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FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA ALÉM DA GRADUAÇÃO:
caminhos percorridos pelos egressos em Serviço Social no interior do Amazonas
Rayanne Roque Gama1
Roberta Ferreira Coelho de Andrade2
RESUMO: O artigo debate sobre a formação profissional e a pós-graduação em Serviço Social sob a perspectiva dos egressos no interior do Estado do Amazonas. A pesquisa foi bibliográfica, documental e de campo, com entrevistas em Parintins, Coari, Itacoatiara e Maués, revelando as alternativas dos egressos em Serviço Social após a formação. Quanto aos cursos de pós-graduação, identificamos que os egressos buscam principalmente as especializações, as quais são majoritariamente na modalidade a distância.
Palavras-chave: Formação Profissional; Egressos; Serviço Social; Pós-graduação.
ABSTRACT: The article debate on vocational training and graduate school in Social work from the perspective of the graduates in the State of Amazonas. The research was documentary and field literature, with interviews in Parintins, Itacoatiara and Maués, Coari, revealing the alternatives of graduates in Social work after training. As for postgraduate courses, we identified that the graduates seek primarily specializations, which are mostly in remote mode.
Keywords: Vocational training; Graduates; Social Work; Postgraduate Studies.
1. INTRODUÇÃO
O debate sobre a formação profissional e o período após a graduação é
indispensável para o Serviço Social. É fundamental compreender a formação a partir das
dimensões do projeto profissional construído coletivamente na década de 1990, numa
perspectiva que forme profissionais aptos para atuar frente as refrações da questão social e,
ainda, capazes de atender as demandas do mercado de trabalho enquanto profissionais
qualificados.
1 Acadêmica de Serviço Social pela Universidade Federal do Amazonas. E-mail: [email protected]. 2 Assistente Social, Professora Adjunta do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do
Amazonas, Doutora em Sociedade e Cultura na Amazônia. E-mail: [email protected]
O objetivo deste artigo é discutir a formação profissional no interior do Estado do
Amazonas e as alternativas que os egressos em Serviço Social encontram para qualificar-se
após a graduação. Tal discussão surge a partir do projeto de iniciação científica “O elo entre
formação profissional e mercado de trabalho sob a ótica dos egressos em Serviço Social no
interior do Estado do Amazonas” desmembrado de um projeto maior sobre “Formação
Profissional do Assistente Social no Estado do Amazonas” financiado pelo Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), conduzido pelo Grupo de Pesquisa
Estudos de Sustentabilidade, Trabalho e Direitos na Amazônia (ESTRADAS), que realizou
pesquisa nos munícipios de Coari, Itacoatiara, Manaus, Maués e Parintins, compreendendo a
formação a partir de entrevistas realizadas com: docentes, discentes, egressos, tutores e
coordenadores de curso de Serviço Social. Para recorte desta discussão, trazemos algumas
reflexões construídas a partir das entrevistas realizadas com os egressos em Serviço Social
formados nas diversas instituições de ensino do interior do Estado do Amazonas.
2. A FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL NO AMAZONAS: A ROTA DO
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL DO AMAZONAS
A primeira Escola de Serviço Social em Manaus foi fundada oficialmente em 1941 a
partir da necessidade de corpo técnico especializado em “problemas” e com “técnicas” para
atuar no âmbito do Juízo de Menores. Antecedente à criação da escola, em 1939, havia um
grupo de estudos voltados aos problemas sociais que se reunia no Círculo Operário, fundado
por André Vidal de Araújo com o objetivo de atender as organizações dos trabalhadores em
relação à sindicalização preconizada pelo Ministério do Trabalho (MONTENEGRO, 1986).
Em 1940, a Escola de Serviço Social passa a funcionar no Círculo Operário sendo
oficializada em 15 de janeiro de 1941, com suas atividades em salas cedidas do Grupo Escolar
Marechal Hermes, mais tarde funcionando no prédio da Justiça Tutelar de Menores e
posteriormente a prefeitura cede um terreno na Avenida Getúlio Vargas e com os recursos
advindos da própria escola construiu-se um prédio que passou a abrigar definitivamente a
escola no centro de Manaus (MONTENEGRO, 1986). Seu reconhecimento deu-se em 14 de
janeiro de 1945 – decreto lei nº 1.412 – e pelo governo federal somente em 1957 – decreto nº
41.463 (COSTA, 1999).
De acordo com Costa (1999), o contexto amazonense em que emerge o Serviço
Social é circunscrito pela imigração, transpassado por revoltas na região Norte como a
Cabanagem que contribuiu para o aumento no número de desemprego na cidade de Manaus,
e pelo mercado da borracha que estava em ascensão. Com isso, agravam-se os problemas
na área social, com destaque ao acréscimo no número de crianças e adultos em situação de
rua.
Para André Araújo, fundador da Escola de Serviço Social de Manaus, a função do
Serviço Social seria a de remediar ou mesmo evitar os problemas sociais emergentes. Para
tal, o Serviço Social deveria carregar uma formação voltada para o conhecimento do homem
e da sociedade, através de métodos próprios. Conforme Ferreira (2007), André Araújo atuou
entre os anos de 1930 e 1970 no cenário intelectual e político do Amazonas, organizando
obras assistenciais. André Araújo entende que cabe ao Estado a solução para os problemas
sociais, considerando necessária a intervenção por meio da ação cristã associada à ação
política. Atuando no parlamento, André Araújo propôs o Código de Menores no Brasil como
resposta a algumas demandas sociais (FERREIRA, 2007).
Segundo Silva e Stampa (2011), na década de 1940 organizam-se as primeiras obras
relacionadas à assistência social atreladas à fundação da primeira escola de Serviço Social:
André Araújo fundou programas sociais, tais como o Instituto Montessoriano Álvaro Maia, o Laboratório Pedagógico de Cultura Infantil Araújo Filho e a Oficina do Serviço Social do Amazonas. Organizou ainda a Cruz Vermelha do Amazonas, o Conselho de Assistência e Proteção aos Menores, a Creche Circulista Menino Jesus, o Instituto Melo Mattos, para meninos abandonados, o Instituto Maria Madalena, para meninas abandonadas, a Escola José do Patrocínio, para menores jornaleiros, o Serviço Social de Mães Solteiras e 72 escolas de alfabetização no interior do Amazonas (SILVA e STAMPA, 2011, p. 59).
Desta forma, Silva e Stampa (2011) destacam que a atuação do Serviço Social está
ligada às demandas das políticas paternalistas do governo Vargas, com ações assistenciais
atreladas ao clientelismo3, favorecendo a manutenção da pobreza e criando uma relação de
dependência do trabalhador com o Estado.
Montenegro (1986) salienta outros aspectos fundamentais para o Serviço Social no
Amazonas: estabelecer bases para a legislação federal na área social; princípios morais que
deveriam vir antes da administração do Serviço Social das esferas governamentais;
coordenação e supervisão do financiamento recebido; coordenação em nível nacional das
atividades de Serviço Social.
A base ideológica do Serviço Social amazonense não divergia da base nacional do
Serviço Social. Para André Araújo, a doutrina cristã daria coerência ao Serviço Social, visando
à conservação da dignidade da pessoa humana. Para o fundador da escola de Serviço Social
em Manaus, o caos instaurado na cidade de Manaus advinha do liberalismo, das ideias
3Forma de expropriação do direito do trabalhador, implicando na dificuldade de acesso aos direitos
sociais imposta por um distribuidor que faz uso dos recursos ou processos para fazê-lo (FALEIROS, 1997).
contrárias à fé, da ânsia sobre os lucros e da decadência das instituições sociais. Por
conseguinte, apoiado à doutrina cristã e às bases científicas, o Serviço Social deveria contar
com o apoio do Estado para solucionar os problemas sociais (MONTENEGRO, 1986). Através
da linha teórica positivista, a escola de Serviço Social passa a formar alunos com intuito de
“normatizar” a vida dos indivíduos (COSTA, 1995). Conforme Lima e Vallina (2017), é possível
identificar também a influência do higienismo na formação dos primeiros assistentes sociais
no Amazonas, o que pode ser exemplificado pela presença de disciplinas voltadas aos temas
de saúde.
O curso de Serviço Social contava com a duração mínima de dois anos, tendo como
critério de seleção dos alunos seu nível cultural e formação moral. Após a formação, os
profissionais estariam aptos para atuar em instituições públicas e privadas (MONTENEGRO,
1986).
Ao longo dos dois anos de curso, as matérias eram divididas da seguinte forma:
1º ano 2º ano
Sociologia; Psicologia Social e Pedagogia Social; Biologia Aplicada à Educação; Higiene; Estatística; Economia Política e Social; Direito;
Psiquiatria; Puericultura; Nutrição; Psicotécnica; Prática do Trabalho Social; Enfermagem;
Quadro 1 – Disciplinas ofertadas no curso de Serviço Social em Manaus (1941).
Fonte: Adaptado de MONTENEGRO, 1986.
Montenegro (1986) ressalta que não há registro oficial do currículo, porém ao analisar
os documentos da Escola de Serviço Social consta um curso que teria duração de três anos,
posto que o último ano seria de especialização nas áreas de família, menores, medicina social
ou trabalho.
Para ingresso na instituição seria necessário: 18 anos completos, curso secundário
ou equivalente (atualmente poderia ser entendido como ensino médio), comprovar idoneidade
moral, atestado de sanidade física e mental, e, para o sexo masculino, certidão de alistamento
militar (MONTENEGRO, 1986).
O curso era oferecido de modo gratuito e contava com um corpo docente voluntário.
Embora a escola recebesse doações, apenas em 1948 a escola passaria a ocupar um prédio
próprio e somente em 1956 começaria a remunerar o corpo docente. A Escola de Serviço
Social foi incorporada à atual Universidade Federal do Amazonas (UFAM) em 1968.
Até a década de 1980, a UFAM é única instituição formadora de assistentes sociais
em Manaus. Contudo, a partir da década de 1990, as primeiras instituições privadas passam
a ofertar o curso de Serviço Social, aumentando consideravelmente o número de vagas.
Conforme Lima (2017), em 1998 o Centro Universitário do Norte abre as primeiras vagas para
o curso de Serviço Social. A presença da graduação em Serviço Social nas IES privadas
ganha força nos anos 2000, possibilitando o aumento no número de discentes e egressos em
Serviço Social. No Amazonas, conforme os dados do Cadastro do Ministério da Educação (e-
mec) consultado no primeiro semestre de 2019, 31 instituições possuem autorização para
ofertar o curso de Serviço Social, destas, em consulta ao endereço eletrônico das instituições,
26 oferecem o curso de Serviço Social, disposto nas modalidades de ensino regular-
presencial, semipresencial e ensino a distância, tanto na capital Manaus quanto no interior do
Estado do Amazonas.
3. UM BREVE HISTÓRICO DAS MUDANÇAS NAS DIRETRIZES CURRICULARES: OS
CAMINHOS QUE GUIAM A FORMAÇÃO
No I Congresso Pan-Americano em 1945, as discussões em torno da formação
profissional sinalizam questões como a regulamentação da profissão e a luta para o
reconhecimento profissional. No II Congresso Pan-Americano de 1949 pede-se uma
adaptação do Serviço Social à realidade brasileira, buscando a reformulação do currículo de
maneira a abranger aspectos relativos à economia, sociologia, pesquisa social, planejamento,
entre outros, reforçando as características técnicas da profissão, sem desvincular-se da Ação
Social. O primeiro currículo de Serviço Social é regulamentado em 1953, por meio da Lei 1889
de 13 de junho de 1953.
A partir da década de 1960, conforme Silva (2002), o Serviço Social passa pelo
Movimento de Reconceituação levando a sua prática profissional a um caráter de
cientificidade imposto pela ideologia desenvolvimentista do país. O Projeto Profissional de
Ruptura é identificado a partir de 1970, tornando-se significativo na década de 1980, na Escola
de Serviço Social da Universidade Católica de Minas Gerais. Esta desenvolve uma alternativa
ao tradicionalismo da profissão, atrelada às preocupações de cunho teórico-metodológico
direcionadas às classes subalternas. Desta forma, o “Método de Belo Horizonte” dá os
primeiros passos em relação à ruptura.
Castro e Toledo (2012) destacam que a partir da década de 1980 inicia-se o processo
de reforma curricular do Serviço Social, o qual leva em consideração o contexto histórico das
transformações no país. A aproximação do Serviço Social com o marxismo indica o caráter
de ruptura, momento em que o serviço social apoia-se mais na ciência e na racionalidade
formal (SILVA, 2002).
Em 1979, a Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS) realiza o
XXI Convenção Nacional da ABESS que teve como tema a “Proposta de reformulação do
currículo mínimo” no qual envia um documento ao Conselho Federal de Educação – CFE,
aprovando em 1982 o currículo mínimo em Serviço Social. O currículo mínimo aprovado em
1982 pelo Ministério da Educação representa, para Iamamoto (2014), o momento de
transição, pois nele o Serviço Social volta-se para a história, a teoria e a metodologia do
Serviço Social, o que representou um enorme desafio introduzindo a política social no âmbito
acadêmico quando amarra o exercício profissional às políticas públicas. A partir de 1987, a
ABESS conta com o apoio do Centro de Documentação e Pesquisa em Política Social e
Serviço Social – CEDEPSS, órgão que tem a função de estimular a pesquisa na graduação e
pós-graduação (ABESS, 1997).
Na XXIX Convenção Nacional da ABESS, realizada em 1995, elaborou-se a nova
Proposta Básica para o Projeto Profissional de Formação Profissional, incluindo novos
pressupostos, diretrizes, metas e novos núcleos de fundamentação teórica, desenhando um
novo currículo de Serviço Social. Em 1996, a ABESS muda sua nomenclatura para
Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social – ABEPSS, buscando vincular
ensino, pesquisa e extensão a partir das novas propostas de Diretrizes Gerais para o Curso
de Serviço Social, aprovado no mesmo ano.
A década de 1990 revela as transformações no processo de produção e reprodução
da vida social aliadas à reestruturação produtiva. Os pressupostos que se inserem na
formação profissional compreendem a nova configuração da divisão sociotécnica do trabalho,
na qual o assistente social está inserido. O currículo mínimo estipulado pela ABESS
organizava-se da seguinte forma:
Matérias Básicas Atividades Indispensáveis integradoras do currículo
Acumulação capitalista e desigualdades sociais; Administração e planejamento em Serviço Social; Antropologia; Ciência política; Direito; Economia política; Ética profissional; Filosofia; Formação sócio-histórica do Brasil; Fundamentos históricos e teórico-metodológicos do Serviço Social; Pesquisa em Serviço Social; Política social; Processo de trabalho do Serviço Social; Psicologia; Sociologia.
Estágio supervisionado; Trabalho de conclusão de curso.
Quadro 2 – Currículo mínimo a partir da diretriz curricular (1996).
Fonte: Adaptado de Caderno ABESS (1997).
A carga horária passa a ser de 2.700 horas com duração na média de 4 anos. A
respeito do Trabalho de Conclusão de curso, a lógica curricular de 1996 torna-o exigência
para obtenção do diploma de graduação em Serviço Social. O Estágio Supervisionado é
incluído como atividade curricular obrigatória, tendo como característica a inserção do
discente no espaço socioinstitucional, visando capacitá-lo para o exercício profissional,
estabelecendo a relação entre professor supervisor e pelo profissional em campo, tendo como
carga horária mínima de 15% do total do curso. A carga horária complementar deve
incorporar: palestras, monitoria, extensão, iniciação científica, seminários, entre outros,
definidos pelo plano de curso das instituições.
A partir do Parecer CNE/CES 492/2001 aprovado em 3 de abril de 2001 pelo
Ministério da Educação (MEC), as diretrizes curriculares estabelecem que o perfil profissional
do assistente social deve ser aquele que atua nas expressões da questão social, formulando
e implementando propostas de intervenção para o enfrentamento da mesma. Apto a promover
o exercício pleno da cidadania, capaz de inserir seus usuários no conjunto das relações
sociais e no mercado de trabalho. Iamamoto (2014) faz sua crítica a esta nova diretriz
curricular, a qual, segundo a autora, descaracteriza a direção da formação profissional que
vinha sendo construída ao longo das décadas anteriores. A legislação estabelece a carga
horária mínima de 3.000 horas.
Na legislação promulgada pela MEC, houve a retirada dos objetivos gerais da
profissão o Código de Ética Profissional como parte constitutiva sobre as competências e
habilidades do assistente social. Para Iamamoto (2014), tal descaracterização fragiliza o
projeto profissional, na medida em que a substituição do item tira das instituições a
responsabilidade quanto ao fortalecimento do Código de Ética da profissão.
Outro aspecto a ser ressaltado nesse projeto é a possibilidade de flexibilidade dos
currículos plenos, assegurada na Lei de Diretrizes e Bases de 1996 (LDB), Lei 9394/1996, por
meio oficinas, seminários temáticos, estágio e atividades complementares. A flexibilização do
ensino abre portas à fragilidade do tripé ensino-pesquisa-extensão, defendido pelos
representantes da categoria profissional.
Dessa forma, a luta pela efetivação das diretrizes curriculares construídas
coletivamente pela categoria segue em processo. Entretanto, não podemos esquecer que
algo que compromete esse processo é a não obrigatoriedade das instituições de ensino em
seguir as Diretrizes Curriculares propostas pela ABEPSS, uma vez que há somente a
obrigação quanto às diretrizes oficiais do MEC, sendo assim, o ensino na graduação abre
brechas para a flexibilização e precarização do ensino superior.
4. CAMINHOS APÓS A FORMAÇÃO: OS EGRESSOS EM SERVIÇO SOCIAL NO
INTERIOR DO ESTADO DO AMAZONAS
A formação profissional não é restrita à graduação nem mera preparação para
ingresso no mercado de trabalho, mas como processo que conduz à construção do perfil
profissional capaz de “responder às exigências de um projeto profissional coletivamente
construído e historicamente situado” (IAMAMOTO, 2002, p. 163). É o embasamento teórico-
metodológico e ético-político que permitirá o desenvolvimento das competências técnico-
operativas. Nesse sentido, compreendemos a formação como processo contínuo, que
extrapola a graduação e pressupõe leituras, inserção em programas de pós-graduação,
participação em encontros, seminários, eventos, momentos de discussão etc.
Para conhecer a continuidade do processo de formação, entrevistamos egressos de
Serviço Social com formação entre os anos de 2006 e 2017, nos municípios de Coari,
Itacoatiara, Maués e Parintins. O acesso aos egressos foi feito através de contato de rede,
indo às instituições de ensino, no campo de trabalho ou mesmo combinando locais acessíveis
aos egressos para realização da entrevista. Tomamos como referência e apoio o Projeto de
Pesquisa intitulado “Formação Profissional do Assistente Social no Estado do Amazonas”,
financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que
alcançou um universo de 323 egressos, entre capital e interior do Amazonas, do qual tomamos
para o presente artigo um universo de 132 egressos. A pesquisa foi realizada com apoio do
Grupo de Pesquisa Sustentabilidade, Trabalho e Direitos na Amazônia (ESTRADAS) que
realizou viagens aos municípios do interior do Estado para a aplicação dos formulários nos
municípios, o que propiciou um maior alcance no número de egressos entrevistados. Para
situar a localização da pesquisa, fizemos um levantamento no Cadastro do Ministério da
Educação (e-mec) dos municípios que têm a oferta do curso do Serviço Social em todo o
Estado e identificamos, no mapa abaixo, aqueles onde houve a realização da pesquisa:
Mapa 1 – Municípios do interior do Estado do Amazonas alcançados pela pesquisa. Fonte: Adaptado por GAMA, 2018.
Importante ressaltar que, após a pesquisa de campo, um levantamento mais recente
revela o constante aumento no número de instituições aptas a atuar conforme o E-MEC, tendo
em vista a prevalência de instituições que ofertam o curso na modalidade a distância e sua
expansão pelos municípios do interior do Estado do Amazonas.
Como resultado da pesquisa podemos destacar que, após a graduação em Serviço
Social, os egressos sentiram a necessidade de continuidade da formação profissional,
compreendendo a importância da pós-graduação lato e stricto sensu, não somente como
complementar à formação, mas como requisito para manter-se no mercado de trabalho.
Entre os egressos entrevistados foi possível levantar que 59% procuraram
especialização, mestrado ou doutorado após o curso de graduação. Os cursos de pós-
graduação a distância são regulamentados pelo MEC (BRASIL. Decreto Nº 9.057 de 25 de
maio de 2017), na modalidade lato sensu e na modalidade stricto sensu – esta deve ser
recomendada pela Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES),
consequentemente a maior incidência na procura dos cursos de pós-graduação encontra-se
principalmente nos cursos de especialização, tendo como menor demanda o doutorado. Dos
egressos que buscaram a pós-graduação, 87% cursaram especialização, 12% mestrado e
1% doutorado.
São poucas as instituições que ofertam os cursos de pós-graduação na modalidade
presencial. Portanto, as especializações ocorrem principalmente por meios dos polos a
distância. As principais áreas de escolhidas pelos egressos no interior do Estado do
Amazonas são: Gestão e Planejamento (38%); Saúde (20%); Educação (14%); Políticas
Públicas (13%); Sociojurídico (10%); Assistência (2%) e outros (3%). Tais áreas são
justificadas por suas razões principais: a) oferta existente por parte das instituições de ensino;
b) necessidade de conhecimentos e habilidades para a inserção profissional ou para o
desenvolvimento do trabalho profissional.
As áreas de formação buscadas nos revelam estreita relação com as políticas
sociais, por meio das quais os assistentes sociais têm a possibilidade de viabilizar os direitos
dos usuários. Não podemos desconsiderar que o Art. 4º da Lei Federal n° 8662/1993 prevê
que é competência do assistente social a elaboração, implementação, execução e avaliação
das políticas sociais, bem como a elaboração, coordenação, execução e avaliação de planos,
programas e projetos sociais. Nesse sentido, a formação buscada atende a lei de
regulamentação da profissão, como também o Código de Ética Profissional que reconhece o
aprimoramento profissional como um dos direitos do assistente social.
As instituições de ensino que ofertam os cursos de pós-graduação entre os
pesquisados totalizam 29, entre instituições públicas e privadas. Grande parte destas são
instituições que ofertam os cursos na modalidade lato sensu. A Resolução CNE/CES Nº 1 de
3 de abril de 2001 (BRASIL, 2001), que dispõe sobre os cursos de pós-graduação, define em
seu art. 1º que os cursos de pós-graduação stricto sensu são aqueles que ofertam as
modalidade de mestrado e doutorado, que dependem da autorização prévia da Câmara de
Educação Superior do Conselho Nacional de Educação e da avaliação da Fundação
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), tendo a
obrigatoriedade de realizar provas e atividades presenciais. No art. 6º, o Ministério da
Educação (MEC) define que as pós-graduações na modalidade lato sensu são ofertadas por
instituições de ensino superior ou instituições credenciadas, que independem de autorização,
reconhecimento e renovação, devendo atender as normativas da resolução do MEC.
A pesquisa, ao mesmo instante em que nos sinaliza a busca de continuidade do
processo de formação por parte dos egressos, também nos evidencia os limites da política de
educação no interior do Estado do Amazonas, visto que o acesso às instituições que ofertam
os cursos de pós-graduação presencial no interior do Amazonas é limitado, tornando as
especializações lato sensu as principais alternativas de formação para os profissionais. Os
limites da política pública de educação não dizem respeito apenas à pós-graduação, já que
há somente uma instituição que oferta o curso de graduação em Serviço Social na modalidade
presencial, a qual é pública e está localizada no município de Parintins. Com isso, a graduação
na modalidade semipresencial e a distância acaba se impondo, dada a falta de alternativas
públicas para o acesso ao ensino superior.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao contextualizar a formação no Amazonas e debater sobre sua continuidade após
a graduação, notamos que o ensino a distância cresce e se fortalece diante da realidade dos
municípios interioranos. A precarização do ensino é percebida diante dos nossos olhos; a
ampliação do número de vagas nem sempre vem acompanhada de qualidade do ensino. O
projeto de formação profissional proposto pela Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa
em Serviço Social não vem andando de mãos dadas com a maioria das instituições de ensino
presentes no interior do Amazonas.
Os limites da formação profissional no interior do Estado do Amazonas estão ligados
principalmente à distância entre os municípios, que corroboram para a proliferação do ensino
a distância em Serviço Social. Junto com este, a formação profissional de qualidade é
fragilizada pelas instituições que, ainda que universitárias, têm dificuldade de promover a
indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensão. Tais restrições se devem à falta de
estrutura e recursos, ou mesmo pela falta de interesse das instituições privadas.
Com a prevalência das instituições de ensino privadas, sobretudo na modalidade
semipresencial e a distância, tanto na formação graduada quanto pós-graduada, aos egressos
são restritas as alternativas para a continuidade da formação profissional. Aqueles que
fizeram mestrado ou doutorado precisaram se deslocar à capital do Amazonas ou a outras
unidades da federação.
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