21
HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL Jorge Brito Pereira Ano Lectivo 2003/2004 Sub turmas 1, 2 e 13 HIPÓTESE Nº 1 Armindo (escultor de sucesso) e Bento (pintor sem uma única obra vendida) partilhavam o mesmo atelier. Um dia adquiriram em conjunto um automóvel pelo preço de 2.000 contos à sociedade comercial VendeAutomóveis, Lda., para facilitar o transporte das matérias-primas necessárias para o trabalho de ambos. Nos termos do acordo celebrado, o pagamento devia ser realizado 60 dias após a entrega do carro. Entretanto, Armindo e Berto zangaram-se, não tendo cumprido a obrigação de pagamento do preço a que estavam vinculados. Pode a VendeAutomóveis demandar apenas Armindo para o cumprimento integral da obrigação de pagamento do preço de aquisição do automóvel? HIPÓTESE Nº 2 Dário (comerciante) entrou em sérios problemas financeiros e foi obrigado a vender parte substancial do seu património. Para o efeito, Armindo (comerciante de automóveis), Berto (comerciante de automóveis) e Carlos (artista plástico) adquiriram conjuntamente a Dário 1000 acções da EDP e 3 automóveis, tudo pelo preço global de 150.000 Euros. Depois do negócio estar acordado, Armindo, Berto e Carlos zangaram-se por causa da divisão dos automóveis e não cumpriram o contrato. Duas questões – (i) admitindo que todos os compradores são casados, qual o regime da dívida? (ii) a obrigação de pagamento do preço a Dário é solidária ou conjunta? HIPÓTESE Nº 3 Abel é um escultor frustrado a quem ninguém comprava esculturas. Já quase falido, surge uma oportunidade de negócio – um amigo tinha para venda 6 conhecidos quadros de Malhoa. Abel decide então adquirir esses quadros para posterior revenda. Só que Abel não tinha condições para guardar e conservar as pinturas. Contratou então com o Museu Gulbenkian o depósito dos quadros por seis meses. Contratou também um guarda com a incumbência específica de guardar estas pinturas. Estes actos são comerciais ou civis? HIPÓTESE Nº 4

Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

  • Upload
    mapab

  • View
    482

  • Download
    14

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL Jorge Brito Pereira

Ano Lectivo 2003/2004 Sub turmas 1, 2 e 13

HIPÓTESE Nº 1 Armindo (escultor de sucesso) e Bento (pintor sem uma única obra vendida) partilhavam o mesmo atelier. Um dia adquiriram em conjunto um automóvel pelo preço de 2.000 contos à sociedade comercial VendeAutomóveis, Lda., para facilitar o transporte das matérias-primas necessárias para o trabalho de ambos. Nos termos do acordo celebrado, o pagamento devia ser realizado 60 dias após a entrega do carro. Entretanto, Armindo e Berto zangaram-se, não tendo cumprido a obrigação de pagamento do preço a que estavam vinculados. Pode a VendeAutomóveis demandar apenas Armindo para o cumprimento integral da obrigação de pagamento do preço de aquisição do automóvel?

HIPÓTESE Nº 2

Dário (comerciante) entrou em sérios problemas financeiros e foi obrigado a vender parte substancial do seu património. Para o efeito, Armindo (comerciante de automóveis), Berto (comerciante de automóveis) e Carlos (artista plástico) adquiriram conjuntamente a Dário 1000 acções da EDP e 3 automóveis, tudo pelo preço global de 150.000 Euros. Depois do negócio estar acordado, Armindo, Berto e Carlos zangaram-se por causa da divisão dos automóveis e não cumpriram o contrato. Duas questões – (i) admitindo que todos os compradores são casados, qual o regime da dívida? (ii) a obrigação de pagamento do preço a Dário é solidária ou conjunta?

HIPÓTESE Nº 3

Abel é um escultor frustrado a quem ninguém comprava esculturas. Já quase falido, surge uma oportunidade de negócio – um amigo tinha para venda 6 conhecidos quadros de Malhoa. Abel decide então adquirir esses quadros para posterior revenda. Só que Abel não tinha condições para guardar e conservar as pinturas. Contratou então com o Museu Gulbenkian o depósito dos quadros por seis meses. Contratou também um guarda com a incumbência específica de guardar estas pinturas. Estes actos são comerciais ou civis?

HIPÓTESE Nº 4

Page 2: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

Armindo é um Advogado casado com Carlota. Para ocupar as suas horas vagas, iniciou, faz já algum tempo, um pequeno comércio de moedas antigas, num quiosque de jardim. Como Armindo apenas tinha disponibilidade para estar no quiosque entre as 18h e as 19h (porque durante o resto do dia estava no seu escritório), contratou Berto, como seu empregado, para o auxiliar. O negócio tem no entanto corrido mal e Armindo deixou de pagar os ordenados a Berto. Podem os bens comuns do casal ser executados para pagar a dívida de Armindo a Berto?

HIPÓTESE Nº 5 Abel, casado com Berta em regime de comunhão de adquiridos, era o dono de uma pequena mercearia de bairro. Um dia surgiu-lhe na mercearia Carla, alegre moçoila de atraente figura, que vendia batatas. Abel de imediato se apaixonou. E porque o amor tem destas coisas, entrou em desvario com o pouco que Carla lhe ligava. Foi ao Casino e perdeu uma pequena fortuna, ficando a dever avultada quantia. Deixou passar o prazo para pagamento de um fornecimento de queijo, tendo contra si sido intentada acção judicial. Tentando captar a atenção de Carla, propôs-lhe um fornecimento de cebolas, pagando tão caro como diamantes. Carla vendeu as cebolas e encetou uma relação ardente com Abel. Este nunca pagou a dívida ao casino, a dívida ao fornecedor de queijo e a dívida a Carla. Berta, quando soube da pecadora traição, embruxou-se. São por tais dívidas responsáveis os bens comuns do casal?

HIPÓTESE Nº 6 B e C dedicam-se à construção de pequenas pontes, tendo vindo a desenvolver um lucrativo negócio nos últimos anos. Em Janeiro deste ano adquiriram por € 500.000 os materiais de que necessitavam para a construção de uma pequena ponte no Norte do país a A, ficando acordado que o preço seria pago daí a 60 dias. Acontece que, durante a construção, a ponte caiu e B e C não têm fundos que permitam o pagamento da dívida. A obrigação de pagamento é conjunta ou solidária?

HIPÓTESE Nº 7 Armindo é agricultor e é casado com Berta. Em 1998, farto dos baixos preços de venda dos seus produtos, decidiu iniciar um pequeno comércio para venda de legumes. Para o efeito, tomou de arrendamento uma pequena loja, adquiriu o mobiliário necessário a Dário e a Dária e celebrou um contrato de “leasing” sobre um computador. A meio do projecto, faltou-lhe o dinheiro - a loja nunca chegou a abrir e Armindo não pagou nem o preço do mobiliário nem as rendas do “leasing”. Farta de tanto insucesso, Berta, a mulher de Armindo, decidiu assumir as rédeas do negócio. O seu primeiro acto foi trespassar a loja que Armindo, sem sucesso, tinha tentado abrir. Fez um acordo com Dário e Dária, que também pretendiam vender produtos agrícolas, – estes

Page 3: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

perdoavam a dívida de Armindo e ainda pagavam 500 contos. Dário e Dária nunca pagaram os 500c. O trespasse é válido? A responsabilidade de Dário e Dária é solidária ou conjunta?

HIPÓTESE Nº 8 A sociedade ComeBem, Lda, explorava uma conhecida e centenária pastelaria num espaço arrendado na zona do Saldanha. Um dia, sob protestos de milhares de fieis clientes, a pastelaria encerrou as suas portas, foi desmantelada (tendo todo o mobiliário sido leiloado) e todos os trabalhadores foram despedidos. Nada restava da velha pastelaria. Passado pouco tempo, a ComeBem, Lda, trespassou a pastelaria a favor da NovoBolo, Lda, que iniciou um mesmo negócio de pastelaria, e logo voltaram todos os velhos clientes. O senhorio do prédio clama, no entanto, que o trespasse não é válido. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 9

Elisa é proprietária de uma livraria on-line que tem vindo a ter muito sucesso. Em 5/1 acordou com Guiomar um contrato de fornecimento de livros por um período de um ano, contra o pagamento de € 10.000. Em 10/1 trespassou a livraria a Fernando, nada se dizendo sobre o referido contrato de fornecimento. Uma vez que a livraria funcionava pela Internet, o trespasse não abrangeu qualquer espaço físico. Guiomar nunca recebeu os seus € 10.000. Elisa está desaparecida na selva da Amazónia. Pode Guiomar exigir os € 10.000 a Fernando?

HIPÓTESE Nº 10 A Mercados, SA, que explora um conhecido hipermercado na região da Grande Lisboa, decidiu iniciar a exploração de um supermercado “online”. Para o efeito criou uma unidade de negócio independente para a qual contratou pessoal, criou um site na Internet, tomou armazéns de arrendamento e celebrou contratos com os fornecedores. Poucos dias antes do lançamento do projecto um concorrente – a sociedade Hiper, SA – apresentou uma excelente proposta de aquisição desse negócio, tendo as partes celebrado o respectivo contrato de trespasse em 5/1/99. Agora, passados quase três anos, a Mercados, SA, decidiu lançar um novo projecto de supermercado “online”. No entanto, a Hiper, SA, opõe-se a esse projecto alegando que viola as obrigações de não concorrência. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 11 A ENGIL, a EDIFER e o BES celebraram um acordo designado de "consórcio" para a construção do metropolitano do Porto. Nos termos do contrato, a ENGIL era responsável pela construção dos carris; a EDIFER era responsável pela construção das carruagens; e o Banco Espírito Santo

Page 4: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

era obrigado a contribuir com € 1.500.000 para as despesas gerais do projecto. Qualifique o contrato e determine o regime jurídico aplicável.

HIPÓTESE Nº 12

Arlindo (pintor) e Berta (comerciante de automóveis) celebraram um designado contrato de consórcio, nos termos do qual ficou prevista a seguinte actividade - A e B adquiririam velhos VW Carocha; Berta procederia a todas as reparações necessárias; Arlindo pintaria os carros com malmequeres em cores berrantes; e posteriormente os carros seriam vendidos a Carlos. Para o efeito, A e B compraram 6 carros a Dário, tendo ficado estipulado que o preço seria pago 3 meses depois. Arlindo, é bom de dizer, nutria uma galopante paixão por Berta mas esta não correspondia. Um dia, ao chegar à oficina de Berta, Arlindo viu esta a dar um tórrido Beijo em Eliseu, seu inimigo desde os Bancos de escola. Arlindo zangou-se com Berta, o negócio correu mal e nunca pagaram o preço até hoje. Esta obrigação é solidária ou conjunta?

HIPÓTESE Nº 13

A sociedade Perfumes Europeus, SA, celebrou com Américo um contrato de agência para a venda dos seus produtos em Portugal. Américo fez um excelente trabalho, mas por diversas vezes foi além dos seus poderes, contratando em nome do principal e recebendo dinheiro dos clientes, o que nunca levantou problemas. Um dia, no entanto, recebeu € 1.000 de um cliente e gastou tudo num Casino, tendo entregue um cartão comercial da Perfumes Europeus, com o seu nome, como recibo. Agora a Perfumes Europeus recusa-se a entregar os perfumes, alegando nunca ter recebido o preço. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 14 João Agrião, agricultor, celebrou em 10/1/95 com Armindo um contrato de agência, sem representação, para a distribuição de produtos agrícolas na zona de Lisboa, com exclusividade. Em Fevereiro de 1996, Armindo nomeou Beltrão como sub-agente. Estavam Armindo, Beltrão e João a comemorar com as famílias, num regado jantar, os excelentes resultados do ano de 1996, quando o inesperado aconteceu – Armindo apaixonou-se pela mulher de João. A partir daí nada foi igual. Em Janeiro de 1997, João nomeou um concessionário para a venda dos mesmos produtos em Lisboa. Logo a seguir, em Fevereiro de 1997, Armindo recebeu de um conjunto de clientes o preço dos produtos vendidos, preparando-se para fugir com a mulher de João. Esta, quando já estava no aeroporto e numa cena digna de filme, arrependeu-se e deitou-se aos pés do marido pedindo perdão. João, tendo conhecimento dos factos, resolveu o contrato de agência e voltou à sua vida de sempre. (i) João violou a exclusividade de Armindo ao nomear um concessionário? (ii) os clientes que pagaram a Armindo ficaram liberados da sua obrigação

Page 5: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

perante João? (iii) Tem Armindo ou Beltrão direito a receber de João a “indemnização de clientela”?

HIPÓTESE Nº 15

João Balão, fabricante de balões, celebrou por escrito em 10/1/93 um contrato de agência com Adriano. Ficou previsto um prazo de 5 anos de duração do contrato, a exclusividade do agente na zona de Lisboa e a inexistência de poderes de representação. Em Março de 1997, por uma única vez, Adriano procedeu à cobrança de créditos junto de um cliente, nunca tendo entregue a quantia a João. Este, zangado com a situação, nomeou um concessionário para a mesma zona. Adriano protestou, alegando estar a seu violado o seu direito de exclusividade. As discussões continuaram durante o ano de 1998 e o contrato continuou a ser executado para além do dia 10/1/98. Em 30 de Fevereiro de 1998, para acabar de vez com a situação, João Balão denunciou o contrato de agência com cinco dias de pré-aviso. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 16 A Telecomunicações SA celebrou com B um acordo de concessão comercial com exclusividade para o território nacional. O acordo não foi reduzido a escrito, embora tenha sido acordado um prazo de 5 anos. Questão 1 – admita que a Telecomunicações, ao terceiro ano, celebrou um contrato de agência com B, também para o território nacional. Quid juris? Admita que a Telecomunicações denunciou o contrato ao terceiro ano. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 17

António celebrou com a McDonalds um contrato de franquia para a abertura do primeiro restaurante da marca em Portugal. O contrato tinha vigência por período indeterminado. Ao longo dos primeiros anos a relação de António com o Franqueado foi excelente. A pouco e pouco, com a abertura de mais lojas da marca na cidade de Lisboa, a relação foi-se deteriorando. Tinha o contrato já 5 anos de vigências e o Franqueados denunciou-o com seis meses de antecedência. Quais os direitos de António?

HIPÓTESE Nº 18 Armindo, lavrador de hábitos empedernidos, avisado dos perigos da tradicional prática de guardar os valores da casa por baixo do colchão, dirigiu-se ao Banco Agrícola, onde, após ter aberto uma conta, entregou para depósito: (i) a quantia de € 100.000 em notas devidamente marcadas); (ii) um cheque de € 50.000 emitido por Baco; (iii) uma moeda de € 500 comemorativa do EURO 2004; e (iv) uma jóia de família. Sempre desconfiado, voltou ao Banco dois dias e

Page 6: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

exigiu o levantamento dos bens entregues, onde, para seu espanto e terror, verificou que: (i) as notas que tinha entregue eram agora substituídas por notas diferentes que perfaziam a mesma quantia; (ii) o cheque tinha sido cobrado e o Banco já não o tinha em seu poder, pretendendo agora entregar o dinheiro a que o mesmo correspondia; (iii) a moeda de € 500 tinha-se transformado em cinco correntes notas de € 100; a jóia de família tinha sido vendida e o Banco pretendia entregar apenas o valor da venda. Armindo ficou muito - mas muito - zangado. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 19

Face ao incumprimento de Clotilde, a LeasingFin concedeu-lhe um prazo suplementar para cumprir as suas obrigações, após o que resolveu o contrato de leasing. Exige agora a restituição do bem, o pagamento das rendas vencidas, das rendas vincendas e o ainda pagamento de uma cláusula penal que visa compensar a sociedade de leasing da desvalorização do bem. As cláusulas contratuais gerais acordadas suportam esta pretensão Quid juris?

HIPÓTESE Nº 20

Armindo vendeu 1000 garrafas de vinho do Porto a um cliente Inglês. Na sequência, contratou com a sociedade TransPorTudo o transporte dessas mercadorias, tendo ficado acordada uma cláusula COD. A TransPorTudo procedeu ao transporte das mercadorias até França, tendo celebrado um contrato com a TransFrança para o resto do percurso. Quando os bens estavam a ser descarregados, já em Londres, partiram-se 100 garrafas; os empregados da TransFrança beberam outras 50 garrafas. Agora o cliente Inglês afirma não pagar enquanto não receber essas 150 garrafas em falta. Armindo quer responsabilizar a TransFrança, empresa com maior solidez financeira. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 21

Armindo dirigiu-se à SeguraTudo para celebrar contrato de seguro automóvel. Não declarou que o seu veículo tinha problemas de travões, facto que era do seu conhecimento, tendo antes declarado que o veículo estava em boas condições. Passados trinta dias, vendeu o automóvel a Berta, tendo o facto sido comunicado à SeguraTudo. 4 meses depois, Berta teve um grave acidente com o automóvel, que ficou destruído. A apólice nada refere sobre a validade territorial da cobertura de seguro. Berta ficou hospitalizada e apenas declarou o sinistro 45 dias depois. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 22

Page 7: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

O automóvel de António foi furtado por Baco. Este, embriagado, embateu contra 5 veículos num parque de estacionamento. António entende que não é responsável porque não era o condutor. A Seguradora entende que também não é responsável pela mesma razão. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 23

Armindo, Berto e Carlos constituíram uma sociedade por quotas com o capital social de € 30.000. Armindo e Berto realizaram imediatamente a sua entrada, enquanto que Carlos diferiu a sua entrada para quando a sociedade necessitasse dos fundos. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 24 Asdrúbal era titular de um direito ao arrendamento, pelo período de 10 anos, de uma fracção autónoma sita na Av. da Liberdade. Em Janeiro de 1999 decidiu constituir uma sociedade por quotas com Berto e Carlos – Armindo contribuía com o direito ao arrendamento; Berto contribuía com € 50.000, através de um cheque; Carlos contribuía com um ano de trabalho gratuito para a sociedade; o capital social ficava um terço para cada sócio. Uma vez que a sociedade não tinha grandes necessidades de fundos, ficou acordado que a entrada de Berto seria diferida em 60%, devendo ser realizada dois anos depois. Um revisor oficial de contas avaliou as contribuições de todos os sócios, considerando que as mesmas valiam, pelo menos, € 50.000 cada. Decorrido um ano, os sócios zangaram-se e põem em causa a licitude de todas as prestações. Berto e Carlos afirmam que Asdrúbal não podia contribuir com um direito (ainda para mais de carácter temporário). Asdrúbal e Carlos afirmam que Berto não podia ter diferido a sua entrada. Asdrúbal e Berto afirmam que Carlos não podia ter contribuído com os seus serviços. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 25

Em 15 de Janeiro de 2000 foi constituída a Santos, SA, sociedade que, nos termos do seu objecto social, se dedica à comercialização de figuras de santos e mártires, tendo por accionistas cinco padres da cidade de Lisboa. Estava acordado entre os accionistas que todos os lucros provenientes da actividade da sociedade seriam, uma vez recebidos pelos accionistas, doados a instituições de caridade. Em Março de 2000, os administradores da sociedade entenderam praticar dois actos distintos – o primeiro foi prestar uma fiança a uma dívida contraída pela Universidade Católica junto de uma instituição de crédito; o segundo foi adquirir uma cadeia de televisão. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 26

A sociedade Panificadora Ideal, Lda, tem como objecto social a “produção e comercialização de pão e bolos”. Um dia, achando que o negócio dos bolos era pouco lucrativo, a Panificadora

Page 8: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

iniciou um negócio de tecnologias de informação, adquirindo um site na INTERNET dedicado à compra e venda de roupas usadas. É este negócio válido face às regras de capacidade da sociedade?

HIPÓTESE Nº 27

Em 5/1/99, A, B e C celebraram a escritura de constituição da SOQUOTAS, Lda, tendo desde logo A e B sido designados como gerentes. No dia seguinte requererem a inscrição no registo comercial da constituição da sociedade a qual, no entanto, veio a ser recusada 2 meses depois, nunca tendo a sociedade sido registada. Durante esse período de dois meses, A e B celebraram diversos contratos na sua qualidade de gerentes com várias entidades. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 28 Abel estava muito triste porque Berta, o amor da sua vida, fugiu com um artista de circo. – Oh, que grande desgraça me aconteceu!, dizia ele todos os dias, num lamento sem fim. Passados uns meses conheceu Carla, uma atraente moçoila. – Que fazes tu na vida?, perguntou ele, ao que Carla respondeu, com o seu mais bonito sorriso, ao mesmo tempo que piscava os olhos – Nas horas vagas, sou contorcionista. Quando ouviu isto – isto dos amores recalcados é mesmo assim – apaixonou-se perdidamente. Só que Carla era uma espertalhaça e logo convenceu Abel a formar uma sociedade consigo e com mais 3 amigos comuns – Dário, Estela e Fernando. O capital social era de € 100.000, cada sócio subscrevia 20% do capital total (mas C, D, E e F só realizaram 30%) e a sociedade foi constituída sob a forma de SA, tendo por objecto a compra e venda de artigos circenses. Na data de constituição da sociedade, Carla disse – Meus Amigos, que fique claro: eu só entro na sociedade se todos votarem de acordo com as minhas instruções durante um ano. Todos disseram que sim, acenando com a cabeça e Abel beijou-a, encantado com a capacidade de liderança da moça. Mas a vida é mesmo assim e Abel nasceu para ser enganado – é que Carla e Dário mantinham um tórrido romance secreto. Um dia, Carla e Dário, que eram administradores da sociedade, tomaram um restaurante de trespasse, em nome da sociedade, a Guilherme, por € 50.000, desconhecendo os outros sócios o negócio. Só que os estatutos da sociedade dispunham que qualquer aquisição de valor superior a € 40.000 dependia de acordo da assembleia geral. Entrava Abel em casa, no fim de um dia de trabalho, quando encontrou Carla e Dário languidamente deitados no leito conjugal. Disse – Ai meu Deus, porque me castigas tanto? Mais disse – seus #?%&&$#!!, seus traidores, hão-de pagar por isto! Zangou-se e contou o sucedido aos outros sócios. Estes, tomando como suas as dores de Abel, convocaram uma assembleia geral e votaram contra a compra o negócio a Guilherme (que já estava executado); a deliberação foi aprovada com maioria de 60% (só C e D é que aprovaram a compra). (i) pronuncie-se sobre a regularidade das entradas para o capital da sociedade; (ii) pronuncie-se sobre a validade do trespasse; (iii) pronuncie-se sobre a validade da deliberação, do acordo de voto e sobre a possibilidade de, com base no incumprimento do mesmo, Carla

Page 9: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

impugnar a deliberação. Fique a saber que, depois de tudo isto acontecer, Abel encontrou quem o mereça e vive hoje com um cão.

HIPÓTESE Nº 29 Abel, aquando da revogação do seu contrato de trabalho com a XPTO, SA, acordou que durante um período de dois anos não exerceria qualquer actividade concorrente com a da sociedade. Por ter acordado este período de não concorrência recebeu a quantia de € 50.000. Passado menos de um ano Abel constituí uma sociedade por quotas com o seu irmão Bento, de que Abel é o único gerente, a qual celebra um contrato de prestação de serviços com a TTT, SA, grande concorrente da XPTO. Esta entende que o acordo de não concorrência foi violado. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 30 A, B e C procederam à constituição de uma sociedade por quotas. Na data da escritura pública, celebraram um contrato nos termos do qual A e B se obrigavam, nos cinco anos subsequentes, a votar nas assembleias-gerais sempre de acordo com as instruções dadas por C. Um dia A e B incumpriram o acordo e aprovaram uma proposta contra a vontade de C. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 31 A assembleia-geral da B, Lda, deliberou em 5/01/01 a realização de prestações suplementares em dinheiro pelos sócios da sociedade, nos termos do art. 210 do CSC, devendo essas prestações ser realizadas no prazo de 15 dias. A proposta foi aprovada por unanimidade. B não realizou as prestações no prazo estipulado. Alega agora, passados alguns meses, que a deliberação é nula, por violação do art. 211.1 do CSC. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 32 Um dia uma galinha de Armando bebeu um frasco de perfume e, para surpresa de todos, cresceu e cresceu. Quando já não cabia no galinheiro foi morta por Armando e a família deste provou a mais deliciosa carne de galinha que haviam saboreado. Armando percebeu que estava ali um bom negócio. Começou por vender galinhas perfumadas na aldeia e rapidamente expandiu o negócio. Contratou então Berta e Carlos como seus agentes para expandir o negócio nas grandes cidades. Berta e Carlos ficavam com o exclusivo para Lisboa e Porto, com a obrigação de promover a venda de, pelo menos, cem mil galinhas por ano, com a obrigação de cumprir regras estritas de publicidade. Berta e Carlos pagaram € 10.000 no momento da celebração do contrato e receberiam depois 5% das vendas. O contrato não foi reduzido a escrito. O primeiro ano de execução do contrato foi um sucesso – Berta e Carlos venderam 200.000 galinhas a partir de um escritório arrendado aberto na zona das Amoreiras com mais de

Page 10: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

100 trabalhadores. Logo Armando percebeu que podia ganhar mais dinheiro e contratou mais dois agentes para as mesmas cidades. Entretanto Berta e Carlos foram abordados pela multinacional Global Chicken que lhes propôs a compra do seu negócio contra o pagamento de € 1.000.000. O contrato de trespasse foi celebrado uma semana depois sem que Armindo fosse ouvido ou achado. Armindo resolve o contrato e logo o caos se instala, ficando os trabalhadores sem receber mais remunerações e pretendendo o senhorio da fracção arrendada intentar acção de despejo.

a) Armando viola as suas obrigações quando contrata outros agentes? b) O contrato de trespasse é válido? Qual é a sua natureza (civil ou comercial)? c) Quem tem a obrigação de pagar aos trabalhadores e qual a natureza – civil ou

comercial – dessa obrigação?

HIPÓTESE Nº 33

A e B celebram contrato de concessão comercial pelo período de três anos, renovável por iguais períodos a não ser que qualquer das partes se opusesse à sua renovação com a antecedência de 15 dias em relação ao termo do período em causa. Esta estipulação é válida?

HIPÓTESE Nº 34 A Petrogal, SA, é titular de uma plataforma petrolífera ao largo do Alentejo que, por estar desactivada, pretendia destruir e afundar. Esta era, note-se, a decisão economicamente acertada face aos enormes custos de manutenção da plataforma. A intenção, no entanto, provocou a ira das associações ambientalistas que iniciaram um movimento de boicote à Petrogal e aos seus postos de abastecimento. Face ao enorme sucesso do boicote, a Petrogal decidiu (i) cancelar o afundamento da plataforma e (ii) fazer uma grande doação a um grupo de associações ambientalistas, o que foi, aliás, largamente publicitado nos jornais. Um dos credores da sociedade intenta uma acção em Tribunal pedindo a declaração de nulidade de ambas as decisões por serem contrárias ao fim lucrativo da sociedade. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 35 André encomendou a Berto 5 toneladas de azeitonas. Ficou acordado entre as partes que André pagaria o preço acordado tão logo as mercadorias iniciassem o transporte. Berto contratou a sociedade Transportes Rápidos SA para fazer o transporte, tendo sido incluído na guia de transporte a cláusula FOB (free on board). Iniciou-se o transporte e André, como combinado, pagou logo o preço. Só que o transportador, por deficiente climatização do contentor, deixou as mercadorias deteriorarem-se e quando as azeitonas chegaram a André estavam já podres. André deve responsabilizar quem e em que termos?

Page 11: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

HIPÓTESE Nº 36

Abel depositou no Banco Bimbo € 10.000. O depósito foi feito com o prazo de um ano e com uma taxa de juro de 3,5% ao ano. Abel tinha, algum tempo antes, contraído um empréstimo para aquisição de habitação no mesmo Banco que, dois meses depois de ter feito o depósito, veio a incumprir. Face a tal incumprimento, o Banco Bimbo compensou os créditos. Abel afirma que essa compensação não é válida. Quid juris?

HIPÓTESE Nº 37 Abel, Bento, Carlos, Dário e Estela constituíram em Janeiro de 2003 a XPTO, SA, tendo cada um dos sócios subscrito e realizado 20% do capital social. Na data de constituição da sociedade celebraram um acordo parassocial em que se obrigaram conjuntamente a distribuir todos os anos o máximo de dividendos que fosse possível. Por esquecimento, nunca procederam à inscrição da sociedade no registo comercial. Em Fevereiro de 2004 reuniram-se na Assembleia-geral anual da sociedade e, apesar dos enormes lucros da sociedade, deliberaram por unanimidade não distribuir dividendos aos accionistas. Passados três meses, Abel zangou-se com os demais sócios e pretendeu vender a sua participação à própria sociedade. Os outros 4 sócios deliberaram em Assembleia-geral aprovar a compra das acções de A pela sociedade. Passado algum tempo, B também se zangou com os outros sócios; só que agora nem a sociedade nem ninguém pretende adquirir as suas acções. Avançou para Tribunal, afirmando que: (i) a assembleia que deliberou a não distribuição de dividendos é nula por violação do art. 294º do CSC e por incumprimento do acordo parassocial; e (ii) a deliberação de aquisição das acções de A é nula por violação do art. 317º do CSC. Os outros sócios defendem-se alegando, nomeadamente, que a sociedade não está sequer registada. Quid juris?

EXAME DE DIREITO COMERCIAL I

1. Armindo é agricultor e é casado com Berta. Em 1998, farto dos baixos preços de venda dos

seus produtos, decidiu iniciar um pequeno comércio para venda dos legumes por si produzidos. Para o efeito, tomou de arrendamento uma pequena loja, adquiriu o mobiliário necessário a Dário e a Dária e celebrou um “leasing” sobre um computador. A meio do projecto, faltou-lhe o dinheiro - a loja nunca chegou a abrir e Armindo não pagou nem o preço do mobiliário nem as rendas do “leasing”. Berta é responsável por essas dívidas?

2. Em 1999, a situação ia de mal a pior. Armindo decidiu então, em 2 de Janeiro, celebrar um contrato com a CompraTudo, SA, uma multinacional de distribuição de produtos agrícolas,

Page 12: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

para que esta, durante um ano, promovesse e venda dos legumes produzidos por Armindo. Armindo estava descontente porque, apesar de a CompraTudo estar a fazer um bom trabalho, os preços eram baixos. Em 5 de Fevereiro de 2000, Armindo procedeu à denúncia do contrato, com 15 dias de pré-aviso. Quais os direitos da CompraTudo?. Admita que, durante a vigência do contrato, a CompraTudo havia recebido de um cliente a quantia de 200 contos pela venda de produtos de Armindo, não estando para isso autorizada e não tendo Armindo, na altura, conhecimento desse facto. Tem Armindo o direito de exigir essa quantia, de novo, ao cliente?

3. Farta de tanto insucesso, Berta decidiu assumir as rédeas do negócio. O seu primeiro acto foi trespassar a loja que Armindo, sem sucesso, tinha tentado abrir. Fez um acordo com Dário e Dária, que também pretendiam vender produtos agrícolas, – estes perdoavam a dívida de Armindo e ainda pagavam 500 contos. Dário e Dária nunca pagaram os 500c. O trespasse é válido? A responsabilidade de Dário e Dária é solidária ou conjunta?

4. O segundo acto de Berta foi constituir uma sociedade para a produção e comercialização de produtos agrícolas. Em Março de 2000 foi celebrada a escritura de constituição da Sementes, SA, tendo por sócios Armindo, Berta e mais 3 agricultores da zona – Elisa, Fernando e Guilherme (cada sócio detinha 20% do capital). Logo na data de constituição da sociedade, as partes acordaram que, durante um ano, votariam sempre seguindo as instruções de Berta. Na passagem para o novo milénio, Armindo apaixonou-se por Elisa; Berta, furiosa, iniciou um projecto concorrente. Em Março de 2001, aquando da assembleia geral para distribuição de dividendos, Armindo, Elisa e Fernando votaram a não distribuição de dividendos; Berta e Guilherme votaram contra. Em Maio de 2001, Berta entra com uma acção em Tribunal alegando a irregularidade da deliberação da Assembleia Geral. Quid juris?

II

Responda a dois dos seguintes quatro casos práticos:

1. Em 5/5/01 a sociedade A, SA, foi declarada falida. Após essa declaração, os credores apuraram que: em 1998, os sócios da falida tinham constituído a B, Lda, que passou a prestar de serviços de agência à A junto dos mercados externos, tendo com retribuição 3 milhões de contos/ano; que em 1999 a falida tinha vendido ao pai de um dos sócios, por 5000 contos, três armazéns que haviam sido comprados por 50 000 contos; e que, com data da falência, foi fechada, com saldo negativo para a falida, a conta corrente celebrada com um dos seus compradores. Quid juris?

2. Em Setembro de 2000, a P, Lda, celebrou com a I, companhia de seguros, S.A., um contrato de seguro multirisco tendo por objecto toda a maquinaria da fábrica de P. O contrato tinha a duração de um ano, renovável. Em Abril de 2001, P vendeu parte da maquinaria segura à M, sua subsidiária. Em 3 de Maio, uma das máquinas vendidas à M

Page 13: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

explodiu devido a curto-circuito. Por não terem sido accionados os mecanismos de combate a incêndio, o fogo provocado pela explosão estendeu-se a toda a fábrica, destruindo o restante equipamento, também ele vendido pela P. A seguradora, tendo recebido a participação, recusa-se a pagar a indemnização, alegando o seguinte: a) a 3º prestação do prémio inicial não havia sido paga, conforme estipulado, em Março de 2001; b) a seguradora apurou que a máquina que explodiu era considerada pelos técnicos da especialidade como pouco fiável, facto não comunicado pela P; c) a M não era tomadora ou segurada no contrato; d) a M não evitou o alastramento do fogo pelo que a indemnização nunca poderá abranger as máquinas destruídas após a explosão. Quid Juris ?

3. António é sócio da sociedade TransporTir, Lda. Um dia, decidiu dar em penhor parte da sua quota e alienar a restante a Rita. Em face de implicações fiscais, António simulou o preço, que corresponde a metade do valor nominal da quota. Reunida a Assembleia Geral, foi recusada a alienação e o penhor atendendo a que Rita é divorciada de um dos outros sócios. Quid juris? Seria a resposta diferente caso se tratasse de uma S.A.?

4. António, empreiteiro, e Berta, engenheira civil, celebraram um contrato com o fim de concorrerem a uma empreitada lançada pela Câmara Municipal de Coimbra para a construção de uma ponte sobre o Rio Mondego. O objectivo seria instruir o processo de candidatura onde se exigia a assinatura de um engenheiro civil, embora fosse clara a intenção das partes em que apenas António assumisse a responsabilidade de construir a referida obra. A candidatura que se apresentou sob o nome de “A&B em consórcio” saiu vencedora. No entanto, António pretende que a expressão “em consórcio” não implica a celebração de um contrato de consórcio, mas sim de colaboração pelo qual António recorreria aos serviços de Berta no âmbito da instrução do processo, só ele pretendendo contratar com a Câmara Municipal de Coimbra e ficando livre de recorrer a terceiros para o trabalho de engenharia civil. Berta contrapõe que não era essa a intenção e que também ela deveria ser parte no contrato de construção e receber directamente da Câmara de Coimbra os montantes indicados relativos ao projecto de engenharia. Quid juris?

GRELHA DE CORRECÇÃO I

1. A eventual responsabilidade de Berta resultará da aplicação dos arts. 15º do CC e 1691.1.d) do Código Civil e a aplicação destas regras dependerá da qualificação de Armindo como comerciante e do regime de bens do casamento. A qualificação do contrato de leasing como acto de comércio por analogia, a qualificação do arrendamento

Page 14: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

como acto de comércio e a qualificação da compra e venda do mobiliário como acto não comercial (para Armindo), não levam a nenhuma conclusão útil, porque o art. 15º é uma regra de estatuto. Na qualificação de Armindo como comerciante – o cerne do problema em análise - levantam-se dois tipos de problemas: (i) o primeiro problema passa pelo facto de a loja nunca ter aberto; existe no entanto diversa doutrina (entre nós, por exemplo COUTINHO DE ABREU) que entende já derivar a qualificação de comerciante da realização dos actos preparatórios da empresa, o que seria o caso; (ii) o segundo problema resulta da compatibilização do parágrafo segundo do art. 230 CC e do art. 464.2 com o nº 2 do art. 230 e com o art. 13º - se Armindo pretendia apenas vender os legumes por si produzidos, daí não resultaria, à partida, a sua qualificação como comerciante, uma vez que a empresa não é comercial e os actos projectados não seriam actos de comércio objectivos (embora se possa discutir se a excepção das referidas regras se refere a vendas de produtos pelo produtor a comerciantes ou também à venda por este dos produtos numa estrutura comercialmente organizada como, no caso, a loja). Apenas assim não seria, se a loja fosse vender também produtos não vendidos por Armindo, sub-hipótese que também pode ser contemplada.

2. O contrato celebrado entre Armindo e a CompraTudo é um contrato de agência (vd. art. 1º do DL 178/96). Nada na hipótese leva a admitir estarmos perante uma concessão (e muito menos perante uma franquia); em todo o caso, aqueles que erraram na qualificação vão também ser conduzidos para o regime da agência, pelo que o resto da hipótese será avaliada normalmente. Suscitam-se dois problemas. (i) Problema da denúncia - O contrato foi celebrado a termo certo em 2 de Janeiro de 1999; quando passa um ano e o contrato continua a ser executado, aplica-se o art. 27.2; quando o contrato é denunciado já é um contrato por tempo indeterminado; face ao art. 28.4, entende-se que o contrato teve a duração de mais de um ano; por isso, o prazo de denúncia é o previsto no art. 28.1.b); os direitos da CompraTudo serão os previstos no art. 29º. Uma vez que se verifica ter existido um mal entendido de diversos alunos quanto à data de celebração do contrato (2 de Janeiro de 1999 e não 2 de Janeiro de 2000) e porque, efectivamente, o enunciado não é claro, devem ser admitidas as respostas que tomam o pressuposto de celebração do contrato em 2 de Janeiro de 2000. Nesse caso, não há lugar a denúncia porque o contrato é por tempo determinado, pelo que essa “denúncia” ou não produz efeitos ou pode ser interpretada como resolução, o que revela incumprimento por parte de Armindo, gerando responsabilidade obrigacional nos termos gerais. Além deste direito, a CompraTudo terá ainda direito à indemnização de clientela, se e na medida em que estejam reunidos os pressupostos do art. 33º. (ii) Problema do recebimento do crédito – uma vez que Armindo desconhecia o facto, parece que estamos no âmbito do art. 3.3, pelo que o cliente apenas ficará liberado se existir ratificação nos termos do art. 770º do Código Civil; poderá ser aberta a sub hipótese de aplicação do art. 23.2, se Armindo tiver contribuído para a confiança do terceiro (nada no entanto leva a entender ser o caso, até porque Armindo

Page 15: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

desconhecia o facto e apenas aconteceu uma vez, pelo que a aplicação do art. 23.2 apenas deve ser admitida como sub hipótese). A aplicação do art. 22º é um erro, porque não se está neste caso perante a celebração de negócios pelo agente, sem poderes de representação, e porque, face à regra do art. 3º, inexiste lacuna.

3. A validade do trespasse depende de três problemas. (i) A loja nunca abriu e, por isso, não tem clientela, pelo que se poderá questionar a existência de um estabelecimento comercial; é no entanto entendido geralmente entre nós que o elemento essencial do estabelecimento é o aviamento e que este poderá existir se a loja estiver pronta a operar, ainda que nunca tenha aberto ao público (podendo no entanto ser questionado se a unidade funcional do negócio já existia ou não, ponto em relação ao qual a hipótese não é clara). (ii) Este trespasse opera por dação em pagamento e não por compra e venda; este facto não obsta à qualificação do acto como trespasse, uma vez que este representa um negócio “plástico” que pode produzir os seus efeitos em função de uma multiplicidade de contratos base ou títulos (veja-se, por exemplo, o art. 116º RAU a confirmar a ideia da licitude da realização do trespasse por dação em pagamento). (iii) Para aqueles que tenham entendido, nomeadamente face ao art. 230º, que a loja não revela uma empresa comercial, poderá ser discutida a validade do trespasse, muito embora seja por muitos entendido que a noção de estabelecimento para efeitos de trespasse está para além da noção restrita de estabelecimento comercial. O outro problema – a responsabilidade solidária ou conjunto de Dário e Dária – depende da aplicação do art. 100º CC. Se Dário e Dária forem comerciantes, o artigo será sempre aplicável. Não o sendo, o artigo 100 aplicar-se-á na mesma, na medida em que o trespasse é um acto de comércio objectivo (regras do RAU são regras comerciais, pelo que o art. 2º do Código Comercial conduz à qualificação dos negócios aí previstos como actos de comércio objectivos). Por isso, a responsabilidade será sempre solidária, independentemente da qualificação de Dário e Dária como comerciantes.

4. O acordo entre os 5 accionistas qualifica-se como um acordo parassocial e é em princípio válido face ao art. 17 do CSC – apenas assim não seria se, sendo Berta administradora da sociedade, a obrigação de seguir instruções resultasse dessa sua qualidade (17.3). Quando o acordo é incumprido pelo sentido da votação de A, E e F é gerada responsabilidade obrigacional. Uma vez que o acordo não é oponível à sociedade (art. 17.1) nunca a deliberação poderia ser impugnada com base neste facto. No entanto, a deliberação viola o disposto no art. 294.1 do CSC, uma vez que é aprovada apenas por uma maioria de apenas 60%. Deve questionar-se se esse facto conduz a uma nulidade ou anulabilidade da deliberação e a justificação deste ponto corresponde à passagem mais importante da alínea. Tendo presente o círculo de interesses protegido pela norma, parece claro que se trata de uma anulabilidade (art. 58.1.a) do CSC), uma vez que estão em causa os interesses dos accionistas e, de entre estes, dos accionistas actuais. Nos termos do art. 59.1, Berta tem legitimidade para interpor a acção; no entanto, já decorreu o prazo de 30 dias previsto no art. 59.2. Poderá

Page 16: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

ainda ser discutido o problema da obrigação de não concorrência de Berta, embora esta só seja relevantes se Berta for administradora (art. 398.3 do CSC) e poderá também ser discutida a obrigação de não concorrência de Armindo e Berta face ao trespasse efectuado (embora não seja claro se a sociedade faz concorrência directa à loja).

II

1. Noção de falência e aplicação do CPEREF: artigo 128º e ss. do CPEREF. Efeitos da

falência: artigos 147º e ss. do CPEREF. Contrato de agência: distinção entre resolução e impugnação, artigos 156º e 157º; análise do artigo 158º/d; inaplicabilidade por ultrapassagem do período de suspeição. CV: análise do artigo 158/a (aplicação analógica; aplicação do artigo 158/d. Conta-corrente: noção de contrato de Conta Corrente: artigo 344º e ss. do CComercial; contraposição entre 153º do CPEREF e 344º e ss. CComercial: Possível aplicação analógica do artigo 162º/1 CPEREF. Efeitos da resolução/impugnação artigo 159º CPEREF.

2. Qualificação do contrato de seguro como seguro contra riscos, incluindo fogo; aplicação dos dois regimes artigo 432º e ss. e 442º e ss. do C. Com. Argumento a): aplicação dos artigos 6º a 8º do Decreto-Lei 142/2000: até ao decurso dos 30 dias contados da recepção do aviso de pagamento, a cobertura é eficaz. Argumento b): aplicação dos artigos 429º e 437/2 do C. Com através da extensão às situações em que o tomador devesse conhecer. Argumento c): aplicação do artigo 431º; ponderação das limitações doutrinais a este artigo; aplicação do artigo 446º. Argumento d) contraposição entre 437º/3 e 443º /1, aplicação deste como norma especial; análise da expressão «não criminoso»; aplicação do princípio da Boa Fé artigo 762º/2 do Ccivil.

3. SQ: Noção de quota artigo 219º CSC/ unidade e divisão 221º CSC; transmissão da quota artigo 228º a 230º CSC - necessidade de consentimento; ponderação da aplicação do 228º e ss à criação de ónus ou encargos. Desnecessidade de fundamento na recusa artigo 231º. Simulação de preço: 231º/2/d. SA: Regra da livre transmissibilidade 328º - necessidade de previsão expressa; necessidade de fundamentação da recusa 329º/1.

4. Objecto do Contrato de Consórcio. A hipótese refere que as partes pretendiam instruir uma proposta com vista a um concurso público para a construção de uma ponte. Ora se entendermos que o objecto é apenas o concurso, não poderá tratar-se de um consórcio ou será atípico. Devem referir-se as questões da tipicidade delimitativa e as suas implicações na resolução do caso. Natureza do contrato. A hipótese diz-nos que as partes se apresentam com “A&B em Consórcio”. Tal parece indiciar que se trata (i) de um consórcio, e ainda (ii) que tal consórcio seria externo. Aqui haverá que definir com clareza se o consórcio seria externo ou interno. Atente-se a que a hipótese refere que a Berta apenas entra no dito consórcio por ser engenheira civil, já que a “responsabilidade pela construção” seria do

Page 17: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

António. Daqui resulta que as partes apenas pretendem que seja António a contratar com a CM de Coimbra. Justificação da solução. A coerência na análise e tomada de posição nos pontos (a) e (b) resulta a solução. A mim parece-me que sendo um consórcio, a Berta tem razão em que o António não poderá subcontratar o projecto de engenharia a terceiros. No entanto, visando as partes apenas que António fosse o “responsável pela construção”, tal não dará o direito a Berta a ser parte no contrato com a CM de Coimbra. Este é, contudo, o ponto mais controverso uma vez que admite a resposta contrária, ou seja completamente favorável a Berta. A posição de António é de todo injustificável atendendo a que as partes se apresentam “em consórcio”.

EXAME DE DIREITO COMERCIAL 1. Mário Jardel, tendo decidido abandonar a carreira desportiva, entendeu constituir uma

sociedade de comercialização de caracóis com 4 outros jogadores de futebol. Os 4 sócios contribuíram para o capital da sociedade com terrenos localizados no centro da cidade e avaliados em € 20.000 cada. Jardel contribuiu para o capital com um crédito indemnizatório sobre o seu empresário, por alegados maus-tratos psicológicos, no montante de € 80.000. Todas as contribuições foram avaliadas por um Revisor Oficial de Contas. Os sócios celebraram a escritura pública e promoveram o respectivo registo comercial. Pouco tempo depois verificou-se que: (i) o PDM da zona em que se encontravam os terrenos proibiu construções, pelo que os terrenos não valiam mais que € 2.000 cada; (ii) um Tribunal entendeu que o alegado crédito de Jardel sobre o seu empresário não existia. A sociedade tem já vários credores que pretendem responsabilizar os sócios. Quid juris?

2. Jardel saiu triste desta situação, mas cedo se recompôs e pouco depois começou a transaccionar acções na bolsa de valores. Com os lucros que teve adquiriu, juntamente com três comerciantes de arte, 4 óleos de Dali a um jogador inveterado. Só que vida não está fácil e (i) os investimentos em bolsa começaram a correr mal e Jardel deve já € 50.000; (ii) Jardel e os comerciantes nunca se entenderam sobre a divisão dos quadros, razão pela qual nunca pagaram o respectivo preço. Pretende-se saber se Karen, com quem Jardel é casado em comunhão de adquiridos, tem algum tipo de responsabilidade por essas dívidas e se, no que aos quadros respeita, a dívida dos adquirentes é solidária ou conjunta.

3. A vida vai correndo cada vez pior a Jardel. Juntando as poucas poupanças que ainda lhe restavam, torna-se agente de uma marca de artigos desportivos – a ARDIDAS. O contrato foi celebrado oralmente, por cinco anos e com exclusividade no território de Portugal. Jardel inicia a sua actividade, mas ninguém lhe compra nada. Triste, torna-se preguiçoso; dorme e nada faz durante um ano. A ARDIDAS ameaça resolver o contrato. As dívidas acumulam-se. Jardel trespassa então o negócio a Berto. Quando toma conhecimento do

Page 18: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

facto, a ARDIDAS resolve o contrato. Jardel afirma que as dívidas se transmitiram. Karen, a mulher de Jardel, está preocupada com a situação. Quid juris?

4. Drama de vida. Tudo corre mal ao pobre homem. Jardel, depois de sem sucesso ter pedido várias vezes emprego ao Sporting, já não trabalha e vive do que lhe é dado pelos amigos. Um amigo, generoso, deu-lhe € 1.000. Jardel, feliz, foi logo ao Banco depositar o dinheiro. Quando o entregou ao Caixa, um assaltante roubou tudo, após o que roubou os cofres alugados do Banco, onde Jardel ainda tinha algumas jóias. Quid juris?

II

Responda a duas das seguintes questões: A. 3 Sócios de uma SA celebraram um acordo parassocial em que se obrigaram a votar

seguindo as intruções de Abel. Numa assembleia estava ser votada a destituição de Abel dos seus cargos de administração. Abel estava inibido de votar, mas instruiu os outros 3 sócios para se oporem à destituição e, por isso, Abel não foi destituído. Um sócio afirma que a deliberação é nula. Quid juris?

B. Abel contratou Berto para transportar um quadro de Lisboa para o Porto. Berto sub contratou Carlos. O quadro nunca chegou ao destino. Berto afirma que foi roubado e que não tem responsabilidade. Abel sabe que Carlos se embriagou no percurso e vendeu o quadro. Abel pretende responsabilizar Carlos pelo sucedido. Quid juris?

C. Abel encomendou um Ferrari a Berto. A pedido de Abel, o Banco Bola garantiu que pagaria o preço logo que esse pagamento fosse solicitado por Berto. Este, tendo recebido a garantia, enviou a Abel um Mini. Este diz que não paga o preço enquanto não receber o Ferrari. Berto vai ao Banco e exige o cumprimento da garantia. O Banco, tendo pago a Berto, exige a Abel o reembolso dos montantes desembolsados. Quid juris?

D. Em 5/5/02 a sociedade A, SA, foi declarada falida. Após essa declaração, os credores apuraram que: em 1999, os sócios da falida tinham constituído a B, Lda, que passou a prestar de serviços de agência à A, tendo como retribuição 3 milhões de Euros/ano; que em 1999 a falida tinha vendido ao pai de um dos sócios, por € 5000, três armazéns que haviam sido comprados por € 50 000; e que, com data da falência, foi fechada, com saldo negativo para a falida, a conta corrente celebrada com um dos seus compradores. Quid juris?

EXAME DE DIREITO COMERCIAL

Grelha de Correcção I

Page 19: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

1. As entradas dos cinco sócios representam contribuições em espécie (incluindo o crédito indemnizatório). A resposta aos problemas suscitados dependerá do tipo de sociedade que haja sido constituída, problema que a hipótese deixa propositadamente em aberto. Caso se trate de uma sociedade em nome colectivo (SNC), os sócios poderiam optar por uma de duas soluções – ou pela verificação das entradas por um ROC, nos termos do art. 28º CSC; ou pela assunção de responsabilidade solidária pelo valor atribuído aos bens, nos termos do art. 179º CSC. Parece ter sido a primeira hipótese a adoptada. Verificando-se um erro na avaliação das 5 entradas pelo ROC, aplica-se o art. 25.2 do CSC, de onde resulta a responsabilidade do sócio até ao valor nominal da sua participação. Caso ainda assim o património social seja insuficiente para satisfazer as dívidas da sociedade, resulta do art. 175.1 do CSC que os sócios serão responsáveis pelas mesmas (subsidiariamente em relação à sociedade e solidariamente entre si). Caso se trate de uma Sociedade por Quotas ou de uma Sociedade Anónima, apenas a via do art. 28º está disponível, aplicando-se também o art. 25.2, com idêntica responsabilidade do sócio até ao valor nominal da entrada. Caso o património social, ainda assim, seja insuficiente, não existirá responsabilidade adicional dos sócios (para a SQ, por força do art. 197.3, salvo a excepção do art. 198 e para a SA via art. 271). Em qualquer dos casos, verificada a não realização das entradas, os credores poderiam recorrer, directamente ou por analogia, ao disposto no art. 30.º.

2. Jardel apenas poderia ser qualificado como comerciante caso se entenda que a aquisição de acções se realiza de forma profissional (art. 13 e art. 463.5, ambos do Código Comercial), no que a hipótese não é clara. (i) os investimentos em bolsa representam actos de comércio objectivos por força do art. 463.5 do Código Comercial; serão, ou não, actos de comércio subjectivos dependendo da qualificação de Jardel como comerciante. (ii) a compra dos quadros não parece ser qualificada como acto de comércio objectivo para Jardel (a não ser que a compra fosse para revenda, o que não parece ser o caso) e será ou não acto de comércio subjectivo dependendo da qualificação de Jardel como comerciante (o que não parece ser o caso) e da possibilidade de do próprio acto resultar o contrário; para os comerciantes, a compra será, em princípio, acto de comércio subjectivo (comerciantes no exercício do seu comércio) e objectivo (compra para revenda). No que respeita a (i) e a (ii) a aplicação do art. 15º apenas será possível se Jardel for qualificado como comerciante, uma vez que se trata de uma regra de estatuto, não sendo relevante se se trata ou não de acto de comércio objectivo. No que respeita a (ii), caso se entenda que Jardel é comerciante ou que o acto é objectivamente comercial (o que não será de assumir em qualquer dos casos, sendo apenas relevante em sede de sub-hipótese), será aplicável o art. 100º; se se entender o contrário, deve ser discutido se pode existir uma relação de solidariedade imperfeita com o credor (dívida solidária perante os comerciantes mas conjunta perante Jardel).

3. Nos termos do art. 4º do DL 178/86, a concessão de exclusividade ao agente implica redução a documento escrito. A falta da forma, gera nulidade e redução do negócio, sendo

Page 20: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

o mesmo válido em tudo o mais. A reiterada falta de actividade de Jardel gera incumprimento das suas obrigações de meios, de onde resulta o direito do principal de resolver o contrato nos termos do art. 30.a). Em princípio, o trespasse do negócio não implica sem mais a transmissão da posição de agente, uma vez que esta depende do acordo do principal nos termos gerais (podendo, para justificar solução contrária, ser desenvolvida a ideia de analogia entre os contratos de distribuição e o arrendamento ou de inserção desta posição contratual nas situações jurídicas exploracionais). A ser assim, poderá ser posta em causa a qualificação do negócio transmissivo como trespasse, mas daqui apenas resulta: (i) a possibilidade de requalificação do negócio (transmissão de um conjunto de bens que não constituem uma unidade económica) e a anulação do negócio, caso se aceite existir um erro relevante; (ii) ou, a ser admitida a sub-hipótese de estar a ser transmitido um direito ao arrendamento, a possibilidade de resolução do contrato pelo senhorio. As dívidas não se transmitem por mero efeito do trespasse; caso de adopte o entendimento de OLIVEIRA ASCENSÃO, apenas as dívidas exploracionais se teriam transmitido. A preocupação da mulher de Jardel convoca o problema da qualificação do agente como comerciante – pelas regras gerais, parece que a qualificação não é possível (porque os efeitos comerciais se repercutem no principal, numa situação análoga à do mandatário comercial), mas o art. 230.3 do Código Comercial parece levar a conclusão distinta. Caso Jardel seja qualificado como comerciante, aplica-se o art. 15º do CC + 1691.º/1/d) do Código Civil.

4. O depósito de dinheiro representa um depósito de coisas fungíveis (depósito irregular), ao qual se aplicam, por força do art. 1206º do Código Civil, as regras do mútuo. Nos termos do art. 1144º, a propriedade sobre o dinheiro transmite-se para o Banco por efeito da sua entrega, sendo gerado um direito de crédito do depositante. O dinheiro roubado não é assim de Jardel, mas do Banco depositário que, evidentemente, fica devedor do depositante. O depósito em cofre gera o problema da natureza do negócio (depósito, locação ou contrato misto); em todo o caso, independentemente da resposta, existem deveres de custódia do Banco que, a serem incumpridos geram responsabilidade obrigacional. Por conseguinte, o Banco suportará risco de perda do dinheiro e Jardel e, estando reunidos os requisitos da eventual responsabilidade obrigacional do Banco (tendo presente, pelo menos em sub-hipótese, a possibilidade de o Banco ilidir a sua presunção de culpa), suportará o risco de perda das jóias.

II

A. Trata-se de acordo parassocial que aparenta ser válido. Face ao art. 17º do CSC os acordos sobre voto são indiscutivelmente válidos. O elemento subordinante do acordo é um accionista e não é o facto de ser simultaneamente administrador que gera a nulidade do acordo. Deve ser discutido se a inibição de voto de Abel se estende aos outros signatários do acordo, caso em que se gera uma invalidade da deliberação (voto abusivo)

Page 21: Hipoteses Praticas de Direito Comercial - Jorge Brito Pereira

A resposta parece ser afirmativa. Mas a ser assim, terá que se aceitar a eficácia do parassocial perante a própria sociedade (pois a invalidade resulta do cumprimento do parassocial), o que põe em causa os próprios fundamentos de concepção da figura.

B. Trata-se de um contrato de transporte e são gerados dois problemas. O primeiro é o da responsabilidade do transportador em caso de furto, que é resolvido pelos arts. 377 e 383º, ambos do Código Comercial. O segundo é o problema da responsabilização directa do sub transportador que, em princípio, não é admitida (a não ser que se parta do pressuposto da eficácia externa das obrigações geradas, numa análise similar àquela que, a propósito da sub-empreitada, é seguida por ROMANO MARTINEZ). Só que, como refere a pouca jurisprudência Portuguesa sobre o assunto, a responsabilidade do sub transportador será sempre possível quanto a imputação seja extra obrigacional, por via do art. 483º do Código Civil, o que parece ser o caso. Poderá discutir-se a natureza comercial do transporte: os dados da hipótese não permitem concluir que Berto seja titular de uma empresa.

C. Qualificação do compromisso assumido pelo Banco. Trata-se claramente de uma garantia bancária. Fora isso, poderá discutir-se a qualificação como (i) fiança bancária; (ii) garantia bancária (autónoma) on first demand ou (iii) garantia bancária (não autónoma) on first demand. A hipótese sugere que o Banco pagará ao primeiro pedido, embora não afaste a possibilidade de invocação de excepções resultantes da relação garantida, apontando para a solução referida em (ii). Embora a jurisprudência retire a autonomia à automaticidade (constitui, de facto, um forte indício nesse sentido), a doutrina aceita garantias (não autónomas) ao primeiro pedido, solução que determina a legitimidade passiva na acção de regresso (Berto em vez de Abel).

D. Noção de falência e aplicação do CPEREF: artigo 128º e ss. do CPEREF. Efeitos da falência: artigos 147º e ss. do CPEREF. Contrato de agência: extinção (art. 168.º); distinção entre resolução e impugnação, artigos 156º e 157º; análise do artigo 158º/d; inaplicabilidade por ultrapassagem do período de suspeição. CV: análise do artigo 158/a (aplicação analógica; aplicação do artigo 158/d. Conta-corrente: noção de contrato de Conta Corrente: artigo 344º e ss. do CComercial; contraposição entre 153º do CPEREF e 344º e ss. CComercial: Possível aplicação analógica do artigo 162º/1 CPEREF. Efeitos da resolução/impugnação artigo 159º CPEREF.