8
Artefilosofia Artelosoa

Heinrich Heine

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Poema de Heine

Citation preview

  • Artefi losofi aArtefi losofi a

  • 209

    Art

    efi lo

    sofi a

    , Our

    o Pr

    eto,

    n.5

    , p. 2

    09-2

    14, j

    ul.2

    008

    Alemanha,um conto de inverno(Caput I)Heinrich Heine

    O poeta alemo Heinrich Heine (1797-1856) no nenhum des-conhecido no Brasil. Alguns dos mais ilustres autores brasileiros, como Gonalves Dias, Machado de Assis, Raul Pompia, Joo Ribeiro, Alphon-sus de Guimaraens, Fagundes Varela e Manuel Bandeira, empenharam-se em traduzir seus poemas. Tambm est presente na memria coletiva devido homenagem de Castro Alves na epgrafe de seu famoso O navio negreiro. Fora do mercado h dcadas, a sua coletnea O livro das canes voltou s estantes este ano e pode-se constatar uma nova valorizao de sua obra em prosa pela traduo das narrativas Das Memrias do Senhor de Schnabelewopski, Noites fl orentinas, O Rabi de Bacherach, Deuses no exlio e do ensaio Contribuio histria da religio e fi losofi a na Alemanha.

    Entretanto, nessa seleo est ausente um poema mais tardio, que o prprio Heine, j um autor clebre, julgou sua obra-prima, quando escrevia para seu editor, Julius Campe: No quero me gabar, mas tenho certeza de que aprontei uma obrinha que provocar mais furor que o folhetim mais popular e que, mesmo assim, ter o valor eterno de uma poesia clssica. O comentrio foi proftico: o poema Alemanha, um conto de inverno, escrito em 1844, mesmo que amenizado pelo autor para dri-blar a censura prvia, provocou reaes violentas. Heine foi acusado de calnia e s no sofreu conseqncias mais severas porque j vivia, desde 1831, exilado em Paris. O que causou esta indignao dos representantes do poder bvio. Heine utilizava o relato de uma viagem que realizou depois de 12 anos de exlio para dissecar a realidade alem: uma multi-plicidade de estados desunidos, vivendo sob o jugo da Restaurao e do domnio prussiano, ou seja, congelados num eterno inverno. Em versos satricos, custicos e altamente divertidos, ele ataca os trs pilares da mis-ria alem: os burgueses e os monarquistas militaristas, ambos fariseus da nacionalidade, e a igreja, instigadora de uma servilidade que h de ser destruda, at no seu ltimo refgio, o cu. O ataque feito preferen-cialmente pelas beiradas, desconstruindo as instituies, os smbolos e os mitos nacionais mais consagrados. O olhar empregado, de um alemo estranho, confrontado com o contexto de uma Alemanha ofi cial. No obstante, este o olhar que clama por legitimidade. No prlogo, Heine salienta que a stira desconstri aquilo que impede o surgimento de uma Alemanha desejada pela populao e defende, ironicamente, seu patriotismo, em funo de uma revoluo universal: Se ns concluirmos o que os franceses comearam, se ns os ultrapassarmos na ao, como j o fi zemos no pensamento [], o mundo inteiro ser alemo!

  • 210A segunda profecia tambm foi cumprida. Heinrich Heine fortemen-te representado no cnone alemo e o Conto de inverno reconhecido como uma das maiores stiras do sculo XIX. Sua leitura, inclusive, obrigatria nas escolas. Mas esta valorizao s comeou nos anos 60. Antes, no Reich, o autor incmodo foi rechaado sistematicamente pela germanstica nacionalista e anti-socialista; depois, os nacional-socialistas conseguiram aniquilar quase completamente a memria do traidor da ptria e, na lgica nazista, judeu da histria literria. Mas Heine ainda no foi plenamente reabilitado: lamentavelmente, a sua revalorizao atual tem mostrado tambm uma certa preferncia pela interpretao imanentista e esttica, em detrimento da provocante mensagem poltica, apenas aparentemente datada, de um escritor politizado at medula. Segundo Heine, nada poderia separar a poltica da cincia, das artes e da religio e o rigor de sua crtica poltica pode ser comparado apenas com o de Heinrich Mann e Kurt Tucholsky. um sinal encorajador, alis, que essa tendncia de interpretao no se estenda ao Brasil, como mostra a interpretao A arte do combate, publicada em 2003 por Marce-lo Backes, tradutor de Heine.

    Georg Wink Reviso. Romero Freitas

    Hei

    nric

    h H

    eine

  • 211

    Art

    efi lo

    sofi a

    , Our

    o Pr

    eto,

    n.5

    , p. 2

    09-2

    14, j

    ul.2

    008

    Deutschland,ein wintermrchen(caput)Heinrich Heine

    Im traurigen Monat November wars,Die Tage wurden trber,Der Wind ri von den Bumen das Laub,Da reist ich nach Deutschland hinber.

    Und als ich an die Grenze kam,Da fhlt ich ein strkeres KlopfenIn meiner Brust, ich glaube sogarDie Augen begunnen zu tropfen.

    Und als ich die deutsche Sprache vernahm,Da ward mir seltsam zumute;Ich meinte nicht anders, als ob das HerzRecht angenehm verblute.

    Ein kleines Harfenmdchen sang.Sie sang mit wahrem GefhleUnd falscher Stimme, doch ward ich sehrGerhret von ihrem Spiele.

    Sie sang von Liebe und Liebesgram,Aufopfrung und Wiederfi ndenDort oben, in jener besseren Welt,Wo alle Leiden schwinden.

    Sie sang vom irdischen Jammertal,Von Freuden, die bald zerronnen,Vom Jenseits, wo die Seele schwelgtVerklrt in ewgen Wonnen.

    Sie sang das alte Entsagungslied,Das Eiapopeia vom Himmel,Womit man einlullt, wenn es greint,Das Volk, den groen Lmmel.

    Ich kenne die Weise, ich kenne den Text,Ich kenn auch die Herren Verfasser;Ich wei, sie tranken heimlich WeinUnd predigten ffentlich Wasser.

    Ein neues Lied, ein besseres Lied,O Freunde, will ich euch dichten!Wir wollen hier auf Erden schonDas Himmelreich errichten.

  • 212H

    einr

    ich

    Hei

    neAlemanha,um conto de inverno(Caput I)Heinrich Heine

    Foi no triste ms de novembro,As tardes eram turvas, estranhas,O vento desfolhava as rvores,E eu viajei para a Alemanha.

    E quando cheguei fronteira,Sentia no peito o pulsar,Creio at mesmo que os olhosPrincipiavam a pingar.

    E quando ouvi a lngua alem,Tive uma sensao diferente:Sentia como se o meu coraoSangrasse deliciosamente.

    Cantava uma pequena harpista.Com emoo verdadeira cantava,E com voz falsa, mas ainda assimTocava-me o que ela cantava.

    Cantava amores e dores,Reencontros e sacrifcios,No mundo melhor l de cimaLivre de todos os vcios.

    Cantava sobre este vale de lgrimas,Sobre o prazer sem histria,Sobre o Alm, onde a alma mergulhaTransfi gurada em eterna glria.

    Cantava antiga cano de renncia,A cano de ninar do CuQue embala o povo birrentoCriana que faz escarcu.

    Conheo a melodia, conheo a letra,Conheo tambm os autores:Quando em pblico dizem gua,Bebem vinho nos bastidores.

    Uma nova cano, uma outra canoQuero compor-lhe, amigo fi el!Queremos aqui na TerraErguer o Reino do Cu.

  • 213

    Art

    efi lo

    sofi a

    , Our

    o Pr

    eto,

    n.5

    , p. 2

    09-2

    14, j

    ul.2

    008

    Wir wollen auf Erden glcklich sein,Und wollen nicht mehr darben;Verschlemmen soll nicht der faule Bauch,Was fl eiige Hnde erwarben.

    Es wchst hienieden Brot genugFr alle Menschenkinder,Auch Rosen und Myrten, Schnheit und Lust,Und Zuckererbsen nicht minder.

    Ja, Zuckererbsen fr jedermann,Sobald die Schoten platzen!Den Himmel berlassen wirDen Engeln und den Spatzen.

    Und wachsen uns Flgel nach dem Tod,So wollen wir euch besuchenDort oben, und wir, wir essen mit euchDie seligsten Torten und Kuchen.

    Ein neues Lied, ein besseres Lied!Es klingt wie Flten und Geigen!Das Miserere ist vorbei,Die Sterbeglocken schweigen.

    Die Jungfer Europa ist verlobtMit dem schnen GeniusseDer Freiheit, sie liegen einander im Arm,Sie schwelgen im ersten Kusse.

    Und fehlt der Pfaffensegen dabei,Die Ehe wird gltig nicht minder -Es lebe Brutigam und Braut,Und ihre zuknftigen Kinder!

    Ein Hochzeitkarmen ist mein Lied,Das bessere, das neue!In meiner Seele gehen aufDie Sterne der hchsten Weihe -

    Begeisterte Sterne, sie lodern wild,Zerfl ieen in Flammenbchen -Ich fhle mich wunderbar erstarkt,Ich knnte Eichen zerbrechen!

    Seit ich auf deutsche Erde trat,Durchstrmen mich Zaubersfte -Der Riese hat wieder die Mutter berhrt,Und es wuchsen ihm neu die Krfte.

  • 214H

    einr

    ich

    Hei

    neQueremos a felicidade terrestre,No queremos mais ser indigentes.O preguioso devorar no deveO trabalho das mos pacientes.

    Aqui em baixo cresce po o bastantePara cada criana de hoje,E tambm rosas, murtas, beleza e gozo,E inclusive ervilha doce.

    Sim, ervilha doce para todos,To logo rebentem os cereais!Ns deixaremos o CuPara os anjos e pardais.

    E se nascerem asas aps a morte,Ento nos veremos de novoL no alto, e l comeremos juntosDitosas tortas e bolos.

    Uma nova cano, uma outra cano!Soa como fl autas e violinos!O miserere j se foi,Ficou o silncio dos sinos.

    A virgem Europa est noivaDo belo gnio da liberdade.Nos braos um do outroBeijam-se de verdade.

    E o casrio no valer menosSem a beno das batinas:Viva o noivo e a noivaE seus meninos e meninas!

    Canto de npcias meu poema,A outra, a nova cano!Brotam na minha almaEstrelas de consagrao:

    Estrelas eufricas, selvagens,Em rios de chamejante cascalho:Sinto um milagre de fora,Eu partiria carvalhos!

    Ao pisar em solo alemo,Atravessam-me fl uidos mgicos:Outra vez, o gigante tocou a me,Renovam-se as foras atvicas.

    Traduo: Romero Freitas e Georg WinkNota Introdutria: Georg Wink(Reviso: Romero Freitas)