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Eixo: 07. Instituições Escolares
EVASÃO ESCOLAR: UMA ANÁLISE DE RELATÓRIOS
ESCOLARES DO APRENDIZADO AGRÍCOLA “VISCONDE DE
MAUÁ” - 1942
Matias José Landim (IFSULDEMINAS- Campus Inconfidentes )1
Fernanda Stefani Alves Costa (IFSULDEMINAS- Campus Inconfidentes)2
Melissa Salaro Bresci (IFSULDEMINAS- Campus Inconfidentes) 3
Resumo:
O presente estudo busca analisar e entender os fatos presentes em um relatório
encontrado no arquivo escolar do então Aprendizado Agrícola Visconde de Mauá,
instituição que abrigava meninos que buscavam um ensino primário e para o trabalho no
campo, atualmente um dos campi do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), situado na cidade de
Inconfidentes/MG. Este estudo foi realizado por alunos dos cursos de Licenciatura em
Ciências Biológicas e Licenciatura e Matemática membros do projeto de iniciação
científica “O Arquivo Escolar do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas Gerais – Campus Inconfidentes: preservação da
memória escolar” que procura limpar, organizar e analisar documentos pertencentes ao
mesmo. O documento em questão datado de 1942 contém diversos assuntos, desde
burocráticos até relacionados ao ensino do local. Uma vez que, como o nome já diz, o
aprendizado oferecia um ensino agrícola, o documento mostra muito dos trabalhos
executados pelos próprios alunos no campo. Chama atenção a grande taxa de
reprovação e evasão dos alunos. O que melhor é retratado no documento é a
precariedade da estrutura física em todas as imediações do aprendizado. No tocante ao
ensino das matérias essenciais nota-se a influência de diversos fatores na qualidade do
processo de ensino-aprendizagem dos alunos e na própria vida dos mesmos. Vários
trechos do registro mostram aspectos que desmotivavam os alunos à continuar seus
estudos naquele local, contribuindo para as taxas de desligamento. A partir dessa
seleção, pretende-se levantar quais questões estariam relacionadas à evasão no
aprendizado: como estrutura física, a reprovação, o trabalho no campo como método de
ensino e suas influências na formação acadêmica e social dos educandos no local no ano
de 1942.
1 Matias José Landim, Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais – Campus
Inconfidentes , MG, Brasil . E-mail: [email protected] 2 Fernanda Stefani Alves Costa , Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais –
Campus Inconfidentes , MG, Brasil . E-mail: [email protected] 3 Melissa Salaro Bresci , Nome Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais –
Campus Inconfidentes , MG, Brasil . E-mail: [email protected]
Palavras-chave: História da Educação; arquivo escolar; desligamentos.
O Aprendizado Agrícola Visconde de Mauá
Tendo em vista a questão da evasão como parte das questões para compreensão
da História da Educação no Brasil, bem como sobre a História das Instituições
Escolares se faz necessário um breve rememoro sobre como e quando surge o
Aprendizado Agrícola nesse contexto.
Os centros das cidades no período da Primeira República (1889-1930),
principalmente a capital federal, Rio de Janeiro, se viam marcados pelos órfãos e
pelos ditos “perigosos” para sociedade. Tais perambulavam pelas centros e nã
oestavam habilitados ao trabalho, pois não possuíam a educação esperada para atuar
como mão de obra eficaz e adequada nos grandes centros. Segundo (BOEIRA, 2012.
p. 27) “Parte desta população percebida como “atrasada” estava inserida em
atividades ilegais; os registros policiais dão conta de diversos delitos envolvendo-os
(embriaguez, vadiagem, jogo etc.), ameaçando a ordem pública e o bem-estar social
que se buscava”.
Para controlar essa grande parcela da população, atribui-se a escola o papel de
estabelecer normas de conduta, princípios e valores aos educandos, evitando o
aumento da marginalidade, permitindo assim a ordem e valores dos quais os
estudantes dependiam (ibdem, p. 64).
Assim, o Decreto nº 12.893, de 28 de fevereiro de 1918 autorizava o Ministro
da Agricultura a criar escolas agrícolas (os patronatos agrícolas), para educação de
menores desvalidos, nos postos zootécnicos, fazendas-modelo de criação, núcleos
coloniais e outros estabelecimentos do Ministério . Considerando que cabia ao
governo impulsionar o movimento de transformação econômica do País, ao passo
que com a criação do ensino profissional a produção agropecuária se tornaria
“frutuosa”, estabelecendo um equilíbrio entre a população urbana e rural ao mesmo
tempo que tirando os meninos órfãos e marginalizados das cidades contribuindo
tqambém para a verdadeira formação técnica agrícola do País.
Desta forma surge o Patronato Agrícola Visconde de Mauá, primeiramente na
cidade de Resende/RJ e posteriormente no ano de 1920 com mesmo nome na cidade
de Ouro Fino/MG (instalado na então Núcleo Colonial de Inconfidentes, que se
constitui como cidade em 1962).
Desse modo, a instituição passou a oferecer instrução primária, em que eram
ministrados Português, denominado na época de Língua Pátria, nessa disciplina eram
ministrados lições de ler, escrever, redação e gramática, na disciplina de Matemática
era ensinado apenas as quatro operações básicas, já as disciplinas de História e
Geografia eram dadas pouca importância, sendo ministradas algumas noções sobre o
assunto.
Nessa época, foi inserido o ensino religioso como ferramenta de instrução e
disciplinas dos estudantes, isso porque, os religiosos consideravam:
(...) que a verdadeira educação devia estar vinculada à orientação
moral cristã. Para eles, as escolas leigas “só instruem, não educam”.
Politicamente representavam uma força conservadora,
comprometida com a antiga oligarquia, daí o viés reacionário de seu
discurso. Outra característica que marcava a atuação dos pensadores
católicos era um ferrenho anticomunismo (ARANHA, 2006. p.
304).
Devido a grande força que os cristãos exerciam sobre a população e
considerando a educação uma área estratégica, o governo brasileiro aliou-se a igreja
afim de prevenir e controlar a população de futuros movimentos operários. A
exemplo disso podemos relembrar um episódio ocorrido na França quando
(...) a burguesia, após ter atacado violentamente a Igreja enquanto
componente do “Antigo Regime”, a ela se aliou diante do temor do
avanço do movimento operário. E no Brasil das décadas de 1920-
1930 também estava em causa esse temor num momento em que se
procurava converter a questão social de caso de polícia, como fora
tratada na República Velha, em questão política. E a igreja aparecia,
aí, como um antídoto importante com sua doutrina social.
(SAVIANI, 2011. p. 196)
Na época, os meninos foram divididos em duas turmas, isso por que a
escola dispunha de apenas uma sala de aula, sendo que os períodos de aulas
alternavam com os trabalhos agrícolas (GUIMARÃES, 2010. p. 179). Isso facilitava
o controle dos alunos e o processo de “regenerar”
os estudantes. Neste modo, os
alunos deveriam ser educados com duas medidas disciplinares, a primeira destinava a
disciplina do tempo, fiscalizando as diferentes formas cotidianas dos indivíduos, por
exemplo, tempo para acordar, para lazer, para trabalhar e etc. A segunda maneira é a
disciplina trabalhista, atendendo ao projeto de construção de adultos que
incorporassem os princípios das ideologias do trabalho, ou seja, desde pequeno o
indivíduo deve se acostumando com os ritmos e habilidades necessárias para o
trabalho.
Imagem 1: prédio principal do Patronato Agrícola “Visconde de Mauá”
Fonte: Acervo fotográfico do arquivo escolar do IFSULDEMINAS – Campus Inconfidentes
No ano de 1934, o Governo Federal estabeleceu o decreto 24.115 de 12 de
abril, no qual os Patronatos Agrícolas seriam transformados em Aprendizados
Agrícolas a fim de dar aos estudantes um ensino técnico profissional de formação do
trabalhador rural e do operário agrícola. Este ato introduzido nas instituições de
ensino agrícola impulsionaria a lavoura e as indústrias derivadas, auxiliando os
pequenos agricultores do então Aprendizado que recebeu o nome de Aprendizado
Agrícola “Minas Gerais” e atribuindo à formação do trabalhador rural e do operário
agrícola. (GUIMARÃES, 2010. p. 179). Desse modo, a instituição iniciou-se o
processo de escolarização a partir dos planos de iniciação agrícola e adaptação
destinado ao ensino básico de ler e escrever e noções agrícolas, cujos estudantes
recebiam as aulas nos horários determinados e cumpriam rigorosamente as obrigações
de limpeza da escola e das outras localidades do estabelecimento(ibdem).
Alia-se a este o Decreto 982 de 23 de dezembro de 1938 que pretendia a
formação de profissionais agrícolas aos filhos de órfãos de pequenos e médios
proprietários rurais, que seriam aptos a exercer qualquer exploração agrícola de
acordo com as modernas práticas no campo. Pois, decretava que os estabelecimentos
de ensino agrícola deveriam orientar-se e dirigir-se a pesquisas agrícolas com o
objetivo do melhoramento do cultivo de plantas, com o fim de adaptar a agricultura
ao ambiente, aumentando assim as colheitas.
Em todas as turmas, os alunos praticavam os trabalhos nas oficinas, na horta, no
pomar, no jardim, no apiário e no aviário. Nada diferente do que foi verificado
anteriormente no Patronato Agrícola nas décadas de 1920 e 1930, evidenciando a
mesma estrutura. Naquele estabelecimento os alunos participavam efetivamente da
construção dos prédios como o dormitório e alguns pavilhões distribuídos pela colônia,
com a instalação da escola foi doado alguns hectares de terra em diferentes partes da
região, para facilitar a prática dos trabalhosagrícolas que era próximo da Sede.
A escola mantinha um regime altamente disciplinar, os alunos eram
proibidos de receber visitas periódicas de pessoas estranhas e até mesmo de
familiares, seu dinheiro era mantido sob guarda da instituição, não podiam manter
transações de qualquer natureza com outras pessoas e eram proibidos de entrar nos
estabelecimentos da instituição fora dos horários permitidos.
Nesse período, também foram encontrados indícios de instrução pré-militar aos alunos,
pelo Decreto-Lei nº 4.642 de 02 de setembro de 1942 em que destinava a instrução
obrigatória aos alunos do sexo masculino de idade de 12 (doze) a 16 (dezesseis) anos,
matriculados em qualquer estabelecimento de ensino. E a escolas a manter centros de
instrução pré-militar. Desse modo, os alunos matriculados no Aprendizado entre a
idade correspondida eram instruídos com o intuito de promover a iniciação para a
prática militar, mais tarde em 1946 foi publicado o Decreto-Lei 9331 que extingue a
instrução pré-militar.
“A norma legal previa o fim da instrução pré-militar para alunos
menores de dezesseis anos e da instrução militar para os maiores. A
estas normas legais citadas acima, que institucionalizaram a
instrução militar preparatória ou a instrução pré-militar são
relevantes em uma análise sobre as práticas e o pensamento militar
nas escolas civis” (NASCIMENTO, 2008).
Outras modificações de nomenclatura bem como de atividades ocorreram ao
longo de sua história, ele passou de Aprendizado Agrícola para Escola Agrícola, Escola
Agrotécnica Federal até chegar a compor pela Lei 11.892, de 29 de dezembro de 2008 o
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais.
Compreendendo a evasão mediante os documentos do Arquivo Escolar do
IFSULDMINAS– Campus Inconfidentes
Esse estudo é parte integrante do projeto de iniciação científica “O Arquivo
Escolar do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais
– Campus Inconfidentes: preservação da memória escolar” que trabalha com a limpeza,
organização e acomodação do arquivo escolar do referido Instituto, composto por
documentos de aproximadamente 98 anos de existência da instituição. Este arquivo se
encontrava em péssimo estado de conservação e em um local insalubre, o que dificultou
o trabalho, pois necessitou de um grande exercício de triagem dos documentos que
melhor retratavam a realidade vivenciada pelos alunos em diferentes épocas.
Dessa forma utiliza-se como referência principal deste trabalho o Relatório
Geral de 1942 que demonstra uma análise da evasão entre os anos de 1934-1942 que
possam apontar quais fatores levaram a grande da evasão escolar do Aprendizado
Agrícola “Visconde de Mauá”, cujo caráter era educação no campo e para o campo.
Este é um relatório sobre o que ocorreu naquele ano escrito para ser encaminhado à
Superintendência do Ensino Agrícola e Veterinário, já que o aprendizado na época
pertencia ao Ministério da Agricultura.
Mediante análise qualitativa pretende-se expor assuntos pertinentes contidos
neste documento, dando um enfoque para a evasão escolar, a infraestrutura que foram
muito criticadas, bem como, para a relação de trabalho presente no ensino no da referida
instituição no período do relatório.
Em boa parte da sociedade o local de conhecimento e aprendizado para a
maioria dos alunos são apenas as escolas, com isso quando temos o indivíduo fora da
mesma retiramos dele a capacidade de ser uma pessoa que tem a possibilidade de mudar
o mundo no qual vive, pois compreende-se que a educação seja um dos principais
instrumentos de formação da cidadania. Tendo como preceito principal que a ausência
dela possa contribuir para que os cidadãos não reflitam sobre suas condições sociais e
apenas repitam o que lhes é demonstrado, temos um grande problema quando tratamos
de evasão escolar.
Indivíduos que se evadem das escolas é tema recorrente na educação, inclusive
nos dias atuais. Para compreendermos o que levou a evasão a ser um fato recorrente
devemos analisá-la historicamente e levar em conta todos os fatores que podem
influenciá-la, logo, diante disso, encontra -se uma questão importante dentro dos
estudos da História da Educação e das Instituições Escolares.
Na procura dos fatos que influenciaram na evasão da instituição estudada
encontramos falta de vagas, falta da estrutura escolar, tanto física quanto pedagógica,
má formação familiar, diferença de classe econômica, repetência entre tantos outros. Há
vários fatores que estão distribuídos de forma distinta para os alunos, como principal
deles temos a estruturação psicológica da família dos mesmos, como fica explicitado na
seguinte fala.
(...) o fator mais importante para compreender os determinantes do
rendimento escolar é a família do aluno, sendo que, quanto mais
elevado o nível da escolaridade da mãe, mais tempo a criança
permanece na escola e maior é o seu rendimento” ( BRANDÃO ,
1983, p.43).
Um outro fator que vale ressaltar é o de diferenças de classes sociais, pois
quanto maior o nível econômico da família menos evasão as crianças oriundas delas
irão sofrer, segundo Brandão, Baeta e Rocha (1983) “os alunos de nível
socioeconômico mais baixo tem um menor índice de rendimento e, são mais propensos
a evasão”. A própria escola quando analisada pode levar o aluno a sofrer evasão, no
encontro da falta de estrutura didática, professores pouco interessados os alunos podem
sofrer de uma falta de estímulo para continuarem seus estudos.
Além da falta de estrutura escolar os alunos podem receber diferentes
tratamentos em relação a estudantes de classes mais abastadas, o que pode contribuir
para uma exclusão e formação de estereótipos em relação a sociedade o que o leva a
perder a confiança no sistema educacional e consequentemente desistir da escola como
revelado por Arroyo:
" É essa escola das classes trabalhadoras que vem fracassando em todo
lugar. Não são as diferenças de clima ou de região que marcam as
grandes diferenças entre escola possível ou impossível, mas as
diferenças de classe. todo lugar.(ARROYO, 1981, p. 21).
Tendo em vista todos esses fatores, uma população que pode ter um maior nível
de evasão seria a população rural em idade escolar, pois além de todos os agravantes
que podem os tirar da escola possuem ainda o fato do trabalho no campo que se
demonstra um forte contribuinte para a falta de tempo, bem como para a desistência dos
estudos. Até bem pouco atrás tinha-se em mente que para viver no campo não era
necessário muito conhecimento apenas o mínimo para saber ler e escrever conforme
Antonio e Lucini (2007, p.178)
Delineia-se, assim, um imaginário de que, para viver na roça, não há
necessidade de amplos conhecimentos socializados pela escola. Esta
concepção de educação rural considerava que, para os trabalhadores
do campo, não era importante a formação escolar já oferecida às elites
brasileiras.
Atentando-se aos dados obtidos a partir do relatório geral do ano de 1942
voltados a área pedagógica foi constatado que havia uma contagem de advertências e
faltas cometidas pelos alunos, que ocorriam em taxas muito altas: em 1941 ocorreram
606 casos e em 1942 foram 304. Além da grande taxa durante o ano, pode-se notar que
essas faltas ocorrem nos meses de janeiro a março. O redator do documento acaba por
relacionar tais questões com a evasão. Esta também ocorria em maior escala nos
primeiros meses do ano. Isso leva a crer que os alunos pouco voltavam das férias; ou
iniciavam os cursos e viam que não era o que queriam estudar realmente; ou não
conseguiam realizar as tarefas exigidas por conta das seguidas advertências que os
desmotivavam a continuar o curso.
Em outro momento do documento em que se trata de assuntos burocráticos, o
autor descreve como ocorriam as despesas, a escrituração, o pagamento de pessoal e
compra de material de consumo, que eram as maiores parcelas das despesas. Entre os
materiais, tanto de consumo como permanente, a serem comprados estavam animais
para o manejo e máquinas agrícolas. Logo após o documento enfatiza a precariedade
nas instalações da cozinha e a decrepitude dos funcionários que ali trabalhavam e dá um
exemplo disso: o aprendizado naquele ano produziu 102 quilos de abóbora, mas foi
impossível a fabricação de doces, pois as instalações mal tinham a capacidade de servir
a comida corriqueira.
Nesta época a instituição passava por uma grande crise financeira, evidenciada
em outros documentos e nessa estrutura física, que pouco atendia as necessidades
básicas dos alunos, como nesse caso, a alimentação, o que poderia também ter
corroborado para a evasão descrita nos gráficos.
O assunto da educação física surge no documento, dizendo que antes não havia
atividades nesse âmbito e que começou a acontecer, após muitos anos de existência da
instituição, com a devida atenção médica. Relacionando o assunto no âmbito de
cuidados médicos, há trechos retratando as moléstias apresentadas pelos alunos, que
foram poucas, o número de óbitos, que foi zero, pequenas cirurgias feitas, que foram 10,
internações de educandos, que foram sete, dados do médico que ali trabalhava e outras
informações.
A terceira seção do documento trata do ensino começando pela localização do
Aprendizado, que segundo o mesmo foi uma feliz escolha, porém, desfavorável às
famílias que viviam em localidades distantes de seus filhos. Surge uma crítica ainda às
instalações, que foram feitas em um povoamento e partes delas eram distantes umas das
outras, logo, os alunos passavam de um prédio a outro pelas ruas onde haviam pessoas
morando, o que segundo o autor é “ prejudicial a sua formação moral e profissional”.
O referido fato também foi uma grande causa de indisciplina e má fiscalização
dos serviços e dos próprios educandos. Segundo o autor “O edifício sede, em particular,
e as demais instalações, de um modo geral, não satisfazem os requisitos da higiene e de
conforto tão necessário nos trabalhos e a vida da comunidade escolar”. Uma vez que no
início da existência desta instituição, eram abrigados ali meninos “menores desvalidos”
(Decreto 12.893 de 28 de fevereiro de 1918), tidos como “arruaceiros” e esse
estereótipo perdurou muito tempo, inclusive na época do documento analisado,
mostrando que os moradores desse povoado mantinham um preconceito que
desmotivava os alunos presentes, mesmo com o passar dos anos e com mudanças de
finalidades de ensino.
A biblioteca contava com uma estrutura que comportava apenas 20 leitores e
ainda era usada para algumas aulas. O alojamento também acabou sendo usado em parte
para serem ministradas aulas, pois haviam alunos além da capacidade das três salas
citadas anteriormente. O refeitório, por sua vez, era escuro e abafado, com mesas e fixas
e com um “ar desagradável”. Este fato da má estrutura influenciava diretamente no
processo de ensino-aprendizagem dos educandos, pois passando por diversos problemas
durante sua rotina escolar havia um maior desinteresse e um menor entendimento do
conteúdo, já que eram muitos alunos por sala e em um ambiente mal estruturado, que
não atendia de forma certa as necessidades deles.
"o fenômeno da evasão e repetência longe está de ser fruto de
características individuais dos alunos e suas famílias. Ao contrário,
refletem a forma como a escola recebe e exerce ação sobre os
membros destes diferentes segmentos da sociedade" (BRANDÂO,
1983)
O Aprendizado que em 1934 tinha uma lotação fixada de 200 alunos passou a ter
vagas para 100 alunos em 1942, devido a falta de estrutura presente no local, mas as
matrículas ficaram acima deste valor neste ano, foram 112 matrículas em janeiro.
Entretanto, devido a diversos fatores como a já citada falta de estrutura, localização e
advertências, o número de alunos decaiu durante o ano passando para 57 em dezembro.
Tais dados foram coletados em um período de 10 anos, sendo os mesmos
apontados em relatórios que eram expedidos para a secretária que determinava a
quantidade de fomento necessária ao funcionamento da instituição. No relatório que
embasa este trabalho se avaliou o decréscimo da quantidade de alunos que adentraram o
referido aprendizado e o aumento da taxa de alunos que o deixaram. No entanto,
observou-se em determinados momentos uma procura alta por vagas pelos filhos de
agricultores da região, o que influenciou à superlotação do local, bem como um gasto
maior num momento de poucas verbas, ficando acima da capacidade de vagas, o que
levou a diminuição das mesmas. Na figura a seguir, encontrado entre as folhas do
documento, pode-se notar o aumento das taxas de desligamentos com o passar dos anos
de 1934 à 1942, em relação a taxa de matrícula dos alunos, que descaíram bruscamente.
Imagem 2: Gráfico das matrículas e desligamentos de 1934 à 1942.
Fonte: Relatório Geral (1934) presente no Arquivo escolar do IFSULDEMINAS – Campus
Inconfidentes.
A partir das matrículas feitas no ano de 1942 foram feitos gráficos e tabelas
mostrando de que local os estudantes provinham. Bem como registrou um grande
número de alunos das cidades da região do Aprendizado, como Ouro fino e Pouso
Alegre e também de muitos outros estados, com destaque para Distrito Federal e Rio de
Janeiro. Nesta época havia uma necessidade de mão de obra cada vez melhor formada
para se trabalhar no setor agrícola e, assim, muitos alunos de outros estados procuravam
o ensino oferecido pelo aprendizado, muitas vezes longe de seu local de origem, o que,
como dito anteriormente, poderia ser um agente da evasão. Abaixo, na Imagem 3,
encontra-se um gráfico demonstrando as cidades e os estados dos quais os alunos
advinham.
Imagem 3:Gráficos representando municípios e estados de origem dos alunos em 1942
Fonte: Relatório Geral (1934) presente no Arquivo escolar do IFSULDEMINAS – Campus
Inconfidentes.
Ainda haviam candidatos a matrícula neste Aprendizado que não conseguiram
vaga naquele ano, porém, registrados e mostrando que a maior parte desses alunos
também era da própria região e a porcentagem de alunos de outros estados era menor
que no gráfico anterior. Isso mostra que havia um maior empenho de alunos de outras
partes do Brasil em ingressar no ensino do local em questão em relação a procura por
alunos da própria região.
Retomando o assunto de desligamentos ocorridos durante o ano de 1942, que
foram 56, distribuídos na maior parte nos primeiros meses do ano e em dezembro, são
apontados seus motivos: estudantes que não regressaram das férias de 1941,
desligamento a pedido dos responsáveis, por conveniência da disciplina, por saúde, por
problemas psicopedagógicos ou por conclusão de curso. A maioria dos estudantes
desligados provinham dos estados de Minas Gerais e Distrito Federal.
Um assunto pertinente, tratado nesta mesma sessão é a taxa de reprovação dos
alunos. Nos três primeiros anos de curso os alunos tinham disciplinas mais gerais e no
quarto ano disciplinas técnicas, e esses eram os assuntos dos exames aplicados para os
mesmos.
No ano de 1942 a média de aprovação em todos as séries era em média de
57,5%, sendo a menor taxa encontrada no primeiro ano, que era de 41,7%. Estas taxas
podem ser devido ao fato de muitos professores atuantes ali não serem da área da
matéria que ministram ou não ter um conhecimento sobre o processo de ensino
aprendizagem dos alunos.
Outro fator que poderia influenciar também é a estrutura que, como já dito
anteriormente, não atende de forma adequada os alunos ali presentes. O gráfico presente
na imagem 4 mostra a quantia de alunos aprovados, reprovados e quantos terminaram o
curso no ano de 1942, revelando a grande reprovação de alunos que ocorria.
Imagem 4: Gráficos de alunos que concluíram o curso no ano de 1942.
Fonte: Relatório Geral (1934) presente no Arquivo escolar do IFSULDEMINAS – Campus
Inconfidentes
Uma nova sessão surge relacionada ao ensino e o trabalho no campo. Aqui são
apontados problemas que já foram relatados ao ensino: a falta de estrutura. São expostos
dados de culturas que os alunos cultivavam, como feijão, arroz, batatinha e milho, com
o pressuposto de que no plantio eram proporcionados aos alunos indispensáveis
ensinamentos teóricos e práticos, junto à um agrônomo. O objetivo dito é ensino,
porém, os alunos faziam tudo o que havia de ser feito nas plantações, inclusive
trabalhos pesados, como a limpeza de terrenos e construção de cercas, o que não cabia
nesse objetivo. Também é apontado uma geração de renda a partir da venda dos
produtos, porém, não é especificado seu destino. Pode-se perceber então que a maioria
dos trabalhos feitos na instituição eram executados pelos próprios alunos e isto gerava
um montante que, segundo os dados, não era bem investido, perceptível na falta de
estrutura física da mesma.
Surgem mais críticas à estrutura do local, dizendo que os sanitários eram muito
distantes das oficinas, o que diminuía a eficiência e aumentava a indisciplina, pois
segundo o relatório os alunos perdiam muito tempo para ir ao banheiro fazendo com
que houvesse agitação quando voltavam para a sala atrapalhando assim o andamento
das aulas. A oficina de ferro era muito pequena para a execução dos trabalhos e
necessitava de armários, máquinas e melhoria na instalação elétrica. Haviam duas minas
de água pertencentes ao aprendizado, mas elas não supriam as necessidades básicas do
mesmo, principalmente na época de inverno. Nota-se então que nem mesmo na questão
da água havia uma boa estrutura para a vivência dos alunos e funcionários.
Assim vemos que os alunos trabalhavam em condições
precárias, sem material, equipamentos e até mesmo em relação às condições básicas de
vida, como o relatório deixa explicito, deixando os alunos dentro de um ambiente até
mesmo sem segurança alguma. O trabalho forçado fazia parte do cotidiano destes
alunos e ocorria durante diversas horas do dia, o que deixava os alunos insatisfeitos e,
consequentemente, aumentava a evasão. A educação para o trabalho baseada no
trabalho constante se mostra arcaica tendo em vista os outros tipos de escolas técnicas
brasileiras, mostrando que os alunos não estavam ali apenas para aprender, mas sim
para serem repreendidos, servirem como uma simples mão de obra que não merecia ter
uma educação mais humanística, o que os prepararia tanto para a resolução dos
problemas do trabalho no campo como para a vida como cidadão.
Educação do e no campo, deve ser pensada para formação da
consciência e para libertação da classe trabalhadora, na perspectiva da
emancipação social, que busque a superação do capitalismo. Para
chegar a emancipação realmente, com base em Marx e Engels (2007)
exige-se a superação do capital e do Estado, uma vez que a
emancipação humana é contrária ao Estado burguês. Para construir
uma sociedade na perspectiva emancipatória, é necessária a luta, a
resistência e a criação de um projeto histórico que traga contribuições
para formação de consciências e identidades que se materializam nas
ações concretas. (LIMA, 2013, p.2)
O último tema discutido foram as realizações feitas pela instituição, que foram
basicamente duas: semana agrícola e semana da produção. A primeira contou com uma
exposição de milho, que proporcionava prêmios, como máquinas, aparelhos e
ferramentas. A semana da produção proporcionou uma palestra sobre a importância da
agricultura na economia. Estes foram fatos positivos para a formação dos discentes, já
que trazia uma responsabilidade para os seus trabalhos no local, aumentando a
autoestima e a motivação para a continuidade do curso. Assim, o documento mostrou
principalmente muitos aspectos negativos da instituição como a falta de estrutura e
muita evasão, que podem ser essenciais para a revisão dos conceitos do local e sua
mudança para melhor. Também teve seus aspectos positivos, como a intensa procura
pelo seu ensino e dar um destino a muitos meninos, que foi essencial para a formação
social da região do aprendizado agrícola.
Considerações Finais
O presente trabalho apresentou os principais fatores que levaram a evasão
escolar do então Aprendizado Agrícola “Visconde de Mauá”, hoje Instituto Federal de
Educação Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais- Campus Inconfidentes.
Nos documentos analisados foram encontrados dados que revelaram os vários
fatores que influenciaram no grande nível de evasão da instituição, entre eles tivemos:
falta de recursos financeiros, pouco conhecimento dos pais sobre educação, altas taxas
de reprovação, poucas vagas, salas superlotadas, trabalho pesado, e falta de estrutura
física que deixava o ensino e a aprendizagem em situação de calamidade, que era
encontrada em todas as dependências da escola.
Consideramos que a principal causa de desistência foi a falta de incentivo que os
alunos recebiam de suas famílias, da sociedade que os cercavam e do modo de vida que
levavam, o que acabava por consequência os levando a perder o interesse no curso e se
interessando mais e trabalhar para si mesmo, o que deixava as médias das taxas de
evasão por volta de 43%, isto é quase metade dos alunos abandonavam o curso no qual
tinham ingressado.
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