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FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES Mestrado Acadêmico em Saúde Pública EVELYN SIQUEIRA DA SILVA A SAÚDE DO CAMPO E O PROCESSO DE TRABALHO DA EQUIPE DE SAÚDE DA FAMÍLIA RECIFE 2017

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FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ

INSTITUTO AGGEU MAGALHÃES

Mestrado Acadêmico em Saúde Pública

EVELYN SIQUEIRA DA SILVA

A SAÚDE DO CAMPO E O PROCESSO DE TRABALHO DA EQUIPE DE SAÚDE

DA FAMÍLIA

RECIFE

2017

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Evelyn Siqueira da Silva

A SAÚDE DO CAMPO E O PROCESSO DE TRABALHO DA EQUIPE DE SAÚDE

DA FAMÍLIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado

Acadêmico em Saúde Pública do Instituto

Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz,

para obtenção do grau de mestre em Ciências.

Orientadora: Drª Idê Gomes Dantas Gurgel

Coorientadora: Drª Paulette Cavalcanti Albuquerque

Recife

2017

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Catalogação na fonte: Biblioteca do Instituto Aggeu Magalhães

S586s

Silva, Evelyn Siqueira da.

A saúde do campo e o processo de trabalho da equipe de saúde da

família / Evelyn Siqueira da Silva. — Recife: [s. n.], 2017.

128 p.: il.

Dissertação (Mestrado Acadêmico em Saúde Pública) - Instituto

Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz.

Orientadora: Idê Gomes Dantas Gurgel; coorientadora: Paulette

Cavalcanti Albuquerque.

1. Saúde da População Rural. 2. Trabalho. 3. Atenção Primária á

Saúde. 4. Estratégia Saúde da Família. I. Gurgel, Idê Gomes Dantas. II.

Albuquerque, Paulette Cavalcanti. III. Título.

CDU 331.47

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EVELYN SIQUEIRA DA SILVA

A SAÚDE DO CAMPO E O PROCESSO DE TRABALHO DA EQUIPE DE SAÚDE

DA FAMÍLIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado

Acadêmico em Saúde Pública do Instituto

Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz,

para obtenção do grau de mestre em Ciências.

Aprovado em: 29/05/2017.

BANCA EXAMINADORA

____________________________________

Profa. Dra. Idê Gomes Dantas Gurgel

InstitutoAggeu Magalhães – FIOCRUZ

____________________________________

Profa. Dra. Kátia Rejane de Medeiros

InstitutoAggeu Magalhães – FIOCRUZ

____________________________________

Profa. Dra. Cynthia Maria Barboza do Nascimento

Instituição Universidade Federal de Pernambuco

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Dedico este trabalho à meus pais e irmãs que me inspiram e fortalecem.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por me dar força na caminhada, por me levantar nos

momentos difíceis de desânimo e mostrar que tenho a força necessária para fazer tudo o que

quero na vida.

Agradeço aos meus familiares (Antonio Alves, Rosalia Siqueira, Gisele Siqueira e Erika

Siqueira) que sempre estão ao meu lado para o que eu precisar e torcem pela minha evolução

pessoal e profissional. Aos amigos do Coletivo Grão de Saúde do Campoqueconstroem um fazer

diferente na saúde do campo e da cidade e por isso estão na minhatrajetória de luta e vida. As

pessoas que militaram junto a mim no movimento estudantil de fisioterapia e da residência

multiprofissional em saúde, pois muitas das escolhas que faço hoje foi e são consequência de

encontros tão ricos que me ajudaram a analisar o mundo com suas relações. Ao meu

companheiro Marcelo Santos e aos amigos Luana Rotolo, Sémares Vieira, Ana Carolina,

Fernanda, Dara Andrade, Marina Fenício, Luiza Maretto, Denyse Gonzalez, César, João

Tragtenberg, Lenna Menezes, Conceição Araújo, Joicy Andreia Paiva, Cibelle Brandão, Karla

Viana, Juliana Rodrigues que diretamente ou indiretamente nesses dois anos foram meu porto

seguro nos momentos difíceis, me escutaram, apoiaram e impulsionaram a frente.

Gostaria de agradecer principalmente a Profa Dra Idê Gurgel, Profa Dra Paulette

Cavalcantti que pacientemente me orientaram nesse processo. Também agradeço às pessoas que

aceitaram participar da pesquisae acolheram a proposta ajudando a realizar o presente estudo

com êxito.

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“Não há utopia verdadeira fora da tensão entre a denúncia de um presente tornando-se cada

vez mais intolerável e o anúncio de um futuro a ser criado, construído, política, estética e

eticamente, por nós, mulheres e homens.”

Paulo Freire

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SILVA, Evelyn Siqueira da. A saúde do Campo e o processo de trabalho da Equipe de

Saúde da Família. 2017. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Saúde Pública) - Instituto

Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz, Recife, 2017.

RESUMO

O campo foi, historicamente, negligenciado em relação às políticas públicas. Na saúde não foi

diferente, pois é no campo que encontramos as piores condições de saúde e de vida. Com a

implantação do SUS e a expansão da Estratégia de Saúde da Família se aumentou a oferta de

serviços de saúde nas áreas do campo. Entretanto, por ser uma população marcada por

singularidades sociais, culturais e de modelo produtivo, necessitam de um trabalho que

respondam às necessidades e características socioculturais da área e por isso foi construída a

Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, da Floresta e das Águas.

Portanto, é necessário entender como se dá o processo de trabalho das Equipes de Saúde da

Família (EqSF) e como elas se organizam de acordo com as especificidades da população do

campo para melhorar o cuidado ao usuário. O objetivo da pesquisa foi analisar o processo de

trabalho das EqSF que atuam junto à população do campo. Para tal, foram desenvolvidas 3

etapas de coleta de dados, sendo: análise documental, observação participante com registro no

diário de campo e entrevistas. As entrevistas foram realizadas com 8 profissionais da EqSF do

campo e 3 gestores da saúde do município de Caruaru. A análise das informações foi

desenvolvida através da análise do conteúdo. Os resultados apontam que os profissionais

identificam algumas especificidades do campo como a difícil mobilidade, a falta de água que

dificulta a agricultura, a superexploração do trabalho. Eles também relatam a existência de

rezadeiras (benzedeiras) na área, porém não possuem um diálogo que integre ou fortaleça essas

práticas no território. Já em relação ao uso de plantas medicinais, demonstram uma

aproximação com o tema. O cenário analisado também se mostra com potencial para a mudança

já que a academia através da Residência de Saúde da Família com ênfase no campo, (prima,

tenta organizar melhor esse último parágrafo) os movimentos sociais representado pelo MST

se fazem presente na área e abertos à construção de novas formas de fazer saúde.

Palavras-chave: Saúde Rural. Trabalho. Atenção Primária á Saúde.

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SILVA, Evelyn Siqueira da. Rural health and the family health team work process.2017.

Dissertation (Academic Masters in Public Health) – Instituto Aggeu Magalhães, Fundação

Oswaldo Cruz, Recife, 2017.

ABSTRACT

The rural zone historically has been neglected in relation to public policies. In health it was not

different, because it is in the countryside that we find the worst health and life conditions. With

the implementation of the SUS and the expansion of the Family Health Strategy, the supply of

health services in the rural areas has increased. However, because they are a population marked

by social, cultural and productive singularities, they need a work that responds to the socio-

cultural needs and characteristics of the area and for that reason the National Policy of Integral

Health of the Populations of the Field, Forest and Waters. Therefore, it is necessary to

understand how the Family Health Teams (EqSF) work process takes place and how they are

organized according to the specificities of the rural population to improve care for the user. The

objective of the research was to analyze the work process of the EqSF that work with the rural

population. For this, 3 stages of data collection were developed: documentary analysis;

Participant observation with recording in the field diary and interviews. The interviews were

carried out with 8 people from the EqSF of the field and 3 health managers from the

municipality of Caruaru. The analysis of the information was developed through content

analysis. The results indicate that the professionals identify some specificities of the field such

as difficult mobility, lack of water that hinders agriculture, and overexploitation of work. They

also report the existence of prayer mongers (healers) in the area, but they do not have a dialogue

that integrates or frees these practices in the territory. In relation to the use of medicinal plants,

they show an approximation with the theme. The analyzed scenario also shows how potential

for change since the academy through the Family Health Residency with emphasis in the field,

the social movements represented by the MST are present in the area and open to the

construction of new ways of doing health.

Keywords: Rural Health. Work. Primary Health Care.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Lista as Doenças relacionadas ao saneamento básico deficitário................. 29

Figura 2 Mapa referente ao município de Caruaru...................................................... 42

Figura 3 Mapa referente às equipes de Saúde da Família de Caruaru......................... 42

Figura 4 Fluxograma da coleta de dados dos documentos de gestão.......................... 44

Figura 5 Fluxograma para as entrevistas.................................................................... 46

Figura 6 Mapa referente às equipes de Saúde da Família do campo de Caruaru......... 51

Figura 7 Mapa referente a USF do campo................................................................... 52

Figura 8 Criação de patos........................................................................................... 56

Figura 9 Plantação de milho....................................................................................... 56

Figura 10 Mandala de plantas medicinais e hortaliças de Normandia em 2015........... 59

Figura 11 Centro de Formação de Normandia ............................................................ 59

Figura 12 Criação de aves............................................................................................. 61

Figura 13 Plantio de Palma........................................................................................... 62

Figura 14 Cisternas na comunidade.............................................................................. 63

Figura 15 Cisterna na comunidade............................................................................... 63

Figura 16 Plantas do quintal de uma usuária da USF do campo estudada.................... 73

Figura 17 Fluxograma do acolhimento e agendamento da USF do campo.................. 94

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Distribuição dos documentos analisados por município........................ 45

Quadro 2 Modo de abastecimento de água, coleta de lixo e saneamento básico

do território da USF do campo no município de Caruaru......................

53

Quadro 3 Situação do saneamento do município de Caruaru em 2015................. 54

Quadro 4 Economia local, equipamentos Sociais e Transporte do território da

USF do campo no município de Caruaru...............................................

57

Quadro 5 Frequência de palavras chaves relacionadas com a cultura e a vida nos

documentos da Gestão de Caruaru.........................................................

74

Quadro 6 Frequência de palavras chaves (Rural ou campo) nos Documentos da

Gestão de Caruaru................................................................................

77

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AB Atenção Básica

ACS Agente Comunitário de Saúde

AI Apoio Institucional

APS Atenção Primária aà Saúde

CNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde

DNERu Departamento Nacional de Endemias Rurais

EPS Educação Permanente em Saúde

ESF Estratégia Saúde da Família

EqSF Equipe de Saúde da Família

FUNRURAL Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural

MST Movimento Sem terra

NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família

PAS Plano Anual de Saúde

PET Programa de Educação pelo Trabalho

PIASS Programa de Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento

PITS Programa de Interiorização do Trabalho em Saúde

PMS Plano Municipal de Saúde

PNAB Política Nacional de Atenção Básica

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNSIPCFA

Política Nacional de Saúde Integral das populações do Campo das Florestas e

das Águas

PSF Programa de Saúde da Família

RAG Relatório Anual de Gestão

RT Relatório de Territorialização

SIAB Sistema de Informação da Atenção Básica

SUS Sistema Único de Saúde

UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

USF Unidade de Saúde da Família

UPE Universidade de Pernambuco

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................... 15

2 OBJETIVOS............................................................................................... 19

2.1 Objetivo geral............................................................................................. 19

2.2 Objetivos específicos................................................................................... 19

3 REFERENCIAL TEÓRICO..................................................................... 20

3.1 A vida no campo......................................................................................... 20

3.1.1 Campesinato Brasileiro................................................................................ 20

3.1.2 Cultura e o campo........................................................................................ 22

3.2 Para entender a Saúde do Campo............................................................. 25

3.3 Trajetória da luta por Saúde do Campo.................................................. 30

3.4 Atenção Primária à Saúde e Equipe de Saúde da Família..................... 33

3.5 Trabalho em Saúde.................................................................................... 37

4 PERCURSO METODOLÓGICO............................................................. 41

4.1 Desenho do estudo....................................................................................... 41

4.2 Período de coleta......................................................................................... 41

4.3 Área do Estudo............................................................................................ 41

4.4 População do Estudo.................................................................................. 43

4.5 Técnicas de coletas e fontes de dados........................................................ 43

4.5.1 Documental................................................................................................... 43

4.5.2 Observação participante................................................................................ 45

4.5.3 Entrevistas..................................................................................................... 46

4.5.4 Diário de campo............................................................................................ 46

4.6 Análise dos dados........................................................................................ 47

4.7 Aspectos éticos............................................................................................. 47

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................... 49

5.1 Caracterização da população e de suas especificidades.......................... 49

5.1.1 Caracterização do Território......................................................................... 49

5.1.2 O desafio do cultivo da terra e criação de animais........................................ 60

5.1.3 Trabalho e vida............................................................................................. 66

5.1.4 Mobilidade da população.............................................................................. 68

5.1.5 Costumes culturais, religiosos e de autocuidado.......................................... 70

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5.2 Conceito sobre Saúde do Campo............................................................... 74

5.2.1 Conhecendo a Saúde do campo..................................................................... 75

5.2.2 Objetivos do trabalho da saúde do campo e sua implantação....................... 76

5.3 O Processo de Trabalho da Equipe de Saúde da Família do campo...... 77

5.3.1 Objeto de Trabalho........................................................................................ 78

5.3.2 Agentes do Trabalho..................................................................................... 79

5.3.3 Meios de Produção........................................................................................ 81

5.3.3.1 Estrutura física e insumos............................................................................. 81

5.3.3.2 O saber na saúde........................................................................................... 85

5.3.4 Organização do Trabalho.............................................................................. 89

5.4 A interação entre o Trabalho da EqSF e as especificidades da saúde

do campo no Agreste Pernambucano........................................................

100

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES..................................... 106

REFERÊNCIAS......................................................................................... . 110

APÊNDICE A – ROTEIROS DE ENTREVISTAS..................................... 121

APÊNDICE B- TERMO DE CONSENTIMENTO...................................... 122

ANEXO A- Carta de aprovação do Comitê de Ética.................................... 124

ANEXO B- Carta de anuência do município de Caruaru............................. 128

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1 INTRODUÇÃO

O campo é visto socialmente como local tranquilo, de um povo orgulhoso de sua terra e de

suas origens, que respeita a sua cultura e história. Contudo outras características podem ser

observadas na vida da população do campo. No Brasil, essa é uma população marcada por um

histórico de negligências por parte das políticas públicas. Na saúde essa negligência também se

dá, principalmente em relação ao acesso aos serviços, a uma qualidade de serviços para o

público do campo o que consequentemente se reflete em piores indicadores de saúde (SANTOS,

2016; SOARES, 2014; WANDERLEY, 1996).

Para se entender o processo de adoecimento de uma determinada população a saúde coletiva

utilizaa teoria da determinação social da saúde. Essa tem sido utilizada para analisar problemas

de saúde relacionando-os com a forma como essa sociedade se organiza e as relações de poder

estabelecidas nela (BREILH, 2013). Assim, dependendo da organização social, uma

determinada população terá maior probabilidade de sofrer com certos problemas de saúde e não

outros (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014; SOUZA, 2014).

No campo a determinação social da saúde está ligada principalmenteas relações sociais, estas

normalmente são marcadas por uma intensa desigualdade social com patrões concentrando os

meios de produção e os camponeses vendendo a baixos preços sua força de trabalho. Essa

desigualdade econômica influenciou e influencia diretamente nas relações de produção, onde

os trabalhadores se submetem a condições precárias de vida e trabalho, pois não enxergam outra

alternativa para sua subsistência (PEREIRA, 2012).

O Brasil, um dos maiores países em extensão territorial, tem sua agricultura marcada pelo

modelo do agronegócio, que se baseia na distribuição desigual das terras, com latifúndios nas

mãos de poucos, que dessa forma detêm o principal meio de produção (posse da terra) e

determinam o modo de produção no campo. Normalmente, visando aumento da produtividade

com máximo lucro, esse modelo está ligado ao uso de agrotóxicos, maquinários, a monocultura

e a exploração do trabalhador. Esse contexto está ligado diretamente ao processo de

adoecimento no campo, o que tem seevidenciado, entre outros fatores, num aumento do número

de intoxicações e suicídio ligados aos agrotóxicos (BRASIL, 2015; PEREIRA, 2012).

A população do campo, diante das dificuldades vivenciadas no território ao longo do tempo,

vem lutando por seus direitos sociais, e para tal tem se organizado nos movimentos sociais e

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sindicais, tendo como exemplo emblemático as Ligas Camponesas e o Movimento Sem Terra

(MST) (AGUIAR, 2011; BRASIL, 2008; CARNEIRO, 2007; CARNEIRO et al., 2007).

A proposição de ações de saúde para o povo do campo é uma pauta reivindicada pelos

movimentos, tendo sido implementados o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e

Saneamento (PIASS) em 1976 e as Ações Integradas de Saúde (AIS) de 1982. Um marco nessa

luta é a implementação do SUS, pois a partir dele o avanço na saúde foi mais intenso com a

implementaçãodo Programa de Saúde da Família (PSF) de 1994; Programa de Interiorização

do Trabalho em Saúde (PITS) de 2001; além da própria criação do Grupo da Terra em 2005

(AGUIAR, 2011; BRASIL, 2008; CARNEIRO, 2007; CARNEIRO et al., 2007).

O Grupo da Terra, instituído pelo Ministério da Saúde por meio da Portaria nº. 2.460, trouxe

as questões que os movimentos do campo, da floresta e das águas demandavam como

importantes para a saúde do seu povo; e finalmente a criação da Política Nacional de Saúde

Integral das Populações do Campo das Florestas e das Águas (PNSIPCFA) afirmou a

necessidade de um maior olhar da saúde para as necessidades dos povos do campo (AGUIAR,

2011; BRASIL, 2008; CARNEIRO, 2007; CARNEIRO et al., 2007).

A PNSIPCFA foi um marco histórico pelo reconhecimento das necessidades de saúde das

populações do campo. Ela reafirma o compromisso das gestões federais, estaduais, municipais

com a implantação de ações e serviços de saúde conforme as especificidades e necessidades

dessas populações. E assim, se garante a equidade em saúde, reafirmando o cuidado em saúde

igualitário, universal e resolutivo para as populações em situação de vulnerabilidade (BRASIL,

2015).

No que diz respeito aos serviços de saúde no país, estes ainda estão hegemonizados pelo

modelo biomédico, tendo como característica principal a eliminação da doença e a figura central

do médico. Nesse modelo, o foco está no olhar biologicista, que ignora as questões culturais,

ambientais e coletivas.Porém, existe um movimento de embate a esse modelo que se espelha

nos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), tendo como base as ações de promoção,

proteção e recuperação com base em um olhar integral (BACKES et al., 2009).

Ao implantar o SUS, a saúde no Brasil passou a ter três níveis de atenção, a Atenção Primária

à Saúde (APS), Atenção Secundária à Saúde e Atenção Terciária à Saúde, que deveriam atuar

de forma interligada, porém ainda não conseguem se articular efetivamente. A APS no Brasil

também pode ser chamada de Atenção Básica (AB) que traz a ideia de um atendimento mais

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próximo do cidadão, para tal trabalha com um alto grau de descentralização e capilaridade

sendo caracterizada por:

um conjunto de ações, de caráter individual e coletivo, situadas no primeiro nível de

atenção do sistema de saúde, voltadas para a promoção da saúde, prevenção de

agravos, tratamento e reabilitação. Sendo considerada como a porta de entrada ao

sistema de saúde, local onde são identificadas as necessidades em saúde (das pessoas,

suas famílias e comunidade), e onde são coordenadas as respostas a estas necessidades

(BRASIL 2011).

Assim no presente trabalho foi considerado APS e AB como sinônimos já que as duas

nomenclaturas são utilizadas em artigos e documentos oficiais.

A AB traz fundamentos e diretrizes importantes para esse trabalho mais próximo da

comunidade, são eles: território adscrito, acesso universal, relação de vínculo; integralidade;

participação popular. Essas diretrizes possibilitam uma maior proximidade entre Equipe de

Saúde e comunidade propiciando assim um trabalho em saúde mais implicado e efetivo

(BRASIL, 2012).

Com o intuito de promover um olhar mais amplo na saúde, ao priorizar a prevenção e a

promoção da saúde e diminuir o foco no modelo biomédico até então vigente, o Ministério da

Saúde em 2006, reconhecendo o fortalecimento do Programa de Saúde da Família, o renomeia

para Estratégia de Saúde da Família (ESF), afim de fortalecer o seu caráter permanente, e o

colocando como novo modelo de atenção à saúde (ANDRADE; BARRETO; BEZERRA, 2006)

A partir desse processo também foram implantadas muitas Equipe de Saúde da Família

(EqSF) em áreas rurais. Por sua vez, o fazer saúde no cotidiano do campo se mostra um desafio

para os profissionais que precisam se organizar para realizar o trabalho pautado na ESF e AB e

na PNSIPCFA, no que tange suas diretrizes. Dessa forma, é necessário pensartanto o processo

de trabalho bem como sua organização a partir das especificidades desse novo contexto

(BRASIL, 2008; REIS et al., 2007).

A necessidade de um maior olhar sobre as questões da saúde da população do campo é posto

pela dificuldade que essa população sofre em relação à assistência de qualidade e a garantia

desse acesso à saúde. Esse acesso muitas vezes é dificultado por especificidades territoriais,

como tamanho das áreas adscritas e grandes distâncias entre os domicílios e o serviço de saúde;

falta de transporte nesses locais; a não valorização de aspectos culturais no fazer saúde (no uso

de ervas, rezadeiras entre outros), consideração do trabalho na agricultura e suas peculiaridades

como o uso ou não de agrotóxicosnessas práticas (BATISTA; ALBUQUERQUE, 2014). Parte-

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se do pressuposto, portanto, que as equipes de saúde do campo reproduzem o processo de

trabalho realizado nas áreas urbanas, não levando em consideração as diferentes necessidades

que a vida do campo demanda. Entendemos porém que esses fatores devem ser pensados e

considerados para se organizar o trabalho na perspectiva de efetivar a Integralidade e a

Equidade.

Corroborando com este fato, os estudos que analisam o campo sob a ótica do processo de

trabalho da saúde para a população do campo são escassos no país, o que por sua vez está ligado

ao pouco investimento e piores indicadores epidemiológico de saúdereferentes a população do

campo.

Assim, se faz necessário investigar como se dá o processo de trabalho em saúde para

população do campo. Perceber as especificidades do conceito de saúde do campo pelos

profissionais e conhecer como se dáo processo de trabalho das equipes vão nos auxiliar a

responder a questão inicial.O campo é um espaço diferenciado em termos de cultura, trabalho,

modos de perceber e viver a vida. Esses aspectos compõem a determinação social da saúde e,

portanto, precisam ser levados em consideração por profissionais e gestores no que se refere ao

processo de trabalho em saúde na AB nessas áreas.

Dessa forma, este projeto pretende contribuir no debate sobre as questões da melhoria do

serviço de saúde para população do campo, no que diz respeito ao seu processo de trabalho, de

forma que ele tenha relação com o modo de vida e cultura da população.

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2 OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

Analisar o processo de trabalho das equipes de Saúde da Família que atuam no cuidado a

saúde da população do campo.

2.2 Objetivos específicos

a) Identificar as especificidades da população do campo e as percepções da equipe e dos

gestores sobre a saúde do campo;

b) Caracterizar o processo de trabalho da Equipe de Saúde da Família para a população do

campo;

c) Identificar no processo de trabalho da Equipe de Saúde da Família aspectos que levem

em consideração as questões de trabalho, cultura e vida dos moradores do campo.

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3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 A vida no campo

Ter as mãos calejadas do cabo das ferramentas,

Sentir o sol escaldante

e o aço das tormentas,

Regar com meu próprio sangue

a saúde das lavouras,

garantir com meu suor,

grandes safras duradouras,

Obter da terra virgem

total fertilidade,

meu calor, minha coragem,

tragando a tempestade, Assim é que me coloco,

sou poeta, sou posseiro,

neste mundo desafeto,

deste solo brasileiro.

Guerreando o granizo

e o fogo das sanções,

enfrento na minha enxada

a ganância dos patrões [...]

(LONGO,1982)

3.1.1 Campesinato Brasileiro

O texto de Longo (1982) traz características do camponês e aspectos da vida no campo

brasileiro. A força e resistência do trabalhador que tem as mãos calejadas do cabo da enxada e

a esperança que ao cuidar da terra e regar com seu esforço, terá sustento e alimento, porém

também coloca as conflituosas relações de trabalho entre patrão e empregado.

No imaginário social de nosso tempo o campo é associado a uma forma natural de vida, de

paz, inocência e virtudes simples e a cidade, num polo oposto, é imediatamente ligada à uma

ideia de centro de realizações, de saber, comunicações e de luz. Porém, a realidade do campo é

surpreendentemente variada, com modos de produção diferentes que engloba desde as práticas

mais ligadas ao campesinato tradicionais, como os criadores de animais, de pastores,

agricultores, a um modo de produção mais ligado ao modo de organização capitalista, com os

grandes empresários agroindustriais (REDIN, 2011).

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A palavra camponês é compreendida como unidade produtiva camponesa, onde pessoas se

dedicam a uma produção agrícola e artesanal autônoma que, apoiada essencialmente na força e

na divisão familiar do trabalho, é orientada pela satisfação das necessidades familiares de

subsistência, como também mercantiliza parte da produção a fim de obter recursos monetários

para a compra de produtos e serviços que não produz (MAESTRI, 2004).

O núcleo familiar camponês mantém uma posse relativamente estável sobre a terra (meio de

trabalho), mesmo quando não possui sua propriedade. O que lhe permite investir trabalho na

potenciação da rentabilidade da terra e de sua exploração através de técnicas como a drenagem

e a irrigação. A capacidade de potencializar a fertilidade da terra pelo trabalho é um elemento

de fixação do camponês à terra, evitando as migrações do campo para a cidade (MAESTRI,

2004).

A partir dessa fixação no território o campesino traz a forte característica geracional, onde

os saberes do cuidado com a terra e modo de vida é passado de geração em geração, o que lhe

permite construir um saber tradicional. Assim, o campesinato temuma cultura própria, que se

refere a uma tradição tanto de parentesco, como também uma tradição cultural de sua

comunidade (WANDERLEY, 1996).

Muitas famílias camponesas para trabalhar a terra se utilizam da agricultura familiar,

entendida como aquela em que a família, ao mesmo tempo em que é proprietária dos meios de

produção, assume o trabalho no estabelecimento produtivo. O fato de uma estrutura produtiva

associar família-produção-trabalho tem consequências fundamentais para a forma como ela age

econômica e socialmente (OLIVEIRA, 2014). Nesse contexto a terra se coloca como centro de

fixação, de tradição entre gerações, de residência e de trabalho para essa população.

Para se entender como se dá o uso, a posse e a propriedade da terra é necessário estudar a

questão agrária do país e conhecer a natureza socioeconômico do campo. O uso da terra vai

determinar que produtos serão cultivados, para atender a que interesses. A posse da terra

determinam quais pessoas e suas categorias sociais vivem na terra. Já a propriedade é uma

questão de reconhecimento jurídica que garante o direito de uma pessoa sobre o bem no caso a

terra, e o proprietário pode cercá-la e ter absoluto controle sobre ela, impedindo que outros a

ela tenham acesso (STEDILE, 2012).

No Brasil o campesinato foi influenciado intensamente pela própria história da agricultura

brasileira:na época da colônia, importantes famílias portuguesas recebiam terras; a divisão dos

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País nas sesmarias;a dominação econômica, social e política das grandes propriedades

principalmente de café em São Paulo, cana de açúcar no Nordeste e a produção de gado leiteiro

em Minas Gerais; a marca da escravidão que com a abolição deixou todo o povo negro, que

trabalhava na terra, sem terra e foi “libertada” sem fornecer meios à sua subsistência. Essa

concentração de terra na mão de poucos e as grandes desigualdades que ela acarreta, se perpetua

até hoje sob diferentes mecanismos.

No mundo a pobreza e os problemas de saúde são encontrados mais comumente em pessoas

que vivem em áreas rurais e remotas. Essa população tem a característica de ter suas casas

afastadas dos serviços básicos de saúde e educação o que dificulta o acesso dessa população a

esses serviços, além de normalmente essas regiões não disporem de água potável, saneamento

e transporte público o que deixa esses povos em condições precárias de saúde (BATISTA;

ALBUQUERQUE, 2014).

3.1.2 Cultura e o campo

No dicionário, a palavra cultura é definida como um conjunto de hábitos sociais e religiosos,

das manifestações intelectuais e artísticas, que caracterizam uma sociedade. Em relação a

etiologia, do latim cultura, culturae, que significa “ação de tratar”, “ cuidar de algo”, “cultivar”

ou “cultivar a mente e os conhecimentos”. Portanto, a palavra cultura carrega em suas raízes

diversas possibilidades refletidas também de como foi utilizada ao longo dos diferentes séculos.

Até o século XVI, o nome cultura estava ligado a prática agrícola ou de animais (por exemplo

a cultura do milho, cultura de aves); nos séculos XVIII e XVIII, a cultura começa a ter um

sentido mais figurado e ser relativo a um esforço despendido para o desenvolvimento das

faculdades humanas (CANEDO, 2009; CULTURA, 2017).

Na França Iluminista, a cultura foi entendida como algo ligado ao conhecimento, a luz da

instrução intelectual, e essa culturaainda traz sentidos relacionados a uma característica do

gênero humano. Essa visão mais ampla originou o conceito universalista em relação a cultura.

Na mesma época na Alemanha, os príncipes arraigados de conceitos nacionalistas,

correlacionaram o termo cultura a ideia de civilização, de características de um povo, dando

origem ao conceito particularista da cultura (CANEDO, 2009).

Partindo do conceito particularista, entende-se a cultura pela produção subjetiva e social de

valores, símbolos, normas e princípios que fundamentam práticas e costumes de um dado grupo

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social ou nação. Assim, se admite que cada espaço territorial e os sujeitos que nele vivem tem

sua maneira singular de compreender e viver o mundo e que esse conhecimento é passado

através das diferentes gerações (CANEDO, 2009).

Os estudos que observam as culturas das diferentes sociedades ainda sinalizam para as

divisões de tipos de sociedade, como a sociedade primitiva (aquela que teve pouco contato com

outras culturas além da sua) e a sociedade complexa (onde a cultura é permeada por uma

estratificação de classes sociais, diferentes grupos étnicos, segmentos sociais de diversas

orientações religiosas, costumes regionais peculiares), visão essa que pode estar carregada de

juízo de valor sobre culturas “melhores” ou“piores” (LANGDON; WIIK, 2010).

No contexto nacional encontramos uma sociedade complexa constituída pela miscigenação

de culturas indígena, negra e europeia. O povo brasileiro formou uma cultura própria

constituída por elementos desses três povos. Contudo, o equilíbrio dessa formação de cultura

nunca foi favorável para a cultura negra e indígena, já que a cultura europeia sempre possuiu o

poder político, econômico e religioso eassim influencia de forma mais veemente no modo de

vida da população brasileira. Esse fato não impediu que a cultura indígena e africana se

enraizassem de forma marcante e trouxessema sua grande marca para a cultura brasileira.

Entretanto nas sociedades complexas como o Brasil onde diferentes culturas coexistem,

também existe a atribuição de valor para a cultura da classe historicamente dominante, sendo

essa supervalorizada em detrimento das classes subalternas. Esse processo de supervalorização

de apenas um modo de vida para toda uma sociedade se propaga principalmente através da

mídia, que influencia na brusca mudança de valores, substituindo antigos padrões de identidade

cultural por uma homogeneização próprios das culturas de massa (LUZ, 2005).

Essa homogeneização cultural nas populações do campo se reflete em um único ideal de

modo de vida, onde a vida urbana é retratada com glamour, atrelada a qualidade de vida e a

vida do campo é retratada como o modo de vida atrasado, o que leva muitas pessoas trocarem

o campo pelas periferias das grandes cidades. Contudo é necessário pontuar que a questão

cultural é importante mas não a única que determina o êxodo rural pois questões como falta de

investimento de políticas públicas nessa região, o não avanço da reforma agrária também são

fatores importantes nesse processo.

O que toca à saúde, esta detém um poder na sociedade dado por seu saber técnico e científico.

Na saúde pública brasileira já vivenciamos a utilização desse poder na atuação policialesca que

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foi um dos motivosda revolta da vacina no Rio de Janeiro. A rotina do trabalho da saúde que

muitas vezes com um olhar higienista julga os costumes da população sem levar em

consideração suas crenças, imprimindo de forma dura “hábitos corretos” e “hábitos errados”,

sem procurar alternativas dentro do contexto de vida das pessoas, oprimindo e segregando os

indivíduos. E é nesse momento que o profissional inclui no seu fazer profissional seus próprios

valores de mundo, essaconfusão muitas vezes ocorre e é justamente nesse ato que a cultura do

outro é desconsiderada (FOUCAULT, 2012).

Certamente, é coerente e fundamental reconhecer a posição central da cultura na estrutura

do saber-fazer saúde. No que diz respeito principalmente ao autocuidado, a população o

realizareproduzindo práticas ligadas às suas heranças culturais, no Brasil essas heranças podem

ser dividas em medicina tradicional indígena e medicina de origem afro-americana (LUZ,

2005).

A medicina indígena, muito atrelada a interação com a natureza, xamânica ou não-xamânica,

é nativa dos países do continente Americano. São práticas principalmente ligadas a recursos

herbolários, minerais e animais de cada região. Como tem sua maior base no sistema homem-

natureza, a saúde está atrelada ao equilíbrio desse conjunto. O aspecto ligado às

crençasreligiosasna medicina indígena também adentram no cuidado à saúde, já que para essas

culturasmuitas vezes a causa do adoecimento está ligado ao binômio corpo-espírito, que para

eles pode ser afetado por feitiços, mau-olhado, a morte ao redor, entre outros (LUZ, 2005).

A medicina afro-americana é um cuidado marcadamente ligado a religião, foi introduzida

no Brasil através da chegada dos africanos escravos. Os negros, consolidaram seu cuidado com

a saúde com grande enraizamento no uso de ervas e no forte cunho espiritualista que se

manifestava através dos búzios e médiuns. Esses costumes foram transmitidos nas diferentes

gerações e hoje se manifesta através do Candomblé e da Umbanda (LUZ, 2005).

Nesse estudo, preferiu-se denominar os cuidados que a população do campo realiza como

práticas de autocuidado, entendendo que as culturas indígenas e africanas têm uma forte

influência sobre essa população já que historicamente vivenciaram a ausência do cuidado de

saúde fornecido pelo Estado o que fortaleceu as práticas de autocuidado tradicionais. Também

é importante pontuar que não só a cultura indígena e africana fazem parte desse autocuidado

regional, a cultura europeia também influenciou nessas práticas.

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A partir da leitura dos artigos, o presente estudo se apoia no conceito particularista de cultura

e amplia ao entender que cultura diz respeito a um modo de viver e enxergar a vida, de se

alimentar, de realizar suas crenças, de realizar o autocuidado em saúde e o modo de se relacionar

com o outro.

3.2 Para entender a Saúde do Campo

A vida humana é determinada socialmente em todas as suas dimensões, inclusive a da saúde.

Compreender como se dá os processos de adoecimento e como são determinados é uma

necessidade para a saúde pública. A teoria da determinação social da saúde, que fundamentou

o movimento de reforma sanitária na conceituação da saúde de forma ampliada, supera a lógica

reducionista que fragmenta a vida a um modelo rígido de causalidade lineare positivista, dando

novos horizontes à atuação da Saúde Pública (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014; BREILH,

2013).

A partir desse olhar, o modo como a sociedade se organiza para produzir a vida é o aspecto

determinante de análise para o entendimentodo processo saúde-doença. Nessa perspectiva, para

compreender o processo de adoecimento na sociedade é preciso levar em consideração o modo

capitalista de produção e a divisão em classes sociais, pois na sociedade capitalista é vital

promover a exploração de parcelas da população para gerar acúmulo de capital. O resultado

desse processo de organização é uma imensa desigualdade socioeconômica entre as classes

sociais. Ou seja, o que o capitalismo precisa para sobreviver e progredir é exatamente o que

promove as iniquidades de vida entre os segmentos populacionais, e dessa forma influencia

diretamente no processo de adoecimento da população (ANTUNES, 2013).

A fim de diminuir o olhar para a determinação social os determinantes sociais trazem o

discurso de fatores de risco, que reduz o discurso da saúde a responsabilização das vítimas que

deverão encontrar individualmente meios de melhor viver, nas condições dadas pela sociedade

do capital (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014; SOUZA, 2013).

A determinação social da saúde não consiste em compreender apenas que a saúde depende

do acesso aos objetos humanos, mas que as possibilidades de realização do humano, e o acesso

aos produtos necessários para tal, dependem do grau de desenvolvimento das forças produtivas

e das relações de produção estabelecidas em cada formação social (ALBUQUERQUE; SILVA,

2014; SOUZA, 2013).

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Indivíduos pertencentes à parcela da população que detém a posse dos meios de produção

têm possibilidades imensamente maiores de se colocar em condições de desenvolver ao máximo

suas potencialidades, pela maior possibilidade de apropriar-se dos objetos humanos produzidos.

Porém, esses mesmos indivíduos, estando, também, submetidos a relações sociais alienadas,

como ocorre no capitalismo, encontram-se em condições de subdesenvolvimento das

potencialidades obtidas pelo gênero humano (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014).

A ideia dominante, de identificação dos determinantes, é, portanto, insuficiente para

direcionar ações de saúde que contribuam efetivamente para a máxima realização do humano.

Para tal, seria necessário alterar o modo de produção. Assim, a determinação social do ser

humano se faz pela análise do modo de produção, do grau de desenvolvimento das forças

produtivas e das relações sociais estabelecidas (ALBUQUERQUE; SILVA, 2014; RÜCKERT.,

2012).

Ao se fazer o recorte das relações de classes na população do campo, entre os que detêm os

meios de produção e os que só detêm a força de trabalho, poderá observar grandes

disparidadessocioeconômicas.Os que detêm os meios de produção, principalmente aqueles com

posse de grandes lotes de terra (latifundiários), trazem a lógica da obtenção de grandes lucros.

Para tal, exploram a força de trabalho (muitas vezes na informalidade, com carga horária de

trabalho extensivas ebaixos salários), exploram a terra (utilização de agrotóxicos, maquinários

e sementes modificadas) para o aumento da produção (PEREIRA, 2012).

A busca por altos lucros no campo levam a consequências desastrosas, de acordo com dados

do Dossiê sobre os Agrotóxicos da Associação Brasileira de Saúde Coletiva, a população do

campo está potencialmente exposta a substâncias químicas, agentes biológicos físicos e

psicológicos, impactando negativamente nos perfis de morbimortalidade (RÜCKERT, 2012).

O campo e a população que nele vive possuem características e uma cultura própria com

uma dinamização das relações sociais locais e de uma grande capacidade de resistência aos

efeitos desagregadores aos quais estão constantemente confrontados. Sua qualidade está

associada à importância da natureza no espaço do campo e às formas como a vida social é

priorizada, fundadas nos laços de proximidade e na sua capacidade de integração. Entretanto o

campo também é caracterizado pela dispersão da sua população, a ausência do poder público

no seu espaço, a ausência dos bens e serviços naturalmente concentrados na área urbana.

(WANDERLEY, 1996).

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A forma como as relações sociais e de produção se dão nesse contexto podem ser

evidenciadas no processo histórico do campo bem como no processo de adoecimento dessa

população. Ao observar os dados epidemiológicos pode-se notar alarmantes números frutos da

exploração e invisibilidade histórica que esse povo sofreu.

No Brasil, historicamente o campo tem sofrido com a expansão do capital, primeiramente

na mão dos colonizadores europeus e depois pelo capital estrangeiro. As Políticas para o campo

durante esse período foram semprevoltadas para atender a exportação ao invés de priorizar as

necessidades do país. O processo de ‘modernização’ da agricultura, com a industrialização e os

pacotes tecnológicos que vieram com a Revolução Verde, chegouno Brasil com a ditadura

militar aumentando ainda mais a concentração de terra e piorando as condições de vida no

campo, o que por sua vez provocou migrações expressivas do campo para a cidade, já que o

camponês expulso de suas terras passou a buscar melhores condições de vida e de trabalho nas

periferias urbanas (PEREIRA, 2012).

De acordo com os dados do último Censo demográfico de 2010, o Brasil possui 15,6% de

sua população residente em domicílios rurais, uma população numericamente grande, porém se

for comparado esse número com a extensão territorial do país ela é pequena. Comparando as

regiões do país amaior população camponesa está na região nordeste (SOARES, 2014).

Ao analisar a esperança de vida ao nascer em municípios com população predominantemente

camponesa a média é de 71, 93 anos, menor que a apresentada para todo país em 2010 (73, 4

anos) (SOARES; et. al., 2014). Isso demonstra a relação da qualidade dos serviços públicos no

campo o que impacta diretamente na esperança de vida.

Com relação ao analfabetismo, o Censo demográfico de 2010 verificou o percentual de

pessoas que não frequentam a escola na faixa etária compreendida entre 10 e 17 anos, o que se

verificou foi que a árearural apresenta (11, 1%) de pessoas que não frequentam a escolaem

comparação com a população urbana (7, 9%). Fato que demonstra que a população urbana tem

mais acesso a serviços educacionais o que é primordial para um maior autocuidado da

população.

Segundo definição da Unesco (2000 apud LORENZO, 2007):

analfabetismo funcional

como a situação de instrução de alguém que

assina o próprio nome ou é capaz de fazer cál-

culos simples e ler palavras e frases isoladas,

mas não é capaz de interpretar o sentido dos

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textos, não é capaz de usar a leitura e a escrita

para seu desenvolvimento pessoal, nem para

fazer frente às suas demandas sociais.

Assim sendo, a educação é uma ferramenta extremamente útil para combater a pobreza e a

desigualdade, elevar os níveis de saúde e bem estar social, criar as bases para

um desenvolvimento econômico sustentável e a manutenção de uma democracia duradoura.

Questões de extrema importância que interferem na saúde pública são os sistemas de

abastecimento de água e de esgoto das cidades, pois a água não tratada e os depósitos

inadequados sãointimamente ligados a transmissão de várias doenças infectocontagiosas.

Contudo, segundo Food and Agriculture Organization (2013), no campo esses sistemas são

ineficientes e chegam para um número reduzido de pessoas. Esses fatos contribuem para o alto

índice de doenças infectocontagiosas nessas regiões. Abaixo podemos ver algumas doenças

relacionadas a fatores como saneamento básico deficitário (SOARES, 2014).

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Figura 1 - Lista as Doenças relacionadas ao saneamento básico deficitário

Fonte: Heller (1997 apud SOARES, 2014)

O descaso do poder público é evidente, e questões como serviços de coleta de lixo,

escoamento sanitário, iluminação elétrica e água por rede pública ainda são um problema a ser

sanado. Dados mostram que apenas 1,5% das famílias cadastradas no Programa Bolsa Família

residente na zona rural tem acesso aos serviços citados (CAMPELLO; NERI, 2013; SOARES,

2014).

Em relação às questões relacionadas a gênero, o campo apresenta fortes segregações no que

diz respeito ao trabalho e a violência. Podemos visualizar isso ao constatar que, embora a taxa

de analfabetismo entre as mulheres rurais seja levemente inferior que a dos homens, elas

apresentaram renda individual média inferior que a dos homens em todo o período de 1992 a

2009 (SOARES, 2014).

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Se formos observar a área da saúde da mulher do campo, de acordo com o Sistema de

Informação da Atenção Básica (SIAB) em 2015, dentre as gestantes residentes em área rural,

23,5% apresentaram idade inferior a 20 anos. Entretanto as mulheres do campo, quando tem

acesso ao serviço, aderem bem ao pré-natal: 97, 3% das gestantes, residentes em área rural,

acompanhadas pelos Agente Comunitário de Saúde (ACS) estavam com pré-natal em dia.

Também observa-se segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)

suplemento de saúde de 2008, que os partos normais em mulheres residentes em área campo

são mais frequentes do que entre mulheres residentes em área urbana, o que pode estar

diretamente ligado a questões culturais (SOARES, 2014).

Na área da saúde da criança, de acordo com o SIAB em 2011, do total de crianças 10,4%

eram de mães residentes em área do campo e destas 2, 3% foram a óbito com idade até 11 meses

e 29 dias. Os óbitos neonatais - que compreendem a faixa etária de até 27 dias- normalmente

estão relacionadas com condições perinatais, genéticas e anomalias congênitas, já os óbitos de

28 dias a 11 meses e 29 dias estão ligadas àscondiçõessocioeconômicas-ambientais. Um grande

número de óbitos podem ser evitados com boa assistência de saúde na gestação, parto, pós parto

e melhorando as condições de vida ( SOARES, 2014; VICTORIA et al., 2011).

3.3 Trajetória da luta por Saúde do Campo

Ainda hoje, as populações mais invisíveis para as políticas públicas do Estado, são os

camponeses, populações atingidas por barragens, extrativistas, pescadores, ribeirinhos,

quilombolas, indígenas, dentre outras (CARNEIRO et al., 2014). Para modificar essa realidade

o povo camponês lutou por melhores condições de vida ao longo das últimas décadas.

No início do século XX as políticas de saúde chegaram ao campo com ações pontuais que

não traziam grandes mudanças no cenário de saúde, a primeira ação voltada para essa população

foi a Liga Pró-Saneamento do Brasil no ano de 1918. A liga defendia uma reforma sanitária

que ampliasse os serviços de saúde rumo ao interior do país.Em 1956 foi criado o Departamento

Nacional de Endemias Rurais (DNERu), que tinha como objetivo a unificação sob uma

coordenação os diferentes órgãos responsáveis por cada endemia (AQUINO et al., 2014;

BARBOSA JUNIOR et al., 2015; ESCOREL; TEIXEIRA, 2008).

Na década de 1950 ocorre um fortalecimento das lutas no campo com o surgimento da Ligas

Camponesas, porém em 1964 com o Golpe Militar, a repressão à luta dos camponeses por

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melhores condições de vida se intensifica. Em 1974 foi criado o Fundo de Assistência ao

Trabalhador Rural (FUNRURAL), permitindo o acesso de trabalhadores rurais, com carteira

assinada, a um modelo de assistência tipicamente curativa (CARNEIRO, 2007; CARNEIRO et

al., 2007).

Em 1976 foi criado pelo Ministério da Saúde o Programa de Interiorização das Ações de

Saúde e Saneamento e em 1980 o Programa de Ações Integradas de Saúde, de abrangência

nacional que permitiu a construção de Unidades Básicas de Saúde (AGUIAR, 2011; BRASIL,

2008; BÚRIGO, 2010; CARNEIRO, 2007; CARNEIRO et al., 2007).

Como forma de garantir o que preconiza a Constituição Federal de 1988 na direção de se

efetivar as lutas de redemocratização do país nessa década, foi criado um Sistema público e

universal, o Sistema Único de Saúde, tendo como princípios: universalidade, integralidade e

equidade. Com a implementação do SUS equipes de saúdeforam implantadas no território, mais

próximo da população com uma lógica de saúde ampliada, voltada para as necessidades da

população. A população do campo apesar de também ser incluída com essa nova estratégia,

ainda não consegue observar suas necessidades contempladas pelas políticas de saúde criadas

num modelo ainda muito centrado no urbano (CARNEIRO, 2007; MATIELO, 2009).

Com o esforço dos movimentos sociais é instituído o Grupo da Terra criado em 2005,

formado pelo movimento social e gestores a fim de garantir a formulação de políticas públicas

específicas tendo como foco populações prioritárias e que consigam realmente tornar visível as

demandas do campo. Em 2011, foi publicada a Política Nacional de Saúde Integral das

Populações do Campo e da Floresta e das Águas, representando uma grande vitória da luta por

saúde (BRASIL, 2005, 2008; CARNEIRO et al., 2014).

A Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, da Floresta e das Águas

reconhece a dívida histórica do Estado brasileiro com a saúde dessas populações, apresenta a

necessidade de superação do modelo de desenvolvimento econômico e social na busca de

relações homem–natureza responsáveis e promotoras da saúde (CARNEIRO et al., 2014).

Com o estímulo do Grupo da Terra e a pressão de movimentos sociais, o principal avanço,

em termos da saúde para o campo, que o Sistema Único de Saúde apresentou nos últimos anos

foi a expansão da Estratégia Saúde da Família (ESF) para as populações de que trata a

PNSIPCFA, mais fortemente, para assentamentos da Reforma Agrária e de remanescentes de

quilombos (BRASIL, 2008).

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Segundo dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde(CNES), no mês de

referência junho de 2013 no Brasil, a EqSF quilombola/assentados estava implantada em 1.294

municípios totalizando 2.548 equipes nessa categoria. As EqSF estão presentes em todas as

regiões do país, porém mais fortemente na região nordeste (43, 6%). É também na região

nordeste onde se concentra a maior parte dos remanescentes de quilombos (SOARES, 2014).

Em 2013, mês de referência dezembro, a Cobertura populacional (urbana e camponesa)

estimada pelas EqSF foi 56, 37%, são 5.346 municípios atendidos em todo país. Por levar em

consideração o tamanho da população municipal, esta cobertura fica comprometida em grandes

áreas rurais com baixa densidade populacional, situação muito comum no norte do país

(SOARES et al., 2014).

As entidades internacionais também estão preocupadas com a saúde da população do campo

e encontros como o da Cúpula da Terra, realizada em Joanesburgo, África do Sul desenvolveu

um Plano de Ação para a saúde do campo. Já a Conferência Internacional sobre Saúde Rural

realizada em Traralgon, Austrália, ambas realizadas em 2002, vêm propondo estratégias para

melhorar o cuidado a essas populações (WONCA, 2003).

O plano de ação traçado traz alguns apontamentos para a saúde do campo, como: o

compromisso aos cuidados primários de saúde e utilização de recursos de saúde para as pessoas

mais necessitadas; a busca por opções estratégicas para implementar a nível local a

autossuficiência; a integração ensino-serviço para que as pesquisas realizadas na área possam

dar subsídio ao desenvolvimento local; a construção e a valorização de um olhar integral de

todas as profissões da saúde; a garantia de uma distribuição equitativa dos recursos da saúde e

do investimento; garantia de que todas as políticas, processos de planejamento e prestação de

serviços sejam centrados nas pessoas e guiados pela comunidade; atuação com equipes

multiprofissionais, integradas entre si e com a comunidade; suporte em tecnologias de

informação para ambientes do campo (WONCA, 2003).

Portanto, para implementar com sucesso um Plano de Ação como esse, pensado nos

encontros internacionais de saúde, é necessário uma abordagem coesa da política de saúde do

campo além de iniciativas específicas para essas áreas que permitam a inovação, com foco no

desenvolvimento intersetorial integrado e com planejamento e avaliação das ações realizadas

(WONCA, 2003).

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3.4 Atenção Primária à Saúde e Equipe de Saúde da Família

A Atenção Primária à Saúde (APS) foi desenvolvida enquanto estratégia para o cuidado à

saúde na década de 1970, alguns marcos históricos impulsionaram esse surgimento, como o

relatório Lalonde,que indicou os estilos de vida e ambiente como responsáveis pelas causas das

doenças; a Conferência de Alma Ata, que estabeleceu a APS como estratégia fundamental e a

porta de entrada do sistema de saúde com capacidade para resolver 80% dos problemas de saúde

da população; e a Conferência de Promoção à Saúde em Otawa (1986), que resultou na Carta

de Otawa - documento que propõe um conceito amplo de saúde, compreendida como “bem-

estar físico, mental e social” e sinaliza a importância da interação entre diferentes setores

(ONOCKO-CAMPOS et al., 2011; SUNDFELD, 2010; WESTPHAL, 2006).

A partir desses referenciais, a APS trouxe um olhar mais amplo em saúde, priorizando a

prevenção e a promoção da saúde e diminuindo o foco no modelo até então vigente -

hospitalocêntrico, médico-centrado e com ações apenas curativas. Estudos como os de Starfield

(2002) que compararam diferentes modelos de saúde em diferentes países constatou que os

países que adotaram um modelo descentralizado e focado na prevenção e promoção, atingiram

a eficácia em relação à níveis de saúde e custos mais baixos, o que demonstrou a eficácia da

APS (CAMPOS; GUERREIRO, 2010).

Entretanto, muitos ainda apontam a APS como algo primitivo, simples que tem uma menor

complexidade e dessa forma desvalorizam o trabalho na APS. Contudo, o trabalho do

profissional da APS é mais complexo por ter que lidar com os sujeitos e coletividades em seu

território, sendo um trabalho mais árduo justamente pela falta de preparo em lidar com esse

nível da atenção a saúde, e com o pouco preparo para desenvolver atividades consideradas de

tecnologia leves, como acolhimento, busca ativa, clínica ampliada e compartilhada, co-gestão

e conselho de comunidade, vínculo entre equipe e usuário, planejamento situacional do

território (CAMPOS; GUERREIRO 2010).

Em 1994 o governo brasileiro implementou o Programa de Saúde da Família tendo grande

impacto na saúde da população. Após doze anos de êxitos no programa, o governo o renomeou

como Estratégia de Saúde da Família, fortalecendo o seu caráter permanente, bem como a sua

importância na organização e reorientação do modelo de atenção à saúde (ANDRADE, 2006;

BRASIL, 2006).

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Com a EqSF, os profissionais de saúde precisam trabalhar em equipe, pois são os

responsáveis pelo cuidado de um número fixo de famílias adstritas no território. O trabalho da

EqSF abarca tanto ações de promoção, prevenção, intervenção quanto tarefas administrativas,

reuniões de equipe e comunidade para planejar as ações (ANDRADE; BARRETO; BEZERRA,

2006 apud SUNDFELD, 2010; BRASIL, 2012; SANTOS; LACAZ, 2012).

As EqSF são compostas por um médico generalista, um enfermeiro, um auxiliar de

enfermagem e quatro a seis agentes comunitários de saúde (ACS). Algumas equipes contam

ainda com um dentista e um técnico em odontologia. Cada equipe é responsávelpor até 4000

pessoas. A atuação da equipe se dá junto à família, que deve ser compreendida sócio-histórica-

cultural e economicamente (BRASIL, 2006; SUNDFELD, 2010).

Nesse contexto, a ESF surgiu como forma de reorientar o modelo de atenção à saúde,

apontando a necessidade de reorganização dos serviços a partir das necessidades da população.

Logo, a estratégia foi implantada com o propósito de atender os princípios do SUS e fortalecer

o modelo de atenção à saúde preconizado, elegendo como ponto central o estabelecimento de

vínculos e a criação de laços de compromisso e de corresponsabilidade entre os profissionais

de saúde e a população, tendo como base as necessidades e prioridades do território,

desenvolvendo seu trabalho com uma equipe multidisciplinar.

A identificação dos problemas de saúde nos territórios deve abarcar suas vulnerabilidades e

a sua determinação. Para conhecer esses fatores a APS, ou Atenção Básica (AB), é desenvolvida

em um alto grau de descentralização e capilaridade, ocorrendo no local o mais próximo das

vidas das pessoas.As EqSF para poder criar vínculos, respeitar as singularidades e identificar

as principais demandas da população que acompanha, deve seguir osprincípios da AB. São eles:

a) Território adscrito: As EqSF prestam o serviço de saúde para uma população adstrita,

com o objetivo de realizar um cuidado longitudinal, baseado em um planejamento de

acordo com os indicadores de saúde e as necessidades dessa comunidade. Esse trabalho

de acompanhamento de acordo com as características da comunidade tem como base a

atividade descentralizada, porém articulada dentro de uma rede de saúde e com os

demais setores. Ocuidado à saúde, parte da concepção de território enquanto resultante

da acumulação de situações históricas, ambientais, sociais que promovem condições

particulares para a produção de saúde e doenças (BRASIL, 2011; GONDIM et al.,

2016);

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b) O acesso universal e contínuo: A AB é caracterizada como a porta de entrada

abertapreferencial da rede de atenção, tem a função de acolher os usuários e

acompanhar a saúde dos indivíduos nas diferentes fases de vida. O trabalho da atenção

básica também traz a corresponsabilização do usuário como uma necessidade. O

estabelecimento de mecanismos que assegurem acessibilidade e acolhimento pressupõe

uma lógica de organização e funcionamento do serviço de saúde que parte do princípio

de que a unidade de saúde deve receber e ouvir todas as pessoas que procuram os seus

serviços, de modo universal e sem diferenciações excludentes. A proximidade e a

capacidade de acolhimento, vinculação, responsabilização e resolutividade são

fundamentais para a efetivação da atenção básica como contato e porta de entrada

preferencial da rede de atenção (BRASIL, 2011; JESUS; ASSIS, 2011; PONTES et al.,

2009);

c) Adscrever os usuários e desenvolver relações de vínculo e responsabilização entre as

equipes e a população adscrita é imprescindível, pois apartir de relações fortes com a

comunidade, o profissional desenvolve um trabalho mais implicado com as demandas

e garanteum cuidado significativo, a continuidade das ações e a longitudinalidade do

cuidado. Durante a territorialização onde ocorre aadscrição dos usuários se inicia o

processo de vinculação de pessoas e/ou famílias e grupos a profissionais/equipes, com

o objetivo de ser referência para o seu cuidado. O vínculo, por sua vez, consiste na

construção de relações de afetividade e confiança entre o usuário e o trabalhador da

saúde, permitindo o aprofundamento do processo de corresponsabilização pela saúde,

construído ao longo do tempo, além de carregar, em si, um potencial terapêutico. A

longitudinalidade do cuidado pressupõe a continuidade da relação clínica, com

construção de vínculo e responsabilização entre profissionais e usuários ao longo do

tempo e de modo permanente, acompanhando os efeitos das intervenções em saúde e

de outros elementos na vida dos usuários (BRASIL, 2011; COELHO; JORGE, 2009);

d) Coordenar a integralidade em seus diversos níveis, nas ações programáticas e

demanda espontânea; articulando as ações de promoção à saúde, prevenção de agravos,

vigilância à saúde, tratamento e reabilitação; trabalhando de forma integrada,

multiprofissional, interdisciplinar e em equipe; realizando a gestão do cuidado integral

do usuário e coordenando no conjunto da rede de atenção. Essa organização pressupõe

o deslocamento do processo de trabalho centrado em procedimentos profissionais para

um processo centrado no usuário (BRASIL, 2011; PINHEIRO, 2016);

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e) Estímulo da participação dos usuários:a AB tem como um dos seus princípios a

estimulação da participação do usuário no controle social, e dessa forma ajuda a

fomentar cidadãos mais empoderados das questões ligadas ao seu processo de

adoecimento, aos seus direitos, e assim trabalha a autonomia do sujeito e propicia a

capacidade na construção do cuidado à sua saúde e coletividades do território,

configurando um processo progressivo e singular que considerao usuário como um

agente ativo e corresponsável (BRASIL, 2011; STOTZ, 2009).

Os princípios que a AB trazsão complementados por outrosconceitos que corroboram com

os princípios. Assim, os conceitos deempoderamento da comunidadeé algo central a ser

trabalhado pelas equipes, pois é a partir dele que se estimula a implicação da população em seu

processo de saúde. Nesse sentido, pode-se trabalhar as seguintes questões: Que mecanismos

precisa-se estabelecer para permitir a entrada no planejamento e prestação de serviços de saúde

dentro das comunidades? Quem são os principais atores e quais os acordos de colaboração ou

parcerias que precisa-se estabelecer? Que redes locais que precisam ser criadas? O que os

governos precisam fazer para criar o enquadramento político para auxiliar na capacitação da

comunidade? (WONCA, 2003).

As EqSF, ao se implicar nas necessidades do povo, podem trazer questionamentos como:

que parcerias a nível local pode-se estabelecer para melhorar a integraçãoentre a assistência ao

paciente e prestadores de saúde pública? Como fortalecer as relações entre aassistência direta

ao paciente e a rede de serviços de saúde pública? Como monitorar e avaliar os resultados?

Como desenvolver abordagens multidisciplinares de cuidados de saúde epromover o trabalho

em equipe na prestação de serviços? Como estabelecer parcerias que facilitem o

compartilhamento de recursos para combater as desigualdades na saúde? (WONCA, 2003).

Outras questões também podem ser elaboradas para realizar um serviço de qualidade na AB

que chega no campo. Quais são as necessidades de saúde locais? Como prestar um melhor

atendimento? Quais as informações são necessárias aoplanejamento de serviços de saúde nas

comunidades do campo? Quais os modelos de cuidado de saúde do campo podemos aprender

e aplicar? Quais as evidênciasexistentes para melhorar a práticada saúde do campo? (WONCA,

2003).

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3.5 Trabalho em Saúde

O trabalho é uma ação previamente projetada, dirigida a um determinado resultadoque já

tinha uma existência no campo das ideias (MARX, 1965). Através dele, os seres humanos

transformam a natureza e a própria sociedade, alcançando assim suas potencialidades, e

ampliando, essas próprias potencialidades. Também pode-se dizer que o trabalho é o conjunto

de atividades pelos quais os homens atuam, através dos meios de produção, sobre algum objeto

para ao transformá-lo consigam obterdeterminado produto ou algum objetivo.

(ALBUQUERQUE; SILVA, 2014; ANTUNES, 2013; FARIA et al., 2009)

Os objetos a serem transformados podem ser materiais, elaborados ou não previamente, ou

podem ser condições pessoais ou sociais. Os meios de produção ou instrumentos de trabalho

podem ser máquinas, ferramentas ou equipamentos em geral, mas também, em uma visão mais

ampla, podem incluir conhecimentos e habilidades. Os homens são os agentes de todos os

processos de trabalho em que se realiza a transformação de objetos ou condições para se atingir

fins previamente estabelecidos, o produto por sua vez, vai ser distribuído na sociedade e essa

distribuição se dará de forma desigual, já que estamos em uma sociedade capitalista

(ANTUNES, 2013; PEDUZZI; SCHRAIBER, 2009).

A saúde é entendida como um trabalho, já que é realizada para atender um objetivo, que

nesse caso é atender as necessidades humanas em saúde. Essas necessidades mudam de acordo

com o período histórico, assim, dessa forma a saúde tem um caráter histórico, porém além dele

também é social, isso porque seu “objeto” de intervenção é o homem em sociedade (LONGHI,

2010).

No final da década de 1960 Maria Cecília Ferro Donnangelo inicia seus estudos sobre a

profissão médica, o mercado de trabalho em saúde e a medicina como prática social. Ricardo

Bruno Mendes Gonçalves, discípulo e colaborador de Donnangelo, foi o autor que formulou o

conceito de processo de trabalho em saúde, a partir da análise do processo de

trabalho médico (SCHRAIBER et. al., 2009; PEDUZZI; SCHRAIBER, 2009).

O trabalho em saúde deve atender as generalidades e individualidades do ser humano.

Infelizmente, o “modelo” de saúde que predomina na atualidade é o biomédico, nele o sujeito

é visto, principalmente, em sua dimensão biológica, em detrimento dos aspectos sociais e

culturais (LONGHI, 2010).

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Entretanto, o SUS e a APS tem o desafio de modificar essa realidade e reorganizara prática

da saúde em novas bases e critérios, em substituição ao modelo tradicional de assistência. As

EqSF tem como centroas famílias e seu territórios físicos e sociais, o que proporciona uma

compreensão ampliada do processo saúde/doença e da necessidade de intervenções que vão

além de práticas curativas.Essa nova configuração do trabalho em saúde exige a utilização de

novas tecnologias para operar o trabalho em saúde. No entanto, esses instrumentos estão sendo

construídos e incorporados no cotidiano da relação de vínculo entre trabalhadores e pacientes.

Isso exige uma melhor organização e gestão dos processos de trabalho em saúde (SCHRAIBER

et. al., 2009; LONGHI, 2010).

A reflexão sobre as questões do trabalho constitui estratégia fundamental às transformações

deste, para que venha a ser lugar de atuação crítica, reflexiva, propositiva, compromissada e

tecnicamente competente. Assim, o trabalhador pode superar a formação normalmente

constituída apenas por práticas tradicionais da saúde e consiga desenvolver um cuidado mais

integral. A fim de aumentar a compreensão desse fazer na saúde é necessário refletir sobre qual

é o objeto de trabalho; quais são os meios de produção; quem são os agentes e como se

relacionam e como se dá a organização do trabalho. Segundo Faria et al. (2009) esses aspectos

podem ser sintetizados da seguinte forma:

a) Objeto de Trabalho: O objeto de trabalho é o próprio fazer na saúde e visa o bem estar

do indivíduo;

b) Agente ou sujeito/Relação de Produção: No trabalho, sempre se tem os sujeitos que

executam as ações, para tal estabelece os objetivos e as relações de adequação dos meios

e condições para a transformação dos objetos. A atividade pode ser realizada apenas por

um indivíduo, mas nos processos de trabalho em geral, trata-se de uma equipe de

profissionais com um objetivo em comum, no caso da saúde encontramos as equipes

multiprofissionais. A maior parte dos processos de trabalho, individuais ou de equipe,

realiza-se dentro de organizações sociais ou instituições especialmente constituídas para

um determinado fim. Assim, os objetivos desses trabalhadores são estabelecidos e

realizados em todos esses níveis (social, institucional, de equipe ou grupo e individual).

Portanto, dependendo da perspectiva de análise, o agente do trabalho pode e deve ser

visto como um indivíduo, um grupo ou equipe, uma instituição ou uma sociedade;

c) Meios de Produção: Todo processo de trabalho é desenvolvido com o uso de meios

específicos para cada condição particular. Os meios e condições de trabalho se

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combinam na realização do trabalho, por meio da atividade produtiva. Eles abrangem

um espectro muito amplo que vai desde ferramentas e estruturas físicas para o trabalho

(como máquinas, equipamentos) até os conhecimentos técnicos, levantamento sócio-

demográfico e econômico das comunidades, escalas utilizadas, sistematizados ou não,

e as habilidades utilizadas no processo de trabalho, comumente chamados de meios

intangíveis;

d) Organização do Trabalho: A organização do trabalho é composta por vários

componentes. Alguns desses componentes são regulamentados centralmente pelo

Ministério da Saúde como o formato da equipe, as funções de cada profissional, a

estrutura, o cadastro das famílias, o levantamento dos problemas de saúde existentes no

território. Mas outros componentes são de dimensão mais regional e próprias das EqSF

de acordo com suas necessidades como as agendas, as reuniões e organização da

demanda.

Existe a necessidade de uma reflexão crítica e contínua sobre os processos que compreendem

o trabalho como uma característica da humanidade, quecontribui para o processo do

desenvolvimento humano. O grau de dificuldade dessa reflexão aumenta com a complexidade

e com a indeterminação dos processos de trabalho. Quanto mais complexo o processo de

trabalho e quanto menos sistematizado ele for, mais difícil será refletir sobre ele (FARIA, 2009;

REIS et al., 2007).

Esse estudo foi embasado no olhar de processo de trabalho segundo Faria et al (2009) para

realizar a análise sobre o processo de trabalho da EqSF do campo.Para o estudo se considerou

que:

a) O objeto seria o próprio fazer da saúde do campo que deve estar atrelado a vida, cultura

e trabalho dos moradores;

b) Os agentes ou sujeitos da saúde no campo da EqSF são todos os atores envolvidos no

trabalho de saúde no território do campo, profissionais de nível superior (médicos,

enfermeiros), nível técnico e nível médio, também são considerados os gestores que

atuam diretamente com a equipe, as demais equipes que realizam o apoio a EqSF

(NASF, Residentes) e os graduandos. O modo como esses atores se relacionam faz parte

da análise sobre os agentes;

c) Meios de Produção da saúde do campo são compostos pela estrutura física (Unidade,

salas, meio de transporte, insumos); conhecimentos técnicos clínicos (o saber do núcleo

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profissional e de escalas e protocolos ministeriais para os procedimentos clínicos);

conhecimentos técnicos não clínicos (conhecimento sobre o campo da saúde pública,

sobre o território, sobre as especificidades do território); conhecimentos

epidemiológicos e sócio demográfico, econômico da loalidade;

d) Organização do Trabalho se relaciona ao componente mais normativo definidos pelos

gestores municipais e pelo Ministério da Saúde, composição da equipe, função de cada

profissional. E os menos normativos definidos pelos gestores municipais e profissionais

de saúde, sendo eles a realização de territorialização (cadastramento das famílias e

pessoas, levantamento dos principais problemas de cada microárea), definição das

agendas, organização dos horários de trabalho e uso dos meios de produção, definição

das reuniões organizativas da EqSF internamente ou com atores externos, modo da

organização da demanda do território.

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4 PERCURSO METODOLÓGICO

4.1 Desenho do estudo

Com o desejo de alcançar os objetivos propostos pelo estudo, optou-se, por uma pesquisa

tipo estudo de caso, que utilizou a metodologia qualitativa. Esse tipo de estudo é utilizado

quando se colocam questões do tipo "como" e "por que", quando o pesquisador tem pouco

controle sobreos eventos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos

em algum contexto da vida real. Além desses fatores, o estudo de caso contribui para a

compreensão que temos dos fenômenos individuais, organizacionais, sociais e políticos (YIN,

2001).

4.2 Período de coleta

A coleta de dados desenvolveu-se no período de outubro à dezembro de 2016.

4.3 Área do Estudo

A pesquisa foi desenvolvida em uma EqSF do campo localizada no município de Caruaru/PE

(Figura 2). O município possui áreas urbanas e rurais, na figura (3) observamos o mapa do

município de Caruaru e a sinalização das equipes de Saúde da Família da cidade e do campo.

Também é importante destacar que a EqSF do campo estudada, bem como seu território se

configuram como campo de prática para a Residência Multiprofissional em Saúde da Família

com ênfase no campo da Universidade de Pernambuco, Residência em Medicina de Família e

Comunidade da Universidade Federal de Pernambuco campos Caruaru.

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Figura 2 - Mapa referente ao município de Caruaru

Fonte: Programa das Nações Unidas Para O Desenvolvimento, Instituto de pesquisa econômica aplicada e

Fundação João Pinheiro (2013).

Figura 3 - Mapa referente as equipes de Saúde da Família de Caruaru

Fonte: Caruaru (entre 2006 e 2016).

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4.4 População do Estudo

A população do estudo foram compostos pelos profissionais de uma EqSF com atuação em

áreas rurais e os gestores de saúde de Caruaru, tendo sido entrevistados um total de 11 pessoas

em dois principais grupos:

a) 8 profissionais da EqSF do campo, sendoum médico, um enfermeiro, um técnico

de enfermagem, 2agentes de saúde, dentista, residente médicoe o motorista.

b) 3 Gestores, sendo a secretária de saúde do Município, a coordenadora da atenção

básica e a chefia imediata da EqSF do campo.

Os critérios de inclusão para participação no estudo foram:

a) Ser integrante da Equipe de Saúde da Família ou da gestão do município de Caruaru;

b) Trabalhar como integrante da Unidade de saúde da família ou da gestão há no

mínimo 1 ano.

4.5 Técnicas de coletas e fontes de dados

Os dados coletados foram qualitativos com o intuito de revelar a percepção dos

sujeitos/atores do estudo. No decorrer da pesquisa, foram utilizadas diferentes fontes de dados

e distintos documentos, o que segundo Minayo (2014) se caracteriza como uma triangulação

metodológica. A presente pesquisa utilizou três diferentes tipos de técnicas afim de poder

mostrar distintos dados sobre as mesmas temáticas, a partir de diferentes perspectivas, que

foram: a perspectiva documental, a perspectiva vivencial - através do diário de campo - e a

perspectiva dos atores do processo - através das entrevistas (MINAYO, 2014).

A pesquisa se desenvolveu seguindo os passos:

4.5.1 Documental

Foi realizado o levantamento dos documentos oficiais da gestão, e relatórios referentes ao

trabalho da EqSF estudada através da solicitação dos estudos realizados por instituições de

ensino e gestão.

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Os documentos oficiais foram extraídos pela plataforma Sistema de Apoio à Construção do

Relatório de Gestão (SARGSUS) e assim foi analisado o Plano Municipal de Saúde (PMS)

2014 a 2017; o Plano Anual de Saúde (PAS) de 2014; o Relatório Anual de Gestão (RAG) de

2014; o Plano Anual de Saúde de 2015. Durante a leitura, foram extraídos os trechos em que

assuntos relacionados ao cuidado da população do campo direta ou indiretamente eram

mencionados (CARUARU, 2014a, 2014b; CARUARU,2015a, 2015b).

Também foi realizado a busca quantitativa de palavras chaves nos relatórios como rural,

campo, agricultura, costura, agrotóxico, raios solares, benzedeiras, plantas medicinais e

rezadeiras. Cabe ressaltar que no momento da busca na plataforma alguns documentos ainda

não estavam disponíveis, entre eles, o Relatório Anual de Gestão de 2015; Plano Anual de 2016

e o Relatório Anual de 2016, por esse motivo não foram analisados.

Abaixo está descrito na figura (4) a coleta de dados dos documentos de gestão.

Figura 4 - Fluxograma da coleta de dados dos documentos de gestão

Fonte: Autora

Os documentos da Residência Multiprofissional em Saúde da Família com ênfase na Saúde

das Populações do Campo da Universidade de Pernambuco também foram analisados, sendo

um total de 3 documentos disponibilizados: o Relatório de Territorialização (RT), Escala

modificada de Risco de Coelho e Savassi e o Protocolo de Cuidado à Criança

(UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015a, 2015b, 2015c)

Abaixo estão descritos no Quadro 1 todos os documentos analisados.

Busca de documentos da Gestão de Caruarua no

SARGSUS (3 documentos)

Leitura dos documentos em busca de trechos relacionados

à saúde da população do campo (3 documentos)

Busca de palavras chaves nos documentos através da

ferramenta localizar

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Quadro 1 - Distribuição dos documentos analisados por município

Instituição Documentos analisados Total

Município de Caruaru

Plano Municipal de Saúde de 2014-2017

(CARUARU, 2014a)

01

Plano Anual de Saúde de 2014 e 2015

(CARUARU, 2014b; CARUARU,

2015b)

02

Relatório Anual de Gestão de 2014

(CARUARU, 2015a)

01

Universidade de

Pernambuco

Territorialização 2015

(UNIVERSIDADE DE

PERNAMBUCO, 2015a)

01

Escala de Risco de Coelho-Savassi

modificada para atuação no Campo 2015

(UNIVERSIDADE DE

PERNAMBUCO, 2015b)

01

Protocolo de Saúde da Criança 2015

(UNIVERSIDADE DE

PERNAMBUCO, 2015c)

01

Total 07

Fonte: Autora

4.5.2 Observação Participante

Foi realizada ainda uma aproximação com a Equipe de Saúde da Família e com o território

em um período de 15 dias, através de um processo de observação participante, onde a

pesquisadora vivenciou o cotidiano da EqSF, participando de aspectos próprios do processo de

trabalho da EqSF, como também atuando enquanto um espectador atento (RICHARDSON,

2014).

A pesquisadora participou de atividades como: acolhimento; atendimentos médicos;

puericultura com a enfermeira; visitas domiciliares com os Agentes Comunitários de Saúde;

visitas domiciliares com o médico; atividades de interação ensino e serviço no Programa de

Educação pelo Trabalho (PET) da UFPE; atendimento médico em pontos estratégicos em áreas

distantes, grupo de gestantes; grupo de terapia comunitária; ação comemorativa do outubro

rosa; atendimento da dentista na unidade; atividade educativa da dentista na escola; realização

de vacinação, aferição de pressão arterial e realização de curativos feitos pela auxiliar de

enfermagem; utilização do transporte da Unidade junto aos profissionais; diálogo com usuários

na sala de espera do acolhimento e nas visitas domiciliares. Todos esses dados advindos do

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processo de observação foram registrados no Diário de Campo com o máximo de informações

relevantes para o trabalho.

É importante observar que durante o período em que esteve no território, a pesquisadora

ficou hospedada no Centro de Formação do MST, que fica em Normandia - área adscrita da

USF do campo–vivenciando esse território tanto na perspectiva da comunidade quanto também

junto aos profissionais, uma vez que participou de alguns momentos de seu processo de

trabalho, incluindo o transporte que esses profissionais utilizam para ir para a Unidade.

4.5.3 Entrevistas

Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os participantes do estudo (profissionais

de saúde e com os gestores) com o roteiro de questões centrais relacionadas ao tema. Estes

roteiros nortearam a coleta dos dados qualitativos, oferecendo aos interlocutores a possibilidade

de se expressarem abertamente sobre o seu processo de trabalho e o cuidado de saúde que

ofertam (APÊNDICE A). As entrevistas foram gravadas e tiveram média de 40 minutos cada e

foram realizadas no local de trabalho dos profissionais. As entrevistas foram posteriormente

transcritas e identificados como P1 a P8 para os profissionais da Unidade e G1 a G3 para os

gestores para garantir a confidencialidade dos participantes.

Abaixo está descrito na figura (5) os passos para a realização das entrevistas.

Figura 5 - Fluxograma para as entrevistas

Fonte: Autora

4.5.4 Diário de Campo

Durante o processo da observação participante e logo após as entrevistas, a pesquisadora

relatou as suas impressões no Diário de Campo. O diário de campo é uma ferramenta utilizada

Aproximação com o território através da observação

participante das atividades na unidade.

A partir do 3 dia da observação participante os profissionais

foram entrevistados no início ou fim do expediente.

Após um mês da observação participante na Unidade e

entrevista com os profissionais da EqSF, foi realizada a

entrevista com os gestores.

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nas pesquisas qualitativas, sobretudo com aproximação com a área da antropologia, no qual são

registradas de forma sistemática as observações, experiências, sentimentos etc., tendo como

função registrar de modo mais fiel possível a vivência no campo (CAPRARA; LANDIM,

2008).

4.6 Análise dos Dados

Para análise dos resultados, se utilizou a técnica de Análise de Conteúdo, realizada através

da condensação de significados de Kvale (1996). A análise de Conteúdo é um conjunto de

técnicas de análise com o objetivo de verificação de hipóteses (MINAYO et al., 2005).

Para isso, foi realizada uma primeira etapa pré analítica com a leitura dos Documentos, do

Diário de Campo e das Entrevistas transcritas para haver um mergulho nos dados e uma

compreensão do todo.

Posteriormente, foi feita uma leitura para organizar os dados, classificando de acordo com

os objetivos específicos da pesquisa e tecendo comentários na margem do texto com base na

leitura da temática e da vivência da observação participante.

Dessa forma, foram construídasas Unidades de Significados Naturais (US) e os temas

centrais/categorias, e assim se buscou a informação relativa a cada categoria. Com a leitura dos

trechos selecionados para cada tema central, também foi identificados os diversos aspectos

referentes as categorias (subcategorias). A partir da leitura dos diversos materiais, foram feitos

resumos e tabelas para organização dos dados, o que permitiu a identificação das citações

frequentes ou que não se apresentavam nos textos ou documentos. Por fim, foram descritos os

resultados e realizada a interpretação desses.

4.7 Aspectos éticos

O presente estudo atendeu aos critérios éticos de pesquisa de acordo com as Resoluções

466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde (Anexo A). Solicitou-se Carta de

anuência ao Município de Caruaru (Anexo B) e os entrevistados assinaram o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Apêndice B), após serem informados quanto aos

objetivos eprocedimentos da pesquisa. Garantiu-se o direito ao participante desistir de sua

participação e retirar seu consentimento a qualquer momento, esclarecendo-se que nesse caso,

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sua recusa não traria nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador, ou ainda, com a

Fiocruz /PE ou com o Serviço ao qual representa. O TCLE foi especificado para cada grupo de

atores da pesquisa (Apêndice B).

Os riscos da participação dos sujeitos neste estudo se referem a possíveis constrangimentos

ou o mau uso dessas informações, podendo comprometer as relações de trabalho, bem como as

relações entre comunitários e profissionais e entre profissionais e gestores. Para minimizar os

riscos das informações aqui colhidas, foi garantido o anonimato dos sujeitos envolvidos, além

de serem tomadas todas as medidas para se evitar a exposição e constrangimento dos

trabalhadores participantes, assim como qualquer possibilidade de retaliação pela instituição ao

qual estão ligados.

Os benefícios foram relacionados com a possibilidade de repensar práticas através das

discussões levantadas, bem como os resultados podem sinalizar para os gestores possíveis

caminhos de potencialização do trabalho da EqSF que dá suporte a população do campo.

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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir das entrevistas com profissionais e gestores; da análise dos documentos da gestão

municipal; dos documentos da Universidade de Pernambuco, e do diário de campo, foi realizada

a análise dos dados com a meta de alcançar os objetivos propostos pelo estudo. Assim, as

informações foram organizadas de acordo com quatro categorias analíticas, a saber:

Caracterização da população e de suas especificidades; Conceito de saúde do campo; Processo

de trabalho da EqSF do Campo (objeto de trabalho, agentes do trabalho, meios de trabalho e

organização do trabalho); A interação entre o Processo de Trabalho da EqSF e o território. Nas

leituras exaustivas e interpretação dos depoimentos, além das categorias foi possível desvelar

subcategorias, que serão discutidas no decorrer dessa sessão.

5.1 Caracterização da população e de suas especificidades

Para pensar a especificidade de um local, precisamos ampliar o olhar para além das questões

físicas e biológicas, precisamos pensar sobre questões geográficas, culturais, econômicas e de

infraestrutura, e apartir daí refletir sobre as especificidades de uma área determinada, bem como

entender essas necessidades dentro do seu complexo contexto de vida. As subcategorias que

surgiram no que diz respeito a características e especificidades da população do campo estudada

foram: a caracterização do território; o desafio do cultivo da terra e criação de animais; o

trabalho e a vida no território; mobilidade da população; costumes culturais religiosos e de

autocuidado.

5.1.1 Caracterização do Território

O município de Caruaru se destaca na região pela sua importante atuação econômica tendo

sua força motriz no comércio, nas feiras livres e na produção de roupas para a região. O Plano

Municipal de saúde 2014-2017 também traz essa característica da região, que influencia no

modo de vida de sua população (CARUARU, 2014a).

Atualmente Caruaru é um importante polo econômico, médico-hospitalar,

acadêmico, cultural e turístico do Agreste, sendo reconhecida pela sua tradição

da feira livre.O ponto central da economia é o comércio, notadamente as feiras

livres de confecções. A feira localizada próximo ao rio Ipojuca congrega feiras

de ervas, legumes e verduras, calçados e produtos eletrônicos, além da de

artesanato e os mercados de farinha e de carne (CARUARU, 2014a)

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A região faz parte de um importante polo têxtil do Estado, assim muitas

famílias alternam atividades agrícolas com a produção têxtil domiciliar ou em

pequenas confecções que se espalham por toda a região. Esse movimento

alternado entre essas duas atividades se dá principalmente por causa das

condições climáticas que durante a estiagem não favorece a prática agrícola

(CARUARU, 2014a).

O município segundo o IBGE (2016), possui uma população estimada em 351.686 pessoas,

em uma área de 920, 611 km2, apresentando um bioma de caatinga e mata atlântica, com clima

semiárido. O município possui 108 estabelecimentos de saúde (públicas ou privadas).

Em relação a Atenção Básica à saúde o município de Caruaru apresenta 63 Unidades de

Saúde da Família, dessas18 ficam na zona rural.Na figura 4 podemos ver onde se localiza as

equipes da zona rural. Dentre as unidades rurais está a USF pesquisada, que apresenta um perfil

misto, tendo tanto usuários que moram em pequenas vilas com aglomerado de casas,quanto

usuários que moram em parcelas onde uma casa fica distante da outra e por isso possuem um

maior isolamento de seus moradores (SANTOS, 2016).

Observou-se que na sala da Atenção Primária à Saúde na Secretaria de Saúde estava exposto

o mapa do território rural do município de Caruaru (Figura 6) com todas as USF do município

e destacado ao lado todas as USF localizadas em área do campo (Diário de Campo). O que já

demonstra que uma identificação por parte da gestão de EqSF rurais e EqSF urbanas.

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Figura 6 - Mapa referente as equipes de Saúde da Família do campo de Caruaru

Fonte: Caruaru (entre 2006 e 2016)

De acordo com o Relatório de Territorialização da Residência de Saúde do Campo da UPE,

os territórios adscritos das USF do campo se localizam nas proximidades da BR 104 , o que

pode ser observado também na Figura 7:

As micro áreas que compõe a área de atuação da equipe da USF do campo

estudada são Salgadinho, Rafael de Dentro, Sítio Zumba, Queimada de Uruçu,

Lagoa Salgada, Normandia, Contendas e Juriti. Todas as micro áreas situam-

se à leste da BR 104, exceto Normandia e Salgadinho que situam-se à oeste

da BR (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015a).

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Figura 7 - Mapa referente a USF do campo

Fonte: Imagem do Google (RAFAEL..., 2016)

Na figura 7 podemos observar que o território destacado de vermelho é a USF do campo,

analisando o seu entorno verifica-se aexistência de um aglomerado humano maior,

caracterizando a região perto da unidade como espaço de campo com aspectos de

comunidade/aglomerado. Nela pode-se notar maior número de estabelecimentos comerciais e

opções de transporte em comparação com as casas e sítios distantes, que tem uma característica

de campo associado ao isolamento, normalmente com pior infraestrutura e acesso aos bens de

consumo e serviços públicos. Entender que dentro do espaço rural também podem existir

diferentes modos de vida, e planejar de acordo com essas características, é uma necessidade na

região. Como podemos observar pelo trecho da entrevista de G3 abaixo.

No campo as equipes tem um processo de trabalho diferente porque existem

as micro áreas, com extensões grandes, o distanciamento complica o acesso

então muitas equipes precisam estar um dia em cada local e é do mesmo

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território, da mesma área descrita mas muitas vezes são populações

completamente distintas de necessidades. (G3)

O território adscrito da USF do campo apresenta pequeno comércio na vila do Rafael, creche

municipal, Unidade de Saúde da Família, porém apresenta algumas características de

infraestrutura precária no que se refere a abastecimento de água, saneamento básico, coleta de

lixo como podemos observar no Quadro 2.

Quadro 2 – Modo de abastecimento de água, coleta de lixo e saneamento básico do território da USF do

campo no município de Caruaru.

Fonte: A autora apartir de UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, (2015a)

Estas questões foram ratificadas pelas falas de profissionais egestores:

[...]Assim depende da localidade. Aqui mais próximo tem esgoto, mas em

outros lugares não. (P1)

O Saneamento Básico é zero, isso é precário, água, saneamento, lixo. O lixo é

todo queimado. (P3)

Saneamento é onde a gente mais tem dificuldades em relação aos indicadores,

é na questão ainda dessa fragilidade de saneamento e das condições de

qualidade de vida na saúde do campo. A gente vê falar no esgoto, água, isso

aí é bem específico da saúde do campo, são algumas dificuldades que a gente

lida. (G2)

No que diz respeito ao serviço de coleta de lixo, este muitas vezes não é realizado pelo

serviço público ou é realizado poucas vezes, assim para lidar com o lixo a população realiza a

Comunidade Abastecimento de

água

Coleta de Lixo Rede de Esgoto

Salgadinho Cisterna (compram

água)

Sim (Recolhimento de 15/15

dias)

Não

Rafael de

dentro

Cisterna (compram

água)

Não (é queimado ou é jogado

em um riacho)

Não

Contendas Cisterna (compram

água),

Compesa libera água

2x no mês

Sim (Recolhimento 2x na

semana)

Não

Lagoa

Salgada

Cisterna (compram

água)

Não (queimado ou usado como

adubo)

Não

Queimada de

Uruçu

Cisterna (compram

água)

- Não

Zumba Cisterna de uso

comunitário

Não (queimado ou usado como

adubo)

Não

Normandia - - Não

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queimada desse material. Apenas Contendas tem uma regularidade maior na coleta, isso pode

ser explicado pelo maior aglomerado humano nessa comunidade.

Em relação ao abastecimento de água, este é feito por cisternas comunitárias, e a compra de

água através dos carros-pipa é algo comum, já que a distribuição pela COMPESA é realizada

em períodos espaçados. Podemos observar a dificuldade de obtenção de água nas falas dos

profissionais abaixo.

A água daqui é em caminhão pipa. Quando não pede a político tem que

comprar. Eles fazem uma cota pra comprar a água, porque ninguém pode

comprar um caminhão pipa. (P1)

Em outros espaços a gente tem acompanhado e visto que água é vida, né? Não

tem como produzir sem água, mas talvez algumas práticas que pudessem gerar

a captação de água em médios reservatórios para uma comunidade maior

pudessem usufruir disso, né? (P8)

Em Caruaru, no que diz respeito ao saneamento básico de acordo com o quadro 3, dentre as

81.035 famílias cadastradas no Sistema de Informação da Atenção Básica –SIAB em dezembro

de 2015, 71.979 famílias são favorecidas com o abastecimento de água pela rede pública, outras

2.769 utilizam água de poço ou nascente, 6.287 tem outros meios de abastecimento de água

(SANTOS, 2016).

Quadro 3 - Situação do saneamento do município de Caruaru em 2015

ITENS DE SANEAMENTO Nº DE FAMÍLIAS

Abastecimento de água - rede pública 71.979

Abastecimento de água – poço ou

nascente

2.769

Abastecimento de água – outros 6.287

Lixo coletado 72.988

Lixo queimado ou enterrado 5.185

Lixo à céu aberto 2.862

Sistema de esgoto 61.421

Fossa 13.815

Esgoto a céu aberto 5.799 Fonte: Adaptado de Santos (2016)

De acordo com o que foi encontrado nos resultados do Quadro 3, o fato de ter abastecimento

de água para as famílias não quer dizer que a água chegue na casa da população, já que existem

comunidades com frequência de duas vezes mensais com água proveniente da COMPESA.

O problema da seca na região se faz presente de forma tão dura, que o território busca formas

alternativas de buscar água e a qualidade dessas formas alternativas estão muitas vezes ligadas

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ao poder econômico de cada família. Alguns conseguem comprar água através do “carro pipa”,

mas outros andam grandes distâncias em busca de açudes, barragens em que possam conseguir

água. E é importante destacar que em nenhuma das duas alternativas, a qualidade da água está

assegurada.

No plano municipal 2014-2017, nas sessões que dizem respeito a vigilância à saúde,

podemos observar a preocupação com relação ao assunto abastecimento de água de forma

alternativa, isso porque são planejadas ações específicas para o cadastramentos de fontes de

água. Mas para além disso é necessário uma aproximação com outros saberes para lidar com o

racionamento e obtenção de água na região.

Ampliar para a zona rural os pontos de coleta do VIGIÁGUA; monitorar as

soluções alternativas de distribuição de água; cadastramento das fontes de

captação de água para consumo humano; licenciamento dos carros de

transporte de água para consumo humano (CARUARU, 2014a).

Já em relação ao acesso ao sistema de esgoto das 81.035 famílias do município cadastradas

no SIAB em 2015, 61.421 famílias têm o sistema de esgoto na sua residência, já outras 5.799

utilizam esgoto a céu aberto e 13.815 famílias tem fossa. Esse sistema, segundo o SIAB,

contempla várias famílias, porém o campo nessa divisão de contemplados e não contemplados,

parece ter uma desvantagem já que a maioria das famílias do Território da USF do campo,

segundo documentos da territorialização realizado pela Residência da UPE, não são

contemplado pela rede de esgoto (Quadro 2) (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015a).

A principal fonte de renda das famílias advém da produção têxtil domiciliar ou em pequenas

confecções como aponta P3 abaixo. Estas muitas vezes significam mão de obra barata e lógica

de ganho por produção, o que intensifica o processo de exploração do trabalhador. Também é

observado a importância da aposentadoria no território como fonte de renda da região como

podemos ver no quadro 4 abaixo.

Tem os que são formados, tem seus trabalhos fixos, outros trabalham na terra.

Mas a maioria trabalha com feira de sulanca (costura). (P3)

Nas áreas de assentamentos, a população trabalha também com agricultura familiar, sendo

os plantios identificados em sua prevalência de milho e palma (Figura 9); há também pequenas

criações de animais - bode, cabra, gado e galinha (Figura 8).

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Figura 8 – Criação de patos

Fonte: Santos (2015)

Figura 9 – Plantação de milho

Fonte: Santos (2015)

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Quanto aos espaços de lazer e cultura, os bares e “campos de futebol” são as únicas opções

de lazer para essa população (Quadro 4). A escassez de lazer, segundo estudos, é uma ameaça

à vida e a saúde mental das pessoas que residem no campo, cabendoàs equipes de saúde

sinalizarem esse déficit e buscar auxílio intersetorial para a implantação de projetos de

intervenção, estimulando o lazer epromovendo saúde (BATISTA; ALBUQUERQUE, 2014;

CARNEIRO et al., 2012).

A única via de transporte público disponível internamente nessas comunidades mais

afastadas da rodovia é o escolar; e as estradas de acesso interno e externo desses territórios estão

em condições precárias, dificultando o acesso para os serviços básicos de educação e saúde, o

que configura uma barreira de acesso geográfica como já pontua o estudo de Santos (2016).

Abaixo, no Quadro 4, observamos esses aspectos nas diferentes comunidades cobertas pela

unidade.

Quadro 4 – Economia local, equipamentos Sociais e Transporte do território da USF do campo

no município de Caruaru

Fonte: A autora apartir de Universidade de Pernambuco (2015a)

Nas áreas de cobertura da USF do campo estudada, está localizado um assentamento e um

acampamento do Movimento Sem Terra. O Assentamento se chama Normandia, pois faz

Comunidade Economia Local Equipamentos Sociais/

Lazer Transporte

Salgadinho Aposentadoria Não. Ronda policial 1x por

semana (grande número de

Assaltos na região)

Ônibus escolar (2x dia)

Rafael de

dentro Plantação - -

Contendas Plantação (milho, feijão,

macaxeira); Confecção

nas pequenas confecções

Escola, bares, mercadinhos,

madeireira, bares, centro

espírita, igreja evangélica,

açude e uma cisterna

comunitária desativada.

-

Lagoa

Salgada Criação de gado; Casa de

farinha; Plantação

(milho, feijão);

Confecção

Bar, estabelecimentos

religiosos, campo de futebol -

Queimada de

Uruçu Aposentadoria;

Confecção; Plantação

para consumo próprio.

Bar, estabelecimentos

religiosos, campo de futebol Ônibus escolar (2 x dia)

Zumba Criação de animais

grande e médio porte;

Comércio de roupas.

Bar, estabelecimentos

religiosos, dois campos de

futebol, mercadinhos.

Ônibus escolar ou

lotação particular (custo

3 reais até Caruaru) Normandia Plantação (milho,

feijão); Confecção. Bar, estabelecimentos

religiosos, campo de futebol. -

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referência à fazenda que existia no local antes da ocupação e que tinha esse mesmo nome. Essa

fazenda tinha extensão de 1.100 hectares sendo considerada improdutiva. Os registros apontam

que a primeira ocupação ocorreu no dia 02 de maio de 1993, com mais de 247 famílias de

trabalhadores da fazenda e pessoas que moravam no entorno (SANTOS, 2016).

Os assentados durante todo o processo de luta pela terra sofreram três despejos violentos,

com denúncia de abuso de poder por parte dos policiais e capangas da fazenda e perda e

destruição dos cultivos ali plantados, bem como pertences dos trabalhadores. Porém vale

ressaltar que o período também foi marcado por apoio e solidariedade a causa por moradores

da região. O decreto com a finalidade da reforma agrária ocorreu em 23 de janeiro de 1997,

com área total de 726, 2 hectares, assim foram divididos os lotes para produção por famílias e

área de preservação ambiental (SANTOS, 2016).

Em relação a infra estrutura da região do assentamento o documento de territorializaçao da

Residência traz que

Na região do assentamento foi construída uma agrovila com cerca de 34 famílias, uma

agroindústria de descasco e guardo a vácuo da macaxeira pela cooperativa do

assentamento, uma academia da saúde com quadra poliesportiva, associação de

moradores e os lotes onde as famílias produzem e criam animais (UNIVERSIDADE

DE PERNAMBUCO, 2015a).

Na antiga casa central da fazenda hoje funciona o Centro de Formação Paulo Freire (Figura

11), sendo uma referência para o MST e para os trabalhadores assentados do Estado de

Pernambuco. No lugar ocorrem estudos, formações, encontros, seminários, reuniões e

socialização. Para tal, nele foram construídos um alojamento, refeitório, biblioteca, auditório,

salas de aula, além de horta medicinal em forma de mandala (Figura 10), que é também um

espaço produtivo com verduras, vegetais, galinha, peixe e pato.

Essa infraestrutura possibilita uma atuação ativa do MST no território, o que fortalece essa

micro área, diferente das outras de cobertura da Unidade de Saúde. Normandia destaca-se por

ter sua associação de moradores com maior poder de organização e reinvindicação no espaço.

Contudo, apesar de ter o Centro de Formação de Normandia, de forma contraditória, os

profissionais das Unidades de Saúde Família do campo da região não participam das formações

do Centro, que normalmente tem temáticas relacionadas a plantas medicinais, agroecologia ou

saúde do campo. A gestão já inicia um diálogo com o MST porém ainda são poucas as

iniciativas em conjunto.

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Figura 10– Mandala de plantas medicinais e hortaliças de Normandia em 2015

Fonte: Universidade de Pernambuco (2015a)

Figura 11 – Centro de Formação de Normandia

Fonte: Santos et al. (2013)

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5.1.2 O desafio do cultivo da terra e criação de animais

O clima da região do município de Caruaru é o semiárido, que é caracterizado pela

intermitência e má distribuição do volume de precipitações de chuvas e longos períodos de

estiagem. O flagelo causado pela seca no nordeste brasileiro é um velho conhecido da

população brasileira. Durante a história a população dessa região já vivenciou ciclos de seca

em diferentes anos e por isso o interior do nordeste brasileiro já foi tema de inúmeras obras

literárias com a temática da seca (SANTOS et al., 2013).

Em Caruaru a falta de água não é diferente do resto do nordeste, como G3 pontua que já

estão a cinco anos com estiagem na região. A entrevistada P6 afirma que o trabalho base é a

agricultura, porém sua prática está bastante difícil pela falta de água na região e traz que a

solução encontrada pelos agricultores é a realização de outros trabalhos para obter a renda

familiar.No caso de Caruaru, a costura se mostra como a alternativa para conseguir o sustentoda

família.

Aqui a gente é agreste, a seca, faz cinco anos que tem, então evidentemente

que as pessoas têm que buscar um caminho, mas as raízes nunca se perdem. E

aí são essas raízes que tenciona a ter que se fazer diferente. (G3)

[O pessoal trabalha mais] É na agricultura, mas não tem mais porque parou de

chover, aí acabou com tudo de emprego aqui. Agora botaram costura aqui,

tinha os que sabem, os que não sabem aprender, os homens aprende a costurar

também. (P6)

O entrevistado P8 traz a análise de que nas situações de regiões com clima semiárido o

Estado deveria ajudar a população para encontrar soluções viáveis a fim de viabilizar a prática

agrícola.

Olha, nós temos que contextualizar que estamos no semiárido, inclusive em

um município onde tem 4 biomas diferentes e o bioma do [comunidade

estudada] o pessoal tende a dizer que parece mais ao do sertão, ao cariri, onde

você não tem brejo, onde você não tem outros biomas que propiciem a

produção agrícola e uma ausência do Estado para que nessas situações possa

se garantir a agricultura, né? (P8)

Em relação a criação de animais, segundo P6 na fala abaixo (o que pode ser visualizado

também pela Figura 12) a população desse território ainda cria animais de pequeno e médio

porte, consumindo a palma que é plantada na região (Figura 13). A prática da criação de

pequenos animais é importante para subsistência dos moradores, pois os animais produzem

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ovos e leite que podem ser comercializados ou utilizados para consumo próprio. Porém, existe

a necessidade de melhorar o cuidado para esses animais já que a morte deles representa um

prejuízo financeiro, portanto a região necessita de orientaçõesde médicos veterinários para

evitar o óbito dos animais e para que não ocorra a transmissão de doenças dos animais para os

comunitários.

Quase todo mundo aqui cria (animal). É, mas também gado, bode, galinha o

pessoal gosta. (P6)

Figura 12 – Criação de aves

Fonte: Santos (2015)

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Figura 13 – Plantio de palma

Fonte: Santos (2015)

A questão da estiagem não condiciona necessariamente o abandono da agricultura e da

criação de animais como pode-se constatar nas imagens 12 e 13. Essas práticas ainda ocorrem

na região, porém com uma frequência menor e com a escolha de produtos que sobrevivam a

estiagem. Também é importante entender que existem diversas formas de lidar com a estiagem,

como no caso de alguns poucos agricultores que possuem cisternas e poços em suas

propriedades, o que pode ser visto nas Figuras 14 e 15 abaixo.

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Figura 14 – Cisternas na comunidade

Fonte: Santos (2015)

Figura 15– Cisternas na comunidade

Fonte: Santos (2015)

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No estudo de Santos (2007), foi feito um levantamento histórico sobre as formas como os

diferentes governantes atuaram em relação a seca no semiárido, sendo destacado ações como o

Decreto de lei nº 8.486 que funda o Departamento de Obras Contra a Seca (DNOCS) em 1954

com a intenção de construir açudes e outras ações em prol da população que vivencia a seca,

entretanto o órgão não teve êxito, pois era submetido a interesses políticos. Posteriormente em

1959 foi criada a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) com intuito

de dar subsídio ao desenvolvimento do nordeste, porém com o golpe militar a SUDENE não

conseguiu alcançar seus propósitos e não conseguiu da suporte a população que em 70 sofreu

com a seca na região. Assim, as medidas e ações para enfrentar a seca no nordeste não têm tido

a consistência e a continuidade necessárias.

Além do clima, a comunidade camponesa também lida com materiais tóxicos para tratar as

pragas de suas lavouras, isso porque estão com o olhar no modo de produção de larga escala e

de uma suposta tecnologia agrícola, assim utilizam agrotóxicos sem ter ciência dos perigos para

a saúde que esses produtos podem causar. O crescente consumo mundial de pesticidas é um

grande problema para a saúde pública, pois esse acarreta um grande número de intoxicações

exógenas, agudas e crônicas, além de causas secundárias à exposição desse material. Alguns

estudos já apontam um possível aumento de casos de câncer e suicídio relacionados ao contato

prolongado com agrotóxico (FARIA, 2014; JOBIM et al., 2010; MATOS, 2013).

Através do trecho de entrevista de P3 podemos constatar a falta de conhecimento acerca o

uso e das consequências do contato prolongado com agrotóxicos.

Hoje em dia 100% da plantação usa [agrotóxico] (As latas junta água?) Junta,

uns usam pra colocar plantas, outros que são serventes deixam guardadas que

serve pra ajuntar massa. [...] Eu nunca falei nada [para eles em relação a

agrotóxicos] [...] (já pensou nisso?) Já, mas a questão é de falta de

conhecimento. O que isso pode vir a prejudicar. Eu acho que tanto na zona

rural, como na urbana deveria ter mais informação sobre o que pode fazer e o

que não pode. [...] a gente não tem a informação concreta, às vezes as coisas

tá tão na frente mas a gente não sabe. (P3)

Segundo Gasparini (2012) o trabalho agrícola vem atrelado a riscos em relação a exposição

à radiação solar; ruído e vibração; acidentes com animais peçonhentos; exposição a agentes

infecciosos e parasitários; exposição a partículas de grãos armazenados; ácaros; pólen; detritos

de origem animal; acidente com ferramentas, máquinas e implementos agrícolas; exposição a

fertilizantes e aos agrotóxicos. Apesar de alguns desses riscos serem mencionados durante as

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entrevistas e nos documentos de gestão, pouco é trabalhado na prática junto com os

trabalhadores.

No Plano Municipal de Saúde do município e no Planejamento Anual de Saúde a sessão que

trata sobre a vigilância do trabalhador traz a intenção de implantar protocolos para o tratamento

de intoxicação exógena de agrotóxicos, antecipando assim possíveis incidentes advindos do uso

de agrotóxico na região:

Implantar protocolo e fluxo para intoxicações exógenas regional

(CARUARU, 2014a)

Implantar protocolo e fluxo para intoxicações exógenas relacionadas ao uso

de agrotóxico (CARUARU,2015b)

Compreendemos que a execução dos serviços de vigilância, especialmente, a inserção da

saúde do trabalhador, faz parte das competências da gestão do SUS e o comprometimento deste

com o bem-estar dos trabalhadores. Ao gestor municipal compete assumir a gestão e execução

das ações de vigilância em saúde realizadas no âmbito local, compreendendo ações de

vigilância epidemiológica, sanitária, de alimentação e nutrição, de saúde do trabalhador e

ambiental (BRASIL, 2006).

Contudo, a iniciativa municipal em relação a questão dos agrotóxicos e outras questões

ligadas ao trabalho na região ainda é muito incipiente e apenas um primeiro passo para atuação

sobre esse tema. É necessário fazer capacitações e treinamentos junto aos profissionais de saúde

para que estes possam abordaros temas no cotidiano de trabalho, já que na fala de P3, colocada

acima, demonstra que os profissionais de saúde não se mostram aptos para orientar sobre os

perigos do uso de agrotóxicos em relação à saúde.

Outra medida que pode ser tomada é fomentar e discutir com os moradores diferentes formas

para lidar com as pragas que atacam as lavouras. Estudos sobre permacultura e agroecologia já

trazem diferentes formas de lidar com a produção agrícola afim de diminuir o número de pragas.

Estes métodos são tecnologias mais limpas e corroboram com modelos de produção mais

saudáveis, compatíveis com a agricultura familiar (PORTO; SOARES; et. al., 2012).

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5.1.3 Trabalho e vida

Tradicionalmente as famílias camponesas tem sua produção ligada a atividades agrícolas,

contudo, como no agreste algumas regiões convivem com a dificuldade de exercer

exclusivamente de práticas agrícolas, estas mesclam suas atividades.No caso do município de

Caruaru, grande polo têxtil, a população camponesa trabalha nas pequenas confecções de

roupas ou transformam sua casa em pequenos fabricos. Este trabalho normalmente está atrelado

a péssimas condições de trabalho (MATOS, 2016).

Estas questões foram ratificadas pelas falas de profissionais e gestores:

[A população daqui trabalha com] Costura, pra Toritama e Caruaru. (P1)

a questão da inserção da confecção, da indústria, a economia mudou bastante

ao longo do tempo na história do município porque tem a coisa do comércio,

né? E a sulanca veio para fortalecer um pouco isso também e aí muitas pessoas

da zona rural trabalham, mas a gente entende que eles estão na confecção, mas

eles não perdem as raízes, né? De ter sua terra, pelo menos para a agricultura

de subsistência, então eles tem essa duplicidade. (G3)

Em uma das visitas domiciliares realizadas, ao chegar notamos que todos os moradores da

casa estavam no terraço para aproveitar a luminosidade do sol e trabalhavam com pedaços de

shorts na mão para retirar “o pelo”, fios soltos da roupa, os moradores relatam que trabalham

durante o dia inteiro, pois quanto mais produzem, mais recebem. Também relatam que esse

trabalho adentra pela noite e por causa da pouca luminosidade na casa “machucam a vista”

(Diário de Campo).

Estudos realizados na região com foco no trabalho precário na indústria do vestuário

destacam a super exploração como característica no trabalho realizado, que se dá através da

distorção do valor do trabalho socialmente necessário, com uma grande redução dos salários do

trabalhador. Isso porque a maioria do serviço se dá sem regulamentação de carteira de trabalho

assinada, associando o pagamento ao quantitativo da produção, o que restringe a remuneração

aos mínimos de sobrevivência. A consequência lógica desse tipo de trabalho é a redução da

qualidade e do tempo real de vida do trabalhador pelo desgaste psico físico do trabalho,

impossibilitando, inclusive, uma maior interação desses sujeitos com a comunidade e com sua

própria vida (MATOS, 2016).

O profissional P1 abaixo identifica a exploração que a população vive com a produção de

roupas, por pegarem apenas uma parte da fabricação num modo fragmentado de trabalho aos

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modos do Fordismo-Taylorismo, onde uma família não realiza todas as etapas da fabricação de

um objeto e sim partes dela.

Acho que dá pra sobreviver, pra uma pessoa inteligente até que dá. Quando

eles fabricam e vendem é melhor, porque quando eles já pegam a costura de

outro é pior. (P1)

Reafirmando a existência da superexploraçãodo trabalho na região, P8 destaca as mudanças

no arranjo da casa que dá espaço a máquinas de costura, a mudança de modo de viver com a

lógica do urgente, do trabalho até a exaustão. Assim o trabalhador muitas vezes adoece e

continua tendo um pequeno retorno financeiro.

Então se a gente imaginar esse mundo do trabalho, o mundo da costura tinha

uma paciente que estava me falando que ela ganha 10 centavos por peça. Ela

normalmente tenta fazer mil peças por semana, mil peças por semana dariam

R$100, 00 por semana, R$400, 00 por mês, meio salário mínimo. E em um

processo onde você vê inclusive o desarranjo da arquitetura familiar, da

arquitetura da casa mesmo, né? As salas deram lugar a costuras, então você

entra na casa das pessoas e elas estão costurando. Como elas ganham por

produção que é diferente da lógica do campo, o tempo é precioso para elas,

então passa a ser da cultura delas a cultura do urgente. Aquilo é para hoje,

aquilo é para agora porque se eu perder tempo, eu perco tempo de costura e se

eu perder tempo de costura eu perco dinheiro e dificulto a minha vida. (P8)

A gestão no plano municipal de saúde não apresentou uma forte atuação dentro dos seus

documentos de gestão para a questão da terceirização da produção têxtil e sobre o adoecimento

da população por Lesão do Esforço Repetitivo (LER) e Doença Ocupacional Relacionada ao

Trabalho (DORT). No que diz respeito aos riscos ocupacionais, a prática da costura realizada

em horas prolongadas está associados a altos índices de dor na região cervical e nos membros

superiores, entre outras patologias osteomioarticulares (CARUARU, 2014a; OLIVEIRA et al.,

2010; KROST, 2015).

Na sessão relacionada a Vigilância do trabalhador no documento do Plano Municipal de

Saúde podemos ver a intenção de aprofundar o olhar para os processos produtivos da região o

que pode ser o início de um processo de mudança no que diz respeito a atuação junto a

população que trabalha na indústriatêxtil da região, principalmente os trabalhadores informais,

que normalmente tem um processo precarizado e adoecedor de exploração.

Mapear os processos produtivos da Região (CARUARU, 2014ª)

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Nas entrevistas abaixo, P1 traz que a população camponesa é mais carente que a população

da cidade, essa afirmação pode estar atrelada às dificuldades que a população camponesa

vivencia por falta de investimento na efetivação das políticas públicas voltadas para o campo.

Diferencia muita coisa, principalmente, a questão econômica. Porque a

população do campo é mais carente, já da cidade não. (P1)

Contudo P5 destaca que as pessoas que não tem renda fixa têm mais dificuldade de vida, e

ter renda fixa não parece ser a regra na região. O entrevistado P5 ainda destaca que pessoas

com melhores condições econômicas têm melhores condições de vida e de acesso a água.

Vê só, aqui - até nessa parte que é mais próxima - falta água, tem casas que

tem 4 ou 5 meses que não chega água. Então tem algumas pessoas que tem

dificuldades, que são bem precárias aqui. Da mesma forma que tem gente que

mora mais afastado que tem mais condições, então não por conta da

localização, é pelo meio, pelo trabalho, pelo orçamento. Então aqui é forte a

questão da costura, a fonte de renda mais forte aqui [da região] é costura, nem

a agricultura é tão forte. Mas tem algumas pessoas que tem dificuldade, que

não tem renda fixa. (P5)

No que diz respeito a economia local tanto durante a vivência quanto no momento das

entrevistas pode-se constatar que a região ainda pratica a agricultura, porém é notável a força

que a indústria têxtil tem na região. Sem um abastecimento de água que garanta um maior

investimento na agricultura familiar a população é atraída para a indústria têxtil. A população

assim, têm a renda familiar garantida pelo trabalho têxtil, pela aposentadoria dos mais idosos e

a venda da pequena produção agrícola. Dessa forma, fatores como renda variável,

superexploração do trabalho têxtil, falta de água parecem ser o ponto chave para a determinação

social da saúde na região.

5.1.4 Mobilidade da população

A mobilidade da região adstrita pela USF do campo estudada apresenta uma precariedade,

pois apesar da região ser cortada por uma Rodovia Federal e ter “Toyotas” (Carros privados

que fazem lotação) e ônibus do centro de Caruaru para a região da USF do campo via

Rodoviária, esses transportes não fazem o percurso por dentro do território (Diário de Campo).

Isso faz com que as regiões mais afastadas da Rodovia fiquem sem transporte coletivo,

dependendo assim de motos e carros privados para se locomover. Outro fator de dificuldade

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são as grandes distâncias entre as diferentes vilas do território, que, por não ter transporte

coletivo, ficam isoladas. Contudo, essa característica pode ser modificada com a ampliação de

transporte público na região, essa estratégia se mostra urgente já que impacta diretamente

dificultando o acesso para vários serviços de saúde, educação, entre outros. Nos trechos de

entrevista do profissional e gestor abaixo podemos ver a falta de alternativa de transporte nas

diferentes microrregiões.

Na cidade tem ônibus, moto táxi, transporte que no campo as pessoas que

moram mais distantes não tem acesso a unidade. (P3)

nós temos áreas rurais bastante extensas, densidade demográfica, micro áreas

longínquas, então é diferente, quer dizer, a formação dessa rede no campo é

bem complicada, bem difícil. (G3)

Segundo os estudos de Travassos e Castro (2012) existem diversas barreiras para o acesso a

saúde (barreiras geográficas, financeiras, organizacionais, informacionais, culturais). A barreira

geográfica está relacionada a dificuldade que o usuário encontra em realizar seu deslocamento

enfrentando assim, dificuldade para percorrer os espaços entre sua residência e os serviços de

saúde. Assim, consequentemente quanto maior a distância e a dificuldade de acesso a meios de

transporte, menor a utilização de serviços de saúde.

De acordo com P5, essas dificuldades na mobilidade das áreas distantes da região,

caracterizam uma barreira para os serviços em geral, inclusive, ao serviço de saúde. Em

consequência, o trecho do Plano municipal de saúde abaixo sinaliza a necessidade de maiores

intervenções no que diz respeito ao acesso à saúde (CARUARU, 2014a).

Com relação a acesso é complicado. Tem micro áreas que mais fácil ir pro

centro da cidade que vir aqui pra unidade, elas são de difícil acesso. (P5)

No contexto do município de Caruaru as provocações atuais observam-se a

necessidade de sistematizar as intervenções sobre algumas questões que têm

vínculo direto com o acesso da população à saúde na forma constitucional

deste direito de cidadania (CARUARU, 2014a).

Os estudos de Bohes e Fernandes (2011) demonstram que o campo historicamente se

organizou na forma em sítios e parcelas, tendo a distância entre as casas como uma de suas

características. Entretanto, essa distância entre as diferentes propriedades dificulta a assistência

à saúde e se mostra como um elemento marcante para o isolamento, fazendo com que aspectos

como isolamento geográfico e acessibilidade limitada componhama determinação social da

saúde do campo.

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Alguns estudos já apontam para formas potentes de organização do espaço do campo através

das agrovilas, onde os camponeses moram em uma vila e tem seus lotes para plantio em locais

próximos. Essa forma de organização foi utilizada pelo Assentamento Normandia para

potencializar o convívio em comunidade, bem como facilita a organização para construção de

serviços, como escolas, na localidade (Diário de Campo).

5.1.5 Costumes culturais, religiosos e de autocuidado

O Brasil é um país multicultural pela múltipla composição existente em seu território desde

a influência da religiosidade católica europeia; a do catimbó e plantas medicinais indígenas e o

culto dos orixás da cultura negra. No campo, a influência cultural miscigenada também se

mostra presente nos cultos de fé e no autocuidado através de plantas ou rezas.Porém, as

tradições, os conhecimentos e os saberes geracionais ao mesmo tempo que resistem no campo,

também são ressignificados com elementos da contemporaneidade (OLIVEIRA, 2016).

Apartir desse legado cultural, se realiza o autocuidado do cotidiano, que é compreendido

como à capacidade que os indivíduos têm de cuidar de si, desempenhando atividades em seu

próprio benefício, a fim de manter a vida, a saúde e o bem-estar próprio (SANTOS; SARAT,

2008). No que diz respeito ao autocuidado religioso, a população cultua padroeiras da religião

católica, realizando festividades, além de reuniões para rezar e se confraternizar como podemos

constatar pela fala de P1 e pelo Relatório de Territórializaçãoda Residência:

O pessoal gosta [das festividades], tem por exemplo a festa da padroeira, aí

pra eles é uma data importante. (P1)

“Em Queimada de Uruçua população no local declara-se predominantemente católica, e nas

quartas-feiras se reúnem para rezar o terço e, caso necessitem de alguma reunião não religiosa,

aproveitam para discutirem lá mesmo” (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015a).

Em contrapartida, na região existem poucas pessoas que se denominam rezadeiras ou

benzedeiras segundo os trechos das entrevistas dos profissionais abaixo, porém esses sujeitos

ainda se fazem presentes na localidade e, mesmo de forma mais discreta, a população busca

pelo serviço para solucionar questões de saúde, mal olhado e má sorte.

Eu não vejo isso com um entrave pra saúde deles, pois quando eles procuram

um rezador ou usam plantas medicinais, e não resolve, eles procuram a

unidade [...] E também tem a questão da educação em saúde, já que a

população do campo geralmente tem seu cuidado baseado em rezadores,

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curandeiros, na base de plantas e de ervas. Então, a gente tirar um pouco dessa

cultura, mas claro que também tem seu valor. (P4)

Aqui acabou quase tudo [em relação a rezador]. Mas tem ainda o pessoal mais

velho. (P6)

Principalmente no catimbó e nas rezadeiras, elas ainda estão por aí resistindo,

rezando as crianças e tentando fazer sobreviver. (P8)

Os profissionais de saúde da USF apesar de saber da existência dessa prática não têm uma

proximidade ou diálogo no cotidiano com os rezadores e benzedeiras da área.Contudo, alguns

profissionais, como podemos ver na fala de P3, estão mais próximos desse tipo de cuidado, por

utilizá-lo no cotidiano da sua vida particular, porém, mesmo esses, não os inserem no cotidiano

do trabalho na USF.

Eu sempre levo meu menino lá quando ele tá meio desanimado, que as vezes

é olhado. Eu não rezo muito, mas eu acredito que reza maior do que Deus não

existe. [...]Tem rezedeira só pra questão de peitos abertos, mal olhado. (P3)

Nos documentos da gestão podemos ver um recorte para questão da saúde da população

negra. A cultura de matriz africana e as benzedeiras são citadas nos documentos de

planejamento da gestão municipal, porém isso não significa que esses pontos tem se convertido

em atividades concretas no cotidiano de trabalho, pois os profissionais de saúde não têm

proximidade com a temática e com esses atores no território.

Ampliar o acesso aos serviços de saúde para população negra residente em

áreas urbanas e rurais.; Realizar oficina com os profissionais de saúde para

inclusão da população de cultura de matriz africana e benzedeiras (Plano

Municipal de Ssaúde 2014-2017).

Além da fé, da busca pelas benzedeiras e rezadores, a população também utiliza as plantas

medicinais para seu autocuidado, prática essa que é mais conhecida e utilizada na região. A

cultura de utilizar plantas medicinais como medicamento é uma prática realizada desde a

antiguidade, fazendo parte do contexto cultural em busca de restabelecer a saúde do indivíduo,

e que foram transmitidas historicamente no ambiente familiar, tendo um forte componente

geracional. (BARBOSA et. al., 2009). Abaixo nos relatos de P2 e no relatório de

territorialização da UPE podemos constatar o uso de plantas medicinais no cotidiano

(UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015a).

[O usuário] Usa chá, lambedor, banho de assento. Tem senhora aqui que diz:

nunca vou fazer exame ‘porque eu tenho meu banho de assento’, que nunca

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teve um corrimento. Aí eu digo tudo bem, continue fazendo seu banho de

assento, já que tá servindo, mas tem que dar uma passadinha na doutora, tem

que fazer a sua citologia pra saber como é que tá aí dentro. (P2)

Na comunidade de Rafael de Dentro muitos utilizam plantas medicinais para

problemas como dor de cabeça, dor de dente e garganta (UNIVERSIDADE

DE PERNAMBUCO, 2015a).

Entretanto, nesse e em outros estudos já é possível se detectar uma diminuição do

autocuidado através do uso das plantas medicinais no território, sendo uma prática mais forte

entre os idosos em relação às novas gerações, fato explicitado pelos profissionais nos trechos

abaixo. Esse fato pode ser explicado pela super valorização do saber científico, medicalização

do processo de cuidados na saúde e a não valorização dos saberes populares e culturais, ainda

imbuído de preconceito e desvalorização dos saberes de origem popular (BATISTA;

ALBUQUERQUE, 2014; SOUZA, 2011;).

quando a gente perguntou sobre plantas medicinais, muitos idosos tomam erva

cidreira, capim santo. Mas já os novos não. (P3)

[o uso de plantas e chás] Ocorre, mas achava que seria mais forte. (P5)

Ainda é, mas a gente percebe que está se perdendo, né? A gente conversa com

pessoas de maior idade e elas não só tem o conhecimento mas tem a prática.

Quando a gente conversa com pessoas mais novas, elas podem ter o

conhecimento porque os pais tratavam e tal, mas não tem tido a prática. [...]

mas é uma tradição que se não cuidar ela tende a desaparecer e ser dominada

por um mercado que prefere vender passiflora em comprimido que as pessoas

plantarem maracujá. (P8)

Contudo numa visita a região pode-se notar que muitos quintais ainda tem o plantio de

plantas medicinais como babosa, hortelã graúda, hortelã miúda, insulina entre outros, como

pode-se constatar na figura 16.

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Figura 16 – Plantas do quintal de uma usuária da USF do campo estudada

Fonte: Santos (2015)

O estudo de Souza (2011) com profissionais de saúde do Pará, demostrou que dentre os

profissionais de nível superior cerca de 90% têm aproximação e conhecimento sobre plantas

medicinais através de livros e a maioria deles preferem prescrever e orientar o uso de

medicamento sintético. Já em relação aos profissionais de nível médio, 100% tinham adquirido

o conhecimento sobre as plantas medicinais através de um repasse oral de um familiar e a

maioria desses prefere orientar o uso de plantas medicinais, fato esse que nos faz questionar o

quanto a academia ou o nível de instrução pode distanciar as pessoas do conhecimento popular.

A gestão também apresenta pouca aproximação com os temas da cultura local. Esse fato

pode ser constatado quando observamos o Quadro 5, logo abaixo, onde verificamos que em

apenas um dos documentos da gestão estudado foi possível observar a referência a palavras

como benzedeiras, plantas medicinais e rezadeiras. Essa ausência aponta para a inexistência de

ações voltadas para o fortalecimento dessas práticas ou o incentivo do olhar para a cultura da

região e seu autocuidado.

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Quadro 5 – Frequência de palavras chaves relacionadas com a cultura e a vida nos documentos da Gestão

de Caruaru

Documentos

Frequência das

palavras

Agricultura ou

Costura

Frequência das

palavras

Agrotóxico, Raios

Solares

Frequência das

palavras

Benzedeira,

Plantas medicinais

Rezadeira

Plano Municipal de Saúde

2014-2017

1 5 1

Plano Anual de Saúde de 2014 Não aparece Não aparece Não aparece

Relatório Anual de Gestão

2014

Não aparece Não aparece Não aparece

Plano Anual de Saúde de 2015 Não aparece 1 Não aparece

Fonte: Autora

Em relação aos demais tópicos analisados nos documentos de gestão, explicitados no quadro

acima, pode-se concluir que os aspectos da saúde relacionados a fatores climáticos e de trabalho

(agrotóxico, raios solares) são apontados no Plano Municipal de Saúde de 2014-2017, mas nos

documentos de 2014 não é citado como atividade anual, apenas reaparecendo no ano

subsequente. Quando a temática analisada foi o trabalho (agricultura e costura), o Quadro 5

demonstra uma maior fragilidade nos documentos de gestão que praticamente omitem esse tema

de suas ações, sendo apenas citado uma única vez no Plano Municipal de Saúde.De forma geral,

esse quadro demonstra o reduzido olhar que a gestão apresentou para as temáticas de saúde e

trabalho do campo, como os riscos desse tipo de trabalho,bem como na questão do autocuidado

através benzedeiras,rezadeiras e plantas medicinais (CARUARU, 2014a).

5.2 Conceito sobre Saúde do Campo

Na descrição dos resultados desta categoria foram exploradas as seguintes subcategorias:

Conceitos sobre a saúde do campo, objetivos do trabalho da saúde do campo e sua implantação.

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5.2.1 Conhecendo a Saúde do campo

Os profissionais reconhecem a existência de diferentes necessidades de saúde para a

população do campo, destacando tanto as condições de vida como também a situação de

exploração do trabalhador como fator de adoecimento.

Eu acredito que a saúde do campo é uma saúde um pouco diferenciada, porque

na verdade o pessoal do campo lida com produtos que os da cidade não

lidam.[...]. Não só para aquele lado corriqueiro, mas também com agrotóxico

e outras coisas também que diferenciam o pessoal do campo do pessoal da

zona urbana. (P2)

nós usamos um termo que é “a saúde é a capacidade de resistir quanto a

qualquer opressão”. E essa saúde na população do campo a gente tenta visar a

opressão e a resposta a ela, né? É entender que a população do campo tem uma

formação distinta, um complexo sócio cultural diferente da cidade onde nos

seus territórios incidem de outras maneiras o que a gente chama de sociedade

moderna e que por isso vai se materializar tanto a saúde como a doença de

formas completamente diferentes comparado a população da cidade. (P8)

Os gestores quando conceituam a Saúde do Campo apontam que não existia um olhar para

as demandas dessa população, sinalizando ainda que não se tinha uma consciência da

necessidade de organizar e executar a saúde de um modo diferente do realizado na cidade.

Porém, foi possível perceber que esses já trazem a necessidade de um olhar diferenciado que

entenda os aspectos culturais, de renda e de infraestrutura. Com a criação da PNSIPCFA, existe

uma maior pressão junto aos gestores para um fazer saúde diferente e de acordo com as

demandas do território.

Historicamente não se enxergava a saúde do campo como diferenciada, então

o gestor reproduzia o mesmo tipo de assistência que na zona urbana. (G1)

Eu acho que seria a gente respeitar a cultura, respeitar o território que é

diferenciado. Principalmente a questão de renda, de infraestrutura. Porque a

gente fala de saúde, mas ela está diretamente ligada também à questão de

saneamento. (G2)

Por tudo isso, quando dizemos “Saúde do Campo” afirma-se as populações que vivem do

campo como parte do campesinato, com relações com terra, com as plantas, com a produção

familiar, que tem seus modos de vida específicos. Contudo, para se fazer presente uma real

prática de Saúde do Campo nos serviços e na gestão é necessário investimento por parte dos

atores em conhecer, se aproximar, se debruçar e mudar o modo de cuidar. Pois, pensar e fazer

Saúde do Campo - e não simplesmente estar “no” campo – implica em um respeito aos seus

modos de vida.

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5.2.2 Objetivos do trabalho da saúde do campo e sua implantação.

Os gestores trazem como principais objetivos da implantação da PNSIPCFA a necessidade

de aproximar a atuação dos profissionais da Saúde das reais demandas dos camponeses da área,

afim de realizar uma proteção dessa população planejando e promovendo atividades realmente

voltadas para a população do campo.

Acho que o principal objetivo da saúde da família na área rural é de proteção,

de informação e de qualificação sobre a saúde do sujeito [...] O meu

entendimento é que as pessoas e os trabalhadores do campo precisam ser

enxergados nas suas especificidades, dentro de seus contextos. E as pessoas

do campo muitas das vezes também não reconhecem as suas especificidades,

não se reconhecem como trabalhadores do campo. Então o nosso

entendimento é de planejar e prover políticas realmente voltadas para as

pessoas do campo. (G1)

Ainda é observado a necessidade de um trabalho conjunto entre os profissionais de saúde, a

população, a academia e os gestores, no que diz respeito ao fortalecimento da PNSIPCFAe

implantação no município. Os entrevistados respetivamente trouxeram a academia como

primordial para aproximar o debate da saúde do campo e ajudar a elaborar formas de atuar no

território.

Essa [PNSIPCFA] foi uma temática que a gente incorporou e foi feito um

debate. Acho que o fato da gente ter recebido uma residência de saúde do

campo ajudou bastante [...] A gente também incorporou profissionais que tem

expertise nessa área, alguns ligados ao MST, outros que fizeram residência

nessa área. Então a gente tá realmente tentando colocar em prática essa

política, observando a realidade do município. (G1)

Aqui em Caruaru, até a residência no saúde do campo veio muito para nos

ajudar, quer dizer, a academia ter se inserido nesse processo de construção,

veio muito para estimular, para tensionar inclusive a visão, o olhar da gestão

como um todo, a macro política as vezes não permite ter esse olhar mais

específico. (G3)

Observando os documentos da gestão no Quadro 6, nota-se que as palavras ‘rural’ ou

‘campo’têm uma grande frequência de citações nos documentos, contudo, em uma análise mais

qualitativa dessas citações vemos que essas se referem apenas para destacar que uma mesma

atividade será feita nas regiões urbanas e rurais. Nos documentos analisados pouco apareceu

em relação às atividades pensadas de forma específica para as necessidades ou contexto do

campo.

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Quadro 6 – Frequência de palavras chaves (Rural ou campo) nos Documentos da Gestão de

Caruaru

Documentos

Frequência de palavras Rural ou Campo

Plano Municipal de Saúde 2014-2017 35

Plano Anual de Saúde de 2014 6

Relatório Anual de Gestão 2014 10

Plano Anual de Saúde de 2015 6

Fonte: Autora

Podemos afirmar que já existe em Caruaru o conhecimento sobre a existência da PNSIPCFA

e atividades que se aproximam de sua implantação. Também pode-se observar que o município

já se aproximou de instituições acadêmicas que discutem o campo e do movimento

socialcamponês presente na região, inclusive com algumas propostas pioneiras em andamento,

como a Residência de Saúde da Família com ênfase no campo.Contudo é necessário um maior

investimento para a implementação da política no cotidiano dos profissionais e gestores, para

que estes passem a considerar o modo de vida específico dessa região (Diário de Campo)

(CARNEIRO et al., 2014).

5.3 O Processo de Trabalho da Equipe de Saúde da Família do campo

O Processo de Trabalho da saúde se mostra um complexo estudo dentro da pesquisa sobre o

trabalho humano. Para uma melhor compreensão o processo de trabalho foi analisado e

categorizado de acordo com as seguintes subcategorias: objeto de trabalho; agentes do trabalho;

meios de trabalho; organização do trabalho.

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5.3.1 Objeto de Trabalho

O objeto de trabalho na saúde é o próprio trabalho em saúde e ele pode se dar de várias

formas, apartir dos meios de trabalho e da sua organização, existindo assim um aspecto

relacional dinâmico (SILVA-ROOSLI; ATHAIDE, 2011).

O trabalho em saúde na ESF tem por base o olhar sobre o território adstrito e aos indicadores

de saúde da região para através de um vínculo e diálogo constante com a comunidade buscar a

prestação de serviço de saúde de qualidade com o objetivo de um melhor acesso à saúde de

forma integral. Essa diferença do trabalho em saúde já é sinalizada por outros autores que

apontam a ESF como uma inovação tecnológica de organização e gestão do trabalho em saúde

ao comparar seu complexo trabalho cotidiano e a organização do fazer saúde do modelo

tradicional influenciado pelo Relatório Flexner da ciência positivista (SHERER et al., 2014).

Essa nova tecnologia da ESF inova quando fortalece o olhar sobre a qualidade de vida e

saúde como seu foco, em contraponto ao trabalho tradicional em saúde que tem como foco do

trabalho a busca pelo corpo doente e a luta em mantê-lo sadio. Assim a EqSF tem a tarefa de

ampliar o olhar equilibrando ações de promoção, prevenção e cura no seu cotidiano. Contudo,

vemos que em alguns momentos a EqSF se mostra mais próximas das características do

território e necessidades da população, mas de forma geral sua prática muitas vezes apenas

reproduz as diretrizes do saber clínico e normatizador. Isso é ainda mais desafiante quando se

vai para o contexto do campo, pois a maioria dos profissionais de saúde vivenciaram a vida e

lógica urbana, sendo necessário aprender novos costumes, cultura e modos de viver a vida a

partir desse novo contexto.

É preciso entender que o usuário do campo pode ser mais envergonhado para relatar questões

íntimas importantes para o cuidado; que a dor pode ser relativa e as vezes subestimada pela

população que em alguns momentos a enxerga como algo menor; que o melhor momento de

encontrar os comunitários é quando estão sentados na beira da calçada e conversando sobre

saúde no fim da tarde; e que fazer educação em saúde para população em dia de feira ou é se

fazna própria feira ou não tem público (Diário de campo).

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5.3.2 Agentes do Trabalho

A Unidade de Saúde do campo estudada é composta por um médico, um médico residente,

uma enfermeira, uma enfermeira residente, uma dentista, uma dentista residente, uma técnica

de saúde bucal, pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), uma técnica em enfermagem, um

motorista, uma recepcionista, uma pessoa para os serviços gerais, o Núcleo de Apoio à Saúde

da Família (NASF) composto por profissionais de nível superior em saúde.

Alguns desses profissionais, principalmente os ACS, são moradores do território adscrito e

esse fator parece favorecer um maior vínculo com os usuários e uma participação mais efetiva

na vida social da comunidade como traz P8:

Eu acho que a gente pode fazer uma diferenciação clara dos profissionais que

trabalham e moram aqui na comunidade e daqueles que não moram. Quase

100% daqueles que não moram eu acho que não veem aqui como seu espaço

comunitário, então até pelo tempo de trabalho não se relacionam com a vida

da comunidade. (P8)

Segundo Silva-Roosli e Athaide, 2011 os ACS têm uma grande inserção no território.Essa

estratégia de inserir moradores daprópria região no fazer saúde é utilizada desde 1943 pelo

Ministério da Saúde através dos chamados “visitadores sanitários”, “guarda da malária” e hoje

ACS e agentes de saúde ambiental.

Os demais profissionais também conseguem uma vinculação forte com a comunidade,

porém esse vínculo está muito mais relacionado a uma confiança profissional-usuário e que só

em alguns momentos chega ao campo de uma ralação mais próxima do cotidiano dos

moradores. Segundo P4 e P2, os profissionais de saúde não tem dificuldade de estabelecer

vínculo com a comunidade, sinalizando que no campo é mais fácil de ganhar o respeito e

confiança dos comunitário.

pessoal de zona rural o vínculo é muito mais fácil e forte, não sei se pela

situação de dificuldade que a população do campo vive, mas o fato que com

eles o vínculo é mais sincero, chega ao ponto deles tomarem aquilo que você

fala como verdade, não questionam tanto né, e por um lado isso é bom, mas

tem outro que é ruim, porque tem uma certa carência na educação em saúde.

Mas o vínculo é muito mais forte. (P4)

muitas das vezes eles chamam pra almoçar na sua casa, então isso acaba

criando um vínculo. E as pessoas, eu acho, se sentem até mais à vontade de

passar pro médico verdadeiramente o que elas sentem (P2)

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Contudo, essa aproximação não implica dizer que os profissionais não tragam preconceitos

em relação a população camponesa, pois alguns profissionais ainda apresentam um olhar

caricaturado do camponês sem instrução, sem conhecimento generalizando-os.

Assim o povo do campo tem aquela dificuldade pra ir pra cidade e o povo da

cidade já tá lá, tem conhecimento. E o povo do campo é um pouco ignorante

ele não tem conhecimento nenhum, e o povo da cidade sabe de tudo. (P1)

O povo de sítio é um povo rígido de ir pra médico. Aí o médico sempre tem

que puxar mais conversa pra ver se puxa mais alguma informação [...] O povo

da minha área é um povo mais antigo daqui, que mesmo estando doente só

vão pro médico quando é nas últimas. E quando o médico faz a visita não fala

tudo. (P3)

A Unidade do campo estudada tem uma grande interação com a academia, dessa forma, se

configura como cenário de prática a formação em saúde. Atualmente, essa unidade de saúde

recebe profissionais da Residência Multiprofissional de Saúde da Família com ênfase no campo

da UPE e a Residência médica de Saúde da Família da UFPE, sendo também campo de prática

para graduandos da medicina da UPE e da UFPE.

Abaixo P4 relata a diversidade de profissionais de saúde que atuam na USF:

A unidade [estudada] tem muitos profissionais, porque além da equipe básica

(médico, enfermeira e técnica) tem os profissionais do NASF, que é o núcleo

de apoio ao saúde da família, com fisioterapeuta, com assistente social. Então

a gente tem residência médico, que o residente é doutor [nome do

profissional], também a residência de saúde do campo, que é multidisciplinar.

Então a nossa oferta de profissional é muito grande. (P4)

A Residência Multiprofissional de Saúde da Família com ênfase no campo da UPE surge

nas falas dos gestores e profissionais como importante fator de ampliação do olhar para a saúde

do campo no território como observado no trecho de G3 abaixo.

Acho que sempre existiu essa preocupação, mas realmente a residência do

campo trouxe essa maior visibilidade (para a saúde do campo), porque mesmo

na zona rural a gente tem as unidades que é o equipamento de saúde que está

na rede de saúde construída aqui para o município, mas nós temos áreas rurais

bastante extensa, densidade demográfica, micro áreas longínquas, então é

diferente, quer dizer a formação dessa rede no campo é bem complicada, bem

difícil e os residentes eles são os olhos dessa necessidade nesse momento.

(G3)

Um importante ator no processo de diálogo entre Gestão e profissionais de Saúde é o

Apoiador Institucional (AI), que surge na organização da saúde como articulador do Processo

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de Trabalho e Educação Permanenteem Saúde (EPS). Os trechos da entrevista de G1 e G2

abaixo se aproxima da concepção aqui explicitada sobre o AI.

O principal momento de diálogo é via o apoio institucional (AI). (G1)

Então esse apoiador tem a função desse diálogo entre a gestão, os

trabalhadores e a população.Então esse espaço, essa dinâmica é muito

impulsionada pelo próprio apoiador. [...] Porque as equipes reconhecem os

apoiadores como pessoas que apoia. Antes disso as unidade e equipes

profissionais viam as pessoas da gestão que estava na atenção básica como

supervisores e tinha essa função de supervisão, e tinha essa supervisão mesmo,

de chegar e checar horário e que é difícil, mas eles conseguem vincular. (G3)

O AI tem por objetivo superar a lógica gerencial hegemônica verticalizada e hierárquica, e

constituir novas relações, em que prevaleçam ações democráticas e cooperativas da equipe entre

si e da equipe com a gestão. Estimula assim, uma concepção ampliada da gestão e do trabalho

na saúde, com uma prática fundamentada na interação dialógica, análise crítica da teoria, do

planejamento e da avaliação. Assim, busca superar a concepção taylorista de supervisão como

a prática de controle e fiscalização do cumprimento das normas. Esse ator nos pareceu ter

grande importância para organizar a interação e relação entre os diferentes agentes do processo

e um potencial articulador de mudanças do Processo de Trabalho da EqSF do campo

(CAMPOS, 1998; CASTRO; CAMPOS, 2014; CECCIM, 2005).

5.3.3 Meios de Produção

Os meios de produção estão ligados as ferramentas e condições que o trabalhador dispõe para

realizar o seu trabalho englobando tanto insumos e estrutura física (salas, transporte) como

também os saberes (saber clínicos, epidemiológico, comunitário).

5.3.3.1 Estrutura física e insumos

Para que as atividades do cotidiano ocorram de forma satisfatória existe a necessidade de

uma infraestrutura adequada, que consiga comportar os diversos profissionais da USF, bem

como consiga acolher o número de usuários que buscam os cuidados de saúde.

Assim, a estrutura da unidade é composta por consultório médico, consultório de

enfermagem, consultório odontológico; área de recepção; local para arquivos e registros; sala

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de curativos; sala de almoxarifado; sala de vacinas; farmácia, sala para curativos; cozinha/copa;

sala de espera, espaço para atividades coletivas, uma sala para a escuta qualificada da triagem,

WC para os trabalhadores de saúde e WC para os usuários (Diário de Campo).

O espaço físico da USF consegue comportar os profissionais já que esses tem por função

atuar na Unidade, porém também devemadentrar no território. Corroborando ao encontrado no

estudo de Menezes (2016) - que analisou o acesso à saúde na região – vimos que a estrutura da

Unidade do campo estudada é adequada, porém o grande número de usuários acompanhados

está acima do previsto na PNAB, o que faz com quea estrutura não comportea grande demanda

da comunidade (BRASIL, 2012).

No cotidiano da unidade são desenvolvidas diferentes atividades, algumas mais ligadas ao

núcleo profissional e outras mais relacionadas ao campo de saber da saúde. Também tem como

função um trabalho mais clínico no âmbito individual desenvolvido nos consultórios e visitais

domiciliares e um trabalho que visa a saúde da coletividade. Essa atuação dos profissionais da

EqSF do campo se mostra complexa por demandar atuação no território e este se apresentar

com grandes dimensões de terra, exigindo ainda maisuma prática para além dos muros da

Unidade de Saúde, com a finalidade de um real acesso para toda a comunidade.

Dessa maneira foi observado a necessidade e garantia de um carro para a Unidade do campo

como demonstra o trecho da entrevista de G3 abaixo:

Aí vem a questão da locomoção, de transporte, que isso é um problema que

na zuna urbana a gente não tem [...] Porque transporte e acesso é um dos

problemas que quando a gente vai fazer conferências não aparece na zona

urbana, mas na zona rural o problema está lá. (G3)

O estudo de Batista e Albuquerque (2014) em área do campo destacou que mesmo em uma área

coberta por ACS, a mesma possui dificuldades de acesso pelas casas serem distantes uma das

outras. Por esse motivo, ainda que havendo cobertura da área pelos profissionais da USF, o

acesso da população não é necessariamente garantido. No intuito de acompanhar a saúde da

população que mora mais distante da Unidade diferentes estratégias tem sido executadas e uma

delas é a garantia de um carro por Unidade que atende o território do campo como vemos nos

trechos abaixo da gestão e dos profissionais.

Toda nossa Zona Rural ela tem um carro que leva a equipe e tá disponível na

Unidade [...], principalmente as visitas, porque a gente tem micro áreas, ainda,

que são 14km de distância da USF. (G2)

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[quando tem um paciente em uma micro área distante] Eu organizo caso chego

hoje, eu aviso amanhã tal hora eu irei [com o carro da USF]. (P1)

Existem aquelas localidades que já tem uns pacientes certos então o carro leva

a equipe, depois traz os pacientes, e a gente sempre tenta priorizar. (G3)

Ainda para sanar a questão de mobilidade no território, alguns profissionais utilizam o meio

de transporte próprio para visitas em áreas distantes, porém essa prática se apresenta como um

problema financeiro para o profissional, em especial o ACS que tem o maior tempo de trabalho

nas áreas distantes como podemos verificar nos trechos de entrevistas dos profissionais abaixo

Os[ACS] de lá [áreas distantes] tem moto, é dois. (P6)

Tem o carro da unidade que traz os profissionais. Se o carro não tiver e o ACS

tiver moto, a gente vai com ele [para Visita Domiciliar](P1).

[Para fazer Visita domiciliar] eu vou de moto. (P3)

Outra estratégia adotada para atendimento em áreas mais distantes é o atendimento clínico

em pontos estratégicos normalmente cedidos pelos moradores da região. Essa estratégia pode

atenuar o problema da barreira geográfica para o acesso a saúde, porém para funcionar é

necessário uma sistemática com a gestão do veículo disponível para levar o profissional de

saúde e no caso da EqSF estudada só se configura em um atendimento individual, não suprindo

a necessidade de atuação de cunho coletivo nessas localidades (Diário de Campo). Nos relatos

abaixo de 3 profissionais da EqSF é explicado como essa prática ocorre.

Quando tem liberação do carro, que é difícil, e quando o médico uma vez ou

duas por mês vai atender nas áreas que são distantes da unidade (lagoa salgada,

[...], zumbá e Rafael de dentro) (P3)

E na realidade as áreas mais distantes o médico vai até lá. De 15 em 15 dias o

médico vai fazer atendimento lá [nas micro áreas distantes] (P1)

Como a gente não tem um ponto de atendimento fixo nessas áreas, uma

unidade de apoio. Por exemplo em Lagoa Salgada a gente usa a casa do ACS,

não é o ideal, infelizmente, já que tira a privacidade e alguns usuários

reclamam, mas é o que a gente tem. Ou é isso ou não [tem] o atendimento lá.

(P4)

Segundo Ferreira (2014), que também fez um estudo acerca do processo de trabalho em área

do campo, no Paraná também foi constatado uma característica de trabalho itinerante, já que os

profissionais de saúde têm uma jornada de trabalho itinerante, atendendo várias localidades

durante a semana.

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Outro fato corriqueiro na unidade é o motorista realizar 3 diferentes transportes no trabalho

cotidiano. O primeiro é o transporte da EqSF para a Unidade, depois para a visita domiciliar e

atendimento nos pontos estratégicos em áreas distantes; o segundo é o transporte dos usuários

da área adstrita para os serviço especializado ou para a unidade; eo terceiro é o transporte de

insumos da Secretaria para a Unidade. A múltipla função da utilização do transporte é

necessária para as demandas do território, porém acaba por limitar os turnos para atendimentos

dos profissionais de saúde em visita domiciliar ou atendimento em áreas distantes. Essa

realidade é relatada abaixo pelos profissionais da Unidade e pela gestão:

Infelizmente a gente tem um problema aqui pra fazer visita domiciliar, porque

a unidade do X (estudada) tem um carro que traz os profissionais de Caruaru

pra cá, só que também é o mesmo carro que leva os pacientes pra hemodiálise

e pra fisioterapia em Caruaru, então é um carro que leva e traz. Então o carro

fica comprometido quase todos os dias da semana. [...] Então assim a gente

tem 2 turnos pra fazer visitas com o carro da unidade, ou seja, é muito ruim.

(P4)

É as vezes tem gente daqui que vai fazer exame em Caruaru aí eu levo, quando

não tem eu vou só mesmo lá pra secretaria pra esperar o pessoal daqui. Levo

pra UPA, pra onde for, depois umas 6 ou 6:30 eu tô lá na secretaria esperando

o pessoal daqui do posto [...] E quando eu chego aqui aí eu volto de novo pra

levar o pessoal da fisioterapia, da hemodiálise, tem tudo isso. (P6)

Porque nós temos um carro para cada unidade e temos dificuldade às vezes.

Por exemplo dessa organização interna da equipe que além do carro ter que

dar conta da mobilidade da equipe, tem que dar conta da população. (G3)

Como já colocado anteriormente, nesses territórios o transporte público apenas passa pela

Rodovia Federal, e por isso os usuários que moram nos territórios afastados têm dificuldade de

acessar o serviço de saúde. Para gerenciar o meio de transporte da unidade é necessário uma

grande organização para suprir a demanda de transporte do território como podemos ver nos

trechos de G3.

Na verdade a organização começa antes mesmo da equipe, começa na

secretaria porque você tem que ter uma central de transporte, tem que ter carro

garantido para a equipe, carro garantido para as visitas que muitas vezes é

complicado. (G3)

A resolução dos problemas de acesso, gerados pelas barreiras geográficas, são complexos,

mas podem ser diminuídos com o investimento numa melhor infraestrutura local de transporte

público e melhoria das estradas. A saúde tem o papel de dialogar com a comunidade sobre suas

dificuldades e potencialidades e, assim, estimular a organização dos comunitários em busca de

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seus direitos e na articulação intersetorialem busca de resolução nos outros setores municipais,

afim de atuar nos problemas da população, assim é fundamental esse tipo de atuação para

melhorar o acesso local. Contudo, atuações mais de organização e controle social pouco foram

observadas na comunidade, ficando ainda restritas à ações menores que não dão conta de

melhorar as condições de transporte e vias públicas na região.

Além da estrutura da Unidade e a garantia de veículos para a mobilidade na região, para um

trabalho em saúde é necessário um aparato de materiais de saúde como vacinas, materiais de

curativo, álcool, luvas, máscaras, remédios que devem ser garantidos pelo município.

5.3.3.2 O saber na saúde

Quando pensamos sobre o saber na saúde este engloba os saberes clínicos amplamente

trabalhados na academia, os saberes organizacionais onde entram protocolos e escalas e os

saberes adquiridos com a localidade onde se trabalha.

Os protocolos do trabalho sobre a prática da saúde na APS são postos pelo Ministério da Saúde

e são apresentados pelos Cadernos de Saúde, esses cadernos podem trazer conhecimentos

relacionados aos diferentes ciclos de vida, como o Caderno n° 19 que traz a temática

envelhecimento e saúde da pessoa idosa ou sobre orientações ao processo de trabalho como no

Caderno n° 28 que traz a temática do acolhimento à demanda espontânea (BRASIL, 2007,

2012).

Porém dentro das necessidades do território os profissionais através do processo reflexivo

podem criar formas de abordagem mais próximas das necessidades da população. Nos trechos

de entrevistas de profissionais e gestores logo abaixo fica claro que a equipe não segue ou não

construiu nenhum protocolo diferenciado de atendimento visando as características da

população do campo e dessa forma segue apenas os protocolos ministeriais. Os entrevistados

foram claros sobre essa questão, pois afirmam de forma unânime a não existência de escalas e

fichas ou protocolos diferenciados voltados para a população do campo.

Não, os instrumentos que a gente usa aqui são todos do Ministério da Saúde,

fiquei me indagando se tem um instrumento específico pra saúde do campo.

Talvez o pessoal da residência de saúde do campo, que faz muita pesquisa no

campo in loco. (P4)

Não, é como eu falei, especificamente não. (G3)

Não [temos protocolo para população do campo], aqui a gente trabalha por

prioridade: o idosos, as crianças menores de 1 ano, gestante.[...]. E também as

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urgências porque as vezes não é idoso, mas tá com cansaço, uma pressão

muito alta. (P2)

A Residência de Saúde da Família com ênfase no campo visando uma atuação mais próxima a

população do campo adaptou a escala de risco de Coelho e Savassi para o Campo e criou um

protocolo de atuação para atuação junto à crianças nessas áreas. Essas ferramentas ainda são

pouco utilizadas pela EqSF. A escala de Coelho e Savassi tem o objetivo de fazer realizar um

olhar inicial sobre a comunidade realizando a partir desse olhar uma estratificação de risco e,

dessa forma, sendo útil para estabelecimento de prioridade na organização do processo de

trabalho. É uma ferramenta de trabalho simples, aplicável em qualquer USF (COELHO;

SAVASSI, 2004; UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2015b; 2015c).

A escala modificada de Coelho e Savassi para o campo traz tanto as questões trabalhadas no

cotidiano das EqSF, incluindo a questão dos usuários acamados como fator de risco, mas

também amplia o olhar para questões do campo trazendo o olhar para o uso de agrotóxicos e o

cuidado com os animais como podemos observar abaixo (UNIVERSIDADE DE

PERNAMBUCO, 2015b).

Desta maneira foram definidos como risco sentinela: Morador com mais de

60 anos sem familiares, Acamado, Domiciliado, Pessoas com deficiência que

demandam cuidados especiais, Transtorno Mental, Alcoolista e ou

dependência química(drogadição), Pessoa privada de liberdade, Desnutrição

em menores de 5 anos, idoso e gestante (por pessoa), Obesidade grau III,

Baixo peso, Doença falciforme, Sífilis congênita, AIDS, HIV, Hanseníase ou

Tuberculose, Leishmaniose ou Doença de Chagas ou Esquistossomose,

Hipertensão e diabetes na mesma pessoa, Hipertensão Arterial Sistêmica

complicada, Diabetes Mellitus com pé diabético ou com comorbidade, HAS

ou diabetes sem complicações, Gestante, Menor de seis meses, Maior de 70

anos, Óbito infantil anterior (menor de 1 ano), Crianças menores de 09anos

que ficam sem adulto em casa, Vacina desatualizada em menor de 18 anos

(pelomenos uma pessoa da família), Mãe ou responsável de menor de 5 anos

analfabeto, Analfabetismo do chefe da família, Ausência de Registro de

Nascimento para maioresde 5 anos, Ausência de cisterna, Desemprego no

chefe de família, Uso de agrotóxicos, Família sem renda, Ausência de

profilaxia animal (no domicílio), Animal doente (por animal), Animal doente

por zoonose, Barbeiro (triatomíneo) na casa e Relação Morador/cômodo (Se

maior que 1, Se igual a 1 e Se menor que 1) (UNIVERSIDADE DE

PERNAMBUCO, 2015b).

Assim, a academia chega com a possibilidade de criação de um olhar diferente para as

especificidades de trabalho, incluindo em protocolos gerais questões específicas e até então

ausentes na preocupação dos profissionais de saúde, como uso de agrotóxicos;ausência de

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profilaxia animal (no domicílio); além de algumas doenças negligenciadas, o que amplia a

atuação da saúde nesse território. Abaixo P4 e P8 corroboram com a afirmação de que a

residência com ênfase no campo auxiliou a ampliação do olhar para a Saúde do Campo.

[A residência] melhorou isso, com uma territorialização mais objetiva com a

classificação de risco, que é importantíssima, pra priorizar as visitas. (P4)

A residência do campo ficou na tarefa de executar um outro protocolo que foi

inclusive desenvolvido pela UPE que seria a escala de Coelho e Savassi

adaptada para o campo, né?. (P8)

Em relação aos diferentes protocolos no Plano Municipal de Saúde 2014-2017 e no Plano Anual

de 2014, a gestão também indica a intencionalidade de rever seus protocolos (CARUARU,

2014a; 2014b).

A Implantação de protocolos clínicos nos níveis de atenção, as equipes

(CARUARU, 2014a)

Viabilizar estudo com equipe e redefinir modelo de protocolo clínico que

atenda a realidade na região (CARUARU, 2014b)

Porém os profissionais não relatam atividades relacionadas a implantação de novos protocolos

clínicos, muito menos a inclusão de temáticas camponesas sendo trabalhadas juntos aos

profissionais, como relatado por G3 abaixo, apontando a Residência de Saúde do campo, a

Residência de Medicina de Família da UFPE e o NASF como potenciais para realizaressa

reflexão sobre saúde do campo.

Veja, infelizmente a gente não conseguiu, em relação às equipes, por exemplo,

educação permanente específica para quem trabalha no campo, na área que

hoje existe a residência de saúde do campo ou residência de medicina de

família e comunidade ou o próprio NASF. (G3)

No estudo de Lara et al. (2011) sobre a prática dos Agentes Comunitários em Saúde em áreas

rurais, foi observado práticas de educação em saúde relacionadas a saberes e costumes

populares ligados à utilização de chás e ervas medicinais, eventualmente conciliados com as

terapias medicamentosas e prescrições médicas. Esses estudos demonstram que as práticas

populares podem ser sim estimuladas pela gestão através de cursos e temáticas durante o

processo de EPS com os profissionais, sendo um caminho potente o investimento no saber

comunitário e dos ACS nesse sentido.

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A EPS é uma estratégia que possibilita aprimorar as práticas assistenciais, mas também atua

na consolidação de um processo educativo que analisa o cotidiano do trabalho e promove a

discussão contínua dos problemas de saúde (SARRETA; BERTANI, 2010).

A EPS é um instrumento fundamental no trabalho da saúde, o estudo de Ceccim (2010)

destaca que a graduação em si não é suficiente para garantir a qualificação necessária para a

atuação cotidiana, já que o conhecimento e a informação em saúde estão constantemente em

mudança exigindo atualização do profissional. Com esse objetivo, vários processos de

formação a distância foram lançados pelo Ministério da Saúde. A primeira iniciativa nesse

sentido para o contexto do campo foi lançado pela UNA-SUSem junho de 2015, com o curso a

distância sobre a “Saúde das Populações do Campo, da Floresta e das Águas” (BRASIL, 2015).

Porém, esse processo de capacitação dos trabalhadores também deve ser realizado no âmbito

Estadual e Municipal, a partir do princípio de descentralização proposto pelo SUS, conseguindo

assim promover estratégias de qualificação de seus trabalhadores de acordo com as

especificidades locais. Segundo Barbosa, Ferreira e Barbosa (2012) a prática de capacitação

dos profissionais de saúde, em serviço, deve ser a base fundamental para o desenvolvimento da

qualidade da assistência prestada à população.

É importante pontuar que tanto os documentos como as entrevistas demonstraram uma

grande necessidade e um solo fértil para discussão e construção da temática da saúde do campo

nesse território. Isso se dá porque, além da existência de atores externos que podem ser

potenciais na discussão, a gestão se mostra disposta a dialogar e tem espaços institucionais de

EPS para essa construção, como evidenciaos trechos das entrevistas de G3 e G1 abaixo.

eu acho que a gente tem uma organização de educação permanente

estruturada, que é uma coisa que a maioria dos municípios não tem, é uma

coisa bem inovadora, mas não é voltada especificamente para a educação do

campo. Essa necessidade, e acho que, por exemplo, eu vejo até como uma

coisa para ser investida no futuro. (G3)

A cada 15 dias, ele é programado. Como estamos implantando redes

temáticas, eles são programados a partir dessas redes temáticas. (G1)

O conhecimento sobre o território se dá de diversas formas, umas mais qualitativas, através

de uma escuta com os usuários em grupos ou reuniões – e outra mais quantitativa através dos

dados epidemiológicos consolidados pela gestão nos setores das vigilâncias em saúde. Porém

o ideal é o equilíbrio desses dois modos de conhecer o território.

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Batista e Albuquerque (2014) utilizaram em seu estudo o Diagnóstico Rural Participativo

(DRP) para realizar uma territorialização junto a população. O DRP viabiliza uma aproximação

sobre o olhar do território sob a perspectiva dos moradores, e, de forma dinâmica, torna possível

realizar o planejamento e/ou monitoramento de ações (CUNHA; FERREIRA NETO, 2006).

Essa nova metodologia se apresenta como uma potente possibilidade de realizar uma

territorialização mais qualitativa no campo, pois através dela é possível analisar conjuntamente

com a comunidade camponesa o foco das intervenções em saúde.

No DRP é possível trabalhar com uma linguagem mais simples e acessível ao grupo de

discussão, também, tem como objetivo despertar a discussão sobre problemas e potencialidades

da realidade da região, o que permite o levantamento e a análise do conhecimento coletivo,

trabalhando com as percepções das pessoas que residem no local, facilitando a verificação de

informações obtidas no processo de diagnóstico e utilizando materiais de baixo custo como

folhas, sementes e papel. Essas novas tecnologias no trabalho, como o DRP, estão sendo

desenvolvidas e podem ser trabalhadas nas áreas rurais para subsidiar a organização do trabalho

em saúde, contudo, para tal elas devem ser conhecidas pela gestão e introduzidas nas EqSF

através da EPS (CUNHA; FERREIRA NETO, 2006).

Nesse sentido, uma maior aproximação do Apoiador Institucional - sendo a ponte entre os

dados da Vigilância Epidemiológica e novas tecnologias para o trabalho como o DRP junto

àsEqSF- se faz necessária. A gestão traz essa reflexão nos trechos de G3 abaixo, ressaltando a

necessidade de um trabalho mais integrado aos dados epidemiológicos do território, e além

disso enfatiza a importância da vigilância ambiental nesse contexto rural.

Eu acho que existeesse diálogo, é o falar, a coisa ser socializada. O

conhecimento da vigilância com o conhecimento que a equipe tem do

território, porque essa é uma das dificuldades que a gente tem em relação a

atenção básica por exemplo, até mesmo na cidade. Você trabalhar dentro da

semana padrão as necessidades que é visualizada pela epidemiologia, esse link

de uma ação com a outra que é falho, precisam ser mais fortalecidos. (G3)

a inserção da vigilância de saúde dentro dessa formação de rede porque eu

acho que a vigilância tem esse papel importante. De fazer esse destaque para

que tipo de adoecimento. Eu acho o diálogo, a troca é fundamental e muitas

vezes é complicado. (G3)

5.3.4 Organização do Trabalho

A organização do trabalho no cotidiano se apresenta de forma complexa quando se atua em

equipe e com desafios a mais como áreas extensas, dificuldade de locomoção, usuários em

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condições de trabalho e vida precárias, além da necessidade de organizar diferentes atores

trabalhando no mesmo espaço físico.

A gestão visualizou essa complexidade e por issoimplantoua atuação dos Apoios

Institucionais por região para que estivessemmais próximosà organização do trabalho nas

Unidades. Esse acompanhamento se dá atrvés de reuniões entre EqSF e seu apoiador

institucional.

Para dar início ao processo de acompanhamento das famílias, a USF precisa conhecer sua

área adstrita, o que se faz principalmente através do cadastramento pelo ACS dos usuários do

território. Esse cadastro garante um conhecimento quantitativo de cada micro áreainserida na

sua equipe, o que é combinado ao reconhecimento territorialpor parte das equipes, que devem

observaras relações existentes, os principais equipamentos sociais, a principal atividade

econômica do território, os fluxos diários das pessoasno território, as demandas de saúde de

cada família, etc. Durante esse processo, denominadoTerritorialização, a equipe observa o

território por vários ângulos (geográfico, epidemiológico, cultural e quantitativo),podendo

definir a partir desse reconhecimento as estratégias prioritárias de intervenção no território.

Segundo Santos e Rigotto (2011) a territorialização é imprescindível para o trabalho do

profissional de saúde na ESF, isso porque é a partir dele que o planejamento das atividades

devem ser orientados, porém também destaca que é necessário conhecer o que este espaço

representa para a população, captando sua dinamicidade e os fatores que interferem nas relações

com a comunidade.

No estudo os profissionais reconhecem que tiveram uma prática próxima a descrita acima,

porém não parecem utilizá-lo para o planejamento de suas atividades diárias. O processo está

mais ligado a uma melhor divisão das micro áreas como visualizamos nas falas de P1 e P2

abaixo.

A gente foi casa a casa. A gente tinha o mapa que a prefeitura mandou. [o

mapa] Não está aqui no momento porque a gente tá com áreas descobertas. A

gente tem sem o ACS pra detectar toda a área. A gente tá com uma população

de mais de 5 mil pessoas. (P1)

Eles vão ao território, os agentes. Eles fazem o levantamento das áreas, das

casas que foram construídas. Todo ano é feito esse mapeamento. Eles fazem

o mapa dos territórios, aí depois eles juntam e colocam num mapa só. [...]Aí

eles fazem a divisão novamente das áreas aumentando as áreas de alguns. [...]

Eu sei que eles fazem também o quantitativo de crianças naquela área, menor

de 1 ano, menor de 5 anos, de gestantes, de idosos, de hipertensos, de

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diabéticos. Aí nesse mapa eles sempre colocam isso. Eles colocam as cores

pra cada um desses. (P2)

[A territorialização] Ocorre em todas as unidades, seja nas urbanas ou no

campo porque isso é fundamental, é você territorializar, você conhecer a

população adstrita, então isso é feito e em relação ao campo. (G3)

Em relação a identificação de situações de riscos específicas para cada micro área os

profissionais colocam que não fazem estudo sobre necessidade por micro área e sim por caso

mais grave. Algo similar foi encontrado por Ferreira (2014 p. 57), que aponta “as equipes das

ESF rurais que participaram do estudo não mencionaram o (re)conhecimento do território como

ponto de partida no planejamento de suas atividades.”

Esse processo reforça o trabalho em saúde individualizado em detrimento da saúde da

coletividade. Porém, alguns profissionais trazem um olhar mais amplo para a territorialização,

mas, a prática atravessada por vários fatores como a alta demanda acaba por impulsionar o

profissional a uma prática mais individual do que coletiva.

Conhecer a população, os dispositivos que tem naquela determinada micro

área, quais as características e o perfil de determinada área, pra gente

determinar quais as estratégias que devem ser feitas. (P5)

O planejamento é um processo necessário tanto para a resolução de problemas no território

quanto para a organização do processo de trabalho em que há a participação dos trabalhadores

da saúde e da sociedade. É uma prática que identifica os problemas, analisa a melhor forma de

solucioná-lo, oportuniza a ação e reduz o afastamento dos trabalhadores e os processos de

produção da saúde. O planejamento não deve se reduzir apenas à construção de projetos, ele

deve influenciar a realidade dos trabalhadores, e a partir dele, devem ocorrer mudanças como

consequência. O ideal é um planejamento com a participação de todos (profissionais,

comunitários e gestores) isso porque, quando há a participação de diversos atores, há uma maior

chance do comprimento das atividades planejadas com menores obstáculos (PAIM, 2012).

Em relação ao horário de funcionamento das USF do território do campo foi observado que

os profissionais de saúde têm um horário diferenciado, um horário corrido (sem intervalo de

almoço) com início e término mais cedo que o horário comercial. Segundo a gestão e os

profissionais, o deslocamento também é contabilizado no horário do trabalhador de saúde do

campo.Essa prática é comum na região do campo, e atende a necessidade do trabalhador da

saúde que se desloca para regiões mais distantes do centro da cidade e também atende as

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necessidades dos usuários da área que normalmente acordam cedo e não se deslocam tanto nos

horários do fim da tarde. Abaixo profissionais e o gestor G2 aponta essa modificação no horário

das EqSF do campo.

A gente funciona das 7:30 as 15:30 (P1)

A unidade tem um funcionamento como as unidades do Brasil, ela começa às

7 da manhã, fecha ao meio-dia e reinicia das 13 às 15:30 porque a secretaria

conta para os profissionais de nível superior que as 7:30 eles precisam estar

na secretaria de saúde e o tempo de translado para área rural é descontado da

área de trabalho assim como o retorno. (P8)

Na Zona Rural a gente deixa em horário corrido, principalmente em horário

de almoço, diminui um pouco o tempo deles, pra poder encerrar mais cedo,

por conta de deslocamento, algumas coisas desse sentido. (G2)

Os profissionais P4 e P5 destacam a grande demanda que a USF acompanha, segundo a

PNAB cada EqSF deveria acompanhar de 3 a 4 mil pessoas e acompanha 6 mil pessoas com 9

micro áreas, onde duas estão sem ACS. Porém os profissionais apontam um número muito

maior de usuários acompanhados. O que consequentemente impacta negativamente no processo

de acompanhamento pela grande demanda (BRASIL, 2012).

Mas nós temos uma demanda muito grande, o (unidade estudada) tem quase

6 mil pessoas adstritas à unidade. (P4)

A demanda como aqui é uma população grande e a gente tem praticamente 6

mil pessoas. (P5)

Para organizar a grande demanda espontânea que chega a unidade, nos turnos da manhã é

realizado o acolhimento. Essa ferramenta de organização é orientada pelo ministério da Saúde,

a partir do caderno nº28 (acolhimento à demanda espontânea), que coloca aescuta qualificada

do usuário como forma de organizar o cuidado a partir de uma avaliação de risco e

vulnerabilidade (BRASIL, 2012). Abaixo P2 traz a forma como a unidade realiza o

acolhimento.

Sempre de manhã cedo tem o acolhimento. Aí a gente recebe o paciente vê

qual é a queixa, encaminha ele a uma escuta. Depois da escuta ele vem aqui

pra sala do médico, depois dessas consultas, também tem as consultas

agendadas. (P2)

Os agendamentos para consultas podem ser marcadas no acolhimento, mas a unidade

atualmente tem três formas de marcação diferentes.O que pode de certa forma confundir o

usuário. A enfermeira durante as reuniões de equipe marca com os Agentes de Saúde turnos de

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puericultura e pré natal para cada micro área. A dentista tem um dia de marcação por mês no

acolhimento, o que provoca certo tumulto no dia de marcação. Já os médicos utilizam o acesso

avançado, que é uma prática que tem como proposta diminuir filas de marcação e melhorar o

acesso ao usuário. No acolhimento a agenda do médico é aberta para consultasnas próximas

48h, e se não houver vaga o usuário é orientado para vir ao acolhimento novamente para realizar

a marcação. Isso pode ser visualizado nos trechos trazidos por P5 e P4.

A gente tem 3 formas de agenda, isso a gente percebe que acaba dificultando

um pouco a questão da marcação mesmo, os médicos atendem por acesso

avançado, a minha agenda é fechada, mas é um fechado que tem possibilidade

de marcação. E a da dentista que marca é ela mesmo com a ASB. Então são

três formas de agenda. (P5)

Quando o paciente não tem consulta agendada e quer marcar consulta, o

profissional que está no acolhimento, ele verifica a possibilidade na agenda de

marcar a consulta, com a orientação de não mais 2 dias pra frente, ou seja, no

máximo 48h. (P4)

No acolhimento é feito uma escuta inicial determinando se o caso é agudo e necessita de um

atendimento no mesmo dia ou se é subagudo e pode aguardar para um atendimento do médico

nos próximos dois dias. Em alguns casos uma orientação do profissional que está no

acolhimento já pode solucionar a queixa do usuário.Abaixo podemos observar os trechos das

entrevistas de P4 e P3 bem como a figura 17, que explicitam o fluxograma de como ocorre o

acolhimento e os agendamentos da unidade.

Então o fluxo é basicamente isso: o usuário chega é feita uma triagem, que

chama acolhimento, mas na verdade é uma triagem (ele passa pela escuta de

um profissional de saúde); e aí tem duas possibilidades, ele pode ter já consulta

agendada, aí o profissional confirma o agendamento e então o paciente é

encaminhado pra recepção, pra tirar o prontuário e aguardar a consulta. (P4)

A segunda-feira é superlotada, em questão de atendimento médico e de

enfermeira, a parte de urgência. É mais médico e enfermeira, porque a dentista

tá atendendo com marcação. (P3)

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Figura 17 - Fluxograma do acolhimento e agendamento da EqSF do campo

Fonte: A autora

A partir do acolhimento e da reunião de equipe os atendimentos individuais são marcados,

nele na maioria das vezes o profissional realiza sua conduta no consultório dentro da Unidade

com o olhar voltado para o seu núcleo profissional como expressado abaixo pelos profissionais.

A gente oferece aqui a população o acolhimento todo dia aqui, oferece

vacinação todos os dias da semana, oferece curativos, troca de curativos,

oferece visita domiciliar de profissional de nível superior três vezes na

semana, mas não são só 3 profissionais. (P8)

A gente também abrange puericultura, pré-natal. Isso é o cotidiano

puericultura também tem todo dia, pré-natal também todo dia, separado de

cada área, cada agente tem o seu dia. (P2)

Os atendimentos não são mais de demanda livre, são agendados – de médico,

dentista e enfermeira – então quando a gente chega já vai saber quais são os

usuários que estão presentes pra organizar a ordem de chegada e iniciar os

atendimentos. (P7)

Acolhimento:

Escuta inicial por ordem de risco

Casos subagudos

Resolução no Acolhimento com

orientações no acolhimento

Agendamendo para os médicos nas

próxima 48h (Acesso avançado)

Casos agudos (ex: presença de febre,

tonturas)

Atendido no dia por um dos profissionais

de nível superior

Agendamento com Dentista uma vez no mês no acolhimento

Agendamento com a enferemeira separado por turnos para cada

microáreas

Reunião de Equipe

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O atendimento individual pode ser realizado tanto no consultório, quanto na residência dos

usuários durante visitas domiciliares. No caso da USF do campo normalmente essas visitas

domiciliares são realizadas com o carro da unidade principalmente para pacientes com

dificuldade de mobilidade. A visita domiciliar se mostra como ferramenta potente já que nela

o profissional tem a possibilidade de um olhar amplo sobre o meio onde cada paciente vive,

bem como pode se utilizar dos potenciais desse espaço para a prática terapêutica, dessa forma

nesse espaço são dadas orientações clínicas efeitos procedimentos terapêuticos. Porém as

visitas domiciliares por vezes não são realizados, pela falta de infraestrutura móvel. Abaixo nos

trechos de entrevistas dos profissionais podemos visualizar em quais casos são realizadas as

visitas no domicílio.

[Nas visitas domiciliares] Como a gente não tem um consultório do lado, a

gente faz aplicação de flúor em crianças, faz o exame da boca pra ver se as

pessoas tem necessidade de marcar consulta pro consultório. Na visita de

puérpera, a gente orienta a mãe os cuidados com o bebê pra que ele não fique

com dente cariado. No caso do acamado o máximo que a gente pode fazer é

uma raspagem, uma limpeza; se for o caso até uma extração dá pra fazer lá.

(P7)

Eu visito os acamados, eu tento fazer uma visita mensal a esse pessoal. Visito

as puérperas, e algumas pessoas que os ACS identificam a necessidade, aí a

gente vai. (P5)

É a tarde (que faço visita Domiciliar), porque de manhã tem o pessoal da

fisioterapia e da hemodiálise. (P6)

Tem se for um acamado, diabético, a questão clínica, pra saber qual paciente

vai precisar primeiro do atendimento. A questão da distância não entra[como

critério de visita domiciliar] não. (P3)

A organização dasvisitas domiciliares nas diferentes áreas se dá por prioridade clínica e

quantitativo de pessoas na comunidade.No estudo vimos que avisita domiciliar -importante

instrumento em que o profissional adentra no ambiente do usuário – é realizada na USF do

campo, porém em quantidade de turnos limitados em áreas mais distantes por causa da

disponibilidade do carro para todos os profissionais.

Não [faço Visita domiciliar por rua], por ser micro área, as famílias são

divididas. Então eu faço 3 visitas em uma, duas visitas em outra, pra não ficar

só em uma micro área.” [...] Tenho 4 [comunidades], como se fossem quatro

povoados. [...] Eu deixo mais tempo pra duas micro áreas [maiores]. (P3)

Faço [visita domiciliar], é mais pra puérpera, acamado e paciente especial.

(P7)

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Já as atividades coletivas são planejadas nas reuniões de equipe, e englobam o planejamento

principalmente das atividades relacionadas ao calendário da saúde e festividades como dia da

mulher, São João, etc como apontado pelos profissionais P2,P3 e P4. Por vezes esse modo de

trabalho baseado pelo calendário de Saúde do Ministério pode não abordar as reais demandas

do território de acordo com a epidemiologia e reforça o Modelo Campanhista de saúde.

Eu acho que quando que aproximam mais é no tempo de campanha de vacina,

como agora teve o Outubro Rosa, quando é algum tempo festivo, quando a

unidade faz festa pra comunidade. (P3)

O povo vem com força viu. Pronto, dia internacional da mulher, a gente faz

os comes e bebes para as mulheres. Dia das crianças a gente faz, São João a

gente faz, final de ano, semana santa a gente faz o café. Toda data

comemorativa a gente faz. (P2)

Fora isso tem aquelas festas relacionadas a promoção da saúde, por exemplo,

esse mês é o mês de combate ao câncer de mama, então a gente procura fazer

palestras sobre isso aqui no (Unidade do campo estudada). (P4)

Os grupos de saúde tem uma atuação mais longitudinal, o que possibilita maior vínculo e

escuta junto aos usuários. A unidade possui grupo de gestantes, terapia comunitária, grupo de

mulheres e grupo de atividade física. Podemos observar a partir dos trechos da entrevista

abaixo, que existe uma grande participação da equipe de apoio do NASF junto a três grupos

(Gestante, grupo de atividade física, grupo de mulheres) e dos Residentes junto a dois grupos

(terapia comunitária, grupo de mulheres), porém a participação da EqSF é pequena e esse fato

normalmente é justificado pela grande demanda por atendimento clínico individual (Diário de

Campo). Dessa maneira a EqSF perde a oportunidade de lançar mãode outra lógica de cuidado

mais pautado na coletividade, o que distancia o olhar dos profissionais do cotidiano dos

usuários.

Temos 3 grupos atuando, que é o grupo de educação física, a terapia

comunitária que é no assentamento e o grupo de Queimada do Uruçú, que é

um grupo de mulheres, esse é um grupo mais auto organizado, elas se

organizaram [...] Tem um grupo que é cíclico com as gestantes que a gente

faz. (P8)

Tem grupo de gestantes e tem atendimento do NASF, que [tem] atendimento

com psicólogo, assistente social. (P1)

E também a gente tem uma coisa muito importante que é o NASF, que ajuda

muito. A gente tem atendimento com nutricionista, psicólogo, fisioterapeuta,

aulas com educador físico toda sexta-feira. (P2)

As reuniões de equipe se mostraram como um dos principais momentos de organização e

planejamento do trabalho da EqSF. Isso porque são nelas que são pactuadas e organizadas as

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atividades que serão executadas, além de planejarem as atividadesa serem desenvolvidas nos

próximos 15 dias e definirem a divisão das diferentes funções. As reuniões podem ser internas,

entre os profissionais da Unidade, ou externas, com atores de outras equipes de saúde, com

outros setores - como educação, assistência -,ou com a comunidade.

Contudo, igualmente ao que foi observado no estudo de Pereira et. al. (2013) as reuniões das

EqSF possuem como atividade central a discussão sobre a divisão de atividades a cuto prazo e

socialização de informações.

Nas reuniões entre os membros da EqSF é realizada a produção, a organização dos horários

de atendimento da enfermagem, a programação de eventos (normalmente ligados ao calendário

da saúde), os atendimentos nas áreas distantes são marcados e realizam a discussão de casos.

Essas reuniões ocorriam semanalmente, porém atualmente estão ocorrendo quinzenalmente.

Abaixo os profissionais trazem um pouco sobre como ocorre a reunião de equipe.

Tem o dia da produção, é uma vez por mês. Então (a enfermeira) ela faz os

horários. Por exemplo quem vai ficar no acolhimento naquela semana. (P2)

A agenda da equipe da gente fecha mensalmente, a gente se reúne e vê as

demandas, os atendimentos nas micro áreas distantes, atividades educativas,

atividades específicas (como dia das mães, novembro azul, etc.). Agora para

discussão de caso, a gente sente a necessidade de fazer quinzenalmente ou até

semanalmente, quando os ACS trazem muitos casos de suas micro áreas pra

gente atender. (P7)

No máximo duas vezes por mês, no máximo. A gente tava tentando fazer toda

semana, mas pela quantidade de pessoas que o posto tem pra atender não dá.

(P3)

Depende do período, quanto a gente consegue uma vez por semana, ou de 15

em 15 dias, ou uma vez por mês, depende da necessidade mesmo. (P5)

É importante relatar que as atividades da unidade parecem não ter um planejamento anual

com análise e planejamento de acordo com a territorialização. Observamos que a organização

da unidade se dá nessas reuniões quinzenais e tem apenas o caráter do imediato, pensando as

atividades normalmente de acordo com demandas solicitadas pela gestão ou de acordo com o

calendário da saúde.

Dessa forma, a atuação é pequena no que diz respeito ao olhar sobre o processo de

adoecimento da coletividade. É importante destacar que segundo a PNAB, é de

responsabilidade dos profissionais de saúde, além de atender a demanda curativa, ter a

responsabilidade sanitária pelo território de abrangência da ESF, e devem atentar-se para as

necessidades de saúde locais (BRASIL, 2012). Portanto, é preciso estabelecer melhor a

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periodicidade da reunião de equipe como estimular a realização de planejamentos e avaliação

a longo, médio e curto prazo, de acordo com as necessidades do território. Os momentos de

reunião fortalecem o vínculo entre os profissionais de saúde e estimulam a participação efetiva

de todos, assim se configura como espaço central na organização do trabalho em saúde.

Os demais agentes (residentes e NASF) que atuam na USF não participam da reunião de

equipe da Unidade e tem um dia aparte de reunião com a equipe, para dialogar e pactuar as

atividades. Nos pareceu que ainda é preciso uma maior integração entre esses diferentes atores,

conforme a descrição de P5 e P8.

Tem uma reunião só com a equipe e outra com todo mundo NASF e

residentes. (P5)

Existem três planejamentos que não se conversam. Tem os planejamentos das

residências que tem suas tarefas a cumprir e organizam seus horários de

acordo para isso, e tem o planejamento da gestão que se organiza

principalmente em torno dos programas e dos planos para cumprir suas metas

necessárias, né? E aí a nossa unidade do X tem tido dificuldade inclusive de

ter frequência de reunião, de ter reuniões frequentes para poder sentar todo

mundo e desenvolver. (P8)

Segundo Gentilini (2014), um potente planejamento se dá com a participação de todos os

atores envolvidos. O método do planejamento estratégico situacional é citado por esse autor por

objetivar uma transformação da realidade, considerando o planejamento como ferramenta de

gestão local em que todos os participantes têm condições de contribuir ou de interferir na

elaboração e implementação dos projetos para promover as transformações necessárias e pode

ser uma alternativa para potencializar os planejamentos na região.

A reunião com a comunidade se configura como um dos espaços mais ricos entre os

comunitários e os profissionais de saúde. É nele que os atores podem analisar a situação de

saúde da localidade de forma compartilhada e a partir daí as atividades seriam desenvolvidas

para e com os comunitários de forma mais próxima e contextualizada. Porém, segundo os

profissionais nos trechos abaixo, a reunião com a comunidade já existiu e atualmente não

ocorre. De acordo com os relatos, as reuniões entre a população e os profissionais da Unidade

que ocorreram teve como tema a forma de marcação da agenda, mas ainda existe a necessidade

de uma aproximação para um fazer compartilhado e que se baseia na cogestão do cuidado de

saúde no território.

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Inicialmente a gente tinha algumas reuniões com a comunidade, que a gente

se propõem a escutar o que a população tem a dizer, pra mudar alguma questão

no fluxograma da unidade. (P4)

Teve um movimento quando comecei minha residência aqui, logo no início

quando a gente fazia parte do processo de territorialização, onde a gente

começou inicialmente a discutir a agenda dos médicos, era essa a pauta que

moveu a população. A gente chegou a fazer umas cinco reuniões desse lado

da pista, [...] Existem opiniões diversas sobre se a equipe tem que escutar a

população ou se tem que obedecer a gestão. Fica um pouco esse paradigma,

que infelizmente não se conversa esses paradigmas. (P8)

Já, mas foram poucas. Sinceramente aqui não é muito de tá fazendo reunião

com a comunidade não, pra saber das dificuldades, das principais

necessidades. Isso a gente observa mais nos prontuários e nos momentos das

consultas. (P7)

As reuniões de comunidade pode ganhar outro perfil se forem direcionadas para o diálogo

com a comunidade com o objetivo de modificar a forma de atuação da equipe, fortalecendo as

organizações comunitárias para buscar efetivar os direitos sociais no campo. Para isso é

necessário um entendimento de que essa prática faz parte do trabalho em saúde, visto que a

permanência dessas condições determina e prejudica à produção de vida no território

(BATISTA; ALBUQUERQUE, 2014).

Outro fator a ser observado é a necessidade constante de um diálogo aberto entre a equipe e

a gestão para pensar juntos e realizar de fato uma cogestão do trabalho em saúde. Em Caruaru

essa relação se dá através do apoiador institucional, que tem por função dialogar sobre o

processo de trabalho, refletir junto as equipessobre o seu fazerna saúde e a partir dessa reflexão

buscar junto a equipe soluções viáveis para um melhor funcionamento. Esta interação entre

equipe e apoiadora institucional fortalece o fazerem rede intrasetorial, intersetorial e de acordo

com as reais necessidades da comunidade, de forma que o planejamento em saúde ocorra de

forma ascendente como podemos evidenciar nos trechos de G1 e G2. Também é evidenciado o

foco na Educação Permanente em saúde com as equipes no documento de gestão de 2014.

A gente vem tentando trabalhar dentro da lógica institucional colocada pelo

MS. A gente também incorporou profissionais que tem expertise nessa área,

alguns ligados ao MST, outros que fizeram residência nessa área. Então a

gente tá realmente tentando colocar em prática essa política, observando a

realidade do município. (G1)

É através de Apoio Institucional. A gente gostaria muito de estar todo mês

participando das reuniões. Era o que no início a gente tava conseguindo fazer.

Então a gente participava das reuniões de planejamento, de discussão. [...] E

o foco mesmo é trabalhar Processo de Trabalho. Analisar perfil

epidemiológico, quais as ações que estão sendo feitas, o que é que a gente

pode pensar junto, e criar estratégia pra melhorar o processo de trabalho. (G2)

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Implementar ações de Educação Permanente em Saúde, estimulando ações de

planejamento das equipes locais de forma ascendente e participativa (PAS

2014)

Porém o fato do município ter poucos Apoiadores para muitas Equipes parece enfraquecer a

atuação desses profissionais da gestão no cotidiano do trabalho, o que pode dificultar que se

organize o processo de trabalho para além das demandas imediatas.

A atuação pautada em demandas imediatistas e a atenção em saúde baseada apenas nos

grupos prioritários é uma prática encontrada em várias USF. Nos estudos de Camuri e

Dimesntein (2010) também é constatado que as atividades desenvolvidas na rotina da unidade

se dão mais dentro da USF e são destinadas às demandas de atendimentos individuais,

resumindo-se em prescrição e administração de medicação; atendimento a usuários diabéticos

e hipertensos; consultas médicas e de enfermagem; consultas na área de saúde da mulher e

criança; fornecimento de medicação; grupo de gestantes e de doenças crônicas.

5.4 A interação entre o Trabalho da EqSF e as especificidades da saúde do campo no

Agreste Pernambucano

Quando analisamos as atividades rotineiras da equipe podemos observar que os profissionais

realizam atividades fora da unidade, essas sempre ligadas ao adoecimento, visita domiciliar a

acamados, idosos ou pacientes de difícil acesso, porém suas práticas na maioria das vezes estão

ligadas as práticas priorizadas pelo Ministério da Saúde, voltadas principalmente ao cuidado

materno-infantil e as doenças crônicas, com pouca análise e atuação na saúde da coletividade

da comunidade coo explicitado por G1 e P5 abaixo.

A gente tem uma cultura instituída ainda do modelo hegemônico, então a

gente tem uma tendência de se ter um cardápio que se reproduz em quase todos

os territórios. Trabalha-se a questão do diabético, do hipertenso, do adulto, da

criança e etc. Então de modo geral as equipes tem dificuldade de trabalhar de

modo diferente. (G1)

Saúde mental é uma principal demanda aqui da unidade. E a maioria das coisas

é de rotina, tem o hipertenso, o diabético, eles querem pedir os exames,

conversar, mas tudo mais programado. (P5)

Em seus estudos Uchoa et al. (2011) observaram que os principais problemas em saúde

foram relacionados às doenças crônicas, como hipertensão e diabetes, e a incorporação de uma

concepção de necessidades de saúde centrada na doença. Da mesma forma, no atual estudo,

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quando observamos as principais demandas, vimos muitas atividades relacionadas a

hipertensão e diabetes no âmbito do atendimento individual e centrado na doença.

Portanto, as atividades ainda estão centradas no corpo doente, com um cuidado que se dá

dentro da Unidade ou no domicílio do usuário. Apesar dos profissionais conseguirem observar

um processo de adoecimento intrinsecamente relacionado ao modo de vida e trabalho das

comunidades, por causa de uma demanda excessiva, formação biomédica, pouco apoio da

gestão, pouco modificam seu processo de trabalho, não conseguindo atuar junto a população

em busca de alternativas para a situação do adoecimento coletivo na área, relacionados a

condições do meio e do trabalho como podemos verificar nas falas dos profissionais abaixo.

Tem uns da minha área que trabalha com tintas de casa, de bordado (que é

coisa química). Até o jeans que tem um pelo que você inalando muito pode te

prejudicar. (P3)

Como a gente tá na zona rural tem muito paciente agricultor, trabalhador da

roça mesmo. Então tem muitos pacientes que trabalham ou trabalhavam

muitos anos na roça, com dor, com DORT [...] a questão das confecções, aqui

a maioria das mulheres trabalham costurando pra outras pessoas, [...] as

mulheres tem muita queixa de dor lombar, dor nas pernas, inchaço nas pernas,

porque ficam horas e horas sentadas costurando. As vezes o patrão não dá nem

oportunidade de folga pro almoço, então elas passam mais de 8 horas

costurando. (P4)

Eu tenho visto aqui muita sinusite e eu tenho conseguido observar, e é muito

uma análise minha, de que são as pessoas que tiram pelo, tirar pelo é dentro

do processo de costura do jeans, uma parte onde você trabalha com um tecido

que solta um pozinho muito pequeno e que essas pessoas quando se referem a

dor de cabeça, espirro, a gente sempre consegue encontrar que se não é ela

que costura ela está na casa de quem costura e tudo mais e nesse trabalho

alienante que explora a mão de obra por um salário de miséria (P8)

O forte aqui é pressão alta e diabetes, tem crises alérgicas, tem muitas pessoas

que tem problema de asma, cansaço, porque tá quente e a poeira tá muito solta,

então é o púbico alvo (P2)

Os profissionais parecem não introduzir novas atividades no seu processo de trabalho,

diferente da atuação clínica, e mais voltadas a necessidade da área. E assim, acabam atendendo

as consequências da vida e trabalho alienador da região. Carvalho e Cunha (2012) destacam a

importância de valorizar, além dos fatores biológicos e orgânicos, aspectos sociais, políticos e

subjetivos que fazem parte do processo saúde-doença, para poder assistir à população adstrita

de modo adequado e condizente com as suas necessidades.

Também é evidente que o trabalho interfere diretamente na relação que o usuário tem com a

USF, pois muitas vezes o fato desse ter um trabalho precarizado faz com que não consigase

liberar do trabalho para ir até a USF, pois isso significa diminuir sua produção, já que ganha

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por número de peças de roupas trabalhadas como relatado pelos profissionais P3 e P4 abaixo.

Então é necessário que os profissionais de saúde observem essa limitação da comunidade e

planeje atividade dentro do cotidiano da população.

Eles alegam trabalho, eles dizem que só vem a unidade quando tão precisando.

(P3)

E segundo quando a gente faz ações de educação em saúde essas mulheres não

aparecem, os homens já não aparecem porque é uma cultura deles mesmos, é

muito difícil a gente fazer uma atividade aqui pra ter uma adesão muito grande

dos homens. Mas as mulheres não podem vir, porque é uma hora que elas não

vão estar costurando. (P4)

A cultura do local ainda é pouco explorada ou estimulada como possível ferramenta de

trabalho por alguns profissionais de saúde. Durante as consultas a maioria dos profissionais não

utiliza a possibilidade de recomendação de chás e ervas, mas quando o usuário sinaliza que

utilizou não existe uma recriminação, apenas a indagação se o paciente tomou a medicação

recomendada como relatado por P4 abaixo. Já outros profissionais sinalizam não ter o

conhecimento sobre as plantas como sinalizado por P3 abaixo.

Algumas coisas são importantes, você vê que funciona. Mas a gente procura

ter cuidado com pacientes hipertensos e diabéticos sempre surge cada mês

chega uma história que tal planta medicinal cura diabetes. A gente sabe que

não tem cura, a pessoa hipertensa e diabética vai ser sempre hipertensa e

diabética. Então assim o que eu procuro passar é tome o seu chá que você

gosta, mas não deixe de tomar sua medicação. (P4)

Eu até tomo chá de capim santo porque gosto muito, mas se me perguntar se

serve pra alguma coisa eu não sei dizer. (P3)

Esse distanciamento dos profissionais em relação as práticas de autocuidado realizadas pela

população pode ser diminuído através de capacitações realizadas pela gestão, bem como pelo

aumento de vínculo e trocas com os saberes da população. Isso porque os profissionais que

atuam nas EqSF do campo – e da cidade - devem (re)conhecer a comunidade e se

(co)responsabilizar continuamente pelo cuidado à saúde, criando uma relação de confiança e

parceria mediante a escuta atenta, o diálogo com troca de saberes e o estabelecimento de

confiança mútua (FERREIRA, 2014).

Talvez esse diálogo já tenha se iniciado, mesmo que ainda seja incipiente, pois já existe um

movimento de aproximação do uso e estudo das plantas medicinais pelos profissionais de saúde

na USF como sinalizado por P4 e P8 abaixo.

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Agora a gente tem uma horta aqui na creche, justamente pra plantas

medicinais. Inclusive X tá fazendo um treinamento com plantas medicinais e

a gente vai tentar utilizar justamente as plantas que estão sendo cultivadas aqui

pertinho, na creche. (P4)

Fora isso a gente tem um objetivo muito inicial, a ideia de fornecer mudas de

plantas medicinais para a população, a gente já conseguiu fazer a nossa horta

e a ideia não é que a gente aqui faça o chá, mas que a gente forneça as mudas

para que a população pratique o seu autocuidado. Para que eles plantem essas

ervas e possam assim garantir a autonomia delas, inclusive frente a

medicamentos e entender o processo de adoecimento. (P8)

Durante a observação participante vimos que Dona Marlene mandou pelo estudante que

estava em Visita Domiciliar uma muda de insulina para a horta que está sendo criada na

Unidade. A horta medicinal do posto já tem Babosa, Hortelã Graúda, Erva Cidreira, Colônia,

Boldo do Chile, mas pelo visto uma das dificuldades de cuidar é pela falta de água e de definir

quem irá cuidar (Diário de Campo).

Já em relação as dificuldades do clima, solo e alta incidência de sol na região os profissionais

não tem grandes reflexões e por fim não trabalham essa temática como podemos verificar

através do trecho da entrevista de P3 abaixo. Apesar da gestão reconhecer que existe essa

necessidade apontado por G1 abaixo, esta também não dialoga com seus trabalhadores sobre

essas questões.

Em quatro anos de trabalho eu nunca escutei sobre questão [de cuidados] de

pele não. (P3)

Acho que o principal objetivo da saúde da família na área rural é de proteção,

de informação e de qualificação sobre a saúde do sujeito. Já que a gente tem

questões específicas como a exposição excessiva ao sol e o uso de

instrumentos de trabalho que podem causar doenças. (G1)

Segundo Batista e Albuquerque (2014) existem poucos investimentos na saúde dos

camponeses, principalmente por serem os que sofrem as principais influências de uma escolha

neoliberal capitalista de um país que prejudica a vida do pequeno agricultor na forma de

produzir, se manter e realizar de forma autônoma sua produtividade econômica, social, cultural

e principalmente de saúde e vida.

Nesse cenário o papel do profissional em saúde in loco parece ser fundamental para dar

destaque as especificidades do campo, já que os profissionais conseguem identificá-las

minimamente no contato com as particularidades da população, que, ao se aproximar destes,

podem se sensibilizar, com o apoio de uma gestão compartilhada que vislumbre a produção em

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saúde voltada para a relação com a natureza, respeitando os diferentes costumes e dialogando

com a produção de novos meios de serviço e atendimento à saúde no campo, através da

Educação Popular.

A gestão traz através dos trechos de G1 e G2 abaixo, que ainda não trabalha questões sobre

a especificidade do campo, porém se mostra aberta a mudanças em seu fazer.

[Capacitação]Especificamente pro campo, não [realizamos]. (G2)

Não existe uma política municipal instituída para induzir isso [uso de plantas

medicinais e benzedeiras]. Existe uma orientação para que seja incorporada.

Nós inclusive estamos discutindo de como dar visibilidade a essas questões,

com as populações de terreiro. Isso é uma coisa que a gente vem estimulando

os trabalhadores a incorporar. (G1)

O início de abertura da gestão em dialogar sobre saúde do campo pode ser observada dentro

de seu planejamento que contempla ainda que minimamente a população camponesa e fortalece

algumas questões culturais, esse fato pode ser notado nos documentos da gestão abaixo, alguns

trechos ligados a Política da população negra e as ações da Vigilância Ambiental.

Ampliar o acesso aos serviços de saúde para população negra residente em

áreas urbanas e rurais; Estimular mudança de comportamento dos

profissionais de saúde para lidar com a diversidade da sociedade brasileira e

com as peculiaridades do processo de saúde/doença da população negra;

Planejar a saúde da população negra em ações programáticas na atenção

básica. (CARUARU, 2015a)

“Intensificar as ações de educação ambiental nas lavanderias de zona rural” (CARUARU,

2014b). “Implantar a Sala de Situação em 100% das unidades básicas da zona rural”

(CARUARU, 2014a).

Movimentos no sentido da mudança têm sido iniciados impulsionados pela academia, pela

gestão e pela própria EqSF no sentido de observar o campo, de alterar algumas práticas, porém

ainda é necessário grandes passos nesse sentido. Mas o contexto, segundo os diferentes atores,

é fértil para se construir esse novo olhar.

Sim, existem conversas, inclusive a gestão - das conversas que eu participei -

sempre se demonstrou aberta, assumiu que desconhece o que é saúde do

campo. Sempre foram sinceros nisso e sempre foram sinceros em dizer que

precisava aprofundar muito mais isso, né? O que a gente faltou foi um grupo

um pouco mais coeso para induzir esse pensamento dentro da própria gestão.

De provocar desde pequenas práticas, que a gestão entendesse uma prática

diferenciada de saúde no campo, né? E que permitisse mudar agenda, mudar

horário, mudar fluxos e o processo todo de trabalho, mas eu particularmente

senti uma gestão aberta para isso mas faltou gente para tocar esse processo

todo. Inclusive nós estamos em uma conversa com a gestão de um seminário

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para sensibilizar os trabalhadores sobre o que é a saúde do campo estamos

atrás de entregar esse projeto do seminário. (P8)

Segundo Ferreira (2014 p. 66), “Para fortalecer as ESF do meio rural é necessária a

implementação de novas formas de gestão que potencializem a criatividade e o anseio de

transformar as situações de saúde. Portanto, o planejamento local é considerado um forte

instrumento de uma gestão descentralizada.” A opção por uma cogestão mais horizontal

baseada no diálogo e em uma construção coletiva pelo trecho de P8 acima parece ser a aposta

potente da gestão local em busca de transformações no trabalho das EqSF do campo.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES

As ações da EqSf do campo, observadas e avaliadas do ponto de vista dos gestores

municipais, dos profissionais da USF, da pesquisadora no momento da observação participante

na USF do campo e análise documental, foram permeadas de indagações, curiosidade, surpresas

e no caminho da pesquisa foram substituídas por reflexões, auto análise e um espírito de que

estamos no caminho para um fazer implicado, porém ainda precisamos caminhar muito em

relação ao trabalho em saúde do campo, isso porque esse fazer necessita ser pensado para/com

a população do campo e de forma que visibilize os modos de vida no campo.

É necessário ousadia para fazer o diferente, para apostar na autonomia dos usuários. Para tal

investir numa territorializaçãode qualidade e em um maior diálogo e escuta junto aos usuários

é um bom caminho. O fortalecimento desse diálogo pode se dar a partir das ações do apoiador

institucional, do fortalecimento das reuniões de equipe e das reuniões da equipe com a

comunidade, de modo a alcançar um fortalecimento do Saúde do Campo na região. Ser ousado

para articular os saberes da saúde com outros saberes necessários para uma melhor qualidade

de vida no campo é fundamental para modificar o processo de determinação da saúde,

garantindo ações de promoção. Vemos como atores potenciais nessa construção intersetorial a

possível parceria com os agrônomos, veterinários, técnicosagrícola entre outros que podem se

somar nessa construção.

Em síntese, pode-se afirmar que a existência de uma equipe multiprofissional não garante a

reformulação das práticas de cuidado, apesar dessaspossuírem um enorme potencial para esta

reformulação. Isso porque é preciso, a cada instante, lidar com problemas e propor soluções à

questões que não são possíveis de serem resolvidas individualmente, como: a dificuldade de

lidar com a demanda do território, a dificuldade de alinhar as atividades desenvolvidas à

realidade territorial; a necessária superação de fatores estruturais da região; de como lidar com

questões ligadas ao trabalho do usuário; e como garantir o acesso e inclusão dos indivíduos

quebrando as barreiras sociais, geográficas e culturais aos serviços de saúde.

O modelo organizacional da EqSF do campo é convidativo a análise, pois pode se

caracterizar através de múltiplas facetas abarcando a população assentada- como no atual

estudo, porém também pode ser refletida a partir de EqSF que estão inseridas em comunidades

quilombolas, ribeirinhas, florestas. Para isso é preciso entender que diferentes contextos trazem

também diferentes desafios e potencialidades para o fazer saúde e, por esse motivo, pedem

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também diferentes arranjos de trabalho. Entender que a profundidade de uma atuação está

intrinsecamente atrelada a proximidade da realidade vivenciada no território -compreendendo

seu o processo comunitário de vida, de trabalho e de cultura em primeiro lugar, para a partir daí

também pensar qual será o trabalho em saúde desenvolvido - é de fundamental importância para

superar o paradigma biomédico e o modo de trabalho em saúde urbano.

A partir das considerações acima, podemos concluir que aPolítica Nacional de Saúde

Integral das Populações do Campo da Floresta e das Águas é conhecida pelos atores da saúde

de Caruaru, bem como as dificuldades vivenciadas pelos usuários são observadas e suas

consequências são identificadas dentro dos consultórios na USF. Algumas mudanças pensadas

pelos profissionais de saúde para a comunidade puderam já ser observadas no processo de

trabalho da EqSF, foram eles:

a) Forma de marcação dos médicos (acesso avançado);

b) A realização de atendimentos em pontos de apoio em áreas distantes quinzenalmente;

c) O início de um movimento de construção de horta medicinal na Unidade;

d) A existência de um carro na unidade para realizar visitas e atendimentos.

Contudo, ainda é pequena a atuação com a comunidade o que reverbera em uma prática

dentro dos consultórios em busca da cura, da prevenção e pouca atuação na comunidade (nas

praças, igrejas, feiras, fabricos) em busca da promoção a saúde. Talvez isso ocorra ainda por

uma concepção de fazer saúde ligada apenas a luta contra adoecimento, ofuscando assim a

promoção de saúde e vida. Isso porque, ainda é pequena a atuação dos profissionais de saúde

nas atividades ligadas aos festejos religiosos, a vida e rede comunitária, as práticas de

autocuidado com as plantas medicinais, aos costumes alimentares.

Nesse processo parece que a academia e os Movimentos Sociais tem um papel importante

para o diálogo, trazendo alguma luz para construção de um fazer diferente. A academia

estudando, elaborando e auxiliando na construção de novos protocolos e escalas que inclua os

principais riscos à saúde do campo - como a falta de lazer, o uso de agrotóxico, exposição

excessiva ao sol, problemasosteomioarticulares- e os movimentos sociais auxiliando na

classificação das características culturais e dificuldades de vida que essa população apresenta.

Alguns avanços já foram observados nesse sentido, foram eles:

a) Implantação de uma Residência Multiprofissional de Saúde com ênfase no campo na

região (UPE junto ao MST)

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b) Adaptação da Escala de Coelho e Savassi para o contexto campo (UPE)

c) Criação de um grupo de Terapia Comunitária na Associação dos Moradores de

Normandia (UFPE)

d) Criação de uma mandala de plantas medicinais em Normandia (MST)

A partir dos dados encontrados nesta pesquisa, parece necessário uma mudança nas práticas

e na organização dos profissionais de saúde, com o investimento no saber popular da região e

se apoiando na criação de novas formas de trabalho baseadas no território. Mapear quais os

cuidados realizados pela população e quem são esses atores do cuidado (rezadeiras,

benzedeiras) potenciais da região é fundamental para se avançar nesse sentido, pois a partir

desse mapeamento pode-se incorporar essas pessoas como cuidadores referenciados pelos

profissionais de saúde. Para tal é necessário que a gestão, profissionais e comunidade caminhem

juntos nessa direção.

A Educação Permanente parece ser um caminho potente que a gestão pode lançar mão para

auxiliar nesse processo, para que esses possam disparar processos de formação junto aos seus

profissionais e assim consigam modificar ainda mais o processo de trabalho, afim de organizá-

lo.

Com um objeto bem definido, agentes/sujeitos podem ser capacitados para uma atuação mais

próxima da população do campo; com os meios de produção físico e intelectual necessários

para uma atuação diferenciada; e uma organização do trabalho quedê visibilidade às

especificidades dessa população.

A gestão por meio do Apoio Institucional parece estar aberta para se apropriar mais e debater

sobre a Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da Floresta e das Águas,

demonstrando uma proximidade com a academia e com o movimento social, o que talvez

permita modificações mais efetivas no território. Um dos entrevistados fez inclusive um diálogo

com a gestão para modificara agenda, mudar o horário, mudar os fluxos e o processo todo de

trabalho, propondo também a realização de um seminário para sensibilizar os trabalhadores

sobre o que é a saúde do campo. Possíveis ações nesse sentido podem ser cruciais para que essa

discussão saia do campo teórico e passe a ser parte da prática nos serviços.

A partir da análise realizada, apontamos algumas possibilidades que poderiam ser

desenvolvidas nessa localidade com o objetivo de fortalecer a atenção às populações do campo

da região, são elas: capacitações ligadas a cultura local de utilização de plantas e ervas; a

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possibilidade de fortalecer a atuação em áreas distantes equipando uma unidade

móvel;aprofundamento sobre as ferramentas de trabalho como territorialização e planejamento

situacional; diálogos intersetoriais para auxílio no manejo da terra em meio ao clima semiárido

e possíveis formas de armazenamento de água; fortalecimento da vigilância do trabalhador no

que toca a superexploração do trabalho têxtil.

A título de conclusão, parece pertinente, portanto, afirmar que os resultados permitiram

identificar a EqSF como um modelo consolidado, porém a EqSF do campo próxima da

comunidade e com o olhar sobre as especificidades do campo está nessa localidade ainda em

construção ativa, com comprometimento dos atores para com as questões de saúde, que ainda

haverá de demandar um montante considerável de esforços.

.

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APÊNDICE A – ROTEIROS DE ENTREVISTAS

Roteiro de entrevistas semiestruturadaspara os Gestores (Secretário de Saúde, Coordenador da Atenção Básica e Coordenador da EqSF)

Data, local e horário da entrevista de realização

1. Na sua opinião, qual o papel/objetivo daEqSF do campo?

2. Como funciona o cotidiano da EqSF? Quais atividades eles desenvolvem?

3. Como se dá diálogo entre a gestão e a EqSF?

4. Existe algum material específico para essa equipe por atender a população do campo?

Escalas? Capacitação?

5. Vocês construíram algum tipo de normas, parâmetros, protocolos para a organização e

funcionamento da EqSF campo no seu município? Como se deu esse processo?

6. Em quais atividades a EqSF se aproxima da comunidade adstrita?

Roteiro de entrevistas semiestruturadaspara os Profissionais de Saúde

Data, local e horário da entrevista de realização

1. Na sua opinião, o que diferencia uma EqSFque atua no campo e a que atua na cidade?

O que muda?

2. Em que momentos a equipe vivencia o cotidiano da comunidade?

3. Como funciona o cotidiano da EqSF? Quais atividades vocês desenvolvem? Descreva?

4. Que instrumentos de trabalho a EqSF utiliza? Existe algo específico utilizado por estar

no Campo?

5. A EqSF desenvolve a territorialização?Se sim como?

6. Como é organizada as atividades e a agenda da Equipe?

7. Como é feito a visita domiciliar dos profissionais da Equipe?

8. Vocês construíram algum tipo de normas, parâmetros, protocolos para a organização e

funcionamento da EqSF campo no seu município?

9. Quais as principais demandas da população?

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APÊNDICE B -TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO (TCLE).

Prezado(a) Gestor (a),

Estamos convidando-o (a) para participar como voluntário da pesquisa intitulada como:“O processo e

organização do trabalho da equipe de Saúde da Família no cuidado a populações do campo” de

autoria de Evelyn Siqueira da Silva, sob orientação da pesquisadora Ide Gomes Dantas Gurgel e co-

orientação da professora Paulette Cavalcanti de Albuquerque, ambas vinculadas ao Centro de Pesquisas

Aggeu Magalhães (CPqAM).

A pesquisa tem como objetivo analisar como acontece o processo de trabalho das equipes de Saúde da

Família que atuam no cuidado em saúde à população do campo. Você foi selecionado(a), pois representa

um sujeito fundamental para o desenvolvimento da pesquisa, e sua participação não é obrigatória. A

qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará

nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador, ou ainda, com a Fiocruz /PE ou com o Serviço ao

qual representa.

A sua colaboração é importante e se trata de aceitar ser entrevistado e falar sobre a proposta da Equipe

de Saúde na Família inserida no campo. O risco da sua participação se da devido ao fato de se discutir

como vem se desenvolvendo a proposta em seu município. Os benefícios que a sua participação trará

são bastante significativos considerando o escasso conhecimento sobre como vem se dando oprocesso

de trabalho da Equipe de Saúde da Família no contexto do campo, além da contribuição acadêmica.

A entrevista será gravada em equipamento digital e posteriormente será transcrita para omaterial poder

ser analisado pela equipe da pesquisa.

Ao participar o (a) senhor (a) estará contribuindo no apoio a gestão e aos profissionais da saúde no que

refere a organização e desenvolvimento do processo de trabalho da EqSF contexto campo na rede de

atenção a saúde do Brasil e tem garantido os seguintes direitos:

1. A garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a qualquer dúvida

acerca de todos os procedimentos e benefícios relacionados com a pesquisa;

2. A liberdade de retirar seu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo

sem que isto traga nenhum prejuízo a sua pessoa;

3. A segurança de que não será identificado em hipótese alguma e que será mantido o caráter

confidencial da informação que seja prestada;

Se o (a) senhor (a) concordar em participar, Uma cópia deste termo de consentimento será fornecida ao

Sr(a) e a outra ficará em posse da pesquisadora. Caso sinta necessidade de mais algum esclarecimento,

poderá entrar em contato com pesquisadora mestrandaEvelyn Siqueira da Silva ou com as suas

orientadoras Ide Gurgel e Paulette Cavalcanti pelo telefone (81) 2101-2500, e-mail:

[email protected] ou Em caso de dúvidas ou preocupações quanto aos seus direitos como

participante deste estudo, o (a) senhor (a) pode entrar em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa

(CEP) deste centro de pesquisas, localizado na Av. Professor Moraes Rego, s/n - Campus da UFPE -

Cidade Universitária, Recife/PE, CEP: 50.670-420, através do telefone (81) 2101-2639 ou pelo e-mail:

[email protected]. O horário de funcionamento é das 08:00 – 12:00 hrs / 13:00 – 15hrs. O

CEP é responsável pela avaliação e acompanhamento dos aspectos éticos de todas as pesquisas

envolvendo seres humanos.

Eu, ___________________________________________, declaro que recebi uma cópia deste termo de

consentimento, que tive a oportunidade de ler e esclarecer as minhas dúvidas, que estou ciente dos meus

direitos relacionados e que aceito participar desse estudo.

__________________________________________________________________________________

Assinatura do Participante Data

__________________________________________________________________________________

Nome e Assinatura do Entrevistador Data

Testemunha 1 _____________________________________________________

Testemunha 2 ____________________________________________________

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Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE).

Prezado(a) Profissional da saúde,

Estamos convidando-o (a) para participar como voluntário de uma pesquisa intitulada O processo e

organização do trabalho da equipe de Saúde da Família no cuidado a populações do campo” de

autoria de Evelyn Siqueira da Silva, sob orientação da pesquisadora Idê Gomes Dantas Gurgel e co-

orientação da professora Paulette Cavalcanti de Albuquerque, ambas vinculadas ao Centro de Pesquisas

Aggeu Magalhães (CPqAM).

A pesquisa tem como objetivo analisar como acontece o processo de trabalho das equipes de Saúde da

Família que atuam no cuidado em saúde à população do campo. Você foi selecionado(a), pois representa

um sujeito fundamental para o desenvolvimento da pesquisa, e sua participação não é obrigatória. A

qualquer momento você pode desistir de participar e retirar seu consentimento. Sua recusa não trará

nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador, ou ainda, com a Fiocruz /PE ou com o Serviço ao

qual representa.

A sua colaboração é importante e se trata de aceitar ser entrevistado e falar sobre a proposta da Equipe

de Saúde na Família inserida no campo. O risco da sua participação se da devido ao fato de se discutir

como vem se desenvolvendo a proposta em seu município. Os benefícios que a sua participação trará

são bastante significativos considerando o escasso conhecimento sobre como vem se dando o processo

de trabalho da Equipe de Saúde da Família no contexto do campo, além da contribuição acadêmica.

A entrevista será gravada em equipamento digital e posteriormente será transcrita para o material poder

ser analisado pela equipe da pesquisa.

Ao participar o (a) senhor (a) estará contribuindo no apoio a gestão e aos profissionais da saúde no que

refere a organização e desenvolvimento do processo de trabalho da EqSF contexto campo na rede de

atenção a saúde do Brasil e tem garantido os seguintes direitos:

1. A garantia de receber resposta a qualquer pergunta ou esclarecimento a qualquer dúvida acerca de

todos os procedimentos e benefícios relacionados com a pesquisa;

2. A liberdade de retirar seu consentimento a qualquer momento e deixar de participar do estudo sem

que isto traga nenhum prejuízo a sua pessoa;

3. A segurança de que não será identificado em hipótese alguma e que será mantido o caráter

confidencial da informação que seja prestada;

Se o (a) senhor (a) concordar em participar, Uma cópia deste termo de consentimento será fornecida ao

Sr(a) e a outra ficará em posse da pesquisadora. Caso sinta necessidade de mais algum esclarecimento,

poderá entrar em contato com pesquisadora mestranda Evelyn Siqueira da Silva ou com as suas

orientadoras Ide Gurgel e Paulette Cavalcanti pelo telefone (81) 2101-2500, e-mail:

[email protected] ou em caso de dúvidas ou preocupações quanto aos seus direitos como

participante deste estudo, o (a) senhor (a) pode entrar em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa

(CEP) deste centro de pesquisas, localizado na Av. Professor Moraes Rego, s/n - Campus da UFPE -

Cidade Universitária, Recife/PE, CEP: 50.670-420, através do telefone (81) 2101-2639 ou pelo e-mail:

[email protected]. O horário de funcionamento é das 08:00 – 12:00 hrs / 13:00 – 15hrs. O

CEP é responsável pela avaliação e acompanhamento dos aspectos éticos de todas as pesquisas

envolvendo seres humanos.

Eu, ___________________________________________, declaro que recebi uma cópia deste termo de

consentimento, que tive a oportunidade de ler e esclarecer as minhas ddúvidas, que estou ciente dos

meus direitos relacionados e que aceito participar desse estudo.

Assinatura do Participante_______________________________________________________

_____________________________________________________________________________

Nome e Assinatura do Entrevistador Data

Testemunha 1 _______________________________________

Testemunha 2 _______________________________________

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ANEXO A- CARTA DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA

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ANEXO B- CARTA DE ANUÊNCIA DO MUNICÍPIO DE CARUARU