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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA
PGR-MANIFESTAÇÃO-259758/2019N.º 489 /2018 – SFPOSTF/PGR
HABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO)PACIENTE: Hugo Alves PimentaIMPETRANTE: Glauber Soares MendesCOATOR(A): Relator do HC N. 496.937 do STJRELATOR: Ministro Marco Aurélio
Excelentíssimo Senhor Ministro Marco Aurélio,Egrégia Primeira Turma,
A Procuradora-Geral da República, com fundamento no artigo 317 do
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), vem interpor
AGRAVO REGIMENTAL
contra a r. decisão monocrática proferida nestes autos concessiva da medida liminar de habeas
corpus, na forma do art. 231-§4º-“e” do Regimento Interno do STF.
Pede-se a Vossa Excelência, desde já, que reconsidere a decisão agravada. Caso
contrário, que envie este pedido de reforma à Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal.
Gabinete da Procuradora-Geral da RepúblicaBrasília/DF
Documento assinado via Token digitalmente por PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE, em 26/08/2019 11:46. Para verificar a assinatura acesse
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA
I – BREVE RESUMO FÁTICO
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo advogado
Glauber Soares Mendes, em favor de Hugo Alves Pimenta, contra decisão proferida pelo
Presidente do STJ, João Otávio de Noronha, que, durante o plantão judiciário, denegou pedido
de reconsideração e novo pedido de liminar apresentado pela defesa em relação aos mesmos
fatos e fundamentos que foram indeferidos pelo Ministro Relator em decisão monocrática1.
Segundo a impetração, o paciente foi condenado à pena de 46 anos, 3 meses e 27
dias de reclusão pelo Juízo da 9ª Vara Federal de Belo Horizonte/MG, em regime inicial
fechado, após o Tribunal do Júri Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais reconhecer sua
participação no crime que ficou conhecido como a “Chacina de Unaí”, pela prática do delito
previsto no art. 121-§2º-I-IV-V (homicídio qualificado mediante paga ou promessa de
recompensa, emboscada, dissimulação e para assegurar a execução ou a impunidade de outro
crime) do Código Penal, por quatro vezes.
No âmbito desse processo, o paciente celebrou acordo de colaboração premiada
com o Ministério Público Federal, que foi homologado pelo Juízo da 9ª Vara Criminal Federal
de Belo Horizonte.
Aduz a impetração que a sentença consignou, expressamente, o direito de o
paciente recorrer em liberdade e aguardar o trânsito em julgado final para o início do
cumprimento da pena. Contra o referido decisum, o paciente opôs embargos de declaração.
Diante do desprovimento dos embargos de declaração, a defesa apelou ao Tribunal
Regional Federal da Primeira Região (TRF-1ª Região) “pedindo a extirpação do veredicto
popular, com fundamentos idôneos para tal, alicerçados nas preliminares de nulidade
arguidas, no acervo probatório coligido e, principalmente, no descumprimento dos termos do
Acordo de Colaboração Premiada celebrado. Alternativamente, pleiteou-se a redução da
reprimenda”.
O Ministério Público Federal e a assistência da acusação também se insurgiram
contra a sentença no tocante à não redução da pena imposta ao paciente, no patamar de 2/3,
em razão de previsão expressa no Acordo de Colaboração Premiada e tendo em vista que o
1 A referida decisão encontra-se disponibilizada no andamento processual do HC n. 496.937/MG, no sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça.HABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO) 2
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Conselho de Sentença reconheceu a efetividade da colaboração para a identificação dos
demais coatores.
Em 19/11/2018, a Quarta Turma do TRF- 1ª Região proveu parcialmente o apelo
do Paciente e reduziu sua pena para 31 anos e 6 meses de reclusão, mantendo-se inalterado
o dispositivo da sentença de que o paciente poderia aguardar o trânsito em julgado final do
decisum para iniciar o cumprimento da pena (acórdão publicado no e-DJF-1, de 1/2/2019).
Contra esta decisão colegiada, a defesa opôs embargos de declaração, em
5/2/2019.
Em seguida, impetrou, em 7/3/2019, o HC n. 496.937/MG no C. Superior
Tribunal de Justiça, por receio da imposição da aplicação imediata da pena, após o julgamento
dos embargos interpostos perante o TRF-1ª Região, em razão do entendimento daquele
Tribunal acerca da aplicação imediata da pena a réus condenados em segunda instância e que
têm o apelo desprovido naquele Tribunal (Portaria/CTUR4/N.01).
Em 08/03/2019, o Ministro Félix Fischer indeferiu o pedido liminar, nos seguintes
termos:
Inicialmente, vale registrar que o habeas corpus preventivo, na esteira do preconizadotanto pelo c. Supremo Tribunal Federal, quanto por esta Corte Superior de Justiça, não serevela pertinente quando inexistente situação de dano efetivo ou de risco potencial aodireito ambulatorial, fazendo-se necessária a comprovação, por meio de pré-constituiçãoprobatória, da concreta vulneração –atual ou iminente –“do jus manendi, ambulandi,eundi ultro citroque" do paciente, o que não ocorre na hipótese (STF-HC 97.119-AgR/DF, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello; HC 113.592/SP, SegundaTurma, Relª. Minª. Carmen Lúcia; STJ-RHC 65462/PR, Quinta Turma, Rel. Min.Felix Fischer; RHC 80843/PA, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares daFonseca; e RHC 63973/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas).
Não há como se vislumbrar, em uma análise meramente perfunctória, o fundado receiode ilegal constrangimento ante à possibilidade de imediata prisão do paciente.
O Plenário do col. Supremo Tribunal Federal evoluiu em seu entendimento e, pormaioria de votos, indeferiu o pedido formulado no HC n. 126.292/SP, de relatoria do em.Min. Teori Zavascki, decidindo pela possibilidade do início do cumprimento da penaapós o julgamento da apelação.
Deve-se ressaltar, ademais, que tal entendimento foi confirmado por ocasião dojulgamento das medidas cautelares nas ADCs n. 43 e 44.
Em outras palavras, está autorizada a execução provisória da pena, após esgotadas asvias recursais em segunda instância.
Ante o exposto, indefiro o pedido liminar. Grifos do original
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Considerando a data para julgamento dos embargos de declaração pelo TRF-1ª
Região para o dia 30/7/2019, o impetrante peticionou ao relator do habeas corpus em
15/7/2019, requerendo a concessão da tutela provisória incidental com a consequente
expedição do salvo conduto ao paciente. Em suas razões, alegou que o paciente estaria na
iminência de sofrer constrangimento ilegal decorrente da ordem de prisão que poderia ser
expedida logo após o julgamento dos embargos declaratórios pelo TRF – 1ª Região.
Em 18/7/2019, o pedido foi negado pelo Presidente do STJ (plantão judiciário),
Ministro João Otávio de Noronha, em razão de a liminar já ter sido analisada pelo relator, e
por entender caber a este a apreciação do pedido de reconsideração, após o término do recesso
forense.
Em seguida, apresentou este habeas corpus perante a Suprema Corte afirmando
ter direito adquirido para aguardar o trânsito em julgado final em liberdade, uma vez que a
parte da sentença que assim deliberou não foi objeto de recurso pelo Ministério Público
Federal.
Defende seja relativizado o alcance do enunciado da Súmula 691 do STF, por
entender se tratar de constrangimento ilegal, haja vista a alegada ausência de decisão do
Ministro Presidente sobre a cautelar incidental pleiteada nos autos do HC 496.937.
Sustenta que a decisão do magistrado a quo, que garantiu ao paciente o direito de
aguardar o trânsito em julgado final de sua sentença para iniciar seu cumprimento formou
coisa julgada em decorrência da preclusão operada com a não impugnação do ponto pelo
parquet.
Aduz que o paciente possui direito adquirido de aguardar o trânsito em julgado
final da decisão condenatória para iniciar o cumprimento de sua pena. Requer a concessão do
salvo conduto para que o paciente possa aguardar em liberdade, ao menos, o julgamento do
mérito das ADC's 43 e 44.
Em 14 de agosto de 2019, esta Relatoria deferiu a liminar deste writ para
suspender, até o desfecho da impetração, a execução provisória do título condenatório,
determinando a abstenção da expedição do mandado de prisão, ou, se já ocorrido, o seu
recolhimento, ou, ainda, se cumprido, a expedição de alvará de soltura a ser implementado
com as cautelas próprias, caso o paciente não esteja preso por motivo diverso do retratado no
processo nº 2004.38.00.036647-4, da Nona Vara Federal de Belo Horizonte/MG.
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Por último, destaco que na tramitação processual destes autos, conforme informa o
site do Supremo Tribunal Federal, há interposição de dois pedidos de extensão em relação a
outros pacientes, que ainda não aportaram nesta PGR.
É o relatório.
Com o devido acatamento, a decisão merece reforma, pois aplica entendimento
minoritário e contrário à orientação firmada em sede de repercussão geral pelo plenário.
II
II.1. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS QUE, SEGUNDO A JURISPRUDÊNCIA DO STF, AUTORIZAM A SUPERAÇÃO
DA SÚMULA 691-STF
O caso é de não conhecimento do habeas corpus impetrado.
A impetração esbarra no teor da Súmula n. 691 do STF, segundo a qual não
compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão
do relator que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar.
É que o ato apontado como coator é a decisão monocrática, da lavra do Ministro
do STJ Félix Fischer, que indeferiu o pedido liminar formulado nos autos do HC n.
496.937/MG. Nesta linha, centenas de precedentes do STF reafirmam a validade do enunciado
691 (HC 144537 AgR/SP, HC 138886 AgR/GO e HC 142997 AgR/PE).
A alegada modificação da decisão do Presidente do Superior Tribunal de Justiça,
durante o plantão judiciário, que indeferiu o pedido formulado pelo paciente, em 15/7/2019,
para a concessão da ordem, cujo despacho determinou sua publicação apenas em 2/8/2019,
não atende aos requisitos do enunciado da Súmula 691 do STF.
É que a liminar já havia sido indeferida pelo relator do habeas corpus
496.937/MG no STJ, em 12/3/2019. Nesta nova decisão, o Presidente da Corte delibera
pedido de reconsideração e um novo pedido de liminar apresentado pela defesa em relação aos
mesmos fatos e fundamentos que foram indeferidos pelo Ministro Relator em decisão
monocrática.
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O ponto fundamental da preliminar é o respeito ao devido processo legal. O
enunciado afirma que o Superior Tribunal de Justiça não exerceu sua jurisdição no Habeas
Corpus lá impetrado, apenas examinou o pedido de liminar. Enquanto o STJ não decidir o
pedido desse Habeas Corpus, não é possível excepcionar a jurisdição do Supremo Tribunal
Federal, que é pacífica sobre essa situação.
Busca-se, desse modo, obstar o conhecimento de causa mediante indevida
supressão de instância, situação que “ofende princípios fundamentais como o da hierarquia
dos graus de jurisdição e o da competência deles”2.
Portanto, a Súmula 691-STF também visa impedir sucessivas impetrações de
habeas corpus contra o indeferimento de medida liminar3, por entender que o STF não
poderia antecipadamente substituir as Cortes competentes e que ainda não julgaram
definitivamente o habeas corpus, o que acarreta violação ao princípio da hierarquia dos graus
de jurisdição e da competência.
Tampouco se trata de hipótese de superação do enunciado 691/STF, quando a
Suprema Corte entende cabível a concessão de habeas corpus contra decisão monocrática
que, também em habeas corpus, indefere pedido de liminar – sempre que se estiver diante
de decisão (que decreta ou mantém prisão) revestida de flagrante ilegalidade ou
teratologia4.
2 STF. HC 80631/RS, relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 06/04//2001.3 FERNANDES,Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7.ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2015.p. 568.4 1. À vista da Súmula 691 do STF, de regra não cabe ao Supremo Tribunal Federal conhecer dehabeas corpus impetrado contra decisão do relator pela qual, em habeas corpus, indefere pedidoliminar, sob pena de indevida supressão de instância, ressalvadas situações em que a decisãoimpugnada é teratológica, manifestamente ilegal ou abusiva, excepcionalidades não verificadas nocaso. 2. O conhecimento do pedido por esta Corte implicaria dupla supressão de instância, jáque acarretaria a deliberação de matéria que sequer foi objeto de apreciação pelo órgãocolegiado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o que não é admitido pela jurisprudênciado Supremo Tribunal Federal. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (HC 131320 AgR,Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 15/12/2015, DJe 5/2/2016 [ênfase acrescida]. I – A superação da Súmula 691 do STF constitui medida que somente se legitima quando a decisãoatacada se mostra teratológica, flagrantemente ilegal ou abusiva. II – No caso sob exame, a situação éexcepcional, apta a superar o entendimento sumular, diante do evidente constrangimento ilegal a queestá submetido o paciente. III – Passados quase três anos do recolhimento do paciente emestabelecimento prisional, o Estado não lhe garantiu o direito de cumprir a medida de segurançaestabelecida pelo juízo sentenciante. IV – Segundo consta no Relatório de Internações, emitido em11/10/2013 pela Vara de Execuções Criminais da Comarca de São Paulo, o paciente está na 698ªposição e permanece recolhido na Penitenciária de Franco da Rocha III. V – Diante da falta deestabelecimento adequado para internação, o paciente permaneceu custodiado por tempo superior aoque disposto pelo juízo sentenciante e não foi submetido ao tratamento médico determinado nodecreto condenatório, o que evidencia a manifesta ilegalidade apta a ensejar a concessão da ordem. VIHABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO) 6
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Certo é que o writ no STJ buscava um salvo conduto de eventual prisão para
execução da pena, que poderia ser decretada pelo TRF- 1ª Região após o julgamento dos
embargos de declaração.
Os embargos contra os quais o paciente menciona como fato ensejador do salvo
conduto deste writ foram rejeitados pelo TRF-1ª Região, em 30/7/2019, à unanimidade, nos
termos do voto do relator.
Relevante consignar que, em 8/8/2019, o paciente opôs novos embargos de
declaração, tendo os autos sido remetidos à Procuradoria Regional da República da 1ª Região
em 22/8/2019, para apresentação de contrarrazões.
A concessão desta liminar ocorreu em 14/8/2019, quando sequer havia sido
determinada a prisão do paciente.
Ademais, inexiste flagrante ilegalidade, abuso de poder ou contradição à
jurisprudência deste STF; ao contrário, o ato impugnado está em dissonância do entendimento
majoritário da Corte acerca da possibilidade de execução provisória da pena.
II.2. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA. JURISPRUDÊNCIA MAJORITÁRIA FIRMADA NO PLENO
Objetiva a impetração impedir a execução provisória da pena do paciente quando
se esgotar a jurisdição do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Ele foi condenado em
primeira instância, no crime que ficou conhecido como a “Chacina de Unaí”, pela prática do
delito capitulado no art. 121-§ 2º-I-IV-V (homicídio qualificado mediante paga ou promessa
de recompensa, emboscada, dissimulação e para assegurar a execução ou a impunidade de
outro crime) do Código Penal, por quatro vezes, e teve sua condenação confirmada e reduzida
pelo TRF-1ª Região, que proveu parcialmente a apelação da defesa para afastar a qualificadora
referente a emboscada.
O duplo grau de jurisdição ainda não se esgotou, pois há recurso pendente de
julgamento no âmbito daquela Corte Regional.
Os julgados lançados na decisão ora agravada para fundamentar a concessão do
habeas corpus de ofício revelam o posicionamento minoritário, já conhecido da Suprema
– Habeas corpus não conhecido. VII – Ordem concedida de ofício para confirmar a medida liminardeferida e determinar a inclusão do paciente em tratamento ambulatorial, sob a supervisão do juízo daexecução criminal. STF. HC 122670, relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma,julgado em 5/8/2014, DJe 14/8/2014 [ênfase acrescida].HABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO) 7
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Corte, dos Ministros que tiveram suas teses vencidas na decisão tomada pela maioria do
Plenário do STF, proferida no julgamento do HC 126.292/SP. Assim, o entendimento
majoritário e atual do STF é pela possibilidade da execução provisória da pena.
É fato notório que o Supremo Tribunal Federal mudou sua jurisprudência a partir
de fevereiro de 2016, quando o Plenário decidiu o HC n. 126.292/SP e declarou constitucional
a execução da pena após o esgotamento do duplo grau de jurisdição, ainda que pendentes de
julgamento recurso extraordinário ou recurso especial nos dois Tribunais Superiores.
Em seguida, em 05 de outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal reafirmou
esta decisão no julgamento de medidas cautelares nas Ações Declaratórias de
Constitucionalidade n. 43 e 44, ao entender que o artigo 283 do CPP não impede o início da
execução da pena após condenação em segunda instância e antes do trânsito em julgado da
ação penal.
Finalmente, em dezembro de 2016, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do
Recurso Extraordinário com Agravo n. 964.246/SP, com repercussão geral5 e efeito
cogente6, consolidou seu novo entendimento em acórdão assim ementado:
CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRINCÍPIOCONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (Constituição, ART.5º, LVII). ACÓRDÃO PENAL CONDENATÓRIO. EXECUÇÃOPROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. REPERCUSSÃO GERALRECONHECIDA. JURISPRUDÊNCIA REAFIRMADA.
1. Em regime de repercussão geral, fica reafirmada a jurisprudência do SupremoTribunal Federal no sentido de que a execução provisória de acórdão penalcondenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito a recurso especial ouextraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção deinocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal.
2. Recurso extraordinário a que se nega provimento, com o reconhecimento darepercussão geral do tema e a reafirmação da jurisprudência sobre a matéria.(destaques acrescidos)
5 Extrai-se do andamento processual, no site do STF:11/11/2016 - Reconhecida a repercussão geral e julgado o mérito com reafirmação de jurisprudência no PV.Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade,reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. No mérito, por maioria,reafirmou a jurisprudência dominante sobre a matéria, vencidos os Ministros Celso de Mello, Dias Toffoli,Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. Não se manifestou a Ministra Rosa Weber.6 Segundo Alexandre de Moraes, embora a decisão que resolve recurso extraordinário com repercussão geral nãotenha efeito vinculante (tal como a súmula vinculante), o entendimento da Suprema Corte em julgamento demérito de repercussão geral deverá ser observado em todas as instâncias judiciais, senão o STF cassará oureformará, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada (MORAES, de Alexandre. DireitoConstitucional. 21ª edição. São Paulo: Atlas, 2007, p. 542.).HABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO) 8
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Decisões judiciais impugnáveis por recursos não dotados de efeito suspensivo ex
lege produzem efeitos desde a sua publicação. Isso significa que a produção dos efeitos de
decisões que estejam nessa situação não fica condicionada a qualquer evento posterior,
como a própria interposição do recurso, e, muito menos, à admissão destes. Tais decisões
já operam seus efeitos de modo pleno, e apenas deixam de fazê-lo caso lhes sobrevenha
decisão concedendo, de modo expresso, efeito suspensivo ao recurso contra elas interposto.
A propósito, destaco que essa Suprema Corte sedimentou a compatibilidade com
a Constituição Federal, mais precisamente com o princípio da presunção de inocência previsto
no seu artigo 5º, inc. LVII das normas infraconstitucionais que preveem que os recursos
extremos em matéria criminal (recursos especial e extraordinário) não possuem o chamado
“efeito suspensivo”: isso significa, em outras palavras, que eles não impedem a produção dos
efeitos próprios e naturais dos acórdãos condenatórios, não impedindo, consequentemente, o
cumprimento imediato da pena por eles impostas.7
A compatibilidade da execução provisória da pena com o ordenamento jurídico-
constitucional pátrio já foi, de forma reiterada, reafirmada pelo Colegiado do STF e não há,
nas razões recursais apresentadas, situação que possa justificar uma distinção em relação que
já foi decidido pelo órgão colegiado.
A decisão impugnada contraria a orientação jurisprudencial majoritária da
Suprema Corte, que hoje prevalece e, qualquer decisão que vá de encontro aos acórdãos
paradigmas, notadamente do acórdão prolatado no Recurso Extraordinário com Agravo n.
964.246/SP, com repercussão geral, contraria, frontalmente, o princípio da colegialidade.
Esta decisão monocrática pauta-se em entendimento jurídico que não prevalece na
Suprema Corte, vencido no colegiado do STF.
As demais situações apresentadas no decisum objeto deste recurso como
“possibilidades de antecipação da execução da pena” também derivam de fundamentação
jurídica que pauta o entendimento do Relator destes autos e não o da Corte ao decidir que, em
qualquer situação, havendo condenação em segundo grau de jurisdição, a execução provisória
da pena é a regra a ser observada.
7 ADC 43 MC, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN,Tribunal Pleno, julgado em 05/10/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-043 DIVULG 06-03-2018PUBLIC 07-03-2018
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Não se imagina que, a cada novo argumento defensivo ou de evolução do
entendimento jurídico sobre o tema de um dos integrantes da Corte, o Colegiado tenha que se
debruçar novamente sobre o assunto para restabelecer e reafirmar o que já está consolidado
em três recentes e sucessivos julgamentos.
O princípio da colegialidade nada mais é do que o fundamento de validade e de
força das decisões dos órgãos colegiados, nos quais, assim como na democracia, prevalecerá o
entendimento majoritário segundo as regras de votação preestabelecidas, ou seja, maioria
simples ou qualificada.
Esse princípio não é absoluto e enseja exceção nas situações previstas na
legislação processual e que permitem decisões monocráticas do relator quando a matéria tenha
jurisprudência consolidada do tribunal, sumulada ou não.
Na essência do tema, não há exceção ao princípio da colegialidade, pois ao
Relator é permitido decidir monocraticamente nas hipóteses já discutidas pelo Tribunal e de
acordo com a orientação prevalente da jurisprudência.
Nesta linha, destaco precedente da Relatoria do Ministro Celso de Mello e que
traduz, com precisão, as situações de cabimento de decisão monocrática de Relator:
“Registro, preliminarmente, por necessário, que o Supremo Tribunal Federal,
mediante edição da Emenda Regimental nº 30, de 29 de maio de 2009, delegou
expressa competência ao Relator da causa, para, em sede de julgamento
monocrático, denegar ou conceder a ordem de “habeas corpus”, “ainda que de
ofício”, desde que a matéria versada no “writ” em questão constitua “objeto de
jurisprudência consolidada do Tribunal” (RISTF, art. 192, “caput”, na redação
dada pela ER nº 30/2009).
Ao assim proceder, fazendo-o mediante interna delegação de atribuições
jurisdicionais, esta Suprema Corte, atenta às exigências de celeridade e de
racionalização do processo decisório, limitou-se a reafirmar princípio
consagrado em nosso ordenamento positivo (RISTF, art. 21, § 1º; Lei nº
8.038/90, art. 38; CPC, art. 557) que autoriza o Relator da causa a decidir,
monocraticamente, o litígio, sempre que este referir-se a tema já definido em
“jurisprudência dominante” no Supremo Tribunal Federal.
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Nem se alegue que essa orientação implicaria transgressão ao princípio da
colegialidade, eis que o postulado em questão sempre restará preservado ante a
possibilidade de submissão da decisão singular ao controle recursal dos órgãos
colegiados no âmbito do Supremo Tribunal Federal, consoante esta Corte tem
reiteradamente proclamado (RTJ 181/1133-1134, Rel. Min. CARLOS
VELLOSO – AI 159.892-AgR/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).”
Não obstante o claro entendimento da maioria desta Suprema Corte quanto à
possibilidade de execução provisória da pena após o julgamento em segundo grau de
jurisdição, constantes e reiteradas inovações a esse julgado, de forma monocrática ou por uma
maioria de votos que, no colegiado, foram vencidos quanto ao tema, têm obstado a aplicação
desse precedente a determinados réus que se enquadram nos julgados paradigmas.
Esta situação de insurgência à decisão do colegiado, além de contribuir para o
enfraquecimento da autoridade da Suprema Corte como ápice do sistema de justiça brasileiro,
cujos precedentes, sobretudo aqueles adotados em sede de repercussão geral, devem orientar a
posição dos órgãos judiciais inferiores, também é fator de insegurança jurídica na população
que vê a aplicação de critérios diferentes para a mesma situação jurídica.
No caso em análise, em se tratando a pretensão do HC justamente a suspensão
prévia de possível determinação do TRF-1ª Região para cumprimento provisório da pena tão
logo esgotadas as vias recursais ordinárias (que ocorrerá com o julgamento dos segundos
embargos de declaração), o acórdão condenatório do TRF-1ª Região deve ser cumprido, ou
seja, as penas de prisão nele previstas devem ser executadas, nos exatos termos do que
decidido nos precedentes que o STF emanou sobre o tema, um deles, inclusive, dotado de
efeito erga omnes vinculante (a saber, o vinculado ao ARE n. 964.246/SP). Não fazê-lo
representa afronta aos precedentes desta Suprema Corte e à autoridade do que restou decidido.
Assim, não se extrai dos argumentos da defesa qualquer razão que justifique
que o cumprimento das penas de prisão impostas aos pacientes pelo acórdão do TRF-1
somente ocorra após o encerramento da persecução penal, tal como defende a parte
impetrante, pretendendo repristinar orientação jurisprudencial já superada.
Exigir o trânsito em julgado após o terceiro ou quarto grau de jurisdição para, só
então, autorizar a prisão de réu condenado, é medida inconstitucional, injusta e errada.
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Também favorece a impunidade e põe em descrédito a justiça brasileira, por perda de
confiança da população em um sistema em que, por uma combinação de normas e fatores
jurídicos, a lei deixa de valer para todos.
O Ministro Luiz Fux, no julgamento do HC n. 126.292/SP, afirmou:
“(...) E, como hoje, efetivamente, essa presunção de inocência não corresponde maisàquilo que se denomina de sentimento constitucional, eu colho da obra da professoraPatrícia Perrone Campos Mello, sobre precedentes, que, às vezes, é fundamental oabandono dos precedentes em virtude da incongruência sistêmica ou social. E, aqui, citoum trecho que eu também repisei no voto da "Ficha Limpa", quando se alegavapresunção de inocência irradiando-se para o campo eleitoral. Aqui, eu trago um textomuito interessante dessa eminente doutrinadora da nossa Universidade. Então afirma ela:
'[…] A incongruência social alude a uma relação de incompatibilidade entre asnormas jurídicas e os standards sociais; corresponde a um vínculo negativo entreas decisões judiciais e as expectativas dos cidadãos.'
Por outro lado, Konrad Hesse, na sua obra sobre 'A Força Normativa da Constituição',com tradução escorreita do eminente Ministro Gilmar Mendes, na obra da Fabris Editor,afirmou:
'[...] Quanto mais o conteúdo de uma Constituição lograr corresponder à naturezasingular do presente, tanto mais seguro há de ser o desenvolvimento de sua forçanormativa.'”
O disseminado sentimento de injustiça, causador de descrédito na Justiça, foi
considerado pelo Plenário do STF no julgamento do ARE 964246 (e dos processos que o
precederam), à luz da Constituição de 1988. A Corte deliberou considerando a expectativa
social de receber a proteção do Direito. Em julgamento histórico, decidiu que o princípio
constitucional da presunção da inocência não impede o início do cumprimento da pena de
prisão após o esgotamento do duplo grau de jurisdição pela decisão do tribunal de apelação e
antes do trânsito em julgado da condenação.
Os fundamentos daqueles precedentes continuam congruentes socialmente e
consistentes sistemicamente. São coerentes com a Constituição e a presunção de inocência.
Conferem as condições necessárias para o precedente ser mantido.
Revogá-los ou alterá-los, mesmo diante de todos os fundamentos jurídicos que o
sustentam, representaria triplo retrocesso, sobretudo por meio de decisão monocrática ou
pautada em entendimento vencido na Corte:
(i) para o sistema de precedentes do sistema jurídico brasileiro, que, diante de julgadovinculante revogado menos de dois anos após a sua edição, perderia estabilidade eseriedade;
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(ii) para a persecução penal no país, que voltaria ao cenário do passado, de baixaefetividade, sempre ameaçada por processos penais infindáveis, recursos protelatórios epenas prescritas;
(iii) para a confiança e credibilidade na Justiça, porque haveria restauração da sensaçãode impunidade que vigorava antes do julgamento do ARE n. 964.246/SP.
A concessão da liminar do presente writ contraria a jurisprudência dessa Suprema
Corte, ao objetivar afastar a liminar do Superior Tribunal de Justiça, no Habeas Corpus nº.
496.937/MG esta, sim, compatível com o decidido no HC 126.292/SP, com o indeferimento
das medidas cautelares nas Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44 e com o
julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo 964.246/SP.
Com a devida vênia, a decisão monocrática que concedeu a liminar não observou
a jurisprudência Plenária do STF e adotou posição minoritária, de modo a promover,
simultaneamente, supressão de instância, com inobservância da posição colegiada firmada a
respeito da questão, estabelecendo um novo momento em que se pode promover a execução
provisória do julgado (encerramento da jurisdição do Superior Tribunal de Justiça),
O início da execução da condenação, com a prisão dos pacientes, deve ocorrer
logo após o encerramento da jurisdição do Tribunal Regional Federal da 1a Região, com o
julgamento do recurso ali interposto pela defesa. Após o esgotamento da jurisdição da Corte
de revisão, haverá o início da execução da pena aplicada, como efeito imediato decorrente do
acórdão condenatório.
II. 3. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS
A fundamentação da defesa volta-se ao fato de o juízo de primeiro grau ter
assegurado ao paciente o direito genérico de recorrer em liberdade, ao condicionar o
cumprimento da sentença ao trânsito em julgado da condenação.
Defende que eventual determinação do Tribunal Regional Federal da 1ª Região –
ainda inexistente diante da oposição dos segundos embargos de declaração pela defesa - de
expedição de mandado de prisão em desfavor do paciente após o exaurimento das vias
recursais ordinárias importaria em reformatio in pejus, ferindo a legislação processual penal
vigente (art. 617 do CPP).
Tal entendimento é equivocado e não merece acolhimento.
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A execução provisória da pena não viola direitos fundamentais do réu, uma vez
que exaurida, com a instância ordinária, a discussão jurídica acerca do crime (autoria,
materialidade e culpabilidade do acusado) eventuais recursos aos Tribunais Superiores, sem
efeito suspensivo, gravitam em torno de questões de direito e não probatórias.
O fato de a sentença ter assegurado ao paciente o direito de recorrer em liberdade
e de ser preso somente após o trânsito em julgado do decisum, não pode vincular, de maneira
nenhuma, as instâncias superiores, de modo que a garantia ao recurso em liberdade cessa com
o julgamento da apelação.
O direito de o réu permanecer solto durante apenas a tramitação dos recursos
ordinários encontra lastro na legislação pátria (art. 5978 c/c art. 6379 do CPP e art. 995
CPC10), de modo que esgotadas as instâncias ordinárias, e preclusa a questão fática, inexiste
ilegalidade em dar início à execução provisória da pena, providência plenamente compatível
com a presunção de inocência.
Assim, futura determinação da execução provisória da pena não viola o princípio
do ne reformatio in pejus, porque não houve piora na situação do paciente, mas tão somente a
determinação de cumprimento de determinação judicial decorrente da condenação penal já
submetida ao duplo grau de jurisdição.
Ademais, a decisão do juízo de primeiro grau de garantir a liberdade ao paciente
até o trânsito em julgado da condenação foi tomada em momento anterior ao atual
entendimento da Suprema Corte (HC 126.292/MG, ADC 43 e 44 e ARE 964.246-RG/SP,
que teve repercussão geral reconhecida, Tema 925) e com ela não entra em conflito, e
nem tampouco pode impedir a eficácia do que foi decidido pelo Pleno do STF.
É que a novel orientação do STF possui índole processual, cuja aplicação é
imediata, como bem salientou o Ministro Roberto Barroso em voto proferido no habeas
corpus nº 135.567/SP (Dje 16.3.2017): “Tal como consignado pelo Ministro Teori Zavascki,
8 Art. 597. A apelação de sentença condenatória terá efeito suspensivo, salvo o disposto no art. 393, aaplicação provisória de interdições de direitos e de medidas de segurança (arts. 374 e 378), e o casode suspensão condicional de pena.9 Art. 637. CPP. O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e uma vez arrazoados pelorecorrido os autos do traslado, os originais baixarão à primeira instância, para a execução da sentença.10 Art. 995 CPC. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisãojudicial em sentido diverso.Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se daimediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, eficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.HABEAS CORPUS 173.741/MG (ELETRÔNICO) 14
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no julgamento do ARE 964.246, em sede de repercussão geral, 'a decisão no HC 126.292 não
representou aplicação retroativa de norma penal mais gravosa, mas apenas entendimento
relativo à dinâmica processual de execução das penas privativas de liberdade, proveniente de
interpretação sistemática da ordem constitucional vigente...'”.
Diante disso, à época em que proferida a sentença que determinara a
expedição de mandado de prisão somente após o trânsito em julgado da condenação
prevalecia na jurisprudência a impossibilidade da execução provisória da pena, de modo
que se existisse eventual recurso da acusação – tal como argúi a defesa para justificar a
peculiaridade do caso a incidir a inexistente reformatio in pejus - sequer seria admitido
naquela oportunidade.
Outrossim, há diversos precedentes do Supremo Tribunal Federal que entendem
pela existência de sintonia entre a execução provisória da pena e o princípio da vedação da
reformatio in pejus.
Nesse sentido:
“4. A execução provisória da pena coaduna com o princípio da vedação dareformatio in pejus, quando mantida a condenação do paciente pela Corte local,porquanto a constrição da liberdade, neste momento processual, fundamenta-se naausência de efeito suspensivo dos recursos extraordinário e especial, no restritoespectro de congnoscibilidade desses mecanismos de impugnação, bem como naatividade judicante desempenhada pelas instâncias ordinárias” (HC 154.976AgR,Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 25/5/2018, DJe-115 de12/6/2018. No mesmo sentido: HC 148.018 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, PrimeiraTurma, julgado em 27/10/2017, DJe-261 de 17/11/2017)
“3. Não se qualifica como ilegal ou abusivo o ato cujo conteúdo é compatível coma compreensão do Supremo Tribunal Federal, sobretudo quando se trata dejurisprudência dominante ao tempo em que proferida a decisão impugnada.
4. Independentemente do caráter vinculante ou não dos precedentes, emanadosdesta Suprema Corte, que admitem a execução provisória da pena, não configuraconstrangimento ilegal a decisão que se alinha a esse posicionamento, forte nonecessário comprometimento do Estado-Juiz, decorrente de um sistema deprecedentes, voltado a conferir cognoscibilidade, estabilidade e uniformidade àjurisprudência.
5. O implemento da execução provisória da pena atua como desdobramentonatural da perfectibilização da condenação sedimentada na seara das instânciasordinárias e do cabimento, em tese, tão somente de recursos despidos deautomática eficácia suspensiva, sendo que, assim como ocorre na deflagração daexecução definitiva, não se exige motivação particularizada ou de índole cautelar.
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6. A execução penal é regida por critérios de oficialidade (art. 195, Lei n.7.210/84), de modo que sua inauguração não desafia pedido expresso da acusação.7. Não configura reforma prejudicial a determinação de início documprimento da pena, mesmo se existente comando sentencial anterior queassegure ao acusado, genericamente, o direito de recorrer em liberdade.” (HC152.752, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 4/4/2018, DJe-127de 27/6/2018). Grifos acrescentados
“A deliberação do magistrado de primeira instância, que condiciona a expediçãodo mandado de prisão ao prévio trânsito em julgado da condenação penal, emboragaranta ao réu o direito de apelar em liberdade contra a sentença, não vincula osTribunais incumbidos de julgar os recursos ordinários ou extraordinárioseventualmente deduzidos pelo sentenciado. O Tribunal ad quem, emconsequência, pode ordenar, em sede recursal, a prisão do condenado, quandoimprovido o recurso por este interposto. O acórdão do Tribunal ad quem - porquesubstitui a sentença recorrida no que tiver sido objeto de impugnação recursal - fazcessar, uma vez negado provimento ao recurso da defesa, a eficácia da decisão deprimeiro grau no ponto em que esta assegurou ao sentenciado o direito de recorrerem liberdade” (HC nº 72.610/MG, Primeira Turma, rel. Min. Celso de Mello, DJe06.9.1996).
Como defendi no Parecer Nº 56/2018-SFCONST/PGR nas ADCs nº 43 e 44, a
Constituição não exige o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Apenas exige o
duplo grau de jurisdição como garantia da presunção de inocência. Este é o princípio
básico do referido precedente vinculante. Exigir o trânsito em julgado após o terceiro ou
quarto grau de jurisdição para, só então, autorizar a prisão do réu condenado é medida
inconstitucional, injusta e errada.
O sistema recursal brasileiro, ao permitir a interposição sucessiva de uma
infinidade de recursos e outros mecanismos de impugnação da condenação, possibilita que o
momento do trânsito em julgado da decisão condenatória se protraia no tempo de modo quase
infinito, a depender da disposição da defesa de recorrer.
Neste modelo recursal, a exigência – consectária da vedação da execução
provisória da pena - de se aguardar o trânsito em julgado da condenação para, só então,
executar-se o acórdão que determina a prisão do réu, conduz quase que inevitavelmente a duas
consequências: ou a prisão do réu condenado (por ter de aguardar o trânsito em julgado)
ocorre anos ou décadas após a prática do crime; ou nem ocorre por causa da prescrição da
pretensão punitiva ou executória”.
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II.4. SOBRE OS PEDIDOS DE EXTENSÃO DO HABEAS CORPUS
Diante dos fundamentos acima, que conduzem à reforma da decisão agravada,
requer-se sejam indeferidos os pedidos de extensão apresentados a essa d. Relatoria.
III – CONCLUSÃO
Ante o exposto, a Procuradora-Geral da República requer:
a) seja reconsiderada a decisão agravada, para reestabelecer o julgamento plenário
do Superior Tribunal de Justiça, no Habeas Corpus nº. 496.937/MG;
b) não se reconsiderando, o provimento deste agravo regimental pela 1a Turma do
STF, no sentido de reformar a decisão agravada e não conhecer, colegiadamente,
a impetração, por afronta ao enunciado nº 691/STF;
c) caso conhecido o writ, seja provido o agravo para, a um só tempo, denegar a
ordem pretendida, sendo facultado às instâncias ordinárias a execução da pena,
independentemente de eventuais recursos excepcionais ao STJ ou STF,
restabelecendo o entendimento firmado no HC 126.292/SP (17/2/2016), nas
Ações Declaratórias de Constitucionalidade 43 e 44 e no julgamento do ARE
964246, de repercussão geral reconhecida; e
d) seja indeferido o pedido de extensão em relação a outros pacientes, ante os
fundamentos expostos e pela relação de prejudicialidade verificada.
Brasília, 26 de agosto de 2019.
Raquel Elias Ferreira DodgeProcuradora-Geral da República
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