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Pós‑Graduação em Gestão Módulo Básico Ética e Relacionamento Interpessoal Maria Sara de Lima Dias

Etica Relac Interp ARTIGO

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Pós‑Graduação em GestãoMódulo Básico

Ética e Relacionamento Interpessoal

Maria Sara de Lima Dias

FAEL

Diretor Executivo Marcelo Antônio Aguilar

Diretor Acadêmico Francisco Carlos Sardo

Coordenador Pedagógico Osnir Jugler

EDitorA FAEL

Autoria Maria Sara de Lima Dias

Gerente Editorial William Marlos da Costa

Projeto Gráfico e Capa Patrícia Librelato Rodrigues

revisão Dayene Castilho

Programação Visual e Diagramação Sandro Niemicz

AtEnção: esse texto é de responsabilidade integral do(s) autor(es), não correspondendo, necessariamente, à opinião da Fael.É expressamente proibida a venda, reprodução ou veiculação parcial ou total do conteúdo desse material, sem autorização prévia da Fael.

EDitorA FAELRua Castro Alves, 362Água Verde | Curitiba | PR | CEP 80240‑270

FAELRodovia Deputado Olívio Belich, Km 30 PR 427Lapa | PR | CEP 83.750‑000

FotoS DA CAPAAfonso LimaIlkerJakub KrechowiczT. Al Nakib

Todos os direitos reservados.2012

Nome da Disciplina

Neste artigo serão apontadas algumas noções de ética que foram se desenvolvendo ao longo da história da civilização humana, perpassando por várias etapas, acentuando a diferença entre a ética e a moral. Serão abordadas a necessidade de uma ética social frente a uma ética individual, bem como as necessidades interpessoais e o processo grupal e os valores éti‑cos na empresa, até ser direcionado para a temática sobre ética do cotidiano e sua importância nas rela‑ções interpessoais e na vida social. A ética será tra‑balhada como produto das relações humanas e como modo de diferenciação entre o homem e o animal, assim como veículo de transmissão dos valores his‑toricamente constituídos, para então ser apresentada a questão da ética dentro das instituições humanas como um produto específico do trabalho humano e que adquire diferentes formas conforme os contextos

organizacionais. Após o resgate histórico da evolução do conceito, o foco se voltará para a ética no contexto das empresas em um mercado globalizante e globa‑lizado. Será abordada também a comunicação e a linguagem como atributos especificamente humanos, assim como as diferenças individuais e as da hierar‑quia das necessidades. As perspectivas da ética para um mundo em mudanças e transformações e, ainda, a questão do conflito e do poder nas organizações, finalizarão a discussão dessa temática. Neste artigo, as noções de ética e de valores pessoais tornaram‑se um elemento fundamental para a melhoria da quali‑dade de vida e das relações que se estabelecem no ambiente de trabalho.

Palavras‑chave: Desenvolvimento interpessoal. Ética. Relacionamento interpessoal.

1 | Noções de ética

Todos possuem alguma ideia do que seja ética, já certamente ouviram falar e trazem consigo alguma concepção ou conhecimento mesmo que mínimo sobre ética. Diariamente surgem relações entre pessoas em que se perguntam que tipo de comportamento deveria ter que poderia guiar sua conduta pessoal.

Cada um possui valores e conhecimentos éticos, no entanto, este conhecimento não é formal. A ética é um ramo da filosofia que se dedica a estudar os compor‑tamentos morais do ser humano. Mas o que é, afinal, a filosofia? De acordo com Comte‑Sponville (2001, p. 7) “a filosofia é uma atividade que, por discursos e racio‑cínios, nos proporciona uma vida feliz. Gosto de tudo nessa definição. Gosto em primeiro lugar que a filosofia seja uma ‘atividade’, energia e não apenas um sistema, uma especulação ou uma contemplação”. Essa obser‑vação permite analisar que a filosofia e mais precisa‑mente o ramo da ética proporciona ou tende a permitir que as pessoas tenham uma vida feliz.

Sabe‑se, a partir disso, que a ética auxilia a com‑preender o mundo e a orientar os indivíduos em relação

ao comportamento e assim a fazer escolhas pessoais de forma mais acertada. Segundo o dicionário etimológico de Cunha (1982), a palavra “ética” significa algo que pertence ou relativo à ética, do latim éthicus, derivado do grego ethikos, e também se classifica como um dos ramos do conhecimento que estuda a conduta humana, estabelecendo os conceitos do bem e do mal numa determinada sociedade e numa determinada época.

Durante a Idade Média a visão de Deus como o centro do mundo fez com que o homem determinasse seus critérios de bom e de mal pela via religiosa. Assim, os valores não seriam deste mundo, mas do mundo divino, e o homem para ser bom deveria ser temente a Deus. Já na Idade Moderna, com a tecnologia e as grandes invenções do conhecimento humano, o centro do universo já não é Deus, mas passa a ser o próprio homem, com sua razão e seu intelecto. No lugar das explicações religiosas para a vida, surgem as explica‑ções racionais. Portanto, a ética está diretamente rela‑cionada com a história do homem e com o desenvolvi‑mento das sociedades humanas.

No entanto, é preciso compreender como foi desenvolvido ao longo da sociedade as ações e normas

Resumo

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a virtude é um resultado do pensamento racional, que por sua vez é ligado a uma reflexão constante

da disciplina moral de hoje. “[...] Os seres humanos tem a opinião de que são livres por estarem cônscios das suas volições e das suas apetências, e nem por sonhos lhes passa a cabeça a ideia das causas que os dispõe a apetecer e a querer, visto que as ignoram.” (ESPI‑NOSA, 1983 p. 115). A autonomia da razão, ser guiado por ideias, é simplesmente uma reflexão que orienta o homem no mundo, ou seja, age‑se porque acredita‑se que somos livres para escolher coisas e tecer desejos.

Para Espinosa (1983), a razão humana seria o cri‑tério da verdade. Enquanto o homem é um ser dotado de razão, pode escolher os caminhos dele. Sendo assim, a razão representa na filosofia um esforço em compre‑ender o mundo e orientar as ações dos homens neste mundo. É no período clássico da filosofia grega que tanto os sofistas quanto os filósofos buscavam debater quais eram os princípios que deveriam orientar o com‑portamento das pessoas para que pudessem viver em sociedade. “Numa época em que havia pouca educação sistemática na Grécia, se é que havia alguma, os sofistas cumpriram essa tarefa. Eram mestres itinerantes, faziam conferências ou ensinavam profissionalmente” (RuS‑SELL, 2001, p. 63).

Embora os sofistas tenham desempenhado um valioso papel no campo da educação, sua visão filo‑sófica foi hostil ao conhecimento porque considerou que, de acordo com Protágoras, “o homem é a medida de todas as coisas, do ser daquilo que é, do não ser daquilo que não é”, o que, no entanto, afirma a opi‑nião de que a verdade de cada homem é a verdade para ele. Tratava‑se de um momento histórico em que as pessoas se questionavam sobre o mundo e sobre a natureza humana: De onde viemos? Para onde vamos? Seriam os homens assim como os animais movidos somente por seus instintos e impulsos? Ou haveria alguma forma de controlar nosso instinto mais animal e nossos desejos? Para alguns filósofos havia sim, como em Aristóteles (1973), uma capacidade das virtudes humanas sobrepujarem os instintos e dirigirem os comportamentos humanos. Portanto, o sábio ou o filósofo seria aquele homem capaz de alcançar a virtude e aqueles que não conseguissem estariam entregues à ignorância e aos vícios. Desse modo, a virtude é um

resultado do pensamento racional, que por sua vez é ligado a uma reflexão constante. “Sendo, pois, de duas espécies a virtude, intelectual e moral, a primeira, por via de regra, gera‑se e cresce graças ao ensino – por isso requer experiência e tempo; enquanto a virtude moral é adquirida em resultado do hábito [...]” (ARISTóTELES, 1973, p. 267). O homem grego poderia ser treinado, educado para desenvolver essa vida que só pertencia aos sábios, mas nem todo cidadão teria direito a esse tipo de educação. A ética se relaciona com questões que até hoje prevalecem: “[...] podemos ser tentados a nos fazer em perguntas tais como, qual o significado da vida, se é que de fato existe um. Será que o mundo tem um propósito, o desenrolar da história nos leva a algum lugar, ou estas perguntas não tem sentido?” (RuSSELL, 2001, p. 11).

Nessa linha de raciocínio, filósofos buscaram uma reflexão racionalista sempre em oposição a fundamentos religiosos que até então serviam de guias aos compor‑tamentos. Para quem tem formação cristã, por exemplo, não roubar, mão matar, não cobiçar, fazem parte do pri‑meiro código de ética aprendido. A relação com a ética que se desenvolve a partir desse ponto vai permitir com‑preender o mundo e a vida cotidiana, está impregnada na capacidade de decidir de cada um. Mesmo entre dúvidas e inseguranças, o homem toma uma posição sobre sua conduta, se algo feito é bom ou mal.

Mas a apreciação do que é bom ou mal é relativa, ou seja, pertence a determinado momento histórico e a deter‑minada sociedade em que se vive. É possível considerar, por exemplo, que a norma é não roubar, mas para alguns tipos de povos nômades o roubo pode fazer parte de um hábito de sobrevivência. No entanto, quando apela para a razão, o homem consegue perceber o lugar da ética. Se todas as pessoas podem roubar de todas as pessoas, então não haveria nada que pudesse não ser roubado e a posse não seria permitida. Esta contradição permite enten‑der a prática da ética como uma norma universal.

O estudo da ética enquanto disciplina formal iniciou com os filósofos gregos, mas a ética tem o seu campo de aplicação envolvendo várias áreas do saber, desde a sociologia, a antropologia até a biologia e a psicolo‑

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gia. Para Aristóteles (1973), em Ética a Nicomaco, toda a ação humana busca um determinado fim que é um bem, na medida em que todos os homens anseiam pela mesma coisa, ou seja, todos querem ser felizes.

Nesse sentido, o conhecimento humano deveria ser dirigido para a busca desse bem comum e universal. Ao longo, portanto, do século XX e do século XXI, os pensadores, partindo da concepção grega, buscaram definições a respeito de uma ação moral universal por meio da razão.

Contudo, as questões éticas não se estabelece‑ram sem debates entre os filósofos e os pensadores de diferentes épocas históricas. Para Aristóteles (1973), por exemplo, a felicidade é considerada como a grande finalidade da vida, não o prazer ou a riqueza, mas uma vida de contemplação. Então, novamente, há o encon‑tro com a religiosidade na ética, com um padrão de conduta a ser seguido que voltasse para um homem comedido, um homem que refreia seus instintos e que pode contemplar a Deus.

Na verdade, o primeiro código moral que organiza a vida social de que se tem notícia são as escritas religiosas que ditam normas e padrões de comportamento sobre o que é certo e o que é errado aos olhos de Deus. Adão, por exemplo, é expulso do paraíso por não ter obediência a uma regra de comportamento. Assim, a suposta liber‑dade de escolha do homem se depara com a necessi‑dade de se fazer o bem para a sua própria salvação, no entendimento de que fazer o bem para o outro é fazer o bem para ele mesmo. Todas as instituições religiosas têm determinados códigos de conduta, determinada ética, na qual Deus é visto como aquele que ilumina contra a ignorância do homem, sendo que todas as coisas boas e justas emanariam de Deus, e assim o homem deveria pautar seu comportamento a partir da busca da perfeição que se assemelharia à divina.

O filho do criador, constituído pela imagem e seme‑lhança de Deus, seria um exemplo de conduta ética a ser perseguida pelo homem. Nesse sentido, pode‑se afirmar que “a civilização ocidental, que brotou das fontes gregas, se baseia numa tradição filosófica e científica que come‑çou em Mileto há dois mil e quinhentos anos e nisso difere de outras civilizações mundiais”. (RuSSELL, 2001, p. 17). Mas a integridade dos atos humanos passa por uma reflexão da vida diária e de uma histórica da própria civilização humana baseada em pressupostos éticos.

No entanto, os valores humanos mudam com o pas‑sar do tempo e conforme o homem adquire consciência desses valores. Conforme as ações humanas podem prejudicar os outros, e conforme aprendemos ou não sobre que não devemos praticar o mal porque vivemos em uma sociedade. O ser humano deve ser dotado de ética para que consiga viver entre seus semelhantes habi‑tando o mesmo ethos, ou ambiente. “Segundo Aristóteles, o homem é um animal político. Não vive isolado, mas em sociedade. Mesmo no nível mais primitivo, isto envolve algum tipo de organização e a noção de ordem brota desta fonte”. (RuSSELL, 2001, p. 18). Desse modo, se o homem só sobrevive em sociedade, deve aprender a respeitar as normas e regras que emergem da vida social, visto que as instituições sociais são organizações que se preocupam em divulgar os padrões de comportamento que são tidos como aceitáveis para se viver em grupo.

Contudo, os pressupostos éticos e o guia de com‑portamento humano se movem e se transformam na medida em que o homem se relaciona com os demais. Então, o homem aprende, ao longo da vida, o que seriam condutas boas ou más, éticas ou não éticas. “Somos e não somos é um modo um tanto enigmático de dizer que a unidade da nossa existência consiste em uma mudança perpétua, ou, para usar uma linguagem forjada por Platão, o nosso ser é um perpétuo devir” (RuSSELL, 2001, p. 31). De tal modo, partindo des‑ses princípios, e tendo consciência de nossos atos, o homem deve buscar aprimorar o seu comportamento ético, com vistas a forjar uma boa vida social. Em busca de viver em harmonia com os outros homens e com a sociedade como um todo, os indivíduos são seres de direitos e deveres, e “por trás da luta entre opostos, segundo certas normas, existe uma oculta harmonia ou afinação, que é o mundo” (RuSSELL, 2001, p. 30). Os diretos e deveres humanos provêm de uma vida em comum, de respeitar e ser respeitado, de ação e reação, que formam a base das relações interpessoais. A seguir serão abordadas as diferenças entre moral e ética.

2 | Diferença entre ética e moral

A palavra “moral” é um adjetivo relativo aos costu‑mes e significa um conjunto de regras de conduta. Exis‑tem diferenças entre o que é da ordem da ética e o que é considerado moral. Segundo o Dicionário epistemoló-gico da língua portuguesa, de Cunha (1992), o termo,

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a ética se refere a posições tomadas na vida e que podem buscar por uma generalidade

ou universalidade de valores.

originado do latim moralis, é a conclusão moral que se tira de uma obra, de um fato, de uma moralidade.

uma das características do pensamento místico é a aceitação de um destino ou da sorte, mas as ações humanas na Terra não são determinadas desde o nascimento. Ninguém nasce a princípio bom ou mau, não existe uma natureza humana. O homem é, portanto, um ser social, aprende a agir sobre o meio que o cir‑cunda, faz suas escolhas, tem consciência de que seus atos podem repercutir na sociedade como um todo. Os indivíduos são livres para escrever sua história humana na Terra. É possível, portanto, tomar uma decisão e depois se arrepender dela, pensamento este que na consciência não tomou uma posição ética.

O agir do homem é moral quando se preocupa com a manutenção da dignidade humana. “A partir do momento em que o homem produziu as possibilidades de sua própria essência, ao elevar‑se através da homi‑nização acima do reino animal, pode realizar apenas precisamente essas possibilidades” (HELLER, 2000, p. 15). Assim, o caráter da história está nos valores que são construídos ao longo da civilização. Os indivíduos decidem com base em valores universais aceitos por todos, desse modo, já não se pode voltar atrás na histó‑ria. É possível fazer todas as escolhas possíveis, mas é preciso reconhecer nas decisões diárias os valores his‑tóricos desenvolvidos pelo homem. Sabe‑se, portanto, que pode‑se tudo, mas que nem tudo convém porque as escolhas podem ferir uma moralidade ou uma ética.

“As alternativas históricas são sempre reais: sempre é possível decidir em face delas, de um modo diverso daquele em que realmente se decide” (HELLER, 2000, p. 15). Não era obrigatório que o desenvolvimento histórico da sociedade tomasse o rumo que tomou, eu mesmo não preciso decidir com base somente na finalidade dos meus atos. Assim sendo, escolhe‑se com base no conhecimento do bem e na capacidade de jul‑gamento moral.

O vínculo entre o bem e o conhecimento é um marco no pensamento grego, mas a alternativa quando se escolhe algo como um comportamento não é des‑truir a história, mas fazer a própria história. Preferir esta

ação em detrimento de outra, de modo que não venha a ferir a outro ser humano, é antes de tudo uma escolha singular, ou seja, da própria pessoa em fazer o bem.

Escolhe‑se, portanto, para o próprio bem e o da coletividade. Isso se refere a um pensamento ético: “pelos atos que praticamos em nossas relações com os homens nos tornamos justos ou injustos, pelo que fazemos em presença do perigo e pelo hábito do medo ou da ousadia, nos tornamos valentes ou covardes” ( ARISTóTELES, 1973, p. 268). Portanto, a ética se refere a posições tomadas na vida e que podem buscar por uma generalidade ou universalidade de valores.

A ética remete a uma universalidade do pensa‑mento humano. Já a moral ou o pensamento moral é situacional, muda conforme a sociedade e o tempo histórico vivido. um exemplo disso é o casamento enquanto instituição social. Até bem pouco tempo era permitido somente ter um casamento ao longo da vida e entre parceiros de sexos diferentes. No entanto, existem determinadas sociedades que julgaram esse comportamento como moralista e passaram a admitir casamentos entre pessoas do mesmo sexo. “Não pode‑mos, portanto, dizer que todo homem predisposto ao preconceito é imoral. Mas podemos afirmar que sobre todos os aspectos nos quais tem preconceitos ocorre uma diminuição para o homem de suas possibilidades de uma escolha adequada e boa.” (HELLER, 2000, p. 60). Portanto, o termo “moral” diz respeito a uma reali‑dade particular da vida social.

Conforme os costumes e hábitos mudam, também mudam os padrões morais. um exemplo é o preconceito que pode mudar de acordo com a cultura e os hábitos locais. Sendo em maior ou menor grau dependendo das alternativas, da informação e do conhecimento que permite que a pessoa faça suas escolhas, de modo diferente das outras. Se toda uma sociedade tem uma cultura preconceituosa, o indivíduo pode escolher não ser preconceituoso se tiver a oportunidade de conhecer os motivos que levaram tal sociedade a ter padrões pre‑conceituosos de relacionamento.

Os traços característicos de um determinado grupo social, os costumes de um povo do ponto de vista das

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relações que as pessoas estabelecem entre si, por exemplo, são comportamentos ditos morais. “Por mais difundido e universal que seja um preconceito, sempre depende de uma escolha relativamente livre o fato de que uma pessoa se aproprie ou não dele” (HELLER, 2000, p. 60). De outro modo, o que é um valor, um hábito ou costume de um povo também pode deter‑minar aquilo que é o bem ou os valores comuns de diferentes povos, atingindo toda a humanidade. Trata‑se, então, de valores éticos. Assim, a atividade humana se relaciona com a vida em agrupamentos sociais, que vão estabelecendo regras, normas, valores e que quando se cristalizam passam a gerar valores universais máximos de conduta aplicados a vários povos. A ética, portanto, estuda o ethos, esse conjunto de ações que servem de norma. No latim, o termo “ethicos” foi traduzido por moralis, que se relaciona com os hábitos e costumes, isso talvez tenha sido a origem da confusão forjada entre os conceitos de ética e de moral.

Para Aristóteles (1973), a fim de viver eticamente o homem precisa dominar suas paixões, seus impulsos, “por paixões entendo os apetites, a cólera, o medo, a audácia, a inveja, a alegria, a amizade, o ódio, o desejo, a emulação, a compaixão, e em geral os sentimentos que são acompanhados de prazer ou dor.” (ARISTó‑TELES, 1973, p. 271). Assim, viver eticamente é, para Aristóteles (1973), controlar os vícios e as paixões e se dedicar a uma vida em busca das virtudes. “Toda a virtude ou excelência não só coloca em boa condição a coisa de que é excelência como também faz com que a função desta coisa seja bem desempenhada” (ARIS‑TóTELES, 1973, p. 272). A distinção entre o comporta‑mento bom ou mal dos homens se estabelece quando o homem atinge uma vida virtuosa, “pois os homens são bons de um modo só e maus de muitos modos” (ARIS‑TóTELES, 1973, p. 273), ou seja, ser bom de um modo só é buscar a própria felicidade e a dos demais. Ainda, afirma que: “[...] o homem feliz, como homem que é, também necessita de prosperidade exterior, porquanto a nossa natureza não basta a si mesma para os fins de contemplação: nosso corpo também precisa gozar saúde e de ser alimentado e cuidado.” (ARISTóTELES, 1973, p. 431).

Compreende‑se a distinção entre o comportamento moral, que muda com o tempo e com o desenvolvimento das sociedades, e o comportamento ético, que permanece assim como o conjunto de valores e virtudes. No entanto,

o comportamento está sempre se referindo a um lugar de convivência em uma sociedade, se o homem precisa gozar de prosperidade para se manter um homem virtu‑oso. Isso ocorre sobre um ethos que é social. A seguir, serão abordadas a ética social e a ética individual.

3 | Ética social e individual

As mudanças no mundo moderno alteraram muito a forma de comportamento. O que antes era conside‑rado imoral hoje pode ser um comportamento perfei‑tamente aceito socialmente. Assim, é possível falar em uma ética social que seja comum a todos os homens e em uma ética individual que seja atrelada aos valo‑res mais íntimos. Contudo, como foi discorrido sobre uma ética social na qual se observa um mundo que sofre os efeitos da poluição, do desmatamento, das crises ambientais, questiona‑se se existe uma desculpa social para um comportamento antiético. “Com efeito, o homem que fez alguma coisa devido à ignorância e não se aflige em absoluto com o seu ato não agiu volunta‑riamente, visto que não sabia o que fazia; mas tampouco agiu involuntariamente, já que isso não lhe causa dor alguma” (ARISTóTELES, 1973, p. 282). Considere que o ser humano se preocupa constantemente com o seu comportamento social, embora não o faça em razão de interesses pessoais como o lucro ou a exploração do trabalho de outro homem.

No século XIX, as relações entre capital e trabalho atingiram muitas divergências, promovendo conflitos entre trabalhadores e donos dos meios de produção, ocasio‑nando greves e lutas por condições mais dignas de tra‑balho. Para a sociedade produzir e reproduzir a sua exis‑tência, alterou‑se o modo de produção: o homem saiu de um regime feudal do cultivo da terra, passou à manufatura e depois para um modo de produção industrializado.

Os conflitos, os movimentos grevistas e a luta por direitos sociais iguais marcaram todo o século XIX. A consciência da classe operária, a luta de classes é, portanto, uma forma de conceber também a moral. A atividade do homem produz o seu modo de vida social e determina o modo como o homem age em relação aos outros em seu meio social de acordo com a época relacionada ao trabalho. Se a vida do homem se baseia no modo como ele produz e reproduz a própria exis‑tência, a existência social determinaria a moralidade do

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homem. Quando se analisa, portanto, a competitividade do mundo moderno, esse mundo precisa cada vez mais de uma ética social que se reflita em condições dignas de trabalho e de vida humana.

A moral dos escravos é diferente da moral dos patrões, a moral dos operários é diferente da moral da classe burguesa. Proclamam‑se valores que ainda não são vividos; a liberdade, a fraternidade, a igualdade ainda são valores a serem perseguidos pela sociedade como um todo. Coerente com ideais humanistas, reclama‑se por uma ética do trabalho e por uma ética que se refira ao planeta, bem como por desenvolvimento com a sus‑tentabilidade pretendida, para que o legado para as pró‑ximas gerações seja uma vida com qualidade.

Observa‑se, enquanto características da vida moderna, o egocentrismo, o narcisismo e o individua‑lismo movido por uma forte competitividade, na disputa por lugares e postos de trabalho, por consumo desen‑freado e insaciável. Nela, os imperativos categóricos da ética são particulares ou individualizados, a moral é individual, as escolhas são cada vez mais centradas em pequenos grupos que comandam o planeta.

É preciso produzir novos sentidos sobre viver em comunidade em um mundo globalizado e globalizante e manter uma ética universal em que o imperativo cate‑górico seja o da convivência em um planeta comum, um lugar de todos. uma luta por direitos universais para que a moral não represente somente grupos menores, os grupos mais frágeis como as mulheres, os homossexu‑ais. É necessário reconhecer que “embora o comum das pessoas detestem os homens que contrariam os seus impulsos, ainda que com razão, a lei não lhe é pesada ao ordenar o que é bom” (ARISTóTELES, 1973, p. 433). É preciso reordenar o bom, o justo, aquele valor que é adequado à coletividade e à convivência pacífica dos povos, nem que para isso se torne necessário recorrer a leis cada vez mais duras sobre uma ética planetária em nome de uma razão universal.

Existe uma ação humana sobre a natureza, o homem precisa sobreviver, e o faz por meio do traba‑lho. Durante anos, o homem não se preocupou muito com a natureza, porque os recursos eram abundan‑tes; hoje em dia, isso não é mais possível. Existe uma compreensão generalizada de que o homem atingiu o topo de sua capacidade destrutiva, portanto, é preciso

recuar entre as leis da natureza para garantir a própria sobrevivência do homem. “E, se é pelas leis que nos podemos tornar bons, seguramente o que se empenha em melhorar homens, estes muitos ou poucos, deve ser capaz de legislar” (ARISTóTELES, 1973, p. 434). O homem chegou a um processo de desenvolvimento da civilização em que deve romper com o individua‑lismo exacerbado. É preciso ter consciência da razão planetária, e talvez uma nova ética social deva prevale‑cer, a lógica de uma ética comunicativa. Sobre a ética individual, há a necessidade do diálogo da troca. Caso desgosto voltaremos aos regimes totalitários através de um controle rígido dos comportamentos pelo Estado, “[...] o controle público é evidentemente exercido pelas leis e o bom controle, por boas leis” (ARISTóTELES, 1973, p. 434), não precisamos de um total controle legal sobre nossas ações precisamos sim de coletivi‑dade e não individualismos.

Desse modo, para prover o homem de seus recur‑sos financeiros e materiais e buscar a satisfação de suas necessidades de sobrevivência enquanto habitante de um planeta comum, é imperativo que os discursos políticos lancem mão de uma discussão sobre a ética, pois “a sabedoria prática está ligada ao caráter virtuoso e este à sabedoria prática, já que os princípios de tal sabedoria concordam com as virtudes morais e a reti‑dão moral concorda com ela.” (ARISTóTELES, 1973, p. 430). É preciso mais sabedoria e retidão para conven‑cer os governos sobre a necessidade de proteção do mundo como um todo.

Falar em ética individual frente a uma ética social é contraditório porque muitas vezes é preciso abrir mão de um desejo em prol de um bem maior. Entre os indiví‑duos existe uma ética singular. Está claro que o homem deve manter, cuidar e preservar a sua própria vida, no entanto, o seu impulso de conservação não deve ultra‑passar a vida dos demais.

Os governos precisam garantir as necessidades essenciais de sobrevivência humana, e estas devem estar protegidas e garantidas na forma da lei. A manu‑tenção da lei e da ordem dentro de uma sociedade que se diz ética, no entanto, não é fácil, porque “surgem desentendimentos quando o que as pessoas obtêm é algo diferente daquilo que desejam, pois é, então, como se nada tivessem obtido” (ARISTóTELES, 1973, p. 399). Ainda que argumentos racionais sirvam para

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a manutenção desse sistema competitivo instalado em nossa sociedade, é necessário falar da ética social.

Compartilha‑se hoje um mundo já conhecido e com escassos recursos naturais, no entanto, o homem ainda não conseguiu atingir padrões mínimos de lei que expres‑sem uma ética e uma justiça social. Em relação à natureza prevalecem os interesses da economia e do capital. A maior preocupação política parece ser no século XIX, no qual a geração de empregos e renda para que as pessoas continuassem a consumir os milhares de produtos que são lançados instantaneamente no mercado.

No entanto, a interação entre as pessoas que habitam o mesmo universo social e o aproveitamento máximo dos recursos naturais ainda não estão na pauta das negocia‑ções e dos acordos internacionais. O homem, com seu egoísmo arraigado, com seus valores pessoais e mesqui‑nhos, nem sempre se percebe como um ser em relação com outros seres de iguais direitos e deveres.

É importante falar de uma ética individual para todos, em que todo e qualquer ser humano tenha direito à reali‑zação humana, como direito ao lazer, ao conhecimento, a formas de socialização, à sua realização pessoal, enquanto um ser dotado de virtualidades. No dizer de Aristóteles, (1973) o homem com suas contradições existenciais deve buscar por uma vida justa e digna e repleta de vir‑tudes éticas. “Por virtude humana entendemos não a do corpo, mas a da alma, e a felicidade também a chamamos uma atividade da alma” (ARISTóTELES, 1973, p. 263). O homem tende a realizar o seu potencial de desenvolvi‑mento, no entanto, a realização dele nem sempre é pos‑sível, a humanização ou o tornar‑se de fato humano tam‑bém reside na possibilidade de o homem ter acesso aos bens culturais produzidos pela sociedade. A seguir, será abordado o homem em seu processo de emancipação, vinculado a necessidades interpessoais que devem ser satisfeitas para serem superadas.

4 | Necessidades interpessoais e o processo grupal

Considera‑se que o ser humano é acima de tudo um ser social, que nasce, cresce e se desenvolve em grupos sociais. O homem depende do homem para poder sobreviver em sociedade. É ser que fala e esta característica o diferencia dos animais. Devido à capaci‑

dade de comunicação, é possível entender o outro, tra‑balharem juntos para atingir a satisfação de suas neces‑sidades e seus desejos. Contudo, a comunicação não é fácil porque existem situações concretas vividas desde o nascimento até as características geneticamente trans‑mitidas que fazem dos indivíduos seres diferentes.

As diferenças podem ser sociais, culturais e devem ser consideradas quando se fala, pois o comportamento verbal é dirigido para outro ser e é nessa ação que se funda a diferença. É importante conhecer o porquê de tais diferenças para que seja possível compreender por‑que os homens agem, como agem em relação uns aos outros. “Em todas as ações e propósitos é ele a finali‑dade, pois é tendo‑o em vista que os homens realizam o resto.” (ARISTóTELES, 1973, p. 255). A primeira ação do homem é a da relação com o outro, é no grupo que o homem aprende as finalidades os objetivos de sua vida, os seus valores éticos e morais.

Em suas ações diárias, o homem reflete padrões de comportamento aprendidos ao longo da vida. “Existe uma finalidade para tudo que fazemos, essa será o bem realizável, mediante a ação, e se há mais de uma, serão os bens realizáveis através dela” (ARISTóTELES, 1973, p. 255). Participando de grupos humanos, o homem altera o grupo e a si mesmo, suas ações promovem rea‑ções nos demais. Considerando que ele não sobrevive sozinho, é preciso aprender a trabalhar em grupos, mas participar de grupos humanos não significa concordar com todas as ideias. Ainda assim, o homem é singu‑lar, ou seja, boa parte de seu comportamento deve ser aprendido em grupo, mas o homem é capaz de reflexão e de mudança de comportamento.

Na medida em que participa de diferentes gru‑pos ao longo da vida – grupos familiares, escolares, grupos religiosos e grupos de trabalho –, o homem desenvolve papéis sociais e modos de ser, a própria maneira de viver em sociedade. Tais papéis se definem para o homem como um meio de ir em busca da satis‑fação de suas necessidades. Entre as necessidades humanas de fome, abrigo, afeto, entre outras, aquela necessidade mais geral ou comum a todos os homens é a busca da felicidade. Nesse sentido, “a felicidade é, portanto, algo absoluto e autossuficiente, sendo também finalidade da ação”. (ARISTóTELES, 1973, p. 255). Quando se chega a participar de um determi‑nado grupo social, não se começa do nada; o homem

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não é uma tábua rasa, já traz consigo determinadas vontades, desejos e valores que aprendeu no decor‑rer de sua existência. “O desejo [...] seria antes em nós esta força, que nos permite comer com apetite, agir com apetite, amar com apetite” (SPINOZA apud COMTE‑SPONVILLE, 2001, p. 77).

Identifica‑se a necessidade de participar como algo absoluto do homem, inerente à sua ontologia. “[...] Cha‑mamos de absoluto e incondicional aquilo que é sempre desejável em si mesmo e nunca no interesse de outra coisa” (ARISTóTELES, 1973, p. 255.) Assim, o homem deseja participar, tomar parte de grupos sociais, ser reconhecido como pertencente a determinado grupo, o que lhe garante uma identificação e consiste em uma sua definição de ser quem ele é. Esse sentimento de pertencer é que lhe permite se sentir integrado, e fazer parte de algo maior e que de certa forma lhe garante a sua própria sobrevivência.

No entanto, as necessidades sociais e de ser aceito em determinados grupos nem sempre são satisfeitas. O grupo controla quem pertence ou não, quem pode ser incluído ou não. “Os vários grupos de trabalho eram coletivamente responsáveis pelos esforços individuais de seus membros” (SENNET, 2005, p. 135). Conforme sua estrutura, seus objetivos de funcionamento grupal partilhando ou detectando erros, um trabalhador pode responsabilizar ou outros, pode incluir e aceitar ou não a participação do individuo no grupo.

Na sociedade, vive‑se em grupos institucionaliza‑dos e hierarquizados no qual nem sempre o estrangeiro é bem‑vindo, as estruturas sociais tornam‑se rígidas, e os diferentes são com frequência expulsos de deter‑minados agrupamentos sociais. “[...] As sociedades complexas tornaram‑se rígidas a tal ponto que a própria tentativa de refletir normativamente sobre elas ou de renovar sua ordem [...] é virtualmente impedida” (BAu‑MAN, 2000, p. 11).

O grupo deve compartilhar determinados objetivos, valores emocionais, e se mantém em estruturas de rela‑ção mais ou menos estáveis. Qualquer elemento que saia ou entre em um grupo tende a alterar a ordem das relações interpessoais estabelecidas. “A ordem das coi‑sas como um todo não está aberta a opções, está longe de ser claro quais seriam estas opções.” (BAuMAN, 2000, p. 11). A organização social do modo como está estruturada obriga‑o a viver em grupos institucionaliza‑

dos, e a se adaptar e estabelecer relações com pessoas que não compartilham dos mesmos valores e opiniões. Nos grupos de trabalho, com frequência os indivíduos veem‑se obrigados a conviver com o diferente e com as diferenças de opiniões, crenças, costumes e valores. Assim, as necessidades de relacionamentos interpes‑soais e intersubjetivos o obrigam a aprender a conviver com o diferente e a desempenhar diferentes papéis quando está em grupos.

um exemplo é o perfil de uma pessoa muito revo‑lucionária, que para participar de um grupo precisa modificar o comportamento se tornando dócil. “Nin‑guém ficaria surpreso ou intrigado pela evidente escas‑sez de pessoas que se disporiam a ser revolucionários” (BAuMAN, 2000, p. 12). Esse tipo de convivência com o outro em função de objetivos de trabalho, por exemplo, com quem se é obrigado a se relacionar por diferentes motivos, é chamada de “solidariedade mecâ‑nica”. Preciso do outro, devo me relacionar com este outro ainda que não compartilhe com ele dos mesmos valores. Desse modo, viver na modernidade é viver em constante reforma, é viver flexibilizando nossas condu‑tas e viver por uma ética da diferença. “A modernidade significa muitas coisas, e sua chegada e avanço podem ser aferidos utilizando‑se muitos marcadores diferen‑tes” (BAuMAN, 2000, p. 15). Se os indivíduos são impelidos a formar uma solidariedade mecânica com os demais, contrariamente também podem fazer suas escolhas.

Dentro de grupos sociais distintos é possível esco‑lher a qual grupo se filiar, a quem oferecer a sincera amizade. A este tipo de formação grupal em que a pes‑soa escolhe os motivos de sua filiação chama‑se de “solidariedade orgânica”. um valor compartilhado, um sentimento de pertencimento de comum, uma comu‑nhão de valores, objetivos e intenções. “O indivíduo se submete à sociedade e essa submissão é a condição de sua libertação. Para o homem, a liberdade consiste em não estar sujeito às forças físicas cegas” (BAuMAN, 2000, p. 27). Assim, os grupos formados por nossas escolhas pessoais são grupos de trabalho mais coesos e fortes e que tendem a se manter unidos mesmo diante de problemas circunstanciais. Nesse sentido, o objetivo do grupo tende a prevalecer sobre os objetivos do indi‑víduo. O homem precisa do trabalho para sobreviver e o tipo de trabalho mais característico da vida moderna é o trabalho em grupos.

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A empresa consciente e cidadã permite que as pessoas sejam autônomas ou consegue definir claramente a autonomia

dentro dos papéis e responsabilidades dos cargos

No grupo de trabalho é que o sujeito deve aprender a aceitar as diferentes necessidades e perfis, aprender a conviver. “Precisar tornar‑se o que já é a característica da vida moderna [...], a expressão sendo evidentemente pleonástica, falar da individualização e da modernidade é falar de uma e da mesma condição social” (BAuMAN, 2000, p. 41).

O processo grupal se estabelece em torno de objetivos comuns, de metas a serem alcançadas e compartilhadas por todos dentro de uma determinada organização de trabalho. É no grupo e convivendo com o outro que os indivíduos compartilham as diferenças, sentem‑se fazer parte do mundo à volta e fortalecem‑se. As atitudes tendem a se voltar para o atendimento dos resultados, dos objetivos grupais: quanto mais coesão no grupo de trabalho, mais produtividade e mais satis‑fação para o participante. A seguir serão abordados os valores éticos que devem permear as relações interpes‑soais na empresa.

5 | Os valores éticos na empresa

Os valores do homem se relacionam com os grupos aos quais ele pertence. Assim, é normal supor que ao se falar de valores éticos individuais também é possível observar que estes sofrem influências dos grupos que convivem e das condições desses grupos, que podem ser relacionadas ao trabalho em conjunto. O homem é um ser que trabalha e ao agir sobre a natureza produz o mundo e produz a si mesmo. O trabalho humano é diri‑gido para atingir determinados objetivos, na medida em que se trabalha, desenvolvem‑se instrumentos e meios de aprimorar o processo de trabalho. O homem é um ser que cria e desenvolve novas formas de produzir a própria materialidade de sua vida.

Quando se fala em ética, é fundamental abordar que essa ética permeia todas as relações humanas, e, portanto, o trabalho não pode estar fora da ética. O trabalho tem um determinado valor para aquele que trabalha e para a empresa que administra a força de trabalho. É preciso falar da ética dentro das economias, nos negócios das empresas, já que ela está em toda

a parte em todos os grupos humanos. “[...] A filosofia moral nos permite avaliar se a história que contamos a nós próprios sobre o nosso contexto moral é razoável ou não” (FuRROW, 2007, p. 15). Assim, existe na empresa moderna uma necessidade de derrubar privilégios, de diminuir as hierarquias e de aproximar a relações entre as pessoas.

Observa‑se cada vez mais, uma acentuada valori‑zação dos valores éticos, daqueles que são proclama‑dos e vividos no cotidiano de trabalho, como o princípio da autonomia, “um requisito básico para o agir moral [...]” (FuRROW, 2007, p. 17). A empresa consciente e cidadã permite que as pessoas sejam autônomas ou consegue definir claramente a autonomia dentro dos papéis e responsabilidades dos cargos. Assim sendo, o requisito básico deve ser a habilidade de dentro da empresa de conseguir tomar as suas próprias decisões.

A empresa, portanto, para ser ética nos relaciona‑mentos interpessoais que promove, não deve se preo‑cupar somente com os lucros de seus investimentos nos negócios, promovendo agentes morais. De acordo com Furrow (2007, p. 18), “um agente moral não só age autonomamente, ele deve ser capaz de realizar ações morais”. Ao se preocupar com questões macroestru‑turais à sua volta, bem como com os relacionamentos interpessoais dentro da empresa, observa‑se que a organização está formando exemplos paradigmáticos de ação moral. um exemplo muito comum seriam as ações voltadas para a responsabilidade social, preo‑cupadas com o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável, voltadas para a melhoria das condições de trabalho de modo a oferecer aos seus funcionários qua‑lidade de vida.

Comumente as ações propagam éticas nas empresas, isto é, tem uma finalidade ou algum tipo de propósito como aumentar os valores dos negócios, difundirem uma imagem pública que possa resultar em dividendos ou lucros. Mas a motivação e o inte‑resse das empresas em divulgarem suas ações morais também se relacionam com o respeito ao consumidor. Dessa forma, a maioria das pessoas prefere adquirir produtos de empresas cidadãs que assumam compro‑missos com a sociedade.

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Conseguir uma boa autoimagem e propagar valores como a não poluição ambiental e as boas práticas no ambiente de trabalho são hábitos cada vez mais valo‑rizados no mercado de trabalho. Assim, acredita‑se ser legítimo e necessário falar sobre a ética nas organiza‑ções e nos negócios, principalmente porque o homem passa a maior parte da vida no trabalho. A questão da complexidade humana e da multiplicidade de condições que interferem em seu comportamento ético influen‑ciam o seu modo de agir na empresa. Portanto, mesmo no ambiente de trabalho, é necessário falar de ética, sendo a atividade humana identificada e descrita. Ainda assim, pode‑se escolher se filiar ou não a determinados grupos de trabalho e não a outros grupos conforme pre‑ferência. “Na sociedade moderna, alguns indivíduos são mais livres que outros, alguns são mais dependentes que outros” (BAuMAN, 2003, p. 38). Nesse sentido, as empresas permitem decisões para pessoas que podem ser mais autônomas e que têm mais recursos intelectu‑ais e morais para decidir.

Por motivos diversos, existem instituições sociais nas quais se confia e outras que parecem idôneas. Assim, os homens são movidos por uma ideia de mora‑lidade empresarial. Todos os seres humanos têm inte‑resses que precisam ser satisfeitos e desejam interagir com instituições que sejam interpretadas como éticas. Nesses julgamentos, buscam a imparcialidade, já que “todos nós temos esta capacidade porque nós temos a capacidade para a liberdade e para a razão, embora seguidamente não a exerçamos” (FuRROW, 2007, p. 31). Contudo, o que é ou não adequado para cada pes‑soa, o que contribui ou o que causa dano ao bem nem sempre são relevantes.

É preciso reconhecer que a produtividade das empresas tende a se relacionar também com o fato fundamental da liberdade humana. “A liberdade (a reali‑dade dela, se não o ideal) é um privilégio, mas privilégio ardentemente contestado” (BAuMAN, 2003, p. 39), ou seja, quanto mais alta a capacidade de as pessoas serem responsáveis por suas ações, mais alta a motiva‑ção e a responsabilidade. Ao contrário, a baixa produti‑vidade tende a se relacionar com uma fraca adesão aos objetivos organizacionais, o que é comum ser assunto de conflito real dentro das organizações de trabalho.

Dentro dos grupos de trabalho, quando se acusa alguém de agir mal, seguidamente o julga pelo padrão

de moralidade. Na divisão social do trabalho, “o tempo era minuciosamente calculado em toda a parte da vasta fábrica, para que os altos administradores soubessem com precisão o que todos deveriam estar fazendo num dado momento” (SENNET, 2005, p. 47). Assim, tempo e espaço controlado, tarefas divididas, foi o início do processo de hierarquização. Nesse processo, ao longo do tempo estru‑turado e até hoje, percebe‑se que existem cargos de maior ou menor responsabilidade sobre as decisões tomadas. No entanto, os valores que a empresa proclama devem ser vivenciados em todos os níveis hierárquicos.

Existe uma necessidade ética de falar e fazer, de divulgar valores e de se comprometer e cumprir tais valores. A presença humana nas empresas proclama a necessidade também de as empresas em cultivarem valores humanos, de valorizarem as relações interpesso‑ais que se estabelecem no ambiente de trabalho. Existe uma ideia de solidariedade nos grupos de trabalho ou de tarefa. Se alguma pessoa não atinge a meta, todo o grupo sofre as consequências dessa ação. Assim, o capi‑tal deve se preocupar em manter e permitir boas rela‑ções interpessoais no ambiente de trabalho, uma ideia de cooperação, de compartilhar, deve estar presente e essa cooperação exige contato com o outro, distribuição do poder e da tomada de decisões em todos os níveis hierárquicos. A empresa moderna deve estar atenta para um novo modelo de relações no qual os valores huma‑nos sobrepõem‑se aos valores técnicos, e no qual o homem tem mais valor do que a máquina no ambiente de trabalho. Somente tais empresas que valorizam seu capital intelectual tendem a manter grupos coesos de trabalho, fortes o suficiente para não sucumbirem diante das primeiras dificuldades encontradas.

6 | Valores individuais X valores organizacionais

As pessoas estão dispostas à trabalhar e filiam‑se a determinadas organizações, mas nem sempre os valo‑res organizacionais equivalem aos valores individuais, assim como nem sempre se está preparado para cer‑tas contingências encontradas no ambiente de trabalho. Quando se entra em um novo ambiente de trabalho nem sempre há clareza sobre quais são os objetivos da empresa, quais são os seus valores organizacionais. O sistema de racionalização aplicado ao trabalho desenvol‑

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veu burocracias e estabeleceu normas e procedimentos para o controle das tarefas diárias. A necessidade de planejamento criou hierarquias e normas que muitas vezes tornam o ambiente de trabalho impessoal.

A neutralidade da empresa existe, os bons fun‑cionários são recompensados e os maus funcionários punidos, mas o valor que a empresa atribui ao homem no processo de trabalho deve se considerado. Assim, quando se entra em uma organização, questiona‑se sobre que tipo de ética se estabelece nas relações diá‑rias, que tipo de posicionamento moral se estabelece entre as tarefas e os resultados alcançados.

Em contrapartida, em um mesmo ambiente de tra‑balho nem todas as pessoas possuem os mesmo valo‑res ou compartilham as mesmas crenças. Quando se fala em ética no ambiente de trabalho, fala‑se de ética relacionada a comportamentos, a condutas que são permitidas ou não nesse ambiente. Existem condutas que podem depreciar o respeito e a dignidade de um trabalhador, como, por exemplo, a pessoa estar com seu uniforme de trabalho em péssimas condições de higiene e limpeza. Para os demais trabalhadores, tal fato pode ser visto como uma falta de cuidado e responsabilidade, sendo uma conduta não permitida. Existem obrigações tácitas ou declaradas, explícitas ou implícitas no trabalho que podem gerar dúvidas. Nesse sentido, “a aceitação da contingência e do respeito pela ambiguidade não são fáceis, não há razão para depreciar os seus custos psi‑cológicos (BAuMAN, 2003, p. 43)”.

Começa‑se a compreender que dentro dos valo‑res individuais as emoções permitem as interpretações e os julgamentos da realidade nos interesses se algo pode ser encarado como bom então eu posso fazer, e assumo um compromisso pessoal com a empresa.

A empresa delega determinadas contingências e comprometimentos com procedimentos morais, que são os códigos de ética das relações interpessoais. Muitas vezes se concorda com estes valores sem reflexão, por hábito ou por conveniência, porque os homens são movi‑dos por um sentido de pertencimento, de tal modo que se julgam parte da empresa. Às vezes, as empresas são vis‑tas como grandes famílias por seus funcionários, tamanha a relação interpessoal e emocional que se estabelece.

Passa‑se a maior parte da vida no trabalho, por‑tanto, é o trabalho que modifica o ser humano e ao

mesmo tempo também modifica a forma do próprio homem de ver o mundo e de se relacionar com este mundo. A perspectiva do ambiente profissional se move por um contrato social, que é gerado no momento do emprego. Muitas vezes se associa a este contrato um contrato psicológico. Esta relação con‑tratual se baseia na reciprocidade entre o ambiente e o homem. Contudo, os acordos feitos também são capazes de gerar desacordos entre o individuo e a empresa em termos de valores.

A consideração e o interesse da empresa pela política de relações interpessoais contratualizada nem sempre se efetiva, e é possível se deparar com situ‑ações que vão contra a ética individual. Observam‑se demissões injustas, promoções que nem sempre teriam a ver com algum sentido de merecimento e entra‑se em contradição. Os problemas sobre a igualdade das rela‑ções no ambiente organizacional mobilizam diferentes emoções, estão em jogo sentimentos de lealdade, de confiança e de consideração.

Questiona‑se sobre como é possível trabalhar em um ambiente em que não somos ouvidos, ou num ambiente em que não podemos expressar as nossas emoções. Nosso posicionamento envolve refletir sobre procedimentos éticos e seus limites bem como a acei‑tação de nossos valores morais e o enfrentamento de situações diárias de conflito no ambiente de trabalho.

Situações de conflito surgem e pedem um posi‑cionamento, recorre‑se à consciência para aumentar a capacidade de julgar uma determinada situação que se apresenta. E, assim, a fragmentação do processo de trabalho também leva a uma fragmentação dos grupos, e dentro da empresa que os valores da competitividade entre os grupos de trabalho são estimulados. Quanto mais fragmentados separados e competitivos, menor o grau de solidariedade do grupo.

As pessoas que aparecem no setor de pessoal são vistas como recursos ou como pessoas pelas empre‑sas. Todos esses fatores compõe o quadro chamado de clima organizacional. Desse modo, faz‑se escolhas e decide‑se permanecer ou não naquele ambiente de tra‑balho, enfrentar ou não aquele momento de discussão. As decisões passam pelo julgamento do indivíduo, por sua razão, que vai justificar o posicionamento de acordo também com as necessidades.

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No ato de participação nos grupos de trabalho, cada decisão tomada dentro do ambiente organizacional tem impactos sobre as demais pessoas com as quais se convive, os juízos ou julgamentos daquilo que é certo ou errado, do que deveria ou não fazer são permeados de emoção, uma vez que as pessoas não são coisas que pertencem a uma organização. As emoções estão presentes no processo de trabalho: sente‑se culpa ou vergonha quando se erra, ou contentes e satisfeitos com as decisões no ambiente organizacional quando estas resultam em objetivos alcançados.

Tudo depende de como são tecidos os julgamen‑tos sobre os atos de cada um e dos demais à volta. É no ambiente organizacional que muitas vezes se deve tomar decisões sem ter tempo suficiente para refletir, e passa‑se a desenvolver certa sensibilidade para fazer julgamentos morais. Faz‑se concessões, aceita‑se desculpas, compreende‑se que os homens falhos nos julgamentos e buscam melhorar, porque, na verdade, busca‑se de fazer o bem. Os conflitos existentes entre os indivíduos e as organizações mui‑tas vezes não podem ser ignorados ou dissimulados, mas devem ser negociados – como será visto na pró‑xima seção.

O homem é um ser racional, e, acima dos valo‑res organizacionais, muitas vezes apresenta valores cristalizados que há muito tempo foram passados pela família, pela sociedade em que vive. É possível alterar os comportamentos diários buscando a excelência nas relações interpessoais. Em certos momentos da vida, as decisões devem ser tomadas e as escolhas feitas muitas vezes porque são o que a organização deseja, mas é preciso usar a inteligência para considerar se tais ações são boas ou más.

7 | Ética no cotidiano

Vamos refletir sobre a ética no cotidiano, como questões práticas ou de ordem moral. É no dia a dia que se descobre porque determinadas decisões são toma‑das e se observam os princípios que orientam a conduta ética de cada um. “Às vezes, as pessoas acreditam que a ética é inaplicável ao mundo real, pois imaginam que a ética seja um sistema de normas simples e breves, do tipo: não minta, não roube e não mate” (SINGER, 2002, p. 10). Contudo, a ética se aplica de modo rápido à realidade ampla da vida diária.

Será que se deve cumprir um compromisso esta‑belecido com alguém mesmo em próprio prejuízo, será que se deve alterar uma promessa feita ou negar uma condição aceita? “Em situações normais pode ser errado mentir, mas se você estivesse na Alemanha nazista e a Gestapo se apresentasse à sua porta em busca de judeus, sem dúvida o correto seria negar a existência da família judia escondida no seu sótão” (SINGER, 2002, p. 10).

Em uma determinada noite um homem caminha na rua e alguém se aproxima. Ele deve correr dessa pessoa, imaginando um inimigo? Deve atirar em um desconhecido, supondo ser um marginal que vai ata‑car?. O que dirige a ação do comportamento é o meu esquema de valores éticos, “as consequências de uma ação variam de acordo com as circunstâncias nas quais ela é praticada” (SINGER, 2002, p. 11). É possível con‑siderar‑se uma pessoa boa e até buscar fazer o bem, mas o que é o bem para um não é necessariamente o bem para o outro. A utilidade de uma ação não pode desprezar o ponto de vista da prática e as consequên‑cias dessa ação.

Quando se faz escolhas diárias, questiona‑se com frequência que critérios devem ser utilizados para julgar se uma pessoa é boa o suficiente para ser amiga ou má o suficiente para ser inimiga. No entanto, “nenhum juízo moral pode fazer mais do que refletir os costumes da época na qual é criado” (SINGER, 2002, p. 13). Se for pensado dessa forma, existe uma ausência de res‑ponsabilidade nas escolhas e decisões subjetivas, pois essas escolhas estariam simplesmente refletindo o espí‑rito da época.

Outro aspecto importante se aplicarmos o princí‑pio de tomada de decisões se uma ética universal e somente com base em nossa felicidade e buscando a diminuição do sofrimento, as nossas atitudes então seriam relativas a nós mesmos e não éticas, uma vez que as consequências de nossas ações para o outro não seriam consideradas.

A grande oportunidade para pensar em ética é transformá‑la no cotidiano pessoal e profissional. Em cada pequeno gesto, em cada ação impregnada de escolhas, a ética estaria presente. “As crenças e os cos‑tumes dentro dos quais fomos criados podem exercer grande influência sobre nós, mas ao refletirmos sobre eles, podemos resolver agir de acordo com o que nos sugerem, mas também podemos fazer‑lhes uma franca

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oposição” (SINGER, 2002, p. 14). Isso porque as esco‑lhas podem ser dadas em um determinado momento da vida conforme se amplia o conhecimento sobre o mundo e sobre si próprio.

O que se fez no passado tende a não se repetir se uma lição ética for aprendida. Por exemplo, a pessoa que faz uma crueldade contra animais e é condenada por esse ato pode aprender subjetivamente que esse ato, além de ser socialmente mau, é condenável e pode mudar o com‑portamento dela para a defesa dos animais.

As divergências podem ser relativas, as defesas éti‑cas podem ser sujeitas a objeções. “As características do argumento ético que implicam a existência de padrões morais objetivos podem ser atenuadas pela afirmação que se trata de um tipo de erro [...]” (SINGER, 2002, p. 15). O ponto fundamental deve ser o papel da razão nos julgamentos éticos, porque os fatos objetivos podem ser questionados sempre a partir da razão e porque a sabe‑doria é necessária nos julgamentos.

Emitir um juízo moral é discutir uma questão do ponto de vista da ética. Questiona‑se sobre como seria possível viver diante de padrões sociais considerados não éticos. É necessário assumir que a diferença entre as pessoas lhe permite tomarem ações não éticas no dia a dia. Todas as questões de julgar o que os demais fazem são relativas em termos de comportamentos éti‑cos. Assim, isso quer dizer que “viver de acordo com alguns padrões éticos é viver à margem de todo e qual‑quer padrão ético” (SINGER, 2002, p. 17) porque os que mentem, enganam e roubam podem também afir‑mar que estão de acordo com os seus padrões éticos.

Desse modo, só é possível viver de acordo com padrões éticos convencionais, uma condição válida para todos aqueles que pretendem justificar seus comporta‑mentos como não movidos somente em função de seus interesses pessoais e particulares.

8 | Ética profissional

Cada um tem um papel profissional na sociedade, assim, uma conduta ética torna‑se importante para todas as profissões. “A ética se fundamenta num ponto de vista universal, o que não significa que um juízo ético particular deva ser universalmente aplicável” (SINGER, 2002, p. 19). As circunstâncias que alteram as causas e

as consequências também alteram as decisões particu‑lares. Quando se emite um juízo ético, deve‑se extrapolar a noção do “eu prefiro” ou “eu gostaria”, pois as coisas devem ser em prol da vida das demais pessoas. Muitas vezes no dia a dia há dificuldade em conciliar aspectos pessoais e profissionais que podem ser incompatíveis até mesmo com uma definição ampla da ética.

As pessoas sentem falta de relações constantes e duráveis no ambiente profissional, sendo “a ética do tra‑balho [...] a arena em que se contesta mais essa expe‑riência” (SENNET, 2005, p. 117). Todas as pessoas no presente sentem que suas relações são de certo modo instáveis ou estão ameaçadas pela falta do tempo e do interesse de uns pelos outros. Mesmo no campo do trabalho não se encontram profissionais como antiga‑mente, que atendiam a mesma família por décadas. Na sociedade moderna, os profissionais não mantém rela‑ções constantes com seus clientes se isso não significar lucro no final do mês.

No entanto, quando se fala em papel profissional de cada um diante da sociedade moderna, resgata‑se a importância da escolha profissional, de modo que mesmo muito antes do exercício profissional, já deveria ser analisada a escolha da profissão do ponto de vista da ética e da sociedade como um todo. Os jovens muitas vezes escolhem suas profissões porque acreditam na rentabilidade, nos ganhos de seu trabalho e não param para refletir sobre a ética. A escolha de uma profissão não vem isolada de um conjunto de regras e normas de condutas profissionais, chamada de “deontologia”, a parte que estuda os códigos de ética de cada profissão.

Para Compte‑Sponville (2001), se não se morresse mesmo sem ser felizes, haveria tempo para aguardar e a felicidade acabaria chegando nem que daqui a cem anos. Sabe‑se que muitas ideias da ética devem ser tomadas à frente quando se busca ser feliz e quando se faz escolhas profissionais boas ou más. Sempre a ética também estará presente. Por exemplo: um advogado que deve defender um traficante, deve pensar se aceita ou não o caso. um médico que deve fazer uma cirurgia de alto risco, um publicitário que divulga a cerveja com a campanha de futebol, estimulando o consumo de álcool. Em toda a nossa sociedade é possível observar situa‑ções em que parece que falta uma determinada ética a guiar as atitudes e atividades humanas. Mas não se deve aceitar aquilo que não se acredita, pois se o fizer é pos‑

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sível entrar em crise com a própria ética. Se for tolerado o pequeno roubo de clipes do colega de trabalho, ou acredita‑se que é normal um pouco de água na gaso‑lina, os indivíduos estão sendo coniventes com a falta de ética. Se não for solicitada a nota fiscal, estimulando o comerciante a não pagar os impostos. Existe um saber em nossas ações diárias e escolhe‑se aceitar ou não atitudes de outras pessoas que parecem ser antiéticas.

Quando um jovem escolhe, por exemplo, ser médico, deve abraçar o juramento de Hipócrates e guiar sua conduta para salvar vidas, sendo que pelos menos tem de levar em conta os interesses de todos que esta‑rão sendo afetados pela sua conduta.

Quando um indivíduo decide ser advogado, deve saber que estará vinculado a um determinado órgão de classe – nesse caso, a OAB – que cuida para que os valores da profissão sejam preservados por todos os profissionais da ordem. O juramento sobre um determi‑nado código de ética significa uma aceitação das regras e dos limites de daca profissão. No entanto, “por mais diligentemente que um homem ou mulher aplique a ética ao trabalho, porém persiste a duvida sobre si mesmo” (SENNET, 2002, p. 125). O prazer pelo trabalho está muitas vezes associado ao equivalente de dinheiro que ele representa, quando conquista algo tende a buscar mais recompensa, assim ,os resultados do trabalho podem interferir no modo como desenvolve‑o, e ao tempo em que se dedica às pessoas que atendem.

No entanto, quando o profissional trabalha em grupo, a formação e partilha das decisões tendem a favorecer as decisões éticas. A cultura do trabalho e das profissões traz consigo os direitos e os deveres pro‑fissionais, que são rigidamente controlados por órgãos de classe que trabalham no intuito de preservar a cate‑goria profissional. A ética profissional também se rela‑ciona com a ética do trabalho, pois de nada adianta a pessoa jurar um determinado código quando está se graduando e depois não praticar no dia a dia os com‑promissos assumidos. É no cotidiano que se desenvolve uma expectativa sobre aqueles que são os prestadores de serviços, quanto aos profissionais serem qualificados, competentes e capazes de prestar um serviço digno. Estabelecem‑se relações de confiança com o médico que atende, com o professor que ensina, com todos os profissionais com os quais se mantêm relações ao longo da vida. Desse modo, a honestidade do trabalho,

o respeito com o ser humano, o sigilo, a segurança, entre outros itens, e valores, devem ser garantidos pelos profissionais. Caso isso não ocorra, existem instâncias que são os conselhos de classe para os quais o público em geral pode se dirigir no sentido de registrar quei‑xas e reclamações por condutas que firam determinado código de ética.

Se, por exemplo, um médico é negligente, pode pôr em risco a vida de um paciente e por esse fato pode ser denunciado ao Conselho Regional da Medi‑cina. A importância do sistema de controle e registro das profissões se estabelece como necessária porque jus‑tamente nem todas as pessoas cumprem com os seus deveres profissionais. Portanto, esses órgãos gestores têm o dever de zelar pelo cumprimento da profissão e funcionam diretamente na interação com o público que é atendido pelos serviços. Acredita‑se que as maiorias das empresas que contratam profissionais deveriam observar se estes estão devidamente registrados em seus Conselhos, evitando casos de falsos profissionais que às vezes são contratados e passam anos exercendo uma profissão indevidamente. Se a maioria das profis‑sões possui seu Código de Ética, é na área da saúde que ele se faz mais necessário porque envolve questões de vida ou morte.

9 | Perspectivas éticas para um mundo de mudanças

Existe‑se em um mundo global, no qual uma diver‑sidade de culturas, costumes e hábitos deve conviver pacificamente. Portanto, em uma sociedade pluralista é cada vez mais necessário ter referencias éticas, onde “as nações colonizadoras esforçaram‑se o máximo para se agarrar à convicção de que estavam espalhando pelo mundo não só a ordem, mas também a civilização” (BAuMAN, 2003, p. 49). Assim, muitos dos valores que foram projetados na história vieram de fora, sem consi‑derar as diferenças culturais existentes.

Contudo, é necessário considerar alguns valores que podem ajudar a definir o que o homem pode ou não fazer, o que seria bom em termos de liberdade de escolhas e o que deve ser impedido por leis. Existem várias concepções de ética e vários discursos que se estabelecem desde os mais conservadores, apelando para a manutenção dos valores e das tradições, até os grupos políticos mais liberais, que permitem a ênfase da

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ética pluralista, baseada no diálogo e na convivência das contradições. Se a ética é relativa a determinada socie‑dade, é preciso saber e conhecer o tipo de sociedade em que se vive e o tipo de sociedade em que se quer viver no futuro.

Será que os valores proclamados pela sociedade de consumo e midiática são valores éticos ou será que a lei de Gerson ou a lei de levar a vantagem em tudo se justifica, dentro de determinadas comunidades de consumo? “Toda a pólis separa, coloca a parte, parti‑culariza seus membros com referência aos membros de outras comunidades, de mesma maneira forma que os une e faz igual dentro de suas próprias fronteiras” (BAuMAN, 2003, p. 51). Assim, quem está dentro e aqueles que deveriam ser exilados de uma sociedade de consumo são definidos pela sociedade. Nesse sen‑tido, questiona‑se se os fins justificam os meios, em ter‑mos de buscar os padrões universais, mas estes só são adequadas para determinadas comunidades humanas e seriam inadequados para outras.

O tipo de sociedade que almejou os valores e as práticas universalizantes também é a mesma sociedade que separa e que classifica as pessoas. É uma socie‑dade programada para ser repetida, em que as regras de conduta sejam rígidas e qualquer comportamento desviante seja francamente punido com “códigos éti‑cos promovidos em nome de grupos, seja em vista de interesses grupais superiores, seja em vista de suprema sabedoria grupal” (BAuMAN, 2003, p. 51). Busca‑se uma sociedade da liberdade sem práticas de controle voltadas para a hegemonia e uma sociedade que forta‑leça os valores da democracia e da cidadania.

Observa‑se hoje novas cenas sociais, como, por exemplo, gangues de rua roubando não para comer, mas para consumir produtos de marcas, guetos dentro da grande cidade, nas vilas de periferia, as favelas da sociedade globalizada. uma sociedade separada por classes que conseguem consumir mais e outras que têm limitado poder de escolha, “[...] uma visão de uma difusão global da informação, tecnologia e interdepen‑dência que notavelmente não envolvia a ecumenização das autoridades políticas, culturais e morais” (BAuMAN, 2003, p. 51).

Nesse tipo de sociedade, as diferenças aumentam em muito as dificuldades de relacionamento. O outro

passa a ser visto como uma ameaça, a competição parece estar instalada até mesmo nos lares. Vive‑se um mundo em transformação no qual os valores tradicio‑nalistas vão pelo ralo; os novos valores, por sua vez, configuram‑se entre campos de conflito e são disputas por espaço, por direitos. As lutas sociais descrevem o movimento de pessoas em busca daquilo que deveria ser um direito de justiça social. As pessoas marcham por terra, marcham por emprego, marcham por liberdade sexual. Ainda, apesar de tantas transformações e valores sociais, existe muita segregação, determinados espaços de exclusão e campos de conflitos.

No entanto, nem sempre foi assim. Na história do Brasil, um país com sucessivos governos militares durante pelo menos 30 anos, as pessoas não tinham o direito de se manifestar ou, se o faziam, eram punidas. Compreende‑se, nesse sentido, que existe uma moral da época em que se vive e que esta moral pode mudar. “A alternativa seria ceder o campo de batalha aos perpétuos adversários dos pregadores do universalismo, aos comu‑nitários” (BAuMAN, 2003, p. 54). Pois, no momento em que alguém aceita a pluralidade cultural e moral presente nos valores morais universais e se retira para os valores de uma comunidade caseira, chega‑se talvez ao apelo que mais faça sentido ao chamado “bom senso”.

Portanto, deve‑se defender a ética e a política, o direito à fala e à diferença de opinião. uma sociedade que promove condições sociais desiguais não tem ética; pessoas que são excluídas do trabalho, de formas de sobrevivência, que não tem suas necessidades bási‑cas atendidas, podem promover ações que aos olhos da sociedade em geral sejam imorais. A corrosão do caráter, de Richard Sennet, é um livro que auxilia a compreender que os valores morais e sociais podem se perder quando o indivíduo passa por constantes priva‑ções na vida. “Quando falta a crença de que podemos fazer alguma coisa para resolver um problema, o pen‑samento em longo prazo é suspenso como inútil” (SEN‑NET, 2005, p. 107). É incrível como é possível associar facilmente o aumento da criminalidade com os períodos de grande desemprego.

É um tempo complexo este atual, em que um tirano no poder pode ser perdoado por roubar milhões dos cofres públicos, e uma pessoa pobre pode estar presa por roubar uma galinha. “um acentuado fracasso é a experiência pessoal que leva a maioria das pessoas a

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reconhecer que a longo prazo elas não mais se bastam” (SENNET, 2005, p. 168).

Ao se falar de ética no mundo contemporâneo, fala‑se da complexidade de um mundo pluralista, no qual se convive com raças, credos e costumes extrema‑mente diferentes. No capitalismo, as pessoas dependem do emprego para sobreviver e a ausência dele pode repercutir em suas ações e comportamentos. “Quando as pessoas acham vergonhosos estar em necessidade, podem tornar‑se mais decididamente desconfiadas das outras” (SENNET, 2005, p. 169).

Fala‑se de padrões de ética nos negócios, nas empresas e no sistema financeiro mundial, mas também se fala do dia a dia das práticas que se estabelecem no cotidiano pessoal e profissional. É preciso cada vez mais que o homem busque por ações justas e aceitáveis, e que exercendo seu direito de cidadão também busque a justiça social para todos. Assim, será possível construir uma sociedade mais fraterna e solidária.

10 | O papel da comunicação nas relações interpessoais

As pessoas, em geral, são mais favoráveis a ouvir assuntos que lhe interessam do que opiniões que sejam divergentes das delas, são mais inclinadas a ouvir opi‑niões que lhes pareçam neutras do que temas hostis. “Não acreditam que possam confiar uns nos outros numa crise, e essa crença é correta” (SENNET, 2005, p. 169). O processo de comunicação envolve troca entre as pessoas e certo grau de confiança.

Essas transações permitem que uma pessoa se faça compreender e que também compreenda, mas muitas vezes não é possível atingir esses objetivos. A comuni‑cação tem um peso muito importante nas relações inter‑pessoais, ainda mais dentro do ambiente organizacio‑nal. Para Chiavenato (2005, p. 81) “as comunicações constituem a primeira área a ser focalizada quando se estudam as interações e os métodos de aprendizagem para a mudança de comportamento ou para influenciar o comportamento das pessoas.”

Sabe‑se que o bom comunicador é capaz de fazer grandes progressos ao liderar e influenciar o comporta‑mento das pessoas. Assim, a comunicação deixou de

ser um fenômeno classicamente definido como algo que ocorre entre um emissor e um receptor e no qual o meio deve ser a mensagem. A comunicação passou a ser vista como um processo complexo em que qualquer condi‑ção própria do ambiente ou do clima organizacional pode interferir em parte do transporte das informações.

Acredita‑se, portanto, que a comunicação na ver‑dade não é algo linear. Cada ser falante se apropria ao longo da própria vida de códigos linguísticos, de um modo de ser e de se expressar, e desse modo, raramente se pode ter certeza de que aquilo que se diz está sendo plenamente compreendido. Seguem‑se determinados padrões de comportamento para se comunicar, lançar mão de frases, de vocabulários que pertencem ao meio social e cultural e aos grupos dos quais se faz parte. Assim, busca‑se compreender amplamente a comunicação. É necessário saber que podem existir entraves nesse processo, bloqueios ou ruídos que podem fornecer uma interpretação inade‑quada daquilo que é dito.

Na teia de relações interpessoais é usado um sistema de mensagens que nem sempre chegam ao seu destino em função de barreiras que, segundo Chiavenato (2005), podem ser: técnicas, semânticas e humanas. Considera‑se que uma distorção técnica pode acontecer devido a problemas de distância, como o espaço entre aquele que fala e aquele que está ouvindo. A barreira também pode ser semântica, ou seja, há a dificuldade de interpretação das pala‑vras, a leitura ou a decodificação dos gestos, significa‑dos. símbolos e lembranças. Ainda, considera‑se que podem existir as barreiras humanas que consistem em: variações perceptivas, diferenças de personalidade e de competências para interpretar.

Assim, as comunicações constituem um complexo sistema no qual as pessoas se envolvem na transmissão de informações em que vários canais podem ou não serem utilizados para transmitir uma mensagem alem da fala. Às vezes é possível dizer que a comunicação é feita pelo olhar, já que a comunicação também se confi‑gura como algo corporal, algo expressivo e significativo do ser humano. Nas interações interpessoais, aspectos da subjetividade estão envolvidos ao se transmitir ou receber diferentes mensagens. Existe sempre um colo‑rido emocional em cada fala, em cada gesto singular e humano. Assim, é possível compreender que a ideia de comunicação está relacionada, conforme Chiavenato

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(2005, p. 81), “com fatores como a motivação, a per‑cepção e a comunicação.”

A ideia que será, portanto, transmitida, é muito situa‑cional. Isso quer dizer que, para ouvir corretamente, per‑ceber corretamente a mensagem, isso vai depender do momento em que se vive, do tempo e da sensibilidade para compreender. Outro fator que se encontra relacio‑nado intimamente com o problema da comunicação é que ela traz em si algo latente, algo que é social e nem sempre racional ou consciente. Muitas vezes se fala sem pensar, ou se quer esconder algo que o emissor conse‑gue captar por meio do estado psicológico momentâneo.

Nas organizações de trabalho, muitas vezes, o padrão de comunicação é linear, ou vertical, de cima para baixo, não considerando, portanto, as sutilezas da fala e da intencionalidade do comunicador. Ainda, é importante considerar que comunicar é também se relacionar, decodificar mensagens que nem sempre chegam claras, buscar impressões e sentidos possíveis daquilo que é dito. A experiência humana com a comu‑nicação remete a uma reflexão sobre o conceito da palavra utilizada pela pessoa e cada conceito pode ter uma interpretação diferenciada. Isso posto, acompanhe a seguir um pouco mais da comunicação enfatizando a importância da linguagem.

11 | O papel da linguagem nas relações interpessoais

O conceito de cada palavra tem uma determi‑nada interpretação dentro de um sistema linguístico. O homem é um ser que fala e a linguagem é o que distin‑gue o homem dos demais animais. Ao entrar no mundo, o homem utiliza sua percepção para apreender objetos que são do mundo dos adultos e apreende também a utilizar a linguagem.

A linguagem interfere em todo o desenvolvimento do homem. Por meio dessa experiência, pode‑se falar sobre algo que já aconteceu e que se situa no passado. A linguagem, portanto, distancia o homem do fato ime‑diato e também o permite associar algo que ainda vai lhe acontecer no futuro. Com ela é possível organizar a experiência humana, contar e recontar fatos, dar sentido aos acontecimentos na vida, e isso é próprio da condi‑ção humana, ou da espécie humana.

A linguagem utiliza a palavra para nomear os obje‑tos do mundo, e cada palavra pode ser associada a uma ou mais coisas. Por exemplo, quando se fala “cadeira”, remete‑se a uma variedade concreta de cadeiras exis‑tentes. Existe para cada um uma significação do que é a cadeira, a palavra pode ser sentida e percebida de diferentes maneiras a partir da vivência pessoal. O homem pode pensar em uma cadeira de palha da casa de sua avó, por exemplo, ou remeter o pensamento a uma cadeira de plástico ou de couro, a várias formas possíveis de cadeiras. O que torna uma palavra inteligível é que ela contém um significado coletivo.

As palavras, portanto, trazem sentidos que são construídos ao longo da vida, mas pelo poder da palavra é possível utilizar‑se também de símbolos, sendo, então, simbólica, porque o homem pode utilizar o seu raciocínio abstrato. Também pode‑se imaginar cadeiras diferentes com uma perna só, por exemplo. “A linguagem permite ao homem se desligar da experiência direta e garante o nascimento da imaginação, de um processo que não existe nos animais e que serve de base para a criativi‑dade, orientada e governada”(BOCK, 2002, p. 79).

Assim, por meio da linguagem, o homem pode tomar distância em relação ao mundo que o cerca, pode refletir sobre ele por meio de palavras e símbolos e pode interferir nele. Não menos importantes são as modificações que a linguagem permite e que elevam as reações emocionais.

Sem a linguagem, o homem não poderia esta‑belecer as mínimas condições de se relacionar e de interagir com outro homem. Enquanto um ser social, o homem utiliza o seu sistema linguístico a partir do significado simbólico de cada palavra, e assim, quanto mais palavras o homem dominar em termos de signi‑ficação, mais capacidade tem de agir sobre o mundo. “A aquisição da linguagem não é outra coisa senão o processo de apropriação das operações de palavras que são fixadas historicamente nas suas significações” (BOCK, 2002, p. 80).

Aprende‑se a linguagem dentro de instituições sociais, na família, na escola, no ambiente de trabalho. São vários ambientes que interferem na forma como se aprende a se comunicar. Ao longo da existência, parte‑se para uma ação de decodificação ou interpretação de mensagens. Sempre que os homens se comunicam vão se apropriando do mundo, e “a principal característica do

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processo de apropriação é criar no homem novas apti‑dões, novas funções psíquicas” (BOCK, 2002, p. 79).

um fator que pode facilitar as relações interpessoais é o auxilio do mecanismo de realimentação. Por exem‑plo, a pessoa pode perguntar ao seu interlocutor se este está compreendendo ou se compreendeu o sentido das palavras. Assim, é possível perceber se houve uma adequada interpretação daquilo que foi dito. Checar o efeito da comunicação é facilitar as interações sociais é realizar um constante feedback daquilo que foi dito.

Considerando que o comportamento das pessoas é orientado por determinadas características pessoais desenvolvidas em determinados contextos em que as interações sociais acontecem, as dificuldades de lan‑çar mão de uma linguagem comum são muitas, uma vez que os significados das mensagens transmitidas também podem sofrer alterações conforme o estado psicológico que as pessoas se encontram ao comu‑nicarem‑se.

A comunicação é um processo que tem o grau de interpretação de significados compartilhados social‑mente sempre imperfeitos. Além do feedback, o homem utiliza para se comunicar uma linguagem que não é somente verbal: seus olhos, seu corpo, sua movimen‑tação no espaço são recursos que pode utilizar para facilitar o intercâmbio de informações. A participação das pessoas em determinados grupos sociais lhe permi‑tem certo grau de status, certo vocabulário que podem transmitir às demais pessoas, sentimentos positivos e afirmativos, como a autoconfiança ao se comunicar e a sinceridade. um exemplo de incongruência entre a palavra e a imagem pode ser um jornalista contando uma notícia triste, com uma expressão facial alegre. Assim, os estados emocionais que são repassados com a linguagem permitem uma maior ou menor integridade na transmissão da mensagem. A linguagem se comple‑menta com o corpo, com a voz, com a emocionalidade expressiva do gesto. Nesse sentido, as relações huma‑nas absorvem mais prontamente as mensagens comu‑nicadas por uma determinada comunidade linguística e em determina cultura de comunicação. Quando isso não ocorre, as barreiras da comunicação aparecem por más interpretações e acabam por gerar conflitos. A seguir serão abordados como alguns fatores além da comuni‑cação podem acabar sendo focos geradores de conflito no ambiente de trabalho.

12 | Fatores estressantes do trabalho gerando conflitos

Nas atividades organizacionais, o homem encon‑tra‑se consumido pela questão da pressão do tempo e do espaço. Assim, o fator estresse se estabelece a partir de tais condições. Para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 229), “presume‑se que o estresse ocupacional seja resultante de um complexo conjunto de fenômenos, e não consequência de apenas um único fator externo que age sobre o trabalhador”.

As relações entre trabalho e trabalhador também apontam que “o estresse ocupacional pode ser enten‑dido como reação tensional experimentada pelo traba‑lhador diante de agentes estressores que surgem no ambiente de trabalho e que são percebidos como ame‑aça à sua integridade” (ZANELLI; BORGES‑ANDRADE; BASTOS, 2004, p. 229).

Assim, conhecido em seu grau mais elevado, dife‑rentes fatores podem ser promotores de estresse no ambiente de trabalho, segundo Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004):

fatores intrínsecos do trabalho: super‑a | posição de tarefas, riscos ou perigos, novas tecnologias, e qualidade física do ambiente;

papel na organização: papéis conflitivos b | ou ambíguos e o grau de responsabilidade por outras pessoas;

Relacionamento no trabalho: relações com c | superiores, subordinados ou colegas;

Desenvolvimento de carreira: instabilidade d | na empresa, fluxos e reduções de pes‑soal;

estrutura e clima organizacional: nível de e | participação, e estilo gerencial;

Interface entre o lar e o trabalho: dificulda‑f | des econômicas e conflitos conjugais.

Muitos desses fatores estressores podem, de modo prolongado, levar o trabalhadoràa depressão e a pouca energia. Tais condições de estresse no ambiente laboral geram a falta de entusiasmo no desempenho das fun‑ções laborais. O trabalho intenso e sem ritmo para as pausas ou descansos pode ser promotor do estresse, levando até mesmo à exaustão. É claro que não se

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encontram pessoas estressadas em todas as ativida‑des profissionais, sendo possível encontrar ambientes de trabalho salutar em que os conflitos sejam mínimos. Para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 223), “pessoas emocionalmente inteligentes estariam aptas a reconhecer os seus estados emocionais e os de outras pessoas, a solucionar problemas e a regular ações em diversas situações e contextos, inclusive no de traba‑lho”. No entanto, as mudanças sociais que interferem no ambiente organizacional, a tecnologia nos processos produtivos, a pressão por metas e a ausência de lide‑rança qualificada podem ser fatores de uma má dis‑tribuição de responsabilidades e tarefas. Seguindo esta linha de raciocínio, a questão da tarefa desarticulada no ambiente organizacional pode ser um fator gerador de conflito. Têm‑se situações de distribuições de papéis e tarefas no ambiente organizacional em que imperam as inconsistências e as ambiguidades e prejudicam as relações interpessoais. um exemplo disso é quando um funcionário novato não sabe exatamente a quem repor‑tar o seu papel. Ele pode acreditar que está desempe‑nhando corretamente o seu trabalho e, no entanto, o seu papel não estava claro, não era aquele. Receber uma opinião negativa de seu trabalho, conforme a maneira como algo é dito e interpretado, pode vir a ser fator gerador de conflitos.

Existem muitas formas de os líderes abordarem o conflito no ambiente organizacional. Nem sempre o conflito deve ser visto como algo negativo, ou que promova a baixa produtividade. Contudo, certamente, o conflito deve ser adequadamente gerenciado para que a empresa obtenha sucesso em suas atividades. É preciso que o líder conheça a todos os seus liderados e faça uma adequada distribuição de papéis e responsabilida‑des para que o conflito não se instale no ambiente orga‑nizacional. É preciso montar equipes que tenham deter‑minadas características de personalidade, que tenham desejos e necessidades semelhantes, enfim, que consi‑gam trabalhar juntas em prol dos objetivos da organiza‑ção de trabalho. Muitas vezes, equipes mal estruturadas ou formadas à revelia de seus desejos e necessidades, ocasionam dificuldades na entrega das tarefas. Quanto mais coesão nos grupos de trabalho, maior a probabili‑dade de uma boa relação interpessoal, de uma comuni‑cação fluida e de bons resultados. Quando os grupos de trabalho não se comunicam adequadamente, as pala‑vras são mal interpretadas e as pessoas tendem a julgar o comportamento umas das outras. Nesse sentido, qual‑

quer palavra mal empregada pode ser motivo de con‑flito. Para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 393), “assim como as organizações, os grupos nascem, crescem, amadurecem, podem experienciar a reprodu‑ção, especialmente quando se tornam muito grandes, provocando subdivisões, e se desintegram”.

Assim, quando a comunicação dentro das equipes de trabalho é estabelecida de uma forma especialmente compreensiva, os acordos tendem a se manter, a per‑cepção de si e do outro no ambiente de trabalho passa a ser considerada, as verdades e atitudes das pessoas tendem a não sofrer um forte julgamento e os confli‑tos diminuem. Para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 398), “os jogos de rebeldia ou resistência fazem parte do movimento de resistência à autoridade, à perícia ou à ideologia quando pretendem provocar qualquer mudança nas funções organizacionais”. Nesse sentido, os jogos se fazem presentes nas equipes de trabalho. As representações e a resistência tende a se manifestar frente a mudanças no esquema de trabalho e nas atividades desenvolvidas.

uma comunicação franca no ambiente de trabalho em que cada pessoa tenha o seu papel claramente defi‑nido, em que os jogos de poder sejam substituídos por uma racionalidade empática e compreensiva do outro, passa a lidar melhor com as contradições do dia a dia. Os conflitos no ambiente de trabalho existem e certa‑mente não vão desaparecer, mas as razões desses con‑flitos não devem ser as más interpretações. O estresse no ambiente organizacional pode gerar muito provavel‑mente situações nas quais as pessoas não estejam a fim de compreender umas às outras, portanto, quanto menor o estresse, menor o conflito. Seguindo essa linha de pensamento, é muito provável que surjam, então, mais grupos de apoio do que de divergências na empresa.

13 | Definição de relações interpessoais

Emprega‑se aqui o conceito de “relação”, que soa como uma descrição de como as pessoas se encon‑tram e, assim, noticiam algo de ligação ou de laço. Vem do latim relatus, “relatar”, no entanto, o uso do dicionário etimológico não auxilia a definir claramente o que são relações interpessoais. De qualquer modo, busca‑se apresentar o que pode ser uma definição a mais pre‑cisa possível. Relações interpessoais são conexões

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complexas que se estabelecem entre as pessoas e que acontecem todos os dias no sistema social dos indiví‑duos. Tal conceito remete à história da sociedade, em que, desde a sua origem, é formada por grupos de pes‑soas e pelas trocas que acontecem entre esses grupos. Do ponto de vista do significado social, a definição das relações interpessoais envolve as trocas que são feitas e também interesses e objetivos. Desde os povos da caverna já havia elementos que permitem julgar rela‑cionamentos interpessoais com base na sobrevivência do grupo. Vale dizer que em na realidade histórica do trabalho, desde os coletores até os agricultores, a ativi‑dade é coletiva, ou seja, realizada em grupos. Portanto, está clara a necessidade de relações entre as pessoas. Na atualidade, as pessoas ainda se relacionam porque buscam algo do meio quando se dirige ao trabalho e se envolvem com grupos porque necessitam do fruto da atividade para a sobrevivência. Assim, participando em grupos, deve ser aceito pelas pessoas. Portanto, desen‑volver boas relações interpessoais é a base para que o ambiente de trabalho seja motivador. O funcionamento positivo e a sensação de bem‑estar no ambiente de tra‑balho comporta um modelo de relações interpessoais que envolvem, para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 229):

autoaceitação: aspecto central da saúde a | mental, ótimo funcionamento e maturidade;

o relacionamento positivo com outras b | pessoas: forte sentimento de empatia e afeição, identificação com o outro;

autonomia: independência a cerca de c | aprovações externas;

domínio do ambiente: capacidade de d | escolher ou criar ambientes adequados;

propósito de vida: manutenção de objeti‑e | vos, intenções e de senso de direção;

crescimento pessoal: necessidade de f | constante crescimento abertura a novas experiências, vencendo desafios em dife‑rentes fases da vida.

Quanto se fala em relações interpessoais, fala‑se da necessidade fundamental que todos têm de desenvolver habilidades relacionais. As habilidades sociais envolvem ideias, sentimentos e valores, tudo aquilo de que se lança mão quando alguém se relaciona com as pessoas à volta. Interagir significa agir com o outro, envolve uma relação de mútuo interesse. Para que isso aconteça, as habilidades sociais são fundamentais. O que cada um

faz promove uma ação ou uma reação no outro, dentro dos grupos sociais, desempenham‑se os papéis sociais, age‑se. Mas, afinal, interação é a ação com o outro em busca de objetivos pessoais porque vive‑se em socie‑dade e participa‑se de grupos sociais em busca de interesses e objetivos próprios. Assim, compreende‑se o homem como um ser social, um ser relacional.

Quando se observa o comportamento das pessoas dentro do ambiente de trabalho, então passa‑se a anali‑sar os intercâmbios entre as pessoas e o confronto exis‑tente entre os objetivos pessoais e os objetivos orga‑nizacionais. Para Chiavenato (2005), as organizações fornecem os meios pelos quais os indivíduos conseguem atingir os seus objetivos. No entanto, existem conflitos entre objetivos organizacionais e pessoais. É na empresa que a relação com interesses e objetivos pessoais se estabelecem, as interações entre as pessoas dinamizam a organização e, ao mesmo tempo, promovem uma variedade de tipos diferentes de relacionamentos. Nesse sentido, aos poucos, interage‑se com o ambiente de tra‑balho, conhecendo os colegas e fazendo‑se conhecer, dinamizando, assim, as relações interpessoais, tecendo relações, fazendo amizades, trocando informações com grupos diferentes de pessoas.

Quanto mais autoconhecimento for tido e quanto mais heteroconhecimento for desenvolvido no ambiente de trabalho, melhor as relações de troca com esse ambiente. Ao se apresentar ao outro no trabalho, diz‑se quem é e quais os seus interesses, suas expectativas e opiniões. Então, conhece‑se as expectativas dos demais em relação a todos e à empresa. Assim, pode‑se afirmar que o desempenho no ambiente de trabalho está relacio‑nado com a forma como se mantêm as relações nesse ambiente. As pessoas estão em busca da satisfação de suas necessidades e precisam estabelecer trocas umas com as outras para que consigam cumprir suas tarefas. O ambiente organizacional é o local em que essas trocas se efetivam. Por isso, a necessidade de que as comu‑nicações favoreçam o bom andamento da organização, com um clima de respeito e amizade, em que as rela‑ções sejam efetivas e confiáveis, as pessoas consigam com facilidade trocar ideias, sentimentos e emoções. Todos participam de grupos de trabalho e o intercâmbio de sugestões e expectativas promovem a efetiva cola‑boração. Assim, o contrário também é verdadeiro. Em ambientes de poucas trocas, os conflitos se estabelecem e as relações interpessoais ficam prejudicadas.

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Somente uma organização aberta à participação do ser humano em seus processos decisórios e que acolha as trocas de informação podem permitir o esta‑belecimento de relações verdadeiras, baseadas na ami‑zade, no diálogo e no mútuo entendimento. Assim, as relações têm uma dimensão de valores humanos e de trocas entre esses valores, em que as pessoas podem comunicar seus erros e acertos e promover correções. Essa relação aceita o outro e permite as trocas de infor‑mação; ainda, promovem o homem em seu trabalho criador e criativo dentro das organizações.

14 | Hierarquia das necessidades

O ser humano é dotado de desejos, vontades e necessidades. Todas as aspirações dependem de certa forma dos ambientes e das relações que são estabele‑cidas entre as pessoas que cercam a todos. Há pessoas que são mais ou menos ambiciosas, pessoas que se con‑tentam com pouco, pessoas que podem trabalhar até a morte, “a persistência na ação é uma tentativa de com‑preender o fenômeno da motivação pela articulação entre ativação, direção e a intensidade da ação [...]” (ZANELLI; BORGES‑ANDRADE; BASTOS, 2004, p. 148). Assim, fatores pessoais, de impulsos ou ambientais, tarefas estão relacionadas com salários ou recompensas que ativam a conduta humana na manutenção ou não de uma determi‑nada necessidade. Cada desejo humano, portanto, advêm não de uma natureza humana, uma vez que tal desejo não é inerente ao homem, mas provém de uma natureza social do homem. “Os psicólogos acreditam que grande parte das razões da diversidade das condutas individu‑ais decorra de um processo denominado de motivação” (ZANELLI; BORGES‑ANDRADE; BASTOS, 2004, p. 145). Tal conceito de motivação pode ser compreendido como motivos para ação, porque cada um age de uma maneira diferente, não em função de suas diferenças biológicas e hereditárias, mas em função do ambiente social de que participam ao longo de suas vidas.

O homem sofre uma influência muito grande da sociedade a qual pertence e dessa sua relação mantém e desenvolve diferentes hierarquias de necessidades. Contudo, nessa organização social em que se vive é preciso trabalhar. Desse modo, o trabalho remete à con‑dição social inerente a todo homem moderno; sem tra‑balho, a maioria dos indivíduos não conseguiria sobrevi‑ver no mundo atual.

A teoria geral da administração, há muito tempo, vem estruturando as relações do homem com o tra‑balho, definindo certa divisão de tarefas dentro do pro‑cesso produtivo, o que cada um faz, como faz, e porque participa dessa parte do processo produtivo. Essa divi‑são de tarefas foi ao longo do tempo se desenvolvendo em tarefas para encarregados e tarefas para subordi‑nados. Mas todo o arcabouço teórico da administração na gestão do processo produtivo não conseguiu com‑preender o homem. O homem trabalhava sim, cumpria determinados papéis hierarquizados pela administração, mas havia diferenças singulares em termos de pessoas mais motivadas e, por isso, mais produtivas e pessoas sem motivação. Então, entra em cena o fator humano nas organizações de trabalho.

um grande número de psicólogos passa a ajudar os administradores na busca da compreensão do por‑quê das diferenças de produtividade. Como resultado de pesquisas realizadas por psicólogos, surge a teoria da hierarquia das necessidades, desenvolvida por Mas‑low. Segundo Chiavenato (2005), é a mais conhecida de todas as teorias a respeito da motivação humana. Em relação a essa motivação, algumas observações são necessárias: o organismo deve estar íntegro para ser motivado; essa motivação deve estar voltada para os objetivos que a pessoa persegue; existem vários meios para alcançar os mesmos objetivos; as necessidades humanas são organizadas em termos das mais para as menos urgentes. Assim, as motivações representam apenas uma classe de comportamentos. Podem estar ainda envolvidos fatores biológicos e outros fatores cul‑turais quando se fala em motivação humana, portanto, é preciso relativizar o que é a motivação porque o termo é sempre contextual, histórico e também situacional. As necessidades das pessoas, para Maslow (apud CHIAVE‑NATO, 2005, p. 68) são dispostas em uma hierarquia:

necessidades fisiológicas (ar, comida, a | repouso, abrigo, etc.);

necessidades de segurança (proteção b | contra o perigo ou privação);

necessidades sociais (amizade, inclusão c | em grupos, etc.);

necessidades de estima (reputação, d | conhecimento, reconhecimento, autorres‑peito, etc.);

necessidades de autorrealização (reali‑e | zação do potencial, utilização plena dos talentos, etc.).

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Assim, em linhas gerais, pode‑se dizer que uma necessidade uma vez satisfeita não mais motiva o com‑portamento da pessoa. O comportamento é sempre dirigido para a participação cíclica das necessidades, como, por exemplo, estar com fome e se alimentar. Isso, então, já não é mais uma necessidade, depois volta a ser quando novamente se apresento com fome. Ao longo da vida, altera‑se o padrão de necessidade: o que era algo importante deixa de ser e novas necessidades vão surgindo conforme os indivíduos se relacionam com o mundo à volta.

A grande maioria das necessidades são culturais, ou seja, são necessidades secundárias e não mais necessidades primárias, como as necessidades fisioló‑gicas ou de segurança. Quando se alcança um nível na hierarquia das necessidades, outro nível superior tende a aparecer. O comportamento da pessoa é motivado por um conjunto enorme de necessidades que podem surgir simultaneamente. Ao mesmo tempo, a privação muito longa de uma necessidade pode atuar sobre o comportamento da pessoa modificando toda a sua escala de valores sociais. um exemplo disso é quando alguém com fome pode ser levado a roubar para comer, buscando a satisfação de uma necessidade de sobre‑vivência – destaca‑se, aqui, que nem todas as pessoas que roubam o fazem em nome da fome.

15 Diferenças individuais nos grupos de trabalho

A sociedade capitalista tem como uma de suas características promover a sensação de que os indiví‑duos são únicos. Assim, a sociedade capitalista agencia “a constituição do individualismo” (BOCK, 2002, p. 81), entretanto, isso não garante a expressão das diferen‑ças. isso porque a sociedade de massas leva o homem a pensar que é único e assim produz uma ilusão de que se é um indivíduo. Contudo, estimula‑os a consumir como massa, a consumir as mesmas coisas, o que os torna parecido com os demais.

Os meios de comunicação difundem e mantêm determinados padrões de valores e crenças, além de formas de controle e autocontrole. Assim, “vemo‑nos como indivíduos e agimos como massa” (BOCK, 2002, p. 82). Dessa forma, as concepções do que é bom e certo, ou do que deve ou não ser feito passam por

uma determinada sociedade. Justificam‑se para manter uma ordem social na qual o homem reflete a ideologia dominante. É importante considerar que as pessoas são diferentes e tem a sua singularidade. Ainda que exista uma determinada hierarquia de necessidades biológi‑cas, fisiológicas e de segurança, e que todos estejam em busca mais ou menos das mesmas coisas, como a felicidade e a qualidade de vida. No entanto, a socie‑dade de classes é uma forma específica de dominação do homem sobre o homem que “deriva do processo de desenvolvimento econômico, que é a forma de ele defi‑nir a condição de produção dos bens para a sua própria reprodução” (BOCK, 2002, p. 82).

A compreensão do fenômeno humano como indivi‑dual ou singular só se desenvolve em determinado con‑texto social e histórico. Existem tribos primitivas em que os valores sociais são bastante diferentes dos demais. De qualquer forma, apoiado na cultura que o cerca, o homem desenvolve uma hierarquia de valores, de cren‑ças, de opiniões que dirigem o seu comportamento. É importante compreender que nem todos os desejos e anseios são conscientes, e, além disso, o comporta‑mento do homem é motivado por impulsos ou desejos de que não se tem consciência. Busca‑se saber sobre os comportamentos e assim ampliar a compreensão de universo. Aumentam‑se os sentidos e significados de cada ação e isso ajuda a conviver e a se relacionar com o outro. Compreender a si mesmo em sua singulari‑dade é uma forma de sentir‑se mais seguro no mundo. Quando se atinge a necessidade de autorrealização realmente se encontra a plenitude do potencial humano. Ser autorrealizado é ser completo no desenvolvimento e isso gera a nossa satisfação de viver.

Têm‑se buscado ao longo da história como homens compreendem os motivos que estão por trás do com‑portamento das pessoas, porque cada um é de uma forma diferente e reage de forma diferente ao meio. Sabe‑se que os grupos sociais com os quais se convive desempenham importante papel na formação da iden‑tidade pessoal. Parte dos objetivos e anseios pessoais se formam a partir das relações que são estabelecidas com o meio.

Acredita‑se que se trata de algo do íntimo que expressa a singularidade do homem, no entanto, quando alguém se aproxima de outras pessoas e passa a conhecer quais suas expectativas, seus valores e suas opiniões, percebe‑se que são muito parecidos com o

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dele, porque tal pessoa pertence a um mesmo grupo cultural. Assim, participa‑se de grupos que conformam opinião, valores e crenças comuns. Afinal, se é o que se pensa de forma semelhante, e comporta‑se em busca de ideais também comuns.

Quando se fala de trabalho, o indivíduo é levado à reflexão no ambiente organizacional. É nas empresas que aprende a conviver com grupos de pessoas, que assimila as normas e as regras de comportamento, e que aprende a conviver. Na verdade, o homem passa a maior parte da vida dentro de ambientes organizacio‑nais, por isso é tão importante pensar sobre os grupos de trabalho. As tarefas dentro de um grupo de trabalho devem ser compartilhadas para que o grupo atinja seus objetivos. Os papéis devem ser adequadamente distri‑buídos pelo líder, normalmente a pessoa‑chave para o sucesso organizacional. É o líder, com sua estrutura de personalidade, que vai delegar tarefas, distribuir res‑ponsabilidades e cuidar dos papéis dentro do grupo. Também é o líder que permite que as pessoas evoluam no ambiente de trabalho, desenvolvendo um clima de companheirismo e solidariedade.

Quaisquer que sejam os objetivos do grupo, ele está inserido em um sistema maior que é a organização. Assim, todos precisam de todos dentro da empresa: os grupos devem efetuar trocas entre si e entre a comu‑nidade organizacional. As tarefas, a distribuição dos papéis, a sinergia do grupo, deve ser motivo de cuidado constante do líder, que também deve estar atento para as diferenças individuais, quem são as pessoas, quais as suas características e quais as suas peculiaridades. Como montar grupos efetivos de trabalho, como sentir a harmonia do grupo, tudo isso depende de uma postura de líder que considere as diferenças interpessoais.

16 | Conflitos no ambiente de trabalho

Os conflitos decorrem de diferenças entre pes‑soas e entre grupos nas organizações de trabalho os autores se referem à positividade do conflito dentro do ambiente organizacional, até mesmo afirmando que é motivo do aumento da competitividade e produtividade. No entanto, não se pode apoiar o conflito, pois “o utilita‑rismo dos atos pode reconhecer a importância dos direi‑tos e da justiça, mas somente naqueles casos em que esse reconhecimento produz mais bem‑estar agregado”

(FuRROW, 2002, p. 55). Se não produz o bem‑estar, o conflito não deveria acontecer no ambiente de trabalho.

Para Chiavenato, (2005, p. 394), “conflito e coo‑peração constituem elementos integrantes da vida das organizações” Contudo, o conflito exacerbado e cons‑tante promove o estresse e diminui a motivação para o trabalho. Hoje, ainda, considera‑se que a cooperação é melhor que o conflito para a saúde organizacional. O tra‑balho dentro das organizações não deve estar baseado em conflitos e sim na coordenação de atividades em práticas colaborativas. “Os tipos de relacionamentos que apresentam a base lógica mais plausível para as neces‑sidades da ética são os relacionamentos de cuidado” (FuRROW, 2002, p. 55). Ao cuidar das pessoas assim nossas ações adquirem valor para nós, mas este valor não é igual para todas as demais pessoas.

Portanto, se existem pessoas diferentes, é normal que tenham opiniões e crenças diferentes sobre as coi‑sas, diferenças de valor e sentimentos, e também apre‑sentem intensidades diferentes. Assim, com frequência o desentendimento acontece no ambiente de trabalho e em alguns casos é inevitável. Porém, tais antagonismos devem ser resolvidos para o bem da convivência. Os desentendimentos podem ser melhor evitados quando se aprende a condenar não a pessoa, mas o erro que esta cometeu. “A dificuldade aqui é que o caráter apropriado de nossas práticas de elogiar e repreender pessoas pelo que elas fazem, que são traços de nossas vidas morais baseiam‑se em afirmações metafísicas difíceis” (FuR‑ROW, 2002, p. 170). É preciso mais do que punir e reclamar ou aprender a elogiar as pessoas para diminuir as relações conflituosas no ambiente de trabalho.

O conflito pode ter resultados construtivos, como despertar os sentimentos e estimular energias, fortalecer o sentimento de identidade, despertar a atenção para o problema, testar a balança do poder, segundo Chiave‑nato (2005). Existe, portanto, uma dimensão positiva no conflito, mas é mais conhecido por suas consequências negativas, a saber: desencadeia sentimentos de frustra‑ção, hostilidade e ansiedade, aumenta a coesão grupal, desvia energias para ele mesmo, leva uma parte a blo‑quear a atividade de outra, autoalimenta‑se e prejudica o relacionamento entre as partes.

O interessante é que as atitudes em relação às outras pessoas expressam os valores que importam nos

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relacionamentos. Assim, é necessário saber administrar os conflitos, porque um conflito não resolvido pode interferir nas relações futuras.

As divergências existem porque as pessoas têm percepções diferentes, e acreditam que a opinião delas deve prevalecer. Desse modo, um dos objetivos da organização e de seus líderes deve ser administrar a divergência, trabalhar com a aceitação do diverso, bus‑car o consenso. A solução de conflitos deve ser cons‑tantemente inovada, já que existem diferentes métodos para resolver conflitos que vão desde a confrontação, quando uma pessoa é colocada frente a outra para o enfrentamento das diferenças, passando pela postura de deixar de lado o conflito com atitudes apaziguadoras, até a supressão total do conflito.

A resolução do conflito pode ser resolvida de três maneiras, segundo Chiavento (2005): a resolução ganhar‑perder, ou seja, parte ganha enquanto outra parte perde; a resolução perder‑perder, em que cada parte desiste de algum objetivo; e a resolução ganhar‑ganhar, em que as partes conseguem ser bem‑sucedidas em seus problemas, permitindo que ambas as parte vençam. Daí a importância de treinar os líderes nas bases de negociação de conflitos, porque “o que nos torna racionais [...] é que como seres sociais devem interagir para que relaciona‑mentos possam ser mantidos” (FuRROW, 2002, p. 171).

Atualmente existem métodos de negociação de conflitos no ambiente de trabalho chamados de “media‑ções”, que buscam solucionar o clima organizacional conflituoso. É importante compreender que na base ou na origem do conflito estão posições muitas vezes de pessoas que são acomodadas, que mantém seu ponto de vista e que são inflexíveis, tendo em vista que as modernas formas de gestão apelam com frequência para mudanças dos mais variados tipos, mudanças de processos de postos de trabalho e de procedimentos. Pessoas de comportamento mais rígido não se adaptam facilmente a mudanças, que são vistas como penosas, e chamam a atenção para o foco do problema, a nego‑ciação. “O que precisamos, para colocar de lado essas objeções, é uma explicação de quando os sujeitos estão no controle de suas ações” (FuRROW, 2002, p. 172). Portanto, ter o controle das ações pode ser, em outros termos, desenvolver a capacidade de resolver conflitos.

Assim, o conflito muitas vezes mobiliza forças de poder dentro das organizações. Quanto mais coeso um

grupo de trabalho em torno de objetivos comuns, mais identidade com o propósito do grupo, mais flexibilidade de comportamento e “mais capacidade para responder a razões” (FuRROW, 2002, p. 172). Os conflitos jogam com papéis estruturados, posições e hierarquias organi‑zacionais já constituídas. É necessário que o líder esteja atento para estabelecer negociações entre as partes conflitantes e administre adequadamente as mudan‑ças para o sucesso organizacional, já que o líder é o agente que desenvolve o controle regulador. “O controle regulador envolve tanto o controle sobre a sequência efetiva de eventos quanto à habilidade de agir de outra forma” (FuRROW, 2002, p. 172). Dessa forma, para ter o controle regulador sobre os conflitos no ambiente, é necessário desenvolver a habilidade de escolher e agir de outra forma.

17 | O poder no ambiente de trabalho

A existência do conflito no ambiente organizacional está relacionada aos papéis e à distribuição do poder. Os papéis são criados para líderes e subordinados, for‑mando uma ideia que se relaciona com a distribuição do poder, ou seja, cada um ter um papel definido e o grupo dominante e dominado concorda e aceita este papel no ambiente de trabalho.

São várias as áreas do conhecimento científico que se interessam por conhecer e estudar o poder, transpas‑sando desde a antropologia, as ciências sociais e até a psicologia. Ao questionar‑se sobre o poder, observa‑se que este se relaciona com uma expressão da natureza do homem: o poder seria a força do desejo do homem.

O poder, aquilo que impulsiona o homem para seguir um determinado caminho na via, também se relaciona com a necessidade do homem de se defen‑der das ameaças, de forças que podem impedi‑lo de seguir a vida. Entretanto, o poder que está garantindo ao homem a sua segurança a sua proteção é uma disputa de um indivíduo contra outro, uma relação que pode vir a ser até mesmo violenta. De acordo com Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004 p. 381), “o poder é visto como a manutenção e reprodução das relações econômicas que constituem relações desiguais e de exploração do trabalho pelo capital.” Assim, o poder é concebido também como uma forma e coesão em uma visão negativa do poder aplicado às organizações.

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No entanto, o poder também tem uma face positiva nas práticas sociais de trabalho e que satisfaz a todos os membros que participam da organização. Conforme afir‑mam Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 381), “o poder existe em um nível de participação coletiva, de aparente fortalecimento do grupo como um todo, domi‑nantes e subordinados”. De certa forma, a crença de que os subordinados possam um dia vir a ser parte do grupo dos dominantes é imprescindível para manter a ideia de uma mobilidade dentro dos grupos. Sem a pretensão de mudança de um grupo para o outro haveria uma tendên‑cia de desagregação do grupo de subordinados.

Desse modo, o estado de subordinados ou domi‑nantes no ambiente organizacional depende de uma perspectiva de mudança de poder na empresa. Por‑tanto, o poder é relativo, pode mudar sempre de posição dependendo da força do líder e da união do grupo. Na percepção dos empregados, sempre existe alguém que conseguiu se posicionar à frente do grupo, alguém que pode vir a ser um chefe em busca de se posicionar na empresa, desempenhando seu papel com este objetivo.

O tema do poder é muito importante para as empre‑sas, porque influencia em toda a dinâmica organizacio‑nal. Sempre existirão nos grupos e nas suas subdivisões relações de duplas, parcerias que se estabelecem entre eles na manutenção de bons padrões de comporta‑mento e relacionamento. Existe, portanto, uma dimensão positiva do poder que se deve considerar.

Os principais estudos sobre o poder surgem relaciona‑dos ao poder do Estado, em uma dimensão política. Para a organização da vida em comunidade, o Estado deveria inter‑vir, sendo assim formadas as estruturas de poder baseadas na lei. Segundo Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 383), “nesse enfoque considera‑se que existem duas gran‑des linhas distintas de evolução do conceito de poder, cujos precursores foram Maquiavel e Hobbes.” O estado natural para esses autores é o estado de guerra de todos con‑tra todos, em que o Estado utiliza seu poder para controlar seus recursos. O poder é definido como conjunto de meios empregados para obter algum tipo de vantagem futura.

A sociologia define o poder pela força ou habilidade de um homem influenciar a outro homem. Assim, pode existir diferentes tipos de poderes na vida social, como poder militar, poder econômico, poder político. Neste momento, será abordado o poder dentro do ambiente organizacional. Em uma instituição, o poder é exercido com a participação

ou não das pessoas na tomada de decisão e também no reforço de valores e políticas da empresa.

O poder também é uma questão de interesse, de fina‑lidade que move alguém em direção a influenciar o com‑portamento de outras pessoas. Assim, dentro do contexto organizacional, existem estratégias e táticas de exercício de poder e influência, quando as pessoas são observadas e controladas dentro de uma determinada ética utilitária. Para que o poder se imponha e seja aceito pelas pessoas deve haver algum tipo de compromisso, daquele que exerce o poder sobre outro e daquele que se submete. Existe uma força que permeia as relações, uma força que é invisível ou desconhecida e que promove uma rede de serviços em que uns atendem aos apelos de outros.

O poder muitas vezes é prescrito para cada um dos papéis que são desempenhados no processo produtivo. Para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 381), “como decorrência da aceitação de papéis universais, da homogeneidade grupal, os subordinados perdem os meios de reação que preservam suas normas e padrões do grupo, uma vez que internalizam a crença da participação geral.”

Nas empresas existem diferentes relações, em fun‑ções de hierarquias e de distribuição de tarefas. Os che‑fes, por exemplo, tem mais poder do que os subordina‑dos, e espera‑se que os líderes exerçam poder sobre os seus liderados. Conforme afirmam Zanelli, Borges‑An‑drade e Bastos (2004, p. 384), “assim sendo, as orga‑nizações podem ser vistas como ambientes permeados por relações de poder entre indivíduos e grupos”.

Cumprir ou fazer cumprir ordens dentro do ambiente de trabalho representam relações que podem ser classifi‑cadas como relações de dominação, mas que são manti‑das por meio de estratégias de ganhos e recompensas. A avaliação do custo‑benefício depende da percepção de cada um dos trabalhadores, pois tanto nos grupos de dominados como nos grupos de dominadores existem fatores que interferem e influenciam o exercício do poder dentro das organizações.

Quando a pessoa tem o controle dos resultados que obtém por sua participação nos grupos, não se mantém devido a próprias flutuações de motivações, interesses e necessidades. É preciso, portanto, ajustar sempre os mecanismos de controle e distribuir o poder entre os membros dos grupos. É um exercício difícil para o líder conseguir manter boas relações no ambiente de trabalho,

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já que existem situações em que líder perde o controle, ou não consegue manter um equilíbrio nos grupos entre as relações de dependência e de autonomia e, ainda assim, exercer o poder. As pessoas são diferentes em suas relações interpessoais, e, portanto, instáveis. Não se trata apenas de um poder disciplinar exercido sobre elas, mas a aceitação dessas pessoas sobre o poder exercido sobre elas. A tomada de decisões e principal‑mente a delegação do poder entre diferentes membros do grupo são técnicas que podem ajudar a garantir bom nível de satisfação subjetiva dos trabalhadores.

18 | Formas de poder

um dos importantes aspectos de estudar as organi‑zações é perceber que esses ambientes sempre desta‑cam valores, rituais e formas de organização que muitas vezes são percebidas como formas de exercer o poder. Os ritos e mitos podem ser fortes instrumentos de uso do poder dentro das organizações, mas nem sempre esse tipo de poder é visível ou fácil de ser identificado.

Os valores são os princípios orientadores da vida organizacional e guiam o comportamento dos membros, os ritos são dramatizações dos valores e regras da organização, e a incorpora‑ção dos mitos, e os mitos, normalmente retra‑tados de forma histórica, codificam e organi‑zam percepções, sentimentos e ações nas organizações (ZANELLI; BORGES‑ANDRADE; BASTOS, 2004, p. 403).

Dentro das estruturas de poder, o modo como as pessoas se comportam pode variar da completa subor‑dinação até formas de enfrentamento do uso e abuso do poder por parte de gestores. Analisando a organiza‑ção é possível observar que existem várias formas de exercício do poder. O poder pode ser compreendido como uma forma de relação tipicamente humana, e para Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004), as orga‑nizações podem ser vistas como ambientes permeados de relações de poder entre os indivíduos e os grupos.

Pode‑se considerar o poder como um jogo no qual os vários jogadores exercem influências e controlam o comportamento uns dos outros. Para Zanelli, Bor‑ges‑Andrade e Bastos (2004, p. 383), “o poder é exer‑cido no contexto da participação da tomada de decisões e também no contexto da criação ou do reforçamento de valores políticos e sociais e práticas institucionais que limitam o âmbito do processo político”. O poder também

é exercido quando uma pessoa cria barreiras que impe‑dem a divulgação dos conflitos políticos. Nesse sentido, a organização cria maneiras de interferir na dinâmica interna do poder explorando ou suprimindo os conflitos.

As decisões tomadas dentro das organizações se baseiam em capacidades diferentes de exercer o poder. Desde o chefe, os acionistas até o diretor da empresa existem diferentes papéis com maior ou menor poder de decisão. Esse sistema de distribuição de poderes pode afetar os resultados das organizações, pois mesmo no que é publico e no que é privado, as decisões são tomadas por pessoas mais influentes. Para Zanelli, Bor‑ges‑Andrade e Bastos (2004, p. 389), “influenciador é aquele membro organizacional que optou por ser partí‑cipe da organização e que usa voz, ou seja, que investe seu tempo, energia e habilidade política, voluntariamente para provocar impacto nos resultados organizacionais”.

Em determinado momento, as pessoas podem delegar o poder de tomada de decisões para especia‑listas. São os executivos, as pessoas de comando que veem para o ambiente organizacional para comandar sistemas complexos. As configurações do poder podem ser de seis tipos, segundo Zanelli, Borges‑Andrade e Bastos (2004, p. 391): “autocracia, instrumento, missio‑nária, meritocracia, sistema autônomo e arena política”.

Na autocracia, o poder está concentrado em um influenciador, o chefe da organização que vai determinar as metas. No tipo instrumento, a configuração do poder na organização está fora é feita por um grupo de influen‑ciadores; a hierarquia é rígida e o poder flui de fora para dentro da organização. Na configuração missionária, o poder é ideológico, ou seja, toda a organização se baseia em uma missão, o sistema de autoridade é fraco. Na configuração da meritocracia, o poder está com os especialistas, são eles que tomam as decisões já que a ideologia organizacional é fraca porque a ideologia pro‑fissional é forte. Na configuração do tipo autônoma, os influenciadores são os próprios membros da organiza‑ção, principalmente seus administradores que exercem controle interno, um sistema de metas claramente ope‑racionais. Na configuração do tipo arena política há uma diminuição das forças de integração; os sistemas ideo‑lógicos de autoridade são fracos, e o conflito predomina porque todos perseguem objetivos individuais.

Assim, entre as diferentes configurações de poder dentro das organizações observa‑se que a função mais

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crítica é o papel da liderança que deve ser exercida por pessoal extremamente capacitado para desempenhar o poder. Isso porque, se os conflitos dentro do ambiente forem prolongados, podem levar a organização à destrui‑ção. As pessoas reconhecem que aquela função deve ser de alguém com poder, portanto, alguém tem o direito de comandar o trabalho e as pessoas reconhecem a autori‑dade no desempenho de um papel de poder. A legitimi‑dade do poder é obtida quando as pessoas concordam que alguém deve exercer o controle sobre os demais e existe uma aprovação no sentido da execução e distribui‑ção do poder dentro das organizações de trabalho.

19 | Conclusão

Neste texto foram apresentados os principais aspec‑tos da ética, desde suas noções básicas, passando pelas diferenças entre ética e moral. A construção de uma refle‑xão ética levou de uma dimensão social e macro para

as pequenas relações diárias, importando o papel da ética individual. Foram abordadas as diferenças entre as pessoas que se acentuam sobre necessidades de outras pessoas e que acabam refletindo no desempenho dos grupos de trabalho. A questão da ética dentro das empre‑sas também é enfatizada, assim como as diferenças entre os valores que são da organização e os valores que são individuais. As perspectivas da ética para um mundo em mudança, um mundo globalizado e globalizante, trazem para a discussão a relatividade da ética frente a culturas diferentes de povos também diferentes. Foi abordado tam‑bém a ênfase para o papel da comunicação nas relações interpessoais e a linguagem, os fatores que podem ser promotores do estresse dentro do ambiente de trabalho e que por isso mesmo geram os conflitos. Em seguida,,foi apontada uma definição própria para as relações inter‑pessoais e as diferenças individuais que complexificam o trabalho dos grupos. Por fim, foram discutido os conflitos no ambiente de trabalho e as formas de poder que são sempre relativas ao contexto em que se inserem.

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