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Lições aprendidas e aprendizagem organizacional: estudo de caso em organizações com escritório de projetos Eron Campos Saraiva de Andrade ( E&A Inovações e Projetos ) - [email protected] Resumo A organização pode aprender consigo mesma, através de dados e informações obtidas com a solução de problemas, com os processos de tomada de decisão e com experiências vivenciadas internamente e externamente a ela. Um dos papéis do processo da gestão de conhecimento é coletar este acervo de dados e torná-lo disponível para todos dentro da organização (SANTORO e SANTOS, 2006). Este artigo tem o objetivo de investigar como as lições aprendidas em projetos são utilizadas para o aprendizado organizacional. Para esse propósito foi realizado um estudo de caso em duas grandes organizações com escritório de projetos. Os resultados mostraram a contribuição das lições aprendidas no aprendizado de primeira e segunda ordem, alcançados pelas organizações estudadas. Palavras-chave: Lições Aprendidas; Gestão de Projetos; Aprendizagem Organizacional. 1. Introdução Estão as organizações trabalhando as lições aprendidas nos projetos a fim de contribuir com a aprendizagem organizacional? De que forma isso está sendo realizado? O objetivo deste artigo é investigar as práticas de algumas organizações relacionadas ao registro das lições aprendidas e como essas são utilizadas na aprendizagem organizacional. Para reconhecer suas necessidades, a organização deve estar atenta às suas falhas e deficiências. Isto vai requerer a abertura para críticas e principalmente espaço para que os problemas sejam comunicados. Outra característica importante é a capacidade de evitar a repetição dos erros. As organizações devem aprender com suas experiências, devem registrar as lições aprendidas e compartilhar esse conhecimento internamente. O conhecimento essencial deve ser institucionalizado e com isso tornasse propriedade comum, evitando que fique restrito a algumas pessoas-chave e que se percam quando elas deixarem a organização. O aprendizado organizacional consiste então na capacidade de uma organização manter e melhorar seu desempenho com base em sua própria experiência (NEVIS et al., 1997 apud SANTORO e SANTOS, 2006). Esse artigo apresenta uma pesquisa realizada nos escritórios de projetos de uma grande empresa pública e de um órgão da administração pública direta federal. O escopo da pesquisa está limitado aos aspectos de como as lições aprendidas em projetos estão sendo utilizadas para a aprendizagem organizacional. Portanto seus objetivos específicos são: Identificar as formas de registro, classificação, armazenamento e recuperação das lições aprendidas (LAPs) nos projetos; Verificar como as LAPs são compartilhadas dentro da equipe do projeto; Verificar como as LAPs são compartilhadas dentro da organização de forma a contribuir para o aprendizado organizacional. 2. Projetos – Elementos de realização de mudanças, estratégias organizacionais e inovação Segundo o (PMBOK, 2004, pág. 5) um projeto é um esforço temporário empreendido para

Estudo de Caso Em Organizacoes Com PMO

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Lições aprendidas e aprendizagem organizacional: estudo de caso em organizações com escritório de projetos

Eron Campos Saraiva de Andrade ( E&A Inovações e Projetos ) - [email protected]

Resumo

A organização pode aprender consigo mesma, através de dados e informações obtidas com a solução de problemas, com os processos de tomada de decisão e com experiências vivenciadas internamente e externamente a ela. Um dos papéis do processo da gestão de conhecimento é coletar este acervo de dados e torná-lo disponível para todos dentro da organização (SANTORO e SANTOS, 2006). Este artigo tem o objetivo de investigar como as lições aprendidas em projetos são utilizadas para o aprendizado organizacional. Para esse propósito foi realizado um estudo de caso em duas grandes organizações com escritório de projetos. Os resultados mostraram a contribuição das lições aprendidas no aprendizado de primeira e segunda ordem, alcançados pelas organizações estudadas. Palavras-chave: Lições Aprendidas; Gestão de Projetos; Aprendizagem Organizacional.

1. Introdução

Estão as organizações trabalhando as lições aprendidas nos projetos a fim de contribuir com a aprendizagem organizacional? De que forma isso está sendo realizado? O objetivo deste artigo é investigar as práticas de algumas organizações relacionadas ao registro das lições aprendidas e como essas são utilizadas na aprendizagem organizacional.

Para reconhecer suas necessidades, a organização deve estar atenta às suas falhas e deficiências. Isto vai requerer a abertura para críticas e principalmente espaço para que os problemas sejam comunicados. Outra característica importante é a capacidade de evitar a repetição dos erros. As organizações devem aprender com suas experiências, devem registrar as lições aprendidas e compartilhar esse conhecimento internamente. O conhecimento essencial deve ser institucionalizado e com isso tornasse propriedade comum, evitando que fique restrito a algumas pessoas-chave e que se percam quando elas deixarem a organização. O aprendizado organizacional consiste então na capacidade de uma organização manter e melhorar seu desempenho com base em sua própria experiência (NEVIS et al., 1997 apud SANTORO e SANTOS, 2006).

Esse artigo apresenta uma pesquisa realizada nos escritórios de projetos de uma grande empresa pública e de um órgão da administração pública direta federal. O escopo da pesquisa está limitado aos aspectos de como as lições aprendidas em projetos estão sendo utilizadas para a aprendizagem organizacional. Portanto seus objetivos específicos são:

• Identificar as formas de registro, classificação, armazenamento e recuperação das lições aprendidas (LAPs) nos projetos;

• Verificar como as LAPs são compartilhadas dentro da equipe do projeto;

• Verificar como as LAPs são compartilhadas dentro da organização de forma a contribuir para o aprendizado organizacional.

2. Projetos – Elementos de realização de mudanças, estratégias organizacionais e inovação

Segundo o (PMBOK, 2004, pág. 5) um projeto é um esforço temporário empreendido para

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criar um produto, serviço ou resultado exclusivo. Cada vez mais empresas públicas e privadas e órgãos da administração direta e indireta fazem uso de projetos como um meio para realizar suas mudanças e estratégias organizacionais.

O mundo do trabalho está mudando – e a velocidade da mudança está aumentando. Isso cria um aumento na demanda de projetos, já que os projetos são o meio pelos quais as organizações se adaptam às condições de mudança. Os projetos são necessários para a reengenharia de uma organização, para a avaliação da direção tomada pela companhia em um mercado novo ou para lançar um novo produto, (VERZUH, 2003, p. 26). Nesse contexto existe, dentro das organizações, por meio dos projetos, uma riqueza de informações e conhecimentos cada vez maiores. Como gerir de forma eficiente essas informações e conhecimentos?

O Project Management Institute – PMI, uma das mais conceituadas organizações no estudo, pesquisa e fomento a área de projetos destaca no seu padrão de conjunto de conhecimentos em gerenciamento de projetos – PMBOK ( Project Management Body of Knowledge) a importância desse tema. O PMBOK define como ativos de processos organizacionais todos os elementos relacionados a projetos de quaisquer organizações envolvidas com o mesmo que são ou poderão ser usados para influenciar o seu sucesso. Esses ativos de processos incluem planos formais ou informais, políticas, procedimentos e diretrizes. Eles também incluem as bases de conhecimento das organizações, como lições aprendidas e informações históricas, (PMBOK, 2004, pag. 353). O tratamento e recomendações relacionadas às lições aprendidas estão identificados em vários processos das diversas áreas de conhecimento em gerenciamento de projeto que compõe o PMBOK.

Nesse artigo as lições aprendidas referenciadas no guia do PMI foram identificadas e mapeadas. A figura 01 apresenta o resultado desse mapeamento. Pode-se perceber que todas as áreas de conhecimento de gerenciamento de projeto, tratam de alguma forma o tema de lições aprendidas. Em particular, as áreas de conhecimento, de comunicações e riscos, são as que possuem uma maior quantidade de processos envolvendo a técnica de registro de lições aprendidas.

Figura 01 – lições aprendidas referenciadas no PMBOK 2004

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2.1 Recomendações e melhores práticas apresentadas no PMBOK (2004) em relação às lições aprendidas.

Para um melhor entendimento relacionado ao que o PMI recomenda no seu guia, foi realizado um estudo aprofundado no mesmo, extraindo dele todas as referencias pertinentes as lições aprendidas. A tabela 01, abaixo, registra essas informações.

Área de conhecimento

Integração

Processo Desenvolver o termo de abertura do projeto

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

No desenvolvimento do termo de abertura de um projeto o PMBOK relaciona como uma das entradas para este processo os ativos de processos organizacionais. Esses ativos organizacionais devem conter, entre outras bases, banco de dados e arquivos, a base de informações históricas e lições aprendidas (por exemplo, registros e documentos de projetos, informações e documentação relativas ao encerramento de projetos, informações relacionadas a seleção, desempenho, riscos e esforços de projetos anteriores, etc.) (PMBOK, 2004). O objetivo dessa entrada é subsidiar novos projetos com dados e informações que possam contribuir para o seu termo de abertura.

Processo Encerrar o projeto

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Uma das saídas desse processo diz respeito à transferência das informações históricas e das lições aprendidas ao longo do projeto para uma base de dados de lições aprendidas (PMBOK, 2004).

Área de conhecimento

Escopo

Processo Controle de escopo

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Como uma das saídas desse processo, as causas das variações de escopo, as razões que motivaram as ações corretivas escolhidas e outros tipos de lições aprendidas do controle de mudanças do escopo do projeto devem ser documentadas e atualizadas no banco de dados histórico dos ativos de processos organizacionais (PMBOK 2004).

Área de conhecimento

Tempo

Processo Definição da atividade

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Uma das entradas desse processo é a base de conhecimento de lições aprendidas que contém as informações históricas relativa às listas de atividades usadas por projetos anteriores que podem ser consideradas como subsídio na definição das atividades do cronograma de projetos semelhantes (PMBOK, 2004)

Processo Controle do cronograma

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas

Faz parte de uma das saídas desse processo, a documentação das causas de variação do cronograma, as razões que motivaram as ações corretivas escolhidas e outros tipos de lições aprendidas relacionados ao controle de cronograma (PMBOK, 2004).

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Área de conhecimento

Custo

Processo Estimativa de custos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Como entradas desse processo as lições aprendidas podem subsidiar estimativas de custos obtidas de projetos anteriores que sejam semelhantes em escopo e tamanho (PMBOK, 2004).

Processo Controle de custos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Na saída desse processo as lições aprendidas são documentadas de modo que possam se tornar parte dos bancos de dados históricos tanto para o projeto quanto para a organização executora. A documentação das lições aprendidas inclui as causas-raiz das variações de custo, os motivos pelos quais as ações corretivas foram escolhidas e outros tipos de lições aprendidas (PMBOK, 2004).

Área de conhecimento

Qualidade

Processo Planejamento da qualidade

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Políticas, procedimentos e diretrizes de qualidade da empresa, banco de dados histórico e lições aprendidas de projetos anteriores específicos para a área de aplicação podem afetar um projeto (PMBOK, 2004). É importante, nesse contexto, consultar e compreender esses ativos organizacionais para subsidiar o planejamento da qualidade do projeto.

Processo Realizar o controle da qualidade

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Na saída desse processo as lições aprendidas são documentadas de modo que possam se tornar parte dos bancos de dados históricos tanto para o projeto quanto para a organização executora. A documentação das lições aprendidas inclui as causas das variações de qualidade, os motivos pelos quais as ações corretivas foram escolhidas e outros tipos de lições aprendidas (PMBOK, 2004).

Área de conhecimento

Recursos Humanos

Processo Planejamento de recursos humanos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Conforme a metodologia de gerenciamento de projeto amadurece dentro de uma organização, as lições aprendidas de experiências passadas de planejamento de recursos humanos são disponibilizadas como ativos de processos organizacionais para ajudar a planejar o projeto atual (PMBOK, 2004)

Processo Gerenciar a equipe do projeto

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Uma das saídas desse processo é garantir que todo o conhecimento aprendido durante o projeto seja documentado de modo a se tornar parte do banco de dados histórico da organização. As lições aprendidas na área de recursos humanos podem incluir (PMBOK, 2004):

• Organogramas do projeto, descrições de cargos e planos de gerenciamento de pessoal (PMBOK, 2004);

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• Técnicas de gerenciamento de conflitos e eventos de reconhecimento que foram especialmente úteis (PMBOK, 2004);

• Procedimentos para equipes virtuais, agrupamento, negociação, treinamento e formação da equipe que foram bem sucedidos (PMBOK, 2004);

• Habilidades ou competências especiais de menbros da equipe que foram descobertos durante o projeto (PMBOK, 2004);

Área de conhecimento

Comunicação

Processo Planejamento das comunicações

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

As lições aprendidas e as informações históricas de projetos anteriores que possuam semelhanças com o novo projeto, podem fornecer informações importantes para subsidiar decisões e resultados no planejamento das comunicações (PMBOK, 2004).

Processo Relatório de desempenho

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Na saída desse processo as lições aprendidas são documentadas de modo que possa se tornar parte dos bancos de dados históricos tanto para o projeto quanto para a organização executora. A documentação das lições aprendidas inclui as causas dos problemas de desempenho, os motivos pelos quais as ações corretivas foram escolhidas e outros tipos de lições aprendidas, (PMBOK, 2004).

Processo Gerenciar as partes interessadas

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Na saída desse processo as lições aprendidas são documentadas de modo que possa se tornar parte dos bancos de dados históricos tanto para o projeto quanto para a organização executora. A documentação das lições aprendidas para esse processo inclui as causas dos problemas de comunicação, os motivos pelos quais as ações corretivas foram escolhidas e outros tipos de lições aprendidas, (PMBOK, 2004).

Área de conhecimento

Riscos

Processo Identificação de riscos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

As lições aprendidas e as informações históricas de projetos anteriores que possuam semelhanças com o novo projeto, podem fornecer informações importantes para subsidiar a identificação de riscos no novo projeto, (PMBOK, 2004).

Processo Análise qualitativa de riscos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

As lições aprendidas e as informações históricas de projetos anteriores que possuam semelhanças com o novo projeto, podem fornecer informações importantes para subsidiar a identificação de riscos no novo projeto, (PMBOK, 2004).

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Processo Análise quantitativa de riscos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

As informações sobre projetos anteriores semelhantes, estudos de projetos semelhantes realizados por especialistas em riscos, banco de dados de riscos comerciais ou proprietários podem ser usados como forma de subsidiar as análises, (PMBOK, 2004).

Processo Monitoramento e controle de riscos

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

Todos os processos de gerenciamento de riscos do projeto produzem informações que podem ser usadas em futuros projetos e que devem ser capturadas nos ativos de processos organizacionais. As lições aprendidas das atividades de gerenciamento de riscos do projeto podem contribuir para o banco de dados de conhecimento de lições aprendidas da organização, (PMBOK, 2004).

Área de conhecimento

Aquisição

Processo Encerramento do contrato

Melhores práticas (Aplicação de lições aprendidas)

A análise das lições aprendidas e as recomendações de melhoria nos processos são desenvolvidas para o planejamento e a implementação de compras e aquisições futuras (PMBOK, 2004).

Tabela 01 – Informações relacionadas a lições aprendidas referenciadas no PMBOK (2004)

3 Aprendizagem Organizacional – Fundamentos

A necessidade de mudança contínua nas organizações, enfatizada por Drucker, é há muito tempo uma preocupação central entre os teóricos do aprendizado organizacional (NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p. 52). Assim como os indivíduos, as organizações precisam sempre confrontar novos aspectos de suas circunstancia (COHEN e SPROULL, 1991 apud NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p. 52).

Echeverria (2006, p. 20-21) acredita ser importante reconhecer que a necessidade de transformação das organizações surge de dois requisitos diferentes. O primeiro refere-se à necessidade de toda empresa adequar-se às mudanças de seus entornos e de assimilar os últimos avanços em sistemas e procedimentos capazes de incrementar seu desempenho, competitividade e rentabilidade. Desse ponto de vista a transformação é um imperativo permanente de toda empresa. Essa transformação, no entanto, caracteriza-se por conservar seu modo de “ser” empresa (ECHEVERRIA, 2006). O segundo surge quando o que se questiona é exatamente o modo particular de “ser” da empresa. Para esses os requisitos de transformação são bastante diferentes e as transformações pontuais e acumulativas serão insuficientes (ECHEVERRIA, 2006).

Echeverria (2006, p. 22) conclui ser necessário distinguir com clareza essas duas linhas diferentes de transformação. Os desafios da mudança não são sempre os mesmos e não podem ser confundidos. Grande parte da frustração que resulta da aplicação de muitos projetos de transformação é conseqüência de uma confusão entre esses requisitos.

A necessidade de transforma-se está aumentando, nessa era de economia turbulenta e mudanças tecnológicas aceleradas. Sabe-se que o aprendizado consiste em dois tipos de atividades. O primeiro tipo de aprendizado é a obtenção de know-how a fim de resolver problemas específicos com base nas premissas existentes. O segundo tipo de aprendizado é o estabelecimento de novas premissas (ou seja, paradigmas, esquemas, modelos mentais ou perspectivas) com o objetivo de anular as existentes (NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p.52).

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Figura 02 - Modelo de aprendizado de primeira e segunda ordem. Construído e adaptado de Argirys e Schon, (1978)

Esses dois tipos de aprendizado são conhecidos como “Aprendizado I” e “Aprendizado II” (BATESON, 1973 apud NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p.52) ou “aprendizado de circuito simples” e “aprendizado de circuito duplo” (ARGYRIS e SCHON, 1978 apud NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p.52). A figura 02 ilustra a idéia contida nesses dois tipos de aprendizado.

Nesse contexto as lições aprendidas nos projetos podem atuar no aprendizado de primeira ordem, quando, por exemplo, um desvio identificado no cronograma de um projeto resulte em ações corretivas para restabelecer o prazo final do projeto, conforme o planejado. Um aprendizado de segunda ordem ocorreria quando, por exemplo, um registro de lições aprendidas identificasse a necessidade de mudança em algum artefato, processo ou procedimento. A partir da mudança desse paradigma, novas ações e resultados podem ser alcançados.

4. Metodologia

A metodologia utilizada para a pesquisa em campo foi baseada em um questionário, construído em Excel, com dezenove perguntas sendo sete objetivas e doze subjetivas. As perguntas objetivas foram estruturadas permitindo uma única alternativa para a resposta: 0–Nunca; 1-Raramente; 2-Freqüentemente; 3-Sempre.

A coleta de dados foi realizada através desse instrumento. A resposta ao questionário foi realizada na forma de entrevista com os participantes, para facilitar o entendimento e alinhamento das idéias.

Fez parte também da metodologia a utilização de um aplicativo de banco de dados, para realização de análises quantitativas, gráficas e para o armazenamento de dados e informações dessa pesquisa.

5. Resultados

5.1 Respostas e comentários relacionados à aplicação do questionário nas organizações.

A tabela 02 apresenta algumas informações relacionadas aos escritórios de projetos das organizações com a finalidade de contextualizá-los em relação ao tempo, volume de trabalho e aplicação de uma metodologia de gerenciamento de projetos

Informações relativas aos Escritórios de projetos (EP)

Organização 1 Organização 2

Tempo de vida do EP 1 a 2 anos 3 a 5 anos Total de projetos acompanhados pelo EP

Mais de 100 projetos 31 a 50 projetos

Tempo de aplicação de um metodologia de gerenciamento de projetos

1 a 2 anos 3 a 5 anos

Tabela – 02 : Informações escritórios de projetos

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A tabela 03 apresenta as respostas emitidas a cada uma das perguntas do questionário, pelas duas organizações e um comentário (juízo) do autor desse artigo em relação a essas respostas.

Questão Qual a posição do escritório de projetos no organograma da organização

Resposta – Org.1 Temos dois escritórios de projetos: um especificamente de TI, subordinado à Diretoria de Tecnologia, o outro (onde estou localizado) é o escritório corporativo. Este escritório esta vinculado à Diretoria de Estratégia e Organização que, por sua vez, está subordinada diretamente ao Presidente do Banco.

Resposta – Org.2 É um órgão pertencente a Assessoria de Gestão de Programas e Projetos vinculado diretamente a Secretaria Executiva do Ministério.

Comentário Percebe-se nas duas organizações que o escritório de projetos encontra-se numa posição estratégica.

Questão Qual a função (responsabilidades) do escritório de projetos

Resposta – Org.1 Definir metodologia de gerenciamento e acompanhamento dos projetos estratégicos, de investimentos e corporativos de tecnologia. O escopo do escritório corporativo envolve projetos de negócio que podem incluir um sub-projeto de TI.

Resposta – Org.2 Executar atividades relativas ao desenvolvimento e difusão de metodologias de gestão de programas e gerenciamento de projetos e de orientação e apoio técnico para sua aplicação. Acompanhar e avaliar a gestão de programas e o gerenciamento de projetos de natureza estratégica.

Comentário Os dois escritórios de projetos possuem funções semelhantes e estão focados na gestão de projetos e programas estratégicos da organização.

Questão As lições aprendidas nos projetos são registradas?

Resposta – Org.1 Freqüentemente

Resposta – Org.2 Freqüentemente

Comentário -

Questão Existe algum procedimento para registro e/ou validação das lições aprendidas?

Resposta – Org.1 Sim

Resposta – Org.2 Sim

Comentário -

Questão Como é o procedimento para registro e/ou validação das lições aprendidas?

Resposta – Org.1 Existe um artefato que deve ser preenchido ao final do projeto.

Resposta – Org.2 Na reunião de ponto de controle são realizadas discussões e validação das lições aprendidas e ao final registrada no artefato definido pela metodologia de gerenciamento de projeto

Comentário Percebe-se nas duas organizações a preocupação de estabelecer um

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padrão, através de um artefato, para o registro das LAPs

Questão De que forma as lições aprendidas nos projetos são registradas?

Resposta – Org.1 Cada líder de projeto registra suas experiências ao final do projeto formalmente. Além disso, as experiências são colhidas pelos pessoal do escritório ao longo de todo o projeto e compartilhadas com os demais projetos.

Resposta – Org.2 Não existe um padrão bem definido, na maioria das vezes é feito de forma coletiva nas reuniões de pontos de controle.

Comentário Nota-se aqui não haver um padrão pré-estabelecido.

Questão Por quem são registradas as lições aprendidas?

Resposta – Org.1 Pelo líder do projeto e também pelos consultores do escritório que acompanham os projetos.

Resposta – Org.2 Gerente de projeto

Comentário Percebe-se que apesar da liberdade em apontar lições aprendidas nos projetos, a responsabilidade em registrá-las em definitivo é de funções hierárquicas superiores.

Questão As lições aprendidas nos projetos são armazenadas?

Resposta – Org.1 Freqüentemente

Resposta – Org.2 Sempre

Comentário -

Questão Aonde as lições aprendidas nos projetos são armazenadas?

Resposta – Org.1 As lições aprendidas ficam registradas na base de documentação dos projetos.

Resposta – Org.2 Servidor de arquivos (Relatórios de ponto de controle e Relatório de encerramento do projeto)

Comentário As duas organizações não possuem uma ferramenta de apoio para o repositório mais eficaz e eficiente das LAPs

Questão Como é realizada a recuperação de LAPs no repositório?

Resposta – Org.1 Os consultores do escritório as consolidam e compartilham com os outros projetos no processo de consultoria e acompanhamento.

Resposta – Org.2 A recuperação é realizada através de acesso direto ao relatório, pelo nome do mesmo.

Comentário Não existe nenhum tipo de indexação das LAPs. Não existe como realizar consultas por key words ou qualquer outro tipo de atributo.

Questão As lições aprendidas são compartilhadas com a equipe?

Resposta – Org.1 Freqüentemente

Resposta – Org.2 Sempre

Comentário -

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Questão De que forma as lições aprendidas são compartilhadas com a equipe?

Resposta – Org.1 Basicamente nas reuniões de acompanhamento e consultoria, dentro do processo de relacionamento do escritório com os projetos. Dentro do escritório são compartilhadas no dia-a-dia, pela proximidade e conversas entre os consultores.

Resposta – Org.2 em reuniões e por e-mail

Comentário Não existe a pratica de comunidades virtuais e nem de portais de comunicação

Questão Em que momento as lições aprendidas são compartilhadas com a equipe?

Resposta – Org.1 Não há um momento específico. A transmissão das LAP acontece ao longo de todo o projeto.

Resposta – Org.2 Nos pontos de controle.

Comentário Aqui se percebe a deficiência e limitações por não existir uma ferramenta mais eficiente e eficaz para compartilhamento das LAPs

Questão Em um projeto novo, existe a prática de estudar ou analisar projetos semelhantes ou mesmo não semelhantes, verificando suas lições aprendidas, antes de iniciar o novo projeto?

Resposta – Org.1 Raramente

Resposta – Org.2 Nunca

Comentário Percebe-se a partir dessa resposta que as LAPs ainda possuem um grande caminho de conscientização e maturidade na sua aplicação

Questão De que forma é realizado o estudo ou análise de projetos semelhantes ou mesmo não semelhantes, verificando suas lições aprendidas, antes de iniciar o novo projeto?

Resposta – Org.1 Individualmente, pelo consultor.

Resposta – Org.2 Não se aplica

Comentário -

Questão As lições aprendidas são divulgadas na organização, de forma sistemática?

Resposta – Org.1 Raramente

Resposta – Org.2 Nunca

Comentário -

Questão De que forma as lições aprendidas são divulgadas na organização?

Resposta – Org.1 A divulgação não é sistemática. Não existe um momento específico de divulgação. Essa divulgação acontece no processo de consultoria do escritório, ao longo de todo o projeto.

Resposta – Org.2 Não se aplica

Comentário Percebe-se a partir dessa resposta que as LAPs ainda possuem um grande caminho de conscientização e maturidade na sua aplicação

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Questão A lição aprendida tem gerado reflexões e mudanças nas ações da equipe para efetivamente possibilitar resultados mais satisfatórios?

Resposta – Org.1 Sempre

Resposta – Org.2 Freqüentemente

Comentário Percebe-se aqui, nas duas organizações, a contribuição das LAPs para o aprendizado de primeira ordem

Questão A lição aprendida tem gerado reflexões e mudanças nos procedimentos, normas e processos da organização para efetivamente possibilitar resultados mais satisfatórios?

Resposta – Org.1 Sempre

Resposta – Org.2 Freqüentemente

Comentário Percebe-se aqui, nas duas organizações, a contribuição das LAPs para o aprendizado de segunda ordem

Tabela – 03 : Resposta ao questionário aplicado

5.2 Análises gráficas e comentários relacionados às questões objetivas.

5.2.1 Spider diagram das organizações

Verifica-se, figura 02 e 03, que as questões cuja resposta obtiveram menor freqüência foram:

Figura 02 – Organização 01: Frequencia da resposta a pergunta formulada

Figura 03 – Organização 02: Frequencia da resposta a pergunta formulada

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“Em um projeto novo, existe a prática de estudar ou analisar projetos semelhantes ou mesmo não semelhantes verificando suas lições aprendidas antes de iniciar um novo projeto?” e “As lições aprendidas são divulgadas na organização, de forma sistemática?” A resposta de raramente – organização 01 ou nunca – organização 02 a essas perguntas evidencia, no juízo do autor, a pequena maturidade dos escritórios de projetos em relação ao tema das lições aprendidas.

É importante destacar, figura 02 e 03, a evidencia do uso (de freqüentemente a sempre) pelas organizações dos dois paradigmas de aprendizado proposto por Argirys e Schon, (1978) apud Nonanka e Takeuchi, (1997) o de primeira ordem e o de segunda ordem.

5.2.2 Somatório das respostas objetivas obtidas pelas organizações

No gráfico ao lado a régua de referencia (em vermelho) serve como apoio, pois ilustra o máximo valor de freqüência (7 perguntas x 3 pontuação máxima = 21) que a organização poderia obter. Observa-se aqui pequena diferença em relação ao tratamento das lições aprendidas pelas duas organizações. A organização 02 trabalha as lições aprendidas com uma freqüência de raro a frequentemente enquanto a organização 01 mais para frequentemente. Outro ponto a destacar é que apesar da organização 01 possuir seu escritório de projeto com menor tempo em operação, a sua maturidade em relação ao tratamento com as lições aprendidas é maior.

6. Conclusão

As lições aprendidas em projetos têm proporcionado um aprendizado de primeira e segunda ordem, conforme constatado nas duas organizações pesquisadas. Não foi observado, ainda, nas organizações estudadas um processo mais dedicado e detalhado ao tratamento das lições aprendidas como previsto no PMBOK (2004). Existe, nas organizações estudadas, uma dificuldade na pesquisa e recuperação das lições aprendidas constantes no repositório e uma deficiência em relação à divulgação sistemática das mesmas dentro das organizações.

A partir de um maior amadurecimento e foco nas lições aprendidas, as organizações poderão agregar maior valor aos novos projetos e assim alcançar um aprendizado mais consistente.

7. Referencias

ECHEVERRIA, Rafael. La Empresa Emergente – La confianza y los desafios de la transformacion – 1ª ed. Buenos Aires: Granica, 2006.

KOFMAN, Fredy. Metamanagement – A nova consciência dos negócios – Volume 2 – Aplicações . São Paulo: Antakarana Cultura Arte Ciência, 2002.

PMBOK, A Guide to the Project Management Body of Knowledge. 3ed. USA :PMI. Project Management Institute. Four Campus Boulevard, Newton Sq, Pennsylvania USA, 2004.

SANTORO, F M ; SANTOS, N. Aprendizagem Organizacional - Uma abordagem baseada em processos e colaboração. Anais do WIAO 2006 in http://www.ucb.br/prg/professores/germana/sbie2006-ws/artigos/santoro-santos.pdf Acessado em 10/06/07

VERZUH, Erick. MBA compacto, gestão de projetos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.

NONAKA, I; TAKEUCHI, H. Criação de conhecimento na empresa - 17ª. Edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997