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 Curso de Toxicologia  ANVISA - RENACIAT - OPA S – NUTES/UFRJ - ABRACIT 1 MÓDULO III Fundamentos de Toxicologia Autores Conceição Aparecida Turini (CCI - Londrina) Tutor Sayonara Maria Lia Fook (CEATOX - Campina Grande) Introdução  A intoxicação humana abrange uma ampla variedade de processos fisiopatológicos relacionados com a interação entre um agente de natureza química ou biológica e o organismo. A condição primária para que a intoxicação aconteça consiste na exposição ao agente tóxico o qual, deverá alcançar o sítio-alvo, após vencer as barreiras impostas pelo organismo. Portanto, a expressão da toxicidade de uma substância sobre um sistema biológico dependerá de inúmeros fatores que incluem as propriedades físico- químicas do agente tóxico, as condições de exposição e, fundamentalmente, de uma série de eventos que ocorrem dentro do organismo, ou seja, de seu comportamento toxicocinético e toxicodinâmico. Este módulo tem por objetivo fornecer elementos teóricos para a compreensão da intoxicação como fenômeno biológico. Para isso, serão abordados os processos que se sucedem desde que o agente tóxico penetra no organismo, a partir da superfície de contato com o meio externo, até alcançar o sítio de ação, com discussão das variáveis que afetam a introdução e o transporte do toxicante, as modificações causadas no seu metabolismo e os mecanismos através dos quais ele exerce sua ação tóxica. Ao mesmo tempo, o enfoque clássico dos tópicos fundamentais de Toxicologia, adotado nesta apresentação, propiciará a normalização de termos e conceitos básicos empregados em Toxicologia.

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MÓDULO IIIFundamentos de Toxicologia

AutoresConceição Aparecida Turini (CCI - Londrina)

TutorSayonara Maria Lia Fook (CEATOX - Campina Grande)

Introdução

 A intoxicação humana abrange uma ampla variedade de processos fisiopatológicosrelacionados com a interação entre um agente de natureza química ou biológica e oorganismo. A condição primária para que a intoxicação aconteça consiste na exposiçãoao agente tóxico o qual, deverá alcançar o sítio-alvo, após vencer as barreiras impostaspelo organismo. Portanto, a expressão da toxicidade de uma substância sobre um

sistema biológico dependerá de inúmeros fatores que incluem as propriedades físico-químicas do agente tóxico, as condições de exposição e, fundamentalmente, de umasérie de eventos que ocorrem dentro do organismo, ou seja, de seu comportamentotoxicocinético e toxicodinâmico.

Este módulo tem por objetivo fornecer elementos teóricos para a compreensão daintoxicação como fenômeno biológico. Para isso, serão abordados os processos que sesucedem desde que o agente tóxico penetra no organismo, a partir da superfície decontato com o meio externo, até alcançar o sítio de ação, com discussão das variáveisque afetam a introdução e o transporte do toxicante, as modificações causadas no seumetabolismo e os mecanismos através dos quais ele exerce sua ação tóxica. Ao mesmo

tempo, o enfoque clássico dos tópicos fundamentais de Toxicologia, adotado nestaapresentação, propiciará a normalização de termos e conceitos básicos empregadosem Toxicologia.

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Áreas e conceitos básicos

 A Toxicologia é a ciência que tem como objeto de estudo o efeito nocivo decorrente dainteração entre um agente tóxico e um sistema biológico, com a finalidade principal deprevenir o aparecimento desse efeito, ou seja, estabelecer condições seguras de

exposição a essas substâncias e assim, permitir que o homem se beneficie dasconquistas tecnológicas da era atual. A toxicologia apóia-se, então, em três elementos básicos:

1.  a existência de uma substância (agente tóxico) capaz de interagir com umsistema biológico e produzir uma resposta;

2.  o sistema biológico com o qual o agente tóxico interage para produzir o efeito;3.  a resposta (efeito) que deverá ser considerada nociva ao sistema biológico com

o qual interage.

Áreas da Toxicologia A toxicologia é uma ciência multidisciplinar que compreende um vasto campo deconhecimentos básicos e aplicados, relacionando-se estritamente com diversas outrasciências. É desenvolvida por especialistas com diferentes formações profissionais queoferecem contribuições específicas em uma ou mais áreas de atividade permitindoassim, o aperfeiçoamento dos conhecimentos e o desenvolvimento de cinco áreas deatuação, de acordo com a natureza do agente tóxico ou a maneira pela qual estealcança o sistema biológico.

Toxicologia de Alimentos: área relacionada ao estudo da toxicidade das substânciasveiculadas pelos alimentos, ou seja, é a área da toxicologia que estabelece índices desegurança para que os alimentos, de origem natural ou industrial, possam ser ingeridossem causar danos à saúde, tanto no que se refere à sua obtenção quanto ao seuarmazenamento.

Toxicologia Ambiental e Ecotoxicologia: essa área do conhecimento toxicológicopreocupa-se com o estudo das ações e dos efeitos nocivos de substâncias químicas,quase sempre de origem antropogênica, sobre os organismos vivos. Em geral,empregam-se os termos Toxicologia Ambiental para os estudos dos efeitos diretoscausados pela interação desses agentes contaminantes do ambiente (ar, água, solo)com o organismo humano e, Ecotoxicologia, para os estudos dos efeitos tóxicos dessescompostos sobre os ecossistemas e seus componentes não humanos. Como o homem

se encontra no topo de muitas cadeias alimentares e existem poucos ecossistemas nosquais os seres humanos não participam, essa distinção é, portanto, bastante frágil.Toxicologia de Medicamentos e Cosméticos: nessa área estudam-se os efeitos nocivosproduzidos pela interação dos medicamentos e cosméticos com o organismo,decorrentes do uso inadequado ou da suscetibilidade individual.

Toxicologia Ocupacional: é a área que se ocupa do estudo das ações e efeitos nocivosde substâncias usadas no ambiente de trabalho sobre o organismo do indivíduoexposto. Nessa área, busca-se, principalmente, a obtenção de conhecimentos quepermitam estabelecer critérios seguros de exposição ocupacional.

Toxicologia Social: embora no mundo contemporâneo a Toxicologia seja uma ciênciade caráter social em sua natureza, o termo Toxicologia Social é designado para a área

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que estuda os efeitos nocivos decorrentes do uso não médico de drogas ou fármacos,com prejuízos ao próprio usuário e à sociedade. Trata do estudo das chamadas“drogas de abuso”, lícitas ou não, cujo uso, sempre voluntário, visa modificar o estadode consciência ou evitar o desconforto ocasionado pela interrupção do uso dasubstância, mesmo que por um curto período de tempo.

No âmbito de cada uma dessas áreas, podem ser abordadas questões relacionadas aaspectos analíticos, clínicos, médico-legais, regulatórios, entre outros. Comoconseqüência da ampliação das áreas de aplicação da Toxicologia, imposta pela suaabrangência multidisciplinar e multiprofissional, essa ciência pode ser dividida, deacordo com os diferentes campos de trabalho, em três áreas ou ramos fundamentais.

 A Toxicologia Clínica ou Médica trata do atendimento do paciente exposto ao agentetóxico ou intoxicado, com a finalidade de prevenir, diagnosticar a intoxicação ouaplicar, se necessário, uma medida terapêutica específica.

 A Toxicologia Analítica ocupa-se da detecção do agente tóxico ou de algum parâmetrobioquímico relacionado com a exposição a ele em fluidos biológicos, alimentos, ar,água e solo, com o propósito de diagnosticar ou prevenir as intoxicações. No exercíciodessa modalidade, é de fundamental importância o domínio de química analítica e deinstrumentação, pois ela busca métodos com precisão, exatidão e sensibilidadeadequadas para a identificação e/ou quantificação inequívocas do toxicante ou para aavaliação de alterações bioquímicas funcionais do organismo. As análises toxicológicassão empregadas com as mais variadas finalidades: no aspecto forense ou médico-legal, na monitorização terapêutica ou acompanhamento do paciente submetido atratamento prolongado com medicamentos, na monitorização biológica da exposiçãoocupacional às substâncias químicas, no controle antidopagem em competiçõesesportivas, no diagnóstico da intoxicação aguda ou crônica em emergências médicas,entre outras.

E, por fim, a Toxicologia Experimental, que desenvolve estudos para elucidar osmecanismos de ação dos toxicantes sobre os sistemas biológicos e avaliar os efeitosdecorrentes dessa ação. A avaliação de toxicidade das substâncias é feita através deestudos conduzidos em diferentes espécies animais, seguindo rigorosas normaspreconizadas pelos órgãos reguladores nacionais e internacionais.

Conceitos Básicos

Considerando-se o caráter multidisciplinar e o fato de que muitas pessoas comdiferentes formações acadêmicas se interessam em estudar e trabalhar comToxicologia, torna-se necessária a observação do uso apropriado de termosempregados em toxicologia e apresentados a seguir.

Agente tóxico, toxicante ou xenobióticoÉ uma substância química ou agente físico capaz de causar dano a um sistemabiológico, alterando seriamente uma função ou levando-o à morte, sob certascondições de exposição. A maioria das substâncias consideradas como agente tóxicosão exógenas, sem papel fisiológico conhecido e denominadas xenobióticos. Outrostermos que merecem ser mencionados são apresentados abaixo.

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Toxina: refere–se à substância tóxica produzida por um organismo vivo (microrganismo,animal ou planta). Existe um campo de estudo específico, denominado Toxinologia, queestuda os efeitos nocivos dessas substâncias.Veneno: termo de uso popular que, embora em princípio, possa ser utilizado comosinônimo de agente tóxico, é reservado especificamente para designar substâncias de

origem animal ou vegetal, utilizadas para autodefesa ou predação, como o caso dosvenenos ofídicos, de abelhas, entre outros.Fármaco: toda substância de estrutura química definida, capaz de modificar ouexplorar o sistema fisiológico ou estado patológico, em benefício do organismoreceptor.Droga: toda substância capaz de modificar ou explorar o sistema fisiológico ou estadopatológico, utilizada com ou sem intenção de benefício do organismo receptor. A palavra droga, tem aceitação popular para designar fármacos, medicamentos, matériaprima de medicamentos, alucinógenos e agentes tóxicos.

Qualquer substância pode atuar como toxicante. Tanto os produtos exógenos como os

próprios constituintes do organismo, quando se encontram em proporções excessivas,podem produzir efeitos nocivos. Os agentes tóxicos apresentam estruturas químicasvariadas e podem ser classificados utilizando-se diferentes critérios, conforme afinalidade de seu estudo. Assim, o toxicante pode ser classificado segudo:

1.  estruturas químicas gerais: aminas aromáticas, hidrocarbonetos alifáticos,hidrocarbonetos aromáticos, metais, etc.

2.  estado físico: sólidos ou líquidos;3.  gases: são fluídos sem forma que permanecem no estado gasoso em condições

normais de pressão e temperatura. Ex.: CO, NO e NO2, O3, etc.4.  vapores: são as formas gasosas de substâncias normalmente sólidas ou líquidas

nas condições ambientais. Ex: vapores resultantes da volatilização de solventesorgânicos como benzeno, tolueno, xileno, entre outros;

5.  partículas ou aerodispersóides: partículas de tamanho microscópico, em estadosólido ou líquido. Ex: poeiras e fumos; neblinas e névoas.

6.  estabilidade ou reatividade química: explosivo, inflamável, oxidante, radioativo.7.  órgãos-alvo: rim, fígado, sistema nervoso central, sistema hematopoiético,

outros.8.  ação tóxica: local ou sistêmica.9.  efeitos tóxicos: carcinogênicos, mutagênicos, neurotóxicos, nefrotóxicos,

hepatotóxicos, .10. usos: agrotóxicos, solventes, aditivos alimentares.11. mecanismo de toxicidade: anticolinesterásico, metemoglobinizante, entre outros.

12. potencial de toxicidade: extremamente tóxicos, moderadamente tóxicos,levemente tóxicos, pouco tóxicos.

ToxicidadeÉ a capacidade inerente a uma substância de produzir danos aos organismos vivos, ouseja, é a medida relativa do potencial tóxico da substância sob certas condiçõescontroladas de exposição. Uma substância muito tóxica causará dano a um organismose for administrada em quantidades muito pequenas, enquanto uma substância debaixa toxicidade somente produzirá efeito quando a quantidade administrada for muitogrande. O conhecimento da toxicidade das substâncias químicas se obtém através deexperimentos em laboratório utilizando animais. Os métodos são empregados com

todo rigor científico com a finalidade de fornecer informações relativas aos efeitos

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tóxicos e, principalmente, para avaliar riscos que possam ser extrapolados para ohomem.

Risco e segurançaO termo risco traduz a probabilidade estatística de que se produzam efeitos adversos

ou danos por exposição a um agente tóxico, em virtude das propriedades inerentes aomesmo, bem como das condições de exposição. Nem sempre a substância de maiortoxicidade é a que oferece maior risco para o homem. Dependendo das condições deuso ou exposição, uma substância classificada como muito tóxica (elevada toxicidadeintrínseca) pode ser menos apresentar menor risco do que uma pouco tóxica. Porexemplo, embora o tolueno seja um solvente carcinogênico, não oferece risco se estiveradequadamente armazenado.

 A existência de risco associado ao uso de uma substância química, torna necessário oestabelecimento de condições de segurança. Portanto, define-se como segurança, acerteza de que não haverá efeitos adversos para um indivíduo exposto a uma

determinada substância, em quantidade e forma recomendada de uso. Ou seja,quando se fala em risco e segurança, significa a possibilidade ou não da ocorrência deuma situação adversa.

No entanto, não é fácil estabelecer o que é um risco aceitável no uso de substânciaquímica. Esta decisão é bastante complexa e envolve o binômio risco-benefício. Nautilização das substâncias químicas para diversos fins, alguns fatores devem serconsiderados na determinação de um risco aceitável: a necessidade do uso dasubstância; a disponibilidade e a adequação de outras substâncias alternativas para ouso correspondente; os efeitos sobre a qualidade do ambiente e conservação dosrecursos naturais; as considerações sobre o trabalho (no caso de ser usada emambiente de trabalho); a avaliação antecipada de seu uso público (ou seja, o que elapoderá causar sobre a população em geral) e considerações econômicas.

Efeito tóxico, adverso ou deletérioÉ uma alteração anormal, indesejável ou nociva decorrente da exposição a substânciaspotencialmente tóxicas. Todo efeito tóxico é indesejável e nocivo, mas, nem todos osefeitos indesejáveis são tóxicos. A morte é o efeito adverso mais drástico que podeocorrer. No caso de medicamentos, em particular, devem-se distinguir os efeitoscolaterais e a toxicidade propriamente dita. Portanto, os efeitos colaterais de agentesterapêuticos são aqueles indesejáveis, mas, muitas vezes toleráveis, que aparecemdurante a farmacoterapia, enquanto a toxicidade representa a manifestação de efeitoslesivos de maior gravidade, podendo levar até à morte.

AlvoÉ o termo usado com freqüência para designar o sítio ou local do organismo queinterage com o agente tóxico e apresenta a resposta biológica correspondente. Pode serreferido como uma molécula (DNA, proteína, etc.), um receptor ou um órgão (fígado,rim, cérebro, etc.).

DestoxificaçãoÉ o processo de transformação química que converte uma substância em formas maisfacilmente excretáveis (menos tóxica), geralmente através de reações debiotransformação.

Antídoto e antagonista

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São substâncias capazes de neutralizar ou reduzir os efeitos de uma substânciapotencialmente tóxica. O antídoto é a substância que se opõe ao efeito tóxico atuandosobre o toxicante, enquanto o antagonista impede o toxicante de se ligar a seu alvo ouexerce ação oposta à do agente tóxico (agonista).

IntoxicaçãoÉ o conjunto de efeitos nocivos representados por manifestações clínicas (sinais esintomas) ou laboratoriais que revelam o desequilíbrio orgânico produzido pelainteração entre o agente tóxico com o sistema biológico. Por envenenamento, entende-se o transtorno produzido por toxinas.

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Fases da intoxicação

 A intoxicação humana compreende uma ampla variedade de processos fisiopatológicosresultantes da interação de um agente tóxico com o organismo. Porém, para que oefeito tóxico ou adverso sobre o sistema biológico seja produzido, é necessário que o

toxicante ou seus produtos de biotransformação (metabólitos) alcancem sítiosespecíficos (alvo) no organismo e permaneçam em contato com os mesmos por umperíodo de tempo suficiente para produzir a ação tóxica.

Dessa forma, a intoxicação inicia-se com a exposição do organismo ao agente tóxicoque, após vencer as defesas do organismo, chega ao local de ação na forma ativa.Essas defesas consistem, fundamentalmente, em mecanismos que restringem a suamobilidade e diminuem o período de exposição do tecido alvo, ou seja, o organismoatua impondo barreiras à distribuição do toxicante para determinados tecidos,diminuindo sua difusibilidade através das membranas celulares e/ou facilitando suaexcreção.

Os processos de transporte e as transformações que o agente tóxico sofre, desde asuperfície epitelial de contato, até alcançar os órgãos nos quais se armazena ou causalesões, são muito complexos. Por conveniência, para facilitar o estudo dos complexoseventos envolvidos desde a exposição do organismo ao agente tóxico até oaparecimento de manifestações clínicas e/ou laboratoriais, a intoxicação pode serdesdobrada em quatro fases:

Fase I – Exposição: corresponde ao contato do agente tóxico com o organismo.Representa a disponibilidade química das substâncias e passíveis de serem introduzidasno organismo.

Fase II – Toxicocinética: consiste no movimento do agente tóxico dentro do organismo.É composta pelos processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção.Todos esses processos envolvem reações mútuas entre o agente tóxico e o organismo,conduzindo à disponibilidade biológica (biodisponibilidade).

Fase III – Toxicodinâmica: corresponde à ação do agente tóxico no organismo. Atingindo o alvo, o toxicante ou o seu produto de biotransformação interagebiologicamente causando alterações morfológicas e/ou funcionais, produzindo danos.

Fase IV – Clínica: é caracterizada pelas manifestações clínicas e/ou laboratoriaisresultantes da ação tóxica.

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Fase I – Exposição

Esta fase é representada pelo período em que o ser humano fica exposto à substânciatóxica. É o contato do toxicante com as superfícies externas ou internas do organismo.Nessa etapa, é de suma importância a disponibilidade química do agente tóxico, ou

seja, a concentração da substância em condições de ser introduzida no organismo. Além da magnitude, deve-se considerar também, a duração e a freqüência daexposição, as vias de introdução e a suscetibilidade individual.

Dose ou concentração

 A dose ou concentração determina o tipo e a magnitude da resposta biológica. Pordefinição, dose é a quantidade de um agente administrado para um indivíduo e,geralmente, é expressa usando-se unidades de massa por massa (ex, mg de agentetóxico / kg de peso corpóreo).O termo concentração aplica-se à exposição do indivíduo a uma determinada

concentração de um agente presente em um compartimento (ex, solo, água, ar). Nestecaso, não se sabe exatamente quanto do agente efetivamente penetrou no organismo. A concentração é expressa em unidades de massa por volume do meio (ex, mg deagente tóxico / m3 de ar; mg de agente tóxico / litro de água, mg de agente tóxico / m3 de solo), mas, também pode ser por massa do meio (ex, mg de agente tóxico / g desolo). A concentração também é comumente expressa através das unidades ppm(partes por milhão) ou ppb (partes por bilhão).Para facilitar, será usado somente o termo dose no resto desse módulo, mas, não seesqueçam de que, se a exposição for ambiental, o termo correto é concentração. Comrelação à dose deve-se distinguir:

Dose efetiva 50 (DE50)Trata-se da quantidade de substância (em mg, g ou mL por Kg de peso corporal) que,em condições bem determinadas, produz um determinado efeito na metade de umgrupo de animais de certa espécie.

Dose letal média (DL50)É a dose calculada estatisticamente, em mg/Kg, de um determinado agente químico oufísico, necessária para matar 50% dos organismos vivos de uma população de animais,sob um conjunto de condições definidas. Os agentes químicos podem ser classificados,segundo cinco classes de toxicidade, de acordo com os valores de DL50.

Tabela 1 - Classificação quanto ao grau de toxicidade

Categoria de Toxicidade DL50 oral para ratos Extremamente tóxica < ou = 1mg/kg

 Altamente tóxica > 1 a 50 mg/kgModeradamente tóxica > 50 a 500 mg/kgLevemente tóxica > 0,5 a 5 g/kgPraticamente não tóxica > 5 g/kg

Esta classificação é utilizada para consultas rápidas, qualitativas, com finalidade de

obter informações relativas à toxicidade intrínseca das substâncias. A falha destaclassificação está no fato dela se basear apenas na toxicidade intrínseca da substância

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que é um parâmetro extremamente variável, sendo influenciado por uma série defatores, relacionados principalmente ao agente químico, ao organismo e à exposição.Em situações práticas não se deve conhecer somente a toxicidade das substâncias,representadas geralmente pela DL50, pois tão importante como conhecer a toxicidadedos agentes químicos, é conhecer e saber avaliar o risco tóxico de uma substância

química.

Concentração efetiva 50 (CE50) e concentração letal 50 (CL50)Quando se estuda a toxicidade de uma substância introduzida no organismo porinalação, considera-se sua concentração no ar e, portanto, fala-se em CE50 e CL50,devendo ser mencionada a duração da exposição do animal ao agente tóxico.

Vias ou locais de exposição

 As principais vias de introdução dos toxicantes no organismo humano compreendem otrato gastrintestinal (ingestão), os pulmões (inalação) e a pele (cutânea). As vias

parenterais (intramuscular e intravenosa) constituem meios normais de introdução demedicamentos que, dependendo da dose e das condições fisiológicas ou patológicasdo indivíduo, podem produzir efeitos adversos acentuados, com lesões graves emdiversos órgãos.

 A via de introdução pode influenciar na toxicidade da substância química. Por exemplo,espera-se que um agente que é destoxificado pelo fígado seja menos tóxico quandointroduzido no organismo por via oral (passagem pela circulação porta) do que porinalação (circulação sistêmica). A comparação da dose letal de um toxicante pordiferentes vias de exposição também fornece informações úteis relacionadas à suaabsorção. Nos casos em que as doses letais por via oral e dérmica são similares àquelaadministrada por via intravenosa, pressupõe-se que o agente é pronta e rapidamenteabsorvido por essas vias. Por outro lado, quando a dose letal dérmica é muito maiorque a dose letal oral, significa que a pele constitui uma barreira efetiva à absorção doagente tóxico.

 As substâncias químicas penetram no organismo humano, a partir das vias deexposição, em velocidades diferentes dependendo de suas propriedades físico-químicase das condições existentes na superfície de contato como, por exemplo, a área epermeabilidade da membrana e o fluxo sangüíneo no local de contato. Assim, aintensidade do efeito tóxico e a rapidez da resposta em função da via de exposiçãoapresentam-se na seguinte ordem decrescente de eficiência: endovenosa, respiratória,intraperitoneal, subcutânea, intramuscular, intradérmica, oral e cutânea.

Essas vias possuem maior ou menor destaque, de acordo com a área da Toxicologiaem estudo.

 Assim, as vias pulmonar e cutânea são as mais importantes na ToxicologiaOcupacional e Ambiental e a via gastrintestinal em Toxicologia de Alimentos e deMedicamentos e, também, nas intoxicações intencionais (suicídios e homicídios). As viasparenterais têm importância na Toxicologia Social e de Medicamentos.

Duração e freqüência da exposição

O tempo e a freqüência com que o organismo permanece em contato com o toxicante

são importantes na determinação e intensidade do efeito tóxico. Entretanto, em sereshumanos, essas condições de exposição não são claramente definidas como nos

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estudos conduzidos em animais. Porém, os mesmos termos são usados para descrevê-las:

•  exposição a curto prazo (aguda) – quando o contato é de curta duração e aabsorção do toxicante é rápida. A dose administrada pode ser única ou múltipla

num período de tempo não superior a 24 horas;•  exposição a médio prazo – quando as exposições são freqüentes ou repetidasnum período de um mês ou menos (sobreaguda) ou no período de um a trêsmeses (subcrônica);

•  exposição a longo prazo (crônica) – quando as exposições se repetem duranteum longo período de tempo (meses, anos ou toda a vida).

Com relação à freqüência, observa-se que, uma simples exposição a um agente tóxicoque produz um efeito drástico, pode determinar manifestações de menor intensidadeou não produzir efeitos se a mesma dose ou concentração total for fracionada e otempo de exposição não for aumentado. É importante ressaltar que a redução do efeito

provocado pelo aumento da freqüência (fracionamento da dose) somente aconteceráse:

•  a velocidade de eliminação for maior do que a de absorção, de forma que osprocessos de biotransformação e/ou eliminação ocorram no intervalo entreduas exposições;

•  o efeito tóxico causado pela substância for parcial ou totalmente revertido antesda exposição seguinte.

Se não houver nenhumas dessas situações, o aumento da freqüência poderá resultarem efeitos crônicos.

Para inúmeras substâncias, os efeitos tóxicos observados nas exposições agudas sãodiferentes daqueles produzidos por exposições repetidas. Por exemplo, a principalmanifestação tóxica aguda do benzeno é a depressão do sistema nervoso central,enquanto exposições repetidas, podem resultar em toxicidade para a medula ósseacom aumento do risco para o desenvolvimento de leucemia. Nas exposições agudas, assubstâncias químicas são rapidamente absorvidas e os efeitos produzidos geralmentesão imediatos. Entretanto, algumas vezes, nota-se a ocorrência de efeitos retardados,similares ou não aos efeitos produzidos nas exposições a longo prazo. Por outro lado,as exposições crônicas a um agente tóxico podem produzir efeitos imediatos (agudos)após cada administração, além dos efeitos produzidos a longo prazo (crônicos) embaixas concentrações do agente.

Suscetibilidade individual

 A variabilidade da resposta biológica em função da suscetibilidade de cada indivíduo éum outro fator importante em Toxicologia. Existem situações em que exposições iguaisdeterminam respostas iguais e outras, nas quais se observam respostas diferentes. Porexemplo, para dois trabalhadores que desempenham funções iguais durante 30 anose, portanto, expostos no mesmo ambiente e nas mesmas condições, é possível queapenas um deles desenvolva uma enfermidade determinada pela exposição aostoxicantes presentes no ambiente de trabalho. Nenhuma pessoa é igual à outra e,portanto, as respostas tóxicas podem variar de um indivíduo para outro.

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Como são observadas respostas diferentes entre indivíduos de uma mesma espécie,espera-se que ocorram diferenças importantes nas respostas entre indivíduos deespécies diferentes. Essas diferenças interindividuais e intraespecíficas devem-se adiferenças metabólicas que podem ser determinadas pelo estado fisiológico ou pelaestrutura genética do organismo. Portanto, a suscetibilidade do organismo está mais

diretamente interligada às fases II e III da intoxicação, ou seja, aos processostoxicocinéticos e toxicodinâmicos.

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Fase II - Toxicocinética

Nessa fase tem-se a ação do organismo sobre o agente tóxico, procurando diminuir ouimpedir a ação nociva da substância sobre ele. É de grande importância, porque delaresulta a quantidade de toxicante disponível para interagir com o sítio alvo e,

consequentemente, exercer a ação tóxica.

 A toxicocinética é constituída pelos seguintes passos:

   Absorção  Distribuição  Biotransformação  Excreção

 A movimentação do agente tóxico no organismo, desde a sua entrada até a suaeliminação, envolve a transposição de membranas celulares. Assim, é de suma

importância o conhecimento dos fatores que influenciam no transporte das substânciasquímicas pelas membranas, os quais podem ser agrupados em duas classes distintas.

Fatores relacionados com a membrana

 As membranas celulares têm espessura de 7 a 9 nm, em média e são constituídas poruma camada lipídica bimolecular, contendo em ambos os lados, moléculas deproteínas que penetram e às vezes transpõem esta camada. Os ácidos graxos presentesna camada lipídica não possuem uma estrutura cristalina rígida, ao contrário, emtemperatura fisiológica eles têm características quase fluidas. Assim, o caráter fluido dasmembranas e, portanto, sua permeabilidade, é determinado, principalmente, pelaestrutura e proporção relativa de ácidos graxos insaturados presentes na região. Estemodelo denominado de “mosaico fluido”, foi proposto por Singer e Nicolson, em 1972,e continua sendo o mais aceito até hoje.

Considerando-se as características das membranas celulares, as substâncias podematravessá-las por diferentes mecanismos, apresentados a seguir.

Transporte passivoEsse mecanismo é dividido em dois subtipos:

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- Difusão simples - a maioria dos agentes tóxicos atravessa as membranas doorganismo por difusão simples e o grau de penetração é determinado pelo coeficientede partição lipídio/água, pelo gradiente de concentração na membrana e pelo pKa. A proporção de um composto atravessar a membrana por difusão simples pode serdeterminada pela lei de Fick, expressa pela seguinte equação:

p = proporção do composto capaz de atravessar a membranak = constante de difusão

 A = área disponível para a difusãod = espessura da membranaC1 = concentração do composto no compartimento extracelular do sistemaC2 = concentração do composto no compartimento intracelular do sistema

Desse modo, se os valores de A e d forem constantes, a capacidade de difusão dasubstância pode ser determinada pela expressão k (C1 – C2). No início, o processo dedifusão é bastante rápido porque a diferença entre C1– C2é significativamente alta.Entretanto, com a efetivação do processo, há uma diminuição dos valores de C1 eaumento conseqüente de C2, com uma tendência de equilíbrio das concentrações nosdois compartimentos do sistema. O movimento unidirecional do composto através damembrana ocorre porque o valor de C2 tende sempre a diminuir em função da suadistribuição, biotansformação e excreção, de tal forma que C1 será sempre maior queC2, até que o processo de difusão se complete.

- Filtração - considerando-se o fluxo de água através dos poros da membrana, assubstâncias polares de baixo peso molecular (até 600 daltons) passarão através dosporos aquosos. O processo de filtração é dependente, portanto, além dahidrossolubilidade da substância, do tamanho dos poros da membrana que sãorelativamente grandes nos glomérulos renais (cerca de 40 Å) e pequenos na maioriadas células (8 Å).

Transportes especializadosExistem inúmeros compostos, cujo movimento através das membranas, não pode serexplicado por difusão simples nem por filtração. Alguns são muito grandes para passaratravés dos poros ou muito insolúveis em lipídios para se difundirem na membranalipídica. Entretanto, essas substâncias são rapidamente transportadas através dasmembranas, mesmo contra gradientes de concentração. Para explicar esse fenômeno,

foram propostos mecanismos de transportes especializados. Esses sistemas sãoresponsáveis pelo transporte de muitos nutrientes como açúcares, aminoácidos e ácidosnucléicos e também de xenobióticos.

São eles:

transporte ativo - esse processo caracteriza-se pelo consumo de energia,movimento da substância contra gradiente de concentração e a existência deproteínas carregadoras de moléculas, as quais apresentam seletividade pelassubstâncias e se saturam em altas concentrações.difusão facilitada - nesse processo, a substância também é transportada por um

carregador, sem contudo, haver consumo de energia. Outra diferença com o

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processo de transporte ativo é que na difusão facilitada a passagem acontece afavor de um gradiente de concentração.endocitose - é um mecanismo especial no qual a membrana celular, sofre umprocesso de invaginação, devido a variações na tensão superficial pela presençade macromoléculas no fluido extracelular, e engloba partículas líquidas

(pinocitose) ou sólidas (fagocitose). Esse tipo de transferência tem se mostradoútil na remoção de material particulado dos alvéolos pelos fagócitos e dosangue pelo reticulo endoplasmático do fígado e rim.

Fatores relacionados com a substância química A passagem dos toxicantes através das membranas celulares, de natureza lipoprotéica,será grandemente determinada por suas propriedades físico-químicas. Entre elasdestacam-se:

SolubilidadeDevido à constituição lipoprotéica das membranas biológicas, as substâncias químicas

lipossolúveis, ou seja, apolares, terão capacidade de transpô-las facilmente, peloprocesso de difusão passiva. Já as substâncias hidrossolúveis não atravessam essasmembranas, a não ser que tenham pequeno tamanho molecular e possam ser filtradas,através dos poros aquosos. A hidrossolubilidade é conferida à molécula porgrupamentos que permitem a formação de pontes de hidrogênio com as moléculas deágua em solução como, por exemplo, os grupos hidroxila (-OH), carboxila (-COOH),amino (-NH2); sulfidrila (-SH) e carbonila (-C=O). A lipossolubilidade é dada àmolécula pela presença de grupos alquílicos, fenílicos, naftílicos, etc.

Coeficiente de partição óleo/águaÉ o parâmetro que permite avaliar o grau de lipossolubilidade das substânciasquímicas, ou seja, é dado pela relação lipossolubilidade/hidrossolubilidade. Estecoeficiente é obtido ao se agitar um agente químico em uma mistura de solventeorgânico e água (em condições de pH e temperatura controladas). As substânciaspolares, hidrossolúveis, concentram-se na fase aquosa e as apolares, lipossolúveis, nafase orgânica. Quanto maior for a concentração da substância na fase orgânica, maiorserá a sua lipossolubilidade. Ex.: coeficiente de partição n-octanol/água a 37o C e pH7,4 de algumas substâncias:

clorpromazina = 79,7ácido acetil salicílico = 11,7paracetamol = 1,79

Grau de ionização ou de dissociação A maioria dos agentes tóxicos comportam-se como ácidos ou bases fracas quepossuem um ou mais grupos funcionais capazes de se ionizarem. A extensão destaionização dependerá do pH do meio no qual a substância se encontra e do seu própriopKa (logaritimo negativo da constante de dissociação da substância). É importanterelembrar que a forma ionizada é polar, hidrossolúvel e com pouca ou nenhumacapacidade de transpor membranas por difusão passiva pela fase lipídica. O grau deionização das substâncias, em diferentes pH, poderá ser obtido através da aplicação daequação de Henderson-Hasselbach, para ácidos fracos e bases fracas.

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Para ácidos fracos: Para bases fracas:

[NI] = forma não ionizada[I] = forma ionizada

Tomando-se como exemplo o ácido acetilsalicílico (um ácido fraco com pKa=3,4), qualserá o seu comportamento no estômago e no plasma? No suco gástrico, com um valorde pH=1,4 tem-se:

3,4 - 1,4 = log NI/I2 = log NI/INI/I = 102, ou seja, uma relação de 100 moléculas não ionizadas para cada uma que

se dissocia.

Portanto prevalece a forma molecular, lipossolúvel e capaz de vencer a membranacelular.No plasma, onde o valor pH é de 7,4 tem-se:

3,4 - 7,4 = log NI/I-4 = log NI/INI/I = 10-4 nesse caso, a relação é de uma molécula não ionizada para cada 10 milque se dissocia.

Portanto, prevalece a forma não ionizada, não lipossolúvel e incapaz de transpor a faselipídica da membrana.

Esses dados permitem evidenciar que a difusão no sentido sangue ? estômagopraticamente não ocorre, o que resulta na absorção do ácido acetilsalicílico noestômago e conseqüente distribuição. O contrário acontecerá com uma base fraca.Portanto, as substâncias ácidas passam as membranas muito mais facilmente em pHácido, enquanto as de natureza alcalina encontrão melhores chances em pH alcalino.

Quando o pH do meio é igual ao pKa de um composto, a metade deste estará naforma ionizada e a outra metade na forma não-ionizada. Importante ressaltar que o

pKa sozinho não indica se um composto tem caráter ácido ou básico, já que os ácidosfracos possuem pKa elevado, mas as bases fortes também. Da mesma maneira, osácidos fortes apresentam pKa baixo assim como as bases fracas.

Tamanho e carga da partícula (molécula ou íon) A existência de poros na membrana celular permitem a passagem de partículashidrossolúveis menores que 8 Å . Aquelas com tamanho superior não sofrem esseprocesso de filtração. Alguns cátions também têm sua passagem dificultada, uma vezque os poros apresentam cargas positivas em razão da presença das proteínas e cálcio.Os ânions passaam com maior facilidade.

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Absorção

 A absorção pode ser definida como o processo por meio do qual o agente tóxicoatravessa as membranas celulares para alcançar a circulação sangüínea.

Vias de absorção

Distinguem-se como principais vias de introdução dos agentes tóxicos no organismo:

Via oral, digestiva ou trato gastrintestinal (TGI)Uma vez no TGI, um agente tóxico poderá sofrer absorção desde a boca até o reto,geralmente pelo processo de difusão passiva. Poucas substâncias sofrem a absorção namucosa oral, porque o tempo de contato é pequeno nesse local. Estudos feitosexperimentalmente, no entanto, mo stram que a cocaína, a estricnina, a atropina evários opióides podem sofrer absorção na mucosa bucal. Esta absorção é dependente,

principalmente, do coeficiente de partição óleo/água (quanto maior este coeficientemais fácil a absorção) e resulta em níveis sangüíneos elevados, já que as substânciasnão sofrerão a ação dos sucos gastrintestinais.

Não sendo absorvido na mucosa oral, o toxicante poderá sofrer absorção na porção doTGI onde existir a maior quantidade de sua forma não-ionizada (lipossolúvel). Para seconhecer a fração da substância não ionizada, ou aquela apta a sofrer absorção pordifusão passiva, é importante a utilização da fórmula de Handerson-Hasselbach. Umdos fatores que favorecem a absorção intestinal de nutrientes e xenobióticos é apresença de microvilosidades, que proporcionam grande área de superfície.

Embora a grande maioria dos agentes tóxicos sofram absorção no TGI por difusãopassiva, muitas substâncias serão absorvidas por processos especiais, maisprecisamente por transporte ativo. Exemplo: o chumbo é absorvido por transporte ativoe utiliza o sistema que transporta o cálcio; o tálio é transportado pelo sistemacarregador responsável pela absorção de ferro, etc.

Fatores que interferem na absorção pelo TGI Além das propriedades físico-químicas dos toxicantes, já discutidas, outros fatorespoderão interferir na absorção:

•  estado de plenitude ou vacuidade gastrintestinal: a absorção será favorecida seo estômago estiver vazio, devido ao maior contato do toxicante com a mucosa.

É importante considerar a apresentação do produto (sólida ou líquida). Alimentos com elevado teor gorduroso como o leite e o tipo de veículo utilizadona formulação podem facilitar a absorção de substâncias lipossolúveis;

•  concentração enzimática e acidez: estes sucos digestivos, seja por sua acideziônica, seja por ação enzimática, podem provocar mudanças na atividade ou naestrutura química do agente, alterando assim a velocidade de absorção. Ex.: opH estomacal das crianças possui menor acidez que o dos adultos. Isto implicaem um desenvolvimento maior de microrganismos, principalmente a Escherichiacoli, bactéria que reduz, no estômago, o nitrato a nitrito. Como as criançaspossuem dietas ricas em nitratos, estes serão reduzidos a nitritos, que sãorapidamente absorvidos pela mucosa estomacal, o que pode ocasionar

metemoglobinemia;

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•  motilidade intestinal: a alteração do tempo de esvaziamento gástrico e damotilidade intestinal (pelo toxicante ou alimentos) poderá aumentar ou diminuiro tempo de contato do agente tóxico com a mucosa e, consequentemente, aabsorção nesse local. Deve-se considerar ainda, a capacidade da substância deprovocar irritação e vômito;

•  efeito de primeira passagem pelo fígado: as substâncias absorvidas noestômago e duodeno entram na circulação porta e passam pelo fígado,podendo ser biotransformadas de maneira mais ou menos intensa. Este efeitopode ser responsável pela menor biodisponibilidade de algumas substâncias,quando estas são administradas por via oral.

 Alguns fatores que interferem na absorção pelo TGI podem variar de acordo com osexo e, no feminino, entre as gestantes e não gestantes. Este fato é importante naavaliação da intensidade de absorção de xenobióticos por essa via.

Via cutânea

 A pele é um órgão formado por múltiplas camadas de tecidos e contribui com cerca de10% de peso corpóreo. No estado íntegro, a pele constitui uma barreira efetiva contra apenetração de substâncias químicas exógenas. No entanto, alguns xenobióticos podemsofrer absorção cutânea, dependendo de fatores tais como a anatomia e aspropriedades fisiológicas da pele e das propriedades físico-químicas dos agentes.

 A pele é formada por duas camadas, a epiderme que é a camada mais externa da pelea derme, que é formada por tecido conjuntivo e onde se encontram vasos sangüíneos,nervos, folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas. Estes três últimos elementosda derme permitem o contato direto com o meio externo.

 As substâncias químicas podem ser absorvidas, principalmente, através das célulasepidérmicas ou folículos pilosos.

Absorção transepidérmica A absorção dos agentes químicos pela pele tem sua velocidade limitada pela regiãocórnea da epiderme, mais precisamente pelo extrato córneo contínuo. As substânciaslipossolúveis penetram por difusão passiva através dos lipídios existentes entre osfilamentos de queratina, sendo a velocidade desta absorção indiretamente proporcionalà viscosidade e volatilidade do agente. Já as substâncias polares, de baixo pesomolecular, penetram através da superfície externa do filamento de queratina, no extratohidratado. A absorção transepidérmica é o tipo de absorção cutânea mais freqüente,devido ao elevado número de células epidérmicas existente, embora não seja umapenetração muito fácil para os toxicantes.

Absorção transfolicular A absorção nessa região é menos significativa do que a transepidérmica. Algumassubstâncias químicas podem penetrar pelos folículos pilosos, alcançando rapidamentea derme. É uma penetração fácil para os agentes químicos, uma vez que eles nãonecessitam cruzar a região córnea. Qualquer tipo de substância química, seja ela lipoou hidrossolúvel, ionizada ou não, gás ou vapor, ácida ou básica, pode penetrar pelosfolículos. É uma absorção também importante para alguns metais.

Fatores que interferem na absorção cutâneaExistem vários fatores que podem interferir na absorção através da pele. Geralmente

eles são agrupados em quatro classes diferentes.

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1. Fatores relacionados ao organismo

•  superfície corpórea: a superfície corpórea total no homem é maior do que namulher (média de 1,70 a 1,77 m2 no homem e de 1,64 a 1,73 m2 na mulher).Este fato pode aumentar a absorção transepidérmica no homem (maior

superfície de contato com o xenobiótico);•  volume total de água corpórea: quanto maior o volume aquoso corpóreo, maiora hidratação da pele e consequentemente, a absorção cutânea. Quandocomparado à mulher, o homem possui maior volume aquoso total, extra eintracelular, o que favorece a absorção cutânea. Este fato deve ser considerado,também, quando se compara mulheres grávidas e não grávidas. As gestantesapresentam maior volume aquoso corpóreo e, em conseqüência, maiorhidratação do extrato córneo. Isto possibilita maior absorção cutânea dexenobióticos;

•  abrasão da pele: com a descontinuidade da pele, a penetração torna-se fácil;•  fluxo sangüíneo através da pele: deve-se considerar a vascularização das áreas

expostas, uma vez que, quanto mais vascularizada a região, maior o fluxosangüíneo no local. Estudos demonstram que, em média, 5% do sanguebombeado pelo coração passa pela pele, com fluxo em torno de 120mL/kg/min. Inflamação ou fatores que levam à hiperemia aumentarão aabsorção cutânea. Durante a gestação também ocorrem aumentos significativosno fluxo sangüíneo das mãos (em até 6 vezes) e pés (até 2 vezes), o que poderáinfluenciar a absorção cutânea de xenobióticos nas gestantes expostas;

•  queimaduras químicas e/ou térmicas: apenas as leves ou moderadas, já que asseveras destroem totalmente o tecido, formando uma crosta de difícilpenetração;

•  pilosidade: nas áreas em que existem pêlos, a absorção cutânea pode ser 3,5 a

13 vezes maior do que nas regiões glabras.

2. Fatores relacionados ao agente químico (já discutidos anteriormente)

•  volatilidade e viscosidade;•  grau de ionização;•  tamanho molecular.

3. Fatores ligados à presença de outras substâncias na pele

•  vasoconstritores: estes vão reduzir a absorção cutânea, devido à diminuição dacirculação sangüínea;

•  veículos: podem auxiliar na absorção, mas não promovem a penetração desubstâncias que, normalmente, não seriam absorvidas pela pele íntegra;

•  água: a pele tem normalmente 90 g de água por grama de tecido seco. Isto fazcom que a sua permeabilidade seja 10 vezes maior do que aquela do extratototalmente seco. O contato prolongado com água pode aumentar a hidrataçãoda pele em 3 a 5 vezes, o que resultará em um aumento na permeabilidadecutânea em até 3 vezes;

•  agentes tensoativos: os sabões e detergentes são substâncias bastante nocivaspara a pele. Eles provocam alteração na permeabilidade cutânea, mesmoquando presentes em pequenas concentrações. Alteram, principalmente, a

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absorção de substâncias hidrossolúveis, devido às modificações que provocamna estrutura do filamento de queratina;

•  solventes orgânicos: estes aumentam a absorção cutânea para qualquer tipo deagente químico, pois removem lipídios e lipoproteínas presentes no extratocórneo, tornando-o poroso e menos seletivo.

4. Fatores ligados às condições de trabalho (exposição ocupacional)

•  tempo de exposição;•  temperatura do local de trabalho: pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na

velocidade de penetração cutânea de agentes químicos, para cada 10oC deaumento na temperatura.

Como já mencionado, o sexo e o estado gestacional podem alterar parâmetrosfisiológicos importantes e, consequentemente, a intensidade da absorção cutânea

O contato dos agentes químicos na pele podem determinar:•  efeito nocivo local sem ocorrer absorção cutânea. Ex.: ácidos e bases fortes.•  efeito nocivo local e sistêmico. Ex.: o arsênio, benzeno, etc.•  efeito nocivo sistêmico, sem causar danos no local de absorção: por exemplo,

inseticidas carbamatos (exceção feita ao aldicarbque é um carbamato compotente ação local).

Via respiratória, pulmonar ou inalatória

 A via respiratória é de suma importância para a Toxicologia Ocupacional. Muitas

intoxicações ocupacionais são decorrentes da aspiração de substâncias contidas no ar. A superfície pulmonar total é de aproximadamente 90 m2, a superfície alveolar de 50 a100 m2 e o total de área capilar é cerca de 140 m2. O fluxo sangüíneo contínuoexerce uma ação de dissolução muito boa e muitos agentes químicos podem serabsorvidos rapidamente a partir dos pulmões. Os agentes passíveis de sofreremabsorção pulmonar são os gases e vapores e os aerodispersóides. Estas substânciaspoderão ser absorvidas, tanto nas vias aéreas superiores, quanto nos alvéolos.

Absorção de gases e vapores

Pelas vias aéreas superiores (VAS)Em geral, não se dá muita atenção para a absorção desses compostos nas vias aéreassuperiores. No entanto, muitas vezes, a substância pode ser absorvida na mucosanasal, evitando sua penetração até os alvéolos. A retenção parcial ou total dos agentesno trato respiratório superior, está ligada à hidrossolubilidade da substância. Quantomaior a sua solubilidade em água, maior será a tendência de ser retido no local. Vistosob este ângulo, a umidade constante das mucosas que revestem estas vias, constituium fator favorável. Há, no entanto, a possibilidade da ocorrência de hidrólise química,originando compostos nocivos, tanto para as vias aéreas superiores quanto para osalvéolos.

Ex.:tricloreto de fósforo + H2O HCl + CO2;

dióxido de enxofre (SO2) + H2O ácido sulfúrico.

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Os produtos formados, além dos efeitos irritantes, favorecem também a absorção delesou de outros agentes pela mucosa já lesada. Assim, nem sempre, a retenção de gases evapores nas vias aéreas superiores é sinônimo de proteção contra eventuais efeitostóxicos.

Pelos alvéolosNos alvéolos pulmonares duas fases estão em contato, uma gasosa formada pelo aralveolar e outra líquida representada pelo sangue. Essas duas fases são separadas poruma barreira dupla: o epitélio alveolar e o endotélio capilar. Diante de um gás ou deum vapor, o sangue pode se comportar de duas maneiras diferentes: como um veículoinerte, ou como meio reativo. Em outras palavras, o agente tóxico pode dissolver-sesimplesmente por um processo físico ou, ao contrário, combinar-se quimicamente comelementos do sangue. No primeiro caso tem-se a dissolução do toxicante no sangue eno segundo caso, a reação química.

Dissolução do toxicante no sangue – neste caso, deve-se considerar o agente químico

como o soluto e o sangue como solvente. Em relação ao soluto, o fator que interfere naabsorção pulmonar é a sua concentração no ar alveolar (pressão parcial). Na verdade,se estabelece uma troca de moléculas entre o ar alveolar e o sangue, no sentido dolocal onde a pressão parcial é menor. Assim, se a pressão parcial no ar alveolar formaior que no sangue, ocorrerá absorção e se for maior no sangue do que no aralveolar, haverá excreção. É evidente, portanto, a importância de fatores ambientais,tais como temperatura e pressão, já que estes fatores alteram a pressão parcial degases e vapores.Em relação ao solvente, deve-se considerar a constituição do sangue. Este tecidoorgânico apresenta tanto uma característica aquosa (3/4 do sangue é água) quantoorgânica (proteínas, lipídios, e outros componentes). Sendo assim, mais do que a lipoou hidrossolubilidade de um agente tóxico, deve-se aqui, considerar a sua solubilidadeno sangue. A importância deste fator surge de maneira mais evidente, quando serecorda que a duração do contato entre o ar alveolar e o sangue é de uma fração desegundo apenas. Então, para os gases e vapores que não estabelecem combinaçõesquímicas, apenas suas solubilidades no sangue assegurarão uma boa absorçãopulmonar. Uma maneira prática de se observar a solubilidade de uma substância nosangue é determinar o chamado coeficiente de distribuição (K). Esse coeficiente éexpresso pela relação entre a concentração do agente tóxico no ar alveolar pelaconcentração do agente tóxico no sangue, no momento em que se instala o equilíbrio.

 Alguns autores utilizam a correlação: concentração do toxicante no sangue porconcentração do toxicante no ar alveolar, para avaliar a solubilidade da substância.Então um coeficiente baixo implica em uma boa solubilidade no sangue e isto conduz a

uma concentração elevada do agente neste meio. No entanto, justamente devido a estaalta solubilidade, a saturação sangüínea será lenta, a retenção do agente neste localserá mais longa e a transferência aos tecidos tardia. Quando o coeficiente dedistribuição é alto, os fenômenos inversos acontecem. Assim, o K permite avaliar aconcentração do agente no sangue conhecendo-se sua concentração no ar alveolar.Pode-se observar que dois fatores foram destacados até aqui: a pressão parcial do gásou vapor e sua solubilidade no sangue. Não foi considerada a presença dasmembranas alveolares e capilares interpostas entre o ar e o sangue. Isto porque estasmembranas possuem espessura muito pequena (cerca de 1?m) e superfície muitogrande, não representando um obstáculo à absorção das substâncias químicas. Se oagente tóxico tem pequeno tamanho molecular e boa solubilidade no sangue, poderá

ser absorvido pelos pulmões.

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É importante considerar também fatores fisiológicos, tais como a freqüência cardíaca erespiratória, que podem aumentar ou diminuir a saturação sangüínea e,consequentemente, a absorção. A influência desses fatores difere de acordo com o tipode substância analisada. Assim, para substâncias com valores de K baixo, ou seja,muito solúveis em água, o aumento da freqüência respiratória favorecerá a absorção.

Já para as substâncias de K elevado (pouco solúvel no sangue), a absorção seráfavorecida pelo aumento na freqüência cardíaca. Deve-se ressaltar que, no caso dosexo feminino, o estado gestacional pode alterar esses parâmetros fisiológicos e, emconseqüência, a intensidade da absorção pulmonar.

Combinação química do agente químico com o sangue - ao contrário da dissolução,que é puramente física, ocorre aqui uma fixação entre o agente tóxico e o sangue quedependerá da afinidade química entre estes dois elementos. No caso da combinaçãoquímica, não ocorrerá um equilíbrio entre agente químico presente no ar alveolar e nosangue. São várias as substâncias que se ligam quimicamente no sangue como, por

exemplo, o monóxido de carbono (CO), o chumbo e o mercúrio.Absorção de material particulado ou aerodispersóides

 Aerodispersóides são partículas sólidas ou líquidas de pequeno tamanho molecular,que ficam em suspensão no ar, por um período longo de tempo. Geralmente, somenteas partículas com diâmetro menor ou igual a 1?m atingirão os alvéolos e poderãosofrer absorção. As partículas que possuem diâmetro maior, ficarão retidas nas regiõesmenos profundas do trato respiratório.

 A penetração e retenção dos aerodispersóides no trato pulmonar depende de fatorescomo:

•  diâmetro da partícula: este nem sempre indica o seu comportamento noaparelho respiratório. É importante considerar o diâmetro aerodinâmico que éfunção do tamanho (diâmetro físico) e da densidade da partícula. Quanto maioro diâmetro aerodinâmico, menor a penetração ao longo das vias aéreassuperiores. Assim, se existem duas partículas com o mesmo diâmetro físico, a demaior densidade terá o maior diâmetro aerodinâmico e penetrará menos aolongo das vias aéreas superiores (VAS).

•  hidrossolubilidade: devido à umidade existente nas VAS, as partículashidrossolúveis tenderão a ficar retidas na parte superior do trato pulmonar, semalcançar os alvéolos.

•  condensação: o tamanho das partículas no aparelho respiratório pode ser

alterado pela aglomeração ou por adsorsão de água, originando partículasmaiores. Influenciam a condensação, a carga da partícula, as propriedadesfísico-químicas da substância, o tempo de retenção no trato respiratório, etc.

•  temperatura: ela pode aumentar o movimento browniano (movimento natural eao acaso de partículas coloidais pequenas), o que provocará maior colisão daspartículas e, consequentemente, sua maior condensação e maior retenção.

Mecanismos de retenção dos aerodispersóides

 As partículas que medem mais de 30µm não conseguem penetrar no trato pulmonar,uma vez que, devido à força da gravidade, elas se sedimentarão rapidamente no

ambiente. Entretanto, quando a “força” de inspiração é aumentada (por exemplo emtrabalhos pesados), pode ocorrer a penetração dessas partículas. Aquelas com

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diâmetro menor que 30µm, entretanto, são capazes de penetrar no trato pulmonar,sendo que o mecanismo de retenção e remoção das mesmas varia de acordo com aregião do trato pulmonar.

Região nasofaríngea: nessa região, as partículas com diâmetro aerodinâmico

entre 30 e 5µm depositam-se pelo processo de impactação. Como o diâmetroda partícula e a velocidade do ar inspirado são elevados e as vias dessa regiãotêm uma mudança brusca de direção, as partículas se chocam com as paredese ficam retidas.

Região traqueobronquial: partículas com diâmetro aerodinâmico entre 5 e 1µmse depositam nessa região, por sedimentação. Como o ar não tem muitavelocidade e nem há mudanças bruscas de direção nesta região, as partículasficam mais tempo no local e se sedimentam devido à força de gravidade.

Região alveolar: apenas partículas com diâmetro menor de 1µm conseguem

atingir esta região, onde se depositam por um processo de difusão. Como avelocidade do ar é praticamente nula, e a força da gravidade pouco influi (aspartículas são muito pequenas), os aerodispersóides, devido ao movimentobrowniano, vão se chocando com as partículas dos gases presentes nos alvéolos(O2 e CO2) e assim difundem-se até às paredes, onde se depositam.

Mecanismos de remoção dos aerodispersóides do trato pulmonarNem todas partículas que se depositam no aparelho pulmonar serão retidas nele. Osmecanismos de remoção dependem do local de deposição.

Região nasofaríngea: as partículas são removidas pelo muco, associado aomovimento dos cílios, que vibram em direção à faringe. É o chamadomovimento mucociliar.

Região traqueobronquial: o processo de remoção é o mesmo anterior(movimento mucociliar), sendo que a tosse, ocasionada pela presença de corpoestranho na região, pode auxiliar nesta remoção. Algumas substâncias taiscomo o SO2, amônia e também a fumaça de cigarro diminuem a velocidade deremoção neste local.

Região alveolar: os epitélios dos bronquíolos e dos alvéolos são desprovidos decílios. O muco está presente devido à secreção das células epiteliais. Esse mucose move em direção ao epitélio ciliado, através de um processo de migração,

ainda bastante discutido. Sabe-se que este mecanismo é capaz de remover aspartículas em direção às vias aéreas superiores e que ele é estimulado pelapresença das próprias partículas nos alvéolos. Outro mecanismo de remoção éa fagocitose, realizada pelos macrófagos presentes em grande número naregião.

Os fagócitos contendo as partículas podem migrar em duas direções: - até aosbrônquios onde são eliminados pelo movimento mucociliar (que é o mais comum); - atéao sistema linfático, através da penetração pelas paredes dos alvéolos. A fagocitose

pode remover até 80% das partículas presentes nos alvéolos. A velocidade do clearenceno trato pulmonar pode variar também de acordo com a região. Na região

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nasofaríngea a velocidade é muito rápida. A remoção ocorre em minutos. Na regiãotraquebronquial a velocidade é rápida e a remoção ocorre em minutos ou horas. Emregiões mais profundas dos brônquios esta velocidade de remoção é moderada (cercade horas). E na região alveolar a velocidade de clearence é lenta, podendo levar dedias até anos para ocorrer. Ela vai depender do tipo de partícula e do mecanismo de

remoção. As partículas presentes nos alvéolos, que não foram removidas ouabsorvidas, podem ficar retidas na região, causando as chamadas pneumoconioses.

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Distribuição

Entende-se por distribuição de um agente tóxico, sua localização e concentração emdiferentes tecidos do organismo. Portanto, a distribuição não é a ação de transportar otoxicante. Por exemplo, quando se diz que uma substância se distribui nos órgãos A, B e

C, não se quer dizer como ela se deslocou da superfície de contato até esses órgãos,mas sim que essa substância aparece nesses órgãos com uma concentração a, b e c,respectivamente.

 Após a entrada do agente tóxico na corrente sangüínea, através da absorção ou poradministração direta, ele estará disponível para ser transportado pelo organismo comdiferentes destinos:

•  sítio de ação•  um ou vários sítios de armazenamento – locais onde o composto pode ser

armazenado e que, para a maioria dos agentes tóxicos, não corresponde aoseu sítio de ação

•  diversos órgãos para sua biotransformação

Fatores que afetam a distribuição

Normalmente a distribuição ocorre rapidamente e a velocidade e extensão desta,dependerá do fluxo sangüíneo, da velocidade de difusão nas interfaces sangue-tecido aqual é dependente do coeficiente de partição e do grau de ionização, dapermeabilidade da membrana e da afinidade do tecido pelo composto. Esses fatoressão agrupados em duas categorias.

Fatores ligados à substância• lipossolubilidade e grau de ionização (já discutidos) • afinidade química do agente – durante a distribuição, o agente alcançará oseu sítio alvo, que é o órgão ou tecido onde exercerá sua ação tóxica, mas,poderá, também, se ligar a outros constituintes do organismo, concentrando-seem algumas partes do corpo. Em alguns casos, estes locais de maiorconcentração são também os sítios de ação e disto resulta efeitos altamenteprejudiciais. É o caso do monóxido de carbono para o qual o sanguerepresenta, tanto o local de concentração quanto o de ação tóxica. Felizmentepara o homem, a maioria dos toxicantes atingem seus maiores níveis em locaisdiferentes do sítio alvo (exemplo: Pb é armazenado nos ossos e atua nos tecidosmoles). Este acúmulo do agente tóxico em outros locais que não o de ação,funciona como uma proteção ao organismo, uma vez que previne uma elevadaconcentração no sítio alvo. Os agentes tóxicos nos locais de concentração estãoem equilíbrio com sua forma livre no sangue e, quando a concentraçãosangüínea diminui, o agente que está concentrado em outro tecido é liberadopara a circulação e daí pode atingir o sítio de ação.

Fatores ligados ao organismo:•  fluxo sangüíneo – quanto maior a irrigação de um órgão, maior será ocontato do toxicante com o mesmo. Dessa forma, órgãos como o fígado, os rinse baço, que recebem cerca de ¾ do fluxo sangüíneo do organismo, tendem a

acumular os agentes tóxicos. Nesse aspect, os rins merecem destaque porque,

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embora representem menos de 1% do peso corporal, recebem de 20 a 25% dodébito cardíaco. •  conteúdo de água ou lipídio de órgãos e tecidos – os agentes tóxicos sefixarão em órgãos ou tecidos de acordo com sua afinidade por esses conteúdos.Por exemplo, substâncias lipossolúveis como solventes orgânicos e compostos

organomercuriais, terão preferência por tecidos ricos em gordura como o SNCe, nesse caso, os efeitos de suas ações tóxicas serão decorrentes dessalocalização. Por outro lado, compostos inorgânicos ionizáveis e solúveis emágua fixam-se, preferencialmente, nos rins como, por exemplo, o mercúrioinorgânico, que lesa o parênquima desse órgão.•  biotransformação do agente tóxico – o organismo tem capacidade debiotransformar a molécula de alguns agentes tóxicos transformando-as emderivados de maior lipossolubilidade, o que dificulta sua eliminação renal efacilita sua acumulação. Como exemplo, tem-se o caso do DDE(diclorodifenileteno), produto de biotransformação do DDT (diclorodifeniletano),um inseticida organoclorado.

• integridade do órgão – a lesão de um órgão pode determinar a acumulaçãodo toxicante. O mercúrio inorgânico, por exemplo, tem afinidade pelo tecidorenal, porém, danifica o néfron, o que pode causar oligúria ou anúria, o quedificulta sua eliminação e aumenta ainda mais sua deposição renal.O sangue tem grande importância no estudo da distribuição, não só porque é oprincipal fluido de distribuição dos agentes tóxicos, mas, também por ser oúnico tecido que pode ser colhido repetidamente sem distúrbios fisiológicos outraumas orgânicos. Além disto, como o sangue circula por todos os tecidos,algum equilíbrio pode ser esperado entre a concentração do agente no sangue(dose interna) e nos tecidos, inclusive no sítio de ação (dose efetiva). Assim, aconcentração plasmática fornece melhor avaliação da ação tóxica do que adose (a não ser quando a concentração plasmática é muito baixa em relação àconcentração nos tecidos).

Sítios de armazenamento no organismo

 A distribuição do toxicante, através do organismo ocorre de maneira não uniforme,devido a uma série de fatores que podem ser reunidos em dois grupos: afinidade pordiferentes tecidos e presença de membranas. O papel da ligação às proteínasplasmáticas na distribuição desigual dos xenobióticos é o fator mais estudado. Osprincipais locais de depósito são discutidos a seguir.

Afinidade por diferentes tecidos

Ligação às proteínas plasmáticas

 Várias proteínas do plasma podem se ligar a constituintes endógenos (ex.: ácidosgraxos, triptofano, hormônios, bilirrubinas, etc.) e também aos xenobióticos. A principalproteína, sob o ponto de vista da ligação a xenobióticos, é a albumina. Algumasglobulinas também apresentam papel relevante na ligação aos agentes exógenos,especialmente àqueles de caráter básico. Destaca-se aqui a α1 glicoproteína ácida.

Com exceção das substâncias lipossolúveis de caráter neutro que, geralmente, se

solubilizam na porção lipídica das lipoproteínas, a ligação de fármacos às proteínasplasmáticas é feita, usualmente, pela interação de grupos polares ou não polares dos

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toxicantes com o(s) grupamento(s) protéico(s). Ex.: os fármacos de caráter ácido, ligam-se em um único sítio de albumina, possivelmente, ao nitrogênio do aminoácidoterminal, que é, no homem, o ácido aspártico. O elevado peso molecular das proteínas plasmáticas impede que o complexo toxicante– proteína plasmática atravesse as membranas dos capilares restringindo-o ao espaço

intravascular. Assim, enquanto ligado às proteínas plasmáticas, o agente tóxico nãoestará disponível para a distribuição no espaço extravascular. Deve-se observar, noentanto, que esta ligação é reversível (geralmente feita por pontes de hidrogênio, forçasde van der Waals, ligação iônica) e, à medida que o agente livre se difunde através damembrana capilar, a fração ligada se dissocia das proteínas tornando-se apta para serdistribuída. Esta ligação atua, portanto, graduando a distribuição dos xenobióticos e,consequentemente, a chegada ao sítio de ação.Efeitos tóxicos severos podem aparecer quando há um deslocamento anormal dosxenobióticos de seus sítios de ligação protéica. Entre os fatores que afetam esta ligaçãodestacam-se:

competição entre toxicantes - as proteínas plasmáticas não possuem sítiosespecíficos de ligação e duas ou mais substâncias que se ligam ao mesmo sítioprotéico, irão competir entre si por esta ligação. Esta competição pode ocorrerentre dois ou mais xenobióticos ou entre xenobióticos e substratos endógenos.Como conseqüência ocorrerá um aumento na concentração livre de uma dassubstâncias e, portanto, o risco de intoxicação. Ex.: sulfonamidas e bilirrubinacompetem pelo mesmo sítio da albumina; a varfarina (anticoagulante) égeralmente deslocado pelo AAS.

condições patológicas - algumas doenças alteram a conformação do sítio deligação na proteína, outras alteram o pH do plasma e podem provocar aionização do complexo agente-proteína e outras, ainda, modificam aquantidade de proteínas plasmáticas. Ex.: a síndrome nefrótica, que permite aeliminação da albumina através da urina, causando hipoalbuminemia.

concentração do agente - quanto maior a concentração do fármaco no plasma,maior a ligação protéica. Ex.: fenitoína. Se a concentração desteanticonvulsivante for muito elevada no plasma a ligação protéica aumenta maisdo que o esperado e a fração livre disponível para a distribuição e ação épequena. Neste caso o efeito terapêutico pode não ser alcançado.

concentração protéica - o aumento das proteínas plasmáticas resulta em maiorligação dos xenobióticos. Ex.: aumento de lipoproteína implica em maior

ligação da imipramina.

pH - para alguns toxicantes o pH do plasma altera a ligação às proteínas. Ex.: ateofilina terá uma maior ligação às proteínas plasmáticas quando o pH dosangue está aumentado.

idade - a concentração de algumas proteínas plasmáticas é alterada com aidade. Ex.: as crianças possuem quantidade de albumina menor do que oadulto. Conseqüentemente, os toxicantes que se ligam essencialmente àalbumina estarão mais livres e serão mais rapidamente distribuídos, causandoefeitos tóxicos mais severos, mesmo com doses não muito grandes.

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Ligações celularesEmbora menos estudado que a ligação às proteínas plasmáticas, a ligação a outrostecidos exerce um papel muito importante na distribuição desigual dos agentes peloorganismo. A ligação de toxicantes a componentes teciduais poderá alterarsignificativamente a distribuição dos xenobióticos, já que a fração destes ligada aos

tecidos será inclusive maior do que a ligada às proteínas plasmáticas. Sob o aspecto deligação a xenobióticos, o tecido hepático e o renal têm um papel especial. Esses órgãospossuem elevada capacidade de se ligarem aos agentes químicos e apresentam asmaiores concentrações destes (e também de substâncias endógenas), quandocomparados com outros órgãos. Os mecanismos através dos quais estes órgãos removem os agentes do sangue nãoestão bem estabelecidos, no entanto, sabe-se que as proteínas intracelulares sãocomponentes fundamentais na ligação dos agentes tóxicos ao tecido hepático e renal.Por exemplo, a proteína Y ou “ligandina”, presente no citoplasma das células hepáticas,tem alta afinidade pela maioria dos ácidos orgânicos e parece ter importante papel natransferência de ânions orgânicos do plasma para o fígado.

 A metalotineína, outra proteína tecidual, tem sido encontrada no fígado e rins ligada aocádmio, cobre e zinco. A rapidez com que o fígado se liga a xenobióticos pode serexemplificada pelo chumbo que, 30 minutos após a administração, tem suaconcentração hepática 50 vezes maior do que a plasmática.

Tecido adiposoComo a lipossolubilidade é uma característica fundamental para o transporte pormembranas, é lógico imaginar que os agentes tóxicos lipossolúveis, de uma maneirageral, poderão se concentrar no tecido adiposo. Os xenobióticos armazenam-se nesselocal através da simples dissolução física nas gorduras neutras do tecido.

 Assim, um agente tóxico, com elevado coeficiente de partição óleo/água, pode serarmazenado no tecido adiposo em grande extensão e isto diminuirá a suabiodisponibilidade (concentração disponível para atingir o sítio alvo). O tecido adiposoconstitui 50% do peso de um indivíduo obeso e 20% de um magro. Sendo oarmazenamento um mecanismo de defesa, pode-se pensar que a toxicidade de umaagente químico será menor para a pessoa obesa como para uma pessoa magra. Maisreal, no entanto, é pensar na possibilidade de um aumento súbito da concentração doagente tóxico no sangue e no sítio de ação, devido a uma rápida mobilização dasgorduras.

Tecido ósseoUm tecido relativamente inerte como o ósseo pode também servir como local dearmazenamento de agentes químicos inorgânicos, tais como flúor, chumbo e estrôncio.

O fenômeno de captura dos xenobióticos pelos ossos pode ser consideradoessencialmente um fenômeno químico, no qual as mudanças ocorrem entre a superfícieóssea e o líquido que está em contato com ela. O líquido é o fluido extracelular e asuperfície envolvida é a matriz inorgânica do osso. Recordando: a superfície ósseapossui uma matriz orgânica e outra inorgânica, esta sendo formada pelos cristais dehidroxiapatita [3Ca3(PO4)2Ca(OH)2]. Após ser trazido até o cristal ósseo através dofluido extracelular, o toxicante poderá penetrar na superfície do cristal, de acordo como seu tamanho e sua carga molecular. Assim, por exemplo, o fluoreto (F -) pode serfacilmente colocado no lugar da hidroxila (OH-) e o chumbo e estrôncio no lugar docálcio.

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O armazenamento de xenobióticos no tecido ósseo poderá, ou não, provocar efeitostóxicos no local. O chumbo não é nocivo para os ossos, mas o flúor pode provocarfluorose óssea e o estrôncio radioativo, osteossarcoma e outras neoplasias.Esse armazenamento não é irreversível. O agente tóxico pode ser liberado dos ossospor dissolução da hidroxiapatita pela atividade osteoclástica (destruição do tecido ósseo

provocado pela ação dos osteoclastos, células do próprio tecido ósseo que têm talfunção); aumento da atividade osteolítica (destruição do tecido ósseo provocada porsubstâncias químicas, enzimas, etc) pela ação do paratormônio, hormônio daparatireóide, que tem ação descalcificante óssea pois, se no lugar do cálcio o ossocontiver um toxicante, este será deslocado para a corrente sangüínea, aumentando asua concentração plasmática e por troca iônica. 

Leite materno A mulher que amamenta e se expõe a agentes tóxicos poderá passá-los para o leitecom conseqüentes prejuízos para o lactente. Por ser mais ácido que o plasma, oscompostos básicos podem se concentrar no leite. Ao contrário, a concentração de

substâncias ácidas no leite é menor que a do plasma. Não eletrólitos como etanol, porexemplo, distribuem-se prontamente no leite e atingem concentrações similares à doplasma, independente do pH deste líquido.

Presença de membranas ou barreiras de exclusão

 As substâncias químicas, como foi visto, podem se acumular em determinados sítios,mas, podem também ser excluídas de outros.

Barreira Hematoencefálica A chamada barreira hematoencefálica, que protege o cérebro da entrada desubstâncias químicas, é um local menos permeável do que a maioria de outras áreasdo corpo. A barreira do sistema nervoso central (SNC) possui três mecanismos deexclusão:

- as células endoteliais dos capilares do SNC são muito finas e encontram-seintimamente unidas e não deixam poros aquosos entre elas. Isto impede adifusão de substâncias polares de baixo peso molecular;- os capilares do SNC são circundados pelos astrócitos (tecido conectivo glial), oque impõe uma película a mais a ser transposta;- a concentração protéica no fluido intersticial do SNC é a mais baixa de todo oorganismo.

 Assim, em contraste com outros tecidos, o toxicante tem dificuldade em se mover entreos capilares, tendo que atravessar não somente o endotélio capilar, mas também amembrana das células gliais, para alcançar o fluido intersticial. Como este fluido épobre em proteínas, o agente tóxico não pode usar a ligação protéica para aumentar adistribuição dentro do SNC. Estes fatos juntos atuam como um mecanismo de proteção,que diminui a distribuição e ação dos toxicantes no SNC, já que eles não entram nocérebro em quantidades significativas. A eficiência da barreira hematoencefálica variade uma área do cérebro para outra. Ex.: o córtex, o nucleopineal e o lóbulo posteriorda hipófise são mais permeáveis do que outras áreas cerebrais. Não está claro se amaior permeabilidade destas áreas decorre de um suprimento maior sangüíneo ou deuma permeabilidade mais adequada da barreira ou dos dois fatores juntos.

Os princípios que regem o transporte das substâncias através de membranas sãotambém os que comandam a entrada de xenobióticos no cérebro. Assim, somente a

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forma livre estará apta para entrar no cérebro, desde que seja lipossolúvel. A lipossolubilidade é um fator preponderante na velocidade e quantidade de toxicanteque entra no SNC, ou seja, a velocidade de entrada no SNC é proporcional aocoeficiente de partição óleo/água da substância.

 A barreira hematoencefálica não está totalmente desenvolvida por ocasião do

nascimento e esta seria uma das razões para a maior toxicidade de substânciasquímicas em recém-nascidos.

“Barreira” PlacentáriaDurante anos, o termo “barreira” placentária demonstrou o conceito que a principalfunção da placenta era proteger o feto contra a passagem de substâncias nocivasprovenientes do organismo materno. Sabe-se hoje, que ela possui funções maisimportantes, tais como a troca de nutrientes (O2, CO2, etc.). Esse material vital,necessário para o desenvolvimento do feto, é transportado por processo ativo, comgasto de energia. Já a maioria dos xenobióticos que se difundem através da placenta ofazem por difusão passiva. Na verdade, a placenta não representa uma barreira

protetora efetiva contra a entrada de substâncias estranhas na circulação fetal. Anatomicamente a placenta é o resultado de várias camadas celulares interpostas entrea circulação fetal e materna. O número de camadas varia com a espécie e com operíodo de gestação e isto, provavelmente, afeta a sua permeabilidade. Na espéciehumana ela possui ao todo seis camadas, três de origem materna e três de origemfetal.Poderia se pensar que as espécies que apresentam placenta com maior número decamadas são mais protegidas contra agentes tóxicos durante a gestação. Entretanto, arelação entre o número de camadas e a permeabilidade placentária não estásuficientemente estudada. Embora não totalmente efetiva na proteção do feto contra aentrada de xenobióticos, existem alguns mecanismos de biotransformação, que podemprevenir a passagem placentária dessas substâncias.

Volume aparente de distribuição (VD)

O volume aparente de distribuição (V D) é uma forma de relacionar a quantidade deagente tóxico presente no organismo com a sua concentração plasmática, ou seja, éum parâmetro toxicocinético que indica a extensão de sua distribuição. É calculado,dividindo-se a dose administrada pela concentração plasmática e expresso em litros.

 V D = dose (mg) / concentração plasmática (mg/L)

Os compostos que se ligam fortemente com as proteínas ou que são muito lipofílicos,apresentam-se em concentrações muito baixas no plasma, fazendo com que sejamestimados volumes aparentes de distribuição muito grandes, 100 litros ou mais, o queindica que o xenobiótico distribui-se a vários compartimentos do organismo e encontra-se em baixa concentração no plasma. Ao contrário, para uma substância com V D relativamente pequeno, a maior fração permanece no plasma, provavelmente, comoresultado da fixação protéica.

 Assim, a toxicidade do xenobiótico depende de seu V D, mas, nem sempre o local quecontém a maior fração do toxicante é o mais lesado. Muitas vezes, esse sítio funcionacomo um simples depósito. Entretanto, a redução do V D pode determinar um aumentonas concentrações plasmáticas com risco de ocasionar intoxicação.

Redistribuição

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O término do efeito tóxico de uma substância costuma ocorrer por biotransformação ouexcreção, mas, também pode resultar da redistribuição da substância do seu sítio deação para outros tecidos. Entretanto, ela ainda estará armazenada nestes locais naforma ativa e sua saída definitiva dependerá de biotransformação e excreção. Sehouver saturação do local de armazenamento com a dose inicial, uma dose

subseqüente pode produzir efeito prolongado.Um exemplo clássico é o uso endovenoso do anestésico tiopental, um fármacoaltamente lipossolúvel. Como o fluxo sangüíneo cerebral é muito alto, o fármacoalcança sua concetração máxima no cérebro, cerca de um minuto após suaadministração. Após o término da injeção, a concentração plasmática do tiopental cai,à medida que ele se difunde para outros tecidos como os músculos. A concentração dofármaco no cérebro segue a do plasma, porque há pouca ligação com componentescerebrais. Desse modo, o início da anestesia é rápido e o término também, pois ambosestão diretamente relacionados com a concentração da substância no cérebro.

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Biotransformação 

Para reduzir a possibilidade de uma substância desencadear uma resposta tóxica, oorganismo apresenta mecanismos de defesa que buscam diminuir a quantidade damesma, que chega de forma ativa ao tecido alvo assim como, diminuir o tempo de

permanência desta em seu sítio de ação. Para isso, é necessário diminuir adifusibilidade do toxicante e aumentar a velocidade de sua excreção. A propriedade física que facilita a absorção de muitos xenobióticos através da pele,pulmões e trato gastrintestinal – denominada lipofilicidade - constitui um obstáculo àsua eliminação, porque as substâncias lipofílicas podem ser reabsorvidas e tendem a seacumular no organismo. Os compostos hidrofílicos, por sua vez, apresentam absorçãomais precária, porém, são facilmente excretados pelos rins. Conseqüentemente, aeliminação de um xenobiótico, freqüentemente, depende de sua conversão paracompostos hidrossolúveis através de um processo conhecido como biotransformação, oqual é catalisado por enzimas presentes no fígado e em outros tecidos.

 Assim, se uma substância lipofílica, que se difunde rapidamente, for transformada em

um composto mais polar, tem-se uma redução na velocidade de difusão e um aumentoda solubilidade em água, o que facilita sua excreção urinária. Por exemplo, adestoxificação do benzeno, que apresenta uma solubilidade de 1g em 1.500 mL deágua, consiste em sua oxidação a fenol, que é 100 vezes mais hidrossolúvel. A posterior sulfatação do fenol produz um composto que possui uma solubilidade emágua de 1g em 3 mL. Como resultado dessas duas reações, obtém-se uma substânciaque é 500 vezes mais hidrossolúvel do que o xenobiótico original (benzeno) e que,portanto, será muito mais facilmente excretada pela urina.

 A biotransformação pode ser, então, compreendida como um conjunto de alteraçõesquímicas (ou estruturais) que as substâncias sofrem no organismo, geralmente,ocasionadas por processos enzimáticos, com o objetivo de formar derivados maispolares e mais hidrossolúveis.Embora existam autores que consideram a biotransformação como um dos processosde eliminação, esse passo da toxicocinética será abordado, aqui, separadamente.

Mecanismos de biotransformação

 A biotransformação pode ocorrer através de dois mecanismos:

a)  mecanismo de ativação ou bioativação - que produz metabólitos comatividade igual ou maior do que o precursor. Ex.: a piridina é biotransformadano íon N-metil piridínico que tem toxicidade cinco vezes maior que o precursor.O mesmo ocorre com o inseticida paration que é biotransformado em

paraoxon, composto responsável pela ação tóxica do praguicida;

b) mecanismo de desativação - quando o produto resultante é menos tóxico queo precursor.

É comum encontrar-se na literatura científica, os termos metabolização e destoxificaçãocomo sinônimos de biotransformação. Hoje, no entanto, utiliza-se o termo metabolismopara descrever o comportamento geral das substâncias (endógenas e exógenas) noorganismo, o que inclui absorção, distribuição, biotransformação e eliminação. Essetermo é comumente usado para se referir à biotransformação o que é compreensível,visto que os produtos da biotransformação de xenobióticos são conhecidos metabólitos.

Entretanto, a destoxificação não é sinônimo de biotransformação. Isto porque,destoxificação significa diminuição de toxicidade e nem todas as reações de

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biotransformação, como citado acima, produzirão metabólitos menos tóxicos ou ativosque o seu precursor.

Sítios de biotransformação

 A biotransformação pode ocorrer em qualquer órgão ou tecido orgânico como, porexemplo, no intestino, rins, pulmões, pele, testículos, placenta, etc. No entanto, agrande maioria das substâncias, sejam elas endógenas ou exógenas sãobiotransformadas no fígado.O fígado é o maior órgão do corpo humano com diversas e vitais funções, destacando-se entre elas, as transformações de xenobióticos e nutrientes. Por ser o sítio primáriopara a biotransformação, o fígado é potencialmente vulnerável à ação tóxica de umxenobiótico que sofre bioativação. A biotransformação é efetuada, geralmente porenzimas, principalmente, aquelas existentes nos chamados microssomas hepáticos(pequenas vesículas presentes no retículo endoplasmático) e na fração solúvel do

citoplasma (citosol). As mitocôndrias, núcleos e lisossomas possuem menor capacidadede biotransformação. Assim, as reações de biotransformação são referidas,freqüentemente, como microssômicas ou citosólicas, de acordo com as localizaçõessubcelulares das enzimas envolvidas.

Fases da biotransformação

 As reações de biotransformação são categorizadas, não somente pela natureza dareação envolvida (oxidação, redução, etc.), mas, também pela seqüência normal comque elas ocorrem. Essas reações catalizadas pelas enzimas biotransformadoras dexenobióticos são classificadas em reações de fase I (ou pré-sintéticas) e reações de faseII (sintéticas ou de conjugação).

 A fase I compreende um conjunto de reações de oxidação, redução e hidrólise quepreparam os toxicantes para as reações da fase II. Essas reações,  geralmente,modificam a estrutura química da substância mediante adição de um grupofuncional (-OH,-NH2, -SH, ou -COOH), o que resulta em um pequeno aumento de hidrofilicidade. Asreações de biotransformação de fase II, também chamadas de reações de conjugação,incluem glicuronidação, sulfonação (mais conhecida como sulfatação), acetilação,metilação, conjugação com glutationa e conjugação com aminoácidos. Os substratosendógenos dessas reações interagem com grupos funcionais presentes na molécula doxenobiótico ou que foram introduzidos ou expostos durante a fase I. Na maioria das

reações de conjugação formam-se compostos altamente polarizados e hidrossolúveisque são prontamente excretados pelos rins.

 As substâncias que possuem grupos funcionais hidrofílicos sofrem conjugação direta,com formação de produtos facilmente excretáveis. Entretanto, para os compostoslipossolúveis, pouco polares, tem-se sempre as reações pré-sintéticas como condiçãopara posterior conjugação. Portanto, a velocidade de excreção do agente tóxico estárelacionada com sua estrutura química.Um bom exemplo é o fenol que é excretado após conjugação direta, enquanto abiotransformação do benzeno requer ambas as reações, ou seja, ele é inicialmentebiotransformado em fenol pela introdução de um grupo hidroxila (-OH) durante a fase I(oxidação) e, o fenol formado, é então conjugado por uma reação de fase II

(sulfatação) em fenil sulfato.

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Reações de fase I

• Oxidação A oxidação é uma reação química na qual o substrato perde elétrons. A reação poradição de oxigênio foi a primeira a ser descoberta e, por essa razão, recebeu essa

denominação. Como exemplo de reações por adição de oxigênio destacam-se ahidroxilação, epoxidação e sulfoxidação. Entretanto, muitas reações de oxidação nãoenvolvem oxigênio. A mais simples delas é a desidrogenação que consiste na remoçãode hidrogênio da molécula. A maioria dessas reações são evidenciadas pelo nome dareação ou enzima envolvida. Por exemplo: desidrogenação alcoólica, hidroxilaçãoaromática, desaminação, desalquilação, dessulfuração, entre outras.O principal sistema enzimático responsável pela oxidação de xenobióticos é oCitocromo P450

1. Esta enzima é uma hemoproteína, com o átomo de ferro em seunúcleo, chamado de P450 porque, em sua forma reduzida está ligado ao monóxido decarbono, e tem um pico de absorbância no comprimento de onda de 450nm. O CitP450 parece estar localizado nas camadas profundas na membrana do retículo

endotelial liso, mais especificamente, nos microssomos hepáticos. Esta enzima é aoxidase terminal do sistema de oxidases mistas que recebe os elétrons provenientes deoutras fases da reação, se reduz e se liga ao oxigênio e ao toxicante, promovendo defato a oxidação do composto. Outras enzimas estão presentes nos microssomoshepáticos e, embora menos conhecidas e importantes que o Cit P450 podem tambémbiotransformar xenobióticos. É o caso, por exemplo, do citocromo b5, que estálocalizado fora das membranas do retículo endoplasmático.

• ReduçãoEssa é uma reação química através da qual o substrato ganha elétrons. São catalisadaspor redutases microssômicas e citosólicas e pelas bactérias intestinais. As reações deredução podem ocorrer através da formação de duplas ligações nitrogênio-nitrogênio(azo-redução) em grupos nitro (NO2). Nesses casos, os compostos amino formados sãooxidados e formam metabólitos tóxicos. Assim, as reações de redução, freqüentementeresultam na ativação do xenobiótico em vez de destoxificação. A natureza dessasreações também é evidenciada pela sua denominação, como por exemplo, azo-redução, desalogenação redutora, redução de carbonila entre outras.

 A redução pode ser efetuada enzimaticamente, envolvendo enzimas microssômicas ounão. A enzima Cit P450 redutase, NADPH dependente, localizada fora da membrana doREL, é responsável pela redução de uma série de produtos.

• Hidrólise

É uma reação na qual a adição de uma molécula de água separa o toxicante em doisfragmentos ou moléculas menores. O grupo hidroxila (-OH) é incorporado em umfragmento e o hidrogênio no outro.Certos xenobióticos são lisados antes de sofrerem outras reações de biotransformação.

 A mais comum destas reações é a hidrólise de ésteres, embora amidas, nitrilas ehidrazidas, também possam ser hidrolizadas. A hidrólise de ésteres (R-COOR) é feitapelas enzimas denominadas esterases, que podem ser de origem microssômica ou não.

1 O citocromo P450 é um sistema de enzimas microsomiais da família das hemoproteínas, compostas deuma parte protéica (apoproteína) e um grupo hemoprostético. Localizam-se nas membranas do retículoendoplasmático dos hepatócitos, onde catalisam reações de oxidação de numerosas substâncias, graças àsua capacidade de transferência de elétrons. É também encontrado nas glândulas, nos testículos, noaparelho digestivo, e nas supra-renais, tanto nas mitocôndrias destas células, como no retículoendoplasmático liso encarregado da síntese de esteróides. O citocromo P450 2D6 ou CYP2D6 é uma dasenzimas hepáticas mais importantes desse sistema complexo.

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Geralmente essas esterases não possuem uma boa especificidade, ou seja, umaesterase pode, além de hidrolisar ésteres, provocar a quebra de acetanilidas, amidas eoutros derivados da anilina.

Reações de fase II

Um fator importante na toxicidade de um xenobiótico é a sua capacidade de serexcretado, e parece que os rins dos vertebrados é constituído de maneira e excretareletrólitos mais facilmente que não eletrólitos. Assim, quanto mais ionizado estiver umácido  orgânico no pH do meio, mais rapidamente ele será excretado pelos rins. A ionização, por sua vez, depende do chamado momento dipolo (ou grau de polaridade),ou seja, da distância entre o centro geométrico de todas as cargas positivas e de todasas cargas negativas. É claro que moléculas com momento dipolo baixo (carga positivaperto da carga negativa) terão uma simetria maior e, portanto, uma ionização maisdifícil. Já moléculas com grandes dipolos (ou seja, moléculas onde as cargas positivas e

negativas estão distantes) terão uma menor simetria e, conseqüentemente, maiorionização.Nas reações de conjugação, os xenobióticos, provenientes ou não da fase pré-sintética,ligam-se a substratos endógenos do organismo formando metabólitos com tamanhomolecular elevado e, conseqüentemente, mais excretáveis e menos tóxicos. Ou seja, naconjugação observa-se: aumento do tamanho → maior polaridade → maior ionização→ maior excreção → menor toxicidade.

Os principais compostos endógenos envolvidos nas reações de conjugação são:

•   Aminoácidos2 e seus derivados, tais como a glicina e cisteína•  Carboidratos e seus derivados, especialmente o ácido glicurônico•  Conjugação com compostos simples como, por exemplo, sulfato e acetato

O composto endógeno envolvido na conjugação está, geralmente, na sua forma“ativa”, ou seja, ligado a uma coenzima da qual é transferido para o xenobiótico. Asenzimas envolvidas incluem a coenzima A, onde está ligado o acetato ou outros ácidosgraxos de cadeia curta, a adenosina ou fosfoadenosina fosfato (PAP) onde está ligado osulfato, metionina e etionina e a Uridina difosfato (UDP) onde se liga o ácidoglicurônico e a glicose. As conjugações mais freqüentes são aquelas feitas com ácidoglicurônico e com o sulfato.

Conjugação com ácido glicurônico - o ácido glicurônico é um derivado 6-carboxil daglicose, formado durante o metabolismo desse açúcar. Sua forma forma ativa, o ácidouridino difosfato glicurônico (UDPGA) é formado enzimaticamente na fração solúvel dofígado. Esta forma ativa doa o ácido glicurônico para se conjugar com o xenobiótico eesta reação é catalisada pela transglicuronilase ou glicuroniltransferase, presente nafração microssômica hepática. Os conjugados glicurônicos ou glicuronídios são muitopolares e, portanto, facilmente excretados do organismo. Em relação às substânciasendógenas, são poucas aquelas capazes de sofrerem conjugação glicurônica. Exemplo:

2 Os aminoácidos são ácidos orgânicos que encerram um ou mais grupamentos amina (-NH2) em suamolécula. Eles constituem as estruturas fundamentais das proteínas e dos ácidos nucléicos, formam partede enzimas e anticorpos e transportam oxigênio. Vinte tipos de aminoácidos existem no corpo humano, dosquais dez são essenciais (sublinhados): ácido aspártico, ácido glutâmico, alanina, arginina, asparagina,cisteína, fenilalanina, glicina, glutamina, histidina, isoleucina, leucina, lisina, metionina, prolina, serina,tirosina, treonina, triptofano e valina.

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tiroxina e bilirrubina. É como se o organismo tivesse “guardado” este tipo deconjugação para a biotransformação de xenobióticos.

Conjugação com sulfato - este tipo de conjugação é quase tão comum quanto aanterior. Os produtos da conjugação com sulfatos são sais de sulfatos ácidos (SO3) ou

de sulfamatos (NHSO3), que, em pH fisiológico são totalmente ionizados e rapidamenteexcretados pelos rins. Os íons sulfatos presentes no organismo também terão que serativados para se conjugarem com os xenobióticos. Esta ativação envolve o uso de ATP eé feita pelas enzimas ATP-sulfato-adenil-transferase e ATP-adenil-sulfato-3-fosfotransferase. Forma-se, então, o PAPS (3-fosfoadenosina-5-fosfossulfato), que é aforma ativa do sulfato, presente na fração microssômica hepática e que sob ação dasulfoquinase cede o sulfato ao xenobiótico, formando o conjugado.

Conjugação com aminoácidos – a reação consiste na formação de uma ligaçãopeptídica entre o grupo amino de um aminoácido, geralmente, a glicina, e o grupocarbonila do xenobiótico. Para que essa reação ocorra, é indispensável que o toxicante

possua um grupo carboxila. Os compostos formados são excretado na urina porque osistema de transporte do rim reconhece o aminoácido.

Conjugação com glutationa – nessa reação, a glutationa (GSH), através de seu gruposulfidrila (nucleofílico), une-se a um carbono eletrofílico do toxicante. A reação écatalisada pela enzima glutationa-S-transferase que tem como cofator o própioglutation. A glutationa é um tripeptídio (ácido glutâmico-glicina-cisteína). O conjugadoformado se rompe nos rins produzindo o Cis-derivado, que se acetila para produzir umconjugado do ácido mercaptúrico que é excretado pela urina. Essa reação é importantena destoxificação de epóxidos e peróxidos. A glutationa-S-transferase encontra-se emcélulas de muitos tecidos do organismo. Se essa reação diminui significativamente osníveis celulares de glutationa, o organismo pode sofrer danos consideráveis devido àperoxidação lipídica ou por outros tipos de agressão química.

Metilação – tem papel de menor importância na biotransformação de xenobióticos,exceto na destoxificação do arsênico. Os compostos inorgânicos do arsênicotransformam-se em metabólitos mono e dimetilados, que são menos tóxicos. A reaçãoconsiste na transferência de um grupo metila (-CH3) a um grupo funcional hidroxila,amina ou sulfidrila, catalisada pelas metiltransferases e o composto doador de gruposmetila é a SAM (S-adenosil-metionina). A metilação é uma reação importante natransformação de compostos endógenos e participa da biossíntese de váriosaminoácidos e esteróides, assim com na metilação do DNA. Enquanto as reações defase I ativam grupos funcionais, a metilação os mascara, impedindo que participem das

reações de fase II e, portanto, se o xenobiótico é metilado, sua taxa de eliminaçãodiminui.

Fatores que modificam a biotransformação

 A eficiência dos processos de biotransformação depende de vários fatores que incluemdose e freqüência de exposição, espécie, idade, gênero, variabilidade genética, estadonutricional, estado patológico e a exposição a outros agentes que podem inibir ouinduzir as enzimas biotransformadoras de xenobióticos.

Dose e freqüência da exposição - a dose geralmente altera a via de biotransformação.Certas enzimas possuem elevada afinidade, mas baixa capacidade para biotransformar

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substâncias exógenas. Por isso, serão rapidamente saturadas quando doses elevadasdo agente tóxico são administradas e outras vias secundárias passam a ter um papelmais importante. Exemplo: cerca de 90% do acetaminofeno (paracetamol), em dosesbaixas (15 mg/Kg), é biotransformado através da conjugação com sulfato. Em doseselevadas (300 mg/kg), apenas 43% será excretado como tal, passando a ser

significativa as excreções como glicuronídio e ácido mercaptúrico (conjugação comglutationa). Em relação à freqüência, esta pode levar a uma sensibilização ou induçãode receptores enzimáticos, aumentando a biotransformação.

Espécie – as diferenças interespecíficas na capacidade de biotransformação desubstâncias químicas são bem conhecidas e constituem, normalmente, a base datoxicidade seletiva, utilizada para o desenvolvimento dos testes de segurança demedicamentos realizados em animais.

Variabilidade genética – a capacidade biotransformadora varia amplamente de umindivíduo para outro em função de diferenças genéticas. Por exemplo, a reação de

acetilação da isoniazida em humanos é particularmente influenciada por fatoresgenéticos. Algumas pessoas conseguem acetilar essa substância rapidamente, enquantooutras, o fazem lentamente.

Gênero - para algumas substâncias, existem diferenças entre as respostas tóxicas emanimais machos e fêmeas. Estudos realizados em ratos demonstraram que as fêmeassão mais suscetíveis a uma dose de hexobarbital do que os machos (elas dormem porum tempo maior). Esse fato é explicado pela menor capacidade do fígado das fêmeasde biotransformar xenobióticos, tornando-as mais suscetíveis à ação da maioria dosagentes tóxicos. A menor atividade hepática em fêmeas, no entanto, diminuirá a açãode substâncias que são biotransformadas pelo mecanismo de bioativação (ex.: otetracloreto de carbono e halotano). Acredita-se que as diferenças entre os gênerossejam causadas pelos hormônios sexuais, tendo em vista que, ao se administrartestosterona às fêmeas, ocorre aumento na capacidade de biotransformação e com acastração de machos há uma diminuição dessa capacidade. A influência do sexo sobrea biotransformação também pode ser observada em processos que ocorrem em outrosórgãos como, por exemplo, nos rins. Ex.: animais machos são mais suscetíveis à açãotóxica do clorofórmio, provavelmente, por biotransformar mais rapidamente estesolvente, originando o fosgênio, metabólito intermediário ativo. Embora essasdiferenças sejam mais pronunciadas em ratos, outras espécies, entre elas o homem,também apresentam estas modificações (ex.: nicotina, ácido acetilsalicílico, heparina,etc.).

Idade - com relação à idade, tanto os animais jovens, quanto os velhos, apresentammenor capacidade de biotransformar xenobióticos e, conseqüentemente, são maissuscetíveis aos seus efeitos tóxicos. Geralmente, o Cit P450 dos recém-nascidos temapenas 20% a 50% da atividade observada em adultos. Em relação aos idosos, não sóa atividade diminuída do Cit P450, mas também outros fatores, tais como menor fluxosangüíneo e menor eficiência no sistema da excreção renal e biliar, contribuem para amenor biotransformação dos xenobióticos.

Dieta e estado nutricional - o estado nutricional é bastante importante para abiotransformação pois pode alterar a atividade do Cit P450 (oxidase ou redutase). Asdeficiências em vitaminas, especialmente, a C, E e do complexo B, reduzem a

velocidade de biotransformação. Elas estão direta ou indiretamente envolvidas naregulação do Cit P450. Além disso, suas deficiências podem alterar a energia e o estado

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redox das células, diminuindo a produção de cofatores necessários para a fase deconjugação. Dietas pobres em proteínas diminuem a síntese enzimática e,conseqüentemente, a biotransformação e, dessa forma, podem aumentar a toxicidadede substâncias ativas, mas, podem também reduzir o potencial tóxico daqueles agentesque necessitam de biotransformação prévia para se tornarem ativos.

Estado patológico –  muitas patologias podem alterar a capacidade individual debiotransformação de xenobióticos, em particular, as doenças hepáticas como cirrose,icterícia obstrutiva, carcinomas e hepatite, devido a uma redução drástica dasatividades enzimáticas do fígado. Distúrbios cardiovasculares, que acarretamdiminuição do fluxo sangüíneo, modificam igualmente a biotransformação e adepuração dos agentes tóxicos.

Inibição e indução enzimática - o sistema enzimático Cit P450 é influenciado por umasérie de substâncias, que podem induzir ou inibir a sua atividade, alterando abiotransformação de determinados compostos. Por exemplo, a fenilbutazona

(antiinflamatório e antireumático) e o cloranfenicol podem inibir a biotransformaçãoenzimática da tolbutamida, medicamento hipoglicemiante. Com isto, uma doseterapêutica desse medicamento poderá causar graves crises de hipoglicemia, devido àdiminuição excessiva de glicose no sangue. A inibição enzimática envolve mecanismosdiversos, desde a inibição da síntese protéica até a competição entre os substratos peloscentros ativos comuns das enzimas. Ao contrário, o fenobarbital e o álcool sãoexemplos de indutores enzimáticos, que aumentam a concentração do Cit P450 e,conseqüentemente, a biotransformação de várias substâncias e a sua própria, o quepode resultar em tolerância farmacocinética.

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Excreção

Os xenobióticos que penetram no organismo são, posteriormente, excretados atravésda urina, bile, fezes, ar expirado, leite, suor e outras secreções, sob forma inalterada oumodificada quimicamente. Este processo é, muitas vezes, denominado "Eliminação",

embora pelo conceito atual a eliminação envolve o processo de biotransformação. A excreção pode ser vista como um processo inverso ao da absorção, uma vez que osfatores que interferem na entrada do xenobiótico no organismo, podem dificultar a suasaída. Basicamente existem três classes de excreção:

•  eliminação através das secreções, tais como a biliar, sudorípara, lacrimal,gástrica, salivar, láctea;

•  eliminação através das excreções, tais como urina, fezes e catarro;•  eliminação pelo ar expirado.

O processo mais importante para a Toxicologia é a excreção urinária.

Excreção urinária A capacidade de um órgão realizar uma determinada função está intimamenterelacionada com a sua anatomia, e os rins possuem um elevado desenvolvimentoanatômico, voltado para a excreção de substâncias químicas.

Os glomérulos renais filtram cerca de 20% do fluxo cardíaco (os rins recebem 25%deste fluxo) e apresentam poros bastantes largos (cerca de 40 Å enquanto o de outrostecidos medem cerca de 4 Å). Assim, os glomérulos filtram substâncias lipossolúveis ouhidrossolúveis, ácidas ou básicas, desde que tenham peso molecular menor do que60.000 daltons3.

 A filtração glomerular é um dos principais processos de eliminação renal e estáintimamente ligado a um outro processo que é a reabsorção tubular. As substâncias,após serem filtradas pelos glomérulos, podem permanecer no lúmem do túbulo eserem eliminadas, ou então, podem sofrer reabsorção passiva através da membranatubular. Isto dependerá de alguns fatores, tais como o coeficiente de partiçãoóleo/água; o pKa4 da substância e o pH do meio. De modo geral, as substâncias decaráter alcalino são eliminadas na urina ácida e as substâncias ácidas na urinaalcalina. Isto porque nestas condições, as substâncias se ionizarão, tornando-sehidrossolúveis e a urina é, em sua maior parte, formada de água.

Outro processo de excreção renal é a difusão tubular passiva. Substâncias lipossolúveis,ácidas ou básicas, que estejam presentes nos capilares que circundam os túbulosrenais, podem atravessar a membrana por difusão passiva e caírem no lúmem tubular.Dependendo do seu pKa e do pH do meio, elas podem, ou não, se ionizarem e,conseqüentemente, serem excretadas ou reabsorvidas.

3 O dalton é uma unidade de massa que corresponde a 1/12 da massa do isótopo 12 do carbono (12C),utilizado para medir a massa atômica e molecular e representado pela letra grega µ: 1 dalton ou 1µ =1.66 × 10−24 gramas.4 Ele corresponde ao pH onde um determinado fármaco encontra-se 50% em sua forma ionizada e 50%em sua forma não ionizada. A maioria das drogas tem seu pK a entre 2,5 e 11. Para drogas ácidas, quantomenor o pK a e maior o pH, mais moléculas estão ionizadas e mais facilmente elas serão eliminadas; paradrogas básicas quanto maior o pK a e menor o pH, mais moléculas estão ionizadas. Para drogas básicas, aacidificação da urina representa um risco de alcalose metabólica difícil de controlar, tornando este métodopouco utilizado.

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O terceiro processo de excreção renal é a secreção tubular ativa. Existem dois processosde secreção tubular renal, um para substâncias ácidas e outro para as básicas. Estessistemas estão localizados, provavelmente, no túbulo proximal. A secreção tubular temas características do transporte ativo, ou seja, exige um carregador químico, gastaenergia, é um mecanismo competitivo e pode ocorrer contra um gradiente de

concentração. Algumas substâncias endógenas, tais como o ácido úrico, são excretadaspor este mecanismo e a presença de xenobióticos excretados ativamente, pode interferircom a eliminação de substratos endógenos. A Penicilina é um exemplo de xenobióticosecretado ativamente pelos túbulos. O uso de Probenecid (fármaco excretado pelomesmo sistema) evita que este antibiótico seja secretado muito rapidamente doorganismo. Geralmente, o que ocorre no organismo é uma combinação dos trêsprocessos de excreção renal, para permitir uma maior eficácia na eliminação dosxenobióticos.

Excreção pelas fezes e catarro

Não são processos muito importantes para a Toxicologia. Os toxicantes encontradosnas fezes correspondem à fração ingerida e não absorvida ou então ao agente tóxicoque sofreu secreção salivar, biliar ou gástrica. As partículas que penetram pelo tratopulmonar podem ser eliminadas pela expectoração no trato gastrintestinal e, se nãoforem reabsorvidas, serão, também, excretadas pelas fezes.

Excreção pela bileDentre as secreções orgânicas, a mais significativa para a excreção de xenobióticos é abiliar. O fígado tem uma posição vantajosa na remoção de substâncias exógenas dosangue, principalmente, daquelas absorvidas pelo trato gastrintestinal. Isto porque, osangue proveniente do trato gastrintestinal, através da circulação porta, passainicialmente pelo fígado, e somente depois entra na circulação sistêmica. No fígadoparte do xenobiótico pode ser biotransformado e os metabólitos ou mesmo o produtoinalterado podem ser secretados pela bile no intestino.

Existem três sistemas de transporte ativo para a secreção de substâncias orgânicas nabile: para substâncias ácidas, básicas e neutras. É quase certa a existência de um outrosistema para os metais. Uma vez secretado no intestino, os xenobióticos podem sofrerreabsorção ou excreção pelas fezes. Não se conhece o mecanismo que determina se aexcreção será urinária ou biliar.

Esquematicamente tem-se:

É o chamado ciclo entero-hepático, e a morfina é um exemplo típico de xenobiótico queapresenta esse ciclo. Ela é conjugada com ácido glicurônico no fígado e o glicuronídiode morfina é secretado pela bile no intestino. Neste local, pela ação da enzima ±β-glicuronidase, a morfina é liberada e reabsorvida. O glicoronídio que não for lisadoserá excretado pelas fezes. É importante observa que os agentes tóxicos que

apresentam recirculação entero-hepática, podem ter sua ação prolongada.

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Excreção pelo ar expiradoGases e vapores inalados ou produzidos no organismo são parcialmente eliminadospelo ar expirado. O processo envolvido é a difusão pelas membranas que, parasubstâncias que não se ligam quimicamente ao sangue, dependerá da solubilidade nosangue e da pressão de vapor. Estes xenobióticos são eliminados em velocidadeinversamente proporcional à retenção no sangue, assim, gases e vapores comcoeficiente de distribuição K 5 elevado (pouco solúveis no sangue) são rapidamenteeliminados, enquanto os de K baixo (muito solúvel no sangue) são lentamenteexcretados pelo ar expirado. A freqüência cardíaca e respiratória afetam a excreçãodestes agentes: a primeira nos de K alto e a segunda nos de K baixo. Em relação àpressão de vapor, os líquidos mais voláteis serão, quase exclusivamente, excretadospelo ar expirado.

Excreção por outras vias A eliminação através da secreção sudorípara já é conhecida há alguns anos. Desde1911 sabe-se que substâncias tais como iodo, bromo, ácido benzóico, ácido salicílico,chumbo, arsênio, álcool, etc., são excretadas pelo suor. O processo parece ser o dedifusão passiva e pode ocorrer dermatites em indivíduos suscetíveis, especialmentequando se promove a sudorese para aumentar a excreção pela pele.

 A secreção salivar é significativa para alguns xenobióticos. Os lipossolúveis podematingir a saliva por difusão passiva e os não lipossolúveis podem ser eliminados nasaliva, em velocidade proporcional ao seu peso molecular, através de filtração.

5 O coeficiente de distribuição (K) é expresso pela relação entre a concentração do agente tóxico no aralveolar/sua concentração no sangue, no momento em que se instala o equilíbrio. Alguns autores utilizama correlação: concentração do agente tóxico no sangue/concentração do agente tóxico no ar alveolar,para avaliar a solubilidade da substância.

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Geralmente as substâncias secretadas com a saliva sofrem reabsorção no tratogastrintestinal.

Existe interesse em relação à secreção de xenobióticos no leite, pois este acaba sendoingerido por recém-nascidos. Geralmente as substâncias apolares sofrem difusão

passiva do sangue para o leite e como esta secreção é mais ácida (pH = 6,5) do que osangue, os compostos básicos tendem a se concentrarem nesse líquido. Já oscompostos ácidos apresentam concentração láctea menor que a sangüínea. Váriassubstâncias são, sabidamente, eliminadas pelo leite: DDT, PCB (bifenil policlorados),chumbo, mercúrio, arsênio, morfina, álcool, entre outros.

Fatores que interferem na velocidade e via de excreção

•   Via de introdução: a via de introdução interfere na velocidade de absorção, debiotransformação e, também, na excreção;

•   Afinidade por elementos do sangue e outros tecidos: geralmente o agente tóxico

na sua forma livre está disponível à eliminação;•  Facilidade de ser biotransformada: com o aumento da polaridade a secreçãourinária está facilitada;

•  Freqüência respiratória: em se tratando de excreção pulmonar, uma vez que,aumentando-se a freqüência respiratória, as trocas gasosas ocorrerão maisrapidamente.

•  Função renal: sendo a via renal a principal via de excreção dos xenobióticos,qualquer disfunção destes órgãos interferirá na velocidade e proporção deexcreção.

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Fase III – Toxicodinâmica

Uma vez que o agente tóxico alcança o seu alvo em concentração adequada, eledesencadeará alterações bioquímicas e fisiológicas que serão responsáveis pelo seuefeito deletério.

 Algumas substâncias precisam, antes, passar pela bioativação para entãodesencadearem os efeitos tóxicos. A bioativação envolve a biotransformação damolécula original levando à formação de um metabólito tóxico. Assim sendo, osdesencadeadores do efeito tóxico podem ser:

•   Agente tóxico original: ex. chumbo, tetrodotoxina, cianeto;•  Metabólito do agente tóxico: ex. fluorocitrato (metabólito do fluoroacetato),

ácido oxálico (metabólito do etilenoglicol);•  Espécies reativas de oxigênio ou de nitrogênio: formação do radical hidroxila

desencadeada pelo herbicida paraquate;

•  Compostos endógenos: ex. bilirrubina deslocada da albumina pelasulfonamida.

Quanto ao modo de ação, os agentes tóxicos podem ser:

•  Inespecíficos: ex. ácidos ou bases que atuam indistintamente sobre qualquertecido, causando irritação e corrosão nos tecidos de contato;

•  Específicos: são mais seletivos e causam injúrias em determinado(s) tecido(s),sem lesar outros. A suscetibilidade de determinado(s) tecido(s) deve-se àpresença de moléculas nas quais o agente tóxico se liga. Essas moléculas-alvoexercem importantes funções no organismo e podem ser enzimas, moléculas

transportadoras, canais iônicos, proteínas reguladoras, ácidos nucléicos, etc.Logicamente, quanto menor for a distribuição da molécula-alvo pelo organismo, maisseletiva será a ação do agente tóxico.

Entretanto, não é só a presença da molécula-alvo entre os diferentes tecidos queconfere seletividade de ação aos agentes tóxicos. Às vezes, um agente pode serpotencialmente tóxico para vários tecidos, mas como ele se distribui em maiorconcentração para determinados tecidos, esses se tornam os alvos. Essa distribuiçãoseletiva pode ser devido a:

•  porosidade do endotélio capilar: células endoteliais dos sinusóides hepáticos ecapilares peritubulares renais têm fenestras maiores que as de outras células.Isto favorece acúmulo de agentes tóxicos nos rins e fígado, fazendo destesórgãos alvos freqüentes;

•  transporte de membrana especializado: por exemplo, no pneumócito existe umcarreador de membrana que captura o herbicida paraquate e, assim, aconcentração deste herbicida no pneumócito pode ser até 50 vezes maior doque nas outras células. Isto faz do pneumócito o principal alvo da intoxicaçãocom paraquate;

•  ligação a compostos intracelulares: como exemplo, podemos citar a ligação daneurotoxina MPTP (1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetrahidropiridina) ao pigmentomelanina presente em grande quantidade na substância negra encefálica.

Devido à essa afinidade, a MPTP acumula-se nesta estrutura e, quandometabolizada pela enzima monoaminooxidase-B, presente nos astrócitos, gera

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o metabólito MPP+ (1-metil-4-fenilpiridina) que lesará seletivamente osneurônios dopaminérgicos da substância negra.

Relação dose-resposta ou concentração-resposta

Um conceito fundamental na Toxicologia é o da relação dose-resposta proposta porParacelsus: “ Somente a dose correta diferencia o veneno do remédio." Ela correlaciona aexposição e a intensidade dos efeitos tóxicos produzidos. As curvas dose-resposta sãoconstruídas a partir de observações feitas em estudos experimentais com animais oucélulas isoladas, bem como observação clínica ou epidemiológica de humanos.

 Acredita-se que, quanto maior a dose, maior e mais intensos (quanti e/ouqualitativamente) serão os efeitos e que deve existir uma condição de exposição queseja segura para a saúde humana, com exceção das substâncias mutagênicas.

Dependendo da variável que estiver sendo avaliada, existem dois tipos de relações

possíveis:•  Quantitativa: para variáveis que podem ser mensuradas em intensidade. Neste

caso, quanto maior a dose do agente, mais intenso o efeito. Algunstoxicologistas chamam a relação quantitativa de relação dose-efeito. Ex:hipertrofia hepática;

•  Quantal: para variáveis do tipo tudo ou nada, como por exemplo, morte,convulsão. Nesse caso, quanto maior a dose, maior o número de indivíduos queapresentam tal efeito. Sempre será expressa em porcentagem de indivíduos querespondem a determinado efeito e só pode ser avaliada quando umapopulação de indivíduos é estudada, ao contrário da quantitativa, que pode seravaliada em um indivíduo.

Existem dois tipos de curvas dose-resposta:

1. Para efeitos que apresentam limiar de segurança (“threshold”): a curva geralmentetem a forma de uma curva sigmóide e baixas doses não são tóxicas, já que oorganismo tem capacidade para biotransformar o agente tóxico, bem como reparareventuais injúrias que tenham sido causadas. O ponto no qual a toxicidade começa ase manifestar é conhecido como limite de segurança (“threshold”).

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2. Para efeitos que não apresentam limiar de segurança (“threshold”): a curva é linear,pois se assume que qualquer dose produzirá um efeito deletério. Esse tipo de curva éusada para agentes mutagênicos.

Mecanismos de toxicidade

Os mecanismos pelos quais os diferentes agentes tóxicos específicos produzem seusefeitos deletérios podem ser agrupados em:

1.   Alteração da expressão gênica;2.   Alteração química de proteínas específicas;3.   Alteração do funcionamento de células excitáveis;

4.  Prejuízo da síntese de ATP;5.   Aumento de cálcio intracelular;6.  Indução de estresse oxidativo.

Alteração da expressão gênica

O DNA 6 é composto por genes que codificam a síntese de proteínas estruturais eregulatórias. No processo de transcrição, uma das fitas do DNA é lida, gerando o RNA 

mensageiro. Uma vez formado, o RNA 7

mensageiro levará à síntese de proteínas,processo chamado de transdução.

6 DNA é a abreviatura de ácido desoxirribonucléico, molécula orgânica que contém a "informação" queinstrui o desenvolvimento e funcionamento de todos os organismos vivos. Ele se estrutura, geralmente, emuma dupla hélice, e forma os cromossomos. Os segmentos de DNA que carregam a informação genéticasão denominados genes. O restante da seqüência tem importância estrutural ou está envolvido naregulação do uso da informação genética.7 RNA é a sigla que designa o ácido ribonucléico, composto por um polímero de nucleótidos, geralmenteem cadeia simples, formado por moléculas de dimensões muito inferiores às do DNA. O RNA forma-se nonúcleo por transcrição (cópia complementar) das seqüências definidas no DNA e migra para o citoplasma.Ele pode ser de quatro tipos:•  ARN Mensageiro (ARNm): transporta as informações do código genético do ADN para o citoplasma, ou

seja, determina as seqüências dos aminoácidos na construção das proteínas.•  ARN transportador (ARNt): encaminha os aminoácidos dispersos no citoplasma ao local onde ocorrerá

a síntese das proteínas.

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 Muitos são os mecanismos pelos quais um agente tóxico pode influenciar a expressãogênica. Lembrem-se de que expressão gênica inadequada pode levar a alteração donúmero ou da estrutura da proteína que está sendo sintetizada. Alteração na expressãogênica pode levar a efeitos tóxicos como carcinogênese, teratogênese, etc.

 Abaixo estão dois exemplos de agentes tóxicos que desencadeiam seus efeitos poralterar a expressão gênica:

Herbicida amitrole: hormônios da hipófise anterior exercem efeitos mitogênicossobre glândulas periféricas agindo em receptores na membrana plasmática. A produção dos hormônios pela hipófise é controlada por retroalimentaçãonegativa dos hormônios produzidos pelas glândulas periféricas. O herbicidaamitrole, ao inibir a produção de hormônios tireoideanos estimula a secreçãodo hormônio tireo-estimulante (TSH) pela hipófise. Isso estimulará a divisãocelular na tireóide levando à neoplasia tireoideana.

 Arsenito: este composto promove uma ativação sustentada do fator decrescimento epidérmico, aumentando a transcrição do DNA e,conseqüentemente, promovendo mitose. Sugere-se que esse seja o mecanismoenvolvido na formação de neoplasias de pele pelo arsenito.

Alteração química de proteínas específicas Alguns agentes tóxicos são capazes de se complexar com proteínas específicas,ativando ou inibindo-as. Metais, complexam-se com o grupamento sulfidrila deproteínas e inibem a função das mesmas. Os praguicidas organofosforados inibem afunção da enzima acetilcolinesterase, responsável pela degradação doneurotransmissor acetilcolina, porque se ligam e fosforilam tal enzima.

Alteração do funcionamento de células excitáveisO funcionamento das células excitáveis (neurônios, músculo cardíaco, músculo liso emúsculo esquelético) é regulado por moléculas sinalizadoras (neurotransmissores) queagem em receptores de membrana. A ligação dos neurotransmissores aos receptoreslevará à manifestação do efeito biológico por aumento dos níveis de cálcio intracelular,fosforilação protéica ou alterações do potencial de membrana (potencial de repouso).

Os agentes tóxicos podem alterar o funcionamento de células excitáveis agindo emdiferentes estágios da neurotransmissão. A seguir estão relacionados os principaisestágios que podem ser alterados e exemplos de agentes tóxicos que atuam nos

mesmos.

Alteração da disponibilidade do neurotransmissorPara alterar a disponibilidade do neurotransmissor, um agente tóxico pode alterar asíntese, a liberação, a recaptura ou a metabolização do mesmo. São exemplos:

•  a toxina botulínica, que promove paralisia flácida por clivar os microfilamentosque ancoram as vesículas de armazenamento da acetilcolina, impedindo a

•  ARN ribossômico (ARNr): faz parte da estrutura dos ribossomos (organelas citoplasmáticas) onde asíntese de proteínas ocorre.O ARN, ao ser sintetizado pelo ADN, liga-se a proteínas e em seguidaforma o nucléolo, que é um corpo denso que fabrica os ribossomos.

 ARN polimerase: enzima que catalisa a síntese de seqüências genéticas a partir de moldes. 

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exocitose do neurotransmissor decorrente do desencadeamento de um potencialde ação;

•  a cocaína, que bloqueia a bomba de recaptura de noradrenalina, dopamina eserotonina aumentando a concentração dessas monoaminas na fenda sinápticae, conseqüentemente, os efeitos mediados pelas mesmas.

Interação com o receptorOs agentes tóxicos podem se ligar a receptores e ativá-los ou não. Se o agente ativar oreceptor, ele será chamado de agonista e, se não ativá-lo, de antagonista. O efeito doantagonista decorrerá da prevenção da ligação do neurotransmissor ao seu receptor.Como exemplos, pode-se citar:

•  o alucinógeno ácido lisérgico (LSD) é agonista do receptor 5-HT2A daserotonina, envolvido no controle da percepção e humor;

•  o relaxante muscular curare é antagonista do receptor nicotínico da acetilcolina,presente nas fibras musculares esqueléticas e responsável pela contração

muscular.Interação com canais iônicos

 A ação em canais iônicos influenciará diretamente o potencial de membrana e,conseqüentemente, a probabilidade de um potencial de ação ser deflagrado eestimular a célula. Os agentes tóxicos podem tanto bloquear quanto abrir canaisiônicos. Alguns exemplos:

•  a tetrodotoxina, uma toxina presente em algumas espécies de peixe comuns noJapão (no Brasil, é encontrada no baiacu), bloqueia canais de sódio do músculoesquelético induzindo paralisia flácida;

•  os antidepressivos tricíclicos bloqueiam canais de sódio na musculatura cardíacapromovendo arritmias;

•  os praguicidas piretróides bloqueiam canais de cloro no sistema nervoso centrallevando à hiperexcitabilidade neuronal;

•  a batracotoxina, uma toxina encontrada na pele de algumas espécies sul-americanas de sapo, e os praguicidas organoclorados prolongam o tempo deabertura do canal de sódio promovendo hiperexcitabilidade celular.

Alteração da fluidez das membranas Acredita-se que compostos muito lipofílicos, como os solventes orgânicos, possam seintercalar na fase lipídica da membrana plasmática desestruturando-a e prejudicandoseu funcionamento.

Prejuízo da síntese de ATPEm condições aeróbias, a síntese de ATP8 ocorre em três estágios:

•  produção de acetil-coenzima A (acetil CoA) a partir de aminoácidos, ácidosgraxos ou piruvato (produzido na glicólise);

8 A adenosina difosfato (ADP) se compõe de uma molécula de adenosina ligada a dois grupamentos defosfato, e tem que ser convertida em adenosina trifosfato para armazenar energia. A adenosina trifosfato (ATP) é formada por uma molécula de adenosina difosfato à qual se fixou umgrupamento de fosfato suplementar. Tem função de coenzima e constitui um dos compostos maisimportantes do metabolismo dos organismos vivos, pois representa a grande reserva de energia celular. A liberação dessa energia se faz durante a liberação dos grupamentos de fosfato. 

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•  ciclo do ácido cítrico (Krebs ): acetil CoA é oxidada enzimaticamente na matrizmitocondrial até CO2 e a energia liberada é conservada nos transportadores deelétrons reduzidos;

•  fosforilação oxidativa: nas cristas mitocondriais, os transportadores sãooxidados, desfazendo-se de prótons (H+) e elétrons. Os elétrons são conduzidos

ao longo da cadeia respiratória (proteínas integrais da membrana capazes deaceitar ou doar elétrons) até uma molécula de oxigênio (O2), o qual elesreduzem para formar água. A transferência de elétrons é acompanhada pelobombeamento de prótons para fora da membrana mitocondrial interna, o queleva a uma diferença transmembrana na concentração de prótons, já que amembrana interna é impermeável aos mesmos. Essa diferença de concentraçãode prótons gera energia eletroquímica, chamada de força próton-motora.Entretanto, na membrana, existem transportadores para os prótonsrepresentados pela enzima ATP-sintase. À medida que os prótons fluempassivamente de volta para a matriz através dos poros formados por estaenzima, a energia eletroquímica impulsiona a ATP-sintase a catalisar a

incorporação de um fosfato ao ADP formando um ATP. Esse processo échamado de fosforilação oxidativa e notem que a fosforilação do ADP éacoplada à transferência de elétrons e uma etapa não ocorre sem a outra.

Os agentes tóxicos podem interferir com a formação de ATP:

•  inibindo a formação de acetil-CoA: como exemplo, temos o etanol que reduz a

formação de coenzima A; o arsenito que inibe a piruvato desidrogenase;

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•  inibindo o ciclo do ácido cítrico: como exemplo, o fluoracetato que inibe aaconitase; o etanol que inibe a α-cetoglutarato; a diclorovinilcisteína que inibe asuccinato desidrogenase;

•  inibindo o transporte de elétrons: pode-se ter tanto compostos que funcionamcomo aceptores de elétrons (tetracloreto de carbono, doxorrubicina) quanto

compostos que inibam as proteínas da cadeia respiratória (rotenona, cianeto,CO);•  inibindo a chegada de oxigênio à cadeia transportadora: agentes que causam

paralisia respiratória (depressores do sistema nervoso central, agentesconvulsivantes); agentes que causam isquemia (alcalóides do ergot, cocaína);agentes que inibem o transporte de oxigênio pela hemoglobina (monóxido decarbono, agentes metahemoglobinizantes);

•  inibindo a fosforilação do ADP tem-se dois grupos: os inibidores da ATP-sintase,representados pela oligomicina, DDT, clordecona e os agentes chamadosdesacopladores da fosforilação oxidativa. Estes agentes prejudicam a formaçãoda força próton-motora por serem ionóforos, ou seja, formam poros na

membrana levando à dissipação do gradiente eletroquímico. Como exemplos,destaca-se o fungicida pentaclorofenol, vários herbicidas e a amiodarona.

Logicamente, a depleção de ATP, por qualquer um dos mecanismos citados acima, teráconseqüências importantes na célula, pois interferirá com a integridade da membrana,funcionamento de bombas iônicas, síntese protéica, enfim, todos os processos ATP-dependentes. Se for intensa, levará à perda das funções celulares e morte celular.

Aumento de cálcio intracelularO cálcio é essencial para várias funções celulares, como exocitose, contração muscular,ativação de algumas enzimas, etc. Entretanto, em excesso, ele é citotóxico. Assim, acélula dispõe de vários mecanismos para manter os níveis intracelulares de cálciodentro de uma faixa adequada de concentração, como por exemplo, as bombas decálcio e de cálcio-sódio (responsáveis pela extrusão de cálcio da célula); seqüestro decálcio no retículo endoplasmático e na mitocôndria. É interessante notar que, como otransportador presente na mitocôndria tem menor afinidade para o cálcio do que otransportador presente no retículo endoplasmático, o seqüestro pela mitocôndria éimportante em elevadas concentrações citoplasmáticas de cálcio.

Os agentes tóxicos podem aumentar o cálcio intracelular através dos seguintesmecanismos:

•   Aumento do influxo (entrada) de cálcio: pode ocorrer por abertura de canaisiônicos de cálcio operados por ligante (ex, glutamato) ou dano à membranaplasmática. Os agentes que danificam podem ser ionóforos (clordecona,metilmercúrio), enzimas hidrolíticas (fosfolipases ofídicas), indutores deperoxidação lipídica (tetracloreto de carbono).

•  Diminuição do efluxo (saída): ocorre quando o funcionamento dostransportadores responsáveis pela saída do cálcio da célula ou pela captura domesmo pelo retículo endoplasmático ou mitocôndria é prejudicado. Isso podeocorrer quando os agentes se ligam ao carreador prejudicando sua função (ex,paracetamol, clorofórmio, tetracloreto de carbono, DDT) ou por diminuição dosníveis de ATP, já que tais transportadores são ATP-dependentes.

•  Mobilização de reservatórios intracelulares: pode ocorrer com agentes quelesem a membrana mitocondrial ou do retículo endoplasmático ou que sejam

agonistas do receptor para inositol trifosfato (IP3), o qual está acoplado a canaisde cálcio na membrana do retículo endoplasmático e cujo estímulo promove

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abertura desses canais com conseqüente saída do cálcio. O praguicida lindanopossui tal atividade.

O aumento de cálcio intracelular pode trazer, como conseqüências:•  Depleção das reservas de ATP: com a elevação dos níveis citoplasmáticos de

cálcio, ocorre uma diminuição da síntese do ATP, bem como aumento do seuconsumo. A diminuição da síntese ocorre tanto porque a captura do cálcio pelamitocôndria dissipa a força próton-motora da membrana quanto porque ocálcio ativa enzimas oxidativas que produzem espécies reativas lesivas àmembrana. Já o aumento do consumo é provocado pelo aumento do trabalhodos transportadores de cálcio na tentativa de reduzir seus níveis citosólicos.

•  Dissociação dos microfilamentos: filamentos de actina mantêm a morfologiacelular por ancoramento a proteínas presentes na membrana plasmática. Oaumento do cálcio citoplasmático dissocia a actina dessas proteínas levando àformação de bolhas na membrana (“blebbing”) e predispondo-a a rupturas.

•   Ativação de enzimas hidrolíticas: existem proteases, fosfolipases, DNAses e

RNAses cálcio-dependentes. A ativação sustentada dessas enzimas levará àcitotoxicidade.•  Geração de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio: o cálcio ativa enzimas

envolvidas na geração de espécies reativas, como desidrogenases, xantinaoxidase, etc.

Indução de estresse oxidativoRadicais livres são átomos, íons ou moléculas que têm um elétron não pareado noorbital externo. Caracterizam-se por uma grande instabilidade e, conseqüentemente,elevada reatividade por tenderem a acoplar o elétron não pareado a um outro presenteem estruturas próximas à sua formação (pois têm meia-vida curta), como proteínas,lipídios, carboidratos. Eles também iniciam reações autocatalíticas, ou seja, asmoléculas com as quais eles reagem são convertidas em radicais livres, ocorrendolesão em cadeia.

 Várias reações do metabolismo celular levam à formação de radicais livres e, portanto,nosso organismo possui um sistema de defesa antioxidante para remover radicais livresconforme eles vão sendo formados. Esse sistema é composto por enzimas (superóxidodismutase, catalase, glutationa peroxidase) e pequenas moléculas sem atividadeenzimática (ácido ascórbico, tocoferol, glutationa).

Em condições normais, existe um equilíbrio entre a formação e a remoção de radicais

livres no organismo e agentes tóxicos podem desequilibrar esse sistema aumentando aformação de radicais livres (ex, tetracloreto de carbono, paraquate, paracetamol,cromo) e/ou diminuindo a função do sistema de defesa antioxidante (chumbo,mercúrio). Nesta situação de desequilíbrio, temos o chamado estresse oxidativo, quepode levar a injúria celular. Três reações são importantes para a injúria celulardecorrente de estresse oxidativo:

•  Peroxidação lipídica das membranas: o dano oxidativo começa quando aligação dupla de ácidos graxos insaturados é atacada por radicais livres,especialmente radical hidroxila. Isso leva à formação de peróxidos que tambémsão instáveis e reativos e uma reação autocatalítica em cadeia é iniciada

(propagação), que pode resultar em dano extenso à membrana plasmática;

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•  Peroxidação protéica: radicais livres oxidam resíduos de aminoácidos de cadeiaslaterais, formam ligação cruzada entre proteínas e alteram a estrutura protéica.Com isso, podem levar à fragmentação da proteína e/ou perda de função;

•  Lesões ao DNA: radicais livres podem interagir com o DNA, modificando basese produzindo mutações.

Considerações finais

Como pôde-se observar, muitos são os mecanismos de toxicidade. O objetivo destaseção foi familiarizar os leitores com os principais mecanismos existentes.

É importante reconhecer:

Mais de um mecanismo pode ser responsável pela toxicidade de um agente eeles podem ocorrer concomitantemente ou seqüencialmente. O chumbo altera

proteínas específicas, mobiliza cálcio e gera estresse oxidativo ao mesmo tempo.Já a toxicidade do herbicida paraquate inicia-se com a geração de radical livreno pneumócito o que lesa a membrana e leva, secundariamente, ao aumentode cálcio intracelular.

 Alguns agentes tóxicos têm mecanismos mais seletivos enquanto outros têmmúltiplos mecanismos e induzem múltiplos efeitos. Como exemplo de agentemais seletivo temos o curare que é um antagonista do receptor nicotínico daacetilcolina e produz, na sua intoxicação, paralisia flácida. Já o chumbo leva a:efeitos hematológicos por inibir enzimas com grupamento sulfidrila; efeitosneurotóxicos por alterar a neurotransmissão; hipertensão por induzir estresseoxidativo e alterar os níveis de cálcio.

 Alguns efeitos tóxicos resultam de múltiplos mecanismos. Assim, a hipertensãoinduzida pelo chumbo origina-se da geração de espécies reativas de oxigênioque são vasoconstrictoras; da inibição da enzima oxido nítrico-sintase queproduz o óxido nítrico, importante vasodilatador endógeno; do aumento detônus vascular promovido pelo aumento de cálcio na musculatura lisa; daliberação de renina provocada pelo aumento de cálcio nas célulasjustaglomerulares.

Interações

Geralmente, estamos expostos a uma mistura de substâncias químicas e não a umasubstância química isolada. Por exemplo, na água de beber podemos encontrarpequenas quantidades de praguicidas, metais, solventes, produtos formados durante acloração, etc. Logicamente, essas diferentes substâncias químicas podem interferir nosefeitos umas das outras, tanto os aumentando quanto os diminuindo. Esta interferênciaé chamada de interação. Apesar da comunidade científica reconhecer a existência e aimportância deste fenômeno, a compreensão da toxicologia de misturas ainda estálonge de ser atingida devido à dificuldade de se prever quali e quantitativamente ascombinações possíveis. Existem três mecanismos de interações:

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ToxicocinéticaOcorre quando um agente tóxico modifica a toxicocinética (absorção, distribuição,biotransformação ou a excreção) do outro.

Como exemplo de uma interação toxicocinética que resulta em aumento de efeito,

podemos citar a interação entre o anticoagulante varfarina e o antiinflamatóriofenilbutazona. A taxa de ligação da varfarina à albumina é de, aproximadamente,98%, o que significa que somente 2% fica na forma livre (farmacologicamente ativa).Como a fenilbutazona também se liga à albumina, na presença dela há um aumentoda fração livre da varfarina, o que pode causar hemorragia fatal.

Como exemplo de uma interação toxicocinética que resulta em diminuição de efeito,podemos citar a alcalinização da urina com bicarbonato feita em pacientes intoxicadosagudamente com barbituratos. Como o barbiturato é um ácido fraco, a elevação do pHurinário pelo bicarbonato aumenta a fração do barbiturato na forma iônica (polar) e,portanto, aumenta a taxa de eliminação do mesmo.

ToxicodinâmicaOcorre quando um agente modifica o efeito do outro por ligação aos seus receptoresou estruturas-alvo.

O álcool produz depressão do sistema nervoso central por aumentar a ligação doneurotransmissor inibitório acido gama-aminobutírico (GABA) no receptor GABAA e pordiminuir a ligação do neurotransmissor excitatório glutamato no receptor NMDA. Osbenzodiazepínicos também são drogas depressoras do sistema nervoso central queatuam aumentando a ligação do GABA no receptor GABAA. Assim, dizemos que ainteração entre álcool e benzodiazepínicos é toxicodinâmica e resulta em um aumentodo efeito dos dois compostos.

Um outro exemplo de interação toxicodinâmica é a que ocorre entre opióides (morfina,heroína) e a naloxona (Narcan®). Os opióides produzem seus efeitos ligando-se areceptores opioidérgicos presentes no organismo. A naloxona é um antagonista destesreceptores, ou seja, liga-se a eles, não os estimula, mas impede os agonistas (morfina,heroína) de se ligarem. Neste exemplo temos uma interação toxicodinâmica que resultaem diminuição do efeito do agente tóxico.

QuímicoEnvolve uma interação química direta entre os dois agentes tóxicos. O exemplo clássicodeste tipo de interação é a que ocorre entre metais e agentes quelantes (dimercaprol,

EDTA 9, etc). Devido à grande afinidade que os metais têm por alguns grupos funcionaisdos quelantes, quando uma pessoa intoxicada com metais é tratada com um quelante,o metal liga-se ao agente quelante e deixa de produzir seus efeitos tóxicos, pois ocomplexo metal-quelante é desprovido de atividade tóxica.

Como visto, uma vez que uma interação tenha ocorrido, o efeito resultante poderá sermaior ou menor. As interações do tipo adição, sinergismo e potenciação resultam emaumento de efeito, enquanto o antagnismo resulta em diminuição de efeito. Esses tiposde interação são discutidos a seguir.

9 O ácido etileno-diamino-tetracético é um poderoso reagente, que complexa com vários íons, incluindometais pesados e alcalino-terrosos, formando estruturas estáveis.

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 Adição – é um tipo bastante comum de interação caracterizada quando o efeitoinduzido por dois ou mais compostos juntos, é igual à soma dos efeitos de cadaagente em separado. Assim, quando dois praguicidas organofosforados estãopresentes, observa-se um prejuízo da condução nervosa igual ao que seobservaria se fossem somados o efeito de cada um deles separadamente.

Sinergismo - é o tipo de interação na qual o efeito induzido por dois ou maiscompostos juntos é maior do que a soma dos efeitos de cada agente emseparado. Quando os agentes são sinérgicos, a toxicidade dos mesmos deve serreavaliada considerando suas propriedades sinergísticas, pois o sinergismopode ter sérios efeitos sobre a saúde. Como exemplo, podemos citar a interaçãoentre cigarro e exposição a asbesto. Sabe-se que a exposição a esses doiscompostos produz um risco de desenvolvimento de câncer de pulmão muitomaior do que a soma dos riscos de cada composto em separado.

Potenciação - este tipo de interação ocorre quando um agente desprovido de

atividade tóxica aumenta a toxicidade de um agente tóxico. Um exemplo é ainteração entre o tetracloreto de carbono e isopropanol. Embora o isopropanolnão seja hepatotóxico, ele aumenta a hepatotoxicidade desencadeada pelotetracloreto de carbono. Um outro exemplo é o que ocorre entre oscomponentes do chá de Santo Daime, usado em seitas religiosas. Este chá éfeito com um cipó (Banisteriopsis caapi - “mariri”) e folhas de (Psychotria Viridis -“chacrona”). Quando administradas individualmente, nenhuma das duasplantas produz alucinação. Entretanto, quando administradas em conjunto,observa-se alucinação e isso ocorre porque o mariri impede o metabolismo deprimeira passagem do princípio ativo alucinógeno dimetiltriptamina, encontradona chacrona.

 Antagonismo - no antagonismo, um agente leva à diminuição do efeito de umoutro agente. Na Toxicologia, este efeito é sempre desejado, já que resulta emuma diminuição da toxicidade e é o modo de ação de muitos antídotos usadosno tratamento de diferentes intoxicações.

Os diferentes livros de Farmacologia apresentam diferentes classificações dos tipos deantagonismo. Nesta seção, optou-se pela mais simplificada para facilitar acompreensão.

 Assim sendo, de uma maneira geral, existem três tipos principais de antagonismo:

Antagonismo farmacológico: é aquele no qual um agente diminui a ação do outro

evitando sua ligação no receptor. Existem dois tipos de antagonismo farmacológico:

Competitivo: o antagonista combina-se com o mesmo sítio do receptor que oagonista mas não induz nenhuma resposta. O antagonista compete com oagonista pelo sítio de ligação do receptor. Liga-se ao receptor aquele compostoque estiver em maior concentração na biofase e, portanto, o antagonismo éreversível. Como exemplos, cita-se o antagonismo entre naloxona e opióides;atropina e acetilcolina; curare e acetilcolina, etc.

Não competitivo: o antagonista liga-se no receptor ou em um sítio fora doreceptor do agonista alterando estruturalmente o receptor. Assim, o

antagonismo é irreversível pois não adianta aumentar a quantidade de agonistana biofase, uma vez que não haverá receptor para ele se ligar. Como exemplo,

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pode-se citar a fenoxibenzamina que forma ligações covalentes comadrenoceptores.

Antagonismo funcional: é aquele no qual dois agentes tóxicos atuam em receptores

diferentes produzindo efeitos opostos. Assim, indiretamente, cada um deles irá anularou reduzir o efeito do outro. Como exemplo, podemos citar a interação entre DDT ebenzodiazepínicos. O DDT promove hiperexcitabilidade neuronal por lentificar ofechamento dos canais de sódio, deixando a membrana parcialmente despolarizada.Os benzodiazepínicos promovem hiperpolarização da membrana por aumentarem aação do neurotransmissor inibitório GABA, que abre canais de cloreto. Por isso, umapessoa intoxicada com DDT que apresenta convulsão é tratada com benzodiazepínico.

Antagonismo químico: já descrito acima na interação medicamentosa do tipo química.

O quadro abaixo, retirado do site do NIH (National Institutes of Health), ilustra

qualitativamente a porcentagem da população afetada pela exposição aos agentes A eB em separado, bem como a uma combinação dos dois, simulando os diferentes tiposde exposição.

Tipo de interação Efeito tóxico doagente A

Efeito tóxico doagente B

Efeito combinado deA + B

Adição 20% 30% 50%Sinergismo 5% 10% 100%Potenciação 0% 20% 50%Antagonismo 20% 30% 5%

É interessante notar que diferentes tipos de interações podem ocorrer em diferentessistemas com a mesma combinação de agentes. Por exemplo, inseticidas clorados esolventes halogenados (presentes nas formulações), podem produzir uma interação dotipo adição quanto à hepatotoxicidade e uma interação do tipo antagonismo funcionalno sistema nervoso central, já que os inseticidas são estimulantes e os solventes,depressores do sistema nervoso central.

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Fase IV – Clínica

Essa fase é caracterizada pela exteriorização dos efeitos do agente tóxico, ou seja, oaparecimento de sinais e sintomas da intoxicação ou alterações laboratoriais causadaspela substância química. No diagnóstico das intoxicações, deve-se lembrar que um

mesmo órgão pode ser afetado por uma grande variedade de toxicantes e que umaúnica substância química pode atingir vários órgãos ou produzir diferentes efeitosrelacionados a um mesmo órgão. Nesse amplo espectro de efeitos tóxicos, distinguem-se:

Efeito imediato, crônico e retardado

•  efeitos imediatos ou agudos - são aqueles que aparecem imediatamente apósuma exposição aguda, ou seja, exposição única ou que ocorre, no máximo, em24 horas. Em geral são efeitos intensamente graves e a evolução pode levar o

paciente à morte, ou a uma recuperação total ou parcial com seqüelas oulesões persistentes.•  efeitos crefeitos crônicos - são aqueles resultantes de uma exposição crônica, ou

seja, exposição a pequenas doses, durante vários meses ou anos. Nasintoxicações crônicas, os sinais clínicos podem advir de dois mecanismos:o  somatória ou acúmulo do agente tóxico no organismo: a velocidade de

eliminação é menor que a de absorção, assim, ao longo da exposição otoxicante vai sendo somado no organismo, até alcançar um nível tóxico.Como exemplo, destaca-se o saturnismo (intoxicação crônica pelo chumbo);

o  somatória de efeitos: ocorre quando o dano causado é irreversível e,portanto, vai sendo aumentado a cada exposição, até atingir um níveldetectável ou, então, quando o dano é reversível, mas o tempo entre cadaexposição é insuficiente para que o organismo se recupere totalmente. essetipo de efeito é exemplificado pela exposição crônica ao dissulfeto decarbono (CS2). As alterações bioquímicas ou fisiológicas se acentuam apóscada exposição ao agente até o surgimento dos sintomas clínicos. Quando oefeito apresenta um quadro intermediário é classificado como sobreagudo.

 As intoxicações por exposições repetidas podem conduzir o indivíduo aestados progressivos de deficiência biológica que impedem a suarecuperação e tornam sua reabilitação deficiente.

•  efeitos retardados - são aqueles que só ocorrem após um período de latência,mesmo quando já não mais existe a exposição. Exemplo: efeitos carcinogênicosque têm uma latência de 20-30 anos.

Deve-se, no entanto, fazer distinção entre exposição a curto prazo (aguda) ou a longoprazo (crônica) e os efeitos agudos e crônicos. Por exemplo, uma exposição a curtoprazo (aguda) pode determinar um efeito crônico, ou seja, a exposição a uma únicadose de triortocresilfosfato (TOCP) pode produzir, no homem, lesão persistente no SNC.Em certos casos, como nas exposições agudas ao tálio, paraquate e derivadoscumarínicos, a intoxicação se manifesta no decorrer de alguns dias (efeito sobreagudo).

Efeito local ou sistêmicoO efeito local refere-se àquele que ocorre onde acontece o primeiro contato entre oagente tóxico e o organismo. Os xenobióticos que possuem ação irritante direta sobre

os tecidos, reagem quimicamente, no local de contato, com componentes destestecidos. Dependendo da intensidade da ação pode ocorrer irritação, efeitos cáusticos

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ou necrosantes. Os sistemas mais afetados são pele e mucosas do nariz, boca, olhos,garganta e trato pulmonar. Destacam-se nesse grupo, a ação dos gases irritantes(fosgênio, gás mostarda, NO2, cloro) e lacrimogênicos (acroleína, bromo, cloro). Outraação irritante de tecidos é a dermatite química. Os xenobióticos que apresentam estaação tóxica (substâncias vesicantes como as mostardas nitrogenadas ou agentes

queratolíticos como o fenol), lesam a pele e facilitam a penetração subseqüente deoutras substâncias químicas.

O efeito sistêmico, de ocorrência mais comum, é produzido em local distante do sítio depenetração do toxicante, portanto, exige uma absorção e distribuição da substância, demodo a atingir o sítio de ação, onde se encontra o receptor biológico. Existemsubstâncias que apresentam os dois tipos de efeitos. (ex.: benzeno, chumbo tetraetila,etc.).

Efeito reversível ou irreversível

O efeito reversível desaparece quando cessa a exposição, enquanto o irreversívelpersiste mesmo após o término da exposição. São exemplos de efeitos irreversíveis oscarcinomas, as mutações e cirrose hepática. A manifestação de um ou outro efeitodepende, principalmente, da capacidade do tecido lesado em se recuperar. Assim,lesões hepáticas são geralmente reversíveis, já que este tecido tem grande capacidadede regeneração, enquanto as lesões no SNC são, geralmente, irreversíveis, uma vezque as células nervosas são pouco renovadas.

Reações idiossincrásicas As reações idiossincrásicas correspondem às respostas anormais a certos agentestóxicos, provocados por alterações genéticas. O indivíduo pode ter uma respostaadversa com doses baixas (não-tóxicas) ou então ter uma resposta extremamenteintensa com doses mais elevadas. Exemplo: sensibilidade anormal aos nitritos e outrosagentes metemoglobinizantes, devido à deficiência, de origem genética, na NADH-metemoglobina redutase.

Reações de hipersensibilidade ou sensibilizaçãoCorresponde ao aumento na suscetibilidade do organismo. Aparece após exposiçãoúnica ou após meses/anos de exposição. Os principais tipos de reações dehipersensibilidade são:

•  alergia química - esse tipo de ação tóxica só é desenvolvida após absorção doxenobiótico pelo organismo e ligação com a proteína formando o antígeno (o

agente tóxico funciona como hapteno). Com a formação do antígeno, ocorre,conseqüentemente, o desenvolvimento de anticorpos e do complexoantígeno/anticorpo. Este complexo se liga às células teciduais ou basófiloscirculantes, sensibilizando-as, ou seja, desenvolvendo grânulos internos,contendo histamina, bradicinina, entre outros. Quando ocorre uma segundaexposição do organismo ao mesmo xenobiótico, os anticorpos previamentedesenvolvidos promovem a alteração da superfície celular com conseqüentedegranulização celular. Estes grânulos secretam na corrente sangüíneahistamina e bradicinina, que são os responsáveis pela sintomatologia alérgica.Essa sintomatolgia é bastante semelhante, independente do tipo de xenobióticoque a desencadeou. Os órgãos mais afetados são pulmões e pele. As reações

alérgicas ou alergia química, também conhecidas como de hipersensibilidadeou sensibilização, são reações adversas que ocorrem somente após uma prévia

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sensibilização do organismo ao agente tóxico, ou a um produto quimicamentesemelhante.

•   Alguns autores não concordam que as alergias químicas sejam efeitos tóxicos,já que elas não obedecem ou apresentam uma relação dose-resposta (elas nãosão dose-dependente). Entretanto, como a alergia química é um efeito

indesejável e adverso ao organismo, pode ser reconhecido como efeito tóxico.•  fotoarlegia (prometazina, sabões, desodorante, hexaclorofeno): ascaracterísticas deste tipo de ação tóxica são bastante semelhantes às da alergiaquímica. A diferença primordial entre as duas é que, na fotoalergia, oxenobiótico necessita reagir com a luz solar (reação fotoquímica), para formarum produto que funciona como hapteno. Após a sensibilização, sempre quehouver exposição ao sol, na presença do xenobiótico, haverá o aparecimentodos sintomas alérgicos. É importante ressaltar que a fotoalergia só aparece apósrepetidas exposições.

•  fotossensiblização (agentes branqueadores, furocumarinas): esses xenobióticos,quando em contato com a luz solar, formam radicais altamente reativos que

produzem lesões na pele, muito semelhante às queimaduras de sol. Essa reaçãopode aparecer logo na primeira exposição. As lesões resultantes dafotossensibilização podem persistir sempre que houver contato com o sol,mesmo sem nova exposição ao agente químico.

Efeitos morfológicos, funcionais e bioquímicos

•  Efeitos morfológicos - os efeitos morfológicos referem-se às mudanças micro emacroscópicas na morfologias dos tecidos afetados. Muitos desses efeitos sãoirreversíveis como, por exemplo, a necrose e a neoplasia.

•  Efeitos funcionais - em geral, representam mudanças reversíveis nas funções dosórgãos-alvo. Essas mudanças geralmente são detectadas antes ou emexposições a baixas doses quando comparadas às alterações morfológicas.

•  Efeitos bioquímicos – apesar de todos os efeitos tóxicos estarem associados aalterações bioquímicas, quando se faz referência a efeitos bioquímicos, significaque os efeitos manifestam-se sem modificações morfológicas aparentes. Porexemplo, a inibição da acetilcolinesterase decorrente da exposição a inseticidasorganofosforados ou carbamatos.

Efeitos somáticos ou germinativosOs efeitos somáticos são aqueles que afetam uma ou mais funções vegetativas e osefeitos germinais correspondem às perturbações determinadas nas funções dereprodução, sobre a integridade dos descendentes e desenvolvimento de tumores.