EXAME_SUST2012

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Edio EspEcialwww.exameangola.comDezembro 2012 v 500 kz

SuStentabilidade5climaprojectos angolanos pioneiros no mercado mundial de carbono

lixo

Lista das empresas-modelo em responsabilidade social e ambiental em Angola

6

programa angola limpa investir 6 mil milhes de dlares at 2025

mais

o desafio da superpopulao a era dos combustveis verdes chegou a lampda inteligente

Chevron

empresa sustentvel do ano

SumriochEvron: A primeira empresa sustentvel do ano eleita pela EXAME

08 12 18 20 24 26 28 32 34 38 40 44 48

Joo Serdio Para o professor da Universidade Agostinho Neto, o futuro do pas pode estar na produo alimentar Alteraes climticas Conhea cinco projectos angolanos em fase de validao para receberem crditos de carbono Polticas pblicas As novas leis para um novo ambiente Resduos urbanos A revoluo na gesto dos lixos j est em curso. Conhea as metas e os investimentos at 2025 Biodiversidade O plano para salvar a floresta do Maiombe Sociedade civil O caso da Juventude Ecolgica Angolana Arte O perfil da artista plstica Daniela Ribeiro que cria obras a partir de telemveis usados e outros desperdcios

EntrEvista

50 54 56 58 61 66 70 72 74 76 78 80

angola

Cradle to cradle A EXAME esteve em Petroplis para conhecer o biossistema que transforma esgotos em energia Aviao Os grandes fabricantes de avies aderiram aos combustveis verdes para reduzir as emisses de carbono Lmpadas Mais luz com menos consumo de electricidade Reciclagem Garrafas de plstico que so 100% reciclveis Metodologia Saiba como a EXAME escolheu as seis empresas-modelo de sustentabilidade a operar em Angola e quem nos ajudou a seleccionar as melhores prticas Chevron A empresa sustentvel do ano distingue-se pela proteco de pessoas e ambiente e o apoio s comunidades Odebrecht Os projectos Acreditar e Kukunga Pala Kukula so trunfos da construtora brasileira, em Angola h 27 anos BP A quarta maior empresa do mundo tem uma poltica de responsabilidade social baseada nas parcerias locais BESA Economia, social, ambiente e cultura so os quatro pilares para a sustentabilidade segundo o banco do planeta Total Nos ltimos cinco anos, a petrolfera investiu cerca 64 milhes de dlares na poltica de responsabilidade social BAI O BAI Arte a iniciativa mais meditica do banco. Conhea outros projectos na sade, desporto e educao Como fazer Erros tpicos dos programas de sustentabilidade Vladimir Russo Recomendaes do mestre em Educao Ambiental pela Universidade de Rhodes, da frica do SulEXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspEciAl 2012 | 3

inovao

EmprEsas modElo

opinio

Eufrazina Paiva A deputada e ambientalista explica como que Angola poder aproveitar melhor a riqueza natural

Jeffrey Sachs O prestigiado economista americano diz que chegou a hora do mundo passar dos discursos aco Ellen Shapiro A especialista em sustentabilidade alerta, no seu novo livro, para os danos ambientais na China Demografia Lidar com o crescimento da populao, que hoje de 7 mil milhes, ser o maior desafio deste sculo Energia O mundo j entrou na era dourada do gs natural. Saiba quem lidera esta corrida escala planetria Economia verde O tema que animou o debate na RIO +20

global

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ExamE final

carta do directorJOO Van dunemMedia Nova, SAPresidente do Conselho de Administrao: Joo B. V. Van Dunem Administrador Executivo: Filipe Correia de S

O

GasLand: O futurO O que fazemOs aGOra

Director: Joo Van Dunem ([email protected]) Director Editorial: Filipe Correia de S ([email protected]) Director Executivo: Jaime Fidalgo ([email protected]) Director de Arte: Jorge Ribeiro ([email protected]) Coordenadora editorial da Edio Especial: Cssia Ayres Colaboraram nesta edio: Andrea Vialli, Bruno Ferrari, Filipe Cardoso, Fabiane Stefano, Jos Alberto Gonalves Pereira, Luiza Dalmazo, Mariana Segala, Srgio Teixeira Jr. (texto), Eufrazina Paiva, Vladimir Russo (colunistas), Antnia Correia (secretariado) Fotografia: Carlos Moco (editor), Carlos Augusto, Daniel Miguel, Jacinto Figueiredo, Maura Gueve, Pedro Nicodemos (fotgrafos), Rosa Gaspar (assistente) Direitos Internacionais: Exame Brasil (texto e imagens), AFP, Graphic News e IStockPhoto Multimdia e Internet: Graldine Correia (directora), e Isabel Dalla ([email protected])

documentrio Gasland, nomeado para os scares de 2010, mostra cenas onde os moradores de fazendas acendem um isqueiro junto torneira e a gua se transforma literalmente em fogo. Realidade ou fico? Para muitos o mundo j entrou na era dourada do gs. A Agncia Internacional de Energia (AIE) estima que os investimentos na explorao do gs natural chegaro aos 20 bilies de dlares em 2035. O paradoxo: boas perspectivas para a indstria e preocupao para os ambientalistas que j falam na iminncia de fractura hidrulica e apelam aplicao rigorosa dos princpios do desenvolvimento sustentvel. Curiosamente, enquanto os pases desenvolvidos percebem na chamada economia verde uma oportunidade de confrontar a crise financeira que se instalou no planeta, os emergentes vem o tema com desconfiana, supondo ser mais um instrumento de manobra dos ricos para restringir o desenvolvimento dos demais pases. Continuar a crescer em ndices satisfatrios, proporcionar a melhoria da qualidade vida das pessoas com uma produo baixa de carbono e no uso sustentvel e eficiente dos recursos naturais a receita da economia verde. Em 2011, a marca do crescimento humano atingiu os 7 bilies. Prev-se que o planeta chegue a 9 bilies em 2050 e ultrapasse os 10 bilies at ao final do sculo. O desafio de alimentar 10 bilies de pessoas voltou a estar no centro do debate sobre sustentabilidade. Somos ns qualificados para mudanas em direco a um mundo mais equilibrado e melhor? Para que um empreendimento humano seja considerado sustentvel preciso que seja: 1. Ecologicamente correcto; 2. Economicamente vivel; 3. Socialmente justo; 4. Culturalmente diverso. Com base nestes pressupostos, a ExAmE decidiu lanar um desafio s empresas nacionais e estrangeiras em Angola, no sentido de medir o grau de envolvimento do empresariado local com os conceitos da sustentabilidade. Em ltima anlise, uma conscincia sustentvel significa uma vantagem competitiva se integrar uma estratgia nica da organizao e no for considerada apenas como parte da poltica de marketing e comunicao. Que lies podemos aprender das empresas que investem em Angola? A resposta ao desafio da ExAmE fala por si nas pginas desta revista, permitindo-nos olhar para o panorama empresarial sobre uma nova ptica e um maior campo de conscincia em que pontificam como marcos os indicadores do desenvolvimento humano. Termino com a mesma reflexo da carta da edio anterior da ExAmE, mas sob uma perspectiva localizada: Em 2030, uma criana nascida neste momento em Angola ter a idade para eleger e ser eleita. Que compromisso assumimos agora para com o seu futuro?

www.exameangola.com222 006 409 [email protected]: Bruno Fundes (918 200 106 / 923 791 605), Viviani Kanzvia (918 800 981 / 924 079 696), Witman Luamba (918 800 982 /937 149 739) Facturao: Firmino Pinto (+244 918 800 980) Registo Minist. Comunicao Social: MCS-560/B/2009 Tiragem: 5 mil exemplares Depsito Legal: 261-09 Distribuio: Media Nova Distribuio Tel: +244 943 028 039 [email protected]

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Antnia Correia: 927 954 [email protected]: Damer Grficas, SA EXAME Condomnio Alpha, Ed. 6, 1. Sector de Talatona; Luanda-Sul, Angola; Tel.: 222 003 275; Fax: 222 003 289;

assinaturas

[email protected] revista Exame (Angola) um licenciamento internacional da revista Exame (Brasil), propriedade da Editora Abril.

SuStentabilidade: o futuro contempla-noS no que fazemoS agora4 | EXAME SUSTENTABILIDADE 2012 | www.exameangola.com

Propriedade: IMPRESCRITA Imprensa Escrita, SA N. de Matrcula: 1279-07 Conservatria do Registo Comercial de Luanda

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FeliPe cruz, director de sustentabilidade da odebrecht angola.

Para realizar grandes obras, como hidroeltricas, rodovias e projectos de saneamento bsico, um amplo conjunto de aces voltadas mitigao de impactos e utilizao racional dos recursos naturais colocado em prtica. A conservao do meio ambiente, da fauna, da flora e da biodiversidade juntamente com o desenvolvimento social e econmico (e isso entendido e praticado em cada um dos projectos que contam com a participao da Odebrecht) fazem parte

do negcio. No se trata apenas do cumprimento da legislao, por mais rigorosa que ela possa ser, mas de ir alm, fazer mais do que o exigido, investir em iniciativas consistentes e avanadas, realizar pesquisas e estudos pioneiros que se tornem referncia nacional e at internacional. A poltica de sustentabilidade da O-debrecht estabelece as referncias sobre o tema para posicionamento interno e externo perante a sociedade de um modo geral e o mundo empresarial em particular.

reconhecimento em sustentabilidadeRecentemente a Odebrecht venceu o Prmio de Sustentabilidade na dcima edio da Feira Internacional de Equipamentos e Materiais de Construo Civil, Obras Pblicas, Urbanismo e Arquitetura Projekta by Constroi Angola 2012 , realizada nas instalaes da FIL/Luanda no perodo de 25 28 de Outubro. No evento que contou com a participao de 380 expositores, a Odebrecht recebeu tambm um Prmio Especial pela sua participao contnua, activa e dinmica em todas as edies da Feira Projekta by Constroi Angola

A Odebrecht estabeleceu para si o desafio de ser reconhecida como uma empresa comprometida com a criao e o oferecimento de um legado s populaes das reas de influncia de suas obras de engenharia e construo e de suas operaes industriais .A Odebrecht estabeleceu para si o desafio de ser reconhecida como uma empresa comprometida com a criao e o oferecimento de um legado s populaes das reas de influncia de suas obras de engenharia e construo e de suas operaes industriais. Esse legado tem como pilar principal o conceito de incluso: essencial que as comunidades sejam envolvidas nesse processo de aprimoramento, com a participao directa de seus membros na manuteno, no aperfeioamento e na multiplicao das transformaes realizadas e dos benefcios conquistados.

O desenvolvimento sustentvel parte do negcio da Odebrecht. Nossos empreendimentos e aqueles que realizamos para outros investidores devem realizar todo o potencial de resultados de que sejam capazes, para clientes, acionistas, comunidades, integrantes e parceiros. A nossa cultura fala de Sobreviver, Crescer e Perpectuar, e isto s possvel em um ambiente de desenvolvimento continuado e como tal sustentvel. Na Odebrecht, a preocupao com a sustentabilidade est presente desde o momento em que se comea a pensar em um projecto, na sua viabilidade. Na sequencia, a nossa ateno focada nos processos executivos e as melhores de mitigao de impactos gerados: s vezes, mudar o traado de uma estrada entre dois pontos pode significar menos rea desmatada, menos pessoas afetadas, menos impacto ambiental. Durante a fase da execuo, uma outra sequencia de cuidados, como, por exemplo, tratar adequadamente os resduos que geramos.afirma Felipe Cruz, director de Sustentabilidade da Odebrecht Angola.

sustentabilidade na odebrecht tem o foco em Pessoas, com nfase no seu desenvolvimento e capacitao. So elas que detm a capacidade para implementar um modelo de desenvolvimento que possa atingir simultnea e sinergicamente resultados relacionados ao desenvolvimento econmico e social, responsabilidade ambiental, participao poltica e valorizao da cultura. Envolvimento com comunidades, melhoria da qualidade de vida, respeito ao cidado, tudo isso est na nossa cultura. Praticamos isso muito antes de ser uma deman-

da externa e fazemos por iniciativa empresarial. Portanto, o grande desafio dos empresrios no criar iniciativas voltadas sustentabiliade, mas, sim, incorporar prticas sustentveis nas organizaes, fazer com que a sustentabilidade esteja no quadro mental referencial de criao dos negcios. Hoje est claro que sustentabilidade e desenvolvimento fazem parte do mesmo lado da equao. Na Viso 2020 da Organizao Odebrecht Sustentabilidade um dos pilares fundamentais. A Odebrecht quer crescer, sim, mas de forma sustentvel.

angola EntrEvista

a agricultura e o futuro Joo Serdio, professor de Biologia da Faculdade de Cincias da Universidade Agostinho Neto, acredita que o futuro de Angola estar na produo alimentar dirigida, sobretudo, aos pases asiticos. Defende que a educao ambiental deveria fazer parte do currculo escolarCssiA AyrEs

J

oo Serdio trabalha na rea ambiental h 40 anos. Alm de educador, comeou por ser quadro do Ministrio da Agricultura, primeiro como tcnico mdio agrcola e depois como mdico veterinrio. Foi vice-

-ministro do Ambiente entre 1997 e 1999. Professor Serdio, como tambm conhecido, filho de um engenheiro silvicultor e entrou na rea ambiental por influncia do pai. Nesta entrevista, ele defende que a educao ambiental a grande prioridade rumo ao desenvolvimento sustentvel.

Qual , na sua opinio, a relao entre a ecologia e a economia? Tudo est ligado ecologia. Ambas as palavras advm de uma mesma raiz: ecos, que em grego oikos, significa casa. So termos indissociveis. Se a economia no tiver como base a ecologia, no sobreviveremos.

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Uma economia para ser vlida, tem de ter uma garantia de continuidade ou de sustentabilidade para as prximas geraes. Algo que somente pode ser alcanado se tivermos conhecimentos de ecologia. Quais so os principais desafios do pas rumo ao desenvolvimento sustentvel? a diversificao da economia. Teremos de dar uma grande ateno agricultura tradicional. Angola enfrenta um problema grave, resultado dos 30 anos de guerra. Basicamente, houve uma ruptura do tecido social campons, com a interrupo da passagem do conhecimento de uma gerao para outra, das prticas agrcolas aprendidas durante alguns milhares de anos. Estes conhecimentos perderam-se com os fluxos migratrios entre as provncias. Por um lado, porque o conhecimento ancestral nem sempre aplicvel quando se muda de regio, por outro, porque as geraes mais novas foram mobilizadas para as guerras, deixando de haver jovens para que os mais velhos passassem o testemunho. As consequncias foram a estagnao da produo de alimentos mesmo nos regime de auto-subsistncia e da silvicultura. Essa ruptura criou problemas sociais? Sim, dado que a agricultura familiar no apenas garantia o sustento, como gerava um rendimento mnimo para 8 milhes de indivduos. Temos de levar em conta que esta imensa quantidade de pessoas no dispe de outros conhecimentos para se dedicar a outras profisses. Da que o Estado tenha de lhes garantir a possibilidade de executarem tarefas onde podem ser teis, tanto a si prprios como sua comunidade. Temos de deixar as pessoas fazerem aquilo que sabem fazer bem, para assim se sentirem felizes, logo estveis emocionalmente. Quando estamos felizes, estamos estveis Que solues prope para o regresso agricultura familiar? fundamental voltar a educar as pessoas. Criar centros de ensino agrcola pelo territrio nacional, mobilizando todas as pessoas com conhecimentos, mesmo que

sejam apenas prticos. Deveremos resgatar os conhecimentos empricos perdidos, mesmo os que se baseavam apenas na tentativa e erro, e ali-los aos conhecimentos tcnicos e cientficos actuais. E temos de fazer com que os mais jovens recuperem o gosto e o entusiasmo por trabalhar a terra, dando-lhe o devido valor. E como promover a agricultura mais sofisticada de tipo empresarial? O Governo tem de definir as zonas onde se pode praticar a agricultura familiar e a empresarial e, sobretudo, criar condies para que o homem volte ao campo, quer seja por uma via quer pela outra. A verdade que a agricultura empresarial o meio mais prximo para sustentar o crescimento econmico do pas. E ela pode ser feita seguindo-se critrios ambientalmente correctos, tal sucedia na agricultura tradicional. A industrializao, outra via do desenvolvimento, demorar mais a ser aplicada, pois carece de quadros tcnicos mais especializados que ainda no temos, sendo necessrio contrat-los fora, com todos os prejuzos ou riscos que essa medida pode acarretar. Como fazer uma agricultura lucrativa, mas com menos impacto ambiental ? Mais uma vez, coloco a educao ambiental como prioridade para se poder atingir bons resultados econmicos na agricultura com um mnimo de impacte ambiental. O conhecimento do clima, dos recursos hdricos e dos solos so indispensveis para se tirar da terra os maiores benefcios. A agricultura, como qualquer outra actividade biolgica,

altera o ambiente local. Foi assim que chegmos aos actuais biomas e ecossistemas (Hiptese Gaia). A agricultura, em particular, cria o chamado ecossistema agrrio, que num estdio de estabilidade, permite a sua utilizao continuada, de preferncia para sempre. Penso que na Europa, a explorao milenar de terras agrcolas criou muitos exemplos desses ecossistemas agrcolas estveis. Essa estabilidade indispensvel para a conservao de zonas naturais que sirvam de reservas biolgicas para as geraes futuras. Tambm a utilizao de gua para a agricultura assim como de defensivos agrcolas, deve ser muito bem ponderada. A cincia moderna j conhece os mecanismos para o fazer com inteligncia. Inclusivamente o que se considera como resduo, pode e deve ser reintegrado na produo, se necessrio, utilizando os mtodos tecnolgicos adequados. Como v a agricultura para os biocombustiveis? No concordo que Angola perca muito tempo com essa actividade. O pas no tem necessidade de avanar nessa senda, pois, segundo se prev, uma prtica que no vai durar mais de 30 a 40 anos. Os hidrocarbonetos para os motores de combusto vo ser mais sofisticados no futuro prximo. Depois sero os motores elctricos a dominar o panorama motriz. Desenvolver agora a produo de biocombustveis, apenas servir para a exportao, logo para permitir que os pases desenvolvidos mantenham o status de bem-estar para as suas populaes, em detrimento dos menos desenvolvidos, que no final ficaro com as suas terras degradadas. Quem ganha com os biocombustiveis? Os biocombustveis s trazem vantagens para os pases sem recursos petrolferos (a excepo o Brasil com o etanol) ou para os que tenham necessidade de reduzir as suas emisses de carbono. Creio que Angola dever aplicar todas as suas capacidades agrcolas na produo alimentar. Essa, sim, ser uma moeda forte nos prximos anos, principalmente nas trocas comerciais com os pases asiticos que comeam a lutar pelo controlo econmico do mundo.EXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspECiAl 2012 | 9

temos de resgatar o conhecimento perdido e fazer com que os jovens recuperem o gosto e o entusiasmo por trabalhar a terra

angola EntrEvista

Mas no h vantagens ambientais... Enquanto os combustveis fsseis so problemticos depois da sua utilizao, os biocombustveis trazem problemas ainda antes, atravs da desmatao para novas terras agrcolas, da utilizao macia de agro-qumicos e de grandes quantidades de gua e, no final da cadeia, na acumulao dos resduos da produo. Em vez de apostar nos biocombustveis Angola deve, em alternativa, fazer um esforo de investigao cientfica, na busca de novas fontes de energia limpa. a que reside o futuro. Onde est o potencial para desenvolver energias limpas em Angola? A nossa matriz a hidroelctrica. Angola possui cursos de gua em todo o pas, at mesmo no deserto. A questo que para a energia chegar s reas mais isoladas os investimentos em linhas de transmisso so muito elevados. Por isso que a energia elica e solar devem ser desenvolvidas para alimentar os locais com menor concentrao humana. A questo que

as pessoas precisam de aprender a evitar os desperdcios. A entra mais uma vez a questo da educao ambiental. preciso rever hbitos de consumo... Sem dvida. O angolano consome de forma desenfreada o que gera desperdcio e lixo. frequente ver, na cidade de Luanda, pessoas com mangueiras de gua a lavar viaturas, a varrer a calada com jactos de gua tratada, que posteriormente,

frequente ver pessoas na rua com mangueiras a lavar viaturas. a gua misturada com o lixo uma fonte de doenas

misturada com o lixo, se vai acumular nas ruas, servindo de fonte para a multiplicao de mosquitos e outros focos de doena. Outro exemplo, o edifcio-sede do Gamek Gabinete para o Aproveitamento do Mdio Kwanza. Quando l trabalhei, em 1988, no tinha interruptores para desligar as luzes. Ficava completamente iluminado 24 horas por dia. Esta prtica correspondia ao conceito americano do sculo xx, que apagar as luzes da casa seria um sinal de pessoas pobres. Espero que esta situao j tenha sido superada. Em termos gerais, em Angola muitos de ns tm comportamentos de novos ricos, quando grande parte da nossa populao vive com grandes dificuldades e carncias de toda a ordem. Como que se muda essa cultura de consumismo e desperdcio? Precisamos de institucionalizar a educao ambiental, prioritariamente na idade entre os 9 e os 14 anos, onde os jovens tm maior interesse e receptividade s novida-

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Quatro razeS de optimiSmo para uma angola maiS SuStentvel

agricultura tradicional: importante formar e resgatar as tcnicas ancestrais de cultivo que no passaram para as geraes seguintes

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Angola tem capacidades financeiras para preparar as polticas ambientais adequadas, mesmo que para tal tenha de recorrer a colaboraes internacionais de qualidade inquestionvel. Angola j tem recursos humanos capazes de darem resposta a muitos dos problemas das populaes. apenas necessrio que haja o bom senso de utilizar esses recursos. Angola ainda est numa situao confortvel quanto preservao de recursos naturais, fruto da fraca densidade populacional em comparao com a sua extenso territorial. Angola fez, na dcada passada, um plano prospectivo at 2025, onde se equacionaram diversos cenrios de desenvolvimento. Agora, apenas necessrio colocar essas premissas em prtica. Podemos dizer que, felizmente, a grande maioria delas est a ser aplicada. Mas ainda h muito que fazer na rea ambiental.

des. A sustentabilidade uma disciplina que tem de vir no currculo escolar. A frica do Sul fez isso. Investiu dez anos em programas macios e os resultados hoje so evidentes. Angola no tem nenhum programa significativo de educao ambiental. Como que estamos a tratar os nossos resduos slidos? Tratamos muito mal a questo. Para ns, ecologistas, no h lixo. H, sim, matria-prima que no sabemos, ou no queremos, aproveitar. Angola ainda est numa posio onde seria fcil evitar problemas futuros, porque tem pouca populao, tem pouco desenvolvimento industrial. Ns podemos ter uma poltica correcta, dando um tratamento adequado ao lixo, aproveitando melhor o potencial energtico e reduzindo a procura de matrias-primas. Como que o lixo pode gerar riqueza? Tudo gera riqueza e pode evitar a poluio. O alumnio, por exemplo, que um metal caro de explorar, pode ser reciclado para

em angola ns no aproveitamos nada. atiramos os desperdcios para um aterro. polumos terras e linhas de guasempre, pois as suas propriedades no se alteram. Aqui ns no aproveitamos nada e somente geramos lixo. Atirar com os desperdcios todos para um aterro e poluir as terras e as linhas de gua, no nos trar nenhum benefcio em termos de sade. O que se est a fazer ao nvel do ensino superior na rea do ambiente? Apenas posso falar enquanto membro da Universidade Agostinho Neto. Desde h

muito tempo que a universidade tem procurado unir esforos de forma a contribuir para a soluo dos problemas que realmente afectam as nossas gentes. S agora podemos dizer que estamos no bom caminho, com a inaugurao do campus universitrio, onde finalmente poderemos concentrar pessoas e competncias para trabalharem em equipa. At agora, a disperso das diversas faculdades pela cidade de Luanda e a falta crnica de fundos financeiros para trabalhos que no sejam exclusivamente ligados ao ensino, limitava-nos a capacidade de desenvolver estudos cientficos e mesmo tecnolgicos. Agora, o encontro dirio com os outros colegas das diversas especialidades permitiu a realizao projectos conjuntos de trabalho. Neste momento, est em curso a possibilidade da Universidade Agostinho Neto colaborar com outras estruturas do Governo em leis ligadas segurana das populaes contra as catstrofes naturais, por exemplo. Os investigadores da Universidade Agostinho Neto podem ajudar a prever essas situaes. hEXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspECiAl 2012 | 11

AngolA AlterAes ClimtiCAs

os projectos pioneiros ...barragem de cambambeAbrange a requalificao e ampliao da barragem. A segunda fase do projecto, a ampliao da barragem de Cambambe, situada na provncia do Kwanza-Norte, iniciou-se em Janeiro, com a construo da segunda central elctrica, com capacidade para produzir 700 megawatts. A nova central estar dotada de quatro grupos geradores, cada qual com capacidade de 175 megawatts, requer um investimento inicial de 400 milhes de dlares e ser concluda em 2014. Recorde-se que a primeira fase foi iniciada em 2009, com a reabilitao e modernizao da primeira central.J a terceira fase, ainda em projecto, vai abarcar o alteamento da barragem de 102 para 132 metros, visando o maior aproveitamento do curso das guas do Kwanza.

barragem do goveInaugurada em Agosto, a barragem hidroelctrica do Gove, localizada na provncia do Huambo, tem uma capacidade de produo de 60 megawatts e ir fornecer energia ao centro e sul de Angola, nomedamente as cidades do Huambo, Cala e Kuito (Bi). O projecto representou um investimento de 279 milhes de dlares e foi executado pelo grupo brasileiro Odebrecht. Recorde-se que a construo da barragem data de 1969 e foi interrompida em 1975. A retoma dos trabalhos s surgiu em 1983 sendo novamente suspensa trs anos depois. Em 1990, foi alvo de um exploso que a destruiu parcialmente. Os trabalhos recomearam em 2001 e s este ano foram concludos.

...e A listA coMpletA

energia hidroelctrica Central Hidroelctrica de Laca Ampliao da central Hidroelctrico de Cambambe Mini-hdrica Cuando Mini-hdrica Liapeca Mini-hdrica Nharea Mini-hdrica MBridge /NZeto Mini-hdrica Cuemba Mini-hdrica Chiumbe Mini-hdrica Kuito 2 (Katermo) Mini-hdrica Andulo

MercAdo de cArbono chegA A AngolAUsar tecnologias amigas do ambiente vale dinheiro. Muito dinheiro. Angola j tem cinco projectos em fase de validao, de forma a receberem crditos de carbono que podero ser comercializados internacionalmenteCssiA AyrEs e JAiME FidAlgo12 | EXAME SUSTENTABILIDADE 2012 | www.exameangola.com

parque elico do tombwaO Governo vai construir o primeiro parque elico de Angola, na regio do Tombwa, provncia do Namibe. Este parque, um dos maiores de frica, ter capacidade para 100 megawatts, tem 50 aerogeradores de 2 megawatts, e representa uma forte aposta por parte do Ministrio da Energia e guas (Minea) nas energias renovveis (a par de projectos ligados biomassa e de sistemas fotovoltaicos). Funcionar tambm como centro de formao e experimentao de novas tecnologias. Segundo a directora nacional para as energias renovveis, Sandra Cristvo, foi encontrada nesta regio potencial elico com ventos de 5,2 metros por segundo tornando o local ideal para a construo de um parque.

Angola lng gs natural liquefeito um projecto ambicioso, iniciado em Dezembro de 2007, que permitir a produo de gs natural liquefeito, reduzindo a queima de gs e as emisses de carbono. Est localizado no Soyo (provncia do Zaire) e tem como accionistas a Sonangol (22,8%), Chevron (36,4%), Total (13,6%), BP (13,6%), e ENI (13,6%). Com uma capacidade de produo de 5,2 milhes de toneladas por ano e um potencial de 1000 milhes de metros cbicos por dia, j est em fase de explorao (apesar de ainda no ter sido inaugurado oficialmente) e teve um impacto significativo na comunidades local ao nvel da reabilitao de infra-estruturas, da gerao de empregos e da responsabilidade social.

energias renovveis Aldeias Solares Energia fotovoltaica nas reas rurais Projecto Onda Verde Distribuio de lmpadas eficientes Parque elico do Tombwa Namibe Angola LNG Soyo

indstria Fbrica de reciclagem de resduos Grupo Neuerth Fbrica de reciclagem de alumnio Neuerth Fbrica de Reciclagem de Resduos Universal Minerals & Metals Fbrica de reciclagem de alumnio Universal Minerals & Metals Fbrica de cimento Nova Cimangola (gerao de energia a partir do calor)

A

lterar a matriz produtiva dos pases industrializados em nome das alteraes climticas algo que vai levar muito tempo e custar muito dinheiro. Para permitir a adequao das economias desenvolvidas s metas de reduo dos gases de efeito estufa (GEE) definidas no protocolo de Quioto, foi criado o mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL). Atravs deste mecanismo, possvel obter as redues certificadas de emisses com projectos sustentveis, os chamados crditos de carbono, que depois podem ser comercializados no mercado internacional. O mecanismo funciona numa via em dois sentidos, que apoia tanto os pases do designado Anexo 1 (pases industrializados com obrigaes de reduo de emisses de GEE no mbito do Protocolo de

o mercado de carbono movimentou 179 mil milhes de dlares em 2011. frica representa menos de 1% do totalQuioto) como os do Anexo 2 (pases em desenvolvimento, isentos dessas obrigaes), para que se desenvolvam economicamente seguindo critrios sustentveis. Na prtica, tanto os governos como os privados ganharo um incentivo financeiro, se provarem que os seus projectos industriais adoptam tecnologias limpas capazes de parar os temidos GEE: dixido de carbono (CO2), metano (CH4) e xido nitroso (N2O). O mercado de carbono visa dois grandes incentivos: a reduo das emisses; e o incentivo ao investimento em tecnologias amigas do ambiente. Mas tambm permite que os pases desenvolvidos comprem toneladas de CO2 que no foram emitidas por pases em desenvolvimento graas implantao de tecnologias limpas em diferentes reas. Um crdito de carbono equivale a 1 tonelada no emitida (por isso o esquema apelidado pelos crticos de licena para poluir). Na lista dos sectores elegveis (ou seja, abrangidos pelo MDL), destacam-se a gerao, distribuio e conservao de energia (renovvel ou no renovvel), as indstrias de transporte, minerao, construo e produo de metais e aindaEXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspECiAl 2012 | 13

AngolA AlterAes ClimtiCAsde 3,6 mil milhes de dlares na mitigao das alteraes climticas. S que o valor dos crditos de carbono apoiados pela ONU, as chamadas redues certificadas de emisses, caiu cerca de 70% ao longo dos ltimos 12 meses, devido grande oferta de crditos (a fasquia de 1000 milhes de certificados emitidos foi batido em Setembro) e queda na procura devido desacelerao global da economia. Hoje a cotao da tonelada de carbono est entre 5 e 16 dlares. Durante a conferncia da UNFCCC, em Durban, em Dezembro no ano passado, na frica do Sul, o preo chegou ao menor patamar de sempre: 3 dlares dez vezes abaixo do pico das cotaes em Maro de 2006. O problema de fundo que os grandes produtores de GEE no ratificaram o Protocolo de Quioto, caso dos Estados Unidos ou da China e da ndia (que, sendo pases em desenvolvimento, no tm essa obrigao). As atenes esto voltadas para a Europa em plena crise econmica. No ETS (European Unions Emissions Trading System), o maior mercado de carbono do mundo, com 11 mil empresas, cada crdito vale hoje 8,32 euros (cerca de 10,5 dlares), quando h um ano a mdia foi de 13 euros (16,5 dlares). Mas o que realmente preocupa os investidores a insegurana sobre o futuro do acordo de Quioto e o do prprio mercado europeu de carbono que aguarda decises quanto sua eventual reformulao. Este um dossi quente que est nas mos da dinamarquesa Connie Hedegaard, comissria da Unio Europeia para as Alteraes Climticas. 19 projectos em curso No meio da incerteza uma coisa certa: o mercado de carbono uma grande oportunidade para os pases em desenvolvimento como Angola. Mas at receber os crditos, os investidores precisam de seguir as fases do MDL, um processo burocrtico que pode demorar 18 meses e inclui a aprovao do projecto como elegvel, a validao (por parte de uma entidade internacional), a obteno da aprovao do pas anfitrio (pela Autoridade Nacional Designada AND) o registo, a implementao do projecto, a verificao e a certificao (pela Conveno das Naes Unidas sobre Alteraes Climticas) para que haja a emisso de crditos de carbono. Angola, que aderiu Conveno-Quadro das Naes Unidas para as Alteraes Climticas, j deu passos firmes desde a fundao da AND em 2010. O rgo, que est ligado ao Ministrio do Ambiente, cria os critrios de avaliao dos projectos que pretendem concorrer ao mecanismo de desenvolvimento limpo. J esto em fase de validao os cinco primeiros projectos, todos na rea de energia barragem de Cambambe (um de reabilitao e outro de ampliao), barragem de Gove, parque elico do Tmbwa e o Angola LNG de gs natural. Juntos, somam 24 milhes de toneladas por ano em crditos e colocam Angola como o terceiro pas do continente, atrs da Nigria e da frica do Sul. Existem ainda outros projectos em curso como a substituio de lmpadas antigas por outras mais amigas do ambiente (projecto Onda Verde). A lista completa, com 19 iniciativas, incluem a nova central hidroelctrica de Laca, diversas mini-hdricas espelhadas pelo pas, fbricas de reciclagem de alumnio e de outros resduos, a instalao de energia fotovoltaica nas reas rurais ou a melhoria dos fornos da Cimangola para que reduzam as emisses. Este um mercado com grande expectativa de retorno, tendo em vista a elevada procura por parte das economias desenvolvidas pelos crditos, que visam a adequao s metas de Quioto, afirma Giza Martins, titular da AND. A opinio da especialista comprovada pelas estatsticas. A expectativa para o mercado de carbono que atinja os 500 milhes de dlares em dez anos. Os projectos das mini-hdricas, onde se espera instalar 52 unidades, e o dos sistemas fotovoltaicos isolados, por exemplo, representam um horizonte no MDL onde essas receitas financeiras podero fazer a diferena na viabilidade

novo centro de estudosInaugurado a 8 de Agosto o CETAC (Centro de Ecologia Tropical e Alteraes Climticas), visa desenvolver estudos e investigaes aplicadas para assegurar a melhoria da qualidade ambiental e da gesto da gua. O criao do novo centro permitiu a insero no mercado de trabalho de 42 jovens licenciados com especializaes em Engenharia Florestal, Engelharia Agronma ou Veterinria e estudantes do Instituto Superior Politcnico. Em declaraes imprensa, a ministra do Ambiente realou que o CETAC tem laboratrios com meios modernos para investigar a qualidade de gua e ir celebrar protocolos com universidades angolanas e outras instituies ligadas ao estudo das alteraes climticas.

a agricultura, e os projectos em prol da biodiversidade, como a reflorestao de reas degradadas. Outras iniciativas que valem crditos de carbono so os aterros sanitrios com captura de gs metano, o aproveitamento de biogs a partir da agricultura ou da compostagem de resduos slidos urbanos e a incinerao de lixo. Segundo um estudo do Banco Mundial, o mercado mundial de carbono movimentou 179 mil milhes de dlares em 2011. A Europa representa o maior mercado, enquanto frica tem menos de 1% do total. Segundo a revista The Economist, o MDL ajudou a reduzir 1000 milhes de toneladas de carbono em sete anos, atraiu 215 mil milhes de dlares em investimentos verdes para os pases em desenvolvimento e teve um impacto estimado

angola o terceiro pas do continente. projectos valem 24 milhes de toneladas por ano em crditos de carbono14 | EXAME SUSTENTABILIDADE 2012 | www.exameangola.com

AngolA AlterAes ClimtiCAs

o essenciAl sobre o MercAdo de cArbonoo que Surgiu a partir da criao da Conveno-Quadro das Naes Unidas sobre a Mudana Climtica (UNFCCC, em ingls), durante a ECO 92, no Rio de Janeiro. Em 1997, na reunio de Quioto, Japo, os pases signatrios concordaram em assumir compromissos mais rgidos para a reduo das emisses de gases que agravam o efeito estufa. Para que o documento, designado por Protocolo de Quioto, entrasse em vigor, deveria ser assinado por 55% dos pases responsveis por 55% das emisses, o que s aconteceu depois que a Rssia o ratificou em Novembro de 2004. O objectivo central que os pases limitem ou reduzam as suas emisses de gases de efeito estufa (GEE). quAnto vAleM As eMisses 1 tonelada de dixido de carbono (CO2) corresponde a um crdito de carbono que pode ser negociado no mercado internacional. A reduo da emisso de outros gases geradores do efeito estufa, tambm pode ser convertida em crditos de carbono, utilizando-se o conceito de carbono equivalente. Para ajudar os pases a alcanarem as suas metas de emisses e para encorajar o sector privado e os pases em desenvolvimento a contriburem para os esforos de reduo das emisses, o protocolo inclui trs mecanismos de mercado: o comrcio de emisses; a implementao conjunta de projectos; e o mecanismo de desenvolvimento limpo (veja ponto seguinte). o que o MecAnisMo de desenvolviMento liMpo Este mecanismo permite projectos de reduo de emisses em pases em desenvolvimento, que no possuem metas de reduo de emisses no mbito do Protocolo de Quioto. Estes projectos (em regra nos sectores energtico, transporte e florestal) podem ser transformados em redues certificadas de emisses (veja ponto seguinte), que podem ser negociados com os pases com metas de reduo de emisses definidas no Protocolo de Quioto. Um projecto s considerado elegvel se for aprovado pela Entidade Nacional Designada de cada pas. A funcionar desde 2006, este mecanismo j registou mais de mil projectos, que valem mais de 2,7 mil milhes de toneladas de CO2 equivalentes. o que so os crditos de cArbono Tambm chamados de reduo certificada de emisses significa simplesmente comprar uma permisso para emitir GEE. O preo, negociado no mercado, deve ser necessariamente inferior ao da multa que o emissor deveria pagar. Os crditos de carbono podem ser gerados em qualquer lugar do mundo e so auditados por uma entidade independente do sistema das Naes Unidas. onde podeM ser trAnsAccionAdos O Protocolo de Quioto, representa o mercado regulado, onde os pases possuem metas de redues a cumprir de forma obrigatria. Existe, por sua vez, um mercado voluntrio, onde empresas, ONG, instituies, governos, ou at cidados, tomam a iniciativa de reduzir as emisses voluntariamente. Alm destes dois tipos de mercado, outra forma de financiar projectos de reduo de emisses so os chamados fundos voluntrios, caso do Forest Carbon Partnership Facility, do Banco Mundial. Hoje o maior mercado mundial de comrcio de emisses o European Union Emission Trading Scheme (EU ETS) que abrange 11 mil empresas de 30 pases (os 27 da Unio Europeia, mais a Noruega, Islndia e Liechtenstein).Fonte: UNFCCC www.unfccc.int

projectos AuMentAM, MAs os preos desceMQuanto vale o mercado global dos crditos de carbonoPreo 25 20 15 10 5 02008 09 10 11 12 (em dlares)

Redues certificadas de carbono emitidas 1,0

(mil milhes)

0,8 0,6 0,4 0,2 0Fonte: The Economist /CDM Policy Dialogue.

do projecto, revela Giza Martins. Para se ter uma ideia da rentabilidade, se um projecto gerar uma substituio equivalente a 10 milhes de toneladas de carbono por ano, algo perto daquilo que far o projecto Angola LNG (avaliado em 12 milhes de toneladas de CO2) e multiplicarmos por um preo de 4,8 euros, isso significa contar com um montante de 48 milhes de euros por ano em recursos adicionais, completa. importante salientar que os lucros dos crditos pertencem a quem adopta a tecnologia limpa, sejam eles actores pblicos, privados, ou mistos. Outra vantagem

que, segundo a AND, a comercializao de crditos de CO2 adiciona entre 1% e 10% taxa de retorno sobre investimento. Estes factos levam a crer que Angola tem um grande potencial em termos de projectos elegveis, sobretudo no sector da energia. Ainda assim, o mercado olhado com desconfiana por alguns pases em desenvolvimento que vem no mecanismo uma licena para as naes ricas continuarem a poluir socorrendo-se da aquisio dos crditos em economias emergentes. Assim pensam alguns pases da Amrica Latina (Venezuela, Colmbia e Bolvia) que con-

corre directamente com frica na atraco de projectos. Outros argumentam que o mercado de carbono foi uma forma inteligente dos pases em desenvolvimento terem acesso s tecnologias limpas de vanguarda. Abias Huongo, responsvel do Ministrio do Ambiente pela rea das alteraes climticas, reconhece as virtudes do mercado de carbono, mas considera que os verdadeiros problemas do planeta s se resolvero quando os pases poluidores mudarem a sua matriz energtica. At l, Angola, como se v, j entrou a todo o gs na rota do carbono. h

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AngolA Polticas PblicasfeirA do AMbiente: Ponto de encontro do sector j vai na segunda edio

ColoCAndo o AMbiente nA AgendAOs ltimos quatro anos foram decisivos para a criao das principais polticas ambientais no pas. Em jeito de balano, o Ministrio do Ambiente Minamb, destaca a consolidao da lei de base do ambiente, o regulamento de avaliao de impacte ambiental e a criao da comisso multisectorial, medidas que trouxeram o tema para a agenda de todos os ministriosCssiA AyrEs

o

Ministrio do Ambiente relativamente jovem em Angola. Teve incio em 1992, ano que marca a 1. Conferncia das Naes Unidas para o Ambiente, realizada no Rio de Janeiro. Naquela poca, o Minamb era apenas uma secretaria de Estado e, ao longo da sua evoluo, chegou a partilhar funes com a rea das pescas e, mais tarde, com o urbanismo. Hoje, um Ministrio dinmico que tem ganho um protagonismo crescente no pas devido transversabilidade da sua actuao.

Nos ltimos quatro anos, s no quadro jurdico, foram criados 20 novos regulamentos dentro da lei de base do ambiente em reas consideradas estratgicas, como gua, resduos, biodiversidade, petrleo e clima. A preocupao das outras reas do Governo e da sociedade civil com o ambiente cresceu desde a criao da comisso multisectorial, em Junho de 2010. Ao todo, so mais de 15 instituies a discutir a relao das questes ambientais. A transversalidade a principal marca do Minamb. As informaes compartilhadas com outros sectores criam os pressupostos para o desenvolvimento sustentvel, onde cada um faz

a sua parte, resume Abias Huongo, responsvel pela rea das alteraes climticas. Na governao, os destaques esto na definio de estratgias para trs reas consideradas prioritrias para as polticas do Executivo que derivaram da participao de Angola na cimeira do Rio 92 a biodiversidade, as alteraes climticas e a desertificao onde novos mecanismos e programas esto a ser desenvolvidos. visibilidade internacional No circuito mundial da sustentabilidade, Angola, que outrora era um participante espectador, tambm tem tido uma posi-

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MAurA GuEvE

teMAS eM AgendA nA CoMiSSo MultiSeCtoriAl Estratgia nacional para as alteraes climticas. Plano estratgico para gesto de resduos urbanos. Plano de contingncia contra derrames de petrleo. Plano de contingncia contra derrames de petrleo no mar. Decreto presidencial sobre as substncias que empobrecem a camada do ozono. Regulamento sobre a qualidade da gua. Regulamento para preveno e controlo da poluio das guas nacionais. Relatrio nacional sobre sade e ambiente. Plano estratgico da rede nacional de reas de conservao.

...e reAS prioritriAS do MiniStrio

1

A novidade o Centro de Ecologia Tropical e Alteraes Climticas, inaugurado em Agosto, na provncia do Huambo. O novo centro investigar a qualidade do ar, gua, solo e os avanos de fenmenos com a desertificao e as alteraes climticas. A sua misso consiste em produzir e disponibilizar informaes ao Governo, comunidade cientfica e s empresas privadas que necessitam de dados desta natureza para desenvolverem as suas actividades. O centro tem uma parceria com a Universidade Jos Eduardo dos Santos, do Huambo.

QuAlidAde do AMbiente

3

Ainda em fase de estudos, o Minamb tem um projecto para a gesto de terras que visa promover a agricultura sustentvel. A iniciativa vai testar as prticas existentes e introduzir inovaes quanto a preveno da desertificao, o aproveitamento da gua e a reduo dos produtos qumicos txicos na agricultura. O Ministrio fez a implantao efectiva da conveno do Rio 92 no que se refere aos temas: Inventrio de emisso de gases de efeito estufa concludo em 2011. Estratgia nacional de alteraes climticas concluda em 2007. Estratgia nacional projectos da autoridade nacional designada em curso. Projecto de substituio de lmpadas de baixo consumo Em curso em Luanda, Hula e Benguela.

AgriCulturA SuStentvel

2

Durante os anos 90, houve um forte engajamento das organizaes no governamentais (ONG), caso do JEA e da Rede Mayombe, na sensibilizao da sociedade para o ambiente. Contudo, a falta de financiamento externo influenciou a qualidade e o alcance das aces de educao. O Ministrio reconhece que sem o apoio da sociedade civil ser difcil alcanar resultados e tem como meta redefinir os projectos de relevncia de forma a funcionar como um mediador junto dos agentes privados.

eduCAo AMbientAl

4

AlterAeS CliMtiCAS

o activa, com participao plena dos seus quadros em grupos de estratgicos de deciso. Neste momento, Angola preside ao Frum das Autoridades Nacionais Designadas, integra o grupo de peritos para a elaborao das comunicaes nacionais e do Plano Nacional de Adaptao s Mudanas Climticas. Todos relativos aos pases do Anexo 2 (pases emergentes sem obrigaes com o Protocolo de Quioto para a reduo de gases de efeito estufa GEE). No mbito das grandes cimeiras internacionais, vale a pena recordar que durante a Rio+20, Angola levou uma delegao com 70 integrantes que participaram em painis paralelos e representaram o pas num stand temtico. No seu discurso, o (na altura) vice-presidente Fernando da Piedade, defendeu a criao de uma agncia especializada do Ambiente na ONU, com poderes de execuo e autonomia superiores ao do Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). H um ano, na COP 17, na cidade de Durban, Angola discutiu as alteraes climticas e os efeitos para os pases africanos. Na opinio

o ministrio do ambiente Possui Poucos recursos financeiros. rePresenta menos de 3% do oramento geral do estadode Abias Huongo, Angola vai ao mundo para mostrar as suas potencialidades em recursos naturais e as suas estratgias para o crescimento sustentvel. Contudo, no nos podemos esquecer de que somos um pas africano e por este motivo ainda precisamos de ajuda externa para concretizar esse desenvolvimento. Mas se por um lado, h muito trabalho a ser feito por parte do Minamb, por outro, faltam receitas financeiras para aplicar os planos de aco que se pretendem. A fatia do Ministrio representa menos de 3% do Oramento do Geral do Estado. Somos os que menos dispe de recursos, o que infelizmente no um caso isolado no contexto global, afirma Kmia Vctor de Carvalho, directora Nacional do Ambiente. Para a responsvel o dilema entre realizar o urgente em detrimento do necessrio, influencia grande parte das decises dos gestores pblicos. No caso de frica, parece que sempre existiu um consenso sobre as verdadeiras prioridades das populaes. Oferecer gua, alimentos, habitao e educao s populaes so problemas que assumem maior urgncia se comparados com as questes do ambiente. A questo fundamental que todos esses problemas acabam por ser influenciados pelo ambiente. um assunto transversal sociedade. Abias Huongo no poderia estar mais de acordo: Este um Ministrio dinmico, no apenas pelo cenrio mundial que o inspira, mas pela maneira como todos reagimos a ele. Convm que esse esprito no se perca neste novo ciclo iniciado aps as eleies de Agosto. h

EXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspECiAl 2012 | 19

AngolA resduos

Por umA AngolA mAis limPAJ foi dado o pontap de sada para um Plano Estratgico de Gesto de Resduos Urbanos em Angola PESGRU que pretende reconstruir, capacitar e alargar as infra-estruturas fundamentais em todo o pas. Mais do que um nome sugestivo, o Programa Angola Limpa a meta do Executivo que repensa a cadeia produtiva dos resduos at 2025CssiA AyrEs20 | EXAME SUSTENTABILIDADE 2012 | www.exameangola.com

Aterro de mulenvos: Lixo de Luanda est concentrado num nico local

QuAnto ser investido no ProgrAmA2012-2017

Angola Limpa prev investimentos de 6 mil milhes de dlares at 20252018-2025 Mnimo Mximo

(em milhes de dlares)

Mnimo

Mximo

Custo da recolha indiferenciada (1) Alargamento do mbito da recolha indiferenciada (2) Recolha e deposio do passivo disperso Infra-estruturas de tratamento e deposio final Valor total de investimento(intervalo estimado por perodo)

1 428 875 25 161 1 061

2 166 1 334 50

1 904 3 264 25

2 888 4 971 50

1 383 1 545 4 672 6 404

ObserVaesXXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXX XXXXXXXXXXXXX

Estimativas baseadas em projeces de acentuado crescimento demogrfico (de 20 milhes para 29 milhes de habitantes) e econmico (14% ao ano at 2016 e 5% ao ano de 2017 a 2025). Custos unitrios da recolha assumidos nesta estimativa podero diminuir at 20% com a optimizao de prticas e a melhoria das infra-estruturas de base. Investimento em infra-estruturas pode diminuir em virtude de economias de escala e da consolidao de estruturas atravs dos planos provinciais de aco. Investimento apresentado no inclui: incinerao, recolha selectiva, capacitao do MINAMB e optimizao de infra-estruturas de base (exemplo: rede viria).(1) Assumindo a realidade actual. (2) Investimento adicional a somar ao actual custo da recolha indiferenciada em Angola, cujo valor total para 2012 se estima entre 240 milhes e 360 milhes de dlares/ano. Fonte: PRESGRU MINANB.

A

gesto dos resduos indicador de desenvolvimento das sociedades modernas e, ao mesmo tempo, um dos problemas mais complexos devido s suas repercusses ambientais e de sade pblica. O crescimento demogrfico e econmico coloca uma forte presso sobre o sistema de gesto de resduos urbanos que leve Angola a alcanar os objectivos de desenvolvimento do milnio e transforme o lixo em oportunidade de negcio com benefcios sociais. A situao actual preocupante. Segundo a Elisal, empresa angolana de recolha de resduos na capital, Luanda produz 5 mil toneladas de lixo diariamente (aproximadamente 1 quilo por habitante), o que coloca a cidade acima da mdia dos pases emer-

luanda produz 5 mil toneladas de lixo por dia (1 quilo por habitante), valor acima da mdia dos pases emergentesgentes na produo de lixo por habitante. O lixo colectado vai para o nico aterro sanitrio da cidade, o de Mulenvos. Mas o passivo restante acumulado nas ruas, onde milhares de indivduos convivem directa e diariamente com todos os perigos para a sade pblica que da advm. Se observamos o mesmo cenrio nas provncias, o nmero cai para 460 gramas por habitante, mas, segundo as projeces at 2025, a tendncia que o descarte passe para o dobro por habitante. Os nmeros advm da pesquisa realizada com as administraes provinciais em 80% do territrio nacional, juntamente com empresas que fazem a recolha de dados para a ONU. A boa notcia divulgada pelo Ministrio do Ambiente (Minamb) EXAME que a legislao que coloca em prtica o plano foi aprovada pelo Conselho de Ministros, em Julho, e deve entrar em vigor ainda este ano aps a apresentao da Comisso Multissectorial para o Ambiente que disseminar o tema para as outras instncias do Executivo.EXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspECiAl 2012 | 21

AngolA resduos

onde FiCAro os Centros de trAtAmentoRede de CTV * ter abrangncia nacional e uma implementao faseadaCentro/PlAtAFormA de triAgem

2017Aterro/vAlA sAnitriA

50% das capitais de provncia

2017

At 2022

Todas as capitais de provncia

Restantes capitais e em cidades com produo >70kton./ano

2022

APs 2022

Todas as sedes de municpio

nas restantes cidades

Centro/PlAtAFormA de ComPostAgem eCoCentro

2017

2017

Todas as capitais de provncia

Capitais de provncia com centro de triagem

2022

2022

Todas as sedes de municpio

Restantes capitais e em cidades com produo >70kton./ano* CTV (centros de tratamento e valorizao). Dimenso da rede pode ser optimizada com estaes/plataformas de transferncia.

O projecto contm o princpio dos trs R reduzir, reutilizar e reciclar que refora quatro eixos de aco: alargamento e optimizao da recolha indiferenciada; implementao do modelo de tratamento, de valorizao e de deposio dos resduos; recolha e deposio do passivo existente; e, por fim, o lanamento da recolha selectiva com a estruturao de fluxos especficos. Para o efeito, o plano prope aces de formao e sensibilizao, a construo de um modelo institucional e um outro modelo para o financiamento. Neste ltimo aspecto, entram em jogo, o aumento das dotaes do Executivo, a capitalizao de fundos internacionais, a entrada nos mecanismos de financiamento de carbono e um sistema tarifrio que garanta a sustentabilidade do sector. A face econmica do lixo A recuperao dos resduos para a gerao de energia e a promoo de uma indstria de reciclagem tambm esto nas ambies do Minamb com o PESGRU. Repensar a cadeia dos resduos ir potencializar as oportunidades do mercado do ambiente.

at ao fim de 2013, sero criados novos regulamentos e a autoridade nacional de gesto do instituto de resduosAs empresas que entrarem neste negcio vo ter o benefcio de implementar projectos prioritrios com o Governo, atravs de parcerias pblico-privadas, esclarece Kmia Victor de Carvalho, directora Nacional do Ambiente. A aplicao do programa ser faseada com o incio em 2017 e o final em 2025. Vai compreender a construo de aterros sanitrios, ecocentros, plataformas de triagem e de compostagem. No total, os investimentos andaro na ordem dos 6 milhes de dlares at 2025. Assim que o plano entre em operao, o Minamb quer dar um salto qualitativo no quadro legal e institucional com a aprovao do Regulamento Geral de Resduos e a constituio de uma Autoridade Nacional de Gesto do Instituto de Resduos, a concluir at ao final de 2013. Mas assegurar a eficincia do servio, com qualidade de cobertura e frequncia da recolha em todo o territrio angolano, tambm gerar novos custos. A taxa de recolha ir crescer e ser partilhada pelas provncias segundo critrios de zonas urbanas estruturadas (100%), zonas periurbanas (100%) e aglomerados das zonas rurais (80%) de acrscimo. Alm dos benefcios sociais e ambientais inerentes a gesto, o PESGRU refora o aspecto econmico quando prope inserir no mercado de trabalho, mais mo-de-obra especializada, incrementar a produo de energia e potencializar o sector turstico. Este conjunto de medidas daro uma nova cara ao Ministrio, os benefcios sero os mais visveis at aqui, refora Kmia. Revelar a outra face do lixo em Angola o todos esperam para ver. h

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angola BIODIVERSIDADE

Angola preside Iniciativa transfronteiria da floresta do Maiombe, que rene a RDC e o Congo. O plano para a conservao da biodiversidade at 2017 precisa de um investimento de 40 milhes de dlares. A FAO, Organizao das Naes Unidas para Alimentao e Agricultura, vai dar um ajudaFILIpE CArDoSo

Salvem o maiombeUnidas para Alimentao e Agricultura (FAO), que anunciou um apoio incondicional iniciativa. Estamos disponveis para apoiar este projecto, sobretudo nas reas de reforo das capacidades, de preservao e proteco assim como a gesto e o aproveitamento dos recursos florestais. Julgamos importante que as comunidades

P

rimeiro surgiu o apelo. a ministra do ambiente, Ftima Jardim, durante um encontro realizado em Luanda com a classe empresarial, representantes de rgo das Naes Unidas em Angola (como o PNUD e a FAO), alm dos representantes do sec-

tor pblico-privado e diplomatas, pediu apoios para a implementao da Iniciativa transfronteiria da floresta do Maiombe, que rene Angola e as repblicas do Congo e Democrtica do Congo (RDC). A resposta surgiu rpida por parte de Maria Helena Semedo, representante regional para frica da Organizao das Naes

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FloreSta do maiombe: Engloba Angola, RDC, Congo e Gabo e tem uma dimenso comparvel de 290 mil campos de futebol

decorrer estes ms em Doha (Qatar), na qual o plano estratgico quinquenal (2012 a 2017) ser apresentado. Ftima Jardim justificou o pedido dizendo que os esforos dos parceiros do projecto devem ser contnuos para que seja um exemplo em matria de preservao do ambiente. Acrescentou que Angola, que preside a esta iniciativa, continua empenhada para que os objectivos traados sejam uma realidade. O problema de fundo que o plano precisa de 40 milhes de dlares para cumprir as metas de proteco da biodiversidade. um plano em trs fases A estratgia traada prev a gesto sustentvel dos ecossistemas florestais do Maiombe, que, numa primeira fase, vai concretizar-se na zona florestal, no Baixo-Congo, incluindo a reserva do Uki, na RDC. A floresta do Maiombe, na provncia de Cabinda, na parte sul, e a dos dois Congos sero alvos de interveno ambiental na segunda fase do projecto. Por fim, a parte norte da floresta, entre a RDC e Gabo, ser revista na terceira. Recorde-se que desde a assinatura do memorando tripartido (Angola, RDC e Repblica do Congo), em 2009, que j foram efectuados estudos de viabilidade que determinam os corredores biolgicos e os instrumentos jurdicos que visam proteger a floresta do Maiombe, com uma dimenso comparvel a de 290 mil campos de futebol.

-se ao Parque Nacional de Cabinda, que est inserido na floresta do Maiombe. O projecto vai formar 45 fiscais, todos ex-militares, para o patrulhamento da zona. Acrescentou que a floresta do Maiombe um territrio importante para a promoo da economia verde, alertando, porm, que o conceito tem um foco diferente em frica, dado que assenta em prioridades como o bem-estar da populao, o acesso gua potvel e a infra-estruturas que promovem o desenvolvimento. Recorde-se que, segundo o Ministrio do Ambiente, 12,56% do territrio nacional j esto classificados como rea de conservao (parques ou reservas naturais). Destaque tambm para projectos em curso como o estudo e a proteco de espcies em vias em extino caso da palanca negra gigante, na provncia de Malanje e o levantamentos da flora nas provncias de Cabinda e Maiombe. Apesar do Plano Nacional da Biodiversidade ter sido aprovado em 2007, os responsveis reconhecem que ainda h muito a fazer para combater ameaas biodiversidade tais como a caa furtiva e a falta de conscincia ambiental da populao. Tal cenrio tambm visvel na floresta tropical do Maiombe, tal como alerta a organizao Mundial para a Conservao da Natureza, (IUCN). Alm da caa ilegal com intuitos comerciais, existem outras ameaas diagnosticadas pela organizao,

A CAA fuRtivA E A fAltA DE ConsCinCiA AmbiEntAl DAs populAEs so os GRAnDEs inimiGos DA pRotECo Dos ECossistEmAs floREstAis Do mAiombEAgostinho Chicaia, o coordenador do projecto transfronteirio, afirmou Angop, que est tudo pronto para o estabelecimento e ligao das cinco reservas ou parques existentes na zona verde dos trs pases, que alimentada pela bacia do Congo e constituda por rvores com mais de 50 metros. Estas zonas em Angola, vo ligartais como a caa de sobrevivncia, a degradao da prpria floresta, o conflito sempre latente entre o homem e o animal, a falta de cultura de educao ambiental, o uso insustentvel da terra ou as obras relacionadas com a minerao. Tudo razes de sobra para que o alerta de Ftima Jardim seja ouvido: Salvem o Maiombe. h

sejam inseridas nas vrias fase do projecto, afirmou e aluso s mais de 1 milho de pessoas, sobretudo agricultores de subsistncia, que vivem e dependem da riqueza natural da floresta do Maiombe. Agora falta saber o que pensam os participantes da 18. Conferncia das Naes Unidas sobre as Alteraes Climticas, a

dEsiREY MiNKoH / AFp

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AngolA Sociedade civil

Por umA juvEnTudE mAis EcologicA CssiA AyrEs

Durante os anos 90, um grupo de jovens foi pioneiro do movimento da sociedade civil pela preservao do ambiente. A Juventude Ecolgica Angolana fez de um assunto ainda pouco conhecido no pas, uma causa de vida para centenas de jovens. O seu trabalho j foi reconhecido com o Prmio Ambiental Global 500 da ONU

E

nquanto muitos jovens da sua idade pensavam no Mussulo como destino de praia e na Ilha do Cabo como fonte de diverso nocturna, estes jovens tinham algo diferente em mente. Eles reuniam-se aos fins-de-semana em campanhas de limpeza e de plantao de rvores nas praias do Mussulo e da Ilha. Cerca de dois anos depois, j eram um grupo organizado com mais de 200 voluntrios que se dividiam em aces de sensibilizao ambiental nas comunidades e nas escolas. Assim foram sendo delineados os princpios e as metas daquilo que hoje a principal ONG ambiental no pas. A Juventude Ecolgica Angolana (JEA) foi constituda oficialmente em 1991 e cedo ganhou notoriedade devido ousadia das suas aces e capacidade de engajamento voluntrio da juventude. Ao regressarem da Cimeira da Terra, na Rio 92, o grupo tinha como meta a educao ambiental dos jovens como forma de sensibilizar o resto da populao a partir de boas prticas. A estratgia tinha de ser atractiva junto do

pblico. Caso contrrio no haveria adeso. Por isso, pensmos em fazer actividades divertidas e cativantes, tais como programas de rdio e jogos educativos, resume Jos Silva, representante da organizao. Foi dessa ideia que nasceu o primeiro programa radiofnico ambiental em Angola criado em 1995 e denominado Telefone Verde, feito pela Rdio LAC. O programa que era exibido semanalmente, com o formato de uma hora de durao, inclua debates, curiosidades, notcias e denncias dos abusos cometidos ao meio ambiente (a sua rubrica mais polmica e popular). Outro momento marcante para a histria da educao ambiental em Angola foi a realizao entre 1999 a 2004 do concurso interescolar denominado Olimpadas do Ambiente, realizado nas provncias de Lunda, Hula e Benguela. O projecto envolveu, anualmente, mais de 2 mil jovens estudantes do ensino mdio de escolas pblicas e privadas e teve como lema Conhecer para Conservar. Consistia no desenvolvimento de vrias actividades tericas e

prticas volta do ambiente. Como resultado, os participantes passavam a integrar a JEA e a tornarem-se novos activistas e educadores ambientais. Ambos os projectos tornaram-se referncias, tanto a nvel nacional como internacional , salienta Jos Silva com indisfarvel orgulho. Trabalho de formiguinha A partir de 1996, a JEA entrou num ciclo de actividades de formao de formadores em metodologias de educao ambiental. O que antes parecia no ter resultados aparentes, tomou corpo quando o conhecimento chegou s escolas, outras ONG parceiras, instituies governamentais, igrejas, os meios de comunicao social e a sociedade civil em geral. um processo quase invisvel, mas que surpreende quando feito por muitas mos, sintetiza. A fora e entusiasmo destes jovens pioneiros fez com que a JEA conte actualmente com mais de 1500 membros voluntrios, desde estudantes a trabalhadores, e tem delegaes em oito provncias do pas: Ben-

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com EsPriTo dE misso: jovens estiveram na Feira do ambiente a fazer pedagogia

a juventude ecolgica angolana conta com mais de 1500 membros voluntrios desde estudantes a trabalhadores e est presente em oito provnciasguela, Cabinda, Cunene, Hula, Kwanza-Sul, Lunda, Malanje e Namibe. Tem ainda representaes, atravs de ncleos dinamizadores, na Lunda-Norte, Cuando-Cubango e Zaire (este em reactivao). Mas a organizao atingiu o seu ponto mais alto quando em 2002 teve o seu trabalho reconhecido mundialmente com a atribuio do Prmio Ambiental Global 500 do Programa das Naes Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Da em diante, alcanou voos mais altos internacionalmente. Hoje, a JEA membro da Unio Internacional para a Conservao da Natureza (UICN/IUCN) e da Associao de Educao Ambiental da frica Austral (EEASA), CNJ Conselho Nacional da Juventude, Plataforma das Organizaes Juvenis Angolanas e membro fundador da Rede Maiombe (o frum das organizaes ambientais em Angola), alm de participar em vrios acordos, protocolos e convenes em todo o mundo. medida em que ampliava o seu raio de aco, aps duas dcadas de trabalho, a JEA tambm alcanou a diversificao da sua rea de trabalho que alm da educao ambiental, advocacia e lobby, actua tambm na investigao, pesquisa e divulgao em questes transversais como o associativismo e participao, HIV/SIDA, direitos humanos e combate pobreza. O financiamento e o apoio material so garantidos por parceiros no Ministrios da Juventude e Desporto, do Ambiente e da Educao, governos provinciais, Conselho Nacional da Juventude, Embaixada da Sucia (atravs da ASDI), Grupo frica da Sucia, Instituto Holands para frica Austral (NIZA), alm de inmeras empresas privadas atentas responsabilidade social ambiental. A mais recente actividade pblica da JEA ocorreu durante a Feira do Ambiente, realizada em Maio deste ano, em Luanda. A organizao criou um stand com dez membros que circularam durante os dias da feira pelo pavilho da FIL para abordar expositores e visitantes sobre a temtica ambiental. Foi como que um exrcito de formigas, laboriosas e determinadas, a pedir passagem rumo a uma juventude angolana mais saudvel e ecolgica. h

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AngolA cultura

O trabalho da artista angolana Daniela Ribeiro tem estado ligado aos desperdcios tecnolgicos e sua reutilizao. Depois da estreia, em 2009, com a exposio de mscaras Tchokwe futuristas, far em Janeiro uma reinterpretao dos smbolos nacionais a partir de telemveis usados. Mal esperamos para ver...Jaime Fidalgo28 | EXAME SUSTENTABILIDADE 2012 | www.exameangola.com

E sE do lixo sE fizEssE ArtE?

FoTos: pEdro pinA

trAdio E modErnidAdE: Mscaras tribais adornadas com desperdcios tecnolgicos foi a base da primeira exposio. Agora, a artista foi desafiada a reinterpretar os smbolos nacionais

A

artista plstica daniela ribeiro, tal como tantos angolanos, tem dois passaportes: o de Portugal e o de Angola. Paradoxalmente no nasceu em nenhum deles, mas, sim, em Moambique (Nampula), para onde o pai, Lus Ribeiro, tinha sido enviado para uma misso temporria. Daniela ficou por l at ter 1 ano de idade e nunca mais voltou. As suas origens e, mais importante do que tudo, o seu corao, sempre estiveram aqui. Daniela faz parte de uma quinta gerao de angolanos, espalhada pelas provncias de Luanda, Huambo, Uge e Benguela.

A filha cresceu na capital, na fase quente, at aos 12 anos. Era uma eximia desportista aos 9 anos j era nadadora profissional do Petro. Foi uma infncia inesquecvel. Passei pelas modas todas. Fazamos natao at que a piscina sofria um rombo e amos todos para o xadrez. Depois faltavam as peas que vinham da Unio Sovitica e amos para o tnis. Tambm experimentei a ginstica rtmica. Faltava tudo em Luanda, por isso tnhamos de ser inventivos e construir os nossos prprios brinquedos a partir do que encontrvamos nossa volta, recorda. Outra memria que retm o fascnio pelas matrias-primas. O pai, engenheiro mecnico de

formao, chegou a ser vice-ministro das Indstrias Pesadas. Passei a minha infncia nas fbricas, resume. Tambm recorda com nostalgia a escola de artes plsticas e de trabalhos manuais do Barraco. Foi l que aprendi a mexer com o barro, com as colas. Todas estas influncias seriam decisivas na sua carreira como artista plstica. Desde pequena que pegava em coisas que encontrava na rua para fazer esculturas. Mas no foi menos importante a sua abertura para o mundo. que Daniela, tal como sucedeu com tantos angolanos da sua gerao, foi estudar para o exterior. Como havia feito o Liceu Francs em Angola a escolha

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AngolA cultura

recaiu sobre um colgio interno em Lyon (Frana), onde viveu at aos 16 anos. No foram momentos fceis. Eu era alvo de piadas por vir de Angola e falar portugus. Mas a cultura francesa at acabou por me marcar nalgumas coisas. Ao nvel do pensamento filosfico ou dos grandes ideais dos direitos humanos, por exemplo. Seguiu-se Portugal onde, em 1993, fez um curso de Design, Imagem e Criao por Computador e, em 1998, se licenciou em Relaes Internacionais. Estagiou no Centro de Estudos Europeus e passou pelo Ministrio da Economia e o Gabinete da Presidncia da Repblica portuguesa. As coisas at no lhe corriam mal, mas o trabalho administrativo no era a sua praia. Era um mundo diferente do meu. Demasiado elitista. Eu vinha de Angola onde ramos todos camaradas. Nada me apaixonava. Nada vinha do corao, justifica. A opo de se tornar artista, sempre desaconselhada pelos pais, s foi tomada aos 30 anos. Comeou quase por acaso. Houve uma altura em trabalhei na organizao de eventos. Mal dava por mim j estava a construir e a decorar as salas. Quando arranjei

coragem para me despedir, resolvi pintar quadros. Comecei por aguarelas, acrlicos e leos. O meu processo era intuitivo. Funcionava por tentativa e erro. Fechava-me em casa e experimentava mexer em tudo at acertar. A sua primeira exposio foi um sucesso. Em duas horas, vendi tudo. As pessoas gostavam daquele experimentalismo e dos padres e traos africanos. Daniela, no entanto, tambm investiu na sua formao. Em 2000, frequentou o curso de Pintura da Sociedade Nacional de Belas Artes e, em 2006, o curso de Escultura na ARCO. No mesmo ano, especializou-se em Moldes de Resina e Silicone na Escola Pascal Rosier, em Paris. No fundo, andava a fazer coisas que j tinha aprendido no Barraco, diz divertida. uma ascenso meterica A sua carreira, embora tardia, teve uma ascenso meterica. Desde 2002 que passou a expor em diversas galerias e espaos nobres como o Convento do Beato, em Lisboa. Em 2005, participa na Feira Art de Madrid e nesse ano convidada para criar quatro obras para o meditico restaurante Terreiro

do Pao, em Lisboa (mais tarde, criou painis para o trio de entrada do grupo Rentipar ou da sede do Banco Mais). tambm em 2005 que cria o Artin Park, uma associao sem fins lucrativos que apoia artistas em incio de carreira. Trs anos depois, a convite da Italian Motors, muda-se para o Spazio Dual, um espao de 1000 metros quadrados na Avenida da Repblica. Leva consigo 11 artistas de reas distintas como as artes plsticas, joalharia, fotografia, moda, graffiti, design, pintura, Web e vdeo. uma espcie de incubadora que promove o intercmbio com jovens talentos de outras nacionalidades. O projecto foi vantajoso para todos. Ns ganhmos um espao fantstico e os nossos artistas deram vida ao show-room de automveis, justifica. Hoje, a Artin Park tem outro espao no Beato, vocacionado para a escultura. A Praa Martins Moniz, o Casino de Lisboa e as Olaias (graas a um protocolo com a Cmara Municipal de Lisboa que deseja revitalizar os bairros sociais) so locais em vista para galerias. Daniela Ribeiro tambm quer replicar o conceito, em Luanda, no comboio do Miramar.

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dAniElA ribEiro: Os painis base de resina, inspirados nas imagens do telescpio Hubble, foram expostas em Londres, durante os Jogos Olmpicos

Importa referir que durante todo este perodo a artista nunca quebrou os laos com a terra. Mas a primeira exposio individual em Angola s surgiu em 2009, no Edifcio Escom, com o apoio da Fundao Sindika Dokolo. Chamada Unicidade do Tempo apresentou mscaras tribais africanas (Tchokwe) adornadas com jias feitas a partir de peas de telemveis, ecrs, chips, teclados, auriculares e fios, numa combinao nica de tradio e modernidade. Esta ideia da reutilizao muito africana. Existe uma tradio de se aproveitar tudo, refere. No ano seguinte, a Fundao Portuguesa de Comunicaes pediu-lhe um ensaio artstico sobre o futuro das tecnologias de informao. Daniela Ribeiro aceitou o desafio e criou um projecto composto por 14 olhos binicos, criados a partir de componentes electrnicos de 2 mil telemveis. Daniela Ribeiro considera que o seu estilo se insere na corrente do surrealismo cientfico. um movimento que est para a pintura como a fico cientfica est para o cinema, esclarece. Foi tambm nessa linha que lanou a exposio Sun, Moon and

A IDEIA DA REUTILIZAO DE MATERIAIS MUITO AFRICANA. EXISTE UMA CULTURA E UMA TRADIO DE SE APROVEITAR TUDOEarth, patente na prestigiada Art Gallery londrina, em plena Cork Street, durante os Jogos Olmpicos deste ano. Fiquei muito orgulhosa de ter os meus painis expostos na ala do Rodin, em frente famosa escultura O Beijo, diz. As obras gigantescas de Daniela Ribeiro (com 2 por 2 metros de dimenso) foram inspiradas em imagens da Terra vistas do telescpio espacial Hubble e vendidas a investidores do Reino Unido, Estados Unidos e Hong-Kong. Feitas base de resinas, transportam-nos para um mundo encantando feito das cores do pr-do-sol e o azul cristalino dos oceanos. Os painis foram inspirados nas minhas memrias de infncia e nas tonalidades da cultura visual africana, confessa. Os prximos desafios da artista tero novamente Luanda como palco. Em Novembro, ter uma obra no leilo anual da Cruz Vermelha (um embondeiro feito com base em peas de telemveis). Em Janeiro, far uma exposio para o BAI Arte que a desafiou a reinterpretar smbolos nacionais como a esttua do Pensador, a rosa-de-porcelana ou a beleza da mulher angolana. A EXAME ainda no viu as obras, mas conhece a matria-prima: dois contentores de telemveis usados cedidos pela Unitel. A escolha propositada. A tradio da comunicao oral sempre foi uma caracterstica dos povos africanos, justifica. Para o futuro, a artista deixa um desejo e um sonho. O desejo que as empresas angolanas, impulsionadas pela nova lei do mecenato cultural, reforcem a sua aposta na cultura. O sonho que se crie um museu de arte contempornea. algo que existe em todas as capitais progressistas do mundo. Porque no em Luanda?, questiona. h

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FoTos: ricArdo quArEsMA viEirA

opinioEufrazina paiva AmbientAlistA e pArlAmentAr, FundAdorA dA AssociAo embondeiro

angola,

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istockphoto

um pas rico Em capital vErdE

a

ngola, como a maior parte dos estados africanos, um pas muito rico em recursos naturais, cuja maior parte desta explorao est muito aqum das suas possibilidades. Florestas, mares, bacias hidrogrficas, mangais e outros biomas esto hoje a ser mais valorizados no mundo inteiro, tendo como base os servios ecossistmicos que prestam economia, na gerao de bens e servios, mas sobretudo manuteno da vida saudvel no planeta. Com a contnua degradao da biosfera, comeamos a ensaiar uma nova forma de explorao sustentvel desses recursos, tendo em vista estender a sua manuteno, garantindo o melhor aproveitamento, em especial daqueles que no so renovveis. Esto a, por exemplo, o REDD (Reducing Emissions from Deforestation and Degradation), que valoriza os ecossistemas florestais e o Cradle to Cradle (bero ao bero) que repensa o ciclo de produo da indstria, preservando recursos logo partida e gerando menos resduos. Numa outra perspectiva, foi criado em 2010, durante a COP 16, no Mxico, o chamado Fundo Verde, onde 194 naes acordaram transferir um montante de 100 bilies de dlares anuais aos pases em desenvolvimento. Os valores que estaro disponveis em 2020 pretendem mitigar efeitos das mudanas climticas em pases com maior vulnerabilidade. Em ambos os casos, seja em estratgias para preservar ou em mitigar efeitos humanos no ambiente, as naes declararam uma inteno precisa de avanar no sentido de valorizao da biodiversidade numa forma mais oficial e universal de finanas. O que as economias mais desenvolvidas apoiadas pelo Banco Mundial e o FMI esto a ensaiar a incluso do capital verde nos oramentos pblicos, tarefa a ser exercida pelos mecanismos institucionais. Insere-se a o conceito da economia verde como um novo modelo de desenvolvimento sustentvel que traz na base o conhecimento da economia ecolgica. Segundo o Programa das Naes Unidas para o Ambiente (UNEP), ela resulta em melhoria do bem-estar e equidade social,

reduzindo significativamente os riscos ambientais e a escassez ecolgica. A sua caracterstica mais marcante em relao ao modelo vigente a avaliao directa do capital natural e servios ecolgicos quantificados e qualificados em valor monetrio (capital verde) e um regime de contabilidade de custo total em que os custos externos para a sociedade atravs de ecossistemas so rastreados e contabilizados como passivos da entidade que faz o mal ou negligencia um activo ambiental. O capital verde oferece uma gama de servios essenciais para a sociedade e que outrora eram considerados commodities sem qualquer valor acrescentado. Ele tambm pode ser quantificado com base naquilo que o homem investiria para substituir o servio que a natureza lhe prestou gratuitamente. Se tomarmos como exemplo as zonas pantanosas saudveis, veremos que elas passaram a ser valorizadas por serem fonte de gua natural purificada, bem como a proteco contra as enchentes e captao de dixido de carbono. Em Angola, as florestas ocupam cerca de 35% do territrio nacional e a sua importncia fundamental manuteno de um ambiente saudvel e no poludo, pois as suas razes ajudam a evitar a eroso do solos e manter preservados os lenis freticos e regular o clima. Alm disso, elas assumem importncia econmica com impactos na gerao de rendimento das populaes quando inclumos a extrao sustentvel da madeira, a silvicultura e a medicina tradicional. Os recifes de corais esto estimados entre 172 mil milhes e 375 mil milhes de dlares por ano. Estes cumprem servios como a pesca, manuteno da biodiversidade marinha e o turismo. O mesmo vale para os mangais e os rios que acrescentam valor econmico e social s comunidades ribeirinhas. Angola precisa atribuir o verdadeiro valor aos seus recursos naturais. Somos um pas de riquezas no aproveitadas. O sector financeiro precisa estabelecer um compromisso ambicioso e comear a incluir o capital verde no Oramento Geral do Estado. Isso permitir o seu uso mais eficiente e sustentvel e a garantia de que futuras geraes possam gozar de bem-estar e incluso social. h

ANGOLA PRECISA DE ATRIBUIR O VERDADEIRO VALOR AOS SEUS RECURSOS NATURAIS. SOMOS UM PAS DE RIQUEZA NO APROVEITADAEXAME SUSTENTABILIDADE Edio EspEciAl 2012 | 33

entrevista jeffrey sachs

menos conversa e mais ~o acaPara o famoso economista americano Jeffrey Sachs, encontros como a Rio+20 s beneficiam advogados e diplomatas. Ele diz que a fase de discutir j passou. Agora tempo de se colocar os projectos em prticaMAriAnA sEgAlA

H quem culpe o crescimento econmico pelos problemas ambientais. Isso faz sentido? A ideia de que precisamos de travar a economia para no agredir o ambiente est errada. A reduo da pobreza depende do progresso econmico. Mas preciso desvincular o crescimento da destruio da natureza. H quem diga que combinar as duas coisas no possvel, pois o uso de recursos naturais cresceu nas ltimas dcadas e no podemos prescindir deles. Creio que no devemos olhar para trs, mas, sim, para a frente. bom lembrar que, para os pases pobres, o crescimento uma questo de vida ou morte. Eles precisam de apoio para adoptar tecnologias novas, mais caras e que conservem os ecossistemas. Alm da tributao sobre as emisses de carbono, defendo que os pases de altos rendimentos paguem pelas suas emisses, criando um fundo global que financie os pases pobres. Investimentos desse tipo podem ser parte da sada para a crise. vivel propor essa medida num momento de crise econmica? verdade que os polticos no gostam de falar de novos impostos. Os americanos so alrgicos a essa palavra como se percebeu na recente campanha presidencial. Sei que as minhas sugestes esto fora da agenda poltica, mas a verdade que a estratgia actual no resulta. Quando a crise se abateu sobre os Estados Unidos, em 2008, o consumo caiu. Para o retomar, alguns defenderam cortes de impostos, outros sugeriram benefcios especiais. Sempre achei que nenhuma delas funcionaria porque os consumidores esto endividados. Defendi que apostssemos numa retoma baseada em investimentos em tecnologias limpas, com um horizonte de dez anos. Infelizmente, o Presidente Barack Obama optou por estmulos de curto prazo. Estamos com a economia estagnada, sem consumo e sem um plano de investimento.

s

obram advogados e faltam engenheiros. Esse , em resumo, o problema de conferncias como a Rio+20 e de outros eventos que se propem a discutir solues para as questes ambientais, na viso do americano Jeffrey Sachs, um dos mais prestigiados economistas actuais, professor da Universidade Columbia, em Nova Iorque. Para ele, a preocupao central desse tipo de encontros deveria ser como tornar as energias alternativas (nomeadamente a elica e solar) comercialmente viveis e no produzir documentos de centenas de pginas com ideias sobre como salvar o planeta.

Conselheiro da Organizao das Naes Unidas (ONU), Sachs est frente dos Objectivos do Milnio, um projecto criado em 2000 para reduzir a pobreza no mundo. Ele orgulha-se da simplicidade da iniciativa: h oito metas, que podem ser descritas numa folha de papel. Nem tudo o que est escrito foi colocado em prtica, mas houve alguns avanos importantes. Segundo os dados da ONU, o nmero de pobres j caiu para metade. Obviamente, que a acelerao do crescimento econmico nos pases emergentes foi essencial. A humanidade gosta de progresso, claro. Mas preciso crescer, sem destruir a natureza, disse ele em entrevista EXAME.

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orjAn F. EllingvAg/corbis/lAtinstock

os pases ricos devem pagar pelas emisses de carbono, criando um fundo global para financiar os mais pobres

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entrevista jeffrey sachs

MArkEl rEdondo/pAnos

A boa notcia que pases como os BRIC (Brasil, Rssia, ndia e China) hoje so muito mais poderosos economicamente. H mais naes para liderar esse esforo. Qual deveria ser a prioridade? necessrio desenvolver tecnologias que nos permitam crescer, usando menos combustveis fsseis, que representam 80% do consumo global de energia. H duas alternativas: ou usamos mais as energias limpas, como a elica e a solar, ou capturamos o carbono emitido quando consumimos combustveis fsseis em vez libert-lo no ambiente. Qual a correcta? No sabemos.

E no se muda da noite para o dia a forma como abastecemos os carros ou aquecemos as casas. Mas preciso comear por algum lado. Entrmos numa fase perigoso das alteraes climticas. Os estragos vo piorar mais rapidamente se no agirmos. E j v alguns sinais de mudana? Sim, mas caminhamos de forma lenta. Eventos como a Rio+20 tm demasiada conversa e pouca aco. H 20 anos, na Eco92, assinmos um bom acordo para enfrentar as mudanas climticas. Consagrmos o conceito de desenvolvimento sustentvel. Discutimos de forma consis-

tente como conciliar desenvolvimento econmico com preocupaes ambientais. S que o documento, a Agenda 21, tinha centenas de pginas de intenes. Muito extenso, muito complicado. Na prtica, no ajudou a mudar nada. Um sistema com base em acordos leva os problemas para o nvel da negociao. Desde ento houve encontros em Cancum, Copenhaga ou Durban, onde diplomatas que no conhecamos discutiram durante dias. E as solues ficaram sempre para o ano seguinte. Esse sistema est a beneficiar advogados e diplomatas. Mas ns precisamos de engenheiros capazes de solucionar problemas quotidianos.

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gerao de energia elica na provncia chinesa de gansu: H iniciativas para a produo de combustveis alternativos em diversos pases; o desafio tornar esses modelos economicamente viveis

nas primeiras eleies, obama disse que a questo climtica era uma prioridade. desta vez, nem mencionou o assuntoPerdemos 20 anos? Sim, e no podemos perder mais 20. Porque no se criam objectivos do desenvolvimento sustentvel, nos moldes dos objectivos do milnio, lanados em 2000. As pessoas percebem que algo est errado. H mais secas em certos lugares, enquanto noutros as inundaes aumentam. Mas os governos j no falam disso. Nesta campanha Obama nem sequer abordou a questo climtica, embora tenha chegado Casa Branca a dizer que isso seria prioridade. Como tornar as energias alternativas economicamente vantajosas? Faltam investimentos. J existem iniciativas interessantes. H veculos elctricos com piloto automtico que, com base em coordenadas de GPS, so mais eficientes em termos energticos do que os guiados por motoristas. Na maioria dos pases, no h impostos que repassem aos consumidores o custo, em poluio e mudana climtica, do uso de combustveis fsseis. Se fossem cobrados 4 dlares por tonelada de carbono emitida pelos pases ricos, e uma parte desse valor aos pases em desenvolvimento, seria possvel arrecadar cerca de 100 mil milhes de dlares por ano. Isso certamente favoreceria a mudana h

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Global Sia

judith shapiro, da american university: Se a China no parar de poluir, o resto do planeta sofrer

A maior autoridade sobre o meio ambiente chins, a americana Judith Shapiro, diz que o pas est a exportar os seus problemas, e o mundo pagar por issoLuizA DALMAzo

uma factura made in chinapor produtos made in China, os preos caram o que, nalguns casos, ajudou a controlar a inflao , mas tudo isso teve um custo. Para a antroploga americana Judith Shapiro, directora do Programa de Recursos Naturais e Desenvolvimento Sustentvel, da American University, em Washington, a principal vtima do pro-

e

m apenas duas dcadas, a china saiu de uma situao de quase irrelevncia no cenrio econmico para o posto de maior potncia industrial do mundo, responsvel por quase 20% da produo global. As lojas e os supermercados de todos os continentes foram invadidos

gresso chins foi o meio ambiente. Este o tema do seu ltimo livro Chinas Environmental Challenges (Os desafios ambientais da China, numa traduo livre). A sua nsia por matrias-primas e as suas fbricas poluentes esto a deixar marcas que extrapolam as fronteiras do pas, diz Judith, na entrevista exclusiva EXAME.

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para outros lugares. As emisses de gases da China e das suas empresas no exterior no so um problema exclusivo dos chineses, mas de todo o planeta. Os pases desenvolvidos tambm fizeram o mesmo no passado. Poluir no um direito da China para tambm crescer? Parte do governo defende que o pas pode seguir o mesmo modelo de industrializao que os pases do Ocidente adoptaram no passado. H vrias razes para isso. Apesar dos progressos das ltimas dcadas, a China ainda tem milhes de pobres. Por outro lado, manter o crescimento econmico e o sonho da ascenso social uma garantia para se evitar os protestos sociais. Dado o histrico dos pases ricos na rea ambiental e a situao poltica chinesa, muitos membros do Partido Comunista sustentam que o pas poderia passar por uma etapa de poluio para depois se limpar. Esse caminho possvel? Infelizmente, no. Essa lgica j no funciona hoje. Existem substncias novas e muito mais txicas do que no passado. bem possvel que no se consiga limpar amanh o que hoje se suja. Quando se destri um ecossistema, se mata um rio ou se deposita lixo nuclear numa regio, no d para a recuperar depois. Hoje, o ar j est to poludo que milhes de chineses no se sentem saudveis. Todos se perguntam se existem formas de desenvolvimento que combinem crescimento e sustentabilidade. O mundo est a tentar encontrar solues. E a China no pode ficar de fora. A China a lder mundial em produo de painis solares e turbinas elicas. Poderemos esperar uma transio para um modelo menos poluente? O impacto ambiental desse esforo menor do que parece. A China ainda depende muito da queima de carvo, que gera graves problemas ecolgicos. A expectativa para os prximos anos que o pas continue a emitir grandes quantidades de dixido de carbono. O problema que, para cada notcia boa sobre energias limpas na China, h muitas outras desanimadoras. h

Qual a real dimenso dos danos ambientais na China? Vinte das 30 cidades mais poludas do mundo esto na China, principalmente devido ao uso intensivo de carvo. Cerca de 75% dos rios e lagos do pas esto to sujos que a gua salobra, inclusivamente para a utilizao agrcola. Cerca de 560 milhes de moradores das reas urbanas chinesas respiram ar com uma qualidade inaceitvel. Estima-se que 750 mil pessoas morrem anualmente devido a questes relacionadas com a poluio de alimentos. A populao chinesa est a ficar cada mais consciente deste problema. Num regime autoritrio como o chins ser que essa insatisfao popular se pode traduzir em mudanas concretas? Alguns sectores do governo j pe