8
1 Das Blatt der Romanistik-Doktorierenden Der akademische Nachwuchs berichtet zu aktuellen Veranstaltungen Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47) Repensando os modernismos O colóquio Modernismo(s). Fernando Pessoa. Eu e (os) outros ocorreu na Universidade de Zurique entre os dias 26 e 27 de outubro de 2015. Tratou-se de um evento crítico- comemorativo a partir da efeméride de 100 anos da publicação do Orpheu – Revista Trimestral de Literatura, editada em Lisboa com o intuito de reunir produções literárias luso-brasileiras. POR ANDRÉ MASSENO De acordo com a idealizadora do colóquio, a profes- sora Maria Ana Ramos (Universidade de Zurique), o evento também surgiu pelo desejo de dar continui- dade aos debates sobre a escrita modernista e suas facetas, ou seja, debruçar-se sobre a importância do modernismo português e brasileiro para o período contemporâneo. Afinal de contas, o modernismo constitui-se como movimento múltiplo em que cada cultura literária promoveu discussões peculiares acerca tanto do fazer literário como de suas respec- tivas tradições culturais, além de estabelecer o jogo com uma certa “sensibilidade moderna” na maneira de ver o espaço urbano e o mundo. Modernismo(s). Fernando Pessoa. Eu e (os) outros teve as participações dos professores-pesquisadores Georges Güntert (Universidade de Zurique), Ida Al- ves (Universidade Federal Fluminense – Brasil), Rosa Martelo (Universidade do Porto) e Fernando Cabral Martins (Universidade Nova de Lisboa), além de contar com a exibição do filme “Conversa Acabada” (1982), de João Botelho, sobre a correspondência entre Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. O colóquio ocorreu sob a chancela da Cátedra Carlos de Oliveira e do Doutorado Interuniversitário de Estudos Ibero- românicos do Romanisches Seminar/UZH. Na conferência “Uma imagem emblemática do Li- vro do desassossego: as nuvens”, o professor Georges Güntert (Universidade de Zurique) partiu de Livro do desassossego para apontar traços constitutivos da es- crita pessoana, e, principalmente, o seu caráter per- formativo, ao afirmar a identidade acionada na escri- tura dos heterônimos de Fernando Pessoa como um conjunto de qualidades e presenças ao tomarem a pa- lavra. Em Livro do desassossego, através do heterônimo pessoano de Bernardo Soares, há uma experiência discursiva modificável a cada texto, porém destituí- da de um caráter evolutivo e temporalmente gradu- al, optando, por outro lado, por um ritmo cíclico em que os fragmentos textuais operam como máscaras do poeta. As nuvens Evidentemente o papel do leitor é primordial para acionar a multiplicidade da obra pessoana, que, por tratar-se de uma obra sem cronologias, circular, aber- ta e portanto não-conclusiva, exige uma postura de leitura diferenciada. Evidencia-se a distância da obra de Fernando Pessoa do gênero autobiográfico, ou dito de outro modo, da autobiografia clássica. Sendo as- sim, qual seria o gênero literário presente nos heterô- nimos pessoanos e em seus comentários descontínu- os sobre a vida? Como uma resposta nada peremptória, o profes- sor Güntert direcionou-se à abordagem das nuvens como figuração importante do Livro do desassossego: tal como o céu com o passar incessante das nuvens, o protagonista muda continuamente sem se trans- formar. A mutação reside no nível discursivo, isto é,

FEBRUAR 2016 (NR. 47) Ibidem Das Blatt der Romanistik ... · te, a vanguarda em Portugal configurou-se através de um grupo de artistas e literários em consonância entre si e que

  • Upload
    others

  • View
    2

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

1

Das Blatt der Romanistik-DoktorierendenDer akademische Nachwuchs berichtet zu aktuellen VeranstaltungenIbidem

FEBRUAR 2016 (NR. 47)

Repensando os modernismosO colóquio Modernismo(s). Fernando Pessoa. Eu e (os) outros ocorreu na Universidade de Zurique entre os dias 26 e 27 de outubro de 2015. Tratou-se de um evento crítico-comemorativo a partir da efeméride de 100 anos da publicação do Orpheu – Revista Trimestral de Literatura, editada em Lisboa com o intuito de reunir produções literárias luso-brasileiras.

Por André MAsseno

De acordo com a idealizadora do colóquio, a profes-sora Maria Ana Ramos (Universidade de Zurique), o evento também surgiu pelo desejo de dar continui-dade aos debates sobre a escrita modernista e suas facetas, ou seja, debruçar-se sobre a importância do modernismo português e brasileiro para o período contemporâneo. Afinal de contas, o modernismo constitui-se como movimento múltiplo em que cada cultura literária promoveu discussões peculiares acerca tanto do fazer literário como de suas respec-tivas tradições culturais, além de estabelecer o jogo com uma certa “sensibilidade moderna” na maneira de ver o espaço urbano e o mundo.

Modernismo(s). Fernando Pessoa. Eu e (os) outros teve as participações dos professores-pesquisadores Georges Güntert (Universidade de Zurique), Ida Al-ves (Universidade Federal Fluminense – Brasil), Rosa Martelo (Universidade do Porto) e Fernando Cabral Martins (Universidade Nova de Lisboa), além de contar com a exibição do filme “Conversa Acabada” (1982), de João Botelho, sobre a correspondência entre Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro. O colóquio ocorreu sob a chancela da Cátedra Carlos de Oliveira e do Doutorado Interuniversitário de Estudos Ibero-românicos do Romanisches Seminar/UZH.

Na conferência “Uma imagem emblemática do Li-vro do desassossego: as nuvens”, o professor Georges Güntert (Universidade de Zurique) partiu de Livro do

desassossego para apontar traços constitutivos da es-crita pessoana, e, principalmente, o seu caráter per-formativo, ao afirmar a identidade acionada na escri-tura dos heterônimos de Fernando Pessoa como um conjunto de qualidades e presenças ao tomarem a pa-lavra. Em Livro do desassossego, através do heterônimo pessoano de Bernardo Soares, há uma experiência discursiva modificável a cada texto, porém destituí-da de um caráter evolutivo e temporalmente gradu-al, optando, por outro lado, por um ritmo cíclico em que os fragmentos textuais operam como máscaras do poeta.

As nuvens

Evidentemente o papel do leitor é primordial para acionar a multiplicidade da obra pessoana, que, por tratar-se de uma obra sem cronologias, circular, aber-ta e portanto não-conclusiva, exige uma postura de leitura diferenciada. Evidencia-se a distância da obra de Fernando Pessoa do gênero autobiográfico, ou dito de outro modo, da autobiografia clássica. Sendo as-sim, qual seria o gênero literário presente nos heterô-nimos pessoanos e em seus comentários descontínu-os sobre a vida?

Como uma resposta nada peremptória, o profes-sor Güntert direcionou-se à abordagem das nuvens como figuração importante do Livro do desassossego: tal como o céu com o passar incessante das nuvens, o protagonista muda continuamente sem se trans-formar. A mutação reside no nível discursivo, isto é,

2

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

nas diferenças do eu-narrador no trecho “Nuvens” a partir do avanço dos parágrafos, exigindo do leitor o emprego de significados pessoais. As nuvens apre-sentam-se como a própria ideia de Pessoa com o fazer literário, como um movimento plural e de passagem, sem a presença de um centro. A função primordial das imagens em Livro do desassossego é a de promover a ideia de nuvens como figuração de uma singula-ridade etérea, efêmera, cambiante, algo que flutua, mais leve do que o ar. O movimento interior do nar-rador Fernando Soares passa a ser representado atra-vés de uma linguagem imagética, em que as nuvens acionam uma passagem desfeita entre o céu e a ter-ra, além de evocarem a espacialidade do sonho que se abriga na mente imaginativa do personagem. Por conseguinte, em Livro do desassossego se mune da ima-gem das nuvens para apre-sentar uma literatura em mise-en-abyme, ou melhor dito, um eu-narrador volátil e refratário a qualquer jogo (auto)biográfico.

Uma janela (poética)para a modernidade

A pesquisadora brasileira Ida Alves (Universidade Federal Fluminense), em sua conferência “Moder-nismo(s): Campos e Drum-mond à janela de nossa con-temporaneidade”, enfatizou que, embora os Modernismos português e brasileiro tenham recebido contornos particulares em cada cul-tura literária, houve traços concomitantes entre am-bos. No caso da relação entre a poesia de Fernando Pessoa e Carlos Drummond de Andrade, já marca-das por diferenças geracionais, entrevê-se a afeição dos dois poetas modernistas pela condição do sujeito em espaços citadinos em transformação – no caso de Pessoa, por uma Lisboa em mudança; Drummond por um território brasileiro situado entre o progresso difundido pelo Estado e o atraso presente em uma realidade social repleta de desigualdades. Ambos os poetas flertam com uma poética moldada por uma subjetividade advinda de identidades móveis que, por sua vez, resultam da experiência urbana, além de coadunada a uma escrita da paisagem da memória. Deste modo, poder-se-ia dizer que há em Pessoa e em Drummond uma “fenomenologia” da janela, ou seja,

a proposição de um espaço literário de constante con-tato entre os mundos interno e externo. Deste modo a literatura como passagem e espaço de trânsito seriam pontos nevrálgicos na poética de ambos os poetas.

Ida Alves enfatizou o ato poético como modo de convivência entre os modernistas e o seu legado, em que ocorre uma “dívida literária” – dívida positiva através da leitura e releitura de uma produção poé-tico-literária antecedente. No caso de Carlos Drum-mond de Andrade, leitor da poesia pessoana, cons-truiu-se um espaço de afetividade com a produção de Fernando Pessoa, que forma seu legado pessoal como artista. Portanto, há um jogo de dívidas do “herdeiro” Drummond com o legado literário – condição recor-rente quando poetas (re)lê poetas, quando o empo-deramento poético surge através da apropriação de

vozes alheias, que conse-quentemente denota uma releitura e re-escritura de um passado literário. A partir deste jogo com as vozes alheias, pode-se verificar em Drummond e Pessoa uma poética do fingimento, em prol de uma estratégia de “outrar-se”.

Escritas poéticas –entre duelos e duetos

Em sua conferência “De-pois do poeta que era

uma literatura inteira”, calcada sobre a redescoberta de Fernando Pessoa pela poesia portuguesa das dé-cadas subsequentes ao modernismo, a pesquisadora portuguesa Rosa Martelo (Universidade do Porto) ressaltou a poética modernista como escrita situada entre o dueto e o duelo, isto é, entre o escrever-falar junto com a tradição e o lutar contra a subserviência ao passado literário.

Iniciando a abordagem aproximativa da obra de Pessoa com as de Sophia de Mello Breyner Andresen e Mário Cesariny (ambos os poetas com uma relação ambivalente com o legado pessoano), a pesquisadora propôs um salto crítico para a poesia dos anos 80 e 90, onde se constata uma apreensão de Portugal di-versa à de Pessoa. Neste caso, a presença do corpo possui aspectos distintos aos da impessoalidade e descarnalidade recorrentes na poética pessoana. Nas produções poéticas mais recentes, os conceitos de

Revista Orpheu, fascículos n.º 1 e 2, 1915

3

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

identidade resvalam da ideia de eu e propõem, por sua vez, a carnalidade como espaço e ponto primor-diais. Sendo assim há uma inscrição poética do corpo em confronto (duelo) e em convivência (dueto) com a produção poética pessoana.

Modernismos para além do saudosismo

De acordo com o pesquisador Fernando Cabral Martins (Universidade Nova de Lisboa) em sua conferência “Orpheu contra o saudosismo”, em cer-tos discursos críticos o termo vanguarda é usado como substitutivo do termo modernismo, embora as vanguardas sejam múltiplas, e precisamente se for levada em conta a diversidade entre os mo-dernismos português e brasileiro. Por conseguinte, o modernismo é plural, exigindo uma atenção maior às forças de integração e caracterização do termo em dis-tintas áreas de atuação, ainda que existam diálogos entre si a partir de alguns de seus agentes interes-sados em um diálogo entre a lite-ratura e as demais manifestações artísticas. Ademais, Fernando Cabral Martins assinalou a male-abilidade dos termos artísticos e de suas reapropriações dentro do debate intelectual e artístico, que, por outro lado, podem acarretar no uso indiscriminado do termo. Entretanto, e em linhas gerais, o pesquisador propôs pensar a van-guarda como um momento artís-tico-cultural desejoso por mudar os parâmetros de conhecimento vigentes através de uma reformulação crítica do mundo e de seus contex-tos culturais. Deste modo, a vanguarda foi ressaltada como extremamente relevante para se pensar acerca do mundo contemporâneo.

No contexto português, através do lançamento da revista Orpheu em 1915, afirmou-se um espaço cos-mopolita e transversal, produzindo uma peculiar rede de relações em torno da revista. Por conseguin-te, a vanguarda em Portugal configurou-se através de um grupo de artistas e literários em consonância entre si e que travavam conexões com outros grupos artísticos. Segundo Cabral Martins este pensamento vanguardista se contrapôs à presença do movimento

literário do Saudosismo português, que estava inte-ressado pelo resgate de uma certa “alma nacional”, isto é, de uma busca de entendimento, de certa for-ma essencialista e nostálgica, de um imaginário lu-sitano. A partir deste contexto, situado entre uma visada cosmopolita do mundo (advinda dos artistas em torno da revista Orpheu) e uma reivindicação de um “modo de ser lusitano” (próprio do Saudosismo), ficou evidente que o suposto “tempo moderno/mo-dernista” tratou-se de uma gama complexa de mo-vimentos e artistas dotados de formas diferentes de ver e participar dos debates artístico-culturais de sua

atualidade.

Modernismoe as escritas de/do agora

Na conferência-seminário “A po-esia portuguesa do século XXI”, a pesquisadora Rosa Martelo pro-blematizou as reverberações da produção modernista portuguesa na poesia contemporânea. Em li-nhas gerais, indagou-se até que ponto a produção atual transfor-mou ou manteve-se em contato direto com os traços constitutivos das obras modernistas como a va-lorização da experiência cinética da velocidade, o gesto de ruptura com o passado, a autorreflexivida-de, a impessoalidade no lirismo e o apreço pela investigação de uma linguagem poética peculiar, que seria consequência de uma cren-ça e defesa do caráter autônomo da arte. Além disso, Rosa Marte-

lo ponderou a demarcação temporal de sua fala no século XXI, deixando claro que tais procedimentos pertencentes à produção contemporânea já estavam sendo empreendidos nas últimas décadas do século anterior, e que o “século XXI” é um marcador tempo-ral de um “tempo contemporâneo” onde se situa uma constelação de poetas de gerações distintas, porém com certos traços estéticos e éticos que dialogam com determinados paradigmas artísticos recorrentes na atualidade.

A partir do século XXI, a produção poética passou a problematizar a hiperatividade e a velocidade atra-vés de uma escrita que investiga uma temporalidade desacelerada, expandida e sobreposta. Assinalou-se

Fernando Pessoa em Lisboa, 1928

4

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

também o interesse da poesia contemporânea por uma releitura desconstrutivista do legado literário, isto é, por um diálogo com os autores modernistas porém sem a retomada da visão utópica e modernis-ta do poder da poesia (ou da “literatura como mis-são”). Ademais, se no modernismo houve a paixão pelo progresso tecnológico-industrial, na poética contemporânea surgiu um jogo irônico com a indús-tria cultural e sua produção incansável de massa de textos através dos meios de comunicação. A indústria cultural, considerada uma parcela constitutiva e ine-vitável do momento presente, passou a fazer parte de um jogo poético alicerçado no discurso intertextual e em uma escrita intermidiática.

Outro ponto de diferença nas estratégias ético-es-téticas entre as poesias modernista e a contemporânea reside na defe-sa da poesia como linguagem au-tônoma. Nas produções do século XXI, a poesia afirma-se como labor artístico alheio à busca e à defesa de uma marca identitária. Não há, portanto, nem a argumentação de uma autonomia identitária no cerne do fazer poético (ou seja, re-chaça-se a concepção essencialista de categorização de sistemas ou métodos como unicamente per-tencentes ao ato de “fazer poesia”) e tampouco a afirmação de uma suposta “identidade” verificável no eu-lírico. A produção poética portuguesa da atualidade apre-senta-se como espaço das singula-ridades, de vozes móveis e maleáveis, mais dispostas a uma condição do devir do que a reivindicar o con-ceito moderno de identidade, geralmente atrelado às noções de onisciência, univocidade e coerência dis-cursiva. Portanto, há um âmbito transnacional que é posto em discussão, quando o sujeito, a arte e as visões de mundo são redimensionados pelo trânsito entre as culturas, pelos meios de comunicação e pelas possibilidades de acesso à mediação e à locomoção (virtuais e/ou físicas) na contemporaneidade. Como exemplos desta poesia contemporânea portuguesa, onde são verificáveis tais traços estéticos acima abor-dados, Rosa Martelo apontou a obra poética de Ma-nuel de Freitas, José Miguel Silva, Ana Luísa Amaral, Adília Lopes e Rui Pires Cabral.

A fala de Rosa Martelo, em certo sentido, conden-sou o intento (por sinal logrado) de Modernismo(s). Fernando Pessoa. Eu e (os) outros: o de discutir a impor-tância do modernismo luso-brasileiro no debate lite-rário, retomar os paradigmas conceituais e estéticos do movimento para, por fim, apontar as tensões e os posicionamentos críticos recorrentes tanto na época de seu surgimento como na atualidade.

André Masseno é assistente de Literatura e Cultura Bra-sileiras na cátedra de Estudos Luso-Brasileiros (Prof. Dr. Jens Andermann) no Romanisches Seminar/UZH. Sua pesquisa doutoral concentra-se nas configurações da noção de tropical na produção (contra)cultural e literária durante os decênios de 1960 e 1970 no Brasil.

Sugestões de leituraPessoa, Fernando. Livro do desassossego. Lisboa: Assírio & Alvim, 2013.Amaral, Ana Luísa. A gênese do amor. Porto: Campo das Letras, 2005.Breyner Andressen, Sophia de Mello. Obra poética. Lisboa: Assírio & Alvim, 2015.Cesariny, Mário. Louvor e simplificação de Álvaro de Campos. Lisboa: As-sírio & Alvim, 2009.Drummond de Andrade, Carlos. Alguma poesia. São Paulo: Compa-nhia das Letras, 2013.Freitas, Manuel de. Ubi Sunt. Lisboa: Averno, 2014.Lopes, Adília. Dobra: poesia reunida 1983-2014. Lisboa: Assírio & Al-vim, 2014.Pires Cabral, Rui. Biblioteca dos rapazes. Lisboa: Pianola, 2012.Saraiva, Arnaldo. Modernismo brasileiro e modernismo português: subsí-dios para o seu estudo e para a história das suas relações. Campinas, São Paulo: Editora da UniCamp, 2004.Silva, José Miguel. Erros individuais. Lisboa: Relógio D’água, 2010.

Lisboa em 1900

5

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

Otium et décadence chez BaudelaireLe 19 novembre 2015, Diemo Landgraf, professeur à l‘Acadia University (Canada), a tenu une conférence à l’Université de Zurich intitulée „Otium et décadence chez Baudelaire“. Sa communication s’est inscrite de manière thématique dans le cours magistral de Thomas Klinkert „Littérature et otium“.

PAr PhiliPPe lArs eberhArd

La conférence de Diemo Landgraf portait sur une analyse subtile de quelques poèmes des Fleurs du Mal de Charles Baudelaire centrée sur le thème de l’otium – terme latin qui signifie „loisir“ –, un état autotélique qui porte son but en lui-même. L‘homme est oisif pour être oisif, et non pas pour arriver à d’autres buts. L’otium est aussi un état dans lequel on a la liberté de prendre des décision libres. Dans cet état de loisir, des activités peuvent se dérouler qui renvoient à la dure réalité de la vie, à la survie ou à la conservation de l’espèce. En écoutant des histoires intéressantes – qui ne doivent pas forcément être vraies –, il est possible d‘apprendre des choses utiles pour la survie personnelle. Tels sont quelques aspects qui caractérisent le concept de l‘otium et qui peuvent être utils pour l’analyse de sa fonction dans l’oeuvre de Baudelaire, en particulier dans Les Fleurs du Mal.

Les Essais de psychologie contemporaine de Bourget

Paul Bourget, écrivain et essayiste, présente Baudelaire comme homme de décadence. L’intense expérience religieuse de son enfance aurait rendu le découlement de la société traditionnelle et de ses valeurs douloureux pour le poète: la perte de la foi, par conséquent, crée un vacuum spirituel qu’aucune des idéologies modernes ne pouvait remplir. Mais, selon les Essais de psychologie contemporaine (1883) de Bourget, Baudelaire n’était pas seulement mysthique, mais aussi libertin et surtout analyste. En même temps qu’il souffrait de cette nostalgie religieuse, il

participait à la bohème parisienne. Cependant, avec une attitude que Bourget caractérise comme étant „scientifique“ en affirmant dans un de ces essais que l’intelligence de l’analyste reste „cruellement maîtresse d’elle même“.

C’est précisément la rencontre paradoxale de ces éléments hétérogènes qui fait la modernité du poète. Selon Diemo Landgraf, la thèse de Bourget est convaincante. Mais seulement parce que Baudelaire participait à la vie moderne, il lui était possible d’en devenir le chroniqueur. Ce que Bourget ignorait cependant c’était l’influence énorme de l’hermétisme sur Baudelaire, un aspect qui aide pourtant à comprendre l’expression de la crise existentielle dans son oeuvre.

L’influence de l’hermétisme sur Les Fleurs du Mal

L’hermétisme est une doctrine spirituelle qui contiendrait les sens et les mystères de l’antique religion egyptienne et dont les textes fondamentaux sont attribués à un adepte légendaire de l’Antiquité surnommé „Hermès Trismégiste“. Baudelaire y a été initié par son ami Louis Ménard qui avait

Charles Baudelaire, le poète du spleen

6

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

publié une nouvelle traduction de l’original grec en 1867. Ménard lui-même connaissait la doctrine hermétique par la traduction libre et christiannisée de l’évêque François de Foix de 1579. Comme Paul Arnold le démontre dans son étude sur „L’Ésotérisme de Baudelaire“ (1979), de nombreux repères des Fleurs du Mal sont identiques avec des formulations de ce texte.

Selon l’approche hermétique, des esprits créés par l’esprit primaire acquièrent une autonomie et s’incarnent sur terre sous forme d‘une âme, ce qui empêche la perception directe de la réalité spirituelle et de Dieu. Seulement de cette façon peuvent-ils se former une idée du bien et du mal de manière autonome et s’orienter vers le bien par des propres décisions. Sous l’influence directe de Dieu et sans la liberté de la volonté absolue, ils ne seraient que des animaux ou des machines.

Ainsi, la matière est l’adversaire de l’esprit dans la doctrine hermétique parce qu’elle l‘enveloppe et l’aveugle ce qui, en fait, est nécessaire pour son apprentissage. Transposé dans la terminologie chrétienne, il s’agit de s’orienter vers Dieu et de résister aux tentations charnelles du diable pendant la vie sur terre. Cette métaphysique – qui est proche de la religion chrétienne, mais ou manque Jésus et la rédemption à la grâce divine – est repérable dans presque tous les poèmes des Fleurs du Mal. Elle est particulièrement notable dans le poème „Au Lecteur“ dans lequel l’ennui joue également un rôle important.

Le poète s‘adresse „Au Lecteur“

Ce poème expose la conception baudelairienne de l’homme. L’explication de ces méchanismes se retrouve dans les strophes trois et quatre. La métaphore de „l’oreiller du mal“ évoque, dans la troisième strophe du poème, l’oisivité dans un cadre négatif où l’homme n’est que le jouet de ses vices. La conséquence du relachement par l’abandon aux plaisirs sensuels est une vie vicieuse, ce que les deux strophes précédentes et les trois suivantes illustrent. Les trois dernières strophes du texte préparent un climax qui présente l’ennui comme étant le vice

suprême. Le moi lyrique parle d’une expérience personnelle, mais il suppose qu’il la partage avec le lecteur: l’ennui – le vice de la modernité par excellence – en est le plus redoutable et à la fois le plus illusoire. La dimension destructive de son indifférence et celle de sa cruauté sans fin se cache derrière le voile de sa passivité. Tout se déroule plutôt dans l’imagination: l’ennui ne fait que „rêver d‘échafauds“ et se sert de substituts comme d‘un „houka“ qui affaiblissent encore la volonté.

Avec l’image de l‘ennui comme fumeur oriental, Baudelaire fait référence au roman Mademoiselle de Maupin (1835) de Théophile Gautier. Dans ce texte, le protagoniste, désespéré par sa propre indifférence et impuissance, rêve d’être un pacha fumant. Dans cet état d’âme, il est possible de voir toute la base de la littérature de la décadence. Mais, ce qui se cache

derrière l’ennui, selon Diemo Landgraf, c’est le nihilisme: la perte des valeurs, l’indifférence, l’impuissance et, par conséquent, l’abandon à la perversion dans la quête de stimulant toujours plus extrême pour combattre l’ennui et la dépression.

Au fond, l’allégorie de l’ennui fumeur caractérise Les Fleurs du Mal dans leur ensemble. L’ennui y est très présent de même que la violence et la cruauté. La mise en scène propre à Baudelaire du

sujet éternel de l’homme entre la quête de Dieu et la perversion est très moderne. Le mal devient un sujet d’oeuvre d’art. Dans „Au Lecteur“, les éléments positifs de l’esprit et de la volonté ne sont présents qu’implicitement. L’élément négatif domine, ici sous la forme du mal et du diable.

La transfiguration du poète dans „Bénédiction“

Le poème „Bénédiction“, qui ouvre „Spleen et Idéal“, est un des rares textes des Fleurs du Mal où l’élément positif est au premier plan. Au contraire de la règle présentée dans „Au Lecteur“, le poète parvient à triompher sur toutes les contrariétés du monde et du diable. On y trouve également une des rares allusions à Jésus. Par l’augmentation exclusive en faveur de Dieu, le poète n’est pas affecté par les attaques d‘autrui, par exemple celles de sa femme cruelle qui veut lui arracher métaphoriquement son coeur

Diemo Landgraf pendant sa conférence

7

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

de saint avec son comportement blasphématoire. Ainsi, des idées inspirées par l’hermétisme et par la religion chrétienne se combinent avec la transfiguration du poète dans „Bénédiction“. Comme „Au Lecteur“, „Bénédiction“ est un texte fortement stilisé qui acquiert un caractère presque baroque par l’importance de l’allégorie et par le sujet religieux: bien et mal sont des hyperboles élevées au degré de pensée absolue.

Par contre, les notes de Baudelaire publiées sous le titre „Fusées“ montrent que sa propre spiritualité était marquée par l’incertitude. Par exemple, parmi ces notes on trouve la remarque suivante: „Dès mon enfance, tendance à la mysticité. Mes conversations avec Dieu“. En outre, Baudelaire confesse à sa mère dans une lettre du 6 mai 1861: „Je désire de tout mon coeur (avec quelle sincérité, personne ne peut le savoir que moi!) croire qu’un être extérieur et invisible s’intéresse à ma destinée; mais comment faire pour le croire?“ Il s’agit de la crise spirituelle qui fait de Baudelaire un homme de décadence. Selon Bourget, les poèmes de „Spleen et Idéal“ constitueraient l’exemple de la décadence le plus remarquable dans Les Fleurs du Mal. Il n’y règne que le pôle négatif, et il s’agit de l’expression d’un désespoir existentiel.

L‘otium comme source de l‘ennui

„Spleen I“ nous introduit dans la demeure du poète, c’est-à-dire dans un espace favorable à la création artistique ou poétique. Aussi s’agit-il d’un espace de l’ennui. Le poème commence avec une allégorie de la mort: „Pluviôse, irrité contre la ville entière […]“. La mort tombe sur les habitants des „faubourgs brumeux“. Si bien que le déménagement au „cimetière voisin“ n’est qu’un petit pas, l’environnement personnifié par l’allégorie du moi „pluviôse“ est un principe actif, mais hostile à la vie.

Les strophes suivantes se déroulent à l’intérieur de la demeure du poète. Les descriptions du chat

„maigre et galeux“, de „l’âme d‘un vieux poète“, de la „bûche enfumée“ et du grincement de l’horloge créent une émotion anxieuse. La mort se décrit comme processus actif inhérent au monde, à la matière et au temps. L’isotopie de la mémoire se joint à celle du temps et de la mort par des images du „cimetière“, de „l’âme d‘un vieux poète“ et de „l’héritage fatal d’une vieille hydropique“ : elle sert, par conséquent, à transcender la rupture de la mort dans le temps. Cependant, le poète – dont le corps se trouve au cimetière – n’est pas éternisé par l’oeuvre immortelle qui transpose son esprit: il semble qu’il

poursuit en tant que fantôme l’existence triste et blafarde que le moi lyrique déplore dans ses vers. Le séjour du moi lyrique dans l’espace d’otium, qui est celui du poète, n’est pas vécu de manière positive par lui – au contraire: ce séjour est la source de l’ennui.

Spleen et nihilisme

Dans „Spleen II“, le moi lyrique explique les causes de l’ennui. La mémoire se trouve au centre du premier vers déclarant: „J’ai plus de souvenirs que si j’avais mille ans“. Par exagération hyberbolique, le texte renvoie à l’âge, à la décrépitude et à la décadence. La mémoire du moi lyrique se limite à des sujets personnels. Cependant, il ne s’agit pas d’expériences vécues

elles-mêmes, mais de leur archivage dans des „vers“, des „billets doux“, des „quittances“ et des dossiers. Le lieu qui correspond à ce genre de documents est „un gros meuble à tiroirs“. Par la comparaison de ce meuble avec une pyramide, la dimension s’agrandit, bien entendu en gardant le caractère insignifiant des souvenirs, puisque la pyramide est comparée à une force commune.

En plus, la putréfaction est à l’oeuvre dans la pyramide, et par l’homophonie des vers biologiques et des vers poétiques, la poésie du moi lyrique est associée à la mort. L’insignifiance de la mémoire, d’ailleurs, s’étend de la dimension personnelle au domaine collectif. La civilisation elle-même est

8

MAI 2010Ibidem FEBRUAR 2016 (NR. 47)

assujettie aux lois de l’évanescence, comme le moi lyrique lui-même. Face à la banalité de sa propre vie – qui s’exprime dans le caractère inerte des moyens matériels d’archivage –, le moi lyrique est en proie à une morne incuriosité. Cela n’est autre chose que le nihilisme: la vie a perdu sa valeur et est devenue ennuyeuse.

C’est surtout le matérialisme que Baudelaire juge responsable de la décadence: seuls les produits de l’esprit peuvent durer dans le temps. Selon l’hermétisme et la religion chrétienne, l’esprit est immortel. Cependant, il se trouve enveloppé par la chair, c’est-à-dire par la matière pendant l’incarnation terrestre, si bien qu’il court le risque de se perdre à elle et d’oublier toute notion de la vie spirituelle. Les derniers vers de „Spleen II“ décrivent la victoire de la matière sur l’esprit au niveau d’une civilisation: „Désormais tu n’es plus, ô matière vivante !“.

La culture est mémoire vivante et vécue: la signifaction du sphinx – „ignoré du monde insoucieux“ – n’est plus connue. Le sphinx représente donc de manière révélatrice le phénomène de la décadence et de la disparition de civilisations entières: le moi lyrique, qui a oublié la signifacation de la vie, s’identifie avec lui. La décadence devient ainsi le sujet principal du poème dans lequel la vie personnelle – représentée par „un gros meuble à tiroirs“ – est connotée au domaine collectif qui est représenté par la pyramide et le sphinx. La relation entre le présent et le passé acquiert un caractère grotesque par la disparité des éléments comparés: le jugement négatif du présent s’augmente.

Baudelaire, le poète décadent

Le point de départ de Baudelaire est celui du sujet romantique qui se comprend comme individu solitaire. Cela se doit aux phénomènes de l’exclusion dans la société moderne qui ne connaît plus l’organisation hiérarchique et qui n’a pas de justification transcendantale. La situation de Baudelaire est particulière parce qu’elle refuse les nouvelles structures sociales de manière radicale.

La liberté issue de cette situation comporte une nouvelle forme d’otium que le poète reflète dans sa poésie. En opposition au matérialisme des sociétés modernes, Baudelaire adhère à une métaphysique inspirée par l’hermétisme et la religion chrétienne –sans toutefois y donner place à Jésus et à l’idée de la rédemption par la grâce divine.

Au lieu de cela, l’individu a peu de chances de ne pas succomber aux appas de la matière, comme le montre „Au Lecteur“. Une victoire sur ces mécanismes n’existe que dans la forme d’un idéal utopique, ce qui est le sujet de „Bénédiction“, puisque la volonté du poète n’est pas assez forte pour s’établir comme individu spirituellement

autonome et, de cette façon, proche de Dieu : la liberté est expérimentée de manière négative. Apparemment, le nihilisme est dû à la volonté de donner du sens à la propre vie de manière autonome. Diemo Landgraf est arrivé à la conclusion qu‘à cause de cet échec au niveau spirituel, la société autant que le poète – qui s’oppose à elle – peuvent être qualifiés de décadents ; l’auteur du présent article partage cet avis. L’otium s’avère comme un phénomène où se cristallise la crise existentielle de la modernité dans l’oeuvre de Baudelaire.

Doctorant à l’Université de Zurich, Philippe Lars Eberhard est en train de rédiger sa thèse de littérature française moderne sur Claude Simon et Samuel Beckett sous la direction du Professeur Thomas Klinkert.

IMPRESSUM

Herausgegeben vom «Doktoratsprogramm Romanistik: Methoden und Perspektiven» der UZH.Autorinnen und Autoren sind die Romanistik-Doktorierenden der Universität Zürich.Layout und Gestaltung: Paul SutermeisterKontakt: [email protected]: www.rose.uzh.ch/doktorat/ibidem.html

Die Texte dieser Zeitung sind lizenziert unter einer Creative Commons Namensnennung 4.0International Lizenz. Sie dürfen wiederverwendet werden, solange ihre Urheber genannt werden.