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Pe lo tas L. M . P. Ro d rig ue s 2001

escrita e cidadania

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A obra Texto argumentativo: escrita e cidadania oportuniza a quem deseja aprimorar a produção textual não apenas uma teoria embasada no que há de mais atual na doutrina lingüística, mas, com diversificados exercícios, mostra a riqueza de recursos que a língua materna nos oferece.A autora, profissional dedicada, competente e com experiência no ensino médio, reconhece a importância de desmistificar o ensino de português, especialmente de redação, no sentido de demonstrar que este não se baseia em regras difíceis e rígidas, em exceções ou armadilhas, mas sim consiste num tesouro do qual dispomos para expressar nossas idéias, nossos sentimentos, nosso posicionamento diante do mundo; enfim, para exercermos a plena cidadania.

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PelotasL. M. P. Rodrigues

2001

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Capa, layout e editoração eletrônica: Ana da Rosa BandeiraConsultoria de editoração, pesquisa e digitalização de imagens: Nara Rejane da Silva

Impresso no Brasil Copyright 2001 – Teresinha dos Santos Brandão

Tiragem: 500 exemplares

Obra publicada por L. M. P. Rodrigues, com o patrocínio de Michigan/Alfa Pré-Vestibular e o apoio da Universidade Católica de Pelotas.

Pedidos para: R. Cel. Alberto Rosa, 1886 apto. 403 CEP: 96010-770 – Pelotas - RS ou pelos e-mails: [email protected] e [email protected]

B817t Brandão, Teresinha Texto argumentativo : escrita e

cidadania. / Teresinha Brandão. – Pelotas: L. M. P. Rodrigues, 2001.

88 p.

1. Português – estudo e ensino. 2. Produção textual. 3. Redação. I. Título.

CDD 469

Ficha Catalográfica: Bibliotec. Cristiane de Freitas Chim CRB 10/1233

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Dedico este livro

AOS MEUS SOBRINHOS – a ordem é estritamente alfabética! –, ALFEU COSTA DA SILVEIRA NETO, BRUNO BRANDÃO DE VARGAS, GABRIEL FLIEG AMARO DA SILVEIRA (recém vindo ao mundo!), LUCAS DE MORAES SMITH (apesar da distância...), MARINA DUARTE GUTIERRE, MARÍLIA BRANDÃO AMARO DA SILVEIRA e PAULA BRANDÃO DE VARGAS, os quais, mesmo nos momentos em que a tristeza se fez presente em mim, foram capazes, pelo encanto, carinho e alegria que emanam, de ajudar a superá-la. Guardarei deles para sempre as lembranças do primeiro sorriso, das primeiras palavras, dos passinhos ainda inseguros, das fotos, das gracinhas. Lutarei, junto a eles, contra as preocupações e adversidades de que a vida não puder poupá-los.

À AMIGA LAÍS MARIA PASSOS RODRIGUES, cujos laços de amizade ultrapassam a relação meramente profissional, propiciam momentos de grande riqueza e firmam uma relação baseada no companheirismo e cumplicidade.

AOS MEUS PAIS, ARITA E PORFÍRIO E ÀS MINHAS IRMÃS, FABIANA E ROSANE, que, com entusiasmo, partilham sempre de meus sonhos e, incansavelmente, lutam por sua realização.

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Agradecimentos

Este livro resultou dos esforços e dedicação de diversas pessoas. Seria impossível mencioná-las todas. Citarei algumas para expressar meu reconhe-cimento.

A FLÁVIO RESMINI, SÉRGIO HUMBERTO FACCINI SILVA, JOSÉ VOLNI DUARTE E GENY DA CUNHA DUARTE, por terem, pacientemente, suportado meus momentos de ansiedade e dependência e, por meio de muita compreensão, ajudado a superá-los.

A GIANE DA CUNHA DUARTE, MARTA SÓRIA E REJANE DE MORAES SMITH, cuja amizade encontra-se feito presente em quase todos os momentos da minha vida.

À PROFESSORA LAIZI DA SILVA DAS NEVES, que me ensinou a ler e escrever, abrindo-me as portas para um universo desconhecido mas profun-damente agradável – o mundo das palavras.

ÀS AMIGAS LÍGIA MARIA DA FONSECA BLANK E RENATA BEIRO, as quais sempre vibraram com minhas vitórias e me orientaram nos passos iniciais de minha vida profissional.

A ANA DA ROSA BANDEIRA E À AMIGA NARA REJANE DA SILVA, pelo paciente trabalho de digitação e dedicada criação do layout.

AO AMIGO E COLEGA LUIZ GUSTAVO RIBEIRO ARAÚJO, com quem partilhei as primeiras idéias deste livro. Sou grata às suas críticas e sugestões, assim como à crença que deposita em meu trabalho.

À AMIGA E PROFESSORA ANA ZANDWAIS, pela dedicação e acompa-nhamento crítico a mim dispensado durante o período em que fui aluna do mes-trado. Seu exemplo de profissionalismo e seriedade marcaram-me profundamente.

A CLÁUDIO DA CUNHA DUARTE E A GILBERTO GARCIAS, pela amizade e empenho na publicação deste livro.

A MICHIGAN-ALFA PRÉ-VESTIBULAR, pelo patrocínio, e a UCPel, pelo apoio, agradeço. Sem a participação dessas instituições talvez não fosse possível a publicação da obra.

A ANDRÉ MACEDO E INÊS PORTUGAL, da equipe do Diário Popular, de Pelotas, pelo incentivo e apoio na divulgação desta obra.

... e, como não poderia deixar de mencionar, A TODOS OS MEUS ALUNOS, que enriquecem a criação deste livro porque dele se tornaram partícipes e co-autores.

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Apresentação

A obra Texto argumentativo: escrita e cidadania oportuniza a quem deseja aprimo-rar a produção textual não apenas uma teoria embasada no que há de mais atual na dou-trina lingüística, mas, com diversificados exercícios, mostra a riqueza de recursos que a língua materna nos oferece.

A autora, profissional dedicada, competente e com experiência no ensino médio, reconhece a importância de desmistificar o ensino de português, especialmente de reda-ção, no sentido de demonstrar que este não se baseia em regras difíceis e rígidas, em ex-ceções ou armadilhas, mas sim consiste num tesouro do qual dispomos para expressar nossas idéias, nossos sentimentos, nosso posicionamento diante do mundo; enfim, para exercermos a plena cidadania.

De forma bastante didática, a autora, por meio de atividades criativas, cujos temas vão ao encontro do interesse dos jovens, porque atuais e estimulantes, propicia o desen-volvimento não apenas do senso crítico, do raciocínio, da capacidade de argumentar, como ainda estimula a criatividade.

Destacaria, como “ponto alto” desta obra, as práticas textuais concernentes à coe-são e coerência – tão indispensáveis a um bom texto –, dando ênfase à pertinência do en-riquecimento do vocabulário, já que os estudantes, sem dúvida, possuem plena capacidade de raciocínio e discernimento, no entanto, às vezes lhes foge o “como dizer”. Tais exercí-cios fortalecem o conceito de que utilizar um vocabulário pertinente à situação de interlocu-ção confere credibilidade às informações dadas, assim como auxilia a criação de uma ima-gem positiva, de seriedade do produtor; dessa forma, concorre para reforçar o peso argu-mentativo de um texto e a capacidade de persuasão.

Assim sendo, com Texto argumentativo: escrita e cidadania, Teresinha brinda os estudantes – razão de ser desse livro –, os professores e aqueles apaixonados pelo idioma e eternos aprendizes.

Laís Maria Passos Rodrigues

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Palavras da autora

Gostaria, inicialmente, de ressaltar alguns aspectos relativos ao título desta obra.

Embora acredite que a argumentação seja constitutiva da linguagem, independente da tipologia textual, concentrei neste livro a atenção em apenas dois tipos de texto: a carta e a dissertação.

Acredito serem elas importantes por duas razões: a primeira justifica-se pelo fato de, na atualidade, a maioria dos veículos de comunicação impressos destinar um espaço privilegiado aos leitores que queiram expressar seus posicionamentos, sejam eles para ratificar ou contestar as mais diversificadas idéias.

Ademais, lembro que, com a redemocratização do País, após um exaustivo período de censura, a escrita de textos desse tipo, veiculados na mídia ou via internet, tem se mos-trado uma das formas mais eficientes de a sociedade civil manifestar-se e, desse modo, exercer um direito legítimo, que é fruto de sua conquista: o direito à cidadania.

Outra razão – esta de ordem pragmática – diz respeito à minha prática pedagógica. Exercendo o magistério, durante alguns anos, no ensino médio, sobretudo em classes fi-nais, de 3º ano, assim como em cursos pré-vertibulares, senti a necessidade de produzir um material didático voltado às exigências de meus alunos. Como as universidades da re-gião em que atuo – UFPel e UCPel –, a exemplo da UNICAMP – SP, adotam, em suas pro-vas de vestibulares, pelo menos uma das duas modalidades citadas, julgo plenamente justificável nelas ter-me concentrado.

É meu desejo, pois, que a obra atenda a essas duas necessidades. Como todo tra-balho humano é passível de erros e, de outro modo, sujeito a acertos, as contribuições dos que vierem a adotar este livro serão bem-vindas.

Um abraço,

A autora

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Sumário

I PARTE - Aspectos teóricos.......................................................................................131 Considerações iniciais: características do texto argumentativo.............................13

2 Finalidades da argumentação................................................................................16

3 Diferenças fundamentais entre argumentação/ persuasão/ coerção.....................17

4 Um exemplo de texto argumentativo: a carta.........................................................19

5 O uso da coletânea e a importância do levantamento de idéias............................21

6 Sugestões de como fazer (quadros sintéticos).......................................................26

7 A contra-argumentação na carta argumentativa....................................................28

8 Sugestões de como fazer (quadros sintéticos).......................................................34

9 Um outro exemplo de texto argumentativo: a dissertação.....................................36

10 Sugestões de como fazer (quadros sintéticos).....................................................42

11 A contra-argumentação no texto dissertativo-argumentativo...............................45

12 Um exemplo de contra-argumentação em texto dissertativo-argumentativo.......49

13 Sugestões de como fazer (quadros sintéticos).....................................................50

14 O uso dos advérbios e adjetivos na argumentação.............................................52

15 O uso dos elementos coesivos nos textos argumentativos..................................55

II PARTE - Problemas de redação...............................................................................61Análise de problemas de redação.............................................................................61

III PARTE - Propostas de redação...............................................................................73Proposta nº 1.............................................................................................................73

Proposta nº 2.............................................................................................................78

Proposta nº 3.............................................................................................................81

Proposta nº 4.............................................................................................................83

Referências bibliográficas...........................................................................................87

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1 Considerações iniciais: características do texto argum entativo

Para bem entendermos o processo de argumentação, assim como as características e os elementos que compõem um texto argumentativo, tomemos por base a coletânea a seguir, cuja temática centra-se no amor:

Texto 3:

Texto 1:

“O amor é finalmenteum embaraço de pernas,uma união de barrigas,um breve tremor de artérias,uma confusão de bocas,uma batalha de veias,um reboliço de ancas,quem diz outra coisa é besta.”

Gregório de Matos

(In: BARBOSA, S. A., AMARAL, E. a

linguagem criadora e o pensamentológico. Campinas: Papirus, 1986)

Escrever é desvendar o mundo:

Texto 2:

“Márcia, se eu gastasse todas as @ deste ciberespaço, ainda assim não poderia expres-sar o quanto curto teclar com você. Amor, Rick”

(declaração virtual)

“Dizer que brevemente serás a metadede minha alma. A metade? Brevemente?Não: já agora és, não a metade, mas toda.Dou-te a alma inteira, deixas-me apenasUma pequena parte para que eu possaexistir por algum tempo e adorar-te.”

Graciliano Ramos

(Em ) Cartas de Amor a Heloísa

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Teresinha Brandão

Texto 4:

(VERISSIMO, Luis Fernando. As cobras em: se Deus existe que eu seja atingido por um raio. Porto Alegre: L&PM, 1997. p.19)

Texto 5:

“Para falar tudo: a vida não começa quando senasce. Começa quando se ama. Romantismo à parte, só adquirimos consciência de nós mesmosquando, sempre de repente, sem aviso prévio,sentimos que alguma coisa mudou no mundo,na noite e no dia, na luz e no vento, mudou tudodentro da gente: estamos enamorados.É ainda um anúncio, ‘preview’ de alguma coisaque pode ser o tesão, o caso, o rolo, o equívoco.São variantes para o grande programa que é oamor, síntese de tudo o que foi fragmentariamen-te anunciado. Amante é um ofício. Namorado, uma vocação.Há amantes que não se namoram. E namoradosque não são amantes. O amor é escravo do tem-po, nasce e pode morrer com o tempo.”

(Carlos Heitor Cony. . Folha de São Paulo, 12/06/96)

A estrela da Ursa Maior

Texto 6:

“Amor, existiria substantivomais abstrato? Amar, outroverbo teria sido tantas ve-zes conjugado? Ninguém écapaz de captar as infinitasreverberações dessa pala-vra, ela escapa até mesmo àquele que vasculha e fre-qüenta todas as celas se-mânticas do dicionário. O amor se desdobra em mitos,se renova em histórias pre-téritas e futuras, renasce em cada poema (...)”

(Augusto Massi. . Folha de São Paulo,

12/06/96)

A Paixão na Moradado Poema

A coletânea evidencia, através de seus textos, opiniões, julgamentos, preferências, pontos de vista diversos sobre o amor. Ela o concebe como um sentimento plural, heterogêneo: amor “carnal” (ou “eróti-co”), “espiritual”, “virtual”, “racional”,...

Se tomarmos o Texto 1 como exemplo, veremos que seu autor sustenta uma tese – proposição ou teoria considerada verdadeira, que pode ser defendida com argumentos – a qual aponta para uma conclusão, a saber: o

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“verdadeiro” amor é o carnal, aquele que merece efetivamente ser vivenciado.

Além disso, nesse tipo de texto, per-cebemos uma característica peculiar do pro-cesso de argumentação: ele pressupõe o confronto de idéias. Tal aspecto heterogêneo da argumentação pode ser comprovado atra-vés do verso “quem diz outra coisa é besta”, o qual se contrapõe a uma outra concepção de amor não explicitada no texto.

Alguns pontos, no entanto, devem ser salientados para que não se confundam noções básicas sobre o ato de argumentar.

Apesar de, nas escolas, de um modo geral, termos aprendido que existem basicamente três tipos de texto – descritivo, narrativo e dissertativo –, e apenas o último ser sinônimo de “argumentativo”, notamos, através da coletânea, que os elementos os quais compõem um texto argumentativo podem se fazer presentes nos mais variados tipos de texto: num poema, numa charge, em ensaios, em narrações, em textos dramatúrgicos, entre outros. Mais ainda: numa conversa de bar; num diálogo entre mãe e filho em que este reivindica, faz exigências.

Tais considerações explicam o fato de que a argumentação é constitutiva da linguagem, independente do texto em questão, da tipologia textual tradicionalmente ensinada nas escolas, segundo a qual “argumentação” chega até mesmo a ser sinônimo única e exclusivamente de “dissertação”.

Julgamos necessário questionar, ainda, idéias as quais sustentam que, em determinados textos argumentativos, como a

dissertação escolar, devem prevalecer a “impessoalidade” e a “objetividade”. Ora, nesse tipo de texto, exigir-se que o autor “não se inclua” ou que exponha de forma “objetiva”, quase “imparcialmente”, dados de uma reali-dade, mostra-se um despropósito. Num texto argumentativo, ocorre justamente o contrário: o autor intervém freqüentemente na análise do

tema, por meio de críticas, ressalvas, na escolha do vocabulário, entre outras formas de expressão, manifestando seus sentimentos, gostos, opiniões.

Lembremos, também, que, num texto argumentativo, a ressalva torna-se um importante elemento de que se pode lançar mão, pois ela funciona como um mecanismo para flexibili-zar o ponto de vista. O objetivo da ressalva é conciliar com o

interlocutor, reconhecer parte da verdade contida nas palavras deste.

Se o assunto em questão for a liberalização das drogas, no caso a maconha, e, se o autor do texto for desfavorável a tal liberalização, ele pode relativizar seu ponto de vista, admitindo que “Apesar dos inúmeros malefícios que esta droga pode causar ao organismo, é inegável sua contribuição no tratamento de alguns tipos de cânceres ou no de doentes que desenvolveram a Aids.”

O levantamento de hipóteses igualmente se mostra relevante no texto argumentativo.

Tomemos como exemplo um fato da atualidade – a violação do painel do Senado, no ano 2001, envolvendo os então senadores ACM e Arruda –. O aluno poderia tecer sua

Ilust

raçã

o:

Na

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ilva

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análise levantando hipóteses: caso eles não tivessem renunciado, a cassação teria amenizado uma possível sensação de impunidade em vigor no País? A instauração de uma CPI teria conferido maior credibilidade ao próprio Senado? Ou não? A julgar pela decisão dos dois

senadores, quais as perspectivas fu-turas em relação ao cenário político brasileiro?

Trata-se, pois, de hipóteses que podem enriquecer a análise de um tema.

2 Finalidades da argumentação

A argumentação presta-se a propósitos vários, entre os quais se destacam:

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reforçar um a determ inada posi-ção em favo r de um a tese (quando o in terlocutor já crê ou crê quase com pletam ente na tese do lo cu -tor) ;

refutar um a determ inada posição, m ed iante contra-argum entos (quando o locu -tor não quer crer em deter-m inada tese) .

p ro duzir um a m udança de m enta-lid ad e/ co m p o rtam en to , p ro vo -cando, dessa fo rm a, a do in terlocutor em favor de um a de-term inada tese (quando o in terlo -cu tor não crê ou crê parcialm ente na tese do locutor) ;

adesão

levar a , pe las quais aque le que argum enta

sustenta determ inada tese, não ob jeti-vando necessariam ente a adesão (quan-do o in terlo cutor desconhece a tese do lo cutor) . Por exem plo , em um a eleição, o “Partido X” não apresenta cond içõ es de vitória, m as, ao m enos, seu d iscurso “a-b re espaço” para to rnar púb lica sua plata-fo rm a po lítica. U m outro caso : um advo-gado, em um julgam ento, sabe que sua tese é “perdida”; no entanto , sustenta-a até m esm o para “m arcar p resença”, to r-nar-se co nhecido no m eio ju ríd ico ;

conhecer com preender as ra-zões

Ilust

raçõ

es: N

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da S

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Diferenças fundamentais entre argumentação/ persuasão/ coerção3

A argumentação é um processo que se dá a partir do raciocínio lógico, da organização do pensamento de forma a sustentar uma tese com argumentos claros, convincentes, sem apelar ao imedia-tismo e à emocionalidade.

Já a persuasão (alguns teóricos tratam-na por persuasão não-válida) ocorre quando, em lugar

da racionalidade, da evidência, há o apelo à afetividade, à impulsividade, ao imediatismo. A persuasão assim vista é própria da maioria dos discursos publicitários, dos discursos políticos não-sinceros.

Como exemplo de texto em que a persuasão sobrepõe-se à argumentação, analisaremos a propaganda a seguir.

A Duloren elaborou sua campanha de lançamento de lingeries movendo o leitor pela provocação, pelo de-safio, conforme perce-bemos não só pelas fotos como também pela estrutura utilizada “Você não imagina...”, a qual desperta uma intensa curiosidade. Na revista, esta curiosi-dade é aguçada, pois as

duas fotos apare-cem de tal forma que o leitor, para continuar a leitura, deve virar a página.

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(Revista Nova, nº 265)

Provocação, desafio, curiosidade, ero-tismo são, pois, palavras-chave neste texto.

Não é o “raciocínio lógico” que incita o leitor a virar a página e compreender o texto, até porque, pela “lógica”, seria difícil acreditar que um membro da seita radical Ku Klux Klan, conhecida pelas suas idéias de racismo extre-mo, poderia “dobrar-se” aos apelos de uma mulher – e negra! – e, ao invés de ser seu car-rasco, tornar-se seu servo, o “dominado”.

A coerção também se diferencia da argumentação: enquanto a primeira visa impor uma tese, por meio de uma proibição, por exemplo, como em “Não fume!”, cuja tese é “fumar faz mal à saúde”, a segunda conduz, através de argu-mentos próprios do raciocínio lógico,

o interlocutor a concluir que fumar faz mal à saúde, ou, pelo menos, a refletir sobre os prejuízos do tabagismo. Podemos sentir, no último caso, o caráter “liberal” da argumentação já que esta permite o confronto de idéias, promove a discussão.

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Em síntese: arg u m en tar n ão é sim p lesm en te im por, m as fazê- lo caso se qu eira a a-d esão d o ou tro essa im p osição po r m eio de u m a an álise convin cen te, b em fun dam en tad a, fato q u e n ão oco rre com a coerção já q ue esta depend e u n icam en te d a do locu to r, m an ifesta através d e pro ib ições, advertências, en tre ou tros re-cu rsos.

Lem b rem os, ad em ais , q ue, no texto arg um en tativo , h á um a am bivalênc ia: ao m esm o tem po em que existe esse efeito de “livre arb ítrio ”, ou se ja, o in terlocu to r “pode” refo rçar u m a tese, aderir a e la ou d isco rda r d ela, h á a von tad e d e o locu to r con du zir o in terlocu to r a aderir às idéias daqu ele. A rgu m en tar, neste caso, sign ifica levar o inte rlo -cu to r a aceitar o q u e está sen d o d ito. Talvez seja esse q u e levou o teó r ico Ch aro lles afi rm ar qu e “o h o rizon te de tod a argum en tação é o ”. ..

legitim ando

vontade

caráter coercitivosilêncio

CHAR OLLES, M . Les formes directes et indirects de l’argumentation. , n.64, p.7-45.Pratiques

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4 Um exemplo de texto argumentativo: a carta

As universidades UNICAMP e UFPel propõem, em suas provas de vestibulares, uma modalidade textual muito interessante: a carta argumentativa.

Nesse tipo de texto, o vestibulando costuma aderir, reforçar ou contrariar uma tese a partir de uma coletânea de textos que constam na prova.

Vejamos um exemplo dessa modalidade, tomando por base a

seguinte proposta.

No ano de 1996, sugeriu-se aos alunos que redigissem uma carta argumentativa ao então ministro da Justiça, Nelson Jobim, com o objetivo de os vestibulandos manifestarem-se sobre a norma, criada pelo Governo Federal, a qual proibia fumar em recintos públicos fechados.

Observemos o texto de um dos alunos, Fernando Rezende.

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Pelotas, ___ de ____________ de ______.

Excelentíssimo Senhor Nelson Jobim

Tendo tomado conhecimento, por meio da imprensa, da norma que regulará o tabagismo em recintos públicos fechados de nossa sociedade, resolvi escrever-lhe para tecer algumas considerações, oferecendo-lhe, dessa forma, minha contribuição acerca desse tema relativamente complexo e polêmico.

Considero justa a restrição legal ao uso do cigarro em recintos públicos fecha-dos, já que esta norma visa proteger a saúde das pessoas que não fumam. No entanto, a ausência de medidas concomitantes a esta proibição, no sentido de restringir ou mesmo proibir totalmente a propaganda de cigarros fragiliza, no meu entender, a referida norma. É necessário, senhor ministro, alguma atenção do Poder Público aos que fumam e que-rem abandonar o hábito, e uma especial atenção aos jovens que, através da propagan-da, irão engrossar as fileiras das vítimas desse malefício.

Gostaria ainda de lembrar-lhe que o fumante, ao comprar um maço de cigarros, está contribuindo com a União, por meio de um imposto muitíssimo elevado. Uma parce-la desse imposto deveria ser, por lei, destinada à pesquisa sobre este problema, tendo por finalidade a prevenção contra os males do tabagismo e o tratamento dos dependen-tes da nicotina.

Portanto, solicito a Vossa Excelência que considere minha colaboração no senti-do de tornar a lei antitabagismo mais consistente e, por conseqüência, mais eficaz.

Atenciosamente,F. R.

Comentários sobre o texto:

Destacam-se, no texto de Fernando Rezende, alguns elementos relacionados ao contexto, à situação em que foi escrito, tais como a data, o local, o interlocutor e o locutor.

Quanto à interlocução, na carta, aparece explícita, através do vocativo, ou do uso de pronomes. Consideremos, no processo de interlocução, a importância de o locutor/interlocutor terem uma imagem precisa, clara um do outro para conduzir os argumentos na direção exata a que se quer chegar. Sem o locutor conhecer as necessidades, as vontades, as limitações do interlocutor, difícil se tornará esse processo.

O aluno levou em conta, ao escrever a carta a Nelson Jobim, que este era um ministro de Estado, da área da Justiça, portanto, alguém que deveria ser tratado, pois não havia intimidade entre os dois, com um certo grau de formalidade. Para tanto, usou a norma culta da língua, um vocabulário próprio ao contexto, evitou intimidades ou posturas agressivas, mesmo quando criticou o Poder Público. Além disso, não tratou o ministro como se este desconhecesse o assunto em questão, pois ambos compartilhavam informações, tinham conhecimento sobre a norma. Até mesmo as sugestões e solicitações feitas por ele ao

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ministro foram adequadas, exeqüíveis ao cargo que este ocupava.

Por outro lado, Fernando não se preocupou somente com a imagem que ele tinha do ministro, mas também com a imagem que o ministro poderia formar de Fernando, fato o qual ficou claro na apre-sentação que apareceu no início da carta, assim como nos próprios argumentos usados, demonstrando, com isso, “dominar”, mesmo não sendo um especialista, noções de legislação e informações sobre o tabagismo.

Notemos que, na introdução da carta, o aluno deixa claras algumas informações: como tomou conhecimento do assunto, qual o assunto em questão e a finalidade do texto.

No 2º parágrafo, já no desenvolvimento, ele expressa um ponto de vista (“Considero justa...”), seguido de uma ressalva (“No entanto...”). Esta se faz acompanhar de uma crítica (“...fragiliza...”). Ademais, chama a atenção para a importância de o ministro, através do Poder Público,

reverter o quadro em questão. Os argumentos do aluno mostram-se consistentes já que há uma tripla preocupação: com os fumantes, os não-fumantes e os que poderão vir a ser fumantes.

No 3º parágrafo, o locutor reitera a necessidade de o ministro, como membro representante da União, tomar uma atitude quanto ao assunto, mas essa solicitação ou exigência, são feitas com polidez.

Na conclusão, no 4º parágrafo, ele confirma a finalidade da carta – contribuir, por meio de seus argumentos, para que a norma seja revista (“tornar a lei antitabagismo (...) eficaz.”).

Palácio da Justiça, Brasília. Foto: Daniel Macedo.

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Agora observemos algumas marcas lingüísticas explícitas no texto:

Excelentíssimo Senhor Nelson Jobim lhe

lhe senhor ministro lhe Vossa Excelência

/ escrever- / oferecendo- / É necessário,

/ lembrar- / solicito a ;

oferecendo-lhe, / esta norma/ / Gostaria / / .

dessa forma já que No entantoainda Portanto por conseqüência

d) uso de substantivos na argumentação: tabagismo/ ma-les/ malefício/ restrição/ vítimas/ prevenção/ tratamento;

tema relativamente e / Considero / atenção/ / lei (...) mais

(...) mais ;

complexo polêmico justa especial muitíssimo elevado

consistente eficaz

resolviminha

Considero no meu entender Gosta-ria solicito

escrever-lhe/ contribuição/

/ / de/ ;

O uso da co letânea e a importância do levantam ento de idéias

Um dos aspectos considerados na avaliação de redações propostas pela UFPel e UCPel refere-se ao uso da coletânea. O vestibulando não pode, segundo as bancas examinadoras, apropriar-se dela copiando trechos como se estes tivessem sido escritos por ele mesmo. No entanto, os argumentos nela contidos podem ser parafraseados, ou seja, ele pode utilizá-los, desenvolvendo-os “com suas próprias palavras”. No caso de dados estatísticos, fatos históricos (inclusive datas), citações, por exemplo, é permitida a

cópia desde que se esclareça a fonte.

Além disso, o aluno não precisa limitar-se às informações e/ou argumentos da coletânea, nem mesmo utilizar todos os fragmentos dela. Ele pode – e isso é mui-to proveitoso! – acrescentar idéias prove-nientes de

seu conhecimento de mundo, de sua experiência cultural.

Além de fornecer informações, argumentos, a coletânea desempenha a função de delimitar o tema, por vezes amplo, di-recionando-o, indicando que aspectos

Ilustração: Nara Rejane da Silva

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devem ou não ser abordados. No texto de Fer-nando Rezende, nota-se a preocupação em posicionar-se sobre a norma em questão, e não em tecer uma análise ampla acerca dos malefícios ocasionados pelo tabagismo.

Para bem aproveitarmos a coletânea, o ideal seria organizarmos um levantamento das idéias, ou

seja, um esquema cujas idéias poderão auxiliar o aluno na construção de seu texto, sobretudo se este for baseado em outro texto ou em um con-junto de textos. Assim, há determinados “passos”, uma espécie de roteiro os quais podem ser os seguintes:

fazer o levantam ento dos dados contidos na co letâ-nea - idéias-chave reti-radas dos textos;

organizar o plano das idéias - argum entação própria, acres-cida dos dados da coletânea os quais julgar m ais relevantes a fim de reforçar o ponto de vista e enriquecer o texto ou dados que serão contestados (no caso da contra-argum en-tação) .

selecionar estruturas básicas a serem utili-zadas - articu ladores de causalidade, conti-n u id a d e , o p o s iç ã o , com paração etc.;

selecionar um voca-bulário com patível com o tem a: verbos, substantivos, adje-t iv o s , a d v é rb io s , pronom es;

Antes, portanto, de concentrar-se na coletânea, analisemos atentamente a proposta que as bancas apresentam pois há nela itens os quais devem ser observados para que não haja fuga do tema ou ina-dequação ao tipo de texto.

Como exemplo de bom uso da coletânea, leia a proposta abaixo, feita no ano 2000, seguida da carta argumentativa, redigida pela aluna Ana Barbosa Duarte, assim como o comentário posterior.

Proposta de redação:

No decorrer do ano 2000, houve inúmeros eventos os quais visaram a celebrar os 500 anos de Descobrimento do Brasil.

Baseando-se não só na conjuntura atual, mas também tomando por base o passado histórico de nosso país, reflita sobre a seguinte

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questão: “A data comemorativa dos 500 anos de descobrimento de nossa terra é motivo de comemoração para nós, brasileiros?”

Para tanto, redija uma carta argumentativa ao editor do jornal Folha de São Paulo (FSP), posicionando-se sobre o tema.

Ao elaborar seu texto, utilize alguns argumentos expostos na coletânea abaixo, assim como outras informações que julgar relevantes.

Atenção: ao assinar sua carta, use apenas as iniciais de seu nome.

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(Folhateen; Fernando Gomide Novaes, 20, São Paulo, SP)

(Gustavo Ioschpe - Colunista da Folha - FSP, 17/04/2000)

“Hesito um pouco em entrar nessa discussão sobre o Descobrimento e seus festejos, porque é entrar no jogo do governo. Essa história de festejar a data é invenção e obra do governo e suas centenas de milhões de reais a serem gastos. A partir da iniciativa do governo, e apoiados em seus recursos, uma série de organismos se contagiou pelo tema e não termina nunca esse desfile de ufanismo: dos desfiles das escolas de samba à penca de livros sobre o assunto, das campanhas publicitárias às capas de revistas.

O governo festeja a data porque, sei lá, não tem nada mais pra festejar nesse país miserável e com tantos proble-mas. Assim, ao invés de ter de se preocupar com decisões complicadas, como continuar deixando metade da popula-ção se esvair em subnutrição ou usar o dinheiro para custear sua dívida com a banca, o pessoal de Brasília deixou de dramas e decidiu torrar o negócio em festas. Quer imbuir na população um sentimento de amor à pátria e deslumbra-mento com a nação, para que o povo se maravilhe com o nosso passado e esqueça os problemas do presente. (...)”

"Não vou comemo-rar como Natal ou Ano Novo, mas vou ficar mui-to feliz. O Brasil é um país maravilhoso, não e-xiste mais bonito. A cul-tura e a natureza da nos-sa terra são muito ricas.”

(idem; Alisson de Moura, 21,São Paulo, SP)

"Não existe muita coisa para se comemo-rar. Só vejo violência e desemprego: a barra es-tá pesada para o brasi-leiro. Além disso, o Des-cobrimento significou a morte dos índios.”

(Em: , 13/03/00)

Folha de São Paulo

(Comissário-geral da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, e da Cátedra Jaime Cortesão, da USP.

Em: FSP, 10/04/00)

Evilânia Alfenas Moreira (Sabará MG)(FSP, 10/04/2000)

Folha - Para que servem datas como a dos 500 anos?

Romero Magalhães - São momentos de reflexão e de estudo. É evidente que, para isso, é preciso chamar a atenção, alertar as pessoas para a efeméride e, portanto, a festa é um componente que funciona apenas como desencadeador do processo de reflexão.

"É motivo de vergonha a maneira como a mídia exalta os 500 anos do Descobri-mento. Além de parecer que o país não existia antes do 'grande favor' que os europeus fi-zeram em aqui pisar, o assunto é abordado como se fôssemos eternamente gratos a nossos 'descobridores'. O que temos a comemorar? Os 500 anos do início da escravidão (que ainda não acabou)? Os 500 anos durante os quais recursos naturais como o pau-brasil e o ouro foram, de certa forma, roubados daqui? Será que são causa de tamanha festa os 500 anos durante os quais nos tem sido imposta uma cultura adversa às condições do povo brasileiro e do Brasil?”

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Samuel Pucci, 20 (via e-mail)(FSP, 11/04/2000)

(depoimento de aluno; ano: 1999)

"Caravelas novamente ao mar; reprodução fidedigna da carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal; reló-gios globais acionados para a contagem regressiva; um lauto banquete para a tão esperada comemoração dos 500 anos do Descobrimento do Brasil. O que realmente há para celebrar??? Talvez o genocídio de tribos selvagens por meio das guerras justas. Ou melhor, o extermínio de avan-çadas civilizações e a crueldade dos conquistadores euro-peus. E, assim, mais uma vez, o Brasil aplaude e engole a inocente versão ensinada nas escolas de que Cabral che-gou ao Brasil por acaso. O importante é mais uma vez con-firmar a incompetência da América católica!!!”

"Não sei o por-quê de tanto pessi-mismo com relação ao nosso país. Da-dos do último relató-rio da ONU, por e-xemplo, demonstram ter havido uma me-lhora quanto ao nível de expectativa do brasileiro.”

FS

P, 2

2/04

/00

Comentários sobre o texto:

Os números destacados nos col-chetes, no texto da aluna, indicam os frag-mentos da coletânea os

quais continham as idéias por ela apresentadas. Como percebemos, Ana Duarte não copiou li-

Nau portuguesaHistória & vida

. Fonte: PILETTI, N.; PILETTI, C.. 13a. ed. São Paulo: Ática, 1993. v1, p.39.

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teralmente os trechos da coletânea, mas transfor-mou-os, “traduzindo”, com palavras próprias, a idéia-base de que queria lançar mão.

Salientemos, tam-bém, que Ana não utilizou todos os fragmentos ao construir seu texto. As idéias da resposta “sim”, do fragmento 2, assim como o depoimento, de 6, por exemplo, não constam em seu texto.

Por outro lado, Ana Duarte acrescentou informações as quais não se faziam presentes na coletânea, como a referência feita à man-chete “Bahia: o Brasil começa aqui”, veicu-

lada freqüentemente em algumas emissoras de televisão, durante a época das comemorações. Forneceu, ainda, sugestões sobre como aplicar a verba destinada às comemorações.

Por fim, destaquemos o bom desempenho da aluna ao utilizar a coletânea: produziu críticas, acrescentou ressalvas (“No entanto...”). Quanto à proposta de redação, desenvolveu-a de forma adequada uma vez que não fugiu do tema e atendeu ao solicitado, fazendo referência não só à conjuntura nacional presente co-mo à passada.

Sugestões de como fazer ( quadros sintéticos)

Pode conter um ou uma (esta, no caso da contra-argumentação) a uma reportagem ou artigo lidos, ou a algum projeto de lei, por exemplo;

sua função é , o qual não deve ficar em suspen-so; portanto, ela não deve ser "vaga". Evitar o uso de "chavões" ou expressões desgastadas como "Venho por meio desta..." ao indicar a da carta.

elogio censura

indicar o assunto

finalidade

Exposição dos argumentos ressalvas

críticas

; uso de , as quais ser-vem para "flexibilizar" o ponto de vista (não torná-lo tão radical) e/ou alertar sobre um fato; realização de a fim de tor-nar o texto mais enriquecedor.

Assim como a introdução, não deve ser vaga como, por exemplo, exi-gir "uma maior conscientização" ou que "medidas urgentes sejam to-madas" sem explicitar de que forma isso deve acontecer. As

, , os de que por ventura o aluno lan-çar mão devem ser bastante claros, detalhados.

suges-tões reivindicações conselhos

Obs.: Não há uma "ordem" ou "colocação" rigorosa quanto às sugestões fornecidas acima. Uma reivindicação pode, por exemplo, aparecer no desenvolvimento, e não na conclusão.

ESTRUTURA

Introdução:

Desenvolvimento:

Conclusão:

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Quanto ao ponto de vista, emprego da 1ª pessoa do singular: julgo, penso, acredito, destaco, considero, acentuo, percebo, creio, observo, discordo, contrario...;

usa-se: senhor/ senhora para tratamento respeitoso em geral (redator, editor, sindicalis-ta, jornalista);

Vossa Excelência para altas autoridades (presidente, senador, deputado, juiz)/ Excelen-tíssimo Senhor...;

Vossa Senhoria para funcionários graduados.

Obs.: Os pronomes de tratamento exigem 3ª pessoa: Vossa Excelência e sua equipe,/ seu projeto/ sua re-portagem/ seu empenho/ sua atuação.

RELAÇÃO LOCUTOR/INTERLOCUTOR

Acreditando sermos todos nós, brasileiros, responsáveis pelo resgate de valores éticos e partícipes na construção de nossa plena cidadania, dirijo-me ao senhor [ou: Vossa Se-nhoria] a fim de (...)

ulgo que Vossa Excelência, como congressista eleito com o respaldo de nosso povo, poderia intervir em questões tão relevantes como "X", contribuindo para amenizar o pro-blema "X". Desejo, pois, através de minha manifestação, solicitar-lhe "Y"; para tanto, os argumentos que apresentarei serão, creio, de fundamental importância.

Acreditando ser um cidadão comprometido com uma prática efetiva no meio em que atuo e, tendo tomado consciência de diversas matérias [ou: reportagens; artigos; programas televisivos] acerca do [ou: a respeito de; a propósito de; sobre] tema [ou: assunto; fato; questão] "X", gostaria de expor-lhe minha posição e, dessa forma [ou: desse modo; as-sim], contribuir para a superação [ou: amenização] de (...)

Como uma jovem estudante interessada na construção de um futuro mais justo de nossa sociedade, acredito serem minhas opiniões [ou: meu posicionamento] relevantes para a superação do problema "X"; por isso [ou: portanto; desse modo] resolvi escrever-lhe (...)

Com o intuito [ou: finalidade; objetivo; propósito] de contribuir para formação da opinião pública e, assim, tentar reverter o quadro [ou: cenário; conjuntura] em que se encontra nossa nação, gostaria de expor-lhe minha posição [ou: posicionamento] sobre (...)

Tendo refletido, através de informações [posições; comentários] veiculadas nos mais variados meios de comunicação [ou: da mídia], acerca de tão importante fato como "X", escrevo-lhe para (...)

J

SUGESTÕES PARA INTRODUÇÃO

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Com base nos argumentos expostos, gostaria de solicitar sua intervenção nesse setor, a fim de que Vossa Excelência possa amenizar (...) por meio de (...)

Julgo, portanto, de suma importância a publicação, neste jornal, de matérias que pos-sam permitir a reversão [ou: transformação] de quadro tão assustador como o apresen-tado.

Sugiro, por fim, que intervenha, através do cargo ocupado por Vossa Senhoria, em tão polêmica questão a fim de (...). Para tanto, o ideal seria (...)

Dessa forma, solicito-lhe que considere minha posição e pondere sobre os argumentos por mim expostos, publicando, nesta revista, reportagens acerca de "X". Acreditando ser esse o caminho mais coerente e eficaz para resolver questões como a que lhe foi ex-posta, sugiro-lhe, ainda, (...)

SUGESTÕES PARA A CONCLUSÃO

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A contra- argumentação na carta argumentativa

Uma das maneiras possíveis de emitir nosso ponto de vista sobre um tema é demonstrar a falsidade da argumentação daqueles que pensam diferentemente de nós. Esse procedimento, chamado de contra-argumentação, consiste em refutar argumentos alheios. Se utilizado criteriosamente, pode ser muito útil

na elaboração de textos argumentativos.

No ano 2000, propôs-se o exercício abaixo aos alunos. Leia-o, assim como as instruções, o levantamento das idéias – fruto de discussão em sala de aula –, o tex-to da aluna Daniela Larentis e o comentário subseqüente.

Proposta de redação:

A autora do texto a seguir utiliza o tema “trote”, na verdade, como pretexto para traçar um perfil dos adolescentes das classes mais favorecidas do País. Nele, a articulista aponta críticas mordazes à maneira como reagem diante da realidade. Após identificar tais críticas, você deverá rebatê-las, por meio de

argumentos os quais julgar pertinentes. Escreva-lhe uma carta contrapondo-se aos pontos de vista que ela assume em seu texto. Não se esqueça: você terá de necessariamente contra-argumentar, refutar as idéias de Marilene Felinto.

Escolha, no mínimo, três das sete declarações, destacadas no texto da jornalista, para refutá-las, transcrevendo-as em seu ras-cunho;

proceda, então, ao levantamento das idéias a fim de facilitá-lo a redigir;

ao assinar sua carta, use apenas as iniciais de seu nome.

Outras informações/instruções:

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Todo começo de ano é a mesma cena: calouros de universidades, as cabeças raspadas e as caras pintadas, incitados ou obrigados por veteranos, ocupam os sinais de trânsito pedindo dinheiro aos motoristas. É uma das formas do chamado "trote", o mais artificial dos ritos de iniciação da mais artificial das instituições sociais contemporâ-neas: a universidade.

O trote nada mais é do que o retrato da alienação em que vivem esses adoles-centes das classes favorecidas. Com tempo de sobra, eles não têm em que empregar tanta liberdade. [1]

Ou querem dizer que essas simples caras pintadas têm qualquer simbologia se-melhante à das máscaras de dança das tribos primitivas estudadas por Lévi-Strauss?

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Para aquelas tribos índias, as máscaras eram o atestado da onipresença do sobrenatural e da pujança dos mitos.

A ausência de conheci-mento e saber limita-lhes os desejos e as atitudes.

Hoje, mais do que nunca, há uma tendência característica da mentalidade das elites da economia capitalista

Mas esses adolescentes urbanos não têm tanta complexidade. Movido a MTV e shopping centers, o espírito deles vive nas trevas.

Em tempos mais admiráveis, ou em sociedades mais ideais, essa massa de vagabundos estaria ajudando a cor-tar cana nos campos, envolvidos com a reforma agrária, em programas de as-

sistência social nas favelas ou com crianças de rua, ou mesmo explorando os sertões e as florestas do país, como faziam os estudantes do extinto projeto Rondon.

de adulação à adolescência, de excessivo prolonga-

[2]

[3]

mento da mesma

ou pelo menos a-madureceriam de verdade, solidários, ocupados com o sofrimento real dos ou-tros

catando moedas para festas e outras leviandades sentindo-se deuses por terem conseguido decorar um punhado de fórmulas e datas e resumos de livros que os fizeram passar no teste para entrar na universidade

[4]

[5]

[6]

[7]

e de excessiva indulgência para com esse período tido como "de intensos processos conflituosos e persistentes esforços de auto-afirmação".

Desde adolescente, sempre olhei com desprezo esse tratamento que se preten-de dar à adolescência (ou pelo menos à certa camada social adolescente): um cuidado especial, semelhante ao que se dá às mulheres grávidas. Pois é exatamente esse pisar em ovos da sociedade que acaba por transformar a adolescência num grande vazio, nu-ma gravidez do nada, numa angustiante fase de absorção dos valores sociais e de inte-gração social.

Se os adolescentes se ocupassem mais, sofreriam menos

.Mas não, ficam vagabundando pelos semáforos das cidades,

. E, o que é pior,

.A mim que trabalhava e estudava ao mesmo tempo desde os 15 anos causava

alarme o espírito de vagabundagem que, cultuado na adolescência, vi prolongar-se na realidade alienada de uma universidade pública.

Na Universidade de São Paulo, onde estudei, os filhos dos ricos ainda passam anos na hibernação adolescente sustentada pelo dinheiro público.

E-mail: [email protected] FELINTOda Equipe de ArticulistasFolha de São Paulo, 25/02/97

Em: de S. Y. Campedelli e J. B. Souza

Literaturas Brasileiras e Portuguesas,

Levantamento das idéias realizado pelas turmas do ano 2000

Resumo da opinião de Marilene Felinto sobre os adolescentes de classes mais favorecidas:

vagabundos

superficiais

alienados

“mimados” (”adulação”)

limitados

Avaliação acerca do texto de Marilene Felinto:

generalização excessiva

comparações inadequadas (sem levar em conta o contex-to cultural e histórico)

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O fato de ta is ado lescen tes ass istirem à M T V n ão sig n ifica qu e sejam "su perfici-a is". E sta em isso ra veicu la, em sua p ro -g ram ação, a lém de q uadros d e en treten i-m en to , prog ram as cu ltu ra is , ed u cativos, d irecion ados aos in teresses d os jovens. Con stan tem ente h á prop agand as de p re-venção contra o uso de d rogas, d oen ças sexu alm ente transm iss íveis , sobre tud o a A ids . A em isso ra transm ite não só a m úsi-ca intern acion al com o tam bém a n acion al, con tribu in do para a valo rização de u m a cu ltu ra g en uin am en te brasile ira. Q uanto ao fato d e os ad o lescentes freq ü en tarem em dem asia os sh opp in g cente rs, é p reci-so lem brar q ue o fazem , prin cip alm en te n os grand es cen tros urban os, em b u sca d e m aio r segu ran ça, já qu e, em m u itos p arqu es, praças ou ou tros loca is a q ue po -d eriam ter acesso , h á o per igo d e serem assaltados, in com od ados, m o lestados.

O s ad o lescen tes d e classe m é-d ia / a lta, ao con trário do qu e se im agin a, n ão têm tem p o de sob ra . G rande pa rte d eles ab -d ica de m om en tos d e laze r p a-ra estu dar. A lgu n s o fazem du -rante a m an h ã e, à tard e, re-fo rçam os estu dos, p reparan -d o -se p ara o vestib u la r; fre-q üen tam cu rsos de lín gu as e, em m uitos caso s, p articip am d e au las d e g inástica ou prati-cam espo rtes até m esm o p ara a liv iar o estresse ca racte rístico d esta e tapa d a vida .

Contra-argum entos:

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C o n tra r iam e n te ao esp e -rado, ta is ado lescen tes são m ais exig idos p o r seu s fam i-liares d o qu e h á d ez an os, p o r exem p lo. Tom an do con s-ciên cia da excess iva lib erda -d e a qu e os fi lh os tin h am d i-re ito , m u itos pa is passaram a im p or- lh es lim ites quan to às su as von tad es, a exig ir m a io r respon sab ilid ade, ta l com o a -p resen tar u m b om ren d i-m en to n a esco la e p repa -ração pa ra o vestibu lar, a lém d e estipu la r h o rários para sa ídas no tu rn as.

Tais joven s n ão são "ego ístas", con fo rm e são ch am ad os. M u itos d eles dem onstram -se sens íveis aos prob le-m as q u e os ce rcam , so lid a r izan d o - se aos m ais n ecessitad os e exclu ídos, através d o en ga jam en to em gru -p os de ig rejas, p artici-p ação em O N G s, pro -m oção em cam panh as b en efi cen tes ou d e con scientização, entre ou tras ativ idad es.

O s tem pos m u daram e, com eles , a m en talid ad e, as asp irações, a p ostu ra d os joven s d iante da realidade. A gera-ção d os an os 60/ 70 acred itava ser po s-sível "m ud ar o m un d o" através de b an -d eiras , p asseatas e confl itos com au to -ridades. A atu al geração tam b ém acre-d ita qu e d eve contr ibu ir pa ra m e lho rar a qu alid ade d e vida das pessoas, só q ue d e ou tra fo rm a : vo ltad a para as p equ en as ações co tid ian as, p o r m eio d o exercício da p róp ria p rofissão . S ão tem pos d iferen tes e, po rtan to, p ostu -ras tam bém d iferen tes.

O s ado lescen tes q ue fo ram ap rovados n o vestib u la r, após o esfo rço dep reen did o, têm o d ire ito a com em orar a vitó r ia , já q ue a aprovação é m otivo de gran de a le-g ria e a lív io .

M u itas u n ive rsidades, en ten den do a n eces-sid ad e de rec iclar o m étod o de avaliação do sis tem a ed ucaciona l, prop useram m ud an -ças nas provas d e vestib u lares, exig in do d os can did atos n ão a m era m em orização , m as a reflexão e postu ra cr ít ica.

Agora leia a carta argumentativa elaborada pela aluna Daniela Larentis:

Page 38: escrita e cidadania

Pelotas, 01 de setembro de 2000.

Senhora Jornalista

Não me considero uma jovem "superficial", tampouco alienada; , após ler minuciosamente seu artigo publicado na Folha, de 25/02/97, resolvi escrever-lhe para ex-pressar minha profunda indignação criticar a excessiva generaliza-ção manifesta pela senhora ao se dirigir aos jovens das classes mais privilegiadas do País.

, gostaria de contestar sua afirmação injusta quanto ao fato de os jo-vens desfrutarem de muito tempo livre e não saberem como utilizá-lo.

grandes exigências do mercado de trabalho, tais adolescentes procuram qualificar-se ca-da vez mais, através de cursos, estágios, estudos de outras línguas, haver o árduo preparo para o vestibular. , evitar ou minimizar o estresse dessa etapa da vida, muitos participam de aulas de ginástica ou praticam esportes. dis-cordo de que a ida a possa ser vista como um entretenimento fútil.

, esses espaços constituem-se em raros lugares onde é oferecida uma ampla di-versidade cultural por meio de formas de lazer tais como cinemas, exposições de arte, livra-rias; , o fator mais atrativo e essencial, sem dúvida, consiste na maior segurança, visto que os jovens, nesses ambientes, encontram-se mais protegidos contra assaltos ou ou-tros perigos mais graves.

, julgo improcedente a referência feita por Vossa Senhoria em relação à exacerbada adulação à juventude. Os adolescentes estão sendo não só mais exigidos por seus familiares, os quais lhes impõem rígidos limites, como por si mesmos. Exemplificam claramente tais atitudes o bom desempenho na escola, a preparação para o vestibular e, so-bretudo, o aumento da responsabilidade característica marcante desconhecida por gran-de parte dos jovens de outras décadas. trote, considero sua posição um tanto limitada, as provas de vestibulares, em muitas universidades brasileiras, exigem dos alunos uma postura crítica, a simples memorização. , aqueles alu-nos cujo esforço e dedicação resultaram na aprovação do concurso devem considerar-se vitoriosos e, , comemorar.

Acrescento-lhe que esses jovens não se mostram passivos frente à preocupante conjuntura atual. Muitos colaboram, em suas co-munidades, engajando-se em grupos de igrejas ou em ONGs,

promoverem campanhas conscientizadoras ou beneficentes; , oponho-me à gravíssima acusação da falta de solidariedade da

juventude atual. Esta não almeja soluções imediatas e individualistas, conscientes, duradouras e solidárias, ocorreu na parti-

cipação dos caras-pintadas durante o processo de do ex-presidente Collor, na década de 90, ocasião em que a iniciativa dos jovens mostrou-se essencial. Eles pretendem, à atitude daqueles dos anos 60 e 70, realizar passeatas por vezes até mesmo violentas , aspirar a mudanças mais profundas e, , auxiliarão, através do exercício da profis-são, por exemplo, em prol dos mais carentes.

, espero ter contribuído a senhora perceba a mudança dos tempos, da mentalidade dos povos e, , das aspirações da juventude, recon-siderando, , sua postura frente às novas gerações.

Atenciosamente,D. Z. L.

por isso

não só como também

InicialmenteAtualmente, devido

àsalém de

Ademais com o intuito deTambém

Ao contrário

entretanto

Igualmente

Com relação ao pois

e não somente Logo

portanto

além de por-tanto

mas tal como

contrariamentenão só

como tambémcom certeza

Desse modo para queprincipalmente

assim

shopping centers

impeachment

IstoÉ, 26 ago. 1992, p.44.

Page 39: escrita e cidadania

Comentários sobre o texto:

Daniela utilizou praticamente todas as idéias sublinhadas no texto de Marilene Felinto para contestá-la, fato que não era obrigatório, ou seja, as instruções não indi-cavam tal obrigatoriedade, mas também não impediam que a aluna o fizesse. Pelo fato de assim tê-las usado, seu texto tornou-se um pouco extenso se comparado aos que costumam ser produzidos em provas de vestibulares, mas nem por isso de qualidade ruim: ocorre justamente o contrário; ela fundamentou muito bem suas idéias, foi crítica, usou apro-priadamente a coletânea. Além disso, selecionou um vocabulário rico e coesivos adequados.

A aluna não perdeu de vista, no 1º parágrafo, as idéias da jornalista: ao se apresentar, selecionou os adjetivos “superficial” e “alienada” para retomar as críticas de Marilene expressas nas linhas 14 e 15 (“Mas esses adolescen-tes urbanos não têm tanta complexidade”) e 6 (“retrato da alienação”). Remeteu, en-tão, ao sentido global do texto e apontou nova crítica – generalização em demasia.

No parágrafo seguinte, refutou as idéias contidas em 1 e 2, sublinhadas no texto-fonte,

comprovando, através de uma breve análise da conjuntura socioeconômica atual, que os jovens aproveitam bem o tempo de que dispõem.

Os argumentos expressos em 4, 7 e 6 fizeram referência à responsabilidade desses jovens. O trecho “característica marcante desconhecida por grande parte dos jovens de outras décadas”, implicita-

mente, alude às atitudes da geração da própria Marilene quando jovem, assim como, no parágrafo posterior, em “contrariamente à atitude daqueles dos anos 60 e 70”, a aluna reafirmou tal alusão.

O 4º parágrafo apresentou argu-mentação construí-da por meio de exem-plos da atuali-dade.

A escolha do vocabulário é con-siderada própria à contra-argumenta-ção: indignação/ contestar/ injusta/ discordo/ improcedente/ um tanto limitada/ oponho-me/ gravíssima acu-sação/ perceba/ re-considerando. Tam-bém o uso de coe-sivos, assinalados no texto, permite a transição adequada entre as idéias.

A aluna marcou explicitamente a retomada do dizer alheio, através de expressões como: não me considero/ gostaria de

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contestar/ também discordo de/ julgo improcedente/ com relação ao trote, considero/ portanto, oponho-me à, típicas da réplica.

Tais estratégias fazem da redação de Daniela um bom exemplo de texto ar-gumentativo, neste caso, estruturado de acordo com o processo de contra-argu-mentação.

Page 41: escrita e cidadania

Sugestões de como fazer ( quadros sintéticos)

Deve haver uma . Também , neste trecho, é importante, além de explicitar-se uma ao texto/fonte.

referência ao texto cujas idéias serão refutadasdelimitar o assunto

censura/ reprovação/ indignação

Retomada do dizer do outrofun-

damentarressalva

, de suas declarações/posições, com o intuito de refutá-las. É preciso, nesta parte do texto,

, através de fatos, exemplos ou outro tipo de recurso, os contra-argumentos. Pode-se fazer uma a fim de fle-xibilizar o ponto de vista e, dessa forma, conciliar com o "adver-sário".

Retomada do ponto de vistaapontar sugestões

com a finalidade de ressaltar a incon-sistência dos argumentos alheios. Podem-se pa-ra tais argumentos serem reconsiderados.

ESTRUTURA

Introdução:

Desenvolvimento:

Conclusão:

Contraponho-me à acusação/ ao fato de (...)Com relação a "x", julgo possível revidar tal fato (...)

Considero improcedente/ impróprio/ injusto/ utópica (...)Manifesto, primeiramente, minha discordância quanto a/ ao (...)

Contrariamente ao que foi exposto em (...)Julgo, ainda, precipitada sua declaração referente a/ ao (...)

Não posso deixar de me surpreender quanto a/ ao (...)Gostaria, igualmente, de contestar/ questionar sua afirmação (...)

No meu entender, não se trata, pois, de (...), mas (...)O senhor acusa-me de (...); no entanto, (...)

Não percebo motivos para tais inquietações, pois (...)Equivocadamente, Vossa Senhoria declarou (...)

Julgo difícil acreditar (...)Tal fato evidencia que o senhor desconhece alguns dados referentes a/ ao/ aos reais motivos/ às verdadeiras razões (...)Quanto ao argumento segundo o qual (...), acredito (...)

Creio que a idéia "x" acaba por reforçar a imagem preconceituosa/ utópica segundo a qual (...)

EXEMPLOS DE TRECHOS PARA RETOMAR OS FATOS/AS DECLARAÇÕES:

Page 42: escrita e cidadania

Verbos

Substantivos:

Adjetivos

Outros reavaliar rever reconsiderar refletirquestionável

uma reflexão

: discordar, contrariar, contrapor-se, revidar, contestar, opor-se, ir de encontro a, ...

oposição, discordância, contestação, objeção, rejeição, antagonismo, con-trariedade, divergência, empecilho, …

: equivocado, improcedente, infundado, inadmissível, irresponsável, inócuo, inefi-caz, arbitrário, desumano, incorreto, unilateral, deplorável, chocante, indignado, incrédulo, surpreso, constrangido, …

: Julgo necessário / / / (sobre) o argumento (...)Acredito ser extremamente o fato de (...)Penso ser imprescindível profunda acerca de (...)

VOCABULÁRIO PARA SE USAR EM CONTRA-ARGUMENTAÇÕES

Após leitura referente ao artigo/ à reportagem “x” acerca de “y” assunto de suma impor-tância , decidi escrever-lhe e manifestar minha opinião, a qual vai de encontro à sua.

Em razão das críticas expostas em seu texto “x”, referente a “y” [indicar o assunto], resolvi expressar minha reprovação em face de sua atitude (...). Desse modo, espero propor-cionar-lhe, por meio de meus argumentos, uma reflexão para que possa reconsiderar seu ponto de vista.

SUGESTÕES PARA A INTRODUÇÃO

Julgo, pois, pertinente que Vossa Senhoria/ Vossa Excelência reavalie suas declarações a fim de evitar prejuízos ainda maiores a (...).

Sugiro que (...) seja efetivado/a e, desse modo, a atual situação possa ser revertida.

Portanto, solicito-lhe que reconsidere seu posicionamento, transformando as infundadas críticas em uma postura mais otimista frente a (...)

SUGESTÕES PARA A CONCLUSÃO

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Um outro exemplo de texto argumentativo : a dissertação

Uma outra modalidade textual proposta por exames de vestibulares de diversas universidades do País trata-se da dissertação. Tal qual ocorre com a carta argumentativa, a dissertação é um tipo de texto em que emitimos julgamentos, fazemos críticas e/ou ressalvas, expres-samos pontos de vista e defendemos idéias as quais são sustentadas por meio de argumentos.

No entanto, se há aspectos comuns entre os dois tipos de textos, também os há diferentes. Na dissertação, ao contrário da carta, não escrevemos dirigindo-nos a um interlocutor específico, determinado. O interlocutor, neste caso, pode ser considerado qualquer pessoa que vá ler o texto; portanto, a interlocução não deve ser explicitada.

Outra diferença a ser salientada refere-se ao uso da 1a

pessoa do singular, que, na carta, deve aparecer com freqüência e, na dissertação, evitada.

Essas são convenções as quais devemos respeitar a fim de que a redação seja adequada ao tipo de texto proposto.

Quanto ao uso da coletânea, recurso normalmente exigido aos vestibulandos que prestam vestibular na UFPel, UCPel e UNICAMP, devemos levar em conta as mesmas observações já mencionadas ao estudarmos a carta argumentativa.

No ano 2000, pediu-se aos alunos que redigissem uma dissertação, baseando-se numa coletânea composta por charges a qual abordava a relação entre ética/política em nosso país e questionando-os acerca da viabilidade ou não da prática política nacional em conformidade com os princípios éticos.

Leia a coletânea, o levantamento com o resumo das idéias das charges, assim como a redação, de autoria da aluna Daniela Larentis. Após, reflita sobre os co-mentários que seguem.

Page 44: escrita e cidadania

TEXTO 1

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 10/7/99)

TEXTO 2

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 21/02/00)

TEXTO 3

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 17/07/00)

Page 45: escrita e cidadania

TEXTO 4

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 18/07/00)

TEXTO 5

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 20/7/00)

TEXTO 6

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 21/7/00)

Page 46: escrita e cidadania

TEXTO 7

OS PESCOÇUDOS – Caco Galhardo

(Folha de São Paulo, 22/7/00)

TEXTO 8

(Folha de São Paulo, 03/01/98)

Levantamento das idéias das turmas do ano 2000

Page 47: escrita e cidadania

estereótipo (devido à própria tradição) do "mau" político.

excesso de privilégios: o político pode aproveitar-se do cargo ocupado para lançar mão de privilégios a si próprio ou a um pequeno grupo (ex.: durante o período Collor: operações fraudulentas, esquemas de corrupção gigan-tescos).

desvio de verbas (ex.: na atualidade: construção do prédio-sede do Tribunal da J ustiça do Estado: N icolau dos Santos N etto) .

compra e venda de votos ("clientelismo", ou seja, uso das institu ições e/ ou do cargo ocupado para "prestar favores"; personalismo, isto é, o que é re-levante não é a ideologia nem o partido do candidato, mas as qualidades pessoais do político).

falta de transparência (finalidade: evitar escândalos) .

tentativa de suborno (alto grau de sofisticação em operações fraudulentas) .

impunidade (os escândalos, envolvendo corrupção, acabam por ser "esque-cidos") .

fisiologismo: legislar em causa própria; uso da máquina administrativa na compra e venda de votos; campanha eleitoral realizada durante a execução do próprio mandato; "clientelismo".

Page 48: escrita e cidadania

Brasil Colôn ia: dependência total da m etrópole.

Brasil I mpério: voto permitido som ente aos lati-fundiários.

República velha: coronelismo: voto a cabresto.

Era Vargas: a m ulher adquire d ire ito ao voto.

D itadura de 64 a 82: forte repressão militar.

Exercício da cidadania de forma constante.

Esclarecimento sobre as funções dos poderes Executivo, Legislativo e J udiciário .

Fisiologismo, corrupção, escândalos, privilégios, impunidade, falcatruas. Essas são al-gumas características identificadas, com freqüência, na atividade política nacional. A cada caso ilícito exposto à sociedade, aumenta o sentimento de vergonha frente à atitude de alguns políti-cos o qual, aliado à insegurança, desperta dúvidas a respeito da real função a ser exercida por esses cidadãos. Contudo, tal conjuntura poderia ser revertida caso a população se integrasse à vida política do País e dela participasse de forma responsável e consciente.

Inicialmente, salienta-se a falta de interesse da imensa parcela da população acerca da política nacional. As causas desse desinteresse são inúmeras; entretanto, as históricas sobres-saem-se e explicam com clareza o início de uma herança: a exclusão social. O Brasil, desde o Descobrimento até a Independência, foi governado por Portugal, o qual manipulou, conforme seus interesses econômicos e políticos, a colônia, iniciando, desse modo, um processo de sub-missão brasileiro. Já na época imperial, o voto era privilégio somente dos latifundiários. Durante a República Velha, estabeleceu-se a política do coronelismo, firmada sobretudo nas fraudes elei-torais e no voto a cabresto, aberto, ou seja, obrigava-se o empregado a votar em seu patrão para que não só se mantivesse no emprego como também preservasse a própria vida. Na verdade, esse tipo de voto nada mais simbolizava do que os interesses oligárquicos. A mulher figura dis-criminada socialmente obteve direito a voto em 1934, na Era Vargas. Todavia, no período dita-torial, de 64 a 82, com o golpe de Estado ou, posteriormen-te, com eleições indiretas, sob forte repressão, evidenciou-se uma vez mais o total afastamento da sociedade na parti-cipação política do País. Logo, os momentos "concedidos" para a prática da cidadania, no Brasil, foram marcados pela imposição ou ausência do voto, garantindo o poder sempre nas mãos de uma minoria.

A situação poderia ser revertida; porém, a conjun-tura política atual mostra-se igualmente caótica e preocu-pante. Observam-se constantemente casos escandalosos envolvendo políticos. Muitos aproveitam-se de seus cargos para obter inúmeros privilégios como, por exemplo, as ope- IstoÉ, 7/4/1993. É o fim? Capa.

Page 49: escrita e cidadania

rações fraudulentas durante o período Collor. Ademais, há o elevadíssimo índice de desvios de verbas as quais deveriam ser repassadas às áreas da saúde, educação, entre outras. Até mes-mo para serem eleitos, alguns políticos "compram" votos, principalmente das classes menos fa-vorecidas, através da oferta de comida e algumas vantagens. Dessa forma, aqueles se elegem devido às suas "qualidades", e não à sua performance ou ao seu programa eleitoral. Como se não bastassem esses prejuízos à população, esta depara-se com a impunidade: tais políticos sentem-se inabaláveis e indestrutíveis perante qualquer forma de punição, estimulando a per-missividade, característica desse mundo político. Evidencia-se, pois, um descrédito da socieda-de quanto à realidade política e social, o qual desencadeia falta de expectativas frente ao futuro do País.

Assim, há a necessidade de uma reversão de tal quadro. Mostra-se fundamental o exer-cício constante da cidadania não só no período eleitoral, como também no pré e pós-eleitoral - deve-se conhecer o programa do candidato e do partido durante o período eleitoral, esclarecer a população sobre as funções do Executivo, Legislativo e Judiciário, assim como fiscalizar as ações dos políticos, exigindo da mídia a divulgação sobre o andamento dos mandatos. Dessa forma, haverá a busca constante pelo voto consciente e a negação dos interesses individuais em prol dos do País para que este se desenvolva, oportunizando atendimento aos excluídos e exer-cendo uma política incentivadora e verdadeira em que a ética mostre-se um valor essencial.

Comentários sobre o texto:

Observemos, primeiramente, o uso que Daniela Larentis faz da coletânea. A aluna utilizou, na introdução (1º parágrafo), as idéias-base de todas as charges, resumidas e expressas através de substantivos.

No desenvolvimento, no 2º parágrafo, ela lançou mão de conhecimentos de História os quais não estavam explicitados nas charges, mas haviam sido discutidos pela turma; acrescentou, portanto, informações à coletânea, enriquecendo a argumentação.

No 3º parágrafo, ainda no desenvolvimento, usou as idéias implícitas nas charges 2 e 7 ao ressaltar os privilégios e escândalos referentes a alguns políticos, exemplifi-cando. Os desvios de verbas, expressos na charge 3, constaram ainda neste parágrafo, assim como a compra e venda de votos, manifestas na charge 4. A impunidade, à qual se refere o chargista no

texto 7, também foi mencionada neste trecho.

Para fundamentar seu texto, sustentou sua argumentação mediante um resumo histórico no qual ressaltou a exclusão política e social da maioria dos cidadãos brasileiros e os interesses econômicos e políticos de uma minoria privilegiada.

Ao analisar a conjuntura nacional, citou alguns “vícios” de determinados políticos – obtenção de privilégios, compra e ven-da de votos, impunidade –, salientando a ne-cessidade de a população reverter tal quadro.

A fim de que tal reversão ocorresse, obedecendo a princípios éticos, Daniela, na conclusão, expôs uma série de sugestões, todas visando

à não-conivência e à participação da comunidade, de forma responsável, na atividade política nacional.

Eis um bom exemplo de texto argu-

Page 50: escrita e cidadania

mentativo: crítico, bem fundamentado, com bom aproveitamento da coletânea, com a escolha de um vocabulário rico e nível de linguagem adequado à situa-

ção. Ademais, a aluna fez bom uso dos elementos coesivos, “costurando” suas idéias com elegância.

10 Sugestões de como fazer ( quadros sintéticos)

Convém salientar (...)Devem ser enfocados os aspectos (...)Ressalta-se que (...)É preciso, pois, questionarmos (...)Convém lembrar (...)Torna-se fundamental (...)É necessário frisar (...)Cumpre destacar (...)Pode-se afirmar que (...)Conforme alegam (...)Alega-se, com freqüência (...)Podem-se traçar, ainda, outras diferenças/ causas/ conseqüências (...)

Page 51: escrita e cidadania

Queimadas desmatamentos poluição contaminação das águas

Criatividade espírito empreendedor preparo para desempe-nhar funções variadas

Bases nitrogenadas, genes, cromossomos DNA

, , ,. Essas expressões sugerem a muitos que não há motivos se-

quer para se comemorar o Dia Mundial do Meio Ambiente. No entanto, aos mais esperançosos e perseverantes, como os ativistas políticos e os ecologistas, são exatamente elas a razão para se reali-zar um trabalho de conscientização, envolvendo questões ambien-tais que ameaçam o Planeta. (assunto: questões ambientais da atualidade; proposta no Dia Mundial do Meio Ambiente; ano: 2000).

" , ,. Essas são algumas características exigi-

das para se ingressar no mercado de trabalho deste fim de século. Sem dúvida, com o avanço tecnológico, o trabalhador deverá renun-ciar a antigos conceitos, tais como a habilidade para atuar em apenas uma função e a for-mação acadêmica limitada a uma área." (assunto: o perfil do profissional no final do século; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Ana Barbosa Duarte).

" , . Finalmente, cientistas conseguiram decifrar cerca de 98% do código genético humano. Essa revolução científica está sendo am-plamente comemorada; entretanto, certas precauções devem ser tomadas a fim de que o Genoma, traduzido, seja utilizado de maneira responsável, em prol da humanidade." (assun-to: Projeto Genoma; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Daniela Larentis).

SUGESTÕES PARA A INTRODUÇÃO

O uso de vários substantivos ou de expressões equivalentes (devem pertencer ao mesmo campo semântico):

IstoÉ, 23/5/2001

Fisiologismo, corrupção, escândalos, privilégios, impunidade, falca-truas. Eis algumas características identificadas, com freqüência, na atividade política nacional. No entanto,

(assunto: relação ética/política no Brasil; ano: 2000).

um questionamento faz-se necessário: é viável o exercício dessa atividade, em nosso país, sem incorrer em tais vícios?

O uso de uma ou mais perguntas:

IstoÉ, 10/1/2001

Page 52: escrita e cidadania

" . Esse número deveria expressar algum sentido para a sociedade bra-sileira; no entanto, muitos cidadãos, por desconhecê-lo, o desrespeitam. Se-gundo a Constituição, a lei 7.716 designa o racismo como um crime. Apesar disso, cotidianamente, presenciam-se cenas explícitas de preconceito racial, sobretudo em relação à raça negra. Tal exclusão pode causar seriíssimas conseqüências, principalmente ao futuro do País, cuja população, aliás, é composta, em grande número, por indivíduos negros ou mulatos." (assunto: discriminação racial; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Daniela Larentis).

" Essa se constitui numa das siglas mais utilizadas atualmente pois, através dela, há o acesso a qualquer página da Internet. Verifica-se, no mun-do contemporâneo, a extrema importância de comunicações rápidas e efica-zes; a Internet qualifica-se, perfeitamente, para esse fim." (assunto: Internet; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Daniela Larentis).

7.716

W.W.W.

O uso de uma sigla/um número seguido de comentário:

" , demonstrou haver uma conscientização geral da sociedade acerca do fato de as pri-

sões em regime fechado, no Brasil, não servirem como meio de diminuição do índice de cri-minalidade ou de ressocialização do infrator. A fim de amenizar esse problema, surgem as penas alternativas, cuja aplicação tem mostrado eficiência nos países em que já vigoram, principalmente nos casos relativos aos usuários de drogas." (assunto: aplicação de penas alternativas aos usuários de drogas; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Ana Barbosa Duarte).

". Tal frase simplifica, de forma clara e fiel, a manipulação da mídia, transformando, con-

forme seus interesses, a imagem do homem perante a sociedade. Frente à passividade das pessoas e, até mesmo, à aceitação, a mídia aumenta, gradativamente, seu controle, aprovei-tando-se dele e desencadeando um grave círculo vicioso, cujo resultado poderá ser, sem dú-vida, a desvalorização do homem em detrimento do culto à imagem." (assunto: desvaloriza-ção do homem/supervalorização da imagem; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Daniela Larentis).

'Prisão não serve para ressocializar.' Essa frase, mencionada pelo atual ministro do Justiça

Segundo o ex-ministro Ricupero, o que é bom deve ser mostrado; o que é ruim, escon-dido

Uso de uma citação (não esquecer de citar a fonte):

Obs.: É interessante, em introduções como essas, lançarmos mão do , recurso que consiste na citação de autoridades conhecidas, autores renomados, celebri-

dades, documentos importantes, de conhecimento em nível mundial, a fim de ratificar o ponto de vista.

argumento de autori-dade

Page 53: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

"A política desenvolvimentista, desencadeada a partir do século XVIII, com o advento da Revolução Industrial, criou um curioso paradoxo na sociedade moderna. Embora a épo-ca atual tenha adquirido um caráter altamente tecnológico, a fim de beneficiar nosso coti-diano, representado nas atividades dos principais centros urbanos mundiais, o ser hu-mano mantém-se escravo do tempo, isto é, o mundo 'high-tech' não favoreceu a qualida-de de vida da sociedade."

"A civilização humana, na sua evolução, sempre conviveu com os alucinógenos. No mun-do Oriental, o ópio foi o estopim de uma guerra; nas Américas, os indígenas habitual-mente reuniam-se para fumar cachimbos à base de ervas ilusionistas. O passado não se revela diferente do futuro: ainda a questão da liberação de certas drogas causa discus-são entre as diversas culturas e crenças."

(assunto: relações trabalho/lazer; ano: 2000; trecho de reda-ção de aluna: Isabel Hruschka Rodrigues).

(assunto: discriminação das drogas; ano: 2000; trecho de redação de aluna: Isabel Hruschka Rodrigues).

Uma breve retrospectiva histórica:

"Enquanto os responsáveis por todos esses acontecimentos* não reavaliarem os métodos de produção, investindo em outras fontes tradicionais e/ou alternativas, o Brasil irá 'ficar no escuro' e, ao contrário do que ocorreu durante o Iluminismo, no Século das Luzes, seremos conhecidos como o 'País do Apagão'."

"O indispensável, portanto, não é reprimir o usuário, mas ajudá-lo a abandonar o vício, através da aplicação de penas alterna-tivas, tais como obrigatoriedade a freqüentar cursos antidro-gas, realização de programas com psicólogos em escolas, in-clusão do tema em disciplinas do currículo e participação das famílias dos dependentes em palestras, com orientação aos fa-miliares e aos consumidores de drogas."

"Portanto, algumas medidas devem ser tomadas para amenizar essa vergonhosa situa-ção em que se encontra a população infantil brasileira e mundial. Os governos devem in-tensificar a promoção de campanhas informativas sobre os direitos das crianças e punir de forma rigorosa os cidadãos que os violarem."

"De acordo com os aspectos abordados, torna-se inadiável efetivarem-se mudanças pois a exploração infantil está acentuando-se. Sendo assim, podemos afirmar que o en-contro na Suécia* no qual se abordou esse sério problema, foi uma boa iniciativa pois, a longo prazo, através da ajuda de pessoas conscientes, tal problema poderá reverter-se."

(as-sunto: crise energética; ano: 2001; trecho de redação de aluna: Lúcia Rota Borges).

(assunto: legalizaçãoou não da maconha; ano: 2001; trecho de redação de aluna: Natália Larentis).

(assunto: violação dos direitos das cri-anças; ano: 2001; trecho de redação de aluna: Vívian Sebastião Caetano).

(assunto: violação dos direitos das crianças; ano: 2001; trecho de redação de aluna: Ro-berta Schwonke Martins).

*relativos à crise de energia

*encontro na Suécia, promovido por uma organização não-governamental sueca.

SUGESTÕES PARA A CONCLUSÃO

Uso de sugestões (possíveis soluções para os problemas em foco):

IstoÉ, 30/5/2001

53

Page 54: escrita e cidadania

Teresinha Brandão

11 A contra- argumentação no texto dissertativo - argum entativo

Existem pelo menos três formas muito freqüentemente empregadas para se argumentar e/ou contra-argumentar:

1º) buscar as causas a fim de sus-tentar um ponto de vista;

2º) fazer concessões para que se possam marcar ressalvas ou tentar conci-liar com o interlocutor, reconhecendo, desse modo, parte da verdade que este defende;

3º) levantar hipóteses para se confirmar uma tese.

Para examinarmos essas três formas, tomaremos por base a proposta reali-zada pela UNICAMP, explicitada a seguir (Atenção! Em lugar de escrever uma carta argumentativa, sugerimos que você escreva um texto dissertativo-argumentativo. Além disso, selecionamos apenas um dos textos para ser refutado e servir para ilustrar o es-quema sugerido).

(UNICAMP/SP) Nos últimos tempos, vêm ocorrendo intensas discussões a propósito dos meios de combater a violência praticada por menores, nas grandes cidades. Um exemplo é a divergência de opiniões entre Nilton Cerqueira (Secretário Estadual de Segurança Pública do Rio de Janeiro) e Benedito Domingos Mariano (Ouvidor da Polícia do Estado de São Pau-lo), veiculada pela Revista , de 04/09/96.IstoÉ

O Estatuto do Adolescente, como está hoje, é uma lei de proteção aos infra-tores. Quem rouba os tênis das crianças que vão ao colégio? Quem assalta as cri-anças nos ônibus? São os menores infratores. A lei acaba deixando desprotegida a maioria, que são as vítimas. Os infratores ficam em liberdade por causa da impos-sibilidade de uma atuação serena e enérgica dos policiais. Com isso, aqueles ele-mentos de alta periculosidade têm campo aberto para suas ações criminais. E aca-bam acontecendo tragédias como a da Candelária ou a das mães de Acari, que até hoje não acharam seus filhos. Temos que cortar essas possibilidades retirando es-ses menores das ruas. (...) Ao contrário do que ocorre hoje, os menores infratores deveriam estar presos, sujeitos ao Código Penal.

Leia a seguir trecho dessa polêmica:

General Nilton Cerqueira

Imaginemos que alguém opte por escrever defendendo as idéias do general Nil-ton Cerqueira, a relação A é causa de B poderia ser assim esquematizada:

N ão h á p un ição pen al aos m en ores in frato res.

E xiste u m alto índ ice de crim i-n alidade d esses in frato res.

é causa de

54

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Agora, vejamos duas maneiras de se refutar as idéias do general:

m esm o com A con tinuar ia acon tecendo B

Ou seja: Mesmo havendo punição penal aos menores infratores, os crimes conti-nuariam acontecendo.

Idéia que pode ser expressa da seguinte forma:

Ex iste um a forte tendência/ M uitos acredi-tam que , quando o assunto é vio lência juvenil, a punição penal a menores de 18 anos d im inuiria o índice de ações crim inais dos in fratores.

Em verdade/ No entanto/ Não obstante/ Apesar disso

sepois

e, sim

, os crim es continuariam aconte-cendo tais in fratores cum prissem pena em presídio com um , nesse tipo de institu ição, não se ressocializa o indivíduo , incita-se a que ele se torne m ais vio lento.

Dessa form a/ Desse m odo/ Assim

não procede/ não pode, pois, ser susten-tada

, a explica-ção segundo a qual a falta de punição penal seria a causa do alto índ ice de crim inalidade juvenil

.

Retom ada da tese do "adversário”

Refutação, através deconcessão, levantam entode hipótese, causa, apon-tando para resultadoscontrários

Conclusão

1)

2 )

3 )

Ou, então, através de uma comprovação:

não é causa de

m esm o com A n ão h ouve B

Ou seja: Mesmo havendo punição penal aos menores infratores, os crimes conti-nuaram a acontecer.

Idéia a qual pode ser assim expressa:

De acordo com os defensores da im putabi-lidade penal, quando o assunto é vio lência, é lícito pensar-se que a punição penal a m enores de 18 anos diminu iria o índice das ações crim inais dos infratores.

Retom ada da tese do "adversário”

1)

Page 56: escrita e cidadania

Teresinha Brandão

Ora/ A bem da verdade

m as, ao con-trário

, esses m enores já fo-ram submetidos a um tipo de punição m uito se-m elhante ao cumprimento de pena em presídio com um , como no caso das FEBEM s, e constatou-se não ter havido ressocialização

, reincidência ao crime.

Não se pode, portanto

O adequado seria insistir na

, considerar essa medi-da como causa da diminu ição do índice de crim i-nalidade. apli-cação de medidas sócio-educativas, protegendo-se aqueles que, na m aioria das vezes, carecem de proteção os menores de rua.

Refutação, através decom provação, apontandopara resultados contrários

Conclusão, seguidade sugestão

2)

3 )

Imaginemos, agora, um outro te-ma – a possibilidade de legalização da ma-conha em nosso país.

Contexto:

Embora no Brasil, de acordo com o Código Penal, o consumo de drogas ilícitas, entre elas a maconha, seja considerado cri-me, percebemos um aumento do consumo da Cannabis sativa e uma concomitante diminuição de condena-ções dos usuários. Em razão disso, a possível legalização dessa droga vem sendo questionada já que as evi-dências apontam haver maior

tolerância por parte da sociedade e maior flexibilidade por parte do Judiciário. A questão, longe de ser pacífica, é alvo de muita polêmica.

Como exercício de contra-argumen-tação, sugerimos que você discuta com seus colegas os argumentos favoráveis e os des-

favoráveis, descritos abaixo, analise o es-quema com os quadros (A é causa de B; A não é causa de B) e elabore um outro esquema, como os anterio-res, em que aparecem a refutação seguida de comprovação, justificati-va,

hipótese etc.

o usuário necessita de ajuda, e não de repressão;

o usuário não é crim inoso; portanto não deve ser afastado do convívio social;

outras drogas são m ais perigosas ao organismo, com o no caso do álcool; este é, tam-bém , causador de inúm eros acidentes de trânsito ou casos de vio lência;

rata-se de um caso de saúde pública cujo objetivo deve centrar-se na prevenção.t

AR G U M EN TO S FAVO R ÁVEI S À LEG ALI ZAÇÃO

56

Page 57: escrita e cidadania

conseqüências maléficas ao organismo e ao psiqu ism o: perda da capacidade cogniti-va; falta de motivação para realizar projetos de vida; comprometim ento do bom fun-cionam ento de órgãos como o pulmão; problemas de garganta;

conseqüências no âmbito social: aumento do índice de crim inalidade (não pelo uso, m as pelo tráfico); pode servir de "passagem " para o uso de drogas mais pesadas, tais com o cocaína, heroína, entre outras; desestruturação fam iliar.

AR G U M EN TO S D ESFAVO R ÁVEI S À LEG ALI ZAÇÃO

rep rim ir apen as não basta: é n ecessár io a ju d ar o d ependen te;

su g estões pa ra a p reven ção :

ap licação de penas a lterna tivas (d esde a ob rig ação a freqü en tar cu rsos an tidrog as até a obrig ato riedad e ao tratam en to ) ;

n as esco las: prog ram as d e p reven ção com especia listas ta is com o ps icó logos, p eda -g ogos; refo rm ulação curricu lar ( in trodu ção d o tem a em d iversas d iscip lin as do cu rr í-cu lo * p roposta atu al do M E C) ;

n os postos de saúd e, h osp ita is, c lín icas: p rog ram as, in clu ind o partic ipação dos fam i-liares dos dep en den tes, em palestras; atend im en to de o rien tação a esses fam iliares e ao d epend en te, através de especia listas d a área m édica .

CO N C LU SÃO ( * deve se r cen trada n a tan to n os casos p ró ou con traa leg alização )

prevenção,

Se alguém for desfavorável à legalização da maconha, a relação A é causa de B poderia ser assim esquematizada:

N ão há punição r íg ida em re-lação aos consum idores da m aconha.

E xiste um aum en to d o co n-sum o de m acon ha.

Pensemos que você opte por escrever contra-argumentando as idéias daqueles que são desfavoráveis à legalização da maconha, poderia refutar tal idéia seguindo o raciocínio (A não é causa de B):

M esm o h aven do p ro ib ição o con su m o au m entou

M esm o h aven do p ro ib ição o con su m o n ão cessar ia

ou :Vejamos outra situação:

Se alguém for favorável à legalização da maconha, a relação A é causa de B po-deria ser assim esquematizada:

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Teresinha Brandão

A p ro ib ição lega l da m aco nh a n ão d im inu i o con sum o.

O con su m o da m acon h a d eve se r leg alizad o.

Agora, levantemos a hipótese de que você opte por escrever contra-argumen-tando as idéias daqueles que são favoráveis à legalização da maconha, poderia refu-tar tal idéia seguindo o raciocínio (A não é causa de B):

M esm o q ue o con sum o d a m aconh a venh a a ser lega-lizad o

a leg alização n ão d im in u ir ia ta l con su m o

O con sum o d a m acon ha fo i leg alizad o

a leg alização não d im in u iu ta l con su m o

ou :

12Um exemplo de contra- argumentaçãoem texto dissertativo- argumentativo

Exemplo interessante de texto dissertativo-argumentativo em que a contra-argu-mentação prevalece é a redação abaixo, de autoria de Roberto R. Von Laer. A temática centra-se na relação violência/segurança pública. Observe:

58

Page 59: escrita e cidadania

De acordo com recentes pesquisas, entre elas a Datafolha, uma das maiores preocu-pações dos brasileiros é a violência. A situação tornou-se tão grave que os números referentes aos crimes lembram o cenário de uma guerra civil. Além do aumento da quantidade de delitos, a brutalidade destes causa perplexidade profunda à sociedade.

É muito comum julgar [1] a pobreza como causa principal da violência. Porém [2], exis-tem países ainda mais pobres que o Brasil nos quais os níveis de subversão permanecem bai-xos, como se constata na Índia; outros onde o nível de desenvolvimento econômico é alto mas o índice de criminalidade também o é, fato existente, por exemplo, nos EUA. Isso indica que, no caso brasileiro, , mas é fruto de [3] duas características nacionais: a desigualdade social e a impunidade. A disparidade entre a condição social dos mais ricos e a dos mais pobres é tanta que muitos, por ambição ou falta de oportuni-dades, optam pelo crime como forma de ascensão social. Soma-se a isso a certeza da impunida-de, causada por uma polícia sucateada e corrupta e uma Justiça lenta e parcial.

Diante de tal situação, a população sente-se cada vez mais acuada. Com medo de tor-nar-se vítima, e, sem poder contar com a polícia, o cidadão não-criminoso tranca-se em casa e abre mão do seu direito de ir e vir. A população, devido à ineficiência do Estado, busca meios para proteger-se; aqueles que podem, contratam seguranças particulares atualmente eles formam um contingente maior que a própria polícia enquanto os demais constroem "prisões" para proteger seu patrimônio.

A situação, sem dúvida, é emergencial. Para revertê-la, torna-se necessário erradicar as principais causas do problema: punir os criminosos e amenizar as desigualdades sociais. A fim de reprimir a criminalidade, a polícia deve sofrer um processo de reciclagem para poder agir duramente com os bandidos, e não punir os cidadãos não-criminosos. Também é preciso investir em educação, chave para a melhoria das condições sociais da população.

a violência não é ocasionada sobretudo pela pobreza

Comentários sobre o texto:

Roberto escolheu uma tese um tanto difícil de ser refutada, a que associa necessariamente pobreza à criminalidade. O aluno não nega haver uma relação entre as duas, mas tentou comprovar que essa relação não é obrigatória (ver expressão em negrito). Esse, aliás, foi o objetivo de seu texto. Vejamos como ele procede.

Na introdução, delimitou o tema – o quadro assustador de violência em nosso país –, acrescido de uma ampla conseqüência, a perplexidade dos cidadãos.

No 2º parágrafo, percebemos a preocupação em questionar a tese fre-qüentemente aceita em relação ao tema: a po-

breza é causa principal de tamanha violência. Para retomar tal tese, usa a estrutura “É muito comum julgar” [1]. Após a indicação de que, apesar de comum, essa idéia não é totalmente verdadeira, ele a refutou, usando a expressão “Porém” [2] e comprovando justamente o contrário, ou seja, lembrando, através de exemplos, casos em que a relação pobreza/violência não apresenta a primeira como causa da segunda.

Para indicar as causas principais contrárias a essa – a pobreza –, empregou a estrutura “não é ocasionada sobretudo pela (...) mas é fruto de” [3]. Aprofundou, então, Cabo Aires Costa, do DF, entre

encapuzados e Gandra (à direita), da Confederação dos Policiais Civis. Fonte: , 1/8/2001IstoÉ

Page 60: escrita e cidadania

Teresinha Brandão

a argumentação, baseando-se nas duas causas apontadas: a desigualdade social e a impunidade.

Na conclusão, ratificou a idéia de que é necessário erradicar as causas apontadas por ele para conter o alto índice de criminalidade e ofereceu su-gestões de como fazê-lo.

Assinalemos, pois, que o aluno empregou as marcas lingüísticas citadas acima – 1, 2 e 3 – muito bem pois elas indicam haver posições divergentes acerca do tema, reforçando e enriquecendo o processo da contra-argumentação.

Sugestões de como fazer ( quadros sintéticos)13

Delimitação do e do "adversário".assunto retomada da tese

Refutação, através do emprego de , levantamento de , seguido de e apontando para

.

concessõeshipóteses justificativas re-

sultados contrários

Retomada do ponto de vista sugestões, acrescida de .

Obs.: É bom lembrar que não há uma "ordem" ou "colocação" rígida quanto às sugestões oferecidas acima. A retomada da tese pode ser feita, por exemplo, no desenvolvimento, e não na introdução.

ESTRUTURA

Introdução:

Desenvolvimento:

Conclusão:

Tal idéia não é senão uma forma rígida/ inconseqüente/ superficial de (...)

Questiona-se muito (...). Antes, porém, é preciso lembrar que (...)

Não se trata de "X", mas de "Y".É certo que (...) mas seria lícito também lembrar (...)

Se é verdade que (...) não menos exato é (...)De fato, (...); no entanto, (...)

É possível que essa medida venha a ser tomada, mas o ideal seria (...)É inegável a existência de (...). Apesar disso, é válido frisar, ainda, um outro aspecto, refe-rente a/ao (...)Não se pode ignorar que (...)

Ainda que muitos aleguem "X", convém salientar (...)

60

Page 61: escrita e cidadania

Alega-se, com freqüência, que a problemática "X" não pode ser resolvida a não ser por meio de (...). Pela polêmica que encerra, tal assunto merece uma detalhada análise.

Há quem considere "X" a solução ideal para amenizar/ reverter o atual quadro de (...). En-tretanto, tal medida torna-se inconsistente/ ineficaz devido a/ao (...)

Longe de ser considerada uma questão pacífica, "X" divide posições em meio à opinião pública: por um lado, salienta-se (...); por outro, (...)

Ao sustentar a idéia (...), muitos esquecem (...)

SUGESTÕES PARA A INTRODUÇÃO

Desse modo, a idéia (...) torna-se insustentável no atual contexto. Seriam necessárias medidas tais como (...) para se garantir a reversão de tal quadro.

É absolutamente indispensável, portanto, reconsiderar o argumento segundo o qual (...) pois, conforme o exposto, ele reforça uma imagem/ preconceituosa/ conservadora/ ultra-passada de (...). O ideal seria (...) para que a situação pudesse ser revertida.

Logo, por mais eficazes que pareçam, tais medidas acabariam não só por (...), como tam-bém (...), fatos que, ao invés de amenizar o problema, poderiam acentuá-lo. Atitudes co-mo, por exemplo, (...) seriam capazes, isto sim, de alterar a atual conjuntura, proporcio-nando uma melhor qualidade de vida aos cidadãos.

SUGESTÕES PARA A CONCLUSÃO

Page 62: escrita e cidadania

O uso dos advérbios e adjetivos na argumentação14

Bréal, um grande teórico da linguagem, ao estudá-la, comparou seu uso com a criação de uma peça teatral, explicando que o produtor intervém freqüentemente na ação para nela misturar suas reflexões e seu sentimento pessoal, assim como o homem quando usa a lin-guagem. Este, ao falar, encontra-se longe de considerar o mundo como mero espectador, como um observador desinteressado.

Prova disso são as inúmeras palavras que usa para expressar suas vontades, críticas, seus pontos de

vista, emitir julgamentos acerca de determinados assuntos.

Em textos argumentativos, o uso dessas categorias gramaticais desempenha função importante já que funciona para marcar ou reforçar a posição do autor diante de um fato.

Destacam-se, entre elas, os advérbios ou locuções adverbiais.

Observemos os exemplos abaixo, levando em conta o seguinte contexto: há uma greve e os envolvidos no acontecimento são o governo por um lado e, por outro, os metalúrgicos.

BRÉAL, M. Ensaio de Semântica. São Paulo: EDUC, 1992.

SITUAÇÃO 1: favorável ao governo

O govern o ag iu com re lação à g reve dos m etalú rg icos.efi cientem entecom retidãocom seriedadem oderadam ente*com ética

* Lembremo-nos que uma mesma categoria lingüística pode expressar pontos de vista diferentes. Assim, a expressão “moderadamente” pode ser usada para elogiar as atitu-des do governo em se tratando de um locutor “de direita” mas, quando empregada por um locutor “de esquerda”, serve para criticar negativamente essas atitudes. É preciso, portan-to, levar em conta a intenção e o contexto em cada enunciado.

SITUAÇÃO 2: desfavorável ao governo

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O govern o ag iu com re lação à g reve dos m etalú rg ico s.autoritariam entecom odam enteprecipitatam entesem pudor

Veja agora outros exemplos:

SITUAÇÃO 3: favorável aos metalúrgicos

O s m etalú rg icos ag iram d uran te a greve.com m aturidadecom responsabilidadepacificam enteordeiram ente

SITUAÇÃO 4: desfavorável aos metalúrgicos

O s m etalú rg icos ag iram d uran te a greve.im propriam enteerroneam enteirracionalm enteirrefletidam entetendenciosam ente

Há casos de dupla adverbialização. Observe:

SITUAÇÃO 5: desfavorável ao governo

O govern o ag iu d uran te a greve d os m etalú rg icos .autoritária e im aturam ente“cega” e im pulsivam ente

SITUAÇÃO 6: favorável ao governo

O governo ag iu duran te a greve dos m etalú rg icos.cautelosa e eticam enteséria e eficientem ente

Obs.: Os exemplos citados foram extraídos da obra publicada também por esta autora:

RODRIGUES, L. M. P., BARBOSA, M. E. O., BRANDÃO, T. S. Maneiras do dizer: língua portuguesa no ensino médio. Pelotas: Escola de Ensino Médio Mário Quintana, 1998, p.141.

Além dos advérbios, também os adjetivos colaboram para

demonstrar o senso crítico, enfatizar

Page 64: escrita e cidadania

argumentos e tornar o texto mais expressivo, mais convincente.

O uso da adjetivação tem a ver com o contexto, a situação em que é empregada, assim como com o locutor, ou seja, com a pessoa que a emprega.

Devemos levar em conta, portanto, nas listas abaixo, as quais sugerem o uso de determinados adjetivos, as questões relativas ao contexto.

Obs.: A lista a seguir foi elaborada e cedida gentilmente pela professora Lígia Maria da Fonseca Blank.

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adequado, autêntico, altruísta, apto, bem-sucedido, bem-feito, beneficente, capaz,

consciente, confiável, cabível, competente, convincente, consistente, desenvolvido, decisivo, dinâmico, equânime, enérgico, essencial, excelente, eqüitativo, exímio,

fecundo, fidedigno, fiel, fundamental, fortíssimo, honrado, íntegro, imparcial,

indispensável, imprescindível, imperdível, inigualável, importantíssimo, incomparável,

intransferível, insubstituível, irrenunciável, inviolável, irrepreensível, imparcial,

pertinente, próspero, promissor, procedente, profícuo, oportuno, proficiente, probo, sério, seríssimo, útil, utilíssimo, valioso, zeloso, …

Argumentos lúcidos e convincentes, ampla e urgente modificação estrutural, atitudes cri-teriosas e transparentes, apuração isenta e meticulosa, eleitor crítico e consciente, espí-rito participativo e comunitário, consumidor vigilante e maduro, plano lúcido e promissor, propostas sérias e coerentes, manifestação concreta e eficaz, sociedade justa e solidária, consciente e participante, soluções legítimas e duradouras, trabalho digno e honesto, providências rápidas e adequadas, recursos imediatos e suficientes, observação contínua e atenta, político íntegro e competente, …

Soluções parciais e equivocadas, situação caótica e desesperadora, sociedade injusta e preconceituosa, setor público inchado e inoperante, atitude arrogante e prepotente, em-presas estatais ineficientes e onerosas, atitudes tão radicais quanto absurdas (compara, enfatizando), princípios fechados e autoritários, argumentos falaciosos e inconsistentes, leis brandas e ineficazes, pais condescendentes e irresponsáveis, episódio lamentável e ultrajante, lugares afastados e inóspitos, salários injustos e desestimulantes, ...

Absoluta prioritária primordial significativoprincipal alto destacada verdadeirodefinitivo relevantes evidente flagrantegravíssima excelente expressivos

prioridade, meta , aspecto , progresso, motivo, escalão, atuação, estadista, resultado , contribuições, desrespeito, corrupção,

infração, atuação, resultados, …

alarmante, assustador, angustiante, anacrônico, confuso, condenável, crítico, criticável, combalido, contestável, caótico, calamitoso, constrangedor, condescendente, corrupto, corruptível, danoso, despótico, ditatorial, demagogo, desmedido, dramático, escasso, excessivo, estéril, escandaloso, estarrecedor, exíguo, equivocado, falso, falacioso, fraudador, fraudulento, grave, gravíssimo, hediondo, hipócrita, indigno, injusto, irrisório, insuportável, inaceitável, intolerável, irrecuperável, inconsistente, inexeqüível, imperfeito, irresponsável, intransigente, lamentável, lastimável, leviano, lento, negligente, paliativo, preocupante, pernicioso, prejudicial, omisso, oportunista, sectário, tendencioso, xenófobo, ...

antidemocrático,

retrógrado,

amplo, evidente, crescente, coercitivo, contínuo, evidente, enorme, controvertido,

drástico, inócuo, instantâneo, indignado, imediato, irreversível, inevitável, inofensivo,

imperceptível, geral, pleno, peculiar, polêmico, perplexo, político, público,

técnico, severo, vultoso, …

Page 66: escrita e cidadania

O uso dos elementos coesivos nos textos argumentativos15

A conexão entre os segmentos de um texto é feita por palavras ou expressões responsáveis pela concatenação, pela criação de relações entre os segmentos de um texto, estabelecendo entre eles uma certa relação semântica, a qual possui uma dada função argumentativa.

O esquema que segue serve apenas de guia para redigir textos. É,

efetivamente, através do funcionamento desses textos, bem como do contexto pragmático no qual estão inseridas, que a utilização desse esquema pode ser proveitosa; do contrário, ela poderá produzir paradoxos semânticos, ou, então, produzir efeitos de sentido contrários aos desejados. Eis alguns dos conectores que servem:

1) Para iniciar a análise, introduzir os argumentos:

Exemplos:

É preciso, inicialmente, observar que toda arte pressupõe criação, produção hu-mana.

Ou:

Deve-se analisar primeiramente (...)Iniciemos a análise observando (...)Analisemos, em primeiro lugar, (...)Para prosseguir a análise:Num segundo plano/nível/momento, observamos (...)Em segundo lugar, destacam-se os elementos (...)Deve-se acrescentar, nesta segunda etapa, que (...)

Para encerrar a análise:

Finalmente/Enfim, destacamos (...)Por último, gostaríamos de salientar (...)

2) Para afirmar algo com veemência:

Exemplos:

É verdade que o tema acerca da chamada ‘arte engajada’ tem suscitado polê-micas.

Page 67: escrita e cidadania

Ou:

É certo que (...)De fato (...)Efetivamente (...)Certamente (...)É inegável (...)É inquestionável (...)

Indubitavelmente (...)Sem dúvida (...)Irrefutavelmente (...)É irrefutável (...)Inquestionavelmente (...)

“De fato, a literatura e a arte européias parecem chegar a um ponto crítico com o Simbolismo.” (GULLAR, F. Vanguarda e subdesenvolvimento: ensaios sobre arte. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p.47)

3) Para expressar hipóteses, dúvidas, probabilidades:

Exemplos:

É provável que muitos teóricos se oponham às palavras de ordem dos parnasia-nos, quais sejam: ‘arte pela arte’.

Ou:

Provavelmente (...)Possivelmente (...)/ É possível (...)

4) Para insistir no problema:

Exemplos:

Não podemos esquecer que todo processo de renovação estética é atravessado por um processo de renovação social.

Ou:

É preciso insistir no fato de que (...)É necessário frisar que (...)É imprescindível insistir na hipótese de (...)Tanto isso é verdade que (...)Vale lembrar o argumento (...)

5) Para estabelecer relações paralelas:

Exemplos:

Paralelamente às tendências vanguardistas mais exacerbadas da Europa, desen-volviam-se, no Brasil, experiências artísticas muito criativas.

Ou:

Ao mesmo tempo (...)

Page 68: escrita e cidadania

Concomitantemente (...)

6) Para fazer referência a autores, episódios:

Exemplos:

No que se refere à obra de Chico Buarque (...)Quanto ao episódio ocorrido na Semana da Arte

Moderna (...)No que diz respeito à distinção entre (...)De acordo com Ferreira Gullar (...)Conforme lemos em Érico Veríssimo (1982) (...)Retomando Graciliano Ramos (...)Nas palavras de Mário Quintana (...)Com a palavra, o autor: “A arte...” (...)

7) Para estabelecer gradação entre os elementos de uma certa escala:

a) no topo da escala, para indicar o argumento mais forte: até/ até mes-mo/ inclusive etc.

Exemplo:

Até mesmo os mais ingênuos desconfiam do lema ‘arte pela arte’.

b) num plano mais baixo, para introduzir um argumento, deixando suben-tendida a existência de uma escala com outros argumentos mais fortes: ao menos/ pelo menos/ no mínimo/ no máximo/ quando muito etc.

Exemplo:

Acreditar no lema ‘arte pela arte’ é, no mínimo, ingenuidade.

8) Para acrescentar argumentos aos demais:

Exemplo:

Um conceito de ‘vanguarda’ estética no Brasil merece uma consideração profunda: é preciso, em primeiro lugar, recusarmos a idéia de que esse conceito é universal. Além disso, é necessário frisarmos que, ao contrário do que muitos pregam, esse con-ceito não possui um caráter alienante.

Emoção e Inteligência,n.3, p.57, fev. 2000.

Page 69: escrita e cidadania

Ou:

além do mais/ ainda/ também/ soma-se a isso/ acresça-se a esses fa-tos/ além de tudo/ ademais etc.

Quando se quer dar ênfase:

não é apenas/ não é senão/ nada mais é do que/ não só... mas (como) também etc.

Exemplo:

“Não se pode, por outro lado, ignorar o fato de que a realidade nacional não ape-nas participa e constitui – com as outras particularidades nacionais – a realidade inter-nacional, como também é constituída por ela.” (idem, p.96)

9) Para indicar uma relação de disjunção argumentativa, pelo uso de expres-sões introdutórias de argumentos que levam a conclusões opostas, que têm uma orientação argumentativa diferente: caso contrário/ do contrário/ ou então etc.

Exemplos:

Não pretendemos adotar um conceito universal de ‘vanguarda’; pelo contrário, tentaremos mostrar como se constrói esse termo no contexto da realidade brasileira.

“A arte religiosa da Idade Média, por exemplo, era realizada com finalidade defini-da. Era uma arte ‘popular’ imposta, tendo assim alguns pontos de contato com a arte de massa de nossos dias. Ao contrário do que acontece hoje, quando a arte de mas-sa, na maioria dos casos, vai ao encontro do consumidor (...)” (idem, p.137)

Ou:

por um lado/ por outro lado/ de um lado/ de outro lado etc.

“Se, por um lado, essa preponderância do processo socioeconômico sobre o cul-tural dificulta a solidificação da superestrutura cultural, por outro lado atua como cor-retor e selecionador, impedindo assim que uma superestrutura falsa – não surtida das necessidades reais da sociedade – se mantenha por muito tempo sobre ela.” (idem, p.40)

10) Para comparar: tal como/ assim como/ da mesma forma que/ da mesma maneira que/ igualmente/ do mesmo modo que/ tanto quanto/ mais... menos (do) que etc.

Exemplos:

“Tais considerações são válidas igualmente para o teatro, o cinema e as demais formas de arte.” (idem, p.99)

Page 70: escrita e cidadania

“A obra de arte aberta (‘vanguarda’) é a expressão, no plano da arte, do processo dinâmico e aberto da sociedade burguesa e de sua crise ideológica e, ao mesmo tempo, o salto para exprimir o caráter dialético da realidade.” (idem, p.77)

“Fenômeno semelhante ocorre no campo das artes plásticas.” (idem, p.129)

11) Para indicar a relação causa/ conseqüência: por causa de/ graças a/ em virtude de/ em vista de/ devido a/ por motivo de/ na medida em que/ porque/ uma vez que/ já que/ visto que/ conseqüentemente/ em con-seqüência de/ em decorrência de/ como resultado de/ em conclusão de/ razão/ motivo/ resultado/ conseqüência etc.

Exemplos:

“Essa é a razão por que o discurso não carrega em seu cerne uma experiência concreta a comunicar, nada revela, não é poesia, e, a rigor, é um falso discurso.” (idem, p.97)

“A pintura brasileira, conseqüentemente, não sofreu essa evolução, cujos resul-tados (...) seriam adotados pelas gerações do pós-guerra.” (idem, p.43)

12) Para indicar conclusões: portanto/ logo/ assim/ pois/ dessa maneira/ dessa forma/ desse modo/ em suma/ em síntese etc.

Exemplos:

“O específico da obra de arte é o particular e, portanto, a experiência determina-da, concreta do mundo.” (idem, p.77)

“Do que foi exposto, parece-nos justo deduzir que (...)” (idem, p.41)

“O que define a arte de massa é, pois, o seu raio de ação, o vasto número de pes-soas, de todas as classes e regiões, que ela pode atingir a curto prazo.” (idem, p.127)

13) Para indicar finalidade, objetivo: para que/ a fim de que/ com o propó-sito de/ com a intenção de/ com o intuito de/ na tentativa de/ visar/ ter por objetivo/ pretender/ ter em vista/ ter em mira/ propor-se a/ pro-jeto/ objetivo/ plano/ pretensão/ aspiração/ finalidade/ meta/ alvo/ intuito etc.

Exemplos:

Com o intuito de verificar algumas concepções correntes acerca do termo ‘van-guarda’ estética, decidimos, em primeiro lugar (...)

Este trabalho visa, primeiramente, a analisar algumas concepções correntes relati-vas ao termo ‘vanguarda’ estética.

Page 71: escrita e cidadania

Este trabalho tem por objetivo examinar algumas concepções correntes acerca do termo ‘vanguarda’ estética.

14) Para indicar precisão: exatamente/ justamente/ precisamente etc.

Exemplo:

É justamente essa noção que faltava destacar: toda arte é política no sentido de que determina uma opção diante dos problemas concretos, afirmando ou negando determinados valores.

15) Para explicar detalhadamente: elas podem exercer funções, tais como as de retificar, ratificar etc.: ou melhor/ ou seja/ quer dizer/ isto é/ por exem-plo/ em outras palavras/ em outros termos/ dito de outra forma/ vale dizer etc.

Exemplo:

“Mas, por outro lado, nada impedirá que, mesmo obras voltadas para temáticas individuais, se situem no plano da realidade política, ou seja, no plano da atualidade.” (idem, p.142)

16) Para marcar uma relação de contrajunção, ou seja, para contrapor enuncia-dos de orientação argumentativa contrária: mas/ porém/ todavia/ contudo/ entretanto/ no entanto/ não obstante/ embora/ ainda que/ apesar de/ apesar de que/ mesmo que etc.

Exemplos:

“O caráter esquemático da arte de massa é, no entanto, no geral, alienante, uma vez que induz a uma visão falsa da realidade concreta.” (idem, p.119)

“A arte de massa é, em essência, mercadoria, e nisso também ela se define como legítimo produto da sociedade capitalista, na qual tudo se transforma em mercado-rias. Mas é preciso atentar para o fato de que essa transformação da arte em merca-doria não é um fenômeno restrito às artes de massas e que ela não significa o fim da arte.” (idem, p.136)

“A posição esteticista rejeita a arte de massa como atividade não-cultural, ou mes-mo anticultural. Não obstante, essa posição não está infensa à existência da arte de massa e é, até certo ponto, condicionada por ela (...).” (idem, p.138)

Obs.: A lista contendo os elementos coesivos pode ser encontrada na obra publicada também por esta autora:

Page 72: escrita e cidadania

RODRIGUES, L. M. P.; BARBOSA, M. E. O.; BRANDÃO, T. S. Maneiras do dizer: língua portuguesa no ensino médio. Pelotas: Escola de Ensino Médio Mário Quintana, 1998. p.53-57.

Page 73: escrita e cidadania

.

Análise de problemas de redação

Em situações um pouco tensas, como no caso de se conceder uma entrevista a um meio de comunicação, é comum o usuário da língua cometer deslizes, descuidando-se, muitas vezes, do vocabulário que emprega. Sobretudo

se for uma figura pública, conhecida na mídia, a impropriedade vocabular pode ser motivo de ironia, contribuindo para desqualificar sua imagem. É o que observamos no exemplo abaixo:

“A faixa etária é essa”, de Paulo Zulu.

(Justificativa sobre os 5000 reais que cobra só para marcar presença em eventos de moda. Em: Revista Elle,

ano 13, n.5, p.30, maio 2000).

O uso da expressão “faixa etária” em lugar da expressão “em média”, acerca de quanto cobrava para se fazer presente, em eventos de moda, causou reações polêmicas aos leitores da revista os quais se manifestaram, através de cartas e/ou e-mails, ironizando a declaração do modelo e ator.

Nos trechos abaixo, extraídos de redações de alunos, percebe-se o mesmo tipo de problema – o uso de um vocabulário impróprio ao contexto. Depois

de lê-los atentamente, siga as instruções:

1

Page 74: escrita e cidadania

Elle, ano 13, n.5, p.30, maio 2000.

Tran screva a pa lavra/ exp ressão u sad a im p ropriam en te.

E xplicite o qu e o au to r q u is d izer ao u sa r ta l p alavra.E xpliq ue o qu e ele realm ente afirm ou .

R eescreva o trecho p rob lem ático , sub stitu in do ta l expressão e ad equ an d o -a à in ten ção d o au to r. Faça as ad aptações in d ispensáve is.

a)b)c)d)

1) “Natureza, cultura, riqueza, liberdade, deuses, coletivismo, paz são alguns dos muitos prejuízos sofridos pelos índios.” (assunto: questão indígena no Brasil; ano: 2000).

2) “(...) água, este simples utensílio essencial a nossa sobrevivência, (...)” (assunto: quan-tidade e qualidade dos recursos hídricos; ano: 2000).

3) “Penso, inicialmente, que o indivíduo, aos 16 anos, não possui condições psicológicas para lidar com tamanha responsabilidade, já que, em tal fase, a instabilidade emocio-nal, a impulsividade e até mesmo o desejo de afirmação são fatores decisivos ao volan-te.” (assunto: possibilidade legal de se dirigir aos 16 anos; carta dirigida ao editor do jornal Zero Hora – RS; ano: 1999).

4) “48, 44, 39 horas semanais. Enganam-se aqueles que ainda pensam na redução da jor-nada de trabalho em detrimento do lazer.” (assunto: redução da jornada de trabalho e aumento de tempo destinado ao lazer; ano: 2000).

Page 75: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

5) “Considero injusta a forma com que os veteranos recebem os calouros; interpreto como uma atitude infantil, indelinqüente, anacrônica e uma verdadeira barbárie (...)” (assun-to: a prática dos trotes aos calouros nas universidades brasileiras; carta argumentativa dirigida ao editor da FSP; ano: 1999).

6) “Dessa forma, torna-se indispensável que os universitários – tidos até então como a mi-noria intelectualizada – dêem exemplos tão grotescos como os dos trotes violentos.” (idem ao anterior).

7) “O vestibular, embora seja muito estressante, é um mal necessário; portanto, convém preservá-lo e, aos poucos, ir fazendo modificações que visem a torná-lo mais demagó-gico e menos elitista.” (assunto: Vestibular: um mal necessário?; ano: 1999).

Muitas tentativas de desenvolvimento do raciocínio lógico-expositivo não são bem sucedidas, desencadeando defeitos de argumentação. Nos trechos abaixo, escritos por vestibulandos, notam-se problemas desse tipo. Depois de lê-los, identifique-os.

Antes, porém, observe um exemplo de trecho o qual apresenta defeito de argumentação, a comparação inadequada (ou falsa analogia), ou seja, um problema decorrente do fato de os elementos de uma comparação diferenciarem-se em algum ponto essencial da ana-logia. Observe:

75

2

Page 76: escrita e cidadania

“Que perturbador ler no Mais!, de 12/03, um artigo sobre a pesquisa de sociobiolo-gia que afirma que o estupro é 'natural'! Pior ainda é que a conclusão seja inferida para a es-pécie humana pelo estudo do comportamento das moscas... Será que é mesmo possível fa-lar em 'estupro' entre moscas?

A antropologia social e cultural já muito rebateu a idéia de que vários comportamen-tos humanos seriam da ordem da natureza. É de especial relevância a idéia de que a cultura atua inclusive nos comportamentos vistos como mais próximos da natureza: nas práticas se-xuais, de casamento, nas regras de parentesco, técnicas de parto. Dizer que vários compor-tamentos vêm apenas da natureza, como fazem muitos estudos de sociobiologia, parece um tanto simplista e cego a toda a cultura contemporânea, aos apelos da mídia e da publicidadee à realidade social e cultural que vivemos hoje. Por esse motivo, dizer que o estupro é 'natural' (com o risco político de igualar o sentido do termo 'natural' à palavra 'normal') é imensa bobagem, já que o com-portamento humano não é regido apenas pelas re-gras da natureza.”

Heloísa Buarque de Almeida, professora e doutoranda em antropologia na UNICAMP (Campinas, SP).

( , 29/3/2000)Folha de São PauloFonte: www.geocities.com/m_rett

1) “Resta-nos reciclar a mentalidade de boa parte da população neste sentido, a fim de que esta supere esse complexo de inferioridade típico de países como o Brasil, científica e tecnologicamente atrasados.” (assunto: transgênicos; ano: 1999).

2) “Embora o avanço da tecnologia tenha grande validade para o Brasil, isso vem causando um aumento na taxa de desemprego, conseqüência direta do aumento da legião dos sem-terra.” (assunto: estratégias do MST; ano: 2000).

3) “Portanto é necessário que o governo tome medidas urgentes a fim de solucionar este momento caótico pelo qual estamos passando.” (assunto: estratégias do MST; conclusão de uma dissertação; ano: 2000).

4) “Com essa possível mudança da emancipação da Metade Sul do Estado, a região extremo sul será beneficiada uma vez que está praticamente isolada.” (assunto: emancipação da Metade Sul do estado do RS; ano: 2000).

IstoÉ, 30/6/2001

Page 77: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

5) “Gostaria de lembrar-lhe que um estudante será um profissional no futuro; um aluno que ‘cola’ para passar de ano não sabe a matéria e se tornará relapso em sua profissão.” (assunto: o uso da ‘cola’ nos estabelecimentos de ensino; carta dirigida ao senhor Groppa Aquino; ano: 2000).

6) “Não se trata de questionar dogmas religiosos, mas sim de resolver um gravíssimo pro-blema, principalmente com a população de menor poder aquisitivo que constitui a 4ª causa de mortalidade materna.” (assunto: planejamento familiar; ano: 2000).

7) “A raça negra não é mais escrava, merecendo direitos iguais, inclusive o de igualdade social.” (assunto: racismo; ano: 2000).

8) “Salienta-se ainda que os usuários de drogas não precisariam ir aos postos de saúde à procura de kits descartáveis, em virtude de serem vítimas da discriminação e estigma-tismo.” (assunto: Projeto de Redução de Danos, da Secretaria Municipal da Saúde de POA – troca de seringas usadas pelos dependentes por novas para evitar doenças; ano: 1998).

9) “Por tudo isso, é imprescindível uma reflexão sobre o assunto dos jovens, que são o fu-turo do país.” (assunto: avaliação sobre os 10 anos de criação do ECA; ano: 2000).

10)“Na certeza de que Vossa Excelência considerará meu apelo, e lembrando-lhe serem as crianças o amanhã da Nação, despeço-me.” (idem ao anterior; carta argumentativa diri-gida ao ministro da Justiça).

11)“Por outro lado, fico ‘pasma’ ao ver crianças que deveriam estar na flor da inocência (...)” (idem ao anterior).

12) “Inicialmente, cabe ressaltar que a discriminação social, aliada à falta do auxílio da família são fatores determinantes a tal problemática. Ademais, falta de escola também contribui para o agravamento da situação.

Importa enfatizar, ainda, que tais fatores acarretam não só a cometer estupros, como também atos sádicos, demonstrando a revolta pela situação em que vivem.” (assunto: violência urbana; ano: 2001).

Há determinados critérios tais co-mo a escolha adequada dos

termos em um texto, a ordem em que eles estão dispos-tos, a estrutura

77

Zezé Mota: "Há preconceito até nas relações afetivas. Já desisti de casar com rapaz branco por causa da pressão da família dele." (IstoÉ, 17/6/96)

3

Page 78: escrita e cidadania

gramatical nele utilizada, entre outros, os quais necessitam ser se-guidos para se garantir a coerência tex-tual, além, é claro, da compatibilidade en-tre o “mundo do texto” e o “mundo real” (relação intra/extratextual).

No trecho abaixo, cujo autor é Ale-xandre Garcia, o jornalista usou a expres-são “sic” para evidenciar uma incoerência devida à impropriedade vocabular. Dessa forma, ele se isentou da responsabilidade do uso inadequado de um termo, no caso, o verbo penalizar. Observe:

"Agora, por falta de planejamento do Governo, os contri-buintes vão pagar. É economizar e pagar ou apagar. O Governo alega que o plano é justo, porque alivia os mais pobres e penaliza (sic) os mais ricos. Será?"

"Se é para o plano ser justo, então que se puna (ou penalize como o Governo usa, sem conhecer bem a língua portuguesa) o responsável pela falta de energia: o que não planejou (...) Que se corte a energia do Governo."

Depois, o jornalista continua:

(Diário Popular, 22/05/01)

Isto

É, 2

3/5/

2001

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enho

de

Aro

eira

.

A troca do verbo penalizar, que significa causar pena ou desgosto; afligir, desgostar, pelo verbo punir ocasionou, neste caso, a incoerência.

Leia os trechos abaixo, extraídos de redações de alunos, e explique o porquê da incoerência. Quando possível, proponha mudanças.

1) “Hoje em dia a maior preocupação de todos os governos é o desemprego que, no Bra-sil, é o maior problema na atualidade, pois ele é o centro de tudo.” (assunto: desem-prego; ano: 1999).

2) “(...) consiste na falta de informações dos cidadãos, uma vez que não existem campa-nhas as quais visem ao esclarecimento da população sobre o possível contágio de doen-ças sexualmente transmissíveis, inclusive sobre a, muitas vezes, impiedosa gravidez.” (assunto: iniciação sexual precoce entre os brasileiros; ano: 2000).

3) “Na verdade, as formas femininas, atualmente, têm-se distanciado de sua real função: virtude de gerar uma criança.” (assunto: topless: direito ou desonra da mulher?; ano: 2000).

4) “(...) porém espero que as pesquisas avancem e, num futuro próximo, consigamos grandes resultados, tanto na área da Saúde quanto na alimentícia.” (assunto: transgêni-cos; ano: 1999).

Page 79: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

5) “Também nas instituições de ensino devem-se mostrar os riscos de contaminação de várias doenças, além de gravidez precoce.” (assunto: iniciação sexual precoce; ano: 2000).

6) “Na minha opinião, acredito, (...)” (assunto: o uso da ‘cola’ nos estabelecimentos de en-sino; carta dirigida ao senhor Groppa Aquino; ano: 2000).

7) “Considero, no meu entender, (...)” (idem ao anterior).

8) “Ao ler sua relevante declaração sobre o comportamento de consumidores de baixo po-der aquisitivo, resolvi escrever-lhe por considerar sua análise superficial e preconcei-tuosa.” (proposta da UFPel/98; assunto: hábito de consumo das classes menos abasta-das; comentário: “Pobre gosta de sofrer aos poucos”).

9) “Logo, tanto a privacidade e os valores individuais quanto as vantagens do conheci-mento do genoma devem ser inseridos em uma mesma conjuntura, como intuito de de-senvolvimento não só do indivíduo como da população (...)” (assunto: genoma; ano: 2000).

10)“De acordo com pesquisas realizadas pelo IBGE, uma elevada porcentagem da popu-lação brasileira acredita em um conceito inovador de ‘família’; para tais entrevistados, esta não precisa ser necessariamente composta por pai, mãe e filhos, vivendo sob o mesmo teto; uma pessoa que vive só, com um animal de estimação, pode considerar-se vivendo em uma instituição familiar.” (assunto: perfil da família no novo milênio; ano: 2000).

11)“É inegável que não existam conflitos, violência, em um país no qual as diferenças soci-ais são alarmantes (...)” (assunto: violência urbana; ano: 2000).

12)“As escolas deveriam conversar mais com os alunos até com os que estão terminando o 2º grau.” (assunto: a prática dos trotes aos calouros nas universidades brasileiras; ano: 1999).

13)“O problema da saúde, no Brasil, é, portanto, gerado pela péssima administração do orçamento.” (assunto: saúde pública no Brasil; ano: 1998).

14)“Durante seu desenvolvimento, a criança recebe influências racistas de vários locais tais como as inocentes histórias infantis, onde a princesa, o herói, o príncipe sempre são de cor branca.” (assunto: racismo; ano: 1999).

15)“Embora se estabeleçam juros altos, há a maciça escolha em adquirir bens a prazo, pois muitos consumidores vêem-se absolutamente coagidos a fazê-lo à vista, uma vez que seus salários não condizem com a realidade de consumismo exorbitante.” (assunto: Pobre gosta de sofrer aos poucos – sobre o fato de se comprar em prestações; ano: 1998/UFPel).

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16)“Além disso, acaba ocorrendo também uma redução do número de trabalhadores, sem-do que poucos conseguem manter seus empregos.” (proposta da UFPel/98; assunto: hábito de consumo das classes menos privilegiadas; comentário: “Pobre gosta de sofrer aos poucos.”).

17)“Assim, vemos que não somente a irresponsabilidade no trânsito é causadora fatal de vidas, mas também o desejo de querer bem a si mesmo.” (assunto: alcoolismo; ano: 1998).

18)“Será ainda relevante que os pais demonstrem vontade e esclarecimento sobre a droga, pois poderá levar vários filhos ao consumo bem como à dependência.” (assunto: alcoolismo; ano: 1998).

19)“Em virtude dos aspectos mencionados, somos levados a crer que o álcool deve ser tra-tado com seriedade e urgência pelas autoridades governamentais.” (assunto: alcoolis-mo; ano: 1998).

20)“O problema de Saúde” (título de redação; assunto: Saúde Pública no Brasil; ano: 1998).

21)“As universidades têm liberdade para escolher seu tipo de avaliação. Entretanto, há um fator que vem desmascarando certas ‘instituições-fachada’, assim como descobrindo universitários dedicados e competentes – o Provão.” (assunto: provão nas universida-des; ano: 2000).

Ao articularmos as idéias em um texto, a fim de que este seja coerente, é necessário verificarmos se elas têm a ver umas com as outras e observarmos o tipo de relação a qual se estabelece entre elas. Também mostra-se importante, ao retomarmos idéias nesse texto, cuidarmos se a retomada foi feita de forma correta ou não. Em ambos os casos, o uso dos coesivos é

importante para garantir a coe-rência textual.

Nos trechos abaixo, de redações de alunos, um problema de coesão acabou por interferir na sua coerência.

Após a leitura do exemplo que evidencia tal problema, reformule os trechos de forma a tornar a relação coesão/ coerência adequada.

4

IstoÉ, 18/7/2001

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Texto argumentativo: escrita e cidadania

"Considero que, por outro lado, a sociedade, em geral, gosta de assistir este tipo de cena onde acontecem 'baixa-rias', fazendo assim pensarem que não são só que pas-sam por situações parecidas." (assunto: guerra pela audiên-cia e a qualidade dos programas na TV brasileira; ano: 1998).

eles*

*O termo destacado não possui referente claro no trecho. IstoÉ, 1/10/97

1) “Ao ler uma matéria na revista Veja, que mostra seu posicionamento sobre o futuro da sociedade, resolvi escrever-lhe por motivo de contrapor-me às mesmas.” (assunto: re-dução da jornada de trabalho e aumento do tempo destinado ao lazer; ano: 2000).

2) “Todo menor deve ter direito à educação, à saúde e à vida digna, segundo a Decla-ração Universal dos Direitos da Criança. No entanto, as imagens observadas na mídia e os dados expostos no encontro, na Suécia, revelam uma realidade assustadora na qual se notam a exploração da mão-de-obra infantil e o uso desses indivíduos em guerras.” (assunto: violação dos direitos das crianças; ano: 2001).

3) “As universidades federais são propriedade do povo, pois eles pagam impostos ao go-verno para que este administre os bens sociais.” (assunto: privatização das universida-des públicas brasileiras; ano: 1999).

4) “A iniciação sexual precoce, sem a devida maturidade para prevenir-se de forma ade-quada, pode acarretar uma gravidez precoce. Esta, portanto, leva ao abandono dos es-tudos, comprometendo a futura qualificação profissional, especialmente das meninas.” (assunto: iniciação sexual precoce; ano: 2000).

5) “Um país que enfrenta tantos problemas na Saúde, ainda tem que ‘lutar’ contra os re-médios, denominados como crime hediondo.” (assunto: falsificação dos remédios; ano: 1998).

6) “Alguns carcerários são injustamente colocados em um mesmo nível criminal. Porém, acabam cometendo os piores crimes com seus colegas de cela.” (assunto: reforma car-cerária; ano: 1999).

7) “Este fato marca a culpa governamental, já que este raramente investe em campanhas de prevenção.” (assunto: maternidade precoce; ano: 2000).

8) “Vossa Senhoria há de convir que, se forem penalizados pelo ECA, os pais desses jo-vens serão responsabilizados, embora caiba àqueles a punição por

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Page 82: escrita e cidadania

um crime praticado por estes.” (carta argumentativa dirigida ao editor da Folha de São Paulo; assunto: ma-ioridade/menoridade penal; ano: 1999).

9) “Para a globalização se efetivar, é preciso que os donos do capital diminuam o lucro, invistam na especialização para ingressá-la no mercado tecnológico.” (assunto: globalização; ano: 1999).

A clareza é uma qualidade textual que consiste em expressar as idéias de forma a torná-las facilmente compreensíveis ao leitor. Muitas vezes, a falta de clareza pode ser um recurso intencional; no entanto, existem alguns “desvios” na

produção de um texto que comprometem o seu entendimento. Eis alguns deles: obscuridade, ambigüidade e falta de paralelismo (gramatical ou semântico).

"Meu professor de Física é do tipo bonitão. No ano passado, ele começou a falar que sempre sonhava comigo. Aquilo me balançou, mas tenho namorado e é casado. Só que começou a me pressionar, pedia para eu ir até a escola à tarde. Pegava na mi-nha mão toda vez que tinha uma chance. No começo, gostei. Imagine: as meninas da es-cola morrendo por causa do professor e ele correndo atrás de mim! Só que, um dia, quan-do estávamos sozinhos numa sala, ele tentou me beijar e disse que queria me levar para um motel. Estava meio apaixonada, mas comecei a ficar com medo. Eu, que sempre fui boa, comecei a ir mal nas aulas, fiquei de recuperação, estava quase repetindo. Não conseguia prestar atenção na aula dele de jeito nenhum. Foi quando resolvi contar em casa. Meu pai ficou furioso! Queria ir à polícia, falar com os diretores da escola, fazer um escândalo. Eu implorei para ele não fazer nada. Depois de desabafar, consegui voltar a estudar e passar de ano.”

eleele

(Revista Carinho)

No texto acima, o entendimento é prejudicado devido

ao uso do termo “ele”, sublinhado no

Imagem: IstoÉ, 1/8/2001.

“Os Estados Unidos, os países da União Européia e a Rússia lançaram na atmosfera 382 bilhões de toneladas de dióxido de carbono nos últimos cinqüenta anos, quantidade superior às emissões de todos os demais países.” (Veja, 1/8/2001, p.48)

5

Page 83: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

texto, pois ora tal termo re-mete ao namorado, ora ao professor de Física.

Analise os trechos abaixo, frag-mentos de redações de alunos,

e explique por que as idéias dificultam a compreen-são ao leitor.

1) “Como exemplo temos a morfina, usada para combater a dor que, aos poucos, está sendo substituída pelo samário – 153.” (assunto: uso da energia nuclear [área médica]; ano: 2000).

2) “Além disso, a energia nuclear provoca a destruição das células e queimaduras (...)” (assunto: uso da energia nuclear; ano: 2000).

3) “Não podemos também deixar de falar nas emissoras de tevê, pois a influência delas sobre os adolescentes, que apresentam programas altamente erotizados em horários inadequados, incentivando, assim, a relação sexual precoce.” (assunto: iniciação sexual precoce; ano: 2000).

4) “Torna-se necessário, portanto, que o governo, a sociedade e a imprensa se unam em torno de objetivos comuns, evitando o desperdício de alimentos, o alcance de uma dis-tribuição de renda mais justa, geração de mais empregos (...).” (assunto: Dar ou não esmolas? ano: 2000).

5) “Na minha opinião é um absurdo permitir que se repitam os ‘espetáculos’ de violência e humilhações que vêm ocorrendo todos os anos cada vez que grupos de estudantes ingressam na universidade. Além disso, é preciso pensar nos traumas psicológicos das vítimas, isso quando estas não estão mortas, o que de fato já ocorreu mais de uma vez.” (assunto: a prática dos trotes aos calouros nas universidades brasileiras; carta ar-gumentativa dirigida ao editor da FSP; ano: 1999).

6) “Em se tratando de fome, temos como grande culpado os milhares de grãos que estra-gam nos armazéns governamentais e particulares os quais, em decorrência disso, são jogados fora.” (assunto: desperdício do dinheiro público; ano: 1999).

Um problema bastante comum en-contrado em redações de alunos diz res-peito à incompletude da frase, ou seja, a idéia pretendida pelo autor é abandona-da e a inteligibilidade torna-se comprome-tida. Muitas vezes, tal problema é decor-rente da pontuação inadequada, do uso impróprio do

gerúndio ou do infinitivo, en-tre outras formas gramaticais utilizadas para se estruturar as frases.

O trecho abaixo, parte de uma carta de leitor, extraído do jornal Diário Popular, de 30/11/97, apresenta algumas frases fragmentadas, ocasionando difi-culdades de entendimento ao leitor.

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6

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Observe:

"Em resposta ao comentário da coluna Ronda dos Pagos de Domingo (23/11/97), que diz respeito ao Pixurum ao muxirão.

Analisando a atual situação financeira da Estância Thomaziana, não foi causada pela patronagem anterior, e sim pela atual.

Pois, como sabemos, a patronagem anterior adquiriu imóveis no valor superior a 50.000 dólares e pagos.”

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Agora, leia os trechos abaixo, extraídos de redações, e reescreva-os, atribuindo-lhes coerência.

1) “Tendo acompanhado, através da imprensa, divulgações importantes sobre a violência nas escolas, fato que decorre, em parte, de uma política adotada que mascara o contin-gente juvenil, uma vez que a maioria dos jovens não possui perspectivas de um futuro digno e promissor.” (assunto: violência juvenil; ano: 2000).

2) “Resolvi, por essa razão, manifestar-lhe meu posicionamento. Distinguindo, com clare-za, situações de violência em que o meio se torna propício (...)” (idem ao anterior).

3) “Saliento-lhe que, em certos casos, compreende-se a revolta e a violência desses jo-vens. Já que a desigualdade social acirra a falta de oportunidades de ascensão social.” (idem ao anterior).

4) “Por sua vez, essa sociedade que omite informações aos jovens, assiste filmes eróticos, novelas em que o sexo está sempre presente.” (assunto: influência da mídia X mater-nidade precoce; ano: 2000).

5) “O jovem brasileiro tem passado por alguns problemas. Entre eles, destaca-se o alcoo-lismo que, lamentavelmente, afeta 20% destes. Tornando-se, assim, para vários, um ví-cio preocupante.” (assunto: o alto índice de alcoolismo entre os jovens; ano: 1999).

6) “Ao tomar conhecimento do projeto de lei de autoria de Vossa Excelência, o qual trata da relevante questão do direito à realização do aborto legal, pelo SUS, por duas razões: em caso de estupro e em caso de risco de vida da

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Texto argumentativo: escrita e cidadania

mãe.” (carta argumentativa dirigida a um congressista; assunto: aborto; ano: 1999).

7) “A justiça; é feita até para os corruptos.” (assunto: impunidade; ano: 2000).

Se compararmos a relação fala/ escrita, nas mais diversas situações do cotidiano, perceberemos que não se fala como se escreve, não se escreve como se fala, assim como não se fala nem se escreve da mesma maneira em todas as oca-siões.

Logo, o que é perfeitamente acei-tável numa situação de fala, em situação informal, pode não o ser

numa de escrita. Igualmente, na escrita, numa situação for-mal, devem-se evitar construções da mo-dalidade da fala.

Nas frases abaixo, extraídas de redações de alunos, notam-se estruturas e escolha do vocabulário próprias da linguagem falada informal, modalidade não acei-ta em provas de redações de vestibulares. Observe:

"I sso n ão leva a n ada.”

"I sso n ão a ju da as d ificu ldad es.”

"N o seu texto, a sen h o ra d iz q ue ( .. .) ”

"E com o isso p ode ser aceito n o m eio u n iversitário q u an do fo ra d ele p ode dar a té cad eia?”

"O s po líticos n ão fazem n ada p ara levan tar o p aís.”

Agora, leia os trechos abaixo e proponha mudanças para melhorá-los, adaptando-os à modalidade escrita culta.

1) “Foram meses sem ninguém descobrir nada. Quando foi descoberto o escândalo, a mídia foi atrás, o povo também, mas, apesar de tudo, os dois senadores renunciaram.” (assunto: renúncia dos ex-senadores ACM e Arruda; ano: 2001).

2) “Em conseqüência desse ato, houve muita especulação sobre uma possível manipulação política e o incentivo à compra e venda de votos, mas desta vez não passou em branco este fato irresponsável.” (idem ao anterior).

3) “Primeiramente, gostaria de dizer que estou indignado (...)” (assunto: trote nas univer-sidades; ano: 2000).

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7

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4) “Não vejo mal nenhum em pintarem os alunos, fazerem eles correr e coisas deste tipo.” (idem ao anterior).

5) “É lamentável que os telespectadores tenham que assistir programas sem conteúdo in-formativo e cheio de baixarias, como é o caso do Gugu.” (assunto: guerra pela audiên-cia e a qualidade dos programas televisivos; ano: 1999).

6) “De todo modo, o único jeito de diminuir (...)” (idem ao anterior).

7) “Essas ONGs estão fazendo um grande bem social.” (assunto: influência do terceiro se-tor em nossa sociedade; ano: 2001).

8) “É preciso tornar mais fácil a solução dos problemas (...)” (idem ao anterior).

9) “Isso sem falar na falta de ética e vergonha na cara de nossos políticos, que só pensam neles.” (assunto: ética e política; ano: 2000).

10)“Quando se fala em drogas (...)” (assunto: alcoolismo entre os jovens; ano: 2000).

11)“Há muitos jovens que começam a beber na noite, exageram na bebida, sem pensar que isso pode virar uma grande tragédia.” (idem ao anterior).

12)“Se isso que foi citado for feito, a saúde já irá dar uma boa melhorada.” (assunto: saú-de pública no Brasil; ano: 1999).

13)“(...) porque, se continuar como está, muitos, com alto potencial, poderão ficar de fora da sociedade.” (assunto: desemprego; ano: 2000).

14)“O ECA deveria trabalhar em cima do dever escolar para menores de rua (...)” (assunto: 10 anos de criação do ECA; ano: 2000).

15)“O problema é que o estatuto muitas vezes inexiste na prática, a maioria dos artigos do texto legal não saem do papel.” (idem ao anterior).

IstoÉ, 8/8/2001

Page 87: escrita e cidadania

Proposta nº 1

O jornal Folha de São Paulo publi-cou, em 18/10/99, uma reportagem contendo o relato de um leitor, 14 anos, Paulo (nome fictício; ver “observação”), segundo o qual está sendo expulso da escola onde estuda em razão do preconceito de que tem sido alvo.

Além do depoimento do leitor, a Folha publicou uma entrevista com o diretor da escola envolvida, depoimentos de alunos da própria instituição, assim como de

especialistas nas áreas educacional e jurídica.

Após a leitura da coletânea, es-creva uma carta argumentativa dirigida ao aluno Paulo ou ao diretor da escola, manifestando-se acerca da acusação de preconceito alegada pelo aluno e da postura adotada pela direção do estabelecimento.

Além das informações contidas na coletânea, você poderá utilizar outras que julgar pertinentes.

Ao assinar sua carta, use apenas as iniciais de seu nome.

Page 88: escrita e cidadania

(Em: , suplemento do jornal )Folhateen Folha de São Paulo

da Redação

Excepcionalmente, nesta reportagem, a tomou a decisão editorial de não identificar vários dos entrevistados, o que não é prática do jornal. Muito pelo contrário. Os autores das declara-ções publicadas são sempre identificados, salvo os chamados casos "off the records", em que a fonte pede o anonimato e há relevância jornalística para que esse procedimento seja realizado.

Nesta reportagem, cujo assunto é delicado e polêmico, o nome da escola envolvida e dos personagens centrais do caso aluno e diretor do colégio não foram revelados com o fim único e ex

Folha

clusivo de preservar a imagem do estudante, que tem menos de 18 anos de idade.Revelar o nome do colégio ou do diretor poderia levar à identificação do aluno e causar

possíveis situações de constrangimento para o estudante e para os demais alunos da escola. Essa foram as preocupações do jornal ao optar por manter no anonimato os principais envolvidos no caso.

Obs.: Por que os nomes dos personagens da escola foram omitidos

Silvia Ruiz

da Reportagem Local

No início do ano, Paulo, 14, da oitava série de um colégio particular da zona leste de SP, declarou sua paixão por Marcelo (nomes fictícios), 16, aluno do ensino médio da mesma escola. A partir daí, a vida dos dois vi-rou um inferno.

A história correu o colégio, e Marcelo passou a ser alvo de gozação por parte de seus amigos. Para Paulo, a situação ficou ainda pior. Segundo ele, alguns alunos passaram a ame-açá-lo, e a direção convocou seus pais para pedir que o tirassem da es-cola.

O estudante acha que tudo não passa de preconceito contra ele. “O que eu fiz, mostrar o meu amor, me apaixonar, é algo que qualquer me-nina ou menino da minha idade está cansado de fazer. Mas, como eu sou diferente, tenho de guardar isso em segredo ou me torno um problema”, diz o estudante.

Para a direção do colégio, não se trata de preconceito. Para o diretor, apesar de ser um bom aluno, Paulo criou um problema para Marcelo.

Em sua defesa, Paulo diz que pode até ter causado um problema, mas afirma que não conseguiu agir de outra forma. “Eu vi Marcelo há dois anos e fiquei apaixonado. Este ano resolvi me abrir.” Ele vê exagero e precipitação na possível decisão da escola de expulsá-lo. “Por que a dire-ção não expulsa os garotos que estão fazendo a gozação?”

Especialistas em Educação e advogados ouvidos pela reportagem questionam a atitude do colégio. Se-gundo eles, esse tipo de expulsão vai contra as tendências modernas de Educação.

“Esse caso mostra, principal-mente, a incompetência educativa dessa escola”, diz Rosely Sayão, psi-cóloga e colunista da Folha. Segundo ela, o papel dos educadores hoje é ensinar os alunos a conviver com a di-versidade. “O que essa escola está fazendo para tornar seus alunos cida-dãos?”

O advogado Luiz Alberto David Araujo, professor de Direito Constitu-cional, da PUC-SP (Pontíficia Univer-

Page 89: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

sidade Católica) e do ITE (Instituto Toledo de Ensino), concorda com Ro-sely. “A escola passa um atestado de incompetência em relação a um tema presente na sociedade. Em princípio, ela tem de manter a disciplina, mas eliminar o problema, em vez de lidar com ele, não resolve nada. Essa não é uma questão de direito, mas sim de pedagogia.” (...)

O promotor da Infância e Juventude, Giovane Serra Azul, diz que nunca viu um caso como esse. “Esse é um caso muito delicado, e, para avaliá-lo, seria preciso que houvesse um processo. É difícil

delinear até onde vai o interesse indi-vidual de uma pessoa e o da coletividade. É preciso ver se essa atitude do garoto está prejudicando o direito dos outros de estudar. Apenas o fato de ter declarado seu afeto e ser homossexual não é motivo de expulsão.”

Segundo ele, as escolas parti-culares têm o direito de expulsar um aluno quando julgam que ele atrapa-lha a coletividade. “Há regras que são subjetivas. Mas, se os pais ou o aluno consideram que há abuso por parte da escola, podem buscar o apoio da Jus-tiça.”

Folha – O que o levou a escrever para o Folhateen?Paulo – A minha escola disse que eu não vou poder estudar lá no ano que

vem. Acho que estou sendo alvo de preconceito porque sou homossexual.

Folha – Por que a direção da escola quer que você saia?

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"Todo mundo na escola sabe que esse moleque é bicha e fica assediando o outro. Se fosse comigo, já tinha dado uma porrada na cara dele." Cláudio (nome fictício), 15

"Todo mundo comenta essa história na escola, mas não deveria levar à expulsão. Gostar de alguém não é motivo para mandar embora." Adriana (nome fictício), 15

"Isso tudo é ridículo. Quer dizer que o outro garoto não sabe se defender sozinho? Se ele não quer nada com o Paulo, ele devia se entender com ele." Marina (nome fictício), 14

"Esse menino não tem o menor direito de ficar expondo os outros. Se ele gosta de alguém que não é homosse-xual, deveria ficar na dele." Paula (nome fictício), 14

Page 90: escrita e cidadania

Paulo – Eles falaram comigo e com os meus pais e disseram que eu deveria sair porque estava incomodando o garoto por quem eu sou apaixonado. A escola acha que eu sou um problema. Eles são preconceituosos e moralistas.

Folha – Você acha que de fato incomodou o garoto?Paulo – No início do ano, mandei uma carta para ele e me declarei. Também

disse para as minhas amigas que gostava dele. Aí, todos na escola ficaram saben-do, ficou uma pressão sobre ele. Acho que isso poderia até incomodar.

Folha – E qual foi a atitude da escola?Paulo – A minha orientadora pediu para que eu parasse de procurá-lo.

Também disse que eu deveria passar a entrar na escola pela secretaria, subir para a classe depois que os outros alunos já tivessem subido e que não poderia ir à cantina. Ela chegou a dizer que os pais dos meninos mais novos poderiam ficar com medo que eu fosse abusar deles no banheiro da escola. Ela também chamou os meus pais e contou tudo a eles e recomendou que eu fizesse terapia. Ela me considera um problema, e a escola não quer problemas.

Folha – E o que você fez?Paulo – Fui fazer terapia. Acho que é bom até para eu me conhecer melhor e

aprender a lidar com toda essa situação. Mas acho que, mesmo que quisesse, não conseguiria deixar de gostar dele. Algumas vezes, liguei para a casa dele e disse que gostava dele, mas ele nunca disse claramente que não gostava de mim. Eu acho que tenho o direito de expressar o meu amor por ele. Acho que isso é algo que a gente deve resolver entre a gente, sem a interferência da escola. Quanto aos outros alunos, disse que eu não sou um maníaco, não vou atacar nenhuma criança.

Folha – O que você acha que a escola deveria fazer nesse caso?Paulo – Acho que eles deveriam conversar comigo, mas não tirar nossa liber-

dade. A posição da escola deve ser de orientar, não de expulsar. E, se eu fosse uma menina, a mãe dele (do outro garoto) estaria feliz, a escola iria proteger a situação. A escola, como educadora, deveria fazer com que os dois fossem respeitados e prote-gidos. Eles deveriam agir em cima de quem goza com a cara dos outros, não de mim e do garoto que eu amo.

Folha – O que você pretende fazer para resolver o problema?Paulo – Meus pais não querem levar isso muito longe, não querem se expor.

Meu pai acha que a gente teria de ter dinheiro para fazer alguma coisa.

Folha – Você se sente discriminado pelos colegas?Paulo – Há vários alunos que dizem: “Você vai morrer”. Há preconceito da

parte de alguns, a maioria não me aceita, mas muitos me respeitam.

Folha – Você gostaria de permanecer na escola, mesmo achando que há preconceito contra você por parte da direção?

Paulo – Acontece que eu gosto da minha escola, dos meus amigos e sou um bom aluno. Se eu for para outro lugar, vou ter de me adaptar. Não é que eu tenha medo, mas sempre penso: “Como os alunos de uma nova escola iriam me olhar?”. Eu quero continuar, apesar de tudo o que está acontecendo. Quero fazer algo para mudar a mentalidade da escola, que não gosta de tocar nesse assunto, assim como em outros, como drogas e sexualidade. Tudo o que provoque o senso crítico dos alunos é sempre evitado.

Page 91: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

Folha – Quando um aluno dessa escola pode ser expulso?Diretor – Quando ele não se adapta às normas da escola, os pais são avisados,

depois pode haver um conselho de classe. Tentamos evitar o máximo possível a expul-são porque é uma marca que o aluno leva para o resto da vida.

Folha – O Folhateen recebeu a carta de um aluno, Paulo, que diz que vai ser expulso dessa escola porque é homossexual.

Diretor – Ele é bonzinho, inclusive é assumido. O problema é que o outro aluno está sendo gozado. Esse aluno não cria problema nenhum, apenas há o constrangi-mento do outro.

Folha – Ele causa algum tumulto na escola?Diretor – Ele me parece que tem boas notas, mas cria um pouco de gozação por

parte dos colegas.

Folha – Por que ele seria expulso, então?Diretor – No ano que vem ele iria para o mesmo prédio (do outro garoto), eles se

encontrariam no recreio, e haveria aquela gozação dos outros colegas. O problema é por aí. Se ele fosse assumido, mas ficasse no seu cantinho, não haveria problema. O problema é a gozação com a vítima, que se sente muito mal. Não é propriamente pelo fato de ser homossexual. Mas isso (a expulsão) vai ser decidido no conselho de classe no final do ano.

Folha – Segundo ele, as orientadoras da escola disseram que alguns pais teriam medo de que ele assediasse crianças.

Diretor – Disso eu não tenho conhecimento.

Folha – Há alguma forma de essa decisão mudar?Diretor – Não está decidido. Geralmente, se os orientadores apresentam todos

esses fatos, os professores (do conselho de classe) seguem mais ou menos a orien-tação dos orientadores.

Folha – A escola pode estar sendo preconceituosa?Diretor – Não sei, aqui não tem muito disso. O nível é alto, os alunos vêm mais

para estudar, não são alunos que vêm criar problemas.

Folha – Mas, se fosse uma menina, aconteceria o mesmo?Diretor – Meninos e meninas apaixonados há centenas. Isso é o pão nosso de

cada dia. O nosso lema é, dentro da escola, amizade, muita amizade, e apenas ami-zade.

Folha – Esses garotos que estão fazendo gozações estão sendo amigos?Diretor – A gente não é dono da cabeça de cada aluno. Entre alunos dessa ida-

de, gozação, essas coisas, são normais. Não sei até que ponto (a gozação) é muito acentuada. Apenas o que ouvi falar, via orientadoras, é que seria um pouco perigoso ele ir para o colegial junto com o outro.

Folha – Ele está sendo ameaçado de ser mandado embora da escola pelo fato de ter declarado que gosta de outro menino?

Diretor – Sim, claro. Para não ter de ser expulso, o que seria ruim para ele, o ide-al seria que os pais decidissem retirá-lo da escola, para evitar o constrangimento de o conselho de classe decidir.

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Page 92: escrita e cidadania

Folha – Então a solução não seria mandar o outro menino embora da esco-la?

Diretor – O outro é a vítima, um menino perfeitamente normal.

Folha – O senhor acha que o Paulo não é normal?Diretor – A homossexualidade é considerada uma anormalidade que precisa ser

respeitada, isso, sim. Ele não tem culpa nenhuma. Ele nem gostaria de ser assim. Que culpa ele tem? Mas normal, normal... Como diz a Bíblia, Deus criou o homem e a mulher, não criou um intermédio entre eles.

Folha – O senhor não acha que a expulsão seria traumática para ele?Diretor – Acho que sim, mas nós temos também que ver o conjunto do colégio.

Folha – Não haveria outro jeito de solucionar o caso?Diretor – Não sei. O conselho de classe é que vai decidir.

Proposta nº 2

O terceiro setor da economia reúne ações de entidades diversas – ONGs, instituições filantrópicas, fundações, entre outras –, assim como o trabalho individual ou em grupo, sem fins lucrativos, realizado, em muitos casos, através de volun-tários.

Tais atividades vêm despertando o interesse do Poder Público e da comunidade em geral pelo efeito do trabalho realizado nos mais diversos setores – educação,

saúde, meio ambiente etc.Após a leitura da coletânea,

posicione-se em um texto dissertativo-argumentativo, acerca do assunto, avaliando a eficiência/não-eficiência do terceiro setor nos aspectos econômicos, sociais e políticos de nossa sociedade.

Além das informações contidas na coletânea, você poderá utilizar outras que julgar adequadas ao tema.

Terceiro setor: nova utopia social?

O terceiro setor congrega organizações sem fins lucrativos, cujas receitas podem ser geradas em suas atividades operacionais (auto-sustentação), mas, em sua grande maioria, se originam de doações, feitas por particulares, pelo setor privado e pelo Governo.

Por essas características, os estudiosos do setor estão substituindo a terminologia “organizações não-lucrativas” por uma designação mais ampla. Elas hoje são categorizadas como organizações da sociedade civil (OSCs).

Page 93: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

Longe de ser uma utopia, o terceiro setor é uma surpreendente e vibrante rea-lidade nas economias modernas. Um es-tudo comparativo entre sete países (Esta-dos Unidos, Japão, França, Alemanha, Reino Unido, Itália e Hungria), realizado pela Johns Hopkins University, revelou que a dimensão do terceiro setor nessas eco-nomias desenvolvidas é bastante significa-tiva, atingindo em média 3,5% do PIB.

Mas é na geração de empregos que ele ganha importância, tendo em vista a catástrofe que a terceira revolução indus-trial tem causado no nível de emprego em todos os países. Enquanto os outros dois setores, Governo e privado, vêm prati-cando um processo de exclusão sem pre-cedentes de trabalhadores, o terceiro setor

vem apresentando taxas surpreendentes de criação de novos postos de trabalho.

A conclusão a que se chega é que, no desenho da sociedade moderna, o ter-ceiro setor aparece como que criando um tripé sobre o qual os sistemas econômicos se apoiarão.

Nesse redesenho da sociedade, esse tripé, formado por Governo, setor pri-vado e terceiro setor (ou setor social), ofe-rece os meios para trabalharmos pela di-minuição das desigualdades sociais e econômicas, a fim de construir uma socie-dade mais justa. (Folha de São Paulo)

Luiz Carlos MeregeProfessor titular da Fundação Getúlio Vargas (SP) e

coordenador do Centro de Estudos do Terceiro Setor (CETS).

Terceiro SetorTerceiro Setor

O que é?

Pode ser definido como o conjunto de atividades das organizações da sociedade civil, portanto, das organizações criadas por iniciativas privadas de cidadãos, com o ob-jetivo de prestação de serviços ao público (saúde, educação, cultura, habitação, direitos civis, desenvolvimento do ser humano, proteção do meio ambiente). Costuma-se dizer que não têm fins lucrativos, muito embora seja melhor defini-las como organizações em que o possível lucro é reaplicado na manutenção de suas atividades ou distribuído entre seus colaboradores, jamais sendo apropriado por um dono ou proprietário. Alardeado como um novo setor da economia na mais franca expansão, pode ser o equilíbrio bus-cado entre as atividades capitalistas – por gerar empregos – e as de assistência social – por não ter o lucro como meta principal, mas o bem-estar da sociedade, neste proble-mático final de milênio para as economias tradicionais.

Obs.: Os dois primeiros fragmentos foram extraídos de DIMENSTEIN, Gilberto. : cidadania hoje e amanhã. São Paulo: Ática, 1998. p.82 e 83.

Aprendiz do futuro

As organizações não-governamentais brasileiras e o Fórum Social Mundial 2001

As organizações não-governamen-tais – ONGs vêm ganhando visibilidade e reconhecimento públicos em todo o mundo. No Brasil, desde a Conferência Mundial do Meio Ambiente, de 1992, o trabalho das ONGs passou a ser mais conhecido e dis-cutido pela população e a mídia.

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Page 94: escrita e cidadania

Fenômeno recente, essas organi-zações sem fins lucrativos vêm se constitu-indo desde a década de 1970 com objetivos, tamanhos e modelos diversos. São muitas as ONGs, difíceis de serem contadas. Além do mais, por ser um conceito amplo, pouco preciso, ONG abarca um conjunto de insti-tuições muito diferentes nas suas finalida-des e origem.

Um segmento importante dessas organizações, associadas à Associação Brasileira de Organizações Não-Governa-mentais – ABONG, é identificado por sua postura crítica frente aos fenômenos sociais. Atuam com o objetivo de superar as diver-sas formas de desigualdades, pelo reconhe-cimento e respeito às diferenças individuais e culturais, ou, ainda, por defender um des-envolvimento sustentável que não condene a existência e a diversidade da vida e dos recursos ambientais para as futuras gera-ções. As ONGs denunciam violações dos direitos humanos, trabalham na construção dos direitos de cidadania, atuam no desen-volvimento de práticas de intervenção so-cial.

Pela natureza do seu trabalho, tais organizações não se pretendem como substitutas da ação do Poder Público. As ONGs não são universais nos seus servi-ços, não têm representatividade pública, não têm institucionalidade nem recursos suficientes para tal fim. Sua missão é identi-ficar e analisar as causas dos problemas sociais, apontar soluções construindo mo-delos de intervenção, ajudar a envolver a

população na luta cidadã. Ao mesmo tempo, não são intermediárias ou substitutas de movimentos sociais, sindicais ou qualquer outra forma de ação coletiva da sociedade civil. Ao contrário, são suportes, apoios, es-tímulos destes movimentos. Não substituem os partidos políticos. Ajudam de forma com-plementar, na medida em que buscam, com seu trabalho, sensibilizar a população para que reconheça e lute por seus direitos.

As associadas da ABONG se sen-tem felizes em estar com outras ONGs no Fórum Social Mundial. Junto com movi-mentos sociais e sindicais, intelectuais, parlamentares, empresários e cidadãos do mundo vamos discutir e propor alternativas, a partir das nossas experiências, que apontem para um desenvolvimento sem ex-clusões e com justiça social. Vimos mostrar que acreditamos que um outro mundo é possível e que temos um papel importante na sua construção.

Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentaiswww.abong.org.br – telefone: (11) 3237-2122Rua General Jardim, 660 – 7º - Vila Buarque – 01223-010 – são Paulo – SP

A ABONG foi fundada em 1991 por um grupo de ONGs que decidiu buscar a intervenção social agindo coletivamente. Nestes 10 anos de trabalho, o grupo inicial ganhou muitas adesões e hoje são cerca de 270 associadas.

(material distribuído aos participantes do Fórum Social Mundial, realizado em POA, em janeiro de 2001)

Page 95: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

A filantropia no Brasiljá movimenta 12 bilhõesde reais por ano e ganhaa adesão de ricos, famosose empresas

É mito que no Brasil se doe pouco em comparação com outros paí-ses. Abaixo, o percentual de doa-ção de indivíduos e empresas no total arrecadado por organiza-ções sem fins lucrativos.

11%

10%

10%

19%Fonte: Pesquisa Comparativa Johns Hopkins-Iser

"(...) Quem não tem recursos doa seu tempo. Cerca de 16% das pessoas com mais de 18 anos são voluntárias de projetos sociais em todo o país. Ou seja, uma massa de 12 milhões de brasileiros trabalha de graça para ajudar o próxi-mo. 'Tem mais jovens querendo se engajar em projetos de ajuda do que as ONGs são capazes de recrutar', afirma o consultor Stephen Kanitz, um dos maiores especialistas em projetos para o setor. A solidariedade do povo brasileiro foi capta-da na pesquisa da Johns Hopkins e do Iser. O tra-balho, que será publicado no mês que vem, é uma análise comparativa de 22 países, incluindo os mais ricos, sobre o papel e o desempenho das or-ganizações sem fins lucrativos. O Brasil não faz feio: aqui se doa mais que a média dos países pesquisados (...)

(...) O que fica patente é que o Brasil está mudando para melhor nesse campo. O governo não tem sido capaz de dar conta de todas as de-mandas sociais existentes. As pessoas incomo-dadas com a pobreza estão esperando menos do governo e arregaçando as mangas. É isso que vem fazendo crescer enormemente o número de organizações sem fins lucrativos. 'O terceiro setor está na moda', afirma Milu Vilela, uma das donas do Banco Itaú e mantenedora de dois centros assistenciais. Espera-se que a moda venha para ficar.”

"Num mundo cada vez mais conturbado, cruel e desigual, a responsabilidade social é uma questão de sobrevivência para as pessoas e organiza-ções." Francisco de Assis Azevedo Timóteo, MG

(Veja, 27 de outubro, 1999)

Proposta nº 3

Esperava-se que a alta tecnologia, com suas novas formas de mecanização e informatização, proporcionassem, no início do novo milênio, um largo espaço de tempo destinado ao lazer. No entanto, o que se percebe são posições polêmicas quanto às relações de trabalho, na atualidade e no futuro, e à busca por maior tempo livre aos trabalhadores.

Baseando-se nas informações abaixo, bem como no seu conhecimento de mundo, redija uma carta argumentativa destinada a um dos autores dos dois primeiros textos, apresentando argumentos para convencê-lo de que está equivocado. Neste exercício de argumentação, você deverá

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Page 96: escrita e cidadania

Os três pilares do tempo livre serão a sensualidade, a criatividade e a estética. Os luxos cada vez mais raros consistirão no silêncio, no espaço, na privacidade.

discordar, portanto, das opiniões desses autores.

Ao assinar a carta, use apenas as iniciais de seu nome.

Uma outra possibilidade é a criação de um texto dissertativo-

argumentativo no qual a contra-argumentação seja o processo básico da redação.

Você poderá utilizar outras informações que julgar pertinentes.

No início do século 20, Freud publicou "A Interpretação dos sonhos", Taylor inventou o "Scientific Management", Einstein anunciou a teoria da relatividade, Picasso expôs "Les Demoiselles d'Avignon", Stravinski compôs "A Sagração da Primavera".

Cada área sofreu uma profunda revo-lução da qual desabrocharia a sociedade pós-industrial na qual temos agora a sorte de viver. Agora as descobertas surgem como cascata, e não passa ano em que não se realizem grandes progressos. Se pensarmos que a potência dos micropro-cessadores, que são a base de cada tec-nologia, dobra a cada 18 meses...

O trabalho é investido por cinco gran-des ondas de transformação: o progresso tecnológico, o desenvolvimento organiza-cional, a globalização, a escolarização e os meios de comunicação.

Disso se deduz que todas as nossas atividades se intelectualizam, que desapa-recem muitas atribuições cansativas e te-diosas, que somos capazes de produzir sempre mais bens e mais serviços com cada vez menos contribuição específica de trabalho humano.

Acima de tudo resulta numa dificul-dade maior em discernir trabalho, diversão e aprendizado; caem as barreiras entre cansaço e tempo livre; de qualquer ma-neira o trabalho ocupa apenas um décimo do nosso tempo de vida.

Isso significa que, enquanto até agora a família e a escola se preocuparam em preparar os jovens para o trabalho, no fu-turo, deverão se preocupar em prepará-los para o tempo livre. O lazer é uma profissão e uma arte não menos importante que o

trabalho, e a qualidade da nossa vida depende sobretudo da qualidade do nosso lazer.

Porém os países anglo-saxões e o Japão, sendo hiperindustrializados economicamente e psicologicamente, aprenderam a organizar e viver o trabalho, mas desaprenderam a organizar e viver o tempo livre. Por outro lado, os países lati-nos (entre eles o Brasil), não tendo nunca assimilado profundamente o modelo in-dustrial, conservam uma grande vitalidade extra-trabalho: sensualidade, comunicabili-dade, hospitalidade, convivência. Estão, portanto, mais preparados para viver com alegria a sociedade do tempo livre que nos aguarda.

Os três pilares do tempo livre serão a sensualidade, a criatividade e a estética. Os luxos cada vez mais raros e preciosos consistirão no silêncio, no espaço, na pri-vacidade, na segurança, na alegria, na beleza: todos pressupostos imprescindí-veis para satisfazer as necessidades de introspecção, amizade, amor, lazer e con-vivência: isto é, as necessidades emer-gentes.

Em um conto belíssimo, intitulado "A Rosa de Paracelso", Borges sustenta que o paraíso existe: é a vida aqui na Terra. Borges acrescentou que existe também o inferno: e consiste em não percebermos que vivemos em um paraíso. Tudo está em

FS

P, 2

2/04

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Texto argumentativo: escrita e cidadania

compreender a condição feliz à qual fomos destinados, nascendo e tomando consci-ência de que a felicidade consiste em pro-curá-la.

Domenico de Masi, sociólogo italiano e autor do livro Desenvolvimento sem Trabalho (Ed. Esfera), entre outros, assina esta coluna toda segunda semana do mês.

Folha de São Paulo, São Paulo, 11 de maio de 2000. Folhaequilíbrio.

(...)O problema do mundo não é eco-

nômico, é de estilo de vida. Precisamos en-contrar um jeito de convencer os povos dos países desenvolvidos a relaxar, a curtir a vi-da. Poderíamos, por exemplo, mandar fazer uns adesivos para os carros deles com frases como "Take it easy", "Curta a vida", "Carpe diem", enfim, "Relax". Povos como os americanos e os japoneses precisam aprender a trabalhar menos, a cuidar mais de suas famílias e a tirar mais férias, de pre-ferência em praias brasileiras. Tem gente que acha o máximo tudo o que vem dos Es-tados Unidos, especialmente na área da ad-ministração e de negócios. Eu acho o máxi-mo que o brasileiro ponha a família em pri-meiro lugar. Que o Brasil tire férias em de-zembro e só retome o ritmo depois do Car-naval. Que o país inteiro pare durante a Co-pa do mundo. Que toda criança brasileira saiba dançar e batucar. Estamos mil vezes mais bem preparados para a era do robô do que os anglo-saxões e os orientais.

(Stephen Kanitz, )Veja

Pesquisa realizada em 30 países revela que*, entre ter mais dinheiro e mais tempo livre, as pessoas prefe-rem a renda. O Brasil, com 59% optando pelo dinheiro, ocupa o 8º lugar na lista. O primeiro posto é da Rússia (71%), seguida da França (63%). Os norte-americanos, herdeiros espirituais do "tempo é dinheiro", ficam na 11ª posição. No outro extremo, o dos que escolhem o tempo livre, estão a Índia e as Filipinas (66%), seguidas do Vietnã (59%).

Não parece haver muita relação entre a qualidade de vida proporcionada pelo país e a preferência de sua população. O Canadá, primeiro colocado no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), é o 5º entre as nações que optam pela renda. Aqui parecem operar mais no-ções filosóficas e culturais. A Índia, campeã do tempo li-vre, é o 138º IDH, mas o hinduísmo, religião predomi-nante, valoriza mais o tempo do que o dinheiro, fenô-meno que, em graus variados, ocorre em toda a Ásia, a região onde a opção pelo lazer é mais forte.

A própria busca de melhorias tecnológicas tinha co-mo fim precípuo poupar o homem do trabalho. Mas algo ocorreu no meio do caminho e o trabalho, cada vez ma-is, invade as outras esferas da vida das pessoas. Decidi-damente, a humanidade passou por uma transformação profunda nestes últimos séculos.

(...)

* O editorial alude à pesquisa do instituto norte-americano Roper Starch World-Wild, coordenada por Tom Miller e divulgada pela em 07/06/00. ( , 9/6/00)

Folha,Folha de São Paulo

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Page 98: escrita e cidadania

"(...) Como é que um século chega à metade celebrando como conquista a luta de sin-dicatos no mundo inteiro para reduzir jornadas fatigantes e termina com boa parte da população trabalhando cada vez mais?

A explicação dos especialistas, vejam só, é a diminuição crescente do emprego confortável do passado, aquele que durava por toda a vida útil e exigia pouco do funcionário. Numa simplificação de um processo intrincado, a economia globalizada da última década, principalmente, pôs contra a parede empresas lotadas de mão-de-obra habituada ao padrão oito-às-cinco. Lançadas numa competição feroz, adotaram a prática do melhor resul-tado ao menor custo possível. Instauraram-se o downsizing, a terceirização, a reengenharia, processos que levam à redução de pessoal. Quem ficou teve suas obrigações aumentadas e passou a trabalhar muito mais, não só para dar conta do recado como para não perder, ele também, a vaga. Quem saiu procurou alternativas menos rentáveis e mais cansativas, como ocorreu no Brasil na busca de brechas no mercado informal. (...)

Outro setor que mantém longas jornadas, sem que isso reflita pujança econômica, é o informal. 'O taxista, o encanador, aquele sujeito que trabalha por conta própria, todos devem es-tar dedicando o dobro de tempo ao batente', analisa José Paulo Chahad, também economista e professor da USP. ‘Eles precisam ficar muito mais horas disponíveis, à espera de um cliente, para manter o nível de renda de antigamente. Se houvesse gente batendo à sua porta, eles poderiam ter um horário fixo, ter a mesma renda e só trabalhariam mais se quisessem um extra.’ (...)

Nessa nova cultura de trabalhar muito, ganhar muito e subir muito na vida, o desejo de consumo é outro fator preponderante. As pessoas estão trabalhando mais, também, para poder comprar mais. Em 1991, a economista Juliet Schor, de Harvard, escreveu um livro que se tornou uma espécie de bíblia do assunto.

(...) Nele, Schor culpa a televisão, principalmente, por impor valores e vender símbolos de status que influenciam o americano a ser um povo que gosta de gastar, não de poupar, uma definição que cabe, sem tirar nem pôr, nas fronteiras do Brasil que tem dinheiro para ir às compras. (...)”

O motor é o desemprego -

( , 05/04/2000)Revista Veja

Proposta nº 4

O jornal Folha de São Paulo, em sua edição de 22/04/01, publicou um suplemento especial intitulado 10 mandamentos para a carreira, contendo dez artigos escritos por especialistas os quais abordam temas como as necessidades do mercado de trabalho atual, a formação dos novos profissionais, os pré-requisitos para se obter sucesso e realização na carreira.

Abaixo, você encontrará tre-chos/textos desse suplemento. Depois de lê-los, selecione as idéias que julgar adequadas e acrescente outras, se for necessário, e produza um texto dissertativo-argumentativo em que seja abordado o tema “O perfil do profissional no novo milênio: atualidade e perspectivas futuras”.

Page 99: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

Trabalhador-empresa-comunidade

Desesperados atrás de mão-de-obra qualificada, executivos dos setores de tecnologia da informação e telecomunicações, no Brasil, vêem-se forçados a oferecer salários altos e benefícios indiretos, mas, mesmo assim, encontram dificuldades de preencher as vagas.

Nos setores de alta tecnologia, há uma discre-pância entre a formação educacional dos trabalha-dores e as vagas ofereci-das, reflexo de um ciclo econômico ancorado no que se convencionou chamar de “era da infor-mação”.

Em poucas palavras, nunca se produziram tantos dados em tão pouco tempo e, mais importante ainda, nunca foram trans-mitidos com tanta rapidez: o novo ritmo vai definindo quem vive, sobrevive ou simplesmente morre nos negócios. Cada vez mais, o tempo é menor e, cada vez mais, ele vale mais dinheiro.

Diante de tanta com-petitividade, seria normal supor que o trabalho só iria piorar as condições de vida dos trabalhadores, submetidos a uma insu-portável pressão. Errado –

e esse erro é um dos fatos notáveis do capitalismo contemporâneo.

Por puro pragma-tismo, as empresas são obrigadas a ser mais ge-nerosas para atrair e manter seu mais impor-tante patrimônio: o capital humano. Passa a ser deci-siva a valorização da transmissão do conheci-mento, numa aposta nos intelectos. A disseminação das universidades corpo-rativas, dragando milhões de reais para treinamento de pessoal, mostra que, na prática, o ambiente de tra-balho se confunde com o ambiente escolar. Aprende-se fazendo, faz-se aprendendo.

Ao se abrirem para uma visão mais complexa de quem trabalha (ser que pensa, tem idéia, inter-age), as empresas são obrigadas a absorver tam-bém a complexidade dos seres humanos, aceitando-os como pais, maridos, filhos.

Cresce o número de empresas que oferecem períodos sabáticos, tele-trabalho, horário flexível, programas psicológicos, estímulo a atividades físi-cas: busca-se fazer do lu-gar de trabalho quase uma

extensão do lar. Tratar bem a mão-de-obra virou tam-bém questão de market-ing, mais especificamente de marketing social.

O Brasil assiste agora à onda da respon-sabilidade social nas em-presas, cobradas sobre como cuidam de seus em-pregados e como tentam melhorar sua comunidade, com ações de cultura, educação, saúde ou ambi-ente.

A confluência de to-das essas tendências – valorizar a mão-de-obra e mostrar um rosto solidário para a comunidade – é o estímulo, bancado pelas empresas, para que os funcionários exerçam ati-vidades voluntárias.

Quem preferir ficar fora dessa nova relação trabalhador - empresa - co-munidade está tão habili-tado a sobreviver como aqueles que, avessos à modernidade, não queriam trocar as máquinas de es-crever pelo computador.

Gilberto Dimentein – Colunista, membro do Conselho Editorial da Folha e presidente da ONG Cidade Escola Aprendiz

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É preciso assumir duas novas responsabilidades

(...)

O foco é a informa-ção. Pelo fato de que a maior transformação é a transformação na informa-ção. A mudança não está nos instrumentos: a mu-dança é o fato de a infor-mação estar acessível a todos. E todos esperam por isso.

Nossa atitude perante a informação mudou mais do que a tecnologia em si, talvez pelo aparecimento dos “knowledge workers” como força de trabalho crí-tica.

Se nós aprendemos algo na escola, é como ob-ter informação. E aprende-mos a depender da infor-mação. É irrelevante se o instrumento para obtê-la é um livro ou um site. Esses são meios para obter infor-mação, não fins.

Não fico impressio-nado com as informações que meus amigos executi-vos obtêm. Pelo contrário, fico deprimido. Quanto mais computadores têm, quanto mais dados obtêm, menos informação de fato pos-suem, porque, sem meias palavras, estão mal direcio-nados. Estão desorientados com os dados que seus computadores produzem, não com a informação de que necessitam. O compu-tador é como a lista tele-

fônica: é preciso saber o que se procura.

(...)

Portanto, é importante fazer a si mesmo a seguinte pergunta: “De quais infor-mações eu preciso para realizar o meu trabalho?” (...)

Em uma sociedade e uma economia em que o conhecimento é o recurso fundamental e mais caro, a educação contínua é do que nós mais precisamos.

Em um mundo de ha-bilidades como foi o nosso durante milhares de anos, as competências mudavam muito lentamente. Sempre digo que meu nome, que é holandês, significa “impres-sor”. Meus ancestrais foram tipógrafos em Amsterdã du-rante 250 anos, do início do século 16 a meados do sé-culo 18. Durante todo esse tempo, não tiveram de aprender nada. Todas as habilidades tipográficas ne-cessárias já haviam sido desenvolvidas em 1510, nos primeiros 50 anos após o primeiro livro impresso. Novas habilidades só foram surgir no século 21.

No que diz respeito ao conhecimento, nem preciso dizer. As coisas mudam a cada seis semanas, a cada três meses, a cada ano.

A educação contínua será o setor de crescimento

mais importante que tere-mos nos próximos, diga-mos, 30 anos. Isso está re-almente começando. Não espere que as universida-des organizem isso. Você tem de aprender a olhar para si e para seu trabalho e perguntar: “Será que pre-ciso voltar a aprender para usufruir os benefícios de meus pontos fortes e mi-nhas competências?” e “O que eu preciso aprender agora que essas coisas mudaram?”

De que modo a edu-cação contínua e boa parte dela são algo que temos de incorporar em nossa vida e em nosso trabalho?

Uma última coisa a ressaltar é que você tem de assumir duas novas res-ponsabilidades. Uma é a responsabilidade pela in-formação. Tanto para si como para a empresa. E a outra é a responsabilidade pelo seu próprio aprendi-zado contínuo. Não espere que alguém lhe diga do que precisa. É sua obrigação.

Peter Drucker – Consultor e professor americano, conside-rado o “pai da administração moderna”.

Especial para a Folha (trecho de videoconferência realizada em agosto/2000, cedido pela HSM, promotora de evento - www.hsm.com.br).

Page 101: escrita e cidadania

Texto argumentativo: escrita e cidadania

Mudanças e escolhas

(...)

A liderança centrada em princípios é a chave para desencadear o po-tencial humano individual. Cada pessoa da força de trabalho precisa empreen-der uma viagem para se tornar líder por opção – uma pessoa que assume a responsabilidade por sua vida, suas escolhas e seu desempenho.

Quando você conse-gue fazê-lo, desenvolve a integridade e o caráter ne-cessários para se adaptar e reagir às transforma-ções, para pensar de ma-neira criativa e encontrar as melhores soluções, para se comunicar com eficácia, para ser alguém que pode ser ensinado, para construir confiança e ser confiável. Olhando es-

sas qualidades, não pa-rece que elas descrevem o funcionário ideal?

Uma forma de anali-sar as habilidades e as competências necessárias para a força de trabalho de hoje é usar a lista dos sete hábitos delineados em meu livro, “The Seven Habits of Highly Effective People” (“Os Sete Hábitos das Pessoas Muitos Efica-zes”).

São eles: 1. liderança própria (ser consciente de que você é responsável sobre você mesmo); 2. possuir senso claro de objetivo, significado e rumo; 3. adaptabilidade (trabalhar com outras pes-soas para buscar situa-ções em que sempre ha-verá ganho comum); 4. comunicação eficaz; 5. si-nergia (possuir as habili-

dades necessárias para trabalhar em equipe); 6. respeito próprio; 7. “afiar o serrote”, que é a soma dos outros seis itens (é preciso que o funcionário aperfei-çoe todos os hábitos, con-servando-se aberto a no-vas oportunidades e à possibilidade de ser ensi-nado).

(...)

Qualquer pessoa que participa da força de tra-balho hoje deve optar por ser líder; logo, saiba es-colher o caminho que quer seguir.

Stephen Covey – Autor de Os Sete Hábitos das Pessoas Muito Eficazes, um dos maio-res bestsellers da área de car-reiras nos EUA

Especial para a Folha.Tradução de Clara Allain

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Page 102: escrita e cidadania

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