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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DEPUTADO FEDERAL MEMBRO DO CONSELHO DE ÉTICA E DECORO PARLAMENTAR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA, Deputado Federal, por seus procuradores e advogados, vem, nos autos do processo nº 04/05 (Representação nº 38/05), em trâmite neste Egrégio Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, expor e requerer o que segue: 1. Ao término do presente processo disciplinar, após a oitiva de relevantes testemunhas e a juntada de inúmeros documentos, ficou claro que o Deputado José Dirceu não cometeu a grave acusação contida na representação, nem tampouco praticou qualquer ato que ofendesse o decoro parlamentar. A seguir, após exposição da questão preliminar, será feita uma breve leitura das provas produzidas, que demonstram, com segurança, que esta representação deve ser arquivada.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DEPUTADO FEDERAL ...JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA, Deputado Federal, por seus procuradores e advogados, vem, nos autos do processo nº 04/05 (Representação

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DEPUTADO FEDERAL MEMBRO DO

CONSELHO DE ÉTICA E DECORO PARLAMENTAR DA CÂMARA

DOS DEPUTADOS.

JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA,

Deputado Federal, por seus procuradores e advogados, vem, nos autos do

processo nº 04/05 (Representação nº 38/05), em trâmite neste Egrégio

Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, expor e requerer o que segue:

1. Ao término do presente processo disciplinar,

após a oitiva de relevantes testemunhas e a juntada de inúmeros documentos,

ficou claro que o Deputado José Dirceu não cometeu a grave acusação

contida na representação, nem tampouco praticou qualquer ato que ofendesse

o decoro parlamentar.

A seguir, após exposição da questão preliminar,

será feita uma breve leitura das provas produzidas, que demonstram, com

segurança, que esta representação deve ser arquivada.

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2. Preliminarmente:

Consta da representação que os atos irregulares

teriam sido praticados pelo Requerente “enquanto licenciado dessa Casa para

exercer as funções do cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil do Presidente da

República”(grifamos), ou seja, enquanto estava licenciado do exercício de seu

mandato nos termos do Art. 56, I, CF c/c o art. 235, IV, do RICD.

O Código de Ética e Decoro Parlamentar da

Câmara dos Deputados é expresso em se destinar, exclusivamente, aos “que

estejam no exercício do cargo de Deputado Federal” (grifamos), como consta no seu

Art. 1º:

“Art. 1º. Este Código estabelece os princípios éticos e as

regras básicas de decoro que devem orientar a conduta

dos que estejam no exercício do cargo de Deputado

Federal”.

Parágrafo único. Regem-se também por este Código o

procedimento disciplinar e as penalidades aplicáveis no

caso de descumprimento das normas relativas ao decoro

parlamentar.” (grifamos).

Portanto, como os atos imputados ao

Requerente teriam sido praticados fora do exercício do mandato parlamentar,

trata-se de matéria não afeita a competência deste Egrégio Conselho de Ética

e Decoro Parlamentar, em razão do princípio constitucional da separação dos

Poderes.

O princípio constitucional da separação dos

Poderes impede que um mesmo indivíduo exerça funções em mais de um

Poder, simultaneamente. Por conta disso, o parlamentar que assume cargo de

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Ministro de Estado afasta-se obrigatoriamente de toda e qualquer função

ligada ao exercício de seu mandato eletivo.

O exercício de cargo ou função em um dos

Poderes determina a submissão integral ao regime jurídico correspondente,

também em razão do princípio da separação dos Poderes. Tal regime é

composto por um conjunto próprio de garantias, impedimentos e formas de

responsabilização. Esses elementos são moldados e justificados, em cada

caso, pela relação de instrumentalidade que guardam com o exercício de

determinada função pública. Não são, portanto, atributos pessoais do agente.

O Supremo Tribunal Federal já manifestou esse

entendimento em relação às garantias, reconhecendo que o congressista

licenciado não goza das imunidades parlamentares.1 De igual maneira, ao não

gozar das garantias, não pode o Deputado ser submetido a procedimento de

investigação de decoro e ética se não estava no exercício do mandato.

É inegável que os Poderes Executivo e

Legislativo apresentam suas próprias hipóteses de sancionamento, regras de

competência e normas procedimentais. Dessa forma, a inobservância do

regime jurídico adequado, além de contrária ao princípio da separação dos

Poderes, viola também o princípio do devido processo legal, com destaque

para alguns de seus principais corolários, tais como as garantias do juiz

natural e da ampla defesa.

Tais conclusões não são afastadas no caso de

exoneração do agente público, seguida de ingresso ou reingresso em cargo

submetido a regime jurídico diverso. A regularidade das condutas praticadas

no desempenho de determinado cargo deve ser apurada segundo o1 Inquérito n. 140-0/RS, Min. Djaci Falcão: “O deputado que exerce a função de Minis tro deEstado não perde o mandato, porém não pode invocar a prerrogativa da imunidade,mater ial ou processual , pelo cometimento de cr ime no exerc ício da nova função ”

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correspondente regime jurídico, que abrange um sistema próprio de controles

internos e externos.

É inconstitucional, portanto, a instauração de

processo de cassação do mandato de Deputado Federal, por suposta quebra de

decoro parlamentar, em razão de condutas praticadas no exercício do cargo de

Ministro de Estado. A cassação de mandato pela Casa Legislativa, embora

envolva um juízo político, é disciplinada por normas jurídicas, como todos os

atos de exercício do poder em um Estado de direito.

Essa conclusão foi encampada por notórios

especialistas no assunto, referidos em matéria publicada no jornal “O Globo”

do dia 3 de agosto de 2005:

“A responsabilidade do agente público se dá em função

do cargo que ele está exercendo. A Constituição prevê

mecanismos diferentes de sanção para parlamentares e

agentes públicos do Executivo, que estão sujeitos a

processo de crime de responsabilidade, que leva à perda

do cargo e à inabilitação para o exercício de qualquer

função pública por um período de tempo. São dois

regimes jurídicos distintos e não se pode responder pelo

mesmo fato duas vezes.” (Luiz Roberto Barroso,

professor de direito constitucional da UERJ – grifamos).

“Estando afastado das funções de deputado, não há

como falar em quebra de decoro.” (José Eduardo

Alckmin, ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral –

grifamos).

“Com relação aos fatos que são objeto do Conselho de

Ética, não é possível falar em eventual penalização de

José Dirceu porque ele não era deputado quando os

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fatos se deram. Mas se concluídas as CPIs, se houver

algo contra ele, a comissão deve recomendar ao órgão

competente, o Supremo Tribunal Federal, que o

processe.” (Ricardo Penteado, especialista em direito

eleitoral – grifamos).

“Ele não estava atuando como deputado, por isto pode

escapar de outras acusações e manter o mandato.”

(Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral,

grifamos).

Não por acaso, os três precedentes citados pelo

parecer da Consultoria Legislativa da Câmara são completamente inaplicáveis

ao presente caso, conforme já demonstrado na defesa acostada em fls. 83/104

do 1º volume desta representação.

Portanto, a presente representação não reúne

condições nem sequer para ser julgada, por reportar-se a supostos fatos que

teriam sido praticados fora do exercício do mandato parlamentar.

3. Da acusação:

O Partido Trabalhista Brasileiro, em sua

representação, acusou o Deputado José Dirceu de obter recursos junto aos

Bancos Rural e BMG, “em conluio com o Secretário de Finanças do Partido dos

Trabalhadores – PT, DELÚBIO SOARES” (grifamos) e com a intervenção de

Marcos Valério.

A finalidade da ação do Requerente era “de

pagar parlamentares para que, na Câmara dos Deputados, votassem projetos em favor

do Governo” (grifamos).

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Em razão de “comprar” Deputados para fraudar

votações, o Requerente teria infringido o Art. 4º, inciso IV do Código de

Ética e Decoro Parlamentar, que assim dispõe:

“IV – fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular

andamento dos trabalhos legislativos para alterar o

resultado de deliberação;” (grifamos).

Antes mesmo que se encerrasse a instrução

probatória, o ex-Deputado Roberto Jefferson, autor das denúncias contra o

Requerente, foi cassado. O motivo: proferiu irresponsáveis acusações com a

pérfida “intenção de desviar o foco das atenções do Representado, para outros políticos

e ainda denegrir a imagem do Poder Legislativo” (processo disciplinar nº 1/05, grifamos).

Segundo este Egrégio Conselho, o ex- Deputado

Roberto Jefferson abusou do “discurso que lhe valeu a notoriedade do momento”

para “defender interesse privado seu ao apresentar tais denúncias, pretendendo apenas

tirar de si mesmo – principal personagem envolvido no escândalo de corrupção dos

Correios – o foco das atenções públicas, direcionando-as para outros políticos e

parlamentares” (idem, grifamos).

Em face da precariedade da acusação, o Partido

Trabalhista Brasileiro, autor da representação, requereu a extinção do

presente processo disciplinar. Portanto, como se verá a seguir, a acusação

deve ser julgada improcedente, não apenas pela sua indecorosa concepção,

mas, principalmente, por restar comprovada sua falsidade, em todos os seus

termos, merecendo o repúdio deste Egrégio Conselho.

4. Da compra de votos e parlamentares:

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A acusação pretende cassar o Requerente pelo

ato de “fraudar, por qualquer meio ou forma, o regular andamento dos trabalhos

legislativos para alterar o resultado de deliberação” (grifamos). Seu suposto conluio

com Delúbio Soares, para arrecadar fundos junto aos Bancos e Marcos

Valério, teria a compra de votos como finalidade.

No seu ponto vital, fracassa a acusação, pois a

compra de votos não foi detectada neste processo disciplinar e nem mesmo na

Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Compra de Votos, especialmente

instaurada para esta apuração.

Reproduzindo o panorama geral das

investigações, o Deputado Federal Eduardo Campos acertadamente

concluiu que não houve compra de parlamentares ou de votos:

“O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - O que eu

posso dizer é que eu não tenho nenhum elemento, como a

instituição Câmara dos Deputados não tem, que

comprove a existência. O que se comprovou

efetivamente até agora foram empréstimos para

financiamentos de campanha que não estão declarados

no TRE ou no TSE.” (pág. 35, grifamos).

Os resultados das CPMIs indicam, seguramente,

que não existiu compra de votos, e que os recursos se destinavam ao

financiamento de campanhas eleitorais. Como expôs o Deputado Federal

Arlindo Chinaglia, os repasses de verba tratavam-se de uma questão

meramente eleitoral e partidária, que “não tinha nada a ver com a governabilidade”

(pág. 46, grifamos).

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5. Uma grande evidência de que não houve

compra de parlamentares ou de votos, está na intensa dificuldade encontrada

pelo Governo para aprovar seus principais projetos.

Esta Casa é testemunha de que os processos de

votação ocorreram de maneira democrática e com os embates de praxe, sem

qualquer indício de irregularidade. Testemunhos neste mesmo sentido

também foram fornecidos no presente processo disciplinar:

“O SR. DEPUTADO ALDO REBELO - Todas as

matérias aprovadas aqui o foram num processo

prolongado e às vezes doloroso de negociação com a

própria base do Governo e com a Oposição. Só

aprovamos as 3 emendas constitucionais - a

desregulamentação do art. 192, que trata do sistema

financeiro, com mais de 400 votos -, quando nem o

PMDB estava na base do Governo ainda. Na reforma da

Previdência, na reforma tributária, alguns aqui

acompanharam as negociações exaustivas. E, durante

esse período, eu nunca ouvi, nem de Deputado nem de

jornalistas, qualquer referência a pagamento para

Parlamentares votarem a favor do Governo.” (pág.16,

grifamos).

“O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Nós só

aprovamos os projetos mais polêmicos a partir de

mediação, de mudanças que foram operadas na proposta

original remetida ao Congresso pelo Poder Executivo, o

envolvimento de Governadores, no caso da reforma da

Previdência, dos fóruns de Prefeitos. Ou seja, tudo o que

nós aprovamos de relevante, ao longo do ano de 2003,

passou por um intenso processo de negociação interno,

dentro dos nossos partidos, que tinham muitos

questionamentos sobre a matéria, como também com os

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partidos da Oposição, que tinham até mais identidade

com as reformas propostas do que nossos próprios

partidos. Nós, portanto, se observarmos o resultado

dessas votações, vamos ver que elas foram operadas a

partir de um amplo processo de negociação política,

acompanhado, de forma intensa, pela imprensa e por

todos os agentes políticos.” (pág. 4, grifamos.)

A acusação pressupõe que o Governo, na figura

do ex-Ministro Chefe da Casa Civil, comprava votos de parlamentares para

fraudar votações. Conforme comprovado, isto nunca ocorreu, e, indo além dos

limites da acusação, percebe-se que o Requerente não teve qualquer

participação ou mesmo ciência dos repasses de verbas feitos por Delúbio

Soares.

6. Os financiamentos eleitorais irregulares e a

participação ou ciência do Requerente:

Provou-se que o repasse irregular de verbas não

tinha relação com a compra de votos, não buscava assegurar a

governabilidade e não partia do Governo. Restringia-se ao setor financeiro do

Partido dos Trabalhadores, na pessoa de seu tesoureiro, Delúbio Soares.

Chega-se, então, ao outro ponto fundamental da

acusação, que é o suposto “conluio” entre o Requerente e “o Secretário de

Finanças do Partido dos Trabalhadores – PT, DELÚBIO SOARES” (grifamos).

Em todas as oportunidades em que foi ouvido,

Delúbio Soares afirmou que o ex-Ministro-Chefe da Casa Civil não tinha

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participação ou mesmo ciência de suas atividades. Não há nenhuma prova em

contrário e, ademais, as evidências colhidas comprovam esta afirmação.

Em primeiro lugar, deve-se notar que os repasses

somente ocorreram durante o período em que o Deputado José Dirceu já não

ocupava nenhum cargo no Partido dos Trabalhadores, estando no exercício da

função de Ministro-Chefe da Casa Civil. A atuação no Poder Executivo

exigia enorme dedicação, impossibilitando qualquer tentativa de interferência

na vida orgânica e financeira do Partido dos Trabalhadores.

A inviabilidade de uma atuação na vida

partidária foi fartamente comprovada pela prova testemunhal:

“O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - Não, não

tenho informação de que ele exercesse essa relação,

mesmo que informal. E acredito que até pelas

atribuições de um Ministro-Chefe da Casa Civil, elas

são quase que incompatíveis com a vida e a rotina de

um partido político da dimensão do Partido dos

Trabalhadores.” (pág. 3, grifamos).

“O SR. DEPUTADO ALDO REBELO - Principalmente

nas funções que eu já exercia como Deputado e depois

como Ministro, eu, pelo menos, dificilmente sei como

funciona a estrutura, por exemplo, do meu partido. Essa

atividade que nós desempenhamos, V.Exa. sabe disso, ela

absorve. Nós somos quase escravos dos nossos eleitores,

a cada dia, e com muita razão, mais exigentes das nossas

funções na Câmara dos Deputados, das Comissões que

nós integramos - permanentes, temporárias, transitórias

-, das conversas com as bancadas do Estados, das

conversas dentro das nossas próprias bancadas. É uma

luta muito grande o exercício do mandato parlamentar. E

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acho que as funções do Executivo, pelo menos pela

minha experiência, também demandam a energia e o

tempo dos integrantes do Executivo, como dos

integrantes do Legislativo, a não ser que eles tenham

funções específicas dentro dos seus partidos.” (pág. 10 e

11).

“As atividades desempenhadas pelo deputado José

Dirceu à frente da Casa Civil exigiram-lhe uma carga

horária muito alta. Não foram raras as vezes em que

terminamos reuniões de trabalho depois das 22h ou

começamos antes das 8h. De forma que é difícil

imaginar que o deputado pudesse exercer qualquer

outra função diferente daquela à qual era incumbido

como Ministro Chefe da Casa Civil.” (MINISTRO

MÁRCIO THOMAS BASTOS, pág. 456, grifamos).

“O SR. DEPUTADO ARLINDO CHINAGLIA - Eu

acho que é plenamente possível que ele não soubesse.

Até porque na função, no início do Governo, durante um

ano, como Ministro da Casa Civil e ao mesmo tempo

coordenador político, era uma sobrecarga de trabalho,

imagino, bastante grande, para além disso ficar ali

bisbilhotando e cuidando da administração do PT. Existe

uma relação formal no PT. Pode ser que nem todo mundo

tenha a dimensão, mas seguramente alguns têm.” (pág.

23, grifamos).

O ex-Presidente do Partido dos Trabalhadores

elucidou, definitivamente, que o ex-Ministro Chefe da Casa Civil não se

ocupava das questões financeiras do partido e tampouco teria condições para

isso:

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“O SR. JOSÉ GENUÍNO - Eu quero deixar bem claro

que o Ministro José Dirceu não interferia na vida

interna do partido. Respeitava o funcionamento e as

decisões da Executiva. Ele participava quando tinha

reunião do Diretório Nacional. Tinha uma relação

política, como dirigente nos debates, nas resoluções do

Diretório Nacional. Em relação ao funcionamento, em

relação ao dia-a-dia do partido, ele não tinha

interferência. Não tinha interferência e ele respeitava,

numa relação comigo - além de ser do mesmo partido,

nós temos uma relação de longa data, que explicitei aqui

-, uma relação de muito respeito. E a agenda que

ocupava a Casa Civil era uma agenda tão intensa, tão

cheia de problemas para resolver que os problemas do

partido, em termos de funcionamento, não entravam

nessa agenda. Portanto, era uma relação política

intensa, em torno da agenda da relação do partido com

o Governo.” (pág. 28 e 29, grifamos).

Logo, é incontroverso que o ex-Ministro Chefe

da Casa Civil não atuava, de qualquer forma, na vida financeira do PT e

tampouco sabia dos repasses feitos por Delúbio Soares.

Buscando derrubar esta sólida constatação,

alguns opositores do Requerente outorgam-lhe ilimitados poderes no

Governo e no Partido dos Trabalhadores. Assim, pretende-se suprir a falta de

provas com um simplório argumento: não seria possível que o “todo

poderoso” ex-Ministro Chefe da Casa Civil não soubesse dos atos de

Delúbio Soares.

Além de absolutamente inconsistente, tal

argumento foi derrubado pelas testemunhas ouvidas. Seja no Governo ou no

Partido dos Trabalhadores, o Requerente manifestava democraticamente suas

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opiniões, estando sujeito a vitórias e derrotas, sem nunca demonstrar controle

ou autoridade sobre seus pares:

“O SR. DEPUTADO ALDO REBELO – (...) Nem

sempre a base conseguia fazer valer seu ponto de vista e

nem sempre o Ministro José Dirceu conseguia valer seu

ponto de vista. Aliás, principalmente, era do próprio

Partido dos Trabalhadores. Lembro-me de muitas

reuniões em que fechávamos o acordo na base e só ficava

faltando o PT. E o Pellegrino dizia: “O PT ainda não

decidiu. O PT ainda vai deliberar”. Porque era a maior

bancada, para alguns dos Deputados não era algo fácil

votar determinadas matérias que o Governo defendia.

Nós, às vezes, chegávamos já perto do plenário e o PT

ainda discutindo. Às vezes o Ministro José Dirceu ficava

mais do lado do PT, às vezes ficava mais do nosso lado.

Era muito difícil fazer as matérias serem aprovadas aqui.

Era um parto muito doloroso. Superministro criou-se,

talvez cultivado pelo próprio traço de personalidade do

Ministro José Dirceu, porque é uma coisa também que

difere um pouco da formação e da geração. O Ministro

José Dirceu foi um homem forjado na clandestinidade,

nos aparelhos clandestinos, para sobreviver à ditadura.

O traço da personalidade do Deputado José Dirceu é

mais da sua formação na clandestinidade. E isso, talvez,

levou a se criar uma aura de mistério, de superpoderes

que não existiam porque ouvi, muitas vezes, nas

reuniões de coordenação, as teses e as opiniões do

Deputado José Dirceu serem derrotadas . E quem

mandava no Governo, sempre quem mandou, cioso de

sua autoridade, era o Presidente Lula, é o Presidente

Lula. Vi, muitas vezes, o Presidente Lula concordar e

apoiar propostas do Ministro José Dirceu e, muitas

vezes, o Presidente Lula discordar e fazer coisas

completamente diferentes das do Deputado José Dirceu.

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E a prova de que esses superpoderes não existem ou não

existiam foi a emenda da reeleição. Tinha como um

Ministro superpoderoso, com o Presidente da Câmara,

com o Presidente do Senado apoiando uma tese e essa

tese não ser vitoriosa, com o apoio inclusive, da emenda

do nobre Deputado Benedito de Lira, derrotada? (Risos.)

” (pág. 22, 23 e 24, grifamos).

“O SR. JOSÉ GENUÍNO - Teve momentos em que ele

foi minoria, teve momentos em que ele ganhou com

poucos votos, e teve momentos em que ele era

Presidente do PT e foi um período em que a bancada

teve mais autonomia na relação com a Executiva

Nacional. E ele era o Presidente do partido, e eu convivi

nesse período. Portanto, eu acho que a maneira de fazer

política, qualquer um entre nós, independente de partido,

tem seu estilo próprio de fazer política.” (pág. 50,

grifamos).

“O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - O

Ministro José Dirceu que nós Congressistas conhecemos

tem uma presença muito forte, é um militante que

acumulou muita experiência, teve uma presença muito

destacada na campanha presidencial, na organização do

partido, da campanha do Presidente Lula. Como

Ministro da Casa Civil, da articulação, um Ministro que

está na vitrine. Então, criou-se toda uma compreensão

de que ele tinha uma presença muito maior do que a

presença real. Claro que ele tinha uma presença

destacada, forte. Mas eu vi várias questões que não

puderam ser...que as posições do Ministro José Dirceu

não foram vitoriosas” (pág. 11, grifamos).

O Requerente é reconhecido e respeitado por

seus 40 anos de vida pública e democrática, merecendo sua importância

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política. Nega a realidade quem lhe imputa responsabilidades indevidas, sob o

pretexto de que “nada poderia ser feito sem sua autorização”.

Como se demonstrou, nunca existiu o alegado

“conluio” entre o ex-Ministro Chefe da Casa Civil e Delúbio Soares,

conforme peremptoriamente negado por este último. Provou-se que o

Requerente não participava e nem sequer tinha condições para acompanhar

as atividades financeiras do Partido dos Trabalhadores. Por fim, verificou-se a

real dimensão da atuação do Deputado José Dirceu, indicando que membros

de seu partido agiam independentemente de sua autorização ou ciência.

7. Da obtenção dos recursos:

Como visto, foi afastada a hipótese de conluio

entre o ex-Ministro Chefe da Casa Civil e Delúbio Soares. Por óbvio, cai

também outra essencial premissa desta representação, de que o Requerente“levantou fundos junto ao Banco Rural e Banco de Minas Gerais – BMG, tomados sob

intervenção e responsabilidade de MARCOS VALÉRIO” (grifamos).

De fato, tanto Marcos Valério quanto os

representantes dos Bancos Rural e BMG negam qualquer participação do ex-

Ministro-Chefe da Casa Civil nos empréstimos.

Marcos Valério não foi ouvido perante esse

Egrégio Conselho, impedindo a produção de prova sob o crivo do

contraditório e ampla defesa, mas em depoimento prestado na CPMI da

Compra de Votos, em 9 de agosto, negou que tivesse mantido qualquer

contato com o Requerente acerca de empréstimos:

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“A SRª ZULAIÊ COBRA (PSDB – SP) – ... porque

precisamos saber de onde surgiram esses esquemas?

Alguém bolou isso, alguém arquitetou?

O SR. MARCOS VALÉRIO FERNANDES DE SOUZA

– Não, com o Ministro José Dirceu, eu não tratei sobre

esse assunto. Eu vou colocar os meus encontros com o

Ministro José Dirceu. Seria leviano da minha parte falar

que eu tratei esses assuntos com o Ministro José

Dirceu, porque eu não tratei, mas eu vou colocar para

você todos os meus encontros. (...) (grifamos).

Em relação aos representantes dos Bancos Rural

e BMG, o ex-Ministro-Chefe da Casa Civil manteve poucas reuniões, em

comportamento extremamente habitual para seu cargo.

Os membros desta Casa certamente sabem que

não há nada de anômalo no fato de um Ministro-Chefe da Casa Civil receber

empresários, conforme bem exposto pelas testemunhas:

“O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS - O

Ministro-Chefe da Casa Civil pode receber no seu

gabinete investidores, da mesma forma que outros

Ministros recebem. Na Casa Civil tem uma sala de

situação. Ou seja, se vem um grande investidor ou algum

grande empresário brasileiro procurar tratar com o

Governo para fazer investimentos, eu acho que o

Ministro-Chefe da Casa Civil, como qualquer outro

agente público - o Presidente do BNDES, o Presidente do

Banco do Brasil ou o Ministro do Desenvolvimento

Econômico -, deve receber.” (pág. 29, grifamos).

“O SR. DEPUTADO ALDO REBELO - Sabemos que

na política todo mundo trata de tudo. Eu recebia visitas

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de pessoas querendo discutir questões da saúde, da

educação, do transporte, do esporte, da energia nuclear,

de tudo no mundo. As pessoas querem discutir com os

políticos, com quem pode ouvi-los, ouvir uma opinião,

uma tese. É natural que na política seja assim, ainda

mais na Casa Civil, pela importância que tinha o

Ministro José Dirceu, por ser a Casa Civil a instância

que consolida projetos, decretos, medidas que

disciplinam assuntos do Governo, do Poder Executivo.

Eu considero isso muito natural.”(pág. 63 e 64,

grifamos).

Além disso, os testemunhos comprovam que são

falsas as afirmações de que, em reuniões do Requerente com essas

instituições financeiras, empréstimos concedidos ao Partido dos

Trabalhadores teriam sido discutidos. O representante do Banco BMG negou,

de forma pública e notória, qualquer envolvimento do Requerente. Inquirida

por este Egrégio Conselho, a representante do Banco Rural, Kátia Rabello,

também foi taxativa ao afirmar que jamais tratou com o ex-Ministro-Chefe

da Casa Civil sobre os empréstimos concedidos ao Partido dos

Trabalhadores:

“O SR. DEPUTADO JÚLIO DELGADO - E nesse

jantar ou nesse encontro, mesmo se tratando de outros

assuntos, como a lavra, como a questão do Banco

Mercantil de Pernambuco foi tratada ou discutida a

questão da dívida do PT com o banco?

A SRA. KÁTIA RABELLO - Não. Em nenhum dos 2

encontros, nós tratamos das dívidas. Nem, nem eu, nem

meu diretor. Nós não tratamos desse assunto.” (pág. 13,

grifamos).

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Tal qual as acusações da compra de votos e

conluio com Delúbio Soares, a alegação de que o ex-Ministro Chefe da Casa

Civil fosse o avalista ou tivesse qualquer relação com os empréstimos é

absolutamente improcedente e desprovida de fundamentação. Da mesma

forma que não discutiu ou solicitou empréstimos aos bancos.

Disse Marcos Valério em depoimento na CPMI

da Compra de Votos, em resposta ao ilustre relator, deputado Ibrahim Abi-

Ackel:

“O SR. MARCOS VALÉRIO FERNANDES DE

SOUZA - (...) Agora, se o senhor me perguntar, com toda

a sinceridade: o aval do Sr. José Dirceu foi dado a você?

Eu falo que não, mas foi confirmado por mim pelo Sr.

Delúbio Soares” (grifamos).

8. Do favorecimento aos Bancos:

Para atestar a suposta atuação do Requerente, a

acusação contida na representação exige, ainda, a comprovação do suposto

favorecimento do Governo aos Bancos Rural e BMG.

Inicialmente, é necessário destacar que não é fato

que as citadas instituições financeiras tenham sido beneficiadas pelo governo.

No tocante ao Banco Rural, indagou-se sobre um

possível favorecimento no aumento das aplicações dos fundos de pensão. Em

seus questionamentos, o Deputado Federal Carlos Sampaio analisou um

fundo de pensão específico (Petros), que teria iniciado suas aplicações no

Banco Rural somente após a concessão dos empréstimos.

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Na resposta de Kátia Rabello, interessa notar

que, de uma análise mais abrangente, compreendendo os investimentos feitos

por todos os fundos de pensão no Rural, houve diminuição em relação ao

Governo passado:

“A SRA. KÁTIA RABELLO – (...) A gente tem algum

problema com a questão do sigilo, de mandar isso, mas

me parece que a gente poderia fazer um somatório

considerando o somatório dos fundos ligados ao

Governo Federal durante o Governo passado e durante

este Governo. Essa proporção, ele se manteve assim...

Houve, parece, que uma mínima queda. Ou seja, ela se

manteve igual. Então, observando de uma maneira

geral a aplicação dos fundos no Banco Rural de um

Governo para o outro, existe uma manutenção da

relação.” (pág. 53, grifamos).

Em relação ao Banco BMG, especulou-se que o

favorecimento estaria no fato da instituição financeira ter lucrado com o

produto “crédito consignado” e obter credenciamento para operar junto ao

INSS.

Contudo, é notório que o Banco BMG é o

pioneiro no produto “crédito consignado”, vendendo-o desde 1998, quando

lançou carteira exclusiva para funcionários públicos. Desde então, é corrente

no mercado financeiro que o BMG ocupa a liderança deste produto, sendo

considerado pelas demais instituições financeiras como "o melhor banco em

crédito consignado do país"2.

2 Banco Itaú, Sr. Francisco Canepa, jornal Valor Econômico, 10.12.04.

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Pelo seu histórico com o “crédito consignado”,

os lucros e a posição destacada do BMG não despertam estranheza, pelo

contrário, apenas indicam a normalidade das regras de mercado.

9. Dos outros itens suscitados:

Ao final da presente instrução processual resta

comprovada, apenas e tão-somente, a inocência do Requerente. Não são

verdadeiras nenhuma das suposições levantadas pelo PTB, feitas

originariamente pelo ex-presidente do partido e ex-Deputado Roberto

Jefferson que, reitere-se, foi cassado pela Câmara dos Deputados por ter

feito acusações levianas e sem provas.

Inicialmente, provou-se que o Requerente, então

Ministro Chefe da Casa Civil, não participava da vida orgânica, partidária e

financeira do Partido dos Trabalhadores, de maneira que não autorizou ou

participou dos atos envolvendo Delúbio Soares e Marcos Valério Fernandes

de Souza, como aliás os mesmos declaram em depoimentos prestados nas

CPMIs em curso no Congresso Nacional.

Em relação à referência nos autos a Maria

Ângela Saragoça, restou comprovada também a total isenção do Requerente

no episódio, seja por meio de depoimentos ou por meio de declarações à

imprensa dos envolvidos. Maria Ângela Saragoça, publicamente, detalhou

com minúcias o ocorrido e negou a participação do Requerente, tanto na

aquisição do imóvel quanto do emprego. Em uma manifestação pública,

afirmou que o Requerente não teve nenhuma influência no contato com

Marcos Valério e que se considerada usada pelo mesmo. Sua declaração é

esclarecedora:

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"No segundo semestre de 2003 procurei meu ex-

marido, José Dirceu, para conversar sobre a

necessidade de mudarmos, nossa filha Joana e eu, para

um apartamento maior. Ele me disse que não estava em

condições de ajudar naquele momento, colaborando na

aquisição do novo imóvel ou ampliando o valor mensal

da pensão. Não desisti da idéia e comecei a procurar um

outro emprego, com o objetivo de resolver o problema

com recursos próprios. Sou psicóloga e exerço a

profissão desde 1979, atendendo em meu consultório e

contratada também pela Universidade Federal de São

Paulo. Vários dos meus amigos tinham conhecimento

da situação -entre eles, o sr. Sílvio Pereira, que conheço

há mais de 20 anos. Em setembro de 2003 encontrei-o

em companhia do sr. Marcos Valério, a quem fui

apresentada. Conversamos sobre minha situação

profissional e o publicitário mineiro se colocou à

disposição para me indicar alguma empresa que

eventualmente necessitasse de meus serviços. Também

disse que tinha contatos se eu precisasse de

financiamento para a compra do novo apartamento.

Recebi um convite do BMG, em outubro, para realizar

uma entrevista de admissão. Após os procedimentos de

praxe, fui contratada como a segunda psicóloga do

Departamento de Recursos Humanos da filial paulista.

Trabalho na empresa desde 3 de novembro de 2003, em

regime de meio expediente, na função de analista de

recursos humanos. Desde então atuei em diversos

programas e atualmente dou assistência psicológica a

funcionários do banco e seus familiares em meu

consultório. O novo emprego permitiu a renda

adequada para que eu me credenciasse a créditos

imobiliários. Além disto, coloquei à venda o

apartamento em que morava e meu carro. A idéia era

complementar o valor do novo imóvel com

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financiamento bancário. Vendi meu antigo

apartamento em novembro ao sr. Ivan Guimarães,

também petista, para servir de residência à sua mãe.

Quando fui passar a escritura, recebi a informação de

que seria outro o efetivo comprador, a quem fui

apresentada na hora, o sr. Rogério Tolentino. Com a

venda do imóvel e do único automóvel que tinha,

consegui parcialmente o valor necessário para o

apartamento que queria comprar. A diferença, de R$ 42

mil, foi financiada em 36 parcelas junto ao Banco

Rural, com a alienação do próprio imóvel, por

indicação do sr. Marcos Valério. Os custos da escritura

foram pagos através de um empréstimo de R$ 5.000 no

Banco do Brasil, regularmente concedido a

funcionários públicos. Estes são os fatos. As transações

citadas estão todas declaradas em meu imposto de

renda. Alguns detalhes, na época, me fugiram à

atenção. Apenas hoje, por exemplo, vim a saber que o

sr. Tolentino é advogado e sócio do sr. Marcos Valério.

Até recentemente, antes da crise em curso, acreditava

que o sr. Marcos Valério era amigo de amigos e

disposto a ser solidário, como muitos que conheci no

ambiente petista. Agora me dou conta que fui usada por

este senhor, que tinha interesses próprios e

provavelmente visava comprometer o ex-ministro José

Dirceu. Quero, por fim, esclarecer que em nenhum

momento meu ex-marido interferiu ou teve

conhecimento das minúcias da compra do imóvel. Os

encaminhamentos que adotei são de minha inteira

responsabilidade e foram conduzidos da maneira

autônoma pela qual sempre geri minha vida. Ontem

[anteontem] à noite, quando relatei a José Dirceu os

detalhes desta situação, o fiz com muita tristeza e

consternação, pois tenho consciência que posso ter sido

um instrumento para abalar sua imagem pública."

(grifamos).

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O advogado Rogério Lanza Tolentino e Ivan

Guimarães, demais personagens que participaram da compra e venda do

imóvel, também excluíram publicamente o Requerente de qualquer

participação no episódio.

No tocante à questão levantada nos autos

referente aos contatos do então Ministro Chefe da Casa Civil com as citadas

instituições financeiras, é necessário destacar que nada foi apurado que possa

suscitar quaisquer dúvidas em relação à lisura de tais atos. O Requerente e as

testemunhas reiteraram, de modo cristalino, a improcedência das alegações de

supostas irregularidades.

Por fim, não bastasse o fato de o Requerente

enfrentar a inversão do ônus da prova - uma flagrante agressão aos direitos

fundamentais do cidadão e aos fundamentos jurídicos do país -, viu-se ele

obrigado a rebater acusações infundadas como a que citou Roberto Marques.

Os supostos “documentos” citados revelaram-se suspeitos na medida em que:

“a) não guardam nexo com os saques e a movimentação bancária; b) as

assinaturas de autorização não conferem com o padrão das demais

autorizações; c) não consta entre os papéis outro documento que confirme a

condição de sacador pela pessoa supostamente autorizada”, como bem

destacou o Deputado Carlos Abicalil, membro da CPMI dos Correios.

O ex-Ministro-Chefe da Casa Civil também foi

acusado de interferir ilicitamente no processo de nomeação de cargos em

estatais, com a finalidade de montar estrutura onde fosse possível o desvio de

recursos públicos.

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Durante a instrução, as testemunhas esclareceram

a verdade, explicando que cabia a cada Ministro coordenar a indicação de

cargos próprios de seus ministérios. A Casa Civil cumpria um papel

institucional e burocrático de checar as indicações, verificando eventuais

impedimentos. Nesse sentido, em uníssono, declaram as testemunhas:

“O SR. DEPUTADO JÚLIO DELGADO - A

participação do Deputado José Dirceu na distribuição ou

na indicação desses cargos era fundamental?

O SR. DEPUTADO ALDO REBELO - Quem decidia,

em última instância, era cada Ministro, a quem a Pasta

ou a função estava subordinada. Ele era quem decidia. E

naturalmente decidia dentro de critérios, que eram os

critérios daqueles que tinham condições de preencher

política e tecnicamente os requisitos para ocupar esses

cargos.” (pág. 13 - grifamos).

“O SR. DEPUTADO ORLANDO FANTAZZINI -

Então, quer dizer, no seu Ministério, no seu período, não

houve nenhum tipo de intervenção, quer do Ministro José

Dirceu, quer da fórmula declarada aqui pelo Deputado

Roberto Jefferson, que seria um certo loteamento das

diretorias, das direções de empresas. Quer dizer, tudo lá

foi decidido por V.Exa. ou V.Exa já adquiriu, manteve o

que já tinha sido decidido posteriormente?

O SR. DEPUTADO EDUARDO CAMPOS -

Exatamente.” (pág. 38- grifamos).

“O SR. DEPUTADO ARLINDO CHINAGLIA - O que

eu sei é que quem indicava os funcionários, as pessoas

para cada cargo em cada Ministério...era papel do

próprio Ministro, até porque o papel institucional da

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Casa Civil era de fazer uma avaliação técnica do

indicado e também fazer ali uma certa, como é que eu

diria, verificação das credenciais administrativas,

inclusive ético-morais, enfim, para que qualquer

indicado não surpreendesse negativamente, até onde é

possível, no desempenho de uma função de confiança.”

(pág. 6, grifamos).

“O trabalho com o Ministro José Dirceu sempre foi

realizado na mais estrita colaboração, sem qualquer

interferência indevida que desse margem a qualquer tipo

de intimidação. As funções do deputado José Dirceu à

frente da Casa Civil foram exercidas em acordo com o

que determina a Lei. As nomeações do Ministério da

Justiça são, por determinação legal, feitas formalmente

em conjunto com a Casa Civil, mas o mérito das

nomeações sempre foi decidido por mim como titular da

pasta.” (MINISTRO MÁRCIO THOMAS BASTOS,

Pág. 454, grifamos).

Assim como ocorreu com as demais acusações,

também no tocante a nomeação de cargos restou demonstrado que o

Requerente não praticou nenhuma irregularidade.

10. Conclusão:

A presente representação afirma que o

Requerente comandava um esquema de compra de votos, e que deve ser

cassado porque, assim agindo, teria interferido no resultado de votações nesta

Casa. Isto não é verdade, como se comprovou nos autos.

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Sustenta ainda a acusação que o repasse de

valores era operado em conluio entre o ex-Ministro Chefe da Casa Civil e o

Secretário de Finanças do PT, Delúbio Soares. Trata-se de outra inverdade,

pois, muito pelo contrário, constatou-se que este conluio não existia, e

tampouco tinha condições de existir, em face das atribuições do Requerente

enquanto Ministro e seu desligamento das questões financeiras do partido.

Na ótica da acusação, os recursos para os

repasses indevidos teriam sido obtidos com a participação do Requerente.

Porém, provou-se que o ex-Ministro-Chefe da Casa Civil desconhecia tais

empréstimos e, em conseqüência, nunca tratou dos mesmos com os

representantes das instituições financeiras. O contato mantido com os Bancos

envolvidos sempre foi institucional e regular, regido pelo comportamento

ético e republicano pelo qual o Requerente sempre pautou os seus 40 anos de

vida pública.

Relembramos, ao término deste processo

disciplinar, as palavras do escritor Fernando de Morais, que, com sua

peculiar lucidez advertiu-nos dos malefícios de uma cassação desprovida de

provas:

“Eu acho que ele está sendo punido, que está se

tentando puni-lo não pelo o que ele fez ou deixou de

fazer, mas pelo o que representa. É a maneira de

degolar. É aquilo que o ilustre Senador Bornhausen

disse na televisão, para espanto do País inteiro, uma

declaração eugênica de dizer o seguinte: “Essa crise

toda tem um lado muito, porque vamos nos livrar dessa

raça pelos próximos 30 anos”.

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Essa raça não é só o PT, não; essa raça sou eu

também. Então, é isso. Não é se roubou, se não roubou,

se tirou dinheiro, se fez mensalão. Isso é uma opinião

subjetiva. Fica a impressão de que o que se quer é

degolar a cabeça de um símbolo, de alguém que tem

uma representatividade.” (pág. 29, grifamos).

Claro está, que mesmo no julgamento político,

necessita-se de provas para dar embasamento a um pedido de cassação. Como

se viu, as acusações não têm fundamento, e, diante de tal constatação, é

evidente que as provas não existem. Não existem provas contra o Requerente

porque as acusações são inverídicas. Somente tribunais de exceção condenam

sem provas e, evidentemente, não é isso que se espera deste Egrégio

Conselho.

É necessário lembrar que, em mais de uma

oportunidade, ao longo das atuais investigações, o Requerente deixou claro

que não teme e não tem motivos para temer quaisquer apurações sobre os seus

atos, em quaisquer instâncias. Ao mesmo tempo, à exclusão da mente doentia

do ex-Deputado Roberto Jefferson - que, diga-se novamente, foi cassado

por esta Casa por mentir -, não houve pessoa que levantasse a voz para

questionar a lisura do comportamento do Requerente enquanto Ministro-

Chefe da Casa Civil ou como parlamentar.

Não há, na história e na biografia do Deputado

José Dirceu, qualquer ato que o desabone perante os seus mais de 500 mil

eleitores, perante este Egrégio Conselho, perante a Câmara dos Deputados,

perante o Congresso Nacional e perante a sociedade brasileira.

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11. JOSÉ DIRCEU DE OLIVEIRA E SILVA,

diante do exposto, requer seja julgada improcedente a presente representação,

determinando-se seu arquivamento.

Termos em que,

Pede deferimento.

São Paulo para Brasília,

Em 18 de outubro de 2005.

JOSÉ LUIS OLIVEIRA LIMA RODRIGO DALL’ACQUA

OAB/SP 107.106 OAB/SP 174.378

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