Estudo Da Glicerina Por Analises Termicas POS GRADUACAO UFRJ

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

ESCOLA DE QUMICA

CURSO DE PS-GRADUAO EM TECNOLOGIAS DE PROCESSOS QUMICOS E BIOQUMICOS

Dissertao de Mestrado

Estudo da glicerina por Anlises Trmicas Aluna: Margarida Loureno Castell

Orientadores: Prof. Donato Alexandre Gomes Aranda, D. Sc. Prof. Jo Dweck, D. Eng.

Rio de Janeiro RJ Brasil Outubro 2009

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ESTUDO DA GLICERINA POR ANLISES TRMICAS

Margarida Loureno Castell

Dissertao apresentada ao Corpo Docente do curso de Ps-Graduao em Tecnologias de Processos Qumicos e Bioqumicos da Escola de Qumica da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessrios para a obteno do grau de Mestre em Cincias. Orientadores:Prof. Donato Alexandre Gomes Aranda, D. Sc.

ESCOLA DE QUMICA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO 2009

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ESTUDO DA GLICERINA POR ANLISES TRMICAS Margarida Loureno Castell

DISSERTAO SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DO CURSO DE PSGRADUAO EM TECNOLOGIAS DE PROCESSOS QUMICOS E BIOQUMICOS DA ESCOLA DE QUMICA COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSRIOS PARA A OBTENO DO GRAU DE MESTRE EM CINCIAS. APROVADA POR:

________________________________________________________ Prof. Donato Alexandre Gomes Aranda, D. Sc. _______________________________________________________ Prof. Jo Dweck, D. Eng.

_________________________________________________________ Profa. Maria Luisa Aleixo Gonalves, D.Sc.

_______________________________________________________ Profa Suely Pereira Freitas, D. Sc.

________________________________________________________ Nelson Csar Chaves Furtado, Ph. D.

Rio de Janeiro RJ, Brasil 2009

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Castell, Margarida Loureno Estudo da Glicerina por Anlises Trmicas. Rio de Janeiro/2009. Dissertao (Mestrado em Tecnologias de Processos Qumicos e Bioqumicos) Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ. Escola de Qumica, 2009. Orientadores: Donato Alexandre Gomes Aranda Jo Dweck 1.Glicerina 2. Anlises Trmicas 3. Volatilizao. I. Universidade Federal do Rio de Janeiro Escola da Qumica. II. Ttulo.

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Para minha famlia, que faz cada momento de minha vida um presente de Deus: meu marido, Ramiro, e meus filhos Pilar, Vera e Ramiro.

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AGRADECIMENTOS Por vezes duvidei da existncia de Deus. Ou de que Ele se fizesse presente no mundo. Ento, um dia, reconheci um anjo. Na forma de gente. Uma pessoa que s faz o bem, cujas mos curam, acalentam, alimentam, e cultivam flores. Lbios que cantam cantigas de roda, oram, consolam, incentivam e sorriem. Gestos contidos, mas atitude firme de quem adota crianas e bichos, e enche-os de mimos. Serei sempre grata minha madrinha, D. Nilza Guimares Barboza, o anjo que testificou a existncia de Deus em minha vida, e me fez acreditar em mim mesma. Na lngua portuguesa a palavra lente descreve um objeto que amplia nosso sentido de enxergar. Mas tambm sinnimo de professor. Talvez porque haja professores capazes de ampliar a capacidade de seus alunos, fazendo-os ver o invisvel, e guiando-os na rdua aventura do aprender. Minha mais profunda gratido a meu querido lente, Dr. Jo Dweck, que me alou a seus gigantescos ombros, e me fez ver mais e melhor. H pessoas que deixam uma marca boa e indelvel em nossas almas. Por sorte, tive grandes mestres assim, que servem de farol quando me vejo entre cogitaes, sejam de natureza cientfica ou tica. Sou muito grata ao meu orientador, Dr. Donato Aranda que acreditou e investiu tempo e saber nesta empreitada de fazer de mim uma Mestra. Generosidade marca de grandes homens, daqueles que conseguem transformar chumbo em ouro, mas que o fazem sem almejar lucro. So pessoas que melhoram o mundo, contribuindo para o aperfeioamento de outras que, como eu, teve a ventura de encontr-las pelo caminho desta vida. Minha eterna admirao e gratido pelos que foram meus professores na antiga Escola Tcnica Federal de Qumica do Rio de Janeiro, ETFQ-RJ: Jos Guerchon, Reinaldo, Zezinho, Marco Antnio, Jos Carlos, Valier, Morgado, Geraldo, Ivonilton, Elisa, Falcon, Virglio. Para citar apenas algumas estrelas daquele brilhante firmamento. Tive certa feita um aluno que me ensinou muito. E que catalisou o processo que me fez chegar at aqui. Obrigada, Bruno. Hoje tenho a honra de poder cham-lo de amigo. A meus familiares e amigos, em particular a Flvia, que me deram abrigo e apoio no Rio, quando vinha estudar. Meus mais sinceros agradecimentos aos colegas do LADEQ, Carla, Reinaldo, Alex, que me ajudaram nas anlises, e que foram sempre grandes incentivadores. Tambm a Mrio, cuja ajuda com as Anlises Trmicas foi fundamental para a construo desta tese. A meus colegas do Instituto Federal Fluminense campus Maca pelo apoio, e a todos os que de alguma maneira contriburam para a realizao deste trabalho.

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CASTELL, M. L. Estudo da glicerina por anlises trmicas. Orientadores: Prof. Dr. Donato Alexandre Gomes Aranda; Prof. Dr. Jo Dweck. Escola de Qumica, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Brasil, 99 p. Dissertao (Mestrado). RESUMO

A glicerina uma substncia que vem sendo usada pela humanidade h mais de um sculo, seja como aditivo para alimentos, frmacos e cosmticos, seja como matria-prima para a obteno de outros produtos. Atualmente, a produo de biodiesel ameaa encharcar o mercado de produtos qumicos com glicerina que, nas rotas mais comuns de produo, gerada na proporo de 0,1 kg por litro de biodiesel produzido. A busca de novas tecnologias de aproveitamento desta substncia demanda um conhecimento mais profundo de suas propriedades, e as Anlises Trmicas podem contribuir nesta construo. Nesta dissertao encontram-se os estudos de caracterizao e volatilizao da glicerina por Termogravimetria (TG) e por Anlise Trmica Diferencial (DTA), em anlises isotrmicas e dinmicas. O estudo por DTA mostrou que a estabilidade trmica da glicerina em atmosfera oxidante menor do que aquela em atmosfera inerte, indicando que o aquecimento da glicerina em temperaturas acima da ambiente promovem reaes de oxidao. Foi desenvolvido um mtodo de determinao de teor de gua em glicerina por TG que pode ser aplicado a misturas com graus de umidade desde ppm at 30%. Os resultados foram comparados com um mtodo de determinao de gua por Karl-Fischer e com os teores de gua usados na preparao das solues testadas, indicando a acurcia do mtodo. Os estudos cinticos foram feitos pelo mtodo de Kissinger, pelo mtodo das isoconverses e por estudos das curvas termogravimtricas isotrmicas. Todos mostram que a glicerina no sofre uma simples volatilizao, mas que entre 10 e 40% de perda de massa inicial este apresenta-se como o mecanismo preponderante. Nesta faixa comeam a ocorrer reaes qumicas paralelas, mas ainda em uma extenso discreta. Entretanto, a partir dos 40% de converso, os clculos mostram que a energia de ativao do fenmeno global difere muito da calculada nas converses iniciais, sugerindo que passam a preponderar reaes qumicas de pirlise e de oxidao, o que corroborado pelos depsitos carbonceos verificados nos cadinhos.

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CASTELL, M. L. Studying the glycerol through Thermal Analysis. Advisors: Prof. Dr. Donato Alexandre Gomes Aranda; Prof. Dr. Jo Dweck. School of Chemistry. Federal University of Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Brazil, 99 p. Monography (Master of Science). ABSTRACT Glycerol is a substance that has been used for over a century, for many purposes such as additive for foods, pharmaceuticals and cosmetics or as raw material for obtaining other products. Currently, the production of biodiesel threat flooding the chemical market with glycerol that, on the most common output is generated at 0.1 kg per liter of biodiesel produced. The search for new technologies for exploitation of this material requires a deeper understanding of his properties, and Thermal Analysis can contribute to this construction. The present work has the studies of characterization and volatilization of glycerol by Thermogravimetry (TG) and Differential Thermal Analysis (DTA) in isothermal and dynamic analysis. The study by DTA showed that the thermal stability of glycerin in an oxidizing atmosphere is less than that in an inert atmosphere, indicating that heating glycerol at temperatures above ambient promote oxidation reactions. It has been developed a method for determining water content in glycerol by TG that can be applied to mixtures with moisture contents from ppm up to 30%. The results were compared with a method of water determination by Karl-Fischer, and the levels of water used in the preparation of the solutions tested, proving the accuracy of the method. Kinetic studies were made by Kissinger method, isoconversions method, and by the studies of the isothermal thermogravimetric curves. All studies suggest that glycerin does not undergo a simple volatilization, but between 10 and 40% of initial weight loss this should be the predominant mechanism. Parallel chemical reactions seem to be occurring, but still in a slight extension. However, after 40% conversion, calculations show that the kinetic energy of the global phenomenon is very different from that calculated in the initial conversion, suggesting that the chemical reactions of pyrolysis and oxidation prevail, which is supported by the carbonaceous deposits observed in crucibles.

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SUMRIO 1 2 INTRODUO....................................................................................................................1 REVISO BIBLIOGRFICA.............................................................................................4 2.1 Glicerina ou glicerol .....................................................................................................4 2.1.1 A qumica da glicerina ......................................................................................6 2.1.2 Reaes qumicas ..............................................................................................6 2.1.3 Glicerina e acrolena .........................................................................................8 2.1.4 Preparao da glicerina .....................................................................................9 2.2 Biodiesel e glicerina ....................................................................................................11 2.2.1 Transesterificao de triglicerdeos ................................................................11 2.2.2 A legislao e o biodiesel ...............................................................................13 2.2.3 Tsunami da glicerina ...................................................................................15 2.3 Anlises trmicas ........................................................................................................16 2.3.1 Anlise Termogravimtrica ............................................................................16 2.3.2 Anlise Trmica Diferencial ...........................................................................19 2.3.3 Aplicaes de anlises trmicas ......................................................................20 MATERIAIS E MTODOS ..............................................................................................24 3.1 Materiais e equipamentos ...........................................................................................24 3.1.1 Preparo das amostras ......................................................................................24 3.1.2 Anlises trmicas ............................................................................................25 3.1.2.1 Anlises dinmicas ...........................................................................25 3.1.2.2 Anlises isotrmicas .........................................................................26 3.2 Ensaios de caracterizao ...........................................................................................26 3.2.1 Determinao da estabilidade trmica ............................................................26 3.2.2 Determinao do teor de gua por Karl-Fischer .............................................26 3.2.3 Determinao do teor de gua por termogravimetria .....................................27 3.2.4 Curva de destilao .........................................................................................29 3.3 Estudos cinticos ........................................................................................................29 3.3.1 Mtodo de Kissinger ......................................................................................30 3.3.2 Mtodo das isoconverses ..............................................................................35 3.3.3 Mtodo por anlises isotrmicas .....................................................................36 4 RESULTADOS E DISCUSSO .......................................................................................38 4.1 Caracterizao da glicerina .........................................................................................38 4.1.1 Estabilidade trmica ........................................................................................38 4.1.2 Teor de gua ....................................................................................................41 4.1.2.1 Por Karl-Fischer ...............................................................................41 4.1.2.2 Por termogravimetria ........................................................................42 4.1.2.3 Comparao dos mtodos .................................................................44 4.1.3 Destilao da glicerina ....................................................................................46 4.2 Estudos cinticos .........................................................................................................47 4.2.1 Anlises dinmicas iniciais .............................................................................48 4.2.1.1 Mtodo de Kissinger ........................................................................50 4.2.1.2 Mtodo das isoconverses ................................................................54

3

X

4.2.2

Anlises isotrmicas .......................................................................................56 4.2.2.1 Anlises termogravimtricas ............................................................56 4.2.3 Anlises dinmicas complementares ..............................................................67 4.2.3.1 Anlises dinmicas no Prottipo TGA .............................................67 4.2.3.2 Anlises dinmicas no SDT .............................................................68 4.2.3.2.1. Mtodo de Kissinger ......................................................................70 4.2.3.3 Mtodo das isoconverses ................................................................72 4.2.4 Comparao de resultados cinticos ...............................................................73

5 6 7

CONCLUSES .................................................................................................................76 SUGESTES .....................................................................................................................77 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ...............................................................................78

XI

NDICE DE FIGURAS

FIGURA 2.1 Frmula estrutural plana da glicerina.................................................................4 FIGURA 2.2 Rearranjo de pinacol na glicerina.......................................................................7 FIGURA 2.3 Reao tpica de saponificao...........................................................................9 FIGURA 2.4 Reao de nitrao da glicerina........................................................................10 FIGURA 2.5 Produo de glicerina a partir do propeno........................................................11 FIGURA 2.6 Transesterificao de triglicerdeos na produo de biodiesel.........................12 FIGURA 3.1 Detalhes da determinao do teor de gua pelas curvas TG e DTG de uma amostra de glicerina P.A. em taxa de aquecimento de 10oC/min e fluxo de 100 mL/min de nitrognio..................................................................................................................................28 FIGURA 4.1 Curvas TG/DTG e DTA de glicerina pura em ar e em nitrognio...................38 FIGURA 4.2 Comparao entre as reas dos picos DTA em ar e em nitrognio..................39 FIGURA 4.3 Detalhe das curvas TG, DTG e DTA de glicerina pura em ar..........................40 FIGURA 4.4 Teor de gua em glicerina pura por Karl-Fischer.............................................42 FIGURA 4.5 Teor de gua em amostra de glicerina P.A. por TG/DTG................................43 FIGURA 4.6 Determinao de teor de gua por TG/DTG....................................................44 FIGURA 4.7 Comparao entre os teores de gua medidos por gravimetria e por TG........45 FIGURA 4.8 Curvas TG de glicerina a 10, 15 e 20oC/min....................................................48 FIGURA 4.9 Curvas DTG de glicerina a 10, 15 e 20oC/min.................................................49 FIGURA 4.10 Curvas DTA de glicerina a 10, 15 e 20oC/min.................................................49 FIGURA 4.11 Determinao dos parmetros cinticos pelo mtodo de Kissinger utilizando dados de anlises por DTA.......................................................................................................51 FIGURA 4.12 Determinao dos parmetros cinticos pelo mtodo de Kissinger utilizando dados de anlises por DTG.......................................................................................................52 FIGURA 4.13 Anlises por isoconverso da glicerina de 10 a 40% de converso..................55 FIGURA 4.14 Anlises por isoconverso da glicerina de 50 a 90% de converso..................55 FIGURA 4.15 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 260oC. Massa de amostra=1,106g...57 FIGURA 4.16 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 275oC. Massa de amostra=1,081g...57 FIGURA 4.17 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 290oC. Massa de amostra=1,123g...58 FIGURA 4.18 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 300oC. Massa de amostra=1,094g...58 FIGURA 4.19 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 350oC. Massa de amostra=1,175g...59 FIGURA 4.20 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 375oC. Massa de amostra=1,160g...59 FIGURA 4.21 Curva TG isotrmica de glicerina P.A. a 400oC. Massa de amostra=1,065g...60 FIGURA 4.22 Curva isotrmica de glicerina a 260oC entre 10 e 40% de converso..............61 FIGURA 4.23 Curva isotrmica de glicerina a 275oC entre 10 e 40% de converso..............62

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FIGURA 4.24 Curva isotrmica de glicerina a 290oC entre 10 e 40% de converso..............62 FIGURA 4.25 Curva isotrmica de glicerina a 300oC entre 10 e 40% de converso..............63 FIGURA 4.26 Curva isotrmica de glicerina a 350oC entre 10 e 40% de converso..............63 FIGURA 4.27 Curva isotrmica de glicerina a 375oC entre 10 e 40% de converso..............64 FIGURA 4.28 Curva isotrmica de glicerina a 400oC entre 10 e 40% de converso..............64 FIGURA 4.29 Anlise dos dados de taxa mdia de vaporizao na faixa de 10 a 40% de perda de massa nas anlises isotrmicas de glicerina.........................................................................66 FIGURA 4.30 Curvas TG obtidas nas anlises de glicerina em cadinho de alumnio fechados com furo, a diferentes taxas de aquecimento............................................................................68 FIGURA 4.31 Curvas DTG obtidas nas anlises de glicerina em cadinho de alumnio fechados com furo, a diferentes taxas de aquecimento.............................................................69 FIGURA 4.32 Curvas DTA obtidas nas anlises de glicerina em cadinho de alumnio fechados com furo, a diferentes taxas de aquecimento.............................................................69 FIGURA 4.33 Mtodo de Kissinger para curvas DTA da glicerina em cadinhos fechados com furo............................................................................................................................................70 FIGURA 4.34 Mtodo de Kissinger para curvas DTG da glicerina em cadinhos fechados com furo ...........................................................................................................................................71 FIGURA 4.35 Mtodo das isoconverses em cadinho fechado com furo nas converses de 10 a 40% .......................................................................................................................................72 FIGURA 4.36 Mtodo das isoconverses em cadinho fechado com furo nas converses de 50 a 90% .......................................................................................................................................72 FIGURA 4.37 Comparao entre as Energias de ativao em cada grau de converso dos experimentos em cadinho aberto ou fechado com furo no SDT e em cadinhos com furo no prottipo ...................................................................................................................................73 FIGURA 4.38 Energias de ativao nos casos cadinho aberto e fechado com furo no SDT, a cada grau de converso em funo da temperatura respectiva, no caso da corrida a 15oC/min .................................................................................................................................................74

XIII

NDICE DE TABELAS

TABELA 2.1 Propriedades especficas da glicerina.................................................................5 TABELA 4.1 Teores de gua nas misturas com glicerina.......................................................45 TABELA 4.2 Dados da destilao de glicerina P.A................................................................46 TABELA 4.3 Medidas e parmetros utilizados a partir de curvas DTA.................................50 TABELA 4.4 Medidas e parmetros utilizados a partir de curvas DTG.................................52 TABELA 4.5 Temperaturas (oC) nos respectivos graus de converso em amostras de glicerina analisadas a diferentes taxas de aquecimento ().......................................................54 TABELA 4.6 Taxas mdias de vaporizao de glicerol entre 10 e 40% de converso obtidas por regresso linear dos dados de termogravimetria isotrmica a diferentes temperaturas.....65 TABELA 4.7 TM das curvas DTG e DTA para cadinhos fechados com furo no SDT...........70 TABELA 4.8 Energia de ativao da converso global da glicerina pelo mtodo de Kissinger em distintas condies de anlise..............................................................................................71

XIV

LISTA DE ABREVIATURAS

Abreviatura TG DTG DTA DSC ABNT DIN ASTM ANP

Significado Termogravimetria Termogravimetria dferencial Anlise trmica diferencial Calorimetria exploratria diferencial Associao Brasileira de Normas Tcnicas Instituto Alemo de Normas Sociedade Americana para Testes e Materiais Agncia Nacional de Petrleo e Biocombustveis

Introduo

1

1

INTRODUO Aparentemente o estudo de novas substncias pode ser mais atraente, do ponto de

vista da curiosidade cientfica ou pessoal. Entretanto, h um grande nmero de substncias cujo uso j to difundido que so julgadas bem conhecidas. o caso da gua, de um semnmero de substncias de origem vegetal, de diversos sais e xidos metlicos, da glicerina, para citar apenas algumas. A descoberta ou a sntese de novas substncias abre caminho para tecnologias ainda adormecidas, favorece outras que, at ento, pareciam inexequveis, modifica a vida quotidiana, prope novas maneiras de interao do homem com o meio ambiente, redesenha o indivduo e, muitas vezes, as relaes de poder que descrevem certas sociedades. O sculo XX foi significativamente profcuo neste particular. A descoberta de que o petrleo era no apenas abundante na Terra, mas tambm matria-prima de milhares de substncias e materiais, foi um marco significativo que alterou inexoravelmente a marcha da Histria. Assim, tambm a Biotecnologia, as Cincias dos Materiais, as Cincias Biomdicas conheceram no sculo passado um perodo de grandes conquistas, como nenhum outro at ento. Os casos de sucesso se sucedem e so to significativos que, em grande parte deles, a substncia em questo tornou-se insubstituvel. O desafio passou a ser, ento, novas maneiras de se produzir as j consagradas substncias. Este o caso, por exemplo, do diesel que designava, na primeira dcada do sculo XX, o motor a combusto interna idealizado e construdo por Rudolph Diesel e movido a leo de amendoim (DIESEL, 1912; SHAY, 1993). A descoberta de uma frao de petrleo que apresentava excelente rendimento no motor, e que por sua abundncia prometia ser um substituto vantajoso ao leo vegetal, garantiu a popularizao deste combustvel que passou a chamar-se, como o motor a que se destinava, leo diesel. Passados 100 anos, a mistura de hidrocarbonetos no encontrou concorrente a altura, mas seu uso to amplamente disseminado acabou por apresentar desvantagens insuspeitas. Assim, antes de se trocarem os tipos de motores, buscam-se novos combustveis para o mesmo fim, mas com caractersticas menos agressivas ao meio-ambiente. O substituto natural, ironicamente, parecia ser o leo vegetal que primeiro fizera funcionar o invento do Sr. Diesel, segundo ele prprio: tem sido provado que motores diesel podem trabalhar com leo de amendoim sem qualquer dificuldade (DIESEL, 1912). Entrementes, a Qumica j avanou a passos largos, e muitas outras propostas vm sendo elencadas no sentido de que se mantenham em pleno funcionamento os eficientes motores diesel. A preocupao com o

Introduo

2

meio-ambiente demanda, ento, novos estudos sobre velhos conhecidos, os biocombustveis, entre eles o biodiesel. O biodiesel pode ser produzido de matria-prima graxa de origem vegetal ou animal. O processo comercialmente mais interessante justamente aquele que converte triglicerdeos em misturas de steres etlicos ou metlicos, o biodiesel, e gera como co-produto a glicerina, numa proporo que os processos atuais mantm em 0,1 kg de glicerina/litro de biodiesel (BOUAS, 2007). Desde 2005 as indstrias brasileiras vm se preparando para alcanar a meta da adio de 5% de biodiesel ao diesel de petrleo, conforme rege a Lei 11097/2005 (BRASIL, 2005). A projeo de demanda de diesel fssil crescente em todo o territrio nacional, alcanando 52 bilhes de litros anuais em 2010, segundo estudos de Monteiro Jr. (2005), forando o mercado brasileiro a buscar a meta de produzir 2,2 bilhes de litros de biodiesel por ano. Mantendo-se a proporo, a previso ser de uma produo paralela de 220 mil toneladas/ano de glicerina j a partir do prximo ano. Em maro de 2007, os nmeros divulgados pela revista eletrnica BiodieselBR, j divergiam daqueles de 2005, afirmando que o Brasil produzir, com a mistura de 5% de biodiesel ao diesel de petrleo (comercialmente conhecido como B5), 2,6 milhes de ton de biocombustvel, o que dar 300 mil ton de glicerina. A glicerina uma substncia conhecida da humanidade h muitos anos, e seu emprego inclui as indstrias farmacuticas, cosmticas, alimentcias, de tintas e vernizes (BIODIESELBR, 2008; ADDISON, 2008; SHREVE; BRINK, 1980; KIRK-OTHMER, 1980, SCHRAUTH, 1925), entre outras. De acordo com a Associao Brasileira da Indstria Qumica (Abiquim, 2007), o consumo anual de glicerina no Brasil situa-se em torno de 13,5 mil toneladas, montante este que vem sendo suprido sem dificuldades pelas indstrias qumicas cuja capacidade instalada pode garantir at 35,8 mil toneladas/ano. A glicerina comea a inundar o mercado, num fenmeno que alguns vem como bastante positivo pela diminuio do preo, mas outros preferem chamar de tsunami da glicerina (BOUAS, 2007) numa aluso aos efeitos devastadores que, sustentam, essa oferta muitas vezes maior do que a atual causar na economia. Faz-se mister, ento, a busca de novas aplicaes para esta velha conhecida. As propostas englobam o uso da glicerina como plastificante de polmeros biodegradveis (QUIJADA-GARRIDO; IGLESIAS-GONZALEZ; MAZONARECHEDERRA; BARRALES-RIENDA, 2006), sua transformao em outras substncias como propeno e derivados ou outros hidrocarbonetos (CORTRIGHT; DUMESIC, 2007;

Introduo

3

SIMONETTI; DUMESIC, 2007), a produo de hidrognio para fins energticos (CORTRIGHT; DUMESIC, 2007), ou mesmo a queima direta, fazendo da glicerina um combustvel para caldeiras, por exemplo. Todas as propostas demandam novos estudos, contemplando diferentes linhas de pesquisa. O objetivo geral desta pesquisa foi estudar por tcnicas de anlises trmicas o comportamento da glicerina quando submetida a temperaturas acima da ambiente. Os objetivos especficos das pesquisas que levaram presente dissertao foram: oxidante; o desenvolvimento de um mtodo de determinao de teor de gua em glicerina por Anlise Termogravimtrica, visto ser a glicerina marcadamente higroscpica; a realizao de estudos cinticos da glicerina por anlises trmicas dinmicas e isotrmicas a caracterizao da glicerina e a anlise de sua estabilidade trmica quando submetida a ambiente inerte, em comparao ao ambiente

Reviso Bibliogrfica

4

2 2.1

REVISO BIBLIOGRFICA GLICERINA OU GLICEROL Glicerol um termo oriundo do grego glycks (RAMIZ-GALVO, 1909) que

significa doce. Da mesma raiz etimolgica deriva-se glicerina, termo cunhado por Michel-Eugne Chevreul em 1855, e que denuncia o sabor adocicado desta substncia. O primeiro registro histrico de obteno da glicerina foi feito por Carl Wilhem Scheele, em 1799, enquanto sua frmula estrutural foi desvendada por Charles-Adolph Wurtz em 1855 (Glicerina in BARSA, 2005; KIRK-OTHMER, 1980).

H H | | O H O | | | HC CCH | | | H O H | H

FIGURA 2.1

Frmula estrutural plana da glicerina

Glicerina e glicerol so verbetes que designam o 1,2,3-propanotriol, conforme a nomenclatura IUPAC (International Union for Pure and Applyed Chemistry). Suas propriedades organolpticas incluem, alm do sabor doce, o aspecto de lquido viscoso, inodoro e incolor, nas condies ordinrias. Suas propriedades especficas so bem conhecidas (SCHRAUTH, 1925; PATTY, 1962; KIRK-OTHMER, 1980; PERRY, 1997; OXFORD UNIVERSITY, 2005), e algumas esto listadas na Tabela 2.1.

Reviso Bibliogrfica

5

TABELA 2.1

Propriedades especficas da glicerina

Propriedade Ponto de fuso sob 760 mm Hg Ponto de ebulio sob 760 mm Hg Temperatura crtica Presso de vapor a 20oC Massa especfica a 25oC Ponto de flash (sistema fechado) (sistema aberto) Ponto de autoignio (sistema fechado) (sistema aberto)

Valor 17,8oC 290oC 492,2oC < 1mm Hg 1,261 g/cm3 160oC 193oC 370oC 400oC

A glicerina pode ser encontrada livre nos tecidos dos peixes antrticos e nos fluidos corporais de invertebrados terrestres como recurso anticongelante (RICKLEFS, 2003, p.38). Solues aquosas apresentam um ponto de fuso menor do que da gua pura, e alguns organismos vivos aproveitam-se desta propriedade para reduzir o ponto de congelamento de seus fluidos corporais. Os sais, mormente o cloreto de sdio, realizam esta funo, mas quando as condies ambientes so extremas, o aumento da concentrao desses sais tambm provocaria o rompimento da funo e da estrutura das protenas. A soluo aquosa de glicerina 10% tem seu ponto de congelamento reduzido para aproximadamente 2,3oC, sem causar grandes efeitos aos processos bioqumicos (op. cit., p. 39), mas os fluidos dos invertebrados terrestres podem apresentar at 30% de glicerina em casos extremos No corpo humano, a digesto das gorduras acontece principalmente no intestino delgado, onde a lipase pancretica catalisa a hidrlise das gorduras em cidos graxos, mono e diglicerdeos, e glicerina. Estes eventualmente so convertidos em outros triglicerdeos e fosfoglicerdeos, que atravessam os vasos linfticos das paredes intestinais, migram para o duto torcico e, ento, para a corrente sangunea. Os cidos graxos com at 12 tomos de carbono atravessam as paredes intestinais diretamente para a corrente sangunea, do mesmo modo que a glicerina livre (SACKHEIM; LEHMAN, 2001).

Reviso Bibliogrfica

6

2.1.1

A Qumica da Glicerina

Glicerina um polilcool, comportando um grupamento hidroxila em cada um dos seus trs carbonos. Isso lhe confere propriedades singulares, pois apresenta facilidade em formar pontes de hidrognio ligaes intermoleculares significativamente fortes, e justifica seus pontos de fuso e de ebulio relativamente altos, se comparados aos de outras substncias de peso molecular semelhante (MORRISON; BOYD, 1978; ALLINGER et al, 1979). De forma anloga, ligaes intermoleculares com outras substncias portadoras de hidroxila prenunciam a miscibilidade com essa natureza de compostos, como o so a gua e o etanol, nos quais apresenta solubilidade infinita (MORITA, 1976; MORRISON; BOYD, 1978; ALLINGER et al, 1979). Em verdade, as caractersticas moleculares da glicerina no apenas a tornam solvel em gua, como fazem dela uma substncia extremamente higroscpica (QUIJADA-GARRIDO et al, 2007).

2.1.2

Reaes qumicas Sendo um lcool, a glicerina sofre as reaes tpicas deste tipo de composto, mas

diferencia-se pela preferncia que pode sofrer o carbono primrio ou o secundrio, conforme seja o caso do intermedirio formado. Segundo MORRISON E BOYD (1978), ao participarem de reaes nucleoflicas, os lcoois formam ons carbnio, cuja estabilidade depende do tamanho da cadeia. Assim, uma vez que as cargas se distribuam melhor em molculas mais extensas, a estabilidade acompanha a ordem preferencial das substituies, e o carbono secundrio mais reativo do que os carbonos primrios da glicerina. Os lcoois primrios (e no caso da glicerina, os carbonos primrios) podem oxidar-se a aldedos. Nesta reao, h a eliminao de dois tomos de hidrognio para a consecutiva formao da ligao dupla com o oxignio, e por isso este processo pode tambm ser considerado uma desidrogenao. Os glicis so lcoois que contm dois grupos hidroxila em carbonos prximos (MORRISON; BOYD, 1978), como a glicerina, e podem sofrer tambm um tipo especial de oxidao: a oxidao pelo cido peridico. Nesta reao, h a ruptura das ligaes carbono-carbono de tomos adjacentes que so oxidados (ALLINGER et al, 1979). Outra reao prpria dos glicis o rearranjo de pinacol, um tipo especial de desidratao que consiste na perda da gua pelo glicol protonado seguida pelo rearranjo do

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on carbnio por meio de transposio 1,2. A Fig. 2.2 ilustra o mecanismo, segundo MORRISON e BOYD (1978).

OHCH2 OHCH H2COH OHCH2 OHCH H2(C)+

H+ OHCH2 OHCH H2C(OH2)+ OHCH2 OHCH H2(C)+ + H2O OHCH2 C(=OH)+ CH3 OHCH2 C(=O) CH3 + H+

FIGURA 2.2

Rearranjo de pinacol na glicerina

Como representante da funo lcool, a glicerina pode reagir para formar steres, teres, haletos, sais, aminas, aldedos e compostos insaturados, como a acrolena (2-propenal) (KIRK-OTHMER, 1980). Pode sofrer reaes de oxidao em apenas uma das hidroxilas, formando a glicerose (ou gliceraldedo), HOCH2CHOHCOH, ou a dihidroxicetona, HOCH2COCH2OH (op. cit.). A glicerina pode ainda se polimerizar e sofrer alguma decomposio a 204oC (op. cit), o que significa que a destilao presso atmosfrica impraticvel. Industrialmente se utiliza a destilao a vcuo, numa temperatura de cerca de 80oC (SCHRAUTH, 1925). Pirlise um verbete que se emprega estritamente para a converso de uma substncia em outras por ao do calor, seja o processo auxiliado ou no por um catalisador (SONNTAG 1979 apud MA; HANNA, 1999). Os autores sustentam que o processo de pirlise envolve aquecimento em ausncia de ar ou oxignio, e a quebra das ligaes qumicas que levam produo de molculas pequenas, e que a qumica da pirlise difcil de se caracterizar por causa da variedade de rotas de reao e de produtos de reao que podem ser obtidos. Os compostos integrados, em sua maior parte ou em sua totalidade, por elementos que se combinam facilmente com o oxignio queimam-se em presena dele ou do ar produzindo uma mistura dos xidos dos elementos constituintes (BABOR; IBARZ, 1960, p.452). Este processo genericamente conhecido como oxidao, pois se refere ao aumento do contedo deste elemento em um corpo. De forma particular, quando esta oxidao se d de forma

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rpida, acompanhada de um aumento de temperatura e, muitas vezes, de emisso de luz, o fenmeno denominado de combusto. A temperatura em que se d o processo depende de vrios fatores, tais como o grau de agregao do material, a concentrao de oxignio, a presena de catalisadores, ou s prprias caractersticas do material. Os materiais que ardem com mais facilidade so os maus condutores de calor, pois o calor se acumula em um lugar de aplicao, e a temperatura na qual se inicia a combusto pode ser alcanada mais facilmente do que nos materiais que conduzem bem o calor. Se a oxidao de um corpo se efetua de maneira que o calor se dissipe mais lentamente do que se produz, a temperatura aumentar gradualmente, o que por sua vez acelerar a oxidao. Chegar o momento em que se alcana o ponto em que o material se inflama. Este fenmeno denominado de combusto espontnea (BABOR; IBARZ, 1960, p.453). PERRY (1997) define flash point ou ponto de ignio como a temperatura na qual um lquido d suficiente vapor para formar uma mistura que entre em ignio com o ar prximo da superfcie do lquido ou que atravesse o vaso usado no ensaio. A temperatura de autocombusto ou autoignition temperature a temperatura mnima para que a substncia inicie a autocombusto no ar em ausncia de fasca ou chama (loc.cit.). As temperaturas de ignio e de autocombusto da glicerina esto na Tabela 2.1.

2.1.3

Glicerina e acrolena Acrolena, ou propenal (ponto de ebulio a 1 atm = 52,5oC (PERRY, 1997)), um

composto de amplo uso, desde precursor do cido acrlico e dos polmeros acrlicos, passando pela sntese do cido nicotnico, at como gs lacrimogneo. Sua preparao se d, industrialmente, pela oxidao da glicerina, em presena de cido sulfrico a quente (MORRISON, 1978). A acrolena um aldedo insaturado, e por isso pode apresentar reaes bastante singulares. Em presena de lcool pode formar acetal (um diter) ou hemiacetal (um lcoolter), desde que o lcool esteja em excesso e seja anidro (op. cit.). A literatura alerta, ainda, para a transformao do glicerol em acrolena quando esta aquecida a 165oC em ambiente aberto (PATTY, 1962; REMIO, 2005; OXFORD UNIVERSITY, 2006), o que pode representar um risco sade do operador. Segundo as fontes citadas, a acrolena txica quando inalada, e por isso as operaes que envolvem

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aquecimento de glicerina em atmosfera oxidante, tal como o ar, demandam cuidados especiais.

2.1.4

Preparao da glicerina Em 1779, Scheele aqueceu leo de oliva com letargrio xido plmbico (LUCAS,

1956) e da lavagem com gua dos produtos de reao obteve uma soluo adocicada. A evaporao da gua revelou um lquido denso, viscoso, de colorao plida. Scheele reproduziu a experimentao com outros leos e gorduras, obtendo resultado semelhante, observao que levou seu descobridor a denominar aquele lquido o princpio doce das gorduras (SHREVE; BRINK, 1980). Desde ento, a glicerina foi preparada exclusivamente a partir do processo de saponificao dos triglicerdeos (leos e gorduras), conforme ilustra a FIGURA 2.3.

CH2 O C R || O CH O C R || O CH2 O C R || O Glicerdeo

NaOH

CH2OH | CHOH | CH2OH

RCOONa+ + RCOONa+ RCOONa+

Glicerina

Sabo

FIGURA 2.3

Reao tpica de saponificao

Em 1846 (op. cit.), o jovem qumico italiano, Ascanio Sobrero, produziu pela primeira vez a nitroglicerina (o ster trinitrato de glicerila), pela adio lenta de glicerina muito pura a uma mistura reacional de cido sulfrico e cido ntrico (Fig. 2.4).

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CH2OH | CHOH | CH2OH

+

3 HNO3

H2SO4

CH2ONO2 | CHONO2 + 3 H2O | CH2ONO2

FIGURA 2.4

Reao de nitrao da glicerina

A nitroglicerina extremamente instvel ao choque, e explode produzindo grande quantidade de gases (ALLINGER et al, 1979). O explosivo logo caiu no gosto daqueles que precisavam abrir estradas, explorar minrios, ou mesmo para fins blicos. Atualmente, tambm tem uso medicinal para o tratamento de angina e dores no corao. Ela causa a dilatao das artrias coronrias, aumentando o suprimento de sangue aos msculos do corao (SACKHEIM; LEHMAN, 2001, p.287). Em meados de 1849, em Paris, Sobrero mostrou sua descoberta a Alfred Nobel, que viu nela amplo uso na construo civil apesar dos riscos que representava para os usurios. Quase 20 anos depois, em 1868, Nobel desenvolveu uma mistura de nitroglicerina com diatomcea que a tornou um explosivo seguro: a dinamite (FONSECA, 2003). O invento revolucionou a humanidade, e aumentou consideravelmente a demanda por glicerina. Em 1870 desenvolveu-se um mtodo industrial de obteno de glicerina a partir da recuperao das lixvias oriundas de saboarias, processo que supria boa parte do consumo de glicerina daquela poca (SHREVE; BRINK, 1980). O novo sculo trouxe conflitos j em andamento, e viu surgirem novas e mais violentas guerras. A glicerina, matria-prima para a produo de explosivos, tambm encontrou aplicao na moldagem de artigos de borracha, e como lubrificante de artigos de artilharia. O aumento da demanda forou a busca de processos mais baratos, o que logo se cumpriu com a recuperao da glicerina formada na hidrlise de gorduras e leos visando produo de cidos graxos. Quando foi deflagrada a II Guerra Mundial, a petroqumica era j um setor da economia de grande expresso. Em 1948, A Shell Chemicals ganhou o prmio de Engenharia Qumica pelo processo de produo de glicerina a partir do propeno dos debutanizadores da indstria de petrleo (SHELL CHEMICALS, 2009). Outros processos, mais simples, vm sendo desenvolvidos com o objetivo de produzir glicerina a partir de matria-prima oriunda de petrleo. Empresas como a Shell e a Dow

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Qumica (SHREVE; BRINK, 1980) partem do propeno que, uma vez convertido em acrolena (2-propenal), gera a glicerina em processo com at 90% de rendimento (Fig. 2.5).

CH3-CH=CH2 + ar

catalisador

CHO-CH=CH2 + H2O CHO-CHOH-CH2OH

CHO-CH=CH2 + H2O2H2

CHO-CHOH-CH2OH

CH2OH-CHOH-CH2OH

FIGURA 2.5

Produo de glicerina a partir do propeno

2.2 2.2.1

BIODIESEL E GLICERINA Transesterificao de triglicerdeos O biodiesel uma mistura de steres metlicos ou etlicos de cadeia longa. Suas rotas

de produo variam, mas a matria-prima na maior parte das vezes oriunda de leos ou gorduras vegetais e animais. Os triglicerdeos, por hidrlise, do origem a cidos carboxlicos que, se submetidos a uma saponificao originam steres metlicos, mas se esterificados com lcoois produzem o biodiesel. Essas reaes, conhecidas e usadas h muito, tm como subproduto a glicerina. O biodiesel o produto de uma transesterificao (Fig. 2.6), dirigida por catalisadores, e o glicerol (ou glicerina) que emerge do processo pode vir misturado com gua, lcool, catalisador, e outros subprodutos da reao, como mono e diglicerdeos.

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CH2 O C R || O cat CH O C R + R1OH || O CH2 O C R || O Triglicerdeo + metanol ou etanol

CH2OH | CHOH | CH2OH

RCOOR1 + RCOOR1 RCOOR1

Glicerina

+

Biodiesel

FIGURA 2.6

Transesterificao de triglicerdeos na produo de biodiesel

A proporo estequiomtrica da reao de fcil previso: para cada mol de triglicerdeo forma-se 1 mol de glicerina e 3 mol de biodiesel. A converso desses valores para massa depende, obviamente, da massa molar do triglicerdeo em questo. Ocorre que a matria-prima usada na converso varia enormemente, de acordo com a vocao econmica do local em que se instala a fbrica, mas no Brasil e no resto do mundo a maior parte da produo de biodiesel se faz a partir de leos e gorduras animais ou vegetais. Assim, h que se considerar que a composio mdia dos cidos carboxlicos formadores dos triglicerdeos usados varia entre 12 e 18 tomos de carbono, de cadeia normal saturada ou insaturada. Para efeito de clculos de balano de massa, considera-se que, para cada quilograma de triglicerdeo h a formao de 100g de glicerol puro, ou 0,1 Kg de glicerol por litro de biodiesel. Por ser um importante subproduto da produo de biodiesel, a glicerina aparece tambm em estudos deste biocombustvel. F. MA e M. HANNA (1999) fazem um apanhado sobre a produo de biodiesel no mundo, e opinam que a glicerina oriunda da produo de biodiesel mais limpa do que a da produo de sabo. Os autores alegam que a recuperao da glicerina demandaria apenas alguns equipamentos a mais numa unidade de produo de biodisel, podendo inclusive vir a minimizar os custos de produo, uma vez que pode ser obtida uma glicerina mais pura e com maior valor de mercado.

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As rotas tecnolgicas de produo de biodiesel por transesterificao levam coproduo de uma fase glicerinosa, que pode ser mais ou menos pura, ou seja, que pode fornecer glicerina pura por processos cuja complexidade e demanda energtica variam bastante. A produo de biodiesel a partir de leos vegetais por catlise bsica homognea leva a uma fase glicerinosa rica em mono e diglicerdeos, alm de gua e do catalisador usado, podendo ainda ser impregnada por fosfolipdeos e outros insaponificveis em menor quantidade. Denomina-se este produto de glicerina loura, pois de fato trata-se de uma fase que varia do amarelo citrino ao amarelo ouro. ROCHA et al (2004) j haviam feito o estudo emprico da hidrlise de leos vegetais e ARANDA (2006) registrou patente de processo de produo de cidos graxos catalisada por lipases no purificadas de sementes ou frutos vegetais para subseqente esterificao por catlise cida. A glicerina oriunda deste processo, chamado de hidroesterificao, mais pura e exige menos processos para sua purificao. LIMA (2007) apresentou dissertao de Mestrado na qual estudou a hidroesterificao dos leos de mamona e de soja. Neste processo, o triglicerdeo reage apenas com gua, produzindo cidos graxos e glicerina. A seguir, os cidos graxos so esterificados pelo lcool (etanol ou metanol), obtendo-se assim o biodiesel. Recentemente foi apresentado no 10th International Chemical and Biological Engineering Congress um processo de produo de biodiesel a partir do leo de macaba catalisado por lipase imobilizada em fibra de coco (NASCIMENTO et al, 2008). O processo leva coproduo de uma fase glicerinosa totalmente transparente, que se separa do biodiesel produzido por decantao.

2.2.2

A legislao e o biodiesel Tecnicamente o termo biodiesel usado para designar os produtos da converso de

triglicerdeos (presentes predominantemente em gorduras e leos de origem vegetal) em steres. A Medida Provisria no 214, de 13 de setembro de 2004 (BRASIL, 2004), define o biodiesel como um combustvel para motores a combusto interna com ignio por compresso, renovvel e biodegradvel, derivado de leos vegetais ou de gorduras animais, que possa substituir parcial ou totalmente o leo diesel de origem fssil. As misturas leo

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diesel/diesel designadas por B2, B5 e B15 so, respectivamente, misturas 2%, 5% e 15% em volume de biodiesel em leo diesel (loc. cit.). O biodiesel, por possuir caractersticas fsico-qumicas semelhantes ao diesel comum, vem sendo aplicado no abastecimento de motores do ciclo diesel como uma alternativa de combustvel. Em pases como Alemanha e Estados Unidos muitos veculos j funcionam usando este biocombustvel apresentando excelente desempenho. No Brasil, o Governo Federal sancionou a Lei n11.097, de 13 de janeiro de 2005, que estabelece a obrigatoriedade da adio de um percentual mnimo de biodiesel ao leo diesel comercializado ao consumidor, em qualquer parte do territrio nacional. Esse percentual obrigatrio ser de 5% oito anos aps a publicao da referida lei, havendo um percentual obrigatrio intermedirio de 2% trs anos aps a publicao da mesma (BRASIL, 2005). Atualmente se se utiliza o B4 (4% em volume de biodiesel em diesel) em todo o territrio nacional. Tal obrigatoriedade implicar numa demanda de biodiesel que varia conforme a metodologia de clculo que se aplica, mas que representa um valor expressivo. Uma dessas metodologias consiste em se fazer a projeo do consumo de diesel fssil, e por clculo proporcional, chegar ao valor necessrio de biodiesel para a produo das misturas idealizadas pela Lei 11097/2005. Partindo destas premissas, MONTEIRO Jr. (2005) props em sua dissertao de mestrado o valor de 52 bilhes de litros como o volume de diesel gasto no Brasil em 2010. Respeitando-se a proporo exigida pela lei, isso significaria e necessidade de se produzirem 2,2 bilhes de litros de biodiesel. Devido aos diversos fatores que a produo de biodiesel agrega, a mesma vem sendo objeto de muitos programas de incentivo agricultura familiar, utilizao de energias renovveis e integrao scio-econmica, como por exemplo, o Programa Nacional de Produo e Uso de Biodiesel desenvolvido pelo Governo Federal. No compasso de trabalho destes programas de incentivo produo, uma ampla rede de pesquisa em tecnologia de biodiesel foi formada no pas, reunindo institutos e universidades que promovem pesquisas em todas as reas do conhecimento cientfico. Em contrapartida, rgos federais e agncias reguladoras j definiram as normas tcnicas e padres de qualidade do biodiesel comercializado no pas (ANP, 2004).

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2.2.3

Tsunami da glicerina

Tomando-se como base o valor proposto por MONTEIRO Jr. (2005), que prev a necessidade de se produzirem 2,2 bilhes de litros de biodiesel em 2010, e a proporo estequiomtrica mdia (BOUAS, 2007), o que se apresenta que a nova dcada ver uma oferta de 220 milhes de quilogramas (220 mil toneladas) de glicerina por ano no mercado. Atualmente a glicerina um importante composto de diversas indstrias, seja como aditivo, plastificante, ou mesmo matria-prima para outras indstrias de transformao. Todos esses fins somam uma demanda de cerca de 13,5 mil toneladas por ano, segundo a ABIQUIM - Associao Brasileira da Indstria Qumica (2007), que sustenta tambm ter o Brasil uma capacidade instalada para a produo de 35,8 mil toneladas/ano. Esse aumento significativo da oferta obriga procura de novos usos para a glicerina, alm daqueles j tradicionalmente conhecidos, ou ela pode vir a ser mais um problema econmico e ambiental. Algumas indstrias, alegando a dificuldade em separ-la da fase aquosa efluente da fabricao de biodiesel, preferem descart-la. Outras preferem proceder purificao, visando seu aproveitamento em outras indstrias, ou mesmo para a queima em suas caldeiras, como combustvel. SIMONETTI, SOARES e DUMESIC (2007) mostram que a glicerina pode ser convertida cataliticamente em CO e H2 que, em seguida, podem produzir metanol ou outros combustveis lquidos. A patente registra que a glicerina reage, em temperatura relativamente baixas (227-347oC), sobre um catalisador bimetlico base de platina, com uma grande taxa de converso. Os autores defendem que este novo processo cataltico a baixa temperatura pode ser usado para produzir combustveis e outros produtos qumicos a partir de correntes de glicerina descartada na produo de biodiesel. CORTRIGHT e DUMESIC (2003a) registraram uma patente na qual descrevem a produo de hidrognio pela reforma de fase condensada atravs da reao de vapor dgua com a soluo de hidrocarbonetos oxigenados na presena de catalisador metlico em temperatura inferior a 300oC. A presso requerida a necessria para manter os reagentes na fase lquida. O catalisador contm metais de transio do Grupo 8B, como Ni, Pd, Pt, Ru, Rh e Ir e misturado ou combinado com outros metais, especialmente Cu, Zn, Ge, Sn e Bi. O catalisador pode ser sustentado por slica, alumina, nanotubos de carbono, e zelitas entre outros, e o processo pode ser aplicado a um grande nmero de substncias, dentre elas a glicerina.

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Em outra patente, os mesmos autores (2003b) registraram um mtodo de produo de hirognio para clulas de combustvel a partir de carboidratos oxigenados, como glicerina, glicose ou sorbitol. O mtodo inclui a reao de gua com a soluo aquosa de hidrato de carbono (que contenha pelo menos dois tomos de carbono) na presena de catalisador metlico (com um metal de transio do Grupo 8B), e pode ser feita em temperaturas inferiores s praticadas em convencionais reformas de vapor de alcanos.

2.3

ANLISES TRMICAS Todas as transformaes, sejam qumicas ou fsicas, so acompanhadas pela perda ou

absoro de energia. O calor uma forma de energia que pode acompanhar, promover, acelerar ou desacelerar processos, conforme sua intensidade e trnsito entre o sistema reagente e o ambiente. Algumas transformaes envolvem ainda a variao da massa, das propriedades eltricas e mecnicas do material, e a observao de como essas variveis se comportam medida que a amostra submetida ao aquecimento ou arrefecimento constitui o objeto da Termoanlise. (WILLARD; MERRIT Jr; DEAN, 1974) No estudo do comportamento trmico da glicerina foram usadas as tcnicas de Anlise Termogravimtrica (TG), de Anlise Termogravimtrica Derivativa (DTG), do Ingls Derivative Thermogravimetry), e de Anlise Trmica Diferencial (DTA, do Ingls Differential Thermal Analysis).

2.3.1

Anlise Termogravimtrica

H muito tempo tem-se buscado o conhecimento a respeito da estabilidade trmica das substncias, seja para evitar sua decomposio, seja, ao contrrio, com o fito de provoc-la. Ao longo do sculo XIX e incio do sculo XX (HARMELIN, 1968), pesquisadores construam, ponto a ponto, grficos de perdas de massa de uma amostra que se operavam em funo da temperatura. As pesagens eram feitas em balanas analticas comuns aps o resfriamento, e as curvas assim obtidas eram denominadas termogramas. Atualmente as curvas termogravimtricas (curvas TG) so obtidas com ajuda de termobalanas que permitem registrar diretamente a alterao de massa em funo da temperatura ou do tempo.

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As curvas obtidas derivando-se os resultados das curvas TG em funo do tempo so chamadas curvas termogravimtricas derivativas (curvas DTG). O carter especfico de uma seqncia de reaes fisicoqumicas que ocorrem em certas condies de temperatura, e em dada velocidade, so caractersticas de um determinado composto ou sistema, dando assim origem a termogramas particulares. As variaes de massa podem se dar graas ruptura ou formao de ligaes, liberao ou absoro de produtos volteis, pirlise ou formao de produtos mais pesados. Por este motivo, as curvas termogravimtricas podem fornecer dados valiosos para o estudo da termodinmica e da cintica de transformaes. A termogravimetria derivativa um artifcio matemtico que torna mais perceptveis as mudanas de massa ao longo de uma anlise termogravimtrica. A curva resultante uma curva que mostra a derivada da massa em funo do tempo (dm/dt) para cada temperatura em curso durante a anlise. habitual que sejam apresentados em um mesmo diagrama cartesiano as curvas TG e DTG, de forma a facilitar as comparaes e as determinaes dos pontos de interesse. As anlises trmicas podem ser dinmicas quando feitas seguindo uma variao prestabelecida de temperatura, ou sob temperatura constante (isotrmicas). Os experimentos no-isotrmicos submetem a amostra a uma rampa de temperatura, controlada automaticamente. A temperatura do forno aumenta segundo uma taxa de aquecimento e possibilita a anlise do comportamento da amostra quando sujeita a diversas temperaturas na faixa de interesse. Os equipamentos de termogravimetria variam muito de tipo, qualidade, sensibilidade, preciso e exatido. Contudo, de forma genrica podem ser descritos por acoplamento de um forno onde fica o cadinho, no qual se coloca a amostra, e que atravs de um suporte, ou sistema de suspenso, acoplado a um sistema de medida de massa (balana). As pesagens podem ser feitas por um elemento sensor que detecta qualquer desvio do travesso que constitui o brao da balana (como feixes luminosos atingindo fotoclulas, por exemplo) (WILLARD, 1974; HEAL, 2002). Outra forma de deteco da variao de massa se d pela contrao ou o alongamento de uma mola helicoidal de preciso, cujo movimento transmitido ao ncleo de um transformador diferencial (WILLARD, 1974). Por microprocessamento e uso de transdutores especficos em cada caso, o sinal referente massa registrado e salvo em periodicidade definida pelo usurio, gerando ao fim da anlise um conjunto de dados de massa, tempo e temperatura que permitem a obteno das curvas TG e DTG.

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As montagens das termobalanas tambm variam bastante, podendo o forno ficar ao lado, acima ou abaixo da balana. Outra variante a quantidade da amostra, que nos primrdios da Termoanlise giravam em torno de 1g, enquanto atualmente vo de 1 a 100 mg. A vantagem de se usarem pequenas massas de amostras que a distribuio do calor se faz mais rapidamente e melhor, atingindo de maneira mais uniforme os corpos analisados. Os fornos usados em termogravimetria freqentemente operam at 1000oC ou mesmo 1500-1600oC, e para isso usam resistncias de ligas de Ni-Cr, Pt, ou Pt-Rh envoltas em tubos de cermica ou slica (HEAL, 2002). A tendncia moderna, naturalmente, de se usarem fornos cada vez menores a fim de se usarem menores quantidades de amostras. A medida e o controle de temperatura so feitos por termopares cujas caractersticas dependem dos nveis de temperatura de cada equipamento. Alguns sistemas fazem o controle de temperatura por dois termopares: um disposto o mais prximo possvel da amostra, para a tomada de temperaturas, e outro, em contato com o forno e ligado ao circuito de controle de aquecimento. Para fornos que operam at 1000oC, em geral so usados termopares de chromel-alumel. Para os que operam at 1500-1600oC so usados termopares de Pt-Pt Rh. A atmosfera em que se d a anlise termogravimtrica tambm pode afetar os dados da anlise. A amostra, ao ser aquecida, pode reagir com o ar sofrendo reaes de oxidao, por exemplo. Por isso, para estudos de volatilizao ou de pirlise, em geral deve-se usar uma atmosfera inerte, fazendo-se passar pelo forno um gs de purga como nitrognio, hlio ou argnio. Entretanto, em casos em que se deseje observar o comportamento da amostra frente ao ar atmosfrico, este usado. O que se deve ter em vista que, uma vez submetida a um gs de purga, a amostra ter um arraste inevitvel dos vapores gerados, o que representa uma diminuio da presso parcial desses na fase gasosa. Esta ocorrncia diminui as temperaturas de volatilizao e de decomposio trmica das amostras. Os cadinhos usados em anlise termogravimtrica so feitos de vrios materiais, recaindo sobre os de platina ou de alumina a preferncia dos analistas. Esses materiais so inertes maioria dos gases e materiais geralmente analisados, alm de poderem ser usados sem alterao de suas caractersticas em anlises at 1600oC (WILLARD, 1974). Embora os cadinhos de Pt sofram quimissoro de hidrognio (o que causaria um falso aumento de massa durante a anlise), estes cadinhos tm a vantagem de poderem ser limpos mais facilmente do que os de alumina, sobretudo no caso de fuso de materiais orgnicos. H cadinhos de outros metais como Al, Au, Ag ou Ni, e de outros materiais como grafita, slica ou de outras composies cermicas. As limitaes prprias de cada um devem ser observadas, de acordo com o material a ser analisado e as condies operacionais de cada

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anlise. Outro fator a se considerar a geometria do cadinho (HEAL, 2002). A forma, mais baixa ou mais alta, platiforme ou coniforme, pode alterar a difusividade dos gases que so liberados da amostra, assim como o fato de o cadinho estar ou no coberto. Neste caso, a tampa colocada sobre o cadinho em certas condies (para anlises de ponto de ebulio, por exemplo), a tampa pode ser dotada de um milimtrico orifcio que permitir a sada de vapores oriundos da amostra, mas evitar em certa medida seu contato com o ambiente.

2.3.2

Anlise Trmica Diferencial A Anlise Trmica Diferencial (abreviada por conveno pelas iniciais DTA, de sua

nomenclatura em Ingls Differential Thermal Analysis) apareceu em 1887, em conseqncia dos trabalhos de H. Le Chatelier (HARMELIN, 1968). A tcnica consiste em medir a diferena de temperatura entre uma amostra e uma referncia inerte quando so simultaneamente submetidas a uma mesma condio de aquecimento ou resfriamento. As transformaes experimentadas pela amostra podem ocorrer com liberao ou consumo de calor, enquanto que a referncia permanece inalterada. Em conseqncia, a temperatura da amostra em relao referncia pode apresentar-se maior ou menor, o que caracteriza respectivamente, um fenmeno endotrmico ou exotrmico, e que gera picos DTA das transformaes respectivas. Os equipamentos comerciais de DTA comearam a surgir na dcada de 1950, e hoje contam com diversos tipos, variando o tamanho do forno, as temperaturas de anlise (at 1600oC), os gases de purga, os tipos de termopares, os computadores para operao e compilao de dados e os softwares. Contudo, pode-se dizer que um equipamento DTA formado por trs partes principais: a sonda (onde ficam os cadinhos com a amostra e a referncia e seus respectivos termopares), o forno, e o sistema de aquisio e registro de dados. Aparelhos comerciais de DTA tm seus prprios softwares. As anlises por DTA para esta dissertao foram realizadas em um equipamento da TA Instruments cujo software permite obter as curvas DTA expressas em diferena de temperatura simplesmente ou em diferena de temperatura por massa de amostra. As consideraes a respeito do forno, da atmosfera dada pelo gs de purga, e dos termopares so as mesmas j apresentadas a respeito da TG e da DTG, com algumas observaes complementares a seguir apresentadas, caractersticas de anlises por DTA

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No tangente aos cadinhos, podem-se usar os mesmos citados para o TG, mas em geral para anlises DTA que no passam dos 600oC so feitas em cadinhos de Al (ponto de fuso=660oC a 1 atm). Estes so particularmente interessantes quando da anlise de materiais orgnicos, como a glicerina, e outros que deixam resduos que ficam aderidos aos cadinhos, pois o baixo custo permite que sejam descartados, sem necessidade de perda de tempo para sua limpeza. Uma vez que a DTA uma anlise que compara temperaturas, um cuidado especial deve ser tomado com a referncia. LAYE (2002) menciona que comum o uso da alfaalumina no cadinho de referncia, mas pode-se usar o cadinho vazio, desde que o material do mesmo no sofra nenhuma transformao durante a anlise, como o caso dos cadinhos de Pt ou alumina. A diferena entre as temperaturas de amostra e de referncia (Ta Tref) medida diretamente proporcional energia liberada ou consumida por unidade de tempo. Uma vez que esta diferena depende da massa de amostra utilizada, para comparaes de curvas DTA o sinal (Ta Tref) deve ser expresso j dividido pela massa de amostra utilizada (DWECK, 2008). Aparelhos comerciais de DTA tm seus prprios softwares. Os trabalhos desenvolvidos para esta dissertao foram realizados em um equipamento da TA Instruments que permite fazer a converso acima descrita de maneira bastante prtica.

2.3.3

Aplicaes de anlises trmicas Na reviso de literatura observou-se que a grande maioria dos estudos de aplicao de

anlise trmica com glicerina foram feitos em temperaturas subambientes (HAYASHI; PUZENKO; FELDMAN, 2005; HAYASHI et al, 2005; INABA; ANDERSON, 2007), quando feitos acima da ambiente, eles tm como objetivo o estudo de sua pirlise visando a formao de produtos de maior valor agregado. Segundo QUIJADA-GARRIDO et al (2006) a glicerina possui propriedades apreciveis que a tornam uma forte candidata a aditivo plastificante em polmeros naturais. Os autores determinaram por DSC que a Temperatura de Transio Vtrea (Tg) do glicerol de 81oC. Alm das propriedades j bem conhecidas e estudadas, como o baixo peso molecular, o alto ponto de ebulio (que causa sua reteno no polmero), e as ligaes de hidrognio (que aumentam a mobilidade de macromolculas), os autores comentam que a sua facilidade em

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formar estruturas vtreas (o que garante baixa perda por evaporao em filmes de certos polmeros), deve-se ao baixo valor de sua Tg. Por outro lado, SCHLEMMER et al (2007) estudaram as propriedades plastificantes da glicerina em comparao com leo de buriti, e concluram que entre 50 e 300oC a glicerina no um bom plastificante para compsitos de poliestireno/amido. Os estudos, feitos por DSC, mostram as transies vtreas dos compsitos assim formados com a glicerina ou o leo de buriti entre 100 e 25oC, e que o leo de buriti mostrou-se com efeito mais plastificante do que a glicerina nas matrizes polimricas testadas. Outra caracterstica aprecivel da glicerina sua capacidade de formar filmes. RYABOV et al (2003) lembram que em temperaturas sub-ambientes a glicerina existe apenas nos estados lquido, super-resfriado ou vtreo, mas que aps tratamento especial, a glicerina pura desidratada pode ser cristalizada. Os autores determinaram, por Calorimetria Exploratria Diferencial (DSC), que a Tg da glicerina 83oC, e que a sua temperatura de cristalizao (Tc) 14oC. Utilizando taxa de aquecimento de cerca de 0,1oC/min a cristalizao ocorre perto da Tg. Em taxas de aquecimento mais rpidas, como 5 ou 25o

C/min, no se observa cristalizao da glicerina. Os autores apontaram, na poca, para a

necessidade de se aplicarem mais esforos nos estudos das transies vtreas da glicerina, pois sustentavam que este composto ainda tinha poucos estudos sobre sua forma cristalina. INABA e ANDERSON (2007) estudaram as mltiplas transies vtreas e a cristalizao em duas etapas para sistemas binrios de gua e glicerina, para ver sua ao anticongelante e por isso seus experimentos situam-se na faixa de -223 a 27oC. Por DSC os autores estudaram limites de composies gua-glicerina que durante processos de resfriamento possibilitam ou no a cristalizao da gua presente. Conforme seus estudos apontam, durante o aquecimento a partir de 223oC, a cristalizao de sistemas binrios glicerina-gua se d em duas etapas, sendo a primeira dirigida para uma estrutura bidimensional e associada a uma grande variao de entalpia, e a segunda, com o contnuo aquecimento, levando estrutura hexagonal do gelo e associada a uma pequena entalpia de transformao. Com o objetivo de avaliar a potencialidade toxicolgica da glicerina adicionada a cigarros, CARMINES e GAWORSKI (2005) estudaram a composio qumica da fumaa de cigarros com e sem glicerina. Esta substncia tem sido adicionada com o objetivo de manter as caractersticas do tabaco, melhorando sua umidade e propiciando um aumento de sabor. Entretanto, dvidas a respeito da produo de acrolena durante a queima do cigarro levou os autores a investigar o comportamento da glicerina quando aquecida da temperatura ambiente

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at 1000oC em trs estgios: 400oC por 10s, 700oC por 10s, e 1000oC por 10s. Os produtos foram condensados em 196oC e analisados por cromatografia gasosa. O resultado mostrou que muito pouca glicerina sofre pirlise nessas condies. O teste foi repetido em ar para determinao dos produtos de oxidao. Os resultados igualmente demonstraram que pouca glicerina se converteu, sendo acrolena e glicolaldedo os produtos que apareceram em quantidades melhor detectveis. BHLER et al (2002) estudaram a decomposio da glicerina em gua nas condies prximas crtica, ou seja, em condies de temperatura de 349-475oC e presses de 25, 35, ou 45 MPa. As reaes tiveram diferentes condies iniciais de concentrao e levaram entre 32 e 165 s. Foram observadas converses entre 0,4 e 31%, e os principais produtos formados pela degradao da glicerina foram metanol, acetaldedo, propionaldedo, acrolena, lcool allico, etanol, formaldedo, CO, CO2, e H2. Os autores concluram que, em reao com vapor dgua em altas presses, as reaes de degradao da glicerina no seguem o comportamento de Arrhenius, pois h competio de diversos mecanismos envolvendo as vrias substncias e intermedirios formados. O estudo da glicerina pura, por anlises trmicas, suscitou um reduzido nmero de pesquisas, o que torna raros os artigos que seriam de interesse imediato para este trabalho. Contudo, como este se concentra em estudos de estabilidade trmica, e das cinticas de volatilizao e de pirlise da glicerina, foi feito um levantamento de estudos de mesma natureza feitos por anlises trmicas. KUCERIK et al (2006) aplicaram a tcnica de TG/DTA simultneo para estudar a influncia de algumas funes orgnicas no comportamento termo-oxidativo de cidos hmicos de lignina. A medida da estabilidade trmica foi tomada pelo deslocamento da temperatura de onset dos picos exotrmicos de degradao. Foram comparadas as perdas de massa registradas pelas curvas TG em pequenos ou grandes intervalos de temperatura (ndice termogravimtrico) como forma de avaliar a influncia de certos compostos nas reaes de recombinao que ocorrem durante a degradao termo-oxidativa de cidos hmicos. Ficou comprovado que alguns compostos podem de fato afetar a estabilidade trmica dos cidos hmicos mesmo em concentraes relativamente baixas. Porm o ndice termogravimtrico se presta melhor a uma avaliao qualitativa do que quantitativa sobre a relao existente entre as partes hmicas biodegradveis no conjunto de matria orgnica extrada. DWECK e SAMPAIO (2004) estudaram a decomposio trmica de leos vegetais em ar por TG/DTA simultneo. Foram testados leo de canola, girassol, milho, oliva e soja em atmosfera de ar a fim de promover a queima dos leos durante a anlise e permitir, assim,

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que fosse estimado seu calor de combusto. As temperaturas de onset obtidas por extrapolao na curva TG foram usadas para comparar as estabilidades trmicas dos leos, mostrando que o leo de milho apresentava maior estabilidade trmica, enquanto o leo de oliva era o menos estvel entre os leos estudados. Os calores de combusto foram estimados a partir das curvas DTA, mostrando uma relao linear inversa entre estes e as estabilidades trmicas dos leos, embora o leo de milho mostre, para seu relativamente modesto calor de combusto, uma grande estabilidade trmica. VECCHIO et al (2008) fizeram um estudo cintico da decomposio trmica de triglicerdeos contidos em leo de oliva extravirgem por TG e DTG, acima de 550oC em distintas taxas de aquecimento (de 5 a 12,5oC/min). O trabalho dedicou-se ao estudo de quatro cidos graxos C18 (saturados ou insaturados) esterificados com glicerina (ou seja, triglicerdeos dos cidos esterico, oleico, linoleico e linolnico) sob as mesmas condies experimentais. Foram usados os mtodos de Kisinger e de isoconverso de Ozawa-FlynnWall, que demonstraram que a mais significante variao de Energia de Ativao observada na evoluo do processo observada na degradao de cadeias insaturadas. LISBOA e WATKINSON (1998) aplicaram a termogravimetria para o estudo da cintica qumica tanto da pirlise como da combusto do leo de xisto. Os autores fizeram anlises termogravimtricas (TGA) isotrmicas e sob taxa de aquecimento constante, e demonstraram que os parmetros cinticos de ambas as reaes pirlise e combusto podem ser obtidos se forem estas consideradas reaes de primeira ordem. As investigaes estabeleceram as bases para o uso das anlises termogravimtricas nesta determinao, e sustentam que o mtodo confivel, desde que a granulometria das amostras de xisto no ultrapassem 0,25 mm, que estas tenham massa de aproximadamente 20 mg, que no estudo da pirlise seja usado gs inerte como nitrognio (ultrapuro ou grau tcnico), e que se observe um fluxo de gs de arraste de 100 mL/min. Este fluxo, os autores ressaltam, bem acima do recomendado pelo fabricante do aparelho usado, mas necessrio nas anlises de xisto para evitar que alguns volteis se condensem no forno, ou nas peas ali presentes.

Materiais e Mtodos

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3

MATERIAIS E MTODOS

3.1 3.1.1

MATERIAIS E EQUIPAMENTOS Preparo das amostras Para este trabalho foi utilizada glicerina pro analisis (P.A.) da VETEC, cujo teor de

pureza, atestado pelo fabricante, era de 99,5% no mnimo . Para o desenvolvimento do mtodo de determinao de gua por termogravimetria foram preparadas solues aquosas, usando-se gua destilada, com concentraes variando entre 3 e 30%. Para as medidas de massa, utilizou-se balana analtica cuja sensibilidade era de 0,0001 g. A preparao das amostras dava-se pela acomodao de certa massa de glicerina pura em recipiente de vidro (de tampa rosquevel) previamente tarado. A massa de glicerina era medida, fazendo-se a seguir adio de certo volume de gua, cuja massa tambm era imediatamente medida. O recipiente era ento fechado, a fim de se minimizar o contato com a umidade do ar, que poderia interferir na concentrao final da soluo devido caracterstica higroscpica da glicerina. Assim, em base aos valores de massa de gua e glicerina P. A. efetivamente misturados, e o teor de gua j existente na glicerina P. A., obtinha-se o teor de gua presente de cada mistura preparada, expresso como a concentrao percentual em massa das amostras. Por se tratar de sistemas lquidos razoavelmente viscosos, as amostras da glicerina pura apresentavam uma certa dificuldade quando se fazia necessrio o uso de amostras pequenas, como as usadas nos pequenos cadinhos com dimetro interno de aproximadamente 7mm nos aparelhos de anlise trmica. O problema foi contornado usando-se o seguinte expediente: a ponta de uma haste de ao de dimetro prximo a 0,5mm era introduzida no sistema e retirada to logo estivesse molhada, sendo imediatamente encostada no fundo do cadinho, deixando ali a massa a ser analisada. As amostras assim obtidas exibiam massas que variavam entre 10 e 20 mg. As anlises feitas com as misturas glicerina-gua no apresentavam uma viscosidade to aprecivel, e por isso a amostragem era feita por intermdio de uma seringa de 0,1 mL. Para as corridas desenvolvidas no Prottipo de Anlise Termogravimtrica (descrito em 3.1.2) foram usados cadinhos maiores, e por isso a colocao das amostras no apresentou

Materiais e Mtodos

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maiores dificuldades, sendo a transferncia operada por meio de uma seringa de vidro de capacidade igual a 1mL. As amostras analisadas eram de aproximadamente 1g.

3.1.2

Anlises trmicas As anlises trmicas foram realizadas em aparelho simultneo TG-DTA da TA

Instruments, modelo SDT 2960 (que ser referenciado neste documento como equipamento SDT 2960), e no prottipo de anlise termogravimtrica desenvolvido por Dweck e Souza Santos, na Escola de Qumica da UFRJ. Este equipamento admite o uso de massas relativamente grandes de amostra (de at 100g) conforme utilizado em trabalhos anteriores (DWECK e SOUZA SANTOS, 1989; 1991), e que doravante ser referenciado como Prottipo TGA.

3.1.2.1 Anlises dinmicas Para os ensaios de caracterizao foram feitas anlises trmicas dinmicas, com taxa de aquecimento constante de 10oC/min, desde temperatura ambiente at 1000OC, em cadinhos abertos de platina no equipamento SDT 2960. Testes comparativos foram realizados para avaliar a estabilidade trmica da glicerina sob atmosfera inerte e sob atmosfera oxidante. Para isso foram realizadas, respectivamente, corridas em fluxo de nitrognio ou de ar, sendo em ambos os casos usada a vazo de 100 mL/min. Uma vez que na taxa de aquecimento de 10oC/min foi possvel observar os picos de interesse na amostra de glicerina, as corridas feitas para o estudo cintico em atmosfera inerte utilizaram taxas de aquecimento de 10, 15 e 20oC/min, em fluxo de 100 mL/min de N2. As amostras usadas foram de cerca de 10 mg, e foram submetidas ao aquecimento da temperatura ambiente at 600oC. Nas anlises trmicas TG-DTA foram usados cadinhos de platina abertos ou de alumnio fechados por tampa furada. Os furos foram feitos por uma broca de 0,6 mm. As curvas termogravimtricas derivadas (DTG) foram obtidas pelo software do equipamento.

Materiais e Mtodos

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3.1.2.2 Anlises isotrmicas Corridas isotrmicas foram feitas no Prottipo TGA, em cadinhos de porcelana (de capacidade igual a 10 mL) cobertos por tampas de quartzo com furo de 1mm de dimetro, o que promovia um ambiente inerte durante a anlise. As amostras tinham massa de aproximadamente 1g e foram submetidas a aquecimentos isotrmicos na faixa de 200 a 400oC. Os dados de massa e de temperatura, registrados pelo sistema de microprocessamento do prottipo, foram tratados matematicamente com auxlio do software Excel.

3.2 3.2.1

ENSAIOS DE CARACTERIZAO Determinao da estabilidade trmica Foram realizadas anlises de glicerina pura em ar e em nitrognio a fim de comparar

os respectivos comportamentos trmicos em cada ambiente, obtendo-se assim as curvas TG/DTG-DTA no SDT 2960. Verificou-se a estabilidade trmica pelo incio extrapolado (onset point) da perda de massa da amostra, e pela anlise da curva DTA.

3.2.2

Determinao do teor de gua por Karl Fischer As Anlises de Karl-Fischer so amplamente utilizadas com a finalidade analtica de

determinao de gua nos mais diferentes tipos de materiais, sendo inclusive usadas em vrios mtodos ABNT (Associao Brasileira de Normas Tcnicas), ASTM (American Society for Testing and Materials)e DIN (Deutsches Institut fr Normung), entre outros. Elas tm como base o processo de xido-reduo que se d pela ao de SO2 em uma soluo de iodo (I2) com piridina e metanol anidros (VOGEL, 1992), no qual cada molcula de gua consumida corresponde a uma molcula de I2 reagente, conforme reao em duas etapas:

Materiais e Mtodos

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(Etapa 1) (Etapa 2)

3 C5H5N + I2 + SO2 + H2O C5H5N SO3 + CH3OH+ -

2 C5H5NH+I- + C5H5N+SO3-

Eq. 3.1 Eq. 3.2

C5H5N(H)OSO2OCH3

A determinao coulomtrica, e foi realizada em um equipamento Metrom 838. O Reagente de Karl-Fischer usado foi adquirido na Merk, e antes da anlise foi padronizado, pois o excesso de metanol confere certa instabilidade ao reagente. Toda a vidraria usada na transferncia dos reagentes foi criteriosamente seca, e a manipulao da glicerina foi clere para evitar contaminao pela umidade do ar. Seguindo o Mtodo ASTM E1064, primeiramente foi feita a titulao do solvente. Em seguida, uma amostra de glicerina foi transferida para um frasco com tampa. Dali, retirou-se uma alquota de 0,5g que foi adicionada ao solvente, sendo ento feita a anlise coulomtrica do teor de gua. Seguiram-se a esta duas anlises mais, com alquotas consecutivamente retiradas do mesmo frasco de amostra.

3.2.3

Determinao do teor de gua por termogravimetria Um mtodo de determinao do teor de gua por anlise trmica foi desenvolvido e

apresentado no 14 ICTAC (14th International Congress on Thermal Analysis and Calorimetry), em setembro de 2008. O mtodo, recentemente publicado (CASTELL; DWECK; ARANDA, 2009), baseia-se em comparar as curvas TG e DTG de uma amostra de mistura glicerina-gua em taxa de aquecimento de 10oC/min, com fluxo de N2 de 100 mL/min. As anlises so feitas em cadinho aberto. A curva termogravimtrica indica a sada de gua atravs de uma variao de massa em temperatura/tempo diferente daquela que a sucede e devida sada da glicerina. O efeito na curva TG o de mudana na inclinao. A DTG evidencia de forma inequvoca o limite entre esses fenmenos, e a partir dela que se faz o procedimento da determinao do teor de gua. Conforme exemplificado na FIGURA 3.1, a condio em que a curva DTG apresenta inclinao nula corresponde condio em que a variao da massa com o tempo se torna nula. A seguir reinicia-se a variao de massa de forma aprecivel: quando se d o incio da volatilizao da glicerina.

Materiais e Mtodos

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101 TG 100 85.69C 99.45%

1.5

1.0 99 Mass (%) Deriv. Mass (%/min)

98 85.69C DTG

0.5

97

0.0 96

95

0

25

50

75 100

150 200 250 Temperature (C)

-0.5 300 350 400 Universal V4.3A TA Instruments

FIGURA 3.1: Detalhes da determinao do teor de gua pelas curvas TG e DTG de uma amostra de glicerina P.A. em taxa de aquecimento de 10oC/min e fluxo de 100 mL/min de nitrognio.

Entretanto, a interao que ocorre entre essas duas substncias polares pode tornar os dois picos DTG cada vez mais coincidentes medida que aumenta a razo da massa de gua/massa de glicerina. Ento, escolhe-se o mnimo da curva DTG ou o meio da parte horizontal que une as duas etapas consecutivas na curva DTG para se proceder leitura da respectiva temperatura, e o valor da massa residual percentual sem gua na curva TG, o que possibilita calcular o teor de gua pela variao de massa percentual ocorrida desde o incio da anlise. Com o objetivo de testar a acurcia do mtodo, amostras da mesma glicerina foram analisadas pelo mtodo de Karl-Fischer ASTM E1064 (2005) descrito no item 3.2.2 . Tambm foram comparadas as concentraes das solues aquosas preparadas conforme tcnica descrita em 3.1.1 desta dissertao, com aquelas determinadas pelo mtodo de anlise da TG/DTG desenvolvido, obtendo-se um coeficiente de correlao igual a 0,9945, indicando a confiabilidade do mtodo.

Materiais e Mtodos

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3.2.4

Curva de Destilao Foram feitas curvas de destilao com a glicerina P. A. em balo de destilao Pyrex

de 250 mL no qual foram postos 100 mL de amostra. As temperaturas foram medidas utilizando-se um termmetro de mercrio com escala de 10oC a 400oC. No condensador foi utilizada gua corrente para resfriamento, estando a proveta de recebimento do condensado em banho de gelo. O colo do balo foi isolado com l de vidro. O controle do aquecimento foi efetuado pelo seletor manual do sistema de aquecimento, ficando na posio Mximo at cerca de 50oC, quando foi sendo modificada consecutivamente para a posio Mdio e Mnimo, medida que a elevao da temperatura se tornava muito rpida. O aquecimento foi interrompido quando o balo apresentou um resduo escuro de massa discreta, como medida para evitar-se um acidente, conforme procedimento laboratorial usual em obteno de curvas de destilao.

3.3

ESTUDOS CINTICOS Estudo cintico a expresso genrica aplicada anlise de uma transformao em

funo do tempo, em determinadas condies operacionais. Embora seja mais utilizada para estudos de transformaes qumicas, aplica-se tambm ao estudo de transformaes fsicas. O processo de volatilizao de uma substncia pura no caso, a glicerina uma transformao que pode ser representada por: G0(L) G(v) + G(L),, onde G0(L)=massa de glicerina lquida inicial, G(v)= massa de glicerina vaporizada, e G(L)=massa de glicerina lquida residual. A taxa de vaporizao (d/dt), onde a frao mssica vaporizada e igual a G(v)/G0(L), pode ser escrita como funo da temperatura (LEVENSPIEL, 1974a; 1974b), conforme a equao Equao 3.1: d/dt = k(T) f() (Eq. 3.1)

onde o grau de volatilizao e k a constante de velocidade (tempo)-1. A funo f() depende da cintica do processo de transformao.

Materiais e Mtodos

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A relao entre a constante de velocidade k e a temperatura T (absoluta em Kelvin) pode ser expressa pela Lei de Arrhenius (LEVENSPIEL, 1974; PILLA, 1980; ATKINS; PAULA, 2003): k = A e(-E/RT) (Eq. 3.2)

onde A chamado fator de freqncia (expresso em tempo-1), E a energia de ativao (energia/mol) e R a constante universal dos gases (8,314 J/K.mol). O Produto R T ser representado apenas por RT. Substituindo-se a Eq. 3.2 na Eq. 3.1, tem-se: d/dt =A e( E/RT) f() (Eq. 3.3)

Como = (mo m)/mo , onde mo a massa inicial, e m a massa residual medida em funo do tempo durante uma anlise termogravimtrica (TG), os valores de d/dt, quando a curva TG expressa em termos de massa percentual da massa inicial de amostra, podem ser obtidos diretamente via curvas DTG, pois nesse caso = (100 m%)/100, e d/dt = 0,01dm%/dt, j que m% representa a massa residual percentual. Contudo, os parmetros cinticos E e A devem ser determinados por mtodos numricos, como descrevem SPEYER (1994) e WILLSON (2002) ou por softwares especficos (ARAJO; MOTH, 2003) que extraem seus dados de anlises feitas por ensaios isotrmicos e no-isotrmicos, como os desenvolvidos por KISSINGER (1957), ou o Mtodo das isoconverses, de OSAWA (1992), detalhados a seguir nesta dissertao.

3.3.1

Mtodo de Kissinger Este mtodo se baseia nas propriedades trmicas de uma amostra que sofre

modificao medida que ela aquecida, e foi desenvolvido em base ao que ocorre durante uma anlise trmica diferencial de uma amostra que se decompe por ao trmica. As ordenadas dos pontos de uma curva DTA indicam, em funo da temperatura de anlise, qual a diferena entre a temperatura da amostra e a temperatura da referncia inerte utilizada. Essa diferena proporcional taxa de calor consumido ou gerado na transformao a uma dada temperatura de anlise.

Materiais e Mtodos

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O mtodo resulta da aplicao e anlise das equaes de transferncia de calor ao que ocorre quando uma amostra e referncia so submetidas a taxas de aquecimento constantes em uma anlise DTA. Tem como base o fato de que a temperatura do pico DTA de uma transformao variar com a taxa de aquecimento, desde que as demais condies experimentais sejam mantidas constantes, e que o pico DTA, que representa o mximo do efeito trmico da transformao, ocorre quando a taxa de reao mxima. No caso de uma reao de ordem n, o comportamento pode ser descrito pela Equao 3.4: dx/dt = A (1-x)n e E/RT (Eq. 3.4)

onde dx/dt a taxa de converso , x a frao convertida, n a ordem da reao e T, a temperatura absoluta. Se a temperatura aumenta durante o processo, a taxa de converso dx/dt aumenta at um valor mximo e retorna a zero quando ocorrer 100% de converso. A taxa mxima ocorre, ento, quando d2x/dt2 = 0. Num caso de mudana de estado fsico, no h que se considerar uma reao qumica, mas pode-se assumir que a converso discutida , matematicamente, equivalente frao volatilizada. Em outras palavras, a taxa de volatilizao da glicerina pode ser tambm descrita por dx/dt, chegando-se Equao 3.3, onde f() seria (1 )n. d/dt =A . e(E/RT) . (1 )n (Eq. 3.5)

Contudo, os estudos de Kissinger enfocam a cintica de reaes qumicas, e ressaltam que, diferenciando-se a Eq.3.4, para uma dada taxa constante de aquecimento , a converso mxima se dar em uma correspondente temperatura Tm:(n1)

= A n (1 x)m E R(Tm )2

e E/RTm

(Eq. 3.6)

Neste caso, conforme ressalta o modelo, o termo (1-x)m a frao mssica residual no ponto de mximo de reagente. Tm a temperatura de taxa mxima de reao (ou de volatilizao no caso aqui discutido) e corresponde temperatura do pico DTA, que apresenta mximo efeito trmico de transformao em conseqncia da mxima taxa de transformao, ou temperatura do pico DTG, visto que nessa temperatura ocorre a mxima taxa de variao de massa.

Materiais e Mtodos

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Kissinger considera que o produto n (1 x)m(n torna: = A R . e E/RT (Tm)2 E

1)

independente da taxa de

aquecimento , e pode ser considerado um valor prximo unidade. Assim, a expresso se

(Eq. 3.7)

que independente da ordem de reao n, e que, aplicando logaritmo neperiano torna-se: ln = E . 1 + ln (A R/E) (Tm)2 R Tm (Eq. 3.8)

A Equao 3.8 uma equao de uma reta que expressa valores de ln/(Tm)2 em funo de 1/Tm. Portanto, foram feitas curvas DTA e DTG em trs taxas de aquecimento () distintas, 10, 15 e 20oC/min, que forneceram as respectivas temperaturas relativas taxa de converso mxima (Tm). Os valores foram plotados num grfico de ln(/Tm2) versus (1/Tm) e, com auxlio do software Excel, foram determinados o coeficiente angular (que propiciou o clculo de E) e a seguir o coeficiente linear (do qual calculou-se o fator A). Neste trabalho, o modelo de Kissinger foi aplicado com uso de dados de curvas DTA e curvas TG/DTG porque, em se tratando de volatilizao, o fluxo de calor consumido pela amostra diretamente proporcional massa que se desprende, e que tambm pode ser detectado mais prontamente pela curva DTG, cujo pico indica efetivamente a condio de mxima taxa de volatilizao. Outra considerao relevante no que se refere determinao dos parmetros cinticos A (fator de freqncia ou fator pr-exponencial) e E (energia de ativao). Em se tratando de um estudo de volatilizao, ou seja, de uma transformao fsica, as consideraes acerca de uma cintica podem aparentemente ser inapropriadas, porm as interpretaes matemticas do fenmeno so adequadas e exeqveis. Durante o tratamento trmico de uma amostra que pode sofrer pirlise, a taxa de sua decomposio trmica diretamente proporcional ao fluxo trmico recebido pela amostra, sendo o calor de decomposio funo da temperatura de operao. Admitindo-se que durante o tratamento trmico da glicerina s ocorra volatilizao da mesma, a taxa de volatilizao ser diretamente proporcional ao fluxo trmico recebido pela amostra, sendo o calor de volatilizao funo da temperatura de operao.

Materiais e Mtodos

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Quando se faz uma anlise trmica dinmica o controlador proporciona uma variao de potncia eltrica nas resistncias do forno, para que se consiga manter a mesma taxa de aquecimento ao longo da anlise. Essa potncia aumenta da mesma forma em funo da temperatura para uma mesma taxa de aquecimento. Ou seja, a amostra que est sujeita a essa taxa de aquecimento recebe o mesmo fluxo trmico em funo da temperatura de operao, que ser usado para volatilizao ou decomposio, o que depender das propriedades termoqumicas da amostra. Em se tratando de uma decomposio trmica de um lquido, tem-se que: A(L) B(L) + C(g) (Eq. 3.9)

onde o lquido A ao se decompor gera um gs C e um lquido B, sendo que este ltimo fica no