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Indaial – 2021 HARMONIA E CONTRAPONTO Prof. Alexandre Gonçalves Prof a . Marcela Rohsbacker Gonzalez Soldatelli Prof. Thales de Godoi Nunes 1 a Edição

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Indaial – 2021

Harmonia e Contraponto

Prof. Alexandre GonçalvesProfa. Marcela Rohsbacker Gonzalez SoldatelliProf. Thales de Godoi Nunes

1a Edição

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Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:

Prof. Alexandre Gonçalves

Profᵃ. Marcela Rohsbacker Gonzalez Soldatelli

Prof. Thales de Godoi Nunes

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

Impresso por:

G635h

Gonçalves, Alexandre

Harmonia e contraponto. / Alexandre Gonçalves; Marcela Rohsbacker Gonzalez Soldatelli; Thales de Godoi Nunes. – Indaial: UNIASSELVI, 2021.

190 p.; il.

ISBN 978-65-5663-468-5ISBN Digital 978-65-5663-469-2

1. Música - Instrução e estudo. - Brasil. I. Gonçalves, Alexandre. II. Soldatelli, Marcela Rohsbacker Gonzalez. III. Nunes, Thales de Godoi. IV. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.

CDD 781.42

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apresentaçãoPrezado acadêmico, seja bem-vindo à disciplina Harmonia e

Contraponto! O estudo desses elementos é muito importante para a compreensão da sintaxe musical. Os conhecimentos adquiridos a partir desses conteúdos poderão ser aplicados em outras disciplinas, como Arranjo, Composição, Regência de Coro ou Orquestra etc.

O estudo e a aplicação da Harmonia e do Contraponto se tornam ferramentas indispensáveis ao licenciado em Música, uma vez que servirão de apoio em muitas atividades pedagógicas, especialmente, em sala de aula. Você poderá perceber a importância e a aplicabilidade dos conceitos e das estruturas harmônicas e contrapontísticas quando estiver elaborando arranjos para as turmas, ou compondo atividades musicais específicas. Perceberá, ainda, como a Harmonia e o Contraponto funcionam na prática, quando realizar algum acompanhamento harmônico para alguma atividade tocada ou cantada pelos alunos.

Este livro está organizado em três unidades. Na Unidade 1, abordaremos os conteúdos relacionados à harmonia. Estudaremos a construção/formação de acordes (tríades e tétrades, inversões, distribuição das vozes e os campos harmônicos maiores e menores), encadeamentos dos acordes, tonalidades, modulação, introdução à análise harmônica e harmonização de melodias.

Na Unidade 2, estudaremos os fundamentos do contraponto, a origem, os principais conceitos e a evolução da escrita contrapontística. Observaremos escalas modais, cadências e transposição dos modos, além dos tipos de movimentos melódicos na prática do contraponto, e que geram qualidade da estrutura melódica.

Na Unidade 3, aprenderemos o contraponto a duas e a três vozes. Estudaremos as cinco espécies do contraponto, uma metodologia que organiza o estudo do contraponto de forma gradativa. Veremos, também, um pouco do estilo imitativo, da invenção a três vozes e da fuga. Por fim, compreenderemos a aplicabilidade de conceitos-chave do contraponto na educação musical. Para ampliar o aprendizado, realize sempre os exercícios propostos. Eles serão acompanhados de um gabarito, para facilitar a compreensão e o consequente aprendizado.

Bons estudos!

Profa. Marcela Rohsbacker Gonzalez SoldatelliProf. Thales de Godoi NunesProf. Alexandre Gonçalves

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Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi-dades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra-mação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida-de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun-to em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

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Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen-tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!

LEMBRETE

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sumário

UNIDADE 1 — HARMONIA ............................................................................................................... 1

TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES ............... 31 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 32 AS TRÍADES ......................................................................................................................................... 3

2.1 FORMAÇÃO DAS TRÍADES ........................................................................................................ 42.2 ACORDES TRÍADES: NOMENCLATURA E CIFRAGEM ....................................................... 62.3 INVERSÃO DAS TRÍADES ........................................................................................................... 8

3 DISTRIBUIÇÃO DAS VOZES ........................................................................................................ 103.1 DUPLICAÇÃO/DOBRAMENTO DE VOZES ......................................................................... 103.2 POSIÇÃO DAS VOZES DO ACORDE ..................................................................................... 11

4 TRÍADES DA ESCALA .................................................................................................................... 124.1 CAMPO HARMÔNICO MAIOR .............................................................................................. 124.2 CAMPO HARMÔNICO MENOR ............................................................................................. 13

RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 15AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 16

TÓPICO 2 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES ......................... 191 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 192 AS TÉTRADES ................................................................................................................................... 19

2.1 FORMAÇÃO DOS ACORDES DE 4 SONS .............................................................................. 202.2 INVERSÃO DAS TÉTRADES .................................................................................................... 222.3 CLASSIFICAÇÃO DOS ACORDES DE SÉTIMA .................................................................... 232.4 ACORDE DE 7ª DA DOMINANTE .......................................................................................... 23

3 ENCADEAMENTOS ......................................................................................................................... 243.1 DE GRAUS DISJUNTOS ............................................................................................................. 263.2 DE GRAUS CONJUNTOS ........................................................................................................... 26

RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 28AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 29

TÓPICO 3 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES ................ 311 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 312 TONALIDADES E CADÊNCIAS ................................................................................................... 31

2.1 FUNÇÕES TONAIS ...................................................................................................................... 322.2 ALTERAÇÕES ............................................................................................................................... 33

3 MODULAÇÃO ................................................................................................................................... 39RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 41AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 42

TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS ............................................................................................................ 431 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 432 REPRESENTAÇÃO DOS GRAUS DA ESCALA E CAMPO HARMÔNICO ........................ 43

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2.1 CIFRAS ........................................................................................................................................... 452.2 PRINCIPAIS CADÊNCIAS .......................................................................................................... 46

3 NOTAS AUXILIARES ....................................................................................................................... 494 SOBRE ANÁLISE HARMÔNICA .................................................................................................. 535 HARMONIZANDO MELODIAS ................................................................................................... 54LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 56RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 60AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 61

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 63

UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO .................................... 65

TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL .......................... 671 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 672 O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL ......................................... 67

2.1 ORGANUM ................................................................................................................................... 692.1.1 Organum paralelo ................................................................................................................ 702.1.2 Organum livre ...................................................................................................................... 702.1.3 Organum melismático ......................................................................................................... 712.1.4 Organum em Notre Dame ................................................................................................... 72

2.2 ARS NOVA .................................................................................................................................... 742.3 O RENASCIMENTO ................................................................................................................... 762.4 OS PERÍODOS BARROCO, CLÁSSICO E ROMÂNTICO ...................................................... 792.5 SÉCULO XX ................................................................................................................................... 81

3 ELEMENTOS DO CONTRAPONTO MUSICAL ....................................................................... 823.1 CANTUS FIRMUS ......................................................................................................................... 823.2 VOX PRINCIPALIS E VOX ORGANALIS .................................................................................. 843.3 CONSONÂNCIAS E DISSONÂNCIAS .................................................................................... 85

RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 87AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 88

TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS ....................................................................................... 911 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 912 AS ESCALAS MODAIS ................................................................................................................... 91

2.1 AS SETE ESCALAS PRINCIPAIS .............................................................................................. 932.1.1 Jônio ...................................................................................................................................... 932.1.2 Dórico .................................................................................................................................... 942.1.3 Frígio ...................................................................................................................................... 942.1.4 Lídio ....................................................................................................................................... 942.1.5 Mixolídio ............................................................................................................................... 952.1.6 Eólio ....................................................................................................................................... 952.1.7 Lócrio ..................................................................................................................................... 96

2.2 CARACTERÍSTICAS DE CADA ESCALA MODAL ............................................................. 1003 MÚSICA FICTA ............................................................................................................................... 103

3.1 CADÊNCIA ................................................................................................................................ 1043.2 TRANSPOSIÇÃO ........................................................................................................................ 105

RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 109AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 110

TÓPICO 3 — CONDUÇÃO MELÓDICA ...................................................................................... 1131 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 113

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2 CONDUÇÃO MELÓDICA ............................................................................................................ 1132.1 MOVIMENTO PARALELO ...................................................................................................... 1142.2 MOVIMENTO DIRETO ............................................................................................................. 1142.3 MOVIMENTO CONTRÁRIO ................................................................................................... 1152.4 MOVIMENTO OBLÍQUO ......................................................................................................... 115

3 TERMOS MAIS UTILIZADOS NA PRÁTICA DE CONTRAPONTO .................................... 115LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 118RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 123AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 124

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 126

UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES ............................................... 127

TÓPICO 1 — CARACTERÍSTICAS GERAIS ............................................................................... 1291 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1292 CARACTERÍSTICAS GERAIS .................................................................................................... 1303 O ESTUDO DO CONTRAPONTO POR ESPÉCIES ................................................................ 131

3.1 PRIMEIRA ESPÉCIE ................................................................................................................... 1313.2 SEGUNDA ESPÉCIE ................................................................................................................. 1313.3 TERCEIRA ESPÉCIE .................................................................................................................. 1323.4 QUARTA ESPÉCIE ..................................................................................................................... 1323.5 QUINTA ESPÉCIE ...................................................................................................................... 132

4 RECONHECENDO AS ESPÉCIES DE CONTRAPONTO ..................................................... 132RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 135AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 136

TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES ............................................ 1391 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1392 PRIMEIRA ESPÉCIE ...................................................................................................................... 140

2.1 NORMAS ..................................................................................................................................... 1402.2 EXERCÍCIOS ................................................................................................................................ 143

3 SEGUNDA ESPÉCIE ...................................................................................................................... 1443.1 NORMAS .................................................................................................................................... 1453.2 EXERCÍCIOS ............................................................................................................................... 147

4 TERCEIRA ESPÉCIE ...................................................................................................................... 1494.1 NORMAS .................................................................................................................................... 1494.2 EXERCÍCIOS ............................................................................................................................... 150

5 QUARTA ESPÉCIE ......................................................................................................................... 1525.1 NORMAS .................................................................................................................................... 1525.2 EXERCÍCIOS ................................................................................................................................ 153

6 QUINTA ESPÉCIE .......................................................................................................................... 1556.1 NORMAS .................................................................................................................................... 1556.2 EXERCÍCIOS ............................................................................................................................... 155

RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 158AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 159

TÓPICO 3 — CONTRAPONTO A TRÊS VOZES ........................................................................ 1611 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1612 OBRAS CURTAS A TRÊS VOZES .............................................................................................. 1613 IMITAÇÃO ....................................................................................................................................... 1644 INVENÇÃO A TRÊS VOZES ....................................................................................................... 165

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5 FUGA ................................................................................................................................................. 166RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 169AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 170

TÓPICO 4 — ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA EDUCAÇÃO MUSICAL .............. 1731 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1732 CONCEITOS GERAIS APLICADOS À EDUCAÇÃO MUSICAL ........................................ 173

2.1 MONODIA .................................................................................................................................. 1752.2 POLIFONIA ................................................................................................................................. 1762.3 HOMOFONIA E SIMULTANEIDADE .................................................................................... 176

3 IMITAÇÃO E CÂNONE ................................................................................................................ 177LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 179RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 184AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 185

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 189

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UNIDADE 1 —

HARMONIA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender a formação dos acordes de três e de quatro sons, além das grafias;

• analisar os acordes e as funções harmônicas dentro dos campos harmô-nicos maior e menor;

• encadear acordes, utilizando inversões e as escrevendo a quatro vozes;• harmonizar melodias, utilizando acordes de dentro e de fora dos cam-

pos harmônicos maior e menor.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

TÓPICO 2 – ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

TÓPICO 3 – ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES

TÓPICO 4 – INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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TÓPICO 1 — UNIDADE 1

ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE

ACORDES TRÍADES

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos os conceitos e as estruturas que são a base para o entendimento e o estudo da Harmonia. Este tópico está dividido em três eixos: a formação de tríades (acordes de três sons), a distribuição das vozes (como escrevemos as notas dos acordes no pentagrama) e as tríades da escala (formação dos campos harmônicos maiores e menores).

O primeiro eixo tratará da formação dos acordes de três sons e das inversões, além da maneira de cifragem (grafia sintetizada das notas de um acorde, utilizando letras ou números romanos) desses acordes. O segundo eixo tratará das possibilidades de duplicação/dobramento de notas de uma tríade quando escrevemos a harmonia em textura coral a quatro vozes e como posicionar as notas do acorde no pentagrama, escrevendo para a textura coral. O terceiro eixo tratará da construção dos campos harmônicos maior e menor, das características principais de cada campo e das formas de cifragem dos acordes.

Após este estudo, estaremos aptos a compreender como ocorre a relação entre os acordes, encadeamento, criando estruturas maiores e relacionadas.

2 AS TRÍADES

O estudo de harmonia que faremos estará embasado no sistema tonal, sistema este que está estruturado sobre as escalas maiores e as escalas menores. A escala pode ser entendida como uma sequência de sete notas musicais, dispostas por graus conjuntos, e que segue uma ordem de tons e de semitons específica. Sobre cada uma das notas da escala, também chamadas de graus da escala, podemos construir um acorde. O conjunto desses sete acordes, na mesma quantidade de notas/graus da escala, forma o campo harmônico dessa escala.

Acorde é definido como o conjunto de três ou de mais notas, que podem ser executadas simultaneamente ou na forma arpejada (nota após nota). Um acorde de três sons é denominado de tríade, enquanto um acorde de quatro sons é denominado de tétrade, e assim sucessivamente.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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2.1 FORMAÇÃO DAS TRÍADES

As tríades podem ser consideradas a estrutura harmônica mais simples de um acorde. Vale lembrar que apenas duas notas não podem formar um acorde, uma vez que apenas duas notas formam um intervalo musical.

Como vimos, para formar um acorde, é necessária a sobreposição de, no mínimo, três notas. Essas três notas devem estar em intervalos de terças. A nota mais grave é chamada de fundamental, a segunda nota é a terça do acorde, e a terceira nota é a quinta do acorde. De acordo com Schoenberg (1999), podemos obter quatro combinações possíveis: o acorde perfeito maior, o acorde perfeito menor, o acorde de quinta diminuta e o acorde de quinta aumentada.

FIGURA 1 – ACORDES DE TRÊS SONS - TRÍADES

Para construir um acorde, devemos lembrar que:

a) precisamos de, no mínimo, três notas; b) essas notas devem estar sobrepostas, e em intervalos de terças;c) a distância entre a primeira e a terceira nota de um acorde maior ou menor

forma um intervalo de 5a justa, conforme mostrará a figura a seguir.

FONTE: O autor

Existem outras disposições de acordes, além desse em terças sobrepostas, como os acordes de quartas, chamados de acordes de quarta ou quartais, ainda, uma sobreposição de segundas, que são chamadas de cluster (termo batizado no século XX pelo compositor Henry Cowell). Você pode conferir detalhamentos em https://www.descomplicandoamusica.com/harmonia-quartal/.

DICAS

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TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

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FIGURA 2 – SOBREPOSIÇÃO DE TERÇAS DA TRÍADE

FONTE: O autor

Um acorde é definido como maior ou menor de acordo com o primeiro intervalo de 3a, que forma o acorde, ou seja, para um acorde ser maior, o primeiro intervalo de terça deve ser maior; para um acorde ser menor, o primeiro intervalo de terça deve ser menor. Desse modo, temos:

a) Um acorde MAIOR deve ter a seguinte estrutura de 3as:

FIGURA 3 – SOBREPOSIÇÃO DE TERÇAS DA TRÍADE MAIOR

FONTE: O autor

b) Um acorde MENOR deve ter a seguinte estrutura de 3as:

FIGURA 4 – SOBREPOSIÇÃO DE TERÇAS DA TRÍADE MENOR

FONTE: O autor

Os acordes do tipo aumentados ou diminutos são aqueles em que a distância entre a primeira nota do acorde (Fundamental) e a terceira nota (5a do acorde) forma intervalos de 5a aumentada (8 ST) ou de 5a diminuta (6 ST), respectivamente. Desse modo, podemos perceber que uma tríade aumentada é formada por duas 3as maiores sobrepostas, e que a tríade diminuta é formada por duas 3as menores sobrepostas.

a) acorde Aumentado = 3ª M – 3ª M

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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FIGURA 5 – SOBREPOSIÇÃO DE TERÇAS DA TRÍADE AUMENTADA

FONTE: O autor

b) acorde Diminuto = 3ª m – 3ª m

FIGURA 6 – SOBREPOSIÇÃO DE TERÇAS DA TRÍADE DIMINUTA

FONTE: O autor

2.2 ACORDES TRÍADES: NOMENCLATURA E CIFRAGEM

Para nomear um acorde de três sons, devemos observar se as notas que o formam estão dispostas em intervalos de 3as. Somente quando as notas do acorde estiverem nessa disposição, é possível nomear um acorde. Dessa forma, o nome do acorde é definido pelo nome da nota mais grave do acorde. Os acordes podem ser nomeados por meio de cifras, utilizando a letra que representa a nota mais grave do acorde, para nomeá-lo.

FIGURA 7 – EXEMPLO DE CIFRAGEM DAS TRÍADES

Dó Maior Dó menor Dó diminuto Dó aumentado

FONTE: O autor

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TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

7

FIGURA 8 – CIFRAGEM DE DIFERENTES TRÍADES

FONTE: O autor

Os acordes aumentados e diminutos podem ser cifrados de diferentes

formas. Os Acordes Aumentados podem ser cifrados como:

FIGURA 9 – FORMAS DE CIFRAGEM DA TRÍADE AUMENTADA

FONTE: O autor

Os Acordes Diminutos podem ser cifrados como:

FIGURA 10 – FORMAS DE CIFRAGEM DA TRÍADE DIMINUTA

FONTE: O Autor

C EM DM

Só devemos indicar com a letra "m" (minúscula) os acordes que são menores. Acordes maiores não têm a sua qualidade, a letra M (maiúscula), descrita na cifra. Portanto:

C = Dó Maior Dm = Ré menor

NOTA

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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2.3 INVERSÃO DAS TRÍADES

Um acorde está invertido quando a ordem das notas NÃO segue intervalos de 3a. A tríade de Dó maior, por exemplo, pode ter três posições diferentes. Cada uma dessas posições possui um nome específico.

As tríades permitem dois tipos de inversão: a 1ª inversão, em que a terça do acorde é a nota mais grave; e a 2ª inversão, em que a quinta do acorde é a nota mais grave. Assis (2016) destaca que esses acordes também são conheci dos como acordes de sexta, “devido ao intervalo de sexta que se forma entre a fundamental e a terça que está no baixo (na primeira inversão) e entre a terça e a quinta (na segunda inversão)” (ASSIS, 2016, p. 29).

FIGURA 11 – INVERSÃO DAS TRÍADES

FONTE: O autor

• Nomeando acordes invertidos Para NOMEAR um acorde invertido, precisamos, inicialmente, descobrir

qual é a nota mais grave desse acorde, chamada de BAIXO. O segundo passo é reordenar as notas que estão invertidas, dispondo-as em intervalos de 3a no estado fundamental, para sabermos a posição original de formação desse acorde.

Depois que as notas do acorde estiverem em intervalos de 3a, identificamos se esse acorde é maior ou menor, assim como a cifra, que corresponde a essa nota mais grave e que dá nome ao acorde.

Posição das notas 1a Posição 2a Posição 3a Posição

Nota mais grave Dó Mi Sol

NomenclaturaEstado

FundamentalE.F. 1a Inversão 2a Inversão

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TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

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O último passo para nomearmos o acorde invertido é unirmos a cifra identificada no estado fundamental reorganizado do acorde com a qualidade (maior, menor, por exemplo) e com a nota mais grave, que inicia a inversão.

FIGURA 12 – INVERSÕES DAS TRÍADES E NOMENCLATURA

FONTE: O autor

• Cifrando acordes invertidos

Para CIFRAR um acorde invertido, também precisamos identificar a nota mais grave, que é o BAIXO. Para isso, devemos reordenar as notas do acorde, dispondo-as em intervalos de 3a no estado Fundamental. Assim que as notas do acorde estiverem em intervalos de 3a, identificamos a cifra que corresponde a essa nota mais grave, e que, consequentemente, dá nome ao acorde.

Para cifrarmos as inversões do acorde, basta escrevermos, ao lado da cifra que nomeia o acorde, a cifra correspondente à nota mais grave da inversão, separadas por uma barra.

FIGURA 13 – CIFRAGEM DAS INVERSÕES DAS TRÍADES

FONTE: O autor

Posição das notas Fundamental 3 a do Acorde 5 a do Acorde

Nota mais grave Dó (C) Mi (E) Sol (G)

Nome Dó Maior Dó Maior com Mi no baixo

Dó Maior com Sol no baixo

Posição das notas Fundamental 3 a do Acorde 5 a do AcordeNota mais grave Dó (C) Mi (E) Sol (G)Cifra C C/E C/G

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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3 DISTRIBUIÇÃO DAS VOZES

Durante o estudo da Harmonia, realizamos os exercícios, distribuindo as notas dos acordes no pentagrama, como se estivéssemos escrevendo para um coral a quatro vozes. Com base nisso, conseguimos criar relações de distanciamento e de tessitura entre as notas do acorde (KOENTOPP, 2010). As vozes de um coral são: soprano (voz mais aguda feminina), contralto (voz mais grave feminina), tenor (voz aguda masculina) e baixo (voz mais grave masculina). As vozes femininas são escritas em clave de Sol, e as vozes masculinas em clave de Fá.

As tessituras usadas para cada voz são:

FIGURA 14 – TESSITURA MÉDIA DAS VOZES

FONTE: Koentopp (2010, p. 17)

Para a prática dos exercícios de Harmonia, usam-se sempre dois pentagramas, como se fosse uma pauta para piano. No pentagrama superior, na clave de Sol, escrevemos as notas das vozes de soprano e contralto, e, no pentagrama inferior, em clave de Fá, as notas das vozes de tenor e baixo.

3.1 DUPLICAÇÃO/DOBRAMENTO DE VOZES

Quando escrevemos uma tríade em uma estrutura para quatro vozes, como a textura coral, precisamos dobrar (duplicar/dobrar) uma das notas da tríade. Acerca disso, Schönberg (2004) define as seguintes opções, por ordem de prioridade:

Opção 1: dobrar a nota fundamental do acorde.Opção 2: dobrar a quinta do acorde.Opção 3: dobrar a terça do acorde.

O autor fundamenta a ordenação em função da série harmônica, ou seja, a preferência da nota a ser duplicada segue o aparecimento dela na série harmônica. Contudo, dentro da série harmônica, as notas que mais aparecem são a fundamental, a quinta, e, por fim, a terça do acorde. Uma outra característica interessante é que a terça do acorde tem a função de determinar se um acorde é maior ou menor, e isso, por si só, já confere um destaque especial, não necessitando ser duplicada. Schöenberg (1999) ainda define que, no VII grau da escala maior, a quinta Diminuta do acorde não deve ser dobrada.

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TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

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3.2 POSIÇÃO DAS VOZES DO ACORDE

Um acorde qualquer pode ter as notas escritas de duas maneiras: com as notas próximas umas das outras (posição fechada), ou com as notas distantes umas das outras (posição aberta). Kostka & Payne (1984) apud Koentopp (2010) definem essas posições da seguinte forma: “Posição Fechada (Close Structure), quer dizer que entre soprano e tenor deve haver menos de uma oitava; Posição Aberta (Open Structure), que entre soprano e tenor haver ter uma oitava ou mais” (KOENTOPP, 2010, p. 33).

Acerca das posições aberta e fechada, Koentopp (2010) destaca que,

segundo Piston (1987), se “a voz do soprano estiver muito aguda, é melhor utilizar a posição aberta para que as outras vozes não fiquem numa região demasiada aguda” (KOENTOPP, 2010, p. 34). Para Koentopp (2010), é importante frisar que, entre as vozes de soprano e de contralto, e entre as vozes de contralto e tenor, não deve haver distância maior que uma oitava. Seguir essa orientação dá consistência sonora ao acorde, ou, como explica Schönberg (1999) apud Koentopp (2010), obtemos uma sonoridade homogênea.

Para o Tenor e o Baixo, a distância entre as notas pode ser maior que uma oitava. Contudo, Piston (1987) apud Koentopp (2010) chama atenção para que não se ultrapasse duas oitavas.

FIGURA 15 – POSIÇÕES DO ACORDE: SCHOENBERG, PISTON, KOSTKA & PAYNE

FONTE: Koentopp (2010, p. 34)

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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Conforme explica Koentopp (2010), nos exercícios propostos de encadeamentos de acordes, podemos ser bem maleáveis quanto ao uso do espaçamento. Todavia, quando vamos aplicá-lo em um arranjo ou em uma composição, é muito importante que se escolha a disposição das notas a serem usadas, conforme o efetivo requerido. O autor complementa, ainda, informando que, quando formos escrever um acorde para coral, é importante que tenhamos conhecimento da tessitura real que os cantores do grupo conseguem alcançar.

4 TRÍADES DA ESCALA

É importante destacar que, nos exercícios de encadeamento, progressão de acordes, utilizaremos os acordes construídos sobre cada grau de uma escala, seja ela maior ou menor harmônica, ou seja, os acordes do campo harmônico dessas escalas (ASSIS, 2016)

Devemos ter em mente que cada grau da escala recebe um número romano, que indica a posição daquele acorde dentro da escala. Se o número romano for em letra maiúscula, representa os acordes maiores, e se for em letras minúsculas, representa acordes menores. Dessa forma, uma escala maior tem os seguintes graus:

FIGURA 16 – TRÍADES FORMADAS SOBRE AS NOTAS DA ESCALA MAIOR

FONTE: Assis (2016, p. 21)

Fique atento para o sétimo grau da escala, que é uma tríade diminuta e, portanto, receba um símbolo diferenciado, VIIo, que pode ser representado em minúsculo porque a terça inferior é menor, acrescido do símbolo o, para indicar que é um acorde diminuto (ASSIS, 2016).

4.1 CAMPO HARMÔNICO MAIOR

Campo harmônico é o conjunto de acordes formados sobre cada grau de uma escala, seja ela maior ou menor, exatamente como vimos no item anterior.

Quando construímos os acordes sobre cada um dos graus de uma escala, surge o campo harmônico daquela escala.

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TÓPICO 1 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS I – FORMAÇÃO DE ACORDES TRÍADES

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FIGURA 17 – CAMPO HARMÔNICO DE DÓ MAIOR

FONTE: Assis (2016, p. 21)

De forma resumida, segundo Assis (2016), há, no modo maior:

• I, IV e V graus – acordes maiores.• II, III e VI graus – acordes menores. • VIIo grau – um acorde Diminuto.

4.2 CAMPO HARMÔNICO MENOR

A tonalidade menor apresenta três possibilidades de escalas: a natural, a harmônica e a melódica.

O campo harmônico da tonalidade menor utiliza, na prática, os acordes

formados sobre a escala menor harmônica. Dessa forma, no modo menor, há o seguinte campo harmônico:

FIGURA 18 – TRÍADES SOBRE AS NOTAS DA ESCALA MENOR HARMÔNICA

FONTE: Assis (2016, p. 21)

Para Assis (2016), é importante repararmos que, na escala menor harmônica, ocorre a alteração da sensível (que é elevada em um semitom), devendo estar presente nos acordes em que a sensível faz parte do acorde. Isso ocorre no V e no VIIo. Vale ressaltar, também, que o terceiro grau se torna um acorde aumentado (tipo de acorde em que as duas ter ças são maiores), recebendo a cifra III+. “O número romano deve ser maiúsculo porque a terça inferior que o constitui é maior, e o símbolo + para indicar que é uma tríade aumentada” (ASSIS, 2016, p. 21). Dessa forma, segundo Assis (2016), há, no modo menor:

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UNIDADE 1 — HARMONIA

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• I e IV graus – acordes perfeitos menores.• V e VI graus – acordes perfeitos maiores.• II e VII os graus – acordes diminutos.• III+ grau – acorde aumentado.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Qualquer acorde é formado pela sobreposição de intervalos de 3ª, e é possível inverter a ordem das notas, gerando acordes invertidos.

• Há quatro tipos de qualidades de acordes de três sons: maior, menor, aumentado e diminuto.

• Os acordes devem ser escritos em textura coral, em duas pautas (uma em clave de Sol para as vozes de soprano e contralto, e outra em clave de Fá para as vozes de tenor e de baixo), respeitando a tessitura de cada voz.

• O conjunto de acordes, formado sobre cada grau de uma escala, é chamado de campo harmônico, acordes principais disponíveis para harmonizar uma melodia naquela tonalidade.

• Quando for necessário, devemos dar prioridade para duplicar notas do acorde quando forem a fundamental e/ou a quinta dos acordes.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Um acorde é formado pela sobreposição de intervalos de 3ª (terças). Essa relação intervalar (terças) pode ser alterada de acordo com a posição das notas no pentagrama, denominadas de inversões. Acerca das inversões de acordes de três sons (tríades) e da relação intervalar entre as notas de um acorde, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Uma tríade em segunda inversão apresenta, entre as notas, os intervalos de 4ª, seguida de 3ª.

b) ( ) Uma tríade em segunda inversão apresenta, entre as notas, os intervalos de 3ª, seguida de 4ª.

c) ( ) Uma tríade em primeira inversão apresenta, entre as notas, os intervalos de 4ª, seguida de 3ª.

d) ( ) Uma tríade em primeira inversão apresenta, entre as notas, os intervalos de 3ª, seguida de 3ª.

2 Existem quatro tipos de tríades: maior, menor, aumentada e diminuta. Cada um desses tipos de acorde apresenta, na formação, intervalos de 3ª (terça) de qualidades diferentes (maiores ou menores). Com base nas qualidades dos intervalos de 3ª (terça) que formam esses quatro tipos de tríades, analise as sentenças a seguir:

I- Um acorde do tipo maior, em Estado Fundamental, apresenta, entre as notas, da mais grave para a mais aguda, os intervalos de 3ªM e de 3ªm.

II- Um acorde do tipo diminuto, em Estado Fundamental, apresenta, entre as notas, da mais grave para a mais aguda, os intervalos de 3ªm e de 3ªM.

III- Um acorde do tipo aumentado, em Estado Fundamental, apresenta, entre as notas, da mais grave para a mais aguda, os intervalos de 3ªM e de 3ªM.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Os acordes podem ser grafado por cifras, por letras ou por números romanos. Quando ciframos um acorde somente com as letras, estamos observando o acorde de forma isolada. Quando ciframos o acorde com números romanos, estamos compreendendo esse acorde dentro de um campo harmônico (maior ou menor) e a função que esse acorde assume dentro desse campo. Considere o campo harmônico representado a seguir, e analise os acordes desse campo de acordo com os dois tipos de cifragem. Classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) A cifra Am é o VI grau desse campo harmônico e representa o acorde de Lá menor.

( ) O acorde correspondente ao II grau desse campo harmônico é o Mi menor.( ) A cifra Bdim ou Bo é o VIIo grau desse campo harmônico e representa o

acorde de Si diminuto.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Quando estudamos Harmonia, temos, por tradição, e recurso pedagógico, escrever as notas dos acordes, distribuindo-as no pentagrama, utilizando duas pautas. Dessa forma, utilizamos a textura coral, e podemos visualizar a relação entre cada uma das notas de um acorde com o acorde seguinte. Disserte acerca dessa prática de escrita no estudo da Harmonia, destacando as vozes, as claves utilizadas, e quais notas do acorde podem ser dobradas quando usamos apenas acordes de três sons (tríades).

5 Um campo harmônico menor pode oferecer três conjuntos de acordes, de acordo com o tipo de escala menor utilizado. É sabido que há a escala menor natural, a harmônica e a melódica. Cada uma dessas escalas apresenta alterações (sustenidos ou bemóis) específicas. Nesse contexto, disserte acerca de que tipo de escala menor é mais utilizado no estudo de Harmonia, além do porquê.

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TÓPICO 2 — UNIDADE 1

ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES

TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 2, estudaremos os conceitos e as estruturas que conduzem o encadeamento dos acordes no estudo da Harmonia. Abordaremos os encadeamentos de acordes por graus conjuntos e por graus disjuntos.

Observaremos a formação dos acordes de quatro sons, as tétrades, inversões e classificações. Dentro desse estudo, abordaremos a importância do acorde de 7ª da Dominante, um dos principais acordes dentro do sistema tonal.

As normas de encadeamento que estudaremos servirão para a condução de acordes de quatro sons. Isso nos abreviará o entendimento das funções das tétrades dentro do campo harmônico tonal.

2 AS TÉTRADES

Os acordes de quatro sons, chamados de tétrades, são formados pela sobreposição de três intervalos de 3a. A distância existente entre a primeira e a quarta nota de um acorde maior ou menor forma um intervalo de 7a maior, ou menor.

FIGURA 19 – DISTÂNCIA ENTRE A FUNDAMENTAL E A SÉTIMA DO ACORDE

FONTE: O autor

Para os acordes maiores e menores, duas qualidades de intervalos de 7a são importantes: a 7a Maior (11 ST) e a 7a menor (10 ST).

As notas que formam uma tétrade são:

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UNIDADE 1 — HARMONIA

FIGURA 20 – NOMES DAS NOTAS DE UMA TÉTRADE

FONTE: O autor

Sabendo disso, há os seguintes acordes de sétima em uma escala de Dó Maior e em uma escala de Lá menor:

FIGURA 21 – EXEMPLO DE ACORDES DE SÉTIMA (TÉTRADES) DO MODO MAIOR

FONTE: Assis (2016, p. 31)

FIGURA 22 – EXEMPLO DE ACORDES DE SÉTIMA (TÉTRADES) DO MODO MENOR

FONTE: Assis (2016, p. 31)

2.1 FORMAÇÃO DOS ACORDES DE 4 SONS

O termo 7ª (sétima) se refere ao intervalo formado entre a nota que dá nome ao acorde (fundamental) e a sétima. Podemos classificar as sétimas em três tipos, basicamente: sétima maior, sétima menor e sétima diminuta. Relembrando:

FIGURA 23 – INTERVALOS DE 7ª

7ª M 7ª m 7ª dim

FONTE: O autor

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TÓPICO 2 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

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Um acorde de C7M, por exemplo, é o acorde de Dó Maior (Dó-Mi-Sol), mais a 7ª nota a partir de Dó (sétima maior=11ST), Si. O acorde final tem as notas Dó-Mi-Sol-Si.

FIGURA 24 – TÉTRADE COM 7M

C + 7M = C7M

FONTE: O autor

Nessa mesma lógica, surgem as seguintes possibilidades de acordes com 7ª:

FIGURA 25 – TÉTRADE COM 7ª MAIOR E 7ª MENOR

C7M C7

Dó com 7ª Maior Dó com 7ª menor

FONTE: O autor

Acordes diminutos podem ter duas possibilidades, de acordo com o tipo de sétima que utilizam:

a) Acorde Diminuto = tríade diminuta com 7a diminuta

FIGURA 26 – TÉTRADE DIMINUTA

FONTE: O autor

b) Acorde Meio Diminuto = tríade diminuta com 7a menor

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UNIDADE 1 — HARMONIA

FIGURA 27 – TÉTRADE MEIO DIMINUTA

FONTE: O autor

2.2 INVERSÃO DAS TÉTRADES

As tétrades também podem ser invertidas. Como há quatro sons, há quatro posições possíveis para acordes desse tipo:

Estado Fundamental (EF): quando a nota que dá nome ao acorde é a mais grave.

1ª Inversão: quando a 3ª do acorde é a mais grave.2ª Inversão: quando a 5ª do acorde é a mais grave.3ª Inversão: quando a 7ª do acorde é a mais grave.

FIGURA 28 – INVERSÃO DAS TÉTRADES NO ACORDE DE C7

FONTE: O Autor

O vídeo que segue contém dicas interessantes, tocadas no violão, acerca de como montar um acorde diminuto e um acorde meio diminuto, além da principal diferença entre esses dois tipos de acordes: https://www.youtube.com/watch?v=ZebtCzGf_Y8.

DICAS

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TÓPICO 2 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

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2.3 CLASSIFICAÇÃO DOS ACORDES DE SÉTIMA

Os acordes de sétima já foram classificados diferente da forma que conhecemos atualmente. “Antigamente, os acordes de sétima eram classificados, de acordo com a estrutura, em sete espécies diferentes. Embora não seja mais utilizada, é interessante relembrar essa classificação para conhecermos melhor a estrutura dos acordes de sétima” (ASSIS, 2016, p. 31). Assim, o autor traz a definição de cada espécie, da seguinte maneira:

1) O acorde de sétima de primeira espécie (acorde perfeito maior com sétima menor) é o acorde de sétima de dominante. 2) O de segunda espécie (acorde perfeito menor com sétima menor) é conhecido como acorde de sétima menor, encontra-se no ii7, iii7, vi7 do modo maior e no iv7 do modo menor.3) O de terceira espécie (acorde diminuto com sétima menor) é chamado de acorde de sétima de sensível, ou, mais popularmente conhecido, como acorde meio diminuto, e se encontra no viiø7 do modo maior e no iiø7 do modo menor. 4) O de quarta espécie (acorde perfeito maior com sétima maior) é chamado, simples mente, de acorde de sétima maior, e se encontra no I7 e no IV7 do modo maior e no VI7 do modo menor. 5) O de quinta espécie (perfeito menor com sétima maior) se encontra no i7 do modo menor. 6) O de sexta espécie (acorde aumentado com sétima maior) se encontra no III+ do modo menor. 7) O de sétima espécie (acorde diminuto com sétima diminuta) é conhecido como acorde de sétima diminuta e se encontra no viiº7 do modo menor (ASSIS, 2016, p. 31-32).

2.4 ACORDE DE 7ª DA DOMINANTE

Um acorde que vale destacar é o de sétima dominante. “É muito importante no contexto tonal, devido à inten sa relação de atratividade que estabelece com a tônica” (ASSIS, 2016, p. 33), sendo uma característica importante, desse acorde, a presença do intervalo de quinta diminuta (trítono) entre a terça e a sétima do acorde. O autor acrescenta que, dentro de uma escala diatônica maior, as notas que formam o trítono contêm, entre si, os semitons da escala, que produzem a sensação de aproximação com as notas vizinhas. Por conta dessa atração, as notas que formam o trítono são denominadas de notas atrativas. Vejamos a figura a seguir, que apresentará as notas atra tivas da escala de Dó, nesse caso, as notas Fá e Si.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

FIGURA 29 – NOTAS ATRATIVAS NA ESCALA DIATÔNICA MAIOR

FONTE: Assis (2016, p. 33)

3 ENCADEAMENTOS

O encadeamento acontece quando relacionamos os acordes entre si, por meio de uma sequência de acordes dentro de um campo harmônico. Estudaremos encadeamentos de acordes por meio de movimentos de graus disjuntos e de graus conjuntos e possíveis inversões.

Para iniciarmos o estudo desses movimentos, aprenderemos, um pouco, a condução de vozes, ou condução de notas. Dentro dessa condução, surgem diferentes classificações de movimentos, como poderemos observar a seguir.

• Condução de vozes

Ao estudarmos a condução das notas de um acorde para outro, Assis (2016) explica que há três tipos de movimentação entre as vozes:

a) Movimento direto ou paralelo: movimento que ocorre quando duas ou

mais vozes se movem na mesma direção.

FIGURA 30 – MOVIMENTO PARALELO DE VOZES

FONTE: Assis (2016, p. 27)

b) Movimento contrário: quando duas ou mais vozes se movimentam em direções opostas.

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TÓPICO 2 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

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FONTE: Assis (2016, p. 27)

c) Movimento oblíquo: uma voz fica fixa, enquanto a outra se movimenta.

FIGURA 32 – MOVIMENTO OBLÍQUO DE VOZES

FONTE: Assis (2016, p. 28)

Observando esses três tipos de movimento, Assis (2016) complementa que regras devem ser observadas na condução das notas:

1) Evitar a condução de duas vozes em uníssono ou em oitavas paralelas.

FIGURA 33 – SALTOS DE OITAVA E UNÍSSONO PARALELOS

FONTE: Assis (2016, p. 28)

2) Evitar a condução de vozes em quintas consecutivas.

FIGURA 34 – SALTOS DE QUINTA PARALELA

FONTE: Assis (2016, p. 28)

FIGURA 31 – MOVIMENTO CONTRÁRIO DE VOZES

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UNIDADE 1 — HARMONIA

Com as regras de condução e os tipos de movimentos expostos, seguiremos com o estudo dos encadeamentos de graus conjuntos e disjuntos.

3.1 DE GRAUS DISJUNTOS

Conforme destaca Assis (2016), o encadeamento de acordes por graus disjuntos pode ser realizado de forma simples, envolvendo quatro passos:

1) Escrevendo a progressão do baixo do primeiro para o segundo acorde.2) Completando as notas do primeiro acorde. 3) Mantendo, no segundo acorde, a nota comum entre ambos.4) Conduzindo as duas notas restantes do primeiro acorde para as notas

mais próximas do segundo.

FIGURA 35 – PROCEDIMENTO BÁSICO DE ENCADEAMENTOS DE ACORDES

FONTE: Assis (2016, p. 28)

3.2 DE GRAUS CONJUNTOS Para encadearmos acordes de graus conjuntos, devemos notar que eles

não possuem notas em comum, e que precisamos estar atentos para evitar os possíveis paralelismos de quintas e de oitavas. Para evitar esses paralelismos, Assis (2016) diz que devemos realizar o movimento contrário das vozes agudas em relação ao baixo, conduzindo as notas sempre pela menor distância entre elas.

Assis (2016) traz um exemplo muito claro, quando apresenta a resolução

de um encadeamento entre o V e o VI graus. Podemos perceber que o baixo realiza um movimento ascendente, enquanto as notas do segundo acorde realizam um movimento descendente e, por consequência, contrário ao movimento do baixo.

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TÓPICO 2 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS II – FORMAÇÃO DE ACORDES TÉTRADES E ENCADEAMENTO DE ACORDES

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FIGURA 36 – ENCADEAMENTO ENTRE GRAUS CONJUNTOS - BAIXO ASCENDENTE

FONTE: Assis (2016, p. 29)

Na figura a seguir, veremos um exemplo em que o autor demonstra o movimento descendente do baixo, enquanto as notas agudas realizam um movimento ascendente e, portanto, contrário, para as notas mais próximas.

FIGURA 37 – ENCADEAMENTO ENTRE GRAUS CONJUNTOS – BAIXO DESCENDENTE.

FONTE: Assis (2016, p. 29)

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• O encadeamento de acordes pode acontecer por graus conjuntos e disjuntos, respeitando normas específicas.

• A 7ª da tétrade pode ser maior, menor e diminuta.

• As tétrades têm 1ª, 2ª e 3ª de inversão, essa última, devido ao acréscimo da quarta nota (a 7ª).

• Uma tétrade pode ser diminuta ou meio-diminuta, dependendo se a 7ª é menor ou diminuta.

• O acorde de 7ª da dominante é de atração, e cada nota resolve em outra nota específica do acorde de tônica.

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1 Os encadeamentos de acordes preveem a observância de movimentos específicos entre as notas (vozes) dos acordes. Esses movimentos podem ser eficazes ou não, conferindo qualidade sonora ao movimento harmônico, enriquecendo, dessa forma, a movimentação harmônica. Acerca das movimentações mais adequadas consideradas eficazes no encadeamento harmônico, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Os movimentos verticais e paralelos são considerados mais eficazes e de qualidade sonora ao encadeamento harmônico.

b) ( ) Os movimentos paralelos e horizontais são considerados mais eficazes e de qualidade sonora ao encadeamento harmônico.

c) ( ) Os movimentos oblíquos e contrário são considerados mais eficazes e de qualidade sonora ao encadeamento harmônico.

d) ( ) Os movimentos laterais e paralelos são considerados mais eficazes e de qualidade sonora ao encadeamento harmônico.

2 As tétrades podem ser grafadas, utilizando letras, denominadas de cifras. As cifras representam várias características dos acordes, como as notas que formam o acorde, a qualidade do acorde (maior, menor, aumentado ou diminuto), e a ordem em que as notas estão dispostas. Com base nas características de uma cifra de acorde, analise as sentenças a seguir:

I- A cifra correspondente ao acorde de Dó maior com sétima menor é C7. II- São cifras possíveis para o acorde de Ré diminuto: D, Dm.III- A cifra correspondente ao acorde de Si bemol maior é Bbm.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença I está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A ordem em que as notas de um acorde se dispõem é estudada na Harmonia quando falamos da inversão de acordes. A inversão de acordes pode ser sinalizada na cifra, indicando qual a nota mais grave inicia o acorde. De acordo com os princípios da inversão de acordes, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) Uma tétrade que estiver na primeira inversão tem, como nota mais grave, a fundamental.

( ) Uma tétrade em Estado Fundamental tem, como nota mais grave, a 3ª do acorde.

( ) Uma tétrade que estiver na segunda inversão tem, como nota mais grave, a 5ª do acorde.

AUTOATIVIDADE

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Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Na figura a seguir, estarão representados quatro acordes. Escreva o nome do acorde, a qualidade (se é maior, menor, aumentado ou diminuto), a inversão (quando houver) e a cifra de cada acorde.

5 No pentagrama a seguir, devem ser encontrados cifrados oito acordes. Escreva, no pentagrama, as notas referentes a esses acordes. Atente-se para as inversões.

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TÓPICO 3 — UNIDADE 1

ESTRUTURAS HARMÔNICAS III –

TONALIDADES E MODULAÇÕES

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 3, abordaremos as estruturas harmônicas que conferem fluência ao texto musical. As tonalidades e as modulações são recursos que os compositores utilizam para contextualizar as ideias musicais. Podemos dizer que são campos sonoros em que as ideias musicais são desenvolvidas.

Abordaremos as funções harmônicas tonais, as alterações possíveis nos acordes, e os tipos de procedimentos harmônicos utilizados para criar modulações. Essas alterações, unidas com encadeamentos harmônicos específicos (cadências), devem gerar uma modulação fluída.

Dentro do estudo da Harmonia, compreenderemos as funções tonais (funções dos acordes dentro de uma tonalidade) com as cadências (sequências de acordes em um encadeamento específico), tornando-se de vital importância para a observação dos tipos de modulação.

2 TONALIDADES E CADÊNCIAS

Tonalidade pode ser descrita como a relação entre notas ou acordes de

uma escala, existindo um centro, uma nota ou acorde central, para o qual sempre se retorna ou repousa (a tônica).

No fim da Renascença, ao agregar várias vozes simultaneamente, a técnica intervalar do contraponto polifônico produziu a maioria das tríades diatônicas maiores e menores e dos acordes de sexta (primeira e segunda inversões das tríades maiores e menores). Além disso, a dificuldade de se controlar as estruturas modais em contrapontos mais complexos acabou por diluir a individualidade dos modos, que se aglutinaram por afinidade em dois modos principais: o modo maior e o modo menor. Principalmente, a partir das fórmulas cadenciais, pela posição nos finais de frase, e pelo caráter fixo, estabeleceu-se um sentido de tonalidade. Gradualmen te, outros acordes passaram a se relacionar com o acorde final e uns com os ou tros, surgindo um senso de progressão e, em um sentido mais amplo, de relações tonais (ASSIS, 2016, p. 41).

Dentro de uma tonalidade, três acordes assumem papel importante para configurar uma cadência e definir uma tonalidade: o acorde de tônica (T – I grau),

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UNIDADE 1 — HARMONIA

o acorde de subdominante (S – IV grau) e o acorde de dominante (D – V grau). Esses três acordes “desempenham as principais funções harmônicas, em torno das quais todo o discurso tonal se estrutura” (ASSIS, 2016, p. 41).

Ao observarmos a relação entre os acordes de tônica – subdominante – dominante, podemos perceber que há um movimento de afastamento e de aproximação entre eles. Da tônica para a subdominante, ocorre um afastamento, e, o movimento da dominante para a tônica, a reaproximação.

FIGURA 38 – RELAÇÕES DE AFASTAMENTO E APROXIMAÇÃO DAS FUNÇÕES HARMÔNICAS

FONTE: Assis (2016, p. 43)

Segundo Assis (2016), podemos destacar quatro tipos principais de cadências:

• Cadência perfeita: quando o acorde de tônica é precedido pelo de dominante (V – I).

• Cadência plagal: quando o acorde de tônica é precedido por qualquer acorde que não o de dominante, geralmente, subdominante (IV – I).

• Cadência de engano: quando o acorde de dominante é se guido por qualquer acorde que não seja o de tônica.

• Cadência à dominante: quando termina no acorde de dominante, e este pode ser precedido por qualquer outro acorde. Um tipo dessa cadência, muito recorrente nas tonalidades menores, é a “cadência frígia”, configurada pela progressão: iv6 – V.

Existem mais tipos de cadências. Detalharemos mais no próximo tópico. Elas são chaves importantes para composição, análise e harmonização de obras musicais.

2.1 FUNÇÕES TONAIS

As principais funções harmônicas estão relacionadas com os acordes de I, IV e V graus da escala, ou seja, tônica, subdominante e dominante, respectivamente.

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TÓPICO 3 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES

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No entanto, dentro de um campo harmônico, ainda, há os acordes de II, III, VI e VII graus, que podem ser utilizados. Devido à familiaridade/proximidade das notas desses outros acordes com aqueles que estruturam as três funções principais, os acordes de II, III, VI e VII graus assumem a tendência de se relacionar com uma dessas funções principais:

a) Acordes com Função de Dominante: “o V e o VII com as sétimas, sendo que a sétima de sensível é somente utilizada no modo maior “ (ASSIS, 2016, p. 43).

b) Acordes com função de Subdominante: o IV e o II, com as sétimas. c) Acordes com Função de Tônica: I (ou I no modo menor) e Vi (ou VI no modo

menor).

A partir dessa classificação, é possível evidenciar o campo tonal, que se caracteriza pelas relações existentes entre os graus da escala diatônica com o centro tonal exercido pela tônica (ASSIS, 2016).

2.2 ALTERAÇÕES

De forma objetiva, além dos acordes formados dentro do campo harmônico de uma escala, é possível incorporar alterações a esse campo. Como observa Assis (2016, p. 44), “mesmo que um compositor utilize toda a gama da escala cromática em uma composição no período da música tonal, essas alterações estão subordinadas às principais relações hierárqui cas do campo tonal”. Para o autor, toda e qualquer alteração diz respeito a notas usadas que não pertencem à tonalidade. As alterações podem surgir como recursos composicionais, utilizando estruturas emprestadas de outras regiões tonais, ainda, como forma de substituições cromáticas ou enarmônicas de notas do acorde.

Para Assis (2016), as alterações podem ser agrupadas em simples e em

complexas:

• Alterações simples

Quando o compositor utiliza empréstimos e alterações diatônicas ou cromáticas sem afe tar as relações intrínsecas da tonalidade. Isso ocorre quando

A função dos acordes está relacionada à harmonia funcional e, na aula a seguir, poderemos ter mais detalhes das funções de tônica, subdominante e dominante. Assista até o fim do vídeo, que possui exemplos sonoros, e aproveite para ler a descrição, que resume, de forma simples, o conteúdo: https://www.youtube.com/watch?v=-Ms2XDHUKSM.

DICAS

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UNIDADE 1 — HARMONIA

há a utilização da escala menor melódica no modo menor; quando se utilizam graus da escala menor no modo maior homônimo (conhecido como “empréstimo modal”); utilizados os acordes de dominantes individuais, que são acordes que não pertencem à tonalidade, mas mantêm uma relação de dominantes com os graus próprios da escala; ou incorporadas alterações cromáticas, como quintas aumentadas ou diminutas (V7(#5); V7(b5)), sextas aumentadas ou acorde de sexta napolitano.

• Escala menor melódica

Na escala menor harmônica, a elevação do sétimo grau da escala em um semitom gera o III+ aumentado, e, consequentemente, um intervalo de segunda aumentada entre o sexto e o sétimo graus da escala. De forma geral, o III+ e a segunda aumentada são pouco utilizados pelos compositores. Por conta disso, é comum observar um grande uso, pelos compositores, da escala menor melódica, como uma forma de amenizar os efeitos do acorde e o intervalo de segunda aumentados da escala menor harmônica (ASSIS, 2016).

A escala menor melódica apresenta alterações nos VI e VII graus quando está ascendente, elevados em um semitom. Essas alterações podem ser anuladas quando está descendente.

FIGURA 39 – ESCALA MENOR MELÓDICA.

FONTE: Assis (2016, p. 45)

FIGURA 40 – EXEMPLO DE ACORDES DISPONÍVEIS A PARTIR DA ESCALA MENOR MELÓDICA

FONTE: Assis (2016, p. 46)

• Empréstimo modal

Note que, quando falamos de escalas, sempre há dois modos: o modo maior e o modo menor. Os acordes de empréstimo modal são aqueles pertencentes a um modo diferente daquele utilizado como principal. Por exemplo: Dentro de uma composição em Dó Maior (modo maior), podemos utilizar o acorde de

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TÓPICO 3 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES

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Fá menor (emprestado do campo harmônico de Dó menor – modo menor). Os acordes de empréstimo modal assumem a função de ornamentação harmônica dentro de uma composição, sem afetar a estrutura harmônica ou a identidade da escala principal (ASSIS, 2016).

FIGURA 41 – ACORDES DE EMPRÉSTIMO MODAL NO MODO MAIOR

FONTE: Assis (2016, p. 46)

No exemplo, em Dó Maior, Assis (2016) chama a atenção para a presença da nota Láb (no primeiro compasso, formando o acorde de IV menor = Fá menor e, no segundo compasso, formando o acorde de VII diminuto na primeira inversão = Si diminuto com baixo em Ré). No caso, a presença da nota Lá bemol é um empréstimo do modo menor (escala de Dó menor), uma vez que essa nota não pertence ao modo maior. Consequentemente, os acordes formados com a utilização do Lá bemol geram acordes emprestados do modo menor. Esses empréstimos ocorrem entre tons homônimos, acordes dos modos maior e menor que possuem a mesma tônica, no caso do exemplo anterior, Dó maior e Dó menor.

Dominantes individuais

Relembrando as características principais de um acorde com função de dominante:

• deve ser um acorde perfeito maior;• pode estar acompanhado da 7ª menor;• pode ser substituído pelo acorde meio-diminuto.

Observe o quadro a seguir, com as possibilidades de Dominantes individuais para cada grau da escala de Dó maior:

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UNIDADE 1 — HARMONIA

QUADRO 1 – DOMINANTES INDIVIDUAIS DE II, III, IV, V E VI DE DÓ MAIOR

FONTE: Adaptado de Assis (2016)

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO II GRAU DO MODO MAIOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO III GRAU DO MODO MAIOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO IV GRAU DO MODO MAIOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO V GRAU DO MODO MAIOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO VI GRAU DO MODO MAIOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO III GRAU DO MODO MENOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO IV GRAU DO MODO MENOR

DOMINANTES INDIVIDUAIS DO VI GRAU DO MODO MENOR

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TÓPICO 3 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES

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• Acordes de sextas aumentadas Acordes de sexta aumentada têm origem na cadência frígia (do modo

menor), que apresenta a seguinte configuração: iv6 – V. É uma cadência à Dominante (ou semicadência), visto que não há resolução do V (ASSIS, 2016).

FIGURA 42 – CADÊNCIA FRÍGIA

FONTE: Assis (2016, p. 48)

Todos os acordes de sexta, uma vez que antecedem um acorde de V grau (Dominante), assumem a função de subdominante. Segundo Assis (2016), os compositores, quando utilizavam os acordes de sexta, costumavam agregar, a eles, cromatismos na voz superior, com a finalidade de aproximar esses acordes. Como esse costume, os cromatismos foram incluídos na estrutura do acorde, sendo uma outra característica importante dos acordes com sexta.

FIGURA 43 – CADÊNCIA FRÍGIA COM CROMATISMO

FONTE: Assis (2016, p. 49)

O acorde que resultou do acréscimo desse cromatismo ficou conhecido como sexta italiana.

FIGURA 44 – ACORDE DE SEXTA ITALIANA

FONTE: Assis (2016, p. 49)

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UNIDADE 1 — HARMONIA

• Acorde de sexta napolitana (IINap)

O acorde de sexta napolitana é um acorde de IV grau, que tem a 5ª transformada por uma substituição cromá tica. Posteriormente, esse acorde foi compreendido como uma modificação do II grau, mantendo essa grafia até os dias atuais. A função do acorde de sexta napolitana também é de subdominante (ASSIS, 2016). Observe:

QUADRO 2 – ALTERAÇÕES DE FORMAÇÃO DO ACORDE DE SEXTA NAPOLITANA – IINAP

FONTE: Adaptado de Assis (2016)

• Alterações complexas

As alterações complexas ocorrem quando são realizadas substituições de notas dos acordes da escala devido à utilização de processos enarmônicos. Da mesma forma que podem existir tonalidades distantes umas das outras, ou seja, que diferem entre sim em muitos sustenidos ou muitos bemóis, as alterações podem ser consideradas complexas pelo mesmo motivo.

A enarmonia, como substituição de uma nota do acorde, abre a possibilidade para conduzir os acordes a outras regiões tonais. “As alterações são consideradas complexas pelas relações distantes que possibilitam” (ASSIS, 2016, p. 5). Os acordes diminutos e os aumentados possibilitam essas alterações.

Detalhando as alterações complexas:

CADÊNCIA PERFEITA NO MODO MENOR

SUBSTITUIÇÃO CROMÁTICA DA QUINTA DO IV GRAU

CADÊNCIA PERFEITA COM O IINAP

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TÓPICO 3 — ESTRUTURAS HARMÔNICAS III – TONALIDADES E MODULAÇÕES

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• Acordes diminutos

Um acorde diminuto é aquele formado pela sobreposição de intervalos de terças menores. Como todos os intervalos são de terça menor, e se considerarmos as inversões e as possíveis substituições enarmônicas, concluímos que só existem três acordes diminutos:

Cdim = Dó diminuto = C + Eb + Gb + Bbb (ou A)C#dim = Dó sustenido diminuto = C# + E + G + BbDdim = Ré diminuto = D + F + Ab + B

Lembremos que o acorde diminuto também assume a função de Dominante e resolve, por semitom, em um acorde perfei to maior ou menor. Ao utilizarmos as substituições enarmônicas, observamos que cada acorde diminuto tem a possibilidade de resolver oito acordes diferentes. Uma vez que há três acordes diminutos diferentes, esses três acordes possibilitam cobrir as 24 tonalidades maiores e menores (ASSIS, 2016).

• Acordes aumentados

Acordes aumentados são aqueles com a estrutura formada pela sobreposição de intervalos de terças maiores. Aplicando-se o mesmo raciocínio dos acordes diminutos para os aumentados, chegamos à conclusão de que existem apenas quatro acordes aumentados.

FIGURA 45 – ACORDES AUMENTADOS

FONTE: Assis (2016, p. 51)

Os acordes aumentados também assumem a função de resolução. Cada um dos acordes aumentados pode resolver seis acordes distintos, cobrindo, assim, como os diminutos, as 24 tonalidades maiores e menores.

3 MODULAÇÃO

A modulação é o processo de transitarmos, ou seja, passarmos de uma tonalidade para a outra. Quando realizamos uma modulação, estamos nos servindo de acordes mais próximos da nova tonalidade que queremos alcançar. Em outras palavras, passamos a utilizar mais dos acordes da nova tonalidade, mas

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UNIDADE 1 — HARMONIA

que são comuns à tonalidade que estamos abandonando, até realizarmos uma cadência para a nova tonalidade. Por exemplo: utilizar acordes de empréstimo modal nos permite transitar entre o modo maior e o modo menor. Ao fazermos isso, estamos modulando do modo maior para o modo menor. Esse é o exemplo mais simples de modulação.

Quando modulamos para tonalidades com menor afinidade, com o tom de origem (tonalidades distantes), essa modulação requer um trabalho harmônico mais cuidadoso, pois necessita de uma grande quantidade de acordes para realizar uma progressão harmônica que leve o novo tom de forma natural. Em outras palavras, serão necessários mais acordes, que permitam a transição de uma tonalidade para a outra.

Quando compreendemos o processo de modulação, conseguimos tocar a mesma música em várias tonalidades diferentes. Se modulamos para outro tom dentro de uma mesma música, esse recurso oferece cores diferentes para o arranjo. A seguir, podemos conferir uma dica simples de como realizar essa modulação: https://www.youtube.com/watch?v=U3ijvjI--BU.

DICAS

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• As tonalidades geram os campos harmônicos.

• A partir de uma tonalidade, é possível especificar a função que cada acorde do campo harmônico ocupa dentro da harmonia.

• As cadências formam estruturas maiores, que pontuam o discurso musical, oferecendo oportunidades de resolução ou de seguimento do discurso musical.

• As alterações, simples ou complexas, transformam um acorde em uma nova possibilidade harmônica, construindo uma linha melódica entre os acordes.

• A modulação pode ser alcançada de forma mais natural, utilizando-se cromatismos criados entre os acordes com notas alteradas.

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1 Uma cadência pode ser entendida como uma sequência de dois ou de mais acordes que completam uma ideia do compositor, conferindo fluxo para o discurso musical. As cadências são encontradas sempre que há um movimento harmônico em direção a um acorde de Tônica (primeiro grau de uma tonalidade). Acerca dos tipos de cadência, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A cadência plagal apresenta a sequência de acordes IV – I.b) ( ) A cadência à Dominante apresenta a sequência de acordes V – I.c) ( ) A cadência perfeita apresenta a sequência de acordes I – III.d) ( ) A cadência imperfeita apresenta a sequência de acordes I – II.

2 Acordes de um campo harmônico podem assumir funções específicas dentro de uma progressão harmônica, e são chamadas de funções harmônicas, ou funções tonais. Acordes diferentes do V grau da escala, por exemplo, podem assumir a função de Dominante (que é, originalmente, uma função do acorde formado sobre o V grau da escala). Acerca das funções harmônicas ou funções tonais, analise as sentenças a seguir:

I- São acordes que podem assumir a função de Dominante: V e VIIO.II- São acordes que podem assumir a função de Subdominante: V e VII. III- São acordes que podem assumir a função de Subdominante: IV, II.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Os acordes com sexta são aqueles que têm a sexta do acorde acrescentada na composição, e que desempenham, dentre outras, a função de facilitar a progressão de acordes. Dentre esses acordes, há o acorde de sexta napolitana. Disserte acerca da formação e da resolução das notas desse acorde.

4 Pode-se afirmar que existem três acordes diminutos. Pela característica estrutural, constituídos de três terças menores sobrepostas, os acordes diminutos podem estabelecer vá rias relações a partir de substituições enarmônicas. Explique quais são os três acordes diminutos, que função eles assumem dentro de uma progressão harmônica e quais as resoluções possíveis.

AUTOATIVIDADE

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TÓPICO 4 — UNIDADE 1

INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E

HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

1 INTRODUÇÃO

Neste último tópico, teremos contato com elementos que compõem as estruturas harmônicas presentes em muitas obras musicais, focando na leitura da simbologia musical tradicional, encontrada nas partituras. A expressão musical está conectada à organização da obra e aos princípios de composição, portanto, é necessário que o intérprete saiba decifrar os elementos e as estruturas musicais utilizados pelo compositor, para, assim, contextualizar e ampliar as possibilidades interpretativas.

Saber analisar uma obra musical permite compreender como pensavam os compositores de diferentes épocas, além das influências que permeiam as composições atuais. Mesmo quando uma obra parece ser uma criação totalmente nova, se analisarmos acordes, frases melódicas, dentre outras estruturas musicais, perceberemos que existem padrões que podem ser combinados ou que até permanecem iguais quando comparadas diferentes obras.

Este tópico pretende despertar o interesse e a necessidade de um estudo da análise harmônica, que faz parte da análise musical, oferecendo algumas ferramentas para a leitura de elementos que compõem uma música. Para isso, trilharemos caminhos de estudos pelos graus da escala e do campo harmônico, cifras, principais cadências, notas auxiliares, além da importância da análise harmônica e dos possíveis caminhos para a harmonização de melodias. A

2 REPRESENTAÇÃO DOS GRAUS DA ESCALA E CAMPO HARMÔNICO

Como já explanado nos tópicos anteriores, o campo harmônico é o

conjunto de acordes formados sobre cada nota de uma escala. Dessa forma, em uma escala maior, há:

• Acordes maiores: sempre aqueles formados sobre I, IV e V graus da escala.• Acordes menores: sempre aqueles formados sobre II, III e VI graus da escala.• Acorde diminuto: sempre aquele formado sobre VII grau da escala.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

Vamos nos aprofundar mais nesse assunto, por meio do estudo de Koentopp (2010), acerca da Harmonia e da Análise Harmônica. Destaca três autores, indicando que Schönberg (1999) e Piston (1987) usam algarismos romanos maiúsculos para representar todos os acordes, os maiores e os menores, diferente de Kostka & Payne (1984), que usam algarismos romanos maiúsculos para representar os acordes maiores e algarismos romanos minúsculos para os acordes menores. O “sinal (º) é usado com o algarismo minúsculo para o acorde diminuto, e o sinal (+) com o algarismo maiúsculo para o aumentado” (KOENTOPP, 2010, p. 31).

FIGURA 46 – SIMBOLOGIA DA ESCALA MAIOR

FONTE: Koentopp (2010, p. 31)

Como vimos anteriormente, a escala menor pode se apresentar sob três formas diferentes: “a escala menor natural, a escala menor harmônica (com o sétimo grau elevado em meio tom) e a escala menor melódica (com o sexto e o sétimo graus elevados na forma ascendente e naturais na forma descendente)” (KOENTOPP, 2010, p. 31). Devido às alterações no sexto e sétimo graus da escala menor (formas harmônica e melódica), podem ocorrer duas versões para cada acorde do modo menor.

FIGURA 47 – POSSIBILIDADES DE ACORDES NAS ESCALAS MENORES

FONTE: Koentopp (2010, p. 32)

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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Essas são as formas mais usuais de representação dos graus das escalas maiores e menores. Os algarismos romanos são sempre utilizados, podendo ser apresentados maiúsculos ou minúsculos, dependendo de alguns autores representantes da área. Os sinais diminutos ou aumentados também podem sofrer variações, sendo, estas, aqui apresentadas, nas formas mais tradicionais.

Saber identificar os graus da escala e a representação escrita (algarismos romanos) é de suma importância para a análise musical, e para orientarmos a nossa percepção sonora referente aos graus do campo harmônico. Ao pensarmos na função harmônica por meio dos graus, educamos nossos ouvidos para realizarem modulações de tonalidade de forma mais dinâmica, assim, é possível perceber a harmonia das melodias de forma mais fluida, sendo mais fácil identificar os acordes das músicas.

2.1 CIFRAS

Para a análise musical, vale relembrar de uma das formas de representação dos acordes: a cifra. Cifra é o nome dado ao símbolo que indica as notas que formam um acorde (tríade ou tétrade), sem precisar estar escrito em notas musicais no pentagrama. Cada nota musical tem uma letra que a representa, e aqui, no Brasil, utilizamos as mesmas letras da cifra inglesa, que é um pouco diferente da alemã, por exemplo.

QUADRO 3 – CIFRAS DAS SETE NOTAS MUSICAIS

FONTE: O autor

Lembremos que uma tríade pode ser maior, menor, aumentada ou diminuta, podendo ser representada pelos seguintes exemplos, respectivamente: C, Cm, Caum e Cdim. As tríades podem estar em Estado Fundamental (nota que dá nome ao acorde é a mais grave), em 1ª Inversão (quando a terça do acorde é a nota mais grave), e 2ª Inversão (quando a 5ª do acorde é a nota mais grave).

As tétrades são formadas por quatro notas e podem estar em Estado Fundamental (nota que dá nome ao acorde é a mais grave), em 1ª Inversão (quando a terça do acorde é a nota mais grave), 2ª Inversão (quando a 5ª do acorde é a nota mais grave), e 3ª Inversão (quando a 7ª do acorde é a nota mais grave).

Cada grau do campo harmônico maior ou menor tem uma cifra

correspondente ao acorde formado nesses graus, formados de acordo com cada tonalidade.

Nota DÓ RÉ MI FÁ SOL LÁ SICifra C D E F G A B

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UNIDADE 1 — HARMONIA

2.2 PRINCIPAIS CADÊNCIAS

Estudar as cadências nos ajuda a perceber a tonalidade e a harmonização das melodias. Os papéis principais de uma cadência, de acordo com Piston (1987) apud Koentopp (2010, p. 111), são “marcar as respirações afirmadas na música, [ou seja, as frases musicais]; estabelecer e confirmar a tonalidade e tornar coerente a [forma estrutural da peça]”. Para nos aprofundarmos um pouco mais no tema, usaremos a análise realizada na pesquisa de Koentopp (2010), em que ele aponta os tipos de cadência, comparando três autores: Schoenberg (1999; 2004), Piston (1987) e Kostka & Payne (1984).

• Cadência Autêntica Perfeita

Cadência Autêntica Perfeita é aquela cujo encadeamento forma a progressão V – I. Os acordes se encontram em estado fundamental (quando a nota mais grave é a nota que dá nome ao acorde), e a melodia terminando na tônica. O V grau pode vir acompanhado da sétima, ou não. Pode-se utilizar a Cadência Autêntica para concluir uma frase ou o fim da música.

FIGURA 48 – BACH, O CRAVO BEM TEMPERADO, II FUGA Nº 9

FONTE: Piston (1987, p. 172) apud Koentopp (2010, p. 111)

• Cadência Autêntica Imperfeita

Cadência Autêntica Imperfeita é aquela cujo encadeamento forma a progressão V – I, podendo, um dos acordes, ou ambos, estar invertidos. Nesse caso, o resultado sonoro de resolução e de finalização dessa cadência fica mais fraco, se comparado à Cadência Autêntica Perfeita. O V grau pode, novamente, estar acompanhado da sétima. “Cadência Autêntica Imperfeita é a utilização do VII° como substituto do V grau (VII° - I)” (KOENTOPP, 2010, p. 112).

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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FIGURA 49 – BACH, BEFIEHL DU DEINE WEGE

FONTE: Kostka & Payne (1984, p. 149) apud Koentopp (2010, p. 112)

• Meia Cadência

Meia Cadência ou Semicadência é aquela cujo encadeamento forma a progressão a partir da qual a frase termina no V grau. O V grau pode ser precedido por qualquer acorde. Esse tipo de cadência é comumente usado desde o período Barroco, para finalizar a primeira parte de duas frases (a segunda acaba com Uma Cadência Autêntica Perfeita).

FIGURA 50 – BACH, CHORALE Nº 1, AUS HERZENS GRUNDE

FONTE: Piston (1987, p. 175) apud Koentopp (2010, p. 112)

• Cadência Interrompida

Também conhecida por Cadência de Engano, ou, em inglês, Deceptive Cadence, é aquela cujo encadeamento forma a progressão V – I, mas o I é substituído por outro acorde. O mais comum visto é a aparição do VI grau, apesar de outros graus também poderem aparecer, mantendo a decepção da conclusão. A função dessa cadência é a de prolongar o discurso musical, oportunizando a apresentação de mais ideias musicais.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

FIGURA 51 – HAYDN, SONATA Nº 4, II MOV

FONTE: Kostka & Payne (1984, p. 149) apud Koentopp (2010, p. 115)

• Cadência Plagal

A Cadência Plagal é aquela cujo encadeamento forma a progressão IV – I. É uma cadência conclusiva, porém, com um poder de resolução menor do que a cadência autêntica perfeita. A Cadência Plagal pode reforçar a “confirmação da tonalidade, vindo após uma cadência autêntica. É, também, conhecida pelo nome de “Cadência o Amem”, pela vasta utilização em hinos religiosos” (KOENTOPP, 2010, p. 115).

FIGURA 52 – DYKES, HOLY, HOLY, HOLY!

FONTE: Kostka & Payne (1984, p. 151) apud Koentopp (2010, p. 115)

• Cadência Frígia

Cadência Frígia é aquela cujo encadeamento forma a progressão IV⁶ – V no modo menor. Via de regra, é uma cadência utilizada como finalização de movimento lento ou fim de uma introdução que precede um movimento rápido. É importante salientar que o nome Frígia, a que se refere a cadência, não indica que a música esteja no modo frígio (sistema modal).

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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FIGURA 53 – BACH, CONCERTO PARA BRANDENBURGO Nº 4, II MOV

FONTE: Piston (1987, p. 184) apud Koentopp (2010, p. 115)

3 NOTAS AUXILIARES

São consideradas notas auxiliares: Nota de Passagem, Bordadura, Suspensão, Retardo, Apojatura, Escapada, Grupo de Bordadura, Antecipação e Nota Pedal, ou seja, notas que não pertencem ao acorde, e que são utilizadas para conectar a melodia (de forma diatônica ou cromática). Continuaremos seguindo a linha de pensamento de Koentopp (2010), para estudarmos os conceitos relacionados às notas auxiliares.

• Nota de Passagem

As notas de passagem devem ser realizadas, melodicamente, por graus conjuntos. Podem ser de segundas maiores ou menores (diatônicas ou cromáticas). As notas de passagem também podem auxiliar no processo de modulação.

FIGURA 54 – BACH - CHORALE Nº 139, JESU, DER DU MEINE SEELE

FONTE: Piston (1987, p. 117) apud Koentopp (2010, p. 164)

• Bordadura

A Bordadura, em uma comparação com a costura de roupas, serve para ornamentar uma nota. Também pode ser diatônica ou cromática. A bordadura

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UNIDADE 1 — HARMONIA

pode ocorrer com uma nota acima ou abaixo da nota principal, e estar presente em mais de uma voz ao mesmo tempo. É importante salientar que as notas repetidas (de origem e fim) podem, ou não, pertencer ao mesmo acorde.

FIGURA 55 – BORDADURA

FONTE: Piston (1987, p. 121) apud Koentopp (2010, p. 165)

• Suspensão

A Suspensão ocorre quando uma nota se mantém soando, enquanto o acorde abaixo dessa nota muda. A nota que se mantém soando deve estar ligada (quando não estiver ligada, deve ser uma apojatura), e o mais adequado é resolver por grau conjunto descentente. De igual importância, a suspensão deve ocorrer em tempo forte ou parte forte de tempo, e pode ocorrer em mais de uma voz simultaneamente.

FIGURA 56 – SUSPENSÃO E APOJATURA

FONTE: Piston (1987, p. 127) apud Koentopp (2010, p. 166)

É possível, ainda, que uma sucessão de suspensões possa ocorrer, sendo denominada, portanto, de cadeia de suspensões (KOENTOP, 2010)

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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FIGURA 57 – BACH - SUITE FRANCESA Nº 2, SARABANDE

FONTE: Kostka & Payne (1984, p. 174) apud Koentopp (2010, p. 166)

• Retardo

O retardo, em definição, é semelhante à Suspensão. A diferença é que deve resolver por graus conjuntos ascendentemente.

FIGURA 58 – RETARDO

FONTE: Schönberg (1999, p. 467) apud Koentopp (2010, p. 167)

• Apojatura

Apojatura significa apoiar. Apojatura é o apoio de uma nota que pode ou não pertencer ao acorde. Deve sempre ocorrer em tempo forte ou parte forte do tempo (apoio). Deve ser antecedida (preparada) por um salto e resolver por grau conjunto, diatônico ou cromático, descendente. Se a resolução for ascendente, deve sempre ocorrer na relação sensível – tônica.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

FIGURA 59 – APOJATURAS

FONTE: Piston (1987, p. 124) apud Koentopp (2010, p. 167)

Salientamos que a apojatura pode estar escrita como uma pequena nota, como na figura a seguir:

FIGURA 60 – BEETHOVEN - SONATA, OP. 2, Nº I, III

FONTE: Piston (1987, p. 125) apud Koentopp (2010, p. 168)

Além das características definidas anteriormente, a sonoridade auxilia na distinção da ornamentação.

• Antecipação

Atecipação é o contrário do retardo. Na antecipação, a resolução de uma nota/acorde acontece antes da chegada da nota do baixo à fundamental do acorde, sendo prolongada até a chegada da nota do baixo na tônica. Veja o exemplo a seguir, com a) um retardo e b) uma antecipação.

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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FIGURA 61 – ANTECIPAÇÃO

FONTE: Schönberg (1999, p. 477) apud Koentopp (2010, p. 170)

• Nota Pedal

A Nota Pedal é um recurso advindo do repertório organístico. No órgão, enquanto os pés sustentam uma única nota por tempo prolongado, as mãos do organista ficam livres para improvisar. Por definição, a Nota Pedal é uma nota que não pertence ao acorde, e não é melódica. É, simplesmente, um som que se mantém durante várias trocas de acordes. É, geralmente, mais utilizada na voz do baixo, podendo ocorrer em outras vozes do acorde. O pedal pode ser de curta duração, preenchendo apenas um compasso, por exemplo. Se utilizarmos um pedal duplo, de tônica e dominante juntos, perceberemos que o efeito produzido é de grande reforço da tonalidade.

FIGURA 62 – TCHAIKOVSKY - O QUEBRA NOZES, DANÇA ÁRABE

FONTE: Piston (1987, p. 134) apud Koentopp (2010, p. 172)

4 SOBRE ANÁLISE HARMÔNICA

A Análise Harmônica nada mais é que reconhecer, em um trecho musical, as estruturas harmônicas presentes na composição, além da relação entre os acor-des utilizados pelo compositor para harmonizar as melodias. Todos os elementos estudados neste tópico servem de ferramentas para a análise harmônica.

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UNIDADE 1 — HARMONIA

Através da análise (observação), podemos reconhecer, na partitura, acordes, tonalidades, cadências, e quaisquer outras estruturas que nos ajudem a compreender as ideias musicais de um compositor. Nessa direção, a análise harmônica é uma parte da análise musical que fica responsável por estudar os aspectos, as estruturas harmônicas e as relações dentro de uma composição.

5 HARMONIZANDO MELODIAS

Para harmonizar melodias, é importante o reconhecimento dos desenhos melódicos do trecho sobre o qual se deseja harmonizar. Reconhecer as notas de apoio, se são notas ornamentais ou se elas possuem força harmônica (especialmente, quando caem no tempo forte).

Um passo seguinte pode ser escolher quais acordes do campo harmônico da tonalidade possuem, nas formações, as notas consideradas fortes harmonicamente. Devemos lembrar que uma melodia sempre segue a mesma ideia de uma cadência. Logo, as cadências que aprendemos até aqui servirão e muito de suporte para as harmonizações.

De acordo com Kostka & Payne (1984) apud Koentopp (2010), cada nota da

melodia pode ser a fundamental, ou a terça, ou a quinta de um acorde do modo maior ou menor. Por conta disso, é importante que se comece pelos primeiros acordes da música, definindo a tonalidade, e, então, pelos últimos acordes, que são definidos por uma cadência forte (geralmente, uma cadência autêntica perfeita).

O último passo seria, então, de acordo com o acorde inicial e os finais, escolher os acordes intermediários, construindo toda uma sequencia harmônica para a música. Após harmonizada a melodia, deve-se executar a harmonia com a melodia, e perceber, sonoramente, se a escolha dos acordes está coerente com o fluxo melódico (KOENTOPP, 2010). Para facilitar o encadeamento dos acordes, e deixar o discurso ainda mais fluído, podemos utilizar a inversão dos acordes.

Assista aos vídeos que seguem, para ter acesso a exemplos sonoros e práticos da teoria. Nos links, você encontrará dicas de como analisar a função dos acordes de uma música, usar acordes diminutos com função dominante, reconhecer acordes homônimos, dentre outras particularidades da análise harmônica. A dica é assistir na sequência sugerida. Bom estudo! https://www.youtube.com/watch?v=ZCtJai_Ifvo, https://www.youtube.com/watch?v=6dQq3Yi1qyU e https://www.youtube.com/watch?v=KMSPdcOleOk.

DICAS

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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É de vital importância que se pratique a análise de corais, para se ter familiaridade com encadeamentos e escolhas harmônicas possíveis. Dessa forma, estaremos criando, na nossa mente, um “banco de dados” de possibilidades harmônicas, cadências e encadeamentos, que poderão ser utilizados quando harmonizamos uma melodia.

Além dos passos de harmonização de melodias aqui indicados, existem outros caminhos para a harmonização. Acessando os três vídeos que seguem, você conhecerá diferentes exemplos de como harmonizar uma melodia: https://www.youtube.com/watch?v=WnEZRWjsY7I, https://www.youtube.com/watch?v=2neJjUOY1MU e https://www.youtube.com/watch?v=-ykUW2BLRCQ.

DICAS

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UNIDADE 1 — HARMONIA

CONSIDERAÇÕES DA HARMONIZAÇÃO E DA MÚSICA POPULAR NA DISCIPLINA PIANO COMPLEMENTAR

Liliana Harb Bollos Carlos Henrique Costa

[...]

O piano é uma ferramenta básica fundamental no estudo da música pela facilidade de visualização de conceitos, pois permite, ao pianista, uma visão geral do teclado e a distinção das teclas brancas e pretas, o que facilita a localização dos intervalos e dos acordes. Por conta das diferentes possibilidades melódicas, rítmicas, harmônicas, polifônicas e expressivas, o estudo passou a ser defendido como uma necessidade básica na formação do músico e do professor de música. [...]

O conhecimento da harmonia é, de fato, uma ferramenta imprescindível no aperfeiçoamento do estudo do piano, e deve ser considerado parte integrante do conteúdo das muitas habilidades que um pianista deve praticar. A harmonização de melodias e de acordes, o estudo sistemático de cadências harmônicas e a praticabilidade são fundamentos essenciais na formação de qualquer músico, principalmente, dos que atuarão no ensino e terão o piano como instrumento auxiliar. [...]

Nesse artigo, os autores apresentam duas opções de raciocínio e de harmonização da canção tradicional popular Sambalelê.

Música popular e ensino

[...]

Embora o ensino do piano popular nas universidades brasileiras seja relativamente recente, há, no Brasil, um expressivo número de profissionais dessa área que atua no mercado há décadas, longe do meio acadêmico, o que denota que há um vasto campo de pesquisa nesse âmbito. Historicamente, o ensino da prática de música popular tem sido difundido através de músicos autodidatas e de professores, porém, a produção de pesquisas no campo da música popular tem se tornado mais ampla e reconhecida. Alguns autores (ARROYO, 2002; COUTO, 2014; SANDRONI, 2000) discutem a dicotomia música popular versus música clássica e apontam que a inclusão da música popular como conteúdo nas aulas de música em diferentes níveis já é vista com naturalidade. Acreditam que o ensino da música popular está às margens de sistemas formais de ensino musical e é preciso pensar em metodologias que sejam mais apropriadas ao contexto.

LEITURA COMPLEMENTAR

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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No cenário atual, discute-se muito acerca dos diferentes ambientes, repertórios e formas de ensino entre as músicas popular e erudita, mas relativamente pouco das metodologias e dos procedimentos pedagógicos que envolvem o ensino da música popular. No ensino da música erudita, por outro lado, diversos métodos e repertórios têm sido amplamente disseminados há mais tempo, de modo que professores e estudantes conhecem a trajetória de estudo e o repertório. O que acontece, com frequência, no entanto, é que os docentes acabam trabalhando, com os alunos, o mesmo material estudado por diversas gerações. Já no ensino da música popular, os materiais pedagógicos disponíveis no mercado ainda são escassos, e os professores estão em constante busca de novos materiais (MELO, 2002; COUTO, 2008; COSTA; GORETE, 2012; SANTOS, 2013; BOLLOS, 2017). Um fundamento muito importante para o ensino do piano popular é o estudo de progressão de acordes em diferentes níveis, que proporciona, ao aluno, no correr do tempo, autonomia para analisar qual a melhor posição, escolher, criar e, finalmente, executar, ao piano, determinada harmonia que se lê em cifras.

[...]

O contexto histórico da Harmonia

[...] Há três sistemas de análise harmônica que são os mais utilizados internacionalmente (MATTOS, 2009). A análise Gradual define a origem dos acordes como graus de escalas e é realizada por meio de numerais romanos que indicam os respectivos graus, por exemplo, o acorde formado sobre o primeiro grau da escala de Sol Maior é cifrado com o símbolo ‘I’, o acorde sobre o quarto grau é cifrado com ‘IV’ e o quinto grau é cifrado com ‘V’. A análise Funcional determina a função de cada acorde no contexto específico em que ocorre em determinada frase musical e é realizada por letras que indicam as funções harmônicas. Assim, o acorde de primeiro grau da escala de Sol Maior, que tem função de Tônica, é cifrado com ‘T’, o acorde sobre o quarto grau, que tem função de Subdominante, é cifrado com ‘S’, e o acorde sobre o quinto grau, que tem a função de Dominante, cifra-se com ‘D’. A análise Cordal determina, com detalhes, as características de cada um dos acordes e é realizada com letras alfabéticas que indicam a fundamental dos acordes (p. ex.: o primeiro grau da escala de Sol Maior é um acorde de Sol maior e é cifrado com a letra ‘G’). Em suma, os três princípios de análise harmônica são úteis e se complementam, visto que nenhum deles tem a capacidade de explicar os processos harmônicos no seu todo. Por outro lado, cada um dos métodos é eficaz na análise e na classificação daquilo que busca demonstrar (MATTOS, 2009).

[...]

Em suma, além de ser tratada como disciplina teórica, a harmonia deve ser vista como um alicerce do conhecimento musical voltado à performance e à prática instrumental. Por sua vez, a capacidade de harmonizar melodias está diretamente ligada à aplicabilidade que se faz dela diretamente no instrumento. Podemos, então, afirmar que fundamentos, como harmonização, transposição,

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UNIDADE 1 — HARMONIA

improvisação e acompanhamento estão interligados. Para tanto, é necessário que se trabalhe com várias progressões de acordes de forma sistemática e gradual, para que o aluno consiga incorporar plenamente a sistematização e as aberturas de acordes.

Harmonização na cantiga de roda Sambalelê

[...]

Antes de iniciar a atividade Sambalelê, apresentamos, aos alunos, a escala na mesma tonalidade com tríades superpostas em cada nota da escala, compondo o campo harmônico de Fá maior. [...] Ao montar o campo harmônico de Fá maior (F, Gm, Am, Bb, C, Dm e Edim), o aluno tem a oportunidade de reconhecer os três tipos de tríades que aparecem no campo harmônico maior de Fá maior: a maior (com terça maior e quinta justa), a menor (com terça menor e quinta justa) e a diminuta (com terça menor e quinta diminuta). Logo após, apresentamos a melodia da canção para que os alunos percebam o movimento e o repouso dos acordes, e façam uma análise melódica na música. Com base na relação de funções de acordes, dois acordes foram escolhidos, Fá maior (F) e Dó com sétima menor (C7). [...]

Um outro recurso de harmonização é distribuir os acordes nas duas mãos, com duas notas na mão esquerda, contendo a fundamental e a terça no acorde tônico e a fundamental e a sétima no acorde dominante [...]. Neste caso, a tônica (Fá maior) é sempre executada com a fundamental e terça do acorde (dedilhado 2 e 1), e a função dominante (Dó com sétima) executa sempre na mão esquerda a fundamental e a sétima (dedilhado 5 e 1). A mão direita, por sua vez, toca a melodia e, quando a função for dominante, tocará a terça com a melodia, distribuindo o acorde entre as duas mãos. Essa técnica na mão esquerda dá origem à técnica de distribuição, com acordes abertos, descrita anteriormente (BOLLOS, 2011; 2017). [...]

Considerações finais

[...]

Como já pontuamos, a harmonização de melodias na música popular está vinculada ao estudo sistemático da harmonia e de progressões de acordes em diferentes etapas do processo de ensino-aprendizagem que um pianista ou estudante de piano (ou teclas, em geral) pode desenvolver. Temos de levar sempre em conta a melodia, a escolha do tipo de acorde, a montagem do acorde, se será com a mão esquerda em tríade fechada, em tétrade fechada, em distribuição, ou dividindo o acorde e a melodia com a mão direita. Aqui, reside o maior desafio de se tocar piano popular, a criação da harmonização e do arranjo.

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TÓPICO 4 — INTRODUÇÃO À ANÁLISE HARMÔNICA E HARMONIZAÇÃO DE MELODIAS

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Um dos meios mais eficazes para conseguir pensar harmonicamente é entender o caminho que os acordes percorrem na música para melhor compreender, assimilar e, consequentemente, memorizar o trajeto. [...]

FONTE: BOLLOS, L. H.; COSTA, C. H. Considerações sobre harmonização e música popular na disciplina Piano Complementar. Belo Horizonte: UFMG, 2017. p. 1-19. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/permusi/article/view/5166/3208. Acesso em: 9 out. 2020.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• As cadências são estruturas harmônicas que determinam o fluxo do discurso musical.

• Cada cadência gera uma ideia sonora de continuidade ou de resolução.

• As notas auxiliares dão suporte no encadeamento dos acordes, conectando um acorde a outro por cromatismos.

• A análise harmônica trata do reconhecimento de encadeamentos harmônicos, cadências e interconexões (notas auxiliares).

• Para harmonizar melodias, é preciso reconhecer cadências a partir de uma melodia, que, geralmente, é construída com os graus da escala e as notas auxiliares.

• Embora a música não seja uma linguagem, no sentido estrito de uma língua verbal, possui uma sintaxe interna reforçada pela harmonia que constrói um discurso sonoro.

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

CHAMADA

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1 O campo harmônico pode ser encontrado montando um acorde sobre cada nota de uma escala. Acerca do campo harmônico, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Em um campo harmônico de uma escala maior, o segundo e terceiro graus da escala são acordes maiores.

b) ( ) Em um campo harmônico de uma escala menor, o acorde com função de Dominante é aquele formado sobre o sexto grau da escala.

c) ( ) Em um campo harmônico de uma escala menor natural, o acorde formado sobre o segundo grau da escala é um acorde maior.

d) ( ) Em um campo harmônico de uma escala maior, o acorde formado sobre o sétimo grau da escala é um acorde diminuto e pode assumir, eventualmente, a função de Dominante.

2 As cadências são estruturas harmônicas eficientes e sonoramente orgânicas

que coordenam o fluxo do discurso musical, pontuando as ideias do compositor. Com base nos seis tipos de cadências, analise as sentenças a seguir:

I- A Cadência Autêntica Perfeita finaliza a frase musical com a sequência V - I.

II- A Cadência Interrompida finaliza a frase musical com a sequência VIIo – I.III- A Cadência Frígia é utilizada em tonalidades menores e finaliza a frase

musical com a sequência IV⁶ - V.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 As notas auxiliares ou notas de passagem servem para fazer uma conexão melódica, diatônica ou cromática, unindo duas ou mais notas. A primeira e a última nota podem ou não pertencer ao mesmo acorde. Com base nos tipos de notas auxiliares ou de passagem, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) A bordadura serve para ornamentar uma nota. Pode ser diatônica ou cromática.

( ) A suspensão deve estar em tempo forte ou parte forte do tempo, e deve ocorrer em uma única voz do acorde.

( ) A apojatura sempre ocorre em tempo forte ou parte forte de tempo, a preparação se dá por salto, e a resolução é por grau conjunto, diatônico ou cromático, descendente.

AUTOATIVIDADE

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Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Ainda a respeito das notas auxiliares, explique a Nota Pedal.

5 A harmonização de melodias segue alguns passos importantes, que nos ajudam a reconhecer o caminho harmônico a partir da observação das notas da melodia. Disserte acerca dos possíveis caminhos para a harmonização de melodias.

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REFERÊNCIAS

ASSIS, C. A. Harmonia e análise musical. 2016. Disponível em: https://www.passeidireto.com/arquivo/72082104/apostila-harmonia-e-analise-musical. Acesso em: 4 out. 2020.

KOENTOPP, M. A. Métodos de ensino de harmonia nos cursos de graduação musical. UFPR: Curitiba, 2010. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/bits-tream/handle/1884/24368/Dissertacao%20Marco%20Koentopp.pdf?sequence=1. Acesso em: 24 out. 2020. KOSTKA, S.; PAYNE, D. Tonal harmony with an introduction to twentieth--century music. 5. ed. New York: Mac Graw Hill, 1984.

PISTON, W. Harmony. 5. ed. New York: Norton & Company, 1987.

SCHÖNBERG, A. Funções estruturais da harmonia. São Paulo: Via Lettera, 2004.

SCHÖNBERG, A. Harmonia. São Paulo: Unesp, 1999.

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UNIDADE 2 —

ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os fundamentos do contraponto musical;• assimilar termos e normas elementares para a composição contrapon-

tística;• desenvolver o raciocínio para a construção melódica e a condução de

vozes;• identificar a sonoridade-característica de obras contrapontísticas nos di-

versos períodos da história da música.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTALTÓPICO 2 – MODOS ECLESIÁSTICOSTÓPICO 3 – CONDUÇÃO MELÓDICA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 1, faremos a contextualização histórica da prática do contraponto no cenário da música ocidental, com recorte na música europeia. Nessa abordagem, estão expressos paradigmas e aspirações que conduziram o desenvolvimento da música ao longo dos séculos. Ainda, este tópico está dividido em dois eixos: o contraponto na história da música ocidental, e elementos do contraponto musical.

No primeiro eixo, estudaremos a origem e as principais características do contraponto praticado desde a música medieval até o século XX. No segundo eixo, você conhecerá as terminologias e os elementos que constituem a composição contrapontística.

Ao término deste tópico, você conseguirá compreender a estrutura de obras que representam os períodos na história da música ocidental, e desenvolver habilidades para o fazer musical. O estudo do contraponto, que seguirá até o fim desta unidade, contribuirá, ainda, para o desenvolvimento do seu ouvido musical, das suas percepções para a análise musical e da coerência do pensamento criativo nos atos de compor e de improvisar na música.

2 O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

É interessante observar que o discurso a respeito da história da música ocidental inicia, comumente, entre os três primeiros séculos da igreja cristã. Esta condenou parte da cultura herdada dos povos antigos, de gregos, romanos e sociedades mistas do mediterrâneo oriental, e rejeitou a música como entretenimento, julgando que o prazer proporcionado pela arte seria capaz de dissuadir o número crescente de convertidos ao passado pagão. Como comentam Grout e Palisca (1988, p. 35), “essa atitude chegou a suscitar, de início, uma grande desconfiança em relação a toda a música instrumental”. Dessa forma, no cenário musical europeu que antecedeu a prática do contraponto, destacava-se a música vocal litúrgica de textura monofônica, “constituída por uma única linha melódica, destituída de qualquer espécie de harmonia” (BENNETT, 1986, p. 12), a chamada cantochão.

TÓPICO 1 —

O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA

MÚSICA OCIDENTAL

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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O cantochão continha frases e períodos musicais, assim como os textos litúrgicos, dos quais se apropriava. A linha melódica apresentava, comumente, a forma de um arco, que iniciava com notas graves, atingia um ponto culminante ascendentemente, e retornava para a região próxima da qual iniciou. Tinha, como propósito, evidenciar o texto litúrgico, e, para isso, mantinha a acentuação musical branda, e imprimia, na melodia, o ritmo do texto.

O cantochão apresentava três tipos de classificação: a primeira compreendia o tipo de texto que era usado, podendo ser textos bíblicos que, comumente, tratavam-se de prosa, como lições do ofício, evangelho da missa, epístola e salmos, e textos não bíblicos, como hinos. A segunda classificação era a respeito da maneira como se cantava o cantochão, podendo ser na forma de responsório, quando havia resposta do coro a uma voz solista; na forma antífona, quando os coros cantavam alternadamente; e na forma direta, em que não existiam divisão em grupos e alternância. A terceira classificação se baseava na relação entre texto e canto, podendo ser silábico quando cada sílaba do texto apresentava uma nota correspondente, ou melismático, quando uma única sílaba era entoada por uma sequência de notas (GROUT; PALISCA, 1988).

FIGURA 1 – EXEMPLO DE CANTOCHÃO

FONTE: Grout e Palisca (1988, p. 41)

Com o passar do tempo, os compositores passaram a buscar novas texturas, o aprimoramento da construção melódica, e um sistema de notação musical mais preciso. A partir desse momento, pode-se observar que o início da prática polifônica ou contrapontística impulsionou, de forma significativa, o desenvolvimento musical através dos séculos.

O contraponto é a técnica composicional de coordenar e de sobrepor linhas melódicas independentes. Essas linhas melódicas são criadas a partir de uma melodia já existente, chamada de cantus firmus. A palavra “contraponto” deriva da expressão em latim “punctum contra punctum”, que pode ser traduzida como “nota contra nota”.

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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Para a melhor compreensão, pense que você deve cantar uma melodia de cinco notas. Eu tendo, como referência, a sua linha melódica, criarei outra linha melódica de cinco notas. Será uma melodia diferente, mas que manterá, de certa forma, relação com a sua melodia. Ao cantarmos essas duas melodias ao mesmo tempo, estaremos contrapondo linhas melódicas. Podemos criar e contrapor simultaneamente diversas linhas melódicas, porém, todas devem ser desenvolvidas a partir de uma melodia principal.

O livro Gradus ad Parnassum, publicado, em 1725, pelo austríaco Johann

Joseph Fux (1660-1741), apresenta um dos tratados de contraponto mais reconhecidos da história da música. De acordo com Ribeiro (2009), o compositor sistematizou o estudo do contraponto, e organizou o material em cinco categorias ou espécies, através das quais introduziu, gradativamente, as dificuldades rítmico-intervalares na construção e na combinação de melodias. Esse método orienta estudantes e musicistas na prática do contraponto até os dias atuais.

2.1 ORGANUM

O organum é a primeira forma de música polifônica ocidental de que temos registro. Tais composições datam do século IX, e são o resultado da busca constante dos compositores da época por novas sonoridades. Os elementos que constituem a composição, neste estilo, são: a voz principal (vox principalis), que entoa o cantus firmus, uma melodia de cantochão, e a vox organal (vox organalis), linha melódica que é adicionada e sobreposta à voz principal.

Podemos observar, entre os séculos IX e XIII, o surgimento de quatro importantes práticas de contraponto musical, compreendidas em: organum paralelo, oragnum livre, organum melismático e organum de Notre-Dame. Os tipos de organa se diferenciam pela maior independência oferecida às vozes no decorrer dos séculos.

O termo organa é utilizado para se referir ao plural de organum.

NOTA

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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2.1.1 Organum paralelo

O organum paralelo é a primeira organização de música polifônica ocidental. A voz principal entoa o cantus firmus, extraído do cantochão, enquanto a voz organal duplica essa mesma linha melódica uma quarta ou quinta justa abaixo.

FIGURA 2 – ORGANUM PARALELO

FONTE: Bennett (1986, p. 14)

Ambas as vozes podem, ainda, ser duplicadas por uma voz oitava abaixo. É importante observarmos, aqui, o princípio do contraponto de “nota contra nota”.

2.1.2 Organum livre

Em meados do século XI, os compositores começam a tratar da voz organal com muita independência. Esta deixa de ser uma cópia da voz principal e passa a adotar, além do movimento paralelo, os movimentos direto, contrário e oblíquo.

• Movimento direto: quando ambas as vozes adotam o mesmo sentido, como no organum paralelo, mas, aqui, a voz organal não precisa respeitar os mesmos intervalos adotados pela voz principal.

FIGURA 3 – EXEMPLO MOVIMENTO DIRETO

FONTE: Fux (2002, p. 6)

• Movimento contrário: quando a voz principal apresenta um intervalo ascendente e a voz organal se contrapõe com um intervalo descendente, e vice-versa.

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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FIGURA 4 – EXEMPLO MOVIMENTO CONTRÁRIO

FONTE: Fux (2002, p. 6)

Movimento oblíquo: quando a voz principal apresenta linha melódica fixa, sem movimentação, e a voz organal se contrapõe com uma linha melódica conduzida através de intervalos.

FIGURA 5 – EXEMPLO MOVIMENTO OBLÍQUO

FONTE: Fux (2002, p. 6)

No organum livre, a voz organal começa a aparecer escrita acima da voz principal, e, ainda que se conserve o princípio de nota contra nota entre as vozes, observa-se, já neste tipo de organum, as primeiras tentativas de oferecer duas notas em contraponto a uma nota da voz principal.

2.1.3 Organum melismático

No século XII, houve uma ruptura significativa com os padrões antigos do contraponto. O conceito de nota contra nota foi abandonado, e a voz principal passou a ser chamada de Tenor, que, em latim, significa “manter”. A voz principal mantém notas longas, enquanto a voz organal, assim como o nome deste tipo de organum sugere, entoa melismas em contraponto àquela.

No decorrer desta unidade, você aprenderá mais acerca desses movimentos aplicados na condução melódica, e terá acesso a outros exemplos das aplicações.

ESTUDOS FUTUROS

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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Melismas são conjuntos de notas de alturas próximas cantados em uma única sílaba. No organum melismático, a voz organal é escrita acima da voz principal.

FIGURA 6 – ORGANUM MELISMÁTICO

FONTE: Bennett (1986, p. 15)

Observe, no exemplo anterior, que a voz principal está representada por breves, figura musical de duração longa que entrou em desuso ao longo dos séculos, enquanto a voz organal é movimentada através do uso de semínimas e de colcheias.

2.1.4 Organum em Notre Dame

Com a construção da catedral de Notre Dame, no século XII, Paris vislumbrou a criação e o registro de organa com elevado grau de elaboração. Leónin e Perótin são dois dos compositores que chegaram ao nosso conhecimento, integrantes da chamada “Escola de Notre-Dame”.

Leónin, primeiro mestre de coro da catedral, contribuiu com expressivo

número de organa para a igreja. As composições visavam datas religiosas festivas, como a Páscoa e o Natal. Primava pela longa duração das notas na linha melódica do tenor (voz principal), que, em muitos casos, tinha a sustentação auxiliada por instrumentos, como sinos e órgão. Escrevia a voz organal sob unidades de tempo precisas e explorava padrões rítmicos ternários, como a métrica da poesia.

Perótin, sucessor de Léonin, revisou e modernizou os organa, compostos,

anteriormente, para a igreja. O trabalho foi marcado pela destreza em adicionar, aos organa, uma terceira (triplum) e uma quarta (quadruplum) voz.

A seguir, apresentaremos o trecho do organum quadruplum de Perótin, “Sederunt príncipe”. Observe que o compositor contrapõe, à voz do tenor, voz mais grave e com nota de longa duração, três vozes superiores com movimentação modal característica.

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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FIGURA 7 – TRECHO DE ORGANUM, DE PERÓTIN

FONTE: Grout e Palisca (1988, p. 111)

Dentre os principais tipos de composição da Escola de Notre Dame, encontra-se o conductus, que tinha, como finalidade, conduzir a movimentação do padre pela igreja. No conductus, a voz do tenor era composta, e não mais extraída do cantochão.

A notação musical precisa, que era, também, empregada à voz organal na Escola de Notre Dame, possibilitou experiências musicais interessantes para a época, como a composição em estilo descante. Neste, quando a voz organal apresentava uma sessão de melismas, os compositores rompiam com as longas notas do tenor, e imprimiam, a esta, a mesma rítmica da voz organal. O trecho do organum que registrava a movimentação abrupta do tenor era chamada de clausula.

O desenvolvimento do estilo descante foi significativo a ponto de os compositores adicionarem uma terceira voz ao organum, com passagens cada vez mais rápidas, e admitirem, na voz mais aguda, a adoção de outro texto, até mesmo, em outra língua. Esse novo estilo de composição, chamado de moteto, desenvolveu-se, também, fora da igreja. A voz do tenor pôde ser interpretada por instrumentos, e a terceira voz adicionada não precisou manter relação com as demais vozes, pois foi permitido responder a apenas uma delas, fato que permitiu conflitos intervalares dissonantes.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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FIGURA 8 – EXEMPLO MOTETO

FONTE: Bennett (1986, p. 175)

O moteto se tornou uma importante estrutura composicional da música polifônica. A grandeza se encontra na “combinação heterogênea de canções de amor, música de dança, refrãos populares e hinos sagrados, […] vertida em um rígido molde formal baseado no cantochão” (GROUT; PALISCA, 1988, p. 127).

Nos períodos que seguem, o moteto aparecerá, sobretudo, atrelado ao

isorritmo, ao cânone e ao estilo imitativo.

2.2 ARS NOVA

A publicação de tratados, no início do século XIV, como Ars Nova, de Phillipe de Vitry (1291 - 1361), e Ars Nove Musice (Arte da Música Nova), de Jehan des Murs (1290 - 1351), demonstra a consciência dos compositores da época de estarem rompendo com as concepções musicais dos séculos anteriores. Mesmo que tais inovações enfrentassem resistência por parte de alguns teóricos e compositores, o desenvolvimento e o refinamento musical chegaram a tal ponto que se tornou claro que, a partir daquele momento, as produções musicais estariam inseridas em uma nova época: uma “nova arte”, de “novas técnicas”, a “Ars Nova”.

Isorritmo: técnica composicional que utiliza o ritmo padrão durante um longo trecho da música. Esse padrão pode ser utilizado diversas vezes e sobre diferentes materiais melódicos durante a composição.Cânone: técnica composicional a partir da qual as vozes sobrepostas apresentam entradas sequenciais e reproduzem o mesmo material melódico. Imitativo: técnica composicional que faz uso da repetição de elementos melódicos entre as vozes. Estes podem reaparecer na composição de várias maneiras, como tendo o material expresso na forma invertida, retrógrada, com duração diminuída ou aumentada.

NOTA

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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Se, agora, existe uma nova maneira de pensar e de produzir arte, a música que estudamos anteriormente, especialmente, o período compreendido entre meados do século XII e fim do século XIII, passa a ser chamada de “Ars Antiqua”.

A Ars Nova vislumbrou a divisão binária; o desuso de figuras musicais

muito longas, como a “longa” e a “breve”; a composição fora do universo religioso; e todo o movimento que viria a desabrochar com a “música ficta” e os novos anseios socioculturais.

Guilherme de Machaut (c. 1.300 – 1.377) foi um dos mais notáveis

compositores do período. A obra contempla significativo número de motetos e de canções, e se destaca, na história, sobretudo, pela composição Messe de Notre-Dame (Missa de Nossa Senhora). Muitos teóricos apontam esta como a primeira composição a apresentar um arranjo polifônico completo da missa. Machaut apresenta, nessa composição, domínio incomum para a época dos contrapontos melódico e rítmico. A textura com quatro vozes, com a presença do contratenor, a unidade que imprime o todo ordinário da missa, composta de cinco partes, Kyrie, Glória, Credo, Sanctus e Agnus Dei, e a peça final Ite missa est jamais tinham sido apreciadas de tal maneira.

[...] A missa de Machaut é importante por causa das amplas proporções e textura a quatro vozes (invulgar na época), por ser claramente concebida como um todo musical e, sob todos os pontos de vista, uma obra de primeira grandeza. Nos séculos XII e XIII, os compositores de música polifônica tinham se interessado, principalmente, pelos textos próprios da missa, como exemplificam os graduais e aleluias dos organa, Léonin e Péroti. Musicavam, por vezes, certas partes do ordinário, mas, quando tais peças eram interpretadas conjuntamente, em um serviço religioso, a seleção e a combinação eram arbitrárias. Ninguém parecia dar a menor importância ao facto de o Kyrie, o Gloria, o Credo, o Sanctus e o Agnus Dei serem ou não do mesmo modo, baseados ou não no mesmo material temático, apresentando ou não, entre si, alguma espécie de unidade (GROUT; PALISCA, 1988, p. 139).

Segue o motivo utilizado por Machaut na composição de Messe de Notre-Dame:

FIGURA 9 – MOTIVO DA MISSA DE MACHAUT

FONTE: Grout e Palisca (1988, p. 140)

Ao fim do Sanctus, uma das partes da missa, nomeada como Benedictus, Guilherme de Machaut aplica a técnica característica da Ars Nova: o isorritmo.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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Esta era utilizada a fim de imprimir unidade a longas composições. Buscavam-se, através da interligação de padrões, sequências rítmicas (talea) e melódicas (color), a organização e a condução da peça. Nos primórdios da utilização da técnica isorrítmica, a talea era composta por uma sequência de poucas unidades rítmicas, porém, com o desenvolvimento, as sequências se tornaram cada vez mais longas e elaboradas, a ponto de estruturarem uma seção inteira da composição.

O exemplo que segue apresenta a parte final do Sanctus, mencionada

anteriormente, composta de cinco taleas. Note que a figura faz indicação de três desses padrões na voz do tenor:

FIGURA 10 – EXEMPLO DE TALEA EM BENEDICTUS, DE MACHAUT

FONTE: Bennet (1986, p. 20)

Vale ressaltar que o isorritmo foi amplamente desenvolvido no serialismo e no dodecafonismo do século XX.

2.3 O RENASCIMENTO O Renascimento foi um período representado por descobertas em muitos

âmbitos da vida humana. Importantes expedições marítimas exploratórias foram realizadas, assim como grandes avanços na astronomia e nas demais ciências. O teocentrismo cedeu lugar para o antropocentrismo, e o homem ocupou o centro do universo, em busca de respostas científicas a respeito da sua existência e da do mundo ao seu redor.

No âmbito musical, a valorização da cultura dos antigos povos gregos e romanos despertou, em muitos compositores, o interesse pela música profana e

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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pelo resgate de instrumentos antigos, que foram, no Renascimento, exaltados com composições instrumentais próprias e utilizados para o acompanhamento vocal. Contudo, ainda no interior da igreja, podemos observar a chamada “idade de ouro do contraponto”, cuja prática foi desenvolvida a tal ponto que, em muitos casos, o virtuosismo era enaltecido em detrimento, por exemplo, da inteligibilidade do texto litúrgico. O estilo polifônico coral, que consistia na composição para um ou para mais coros cantados a cappella (sem acompanhamento instrumental), marcou a música sacra renascentista.

O contraponto musical do período utilizava, ainda, a linguagem modal, porém, com significativo uso de acidentes, a chamada música ficta, que você estudará no próximo tópico. A missa e o moteto continuaram sendo as principais formas da música religiosa, agora, com o mínimo de quatro vozes, e com a exploração de registros abaixo do tenor, cuja linha melódica foi chamada de “baixo”. Os intervalos dissonantes passaram a exigir resolução, e a relação entre as vozes começou a manifestar um compromisso vertical. A textura se apresentava como uma trama sem “rupturas” audíveis, e não mais como a textura de camadas de nota contra nota dos períodos passados. A imitação foi uma técnica muito utilizada para garantir esse tipo de sonoridade:

O elemento-chave, nesse tipo de textura, é chamado imitação, ou seja, a introdução, por uma voz, de um trecho melódico que, imediatamente depois, será repetido ou copiado por outra voz. Nos fins de frase, quando a música pedia uma resolução, interrompendo o fluxo, o compositor, geralmente, introduzia uma nova modalidade de imitação: os acordes finais eram sustentados, enquanto umas das vozes surgia, trazendo nova ideia melódica, logo, imitada por outra voz (BENNETT, 1986, p. 24).

Os compositores Josquin des Prés (c. 1440 – 1521) e Giovanni da Palestrina (c. 1525 – 1594) se destacaram no cenário contrapontístico renascentista, o primeiro, por se apresentar à frente do tempo, e, o segundo, pela primazia composicional regida pelo conservadorismo.

Josquin des Près, compositor franco-flamengo, já trazia, na sua obra, os primeiros traços dos ideais humanistas. As composições contrapontísticas esbanjavam domínio de técnica e de expressividade, e apresentavam “articulação clara e facilmente apreensível, lógica e coerência formais, períodos contrastantes, princípio de repetição de trechos pequenos, sequências, ostinatos e o estabelecimento definitivo do estilo imitativo” (KOELLREUTTER, 1915, p. 11). Josquin foi muito admirado e reconhecido no seu tempo e pelos contemporâneos. A obra é composta por cerca de 18 missas, 100 motetos, 70 chansons, e demais peças vocais profanas (GROUT; PALISCA, 1988).

Bennett (1986) traz, no seu livro, um trecho do moteto Absalon fili mi, no qual Josquin expressa, de acordo com a bíblia, o lamento de Davi em relação à morte do filho traidor, Absalão. Nesse breve exemplo, podemos observar a maneira como o compositor realiza a condução melódica entre as vozes em contraponto, a fim de enaltecer a mensagem e a expressividade contidas no texto.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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FIGURA 11 – TRECHO ABSALON FILI MI, DE JOSQUIN DES PRÈS

FONTE: Bennett (1986, p. 259)

Mesmo apresentando características diferentes de Josquin des Près, Palestrina foi outro compositor de destaque do período. As técnicas e composições são objetos de muitos estudos e análises no universo da pesquisa musical. Giovanni da Palestrina foi educado, musicalmente, ainda criança, como integrante de coro na cidade de Roma. Esteve a cargo de importantes igrejas da Itália, como organista, cantor e mestre de capela. De acordo com Grout e Palisca (1988), sua obra, majoritariamente sacra, é comporta por inúmeras composições litúrgicas, 104 missas, cerca de 250 motetos e 50 madrigais espirituais com textos italianos. Seus madrigais profanos, que somam mais de 100 composições, são, tecnicamente, perfeitos e conservadores.

O estilo de Palestrina foi o primeiro na história da música ocidental a ser conscientemente preservado, isolado e tomado como modelo em épocas posteriores, quando os compositores, naturalmente, escreviam um tipo de música totalmente diferente. Era esse estilo que os compositores tinham, geralmente, em mente quando, no século XVII, falavam de stile antico (estilo antigo). A obra chegou a ser considerada como a encarnação do ideal musical de certos aspectos do catolicismo que vieram a ser especialmente sublinhados no século XIX e no princípio do século XX (GROUT; PALISCA, 1988, p. 294).

A serenidade e a transparência, tão admiradas na música contrapontística de Palestrina, provêm da suavidade e da regularidade rítmica das linhas melódicas diatônicas, que relutavam à utilização de cromatismos; da maneira como sobrepunham, sutilmente, os intervalos consonantes; da variedade que imprimiam sobre os agrupamentos, da combinação e da duplicação das vozes; e por desprenderem, do tenor, o compromisso com o cantus firmus ou como voz principal quando parafraseavam o conteúdo com as demais vozes. Tais tratamentos, somados à predileção conservadora por arranjos com quatro vozes, em uma época em que cinco ou mais vozes enalteciam o virtuosismo composicional, conferiam, às composições, efeitos e cores sonoras surpreendentes.

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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2.4 OS PERÍODOS BARROCO, CLÁSSICO E ROMÂNTICO

Os costumes de sustenizar e de bemolizar as notas de forma tão recorrente pelos compositores e intérpretes acabaram por descaracterizar o sistema dos modos, que ficou, na prática, reduzido aos modos jônio e eólio. Acerca destes, desenvolveu-se o sistema tonal, cujas escalas maior e menor, homônimas aos modos citados, estruturaram a harmonia que regeu o desenvolvimento musical pelos dois séculos seguintes (BENNETT, 1986).

Novas orientações para a construção de linhas melódicas foram

sendo concebidas na medida em que os instrumentos musicais foram sendo aperfeiçoados. As composições polifônicas deixaram de se basear apenas nas diretrizes e nas possibilidades inerentes à prática vocal, e passaram a considerar a prática instrumental contrapontística, orientada pelas perspectivas da técnica e do timbre.

No contraponto tonal, a condução das vozes passou a obedecer às

progressões harmônicas. As dissonâncias recebiam um tratamento mais livre, e a construção da linha melódica admitia bordaduras cromáticas e notas de passagem estranhas à função do acorde. A técnica da imitação continuava em uso, e chegou ao apogeu com as composições no estilo de fuga e com as obras do compositor Johann Sebastian Bach (1685 – 1750). A fuga era composta para as vozes soprano, alto, tenor e baixo, nomeadas, assim, independentemente de a composição ser vocal ou instrumental. Uma dessas vozes entoava um tema de melodia curta que era imitada pelas outras vozes com adequação de altura e transposição para outras tonalidades. As obras contrapontísticas de Johann Sebastian Bach apresentam equilíbrio das construções harmônica e melódica surpreendente, e deixam um legado para o ensino e para a prática do contraponto musical.

A obra de Bach representa a consolidação de uma etapa da linguagem musical que marca a passagem definitiva do modalismo e do pré-modalismo às tonalidades de modos maior e menor, com o conjunto de relações. Ainda, a aquisição definitiva, para essa linguagem, de cromatismos, cadências e acordes com novas formações (TRAGTENBERG, 2002, p. 19).

Segue um exemplo de fuga escrito com quatro vozes por Bach. Este se encontra no Livro I, do Cravo Bem Temperado.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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FIGURA 12 – FUGA COM QUATRO VOZES, DE BACH

FONTE: Kennan (2008, p. 8)

O Cravo Bem Temperado (Das wohltemperierte Klavier), de Bach, é uma coleção de peças para cordofones de tecla, que abrange doze tonalidades maiores e doze tonalidades menores. Os dois volumes da coleção, publicados, respectivamente, em 1722 e em 1744, ambos contemplando as 24 tonalidades, desempenharam um papel de grande importância no desenvolvimento da história da música ocidental. As peças revelam, além da intenção didática do compositor, as possibilidades composicionais do novo sistema de afinação temperado.

O equilíbrio alcançado no contraponto do período barroco sofreu uma

significativa deterioração nas obras contrapontísticas dos períodos clássico e romântico, cujos compositores permitiram uma influência desmedida da harmonia sobre a construção contrapontística. Nesses períodos, enaltecia-se a composição homofônica, na qual todas as linhas melódicas assumiam o mesmo ritmo.

Respeitando as características específicas de cada momento da história da música, os períodos clássico e romântico são abordados, aqui, conjuntamente, para indicarmos esses dois momentos nos quais o contraponto musical europeu aparece de forma comedida. Vale ressaltar que a composição contrapontística não se extinguiu nesses períodos, mas foi revisitada, com um olhar que buscava a clareza das ideias e a máxima expressão das emoções.

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2.5 SÉCULO XX

No século XX, podemos observar um novo surgimento do contraponto musical. Este, depois de sofrer, ao longo dos séculos, significativa expansão de técnicas e de diretrizes, representava, agora, as novas concepções musicais do período.

No contraponto dodecafônico, deixa de existir a relação entre tensão e

relaxamento, e, consequentemente, a diferença entre consonância e dissonância. As vozes são concebidas de forma linear, a partir da ordem intervalar da série, e os intervalos harmônicos resultantes de sobreposições melódicas são cuidadosamente observados. O conceito de contrapor linhas melódicas passa a ser aplicado a outros elementos musicais, como é o caso do contraponto rítmico, entre acordes paralelos, em torno de ostinatos, e de fontes sonoras, em obras mistas eletroacústicas.

Além das novas práticas, surge o Contraponto Conceitual, que ocorre da

fruição artística entre intérprete e ouvinte, e o Contraponto Textural, conhecido, também, como micropolifonia. Esta foi desenvolvida pelo compositor húngaro Gyorgy Ligeti (1923-2006), que contrapunha linhas independentes com proximidade de altura e de tempo. Ao entrelaçar esses elementos, o discurso melódico se esvaecia e dava lugar a uma massa sonora. Assim como o próprio compositor define, “é uma polifonia que não funciona mais como tal, porque suas vozes individuais não são mais perceptíveis. Isso desenvolve um timbre que não é mais a cor da voz humana, nem a das cordas ou sopros, mas um tipo de 'cor-em-movimento' ou 'cor-rítmica'” (LIGETI apud CATANZARO, 2005, p. 1253).

Como uma referência de contraponto musical brasileiro no século XX, há

a obra do compositor Heitor Villa-Lobos. As 16 Cirandas para Piano e o Estudo nº 5 para Violão revelam o tratamento contrapontístico sobre materiais característicos da música do século XX, como ostinatos e cromatismos, além da sobreposição de texturas e de blocos harmônicos.

A música do século XX foi marcada pela ruptura de paradigmas, que

abriu espaço para novas tentativas, experiências e percepção do universo sonoro que temos nos dias atuais.

É importante ressaltar que, ao abordarmos o contraponto, tendo, como recorte, o desenvolvimento musical no cenário europeu, excluímos, de fato, inúmeros compositores e movimentos de mesmo caráter.

Este tópico destacou as principais características do contraponto em cada período da música ocidental/europeia, e fez uma breve menção da obra de compositores que aparecem citados, de forma recorrente, nas referências bibliográficas. De forma alguma, a menção aos compositores foi realizada com

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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juízo de valor, e devemos ter sempre em mente o magnífico número de obras e de compositores que teceu a história do contraponto musical. A pesquisa e o aprofundamento nos assuntos são sempre as melhores maneiras que você tem para alcançar o conhecimento não excludente.

3 ELEMENTOS DO CONTRAPONTO MUSICAL

Após este breve panorama histórico da origem e do desenvolvimento do contraponto musical, você encontrará, a seguir, a definição dos elementos sobre os quais o contraponto se manifestou, e terá ferramentas para iniciar a sua própria prática contrapontística.

3.1 CANTUS FIRMUS

O cantus firmus é uma linha melódica que serviu como base para as composições contrapontísticas durante muitos séculos. Sua melodia, comumente extraída do cantochão, durante a época do contraponto modal, quando construída ou adaptada, deve:

• ter, como base, um dos modos litúrgicos;• iniciar e terminar com a finalis do modo;• alcançar a última nota (finalis) por grau conjunto ascendente ou descendente;• manter tessitura entre nota mais grave e aguda dento de uma 10ª;• apresentar intervalos por graus conjuntos fáceis de entoar; • evitar mais de dois saltos consecutivos na mesma direção. Deve-se compensar

saltos seguidos com movimento em direção contrária;• apresentar apenas um ponto culminante.

Fica vetada a utilização de:

• intervalos aumentados e diminutos, de sétima maior e menor, sexta maior, e sexta menor descendente (permitido sexta menor em movimento ascendente);

• movimentos cromáticos;• repetição seguida de notas;• repetição de motivos.

Sugerimos que você pesquise a obra dos compositores dos períodos estudados, e identifique os elementos musicais característicos no contraponto musical de cada época.

DICAS

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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Segue um exemplo de cantus firmus:

FIGURA 13 – CANTUS FIRMUS

FONTE: Ribeiro (2009, p. 16)

A composição do cantus firmus deve, sobretudo, obedecer aos princípios de direção, continuidade, variedade e equilíbrio. O compositor também deve se ater a aspectos rítmicos, intervalares, de emprego de salto e de duração.

Os princípios mencionados serão aprofundados ao término desta unidade,

no texto indicado como leitura complementar. É imprescindível que você os assimile para uma prática satisfatória do contraponto, e, consequentemente, para o entendimento dos assuntos que serão abordados na unidade seguinte. Esses princípios aparecerão, também, no terceiro tópico da presente unidade, quando estudarmos a condução melódica, uma vez que orientam não somente a construção do cantus firmus, como de qualquer linha melódica pertencente ao contraponto musical.

Para fins de estudo do contraponto, o cantus firmus é, comumente, escrito

sobre a clave de dó, e através de uma única figura de valor, evitando-se a variedade rítmica, a organização métrica, ou, até mesmo, a indicação de pulsos fortes e fracos. A melodia deve conter início, clímax e fim, e, para isso, é recomendável a escrita entre oito e dezesseis compassos. Do contrário, quando muito curta, não contemplará esse desenvolvimento ideal, e, quando muito longa, poderá soar de forma monótona.

Nos exercícios de contraponto, a estrutura do cantus firmus está, ainda, vinculada à prática vocal, por isso, a melodia deve ser composta por intervalos fáceis de entoar, como graus conjuntos, intervalos consonantes e saltos próximos. Como mencionado, deve-se evitar cromatismos e intervalos dissonantes.

O princípio da direção orienta que o cantus firmus apresente um clímax, um desenvolvimento inicial que conduza a uma nota aguda. Esta não pode ser repetida em outros pontos da linha, nem mesmo ser a sensível do modo. A condução melódica por grau conjunto, a fim de garantir fluidez à linha, é garantida pelo princípio da continuidade, porém, deve-se tomar cuidado para que a melodia não soe monótona.

O princípio da variedade vem, neste caso, orientar a mudança de direção

da linha e a utilização de saltos. Estes não devem somar mais de quatro, e, quando maiores de uma terça, devem ser compensados por movimento contrário.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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Por fim, o princípio do equilíbrio desorienta a utilização de motivos, frases, repetições ou qualquer elemento que possa caracterizar um padrão ou sessão na melodia. O equilíbrio do cantus firmus é atingido quando os demais princípios são aplicados de forma correta, e quando a linha é sólida o suficiente para alicerçar o contraponto sem se sobrepor ou se destacar das demais vozes. Desorienta-se, ainda, o envolvimento das notas extremas da linha melódica (a nota mais grave e a nota mais aguda) na formação do trítono, uma vez que, nessa posição, dificulta-se a resolução do intervalo.

A tessitura do cantus firmus não deve exceder o intervalo de décima maior,

ou seja, o intervalo entre a nota mais grave da linha melódica e da nota mais aguda não deve ser maior do que o intervalo de terça maior composto.

3.2 VOX PRINCIPALIS E VOX ORGANALIS

Assim como comentado anteriormente, a vox principalis (voz principal) serve como alicerce para o contraponto. É representada pelo cantus firmus, e se estabelecem as demais relações intervalares e a sonoridade da composição.

A vox organalis é a voz adicionada para se contrapor à vox principalis. Mesmo que apresente independência na linha melódica, a composição da vox organalis é atrelada à estrutura da vox principalis, pois a criação se realiza a partir desta. Nos primeiros séculos da música contrapontística, a vox organalis era improvisada, diferente da vox principalis, que era registrada através da notação musical.

EXEMPLO 18 – NOTAÇÃO DAS VOZES PRINCIPAL E ORGANAL

FONTE: Grout e Palisca (1988, p. 99)

Assim como você aprendeu na contextualização histórica desta unidade, a voz principal, que apresentava o cantus firmus, tinha o material extraído do cantochão, e, ao longo dos períodos, o cantus firmus perdeu a relação direta com este e passou a ser composto. Nos exercícios de contraponto dos dias atuais, você também deverá compor o cantus firmus para a prática contrapontística, ou seja, você deverá compor o material musical para a voz principal. Dessa forma, é muito importante que você tenha clara, em mente, a função de cada uma das vozes e das relações.

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TÓPICO 1 — O CONTRAPONTO NA HISTÓRIA DA MÚSICA OCIDENTAL

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3.3 CONSONÂNCIAS E DISSONÂNCIAS Consonância e dissonância são maneiras de classificar os intervalos, tendo,

como base, a sonoridade. A princípio, esse julgamento pode parecer subjetivo, até mesmo, porque observamos, ao longo do desenvolvimento da história da música, que os conceitos de consonância e de dissonância sofreram alterações, de acordo com os anseios e os ideais de cada período. Porém, dentro destes, uma vez classificados, orientaram o fazer musical.

Nesta unidade, abordaremos apenas os intervalos entendidos como consonantes e dissonantes na construção melódica do cantus firmus, para que você possa apresentar, na Unidade 3, uma boa base para a aplicação do contraponto realizado por espécies, e, consequentemente, as capacidades de distinguir e de assimilar as novas diretrizes do contraponto tonal.

Segue um quadro com os intervalos classificados como consonantes

e dissonantes. Vale ressaltar que o intervalo de segunda é sinônimo de grau conjunto, e este orienta a construção melódica do cantus firmus.

QUADRO 1 – CONSONÂNCIAS E DISSONÂNCIAS

FONTE: O autor

Assim como você pode observar no quadro anterior, o intervalo de quarta justa é classificado como dissonante quando tratamos do contraponto com duas vozes, porém, esse mesmo intervalo é considerado consonante perfeito quando o contraponto envolve três ou mais vozes, desde que o intervalo de quarta justa não se encontre entre as notas mais graves da composição:

CONSONÂNCIASPERFEITAS

CONSONÂNCIASIMPERFEITAS DISSONÂNCIAS

Uníssono terça menor sétima menor

oitava justa terça maior sétima maior

quinta justa sexta menor intervalos aumentados

sexta maior intervalos diminutos

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

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FIGURA 14 – QUARTA JUSTA CONSONANTE

FONTE: O autor

Fux (2002) ressalta a capacidade de os intervalos de transmitirem sensações e emoções. O autor afirma que a variedade de sons e a progressão de um intervalo para o outro são responsáveis pela fruição. Estando imerso no universo do contraponto modal, o compositor orienta o uso desses intervalos, de acordo com a movimentação da linha melódica.

A movimentação que o autor se refere é a mesma que aprendemos quando estudamos o organum livre, que consiste nos movimentos direto, contrário e obliquo.

De acordo com as regras estabelecidas por Fux (2002):

• Intervalo consonante perfeito seguido de outro intervalo consonante perfeito: deve ser realizado por movimento contrário ou oblíquo.

• Intervalo consonante perfeito seguido por intervalo consonante imperfeito: pode ser realizado através dos três movimentos.

• Intervalo consonante imperfeito seguido de intervalo consonante perfeito: deve ser realizado por movimento contrário ou oblíquo.

• Intervalo consonante imperfeito seguido por outro intervalo consonante imperfeito: pode ser realizado através dos três movimentos.

O autor ressalta que o movimento obliquo pode ser utilizado nas quatro situações anteriores, desde que usado de forma consciente.

Finalizamos este eixo tendo abordado a prática do contraponto musical ao longo da história da música ocidental, assim, observamos que os anseios e as ideias de cada período estão expressos, também, nas diretrizes do contraponto musical de cada época. Ainda, os principais elementos da prática do contraponto, como cantus firmus, vox principalis, vox organalis, e os intervalos estabelecidos como consonantes e dissonantes aqui apontados, servindo como fundamentos básicos para a compreensão dos assuntos a serem abordados nos tópicos seguintes.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Os conceitos acerca da prática do contraponto musical sofreram alterações, conforme as ideologias de cada período da história da música ocidental.

• A voz principalis, a voz organalis e o cantus firmus são elementos fundamentais do contraponto musical.

• São classificados, como intervalos consonantes perfeitos, uníssonos, oitavas e quintas justas.

• São classificados, como intervalos consonantes imperfeitos, terças e sextas maiores e menores.

• São classificados, como intervalos dissonantes, aumentados, diminutos, sétimas maiores e menores.

• O intervalo de quarta justa é considerado dissonante no contraponto que envolve duas vozes, e considerado consonante em contraponto com mais de três vozes, desde que o intervalo de quarta justa não esteja entre as vozes mais graves.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 O contraponto musical adotou diferentes diretrizes ao longo da história da música ocidental. Podemos destacar momentos de significativas mudanças dessa prática criativa no cenário de Notre Dame, no século XII, nos períodos renascentista e barroco e na música do século XX. Tendo, como base, a contextualização histórica do contraponto musical apresentado neste tópico, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Com a construção da catedral de Notre Dame, no século XII, Paris vislumbrou o declínio da prática do contraponto musical.

b) ( ) A voz do baixo foi adicionada ao contraponto durante a Ars Antiqua. c) ( ) A técnica da imitação foi desenvolvida na Renascença e continuou

em uso durante o período barroco, chegando ao apogeu com as composições no estilo de fuga e com as obras do compositor Johann Sebastian Bach (1685-1750).

d) ( ) A prática do contraponto, no século XX, era estritamente modal.

2 Dentre os elementos constituintes do contraponto musical, destacam-se as vozes que apresentam linhas melódicas em contraponto, e a apropriação de uma destas pelo material melódico extraído do cantochão, nomeado de cantus firmus. Com relação à vox principalis (voz principal), à vox organalis (voz organal) e ao cantus firmus, analise as sentenças a seguir:

I- A vox principalis e a vox organalis são elementos fundamentais do contraponto musical.

II- O cantus firmus é entoado pela vox organalis.III- Nos primeiros séculos da música contrapontística, a vox organalis era

improvisada.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença I está correta.

3 Consonância e dissonância são maneiras de classificar os intervalos, tendo, como base, a sonoridade. Nesta unidade, abordamos apenas os intervalos entendidos como consonantes e dissonantes na construção melódica do cantus firmus e no contraponto modal. De acordo com a classificação dos intervalos nessa prática do contraponto musical, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) O intervalo de quinta junta é classificado como consonância imperfeita. ( ) Os intervalos uníssonos e de terça maior são consonantes perfeitos. ( ) Intervalos diminutos e aumentados são classificados como dissonantes.

AUTOATIVIDADE

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89

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Entre os séculos IX e XIII, observamos o surgimento de quatro importantes práticas de contraponto musical: organum paralelo, organum livre, organum melismático e organum de Notre-Dame. Disserte a respeito das principais características do organum melismático.

5 O período do Renascimento é conhecido como a “época de ouro” do contraponto musical. Descreva acerca das principais características da prática do contraponto, nesse período, que justificam a afirmação.

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 2, você aprofundará os conhecimentos acerca dos modos eclesiásticos, os quais serviram de base para o desenvolvimento do contraponto musical. Aprenderá a música ficta, cujas práticas impulsionaram a transição do contraponto modal para o tonal. Este tópico está dividido em dois eixos: as escalas modais, e a música ficta.

No primeiro eixo, falaremos da estrutura das sete principais escalas

modais e das características. No segundo eixo, observaremos como a prática da chamada música ficta mudou os rumos do contraponto modal. Ainda, você conhecerá as principais cadências utilizadas no contraponto modal, e como ocorre a transposição musical nesse universo.

Ao término deste tópico, você terá uma base para compor linhas melódicas

e para as contrapor, de acordo com as normas do contraponto modal.

2 AS ESCALAS MODAIS

Entende-se por “modo” a maneira como os tons e os semitons são distribuídos entre os graus da escala (LACERDA, 1961). As escalas modais foram uma das primeiras formas de organização estrutural da música ocidental. Os modos foram utilizados na Idade Média para classificar e para ordenar os cânticos nos livros litúrgicos. A sonoridade própria de cada modo, cuidadosamente aplicada aos cânticos, garantiu, à igreja, a expressividade necessária nas atividades de doutrinação e de adoração. Dessa forma, os modos são chamados de eclesiásticos, litúrgicos ou gregorianos. Este último em referência ao trabalho realizado pelo papa Gregório I, no século VI, de empregar os modos na música litúrgica.

Os modos já eram usados na Grécia antiga, e os nomes representavam as maneiras como os povos oriundos das regiões da Jónia, Dória, Frígia e Eólia organizavam os intervalos da escala temperada ocidental. Por esse fato, os modos podem ser, também, chamados de modos gregos, mesmo que, hoje, já se saiba que os homônimos eclesiásticos são iniciados por notas diferentes e por sentidos opostos.

TÓPICO 2 —

MODOS ECLESIÁSTICOS

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

O primeiro e o último graus do modo são “ocupados” pela nota finalis (final), ou tônica, que é a nota sobre a qual a escala do modo é construída. Quando o modo inicia e termina na finalis, dizemos que este se encontra na forma autêntica, porém, não é sempre que isso ocorre. Os modos também podem aparecer na forma plagal, pois a finalis se encontra posicionada no quarto grau do modo, ou seja, o modo é iniciado uma quarta justa abaixo da forma autêntica. A forma plagal adiciona o termo “hipo” ao nome da correspondente autêntica.

FIGURA 15 – MODOS AUTÊNTICO E PLAGAL

FONTE: Lacerda (1961, p. 107)

No exemplo anterior, você pode observar o modo jônio nas formas autêntica e plagal. Note que a finalis (F) não ocupa o primeiro e o último grau da escala. A nota sol, que se encontra a um intervalo de quarta justa da nota dó, inicia o modo jônio na forma plagal , hipojônio. Assim como no exemplo anterior, Lacerda (1961) exemplifica a forma plagal dos modos dórico, frígio, lídio, mixolídio e eólio:

FIGURA 16 – MODOS NAS FORMAS AUTÊNTICA E PLAGAL

FONTE: Lacerda (1961, p. 107)

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

93

2.1 AS SETE ESCALAS PRINCIPAIS

Os sete modos de que temos conhecimento hoje são: jônio, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio.

Para você compreender a formação de cada um desses modos, pense nas notas naturais, eleja cada uma delas como tônica (finalis) de uma escala, e ordene o restante das notas em sentido ascendente. Ao construir essas sete escalas musicais, você terá organizado sete modelos de disposição intervalar.

2.1.1 Jônio

O modo jônio é uma organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus III - IV e VII - VIII da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota dó como tônica.

FIGURA 17 – MODO JÔNIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

Ao aplicarmos essa mesma ordem intervalar em outra tônica, geraremos uma escala com sonoridade jônica.

O modo jônio, que corresponde ao conhecido modo maior, foi amplamente desenvolvido e utilizado ao longo da história da música.

O termo “confinalis” era utilizado para indicar o quinto grau do modo na forma autêntica.

NOTA

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94

UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

2.1.2 Dórico

O modo dórico é a organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus II - III e VI - VII da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota ré como tônica.

FIGURA 18 – MODO DÓRICO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

2.1.3 Frígio

O modo frígio é a organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus I - II e V - VI da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota mi como tônica.

FIGURA 19 – MODO FRÍGIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

2.1.4 Lídio

O modo lídio é a organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus IV - V e VII - VIII da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota fá como tônica.

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

95

FIGURA 20 – MODO LÍDIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

2.1.5 Mixolídio

O modo mixolídio é a organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus III - IV e VI - VII da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota sol como tônica.

FIGURA 21 – MODO MIXOLÍDIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

2.1.6 Eólio

O modo eólio é a organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus II - III e VI - VI da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota lá como tônica.

FIGURA 22 – MODO EÓLIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

Essa disposição intervalar corresponde à escala menor natural. Esse modo, amplamente desenvolvido e utilizado ao longo da história da música, desdobra-se em mais duas escalas: harmônica e melódica.

2.1.7 Lócrio

O modo lócrio é uma organização intervalar na qual os semitons se encontram entre os graus I - II e IV - V da escala. Essa disposição intervalar é gerada a partir da nota si como tônica.

FIGURA 23 – MODO LÓCRIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 101)

Apresentaremos a relação intervalar completa dos modos:

FIGURA 24 – RELAÇÃO INTERVALAR MODOS ECLESIÁSTICOS

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

97

FONTE: O autor

Se você precisar, por exemplo, criar uma melodia no modo lídio, tendo, como finalis, a nota ré, ou seja, uma melodia em ré lídio, a escala musical sobre a qual você deve trabalhar deve iniciar com a nota ré e os demais graus devem obedecer à disposição de tons e de semitons do modo lídio: tom – tom – tom – semitom – tom – tom – semitom. Para isso, é necessário acidentar algumas notas da escala para que os intervalos naturais sejam alargados a tom ou retraídos a semitom. Segue a estrutura do modo lídio:

FIGURA 25 – MODELO INTERVALAR MODO LÍDIO

FONTE: O autor

FIGURA 26 – APLICAÇÃO DO MODELO INTERVALAR A PARTIR DA FINALIS RÉ

FONTE: O autor

Na figura anterior, as notas naturais, tendo, como partida, a nota ré, foram dispostas sobre a estrutura intervalar do modo lídio. Observe que as notas na cor vermelha não correspondem ao intervalo exigido pela estrutura do modo. A distância entre o segundo e o terceiro grau, no modo lídio, apresenta o intervalo

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

de tom, e há, naturalmente, entre as notas mi – fá, que se encontram nessas respectivas posições, o intervalo de semitom. Nesse caso, você precisa alterar a nota fá em um semitom para que o intervalo entre as notas corresponda ao intervalo do modelo lídio. A nota fá passa, então, a ser fá#.

A alteração gera o ajuste do intervalo seguinte, entre as notas fá# e sol.

Uma vez que a nota fá é alterada, o intervalo existente entre o terceiro e quarto grau da escala passa a ser semitom, e, de acordo com o modelo lídio, o intervalo entre esses graus precisa ser, também, de tom inteiro. Você deve alterar, também, a nota sol para sol#. Fazendo essa última alteração, o intervalo entre o quarto e o quinto grau da escala se ajusta automaticamente na distância de semitom, de acordo com o exigido pelo modo.

A próxima alteração a ser feita é entre o sexto e o sétimo grau da escala,

assim, você deve alterar a nota dó para dó#, havendo o ajuste dos graus à distância de tom e os próximos a semitom.

O exemplo que segue apresenta as alterações do modo ré lídio:

FIGURA 27 – ESCALA RÉ LÍDIO

FONTE: O autor

Observe, na figura anterior, que os acidentes da escala ré lídio foram notados de maneira ocorrente, mas nós poderíamos, também, fazer a notação da escala com a armadura de clave correspondente:

FIGURA 28 – ESCALA RÉ LÍDIO COM ARMADURA DE CLAVE

FONTE: O autor

Para descobrir a qual universo modal cada escala pertence, e,

consequentemente, a armadura de clave, você precisa estabelecer relações entre o modo em questão e a finalis. Esse assunto será abordado, de forma mais profunda, no subtópico “Transposição”.

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

99

O autor Osvaldo Lacerda, no livro Teoria Elementar da Música (1961, p. 103), salienta que “qualquer modo eclesiástico pode servir de base à construção de uma melodia”. Assim, a seguir, veremos alguns exemplos que o autor traz. Tente visualizar, em cada melodia, a estrutura do modo a qual pertence. O primeiro exemplo mostrará uma melodia composta sobre o modo mi dórico:

FIGURA 29 – MELODIA SOBRE MODO DÓRICO

FONTE: Lacerda (1961, p. 103)

O próximo exemplo demonstrará uma melodia composta sobre o modo mi frígio:

FIGURA 30 – MELODIA SOBRE MODO FRÍGIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 103)

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

O exemplo a seguir apresentará uma melodia composta sobre o modo ré mixolídio:

FIGURA 31 – MELODIA SOBRE MODO MIXOLÍDIO

FONTE: Lacerda (1961, p. 104)

Seguiremos o nosso estudo com as características sonoras de cada modo.

2.2 CARACTERÍSTICAS DE CADA ESCALA MODAL

Através da análise intervalar de cada escala modal, podemos classificar os modos em maiores, menores ou diminutos, e compreender quais são os intervalos responsáveis pelas sonoridades. Para identificarmos os intervalos característicos de cada modo, precisamos compará-los aos semelhantes, como maiores, menores e diminutos.

São classificados, como maiores, os modos jônio, lídio e mixolídio. Estes

apresentam o intervalo de terça maior entre o primeiro grau/finalis e o terceiro grau da escala, assim, na figura a seguir, essa característica estará destacada na cor azul:

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

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FIGURA 32 – COMPARAÇÃO MODOS MAIORES

FONTE: O autor

Ao compararmos essas três disposições intervalares, podemos perceber que o modo lídio difere do modo jônio pelo intervalo de quarta aumentada, e o modo mixolídio difere do modo jônio pelo intervalo de sétima menor. Dessa forma:

• o modo jônio tem, como intervalos característicos, a 4 justa e a 7 maior;• o modo lídio tem, como intervalo característico, a 4 aumentada;• o modo mixolídio tem, como intervalo característico, a 7 menor.

São classificados, como menores, os modos dórico, frígio e lídio. Estes

apresentam o intervalo de terça menor entre o primeiro grau/finalis e o terceiro grau da escala, assim, na figura a seguir, estará, a característica, destacada na cor azul:

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

FIGURA 33 – COMPARAÇÃO MODOS MENORES

FONTE: O autor

Ao compararmos essas três disposições intervalares, podemos perceber que o modo frígio difere do modo dórico pelo intervalo de segunda menor, e o modo eólio difere do modo dórico pelo intervalo de sexta menor. Dessa forma:

• o modo dórico tem, como intervalos característicos, 2 maior e 6 maior;• o modo frígio tem, como intervalo característico, 2 menor;• o modo eólio tem, como intervalo característico, 6 menor.

O modo lócrio é classificado como modo diminuto, pois apresenta o

intervalo de quinta diminuta entre o primeiro grau/finalis e o quinto grau da escala.

FIGURA 34 – MODO LÓCRIO

FONTE: O autor

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

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3 MÚSICA FICTA

A música ficta, “música fingida”, marca a transição da linguagem modal para a tonal. Nessa fase da história da música ocidental do século XIV, os compositores e os intérpretes conferiam alterações melódicas nas partituras e nas performances para evidenciar a finalis, e evitar intervalos indesejáveis, como o trítono e a finalização da peça em intervalo de terça menor. As alterações eram realizadas por meio de acidentes, como sustenido e bemol.

De acordo com Carvalho (2000, p. 43), o si bemol já era utilizado no

cantochão, e, com o desenvolvimento da polifonia, outros acidentes surgiram. “O sistema modal era baseado em escalas diatônicas, sem o uso de acidentes. O primeiro acidente a ser utilizado foi o si bemol, para evitar a ênfase melódica do trítono fá – si, e, também, para produzir um som mais desejável, ao se cantar os intervalos lá – si – lá”.

Os compositores nem sempre escreviam as alterações nas partituras, nesses casos, cabia, ao intérprete, reconhecer qual nota deveria ser alterada para criar uma progressão mais suave e congruente à estética da época.

Na música tonal, existem as chamadas notas evitadas ou “avoid notes”. Estas são notas da escala que, ao serem incorporadas como extensão do acorde, descaracterizam a função tonal. Não abordaremos, aqui, esse assunto, pois este perpassa, de certa forma, pelas diretrizes do contraponto musical modal, cuja trajetória se desenvolveu sobre os conceitos de consonâncias e de dissonâncias estabelecidos em cada período da história. Como uma ferramenta de estudo complementar, sugerimos a visualização do seguinte vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=YRxdrkJev3s.

DICAS

Alguns teóricos sugerem que o posicionamento da igreja, de evitar o interva-lo de trítono (intervalo de três tons inteiros entre duas notas), estaria associado à relação entre a tensão e a malignidade. O intervalo, muitas vezes, referenciado como “Diabolus em Música”, faz menção à ideia de que a tensão sonora, gerada pelo trítono, estaria vin-culada a uma manifestação diabólica.

NOTA

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104

UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

3.1 CADÊNCIA Assim como você aprendeu na Unidade 1 do livro de Harmonia e

Contraponto, o termo cadência se refere a padrões de conclusão musical. Estes sempre estiveram em conformidade com os ideais musicais de cada período.

A finalização do cantochão era, primeiramente, por grau conjunto, descendente em direção à final do modo, e, em um segundo momento, também por grau conjunto, ascendente ou através do intervalo de oitava acima da final do modo. Essa movimentação por grau conjunto foi, aos poucos, sendo substituída pelo salto de terça. Esse descendente, seguido pelo movimento de segunda maior ascendente, era comum no canto litúrgico.

Entre os séculos XI e XII, as principais cadências aplicadas aos organa envolviam as adoções de intervalos consonantes e dissonantes. A principal cadência compreendia a resolução de vozes em intervalo consonante perfeito em outro intervalo consonante perfeito, como intervalo de quinta ou quarta justa (contraponto com mais de duas vozes), finalizando em intervalo de oitava ou uníssono.

Cadências secundárias conduziam vozes em intervalo imperfeito para

intervalo perfeito, como terças e sextas, finalizando em intervalos de oitava ou uníssono.

A partir do século XIV, as cadências eram vinculadas ao movimento do tenor, a disposição intervalar em relação a outras vozes definia a movimentação destas. Concepções, como intervalos de terça menor abaixo finalizado em uníssono, terça maior acima em quinta justa, e sexta maior acima em oitava, eram alguns dos padrões que surgiam para garantir que os anseios da chamada música ficta fossem audíveis. De forma geral, compositores e intérpretes estavam aptos a conduzir as vozes, e, se necessário, a fazer as devidas alterações, para garantir que intervalos e sensações indesejáveis, na época, fossem evitados.

De acordo com Koellreutter (1915), algumas das alterações que eram realizadas nos modos compreendiam:

• modo dórico: a nota dó poderia ser alterada para dó# se desempenhasse função de sensível (no caso de anteceder a finalis ré), e se fosse bordadura de ré. Esse mesmo caso acontecia com a nota si em bordadura de lá, podendo ser alterada para sib.

• modo lídio: a nota si poderia ser alterada para sib, principalmente, quando estivesse em movimento descendente.

• modo mixolídio: a nota fá poderia ser alterada para fá# se desempenhasse função de sensível (no caso de anteceder a finalis sol).

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

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• modo eólio: a nota sol poderia ser alterada para sol# se desempenhasse função de sensível (no caso de anteceder a finalis lá). Nesse caso, se a nota fá antecedesse em uma linha melódica ascendente, seria necessário alterá-la para fá#, a fim de evitar o intervalo de segunda aumentada entre fá e sol sustenido.

3.2 TRANSPOSIÇÃO

A transposição musical ocorre quando a altura de uma música ou material musical é alterada, e a disposição intervalar entre as notas é conservada. De acordo com Lacerda (1961, p. 102), “assim como o modo maior pode ter, por tônica, qualquer nota, natural ou acidentada, os outros modos podem, também, iniciar-se em qualquer nota, desde que, é claro, sejam respeitadas as posições de tons e semitons que são próprias”.

No exemplo que segue, o autor apresentará duas escalas transpostas.

Observe que os semitons estão entre os mesmos graus das escalas-modelos:

FIGURA 35 – EXEMPLO DE ESCALA TRANSPOSTA

FONTE: Lacerda (1961, p. 102)

A seguir, observaremos a transposição aplicada em duas melodias para que a abordagem teórica da transposição possa se aproximar ainda mais da prática musical. A segunda melodia será transposta a um intervalo de segunda maior em relação à primeira. Observe que a disposição intervalar entre as notas da segunda melodia é a mesma da partitura original, por exemplo, ambas iniciam com o intervalo de terça maior:

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

FIGURA 36 – MELODIA TRANSPOSTA

FONTE: O autor

A transposição pode ser previamente escrita ou realizada no momento da performance. Nesta última, o musicista lê a partitura original e interpreta, instantaneamente, a música transposta. Em ambos os casos, é possível realizar a transposição com ou sem mudança na armadura de clave.

FIGURA 37 – TRANSPOSIÇÃO COM OU SEM MUDANÇA NA ARMADURA DE CLAVE

FONTE: O autor

Vale ressaltar que, na transposição modal, ocorre a mudança de altura, e não a mudança do modo, pois, como você aprendeu anteriormente, cada modo designa uma estrutura intervalar específica, e transpor uma música de um modo para outro seria alterar a organização, fato que descaracterizaria o ato de transpor.

Para você realizar uma transposição modal e determinar a armadura de clave do modo a ser transposto, é importante compreender a relação intervalar existente entre os modos. Você deve ter claro em mente:

O modo dórico se desenvolve a partir do segundo grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de segunda maior da finalis deste.

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TÓPICO 2 — MODOS ECLESIÁSTICOS

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• O modo frígio se desenvolve a partir do terceiro grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de terça maior da finalis deste.

• O modo lídio se desenvolve a partir do quarto grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de quarta justa da finalis deste.

• O modo mixolídio se desenvolve a partir do quinto grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de quinta justa da finalis deste.

• O modo eólio se desenvolve a partir do sexto grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de sexta maior da finalis deste.

• O modo lócrio se desenvolve a partir do sétimo grau do modo jônio, e a finalis se encontra a um intervalo de sétima maior da finalis deste.

Pense que você está interpretando um cantus firmus no modo mi dórico, porém, está com dificuldade de entoar as notas graves dessa linha melódica:

FIGURA 38 – CANTUS FIRMUS PARA TRANSPOSIÇÃO

FONTE: O autor

Nesse caso, seria interessante você transpor o cantus firmus escolhendo uma finalis mais aguda do que a original. Um intervalo de terça menor acima resolveria o problema. Então, a finalis passa a ser sol (nota que se encontra uma terça menor acima de mi). Portanto, você deve cantar em sol dórico.

Para encontrar a clave que determina os acidentes de sol dórico, basta

você processar as informações contidas em “sol” e em “dórico”. Primeiramente, relacione o modo. Você aprendeu, anteriormente, que o modo dórico se desenvolve a partir do segundo grau do modo jônio, a um intervalo de segunda maior deste. Tendo essa relação estabelecida, segundo grau a intervalo de segunda maior, questione o posicionamento da finalis “sol” da melodia. Faça, portanto, qualquer um dos questionamentos a seguir:

• “Sol”, sendo dórico, desenvolve-se a partir do segundo grau de qual centro

modal?• A finalis “sol” é segundo grau de qual centro modal?• A finalis” sol” está a um intervalo de segunda maior de qual nota (centro

modal)?

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

A finalis sol está a um intervalo de segunda maior da nota fá, ou seja, o sol dórico pertence ao centro modal de fá jônio, e está subordinado à armadura de clave desse modo. Nos dias de hoje, fica mais fácil pensarmos no homônimo, visto que o modo jônio corresponde ao modo maior, dessa forma, fá jónio corresponde à escala de Fá Maior. Podemos dizer, então, que sol dórico recebe a armadura de clave de Fá Maior. O cantus firmus transposto ficará assim:

FIGURA 39 – CANTUS FIRMUS EM SOL DÓRICO

FONTE: O autor

Koellreutter (1915) sugere outro caminho: você precisa encontrar o intervalo entre o modo a ser transposto e o modo jônio, porém, deve aplicá-lo de forma descendente à finalis do modo, ou seja, “qualquer modo dórico transposto tem, na armadura de clave, os acidentes da escala maior, que se encontra uma segunda maior abaixo da finalis do modo”.

FIGURA 40 – TRANSPOSIÇÃO KOELLREUTTER

FONTE: Koellreutter (1915, p. 24)

A mesma lógica pode ser aplicada aos outros modos. Sugerimos que, em caso de dúvida, você busque mais informações na referida obra do autor.

Neste tópico, aprendemos fundamentos importantes do contraponto musical. É interessante que você revisite esses assuntos frequentemente, até que as estruturas e as aplicações da prática estejam interiorizadas. Se estabelecermos uma relação entre os assuntos aqui abordados com o panorama histórico apresentado no primeiro tópico, poderemos compreender ainda mais o percurso e o desenvolvimento da música ocidental.

Dório Dório em Fé

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Damos o nome de modo à maneira como os tons e os semitons são distribuídos entre os graus da escala.

• Os modos podem ser chamados de eclesiásticos, litúrgicos, gregorianos ou gregos. Esse último termo encontra divergências entre os músicos e os teóricos quanto à utilização.

• Os modos jônio, dórico, frígio, lídio, mixolídio, eólio e lócrio podem assumir a forma autêntica ou plagal.

• Através da análise intervalar dos modos, podemos estabelecer os intervalos responsáveis pela sonoridade característica de cada um.

• A música ficta marca a transição da linguagem modal para a tonal. As alterações melódicas que os compositores e os intérpretes conferiam às partituras e as performances tinham, como objetivo, evitar sonoridades indesejadas.

• As cadências são padrões de conclusão musical norteadas pelas concepções musicais de cada período.

• A transposição musical ocorre quando a altura de uma música ou de um material musical é alterada, e a disposição intervalar entre as notas é conservada.

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1 A música ficta, “música fingida”, marcou a transição da linguagem modal para a tonal. Nessa fase da história da música, os compositores e os intérpretes conferiam alterações melódicas nas partituras e nas performances a fim de:

a) ( ) tornar a música instrumental mais fácil de ser tocada. b) ( ) contribuir para o desenvolvimento da notação musical.c) ( ) ornamentar o contraponto paralelo. d) ( ) evitar sonoridades, intervalos e movimentos melódicos entendidos

como impróprios para a época.

2 Através da análise intervalar de cada escala modal, podemos classificar os modos em maiores, menores ou diminutos. De acordo com essa afirmativa, analise as sentenças a seguir:

I- O modo mixolídio é classificado como um modo menor. II- O modo frígio é classificado como um modo menor. III- O modo lídio é classificado como um modo aumentado.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças II e IV estão corretas.d) ( ) Somente a sentença IV está correta.

3 Através da análise intervalar das escalas modais, podemos compreender quais são os intervalos responsáveis pela sonoridade de cada modo. De acordo com essas características, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) O modo lídio tem, como intervalo característico, a quarta aumentada.( ) O modo mixolídio tem, como intervalo característico, a sétima menor. ( ) O modo eólio tem, como intervalo característico, a sexta menor.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – V – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Nesta unidade, você aprendeu que modo é a maneira de como os tons e os semitons se distribuem entre os graus da escala. Assim como o exemplo a seguir sugere, escreva, através da notação musical, as escalas

AUTOATIVIDADE

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modais, tendo, como finalis, a nota dó. Lembre-se de respeitar a disposição intervalar característica de cada modo. Você pode utilizar armadura de clave e acidentes ocorrentes.

5 A transposição musical ocorre quando a altura de uma música ou de um material musical é alterada, e a disposição intervalar entre as notas é conservada. Faça a transposição da melodia a seguir a um intervalo de segunda maior. Utilize acidentes ocorrentes.

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 3, você aprenderá as formas de condução melódica utilizadas no contraponto musical, e, no fim do tópico, você terá acesso aos termos mais utilizados na prática. Através da manutenção da aprendizagem, você terá ferramentas para aprender, na próxima unidade, o contraponto musical por espécies.

No primeiro eixo, falaremos de alguns movimentos de condução melódica, como o movimento paralelo, contrário, direto e oblíquo. No segundo eixo, você terá acesso a um quadro de consulta rápida com os principais termos utilizados no contraponto musical.

Ao término deste tópico, você terá aprendido alguns caminhos para compor linhas melódicas e contrapô-las, de acordo com as normas específicas da prática.

2 CONDUÇÃO MELÓDICA

A condução melódica, na prática do contraponto musical, compreende, sobretudo, as escolhas que o compositor realiza no ato de compor uma melodia, seja para desempenhar a função da voz principal ou da voz organal. Ao passo que se cria, realiza-se a condução melódica. É, portanto, primordial que o ato esteja orientado pelos conceitos de direção, continuidade, variedade e equilíbrio.

Direção: é o movimento empregado na linha melódica para que se atinja

um ponto culminante. Este, no cantus firmus, compreende a nota mais aguda da linha melódica, que não pode ser repetida, tão pouco, apresentar-se como sensível do modo. As demais vozes do contraponto podem apresentar ponto culminante grave ou agudo, desde que não coincidam com o da voz principal.

Continuidade: este princípio compreende o emprego do movimento melódico por grau conjunto. Desaconselha-se manter a direção da linha melódica por muito tempo.

Variedade: assim como o nome sugere, este princípio orienta que a linha melódica apresente elementos contrastantes, a fim de evitar a monotonia sonora.

TÓPICO 3 —

CONDUÇÃO MELÓDICA

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

Mudar, com frequência, a direção da linha melódica, utilizar saltos, e evitar a repetição de notas ou de grupo de notas são ações que contribuem para uma linha melódica interessante.

Equilíbrio: este princípio também desorienta o uso frequente de movimentos na mesma direção. Estes devem ser, sempre que possível, compensados com movimento em direção oposta. “A mudança de direção é obtida por meio de um salto ou pelo movimento de grau conjunto na direção oposta. Mover-se em “ondas”, para cima e para baixo, é, em geral, o melhor procedimento” (SCHOENBERG, 2001, p. 25).

De forma geral, deve-se evitar alcançar a última nota da linha melódica através do salto, assim como não é recomendado realizar mais de dois saltos seguidos, e que envolvam intervalos dissonantes e compostos (acima de uma oitava). Saltos não devem somar mais de quatro, e se apresentarem intervalos maiores de terça, devem ser sempre compensados com mudança de direção. Deve-se evitar cromatismos, arpejos de acordes, e intervalos diminutos e aumentados.

2.1 MOVIMENTO PARALELO

O movimento paralelo ocorre quando duas ou mais vozes se desenvolvem na mesma direção, conservando os mesmos intervalos melódicos.

FIGURA 41 – MOVIMENTO PARALELO

FONTE: Kohler (2012, p. 25)

2.2 MOVIMENTO DIRETO

O movimento direto ocorre quando duas ou mais vozes se desenvolvem na mesma direção, sem conservar o intervalo melódico.

FIGURA 42 – MOVIMENTO DIRETO

FONTE: Kohler (2012, p. 25)

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TÓPICO 3 — CONDUÇÃO MELÓDICA

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2.3 MOVIMENTO CONTRÁRIO

O movimento contrário ocorre quando duas vozes se desenvolvem em direção oposta.

FIGURA 43 – MOVIMENTO CONTRÁRIO

FONTE: Kohler (2012, p. 25)

2.4 MOVIMENTO OBLÍQUO O movimento oblíquo ocorre quando uma das vozes permanece sem

movimentação, sustentando uma nota, por exemplo, enquanto a outra voz se movimenta livremente.

FIGURA 44 – OBLÍQUO

FONTE: Kohler (2012, p. 25)

3 TERMOS MAIS UTILIZADOS NA PRÁTICA DE CONTRAPONTO Até este ponto da unidade, tivemos acesso a informações dos elementos

e das ações pertencentes ao contraponto musical. Assim, como uma forma de manutenção do aprendizado, segue um quadro de consulta rápida com os principais termos utilizados nessa prática para que você possa acessar sempre que necessário.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

QUADRO 2 – TERMOS MAIS UTILIZADOS

FONTE: O autor

Cantochão Música vocal litúrgica de textura monofônica.Organum Primeira forma de música polifônica ocidental.Organa Plural de organum, mais de um organum.

Vox principalis Voz principal, serve como alicerce para o contraponto. Entoa o cantus firmus extraído do cantochão.

Vox organalis Linha melódica adicionada, composta em contraponto à voz principal.

Cantus FirmusMelodia entoada pela voz principal criada a partir de um trecho do cantochão. Serve como alicerce para o

contraponto.

FinalisNota musical final ou tônica. Nota sobre a qual a escala

do modo é construída. O modo inicia e termina na mesma nota, na mesma finalis.

Confinalis Quinto grau do modo na forma autêntica.

DireçãoMovimento empregado na linha melódica para que se atinja um ponto culminante, clímax. Nota não deve ser

repetida, nem ser sensível do modo.Continuidade Condução melódica por grau conjunto.

Variedade Emprego de saltos, mudança de direção da linha melodia, elementos contrastantes.

Equilíbrio Compensação de movimentos, mover-se em ondas. Exclui padrões.

Movimento paralelo

Movimento direto

Movimento contrário

Movimento oblíquo

Consonâncias perfeitas

Uníssono, oitava justa, quinta justa e quarta justa em contraponto a três ou a mais vozes.

Consonâncias imperfeitas Terça e sexta maiores e menores.

Dissonâncias Intervalo aumentado e diminuto, sétima maior e menor, quarta justa em contraponto a duas vozes.

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TÓPICO 3 — CONDUÇÃO MELÓDICA

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Na Unidade 2, você teve contato com um breve panorama histórico do contraponto musical e conheceu os principais elementos e as diretrizes que regem a prática. Indicamos que você pratique os assuntos abordados nesta unidade para que possa fixar, de forma efetiva, os conhecimentos aqui adquiridos.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

LEITURA COMPLEMENTAR

CANTUS FIRMUS

Guilherme Ribeiro

Baseado nos cantos gregorianos e melodias antigas, o cantus firmus servirá de ponto de partida para todo e qualquer exercício de contraponto. O entendimento da construção, além da compreensão das características básicas, são de fundamental importância para o estudante de contraponto. De certa forma, toda melodia construída, neste curso, deverá buscar inspiração nas regras aplicadas ao cantus firmus.

O cantus firmus deve ser entendido não como uma melodia propriamente

dita, mas como uma abstração da melodia real, na qual a linearidade é separada de outros aspectos do desenho melódico.

Deve apresentar organização melódica na forma mais simples, entretanto,

aspectos, como harmonia, motivos, clichês, sequências rítmicas, dentre outros, devem ser eliminados.

Apesar de todo esse caráter simplista, o cantus firmus não deve se abster

da qualidade estética, ou seja, uma linha bem construída revela características, como equilíbrio, variedade, direção e continuidade.

Para efeito de diferenciação entre as vozes e para reverenciar o aspecto tradicional do estudo e da prática do contraponto, o cantus firmus será escrito em clave de Dó na terceira linha:

Ritmo e tamanho

O cantus firmus se constitui de figuras de valores iguais. Essa ausência de diferenciação rítmica possui um importante valor pedagógico, pois concentra a atenção em fatores puramente lineares. A vitalidade da linha provém somente do contorno melódico, sem que seja necessária a variação rítmica; as notas possuem a mesma acentuação, não há a existência de tempos fortes e fracos.

O cantus firmus será escrito com semibreves, pois figuras de menor valor poderão sugerir certa organização métrica, alternância periódica entre pulsos fortes ou fracos.

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TÓPICO 3 — CONDUÇÃO MELÓDICA

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Com relação ao tamanho, não deve ser muito extenso, ao ponto de se tornar monótono por não possuir variação rítmica, nem muito curto, sem que se possa identificar começo, clímax e fim. Como regra geral, o cantus firmus deve conter entre 8 e 16 semibreves.

Material melódico

Como dito anteriormente, o cantus firmus e, consequentemente, toda e qualquer linha melódica obtida a partir dos exercícios de contraponto, deverão guardar características de uma melodia vocal. Assim, devemos considerar mais apropriado o emprego de pequenos intervalos ao invés de grandes. Consonâncias são mais fáceis de entonar do que dissonâncias, e intervalos diatônicos mais fáceis do que cromáticos. Na linha melódica do cantus firmus, não devemos utilizar saltos dissonantes ou cromatismos.

Âmbito

A distância entre a nota mais grave e a mais aguda do cantus firmus deverá ser de, no máximo, uma 10ª.

Direção

O cantus firmus deve conter o clímax ou o ponto alto, que servirá como meta ou objetivo melódico, após o início do exercício. Também, será encarado como ponto de partida em direção ao fim do exercício.

O ponto alto não deve se repetir durante o exercício e, em razão do poder resolutivo em melodias tonais, não se deve utilizar a sensível, além da tônica, como ponto alto de uma melodia.

Continuidade (grau conjunto)

Um cantus firmus pode conter um bom começo, clímax, fim, e, ainda assim, não soar satisfatório. Esse fato se dá quando não há conexão clara e lógica entre um ponto e o outro. Nesse sentido, faz-se necessária a utilização, predominantemente, de graus conjuntos no decorrer da linha ao invés do excesso ou da predominância de saltos.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

Variedade

Uma linha pode ter direção e continuidade, porém, o excesso de grau conjunto, aliado à ausência de mudança de direção da linha, pode contribuir para uma melodia excessivamente homogênea e monótona. Para que isso não ocorra, são necessários dois cuidados: utilização de saltos (compensados, quando necessário) e mudança de direção da linha.

O cantus firmus deve conter entre dois e quatro saltos, e a linha pode mudar a direção diversas vezes no decorrer do exercício, sem interferir na direção como um todo.

Saltos

Vimos que a utilização de saltos no decorrer do cantus firmus é de vital importância para se conseguir variedade no exercício. Entretanto, alguns cuidados devem ser tomados ao se tratarem de saltos. Por razões óbvias, saltos grandes interferem na continuidade do movimento muito mais do que saltos pequenos. Um salto grande deve ser compensado por graus conjuntos e mudança do movimento da linha para que o ouvido não acuse uma linha fragmentada em duas partes. Saltos de 3ª não são, necessariamente, problemáticos, a ponto de haver a necessidade de compensação, mas devemos ter o cuidado de não agrupar mais de dois saltos consecutivamente. De maneira geral, saltos maiores de 3ª devem ser seguidos de mudança de direção e, preferencialmente, por grau conjunto, além de evitar dois saltos consecutivos na mesma direção e mais de dois saltos consecutivos.

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TÓPICO 3 — CONDUÇÃO MELÓDICA

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Equilíbrio

A utilização de elementos identificáveis, como sequências, motivos, frases, repetição, notas ou grupos de notas, movimentação em uma única direção etc., pode prejudicar a linha. Uma linha equilibrada não apresenta tais elementos na extensão. Vimos que a mudança na direção nos ajuda a adquirir variedade, ainda, a inversão do movimento é necessária após um grande salto. A essas duas observações, podemos adicionar uma terceira: o movimento por grau conjunto não deve se prolongar por muito tempo na mesma direção.

[…]

Tensão melódica não resolvida

Notas que iniciam e finalizam um contorno melódico são mais proeminentes do que outras, pois se encontram posicionadas nas extremidades do movimento. Nesse caso, devemos ter o cuidado de não acomodar, em tais pontos, o trítono. O mesmo cuidado é recomendado à sensível (sétimo grau), pois o ouvido necessita escutar uma resolução dessa tensão.

Repetição de notas

Os requisitos para um bom cantus firmus excluem a possibilidade de notas repetidas consecutivamente. Observe que, em alguns casos, a recorrência a uma determinada nota, sem que haja uma repetição imediata, pode representar tal problema e causar desequilíbrio ao cantus firmus.

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UNIDADE 2 — ORIGEM E FUNDAMENTOS DO CONTRAPONTO

Início e fim

O cantus firmus deve começar e terminar na tônica: deve conter notas diatônicas à tonalidade escolhida, além de se fazer necessário que a penúltima nota alcance a última por grau conjunto, formando a terminação 7 – 8 ou 2 – 1. Isso é importante para que a tonalidade seja muito bem expressa, através da harmonia implícita V – I.

FONTE: RIBEIRO, G. Contraponto tonal a duas vozes. São Paulo: Editora Espaço Cul-tural Souza Lima, 2009. p. 11-16.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A condução melódica deve ser orientada pelos conceitos de direção, de continuidade, de variedade e de equilíbrio.

• O emprego de saltos na condução melódica é orientado, sobretudo, pela compensação do movimento em outra direção. Deve-se evitar saltos que envolvam intervalos compostos e dissonantes.

• A condução melódica é realizada através dos movimentos paralelo, direto, contrário e oblíquo.

• Vox principalis, vox organalis e cantus firmus são os principais agentes da prática do contraponto modal.

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

CHAMADA

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1 A condução melódica é orientada pelos conceitos de direção, de continuidade, de variedade e de equilíbrio. De acordo com a forma de tais diretrizes, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A variedade é o princípio do movimento empregado na linha melódica para se obterem vários pontos culminantes.

b) ( ) O equilíbrio é o princípio que determina a repetição de notas como quebra da monotonia na linha melódica.

c) ( ) A continuidade é o princípio que estabelece a movimentação da linha melódica por saltos.

d) ( ) A direção é o princípio do movimento empregado na linha melódica para que se atinja um ponto culminante.

2 A condução melódica pode se desenvolver por movimento paralelo, contrário, oblíquo ou direto. Com base nesses tipos de movimentação, analise as sentenças a seguir:

I- No movimento oblíquo, as duas vozes se movem em direções opostas. II- No movimento paralelo, as vozes se desenvolvem na mesma direção,

conservando os intervalos melódicos. III- No movimento direto, as vozes se desenvolvem na mesma direção, sem

conservar os mesmos intervalos melódicos.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença I está correta.c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 O princípio da variedade orienta que a linha melódica deve apresentar elementos contrastantes, a fim de evitar a monotonia sonora. Mudar, com frequência, a direção da linha melódica, utilizar saltos, e evitar a repetição de notas ou de grupo de notas são ações que contribuem para uma linha melódica interessante. De acordo com as diretrizes do emprego de saltos na condução melódica, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) Não se recomenda o emprego de saltos que envolvam intervalos dissonantes e compostos.

( ) A última nota da linha melódica precisa ser alcançada através de salto de 10ª.

( ) Saltos com intervalos maiores de terça devem ser sempre compensados com mudança de direção.

AUTOATIVIDADE

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Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 A condução melódica, na prática do contraponto musical, compreende, sobretudo, as escolhas que o compositor realiza no ato de compor uma melodia, seja para desempenhar a função da voz principal ou da voz organal. Nas figuras a seguir, estarão representados os quatro tipos de movimentos possíveis de serem utilizados na condução melódica. Identifique-os.

a) movimento ___________________________.b) movimento ___________________________.c) movimento ___________________________.d) movimento ___________________________.

5 Utilizando os conceitos aprendidos neste tópico, conduza a voz organal (vox organalix) através da movimentação paralela. Lembre-se de que, neste tipo de movimentação, você deve mover as vozes na mesma direção, e conservar os mesmos intervalos presentes na condução melódica do cantus firmus.

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REFERÊNCIAS

BENNETT, R. Uma breve história da música. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1986.

CARVALHO, A. R. Contraponto modal: manual prático. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2000. CATANZARO, T. Do descontentamento com a técnica serial à concepção da micropolifonia e da música de textura. Rio de Janeiro: ANPPOM, 2005.

FUX, J. J. O estudo do contraponto (do Gradus ad Parnassum). 2002.

GROUT, D. J.; PALISCA, C. V. História da música ocidental. Lisboa: Gradiva Publicações, 1988.

KENNAN, K. W. Counterpoint: based on eighteenth‐century practice. Bahia: UFBA, 2008.

KOELLREUTTER, H. J. Contraponto modal do século XVI: Palestrina. Brasília: Musimed Editora, 1915.

KOHLER, E. N. Apostila de harmonia e contraponto musical do curso de Mú-sica da Universidade do Vale do Itajaí UNIVALI. Itajaí: Univali, 2012.

LACERDA, O. Teoria elementar da música. São Paulo: Ricordi Brasileira S.A., 1961.

RIBEIRO, R. Contraponto tonal a duas vozes. São Paulo: Editora Espaço Cultu-ral Souza Lima, 2009.

SCHOENBERG, A. Exercícios preliminares em contraponto. São Paulo: Via Lattera, 2001.

TRAGTENBERG L. Contraponto: uma arte de compor. São Paulo: Edusp, 2002.

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UNIDADE 3 —

CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• reconhecer as cinco espécies de contraponto;• realizar a prática do contraponto a duas vozes por meio de alguns exer-

cícios;• identificar especificações do contraponto a três vozes;• classificar a textura de uma obra musical;• estabelecer relações entre o aprendizado do contraponto e estratégias

composicionais na educação musical.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – CARACTERÍSTICAS GERAISTÓPICO 2 – PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZESTÓPICO 3 – CONTRAPONTO A TRÊS VOZESTÓPICO 4 – ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA EDUCAÇÃO MUSICAL

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Você estudou o cantus firmus na Unidade 2, certo?! Pois bem, agora, consideraremos, o cantus firmus, a nossa base melódica, para podermos criar uma segunda melodia a partir dela. Essa nova melodia pode ser mais aguda ou mais grave em relação ao cantus firmus, porém, deve ter a mesma relevância na música. O objetivo é desenvolver a capacidade de utilizar o contraponto como meio para as criações musicais. Assim, você tem mais ferramentas para empregar nos processos criativos, na produção de trabalhos artísticos e na produção de material didático para os alunos.

No Tópico 1, abordaremos características básicas das cinco espécies de contraponto concebidas pelo compositor e teórico austríaco Johann Joseph Fux (1660-1741). O método desenvolvido por Fux (1725) propõe a divisão do estudo do contraponto em cinco espécies, com novos elementos musicais gradativamente introduzidos e organizados. Após uma breve explicação dos principais atributos, estudaremos como reconhecer cada uma dessas espécies. Apesar de Fux ter o tratado voltado para a música de uma época específica, nossos objetivos serão os de treinar e de educar o ouvido musical, independentemente da estética. Dessa forma, estaremos aptos para seguir para o Tópico 2, no qual traremos exercícios progressivos para você praticar a criação de linhas melódicas simultâneas e independentes.

TÓPICO 1 —

CARACTERÍSTICAS GERAIS

Nossos estudos de contraponto serão realizados dentro do sistema tonal. Ainda que a nossa preocupação seja mais voltada ao movimento melódico, as funções harmônicas de tensão e de repouso se farão presentes nos exercícios.

ESTUDOS FUTUROS

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

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2 CARACTERÍSTICAS GERAIS Para iniciar, façamos uma comparação opositiva entre contraponto e

harmonia, relacionando os conteúdos das Unidades 1, 2 e 3 deste livro. Assim, podemos contrapor essas duas áreas da música mediante características contrastantes entre elas.

Vejamos um quadro comparativo proposto pela pesquisadora e organista

brasileira Any Raquel Carvalho:

QUADRO 1 – CONTRAPONTO E HARMONIA

FONTE: Carvalho (2000, p. 54)

A Harmonia tem, como objeto de estudo, o pensamento vertical da música, enquanto o contraponto se dedica à horizontalidade de linhas melódicas simultâneas. No entanto, não se trata de uma separação plena, pois as linhas melódicas também formam a harmonia quando as notas se encontram verticalmente, como o movimento dos acordes gera caminhos horizontais. O compositor e maestro francês Pierre Boulez se manifesta, nesse sentido, quando afirma que

a noção de contraponto se aplica às linhas que se podem desenvolver a partir de uma linha principal dada, chamada de cantus firmus: a partir do cantus firmus, graças a certas relações de intervalos, pode-se estabelecer diversas linhas melódicas, mas que estão em relação única com essa linha principal. Uma linha contrapontística adquire, portanto, toda a importância no sentido horizontal, ainda que controlada verticalmente. O estudo das relações verticais é mais, especialmente, o objeto da harmonia, enquanto o contraponto acentua as diversas combinações que podem ser feitas entre várias melodias, horizontalmente, sem que elas percam a individualidade. É evidente que música nenhuma pode ser dita estritamente contrapontística ou

Contraponto Harmonia

Superposição de linhas melódicas independentes

Sucessão de acordes, em geral, com uma linha melódica mais importante

Todas as vozes têm a mesma importância

Em geral, uma voz é mais importante melodicamente

Polifonia Homofonia

O aspecto horizontal prevalece O aspecto vertical prevalece

Cada voz tem uma ideia distinta e individual

A soma das vozes transmite uma única ideia

A preocupação fundamental é com a melodia A preocupação principal é o colorido

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TÓPICO 1 — CARACTERÍSTICAS GERAIS

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estritamente harmônica: toda música depende, necessariamente, de características horizontais e verticais. Quando a preponderância se manifesta, mais especialmente, em uma direção, podemos dizer que a música é harmônica ou que é contrapontística (BOULEZ, 1995, p. 263).

Assim, entendemos que a diferença está na ênfase que a música atribui para uma ou para outra vertente, gerando um perfil textural.

3 O ESTUDO DO CONTRAPONTO POR ESPÉCIES

Foi o compositor e teórico austríaco Johann Joseph Fux (1660-1741) que organizou o estudo do contraponto, dividindo-o em cinco espécies, a fim de proporcionar um aprendizado progressivo aos compositores interessados em utilizar o contraponto como base composicional.

O Gradus ad Parnassum (1725) continua sendo o grande marco teórico do contraponto, servindo de base para o aprendizado em muitas escolas até os dias de hoje.

Cabe lembrar que não existem composições nas cinco espécies. Essa divisão foi elaborada como um exercício técnico, que objetiva a fluência na criação e na organização de melodias simultâneas, ferramenta imprescindível para a composição musical.

Agora, conheceremos as características principais das cinco espécies de contraponto, para que possamos aprofundar o estudo de cada uma no tópico seguinte.

3.1 PRIMEIRA ESPÉCIE

Para cada nota do cantus firmus, será adicionada uma nota na nova melodia (em semibreves, assim como o cantus firmus), que pode se situar acima ou abaixo do cantus firmus. As duas vozes deverão formar somente consonâncias perfeitas e imperfeitas, não sendo permitidos os intervalos dissonantes entre elas.

3.2 SEGUNDA ESPÉCIE

Para cada nota do cantus firmus, serão adicionadas duas notas na nova melodia (em mínimas), que pode se situar acima ou abaixo do cantus firmus. Nos tempos fortes, as duas vozes deverão formar somente consonâncias perfeitas e imperfeitas. Já nos tempos fracos, os intervalos poderão ser dissonantes.

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

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3.3 TERCEIRA ESPÉCIE

Para cada nota do cantus firmus, serão adicionadas quatro notas na nova melodia (em semínimas), que pode se situar acima ou abaixo do cantus firmus. Assim como em todas as espécies, os intervalos consonantes podem ser usados livremente. Quanto às dissonâncias, estas serão usadas somente nos tempos fracos.

3.4 QUARTA ESPÉCIE

Na quarta espécie, haverá uma evolução importante na parte rítmica da nova melodia: o uso da síncope. Com isso, as notas situadas no tempo fraco podem ser prolongadas até o tempo forte, através de ligaduras de valor. Há a possibilidade de a dissonância também aparecer no tempo forte, o que pode intensificar e reforçar as consonâncias.

3.5 QUINTA ESPÉCIE

Na quinta espécie há uma combinação das espécies anteriores, e notas de diferentes durações podem ser usadas na nova melodia. Essa espécie é chamada de contraponto florido em função de sua variedade rítmica.

4 RECONHECENDO AS ESPÉCIES DE CONTRAPONTO

Você deve ter notado que a progressividade das espécies se dá por meio da adição de novos elementos. Assim, veremos, agora, como ficam esses exercícios por espécies na partitura, com o cantus firmus na voz inferior. Veja os intervalos harmônicos obtidos. Clique nos links da fonte para ouvir como os exercícios soam.

• Primeira espécie: nota contra nota.

FIGURA 1 – CONTRAPONTO DE PRIMEIRA ESPÉCIE

FONTE: <http://carlosveigafilho.com.br/contraponto/ctpt.html>. Acesso em: 24 jan. 2021.

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TÓPICO 1 — CARACTERÍSTICAS GERAIS

133

• Segunda espécie: duas notas contra uma.

FIGURA 2 – CONTRAPONTO DE SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: <http://carlosveigafilho.com.br/contraponto/ctpt.html>. Acesso em: 24 jan. 2021.

• Terceira espécie: quatro notas contra uma.

FIGURA 3 – CONTRAPONTO DE TERCEIRA ESPÉCIE

FONTE: <http://carlosveigafilho.com.br/contraponto/ctpt.html>. Acesso em: 24 jan. 2021.

• Quarta espécie: uso de síncope.

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

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FIGURA 4 – CONTRAPONTO DE QUARTA ESPÉCIE

FONTE: <http://carlosveigafilho.com.br/contraponto/ctpt.html>. Acesso em: 24 jan. 2021.

• Quinta espécie: utilização das quatro espécies anteriores, gerando um contraponto florido.

FIGURA 5 – CONTRAPONTO DE QUINTA ESPÉCIE

FONTE: <http://carlosveigafilho.com.br/contraponto/ctpt.html>. Acesso em: 24 jan. 2021.

Agora que vimos o resultado dos exercícios na partitura, podemos perceber a progressividade do estudo do contraponto por espécies. O próximo passo é praticar esses exercícios. Para isso, vamos ao tópico seguinte, no qual aprofundaremos as regras de cada espécie, praticando os exercícios na medida em que novas regras são adicionadas.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• O contraponto é uma ferramenta fundamental para a composição musical, pois tem, como objeto de estudo, os aspectos horizontais da música.

• A harmonia e o contraponto são dois campos de estudo diferentes na área da música: enquanto a harmonia se concentra na relação dos acordes, o contraponto enfatiza a simultaneidade das linhas melódicas.

• O estudo do contraponto, criado por Fux, é dividido em cinco espécies progressivas.

• Cada uma das cinco espécies traz características próprias no que diz respeito à quantidade de notas da melodia acrescentada ao cantus firmus. Ainda, é possível reconhecê-las por meio de padrões básicos.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 Neste primeiro tópico, recordamos os conceitos de harmonia e de contraponto, confrontando as características a fim de explanar as intenções desses dois campos do estudo da música. Estabelecidas as devidas diferenças entre os conceitos, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) No estudo do contraponto, o principal enfoque está no aspecto vertical

da música. b) ( ) A relação intervalar das notas dos acordes, entre um mesmo acorde, ou

de um para outro acorde, é matéria fundamental da harmonia. c) ( ) No estudo do contraponto, o principal enfoque está no aspecto

horizontal da música. d) ( ) Fundamentalmente, o estudo do contraponto possui a preocupação de

trabalhar com melodias simultâneas e independentes.

2 Para proporcionar um aprendizado progressivo aos compositores interessados em utilizar o contraponto como base composicional, o compositor e teórico austríaco Johann Joseph Fux (1660-1741) organizou o estudo do contraponto, dividindo-o em cinco espécies. Com base na divisão do contraponto por espécies, organizadas por Fux, analise as sentenças a seguir:

I- Os exercícios da primeira espécie utilizam uma nota do contraponto para cada nota do cantus firmus.

II- O contraponto de quinta espécie é, também, chamado de contraponto florido.

III- Os exercícios da quarta espécie utilizam quatro notas do contraponto para cada nota do cantus firmus.

IV- A síncope pode ser utilizada somente na segunda espécie.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.b) ( ) Somente a sentença I está correta.c) ( ) As sentenças I e II estão corretas.d) ( ) Todas as sentenças estão corretas.

3 Os trechos musicais a seguir possuem diferenças na textura musical. A primeira peça é Jacaré, do compositor brasileiro Ernesto Nazareth (1863-1934). A segunda obra é de Giovanni Pierluigi, da Palestrina (1525-1594), compositor italiano da Renascença, chamada de Dies Sanctificatus. Observe:

AUTOATIVIDADE

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137

JACARÉ, DE ERNESTO NAZARETH

FONTE: <https://bit.ly/32GwRAQ>. Acesso em: 3 fev. 2021.

DIES SANCTIFICATUS, DE PALESTRINA

FONTE: <https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/151272>. Acesso em: 3 fev. 2021.

Com base nos trechos musicais apresentados, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as sentenças falsas:

( ) Na música de Ernesto Nazareth, há uma melodia principal na clave de sol, e um acompanhamento produzido pelos acordes na clave de fá, gerando uma textura polifônica.

( ) A ênfase da música de Palestrina está no aspecto vertical, isto é, nos acordes criados para realizar o acompanhamento da melodia.

( ) Na música de Ernesto Nazareth, há uma melodia principal na clave de sol, e um acompanhamento produzido pelos acordes na clave de fá, gerando uma textura homofônica.

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138

( ) Apenas a peça de Palestrina pode ser considerada como contrapontística, pois se observa a independência das linhas melódicas escritas, técnica em que o compositor possuía pleno domínio.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:a) ( ) V – F – F – V.b) ( ) F – F – V – V.c) ( ) V – F – V – V.d) ( ) F – F – F – V.

4 A partitura a seguir representará um exercício de contraponto na primeira espécie. Observe:

EXERCÍCIO DE PRIMEIRA ESPÉCIE

Com base nas regras do exercício de contraponto de primeira espécie, responda à seguinte pergunta: Há algum erro no exercício anterior? Se sim, qual (quais)?

5 A partitura representa um exercício de contraponto na terceira espécie, mas possui erros. Identifique quais foram os erros cometidos no exercício, apontando, também, a localização na partitura.

EXERCÍCIO DE TERCEIRA ESPÉCIE

FONTE: O autor

FONTE: O autor

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 2, abordaremos, com profundidade, as normas de cada uma das cinco espécies de contraponto, para, então, prosseguir com exercícios práticos de criação.

Por que estudar o contraponto em espécies se as músicas não foram

compostas dessa maneira? Podemos entender esse método como exercícios de percepção e de criação, e que essas divisões em espécies foram didaticamente organizadas para que o aprendizado seja realizado por etapas. Com o objetivo de desenvolver melodias fluentes, independentes e simultâneas, aprenderemos a organizá-las de maneira lógica, por meio de exercícios de dificuldade progressiva.

Antes de realizarmos os exercícios, reforçaremos alguns pontos

importantes acerca da condução das linhas melódicas que você aprendeu na unidade anterior. Vejamos:

• Uso de graus conjuntos para conseguir um bom direcionamento linear.• Saltos devem ser compensados por grau conjunto em movimento contrário.• Utilizar somente notas da escala diatônica.• Se o contraponto for mais grave do que o cantus firmus, o ponto culminante

pode ser grave ou agudo.• Não coincidir o ponto culminante nas duas vozes para manter a independência.• O ponto culminante não deve ser repetido.• Evitar o movimento em uma mesma direção e por muito tempo.• A relação intervalar entre as notas é calculada a partir da nota mais grave.• Intervalos consonantes se movimentam livremente, enquanto os dissonantes

possuem restrições.• Saltos e mudanças de direção criam variedade na linha melódica.• A repetição de notas, de grupo de notas, ou de uma tessitura pequena provoca

monotonia.• É importante que você escreva melodias que possam ser facilmente cantadas.

O método de contraponto em espécies de Fux foi concebido para o estudo da técnica de uma estética específica: a música vocal do século XVI, com referência ao compositor Giovanni Pierluigi da Palestrina (1525-1594). No entanto, o compositor austríaco Hugo Kauder (1888-1972) afirma que o método

TÓPICO 2 —

PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

trata apenas de uma técnica de composição polifônica, e que os elementos básicos podem ser assimilados em qualquer sistema tonal e aplicados a qualquer estilo individual (KAUDER, 1960).

Outro ponto importante de ser esclarecido é que você deve seguir as regras

estabelecidas por Fux para assimilar princípios básicos da escrita contrapontística. Após muita prática, você deve ter incorporado as normas, podendo transcendê-las ou se libertar delas, de fato. É como a analogia da escada criada pelo filósofo austríaco Ludwig Joseph Johann Wittgenstein, que falava que as regras são como escadas, das quais subimos os degraus, para, depois, jogar a escada fora. Isso posto, primeiramente, vamos nos ater às regras de Fux.

2 PRIMEIRA ESPÉCIE

Aprofundaremos as normas da primeira espécie no próximo subtópico, para, então, seguirmos com os exercícios. Não se prenda somente a resoluções matemáticas dos exercícios. Tente se orientar, também, por uma escuta ativa dos trechos musicais durante a criação.

2.1 NORMAS

Seguem as mesmas diretrizes para a criação do cantus firmus, no que se refere à direção, variedade, emprego de saltos e equilíbrio. Na primeira espécie, emprega-se uma nota (semibreve) do contraponto para cada nota do cantus firmus.

Na espécie, são permitidos somente os intervalos consonantes entre o

cantus firmus e a linha do contraponto. As consonâncias podem ser perfeitas ou imperfeitas, como no quadro a seguir:

Retome o Tópico 3, da Unidade 2, para mais detalhes acerca do tema, principalmente, no que se refere aos tipos de movimento: contrário, paralelo, direto e oblíquo.

ATENCAO

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

141

QUADRO 2 – CONSONÂNCIAS PERFEITAS E IMPERFEITAS

FONTE: O autor

Os outros intervalos (2ª M, 2ªm, 4ªJ, 7ªM, 7ªm e todos os intervalos aumentados e diminutos) são considerados dissonantes e não serão utilizados no início do estudo.

O contraponto deve começar e terminar com uma consonância perfeita,

de acordo com a seguinte organização:

• Cantus firmus na voz inferior: o contraponto pode iniciar em uníssono, ou com qualquer consonância perfeita.

• Cantus firmus na voz superior: o contraponto deve iniciar com o intervalo de uníssono ou oitava.

• Em ambas as situações, o contraponto sempre finaliza com um intervalo de oitava ou uníssono.

A maior distância entre as vozes (cantus firmus e contraponto) deve ser de uma décima, e não é permitido o cruzamento entre as vozes. Tente evitar a repetição de notas.

O intervalo de oitava possui alto grau de estabilidade, e o uso em demasia

enfraquece a independência das vozes. No livro Exercícios Preliminares em Contraponto (2001), o compositor Arnold Schoenberg (1874-1951) recomenda que esse intervalo não seja utilizado nos exercícios para não comprometer a fluência melódica. O uso constante do intervalo de 5ª também pode afetar a independência das melodias. Não é permitido o uso de 5ª e 8ª em movimento paralelo.

Além do intervalo de 8ª e uníssono, o início pode, também, ser realizado

com intervalo de 5ª e 3ª, como nos três exemplos de início de contraponto a seguir:

Consonâncias perfeitas Consonâncias imperfeitas

Uníssono8ª J5ª J

3ª M3ª m6ª M6ª m

Pratique cada exercício em um instrumento polifônico, como um piano, ou toque com outro músico, para ver como está soando.

DICAS

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 6 – INÍCIO DO CONTRAPONTO

FONTE: O autor

É recomendado evitar o excesso da utilização dos intervalos de terça e sexta. Use, no máximo, três vezes seguidas:

FIGURA 7 – REPETIÇÃO DE INTERVALOS DE 3ª

FONTE: O autor

No penúltimo compasso do contraponto, é evidenciado o pensamento tonal, no qual há a tensão produzida por um acorde dominante, para resolver no último compasso com a tônica. Recomenda-se o uso da sensível (7ª maior) nesse compasso. Se realizarmos somente exercícios nas tonalidades de dó maior e de lá menor, ou seja, sem o uso de acidentes, apenas notas diatônicas, com exceção desse penúltimo compasso, podem ocorrer alterações para o uso da sensível da tonalidade.

FIGURA 8 – ACORDE DOMINANTE NO PENÚLTIMO COMPASSO

FONTE: O autor

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

143

Achou que são muitas regras? Pode ser que sim. Contudo, fica mais fácil trabalhar dentro de limites, pois, assim, sabemos exatamente as possibilidades que temos. Não se esqueça de que o objetivo dessas regras é o resultado sonoro, e a independência das melodias é fundamental.

2.2 EXERCÍCIOS

Uma boa maneira de iniciar os exercícios é escrever todas as possibilidades em uma pauta intermediária. Seguindo um exemplo do livro Contraponto: A Arte de Compor (1994), do compositor Lívio Tragtenberg, vejamos como isso pode ser feito.

Na primeira pauta (de baixo para cima), há o cantus firmus, e, na pauta do

meio, você deve escrever todas as possibilidades intervalares para o contraponto. Na pauta de cima, escreva a linha melódica. Lembre-se de que cada voz (cantus firmus e contraponto) deve manter a identidade, e, para que isso aconteça, trabalhe com movimento contrário e grau conjunto, sempre que possível.

A primeira e a última notas devem formar intervalos de 8ª ou uníssono.

FIGURA 9 – PRÁTICA DE CONTRAPONTO DE 1ª ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Tragtenberg (2004)

Apesar de ter o controle vertical (harmônico) do contraponto, não deixe que a linha melódica seja guiada pelo pensamento harmônico. Trabalhe para que o aspecto horizontal prevaleça.

A partir do cantus firmus proposto por Fux, escreva, também, as possibilidades na pauta do meio, para, depois, criar a linha melódica na pauta de cima. • Exercício n. 1

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 10 – EXERCÍCIO N.1 - PRIMEIRA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 2

FIGURA 11 – EXERCÍCIO N.2 - PRIMEIRA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

3 SEGUNDA ESPÉCIE

Aprofundaremos as normas da segunda espécie no próximo subtópico, para seguirmos com os exercícios. As regras da primeira espécie são mantidas na segunda espécie, mas com a adição de novos elementos. Lembre-se de não se prender somente a resoluções matemáticas dos exercícios. Oriente-se, também, por uma escuta ativa dos trechos musicais durante a criação.

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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3.1 NORMAS

Na segunda espécie, aplicamos duas notas (mínimas) no contraponto para cada nota do cantus firmus. As notas dos tempos fortes devem formar somente consonâncias em relação ao cantus firmus. Nos tempos fracos, podem ser usados intervalos consonantes e dissonantes.

Para obter independência, o contraponto pode iniciar com pausa, tornando-se melhor opção se comparada com o início simultâneo das melodias. Nesse caso, o contraponto deve iniciar com uma consonância, inclusive, se for mais grave do que o cantus firmus, deve iniciar em uníssono ou 8ª.

FIGURA 12 – INÍCIO DO CONTRAPONTO EM SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: O autor

As dissonâncias podem ser usadas no tempo fraco, e devem ser alcançadas por grau conjunto. No exemplo, anterior, havia uma 4ª J (dissonância) no segundo compasso, que se movimentava por grau conjunto para resolver na 6ª (consonância).

No último compasso, as duas melodias usam a mesma figura, uma semibreve. Já no penúltimo compasso, a regra do acorde dominante continua sendo aplicada, e se pode usar a mesma figura nas duas vozes em ocasiões especiais.

FIGURA 13 – PENÚLTIMO COMPASSO DO CONTRAPONTO EM SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: O autor

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

Estamos fazendo o possível para garantir a identidade de cada melodia, certo?! Contudo, precisamos controlar as duas melodias harmonicamente também. Na segunda espécie, podemos fazer o uso da dissonância nos tempos fracos, que, quando resolvidas, enfatizam e valorizam o centro tonal. As dissonâncias devem aparecer entre duas consonâncias como nota de passagem: na mesma direção melódica e em uma distância de terça (entre as consonâncias).

FIGURA 14 – NOTA DE PASSAGEM

FONTE: Kohler (2012, p. 1)

A repetição constante do mesmo intervalo é um fator que pode gerar certa monotonia. De fato, como queremos uma melodia com musicalidade, convém evitar a repetição sistemática de elementos; deve-se encontrar um ponto de equilíbrio dentro da variedade. Sirva-se desse princípio nos exercícios em todas as espécies.

Segundo Kohler (2012), com o cantus firmus na voz inferior, terminando

em II – I, o contraponto superior possui somente uma solução:

FIGURA 15 – FINALIZAÇÃO EM II – I - CONTRAPONTO NA VOZ SUPERIOR

FONTE: Kohler (2012, p. 3)

Já o contraponto na voz inferior possui mais possibilidades de finalização:

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

147

FIGURA 16 – FINALIZAÇÃO EM II – I - CONTRAPONTO NA VOZ INFERIOR

FONTE: Kohler (2012, p. 3)

Veja, agora, alguns exemplos com o cantus firmus terminando em VII – I, e o contraponto nas vozes inferior e superior.

FIGURA 17 – FINALIZAÇÃO EM VII – I - CONTRAPONTO NA VOZ INFERIOR

FONTE: Kohler (2012, p. 3)

FIGURA 18 – FINALIZAÇÃO EM VII – I - CONTRAPONTO NA VOZ SUPERIOR

FONTE: Kohler (2012, p. 3)

3.2 EXERCÍCIOS

Vamos praticar? Escreva linhas melódicas seguindo as regras estudadas a partir de cada cantus firmus proposto por Fux a seguir:

• Exercício n. 1

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 19 – EXERCÍCIO N.1 - SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 2

FIGURA 20 – EXERCÍCIO N.2 - SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 3

FIGURA 21 – EXERCÍCIO N.3 - SEGUNDA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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4 TERCEIRA ESPÉCIE

Um fator positivo de estudar contraponto por espécies é a progressividade dos exercícios. Logo, as regras que vão surgindo em cada espécie continuam valendo nas próximas. Agora, aprofundaremos as normas da terceira espécie, para seguirmos com os exercícios. Lembre-se de não se prender somente a resoluções matemáticas dos exercícios. Mesmo seguindo as regras, tente criar de uma maneira musical, e que agrade o seu ouvido.

4.1 NORMAS

Na terceira espécie, aplicamos quatro notas (semínimas) no contraponto para cada nota do cantus firmus. Você deve ter percebido que o nosso estudo está baseado em divisões binárias e quaternárias do compasso, certo?! Nessa espécie, os pulsos 1 e 3 são considerados tempos fortes, o 3 tem apenas uma leve acentuação, e pode ser chamado de meio forte, e 2 e 4 são tempos fracos.

Enquanto consonâncias podem ser usadas livremente, devemos ter

certos cuidados com as dissonâncias. Além de se preocupar com a resolução, as dissonâncias podem ocorrer como nota de passagem, bordadura e cambiata. Observemos como fica cada situação.

• Nota de passagem: caminha por grau conjunto entre duas consonâncias a uma distância de terça.

FIGURA 22 – NOTA DE PASSAGEM

FONTE: Kohler (2012, p. 168)

• Bordadura: caminha por grau conjunto e retorna à mesma nota.

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 23 – BORDADURA

FONTE: Kohler (2012, p. 17)

• Cambiata: ornamento que abrange um total de cinco notas, e deve seguir o seguinte esquema: parte de uma dissonância realiza um salto de terça movimenta-se em grau conjunto para a resolução. A primeira nota e a última devem ser consonantes, e a relação intervalar é sempre de 2ª. A cambiata inicia sempre no primeiro tempo do compasso.

FIGURA 24 – CAMBIATA

FONTE: Kohler (2012, p. 17)

Observe que a cambiata surge da ornamentação de duas notas: a nota ré e a nota dó (intervalo de 2ª sempre). Utilize os diferentes tipos de movimentos e ornamentos com parcimônia, a fim de não comprometer a fluidez da melodia. A sensível deve aparecer no último tempo do penúltimo compasso, com a função harmônica do acorde dominante. A nota final do contraponto é de igual duração à nota do cantus firmus.

4.2 EXERCÍCIOS

O procedimento melódico é o mesmo da segunda espécie, mas, como temos mais notas para trabalhar, tentemos equilibrar diferentes tipos de movimento melódico, com direções variadas. Utilize saltos para mudança de direção da melodia.

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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• Exercício n. 1

FIGURA 25 – EXERCÍCIO N.1 - TERCEIRA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 2

FIGURA 26 – EXERCÍCIO N.2 - TERCEIRA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 3

FIGURA 27 – EXERCÍCIO N.3 - TERCEIRA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

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152

UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

5 QUARTA ESPÉCIE

Nesta espécie, há mais possibilidades rítmicas para a linha melódica, e desperta a opção de trabalhar com as dissonâncias no tempo forte. Para cada nota do cantus firmus, uma nota sincopada é aplicada, utilizando figuras de igual duração.

A síncope ocorre quando uma nota do tempo fraco tem a duração

prolongada até o tempo forte. Esse prolongamento é obtido com a aplicação de ligaduras de valor.

FIGURA 28 – SÍNCOPE

FONTE: O autor

Investigaremos as normas da quarta espécie, para seguirmos com os exercícios.

5.1 NORMAS

Apesar da abertura para o uso da síncope, a aplicação não precisa ser constante, e é preferível que não seja. Em todas as espécies, temos evitado a repetição de elementos, para que a linha melódica não soe monótona demais. Nesse sentido, o uso de mínimas não ligadas, como na segunda espécie, e de notas de passagem, colabora para a identidade e a variedade da melodia.

As notas da síncope podem ser consonantes em relação ao cantus firmus,

mas você também pode trabalhar com as dissonâncias no tempo forte, gerando um efeito conhecido como suspensão. Segundo Schoenberg (2001), a suspensão consiste em uma dissonância em uma fórmula de três notas.

A primeira nota, colocada sobre um tempo fraco como consonância do cantus firmus, é o início da síncope e serve como preparação. Essa nota sustentada se torna, nesse ponto, através do movimento do cantus firmus, uma dissonância situada no tempo forte. No tempo fraco seguinte, a resolução é obtida pelo movimento descendente, por grau conjunto, da dissonância para a consonância (SCHOENBERG, 2001, p. 63).

Assim, a dissonância fica localizada entre duas consonâncias. No exemplo a seguir, poderemos ver a partitura com o movimento melódico descrito:

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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FIGURA 29 – SUSPENSÃO

FONTE: Adaptada de Schoenberg (2001)

A suspensão não deve ser resolvida na direção ascendente, mas por grau conjunto descendente. Com esse movimento, a sensação de resolução é mais efetiva.

5.2 EXERCÍCIOS

Antes dos exercícios, vejamos um trecho musical proposto por Kohler (2012), que possui problemas e algumas soluções possíveis. Primeiramente, o contraponto com problemas:

FIGURA 30 – CONTRAPONTO FRACO

FONTE: Kohler (2012, p. 17)

Dentre as falhas observadas, podemos citar a previsibilidade e a repetição da direção da linha, além do uso constante do intervalo de 3ª (ou 10ª).

Agora, duas possíveis soluções:

FIGURA 31 – RESOLUÇÕES PARA O CONTRAPONTO ANTERIOR

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FONTE: Kohler (2012, p. 17)

Vamos praticar? Vale lembrar que as mesmas regras das espécies anteriores para o início e o fim do contraponto também continuam válidas.

• Exercício n. 1

FIGURA 32 – EXERCÍCIO N.1 - QUARTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 2

FIGURA 33 – EXERCÍCIO N.2 - QUARTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

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• Exercício n. 3

FIGURA 34 – EXERCÍCIO N.3 - QUARTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

6 QUINTA ESPÉCIE

A quinta espécie reúne os valores de duração das notas que aparecem nas espécies anteriores, gerando o chamado contraponto florido. Depois de realizar os exercícios, o próximo passo para você se aprofundar na escrita contrapontísti-ca é praticar o contraponto livre, a partir do qual as regras estão internalizadas de tal maneira que você pode se sentir apto a criar livremente, inclusive, transcen-dendo as normas. Você também pode inventar as próprias regras para compor, criando processos criativos particulares. Tendo esse objetivo em vista, vamos aos exercícios!

6.1 NORMAS

Como a quinta espécie, utilizam-se normas das quatro espécies anteriores, assim, é necessário lembrar dos principais pontos de cada uma:

1ª espécie – consonâncias 2ª espécie – consonâncias e notas de passagem 3ª espécie – consonâncias, notas de passagem, bordaduras e cambiatas 4ª espécie – síncope (suspensão)

6.2 EXERCÍCIOS

Escreva linhas melódicas, seguindo as regras estudadas, a partir de cada cantus firmus proposto por Fux:

• Exercício n. 1

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 35 – EXERCÍCIO N.1 - CONTRAPONTO NA QUINTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 2

FIGURA 36 – EXERCÍCIO N.2 - CONTRAPONTO NA QUINTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

• Exercício n. 3

FIGURA 37 – EXERCÍCIO N.3 - CONTRAPONTO NA QUINTA ESPÉCIE

FONTE: Adaptada de Man (1971)

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TÓPICO 2 — PRÁTICA DE CONTRAPONTO A DUAS VOZES

157

Para conseguir o domínio da técnica do contraponto, é necessária muita prática, além de realizar muitos exercícios. Esperamos que você tenha compreendido o suficiente dos mecanismos da técnica, para que possa aplicar no processo criativo.

Será que as regras do contraponto em espécies trazem limites para a criação das melodias? Se levarmos em conta que sempre há um número limitado de possibilidades melódicas e rítmicas, a resposta é afirmativa, porém, o exercício constrói um ambiente para a exploração da criatividade, em que a técnica e a musicalidade se aglutinam, trazendo fluência e independência para as linhas melódicas.

Neste tópico, trabalhamos com o contraponto a duas vozes. Nosso

próximo passo será conhecer a aplicação das regras estudadas em contrapontos a três vozes. No tópico seguinte, examinaremos estilos e técnicas composicionais de obras curtas a três vozes.

Agora que você passou por este conteúdo, recomendamos o estudo da prática do contraponto pelo livro Contraponto Modal do Século XVI (Palestrina), de Koellreutter. Nesse livro, o autor direciona o estudo para o estilo específico de Palestrina, dentro do contexto do contraponto modal.

DICAS

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158

RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• A repetição de elementos (melódicos e rítmicos) pode gerar monotonia no contraponto.

• Há os seguintes recursos melódico-rítmicos: nota de passagem, bordadura e cambiata.

• A criação de linhas melódicas pode ser realizada por meio da prática de escrever o contraponto em espécies, e o objetivo dessa prática é chegar ao contraponto livre, para poder transcender as regras dos exercícios praticados anteriormente.

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1 A organização do contraponto em espécies se traduz na progressividade da utilização de recursos. Inicia-se, na primeira espécie, com poucas possibilidades, ampliando-as gradualmente. Sabendo que cada espécie possui atributos específicos, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Na primeira espécie, utilizam-se consonâncias e notas de passagem. b) ( ) A síncope é um importante recurso rítmico e melódico que é introduzido

a partir da 3ª espécie. c) ( ) Notas de passagem, bordaduras e cambiatas são permitidas a partir da

terceira espécie, em que se trabalha com quatro notas no contraponto em relação ao cantus firmus.

d) ( ) Na segunda espécie, são permitidas somente as consonâncias.

2 A primeira espécie proporciona um contato inicial com a prática do contraponto, trazendo um limitado número de recursos melódicos. Na segunda espécie, adiciona-se uma nota em relação à primeira espécie, gerando um contraponto de duas notas contra uma, do cantus firmus. Em síntese, a progressão entre as duas primeiras espécies é pequena. Já na terceira espécie, a gama de possibilidades é ampliada, e requer habilidade do estudante para explorar os recursos. Com base nas regras da terceira espécie de contraponto, analise as sentenças a seguir:

I- As dissonâncias podem ser usadas livremente nessa espécie, enquanto as consonâncias têm regras a serem seguidas.

II- O recurso chamado de nota de passagem consiste em uma nota que se movimenta em grau conjunto entre duas consonâncias.

III- A cambiata é um ornamento que abrange um total de cinco notas. IV- A bordadura caminha por grau conjunto e retorna à mesma nota.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) Somente a sentença III está correta.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. d) ( ) Todas as sentenças estão corretas.

3 O cantus firmus e o contraponto são linhas melódicas. Ao ser escrita, cada linha deve ter uma qualidade individual, ou seja, ser elaborada de forma a preservar uma identidade própria. Para conseguir um bom resultado, há um conjunto de estratégias que nos auxilia nesse processo. Acerca da condução de uma linha melódica no estudo do contraponto, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) Um movimento, na mesma direção, por muito tempo, gera uma boa linha melódica.

AUTOATIVIDADE

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b) ( ) Saltos e mudanças de direção criam variedade na linha melódica. c) ( ) Saltos devem ser compensados por grau conjunto em movimento

contrário. d) ( ) A repetição de notas, de um grupo de notas, ou de uma tessitura

pequena provoca monotonia.

4 Segundo Kohler (2012), em um cantus firmus que finaliza com II – I, há apenas uma opção para finalizar um contraponto na segunda espécie. Escreva a única possibilidade para o contraponto a seguir:

CANTUS FIRMUS FINALIZANDO EM II - I

FONTE: O autor

5 Na terceira espécie, expandem-se, consideravelmente, os recursos a serem utilizados. Colocam-se à disposição as cambiatas, as notas de passagem e as bordaduras. Na partitura a seguir, haverá uma ornamentação específica gerada pelo movimento melódico. Descreva qual é a ornamentação apresentada, e justifique a resposta, descrevendo o movimento melódico.

ORNAMENTO

FONTE: O autor

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161

UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, neste tópico, continuaremos a desenvolver assuntos relacionados à composição musical contrapontística. Examinaremos obras curtas a três vozes, estilos e importantes técnicas composicionais, como a imitação, a invenção e a fuga.

Primeiramente, investigaremos possibilidades de aplicar as regras do contraponto por espécies aprendidas na unidade anterior, em três melodias simultâneas. Perceba que, com três notas simultâneas, é possível formar tríades, ampliando as possibilidades e as sonoridades na composição. Em seguida, veremos uma parte da diversidade de técnicas polifônicas que foram desenvolvidas desde a Renascença até o período Barroco. Dentre os elementos que aparecem nas técnicas abordadas, podemos citar o compartilhamento de trechos melódicos por vozes diferentes, além do desenvolvimento de materiais musicais. Esses elementos são familiares em alguma música que você conhece? Provavelmente, sim. Muitos traços de estilos antigos foram incorporados em músicas atuais, de gêneros e estilos variados.

2 OBRAS CURTAS A TRÊS VOZES

As regras para o contraponto de duas vozes continuam válidas quando trabalhamos com três vozes ou mais. Como o número de vozes foi aumentado, ampliam-se as regras. Em obras a três vozes, pode-se utilizar as três notas que formam uma tríade completa.

No livro Contraponto Modal do Século XVI (1996), o compositor e teórico

Hans Joachim Koellreutter (1915-2005) nos apresenta todas as combinações intervalares possíveis no contraponto a três vozes:

TÓPICO 3 —

CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

8 10 5 6 8 12 10 10 12 13 8 13 103 3 3 3 5 5 5 8 8 8 6 6 61 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

Como você pode ver, os intervalos formam tríades em posição fundamental ou na primeira inversão (baixo na 3ª acorde). Para ilustrar, veremos e reconheceremos os exemplos de espécies de contraponto a três vozes, propostos por Koellreutter (1996).

FIGURA 38 – NOTA CONTRA NOTA (PRIMEIRA ESPÉCIE)

FONTE: Koellreutter (1996, p. 53)

FIGURA 39 – PRIMEIRA ESPÉCIE NAS VOZES SUPERIORES E SEGUNDA ESPÉCIE NA VOZ INFERIOR

FONTE: Koellreutter (1996, p. 53)

FIGURA 40 – PRIMEIRA ESPÉCIE NAS VOZES SUPERIORES E TERCEIRA ESPÉCIE NA INFERIOR

FONTE: Koellreutter (1996, p. 53)

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TÓPICO 3 — CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

163

Koellreutter (1996) aconselha o estudante a praticar as seguintes mesclas de espécie a três vozes:

• Utilizar o cantus firmus em semibreves em uma das três vozes, mais um contra-ponto em mínimas (segunda espécie) em outra voz e criar outro contraponto em semínimas (terceira espécie) na voz restante, como no exemplo a seguir:

FIGURA 41 – MESCLA DE ESPÉCIES NO CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

FONTE: Koellreutter (1996, p. 56)

• Utilizar o cantus firmus em semibreves em uma das três vozes, mais um con-traponto em semínimas (terceira espécie) em outra voz e criar outro contra-ponto em mínimas ligadas (quarta espécie) na voz restante, como no exemplo a seguir:

FIGURA 42 – MESCLA DE ESPÉCIES NO CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

FONTE: Koellreutter (1996, p. 56)

• Utilizar o cantus firmus em semibreves em uma das três vozes, mais dois contrapontos na quinta espécie, como no exemplo a seguir:

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 43 – MESCLA DE ESPÉCIES NO CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

FONTE: Koellreutter (1996, p. 56)

Para exercitar, ainda mais, a técnica que você aprendeu no estudo do contraponto a duas vozes, aplique as mesmas diretrizes, e as novas, em exercícios a três vozes. Você pode partir de um cantus firmus existente, ou criar um, para, depois, distribuir os contrapontos, como Koellreutter (1996) orienta.

3 IMITAÇÃO

A imitação é um importante estilo de composição polifônica da Renascença, que consiste em uma voz reproduzir (imitar) trechos melódicos de uma outra voz. Uma voz anuncia uma ideia musical, em seguida, outra voz entra e imita aquela ideia, como uma resposta à ideia inicial. Essa imitação pode ser realizada em maior ou menor grau de fidelidade. A repetição literal da peça (ou da seção) é chamada de cânone. Para o chamado estilo imitativo da Renascença, uma voz imita uma passagem melódica transposta, normalmente, em intervalos de 4ª e 5ª justa, 8ª e uníssono.

Você percebeu a complexidade da polifonia presente na música de Palestrina? Como pode, uma música conduzida pela precisão matemática, carregar atributos expressivos dessa maneira? Essas técnicas de imitação foram consolidadas na música da Renascença, com um contexto modal. Já a imitação tonal foi desenvolvida no período Barroco, no qual o modalismo teve o uso significativamente reduzido pelos compositores. Procedimentos de contraponto imitativo podem ser identificados em diversos estilos musicais desde a Renascença, como fuga, moteto, invenção, cânone, madrigal etc.

https://www.youtube.com/watch?v=1mTUOk633DQAssista ao vídeo com a partitura de Palestrina – Dies Sanctificatus (moteto), e tente identi-ficar as imitações que ocorrem nas vozes.

DICAS

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TÓPICO 3 — CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

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Na produção contemporânea, podemos perceber que a imitação é, ainda, um recurso amplamente utilizado pelos compositores. Como exemplo, citamos o violonista brasileiro Camilo Carrara, que utilizou uma técnica imitativa em uma gravação da canção japonesa Hana no Uta (anônimo, séc. XIX). No caso, a técnica empregada se chama stretto, muito presente nas fugas. No stretto, uma voz repete a frase realizada por outra voz em um curto espaço de tempo. Na versão de Camilo Carrara, a defasagem temporal entre uma voz e outra é de somente uma semínima, e a relação intervalar entre as vozes é de uma oitava.

O violonista inicia a música apresentando a melodia com um acompanhamento harmônico. A partir de 1’47”, Carrara aplica o recurso imitativo na seguinte situação: exposição da melodia no agudo, e repetição uma oitava abaixo. Perceba como a distância de tempo entre as vozes é pequena.

4 INVENÇÃO A TRÊS VOZES Outro estilo da composição contrapontística é a invenção, que tem, como

grande representante, Johann Sebastian Bach (1685-1750). Trata-se de uma obra de curta duração, composta, normalmente, para teclado, e os aspectos técnicos são pedagogicamente empregados, como os estudos. Possui a finalidade de promover o exercício da técnica instrumental para os músicos, sendo um exercício de composição, com regras específicas. As invenções de Bach foram escritas para duas e três vozes, sendo, hoje, conhecidas como Invenções a duas partes, e Invenções a três partes.

https://www.youtube.com/watch?v=_E_tH3fEheQ Assista ao vídeo de Hana no Uta, música tradicional japonesa em arranjo de Camilo Carrara.

https://youtu.be/5EaerNmnY84Ouça as Invenções a Duas Partes, de Bach, e procure analisar o processo de desenvolvi-mento de motivos melódicos.

DICAS

DICAS

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

A forma das invenções consiste em uma breve exposição, seguida por um desenvolvimento, que toma a maior parte da obra, e pode finalizar com uma recapitulação. Segundo o compositor e teórico estadunidense Kent Kennan (1913-2003), uma invenção poderia ser definida como “uma obra contrapontística curta centrada em torno do desenvolvimento do material de um ou dois motivos” (KENNAN, 1987, p. 109).

Durante a exposição, um motivo é apresentado. Esse motivo é chamado

de tema, ou sujeito, e é repetido na segunda voz, enquanto a primeira voz faz um contraponto livre ou um contra-sujeito.

No desenvolvimento, há o emprego de variações melódicas e harmônicas do sujeito, e as outras vozes produzem contraponto livre.

A recapitulação se restringe a uma repetição, literal ou com pouca variação, do sujeito na voz superior, enquanto outra voz realiza o contraponto livre ou o contra-sujeito. Quando a invenção é a três vozes, adiciona-se uma voz acompanhante, abrindo a possibilidade de criar um segundo contra-sujeito.

Com relação às regras, você deve ter percebido que a música contrapontística contém um alto grau de racionalidade no processo criativo. Isso reside no fato de que, para tornar inteligíveis linhas melódicas que são tocadas ao mesmo tempo, é preciso ter um controle sobre cada uma delas. Por isso, a grande quantidade de normas para serem seguidas nesse tipo de escrita. Embora não haja um grande número de invenções, a importância do estudo está, justamente, nos rigores técnico e musical. Outro exemplo de estilo contrapontístico é a fuga, que possui regras ainda mais rígidas.

5 FUGA O que te vem à cabeça quando pensa na palavra fuga? Possivelmente,

algo como uma perseguição, ou uma correria, não é mesmo?! Pois é, na música, podemos pensar que a fuga é uma peça contrapontística que, realmente, traz esses elementos. Com esse nome sugestivo, a fuga pode possuir uma estrutura

Se você quer examinar, com mais profundidade, as regras das invenções de Bach, o livro Counterpoint: Based on Eighteeth-Century Pratice (1987), de Kent Kennan, traz um capítulo inteiramente dedicado ao assunto.

DICAS

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TÓPICO 3 — CONTRAPONTO A TRÊS VOZES

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complexa. Para o entendimento completo da técnica, deve-se ficar atento às diversas regras estabelecidas, principalmente, no que se refere ao controle dos intervalos harmônicos que as linhas melódicas produzem.

No estilo imitativo da música vocal renascentista, é possível perceber

traços que deram origem à fuga posteriormente, mas foi no período barroco que Bach e Handel levaram esse estilo composicional às últimas consequências.

Uma fuga, normalmente, tem três ou quatro vozes, e um recurso importante utilizado é a imitação. Basicamente, uma voz realiza uma melodia curta, chamada de tema, com forte identidade musical, e as outras vozes a imitam, com notas adaptadas ao contexto harmônico. As entradas de cada voz são divididas por seções denominadas de episódios, sendo sempre iniciadas com a exposição do tema.

Os temas também são chamados de sujeitos, e a repetição nas outras vozes

soa como uma resposta ao sujeito. Quando uma outra voz entra “respondendo” o sujeito, a voz anterior não é interrompida, e inicia, inclusive, outra atividade melódica, chamada de contra-sujeito.

Observe a partitura com o início da Fuga BWV 847, em dó menor, de Bach:

FIGURA 44 – PARTITURA

FONTE: <https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/569612>. Acesso em: 24 mar. 2021.

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

Nos primeiros compassos, há o sujeito indicado em azul. Repare que a resposta ao sujeito (em verde) possui o mesmo contorno melódico, e o mesmo ritmo do sujeito, mas transposta uma quinta acima. No terceiro compasso, momento em que a resposta do sujeito é realizada, o contra-sujeito é apresentado na voz inferior, destacado em vermelho. Nos compassos 5 e 6, há uma transição que funciona como uma preparação para a entrada da terceira voz. No compasso 7, a terceira voz aparece em amarelo como um segundo contra-sujeito, incorporando elementos rítmicos do primeiro contra-sujeito (em vermelho). Ao fim, em azul, o sujeito é exposto novamente. Podemos chamar todo esse início da peça (até o primeiro tempo do compasso 9) de exposição.

A trama contrapontística de uma fuga requer uma escuta extremamente atenta, para que o ouvinte que resolver enfrentá-la possa usufruir plenamente da música. O sujeito é fácil de reconhecer, porque os compositores sempre realizam a exposição somente com uma voz. Na medida em que as outras vozes vão entrando, a textura vai ficando cada vez mais complexa e densa.

Temos estudado, até aqui, diversas maneiras de trabalhar com uma textura contrapontística. No próximo tópico, estudaremos, ainda, outros olhares da textura musical. Desvendaremos conceitos de textura e possíveis relações com a prática no contexto da educação musical.

https://youtu.be/sA_JB2MbUjkNada melhor que ouvir a música para entender o funcionamento. Veja, neste vídeo-parti-tura, uma análise da Fuga em Sol Menor BWV 861, de Bach. Concentre-se para conseguir reconhecer, principalmente, as entradas de cada elemento da fuga.

DICAS

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• As regras de contraponto por espécie a duas vozes podem ser aplicadas em obras musicais de três ou mais vozes.

• A imitação é um recurso amplamente utilizado na escrita polifônica e pode ser utilizado em diversos estilos musicais.

• A invenção é uma peça musical norteada pelo desenvolvimento de um ou de dois motivos.

• A fuga também utiliza o recurso da imitação, e o processo composicional abrange a exposição de um tema e a repetição nas outras vozes, com as devidas alterações melódicas.

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1 No contexto da música clássica ocidental, o desenvolvimento da polifonia ocorreu no fim da Idade Média, atingindo um alto grau de elaboração nos períodos da Renascença e do Barroco. Levando em consideração os estudos históricos do contraponto, analise, com atenção, as sentenças a seguir:

I- Para o estilo imitativo da Renascença, uma voz imita uma passagem melódica transposta, normalmente, em intervalos de 4ª e 5ª justa, 8ª e uníssono.

II- Para o estilo imitativo da Renascença, uma voz imita uma passagem melódica transposta sempre em intervalos de 3ª.

III- Bach e Handel são dois compositores no estilo da fuga. IV- As regras de contraponto por espécie a duas vozes não podem ser

aplicadas em obras musicais de três ou mais vozes.

Assinale a alternativa CORRETA:a) ( ) As sentenças I e III estão corretas.b) ( ) Somente a sentença III está correta.c) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. d) ( ) Todas as sentenças estão corretas.

2 Nesta unidade, estudamos a aplicação de técnicas composicionais para a música polifônica. Iniciamos com duas vozes no Tópico 1, e, agora, estamos trabalhando com três vozes. Acerca do estudo do contraponto a três vozes, assinale a alternativa INCORRETA:

a) ( ) A imitação é um recurso amplamente utilizado na escrita polifônica e pode ser utilizado em diversos estilos musicais.

b) ( ) A invenção é uma peça musical que possui um ou dois motivos, e tem a estrutura baseada no desenvolvimento desses motivos.

c) ( ) O processo composicional da fuga abrange a exposição de um tema e a repetição literal, sem nenhuma alteração nas outras vozes.

d) ( ) Não há como utilizar tríades completas no contraponto a duas vozes, mas, trabalhando com três vozes, esse importante recurso se torna possível.

3 Dos estilos musicais estritamente polifônicos, a fuga é o que ostenta maior rigidez e complexidade nas regras para a elaboração. Mesmo com as normas definidas, o compositor que as domina pode ter liberdade para a criação. Acerca da fuga, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O tema da fuga também é chamado de contra-sujeito. b) ( ) A imitação é um importante recurso da música contrapontística, mas

não aparece nas fugas.

AUTOATIVIDADE

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c) ( ) Uma fuga tem sempre entre sete e treze vozes. d) ( ) A trama contrapontística de uma fuga requer uma escuta extremamente

atenta, para que o ouvinte possa usufruir plenamente da música.

4 Considerando o cantus firmus na voz superior, analise a partitura a seguir para responder às seguintes questões:

a) Qual a espécie de contraponto encontrada na voz intermediária?b) Qual a espécie de contraponto encontrada na voz inferior?

5 Considerando o cantus firmus na voz intermediária, analise a partitura a seguir para responder às seguintes questões:

a) Qual a espécie de contraponto encontrada na voz superior?b) Qual a espécie de contraponto encontrada na voz inferior?

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 4, abordaremos conceitos da textura musical e conteúdos criativos para aplicação na educação musical. Toda essa diversidade de recursos aprendidos nos tópicos anteriores serve de base para uma formação musical sólida do professor de música. O educador, bem preparado musicalmente, pode criar materiais com finalidade didática para os alunos, de rigor musical significativo.

Tomemos, como exemplo, a flauta doce, que é um instrumento utilizado com frequência em aulas de musicalização. Há uma literatura musical considerável para o ensino, mas nem sempre o professor pode encontrar, nos livros, o repertório que deseja utilizar nas aulas. Então, pode realizar um arranjo a duas ou mais vozes, além de adaptações melódicas que estejam de acordo com o nível técnico dos alunos. Nestas ocasiões, não raras ao ofício do professor, a habilidade de saber criar trechos musicais se torna fundamental.

A tradição musical acumulada em séculos de desenvolvimento produziu toda uma gama de mecanismos, fórmulas, ferramentas e materiais essenciais para a criação e o fazer musical no mundo contemporâneo. Esses conhecimentos são princípios importantes que ampliam as possibilidades musicais dos professores e de todo profissional da música.

Esperamos, por meio do conteúdo e da prática aqui elucidados, contribuir para o fortalecimento do seu desenvolvimento musical.

2 CONCEITOS GERAIS APLICADOS À EDUCAÇÃO MUSICAL A professora e organista Any Raquel Carvalho desenvolve extensa

pesquisa acerca do contraponto, sendo considerada uma autoridade do assunto no Brasil. No livro O Ensino de Contraponto nas Universidades Brasileiras (1994), a pesquisadora elenca conhecimentos importantes que podem ser adquiridos através do estudo do contraponto, como:

TÓPICO 4 —

ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA

EDUCAÇÃO MUSICAL

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

1. desenvolvimento do ouvido interno através da prática de exercícios (os quais devem ser sempre cantados);

2. desenvolvimento da capacidade do aluno de discernir uma voz da outra; o reconhecimento de cada voz como uma melodia distinta;

3. conhecimento histórico-musical da evolução da linha melódica; 4. distinção entre polifonia e homofonia; 5. utilização da técnica de contraponto livre para compor como

resultado das cinco espécies; 6. análise de repertório característico para uma maior

compreensão do discurso musical, como auxílio à análise de música de períodos subsequentes (CARVALHO, 1994, p. 31).

A autora segue destacando a importância do estudo do contraponto nas áreas da performance, da análise, da composição e da educação musical. A respeito dessa última área, a autora escreve que “o educador tem o dever de saber criar sua própria melodia e, a partir desta, compor novas ideias”. Compreender os princípios da técnica contrapontística permite, ao educador, transmitir, ao aluno, uma bagagem musical muito mais completa (CARVALHO, 1994, p. 31).

O canadense Murray Schafer é um exemplo de compositor-educador que

se preocupa em desenvolver o potencial criativo dos estudantes. Para conseguir realizar um bom trabalho, nesse sentido, o professor deve estar devidamente preparado musicalmente. Isso envolve ter a percepção apurada e saber como aplicar a técnica. Além desses saberes, o professor, atento e envolto em uma atividade criativa constante, dispõe das próprias experiências para construir a forma de atuar. Para Schafer, “todo o professor deve se permitir ensinar diferentemente ou, ao menos, imprimir, no que ensina, a sua personalidade” (1991, p. 284). Dessa forma, o conhecimento construído é acessado e aplicado de maneira particular, de acordo com a realidade e as necessidades como educador.

Schafer é um defensor das práticas de criação musical em sala de aula,

o que demonstra, de fato, o caráter de compositor. Podemos notar, nos escritos dele, a atenção constante em orientar os professores de música a trabalharem nesse sentido. Segundo o autor, “a única maneira pela qual podemos colocar a música do passado dentro de uma atividade do presente é através da criação” (SCHAFER, 1991, p. 286), isto é, a importância de estudar e de compreender a tradição musical para, a partir dela, criar algo original.

Para todo processo composicional, aconselha-se a elaboração de um

planejamento da composição, como um mapa, com caminhos a seguir. Você pode criar uma composição ou um arranjo para um grupo, tendo, por exemplo, o controle da textura como ponto de partida. As partes mais difíceis na criação de uma peça musical podem ser: 1) o ponto de partida (como iniciar?) e 2) a conclusão (como terminar?).

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TÓPICO 4 — ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA EDUCAÇÃO MUSICAL

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Veremos, agora, conceitos importantes da textura musical. Durante a história da música, muitos termos foram ressignificados, e esse processo também ocorreu nos conceitos que veremos a seguir. Serão abordados como se convencionou significá-los.

2.1 MONODIA

A monodia, a textura monofônica, contrapõe-se a todo o assunto estudado nesta unidade. O fato é que ela não tem nenhuma característica polifônica ou contrapontística que tem sido o fio condutor dos últimos temas estudados: trata-se de uma única melodia, sem outra linha simultânea, ou qualquer tipo de acompanhamento. Até pode ser realizada por mais instrumentos ou vozes, mas sempre em uníssono.

No período medieval, a música mais antiga de que se tem registro é o

cantochão, que é uma prática monofônica. Um exemplo representativo de cantochão é Ut Queant Laxis, de Guido D’Arezzo (992 – 1050). Ouça a música enquanto acompanha a partitura, e perceba que, apesar de ser uma única melodia, o acompanhamento não se faz necessário, pois a obra se basta.

FIGURA 45 – CANTOCHÃO

FONTE: <https://bit.ly/3tPZMy9>. Acesso em: 24 fev. 2021.

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

O áudio da música Ut Queant Laxis pode ser acessado a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=rDJH1WTs2-8.

DICAS

2.2 POLIFONIA

Durante toda a Unidade 3, temos mencionado o termo polifonia para nos referirmos a aspectos contrapontísticos da música. Os dois temos possuem o mesmo significado. Nesse tipo de textura, as linhas melódicas mantêm independência de movimento uma em relação a outra, mas, ao mesmo tempo, complementam-se, pois compartilham o mesmo contexto musical.

2.3 HOMOFONIA E SIMULTANEIDADE

No Tópico 1, citamos a textura homofônica como característica de uma música que pode ser considerada “harmônica”. A principal diferença entre homofonia e polifonia é que, na primeira, há uma melodia principal, que funciona como fio condutor da música. Já na polifonia, todas as melodias que soam simultaneamente têm o mesmo valor nas obras. Dessa forma, podemos definir a homofonia como uma textura musical em que uma melodia é acompanhada por acordes.

A música homofônica, como nós a entendemos, permaneceu ausente da história da música durante todo o período das músicas vocal e contrapontística, isto é, até o fim do século XVI. A homofonia foi “invenção” dos primeiros compositores italianos de ópera, que estavam em busca de uma maneira mais direta para comunicar a emoção dramática e, de um modo mais claro, para apresentar o texto, que ficava muito confuso quando apresentado sob a forma de contraponto (COPLAND, 1974, p. 32).

Então, a ênfase está toda em uma linha melódica, restando, aos acordes,

a função secundária, de apenas acompanhar essa melodia. Obviamente, cada compositor, músico ou instrumentista pode dar, ao acompanhamento, maior ou menor destaque na música, de acordo com a concepção estética. O colorido dos acordes é, também, parte importante de uma música homofônica, mas, certamente, a melodia possui grande relevância. Além do mais, os acordes têm a capacidade de enfatizar a melodia.

Consegue notar alguma semelhança com a textura praticada na música

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TÓPICO 4 — ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA EDUCAÇÃO MUSICAL

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popular brasileira ou no jazz? Nossas canções, choros, frevos e muitos outros gêneros apresentam uma textura homofônica.

Agora, imagine a seguinte situação: você está caminhando em um corredor de uma escola de música, e, em cada sala desse corredor, há um estudante praticando um instrumento. Pode-se dizer que há uma simultaneidade de sons, meio caótica, inclusive. Os sons produzidos, concomitantemente, pelos instrumentos, não formam um contraponto, mas uma textura simultânea de sons, que não possuem, exatamente, relação entre si.

O compositor estadunidense Charles Ives (1874-1954) aplicou o conceito

de simultaneidade em diversas obras. Ouça a obra chamada The Unanswered Question e perceba como a peça trabalha com três planos musicais distintos: 1) cordas, 2) madeiras e 3) trompete solo.

3 IMITAÇÃO E CÂNONE Vimos que você pode adaptar esses artifícios contrapontísticos estudados,

seguindo as normas com maior ou menor rigidez, para composições, arranjos, ou para a criação de material didático para os alunos. Tomemos, como exemplo, uma atividade comumente empregada em aulas de instrumento para grupos de iniciantes. Trata-se da prática da música Frèree Jacques, do folclore tradicional francês:

Como Ouvir e Entender Música, de Aaron Copland, é um livro com um con-teúdo fácil de ser digerido. Recomendamos a leitura integral, que serve de apoio para o entendimento de formas e de estilos musicais diversos. Uma parte do livro está anexada nesta Unidade 2, como Leitura Complementar.

Neste vídeo de The Unanswered Question, pode-se perceber a espacializa-ção dos instrumentistas pela sala de concerto, o que favorece a percepção de cada uma das três camadas da textura musical. Acesse https://youtu.be/gPQuFFyjxZ8.

DICAS

DICAS

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

FIGURA 46 – FRÈRE JACQUES

FONTE: O autor

Em uma de divisão de dois ou de mais instrumentos, cada aluno pode entrar em um momento para criar uma textura polifônica, ou canônica. Veja, na partitura, como ficaria a entrada de uma segunda voz:

FIGURA 47 – FRÈRE JACQUES EM CÂNONE

FONTE: O autor

Essa pode ser uma boa atividade para desenvolver a percepção de vozes diferentes, e iniciar a prática musical polifônica. O tipo de cânone produzido, nesse exemplo, é chamado de round, com um trecho melódico repetido, literalmente, em uníssono, e de forma cíclica.

No decorrer da história da música, os teóricos podem divergir na

definição de conceitos, como os apresentados aqui, e, até mesmo, esses termos sofrem alterações mediante os desdobramentos ao longo do tempo. Neste livro, buscamos uma forma de esclarecer conteúdos que possam ser utilizados, por você, na sua realidade profissional. Para um aprofundamento de cada um dos assuntos, recomendamos leituras específicas dos temas. Há ampla bibliografia citada neste texto que você poderá investigar, conforme necessidade e curiosidade.

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TÓPICO 4 — ESTRATÉGIAS COMPOSICIONAIS NA EDUCAÇÃO MUSICAL

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COMPOSITOR, INTÉRPRETE E OUVINTE

Do livro Como Entender E Ouvir MúsicaAaron Copland

Do ponto de vista prático, quase todo fato musical implica em três fatores distintos: um compositor, um intérprete e um ouvinte. Eles formam um triunvirato, em que nenhuma parte está completa sem a outra. A música começa no compositor, passa através do intérprete e termina em você, o ouvinte. Em última análise, pode-se dizer que tudo, na música, está dirigido ao ouvinte. Assim, para ouvir com inteligência, você deve entender, claramente, não só o seu próprio papel, mas, também, o do compositor e o do intérprete, e entender de que maneira cada um deles contribui para o conjunto total de uma experiência musical.

Comecemos com o compositor, já que a música da nossa civilização começa com ele. O que é que estamos ouvindo, quando ouvimos um compositor? Ele não precisa nos contar uma história, como o romancista, nem precisa “copiar” a natureza, como faz o escultor; sua obra não tem funções práticas imediatas, como o desenho de um arquiteto. Assim, o que é que ele nos dá? Uma única resposta me parece possível: ele se dá a si mesmo. O trabalho de qualquer artista, naturalmente, é uma expressão dele mesmo, mas nunca de uma maneira tão direta como no caso da criação musical. O compositor nos dá, sem se referir a “acontecimentos” exteriores, a quintessência de si mesmo, a expressão mais profunda e intensa da sua experiência de ser humano.

Lembre-se, então, de que quando você está ouvindo uma obra musical, está ouvindo, simultaneamente, um homem, um determinado indivíduo, com a sua personalidade específica. Um compositor, para ter algum valor, deve ter a sua própria personalidade. A sua música pode ser mais ou menos importante, mas será sempre um espelho dessa personalidade. Nenhum compositor pode incluir, na sua música, um valor que ele não possua como homem. Seu caráter pode estar penetrado de fraquezas, como no caso de Lully e Wagner, mas o que a sua música revelar de grande estará sempre ligado ao que existir nele de grandeza humana.

Se examinarmos mais de perto essa questão do caráter individual do compositor, descobriremos que ele é feito de dois elementos distintos: a personalidade com que ele nasceu e as influências do tempo em que viveu. Naturalmente, cada compositor vive em um período determinado, e cada período tem o seu caráter. Seja qual for a personalidade de um compositor, ela se expressa dentro da moldura da sua própria época. É a interação da personalidade e da época que gera a formação do estilo de um compositor. Dois compositores com personalidades exatamente similares, vivendo em duas épocas diferentes,

LEITURA COMPLEMENTAR

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UNIDADE 3 — CONTRAPONTO A DUAS E A TRÊS VOZES

produziriam, inevitavelmente, dois estilos diferentes. Assim, quando falamos do estilo de um compositor, referimo-nos ao resultado da combinação de um caráter individual e de uma determinada época.

Talvez, essa importante questão do estilo musical se torne mais clara se aplicada a um caso específico. Beethoven, por exemplo. Uma das características mais óbvias do seu estilo é a sua aspereza. Beethoven, como homem, tinha a reputação de ser, ao mesmo tempo, brusco e áspero. Só pelo testemunho da sua música, entretanto, já saberíamos que ele é um compositor enérgico, quase titânico, a própria antítese do suave e do melífluo, mas esse caráter de aspereza se expressou, diferentemente, em períodos diferentes da sua vida. A aspereza da Primeira Sinfonia é diferente da Nona. É a diferença de períodos. O Beethoven primitivo era áspero dentro dos limites do classicismo setecentista, enquanto o Beethoven maduro estava sob a influência das tendências liberadoras do século XIX. Considerando o estilo de um compositor, devemos levar em conta a sua personalidade tal como ela se refletiu no período em que ele viveu. Há tantos estilos quantos são os compositores, e cada compositor importante tem vários estilos diferentes, de acordo com as influências do seu tempo e com o amadurecimento da sua personalidade.

Se é essencial, para o ouvinte, entender a questão do estilo musical aplicada à obra de um determinado compositor, isso ainda é mais importante para o intérprete, pois o intérprete é o “intermediário” da música. O ouvinte ouve menos o compositor do que a concepção que o intérprete faz desse compositor. O contato do escritor com o leitor é direto; um quadro precisa apenas ser pendurado na parede para que possa ser apreciado, mas a música, como o teatro, é uma arte que deve ser reinterpretada para que possa viver. O pobre compositor, tendo terminado a sua composição, deve colocá-la à mercê de um intérprete, que, é bom não esquecer, é uma criatura com a sua própria natureza musical e a sua própria personalidade. Assim, o ouvinte leigo só fará bom juízo de uma interpretação se for capaz de distinguir entre o pensamento do compositor, que existe em um plano ideal, e o grau em que o intérprete foi capaz de transmiti-lo fielmente. O papel do intérprete não chega a ser um assunto controvertido. Todo mundo concorda com que ele existe para servir ao compositor, para assimilar e recriar a “mensagem” do compositor. Se a teoria é simples, o mesmo não acontece com a aplicação prática.

A maioria dos intérpretes de primeira classe, hoje em dia, dispõe de um equipamento técnico que é mais do que suficiente para as exigências que possam ser feitas. Assim, na maioria dos casos, podemos ter como certo que a técnica não é problema. O primeiro verdadeiro problema de interpretação é representado pelas próprias notas. A notação musical, tal como ela existe hoje, não é uma transcrição exata do pensamento do compositor. Não poderia sê-lo, porque é muito vaga. Permite uma liberdade muito grande em questões de gosto e de opção. Devido a isso, o intérprete está sempre diante do problema de saber até que ponto deve obedecer, literalmente, ao que está escrito.

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Os compositores são humanos. Sabemos que, muitas vezes, eles anotaram incorretamente as suas ideias, e não se aperceberam de omissões importantes. Também é sabido que eles mudavam de opinião no que se refere às próprias indicações de tempo e de dinâmica. O intérprete, assim, deve usar a sua inteligência musical ao se defrontar com a página impressa. Existe, naturalmente, a possibilidade de exagero nas duas direções, fidelidade excessiva às notas ou excessivo afastamento do que está escrito. O problema seria resolvido até um certo ponto se se dispusesse de uma maneira mais exata de anotar uma composição, mas, mesmo assim, a música ainda estaria aberta a uma grande variedade de interpretações.

Uma composição, em última análise, é um organismo. Não é uma coisa estática, mas algo vivo. É por isso que pode ser vista a uma luz sempre diferente, e em ângulos diferentes, por vários intérpretes ou pelo intérprete em épocas diferentes. A interpretação é, em grande parte, uma questão de ênfase. Cada peça tem características básicas que a interpretação não deve desvirtuar. Ela tira essas características da sua natureza musical, que decorre da personalidade do compositor e do período em que essa peça foi escrita. Em outras palavras, cada composição tem o seu próprio estilo, a que o intérprete deve ser fiel, mas o intérprete tem, também, a sua própria personalidade, de modo que o estilo da peça atinge o ouvinte através da sua refração na personalidade do intérprete.

A relação entre a obra e o intérprete é delicada. Quando o intérprete injeta a sua personalidade na obra em um grau maior que o desejável, o desencontro é visível. Em anos recentes, a própria palavra “interpretação” caiu de moda. Desencorajados e desautorizados pelos exageros e falsificações das “prima dona”, alguns compositores, liderados por Stravinsky, chegaram a dizer: “Não queremos qualquer interpretação na nossa música; limitem-se a tocar as notas; não acrescentem nada e não retirem nada”. Embora a razão dessa advertência seja clara, parece-me que ela representa uma atitude não realística da parte dos compositores, pois nenhum intérprete perfeito pode tocar uma peça de música, ou uma frase, sem acrescentar alguma coisa da sua personalidade.

De outra maneira, os intérpretes teriam de ser autômatos. Inevitavelmente, ao executarem uma peça, eles a executarão a sua maneira. Fazendo assim, não estarão, necessariamente, falsificando as intenções dos compositores, estarão, simplesmente, “lendo” a música com a inflexão, que é própria a sua voz.

Há, ainda, outras razões, e mais profundas, para as discrepâncias de interpretação. Não há dúvida de que uma sinfonia de Brahms, interpretada por dois regentes de primeira ordem, pode tomar formas diferentes sem que haja traição ao pensamento de Brahms. Vale especular a respeito disso. Tome, por exemplo, dois desses regentes completos: Arturo Toscanini e Sergei Koussevitzky. São duas personalidades totalmente diferentes, homens que pensam diferentemente, que emocionam de maneira diferente, e cuja filosofia de vida é diferente. É difícil imaginar de que maneira as suas interpretações das mesmas notas não soariam diferentemente. O italiano é, por natureza, um

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clássico. Um certo desprendimento faz parte da “maneira clássica”, e temos, aqui, uma impressão curiosa: Toscanini parece não estar fazendo nada com a música. É só depois que se ouve por algum tempo que se descobre a ideia de uma arte que esconde a arte. Toscanini encara a música como se ela fosse um objeto. Ela parece existir no fundo do palco, onde podemos contemplá-la à vontade. Há, nela, algo de maravilhosamente desprendido, não obstante, durante todo o tempo, é música, a mais apaixonada de todas as artes. A ênfase, com Toscanini, está sempre na linha longa, na estrutura como um todo, nunca no detalhe, ou no compasso isolado. A música se move por si mesma, vive a sua própria vida, e nós nos sentimos felizes ao vê-la vivendo assim.

O maestro russo, ao contrário, é uma natureza romântica. Ele se envolve de corpo e alma na música que está interpretando. Há, nele, pouco cálculo. Ele está possuído do verdadeiro fogo romântico, cheio de paixão, imaginação dramática e sensualidade. Com Koussevitszky, cada obra-prima é um campo de batalha, em que ele lidera o combate, e, do qual, pode-se estar certo, o espírito humano emergirá vitorioso. Quando ele está “in the mood”, o efeito é esmagador.

Quando essas duas personalidades aplicam os seus dons a uma mesma sinfonia de Brahms, o resultado é forçosamente diferente. Esse caso de um compositor profundamente germânico que é interpretado por um russo e por um italiano é realmente típico. Nenhum dos dois, certamente, extrairá, da sua orquestra, uma sonoridade que os alemães considerariam “realmente alemã”. Nas mãos do russo, a orquestra de Brahms assumirá um brilho inesperado, e cada gota de drama romântico que a sinfonia contenha não deixará de ser extraída antes que soe a última nota. Com o italiano, o lado clássico-arquitetônico de Brahms receberá toda a ênfase, e as linhas melódicas poderão se desenvolver em toda a pureza da sua qualidade lírica.

Nos dois casos, como se vê, trata-se de uma questão de ênfase. Pode ser que nenhum desses dois regentes exprima, para você, a ideia de uma perfeita interpretação de Brahms, mas isso não importa. O que importa é que, para ouvir inteligentemente uma determinada interpretação, você deve ser capaz de reconhecer o que é que o intérprete está fazendo com o compositor no momento em que o recria.

Você deve reconhecer melhor a parte do intérprete na execução que

está ouvindo. Para fazer isso, duas coisas são necessárias: você deve ter, como ponto de referência, uma concepção mais ou menos ideal a respeito do estilo que é próprio do compositor em questão, e você deve ser capaz de sentir até que ponto o intérprete está reproduzindo esse estilo, dentro da esfera da sua própria personalidade. Realizando ou não esse ideal no momento da audição, você deve tê-lo, de alguma forma, na cabeça, como algo a ser obtido.

A essa altura, a importância do ouvinte em todo esse processo já deve estar

suficientemente clara. Os esforços combinados do compositor e do intérprete só têm sentido enquanto se dirigem a um grupo inteligente de ouvintes, e isso indica uma responsabilidade da parte do ouvinte.

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Antes que possamos entender música, é preciso que a amemos. Acima de tudo, compositores e intérpretes querem ouvintes que se entreguem à música que estão escutando. Virgil Thomson, certa vez, descreveu o ouvinte ideal como sendo “uma pessoa que aplaude vigorosamente”. Com esse dito espirituoso, ele queria dizer, sem dúvida, que só um ouvinte que se deixa envolver é realmente importante para a música e para os que fazem a música.

Deixar-se envolver significa, em parte, a ampliação do nosso gosto pessoal.

Não basta amar a música apenas nos seus aspectos mais convencionais. O gosto, como a sensibilidade, é, em parte, uma qualidade inata, mas ambos podem ser consideravelmente desenvolvidos através da prática inteligente. Isso significa ouvir música de todas as escolas e de todos os períodos, música velha e nova, moderna e conservadora. Significa ouvir sem preconceitos, no melhor sentido do termo.

Tome, seriamente, a sua responsabilidade como ouvinte. Todos nós,

profissionais e leigos, estamos sempre tentando aprofundar a nossa compreensão da arte. Você não deve ser exceção, por modestas que sejam as suas pretensões como ouvinte. Já que é a nossa reação combinada de ouvintes que influencia mais profundamente a arte da composição e a da interpretação, pode-se dizer, verdadeiramente, que o futuro da música está em nossas mãos.

A música só pode se conservar viva enquanto há ouvintes realmente vivos.

Ouvir atentamente, ouvir conscientemente, ouvir com toda a nossa inteligência é o mínimo que podemos fazer pelo futuro de uma arte que é uma das glórias da humanidade.

FONTE: COPLAND, A. Como ouvir e entender música. Rio de Janeiro: Arte Nova, 1974. p. 71-73.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• A homofonia é um tipo de textura musical em que uma melodia é acompanhada por acordes. A ênfase está toda em uma linha melódica, e os acordes possuem uma função secundária de acompanhar essa melodia.

• Para todo processo composicional, é imprescindível a elaboração de um planejamento da composição, como um mapa da obra. Você pode criar uma composição ou um arranjo para um grupo, tendo, por exemplo, o controle da textura como ponto de partida.

• A monofonia consiste em uma única melodia, sem outra linha simultânea, ou qualquer tipo de acompanhamento. Até pode ser realizada por mais instrumentos ou vozes, mas sempre em uníssono.

• Você pode adaptar os artifícios contrapontísticos estudados, seguindo as normas com maior ou menor rigidez, para composições, arranjos, ou para a criação de material didático para os alunos.

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CHAMADA

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1 Neste Tópico 4, estudamos diversas formas de textura musical, como homofonia, monodia e polifonia. Uma música não precisa ser somente homofônica ou polifônica na totalidade, as texturas podem ocupar momentos diferentes de uma mesma obra. A partir dos estudos de monodia, podemos dizer que ela consiste em:

a) ( ) Uma linha melódica de apenas uma nota. b) ( ) Uma única linha melódica sem acompanhamento. c) ( ) Melodias simultâneas. d) ( ) Melodia com apenas um acorde para realizar o acompanhamento.

2 Observe um trecho da partitura de Chovendo na Roseira, de Tom Jobim:

TRECHO DE CHOVENDO NA ROSEIRA

FONTE: <https://bit.ly/3tNwQqp>. Acesso em: 24 jan. 2021.

Apesar de possuir passagens em texturas diferentes, certamente, há uma que é enfatizada. Qual textura é enfatizada nessa obra?

a) ( ) Polifônica. b) ( ) Homofônica. c) ( ) Monofônica. d) ( ) Nenhuma das anteriores.

AUTOATIVIDADE

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3 Observe um trecho da partitura do Quarteto de Cordas n. 1, de Schoenberg:

TRECHO DO QUARTETO DE CORDAS N.1

FONTE: <https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/29719>. Acesso em: 24 jan. 2021.

Acerca da textura-característica dessa música, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Polifônica. b) ( ) Homofônica. c) ( ) Monofônica. d) ( ) Nenhuma das anteriores.

4 Na adaptação para canto e violão da ária da Bachiana n. 5, de Heitor Villa-lobos, há uma série de elementos texturais estudados nesta unidade. Observe, a seguir, a partitura com o início da obra:

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TRECHO DA BACHIANA N. 5

FONTE: <https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/393907>. Acesso em: 24 jan. 2021.

Considerando os quatro compassos do trecho apresentado, notam-se texturas diferentes nos dois primeiros compassos, em relação aos dois últimos. Escreva quais as texturas geradas e justifique a sua resposta.

5 Nas partituras a seguir, surgirão exemplos de obras com texturas homofônica, polifônica e monofônica. Analise os atributos texturais das obras, e, depois, responda às questões.

EDU LOBO/CHICO BUARQUE – MOTO CONTÍNUO

FONTE: <www.funarte.gov.br/wp-content/uploads/2020/01/Brazilian-Songbook-Online-po-pular-1.pdf>. Acesso em: 24 jan. 2021.

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EL GRILLO, DE JOSQUIN DES PREZ

FONTE: <https://imslp.org/wiki/Special:ReverseLookup/130388>. Acesso em: 24 jan. 2021.

CANTO GREGORIANO ANÔNIMO

FONTE: <https://bit.ly/3tPB2WG>. Acesso em: 24 jan. 2021.

a) Em qual das músicas a textura é homofônica?b) Em qual das músicas a textura é polifônica?c) Em qual das músicas a textura é monofônica?

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REFERÊNCIAS

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CARVALHO, A. R. Contraponto modal: manual prático. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto: Novak Multimídia, 2000.

CARVALHO, A. R. O ensino de contraponto nas universidades brasileiras. Em Pauta, Porto Alegre, v. 6, n. 9, p. 44-52, 1994.

COPLAND, A. Como ouvir e entender música. Rio de Janeiro: Arte Nova, 1974.

KAUDER, H. Counterpoint: an introduction to polyphonic composition. New York: Macmillan Company, 1960.

KENNAN, K. W. Counterpoint: based on eighteeth-century pratice. 3. ed. New Jersey: Prenti e-Hall, 1987.

KOELLREUTTER, H. J. Contraponto modal do século XVI (Palestrina). Brasí-lia: Musimed, 1996.

KOHLER, E. Apostila da disciplina de Contraponto. Itajaí: UNIVALI, 2012.

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SCHOENBERG, A. Exercícios preliminares em contraponto. São Paulo: Via Lattera, 2001.

TRAGTENBERG, L. Contraponto: a arte de compor. São Paulo: EDUSP, 2004.

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