Upload
others
View
17
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
EXMO. SRA. DRA. DESEMBARGADORA 1º VICE-PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
“As hipóteses em que é possível este afastamento, por
determinação do juízo recuperacional, são exclusivamente
as listadas nos incisos deste dispositivo [art. 64 da LRF].
Não pode o juízo recuperacional determinar, por
exemplo, a destituição de administrador ou a
suspensão do direito de voto de acionista na
assembleia geral, sob o fundamento de que não
estaria concordando com as posições exteriorizadas
pelos credores nas negociações do plano de
recuperação, que estaria insistindo demasiadamente
em certas soluções para a crise, ou por qualquer outra
razão senão uma das específica e expressamente
previstas no art. 64. A relação do art. 64, de hipóteses
que autorizam a intervenção do juízo recuperacional na
empresa devedora, é numerus clausus”
(Trecho do parecer jurídico elaborado pelo PROF. FÁBIO
ULHOA COELHO a pedido da Agravante - doc. 10).
“Ainda que o plano de recuperação alterasse regras do
Estatuto Social – com autorização e aprovação em
assembleia geral de acionista – ainda assim, a
arbitragem seria o campo necessário (competente)
para discussão de litígios relacionados ou oriundos
do diploma máximo da companhia com relação aos
sócios, a companhia e a administração”.
(Trecho do parecer jurídico da lavra do PROF. CARLOS
ALBERTO CARMONA em resposta à Agravante - doc. 09).
GRERJ n. 201608381285-97
Distribuição por prevenção à 8ª Câmara Cível
BRATEL S.À.R.L (“AGRAVANTE”), sociedade limitada constituída e
validamente existente sob as leis de Luxemburgo, com sede em Luxemburgo e com
endereço em 69, boulevard de la Pétrusse, L-2320 Luxembourg, inscrita no registro
comercial da Câmara de Comércio sob o número B 212.922, por seus advogados
constituídos nos termos dos instrumentos anexos (doc. 01), com fundamento nos arts.
1.015 e seguintes do Código de Processo Civil, bem como nas demais disposições
pertinentes da Lei das S.A, interpor o presente
AGRAVO DE INSTRUMENTO
COM REQUERIMENTO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA RECURSAL
2
em face da r. decisão de fls. 243.826/243.835 (doc. 04), proferida pelo Juízo da 7ª
Vara Empresarial do Foro da Comarca do Rio de Janeiro/RJ, nos autos da
recuperação judicial de OI S.A. (“OI”) e OUTRAS (em conjunto com a OI,
“Recuperandas”), processo n. 0203711-65.2016.8.19.0000, pelas razões de fato e de
direito expressas na minuta em anexo.
Em atenção ao disposto no art. 1.016, IV, do CPC, a Agravante informa
que é representada pelos advogados Tiago Schreiner Garcez Lopes, OAB/RJ n.
117.852, e Guilherme França, OAB/SP 324.907, ambos com escritório na Rua
Funchal, 418, 11º andar, CEP 04551060, São Paulo – SP (doc. 01).
As Recuperandas, por sua vez, são representadas pelos advogados
Ana Tereza Basilio, OAB/RJ 74.802, com endereço na Avenida Presidente Wilson,
210, 12º andar, CEP 20030-021, Rio de Janeiro - RJ, Paulo Penalva Santos, OAB/RJ
31.636, com endereço na Rua da Assembleia, 10, 38º andar, CEP 20011-901, Rio de
Janeiro - RJ, José Roberto de Albuquerque Sampaio, OAB/RJ 69.747 e Sérgio Savi,
OAB/RJ 106.962, esses últimos com endereço com endereço na Avenida Almirante
Barroso, 52, 31º andar, CEP 20031-000, Rio de Janeiro - RJ (doc. 02).
Em razão da natureza do presente recurso, requer-se ainda a
cientificação do Administrador Judicial dos termos do agravo, nas pessoas de Arnoldo
Wald Filho, inscrito na OAB/SP sob o nº 111.491 e Alberto Camiña Moreira, inscrito na
OAB/SP sob o nº 347.142, com escritório na Av. Presidente Juscelino Kubitschek, 510,
8º andar, São Paulo, SP, 04543-906, nomeado para o cargo pela decisão de fls.
187.886/187.889, e cujo termo de compromisso consta às fls. 91.258.
A Agravante informa, ainda, que o presente recurso é instruído com as
cópias obrigatórias previstas no art. 1.017 do Código de Processo Civil, quais sejam,
(i) da procuração outorgada aos advogados da Agravante e Recuperandas (doc.
01/02); (ii) cópia da petição inicial (doc. 03); (iii) da r. decisão agravada (doc. 04); e (iv)
certidão de intimação (doc. 05).
O recurso também é instruído ainda com documentos adicionais,
listados no Anexo I da presente petição (doc. 06).
3
Ademais, os signatários declaram, sob sua responsabilidade pessoal,
nos termos do art. 425, IV, do CPC, a autenticidade das cópias que formam o
instrumento do agravo (doc. 07).
Por derradeiro, a Agravante requer a juntada da anexa guia
comprobatória do recolhimento das custas de preparo, em cumprimento ao disposto
no art. 1.017, § 1º, do Código de Processo Civil (doc. 08).
Por fim, requer que todas as publicações sejam feitas exclusivamente
em nome do advogado Tiago Schreiner Garcez Lopes, OAB/RJ 117.852, sob pena de
nulidade.
Termos em que, Pede deferimento.
Rio de Janeiro, 07 de fevereiro de 2018.
Tiago Schreiner Garcez Lopes
OAB/RJ 117.852
Guilherme França OAB/SP 324.907
Fábio Rosas OAB/SP 131.524
Juliana Iglesias Vasquez OAB/SP 399.797
4
RAZÕES DE AGRAVO
• Agravante: Bratel S. À. R. L.
• Processo de origem: Recuperação Judicial nº 020371165-2016.8.19.0000
• Juízo de origem: 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro/RJ
1 – DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO
1. A r. decisão agravada foi proferida em 29 de novembro de 2018 e
publicada em 22 de janeiro de 2018 (doc. 05), fazendo iniciar o prazo de 15
dias para interposição do presente recurso.
2. Latente, portanto, a tempestividade do agravo.
2- INTRODUÇÃO
3. Trata-se de recurso de agravo de instrumento contra r. decisão
que, de maneira inédita, promoveu intervenção em sociedade de capital aberto
ao (1) retirar, sem razão justificável, do seu Conselho de Administração os
poderes que lhe competem para aprovação prévia de plano de recuperação
judicial da OI apresentado em juízo e (2) concentrar os poderes da maior
empresa de telecomunicação do país em uma única pessoa, um Diretor
Estatutário, designando-o como o único responsável pela condução das
negociações com os credores e pela apresentação do plano de recuperação
judicial que seria levado a votação em assembleia de credores.
4. A Agravante é a maior acionista individual da OI, detentora, nesta
data, de 22,24% do total das ações de emissão da companhia.
5. A decisão agravada justificou (a injustificável) medida com base
no aparente conflito de interesses entre os acionistas, corpo diretivo da
companhia e “credores relevantes”, bem como que na intenção de
supostamente assegurar estabilidade à companhia na condução das
5
negociações das condições do plano e do processo de soerguimento das
Recuperandas.
6. Ou seja, decidiu-se que o melhor interesse de uma companhia
aberta não mais pertenceria àqueles que possuem o poder-dever de preservá-
lo, mas sim foram erroneamente transmitidos a um único indivíduo, apenas
com base em um critério não previsto em lei e criado, sem precedentes, pela
decisão agravada, obstando os conselheiros e determinados diretores da
companhia de participarem do processo de recuperação da OI.
7. Em verdade, a estabilidade almejada não vai ser alcançada por
meio das constantes interferências do Poder Judiciário nas vontades e
decisões interna corporis da companhia. Tais intervenções, aliás, sequer
cabem à jurisdição do Poder Judiciário, em razão da cláusula compromissória
arbitral prevista no Estatuto Social da Oi.
8. E isto porque, com a devida vênia, não cabe ao Poder Judiciário
imiscuir-se em questões corporativas e negociais para afirmar que uma ou
outra pessoa no cargo de administração seria melhor do que outra que foi
afastada.
9. Ademais, essa forma heterodoxa de se conduzir um processo de
recuperação judicial causa ainda mais instabilidade, porquanto os acionistas se
veem obrigados a tutelar seus direitos de forma litigiosa em outras esferas que
fogem da estrutura interna de poder e controle (governança) da Companhia.
10. Por fim, não se pode acreditar que o afastamento dos
administradores e diretores da OI atenda ao melhor interesse das
Recuperandas e ao soerguimento do grupo.
11. De outro lado, é certo que a r. decisão comporta reforma por esse
E. Tribunal de Justiça, na medida em que:
(i) Não cabe ao Poder Judiciário se imiscuir nas deliberações
internas da OI, em razão da falta de jurisdição para tal;
6
(ii) A subtração de poderes do Conselho de Administração e
de determinados diretores da OI não encontra qualquer respaldo
legal ou sequer foi devidamente fundamentada pelo MM. Juízo a
quo, sendo certo que nenhum dos administradores indiretamente
afastados adotaram qualquer medida que se identificasse com as
hipóteses do art. 64 da LRF;
(iii) Houve latente interferência do MM. Juízo a quo nas
atribuições dos órgãos da companhia, em violação frontal à
legislação societária, que, ao contrário do quanto asseverado, não
deve ser sobreposta à legislação falimentar, mas sim deve ocorrer
uma aplicação harmônica de ambas as normas jurídicas;
12. É o que passa a demonstrar.
3 - PRELIMINARMENTE: DA NULIDADE DA D. AGRAVADA AUSÊNCIA DE JURISDIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO
13. A r. decisão agravada, dentre outras determinações, nomeou um
Diretor da OI para que assumisse as rédeas das negociações junto aos
credores e, ao final, apresentasse em juízo a versão do plano de recuperação
judicial que seria submetida à apreciação pelos credores das Recuperandas.
14. O provimento foi exarado em um contexto no qual o Conselho de
Administração da OI, como único órgão competente para tanto, rejeitou o plano
de recuperação alternativo (“PRJ Alternativo” – doc. 13) apresentado por um
grupo de credores – essencialmente credores internacionais1 -, e nomeou, para
1 Os denominados “fundos abutres” correspondem a determinados credores bondholders das
Recuperandas., quais sejam, (1) Capricorn capital, ltd., (2) Syzygy capital management, ltd., (3) York global finance fund, l.p., (4) citadel equity fund ltd., (5) canyon capital finance s.à.r.l., (6) Goldentree distressed fund 2014 LP; (7) gn3 sip limited; (8) GN3 sip LP, (9) the Louisiana state 4 employees retirement system, (10) Goldentree insurance fund series interests of the sali multi-series fund, LP, (11) Goldentree distressed master fund 2014 ltd, (12) Goldentree master fund, ltd., (13) gold coast capital subsidiary x limited, (14) Goldentree e distressed debt master fund ii lp, (15) Goldentree NJ distressed fund 2015, LP, (16) GT nm, LP, (17) Goldentree credit opportunities master fund, ltd., (18) Goldentree multi-sector master fund Icav – Goldentree multisector master fund portfolio a, (19) stellar performer global series: series g – global credit, (20) Goldentree entrust master fund SPC, em nome de segregated portfolio i., (21) Goldentree e distressed debt fund ii LP (22) Goldentree master fund ii, ltd., (23) benefit street credit
7
os cargos vacantes da Diretoria da companhia – como igualmente incumbia ao
Conselho fazer – dois conselheiros, os srs. Hélio Costa e João Vicente Ribeiro.
15. Nesse diapasão, a subtração de poderes do Conselho de
Administração para tratar dos assuntos atinentes à presente recuperação
judicial, bem como o afastamento dos dois diretores recém-nomeados pelo
órgão competente foi justificado no suposto “conflito de interesses entre alguns
acionistas, a Diretoria das recuperandas e o universo de credores”.
16. Acontece que, conforme consta da ata da reunião do Conselho de
Administração realizada em 03 de novembro de 2017 (doc. 16), tem-se que o
PRJ Alternativo foi rejeitado pelos conselheiros administrativos em decisão
regular colegiada e devidamente fundamentada, representando questão
naturalmente negocial e eminentemente societária, interna corporis.
17. Interna corporis, porque a decisão de rejeição do PRJ Alternativo
pelos conselheiros consiste no exercício puro e simples do dever de fidúcia do
aludido órgão, ou seja, no dever de “zelar pela preservação dos interesses e
investimentos dos acionistas realizados na companhia, indispensáveis, em
tempos pretéritos, à sua capitalização e à capacitação econômica para o
desenvolvimento de seu objeto”2, dever este que se faz presente mesmo no
regime concursal como o é o da recuperação judicial3.
18. Outrossim, a nomeação de pessoas para integrarem o corpo
diretivo da companhia também corresponde à gama de assuntos internos da
companhia. Assim, as deliberações do Conselho de Administração não podem
estar sujeitas à jurisdição do Poder Judiciário, mas sob jurisdição arbitral, em
razão de cláusula compromissória presente do Estatuto da OI.
alpha master fund ltd., (24) Blackrock strategic fund, (25) Brookfield credit opportunities master fund, L.P.; (26) redwood drawdown master fund, L.P.; e (27) redwood master fund, ltd., (27) BNP Paribas fortis SA/NY, e (28) KFW Ipex-bank GMBH 2 Vide parecer exarado pelo Prof. Sérgio Campinho em consulta realizada pelo acionista Fundo Societé
Mondiale (p. 11) 3 Idem.
8
19. Ademais, como exposto no item 4.4 abaixo, ainda que se entenda
que administradores devem ter seus poderes suprimidos, nos termos do art. 64
da LRF, não cabe ao Judiciário fixar ou eleger quem deva exercer tais poderes,
e sim aos órgãos internos competentes para tal, na forma do Estatuto. Caberá
ao Tribunal Arbitral solucionar eventual litígio na escolha de um novo
administrador para exercer um cargo objeto de decisão de afastamento.
20. Isso porque, assim dispõe o art. 68 do Estatuto da OI:
“Art. 68 – A Companhia, seus acionistas, administradores e os membros
do Conselho Fiscal, obrigam-se a resolver, por meio de arbitragem,
perante a Câmara de Arbitragem do Mercado, toda e qualquer disputa
ou controvérsia que possa surgir entre eles, relacionada com ou
oriunda, em especial, da aplicação, validade, eficácia,
interpretação, violação e seus efeitos, das disposições contidas na
Lei das Sociedades por Ações, no estatuto social da Companhia,
nas normas editadas pelo Conselho Monetário Nacional, pelo
Banco Central do Brasil e pela CVM, bem como nas demais normas
aplicáveis ao funcionamento do mercado de capitais em geral, além
daquelas constantes do Regulamento do Nível 1, do Regulamento de
Arbitragem, do Regulamento de Sanções e do Contrato de Participação
no Nível 1 de Governança Corporativa.
21. Como é cediço, o art. 109, §3º da Lei das S.A. possibilita a
solução de “divergências entre os acionistas e a companhia, ou entre os
acionistas controladores e os acionistas minoritários” mediante arbitragem.
22. Acrescente-se que a cláusula de eleição de foro arbitral foi
incluída justamente para atender ao interesse do mercado investidor em ver os
conflitos solucionados de forma privada, com as benesses daí decorrentes,
como é praxe em questões dessa natureza. Desrespeito à cláusula
compromissória importaria em descrédito da própria OI perante novos
investidores – que neste momento se mostram a maior possibilidade de real
soerguimento das Recuperandas.
9
23. Para que não pairassem dúvidas acerca do tema, a Agravante
formulou consulta independente a um dos coautores da Lei de Arbitragem,
PROFESSOR CARLOS ALBERTO CARMONA (doc. 09), que concluiu: “o Juízo da RJ
não detém jurisdição para julgar demandas que envolvam OI, seus acionistas e
administradores e que versem sobre violações à LSA e/ou observância às
normas previstas no Estatuto”:
“60. A superveniência da recuperação judicial de OI não infirma a
validade e a eficácia da referida cláusula arbitral estatutária. Isso porque
– ao contrário do que ocorreria em processo falimentar – a recuperação
judicial, cujo processamento foi deferido em 29.06.2016, não visa à
liquidação da Companhia, mas sim a uma reestruturação temporária
que viabilize a manutenção das suas atividades e, assim, permita o
cumprimento de suas obrigações frente a credores, gerando empregos
e estimulando a economia.
(...)
64. Disso decorre que os fins da recuperação judicial e as normas
que a regem não derrogam as regras previstas na LSA ou criam um
arcabouço normativo diferenciado para os atos internos da
recuperanda. Não há modificação dos direitos dos acionistas no âmbito
intrassocietário apenas pelo fato de existirem interesses não privados
em favor do soerguimento econômico e financeiro da Companhia. Não
há, portanto, alteração da validade e eficácia da cláusula 68 do Estatuto
em decorrência da decretação da recuperação judicial – pelo fato de a
Companhia restar plenamente capaz de contratar e de os direitos
submetidos à cláusula compromissória estatutária continuarem
patrimoniais e disponíveis – razão pela qual permanece vigente a
reserva à jurisdição arbitral por aquele dispositivo.
65. É imperativo reconhecer, portanto, que o Juízo da RJ não detém
jurisdição para julgar demandas que envolvam OI, seus acionistas e
administradores e que versem sobre violações à LSA e/ou observância
às normas previstas no Estatuto, por força da convenção de arbitragem
disposta na sua cláusula”
10
24. O I. Processualista esclarece que a solução não é outra em razão
do conteúdo do plano que veio a ser aprovado e eventual modificação das
regras do Estatuto. O juízo arbitral e o juízo recuperacional coexistem, sendo a
arbitragem o foro correto para disputas internas da sociedade – como a
aprovação interna do conteúdo do plano de recuperação. Confira-se:
“68. Ainda que o plano de recuperação alterasse regras do Estatuto
Social – com autorização e aprovação em assembleia geral de acionista
– ainda assim, a arbitragem seria o campo necessário (competente)
para discussão de litígios relacionados ou oriundos do diploma máximo
da companhia com relação aos sócios, a companhia e a administração.
69. Na realidade, há distinção clara entre a competência do juízo
arbitral e a do recuperacional, que não se entrelaçam; mas coexistem,
lado a lado, de forma harmônica. Isso porque, ao juízo arbitral devem
ser submetidas disputas intrassocietárias abarcadas pela convenção de
arbitragem, que versam sobre relações jurídicas entre acionistas, OI e
sua administração. Seria o caso, por exemplo, de ação buscando a
responsabilização do Diretor Presidente por aprovar plano sem ter
previamente consultado o Conselho de Administração e ter submetido
seu conteúdo à Assembleia Geral – contrariando o Estatuto da
Companhia – em violação a seus deveres fiduciários (vide item IV, “e”,
supra). Outro exemplo, sempre aproveitando o caso concreto, seria a
discussão sobre o direito de acionista convocar Assembleia Geral.
Cristalino, pois, que não se trata de discutir, no juízo arbitral, questões
atinentes à validade e à eficácia do PRJ, à sua aprovação e
homologação pelo Juízo da RJ e a quaisquer atos que sejam
relacionados à atividade de fiscalização dos atos da recuperação
judicial realizadas por aquele juízo” (doc. 09).
25. A conclusão do parecer tem eco também na prática forense e na
doutrina.
26. De acordo com Enunciado nº 6 aprovado na I Jornada “Prevenção
e Solução Extrajudicial de Litígios”, organizada pelo Conselho da Justiça
Federal:
11
“O processamento da recuperação judicial ou a decretação da falência
não autoriza o administrador judicial a recusar a eficácia da convenção
de arbitragem, não impede a instauração do procedimento arbitral, nem
o suspende.”
27. A jurisprudência já decidiu que a cláusula compromissória
permanece eficaz até em caso de liquidação da sociedade4, no qual tem-se (1)
o afastamento do devedor da empresa, (2) a vis attractiva do juízo falimentar e
(3) normas autorizando o descumprimento de contratos pela massa (arts. 117 e
118 da LRF) – todos conceitos inaplicáveis à recuperação judicial. Assim,
menos razão ainda haveria para desconsiderar a eleição de foro arbitral
prevista no Estatuto Social da OI.
28. Ausente qualquer limitação na LRF, eventual óbice à arbitragem é
averiguado no art. 1º da Lei de Arbitragem: “As pessoas capazes de contratar
poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos
patrimoniais disponíveis”.
29. Os direitos em discussão são plenamente disponíveis, como
leciona o próprio autor do parecer jurídico apresentado pela Diretoria da Oi,
PROF. NELSON EIZIRIK. Em doutrina, afirma que “todas as matérias que podem
ser validamente decididas pela companhia são arbitráveis, pois se
referem à sua autonomia privada”:
4 “Em que pese o respeito à argumentação adotada, mesmo considerando-se que no processo de falência
há interesses da coletividade dos credores do devedor comum, não se entrevê qualquer impedimento ao cumprimento de convenção de arbitragem pactuada anteriormente à decretação da falência, em cláusula prevista no contrato firmado por pessoas jurídicas, regularmente constituídas e apresentadas na forma de seus atos constitutivos, com plena capacidade negocial e tendo por objeto direitos patrimoniais disponíveis, conforme estabelece o art. 1º, da Lei n.º 9.307, de 1996.” (TJSP - Agravo de Instrumento n.º 531.020-4/3-00 - Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais - Rel. Pereira Calças- j. em 25/06/2008. “O primeiro aspecto a ser ressaltado é que a cláusula compromissória foi firmada pelas partes antes da decretação da liquidação extrajudicial da INTERCLÍNICAS, oportunidade em que esta detinha capacidade plena para contratar, tendo então optado por sujeitar à arbitragem a resolução de direitos patrimoniais disponíveis, concernentes à transferência de sua carteira de clientes. Assim, no ato de celebração do compromisso arbitral estavam presentes tanto o seu requisito subjetivo, previsto na primeira parte do art. 1º da Lei nº 9.307/96, consistente na capacidade civil para contratar, quanto seu requisito objetivo, também contido no referido art. 1º, in fine, correspondente à disponibilidade do direito patrimonial. Não há, pois, dúvida alguma acerca da validade da cláusula compromissória na espécie.” (STJ - Medida Cautelar n.º 14.295-SP - Rel. Min. Nancy Andrighi - Decisão monocrática proferida em 09/06/2008). Ainda, acórdão do TJSP “A superveniência da massa falida e indisponibilidade de seus bens não impede a aplicação da Lei n° 9307/96, prosseguindo-se o processo de arbitragem com a participação do administrador judicial” (TJSP - Embargos de Declaração nº 644.204-4/4-01 – Rel. Des. Maia da Cunha).
12
“As 2 (duas) principais discussões sobre arbitragem em Direito
Societário são: a arbitrabilidade objetiva, ou ratione materiae, que
consiste em verificar que matérias podem ser objeto de arbitragem; e a
arbitrabilidade subjetiva, ou ratione personae, que consiste na
identificação das pessoas que estão sujeitas à cláusula compromissória
estatutária.
Com relação à arbitrabilidade objetiva, a lei 9.307/96 estabeleceu que
podem ser dirimidas pela via arbitral questões relativas a "direitos
patrimoniais disponíveis". No mesmo sentido, dispõe o Código Civil
(clique aqui) ser vedado o compromisso para solução de conflitos de
Estado, de direito pessoal de família e de outros que não tenham
caráter estritamente patrimonial.
(...)
Pode-se entender como arbitráveis todas as questões relacionadas
às decisões de assembleias gerais, uma vez que tratam de direitos
que não só caracterizam-se como patrimoniais, como, também, são
disponíveis no âmbito interno da companhia. Assim, todas as matérias
que podem ser validamente decididas pela companhia são
arbitráveis, pois se referem à sua autonomia privada”5.
30. É irrelevante que os credores tenham, posteriormente à decisão
agravada, aprovado um plano de recuperação. A assembleia de credores é o
órgão deliberativo dos credores, no qual se apura se um dos polos da relação
obrigacional aprovou adequadamente a celebração do negócio – ou seja, se os
credores anuíram ao plano de acordo e com os quóruns definidos na LRF.
31. A assembleia em absolutamente nada afeta o outro polo da
relação obrigacional, qual seja, o polo formado pela sociedade devedora. Esse
tema foi tratado em parecer específico da lavra do PROF. FÁBIO ULHOA COELHO
(doc. 10), em minuciosa análise na qual examina a questão aqui debatida:
De qualquer forma, a deliberação dos credores em AGC não tem o
efeito jurídico de formação da vontade da devedora! Ela forma única e
5 Eizirik, Nelson, “Cláusula compromissória estatutária – A arbitragem na companhia”. In
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI145329,51045-Clausula+compromissoria+estatutaria+A+arbitragem+na+companhia, acesso em 03 de fevereiro de 2018.
13
simplesmente a vontade do polo ativo do acordo recuperacional; nunca
a do polo passivo.
Quer dizer, não basta constar de um plano de recuperação aprovado
pela AGC para suas cláusulas serem vinculativas para a pessoa jurídica
da sociedade anônima devedora. É necessário, ainda, que esta tenha
tido a sua vontade de concordar com tais cláusulas formada regular,
válida e eficazmente, por meio de deliberação dos seus órgãos
societários competentes (doc. 10).
32. Assim, foge à Jurisdição estatal se pronunciar sobre o tema, posto
que envolve questão atinente à administração da Oi e prerrogativas conferidas
a seus acionistas e conselheiros, havendo evidente falta de jurisdição ao se
decidir pela desnecessidade de se realizar a assembleia de acionistas.
4 – DO MÉRITO
4.1 – AFASTAMENTO DOS ADMINISTRADORES NÃO JUSTIFICADO
33. Caso a preliminar de ausência de jurisdição do Poder Judiciário
para nomeação de Diretor Presidente da Companhia não seja afastada, o que
se admite apenas para argumentar, é certo que no mérito o decisum guerreado
também comporta reforma no mérito.
34. Ao transferir os poderes para o Diretor Presidente, a r. decisão
agravada retirou dos demais administradores as funções de negociação e
elaboração do plano de recuperação judicial. Na prática, o MM. Juízo a quo
afastou todos conselheiros e demais diretores de funções que lhes são
conferidas por força de lei e Estatuto social da companhia.
35. Acontece que não restou sequer minimamente configurada
qualquer das hipóteses que autorizam o afastamento do corpo administrativo e
diretivo da companhia em crise.
36. Como se sabe, consoante o art. 64 da LRF, o devedor em
14
recuperação judicial e seus administradores serão mantidos na condução da
atividade empresarial, salvo se ocorrer alguma das situações previstas em
seus incisos6.
37. A respeito das hipóteses de afastamento da companhia e seus
administradores da manutenção da atividade negocial, leciona a doutrina que
“contempla[m] situações cuja gravidade o legislador considerou suficiente[s]
para dispensar o debate acerca da virulência dos atos dos administradores e
da capacidade destes de orientar a empresa em direção à superação da
crise”7.
38. Tratam-se, portanto, de situações excepcionais de cunho grave,
ligadas, em sua grande maioria, a atos criminosos ou de fraude em prejuízo da
companhia. Em poucas palavras: a manutenção da administração é regra;
o seu afastamento, exceção.
39. E, justamente por se tratar de norma restritiva de direitos8, o art.
64 da LRF estabelece um rol taxativo de hipóteses – que devem ser
interpretadas restritivamente –, nas quais pode vir a ocorrer o afastamento da
administração da companhia.
6 Art. 64. Durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão
mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, salvo se qualquer deles: I – houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente; II – houver indícios veementes de ter cometido crime previsto nesta Lei; III – houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores; IV – houver praticado qualquer das seguintes condutas: a) efetuar gastos pessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial; b) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas; c) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular; d) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação de que trata o inciso III do caput do art. 51 desta Lei, sem relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial; V – negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê; VI – tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial. 7 Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas: Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de
2005 / coordenadores Osmar Brina Corrêa-Lima, Sérgio Mourão Corrêa Lima. – Rio de Janeiro : Forense, 2009, p. 430 8 Cf. Modesto Carvalhosa. Comentários à Lei de Sociedades Anônimas. Ed. de 1997. São Paulo, Saraiva,
1997, vol. 2, p. 443; Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas: Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 / coordenadores Osmar Brina Corrêa-Lima, Sérgio Mourão Corrêa Lima. – Rio de Janeiro : Forense, 2009, p. 432
15
40. O Professor FÁBIO ULHOA COELHO, em elucidativo parecer
endereçado à Agravante (doc. 10), registrou que:
“As hipóteses em que é possível este afastamento, por determinação do
juízo recuperacional, são exclusivamente as listadas nos incisos deste
dispositivo [art. 64 da LRF]. Não pode o juízo recuperacional
determinar, por exemplo, a destituição de administrador ou a
suspensão do direito de voto de acionista na assembleia geral, sob
o fundamento de que não estaria concordando com as posições
exteriorizadas pelos credores nas negociações do plano de
recuperação, que estaria insistindo demasiadamente em certas
soluções para a crise, ou por qualquer outra razão senão uma das
específica e expressamente previstas no art. 64.
A relação do art. 64, de hipóteses que autorizam a intervenção do
juízo recuperacional na empresa devedora, é numerus clausus”
(doc. 10).
41. Fixada essa premissa, veja-se que não há, nos autos ou na
decisão agravada, sequer menção de qualquer hipótese de afastamento
prevista no art. 64 da LRF.
42. Em verdade, ainda que se queira, contra legem, ampliar as
hipóteses de aplicação do art. 64, também não se encontraria motivo suficiente
para tal.
43. Com efeito, conforme se verifica da ata da reunião do Conselho
de Administração realizada em 03.11.2017 (doc. 16), o aludido órgão apenas
deliberou e decidiu, dentre outros assuntos, pela (i) rejeição de uma
correspondência – não vinculante – enviada por determinados credores
internacionais (o PRJ Alternativo), e pela (ii) eleição de dois novos diretores
estatutários para cargos vacantes da diretoria.
44. Nesse sentido, não se vislumbra, em qualquer das deliberações
tomadas pelo Conselho de Administração da OI, possibilidade de
16
enquadramento dos administradores (ou acionistas) em alguma das condutas
previstas no art. 64 da LRF.
45. Como já adiantado, a rejeição do PRJ Alternativo decorre simples
e principalmente do dever fiduciário que possuem os conselheiros em relação à
OI, resultando em uma deliberação interna e corporativa do Conselho.
46. Ninguém discorda que um plano de recuperação importa em
concessões mútuas e em um equilíbrio de sacrifícios por todos os
stakeholders. No entanto, independentemente das proporções que
notadamente acometem esse procedimento, o dever de diligência dos
administradores - o qual importa na obrigação de gerir o patrimônio alheio
como se seu próprio fosse – deve ser observado. Ao ser consultado sobre o
presente caso, o PROF. SÉRGIO CAMPINHO ensina que “a tutela dos direitos
patrimoniais dos acionistas não desaparece no regime de recuperação da
companhia. (...) jamais poderá ser subjugada e, muito menos, aniquilada” (doc.
11)9.
47. E, como corretamente consignado pelo D. Ministério Público10 e
reiterado pela própria r. decisão agravada11, não cabe ao Poder Judiciário
exercer um juízo de valor sobre as condições previstas no plano de
recuperação judicial.
48. No entanto, mesmo declarando-se ciente de que não lhe cabe
apreciar o mérito do plano de recuperação judicial, o MM. Juízo de piso afastou
os conselheiros em razão do suposto “tumulto” causado na administração da
companhia justamente pela rejeição do PRJ Alternativo.
9 Vide parecer exarado pelo Prof. Sérgio Campinho em consulta realizada pelo acionista Fundo Societé
Mondiale (p. 11) 10
“traduz[em] aspecto econômico defeso de considerações por parte do juízo e do MP” e “seus destinatários são os credores (não apenas parte deles, ainda que representem fração expressiva da dívida total) e a sede e momento adequados para aferição de seus termos é a AGC” (fl. 242.370); e (ii) “reexaminando os diversos incisos do art. 64 da LFRE/2005, não consegue o MP entrever que os requeridos [diretores, conselheiros e acionistas] tenham diretamente incorrido em quaisquer condutas consideradas como ensejo do afastamento” (decisão agravada). 11
“O juiz não pode analisar as questões negociais e os aspectos econômicos e financeiros do plano de recuperação. Trata-se, em verdade, de prerrogativa do credor que irá aprovar, rejeitar ou propor modificações ao plano”.
17
49. Ora, jamais se poderia imaginar que o plano de recuperação
judicial do maior processo recuperacional da América Latina seria negociado
sem quaisquer empecilhos, sem dificuldades e sem maiores discussões.
50. Acontece que as negociações que norteiam a elaboração de um
plano de recuperação judicial nem sempre são práticas e objetivas; pelo
contrário, demandam trabalho e sacrifício de todos os interessados no
soerguimento da companhia em crise. Mas nem por isso pode-se dizer que o
andamento das negociações está caracterizando um tumulto na OI.
51. Outrossim, a nomeação de dois novos Diretores foi levada a cabo
após a renúncia voluntária do ex-diretor Ricardo Malavazi em 02 de outubro de
2017, bem como do então diretor presidente Marcos Schroeder, pelo que a OI
passou a operar com apenas 02 (dois) Diretores – ao passo que três é o
mínimo de diretores estatutários para que o corpo diretivo da companhia esteja
regular12.
52. Nesse diapasão, a medida adotada pelos conselheiros encontrava
respaldo tanto na legislação societária13, no Estatuto Social da OI14, e no
contexto fático de crise econômico-financeira em que se encontra(va) a
companhia, que necessitava urgentemente reconstruir sua Diretoria.
53. E nem se alegue que a nomeação do Diretor Jurídico como
Diretor Presidente, pelo Conselho, significou concordância para que fosse
suprimida a competência do Conselho de Administração e para a elaboração
unilateral do plano de recuperação pelo referido Diretor.
54. Uma coisa é nomear um indivíduo para o cargo de Diretor-
Presidente, cujas atribuições e poderes são circunscritos à alçada de diretoria.
12
“Art. 35 - A Diretoria será composta por, no mínimo, 3 (três) e, no máximo, 6 (seis) membros, sendo um Diretor Presidente, um Diretor de Finanças, um Diretor de Relações com Investidores e um Diretor Jurídico, e os demais serão Diretores sem designação específica, eleitos pelo Conselho de Administração”. 13
“compete ao conselho de administração [...] eleger e destituir os diretores da companhia e fixar-lhes as atribuições” (LSA, art. 142, II). 14
“compete ao Conselho de Administração [...] eleger e destituir, a qualquer tempo, os Diretores da Companhia, fixando-lhes as atribuições, observadas as disposições legais e estatutárias” (art. 32, VI).
18
Já a aprovação interna do plano de recuperação judicial é do Conselho de
Administração, órgão colegiado formado por 11 indivíduos, hierarquicamente
superior à Diretoria. Isso sem mencionar, é claro, que outras matérias
dependem de aprovação dos acionistas, como o aumento de capital ou a
própria alteração do conselho de administração.
55. Ao ser consultado por outro acionista acerca desse tema, o PROF.
FRANCISCO SATIRO concluiu em nota técnica que a competência para
elaboração do plano é do Conselho de Administração, exceto a respeito de
temas reservados à assembleia de acionistas. Confira-se:
As medidas de recuperação, no entanto, não são reservadas à
Assembleia Geral [de credores] – nem poderiam. Não há na Lei das
S/As uma previsão específica sobre planos de recuperação judicial. De
maneira geral, como o Conselho de Administração tem competência
para a orientação geral dos negócios da companhia (art. 142, I) não
parece haver dúvidas de que lhe cabe a última palavra sobre o plano de
recuperação judicial (p. 4, doc. 12).
56. Ou seja, não há rigorosamente nenhuma circunstância que
justifique a atuação ex officio do MM. Juízo a quo, como de fato o fez ao
nomear um único Diretor para que concluísse - sozinho - as negociações para
apresentação do plano de recuperação judicial, menoscabando os poderes – e
deveres - detidos pelo Conselho de Administração.
57. Nesse sentido, o que se tem é que a r. decisão agravada é
carente de fundamentação, porque simplesmente afasta pessoas
legitimamente eleitas para seus respectivos cargos sem realizar a devida
correspondência com a suposta conduta ilícita e o seu enquadramento legal.
4.2 – INTERFERÊNCIA INDEVIDA NAS ATRIBUIÇÕES DOS ÓRGÃOS DA OI
58. É igualmente certo que houve uma interferência descabida nas
funções exercidas pelos órgãos internos da companhia, invertendo-se
atribuições legais ao conferir à Diretoria da OI as funções e deveres legal e
19
exclusivamente pertencentes ao Conselho de Administração e à Assembleia de
Acionistas.
59. E tudo isso ocorreu em um cenário no qual supostamente a
legislação falimentar e societárias seriam conflitantes, de modo que as regras
atinentes à reestruturação da companhia devessem se sobressair em relação à
norma reguladora das sociedades anônimas.
60. Em primeiro lugar, deve-se ter presente que não há nada nos
autos que permita afirmar que a medida promovida pela decisão agravada fora
benéfica à recuperação judicial. A aprovação maciça do plano de recuperação
elaborado pelo Diretor-Presidente, aliás, reforça que a medida não foi benéfica.
61. Como bem anotou o PROF. FÁBIO ULHOA em sua análise deste
caso, “É ingenuidade considerar que a deliberação dos credores, em AGC,
aprovando um plano de recuperação representaria sempre a realização do
princípio da preservação da empresa”.
62. Bem destaca15 o parecer que o plano pode embutir vantagens
despropositadas a determinados credores. É exatamente o caso dos autos, em
determinados credores vêm conduzindo de forma beligerante a recuperação
judicial desde o seu início e receberam benefícios exclusivos no PRJ Diretoria,
tais como prêmios multimilionários e, até mesmo, somente eles, o reembolso
de honorários gastos com os advogados. Frise-se: conforme o plano elaborado
pela Diretoria, a OI deveria pagar os custos que tais credores tiveram para, por
exemplo, pedir sua falência da Holanda.
63. Deve-se também ter em mente que as legislações societária e
recuperacional não colidem, mas sim coexistem entre si, de modo que cabe ao
intérprete se utilizar da técnica de freios e contrapesos a fim de alcançar uma
15
“Um plano de recuperação pode, nos meandros de complexas operações financeiras, perfeitamente embutir vantagens despropositadas à parcela dos credores de maior ativismo. A implementação de plano deste jaez, em consequência, coloca em risco até mesmo a sobrevivência da devedora, frustrando o princípio da preservação da empresa. A premissa de que os credores estariam sempre interessados na recuperação do devedor não é invariavelmente verdadeira; por vezes, estão agindo apenas sob o impulso do “salve-se quem puder!”.
20
solução que seja adequada ao ordenamento jurídico quando analisada à luz de
ambos os diplomas.
64. Um exemplo prático de tal afirmativa se encontra no art. 50 da
LRF, o qual prevê a observância das regras específicas aplicáveis a cada meio
de recuperação escolhido pelo devedor, de modo que seja elaborado um plano
de recuperação judicial em uma perspectiva jurídica global, respeitadas as
normas aplicáveis.
65. O prof. FÁBIO ULHOA COELHO, ainda no âmbito do parecer
elaborado em resposta à consulta da Agravante, não poderia ser mais
elucidativo:
“Uma vez mais, percebe-se que não existe nenhum conflito normativo
entre os preceitos do direito recuperacional e os do direito societário. O
Poder Judiciário, assim, não é chamado a resolver nenhum conflito
normativo, que sequer existe. Descabe, por consequência, invocar-se o
princípio da recuperação da empresa, ou outro qualquer, com a
finalidade de superar uma inexistente antinomia entre os diplomas em
questão (LRF ou LSA)” (doc. 10).
66. E é essa mesma dinâmica de coexistência de normas jurídicas
que deve ser observada no tocante às atribuições dos órgãos da companhia –
mas que foi absolutamente desprezada pela decisão agravada.
67. A Lei das S.A. prevê expressamente as atribuições de cada órgão
deliberativo de uma companhia aberta. Compete à assembleia-geral de
acionistas, por exemplo, decidir sobre o pedido de recuperação judicial do
devedor16. Por seu turno, ao Conselho de Administração da companhia é
atribuída, dentre outras, a função de “fixar a orientação geral dos negócios da
companhia”, donde se inclui a negociação e elaboração do plano de
recuperação judicial do devedor.
16
“Art. 122. Compete privativamente à assembleia geral: (...) IX - autorizar os administradores a confessar falência e pedir concordata”.
21
68. Essa competência é atribuída ao Conselho Administração
principalmente em razão dos deveres fiduciários (art. 15317 da Lei das S.A) e
de lealdade (art. 15518 da Lei das S.A) que os conselheiros devem guardar em
relação à companhia administrada.
69. Nesse diapasão, aos conselheiros cabem “dispor de bens alheios
– os da companhia – como um proprietário, em decorrência do exercício da
gestão da companhia”19, sempre manifestando-se com zelo e o cuidado
devidos, “seja nos negócios ordinários, seja nos relevantes ou extraordinários
que ocorrem no curso da existência da companhia”20
70. E, como se sabe, trata-se de competência exclusiva do Conselho
de Administração, fixada por lei e indelegável por aqueles que detêm tais
poderes21. À diretoria de uma sociedade por ações, portanto, não caberia tal
função, ainda de acordo com o PROF. FRANCISCO SATIRO:
“O plano, como visto, não é ato de gestão ordinária da companhia. Não
cabe originalmente à diretoria definir seus termos ou suas modificações.
Se a diretoria está autorizada a propor determinado plano já aprovado
pelas instâncias competentes (Conselho de Administração, Assembleia
Geral e eventualmente até comitê financeiro) sua alteração demandará
nova aprovação, salvo se houver expressa autorização para atuação
discricionária dos diretores, e ainda assim somente quanto a assuntos
que não digam respeito a matérias de competência exclusiva de outros
órgãos. Afinal, lembre-se que as competências exclusivas previstas pela
Lei das S/As não são delegáveis” (doc. 12).
17
“Art. 153. O administrador da companhia deve empregar, no exercício de suas funções, o cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios”. 18
“Art. 155. O administrador deve servir com lealdade à companhia e manter reserva sobre os seus negócios (...)” 19
Carvalhosa, Modesto. Sociedades Anônimas / Modesto Carvalhosa, Luiz Fernando Martins Kuyven. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2016.—(Coleção tratado de direito empresarial ; v. 3). p. 840. 20
Idem, p. 852. 21
“Isto posto, e em face do princípio da indelegabilidade doe poderes (art. 139) e de reserva de competência, o elenco de matérias atribuídas pela Lei Societária ao conselho de administração é exaustivo e não exemplificativo”. Idem, p 818.
22
71. Tem-se, portanto, que os “poderes supremos” conferidos ao
Diretor-Presidente vão de encontro à legislação societária e não encontram
respaldo na Lei de Falências.
72. E, frise-se, justamente porque contrários à lei, os atos praticados
por aquele que não possui as prerrogativas exclusivas para tanto são nulos de
pleno direito22.
73. Diante disso é que a interferência Judicial sobre as atribuições e
competências internas dos órgãos da companhia – as quais estão
expressamente definidas por lei e não são flexíveis -, não merece prevalecer,
impondo-se a reforma da r. decisão agravada.
4.3 – DECISÃO FORA DOS LIMITES DO PROCEDIMENTO RECUPERACIONAL
74. Além de todos os aspectos já tratados nos itens anteriores, tem-
se igualmente que a decisão agravada ultrapassa – e muito – os limites do
objeto do processo de recuperação judicial.
75. Com efeito, os limites do processo recuperacional se encontram
no soerguimento da companhia mediante a conclusão de um acordo de
credores e devedor(es). Não se trata, pois, de submeter a condução das
atividades da companhia às vontades de terceiros, mas apenas, pura e
simplesmente, de renegociação de dívidas de determinados credores.
76. A decisão agravada, porém, praticamente exerce verdadeiro ato
de gestão sobre a companhia, afastando conselheiros e diretores e nomeando
um Diretor para elaborar um contrato (o plano) de tamanha importância para as
Recuperandas.
22
“Já quanto aos diretores, cientes da limitação de seus poderes a partir da distribuição de competências da Lei das S/As, não há outro comportamento admitido que não a submissão do assunto ao órgão competente para só então manifestar-se na qualidade de presentante da sociedade em questões que não foram expressamente aprovadas, sob pena de quebra do dever de diligência e responsabilização, além, é claro, da invalidade do ato praticado” (doc. 12).
23
77. E nem se diga que a Agravante está exagerando. Na qualidade
de único responsável pela negociação e apresentação do plano de
recuperação judicial, foi apresentado aos credores um contrato que prevê,
dentre inúmeras ilegalidades, a própria indemissibilidade daquele que cuidou
de elaborar os seus termos e condições23.
78. Evidente, portanto, a intenção de se perpetuar no comando da OI
e da presente recuperação judicial, ilegalidade esta para a qual, certamente,
não pode esse E. Tribunal fechar os olhos e quedar-se inerte.
79. Não é minimamente razoável que uma decisão como a agravada,
proferida em evidente ato de intervenção judicial em uma sociedade de
capital aberto e que não guarda qualquer relação com o objeto do
processo em si, possa determinar quem é a pessoa mais adequada para,
sozinha e sem qualquer tipo de controle, gerir a companhia como bem
entender.
80. O entendimento exarado pelo MM. Juízo a quo representa o mais
perigoso precedente às companhias de capital aberto em crise, que se verão
sujeitas a, literalmente, qualquer provimento jurisdicional...
4.4 – EVENTUAL SUBSTITUIÇÃO DEVERIA OBEDECER AS REGRAS
SOCIETÁRIAS
81. Por fim, ainda que se diga que o afastamento dos administradores
de seus cargos e funções estivesse devidamente enquadrada e fundamentada
23
Cláusula 9.1.1: “(iii) Nova Diretoria: Após o Período de Transição, o Conselho de Administração Transitório ou Novo Conselho de Administração, conforme o caso, poderá deliberar livremente sobre a composição da Diretoria das RECUPERANDAS, observado que o atual Diretor Presidente e Diretor de Finanças e Relações com Investidores serão reconduzidos e mantidos até o encerramento da Recuperação Judicial aos cargos de Diretor Jurídico e de Diretor sem designação específica com funções administrativo-financeiras, com as mesmas atribuições e competências atuais, estrutura administrativa, alçadas de decisão e com a manutenção e renovação dos compromissos contratuais atuais, incluindo, mas sem limitar, às indenizações previstas contratualmente. Na hipótese de destituição do Diretor Jurídico e do Diretor sem designação específica com funções administrativo-financeiras pelo Conselho de Administração Transitório ou Novo Conselho de Administração, conforme o caso, antes do encerramento da Recuperação Judicial, as RECUPERANDAS obrigam-se por este Plano a cumprir integralmente os pacotes de remuneração atualmente existentes” (doc. 13).
24
– o que se admite apenas para argumentar -, é certo que não há qualquer
justificativa para a nomeação especificamente do Diretor-Presidente para o
mister de elaborar o plano de recuperação!
82. Ora, a nomeação do Diretor-Presidente da OI não é consequência
legal ou lógica do acolhimento de nenhum pleito formulado por credores, pelas
Recuperandas ou mesmo pelo D. Ministério Público. Como se viu acima, trata-
se de um nome escolhido sem qualquer razão plausível para tanto, o que por si
só justifica a reforma da decisão.
83. Ademais, a decisão de afastamento dos administradores da
condução das atividades do devedor deve, necessariamente, obedecer às
regras de governança da companhia.
84. Significa dizer que, ao determinar o afastamento do Conselho de
Administração e os novos Diretores de suas funções, ainda que circunscritas à
elaboração do plano, caberia ao MM. Juízo a quo determinar aos acionistas
que elegessem novos conselheiros, e aos novos conselheiros que elegessem
outros Diretores para ocuparem os cargos, nos termos da legislação societária
e Estatuto social da OI.
85. É exatamente o que dispõe a mais balizada doutrina a respeito do
tema, em obra específica sobre recuperação judicial de sociedades por ações,
de autoria da PROF. SHEILA CEREZETTI:
“Neste sentido, parece necessário que se zele para que, durante o
processo de recuperação, as regras que estruturam a governança
do devedor – que, no caso em estudo, é a sociedade por ações -,
sejam observadas. Isto significa que as normas sobre a condução da
empresa, formação dos órgãos de administração e diretos e deveres de
administradores e acionistas devem permanecer em pleno vigor. A
existência da crise e da tentativa de solucioná-la não deve,
portanto, acarretar descuidos das regras societárias que tutelam o
interesse social. A afirmação vale, inclusive – e ainda mais -, nas
25
situações em que um gestor judicial for eleito para conduzir as
atividades do devedor”24.
86. Assim, se é que se pode entender que é o caso de impedir algum
administrador de ocupar seu posto e cumprir com suas funções, esse
administrador deve ser substituído na forma do Estatuto Social, e não por meio
de eleição judicial.
5 – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL
87. Como se viu ao longo da presente, a r. decisão agravada
promoveu uma verdadeira intervenção em uma sociedade de capital aberto
sem que houvesse a menor justificativa para tanto e, além disso, conferiu
poderes legalmente indelegáveis a pessoa que não pode deles dispor, em
evidente prejuízo do Conselho de Administração, da Diretoria e da própria Oi,
que se tornou refém das arbitrariedades de uma única pessoa.
88. O “aval” para que o Diretor-Presidente da OI pudesse negociar e
elaborar um plano de recuperação sem deter as prerrogativas legais para tanto,
e a atuação nociva deste configurada pelo contrato apresentado aos credores
representam uma verdadeira violação da companhia. O decisum não encontra
respaldo na lei, no Estatuto, e tampouco na jurisprudência. Trata-se de um
precedente único.
89. Outrossim, a r. decisão agravada fez com que o plano de
recuperação judicial votado e aprovado pelos credores padecesse de latentes
ilegalidades, dentre as quais, a indemissibilidade do próprio autor do plano de
seu cargo de Diretor-Presidente.
90. Nessa seara, um pronunciamento imediato dessa E. Turma se faz
necessário, na medida em que as medidas iniciais previstas no plano de
recuperação judicial – que, frise-se, padece de nulidade – já estão sendo
24
Cerezetti, Sheila Christina Neder, A Recuperação Judicial de Sociedade por ações – o princípio da preservação da empresa na Lei de Recuperação e Falência, Editora Malheiros, 2012, p. 223
26
executadas, tais como os procedimentos para emissão de títulos no exterior,
conforme edital publicado pelas Recuperandas ontem, 6 de fevereiro (doc.
14).
91. A irreversibilidade é latente, na medida em que essa e outras
complexas operações financeiras serão realizadas e dificilmente revertidas,
causando lesão ao caixa da OI, seus acionistas e a terceiros.
92. Não se vislumbra qualquer perigo ou dano inverso, na medida em
que apenas se paralisará o cumprimento do plano até o julgamento definitivo
do agravo.
6 – DO PEDIDO
93. Ante o exposto, requer-se liminarmente a antecipação da tutela
recursal, com o fim de suspender o cumprimento do plano de recuperação
judicial, uma vez que elaborado por pessoa indicada unicamente pela decisão
agravada e em desencontro ao Estatuto Social, à Lei das S.A. e à própria Lei
de Falências.
94. Ao final, requer-se o provimento do agravo para que seja anulada
a r. decisão de fls. 243.826/243.835, que afastou conselheiros e diretores de
suas funções legais e estatutárias, em razão da ausência de jurisdição do
Poder Judiciário para decidir sobre questões relativas a condutas dos órgãos
deliberativos interna corporis da OI.
95. Caso a preliminar de nulidade do decisum seja superada, o que
se admite apenas para argumentar, requer-se o provimento do recurso para
que seja reformada a decisão de fls. 243.826/243.835, a fim de que
a) seja afastada a nomeação judicial do Diretor-Presidente da OI
para exercer as funções de negociação e elaboração do plano
de recuperação judicial, declarando-se a inexistência do Plano
27
de Recuperação Judicial apresentado em 12 de dezembro de
2017 e em assembleia de credores de 19 de dezembro, com a
consequente concessão de prazo para apresentação de plano
de recuperação na forma do Estatuto Social das
Recuperandas; ou
b) subsidiariamente, seja afastada a nomeação judicial do
Diretor-Presidente, cujo substituto deverá ser nomeado na
forma do Estatuto, cabendo à Assembleia Geral de Acionistas
deliberar sobre o plano de recuperação judicial já aprovado
pelos credores, na Assembleia Geral de Credores de 19 e 20
de dezembro de 2017.
96. A Agravante ressalva que este recurso não é e nem poderá ser
entendido como renúncia à cláusula compromissória prevista no Estatuto, e
tomará as medidas adequadas para tutelar seus direitos perante o Tribunal
Arbitral competente.
97. Por fim, requer que todas as publicações sejam feitas
exclusivamente em nome do advogado Tiago Schreiner Garcez Lopes, OAB/RJ
117.852, sob pena de nulidade.
Termos em que, Pede deferimento.
Rio de Janeiro, 07 de fevereiro de 2018.
Tiago Schreiner Garcez Lopes
OAB/RJ 117.852
Guilherme França OAB/SP 324.907
Fábio Rosas OAB/SP 131.524
Juliana Iglesias Vasquez OAB/SP 399.797