Ética à Nicomaco Livros I a VI

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Fichamento da obra Ética à Nicômaco, de Aristóteles, Livros de I à VI

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    tica a Nicmaco de Aristteles: Livros I - VI

    LIVRO I

    I. 1 Toda arte, investigao, ao ou escolha miram a um bem qualquer. Bem aquilo

    a que todas as coisas tendem. Mas existem diferentes fins, dado que alguns so

    atividades, outros produtos e outros ainda fins distintos das aes. Estes ltimos se

    demonstram superiores excelncia das aes.

    Por exemplo, o fim da arte mdica a sade, o da construo naval o navio e o da

    economia, a riqueza. Quanto as artes ou as aes, enquanto fins subordinados, se

    orientam uma faculdade maior, se estabelece que este ltimo fim tambm maior que

    os fins subordinados que a ele se dirigem.

    O sumo bem o fim ltimo, j que nem tudo desejado em vista de outro desejo, dado

    que haver um fim para o qual todos os outros convergem. Conhece-lo seria algo

    extremamente importante para a vida humana.

    I.2 Para, pois, desvendar o sumo bem, Aristteles sugere o uso de uma arte mestra, a

    saber, a poltica, pois ela quem: determina quais as cincias devem ser estudadas

    num Estado e ainda quem deve aprende-las e at que ponto este aprendizado deve

    prosseguir. Mesmo a econmica e a retrica ela se subordinam, pois a finalidade da

    poltica o bem humano, sendo o Estado um bem maior que o indivduo.

    I.3 A cincia poltica investiga aes belas e justas que existem dentro de uma variedade

    e flutuaes no conjunto das aes, de acordo com as convenes que se estabelecem

    e no por uma questo de natureza. Tambm os bens tm uma conotao e uma

    flutuao semelhante.

    I.4 Para todo o homem, a finalidade da boa ao a felicidade. No entanto, alguns

    pensam que a felicidade seja coisa simples e bvia, como o prazer ou a riqueza. Outros

    a pensam como um grande ideal inacessvel compreenso. I.5 Aristteles parte do

    conhecimento verificvel no cotidiano para defini-la:

    Com efeito, o filsofo define trs tipos de vida: um tipo mais vulgar, que apenas busca

    o prazer, a vida contemplativa e ainda a vida poltica onde as pessoas de grande

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    refinamento e vida ativa, identificam a felicidade com a honra, que a finalidade da

    vida poltica. Quem assim o faz, porm o faz para convencer-se de serem bons.

    I. 6 Mas a ideia de bem universal oriunda da teoria das Ideias tambm questionada.

    No haveria uma Ideia acima de todos os tipos de bem, j que por bem existe tanto a

    substncia quanto as qualidades relativas s categorias tais como: quantidade,

    utilidade, temporalidade... O bem no nico e nem universalmente presente, nem

    existe uma cincia apenas para todos os tipos de bem. I. 7 Igualmente, nem todos os

    fins so absolutos, mas somente o sumo bem algo absoluto e este que Aristteles

    busca definir.

    Para tanto, ele faz uma associao entre o sumo bem e a felicidade, como algo

    autossuficiente, e por isso buscado por si mesma e no com vista a outras coisas. Esta

    felicidade aquilo que, em si mesmo, torna a vida desejvel e carente de nada.

    O filsofo traa ainda uma abordagem sobre a vida enquanto atividade de seres

    racionais. As funes dos homens so vistas como uma certa espcie de vida, enquanto

    atividades ou aes da alma que implicam um princpio racional. Neste sentido, o bem

    do homem uma atividade da alma em consonncia com a virtude.

    I. 8 O bem apresentado, ento, em trs classes: bens exteriores, bens relativos alma

    e ou ao corpo.

    I.9 D-se ento a indagao de que a felicidade deva ser adquirida pela aprendizagem,

    pelo hbito ou por alguma outra espcie de adestramento, ou se ela conferida por

    alguma providncia divina. Aristteles afirma que melhor alcanar a felicidade com a

    virtude de poder conquista-la, mediante certa espcie de estudo e diligncia, do que

    recebe-la ao acaso. A felicidade liga-se a capacidade da alma racional de participao

    e conquista da primeira. Em suma a felicidade uma espcie de atividade.

    I.10 Pergunta-se a felicidade poder ser alcanada nesta vida e ainda qual a sorte dos

    mortos e de seus descendentes, pois considera-se estranho que os mortos continuem

    a participar das vicissitudes da vida, ora felizes e ora tristes e ainda que seus

    descendentes no compartilhem da conquista da felicidade ou do infortnio de seus

    ancestrais. Aristteles trata das contingncias da vida e o modo como estas se

    relacionam com o status de felicidade.

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    I.11 As vicissitudes e as contingncias da vida, assim como os infortnios, podem afetar

    a vida do homem, mas no a ponto de mudar-lhe a sorte no conjunto desta vida mesma:

    um infortnio no tem a capacidade de fazer infeliz a vida do virtuoso, nem um pouco

    de sorte muda a situao do infeliz.

    I.12 investiga-se se a felicidade louvvel. Merece louvor o que justo, valoroso e a

    saber, tanto em relao ao homem quanto em relao a estas virtudes. Mas a

    felicidade considerada superior s tais virtudes, sendo digna de bem-aventuranas

    e no apenas de louvor por ser um primeiro princpio e causa dos bens. (Aqui resta a

    dvida se ela causa ou finalidade ltima, ou se estas coisas coadunam.)

    I.13 A felicidade ento uma atividade da alma conforme a virtude perfeita e para

    compreender sua natureza, Aristteles sugere que seja compreendida a natureza da

    virtude. o poltico que se ocupa do estudo da virtude humana, posto que estuda a

    alma em vista do bem dos cidados e do Estado. Sobre a alma, afirma-se que tenha

    uma parte racional e outra privada da razo. Esta ltima subdiviso corresponde

    natureza vegetativa da alma que causa do crescimento e da nutrio que no

    participam da excelncia humana, pois no distingue os homens, a no ser em

    pequenos detalhes.

    Existe tambm um outro elemento irracional, mas que de certa forma participa da razo.

    Trata-se do aspecto de continncia e de incontinncia que influenciam a alma em

    direes contrrias. Os elementos apetitivos e o desiderativo tambm participam da

    racionalidade. Mas estes elementos irracionais podem ser persuadidos pela razo, tal

    como os conselhos de parentes e amigos persuadem o homem. Tambm as virtudes

    possuem uma diviso, de modo que existam virtudes intelectuais e morais.

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    LIVRO II

    II.1 As virtudes intelectuais geram-se graas ao ensino, requerendo experincia e

    tempo, ao passo em que as morais so adquiridas pelo hbito, cujo nome (tico,

    moral) se origina da palavra (hbito). Elas no surgem em ns por natureza, pois

    nada do que existe naturalmente pode formar um hbito contrrio natureza. Mas

    somos adaptados por natureza recebe-las, tornando-nos perfeitos pelo hbito.

    As virtudes as adquirimos pelo exerccio, o que requer aprendizado. Tal o que

    acontece nos Estados, onde os legisladores tornam bons os cidados por meios de

    hbitos que lhes incutem, sendo esse o propsito do legislador e das constituies. Do

    mesmo modo, individualmente, pelos atos que praticamos que nascem as diferenas

    de carter.

    II.2 Se os atos determinam a natureza dos estados de carter, os mesmos devem ser

    executados com justeza, pois tanto a negligncia quanto o excesso devem ser evitadas,

    tanto a deficincia quanto o excesso.

    II.3 O prazer e a dor podem ser tomados como indicativos do carter dos atos,

    relacionando-se excelncia moral. preciso, como afirmou Plato, que uma tal

    educao seja dada de modo que o prazer seja vivenciado nas coisas que devem

    causar deleite e o sofrimento, naquelas que de fato devem fazer sofrer. Neste sentido,

    o castigo uma espcie de cura, cuja natureza efetuarem-se pelos contrrios.

    Igualmente as virtudes se relacionam com prazeres e dores. A excelncia a tendncia

    de fazer o melhor a respeito destes dois aspectos, sendo ela o que nobre, vantajoso e

    agradvel e o vcio consiste em fazer exatamente o contrrio, a saber, os contrrios da

    excelncia o vil, o prejudicial e o doloroso.

    A virtude se orientar portanto um caminho mais difcil de lutar contra o prazer e contra

    a dor, o que torna melhores as coisas boas.

    II.4 As aes so qualificadas de acordo com o modo como faz quem as pratica em

    comparao um modelo de homem virtuoso de uma tal ao. No assumindo-se por

    virtuoso que se alcana a virtude, antes pela prtica que se chega virtude. Por

    exemplo uma ao justa aquela praticada como um justo a praticaria, mas o homem

    que a pratica no (ainda) o justo.

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    II.5 Mas a virtude pertence a uma das trs espcies de elementos encontrados na alma:

    paixes (isto , os apetites e os sentimentos, que em geram so acompanhados de

    prazer e dor); faculdades (as coisas pelas quais somos capazes de sentir as paixes,

    irar-nos, magoar-nos, etc.); disposies de carter (posicionamento diante das

    paixes, bons ou maus). Quanto ao seu gnero, as virtudes, no so paixes nem

    faculdades, mas disposies de carter.

    II.6 Aps determinar que a virtude uma disposio de carter, Aristteles busca

    dizer de que espcie tal disposio. Para o filsofo, ela possui o atributo de visar o

    meio-termo. A virtude , pois, uma disposio de carter relacionada com a

    escolha e consistente numa mediania, a qual determinada pelo princpio racional

    prprio do homem dotado de sabedoria prtica. Em suma, todavia no h nem

    excesso e nem falta no meio-termo, assim como no h meio-termo para os excessos

    e nem para as faltas.

    II.7 A seguir, Aristteles aplica a definio geral a vrios casos particulares. Explica

    ainda que os excessos podem se dar de maneiras opostas, tanto por carncia quanto

    por exagero, de acordo com a disposio da ao. Algumas disposies porm no

    recebem nomes, mas em todo caso o meio-termo louvvel e os extremos, dignos de

    censura.

    II.8 Das trs espcies de disposies, duas delas so consideradas vcios pois

    envolvem excesso ou carncia e o meio-termo a virtude. Enquanto os extremos

    mostram a maior disparidade entre si, alguns deles em relao ao meio-termo mostra

    certa semelhana, porquanto dos dois o mais contrrio ao meio-termo pode ser as vezes

    tanto a deficincia, quanto o excesso.

    II.9 Aristteles termina o livro II julgando ter esclarecido que a virtude moral um meio-

    termo entre dois vcios, pois sua natureza visa a mediania nas paixes e nos atos.

    preciso aprendizagem para encontrar o meio-termo, mas a bondade ainda assim

    rara, nobre e louvvel. Por conseguinte preciso afastar-se do que errado, indo na

    direo contrria (ou rumo ao outro extremo) com o intuito de encontrar a mediana. No

    se nega porm, que seja difcil, sobretudo nos casos particulares, determinar com

    preciso at que ponto preciso ir rumo ao outro extremo para encontrar o meio-termo.

    De modo que no se deve censurar o homem que buscando a mediania, se desvie um

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    pouco desta. Cabe percepo, determinar pelo raciocnio e pelos sentidos, at que

    ponto este desvio no digno de censura.

    LIVRO III

    III.1 Aristteles trata da necessidade de que os que se ocupam da natureza das virtudes

    faam a distino entre as aes e paixes voluntrias e involuntrias, uma vez que

    s primeiras deve ser dispensado louvor ou censura, enquanto s outras, perdo ou

    piedade.

    Involuntrio aquilo que ocorre por compulso ou ignorncia, sendo compulsrio aquilo

    cujo motor (princpio) se encontra fora do sujeito. Mas existem atos mistos, cujo

    tratamento dever ser o mesmo dado aos voluntrios. Em tais atos, o princpio encontra-

    se no prprio agente.

    Aes foradas so aquelas que ocorrem quando a causa se encontra nas

    circunstncias exteriores e o agente em nada contribui, sendo assim, compulsrias. Em

    qualquer circunstncia de atos pode haver ignorncia por parte dos agentes.

    III.2 As escolhas so voluntrias, embora este ltimo conceito seja mais amplo que o

    primeiro, pois nem tudo o que voluntrio parece ser objeto de escolha. Elas igualmente

    se diferenciam dos desejos pois estes tendem um fim enquanto aquelas com os meios.

    A opinio ou precede ou acompanha a escolha, pois esta envolve um princpio racional

    e tambm o prprio ato de pensar. Aristteles a define como aquilo que colocamos

    diante de todas as outras coisas.

    III.3 Deliberamos sobre as coisas que esto ao nosso alcance e que podem ser

    realizadas, mas cujo resultado possvel e obscuro. Por isso deliberamos acerca dos

    fins, mas a respeito dos meios. O homem um princpio motor de aes e a escolha

    um desejo deliberado de coisas que esto ao seu alcance, pois aps decidir em

    resultado de uma deliberao, o homem deseja de acordo com o que deliberou.

    III.4 O desejo tem por objeto o fim. Ora este fim um bem, j que o homem deseja o

    bem. Todavia este bem pode ser aparente, dado que coisas diferentes e at contrrias

    parecem boas a diferentes pessoas. O filsofo admite ento que pode haver engano,

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    de acordo com a disposio de carter e com o prazer que faz algo parecer bom sem

    realmente s-lo.

    III. 5 J o exerccio da virtude diz respeito aos meios. Cada homem de certo modo

    responsvel pela sua disposio de nimo, sendo responsvel pelos seus maus atos.

    Visar o fim no depende da escolha do homem, mas preciso ter nascido dotado de

    um discernimento acerca dos fins. Como se afirma que as virtudes so voluntrias, j

    que somos em parte responsveis por nossas disposies de carter. Se muitas vezes

    os fins no esto claros, a virtude o que direciona o homem ao bem, pela deliberao

    dos meios.

    III. 6 Aristteles passa a abordar as vrias virtudes:

    A coragem o meio-termo em relao ao medo e a confiana. As coisas que tememos

    e as coisas no nobre as quais enfrentamos com confiana so males, ao passo em

    que a coragem leva ao bem em situaes que permitem ao homem demonstrar seu

    valor ou em situaes em que o enfrentamento seja nobre.

    III.7 O filsofo relaciona ainda a covardia, a temeridade e a bravura com a coragem, tal

    como havia feito no livro anterior.

    III.8-9 Em seguida, Aristteles descreve cinco espcies de coragem: a do cidado-

    soldado, a dos sbios, aquela que pode ser confundida com a paixo, a coragem dos

    otimistas e a da confiana.

    III.10-12 A temperana definida como o meio-termo em relao aos prazeres, que

    podem ser corporais ou espirituais. O intemperante almeja as coisas agradveis e

    levado pelo seu apetite a escolh-las a qualquer custo.) A intemperana mais

    voluntria que a covardia, pois se esta foge da dor, aquela s procura o prazer. As

    crianas podero ser vtimas da intemperana, se no forem educadas a controlar seus

    apetites. necessrio pois harmonizar o apetite com um princpio racional para

    apetecer aquilo que deve ser apetecido.

    LIVRO IV

    IV. 1 A liberalidade tomada como o meio-termo em relao riqueza. Por riqueza, o

    filsofo entende todas as coisas cujo valor se mede pelo dinheiro. Seus extremos so a

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    prodigalidade e a avareza. Por prodigalidade entenda-se a ao de maltratar o dinheiro

    com os prprios prazeres. A riqueza til e como tal pode ser bem ou mal usada.

    Gasta-la seu uso e possu-la, sua posse. Partindo da ideia de que as aes virtuosas

    so as nobres, o homem liberal d de maneira livre s pessoas que convm, as quantias

    certas nas ocasies certa, e tomar as quantias que convm, das fontes que convm.

    Neste discernimento que erra o prdigo e o avarento.

    IV.2 A magnificncia se relaciona tanto aos objetos quanto s circunstncias. O

    magnificente o liberal, embora este s seja magnificente quando sua liberalidade

    relativamente grandiosa. A deficincia desta disposio de carter chamada

    mesquinhez e seu excesso vulgaridade.

    IV. 3 A Magnanimidade o meio termo entre o respeito grande de suas pretenses.

    Ele tange justeza de tais pretenses, pois se arroga o que corresponda aos seus

    mritos, no excedendo e nem ficando aqum da prpria medida. O magnnimo no se

    expe a perigos insignificantes, mas queles dignos. muito capaz de conferir

    benefcios, mas pouco apto a recebe-los. em suma um honrado em grande escala.

    IV. 4 Igualmente na esfera da honra h uma virtude ligada magnanimidade do mesmo

    modo que a magnificncia se liga liberalidade. A honra, e tambm a magnanimidade,

    no est ligada escala das coisas mas da disposio frente aos objetos de dispor

    deles corretamente, mesmo que possuam pouca ou nenhuma importncia. na

    verdade uma virtude no nomeada, mas reconhecida pelos extremos: ambio e

    desambio.

    IV.5. A calma o meio termo em respeito clera, mas ela pode se inclinar para a

    deficincia, que no nomeada. Com efeito, ela no o extremo da clera, pois esta

    inclui a vingana, mesmo perante a irascibilidade justificada. Este excesso determinada

    o irascvel, que se encoleriza depressa, o birrento que so difceis de apaziguar e os

    mal-humorados que se encolerizam pelo que no devem, mais do que devem e por mais

    tempo.

    IV 6. Aristteles censura ainda duas disposies: o ser obsequioso e o inescrupuloso,

    ou grosseiros e altercadores. O compromisso com a verdade o meio termo entre estas

    disposies, quando o homem se rebela e se conforma ante a coisa certa. No h um

    nome para tal disposio intermediria, mas o filsofo a aproxima da disposio do bom

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    (verdadeiro) amigo, que se relaciona com todos do modo certo, isto , que convm, sem

    procurar causar-lhes dor ou prazer.

    IV.7 O meio-termo oposto jactncia tambm est em igual posio da virtude anterior.

    Seus extremos so, de um lado, o ato de arrogar-se coisas que trazem glria quando

    no a possui, ou arrogar-se mais do que possui. Este o comportamento tpico do falso

    modesto, ao passo que quem observa o meio-termo no exagera e nem subestima,

    sendo sincero tanto no modo de viver como em suas palavras, nem para mais nem para

    menos.

    IV.8 Igualmente o repouso contemplado por Aristteles. Por repouso, o filsofo refere-

    se aos lazeres e recreao. caracterstico de um homem de tato dizer e escutar

    aquilo que fica bem uma pessoa digna e bem educada. Os que levam a jocosidade ao

    extremo so considerados farsantes e vulgares, enquanto os que no sabem gracejar

    e nem suportam os que o fazem so rsticos e impolidos.

    IV. 9 Por fim, a vergonha no entendida como uma disposio de carter mais como

    um sentimento. Em todo caso, h um medo de desonra de modo que o sentimento de

    vergonha fique bem somente juventude. Ela pode, contudo, ser considerada uma boa

    coisa dentro de certas condies em que o homem bom comete uma ao vergonhosa.

    Diferentemente so as virtudes que no esto sujeitas a tais condies.

    LIVRO V

    V.1 Justia e injustia: os homens entende por justia aquela disposio de carter

    que torna as pessoas propensas a fazer o que justo, que as faz agir e desejar o que

    feito de modo justo. O justo o respeitador da lei, ao passo que o injusto o homem

    sem lei e improbo. As leis tm em mira a vantagem do bem comum, que de todos, quer

    dos melhores ou daqueles que detm o poder ou algo do gnero, de forma que a justia

    seja uma virtude completa, mas em relao ao prximo e por isso ela pode ser

    considerada a maior das virtudes, sendo o bem de um outro, isto , busca o que

    vantajoso ao outro.

    Logo, de certo modo a justia no parte da virtude, mas a virtude inteira, e certa

    injustia o vcio inteiro, pois a justia e a virtude so em certo sentido uma mesma

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    coisa, embora no o seja a sua essncia: aquilo que, em relao ao outro justia,

    tambm virtude.

    V.2 Existe porm uma justia que parte da virtude. Esta justia particular proveniente

    daquilo que justo em sentido correspondente. H aquela que se manifesta nas

    atribuies das honras, de dinheiro e de outras coisas divididas entre pessoas que tem

    parte em uma dada constituio (A) e aquela que desempenha papel corretivo nas

    transaes entre indivduos (B).

    V. 3 O que justo em (A) uma espcie de temo proporcional, que envolve quatro

    termos pelo menos e a razo entre dois termos a mesma que entre os outros dois e o

    todo guarda a mesma relao para com o todo. Injusto o que viola a proporo.

    V. 4-5 O que justo em (B) algo intermedirio entre uma espcie de ganho e uma

    espcie de perda, a saber, os que so involuntrios. Consiste em ter uma quantidade

    igual antes e depois da transao. A reciprocidade no justa sem qualquer reserva,

    pois no se enquadra nem na justia corretiva (B) e nem na distributiva (A).

    V. 6-9 A justia existe apenas entre os homens cujas relaes mtuas so governadas

    pelas leis e estas existem para homens entre os quais h injustia, pois a justia legal

    a discriminao do que justo e do que injusto. Quem deve governar no o homem,

    pois este o faz no seu prprio interesse e converte-se em um tirano. Ao contrrio quem

    deve governar um princpio racional. Neste caso, o Magistrado um protetor da justia

    e por isso no deve possuir mais do que a sua parte, de modo que para os outros que

    trabalha. Ele recompensado com honra e privilgio e aqueles que no se contentam

    com estas coisas, tornam-se tiranos.

    V. 10-11 Para Aristteles, a equidade, que a disposio de reconhecer igualmente o

    direito de cada um, no idntica justia mas superior a esta. O papel da justia

    equitativa o de servir como instrumento de correo de uma lei quando esta

    deficiente e no prev algum caso particular, o equitativo no superior a lei natural,

    mas a compreende e sabe aplic-la no sentido especfico exigido pelo caso A justia

    equitativa surge da necessidade da generalidade da lei. Ela deve cumprir com o papel

    de tratar igual os iguais e desigual os desiguais.

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    LIVRO VI

    VI.1 Em todas as disposies de carter h uma meta a que visa o homem orientado

    pela razo, ora intensificando, ora relaxando a sua atividade; e h um padro que

    determina os estados medianos (meios-termos), em consonncia com a reta razo.

    As virtudes da alma foram divididas em virtudes de carter, de intelecto e as morais que

    possuem duas partes: a que concebe uma regra ou princpio racional e a que privada

    da razo.

    VI. 2 A virtude de uma coisa relativa ao seu funcionamento apropriado. Trs coisas na

    alma controlam a ao e a verdade: sensao, razo e desejo. Mas a sensao no

    princpio de nenhuma ao. em suma a escolha a origem da ao e da escolha o

    desejo. A boa ao uma combinao entre intelecto e carter.

    VI.3 Aristteles estabelece que as disposies em tono das quais o homem possui a

    verdade so cinco: arte, conhecimento cientfico, sabedoria prtica, sabedoria filosfica

    e a razo intuitiva.

    VI. 4 Estabelece uma diferenciao entre coisas produzidas e coisas praticadas e da

    capacidade raciocinada de ambos. Nem o agir produzir, nem o produzir agir. A arte

    visa gerao e se ocupa de inventar e em considerar as maneiras de produzir alguma

    coisa que tanto pode ser, como no ser e cuja origem est no que produz, e no no que

    produzido. Ela uma questo de produzir e no de agir, uma disposio que se ocupa

    de produzir, acompanhada de raciocnio, sua carncia a produo que carece de

    raciocnio.

    VI.5 A sabedoria prtica consiste na capacidade de raciocinar e agir naquilo tocante

    ao bem e ao mau para os homens. Esta, difere-se da arte por ser a arte excelente na

    sua elaborao e no em sua ao. Para Aristteles, a sabedoria prtica a capacidade

    verdadeira e de raciocnio de agir no que se refere s aes humanas.

    VI. 6-7 O conhecimento cientfico o juzo acerca de coisas universais e necessrias.

    E, tanto suas concluses quanto as demonstraes so derivadas dos primeiros

    princpios. Consideramos um homem sbio no somente em um campo particular, mas

    em mbito geral, pois, segundo ele, a sabedoria deve ser a mais perfeita forma de

    conhecimento. A sabedoria deve ser a combinao entre a razo intuitiva e o

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    conhecimento cientfico. Aristteles acredita que a sabedoria prtica possui um campo

    gigantesco. Ela envolve tudo sobre o que o homem pode deliberar e visa como agir bem.

    VI. 8 A sabedoria prtica necessita de experincia. J a sabedoria filosfica no visa

    a ao mas o estudo. necessrio que tenhamos ambas, pois, uma completa a outra.

    A sabedoria poltica e a prtica correspondem mesma disposio da alma, mas so

    diferentes, pois, a sabedoria poltica relaciona-se com a ao na cidade e a sabedoria

    prtica com o indivduo e ele mesmo.

    VI. 9 As investigaes se diferem das deliberaes. Esta ltima refere-se na

    investigao de algo em particular e implica o raciocnio. A deliberao excelente

    aquela que tende a alcanar o bem. Um bom deliberador normalmente tambm dotado

    de sabedoria prtica, pois ele deve agir naquilo que delibera para alcanar o bem

    desejado.

    VI. 10 A inteligncia tambm difere da sabedoria prtica, posto que esta se encarrega

    de agir em suas deliberaes e a inteligncia se ocupa em julgar. A inteligncia,

    segundo ele, no consiste em ter sabedoria prtica, mas em aprender, no exerccio da

    arte de conhecer, no opinar, ela idntica a perspiccia. O homem perspicaz

    observador e sagaz.

    VI. 11-13 O discernimento o julgar segundo a verdade, e a ele converge: inteligncia,

    sabedoria prtica, razo intuitiva. As pessoas dotadas destes atributos so portadoras

    de discernimento. O discernimento vem com o tempo. Um homem sem virtude no se

    torna bom apenas por conseguir estas sabedorias com o tempo se no as usar. O fato

    que elas trazem complemento a vida, fazem parte da felicidade, deixam nos cientes

    daquilo que acontece e daquilo que vivemos.

    As sabedorias no nos tornam virtuosos e bons mas nos do instrumentos para

    decidirmos o queremos ser: se virtuosos ou viciosos. As disposies das virtudes, com

    as quais todos nascem, de nada adiantariam sem a razo. A razo indispensvel para

    a formao das virtudes em ns. Estas, quando praticadas e estimuladas, implicam em

    sabedoria prtica. E, quanto mais praticamos mais virtuosos nos tornamos.