Ferreira. J. B. e Mendes, A. M. (2012). A sabedoria prática_estudo com base na psicodinâmica do trabalho de criação literária..pdf

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    Revista Psicologia: Organizaes e Trabalho, 12(2), maio-ago 2012, pp . 141-154

    ISSN 1984-6657 http://submission-pepsic.scielo.br/index.php/rpot/index

    A Sabedoria Prtica: Estudo com Base naPsicodinmica do Trabalho de Criao Literria

    Practical Wisdom a Study Based on Psychodynamicsof Work of Literary Creation

    Joo Batista FERREIRA (Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ) Ana Magnlia MENDES (Universidade de Braslia - UnB)

    As relaes entre arte e trabalho remontam aos primrdios da existncia humana, sendo o fazer literriouma das mais antigas e conhecidas formas de arte. O fazer literrio oferece um campo de estudos favorvel compreenso da potencialidade do trabalho de criao na constituio do sujeito. O objetivo deste es-

    tudo discutir aspectos da sabedoria prtica, a partir do trabalho de criao artstica do fazer literrio, como aspectosignificativo do processo de subjetivao. A investigao parte de uma pesquisa mais ampla, concluda com baseno referencial terico da psicodinmica do trabalho. A abordagem qualitativa e exploratria, com metodologia depesquisa documental. Foram analisadas 33 entrevistas e depoimentos de escritores publicadas no Brasil nos ltimos25 anos, a partir da tcnica da Anlise dos Ncleos de Sentidos (ANS). A anlise dos resultados destacou a forma ea temporalidade singulares da sabedoria prtica, configurada como processo subjetivo de permanente inveno dassituaes de trabalho e do sujeito. Conclui-se que a anlise dos trabalhos de criao, que resultam em forte impli-cao subjetiva, fornece operadores crticos significativos das estruturas sociais, institucionais e organizacionais queproduzem o trabalho alienado e que podem subsidiar anlises e intervenes nessas situaes.

    Palavras-chaverabalho, Psicodinmica do rabalho, Criao Literria, Sabedoria Prtica.

    Te relationship between art and work goes back to the beginnings of human existence, literary produc-tion being one of the oldest and best known art forms. Literary production offers a favorable field ofstudy for understanding the potential of creative work in the constitution of the subject. Te objective

    of this study is to discuss aspects of practical wisdom, from the creative work of literary art, as a significant aspectof the process of subjectivization. Te investigation is part of a larger study, completed on the basis of theoretical

    psychodynamics of work. Te approach is qualitative and exploratory, with a documentary research methodology.We analyzed 33 interviews and testimonies of writers published in Brazil in the last 25 years, based on the techni-cal analysis of the Centers for Senses (ANS). Te results highlighted the unique form and temporality of practicalwisdom, set up as a subjective process of continuous invention of work situations and of the subject. It is concludedthat the analysis of creative work, resulting in a strong subjective implication, provides workers significant criticsof social, institutional and organizational structures producing alienated labor, which can provide analysis and as-sistance in these situations.

    KeywordsWork, Psychodynamics of Work, Literary Creation, Practical Wisdom.

    Resumo

    Abstract

    Recebido em: 20.12.2011 Aprovado em: 01.03.2012 141

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    As relaes entre arte e trabalho remontam aos primrdios da existncia humana. Artistasde diversas pocas nomearam seu processo de criao como trabalho, referindo-se tantos suas produes ou obras, quanto ao processo de criao propriamente dito.O reconhecimento do trabalho artstico ganhou evidncia especialmente a partir do

    Renascimento, quando o nome do artista passou a ser associado sua criao. At ento, essaforma de trabalho tendia a ficar no anonimato, salvo algumas excees. O reconhecimento

    dessa autoria, com o passar do tempo, alcanou as diversas manifestaes de arte, entre asquais a criao literria (Heinich, 2008).O fazer literrio uma das mais antigas e conhecidas formas de arte. Ao longo da histria,

    os trabalhos de criao de inmeros escritores alcanaram espaos coletivos que se estenderampara alm do seu tempo. As formas histricas do trabalho apontam para uma relao entretempo e narrativa. No modelo pr-capitalista de produo, as pessoas se reuniam em torno donarrador nos momentos ociosos ou quando, sem pressa, estavam envolvidos no trabalho co-letivo e artesanal que ajudava a enunciar a experincia do mundo. Como assinala Kehl (2007,p. 268): A experincia de viver e trabalhar em um ritmo no ordenado pela produtividadepermitia que o abandono dos sujeitos temporalidade guardasse uma proximidade grandecom o tempo do sonho.

    A sociedade moderna marcada pela complexidade, abstrao e instabilidade - fa-vorece o isolamento e a perda de sent ido da exper incia. No mundo da modernidade,o oposto da narrativa a informao jornalstica escrita ou televisiva, essencialmentecentrada na novidade, na imagem como espetculo, conectada ao acontecimento fugazque, como mostra Kehl (2007, p. 268), corresponde a um tempo vazio da experinciae da subjetividade. Neste contexto, em que cada um vive a prpria vida de maneiraindividualizada, esta perda de sentido compartilhada pelos sujeitos desgarrados dasformaes sociais estveis.

    Ainda assim, o fazer narrativo, na qual se inclui o fazer literrio, possui funo organizadorado campo social, do processo de permanente constituio do sentido da vida, pois d consistn-cia imaginria a uma noo de eu de que o sujeito dispe para sentir-se vivo (Kehl, 2001, p. 67).

    Em Foucault (2000), vemos que a literatura se constitui como artifcio movido pela neces-sidade de transgresso e instaurao do novo, que produz efeitos de verdade. No DicionrioAurlio (Ferreira, 2001), o termo artifcio apresentado como processo ou meio para se obterum artefato ou um objeto artstico, recurso engenhoso, habilidade, perspiccia.

    A definio de literatura tem variado ao longo do tempo, sempre provisria. Diversos cri-trios so utilizados para identificar literatura, como: tipos de linguagem, textos, identificaodo autor da obra. Um critrio complementa o outro e dificilmente se chegar a um consenso.

    Literatura tudo aquilo que se escreve? Literatura fico? O fazer literrio escapa sdeterminaes e afirmaes que o estabilizem em conceitos determinados. Nunca est dado,est sempre por se reinventar. Como fazer da arte, a literatura no pode ser medida pelos

    critrios da funcionalidade, da utilidade ou da informao (Blanchot, 2005).Embora a literatura como fico se apresente como conceito mais fcil de ser apreendido,seria difcil delimit-la olhando somente o ficcional. Na fronteira dessa discusso, resgatamos aproposio de Sousa (2000) de que a escrita dos casos clnicos em psicanlise pode ser conside-rada como fico clnica resultado de uma hiptese terica, tendo em vista a impossibilidadede um relato real.

    Com o tempo, a especializao literria levou diferenciao entre fico e outros tiposde escrita, como jornalismo, filosofia, ensaio, estudo histrico. O percurso da literatura emdireo ao texto produzido pela imaginao tornou-se uma das referncias do romantismo.O conceito de literatura tem sido colocado em questo e, com isso, surgiram conceitos maisabertos como textos, escritura ou discurso (Costa, 2005). Adotamos o conceito de literaturacomo produo de uma nova realidade constituda pelo ato de escrever (Foucault, 2000, p.140), como palavra-ao de ruptura, que nomeamos aqui de litera-ruptura.

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    O ato de criao, intrnseco experincia do trabalhar, frequentemente se depara com ogrande prescrito ordenador das configuraes mais especficas da cultura: grupos, comuni-dades, organizaes. Antonio Negri (apud Sousa, 2007) evidencia essa tensa dinmica, aoutilizar os conceitos de poder constituinte e poder constitudo.

    O poder constituinte a capacidade de retornar ao real, de organizar uma estrutura

    dinmica, de construir uma forma formante que, atravs de compromissos, ordenaese equilbrio de foras diversas recupera sempre a racionalidade dos princpios, ou seja,a adequao material do poltico em relao ao social e ao seu movimento indefinido.(Negri, apud Sousa, 2007, p. 25).

    A partir do encontro com o real, a criao artstica instaura possibilidades de questiona-mento da ordem institucional, social e do conhecimento. Como escreve Sousa (2007, p. 26)o ato de criao um fazer que s se faz fazendo e informa ao sujeito, a partir de sua obra,os horizontes que se desenham em seu trabalho. O ato criativo adquire necessariamente umapotncia crtica e de desequilbrio dos saberes vigentes.

    O fazer artstico possibilita experincias que podem levar o sujeito a situaes de descentra-

    mento e, desta forma, a repensar sua constituio nas dimenses mais imediatas da existncia e tambm mais amplas e sociais nas quais est presente uma desconstruo da temporalidade:o passado como espao de imensido ancestral, habitado por mitos, fbulas e histrias quetraduzem as enigmticas dimenses da existncia humana; o presente como espao de sntesede um determinado contexto sociohistrico; e o futuro como projeo para alm do tempopresente, para uma espcie de transcendncia e o espao de possibilidades do ser.

    Com essa perspectiva, entendemos que o trabalho de criao literria que depende deum forte engajamento subjetivo oferece um campo de estudos que parece favorvel com-preenso da potencialidade da sabedoria criativa nos processos de mobilizao subjetiva e naconstituio subjetiva do sujeito na sua singularidade que, numa dinmica dialgica, podeoferecer contribuies para os aportes da prpria compreenso do trabalho como potncia

    constituinte da condio humana.A ao de trabalharpode ser entendida como possibilidade de desenvolvimento das capaci-

    dades humanas, de acesso autonomia, construo de sentidos para o sujeito e a sociedade.Para isso, necessrio que o trabalho no esteja submetido a situaes que levem fragmen-tao das capacidades individuais e coletivas, nem anulem a experincia da singularidade,como se observa nos efeitos do imprio das relaes de troca no mercado, da diviso alienantedo trabalho.

    Neste sentido, como ato de criao, o fazer artstico pode ser utilizado como instrumentode crtica aos modelos sociais e econmicos que resultam no trabalho alienado. Foi com estaperspectiva que Marx e, posteriormente, Adorno tomaram a atividade artstica como refern-

    cia para uma crtica ao trabalho assalariado principalmente na distino entre trabalho livree trabalho alienado. A anlise do fazer artstico, como forma de trabalho, possibilita estenderesse campo de estudos a profisses com forte engajamento subjetivo, voltadas para a criativida-de, caractersticas cada vez mais demandadas no mundo do trabalho (Menger, 2005).

    No referencial da psicodinmica do trabalho, encontramos em Dejours (2004b) refernciasa situaes de trabalho marcadas por essas caractersticas como, por exemplo, nas atividades depesquisadores e artistas. As pesquisas com esse referencial voltadas para o trabalho artstico,no entanto, so muito recentes (Segnini, 2006 e 2010; Lima e Mendes, 2009; Assis e Macedo,2008; Santos, 2008; Bueno, 2010). Alm disso, no foram identificadas pesquisas concludassobre o trabalho de criao artstica do escritor.

    Entendemos que a psicodinmica do trabalho oferece recursos para delimitar o quadro

    terico em torno do fazer literrio. O trabalho compreendido como o saber fazer, um enga-jamento do corpo, a mobilizao da inteligncia, a capacidade de refletir, de interpretar e dereagir s situaes; o poder de sentir, de pensar e de inventar (Dejours, 2004a, p. 28). Com

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    esse olhar, enfatiza-se a dimenso criadora do trabalho, seu estatuto de ao que possibilitaa constituio da subjetividade e do sujeito, sua condio transcendental de manifestaoabsoluta da vida (Dejours, 2004a, p. 31).

    Sendo por definio o que no dado pela cincia e pela tcnica, a experincia de trabalharnos coloca, com frequncia, diante do imprevisto, daquilo que desvela nossa impossibilidadede organizar o mundo em concepes estticas. al experincia se constitui por um fazer nem

    sempre visvel, pontuado por aspectos incompreensveis, pela aura enigmtica em torno dassituaes inusitadas que desafiam conhecimentos consagrados e aparatos tcnicos construdossobre a pretenso do infalvel.

    rabalhar no se reduz racionalidade instrumental, pois se constitui como evidncia dofracasso dessa racionalidade, de ruptura com o estabelecido, na qual uma verdade se desvela.A verdade, para a psicodinmica do trabalho, se constitui pela experincia do real. al pres-suposto dejouriano uma referncia fundamental dessa pesquisa, ao indicar que o trabalharno se reduz s relaes sociais que o enquadram, aos salrios, s relaes de poder ou normas.

    rabalhar no somente produzir. a possibilidade para o sujeito se constituir e, ao faz-lo, transformar a si mesmo. O trabalho parte fundamental para afirmar a subjetividade,para o processo de enunciao do sujeito e construo da sade. O conceito de sade torna-se

    mais abrangente quando articulado ao trabalhar. No entanto, de acordo com Dejours (2004b,2007a), a sade antes um ideal. Como o ideal de justia, sem o qual no se pode pensar ajustia, mas que no existe do ponto de vista prtico. Nessa linha, entendemos sade no trabal-ho como a capacidade de mobilizao subjetiva para uma relao gratificante com o trabalho,essencial para o processo de subjetivao (Mendes, 2007).

    O processo sade-adoecimento precisa ser compreendido no contexto especfico de cadasituao de trabalho que, por sua vez, no pode ser pensada fora da dinmica da histria, doslaos sociais e, mais especificamente, das relaes do sujeito com seu trabalho.

    As situaes de trabalho esto, direta ou indiretamente, associadas a uma organizao oucomunidade de filiao. A compreenso da psicodinmica sobre a organizao do trabalho vaialm da racionalidade que tenta controlar as situaes cotidianas, extrapola aspectos fsicos,alcana a subjetividade individual, as relaes interpessoais e a sutil rede intersubjetiva mobi-lizada pelo trabalho (Mendes, 2007).

    A organizao do trabalho tem duas dimenses: prescrita e real. A primeira composta porregras e normas ligadas lgica da produtividade, tende a ser desconectada das necessidades edesejos das pessoas e das atividades reais. A segunda reflete as situaes imprevistas que ultra-passam o domnio tcnico e o conhecimento cientfico; evidencia o fracasso da normatizaodiante da modificao contnua da real idade e estabelece desafios constantes compreenso eao fazer humanos.

    importante assinalar a grande diferena terica entre realidade da atividade (a que

    visada pela expresso atividade real ou trabalho real) e real do trabalho, isto os limi-tes do saber, do conhecimento e da concepo, com os quais se chocam os atos tcnicose as atividades de trabalho. (Dejours, 1997, p. 43).

    Como reconhecer a distncia irredutvel entre essas duas dimenses? Sempre na formade um fracasso: o real se revela ao sujeito pela resistncia aos procedimentos, ao saber fa-zer, tcnica, ao conhecimento, isto , pelo fracasso do estabelecido e do conhecimento.rabalhar fazer a experincia do real, esse o centro de gravidade da clnica do trabalho(Dejours, 2004b).

    O real na psicodinmica do trabalho influenciado pelo conceito de real de Lacan, maso prprio Lacan tirava esse conceito de seu conhecimento da fenomenologia. Devemos

    muito, neste aspecto, antropologia, que mostra que o acesso ao real nunca imediato(Dejours, 1999b, p. 47).

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    A mobilizao para enfrentar as adversidades do trabalho e fazer a experincia do real queentendemos se aplica tambm ao trabalho dos artistas articula conceitos importantes da psico-dinmica do trabalho, como a sabedoria prtica decorrente da mobilizao subjetiva no trabalho.

    A mobilizao subjetiva possibilita a constituio da sabedoria prtica, necessria parafazer a experincia do real do trabalho. Com isso, o sujeito desenvolve um modo particularde inveno, de usar a capacidade de criao e de um saber fazer singular. A sabedoria prtica

    frequentemente ultrapassa e est frente da conscincia e do conhecimento que o sujeito temdo mundo e de si mesmo. A sabedoria prtica enraizada no corpo e depende de condiespsicoafetivas.

    A sabedoria prtica parte essencial para processo de subjetivao em todas as formas detrabalho. Conforme Mendes (2007), a subjetivao entendida como o processo de atribuiode sentido, construdo com base na relao do trabalhador com sua realidade de trabalho,expresso em modos de pensar, sentir e agir individuais ou coletivos (p. 30). O essencial dasubjetividade e do processo de subjetivao invisvel.

    O processo de subjetivao pelo trabalho precisa ser renovado e reinventado todos os dias.Condio essencial para a constituio do sujeito e que depende de situaes favorveis aoequilbrio psquico e sade. A reinveno dessa escrita da subjetividade (Ferreira, 2007, 2009),

    no entanto, enfrenta desafios crescentes, tendo em vista o cenrio adverso do admirvel mundonovo do trabalho.

    O desafio permanente do sujeito no trabalho fazer a experincia do real, o que indica, emnosso entendimento, que o trabalhar tambm fazer a experincia de descentramento do sujeito.Nesse sentido, resgatamos os comentrios dejourianos de que as pesquisas deveriam investigarmais as articulaes entre as situaes de trabalho e as dimenses do funcionamento subjetivoe intersubjetivo (Dejours, 2004a).

    O encontro da histria singular com a situao presente, o encontro do sujeito com o camposocial, mediado pela experincia do trabalhar, marcado por contradies (Dejours, 2004b).A palavra, desta forma, um mediador privilegiado para a compreenso sempre provisriadessas contradies.

    O termo sujeito na psicodinmica do trabalho no utilizado como denominao genricapara designar uma pessoa ou um agente indefinido. O conceito refere-se a quem vivenciaafetivamente a situao, no um contedo de pensamento, mas essencialmente um estadode corpo (Dejours, 1999a). A afetividade o modo pelo qual um corpo singular vivencia seucontato absolutamente nico com o mundo. H um irredutvel na singularidade. A afetividadeest, portanto, na base do processo de subjetivao.

    Com estes aportes, este estudo tem como objetivo discutir aspectos da sabedoria prtica oucriativa, a partir do trabalho de criao artstica do fazer literrio, como aspecto significativodo processo de subjetivao no trabalho. A investigao parte de uma pesquisa de doutorado,j concludo, que analisou a criao literria como trabalho vivo, com base no referencial da

    psicodinmica do trabalho.

    MTODO

    rata-se de uma pesquisa exploratria, de natureza qualitativa, realizada com base empesquisa documental e no referencial terico da psicodinmica do trabalho. Por meio daanlise de entrevistas com escritores, buscamos investigar o trabalho de produo literria,tendo como principal objetivo evidenciar aspectos de seus processos de criao relacionados sabedoria prtica.

    Com esse olhar, no buscamos a representatividade do pensamento de cada escritor ou grupode escritores, nem delimitar generalizaes sobre o processo de criao literria. rabalhamosna articulao das manifestaes dos entrevistados com o referencial da psicodinmica dotrabalho. al mtodo encontra paralelos na investigao sobre o trabalho do escritor realizadapela sociloga da arte Nathalie Heinich (2000), que entrevistou trinta autores, visando a

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    maior variedade possvel no perfil dos autores, mas buscando sempre a conexo e a articulaocom o referencial terico utilizado e com seus objetivos de pesquisa.

    No presente estudo foram analisadas 33 entrevistas completas publicadas em livros e re-vistas especializadas e cinco trechos de entrevistas realizadas com 32 escritores, sendo 11brasileiros, 11 hispano-americanos e dez de outras nacionalidades, publicadas no Brasil, nosltimos 25 anos, conforme descrito na abela 1.

    Esses escritores consolidaram trabalhos que so reconhecidos por sua contribuio lite-ratura. Alguns autores abordam com maior profundidade o trabalho de criao literria, nasentrevistas e em sua produo literria. Ricardo Piglia, Jlio Cortzar e Jorge Luis Borges,por exemplo. Clarice Lispector cujos trabalhos tornaram-se mais conhecidos a partir dosanos 80 e esto entre os mais estudados no pas tambm uma das maiores referncias nestesentido. Seus romances gua viva e Um sopro de vida, por exemplo, apresentam inmerasreferncias aos desafios do ato de escrever.

    O recorte temporal de 25 anos foi estabelecido aps levantamento bibliogrfico inicial,no qual se buscou identificar as principais publicaes de entrevistas com escritores editadasno pas, e tambm com base no acompanhamento deste tipo de publicao realizado desdeo incio dos anos 80, em oficinas literrias, e que resultaram na publicao e premiao decontos, alguns includos no livro O doce vermelho das beterrabas, em 2006, de nossa autoria.

    Para S Silva et al. (2009), uma justificativa para a utilizao da pesquisa documental quepermite acrescentar a dimenso do tempo compreenso da temtica em estudo. Documento

    entendido aqui como: tudo o que vestgio do passado, tudo o que serve de testemunho, con-siderado como documento ou fonte (Cellard, 2008, como citado por S Silva et al., 2009, p. 7).Os autores (S Silva et al., 2009, p. 3) citam Helder (2006, p.12) para discutir o estatuto

    da tcnica: A tcnica documental vale-se de documentos originais, que ainda no receberamtratamento analtico por nenhum autor... uma das tcnicas decisivas para a pesquisa emcincias sociais e humanas.

    Este trabalho constitui-se, assim, de uma investigao cuja coleta de dados foi realizada combase em pesquisa documental, escolha que se justifica pelo fato de haver uma enorme quanti-dade de entrevistas disponveis, em um horizonte temporal extenso, com escritores importantes alguns j falecidos que constituem um vasto material disponvel como fonte de pesquisa.No foram identificados tratamentos desse material com base na abordagem da psicodinmica.

    Alm disso, o interesse pela entrevista refere-se ao espao de significao que essas conversastambm propiciam, na medida em que o processo criativo se constitui em enigma tambm paraos artistas-escritores. Como vemos nesta referncia de Ehrezenweig, resgatada por Coutinho

    TABELA 1. Escritores por nacionalidade

    BRASILEIROS HISPANO-AMERICANOS OUTRAS NACIONALIDADES

    Afonso Romano de SantAnna Carlos Fuentes Antonio Lobo Antunes

    Caio Fernando Abreu Ernesto Sbato Ian McEwan

    Charles Kiefer Gabriel Garcia Mrquez talo Calvino

    Chico Buarque de Hollanda Jorge Luis Borges Jean Cocteau

    Clarice Lispector Juan Carlos Onetti Jos Saramago

    Fernando Bonassi Juan Rulfo Milan Kundera

    Ferreira Gullar Jlio Cortzar Paul Auster

    Joo Antnio Mrio Vargas Llosa Peter Handke

    Joo Gilberto Noll Octvio Paz Philip Roth

    Lygia Fagundes Telles Pablo Neruda Primo Levi

    Mrio Quintana Ricardo Piglia

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    Jorge (2009, p. 42): um espetculo espantoso ver os artistas, uma vez findo seu trabalho,comear s vezes a examin-lo em todos os seus detalhes, como se ele no viesse deles.

    As entrevistas-documentos foram analisadas com base na tcnica de Anlise dos Ncleosde Sentido (ANS), desenvolvida por Mendes (2007). Esta tcnica de anlise qualitativa pos-sibilita a construo de ncleos de sentido e a investigao de temas que se evidenciam nasnarrativas dos entrevistados.

    As categorias temticas foram definidas com base nos objetivos da pesquisa aqui apre-sentada e na perspectiva da psicodinmica do trabalho. Aps a leitura das entrevistas, foramidentificados trechos das narrativas que estabeleceram ressonncia com as categorias temticaspreviamente definidas. Foi realizado, ento, um trabalho de anlise das narrativas que foram,gradativamente, articuladas em torno de temas-proposies. Esse trabalho de anlise resultouna composio de trechos significativos dessas narrativas que procuramos articular s dimen-ses tericas da psicodinmica do trabalho.

    RESULTADOS E DISCUSSO

    Nos relatos dos escritores, identificamos aspectos relacionados sabedoria prtica que

    resultaram em duas categorias temticas o trabalho me impe um mtodoe apressa-te len-tamente, bem como na proposta de diferenciao conceitual entre saber fazer instrumental esaber fazer com o real, apresentados e discutidos a seguir.

    O trabalho me impe um mtodo

    Essa categoria temtica oferece elementos para pensarmos a sabedoria prtica comopermanente inveno de um caminho para cada situao de trabalho. So recorrentes asmanifestaes de escritores que vivenciam o fazer literrio como caminho que se mostra nopercurso da escrita, frente do conhecimento, o que constitui aspecto significativo desse modode saber fazer. Encontramos isso no relato de Clarice Lispector (2007, p. 163): Eu nunca seide antemo o que eu vou escrever... Vou me seguindo e no sei no que vai dar. Depois voudescobrindo o que eu queria. Jlio Cortzar (1991, p. 165) ressalta o saber fazer que antecedea conscincia, mobilizado por uma espcie de sbita corrente entre ele e o trabalho.

    O trabalho me impe um mtodo. Posso estar dando voltas ao redor de um contodurante semanas e de repente vou para a mquina achando que est pronto, que possome soltar e abandon-lo bruscamente e no fazer nada de nada durante semanas. Maso que eu posso dizer, e por isso falo que o trabalho me impe o mtodo, que, quandocomeo uma coisa, h subitamente uma espcie de corrente entre mim e essa pginaque foi posta na mquina.

    O escritor Jlio Cortzar (2002, p. 34) tambm resgata a conhecida frase de Picasso euno procuro, eu acho ao se referir ao seu prprio modo de trabalhar. A distino significati-va para nossa discusso. A procura pressupe algo previamente conhecido. Achar o encontrocom o inesperado, com a dimenso enigmtica do no saber. A frase do artista espanholtambm serviu de mote para Lacan identificar, neste processo, um mtodo para a psicanlise.

    Lacan refere-se a esse dito de Picasso para ver nele uma verdadeira metodologia psi-canaltica: o psicanalista tambm no procura o que sabe nas anlises que conduz, masacha aquilo que no sabia que encontraria e, como Freud j recomendara, deve abordarcada novo caso como se fosse o primeiro, esquecendo tudo o que sabe (Coutinho Jorge,2009, p. 48).

    No relato do escritor uruguaio Juan Carlos Onetti (1999): O escritor deve enfrentar cadatema novo de maneira nova. Eu no podia trabalhar Los adiosesda mesma forma que em

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    Junta-cadveres.O tratamento sempre outro (p. 104). Ainda com Onetti (1999), vemos quea descoberta um dos componentes da mobilizao subjetiva do escrever: Eu no sentiria omnimo interesse em escrever se soubesse o que vai acontecer. (...) Nada delibero de antemo(p. 105). A manifestao do escritor Charles Kiefer (1990) aponta nesta direo: A questode contedo/forma dialtica e imbricada. A minha tentativa de deixar que a literatura, namedida em que eu a fao, se faa. Parece meio redundante, mas o mximo que eu posso che-

    gar na explicao do meu prprio texto. Deixar que a coisa se faa dentro de si mesma (p. 7).Para Caio Fernando Abreu (1988): O primeiro momento de escrever intuitivo. Depoisvem o trabalho braal. Os drages no conhecem o paraso, eu reescrevi seis ou sete vezes(p. 8). Ao comentar o processo de criao do romance Onde andar Dulce Veiga?1,duranteuma oficina de criao literria, o escritor contou que as quase mil pginas iniciais do livroforam transformadas, depois de muito trabalho, na verso final do livro com pouco mais deduzentas pginas2. Referncia semelhante encontramos em Ricardo Piglia (1999), na qual oautor enfatiza o trabalho da reescrita:

    Reescrever a nica maneira de saber aonde vou. Nada est previsto em minhas obras.O ponto de partida de Respirao artificialfoi o desejo de escrever em forma de um

    arquivo, misturando tudo o que h num arquivo: cartas, testamentos. O ttulo foi en-contrado no final, pois chamava-seA prolixidade do real, baseado em versos de Borges:y la noche que de la mayor congoja nos libra/la prolijidad de lo real (p. 38).

    O comentrio de Piglia significativo para nosso percurso: a prolixidade do real, entendidacomo dimenso da realidade que no cessa de mostrar o inesperado e colocar o institudoem questo. O correlato simblico das tentativas de lidar com a prolixidade do real a buscaincessante de dar-lhe forma por meio da palavra. A interminvel busca de simbolizao. Astentativas marcadas pelo fracasso de constituir sentidos para o real.

    Nessa perspectiva, a reflexo de Maurice Blanchot (1987) elucidativa: Escrever fazer-seeco do que no pode parar de falar (p. 17). O real no pode parar de falar, mas contido e

    ao mesmo tempo alcanado por nossas configuraes simblicas. A escrita a construo deuma escuta e materializao dessa prolixidade infinita.

    No que se refere ao saber fazer que procura contornar a dificuldade de simbolizao, encon-tramos em Vargas Llosa (1999): Algumas vezes, eu tambm busquei a expresso: agora sei quemeus deuses no me concedem mais do que aluso ou meno (p. 180). A referncia alusocomo forma de trabalhar com a simbolizao tambm enfatizada por Ricardo Piglia (1994):

    O que se busca o que no se disse, e esse processo equivale a uma edio, pois maisimportante saber o que no se vai narrar. Os grandes narradores so aqueles que sabemdeter um relato no momento em que a aluso, o no dito, a elipse produzem um efeitosobre o que se est dizendo. Borges um mestre absoluto nisso... rabalho a partirde um rascunho e, quando chego ao final, vejo que deixei de contar muita coisa quepretendia (p. 133).

    Os depoimentos dos escritores oferecem elementos para pensarmos a sabedoria prticacomo permanente inveno de um caminho para cada situao de trabalho. Desta forma, seconfigura uma dinmica mergulhada na experincia do real. Campo enigmtico que escapa simbolizao. A dimenso de um saber que se constitui na experincia do real e com o reale o simblico significativa para reafirmar a compreenso de que o trabalho se constitui noseu prprio fazer, cujo mtodo continuamente reinaugurado a partir de uma prtica singular.

    1 Adaptado para o cinema por Guilherme de Almeida Prado, em 2007.

    2 Oficina de contos coordenada pelo escritor na Casa de Cultura Mario de Andrade, em So Paulo (SP), confor-me notas pessoais do autor deste artigo.

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    Apressa-te lentamente

    Outro aspecto fundamental da sabedoria prtica o saber fazer em um tempo prprio, quedesconhece sua face cronolgica e se aproxima da temporalidade do inconsciente. Assim, des-tacamos o comentrio do escritor Octvio Paz (1999): O tempo o ncleo do que eu creio queseja a experincia literria. Ela um dos modos de apario desse elemento estranho (p. 99).

    empo impondervel da elaborao que pode levar produo de sentido do prprio tra-

    balho e do sujeito. empo da ressonncia com o desejo, potencialmente dissonante do mundoconformador das representaes. Como indica Clarice Lispector (2007): Eu elaboro muitoinconscientemente. s vezes pensam que eu no estou fazendo nada. Estou sentada numa ca-deira e fico. Nem eu mesma sei que estou fazendo alguma coisa. De repente vem uma frase...(p. 150). E tambm Jorge Luis Borges (2009): O trabalho essencial do escritor consiste emdistrair-se, em pensar em outras coisas, fantasiar, no se apressar para dormir (p. 152).

    empo que extrapola horrios regulares, se estende para o sono e os sonhos. Horas e noitesnas quais sonhamos com o trabalho: Quando escrevo um livro, trabalho sem parar, at dor-mindo. s vezes, viajo para ter sossego, s vezes fico por aqui mesmo, mas mando dizer queestou na fazenda, embora no tenha fazenda, conta Chico Buarque (2007, p. 100).

    Isso nos reporta aos comentrios de Dejours (2004b): O trabalho no , como se acreditafrequentemente, limitado ao tempo fsico. (...) O trabalho ultrapassa qualquer limite dispen-sado ao tempo de trabalho; ele mobiliza a personalidade por completo (p. 31). E tambm considerao de que sonhamos com o trabalho. Pois bem, isso necessrio para nos tornarmoshbeis em nossas atividades. (...) toda a subjetividade que arrebatada nesse movimento, ato mais ntimo do ser (Dejours, 2007a, p. 19).

    O tempo da criao artstica e de todo trabalho de criao se contrape exacerbaodo tempo instrumentalizado pela conformao capitalista do trabalho, e potencialmentetransgressor. Como ressalta Edson Sousa (2000, p. 216), o trabalho do artista introduz novasexperincias sobre a funo do tempo no trabalho: Justamente por no responder a uma lgicado capital, que em nosso tempo prope equivalncias entre tempo e dinheiro, o artista produz

    muitas vezes, num longo tempo silencioso, um trabalho nem sempre visvel.Encontramos aproximaes disso nas reflexes de Calvino (1990) sobre a problematizaodo tempo necessrio criao literria, descritas no livro Seis propostas para o prximo milnio.O autor resgata a mxima latinafestina lente(apressa-te lentamente), e a sublinha com umahistria chinesa:

    Entre as mltiplas virtudes de Chuang-s estava a habilidade para desenhar. O reipediu-lhe que desenhasse um caranguejo. Chuang-s disse que para faz-lo precisa-ria de cinco anos e uma casa com doze empregados. Passados cinco anos, no haviasequer comeado o desenho. Preciso de outros cinco anos, disse Chuang-s. O reiconcordou. Ao completar-se o dcimo ano, Chuang-s pegou o pincel e num ins-

    tante, com um nico gesto, desenhou um caranguejo, o mais perfeito caranguejo quejamais se viu (p. 67).

    Nesta linha, ao analisar o conto resgatado por Calvino, Ricardo Piglia (2004) ressalta quea histria se refere ao tempo outro necessrio ao trabalho de criao:

    Como o relato trata de um artista, seu ncleo bsico o tempo e as condies materiaisde trabalho: neste sentido, o conto um tratado sobre a economia da arte. Firma-seum contrato de trabalho entre o pintor e o rei: a dificuldade reside, recordemos Marx,em medir o tempo de trabalho necessrio numa obra de arte e, portanto, a dificuldadede definir (socialmente) o seu valor (p. 98).

    A observao de Piglia bastante prxima das crticas contundentes de Dejours (2008) stentativas de avaliar o trabalho, que igualmente se reportam a Marx:

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    Acho importante ressaltar que, em seus escritos filosficos, Marx j sustentava que otrabalho no pode ser medido, pois provm de uma experincia subjetiva e fundamen-talmente incomensurvel. E na ausncia de outra possibilidade que se passa da ava-liao do trabalho avaliao do tempo de trabalho, e que as duas dimenses passama ser consideradas equivalentes (p. 34).

    As avaliaes quantitativas tm dificuldade para capturar o tempo singular de elaborao erealizao do trabalho, cuja parte mais importante essencialmente invisvel. Dejours (2008)afirma ainda que as pesquisas mostram claramente que o empenho da subjetividade ultrapas-sa, e muito, o tempo que contabilizado como tempo de trabalho (p. 65).

    al instrumentalizao uma das faces da lgica que induz alienao, dado que a ex-perincia de trabalhar no redutvel dimenso objetiva. Aqui reencontramos a viso deque a experincia de trabalhar tambm escapa s definies. E nos encontramos com as re-flexes de Blanchot (2005) sobre a impossibilidade de definir o trabalho de criao literria,reflexes que se contrapem viso instrumental do trabalho, como enfatiza, de modo crtico,a psicodinmica.

    O fazer literrio escapa s determinaes, s afirmaes que o estabilizem em conceitos

    determinados. Nunca est dado, est sempre por se reinventar. Como fazer da arte, a literaturano pode ser medida pelos critrios da funcionalidade, da utilidade ou da informao (p. 49).Quando situada no territrio da no funcionalidade, a sabedoria prtica possibilita a expe-

    rincia do real do trabalho e o desenvolvimento de um saber fazer singular, um modo prpriode criao e inveno do sujeito e da vida.

    A sabedoria prtica frequentemente ultrapassa a conscincia e o conhecimento que o sujeitotem do mundo e de si mesmo. Como indica Dejours (2004a), uma das construes significa-tivas da psicodinmica que a experincia precede o saber (p. 287) e depende das condiespsicoafetivas (ressonncia simblica e mobilizao subjetiva) e sociais (reconhecimento pelooutro) nas quais o trabalho realizado.

    A sabedoria prtica suscita questes sobre os requisitos para sua mobilizao que, segundo

    Dejours (2004b), demandam investigaes sobre o tema. A anlise psicodinmica dos trabal-hos de criao, em nosso entendimento, oferece elementos importantes para este percurso. Comessa perspectiva, sugerimos uma distino terica para a sabedoria prtica, descrita a seguir.

    Saber fazer instrumental e saber fazer com o real

    O saber fazer da criao literria oferece um contraponto crtico s formas de trabalhoalienadas, anteriormente enfatizadas, e fornece elementos para pensarmos em configuraesdiferentes da sabedoria prtica: saber fazer instrumental e saber fazer com o real.al distino foiconstruda nesta pesquisa a partir da discusso dos depoimentos dos escritores com base noreferencial terico da psicodinmica e, de modo especial, articulada observao de Lacan,conforme Lima (2009), sobre as expresses savoir-fairee savoir-y-faire:

    ...a primeira traduz um saber fazer com uma tcnica conhecida pela habilidade que setem de um elemento qualquer, um saber ensinado atravs de normas porque se tem asregras universais do uso, um artifcio. Ao passo que a segunda expresso que serviucomo ttulo para o Colquio que originou o livro Saber fazer com o real possui umainterpretao mais prxima aos psicanalistas e aos artistas, pois valoriza a diferenaentre o universal e o particular. Enquanto o saber fazer no traz grandes surpresas,visto que supe um saber domesticado, submisso, universalizado pelo conceito queadvm do Outro, na expresso savoir-y-faire h um saber fazer com, um saber se virarcom isso, que no universaliza o sujeito, ao contrrio, produz surpresa e o conduz ao

    singular de seu ato (p. 26).

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    A distino entre saber fazer instrumental e saber fazer com o real parte justamente des-sa proposio lacaniana, que entendemos pertinente para pensarmos uma amplificao dasdimenses da sabedoria prtica. O saber fazer instrumental opera nos aspectos mais direta-mente ligados ou intrnsecos organizao do trabalho, tende a ser formatado pela lgica daprodutividade, da otimizao de resultados, podendo desconsiderar as consequncias ticas ede sade das pessoas em situao de trabalho. Busca viabilizar alternativas s deficincias e

    adversidades do trabalho, cujo aprimoramento implicaria maiores custos para as organizaes,como a aquisio de equipamentos de segurana ou recursos materiais e tecnolgicos queofeream melhores condies de trabalho. A exacerbao do saber fazer instrumental pode seridentificada no zelo perverso(Ferreira, 2009).

    A viso de que trabalhar fazer a experincia do real demanda um saber fazer com o inusi-tado, com a surpresa que indica e aponta para o real, e implica colocar em questo modos de sere de existir. Isso abre possibilidades para o processo de significao do sujeito que nomeamosaqui de saber fazer com o real que um fazer na borda indefinvel entre o trabalho prescrito eo real do trabalho.

    Um aspecto significativo da interlocuo da psicodinmica do trabalho com a psicanlise a articulao do real com o inconsciente. A dimenso primeira do real o inconsciente fonte

    primordial do no saber do eu seu ncleo central (Coutinho Jorge, 2000, p. 97). Assim,fazer a experincia do real , sobretudo, fazer a experincia do inconsciente. Neste sentido, osaber fazer com o real est conectado experincia do inesperado, produz surpresa e conduzo sujeito ao seu ato singular e, ao mesmo tempo, voltado e decorrente da sua relao com adimenso do coletivo, que se manifesta no fazer da criao.

    Essa distino tambm fornece elementos para uma amplificao conceitual que podecontribuir para a anlise psicodinmica de trabalhos mais voltados criao, realizados, porexemplo, por pesquisadores, psicanalistas e artistas.

    CONSIDERAES FINAIS

    Com a viso de que trabalhar fazer a experincia do real, do inusitado, da permanentebusca da verdade instaurada pelo no saber, a permanente reinstaurao subjetiva possibili-tada pelo trabalho de criao processo indispensvel para colocar em questo situaes deadoecimento e alienao no trabalho. Esses sugerem importantes questes para pensarmosa indissocivel articulao entre as teorias do sujeito, da ao e da sade, projeto com o quala psicodinmica do trabalho tem se ocupado na sua jovem e inovadora trajetria e que temproduzido significativas contribuies para a evidenciao da alienao no trabalho e para aconstruo de prticas de emancipao do sujeito-trabalhador.

    Nosso exerccio de anlise da experincia de criao literria, a partir das categorias tem-ticas constitudas e com base no referencial da psicodinmica do trabalho, destaca a sabedoria

    prtica como aspecto fundamental do processo de subjetivao. Alm disso, foram identifica-dos operadores crticos, nessa dimenso da experincia criadora, que enfatizam os efeitos dotrabalho alienado na constituio do sujeito.

    A anlise dos resultados sinalizou aspectos da sabedoria prtica relacionados necessidadede se considerar a forma e a temporalidade singulares das situaes de trabalho, bem como seucarter de permanente inveno, que nos levou proposta de distino conceitual entre saberfazer instrumentale saber fazer com o real.

    O primeiro saber foi identificado como voltado reparao das deficincias primrias do tra-balho prescrito e mais facilmente reforado pela exacerbao da produtividade, resultando emperda do sentido do trabalho e adoecimentos. O segundo saber, potencialmente transgressordo trabalho prescrito, continuamente se depara com a irredutibilidade do real simbolizao(dficit semitico),referente insuficincia das palavras para traduzir a experincia do real.

    O saber fazer com o realdesafia conhecimentos e aparatos tcnicos estabelecidos. Ao seconstituir como operador crtico das estruturas sociais, institucionais e organizacionais que

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    produzem o trabalho alienado, torna-se essencial para a desconstruo de enunciados na-turalizados do eu. ais proposies contribuem, em nosso entendimento, para uma melhordiferenciao dos conceitos de real do trabalho e trabalho real, assinalada por Dejours (1997).

    O fazer literrio entendido como forma de trabalho na qual os processos de criaofornecem elementos para anlise do poder constituinte de outras formas de trabalho que pos-sam ser configurados como trabalho vivo. Estudar formas de trabalho dinamizadas por essas

    caractersticas possibilita a compreenso e a delimitao de elementos prticos das experinciasdo trabalhar, que podem ser utilizados como base para a construo de sentidos e da vida.Nesta perspectiva, o estudo da sabedoria prtica possibilita ressaltar questes importantes

    sobre a articulao dos requisitos fsicos, sociais e cognitivos de seu funcionamento que, se-gundo Dejours (2004b), demandam mais investigaes para elucidao de seus fundamentos.As descobertas advindas das experincias singulares dos trabalhos de criao, em nosso enten-dimento, podem fornecer elementos significativos para este percurso.

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