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1 CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. Prefácio_ Milton Santos; Apresentação_ Roberto Lobato Corrêa. Esta obra trata-se de uma coletânea de textos da trajetória geográfica, mas também da trajetória de pesquisa do professor Roberto Lobato Corrêa. Esta obra é dividida em 5 partes. A primeira contempla as redes geográficas, que apresenta teses clássicas como a Christaller, além de uma análise crítica, acompanhada de observações empíricas da realidade brasileira. O espaço urbano constituísse como objeto da segunda parte desta obra, dando destaque aos processos espaciais associados à noção de dinâmica urbana. O terceiro tema a região é observada por dois enfoques: sobre a evolução do conceito e, sobre uma ótica atual que CORRÊA chama de “fragmentação articulada”. A quarta parte refere-se a relação entre as grandes corporações e a divisão internacional do trabalho , mediante a identificação dos seus respectivos processo de rebatimento espacial. A quinta e última parte elucida as relações entre espaço, tempo e cultura . Essa coletânea de textos busca refletir as múltiplas possibilidades do geógrafo debruçar-se sobre várias facetas do espaço produzido pela ação humana. À multiplicidade temática, verifica-se uma pluralidade metodológica, ou seja, uma trajetória epistemológica complexa. Primeira Parte: As Redes Geográficas. 1. Representando a Teoria das Localidades Centrais: “Este trabalho preocupa-se em repensar a teoria das localidades centrais através de cinco proposições, tendo com o intuito de tentar recuperar dialeticamente a teoria em questão.” (p.16). Uma observação deve ser feita sobre o estudo das localidades centrais. Em primeiro lugar, dentro do quadro positivista que referencia uma ‘nova geografia’, a teoria em questão é apresentada sem um pensamento crítico que não representa a realidade. Em segundo lugar, deve ser levado em consideração o fato de que as trocas são feitas por seres sociais e, portanto, deve-se atentar para a as relações sociais ao longo da história. “A recuperação da teoria das localidades centrais é importante porque ela trata de um tema relevante que é o da organização espacial da distribuição de bens e serviços, portanto, de um aspecto produção e de sua projeção espacial, sendo assim, uma faceta da totalidade social

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CORRÊA, Roberto Lobato. Trajetórias Geográficas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

Prefácio_ Milton Santos; Apresentação_ Roberto Lobato Corrêa.

Esta obra trata-se de uma coletânea de textos da trajetória geográfica, mas também da trajetória de pesquisa do professor Roberto Lobato Corrêa. Esta obra é dividida em 5 partes. A primeira contempla as redes geográficas, que apresenta teses clássicas como a Christaller, além de uma análise crítica, acompanhada de observações empíricas da realidade brasileira. O espaço urbano constituísse como objeto da segunda parte desta obra, dando destaque aos processos espaciais associados à noção de dinâmica urbana. O terceiro tema a região é observada por dois enfoques: sobre a evolução do conceito e, sobre uma ótica atual que CORRÊA chama de “fragmentação articulada”. A quarta parte refere-se a relação entre as grandes corporações e a divisão internacional do trabalho, mediante a identificação dos seus respectivos processo de rebatimento espacial. A quinta e última parte elucida as relações entre espaço, tempo e cultura. Essa coletânea de textos busca refletir as múltiplas possibilidades do geógrafo debruçar-se sobre várias facetas do espaço produzido pela ação humana. À multiplicidade temática, verifica-se uma pluralidade metodológica, ou seja, uma trajetória epistemológica complexa.

Primeira Parte: As Redes Geográficas.1. Representando a Teoria das Localidades Centrais:

“Este trabalho preocupa-se em repensar a teoria das localidades centrais através de cinco proposições, tendo com o intuito de tentar recuperar dialeticamente a teoria em questão.” (p.16).

Uma observação deve ser feita sobre o estudo das localidades centrais. Em primeiro lugar, dentro do quadro positivista que referencia uma ‘nova geografia’, a teoria em questão é apresentada sem um pensamento crítico que não representa a realidade. Em segundo lugar, deve ser levado em consideração o fato de que as trocas são feitas por seres sociais e, portanto, deve-se atentar para a as relações sociais ao longo da história.

“A recuperação da teoria das localidades centrais é importante porque ela trata de um tema relevante que é o da organização espacial da distribuição de bens e serviços, portanto, de um aspecto produção e de sua projeção espacial, sendo assim, uma faceta da totalidade social (...) enriquecendo nossa compreensão sobre as diferentes formas de espacialização da sociedade.” (p.17).

I.“A organização espacial da distribuição que emerge, fundamentada na divisão social e territorial do trabalho [que tem origem direta na evolução do capitalismo], na existência de uma massa predominantemente assalariada, e na articulação entre diferentes áreas produtoras, tem como locais as cidades que se interligam através do comércio atacadista, varejista e dos serviços (...). Esse processo de articulação e integração gera uma diferenciação hierárquica entre todos de uma rede de distribuição (p.18, 19).

“Desde modo, afirma-se que a rede hierarquizada de localidades centrais constitui-se em uma forma de organização do espaço vinculado ao capitalismo, sendo, portanto, de natureza histórica.” (p.20).

II.“(...) o processo de acumulação capitalista, fundamentado na produção industrial e no trabalho assalariado, tem uma dimensão espacial e esta tem como um de seus lugares a rede de localidades centrais tanto em nível regional como intra-urbano” (p.21).

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“A rede de localidades centrais aparece também como uma estrutura territorial pro meio da qual o processo de reprodução das classes sociais se verifica (...) ocasionando um espectro social variado, mas fragmentado.” (p.21).

“(...) a rede de localidades centrais cumpre simultaneamente dois papeis que são complementares: de um lado constitui-se em um meio para o processo de acumulação capitalista, e de outro, constitui-se em um meio para a reprodução das classes sociais. Isto significa que a rede de localidades centrais constitui-se em um meio através do qual a reprodução do modo de produção capitalista se verifica.” (p. 24).

III.As localidades centrais são caracterizadas por arranjos estruturais [podendo ter uma cidade comercial primaz e ausência de centros intermediários; pela existência de dois circuitos, pela distribuição temporal, sazonal ou semanal; ou modelo teorético de Christaller] e, por arranjos espaciais [centralidade geométrica do seu centro ou uma forma excêntrica me forma de cometa].

“(...) admite-se a existência de uma conexão entre a inserção de uma determinada área na divisão internacional do trabalho e o arranjo estrutural e espacial de sua rede de localidades centrais.” (p.25).

IV.“(...) o conceito de economias de aglomeração, não deve ser referido apenas às vantagens para uma série de atividades reunidas no mesmo centro urbano, mas também às vantagens que a classe dominante desfruta para exercer seu poder, sua reprodução, controle e reprodução de toda a sociedade. Trata-se, afinal de contas, de economias locacionais para a reprodução” (p.31)

“Em resumo, a rede de localidades centrais constitui-se em uma estrutura territorial cuja análise possibilita a compressão do sistema urbano de países não industrializados ou onde a industrialização se verifica espacialmente concentrada.” (p.32).

V.“A última proposição envolve a questão da conexão entre redes de localidades centrais e capitalismo monopolístico.” (p.32)

“A este processo interno ao capital associa-se a continuidade do processo de urbanização, ele próprio causa e feito do processo de centralização do capital, o qual privilegia progressivamente as grandes cidades, esvaziando a área de mercado das pequenas localidades centrais. Este processo de centralização do capital e urbanização implica, por sua vez, na ampliação e melhoria das vias de circulação e na difusão do uso de automóveis, que minimizam os efeitos da distância-tempo-custo, eclipsando os pequenos centros de mercado cujas firmas não representam economias de escalas para a competição, oferecendo preços mais elevados que as dos centros maiores, nem vantagens locacionais que atraiam lojas pertencentes às grandes cadeias.” (p.33).

“Nessa linha de argumentação pode-se dizer que a rede hierarquizada de localidades centrais seria uma estrutura territorial associada a uma fase concorrencial do capitalismo, e que o daily urban system seria a estrutura territorial básica associada ao capitalismo monopolístico.” (p.34).

Considerações Finais:“A questão da teoria das localidades centrais e de seu repensar nos remete, em verdade, à questão desse pensar em uma outra teoria geográfica que esteja fundamentada nas relações entre sociedades historicamente determinadas e o espaço.” (p. 36).

2. As Redes de Localidades Centrais nos Países Subdesenvolvidos:

“Segundo a proposição geral de Christaller, a diferenciação entre as localidades centrais traduz-se, em uma região homogênea e desenvolvida economicamente, em uma nítida hierarquia definida simultaneamente pelo conjunto de bens e serviços oferecidos pelos estabelecimentos do setor terciário e pela atuação espacial dos mesmos. (...) Os mecanismos fundamentais que atuam gerando essa hierarquia de centros são, de um lado, o alcance espacial máximo e, de outro, o alcance espacial mínimo.” (p.41).

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As Redes Dendríticas:“Primeiramente, uma rede dendrítica de localidades centrais caracteriza-se pela origem colonial, ou seja, é no âmbito da valorização dos territórios conquistados pelo capital europeu que nasce e se estrutura uma rede dendrítica. Seu ponto de partida é a fundação de uma cidades estratégica e excentricamente localizadas em face de uma futura hinterlândia. Essa cidade, de localização junto ao mar, é o ponto inicial de penetração do território e sua porta de entrada e saída.” (p.43).

“Em segundo lugar, a rede dendrítica caracteriza-se pelo excessivo número de pequenos centros, pequenos pontos de vendas indiferenciados entre si, no que se refere ao comércio varejista. Resulta essa característica do baixo nível de demanda da população e de sua limitada mobilidade espacial, bem como da precariedade das vias e dos meios de transporte.” (p.44).

“Em realidade, na rede dendrítica verifica-se, em consequência do padrão espacial de interações, que à medida que de afasta da cidade primaz, os centros urbanos diminuem gradativamente de tamanho populacional, no valor de vendas do comércio atacadista e em termos de expressão política.” (p.45).

“A rede dendrítica de localidades centrais pode evoluir, segundo Kelley, passando de uma rede imatura com apenas dois níveis hierárquicos, a cidade primaz, de um lado, e os demais centros que não apresentam funcionalmente estratificados, de outro, para uma rede madura, onde aparece uma estratificação funcional entre os centros da rede. A passagem de um padrão para outro implica em uma maior complexidade na esfera da produção, circulação e consumo, com a coleta e redistribuição intra-regional d produtos da própria hinterlândia da cidade primaz, visando ao mercado consumidor regional.” (p.49).

Os Mercados Periódicos:“Os mercados periódicos são definidos como aqueles núcleos de povoamento, pequenos, via de regra, que periodicamente se transformam em localidades centrais: uma ou duas vezes por semana, de cinco em cinco dias, durante o período da safra, ou de acordo com outra periodicidade. Fora dos períodos de intenso movimento comercial esses núcleos voltam a ser pacatos núcleos rurais, com a maior parte da população engajada em atividades primárias (...) os mercados periódicos representam uma forma de sincronização espaço-temporal das atividades humanas.” (p.50).

“O centro elementar e sua área de influencia, por outro lado, não constitui apenas um espaço onde as transações econômicas são realizadas. Constituem, também, um espaço social, cultural e político.”(p.55).

“Stine argumenta que a passagem de uma economia autárquica para uma economia de mercado, verifica-se a progressiva especialização produtiva das áreas rurais, implicando em trocas entre elas. As trocas são viabilizadas por um conjunto de centros, as localidades centrais, que começam a emergir na ‘paisagem econômica’. (...) a explicação de Stine baseia-se em duas ordens de considerações. De um lado, considera a teoria de localidades centrais de Christaller como base para uma explicação satisfatória a respeito do funcionamento dos mercados periódicos; particularmente importantes são os conceitos de alcance espacial máximo (range ou maximum range) e de alcance espacial mínimo (threshold ou minimum range). De outro, considera que a natureza periódica ou permanente dos mercados verifica-se no âmbito de uma mudança gradativa, em que os comerciantes itinerantes passam de uma total mobilidade para uma localização completamente fixa.” (p.57).

“O alcance espacial máximo define a área determinada por um raio a partir de uma dada localidade central. Dentro dessa área os consumidores efetivamente deslocam-se para a localidade central, visando à obtenção de bens e serviços. (...) O Alcance espacial mínimo, por outro lado, define a área em torno de uma localidade central que engloba o mínimo de consumidores suficientes para que um dado comerciante nela se instale.” (p.58).

Os Dois Circuitos da Economia:“O terceiro modo como está organizada a rede de localidades centrais nos países subdesenvolvidos diz respeito ao desdobramento da rede em dois circuitos econômicos.” (p.72).

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A Contribuição de Milton Santos“O processo de modernização tecnológica, verificado nos países subdesenvolvidos após a Segunda Guerra Mundial, por atuar de forma muito relativa, teve o papel, segundo Santos, de dividir a vida econômica desses países em dois circuitos de produção, distribuição e consumo. Um deles (o circuito superior) é diretamente resultante da modernização tecnológica, enquanto o outro (inferior) deriva, indiretamente, da citada modernização tecnológica, dirigindo-se aos indivíduos que pouco ou nada se beneficiaram com o progresso.” (p.72).

“Os dois circuitos, em realidade, não estão isolados entre si. Primeiramente, porque a existência de uma classe média que utiliza um ou outro circuito impede o isolamento. Em segundo lugar, porque existem articulações de complementariedade e de dependência, envolvendo intercâmbios de insumos entre os dois circuitos. A longo prazo, entretanto, prevalece a dependência do circuito inferior e superior.” (p.73).

“A rede de localidades centrais dos países subdesenvolvidos é uma das dimensões espaciais (talvez a mais importante) dos dois circuitos da economia urbana. Reflete a pobreza da parcela considerável da população, isto é, o resultado das diversas formas de exploração social. Nesse sentido, e por essa via, o estudo das redes de localidades centrais no Terceiro Mundo ganha uma dimensão política.” (p.77, 79).

3. Origem e Tendências da Rede Urbana Brasileira: Algumas NotasI.“Em termos genéticos a rede urbana constitui-se no conjunto de centros urbanos funcionalmente articulados entre si. É, portanto, um tipo particular de rede na qual os vértices ou nós são os diferentes núcleos de povoamento dotados de funções urbanas, e os caminhos ou ligações os diversos fluxos entre esses centros.” (p.92).

“(...) verifica-se a existência de diversos tipos de redes urbanas de acordo com o padrão espacial, a complexidade funcional dos centros e o grau de articulação interna e externa de cada rede.” (p. 92).

“Entendemos que para haver rede urbana três condições mínimas devem ser satisfeitas: 1) a construção de uma mínima divisão territorial do trabalho; 2) a existência de pontos fixos no espaço, onde as relações de troca se estabeleçam (podendo ser de modo temporário ou permanentes); 3) diferenciação hierárquica e/ou em termos de especialização produtivas entre eles.” (p.94).

“As grandes corporações multifuncionais e multilocalizadas, estruturadas em redes, desempenham poderoso papel na (re) definição funcional dos centros e na natureza e intensidade da integração de cada rede na economia global que possui poucos centros de gestão do território, cabeças de redes urbanas de abrangência mundial.” (p.95).

II.Características da rede urbana brasileira: complexidade genética; os diversos padrões espaciais; crescente complexidade funcional de seus centros e; os diversos tipos e intensidades de integração interna e externa.

A Complexidade Genética:A rede urbana brasileira é constituída por um conjunto de centros datados de diversos momentos. Sendo assim, não está totalmente elaborada. A sua complexidade se dá: devido a coexistência de núcleos urbanos formados em tempos diferenciados; agentes e propósitos imediatos da criação; diversos padrões espaciais e funcionalidade desses centros.

Os Diversos Padrões Espaciais:“A rede urbana brasileira não pode ser descrita a partir de um único padrão espacial, seja ele tipicamente christalleriano, dendrítico ou oferecendo algum tipo particular de arranjo espacial; as densidades de centros, por sua vez, variam desde as altas densidades de certas áreas do Sudeste, como a região urbano-industrial paulista, do Sul, como as ‘zonas coloniais’ antigas gaúchas e catarinense, e do Nordeste como o Agreste pernambucano, às baixas densidades de centros das regiões escassamente povoadas como o sertão nordestino.” (p.97).

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“Ao que tudo indica, o primeiro padrão espacial da rede urbana brasileira foi o padrão dendrítico, caracterizado por uma cidade litorânea criada para ser primeiramente um ponto de defesa do litoral e um via de penetração para o interior; posteriormente, transforma-se em ponto de apoio para a penetração e conquista do interior. A partir dela são criadas outras cidades subordinadas de modo sistemático a centros urbanos localizados a jusante ou na direção da cidade litorânea: as cidades ‘bocas de Sertão’ e ‘pontas de trilhos’ são exemplos de centros do interior.” (p. 98).

A Crescente Complexidade Funcional dos Centros:

“A complexidade funcional crescente vai traduzir-se, entre outros aspectos, no fato de que cada centro situa-se simultaneamente em pelo menos duas redes. Uma constituída por localidades centrais e na qual cada centro tem uma posição (metrópole, capital regional, centro sub-regional, centro de zona, centro local) e outra, menos sistemática e mais irregular, na qual cada centro desempenha um papel singular e/ ou complementar a outros centros. Um exemplo é suficiente: a cidade paulista de Franca é simultaneamente um centro sub-regional subordinado a Ribeirão Preto e um centro industrial especializado na produção de calçados masculinos para o mercado nacional e internacional.” (p. 100).

A Integração Interna e Externa:

“Qualquer rede urbana entre seus atributos necessários alguma integração interna e externa que, em razão desigual espaço-temporalidade dos processos sociais, vai traduzir, segundo as diversas redes urbanas, em tipos e intensidades distintos.” (p.101)

“Foi no pós-guerra que, e sobretudo a partir do forte processo de industrialização da década de 1950, que a rede urbana brasileira foi efetivamente integrada.” (p.101).

“A continuidade do processo de industrialização que se difundiu parcialmente pelo interior, a modernização do campo gerando o esvaziamento de homens ao mesmo tempo que introduziria novas demandas nas cidades, as transformações na estrutura comercial, as novas vias de circulação de mercadorias e os novos meios de telecomunicações constituem um conjunto articulado de fatores vinculados ao grande capital e à ação do Estado, que afetaram os tipos e a intensidade da integração da rede urbana brasileira.” (p. 102; 103).

“A desigual integração da rede urbana brasileira, que foi ampliadamente ratificada nos últimos 20 anos, revela claramente os resultados deu processo de desenvolvimento capitalista que, longe de gerar uma tendência a homogeneização social e da organização espacial, acentua as diferenças entre os diversos segmentos da rede urbana brasileira, revelando, através da rede urbana, uma efetiva integração de parte da população ao sistema social e, simultaneamente, uma menor integração, senão exclusão, da parcela importante da população.” (p.104).

4. Dimensões de Análises das Redes Geográficas:

“Por redes geográficas entendemos ‘um conjunto de localizações geográficas interconectadas’ entre si ‘por um certo número de ligações’. (...) Há em realidade, inúmeras e variadas redes que recobrem, de modo visível ou não, a superfície terrestre. As redes, em realidade, são redes geográficas.” (p.107).

“A este respeito entendemos que as redes geográficas são, como qualquer materialidade social, produtos e condições sociais.” (p.108, 109).

“A dimensão organizacional refere-se à configuração interna de entidade estruturada em rede, abrangendo os agentes sociais, a origem da rede, a natureza dos fluxos, a função e finalidade da rede, sua existência e construção, sua formalização e organicidade.” (p.109).

“A dimensão temporal envolve a duração da rede, a velocidade com que os fluxos nela se realizam, bem como a frequência com que a rede se estabelece.” (p. 109).

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“A escala, a forma espacial e a conexão são as características que constituem a dimensão espacial da análise das redes geográficas. As duas últimas estão fortemente articuladas entre si e têm merecido uma importante atenção por parte dos geógrafos.” (p.110).

Segunda Parte: O Espaço Urbano

5. Processos Espaciais e a Cidade:“A cidade é descrita por Harvey, como a expressão concreta de processos sociais na forma de um ambiente físico construído sobre o espaço geográfico, refletido as características da sociedade, sendo assim observada em diversas tipologias no tempo e no espaço. Hoje, a metrópole moderna se caracteriza como um exemplo dessa tipologia. Esta última constitui-se em um produto da economia de mercado, afetada direta ou indiretamente pela industrialização, e da complexa sociedade estratificada que emerge” (p.121).

“Esta organização caracteriza-se por usos da terra extremamente diferenciados tais como o da área central, áreas industriais e áreas residenciais diversas, e pelas interações como fluxos da capital, migrações diárias entre local da residência e local de trabalho, e deslocamento de consumidores, que permitem integrar essas diferentes partes.” (p.121; 122).

Os processos sociais e organização espacial são mediados por um elemento viabilizador constituído por um conjunto de forças, que atuam ao longo do tempo e que permitem localizações, relocalizações e permanência das atividades e populações sobre espaço urbano. São os processos espaciais responsáveis pela organização espacial e, esses processos são colocados em prática pelos atores que modelam essa organização do espaço. São esses atores: proprietários de terra; empresas imobiliárias e de construção e; o Estado. “Cada um desses atores tem a sua própria estratégia e entre os três primeiros há conflito que são, em maior ou menos grau, resolvidos pelo Estado, simultaneamente ator e árbitro desses conflitos” (p.122).

I.Centralização:

“Uma característica comum da metrópole moderna é a existência de uma área onde se concentram as principais atividades comerciais e de serviços, bem como os terminais de transporte interurbanos e intra-urbanos. Esta área, conhecida como área central, resulta do processo de centralização, indubitavelmente um produto da economia de mercado levado ao extremo pelo capitalismo industrial.” (p.123).

II. Descentralização:

A descentralização tem origem na centralização excessiva, causadora das deseconomias de aglomeração, a saber:a) Aumento constante do valor da terra – afetam atividades que perdem a capacidade de se manter em

áreas centrais.b) Congestionamento e alto custo da rede de transportes e comunicação.c) Dificuldade de obter espaço para a expansão.d) Restrições legais implicando na ausência de controle do espaço.e) Ausência ou perda de amenidades e/ou pressões contra determinados tipos de usos como atividades

poluidoras.

“A descentralização está também associada ao crescimento da cidade, tanto demográfica como espacialmente, aumentando a distancia entra a Área Central e as novas áreas ocupadas.” (p.125).

“este processo de descentralização é, entretanto, extremamente complexo, caracterizando uma seletividade de termos de:a) Atividades, no sentido de que algumas atividades apresentam uma maior tendência a

descentralização que outras, como é o caso da indústria em geral, em oposição a atividade de administração;

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b) Tempo, em relação ao uma mesma atividade. No caso da indústria, por exemplo, a primeira a deixar a área central é a atividade poluidora.

c) Divisão Territorial de Funções. Exemplo dessa descentralização funcionalmente seletiva encontra-se no caso da indústria em que a sede social permanece com localização central e o estabelecimento de produção se descentraliza e, no caso de depósitos de grandes firmas comerciais que são relocalizadas fora da Área Central, aí permanecendo o estabelecimento de vendas varejistas.

d) Tamanho das cidades que implica em um sistema de transporte intra-urbano, das funções urbanas e do nível de renda da população, implicando, por sua vez, em poder aquisitivo e mobilidade espacial.” (p.126;127,128).

“A descentralização aparece como um processo espacial associado às deseconomias de aglomeração da Área Central, ao crescimento demográfico e espacial da cidade, inserindo-se no processo de acumulação de capital. De certa forma repete o fenômeno de centralização tornando a organização espacial da cidade mais complexa, com o aparecimento de subcentros comerciais e áreas industriais não-centrais.” (p. 129).

III. Coesão“O processo de coesão ou economias de aglomeração tende, em realidade, a gerar conjuntos de atividades espacialmente coesas devido:

a) Apesar de não manterem ligações entre si, lojas varejistas de mesma linha de produtos formam um conjunto que cria atenção para o consumidor;

b) A presença de lojas com produtos diferentes pode induzir ao consumidor comprar bens que ele não previa;

c) Complementariedade de atividades;d) Criação de escalas para o aparecimento de atividades necessárias como redes bancárias, de serviços e

de transporte e comunicação.” (p.129, 130).

“(...) o processo de coesão pode ser verificar simultaneamente como os processos de centralização e descentralização, gerando o aparecimento de áreas especializadas dentro do espaço urbano tornando assim sua organização espacial mais complexa.” (p.131).

IV. Segregação:“(...) o processo de segregação refere-se especialmente à questão residencial, relacionando-se muito mais, portanto, à reprodução da força-de-trabalho. A segregação é um processo que origina a tendência a uma organização espacial em áreas de ‘forte homogeneidade social interna e de forte disparidade social entre elas’. Estas áreas segregadas tendem a apresentar estruturas sociais que podem ser marcadas pela uniformidade da população em termos de renda, status ocupacional – operários, empregados de escritórios, profissionais liberais, diretores de firmas – instrução, etnia, fase do ciclo da vida – casais com crianças, casais idosos, solteiros – e migração, podendo-se falar em áreas sociais caracterizadas, por exemplo, por bairros operários com residências unifamiliares modestas, por bairros de classe média com apartamentos, de baixa classe média ou pobre em prédios deteriorados ou em favelas, etc.” (p. 131).

”De acordo com Harvey a sociedade capitalista da segunda metade do século XX apresenta três forças básicas que levam a uma estruturação de classe: (1) uma força primaria, que vem de relação entre capital e trabalho, e que pode levar a uma estrutura dicotômica de classes; (2) uma força residual que é originada de formas pretéritas de modos de produção, ou do contato geográfico entre um modo de produção dominante e um modo subordinado de produção, e que se traduz na existência de uma aristocracia da terra, campesinato, grupos marginalizados que podem ou não ser incorporados à estrutura do capitalismo avançado; e (3) forças derivativas que emergem devido às necessidades de preservar os processos de acumulação de capital através da inovação tecnológica e mudanças na organização social. Tais forças geram, em termos de grupos, uma fragmentação de classe capitalista e proletária, classes distintas de consumo e emergência de uma classe média que não é de todo homogênea.” (p. 132).

V. Invasão Sucessão:

“O processo de invasão-sucessão, como o anterior, está associado sobretudo à questão residencial, ainda que possa afetar as atividades terciárias e industriais. Foi verificado empiricamente que, no espaço

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urbano, há bairros que são habitados, durante um certo período de tempo, por uma classe social, e que a partir de um certo momento verifica-se a ‘invasão’ de pessoas de outra classe social, via de regra, de classe inferior àquela que ocupa o bairro. Inicia-se então a saída da população pré-existente e a chegada de novo contingente, ou o processo de ‘invasão-sucessão’. Tal processo foi proposto pela escola de Ecologia Humana e corresponde a uma analogia com a ecologia vegetal, em que se substitui o conceito de equilíbrio, por equilíbrio entre valor dos imóveis e capacidade de grupos sociais em pagar por estes imóveis.” (p.135).

VI. Inércia:

“Esta inércia deve-se a uma série de fatores, entre aquilo de Firey denomina de ‘simbolismo e sentimento’, ou seja, a existência de valores que levam a permanência de localizações e usos da terra que não mais obedecem a uma racionalidade econômica. (...) A implicação do processo de inércia sobre a organização do espaço intra-urbano é a cristalização de certos usos da terra que aparecem como não-racionais.” (p.137).

6. O Espaço Urbano: Notas Teórico- Metodológicas:

“O espaço urbano apresenta diversas características que interessam aos geógrafos. É fragmentado e articulado, reflexo e condição social, e campo simbólico e de lutas. O espaço urbanos pode ser assim submetido a diferentes análises pelos geógrafos, cada uma delas privilegiando uma das características acima apontadas sem, contudo, excluir as demais.” (p.145).

“O espaço urbano aparece, no primeiro momento de sua apreensão, como um espaço fragmentado, caracterizado pela justaposição de diferentes paisagens e usos da terra. (...) Essa fragmentação é decorrente da ação dos diversos agentes modeladores que produzem e consomem espaço urbano: proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais, proprietários fundiários, promotores imobiliários, Estado e grupos sociais expluídos.” (p.146).

“Por derivar da dinâmica de acumulação de capital, das necessidades mutáveis de reprodução das relações sociais de produção e dos conflitos de classe, a ação dos agentes modeladores gera mudanças de conteúdo e/ou das formas das diversas áreas, de modo que novos padrões de fragmentação do espaço urbano emergem, desfazendo total ou parcialmente os antigos e criando novos padrões no que diz respeito à forma e ao conteúdo.” (p.146).

“Com a articulação quer dizer que cada uma das partes da cidade mantém relações com as demais, ainda que sejam de natureza e intensidade variáveis. Através da articulação o espaço urbano ganha unidade, originando um conjunto articulado cujo foco de articulação tem sido o núcleo central da cidade que, entre outras funções, realiza as de gestão das atividades.” (p.147). “Ao se constatar que o espaço urbano é simultaneamente fragmentado e articulado, e que esta fragmentação articulada1 é a expressão espacial de processos sociais, introduz-se o terceiro momento de apreensão do espaço urbano: o de ser um reflexo da sociedade. Assim, o espaço da cidade capitalista é fortemente dividido em áreas residenciais que tendem à segregação, refletindo a complexa estrutura social em classes, própria do capitalismo. A jornada para o trabalho, por outro lado, aparece como consequência da fragmentação capitalista que separou lugar de trabalho de lugar de residência.” (p.148).

“É conveniente também ressaltar dois outros aspectos. Em primeiro lugar o espaço urbano capitalista é profundamente desigual: a desigualdade constitui-se em característica própria do espaço urbano capitalista, refletindo, de um lado, a desigualdade social expressa no acesso desigual aos recursos básicos da vida e, de outro, as diferenças locacionais das diversas atividades que se realizam na cidade. Em segundo lugar, ressalta-se que por ser reflexo social e porque a sociedade apresenta dinamismo, o espaço urbano é também mutável, dispondo de uma mutabilidade que é complexa, com ritmos e natureza

1? Fragmentado e articulado segundo: (1) fluxo de veículos, pessoas e mercadorias; (2) circulação de decisões, investimento e, poder, fazendo parte do processo de formação da sociedade; (3) reflexo da sociedade e; (4) condicionante da sociedade. In: CORRÊA, Roberto Lobato. O Espaço Geográfico. Série Princípios. São Paulo: editora Ática S.A, 1989.

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diferenciados. Mas é preciso considerar que a cada transformação o espaço urbano se mantém desigual, ainda que as formas espaciais e o arranjo delas tenham sido alterados. Mantém-se, ainda, fragmentado e articulado.” (p.149).

“O espaço urbano é também um condicionante social. Este é o quarto momento de sua apreensão.” (p.149).

“Fragmentado, articulado, reflexo e condicionante da social, o espaço urbano é também o lugar onde os diferentes grupos sociais vivem e se reproduzem. Isso envolve, de um lado, o cotidiano e o futuro. De outro, envolve crenças, valores, mitos, utopias e conflitos criados no bojo da sociedade de classes em parte projetados nas formas espaciais: monumentos, lugares sagrados, uma rua especial, uma favela, lugares de lazer etc. Formas espaciais em relação às quais o homem desenvolve sentimentos, cria laços de afeição ou delas desgosta, atribui-lhes a propriedade de proporcionar facilidade ou status, ou associa-se a dor ou pobreza. A fragmentação e a articulação do espaço urbano, seu caráter de reflexo e condição social são vivenciados e valorados das mais diferentes maneiras pelas pessoas. O espaço urbano torna-se, assim, um campo simbólico que tem dimensões e significados variáveis segundo as diferentes classes e grupos etário, étnico etc. Este é o quinto momento de sua apreensão. (p. 150; 151).

“O espaço da cidade é assim, e também, o cenário e o objeto das lutas sociais, pois estas visam, afinal de contas, o direito à cidade, à cidadania plana e igual para todos. O espaço urbano converte-se, assim, em campos de lutas. Este é o sexto momento de sua apreensão.” (p.151)

“O espaço enquanto objetivação geográfica do estudo da cidade apresenta várias facetas que permitem que seja estudado de modo multivariado. Esta multivariabilidade constitui-se em riqueza que foi gestada, de um lado, pela própria realidade e, de outro, pela prática dos geógrafos.” (p.152).

7. Meio Ambiente e a Metrópole:

“Por meio ambiente entendemos, segundo a visão da geografia humana, o conjunto de três aspectos interligados:a) Meio ambiente é o resultado material da ação humana, tratando-se da segunda natureza, da natureza

transformada pelo trabalho social;b) O meio ambiente agrafa fixos e fluxos;c) O meio ambiente não pode deixar de incluir o homem, mas um homem qualificados pelas suas

relações sociais, cultura, seu ideário, mitos, símbolos, utopias e conflitos.” (p.153; 154).

Geografia Humana e Meio Ambiente:Vias de análise do meio ambiente:a) Relação homem-natureza: privilegia as ações humanas em face a natureza, principalmente a

transformação da paisagem natural em paisagem cultura (Escola da Paisagem);b) Recortes espaciais definidores de ambientes uniformes (Geografia Regional);c) Espacialidade (os diversos ambientes apresentam um caráter valorativo, ou seja, são qualificados

diferencialmente entre si, dispondo de uma espacialidade duplamente diferencial).

Vetores epistemológicos: as matrizes filosóficas de práticas dos geógrafos:a) O Positivismo;b) O Historicismo;c) O Positivismo Lógico;d) O Materialismo Histórico e Dialético e;e) As Filosofias do Significado.

“A espacialidade diferencial implica que se considere o meio ambiente, de um lado, como reflexo social e, de outro, como condicionante social, isto é, reflete os processos e as características da sociedade que o criou e que ali vive, como impacta sobre seu futuro imediato.” (p.156).

Meio Ambiente e o Rio de Janeiro:

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A complexidade de sua organização permite detectar diferentes ambientes:a) Centro de negócios, no qual prevalece a existência da segunda natureza. Ambiente fruto de aterros,

drenagens e desmontes de morros;b) Uma zona periférica ao centro onde tem se desenvolvidos outros núcleos de negócios. Nesta zona

periférica está presente também a zona portuária, que hoje recebe destaque.c) A periferia da metrópole é o lugar da existência e reprodução de parcela ponderável das camadas

populares. (sobretudo como Baixada Fluminense). d) Merece destaque também a favela, “resultado da ação de grupos socialmente excluídos que ocuparam

terrenos, público ou privamos, via de regras inadequados para a valorização fundiária e promoção imobiliária. Neste ambiente, onde a ação do Estado é, via de regra, limitada, surgem novas regras, códigos e poderes que, ao mesmo tempo, que exercem vigoroso controle social, criam um modus vivendi próprio, capaz de minimizar as duras condições de existência. Estabelece-se muitas vezes, um conflito entre as associações de moradores e os grupos organizados associados ao crime que procuram transformar a favela em seu território.” (p.163;164)

e) “No complexo e diversificado ambiente metropolitano, no qual as diferenças se dão segundo a natureza e a intensidade, há, no outro extremo social, um ambiente de idade recente: trata-se dos condomínios exclusivos, um outro mundo, um outro quadro sócio-espacial de referência e coexistência.” (p.165).

À Guisa de Conclusão:

“É conveniente ressaltar que os diversos ambientes não constituem células autônomas, independentes uns dos outros. Ao contrário, estão articulados entre si por diversos laços claramente visíveis: jornada para o trabalho, circulação de mercadorias, visitas a parentes e amigos, idas ao cinema ou ao culto religioso etc. É também articulado por laços invisíveis como decisões, ordens, circulação de mais- valia, valores, mitos, utopias etc.” (p.167).“Mais do que isso, os diversos ambiente metropolitanos, reflexos e condicionantes das desigualdades sociais, constituem campos de lutas e campos simbólicos.” (p.168).

8. O Espaço Metropolitano e Sua Dinâmica:

“no processo de compreensão dessas transformações torna-se necessário, contudo, considerar preliminarmente dois elementos de diferenciação. Ou seja, é necessário considerar o fato de que as transformações que se verificam no espaço metropolitano são diferenciadas segundo duas linhas de diferenciação.” (p.171).

“Primeiramente deve-se considerar o tamanho metropolitano. Certas transformações são, em grande parte, condicionadas pela dimensão demográfica da metrópole. Esta tese está apoiada na crença de que uma mudança quantitativa implica em um salto qualitativo. Assim, existe um patamar crítico a partir do qual o processo de descentralização inicia-se.” (p. 171).

“Em segundo lugar deve-se considerar singularidades vinculadas ao sítio metropolitano, à história urbana e regional e ao processo de inserção da metrópole na divisão territorial do trabalho em escala nacional e internacional.” (p.172).

A “Explosão” da Periferia Popular:

“A expansão da periferia metropolitana, que inclui cada vez mais novos municípios, significa, de um lado, a criação ampliada de um vasto reservatório de mão-de-obra e, de outro, a oportunidade de extração de renda da terra e de investimentos em infra-estrutura e nos setores vinculados, direta ou indiretamente, á produção de habitação.” (p.177).

Terceira Parte: A Região

9. Região: A Tradição Geográfica

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“ O termo região deriva do latim régio, que refere-se à unidade político-territorial em que de dividiria o Império Romano. Sua raiz está no verbo regere, governar, o que atribui à região, em sua concepção original, uma conotação eminentemente política2.

I.Tradição e Pluralismo:

“Associando genericamente à noção de diferenciação de áreas, o conceito de região tem se constituído, ao longo da história moderna do pensamento geográfico, em um dos seus conceitos-chaves, os outros sendo os de paisagem, espaço, lugar e território.” (p.184).

“Em torno do conceito de região desenvolve-se intenso debate entre os geógrafos, debate que está centrado na procura de um conceito e um método que fornecessem à geografia a sua identidade, diferenciando-a tanto das ciências naturais como das ciências sociais.” (p.184).

“Desde o início do último quartel do século XIX, quando a geografia é institucionalizada como disciplina nas universidades europeias, até 1970 aproximadamente, três grandes acepções de região foram estabelecidas entre os geógrafos.” 9p.184).

“A primeira apoia-se nos dados da natureza. Trata-se da região natural, conceito adotado tanto pelos geógrafos físicos como por aqueles que adotaram determinismo ambiental, isto é, a visão darwinista e neo-lamarckiana como base para o entendimento das relações entre homem e natureza.” (p.184).

“A segunda acepção da região origina-se de uma reação à matriz positivista que sustentava a leitura determinista da região natural. A matriz agora é o historicismo de base neokantiana, enfatizando a separação entre ciências naturais e sociais, atribuindo um caráter ideográfico3 aos eventos e às regiões, ao tempo e ao espaço. A História reduzia-se a uma sucessão de eventos em relação aos quais a contingência e a intencionalidade eram peças fundamentais para a compreensão da ação humana. (p.185)

“A região passa a ser vista como área de ocorrência de uma mesma paisagem cultural. Trata-se agora da região-paisagem, dois termos que nas línguas alemã e inglesa podem ser referidos como uma única palavra, respectivamente landschaft e landscape.” (p.185).

“A região agora é entendida como o resultado de um longo processo de transformação da paisagem natural em paisagem cultural.” (...) A região é vivenciada pelos habitantes que reconhecem sua existência concreta a ponto de nomeá-la: Pays de la Brie, Sertão, Amazônia, Campanha Gaúcha etc. Por outro lado os habitantes tinham a sua identidade referenciada à região que habitavam.” (p.185; 186).

“O período que se estende de 1920 a 1950 caracterizou-se, na história do pensamento geográfico, pela importância assumida pelo conceito região-paisagem. A década de 1950 foi marcada, na geografia, sobretudo nos países de língua inglesa, pela denominada revolução teorética-quantitativa, de base eminentemente lógico-positivista. Emerge então a terceira acepção da região entre os geógrafos. A região é marcada a partir do propósito específico, não tendo a priori, como no caso da região natural e da região-paisagem, uma única base empírica. É possível identificar regiões climáticas, regiões industriais, regiões nodais, ou seja, todo tipo de regiões quantos forem os propósitos do pesquisador. A região natural e a região-paisagem passam a ser apenas uma das múltiplas possibilidades de se recortar o espaço terrestre. A região constitui-se para os geógrafos lógico-positivistas em uma criação intelectual, criada a partir de seus propósitos específicos. (p.186).

“Segundo Anne Gilbert três conceitos de região foram desenvolvidos após 1970. O primeiro refere-se à região como uma resposta aos processos capitalistas, sendo a região entendida como a organização espacial dos processos sociais associados ao modo de produção capitalista. Trata-se da reoganização da divisão social do trabalho, do processo de acumulação capitalista, da reprodução da força-de-trabalho e

2 LACOSTE, Yves. A Geografia Serve Antes de Mais Nada Para Fazer a Guerra. Lisboa: Iniciativas Editoriais, 1977.

3 O modelo de interpretação idiográfico, em síntese, pode ser observado como parte da ciência não determinística que utiliza um contexto particular para a compreensão dos fenômenos baseando-se na hermenêutica (“arte da interpretação”).

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dos processos políticos e ideológicos. Alguns autores argumentam ainda ser a região o resultado de práticas específicas de classe, de uma cultura distinta ou do regionalismo.” (p.187)

“Merecem menção as contribuições, entre outras, de Coraggio, Massey e Smith que, com uma abordagem fundada no marximos rediscutem o conceito de região” (p.187)

“No segundo conceito a região é considerada como foco de identificação sendo ‘definida como conjunto específico de relações culturais entre um grupo e lugares particulares’, uma ‘apropriação simbólica de uma porção do espaço por um determinado grupo’ e, assim, ‘um elemento constituinte de uma identidade’” (p.188).

Sua base na geografia humanista que se apóia nas filosofias do significado e que, em última instância, considera a região como espaço vivido. Outra base é a geografia cultural renovada, cuja origem remonta aos estudos sobre a paisagem realizados por geógrafos alemães, franceses e anglo-saxônicos. Os estudos de Piveteau, Tuan e Frémont, são exemplos desta abordagem.

“A região como meio de interações sociais constitui-se no terceiro modo de uma conceituação pós-1970. Trata-se de uma visão política da região como base na idéia de que o poder e a dominação constituem fatores fundamentais na diferenciação de áreas. Os estudos de Pred, Gregory e Raffestin são exemplos dessa abordagem.” (p. 188).

II. As Razões do Pluralismo:

“Admitimos, em realidade, que os diversos conceitos de região que os geógrafos desenvolveram constituem respostas aos múltiplos ângulos com que eles observaram e observam o mundo real já complexamente fragmentado e articulado. Com a globalização este processo de exercer muitos olhares sobre o espaço do homem foi acentuado.” (p.191).

III. Região e as Categorias da Particularidade:

“A diferenciação de áreas, resultante tanto de processos da natureza como sociais e razão de ser da própria geografia como um saber dotado de uma relativa autonomia, constitui-se na sabe da possibilidade de se poder falar em região. (...) Mas a diferenciação de áreas não está, no nosso entender, associada a noção de unicidade hartshorniana (uniqueness). Não se associa a idéia de singularidade que entendemos vincula-se ao conceito de lugar, mas sim à idéia de particularidade, isto é, uma mediação entre o universal (processos gerais advindos da globalização) e o singular (a especificação máxima do universal).” (p.191, 192).

10. A Organização Regional do Espaço Brasileiro:

“Falar sobre a organização região do espaço brasileiro é algo muito complexo, pois se trata da regionalização de um país de grandes dimensões que tem passado por um complexo e desigual processo de diferenciação que envolve o espaço e o tempo4.” (p.197)

I.A nova regionalização brasileira é caracterizada por três regiões: o Centro-Sul (definida pelos estudos da região Sul, Sudeste e acrescentando Mato Grosso do Sul; Goiás e Distrito Federal); o Nordeste e a Amazônia (que incluiria os estados da região Norte, mais Mato Grosso; Tocantins e Maranhão).

“A organização regional do país que ora é apresentada difere da que ainda está vigente. Verifica-se, de um lado, a fusão de regiões Sudeste e Sul gerando o Centro-Sul que inclui ainda parte da antiga região Centro-Oeste. Esta, por outro lado, desaparece, parte passando a integrar o Centro-Sul, parte a Amazônia. O desaparecimento da região Centro-Oeste foi viabilizado pela fragmentação político- administrativa que ali se verificou na década de 80, a qual reflete, por sua vez, processos mais acentuados de diferenciação

4 A regionalização do Brasil descrita aqui tem base no Novo Atlas Nacional do IBGE, no qual o geógrafo Roberto Lobato Corrêa foi consultor.

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sócio-econômica d território. A Amazônia teve seu território ampliado, aproximando seus limites da denominada Amazônia Legal.” (p.198).

“Mas deve-se considerar que a regionalização aqui apresentada está apoiada em limites formais, isto é, político-administrativos. Se considerarmos outros limites que os estaduais, veremos, com certeza, que o Nordeste avança pelo norte mineiro, fato que a SUDENE reconhece plenamente.” (p.198).

“Trata-se efetivamente de três Brasis e mais dois Brasis como Jacques Lambert em seu clássico ‘Os Dois Brasis’ se referia. Mas os três Brasil estão articulados entre si e não mais desarticulados.”

“As três grandes regiões podem ser reconhecidas como expressão de uma nova divisão territorial do trabalho vinculada à dinâmica de acumulação capitalista internacional e brasileira e, aos numerosos conflitos de classe.” (p.199).

“As três grandes regiões diferenciam-se entre si em razão de apresentarem:a) Diferenciação no que se refere a sua produção (especialização produtiva);b) Intensidade da circulação, consumo e gestão das atividades;c) Distintas organizações espaciais criadas pelo trabalho social, em seu arranjo espacial (densidade dos

fixos criados pelo homem – campo, estradas, dutos, portos, cidades etc.).d) Níveis de articulação interna, inter-regional e internacional.” (p.199,200).

II.O centro- Sul é o coração econômico e político da nação, tendo como características fundamentais:

a) Concentração dos principais centros de gestão econômica e política do país. Grandes centros metropolitanos e, ainda de cidades menores sediando poderosas empresas;

b) Concentração da produção industrial do país, possuindo quatro grandes regiões industriais: (1)eixo Rio-São Paulo (São Paulo, Sorocaba, Baixada Santista, Interior Paulista, Vale do Paraíba e Rio de Janeiro); (2) Belo Horizonte e a “Zona Metalúrgica”; (3) Nordeste Catarinense (Brusque, Joinville e Blumenau); (4) Metrópole Gaúcha (Porto Alegre e Caxias do Sul);

c) Urbanização provinda em sua maioria de sua magnitude industrial;d) Densa rede de circulação, envolvendo os principais nós de circulação: portos; aeroportos e; rede

rodoferroviária, que se apresentam com um grande poder de integração intra-regional, sendo também responsável pela integração nacional;

e) Principal área agropecuária do país, devido a sua variedade de sua produção, e valor do volume da produção em relação a esses produtos. “A região é aquela que mais foi afetada pelo processo de modernização da agricultura, incluindo não apenas os investimentos técnicos, mas também alterações na estrutura fundiária e nas relações de produção.” (p.202; 203);

f) Principal área em termos de mobilidade demográfica, possuindo fortes correntes migratórias internas, como também advindas das outras regiões, principalmente, do Nordeste;

g) Alta concentração de renda que implica em um elevado nível de consumo e no desenvolvimento maior das atividades terciárias. Isso gera um aspecto negativo: uma grande concentração de pobres nas periferias;

h) Principal área política do país. É a região de maior efervescência política, palco de conflitos sociais diversos, mais números e evidentes e;

i) Maior concentração de estradas, cidades, hidrelétricas etc. (capitais constantes).

III.“O Nordeste pode ser definido como a região das perdas. Das perdas econômica e demográfica sobretudo, mas também, ainda que em menor escala, do poder político.” (p.204).

a) Importância declinante da agropecuária no contexto nacional (declínio da cultura canavieira e queda da importância da produção de algodão, seus principais produtos);

b) Perda demográfica: área de expulsão demográfica. A mobilidade demográfica intra-regional é também acentuada, calcada em fluxos migratórios para as capitais estaduais.

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c) Perdas relacionadas as suas atividades dinâmicas estarem sob controle de agentes externos. A SUDENE viabilizou a perda do controle das atividades regionais mais dinâmicas, assim como viabilizou a implantação e de outros grandes projetos;

d) Pequeno grau de articulação interna. “O Nordeste caracteriza-se pela pequena divisão intra-regional do trabalho, aliado á forte integração-dependente ao Centro-Sul, faz com que as principais vias sejam direcionadas para a ‘core area’ do país” (p. 205);

e) O baixo nível de renda da maior parte da população é outra característica regional: associa-se ao baixo índice de escolaridade e qualidade de vida e o índice de elevado de mortalidade infantil e; a concentração da riqueza regional de grandes latifundiários;

f) Menor variedade e densidade das formas espaciais (vias de comunicação, hidrelétricas, rede de transportes etc.);

g) “A fragmentação político-administrativa aliada à força política e à aparente união dos grupos dominantes tradicionais e emergentes tornam possível a venda da imagem do subdesenvolvimento regional visando obter recursos políticos que, se não resolvem os problemas da região, contribuem para manter os grupos dominantes no poder.” (p.206).

IV.A Amazônia é definida a partir de uma nova integração regional ao sistema capitalista, que se verifica pós-1977, que implica:

a) Apropriação dos recursos naturais (a terra é vista como reserva de valor);b) Dizimação física e cultural da base social prévia: as áreas preservadas aos índios e o assassinato de

Chico Mendes são a expressão mais dramáticas deste processo de dizimação física e cultural. A dilapidação da floresta é a expressão material da dizimação social;

c) Correntes migratórias para a região: iniciados ciclo da borracha e soja e; tendo fluxos migratórios do Centro-Sul e do Nordeste;

d) Investimentos pontuais de capital: hidrelétricas, aeroportos, portos, núcleos de mineração e de transformação industrial, e de um mais complexo ‘enclave’ industrial (Zona Franca de Manaus);

e) Integração ao mercado do Centro-Sul, envolvendo tanto matérias- primas como produtos industrializadas;

f) Existência de diferentes tipos de conflitos sociais. “Envolvem eles a grande empresa capitalista, o latifundiário pecuarista, a população indígena, os pequenos produtores, peões das fazendas, seringueiros e garimpeiros. A terra está no centro dos conflitos; trata-se de conflitos entre a reprodução do capital e a reprodução do pequeno produtor, de um lado, e entre ambos e a população indígena, de outro.” (p.209).

g) A Amazônia é fronteira do capital também pelo fato de que há ainda muito espaço a ser ocupado, muitos recursos a serem dilapidados, e muitos conflitos sociais a serem desenvolvidos.

Quarta Parte: Espaço e Empresa

11. Corporação e Espaço – Uma Nota:

A corporação se configura como o mais importante agente da reorganização espacial capitalista.

“A criação de áreas de produção especializada e novas atividades urbanas, ambas articuladas entre si através da produção que circula entre elas e do processo de gestão que as integra em uma mesma organização, estão entre os impactos que a grande corporação gerou quando se considera o conjunto dos países onde atua.” (p.213).

Características Selecionadas da Corporação

a) Ampla escala de operações: associa-se a isso a ampla diversidade de produtos manipulados e o elevado número de unidades produtivas e de serviços que as corporações dispõe: sede, centro de pesquisa e desenvolvimento, escritórios de compra de matérias-primas, depósitos, unidades fabris, escritórios de venda, unidades de prestação de serviços especializados etc.

b) Natureza multifuncional: uma empresa bem - sucedida passa a possuir mais de uma unidade. Trata-se da concentração horizontal, que resulta da fusão com/ou aquisição de empresas rivais e/ ou criação de

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novas unidades. A concentração vertical trata-se da aquisição, fusão e integração. “A multifuncionalidade, originando o conglomerado, a grande corporação altamente diversificada, com atividades que no plano técnico não estão vinculadas entre si, como por exemplo, a têxtil, metalúrgia, pecuária e hotelaria.” (p.216).

c) A segmentação da corporação: suas empresas componentes se diferenciam entre si, por meio do seu desenvolvimento tecnológico e da sua especialização no processo de produção (mais uma vez a divisão territorial do trabalho!);

d) Múltiplas localizações: custos diferenciais da força de trabalho, especialização funcional, mercado consumidor e em termos de administração no âmbito da própria corporação. “Há, assim, uma divisão territorial do trabalho específica a uma dada corporação. Esta divisão, por sua vez, em maior ou menor grau, na divisão territorial do trabalho de um dado país e global.”(p.217);

e) A pressão econômica e política que possui. “Traduz-se no plano espacial, na gestão do território, entendida como o conjunto de práticas econômicas e políticas visando ao controle da organização espacial, aí incluindo-se a gênese e a dinâmica da mesma.” (p.218). “(...) a organização espacial é necessariamente desigual, qualquer que seja a escala considerada, internacional, nacional, regional e intra-urbana (...) a gestão do território torna-se, na realidade, gestão das diferenças territoriais (Corrêa, 1989).” (p.218).

Corporação e Ciclo de Reprodução do Capital:

“A complexidade que caracteriza-se a corporação – escala de operações, multifuncionalidade, segmentação, múltiplas localidades e poder econômico e político – vai se traduzir em um complexo ciclo de reprodução do capital que, por sua vez, está associado a um complexa espacialidade.” (p.219).

Corporação e Espaço:

“As grandes corporações desempenham papel fundamental na organização do espaço. Consumidoras de uma gama variada de matérias-primas, interferem no processo produtivo de áreas agropastoris e mineradoras. Consumidoras e produtoras de uma gama também variada de produtos intermediários e finais, as corporações estabelecem ligações internas entre si e com outras empresas dos setores industrial, comercial e de serviços.” (p.222).

A Integração Territorial:

As grandes corporações chegam a um nível de complexidade que implicam em um duplo modo de interação (1) integração territorial da gestão (integração administrativa) e; (2) integração territorial da produção (vinculada a produção).

Segundo Hymer (1978) a estrutura administrativa se apresenta em três níveis hierárquicos. “O nível III refere-se à administração das operações diárias da corporação, obedecendo a regras preestabelecidas. O nível II tem como função a coordenação das administradores do nível III; dispõe de uma escala de tempo que é definida como de médio prazo. O Nível I, por sua vez, corresponde ao nível superior, tendo como função a fixação de objetivos e o planejamento a longo prazo, definindo as regras em que os dois níveis inferiores devem atuar.” (p.233).

Funções de Decisões e Controle:

“As cidades em tela são aquelas denominadas de ‘cidades mundiais’ por Sachar (1983), entre as quais Nova York, Londres e Tóquio são os melhores exemplos. Correspondem elas aos centros do tipo I de Lipietz (1977), locais de concentração das sedes sociais das grandes corporações, e onde se verifica a acumulação autocentrada, onde está o controle real do complexo processo de valorização do capital e onde o processo de trabalho é decidido em termos técnicos.” (p.225).

“A dupla integração territorial acaba constituindo elemento fundamental da gestão do território. De fato, a integração administrativa implica decisões e ordens que se traduzem em fluxos de capital, matérias-primas, produtos intermediários, forças-de-trabalho e produtos finais. Fluxos que se cristalizam em uma dada organização espacial e sua dinâmica. É, assim, gestão do território.” (p.226).

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“O nível I encontra-se decisões para toda a corporação. O nível II encontra-se nos três escritórios regionais ligados à produção. Comandam as atividades dos centros de beneficiamento e rebeneficiamento onde estão localizados os níveis III da estrutura administrativa da corporação. Este nível acha-se também disseminado pelas fábricas, escritórios de vendas e centros de pesquisa e desenvolvimento.” (p.228).

“A integração territorial da produção assume uma espacialidade mais complexa, não hierárquica, com ligações entre diversas unidades, gerando um padrão espacialmente convergente de matérias-primas brutas, beneficiadas e rebeneficiadas, e divergentes no que se refere aos produtos finais. A rede urbana da corporação, que se assumia uma natureza hierárquica na integração territorial da gestão, passa a construir-se agora de centros funcionalmente especializados.”(p.228).

Os Impactos Sobre a Organização Espacial:

“a manutenção, o desfazer e a recriação das diferenças espaciais constituem o principal impacto. Resultam eles da ação das corporações multifuncionais, segmentadas, multilocalizadas e dotadas de grande escala de operações e poder econômico e político, sobre uma organização espacial prévia, já desigual.” (p.229).

“a perda de controle e decisão das cidades da hinterlândia dos centros de gestão, através de falência e dos processos de fusão e satelização funcional das empresas locais, que não apresentam condições de competição com a grande corporação” (p.231).

Quinta Parte: Espaço, Tempo e Cultura

12. Carl Sauer e a Geografia Cultural

“Sauer é o criador expoente máximo da Geografia Cultural norte-americana, ou do que se convencionou denominar, entre os geógrafos, da “Escola de Berkeley.” (p.261).

Segundo Sauer, a Geografia é: “(...) concebida como o estabelecimento de um sistema crítico que engloba a fenomenologia da paisagem, de modo a abarcar, por meio de seu significado e cores, o variado cenário terrestre.” (p.266).

“A paisagem, um conjunto de formas físicas e culturais associadas em área, torna-se para Sauer o conceito fundamental da Geografia, tendo qualidade orgânica.” (p.266).

“O papel do homem como agente modificador da natureza primitiva constitui-se em um tema extremamente importante para Sauer e os geógrafos culturais.” (p.275).

VI Perspectivas Recentes na Geografia Cultural

“O tema percepção ambiental originou também estudos de como determinados grupos sociais, étnicos ou etários definem limites e preferências espaciais: provavelmente o melhor exemplo é o estudo de Peter Gould e Rodney White sobre mapas mentais, publicados em 1974. (...) Convém ressaltar que, como outros temas, os geógrafos repartem com os antropólogos uma preocupação similar com a questão da percepção ambiental, tema que, ainda não seja central à Antropologia, mereceu considerações de antropólogos como Franz Boas, B. Mslinowski e E.E. Evans-Pritchard, conforme assinala Grossman.” (p.282).

13. Dimensão Cultural do Espaço: Alguns Temas:

Cultura é observada como:a) O conjunto daquilo que é transmitido e inventado, implicando se que conheça a dinâmica da inovação

e difusão das técnicas, atitudes, idéias, valores, vem como as condições de transmissão;b) Caracterizada por componentes materiais, sociais, intelectuais e simbólicos;c) Estando presentes da mesma maneira entre todos os representantes da sociedade, distinguindo-se, de

um lado, cultura popular e cultura da elite e, de outro, cultura dominante e contracultura;

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d) Sendo vivida individualmente.

II. Paisagem Cultural:“Trata-se da paisagem cultural, um conjunto de formas materiais dispostas e articuladas entre si no espaço como os campos, as cercas vivas, os caminhos, a casa, a igreja, entre outras, com seus estilos e cores, resultante da ação transformadora do homem sobre a natureza.” (p.289).

“Cosgrove, por sua vez, admite que a paisagem geográfica ‘contém um significado simbólico, porque é produto da apropriação e transformação da natureza’, na qual foi impressa, através de uma linguagem, os símbolos, os traços culturais do grupo, ao geógrafo competindo decodificar a paisagem, aprendendo a ler o seu significado.” (p.290).

III. Percepção Ambiental e Cultura

“A natureza e o espaço socialmente produzido, do qual o homem é parte integrante, constituem o ambiente geográfico. Este, contudo, não é vivenciado nem percebido do mesmo modo pelos diversos grupos sociais diferenciados entre si segundo um amplo leque de atributos que se combinam entre si de modo complexo: renda, sexo, idade, as práticas espaciais associadas ao trabalho, crença, mitos, valores e utopias. A percepção do ambiente tem uma base eminentemente cultural.” (p.292).

IV. Espaço e Simbolismo

“(...) o espaço geográfico é também um campo de representações simbólicas, rico em signos que cumprem a função de expressarem as estruturas sociais em suas mais diversas dimensões.” (p.294).

VI. Temas Para Investigação:

“A percepção e avaliação ambiental por parte dos diversos grupos sociais, incluindo os naturais e os imigrantes, da natureza e dos ambientes socialmente produzidos.” (p.299).