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e a estética da tronculência tronculência e a estética da tronculência tronculência Conservadora foi o termo mais brando usado para qualificar a convoca- ção final de Dunga para a Copa do Mundo. Cadê o Ganso? E o Neymar? E Ro- naldinho? Estão todos fora. Até Adriano, cuja presença na copa era quase certa, ficou de fora da lista, graças à sua própria, essa de polêmicas fora de campo. A crônica esportiva estrebucha, mas reconheçamos: Dunga é um técnico. Para justificar sua lista final, mostra seu retrospecto na seleção. Ganhou quase tudo que disputou. Só perdeu as Olimpíadas. O que, convenhamos, é um belo retrospecto. E ganhou com esses mesmo jogadores. O contestado Júlio Batista, por exemplo, foi fun- damental na conquista da Copa América. Como desprestigiar um jogador que aproveitou tão bem sua oportunidade na seleção? Seria como punir alguém que obteve grandes méritos. O futebol é um reflexo da vida, da sociedade. Se nesta vivemos sob a lei da meritocracia (quem dá mais resultados, mais lucros, ganha mais), por que no futebol seria dife- rente? Os jogadores convocados por Dunga ganharam tudo o que disputaram. Não é prova suficiente de suas qualidades? Qualquer outra discussão que não seja a eficiência e o resultado conquistado não se justifica. Porque ela também não se justifica na vida. Se um empregado de uma fá- brica faz o seu trabalho de forma diferente e não dá o mesmo lucro que anteriormente dava, ele será demitido. Não adianta ele argu- mentar e dizer: “eu estava tentando inovar, ser mais ousado, mais cria- tivo”. Azar. Baixou a produtividade, diminuiu os lucros, um abraço. Criatividade e inovação só contam na nossa sociedade se junto vier o lucro, a conquista do objetivo. Dunga age com a mesma consciência eficiente do mundo empresarial. Testa as pessoas e, aquelas que dão o resultado espe- rado, permanecem no grupo. Assim é a vida, assim é o futebol. Discussões românticas sobre a tradição do futebol brasileiro, que deve ser sempre bonito, ofensivo, mágico, não valem nada. Valem apenas para os saudosistas jor- nalistas que acham que a seleção de 82 é o paradigma do futebol brasileiro: mágica e perdedora. Dunga quer vencer. Para tanto, utiliza aqueles que com ele vence- ram. Aqueles que demonstraram disposição e comprometimento com o time. O talento individual, se nos dá ápices de genialidade, também nos abismos de ineficiência. Dunga prefere a eficiência, muito mais regular, muito mais segura. Certamente considerando o exemplo (mau) de 2006, em que tínhamos talento de sobra, e nenhuma eficiência, ne- nhum comprometimento. Dunga quer ganhar. Com jogadores que já ganharam. Todos testados em jogos importantes. Todos com boas atuações pela seleção. Dunga é um lógico. Dunga é um técnico. Assim é a vida. Alguém pode negá-lo? D u n g g a a , u m t é c n i c o D u n g g a a e a e s t é t i c a d a t r u c u l l ê ê n n c i a geral geral Dunga tem um problema. “Só um?”, dirá algum sar- cástico leitor. Por ora só um, replicarei. Dunga é um sujeito truculento. O futebol é um jogo. Como tal, há vencedores e perdedores. Os té- cnicos armam seus times de forma a ampliar as suas possibilidades de vitória frente a um adversário. Nada de mal nisso. Mas o futebol não é simplesmente vencer e perder. Futebol faz parte da cultura. É o esporte mais popular do mundo. E cada seleção que jogará a Copa do Mundo, representa não só seu país, como a sua cultura. A nossa, a brasileira, sempre foi conhecida pela criatividade, inventividade e, até, exotismo. Tudo que não ecoa na nossa atual seleção. Dunga, obviamente, não se im- porta com a esfera mais ampla do futebol. Ele quer ganhar, e pronto. É legítimo. Por outro lado, perde- remos uma chance única, histórica, de colocarmos num mesmo time jogadores muito talentosos. Quem não gostaria de ver um meio campo com Ronaldinho Gaúcho, Kaká e Ganso? Três gerações de craques que, por um azar chamado Dunga, não atuarão juntas. Jamais sabe- remos o que eles poderiam fazer se unidos. Perdemos, assim, uma chance de entrarmos para a história mais uma vez. Não como campeões mundiais novamente, mas como a seleção de melhor futebol do mundo. A ladainha que sempre acompanha a discussão entre futebol bonito e futebol eficiente (leia-se vencedor), é que a ótima seleção brasileira de 82 não ganhou. Idem para a Holanda de 74. Só que, como falei acima, o futebol não se restringe ao mero resultado. Futebol é cultura. Temos que mostrar ao mundo o que temos de melhor em determinado momento histórico. Parreira em 94 fez isso. Não tínhamos uma grande geração de jogadores. Por sorte tín- hamos um gênio chamado Romário que, num time bem ajustado pelo treinador, conseguiu ser campeão. Aquilo que se viu ali era o que tínhamos de melhor na época. Parreira estava certo. Hoje não. Hoje temos uma geração de joga- dores incríveis. Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Neymar, Ganso, Roberto Carlos, Robinho, Daniel Alves, Júlio César, etc... Só que apenas alguns desses fazem parte da seleção de Dunga. É aí que Dunga erra. Por ser truculento, Dunga só consegue enxergar o próximo adversário, a próxima briga. Não tem uma visão mais ampla do futebol, não tem senso de opor- tunidade histórica. Fiar-se na velha ladainha de que futebol bonito não ganha jogo é de uma mediocri- dade gritante. Os exemplos, sejam times ou seleções, que praticavam grande futebol e foram vencedores estão aí aos montes: Santos de Pelé, Flamengo de Zico, Seleção brasileira de 70, etc. As condições para repetirmos isso nos foram da- das. Dunga, infelizmente, negou-as Se o futebol bonito nem sempre ganha títulos, ele sempre ganha um lugar na história e na memória dos torcedores. E isso, meu caro Dunga, é muito mais raro e difícil. nº 1 I maio 2010 nº 1 I maio 2010 M a r t i m S i l v e i r a G a b r i e l Z a p a t a

Geral

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Jornal sobre futebol

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Page 1: Geral

Dunga e a estética da tronculência tronculênciaDunga e a estética da tronculência tronculência

Conservadora foi o termo mais

brando usado para qualifi car a convoca-

ção fi nal de Dunga para a Copa do Mundo. Cadê o

Ganso? E o Neymar? E Ro-naldinho? Estão todos fora. Até

Adriano, cuja presença na copa era quase certa, fi cou de fora da lista, graças à sua própria, essa de polêmicas fora de campo. A crônica esportiva estrebucha, mas reconheçamos: Dunga é um técnico. Para justifi car sua lista fi nal, mostra seu retrospecto na seleção. Ganhou quase tudo que disputou. Só perdeu as Olimpíadas. O que, convenhamos, é um belo retrospecto. E ganhou com esses mesmo jogadores. O contestado Júlio Batista, por exemplo, foi fun-damental na conquista da Copa América. Como desprestigiar um jogador que aproveitou tão bem sua oportunidade na seleção?

Seria como punir alguém que obteve grandes méritos. O futebol é um refl exo da vida, da sociedade. Se nesta vivemos sob a lei da meritocracia (quem dá mais resultados, mais lucros, ganha mais), por que no futebol seria dife-rente? Os jogadores convocados por Dunga ganharam tudo o que disputaram. Não é prova sufi ciente de suas qualidades? Qualquer outra discussão que não seja a efi ciência e o resultado conquistado não se justifi ca. Porque ela também não se justifi ca na vida. Se um empregado de uma fá-brica faz o seu trabalho de forma diferente e não dá o mesmo lucro que anteriormente dava, ele será demitido. Não adianta ele argu-mentar e dizer: “eu estava tentando inovar, ser mais ousado, mais cria-tivo”. Azar. Baixou a produtividade, diminuiu os lucros, um abraço. Criatividade e inovação só contam na nossa sociedade se junto vier o lucro, a conquista do objetivo. Dunga age com a mesma consciência efi ciente do mundo empresarial. Testa as pessoas e, aquelas que dão o resultado espe-

rado, permanecem no grupo. Assim é a vida, assim é o futebol. Discussões românticas sobre a tradição do futebol brasileiro, que deve ser sempre bonito, ofensivo, mágico, não valem nada. Valem apenas para os saudosistas jor-nalistas que acham que a seleção de 82 é o paradigma do futebol brasileiro: mágica e perdedora. Dunga quer vencer. Para tanto, utiliza aqueles que com ele vence-ram. Aqueles que demonstraram disposição e comprometimento com o time. O talento individual, se nos dá ápices de genialidade, também nos dá abismos de inefi ciência. Dunga prefere a efi ciência, muito mais regular, muito mais segura. Certamente considerando o exemplo (mau) de 2006, em que tínhamos talento de sobra, e nenhuma efi ciência, ne-nhum comprometimento. Dunga quer ganhar. Com jogadores que já ganharam. Todos testados em jogos importantes. Todos com boas atuações pela seleção. Dunga é um lógico. Dunga é um técnico. Assim é a vida. Alguém pode negá-lo?

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Dunga tem um problema. “Só

um?”, dirá algum sar-cástico leitor. Por ora só

um, replicarei. Dunga é um sujeito truculento.

O futebol é um jogo. Como tal, há vencedores e perdedores. Os té-cnicos armam seus times de forma a ampliar as suas possibilidades de vitória frente a um adversário. Nada de mal nisso. Mas o futebol não é simplesmente vencer e perder. Futebol faz parte da cultura. É o esporte mais popular do mundo. E cada seleção que jogará a Copa do Mundo, representa não só seu país, como a sua cultura. A nossa, a brasileira, sempre foi conhecida pela criatividade, inventividade e, até, exotismo. Tudo que não ecoa na nossa atual seleção. Dunga, obviamente, não se im-porta com a esfera mais ampla do futebol. Ele quer ganhar, e pronto.

É legítimo. Por outro lado, perde-remos uma chance única, histórica, de colocarmos num mesmo time jogadores muito talentosos. Quem não gostaria de ver um meio campo com Ronaldinho Gaúcho, Kaká e Ganso? Três gerações de craques que, por um azar chamado Dunga, não atuarão juntas. Jamais sabe-remos o que eles poderiam fazer se unidos. Perdemos, assim, uma chance de entrarmos para a história mais uma vez. Não como campeões mundiais novamente, mas como a seleção de melhor futebol do mundo. A ladainha que sempre acompanha a discussão entre futebol bonito e futebol efi ciente (leia-se vencedor), é que a ótima seleção brasileira de 82 não ganhou. Idem para a Holanda de 74. Só que, como falei acima, o futebol não se restringe ao mero resultado. Futebol é cultura. Temos que mostrar ao mundo o que temos de melhor em determinado momento histórico. Parreira em 94 fez isso. Não tínhamos uma grande geração de jogadores. Por sorte tín-hamos um gênio chamado Romário que, num time bem ajustado pelo

treinador, conseguiu ser campeão. Aquilo que se viu ali era o que tínhamos de melhor na época. Parreira estava certo. Hoje não. Hoje temos uma geração de joga-dores incríveis. Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Neymar, Ganso, Roberto Carlos, Robinho, Daniel Alves, Júlio César, etc... Só que apenas alguns desses fazem parte da seleção de Dunga. É aí que Dunga erra. Por ser truculento, Dunga só consegue enxergar o próximo adversário, a próxima briga. Não tem uma visão mais ampla do futebol, não tem senso de opor-tunidade histórica. Fiar-se na velha ladainha de que futebol bonito não ganha jogo é de uma mediocri-dade gritante. Os exemplos, sejam times ou seleções, que praticavam grande futebol e foram vencedores estão aí aos montes: Santos de Pelé, Flamengo de Zico, Seleção brasileira de 70, etc. As condições para repetirmos isso nos foram da-das. Dunga, infelizmente, negou-asSe o futebol bonito nem sempre ganha títulos, ele sempre ganha um lugar na história e na memória dos torcedores. E isso, meu caro Dunga, é muito mais raro e difícil.

nº 1 I maio 2010nº 1 I maio 2010

Marti

mSi

lveira

GabrielZapata

Page 2: Geral

Esta pracinha sem aquela pelada virou uma chatice completa: agora, é uma babá que passa, empur-rando, sem afeto, um bebê de car-rinho, é um par de velhos que troca silêncios num banco sem encosto.E, no entanto, ainda ontem, isso aqui fervia de menino, de sol, de bola, de sonho: “eu jogo na linha! eu sou o Lula!; no gol, eu não jogo, tô com o joelho ralado de ontem; vou fi car aqui atrás: entrou aqui, já sabe.” Uma gritaria, todo mundo se escalando, todo mundo querendo tirar o selo da bola, bendito fruto de uma suada vaquinha.Oito de cada lado e, para não con-fundir, um time fi ca como está; o outro joga sem camisa.Já reparei uma coisa: bola de fute-bol, seja nova, seja velha, é um ser muito compreensivo que dança conforme a música: se está no Ma-racanã, numa decisão de título, ela rola e quiçá com um ar dramático, mantendo sempre a mesma pose adulta, esteja nos pés de Gérson ou nas mãos de um gandula.Em compensação, num racha de menino ninguém é mais sapeca: ela corre para cá, corre para lá, quiçá no meio-fi o, para de estalo no canteiro, lambe a canela de um, deixa-se espremer entre mil cane-las, depois escapa, rolando, doida, pela calçada. Parece um bichinho.Aqui, nessa pelada inocente é que se pode sentir a pureza de uma bola. Afi nal, trata-se de uma bola profi ssional, uma número cinco,

cheia de carimbos ilustres: “Copa Rio-Ofi cial”, “FIFA - Especial.” Uma bola assim, toda de branco, co-berta de condecorações por todos os gomos (gomos hexagonais!) ja-mais seria barrada em recepção do Itamarati. No entanto, aí está ela, correndo para cima e para baixo, na maior farra do mundo, disputada, maltratada até, pois, de quando em quando, acertam-lhe um bico, ela sai zarolha, vendo es-trelas, coitadinha.Racha é assim mesmo: tem bico, mas tem também sem-pulo de craque como aquele do Tona, que empatou a pelada e que lava a alma de qualquer bola. Uma pin-tura.Nova saída.Entra na praça batendo palmas como quem enxota galinha no quintal. É um velho com cara de guarda-livros que, sem pedir li-cença, invade o universo infantil de uma pelada e vai expulsando todo mundo. Num instante, o cam-po está vazio, o mundo está vazio. Não deu tempo nem de desfazer as traves feitas de camisas.O espantalho-gente pega a bola, viva, ainda, tira do bolso um canive-te e dá-lhe a primeira espetada. No segundo golpe, a bola começa a sangrar. Em cada gomo o coração de uma criança.

Peladas

Arm

ando

Nogu

eira

,1977

O ANJO DAS PERNAS TORTASA Flávio Porto

A um passe de Didi, Garrincha avançaColado o couro aos pés, o olhar atentoDribla um, dribla dois, depois descansaComo a medir o lance do momento.

Vem-lhe o pressentimento; ele se lançaMais rápido que o próprio pensamentoDribla mais um, mais dois; a bola trançaFeliz, entre seus pés – um pé-de-vento!

Num só transporte a multidão contritaEm ato de morte se levanta e gritaSeu uníssono canto de esperança.

Garrincha, o anjo, escuta e atende: - Goooool!É pura imagem: um G que chuta um oDentro da meta, um l. É pura dança!

Em cada gomo o coração de uma

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“E...........que.........gooool! Osmar Santos (Rádio Globo - SP)

“É o pai da criança...

foi ele que botou lá dentro.” Édson Mauro (CBN e rádio Globo)

Édson Mauro (CBN e rádio Globo)

Édson Mauro (CBN e rádio Globo)

“Tá lá!” José Cunha (TV Tupi)

“Olho no lance!” Silvio Luiz

“Olha lá, olha lá, olha lá no placaar!” Geraldo José de Almeida (TV Globo)

Geraldo José de Almeida (TV Globo)

Geraldo José de Almeida (TV Globo)

“Fecham-se as cortinas e termina o espetáculo” Fiori Giglioti (Rádio Bandeirantes - SP)

Fiori Giglioti (Rádio Bandeirantes - SP)

Fiori Giglioti (Rádio Bandeirantes - SP)

Fiori Giglioti (Rádio Bandeirantes - SP)

Fiori Giglioti (Rádio Bandeirantes - SP)

Vinícící ius de Moraes , 1962

Décio Pignatari, 1964

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