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Especial Internacionalização

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A Ciência que une o mundo - Acordos possibilitam intercâmbio e projetos de cooperação internacional

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MINAS FAZ CIÊNCIAAssessora de Comunicação Social e Editora Geral: Ariadne Lima (MG09211/JP)Editor Executivo: Fabrício Marques Assessora Editorial: Vanessa Fagundes Redação: Ariadne Lima, Fabrício Marques, Vanessa Fagundes, Juliana Saragá, Maurício Guilherme Silva Jr., Ana Flávia de Oliveira, Marcus Vinicius dos Santos,Hely Costa Jr., Kátia Brito (Bolsista de Iniciação Científica).Diagramação: Beto PaixãoRevisão: Glísia RejaneProjeto gráfico: Hely Costa Jr.Editoração: Fazenda Comunicação & MarketingMontagem e impressão: Lastro EditoraTiragem: 20.000 exemplaresCapa: Hely Costa Jr.

Redação - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar, São Pedro - CEP 30330-080Belo Horizonte - MG - BrasilTelefone: +55 (31) 3280-2105Fax: +55 (31) 3227-3864E-mail: [email protected]: http://revista.fapemig.br

Blog: http://fapemig.wordpress.com/Facebook: http://www.facebook.com/FAPEMIGTwitter: @fapemig

GOVERNO DO ESTADODE MINAS GERAISGovernador: Antonio Augusto Junho Anastasia

SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIORSecretário: Narcio Rodrigues

Fundação de Amparo à Pesquisado Estado de Minas Gerais

Presidente: Mario Neto BorgesDiretor de Ciência, Tecnologia e Inovação: José Policarpo G. de AbreuDiretor de Planejamento, Gestão e Finanças: Paulo Kleber Duarte Pereira

Conselho CuradorPresidente: João Francisco de Abreu Membros: Antônio Carlos de Barros Martins, Dijon Moraes Júnior, Evaldo Ferreira Vilela, Giana Marcellini, José Luiz Resende Pereira, Magno, Antônio Patto Ramalho, Paulo César Gonçalves de Almeida, Paulo Sérgio Lacerda Beirão, Rodrigo Corrêa de Oliveira

Estar conectado com o mundo é uma necessidade da civilização contemporâ-nea. Os pilares Ciência, Tecnologia e Inovação, de maneira especial, precisam inte-ragir nas diversas nacionalidades, a fim de garantir e, mesmo, acelerar o progresso científico da humanidade.

Atenta às movimentações globais, a Fundação de Amparo à Ciência do Es-tado de Minas Gerais (FAPEMIG) promove a internacionalização da ciência minei-ra, estabelecendo o intercâmbio de pesquisadores e a pesquisa conjunta. Assim, potencializa as ações similares desenvolvidas em diferentes países e aproxima a ciência brasileira dos padrões científicos internacionais.

Na FAPEMIG, as parcerias internacionais cresceram ao longo dos anos e foram institucionalizadas em 2011, com a criação da Assessoria Científica Inter-nacional, voltada especialmente para gerir as relações internacionais da Instituição.

Esta edição especial procura colocar em primeiro plano os acordos já fir-mados e aqueles em processo de efetivação, num total de oito países, como no exemplo a seguir: em 29 de setembro de 2009, por meio da Deliberação nº 43, foi regulamentada, pelo Conselho Curador da FAPEMIG, a bolsa de iniciação cientí-fica internacional, que beneficiou, desde então, estudantes interessados em fazer intercâmbio científico na Alemanha, por meio da parceria com o Serviço Alemão de Intercâmbio Científico (DAAD). Outra parceira nesse país é a Fundação Alemã de Pesquisa Científica (DFG).

Na França, os diálogos tiveram início em 2007 e foram oficializados em 2008, com o Instituto Nacional Francês para Pesquisa em Ciência da Computação e Auto-mação (Inria). Desde então, editais já foram lançados e projetos científicos e tecno-lógicos de cooperação binacional estão sendo desenvolvidos por meio da parceria.

As aproximações com a Itália se deram com a região de Piemonte, com o Politecnico di Torino (PoliTO), em que professores da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) têm a oportunidade de fazer Doutorado, e graduandos podem obter a Dupla Titulação.

No Reino Unido, um acordo de cooperação científica foi firmado com o Centro de Inovações Csem Brasil e o Imperial College London, um dos principais centros de referência internacional no estudo e no desenvolvimento da eletrônica orgânica e impressa.

Outros acordos, não menos importantes, se dão com a Austrália (Universida-de de Queensland), o Canadá (Universidade Alberta) e Estados Unidos (Purdue). Ao mesmo tempo, uma comissão criada pela FAPEMIG tem feito contatos com Israel.

Convidamos o leitor a ler as reportagens e conhecer um pouco mais desses diálogos.

SemFronteiras

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ASSESSORIA INTERNAcIONALEm busca de cooperação e entendimento entre instituições internacionais e o Estado, assessoria científica internacional da FAPEMIG desenvolve estratégias de aproximação entre países

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cANADáEstudos são referência na pesquisa da Mata Seca e embasam até mesmo decisões jurídicas

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ISRAELSistema de inovação israelense acrescenta novas perspectivas para promover a união entre academia e empresas

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ITáLIAReferência mundial, design praticado na região de Piemonte liga a riqueza da terra de Dante à Estrada Real mineira

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FRANçAProjetos de cooperação com Nord-Pas de Calais estimulam desenvolvimento em diversas áreas, como Tecnologia da Informação, Mineração, Saúde e Materiais

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AuSTRáLIAParceria promove a expansão da indústria mineral sem causar danos ao meio ambiente

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INgLATERRADo Reino Unido, o suporte teórico para a ciência dos chips orgânicos impressos feitos em Belo Horizonte

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ALEmANhAAcordos com agências alemãs proporcionam a pesquisadores cooperarem em diversas áreas

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EuATrazendo à memória antigos vínculos de cooperação entre Minas e Purdue, novo acordo promete avanços científicos na área de bioenergia

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ENTREvISTAAbrindo as portas para o mundo: o reitor da UFMG, Clélio Campolina, aponta as perspectivas da Ciência brasileira no campo internacional

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44 A vIDA DOS bOLSISTAS LáHistórias de estudantes e pesquisadores brasileiros no exterior revelam rotinas atribuladas, mas, ao mesmo tempo, coroadas por conhecimento, amizade e cultura

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MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 5

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MINAS FAZ CIÊNCIA tem por finalidade divulgar a produção científica e tecnológica do Estado para a sociedade. A reprodução do seu conteúdo é

permitida, desde que citada a fonte.

Para receber gratuitamente a revista MINAS FAZ CIÊNCIA, preencha o cadastro no site http://revista.fapemig.br ou envie seus dados (nome, profissão, instituição/empresa, endereço completo, telefone, fax e e-mail) para o e-mail: [email protected] ou para o seguinte endereço: FAPEMIG / Revista MINAS FAZ CIÊNCIA - Rua Raul Pompéia, 101 - 12.º andar - Bairro São Pedro - Belo Horizonte/MG - Brasil - CEP 30330-080

“Estar junto ao Politecnico di Torino (PoliTO) é fundamental. O know how e as pesquisas desenvolvi-das propiciam uma vivência aprofundada e dinâmica a respeito do meu tema de pesquisa, amplamen-te investigada e trabalhada por eles. Estar aqui é acima de tudo conhecer, aprender e experimentar”,Paulo MirandaDoutorando em Pesquisa em Sistema de Produção e Desenho IndustrialPoliTO

“A extensão dos conhecimentos científicos para o processamento industrial é o principal foco de interesse, além do contato com a experiência dos ingleses, que são pioneiros na área de dispositivos eletrônicos orgânicos”Giovani GozziFísicoEscola FAPEMIG/Csem Brasil/Imperial/College London (Eficc)

“Esse acordo de cooperação focou especificamente a área de mineração e mostra como pode ser multiplicado para outras iniciativas. A Austrália também é um país com tradição em atividade minera-dora. E Minas Gerais tem recebido um volume expressivo de investimentos do setor”Virgínia CiminelliCoordenadora da parte mineira do acordo com a Universidade de QueenslandDepartamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais (Demet-UFMG)

“Quando nos aliamos a instituições que são destaque na área de Ciência e Tecnologia ganhamos em qualidade. Com isso, criamos oportunidades para os nossos pesquisadores trabalharem com o ‘top’ do mundo”.Evaldo Ferreira VilelaSubsecretário Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais (Sectes)

“A participação em um projeto internacional, com a Universidade de Alberta, no Canadá, enriquece a formação dos alunos. Esse intercâmbio também se estende aos pesquisadores. Já recebemos vários colegas que ministraram palestras ou minicursos para a nossa comunidade acadêmica”.Mário Marcos do Espírito SantoPesquisador, membro da Rede Tropi-DryDepartamento de Biologia Geral da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes)

“Seria excelente que os estudantes mineiros tivessem Israel como opção de intercâmbio e que, da mesma forma, as universidades mineiras pudessem receber estudantes israelenses. Nada impede que possamos fazer os contatos necessários para que as universidades mineiras assinem acordos com as universidades israelenses”.Cynthia RochaAssessora para Parcerias Nacionais e Internacionais Sectes

“Com o acordo entre FAPEMIG e DFG, criamos uma base bem definida e segura pelos pesquisadores que querem estabelecer projetos conjuntos entre Alemanha e Minas Gerais” Detrich HalmDiretor Fundação Alemã de Pesquisa Científica (DFG)

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Ao pretender internacionalizar-se, uma organização prepara-se, definitiva-mente, para se mostrar ao mundo. Com a instauração de sua Assessoria Científica Internacional, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FA-PEMIG) incrementa-se com o objetivo de aproximar os pesquisadores mineiros de alguns dos mais importantes centros de produção do conhecimento, sediados nos quatro cantos do planeta. Até o momento, a Fundação estabeleceu dez acordos com

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científico. “Some-se a isso o fato de ha-ver um lado subjetivo no desenvolvimen-to de um acordo. Afinal, tais negociações baseiam-se em confiança e compromisso mútuos”, ressalta Cerqueira.

Em seu projeto de internacionalização, a FAPEMIG tem buscado acordos com reno-mados centros de pesquisa e instituições de ensino superior, a exemplo de Fundação de Pesquisa Alemã (DFG) e Intercâmbio Acadê-mico Brasil-Alemanha (DAAD); Instituto Na-cional de Pesquisa em Informática e Automa-

Maurício Guilherme Silva Jr.

instituições estrangeiras (confira reporta-gens ao longo da revista).

“Além de facilitar o acesso a presti-giados centros de pesquisa e universida-des, buscamos fazer com que a ciência produzida em Minas Gerais seja conhecida em diversos países”, ressalta Flávia Perdi-gão Cerqueira, assessora científica inter-nacional da FAPEMIG. Como fruto de tal iniciativa, abrem-se importantes canais de comunicação, estimulados por instituições idôneas e com tradição em intercâmbio

De asas bem abertasAções da Assessoria Científica Internacional da FAPEMIG buscam aproximar instituições mineiras dos mais importantes centros de pesquisa do planeta

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MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 9

ção (Inria), na França, e das universidades de Purdue (EUA), Queensland (Austrália), Alber-ta (Canadá), e Imperial College (Inglaterra).

Namoro científicoPara que as metas de parcerias cientí-

ficas e/ou de inovação sejam efetivadas entre instituições de distintos países, é necessário, por vezes, que se cumpram etapas. Trata-se, em síntese, do período para identificação re-cíproca “de terreno”. Num primeiro momen-to, costuma-se elaborar cartas de intenção. “Trata-se de documento mais simples. Ao assiná-los, as instituições revelam que es-tão se conhecendo”, ressalta a assessora, ao lembrar que a parceria da FAPEMIG com o DFG, a Fundação Alemã de Pesquisa Cien-tífica, começou exatamente assim, em 2009.

A segunda etapa dos “relacionamen-tos” entre as organizações tem como cami-nho natural a assinatura de memorandos de entendimento, documentos que, geralmen-te, pregam benefícios mútuos e têm duração mais prolongada. Neste estágio, a confiança entre os parceiros já se revela consolidada. Por fim, como terceiro estágio do processo de intercâmbio científico e/ou de inovação, parte-se para a efetivação de um acordo de cooperação. “Nestes casos, trabalha-se sem quaisquer vestígios de desconfiança”, destaca Flávia Cerqueira.

Linhas de açãoA filosofia do processo de internacio-

nalização da FAPEMIG segue, em síntese, três vertentes de ação, todas desenvolvidas simultaneamente. Em primeiro lugar, está o objetivo de desenvolvimento de projetos e pesquisas conjuntas entre instituições mi-neiras e estrangeiras. Some-se a tal inicia-tiva o estímulo ao intercâmbio de estudan-tes, professores e PHDs e a organização de eventos – principalmente, workshops –, em parceria com entidades internacionais.

“As parcerias começam de diversos modos. Por vezes, somos procurados por representantes de instituições estran-geiras. Em outras ocasiões, a FAPEMIG aproxima-se de universidades e centros de pesquisa com quem o Governo de Minas Gerais tem conversado”, explica Flávia Cer-queira, ao ressaltar que o importante, para o início de um relacionamento institucional, é a vontade dos parceiros e o compromisso que surgirá a partir de tal proximidade: “Os pro-cessos de negociações, contudo, revelam-se longos. Para que um acordo seja assinado, são necessários muitos e-mails e encontros. Afinal, os dois lados buscam iniciativas que lhes garantam zonas de conforto”.

Daí a importância de a FAPEMIG inves-tir, permanentemente, em editais muitíssimo bem elaborados, que atraiam pesquisadores

aptos a preencher os requisitos de projetos que envolvam parceiros internacionais.

A AssessoriaDesde que foi criada, em 2009, a

Assessoria Científica Internacional da FA-PEMIG desenvolve uma série de iniciati-vas simultâneas. A área é responsável por gerenciar os acordos – assim como por manter seu histórico –, organizar missões internacionais e promover o que se pode chamar de “reconhecimento oficial do ter-reno”, no caso de parcerias em potencial. “Precisamos estar sempre atentos. Lida-mos, ao mesmo tempo, com prospecção de oportunidades e realização de eventos. Além disso, é preciso conhecer as necessidades dos parceiros”, conta Flávia Cerqueira.

Setores com a responsabilidade de buscar parcerias internacionais delineiam-se de acordo com a dimensão e a natureza da instituição que representam. “Além disso, as relações internacionais dizem do direito do outro. Daí a necessidade de pensar, de modo particular, as principais diferenças entre duas instituições”, explica Cerquei-ra, ao ressaltar o caráter generalista da Assessoria Científica Internacional criada pela FAPEMIG: “É preciso sempre mudar de estratégias de acordo com as demandas e as oportunidades”.

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À frente de uma das mais impor-tantes instituições de ensino superior do País, o professor Clélio Campolina Diniz conhece muito bem a importância, para o desenvolvimento da ciência, do cultivo de projetos e redes de contato nos qua-tro cantos do mundo. Pós-doutor pela University of Rudgers, nos Estados Uni-dos, o atual Reitor da Universidade Fe-deral de Minas Gerais (UFMG) discute, nesta entrevista, as dificuldades, trunfos e desafios rumo ao aprimoramento do processo de internacionalização da pes-quisa brasileira.

Durante os chamados “anos de chum-bo”, muitos pesquisadores saíram do Brasil rumo a universidades estrangei-ras. Já nos anos 1980, tais “cérebros” retornam e garantem novos contornos à ciência e à educação no País. Esse seria, realmente, o momento inicial do processo de “internacionalização” de nossa pesquisa?O retorno de tais pesquisadores foi impor-tante, mas não diria que tudo tenha come-çado apenas nos anos 1980. Já na década de 1960, muitos pesquisadores começam a voltar. Exemplo interessante aconteceu na Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp, que começou a operar em 1966 e teve política muito objetiva no sentido de atrair os pesquisadores brasileiros que estavam no exterior. Isso ocorreu, por exemplo, com os importantes físicos César Lattes e Rogério Cerqueira Leite. A rigor, os pesquisadores começam a retor-

Maurício Guilherme Silva Jr.

nar quando aqui são criadas as condições para o desenvolvimento da pesquisa. Isso se dá, exatamente, com a montagem da pós-graduação no País. O Conselho Na-cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su-perior (Capes) foram criados em 1952. Em sua fase inicial, contudo, investiam mais na capacitação de professores. A pós-graduação e a pesquisa brasileiras são fundamentalmente desenvolvidas a partir dos anos 1960.

Mas, na década de 1960, também hou-ve a reforma universitária...A reforma universitária foi autoritária, mas, ao mesmo tempo, trouxe ares de progresso. Como exemplo, cito o fim da cátedra, ação que interpreto como um grande avanço, já que o catedrático era o “dono da matéria”, a ponto de nome-ar quem bem desejasse como assisten-te. Antes disso, aqui na própria UFMG, recordo-me que, durante a gestão do professor Aluísio Pimenta, houve signi-ficativo processo de modernização. Os institutos centrais foram criados, à épo-ca, com o intuito de permitir maior com-plementaridade entre áreas do conheci-mento, o que auxiliaria a pesquisa. Até então, só se investia na formação profis-sional, em áreas como Direito, Medicina, Engenharia, Farmácia e Odontologia. A ciência era vista como mero subsídio a tal formação. Ao contrário, nos institutos centrais, buscava-se a pesquisa.

“Não podemos fechar as portas para o mundo”Em entrevista à Minas faz CiênCia, o reitor da UFMG, Clélio Campolina, comenta os primórdios e as perspectivas da produção científica brasileira no cenário internacional

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Investimento em pesquisa e interna-cionalização, portanto, precisam cami-nhar juntos? Sem pesquisa não há internacionalização. Além disso, não se pode dissociar pes-quisa de ensino. Hoje, grande parte dos estudos está vinculada aos programas de pós-graduação. Um bom professor, para avançar no conhecimento científico, não pode apenas transmitir o conhecimento disponível. Ele precisa ser capaz de gerar conhecimento novo. Se, na dissertação, reproduz-se um conhecimento já disponí-vel; na tese, prevê-se que o trabalho apre-sente nova contribuição. A pós-graduação – e, em especial, o doutorado – é o locus da pesquisa, onde há a conjugação de um professor e pesquisador experiente com um aluno já na “fronteira”, capaz de desen-volver temas próprios e inéditos.

Como o senhor analisa, hoje, o proces-so de internacionalização das universi-dades brasileiras?Estou muito à vontade para dizer que sem-pre batalhei, como integrante do Conse-lho Científico e Coordenador de Área da Capes, para a manutenção das bolsas de alunos brasileiros no exterior. Afinal, hou-ve um momento em que o Brasil enxugou tal processo. De 1950 a 1980, muitos es-tudantes foram fazer pós-graduação em outros países. Já nos anos 1990, à medi-da em que nossa pós-graduação crescia, houve a ideia, por parte dos órgãos brasi-leiros de fomento – principalmente, Capes e CNPq –, de que era muito caro enviar alunos para fora do País e, por isso, tal processo deveria ser reduzido. A meu ver, isso era um erro que sempre combati. O País é muito grande, precisa desenvolver pesquisas internamente, mas sem fechar as portas ao mundo. Nenhuma nação de-senvolvida se fecha. Vejo muitos pesquisa-dores americanos na Europa e vice-versa. Quanto aos países asiáticos, nem se fala: há muitos japoneses e coreanos pelo mun-do. A partir dos anos 1990, o Brasil limitou muito o envio de estudantes ao exterior, in-vestindo, apenas, no doutorado sanduíche, em que o pesquisador passa um período fora. É vital, porém, que uma cota de es-tudantes faça pós-graduação integral no

exterior, não só pelo conhecimento gerado, mas pela experiência de vida, pelo conví-vio com outras culturas. Assim como para evitar a endogenia, quando se começa a criar uma espécie de pensamento único, por meio de grupos que se realimentam. Nestes grupos, os padrões culturais e re-ferenciais são os mesmos, o que percebo como muito negativo.

E a validação de diplomas estrangei-ros, no Brasil, seria um problema a ser superado? Há dois lados para este problema. O mais grave é a grande quantidade de di-plomas falsos, que não merecem ser re-conhecidos. Quando estava no Conselho Técnico-Científico da Capes, avaliáva-mos que existiam cerca de 17 mil diplo-mas de mestrado e doutorado, no Brasil, que não podiam ser reconhecidos. Por outro lado, precisamos facilitar o que é correto, legítimo e não pode ficar parado em função da longa burocracia. Esse é um problema das universidades brasilei-ras. O Brasil precisa acelerar o processo de reconhecimento dos diplomas legíti-mos, adequados e corretos. Ao mesmo tempo, é vital, aumentar a fiscalização. Aliás, há cerca de cinco anos, a possi-bilidade de transformar a educação em serviço de livre comércio foi tema da Or-ganização Mundial do Comércio (OMC). Isso não pode acontecer. O País precisa preservar o controle sobre a educação, pois se trata dos fundamentos culturais da nação. Não se pode abrir a educação para o mercado.

Atualmente, o Brasil é mais respeita-do pela comunidade científica inter-nacional, em função do maior volume de patentes, de artigos publicados em renomados periódicos etc.? Sim. O Brasil avançou muito e temos, hoje, uma comunidade científica, nas diversas áreas do conhecimento, com padrões internacionais. E olha que, por muitos motivos, ainda não temos as condições de trabalho de muitas universidades es-trangeiras. As instituições brasileiras são relativamente novas e é preciso consolidar e institucionalizar a pesquisa. Além disso,

ainda há variações no comportamento go-vernamental. Nesse momento, contudo, vi-vemos um período favorável. A postura dos governos federais e estaduais, em relação às universidades, é muito positiva. Mas já houve momentos em que não era assim. Atualmente, nossa qualificada comunidade científica atrai pesquisadores estrangeiros para o Brasil e facilita nossa inserção na comunidade internacional. Estou seguro de que isto será ampliado.

Para tal ampliação, o que falta ao País? Enfrentamos várias dificuldades. Em pri-meiro lugar, embora tenha melhorado nos últimos anos, o recurso para pesquisa sempre foi limitado. Além disso, os padrões salariais para quem deseja dedicar-se à pesquisa permanecem insuficientes. Isso leva à cópia de algo complexo no mun-do: a mercantilização da academia. Há, hoje, autorizações formais para que você desenvolva atividades remuneradas fora da universidade, por exemplo. Acho im-portante tal flexibilidade, mas o ideal seria que o professor não dependesse de rendas externas. Digo isso para o padrão de vida normal de um docente, que, no mundo in-teiro, é modesto. O ideal é que o pesqui-sador não precisasse buscar subterfúgios ou alternativas. Há, ainda, graves deficiên-cias de infraestrutura, como recursos para laboratórios, instalações físicas etc., que, mais recentemente, estão sendo sanadas. A maior de todas as dificuldades, porém, é institucional. Trata-se das normas legais que, nas universidades, são as mesmas para todo o setor público. Há, por exem-plo, a lei das licitações, nº 8.666, que diz que tudo precisa ser licitado, pelo menor preço. A pesquisa, contudo, precisaria ter certa autonomia para eleger o que lhe é prioritário. Seriam necessários critérios científicos de avaliação, e não mercado-lógicos. Outro problema diz respeito à transferência de tecnologia, que enfrenta dificuldades formais. O Brasil produz muita ciência, mas pouca tecnologia.

Por que isso ocorre?Tal realidade relaciona-se ao fato de ter-mos base produtiva internacional. Coreia, Alemanha, Japão e Estados Unidos são

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MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 13

países que se industrializaram com base em empresas nacionais. O Brasil, ao con-trário, industrializou-se com forte presença de empresas estrangeiras, que não neces-sariamente têm interesse em desenvolver pesquisa no País. Esse é um desafio a ser enfrentado, para que se consiga fazer a ponte entre o conhecimento científico e a sua aplicação prática, seja de mercado, seja social ou pública. Hoje, os dois gran-des desafios para o avanço e a aplicação da ciência no Brasil resumem-se em melhorar o aparato jurídico-institucional – que pos-sui muitas proibições e pouca flexibilidade – e convencer o capital estrangeiro de que é preciso investir em pesquisa, transfor-mando-a em tecnologia. Em setores nos quais se pôde concentrar a pesquisa, de modo a desenvolver iniciativas com base em empresas nacionais, percebe-se suces-so absoluto.

A que setores, exatamente, o senhor se refere?A Petrobras é, hoje, um dos maiores suces-sos mundiais na exploração de petróleo em águas profundas. Tínhamos o monopólio estatal do petróleo, o que fez com que se con-centrasse pesquisa nessa área. A Embraer, que também era estatal, é uma empresa ex-tremamente bem sucedida do ponto de vista tecnológico e comercial. Na área agrária, o Brasil possui tecnologias que são fronteiras em todo o mundo. Isso porque a especifici-dade da tecnologia agrícola está muito vin-culada às condições climáticas do País. Em resumo, setores ligados ao petróleo, à avia-ção e à produção agrícola desenvolveram-se na ausência do capital estrangeiro. Não sou xenófobo em relação a tais recursos, mas, conforme comentei com o Ministro de Ci-ência e Tecnologia [Aloizio Mercadante], é preciso criar condições para que o capital es-trangeiro invista em pesquisa no Brasil. Nos Estados Unidos, hoje, boa parte das empre-sas que pesquisam é estrangeira. Entre Nova Iorque e Princeton há um corredor nas áreas de biotecnologia e farmacêutica, com estudos realizados por centros e escritórios ligados a grandes corporações europeias.

Com relação à UFMG, hoje uma das mais importantes universidades brasi-

leiras, quando se dá o início do proces-so de internacionalização? Na UFMG, a pesquisa é relativamente re-cente e remonta, como já ressaltei, a cria-ção dos institutos centrais, nos anos 1960 e 1970. O grande salto de nossa pesquisa, contudo, dá-se dos anos 1990 para cá, devido à consolidação da pós-graduação, ao desenvolvimento de muitos grupos de pesquisa e ao aumento do número de alunos de mestrado e doutorado. Impor-tante destacar, ainda, a disponibilidade de recursos via instituições de pesquisa, como CNPq, Capes e FAPEMIG. Não sou filiado a nenhum partido político, mas diria que o grande apoio ao ensino supe-rior e à pesquisa no Brasil vai se dar no governo Lula. Com relação à FAPEMIG, que andou claudicante no final dos anos 1980, o apoio veio a partir do governo Aécio Neves. Não resta dúvida de que mudou a cara da Fundação.

Neste sentido, de que modo o senhor avalia o atual investimento da FAPE-MIG em iniciativas de internacionali-zação?Acompanho a trajetória da FAPEMIG des-de o início. Fui presidente da Câmara de Ciências Sociais, no final da década de 1980, quando o Newton Cardoso queria acabar com a Fundação e lhe fizemos heroica resistência. Nos últimos anos, o governo apoiou a entidade, que, hoje, tem uma direção com fundamentação, visão e bagagem acadêmicas. No que se refere à internacionalização, percebo as ações como extremamente louváveis. É preciso, contudo, internacionalizar com qualidade. Não adianta bus-car o mundo sem cuidar do “andar de baixo”: há que se tratar muito bem da qualidade de nossos cur-sos, de nossa pós-graduação e de nossa pesquisa. A UFMG, por exemplo, acaba de oferecer um curso de mestrado e doutorado em Angola. Eis o nosso compromisso com o hemisfério sul do planeta. Precisamos manter nossa internacionalização “para cima” e a FAPEMIG possui importante papel a cumprir nesse sentido.

Segundo o senhor, em depoimento so-bre o programa Ciência sem fronteiras, “a UFMG receberá de 500 a mil bol-sas de um total previsto de 25 mil por ano”. Com números assim, não seria possível falar em mudança paradig-mática da ciência no Brasil? É verdade que tais investimentos permi-tem outros modos de pesquisa no País. Creio, porém, que a ideia de “mudança paradigmática” seja muito pesada. Já recebemos uma batelada de bolsas do CNPq e tentaremos responder da melhor forma possível. Mas não será simples. O programa Ciência sem fronteiras está em fase de implantação, precisa de ajustes, e daremos toda a contribuição necessária para tal. Importante lembrar que o progra-ma exige ampla articulação com as insti-tuições estrangeiras. Para distribuir 500 bolsas para intercâmbio, também preciso selecionar 500 alunos, encontrar univer-sidades que desejam recebê-los e saber de suas contrapartidas. Em seguida, terei que receber os alunos de volta e realizar a adaptação curricular. Sabemos que não é simples porque, na UFMG, já realizamos intercâmbio há bastante tempo, por meio de nossa Diretoria de Relações Interna-cionais. É preciso internacionalizar com alta qualidade em todo o processo.

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14 MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011

ITá

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Referência na área, Escola Politécnica

de Torino recebe estudantes e

pesquisadores da Uemg

Fabrício Marques

do design

O lugar

O Instituto Politéc

nico de Torino (Regio Politec

nico di

Torino) foi fundado em 1906 como uma instituição

,

mas suas

origens são mais

antigas. Remontam

a Es-

cola de A

plicação

para Engenheiro

s, fundada em

1859.

Seguindo o modelo dos grandes p

olitécnicos eu

ropeus

nos primeiro

s anos do séc

ulo XX, o Real Institu

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técnico de Tu

rim am

pliou sua ação em

várias

direções,

tecendo rela

ções tanto com o mundo cie

ntífico europeu,

quanto com a indústri

a local

e nacional.

Page 15: Especial Internacionalização

MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 15

“Em um acordo de cooperação entre instituições de dois países, como o que acontece entre a Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) e o Politecnico di Torino (PoliTO), todos ganham”, diz o reitor da Uemg, Dijon Moraes Júnior, sentado no sofá de sua sala, no oitavo an-dar do prédio Gerais, na Cidade Adminis-trativa, sede do governo mineiro, na ma-nhã do último dia de setembro. Dijon, que também é membro do Conselho Curador da FAPEMIG, prossegue: “Ganha o aluno,

ao adquirir experiência internacional; ganha a Uemg, que amplia

e efetiva seu pro-g r a m a

de mobilidade estudantil; e ganham a FAPEMIG e o governo estadual, que cum-prem sua missão de promover o ensino e a pesquisa em Minas Gerais”.

Dezesseis dias antes, em um fim de tarde extremamente quente, cinco alunos de graduação da Escola de Design, se-lecionados p a r a

o

c u m -primento do

Acordo de Dupla Titulação entre Brasil e

Itália, chegavam ao país de Dante Alighieri e eram apresen-

tados ao PoliTO, com cronograma de atividades acadêmicas previsto para inte-gralização em dois anos.

O acordo de Dupla Titulação foi as-sinado pela Uemg e pelo PoliTO em no-vembro de 2008, como parte do programa de cooperação do Estado de Minas Gerais com a Região de Piemonte, na Itália. Pelo PoliTO, todos os títulos outorgados se-rão Laurea in Design (Design di Prodotto), e pela Uemg dois alunos obterão título de bacharel em Design de Produto e os outros três receberão o título de bacharel em De-sign Gráfico.

Por que PoliTO e por que Design? A ação é também um resultado de uma exten-sa parceria entre o Brasil e a Itália e baseia--se em acordos internacionais assinados entre o Estado

de Minas Gerais e a re-

gião de Piemonte, a partir de linhas gerais

de desenvolvimento entre os países, especificamente formação

profissional e cooperação cultural. “A escolha sobre o Design como área do co-nhecimento faz parte de estratégia maior do Governo. Na época, o então governador Aécio Neves firmou acordo com a Itália, e, nesse contexto, Uemg e Torino puderam realizar as parcerias”, observa o reitor.

Gabriela Cristina de Souza Silva, 22 anos, graduanda do 7º período de Design Gráfico na Universidade do Estado de Mi-nas Gerais, do 6º período de Comunicação Social da UFMG e do primeiro período de Ecodesign no Politecnico di Torino, é uma das selecionadas que estão em Turim, ao lado de Gabriel Figueiredo, Márcio Pinho, Thayana Meneses e Ravi Bellard. Ela co-menta o impacto da experiência: “Para nós tem sido uma grande honra ser os primeiros alunos da graduação da Escola de Design da Uemg a participar de inter-câmbios (algo que já é corriqueiro em muitas universidades por todo o País e que pudemos comprovar ao nos encontrarmos com muitos brasileiros em Torino e univer-sidades que possuem até 17 alunos em

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intercâmbio). E podemos dizer, em nome dos coordenadores, que se tratou de um processo longo e difícil, mas que nos ren-derá bons frutos”.

Ainda no Brasil, os estudantes par-ticiparam de um projeto de pesquisa de-nominado Design e Integração Competiti-va no Território da Estrada Real, que durou um pouco mais de um ano e cujo objetivo principal era o de utilizar os conhecimen-tos relativos à interface entre Design e Ter-ritório, requisitos ambientais, Ecodesign, para discutir e desenvolver ações que con-tribuam para o Território da Estrada Real de forma ampla. “A ideia é pensar em ações de modo sistêmico que possam levar ao desenvolvimento e à sustentabilidade so-cial, cultural, ambiental e econômica dessa região, que cada vez mais vem sendo vi-sada em termos turísticos, mas que ainda carece de fazê-lo de forma mais integrada ao seu contexto, à sua comunidade, à sua história”, diz Gabriela.

A estudante ressalta que a parceria com a instituição italiana já se fazia pre-sente nessa pesquisa. “Eles possuem um grande knowhow nesse campo e várias iniciativas semelhantes que contam com a visão do designer, como os ecomuseus, rotas do vinho e do queijo”.

Sobre esses projetos, o que os alunos fizeram, primeiramente, foi um diagnóstico de pontos críticos/problemáticos e os potenciais locais. A partir daí propuseram uma série de

projetos que possam contribuir para a região. “A nossa vinda para o PoliTO tem como ob-jetivo aprimorar nosso conhecimento no que concerne a essa visão projetual de modo sis-têmico e ao fim propor uma ação que possa de fato ser aplicada à Estrada Real”.

Depois das primeiras aulas, Gabriela percebeu que terá contato com um apro-fundamento muito detalhado nesse tipo de projetação. “Estamos em uma Laurea Ma-gistrale em Ecodesign, é uma especializa-ção. Uma experiência bem diferente do que vemos em graduação. O mais interessante é que, na prática, é como uma continuida-de do projeto de pesquisa em que traba-lhamos no Brasil, como se estivéssemos subindo um degrau a mais”.

A base para o projeto final dos gra-duandos é a pesquisa da Estrada Real, que concerne a diferentes aspectos do território, seja no âmbito da tipografia, do design de informação, de novas tecnolo-gias, espaços museográficos. “Mas ainda é cedo para especificar do que se tratará especificamente, mesmo porque deve tra-tar do ambiente com um todo, de modo sistêmico. Estamos aprendendo a pensar os territórios de modo amplo”, avalia.

Para Gabriela, um detalhe signifi-cativo despertou seu interesse, pelo fato de, além de ser aluna de Design Gráfico, também estudar Comunicação Social, como ela mesma explica: “o que mais me chama atenção em meio a tudo que vimos, diagnosticamos e projetamos é a impor-tância de se comunicar o que se projeta. Não basta ter um projeto elaborado, com-patível com requisitos ambientais, sociais, econômicos e culturais se aqueles que se deparam com esse projeto não são capazes de perceber isso. Perde-se a oportunidade de educação e de perpetuação dessa ação”.

Esse é um ponto que ela espera po-der trabalhar bastante, da importância de comunicar do modo mais adequado, para todos, as soluções propostas para um am-biente (tanto aqueles que governam, que vivem, que trabalham ou que visitam esse ambiente). “O que é algo bem amplo, já que essa comunicação pode ser pelo tipo de material utilizado, pela forma como é escrita, pela iluminação, e inúmeras ou-tras formas que devem ser trabalhadas de modo coordenado”, ressalta.

POR DENTRODO PIEmONTEO Piemonte é uma região situada no norte da Itália, com 4,3 millhões de ha-bitantes. É composto pelas seguintes províncias: Alessandria, Asti, Biella, Cuneo, Novara, Turim, Verbano Cusio Ossola e Vercelli. Tem limites com a França, o Valle d’Aosta, Suíça e Lom-bardia.

POR DENTRODE TuRImTurim (Torino em italiano e Turin em piemontês) é uma comuna italiana, capital e maior cidade da região do Piemonte, e a quarta maior cidade do país, com uma população de 910.188 habitantes (2009), estando atrás ape-nas de Roma, Milão e Nápoles. Situada na extremidade ocidental da planície do rio Pó, Turim é um dos principais centros de edição, artes, erudição e moda da Itália. Seus principais edifí-cios datam principalmente dos séculos XVII e XVIII. A cidade é sede da Fiat.

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O reitor da Uemg, Dijon Moraes Júnior

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Em destaque, o Doutorado Além do acordo de Dupla Titulação,

outro destaque do diálogo entre Minas e Piemonte é o Doutorado de Pesquisa em Sis-tema de Produção e Desenho Industrial (De-sign), que, de acordo com o reitor da Uemg, Dijon Morais Júnior, foi inovador em Minas: “foi a primeira vez que a FAPEMIG concedeu bolsa de doutorado para um programa no exterior. Foram resolvidos também três di-ficuldades que os professores normalmente enfrentavam: conseguir a bolsa, conseguir a vaga na faculdade e continuar recebendo pela universidade. Graças à nossa ação estraté-gica estes problemas foram resolvidos pois nosso professor ganha vaga, bolsa e mantém o seu salário integral”.

O primeiro professor contemplado com o intercâmbio nesse programa foi Paulo Miranda, que chegou a Torino em fevereiro de 2009. Atualmente encontra-se na fase de conclusão de sua tese. A provável data de defesa será marcada pelo Senado Acadê-mico/Escola de Doutorado e deve acontecer entre os meses de fevereiro e abril de 2012. A duração da bolsa segue a duração prevista para o curso: três anos, prorrogáveis por no máximo um ano, mediante justificativa do bolsista e parecer do professor orientador e dos professores coordenadores (da Uemg e PoliTO) responsáveis pela parte acadêmica do convênio entre as instituições.

Miranda trabalha com a pesquisa “Exploração mineral, homem e ambiente: relações sistêmicas do design – fatores hu-manos, sociais e estratégicos na produção artesanal em pedra sabão” (nome provisó-rio), sob a orientação dos professores Luigi Bistagnino e Claudio Germak. “Estar junto ao PoliTO é fundamental. O know how e

as pesquisas desenvolvidas pelo Departa-mento de Projetação Arquitetônica e Design Industrial (Dipradi) propiciam uma vivência aprofundada e dinâmica a respeito do meu tema de pesquisa (Metodologia do Design Sistêmico), amplamente investigada e tra-balhada por eles. Estar aqui é acima de tudo conhecer, aprender e experimentar”, afirma.

O objetivo do trabalho é reconhecer, através da metodologia do design sistê-mico, as relações da cadeia de exploração mineral no contexto territorial e suas con-sequências na produção de artesanato, em particular no polo produtor de pedra-sabão das regiões de Ouro Preto, Mariana e Catas Altas da Noruega, em Minas Gerais.

“A estrutura exploratória existente, bem como as consequências atuais e prin-cipalmente futuras a propósito dos fatores humanos, sociais, ambientais e econômi-cos, são os pontos particularmente tratados nesse estudo. O objetivo específico tem o foco na exploração do esteatito, conhecido como pedra-sabão ou ainda pedra-talco, bastante difundido na região mineira e reconhecida como um bem cultural deste território”, explica o pesquisador.

Design e Território

Outro professor que também parti-cipa do programa de Doutorado é Mar-celo Amianti, em Torino desde março de 2010. Conforme o cronograma de traba-lho, ele deve terminar o período letivo em janeiro de 2013 e defender a tese até três meses depois.

Seu projeto está em fase de desen-volvimento e sofreu muitas modificações desde sua chegada. “Até a conclusão da pesquisa e da fase de análise dos dados ob-

tidos o projeto passará por várias revisões, mas o título provisório, Estudo da produção científica dos cursos de Pós-graduação em Design de Produto (Mestrado) das Univer-sidades públicas na União Europeia e no Mercosul, dá uma ideia da abrangência do tema que está sendo investigado”.

Esta pesquisa tem como objetivo ve-rificar a contribuição e a aplicação da pro-dução científica desenvolvida nos Cursos Mestrado em Design de Produto para a região em que se situam, seja para a socie-dade, a comunidade ou para a indústria, as-sim como para com a própria comunidade acadêmica em questão, tomando como re-ferência o conceito de “Design e Território”.

Além de Paulo Miranda e Marcelo Amianti, também cursa doutorado em PoliTO a professora Rosângela Miriam Mendonça, que chegou à Itália em janeiro deste ano, e a professora Ana Luiza Cirqueira Freitas, recém-selecionada e que inicia seus estudos em janeiro de 2012.

Viver em PiemonteEstudar fora do País traz poucas di-

ficuldades, porém, significativas, na ava-liação do pesquisador Marcelo Amianti. A primeira delas é a fluência em um idioma estrangeiro. “Apesar do período que me dediquei à língua italiana no Brasil, percebo que o verdadeiro aprendizado somente se dá sob uma imersão completa, no próprio país de origem”. Amianti também cita a di-ficuldade de adaptação ao clima, bastante diverso do nosso, onde o inverno é rigoroso e o verão muito quente. Ambas as estações com duração aproximada de quatro meses.

“Porém, existe uma dificuldade que só se percebe com o passar dos dias e ten-

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O pesquisador Paulo Miranda, em TurimUnidade Central do Politecnico di Torino

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de a ficar mais intensa a cada dia que pas-sa. É a falta que sinto do trabalho desen-volvido junto aos colegas de trabalho da Uemg, da hospitalidade e do calor humano do brasileiro e a saudade dos amigos e dos familiares que deixei”, diz.

De positivo, Amianti destaca o se-guinte aspecto: “Percebe-se na população italiana um orgulho intenso pelas tradições, pelas instituições e pela cultura alimentar. Cada região, bastante peculiar e diversa das outras, preserva e cultua sua própria história. O produto ‘made in Italy’ é muito valorizado pela sociedade, o que estimula o seu melhoramento contínuo”.

Já Paulo Miranda também encontrou as dificuldades comuns a qualquer estudan-te de doutorado: acertar os passos com a língua italiana (“o que foi muito prazeroso”), aprender a lidar com uma cultura diferente e respeitar seus limites. “Talvez o mais signi-ficativo seja o fato de deixar um pedaço do meu trabalho aí no Brasil. Temos que renun-ciar a várias coisas para estar aqui e fazer um bom trabalho: ficar longe dos familiares, deixar sua casa, seus bens, estar fora da vida universitária da Uemg (instituição com que tenho grandes laços), não acompanhar meus alunos de perto (como um sentimento de paternidade) no cotidiano da universida-de. Enfim, saudades!”

Em síntese, Miranda afirma que essa é uma experiência de muita responsabi-lidade, que impõe uma dedicação intensa e muitas vezes solitária, pois depende so-mente de si mesmo a transformação des-

se conhecimento absorvido. É um grande sacrifício e ao mesmo tempo um prazer. “O ponto positivo de tudo isso é a expe-riência ímpar, única, de estar enxergando através de um outro e ao mesmo tempo de vários pontos de vista. Ver nosso país com esse olhar, ‘de fora da caixa’, faz com que acreditemos no nosso potencial, motiva, faz com que percebamos mais claramente nossas virtudes e nossas deficiências”.

“Além de realçar o conhecimento e alargar a experiência, principalmente no cam-po internacional, a experiência vivenciada no PoliTO motiva-me em novas linhas de pes-quisa com o desejo de aplicar e difundir es-ses conhecimentos dentro da Uemg. Quando voltar, pretendo direcionar a experiência ad-quirida em prática nas minhas atividades na Escola de Design da Uemg. Dar continuidade à minha linha de pesquisa, que acredito ser muito relevante, e fazer a minha contribuição social como pesquisador e professor, trans-ferindo o conhecimento, praticando e experi-mentando os novos desafios e necessidades no nosso território”.

Dia a dia intensoMarcelo Amianti diz que seu cotidiano

não é muito diverso daquele que habitual-mente vivenciava no Brasil. “Durante a sema-na mantenho um horário regular de trabalho no Departamento onde desenvolvo meu projeto. A diferença consiste na carga de tra-balho e na quantidade de tarefas necessárias ao objetivo do Curso de Doutorado, que são grandes. As disciplinas são ministradas em

Informações gerais sobre o Convênio com Termo de Cooperação Técnica: Duplo Título e Doutorado. Começou em 2008.

Qual o objetivo daDupla Titulação?Ampliar e aprimorar a pesquisa, assim

como também validar o currículo internacio-nalmente. O apoio prevê ainda um acordo com as prefeituras das cidades participan-tes do Projeto Estrada Real, que permita o aproveitamento dos profissionais formados por pelo menos um ano, para continuidade e implementação das atividades identificadas durante o desenvolvimento do trabalho. Após

a conclusão das atividades da primeira tur-ma, a FAPEMIG deverá avaliar o sucesso do programa e sua possível renovação.

Quanto ao Doutorado,qual a contrapartida que oprofessor oferecepara a sociedade?O professor assina o Termo de

Compromisso que, após o retorno do curso, permanecerá na instituição por pelo menos o dobro do tempo de dura-ção do afastamento, em meses, no regi-me de trabalho semanal que for determi-nado pela instituição.PE

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Em 2008 a UEMG e o Politecnico di Torino, com o apoio da FAPEMIG, as-sinaram convênio de Dupla Titulação, que faz parte do Programa de Coope-ração do Estado de Minas Gerais com a região de Piemonte. O acordo per-mite estudantes brasileiros de Design ir para Itália e usarem por dois anos a graduação com diploma válido no Brasil e na Itália. Este ano foram para PoliTO cinco alunos do curso de De-sign, que vão terminar a graduação na escola em dois anos. A FAPEMIG for-nece um suporte financeiro de R$ 425 mil reais divididos entre a mensalidade da escola italiana, seguro saúde, auxí-lio instalação e passagem de ida e volta para os cinco estudantes.

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horários e locais diversos, espalhadas pelas várias unidades do PoliTO em Torino”.

Com o pouco tempo que resta, pro-cura conhecer bem a cidade onde vive. Aos finais de semana, lembra Amianti, Torino oferece uma quantidade conside-rável de locais para visitação, como mu-seus, palácios, mostras e apresentações de arte e cultura em geral. “A cidade tem aproximadamente 900 mil habitantes e um simples passeio pelas ruas e aveni-das se torna um programa bastante rico, em função de sua arquitetura particular. O sistema de transporte público é bastante eficiente e facilita o deslocamento e o acesso por toda a cidade”.

A poucos meses de defender sua tese, Miranda lembra que, no início, quando che-gou, o cotidiano era bastante complexo no que diz respeito à cultura. “Era uma espécie de bombardeamento de informações, um plano um tanto quanto caótico, pois era necessário encarar uma realidade diferente, tanto cultural quanto organizacionalmente. Necessitei de algumas semanas para enten-der como tudo funcionava; a universidade, o modo de lecionar e frequentar as discipli-nas, comer etc”.

Além de cursar as disciplinas, ele teve a oportunidade de participar academi-camente, como convidado em duas disci-plinas do curso de graduação em Design Industrial do PoliTO, uma na área projetual e outra na área de materiais, em que pôde confrontar tanto a qualidade quanto a didá-tica e o nível dos alunos. “Depois, já ao fim do segundo ano, o trabalho se concentrou no meu tema de pesquisa e ali fui funda-mentando gradativamente os argumentos principais. Atualmente concentro todo o meu tempo na conclusão do meu trabalho, e como de praxe, ‘os dias são longos e as noites curtas’, é preciso muito empenho”.

Eu vou me adaptarRecém-chegada, a estudante Ga-

briela Cristina Silva tenta se adaptar aos costumes locais. “Por exemplo, aqui não existe horário comercial comum a todos os comerciantes no Brasil. Cada estabelecimento tem seu próprio horário e a maioria deles fecha para almoço ou determinado dia simplesmente não abre. Em termos de burocracia, muitos ór-gãos, dentro da própria universidade, só

DOuTORADO POLITO• Nome técnico: Doutorado de Pesquisa em Sistema de Produção e Desenho

Industrial (Design).• O acordo inicial previa que PoliTO se comprometia a reservar para os anos de 2009,

2010 e 2011 nove vagas (três por ano), a fim de que professores da Uemg possam seguir o percurso formativo para a obtenção do título de Doutor em Pesquisa (Ph.D) na Itália.

• Foi assinado um Termo Aditivo em 2010 com o objetivo de ampliar o convênio para os anos de 2012, 2013 e 2014, garantindo também três vagas anualmente.

funcionam pela manhã, durante horários em que estamos em aula”.

De positivo, ela destaca, entre ou-tros, o fato de que a universidade tem grande experiência com estudantes es-trangeiros e os auxilia em tudo o que se refere a burocracias locais, regulamentos e leis necessárias. “Oferece também cur-sos de língua gratuitos, já somos matricu-lados automaticamente no curso da língua italiana, no qual mais do que aprender o italiano conhecemos muito sobre cultura geral, por convivermos e escutarmos pes-soas de todas as partes do mundo”.

Sua rotina diária tem sido bem corrida. “Aqui parece que o tempo passa mais rápido do que devia e que temos menos do que 24h para fazer as coisas”, afirma. Suas aulas, as-sim como de todos os cursos relativos ao design, são na nova sede da universidade, em Mirafiori, onde se encontra o centro de design da cidade. “O prédio da universida-de é, inclusive, dentro das fábricas da Fiat, muito bonito, mas muito distante de tudo e de todos. Aliás no primeiro dia de aula fomos visitados pelo prefeito de Torino, o reitor de PoliTO e um dos diretores da Fiat”.

SObRE O PROJETO ESTRADA REALO Centro Minas Design (CMD) e a Uemg desenvolvem o projeto “Design e Inte-

gração Competitiva do Território”, com o objetivo de construir uma estratégia compe-titiva para a oferta de produtos e serviços das empresas da região. Para esse empre-endimento, foram selecionadas seis cidades e um distrito, que fazem parte do trajeto Estrada Real (Coronel Xavier Chaves, Entre Rios de Minas, Lagoa Dourada, Prados e seu distrito Bichinho, Resende Costa e São Brás do Suaçuí).

Os resultados pretendidos são desenvolvimentos de protótipos virtuais, sinali-zação interna e externa, serviços e marcas para empresas de cada cidade voltada para a melhora da competitividade local. O projeto abarca o acordo de Dupla Titulação, assinado por Uemg e PoliTO, e conta com recursos da FAPEMIG.

Foto: Arquivo pessoal / Paulo Miranda

O majestoso Castello del Vallentino, construído na metade do século XVII

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Nord-Pas de Calais, uma das 26 regiões administrativas da França, é composta pelos distritos “Norte” e do “Estreito de Calé” (Pas de Ca-lais). Sua capital é a cidade de Lille, a maior da região, onde funciona a prefeitura do distrito Norte. Na ci-dade de Arras fica a direção de Pas de Calais. Na França, uma região é administrativamente semelhante aos nossos Estados. O norte da França é composto também pelas regiões da Normandia e da Picardia.

conhecimentocom sotaque francês

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Marcus Vinicius dos Santos

Projetos de cooperação com Nord-Pas de Calais estimulam desenvolvimento em diversas áreas, como Tecnologia da Informação, Mineração, saúde e Materiais

Até pouco tempo atrás, a tradição que marcava a região francesa de Nord-Pas de Calais era o extrativismo mineral e as fábricas, grande parte delas de siderurgia, de mecânica pesada e têxtil. A partir de uma série de investimentos, a opção do governo da região foi valorizar uma outra tradição, a pesquisa e o ensino. Na mesma região, por exemplo, funciona o Instituto Louis Pasteur, onde foi descoberta a vacina BCG, dentre outros feitos. É lá também que fica a terceira maior universidade daquele país, a Lille do Norte. Ao lado do desenvolvimento tecnoló-gico e científico, o turismo complementa as bases do crescimento local.

A tradição e a expertise de Nord-Pas de Calais na área da mineração sustentável e recuperação de áreas degradadas foram os pontos que inicialmente potencializa-ram os primeiros contatos com o Governo estadual de Minas. Segundo Priscila Go-mes, coordenadora de Parcerias Nacionais e Internacionais da Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais (Sectes), atualmente este assunto é um dos principais na agenda de sua pasta. “O desenvolvimento científico e tecnológico é um dos motores do desen-volvimento econômico de um Estado, re-gião ou País”, dimensiona.

A subchefe da Assessoria de Relações Internacionais da Secretaria-Geral da Go-vernadoria, Chyara Sales Pereira, vai além. “O processo de internacionalização é uma importante estratégia de promoção da com-petitividade do território de Minas Gerais na busca pela diversificação da economia e pela inserção internacional”, destaca. Minas trabalha com uma modalidade de relação descentralizada, feita entre estados, cidades, províncias ou regiões que apresentem visí-veis semelhanças em suas características. “O estabelecimento de uma parceria internacio-nal é longo e precisa ser desta forma para ser eficiente”, garante Priscila Gomes. Para ela, só com o relacionamento é possível conquis-tar confiança mútua, identificar similaridades e o que pode ser feito conjuntamente. “Desta forma se encontram as condições para am-pliar o escopo da cooperação”, diz.

A cooperação com a região francesa é produto de metodologia conhecida como “Rede de Articulação”. Ou seja, “uma ferra-

menta que cumpre o objetivo de coordenar e assessorar as operações internacionais realizadas pelas unidades da administra-ção do Governo com vistas à atração de investimentos em projetos que promovam a internacionalização do território parcei-ro”, explica. Considerando as semelhan-ças com Minas Gerais, a cooperação com a região se destaca dentre todos os países europeus com os quais o Estado mantém diálogo. Segundo Chyara Pereira, este relacionamento é modelo: “O mais trans-versal e interdisciplinar. Por isso, envolve maior número de unidades da administra-ção direta e indireta, e tem maior diversi-dade de temas de ação”, avalia. Isso, sob o lema de gerar recursos gastando o mínimo possível. Recurso entendido não apenas como valor pecuniário, mas “todo conhe-cimento ou oportunidade de conhecimento que possa ser recebido ou transferido para um parceiro de ambas as partes”.

Ela destaca que, além de um rela-cionamento mais próximo com o governo francês, técnicos e especialistas envol-vidos, o apoio prestado pela Embaixada da França no Brasil, especialmente pelo cônsul honorário da França em Minas Gerais, Manoel Bernardes, e pelo adido de cooperação e ação cultural da Embaixada, Serge Borg, são imprescindíveis para que a iniciativa francesa já caminhe para uma segunda fase.

Acordos com a regiãoSão dois os projetos de cooperação

internacional com a região de Nord-Pas de Calais em andamento. O Inria e a FAPE-MIG já começam a estruturar seu terceiro edital, sendo que o segundo foi renovado agora, em 2011, por mais três anos. Um outro projeto, o Pres/Arcus, ainda está em fase de implantação, mas bastante adian-tado. Ele deverá ser assinado tão logo o governo francês aprove o projeto que lhe foi submetido pelo Pres - entidade que representa as universidades francesas -, e pelo governo de Minas, por meio da FAPE-MIG. Em ambos os projetos cada uma das partes se responsabiliza por uma parcela do financiamento. Apesar de envolverem a mesma região da França, os dois acordos são completamente distintos.

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O InriaO diálogo entre a FAPEMIG e o Insti-

tuto Nacional de Pesquisas em Informática e automação (Inria), teve início em 2007, quando o diretor de Pesquisas do instituto, Pierre Deransart, apresentou uma proposta à diretoria da Fundação. A prospecção da parceira foi ação da Rede de Articulação Internacional da, então, Superintendência de Relações Internacionais (atualmente Assessoria de Relações Internacionais) da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede). Na ocasião foram or-ganizadas reuniões pela Superintendência, da qual participaram Sandra Fernandes, da equipe do governo de Nord-Pas de Calais, e também técnicos de vários órgãos - de diferentes instâncias -, públicos e priva-dos, ligados ao Desenvolvimento, Meio Ambiente, Saúde e Cultura.

O primeiro passo foi a assinatura, em 2008, de um Acordo de Irmandade entre Minas e Nord-Pas de Calais. No documento, Minas e região francesa re-conhecem suas semelhanças e explicitam sua intenção de cooperar mutuamente. O passo seguinte foi dado já em março de 2009, quando foi assinado um Acordo de Cooperação. Ele estabelecia como grande objetivo “estimular o desenvolvimento de

sagens aéreas e seguro saúde, além de visitas técnicas de até 15 dias, incluindo o financiamento de diárias, passagens aé-reas e seguro-saúde. Cada projeto poderá realizar até duas missões por ano e apenas o coordenador da pesquisa poderá realizar missões em anos consecutivos.

O programa Pres/ArcusUm desses caminhos levou os di-

rigentes do Polo de Pesquisa e Ensino Superior (Pres), que representa várias das Universidades da região de Nord-Pas de Calais, a procurar o Governo de Minas Ge-rais para viabilizar um acordo. Uma possi-bilidade para isso era o programa de mobi-lidade acadêmica e científica do Ministério de Relações Exteriores da França, o Arcus, “Ação entre Regiões para Cooperação Uni-versitária e Científica”, responsável por fomentar a cooperação entre regiões fran-cesas e outras regiões do mundo com as quais já tenha algum relacionamento. Se a proposta feita for aprovada, o governo fran-cês autoriza um financiamento especial.

Este ano, o governo da França lan-çou o nome de três países para que sejam feitas propostas de iniciativas com o apoio do Arcus, dentre eles o Brasil. Com base nisso os governantes de Nord-Pas de Calais assinaram Carta de Intenção, em fevereiro de 2011, estabelecendo os ter-mos de um futuro acordo. Em resumo, o documento define quatro áreas de atuação: Saúde, Materiais (engenharia, nanotec-nologia, química, física etc.), Territórios e Área Transversal (intercâmbio acadêmico, língua, troca cultural), e estabelece o valor de quase mil euros para o programa. Esse valor seria financiado como contrapartida, pelo Governo Francês (50%), pelo Conse-lho Regional (governo local) de Nord-Pas de Calais (25%), e pelo Governo de Minas, por meio da FAPEMIG (25%), que disponi-bilizaria cerca de 225 mil euros para a ini-ciativa. A verba mineira vem da alíquota de 1% da arrecadação de impostos do Estado.

Agora, toda a documentação apresen-tada ao Arcus está sendo avaliada pelo Mi-nistério das Relações Exteriores da França, que deve se pronunciar até o final de 2011. Sendo aprovados os projetos em Minas, após o processo necessário, a FAPEMIG

novas tecnologias e o aperfeiçoamento de pós-graduandos e docentes na área de Tecnologia da Informação e Comuni-cação”, e determinava suas áreas de atu-ação: “Capacitação profissional”; “Polos de Competitividade e Excelência”, onde se enquadra a cooperação na área de mine-ração e recuperação de áreas degradadas; “Agricultura e questões ligadas aos agro-carburantes” e “Desenvolvimento cultural e social”. No mesmo ano foi realizado o “Fó-rum dos Atores”, marco do início das ativi-dades práticas e que reuniu pesquisadores das duas nacionalidades interessados.

Os dois editais publicados, em 2009 e em 2010, eram para propostas científicas e tecnológicas nas áreas de Ciências e Tec-nologias de Informação e Comunicação, elaboradas em conjunto por pesquisadores mineiros e franceses, apresentadas simul-taneamente à FAPEMIG, pelo coordenador de Minas e, ao Inria, pelo coordenador da equipe francesa. O edital permite, excep-cionalmente, o custeio de itens relacio-nados a missões de estudo ou trabalho. Podem ser financiadas, por exemplo, bol-sas de doutorado sanduíche, com duração de três meses para estudantes brasileiros integrantes da equipe técnica do projeto, incluindo bolsa, auxílio instalação, pas-

Em agosto de 2011 uma comitiva de auditores da Unesco visitou o Geopark mineiro para avaliar pos-sibilidade de reconhecimento da área. O sítio arqueológico de Pedra Pintada, por exemplo, localizado em área particular, preserva pinturas rupestres de mais de 6 mil anos

www.geoparkquadrilatero.org

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ficará autorizada a abrir editais convidando os pesquisadores - das Universidades mi-neiras - a submeter seus projetos.

O futuroNo Brasil, várias fundações de am-

paro à pesquisa e universidades firmaram acordos de cooperação com a França. Com o objetivo de estreitar laços e ir além nas iniciativas de cooperação científica, com apoio da Embaixada da França, o Conse-lho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap) organizou no último mês de outubro uma comitiva que visitou, por uma semana, as principais organizações francesas, e com as quais as fundações de amparo à pesquisa brasilei-ras têm acordo de cooperação.

Mario Neto Borges, presidente da FAPEMIG e da Confap, integrou o grupo. Além do Inria, a programação incluía visi-tas ao Centro Nacional de Pesquisas Cien-tíficas (CNRS), Universidade Lille Norte da França, Instituto de Pesquisa em Ciências e Tecnologias para o Meio Ambiente (Ce-magref) e ao Instituto Superior de Aero-náutica e Espaço (Ensica). Dá o “tom” da visita um artigo publicado em junho deste ano, do diretor científico da Fapesp, Car-los Henrique de Brito Cruz: “Um dos mais importantes desafios para a ciência brasi-leira nesta segunda década do século XXI é buscar maior impacto mundial para o conhecimento criado no país”.

Atualmente já são realizadas cerca de cinco missões técnicas e institucionais francesas por ano, além das missões bra-sileiras que vão à França e da participação em encontros de interação entre os agentes técnicos e governamentais da cooperação. “E essas relações já estão se estendendo para além da França, alcançando também seus parceiros”, relata Chyara Pereira, ci-tando um relacionamento inicial com a Re-gião de Matam, no Senegal, país africano de língua francesa, e que se viabilizou por intermédio de Nord-Pas de Calais.

De mineração de dados ao monitoramento de minas

Os resultados de todo esse trabalho de muitos já começa a aparecer. Para o professor associado Wagner Meira Júnior,

da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que coordena o estudo “Minera-ção de Dados: Incorporando Modelos de Conhecimentos a Algoritmos de Minera-ção de Dados Escaláveis”, selecionado nos editais de Cooperação FAPEMIG/Inria 2009 e 2010, o apoio abriu portas. Ou me-lhor, nova frente de trabalho nas pesquisas.

“Em particular, nos familiarizamos com modelos formais de representação de conhecimento”, salienta, dizendo que isso tornou os algoritmos de mineração de dados desenvolvidos mais eficazes. “Mais ainda, através da paralelização dessas téc-nicas, conseguimos lidar com modelos maiores e de maior abrangência”, observa Meira Júnior, destacando a parceria com o laboratório Loria, localizado em Nancy, na região de Nord-Pas de Calais.

Wagner Júnior, que é PhD em Ciência da Computação pela University of Roches-ter e também coordenador da linha de pes-quisa em “Descoberta do Conhecimento”, do Instituto Nacional de Ciência e Tecno-logia para a Web, destaca como resultados práticos já alcançados a publicação de tra-balhos nas novas linhas iniciadas e a visita que recebe em seu laboratório, por pelo menos um ano, de um pós-doutor francês, formado no Instituto Nacional de Pesquisas em informática e Automação (Inria).

Ciminelli, do Polo de Excelência Mineral e Metalúrgico, coleciona resultados positivos

Pedro Homem

Crédito: Ilana Lansky / 1° lugar concurso Geopark Quadrilátero de Fotografia

Serra da Calçada, entre Nova Lima e Brumadinho - é preciso encontraro equilíbrio entre exploração mineral, imobiliária e meio ambiente

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Muito chão...O engenheiro Renato Ciminelli,

gerente executivo do Polo de Excelência Mineral e Metalúrgico da Sectes, é um pioneiro na cooperação internacional. Ele está envolvido desde o Fórum de Atores, encontro realizado em 2009 para promover a integração entre os interessados em coo-peração internacional, e tornou-se um dos seus principais apoiadores. Com experi-ência profissional em outros países, como Austrália, Franca, Estados Unidos, Canadá, Portugal e Chile, o engenheiro químico es-

Alemanha”, destaca, lembrando que a co-operação com a Franca no escopo da mi-neração está inserida nos temas sustenta-bilidade, reconversão tecnológica e urbana de territórios mineradores, diversificação econômica e industrial de territórios, pla-nejamento urbano e territorial.

Como resultados efetivos alcança-dos pelo Polo de Excelência, Ciminelli conta que em 2010 e 2011 foram realiza-das diversas missões e eventos científicos e técnicos, em Minas Gerais e na França, além de ter sido assinada cooperação com o francês CD2e, um centro de espe-cialistas voltado para o desenvolvimento e a transferência de inteligência e tecno-logias direcionadas para atrair negócios ambientais para regiões mineradoras de Minas, como estratégia de diversificação econômica destes territórios. A aplicação piloto dos resultados deste acordo será nos municípios que constituem o Con-sórcio Público de Desenvolvimento do Alto do Paraopeba (Codap). Dentre as possibilidades estão ações voltadas para a recuperação de commodities metálicas, metais preciosos, metais nobres e terras raras de circuitos eletrônicos reciclados – a chamada “Mina Urbana”.

Outro resultado envolve cooperação entre o Geopark Quadrilátero Ferrífero, lançado em Minas Gerais em 1º de setem-bro de 2011, e o Projeto Mission Bassin Minier, de Nord-Pas de Calais, visando desenvolver sistemas de gestão e gover-nança, capacitação de lideranças, inteli-gência e tecnologias para a reconversão tecnológica e diversificação econômica e industrial de territórios mineradores. E ele já empreende outros desdobramentos desse relacionamento. Geopark precisa dispor de vários locais de interesse geoló-gico, chamados geosítios, e ter valor eco-lógico, arqueológico, histórico e cultural. “A abordagem de cooperação científica e educacional para planejamento urbano, territorial, de reconversão e diversificação, está sendo tratada no âmbito de um acordo de cooperação entre UFMG e o Instituto de Planejamento Urbano e Desenvolvimento da Universidade de Lille”, adianta.

POR DENTRO DE NORD-PAS DE cALAIS • 12 414 km2 ou 2,3% do território do país• Mais de 4 milhões de habitantes, 64% no Departamento do Norte e 36% no Pas-de-Calais.• 324 habitantes por km2, contra 109 no resto da França• Uma das regiões mais jovens da França: 37% das pessoas têm menos de 25 anos• 2 departamentos (distritos), 1547 comunas (espécie de municípios), 20 cidades com mais de 30 mil habitantes,• 8 cidades com mais de 100 mil moradores, e uma cidade de mais de 1 milhão de habitantes.• Mais de 160 mil estudantes em formação nas universidades e escolas da região. 4 mil pes-quisadores, em cerca de 400 centros de pesquisa públicos e privados. • Reúne centros de especialização de ponta em campos como Saúde (Polo Eurasanté), Novas Tecnologias (Euratechnologies), Desenvolvimento Sustentável, Inovações Têxteis (UP-TEX) e Economia Social e Solidária. Nord-Pas-de-Calais é a terceira região industrial e a quarta região econômica francesa. Seu produto interno bruto é de 96,5 milhões de euros.

Curiosidade: Minas Gerais: Área = 586.528 km². França: Área = 543.965 km²Fontes: www.nordpasdecalais.fr e www.minas-gerais.net

Contatos:Pôle de Recherche et d’Enseignement Supérieur (Pres): www.pres-lpc.frUniversité Lille Nord de France: www.poleuniv-lille-npdc.frProgramme de Coopération Inria-Brésil: www.inria.fr/institut/relations-internationales/appels-a-projets/fap-bresil

pecialista em Gestão, Concepção e Fomen-to de programas científicos com ênfase em parceria universidade-empresa, conta que o Polo de Excelência que dirige foi conce-bido para alcançar os objetivos de desen-volvimento de competências e referências científicas, tecnológicas, profissionais e gerenciais de classe mundial.

“Era necessária a abertura de Aveni-das Internacionais de Cooperação. Apro-veitamos os acordos governamentais, tanto na França, quanto com o estado de Queensland, na Austrália, e Saarland, na

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Ana Flávia de Oliveira

belezasmineirais

Acordo com Universidade de Queensland procura

compatibilizar grande expansão da indústria mineral com

conservação de recursos hídricos, biodiversidade e

patrimônio cultural

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Queensland fica no Nordeste da Aus-trália, é o segundo maior Estado e o terceiro mais populoso. Mais de um terço dos habitantes vivem em Bris-bane, a capital e a terceira maior cida-de do País. Atividades se centralizam em torno do Rio Brisbane com res-taurantes na beira do rio, mercados, parques e calçadões. O Estado tem uma área de 1,8 milhão km2 e uma população em torno de 3,9 milhões de habitantes. Tem clima tropical e florestas tropicais junto à costa. Queensland é um destino bastante apreciado por turistas. As atrações principais são a Grande Barreira de Coral e as ilhas costeiras.

A Austrália está localizada na Ocea-nia, o menor continente do mundo. Tam-bém conhecido como continente-ilha, o País é banhado pelos oceanos Pacífico e Índico, tem belas praias e recifes de corais, florestas tropicais, montanhas, grande área para pasto e desertos. Os australianos convivem com uma fauna e flora únicas, que não se encontram em outras partes do mundo. Situado no he-misfério Sul, assim como o Brasil, o país dos cangurus e coalas se assemelha a nós em vários aspectos. Além das belezas naturais, Austrália e Brasil, especialmente o Estado de Minas Gerais, contam com uma intensa atividade mineradora.

Todas essas semelhanças contribu-íram decisivamente para que fosse criada

Queensland. Em cada um dos trabalhos, um professor de cada uma das institui-ções brasileiras aprovadas irão traba-lhar em parceria com um professor da universidade australiana. As propostas aprovadas para a cooperação binacional de intercâmbio científico superam os R$ 700 mil. O projeto do CDTN, coordenado pelo professor Rubens Martins Moreira, trata de estudos hidrogeológicos e hi-drogeoquímicos visando soluções para um problema grave de drenagem ácida de mina em uma pilha de rejeitos de mineração de urânio. Outro projeto, da PUC-Minas, está sob a coordenação do professor Robert John Young e estuda os efeitos do ruído proveniente de atividade mineradora sobre a fauna.

O terceiro projeto aborda a utiliza-ção de hidróxidos de ferro e alumínio – recursos naturais abundantes no Estado – para a redução da drenagem ácida, e é orientado pelo professor da Universidade Federal de Viçosa, Jaime Wilson Vargas de Mello. Ele enfatiza a importância dos benefícios para os países com o trabalho conjunto. “Podemos contar com a parce-ria de um país desenvolvido, que apre-senta vários aspectos em comum com o Brasil. A Austrália e o Estado de Queens-land, em particular, têm vocação e grande experiência em mineração, que é uma atividade importante para nós, mineiros. Ambos os países convivem com diversi-dade climática, mas em que predominam condições tropicais. Isso faz com que certas tecnologias sejam mais adequadas às nossas condições, favorecendo o inter-câmbio de tecnologia e experiências entre os países”, comenta.

O acordo envolve o desenvolvimen-to de pesquisas em temas de interesse comum, estágios de pesquisadores e estudantes, com aporte de recursos dos dois países. O grande diferencial do Edital da FAPEMIG, de acordo com Ciminelli, é que, ao contrário dos outros programas, a Fundação inovou, ao colocar recursos para o desenvolvimento do projeto de pesquisa e não apenas para intercâmbio de alunos e de pesquisadores. “Isso torna a parceria muito mais efetiva e com resul-tados mais concretos”, afirma.

uma parceria entre os dois países para a realização de pesquisas científicas. Em abril deste ano, a FAPEMIG assinou um instrumento de cooperação com a Univer-sidade de Queensland. O Memorando de Entendimento (MOU) celebra a intenção de cooperação em várias áreas do conhe-cimento. A professora Virgínia Ciminelli, do Departamento de Engenharia Meta-lúrgica e de Materiais, da Universidade Federal de Minas Gerais (Demet-UFMG), coordenadora da parte mineira do pro-grama, ressalta a importância da com-preensão do universo de oportunidades que este instrumento abre com a parceria entre governos, o que tem trazido mais frutos para Minas Gerais. “Este acordo de cooperação focou especificamente a área de mineração e mostra como pode ser multiplicado para outras iniciativas. A Austrália também é um país com tradição em atividade mineradora. Minas Gerais tem recebido um volume expressivo de investimentos do setor. E isso coloca uma questão central de como compatibilizar a grande expansão da indústria mineral com a conservação dos recursos hídricos, da biodiversidade e do patrimônio cultu-ral. Mais ainda, como tirar proveito dos ganhos desse ciclo de grande exploração das riquezas, não renováveis de Minas Gerais para o planejamento e a constru-ção de um futuro que contemple o desen-volvimento sustentável e o benefício das futuras gerações”, destaca.

O acordo congrega várias institui-ções (PUC-Minas, Universidade Federal de Viçosa, a UFV, e o Centro de Desen-volvimento em Tecnologia Nuclear, o CDTN, da UFMG). O objetivo é promover pesquisa e desenvolvimento nos cam-pos de geoquímica, impacto ambiental e qualidade da água em áreas afetadas pela indústria mineradora. A parceria também visa estimular o desenvolvimento de no-vas tecnologias e o aperfeiçoamento de pós-graduandos e docentes por meio da cooperação científica entre equipes do Brasil e da Austrália. Oito projetos foram enviados e em junho deste ano saiu o resultado do julgamento de edital. Três deles foram aprovados para receber apoio da FAPEMIG e da Universidade de

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Para a professora, a experiência da Austrália em modelos de investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), com participação efetiva do setor industrial, é exemplar e original. O investimento em pesquisa mineral teve muito sucesso no desdobramento em tecnologias e serviços para fornecimento ao setor mineral mun-dial. O país é uma referência em termos de patamar de desenvolvimento em Ciên-cia e Tecnologia na área. “Portanto, essa parceria visa o aumento da competência no Estado em áreas que a Austrália se des-taca, e vice-versa; a troca de experiências em termos de modelos de P&D e, princi-palmente, a construção compartilhada de conhecimento e a formação de pessoal em áreas de interesse comum. A Austrália traz uma competência complementar de como agregar valor a negócios vinculados a mi-neração”, enfatiza.

Para Ciminelli, a construção de uma parceria envolve investimentos de médio e longo prazo, além de persistência. “Des-de a visita do então vice-governador do Estado, em 2008, e hoje governador, An-tonio Anastasia à Austrália, houve uma série de iniciativas lideradas pelo Polo de Excelência Mineral e Metalúrgico, da Se-cretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Sectes), com o apoio da FAPEMIG, visando identificar lideran-ças, colaboradores e competências em torno de temas de interesse. Esse traba-lho culminou em projetos de cooperação, inclusive, com aportes do setor privado superiores aos recursos totais alocados pelos dois países no edital em questão. Isso é certamente um indicador de su-cesso da ação de fomento da FAPEMIG”, ressalta. Segundo Virgínia Ciminelli, o edital deve ser visto como uma iniciati-va piloto cujo aprendizado apoiará novos editais a serem lançados. “A instalação de um escritório de negócios do Governo de Queensland em Belo Horizonte planejada para novembro de 2011 vai potencializar o Memorando de Entendimento entre a FAPEMIG e a Universidade de Queens-land em várias áreas do conhecimento e negócios entre os dois Estados”, explica.

Além do acordo com a Universidade de Queensland, também está sendo dis-

cutida a cooperação entre o instituto de pesquisa da Austrália – Commonwealth Scientific and Industrial Research Orga-nization (Csiro) e a FAPEMIG. Em ou-tubro de 2010, durante a sexta Feira de Inovação e Negócios (Inovatec), repre-sentantes do Instituto se reuniram com o presidente da FAPEMIG para acordar a assinatura de um Memorando de En-tendimento, com o apoio da Sectes nas áreas de desenvolvimento sustentável, mineração e processamento mineral e inovação e transferência tecnológica.

O Csiro é um dos principais mem-bros do programa do governo australiano para o Centro de Pesquisa Cooperativa (CRC). A instituição fomenta o alinha-mento entre a pesquisa e a indústria na Austrália, contribuindo pra o desenvolvi-mento naquele país. Uma parceria entre a FAPEMIG e a Csiro ampliaria a atuação de ambas as instituições, além de promover a possibilidade de transferência de tecnolo-gia, pesquisas conjuntas e intercâmbio de pesquisadores.

Minas tem experiência em mine-ração, o que reforça os laços com o Es-tado de Queensland; e também estreitas relações com o Csiro, por meio do Polo de Excelência Mineral e Metalúrgico. Ain-da não há uma previsão de assinatura do convênio, mas, de acordo com a Sectes, a parceria é um passo a mais para o fomento da cooperação científica e tecnológica en-tre os dois países.

Foto: Ângelo Paulino

Brasil e Austrália têm vocação mineradora; o acordo inova ao fechar o convênio internacional que financia as viagens e também libera recursos para pesquisas

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Elas são pouco conhecidas, mas não por isso menos impor-tantes. As florestas estacionais deciduais, popularmente conheci-das como Matas Secas, ocupam cerca de 6% do território nacio-nal. Encontradas principalmente nas regiões Central e Nordeste do Brasil, elas são típicas de ambientes áridos e se caracterizam por árvores de grande porte que perdem todas as suas folhas em determinados períodos do ano. Historicamente, esse bioma vem sofrendo com o desmatamento e as queimadas para instalação de pastagens e obtenção de carvão. Sua preservação passa pelo maior conhecimento de suas características, que é o objetivo da Rede Colaborativa de Pesquisas Tropi-dry (abreviação de Tropical Dry Forests ou Florestas Tropicais Secas).

A Rede Tropi-dry surgiu como iniciativa da Universidade de Alberta, no Canadá. A princípio, isso pode soar estranho: estudo sobre florestas tropicais em um país onde as temperaturas são próximas do negativo na maior parte do ano? O envolvimento da Universidade de Alberta deve-se ao pesquisador costarriquenho Arturo Sanchez, coordenador geral da Rede. Ele já desenvolvia pesquisas sobre o tema em seu país e, ao mudar-se para o Canadá, deu continuidade aos seus estudos, criando, em 2004, esse grupo internacional para estudos sobre as matas estacionais deciduais.

O Brasil é um dos oito países que compõem a Rede, ao lado do Canadá, Estados Unidos, México, Costa Rica, Cuba, Venezuela e Panamá. Mário Marcos do Espírito Santo, do departamento de Biolo-gia Geral da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), é um dos pesquisadores brasileiros que participa do grupo. Ele conta que o envolvimento do país teve início em 2005, a partir de um con-tato feito durante congresso da Association for Tropical Biology and Conservation (ATBC). “Em uma palestra, o professor Arturo Sanchez falou sobre o projeto de uma rede de pesquisas internacional para estudo do tema. Alguns países já compunham o grupo: Canadá, Mé-xico, Costa Rica, Venezuela... mas não o Brasil. Após a apresentação, eu e os professores Frederico Neves e Geraldo Wilson Fernandes, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), este último atual coordenador geral da equipe brasileira, procuramos o Sanchez para propor um site de estudos da rede no Brasil”

Assim nasceu a parceria entre os dois países, que já resultou em intercâmbio de pesquisadores, dissertações e teses, aumento

Vanessa Fagundes

uma rede para as matas SecasEstudos são referência na pesquisadesse bioma e embasam decisões jurídicas

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da produção científica e conhecimento maior da flora e da fauna deste bioma brasileiro. Todas as pesquisas do grupo são desen-volvidas obedecendo aos mesmos protocolos de coleta de dados, a fim de diagnosticar semelhanças e diferenças nos países estu-dados. Isso também permite estabelecer padrões de conservação, recuperação e uso do solo nessas regiões.

No Brasil, os estudos são realizados na Paraíba e em Minas Gerais, onde reúne pesquisadores da Unimontes e das universi-dades federais de Minas Gerais, Ouro Preto e Viçosa. O financia-mento inicial veio do Inter-American Institute for Global Change Research (IAI), entidade internacional de fomento à pesquisa. Em Minas Gerais, a FAPEMIG tornou-se parceira do projeto a partir de 2007, destinando recursos para os trabalhos. Em 2010, a Fun-dação assinou um memorando de entendimento com a Universi-dade de Alberta que expandia as possibilidades de cooperação. O acordo permite, por exemplo, o financiamento de pesquisas em outras áreas de interesse comum; o intercâmbio de pesquisadores e estudantes em projetos comuns de pesquisa; a realização de se-minários e workshops em conjunto; entre outras atividades.

Projeto amploNa Unimontes, o trabalho com as Matas Secas envolve três

grandes vertentes: socioeconômica, de sensoriamento remoto e eco-lógica. Na primeira, os pesquisadores buscaram avaliar a ocupação humana na região do Parque Estadual das Matas Secas, localizado em Manga, município do Norte de Minas, levando em conta aspec-tos sociais, econômicos e culturais. Como explica Mário do Espírito Santo, o componente humano é muito importante. “Essa é uma re-gião rica no sentido cultural, mas muito pobre no sentido econômi-co, o que a torna bastante interessante para estudos sociológicos”.

Foram estudados especialmente os conflitos decorrentes da instalação de unidades de conservação na região, como aqueles re-lacionados ao Projeto Jaíba. “A região possui muitos quilombolas e outras comunidades tradicionais que tiveram a rotina alterada com a demarcação dessas unidades”, explica Mário do Espírito Santo. O gru-po realizou um extenso trabalho de conhecimento dessas comunida-des, que envolveu o levantamento censitário e a coleta de informações sobre renda, trabalho e forma de utilização das Matas Secas.

O sensoriamento remoto consiste na análise de imagens colhi-das via satélite. O monitoramento é feito à distância, por pesquisado-res da Universidade de Alberta. Uma vez por ano, a equipe canaden-se comparece ao Brasil para coleta de dados. Informações básicas, como coordenadas geográficas e estrutura de formações vegetais específicas, são enviadas ao Canadá pela equipe da Unimontes. A comparação entre imagens de satélite da cobertura vegetal do Norte de Minas nos anos de 1986, 1996 e 2006 também apontou dados importantes com relação aos índices de desmatamento. Ao longo dessas duas décadas, a área de Matas Secas diminuiu cerca de 11%, o que equivale a uma perda de 2.040 quilômetros quadrados.

Dentro da dimensão ecológica, foram realizados estudos deta-lhados sobre a composição da flora e a estrutura da floresta. As co-letas intensas e sistemáticas ao longo de cinco anos resultaram em um levantamento riquíssimo sobre o bioma, com listas de espécies de grupos pouco estudados como as micorrizas arbóreas, fungos que se associam às raízes das árvores. “O grande mérito do trabalho foi cobrir

@Para saber mais sobre a Rede Tropi-dry e os trabalhos desenvolvidos pela equipe brasileira visitehttp://tropi-dry.eas.ualberta.ca/

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lacunas de conhecimento, especialmente so-bre a região Norte do Estado”, destaca Mário.

Os pesquisadores também buscaram entender como a floresta se regenera. Para isso, eles acompanharam parcelas de amos-tragem de diferentes estágios de recuperação. O estágio inicial refere-se à vegetação que foi cortada há cerca de cinco anos; o interme-diário, às plantas que estão em processo de recuperação no período entre 15 e 20 anos; e, no estágio tardio de recuperação, as florestas recuperam-se há mais de 50 anos (desde o último registro de corte). Há ainda o estágio primário, em que a floresta não foi tocada.

“Nosso objetivo era verificar se o que acontece aqui é parecido ou diferente do que acontece nas Matas Secas em outros países e, com isso, tentar delinear um padrão de

recuperação, além de reunir experiências de conservação que deram certo em um país e que possam ser reproduzidas”, explica o pesquisador. Além disso, o trabalho serve como aliado nas atividades de fiscalização e monitoramento: de acordo com a lei que regula o uso dessa vegetação, apenas áreas em estágio inicial podem ser convertidas para uso econômico. As informações co-letadas resultam em um aprimoramento da diferenciação dos estágios, tanto em campo como via sensoriamento remoto, apontando onde os fiscais devem atuar.

Legislação revisadaPara Mário do Espírito Santo, uma das

grandes contribuições do grupo foi a partici-pação decisiva na invalidação da Lei Estadual 19.096/2010, que alterava o uso do solo, a conservação e a proteção das áreas de Ma-tas Secas na região Norte de Minas. Essa lei permitia o desmatamento de até 70% dessas áreas. A partir dos dados coletados ao longo de cinco anos de estudos sobre o bioma, os pesquisadores elaboraram uma nota técnica que foi enviada para o Ministério Público e ajudou a embasar uma ação direta de incons-titucionalidade. Em janeiro deste ano, a corte superior de Minas Gerais considerou a lei in-constitucional. “Isso mostra como os dados científicos podem embasar decisões jurídicas e orientar políticas públicas”.

Sobre os próximos passos, o pes-quisador conta que o grupo acaba de ter um projeto aprovado dentro do edital Pro-grama Sisbiota, ou Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Isso garantirá a con-tinuidade dos trabalhos por mais três anos, consolidando ainda mais a Rede no Brasil. Com esses recursos, a equipe irá estudar, por exemplo, novos grupos biológicos, como as bactérias de solo, sobre as quais existem poucas informações disponíveis.

Além disso, as pesquisas irão se ex-pandir para a margem direita do São Fran-cisco, já que nos primeiros cinco anos de trabalho os espaços estudados estavam localizados na margem oposta do rio. Entre os novos locais estão parques próximos ao projeto Jaíba, como o Parque Estadual Lagoa do Cajueiro e as Reservas Biológicas Jaíba e Serra Azul. Serão utilizados os mesmos

protocolos para coleta e análise dos dados, o que fornecerá um panorama completo deste bioma na região Norte do Estado.

IntercâmbioA participação em um projeto interna-

cional trouxe ganhos para a universidade, seus professores e seus alunos, na opinião do professor Mário. Através da interação proporcionada pela Rede Tropi-dry, por exemplo, abriram-se oportunidades para que graduandos e pós-graduandos da Unimontes fizessem estágios no Canadá. Da mesma for-ma, a universidade mineira passou a receber estudantes dos países que compõem a Rede. “Isso enriquece a formação dos alunos. Esse intercâmbio também se estende aos pesqui-sadores. Já recebemos vários colegas que ministraram palestras ou minicursos para a nossa comunidade acadêmica”.

O professor Arturo Sanchez, da Uni-versidade de Alberta, passou a orientar projetos de mestrado em conjunto com pesquisadores da Unimontes. Isso au-mentou também a produção científica do departamento de Biologia Geral. Segundo Mário do Espírito Santo, essa colaboração em artigos e livros foi elogiada pela Coor-denação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) em sua última ava-liação do programa de pós-graduação. Ele também destaca a formação de novos pes-quisadores para estudar o tema: o grupo brasileiro já produziu, até agora, seis teses, 18 dissertações e mais de 30 monografias de conclusão de curso.”Nosso grupo, hoje, é referência no estudo das Matas Secas”.

Em bREvE, NOvIDADES

Além da Universidade de Alberta, a Eco-gene-21, instituição de pesquisa bioge-nética, também se tornou parceira da FA-PEMIG. Em março deste ano, foi assinado um memorando de entendimento que prevê, entre outros, o desenvolvimento de um centro da América do Sul para terapias de base de células para doenças de retina, dermatológicas e degeneração neural. O projeto ainda está em fase inicial, mas em breve começará a ser desenvolvido.

Professor Mário do Espírito Santo, coordenador das pesquisas na Unimontes. O trabalho incluiu coleta de material biológico, que permitiu co-nhecer melhor as espécies do bioma

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AA eletrônica orgânica e impressa é

uma tecnologia recente no mundo que conjuga novos materiais orgânicos com técnicas de impressão para produção de eletrônica de baixo custo. Dispositivos eletrônicos leves, flexíveis e baratos es-tão ocupando novos espaços de mercado. Entre as diversas aplicações da tecnolo-gia, destacam-se dispositivos inteligentes (como sensores e teclados flexíveis), célu-las fotovoltaicas (para geração de energia limpa), displays e painéis de iluminação. “Essa tecnologia é pioneira e estratégica para o Brasil nos próximos anos”, afirma

Acordo de cooperação científica coloca Minas em contato com centro de referência internacional no estudo de eletrônica orgânica e impressa

Danielle Moraes, gerente de P&D e Pro-jetos e coordenadora do Projeto de Ele-trônica Orgânica e Impressa do Centro de Inovações Csem-Brasil.

No Reino Unido, um acordo de cooperação científica foi firmado entre a FAPEMIG, o Csem Brasil e o Impe-rial College London, um dos principais centros de referência internacional no estudo e no desenvolvimento de eletrô-nica orgânica e impressa. A parceria in-clui a oferta de cursos para estudantes de mestrado, doutorado e pós-doutora-do de Minas Gerais com experiência na

Tecnologia pioneira

Fabrício Marques

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área, o desenvolvimento de projetos de pesquisa, além da implantação de um centro de excelência em eletrônica or-gânica no Estado.

De acordo com Danielle, que é também a organizadora da primeira Escola FAPEMIG–Imperial College–Csem Brasil (Eficc), o acordo entre as três instituições é um memorando de intenções que visa priorizar suporte cientifico em projetos de pesquisa, com foco na área de eletrônica orgânica e impressa. Esta é a primeira es-cola organizada pelo Csem Brasil. Mas em termos de parcerias internacionais, além da aproximação com o Imperial College London, o Centro também possui parceria com o Csem e a École Polytechnique de Lausanne (EPFL), ambos na Suíça, e com o Fraunhofer, na Alemanha.

Com o termo de cooperação, o Csem Brasil e o Estado de Minas passam a ter acesso ao Centro de Eletrônica Orgânica e Impressa (CPE) do Imperial College Lon-don. O CPE conta com dezenas de pes-quisadores e tem como diretor o professor Donal Bradley, um dos físicos mais citados

no mundo e um dos pesquisadores mais renomados nesta tecnologia. “Esse termo é de suma importância para alavancar a capacidade do Csem Brasil e na formação de pessoal. Ele possibilitará a capacitação de mão de obra especializada em eletrôni-ca orgânica, trazendo conhecimento para o estado de Minas Gerais”, afirma Danielle.

O objetivo do programa é contribuir para a formação de estudantes na fabrica-ção de dispositivos de eletrônica orgânica e impressa, e com isso gerar mão de obra qualificada para alavancar o desenvolvi-mento dessa indústria no Brasil. O primeiro processo de seleção já foi concluído. Foram selecionados seis alunos: os doutorandos Giovana Ribeiro Ferreira, Marcos Flávio de O. Silva, Mariana de Melo Silva e Mirela de Castro Santos e os pós-doutorandos Weber Hanry M. e Feu e Giovani Gozzi. Giovana, Mariana e Mirela são da Universidade Fe-deral de Ouro Preto (Ufop); Marcos Flávio e Weber são da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); e Giovani é contrata-do pelo Csem Brasil para ocupar uma vaga pós-doc neste projeto.

Foto: Arquivo pessoal

Pesquisadores do Brasil e do Imperial College, em Londres

Os pesquisadores participaram de um curso de 78 horas realizado entre os dias 3 e 14 de outubro, em Londres, In-glaterra, com aulas teóricas e experimentos práticos. Também foi convidado a partici-par das atividades do curso o professor Rodrigo Fernando Bianchi, coordenador do Laboratório de Polímeros e de Proprie-dades Eletrônicas de Materiais (Lappem) da Ufop e um dos gestores do Instituto Na-cional de Eletrônica Orgânica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Eles viajaram dois dias antes do início das atividades acadê-micas. As aulas aconteceram todos os dias, de 9h às 17h. Foram aulas práticas em la-boratórios de Química, Física e Simulação Computacional. As atividades de Simula-ção Computacional foram conduzidas pela doutora Jenny Nelson - incluída entre os 50 maiores pesquisadores em Ciência dos Materiais da última década. Em seguida, a doutora Pabitra Shakya Tuladhar apresen-tou o curso de fabricação de dispositivos em sala limpa, seguido de uma semana de experimentos práticos nos laboratórios do Imperial College.

Durante as aulas, os alunos tiveram acesso ao estado da arte na produção, sín-tese e processos relacionados à eletrônica orgânica e impressa, como técnicas de fabricação de dispositivos orgânicos, im-pressão em substrato flexível, preparação de substrato, síntese de material e proprie-dades elétricas. Além disso, foram estuda-das técnicas de impressão como gravura, offset, screen printing e inkjet.

De volta ao País, os estudantes devem enviar um relatório com o resumo dos traba-lhos desenvolvidos na escola. Eles deverão empregar os conhecimentos adquiridos em suas pesquisas, bem como iniciar possíveis colaborações no âmbito de projeto de inte-resse com o Csem Brasil na criação de uma plataforma de eletrônica orgânica e impres-sa em Minas Gerais.

No período em que estavam no cur-so, MINAS FAZ CIÊNCIA conversou por e-mail com os pesquisadores Giovana Ri-beiro e Giovani Gozzi. Giovana, atualmen-te vinculada ao Laboratório de Polímeros e Propriedades Eletrônicas de Materiais (Lappem), do Instituto de Ciências Exatas

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e Biológicas (Iceb) da Ufop, formou-se em Química Industrial na mesma univer-sidade. Nos primeiros anos da graduação, seu desejo era se formar e trabalhar como Química Industrial em empresas fora do meio acadêmico. Ao fazer estágio em uma grande empresa percebeu que aquilo não era o que pensava, e que talvez o meio aca-dêmico fosse uma alternativa interessante. “Apaixonei-me pela área, e acabei me de-dicando a ela em minha iniciação científi-ca, meu mestrado e atualmente curso dou-torado. Atualmente, curso doutorado em Engenharia de Materiais estudando a de-gradação de polímeros luminescentes para aplicação em sensores de radiação em um dos únicos laboratórios do Brasil com foco em projeto e fabricação de dispositivos eletrônicos orgânicos, o Lappem/Ufop”.

Giovana comenta que no Imperial College acompanhou o desenvolvimento de dispositivos como OLEDs e células fotovoltaicas. “Também fabricamos es-ses dispositivos. Como meu estudo visa a melhoria da performance de materiais para serem utilizados nesses dispositi-vos, poder fabricá-los ajuda a focar o meu trabalho nas áreas específicas que neces-

sitam de melhorias”. Nesta experiência, frisa Giovana, são muito importantes a visão de como são os grupos de pesquisa no exterior, e da fabricação de dispositi-vos eletrônicos.

Por sua vez, Giovani Gozzi está no momento de transição do nível de dou-toramento para pós-doutoramento, que executará junto à Csem Brasil. “De fato, já iniciamos algumas atividades, que incluem o curso em colaboração com o Imperial College”.

Giovani é graduado em Física pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), onde executou atividades de iniciação científica na área de Eletrônica Orgânica. Como membro do Instituto Multidiscipli-nar de Materiais Poliméricos (Immp), que deu origem ao Instituto Nacional de Ciên-cia e Tecnologia em Eletrônica Orgânica (Ineo), seu então orientador o inseriu neste contexto de pesquisa em 2002.

Atualmente está em fase de depósito de tese e de transição para atuar na área de Eletrônica Orgânica. “Minha perspecti-va de atuação é industrial, já que poderei aplicar meus conhecimentos em temas que pesquisei do ponto de vista científico de

SObRE O cSEm bRASILCom sede em Belo Horizonte,

o Csem Brasil é um centro privado brasileiro de pesquisa aplicada e desenvolvimento, criado em 2006, especializado em micro e nanotec-nologias, engenharia de sistemas, microeletrônica e tecnologias de comunicação.

Fundado pelo Csem S.A. (Centre Suisse d’Electronique et Microtechnique) da Suíça e FIR Ca-pital, com o apoio do Governo de Minas Gerais e FAPEMIG e, mais recentemente, do BNDES, o Csem Brasil tem como objetivo trans-formar nano e microtecnologias avançadas em produtos, processos e empresas inovadoras, operando como ponte entre a ciência e a in-dústria, e entre o Brasil e centros mundiais de excelência em tecnolo-gia aplicada.

forma mais direcionada aos interesses da sociedade”, avalia.

Devido à experiência de quase dez anos em pesquisa e desenvolvimento de dispositivos eletrônicos orgânicos para conversão de energia elétrica em luz, Gio-vani foi admitido para desenvolvimento de dispositivo de mesma natureza com aplicação também na conversão de ener-gia luminosa em elétrica, que é o principal foco da colaboração Csem Brasil/Imperial College-London.

O que a estada no Imperial College pode ajudar no avanço de suas pesquisas? Giovani responde: “O processamento in-dustrial de dispositivos eletrônicos orgâni-cos envolve o processamento contínuo de dispositivos por técnica de impressão grá-fica. Assim, a extensão dos conhecimentos científicos para o processamento industrial é o principal foco de interesse, além do contato com a experiência dos ingleses, que são pioneiros na área de dispositivos eletrônicos orgânicos”.

cOmO FOI O PROcESSO SELETIvOPoderiam participar do processo estudantes de mestrado, doutorado e

pós-doc vinculados a uma instituição de Minas Gerais. Não houve submissão de projetos na seleção de alunos. As regras de seleção foram as seguintes: para concorrer, bastaria apresentar currículo e carta de referência. Os candidatos foram avaliados por uma comissão formada com representantes do Csem Brasil e da FAPEMIG, de acordo com os seguintes critérios:

Critérios de análise e julgamento Peso

Aluno de pós-graduação no Estado de Minas 5

Experiência na área de eletrônica orgânica e impressa (familiaridade com procedimentos de laboratório e processos industriais) 4

Fluência em inglês 5

Potencial de sinergia com os atuais projetos de pesquisa do candidato 3

Qualidade e número de artigos e trabalhos nesta área 1

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34 MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011

ISR

AEL

Diálogos epossibilidades

Sistema de inovação israelense acrescenta novas perspectivas para promover a união entre academia e empresas no desenvolvimento da inovação de Minas Gerais

Kátia Brito

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Em junho deste ano, comitiva com-posta por representantes da FAPEMIG, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais (Sectes), Univer-sidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Serviço Nacional de Aprendizagem (Se-nai), participou da conferência presiden-cial israelense Global Business Network, organizada pelo presidente de Israel, Shi-mon Peres. O evento tinha o objetivo de proporcionar aos participantes reflexões que pudessem ser convertidas em ações de cunho global. Dentre os temas aborda-dos estavam: a busca por novas fontes de energia; o futuro da exploração do espaço; a medicina do amanhã: inovações e dile-mas morais; e as vantagens comparativas da economia de Israel.

O encontro possibilitou o primeiro contato do grupo de Minas com institu-tos de Ciência e Tecnologia, universida-des e agências de fomento israelenses. A finalidade das reuniões era conhecer como funciona o sistema de inovação do Estado de Israel, que ocupa o primeiro lugar no número de star-up (empresas que começam pequenas, mas apresen-tam rápido crescimento econômico, por causa de suas ideias inovadoras e de base tecnológica que atraem investimen-tos, inclusive externos).

“Nosso objetivo foi entender como a relação empresa-universidade produz tanta inovação e tantas empresas bem-sucedi-das e como podemos alavancar a relação entre nossas empresas e a academia”, ex-plica a assessora para Parcerias Nacionais e Internacionais da Sectes, Cynthia Rocha. Além dela, viajaram a Israel o diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação da FAPE-MIG, José Policarpo de Abreu, o diretor regional do Senai-MG, Lúcio Sampaio, e os professores da UFMG Virgínia Ciminelli (Departamento de Engenharia Metalúrgica) e Marcos Pinotti (Engenharia Mecânica).

O grupo de Minas pôde conhecer iniciativas como a da incubadora Yissum que, desde 1964, é responsável pelas re-lações entre empresas e pesquisadores, organização responsável pela transfe-rência tecnológica da universidade para o mercado. Considerada como uma das melhores em transferência de tecnologia

no mundo, a companhia já registrou mais de 6.100 patentes, licenciou mais de 480 tecnologias e gerou 65 novas empresas. José Policarpo observa que entrar em con-tato com a experiência da Yissum chamou sua atenção. “A forma como eles ajudam o pesquisador a estabelecer um relacio-namento com as empresas, com o apoio de analistas de mercado, especialistas em propriedade intelectual e proteção dos documentos das patentes por meio de im-portantes escritórios de advocacias é muito interessante”, afirma. A Yissum tem como vice-presidente de propriedade intelectual Renne Ben-Israel, que em 2012 visitará Minas Gerais para apresentar o modelo de inovação da Yissum.

Ponte entre academiae indústria

Outro modelo que também desper-tou o interesse da comitiva é o do Instituto Weizmann, centro de excelência multidis-ciplinar em pesquisa. Com forte atuação nas áreas de Exatas, Computação, Bioquí-mica e Biologia, é conhecido por estimu-lar a transformação dos conhecimentos construídos na academia em produtos com caráter industrial. Para conduzir a produção científica, para além dos muros do centro, foi criada a agência Yeda (que significa “conhecimento” em hebraico) que tem por responsabilidade proteger e transferir a propriedade intelectual cien-tífica. O Instituto tem papel fundamental

Foto: Arquivo Pessoal

Comitiva de Minas Gerais em Israel

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na relação entre pesquisador e empresa, pois identifica as empresas que podem investir nas pesquisas tirando da respon-sabilidade dos cientistas a preparação da documentação que protege as tecnologias de interesse comercial.

Para compreensão de como a Weis-mann coloca em contato academia e em-presas, em novembro o diretor científico de Iniciativa de Pesquisa em Alternativa Sustentável de Energia da instituição, Da-vid Cahen, vem ao Brasil a fim de mostrar como é importante para o sistema de ino-vação de um país que a Ciência dialogue com as empresas. “Muitas vezes os pes-quisadores ficam muito tempo no universo acadêmico e com certa dificuldade de se aproximar do mercado. A filosofia de um Instituto como o Weizmann é muito inte-ressante para a nossa realidade”, explica José Policarpo de Abreu.

Um recurso natural que gerou e gera, em Israel, um grande desenvolvimento científico e tecnológico é a água. A ne-cessidade de abastecimento aquífero do país fez com que os cientistas criassem mecanismos de extração e dessalinização das fontes de abastecimento da população. Para se ter uma ideia, o mar que fornece

água para os israelenses é o da Galileia, conhecido por alto teor de sal em suas águas. A empresa, que se destaca na rea-lização desse processo de extração e des-salinização é a Mekorot, responsável por 80% do abastecimento de água potável em Israel e por reaproveitar 75% do que é fornecido. A corporação possui laços de cooperação com diversas nações. Um projeto que merece destaque é o de “Ge-renciamento Sustentável dos Recursos Disponíveis de Água com Tecnologias Ino-vadoras”, consórcio composto por Alema-nha, Jordânia, Palestina e Israel. O grupo busca desenvolver tecnologias para solu-cionar, de modo sustentável, o problema de escassez de recursos hídricos do Vale da Baixa Jordânia.

De acordo com José Policarpo, hou-ve uma demonstração de interesse por parte da empresa israelita de iniciar uma parceria com a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). A Mekorot já estabeleceu laços de convênio no Brasil, porém no Estado de São Paulo, com a empresa de abastecimento de água, a Sa-besp. Assim que chegou de Israel, o diretor José Policarpo agendou uma reunião com representantes da empresa de abasteci-

mento mineira e apresentou como funcio-na a Mekorot e a possibilidade de acordo entre as empresas. “Passei os contatos da Mekorot para a Copasa e mostrei que a FAPEMIG pode ajudar com o lançamento de uma chamada de trabalhos, que possam contribuir com as duas empresas, mas se eles quiserem podem estabelecer acordos de transferência tecnológica sem o envol-vimento da Fundação”.

Outra possível associação é do Departamento de Engenharia Elétrica da UFMG e do Instituto Israelense de Tec-nologia (Technion). O professor Marcos Pinotti, em reunião com o professor do departamento de Engenharia Mecânica, Izhak Etsion, identificou áreas de pesqui-sas em comum entre as duas instituições: a tribologia, que utiliza a técnica LST (si-gla em inglês de texturização de superfí-cie por laser) e a biomimética, tecnologia inspirada na natureza. Desde esse primei-ro contato, as instituições de ensino estão em negociação para a assinatura de termo de cooperação. A assessora da Sectes Cynthia Rocha avalia que o fato de Israel disponibilizar para o mercado um gran-de número de engenheiros por renda per capita aponta um caminho interessante

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ESTREITANDORELAçõES

A fim de aproximar o diálogo entre Minas e Israel para a realidade da inovação do Estado a FAPEMIG realizou no dia dez de novembro, às 14h, no auditório da Fundação, a palestra The energy Challenge- biofuels put in perspective com o professor David Cahen, do departa-mento de Materiais e Interfaces do Instituto de Ciências Weizman. O evento tem como público-alvo pes-quisadores e estudantes que desen-volvem estudos nas áreas de energia sustentável e empresas.

Já no primeiro semestre de 2012 a FAPEMIG recebe a vice-pre-sidente de propriedade intelectual da incubadora Yissum, ligada à Univer-sidade Hebraica de Jerusalém Renee Ben- Israel. O tema da palestra é o relato de como a empresa protege e comercializa a propriedade intelectu-al da Universidade.

de intercâmbio para a engenharia do Es-tado. “Seria excelente que os estudantes mineiros tivessem Israel como opção de intercâmbio e que, da mesma forma, as universidades mineiras pudessem rece-ber estudantes israelenses. Nada impede que possamos fazer os contatos necessá-rios para que as universidades mineiras assinem acordos com as universidades israelenses”.

A inovação, lá e aquiAs diferenças entre Brasil e Israel

no que tange o investimento em inova-ção estão atreladas às suas realidades econômicas e geográficas. As necessi-dades econômica e social geraram os desenvolvimentos tecnológico, cientí-fico e inovador dos israelenses, colo-cando-os no topo da lista das nações inovadoras. Já no Brasil o processo está caminhando lentamente. De acordo com o Conselho Nacional de Desen-volvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a inovação nacional ocupa no mundo a 47ª posição, enquanto a tec-nologia alcançou o 8º lugar, podendo, até o ano de 2012, alcançar a quinta posição mundial.

Nesse quadro nacional, na opinião de José Policarpo, Minas se apresenta “bem posicionada no quesito inovação”. O diretor entende que Minas, por meio da FAPEMIG, em ação conjunta com a Sec-tes e a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), tem conseguido transformar em realidade a inovação do Estado. “A partir da criação da assessoria adjunta de inovação da Fundação, com os departamentos de Relações Empresariais, Inovação, Propriedade Intelectual e Ciência e Tecnologia conseguimos uma estrutura que oferece o suporte necessário para a re-lação empresa e pesquisador. Além disso, estamos induzindo a inovação no Estado pregando a aplicação da tripla hélice: go-verno, academia e empresa. A academia gera conhecimento e a empresa, inovação. E nós temos o papel de aproximá-las”. ex-plica. Outro ponto que pode transformar a inovação tanto nacional quanto mineira é a aprovação do novo Código da Ciência, proposta de lei encaminhada ao Congresso Nacional, que visa à criação de uma legis-lação própria para as atividades de CT&I no Brasil, reduzindo gargalos e burocra-cias da legislação atual.

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Acordos com DFG e DAAD proporcionam a pesquisadores de Alemanha e Minas Gerais cooperarem em diversas áreas

Fabrício Marques

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Entre 1990 e 1992, Ciomara Ferreira Cam-pos, da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), avançou nos estudos para ampliação de um glossário de Engenharia Mineral. No ano de 2000, Cristina Helena Ribeiro Rocha Augustin, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), fez estágio na Universidade de Leipzig para apresentar pesquisas desenvolvidas pelo Núcleo de Estudos Ambientais e Recursos Hídricos (Negeo), estabele-cendo convênio de Cooperação Científica entre as instituições mineira e alemã. Finalmente, em 2007, Rita Amélia Teixeira Vilela, da Sociedade Mineira de Cultura (SMC), esteve às voltas com a Metodo-logia Hermenêutica Objetiva para Análise da Escola Contemporânea. Aparentemente sem ligação, as três pesquisadoras têm em comum o fato de terem

seus estudos beneficiados, entre diversos outros pesquisadores, pelo acordo firmado entre a FAPEMIG e o Serviço Alemão de In-tercâmbio Acadêmico (DAAD).

O acordo com o DAAD tem três ob-jetivos: permitir projetos de pesquisa em conjunto, conduzidos por cientistas e gru-pos de pesquisa tanto no Brasil quanto na Alemanha; intercâmbio de estudantes, pro-fessores e pesquisadores; criação de uma “Amizade Internacional” para apoiar as atividades de cooperação. Além do DAAD, outra instituição com a qual a FAPEMIG firmou laços é a Fundação Alemã de Pes-quisa Científica (DFG). Conheça, a partir de agora, um pouco desses dois acordos.

Leibniz-Institute of Freshwater Ecology and Inland Fisheries, em Berlim

Ato de assinatura do Memorando de Entendimento entre os presidentes da FAPEMIG, Mario Neto Borges, e da DFG, Matthias Kleiner, na Embaixada Alemã em Brasília, no dia 18 de agosto de 2011

Foto: Divulgação

Foto: Divulgação

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Fundação Alemãde Pesquisa Científica (DFG)

A cooperação entre a Fundação Alemã de Pesquisa Científica (DFG) e a FAPEMIG desenvolveu-se em duas eta-pas, iniciando-se em outubro de 2009, com base em uma carta de entendimen-to. Neste acordo, as duas fundações começaram a cooperação em fomentar um grande workshop na área de Biologia de Sistemas, entre muitas universidades alemãs e mineiras. E um projeto indivi-dual na área de Agricultura/Hidrologia entre o Leibniz-Institute of Freshwater Eco-logy and Inland Fisheries, em Berlim, e o De-partamento de Engenharia de Biossistemas, da Universidade Federal de São João del Rei.

Em 18 de agosto de 2011, em Brasília, foi assinado um acordo entre os presidentes da FAPEMIG, Mario Neto Borges, e Matthias Kleiner. Este Memorando substitui a carta de entendimento de 2009. “É uma boa e segura base para criar cooperações em várias áreas de pesquisa científica entre a Alemanha e o Estado de Minas Gerais”, afirma o diretor da DFG, Dietrich Halm.

O acordo tem um prazo de cinco anos (até 2016) e vai ser prolongado automati-camente num modo bianual. “Com isso, criamos uma base bem definida e segura pelos pesquisadores que querem estabe-lecer projetos conjuntos entre Alemanha e Minas Gerais”, observa Halm.

A partir do memorando deste ano, abriu-se espaço para pesquisas na área de Água e Mineração. No momento, são iden-tificados grupos de pesquisadores na Ale-manha e em Minas, dentro dessa área de conhecimento. Esses pesquisadores, que devem apresentar grande experiência nes-se campo, vão definir os temas mais emer-gentes para projetos de pesquisa durante um workshop temático que é planejado para o próximo ano. Depois as propostas podem ser submetidas para a DFG e para a FAPEMIG, simultaneamente.

“Atualmente, recebemos propostas em ambas as agências para um projeto teuto-mineiro na área de Águas Super-ficiais, especificamente sobre fluxos em relação à mudança do uso da terra. Espe-ramos mais e mais propostas conjuntas no futuro”, diz o diretor da DFG.

Segundo Dietrich Halm, o acordo permite que os pesquisadores da Alema-nha e do Estado de Minas Gerais possam cooperar em qualquer área de pesquisa. Mas algumas áreas já foram identificadas como aquelas que têm recebido um maior interesse das comunidades científicas de ambas as fundações: Águas e Atividades Minerais, Agricultura, Nanotecnologia, En-genharia e Medicina.

“Outra importância do acordo FA-PEMIG/DFG é que podem ser incluídos jovens pesquisadores de doutorado ou mestrado com estadas de intercâmbio em qualquer projeto”, explica.

De modo geral, comenta Halm, a co-operação científica entre a Alemanha e o Brasil está crescendo mais e mais. Pesqui-sadores dos dois países querem pesqui-sar e publicar conjuntamente. “A mesma tendência é válida para a cooperação com Minas, que é um Estado com uma paisa-gem científica bem diversa e interessante. O Estado de Minas tem 17 universidades federais, estaduais e instituições não-uni-versitárias de pesquisa básica e aplicada. Com isso, Minas Gerais torna-se também um lugar científico muito atrativo em nível internacional”.

E quais são os benefícios dessa parceria? Halm responde que tanto a FA-PEMIG quanto o DFG fomentam projetos de pesquisa científica por critérios de ex-celência e de caráter inovador. “Isto é uma base que garante uma cooperação num nível alto e que promove pesquisadores de excelência”, avalia.

Para Halm, um dos maiores benefí-cios nesta parceira é de complementar-se e de aprender um lado com o outro. Isto vale não só entre pesquisadores em proje-tos conjuntos, mas também entre a DFG e a FAPEMIG.

Serviço Alemãode Intercâmbio Acadêmico

Desde o final dos anos de 1980, o Serviço Alemão de Intercâmbio Aca-dêmico (DAAD) mantém um convênio com a FAPEMIG. O último acordo foi assinado em março de 2010, por um período de cinco anos. Ao longo destes anos foram beneficiados aproximada-

POR DENTRODO DAADO escritório do DAAD no Rio de Janeiro, fundado em 1972, co-ordena atualmente mais de 30 programas de intercâmbio para estudantes e pesquisadores bra-sileiros e atua em parceria com as agências brasileiras de fomento.

Foto: Arquivo

Rita Meyer, do DAAD

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Universitäten (U) /Technische Universitäten (TU):São as universidades tradicio-

nais ou técnicas com cursos voltados para teoria e pesquisa, com a titulação de Bachelor (para todas as áreas, ex-ceto Direito e Medicina) ou Staatsexa-men (para as áreas de Direito e Me-dicina) e possibilidade de doutorado.

Fachhochschulen (FH):São as universidades de Ci-

ências Aplicadas que oferecem um Bachelor de três anos, podendo ser exigido um estágio durante o curso. Após o Bachelor existe a possibilidade de cursar um Master também em uma universidade de Ciências Aplicadas. Não oferecem cursos de doutorado.

O ano acadêmico é dividido em dois semestres: o semestre de verão vai de abril a setembro, e o semes-tre de inverno de outubro a março. O período não-letivo é muitas vezes preenchido com trabalhos científicos e preparações para apresentações para o próximo semestre. Alguns professo-res costumam agendar provas durante as férias. Muitos estudantes alemães aproveitam as longas férias para ad-quirir experiência profissional através de estágios.

FONTE: DAAD/DFG

mente 20 professores brasileiros e 20 alemães. Trata-se de um programa de intercâmbio de curta duração, denomi-nado Intercâmbio de Cientistas, para professores/pesquisadores doutores com vínculo em uma instituição de ensino superior ou em um instituto de pesquisa. As missões têm a duração de um mês, no mínimo, a três meses, no máximo. O acordo finda em 2014, mas poderá ser renovado.

SAIbA mAIS !

“O objetivo do programa é apoiar a mobilidade de professores/cientistas brasi-leiros e alemães para fortalecer a pesquisa e a internacionalização das instituições de ensino superior e de pesquisa, sem restri-ções de áreas de conhecimento”, afirma a coordenadora de programas de intercâm-bio de pesquisadores e de programas para ex-bolsistas do DAAD, Rita Meyer.

De acordo com a coordenadora, em um mundo cada vez mais globalizado, a

internacionalização desempenha um papel importante para o desenvolvimento e pro-gresso da ciência. “Este é o benefício para instituições superiores de ensino alemãs e brasileiras”, completa.

Acordos como esses, entre Alemanha e Minas, na opinião de Rita Meyer, fomentam a internacionalização das universidades ale-mãs e brasileiras, através de projetos entre as instituições e contribuindo para o desenvolvi-mento da Ciência.

POR DENTRO DA DFgDo ponto de vista organizacional, a DFG é uma associação de direito privado.

Seus integrantes são universidades alemãs, institutos de pesquisa sediados fora das universidades, associações científicas e as academias de ciências. Para realizar suas atividades, a entidade dispõe anualmente de mais de 2 bilhões de euros, verba rece-bida principalmente do governo federal da Alemanha (65%) e de governos estaduais do país (34%), bem como da UE ou de doadores particulares.

Em janeiro de 2011, abriu-se um novo escritório em São Paulo cujo diretor, Dietrich Halm é quem coordena o trabalho da DFG no Brasil.

INTERcâmbIO DE cIENTISTAS (DAAD)Inscrições: fluxo contínuo, com quatro meses de antecedênciaAuxílio para cientistas brasileiros que queiram realizar uma es-

tadia de pesquisa em universidades ou institutos de pesquisa alemães durante período de um a três meses. Uma agência brasileira deve aprovar o pedido e custear a passagem aérea.

Em contrapartida, o DAAD financia a viagem de pesquisadores alemães convidados para uma pesquisa em universidades ou insti-tutos de pesquisa no Brasil, cabendo à agência brasileira custear os gastos da estadia.

Requisitos Benefícios

Doutorado e publicações emnível internacional

Passagem aérea (paga pela agência brasileira)

Convite do pesquisador anfitrião Ajuda de custo mensal no valor de 1.990 eurosPlano de trabalho

FONTE: DAAD

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42 MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011

Em um breve retorno à história das aproximações entre Minas Ge-rais e Estados Unidos, encontramos um acordo firmado há quatro décadas entre a Universidade Federal de Viçosa e a Universidade de Purdue, loca-lizada no estado de Indiana. Nos anos de 1960, as duas instituições de ensino superior tinham uma parceria que, nas palavras do subsecretário de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais, Evaldo Ferrei-ra Vilela, era “boa demais”. Durante três anos, as Fundações Rockfeller e Ford financiaram a vinda de pesquisadores norte-americanos para Viçosa. Eles trouxeram em suas bagagens conhecimentos científicos agrícolas que

EuA Reatando

laços

Trazendo à memória antigos vínculos de cooperação entre Minas e Purdue, novo acordo promete avanços científicos na área de bioenergia

Kátia Brito

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MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 43

proporcionaram o desenvolvimento dessa área em Minas e no Brasil. “Foi graças a isso que se iniciou, em 1961, no Brasil, o primeiro mestrado stricto sensu nos mol-des que conhecemos hoje”, conta Vilela.

Por 15 anos, os doutores de Pur-due compartilharam com os estudantes mineiros de então conhecimentos que proporcionaram a elaboração do sistema agrícola de Minas. Agora, uma nova etapa dessa cooperação está para ser iniciada. Por meio de uma parceria que envolve, além das duas universidades, a FAPEMIG, surgem novas perspectivas para o desen-volvimento da área de bioenergia. “Naque-la época, Purdue ajudou Viçosa e o Brasil a inventar a agricultura que temos hoje. Hoje essa área precisa ser modificada, pois o clima, os recursos naturais e o meio am-biente estão em constante transformação. Portanto, essa cooperação internacional tem uma importância muito grande”, avalia Evaldo Vilela.

O novo convênio foi assinado em maio de 2011, durante o simpósio interna-cional Frontiers in Bioenergy: United Sta-tes-Brazil Symposium on Sustainable Bio-energy (Fronteiras em Bioenergia: Estados Unidos-Brasil Simpósio em Bioenergia Sustentável), em Purdue. Diferentemente do que fora firmado no passado com Vi-çosa, ele prevê o intercâmbio técnico-cien-tífico e de pesquisadores. O interesse dos cientistas estadunidenses está no etanol brasileiro, principalmente no desenvolvi-mento de variedades de cana-de-açúcar melhoradas, no processo de fermentação e na distribuição do plantio. O Brasil, por sua vez, quer conhecer o processo desen-volvido por Purdue de fermentação da cana para transformação em combustível. “Eles têm uma técnica interessante, na qual uti-lizam as folhagens que sobram do corte da cana para fazer o álcool. Essa técnica é chamada hidrólise enzimática da celulose. E essa tecnologia nós não temos”, expli-ca o subsecretário. Tal procedimento, se aplicado na fermentação brasileira, pode tornar o processo de obtenção do álcool mais eficiente.

A viabilização da troca de conheci-mentos e intercâmbio de cientistas entre Minas e Indiana, Estados Unidos, vai acon-tecer por meio do Instituto de Pesquisa em Energias Renováveis (Bioerg). O instituto é um escritório gestor que pertence à Secre-taria de Estado de Ciência e Tecnologia e Ensino Superior e objetiva promover e exe-cutar pesquisas para o desenvolvimento e inovação no setor da bioenergia. Segundo Vilela, as pesquisas passarão pelo Bioerg a fim de articular trabalhos que se comple-mentem e pesquisadores para atuarem de forma concentrada na progressão de uma determinada área da bioenergia. “Existem pessoas no Bioerg que estudam o tema e sabem qual é a necessidade científica para a área no momento. Isso vai ajudar o Estado a competir naquilo em que somos bons” explica.

Depois das pesquisas passarem por especialistas do Bioerg, elas serão sub-metidas à avaliação da FAPEMIG, que por sua vez irá selecionar os beneficiados. O

A Purdue University fica situada na cidade de West Lafayette, no Estado de In-diana, localizado na região centro-oeste do país norte americano. Dentro do ranking das indústrias agropecuárias, o Estado ocupa o primeiro lugar, sendo um dos prin-cipais produtores de trigo e milho dos Estados Unidos. Por se localizar na região central do país Indiana foi importante na expansão norte-americana, rumo ao oes-te, no século XIX. Por causa dessa significativa participação Indiana adotou o lema Crossroads of America (As estradas da América).

que ainda não ficou decidido é como será a divisão de investimentos entre as duas instituições, que estão em fase final de negociação. De acordo com Vilela, a par-ticipação em projetos internacionais abre muitas portas. “Quando nos aliamos a instituições que são destaque na área de Ciência e Tecnologia ganhamos em qua-lidade. Com isso, criamos oportunidades para os nossos pesquisadores trabalharem com o ‘top’ do mundo”.

Parceiro à vistaOutra negociação que ainda está em

fase de diálogo é com o Instituto de Tec-nologia de Massachussetts (MIT), um dos maiores centros de desenvolvimento cientí-fico e tecnológico do mundo. O acordo deve acontecer no mesmo molde de Purdue: fun-do conjunto para patrocínio de intercâmbio de pesquisadores. Entretanto, ainda não existe nenhum documento formalizando a cooperação entre FAPEMIG e MIT.

Foto: SXC.HU

Desenvolvimento de variedades de cana-de-açúcar é um dos Interesses dos cientistas norte-americanos, em relação ao etanol brasileiro

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ENTO Os muitos

sabores do reino de láHistórias de estudantes e pesquisadores brasileiros no exterior revelam rotinas atribuladas, mas, ao mesmo tempo, coroadas por conhecimento, amizade e cultura

Maurício Guilherme Silva Jr.

A maioria dos estudantes e pesquisadores brasileiros desfaz as malas nos Estados Unidos, na França, em Portugal, na Espa-nha e na Alemanha. Nos últimos cinco anos, aumentou 23% o número de estudantes agraciados com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação. No último ano, 4.900 brasileiros par-tiram em busca de cursos de graduação, mestrado, doutorado, pós-doutorado ou estágio no exterior (com bolsas de US$ 870 a US$ 2.300, além de auxílio-instalação e seguro-saúde). A divulgação, em julho de 2011, de que a Capes e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) concederão 75 mil bolsas de estudo no exterior deve aumentar ainda mais a presença de brasileiros em centros de excelência em pesquisa e ensino do mundo.

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Dos múltiplos condimentos recendia o aroma da di-versidade. Na animada cozinha comunitária da Internacional University of Japan, instituição com sede em Niigata, estu-dantes indianos, mongois, costarriquenhos, quirguistaneses, japoneses, norte-americanos – e de outras tantas nacionali-dades – preparavam juntos suas tradicionais maravilhas gas-tronômicas. Como nas melhores reuniões ao redor do fogão, o ápice da “festa” revelava-se ao final: prontas as delícias multiculturais, todos acabavam por provar um pouquinho de tudo. Assídua frequentadora de tais “saraus culinários”, a en-tão mestranda Flávia Cerqueira, única brasileira matriculada na instituição nipônica em 2008, descobriria ali, em meio a inusitados ingredientes, técnicas e receitas, alguns dos mais intensos sabores já experimentados em sua permanente bus-ca pelo conhecimento.

Tal prosaica lembrança das refeições coletivas – uma espécie de “metáfora real” da múltipla e fascinante experiên-cia de um estudante em solo estrangeiro – jamais abandona-ria a mente da (hoje mestre) Flávia, atual assessora científica internacional da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG): “Na universidade japonesa, cada estudante possuía um dormitório individual, mas, na hora das refeições e das festas, todos se encontravam”, res-salta. Pois do início ao fim do desenvolvimento de sua dis-sertação, muitos seriam os pratos e folias – assim como os aprendizados, histórias, valores e sonhos – vivenciados em terras orientais. “Ao estudar em outro país, convive-se o tem-po inteiro com a riqueza de diversas culturas”, ressalta, ao comentar, de modo bem-humorado, o “choque” diário diante das inúmeras novidades: “Em algum momento da viagem, você se dá conta de que, a seu lado, há um colega nascido no Sri Lanka”.

A “aventura nipônica” de Flávia Cerqueira – que, aliás, aprendeu o complexo idioma japonês – soma-se à vivência de milhares de estudantes e pesquisadores brasileiros que, ano a ano, buscam conhecimento científico em outras na-ções. Dados da Organização para a Cooperação e Desenvol-vimento Econômico (OCDE) revelam que, ao longo de apenas 12 meses, cresceu 14% o número de alunos de nível superior a estudar ou desenvolver projetos fora do Brasil.

MINAS FAZ CIÊNCIA • ESPECIAL 2011 45

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Segundo o relatório Education at a glance, de 2010, eles eram 27.571 em 2008, con-tra 24.157 em 2007. Menos de uma década antes, no ano 2000, havia apenas 11 mil em terras estrangeiras.

Rotinas cosmopolitasA ideia de uma experiência no ex-

terior sempre esteve nos planos do mé-dico Marcelo Mamede, que, em 1998, ao desenvolver trabalho no Distrito Federal, soube de um edital da embaixada japone-sa para estudantes brasileiros: “Naquela época, interessava-me estudar a tecnolo-gia Tomografia por Emissão de Pósitron (PET) em pacientes oncológicos, exame diagnóstico ainda não disponível em nos-so país, mas há anos dominado pelos ja-poneses”. Dito e feito: selecionado para o projeto, Mamede muda-se para a cidade histórica de Kyoto, “com seus mais de 2 mil templos budistas”, em março de 1999.

O médico permaneceria no Japão para um treinamento de dois anos, mas, aprovado em pós-graduação da Univer-sidade de Kyoto, tem a bolsa estendida para conclusão do doutorado. Ao iniciar os trabalhos no Departamento de Medici-na Nuclear e Diagnóstico por Imagem do hospital universitário, acaba por se envol-ver numa série de projetos de pesquisa, a exemplo do desenvolvimento de moléculas para avaliação de neurorreceptores em fu-mantes. “Durante o doutorado, a rotina de trabalho era bastante pesada. Tive apenas

dois meses de férias e aproveitei para visi-tar meus familiares. Apesar disso, tudo era extremamente proveitoso”, afirma.

De volta ao Brasil em 2004, o médico descansaria por apenas três meses, para, em seguida, partir em busca de mais co-nhecimento. Dessa vez, porém, em territó-rio ocidental: Mamede é aceito em curso de pós-doutorado nos Estados Unidos e se muda para Bethesda, cidade próxima ao National Institutes of Health (NIH): “A pri-meira impressão foi extasiante, pois o NIH é praticamente uma cidade, com seus mais de 60 prédios dedicados à pesquisa. Ali, continuei meus trabalhos de PET em onco-logia, mas focados em estudos clínicos”.

Em território norte-americano, a roti-na revelara-se um pouco mais leve. Afinal, na condição de pós-doutor, os projetos não lhe causavam o estresse da correria no Japão: “Visitei meus familiares em duas ocasiões e ainda pude conhecer outros laboratórios nos Estados Unidos”. Ape-sar disso, nada de parar por aí: em 2005, após nova seleção, o pesquisador muda-se para Boston. “Terminada a primeira fase de trabalhos, busquei novo pós-doutorado em um dos hospitais da Universidade de Harvard, fruto de variações dos temas de-senvolvidos no NIH”, explica.

Na visão do viajado médico e pes-quisador, a convivência cultural e científica em outro país está diretamente ligada à natureza do trabalho desenvolvido. Para ele, ter dedicação exclusiva aos estudos e experimentos é a base para melhoria da formação científica. “Infelizmente, não temos algo similar nas universidades bra-sileiras. No Japão, vivenciar o modelo de trabalho dos médicos pesquisadores foi o que influenciou minha postura atual”, co-menta. Com relação aos Estados Unidos, Mamede diz ter aprendido muito com os estudos clínicos e as informações ampla-mente disponíveis. “Tudo foi extremamente positivo e construtivo. A meu ver, todos os pesquisadores deveriam ter experiência no exterior para comparar e separar o que te-mos daquilo que é preciso melhorar”, con-clui, ao ressaltar que é preciso “valorizar aquilo que não valorizamos e desmistificar o que achamos que sabemos, ou pelo me-nos pensamos que sabemos”.

Visita técnica a Usina Nuclear em Niigata – parte de uma disciplina. Flávia Cerqueira (em pé, a quarta da esquerda para a direita) e alguns dos amigos que conheceu no JapãoFoto: Arquivo pessoal

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Também cosmopolita, o atual reitor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Clélio Campolina Diniz, destaca que as experiências no exterior são impor-tantíssimas por ampliar a rede de contatos do pesquisador. No início de sua carreira, como funcionário do Banco de Desenvolvi-mento de Minas Gerais (BDMG), trabalha-va como datilógrafo, no setor de Estudos de Planejamento, ao lado de importantes professores da UFMG, a exemplo de Fer-nando Antonio Roquette Reis, Élcio Costa Couto e Álvaro Santiago.

No mesmo período, ao longo da década de 1960, Campolina forma-se em Engenharia e o BDMG realiza acordo com o Instituto Latinoamericano de Plani-ficação Econômica (Ilpes), com sede em Santiago, no Chile. “Por lá, liguei-me a um grupo de importantes pesquisadores brasileiros e fui convidado, por Carlos Matos, ex-presidente do Banco Central, a fazer um curso de longa duração”, conta. Tal oportunidade permitiu que ele se en-cantasse pelos estudos econômicos. “De volta ao Brasil, fiz mestrado na Universi-dade Estadual de Campinas (Unicamp) e, logo depois, veio a ‘opção pela pobreza’: larguei o trabalho no BDMG e comecei minha carreira na UFMG”, diz.

Na Universidade, Clélio Campolina assume o Departamento de Economia da

Faculdade de Ciências Econômicas (Face) e começa a trazer visitantes estrangeiros a Belo Horizonte. A ideia de internacionaliza-ção revelava-se cada mais próxima de sua realidade: “Após o doutorado, também na Unicamp, passei um ano em Oxford. De lá, fui para a Itália e, então, para a University Of Rudgers, nos Estados Unidos, onde me liguei à professora Ann Markusen, com quem trabalho até hoje, 20 anos depois”.

Por meio das pesquisas ao lado de Markusen, o atual reitor da UFMG realizou dezenas de contatos em todo o mundo, a ponto de trabalhar com pesqui-sadores de países como Coreia do Sul, Japão e Estados Unidos, além de partici-par de comissões científicas internacio-nais. “Permaneço, contudo, um ‘capiau cosmopolita’. Saí lá da barranca do rio e a coisa mais difícil, para mim, foi mudar 30 quilômetros, quando eu tinha 12 anos. À época, fui morar com minha avó, que depois morreu, e eu nunca mais morei na casa dos meus pais”, afirma.

Para o físico Felipe de Oliveira Alves, doutor em astrofísica pela Universidade de Barcelona, a rotina de trabalho de um pes-quisador no exterior não se distingue mui-to de suas atividades na terra natal. “Minha rotina profissional na Espanha e, agora, em Bonn, na Alemanha, onde tenho contrato de pós-doutorado, não é tão diferente da

Paisagens deslumbrantes fizeram parte da rotina de Martha Linhares (de calça preta)

Fotos: Arquivo pessoal

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que eu tinha no Brasil. Diariamente, sigo ao instituto e desenvolvo minha pesquisa, sempre com uma paradinha para o café”, conta, ao ressaltar que a grande diferença, em relação à realidade brasileira, está a seu redor: “O nível de internacionalizacão num instituto de pesquisa europeu é in-crivelmente alto, tanto que o idioma pa-drão, por aqui, é o inglês”. Além disso, há grande facilidade para desenvolver conta-tos profissionais, posto que, diariamente, encontra-se com astrônomos visitantes, a ministrar palestras ou cooperar com pes-quisadores locais. “Isso é certamente uma das maiores aportações profissionais que ganhei por trabalhar no exterior: o dina-mismo cooperativo”, conclui.

A gente nãoquer só pesquisa

Nem só de estudos e desafios, po-rém, sobrevivem os pesquisadores. A vida em outro país também se revela a oportu-nidade para que se aprimorem em línguas e descubram as belezas de outras culturas, tradições e... amizades. Professora da Uni-versidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), Martha Maria Prata Linhares não sentiu dificuldades em se adaptar ao Ca-nadá – onde realizou doutorado sanduíche na Queen’s University – por conta, justa-mente, da gentileza das pessoas: “Apesar do frio intenso, adaptei-me com facilidade. Os canadenses são muito gentis e me cer-caram de atenções e cuidados. Lá, não me senti estrangeira no Canadá, pois minha cultura foi muito bem aceita”.

Na instituição onde estudou, a pes-quisadora convivia com diversos outros estudantes e professores estrangeiros. Além disso, a cidade de Kingston, sede da univer-sidade, conta com excelente infraestrutura e grande oferta de casas e quartos para alugar. Some-se a tais vantagens a inin-terrupta movimentação artística do lugar. “A programação cultural da cidade nos finais de semana era de ótima qualidade, com muitas apresentações musicais. Isso me fez sentir adaptada logo nos primeiros dias”, destaca.

Pois diversão é o que realmente não faltou à rotina de Martha. Todos os dias, ela acordava cedo para as aulas na univer-

sidade e, apesar do frio intenso, seguia a pé, “pois gostava da caminhada e sem-pre encontrava esquilos pelo caminho”, afirma, ao descrever, ainda, suas variadas atividades, digamos, extracurriculares: “As terças-feiras pela manhã eram especiais, pois ia à Stone House, a casa de pedra, fa-zer arte. Trata-se da sede do programa Arts Matter e um dos espaços disponíveis para que os professores da faculdade de Educa-ção possam criar”. Além disso, a profes-sora visitava escolas integrantes do projeto Learning Through the Arts e participava de pesquisas especiais. “Fomos ao campo al-gumas vezes e, em determinado momento, fizemos observações em uma escola. Esta pesquisa introduziu-me às questões relati-vas ao ‘ritmo’ na aprendizagem, tema novo para mim à época, que depois acabei agre-gando à minha tese”.

Os instantes de entretenimento tam-bém incluíam passeios, pequenas refei-ções e lanches nas casas dos professores da universidade, além de “cafezinhos no Second Cup e leituras na Livraria Índigo”. Para não falar do saboroso hot apple cider, o suco de maçã quente, das caminhadas pela Princess street – a principal rua do centro de Kingston –, a apreciar os bre-chós e as pequenas galerias de arte. “Tam-bém gostava muito de caminhar na beirada do lago e tirar fotografias”, recorda-se, ao dizer, emocionada, que os laços de amiza-de que construiu, na ocasião, permanecem firmes: “Voltei ao Canadá para participar de evento científico e visitar meus amigos. Uma delas, a Katharine, também já veio ao Brasil e passou alguns dias comigo”.

Em suas experiências no exterior, o médico Marcelo Mamede passava os mo-mentos de lazer com os amigos que cul-tivou durante a jornada estrangeira: “Em território japonês, o período foi de intensa imersão em várias culturas, mas, principal-mente, na local. Nos Estados Unidos, todos diziam que ‘quem morou no Japão, mora em qualquer outro lugar!’. Fingia compre-ender a piada, mas somente aqueles que vivenciaram a cultura entenderiam o valor da experiência”. O pesquisador confessa, contudo, que a vida nos EUA foi realmen-te mais tranquila, em função dos poucos choques culturais. O que não quer dizer

“O nível de internacionalizacão num

instituto de pesquisa europeu é incrivelmente alto,

tanto que o idioma padrão, por aqui, é o inglês”.

Felipe de Oliveira AlvesFísico

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SãO SEuS OLhOS...MINAS FAZ CIÊNCIA quis saber dos pesquisadores

entrevistados pela reportagem o que seus pares, no exte-rior, acham dos cientistas brasileiros. Confiram:

“Os estrangeiros veem os pesquisadores brasileiros conforme nossa postura ética e construtiva. Há profissio-nais extremamente qualificados no Brasil, mas faltam re-cursos para projetos inovadores. Ainda estamos presos a conceitos que não fazem sentido na atualidade. Precisa-mos de gerentes de processos administrativos com visão multidisciplinar, mais interessados no desenvolvimento de várias áreas (menos beneficiadas), para geração de pesqui-sadores que saiam, mas retornem.”

Marcelo Mamede, médico

“Os pesquisadores brasileiros são muito respeitados. Na astrofísica e, acredito, na física, somos vistos como trabalhadores competentes. Como exemplo, ressalto que o Brasil, com apenas 2% de tempo de observação nos teles-cópios Gemini, possui uma das melhores frações – número de publicações/tempo de observação – dentre os parceiros neste consórcio. Outro exemplo é que, como novo membro do ESO, conseguimos ter uma dentre as poucas propostas de observação aceitas no novo interferômetro de antenas instalado no Chile: ALMA. A concorrência, para pedir tem-po nesse instrumento, foi muito alta e, por isso, poucos projetos foram galardeados. Cada vez mais, enfim, o mun-do científico se interessa pelos pesquisadores brasileiros.”

Felipe Alves, físico

“A partir dos contatos que realizamos, nossas redes vão sendo criadas e pesquisadores vêm até nossas univer-sidades, participam conosco de nossas pesquisas e even-tos. Além disso, somos convidados a participar de eventos e a nos integrarmos em projetos e pesquisas com grupos de outros países. A aprendizagem é de todos”

Martha Maria Prata Linhares

que os olhares enviesados tenham se dissipado completamen-te: “Ser americano do sul era motivo de preconceito, como se eu fosse imigrante ilegal. Tudo se desfazia quando mencionava que era pesquisador do NIH ou de Harvard”.

Atualmente em Bonn, na Alemanha, o físico Felipe Alves diz contar com diversos momentos e opções de lazer. Além dis-so, tudo em sua rotina é motivo de surpresa: “Afinal, minha vida diária é toda cercada por uma cultura distinta e por com-portamentos diferentes daqueles a que estamos acostumados no Brasil. Eu me divirto indo ao curso de idiomas ou ao com-prar comida num supermercado onde não existem, por exem-plo, salgadinhos!”. O pesquisador chama a atenção, ainda, para uma interessante característica dos europeus, que “valorizam muito seu tempo livre e não são workaholics como os ameri-canos. Isso se encaixa muito bem com nossa cultura brasileira. Nós, cientistas não somos todos ‘nerds’ como se imagina”, res-salta, de modo bem-humorado.

Por fim, quanto à fascinante oportunidade de morar no exterior, o depoimento de Felipe parece resumir os sentimentos de outros milhares de pesquisadores que, ano a ano, buscam conhecimento em longínquos horizontes: “Morar no exterior foi de longe a experiência mais interessante da minha vida. Eu me integrei muito à cultura catalã e tento fazer o mesmo na Alemanha. Acho que essa oportunidade é única: saber que há um mundo que pode ser totalmente diferente do que vivencia-mos até hoje e absorver o máximo disso. O medo de deixar o Brasil, há cinco anos, foi totalmente substituído por tudo que conquistei aqui. Afinal, sempre deve haver espaço para o novo em nossas vidas. Recomendo!”

Foto: Arquivo pessoal

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Martha Linhares em frente à Queen’s University, no Canadá, onde realizou doutorado sanduíche

Na tradição do Halloween, no Canadá, o que não faltam são amigos inusitados

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