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1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _ ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PONTA GROSSA PARANÁ O Ministério Público do Estado do Paraná, por intermédio do Promotor de Justiça que esta subscreve, com fulcro nos artigos 127, caput e 129, inciso III, da CF/88; art.25, inciso IV, alínea “a”, da Lei nº 8.625/ 93; art.57, inciso IV, alínea “b”, da LCE nº85/99; Lei Federal 7.347/85; com fundamento ainda no artigo 225, da Constituição da República; na Lei Federal 6.938/81, e demais dispositivos legais atinentes à espécie, e com base nas peças informativas inclusas e demais elementos contidos nos autos de Inquérito Civil Público nº MPPR-0113.02.000001-5, vem, perante Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL com pedido de LIMINAR, em face de: MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA, pessoa jurídica de direito público, representada atualmente pelo Sr. MARCELO RANGEL CRUZ DE OLIVEIRA, Prefeito Municipal, com sede na Avenida Visconde de Taunay, nº 950, Bairro Ronda, CEP 84051-000, na cidade de Ponta Grossa, Estado do Paraná; e

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _ ª

VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PONTA GROSSA –

PARANÁ

O Ministério Público do Estado do Paraná, por intermédio do

Promotor de Justiça que esta subscreve, com fulcro nos artigos 127, caput e 129,

inciso III, da CF/88; art.25, inciso IV, alínea “a”, da Lei nº 8.625/93; art.57,

inciso IV, alínea “b”, da LCE nº85/99; Lei Federal 7.347/85; com fundamento

ainda no artigo 225, da Constituição da República; na Lei Federal 6.938/81, e

demais dispositivos legais atinentes à espécie, e com base nas peças

informativas inclusas e demais elementos contidos nos autos de Inquérito Civil

Público nº MPPR-0113.02.000001-5, vem, perante Vossa Excelência, propor a

presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – com pedido de

LIMINAR, em face de:

MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA, pessoa jurídica de direito

público, representada atualmente pelo Sr. MARCELO RANGEL CRUZ DE

OLIVEIRA, Prefeito Municipal, com sede na Avenida Visconde de Taunay,

nº 950, Bairro Ronda, CEP 84051-000, na cidade de Ponta Grossa, Estado do

Paraná; e

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ASSOCIAÇÃO DO COMÉRCIO E INDÚSTRIA DE CARNES

– PONTA GROSSA – ACIC-PG, pessoa jurídica de direito privado, inscrita

no CNPJ/MF sob nº 84.791.995/0001-46, com sede na Rua Valério Ronchi, s/nº,

Bairro Uvaranas, nesta cidade e comarca, representada por seu Presidente Sr.

NIVON CARLOS TABORDA SCHEIFER JUNIOR, brasileiro, inscrito no

CPF/MF sob nº 003.901.109-73, residente e domiciliado na Rua Antônio Saad,

nº 716 – Núcleo Santa Mônica, CEP 84016-630, nesta cidade e comarca.

I – DOS FATOS

Em primeiro lugar, a fim de se compreender a gravidade da questão

tratada nesta ação civil pública, é importante fazer um breve retrospecto dos

fatos que ensejaram a propositura da presente ação.

Com este propósito faz-se mister esclarecer, desde o início, que o

atual matadouro está localizado em área pública de domínio do Município de

Ponta Grossa – PR - primeiro requerido - sendo que o uso do imóvel e das

instalações foi concedido à Associação de Comercio e Indústria de Carnes de

Ponta Grossa-PR (ACIC-PG) para exploração, gerenciamento e administração,

respeitando-se a destinação específica de abatedouro de animais.

Tal concessão teve início em 01 de fevereiro de 1995 mediante

Termo de Concessão de Uso (doc. – 01), celebrado entre o Município de Ponta

Grossa e a ACIC-Ponta Grossa, (os requeridos). Esta primeira concessão

vigorou pelo prazo de 10 (dez) anos, expirando no ano de 2005, quando, então,

foi prontamente renovada pelo município mediante novo Termo de Concessão

de Uso, o qual está disciplinado pela Lei Municipal nº 8196/2005, e ainda

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encontra-se em plena vigência, tendo o seu término previsto para 01 de fevereiro

de 2015 (doc. – 02).

Pois bem, as investigações das irregularidades foram iniciadas no

âmbito do Ministério Público em 12 de julho de 1995, quando foi instaurado na

Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente da comarca de Ponta

Grossa-PR o Procedimento de Investigação Preliminar sob o nº 37/1995, com o

fim de verificar a ocorrência de poluição hídrica no curso do Rio Verde,

causada pela Associação do Comércio e Indústria de Carnes de Ponta Grossa-PR

(ACIC-PG) decorrente das atividades do “matadouro municipal”, por ocasião do

abate de bovinos. Tal procedimento foi, posteriormente, registrado novamente

sob o nº 17/2002 e, por fim, convertido em Inquérito Civil Público

(0113.02.000001-5), em 27 de abril de 2011, sempre com o intuito de buscar-se

uma solução administrativa e pacífica para os problemas.

No entanto, passados muitos anos, mais precisamente 18 anos, e

apesar das inúmeras promessas e acordos firmados, não se obteve êxito nas

tentativas de conciliação com os requeridos para que as irregularidades fossem

corrigidas e o matadouro transferido para local adequado.

O referido procedimento teve início com requerimento de

moradores próximos ao matadouro, os quais relatavam inúmeros incômodos,

principalmente, o forte odor proveniente do estabelecimento de abate, além da

proliferação de insetos nas imediações. Diante de tal situação foram solicitadas

informações à Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Estado do Paraná e ao

Instituto Ambiental do Paraná (IAP) acerca da regularidade do empreendimento

de abate de animais em Ponta Grossa-PR.

Em resposta, a Secretaria do Estado apresentou relatório interno

apontando sérias irregularidades estruturais e sanitárias, as quais, em suma,

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comprovavam que a qualidade da água do Rio Verde estava prejudicada em

razão do lançamento de efluentes no corpo hídrico pelo abatedouro em

desconformidade com os padrões ambientais (doc. – 03).

De igual modo, o IAP em 19 de janeiro de 1996, verificando as

irregularidades cometidas pela segunda requerida, firmou um Termo de

Compromisso com a mesma, buscando a adoção de medidas por parte da

associação para a minimização dos danos ambientais constatados pelo

lançamento de efluentes fora dos padrões químicos permitidos (doc. – 04).

Após a adoção de determinadas medidas, tais como a construção de lagoa

anaeróbica, lagoa aerada e lagoa facultativa, foi expedida pelo IAP em

27/05/1996 a Licença de Instalação de nº 1026, com validade até 28/05/1997

(doc. – 05).

Todavia, as reclamações dos moradores continuaram, demonstrando

que os problemas não estavam solucionados, ao contrário se agravaram. Assim,

solicitadas novas informações, o IAP, após longo período, limitou-se a informar

que algumas medidas haviam sido tomadas, no entanto, ainda não havia solução

para a questão da destinação final do sangue dos animais abatidos, questão

gravíssima, diga-se de passagem, já que o abatedouro está instalado em área

urbana e próxima de um rio.

Posteriormente, tendo em vista que as irregularidades continuavam,

o IAP autuou a empresa ACIC-Ponta Grossa, embargou as atividades e remeteu

a esta Promotoria o Auto de Infração Ambiental nº 36.988, com o respectivo

Termo de Embargo registrado sob o nº 23853 (doc. – 06), lavrados na data

de 17/02/2004, em desfavor da segunda requerida em razão do lançamento de

efluentes líquidos diretamente no Rio Verde em desconformidade com os

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padrões ambientais, ocasionando, assim, poluição e dano ambiental. Na

mesma oportunidade, o instituto ambiental informou que a referida requerida já

havia sido autuada e embargada pelos mesmos motivos alguns meses antes,

em 08/05/2003, sendo que na oportunidade foram lavrados o AIA nº 27968 e

o Termo de Embargo nº 19666 (doc. – 07), os quais ensejaram a instauração

nesta Promotoria do Procedimento Preparatório nº 0113.04.000005-2, que

atualmente encontra-se apenso aos autos de Inquérito Civil nº MPPR-

0113.02.000001-5.

Tal situação demonstra que a poluição e dano ambiental foram

prática rotineira e reiterada da segunda requerida, pois, inobstante o fato de ser

autuada e embarga continuou com a atividade poluidora como se nada tivesse

ocorrido.

Sobre o AIA nº 27968 e o seu respectivo Termo de Embargo de nº

19666 há que se fazer um parêntesis neste momento para registar que, quando da

lavratura do referido auto, a segunda requerida ingressou com o Mandado de

Segurança nº 1626/2003, o qual tramitou perante a 2ª Vara Cível desta comarca,

pretendendo a anulação do AIA e do auto de Embargo. Para tanto, sustentou que

havia diversas irregularidades na expedição de tais documentos, as quais

comprometiam a validade dos atos administrativos e, consequentemente,

deveriam levar a anulação destes.

Seguindo-se o curso processual, embora a referida requerida tenha

obtido liminar e sentença favoráveis ao seu pleito na primeira instância, ou seja,

determinando-se a anulação do auto e do embargo, tal situação foi totalmente

revertida no Tribunal de Justiça do Paraná, quando do julgamento do recurso de

apelação interposto pelo Instituto Ambiental do Paraná. Neste julgamento

entendeu o Tribunal pela plena validade dos atos administrativos que

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culminaram na lavratura do AIA e do Embargo, reformando integralmente a

sentença exarada pelo juiz de 1º grau (doc. – 08). Tal decisão foi confirmada

pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em sede de Recurso Especial (doc. –

09).

Assim, vislumbra-se que o estabelecimento do matadouro

municipal encontra-se embargado desde a data de 08 de maio de 2003,

funcionando em situação de total irregularidade e ilegalidade desde então,

descumprindo, inclusive os termos do embargo administrativo confirmado

judicialmente.

Retomando-se a retrospectiva dos fatos, além das constantes

autuações pelo órgão ambiental, já nesta altura dos acontecimentos o

estabelecimento gerido pela segunda requerida encontra-se funcionando em

completa irregularidade, pois que após a expiração da licença de instalação nº

1026 no ano de 1997, nunca mais fora expedida nenhuma licença ambiental em

favor do empreendimento do “matadouro municipal” gerenciado pela segunda

requerida.

Acerca desta questão é importante registrar que apenas em

21/05/2003, isto é, cerca de 6 (seis) anos depois do vencimento da licença de

instalação, a requerida protocolou junto ao órgão ambiental o pedido de licença

de operação, a qual, posteriormente, foi indeferida pelo IAP em razão de o

estabelecimento encontrar-se em área de preservação permanente.

Tal situação foi verificada em vistoria realizada pelo IAP em 10 de

setembro de 2008, na qual o técnico responsável informou que o

empreendimento continuava irregular e que não havia possibilidade de

concessão da Licença de Operação, justamente pelo fato de o

estabelecimento encontrar-se muito próximo do Rio Verde – dentro de área

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de preservação permanente – e localizar-se em zona urbana do município, o

que é vedado pela legislação (doc. – 10).

Destaque-se que o primeiro requerido, o Município de Ponta

Grossa, chegou a autuar e a notificar a segunda requerida em razão do

funcionamento sem a competente licença ambiental, consoante termo de

notificação nº 701 de 24/02/2009, sem, no entanto, tomar nenhuma providência

concreta para fazer cessar a atividade.

Para demonstrar a situação ilegal em que ainda se encontra o

“abatedouro municipal”, basta dizer que o estabelecimento foi novamente

autuado e embargado pelo IAP recentemente, em 03 de agosto de 2012, por

estar desenvolvendo atividade altamente poluidora sem a competente

licença de operação (doc. – 11).

Em vistorias realizadas pela Prefeitura Municipal de Ponta Grossa

no período compreendido entre 15/04/2008 a 08/05/2009, das quais foi

elaborado minucioso Relatório de Inspeção Técnica e Investigação Sanitária

(doc. – 12), restou confirmado pela municipalidade que o estabelecimento está

localizado em área urbana e em área de preservação permanente, além de

não possuir licença ambiental, sanitária ou o alvará de localização e

funcionamento. Mesmo diante de todas essas irregularidades o primeiro

requerido não tomou nenhuma medida eficiente no decorrer de todos esses anos

no sentido de interditar administrativamente o local ou de cancelar a concessão,

contribuindo, assim, para a perpetração do dano ambiental, em face de sua

omissão, quando tinha o dever de agir.

Frise-se que a inexistência de licenças ambientais e a ocorrência de

inúmeras irregularidades de ordem estrutural, higiênicas e sanitárias no

matadouro municipal persistem até hoje.

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Cerca de um ano depois, em 28/05/2010, foi realizada pela

Vigilância Sanitária Municipal, em conjunto com a Terceira Regional de

Saúde/SESA, o Serviço de Inspeção Municipal e o Serviço de Inspeção do

Paraná/SIP/POA, outra vistoria criteriosa nas dependências do abatedouro

municipal (doc. – 13). Nesta ocasião também foram identificadas centenas de

irregularidades sanitárias, higiênicas, ambientais e estruturais, que

motivaram a elaboração de parecer, firmado por todos os órgãos acima,

aconselhando a interdição do local. Dentre as irregularidades apontadas

podem ser elencadas, a título de exemplo, a falta de esterilização nos

instrumentos utilizados na sala de abate; piso com rachaduras e buracos,

contribuindo para a formação de poças de sangue e proliferação de

bactérias; ausência de controle de temperatura tanto para as câmaras frias

como para a água utilizada no abate e na esterilização dos instrumentos,

entre outras tantas que representavam sérios riscos para a saúde humana,

conforme se denota das fotografias abaixo que ilustram a situação:

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Agora, outra questão de extrema importância a ser considerada

nesta ação refere-se à localização do matadouro municipal, o qual, como já

afirmado acima, encontra-se em zona urbana habitada, contendo diversos

núcleos habitacionais ao seu entorno, além de estar localizado em área de

preservação permanente, situação que fere frontalmente a legislação vigente.

Desse modo, o matadouro municipal está situado na Rua Valério

Ronchi, s/nº, no Bairro de Uvaranas, em zona urbana e altamente habitada do

município de Ponta Grossa, ocupando uma extensa área de 3.345 m² às margens

do Rio Verde. Tal localização afronta a legislação municipal e estadual em todos

os aspectos, sendo inadmissível manter um estabelecimento deste porte na área

acima descrita.

Pois bem, diante de todas essas irregularidades apontadas, em 22 de

outubro do ano de 2010 foi celebrado um Termo de Ajustamento de Conduta

entre o Ministério Público do Estado do Paraná e Associação do Comércio e

Indústria de Carnes de Ponta Grossa – ACIC-PG, ora segunda requerida. Neste

termo ficou estabelecido que a ACC-PG permaneceria no local pelo prazo de 01

(um) ano e 06 (seis) meses, tempo esse razoável para que a compromissária

ACIC-PG construísse um novo matadouro localizado em área rural e fora de

área de preservação permanente e, principalmente, licenciado junto ao IAP para

operar regularmente. Ficou também estabelecido que o IAP concederia uma

licença prévia para o estabelecimento a fim de contribuir para o bom

cumprimento do TAC (doc. – 14).

Assim expedida a referida licença prévia temporária, acordou-se

que a referida requerida ingressaria com os pedidos de licenciamento junto ao

IAP para o novo empreendimento, iniciando com o pedido de licença de

instalação dentro do prazo de 06 (seis) meses a contar da concessão da licença

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prévia, e, uma vez concedida a licença de instalação deveria a requerida pleitear

no prazo de 06 (seis) meses a concessão da licença de operação, comprovando,

para tanto, que havia realizado as obras devidas e que já contava com um novo

matadouro para transferência das atividades.

Paralelamente ao TAC firmado, ficou acordado com o primeiro

requerido que o mesmo apresentaria um Plano de Recuperação da Área

Degradada do Matadouro Municipal. O plano foi enviado pela Prefeitura

Municipal, no entanto, o mesmo não pode ser executado até a data de hoje em

razão de a segunda requerida ainda não ter providenciado a retirada do

estabelecimento do local.

Enfim, o TAC não foi cumprido. Nada foi realizado e o matadouro

continuou na mesma situação, completamente irregular, operando até esta data,

alheio a tudo e a todos.

Pois bem, sobre a transferência das atividades para zona rural do

município e fora de área de preservação permanente, conforme acordado em

TAC, a requerida ACIC-PG não providenciou a retirada do estabelecimento no

prazo estabelecido, afirmando, para tanto, que realizou pedido junto ao primeiro

requerido, o Município de Ponta Grossa, para a doação de um terreno em outro

local, o que não ocorreu até esta data, prolongando-se no tempo e eternizando,

assim, o dano ambiental e o risco à saúde humana.

Vale ressaltar que a doação de um terreno pelo primeiro requerido

nunca foi objeto do TAC firmado, sendo de total responsabilidade da segunda

requerida a transferência de suas atividades para outro local, até porque se trata

de atividade privada, altamente lucrativa.

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No entanto, com o fim de se agilizar o procedimento, foi realizado

um termo aditivo ao TAC anteriormente firmado, estipulando o prazo de 90

(noventa) dias para que a segunda requerida comprovasse nos autos a doação

efetiva do terreno mediante a apresentação da escritura pública ou, ao menos, a

autorização para uso e edificação em outro local do município, o que também

nunca ocorreu (doc. – 15).

Ao fim, merece destaque a informação extraída do laudo de vistoria

da última inspeção realizada pelo IAP, em 02 de agosto de 2012, na qual o

órgão competente afirma categoricamente que o estabelecimento do

matadouro municipal encontra-se dentro de área de preservação

permanente, estando a aproximadamente 05 (cinco) metros do rio (doc. –

16).

Assim, finalmente, verifica-se que além da construção irregular, o

Matadouro Municipal foi autuado novamente pelo IAP por estar

funcionando sem licença de operação em desconformidade com a legislação

ambiental, praticando atividade poluidora e descumprindo as condições do

Termo de Ajustamento de Conduta. Vale lembrar que a atividade de abate de

animais não poderia continuar operando até que a empresa providenciasse a

devida licença. Acontece que até o momento da propositura da presente ação, os

requeridos não tomaram nenhuma providência no sentido de obter a referida

licença e a regularização da situação perante o IAP, continuando o

estabelecimento a poluir e a degradar o meio ambiente, sem autorização para

funcionar.

Diante destas inúmeras irregularidades constatadas e do

descumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta firmado pela segunda

requerida, não resta alternativa senão o ajuizamento da presente ação civil

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pública, a fim de buscar-se junto ao Poder Judiciário a imediata interdição do

estabelecimento para fazer cessar as atividades potencialmente danosas ao meio

ambiente, bem como a devida recuperação da área de preservação permanente.

II – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

2.1 – Da Legitimidade do Ministério Público e do Cabimento da Ação Civil

Pública

A Constituição Federal, em seu artigo 127 reconheceu a

imprescindibilidade do Ministério Público à função jurisdicional do Estado bem

como lhe incumbiu da tarefa de defender a ordem jurídica, o regime

democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.

Para tanto, a necessária legitimidade à propositura de ação civil

pública destinada à proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e

de outros interesses difusos e coletivos, foi-lhe conferida pelo artigo 129, inciso

III, da Constituição Federal, bem como no artigo 25, inciso IV, da Lei nº

8.625/93, e no artigo 5º, inciso I, da Lei nº 7.347/83, que disciplina a ação civil

pública.

O ajuizamento da presente ação civil pública objetiva, em resumo,

compelir o Município de Ponta Grossa e a Associação do Comércio e Indústria

de Carnes de Ponta Grossa – ACIC-PG a cessarem as atividades desenvolvidas

no atual “matadouro municipal”, seja transferindo as atividades para um local

adequado e licenciado, seja encerrando definitivamente suas atividades, bem

como para repararem os danos ambientais causados em área de preservação

permanente pelo incessante funcionamento de atividade poluidora sem licença

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ambiental, tudo em respeito ao meio ambiente e à saúde pública, temas de

interesse coletivo e difuso, inseridos no campo de atuação do Ministério

Público, conferindo-lhe legitimidade para buscar judicialmente a proteção

jurídica desses bens.

2.2 – Da Competência em Razão do Local do Dano

A ação civil pública em defesa do meio ambiente deve ser aforada

no lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, segundo se extrai da interpretação

conjugada dos artigos 2° da Lei 7.347/85, e 93, I, da Lei 8.078/90.

Deste modo, tendo em vista que o dano ambiental causado – em

razão de o estabelecimento estar situado em área de preservação permanente e

estar funcionando sem as devidas licenças ambientais e sanitárias – está adstrito

a esta cidade e comarca, ainda que possa ter efeitos reflexos em outras regiões,

fica firmada a competência do Juízo da Comarca de Ponta Grossa, Estado do

Paraná, para processar e julgar a presente ação.

2.3 – Dos danos ambientais e à saúde pública

Nos termos do artigo 225, caput, da Constituição da República

Federativa do Brasil, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-

lo para as presentes e futuras gerações.” (Grifos nossos)

Da interpretação do texto constitucional transcrito extrai-se a íntima

relação entre o equilíbrio ambiental e a saúde humana, e o direito de todos a

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ambos, sendo esses direitos elevados à categoria de direitos constitucionais

fundamentais, tamanha é sua relevância.

Por sua vez, são inegáveis os sérios riscos ao meio ambiente e à

saúde pública resultantes do abate de animais em desconformidade com as

normas ambientais e sanitárias. A falta de ação dos requeridos em somar

esforços para fazer cessar as atividades de abate no local atual – completamente

irregular e inadequado – constitui grave violação ao preceito constitucional antes

referido, e ao artigo 170, inciso VI, do mesmo diploma legal, que insere a defesa

do meio ambiente entre os Princípios Gerais da Atividade Econômica.

Há que se considerar que o Direito Ambiental é um ramo especial,

com inúmeras especificidades, principalmente, pelo objeto que tutela, e, em

razão disto, deve ser tratado exatamente de acordo com suas peculiaridades.

Dentre elas está o caráter irreversível que os danos ambientais podem assumir.

Assim, além da responsabilidade em se reparar danos efetivamente causados,

deve ser considerada a exigência de se evitar a ocorrência deles.

Esta é a razão para a exigência de licenças ambientais de

empreendimentos potencialmente poluidores, para que se possa evitar, controlar

ou amenizar os danos porventura existentes, como no caso em tela, em que a

atividade de abate de animais é atividade altamente poluidora, que afeta

inúmeros bens jurídicos tutelados e, por isso, deve ser desenvolvida com

extrema cautela e responsabilidade.

No caso em análise, entretanto, o estabelecimento está funcionando

sem a devida licença ambiental; seu funcionamento está causando efetivo dano

ao meio ambiente por estar localizado (parte) em área de preservação

permanente, e por não obedecer as normas ambientais e sanitárias. Desse modo,

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se não for imediatamente interrompida a atividade poluidora, os danos, que já se

prolongaram por demasiado tempo, poderão se agravar ainda mais.

Além dos danos ambientais deve ser considerado o risco iminente a

que a saúde pública está sendo exposta diariamente enquanto as requeridas

mantêm as atividades no matadouro municipal sem qualquer regulamentação.

Isso porque, fazer funcionar empreendimento deste porte e com esta

importância, sem a devida licença de operação – a qual atesta as condições para

funcionamento – é equivalente ao abate clandestino de animais para a

alimentação humana.

Excelência, gravíssima é a situação do “matadouro municipal”, pois

que além de degradar o meio ambiente, oferece sérios riscos à saúde da

população ao abater animais e produzir carne sem estar com as devidas licenças

ambientais para tanto, colocando à disposição, assim, produtos impróprios para

o consumo, violando, deste modo, os direitos básicos das relações de consumo.

Um abatedouro de animais deste porte, em uma cidade do

tamanho, riqueza e importância de Ponta Grossa, funcionando sem as

licenças ambientais, sem licença sanitária, sem alvará de funcionamento,

com parte do estabelecimento sobre área de preservação permanente, com

suas atividades embargadas pelo órgão ambiental há anos, certamente seja

um caso único em todo o Brasil, que deve ser cessado imediatamente, sem

mais procrastinação.

Apenas para demonstrar o risco a que o consumidor está exposto, é

importante registrar que várias doenças graves podem ser transmitidas através

do consumo da carne. A título de exemplo, tais doenças podem ser aquelas que

se instalam no ser humano a partir de animais infectados, como a tuberculose e a

brucelose, as doenças parasitárias como as teníases, que podem acometer o

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homem devido ao consumo de carnes bovinas ou suínas com cisticercose e as

toxinfecções alimentares, de origem microbiana, ocasionadas pelo consumo de

carnes contaminadas com bactérias patogênicas.

Por isso o abate de animais sob a fiscalização da inspeção sanitária,

bem como do órgão ambiental, diminui drasticamente os riscos de danos à saúde

humana e ao meio ambiente, bem como preserva as relações de consumo.

Assim, configurados os danos ambientais e os riscos à saúde da

população decorrentes do funcionamento do empreendimento do matadouro sem

as devidas licenças e em área de preservação permanente, resta a análise da

responsabilidade dos requeridos por tais danos.

2.5 – Da Responsabilidade dos Requeridos

Em primeiro lugar insta ressaltar que Direito Ambiental é

fundamentado em princípios, dentre os quais se destacam os princípios da sadia

qualidade de vida, da prevenção, da precaução e da reparação, os quais norteiam

esta ação.

Sobre tais princípios cabe mencionar as considerações feitas por

Édis Milaré, o qual com peculiar clareza explica o sentido do tão aclamado

princípio do “poluidor-pagador”:

"Assenta-se esse princípio na vocação retributiva do Direito

Ambiental e se inspira na teoria econômica de que os custos

sociais externos que acompanham o processo produtivo

(v.g., o custo resultante dos danos ambientais) devem ser

internalizados, vale dizer, que os agentes econômicos

devem levá-los em conta ao elaborar os custos de produção

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e, conseqüentemente, assumi-los. Esse princípio, escreve

Prieur - visa a imputar ao poluidor o custo social da

poluição por ele gerada, engendrando um mecanismo de

responsabilidade por dano ecológico abrangente dos efeitos

da poluição, não somente sobre bens e pessoas, mas sobre

toda a natureza".

Este princípio não objetiva, por certo, tolerar a poluição mediante

um preço, nem se limita apenas a compensar os danos causados, mas sim,

precisamente, a evitar o dano ao meio ambiente.

Assim, somente da análise de tais princípios já se visualiza a

questão da responsabilidade dos requeridos na adoção imediata de medidas

reparadoras dos danos ambientais ocasionados pela atividade desenvolvida.

Nesse sentido é o que dispõe a Constituição Federal em seu artigo

225, §3º1 ao determinar que o responsável por condutas e atividades lesivas ao

meio ambiente sujeitar-se-á a sanções penais e administrativas, além da

obrigação de reparar o dano.

Some-se a isso a previsão do artigo 14, §1º da Lei 6.938/812 – que

institui a Política Nacional do Meio Ambiente – o qual disciplina a

responsabilidade objetiva ao autor de danos ambientais, isto é, será

responsabilizado o agente a indenizar ou a reparar os danos independentemente

da existência de culpa, bastando que se demonstre o dano e o nexo de

causalidade.

1 Art. 225, § 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,

pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os

danos causados. 2 Art. 14, § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,

independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a

terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor

ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.

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Tal disposição é a pura aplicação da Teoria do Risco Integral, pela

qual todo aquele que causar danos ao meio ambiente deverá ressarci-lo,

principalmente as empresas, considerando que toda empresa traz consigo riscos

inerentes à sua atividade, justificando-se, por isso, o dever de indenizar,

independentemente de ter o agente agido com culpa ou não.3

Sobre tal assunto tem-se a importante lição de Paulo Affonso Leme

Machado, segundo o qual:

“O direito ambiental engloba as duas funções da

responsabilidade civil objetiva: a função preventiva –

procurando, por meios eficazes, evitar o dano – e a função

reparadora – tentando reconstruir e/ou indenizar os

prejuízos ocorridos. Não é social e ecologicamente

adequado deixar-se de valorizar a responsabilidade

preventiva, mesmo porque há danos ambientais

irreversíveis.”4

O estabelecimento “Matadouro Municipal”, administrado pela

segunda requerida, atua desde sempre sem a devida licença ambiental e vem

causando efetivo dano ao meio ambiente por estar localizado dentro de área de

preservação permanente. Tais fatos ficaram demonstrados no Inquérito Civil

Público em trâmite perante a 6ª Promotoria de Justiça de Ponta Grossa-PR, e,

mesmo após a empresa ser autuada por diversas vezes pelo Instituto Ambiental

do Paraná, a autuada não solucionou o problema e continuou atuando de forma

irregular.

3 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental, 6ª edição. Editora Saraiva. São Paulo: 2008. pg. 189.

4 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro, 21ª edição. Editora Malheiros. São Paulo:

2013. pg. 409.

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Merece destaque, Excelência, a responsabilidade do primeiro

requerido, o qual concedeu o uso do estabelecimento com as instalações para a

segunda requerida, autorizando-a a explorar comercialmente o local. Porém, é

certo que a concessão de uso não exime o Município de suas responsabilidades.

Até porque tem o dever legal de fiscalizar, de conceder ou negar alvará de

funcionamento, de tomar as medidas necessárias para interditar/fechar

estabelecimentos em funcionamento irregular, dentre outros. O Município –

atual concedente – tem o dever de zelar pelo atendimento às normas ambientais,

sanitárias e consumeristas, além de fiscalizar o seu fiel cumprimento, devendo

tomar as medidas necessárias em caso de descumprimento do termo de

concessão ou das normas legais. Tal obrigação está, inclusive, expressa na Lei

Municipal nº 8.196/2005, consoante se verifica a seguir:

“Art. 3º - Competirá ao concedente designar pessoal de

seu quadro para os serviços permanentes de inspeção

sanitária e de fiscalização da concessão e dos aspectos

relacionados à legislação ambiental.”

Ademais, tendo conhecimento de que o estabelecimento

encontrava-se e encontra-se em local completamente inapropriado, sem o devido

licenciamento ambiental e sanitário, era obrigatória a tomada de providências

pelo primeiro requerido, sob pena, sim, de responsabilização pelos danos

ambientais causados. Sua omissão é, por via indireta, também a causadora do

dano respectivo.

Não se pode, também, olvidar, Excelência, de que o poder público é

o responsável pela saúde pública e pela preservação do meio ambiente

ecologicamente equilibrado, o que não está sendo respeitado e protegido no caso

em mesa.

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Do mesmo modo, a municipalidade tem competência administrativa

concorrente com a União e com os Estados para fiscalizar e adotar medidas

administrativas visando cuidar da saúde da população e organizar o

abastecimento alimentar, por força do que dispõe o artigo 23, incisos II, VI e

VIII 5 da Constituição Federal, não havendo dúvida que há flagrante interesse da

municipalidade em tal fiscalização, visando proteger os munícipes, evitando a

utilização de carne imprópria e minimizando o risco de doenças.

Assim, além do dever objetivo de reparar os danos causados

(princípio da reparação), incide ao município o dever de evitar danos futuros, em

nítida aplicação do princípio da prevenção.

Nesta senda coadunam-se os entendimentos dos Tribunais, veja-se:

“ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA. MATADOURO PÚBLICO E DEPÓSITO DE

RESÍDUOS SÓLIDOS. DANO AMBIENTAL.

DESCUMPRIMENTO DE TERMO DE AJUSTAMENTO

DE CONDUTA. RESPONSABILIDADE DO PODER

PÚBLICO MUNICIPAL. 1. Apelação em face da sentença

que julgou procedente o pedido do MPF de condenação do

Município de Parelhas/RN à reparação de dano ambiental

causado em razão do matadouro e do lixão municipal. 2. A

CF/88 estabelece, no art. 225, que todos possuem direito ao

meio ambiente ecologicamente equilibrado, tendo o Poder

Público o dever de defendê-lo e preservá-lo, para que seja

5 Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: (...)

II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;

VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; (...)

VIII - fomentar a produção agropecuária e organizar o abastecimento alimentar; (...)

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assegurado o interesse coletivo. Sem dúvida, ao Poder

Judiciário cabe, embora excepcionalmente, a imposição da

implantação de políticas públicas constitucionalmente

previstas, quando a omissão perpetrada comprometa a

própria integridade dos direitos sociais igualmente

protegidos pela Carta Magna vigente. 3. O não

cumprimento, de forma devida, das obrigações assumidas

no TAC pelo Município de Parelhas/RN põe em risco o

equilíbrio ecológico. Desse modo, o abatedouro público e o

lixão funcionam em detrimento da saúde e do meio

ambiente. 4. O município possui a responsabilidade pela

saúde pública e de preservação do meio ambiente

ecologicamente equilibrado. Nesse sentido, mostram-se

acertadas as demolições e a recuperação da área

degradada. 5. Apelação improvida.”(Grifo nosso)6

E também:

“AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ATIVIDADES

DE CULTIVO DE PLANTAS, CRIAÇÃO DE ANIMAIS E

MANUTENÇÃO DE ABATEDOURO - AUSÊNCIA DO

DEVIDO LICENCIAMENTO AMBIENTAL -

OCUPAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO

PERMANENTE - DANO AMBIENTAL EVIDENCIADO

- REPARAÇÃO DEVIDA A desobediência às normas

ambientais vigentes - quais sejam, a realização de

atividades de cultivo de plantas, criação de animais e

6 TRF-5 - AC: 1000720114058402: Relator: Desembargador Federal Marcelo Navarro, Data de Julgamento:

20/06/2013, Terceira Turma, Data de Publicação: 27/06/2013.

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manutenção de abatedouro, sem o respectivo

licenciamento ambiental, além da indevida ocupação de

área de preservação permanente -, a implicar manifesto

dano ao meio ambiente, obriga os responsáveis à sua

plena reparação.”(Grifo nosso)7

Desta forma, resta clara a responsabilidade dos requeridos na

obrigação de reparar os danos, sendo imperiosa e urgente a necessidade de

interrupção das atividades do matadouro municipal gerido pela segunda

requerida – ACIC-PG – até que os requeridos providenciem outro local para

essa atividade e, acima de tudo, se adequem aos padrões exigidos pelo órgão

ambiental e sanitário, podendo assim, obter a licença de operação para o

exercício de tal atividade, caso tenham interesse na continuidade dessa atividade

em outro local.

Excelência, a coletividade e o meio ambiente não podem sucumbir

face às irregularidades existentes, impondo-se a tomada de medida efetiva para a

solução.

2.6 – Da Proibição da Manutenção no Matadouro Municipal na Localidade

Atual

Conforme já descrito, o Matadouro Municipal encontra-se

atualmente em zona urbana do município de Ponta Grossa e, além disso, parte

do estabelecimento ocupa área de preservação permanente, estando às margens

do Rio Verde.

7 TJ-SC, Relator: Luiz Cézar Medeiros, Data de Julgamento: 22/07/2013, Terceira Câmara de Direito Público

Julgado.

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Este cenário é completamente irregular, sendo expressamente

proibido pela legislação municipal e estadual, conforme se demonstrará a seguir.

Em primeiro lugar é importante ficar claro o que se entende por

zona urbana e zona rural no município de Ponta Grossa. Pois bem, assim define

a Lei Municipal nº 8.799/06:

“Art. 2º Para os efeitos de interpretação e aplicação desta

Lei são adotadas as seguintes convenções:

VI - Zona Urbana: o mesmo que Área Urbana; sob o

aspecto político-administrativo é a área situada dentro dos

perímetros urbanos do Distrito-Sede, das Sedes Urbanas

dos Distritos Administrativos e das Áreas Urbanas

Isoladas; sob o aspecto tributário é a zona definida por lei

municipal de acordo com os requisitos do Código

Tributário Nacional;

VII - Zona Rural: é toda a extensão do território municipal

que não esteja abrangida no Distrito-Sede, nas Sedes

Urbanas dos Distritos Administrativos ou nas Áreas

Urbanas Isoladas, na qual predominam as atividades

agrícolas ou pecuárias;”

Também há previsão nas Leis Municipais nº 9.055/07 e nº 9.865/09,

as quais delimitam especificamente a área que compreende o Matadouro

Municipal:

"Art. 3º - ...

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I - Distrito-Sede, delimitado pelo seguinte perímetro: inicia

na Estrada Peri Pereira Costa (Ponta Grossa - Itaiacoca),

na divisa com a sede campestre do Clube Guaíra,

prolongamento na divisa do Jardim Paraíso, seguindo por

uma estrada no sentido Itaiacoca - Centro, até a Rua

Cândido Borsato do Jardim Paraíso, final da Avenida

General Carlos Cavalcanti, sentido Bairro-Centro, até

alcançar a Rua Beato Ceferino Jimenez Malla (Rua de

acesso ao cemitério Parque Jardim Paraíso), seguindo por

esta até encontrar o Rio Verde, descendo por este até

encontrar os limites do loteamento André Dal´Col (Rio

Verde), contornando-o externamente até encontrar

novamente o Rio Verde, descendo pelo Rio Verde, até

encontrar o Arroio Claudionora, seguindo por este até

encontrar o Arroio Francelina, seguindo por este até

encontrar a Rua Barão de Ramalho, seguindo por esta até

encontrar a Rua Teixeira Mendes, seguindo por esta até a

Rua Vicente Espósito, seguindo por esta até encontrar a Av.

General Carlos Cavalcanti, seguindo por esta até a Rua

Barão de Ramalho, seguindo por esta até o Arroio

Francelina, seguindo por este até encontrar o Arroio

Claudionora, seguindo por este até encontrar o Rio Verde,

seguindo por este até encontrar a faixa de domínio da

Estrada de Ferro Central do Paraná, seguindo por esta até

encontrar o limite do Jardim Residencial San Martin,

contornando-o externamente até atingir a Estrada do

Alagado, também denominada Estrada Arichernes Carlos

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Gobbo, retornando pela referida estrada até encontrar a

faixa de domínio da Estrada de Ferro Central do Paraná,

seguindo por esta até encontrar a faixa de domínio da

Estrada de Ferro Central do Brasil, seguindo por esta até

encontrar a rua final do Loteamento Jardim Lagoa

Dourada II ... (Grifo nosso).

“Art. 2º A área urbana do Município de Ponta Grossa,

previsto na Lei Municipal nº 8.799, de 26 de dezembro de

2006 e suas alterações posteriores, é fracionada para os

efeitos desta lei da seguinte forma:

II - Bairro Neves, delimitado pelo seguinte perímetro:

inicia na faixa de domínio da Estrada de Ferro Central do

Brasil, no ponto georreferenciado "AF", seguindo por

esta até encontrar o limite do Jardim Residencial San

Martin, no ponto georreferenciado "CV", contornando

externamente o citado loteamento até atingir a Estrada do

Alagado, também denominada Estrada Arichernes Carlos

Gobbo, do loteamento San Martin, no ponto

georreferenciado "CW", retornando pela referida estrada

até encontrar a faixa de domínio da Estrada de Ferro

Central do Brasil, no ponto georreferenciado "CX",

seguindo por esta até encontrar a rua final do Loteamento

Jardim Lagoa Dourada II, Rua Amauri de Arruda Moura,

contornando externamente o citado loteamento até a Rua

Edgar Bastos Pequeno, do Jardim Lagoa Dourada II,

seguindo em linha seca sentido oeste até encontrar

novamente o Rio Verde,... (Grifo Nosso).

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Ora, da análise da legislação municipal, conclui-se sem sombra de

dúvidas, que o matadouro municipal encontra-se em Zona Urbana do município,

o que contraria expressamente a Norma Técnica para estabelecimentos de abate

de bovídeos, suídeos, caprídeos e ovinos (NTEA) expedida pela Secretaria de

Agricultura do Governo do Estado do Paraná, a qual define que:

“Art. 2o O estabelecimento de abate deve:

I - Ser em área rural, distar no mínimo 500m (quinhentos

metros) de estábulos, pocilgas, apriscos, capris, aviários,

coelheiras ou de quaisquer fontes poluidoras de odores

desagradáveis ou poluentes;

II - estar instalado em terreno cercado e afastado no

mínimo 15m (quinze metros) de vias públicas;

III - apresentar área compatível com as necessidades do

estabelecimento e suficiente para a circulação e realização

de manobras de veículos;

IV - possuir instalações em quantidade e dimensões

condizentes à realização dos trabalhos de cada etapa do

abate.

(...) (Grifo nosso)

Entretanto, não é o que ocorre no caso em tela, uma vez que o

estabelecimento está na zona urbana e habitada, sendo que a sua entrada

encontra-se praticamente na via pública, conforme se denota das fotografias

abaixo (prédio branco e azul):

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Ressalte-se, que, além de estar em zona urbana, o estabelecimento

também ocupa uma importante área de preservação permanente ás margens do

Rio Verde. Se já não bastasse estar irregular em razão do zoneamento urbano, o

estabelecimento contraria as normas federais ao se manter instalado em área de

preservação permanente.

Assim dispõe o Código Florestal – Lei nº 12.651/2012 sobre as

áreas de preservação permanente:

Art. 3o Para os efeitos desta Lei, entende-se por:

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II - Área de Preservação Permanente - APP: área

protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a

função ambiental de preservar os recursos hídricos, a

paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade,

facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e

assegurar o bem-estar das populações humanas; (Grifo

nosso)

Art. 4o Considera-se Área de Preservação Permanente, em

zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:

I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural

perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda

da calha do leito regular, em largura mínima de:

(Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012).

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10

(dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham

de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de

50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que

tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de

largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que

tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

(...)

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Ora, Excelência, conforme já afirmado anteriormente as instalações

do matadouro municipal encontram-se muito próximas ao Rio Verde,

deflagrando uma situação totalmente inadmissível, tendo em vista que as

instalações deveriam resguardar, no mínimo, a distância de 30 (trinta) metros,

consoante a legislação vigente.

Some-se a isto o fato de que as lagoas de tratamento estão

localizadas a menos de 300 (trezentos) metros do matadouro e, mais grave

ainda, constatou-se a invasão de famílias carentes, as quais apossaram-se do

local e ali criam os seus animais, tais como cavalos, suínos, cachorros e

vacas, o que também contraria completamente a exigência do art. 2º, inciso I da

norma técnica exposta acima. Tal situação foi registrada pela Prefeitura

Municipal (1ª requerida) quando da realização do Relatório de Inspeção Técnica

e Investigação Sanitária, tendo-se as seguintes imagens do local:

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Ademais, ainda sobre as lagoas de tratamento, consoante relatório

de inspeção ambiental realizado pelo IAP, em 10/09/2008, foram constatadas

deficiências nas referidas lagoas, tais como a ineficácia do bombeamento dos

resíduos dos animais, o que poderia ocasionar o lançamento de resíduos in

natura diretamente no corpo hídrico Rio Verde, causando, assim, grave

poluição. Esta situação viola a Resolução nº 430/2011 do CONAMA8, pela qual

os resíduos e dejetos de fonte poluidora somente poderão ser lançados no corpo

hídrico se obedecerem aos padrões e exigências químicos, sanitários e

ambientais, o que não está ocorrendo no matadouro municipal, uma vez que as

constantes autuações do IAP foram em decorrência de lançamento de efluentes

em desconformidade com os padrões químicos.

Registre-se, ainda, para visualização e melhor compreensão da

questão aqui tratada, as fotografias abaixo, as quais demonstram claramente a

proximidade das instalações do matadouro com o Rio Verde, abrangendo área

de APP e irregularidades do local.

8 Art. 16. Os efluentes de qualquer fonte poluidora somente poderão ser lançados diretamente no corpo receptor

desde que obedeçam as condições e padrões previstos neste artigo, resguardadas outras exigências cabíveis:

(...)

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Pois bem, Excelência, vislumbra-se com isso a gravidade da

situação e, sendo assim, não há como manter-se a situação como está, impondo-

se a imediata intervenção no sentido de fazer cessar as atividades desenvolvidas

no local e, bem como determinar a demolição de qualquer construção ou

instalação do atual matadouro, na parte que ocupar área de APP, com a posterior

recuperação da área degradada, tudo pela preservação da saúde da população de

Ponta Grossa, bem como de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, os

quais estão sendo seriamente lesados com o desenvolvimento da atividade dos

requeridos em local totalmente inadequado e sem nenhuma das licenças exigidas

para o exercício da atividade.

2.7 – Da Imprescindibilidade da Licença de Operação para a atividade

Outra questão de extrema importância que merece análise nesta ação é

a ausência do devido licenciamento ambiental por parte do empreendimento do

“Matadouro Municipal”.

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Como já afirmado anteriormente, o referido estabelecimento nunca

obteve a competente licença de operação. Licença esta indispensável para o

funcionamento do empreendimento, pois, a partir do momento em que uma

empresa obtém a licença de operação, atesta-se que a mesma, embora

desenvolva atividade poluidora, cumpre com as normativas ambientais exigidas,

evitando ou minimizando os impactos ambientais decorrentes de sua atividade9.

Porém, não é o que ocorre no caso em tela. O Matadouro

Municipal nunca obteve a devida licença ambiental, ou seja, nunca esteve

apto a funcionar, inobstante esteja em pleno funcionamento desde sempre.

A obrigatoriedade da licença de operação está prevista na legislação

federal e não há possibilidade de se afastar tal exigência, tendo em vista que se

trata o meio ambiente de um direito difuso – pertencente a toda a coletividade –

que sofre os impactos e danos em razão de uma atividade empresarial irregular.

Assim prescreve a Lei nº 6.938/81, em seu artigo 10, ao exigir o

prévio licenciamento ambiental para atividades utilizadoras de recursos

ambientais que sejam potencialmente poluidoras, como é o caso do matadouro

objeto desta ação.

Art. 10. A construção, instalação, ampliação e

funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores

de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente

poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar

degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento

ambiental.

9 Resolução CONAMA 237/97: Art. 8, III: Licença de Operação (LO) - autoriza a operação da atividade ou

empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as

medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação.

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A atividade desenvolvida pelos requeridos é, sem dúvida, altamente

poluidora, sendo imprescindível, para tanto, o competente licenciamento

ambiental, o qual comprovará que a atividade está sendo desenvolvida com

respeito ao meio ambiente. Tal situação está, inclusive, prevista expressamente

na Resolução nº 237/97 do CONAMA, ao prescrever que:

Art. 2º- A localização, construção, instalação, ampliação,

modificação e operação de empreendimentos e atividades

utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva

ou potencialmente poluidoras, bem como os

empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar

degradação ambiental, dependerão de prévio

licenciamento do órgão ambiental competente, sem

prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis.

§ 1º- Estão sujeitos ao licenciamento ambiental os

empreendimentos e as atividades relacionadas no Anexo 1,

parte integrante desta Resolução.

ANEXO 1: ATIVIDADES OU EMPREENDIMENTOS

SUJEITAS AO LICENCIAMENTO AMBIENTAL:

Indústria de produtos alimentares e bebidas

(...)

- matadouros, abatedouros, frigoríficos, charqueadas e

derivados de origem animal;

(...)(Grifos nossos)

No caso em mesa observa-se que não há respeito à legislação vigente.

Os requeridos não providenciaram a devida licença de operação e continuaram

operando de forma absolutamente ilegal e precária, desenvolvendo atividade

com alto risco de poluição, contrariando, assim, todas as normas expostas acima,

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bem como as obrigações contraídas no Termo de Ajustamento de Conduta

firmado com o Ministério Público, o qual prescrevia como uma das obrigações a

transferência das atividades para local apropriado e devidamente licenciado pelo

órgão ambiental competente.

Aliás, vale registrar, que, fazer funcionar estabelecimento ou serviço

potencialmente poluidor, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais

competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares, constitui crime

ambiental, previsto no art.60 da lei 9.605/98.

Insta salientar que, além de não possuir a licença ambiental, o

empreendimento dos requeridos não possui também a licença sanitária e o

competente alvará de localização, estando em situação de plena irregularidade.

Este é mais um dos inúmeros motivos, Excelência, que impõem a

tomada imediata de providências para fazer cessar as atividades desenvolvidas

pelos requeridos e impedir a continuidade dos danos ambientais causados pelo

total descaso dos requeridos com o meio ambiente e com a saúde pública.

III – DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

A Ação Civil Pública é o instrumento processual que busca facilitar a

deflagração de demandas para a tutela adequada e efetiva dos interesses difusos,

coletivos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis.

Desse modo, para viabilizar o acesso pleno à justiça, a lei cria

mecanismos de facilitação da demonstração dos direitos, em benefício dos

vulneráveis ou hipossuficientes, ainda que apenas tecnicamente.

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É sabido, Excelência, que o Código de Defesa do Consumidor integra

o sistema processual coletivo, trazendo inúmeros avanços legislativos e

instrumentos processuais que viabilizam a tutela dos direitos dos vulneráveis.

Conforme ensinamentos de Fiorillo, Abelha e Nery:

“a relação entre o Código de Defesa do Consumidor e a

Lei de Ação Civil Pública possui cunho visceral, pois suas

regras processuais se aplicam aprioristicamente a toda

ação coletiva, formando um sistema processual coletivo.

Desta forma, é perfeitamente possível a aplicação da

inversão do ônus da prova em sede de qualquer ação

coletiva, nestas incluídas aquelas para a tutela do meio

ambiente, pois a inversão do ônus da prova é regra de

natureza processual e todas as regras processuais do

Código de Defesa do Consumidor e da Lei de Ação Civil

Pública devem ser aplicadas na tutela de outros direitos

difusos e coletivos conforme arts. 1.º, IV, e 21 da Lei

7.347/1985". 10

(Grifos nossos).

Assim, a possibilidade de inversão do ônus da prova prevista no

Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de norma de cunho processual,

alcança a proteção dos demais direitos difusos e coletivos.

O Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo a existência do

microssistema coletivo e da aplicação da regra de inversão do ônus probatório

no caso de ação civil pública ambiental, como se observa pelo seguinte julgado:

10

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco; RODRIGUES, Marcelo Abelha; NERY, Rosa Maria de Andrade. Direito

processual ambiental brasileiro: ação civil pública, mandado de segurança, ação popular, mandado de injunção.

Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 142.

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39

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. AGRAVO

DE INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. INVERSÃO DO

ÔNUS. ADIANTAMENTO PELO DEMANDADO.

DESCABIMENTO. PRECEDENTES. I - Em autos de ação

civil pública ajuizada pelo Ministério Público Estadual

visando apurar dano ambiental, foram deferidos, a perícia e

o pedido de inversão do ônus e das custas respectivas,

tendo a parte interposto agravo de instrumento contra tal

decisão. II - Aquele que cria ou assume o risco de danos

ambientais tem o dever de reparar os danos causados e, em

tal contexto, transfere-se a ele todo o encargo de provar

que sua conduta não foi lesiva. III - Cabível, na hipótese, a

inversão do ônus da prova que, em verdade, se dá em prol

da sociedade, que detém o direito de ver reparada ou

compensada a eventual prática lesiva ao meio ambiente -

artigo 6º, VIII, do CDC c/c o artigo 18, da lei nº 7.347/85.

IV - Recurso improvido.” 11

(Grifos nossos)

Também, o próprio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná já

decidiu de igual modo no seguinte julgamento:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA

AMBIENTAL - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA -

POSSIBILIDADE - ANALOGIA COM O ART. 6º, VIII,

DO CDC - SÚMULA 232 DO STJ - EXIGÊNCIA CABÍVEL

DE DEPÓSITO PRÉVIO DOS HONORÁRIOS - RECURSO

DESPROVIDO. O meio ambiente é bem de uso comum do

11

STJ - REsp: 1049822 RS 2008/0084061-9, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento:

23/04/2009, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/05/2009.

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povo, pertencente a toda a coletividade, incorpóreo,

indisponível, indivisível, inalienável, impenhorável,

essencial à qualidade de vida e à dignidade da pessoa

humana, sem valor pecuniário, cujos danos são de difícil

ou impossível reparação. A produção de prova pericial, seu

custo, ante a inversão e tendo sido pedida também pelo

requerido, deve por este ser suportado. Interpretação

sistemática do art. 6º, inc. VIII, do CPC, art. 33 do CPC,

art. 18 da Lei 7347/85. Invertido o ônus da prova. A

isenção de antecipação atinge somente o autor da ação civil

pública.” 12

(Grifos nossos).

Vislumbra-se dos julgados acima expostos que é perfeitamente

possível e prudente a inversão do ônus da prova em sede de ação civil pública

que tutela o meio ambiente, em razão de o sistema coletivo implicar aplicação

harmônica de suas regras e, principalmente, pelo fato de a ação tutelar direito de

toda a sociedade.

Outro importante fundamento que justifica a inversão do ônus

probatório é o princípio da precaução, pois ao passo em que há indícios da

potencialidade lesiva de determinada conduta ao meio ambiente, esta deve ser

imediatamente impedida, cabendo ao empreendedor responsável pela atividade

em questão comprovar que a sua conduta não gera riscos para o meio ambiente.

Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça em julgamento de questão

semelhante a dos autos:

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO

ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL E

12

TJ-PR - AI: 6892893 PR 0689289-3, Relator: Fabio André Santos Muniz. Data de Julgamento: 14/09/2010, 5ª

Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 479.

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DIREITO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO DE USINA

HIDRELÉTRICA. REDUÇÃO DA PRODUÇÃO

PESQUEIRA. SÚMULA Nº 7/STJ. NÃO CABIMENTO.

DISSÍDIO NOTÓRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA.

DANO INCONTESTE. NEXOCAUSAL. PRINCÍPIO DA

PRECAUÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA

PROVA.CABIMENTO. PRECEDENTES.

(...) 4. O princípio da precaução, aplicável à hipótese,

pressupõe a inversão do ônus probatório, transferindo

para a concessionária o encargo de provar que sua

conduta não ensejou riscos para o meio ambiente e, por

consequência, aos pescadores da região. 5. Agravo

regimental provido para, conhecendo do agravo, dar

provimento ao recurso especial a fim de determinar o

retorno dos autos à origem para que, promovendo-se a

inversão do ônus da prova, proceda-se a novo

julgamento.”13

(Grifos nossos)

No mesmo sentido defende Édis Milaré ao afirmar que em caso de

dúvidas deve-se sempre militar a favor do meio ambiente:

“a ausência de certeza científica absoluta não deve servir

de pretexto para procrastinar a adoção de medidas efetivas

visando a evitar a degradação do meio ambiente. Vale

dizer, a incerteza científica milita em favor do ambiente,

13

STJ - AgRg no AREsp: 206748 SP 2012/0150767-5, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA,

Data de Julgamento: 21/02/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/02/2013

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carregando-se ao interessado o ônus de provar que as

intervenções pretendidas não trarão consequências

indesejadas ao meio considerado. 'O motivo para a adoção

de um posicionamento dessa natureza é simples: em muitas

situações, torna-se verdadeiramente imperativa a cessação

de atividades potencialmente degradadoras do meio

ambiente, mesmo diante de controvérsias científicas em

relação aos seus efeitos nocivos.” 14

Assim, ante a importância do bem tutelado nesta ação e ante a

gravidade dos fatos narrados, torna-se extremamente necessária a inversão do

ônus probatório, com o fim de facilitar a proteção da saúde pública e do meio

ambiente.

IV – DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

A farta prova documental acostada aos autos, principalmente os

relatórios produzidos pela Inspeção Sanitária da Secretaria Municipal de

Agricultura, Pecuária e Meio Ambiente e pelo IAP, dão conta da precariedade

do funcionamento do Matadouro Municipal de Ponta Grossa, operado pela

segunda requerida, sem o devido licenciamento ambiental e com as demais

irregularidades já citadas. Além disso, também restou evidenciado o lançamento

ilegal de resíduos no leito do Rio Verde, em razão da prática do abate irregular

de animais, acarretando danos contínuos e irreversíveis ao meio ambiente.

Todo esse quadro revelado delineia prova inequívoca da

verossimilhança de que ambos demandados são efetivos poluidores, os quais

14

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: doutrina, prática, jurisprudência, glossário. 2. ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2001. p. 119.

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mesmo depois das providências ministeriais e das autuações realizadas pelo

IAP, insistem em perpetuar com a poluição. Deve-se frisar que os demandados

têm todo o conhecimento da poluição e tem toda a condição de supri-la, não se

podendo admitir tamanho descaso com o meio ambiente.

Assim, urge a necessidade da concessão da medida liminar,

antecipando-se os efeitos da tutela pretendida, para o fim de se determinar

a imediata interdição do Matadouro Municipal de Ponta Grossa-PR.

Essa providência, de caráter nitidamente cautelar, está prevista no

artigo 273, inciso I, do Código de Processo Civil15

e no artigo 12 da Lei Federal

n° 7.347/8516

, os quais preveem a possibilidade de liminarmente, isto é, em

caráter de urgência, serem antecipados os efeitos da tutela pretendida,

independentemente de justificação prévia, desde que presentes os requisitos

legais, quais sejam, o fumus boni juris - a fumaça do bom direito - aqui

materializado pelos laudos juntados, pelas imagens e pela farta

documentação inclusa, e o periculum in mora - perigo na demora - que, no

caso em tela está consubstanciado na certeza de irreversibilidade dos danos

ambientais e à saúde pública ocasionados pela continuidade da atividade

irregular desenvolvida pelos requeridos, reforçando-se, novamente, que o

empreendimento do matadouro municipal não possui qualquer espécie de

licença para funcionamento, quer seja ambiental ou sanitária, o que leva,

consequentemente, à clandestinidade e à contínua poluição resultante do

lançamento de resíduos do abate em local inadequado, atingindo, inclusive o

leito do Rio Verde, acarretando, desse modo, prejuízos incalculáveis à vida da

15

“Art. 273: O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela

pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da

alegação e:

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação;”. 16

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

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população de Ponta Grossa, ao passo em que afeta a saúde pública e o equilíbrio

do meio ambiente.

Nesse sentido é o entendimento dos Tribunais ao confirmarem a

concessão da antecipação de tutela em sede de ação civil pública em respeito aos

princípios da precaução e prevenção, pilares do direito ambiental:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA

AMBIENTAL ANTECIPAÇÃO DA TUTELA PARA EXECUÇÃO

DE OBRAS EMERGENCIAIS POR PARTE DE PROPRIETÁRIOS

RESPONSÁVEIS PELA DEGRADAÇÃO DE IMÓVEL TOMBADO

NA AVENIDA PAULISTA - ADMISSIBILIDADE EXISTÊNCIA DOS

REQUISITOS AUTORIZADORES - PREPONDERÂNCIA DOS

PRINCÍPIOS DA PRECAUÇÃO E DA PREVENÇÃO -

DESPACHO MANTIDO – (...) AGRAVO DESPROVIDO. (...)17

Também o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná manteve a

antecipação de tutela deferida em caráter liminar em caso análogo ao da presente

ação:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PEDIDO

DE LIMINAR. INTERDIÇÃO DE MATADOURO. RISCO AO

MEIO AMBIENTE E À SAÚDE DOS CONSUMIDORES DE

CARNES ALI ABATIDAS. DEMONSTRAÇÃO DE

INOBSERVÂNCIA DAS CONDIÇÕES MÍNIMAS DE HIGIENE

SANITÁRIA NO PROCESSO DE ABATE E RETALHAMENTO DOS

BOVINOS. INTERDIÇÃO LIMINAR DO MATADOURO

INDISPENSÁVEL PARA CONTER O AGRAVAMENTO DA

SITUAÇÃO QUE DEU ORIGEM À AÇÃO CIVIL PÚBLICA E

PRESERVAR DE DANOS A SAÚDE DOS CONSUMIDORES E

DA POPULAÇÃO EM GERAL. DECISÃO SINGULAR 17

TJ-SP - AI: 1339494320118260000 SP 0133949-43.2011.8.26.0000, Relator: Renato Nalini, Data de

Julgamento: 20/10/2011, Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Publicação: 28/10/2011.

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REFORMADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. 18

(Grifos nossos)

Pois bem, do exposto, urgente se mostra a concessão da tutela

inibitória antecipada.

Estão presentes a fumaça do bom direito, evidenciada pelos

documentos juntados em anexo e o perigo da demora, já que os danos

ocasionados ao meio ambiente podem assumir caráter irreversível.

Sobre a temática bem afirma Paulo Affonso Leme Machado ao

dizer que “os danos causados ao meio ambiente encontram grande dificuldade

de serem reparados. É a saúde do homem e a sobrevivência das espécies da

fauna e da flora que indicam a necessidade de prevenir e evitar o dano.” 19

Ficou claro que o empreendimento do matadouro municipal está

causando grave dano ambiental e à saúde pública, devendo a sua atividade

nociva ser interrompida imediatamente, Excelência.

Por esse motivo requer-se a concessão de antecipação de tutela,

expedindo-se o competente mandado liminar ordenando a interrupção imediata

de todas as atividades desenvolvidas no matadouro municipal, até que os

requeridos providenciem novo local adequado aos parâmetros e exigências

estabelecidos pelo órgão ambiental e sanitário.

Deste modo, então, requer o Ministério Público seja determinada,

liminarmente, a paralisação imediata das atividades do matadouro, fixando-se

multa cominatória no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais) por dia de

18

TJPR - 4ª C.Cível - AI 0471169-7 - Barbosa Ferraz - Rel.: Desª Maria Aparecida Blanco de Lima - Unanime -

J. 13.01.2009. 19

MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 11ª Edição, Revista, Atualizada em

Ampliada. Malheiros: São Paulo, 2003. pg 331.

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descumprimento, os quais serão destinados ao Fundo Municipal de Defesa do

Meio Ambiente.

V – DOS PEDIDOS

Assim, diante da ausência de licença de operação, de licença

sanitária e de alvará de localização e funcionamento, bem como ante ao fato

de o estabelecimento estar localizado em zona urbana, dentro de área de

preservação permanente, e de inúmeras outras irregularidades, causando

grave poluição e trazendo inúmeros riscos para a saúde pública e para o

meio ambiente ecologicamente equilibrado da região de Ponta Grossa-PR,

requer-se de Vossa Excelência:

a) A autuação da presente petição inicial e dos documentos que a

instruem, bem como o seu recebimento e processamento seguindo o rito

estabelecido pela Lei 7.347/85, com a urgência que o caso requer;

b) A concessão de medida liminar, nos moldes acima delineados,

inaudita altera parte, antecipando-se os efeitos da tutela para determinar-se

aos requeridos a obrigação de não fazer, consistente na imediata interrupção

do funcionamento de suas atividades no “matadouro municipal”, enquanto

não houver a transferência para local adequado e com as devidas licenças

ambientais, sanitárias e alvará de funcionamento, expedidas pelos órgãos

competentes, com a cominação de multa diária em caso de descumprimento da

decisão em valor não inferior a R$ 1.000,00 (mil reais) a ser destinada ao Fundo

Municipal de Defesa do Meio Ambiente;

c) A citação dos requeridos na pessoa dos seus representantes

legais, com o permissivo do artigo 172, parágrafo 2º, do CPC, para querendo,

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responderem e acompanharem os termos da presente, sob pena de serem

considerados como verdadeiros os fatos nesta alegados;

d) Produção de provas por todos os meios em direito admitidos,

inclusive depoimento pessoal dos representantes legais dos demandados, de

prova pericial, documental e testemunhal;

e) O deferimento da inversão do ônus da prova com aplicação de

todas as consequências jurídicas derivadas, nos termos do artigo 21 da Lei nº

7.347/85 c/c artigo 6º, VIII da Lei 8.078/90;

f) A dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros

encargos, nos termos do art.18 da Lei 7.347/85;

g) Ao final, seja julgada procedente a presente Ação Civil Pública,

com a condenação solidária dos requeridos MUNICÍPIO DE PONTA

GROSSA-PR e ASSOCIAÇÃO DO COMÉRCIO E INDÚSTRIA DE CARNES

– PONTA GROSSA – ACIC-PG, confirmando a liminar concedida e impondo

aos requeridos a obrigação de não fazer consistente em cessar definitivamente as

atividades do matadouro municipal no local atual, quer pela transferência

para um local adequado (em zona rural) e devidamente licenciado pelos

órgãos competentes, quer pelo abandono em definitivo da atividade de

abate de animais; bem como seja determinado que promovam a demolição

das atuais instalações do matadouro municipal na parte sobre a área de

preservação permanente, e ainda seja determinado que promovam a

reparação da área de preservação permanente degradada mediante

Plano/Cronograma de operação devidamente autorizado pelo órgão ambiental e

comprovado nos autos, em prazo fixado por Vossa Excelência.

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h) A intimação pessoal do Ministério Público (6ª Promotoria) para

acompanhar todos os atos praticados nos autos ora instaurados.

i) a procedência da ação em todos os seus termos, condenando-se os

demandados ao pagamento das despesas processuais e verbas honorárias de

sucumbência, cujo recolhimento deste último deve ser feito ao Fundo Especial

do Ministério Público do Estado do Paraná, criado pela Lei Estadual n. 12.241,

de 28 de julho de 1998 (DOE n. 5302, de 29 de julho de 1.998), nos termos do

artigo 118, inciso II, alínea “a”, parte final, da Constituição do Estado do Paraná.

Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por ser

inestimável o valor dos bens tutelados.

Nestes termos, pede deferimento.

Ponta Grossa, 10 de outubro de 2013.

HONORINO TREMEA

Promotor de Justiça

Thais Sanson Sene

Assessor de Promotoria

Relação de Documentos Anexados digitalmente:

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Doc. 01 – Termo de Concessão de Uso do matadouro municipal feito pela

Prefeitura Municipal de Ponta Grossa para a Associação do Comércio e

Indústria de Carnes de Ponta Grossa (ACIC-PG), em 01/02/1995. 20

Doc. 02 – Renovação da concessão de uso mediante novo Termo de Concessão

de Uso do matadouro municipal feito pela Prefeitura Municipal de Ponta Grossa

para a Associação do Comércio e Indústria de Carnes de Ponta Grossa (ACIC-

PG), em 01/02/2005. 21

Doc. 03 – Relatório interno da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do

Governo do Paraná.22

Doc. 04 – Termo de Compromisso firmado entre a ACIC-PG e o IAP em

19/01/1996. 23

Doc. 05 – Licença de Instalação de nº 1026 com validade até 28/05/1997. 24

Doc. 06 – Auto de Infração Ambiental nº 36.988 e o respectivo Termo de

Embargo nº 23853. 25

Doc. 07 – AIA nº 27968 e o Termo de Embargo nº 19666. 26

Doc. 08 – Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná na decisão do

MS 1626/2003.

Doc. 09 – Julgamento do Recurso Especial no STJ do MS 1626/2003.

Doc. 10 – Relatório de Inspeção Ambiental elaborado pelo IAP. 27

20

Fls. 98/110 do ICP. 21

Fls. 236/247 do ICP e Lei Municipal nº 8196/2005. 22

Fl. 25 do ICP. 23

Fl. 31/33 do ICP. 24

Fl. 38 do ICP. 25

Fls. 77/81 do ICP. 26

Fls. 03/05, Procedimento Preparatório nº 0113.04.000005-2. 27

Fl. 132 do ICP.

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Doc. 11 – Auto de Infração Ambiental 101754, lavrado em 03/08/2012. 28

Doc. 12 – Anexo I do Relatório de Inspeção Técnica e Investigação Sanitária,

elaborado pelo Serviço de Vigilância Sanitária da Prefeitura de Ponta Grossa. 29

Doc. 13 – Relatório da vistoria conjunta entre a Vigilância Sanitária Municipal,

a Terceira Regional de Saúde/SESA, o Serviço de Inspeção Municipal e o

Serviço de Inspeção do Paraná/SIP/POA. 30

Doc. 14 – Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre a ACIC-PG e o

Ministério Público. 31

Doc. 15 – Termo Aditivo do TAC firmado entre MP e ACIC-PG. 32

Doc. 16 – Laudo de vistoria da última inspeção realizada pelo IAP, em

02/08/2012. 33

Obs. os autos de Inquérito Civil Público e seus anexos, que

embasaram a instauração da presente ação civil pública, foram entregues em

cartório para consulta e utilização no decorrer do processo pelas partes e agentes

do processo.

28

Fl. 572 do ICP. 29

Anexos I, II e III do ICP. 30

Fl. 481 do ICP. 31

Fls. 524/528 do ICP. 32

Fls. 561/563 do ICP. 33

Fls. 569/571 do ICP.