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CAMPOS, Haroldo. A arte no horizonte do provável. Perspectiva, 1972 p. 17 Isto no seu poema-partitura, de 1897, poema circular, que gira semanticamente sobre si mesmo, que está recomeçando... [dados] p. 24-25 citando Kalte Kunst (1957): “...Original, nesses trabalhos, é, sobretudo, o tipo de sua estrutura, sua lei formativa. Esta é de tal arte que os elementos não se fixam reciprocamente de maneira coerciva e definitiva, mas através de um sistema de referências. O importante PE o seguinte: no âmbito do sistema, não se cogita meramente de uma ‘composição’, mas de inumeráveis ‘constelações’ igualmente válidas”. suas obras...são também manipuláveis diretamente pelo telespectador. p. 26 citando Umberto Eco “Não será pois impossível programar, com a pureza linear de um programa matemático, campos do conhecimento, nos quais se possam verificar processos casuais. Teremos assim uma dialética singular entre acaso e programa, entre matemática e aleatório, entre concepção planificada e aceitação livre daquilo que sucederá, mas sucederá segundo precisas linhas formativas predispostas, que não negam a espontaneidade, mas que lhe pões limites e direções possíveis”. O que nos recorda Boulez, com seu lema de “organiser Le delire”, de impor balizas (formates) à pura fermentação do acaso. Não é à toa que se invoca, no mesmo catálogo, uma proposição de Valéry, o discípulo dileto de Mallarmé: “A maior liberdade nasce do maior rigor”. p. 31 O poema “acaso” (1963) de Augusto de Campos, fundado nas possíveis permutações de letras dessa palavra, a qual, como que por acaso, só é legível um vez em todo o texto, e esse acaso, perdido no aparente anonimato das sequencias de letras privadas (ou quase) de semântica (digo “quase” porque numa delas, por exemplo, se pode reconhecer a palavra caos...), é que constitui a informação estética, o poema. p. 132 A ciência geral dos signos é a semiologia. A semiologia estuda todos os fenômenos culturais como se fossem sistemas de signos, fenômenos de comunicação (U. Eco). Saussure, Barthes, Jakobson, Eco, Ezra Pound, C S Peirce, C Cherry, Bense, Hegel, Charles Morris... (p. 132-5)

Fichamento de Campos - A Arte No Horizonte Do Provável

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Page 1: Fichamento de Campos - A Arte No Horizonte Do Provável

CAMPOS, Haroldo. A arte no horizonte do provável. Perspectiva, 1972

p. 17 – Isto no seu poema-partitura, de 1897, poema circular, que gira

semanticamente sobre si mesmo, que está recomeçando... [dados]

p. 24-25 – citando Kalte Kunst (1957): “...Original, nesses trabalhos, é,

sobretudo, o tipo de sua estrutura, sua lei formativa. Esta é de tal arte que os elementos

não se fixam reciprocamente de maneira coerciva e definitiva, mas através de um

sistema de referências. O importante PE o seguinte: no âmbito do sistema, não se cogita

meramente de uma ‘composição’, mas de inumeráveis ‘constelações’ igualmente

válidas”. suas obras...são também manipuláveis diretamente pelo telespectador.

p. 26 citando Umberto Eco “Não será pois impossível programar, com a pureza

linear de um programa matemático, campos do conhecimento, nos quais se possam

verificar processos casuais. Teremos assim uma dialética singular entre acaso e

programa, entre matemática e aleatório, entre concepção planificada e aceitação livre

daquilo que sucederá, mas sucederá segundo precisas linhas formativas predispostas,

que não negam a espontaneidade, mas que lhe pões limites e direções possíveis”. O que

nos recorda Boulez, com seu lema de “organiser Le delire”, de impor balizas (formates)

à pura fermentação do acaso. Não é à toa que se invoca, no mesmo catálogo, uma

proposição de Valéry, o discípulo dileto de Mallarmé: “A maior liberdade nasce do

maior rigor”.

p. 31 O poema “acaso” (1963) de Augusto de Campos, fundado nas possíveis

permutações de letras dessa palavra, a qual, como que por acaso, só é legível um vez

em todo o texto, e esse acaso, perdido no aparente anonimato das sequencias de letras

privadas (ou quase) de semântica (digo “quase” porque numa delas, por exemplo, se

pode reconhecer a palavra caos...), é que constitui a informação estética, o poema.

p. 132 – A ciência geral dos signos é a semiologia. A semiologia estuda todos os

fenômenos culturais como se fossem sistemas de signos, fenômenos de comunicação

(U. Eco).

Saussure, Barthes, Jakobson, Eco, Ezra Pound, C S Peirce, C Cherry, Bense,

Hegel, Charles Morris... (p. 132-5)

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Todo o sistema semiológico se impregna de linguagem verbal: o cinema se vale

da palavra, os comics, a publicidade, as fotografias de imprensa, de legendas; mesmo os

sistemas da moda, do vestuário e da alimentação passam pelo crivo da linguagem

verbal, que estabelece nomenclaturas (significantes) e usos (significados).

p. 136 como observa Roland Barthes, a literatura, diferentemente da pintura ou

da música, é uma mensagem segunda, que se erige, como um sistema de conotação,

sobre a mensagem primeira da língua denotativa corrente. É um sistema complexo,

fundado não sobre a mera fisicalidade do som ou das formas e cores, mas sobre a

unidade de significante e significado de um outro sistema de base, o sistema da língua

ou da linguagem verbal.

p. 142 A função do poeta, no sentido do exercício predominante da função

linguística centrada sobre a própria estrutura sensível de sua mensagem, é, pois, a de um

configurador de mensagens. O poeta é um designer da linguagem, como o exprime

Décio Pgnatari, num paralelo que toma como ponto de referência o desenhista industrial

empenhado na melhor configuração do objeto que projeta. Se tivermos em vista

algumas das reflexões de Jakobson sobre a essência da linguagem ..., nas quais...

salienta o caráter diagramático, icônico (trata-se de um ícone de relações, como a

álgebra), presente nas estruturas sintáticas e morfológicas da linguagem, ... o poeta é um

diagramador da linguagem, tirando especial partido, no campo onde a função poética é

a dominante, das virtualidades desses constituintes icônicos.

p. 145 O que caracteriza a função poética é, assim, um uso inovador, imprevisto,

inusitado das possibilidades do código da língua.

p. 146 Se a ambiguidade existe, pois, na comunicação referencial cotidiana, nas

relações interpessoais mais elementares da língua (o mal-entendido é o cerne da

tragédia, já dizia Camus), na poesia, com o exercício predominante da função poética,

ela domina. Não se entenda porém a palavra ambiguidade numa acepção vinculada aos

preceitos da poesia simbolista, como sinônimo de vagueza, imprecisão, ou,

conteudisticamente, como invólucro de “sentimentos inarticulados”. Trata-se aqui de

uma ambiguidade operacional, que põe em discussão o código na língua e as

expectativas criadas por seu uso normal, revelando-lhe possibilidades insuspeitas. Nesse

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sentido, a mensagem poética – ao atualizar imprevisivelmente o código, enfatizando os

valores sensíveis, o lado palpável dos signos de seu repertório – é altamente

informativa, e, por isto mesmo, mas dificilmente decodificada, interpretada, percebida...

Para Umberto Eco, a mensagem reveste uma função estética quando se apresenta

estruturada de maneira ambígua e se mostra autorreflexiva, isto é, quando chama a

atenção do destinatário antes de tudo sobre a própria forma dela mensagem.

... desautomatização e singularização

p. 147 Este código privado e individual [do poeta] no nível da função poética,

vai construir um idioleto. Dentro da linguagem verbal podem-se reconhecer idioletos

sem função estética, no nível da função referencial (Como o jargão de certas profissões,

a gíria de certas comunidades), assim como há idioletos com função estética dentro de

outros sistemas semi[óticos (o cubismo é um idioleto poctórico; o expressionismo, além

de literário, um idioleto pictórico e cinematográfico). Quando o idioleto passa a ser

integrado no código geral, quando ele vai virando linguagem comum, surgem as

convenções acadêmicas, geradoras de novas normas e suscitadoras de novos “desvios da

norma”.

p. 151 A crise da linguagem coincide com o surgimento da civilização

tecnológica, com a crise do pensamento discursivo-linear em arte, com a superveniência

daquilo que Marshall McLuhan chama “a civilização do mosaico eletrônico”, uma

civilização marcada não pela ideia de princípio-meio-fim, mas pela de simultaneidade e

interpenetração, de compreensão da informação, tal como foi anunciada pela

conjugação da grande imprensa com o noticiário telegráfico. Dois são os fenômenos,

portanto: a) de um lado, o poema começa a tomar como seu objeto a própria poesia; o

ato de poetar, a crise ou a possibilidade mesma do poema, tal como se o poeta estivesse

assumindo em seu ofício o dilema hegeliano e marxiano, perguntando-se sobre a morte

ou o devir da poesia; trata-se de uma poesia que tematiza a poiésis até no seu sentido

etimológico (poiéoo, em grego, fazer, fabricar); b) de outro lado, a linguagem da poesia

vai ganhando cada vez mais em especificidade, vai-se emancipando [p. 152] cada vez

mais da estrutura discursiva da linguagem referencial, vai eliminando os nexos, vai

cortando e reduzindo ao extremo...

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p. 152 A não linearidade, a estética do fragmentário e do fragmentário e do

prismático, que se projeta do poema mallarmeano pelo futurismo e pelo cubismo até os

nossos dias... Como escreve Lacan, a quem devemos uma reproposição da psicanálise

em termos estruturalistas, “toda nossa experiência vai contra essa linearidade”; “tem-se

apenas que prestar atenção à poesia, coisa que talvez Saussure não estivesse habituado a

fazer, para ouvir uma verdadeira polifonia emergindo, para reconhecer que de fato todo

discurso se alinha nas várias pautas de uma partitura”.

p. 152 Na poesia de vanguarda, então, o poeta, além de exercitar aquela função

poética por definição voltada para a [p. 153] estrutura mesma da mensagem, é ainda

motivado a poetar pelo próprio ato de poetar, isto é, mais do que por uma função

referencial ou outra, ele é completamente movido por uma função metalinguística:

escreve poemas críticos, poemas sobre o próprio poema ou sobre o ofício do poeta...

p. 156 Nos anos 50, com o advento da poesia concreta... criou-se no Brasil pela

primeira vez em termos históricos um movimento de vanguarda de trânsito nacional e

internacional, não subsequente a movimentos europeus análogos...

p. 157 [Poetamenos – Augusto de Campos.] Trata-se de poemas em cores que

respondem, de um lado, à concepção mallarmeana das “subdivisões prismáticas da

Ideia” e à técnica de montagem ideogrâmica de Pound, e, de outro, o exemplo musical

da “Klangfarbenmelodie” (melodia de timbres) de Anton Webern, o compositor mais

radical da trindade dodecafônica de Viena, cuja obra, pelo poder de síntese, é

comparável ao haicai japonês, na expressão do crítico Antoine Goléa.

p. 160 [Goringer (Alemanha), epigrafe de cadernos:] “A poesia concreta é o

capítulo estético da formação linguística universal de nossa época”.

p. 168 Para ficar só na poesia, pode-se dizer que Oswald foi precursor da poesia

concreta, com seus poemas-minuto (reduzidos até mesmo a duas palavras, como: título,

amor, poema, humor), com sua técnica de justaposição direta de frases e situações

recolhidas no cotidiano, com sua sensibilidade que Décio Pgnatari analisou muito bem

como “dada” e antecipadamente “pop”, com sua elementaridade que combatia o vício

retórico nacional.

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p. 169 Wittgenstein: “A Filosofia existe porque as línguas são absurdas”.

CAMPOS, Augusto de. Rimbaud livre. 1992

p. 15 Um texto-ícone que funde o visionário e o visualista, sobrepondo à precisão

imagística o “desregramento de todos os sentidos” preconizado pelo poeta. Pois, como

observa Marjoire Perloff, ao abordar a “lúcida indeterminação” de “Bateau Ivre”, são

“altamente concretas mas fundamentalmente cambiantes e enigmáticas” as suas

imagens.

p. 19 [Valéry:] “Rimbaud inventou ou descobriu o poder da ‘incoerência harmônica”.

p. 20 Rimbaud é, sem dúvida, um dos grandes inovadores da linguagem poética, na raiz

da Modernidade. Se não elude ou desestrutura a sintaxe tão fundamente como

Mallarmé, se não conflita, no mesmo grau, palavra e significado, desestabiliza a

semântica poética com as associações insólitas de sua imaginação e a violência do seu

vocabulário, corrói os limites entre prosa e poesia, consciente e inconsciente, e prepara

as investidas da parataxe que caracterizarão o discurso poético moderno. Ao seu modo,

vai, como Mallarmé, às últimas consequências. Em suma, se a poesia de Mallarmé é

implosiva, a de Rimbaud é explosiva. Duas táticas para um fim comum: o de questionar

o homem, pondo em xeque a criação que mais o caracteriza – a linguagem.

Como disse Valéry, “o belo exige talvez a imitação servil do que é indefinível nas

coisas”.

ARRIGUCCI, Davi Jr. O guardador de segredos. São Paulo: Companhia das Letras,

2010.

02/07/2012 - internet

Por meio do poeta norte-americano Ezra Pound, processou-se, no grupo da Poesia

Concreta, o apego pela escolha de autores para construir um corpus capaz de oferecer

opções aos poetas. O paideuma – conceito utilizado por Pound a partir de Frobenius –

traria “a organização do conhecimento para que o próximo homem ou geração possa

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achar, o mais rapidamente possível, a parte viva dele e gastar o mínimo tempo com itens

obsoletos”. Por meio desse paideuma, haveria a chamada “crítica por demonstração”,

além dos punti luminosi, capazes de atrair a atenção dos leitores.