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XI CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE PIBIC/CNPq-UFCG 2014 HINDUÍSMO E BUDISMO EM MAX WEBER A indologia da religião weberiana frente ao eurocentrismo alemão Rodrigo da Silva Ferreira 1 ,Arilson Silva de Oliveira 2 RESUMO A sociologia da religião tem em Max Weber um exaustivo e grandioso trabalho. Nos estudos sobre as religiões mundiais o autor buscou elucidar questões-chave para compreender a lógica que se compunha a sociedade em análise. Neste artigo partimos do referencial de seu estudo sobre a Índia e as religiões Hinduísmo e Budismo com objetivo de compreender os fatores determinantes que moldam as doutrinas, seu caráter político e social aplicando as esferas da vida: político e doméstica; tendo como meta comparar as duas religiões. Para chegar ao objetivo foram selecionados referenciais teóricos introdutórios à sociologia da religião do autor em análise e outros estudiosos que auxiliam na compreensão dos fenômenos. A pesquisa utiliza como questão-variável, em um ponto Hinduísmo - as castas e as motivações que os levam a seguir a lógica no qual estão inseridos - e o contraponto, o Budismo antigo e duas divisões, hinayana e mahayana. Em caráter de conclusão percebeu-se que as principais similitudes e diferenças permeiam as questões ritualísticas, dharma e karma, políticas e intelectuais. Palavras-chave: Max Weber, Hinduísmo/Budismo, Oriente. HINDUISM AND BUDDHISM IN MAX WEBER The weberian religion indology front to german eurocentrism ABSTRACT The sociology of religion has in Max Weber a comprehensive and great work. In studies of world religions the author sought to elucidate key issues to understand the logic that society consisted in analysis. In this paper we set out the framework of his study about India and Hinduism and Buddhism religions in order to understand the determinants that shape the doctrines, its political 1 Aluno do Curso de Ciências Sociais, Unidade Acadêmica de Ciências Sociais, UFCG, Campina Grande, PB, E-mail: [email protected] 2 Professor, Doutor, Unidade Acadêmica de Ciência Sociais, UFCG, Campina Grande, PB, E- mai:[email protected]

Hinduísmo e Budismo

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A sociologia da religião tem em Max Weber um exaustivo e grandioso trabalho. Nos estudos sobre as religiões mundiais o autor buscou elucidar questões-chave para compreender a lógica que se compunha a sociedade em análise. Neste artigo partimos do referencial de seu estudo sobre a Índia e as religiões Hinduísmo e Budismo com objetivo de compreender os fatores determinantes que moldam as doutrinas, seu caráter político e social aplicando as esferas da vida: político e doméstica; tendo como meta comparar as duas religiões. Para chegar ao objetivo foram selecionados referenciais teóricos introdutórios à sociologia da religião do autor em análise e outros estudiosos que auxiliam na compreensão dos fenômenos. A pesquisa utiliza como questão-variável, em um ponto Hinduísmo - as castas e as motivações que os levam a seguir a lógica no qual estão inseridos - e o contraponto, o Budismo antigo e duas divisões, hinayana e mahayana. Em caráter de conclusão percebeu-se que as principais similitudes e diferenças permeiam as questões ritualísticas, dharma e karma, políticas e intelectuais.

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XI CONGRESSO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

PIBIC/CNPq-UFCG 2014

HINDUÍSMO E BUDISMO EM MAX WEBER

A indologia da religião weberiana frente ao eurocentrismo alemão

Rodrigo da Silva Ferreira1,Arilson Silva de Oliveira2

RESUMO

A sociologia da religião tem em Max Weber um exaustivo e grandioso trabalho. Nos estudos sobre as religiões mundiais o autor buscou elucidar questões-chave para compreender a lógica que se compunha a sociedade em análise. Neste artigo partimos do referencial de seu estudo sobre a Índia e as religiões Hinduísmo e Budismo com objetivo de compreender os fatores determinantes que moldam as doutrinas, seu caráter político e social aplicando as esferas da vida: político e doméstica; tendo como meta comparar as duas religiões. Para chegar ao objetivo foram selecionados referenciais teóricos introdutórios à sociologia da religião do autor em análise e outros estudiosos que auxiliam na compreensão dos fenômenos. A pesquisa utiliza como questão-variável, em um ponto Hinduísmo - as castas e as motivações que os levam a seguir a lógica no qual estão inseridos - e o contraponto, o Budismo antigo e duas divisões, hinayana e mahayana. Em caráter de conclusão percebeu-se que as principais similitudes e diferenças permeiam as questões ritualísticas, dharma e karma, políticas e intelectuais.

Palavras-chave: Max Weber, Hinduísmo/Budismo, Oriente.

HINDUISM AND BUDDHISM IN MAX WEBER

The weberian religion indology front to german eurocentrism

ABSTRACT

The sociology of religion has in Max Weber a comprehensive and great work. In studies of world religions the author sought to elucidate key issues to understand the logic that society consisted in analysis. In this paper we set out the framework of his study about India and Hinduism and Buddhism religions in order to understand the determinants that shape the doctrines, its political and social character applying spheres of life: political and domestic; with the goal of comparing the two religions. To reach the goal referential introductory sociology of religion in the author's analysis and other scholars that assist in understanding the phenomena theorists were selected. The research uses as a matter-variable at a point Hinduism - caste and the motivations that lead them to follow the logic in which they live - and the counterpoint, the former two divisions and Buddhism, Hinayana and Mahayana. In character completion is realized that the main similarities and differences permeate the ritualistic, dharma and karma, political and intellectual issues.

Keywords: Max Weber, Hinduism/Buddhism, Orient.

1 Aluno do Curso de Ciências Sociais, Unidade Acadêmica de Ciências Sociais, UFCG, Campina Grande, PB, E-mail: [email protected], Doutor, Unidade Acadêmica de Ciência Sociais, UFCG, Campina Grande, PB, E-mai:[email protected]

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Introdução

A sociologia da religião tem para Weber a possibilidade de olhar para um aspecto social e compreender a sociedade moderna na qual está inserido (MARIZ, 2011). O desenvolvimento histórico de uma sociedade apresenta algumas singularidades, tais como fatores políticos e econômicos. E, olhando para a Índia vê-se características distintas e intrigantes para os autores, como para Marx. Se deparando com o modo com que a sociedade se organizava, bem como com sua maneira de produção, no qual não se encaixava nenhum conceito, a priori elaborado, têm-se a ideia de um modo de produção asiático.

Weber (2005) observa que a religião determina a ação dos indivíduos e que ela está diretamente ligada a fatores econômicos e políticos. Todavia, o epicentro de algumas religiões mundiais apresentam-se com características apolíticas e anti-politicas que posterior recebem novos fatores que determinam o processo de desenvolvimento e de propagação de novos fatores sociais.

.Nas religiões do oriente vemos o contraste: como a China caracterizada com a lógica de afirmação do mundo e a Índia apresentando religiões puramente de negação do mundo, com o objetivo de desvencilhar dos desejos mundanos e salvar o indivíduo da roda da existência.

Nessa perspectiva este relatório consiste na apresentação dos estudos que foram realizados no decorrer do projeto PIBIC (2013/2014) intitulado: HINDUÍSMO E BUDISMO EM MAX WEBER – A indologia weberiana frente ao eurocentrismo alemão. A pesquisa decorreu de uma revisão da literatura elaborada tanto com o autor em questão, quanto com diversos estudiosos, tendo como objetivo compreender a forma pela qual Weber ponderou seus estudos sobre as religiões. Para se aproximar deste objetivo e caminhar ao entendimento de como fora desenvolvida a pesquisa sobre as religiões, mobilizou-se um referencial de estudiosos que se propõem a estudar exaustivamente o pensamento de Weber. Entre estes autores destacamos Carlos Eduardo Sell, Pedro Monroy e Cecília Loreto Mariz. O acesso a esta literatura nos permite construir um entendimento sobre os fatos e influências da religião nas esferas da vida. Em caráter de explorar superficialmente a leitura densa de Weber, podemos percorrer alguns traços que o autor apresenta ao longo de seus textos publicados nos Arquivos de Ciências Sociais (Archiv für Sozialwissenscraften), tais como: a racionalização, a ação religiosa ou magicamente motivada, a presença do mago e a observação dos tipos de dominação, teodiceias de sofrimento, etc. A obra de Weber nos permite observar muitos ângulos em volta da influência que as religiões desenvolvem sobre o indivíduo. Entretanto, para chegar ao estudo sobre as religiões indianas (hinduísmo e budismo), se fez necessário traçar um curso macro das religiões.

O foco da segunda parte deste texto nos centrará em duas religiões da Índia, o Hinduísmo Ortodoxo, o Bramanismo; e o Hinduísmo Heterodoxo, o Budismo, tendo como questão norteadora a comparação entre as duas religiões. Podemos desenvolver um conjunto de fatos que servirão como caminho para chegar a resposta da pergunta-guia. Como a dimensão do trabalho de Weber é extensa, a área que nós poderíamos nos centrar para analisar as duas religiões pode ter como epicentro as observações sobre as esferas da vida: esfera econômica, doméstica, intelectual, política, erótica e artística. Neste caso, a inclusão da esfera religiosa não é mencionada, pois terá como pressuposto inicial para análise de duas religiões específicas. No período histórico em questão, a religião está em interseção com as demais esferas. Em outras palavras, a esfera religiosa pode ter uma área de contato com a esfera política, intelectual, doméstica ou artística, apresentando-se de diversas formas. Não obstante, a densa literatura weberiana nos dificulta centralizar a particularidade de cada esfera, pois partimos do pressuposto de que o indivíduo está inserido em um contexto social, no qual as esferas da vida se inter-relacionam. Para propor o debate buscaremos elaborar uma discussão em duas esferas da vida: política e doméstica. Entretanto o leitor não deve ignorar o diálogo com as demais esferas.

Este texto será dividido em alguns pontos. De início iremos explanar as religiões mundiais e os conceitos apresentados sobre a sociologia da religião. Em seguida, as religiões da China, como caráter de desenvolver uma leitura e comparação com o misticismo nas religiões da Índia. Em terceiro, abordaremos o Bramanismo, através do qual nos propomos a analisar as questões sobre as Castas, Dharma, Samsarae Karma. Posterior análise do Budismo antigo e suas duas derivações Hinayana e Mayanaos relacionando como rituais citados anteriormente designados para o Bramanismo. Como conclusão, a comparação entre as duas religiões indianas.

Fundamentação teórica1. Breves observações sobre as religiões e agentes sociais

Tendo como finalidade duas religiões que são objeto de estudo de Max Weber, é importante apresentar e buscar compreender a relação que o autor desenvolve com a religião e modos de compreensão para chegar a duas específicas religiões da Ásia. Os relatos que são encontrados em grande parte dos escritos weberianos acerca da religião apresentam as relações que as religiões desenvolvem nas esferas de valores. Nesta perspectiva, as religiões de salvação desenvolvem uma influência ou uma ação diretamente ligada às esferas da vida. Tais esferas devem ser compreendidas como: a esfera econômica, esfera

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doméstica, esfera erótica, esfera política, esfera religiosa e esfera intelectual - apresentando uma objetividade desta relação do indivíduo como uma ação individual relacionada à finalidade.

A forma que tais religiões se desenvolvem para trazer adeptos as suas doutrinas apresenta-se com caráter psicológico e coletivo aos indivíduos. Assim, as religiões de salvação desenvolvem com os profetas por exemplos e profetas emissários modos de salvar os indivíduos deste caráter de sofrimento. Weber relata que: “o profeta é o salvador se legitimado mediante a posse de um carisma mágico. [...] Pois o essencial do mandamento da profecia do salvador consiste em canalizar um estilo de vida na obtenção de um valor sagrado” (WEBER, 2005, p. 9). O autor prossegue na explanação na ação da religião de salvação afirmando que “a profecia e o mandamento implicam, ao menos relativamente, uma sistematização e racionalização do estilo de vida”. (Ibid, 2005, p. 76).

As formas de sofrimento ou felicidade nos indivíduos possuem determinados aspectos singulares. Os modos de felicidade ou o motivo que leva tal homem a estar feliz, é motivo de crítica e pensamentos intrínsecos ao ser para obter a compreensão do motivo de sua felicidade. Em outro ponto, o aspecto do sofrimento não possui uma explicação diferenciada, mas há uma aceitação pelo indivíduo. No caso das castas negativamente privilegiadas, tais como, a Vaishya e a casta Shudra, respectivamente, desenvolvem atividades no campo e atividades manuais. Os Brâmanes, positivamente privilegiados, não aceitam algo oferecido pelos Shudra.

Em caráter de exemplo sobre o sofrimento que é desenvolvido nos indivíduos e aceito, na observação do Hinduísmo, as castas negativamente privilegiadas acreditam que a sua situação atual é em resposta a sua vida anterior e o modo de seguir para poder ascender em vidas posteriores.

As religiões mundiais observadas por Weber (2005) em sua obra Sociologia da religião abrangem observações sobre: Islâmica, Confucionismo, Taoísmo, Hinduísmo, Budismo, Cristianismo e Judaísmo. Cada uma desenvolve caráter específico em suas dimensões geográficas, políticas e sociais, tal como Weber relata “Determinar detalhadamente todos estes condicionamentos seria perder-se em um labirinto de discussões”(Ibid, 2005, p. 76)

É intrigante observar no desenvolvimento da literatura sobre a abordagem da religião que o autor faz uma exaustiva correlação entre a religião com a esfera econômica e a forma como as doutrinas desenvolvem uma influência sobre a vida dos indivíduos. Nela, a aceitação de singulares religiões tais como o cristianismo torna-se possível observar como na esfera da vida de cada indivíduo, se desenvolve uma perspectiva que orienta o indivíduo a algum caminho, buscando uma finalidade em cada ação do homem.

Desta forma, o modo como as religiões se propagam entre os estratos sociais negativamente desfavorecidos, desenvolvem uma perspectiva que nos permite observar como a ação e o carisma de tais religiões afetam os indivíduos.

A utilização dos tipos ideais ou dos três tipos puros de dominação de Weber permite aos estudiosos fazer observações e elaborar um conceito acerca dos fatos que se observam. Sendo assim, a ação social possui uma criação conceitual que permite ao observador utilizar tais métodos para compreender a realidade. No próximo tópico discorreremos sobre a apresentação dos fatos e interesses de Weber ao analisar as religiões mundiais e a busca do significado da ação que as religiões desenvolvem sobre os indivíduos.

2. Religiões Mundiais

Nas observações sobre a religião, o autor alemão compreende que os métodos das ciências sociais possuem limitações para observar a essência da religião, como relatado em nota por Pedro Monroy que: “a definição de religião requer ser praticante e ter experiencia interna da mesma; é dizer, ter ouvido as coisas da religião, ser “religios musikalisch; só assim pode aspirar a vislumbrar a sua essência” (Monroy, 2004, p. 145 – tradução minha).

Não há demonstração de interesse pelo autor em mostrar a relação da gênese da religião, tal como Durkheim em sua obra “As formas elementares da vida religiosa”, mas sim a influência que as doutrinas desenvolvem nos indivíduos e a religião em sua origem. De um modo geral, as religiões mundiais desenvolvem um caráter para uma camada de cavaleiros assim como desenvolvem para um grupo economicamente centrado em uma cidade.

Não tratando da essência da religião, o autor busca observar as religiões como fenômenos, e possui a concepção que tais crenças desenvolvem uma ação sobre os indivíduos. A presença da religião em determinados estratos sociais são determinantes pelos fatores em torno da esfera da vida. Relatada por Arilson Oliveira (2009, p. 137):

Assim, ao falar das religiões, Weber indaga sobre as condições e efeitos desse tipo de ação comunitária. E ao afirmar que a religião é uma “ação comunitária”, ou seja, mais do que um conjunto de crenças, ou uma realidade que paira acima dos indivíduos, ela se transforma, na sua concepção, em um certo tipo de ação específica.

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Portanto, para ter como objetivo a compreensão das religiões mundiais, torna-se importante relatar alguns fatos que estão presentes nas ações dos indivíduos.

Observando as religiões e a forma como se manifesta pelos estratos sociais, Weber compreende que há algumas formas dos indivíduos se relacionarem com o divino. Dentre esses indivíduos que permeiam a relação entre o homem e o sagrado, podemos encontrar alguns atores magicamente motivados que desenvolvem estes poderes. Este poder ou carisma3 manifesta-se de diferentes formas nos indivíduos que são capazes de fazer uma ligação com divino/sagrado. Os atores sociais que desenvolvem uma relação entre o mundo e o divino podem ser compreendidos por magos, sacerdotes e profetas.Os profetas, no qual nos debruçaremos para explorar as religiões mundiais e as formas que as mesmas se propagam entre os estratos sociais negativamente privilegiados possuem uma dicotomia na forma que desenvolvem sua ação. Os profetas podem ser compreendidos em dois pontos, sendo eles: o profeta exemplar e o profeta emissário. Observado por Weber, o profeta exemplar direciona “o caminho da salvação por uma vida de uma vida exemplar, em geral contemplativa [...]” e relata o profeta emissário “O profeta emissário direciona suas exigências sobre o mundo em nome de deus” (Weber, 2005. p. 38 e 39, tradução minha).

Para Weber, a influência das religiões nas esferas da vida desempenha um caráter singular, pois o carisma utilizado pelos atores magicamente motivados determina uma ação psicológica no indivíduo de estrato negativamente privilegiado. Estes indivíduos têm como objetivo uma salvação, compreendida como uma salvação metafísica ou de sua alma. Nesta busca de apresentação de uma ética de convicção, Weber exibe uma dicotomia no fenômeno religioso: o comportamento ascético e o místico.

Na obra da sociologia da religião, as compreensões dos fenômenos da ética de convicção são de caráter particular, pois com base no entendimento dos conceitos comportamento ascético e místico e derivações, caminharemos para observar as religiões de afirmação do mundo e de negação do mundo.

Max Weber observa quatro formas de salvação do indivíduo: o comportamento ascético intramundano, o ascetismo extramundano, o misticismo intramundano e o misticismo extramundano. Entretanto, em sua obra Sociologia da religião, o autor dá ênfase a apenas dois desses comportamentos: o ascetismo intramundano e o místico extramundano.

O ascético desenvolve um comportamento singular tendo a crença de que o indivíduo desenvolve a sua ação por vontade de deus. E o comportamento místico é o homem sendo um receptáculo do divino.

Na sociologia das religiões mundiais, o tema sobre a teodiceia, é recorrente ao estudo sobre as religiões. Weber relata brevemente sobre os três tipos de teodiceia4. “Dualismo, em caráter definitivo, representa a sistematização purificada do polimorfismo mágico dos espíritos com uma divisão em espírito bom e mau, os quais simbolizam os períodos prévios do conflito do conflito entre divindades e demônios”. (WEBER, 2005, p.128 – tradução minha)

A segunda observação sobre a teodicéia é a predestinação, em que “a declaração da incapacidade do homem para descobrir os desígnios de deus representa a renúncia da possibilidade do homem de descobrir algum sentido do mundo.”A Terceira teodiceia nos apresenta um aspecto particular de uma religião mundial “foi a própria religiosidade dos intelectuais indianos. É relevante por sua coerência e por seu excepcional alcance metafísico: vincula a redenção a um tipo virtuoso por meio do poder do homem com a possibilidade universal de salvação” (Ibid, 2005, p.129-130).

3. Oriente – Uma região mística

Direcionar a atenção para a Índia e discorrer sobre o caráter sociológico que as duas religiões ao qual Max Weber se debruçou nos apresentam algumas dificuldades de desenvolver uma compreensão sobre o Hinduísmo e Budismo. Primeiro pelo modo como o autor desenvolve a leitura sobre o tema: o enfoque histórico comparativo; em segundo pela a complexa estrutura observada e apresentada pelo autor. É interessante olhar para a Índia que Weber apresenta como um local puro, no qual surgem as formas de desenvolvimento da ciência, política e estratificação social (hierarquia). Oliveira (2009, p.325) apresenta:

A Índia, no arguto olhar weberiano, é a terra natal do atual sistema racional (fundamento de toda calculabilidade, matemática e gramática) ocidental, o qual manifestou na condução da

3Há uma dúvida e discordância neste ponto. Observar as formas que os tipos ideais se manifestam é compreender que só é possível encontrar esses conceitos no campo das ideias. Como observado por Cecília Mariz “Os tipos ideais para Weber são construções heurísticas que não representam nenhum fenômeno empírico. São apenas recursos metodológicos, com valor exclusivamente instrumental.”(2003:78)Desta forma, observo que seja passível de questionamento e dúvida. Como decorre a criação dos conceitos que não estão presentes no mundo empírico? Assim poderíamos observar o caráter idealista em Weber. Entretanto, como questão de compreensão deste quesito, os tipos ideais se manifestam na sociedade ou nos grupos sociais de uma forma passível de observação. Os indivíduos que manifestam uma ação magicamente motivada, ou uma ação racional referente à finalidade, manifestam o que pode ser compreendido conceitualmente como tipo ideal. 4 Os conceitos sobre os tipos de teodicéia podem ser compreendidas tais como tipos ideais.

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guerra, da política e da economia – todas circundadas de um racionalismo que acompanha a literatura que as teoriza, a Arthashastra.

Comparar o desenvolvimento filosófico no oriente em contraste com o ocidente nos remete a observar como o pensamento na Índia está anterior ao pensamento filosófico europeu. Podemos desenvolver uma alusão sobre o contato que os povos jônicos tiveram com os povos na Ásia Menor e o falecimento do método utilizado para explicar os processos naturais, comportamento e moral: os mitos.

Restringindo-se ao pensamento desenvolvido na Ásia, Weber observa quatro das religiões consideradas mundiais, são elas: na china – Taoísmo e Confucionismo, e na Índia – Hinduísmo e Budismo.

O sistema religioso na Ásia apresenta-nos com uma singularidade. Podemos observar o caráter místico presente nas religiões.

Aqui não iremos trabalhar com as religiões da China, mas é interessante observarmos como o caráter místico é apresentado nas religiões e elaborar uma pequena comparação com as religiões na Índia.

O Confucionismo compreendido como religião estatal na China tem como base o conhecimento sendo compartilhado a partir da literatura. Com um aspecto intramundano, os indivíduos movidos pela doutrina de Confúcio apresentam um objetivo para conquista de bens materiais, riqueza e filhos. Como doutrina estatal, os ritos eram desenvolvidos pelo Estado.

O conhecimento da doutrina de Confúcio, como observado por Sell (2013, p.135): “O principal meio para o aperfeiçoamento moral era a aprendizagem contínua [...]. Para o confucionismo, todo pensamento sem leitura era considerado estéril.” O estado combatia todo o modo de ascetismo e contemplação de um deus supramundano.

Não diferente do Confucionismo, o Taoísmo desenvolve um comportamento místico intramundano, entretanto recebe algumas particularidades. Enquanto a doutrina literária busca o conhecimento tendo uma finalidade de conquistas, muitos anos de vida, filhos, bens materiais, a filosofia de Lao-Tsé se apresenta como objetivo de prolongar sua vida.

A relação que o Taoísmo desenvolve com a magia tem uma aceitação pelas massas adequando-se as necessidades que eram apresentadas por estes grupos.

Os rituais, como forma de conquistar um prolongamento da vida, eram desenvolvidos a partir de técnicas e conhecimentos macrobiológicos. O controle da respiração e a desvinculação das práticas mundanas são caminhos para o objetivo dos adeptos e praticantes da religião heterodoxa chinesa.

As particularidades das religiões na China apresentam-se como aspecto de desenvolver uma manutenção para a vida dos indivíduos. As ações que são desenvolvidas nos rituais apresentam-se com uma finalidade objetiva, o que nos permitiria concentrar nos tipos ideais de Weber, neste caso, uma ação racional relacionada à finalidade. Tanto para a doutrina de Confúcio quanto para o Taoísmo os adeptos mostram-se preocupados com sua vida. No primeiro, a doutrina literária, as “coisas” produzidas pelo homem, o que traria uma perspectiva de conforto mundano e prolongamento da linhagem, no caso ter filhos, são compreendidos como objetivos aos indivíduos. Em contraste, o Taoísmo não se apresenta com total oposição contrária a doutrina estatal, pois busca a dilatação da vida no homem. Em outras palavras, os ritos desenvolvidos são direcionados para interesses dos indivíduos para com o interior mundo.

4. Hinduísmo

Tendo como ponto inicial para desenvolver a compreensão sobre a indologia weberiana, partiremos da análise geral do hinduísmo. Considerando a dicotomia que surge na literatura entre a religião heterodoxa e ortodoxa, o desenvolvimento proposto para análise se fundará na compreensão das esferas da vida político e doméstica. Assim, a manifestação dos rituais no hindu poderá ser observada no sistema de estratificação social, as castas.

Podemos considerar o hinduísmo como uma religião de aspectos semelhantes às igrejas e seitas. O tipo igreja é caracterizado pelos indivíduos que se encontram no interior da doutrina pela hereditariedade. Em outras palavras, aqueles que levam o modo de vida dos Shudras nascerão e irão completar o ciclo da vida no interior desta casta. O aspecto seita denomina-se na impossibilidade de os indivíduos não presentes no interior na linhagem de consanguinidade, participarem de alguma casta. Sendo considerados bárbaros aqueles que estão fora da religião, o hindu não possuí a pretensão de aceitar todos os indivíduos.

Ao analisarmos as castas poderemos observar como os indivíduos que estão localizados em um determinado ponto social desenvolvem a relação de permanecer e difundir as regras sociais.

Partindo de um epicentro “o sistema hindu se propaga de uma pequena região do norte da Índia (WEBER, 1958, p.9 – tradução minha) e percorre pontos interessantes no modo como os indivíduos são iniciados e passam a refletir os costumes e restrições que são propagadas pelo Hindu. Weber apresenta que o “estrato “animistic” do território tribal começam a imitarem específicos costumes do hindu [...]: abster-se da carne, particularmente do beef, a absoluta recusa de vacas; total abstinência de bebidas tóxicas” (Ibid, 1958, p.9 – tradução minha).Além de práticas alimentares, os grupos tribais começam a manifestar semelhanças aos costumes Hindu, direcionados à esfera doméstica. A forma como os costumes da religião perpassa por esses grupos tem nos Brâmanes sua fonte primária. Tais indivíduos detentores do

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conhecimento do Vedas são direcionados as tribos para difundir os costumes. “Os brâmanes, a propósito, são frequentes tolerantes com os costumes matrimoniais. Durante a hinduização de pequenas regiões, há linhas matrimoniais que são deixadas em paz. [...] Os costumes adicionais do hindu:[...] viúvas são forçadas a [viver] no celibato, filhas são entregues para o casamento antes da puberdade sem serem questionadas” (Ibid, 1958, p.9 – tradução minha).

A difusão do Bramanismo ao longo da Índia tem uma singularidade no modo de agir da religião. Como observado acima, as tribos vão se adequando as regras estabelecidas, para assim viver na lógica do Hindu. Nesta lógica, podemos observar o modo como Weber considera a passagem de um estágio tribal animistic para o estágio Hindu, a Hinduização.

Há algumas formas para que ocorra o processo de Hinduização. Em uma dicotomia existem aqueles que se consideram Hindu e vivem na lógica da religião, mas para os Brâmanes eles são vistos como bárbaros impuros. Numa segunda forma háa “transformação de tribos dentro das castas [...] às vezes ocorre uma variedade de formas, parcialmente extensas, parcialmente intensas propagandas; as vezes a subdivisão de tribos recebem os ‘people guest5’”.(Ibid, 1958, p.15 – tradução minha).

Este processo nas tribos se apresenta com um caráter peculiar. Anteriormente, levantamos que a característica do Hindu é a seita, não aceitando novos povos considerados impuros. Todavia, as tribos nascentes ao longo da Índia, movendo e aceitando a perspectiva de suas ações por uma via Brâmanes, tem uma singularidade política de assegurar uma dominação pela religião. Entretanto, essas novas castas não devem ser compreendidas como Brahmans, mas como uma sub-castas. Internalizando a lógica Hindu, o Pariah e Guest People se auto-afirmam em uma estratificação social.

Na estratificação social Hindu há uma determinação do ritual (Dharma) presente em todas as castas com base na tradição sagrada da religião.

5. Dharma, Samsara e Karma – Dos rituais à doutrina compensação

I

Desenvolver a análise proposta pelo subtítulo desta sessão não nos permite apresentar um construção única referente a cada item. Primeiro, por alguns pressupostos: este ensaio não se propõe a observar a particularidade de cada um, mas os considero de extrema importância para o estudo sobre as religiões indianas. Segundo, a literatura weberiana apresenta estes tópicos se inter-relacionando entre os pontos, assim, a compreensão parte da conexão entre os três tópicos.

O conceito de Dharma se apresenta com uma importância singular ao se remeter na exposição e na explicação sobre a doutrina na Índia.

A divisão elaborada para remeter ao sistema religioso hindu parte da representatividade que os rituais representam na religião. Relatado a particularidade de Dharma, Carlos Sell aponta o modo como a religião em questão da Índia considera outra religião. Weber relata que, “a primeira questão que o Hindu questiona a uma religião estranha não é seu ensinamento, mas seu dharma”(Ibid, 1958, p.26 – tradução minha).

Para compreender a questão sobre os rituais, Weber aponta a relação que os rituais desenvolvem com as castas. É interessante observar o contraponto que o autor desenvolve, não o apresentando com uma fácil compreensão.

A lei natural determina o dharma do indivíduo ou membro de casta. Na compreensão da doutrina, o ser humano é dotado de uma determinada vontade, e este livre-arbítrio o permite apresentar ações, sejam na orientação religiosa ou profana. Na lógica bramânica, alimentar-se com carne ou ingerir bebidas alcoólicas representa um modo de ação profana. O karma(que será analisado em seguida) seria o modo de “prestar contas” com a ação anterior considerada profana. O indivíduo iria sofrer uma determinada consequência, o que gera a concepção que Weber possui de lei natural. Já para os Kshatriyas, o ritual é direcionado para a defesa contra os inimigos. Em outras palavras, aqueles que nascem nesta casta possuem a lei natural de desempenharem o mesmo dharma.

Max Weber apresenta a concepção de dharma conforme as leis naturais,todavia,SurendraMunshi (2003, p.63 – tradução minha) relata um erro na compreensão do autor, afirmando que:

Chaturvedi Badrinath argumenta que o erro central de Weber é sua compreensão falha para entender o dharma, reduzindo a uma relação com as castas. Não o conceito de religião, mas o conceito de dharma é relevante para entender a sociedade indiana. Dharma significa “aquilo que é [de] interesse” ou “aquilo que mantém”. [...] o dharma sustenta o mundo [...] Dharma é a ordem natural que sustenta a vida. É em essência secular e universal.

5 People guest e Pariah são duas divisões apresentadas por Max Weber de indivíduos que tiveram suas terras expropriadas por castas imigrantes. Após a expropriação,esses grupos migraram para tribos, ou criaram suas vilas em assentamentos.

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E John Love apresenta a observação de Dieter Conrad (2000, p.194 – tradução minha):

De acordo com Conrad, Weber está tão focado na ideia de dharma como “particularizado, dever individual,” e nem mesmo pensa que a noção de dharma estava também associado com uma ideia de ordem cósmica, ele não aprecia o modo que svadharmassão derivados a partir da compreensão da ideia de dharma como “a primeira integradas de manter a ordem do universo.

Dharma ou ritual, segundo Max Weber, é direcionada à compreensão ao modo como o indivíduo ou casta desenvolve os rituais seguindo uma lógica baseada na doutrina Hindu. Esta lógica pode ser aplicada para as tribos que sofreram o processo de Hinduização, pois passaram a desenvolver as ações pautadas nos costumes dos brâmanes.

II

“Todo hindu aceita dois básicos princípios: a crença no samsara na transmigração da alma e a relação da doutrina de compensação karma” (WEBER, 1958, p.118).

O Karma parte do pressuposto de compensação. Esta ideia apresenta o modo como é compreendido algum fato como forma de pagamento por uma ação desenvolvida fora dos preceitos elaborados pela doutrina.

Anteriormente, apresentamos o conceito de dharma e o modo como os rituais orientam os costumes dos indivíduos que estão inseridos nesse ciclo. O karma apresenta a ideia que mantém uma regularidade e disciplina na ação dos indivíduos. Essa disciplina pode moldar a ação, tanto para que não haja o sofrimento na vida corrente ou em outra vida à posteriori.

Weber assegura que “a doutrina do karma deduz a partir do princípio de compensação por um ato passado no mundo, não só explanado na organização das castas mas [em uma] ordem divina, humano, e animal de todos níveis.”(Ibid, 1958, p.144 – tradução minhã).

Whitley Kaufman (2005) expõe que não há uma determinada ordeme que as relações é que estabelecem um grau de compensação. Os problemas de pecado em relação a um sofrimento. Kaufman apresenta diversos argumentos, desde problemas econômicos até o desenvolvimento de doenças, e pontua seis pontos morais como uma forma não “justa” para explicar o sofrimento: The Memory Problem, The Proportionality Problem, The Infinite Regress Problem, The Problem of Explaning Death, The Free Will Probleme Karma and the Verifiability Problem.

A relação de sofrimento que pode ser causado por uma ação profana representa no indivíduo reações que os fazem não ultrapassar as regras estabelecidas pelo dharma.“A doutrina Karma transforma o mundo em uma severa ética racional. (WEBER, 1958, p.121)

Racionalidade esta que determina e pauta o comportamento do indivíduo que age conforme as ações de seu dharma. Weber aponta que o Karma é o modo de compensação das ações. Tais ações são geradas em uma determinada vida e podem ser manifestadas em uma vida posterior. Este ciclo de nascimento e morte representa o destino da alma após a morte. O Samsara constitui a ideia da posterioridade da vida, sendo, portanto, um ciclo. A conexão que podemos discorrer sobre o Karmae Samsara ao modo que terá uma sequência infinita de vidas e o status do determinado período será determinado em compensação da vida anterior. Portanto, a oportunidade do homem nascer em uma posição social, seja positivamente ou negativamente privilegiada, será relativa ao comportamento em detrimento do dharma estabelecido pela estratificação social do indivíduo.

6. A estratificação social das castas

Para análise das castas partiremos das características gerais de uma estratificação social, pois relativo à localidade de uma determinada casta, a relação que é estabelecida entre as diferentes posições variam de acordo com a região. Como exemplo pode-se observar na Índia central que há castas que os Brâmanes não aceitam nem mesmo água.

O significado de casta seria no português “cor”. Cada uma das quatro castas é referida nas escrituras do Vedas, o que seria contrário as posições de que são ficções literárias.

As castas se desenvolveram a partir da hinduização das tribos e “guest peoples”6 são sistemas fechados, não aceitam indivíduos aleatórios, sendo as condições de “permissividade” dada no nascimento. Vimos anteriormente, as condições de tribos que desenvolvem seu comportamento referente aos rituais postos pelas castas, brâmane, e assim considerados uma sub-castas, mas ainda impuros. Referir as tribos

6 Partir de um epicentro único para determinar uma origem pura seria determinar e ver a história como episódios únicos. Partindo de uma compreensão dialética, chegar a gênese de onde e como surgiram as castas nos levaria a conclusões dos tempos mais remotos da Índia.

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como castas, nos remete a outro lado, as profissionais7. No processo de hinduização algumas tribos passaram a se reconhecer com os termos profissionais, “estas [por sua vez] no ponto de vista histórico, constituem a base para a origem desse sistema de estratificação social.”(SELL, 2013, p.154)

Referir-se ao sistema de estratificação têm-se como base compreender o princípio que iremos discorrer sobre a leitura. A posição que cada casta possui é referente a outra. Assim, podemos compreender a conexão que se tem entre elas partindo dos brâmanes. Os direitos e deveres, dharma, são as imposições da casta positivamente privilegiada. “[Uma] característica fundamental das castas é a disciplina. Uma casta ou subcasta não deve ser entendida como uma corporação ou sindicato. Sua função essencial é controlar e iniciar as separações rituais e transgressões da etiqueta” (Ibid, 2013, p.154).

Os Brâmanes, casta que estão os sacerdotes, se constituem no ponto privilegiado da hierarquia da estratificação social indiana. Considerados intelectuais, são dirigidos para desenvolver atividades administrativas pelo domínio de habilidades, tais como a escrita e educação. Weber aponta que os brâmanes não passaram por um processo de hinduização em um passado remoto, mas se constituíram no interior das vilas. Por uma referência carismática, anterior a serem considerados como brâmanes, eram magos. Sua formação “consiste da aprendizagem de formulas sagradas, práticas rituais e uma mecânica de oralidade” (WEBER, 1958, p.58). No aprendizado, o conhecimento torna-se o mecanismo principal de distinção com as demais castas. O exercício para o crescimento de um brâmane, a partir do noviço, se dá a partir do ensinamento do Vedas. Ao final da vida, após o nascimento de seu filho e neto, o brâmane, neste caso pai, entra em um exercício para “atingir misteriosos poderes mágicos”(Ibid, 1958 p.61 – tradução minha).

A segunda casta, socialmente privilegiada, são os Kshatriyas. Compreendem os cavaleiros, reis e aqueles que possuem privilégios econômicos. Seu dharma é a proteção das cidades e sua população. Os antigos Kshatriyas eram rivais dos brâmanes na ordem educacional, sendo a posteriori substituídos pela casta Rajputs que submeteram a lógica dos brâmanes e “são formados pelas mais distintas tribos” (Ibid, 1958, p.65 – tradução minha).

Em sua origem, a casta Vaishyas era compreendida por camponeses observados como negativamente privilegiados. Camponeses que não tinham acesso ao conhecimento, destinados anterior a altas castas. Posterior a uma classe pequeno burguesa, Vaishyas, assimilada ao conceito de camponeses fora substituído por comerciantes que pagavam impostos sob o interesse da alta casta, Kshatriyas. A migração desta casta para a cidade faz surgirem outros estratos de agricultores, tais como upri. Essa classe burguesa urbana em ascensão poderia despertar um poder militar, contrária as ideias propagadas pelo bramanes. Sendo eles, contrários as guerras, compreendiam que “o dharma do príncipe não é em conduzir as guerra, mas proteger a paz e a prosperidade dos cidadãos”(Ibid, 1958, p.88 – tradução minha).

Na última e negativamente privilegiada casta, vemos os Shudas. “Social e ritualisticamente degrada [...] não podem nem dar água a um bramanes como não pode trabalhar em uma casa de sacerdotes”(Ibid, 1958, p.93 – tradução minha). Em antigas vilas, os Shudras desenvolviam atividades como artesanato e trabalhadores do comércio que eram importantes para o trabalho dos camponeses. Em outro ponto, há os Shudas de sangue-puro. Estes são industriais urbanos e comerciantes que possuem a permissão de desenvolverem atividades como servos.

Há uma proibição para os Shudas, no qual tem seu dharma ligado ao serviço. Quando estes não encontram trabalho é permitido tornarem-se comerciantes”(Ibid, 1958, p. 94 – tradução minha).Contudo, a possibilidade destes poderem tornarem-se comerciantes, os incubem, assim como a castas vaishyas, ao pagamento de impostos para os reis.

7. Budismo

A doutrina de Buda foi desenvolvida como um produto de seu tempo. Oposta as ideias difundidas pelos brâmanes e ao sistema de estratificação social, o budismo inicialmente, apresenta-se com uma característica de seita, o budismo antigo, e em segundo momento, poderemos ver a influência do rei Ashoka e a difusão para além da Índia, com a subdivisão hynaina e mahayana, tendo a pretensão de chegar nas camadas negativamente privilegiadas.

Fundada por Gautama, posterior conhecido como Buda, pertencendo a priori à Kshatriya, casta positivamente privilegiada, entra em um período de renúncia dos fatores que os ligam as “coisas” mundanas e colocando-se em uma solidão. Não distinto do Jainismo, que apresenta um comportamento ascético8 e tem como meta chegar a uma tranquilidade, tendo a crença de que este é o único caminho para salvação, o budismo observa que esta tranquilidade e a libertação das coisas mundanas são os únicos caminhos de

7 Max Weber apresenta que há dois tipos de castas, sendo tribais e profissionais. Aqui trabalharemos os aspectos profissionais, para conhecer algumas tribos ver Gerald D. Berreman, Etnografia e controle de impressões em uma aldeia do Himalaia, in Behind many Masks.8 No budismo o comportamento ascético, ou um ascetismo racional é compreendido como um modo racional de viver. Portanto vemos a posição contrária do budismo em relação Jainismo.

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uma salvação. A divergência entre as duas religiões ortodoxas se apresenta nas éticas de comportamento. O budismo se contrapõe as ideias sagradas que são manifestadas no comportamento ascético, no qual o indivíduo é o receptáculo do divino.

O budismo antigo se manifesta como uma religião apolítica e anti-politica, tendo como base a busca e o entendimento de uma salvação extramundana, possuindo deveres, mas não rituais. No grupo intelectual, os monges mendicantes se abstém tanto dos produtos mundanos, como criticam a existência de um deus. “Corretamente, é uma ética com absoluta indiferença para a questão se há “deuses” e como eles existem” (WEBER, 1958, p. 206). A salvação seria inteiramente individual, oposta as ideias do cristianismo no qual procuram a salvação de sua alma buscando direcionar os indivíduos para o que acreditam ser um caminho para salvação9.

Sendo Gautama, anterior membro do sistema de estratificação social hindu, e posterior abdicando a todas as manifestações da lógica do sistema bramânico, as ideias que são combatidas pela filosofia do Buda têm no karma, ou no comportamento presente, o ponto fundamental que determina seu futuro. A peregrinação para a salvação do indivíduoé relativa ao comportamento que é desenvolvido, encontrando em uma simples ação seu caminho para a manifestação. Assim, o karma10é questão de preocupação para os monges e aqueles que serão adeptos a esta doutrina.

Weber (1958) aponta que todas as causas que remetem a uma ideia de salvação é referente à crença na alma, podendo nos levar a compreender a indiferença à questão referente a um ou mais deuses. A salvação do que ou para que? “Para o pensamento budista a [questão] davida eterna deve ser um “contradictio in adjecto”. “Vida” consiste precisamente da fusão dos elementos constitutivos do indivíduo (khandas) na forma de autoconsciência”(Ibid, 1958, p. 207 – tradução minha).

Para o Budista, atribuir validade atemporal a individualidade, como em todo o pensamento indiano, é como uma presunção absurda e ridícula [...]. O que se busca não é a salvação de uma vida eterna, mas para a tranquilidade eterna de morte. O sistema operacional base para este budismo, como para os índios em geral esforçando-a salvação, não era uma saciedade para com a morte. Isto é indicado mais claramente na legenda das experiências anteriores da saída do Buda da casa dos pais, do lado da jovem esposa e o filho na e entrar na solidão das florestas (Ibid, 1958, p. 207 – tradução minha).

A forma de compreender as doutrinas do mal baseado nos pecados, como pode-se observar no não comprometimento com o dharma para os brâmanes ao abdicarem de alimentar-se com carne de vaca ou não ingerir algum tipo de bebida alcoólica são as formas negadas pela doutrina de Gautama de ter a salvação, ou os caminhos para ela. A efemeridade da vida poderia ser um impedimento para salvação, assim como as formas de sentimentos para com algo mundano ou extramundano. A paixão, o ódio e o egoísmo são contraposições que impediriam o indivíduo de assar por um tranquilo processo até chegar a morte.

Outro processo para compreender os fatores que o monge chegaria a salvação no budismo antigo está na forma do despertar do sentimento frente às experiências místicas, regras morais e o conhecimento. A primeira, nasce de um “amor puro”, relativo a relação que o homem desenvolve com a natureza. O segundo, seria a ordem estabelecida pelos monges, monkhood11, como forma de estabelecer os limites e deveres a serem seguidos, dentre eles se destacam: abstenção de carnes, assassinatos, roubo, etc. Em terceiro, o fator que afastaria o indivíduo da salvação, o conhecimento. Neste ponto podemos compreender que o tipo de conhecimento apontado é aquele compreendido como algo gerado para o mundo. Seja ele conhecimento mundano ou sagrado, buscando um caminho de se opor a ordem natural, teria a mesma restrição, não levando o indivíduo para o lado oposto da salvação.

No budismo foi rejeitada porque evidencia de um conhecimento intelectual mundano não tem utilidade para a futura perfeição. Mas o conhecimento salutar é exclusivamente a iluminação prática pelas quatro grandes verdades da natureza, origem, condições e meios de destruir sofrimento. (WEBER, 1958, p.2009).

9 O uso do termo salvação pode nos remeter a uma compreensão para o pós-vida, mas no budismo há uma diferença fundamental. A salvação não é na lógica do samsara, para uma vida posterior, muito antes para a vida, mas remete para uma tranquilidade para a morte.10 É importante ter em mente que a ética de compensação está ligada diretamente a questão do Samsara, para o hinduísmo, a transmigração da alma. As ações de comportamento manifestam em vida pode se apresentar em vidas posterior, ou na vida corrente, tal como visto na proposta por Whitley R. P. Kaufman: Karma, Rebirth, and the Problem of Evil. No Budismo devemos nos prender ao comportamento ligado em vida. A ação que o indivíduo manifesta em um determinado fato poderá refletir durante a vida corrente. A questão de entendimento da compensação se seria ou não equivalente ao comportamento do indivíduo nos remeteria a outras questões.11 Uma possível tradução de “monkhood” seria a irmandade de monges, ou algum tipo de vizinhança de monge. A compreensão se atrela ao fato de que há uma ordem de monges que estabelecem algumas regras morais, que “devem” ser seguidas como orientação para se atingir o nirvana.

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A abdicação de todos os fatores intramundanos e extramundanos são etapas que o monge perpassa para atingir iluminação. Tais etapas, de um processo de autoconhecimento e contemplação, não devem ser consideradas um treinamento sistemático, masuma liberação para se chegar ao estado psíquico da iluminação. “Toda prescrição de Buda são designadas para a obtenção deste estado”(Ibid, 1958, p.220 – tradução minha).Para compreender os devemos considerar quais são as verdades sagradas: 1) sofrimento; 2) as bases do sofrimento; 3) o fim do sofrimento; e 4) os oitos caminhos fechados.

Os três pontos que remetem ao sofrimento são compreendidos de uma forma única. Os sofrimentos na vida são causados pela busca do indivíduo às formas de ter uma euforia pela vida. Ter a crença na alma leva ao querer um conhecimento não necessário para se atingir o estado de iluminação, o que remete o indivíduo a desenvolver um modo racional da vida e a acreditar em um deus.“O fim da sede pela vida é o fim do sofrimento na imperfeição e na vida”(Ibid, 1958, p. 221 – tradução minha), é o que leva aos oito caminhos fechados. Primeiro, o conhecimento racional sobre os efeitos dos elementos da natureza. Segundo, a renúncia dos prazeres mundanos. Terceiro, o afastamento das mentiras. Quarto, afastar-se das condutas impuras. Quinto e sexto passo, nenhum modo de uma alienação por uma vida pautada as ideias sagradas lhe dão um poder espiritual. O próximo caminho é a perfeição gerada pelo conhecimento levando a um excedente do poder da consciência o leva ao nirvana. Esses são os passos alcançados através da meditação e pura concentração.

Os processos para chegar ao Satori12foram desenvolvidos pelo budismo antigo, restrito a uma região da Índia. Posterior tornou-se uma religião missionária, com a intenção de levar a doutrina para outras regiões, surgindo assim a dicotomia entre: hynayana-budismo – que predominou no sul da Índia, e mahayana-budismo, presente no norte.

A difusão do budismo na Índia tem como ator principal, o Rei Ashoka, membro da casta Kshatriya. Ao converter-se para o budismo, acusado de proporcionar muitos assassinatos por seu nome, remete que estava segundo os paradigmas do dharma de sua antiga crença. O budismo antigo sendo perpetuado oralmente entre os grupos de monge começa a se desenvolver como literatura pelo rei ao propor que os dogmas da doutrina sejam perpetuados e escritos para sua difusão – visto que na China, a doutrina de Confúcio pertencente ao estado e as intelectuais, a “religião do livro” seria o modo de alcançar tais grupos.

Sendo uma mudança radical, após a exposição do rei ao budismo, tem-se como pressuposto expandir o budismo pelas massas. Visto anterior que o budismo antigo tinha como método de salvação o indivíduo e não grandes grupos. A adaptação13 do budismo tem diversos contrapontos, econômicos, domésticos e políticos. Tanto para a camada negativamente privilegiada, ao qual não havia uma dominação da cultura literária, a doutrina adaptou-se a realidade. O oposto também ocorre. A dedicação para as maneiras de contemplação e meditação com meta a salvação sofrem modificações. Weber observa que “Logo o budismo resultou para a realeza um efetivo para a domesticação das massas”(WEBER, 1987, p.252)14. Todavia o budismo antigo se posiciona de forma apolítica.

O budismo-mahayana apresenta particularidades no seu desenvolvimento e compreensão sobre o pensamento do budismo antigo. Em primeiro, o desenrolar intelectual que o mahayanismo apresenta com a ideia de materializar o que anteriormente era transmitido por forma oral o permite a chegar as camadas intelectuais da China que tinham na apresentação um poder carismático a partir dos conhecimentos literários. Enquanto no budismo antigo não havia uma crença na alma, esta doutrina vem a apresentar essa característica, partindo do pressuposto que os indivíduos negativamente privilegiados não se preocupavam com uma salvação pós-vida ou uma tranquilidade para e durante a morte, nirvana, mas tinham um interesse voltado para o mundo, passando assim a um processo de deificação de Buda15.

O processo de desenvolvimento do mahayana tem sua origem nos centros de filosofia e soteriologia bramânica, no interior das castas hindu, levando a uma lógica de uma estratificação social. Todavia, a concepção de uma estratificação social se dava contrária a posição de que o mahayanismo tinha a pretensão de levar a salvação contra o sofrimento mundano a todos, mas ainda era necessário um exercício para concluir a meta. Aqueles que terão a salvação seriam os fariam o exercício gnóstico, o que não era presente aos leigos. “Segundo a doutrina [...] a gnose salvadora leva é a [...] combinações sentimentalistas práticos do amor com uma controlada concentração do sentimento”(WEBER, 1987, p.265).

O aspecto econômico leva a compreender a influência bramânica no interior desta doutrina. Na adaptação para o desenvolvimento da doutrina mahayana as condições econômicas e as adaptações às necessidades seriam relativas aos momentos de adversidade. Sendo assim, todos os processos que

12 A compreensão de Satori se atrela a perspectiva de que o indivíduo que segue os passos para chegar ao nirvana recebe o Satori, como iluminação, que está em processo de se desvencilhar dos desejos mundanos.13 É interessante aqui observar, que esta difusão entre diversas camadas sociais ocorreu não apenas pelo budismo, mas também pelo hinduísmo.14Se nos referirmos ao budismo como crença direcionada para interesses políticos poderíamos cair em um erro. Inicialmente, foi desenvolvida como um modo racional do hindu para livrar-se da lógica bramânica. O interesse político surge na difusão pelo rei Ashoka.15 O mahayanadifunde que para o Gautama atingir o estado de nirvana, fora necessário um exercício durante quinhentas reencarnações, sendo a sua última em sua mãe Maya. Levando-nos a compreender a doutrina do samsara

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levaram Buda a atingir o nirvana, abdicando-se as coisas mundanas que eram consideradas de inutilidade para o homem, não poderiam manter-se para alcançar os grupos negativamente privilegiados.A escola hinayana desenvolve-se ao longo da Ásia juntamente com a doutrina mahayana. Em fatores econômicos, o budismo ortodoxo tem um desenvolvimento acentuado. Na Indochina a economia é desenvolvida pelos monges através da agricultura, enquanto na Índia se tem a presença da indústria. O exercício de abstenção ao dinheiro é perpetuado entre as diferentes doutrinas do budismo, portanto, devemos compreender o mesmo como modo da “irmandade” sobreviver.

Estes monges têm sua prática como guru, conselheiro espiritual por possuir um carisma direcionado as bases do conhecimento sagrado, visto que, ao abarcar os leigos, o hiyanismo apresenta-se como uma ética de comportamento extramundano.

Os homens possuem a crença do samsara com a meta de que em sua reencarnação seja possuidor de riquezas discípulo de Buda (Ibid, 1987, p.276), e por fim possa alcançar o nirvana.

Entre o hinayana e mahayana difundem-se a partir de líderes que migraram do hindu para o budismo como forma de esquivar-se da estratificação social. É interessante observar que aqueles que promoveram a difusão pela Ásia são reis provenientes dos Kshatriays.

Resultados e Discussões

I

A sociologia da religião weberiana apresenta-nos a ação que as religiões desenvolvem sobre os indivíduos. Weber identifica três tipos de religiões: religiões mundiais, religiões de salvação e religiões culturais. Abaixo apresento uma reconstrução da organização das religiões.

Figura 1: tipos de religiões, segundo Weber

Fonte: Elaboração própria

A construção de um grupo hierárquico das religiões identificadas por Weber se concentra na forma que cada religião desenvolve. As religiões de salvação e religiões culturais encontram-se no grupo das religiões mundiais, sendo a recíproca não verdadeira e as religiões culturais são ligadas às religiões de salvação. Tais religiões culturais podem ser observadas nos estudos elaborados por Durkheim, na obra já citada neste texto, pois tais religiões são de caráter místico. Assim como o autor francês observa os totens sendo representações do divino, indivíduos carismáticos desenvolvem relações mágicas.

Figura 2: A relação dos profetas emissários na religião de salvação

Fonte: Elaboração própria

Nesta figura, vemos a observação da religião de salvação ou para dentro do mundo. Os profetas emissários desenvolvem o comportamento ascético, acreditando que os instrumentos divinos permeiam a ideia de influenciar os indivíduos. Esta observação aplica-se a um período histórico pré-moderno, no qual a esfera que a vida encontra-se em diversas intercessões. Como observada na conferência de Georg Simmel, “As Grandes Cidades e a Vida do Espírito”, os indivíduos são moldados por uma racionalidade objetiva, concluindo-se que em um dado histórico pós-moderno, os comportamentos do indivíduo não são

Religiões mundiais

Religiões de Salvação Religiões Culturais

Religião de salvação

Esfera da vida Profetas emissários

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observados pelas esferas da vida em diversas intercessões no qual não há uma predominância. Cada esfera torna-se independente da outra.

Figura 3: A relação dos profetas exemplares na religião de salvação

Fonte: Elaboração própria

Nesta terceira e última figura, observamos as religiões de salvação de negação do mundo, no qual os profetas exemplares possuem um comportamento místico, acreditando ser um receptáculo do divino.Estes desenvolvem um modo de contemplação do divino, como observado em algumas religiões mundiais.

II

Posicionar a obra da sociologia da religião: hinduísmo e budismo em uma área especifica levaria a um grosso erro. Há uma discussão para tentar definir o estudo weberiano nas áreas de história, sociologia ou política. Todavia a obra apresenta proposta de análise para as três vias de estudo.

Na primeira parte a definir a questão sobre as religiões da China, observamos alguns aspectos gerais. A preocupação intramundana que as doutrinas desenvolvem como preocupação da dilatação da vida, riqueza e filhos, são pontos a se questionar. Enquanto na doutrina de Confúcio é o estado que manifesta o controle e tem no conhecimento os métodos para chegarem a sua meta, o Taoísmo tem nos seus rituais, na magia, seu modo de prolongamento da vida. Com algumas restrições, poderíamos apontar que o Confucionismo está para o Hinduísmo, assim como o Taoísmo está para o Budismo. Dentre as restrições, as que levaremos em nota será que no Hinduísmo não há a presença do estado – os kshatriyas não manifestam interesse em manter a ordem dentro das cidades – e o Budismo liberta-se dos rituais.

Na obra hinduísmo e budismo o autor desenvolve um caráter histórico sobre os agentes sociais e a designação de estratificação social, economia e relações de poder o que dificultaria a compreender qual seria a preocupação do autor em discorrer sobre os tipos ideais apresentados na Índia.

Munshi (2003) observa que a análise de Weber sobre o dharma é incompleta e não o epicentro de onde determinado fator surge e quais são os motivos. Em detrimento do questionamento poderíamos nos questionar: qual é o real interesse de Weber ao relacionar o caráter social do dharma para o bramanismo? E porque não há o aprofundamento deste conceito a outras áreas?

A apresentação do conceito por Weber é relacionado diretamente para as castas. Sendo a preocupação em elucidar os motivos que levam os agentes a serem determinados a manifestarem o ritual por estarem inseridos nas castas é que iremos refletir. A questão intrigante é referente ao motivo que determina o indivíduo a ter ação ao dharma. Os brâmanes se abdicam de ingerir carne animal, entretanto o ritual é assassinar o mesmo animal que não é direcionado à alimentação. Sendo que o dharma não executado tem na doutrina de compensação o método que irá determinar uma consequência futura. A lógica hindu direcionada aos rituais são os fatores desenvolvidos pelo autor para compreender como o sistema funciona, nos levando a conclusão de que observar a gênese e ordem do dharma não são questões determinantes na análise weberiana.

Sendo o dharma definido como lei natural, os princípios questionados são os valores mais fundamentais ao indivíduo, seja agradável ou não o indivíduo terá que executá-lo. Como exemplo pode-se observar, além dos brâmanes, os reis, na casta kshatriyas. Arjuna e Shura, respectivamente, mestre e aprendiz se enfrentam em campo de batalha, no qual ao defrontar-se se negaram a completarem seu ritual. A quebra da lógica dos rituais é o modo de libertar-se da roda do samsara. Em outras palavras, cada membro de castas tem seu dharma determinado no nascimento, e posterior a comprovação de que faz parte da determinada casta têm-se que executar o dharma. O rompimento com o ritual transforma o karma em um ritual, o karma ritualístico. Este é o método de sair da lógica da transmigração de almas. Mas o que impossibilita aos indivíduos libertar-se facilmente do samsara?

Religião de salvação

Profeta exemplarRituais/divino

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Elias (1994) desenvolve a construção do indivíduo a partir das estruturas no qual são inseridos, sendo os valores morais internalizados e não questionados. Estes, os hábitos mentais inconscientes, são automáticos nos homens, fazendo-os reproduzirem as ações anteriores ao agente. Entretanto, este agente é passível de uma ação, referente as reações expostas ao indivíduo. Como exemplo, os reis que se enfrentaram e negaram-se a completar seu dharma moveram uma nova estrutura a partir dos fatos, gerando assim, novos fatos históricos.

A ação tradicional, em Weber, promove nos homens ações irracionais, não questionáveis aos indivíduos. Logo, a estratificação social age por uma lógica interna, única, criada e passível de análise nos fatores indianos. Por ser o dharma uma lei natural internalizada no indivíduo, este torna-se apenas capaz de observar as ações diante de referências externos e contrário às posições reproduzidas. Esses fatores locais não nos permitem a aplicar conceitos, no período histórico em análise, ocidentais na Índia, tais como: democracia, relações de trabalho ou modos de julgamento; anterior a ter conhecimento sobre a lógica social que está presente no país.

III

O budismo antigo surge de um processo de racionalização do bramanismo. Sua origem sendo da casta kshatryia e sua prática nas ações dos brâmanes, surge com o pressuposto de romper com o samsara. Compreendendo que a transmigração das almas são paradigmas alimentados pelo dharma, o budismo antigo não repete as práticas ritualísticas.

Observando no dharma toda ação gerada a partir da violência, ahimsa, sendo estes os fatores que estão ligados diretamente aos valores intrínsecos dos indivíduos que vivem na lógica do hindu, o fator predominante do budismo é ampliar o ahimsa é livrar-se da lógica do samsara.

A meta da doutrina de Buda livra-se de todos os desejos mundanos seja político, econômico e doméstico, para alcançar o nirvana. A única preocupação está diretamente ligada a uma tranquilidade para a morte do indivíduo.

As divisões que surgem no budismo recebem características distintas do antigo. Os interesses gerados na doutrina Hinayana e Mahayana são contrárias as posições iniciais do budismo. Com um discurso de promover a salvação de todos, as práticas do rei Ashoka são estritamente direcionadas para a concentração de força e interesses políticos.

Em caráter de comparação entre as divisões do budismo, o primeiro tem um processo de abdicação de todos os fatores mundanos, já as subdivisões são contrárias. A adaptação as camadas populares com a meta de abarcar grupos negativamente privilegiados deturpam os ensinamentos na origem por Gautama.

IV

As religiões da Índia, Hinduísmo e Budismo antigo, manifestam comportamento místico. Sendo as práticas de Gautama semelhante as ações dos brâmanes16, o interesse político e relações econômicas são negados. Os brâmanes não participavam das decisões políticas. Todavia, a influência que exerciam sobre os reis eram presentes, pois o carisma apresentado pelo conhecimento no vedas possui caráter de dominação das massas. Por outro lado, os monges budistas não manifestavam nenhuma forma de interesses nas relações políticas. Tinha, apenas como prática a contemplação e meditação.

A relação que as doutrinas desenvolvem com o samsara são semelhantes. Ambos buscam métodos de romper a roda da existência. Enquanto para o Hinduísmo seria necessário transformar o dharma em um karma ritualístico, no budismo havia apenas uma descrença na transmigração. O karma apresenta como um modo compensatório nas duas doutrinas, enquanto na primeira a compensação vem na vida posterior, a segunda apresenta aspecto na vida corrente.

Nos aspectos econômicos, enquanto os brâmanes não tinham a permissividade de receber pagamento pelos serviços, apenas terras e oferendas, no budismo o interesse de salvação era centrado apenas do indivíduo, não havia preocupação em produção ou a salvação coletiva.

Considerações Finais

A partir das etapas e do confronto entre as duas religiões, chegou-se à conclusão de que as religiões da Índia apresentam características singulares em suas etapas. Para discorrer sobre a análise do processo histórico, a estratificação social age sobre uma lógica particular. Os indivíduos pertencentes as castas agiam de acordo com os costumes da casta que fazem parte, os direitos e deveres eram discorridos sobre a cada grupo, não sendo permitido a intromissão de outros.

O budismo antigo não desenvolve um modo de libertar todos da lógica hindu. O surgimento das dicotomias da doutrina nos remete a observar quais seriam os interesses gerados pelo rei Ashoka descaracterizando os princípios iniciais do budismo

16 A lógica hindu é regida pela forma que os brâmanes determinam as ações.

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Em síntese, as religiões indianas tinham como meta a partir dos mesmos pressupostos libertar-se do samsara.

Agradecimentos

Ao CNPq, pelo financiamento do projeto e pela concessão da bolsa PIBIC; Ao meu orientador, professor Dr. Arilson Silva de Oliveira, pelos debates, diálogos e orientações para o

desenvolvimento deste artigo e crescimento intelectual.

Referências Bibliográficas

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