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Grafia de Libras (Signwriting): algumas considerações Sheila Vicente (UNIFAE) 1 Maria Cândida de Oliveira Costa (UNIFAE) 2 Resumo:A língua brasileira de sinais (libras) é a principal forma de comunicação e interação da comunidade surda. Ainda que se acredite que seja uma língua ágrafa, isso é, que não tenha sistema de escrita, existe o recurso SignWriting (SW), cuja simbologia permite representar graficamente traços de línguas viso-gestuais. Dada a relevância da escrita em sociedades contemporâneas, esse é um importante instrumento de legitimação tanto da língua quanto do sujeito surdo. Esse estudo, tomando por base a metodologia de pesquisa bibliográfica, tem por objetivo descrever aspectos históricos e de simbologia da SW, que, apesar da importância em termos de cidadania e autonomia, é pouco conhecida no país. Cumpre salientar queesse sistema possibilitou o que muitos consideravam improvável: o grafema da língua de sinais, que, teoricamente, oportuniza aos surdos escreverem seus próprios livros, jornais e dicionários diretamente em sinais (sem a tradução indireta ao português). Palavras-chave: Língua de sinais; Escrita; Surdo;SignWriting. Abstract: The Brazilian sign language is a major form of communication and interaction of the deaf community. Although it is believed that it is an agraph language, that is, without a writing system, there is the SignWriting (SW) feature, whose symbology allows to graphically represent traces of visual-gestural languages. Given the relevance of writing in contemporary societies, this is an important instrument for legitimating both the language and the deaf person. This study, based on the methodology of bibliographical research, aims to describe historical aspects and symbology of SW, which, despite the importance in terms of citizenship and autonomy, is little known in Brazil. This system made possible what many considered improbable: the sign language grapheme, which theoretically enables the deaf to write their own books, newspapers and dictionaries directly in signs (without an indirect translation into Portuguese). Keywords: Sign language; Writing; Deaf;SignWriting. Introdução Há uma ampla discussão sobre processos de ensino-aprendizado do surdo que vem paulatinamente sendo ampliada no âmbito acadêmico nos últimos anos,em especial, no que diz respeito à libras, língua de sinais brasileira. Oficializada em abril de 2002 com a Lei n. 10.436, 1 Graduada em Pedagogia e em Letras Libras. Professora de Educação Especial dos municípios de São Vicente e Cubatão-SP,baixada Santista. Mestranda do programa Interdisciplinar em Educação, Ambiente e Sociedade na linha de pesquisa “Educação e Cidadania” da Universidade Pública Municipal - UNIFAE. E-mail: [email protected]. 2 Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é docente do Centro Universitário das Faculdades Associadas de Ensino FAE.

Grafia de Libras (Signwriting) - seminariolhm.com.br · a libras é considerada a língua materna dos surdos, ao contrário do português da maioria da população ouvinte. A língua

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Grafia de Libras (Signwriting): algumas considerações

Sheila Vicente (UNIFAE)1

Maria Cândida de Oliveira Costa (UNIFAE)2

Resumo:A língua brasileira de sinais (libras) é a principal forma de comunicação e interação

da comunidade surda. Ainda que se acredite que seja uma língua ágrafa, isso é, que não tenha

sistema de escrita, existe o recurso SignWriting (SW), cuja simbologia permite representar

graficamente traços de línguas viso-gestuais. Dada a relevância da escrita em sociedades

contemporâneas, esse é um importante instrumento de legitimação tanto da língua quanto do

sujeito surdo. Esse estudo, tomando por base a metodologia de pesquisa bibliográfica, tem por

objetivo descrever aspectos históricos e de simbologia da SW, que, apesar da importância em

termos de cidadania e autonomia, é pouco conhecida no país. Cumpre salientar queesse sistema

possibilitou o que muitos consideravam improvável: o grafema da língua de sinais, que,

teoricamente, oportuniza aos surdos escreverem seus próprios livros, jornais e dicionários

diretamente em sinais (sem a tradução indireta ao português).

Palavras-chave: Língua de sinais; Escrita; Surdo;SignWriting.

Abstract: The Brazilian sign language is a major form of communication and interaction of

the deaf community. Although it is believed that it is an agraph language, that is, without a

writing system, there is the SignWriting (SW) feature, whose symbology allows to graphically

represent traces of visual-gestural languages. Given the relevance of writing in contemporary

societies, this is an important instrument for legitimating both the language and the deaf person.

This study, based on the methodology of bibliographical research, aims to describe historical

aspects and symbology of SW, which, despite the importance in terms of citizenship and

autonomy, is little known in Brazil. This system made possible what many considered

improbable: the sign language grapheme, which theoretically enables the deaf to write their

own books, newspapers and dictionaries directly in signs (without an indirect translation into

Portuguese).

Keywords: Sign language; Writing; Deaf;SignWriting.

Introdução

Há uma ampla discussão sobre processos de ensino-aprendizado do surdo que vem

paulatinamente sendo ampliada no âmbito acadêmico nos últimos anos,em especial, no que diz

respeito à libras, língua de sinais brasileira. Oficializada em abril de 2002 com a Lei n. 10.436,

1Graduada em Pedagogia e em Letras Libras. Professora de Educação Especial dos municípios de São Vicente e

Cubatão-SP,baixada Santista. Mestranda do programa Interdisciplinar em Educação, Ambiente e Sociedade na

linha de pesquisa “Educação e Cidadania” da Universidade Pública Municipal - UNIFAE. E-mail:

[email protected]. 2Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é docente do Centro Universitário

das Faculdades Associadas de Ensino – FAE.

a libras é considerada a língua materna dos surdos, ao contrário do português da maioria da

população ouvinte.

A língua brasileira de sinais é a um idioma gestual, isto quer dizer que apresenta

aspectos linguísticos morfológicos, sintáticos, semânticos e discursivos, diferentes de línguas

orais como o português. Cumpre reiterar, portanto, que a libras não é gestualização do

português, como ainda atribui o senso-comum.

A principal diferença das línguas orais é sua modalidade de articulação visual-espacial

ou cinésico-visual. Por essas singularidades, por muito tempo foi considerada por muitos

estudiosos uma língua sem possibilidade de grafia. No que toca à questão da importância da

escrita, Charles Higounet (2003) salienta que

A escrita faz de tal modo parte da nossa civilização que poderia servir de

definição dela própria. A história da humanidade se divide em duas imensas

eras: antes e a partir da escrita. (...) vivemos os séculos da civilização da

escrita. Todas as nossas sociedades baseiam-se sobre o escrito. A lei escrita

substitui a lei oral, o contrato escrito substituiu a convenção verbal, a religião

escrita se seguiu à tradição lendária. E, sobretudo não existe história que não

se funde sobre textos (HIGOUNET, p. 36, 2003).

No desenvolvimento das práticas sociais que culminaram com avanços tecnológicos,a

utilização do registro escrito se tornouimprescindível. Existe, assim, uma relação inseparável

entre civilização e a escrita, pois

a escrita abriu um espaço de comunicação desconhecido pelas sociedades

orais, no qual tornava-se possível tomar conhecimento das mensagens

produzidas por pessoas que encontravam-se a milhares de quilômetros, ou

mortas há séculos, ou então que se expressavam apesar de grandes diferenças

culturais ou sociais (LÉVY, 2000, p. 114).

A escrita faz parte da história da humanidade:éum marco das formas de comunicação,

possui capacidade de registrar a história, representar a linguagem verbal, transpor limites

geográficos, ultrapassar eras, “eternizar” ideias e pensamentos. Nesse sentido, mesmo uma

língua viso-gestual, precisa de um registro escritoque lhe garanta legitimidade e possibilite aos

seus usuários ampla inclusão na sociedade contemporânea “grafocêntrica”.

Assim sendo, o objetivo do estudo ora apresentado é descrever algumas das

características principais da escrita da língua de Sinais Brasileira o SignWriting(SW), além de

realizar um estudo sobre a grafia dos sinaiscomo recurso que auxilie o surdo na escrita e leitura

dos sinais, sem que haja a necessidade direta da tradução do português.

Esta pesquisa foi desenvolvida de acordo com o método bibliográfico. Para Fonseca

(2002),

a pesquisa bibliográfica é feita a partir do levantamento de referências teóricas

já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros,

artigos científicos, páginas de web sites. Qualquer trabalho científico inicia-

se com uma pesquisa bibliográfica, que permite ao pesquisador conhecer o

que já se estudou sobre o assunto. Existem, porém, pesquisas científicas que

se baseiam unicamente na pesquisa bibliográfica, procurando referências

teóricas publicadas com o objetivo de recolher informações ou

conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual se procura a

resposta (FONSECA, 2002, p. 32).

Salienta-se que o SignWriting (doravante, SW) é o sistema de escrita que torna possível

fazer a leitura e grafar a libras. Contudo, a utilização por surdos no Brasil é praticamente

inexistente. A escrita da língua de sinais pode servir como uma proposta pedagógica ao ensino

e letramento das pessoas surdas. Pretende-se, assim, que este trabalho dê visibilidade ao

método de escrita viso gestual. Em um primeiro momento, define-se o SW; em um segundo

momento, descrevem-se algumas das simbologias principais, tomando por base os sinais da

libras.

2. Definição do Singwriting

Segundo Nogueira et al (2012), a escrita da língua de sinais, que poderia significar

mudanças positivas para o ensino-aprendizagem do surdo, é pouquíssimo utilizada no Brasil:

“a Libras ainda é considerado uma língua ágrafa no Brasil porque sua escrita não foi

reconhecida oficialmente e é utilizada por um número ainda restrito de pessoas” (NOGUEIRA;

CARNEIRO, 2012. p.147).Para Barreto (2012), o desconhecimento sobre a escrita da libras

gera impressões errôneas mesmo por parte dos profissionais na medida em que

existem muitos mitos em torno da Escrita de Sinais. Muitas pessoas, por não

conhecê-la, afirmam que a escrita de Sinais não é capaz de registrar a Língua

de Sinais com todas as suas características. Para muitos o primeiro contato ou

o estudo desta escrita foi superficial e envolto em mistérios (BARRETO,

2012, p. 27).

SignWriting é um sistema de escrita que torna possível ler, escrever e digitar qualquer

língua de sinais no mundo.A escrita da língua de sinais não se resume ao alfabeto manual, a

datilologia é um sistema que representa o alfabeto das línguas orais da forma escrita, esta

representação é feita por meio das mãos.Se o alfabeto latino é usado para escrever diversas

línguas como o Inglês, Italiano, Espanhol, Romeno, Catalão, Francês, dentre muitos outros

idiomas que usam de comunicação verbal,da mesma forma, os símbolos do alfabeto de

SignWriting são internacionais e podem ser usados para escrever, teoricamente, os movimentos

de qualquer língua gestual.

Em relação aos aspectos históricos, cumpre informar que oSignWriting surgiu em 1974,

elaborada pela professora de dança dinamarquesa Valerie Sutton, que dirigiu o

DeafActionCommitee (DAC). A escrita de sinais ocorreu pela necessidade de marcar

movimentos das danças (STUMPF, 2005). O SignWriting é usado em vinte e sete países para

registrar vinte e sete diferentes e únicos idiomas de sinais. SW não modifica a língua de sinais,

mas a preserva tal como é sinalizada para que outros a possam ler por meio de sinais

convencionais. Os símbolos de SignWriting registram os movimentos do corpo exatamente

como os sinais são feitos. Essa base é propícia para captar sutilizas de qualquer língua de sinais

do mundo, pois registra com precisão os movimentos do corpo.

Fernando Capovilla (2000) sobre importância crucial da escrita afirma que:

A história nasce com a escrita. Ao fornecer um registro secundário e perene

do ato linguístico primário e transitório, a escrita permite a reflexão sobre o

conteúdo da comunicação, sobre as coisas do mundo e o que delas sabemos.

Enquanto registro perene promove também a segurança e consolida o contrato

social. Na história do conhecimento, é a escrita que dá luz à Filosofia e à

Epistemologia, permitindo superar ortodoxias. A escrita permite a reflexão

sobre o próprio ato linguístico, o avanço e o aprimoramento constante da

linguagem como veículo do pensamento para o pleno desenvolvimento social

e cognitivo. É a escrita, mais que apenas a língua primaria do dia a dia, que

unifica as pessoas de um determinado território geográfico e ao longo do

tempo, nas sucessivas gerações, constituindo sua identidade como um povo.

Uma língua que não tem um registro escrito é limitado, e incapaz de

desenvolver-se e consolidar-se a ponto de servir de base para a constituição

de um povo e de uma cultura. Agrupamentos que não têm registro escrito da

própria língua não têm dela o domínio necessário para articular, de modo

solido e seguro, seu desenvolvimento cultural e organização social.

Permanecem sem a união da organização central efetiva e sem tradições ou

memória, dependentes de feudos dispersos e de intermediários para obter

informações transitórias, instáveis e vulneráveis a distorção e boatos

(CAPOVILLA, p. 1491, 2000. Vol. II).

As línguas gestuais, a partir do momento que possuem registro, fazem parte da história

no que diz respeito ao aspecto documental; ganham enlevo e formalidade: não pode ser

subitamente alterada segundo os desígnios do “boca-a-boca”, isto é, da imprecisão das falas

cotidianas. Com o registro da língua, permite-seacesso à informação de um povo, ou seja,

favorece o crescimento cultural do surdo.

3. Símbologia do Signwriting

Assim como em português os teóricos tratam do ponto e modo de articulação para que

o sistema fonador produza sons (reconhecidos culturalmente como unidades de significação),

para formação dos sinais da libras existe configurações de mãos, orientação de contato, ponto

de articulação, parâmetros, movimentos, marcações manuais e movimentos específicos.O SW,

portanto, é um método gráfico esquemático que funciona como a escrita alfabética, em que a

grafia pode ser representada por gestos.

Boutora (2003) explica que a SW

é uma forma gráfica que está apta a assegurar as funções da escrita, da

possibilidade de distanciamento da língua, passando pelo armazenamento e

transmissão de informação. Sua evolução acontecerá pelos objetivos de

adaptação às novas práticas e situações. Veremos com o tempo se o sistema

se adapta às novas línguas ou se são as línguas que se adaptarão à escrita.

(BOUTORA, 2003, p. 95).

Esse sistema permite a sintaxe e semântica próprias no desenvolvimento de línguas não

verbais,por meio de três dimensões espaciais, valendo-se de colunas, cuja leitura é da esquerda

para a direita como a escrita convencional. Existem três colunas, a coluna central é o meio do

corpo, que é uma estrutura neutra, as colunas da direita e da esquerda são referências para o

deslocamento do gesto na direção desejada.O SignWriting é universal, ou seja, seus símbolos

são os mesmos em toda parte do mundo, de modo que, sem qualquer prejuízo, pode-se registrar

diferentes línguas de sinais, que passam não precisar mais passar por traduções de línguas orais.

Esse sistema é plenamente adequado à realidade brasileira haja vista que a libras é

tridimensional para marcar a relação sintático-semântica. A língua brasileira de sinais permite

que tenha um referencial espacial e temporal. Com o sistema de escrita, assim, é possível o

registro gráfico tridimensional.

Como qualquer língua, a SignWriting permite escrever a mesma coisa de várias formas.

No entanto, ressalta-se que, em alguns casos, um mesmo sinal pode ser escrito de várias formas

diferentes (BARRETO, 2012). Exemplifica-se com a escrita de diferentes formas do sinal de

“surdo”:

Fig. 1: Sinais de surdos. Fonte: Stumpf (2005).

OSignWriting parte sempre da perspectiva do emissor, ou seja, em como o emissor vê

suas próprias mãos quando sinaliza:

Fig. 2: Ponto de vista do emissor. Fonte: Stumpf (2005).

Para Madson e Barreto (2012), a perspectiva para a simbologia das mãos é sempre do

sinalizador. “Quando é você quem está sinalizado, você vê os sinais de sua própria perspectiva.

É nela que a Escrita de Sinais se baseia” (BARRETO, 2012, p.52).

Fig. 3: Dorso da mão. Fonte: Capovilla (2005).

Como orienta Barreto (2012), por questão de convencionalidade, o dorso da mão é

representado por seta preta, ao passo que a palma da mão é representada pela seta branca.

Assim,“se ao sinalizar você pode ver a palma de sua mão, o símbolo que a representa será

branco”. (BARRETO, 2012, p. 52).

Fig. 4: Palma da mão. Fonte: Capovilla (2005).

Fig. 5: Lado da mão. Fonte: Capovilla (2005).

Já se “ao sinalizar e ver o lado de sua mão, o símbolo será metade branco, metade preto.

A parte branca mostra para que lado a palma está virada. A parte preta, o dorso da mão”.

(MADSON; BARRETO,2012, p. 53).A escrita de sinais é realizada como é feito o sinal, então,

por convenção o sinal é sempre descrito de cima para baixo, seguindo a postura vertical do

corpo.Existem configurações de mão, independentes se é a palma da mão ou o dorso, se é a

mão esquerda ou direita, o importante é que se mantenha o formato da configuração de mão

para que seja clara a referência ao sinal (tridimensional e sinestésico) que se escreve:

Fig. 6: Configurações básicas de mãos. Fonte: Capovilla (2005).

A palma da mão é representada pela cor branca, o dorso da mão pelo preto. Dependendo

da orientação da mão, escrevem-se os símbolos com qualquer direção de mãos: “se ao sinalizar

você pode ver a palma de sua mão, o símbolo que a representa será branco”. (BARRETO,

2012, p. 52).

Existem dez categorias na escrita de sinais: mãos, ponto de contato das mãos, face,

movimentos do corpo e da cabeça, ombro, membros, inclinação da cabeça, várias localizações,

movimentos dinâmicos e pontuação. Toda configuração e em qualquer direção deve ter uma

marcação para que saibam se a posição da mão está na horizontal (paralelo ao chão) ou vertical

(paralelo à parede), esta marca os dedos separados da mão ou um risco transversal na mão para

representar a posição horizontal.

FIG. 7: Rotação das mãos. Fonte: Stumpf (2005).

Fig. 8: Grafia das mãos em plano de parede e chão. Fonte: Capovilla (2005).

A escrita de sinais possui símbolos para representar contato que as mãos fazem durante

a sinalização. O “*” é o contato simples; “+” é o ato de agarrar, segurar algo;“I*I” é tocar entre

dois pontos; “#” representa bater com força, “ ” é tocar e deslizar na superfície para fora e

“@” esfregar que é o ato de deslizar permanecendo na superfície.Existem símbolos de

superfície que mostram qual a superfície representada pelo sinal. Contudo,esta simbologia, por

ser muito específica, só é feita em caso de extrema necessidade.

As expressões faciais também são escritas, o sinalizar descreve como se expressa os

sentimentos no rosto ao realizar o sinal.Para Madson e Raquel (2012), na Linguagem viso-

gestual, as expressões faciais são de extrema importância. Existem meios para esse registro:

cada sobrancelha é representada por um par de linhas curtas, viradas para baixo ou para cima

conforme a expressão facial desejada:

Fig. 9: meios de grafar as sobrancelhas. Fonte: Stumpf (2005).

O olhar é também de extrema importância para libras, conforme Bruno Gonçalves

Carneiro e Christiane Cunha de Oliveira (2011):

As línguas de sinais são de modalidade gestual-visual e a descrição de tais

línguas requer um exame atento a fim de observar a manifestação de aspectos

funcionais no espaço de sinalização e a ação de marcadores não-manuais. O

estabelecimento do olhar entre os interlocutores nas línguas sinalizadas é um

acontecimento importante deste que a articulação gestual é objeto de

percepção. O comportamento do olhar, concomitante a componentes

manuais, participa da organização do sistema pronominal, bem como na

indicação de referentes nas línguas de sinais. (CARNEIRO & OLIVEIRA, p.

01, 2011).

Fig. 10: meios de grafar os olhos. FONTE: Ribeiro (2011).

Já a boca é assim representada pela SW:

FIG. 11: meios de grafar a boca. Fonte: Ribeiro (2011).

Por sua vez, “se for importante mostrar o que a boca está fazendo, escrevemos a

expressão dentro do círculo que representa o rosto” (BARRETO, 2012, p. 164).Com o símbolo

“^” pode-se descrever a dobra da junta da mão. Quando as juntas das falanges dos dedos

também se movimentam, deve-se registrar apenas o movimento as juntas do meio.

Segundo terminologia gráfica, as setas mostram as direções: setas paralelas às paredes

são duplas, as setas simples representam os movimentos paralelos ao chão. A ponta da seta

preta mostra que a mão direita é que moveu; a branca, a esquerda e a seta aberta mostra ambas

as mãos moveram-se.

Paralela a parede Paralela a parede Paralela ao chão Paralela ao chão

Mão esquerda Mão direita Mão esquerda Mão direita

Fig. 12: Setas de plano.Fonte: Autoral.

Os movimentos curvos são mais complexos, mas também possuem convenções de

utilização.As setas que mostram movimentos curvos possuem um traço atravessado, mostrando

assim o percurso do movimento e a qual plano pertencem. As setas que mostram movimentos

curvos paralelos às paredes possuem o sinal “●” (uma circunferência negra):

Fig. 13: Setas de movimentos curvos. Fonte: Ribeiro (2011).

Quando se representam movimentos curvos envolvendo três dimensões, os elementos

que estiverem perto do observador parecerão maiores do que os que estão à distância, portanto

a seta que mostra esse movimento será sempre mais larga na trajetória próxima do emissor:

Fig. 14: Seta tridimensional. Fonte: Ribeiro (2011).

Segundo Barreto (2012), “quando a mão se move em círculo com um movimento

semelhante ao que é feito para limpar uma mesa com um plano, este movimento é representado

com esta seta tridimensional. Sua haste é mais grossa quando a mão se aproxima do corpo e

mais fina quando se afasta” (BARRETO, 2012, p. 92).Possuem também representação gráfica

os movimentos de “tremer”, feito com o antebraço paralelo à parede.

Movimentos paralelos a parede Movimentos paralelos ao chão

Fig. 15: Movimentos de tremer. Fonte: autoral.

Ao escrever um sinal que é feito com os músculos mais tensos que o normal se utiliza

o“~”. Cumpre salientar que sempre que o sinal requerer movimento no qual há rotação de pulso,

antebraço fixo ao passo que mão gira, deve-se grafar um círculo com traço mais largo perto do

sinalizador, bem como deve-se grafar uma seta por fora deste círculo que mostra a direção do

movimento.

Por fim, os sinais de pontuação são: “I” ponto final, “II” dois pontos, “II” interrogação,

“í” exclamação e “I” vírgula. Para poder registrar as sutilezas de uma língua viso-gestual são

necessários muitos símbolos e regras de utilização. Esta pesquisa mostra apenas um recorte de

aspectos principais, uma introdução ao SignWriting.

Considerações finais

Procurou-se, nessa pesquisa, esclarecer alguns dos aspectos principais daSignWriting,

em especial no que diz respeito ao seu desenvolvimento histórico, assim como se deve utilizar

certos símbolos do sistema de grafia. Esse sistema possibilitou o que muitos achavam

improvável: o grafema da língua brasileira de sinais, que foi considerada, durante muito tempo,

uma língua sem escrita.

Essa não foi a primeira tentativa de se desenvolver essa escrita, no entanto o

SignWriting representa, por meio de uma gama complexa de símbolos, expressões faciais e

posturas corporais do gesto de forma adequada.

A escolha desta temática se fundamentou na importância de tornar conhecida a escrita

da língua de sinais, como também visibilizar padronização de escrita a fim de que todos possam

usar os mesmos grafemas, facilitando, assim, a comunicação entre pessoas surdas. Para tal, é

necessário difundir esse conhecimento de modo que mais pessoas conheçam a língua brasileira

de sinais (ouvintes e surdos) e utilizem os recursos que ela dispõe. O conhecimento, nesse caso,

atrela-se ao exercício da cidadania, da autonomia e da inclusão social.

Referências

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CAPOVILLA, Fernando Cesar; RAPHAEL, Walkiria Duarte. Enciclopédico Dicionário

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CARNEIRO, Bruno G.; OLIVEIRA, Christiane Cunha de. A direção do olhar do sinalizador

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da SBPC, 2011.

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Beatriz Ignatius. Surdez, Libras e Educação de Surdos: Introdução à Língua Brasileira de

Sinais. Maringá: EDUEM, 2012.

RIBEIRO, EdaAmorin. Curso Completo de signWriting. São Paulo; 2011. Apostila de Curso

Completo de no Centro Educacional Cultura Surda.

STUMPF, Marianne Rossi. Aprendizagem de Escrita de Língua de Sinais pelo Sistema -

SignWriting: Línguas de Sinais no Papel e no Computador. 2005. Tese (Doutorado) –

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.