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  • A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012)*

    Rafael Fagundes Cagnin

    Daniela Magalhes Prates

    Maria Cristina P. de Freitas

    Lus Fernando Novais

    Resumo

    O artigo identifica e analisa o desempenho de trs perodos da

    gesto da poltica macroeconmica durante os dois primeiros anos do governo Dilma (2011 e 2012). No primeiro, que abarca

    o primeiro semestre de 2011, as polticas monetria e fiscal tiveram um carter restritivo, no intuito de arrefecer a atividade

    econmica e, assim, conter a acelerao inflacionria observada naquele momento. O contexto do segundo, que se inicia em

    agosto de 2011 e termina em junho de 2012, foi condicionado pelo aprofundamento da crise da rea do euro. O terceiro, que

    compreende o segundo semestre de 2012, foi marcado pelo aprofundamento da desacelerao da atividade econmica.

    Palavraschave: Governo Dilma Rousseff (20112012); gesto

    macroeconmica; inflao; atividade econmica.

    AbstRAct

    The article identifies and analyzes the performance of three pha

    ses of the management of macroeconomic policy during the first two years of Dilma Rousseffs administration (2011 and

    2012). The first, comprising the first semester of 2011, is characterized by a restrictive monetary and fiscal policy, in the intent of

    producing economic downturn and controlling a inflation. The second period was largely conditioned by the eurozone crisis.

    The third, comprising the second semester of 2012, was characterized by the deepening of the economic downturn.

    Keywords: Dilma Rousseff s administration, 20112012;

    macroeconomic policies; inflation; economic activity.

    Novos esTUdos 97 NoveMBro 2013 169

    O governo Dilma manteve o regime de poltica macroeconmica1 ancorado nas metas de inflao e de supervit fiscal primrio e na flutuao (suja) da taxa de cmbio. No obstante, mudanas importantes introduzidas na gesto desse regime o tornaram mais flexvel. A obteno de taxas mais elevadas de crescimento econmico (com destaque para a recuperao da indstria) passou a ocupar uma posio central entre os objetivos dessa poltica em 2011 e 2012. Alm disso, houve uma ampliao da gama de instrumentos utilizados, que no se limitaram aos instrumentos convencionais das polticas monetria, fiscal e cambial. E, por fim, a melhor coordenao entre as autoridades econmicas, em especial entre o Ministrio da Fazenda e o Banco Central do Brasil (bcb), possibilitou uma maior convergncia dos objetivos e, consequentemente, uma maior eficcia do conjunto de polticas implementadas.

    [*] Este artigo consiste em umaversoatualizadadetrabalhosante-rioresdesenvolvidosnombitodoGrupo deEconomia da FundaodoDesenvolvimentoAdministrati-vodoEstadodeSoPaulo(Fundap/SP) (Regime de polticamacroe-conmicanogovernoDilma.Bole-tim de Economia da Fundap,n-o7,set.2011.Disponvel em ;e Balano do regime de polticamacroeconmica do governo Dil-ma.Boletim de Economia da Fun-dap,n-o17,ago.2012.Disponvelem

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    quivos/pdf/BOLETIM_17_agos-to_2012_completo.pdf>), comacolaboraodeJlioS.GomesdeAlmeida,GeraldoBiasotoJnioreMarinaSequetto.Osautoresagrade-cemaindaoscomentriosdeBrunoM.DeConti(Unicamp)edeCarlosEduardoG.Cavalcanti(Fundap/SP),assumindo,comodepraxe,a totalresponsabilidadeporpossveiserroseomissesdessaverso.Foramutili-zadasinformaesdisponveisatomsdesetembrode2013.

    [1] Oconceitoderegimedepol-ticamacroeconmicarefere-seaosobjetivosemetasdapolticamacroe-conmica,bemcomoaosinstrumen-tosutilizadosparaoalcancedessesobjetivos,queincluemtantoaspol-ticasmonetriaecreditcia,cambialefiscal,comoosinstrumentosdere-gulaofinanceira(nocasodopero-doanalisado,medidasderegulaofinanceiraprudencial,controlesdecapitaiseregulaodosderivativoscambiais).Contudo,mesmoutilizan-doumamplolequedeinstrumentos(almdastrspolticasmacroecon-micasconvencionais),queampliamoraiodemanobradagestomacroeco-nmica,esseregimepodenoatingirosobjetivosalmejados.

    [2] Sobreasmedidasdenaturezamacroprudencialdecontroledocr-ditoapessoas fsicas,verFundap.Intervenesmacroprudenciaisnomercadodecrditoedecmbio.Bo-letim de Economia da Fundap,no3,abr.2011.Disponvel em .

    [3] Ver,porexemplo,Freitas,Ma-riaCristinaPenido.Acrisenareado euro.Boletim de Economia da Fundap,n-o10,dez.2011.Disponvelem.

    Entre 2011 e 2012, podem ser identificados trs perodos distintos na orientao da poltica macroeconmica do governo Dilma. No primeiro perodo, que abarca o primeiro semestre de 2011, as polticas monetria e fiscal tiveram um carter restritivo, no intuito de arrefecer a atividade econmica e, assim, conter a acelerao inflacionria observada naquele momento. A diretriz de poltica do novo governo alinhouse, ento, s iniciativas adotadas no final do governo Lula2, tais como as medidas macroprudenciais no mercado de crdito de dezembro de 2010, que procuravam reduzir os riscos associados forte expanso dos emprstimos com recursos livres s famlias, mas que tambm contriburam para a desacelerao da demanda. Nesse perodo, novas medidas macroprudenciais no mercado de cmbio e controles de capitais foram adotados no sentido de conter a tendncia de apreciao do real, resultante do maior diferencial entre os juros internos e externos.

    O contexto do segundo perodo, que se inicia em agosto de 2011 e termina em junho de 2012, foi condicionado pelo aprofundamento da crise da rea do euro3. Diante da acentuada desacelerao da atividade econmica, o governo adotou medidas anticclicas, embora menos intensas que aquelas tomadas em 2008/09: reduo da taxa bsica de juros, estmulos creditcios e desonerao tributria. A deteriorao do cenrio externo e a desacelerao da inflao abriram caminho para a reorientao dos objetivos da poltica econmica para priorizar a diminuio do diferencial entre a taxa bsica de juros brasileira (Selic) e as taxas de juros internacionais. Em contrapartida, para garantir estabilidade monetria com taxas de juros mais baixas e taxa de cmbio competitiva para o setor industrial, o governo anunciou uma conteno adicional de gastos pblicos, reforando seu compromisso com a austeridade fiscal, e ampliou os controles de capitais diante do receio de uma nova enxurrada de capitais externos aps a expanso de liquidez pelo Banco Central Europeu (bce), em dezembro de 2011 e fevereiro de 2012.

    Esse conjunto de medidas, todavia, no gerou estmulos suficientes para reativar o nvel de atividade e o investimento produtivo. O terceiro perodo, que compreende o segundo semestre de 2012, foi marcado, ento, pelo aprofundamento da desacelerao da atividade econmica. Com o objetivo de estimular a economia, alm da reduo da meta da taxa bsica Selic, os bancos pblicos agiram novamente de forma anticclica ( semelhana do observado em 2008 e 2009), mitigando o efeito negativo sobre a oferta de crdito da perda de ritmo do crdito concedido pelos bancos privados e assegurando que as redues da taxa bsica de juros atingissem os tomadores finais.

    Combinadas a essas medidas, formas mais diretas de atuao sobre a demanda com a flexibilizao da poltica fiscal foram adotadas

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    [4] Aaltadospreosdosserviosrefletiutantoumapressoconjuntu-ral,emrazodofortedinamismodealgunssetoresem2010,comoumamudanaestruturaldepreosrela-tivos,associadamelhoradadistri-buiodarenda(Martinez,ThiagoS.Inflaoeopadrodecrescimentobrasileiro:consideraesapartirdadesagregaodoIPCA.Texto para discusso do Ipea,n-o1804,dez.2012;Martinez,ThiagoS.eCerqueira,Vi-nciusS.Estruturadainflaobra-sileira:determinantesedesagregaodoIPCA.Economia e sociedade,vol.22,n-o2(48),pp.409-56,2013).

    [5] Sobreasmedidasdenature-za macroprudencial de controledo crdito spessoas fsicas, verFundap,Intervenesmacropru-denciaisnomercadodecrditoedecmbio,op.cit.

    pelo governo. A estratgia foi a adoo de pacotes de compras governamentais e de investimentos pblicos, que compem uma poltica fiscal de estmulo ao crescimento econmico de carter mais ativo e direto em comparao com a desonerao tributria que at ento vinha sendo privilegiada. No caso do investimento, o estmulo extra ocorreu por meio do Programa de Sustentao do Investimento (psi), que passou a cobrar, at dezembro de 2012, juros negativos na aquisio de mquinas e equipamentos.

    O processo de acelerao inflacionria, que teve incio no final de 2012 e se estendeu pelo primeiro semestre de 2013, associado ao resultado decepcionante do crescimento econmico de 2012, explicitou os dilemas do regime de poltica macroeconmica e os limites da prpria estratgia de flexibilizao, que caracterizou o primeiro binio do governo Dilma. O combate inflao, que havia cedido espao para a busca de um crescimento econmico mais acelerado, voltou a ocupar o topo das prioridades do governo em 2013. Assim, diante da manuteno da poltica de metas de inflao, a autoridade monetria acabou respondendo s presses inflacionrias, levando ao incio de uma nova fase de elevao da taxa bsica de juros.

    Alm desta introduo, este artigo est estruturado em trs sees, que analisam as trs polticas macroeconmicas (monetria, cambial e fiscal). Seguem algumas consideraes finais.

    PolticA monetRiA

    Embora no tenha ocorrido ruptura do regime de metas de inflao, que se manteve como um dos pilares centrais da poltica macroeconmica do atual governo, sob o comando de Alexandre Tombini, ocorreram alteraes significativas na operacionalizao da poltica monetria e na utilizao do seu principal instrumento, a meta da taxa Selic. Essas mudanas tiveram duas consequncias importantes: possibilitaram a ampliao do grau de liberdade de ao do bcb ante as flutuaes da atividade econmica e produziram uma melhor coordenao da poltica monetria com as demais polticas macroeconmicas.

    Num primeiro momento, com o propsito de assegurar a convergncia das expectativas para o centro da meta, em um contexto de inflao ascendente e em acelerao, associado elevao dos preos internacionais das commodities (e, em menor medida, alta dos preos de alguns servios4), a autoridade monetria substituiu a estratgia de elevao tempestiva da meta dos juros pelo gradualismo, aguardando os efeitos defasados das medidas macroprudenciais de controle do crdito s pessoas fsicas5, adotadas em dezembro de 2010 e em abril de 2011, em vez de sobrecarregar a poltica de juros.

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    [6] ORelatriodeInflaodemarode2011explicitaaestratgiadobcb,segundoaqualnasatuaiscircuns-tncias,aboaprticarecomendabus-carumaconvergnciamaissuavedainflaoparaatrajetriademetas,semelhanadeestratgiaadotadanopassadopeloBancoCentral.Nessecontexto,ento,oCopomressaltaqueaestratgiadepolticamonet-riaserimplementadacomvistasaconterosefeitosdesegundaordemdochoquedeofertaeagarantiraconvergnciadainflaoparaametaem2012.

    Essa postura do Comit de Poltica Monetria (Copom), que decidiu elevar gradualmente a meta da taxa Selic em 1,75 ponto percentual (p.p.) em cinco reunies consecutivas, entre os meses de janeiro e julho de 2011, pode ser vista no Grfico 1. Um dos fatores que permitiram a adoo dessa nova postura pelo bcb foi o alongamento do horizonte temporal para o cumprimento da meta de inflao ao se estabelecer o ano de 2012 como o prazo para a convergncia da inflao ao centro da meta6.

    Indicando uma melhor coordenao das polticas macroeconmicas, a estratgia gradualista de combate inflao foi acompanhada da adoo, pelo Ministrio da Fazenda, de uma srie de medidas nas esferas creditcia, cambial e fiscal. Alm das medidas de restrio ao crdito ao consumo e de controle dos fluxos de capitais adotadas no primeiro semestre de 2011, foram estabelecidos, no segundo semestre, limites s operaes especulativas de investidores estrangeiros com derivativos cambiais e lanadas medidas adicionais de austeridade fiscal.

    A elevao do Imposto sobre Operaes Financeiras (iof) sobre operaes de crdito para pessoas fsicas, de 1,5% para 3,0% em abril

    Fonte: Banco Central do Brasil. Elaborao: Grupo de Conjuntura Fundap.

    Grfico 1evoluo da meta selic e iPca variao acumulada em 12 meses

    Jan./10

    Fev./10

    Mar./10

    Abr./10

    Maio/10

    Jun./10

    Jul./10

    Ago./10

    Set./10

    Out./10

    Nov./10

    Dez./10

    Jan./11

    Fev./11

    Mar./11

    Abr./11

    Maio/11

    Jun./11

    Jul./11

    Ago./11

    Set./11

    Out./11

    Nov./11

    Dez./11

    Jan./12

    Fev./12

    Mar./12

    Abr./12

    Maio/12

    Jun./12

    Jul./12

    Ago./12

    Set./12

    Out./12

    Nov./12

    Dez./12

    13,0%

    12,5%

    12,0%

    11,5%

    11,0%

    10,5%

    10,0%

    9,5%

    9,0%

    8,5%

    8,0%

    7,5%

    7,0%

    8,0%

    7,0%

    6,0%

    5,0%

    4,0%

    3,0%

    2,0%

    1,0%

    0,0%

    selic

    iPca

    selic (meta)

    Teto da Meta de inflao

    centro da Meta de inflao

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    [7] Sobreasdiversasfasesdacriseinternacional,verFundap.Acrisenoacabou:gnesedacriseeevoluorecentedaseconomiasavanadas.Boletim de Economia da Fundap,n-o20,nov.2012.Disponvelem.

    [8] Apartirde4demaiode2012,por foradaMedidaProvisrian.567,osnovosdepsitosnacadernetadepoupanapassaramaterremu-neraoequivalentea70%dametadataxadejurosSelic,quandoestafor igualoumenora8,5%aoano.Nocasodepatamaressuperioresaesse,ossaldosnovoseantigoscon-tinuamsujeitosregraanteriorderemunerao(TR+0,5%a.m.).Paramaisdetalhes,verFundap,Ritmodaatividadeeconmicaemudananas regras da poupana.Boletim de Economia da Fundap,n-o15,maio2012b.Disponvelem.

    [9] A Circular n. 3563 revogou aexignciadecapitaladicionalparaasoperaesdeemprstimosaoconsu-mocomprazomximode60meses(aindaquetenhasidoacompanhadadeelevaodorequerimentodeca-pitalparaasoperaesdecrditoaoconsumocomprazosuperioracincoanos).PormeiodaCircularn.3512,aautoridademonetriatambmdesis-tiudeelevaropercentualmnimodepagamentodasfaturasdecartodecrditode15%para20%,quehaviasidodeterminadoemjunhode2011.

    de 2011, funcionou como instrumento auxiliar da poltica monetria ao potencializar o efeito do aumento gradual da meta da Selic. J os controles de capitais atenuaram o impacto do aumento do diferencial de juros domstico sobre a taxa de cmbio do real, cuja queda (apreciao do real) vinha afetando seriamente a competitividade da indstria brasileira, tanto no mercado internacional como no domstico, em razo da concorrncia dos produtos importados. J o compromisso assumido de controlar as contas pblicas (reiterado com o anncio, em agosto, da ampliao do esforo fiscal em R$ 10 bilhes em 2011) teria contribudo, na viso do governo, para aliviar as presses sobre a poltica monetria, permitindo que o bcb iniciasse uma nova fase de corte da meta da taxa Selic, to logo percebeu os sinais de deteriorao do cenrio externo, com agravamento da crise das economias da rea do euro.

    Em um segundo momento, o corte de 0,5 p.p. na meta da Selic, decidido pelo Copom em agosto de 2011, surpreendeu o mercado e imps perda aos agentes privados que, no mercado financeiro, apostavam na manuteno da taxa em vigor. Essa deciso significou uma expressiva alterao de postura da autoridade monetria, que passou a atuar de forma menos conservadora e com maior independncia em relao ao consenso estabelecido por esses agentes.

    O agravamento da crise do euro a partir de setembro de 20117, ao lado da desacelerao da inflao e da sua trajetria de reaproximao ao centro da meta (condicionadas pelo menor ritmo de alta dos preos das commodities no mercado internacional e da demanda interna), favoreceu a continuidade da poltica de reduo da meta da taxa bsica de juros ao longo do segundo semestre de 2011 e em 2012. Essa meta da taxa Selic recuou 5 p.p. em relao ao patamar de julho de 2011, passando de 12,5% nesse ms para 7,5% no dia 29 de agosto de 2012. Essa trajetria cadente resultou numa significativa queda do diferencial entre as taxas de juros domstica e internacional.

    Alm da mudana de postura do bcb, esse prolongado processo de afrouxamento monetrio foi viabilizado por aes complementares das demais autoridades da rea econmica do governo. Esse foi o caso da alterao nas regras da caderneta de poupana, em maio de 2012, considerada essencial para que a queda da Selic abaixo do patamar de 8,5% no resultasse em migrao de recursos dos fundos de investimento para a poupana8.

    No quadro de incertezas internacionais, a poltica econmica apostou em outros instrumentos, em paralelo diminuio da taxa bsica de juros para estimular a reativao da demanda privada. Entre os meses de novembro e dezembro de 2011, foi revertida parte das medidas restritivas ao crdito de carter macroprudencial9 e o Ministrio da Fazenda reduziu de 3% para 2,5% a alquota de iof sobre as

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    [10]DecretodoMinistriodaFazen-dan.7.632,dedezembrode2011.

    [11] Ver, por exemplo, Fundap Aevoluo do crdito bancrio em2012.Boletim de Economia da Fun-dap, n-o 19, out. 2012. Disponvelem ; Costa, FernandoNogueiraePinto,GabrielMussodeAlmeida.Impactosdapressoparaconcorrnciabancrianomercadodecrditobrasileiro. InstitutodeEconomiadaUnicamp.Texto para discusso,2013.

    operaes de crdito ao consumo10. Ademais, nesse perodo, o governo Dilma incentivou os bancos pblicos a atuar de forma anticclica, neutralizando a desacelerao da contratao de crdito pelos bancos privados (Grfico 2). No primeiro semestre de 2012, o governo Dilma tambm utilizou novamente os bancos pblicos com carteira comercial (bb e cef) para forar, pelo mecanismo da concorrncia, a queda dos juros e spreads praticados pelos bancos privados11. O bndes continuou desempenhando papel fundamental na implementao da poltica creditcia. Alm da prorrogao do Programa de Sustentao do Investimento (psi) (em vigor desde 2009), para at o final de 2013, a Taxa de Juros de Longo Prazo (tjlp), que estava no patamar de 6% ao ano desde julho de 2009, foi reduzida para 5,5% a.a. em junho de 2012 e para 5% a.a. em janeiro de 2013.

    Ao longo do segundo semestre de 2012 acumularamse presses inflacionrias que levaram o ipca acumulado no ano para o patamar de 5,8%, bem acima do centro da meta de 4,5% a.a. A acelerao inflacionria do perodo decorreu da interao de diferentes fatores, entre os quais a elevao dos preos dos alimentos, desencadeada pela seca nos Estados Unidos (impactando os preos dos gros, especialmente da soja e do milho) e no Brasil (com efeitos sobre produtos in natura), o passthrough da desvalorizao cambial de mais de 20% entre final de fevereiro e junho de 2012, alm da resilincia da inflao de servios e bens no comercializveis. Contudo, diante do

    Fonte: Banco Central do Brasil. Elaborao: Grupo de Economia Fundap.

    Grfico 2crdito total ao setor privado por natureza do capital: variao real em 12 meses (em %)

    Jan./10

    Fev./10

    Mar./10

    Abr./10

    Maio/10

    Jun./10

    Jul./10

    Ago./10

    Set./10

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    Nov./10

    Dez./10

    Jan./11

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    Mar./11

    Abr./11

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    Jun./11

    Jul./11

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    Dez./11

    Jan./12

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    25

    20

    15

    10

    5

    0

    -5

    sf Pblico

    sf Privado

    sf estrangeiro

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    [12]Sobreamanipulaodasalquo-tasdeIOFcomomeiodecontroledosfluxosdecapitaisnoBrasilederegulamentaomacroprudencial,verMunhoz,VanessadaC.V.eSilva,ThiagodeM.Vulnerabilidadeex-ternaecontroledecapitaisnoBrasil:umaanlisedasinter-relaesentrecmbio,fluxosdecapitais,IOF,juroserisco-pas.TrabalhoapresentadonoXVI Encontro Nacional de Economia Poltica,Uberlndia,de21dejunhoa24dejunhode2011.Disponvelem;Freitas,MariaCristinaPenidoeCagnin,RafaelFa-gundes.Tributaodastransaesfinanceiras:aexperinciabrasileiracomoIOFeaCPMF.XVII Encontro Nacional de Economia Poltica.RiodeJaneiro,de5a8dejunhode2012.Disponvelem,entreoutros.

    [13] Vriostrabalhos,apartirdedife-rentesabordagenstericaseempri-cas,concluramqueasoperaescomderivativoscambiais(comdestaqueparaoscontratosdedlarfuturodaBM&FBovespa)tmumainflunciadecisivanadinmicadataxadecm-biodoreal.Ver,entreoutros,Dodd,RandalleGriffith-Jones,Stephany.Brazils Derivatives Markets: Hed-ging, Central Bank Intervention and Regulation,EconomicCommissionfor LatinAmerica and theCarib-bean(eclac),2007;Farhi,Maryse.Os impactos dos derivativos noBrasil.In:Marcolino,L.C.eCar-neiro,R.Sistema financeiro e desen-volvimento no Brasil.SoPaulo:Ati-tude,2010;Prates,DanielaM.OsdeterminantesdastaxasdecmbionominalerealnoBrasilnoperodo2003-2007.In:Ferreira,F.eMei-reles,B.Ensaios sobre economia finan-ceira.RiodeJaneiro:bndes, 2009.

    fraco desempenho da economia brasileira, das incertezas advindas do front externo e do peso de fatores climticos na evoluo da inflao, a autoridade monetria manteve inalterada a meta da taxa Selic em 7,25% a.a. at maro de 2013.

    PolticA cAmbiAl

    A exemplo da poltica monetria, no governo Dilma a poltica cambial tambm foi marcada por um maior nvel de coordenao entre o bcb e o Ministrio da Fazenda. Alm disso, duas outras mudanas caracterizam a poltica cambial desde 2011, ainda que o regime de cmbio permanea sendo o de flutuao suja.

    Em primeiro lugar, identificouse uma ampliao dos objetivos perseguidos (ainda que nem sempre convergentes). Alm da mitigao da volatilidade cambial (para atingir os objetivos de controle da inflao e estabilidade financeira) e do acmulo de reservas (voltado para a reduo da vulnerabilidade externa), a poltica cambial passou a ter como meta o patamar da taxa de cmbio, com o propsito de conter a deteriorao da competitividade da indstria brasileira (seja no mercado externo, seja no mercado interno).

    Em segundo lugar, foi diversificado o conjunto de instrumentos utilizados para o alcance desses objetivos. Desde janeiro de 2011, o bcb e o Ministrio da Fazenda recorreram no somente a alteraes das alquotas do iof12 sobre os investimentos estrangeiros de portflio, mas tambm impuseram esse mesmo tipo de controle de capital sobre as captaes externas, inclusive sobre emprstimos intercompanhias. Adicionalmente, acionaram dois novos instrumentos regulatrios: (a) a regulao financeira prudencial, ao impor recolhimento compulsrio sobre as posies vendidas dos bancos no mercado de cmbio vista; e (b) a regulao das operaes com derivativos cambiais, ao impor iof de 1% sobre as posies lquidas vendidas nesses derivativos acima de US$ 10 milhes13. Ademais, esse arsenal de medidas regulatrias foi utilizado de forma dinmica, ou seja, ajustado em funo das mudanas no ambiente financeiro internacional, que afetaram o ingresso lquido de divisas (Grfico 3).

    Dessa maneira, o governo Dilma optou por ampliar o mix de instrumentos regulatrios, alargando o raio de manobra e a eficcia da poltica cambial, em vez de recorrer, quase que exclusivamente, s intervenes no mercado de cmbio vista e ao acmulo oneroso de reservas. Entretanto, em funo do ambiente macroeconmico (patamar elevado da taxa bsica de juros) e institucional (grau de abertura financeira) domsticos, bancos e empresas residentes e investidores no residentes encontraram vrias formas de burlar esses instrumentos (movimento denominado arbitragem regulatria).

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  • 176 A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012) Cagnin,Prates,FreitaseNovais

    [14]Asoperaesdecarry tradecon-sistememestratgiadearbitragemdetaxasdejuros,segundoaqualoinves-tidorassumeumaposiopassivaemumadivisaassociadaabaixastaxasdejuroseumaposioativanadivisaquelherendemaiorestaxasdejuros.

    O governo s conseguiu efetivamente desmontar as estratgias especulativas do tipo carry trade14(nos mercados vista e futuro de cmbio) com a cobrana de iof sobre as posies lquidas em derivativos cambiais, em julho de 2011, penalizando as apostas dos investidores estrangeiros na apreciao do real. Depois de zerarem suas posies lquidas vendidas em dlar em setembro, esses investidores alternaram posies lquidas vendidas e compradas em volume bem inferior ao vigente antes dessa regulao (Grfico 4).

    A desvalorizao do real entre os meses de setembro e outubro de 2011 no pode ser, contudo, creditada exclusivamente s medidas adotadas pelo governo, uma vez que o cenrio externo voltou a se deteriorar no pero do com o aprofundamento da crise do euro. Esta teve um impacto negativo sobre os fluxos de capitais para os pases emergentes e sobre o apetite por risco em mbito global, contribuindo para a inverso das apostas dos investidores estrangeiros e dos bancos no mercado futuro de dlar e para o dficit no movimento financeiro de cmbio a partir de agosto.

    16/03: exportadores isentos de iof nas operaes de hedge cambial equivalentes a 1,2 vez o valor exportado nos 12 meses anteriores

    18/12: aumento de Us$ 1 bilho para Us$ 3 bilhes do limite de posio vendida em cmbio dos bancos isento de compulsrio

    14/06: iof volta a incidir somente em captaes externas com prazo de at 2 anos

    14/12: Prazo mnimo das operaes de pagamento antecipado de exportaes foi ampliado de 1 para 5 anos05/12: iof de 6% voltou a incidir somente sobre captaes externas com prazo mnimo de 1 ano

    01/03: Proibio de pagamento antecipado de exportaes acima de 1 ano29/02: 6% iof estendido para captaes externas de at 3 anos

    12/03: 6% iof estendido para captaes externas de at 5 anos

    Fonte: Banco Central do Brasil. Elaborao prpria.

    03/01/2011

    28/01/2011

    22/02/2011

    19/03/2011

    13/04/2011

    08/05/2011

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    16/08/2011

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    24/11/2011

    19/12/2011

    13/01/2012

    07/02/2012

    03/03/2012

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    22/04/2012

    17/05/2012

    11/06/2012

    06/07/2012

    31/07/2012

    25/08/2012

    19/09/2012

    14/10/2012

    08/11/2012

    03/12/2012

    28/12/2012

    2,15

    2,10

    2,05

    2,00

    1,95

    1,90

    1,85

    1,80

    1,75

    1,70

    1,65

    1,60

    1,55

    1,50

    1,45

    flexibilizao

    restrio

    06/01: anncio do recolhimento compulsrio sobre posies vendidas no mercado de cmbio vista

    04/04: iof estendido s renovaes de captaes externas06/04: iof estendido s captaes externas at 2 anos

    29/03: iof de 6% sobre captaes externas at 1 ano

    27/07: iof de 1% sobre posies lquidas vendidas em derivativos cambiais superiores a Us$ 10 milhes

    08/07: aumento do compulsrio s/ posies cambiais vendidas

    01/12: investimentos estrangeiros de portflio em aes e em ttulos privados com prazo acima de 4 anos isentos de iof

    Grfico 3Taxa de cmbio nominal r$/Us$ 2011 a 2013

    11_Cagnin_97_p168a185.indd 176 12/10/13 5:37 PM

  • Novos esTUdos 97 NoveMBro 2013 177

    [15] Valelembrarqueumdosprin-cipaiscanaisdetransmissodacrisefinanceiraglobalparaomercadofi-nanceirobrasileiro,apsafalnciadobancoLehmanBrothersemmeadosdesetembrode2009,foiaexposiodevriasempresasemcontratosdederivativoscambiaisnegociadosnomercadodebalco,nosquaisosban-coseramascontrapartes.Almdafortereduodessaexposioapsacrise,vriosavanosnaregulaodessescontratosforamrealizadosafimdeampliarsuatransparnciaeomonitoramentodastransaes,den-treosquaisacriao,pelaFederaoBrasileiradeBancos(Febraban),daCentraldeExposioaDerivativos(ced).Pormarentabilidadecorren-tedasgrandesempresas,quetinhamampliadonoperodooendividamen-toemmoedaestrangeira,caiudevidoelevaodasdespesasfinanceiras,dificultando,assim,areversodoci-clodebaixadoinvestimento.

    Assim, podese afirmar que a deteriorao do ambiente financeiro internacional ampliou a eficcia da poltica cambial para atingir sua nova meta, conduzindo a taxa de cmbio para um patamar mais competitivo. Ao mesmo tempo, o efeito deflacionrio dessa deteriorao sobre os preos das commodities atenuou o impacto da desvalorizao cambial sobre a inflao interna, reduzindo o conflito entre os objetivos controle da inflao e competitividade externa. J a manuteno da estabilidade financeira no foi ameaada por essa desvalorizao, tal como ocorreu no ltimo trimestre de 2008, devido forte reduo do risco cambial das empresas e de contraparte dos bancos nas operaes com derivativos cambiais desde 200915. Ademais, para evitar uma alta adicional da taxa de cmbio e no sobrecarregar a poltica cambial, o governo realizou o primeiro ajuste no mix regulatrio, relaxando os controles de capitais ao eliminar o iof sobre investimentos de portflio em aes e em ttulos de renda fixa de longo prazo (debntures vinculadas a projetos de infraestrutura).

    No se pode subestimar a importncia das medidas regulatrias adotadas at julho de 2011. Elas tiveram o papel de evitar um acmulo excessivo de posies especulativas em ativos financeiros vinculados

    07/01/2011

    21/01/2011

    04/02/2011

    18/02/2011

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    30/11/2012

    14/12/2012

    300000

    200000

    100000

    0

    -100000

    -200000

    -300000

    Bancos

    Pessoa jurdica no financeira

    invest. institucional nacional

    inv. no residente

    vendido

    comprado

    Grfico 4Mercado futuro de dlar: posies lquidas dos investidores (Us$ milhes)

    Fonte: BMFBovespa. Elaborao prpria.

    11_Cagnin_97_p168a185.indd 177 12/10/13 5:37 PM

  • 178 A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012) Cagnin,Prates,FreitaseNovais

    [16]Oprimeiroleilofoirealizadoem21/12/2011,quando523bancostomaram489bilhes;osegundoleiloocorreuem28/02/2012,comemprstimos de 529 bilhes a800bancos,totalizandocercade1trilho.

    [17] Essas operaes avanaram48%emrelaoaosdadosdomesmoperodode2012(deUS$4,4bilhesparaUS$8,5bilhes);comisso,suaparticipaonototaldocmbiodeexportaopassoude15%para22%nomesmoperodo.VerFundap.OnovoplanoBrasilMaior,apolticacambialeaindstriabrasileira.Bole-tim de Economia da Fundap,n-o14,abr.2012.Disponvelem.

    [18]Paramaisdetalhes,verFundap,OnovoplanoBrasilMaior,apol-ticacambialeaindstriabrasileira,op.cit.

    ao real, cuja desmontagem poderia trazer presses tambm excessivas sobre a taxa de cmbio, colocando em risco o objetivo de controle da inflao e/ou de reduo da vulnerabilidade externa (se, para evitar a desvalorizao, o bcb utilizasse seu colcho de segurana, ou seja, as reservas internacionais).

    A dificuldade de compatibilizar os mltiplos objetivos da poltica cambial veio tona no primeiro bimestre de 2012. Do incio de janeiro ao final de fevereiro, a taxa de cmbio R$/US$ deslizou de um patamar de 1,86 para 1,71, o que correspondeu a uma apreciao de 8,9% do real (Grfico 3). Nesse perodo, o bcb mantevese praticamente ausente do mercado de cmbio vista, apesar da retomada do ingresso de divisas aps trs meses consecutivos de dficit. O excesso de divisas no mercado vista foi absorvido pelos bancos, cuja posio cambial passou de vendida, em dezembro, para comprada, em janeiro e fevereiro.

    Esse excesso decorreu, principalmente, da melhora das condies financeiras internacionais aps a expanso da liquidez pelo bce no mbito da nova linha de crdito de trs anos a juros de 1% ao ano lanada em dezembro de 201116. Essa iniciativa, ao afastar o risco de falncia de instituies relevantes (e, assim, a ameaa de crise sistmica na rea do euro), teve como desdobramento a queda da averso aos riscos dos investidores globais, que voltaram a assumir posies em ativos de risco, como moedas, ttulos e aes de economias emergentes. O movimento de cmbio comercial tambm foi beneficiado pelo alvio das tenses no mercado financeiro internacional, que favoreceram as operaes de pagamento antecipado de exportaes, as quais dependem da oferta de linhas bancrias externas de mais longo prazo17. De acordo com o bcb, essas operaes estavam concentradas em um nmero pequeno de empresas que utilizavam esse mecanismo para realizar operaes de arbitragem de juros.

    A lenincia em relao ao patamar da taxa de cmbio em janeiro e fevereiro de 2012 sugere a maior importncia atribuda nesses meses ao objetivo controle da inflao. Ou seja, o governo optou por aproveitar a nova fase (de durao incerta) de apetite por riscos para garantir a desacelerao do ipca acumulado em 12 meses, que recuou de 6,5% em dezembro para 5,8% em maro (Grfico 1).

    Confirmado o cenrio mais benigno para a inflao (para o qual tambm contribuiu a queda dos preos das commodities no mercado internacional), o objetivo competitividade externa voltou a ser priorizado. Por um lado, receoso do aumento das presses baixistas sobre a taxa de cmbio do real decorrentes do tsunami monetrio do bce, o governo reforou os controles de capitais no incio de maro de 2012 (Grfico 3). Por outro lado, no mbito da poltica cambial, a autoridade monetria retomou as intervenes no mercado vista em maro e abril18. Ademais, aps trs meses praticamente ausente do mercado

    11_Cagnin_97_p168a185.indd 178 12/10/13 5:37 PM

  • Novos esTUdos 97 NoveMBro 2013 179

    de derivativos cambiais, o bcb ampliou as operaes de swap reverso, mediante as quais assume uma posio comprada em dlar para atenuar as presses em prol da apreciao do real.

    Aps as novas medidas de controle de capitais e a retomada das intervenes cambiais nos mercados vista e de derivativos, a trajetria da taxa de cmbio se inverteu, tornandose novamente ascendente. Do patamar de R$ 1,70 no final de fevereiro, essa taxa atingiu o patamar de R$ 1,89 no final de abril de 2012.

    Mais uma vez, os desdobramentos da crise da rea do euro condicionaram essa trajetria. A partir de maro, iniciouse uma nova fase de aprofundamento dessa crise agora com foco na Espanha contaminando a averso aos riscos dos investidores globais. Nesse contexto, a taxa de cmbio do real seguiu seu movimento ascendente, atingindo R$ 2,00 no dia 18 de maro. Desde ento, ela passou a flutuar entre esse valor e o patamar de R$ 2,10, o que suscitou a interpretao de que o bcb estaria defendendo uma banda estreita de flutuao, com piso em R$ 2,00 e teto em R$ 2,10 (Grfico 3).

    Essa defesa no se ancorou em intervenes no mercado vista, j que o bcb se manteve ausente desse segmento entre maio e novembro, operando exclusivamente por meio de swaps e swaps reversos. Ou seja, a autoridade monetria optou pelas atuaes no mercado de derivativos, que no afetam as reservas internacionais, para defender o piso e o teto implcitos da taxa de cmbio, j que altas adicionais dessa taxa poderiam comprometer o objetivo controle da inflao. A preocupao com esse objetivo tambm parece explicar a flexibilizao dos controles de capitais sobre captaes externas pelo Ministrio de Fazenda em junho e dezembro (quando predominaram presses de depreciao cambial). Ao mesmo tempo, as presses em prol da apreciao do real foram mitigadas tanto pelas tenses no mercado financeiro internacional como pela reduo do diferencial entre os juros internos e externos.

    PolticA fiscAl

    No primeiro semestre de 2011, a poltica fiscal teve perfil contracionista, responsvel pela elevao do supervit primrio do setor pblico consolidado, de 2,77% do pib no acumulado de 12 meses (R$ 101,7 bilhes) em dezembro de 2010 para 3,74% do pib (R$ 150,1 bilhes) em julho de 2011 (Grfico 5). Segundo o prprio governo federal, com essa contribuio do setor pblico para o arrefecimento da expanso da demanda agregada, buscavase abrir caminho para a reduo da meta Selic pela autoridade monetria. Nesse perodo, o Ministrio da Fazenda tambm realizou desoneraes tributrias para atenuar a elevao do nvel geral de preos.

    11_Cagnin_97_p168a185.indd 179 12/10/13 5:37 PM

  • 180 A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012) Cagnin,Prates,FreitaseNovais

    J garantido o cumprimento da meta de supervit fiscal estabelecida para o ano devido expanso das receitas, mais do que conteno de gastos pblicos no primeiro semestre , no ms de agosto, o governo federal divulgou a elevao da meta de supervit fiscal do setor pblico em 2011de R$ 125,5 bilhes para R$ 135,5 bilhes. Dessa forma, buscou ratificar seu compromisso com o equilbrio das contas pblicas, com o objetivo de reforar a confiana dos agentes privados e conceder graus de liberdade atuao do bcb.

    Entre o segundo semestre de 2011 e o primeiro semestre de 2012, a poltica fiscal assumiu, contudo, um perfil anticclico que, graas ao resultado do primeiro semestre de 2011, pode ser adotado sem comprometer a obteno da meta de supervit fiscal. A desonerao tributria de diversos setores foi o principal instrumento utilizado nesse perodo, aliando os objetivos de reaquecimento econmico ao aumento da competitividade da indstria nacional, prejudicada, ento, pela apreciao cambial e pelo acirramento da concorrncia nos mercados externo e domstico aps a crise financeira global de 20082009.

    % do PiB

    Dez./10

    Jan./11

    Fev./11

    Mar./11

    Abr./11

    Maio/11

    Jun./11

    Jul./11

    Ago./11

    Set./11

    Out./11

    Nov./11

    Dez./11

    Jan./12

    Fev./12

    Mar./12

    Abr./12

    Maio/12

    Jun./12

    Jul./12

    Ago./12

    Set./12

    Out./12

    Nov./12

    Dez./12

    4,0

    3,5

    3,0

    2,5

    2,0

    1,5

    1,0

    setor pblico consolidado

    Governo federal

    Grfico 5evoluo do supervit primrio(1) (acumulado de 12 meses) do setor pblico consolidado(2)

    e do governo federal(3), em % do PiB dez./10 a dez./12

    Notas: (1) No considera os efeitos decorrentes da variao cambial. (2) considera o esforo fiscal da Unio (Tesouro Nacional e Previdncia social), estados, municpios, alm do resultado do Banco central e das empresas estatais (das trs esferas de poder), exceto Petrobras e eletrobras. (3) inclui o Tesouro Nacional e o sistema de Previdncia social.

    Fonte: Banco Central do Brasil. Elaborao prpria.

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  • Novos esTUdos 97 NoveMBro 2013 181

    [19]Para uma avaliao do PlanoBrasilMaior, ver Iedi (Umaan-lisedoplanoBrasilMaior.Carta Iedi, n-o 486, 2011. Disponvel emeIndstria,desenvolvimentoepolticaindustrial.Carta Iedi,n-o530, 2012.Disponvel em )eFundap(OnovoplanoBrasilMaior,apolticacambialeaindstriabrasileira,op.cit.). Informaes recentespodemserencontradasdiretamentenoen-dereoeletrnico.

    A maior parte das medidas de desonerao fiscal integrou o Plano Brasil Maior, lanado em agosto de 2011. Dentre elas podem ser citadas: reduo do ipi sobre bens de investimento; instituio do Reintegra (Regime Especial de Reintegrao de Valores Tributrios para as Empresas Exportadoras), que permite a devoluo s empresas de at 3% das receitas de exportao; reduo gradual do prazo de devoluo de crditos referentes ao pisPasep/Cofins sobre bens de capital; ampliao do Simples Nacional; desonerao da folha de pagamento de setores intensivos em mo de obra (confeces, mveis, calados, softwares); e estabelecimento de um novo regime tributrio para o setor automotivo19.

    Ademais, para estimular o investimento pblico, o governo federal autorizou, no final de 2011, a ampliao dos limites de endividamento dos estados para R$ 40 bilhes junto ao bndes e a outros agentes financeiros internacionais, como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (bid). Uma nova rodada de desoneraes fiscais foi lanada no segundo trimestre de 2012, com a adoo, no ms de abril, de medidas adicionais no mbito do Plano Brasil Maior, tais como a ampliao da desonerao da folha de pagamento, a reduo do ipi de bens de consumo, a postergao do recolhimento do pis/Cofins e a reduo da alquota de iof sobre operaes de crdito a pessoas fsicas, a partir do ms de maio.

    A poltica fiscal anticclica anunciada pelo governo previa, portanto, a reduo dos tributos (em virtude das desoneraes) e o aumento dos investimentos, sem o comprometimento da meta fiscal. Entre agosto de 2011 e julho de 2012, o supervit primrio do setor pblico foi reduzido de 3,7% para 2,5% do pib (Grfico 5). No ms de julho, o supervit acumulado chegava a R$ 71,2 bilhes, cerca de 51% da meta estabelecida para o ano de 2012 (R$ 139,8 bilhes).

    Entretanto, diante das expectativas empresariais pessimistas (em razo, sobretudo, do cenrio externo de forte incerteza), os estmulos fiscais por meio de desoneraes no tiveram o efeito esperado em termos de dinamismo econmico, exigindo intervenes mais diretas por parte do governo federal. Marcou, ento, o segundo semestre de 2012 a implementao de pacotes de ampliao das compras governamentais e dos investimentos pblicos.

    No ms de junho de 2012, o governo federal divulgou o Programa de Compras Governamentais, sob o qual foram previstos R$ 8,43 bilhes de compras, beneficiando diferentes setores, como o de mquinas e equipamentos (3,6 mil retroescavadeiras e 1,33 mil motoniveladoras), veculos (8 mil caminhes, 40 blindados e 30 lanadores de msseis para as Foras Armadas, 8,7 mil nibus para o Programa Caminho da Escola, 2,1 mil ambulncias, 3 mil tratores), medicamentos (R$ 6 bilhes em vacinas e medicamentos), etc. O pacote incluiu

    11_Cagnin_97_p168a185.indd 181 12/10/13 5:37 PM

  • 182 A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012) Cagnin,Prates,FreitaseNovais

    [20]Umconjuntodemedidasado-tadasnofinaldedezembrode2012permitiuquetaisoperaessecon-cretizassem:Medida Provisria n.600permitiuqueoTesouroNacionalaumentassea concessodecrditoextraordinrio Caixa EconmicaFederal ante uma emisso de ttu-los,vendesserecebveisdaUsinadeItaipuaobndes(cujopagamentofoifeitocomaesdeempresaspriva-dascotadasembolsa)eampliasseossubsdiosassociadosaopsi;Decreton.7880autorizouoaumentodeca-pitaldaCaixaEconmicaFederalpormeiodeaesdaPetrobrasedeoutrasempresasdecapitalaberto(taisaestinhamsidorecebidaspeloTesourodobndesemtrocadosrecebveisdeItai-pu);Decreton.7881permitiuqueoFundoSoberanovendessesuasaesdaPetrobrasparaobndes(autorizadodesde28dedezembroadeclarardi-videndosintermedirios);Resoluon.4175doConselhoMonetrioNa-cionalautorizouobndesanoabaterdeseulucroasperdasobtidascomaquedadovalordemercadodasaesdeempresascomoaPetrobraseaEle-trobras.Paraumadiscussodetalhadasobreacontabilidadecriativaaqueogovernofederalfezrecursoem2012,verBarros,GabrielLealeAfonso,JosRoberto.Sobrefazerocumprimentodametadesupervitfiscalprimriode2012.InstitutoBrasileirodeEcono-mia,FundaoGetlioVargas.Texto para discusso,fev.2013.Disponvelem,entreoutros.

    [21]Denominado oficialmente deFundoFiscaldeInvestimentoseEs-tabilizao.

    [22]Oreng,Mauricio.Contasp-blicas:dimensionandooimpactodasoperaes no recorrentes. Ita BBA Macro Viso,jan.2013.Dispo-nvelem.

    [23]Setor pblico consolidadoconsideraoesforofiscaldaUnio(Tesouro Nacional e PrevidnciaSocial),estados,municpios,almdoresultadodoBancoCentraledasempresasestatais(dastrsesferasdepoder),excetoPetrobraseEletrobras.

    compras governamentais adicionais gastos que no estavam previstos no Oramento de R$ 6,6 bilhes.

    Esses gastos eram vistos como necessrios para o andamento do pac. O governo esperava que contribussem para que o investimento pblico avanasse, estimulando igualmente alguns setores industriais, como o automotivo, que fornece parte dos equipamentos. Todavia, apesar dos esforos governamentais, perdurou uma grande dificuldade para executar os investimentos ancorados em recursos do Oramento Geral da Unio.

    No final de agosto de 2012, juntamente com a reduo da taxa de juros cobrada no psi de 5,5% para 2,5% a.a., o que a levou para patamares reais negativos, foram anunciadas a prorrogao e a definio de novas renncias fiscais, totalizando R$ 5,5 bilhes a serem divididos entre os anos de 2012 (R$ 1,6 bilho) e de 2013 (R$ 3,9 bilhes). A reduo do ipi do setor automotivo foi prolongada para at o final do ms de outubro, enquanto para outros setores, como o de mveis e linha branca, a cobrana de alquotas reduzidas foi garantida at o final do ano de 2012 e, no caso dos setores de materiais de construo e de bens de capital, at o final de 2013. Para as empresas participantes do psi, mas com dificuldades de pagar seus compromissos, criouse a possibilidade de acelerar (de 48 para 12 meses) a depreciao de determinados bens (caminhes e vages), o que implica reduo do lucro contbil e, consequentemente, da arrecadao de imposto de renda e da Contribuio Social sobre Lucro Lquido (csll) (em R$ 586 milhes, segundo o Ministrio da Fazenda).

    O resultado primrio da Unio da ordem de R$ 86,1 bilhes, obtido em 2012, contou com a ajuda de operaes contbeis atpicas, que ficaram conhecidas na imprensa especializada como contabilidade criativa. Essas operaes20 envolveram a troca de ativos financeiros pblicos e privados entre Secretaria do Tesouro Nacional, bndes, Caixa Econmica Federal e Fundo Soberano do Brasil21, assim como a antecipao do pagamento de dividendos ao governo, de forma a reforar contabilmente seu resultado primrio (Grfico 6). Segundo Oreng22 (2013), excludas as receitas no recorrentes, resultantes dessas operaes atpicas, o resultado primrio do setor pblico consolidado23 de 2012, que chegou a 2,4% do pib, seria apenas de 1,8% do pib.

    Ademais, o esforo fiscal de 2011 e a trajetria de queda da taxa bsica de juros, na segunda metade de 2011 e em 2012, tambm contriburam para a adoo de uma poltica fiscal anticclica, implicando menor comprometimento com o pagamento de juros da dvida24. De fato, a dvida lquida do setor pblico foi reduzida de 39%, no incio de 2011, para 35%, no final de 2012. A dinmica da dvida lquida no capta, entretanto, o suporte financeiro a um dos

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    [24]Amudananacomposiodadvida,comoaumentodaparticipa-odoscompromissosindexadosandicesdepreoseajurosprefixadosequedadaparticipaodaSeliccomoindexador,ajudaaarrefeceresseefei-topositivo.

    [25]ParamaisdetalhesverAfonso,JosRoberto.Asintricadasrelaesentrepoltica fiscal e creditcianoBrasilps-2008.Revista Econmica,vol.13,n-o2,dez.2011,pp.125-54;eBarroseAfonso,op.cit.

    [26]VerAlmeida,JulioS.GomeseNovais,LuisFernando.Odesem-penho das grandes empresas decapital aberto no perodo recente(2007-2011)enoprimeirotrimes-trede2012.Boletim de Economia da Fundap,n-o16,jun.2012.Disponvelem;Fundap,OnovoplanoBrasilMaior,apolticacambialeaindstriabrasi-leira,op.cit.,eFundap,Ritmodaatividadeeconmicaemudananasregrasdapoupana,op.cit.

    aspectoschave da poltica anticclica brasileira: a expanso do crdito pelos bancos pblicos. A capitalizao dessas instituies foi realizada, desde o aprofundamento da crise internacional em 2008, por meio de crditos do Tesouro aos bancos pblicos. Na prtica, o Tesouro emitiu ttulos de dvida que foram posteriormente transferidos aos bancos pblicos, a ttulo de concesso extraordinria de emprstimo. Dessa forma a dvida bruta aumentou (53,4% do pib em 2010, para 58,7% em 2012), mas tambm cresceram os crditos do governo (os emprstimos s instituies financeiras oficiais contabilizavam 6,8% do pib em 2010 e 9,2% em 2012). No longo prazo, contudo, essas operaes no so isentas de efeitos negativos sobre as finanas pblicas, uma vez que a taxa de juros que remunera os emprstimos aos bancos pblicos (geralmente tjlp) menor do que aquela que o Tesouro deve pagar (Selic)25.

    consideRAes finAis

    Ao longo dos dois primeiros anos de mandato, caracterizados por um contexto internacional adverso, o governo da presidente Dilma Rousseff obteve resultados econmicos positivos e negativos. No que diz respeito aos resultados positivos, destacaramse: a reduo do diferencial entre as taxas de juros domstica e internacional, a diminuio da dvida lquida do setor pblico, a obteno de uma taxa de cmbio mais competitiva e a queda da taxa de desemprego. Em relao aos resultados negativos, a atividade econmica, continuou apresentando desempenho insatisfatrio, condicionado, especialmente, pelo desempenho decepcionante da indstria do lado da oferta e dos investimentos (sobretudo de infraestrutura) do lado da demanda.

    Ainda que a conjuntura internacional no tenha progredido para a ruptura da rea do euro, conservouse um cenrio de fortes incertezas e de recesso em vrios pases da Europa. Do ponto de vista domstico, fatores estruturais de perda da competitividade da economia brasileira se sobressaram e se ampliaram com os efeitos conjunturais negativos do perodo 20112012 de ajuste nos estoques, observado principalmente no setor industrial26. Nesse contexto, o ritmo de crescimento do pib recuou de 7,5%, em 2010, para 2,7%, em 2011. Em 2012, foi de apenas 0,9%, bastante abaixo das expectativas do Ministrio da Fazenda no incio desse ano, que apontavam para a faixa de 4%.

    O desempenho de 2012 decorreu da conjuno de diferentes fatores, dentre os quais a demanda externa mais fraca e o acirramento da concorrncia internacional, mas tambm explicitou os limites da reafirmao da estratgia governamental de estmulo da demanda. Era de se esperar que os efeitos das medidas adotadas fossem menos expressivos em 2012, dado o forte crescimento, nos anos anteriores, do

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  • 184 A gesto mAcroeconmicA do governo dilmA (2011 e 2012) Cagnin,Prates,FreitaseNovais

    [27]Sobre a evoluo da inadim-plnciaem2012eseuimpactosobreocrescimentodocrdito,verFundap,Aevoluodocrditobancrioem2012,op.cit.

    [28]Carnes, caf, leo,manteiga,acarepapelhiginicotiveramaalquotadepis/Cofinsreduzidade9,25%para0%;pastadedentesesabonete,de12,5%para0%.Foize-radaaalquotadeipisobreacaresabonete(5%antesda iseno)(Dieese, Adesoneraodospro-dutosdacestabsica.Nota Tcnica,n-o 120,mar. 2013.Disponvel em).

    consumo, sobretudo, de bens durveis. A acelerao da inflao no segundo semestre de 2012 e o elevado endividamento das famlias, cuja inadimplncia mantevese em patamar considerado elevado pelos bancos, tambm contriburam para a baixa eficcia dessas medidas27.

    A esses fatores, somouse uma fonte de incerteza possivelmente resultante da prpria ao do governo. medida que anncios de desonerao fiscal a determinados setores passaram a integrar o modus operandi da poltica econmica, alguns empresrios podem ter preferido adiar seus projetos e intensificar suas presses junto ao governo com o objetivo de antes obter algum benefcio fiscal. Mudanas nas regras de concesses e da remunerao de alguns setores, tais como de energia eltrica, tambm ajudaram a minar a confiana dos empresrios.

    No que diz respeito evoluo dos preos, as presses inflacionrias do segundo semestre de 2012 estenderamse para o incio de 2013, levando o ipca, no acumulado em 12 meses, a superar o limite superior da meta de inflao em maro de 2013. A elevao dos preos de alimentos, condicionada pela seca nos Estados Unidos e no Brasil, e o passthrough da desvalorizao cambial de 2012 explicam, em boa medida, essa acelerao inflacionria. Tambm importante foi a deciso do governo, em janeiro de 2013, de elevar os preos dos derivados de petrleo, devido s condies financeiras e operacionais fortemente debilitadas da Petrobras. Esses fatores cclicos somaramse a uma inflao de servios e de bens no comercializveis resistente queda. Assim, avolumaramse presses exigindo a ratificao do compromisso do bcb no combate inflao.

    A taxa Selic foi, contudo, mantida em 7,25% a.a. at final de maro de 2013. Essa deciso contribuiu, ao menos nesse momento, para no abortar a frgil acelerao do crescimento econmico iniciada no ltimo trimestre de 2012. A autoridade monetria contou, para tanto, com o auxlio de medidas do Ministrio da Fazenda, ainda que nem todas elas tivessem como principal objetivo a desacelerao da inflao. O reajuste dos preos de derivados de petrleo, em janeiro de 2013, ficou abaixo das expectativas do mercado; tambm nesse ms passou a vigorar a reduo das tarifas de energia eltrica (Medida Provisria n. 605). Em maro de 2013, vrios itens28 da cesta bsica foram isentos de tributos federais, tais como pis/Cofins (Medida Provisria n. 609) e ipi (Decretolei n. 7947). O governo federal tambm conseguiu o compromisso das prefeituras de So Paulo e do Rio de Janeiro para a postergao do reajuste do preo dos transportes, que geralmente ocorre no ms de janeiro. Esse adiamento acabou se transformando na suspenso do reajuste diante das manifestaes populares de meados de 2013.

    Se as medidas de desonerao fiscal, de um lado, e a manuteno da taxa bsica de juros, de outro, sugeriam a conservao da coorde

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    nao entre Ministrio da Fazenda e Banco Central, a evoluo da taxa cmbio do real sinalizava que os dilemas de poltica macroeconmica tinham se agravado. Entre novembro de 2012 e maro de 2013, o bcb deixou a taxa de cmbio deslizar de R$ 2,10 para R$ 1,95, voltando, ento, a usar a apreciao cambial como instrumento auxiliar do combate inflao. Esse movimento contrapunhase aos objetivos, reconhecidos pelo governo federal, de elevar a competitividade do produto nacional, tanto no mercado domstico como no mercado internacional, e de promover a recuperao da indstria. O aparente conflito entre os objetivos da poltica cambial foi, todavia, contornado pela inverso da tendncia da taxa de cmbio a partir do final de maio, quando o real (e a maioria das moedas emergentes) voltou a se depreciar ante o dlar em razo de estratgias de recomposio das carteiras dos investidores internacionais, aps o presidente do Federal Reserve, Ben Bernanke, ter sinalizado que a desacelerao da poltica de afrouxamento quantitativo poderia ter incio ainda em 2013.

    Em abril de 2013, o Copom deu incio a uma nova fase de elevaes graduais da taxa bsica de juros. No apenas a acelerao do ndice oficial de inflao, o ipca, mas tambm a difuso dos aumentos de preos entre os itens que o compem justificaram a deciso da autoridade monetria. Abriuse, nesse momento, um novo perodo da gesto macroeconmica, em que o combate inflao retornou ao topo das prioridades do governo. No se trata de abandonar o crescimento econmico a taxas mais elevadas enquanto objetivo do governo, mas, diante da conjuntura e dos dilemas do regime de poltica macroeconmica, de trazer para o primeiro plano o equacionamento da questo inflacionria. O episdio ilustra as limitaes da estratgia de flexibilizao desse regime, que decorrem, sobretudo, da manuteno da poltica de metas de inflao como um dos seus pilares.

    Rafael Fagundes Cagnin economista da Fundapsp, mestre em Teoria Econmica na Unicamp.

    Daniela Magalhes Prates economista e professora doutora do Instituto de Economia da

    Unicamp.

    Maria Cristina P. de Freitas economista e doutora pela Universidade Paris xiii e exconsul

    tora do Grupo de Economia da Fundapsp.

    Lus Fernando Novais economista e coordenador do Grupo de Economia da Fundapsp.

    Rece bido para publi ca o em 30 de setembro de 2013.

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