitos tericos como os de igualdade, liberdade, estado, democracia, tolerncia, obedincia, castigo, entre outros. A partir dos quais, discute problemas como: O que a liberdade? Em que consiste a igualdade? Ser possvel atingi-las ou realiz-las? Se assim for, como deveremos organizar-nos para consegui-las? Ela

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    busca estabelecer princpios bsicos que justifiquem uma forma de Estado e um agir em sociedade. Para tanto, prope atingir duas funes no seu processo reflexivo: a) analisar e interpretar conceitos e b) aplicar essa anlise e interpretao s instituies polticas, econmicas e sociais. A diferena fundamental entre Administrao Poltica e Filosofia Poltica apenas de grau de profundidade e de generalizaes. Enquanto a Administrao Poltica cuida das particularidades da gesto das relaes sociais de produo, distribuio e consumo, em qualquer contexto e momento histrico do processo civilizatrio, a Filosofia Poltica questiona os fundamentos mais profundos e universais do ser, busca compreender os valores que dirige a ao, procura conhecer a origem dos problemas e cria para eles respostas racionais base de provas especulativas, cabendo-lhe, inclusive, fazer da Administrao um objeto de estudo (filosofia da cincia). A Economia Poltica , sem dvida, outro campo de conhecimento para compreender os fundamentos da Administrao Poltica. Etimologicamente, a expresso economia poltica significa administrao do patrimnio da cidade, uma vez que tem a sua raiz nas palavras gregas aikonomia (aikos casa, patrimnio nomos ordem, lei administrao) e poltica (relativo polis, cidade-estado dos gregos). Entretanto, nem sempre o seu significado etimolgico coincide com o seu sentido aplicado. Fato esse observado nas discusses tericas desenvolvidas por Smith, Marx e Marshall, Walras e outros. Em A Riqueza das Naes (1776), Adam Smith explicou como ocorre o processo de formao da riqueza de um Estado. A obra traduzia, de certa forma, os anseios de parte da sociedade que almejava por uma nova concepo de Estado e, consequentemente, por um novo sistema econmico e social. Smith propagou o pensamento iluminista com vista ao enfraquecimento do Estado Absolutista, da economia mercantilista e do poder na nobreza, fazendo assim emergir o Estado Liberal, a economia de mercado e a classe burguesa. Portanto, via na economia poltica uma forma de garantir o bem-estar do povo e do Estado.

    Economia poltica, considerada um ramo da cincia do estadista ou do legislador, prope dois objetos distintos: primeiro, suprir renda ou produtos em abundncia para o povo, ou, mais apropriadamente, possibilitar que provenham tal renda ou provento por si ss; e segundo, suprir o Estado ou Commonwealth com uma renda suficiente para os servios pblicos. Ela se prope a enriquecer tanto o povo quanto o soberano. (Smith, 1996, p. 413.)

    A expresso economia poltica, aplicada por Smith, evidencia, essencialmente, a teoria da produo e do crescimento de uma corrente de pensamento denominada Escola Clssica da Economia. Por Escola Clssica, entendem-se os economistas da primeira gerao que vo da publicao de A Riqueza das Naes (1776), portanto o prprio Smith, at a dos Princpios de Economia Poltica (1848), de J. S. Mill. Para Teixeira (2000), esses economistas tinham por finalidade produzir recomendaes de ordem prtica para a organizao da vida econmica. Entretanto, no podemos afirmar que tais recomendaes eram fundamentadas apenas em instrumentos de carter meramente tcnicos. possvel que tambm estivessem presentes elementos subjetivos pautados em crenas e valores especficos de uma determinada classe social. Em Para Uma Crtica da Economia Poltica (1859), Marx retomou o conceito de economia poltica para explicar os problemas no resolvidos pela Escola Clssica. Problemas tais

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    como o valor, o trabalho e o dinheiro. Para Marx, os economistas burgueses, cujos crebros so limitados, no sabem distinguir entre a forma aparente e o que nela se oculta (Marx,1892, p.662). Ele est a dizer que o mtodo de investigao utilizado pelos economistas burgueses (clssicos) no consegue captar as complexidades existentes no meio para explicar o fenmeno. Isso porque os economistas clssicos iniciam seus estudos pelos elementos reais e concretos, como a populao, a cidade, o campo, o mar e os diferentes rumos da produo, exportao, importao, preos, etc., em detrimento dos elementos abstratos decorrentes das relaes sociais. [...] Todas as cincias, exceto a economia poltica, reconhecem que as coisas apresentam uma aparncia oposta sua essncia (id, 1982, p. 620). Para Teixeira (2000), o elemento essencial do mtodo adotado por Marx reside, portanto, na abstrao, ou seja, na capacidade de distinguir os elementos essenciais do fenmeno analisado, afastando toda e qualquer influncia que possa perturbar sua anlise em estado puro. Na verdade, percebe-se que Marx constitui um novo objeto, um novo mtodo e um novo programa de pesquisa para a economia poltica. Marx inaugurou um novo programa de pesquisa cujo objeto so as leis de movimento da sociedade capitalista, cuja essncia nos dada pelos processos de acumulao, distribuio e inovao do capital em ambiente de concorrncia. Diante do exposto, existiu para Marx uma diferena entre o que economia poltica, enquanto campo do conhecimento cientfico, para o que poltica econmica, enquanto forma para promover o bem-estar da sociedade, tal como foi proposta por Smith. Para Nunes (2007), Marx e os autores marxistas consideram que a Economia Poltica Clssica surgiu e desenvolveu-se como cincia da burguesia, num perodo em que a burguesia ascendente, em luta para ocupar a posio de classe dominante na economia, na sociedade e na poltica, era a classe que reunia condies para analisar, objetivamente, a sociedade e os mecanismos da economia. J. S. Mill foi o ltimo grande representante da Economia Poltica Clssica. J Marshall foi aquele que consolidou o pensamento da Escola Neoclssica. Mill tido, por muitos, como o pai da microeconomia. Os dois pensadores, de certa forma, encontraram a economia em crise e ambos influenciaram geraes com os seus princpios de economia: Mill com sua obra Princpios de Economia Poltica (1848) e Alfred Marshall com Princpios de Economia (1890). Matos (2010) afirma que, mesmo tendo perdido boa parte do seu prestgio, os Princpios de Economia Poltica de Mill continuara sendo utilizados em todas as mais importantes universidades at 1890, quando foram substitudos pelos Princpios de Economia de Marshall. Mas, o que de fato mudou no decorrer da publicao dos Princpios de Economia de Marshall? Qual a relao desta publicao com Administrao Poltica? Para compreender a essas questes preciso entender que a publicao dos Princpios de Economia constitui, juntamente com A Riqueza das Naes, de Adam Smith, e os Princpios de Ricardo, um dos grandes divisores de guas no desenvolvimento das ideias econmicas, representando a transio da antiga para a moderna Economia. Laura Mattos (2010) relatou que, neste perodo, vrias vises alternativas sobre o que seria ou deveria ser a Economia ganharam fora e lanaram desafios tericos, metodolgicos e prticos quanto ao futuro da Economia. Dentre muitas, ganha destaque o pensamento de Walras, um dos fundadores da Escola Neoclssica, que discute o futuro da economia e prope o que, na literatura, ficou conhecido como a trilogia terica da economia. Walras distinguiu a economia poltica pura da economia aplicada, bem como da economia social. A primeira compreende a teoria do valor de troca, mediante comprovao matemtica dos seus pressupostos. As demais tratariam da produo da riqueza social (economia poltica aplicada) e da repartio da riqueza social (economia social). Porm coube a Marshall a tarefa de resgatar o prestgio da Economia. Os Princpios so tanto uma exposio da

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    economia como uma apologia desta: um tipo de contra-reforma, por assim dizer, direcionada contra as dvidas provindas de dentro e contra as denncias vindas de fora (Shove, apud Mattos, 2010, p.274). Neles, Marshall abandona a expresso poltica e troca-a por um novo termo ao denominar sua obra de Princpios de Economia. Para Marshall, a expresso economia poltica estava na sua origem, relacionada expresso inversa poltica econmica. Por isso, os pensadores dos sculos XVII e XVIII, que escreveram sobre os problemas econmicos, no desenvolviam teorias, modelos abstratos de anlise, mas discusso e formulao de polticas concretas, envolvendo tributos, moedas, comrcio, preos etc. Marshall, sistematizou e quantificou o material de Adam Smith e Ricardo, complementando e transformando seus princpios e conceitos em modelos tericos operacionais, criando assim a teoria quantitativa da moeda, da oferta, da demanda, da produo, do comrcio e tantas outras que surgiram como uma necessidade de dar uma base mais consistente s polticas econmicas propostas na poca. Surge, assim, o pensamento da Escola Neoclssica da Economia, deslocando a discusso da formao e distribuio da riqueza como objeto de estudo da Economia para a discusso da escassez de recursos com base nos pressupostos das necessidades ilimitadas, do equilbrio geral, da viso do homem econmico, da racionalidade ilimitada, da maximizao dos ganhos e minimizao das perdas. com base na fundamentao terica da Escola Neoclssica da economia que surgem os primeiros estudos da Administrao. Como exemplos claros para essa argumentao, temos os trabalhos desenvolvidos por Frederick Taylor, Princpios da Administrao Cientfica (1911), e o de Henri Fayol, Administrao Industrial e Geral (1916). Esses estudos estavam, efetivamente, voltados para a busca de respostas prticas e objetivas aos problemas de organizao, produtividade e controle do sistema produtivo existente naquele momento. Para eles, a eficincia organizacional daria a partir do planejamento e do controle do sistema produtivo, cabendo Administrao a tarefa de coordenar os fatores de produo com vista a atingir tal objetivo. Santos et al (2009) afirmaram que desse momento em diante, ainda que a anlise administrativa incorporasse ao seu repertrio conceitos de cultura, valor e tica, a administrao nunca perdeu de vista a sua racionalidade instrumental no mbito das organizaes. (p. 926). Isso significa dizer que, mesmo com o surgimento de outras correntes do pensamento administrativo, como os comportamentalistas, estruturalistas, sistmicos, contingenciais, entre outras, ainda assim prevalecem os fundamentos da Escola Neoclssica da economia, e quando no, preciso retomar a esta para prosseguir no avano das investigaes, como aponta os estudos Oliver Williamson e Eleonor Ostram sobre governana econmica. Pela nossa percepo, fica claro que, qualquer que seja o modelo de gesto da produo existente na literatura da Administrao tradicional (taylorismo, fordismo, toytismo, volvismo etc.), encontrar-se-, na sua forma, contedo que remete aos pensadores da Escola Neoclssica da Economia. Isso nos leva a afirmar que a Administrao Poltica que existe de forma sistematizada na literatura atual, em sua corrente hegemnica, , sem dvida, uma Administrao Poltica de base neoclssica, pois, a Administrao, enquanto cincia, nasce enquadrada nos pressupostos tericos e metodolgicos desta corrente de pensamento. Entretanto, entendemos que no se pode falar apenas de uma administrao poltica, mas de vrias administraes polticas, dentre elas, a neoclssica. Sobre isso, concordamos com a tese de Carib (2008), quanto ao rumo da Administrao Poltica ao dizer que:

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    Consolidar a Administrao Poltica enquanto disciplina autnoma buscar na Economia Poltica todo o saber que dedica a compreender o mundo das organizaes e, em especial, ao gerenciamento delas. Esse contedo fica mais evidente dentro da Economia Poltica, notadamente nas ltimas dcadas, quando os estudos do micro se tornaram hegemnicos. (p. 39).

    A partir destas reflexes, tambm concordamos com Santos et al, (2009), quando analisaram o conceito de economia poltica proposta por Walras e afirmaram que: o que se atribui como no cientfico da economia, na verdade pertence a um novo campo do conhecimento, ao da administrao poltica. (p. 925). Com essa afirmativa, o conceito de economia poltica, formulado por Smith e contestada por Marx e Walras, passa por analogia a pertencer Administrao Poltica. Porm, como delimitar o campo de atuao da Administrao Poltica com a da Economia Poltica? Sobre isso, Santos (2004) defende:

    Para ampli-lo, devemos pr a administrao poltica em confronto com a economia poltica. Desse modo, se a economia poltica, no plano da materialidade humana, responde pelo que e por que fazer, ou seja, pelas possibilidades da produo, circulao e da distribuio de bens materiais, a administrao poltica tende a responder pelo como fazer, ou seja, pela concepo do modelo de gesto para se chegar finalidade. (Santos, 2004, p. 40).

    Para Santos, esse o momento em que a economia poltica caminha junto da administrao poltica. Portanto, o momento em que se compreende, de forma cientfica, que o processo produtivo das relaes sociais no se efetiva em termo de resultado timo sem uma concepo de gesto previamente estabelecida. Por sua vez, possvel estabelecer uma relao direta entre modelo de gesto (projeto de nao) com os resultados adquiridos (bem-estar social). Analisar e interpretar sobre quais fundamentos esto pautada a gesto das relaes sociais de produo, distribuio e consumo de uma dada sociedade , sem dvida, o campo de atuao da Administrao Poltica. Da possvel falar de Administrao Poltica Clssica, Marxista, Neoclssica, Keynesiana, Institucionalista, Regulacionista, Gerencialista, entre tantas. Esta anlise pode ser observado em Santos (2010), onde se faz uma releitura da obra de Keynes, a partir do livro Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda (1936), apontando os equvocos terico-metodolgicos e analticos por parte de alguns autores comentaristas, e sistematizando o que seria a Administrao Poltica em Keynes. Tambm pode ser observada na produo acadmica de Mauricio Tragtenberg (1971), pois se trata de um dos fundadores dos Estudos Crticos em Administrao, com uma produo conduzida por um forte referencial terico marxista, no ortodoxo. Da mesma forma, possvel, atravs de um estudo mais sistemtico, mapear na Revista Brasileira de Administrao Poltica alguns artigos que versam sobre outras vertentes da Administrao Poltica. Temos na Cincia Poltica outro campo analtico, no menos importante, para compreender a Administrao Poltica. A distino entre elas, do ponto de vista metodolgico, complexa, pois ambas elaboram saberes experimentais de base intuitiva. Diferente da Filosofia Poltica, cujo pensar fundamentalmente abstrato, trata-se de raciocnio lgico e rigoroso que parte de conhecimentos anteriores e chega a novos saberes, sem passar pela observao dos dados concretos, coletados com rigor metodolgico, procura a partir das verdades universais, proporem concluses particulares. Ao contrrio das cincias sociais, tais como a Poltica e a Administrao que no nascem da deduo lgica, mas sim da induo, da observao e da

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    experimentao. A Cincia Poltica descreve sistemas polticos concretos, analisando as suas caractersticas, comparando-as com as de outros sistemas, conforme relatou Costa (2009). De modo geral, a Cincia Poltica uma disciplina social autnoma que engloba atividades de observao, de anlise, de descrio, de comparao, de sistematizao e de explicao dos fenmenos polticos. Busca compreender como os homens fazem a poltica. Seu objeto a ao humana nas instituies polticas. Etimologicamente, o termo poltica ou politiks deriva do adjetivo originado de plis tudo que se refere cidade, o que urbano, civil, pblico, socivel, social. Semanticamente, podemos usar o termo poltica como o fazer humano que precedido de um discurso. Discurso esse que pode estar pautado numa base filosfica, cientfica ou, at mesmo, no senso comum. Mas, do ponto de vista clssico, poltica consiste na arte ou cincia da organizao, direo e administrao do Estado. Na filosofia aristotlica no existe separao entre tica e poltica. Ambas so formas para alcanar a felicidade humana. A tica se preocupa com a felicidade individual do homem na plis e a poltica se preocupa com a felicidade coletiva da plis. Sobre isso Aristteles disse que:

    Vemos que toda cidade uma espcie de comunidade, e toda comunidade se forma com vistas a algum bem, pois todas as aes praticadas com vistas ao que lhes parece um bem; se todas as comunidades visam a algum bem, evidente que a mais importante de todas elas e que inclui todas as outras tem mais que todas este objetivo e visa ao mais importante de todos os bens; ela se chama cidade e a comunidade poltica. (Poltica, 2001, p. 11).

    O objetivo de Aristteles com sua Poltica investigar as formas de governo e as instituies capazes de assegurar uma vida feliz ao cidado. A Cincia Poltica deve ser a tica de toda uma sociedade, cuja consistncia deriva de um propsito moral comum. Ela deve determinar o que o bem para a sociedade e qual a estrutura que vai assegurar a melhor maneira de alcan-lo e as aes que melhor contribuiro para esse fim. Todavia, do ponto de vista contemporneo, a Cincia Poltica possui um objeto mais amplo, visto que os fenmenos polticos transcendem o Estado para tambm abranger outros agrupamentos sociais menos complexos como igrejas, partidos polticos, empresas etc. Neste sentido, a Cincia Poltica o estudo da natureza, dos fenmenos, do exerccio, dos objetivos e dos efeitos do poder na sociedade, conforme descreveu Friede (2002). Com base nesta definio, podemos estabelecer a relao entre Cincia Poltica e Administrao Poltica. Enquanto a primeira estuda a forma como o poder exercido na sociedade, a segunda estuda como exercida a gesto das relaes sociais de produo, distribuio e consumo desta sociedade. Contudo, o modelo de gesto (projeto de nao) constitui uma deciso poltica que remete a uma base ideolgica, de crenas e valores. Haja vista que todas as idias polticas so determinadas pelas circunstncias sociais e histricas em que se desenvolveram e pelas ambies polticas a que servem. Isto, como j mencionado, pode ser verificado nas diversas fases transitrias da humanidade do feudalismo para o capitalismo, do capitalismo comercial para o capitalismo industrial, do industrial para o financeiro ou, ainda, do capitalismo para o socialismo. No geral, a teoria e a prtica poltica esto intrinsecamente relacionadas. Sobre isso Keynes reflete:

    Os homens prticos, que acreditam estar totalmente isentos de qualquer influncia intelectual, so normalmente os escravos de algum economista morto. Os loucos no poder, que escutam vozes, esto apenas destilando o que algum escrevinhador acadmico produziu h poucos anos. ([1936] 1963, p.383).

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    Na concepo de Keynes, toda deciso poltica regida por uma base terica, ideolgica que estabelece metas, que inspira a uma ao. A Cincia Poltica costuma agrupar as ideologias modernas em trs categorias: esquerda, centro e direita. As ideologias de esquerda caracterizam-se pela simpatia por princpios como liberdade, igualdade, fraternidade, cooperao e justia. As ideologias de direita primam por princpios como autoridade, ordem, hierarquia, dever, competio e progresso. J as ideologias de centro podem absorver caractersticas tanto da esquerda como da direita, a depender das correlaes de foras. Para uma melhor visualizao apresentamos a seguir o esquema linear das chamadas ideologias modernas.

    Figura 01: Esquema Linear das Ideologias Modernas Fonte: Adaptao do modelo de Heywood, 2010, p.30

    De um modo geral, essas ideologias servem de referencial analtico para os estudos em Cincia Poltica. Elas expressam as principais vertentes do pensamento poltico do mundo moderno e contemporneo. De alguma forma ou de outra, a conduta poltica de quem exerce algum tipo de poder na sociedade guiada por crenas, valores, e princpios pertencentes a uma destas ideologias. Na nossa prtica cotidiana, comum ouvir expresses do tipo liberdade, igualdade, justia, direito, pluralismo e tantas outras. Isso significa dizer que todos ns pensamos politicamente, tendo ou no conscincia disso. Portanto, no seremos ingnuos em acreditar que a Administrao com suas teorias, pressupostos, tcnicas constitui em uma cincia desprovida de ideologia. muito mais lgico compreender que as teorias administrativas so produtos das formaes socioeconmicas e polticas de um determinado contexto histrico, sendo extremamente dinmicas na sua capacidade de adaptar s demandas do modelo de acumulao capitalista, do que acreditar no mito da neutralidade. Nestes termos, cabe Administrao Poltica exercer o seu papel enquanto campo disciplinar, cuja finalidade constitui em fazer a crtica perante o mainstream da cincia administrativa, especialmente no tocante sua epistemologia e metodologia cientfica. 4. Consideraes Finais Neste ensaio, verificou-se que o conhecimento cientfico, na sua verso contempornea, fundamenta-se em princpios que prezam pela totalidade universal dos saberes, independente das suas categorias e especializaes. O fazer cincia significa estabelecer dilogos que vo da filosofia esttica, do local ao global e do micro ao macro, alm de considerar que o processo de investigao no se restringe a apenas observar, descrever e explicar preciso propor. Para tanto, entendemos que o campo dos Estudos Crticos em Administrao se posiciona como a principal perspectiva terica alternativa ao mainstream funcionalista e que a proposta da Administrao Poltica coaduna com essa corrente. Porm, consegue ampliar

    Esquerda Direita

    Comunismo socialismo liberalismo conservadorismo fascismo

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    ainda mais o seu campo de anlise ao eleger a gesto como objeto de estudo da Administrao, possibilitando uma melhor compreenso das relaes sociais de produo, distribuio e consumo da sociedade. No temos dvidas que a Administrao Poltica se constitui num avano significativo para o amadurecimento do campo, bem como, na ampliao de seus referenciais tericos e metodolgicos. O ensino e a pesquisa no campo dos estudos administrativos no podem, em hiptese alguma, ficar restritos ao pensamento funcionalista, cujas referncias so os pressupostos tericos da Escola Neoclssica da Economia. Embora saibamos que a hegemonia do funcionalismo ir perdurar por um bom tempo. Essa forma de analisar os fenmenos sociais limita a capacidade de compreender melhor o mundo. Estudos mais recentes (institucionalismo, teoria dos custos de transao, economia da cooperao), dentro do prprio campo da Economia, demonstram que nem sempre o homem age de forma racional, nem sempre o valor ser dado pela sua utilidade marginal, nem to pouco a concorrncia a melhor forma de garantir o bem-estar da sociedade. preciso aprender, com isso, que existem outras formas de gesto das relaes sociais que demandam por uma anlise mais sistemtica por parte da Administrao e os estudos sobre governana econmica de Eleonor Ostrom comprovam isso. Fica evidenciado que os estudos no campo da Administrao Poltica tm que contemplar as diversas formas de gesto das relaes sociais, independente do sistema econmico de produo ou do seu tempo histrico. S assim, acreditamos que seja possvel desenvolver um conhecimento que integra e engloba e no que exclui e fragmenta, evitando, com isso, uma viso desatualizada, doutrinria e sem criticidade da Administrao. E o conhecimento acumulado da filosofia poltica, da economia poltica e da cincia poltica tem muito como contribuir para o avano da Administrao Poltica. 5. Referncias CALDAS & BERTERO. (2007). Teorias das Organizaes. So Paulo: Editora Atlas. CALDAS & FACHIN (2005, abr/jun). Paradigma funcionalista: desenvolvimento de teorias e institucionalismo nos anos 1980 e 1990. RAE Revista de Administrao de Empresas, 45(2), 46-52. CARIB, Danilo Andrade.(2008, out) Cincia ou Ideologia? A contribuio do campo da Administrao Poltica. Salvador, REBAP Revista Brasileira de Administrao Poltica. Salvador, 1(1), 54-73. COLEO OBRA PRIMA. (2001). Poltica Aristteles. So Paulo: Martin Claret. COSTA, Antnio Paulo (2011). Problemas de Filosofia Poltica. Recuperado em 20 de janeiro, 2011, de http//aartedepensar.com/filofofiapoltica. FRIEDE, Reis.(2003). Curso de Cincia Poltica e Teoria Geral do Estado. Rio de Janeiro, 2 Edio. Editora Forense Universitria. FOURNIER, Velrie e GREY, Chris ([2000], 2007), Hora da Verdade: condies e prospectos para os estudos crticos de gesto. In. CALDAS & BERTERO. (Org). Teorias das Organizaes. So Paulo: Editora Atlas. HEYWOOD, Andrew. (2010). Ideologias Polticas: do liberalismo ao fascismo. So Paulo: Editora Atlas. HURTIG, Serge (1966). Introduo Sociologia Poltica. RAS Revista Anlise Social. Lisboa. 4(13). KEYNES, J. M.([1936], 1982) Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. So Paulo: Editora Atlas.

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