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I PARTE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: A CULTURA DA EXCLUSÃO EM PROCESSO Acácia Maria Costa Garcia, Universidade Estadual da Paraíba Este trabalho objetiva socializar os resultados de uma pesquisa sobre avaliação, realizada em séries iniciais do Ensino Fundamental, da rede pública de ensino da cidade de Campina Grande Paraíba-Pb, no período 2002-2003. Penetrou-se no cotidiano de três escolas, procurando analisar os significados atribuídos à avaliação da aprendizagem pelos segmentos escolares nela envolvidos, os processos avaliativos utilizados e a relação existente entre avaliação e dinâmica organizacional da escola. A investigação foi conduzida através de observações à prática escolar, dando-se particular relevo ao planejamento, e observações à sala de aula. A utilização de entrevistas realizadas com docentes, estudantes e equipes técnico-pedagógicas das escolas complementaram os instrumentos da pesquisa. Os dados coletados e sistematizados permitiram apreender a força do senso comum na avaliação praticada na escola e traços para a tendência tecnicista, que segmenta o trabalho escolar e exime a educação de um compromisso com a produção de identidades socialmente engajadas no contexto sócio- histórico. A escola, fechada nos limites do seu cotidiano, não se reconhece como organização de trabalho orientada por um princípio educativo e funcionando com um currículo disciplinar, homogeneiza o conhecimento através do livro didático e valida os resultados pedagógicos através de exames. Em decorrência, a avaliação continua mantendo a sua função de instrumento burocrático, reforçador de um processo de dupla exclusão: educacional, quando seleciona os estudantes pelos comportamentos e resultados das aprendizagens, e social, quando utiliza mecanismos de controle para formar consenso em torno dos resultados e induzir à conformação frente à repetência e abandono escolar, ambos potencializadores da exclusão social. UMA VELHA/NOVA DISCUSSÃO: A RELAÇÃO ESCOLA-COMUNIDADE Adir da Luz Almeida , UERJ O debate do significado e importância da participação popular junto às escolas públicas e a necessidade de canais para esta participação é retomado de maneira intensa anos 80/90, do século passado. No cenário acadêmico forte produção sobre políticas públicas consolida um campo de discussão chamado de “gestão democrática”. Porém, ainda é uma produção acadêmica de menos vulto a 1

História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

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Livro de Resumos do V Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação na Universidade de Évora

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I PARTE

AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: A CULTURA DA EXCLUSÃO EM PROCESSO

Acácia Maria Costa Garcia, Universidade Estadual da Paraíba

Este trabalho objetiva socializar os resultados de uma pesquisa sobre avaliação, realizada em séries iniciais do Ensino Fundamental, da rede pública de ensino da cidade de Campina Grande Paraíba-Pb, no período 2002-2003. Penetrou-se no cotidiano de três escolas, procurando analisar os significados atribuídos à avaliação da aprendizagem pelos segmentos escolares nela envolvidos, os processos avaliativos utilizados e a relação existente entre avaliação e dinâmica organizacional da escola. A investigação foi conduzida através de observações à prática escolar, dando-se particular relevo ao planejamento, e observações à sala de aula. A utilização de entrevistas realizadas com docentes, estudantes e equipes técnico-pedagógicas das escolas complementaram os instrumentos da pesquisa. Os dados coletados e sistematizados permitiram apreender a força do senso comum na avaliação praticada na escola e traços para a tendência tecnicista, que segmenta o trabalho escolar e exime a educação de um compromisso com a produção de identidades socialmente engajadas no contexto sócio-histórico. A escola, fechada nos limites do seu cotidiano, não se reconhece como organização de trabalho orientada por um princípio educativo e funcionando com um currículo disciplinar, homogeneiza o conhecimento através do livro didático e valida os resultados pedagógicos através de exames. Em decorrência, a avaliação continua mantendo a sua função de instrumento burocrático, reforçador de um processo de dupla exclusão: educacional, quando seleciona os estudantes pelos comportamentos e resultados das aprendizagens, e social, quando utiliza mecanismos de controle para formar consenso em torno dos resultados e induzir à conformação frente à repetência e abandono escolar, ambos potencializadores da exclusão social.

UMA VELHA/NOVA DISCUSSÃO: A RELAÇÃO ESCOLA-COMUNIDADE

Adir da Luz Almeida , UERJ

O debate do significado e importância da participação popular junto às escolas públicas e a necessidade de canais para esta participação é retomado de maneira intensa anos 80/90, do século passado. No cenário acadêmico forte produção sobre políticas públicas consolida um campo de discussão chamado de “gestão democrática”. Porém, ainda é uma produção acadêmica de menos vulto a que se dedica a pesquisar nas políticas públicas implementadas em diferentes períodos da história do país, o papel a ser desempenhado pela escola na relação com a comunidade. Nossa perspectiva de pesquisa vem buscando a relação existente entre as concepções que sustentam as discussões e ações dos anos 80/90 sobre escola-comunidade com o movimento escolanovista, reconhecendo no pensamento e ação de intelectuais a ele pertencente a gênese, no Brasil, dessa relação.

Os intelectuais escolanovistas consideravam a escola como “agência reconstrutora da sociedade”. Nessa visão o estreitamento da relação com a comunidade é importante estratégia do trabalho pedagógico. Trabalho de interação e participação através dos pais, onde “toda comunidade é convidada a colaborar na obra educativa (...) a educação assim compreendida é um dos meios naturais, talvez o mais seguro, de provocar mudanças, de criar uma sociedade próspera (...) a sociedade deve sofrer transformações”(1).Implementando políticas nesta direção destacamos Fernando Azevedo, Anísio Teixeira e Arthur Ramos.

Fernando Azevedo defendia a importância da relação “ESCOLA-COMUNIDADE”, onde a escola tivesse em sua organização interna “uma forma de vida e de trabalho em comum”, que possibilite ao aluno “a prática da vida social e coletiva, nas suas principais manifestações”.(2)Já na gestão Anísio Teixeira vamos encontrar o estímulo ao self-governmen, em algumas escolas do então Distrito Federal, “através do qual a gestão escolar era realizada pelos próprios alunos, organizados em conselho” e, também, a interação da escola com as famílias e comunidade, através da

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criação, por Arthur Ramos, do dispositivo institucional mediador entre a escola-comunidade conhecido como Círculo de Pais e Professores (CPPs), institucionalizado na época do Distrito Federal, através do Decreto 7718.(3)

Se em 1920/ 1930 os educadores escolanovistas viam na relação escola-comunidade uma ação importante para, através da educação, alavancar o país para a modernidade; posteriormente vemos esta relação transformar-se em civismo para sustentar a ditadura do Estado Novo; vemos a participação para conscientização nos anos 60; vemos nos anos 70/80 a relação escola-comunidade servir de aparato para vigiar e manter a população sobre controle; e tornar-se a base das propostas de gestão democrática a partir dos anos 80/90.Discutir se houve ou não efetiva superação do ideal presente nos anos 30 da escola ter como tarefa educar o povo nos parece relevante e oportuno.

DEWEY, John, em a Ilusão Fecunda (A luta por Educação nos Movimentos Populares, de Marília Sposito, SP, Ed. Hucitec, 1993, pág. 168. 2 AZEVEDO, Fernando de. Novos Caminhos e novos fins; a nova política da educação no Brasil. SP, Melhoramentos, 3. Ed., 1958, p.20. 3 NUNES, Clarice. Anísio Teixeira: A Poesia da Ação. SP, CDPAH-IFAN, Universidade de São Francisco, 2000.

HISTÓRICO DA PROPOSTA CURRICULAR DA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE SANTA CATARINA – BRASIL – 1988 A 2000

Aida Rotava Paim, Doutoranda da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP Nos anos 80, no Brasil o processo de abertura política do regime autoritário, constitui-se em um momento histórico de anseio à democracia. Na educação abre-se espaço para questionamentos quanto aos modelos pedagógicos vigentes que estavam de acordo com as políticas de governo voltado para o desenvolvimento técnico e de reprodução ideológica. Em Santa Catarina, dá-se um processo de redemocratização, com a participação da comunidade. No final dos anos 80, início dos anos 90, os professores da rede são chamados para elaborar uma Proposta Curricular, voltada aos interesses culturais e sociais do Estado, com o viés crítico, buscando a história dos vencidos e dos vencedores, procurando entender a relação entre ambos de forma dialética. A proposta procura fundamentar-se na concepção materialista histórica e dialética e na tendência pedagógica sócio-interacionista. O Estado possui linhas mestras de ação para educação onde propõe a escolarização para todos, socialização do conhecimento e instrumentalização para o mundo do trabalho, eficiência administrativa, promover a pesquisa e a extensão necessárias às exigências do processo de desenvolvimento, o que o caracteriza como um governo de princípios liberais. Neste contexto busco entender a construção desta Proposta Curricular como uma intenção de escolarização, enquanto prática cultural que se constitui parte do sistema das estruturas organizativas da sociedade, que trás no seu bojo o escolar, dotado de uma seleção de conhecimentos e de representações. Esta forma institucionalizada de se dar a escolarização, favorece a ação de proposta de controle da sociedade. Percebendo-a como prática cultural, além de propor uma lógica de produção e reprodução através planos e controle dos resultados, ela também interage com os sujeitos (professores) que interpretam tais planos e os transforma em prática, ou seja, em aula. A isto, chamo de significação de vivências, que com a relação com outros sujeitos fazem romper em alguns pontos o currículo como prescrição (Goodson, 1995) ou como prática idealizada (Reid,1978). Para entender a relação entre o currículo prescrito e sua implementação, busco na história social do currículo elementos para problematizar: Porque esta discussão surge em Santa Catarina? Quem são as pessoas que levaram para o Estado a idéia de construção de uma Proposta Curricular com os professores e deram sustentação? Que subsídios se têm para elaborar uma Proposta Curricular que tem o intuito de produzir conhecimento?

OS CÍRCULOS DE QUALIDADE EM EDUCAÇÃO

Aires Antunes Diniz, Escola Secundária Avelar Brotero

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O passado é muitas vezes esquecido quando se inova. Acontece com os círculos de qualidade em educação que funcionaram em Portugal de modo institucional na década de 80 do século XIX no arranque e consolidação do Ensino Primário Obrigatório. Assumiram a forma de Conferências Pedagógicas anuais em que se fazia a formação e actualização profissional dos professores num Círculo Escolar, uma área geográfica composta por diversos concelhos. Resultavam de uma legislação que mantinha e institucionalizava as tradições pedagógicas.O suporte legislativo era a lei de 2 de Maio de 1878, complementada pela de 11 de Julho de 1880, relativa às questões financeiras. Mais tarde, em 28 de Julho de 1881 é publicado um regulamento que integra e explicita esta legislação e a torna exequível.

A par da formação inicial dos professores do ensino elementar e complementar feita em escolas normais de 1º classe e em escolas normais de 2ª classe, há agora as Conferências Pedagógicas cujo “objecto será o aperfeiçoamento dos métodos, modos e processos de ensino; a organização material e disciplinar das escolas; a estatística e todos os assuntos que especial e directamente disserem respeito ao desenvolvimento da instrucção popular.” (art.º 236 do regulamento citado). Eram a uma forma económica e coordenada de partilha de saberes. Mostrarei agora três das suas expressões concretas: uma na Covilhã, no interior, outra no litoral, em Aveiro e uma outra no meio universitário de Coimbra, entre o litoral e o interior. Veremos aí o papel activo e empenhado dos professores e ainda a sua falta de ânimo, algo que os inspectores reforçam ou contrariam.

Veremos como os professores do Círculo da Covilhã, apesar do isolamento, aprofundam os seus conhecimentos, integrando-se bem nas grandes discussões pedagógicas. No círculo de Aveiro veremos um funcionamento quase sigiloso pois as actas pouco dizem. Mostram as culpas dos professores e numa primeira fase as de uma inspecção abúlica e incompetente. Só a vinda dum subinspector mais dinâmico ou a presença de um professor empenhado quebra em parte a situação. Neste processo, Coimbra mostra a sua pujança cultural nas discussões dos professores, onde os inspectores são intelectuais com profunda erudição pedagógica. É o caso de Francisco Augusto de Quintanilha. Há ainda muitos professores de excelente nível. Em 1888, quando, por falta de financiamento, as conferências acabaram na primeira sessão na Covilhã e em Aveiro nem sequer se iniciaram, os professores de Coimbra mostraram ao poder que, mesmo sem apoios, eram capazes de as continuar.

POMBALISMO, ANTI-JESUITISMO E EDUCAÇÃO REPUBLICANA

Aires Antunes Diniz, Escola Secundária Avelar Brotero

Na transição entre a Monarquia e a República, a lembrança da acção educativa do Marquês de Pombal jogou como factor ideológico.

De facto, este tinha mostrado que era possível dominar as forças retrógradas e incentivar o nosso progresso cultural e científico. Foi, dentro desta estratégia, que expulsou os jesuítas como elementos perniciosos ao desenvolvimento educacional do País. Também, numa estratégia de mudança do paradigma educativo e científico, o Marquês não só reformou a Universidade de Coimbra como extinguiu a de Évora que era dirigida pelos Jesuítas.

Com ele, o Ensino Primário ganhou um forte e determinante impulso do seu desenvolvimento. Mas, a morte de D. José arredou Pombal do poder e mergulhou o país no marasmo, prejudicando o seu projecto de criação de um sistema público de educação. Mais tarde, levou à nossa derrota sem luta perante o exército napoleónico e à fuga de D. Maria I e do Príncipe D. João para o Brasil.

Durante o século XIX, o liberalismo, o acto institucional de 1852, o ministério de D. António da Costa, bisneto do marquês de Pombal, a reforma do ensino primário de 1878 estruturaram e incentivaram a formação de uma classe docente numerosa. Esta espalhou-se pelo país e procurou afirmar-se como classe profissional coesa e competente. Neste processo de afirmação profissional, o Marquês de Pombal transformou-se primeiro num modelo

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político para o pensamento liberal, incorporando-se mais tarde no pensamento republicano como elemento fundamental de coesão e de inspiração. Também, a formação gradual do professorado primário e secundário sofreu a concorrência do ensino primário das ordens religiosas e dos professores do ensino particular. Os jesuítas integravam-se neste processo e criavam escolas em S. Fiel, Campolide e Barro. Também outras ordens, criavam escolas, entre as quais as Doroteias, que muitos consideravam as jesuítas de saias.

A luta pelo mercado do ensino transformou-se assim numa luta política contra a monarquia, que teve fortes implicações nas ordens religiosa, já que nunca deixaram de se associar ao poder como fonte de rendimento e de protecção política. Contudo, em 1900, os exames nacionais nos liceus, na sequência da Reforma Jaime Moniz, vieram demonstrar a superioridade do Ensino Público e tornar mais acesa esta luta política.

Foi isso que transformou a luta política dos professores portugueses numa luta dirigida contra os jesuítas, marcando–a com os matizes pombalinos e anti-jesuíticos que os jornais de Coimbra mostram muito claramente. É o que vamos analisar detalhadamente.

O CARIMBO DA HÓSTIA: IGREJA E SOCIEDADE CIVIL FACE À REFORMA DO ENSINO TÉCNICO DE 1948

Albérico Afonso Costa Alho, ESE Setúbal

A reforma do ensino técnico de 1948 é filha das mudanças que espreitam o Portugal do pós-guerra. Apesar do espartilho imposto à liberdade de expressão quase todos os sectores sociais vão tomar posição sobre os novos caminhos enunciados para o ensino profissional. Das associações patronais aos sectores oposicionistas ninguém vai ficar indiferente às novas propostas que emergem da reforma em curso.

Deste modo as elites patronais vão ter uma participação empenhada e activa, seguindo zelosamente o percurso da reforma desde a sua preparação e discussão até aos primeiros anos da sua implementação; por outro lado a oposição ao Estado Novo e particularmente a candidatura de Norton de Matos à Presidência da República vão ser extremamente críticos face ao novo modelo de ensino técnico que a reforma irá propor.

A Igreja Católica apesar de não ter tomado posição pública sobre as alterações curriculares vai ter um papel fundamental na recepção dos novos educativos no quadro das escolas técnicas. As manifestações de carácter religioso vão ter uma omnipresença nos diferentes momentos da acção educativa. A comparência solene dos dignitários da igreja nos principais actos da vida escolar, ilustram não só o peso, mas também a coabitação efectiva da Igreja Católica na sociedade, elucidando a forma como o regime operacionalizava estes valores religiosos, metamorfoseando-os em ideologia oficial, numa lógica de confessionalização do sistema educativo.

À Mocidade Portuguesa e à Mocidade Portuguesa Feminina vão ser igualmente adjudicadas pela reforma competências políticas e ideológicas.

Qual o conteúdo dessas competências e quase o peso real destas instituições no ensino técnico profissional?

Que condições e que espaço tiveram estas organizações, como “empresas” produtoras de ideologia e de enquadramento político da juventude, no Portugal do pós-guerra, neste específico território do ensino técnico?

Que tipo de entraves e obstáculos ou facilidades e incentivos encontraram estas estruturas, organicamente exteriores ao mundo educativo, para continuarem “normalmente” integradas neste ensino, que se pretendia tutelado por um espírito de tecnicidade modernizadora e por uma prática pedagógica de inovação?Estas serão algumas das questões que também pretendemos analisar nesta comunicação.

O ENSINO OBRIGATÓRIO E A IMPRENSA. O CASO DE SETÚBAL (1855-1926)

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Alberto Manuel Lopes, Faculdade de Psicologia e de Ciência de Educação de Lisboa

A instrução popular, onde se inclui a questão do ensino obrigatório, constituiu um dos temas mais discutidos pela imprensa setubalense. Segue-se um conjunto de reflexões que pretendem assumir-se como linhas orientadoras da investigação empreendida.A aplicação do princípio da obrigatoriedade escolar insere-se na estratégia do Estado a qual visava a erradicação do analfabetismo, dai a asserção «a imposição do ensino deve estar na razão directa da ignorância de um povo».

A discussão do modelo de ensino obrigatório oscila entre os que defendem que a «educação da mocidade deve ser toda baseada nos princípios do Cristianismo» ou numa escola que «proporciona uma educação livre das mentirosas teorias em que a educação religiosa mergulha a criança».

O estabelecimento de um ensino de cariz obrigatório, pressupõe o livre acesso à educação de todos, independentemente da sua condição social. No entanto, segundo a imprensa, vários factores impossibilitam a concretização de tal objectivo, entre os quais se destaca: a falta de escolas nos bairros mais desfavorecidos e a persistência de uma mentalidade que concebe a pobreza como uma «espécie de ferrete de ignomínia», donde resulta que «os homens pobres do Tróino antes querem privar seus filhos da instrução do que mandá-los descalços ou menos decentemente vestidos à aula.» 1

Por último, dadas as dificuldades reveladas pelo Estado na imposição do modelo escolar, emergiram um conjunto de iniciativas, originárias algumas da sociedade civil, que pretenderam colmatar as deficiências do modelo estatal. Insere-se neste contexto por exemplo a fundação das Escolas Liberais (1901), do Centro Setubalense de Instrução (1901) e da Sociedade Promotora de Educação Popular (1926).

Registe-se ainda que esta investigação tem como suporte documental a imprensa setubalense durante o período de 1855 a 1926 e insere-se no trabalho de mestrado que estou a realizar.

1in “Instrução Pública”, O Correio de Setúbal (1861)

A PEDAGOGIA DE MARIA MONTESSORI E A PSICOLOGIA DE CLAPARÈDE NOS LIVROS DIVULGADORES DO IDEÁRIO ESCOLANOVISTA NO BRASIL (1950-1970)

Alessandra Arce, USP/FFCLRP

O presente trabalho é fruto das análises e investigações que venho realizando dentro do projeto intitulado: “A Naturalização da Infância e a Pedagogia Centrada na Criança - uma análise do pensamento de Montessori e Claparède e de suas repercussões na difusão do ideário escolanovista no Brasil”. Este trabalho tem por objetivos: analisar nas obras de Montessori e Claparède suas concepções de homem, educação e sociedade, procurando contextualizá-las no universo sócio-histórico de sua época, apontando os reflexos desse universo nas obras desses educadores; realizar uma investigação, acerca das repercussões das idéias de Montessori e Claparède no pensamento pedagógico brasileiro das décadas de 50, 60 e 70, através da investigação dos livros produzidos pela Companhia Editora Nacional (livros de Cousinet, Foulquié, Bloch e Luzuriaga) para divulgação dos ideais do Movimento da Escola Nova no Brasil, bem como obras de grandes educadores brasileiros defensores deste movimento como Lourenço Filho. Imbuída do princípio de que o principal guia metodológico de uma pesquisa em educação deve ser o de compreender seu objeto, isto é, a educação, como indissociável da “profunda historicidade humana”, e considerando a educação como uma prática intencionada, uma forma de intervenção social que acaba por construir sujeitos humanos é que realizamos este trabalho de pesquisa teórico-bibliográfica acrescentando que a pesquisa realizada caracteriza-se como um estudo de caráter histórico e filosófico. Para tanto, o trabalho de análise destas obras não pode ser realizado sem o estudo das obras produzidas pelos autores e suas proposições para a educação, bem como sua filosofia. Ao cotejarmos os trabalhos dos autores com as referências encontradas à seus trabalhos nos manuais podemos em um primeiro momento afirmar que a obra destes autores possui um caráter especial e significativo no movimento escolanovista brasileiro. Ao se descrever a importância do trabalho de Montessori e Claparède para o movimento

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escolanovista, aponta-se estes autores como marcos na busca de uma educação que proporcione liberdade e autonomia para o educando. Entretanto, apesar de reconhecida a importância dos trabalhos destes autores, suas discussões espistemológicas bem como todo o construto para uma psicologia do desenvolvimento são pouco explorados. Aponta-se assim para um aligeiramento da teoria que se empobrece reduzindo-se a um conjunto de princípios metodológicos estéreis acabando por não desvelar a essência do pensamento educacional.

FORMANDO PROFESSORAS: A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES RELIGIOSAS NAS PROFESSORANDAS NA ESCOLA NORMAL LIVRE NOSSA SENHORA AUXILIADORA DE RIBEIRÃO PRETO/SP 1944 -1970.

Alessandra Cristina Furtado, Faculdade de Educação Universidade de São Paulo

O presente texto pretende analisar as identidades religiosas presentes na formação das professoras na Escola Normal Livre Nossa Senhora Auxiliadora de Ribeirão Preto/SP, no período de 1944 - 1970. Para tanto, examino as fontes documentais pertencentes ao arquivo dessa instituição tais como: o programa escolar, o regimento interno, os relatórios de inspeção federal, as biografias de Dom Bosco, Maria Domingas Mazzarello, Laura Vicunã, Domingos Sávio, o jornal "A Voz do Auxiliadora" entre outras. A escola em regime de internato e externato iniciou seu funcionamento com uma proposta pedagógica fundamentada no Sistema Preventivo de Dom Bosco.

Ao ancorar sua proposta pedagógica nesse sistema, a instituição "visava proporcionar às alunas uma formação integral e levá-las ao conhecimento de seus deveres para com Deus, com a Igreja e com a Pátria" (Regimento Interno, 1944-1970, p.1), entendendo que seu papel junto à juventude feminina não era somente instruir, mas, também educar, formar às normalistas integralmente. Ao examinar o quadro curricular verificou-se que essa formação voltava-se para disciplinas de caráter propedêutico e profissionalizante. No entanto, no programa de ensino da instituição a preparação moral, cívica e religiosa também era valorizada na formação docente e neste sentido, é importante ressaltar que no quadro curricular a Doutrina Católica não estava representada, pois os seus ensinamentos eram ministrados por meio de um curso extra-classe, em que as alunas faziam a leitura da Bíblia e dos livros de vidas santificadas de devoção salesiana tais como: as biografias de Dom Bosco, Maria Mazzarello, Laura Vicunã e Domingos Sávio.

A preocupação com a formação religiosa das normalistas não se circunscrevia apenas a essas atividades, porque nesse espaço escolar havia um conjunto de rituais religiosos que não estavam prescritos formalmente no programa de ensino, mas que se constituíam como subsídios nas práticas escolares da instituição. Neste sentido, os ensinamentos e as práticas do catolicismo, tinham o objetivo de modelar e padronizar formas de comportamentos em suas professorandas, inculcando-lhes os valores da Doutrina Católica, os modelos de virtude e de comportamento, que devem ser construídos e preservados na prática cotidiana das moças, modelando assim, a preparação de uma professora com um perfil católico e compartilhando da concepção de Dom Bosco a respeito da educação da juventude.

A CRIAÇÃO DA SEÇÃO PELOTENSE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO E O MOVIMENTO DE RENOVAÇÃO EDUCACIONAL NA REGIÃO SUL DO RIO GRANDE DO SUL

Aliana Anghinoni Cardoso; CEIHI-FEUFP

Esta comunicação faz parte de um estudo desenvolvido junto ao Centro de estudos e Investigações em História da educação, departamento da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas. Intitulado O movimento de Renovação Educacional e a Formação do Pensamento Pedagógico na Região Sul do Rio Grande do Sul, esse estudo tem como principal objetivo verificar a divulgação e a repercussão do movimento de renovação educacional na região sul do estado do Rio Grande do Sul.

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Para atingir tal objetivo, as principais cidades da região, Rio Grande, Bagé e Pelotas, serão investigadas em diferentes etapas, sendo a primeira fase, já em andamento, está sendo realizada no município de Pelotas.

O recurso metodológico utilizado para a realização desta pesquisa é a analise documental. O trabalho de levantamento de dados efetuado nesta etapa de investigação tem como principal fonte os exemplares do jornal “Diário Popular” que circularam na cidade de Pelotas no início da década de 1920. Os artigos e notas já encontradas nesse periódico, no período que compreende os anos de 1926 a 1930, referentes ao objetivo da pesquisa estão sendo categorizados e arquivados para posterior análise.

Dos dados já analisados, pode-se ter uma visão parcial da repercussão e disseminação das idéias do movimento de Educação Nova na nossa região, bem como as ações impulsionadas por esse movimento, dentre elas, e talvez a mais relevante, a criação da seção pelotense da Associação Brasileira de Educação, incentivada pelo departamento central com sede no Rio de Janeiro.

As ações da SBE pelotense no âmbito educacional da região sul do estado, pelos dados até agora coletados e analisados, constituem um esforço para equiparar o sistema educacional de Pelotas às mais modernas concepções pedagógicas da época, fazendo do município referencia nacional em educação.

“UMA CORRENTE POSITIVA”: UM CÓDIGO DE SOCIABILIDADE ESCOLAR/ ESCOLA NAVAL DO BRASIL, 1897/1898

Alice de Oliveira Viana, UDESC

Lucas Alexandre Boiteux, historiador catarinense, nasceu na cidade de Nova Trento(SC) em 1880, vindo a falecer no Rio de Janeiro em 1966. Seguiu carreira militar, veio a ingressar na Escola Naval(RJ) em 1897, na Marinha do Brasil, onde chegou até o posto de contra-almirante em 1951. Escreveu várias obras sobre a história de SC, além de temas navais, e pertenceu a diversas entidades culturais, dentre elas o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o de Santa Catarina. Foi articulista do Jornal do Comércio(1911 a 1959), no Rio de Janeiro, tendo publicado ali inúmeros artigos.

O acervo privado de Lucas Boiteux encontra-se no Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, local de estudo desta pesquisa. Sua obra compõe-se de vasto material, desde documentos manuscritos, datilografados, até recortes de jornal, especialmente os que se referem a SC.No entanto, é no seu texto manuscrito, através das “escritas ordinárias”( cartas, manifestos, pequenos avisos em código, comunicações aos colegas...) onde buscou-se compor o objeto de estudo. Com isso, procurou-se evidenciar o papel da escrita como um dos processos construtivos do ser, como firmadora de uma conduta, a da ordem e da disciplina, a da busca da honra e da dignidade. E por esta escrita é que é construída, nos homens de formação militar, um modo peculiar de comunicação, toda uma linguagem característica que é entendida como mediadora do jogo de relações que os homens estabelecem entre si.

No que tange às escritas de si, no acervo do historiador, há uma série de documentos sobre sua época de estudante na Escola Naval, dentre estes, a formação de uma sociedade secreta, a República do Cubatão. Formada por alunos das turmas de 1897 e 1898, possuía estatuto, constituição, atas e manifestos, além de um alfabeto secreto, composto por códigos e sinais. Através deste material, pretendeu-se dar visibilidade àquilo que anunciasse práticas cotidianas escolares entre o corpo discente, a mostrar como se organizavam fora do aparato institucional da escola. É a valorização de uma cultura escolar por trás do cenário da sala de aula, a buscar, por estas práticas e relações evidenciadas, assim como regras de comportamento e códigos de conduta, compreender como se formou o profissional militar do início da República, seus modos de subjetivação e processos diferenciados, através da educação escolarizada.

Também buscou-se problematizar as sensibilidades presentes em uma instituição militar escolar da época, como a visão romântica e heróica do servidor da nação, nítida no lema da sociedade “ O amor por base, a sinceridade por princípio, e a alegria por fim.” E nos manifestos ora aclamados “...alvos da imensa honra de dirigir os primeiros passos da Nação...”.

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Por fim, o trabalho também analisou a materialidade do suporte das escritas de si de Lucas Boiteux, o modo como ele se dá a ler. Seus escritos são de diversos materiais, desde cadernos pautados a folhas em branco timbradas; a escrever sempre em caneta tinteiro, a diferença de caligrafia é nítida entre o período que ingressou na escola e datas posteriores.

IMPRENSA REGIONAL E EDUCAÇÃO: ANÁLISE COMPARADA DE DOIS JORNAIS ESCOLARES DE INSTITUIÇÕES DE FORMAÇÃO

Alunos colaboradores do Projecto “Imprensa Regional e Educação”Escola Superior de Educação/Instituto Pol. de Portalegre. Alunos licenciados em Filosofia e a frequentar o Curso de Complemento de Formação Educacional da Universidade de Évora

As presentes comunicações são fruto da colaboração entre a Universidade de Évora e Escola Superior de Educação de Portalegre, a qual obedeceu às seguintes finalidades:Promover o envolvimento de duas instituições vizinhas no âmbito da História da Educação, a nível local e regional;Criar uma rede investigativa entre os respectivos professores e alunos de modo a favorecer a dinâmica escolar e a mobilidade de saberes;Potenciar investigações conjuntas que permitam explorar os fundos bibliográficos, os arquivos e o património (particularmente o de natureza educativa) da região em que as referidas instituições se inserem.

A imprensa regional foi o domínio de pesquisa seleccionado, quer pela riqueza de informação que pode fornecer, quer por não estar ainda suficientemente trabalhado, quer também por se tornar urgente a sua classificação e preservação. A fim de melhor cumprir as finalidades propostas, seleccionaram-se dois jornais regionais de natureza similar, respectivamente O Leme, órgão dos alunos da Escola do Magistério Primário de Évora, publicado entre os anos lectivos de 1952/1953 e 1957/1958, e Mais Além, periódico da Escola do Magistério Primário de Portalegre, que foi publicado entre 1960 e 1970. Estes dois jornais são dominados por preocupações educativas pragmáticas e inserem-se no contexto ideológico do Estado Novo, apresentando uma forte intencionalidade interventiva.

Os jornais foram analisados mediante uma grelha comum, elaborada para o efeito, de modo a garantir uma abordagem coordenada que assegurasse, em regime comparativo, a visibilidade de semelhanças e diferenças quer quanto à estrutura, quer em relação às temáticas e finalidades. Neste sentido, a investigação desenvolvida em conjunto combina o levantamento estrutural dos jornais com a análise temática e a apreciação contextual.

Embora a grelha de análise seja constituída por um leque mais vasto de categorias, privilegiaram-se dois eixos de pesquisa para esta comunicação: a concepção de professor que está presente nos artigos de docentes e alunos destas instituições de formação; e as informações sobre aspectos do quotidiano que marcaram a vida escolar e que transparecem nas páginas dos dois periódicos em análise. Pretende-se, assim, envolver os alunos das duas instituições que integram o projecto em actividades de iniciação à pesquisa, no âmbito de domínios temáticos que constituem também áreas formativas dessas mesmas instituições Simultaneamente, valorizam-se os seus contactos directos com fontes primárias de informação, que têm uma natureza específica (a imprensa escolar), promovendo-se desta forma uma consciência da historicidade que está subjacente a alguns dos temas que marcam o debate educativo actual.

Nota explicativa: Serão apresentadas duas comunicações sequenciadas. Uma dará conta da investigação sobre o periódico Mais Além; outra debruçar-se-á sobre o Leme.

CRIAÇÃO E AFIRMAÇÃO DO PRIMEIRO LICEU FEMININO EM PORTUGAL

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Amaro Carvalho da Silva, Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho

             De acordo com um ideário positivista, republicano, mação e feminista, a Câmara de Lisboa cria em 1884 a primeira escola secundária feminina designada Maria Pia. Apesar dos obstáculos financeiros, legislativos e de opinião pública, esta escola mantém-se por especial empenho dos mações Rosa Araújo, Presidente da Câmara, e Cunha Belém, director desta escola. Em 1906, 70 anos após os liceus masculinos, cria-se o primeiro liceu feminino. Com os valores e ideário do Estado Novo afirma-se o Liceu Feminino Maria Amália Vaz de Carvalho como um centro nacional de educação feminina.

DAS RUAS PARA A ESCOLA: ESTUDO SOBRE OS MANUAIS DE HISTÓRIA DO BRASIL PARA O ENSINO MÉDIO (1979-1988)

Américo Freire; CPDOC/FGV CAP/UFRJ

Dois eventos podem ser assinalados como fundadores do Estado Democrático brasileiro contemporâneo: a aprovação da lei da anistia – que permitiu ao país a volta dos exilados e marcou um novo momento nas relações entre o regime militar e a sociedade civil – e o processo constituinte que deu origem à Constituição de 1988 – a chamada Constituição cidadã – que pôs abaixo a legislação autoritária e definiu um nova base jurídico-política para a cidadania brasileira.

Durante essa travessia, foram promovidas em alguns dos principais estados e municípios do país, iniciativas no sentido de se estimular uma renovação nos programas e métodos para o ensino fundamental, que ficaram sob a responsabilidade de equipes técnicas constituídas por professores da rede pública. No caso do ensino de história, uma das preocupações centrais consistiu em romper com concepções tradicionais ou evolutivas da história, ao mesmo tempo em que propunham a adoção de metodologias que levassem em conta o desenvolvimento cognitivo dos alunos. Como expressão da importância desse impulso de mudança, registra-se um número expressivo de trabalhos acadêmicos voltados para o estudo dessas propostas renovadoras.

No caso do ensino médio, a história foi (e continua a ser) diferente. Espremido entre a escolarização obrigatória e uma universidade em expansão, o ensino médio terminou por ficar ao largo desse processo de renovação conduzida pelo poder público. Depois do malogro da política do regime militar em universalizar o ensino médio profissionalizante consubstanciada na lei 5692/71, o que se viu, em linhas gerais, foi o reforço de sua tradicional função propedêutica ao ensino superior. Diante dessa situação, manteve-se a tendência já conhecida: os conteúdos do ensino médio tomavam como referência fundamental os programas de vestibulares apresentados pelas universidades (ou por órgãos que organizavam os então chamados exames unificados).

Foi nesse contexto que começaram a ser publicados novos manuais de História do Brasil, elaborados principalmente por autores/ professores do ensino médio. Na pesquisa que venho realizando, examino a maneira pela qual estes novos manuais – sob o signo do marxismo – procuram reconstruir a história do Brasil em conexão com as rápidas mudanças que estavam sendo processadas na sociedade brasileira.

A CONSTRUÇÃO DA IMAGEM DA MULHER NO SISTEMA EDUCACIONAL SERGIPANO NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX

Amy A. F. Alves, Maria Helena Santana Cruz, Ana M. V. Melo; Universidade Federal de Sergipe

A pesquisa visa atualizar a discussão teórico-metodológica sobre os elementos histórico-educacionais (História da Educação), entendendo que avançar na leitura da história (e da história da educação) sob a perspectiva de gênero, exige efetivamente aceitar que essa categoria é, ao mesmo tempo, social (portanto histórica) e biológica. A Historiografia possibilita, de forma organizada,

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explicar e desvendar o processo educativo de uma época, os acontecimentos organizados na história, em busca de articulação entre a teoria e a realidade empírica, integradas por meio de um fio condutor que é o método, significando o próprio caminho do conhecimento. A metodologia utilizada é entendida como articulação entre conteúdos, pensamentos e existência, integrando-se os elementos universal e particular, geral e específico em suas formas próprias no movimento do real. A abordagem qualitativa efetivou-se através da pesquisa documental, que inclui uma parte de natureza teórica, e outra, histórica, e o uso do método histórico interpretativo; e a história oral, por meio do estudo de duas histórias de vida de educadoras sergipanas e pessoas que conviveram com elas, recuperando suas biografias, difundindo suas experiências na configuração das relações sociais em determinações específicas. Não foi fácil “captar” a mulher, com suas representações e mesmo o seu cotidiano, no discurso expressivo dos aspectos normativos ditados pela sociedade sergipana. As mulheres incluídas na abordagem realizada expressam a visão do mundo, os sentimentos de outrora, as trajetórias, experiências pessoais e profissionais, articuladas ao público/privado, produção/reprodução, aos mecanismos de formação de identidades diferenciadas de acordo com o gênero. Como jovens e como educadoras elas tiveram que enfrentar as grandes perguntas do seu tempo no confronto com suas experiências. Na verdade, a escola primária foi uma das primeiras portas a se abrir para a mulher, no mercado de trabalho. Inseridas no tempo e espaço geográfico da região nordestina, como filhas, as educadoras foram formadas em um ambiente em que o modelo de família patriarcal ainda estava presente com força considerável na sociedade sergipana. Nesse cenário, emergem idéias libertárias feministas, contendo concepções de igualdade e participação em diferentes espaços da esfera pública, provavelmente reflexo do movimento sufragista no Brasil ocorrido há aproximadamente 70 décadas. Tais mudanças continuam a ocorrer ao mesmo tempo nos mais variados locais, sempre em velocidade crescente.

PREZADO DIRETOR, RESPEITOSAS SAUDAÇÕES: CULTURA DOCENTE EM CARTAS DE PROFESSORAS PARA ANÍSIO TEIXEIRA (1931-1935)

Ana Chrystina Venancio Mignot, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Examinar a cultura docente durante a reforma educacional que Anísio Teixeira liderou, entre 1931 e 1935, quando esteve à frente da Diretoria Geral da Instrução Pública do Distrito Federal, tomando como fonte privilegiada de análise as cartas enviadas por professoras que estão no arquivo pessoal do educador, no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas, é o objetivo deste texto.

Elas fazem parte de um vasto conjunto documental composto de 34000 documentos manuscritos, 600 documentos impressos e 502 fotografias, 199 cartões postais e 4 discos nos documentos audiovisuais, microfilmados, dividido nas séries documentos pessoais, correspondência, produção intelectual, legislação, temática, diversos e recortes de jornais, e que tem permitido pesquisas que iluminam a trajetória pessoal e profissional do educador.

Cumprimentos, pedidos, agradecimentos, indicações, apresentações, envio de livros, solicitação de material e informações diversas, enviados por missivistas renomados ou anônimos, membros do governo, políticos, intelectuais, amigos, familiares e funcionários públicos, integram a correspondência passiva do educador. Os pedidos, por exemplo, não se restringem aos políticos. Motivaram familiares, amigos e conterrâneos. Os remetentes escrevem em defesa de seus próprios interesses mas, na maior parte das vezes, o fazem para interceder por familiares e amigos e, também, não se limitam a empregos e benefícios no âmbito da educação, evidenciando assim que o consideram com uma posição de destaque que credencia para conseguir favores até no gabinete presidencial. Os agradecimentos, por sua vez, se referem ao atendimento de pedidos de nomeação ou intermediação para cargos, empregos nas escolas públicas, envio de livros e material escolar, apoio dado à entidades profissionais e cartas de apresentação para finalidades diversas. Muitos deles são manuscritos em cartões e papéis com monogramas.

Pedir, agradecer, cumprimentar, sugerir, cobrar, reivindicar, são alguns dos motivos que levam os integrantes do magistério a escrever cartas para este intelectual no poder. Entendendo que tanto nos temas, como na cerimônia epistolar e nos suportes da escrita íntima, os que se dedicavam ao

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ofício de ensinar deixam pistas sobre como esta reforma foi interpretada, apropriada e re-significada, na medida em que inscrevem suas visões de mundo, crenças, valores, saberes e práticas, pretende-se contribuir para ampliar a compreensão sobre as repercussões da mesma.

PRESCREVENDO PRÁTICAS E SABERES: AS POLÍTICAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO ESTADO DE SÃO PAULO (1911-1930)

Ana Clara Bortoleto Nery, FFC/UNESP

Este trabalho tem por objetivo o estudo das políticas para a formação de professores pelas Escolas Normais no Estado de São Paulo entre 1911 e 1930. O ponto de partida deste empreendimento é o estudo dos impressos oficiais publicados pela Diretoria Geral da Instrução Pública - que passa a se chamar Diretoria Geral do Ensino a partir de 1931. Tais impressos são veículos de divulgação dos discursos oficiais sobre assuntos educacionais e especificamente também sobre a formação do professor primário no Estado de São Paulo. Os temas desses discursos são potencialmente férteis para a compreensão de quais práticas e saberes estão sendo privilegiados pelos governantes que se sucedem na Diretoria no período proposto. Além disso, nos permite conhecer novos aspectos da estruturação do campo educacional paulista no tocante à formação do professor primário. O período se justifica pelo impulso das construções das Escolas Normais no interior do Estado e pela regularidade dos periódicos educacionais oficiais publicados no intervalo. Os impressos analisados são os periódicos educacionais oficiais Revista de Ensino (1902-1919) Revista Escolar (1925-1927), Educação (1927-1930/1931-1932) e Escola Nova (1930-1931) e os documentos oficiais Mensagem Presidencial e Anuário do Ensino do Estado de São Paulo (1907-1930). O uso dos impressos como fonte dos estudos em educação é problematizado por Marta Carvalho em seu artigo “Por uma História Cultural dos Saberes Pedagógicos”. Ao atentar para as transformações que “reconfiguram” a História da Educação tendo por eixo a História Cultural, especialmente baseada nos escritos de Chartier e Certeau, a autora traça considerações em torno dessas transformações que passam a “abolir a rígida demarcação das fronteiras” entre a história das instituições escolares e a história das idéias pedagógicas. O uso dos impressos como fonte dos estudos sobre a História Cultural das práticas educativas tem duplo sentido: “como dispositivo de normatização pedagógica, mas também como suporte material das práticas escolares”. A importância do uso dos impressos e dá pela materialidade dos processos de produção, circulação, imposição e apropriação dos saberes pedagógicos. Tais considerações contribuem para a pertinência e importância deste estudo uma vez que ele é parte de um trabalho que se preocupa em analisar a circulação de práticas e saberes nas Escolas Normais do Brasil e de Portugal, entre 1911-1950. Além disso, estudar aspectos da estruturação do campo educacional requer entendimento sobre o que se entende por "campo" e como se dão as disputas pela legitimidade no interior do campo. Para tanto o referencial utilizado baseia-se nos estudos de Pierre Bourdieu sobre a constituição dos campos. Dessa forma, o objetivo central deste estudo é propor subsídios para o estudo de aspectos da estruturação do campo educacional através da análise dos impressos produzidos pela Diretoria Geral da Instrução Pública do estado de São Paulo, os quais prescrevem práticas e saberes que deveriam ser empregadas pelos docentes das escolas públicas, entre os anos de 1911 e 1930 – num período intermediário marcado por uma aparente disputa pelo monopólio do conhecimento pedagógico.

REFORMA CURRICULAR NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM SANTA CATARINA/ BRASIL (1930-1940): A EXPRESSÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA ESTATAL

Ana Claudia da Silva, Leziany Silveira Daniel - CED/ UFSC e Maria das Dores Daros, Universidade Federal de Santa Catarina

A formação de professores no Estado de Santa Catarina, como também no restante do Brasil, nos anos de 1930 e 1940, tornou-se temática recorrente, constituindo-se em campo estratégico para a implementação de um novo ideal de educação. Elevar a formação do professor e muni-lo de

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instrumentos cada vez mais científicos e racionais para exercer sua prática tornou-se preocupação central das políticas públicas gestadas neste período. Nos anos de 1935 e 1939 o Estado de Santa Catarina realizou reformas no seu sistema de ensino, modificando a estrutura dos cursos de formação de seus professores. Criou-se, em especial, a Escola Normal Superior Vocacional, expressão de uma tentativa de elevar a formação de professores para um nível pós-médio,bem como de introdução de disciplinas de cunho científico, as chamadas “Ciências Fontes da Educação”. Posteriormente, no ano de 1939, o modelo de formação de professores sofreu nova reforma, originando o Curso Normal de 2 anos. Nas duas reformas realizadas, houve reestruturação dos currículos, com a introdução de disciplinas como a Sociologia, a Psicologia e a Biologia, que encontraram espaço central na carga-horária desses cursos. A análise dos programas e carga-horárias dessas disciplinas expressam o próprio direcionamento dado pelo Estado à formação docente de seus professores. Privilegiar a análise do currículo pressupõe um entendimento, segundo Petitat (1994), de que este não é somente reflexo da realidade social, mas é também responsável pela constituição de identidades e subjetividades, ligado aos conceitos de ideologia, poder e cultura. A análise do currículo possibilita ainda, o estudo da política de formação docente, que fazendo parte da política educacional, integra diretriz maior dada pelo projeto do regime, neste caso um regime autoritário (GOMES:1999) que se consolida no Estado Novo brasileiro (1937-1945). Um dos traços das políticas do regime político do período é o nacionalismo, presente inclusive na Constituição de 1937 (SOLA:2001), que em Santa Catarina ganha contornos específicos com a preocupação com os imigrantes italianos e alemães, que necessitam ser assimilados pelo processo de escolarização. Daí a preocupação com a formação de professores consolidada nas reformas curriculares do período.

O DEBATE PEDAGÓGICO NA REVOLUÇÃO FRANCESA: E AS REPERCUSSÕES NA EDUCAÇÃO DE SURDOS

Ana Dorziat e Niédja Maria Ferreira de Lima, PPGE/UFPB

O século XVIII foi palco de grandes revoluções, dentre elas a Revolução Francesa de 1789 que , sob o comando da burguesia, provocou enormes transformações nos contextos político, sócio - econômico, religioso, tecnológico e educacional na civilização ocidental. Foi a única revolução social de massa e a mais radical de qualquer levante comparável (Hobsbawn, 2002). Nesse cenário, os debates em torno de uma pedagogia política ocupa o primeiro plano, sendo apresentados vários projetos pedagógicos que invocam e evocam o pensamento Iluminista, como fonte inspiradora, e reivindicam uma escola única, laica, obrigatória, gratuita, universalizada, sob o encargo do Estado, enfim uma escola democrática para o “homem novo”,como instrumento prestigiado para capacitar as novas gerações, com vistas às transformações dos valores, crenças, tradições e utopias. Para tanto, as conquistas das ciências e unificação lingüística foram intensificadas ( Boto, 1996).

Esse pensamento pedadógico teve repercussões também no âmbito da educação de surdos,que, até então não tinham o direito à escolarização; por não possuírem a linguagem estruturada, o que era privilégio apenas dos que pertenciam à nobreza. É na efervecência do movimento revolucionário francês que surge a possibilidade de uma intervenção educativa para maior parcela dos surdos, sob a responsabilidade do abade L’Epee que funda, em Paris, a primeira instituição pública para surdos do mundo, utilizando a linguagem gestual. Esse momento costuma ser considerado a “época áurea” do movimento surdo francês (Sánchez, 1990).

No século XIX, com o novo quadro político-científico,mudanças foram implementadas, tendo como marco o Congresso Internacional para a Educação do Surdo, realizado em Milão, em 1880, quando é recomendada a substituição da linguagem gestual pelo método oralista, que passa a ser hegemônico.A educação de surdos assume, assim, de uma vez por todas a concepção Iluminista homogeneizadora e normalizadora.Considerando, assim, a importância da aproximação das discussões que envolvem a educação de surdos com às questões educativas gerais, nos propomos a refletir sobre as repercussões do debate pedagógico da Revolução Francesa no nesse contexto educacional: seus avanços e conseqüências para a comunidade surda.

Revisitarmos esse momento da história moderna, constitui-se numa oportunidade de buscarmos compreender o significado dessa “época de ouro” na educação dos surdos, bem como

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desvelar os desdobramentos da unificação da língua oral : o porquê do domínio de práticas “ouvintistas” nos processos educativos; do silenciamento e exclusão da própria comunidade surda das questões que lhes eram, peculiares: identidade, língua e cultura.

HIGIENE FÍSICA E MENTAL E O GOVERNO DA FAMÍLIA E DA INFÂNCIA

Ana Laura Godinho Lima, Flávia Sílvia Rodrigues, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo

Esta comunicação constitui um desdobramento das pesquisas intituladas “Saberes e Recomendações para a Educação da ‘Criança Problema’: um estudo da literatura educacional e da legislação nas décadas de 1930 a 1960” (Godinho-Lima, projeto de doutorado, 2000) e “Dimensões educativas das normas e saberes acerca das crianças ‘em risco’ no estado de São Paulo - a literatura especializada e a legislação entre 1890 e 1930” (Rodrigues, projeto de mestrado, 2002). Estas investigações inserem-se, por sua vez, no âmbito do projeto luso-brasileiro “Estudos Comparativos sobre a escola: Brasil e Portugal (séculos XIX e XX)” (CAPES-ICCTI, 2000) para o programa de pesquisas do grupo PRESTIGE, em seu ramo português, que busca elaborar uma “análise histórica comparada da ‘escola de massas’ nos países lusófonos e europeus (1880-1960)” (Nóvoa, 1998, p. 10) .

Desde o final do século XIX, no Brasil os “homens de sciencia” passam a ter grande importância na implementação de projetos urbanos de cunho eugênico, com os quais se pretendia eliminar a doença, conforme Lília Schwarcz (2002), “separar a loucura e a pobreza” (p.34). Assim, por volta de 1870, estes homens se auto-representavam como fundamentais para as soluções e os destinos do país. As propostas de disciplinamento da infância e da família tinham em vista a formação da consciência sanitária, Marta Carvalho (2001) propõe a metáfora da disciplina como ortopedia de práticas discursivas e institucionais que se estenderam até a década de 1920. Em 1927, a primeira turma de educadoras sanitárias conclui o seu curso no Instituto de Higiene de São Paulo, as novas missionárias, segundo Helena Rocha (2003), atuariam no tripé saúde, instrução e moral.

Ainda nos vinte, torna-se expressiva a atuação dos profissionais da higiene mental. Em 1923, o psiquiatra Gustavo Riedel cria a Liga Brasileira de Higiene Mental, inicialmente com o propósito de melhorar a assistência aos doentes mentais. No entanto, para os integrantes da Liga, sua atuação deveria ir além de simplesmente tratar os doentes. Sua função mais nobre seria a de impedir o aparecimento da doença. A partir daí, um número cada vez maior de psiquiatras se definiria como higienista e a Liga teria seus objetivos ampliados, passando a ambicionar a prevenção, a eugenia e a educação dos indivíduos. Esperava-se assim poder contribuir para a regeneração da sociedade brasileira.

MEMÓRIA ESCOLAR NOS DOCENTES DO ENSINO PRIMÁRIO DO ESTADO NOVO. A RECORDAÇÃO E A PRÁTICA ESCOLAR

Ana Luísa Paz, U. Nova de Lisboa - FCSM

No âmbito da dissertação de Mestrado que temos vindo a realizar, intitulada “Identidade, Escola e Mudança na Segunda Metade do Século XX em Portugal: textos e actores”, temo-nos vindo a confrontar com o problema da construção da memória da história da educação.

Nomeadamente, no que diz respeito às fontes orais, que temos vindo a observar mais de perto para as décadas de cinquenta e sessenta do século XX, as disparidades, incongruências ou afirmações dificilmente sustentadas pelas fontes escritas são constantes. Longe de essas disparidades entre testemunhos orais de professores/as e regentes constituírem um factor a menosprezar, tornam-se, pelo contrário, num factor a ter em atenção.

Assim, por exemplo, quando se perguntou individualmente a duas professoras e a duas regentes que iniciaram as suas respectivas carreiras docentes no início da década de cinquenta se o Hino Nacional era cantado todos os dias, apenas uma respondeu que sim e “de pé”, apesar das

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restantes docentes terem garantido que seria manifestamente impossível faze-lo. Sucede que, precisamente esta professora, leccionara apenas durante três anos, tendo voltado ao ensino apenas na década de setenta, por razões de ordem familiar. Colocamos, por isso, a hipótese, de que a representação que fez da sua prática escolar inicial se tivesse moldado mais à representação social que se faz dessa década, do que da sua própria experiência.

É notório o peso que a suposta qualidade e rigor de ensino do Estado Novo tem para a memória destes docentes. São recordados com saudade os tempos do “livro único”, da obediência, dos currículos extensos e, não raramente, do patriotismo e do catolicismo, apesar de se entrar usualmente em contradição. Por exemplo, no que diz respeito à História de Portugal, são recordados os tempos em que os alunos sabiam tudo sobre esta disciplina, mesmo que decorando forçosamente, lamentando, ao mesmo tempo, que actualmente impere tanta ignorância neste campo. Mas estas mesmas testemunhas, acabam por declarar também que os livros de História de Portugal, segundo vieram a constatar mais tarde, estavam pejados de erros historiográficos e que o método pedagógico do ensino desta mesma História de Portugal fora, na verdade, valorizado a partir dos anos oitenta.

Assim, há a ter em conta não apenas a atitude que um indivíduo interrogado tem usualmente face ao/à investigador/a, mas que os próprios actores da educação parecem a repensar a sua memória escolar, enquadrando-a quer através da sua história pessoal, quer através da memória colectiva estereotipada, mesmo que difira da sua experiência docente.

RECEITAS DE CIVILIZAÇÃO: A ALIANÇA MÉDICO-MULHER E A EDUCAÇÃO DA FAMÍLIA BRASILEIRA NA 1A. REPÚBLICA

Ana Maria Bandeira de Mello Magaldi,UERJ / PUC

O trabalho apresentado tem como objetivo refletir sobre estratégias de governo da família encaminhadas na sociedade brasileira das primeiras décadas do século XX, no bojo de um projeto coordenado pelo campo médico, que vinha conhecendo uma progressiva afirmação social. Nossa intenção é a de pôr um foco em ações pedagógicas que elegem a mulher como um alvo privilegiado, constituindo-a como mediadora por excelência entre o poder médico e a instituição familiar e, em especial, entre aquele e a criança, figura em torno da qual erigiam-se expectativas de construção de um país “novo” e “civilizado”.

Em um quadro de importantes transformações, em que adquirem destaque a superação da ordem escravista e a instauração do regime republicano, observa-se a expressão de inquietações nos discursos de intelectuais da época, sinalizando para a necessidade de ajustes na conformação da sociedade. Convergindo no diagnóstico da inexistência de uma nação brasileira organizada e na compreensão da urgência de sua construção em “bases modernas”, segundo referenciais científicos, os médicos, ao lado de intelectuais de outras áreas, assumiam-se como os agentes responsáveis pela nova ordenação social, a que se atribuía um sentido de “regeneração”.

No projeto médico, a educação aparece como o caminho privilegiado por meio do qual se atingiriam os objetivos desejados de “saúde” e “civilização” da sociedade. Entre as múltiplas ações orientadas nessa direção, inscreveram-se variadas estratégias pedagógicas destinadas a mulheres, de modo que, como esposas e mães, concorressem para a educação de suas famílias e, em especial, contribuíssem para a modelação das condutas dos “futuros cidadãos da pátria”.

Se é visível o investimento realizado pelos médicos no estabelecimento de uma aliança com as mulheres, constituindo-as como mensageiras de seu receituário científico, deve-se atentar para as distinções expressivas observadas entre as ações dirigidas a mulheres pertencentes aos segmentos dominantes e aquelas destinadas a mulheres dos segmentos populares, tanto em termos de intenções, como de formas de transmissão das lições. Nessa rede estabelecida, não sem tensões, significativa foi a participação de mulheres das elites, também para além de suas casas, em ações modeladoras dirigidas a famílias e à infância pobre, sendo as mesmas coordenadas por médicos, como Moncorvo Filho, em instituições como o Instituto de Proteção e Assistência à Infância (IPAI).

A constituição desse vínculo pode ser percebido, por exemplo, pela análise de manuais femininos da famosa escritora brasileira, Júlia Lopes de Almeida, editados na virada do século XIX para o XX. Em suas lições, a autora, que integrou obras de assistência, como o Patronato de Menores

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no Rio de Janeiro, orientava as leitoras a se envolverem em ações que minimizassem a “miséria dos outros”. Demonstrando sintonia com o projeto médico que, produzindo deslocamentos na noção religiosa de caridade, apoiava-se na concepção de “filantropia científica”, a autora-educadora estimulava, assim, o exercício do que compreendia como uma das “missões femininas mais belas”.

MUSEU DA ESCOLA E PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

Ana Maria Casasanta Peixoto, PUC

O Museu é um dos espaços de representação do mundo, dos seres, das coisas e suas relações. O que o distingue de outros espaços com esta finalidade, como a ciência, a arte, a religião, etc, é seu papel de guardião da memória. Isto faz com que se constituam em refúgios do “eu” ameaçado pelo ritmo frenético do mundo atual, convertendo-se em reduto onde vivências sociais se encontram, se chocam, legitimando o heterogêneo, o híbrido e até mesmo o irreconciliável. Assim sendo, um museu não se faz apenas pelo reconhecimento e guarda de documentos, por mais expressivos que estes possam ser. Vai além, devendo constituir-se num espaço de dinamização e realização cultural, de produção de conhecimento. Nesta perspectiva, um dos objetivos do Museu da Escola de Minas Gerais, Brasil, é dar suporte a estudos e pesquisas que possam contribuir para o entendimento de nossas questões educacionais. Um dos aspectos que conferem identidade aos museus é a sua linguagem, construída, geralmente, a partir de elementos pertencentes ao denominado universo iconográfico. Embora este universo seja amplo, envolvendo inúmeros tipos de imagens e grande quantidade de técnicas usadas em sua produção , na maioria das vezes ela é utilizada para designar pinturas, desenhos, imagens gravadas por meio de variadas técnicas fotográficas. É também utilizada para expressar imagens de memória, de que nos valemos no cotidiano, muitas vezes sem perceber e que nem sempre têm uma representação plástica e invariável- imagens de dor, fé, felicidade, etc. Nesta comunicação, a palavra imagem será empregada no sentido mais amplo, uma vez que os objetos, ao serem integrados num acervo perdem seu valor de uso e adquirem valor simbólico.

O Museu é, por excelência, um lugar de memória. Com um discurso argumentativo e teatralizado e, por isso mesmo, com recursos de sedução maiores, uma vez que à mudez dos objetos se acrescenta a eloqüência própria de sua presença, ele propicia a recordação do passado. Através dos documentos preservados, uma ou mais histórias podem ser recuperadas, revividas e reatualizadas, visto que “a força reunida em seu âmago é capaz de desdobrar-se”.

A que história, a que educação, a que escola se refere o acervo do Museu da Escola de Minas Gerais? O que oculta, o que revela ? Que possibilidades de leitura oferecem cadernos e livros amarelados, tinteiros...e a velha lousa? Que sensações desperta no pesquisador? Que possibilidades de pesquisa pode lhe oferecer? Como pode contribuir para o avanço da historiografia educacional? Esta discussão é o objeto desta proposta.

ASPECTOS DA CIRCULAÇÃO DO LIVRO ESCOLAR NA PROVÍNCIA DE PERNAMBUCO, BRASIL (1825-1889)

Ana Maria de Oliveira Galvão, Universidade Federal de Pernambuco

Este trabalho, parte de uma pesquisa concluída, busca discutir os diversos aspectos que compunham o circuito da circulação do livro escolar na província de Pernambuco, Brasil, no período de 1825 a 1889: as instâncias responsáveis pelo julgamento dos manuais, os critérios utilizados para distinguir os “bons” dos “maus” livros, as estratégias utilizadas pelos autores e/ou impressores para que determinados livros fossem adotados nas escolas. Os manuais escolares foram tomados como fonte principal da pesquisa, ao lado de (auto)biografias, romances e documentos oficiais como relatórios de instrução pública, programas de ensino, regimentos, regulamentos, ofícios diversos, pareceres e legislação. Foram também consultados dicionários biográficos/bibliográficos da época. A pesquisa foi realizada nos acervos Biblioteca Pública Estadual, no Gabinete Português de Leitura de Pernambuco

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e no Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano, todos situados no Recife. A pesquisa mostrou que, desde o início do Império, existia uma preocupação, entre os que estavam à frente da instrução pública da província, em constituir instâncias que pudessem julgar e aprovar o mérito dos manuais e de sua utilização nas escolas. Percebe-se, portanto, que havia uma certa crença na importância do poder do livro e da própria instrução, que deveriam ser, pelo menos em parte, controlados pelo Estado. A aprovação dos manuais por essas instâncias legitimava o seu uso tanto em Pernambuco como em outras províncias. A análise dos pareceres apresentados revela alguns aspectos bastante recorrentes que pareciam definir, aos olhos do que estavam encarregados de julgar as obras, um “bom” livro: teria que abordar conteúdos prescritos pelo currículo oficial, ser consistente do ponto de vista científico e ser útil aos alunos (aplicado à vida prática, conter elementos formadores dos pontos de vista moral e religioso e, de preferência, usar a linguagem lusitana). O livro escolar também deveria ser bem organizado, metodicamente planejado, apresentar uma seqüência lógica, ser claro/breve e adequado ao uso escolar. Outros fatores, que não dizem respeito à estrutura interna da obra, pareciam decisivos para que fosse aprovada pelas instâncias públicas de instrução: o seu preço e o “lobby” realizado por seus autores e editores. Por outro lado, o fato de um livro ser julgado, aprovado, mandado adotar e ser distribuído nas escolas de primeiras letras também não significava que ele era efetivamente utilizado. Foram encontrados alguns casos em que professores afirmavam não usar os manuais recomendados por não “funcionarem” no cotidiano escolar. Explicitam, desse modo, que nem sempre as ordens emanadas das autoridades provinciais eram cumpridas no cotidiano escolar. A partir dos resultados da pesquisa podem ser realizadas diversas reflexões sobretudo no que diz respeito ao significado do manual na “fabricação” dos conhecimentos e do cotidiano escolares e, de maneira mais ampla, às relações estabelecidas entre os saberes da escola e outros saberes que eram produzidos e circulavam na sociedade na época.

EDUCAÇÃO DE MENINAS SOB A ÉGIDE DA CONGREGAÇÃO DE SÃO JOSÉ DE CHAMBÉRY NO ASILO DE ÓRFÃS DA SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE CAMPINAS/SP

Ana Maria Melo Negrão, Faculdade de Educação – Unicamp

Este estudo integrou a tese de doutorado “ Infância, Educação e Direitos Sociais: Asilo de Órfãs”, circunscrita no interregno de 1870 a 1960, objetivando analisar os parâmetros da educação jesuítica desenvolvida no “Asylo de Orphãs” criado em 1890, na Santa Casa de Misericórdia de Campinas /SP, sob tutela da Congregação de São José de Chambéry, a partir de escorço histórico e representações construídas pelas egressas em relação aos espaços físicos, regulamentos, legislação, orientação religiosa, proposta educativa, filantropia e cotidiano. Como em 1889, eclodiu em Campinas a terrível epidemia de febre amarela, transmitida pelo mosquito “Stegomya fasciata”, reduzindo a população a um terço, embora desde 1878, já funcionasse na Santa Casa de Misericórdia um Asilo de Órfãs, apenas como escola regular para alunas externas, urgia a consolidação do regime de internato, conforme idealizado pelo fundador, Padre Vieira: um Asilo de Órfãs para amparar a infância, sanando um problema emergente social referente a meninas órfãs desvalidas prostituindo-se ou mendigando pelas ruas de Campinas, cidade predominantemente aristocrata

Essa pesquisa incitou-nos a buscar a origem das Santas Casas de Misericórdia com atendimento à orfandade, em acervo documental, e também perquirir o passado institucional, pelas histórias de vida de egressas, entre 55 e 85 anos de idade, com suas representações, olhares sobre o percurso, marcas, sonhos, folguedos, humilhações, reprimendas, misto de alegria e dor, rituais, no intuito de compreender as práticas cotidianas institucionais, as regras disciplinares rígidas, e, ainda entender como a egressa, na adultez, retratava as lembranças da infância com foco na exclusão social e confinamento, e depois refletia sobre sua pessoal inclusão social alicerçada naquele padrão de educação jesuítica recebida. Enquanto as informantes exercitavam a memória com histórias entrelaçadas, mergulhamos em uma análise hermenêutica, subsidiada por uma vasta esteira teórica, com o fim de apreender o que subjazia à fala, com representações construídas, para ir esboçando o desenho educacional da

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instituição, com suas contradições e pluralismo de olhares. O Asilo de Órfãs marcou, significativamente, Campinas, pelas meninas ali acolhidas, pelas irmãs de São José, pelos integrantes da Irmandade e da Provedoria que comungaram a causa e prestavam serviços ou deixaram legados. No final do trabalho, um aspecto surpreendente emergiu: a dimensão sócio-política da pesquisa que propiciou voz às órfãs que se libertaram do estigma da orfandade e do confinamento para se sentirem protagonistas da história de Campinas, privilegiadas por terem recebido educação francesa, cujos valores carregam em suas vidas e transmitem a seus familiares.

O SIGNIFICADO DO DIREITO À EDUCAÇÃO EM ARMAÇÃO DOS BÚZIOS. (PODER PÚBLICO E FAMÍLIAS DE CAMADAS POPULARES)

Ana Maria Severiano de Paiva

A minha pesquisa enfoca as políticas educativas locais e os significados que são atribuídos à escolarização pelo poder público e por famílias de camadas populares. Dois eixos de análise orientam o trabalho: a política e o direito; a família e a escola. O campo empírico é o município de Armação de Búzios/RJ.

As análises estatísticas mostram que este município é o que mais cresce em termos populacionais e o que apresenta índices de escolarização de crianças, jovens e adultos, surpreendentes em comparação com os outros municípios do Estado e mesmo do Brasil. Índices que não podem ser explicados apenas pelas políticas públicas nacionais.

O que observo, em cada município, é que a política nacional traduzida ao nível do local - municípios e escolas- não possue a mesma leitura, o que me permite afirmar não ser mecânica a implantação da legislação educacional, assim como não é igual o sentido que as famílias, os professores e as lideranças políticas atribuem a escolarização. Há, em função desta concepção, necessidade de ampliar a discussão sobre o direito à educação para o campo da relação entre Estado e a sociedade, considerando a experiência e os sentidos que os diferentes grupos sociais atribuem ao processo de escolarização. Este fato insere a discussão deste direito no campo da definição de prioridades das políticas públicas pela ótica do Estado e pela ótica dos sujeitos sociais. A implementação destas políticas, que dão centralidade à instituição escola, identifica-se com as propostas do Estado, através do reforço da descentralização e da desconcentração, promovendo a aproximação dos diferentes sujeitos da instituição escolar com o órgão gestor da escola e do sistema de educação. Esta aproximação supõe a apropriação dos espaços de educação no âmbito do poder local, pelos profissionais de educação e pela população. Redefine-se, desta forma, o caráter público do local. Focalizar o local como sendo o da escola torna-se significativo, neste momento, em que, em função de dispositivos de descentralização e desconcentração aparecem uma série de questões relacionadas com a definição e redefinição de competências e de responsabilidades pertinentes aos sistemas nacionais, municipais e locais.

A REFORMA DO ENSINO PRIMÁRIO DE 1894 E A MENTALIDADE CURRICULAR

Ana Parracho Brito, Instituto Superior de Humanidades e Tecnologias - Marinha Grande

No campo da actividade pedagógica, a década de 1890, ficou marcada pela preparação de diplomas reformadores do sistema escolar português, que visavam melhorar os serviços e promover o progresso do ensino. Realmente, no final do século XIX, verificou-se uma melhoria da situação das escolas quando se começou a cuidar da formação profissional dos professores, através da abertura de escolas normais nas capitais de distrito e, certamente, que a divulgação e o uso da escrita se ligavam às relações de força entre os grupos sociais, mas o problema também cabia ao Estado e este devia

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resolvê-lo. Assim, a partir de 1890, o executivo passa a tomar algumas medidas no campo da instrução.

Estima-se que, no ano de 1892, existiam ainda 1370 freguesias sem escola de instrução primária, embora houvesse pessoal docente suficiente. Deste modo, tornava-se necessária uma reforma do ensino primário, capaz de suprir as lacunas existentes no sistema e de introduzir alterações significativas. Para aumentar a percentagem da população a saber ler e escrever não bastava que o Estado criasse mais escolas e formasse professores em quantidade suficiente. Era, sobretudo, conveniente sensibilizar os pais e criar mecanismos que os motivassem a orientar os filhos para a escola, fazendo-lhes compreender o valor da instrução como investimento indispensável à vida.

Face ao panorama desolador, o governo reconheceu a urgência em remodelar a estrutura da instrução primária e, assim, este grau de ensino vai ser objecto de uma reforma, corporizada no diploma de 22 de Dezembro de 1894, assinado por João Franco, como Ministro do Reino. Contudo, o seu Regulamento Geral só foi aprovado em 1896. Esta reforma procura contemplar as lacunas deixadas em aberto pela legislação anterior e dar uma resposta mais adequada às necessidades do ensino primário português. A nova proposta, embora reconheça o valioso auxílio prestado pelas autoridades administrativas e pela iniciativa individual no que respeita ao interesse capital da educação popular, atribui ao poder central o papel de protagonista principal na acção educativa.

A proposta para o ensino primário passa a traduzir uma nova mentalidade curricular que assenta numa dupla finalidade: educar as classes populares e preparar os alunos para outros estudos. A maior preocupação do governo assenta na directriz social de que mais vale combater o analfabetismo de milhares de cidadãos portugueses, do que aumentar o número de conhecimentos que o ensino primário se destina a transmitir. Assim, em coerência com esta convicção, o primeiro grau do ensino elementar passa a englobar o limite mínimo de conhecimentos exigidos pela lei a todos os cidadãos, enquanto o segundo grau se compõe das disciplinas consideradas indispensáveis para a frequência dos estudos secundários, conforme, em ambas as situações, atestam as finalidades dos respectivos conteúdos programáticos a serem leccionados no ensino primário.

A EDUCAÇÃO MÉDICA NO BRASIL: HISTÓRIA E PERSPECTIVAS

Ana Raquel Lucato Cianflone, Universidade de São Paulo

Ao longo do século XX, até os dias de hoje, a educação médica tem sido alvo de debates e diversas propostas de reforma visando adequá-la tanto às demandas sociais de cada momento histórico quanto aos avanços científicos e tecnológicos. Nas últimas cinco décadas, as análises das crises e as propostas de mudanças na formação médica foram permeadas por distintos discursos pedagógicos, que desempenharam importante papel nesses processos. Partimos do pressuposto que o discurso pedagógico constitui-se com base em fontes - paradigmas científicos e correntes filosóficas - variadas, tendo sempre em vista a obtenção de metas educacionais. No entanto, essas metas definem-se no interior de certas intenções políticas e concepções de sociedade, variáveis de uma época para a outra. Nessa perspectiva, temos como objetivo historiar a trajetória da educação médica no Brasil, com especial destaque à expansão do número de escolas, os modelos pedagógicos adotados, os discursos pedagógicos que permearam os projetos de reforma e as perspectivas que se delineiam no panorama atual.

Os dados demonstram que houve dois períodos que concentraram grande expansão no número de escolas médicas: as décadas de 70 e 90. No entanto, essa expansão não foi acompanhada por medidas disciplinadoras e fiscalizadoras e nem pela diversificação de modelos pedagógicos. O modelo flexneriano de formação, originário de um relatório sobre a educação médica na América do Norte, se manteve hegemônico ao longo de todo século XX. A partir da década de 90, na América Latina e no Brasil, as reformas se intensificaram e a adoção de metodologias ativas de ensino aprendizagem tem sido adotadas de modo crescente e estimuladas por programas oficiais. Nesse contexto, a avaliação da aprendizagem adquiriu relevância e valor estratégico, representando um dos maiores desafios à implantação das novas propostas. Assim, torna-se necessário o desenvolvimento de pesquisas e procedimentos de meta-avaliação que evidenciem os fundamentos históricos,

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pedagógicos, epistemológicos e políticos dessas inovações e suas implicações para a educação médica.

LIVRO DIDÁTICO E ICONOGRAFIA: (RE)INTREPRETAÇÕES DA MEMÓRIA DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

Ana Teresa de Souza e Castro da Purificação, USP

O trabalho a ser apresentado discute as interpretações e (re)interpretações acerca do tema da Independência do Brasil partindo da análise de fontes iconográficas reproduzidas nos manuais escolares de História brasileiros publicados nos últimos dez anos. Essa reflexão é um desdobramento da pesquisa desenvolvida durante o Mestrado em História Social e está inserida nas discussões do grupo de pesquisadores do Banco de Dados (LIVRES) do Centro de Memória da Educação Escolar (CME) da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

Levando em conta que as imagens, principalmente as reproduções de pinturas históricas, adquiriram significados diferentes no conjunto de cada um dos manuais estudados, a análise indica que um complexo conjunto de variáveis para uma mesma obra de arte interferem no movimento de construção e (re)construção da memória da Independência do Brasil. Não é somente a quantidade de vezes que as imagens foram reproduzidas nos manuais, mas a variedade de formatos que adquiriram, a posição que ocuparam nas páginas, o capítulo no qual foram inseridas, as legendas que receberam, a ausência de créditos e referências junto a reprodução da obra conferem novos sentidos ao fato histórico.

Entre a listagem de reproduções dos manuais escolares de História estudados estão obras de Giorgina de Albuquerque, Jean-Baptiste Debret, Pedro Américo Figueiredo e Oscar Pereira da Silva. Mostrando como o tema da Independência do Brasil é tratado em cada um dos manuais, como as imagens estão articuladas com os textos e exercícios, o trabalho evidencia que a incorporação das fontes iconográficas nessa espécie de material pedagógico reforça o processo que instrumentaliza a própria história e o conjunto de interpretações que constituem a memória construída e a ser construída no momento de sua utilização em sala da aula.

A GÊNESE DO CONCEITO DE EDUCAÇÃO PÚBLICA

Ana Waleska Pollo Campos Mendonça (PUC-Rio), Maria Celi Chaves Vasconcelos (UERJ/FEBF e UCP)

Este trabalho se origina da preocupação com a forma como a questão da educação pública vem sendo apropriada em alguns trabalhos recentes sobre essa temática, que vêm se utilizando do conceito de educação pública, de maneira algumas vezes anacrônica, sem maiores preocupações com a sua historicidade. Numa interlocução com o historiador Reinhart Koselleck (1992), o trabalho se propõe a desenvolver uma reflexão sobre a historicidade do conceito de educação pública, sem qualquer pretensão de esgotar o assunto. Desta perspectiva, assumindo como pressupostos que os conceitos têm uma história, que todo conceito se articula a um determinado contexto sobre o qual também pode atuar, tornando-o compreensível, que é possível assumir a variação temporal do conceito, por isso mesmo histórica, e daí o seu caráter único, articulado ao momento da sua utilização, propomo-nos a nos debruçar sobre dois momentos/dimensões da gênese do conceito moderno de educação pública.

O primeiro deles se situa nos séculos XVIII/XIX e se traduz na oposição que se estabelece entre os conceitos de educação pública e de educação doméstica. No nosso ponto de vista, uma primeira significação que se atribui ao conceito de educação pública nasce da diferenciação/oposição estabelecida entre o âmbito do público e do privado e, dessa primeira perspectiva, a educação pública é primordialmente aquela que se realiza fora do âmbito do doméstico. Cumpre destacar, a esse respeito, que o confronto teórico e prático que se dá, à época, entre essas duas formas de educação se articula com o processo de institucionalização da educação escolar, que se tornará vitorioso ao final

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do século XIX, início do século XX. Esse confronto também se expressa na tensão entre os termos educação/instrução pública, que remete, igualmente, à resistência que se apresenta à interferência crescente do poder público, particularmente do Estado, sobre o âmbito do privado, numa tentativa de limitar as suas atribuições, especialmente no campo da educação.

A segunda dimensão/momento da história do conceito de educação pública irá nos remeter à Reforma Pombalina, no Portugal do século XVIII, considerando que essa reforma expressa uma das primeiras tentativas de estatização da educação pública, no âmbito europeu. O que se pretende destacar é o caráter desta intervenção, que deve ser compreendida no contexto da implantação do Despotismo Ilustrado em Portugal. Desse ponto de vista, essa intervenção expressa fundamentalmente uma preocupação do Estado com o controle da formação das mentalidades, particularmente da aristocracia intelectual, destinando-se a educação pública, portanto, àquela parcela da população que poderia contribuir efetivamente com as perspectivas do Estado de implantação do seu projeto centralizador.

O COLÉGIO NOSSA SENHORA SANT’ANNA E A FORMAÇÃO DAS JOVENS DA ELITE SERGIPANA (1848-1941).

Anamaria Gonçalves Bueno de Freitas, Universidade Federal de Sergipe (UFS)

O presente estudo tem como objetivo analisar as práticas escolares desenvolvidas no Colégio Nossa Senhora Sant’Anna no processo de formação das jovens da elite sergipana. Fundado em 1848, na cidade de Laranjeiras (SE) um importante pólo cultural, comercial e político na segunda metade do século XIX, pela professora Possidônia Maria Santa Cruz de Bragança o Colégio oferecia inicialmente ensino primário em regime de internato e externato. Em 1898, Quintina Diniz de Oliveira Ribeiro assumiu a direção do estabelecimento de ensino que passou a oferecer também o ensino secundário. O Colégio Sant’Anna foi transferido para Aracaju, em 1906, além de funcionar como instituição escolar passou a oferecer pensionato para as jovens oriundas do interior que estudavam na Escola Normal Rui Barbosa.Os documentos oficiais, Relatórios de Instrução Pública e Mensagens Presidenciais, em sua maioria são omissos quanto às estatísticas referentes à evolução do número de alunas atendidas no Colégio Sant’Anna como em outros estabelecimentos privados de ensino. Os colégios particulares possuíam autonomia na elaboração e desenvolvimento de seus currículos, estimulados pela concorrência, em geral eles possibilitavam uma formação mais diversificada e ampliada, principalmente para as jovens oriundas da elite. Os registros encontrados, principalmente na imprensa, como os anúncios e festas escolares destacavam os resultados obtidos pelas alunas quanto ao domínio de técnicas sofisticadas de trabalhos manuais e no aprendizado de diversas línguas estrangeiras, ao lado do ensino dos rudimentos de aritmética, língua portuguesa, geografia e história, em alguns casos também se incluíam o catecismo ou o ensino de história sagrada. Os exames públicos dos idiomas e dos demais componentes curriculares, a recitação de poemas e peças musicais em francês e inglês, a exposição dos bordados, tapeçarias e pinturas através de diferentes técnicas produzidos pelas alunas eram minuciosamente relatados nos jornais sergipanos do período, permitindo a visibilidade das habilidades adquiridas pelas jovens. A maior parte das escolas particulares femininas de Aracaju, na passagem do século XIX para o século XX, se constituíam em empresas familiares, possuíam internatos e em geral a direção e algumas professoras também moravam nas dependências da escola, como acontecia também no Colégio Sant’Anna. Acompanhando os registros e entrevistando ex-alunas foi possível perceber que muitas delas assumiram funções docentes no próprio Colégio, ou criaram outros estabelecimentos de ensino privado, bem como atuaram em escolas públicas, além de terem desenvolvido atividades literárias e intelectuais relevantes.

PRÁTICAS PEDAGÓGICAS E COTIDIANO ESCOLAR: AS MÚLTIPLAS FACETAS DO PROCESSO DE INCLUSÃO DOS ESTUDOS ÉTNICO-RACIAIS NO CURRÍCULO DA EDUCAÇÃO BÁSICA

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Andréa Borges de Medeiros, Escola Municipal José Calil Ahouagi

O presente trabalho pretende refletir sobre as transformações no cotidiano escolar a partir da inclusão dos estudos étnico-raciais no currículo da educação básica de uma escola de periferia urbana no município de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. Desde o ano de 1999, a referida escola vem buscando alternativas para construir uma proposta de educação inclusiva, capaz de lidar com as diferenças e discutir com os alunos as práticas discriminatórias existentes. A fim de organizar metodologicamente a reflexão, o grupo elaborou um Projeto de Pesquisa, tendo como foco a seguinte questão: Como se processam as relações de alteridade e as construções de saberes numa escola que optou pela inclusão dos estudos étnicos e raciais na organização curricular. A expectativa é fazer fluir a discussão sobre a diversidade e subjetividade humanas e sobre os processos de construção de identidades. É também poder pensar sobre as estratégias de intervenção que estamos criando, na esperança de lutar contra a carga racista e discriminatória que as crianças afrodescendentes carregam e que são submetidas todos os dias na escola e fora dela. Entretanto, a escrita etnográfica da prática pedagógica, contando as histórias do cotidiano e registrando os entraves e os avanços da implantação de uma proposta que fomenta a construção de um saber, comprometido com o resgate da cidadania de crianças e adolescentes afrodescendentes, é o maior desafio. Interpretar interpretações e através delas registrar a história da formação continuada de um grupo de educadores e dos processos de transformação da escola é uma possibilidade de rever posturas, reescrever contextos e reconstruir conceitos.

Assim sendo, proponho apresentar reflexões documentadas sobre as práticas e o cotidiano escolar, focalizando as interpretações do coletivo, crianças e adultos, envolvidos no processo de reconstrução curricular. Quando o coletivo de uma escola se põe a pensar o cotidiano, colocando-se na perspectiva do estado de se dar a ler, a ouvir e a falar, há possibilidades de intervenções que transformam as formas de inserção no contexto vivido. A pesquisa, então, parafraseando Bertold Brecht, surge como uma esperança no sentido de refletir sobre a miséria humana e assim poder aliviá-la.

O Projeto de Pesquisa elaborado pela escola está sendo financiado pelo FAPEB ( Fundo de Apoio a Pesquisa na Educação Básica ), criado pela Gerência de Educação Básica/ Prefeitura Municipal de Juiz de Fora.

FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM PERNAMBUCO NA PRIMEIRA REPÚBLICA: ENTRE O CONSERVADORISMO E O LIBERALISMO

Andréa Carla Agnes e Silva, UFPE

O estudo, ora em andamento, tem por objetivo identificar como a Escola Normal Oficial de Pernambuco - Instituição modelo para todo o ensino normal no Estado - conduziu sua proposta educacional, frente ao conservadorismo católico e ao liberalismo republicano, no período de 1890-1930; considerando o conflito desencadeado entre católicos e liberais, a partir da laicização da educação, determinada na Constituição Republicana, em 1891. O período histórico desta pesquisa é marcado por grandes transformações econômicas, políticas e sócio-culturais. Junto à mudança de regime político, com a Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, verifica-se o predomínio de tendências secularizantes, como a abolição do Padroado em 7 de janeiro de 1890, deixando o catolicismo de ser religião oficial do Estado. Um ano depois é decretada a Constituição Republicana que estabelecia em seu art. 72 no 6, a laicidade do ensino nos estabelecimentos públicos. A igreja católica que teve grande importância na organização e funcionamento da educação brasileira, durante o período da Colônia e do Império, sofre um grande golpe no processo de laicização da educação na Primeira República e reage com toda força contra os liberais. Este cenário vem realçar a temática da nossa pesquisa, sobretudo pela influência na formação dos professores - agentes importantes para viabilização das propostas de organização do Estado Republicano. Os vestígios históricos sobre essa temática estão sendo investigados na tentativa de que nos levem às respostas que buscamos. Que face(s) tem a educação nas propostas defendidas pela Escola Normal Oficial de Pernambuco? Que tipos de moral e de saberes deveriam os professores dominar e transmitir, diante

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dos desafios postos pelas mudanças ocasionadas pela República laica? Nesse sentido estamos tentando caracterizar o currículo da Escola Normal Oficial de Pernambuco antes e depois da laicização do ensino estabelecida na Constituição republicana, de modo a verificar quais as disciplinas e práticas pedagógicas que foram abolidas e as que foram inseridas após a laicização da educação. No momento, pesquisamos: os Relatórios de Instrução Pública de Pernambuco; a Collecção de Leis, Decretos e Resoluções da Província de Pernambuco; as Leis do Estado de Pernambuco; e os Documentos referentes à Escola Normal Oficial de Pernambuco. Tentaremos confrontar os resultados com matérias publicadas na Imprensa local, sobretudo no Jornal Diário de Pernambuco publicados no Recife, no final do século XIX e inicio do século XX, de modo a verificar a repercussão da laicização do ensino, pelas polêmicas suscitadas entre católicos e liberais.

AS RELAÇÕES ENTRE O ENSINO DE HISTÓRIA, O CINEMA EDUCATIVO PRODUZIDO PELO INSTITUTO NACIONAL DO CINEMA EDUCATIVO (INCE) E A PROPAGANDA OFICIAL DO GOVERNO GETÚLIO VARGAS (1930-1945) CRIADA PELO DEPARTAMENTO DE IMPRENSA E PROPAGANDA (DIP) NO CONTEXTO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

André Chaves de Melo Silva, mestrando da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE/USP)

Esta pesquisa se insere em um projeto sobre o papel das relações entre o ensino de História, o cinema educativo e o cinema voltado para a propaganda governista, no contexto da História da Educação brasileira, especificamente na Era Vargas (1930-1945), quando a Educação foi transformada em ferramenta de um projeto, que era o de criar uma nova identidade nacional baseada na negação das diferenças culturais e sociais regionais e na gênese do bom brasileiro, trabalhador e honesto. Essa identidade, forjada a partir das discussões dos intelectuais brasileiros na década de 1920 – muitos dos quais acabaram ficando a serviço do regime e foram responsáveis pela reorganização do sistema educacional e de outras esferas de atuação governamental –, favorecia a realização do objetivo do governo, que era o exercício de um forte controle sobre a população, por meio da criação de mentes alinhadas ao regime, o que garantiu o desenvolvimento econômico baseado na industrialização e o enfraquecimento das elites regionais, fatores fundamentais para a viabilização de um projeto de poder de longo prazo.

O estudo se concentra sobre os programas e currículos do ensino de História criados pelas Reformas Campos (1931) e Capanema (1940) e suas relações com os discursos veiculados por meio do cinema. Para melhor delimitar nosso campo de estudos nos concentramos sobre os cinejornais do acervo da Cinemateca do Estado de São Paulo, num total de 433 volumes sendo que, desses, 230 ou 53,11% apresentam temas relacionados com os programas e currículos do ensino de História, o que deixa claro a relação entre imprensa, cinema e educação enquanto instrumentos disseminadores da ordem social vigente. Esse material foi escolhido por ter sido produzido pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), órgão responsável pela publicidade oficial e pelo controle dos veículos de comunicação por meio da censura, além de ter sido protagonista de uma ferrenha disputa com o Instituto Nacional do Cinema Educativo (Ince) pelo controle da produção de filmes educativos.

A importância do estudo se encontra na necessidade de investigarmos as relações entre os saberes produzidos para o ensino de História e sua utilização pelo cinema educativo, tema que se mantém pouco pesquisado pela História da Educação brasileira. Atualmente estamos analisando os cinejornais por meio da comparação dos conteúdos presentes nessas obras e previstos nos programas de ensino de História e sua utilização em ambas as áreas enquanto ferramentas de construção dessa nova identidade nacional, atualmente em crise.

AS PRÁTICAS SÓCIO-EDUCATIVAS DA ARQUIDIOCESE DE NATAL NAS DÉCADAS 40 E 50

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Andréa Gabriel F. Rodrigues e José Mateus do Nascimento, U. Federal do Rio Grande do Norte

Trabalho de investigação histórica, tendo como objeto de estudo as práticas sócio-educativas da Igreja Católica de Natal /Brasil nos anos 40 e 50. Enfoca as fases urbana e rural das ações da igreja, as quais ficaram reconhecidas historicamente como ‘ Movimento de Natal’. Essas práticas, a priori, foram organizadas nas décadas 40 e 50 no espaço urbano e tinham como foco de atenção os grupos menos favorecidos economicamente, visando assistência social, educativa e religiosa. Como estratégias de atuação foram organizadas instituições como Escolas Ambulatórios, centros sociais, clubes de mães, creches e orfanatos; funcionando como pólos de desenvolvimento de novos bairros e de divulgação da doutrina social católica. Na metodologia priorizamos a pesquisa de documentos históricos (jornais, revistas, relatórios, cartas), tendo a memória e a educação enquanto elementos mediadores do fazer histórico. Nos anos 50, a Igreja de Natal direciona suas práticas para o meio rural, como forma de expandir seu ideário católico e de assegurar a permanência do homem no meio rural, numa época em que no Brasil e particularmente no nordeste do país, ocorriam grandes migrações para os centro urbanos. Para tanto, a Arquidiocese de Natal, mediante a criação do Serviço de Assistência Rural, sistematizou o programa de Missões Rurais, que promoviam assistência espiritual, sócio-educativa, médica e cultural destinadas às comunidades rurais; respaldadas no desenvolvimento de comunidade. Como resultados de pesquisa, constatamos que a intervenção da igreja, apesar de assistencialista, provocou mudanças significativas na reorganização social dos espaços urbano e do rural, atribuindo aos grupos comunitários novas formas de pensar e agir. Com isso, a igreja mantém o espírito de renovação de suas práticas e conservação do seu ideário católico.

COMPANHIA DE JESUS: PARTICULARIDADES DO CURRÍCULO DE MATEMÁTICA NO COLÉGIO DO ESPÍRITO SANTO

Andrea Eduardo, Carla Vicente, Carlos Santos, e Sílvia Silveira, Universidade de Évora

“(...) A história da Companhia de Jesus, neste campo determinado de sua acção (Província de Portugal ), estava sempre tão travada com a história de Portugal e de suas conquistas e missões, que é necessariamente parte relevante da nossa história nacional, e forma, pelas empresas, que aCompanhia realizou, um dos timbres mais ilustres da nação Portuguesa.

Se considerarmos a Companhia de Jesus como Ordem Religiosa, que o é essencialmente, havemos de concordar que não houve nos séculos dezasseis, dezassete e dezoito Ordem nenhuma, que manifestasse entre Portugueses tão grande e tão intensa actividade em ministérios sacerdotais de toda a sorte, como ela exerceu constantemente pelo fervor de seus religiosos. Se a olharmos como associação de ensino e educação, veremos que sempre levou a primazia e notável dianteira a quaisquer outras associações na formação literária, científica e moral da Juventude. Se finalmente atendermos à sua feição particular de Ordem Apostólica, deveremos confessar não sem admiração que foi a Companhia de Jesus a Corporação que mais engrandeceu o nome de Portugal com o número, zelo e constância de seus missionários, enviados em sucessivas expedições às terras do domínio e padroado português.”1

Atendendo a todas estas considerações e numa perspectiva de enquadrarmos a nossa formação académica, resolvemos debruçarmo-nos sobre o estudo da história da Companhia de Jesus e pesquisar as particularidades do Ensino da Matemática (disciplina Propedêutica ) nos Colégios da Companhia.

Por outro lado, e uma vez que estudamos em Évora, cidade que por muitos anos acolheu missionários desta Companhia, restringimos ainda mais o nosso campo de acção, concentrando-nos apenas ao Colégio do Espírito Santo.

1 In História da Companhia de Jesus na Assistência em Portugal, Vol. I, Tomo I, pág. VII e IX23

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EM CAIXAS, GAVETAS E ARMÁRIOS: A PRESENÇA E O PAPEL SOCIAL DA ESCOLA NOS GUARDADOS PESSOAIS

Andrea Soares Caruso e Luana de Souza Siqueira; U. Do Estado do Rio de Janeiro

Em caixas, gavetas e armários guardamos os mais diferentes objetos, dentre eles: diários, cadernos, cartas, cartões, postais, bilhetes, agendas, telegramas, autobiografias, livros de receitas, provas, cadernetas e boletins escolares, cadernos de anotações, álbuns de família, fotos com dedicatória, entre outros. Nesses documentos, tidos como não oficiais, estão registradas vivências e práticas cotidianas, que vêm preencher lacunas deixadas pela história oficial.

Sob a árdua tarefa de preservar esses arquivos privados e livrá-los do lixo, do fogo ou do esquecimento, alguns pesquisadores como Ana Chrystina Mignot, Maria Teresa Santos Cunha, Ana Maria Casasanta, Lílian Lacerda, Héctor Rubén Cucuzza, Philippe Lejune, Dominique Juliá, Jean Hébrard e Antonio Castillo reúnem esses documentos, promovem e organizam eventos como exposições, escrevendo e traçando a sua importância para a história.Essa iniciativa de preservação de arquivos privados e íntimos, como contribuí Ciavatta (2002), é uma tentativa que vem configurando as últimas décadas, proporcionando assim, um notável desenvolvimento da historiografia. Como em outras áreas, a história da educação se beneficiou destes novos estudos, “superando a história factual, alargando a visão dos fatos, renovando os enfoques, introduzindo outras fontes e documentos” (ibid., p. 15).

Convencidas dessa iniciativa, esse estudo busca em arquivos privados, de pessoas comuns, pistas que permitem compreender hábitos, formas de pensar, ideologias e concepções políticas, culturais e econômicas pertencentes a tempos e espaços sociais. Levando -se em consideração que a história da educação no Brasil começou a ser escrita, a partir dessa perspectiva, há pouco tempo e que a necessidade do conhecimento do passado da nossa educação é incontestável, objetivamos identificar nesses guardados, sobreviventes ao tempo e emprestados pelos seus respectivos donos, a presença e a importância social da escola em determinados momentos vividos. Elegemos, então, as dedicatórias e as mensagens presentes em fotos tiradas em ambientes escolares.

Analisando álbuns de família foi possível visualizar um grande número de fotografias de crianças uniformizadas, com roupas contendo o emblema da escola, sob cenários que contemplam momentos históricos, assuntos em evidência, capitais ou cidades ou mapa do país, a própria escola etc. Atrás, ou até mesmo por cima da imagem fotografada estão dedicatórias que nos fazem inferir que essas são tiradas com a finalidade de presentear. E assim, são guardadas por familiares em álbuns, ou expostas em paredes e móveis com muito orgulho. Ultrapassando as barreiras do tempo, esse hábito pendula e compõe muito da cultura familiar brasileira. Esse misto imagem e escrita parece estabelecer uma relação entre a família e a importância atribuída à escola. Dessa forma, rastreamos esses objetos que mais do que suporte físicos da escrita ou uma simples representação da realidade, reconstroem o tempo, pois como coloca Certeau (2002), “(...)o historiador não tem o tempo como um material de análise ou como material específico, (...) trabalha, de acordo com seus métodos, os objetos físicos (...) trabalha sobre um material para transformá-lo em história” (p. 79).

CIAVATTA, Maria . O mundo do trabalho em imagens: a fotografia como fonte histórica (Rio de Janeiro, 1900-1930). Rio de Janeiro: DP&A, 2002.2 CERTEAU, Michel de. A Escrita da História. 2a ed.. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.

DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM : CONCEPÇÕES E ATUAÇÃO DOCENTE

Andréia Mucio Jeronymo, Pedagoga habilitada em Deficiência Mental pela Faculdade de Ciências e Letras- Unesp – Araraquara – SP; Psicopedagoga pela USP – Ribeirão Preto – SP e Mestra em Educação pela Unesp – Araraquara – SP.

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A presente pesquisa teve como fundamento , a prática indiscriminada de rotular alunos, como possuidores de dificuldades de aprendizagem. Assim, como é observado no cotidiano escolar, muitas crianças são encaminhadas a especialistas- psicólogos, psicopedagogos e até psiquiatras infantis – sem uma avaliação prévia por parte dos educadores; sendo imprescindível o discernimento dos mesmos em suas análises. O objetivo mais amplo foi o de trazer a tona as concepções de alguns educadores acerca da expressão “dificuldades de aprendizagem” e como conduzem os possíveis “entraves” ocorridos em sala de aula. Partiu-se da investigação, de 10 professoras da 2ª série do Ensino Fundamental da rede pública estadual da cidade de Araraquara (São Paulo- Brasil) ; além, de 10 alunos da 2ª série, encaminhados à pesquisa pelas educadoras com queixa de dificuldades de aprendizagem. O método utilizado na entrevista com as professoras, foi o de exploração crítica, partindo de princípios metodológicos piagetianos e que apresentou como base, histórias hipotéticas com situações-problema, para as quais as professoras deveriam encontrar suas próprias soluções; este material permitiu analisar as reflexões das educadoras acerca dos acontecimentos relatados e, consequentemente, de sua própria conduta, permitindo às mesmas se colocarem como protagonistas das histórias, manifestando-se com maior liberdade de expressão, projetando-se em cada situação narrada. No que confere aos alunos indicados, foram observados na produção escrita e expressão através de desenhos, não com o intuito de testar a capacidade de aprendizagem dos alunos, pois esse não era o objetivo do trabalho, mas o de contextualizar as concepções que as educadoras traziam como sendo sinônimo de dificuldades de aprendizagem. Os resultados obtidos confirmaram mais uma vez que as causas das dificuldades escolares são investigadas na família e na própria criança e em raras exceções no processo de “ensinagem”, com isso, os alunos são encaminhados indiscriminadamente a especialistas, delegando a função de ensinar a profissionais que não tem esse objetivo em sua prática de atendimento, como é o caso da Psicopedagogia, que traz definida em sua atuação, a de compreender o que envolve o aluno em seu ato de aprender e a consciência que tem do que realiza ; as produções dos alunos vêm comprovar lacunas no processo de ensino . O professor precisa ser o sujeito do seu fazer, ser observador de suas ações, ser ator e escritor de sua própria prática, ser protagonista , entrar em confronto com suas concepções , perceber suas limitações , sair da alienação em que vive.

ENTRE POLÍTICAS E REFORMAS - A CONSTRUÇÃO DE LAÇOS COM A CULTURA ESCRITA

Ângela Bonifácio Vítor, Universidade Lusófona

Foram factores diversos, aqueles que, ao longo do tempo, contribuíram para que a generalidade das pessoas fosse gradualmente construindo formas de relacionamento progressivamente mais firmes com alguma cultura escrita. Nesse longo percurso, a Igreja, o Estado e outras instituições assumiram um contributo relevante na construção do “universo das letras”.

Admitindo, então, a não existência de causas únicas na construção desse universo pretendemos abordar algumas mudanças que ocorreram, designadamente no Ocidente Europeu e que viriam a possibilitar que a leitura e a escrita se pudessem tornar em algo universalmente mais acessível.

Porque queremos partilhar a convicção de que a escola actual só pode ser um instrumento de inovação, se for um instrumento de memória, propomo-nos revisitar um contexto histórico que se move entre a vontade de pertença à sociedade letrada e a construção da escola de massas dos séculos XIX e XX; num processo que conduziu à escolarização de responsabilidade social objectivada no Estado.

OS LIVROS PARA CRIANÇAS COMO INSTRUMENTOS DOUTRINÁRIOS - O CASO DA COLECÇÃO “GRANDES PORTUGUESES”

Ângela Coelho de Paiva Balça, Universidade de Évora

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De um modo geral, os livros para crianças e para jovens encerraram, nas mais diversas épocas, uma clara função educativa, transformando-se não raro em materiais pedagógicos, por vezes com determinadas intenções doutrinárias.

Assim, nesta comunicação, pretendemos analisar a colecção “Grandes Portugueses”, iniciada pela escritora Virgínia de Castro e Almeida, em 1943, e editada pelo Secretariado da Propaganda Nacional. Esta colecção de narrativas, destinada aos leitores mais novos, pretendia divulgar a vida e a obra de figuras da História de Portugal.

Na verdade, estas narrativas apresentam determinadas representações sobre as figuras e sobre a História de Portugal, sobre o país real, sobre os seus governantes e também sobre a ideologia vigente na época, que as tornam num claro instrumento pedagógico e doutrinário, colocado ao alcance dos jovens leitores de então.

CONHECER E CONTROLAR: UMA REFLEXÃO ACERCA DAS CONFERÊNCIAS PEDAGÓGICAS NA CORTE IMPERIAL

Angélica Borges, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

As Conferências Pedagógicas, impostas e reguladas pelo poder público na segunda metade do século XIX, eram um espaço de reunião de professores primários, principalmente os públicos, vistos como potenciais aliados na ‘difusão das luzes’ junto ao povo, para reflexão de assuntos pertinentes à instrução e ao ensino. Por intermédio das conferências, seria possível ao governo conhecer um pouco das idéias correntes na corporação de professores e, de algum modo, controlar e instituir códigos e doutrinas norteadoras de suas práticas. Este estudo pretendeu investigar as condições de aparecimento e funcionamento dessas conferências, as intenções do governo em normatizá-las e os efeitos esperados. Abordou-se também o modo como se deu a participação dos professores, a escolha dos temas a serem discutidos, a publicação de trabalhos apresentados e a repercussão do evento.

As Conferências Pedagógicas foram estabelecidas pelo Regulamento de 1854, devendo ocorrer duas vezes anualmente, sob a presidência do Inspetor Geral de Instrução Pública. Contudo, a regulamentação especial prevista somente veio a ser organizada em 1872 pelo conselheiro José Bento da Cunha Figueiredo. Desta forma, a primeira conferência oficial consta de janeiro de 1873, entretanto, documentos encontrados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro apontam indícios da sua realização em momentos anteriores. A freqüência irregular foi uma característica constante, mesmo após a regulamentação especial.

Observou-se nestes documentos e na imprensa pedagógica do período que a participação dos professores era problemática e não se dava de forma maciça, apesar da obrigatória presença dos professores públicos. Percebeu-se que alguns nomes da primeira conferência reaparecem com certa freqüência nas posteriores, havendo também indícios da formação de certos grupos que travavam debates não somente no âmbito das reuniões, abarcando outros espaços como os jornais especializados.

Com relação às questões a serem discutidas, o governo as estabelecia e divulgava previamente aos professores para que estudassem, incluindo-se no temário o regime interno das escolas, métodos e sistemas de ensino e de recompensa e punição, estrutura das escolas, adoção de livros, entre outros. A imposição de temas era evidente não obstante o regulamento apontasse a participação dos professores na formulação do programa.

Enfim, este estudo buscou melhor compreender a significatividade das Conferências Pedagógicas como parte dos projetos relativos à instrução pública, representando um espaço de formação, de atualização e controle das práticas docentes, de instituição de códigos e doutrinas, de “circulação de idéias e posturas”, cujo um dos efeitos esperados pelo governo poderia traduzir-se no exemplo do relatório de Azevedo Correa, membro do Conselho Diretor, no qual registra o bom resultado da primeira conferência por conseguir “Concentrar a attenção do corpo professoral da Corte para o estudo de assumptos de alto interesse para a escola”, ou seja, evitar assuntos não desejados em um momento de consideráveis discussões corporativas, políticas e sociais. NA ESCRITA ESCOLAR: A CULTURA CÍVICA –RELIGIOSA RETRATADA

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Antonia Simone Coelho Gomes, Professora UEMG/Carangola

Esta comunicação tem como objetivo apresentar um fragmento da pesquisa desenvolvida durante o programa de Pós Graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, cujo objeto é a escrita escolar religiosa produzida na Escola Estadual Melo Viana, situada na cidade de Carangola, Minas Gerais. Durante a investigação tive acesso a materiais como cadernos de lições de professoras das décadas de 30 e 40, caderno de organização de festividades da escola do final da década de 40 e início de 50, Caderno de ensino religioso produzido na década de 60, livros de atas, registros escolares, documentos oficiais, registros pessoais, fotografias e uma série de guardados de uma diretora que compõem seu arquivo-memória, no que diz respeito à sua trajetória profissional, que serviram para traduzir parte das relações desta escola.

Nos vestígios da escrita escolar, aparecem concepções de educação consideradas como legítimas, reveladoras de valores privilegiados, comportamentos valorizados por práticas de cultura cívico-religiosas que refletem parte da cultura escolar. O entendimento deste material produzido por professores e alunos, possibilita dar visibilidade ao cotidiano escolar e contribui para consolidar uma escolarização de práticas pedagógicas. Recorri à Castillo Gómez (20001) e Vinão Frago(2000) que me propiciaram uma reflexão sobre a escrita cotidiana escolar, buscando compreender o contexto em que essa escrita foi produzida, suas condições, as finalidades que dirigiram e dirigem as práticas educativas.

No presente estudo pretendo enfocar o caderno de ensino religioso datado de 1961. Esse caderno composto por cânticos e orações trazia também as explicações de cada momento da missa. Ao se abrir o caderno de desenho sem pauta, encontra-se nos textos e nas figuras cuidadosamente desenhadas, a presença de valores cívico-religiosos preservados pela escola. A descrição e narrativa dos momentos da santa missa indicam uma preocupação em fazer a criança se familiarizar com o ritual religioso e de certa forma.A escola, através das aulas de religião,atua como um canal de reprodução destes valores. Estão presentes indícios que mostram como a escrita informa, exibe, controla, constitui sujeitos e instala espaço de poder no interior da escola.

Esta escrita nos dá pistas de simbolização de um tempo em que o ensino da religião católica era uma prática convencionada pelo Estado, na intenção de organizar e manter uma certa ordem escolar, assim como instaurar valores e formar identidades. Esse caderno constitui-se como uma marca registrada de um tempo onde a escola pública em Minas Gerais se notabilizará pelo incentivo `a uma cultura cívica-religiosa dando visibilidade à escola durante as comemorações oficiais e religiosas da cidade.O material analisado à luz de Marilena Camargo (2000) confere ao estudo uma discussão que pode indicar a cultura escolar e pode, no conjunto com outros escritos iluminar valores de uma época.

Referências Bibliográficas

CAMARGO, Marilena A. Jorge Guedes de. Coisas Velhas, Um percurso de investigação sobre cultura escolar (1928-1958). São Paulo: Ed. Unesp, 2000.CASTILLO, Antonio Gómez.; MONTEAGUDO, José Ignácio (orgs.). Los archivos europeo de la escritura popular.Boletin Acala Archivamos, Alcala, nº38, p.5-11, out. 2000.CASTILLO, Gomes. Un archipiélago desconocido archivos y escritura de la gente comun. Boletin Acalá Archivamos, Archiveros de Castilla y Leon, nº38, p.6-11,out. 2000.VIÑAO, Antonio Frago. Por uma história da cultura escrita: observações e reflexões. Cadernos do projecto Museológicos sobre educação e infância, n. 77, p. 3-57, 2001.

VIÑAO, Antonio Frago. Del Periódico a internet. Leer y escribir em los siglos XIX y XX. In CASTILLO, Gómes(coord). Historia de la cultura escrita. Del proximo oriente antigo a la sociedad informatizada.Gijón: Trea, 2001.

MEMÓRIA DO LIVRO DIDÁTICO - PROJETO LIVRES

Antonia Terra de Calazans Fernandes, UNIFIEO

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A proposta da comunicação é apresentar a pesquisa que reúne estudos e reflexões sobre a Memória de Livros Didáticos, desencadeados de análise de depoimentos coletados pela metodologia de História Oral, de alunos e professores que freqüentaram a escola, entre as décadas de 1940 e 1960, em diferentes localidades brasileiras. A pesquisa faz parte do Projeto LIVRES, coordenado pela Profa. Dra. Circe Bittencourt, da Faculdade de Educação da USP, que reúne diferentes pesquisadores do livro didático.

O objetivo da pesquisa tem sido contribuir para ampliar o leque de análises que fundamentam a história e o papel social do livro didático na história da educação brasileira. Nessa linha, tem possibilitado, de modo geral, reflexões sobre a história da literatura didática no Brasil; a presença ou não dos livros didáticos no cotidiano da escola; se e como o livro era utilizado; como o livro didático marca o imaginário de alunos e professores; quais livros ficam na memória de indivíduos e gerações; a relação entre livros e currículos (o que era estudado); a presença ou não de livros com história regional e local; formatos e modelos de livros didáticos; os aspectos físicos (cor, grossura, capa...); ilustrações, mapas, quadros e atividades; quais suas interferências na formação social e cultural de indivíduos; e os papéis sociais, educacionais e culturais do livro didático na formação de gerações.

Uma particularidade da história oral é a coleta de depoimentos que extrapolam o tema de estudo, mesmo que exista um grande esforço do pesquisador em orientar as questões. Por ser a memória associativa e relacional, surgem lembranças variadas, de contextos amplos, ambientes e espaços, objetos, sentimentos e acontecimentos associados ao tema. Nesse sentido, muito do que os depoentes recordam vão além do foco da pesquisa. Lembram da merenda, das dificuldades enfrentadas, da professora, do recreio, dos castigos, do espaço físico da escola, dos textos literários, dos desfiles e festas cívicas, da distribuição de materiais e livros aos mais pobres, das repetências e prêmios, e dos modelos de escola (regular, multiseriada, supletiva...).

Como no caso dos demais documentos, os depoimentos estão sendo analisados como representações, ou seja, não podem ser confundidos com a realidade, e, portanto, tem sido preciso confrontá-los com outras fontes. E, por suas especificidades, tem sido problematizados a partir de valores e significações que estruturam as narrativas e as histórias de vida.

O CALÍGRAFO, O DIPLOMATA E OS LIVROS MANUSCRITOS: UM MANUAL LUSITANO SE ADAPTA ÀS CRIANÇAS DO PARÁ NO SÉCULO XIX

Antônio Augusto Gomes Batista, UFMG

Diretor do Instituto Caligráfico de Lisboa e professor de caligrafia em vários estabelecimentos de instrução de Lisboa, Carlos Silva publica, em 1864, O paleographo em escala calligráphica para apprender a leitura manuscripta [...], adotado “nos principais colégios deste reino e do Brasil”.

Como os demais livros do gênero, o de Carlos Silva apresenta uma coletânea de textos litografados em diferentes tipos de caligrafia, dispostas em ordem de dificuldade. Diferentemente dos demais, que organizam a inserção da criança na cultura do manuscrito por meio de antologias de textos literários e históricos, a obra volta-se para usos práticos da escrita, na família e no comércio, e utiliza textos, em geral, sem “pedigree” literário.

Sete anos após a primeira edição do livro, um diplomata brasileiro, nascido na então Província do Grão-Pará, publica o primeiro paleógrafo brasileiro, destinado às escolas de sua província e do Amazonas. Trata-se do Paleógrafo, ou Arte de aprender a ler a letra manuscripta [...], de Joaquim Corrêa de Freitas.

No prefácio do livro, Freitas informa que este “não vem pleitear mérito com outras já conhecidas”, pois “todas servem ao seu fim; e quantas mais aparecerem melhor para os que precisam aprender”. Com efeito, a originalidade tem, em geral, pouco peso em obras escolares. Assim, não deve causar surpresa que boa parte do livro de Freitas seja uma cópia do paleógrafo de Silva. Do livro lusitano, o brasileiro guarda sua estrutura, baseada na apresentação das letras do alfabeto, abreviaturas e sinais taquigráficos, de uma pequena antologia de textos e de um extenso conjunto de exemplos epistolares e documentos ligados ao comércio.

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Se Freitas não quer “pleitear mérito” com outras obras, isso não significa, porém, que o livro não se distinga dos demais, inclusive do paleógrafo lusitano em que se baseia, pois, como acrescenta o diplomata em seu prefácio, “se em alguma coisa este livrinho se avantaja a outros de igual natureza, é, decerto, pela variedade de caracteres e pela especialidade da maior parte dos assuntos, cuja escolha nenhum brasileiro deverá censurar”: descrições do Brasil, da corte, de cidades das províncias do Pará e do Amazonas, biografias de D. Pedro II e de brasileiros célebres, trechos da Constituição, cartas de brasileiros, num ambiente brasileiro. O livro se baseia, portanto, no paleógrafo do calígrafo lusitano, mas é apropriado pelo diplomata brasileiro para assumir novos temas e motivos, novas finalidades.

O que significa tornar o manual lusitano adequado para esse novo público-leitor? O que se deve recusar, o que se deve acrescentar, o que se deve manter para fazer do livro de Carlos Silva um instrumento adequado à formação de crianças do Pará? Manual destinado a inserir os alunos na cultura da escrita, particularmente no registro manuscrito, em que o livro deve se transformar para promover a entrada nessa cultura de crianças brasileiras?

Discutir esse caso de “transmigração” pedagógica, no contexto mais amplo das continuidades e rupturas das relações culturais e políticas que, no período, unem e afastam brasileiros e portugueses, é o objetivo deste trabalho. Suas principais fontes residem numa série de edições das duas obras (de 1864 a 1912), bem como de outras obras do gênero, lusitanas e brasileiras. Dados sobre os autores dos paleógrafos e registros esclarecedores de sua utilização e público, no Brasil e em Portugal, são também utilizados.

A INSTRUÇÃO NA PROVÍNCIA DA PARAHYBA DO NORTE DURANTE O PRIMEIRO REINADO E PERÍODO REGENCIAL (1822 – 1840)

Antonio Carlos Ferreira Pinheiro, Universidade Federal da Paraíba

Este trabalho tem como objetivo analisar alguns aspectos relativos ao processo de organização da instrução pública e privada na província da Parahyba do Norte nos anos que se sucederam à independência política do Brasil até o final do período Regencial. Esse período encerrou-se no momento em que foi efetivado o “golpe da Maioridade”, quando D. Pedro II formalmente passou a ocupar o trono brasileiro, dando início ao segundo reinado.

A partir de 1822 foram implantadas as Aulas Públicas mantendo, todavia, as mesmas características das Aulas Régias inspiradas nos ideais iluministas e da ilustração, seguindo de maneira geral as diretrizes propostas pelas reformas pombalinas. Entremeando o funcionamento de algumas Aulas Públicas, três legislações imperiais foram implementas e deram as primeiras configurações para a estruturação da educação escolar brasileira: A Constituição de 1824, a Lei de 15 de outubro de 1827 e o Ato Adicional de 1834. Essas leis gerais já foram bastante analisadas por estudiosos e pesquisadores da história educacional brasileira, contudo, os seus desdobramentos nas províncias são pouco conhecidos. Para analisarmos essas influencias na província da Parahyba do Norte tomaremos como fontes os discursos e exposições elaborados pelos presidentes da província e encaminhados à Assembléia Legislativa, além da legislação que foi produzida no período em estudo. Analisaremos essa documentação relacionando-a com as condições sociais, políticas e culturais marcadas por uma estrutura social extremamente hierarquizada e assentadas no modelo agro-exportador.

A partir de um breve cotejamento, sobre essa documentação, percebe-se que alguns agentes políticos compreendiam o aperfeiçoamento do Homem a partir da instrução como vital para o processo de consolidação e fortalecimento da recente nação brasileira. Sabemos, ainda, que essa perspectiva “político-pedagógica” propiciou, na província da Parahyba do Norte, a estruturação escolar que contava, até o início dos anos quarenta do século XIX, com uma escola secundária mantida com recursos públicos: o Lyceu Parahybano, que fora fundado em 1836, além de 17 cadeiras isoladas com aproximadamente 512 alunos matriculados.

A EDUCAÇÃO INTELECTUAL, MORAL E FÍSICA EM MINAS GERAIS NO SÉCULO XIX: UM ESTUDO SOBRE O COLÉGIO DO CARAÇA

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Antonio Carlos Moraes, UFRJ

O presente estudo é fruto de uma tese de doutoramento e versa sobre o funcionamento do Colégio do Caraça, um dos mais antigos colégios instalados no Brasil e sua participação no processo de organização do ensino escolar brasileiro, a partir da primeira metade do século XIX. O Colégio foi criado por padres portugueses da Congregação da Missão, ordem religiosa que congrega os seguidores de São Vicente de Paula. O estudo teve como objetivo a revelação da convergência da prática pedagógica do Colégio na formação da classe dirigente mineira, num período em que os vários setores dominantes da sociedade brasileira possuíam interesses diversos diante da adesão e da resistência à família real portuguesa.

Para alcançar o objetivo proposto, foram formuladas duas questões: 1) em que medida a pedagogia praticada no Colégio do Caraça transitou e interferiu no processo de organização escolar da educação brasileira, e, 2) quais foram as intenções pedagógicas que permitiram o destaque dado à cultura corporal no cotidiano escolar do colégio. O período pesquisado foi a prática escolar entre 1820 e 1842, período em que o Colégio funcionou sob a direção de padres portugueses que irradiaram a política educacional da instituição em regiões importantes do Brasil imperial, influenciando na criação e consolidação de escolas importantes na história da educação brasileira, entre elas, o Colégio Pedro II no Rio de Janeiro e o Colégio Mineiro em Ouro Preto.

A metodologia utilizada teve como suporte a obra de Karel Kosik acerca da revelação da essência do fenômeno, que consideramos ser a história do colégio produzida por seus dirigentes. O instrumental de análise utilizado partiu da referência gramsciana, tendo a categoria da Hegemonia como principal articuladora.

Concluímos que: a) o Colégio do Caraça foi responsável pela formação de uma geração de intelectuais, que fizeram parte da construção de um pensamento pedagógico que predominou o cenário educacional em Minas Gerais no século XIX; b) a cultura corporal praticada no colégio teve papel atenuante no processo de estudo clássico, excessivamente exaustivo, cumprindo a função de fornecer um mínimo de liberdade vigiada aos internos e fez parte das alianças com os setores dominantes da sociedade brasileira no que se refere ao pensamento pedagógico nacional e à formação do Homem Novo sadio, higiênico e humanista.

A EDUCAÇÃO NA IMPRENSA VIANENSE NO 1º QUARTEL DO SÉCULO XX

António José Gonçalves Barroso, Escola EB 23 de Viana do Castelo

O objectivo desta comunicação é realçar a importância do estudo da imprensa para o conhecimento da realidade de um dado território educativo, neste caso o concelho de Viana do Castelo, nas primeiras décadas do século XX.

Colectámos umas dezenas de periódicos publicados neste período, na cidade de Viana do Castelo. Serão referenciados diferentes tipos de publicações periódicas, destacando-se, obviamente, os jornais do campo da Educação e do Ensino.

Embora não sendo um jornal que se enquadre na classificação anterior, A Aurora do Lima, fundado em 1855, será privilegiado, já que foi o único que se publicou ininterruptamente, no período a que se reporta este estudo. Note-se que este periódico continua ainda hoje a ser publicado, sendo o segundo jornal mais antigo do país e o decano dos jornais minhotos. Com base numa amostragem de perto de 3000 números do referido jornal, foi feita para cada número a listagem das notícias e anúncios referentes à Educação, concluindo-se que nos exemplares lidos, 75% apresentavam uma ou mais notícias sobre Educação, ou um ou mais anúncios sobre a mesma temática educativa.

Comparando diversa documentação depositada no Arquivo Nacional da Torre do Tombo e no Arquivo Municipal de Viana do Castelo, com a veracidade das notícias insertas na imprensa vianense, sobre temas educativos, procuraremos demostrar como a imprensa é uma fonte credível para o estudo da História da Educação.Numa pequena cidade como Viana do Castelo, a imprensa era um veículo primordial de informações importantes para a comunidade letrada, logo, a Educação não poderia estar arredada das suas páginas.

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O ENSINO PRIMÁRIO NUM CONCELHO DA BEIRA INTERIOR – TONDELA (1859-1910)

António Manuel Matoso Martinho, Universidade Católica Portuguesa

Com base nas Actas da Câmara Municipal, nos Relatórios do Governo Civil, nos Livros de Termos de Autos de Posse e Juramento de Professores e na Imprensa Local procurámos analisar a implementação e o desenvolvimento do ensino primário no concelho de Tondela no período de 1850 - 1910, embora no Mapa das Escolas criadas pelo Marquês de Pombal, em 1772 já renham sido concedidas ao concelho 4 escolas menores e dois professores de gramática latina.Durante o período em causa identificámos as diferentes escolas de instrução primária elementar distribuídas por 42 localidades, sua frequência (sempre que possível), tipo e natureza das instalações e a participação dos professores nas grandes questões nacionais sobre a instrução primária, como na exposição pedagógica realizada em Tondela (1906) e no Congresso Pedagógico, reunido em Coimbra, promovido pelo Inspector da 2ª Circunscrição Escolar (1906).

A ESCOLA DO TORNE: DINÂMICAS EDUCACIONAIS DE UMA ESCOLA EVANGÉLICA NA TRANSIÇÃO DO SÉC. XIX PARA O SÉC. XX

António Manuel Silva, Faculdade de Letras U. do Porto; José António Afonso, U. do Minho; Silvestre Lacerda, Arquivo Distrital do Porto

Analisa-se a experiência educativa de Escola do Torne (Vila Nova de Gaia), uma instituição fundada em 1868 no âmbito dos movimentos reformistas religiosos portugueses enquadráveis genericamente no campo evangélico.

O seu fundador, Diogo Cassels (1844-1923) dinamizou naquela localidade do Norte de Portugal um projecto de largo alcance que passou pela criação de uma igreja, de matriz episcopal, uma escola elementar e muitas outras iniciativas de carácter religioso, social e cultural.

O papel de Cassels na educação popular, designadamente, causou profundo impacto na comunidade e suscitou apreciações elogiosas em múltiplos sectores, do que são exemplo as referências de apreço de António da Costa Lobo nas Auroras da Instrução pela Iniciativa Particular (1885, 2.ª ed.)., o diploma de “Benemérito da Instrução” concedido pela Liga Nacional de Instrução (1908) e a condecoração do Governo da República com a comenda da Ordem de Cristo (1922).

Focam-se no trabalho aspectos relacionados com a população escolar, as inovações pedagógicas ensaiadas, a articulação da escola com o meio e o estatuto que a instituição alcançou na comunidade local.

ESTADO BRASILEIRO E ENSINO: A SINGULAR EXPERIÊNCIA DO ISEB

Antônio Marques Vale; Universidade Estadual de Ponta Grossa-Pr; Manoel, Ivan Aparecido - Unesp

Nossa pesquisa estuda os cinco fundadores e membros de direção do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). O ISEB, criado em julho de 1955 dentro do MEC, visou "o estudo, o ensino e a divulgação das ciências sociais, notadamente da sociologia, da história, da economia e da política", e corrigir a "hemiplegia" do Ministério que, promovendo a Educação, esquecia a Cultura. Esses intelectuais queriam a transformação do Brasil e sua "descolonização", fornecendo bases teóricas à Educação. Vindos de época já marcada por "planejamento", e, no entanto, por uma Educação mal planejada e por discussão lenta sobre uma futura LDBN, eles tinham escrito sobre universidade em termos de pedagogia, visão de conjunto e ética. Para incentivar o progresso, consolidavam o candidato e Presidente Kubitschek, abriam-se em aliança com a burguesia industrial e buscavam a unidade nacional em torno à "ideologia do desenvolvimento".Contudo, a influência prevalecente do pensamento hegeliano provocou no grupo, além de exaltação do Estado, um

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destaque excessivo da filosofia contra a "técnica": vendo os filósofos como homens do "esclarecimento", consideraram até os diretores de escola simples "técnicos" necessitados de ouvir os primeiros. De notável preparo intelectual, eles eram levados por um idealismo espontaneísta, segundo o qual a Revolução Brasileira se daria a partir da burguesia industrial com a tácita anuência de todos e a todos trazendo ganhos reais. Como intelectuais, evitavam intervenções diretas no campo escolar, pois pretendiam veicular a "ideologia do desenvolvimento" e promover a "Cultura nacional" através dos seus Cursos e conferências. Tratavam de mudança acelerada, de educação de adultos e de formação metódica, científica e crítica. O vetor era o Estado - o de Kubitschek -, donde se originaria "progresso" e emancipação através dos Cursos oferecidos a pessoas de elite, muitas delas militares. Desconsideraram que a sociedade civil, plural e já complexa, buscava assumir o próprio destino, partilhar sem populismo na administração do Estado, promover vida humana: partidos vários, sindicatos, professorado, igrejas, esquerdas, trabalhadores e favelados, exército. O elitismo do grupo nem consentiu num diálogo interno, falho desde a preparação de aulas até o debate de crises como a de 1958, em torno ao nacionalismo e ao capital estrangeiro, e subseqüentes. Do forte apelo isebiano à consciência crítica, mas também da sua experiência grupal, deduzimos que verdadeira intelectualidade exige atenção à multidimensionalidade da condição humana, sobretudo do trabalho educativo.

ONDE É QUE SE APRENDE? O PENSAMENTO DE BENTO DE JESUS CARAÇA, ENTRE A “UNIVERSIDADE POPULAR” E A “BIBLIOTECA COSMOS”

António Pedro do Couto Rocha Pita, Universidade de Coimbra

Ao longo da sua vida, dedicada sobretudo à socialização do que designou por “cultura integral do indivíduo”, qualificada como o “problema central do nosso tempo”, Bento de Jesus Caraça desenvolveu intensa actividade em duas instituições: primeiro, na Universidade Popular Portuguesa, à qual deu uma configuração autónoma em especial a partir da viragem dos anos 20 para os anos 30; depois, na Biblioteca Cosmos, cujo plano é da sua responsabilidade e que irá dirigir até falecer, em 1948.

Para além de tudo aquilo que as aproxima, as duas entidades concretizam modos diversos de desenvolver uma estratégia cultural.O objectivo da pergunta “Onde é que se aprende?” é situar o problema no ponto que interessa a esta comunicação: a actividade da Universidade Popular Portuguesa pressupõe que há um lugar privilegiado para a relação entre o ensino e a aprendizagem (e que esse é o lugar central da cultura) enquanto a iniciativa e o plano da Biblioteca Cosmos assenta no pressuposto de que o lugar da cultura começou a pulverizar-se (isto é, a tornar-se múltiplo) e deixou de ser um sítio onde é preciso ir, tornando-se portátil.

A Universidade Popular Portuguesa e a Biblioteca Cosmos correspondem a pressupostos diferentes, embora não conflituais: Bento de Jesus Caraça percebeu que estão profundamente alteradas as condições de unicidade da mediação pedagógico-cultural: a sala (de aula), a presença (do professor) e a voz (do saber) transformam-se em qualquer lugar, autor e texto.

A INTERFACE SAÚDE/EDUCAÇÃO NO ÂMBITO DO SISTEMA ESCOLAR: A EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE EM ESCOLAS DE UBERLÂNDIA-MG, BRASIL

Aparecida de Fátima Soane Lomônaco, Graça Aparecida Cicillini; U. Federal de Uberlândia

O presente trabalho tem como objeto de investigação o ensino de saúde na escola fundamental, configurado pelas diretrizes curriculares brasileiras como um tema transversal, no qual a saúde deve perpassar todos os conteúdos disciplinares. A reflexão se faz por meio de uma abordagem qualitativa, considerando como importantes interlocutores diferentes sujeitos da comunidade escolar, tais como: professoras de 1ª à 4ª séries, orientadoras, diretoras e supervisoras escolares e pessoal de apoio como merendeiras e auxiliares de serviços gerais. A observação de sala de aula e de ambiência escolar,

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evidenciando-se as práticas e ações ocorridas no cotidiano da escola por meio do paradigma indiciário, foram importantes instrumentos para a configuração do ensino de saúde na escola. A análise demonstra que as mudanças ocorridas na legislação nem sempre acontecem no cotidiano escolar, evidenciando-se na pesquisa a prática histórica dos conteúdos de saúde serem abordados nas aulas de ciências, como também por meio do desenvolvimento de projetos pontuais, como, por exemplo, datas comemorativas. A relação intrínseca entre os diferentes conteúdos e as formas de trabalho interdisciplinares, embora existente no discurso dos interlocutores, não foi evidenciada na prática da educação para a saúde na escola. As concepções e práticas de saúde nas escolas pesquisadas demonstram a existência de um pensamento hegemônico sobre a importância do cuidado com o corpo em detrimento da qualidade de vida e do bem-estar, que aparecem como questões secundárias. As questões de saúde relacionadas à violência, ao consumo ou à justiça social, presentes no cotidiano das escolas, não foram mencionadas na pesquisa. Considerando a função socializadora da escola, os sujeitos da pesquisa consideram a responsabilidade pela saúde inerente ao indivíduo, sendo a família a responsável pela saúde do escolar, cabendo à escola o papel de orientação e informação. A análise demonstra a necessidade de uma reflexão acerca do papel da escola na educação para a saúde a partir do locus onde ela se realiza, uma escola cujo cotidiano se encontra permeado por práticas e concepções centradas no modelo preventivista, e na inserção de novos paradigmas, que considerem os sujeitos na sua totalidade, com aspectos sociais, culturais e econômicos diferenciados a partir de suas realidades.

O 1° CONGRESSO NACIONAL DE ENSINO DA MATEMÁTICA NO CURSO SECUNDÁRIO: UMA ANÁLISE DA PARTICIPAÇÃO DE OSVALDO SANGIORGI E OMAR CATUNDA

Aparecida Rodrigues Silva Duarte, Universidade do Vale do Sapucaí

O propósito deste artigo é levantar alguns elementos que possam contribuir para a compreensão das circunstâncias históricas que levaram à implementação do Movimento da Matemática Moderna (MMM) no Brasil, na década 1960. Buscamos identificar sinais desse movimento, a partir da análise da participação de matemáticos brasileiros no 1° Congresso Nacional de Ensino da Matemática no Curso Secundário, realizado em 1955. Dentre os participantes, destacamos o posicionamento de dois matemáticos: Osvaldo Sangiorgi e Omar Catunda. Ambos eram representantes da Sociedade de Matemática de São Paulo, fundada por André Weil em 1946, cuja participação propiciou elementos importantes no processo de surgimento do MMM no Brasil. Os textos publicados pelos anais do referido congresso expressam as insatisfações dos participantes com a educação ministrada no secundário, seus anseios, bem como suas disposições em participarem de mudanças consideradas prioritárias nesse ensino. Percebemos que estes textos refletem as convicções dos professores da época que antecede esse movimento. A análise comparativa das idéias defendidas pelos matemáticos e educadores de matemática presentes neste evento permitiu elucidar alguns pontos que contribuem para uma reconstrução do percurso da História da Educação Matemática no Brasil. Para tanto, utilizamos dados provenientes de documentos produzidos no período que antecede o MMM, como também daqueles produzidos pelo movimento durante seu desenvolvimento ou que abordem de modo efetivo o assunto. Procurando fazer uma leitura crítica das fontes, valemo-nos da Nova História das Ciências, fundamentandos principalmente em Pestre (1996; 1998) e Belhoste (1998).

O ENSINO SUPERIOR NAS UNIVERSIDADES FUNDACIONAIS MUNICIPAIS CATARINENSES: SUA GÊNESE E O COMPROMISSO COM O DESENVOLVIMENTO REGIONAL X A MERCANTILIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR

Argos Gumbowsky, Universidade do Contestado

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Objetiva-se com o presente documento apresentar a evolução histórica das Instituições de Ensino Superior Fundacionais Municipais no estado de Santa Catarina. Discute ainda, o problema do financiamento e o conflito entre o seu compromisso original de fomentar o desenvolvimento regional e o novo contexto marcado pela hegemonia do mercado. O ensino superior surge no estado de Santa Catarina em 1917, com a criação do Instituto Politécnico, sendo extinto em 1935, motivado por crise financeira. Em 1932 é criada a Faculdade de Direito. No ano de 1960 é criada pelo poder público federal a Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC e em 1965 a Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina - UDESC, pelo poder público estadual. A década de 1960 é marcada pela expansão do ensino superior catarinense com a autorização pelo Conselho Estadual de Educação dos primeiros cursos, cuja instalação se deu no interior do estado, iniciando o processo de interiorização do mesmo. Independente da ação do governo federal ou estadual, fundações educacionais foram sendo criadas, com estruturas administrativas e financeiras próprias - em todos os casos com o aval dos municípios - públicas, portanto - com forte apoio financeiro. Nas décadas de 1960 e 1970, haviam sido criadas dezesseis fundações educacionais pelas prefeituras municipais. A inclusão das IES fundacionais catarinenses, no Sistema Estadual de Educação, remonta à lei federal n. 4.024/61. A criação das IES, por lei municipal, não representou necessariamente a manutenção das mesmas pelo poder público. A partir da Constituição de 1988, os municípios passam a atuar prioritariamente no ensino fundamental, debilitando as fundações municipais. O problema é amenizado com a inserção na Constituição Estadual de Santa Catarina de artigo que estabelece auxílio financeiro às IES municipais. A partir de 1999, estes recursos são repassados sob a forma de bolsas de estudo e de pesquisa. As dificuldades financeiras das IES obrigam-nas a aumentar o valor das mensalidades para garantir sua sobrevivência. A partir da década de 1980 as IES começam a transformar-se em universidades, sejam individualmente, sejam via união de várias fundações. Nesta fase a disseminação da política neoliberal corrobora com a ampliação do número de vagas, cursos e a mercantilização do ensino superior. Constitui-se este documento em parte integrante da Tese de doutoramento defendido junto à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na linha de pesquisa Universidade: teoria e prática.

AS INSTÂNCIAS PROMOTORAS DA EDUCAÇÃO DOS IMIGRANTES POLONESES EM CURITIBA NO SÉCULO XIX: O ESTADO, A COMUNIDADE E A IGREJA.

Ariclê Vechia, Programa de pós – graduação em Educação, Universidade Tuiuti do Paraná

Na década de 1870, o governo da Província do Paraná (Brasil), desenvolveu e passou a colocar em prática um plano de colonização calcado no estabelecimento de núcleos agrícolas nas proximidades dos centros urbanos. Em resultado, Curitiba foi cingida por diversos núcleos populacionais, formados, principalmente, por imigrantes poloneses. Em sua campanha para atrair imigrantes, o Governo Imperial havia oferecido, além de outras vantagens, escolas nas colônias do Estado para educação dos filhos dos colonos. Em um primeiro momento, o Governo buscou assumir para si o encargo de promover o atendimento escolar para os filhos dessa população com características distintas, criando escolas em quatro dos dez primeiros núcleos coloniais estabelecidos nos arredores de Curitiba. A chamadas “escolas” eram simples salas alugadas pelo professor nomeado para provê-la. As aulas de ler, escrever e contar eram ministradas em português, uma vez que, em geral, o professor designado falava apenas essa língua. Uma segunda instância promotora de ensino para as crianças, filhas de poloneses, era a própria comunidade. Mediante os chamados “Comitê dos Cidadãos” - uma instituição formada por voluntários- que tratava dos assuntos sociais, culturais, educacionais e religiosos das colônias, cada comunidade passou a fundar suas próprias escolas e a manter professores que ensinassem em português e polonês. Uma terceira instância da educação escolar era a Igreja. Em algumas colônias, com menor nível de organização comunitária, o padre tomava para si o encargo de ofertar o ensino elementar para as crianças da paróquia. Com o tempo, o Governo, percebendo o fracasso do tipo de escola oferecida, optou por subsidiar as escolas fundadas e mantidas pelas comunidades. A escola almejada era a bilíngüe: a que alfabetizasse em língua polonesa e portuguesa. A língua polonesa era o veículo de transmissão dos valores culturais e da prática da

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religião; a portuguesa, tinha uma função utilitária: era necessário aprende-la para comunicar-se com os brasileiros. Com o advento da República, o Governo expandiu sua rede escolar e fundou escolas públicas na maioria das colônias. Porém, mais uma vez, por falta de verbas e de pessoal, foi obrigado a subsidiar as escolas comunitárias. O estudo tem por finalidade analisar os objetivos, as dificuldades verificadas, os encontros e desencontros entre os anseios da comunidade e o funcionamento das escolas mantidas pelas três instâncias promotoras da educação escolar dos imigrantes poloneses em Curitiba no século XIX.

CONSTRUTORES DE IDENTIDADES: OS LIVROS DIDÁTICOS NA ESCOLA SECUNDÁRIA BRASILEIRA

Arlette Medeiros Gasparello, Universidade Federal Fluminense

O texto refere-se às conclusões de pesquisa sobre os livros didáticos de História do Brasil utilizados na escola secundária brasileira de 1838 a 1920, que teve por objetivo compreender a expressão pedagógica dos conceitos de nação e de nacionalidade em diferentes períodos dessa história escolar. Teve como locus privilegiado de análise o Colégio Pedro II - instituição secundária oficial do Império Brasileiro, fundada em 1837, no Rio de Janeiro - e a temática nacional como perspectiva de análise. Nos marcos conjunturais do tempo/espaço da pesquisa, as questões foram situadas no interior de um ensino secundário que se tornava nacional - como parte do amplo processo político de controle e centralização do governo central.

Na construção do imaginário popular sobre a nação, um importante papel foi exercido pela educação escolar. Profundamente inscritos no processo de escolarização, como veículos privilegiados dos saberes a serem ensinados, os livros didáticos tornaram-se instrumentos pedagógicos cada vez mais utilizados por professores e alunos, fortalecendo um processo de produção e reprodução de práticas e representações sociais no mundo escolar.

Na experiência histórica brasileira, a exigência de se construir simbólica e objetivamente a nação configurou-se particularmente em dois importantes momentos daquele século: no período que se seguiu à nossa autonomia política, quando emerge a necessidade de definir o nascente Estado brasileiro e no final do século, numa conjuntura marcada pela transição da ordem monárquica para a republicana. Na divulgação/construção da identidade nacional, os livros didáticos adotados no Colégio Pedro II desde o seu primeiro ano letivo até o período inicial da República foram analisados como referenciais importantes desse processo.

Neste trabalho, são discutidas principalmente as questões que se referem à produção inicial da historiografia didática, um período que lançou os primeiros desafios concernentes à questão da prática de escrita e uso de livros escolares e que ajudaram a tecer os sentidos e noções da construção do conceito de livro didático. Numa abordagem sociocultural, o texto analisa a contribuição exercida pelos livros escolares no amplo processo de fabricação de um imaginário nacional, considerando-os construtores de identidades, na medida em que expressam as representações sobre a sociedade histórica na construção de indivíduos sociais. Tais categorias históricas, na perspectiva de Norbert Elias, ajudam a compreender a formação de identidades nacionais, na pluralidade dos diferentes momentos/modelos da pedagogia da nação: os modelos da história patriótica, da história imperial e da história republicana.

A ESCOLA COMO CARTÃO-POSTAL: AS PRÁTICAS DISCURSIVAS DO OLHAR NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO AO INÍCIO DO SÉCULO XX

Armando Martins de Barros , Universidade Federal Fluminense

A comunicação aborda pesquisa que investigou o estatuto epistemológico das fotografias em suporte cartão postal, enquanto documento historiográfico. O corpus do trabalho constituiu-se de série com sessenta e cinco cartões-postais que servem de suporte a fotografias realizadas por Augusto Malta entre 1906 e 1912, tematizando a educação primária pública na Cidade do Rio de Janeiro, à

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partir da valorização da arquitetura escolar, do entorno urbano, da prática de ensino e de atividades extra-classe.

Na série estudada imagens de vinte e cinco escolas construídas ao fim do Império e início da República, localizadas em áreas reformadas da cidade do Rio de Janeiro - Centro e Zona Sul - detentoras de arquitetura, recursos docentes e pedagógicos condizentes ao exercício de várias turmas e classes.

Os postais indiciaram um discurso não verbal, afirmativo de projeto ideológico de modernidade e progresso, sobredeterminando o papel da escola. Como cenário de fundo, a cidade do Rio de Janeiro na reforma urbana promovida por Pereira Passos (1903-6). As construções escolares e o cartão postal fotográfico realizavam-se como prática educativa discursiva, justificando políticas públicas para educação e moradia com características de exclusão dos grupos populares.Em seu tratamento, as imagens são analisadas em sua condição de monumento, expressão recortada de uma realidade visível, indiciando um projeto de modernidade excludente, promovido pelas elites gestoras do Estado. As fotografias presentes na série postal velam ao olhar a imagem da maioria das escolas primárias públicas então existentes - caracterizadas pela precariedade das condições materiais, pedagógicas e docentes.

Concluimos que o estudo do circuito social do postal indiciou uma cultura do olhar, materializada na rede de editores, fotógrafos, comerciantes, colecionadores, remetentes, destinatários, leitores, espectadores, todos envolvidos em práticas que tornam heterogêneas as leituras das imagens, indiciando disputas pelo território da significação.

O cartão postal é expressão de um tempo outro. Nós o lemos como algo "fora do presente". Ali, no postal, "éramos aquilo" e ao realizarmos a ação de lê-lo, fruindo as imagens e o seu verso, aconchegamos ao que somos um passado recente ou antigo mas, sempre, cindido ao presente. Articular as falas desses lugares diferentes, seja um dos desafios aos pedagogos, em seu esforço em tornar a prática da escrita mediação na construção de sujeitos, no exercício da cognição, no estímulo à sociabilidade.

DO CLAUSTRO ÀS ARCADAS: O PRIMEIRO SÉCULO DE HISTÓRIA DA FACULDADE DE DIREITO DO LARGO SÃO FRANCISCO NA CIDADE DE SÃO PAULO

Arnaldo Romero, UFMS

A história de uma instituição pode ser contada de várias formas: pela sua arquitetura, pelas memórias de seus membros e também por meio de sua relação com outras instituições. Inspirada na Universidade de Coimbra, a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, na cidade de São Paulo, criada por Pedro I, em 1827, foi inicialmente instalada no claustro do Mosteiro de São Francisco, adaptado para receber os alunos. Segundo historiadores da escola, fiéis e estudantes freqüentavam o mesmo espaço físico, considerado pátio da igreja pelos fiéis e pátio da escola pelos estudantes. Há relatos de desavenças entre os dois grupos e entre o superior franciscano e o diretor da academia quanto ao horário e aos objetivos do toque dos sinos, se profanos ou religiosos. Considerando que esses conflitos entre Igreja e Estado caracterizaram a segunda metade do século XIX no Brasil, o objetivo deste trabalho é descrever a história dos primeiros cem anos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco através da biografia de seus diretores, como parte desse processo. No primeiro século de sua existência, a Faculdade de Direito teve 15 diretores, em sua grande maioria oriundos de famílias paulistanas. Com exceções pontuais, como a dos quatro primeiros, formados em Coimbra, os titulares da direção da Academia foram seus ex-alunos e/ou ex-professores, o que indica a construção de uma tradição. Esse traço aparente da estreita vinculação entre a Academia e a família paulistana, vai pouco a pouco desenhando uma escola formadora de líderes para São Paulo e, à medida que a cidade se transforma na principal do país, vai emprestando seus ex-alunos, ex-professores e ex-diretores para a composição da elite dirigente, política, científica e cultural da nação. Muito mais que um espaço de ciência e formação de estudantes, as Arcadas (evocando os Geraes da Universidade de Coimbra) serviram, ao que parece, para cultivar a “fina flor” da elite paulistana, possibilitando a constituição de várias gerações de juristas, pensadores, intelectuais e políticos que se revezaram no poder, entre os quais, 10 presidentes da República e 18 governadores de São Paulo.

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O ESPIRITISMO E A PEDAGOGIA DAS ELITES

Artur Cesar Isaia, Universidade Federal de Santa Catarina A comunicação toma como fonte o chamado “Pentateuco”, os cinco livros básicos da codificação que Allan Kardec efetuou da doutrina espírita: o Livro dos Espíritos, o Livro dos Médiuns, o Evangelho Segundo o Espiritismo, o Céu e o Inferno e a Gênese. Além das obras codificadoras do Espiritismo francês do século XIX, debruça-se sobre fontes relativas ao Espiritismo brasileiro, com o objetivo de estudar a ênfase pedagógica de seu discurso. Guardando familiaridade com um prisma bastante desigual de idéias (liberalismo, positivismo, utopias sociais, entre outras), o Espiritismo vai reiterar duas características definidoras: a ênfase no livro e no papel magisterial de uma elite. Quanto à primeira característica, fica explícita a preocupação do Espiritismo em estender a alfabetização, a fim de possibilitar a leitura e discussão da obra de codificação e seu esforço em instituir uma identidade livresca e próxima dos valores caros à modernidade. Em relação à segunda característica, as fontes estudadas, insistem no papel formador das elites intelectuais, vistas como capazes de socializarem os conteúdos de um sistema de idéias que se quer simultaneamente científico e religioso. No Brasil, o Espiritismo vai estruturar-se insistindo no aspecto formador, com seus núcleos funcionando como escolas, ministrando cursos, programando palestras, organizando grupos de estudos. Em todas essas ocasiões reitera-se a importância do livro e da leitura, atualizando-se a característica intertextual do Espiritismo e sua proposta que alia necessariamente a conversão à aprendizagem.

AS “QUESTÕES EDUCATIVAS” NO QUINZENÁRIO A VIDA PORTUGUESA: O CONTRIBUTO DE LUÍSA SÉRGIO PARA A EDUCAÇÃO DAS CRIANÇAS

Artur Manso, Universidade do Minho

Nesta comunicação pretendemos, no âmbito da publicação ligada à Renascença Portuguesa, A Vida Portuguesa, que se tinha assumido como “quinzenário de inquérito à vida nacional”, apresentar os contributos de Luísa Sérgio que com outros colaborou na secção intitulada “questões educativas”, tendo feito incidir a sua reflexão na problemática que se prendia com a educação das crianças, nas idades compreendidas entre o nascimento e os sete anos.

Aqui daremos conta como a pedagoga, partindo do novo conceito de criança e das aportações psico-sociais com que o movimento da Escola Nova, de que foi uma das principais divulgadoras entre nós, ia alimentando os grandes debates em torno da educação e da instrução, destacando, em consequência, o papel da família e da escola, a organização escolar e a utilidade da aplicação de diversos métodos pedagógicos que melhor serviam as novas práticas lectivas, a necessidade de se promover uma boa educação moral e cívica, bem como da importância da actividade lúdica no desenvolvimento infantil.

RELAÇÕES DE PODER: DOMINAÇÃO E RESISTÊNCIA NO INTERIOR DAS PRÁTICAS E DO COTIDIANO ESCOLAR

Áurea M. Guimarães, Faculdade de Educação da Unicamp

Proponho, nesse trabalho, olhar a instituição escolar com o objetivo de apreender a forma como se tecem as relações de poder de dominação e de resistência no interior de suas práticas e do seu cotidiano. Trago para o debate dois autores que, por meio de perspectivas diferentes, podem nos acompanhar nos jeitos de se pensar e de se olhar a circulação de poderes nessas instituições.

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Um dos nossos interlocutores será Michel Foucault. Considerado um arqueólogo, ele olha para as instituições e procura descobrir como se dão as relações de saber, isto é, como os saberes aparecem, desaparecem, se modificam, como alguns saberes são considerados verdadeiros e outros não. Por outro lado, a sua genealogia nos orienta na direção das relações de poder, das táticas e estratégias que se articulam no interior das instituições.

Michel Maffesoli, por sua vez, nos fala de uma tensão entre poder e potência. Enquanto o poder tem como lógica a dominação, a redução ao uno, a potência conduz ao pluralismo, à diversidade do real.

Para Foucault, a escola é entendida como um lugar de confinamento, onde se aprende uma situação de dependência em relação ao professor. A disciplinarização não se restringe ao corpo e se estende à disciplinarização do conhecimento. O aluno adquire o hábito da rotina, da repetição, de uma memorização que apaga a memória do “eu” enquanto criador de espaços de liberdade.

Para Maffesoli, ao lado de um poder que se espraia em todas as direções, existem nas instituições em geral, e, nas escolas, em particular, ruídos, rupturas que, espalhadas pelo interior dos grupos de alunos, professores, funcionários, abrem brechas diante das imposições das normas.

A partir dos referenciais desses autores, explicitarei os rumos de duas pesquisas realizadas na década de 80, junto a algumas escolas estaduais da cidade de Campinas, S.P., Brasil, relatando, num primeiro momento, as possíveis relações entre a depredação escolar e o rigor dos sistemas disciplinares, para, num segundo momento, acompanhar a forma como se entrecruzavam ações mais frontais contra a instituição (depredação - brigas - ações das gangs e das turmas) e outros tipos de reações (zombarias - risos - ironias - silêncios - tagarelices - fofocas) que não se opunham abertamente em relação ao poder instituído, mas significavam também a recusa de submeter-se, porém de modo passivo e duplo.

PASTORA OU PARTE DO REBANHO? ENUNCIADOS CATÓLICOS CONSTITUINDO A PROFESSORA DO SUL DO BRASIL EM MEADOS DO SÉCULO XX

Beatriz Daudt Fischer, UNISINOS

No Brasil, a década de cinqüenta do século XX tem sido identificada como um tempo bom de se viver. Com a consolidação da democracia, proliferam discursos anunciando o progresso social. O magistério é encarado como uma sublime missão, tendo nas mestras pessoas responsáveis pelo preparo de futuros cidadãos para a pátria e herdeiros do céu. A pesquisa que apresentamos, entretanto, identifica um contexto não tão sublime assim. Adotando o recorte temporal entre 1950 e 1970, o estudo partiu do pressuposto de que a mulher professora, formada em escola de inspiração católica, encontrava o sentido de suas práticas em referenciais da ordem do sagrado ou religioso. Ao longo do tempo, porém, forças divergentes tornariam possível a emergência de novos enunciados, sustentando novas práticas, mas sem condições de permanência. A professorinha de então, sem saber, é poderosa e, ao mesmo tempo, e na mesma intensidade, não assume poder algum. Desde sua formação inicial, sutis mecanismos de controle e normalização colaboram para que, através dela, outras forças se exerçam com vigor. Na tentativa de melhor compreender o contexto discursivo de então, a pesquisa selecionou alguns dos principais periódicos em circulação no estado do Rio Grande do Sul/Brasil. Também a Revista do Ensino, considerada na época periódico indispensável ao trabalho docente, foi exaustivamente pesquisada. Igualmente incluíram-se fotos, cadernos de anotações, recortes e lembranças de acervos particulares. De modo especial há que se destacar os dados provenientes das fontes vivas: depoimentos colhidos a partir das lembranças de quinze professoras com idade em torno de 70 anos. Pastoras ou parte do rebanho? Como descrever essas mulheres que, esquecendo-se de si próprias, negavam sua natureza de jovens com desejos e buscas pessoais, inserindo-se em sítios distantes, exercendo o magistério com enormes sacrifícios e poucos ganhos materiais? Sob a perspectiva de Foucault, os documentos analisados permitem explicitar enunciados que se sustentam em forças advindas de um catolicismo conservador, subjetivando a mulher professora a determinadas formas de ver e de agir sobre o mundo. A partir desta perspectiva, enunciados de fundo católico não passam de enunciados normalizadores, articulados a forças políticas em luta, cuja dinâmica se opera no tensionamento entre conservação e mudança. Ou, dito de outro modo, em torno de jogos de

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poder.Tramas complexas materializam-se através de práticas, discursivas ou não, trazendo à tona um passado ainda presente.

ALZIRA ALVES VILELLA (1893- 1925): A PROFESSORA TECENDO A RES PÚBLICA NAS ENTRANHAS DAS MINAS GERAES.

Betânia O. Laterza Ribeiro, UEMG e Elizabeth Farias da Silva, UFSC

Ela, como aluna, foi a primeira geração a receber o "discurso fundador" da então recente República brasileira (1889).Como professora do Grupo Escolar de "Villa Platina" -município do Triângulo Mineiro (Minas Gerais)-também, fez parte da primeira geração a propagar a coisa pública e corolários para a nova forma de governo. Alzira Alves Villela, privilegiada por nascimento, privilegiável fez-se pelo contexto e texto de sua vida. Na confluência dos acontecimentos impôs pauta. Casou-se contra a vontade da família e assumiu viuvez com um filho e um ano de casada. Na sala de aula representava a "feminização" da profissão. No início da industrialização e urbanização, no interior do Brasil, de trem, viajava do Oeste (Triângulo Mineiro) para o sul de Minas Gerais (Alfenas) onde fazia a Faculdade de Farmácia. Pertenceria a turma de 1925. Faleceu, no dia 31 de outubro. No Estado de Minas Gerais o grupo escolar aparece em 1906, sob a determinação legal (Lei n° 434 de 28 de setembro de 1906) no governo estadual encabeçado por João Pinheiro, um positivista. Materializando, o grupo escolar, o artigo 21 da referida Lei. O grupo escolar, com origem em São Paulo, na sua forma exala o conteúdo de parcelas da elite republicana brasileira em livrar-se, de maneira a ela peculiar, dos precários indicadores educacionais herdados do Império, bem como de tentar rearanjar-via a educação pública- um novo simbólico e imaginário para a nascente República, onde a primeira Constituição republicana garantia um Estado totalmente laico após quatro séculos de vínculo incestuoso com a Igreja Católica, ligada a Roma. A prática profissional de Alzira Alves Vilella, em um grupo escolar do Triângulo Mineiro, demonstra, para além da doxa estabelecida pela sociedade política, táticas de uma subordinada às suas diretrizes. Apresentamos com a biografia da professora Alzira Alves Vilella, enfatizada na identidade profissional, parcela da cultura escolar republicana no interior do Brasil em sua génesis. Priorizamos documentos onde constam os planos de aulas, correspondências oficiais e fichas de chamadas da professora. Esta comunicação surge como a concretização de um dos eixos da pesquisa denominada: "Primórdios da escola pública republicana do Triângulo Mineiro". Nos dizeres escritos da professora analisamos o discurso contextualizado. Na conclusão emerge uma figura com representação social e papel extemporâneos.

A POLÍTICA EDUCACIONAL DO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL: A MEDIAÇÃO ENTRE O ESTADO E A IGREJA (1889/1930)

Berenice Corsetti, Universidade do Vale do Rio dos Sinos

O trabalho que apresentamos trata da política educacional implementada pelo Estado do Rio Grande do Sul/Brasil, no período de 1889/1930, quando um projeto de modernização conservadora foi implementado pelos líderes políticos de orientação positivista. Essa política articulou ações a nível nacional com iniciativas no plano regional, entre as quais destacamos a importante mediação do Estado com a Igreja Católica, que buscou o atendimento dos objetivos das duas Instituições.

No plano de uma acomodação de interesses, o Partido Republicano Rio-Grandense (que comandava politicamente o Estado) e a Igreja Católica desenvolveram um relacionamento que, mesmo não isento de divergências, serviu à concretização dos projetos por eles desenvolvidos. O apoio da Igreja foi elemento importante no processo de dominação republicana no Estado. Por outro lado, o favorecimento à Igreja, oportunizado pelos republicanos, facilitou a consolidação da posição pretendida pela instituição católica no Rio Grande. Enquanto a Igreja solidificava sua força na região, os republicanos obtinham o seu concurso para conquistar o apoio político especialmente das populações coloniais e, também, das camadas médias urbanas e inclusive do operariado. As diretrizes

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da Constituição Estadual de 1891, bem como a perspectiva positivista em termos educacionais, deixaram o campo aberto e a Igreja não perdeu a oportunidade montando, em poucas décadas, uma rede de escolas que atingiu todo o Estado, tanto Porto Alegre como as cidades do interior.

Desde o início da gestão republicana, a ocupação dos espaços educacionais situou uma disputa permanente entre o público e o privado, especialmente na região colonial, onde a questão da nacionalização do ensino era também da maior relevância, nos marcos da ação política republicana. A questão da expansão do ensino, elemento fundamental da política educacional pretendida pelos republicanos, foi aresta difícil de ser aplainada.

A disputa com o Estado, no campo do ensino primário, significou a sinalização de que o Estado não abria mão de ser o educador por excelência do trabalhador que o capitalismo necessitava para sua consolidação e pleno desenvolvimento. Não foi por outra razão que o Estado investiu de forma expressiva no ensino primário e foi nesse nível que, no período de nosso estudo, se concretizou sua preponderância no setor. Ao findar a Primeira República, essa tendência era evidente, restando à Igreja Católica o ensino primário das elites e o ensino secundário onde, então, teve presença dominante.

A DOMINAÇÃO MASCULINA NO ETHOS DO “GAÚCHO DA FRONTEIRA”(DO BRASIL COM O URUGUAI) NO SÉCULO XX – PERMEANDO OS DITADOS POPULARES QUE INTEGRAM A MEMÓRIA REGIONAL – E SUA REPERCUSSÃO NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO SUL-RIO-GRANDENSE

Berenice Lagos Guedes de Bem, Universidade Federal de Pelotas, RS/Brasil

RESUMO: Este trabalho refere-se a relações de gênero imbricadas na História da Educação (que tem sido discriminatória e excludente), tendo o propósito de relatar o uso dos ditados populares freqüentes no cotidiano doméstico e escolar do Gaúcho da fronteira do Rio Grande do Sul (Brasil) com o Uruguai, no início do século XXI, como instituidores e reprodutores de uma sociedade que se constituiu androcêntrica por excelência, de origem agrária, militar e patriarcal, que formou historicamente o tipo social característico da região, o “Gaúcho”. Este assume na região da fronteira um exacerbado sentimento de posse, permeado pela dominante postural sexista masculina, onde, ainda na atualidade, a mulher é vista como subalterna, coadjuvante, idealizada para a maternidade e a submissão.

Esta pesquisa foi realizada junto às professoras-alunas do Programa de Formação de Professores em Serviço – Pedagogia, da Universidade da Região da Campanha (URCAMP/Bagé/RS) em 2003.

Buscou-se um resgate histórico das origens (e da conseqüente perpetuação da dominação masculina) que forjaram o ethos do gaúcho fronteiriço, formado em um cenário de lutas contra os espanhóis pela demarcação do território, constituído como homem valente, guerreiro e rude, desprezando sentimentalismos e cultuando, até o presente, os valores de um “passado heróico” onde foi criado o mito da coragem, bravura e violência, enaltecendo a supremacia masculina e influenciando a História da Educação da fronteira. Utilizou-se o conceito de dominação masculina segundo a ótica de Pierre Bourdieu (1999), bem como o de habitus e dominação simbólica, considerando-se os ditados populares como um dos indicadores da “inculcação” e da “naturalização” dessa dominação, uma vez que, neles, a mulher é vista como “propriedade”, comparada à égua e devendo ser “domada” e o homem é enaltecido como a figura mítica do “centauro do pampa”, numa sociedade prenhe de símbolos e representações do imaginário machista predominante na região.

Neste trabalho foram analisados alguns dos muitos ditados populares advindos da tradição oral e de compilações realizadas por Victor Russomano (1948/1949) e Sylvio Echenique (1980).Pela pesquisa pôde-se perceber que os ditados populares são de uso freqüente, sendo repetidos tanto por professores como alunos, na zona rural e urbana da Região da Fronteira, como um meio de criar, reforçar e perpetuar a superioridade androcêntrica, despertando nas mulheres o “preconceito desfavorável”, de que fala Bourdieu (1999), pela repetição constante de sua condição de

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subalternidade e a “naturalização” da dominação masculina – e que este viés vêm permeando a História da Educação Sul-rio-grandense.

O MÉTODO DO GATO

Carla Simone Chamon

O objetivo da presente comunicação é analisar a série de livros de leitura (primeiro, segundo e terceiro), destinados aos alunos do ensino primário, escritos por Maria Guilherrnina Loureiro de Andrade no final do século XIX procurando mostrar como esse material deu visibilidade e colocou em circulação no Brasil algumas idéias do repertório pedagógico norte-americano.Maria Guilherrnina foi uma importante educadora brasileira que, diferentemente de outras mulheres de seu tempo, experimentou uma inserção destacada no campo educacional: participou de exposições e congressos pedagógicos, participou da reforma Caetano de Campos em São Paulo (1890) e da reforma João Pinheiro em Minas Gerais (1906), além de ter estudado durante quatro anos nos Estados Unidos nos anos oitenta do oitocentos. Além disso, escreveu e traduziu manuais escolares, colaborando para romper com o monopólio masculino no campo da produção escolar.A série de livros de leitura de Maria Guilherrnina, escritos em 1894/1895, e publicados nos Estados Unidos, foram importantes não só porque ela era uma mulher a penetrar em domínio predominantemente masculino, mas também por utilizar um novo método de leitura, representando uma inovação no campo educacional brasileiro: o método da palavração. O ensino da leitura nas escolas brasileiras no final do século XIX e início do XX era, em geral, realizado através dos métodos sintéticos -soletração e silabação, nos quais se baseavam as cartilhas tanto nacionais quanto as que eram traduzidas. Nos chamados métodos sintéticos, o ensino partia do conhecimento das letras do alfabeto para o conhecimento das sílabas e daí para as palavras. Já nos processos analíticos -palavração e sentenciação -o ensino da leitura começava pelas palavras e pelas frases simples.Entretanto, mais do que introduzir nos seus livros de leitura o método da palavração, sintonizado com uma proposta pedagógica considerada mais moderna racional e ativa, como já foi apontado por alguns autores, Maria Guilherrnina tentou compor seu manual com vários métodos, o que ela denominou de método eclético de leitura. A combinação que ela fez dos métodos de palavração, sentenciação e fonético foram o resultado do esforço dessa educadora de "traduzir" para o Brasil os modernos métodos de leitura empregados nos Estados Unidos, fazendo circular assim uma outra concepção a nortear "o que, como, quando e por quê" ler.

A POLÍTICA DO LIVRO ÚNICO NA REFORMA LICEAL DE 1947: O CASO DA DISCIPLINA DE CIÊNCIAS FÍSICO-QUÍMICAS

Carlos Beato, Escola Sec. José Afonso

A última reforma global do ensino liceal durante o período do Estado Novo em Portugal concretizou-se a partir de 1947 com a publicação dos decretos fundacionais, nomeadamente os diplomas da reforma propriamente dita (DL 36507 de 17/9/47) e do Estatuto do Ensino Liceal (DL 36508 de 17/9/47).

O Estatuto que se pode caracterizar, formalmente, por ser constituído por 573 artigos em quarenta páginas no formato habitual do Diário do Governo com cerca de 500 palavras por página, procurava ser o padrão regulamentador e regulador de todos os aspectos da vida escolar nos liceus. Aí estavam contidos 31 artigos (capítulo XII) que enunciavam a chamada política do “livro único”, um dos instrumentos fundamentais para o controlo da vivência nas escolas. Esse controlo, que o Estado sempre procura fazer enquanto “promotor do ensino”, reflectia-se na preocupação central com as questões de doutrinação e formação ideológica e, por isso, os manuais para uso dos estudantes não poderiam deixar de ser objecto de formatação apertada.

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Com base num estudo efectuado recentemente (dissertação), tentar-se-á mostrar que o percurso foi bem mais sinuoso que o previsto pelo legislador e, em apoio a essa ideia, será feita uma análise dos aspectos concretos da implantação dessa política procurando evidenciar as fissuras ou brechas que o sistema não conseguiu, na prática, evitar.

A comunicação que se propõe versará, portanto, sobre essa política e tratará da legislação, respeitando aos manuais, adoptada na reforma de 1947, mas também do modo como foi praticada. Haverá um desvendar dos artigos principais da legislação sobre os concursos de apuramento do “livro único” e procurar-se-á apresentar o funcionamento real desses concursos no processo que conduzia à adopção dos manuais. Mostrar-se-ão alguns dos resultados e consequências da metodologia adoptada, tomando como referência o caso da disciplina de Ciências Físico-Químicas, que realçam as dificuldades e as contradições do processo.

HISTÓRIA, TRABALHO E EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA REGIÃO DE CAÇADOR – SC (1970 – 2001)

Carlos Alberto Lucena, Universidade Federal de Uberlândia; José Claudinei Lombardi, Universidade Estadual de Campinas

Na região de Caçador, no oeste estado de Santa Catarina, predomina o ramo agroindustrial. Verifica-se a presença de pequenos produtores rurais integrados à produção de frangos e suínos, pequenos produtores de tomate e um amplo segmento voltado para a indústria da madeira. O desenvolvimento econômico da região deve ser compreendido articulado ao avanço do capitalismo monopolista no Brasil que, paulatinamente, foi implementando mudanças estruturais que visavam garantir o acesso a matérias primas e ao escoamento da produção. Esse processo influenciou a formação profissional dos trabalhadores da região. Tendo como recorte histórico o período correspondente entre 1970 a 2001, verificou-se o desenvolvimento de um discurso ideológico defensor do determinismo tecnológico que tinha como objetivo estabelecer a relação causal em que um maior nível de automação só se efetivaria com um maior nível de escolaridade dos trabalhadores. A análise das fontes pesquisadas como documentos que nortearam os cursos de formação dos trabalhadores do Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e do Sesi (Serviço Social de Indústria), currículos dos cursos de formação profissional oferecidos pelas empresas da região, currículos dos cursos oferecidos pela Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina) articuladas aos resultados de uma pesquisa de campo com trabalhadores dos diferentes segmentos, apontaram a existência de condições precárias de trabalho. O crescimento da automação foi acompanhado pela existência de trabalhadores com nível escolar inferior aos das regiões mais desenvolvidas do Brasil apesar de realizarem tarefas similares. O baixo escolar e salarial é um indício de um movimento histórico do capital que expande a produção para regiões em que os custos da produção são menores. O estudo teve como preocupação problematizar as formas de organização técnica da produção na região e a educação para o trabalho. Isso possibilitou verificar a existência de conflito de saberes. Ao mesmo tempo em que se desenvolve uma concentração crescente da tecnologia sob o domínio das instituições formativas, consolidam-se processos de expropriação dos conhecimentos tácitos desses mesmos trabalhadores. Esta pesquisa, realizada entre os anos de 2001 a 2003, foi desenvolvida junto à Universidade do Contestado, em Santa Catarina, e contou com financiamento da Funcitec (Fundação de Ciência e Tecnologia do Estado de Santa Catarina).

O LUGAR DA ESCOLA NA CIDADE

Carlos Augusto de Amorim Cardoso, Universidade Federal da Paraíba

A investigação procurou analisar o processo de estruturação da cidade da Parahyba do Norte na sua relação com as reformas urbanas e as reformas educacionais, através das ações dos administradores públicos e da observação da reforma curricular da Escola Normal, que incluía noções

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de urbanidade, de disciplina, de bem estar, de higiene e de educação moral. A reforma curricular fez com que a vida das ruas começasse a adentrar aos muros da escola: uma modernização urbana refletida na criação de cadeiras especiais e no estabelecimento de um serviço de higiene. A pesquisa constou de coleta de artigos e reportagens da revista Era Nova e do Jornal O Educador, no Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, de documentos oficiais (atas, relatórios, leis, etc.) da Assembléia Legislativa e do Arquivo Histórico do Estado. A investigação possibilitou ainda a análise da cidade diante do processo de reajustamento urbano, imposto pela nova disciplina republicana que reivindicava uma cidade moderna. Neste sentido, a pesquisa conclui que a idéia de moderno e o de urbanizar no período de 1910 à 1930 era sinônimo de sanear, embelezar e iluminar. E nesse sentido, a atualização formal do sistema escolar, na então cidade da Parahyba, deu-se simultaneamente à introdução, na década de 10 do século XX, de modernos equipamentos urbanos, tais como o abastecimento de água, a iluminação elétrica e os bondes movidos à eletricidade Os progressos da cidade deveriam estar, tecidos junto aos aspectos de ordem educacional para que a sociedade possa se apropriar do urbanismo.

O COLÉGIO DE JESUS E O COLÉGIO ANTÔNIO VIEIRA EM SALVADOR-BAHIA

Carlos Bresciani e Stela Borges de Almeida - Cohiba/Cav E Ufba

Esta comunicação resulta de dois trabalhos de pesquisa e examina duas edificação jesuíticas na Bahia: o antigo Colégio de Jesus na Cidade de Salvador( 1549) e o Colégio Antônio Vieira ( 1911) e sua importância na colonização e missão pedagógica. O primeiro e único texto de pesquisa encontrado, em Salvador, elaborado por Carlos Bresciani, remonta as origens do processo de colonização no Brasil com a chegada dos primeiros jesuítas e examina, especificamente, as estruturas de edificação do primeiro colégio jesuíta no Brasil, responsável pela formação dos inacianos e a formação do Pe. Antônio Vieira. Entende o Colégio da Companhia de Jesus como uma instituição com o objetivo de formar missionários para o Brasil. Utiliza como referência principal a obra de Serafim Leite, sistematizando e relendo as principais anotações sobre este monumento e informando o processo de sua instalação. O segundo, remonta a construção e instalação do colégio jesuíta de larga tradição na vida da cidade do Salvador-Bahia, o Colégio Antônio Vieira, responsável pela formação de segmentos de camadas privilegiadas desta cidade. A reconstrução da implantação da instituição realizou-se através de uma coleção de negativos em vidro produzida por estudiosos europeus. Esta coleção foi divulgada, principalmente, por periódico originado em Portugal ( 1902) e, em Salvador, foi acrescida e enriquecida pela iconografia fotográfica das expedições científicas pelo interior da Bahia, retratando aspectos da flora baiana e de agrupamentos humanos característicos da região nordestina. A hipótese que trabalhamos é de que estas duas edificações espelham o olhar renascentista na “perspectiva artificialis” encontrada nos panópticos divulgados nos séculos XVI e XVII e reproduzidos na contemporaneidade.

PROCESSO DE FORMAÇÃO DE IDENTIDADE NEGRA EM COMUNIDADES REMANESCENTE DE QUILOMBO: UM ESTUDO SOBRE AS COMUNIDADES DE BARRA, BANANAL E RIACHO DAS PEDRAS

Carlos Eduardo Carvalho de Santana, Universidade do Estado da Bahia

A comunicação proposta pretende apresentar o processo de formação de identidade em comunidades remanescentes de quilombo no Estado da Bahia, Brasil, entendendo este processo como um processo educativo. Localizadas na Chapada Diamantina, nas proximidades da cidade de Minas do Rio de Contas, antigo pólo de mineração de ouro, as comunidades quilombolas estudadas são das poucas já reconhecidas e tituladas pelo governo brasileiro como conseqüência das determinações da Constituição Federal de 1988. A dinâmica da existência das comunidades remanescente de quilombos se constitui como um elemento contestador e ao mesmo tempo alternativo de conceber e se perceber o mundo. O estudo das Comunidades Negras de Barra, Bananal e Riacho das Pedras dará visibilidade a outras formas de ser e estar no mundo com outros os valores e concepções que não

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necessariamente coincidem com a sociedade moderna, ou pós-moderna, ou outras formas contemporâneas de ser e estar no mundo. Logo, este estudo inaugurará um dialogo pautado em outras formas de percepção de comunalidade; outras formas organizacionais de espaço/território, e mesmo outras concepções de relacionamento, baseado em valores como ancestralidade, solidariedade e cooperativismo. Neste sentido, estou considerando a identidade de um grupo social como um processo construído a partir de símbolos ou valores que carregam em si um significado aos indivíduos que se incluem (ou excluem-se) naquele circulo convivencial. O sentimento de pertencimento, percebido nas comunidades negras remanescentes de quilombos se dá a partir de um passado comum, cujos laços de parentescos reforçam e revivifica esse sentimento. A memória tem um papel fundamental na afirmação identitário do grupo, pois é nela que se fundamenta o continuum entre passado-presente num jogo de resignificados e relaborações, construído coletivamente. A terra onde os antigos viveram não será apenas um lugar de lembranças, mas sim um espaço vivo, cujo sentido exibirá um significado existencial apenas para aqueles que se identificam com ela. Fundamentalmente, é na tradição oral que os sentidos e os significados são passado de pai para filho, e a palavra, o dialogo, o argumento e o conselho, que constituem práticas essenciais na vida dessas comunidades, terminam por configurar e propiciar a própria dinâmica existencial do grupo. O estudo quer resgatar, assim, a existência de um processo pedagógico de formação dessa identidade, calcado numa história /memória da resistência à escravidão e à exclusão.

CIÊNCIA E ARTE DE EDUCAR: ENSAIO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE AS IDÉIAS DE ANÍSIO TEIXEIRA E A FORMAÇÃO DO CAMPO DA PESQUISA EM EDUCAÇÃO NO BRASIL

Carlos Eduardo Vieira, Universidade Federal do Paraná

A intenção deste trabalho é discutir, a partir de alguns marcos históricos e teóricos, a configuração da Área da Pesquisa em Educação no Brasil, enfatizando particularmente as dificuldades verificadas no processo de formação dos intelectuais envolvidos neste campo de pesquisa. A análise incidirá especificamente sobre a concepção de Anísio Teixeira da relação entre ciência e educação, bem como sobre as implicações desta visão no processo de formação do campo da pesquisa em educação no Brasil. A trajetória e as idéias de Anísio Teixeira estiveram associadas, ao longo da sua intervenção como intelectual público, a diferentes empreendimentos políticos e educativos, entre os quais destacaríamos a institucionalização da pesquisa em educação no Brasil. Teixeira dirigiu o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) e, a partir desse órgão governamental, criou, em 1956, o Centro Brasileiro de Pesquisa Educacional (CBPE). Também esteve à frente da CAPES, na época Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, desde a sua criação em 1951 até 1963. É possível afirmar que, entre os principais expoentes do Movimento pela Escola Nova (MPEN) no Brasil, Teixeira foi o intelectual que esteve diretamente ligado ao projeto de afirmação e de desenvolvimento da pesquisa em educação.

Nesses termos, a análise incidirá especificamente sobre a concepção de Teixeira da relação entre ciência e educação e a hipótese a ser explorada está nas implicações desta concepção — que estabelece a educação como espaço de práticas de formação e de gestão do sistema educacional, vinculado intimamente ao saber científico, porém sem a responsabilidade de produzi-lo diretamente — sobre a configuração desse campo de pesquisa e, sobretudo, sobre o processo de formação dos seus intelectuais.

As fontes utilizadas foram: a literatura que aborda a história da pesquisa em educação no Brasil e, sobretudo, os textos que evidenciam a concepção de Teixeira sobre o tema, particularmente, Ciência e arte de educar, de 1957, Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, de 1956, Ciência e Educação, de 1957. O período analisado se estende da década de 30, momento de implantação das primeiras experiências de pesquisa em educação no país, até o processo de introdução dessa área de pesquisa na universidade brasileira, na década de 70, no âmbito dos Programas de Pós -Graduação.

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ESTADO, SOCIEDADE E EDUCAÇÃO: (RE)DEFININDO AS AÇÕES DO PODER PÚBLICO NO CAMPO EDUCACIONAL (UBERABINHA-MG, 1920-1930)

Carlos Henrique de Carvalho e Luciana Beatriz de Oliveira Bar de Carvalho, Centro Universitário de Patos de Minas

A República floresceu como uma esperança. Os ideais que haviam mobilizado as forças políticas, de então, estruturavam-se, externamente, em torno da lógica mudancista, promovida, entre outras influências, pelo pensamento positivista e liberal. Intelectuais liberais, exército e fazendeiros do café formavam uma linha de frente, destaque para os dois últimos, no movimento que daria origem à proclamação da República. Euforia em torno da possibilidade de adequação do Brasil e, conseqüentemente, à sua inserção no mundo moderno e civilizado. Neste cenário, a educação era instrumento prioritário, da ação do Estado “até porque a chave misteriosa das desgraças que nos afligem é esta e só esta: a ignorância popular, mãe da servilidade e da miséria”. Desta forma, era urgente uma política educacional que fosse responsável pela transformação, uma vez que nas últimas décadas do século XIX e as três primeiras décadas do século XX, a educação era entendida como fonte libertadora, capaz de revigorar a sociedade brasileira como um todo, através da implementação de um sistema escolar público. É neste cenário que Minas Gerais promove esforços para mudar este panorama, com as reformas realizadas no período republicano, através de Mello Vianna, em 1925 e Francisco Campos, em 1927. Ambas concebidas dentro do “espírito de modernidade” que envolvia parte da intelectualidade brasileira. Foi procurando compreender a influência e/ou repercussão dessas reformas que desenvolvemos um estudo sobre o problema educacional, na cidade de Uberabinha-MG, hoje Uberlândia, no período compreendido entre 1920 e 1930, tendo por objetivo identificar, nas atas da Câmara Municipal, as discussões em torno de se promover a ampliação da educação pública na cidade, em razão do poder legislativo local considerá-la responsável pelo engedramento de valores, capazes de irradiar “sobre a sociedade e sobre as instituições, os moldes em que se há de situar e mover o espírito público,” os quais estão consonantes aos apresentados pelas reformas de Mello Vianna e Francisco Campos, tais como: ordem , progresso, civismo e cidadania, dentre outros. Além do mais, foi possível perceber a preocupação dos vereadores com o problema da organização de uma educação pública no município, em decorrência do crescente processo de urbanização, estando reservada à escolarização a missão de ordenar e disciplinar a população local, alcançando, assim, o progresso e a civilidade, elementos imprescindíveis à consolidação do ideário de modernidade. Portanto, cabia à educação pública a responsabilidade da formação do indivíduo, tornando-o apto, no sentido de promover o progresso da sociedade uberabinhense, tanto material quanto moral.

UMA INSTITUIÇÃO DE ENSINO FUNDADA POR D. PEDRO V: A ESCOLA REAL DE MAFRA

Carlos Manique, Universidade de Lisboa O presente artigo perspectiva a história de uma instituição de ensino criada por D. Pedro V

(1837-1861) – a Escola Real de Mafra. A interpretação delineada procura, por um lado, apreender as linhas mestras da construção e afirmação da “identidade da Escola” e, por outro, salientar aspectos da sua organização pedagógica, estabelecendo para o efeito pontos de contacto com o panorama das escolas primárias públicas da segunda metade de Oitocentos.Um objectivo paralelo deste estudo será perceber de que forma a dita instituição, que veiculou um projecto pedagógico coerente e muito peculiar ao nível do ensino primário, abraçou uma dimensão de formação de docentes, ou pelo menos de encaminhamento para essa área profissional.

INSPEÇÕES À VIDA COTIDIANA DA ESCOLA PRIMÁRIA PORTUGUESA EM MEADOS DO SÉCULO XIX: REFLEXÕES SOBRE O LUGAR DOS COMPÊNDIOS DIDÁTICOS DE PRIMEIRA LEITURA

Carlota Boto, Faculdade de Educação da USP

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A presente comunicação busca apreender a presença dos materiais didáticos presentes na escola primária portuguesa, a partir de registros de dois relatórios de inspeções às escolas, respectivamente concernentes aos anos letivos de 1866-1867 e 1874-1875. Procuramos entrecruzar abordagens simultaneamente qualitativa e quantitativa da rotina escolar em seus usos e costumes. Tratava-se do parecer proferido pelos inspetores em suas visitas às escolas; parecer que trazia, até certo ponto, o vestígio de uma indeclinável subjetividade, mas que remarcava, também, aproximações confiáveis, verossímeis. Tanto o material escolar como a disposição física da sala de aula, incluindo o próprio mobiliário, seria vistoriado. Procuramos, assim, obter dados sobre o edifício escolar (a quem ele pertencia, quanto se pagava de renda pelo seu aluguel, etc.), as dimensões da sala de aula, a superfície interna do prédio, o número de janelas de que dispunham as classes, a ventilação, as condições higiênicas e pedagógicas do local onde se situava a casa de escola; procuramos informações acerca da mobília e dos utensílios presentes na sala de aula (mesas, bancos, cadeiras, tinteiros, quadros-negros, lousas pequenas, coleção de pesos e medidas, papel, livros, penas, tinta, etc.). Além disso, detivemo-nos mais especificamente nas condições de trabalho do professor, na disciplina, nos métodos de ensino utilizados para a primeira leitura, nas recompensas, nos castigos, nos registros de matrículas e de faltas, etc. Buscamos ainda mapear a idade dos estudantes, o tempo médio de freqüência à escola e a classificação dos alunos - pela avaliação do inspetor e do professor nas diferentes matérias. Finalmente - e esta foi a prioridade - procuramos fazer um inventário (tanto para a inspeção de 1867 quanto para a de 1875) dos registros de compêndios didáticos utilizados pela escola e pelos alunos: quais eram os livros escolares de que a sala de aula portuguesa se valia naquela época determinada? O relatório de 1875 - por ter um espaço maior para a palavra do inspetor no julgamento das condições gerais da escola, do mobiliário, do professor, da freqüência e do aproveitamento dos alunos - possibilitou-nos a reconstituição de alguns relatos de histórias de vida escolar, narrados a partir da experiência de inúmeros professores, que apareciam retratados pela voz da inspeção. O objetivo do trabalho foi, em princípio, o de trazer à tona elementos do cotidiano escolar como fontes para apreensão de alguma atmosfera mental que povoava a escolarização portuguesa de meados do século XIX.

DIVERSIDADE DE ORGANIZAÇÕES RELIGIOSAS E HOMOGENEIDADE DE PRÁTICAS EDUCATIVAS NO BRASIL COLONIAL

Carmen Lúcia Fornari Diez, Universidade Federal do Paraná

A pesquisa teve por norte identificar práticas educativas no Brasil Colônia, para desconstruir a concepção assente da História da Educação de que neste período a educação foi majoritariamente jesuítica e tinha como fundamento a erudição dos homens da Companhia de Jesus. A arque-genealogia de Foucault foi a opção metodológica para a pesquisa, por eleger como fontes os bas-fonds, as informações situadas nos espaços marginais à área de conhecimento central do objeto. Ou seja, foi possível pensar na História da Educação Brasileira — a partir de outras histórias que lhes são periféricas, como as da Igreja, dos homossexuais, dentre outras, as quais possibilitaram identificar diversas práticas educativas no período recortado.

Dentre as ações vinculadas à religião católica, predominaram as desenvolvidas por: Clero Secular, Franciscanos, Carmelitas, Mercedários, Beneditinos e Oratorianos. Destarte, a insuficiência de conhecimentos dos mestres, a primazia de seus interesses econômicos e a capitulação aos “prazeres da carne” foram evidenciadas como experiências cotidianas, comuns a todas as ordens e congregações, questões que se projetaram nas lutas entre essas organizações.

Essa busca nos bas-fonds da educação no período colonial trouxe elementos que permitem: contestar a história tradicional e mostrar que sua escritura não primou pela tão propalada neutralidade científica, constituindo o viés do «jesuitismo»; desconstruir a concepção da exclusividade das ações educativas jesuíticas e do elevado padrão de erudição que lhes era atribuído; inferir que a educação ao encargo dos religiosos, partindo de uma diversidade de agentes, pautava-se em práticas similares que, em nome de Deus e de Portugal, escravizavam a população nativa; abrir leques de novos objetos para pesquisas e reflexões sobre a trajetória da Educação Brasileira.

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PRÁTICAS SOCIAIS, CULTURAIS E PEDAGÓGICAS: UM OLHAR PARA AS FONTES

Carmen Maria Aguiar e Maria Rosa R. Martins de Camargo; Universidade Estadual Paulista

O trabalho aqui apresentado visa refletir sobre fontes materiais que possibilitam uma visualização de práticas sociais e culturais, particularizando a leitura e escrita, e, ao mesmo tempo, possibilitam estabelecer laços com a prática pedagógica.

Ao longo dessa pesquisa que vimos desenvolvendo, na qual propomos identificar, discutir e refletir sobre práticas de escrita em que brotam tipos alternativos de registros e de informações, praticadas por sujeitos adultos, temos encontrado evidências de que saberes culturais e sociais estão envolvidos ou relacionados com aqueles praticados na escola.

Esses registros de saberes culturais, aos quais nos referimos, se revelam ricos em informações sobre práticas culturais que são também pedagógicas e educativas. Nesse universo, nota-se a imposição e a possibilidade de escapar de figuras fixas representadas pelo saber e o não saber, permitindo uma reflexão mais ampla sobre o padrão escolar. Em tais registros temos identificado práticas sociais que suscitam e dão pistas de estratégias outras de criação que ‘impõem’ outras categorias de conhecimento.

Neste trabalho, focalizamos nosso olhar analítico sobre as fontes materiais tomando como objeto de análise um diário, localizado e elaborado fora do espaço institucional da escola, e um quadro feito com retalhos, elaborado em uma sala de aula. Constituem-se como fontes peculiares de registros de informações e códigos diversos, que circulam entre a escrita e modos de registrar, e revelam saberes escolares e práticas que deles advém ou a elas remetem.

Conceber tais fontes materiais como objeto de estudo significa aceitar inverter paradigmas cristalizados, indicando a constituição de um campo que integra a história da educação e não apenas sua utilização como instrumento de manipulação do investigador. Tal propósito aponta dificuldades, por exemplo, as referentes à construção desse campo de pesquisa que exige uma desconstrução de modelos e valores pré-estabelecidos.

A proposição do estudo dessas fontes revela opções teóricas, interesses e recortes, e localiza seu viés interpretativo em uma nova história cultural.

Refletir sobre as fontes envolve reflexões sobre os limites das práticas institucionais e discursivas no âmbito da história. A localização e usos das fontes realçam e incluem reflexões que podem permitir novas buscas para a compreensão e inserção de outras formas de conceber o saber, no campo do conhecimento. Não se trata apenas de entrelaçar saberes culturais e sociais com práticas escolares, mas, principalmente, de buscar possibilidades de afinar o olhar para fronteiras que marcam os saberes e os não saberes.

Os eventos contidos nessas fontes apontam práticas sociais que são elaboradas, circulam e se articulam a processos educativos e culturais. Ao se estabelecer uma inter-relação com as práticas, essas fontes materiais se tornam um campo instigante e inovador para os horizontes da pesquisa, recebem um tratamento criterioso, e sua interpretação avança para uma compreensão mais ampla do conhecimento, ganhando, ao mesmo tempo, contorno próprio.

ARQUIVOS ESCOLARES E PESQUISA HISTÓRICA: FONTES PARA O ESTUDO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Carmen Sylvia Vidigal Moraes ; Faculdade de Educação - USP; Maria Cristina Menezes; Faculdade de Educação - UNICAMP

Nos últimos anos, pesquisadores do Centro de Memória da Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas têm procurado contribuir para o debate no âmbito das relações entre história e historiografia, ao proporem a problematização e o alargamento da concepção de fontes para a história da educação.

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A partir dessas preocupações e em face da situação precária dos acervos documentais das escolas técnicas oficiais e Escolas Normais no estado de São Paulo, foram reunidos esforços no sentido do envolvimento dessas instituições e de sua administração com a questão da construção e preservação da memória institucional.

A cooperação com o Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, visando promover o encontro entre pesquisa e atividade pedagógica, através da integração dos diferentes agentes das práticas escolares na produção do conhecimento histórico consistiu na instalação de Centros de Memória em oito escolas técnicas participantes - com acervos documentais organizados, banco de dados informatizados, espaço para exposição de fotos e de objetos museológicos, salas de trabalho, consulta e pesquisa - e a viabilização de acesso público aos seus documentos textuais, iconográficos, museológicos, às entrevistas/depoimentos de ex-alunos, ex-professores e funcionários. Com essa mesma perspectiva, está em desenvolvimento um projeto na Escola Normal de Campinas, por pesquisadores da Unicamp, com o apoio de pesquisadores do Centro de Memória da USP.

O trabalho de organização das fontes realizado com o envolvimento de alunos, professores, funcionários e população local, viabiliza o contato desses agentes sociais com questões referentes à preservação da memória institucional e o desenvolvimento de ações de preservação do patrimônio histórico e cultural, entendidas como fundamentais para a constituição e o exercício da cidadania. A partir dessas referências, a possibilidade da realização de estudos e produção de conhecimentos sobre a história das instituições, da educação em geral, do ensino técnico e Normal, da constituição das profissões e das mudanças no mundo do trabalho no decorrer do tempo, os quais subsidiaram as atividades de ensino e promoveram o enriquecimento curricular das instituições.

Como resultado de suas atividades, os projetos em questão produziram Inventário de Fontes Documentais existentes nas escolas, também um Álbum Fotográfico com cerca de 100 fotos das escolas técnicas, além de catálogo e exposição documental e iconográfica por ocasião do Centenário da Escola Normal de Campinas, em maio de 2003.

Nesta direção, o texto a ser apresentado tem dupla perspectiva: relatar o processo de desenvolvimento da pesquisa e seus resultados pedagógicos, assim com indicar a relevância das fontes institucionais para o estudo da educação brasileira e a renovação da pesquisa histórica.

A DOAÇÃO DE EDIFÍCIOS ESCOLARES AO ESTADO POR PARTICULARES, EM PORTUGAL (1920-1930)

Casimiro Amado, Universidade de Évora

Está por contabilizar o número de edifícios escolares que em Portugal foram doados ao Estado por particulares. A I República terá sido o período em que mais edifícios foram doados com a finalidade de neles serem instaladas escolas primárias. O nosso estudo não abarca a totalidade deste período da nossa história nem sequer abrange a generalidade das doações. Trata-se ainda de um primeiro estudo procurando lançar as bases de um estudo mais amplo sobre o assunto.

Do ponto de vista da produção legal, a década de vinte produziu três textos fundamentais na matéria: a Lei nº 1029, de 23 de Agosto de 1920, a Lei nº 1114, de 2 de Fevereiro de 1921 e, especialmente, a Lei nº 1754, de 14 de Fevereiro de 1925. Em todos eles se determina forma como o Governo pode converter em oficiais escolas primárias criadas por particulares e instaladas em edifícios que os mesmos tenham oferecido ao Estado. Sabemos pela leitura da imprensa da época e, em particular, pela leitura da imprensa de educação e ensino, que esta legislação não se limitou a enquadrar uma realidade social em que naturalmente emergiam iniciativas privadas de tipo filantrópico, mas que ela dinamizou essa realidade, inclusive dando lugar a um razoável mercado de construção e/ou adaptação de edifícios de acordo com as normas técnicas legalmente exigidas para poderem servir como edifícios escolares para o ensino primário. Esses edifícios eram, então colocados à venda para poderem ser comprados pelos interessados em recolher o benefício criado pela Lei nº 1114 e confirmado pela Lei nº 1754 de indicarem o professor ou professores a serem nomeados para as novas escolas primárias neles criadas. O nosso estudo limita-se, assim, aos edifícios escolares doados ao Estado por particulares ao abrigo da referida legislação.

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Para além de procurar quantificar e identificar a distribuição regional das doações, procuraremos estabelecer um tipologia dos doadores, pois que os há de diversa índole desde a “colónia de Arganil em Lisboa” que está na origem da criação de várias escolas naquela região à de particulares em que percebemos ter havido fundamentalmente um investimento de capital em que a doação é a forma de conseguir a colocação de um familiar (geralmente uma filha), numa altura em que o desemprego grassava ente os professores diplomados para o ensino primário. Mas deu-se inclusive o caso de a doação ser feita numa lógica estritamente capitalista envolvendo o recurso a empréstimo por parte de um professor desempregado que depois, conseguida a colocação, tratará de amortizar a dívida com o salário auferido no exercício das suas funções docentes.

Finalmente, veremos a forma como a classe do professorado primário e os seus dirigentes associativos encaram esta legislação. Geralmente apreensivos ou até mesmo reprovando um estratagema legal que permite que professores melhor qualificados sejam preteridos na colocação e continuem desempregados enquanto outros exercem a docência e asseguram o seu ganha-pão, exclusivamente por a fortuna lhes ter proporcionado a possibilidade de (eles ou familiares por si) doarem ao Estado um edifício escolar.

De facto, na década de 20 em Portugal, a forma como se encara pública e particularmente a generalização da educação é profundamente devedora não só do filantropismo de matriz republicana mas também de uma lógica de mercado de base capitalista. Bem diferente da que predominará logo mais à medida que o Estado (“Novo”) se imporá cuidando progressivamente de regular absolutamente a criação de uma rede escolar pública.

A REFORMAS DE ENSINO E O LIVRO DIDÁTICO

Cecília Hanna Mate, Faculdade de Educação da USP

A partir das reformas de ensino ocorridas nos Estados de São Paulo (1920), Ceará (1922) e do Distrito Federal (1927), do Manifesto dos Pioneiros da Educação de 1932 e do Código de Educação de 1933 publicado pela Diretoria Geral do Departamento de Educação do Estado de São Paulo, cujo pano de fundo foram as transformações sócio-culturais intrínsecas a esse movimento, problematizo as mudanças pedagógicas ocorridas em São Paulo de 1930 a 1933, usando como fontes principais as revistas Escola Nova, Educação e Revista de Educação publicadas neste período pela Diretoria da Instrução Pública de São Paulo.

Visto até então como um movimento que propôs a “renovação” dos “velhos” e “tradicionais” métodos de ensino, a Escola Nova recebe com esta pesquisa outra interpretação: com base em análise documental detalhada, minuciosa e historicamente contextualizada descobrimos várias evidências de intervenções nas formas de ser e estar na escola cujos detalhes e minúcias compunham um conjunto de prescrições na direção do “como” ser professor/a e do “como” ser aluno/a. Isso torna a escolarização um processo crescente de regulação social e foco de vários estudos e legislações complexas. Como desdobramento desta pesquisa o objetivo é trazer alguns aspectos que este movimento gerou na produção do livro didático brasileiro nos anos 30/50, especialmente da educação paulista. Ao examinar esses materiais buscamos confrontá-los com dimensões das reformas educacionais consolidadas a partir dos anos 30 e que traziam inscritos em seu discurso prescrições de novos hábitos e costumes para os/as alunos/as e suas famílias. Concebida então como espaço privilegiado na fabricação de comportamentos sociais mais adequados às mudanças operadas na sociedade moderna, a escola deveria configurar-se, conforme os renovadores, em importante espaço gerador do “processo civilizatório”. O estudo em torno das reformas e os textos que as tornam “regime de verdade” permitiu percebê-las como fenômeno imbuído dessa missão civilizadora e também racionalizadora das diferenças e das anormalidades existentes na sociedade. Desse modo o/a professor/a, parte intrínseca desse processo, recebe destaque nos textos das reformas e os discursos que a acompanham, como semeador/a da reforma social, pois seria principalmente nele/a que as reformas inscreveriam seus códigos para que a propagassem.

Os livros didáticos editados e veiculados em São Paulo após 1933, tomada aqui como data referência, serão as fontes principais utilizadas como material de análise para essa pesquisa, juntamente com o discurso reformista que o acompanha.

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Projeto de pesquisa que integra o Projeto Temático: Educação e Memória: Organização de Acervos de Livros Didáticos, coordenado pela Profª Drª Circe Maria Fernandes Bittencourt e financiado pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

CIRCULAÇÃO DE LIVROS DIDÁTICOS: POLÍTICAS PÚBLICAS, EDITORAS, ESCOLAS E O PROFESSOR NA SELEÇÃO DO LIVRO ESCOLAR.

Célia Cristina de Figueiredo Cassiano, PUC de São Paulo

Este trabalho tem como objeto a circulação do livro didático no Brasil, apresentando como se dá este processo nas últimas décadas do século XX e início do século XXI. A partir disso, delimita a seleção deste recurso didático nas escolas públicas da cidade de São Paulo, no início do século XXI. Parte do princípio de que as editoras privadas e as políticas públicas levam para esse processo determinantes de mercado, que precederiam a escolha do professor e implicariam a construção do currículo. Trazemos, então, três instâncias brasileiras fundamentais: as editoras privadas de livros didáticos, apresentando como estas se organizam; o Estado, especificando as políticas públicas para o livro escolar, representadas pelo Programa Nacional do Livro Didático – PNLD (criado em 1985, cuja política de planejamento, compra, avaliação e distribuição do livro escolar é centralizada no governo federal) e a escola. Como procedimentos de pesquisa, valemo-nos, como fonte, das listas de livros de 5ª a 8ª séries recebidos pela totalidade das escolas públicas da cidade de São Paulo, em 2002, assim como entrevistamos docentes e consultamos documentos governamentais. O estudo da circulação do livro didático nos forneceu elementos para estabelecer relações entre o currículo em ação e processos globais que extrapolam os portões escolares. Propiciou-nos, também, desvelar alguns conflitos impostos aos docentes, que têm de administrar tensões procedentes das negociações para a entrada do livro didático na escola, que, por vezes, não são de interesse da educação, e sim do mercado. Tais conflitos, que interferem no currículo, aparecem no discurso oficial como exemplos da desqualificação do professor. Este estudo nos ofereceu elementos para refutar parcialmente esse discurso, revendo a posição do professor em relação ao livro didático. Autores como Michael Apple e Gimeno Sacristán, que produzem uma teoria crítica do currículo, nos auxiliaram a situar o objeto de nossa investigação, ou seja, a circulação do livro didático, na dinâmica do currículo.

PRÁTICAS CULTURAIS NO QUOTIDIANO ESCOLAR: POR UMA EDUCAÇÃO INTERCULTURAL

Célia Maria de Castro Almeida, Universidade de Uberaba

O trabalho apresenta resultados de um projecto temático de pesquisa centrada no estudo das relações entre educação escolar e práticas culturais da vida quotidiana. Este projecto foi desenvolvido em duas escolas localizadas numa comunidade rural situada no Estado de Minas Gerais (região Sudeste do Brasil): uma escola com classes de educação infantil e ensino fundamental (quatro primeiras séries), e uma escola de ensino médio. O projecto temático abrangeu três subprojectos de pesquisa que investigaram: i) relações entre família e escola; ii) narrativas orais e ensino de Língua Portuguesa; iii) práticas musicais da comunidade local e currículo escolar. Considerando-se que, em geral, os currículos escolares reafirmam a superioridade de uma cultura erudita associada a uma determinada classe social, sendo deles excluídos os conhecimentos, práticas, afectos e valores próprios da vida quotidiana de alunos e alunas, e entendendo que para promovermos uma sociedade mais compreensiva e humanitária é preciso abordar diferenças e desigualdades no processo educativo, a pesquisa adoptou a perspectiva da educação intercultural, compreendendo a diversidade não como um problema, mas como um recurso para a educação, rejeitando as concepções universalistas de educação e ressaltando as diferenças como construções históricas e culturais. Dois foram os objectivos da pesquisa: produzir conhecimentos sobre a comunidade rural e implementar práticas

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pedagógicas capazes de articular conhecimentos escolares com valores, saberes e práticas presentes na vida quotidiana dos alunos e alunas que frequentavam as escolas enfocadas na pesquisa. A investigação foi desenvolvida em dois eixos: o primeiro pesquisou artefactos e práticas culturais das famílias que vivem no assentamento; o segundo, numa perspectiva de intervenção, propôs aos professores e professoras das escolas estudadas, adoptarem práticas educativas que possibilitassem aproximar sensibilidades, práticas e saberes separados pelo tempo e espaço, ou por categorias criadas a partir de uma perspectiva monocultural, buscando, deste modo, romper com uma tradição escolar que distingue e hierarquiza os diversos campos de produção cultural. Contrariando um discurso que pretende naturalizar uma identidade nacional, apagando a diversidade cultural, ignorando o dinamismo e hibridização cultural, legitimando a valorização diferencial de determinados padrões socioculturais, a pesquisa questionou a exclusão ou abafamento de vozes de determinados grupos sociais, defendendo que o currículo escolar deve contemplar as variadas formas de expressão da cultura produzida pelas famílias e grupos socioculturais aos quais pertencem os alunos e alunas.

1759: CONSIDERAÇÕES SOBRE AS REFORMAS POMBALINAS E A CONTINUIDADE DA “VELHA ESTRUTURA” NO BRASIL COLONIAL

Célia Maria Fernandes Nunes, Rodrigo Mello de Moraes e Dulce Maria Viana Mindlin

Este trabalho faz parte do projeto de pesquisa O outro e o mesmo: ex-jesuítas no sistema pombalino de ensino, que objetiva comparar as estruturas administrativas pedagógicas do período pombalino com as do período Jesuítico, verificando assim se houve de fato alguma mudança na “praxis pedagógica” do ensino na colônia em meio às reformas pombalinas. Para o desenvolvimento da pesquisa foi analisada uma série de códices em Arquivos Históricos, que permitiu comprovar o sistema de recolhimento do subsídio literário, imposto criado para suprir as necessidades econômicas do ensino Régio promovido por Pombal, que comparadas às fontes referentes ao período Jesuítico, evidenciou detalhes que deixam em dúvida as mudanças efetivas nos pontos de vista estrutural (administrativo) e filosófico do ensino. Para alguns estudiosos essa política fora caracterizada por uma vasta e profunda reforma, sendo reconhecida inclusive como criadora do sistema de ensino oficial português. Este tem sido o objeto de análise, que tem buscado a comprovação através de fontes primárias que mostrem se de fato houve esta mudança. Surgem assim questões como: será que a mudança do ensino Jesuítico para o Pombalino alterou a estrutura, os métodos e a filosofia educacional que os jesuítas implementaram em 200 anos de História? Quais foram as reais mudanças?Comparação entre os currículos das escolas coloniais destes dois períodos tem sido realizada procurando: a) destacar as mudanças levando em consideração a questão do professorado evidenciando o fato dos mestres régios onerarem o sistema pombalino de ensino; b) identificar também uma possível continuidade do “Molde Inaciano” na praxis pedagógica do período pombalino, por acreditar que o que sustentou todo o sistema Jesuítico de ensino, no que se refere à CONTEMPLAÇÃO colocada através dos Ejercícios Espirituales. Considera-se que este aspecto depois de 200 anos não pode ter simplesmente desaparecido, continuando perceptível no período Pombalino, somando assim argumentos para o projeto que visa sustentar a hipótese de que esta Reforma, na prática, fora no mínimo muito limitada. Enfim, este artigo procurará analisar como a expulsão dos Jesuítas mergulha Portugal numa verdadeira experiência Ilustrada que iniciará, a partir de 1759, uma política na tentativa de “repor”, em todas as linhas, as Escolas banidas da responsabilidade da Companhia de Jesus. “Estamos em meio a um conflito entre a conceituação pragmática da pedagogia Iluminista e a velha estrutura das escolas jesuíticas”.(1)

CARRATO, José Ferreira. Igreja, Iluminismo e Escolas mineiras coloniais. São Paulo: Editora Nacional, 1968, p.130.

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DA ESCOLA IDEALIZADA À UNIVERSIDADE CONCRETIZADA: O PAPEL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NA CONFIGURAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

Celia Regina Otranto, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Esta pesquisa traça a trajetória histórica da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), de suas origens (1910) até final da década de 1960, apontando o papel das políticas públicas e reformas educacionais no delineamento do perfil da Instituição. Inicia-se em 20 de outubro de 1910, quando o Presidente da República, Nilo Peçanha, assina o Decreto nº 8.319, criando a Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária (ESAMV), primeira representante federal do ensino superior agrícola brasileiro. O mesmo decreto delineia a política de educação agrícola imposta pelo Estado na Primeira República, vinculando este ensino ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio e não ao Ministério do Interior, ao qual estava ligada a questão da educação em geral. O ensino agronômico foi o único ramo do ensino superior criado no Brasil na Primeira República. Tinha por objetivo diversificar a formação da elite política brasileira, dotando-a de instrumentos que propiciassem a reciclagem da tradicional “vocação eminentemente agrícola” do país e a definição de novas modalidades de coação, impeditivas da fuga do trabalhador rural para o circuito mercantil. A ESAMV foi idealizada, principalmente, para promover o desenvolvimento científico da agricultura e para formar profissionais aptos a assumir os cargos superiores do Ministério da Agricultura, diferentemente das demais escolas congêneres que visavam formar os filhos dos grandes proprietários rurais.

Em 1933, a ESAMV transformou-se em “escola padrão nacional” para os cursos que ministrava - Agronomia e Medicina Veterinária. Seu crescimento e o reconhecimento do trabalho nela desenvolvido, fizeram com que, em 1943, a Instituição adquirisse o status de universidade - Universidade Rural -, embora continuasse vinculada ao Ministério da Agricultura.

A Reforma Universitária promovida pelo regime militar, na década de 1960, levou a Instituição a adequar o seu perfil exclusivamente agrário às novas diretrizes legais, que obrigavam todas as universidades a oferecer cursos nos diferentes campos do saber. Neste período, a Instituição foi transferida do Ministério da Agricultura para o Ministério da Educação e Cultura, assumiu sua atual denominação - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - e criou novas unidades universitárias voltadas para as áreas de ciências humanas e sociais.

A pesquisa conclui demonstrando que a ação do Estado, na Primeira República, que fez da ESAMV seu principal instrumento de implementação da política de educação superior agronômica, foi decisiva para o delineamento das características assumidas pela atual UFRRJ. É certo que a Reforma Universitária da década de 1960 modificou sua estrutura organizativa e ampliou o oferecimento de novos cursos, mas a vocação agrária da Instituição prevaleceu e permanece até os dias atuais.

AS ESCOLAS ANISIANAS NO RIO DE JANEIRO (1931-1935): A ARQUITETURA A SERVIÇO DA EDUCAÇÃO

Célia Rosângela Dantas Dórea, Universidade do Estado da Bahia

Este trabalho discute o papel que a organização do espaço escolar desempenhou na obra do educador Anísio Teixeira, no período de 1931 a 1935, durante a sua gestão à frente da Diretoria de Instrução Pública do Distrito Federal, à época o Rio de Janeiro. Para esta análise, recorreu-se à produção intelectual do próprio educador - livros, artigos, relatórios administrativos e relatórios de viagem - que refletiu sua política de edificações escolares; à pesquisa nos arquivos das escolas; assim como à produção de outros intelectuais e profissionais ligados ao tema. Sua concepção de uma proposta arquitetônica específica para a escola, no início dos anos 30, trouxe nova conformação para o espaço escolar e possibilitou novo modo de ordenação das práticas e dos hábitos escolares ali desenvolvidos. Em suas administrações públicas, na área educacional, Anísio Teixeira deu ênfase especial ao planejamento das edificações escolares. Para ele, sem instalações adequadas não poderia

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haver trabalho educativo e, por isso, o prédio, base física e preliminar para qualquer programa educacional, tornava-se indispensável para a realização de todos os demais planos de ensino. Os prédios escolares construídos nesse período compreendiam programas arquitetônicos distintos (tipos Mínimo, Nuclear, Platoon de 12, de 16 e de 25 classes e Playground ou “escola-parque”), foram projetados de modo a atender às exigências das modernas conquistas pedagógicas que a escola passava agora a exigir e destoavam do padrão arquitetônico até então adotado para os edifícios públicos e, em particular, para os edifícios escolares. Por meio da arquitetura dessas escolas, Anísio procurava expressar o próprio sentido da educação que desejava implantar com a sua reforma: um projeto de renovação cultural pela educação - que, mais tarde, retomaria com a concretização do modelo “escola classe - escola parque” em Salvador (BA). Uma nova educação pedia uma nova arquitetura que, pela sua forma, refletia a sua função: educar.

EDUCAÇÃO E RACIONALIDADE JESUÍTICAS NO IMPÉRIO PORTUGUÊS DO SÉCULO XVI

Célio Juvenal Costa, Universidade Metodista de Piracicaba-São Paulo e Universidade Estadual de Maringá-Paraná

Este trabalho é parte de uma tese de doutorado sobre o tema da Racionalidade Jesuítica de 1540 a 1599 no império português. Uma das atividades que mais notabilizou a Companhia de Jesus foi, sem dúvida, a educação, principalmente aquela dirigida ao público em geral. A abordagem sobre a educação jesuítica desenvolvida aqui, no entanto, é mais interna do que externa à Companhia, no sentido de se compreender a própria educação como uma das características da sua mentalidade. A delimitação temporal do trabalho compreende o período de surgimento e desenvolvimento das primeiras atividades da Societatis Iesu em Portugal. O primeiro contado do soberano português com os jesuítas se deu dois anos e meio antes do papa Paulo III oficializar a Companhia de Jesus, onde se cogitava a possibilidade de os padres reformados irem trabalhar nas Índias portuguesas. No ano de sua fundação, 1540, dois jesuítas chegam em Lisboa, Simão Rodrigues e Francisco Xavier, atendendo a um pedido que o rei fizera ao papa e que foi prontamente aceito pela cúpula jesuítica. Em dois anos o trabalho destes padres foi tão elogiado pelo soberano que não se admitiu mais a saída deles do reino e apenas um, Xavier, viajou para Goa em 1542, inaugurando as missões jesuíticas, ou principiando o Padroado português sob a bandeira jesuítica. Desta próxima e próspera relação entre a Coroa portuguesa e os padres da Companhia de Jesus destaca-se, ainda, que a primeira casa e o primeiro colégio que os jesuítas tiveram em todo o mundo foram em Lisboa e em Coimbra respectivamente, além de, em 1559, eles terem sob sua direção uma universidade, a de Évora. As atividades nas primeiras décadas em Portugal podem ser resumidas na educação, nas missões e na confissão dos soberanos. Os trabalhos relacionados à educação, tanto no reino como no império de além-mar, são analisados aqui num triplo aspecto relacionado com a preparação intelectual e mística: a formação rigorosa, a formação escolástica e a formação prática para as missões. Além disso, outro fator importante analisado, que também se refere ao lugar da educação na racionalidade jesuítica, é o colégio, como centro administrativo, como espaço educacional e como meio fomentador da cultura de corte própria do século XVI. As atividades dos padres reformados ocorrem no processo de expansão do império português, e como esse processo é eminentemente comercial, a racionalidade e, por conseguinte, a própria educação jesuítica, não deixa de ser também mercantil, no sentido de uma contabilização corrente e aprimoramento constante. O Ratio Studiorum pode ser entendido, também, como expressão oficial dessa racionalidade.

RAZÕES E CONSEQUÊNCIAS DA RETIRADA DA FILOSOFIA DO ENSINO MÉDIO BRASILEIRO

Celso João Carminati, Universidade do Vale do Itajaí e Universidade do Sul de Santa Catarina

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Neste trabalho procuramos identificar e discutir as principais razões e as conseqüências da retirada da Filosofia do ensino médio brasileiro. Traçamos um perfil do momento político e ideológico a partir dos anos de 1960 no Brasil, os quais foram profundamente marcados pelas ranhuras da ditadura militar (período circunscrito entre os anos de 1964 aos anos de 1984), para podermos compreender por que a partir da reforma educacional nº 5.692/71 a Filosofia foi retirada dos currículos de ensino médio e por que muitos intelectuais foram expurgados de suas atividades acadêmicas. Diante de algumas respostas correntes sobre esta realidade, insatisfatórias, naturalmente, coube-nos perguntar e discutir se esta condição estaria condicionada ao propalado caráter crítico que se atribuiu ao ensino de Filosofia naquele período ou, se a Filosofia foi retirada do ensino médio devido a pouca seriedade com que professores e alunos tratavam os seus conteúdos? Neste ínterim, é possível afirmar que a sua ausência no ensino médio propiciou o empobrecimento da formação cultural da juventude? Além disso, esta realidade diminuiu a procura e importância dos cursos de Filosofia nas universidades brasileiras? Estas e outras questões constituem o eixo das reflexões que realizamos neste trabalho.

A EDUCAÇÃO DE MENINOS DESVALIDOS NO MARANHÃO NO SÉCULO XIX

César Augusto Castro, Universidade Federal do Maranhão

Este trabalho resgata a trajetória da Casa dos Educandos Artífices do Maranhão no Segundo Reinado, ou seja, buscamos traçar um retrato desta Instituição Educativa, sua cultura escolar, seu cotidiano, seus rituais e seu significado para a sociedade maranhense do século XIX. A Casa dos Educandos foi criada em 1841 e encerra suas atividades com o advento da República. A sua finalidade era, assim como outras criadas no Brasil, atender crianças do sexo masculino, “desassistida de sorte” e “desvalidas”. Nesta Casa aprendiam um ofício (sapateiro, espingardeiro, alfaiate, etc.) e as primeiras letras (ler, escrever, as quatro operações de aritmética, prática dos quebrados, decimais e proporções, os princípios da religião, etc.). A metodologia da pesquisa em foco seguiu dois percursos que se completaram: o primeiro, pesquisa bibliográfica, se concentrou em livros, artigos, teses, dissertações, etc; a segunda, pesquisa documental, foi realizada através de fontes primárias localizadas na Biblioteca Pública e no Arquivo Público do Estado do Maranhão. Elegemos, com base em André Petitat (1994), algumas categorias, dentre as quais: processo de criação e de instalação da Casa dos Educandos Artífices; caracterização e a utilização do espaço físico; espaços de poder (diretor, escrivão, professores, etc.); organização do tempo escolar; origem social da clientela; conteúdos escolares; professores; legislação, normas e a administração da Casa dos Educandos. As fontes consultadas foram: documentos manuscritos, discursos escritos e relatórios dos Presidentes da Província, legislação e jornais. Esta pesquisa contribuiu para uma compreensão histórica e crítica da educação brasileira e, em especial a maranhense, no século XIX.

USOS DA PALAVRA ESCRITA E GRAUS DE LETRAMENTO ENTRE ESCRAVOS E FORROS NA COMARCA DO RIO DAS MORTES (MINAS GERAIS, 1731-1850)

Christianni Cardoso Morais, Universidade Federal de São João del-Rei

A escravidão no Brasil foi alvo de estudos isolados até a conformação de um campo de pesquisa em 1960, dominado então pela “Escola Sociológica Paulista”. De acordo com esta perspectiva, havia um processo de “coisificação subjetiva e social” dos escravos, respaldado legalmente, que só poderia ser rompido no momento em que os cativos se rebelassem contra o sistema escravista, fugindo das senzalas, formando quilombos. Desde 1980, várias pesquisas têm buscado relativizar a dicotomia “coisa” versus “quilombola”. Considera-se que nem sempre o que é previsto legalmente é vivido nas relações sociais, pois há uma dinâmica sócio-histórica que ultrapassa a legalidade. Não é negado o caráter violento da escravidão, mas reconhece-se que simplesmente a violência não poderia manter o sistema escravista funcionando por mais de trezentos anos. Os escravos eram capazes de criar identidades (individual, coletiva), de estabelecer múltiplas maneiras

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de “negociação” pela liberdade e de ter sua própria visão da escravidão, mesmo que limitados pelas imposições de seus proprietários. Apesar de toda produção atual sobre escravidão, poucos pesquisadores têm se dedicado a estudar como eram as relações dos escravos e forros com a palavra escrita, o que constitui uma lacuna na historiografia brasileira. Buscando contribuir para a área, numa constante interlocução com as recentes pesquisas de História da Educação, e a partir de um levantamento quantitativo das fontes cartoriais da Comarca do Rio das Mortes (Minas Gerais), optei por um estudo de longa duração. Procurei, primeiramente, quantificar quantos escravos e libertos eram capazes de ler/escrever, num período em que o Estado não pretendia constituir políticas para a escolarização dessas parcelas da sociedade. Por serem raríssimos os testemunhos diretos de escravos e ex-escravos, foram utilizadas, de maneira indireta, fontes manuscritas, como os processos-crime, testamentos e inventários. Outros registros importantes são as notícias de venda ou fuga de escravos publicadas em periódicos. Tais anúncios informam sua descrição física, os tipos de trabalhos nos quais eram habilitados e se estavam de posse das “tecnologias” de leitura/escrita. Tendo como foco central da pesquisa analisar as relações estabelecidas entre escravos e forros com a palavra escrita, a partir da quantificação do número de escravos e libertos que se encontravam de posse das habilidades de ler/escrever, os dados foram qualificados para que fosse possível inferir os graus de letramento destes sujeitos, através da análise das assinaturas encontradas, com o auxílio de uma escala de assinaturas.

HISTÓRIA DAS EDITORAS DE LIVROS DIDÁTICOS

Circe Maria Fernandes Bittencourt, USP

O tema desta apresentação é sobre investigações em andamento sobre a história das editoras de livros didáticos brasileiros. Nesta apresentação abordamos alguns aspectos da produção editoral do Brasil e suas relações com a produção didática da França e Portugal, países que mantiveram estreitas relações educacionais e culturais no decorrer do século XIX e XX. O recorte temporal foi o período correspondente à produção de livros escolares pela Imprensa Régia no Brasil a partir de 1810 até os anos de 1930, fase em que se inicia um período denominado de nacionalização editorial no país. A produção dos livros didáticos brasileiros, no decorrer do século XIX e primeiras décadas do século XIX, caracterizou-se pelo predomínio do modelo francês, que em certa medida, correspondia a uma situação semelhante em Portugal, estabelecendo-se, assim algumas identidades no processo de escolarização, expressas entre outros aspectos na configuração de programas curriculares tanto do ensino primário quanto secundário. As articulações educacionais entre esses países faziam parte de uma estratégia política que explicam a instalação de livrarias e editoras de portugueses e de franceses no Brasil, sobretudo a partir da segunda metade do século XIX, na capital do império e em outros centros como Recife e São Paulo. Nesta perspectiva, o enfoque inicial da apresentação refere-se às editoras B.L. Garnier, Aillaud, Francisco Alves, Emmanuel Vitte( FTD) e de livrarias francesas existentes no Brasil, para, em seguida desatcar as transformações no decorrer das primeiras décadas do século XX, em fase do regime republicano e suas políticas educacionais.

O corpus documental da pesquisa tem sido contituído por livros didáticos de acervos brasileiros das Bibliotecas da Faculdade de Educação da USP, da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e de livros didáticos brasileiros que se encontram na Bibliothèque Nationale de France. As fontes se completam pela análise de catálogos de referidas editoras. Trata-se, portanto, de uma pesquisa sobre o processo de produção das obras escolares do período assinalado, destacando as características técnicas e estruturais que marcaram os livros, e sobre a história das editoras do Brasil relacionada à política educacional desses países.

MEMÓRIA E HISTÓRIA DAS PRÁTICAS EDUCACIONAIS EM TELÊMACO BORBA – PARANÁ/BRASIL. 1960-1980

Cirlei Francisca Gomes Carneiro, Universidade Estadual de Ponta Grossa

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O tema diz respeito a preservação da memória histórica das práticas educacionais da localidade paranaense de Telêmaco Borba. Tendo por fundamento a oralidade (MAUAD, 2001), as raízes históricas sobre o quotidiano do ensino primário e ginasial foram rememoradas pelo educador como fruto de “processos mais amplos”, que só se tornaram compreendidos quando ocorreu a articulação entre os documentos escritos, orais e visuais com o objetivo de dar conta da “amplitude estrutural” sobre o processo educativo (SEFFNER, 1998). Ao recompor o passado da educação dos Campos Gerais do Paraná (LUPORINI, 1998) __ com base no levantamento e catalogação de fontes primárias e secundárias da educação brasileira (SAVIANE, 1991) __ a pesquisa permitiu resgatar da memória coletiva a história das instituições de ensino da rede pública telemacoborbense. A memória foi interpretada a partir do registro realizado como “produção de documentação” (NADAI, 1994), pois, os dados brutos e as explicações particulares que constituem tanto as fontes orais como, também, as visuais permitiram conhecer a participação de novos agentes sociais no processo da educação escolar. As relações entre história e as dimensões da memória educacional de Telêmaco Borba fundamentaram-se nos relatos orais de segmentos diferenciados da população, cuja reflexão encontra-se centrada na vivência escolar do professor em sala de aula. Analisar, portanto, o passado em duas décadas de ensino, 1960 a 1980, permitiu abordar a formação e a carreira de professores no início do processo de expansão do sistema educacional em Cidade Nova, cuja Vila por Lei Nº 26/60 recebeu esta denominação; por Lei Nº 4.445/61 passou a ser Distrito Administrativo e Judiciário de Tibagi; e, posteriormente, por Lei Nº 4.738/63 o Distrito de Cidade Nova desmembrou-se com o nome de Telêmaco Borba. Assim, ao recompor e preservar para a história da educação de Telêmaco Borba o “valor histórico” do documento escrito, oral e visual se buscou criticamente, a partir do quotidiano escolar, o que deveria ser preservado. Nestes termos, a opção pautou-se por aquilo que Umberto Eco chamou de “nossa ‘enciclopédia mental’, que é composta não só de palavras e idéias, mas também de imagens visuais (...).Todos esses elementos se entrelaçam em nosso cérebro, mais particularmente no ‘lócus’ da nossa memória (...) vão sustentar a formação de conceitos, de idéias, de julgamentos, e a criação de novas formulações, no processo do pensamento consciente, da reflexão, da análise crítica que nos permite tomar decisões e chegar a conclusões em nossa vida quotidiana” (HORTA, 2000).

POLÍTICAS PÚBLICAS E REFORMA EDUCACIONAL NO RIO GRANDE DO SUL NA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX: O PAPEL DO CPOE/RS

Claudemir de Quadros, Centro Universitário Franciscano de Santa Maria e Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Na segunda metade do século XX, entre os anos de 1942 e 1971, o campo educacional do estado do Rio Grande do Sul, Brasil, foi palco de uma série de ações desenvolvidas pelo Centro de Pesquisas e Orientação Educacionais - CPOE. Esse órgão, vinculado à Secretaria da Educação e Cultura, interveio diretamente na organização do ensino, na formação dos professores, na orientação das atividades didático-pedagógicas e na normatização da rede pública estadual de ensino. Desempenhou, portanto, um papel proeminente na constituição do campo educacional do Rio Grande do Sul, especialmente a partir da proposição e execução de políticas públicas e reformas educacionais. Tomando a perspectiva foucaultiana como estratégia analítica, a problemática da pesquisa se dirige no sentido de focalizar o CPOE como um problema histórico particular e de mostrar as condições de emergência, de inserção e de funcionamento desse órgão na educação do Rio Grande do Sul. Nesse sentido, procura-se constituir um olhar sobre as multiplicidades, tendo em vista que as condições de emergência do CPOE estão ligadas a diferentes movimentos em curso na sociedade brasileira, dentre os quais a circulação de discursos pedagógicos e a ação de intelectuais; um maior aparelhamento do Estado para promover a educação; a instalação da universidade moderna e a constituição da escola de massa no Brasil. A partir disso, busca-se entender a emergência do CPOE muito antes da sua criação formal dada por meio de um ato legislativo. Infere-se que no decorrer do processo histórico de constituição do campo educacional do Rio Grande do Sul foram decisivas as práticas e a ação dos intelectuais do CPOE. Os documentos que são examinados no trabalho são os produzidos pelo CPOE, por outros organismos governamentais e narrativas orais.

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UMA PUBLICAÇÃO PEDAGÓGICA E SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A HISTÓRIA POLÍTICA

Claudia Alves, Universidade Federal Fluminense

A Revista do Exército Brasileiro, publicada no período de 1882 a 1889, tem sido pouco valorizada pelos historiadores como fonte para compreensão dos processos que envolveram o exército nas articulações do golpe republicano. Em grande parte, isso se deve ao fato de tratar-se de uma publicação de caráter pedagógico, voltada para o aperfeiçoamento dos oficiais do exército.

Neste trabalho, pretendemos discutir o uso dessa fonte num percurso de pesquisa que procura investigar os itinerários de formação da intelectualidade militar na segunda metade do século XIX. A Revista do Exército Brasileiro é tomada como um repertório documental que expressa, de forma sintetizada, o potencial de autoria e de construção de um projeto coletivo que resulta de um duplo percurso. De um lado, seus textos denotam as formas de elaboração e expressão do pensamento promovidas pela formação escolar no interior do exército. Por outro, deixam entrever a reflexão coletiva a respeito das práticas e das situações que se constituíam em problemas a serem enfrentados pela oficialidade.

Embora a publicação tenha sua origem ligada a um projeto submetido à apreciação do Ministro da Guerra, em meados do ano de 1881, por um grupo de oficiais, não seria possível caracterizá-la como um periódico oficial. Percebe-se, entretanto, que esperava-se contar com o aval do Ministério, o que denota que a proposta surgiu de indivíduos que partilhavam de um certo quantum de poder decisório no seu interior, ocupando postos de direção ou inseridos em posições de prestígio.

No seu editorial de abertura pode-se ler que a Revista deveria ser um órgão que atuasse como transmissor das idéias e de laço de união entre os membros do exército, porém logo adiante percebe-se que ela não foi pensada para essa totalidade, mas para um corpo de elite. Segundo o texto, terá por fito trazer o militar estudioso a par dos fatos de maior importância ao seu interesse e ilustração. A revista reuniu a função de veículo de opinião e debate sobre temas que afetavam a corporação a uma outra função, pedagógica, de complemento da formação que os militares recebiam nas escolas. Durante oito anos, oficiais de diversas patentes publicaram artigos em suas páginas, enfocando temas que consideravam ser de interesse para a oficialidade.

Utilizando o conceito de campo intelectual, de Bourdieu, tornou-se possível articular ação pedagógica e ação política, numa leitura que leva em conta, não só o conteúdo dos artigos publicados, mas as informações coletadas em seções diversas do periódico.

MÉTODOS DE ENSINO E FORMAS DE CONTROLE SOBRE O COTIDIANO ESCOLAR NA INSTRUÇÃO PÚBLICA DA PARAHYBA DO NORTE (1835-1864)

Cláudia Engler Cury, Universidade Federal da Paraíba

O levantamento, a seleção e a transcrição das leis e regulamentos sobre a antiga Província da Parahyba do Norte, hoje Estado da Paraíba, realizaram-se a partir das Collecções das Leis Provinciais (1835-1889), publicadas, ordinariamente, todos os anos, no período em questão. A documentação foi localizada no Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional (NDIHR-UFPB), no Arquivo Nacional e Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, no Arquivo do Estado de São Paulo e na Biblioteca da Faculdade de Direito do Recife.

Para este artigo selecionamos, como foco de análise, o conjunto de Leis do período que vai de 1835 até 1864. O primeiro marco cronológico deveu-se à legislação mais antiga que encontramos aonde verificamos a criação das cadeiras isoladas e as primeiras indicações de como deveria ser organizado o cotidiano escolar. O segundo referencial foi selecionado por ter sido um ano no qual foi realizada uma grande reforma na instrução pública primária dividindo-a em elementar e superior.

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Fizemos, primeiramente, um minucioso levantamento do conjunto de “procedimentos instrucionais” encontrados na documentação e, em seguida, analisamos as questões relativas aos métodos de ensino e as tentativas de controle exercidas pelas autoridades provinciais sobre o cotidiano escolar.

Concordamos com as diversas problematizações que vem sendo exaustivamente postas pela historiografia contemporânea com relação ao tratamento que deve ser dado às fontes escritas/oficiais. Considerando que muitas vezes só encontramos este tipo de documentação é preciso que seja trabalhada como uma das fontes possíveis para análise/interpretação em determinado momento da história e, sempre que possível, confrontadas com outras fontes e sujeitos da história.

Pudemos identificar as dificuldades de implementação das leis mais gerais, sobre instrução pública, na insistência dos legisladores em construir um aparato de controle sobre o universo escolar, contendo atitudes tanto de professores como de alunos que poderiam transgredir a “ordem”. Esses mecanismos de controle, engendrados pelo estado provincial, podem ser indicativos de possíveis mecanismos de resistência dos sujeitos históricos que eram alvo da legislação. Havia também um esforço das autoridades provinciais em incorporar tendências de práticas escolares que estavam sendo implantadas em outras localidades do Império ou mesmo, instaurando “novos” métodos de ensino.

Ressaltamos, ainda, que temos como perspectiva de análise a compreensão dos métodos de ensino, articulada com as questões que envolvem o tempo escolar, os mecanismos de controle e métodos punitivos.

EDUCAÇÃO E POLÍTICA NO BRASIL: ROBERTO SIMONSEN E A QUESTÃO EDUCACIONAL

Claudinei Magno Magre Mendes ; DHI/UNESP/C. de Assis/SP

Roberto C. Simonsen foi o mais importante dos industrialistas do Brasil nas décadas de 30 e 40 do século XX e um dos homens públicos que mais marcou o debate político e econômico desse período. Em algumas das suas obras, tratou da questão educacional, ainda que nenhuma delas fosse específica sobre esse assunto, o que, no entanto, não diminui sua importância. Nessas obras tratou da educação sob um duplo aspecto. Sob o primeiro aspecto, tratou da educação enquanto formação de uma nova elite que estivesse sintonizada com as exigências sociais e políticas de sua época. Ao propor essa nova educação, Simonsen critica a maneira como se dava a formação da elite, mostrando-a defasada diante das novas circunstâncias históricas. Sob o segundo, discutiu a educação como formação de uma mão-de-obra qualificada para as necessidades criadas pela nascente industrialização. Deve-se salientar, no entanto, que não considerou a formação da mão-de-obra apenas a partir do prisma técnico, mas, também, político. Simonsen entendia que, na formação do operário, dever-se-ia contemplar sua inserção política na sociedade burguesa então em consolidação. Assim, os dois aspectos da educação no Brasil são abordados de uma perspectiva política, o que lhes confere uma unidade. É justamente essa perspectiva política que torna Roberto Simonsen um autor afinado com os novos tempos e que, por isso mesmo, merecedor de um estudo que não considere simplesmente como representante da burguesia industrial. É preciso analisá-lo em sua dimensão histórica, por conseguinte como um autor capaz de iluminar uma das facetas de um momento decisivo da história contemporânea do Brasil.

(RE)CONTAR PARA (RE)FORMAR A CARREIRA DOCENTE

Conceição Passeggi UFRN/CNPq; Tatyana Mabel Barbosa, Mª de Fátima P. Carrilho, Mª José Medeiros D. de Melo PPGEd e Patrícia Lúcia da Costa - PPGEd

A abordagem (auto)biográfica (DOMINICÉ, 2000), ao situar o quotidiano escolar no centro da produção do conhecimento pedagógico (NÓVOA, 1995), torna indissociáveis a vida e a docência, tanto para pesquisa educacional, quanto para a profissionalização docente. Segundo Momberger (2000), as histórias de vida asseguram o lugar do indivíduo na história coletiva e respondem pela reorientação profissional na qual valorizam-se os saberes subjetivos. Para Pineau e Le Grand (1996),

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as profissões suscitam práticas específicas de registro (curriculum, portfolios, dossiês etc) que atuam, no âmbito profissional, como diretrizes escolares da formação e do trabalho. Passeggi (2001) defende que a escrita (auto)biográfica, no processo de formação docente, configura-se como prática reflexiva, favorecendo a articulação entre teoria e prática. Para este trabalho, analisamos 15 memoriais de formação – autonarrativas escritas durante a formação continuada (IFESP, Natal-RN) – onde as autoras examinam sua trajetória pessoal para (re)contar como se tornaram professoras (FONTANA, 2000). Esses dados foram complementados com o estudo dos diários docentes, registros sem vocação institucional, escritos pelas pesquisadoras. Tomamos como critério de análise, o tempo de exercício do magistério das professoras participantes: de 0 a 5 anos de carreira; entre 6 e 11; entre 12 e 21 anos de profissão docente. Procuramos verificar de que maneira a representação do entorno psico-sócio-afetivo agia como elemento orientador na escolha da profissão. Os resultados mostraram que tanto para as professoras em início de carreira, quanto para as veteranas as lembranças da infância escolar constituem a primeira justificativa apresentada como fator determinante para se tornarem professoras. O medo e a decepção marcam o início da carreira docente. O dilema entre a desistência e a persistência apresenta-se como um dos sentimentos fortes, que coloca em jogo o processo identitário ou de identificação com a profissão. Finalmente, a esperança de contribuir para a formação do outro (criança, adolescente, adulto) é o que assegura a continuidade da vida profissional. Presumimos que esse desabrochar para si e para o outro constitui um aspecto constitutivo da abordagem autobiográfica como prática reflexiva inovadora para a profissionalização docente.

PROFESSORAS NA INSTRUÇÃO PÚBLICA DE CURITIBA: DA IMPLANTAÇÃO DOS PRIMEIROS GRUPOS ESCOLARES (1903) A PRIMEIRA CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO (1927)

Cristiane dos Santos Souza, U. Federal do Paraná

O presente trabalho, inserido no eixo temático “Gênero, etnia e geração”, tem por objetivo realizar uma investigação histórica sobre os papéis desenvolvidos pelas professoras inseridas na Instrução Pública de Curitiba entre 1903 e 1927. Na esteira de SCOTT, discutindo os papéis adequados a homens e a mulheres enquanto construções culturais; pensando os sujeitos históricos em suas relações como analisa LOURO; para além dos aspectos de dominação entre os sexos conforme aponta VIDAL, é que esta pesquisa procurou verificar como as professoras incorporaram e repassaram a seus(as) alunos(as) as normas estabelecidas no período e analisar como, através de suas práticas, procuraram inculcar valores que entendiam serem próprios da suposta condição feminina. Nesta direção, trilhar este propósito de estudar os papéis desenvolvidos pelas professoras da Instrução Pública de Curitiba, no início do século XX, exigiu uma aproximação às discussões em torno da(s) cultura(s) escolar(es). Lembrando que, para Dominique JULIA, ”A cultura escolar é descrita como um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos”. (2001, p.9).

Este período marca, inicialmente, a implantação dos primeiros grupos escolares em Curitiba, em um momento em que a escola era vista, também, como um veículo de propagação dos interesses da Nação. As professoras inseridas no ideário republicano, já constituíam a maioria dos docentes ligados à Instrução Pública Primária no Estado do Paraná. Em 1927, marco final da periodização deste trabalho, acontece na cidade a Primeira Conferência Nacional de Educação, na qual a participação das professoras se fez tanto pelas teses apresentadas, quanto nos debates realizados.

O desafio lançado está em analisar a condição da professora inserida nas relações de gênero, como sujeito de sua própria trajetória para além das visões bipolarizadas (homem-mulher).Analisar o percurso das professoras requer um constante diálogo com as fontes, que para este trabalho se constituíram de relatórios, regimentos e regulamentos da Instrução Pública (1903-1927), teses defendidas na I Conferência Nacional de Educação, bem como artigos, discursos e obras publicadas no período em questão. O cruzamento das fontes com a literatura consultada possibilitou a realização deste trabalho, organizado nos seguintes itens: “A presença da mulher professora na Instrucção Publica de Curityba (1903-1927)”, capítulo este subdividido em dois tópicos: “Programada para ser

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mulher”- uma discussão sobre o quê e como se ensina”, e “A feminização do magistério na Instrucção Publica do Paraná”, pautado em aspectos que direcionavam a mulher para o magistério, este tópico pretende levantar como se deu este ingresso da professora curitibana, no magistério público no início do século XX.

No segundo capítulo: “Professora, que mulher é essa? Discursos femininos e masculinos em questão”, o estudo vai de encontro a verificar através de artigos, palestras, teses produzidas no período, qual era a participação das professoras na produção destes documentos. Capítulo este estruturado em três tópicos: ”Entre submissões, resistências e rupturas”, tópico que discorre sobre a responsabilidade da mulher professora sobre sua própria trajetória, na qual ao se submeter e/ou romper com os discursos, ela fez escolhas; “Uma conveniente confusão de papéis: os valores da maternidade incutidos na professora”, e “Deveres de uma boa professora: a moral em questão”.

EDUCANDO O INDIVÍDUO NA SOCIEDADE MODERNA: O PRINCÍPIO DE AMPLIAÇÃO DAS OPORTUNIDADES EDUCACIONAIS COMO INVESTIMENTO SOCIAL NO GOVERNO DE JUVENAL LAMARTINE DE FARIA, NO RIO GRANDE DO NORTE (1928-1930)

Cristiana Moreira Lins de Medeiros - UFRN

O presente trabalho se constitui em uma das etapas resultantes de uma pesquisa intitulada “A Modernidade Pedagógica da Educação Escolar no Governo de Juvenal Lamartine de Faria, no Rio Grande do Norte (1928-1930)”, que pretendeu conhecer os investimentos socioeducacionais desse governo na esfera da educação primária, secundária, normal e profissional, na etapa correspondente à modernidade educacional no Brasil e no Rio Grande do Norte, no período de 1928 a 1930. O programa de ações socioeducacionais inovadoras, implementado por Juvenal Lamartine, objeto de estudo que deu origem a pesquisa, é identificado como um conjunto de investimentos que cujas ações sociopolíticas foram projetadas a partir do cenário moderno das grandes cidades, tanto européias quanto norte-americanas, aspirando ao progresso econômico do Rio Grande do Norte. O estudo parte da categoria de intelectuais, considerando-se que estes sejam aqueles sujeitos criadores, portadores e transmissores de idéias peculiares de uma época, politicamente engajados em torno da concretização de ideais, os quais defendem vigorosamente. Na busca de compreender a educação escolar como produto de intervenções políticas e democráticas desse governante potiguar, para quem a difusão de uma nova etapa de uma cultura moderna advinha da ampliação das oportunidades educacionais no estado e na sociedade republicana de seu tempo, o estudo teve como procedimento metodológico a análise histórica de fontes documentais, como Mensagens Governamentais, Leis e Decretos estaduais, Regimentos e Regulamentos Escolares, Relatório do Departamento de Educação, artigos de jornais e revistas e publicações do próprio Juvenal Lamartine de Faria e seus comentaristas, visando mostrar a ampliação das oportunidades educacionais que contribuíram para a implementação de uma educação moderna no Estado. Juvenal Lamartine mostrou, durante os seus dois anos e dez meses de governo, que estava em conformidade com o princípio de igualdade das oportunidades educacionais, investiu na ampliação do número de matrículas, construiu novos prédios escolares, subvencionou os estabelecimentos particulares de ensino primário, secundário e profissional e destinou mais verbas à educação escolar. Essa ampliação das oportunidades educacionais envolveu todas os segmentos da sociedade, mas destaca-se aqui, o envolvimento de crianças, jovens e adultos, do segmento da classe trabalhadora urbana e rural. Percebeu-se também, que o governo Juvenal Lamartine, no campo da educação escolar, investiu na democratização do conhecimento pela equalização das oportunidades educacionais acompanhada de uma concepção de educação moderna, pautada na pedagogia escolanovista, com o propósito de revigorar intelectual, moral, físico e econômico a população escolar infantil, jovem e adulta do Rio Grande do Norte.

PASSEATA DO RÁDIO: ISOLAMENTO ESCOLAR E PROPAGANDA TOTALITÁRIA

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Cynthia Machado Campos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Um texto literário publicado no sul do Brasil (1) traz para os dias de hoje imagens do desconcerto da população alemã e teuto-brasileira diante da proibição do falar da língua alemã e leva a pensar o momento do Estado Novo, conforme referenciais pautados na teoria do totalitarismo de Hannah Arendt.

Contrastando com a situação muito particular evidenciada pelo texto literário, as imagens de totalitarismo difundidas pelas leituras de textos de Hannah Arendt suscitam imagens de massificação. Tais imagens advêm de uma prática experimental do regime de fazer uso de estratégias diversas para difundir mensagens oficiais, lançando mão de linguagens sedutoras, que produziriam efeitos desejáveis. Fazendo uso de símbolos, metáforas e alegorias, tais imagens atingiriam indivíduos isolados e apáticos, que se comportariam como espécie de receptáculo de mensagens oficiais.

Tais mensagens previamente articuladas e centralizadas pelo poder totalitário, estariam destinadas a atuar no imaginário de indivíduos atomizados, isolados (2), desenraizados e indiferentes. Este exercício estaria vinculado a um modo de asserção da política que implicaria em elementos de persuasão. A tendência persuasiva estaria exacerbada, adquirindo estatuto de manipulação, a medida em que o exercício do poder político tenderia a substituir dados de realidade por imagens fabricadas. O resultado poderia ser a afirmação de uma mentira falaciosa, pelo poder instituído que tende a dissociar a noção de verdade da política (3).

Quais as vinculações que podem ser feitas entre as imagens sugeridas pelo texto de Hannah Arendt e uma situação particular, isolada, solitária, à primeira vista, pontualmente localizada no sul do Brasil? Tais imagens nos abrem possibilidades de repensar o político na era Vargas, ou a modernidade no Estado Novo quando se constituiu uma situação de controle sobre a vida das pessoas nas escolas, nas suas casas, associações recreativas, sociedades culturais, no que se refere ao uso da língua.

Ingerências sobre os espaços públicos e o privado foi apenas uma das faces de uma ampla campanha coordenada pelo Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, criado em Santa Catarina no ano de 1941. Essa campanha se estendeu aos meios de comunicação e às artes em geral, através de uma rigorosa censura: teatro, cinema, rádio-difusão, literatura, imprensa, foram os seus alvos. Algumas programações tiveram sua veiculação dificultada, à outros programas foram impressos cunhos „patrióticos“(4). Tais ingerências se deram no âmbito do cotidiano, no lugar do privado, no núcleo domestico, na escola. A infiltração da máquina totalitária nas fileiras familiares, entre os casais e na infância, atingiram subjetividades e visões de mundo, regulando suas engrenagens no sistema automático lançando mão dos equipamentos coletivos como os meios de comunicação de massa. Foi uma forma de banalização da violência na sua faceta totalizadora.

SILVEIRA JÚNIOR, Norberto Cândido. Nossa guerra contra a Alemanha: crônica de um tempo de arbítrio. Florianópolis: Lunardelli, 1988. 2 Idem. P. 457. 3 ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1992. p. 2834NOGUEIRA, Rui Alencar. Nacionalização do vale do Itajaí. Rio de Janeiro: Biblioteca Militar, 1947. p. 132.

NÚMEROS DA EDUCAÇÃO PRIMÁRIA EM PERSPECTIVA HISTÓRICO-COMPARADA: PORTUGAL E BRASIL NAS ESTATÍSTICAS DA UNESCO (1946-1960)

Cynthia Pereira de Sousa, Universidade de São Paulo

No âmbito de um projeto em curso, que pretende examinar a “escola de massas” no Brasil e em Portugal, de uma perspectiva histórico-comparada, um dos aspectos que estava a merecer um estudo mais aprofundado era o de recuperar os “lugares” ocupados por estes dois países no cenário mundial, segundo estudos e pesquisas sobre educação elementar que passaram a ser feitos por organismos internacionais, depois da Segunda Grande Guerra.

A criação de instituições de caráter internacional emergidas depois das duas grandes guerras teve a clara finalidade de tentar reorganizar as regiões diretamente atingidas. Nossas atenções estarão

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centralizadas na UNESCO, como um dos ramos da ONU, e que inaugura de forma sistemática um trabalho de grandes proporções em relação à educação, o que coloca a Educação Comparada, em plano destacado. Junto dela, a estatística se põe a campo, como ferramenta de larga utilização para os estudos comparados em educação. De forma constante, a UNESCO exercerá pressão no sentido de enfatizar a necessidade de que lhe fossem fornecidos os quadros estatísticos sobre a educação em todos os países e territórios. Nos numerosos estudos elaborados pela UNESCO de que se tem notícia no período abrangido por este trabalho, a entidade recorreu a todo tipo de documentação existente (publicações sobre educação, relatórios, documentos oficiais de natureza variada produzidos nos países) e, na falta de estatísticas oficiais, as comissões encarregadas optaram por “estimativas”.

Tomando como eixos centrais a escola primária e o analfabetismo das populações, nosso objetivo principal consiste em apontar como os dados relativos ao Brasil e a Portugal foram sendo trabalhados, o que resultou em comparações, em classificações, na construção de categorias, na hierarquização dos países no “concerto das Nações” e em relação aos seus vizinhos continentais, buscando indicar como foram feitas também as comparações internas e a partir de quais critérios. Servimo-nos de algumas publicações pontuais da UNESCO - o World Handbook of Educational Organization and Statistics e duas monografias encomendadas sobre analfabetismo no mundo - a partir das quais pretendemos destacar permanências e mudanças do ponto de vista interno das mesmas, o modo como foram estruturadas, o tratamento dos dados estatísticos e a classificação dos países, a partir de critérios nem sempre muito claros, pois esbarravam no problema da falta de uniformização dos dados enviados.

Para os responsáveis pela administração social dos países recenseados, para os educadores e setores interessados da população, os efeitos das estatísticas e das classificações podem ter servido para evidenciar diferenças “comparáveis e mensuráveis”, podem ter gerado sentimentos de insucesso, de inutilidade de campanhas de alfabetização para promover o “progresso” social e educacional, podem ter ampliado o distanciamento em relação aos países mais bem sucedidos nos processos de diminuição das taxas se analfabetismo (Popkewitz & Lindblad, 2001).

O CURSO DE MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS: HISTÓRIA E MEMÓRIA

Dagmar Junqueira,Universidade Católica De Goiás

A presente pesquisa tem como objetivo compreender e analisar o processo de criação e consolidação dos cursos de Matemática da Universidade Católica de Goiás (UCG), reconstruindo sua trajetória histórica, por meio de documentos escritos e da memória de seus construtores. Aborda seus pontos altos, suas crises, sua contribuição para a sociedade goiana na formação de professores e bacharéis. Resgata a história do curso desde a sua criação, destacando vários momentos como o início da década de 1960.

Analisa a repercussão do golpe militar de 1964 e da reforma universitária de 1968. Busca as raízes da criação da universidade e do ensino superior de Matemática em diversas épocas, e enfatiza a criação da Universidade Católica de Goiás (1959). Trata-se de uma pesquisa qualitativa que utiliza os recursos da história oral. Foram usadas entrevistas semi- estruturadas com professores, ex-professores e idealizadores dos cursos em questão, documentos escritos, como atas, anuários, boletins, processos, livros de registros das secretarias.

CINCO PILARES DE UMA EDUCAÇÃO ABERTA PARA O NOVO MILÊNIO

Dalcy da Silva Cruz, UnP - Natal/RN

O destino da educação para o novo milênio, certamente, que estará ligado à uma perspectiva de construção de saberes interelacionados, sem disjunção nem fraturas. A transdisciplinaridade que reflete uma realidade multicultural, como ocorre na América Latina, em geral, no Brasil, em particular, sugere que o diálogo entre educação e cultura humanística e científica

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- deverá abrir caminhos mais construtivos no que diz respeito à formação do indivíduo que se prepara para a vida.. A educação, articulada com a cultura, terá o propósito de transmitir, não um saber disciplinar, mas a compreensão do viver e da condição humana, a partir de um pensar aberto e livre. Nesse sentido, os cinco pilares aqui propostos, teatro, música, pintura , literatura e cinema - servirão de apoio à uma formação/reformulação do pensamento que deverá se abrir para o mundo. O teatro, usado pelos jesuítas desde o Brasil Colônia, enquanto uma construção social, tem proporcionado em algumas experiências, uma grande estratégia de educação, sobretudo quando se observa seu caráter pedagógico. A educação musical, também pode criar uma nova cultura escolar. A música tem sido, não só na atualidade, mas desde a catequese indígena, um dos instrumentos utilizados com caráter pedagógico. A pintura é um outro meio que vem possibilitando a transmissão do conhecimento e do saber, no sentido de expressar os sentimentos e a sensibilidade que cada indivíduo carrega dentro de si. A literatura, pode trazer para o educando as representações da sociedade, alimentando a inteligência geral e criando interrogações a respeito da realidade concreta e do subjetivo do educando. Sua força estimula a reflexão sobre os vários aspectos do saber e cria a possibilidade de integrar o indivíduo no conhecimento mais global. O cinema, assim como a literatura, faz com que o indivíduo reconheça os instantes de verdade do amor, do sofrimento, das subjetividades dilaceradas e, descubra, ao mesmo tempo, a profundidade da condição humana. O filme revela, tanto à grandeza como a miséria do homem com suas tragédias e suas alegrias que podem desembocar em fracasso, erro ou loucura. Portanto, a articulação da educação com a cultura, proporciona o desenvolvimento de um pensar unificador que se abre para o mundo. Forma-se um pensar planetário. Esse relacionamento cultura escolar/cultura historicamente produzida pela sociedade, é uma possibilidade de religar escola oficial com saberes tecidos pela sociedade dos homens. É considerar a diversidade cultural brasileira e latino-americana com um meio de formar novos cidadãos.

O NASCIMENTO DOS GRUPOS ESCOLARES NUMA CIDADE DE VOCAÇÃO INDUSTRIAL

Dalva Carolina (Lola) de Menezes Yazbeck, Universidade Federal de Juiz de Fora. M.G

Este trabalho foi concebido a partir dos primeiros resultados de uma pesquisa mais ampla, onde o objetivo geral é o de reconstituir a história dos primeiros Grupos Escolares na cidade de Juiz de Fora, no estado de Minas Gerais.

O texto registra os primeiros momentos da institucionalização dos Grupos Escolares, no início do século XX, sendo inaugurado, o primeiro, em 04 de fevereiro de 1907 e o segundo, em 23 de março do mesmo ano, com 470 e 396 alunos matriculados respectivamente. Desta forma, este trabalho aponta as ações políticas entre o estado e o município, a organização e o desenvolvimento deste novo espaço escolar o qual consubstanciava, por um lado, o fortalecimento da proposta republicana e por outro, o preparo da classe pobre para o trabalho, além do que instituía os princípios da ordem, da disciplina e da higiene. É destacada ainda a importância dos Grupos Escolares em Juiz de Fora que ao oferecer educação para os filhos da classe pobre, garantiu o sucesso e a maior abrangência do projeto educacional já existente na cidade, que assegurava, até então, somente a educação dos filhos da elite industrial. Além disso fica claro que a iniciativa de criar um novo espaço escolar na cidade guarda coerência com a Reforma Educacional proposta para Minas Gerais que ao promover a modernização da sociedade através da racionalização do ensino público, deu a possibilidade do preparo profissional da camada pobre da população.

Assim, a importância deste estudo reside na contribuição para as discussões desenvolvidas pelos grupos de História da Educação Regional, que têm apresentado um crescente número de estudos sobre as instituições escolares. Da mesma forma oferece subsídios à História da Educação Brasileira, em estudos que demandam conhecer o desenvolvimento das políticas educacionais regionais para maior fidelidade dos relatos e das análises.

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O estudo utilizou a literatura pertinente ao tema e ao período estudado, além das fontes documentais primárias tais como: os arquivos dos Grupos Escolares, os jornais da época e as publicações oficiais da Estado de Minas Gerais.

A pesquisa: O Estado e a Educação Básica em Juiz de Fora: pioneirismo,organização e expansão2 Fonte:Jornal do Commercio de 05 de fevereiro de 1907.

O ENSINO SECUNDÁRIO LICEAL NOCTURNO. OS ADULTOS TRABALHADORES TÊM ACESSO A UMA QUALIFICAÇÃO MAIS AVANÇADA

Daniel Melo Rosa, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Até ao ano lectivo de 1972/73 todos aqueles que, pelos mais variados motivos, abandonavam o sistema regular de ensino, para se integrarem prematuramente na vida activa e que ambicionavam uma valorização cultural e social, só poderiam fazê-lo voltando à escola no único regime que tinham ao dispor - o nocturno. No caso de pretenderem estudar no ensino secundário, apenas poderiam usufruir do Ensino Técnico oficial, que dispunha de aulas em regime pós-laboral. Aos que queriam cursar o ensino liceal não lhes restava outra alternativa senão frequentarem os colégios particulares e/ou explicadores. Só assim, depois de terem despendido alguns recursos retirados aos seus baixos vencimentos, os alunos adultos conseguiam as bases que lhes dariam conhecimentos programáticos para requererem individualmente os exames do 5º ano (3º do Curso Geral), ou do 7º ano (2º do Curso Complementar). Era esta a preparação que lhes poderia dar alguma esperança na qualificação académica mais elevada.

Deve-se a Veiga Simão, ministro da Educação empossado no início de 1970, a introdução deste nível ensino, criado ao abrigo do Decreto-Lei das experiências pedagógicas (1967). Um despacho de 31 de Agosto de 1972 apontava o próximo ano lectivo para o arranque do Ensino Liceal Nocturno, a título experimental. Foram três os estabelecimentos de ensino escolhidos para o efeito: Liceu Camões, em Lisboa; Liceu D. João III, em Coimbra e D. Manuel II, no Porto. A sua implementação ficou a cargo da Direcção Geral da Educação Permanente. Numa estratégia de desenvolvimento e modernização do sistema de ensino, a educação permanente iria desempenhar um papel importante na “democratização do ensino”. A diversificação das formações propiciadas aos adultos, desde a alfabetização até à entrada na universidade, no decurso das suas próprias vidas, era, sem dúvida, um recurso até então inexistente.

Contudo, no ano lectivo de 1974/75 apenas 12 dos 18 distritos do Continente tinham Ensino Liceal Nocturno e dos 4 distritos dos Açores e Madeira somente os habitantes de Ponta Delgada podiam frequentar este ensino. Com esta comunicação, pretende-se analisar o aparecimento do Ensino Secundário Liceal Nocturno, mostrar como este projecto não era uma novidade e apresentar o modo de sua implementação de uma forma demasiado lenta.

COMPÊNDIOS DE VIRTUDES OU HOMENS DOTADOS DE QUALIDADES EXTRAORDINÁRIAS: O MAGISTÉRIO SEGUNDO ANTÔNIO DE ALMEIDA OLIVEIRA

Daniel Cavalcanti de Albuquerque Lemos,UERJ

Neste estudo pretendo discutir as concepções sobre os professores, segundo Antonio. de Almeida Oliveira, deputado pelo partido liberal, bacharel em direito e jornalista que teve sua vida ligada à instrução pública. Criou em 1871 uma escola noturna para adultos em recife, batizada de 11 de agosto e, em 1872, fundou em São Luiz do Maranhão uma biblioteca popular com mais de dois mil volumes, sendo incentivador da criação de bibliotecas populares pelo Brasil, e autor de livros sobre a educação. Republicano confesso, fez através de suas obras duros ataques à monarquia e à igreja

Para desenvolver uma reflexão sobre o papel que era esperado e atribuído ao magistério, trabalho com o livro de sua autoria intitulado “O Ensino Público”, escrito em 1873. Analiso a quarta

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parte do livro denominada “Do Magistério” e os seus seis capítulos que tratam respectivamente: do professor, suas qualidades e suas virtudes (capítulo primeiro); da mulher no magistério (capítulo segundo); das condições de que depende um bom magistério (capítulo terceiro); das escolas normais (capítulo quarto); das conferências pedagógicas (capítulo quinto) e das vantagens do professorado (capítulo sexto).

Junto a análise do livro busco perceber o seu alcance e a sua repercussão. Para isso trabalho com jornais da época que tratam da educação e com a legislação então vigente, percebendo os locais de circulação e compreendendo os documentos, como produtos de uma sociedade, sujeito à condições de elaboração. Neste sentido entendo, como diz Foucault, que “ o documento não é o feliz instrumento de uma história que seja, em si e com pleno direito.”. Desta forma buscarei trabalhar o documento como um monumento como afirma Le Goff

Entendida essas e outras relações, a obra oferece a possibilidade de perceber discussões e tensões no campo da educação, traçando um interessante panorama desta época. Assim, procurei compreender os discursos contidos no livro O ensino público, levando em consideração suas articulações com práticas não discursivas sociais e políticas que desempenharam um papel na constituição de uma nova proposta para o magistério. E que, junto com o papel atribuído ao professor, havia todo um sistema de controle operando em diferentes níveis, seja na associação da imagem do magistério com o sacerdócio, seja por provas e normas de conduta, seja por baixos salários. Este sistema não ficou restrito ao século XIX. Acredito que tenha se aperfeiçoado e ficado mais “discreto” para se tornar mais eficiente. Assim, podemos perceber que a associação da imagem do magistério com o sacerdócio ainda é utilizada contra os que profanam a nobre missão ao reivindicarem melhores salários e a fazer greves. Nesta perspectiva, do sagrado ao profano, homens que deveriam ser compêndios de virtudes, o princípio e a vida da escola, falham miseravelmente em sua missão, tanto no período de Antônio de Almeida Oliveira, como hoje.

OS GINÁSIOS VOCACIONAIS: A (DES)CONSTRUÇÃO DA HISTÓRIA DE UMA EXPERIÊNCIA EDUCACIONAL TRANSFORMADORA

Daniel Ferraz Chiozzini, Faculdade de Educação / Unicamp

O trabalho consiste em um estudo histórico sobre os Ginásios Vocacionais, uma das experiências educacionais inovadoras implantadas no estado de São Paulo, entre 1961 e 1969, voltada para o ensino de 5 ª a 8 ª séries, investigando suas origens, contradições, crises internas e externas.Foram retomadas algumas propostas educacionais anteriores a ele, que direta ou indiretamente foram referenciais para sua construção, assim como o processo político relacionado a sua implantação, tanto no estado como no país. Também foram resgatadas, através de depoimentos e análise de fontes primárias, visões distintas e inexploradas sobre o início e desenvolvimento deste projeto educacional.A pesquisa foi baseada na análise dos Documentos do Acervo Histórico da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, depoimentos de dois ex-participantes e na bibliografia já existente sobre o projeto.

O estudo constatou, em primeiro lugar, como foi possível a realização da experiência. Havia um projeto pedagógico e uma estrutura institucional diferenciada que viabilizaram a implementação de uma série de inovações em relação à escola tradicional, criando condições para que se avançasse de maneira significativa em termos de interdisplinaridade, processo de avaliação, currículo, vínculo da comunidade com a escola, estudo do meio, entre outros.

O projeto curricular era marcado pela integração entre as problemáticas da comunidade onde o aluno estava inserido e o conteúdo convencionalmente trabalhado no ensino fundamental. Isto visava proporcionar a formação de uma consciência crítica e de um cidadão compromissado e atuante na sociedade. Cabe destacar que o currículo também era composto de disciplinas não existentes na escola convencional, como Artes Industriais, Práticas Comerciais, Práticas Agrícolas, Educação Doméstica, juntamente com Educação Física e Artes Plásticas. O conteúdo dessas disciplinas, destinado aos meninos e meninas, além de proporcionar uma formação ligada ao mundo do trabalho, tinha o objetivo de desenvolver atividades práticas, associadas às demais disciplinas, classificadas como "teóricas". Este tipo de formação permitia ao aluno desenvolver todas as suas potencialidades e,

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a partir daí, identificar a sua vocação e o campo de trabalho onde ele poderia atuar de maneira mais competente e prazeirosa. Por isso, o projeto trazia em seu nome o conceito "Vocacional".

O término dessa experiência educacional está principalmente ligado à repressão militar, que culminou com a invasão das unidades e prisão de professores e coordenadores, acusados de "preparar mentes para o comunismo". A construção da memória do projeto esteve muito marcada pelo seu fim traumático, assim como pela visão de sua principal idealizadora, a professora e pedagoga Maria Nilde Mascellani. A dissertação também contribuiu para lançar novos olhares sobre esse processo e para levantar hipóteses para pesquisas futuras.

OS PROJECTOS PARLAMENTARES DE EDUCAÇÃO POPULAR NO PORTUGAL DOS ANOS DE 1930

Daniel Melo, Investigador associado sénior do ICS-UL, bolseiro de pós-doutoramento da FCT A presente comunicação tem como objectivo analisar os vários projectos de educação popular que foram apresentados na Assembleia Nacional na sua I Legislatura (1935-38) e que não focam a escolarização obrigatória. Pretende-se assim averiguar o lugar que era atribuído à educação daqueles que não tinham tido hipóteses de iniciar a sua educação formal desde a infância ou de a prosseguir e completar de modo normal.A disputa que ocorreu no parlamento português a propósito da educação popular revela a existência de correntes concorrentes no seio das forças situacionistas e de projectos político-ideológicos distintos: por um lado, uma tendência favorável ao desenvolvimento e ligada aos sectores mais dinâmicos da economia, bem personificada e representada pelo eng. Araújo Correia; por outro lado, uma tendência favorável à manutenção do status quo, ligada aos sectores mais conservadores e tradicionalistas, representada pelo também deputado António Pinto da Mota.O facto dos projectos específicos mais progressistas apenas terem sido derrotados pela intervenção do próprio Salazar ilustra não só o desvirtuamento do equilíbrio de forças políticas então existente no hemiciclo como foi aproveitado dum modo assaz singular para o reforço do seu poder unipessoal. Foi, portanto, mais um passo para a cristalização da própria ditadura.

AS CAMPANHAS DE EDUCAÇÃO POPULAR NO PORTUGAL DO PÓS-II GUERRA MUNDIAL

Daniel Melo, Investigador associado sénior do ICS-UL, bolseiro de pós-doutoramento da FCT

A presente comunicação tem como objectivo analisar as relações entre a alfabetização e a leitura pública no pós-II Guerra Mundial, tomando como ponto de partida as políticas oficiais para promover a alfabetização e a pós-alfabetização dos adolescentes e adultos.

Propõe-se um exercício comparativo entre as campanhas de alfabetização da década de 1950 (da Campanha Nacional de Educação de Adultos do Ministério da Educação Nacional) e as do pós-25 de Abril de 1974 (umas organizadas por entidades da sociedade civil e outras pelo Estado), sendo que em ambas as bibliotecas públicas (em sentido literal) tiveram um papel de destaque, servindo como instrumento complementar para possibilitar o acesso à leitura e para travar o aumento do analfabetismo funcional e do analfabetismo regressivo.

Pretende-se ainda analisar as perspectivas político-ideológicas subjacentes a estas campanhas, bem como as prioridades na selecção bibliográfica para as bibliotecas de apoio.São deste modo analisadas e confrontadas certas facetas de políticas educativas sob distintos regimes políticos, ou seja, numa ditadura (o salazarismo) e numa democracia (a II República), embora esta ainda numa fase de transição, incluindo um período revolucionário.

A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA ESCOLA PRIMÁRIA PAULISTA (1968-1990)

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Daniela Cristina Lopes de Abreu , Unesp/Araraquara

O presente estudo, intitulado “A institucionalização da escola primária paulista (1968-1990)”, é resultado da dissertação de mestrado, que teve por finalidade dois objetivos: mapear as transformações institucionais e pedagógicas da escola primária paulista e realizar um levantamento das possibilidades de estudos históricos da escola primária no período delimitado para a pesquisa. O período delimitado para a pesquisa, 1968 a 1990, compreende o ciclo de reformas que provocaram transformações no ensino primário, isto é, do curso primário de educação elementar, cuja duração era de quatro anos à escola de 1º grau, cuja duração passou a ser de oito anos. Sem pretender cobrir exaustivamente todo o período, daremos maior ênfase aos momentos cruciais em que medidas governamentais implicaram mudanças nesse nível de ensino, tais como as reformas de 1968, a promulgação da Lei 5.692 em 1971, a implantação do ensino de 1º grau na rede pública de São Paulo entre os anos de 1974 e 1976, decorrentes da Lei 5.692/71 e a criação do ciclo básico em 1983, por meio do decreto 21.833. Essa época esta cercada de modificações tanto no setor político, econômico e social do país, quanto no campo educacional. O fenômeno da urbanização, desaceleração do crescimento industrial, o milagre econômico, o pacote de abril, e outras tomadas de decisões influenciaram as administrações educacionais que a cada novo governo realizavam novas reformas ignorando as do governo passado. Para a realização desta pesquisa, além da revisão bibliográfica, foram feitas visitas ao Arquivo do Estado de São Paulo, consultas no acervo da biblioteca do Centro do Professorado Paulista - Instituto de Estudos Educacionais Profº. “Sud Menucci” e no Centro de Referência em Educação Mário Covas.Estas visitas tornaram-se imprescindíveis para conseguir reunir os artigos dos periódicos. Optei por não trabalhar apenas com os documentos oficiais como Leis, Decretos, Deliberações, Resoluções e materiais produzidos pela Secretaria da Educação de São Paulo, como também artigos de periódicos de relevância para o campo educacional. Desse modo, acreditei poder visualizar o debate educacional do período estudado.Quanto aos periódicos selecionados estes foram:1. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos; (1971 - 1990)2. Cadernos de Pesquisa; (1971 - 1990)O resultado desta pesquisa trás um balanço dos estudos produzidos na época, além de apontar as possibilidades quanto a temas e fontes aos pesquisadores que procurarem estudar a história da escola primária na década de 1970 e 1980.

HISTÓRIA, MEMÓRIA E HISTORIOGRAFIA DA EDUCAÇÃO NA REGIÃO DO TRIÂNGULO MINEIRO E ALTO PARANAÍBA, MINAS GERAIS, BRASIL: ACERVOS DOCUMENTAIS PÚBLICOS E PRIVADOS E PRODUÇÃO DE DOCUMENTOS A PARTIR DE TESTEMUNHOS ORAIS

Décio Gatti Júnior, Universidade Federal de Uberlândia e Centro Universitário do Triângulo

Trata-se da comunicação de reflexões teórico-metodológicas efetivadas a partir de experiência de pesquisa no âmbito da História da Educação, em especial, acerca das instituições escolares criadas nas principais cidades do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, a saber: Uberaba, Uberlândia e Araguari. De fato, o esforço investigativo realizado no âmbito do Núcleo de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação (NEPHE), da Universidade Federal de Uberlândia, desde 1992, e do Grupo de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação Superior (GEPHES), do Centro Universitário do Triângulo, desde 1998, oportunizou e tem oportunizado grande envolvimento na busca de evidências históricas que possam sustentar a elaboração de teorias sobre o processo de escolarização vivenciado, de modo especial ao longo do Séc. XX, nesta região brasileira. Tomou-se como prioridade apreender o movimento de constituição e

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funcionamento inicial das primeiras instituições escolares nestas cidades, mediante a qual pôde-se levantar, catalogar e analisar uma série de evidências históricas, provenientes de diferentes acervos, públicos e particulares, com diferentes formas de acesso e mesmo de conservação. Como recorte temporal da investigação, priorizou-se, inicialmente, a passagem do Séc. XIX ao XX, quando fundaram-se importantes instituições escolares de nível elementar e ginasial de caráter privado, confessional e público nas cidades selecionadas. Em seguida, observou-se um segundo movimento, em busca da escolarização em nível superior, em meados do Séc. XX, no qual, novamente, pôde-se perceber disputas entre instituições confessionais, privadas e públicas na região. Na análise da documentação referente aos processos de constituição e funcionamento inicial dessas instituição foi possível perceber diferenças de esforço de preservação entre as iniciativas de caráter privado, confessional e público, muitas das quais observadas nos trabalhos de dissertação apresentados recentemente nos cursos de mestrado existentes atualmente na região. Além disso, no interior dos grupos de pesquisa em História da Educação instalados na região, NEPHE e GEPHES, foi possível acompanhar o esforço de constituição de documentação procedente da História Oral, mediante o qual, quase uma centena de administradores escolares, membros docentes e discentes das primeiras turmas das instituições escolares analisadas foram entrevistados, quase sempre a partir de questionários semi-estruturados, transcritos e arquivados em papel e eletronicamente, com finalidade de serem utilizados em investigações dos pesquisadores da área na região. Por fim, houve a constituição de acervo iconográfico devidamente digitalizado, que apesar, de repleto de informações, ainda carece de um maior aproveitamento pelos pesquisadores afetos a área. A análise especifica desses materiais históricos e de sua importância para a efetivação dos procedimentos investigativos da pesquisa em História da Educação na região corroboram as elaborações teóricas e as preocupações de tom arquivístico que tem tomado conta dos pesquisadores da área da História da Educação na região, com a proposição de criação de centro de documentação diretamente relacionado a temática.

AS REUNIÕES GERAIS COMO RECURSO DE DOUTRINAÇÃO DE VALORES MORAIS, CÍVICOS E HIGIENISTAS NUMA ESCOLA SUPERIOR DE AGRICULTURA E VETERINÁRIA DE MINAS GERAIS

Denilson Santos de Azevedo, USP/UFU

A comunicação tem o propósito de realizar um estudo sobre as Reuniões Gerais, realizadas durante a vigência da Escola Superior de Agricultura e Veterinária do Estado de Minas Gerais (ESAV), no período compreendido entre 1926 e 1948, e que forjou a atual Universidade Federal de Viçosa - MG (UFV), instituição federalizada em 1969 (1).

A ESAV foi concebida pelo Governo do Estado de Minas para ministrar um ensino essencialmente prático, constituindo-se numa das raras exceções ao predomínio do ensino bacharelesco, acadêmico, que ainda vigia na maioria dos estabelecimentos de ensino superior brasileiros da época. No entanto, para contornar essa exigência do Governo do Estado e propiciar uma formação mais ampla aos estudantes, a direção da Escola conseguiu aprovar o Artigo 58 do Regulamento da ESAV de 1927, que estabelecia por semana uma reunião geral dos alunos, de curta duração, com o fito de lhes serem ministradas instruções de ordem moral, cívica e higiênica.Dessa reunião participavam o diretor, os professores e os alunos. Em pouco tempo, essas reuniões tornaram-se diárias, por serem consideradas pela Congregação como “um dos melhores cursos da Escola para o melhoramento dos alunos” (Ata nº 6, 29/11/1927). Elas eram realizadas no salão nobre do Edifício Principal, de segunda-feira a sábado, das 10 às 10:30 horas, e com freqüência obrigatória. Cada participante, após assistir à primeira reunião, passava a ter seu assento fixo, o que facilitava o registro de freqüência.

No início da reunião, o diretor transmitia avisos e/ou fazia uma breve preleção de moral, civismo e higiene. Depois, um professor prelecionava por 10, 15 minutos no máximo. O tema era livre. Cada dia um professor apresentava um assunto para reflexão, discussão. Dentre as temáticas explanadas e que serão analisadas, pode-se destacar: Aproveitamento do Tempo, Ilusão Livresca, Instrução Agrícola nos Estados Unidos, Ideal da Escola, Questões Educativas, Cooperativa - Associações, Reflexões sobre Educação e Instruções Modernas, O Valor da Higiene,

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Doenças Venéreas e sua Profilaxia, O Valor dos Desportos, Temperamentos, O Homem Insociável, Ensino aos Homens do Campo, Profilaxia do Pensamento, Fraqueza da Vontade.Em fins da década 1940, essas reuniões passaram a acontecer duas vezes por semana e depois só por uma vez. Uma das razões da extinção das reuniões gerais, foi a falta de espaço para abrigar todo corpo docente e discente da já então UREMG.

Entre 1948 e 1969, a ESAV foi transformada, pelo governo do Estado de Minas Gerais, em Universidade Rural do Estado de Minas Gerais – UREMG.

ILHAS DE SABER - COTIDIANO E PRÁTICAS DAS ESCOLAS ISOLADAS DE SÃO PAULO (1933-1943)

Denise Guilherme da Silva, U. Católica de S. Paulo

Este trabalho está relacionado à pesquisa para minha dissertação de mestrado em andamento envolvendo as Escolas Isoladas do Estado de São Paulo na década de 30. A proposta tem por objetivo apresentar o cotidiano e as práticas prescritas e observadas pelos inspetores escolares junto a essas escolas. A partir das questões levantadas pelos Delegados Regionais em seus relatórios anuais e pela Revista Educação em artigos publicados na década de 30, este trabalho pretende mostrar de que forma a atuação dos inspetores escolares contribuiu para a construção de uma representação acerca das escolas isoladas, dos professores para elas designados e das práticas por eles desenvolvidas.

Desde a implantação dos grupos escolares no final do séc. XIX, o projeto republicano de difusão da escola graduada encontrou na “dispersão” geográfica um grande obstáculo. Neste período, grande parte da população encontrava-se em regiões afastadas dos centros urbanos onde, muitas vezes, dada a distância e as dificuldades materiais encontradas, a instalação e manutenção dos grupos escolares tornava-se inviável. Dessa forma, nesses lugares, a alternativa encontrada para a difusão da instrução primária foi a implantação de escolas isoladas.

Embora necessárias, as tais escolas não se adequavam ao modelo de instrução defendido no projeto republicano. Para muitos dos inspetores escolares, elas opunham-se à opulência, racionalidade e progresso representados pelos grupos escolares. No entanto, diante da necessidade de difusão da Instrução Primária, as escolas isoladas configuraram-se como um mal necessário. Na década de 30, os grupos escolares já fazem parte do cenário educacional paulista, estando presentes em todas as 21 regiões escolares em que o estado foi dividido. Entretanto, o número de escolas isoladas ainda é crescente, chegando a ultrapassar o número de três mil unidades em 1935. A grande quantidade de estabelecimentos contribuía também para trazer visibilidade para as inúmeras dificuldades enfrentadas nesses locais e as estratégias de atuação utilizadas pelos inspetores escolares para superá-las.

Problemas como falta de matrícula e freqüência às escolas, na maioria das vezes determinadas pelo estado de pobreza das populações, falta de estabilidade e isolamento do professor, falta de material escolar, moléstias comuns à zona rural, falta de instalação condigna das escolas, falta de materiais e de assistência técnica mais assídua ao professor rural parecem ser alguns dos elementos que distanciam as práticas dessas escolas daquelas defendidas para a Instrução Pública no período e, por isso, constituíam grande preocupação dos inspetores . Identificar o que constituíam essas práticas “ideais” pode contribuir para a compreensão de um conjunto de “condutas desviantes” que parecem compor a representação construída por esses profissionais a respeito da cultura escolar concebida nessas ilhas de saber - as escolas isoladas.

A TRAJETÓRIA DA PEDAGOGIA CATÓLICA NO BRASIL: DA HEGEMONIA À RENOVAÇÃO PELA MEDIAÇÃO DA RESISTÊNCIA ATIVA

Dermeval Saviani,UNICAMP e USP-Ribeirão Preto

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O presente trabalho se propõe a abordar a trajetória da pedagogia católica no Brasil considerando os seguintes momentos: a) hegemonia plena, correspondente ao período colonial, quando a educação formal no Brasil foi marcada pelo controle exercido pelo Companhia de Jesus; b) com as reformas pombalinas e o avanço do laicismo, a Igreja Católica se colocou na posição de resistir ativamente dando origem, no final do império, à questão religiosa, reorganizando-se para manter o controle educativo do país e recuperar a presença do ensino religioso nas escolas oficiais no decorrer da Primeira República e movendo um combate sem tréguas ao avanço do movimento da Escola Nova após a Revolução de 1930 e ao longo da era Vargas; c) finalmente, diante das transformações da sociedade brasileira articuladas ao avanço das idéias novas, os colégios católicos se empenham na sua própria renovação dando origem a uma espécie de “Escola Nova Católica”.

Os dois primeiros momentos, que compreendem o longo período que se inicia com a chegada dos primeiros jesuítas ao Brasil, em 1549, e se estendem até meados do século XX, serão abordados de forma sucinta, à guisa de antecedentes do problema a ser analisado mais detidamente, que está referido ao movimento de renovação da pedagogia católica que se manifesta, de forma específica, na segunda metade do século XX.

A produção do texto estará apoiada nos resultados da pesquisa “História das idéias pedagógicas no Brasil”, recentemente concluída com o apoio do CNPq e no projeto “O espaço acadêmico da pedagogia no Brasil: perspectiva histórica e teórica”, em desenvolvimento, que também conta com apoio do CNPq. As fontes, de caráter historiográfico, sobre as quais se baseia este estudo, estão configuradas por uma ampla gama de publicações levantadas no âmbito das duas pesquisas acima mencionadas.

Espera-se, com este trabalho, captar a Igreja como uma força educativa viva que se move e se transforma no embate doutrinário e político em que teve, como principais contendores, o Estado e o movimento da Escola Nova com os quais, entretanto, não manteve relações monolíticas. Ao contrário, aos momentos e agentes caracterizados por virulento e ácido combate, coexistem ou se sucedem outros marcados por composições e sutis distinções tendo em vista a manutenção ou retomada da hegemonia na educação da população brasileira.

JULIA LOPES DE ALMEIDA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA NO FIM DO SÉCULO XIX: UM ESTUDO SOBRE O LIVRO ESCOLAR CONTOS INFANTIS.

Diana Gonçalves Vidal, Fac. Educaçăo USP

Julia Lopes de Almeida (1862-1934) insinua-se como sombra na historiografia educacional brasileira. Da mesma maneira que a personagem principal do romance A intrusa, mulher sem rosto, conhecida pelas suas ações e amada pelo universo feminino que recria no cuidado da casa e da família, Julia mantém-se presente na escola brasileira do fim do império e início da república, através de seus livros escolares, intensamente utilizados no ensino primário, mas seguidamente esquecidos pela escrita da história educacional.

Análises da sua obra aparecem de forma recorrente no campo da literatura e dos estudos feministas. Intelectual de prestígio, considerada por José Veríssimo como principal representante literária dos primeiros anos do século XX (Menezes, 1978, p. 24), com uma produção de mais de 40 títulos, entre prosa e verso, publicados no Brasil, em Portugal e na Argentina, Julia é referenciada em dicionários de Literatura e seu trabalho investigado na arena das Letras. A família Medeiros (1892), A viuva Simões (1897), A falência (1902), A intrusa (1908) e Correio da roça (1913), só para citar alguns romances, são o foco de interesse.

Ora considerada como conservadora, defendendo a supremacia intelectual masculina; ora percebida como feminista, por suas participações públicas em defesa do voto da mulher e por sua posição de destaque junto à Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, nos anos 1920 e 1930, a escritora chama a atenção também de feministas e estudiosas de gênero, preocupadas em compreender o lugar social da mulher no Brasil do fim do oitocentos (Besse, 1999). Especialmente destacam-se para essa abordagem o Livro das noivas (1896), Livro das donas e donzelas (1906) e Maternidade (1924).

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Apesar de todo esse destaque literário, político e social, nos anos iniciais da república, e a despeito de ter-se dedicado a escrever cinco livros escolares, Contos infantis (1886), em colaboração com sua irmã Adelina Lopes Vieira, Histórias de nossa terra (1907), A árvore (1916), Era uma vez (1917) e Jornadas no meu país (1920), sendo o primeiro deles aprovado pela Inspetoria Geral de Instrucção Primária e Secundária, em 1891, para uso nas escolas primárias, Julia Lopes de Almeida é escassamente pesquisada no cenário educacional. As exceções ficam por conta do trabalho de Ana Magaldi que se ocupa particularmente das publicações dedicadas à formação da esposa e mãe, e, portanto interessa-se principalmente pela vertente feminista da escritora, e de um breve estudo acerca dos livros didáticos no início da república, no qual Clarice Nunes (s.d.) se debruça sobre Histórias de nossa terra e À margem da história da república, de Vicente Licínio Cardoso. Curiosa com essa ausência, resolvi analisar Contos infantis, sua primeira publicação educacional, tanto no que concerne aos aspectos materiais e de conteúdo do impresso, quanto no que tange à trajetória de vida de suas autoras. Ao entrecruzar as duas abordagens almejo perceber matizes dos projetos de escola e de escolarização do saber presentes no oitocentos brasileiro.

A PESSOA MULHER, O CLERO E OS INTELECTUAIS NO ENSINO SUPERIOR NO MARANHÃO

Diomar das Graças Motta, Universidade Federal do Maranhão A implantação do ensino superior no espaço maranhense (localizado entre as regiões Norte e Nordeste do Brasil) foi marcada por várias lutas entre homens: de um lado, os do clero e de outro, os intelectuais, face ao descaso do poder público com a educação, de um modo geral. Há omissão da participação da mulher, nesta ocasião. Entretanto há 50 anos foi criada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras tendo como mentores do projeto, intelectuais maranhenses, com o objetivo precípuo de reverter o baixo nível de conhecimento dos candidatos ao vestibular para as duas unidades do ensino superior existentes no Estado, a época, que eram a Faculdade de Direito (fundada em 1918) e a Faculdade de Farmácia e Odontologia (fundada em 1922), vinculadas a uma Fundação, criada em 1944 pelo Interventor Federal, no regime discricionário do Estado Novo - Dr. Paulo Martins de Souza Ramos. Para concretização do projeto da nova Faculdade era necessário o espaço físico, ocasião em que o clero local, (que tinha um projeto a criação de uma escola normal superior), através do Arcebispo de São Luís, D. Adalberto Accioly Sobral (1887-1951) ofereceu sua contribuição, cedendo um dos seus prédios, mediante a contrapartida de cessão de docentes e direção da instituição. Proposta aceita, sendo possível a sua consolidação graças a habilidade político-religiosa da primeira secretária da recém - criada instituição, Madre Maria, das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado. Assim este estudo integra a reconstituição da memória feminina no campo educacional maranhense, que faz parte do NUMHE (Núcleo maranhense de História da Educação) da Universidade Federal do Maranhão - UFMA. Tem-se como referência teórica a história das mulheres e procura-se resgatar os conflitos que envolveram os sujeitos femininos, nas instâncias promotoras de ensino superior e sua articulação com a produção de saberes no campo historiográfico educacional.

RETRATOS DE FAMÍLIA: UMA ANÁLISE DAS IMAGENS, CONCEPÇÕES E VALORES PRESENTES NOS LIVROS DIDÁTICOS

Dione Dantas do Amaral, Universidade Católica do Rio de Janeiro

O livro didático, em nosso país, continua a ser uma das principais ferramentas de trabalho do professor. Dentro do processo educacional ele se situa como instrumento mediatizador na relação entre escola, aluno e professor, agentes deste processo. A solidez de sua escritura e sua capacidade de sistematizar e fragmentar um determinado campo do saber tem peso definitivo nesta dinâmica que fomenta a ação pedagógica.

O livro texto no Brasil é, também, um negócio altamente lucrativo para as editoras e os autores. O governo brasileiro gasta enormes quantias em sua compra. Este segmento é considerado o

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“filé” do mercado livreiro. Em 1998, este setor teve um faturamento de US$ 998 milhões, com o governo adquirindo 44% dos livros produzidos (Fonte: Jornal O Globo -18/01/2000).

No que toca à qualidade do livro, após os esforços de alguns autores, dos educadores e do governo, pode-se notar melhorias; no entanto, muitos professores ainda se queixam dos mesmos. Uma das queixas mais freqüentes refere-se à linguagem utilizada, que segundo eles, mantém-se distante da realidade cultural de muitos alunos.Sendo uma ferramenta tão amplamente utilizada, surgem, portanto, questionamentos sobre as mensagens veiculadas pelos mesmos. Uma questão básica aqui expressa, diz respeito ao papel do sistema de ensino como elemento de reprodução de determinados valores e atitudes socialmente privilegiados numa dada cultura.

O objetivo principal deste estudo foi, portanto, analisar o sistema de idéias, valores, concepções e práticas sobre família que estão sendo transmitidos nos livros de Estudos Sociais da 1ª série do 1° grau. O tema família foi escolhido para análise devido sua importância como um dos núcleos fundamentais da sociedade e, por este motivo, constituí-se em um dos assuntos mais importantes e mais citados nestes livros. Relacionados a este objetivo, secundariamente surgem outros: realizar um levantamento iconográfico sobre imagens de família retratadas; perceber as relações homem-mulher como expressivas de um sistema de valores; perceber o lugar da criança como expressão de uma concepção presente na cultura e na sociedade; levantar estereótipos e preconceitos veiculados nas relações internas à família.

Foram investigados os dez livros recomendados pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) nos anos de 1999 e 2000. A título de complemento, foram realizadas cinco entrevistas com professoras destas séries, em escolas da rede particular e pública de ensino.

Ao final da investigação, verificou-se que a família representada nos livros didáticos apresenta-se como uma estrutura auto-suficiente, sofrendo pouca ou nenhuma influência de fora. O grupo familiar nem sempre acompanha as constantes transformações ocorridas na sociedade, tais como mudanças nos papéis de gênero, novos arranjos familiares, novas alianças etc.

A família dos livros convive ainda entre os ideais modernizantes e os antigos valores familiares. Pode-se dizer que, neste aspecto, o livro didático não está longe da realidade.

Constatou-se através das entrevistas que estas mensagens não são sempre absorvidas tal como aparecem nos livros, ao contrário, muitas vezes alunos e professores se apropriam de modo diverso do pretendido pelo texto e dão um significado diferente ao que é veiculado. As competências de alunos e professores representadas por autores e editores, não são, muitas vezes, condizentes com aquelas que eles realmente possuem.

Destaca-se como positivo o fato de os livros estarem sendo avaliados pelo MEC, isto parece estar contribuindo para uma melhoria da qualidade destes, no entanto, sob vários aspectos, ainda necessitam ser aperfeiçoados.

UMA ESCOLA PÚBLICA NO LIMIAR DO SÉC. XXI E SEUS ESTUDANTES DE ENSINO MÉDIO: EVIDENCIANDO CONTRADIÇÕES

Dirce Maria Falcone Garcia , Universidade de Uberaba

Este trabalho é parte de uma pesquisa realizada entre 1999 e 2002, na perspectiva de compreender como os jovens, na maioria estudantes trabalhadores do ensino médio regular noturno de escola pública, se percebem nessa dupla condição. E em que medida a escola que freqüentam condiciona a valorização do saber escolar, da escolaridade, sua inserção no mundo do trabalho e seus projetos de futuro.

Tendo em vista estes objetivos, selecionamos duas escolas públicas, uma central e outra de periferia, na cidade de Campinas- SP- Brasil, nas quais trabalhamos com os alunos da segunda série do ensino médio noturno, aplicando questionários (88) e, no ano seguinte, realizando entrevistas com os jovens (20), com seus familiares (6), diretores, coordenadores. Analisamos, ainda, as regulações oficiais sobre a organização da escola quanto ao ingresso, progressividade, grade curricular, carga horária etc.

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Nesta comunicação nos deteremos na abordagem de uma das escolas estudadas, a Escola Alfa, do bairro central, mais heterogênea quanto à origem social de seus alunos e mais antiga, com mais de meio século de existência, nos permitindo observar as mudanças mais significativas no funcionamento e no perfil de seu alunado no transcorrer de sua história, tendo em vista, sobretudo, as políticas públicas implementadas. Procuramos analisar aspectos do funcionamento da escola e compreender em que medida tais aspectos se refletem nos projetos de futuro e nas representações da educação desses jovens estudantes trabalhadores. Neste sentido, analisamos a Reorganização das Escolas da Rede Pública Estadual, que visava maior racionalização de investimentos, e preparar o campo para a Municipalização do Ensino Fundamental e a flexibilização do formato dos cursos de Ensino Médio, com mudanças significativas na carga horária da grade curricular, evidenciadando o seu papel de garantir, mais do que tudo, certificação escolar para a empregabilidade.

A análise demonstra que os jovens ressentem-se dessa política educacional que lhes propõe igualdade e de fato lhes garante um simulacro; e responsabilizam, sobretudo, a "engrenagem escolar" pelo ensino que recebem e que os obriga a postergarem indefinidamente seus projetos de futuro. O referencial teórico fundamenta-se em Bourdieu, Gentili, Frigotto e Souza, dentre outros.

A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E A HISTÓRIA DOS CONCEITOS: IMPLICAÇÕES DAS CATEGORIAS CAPITAL HUMANO E EMPREGABILIDADE SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A FORMAÇÃO DE TRABALHADORES NA AMÉRICA LATINA NAS DÉCADAS DE 1970 A 1990

Domingos Leite Lima Filho, Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná

A partir do último quarto do passado século o discurso hegemônico tem destacado de forma recorrente a importância da educação e da formação profissional como instrumentos ou políticas capazes de influenciar fortemente a mobilidade social e proporcionar a inserção vantajosa das nações na economia mundial. Por uma parte, a formação profissional passou a ser considerada um mecanismo eficaz para o acesso ao emprego, ou para a manutenção e progressão a melhores postos de trabalho. Por outra parte, a educação é considerada um recurso e bem estratégico nacional para a conquista da produtividade e da competitividade requeridas para garantir vantagens econômicas e políticas em uma economia internacional caracterizada por acirradas disputas. Essa construção conceitual, presente em informes e diagnósticos setoriais de diversos organismos internacionais (OCDE, Banco Mundial, CEPAL, UNESCO), passou a compor o núcleo ideológico do discurso educacional de reformas educativas e políticas públicas para a formação, trabalho e renda realizadas em diversos países da América Latina a partir dos anos de 1970. Dentro destas, ganharam especial relevo as políticas para a formação profissional - no e para o emprego - colocadas na ordem de prioridade de vários programas regionais, coordenados por organizações internacionais e governos.Este trabalho tem por objetivo analisar categorias conceituais que orientaram as políticas públicas para a formação de trabalhadores na América Latina nas três últimas décadas do século XX. Neste intervalo histórico, observou-se, sobretudo na década de 1970, a centralidade do conceito de capital humano, contido especialmente nas contribuições que tinham como referência principal os pressupostos teóricos da economia da educação. Após relativo esmaecimento ocorrido no decurso dos anos de 1980, presenciamos a partir da última década o ressurgimento e a revalorização da importância econômica da educação. No entanto, constata-se que o conceito de capital humano é re-significado a partir de sua vinculação com outras categorias conceituais, tais como empregabilidade, empreendedorismo e eqüidade. Concluiu-se, portanto, que as políticas públicas refletem este movimento teórico, revelando que a história da educação profissional representa, de certa maneira, uma assimilação da história destas categorias conceituais.

NARRATIVAS DE QUEM APRENDE AO ENSINAR E ENSINA AO APRENDER

Doris Helena de Souza, UNILASALLE / Canoas

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O presente trabalho visa aprofundar o olhar investigativo nas relações que se estabelecem entre as alunas do curso de Pedagogia na disciplina de Prática de Ensino e a professora da referida disciplina a partir das atividades desenvolvidas e dos encontros individuais e coletivos ocorridos ao longo do semestre. O aporte teórico de sustentação metodológica referendou-se em alguns pressupostos das Histórias de Vida que segundo Santamarina e Marinas (1994) são produzidas por narrativas que intencionam construir a memória de pessoas ou grupos em um determinado período histórico, memórias que não estão pré-determinadas e nem se constituem por mera transmissão de fatos, mas que se dão a partir da interação estabelecida entre pesquisadora e pesquisadas. No caso em questão refere-se às relações que se estabelecem entre eu e as alunas, a partir de seus memoriais, diários de campo, cadernetas pedagógicas e do relatório final. Desta forma assumo esses registros como elementos de potência para que se (re)pense a proposta da disciplina em suas múltiplas relações, desde sua dimensão pedagógica e legal até as relações de amizade que aí e a partir daí se estabelecem (ou não) entre quem ensina praticando e aprendendo e aprende ensinando e praticando, ou seja, que sentidos essas alunas imprimem às suas experiências de vida e às suas práticas cotidianas. Em relação ao método utilizo a análise de discurso na perspectiva foucaultiana assumindo o referencial metodológico da arqueologia e da genealogia de Foucault. Na perspectiva da arqueologia busco escavar até trazer à visibilidade às relações que se produzem entre quem ensina praticando e aprendendo e aprende ensinando e praticando, para ver a possibilidade de instauração de uma outra/nova ética da amizade a partir do movimento desenvolvido durante a disciplina. Na perspectiva genealógica busco analisar como essas alunas estão se constituindo e se transformando a partir do início do semestre até o final. A partir da análise dos discursos dessas alunas (que se constituem de acontecimentos) identifico os enunciados, as formações discursivas e os regimes de verdade que operam como produto/produtores de outras/novas epistemes.

REPRESENTAÇÕES E PRÁTICAS ESCOLARES NA CONSTRUÇÃO DA ESCOLA REPUBLICANA : O OLHAR ETNOCÊNTRICO NOS MANUAIS ESCOLARES

Ediógenes Aragão Santos, UNICAMP

O estudo do período 1870/1930 permite-nos compreender o abismo entre a Escola, a Republica e a Democracia no Brasil. A Republica se diferencia dos particularismos dos assuntos privados, domésticos e familiares, se guia pelo critério da res-publica. A construção das instituições e canais de representação política onde o público tenha primazia em relação aos interesses privados, a separação e independência entre os poderes, a laicidade são elementos fundadores da República. A Republica implantada em 1889, estendeu o preconceito, a discriminação racial e social contra o negro para os demais setores pobres da população e colocou o povo à margem da Historia. As representações que fecundaram o ideário das elites imperiais, na transição do Império para a Republica no Brasil, não podem ser tratadas sem pensar nos limites do Liberalismo Brasileiro, que concilia Liberalismo com centralização e Republicanismo com escravismo. O enfraquecimento no cenário político brasileiro da vertente democrática jacobinista, da cepa de Alberto Salles, e da liberal progressista, de um Joaquim Nabuco, as quais defendiam o sufrágio universal, o direito à participação política, ao trabalho e a instrução pública, sem restrições de raça, crença, ou classe, exclui da História o povo analfabeto. A Educação republicana é positivista; vence o liberalismo conservador, regenera o povo via educação e não pela Revolução.

O estudo das representações tornou-se um pré-requisito a todo estudo histórico. Pretende-se nesta exposição analisar e interpretar as representações, sobre o caráter nacional brasileiro e o papel da escola, como lócus privilegiado para civilizar o povo, embranquecer a raça e prepará-lo para o trabalho fabril. Inventariá-las nos escritos de intelectuais e políticos, bem como no Compêndio de Civilidade, redigido e editado pelos padres Salesianos e no Manual Pedagógico para a Formação de Professores da Escola Normal de São Paulo Pedagogia e Methodologia de Camillo Passalacqua. Era preciso formar homens “civilizados” para a convivência pública, para servir a nova ordem social competitiva. Sabemos que os discursos construídos sobre o real não são exatamente o real, mas expressões literais da realidade. Esta literatura prescreve modelos de socialização, procurando orientar as crianças nas escolas primárias, bem como definindo os conteúdos para a formação de

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professores, através de normas, regras, modelos de comportamento, hábitos, de vestuário e alimentação. Normatizando a conduta dos indivíduos no espaço público e privado, a partir da veiculação de valores e conceitos etnocêntricos.

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E CINEMA: PENSANDO OS MODELOS PEDAGÓGICOS

Edison Luiz Saturnino, UFRGS

O trabalho procura demonstrar uma possibilidade de utilização dos documentos audiovisuais, no caso o cinema, como fontes para a pesquisa e o ensino em história da educação, principalmente sobre doutrinas e modelos pedagógicos.

Nesta perspectiva, proponho um estudo que se constitua a partir dos pontos de intersecção entre as idéias de Joham Heinrich Pestalozzi e o filme “La Lengua de Las Mariposas”, belíssima produção do cinema espanhol dirigida por José Luis Cuerda, que, de certa forma, discute questões que podem ser relacionadas com a produção teórica e as práticas pedagógicas do pedagogo suíço. Resguardadas as diferenças das realidades históricas, a ação se passa na Espanha na década de 1930, o filme apresenta algumas idéias que podem contribuir para a qualificação do debate e do entendimento de certos conceitos da teoria pestalozziana. Nele estão contempladas as questões da natureza, vinculadas às concepções de sujeito e conhecimento; também são discutidas as relações entre a educação instituída pela escola e aquela oferecida por outros contextos não-escolares. O filme remete à idéia de que os processos educacionais (e seus resultados) estão imbricados com as questões políticas e culturais além de expor os enfrentamentos de uma educação que se pretende cada vez mais científica com uma Igreja indisposta a abrir mão de seu poder.

Sendo assim, o presente estudo parte do pressuposto de que as formas de escolarização, as teorias pedagógicas e as práticas escolares estão situadas historicamente e apresentam-se articuladas com os contextos políticos, econômicos, sociais e culturais de cada época. Da mesma forma refletem, produzem, reproduzem, se esforçam por legitimar ou tentam negar as concepções de homem, de mundo e de sujeito produzidas por determinado período histórico. Traduzem os enfrentamentos de discursos e de visões de mundo que circulam nas sociedades.

O trabalho privilegiará a discussão dos pressupostos teóricos defendidos por Pestalozzi na medida em que se tornar interessante explicitá-los para ressaltar a necessidade do entendimento de sua pedagogia articulada com outros aspectos da realidade histórica, a fim de que se possa perceber a historicidade de seu pensamento, tanto na dimensão externa, no que diz respeito à articulação com os processos sócio-econômicos e político-culturais, quanto na dimensão interna, no que diz respeito à própria transformação de seu pensamento, que foi se construindo na medida que aplicava suas teorias nas experiências vivenciadas nos institutos que planejou e dirigiu.

Desta forma, o texto pretende lançar um olhar mais atento sobre as condições históricas que possibilitaram a emergência do pensamento filosófico-pedagógico de Pestalozzi, que está situado historicamente num tempo repleto de transformações, de disputa de hegemonias, de tentativas de legitimação de discursos, de medos, de contestações, e principalmente, de disputas pelo poder político e econômico, entre a segunda metade do século XVIII e o início do século XIX..

HISTÓRIA, CULTURA E LOUCURA, UM ESTUDO NECESSÁRIO: RELATO E REFLEXÕES

Elaine Cristina Carvalho Moura, Universidade Federal do Piauí, Mestranda em Educação e Paulo Rômulo Frota, Universidade Federal de Santa Catarina

Este artigo é resultado de um estudo exploratório realizado na cidade de Oeiras, no Estado do Piauí, Brasil, intitulado “Transtornos Mentais na População de Oeiras Piauí: uma investigação de fatores biológicos e culturais” numa abordagem sócio histórica, elegemos o aspecto cultural como parâmetro para o desenvolvimento de nosso estudos e Vygotsky como autor central para o embasamento de nossas reflexões. Pesquisamos as condições histórico culturais do oeirense focalizando a problemática

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da loucura como fator influenciador da produção artística e intelectual relevante naquela cidade. A cidade foi capital do Estado do Piauí de 1740 a 1852 e seus moradores, passados cento e cinqüenta anos da mudança, ainda hoje se recentem por terem perdido o título. Esse fato histórico proporcionou aos indivíduos de Oeiras, a formação de um sistema simbólico de representações mentais muitas vezes expresso pela arte que retrata desde o recentemento até a loucura que caracterizou miticamente a cidade. Para atender nossos objetivos entrevistamos dez sujeitos, dos quais destacamos dois deles para produção desse artigo, onde relacionamos a história da cidade com relatos falados e escritos da prevalência de doentes mentais, afim de investigar na linguagem artística do oeirense a influência da Loucura e Cultura para produção artística e intelectual da cidade. A comunidade oeirense orgulha-se de concentrar uma sensibilidade artística diferenciada expressa na música, pintura e especialmente prosa e poesia, dando origem a criação a revista do Instituto histórico de Oeiras, cuja produção intelectual procura preservar as tradições e memórias da comunidade focalizando aspectos históricos, artísticos e culturais exaltando a criatividade do oeirense. Os resultados obtidos, mostraram que a influencia da história e da loucura na cidade são relevantes para criatividade, produção artística e intelectual do oeirense, que conviveu pelo menos duzentos anos, com a expressão livre da loucura em suas ruas e casas. Segundo a trajetória histórica apresentada, a loucura se manifesta como um estatuto de um documento vivo, adquirindo um novo sentido quando assume a duplicidade, ou seja, passa de objeto de conhecimento a possibilidade de auto reconhecimento, influenciando fortemente o processo formativo do ser humano naquela localidade.

POR UMA NOVA ARITHMETICA: CONSIDERAÇÕES SOBRE O COMPÊNDIO “NOÇÕES SOBRE O SYSTEMA METRICO DECIMAL”, DE JOÃO BERNARDES DE AZEVEDO COIMBRA, ADOTADO NO BRASIL EM 1866

Elenice de Souza Lodron Zuin, PUC-Minas

Em relação aos estudos no campo da História da Educação, existem grandes lacunas no tocante aos saberes da matemática escolar. No Brasil, existe um grupo de pesquisadores voltados para este campo. No entanto, ainda são restritas as pesquisas que trazem à luz a constituição da matemática escolar nos séculos passados.

Uma mudança fundamental na aritmética escolar acontece depois das reformas do sistema de pesos e medidas na França revolucionária, nos fins do século XVIII, que irão se aportar em outros países. Em Portugal, através de um decreto de D. Maria II, a partir de 13 de dezembro de 1852, o país teria um prazo de dez anos para implantar o Sistema Métrico criado na França e, em 1862, passaria a integrar os saberes das escolas portuguesas, públicas e particulares.

Apesar de existirem defensores da adoção do sistema francês no Brasil antes de meados do século XIX, apenas através da Lei Imperial n. 1157, promulgada por D. Pedro II, é adotado oficialmente o sistema francês em 1862. A Lei deixava claro que o novo sistema teria um prazo de dez anos para ser implantado. No entanto, diferentemente de Portugal, a sua integração aos currículos escolares das escolas públicas e particulares seria imediata. Deste modo, livros didáticos de Aritmética são publicados integrando não apenas o sistema métrico decimal, mas as conversões do sistema de pesos e medidas utilizados no país para o sistema francês, constituindo-se em um novo saber que se integra à formação geral. Além disso, foram editados livros, nos quais tratava-se especificamente do sistema francês, de modo a auxiliar também os professores.

Um compêndio que merece um estudo é “Noções sobre o Systema Métrico Decimal”, de João Bernardo de Azevedo Coimbra, com primeira edição em 1866. Este livro foi adotado nas escolas públicas da província do Rio de Janeiro, tendo edições subsequentes. Neste artigo, estaremos apresentando uma análise da segunda edição do livro, do ano de 1867, a qual, segundo o autor, está “desembaraçada das faltas que a pressa” o “havia feito cometer na primeira”. O direcionamento que é dado ao ensino do sistema métrico decimal no Brasil pode ser interpretado, permitindo-nos fazer algumas inferências, ao se comprovar a adoção do compêndio de Coimbra e a sua circulação.

Fundamentando-nos na Nova História das Ciências, pretendemos, com este estudo, dar contribuições para a História da Educação e propiciar um novo olhar para o ensino da matemática escolar no Brasil dos oitocentos.

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REVOLUÇÃO, INTEGRAÇÃO E EDUCAÇÃO: ESCRITAS PARA COMEMORAR

Élio Cantalício Serpa, UFG

“Não somos responsáveis pelo passado, e sim pela desobstrução dos caminhos do futuro.” (1)

Diz Roland Barthes que “não há dúvida de que cada regime possui sua escrita, cuja história ainda está por se fazer” (2). Assim, não seria idiossincrático levantar a questão de que o regime militar implantado no Brasil a partir de 1964, usando de diferentes expedientes, notadamente o ensino, procurou imprimir uma prática de escrita política que deveria chegar à população através de livros, revistas, propaganda e outros meios. Nesta prática de escrita se pode então perceber como o regime militar pós 64 tornava visível, como diz Barthes ao analisar práticas de escritas, “o ser e o parecer do poder, ou seja, o que ele é e o que ele quereria que se acreditasse que ele fosse” (3).

Assim, as escritas produzidas pelos alunos do Colégio Pedro II, do Rio de Janeiro e publicadas em 1973 como comemoração ao 9.º aniversário da dita “revolução de 64” podem ser lidas como produção de memória para solidificar um mito de origem, substituindo o caos pela ordem e combater inimigos para realizar a utopia autoritária do “Brasil Grande”.

A prática de comemoração implica na constituição de narrativas memorialísticas, mexendo e intervindo no caos de imagens guardadas que são (re) significadas pelo efeito discursivo carregado de positividades. As narrativas apontam para o progresso, para o espírito comunitário, para a organização, para a ordem e para o desenvolvimento tecnológico. As escritas produzidas ao sabor da emulação, da repetição querem instaurar um tempo novo, apontando para um futuro grandioso.

1 SOUZA, Antônio Carlos de & MARQUES, Pedro José. A Revolução e a Educação Nacional. In:A Revolução e Juventude, Rio de Janeiro:Colégio Pedro II, 1973, p.

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2 BARTHES, Roland. O Grau zero da escrita. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p.23

3 Idem, p.23

ASPECTOS HISTÓRICOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE HISTÓRIA NA UNOCHAPECÓ – SC - BR

Elison Antonio Paim, Unochapecó/Unicamp

A experiência de coordenar a disciplina Prática de Ensino de História (estágio) tem possibilitado-me desenvolver experiências no sentido de relacionar a produção de conhecimento histórico com o ensino de história. Procuro orientar que, todas as atividades do estágio sejam elaboradas tendo como ponto de partida, temáticas relacionadas diretamente com as pesquisas produzidas. Freqüentemente, falo com ex-alunos sobre como e o que estão trabalhando, as dificuldades enfrentadas, onde destacam: a sobrecarga de atividades e turmas; a falta de material e de tempo para preparar aulas melhores; a necessidade de recorrer aos livros didáticos... A questão central que estou buscando respostas é: Como os alunos egressos, do Curso de História da UNOCHAPECÓ nos anos de 1998 e 1999, avaliam a experiência de passar de acadêmicos para profissionais? O principal instrumento de coleta de informações são os depoimentos orais, gravados, onde apresento algumas questões chaves para que possam dar início as falas. Após a coleta gravada dos depoimentos realizo a transcrição e textualização, para posterior análise, confronto com outras fontes e referencial teórico. Além das fontes orais utilizo materiais usados pelos professores, como diários de classe, planos de ensino, textos produzidos por eles próprios, trabalhos de alunos, textos ou livros didáticos, enfim toda gama de instrumentos didático-pedagógicos utilizados. A identificação dos professores em início de carreira ocorreu através de contatos prévios com as escolas, contatos durante o Curso de Pós-graduação, História: Cidade, Cultura e Poder e, através do curso de extensão, História, Historiografia e Ensino de História, nas duas atividades citadas vários inscritos são egressos das turmas delimitadas. Quanto à

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amostra selecionei depoentes que procurassem expressar as diversas condições de trabalho, ou seja, escolas públicas municipais, estaduais e particulares; bem como os diversos municípios da região Oeste de Santa Catarina, escolas de centro, bairros e de comunidades do interior. Este projeto é desenvolvido junto a Faculdade de Educação da Unicamp, no grupo Memória. Como fundamentação teórica são utilizados autores como Walter Benjamim, E.P. Thompson, L.S. Vygotsky. Para este evento pretendo discutir as questões vinculadas às memórias de sua formação e o contexto histórico da criação do curso de História no qual graduaram-se.

REFORMA EDUCACIONAL MATO-GROSSENSE DE 1910: ESTADO X IGREJA

Elizabete Figueiredo de Sá Poubel e Silva, U. de S. Paulo

A reforma da Instrução Pública de Mato Grosso foi autorizada através da Lei nº 533 de 04 de julho de 1910 e organizada pelo Coronel Pedro Celestino Corrêa da Costa, 1º Vice-Presidente do Estado. Este mandou contratar dois normalistas paulistas, Leowigildo Martins de Mello e Gustavo Kulhmann, para que estivessem à frente da Reforma Educacional do Estado, pois ressaltava em seus discursos a importância de que tal legislação tivesse como referência o estado de São Paulo, considerado por ele como um estado na vanguarda educacional do país. Os dois jovens professores, ambos de formação positivista, procuraram imprimir na reforma educacional características condizentes à formação.Os governantes, com a reforma de 1910 buscaram, através da educação, promover o progresso social da região, procurando introduzir uma nova moral na sociedade através do ensino da moral e cívica. Com a criação da Liga dos Pensadores em Cuiabá em 1910 e em Corumbá em 1911 houve a divulgação da filosofia positivista, buscando imprimir novas diretrizes morais à sociedade mato-grossense, combatendo as teorias e a influência da Igreja Católica, defendendo o conhecimento científico de base experimental e o ensino laico. A reforma educacional em fase de implantação coadunou com tais idéias. Por outro lado, a Igreja Católica, através da criação da Liga Católica Mato-Grossense, reagiu frente à reforma educacional, sensibilizando a sociedade em ajudá-la na expansão das escolas paroquiais gratuitas elementares e complementares nas quais seus filhos aprenderiam a conhecer e a amar a Deus. Através do jornal “A CRUZ” teceram severas críticas ao ensino positivista e laico. Partindo de uma análise dos artigos veiculados em A CRUZ, dos enunciados do decreto de 1910 e das medidas concretas implementadas pelo Estado, o presente trabalho objetiva analisar as diferentes representações da escolarização da infância em Mato Grosso. A ênfase do estudo recairá sobre a disputa em torno do ensino religioso: face mais visível do confronto entre as duas Instituições.

A REVISTA BRAZILEIRA E O DEBATE EDUCACIONAL NO SÉCULO XIX

Elizabeth M. Teixeira Leher, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Editada no Rio de Janeiro, a Revista Brazileira (1879-1881) surgiu em um período de profundos contrastes da sociedade no qual o questionamento do regime escravista era central. Sua proposta era “pensar o país, ilustrar o povo brasileiro e indicar caminhos para o desenvolvimento nacional”. Muitos desses colaboradores pertenciam à chamada “Geração de 1870”, que divulgou novas doutrinas filosóficas e novos modelos literários. A Revista foi um campo polissêmico de debates no qual coexistiam teorias transpostas de centros europeus e novas idéias desenvolvidas a partir da reapropriação das mesmas. Em comum, a busca por compreender o Brasil, estudando suas origens e identificando seus problemas, buscando alcançar a afirmação nacional e definir uma identidade brasileira. Esses intelectuais forjaram um entendimento polissêmico de que o país precisaria mudar e a educação teria papel fundamental na construção desse novo país. A análise do periódico permitiu vislumbrar o modo como as idéias de nação, povo, “raça”, identidade, língua, progresso, ciência etc., foram trabalhadas e contribuíram para a estruturação da educação e para a edificação do campo pedagógico no país.

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Diante da forte presença do determinismo - racial e geográfico - e mesmo das doutrinas abertamente racistas, o problema da unidade da espécie humana assumiu, no período, extraordinária importância. Na Revista Brazileira, positivistas comteanos posicionaram-se contra a escravidão, defenderam a tese da unidade da espécie humana e apregoaram a instrução básica, não-clerical e científica para todos, independentemente do grupo étnico; juristas defenderam a transformação dos infratores pela educação; médicos sustentaram a importância dos meios natural e social para a formação das crianças e jovens, relativizando o determinismo da herança; estudiosos da língua portuguesa incorporaram palavras indígenas e africanas como parte do idioma nacional.

A grande virtude desses intelectuais foi criar novas referências para o debate educacional capazes de torná-lo menos excludente. O parâmetro cultural ocidental uniformizador não foi abandonado: a crença evolucionista estava arraigada no pensamento de muitos colaboradores. Entretanto, a partir de 1870, o debate veiculado pela Revista produziu arestas e rugosidades no pensamento liberal europeu, como em Gobineau, que via na mestiçagem do povo brasileiro o sinal de sua decadência. A Revista Brazileira ofereceu novos horizontes de pensamento para as questões educacionais do período, notadamente pela crítica aos determinismos biológico e geográfico e pela crítica ao universalismo liberal.

A EXTENSÃO REALIZADA PELA ESCOLA SUPERIOR DE VIÇOSA (1926-1948): O PIONEIRISMO DE SUAS ATIVIDADES EXTENSIONISTAS

Ellen Scopel Cometti, Universidade Federal de Juiz de Fora

O presente trabalho apresenta resultados parciais de uma dissertação de mestrado, hora em desenvolvimento, cujo objetivo é o estudo das práticas de extensão realizada pela Escola Superior de Agricultura e Veterinária de Viçosa (ESAV), instituição inaugurada em 1926, na Zona da Mata Mineira, que deu origem, em 1969, à Universidade Federal de Viçosa (UFV). Para tanto, examina-se as práticas de extensão nessa instituição, a partir da discussão sobre as origens da extensão universitária nos Estados Unidos, no limiar do século XX.

Assim, este trabalho tem como objetivo mostrar a importância da extensão que se desenvolveu na instituição, analisando, ainda, se esta prática extensionista desenvolvida foi fiel aos objetivos da ESAV.

Para a sua realização procedemos à revisão de literatura sobre a extensão universitária. Além disto, examinou-se uma grande quantidade de documentos, tais como, leis, decretos, regimentos, estatutos, regulamentos, atas e periódicos editados pela ESAV, localizados no Arquivo Central e Histórico da UFV.

As primeiras experiências relacionadas à Extensão nos Estados Unidos da América vincularam-se ao desenvolvimento da agricultura ainda no final do século XIX. Duas leis contribuíram então para que fossem iniciadas as práticas de Extensão; foram elas: a Lei Morril, de 1862 e a de 1880. Todavia, o que realmente viria a ser o Serviço de Extensão Rural dos Estados Unidos teve origem através de outra Lei, a Lei Smith Lever. Essa Lei responderia às necessidades de um serviço especializado para assistir ao produtor rural.

No Brasil ainda são poucos os trabalhos sobre a extensão universitária. A maioria destes se remete ao ano de 1948, considerando ser neste ano, com a implantação de alguns programas em São Paulo e Minas Gerais o ano de inicio da prática extensionista realizada no Brasil.

Entretanto a prática da extensão universitária esteve presente na ESAV desde os seus primórdios, trazida pelos professores norte-americanos que nela estiveram. No princípio, a Escola restringia a extensão a visitas de professores aos fazendeiros da região, à edição de boletins de divulgação, ao atendimento de consultas por correspondência, evoluindo este trabalho para a criação do Departamento de Educação Rural, em 1939. É importante lembrar que a Semana do Fazendeiro - uma das atividades de extensão -, encontro anual realizado na Escola para a oferta de cursos práticos sobre a agricultura, desde 1929, tornou-se o ponto alto das atividades na ESAV. Desse modo, a importância deste trabalho se deve pelo fato desta instituição ter sido pioneira no serviço de extensão realizado no país, uma vez que, desde 1929, a Escola criou todo um conjunto de atividades que garantiu sua prática extensionista.

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ESTADO, IGREJA E EDUCAÇAO NO BRASIL – DO PADROADO AO ULTRAMONTANISMO (1870/1935)

Elomar Tambara

A relação entre Igreja e Estado no Brasil regeu-se até a proclamação da República pelo sistema de padroado cujos privilégios, em 1827, (Bula Praeclara Portugalliae Algarbiorunque Regum) foram concedidos ao Império Brasileiro. Assim, plasma-se uma relação de continuidade do status quo anteriormente reconhecido a Portugal. Em resumo, esta concordata concedia ao Imperador o poder de aceitar ou vetar as orientações advindas de Roma.

Este trabalho investigou o processo de consolidação do projeto de romanização da Igreja Católica no Brasil. E, particularmente, qual o papel do aparelho ideológico escolar nesta consecução. O período em análise (1870-1935) caracteriza-se pela consolidação da hegemonia ultramontana.

A principal estratégia utilizada pela Igreja Católica para a consolidação deste processo foi a implantação de uma rede de ensino confessional baseada, principalmente, na atuação de congregações religiosas e de uma intricada relação com o positivismo político e estruturas sociais conservadoras então hegemônicas no Brasil.

Metodologicamente nos utilizamos, para identificar este novo perfil ideológico do episcopado brasileiro, de cartas pastorais elaboradas no período, constituindo-se em documentos que, de certa forma, representavam o pensamento médio da comunidade eclesial brasileira naquele período. A análise teve como parâmetro teórico categorias oriundas do paradigma “história cultural”

Essas cartas pastorais são, a rigor, uma simbiose entre as diretrizes do Vaticano e as peculiares circunstâncias ideológicas que condicionavam a relação entre Igreja-Estado. Mas que, paulatinamente, consolidaram um processo de “sacramentalização” da Igreja associado a um movimento direcionado à “sacerdotização” da mesma, e que “abafaram” aspectos típicos do regalismo como, por exemplo, as irmandades. Neste sentido, o episcopado brasileiro assumiu como prioridade a consolidação de um sistema de ensino sob a égide da Igreja.

Esta estrutura adotou, na prática, dois eixos de atuação: um direcionado às escolas católicas propriamente ditas e outro direcionado ao sistema público de ensino. Este processo caracterizou-se por uma lenta e gradual ocupação de espaços e obviamente, com vitórias e derrotas para todos os contendores. Fenômenos emblemáticos deste conflito de interesses foram o “manifesto dos pioneiros” e, de modo especial, a constituinte de 1934. Esta última representando o sucesso das assunções das teses católicas em termos da relação Igreja/Estado/Educação enquanto aquele representando a consagração do pensamento liberal.

Em suma, os dados evidenciaram que a principal estratégia da Igreja Católica para consolidar sua hegemonia foi a expansão da rede de ensino confessional sob o controle de inúmeras ordens e congregações que instalaram educandários no Brasil neste período. E o controle “ideológico” da rede pública via introdução do ensino religioso nos currículos escolares.

NO CONTRA-RITMO DA VIDA

Eloíza da Silva Gomes de Oliveira e Marcia Souto Maior Mourão Sá, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

O texto trata do quotidiano escolar de adolescentes na faixa etária de 12 a 18 anos de idade pertencentes a classes sociais diferentes. A pesquisa, ainda em andamento, já entrevistou 120 jovens usando a linha de história de vida e, através da categorização de várias temáticas recorrentes nos relatos dos jovens, pode estabelecer desde já o significados emprestados as práticas e ao quotidiano escolar pelos adolescentes.

As narrativas nos mostram ainda, como as relações passado/presente, que inspirou e deu nome à revista britânica de história “Past and Present”, modelam as expectativas de futuro e dão

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corpo e sangue aos sonhos desses jovens. A escolarização é penosa para muitos, mas mesmo sendo uma travessia sofrida, um mal necessário, não conseguem vislumbrar uma vida futura sem ter vivido a experiência escolar. Enfim, em nenhum tempo de verbo? passado, presente, futuro? a escola está ausente.

O referencial teórico está assentado no entrecruzamento de várias abordagens teóricas: psicanálise, sociologia, antropologia, história e educação porque entendemos que seria impossível interpretar a realidade vivida por esses jovens com um único olhar teórico. Os jovens apontam para novas dinâmicas sociais e culturais, lutando para serem respeitados pelo mundo adulto que ainda os vê como crianças, subestimando suas competências e, de forma sistemática, são excluídos de diversas práticas e movimentos sociais. A escola, significante do mundo adulto, não foge à regra da exclusão, tratando-os como rebeldes e transgressores de um modelo de vida considerado o único possível.

EDUCAÇÃO E CIVISMO NO GRUPO ESCOLAR LEÔNIDAS DE MATOS

Emilene Fontes de Oliveira Xavier; UFMT e PAIÃO, Ilza Dias; UF

Este estudo faz parte de um projeto que está sendo desenvolvido no grupo de pesquisa em História da Educação na Universidade Federal de Mato Grosso pelo Programa de Pós-Graduação em Educação. A temática tem como abordagem a construção da nacionalidade no grupo escolar Leônidas de Matos, localizado no Município de Santo Antonio de Leverger - Mato Grosso, sob a ótica do Estado Novo. Para este trabalho especificamente, analisou-se uma ata de festejos do ano de 1939 em comemoração ao cinqüentenário da Proclamação da República brasileira na instituição citada acima. A construção da nacionalidade era tema contemplado nas práticas escolares, principalmente na organização de rituais cívicos e de comemoração de cunho patriótico. Sob a égide do Estado Novo, o emprego dos símbolos nacionais, do culto aos “heróis”, a organização de rituais e comemorações eram de suma importância para a consolidação dos ideais republicanos na perspectiva de construir uma unidade nacional e difundir os sentimentos de civilidade, patriotismo e cidadania. Nesta discussão coube averiguar como esta instituição de ensino primário utilizou-se dessas representações para atender aos interesses do Estado. Mas o objetivo primordial partiu da necessidade de buscar reconstruir os discursos proferidos nesta ocasião, bem como, a participação da comunidade escolar e civil nesse processo. Portanto, é evidente a manipulação política no âmbito escolar, transformando-o em espaço privilegiado para a divulgação de mensagens legitimadoras do regime, que por sua vez, não representava os interesses da nação. Para melhor esclarecimento, utilizou como referencial teórico-metodológico os conceitos de História Cultural de Chartier (1990) e de Cultura Escolar concebida por Julia (2001), na tentativa de compreender como uma realidade social é construída, pensada e dada a ler; e como práticas escolares articuladas ideologicamente provocam mudanças de comportamentos, hábitos e valores. Por fim, verificou-se que tanto os discursos políticos quanto as atividades pedagógicas representaram uma construção ideológica, promovida por um grupo dominante que controlava o poder, visando inculcar nas pessoas um novo padrão de cidadania, ou seja, instrução e obediência. O ensino primário foi estruturado para corresponder a esses anseios. No entanto, concluiu-se que atividades cívicas como esta contribuíram mais para a difusão de símbolos e mitos nacionais e para a conformação de novos hábitos e comportamentos.

PROFISSIONALIZAÇÃO COMO ESTRATÉGIA DE GERENCIAMENTO DE PROFESSORES

Eneida Oto Shiroma; CED/UFSC e Olinda Evangelista; CED/UFSC

Nas duas últimas décadas, a profissionalização docente ganhou lugar de destaque na agenda educacional. Documentos de políticas públicas de inúmeros países apresentam o termo profissionalização freqüentemente associado a conceitos, tais como: competência, eficiência, qualidade, autonomia, responsabilidade, accountability, avaliação. De que forma estes conceitos, vedetes no discurso educacional, estão articulados? Como, com base no estudo da teia conceitual por

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eles constituída, podemos construir pistas para compreender a racionalidade da reforma da formação docente neste início de século? Neste trabalho pretendemos, justamente, discutir a centralidade do conceito de profissionalização, ressaltando sua articulação com dois eixos da reforma educacional: a formação de professores e a gestão. Orientamo-nos pela hipótese de que este termo é utilizado para obter consenso entre segmentos sociais diversos. Aparentemente a política de profissionalização atende à antiga demanda por maior qualificação: de professores em busca de aprimoramento; de diretores visando aumentar a eficiência de seu estabelecimento; de sindicatos na luta por melhores condições de trabalho, plano de carreira, status e remuneração. No entanto, na medida em que a política de profissionalização está atrelada à avaliação para criação de rankings e ao pagamento por produtividade, ela promove um efeito contrário ao que anuncia, estimulando a competição entre professores, entre escolas, entre alunos. As mudanças por ventura promovidas comprometem a “eficiência coletiva” das instituições educativas. Os efeitos da ideologia do profissionalismo na categoria do magistério fomenta a disputa entre pares e o individualismo, alterando as relações no interior do grupo ocupacional e dele com seus empregadores. Por esta razão, argumentamos que a proposta oficial de instituir um novo profissionalismo docente complementa e reforça a nova ideologia que se dissemina no campo educacional, o gerencialismo. Por parte dos docentes, o apelo à profissionalização constitui uma forma de obter adequadas condições de trabalho, formação, melhoria salarial, reconhecimento social, enquanto que por parte dos empregadores é um recurso para administrar conflitos, estabelecer critérios meritocráticos, implementar salários diferençados. Configura-se, pois, como estratégia de gerenciamento do imenso contingente de professores que constitui, segundo a UNESCO, uma das categorias mais numerosas e organizadas do serviço público de vários países. A contribuição deste artigo é discutir o conteúdo e a forma pela qual articuladores de políticas educacionais, na década de 1990 e no início do século XXI, vêm manufaturando consensos por meio da política de profissionalização.

PROTESTANTISMO E EDUCAÇÃO: UMA TRAJETÓRIA DO ENSINO E DA ATUAÇÃO DAS MISSIONÁRIAS EDUCADORAS, MENSAGEIRAS DA FÉ E DA EDUCAÇÃO

Eneida Ramos Figueiredo, Faculdade de Educação USP

Neste trabalho tenho o intuito de remeter-me a importância da educação no protestantismo, mais especificamente no Calvinismo e presbiterianismo, desde a Reforma Protestante até a chegada da empresa educacional presbiteriana no Brasil. Elucidando as características, objetivos e ideais do presbiterianismo missão e de sua empresa educacional que implantou-se de forma regular no Brasil, a partir do final da década de 1850.

Em sua longa trajetória entre Europa-América do Norte-Brasil, o calvinismo puritano sofreu influências e transformações provocadas pelo arminianismo-wesliano (individualista e conversionista), pietismo, pragmatismo, escolaticismo, milenismo, embalados pela teologia do pacto e o Destino Manifesto, foram sendo moldados até se configurarem no presbiterianismo de missão que aportou no território brasileiro. Enfocarei as principais mudanças e aspectos que configuraram o protestantismo tornando-o símbolo do progresso para sociedade brasileira. Destacando que a educação sempre esteve na base do protestantismo, que a incentivou, promoveu e utilizou-a como uma forte aliada em sua expansão e fundamentação. A importância da educação na Reforma e desta para o desenvolvimento da instrução nos países que sofreram sua influência, é inegável.

Esta breve exposição das raízes, transformações, influências e aspectos que configuraram a empresa educacional presbiteriana de missão, constitui-se um alicerce contextual-histórico à pesquisa e ao trabalho no qual me empenho, de resgatar as histórias de vidas e o legado educacional deixado na história da educação brasileira, pelas missionárias educadoras protestantes norte-americanas Mary Dascomb e Elmira Kuhl, que fizeram parte da empreitada missionária presbiteriana, nas últimas décadas do século XIX, como força expedicionária das missões protestantes norte-americanas para exercerem o papel de educadoras nas escolas fundadas pelos presbiterianos na província de São Paulo. A pesquisa aborda aspectos pessoais e profissionais destas educadoras permeando o cotidiano escolar dos lugares onde exerceram o magistério: Brotas, Rio Claro, Botucatu, Escola Americana de São Paulo (atual Mackenzie) e na Escola Americana de Curitiba, que foi fundada por elas.

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O estudo historiográfico de suas vidas, do ser professora protestante, das práticas educativas e do cotidiano escolar, possibilitará a elucidação do magistério feminino e de sua importância histórica no cenário educacional brasileiro no final do século XIX e inicio do século XX, resgatando o legado educacional que deixaram para a educação nacional

IRMÃS FRANCISCANAS DE MARISTELLA FORMANDO PROFESSORAS –TIMBAÚBA/PE, 1938 À 1950

Eremilda Vieira da Costa, Universidade Federal de Pernambuco

Este trabalho partiu de uma curiosidade que há muito tempo revolvia meu pensamento. Quando viajava pelos municípios do interior de Pernambuco, Brasil; verificava que em quase todas as cidades havia sempre um ou dois colégios católicos administrados por congregações diferentes, geralmente originárias de países estrangeiros. Esses colégios são identificados pelos moradores como os mais conceituados. Sempre tive o desejo de saber o porquê da existência de tantos deles e/ou quais os motivos que influenciaram esses(as) religiosos(as) a saírem de seus países e fixarem residência no Brasil, dedicando-se à educação de um povo que não é o seu, e de um país que não é o seu. Outros aspectos que me inquietaram apontam para o marco de qualidade que eles primam em apresentar à sociedade. Perguntava-me, freqüentemente, a quem eles formavam e como era constituído o cotidiano escolar nos anos iniciais do seu funcionamento. Optei por investigar a história de uma dessas instituições: o Colégio Santa Maria, no período de 1938 a 1950, sob a direção das Irmãs Franciscanas de Maristella que vieram de Augsburg – Alemanha – para a cidade de Timbaúba situada na zona norte da mata de Pernambuco. Formavam meninas através do Ensino Normal Rural e preparavam religiosas para atuarem na ordem franciscana. Pesquisei a formação da mulher, procurando entender o momento político que caracterizou a época em questão: o Estado Novo e o III Reich. Utilizei documentos do acervo da escola, livros didáticos, fotografias e documentos oficiais. Destaquei os saberes que marcaram essa cultura escolar e a formação dessa mulher que se preparava no Colégio Normal Rural Santa Maria, como era chamado em seus primórdios. Saberes esses que não só estavam explícitos no currículo oficial legislado pelo Estado, mas também eram socializados através do currículo oculto. Enfoquei os rituais desse cotidiano com as suas nuances e sabores que envolviam os métodos de ensino, as formas de avaliação, as festas, a prática religiosa e a disciplina imposta às alunas para que o comportamento estivesse em harmonia com o modelo que a sociedade e a escola defendiam na época. Foram identificados momentos e posturas de resistência, por parte das alunas e madres, na vivência desses rituais. Os espaços desse cotidiano são a cidade de Timbaúba e o próprio Colégio Normal Rural Santa Maria com implicações nacionais e internacionais que aconteceram.

A ESCOLA DOS GAIATOS DA GUARDA (1943-1963): UMA OBRA SÓCIO-EDUCATIVA CRISTÃ

Ernesto Candeias Martins, IPCB / ESECB

O Centro de Assistência Social da Guarda (1943), primeiro a ser criado no país e com várias experiências sociais e actividades no domínio da família, solidariedade e aos rapazes. Esse Centro integrava as seguintes extensões (estabelecimentos): Cozinha Económica, Sopa dos Pobres, Lar dos Gaiatos, Escola dos Gaiatos, Grupo Cénico e Orfeão dos Gaiatos, Centro Cultural e Desportivo da Guarda, etc.

Os mentores e percursores desta obra social, educativa e assistencial destinada aos rapazes sem família, foram uns autênticos pedagogos ou educadores sociais pelas características das suas intervenções. Referimo-nos a D. João de Oliveira Matos (1879-1962) - Bispo da Guarda, fundador da Liga dos Servos de Deus, suporte desta obra cristã; Dr. Alberto Dinis da Fonseca (1888-1962), criador da Sociedade de Produção e Educação Social - SPES (1925), das Oficinas de S. Miguel (tipografia e encadernação) e o colégio masculino (Outeiro S. Miguel), este dando origem à Escola

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Regional, em 1931; D.ª Maria Luísa Godinho (1910-2001), membro da Liga dos Servos de Deus, responsável pelo Centro de Assistência Social da Guarda.

A Obra dos Gaiatos da Guarda (estabelecimento privado de ensino, criado em 1944), assente na alma de D. João de Oliveira Matos, na Liga dos Servos de Jesus, na obra assistencial e sócio-educativa do Centro de Assistência Social , teve inicialmente instalações adaptadas para ministrar instrução primária elementar e 2.º Grau e instrução complementar de cultura geral, adequada às respectivas profissões. Possuía serviços de apoio aos jovens no lugar de trabalho (indústria, comércio e construção civil) e ocupações sócio-educativas e recreativas e aulas nocturnas.

Por último faremos uma análise descritiva do movimento assistencial e educativo, nos diversos estabelecimentos do Centro de Assistência Social da Guarda (Escola dos Gaiatos, Florinhas da Guarda, Abrigo Infantil, Colónias Balneárias e Cantina Escolar, durante o período 1943-1963. Por último, apresentaremos um estudo histórico-descritivo da Escola dos Gaiatos (externato para rapazes dos 12 aos 20 anos), onde se ministrava instrução primária e curso complementar de aprendizagem. Pedagogicamente a Obra dos Gaiatos procurava dar aos rapazes uma formação moral, religiosa, intelectual, social e combate aos vícios.

Valorativamente, todos os jovens que passaram pela Escola dos Gaiatos na ânsia de se promoverem pessoal, social e profissionalmente, conseguiram atingir lugares de prestígio na sociedade portuguesa.

AS RESPOSTAS SÓCIO-EDUCATIVAS DO ESTADO À INFÂNCIA: PROTECÇÃO E REEDUCAÇÃO INSTITUCIONAL (1910-1930)

Ernesto Candeias Martins, IPCB / ESECB

A consolidação da ‘imagem da infância na mentalidade social na classe média portuguesa verifica-se no séc. XIX e primeiras décadas do séc. XX, devido ao surgimento de novas ideias psicopedagógicas. Trata-se da conceptualização simbólica construída em associação a uma ‘imagem natural ou da representação da infância, fundamento do adulto futuro e da sociedade que ela fará parte como cidadão.

O modelo explicativo da realidade (ecologia social ou ambientalismo) emerge socialmente no séc. XIX. Este paradigma multidisciplinar (originário do evolucionista do séc. XVIII) aplica-se às diferentes áreas do conhecimento (ciências jurídicas, ciências médicas, ciências sociais, à física, à biologia, à psiquiatria, à geografia, à pedagogia, etc.). Aquele modelo mental estará presente nas decisões chaves dos nossos reformadores sociais, que projectaram a sua visão das problemáticas de desviação social da infância e juventude com respostas e soluções (assistenciais, sociais, médico-pedagógicas, jurídicas, etc.), incluindo os modelos correccionais e/ou de reeducação institucionais).

Para os reformadores o abandono (físico, moral) da infância pela família, geram situações de inadaptação, marginalização e (pré)delinquência, que obrigaram o Estado a tomar medidas de intervenção (prevenção, protecção e correcção) no âmbito legalislativo-penal e jurídico, no âmbito educativo e correccional e no âmbito institucional, diferentes do ambiente carcerário e prisional existente ao longo do séc. XIX.

Foi no início do séc. XX que aparecem em Portugal as tendências gerais e as directrizes de protecção para esse colectivo de infância e juventude, que determinou a criação de um sistema judicial infantil próprio (Lei de Protecção à infância, tutorias de infância ou tribunais de menores, medidas educativas de tratamento reeducativo, estabelecimentos específicos, etc.). Essas respostas do Estado resumem-se a três âmbitos: legislativo-penal ou jurídico-social, institucional (escolas de reforma, reformatórios e colónias agrícolas) e pós-institucional) (medidas de tratamento médico-pedagógico e regimes semi-liberdade e de vigilância.

O autor aborda nesta comunicação três pontos essenciais, num arco histórico que abrange as três primeiras décadas do séc. XX e que são: a infância e os reformadores sociais (âmbitos: legislativo-penal/jurídico, institucional e educativo); os sistemas, a organização e a prática (re)educativo; e análise à Escola Industrial de Reforma de S. Fiel (1919-1925) e Reformatório de S. Fiel (1925-1931).

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EVANGELIZAÇÃO E EDUCAÇÃO: A MISSÃO CENTRAL DO BRASIL

Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do Nascimento Universidade Católica de São Paulo

Em 1859, com o intuito de expandir as fronteiras presbiterianas para o Brasil, a Junta de Missões da Igreja Presbiteriana do Norte dos Estados Unidos (PCUSA), sediada em Nova Iorque, enviou ao Rio de Janeiro seu primeiro representante - Ashbel Green Simonton -. Na década seguinte, chegaram outros missionários, formando o primeiro núcleo da Missão no país, a Missão Brasil. Apesar da capital do Império ter sido o locus inicial de sua ação, São Paulo tornou-se o epicentro da Missão Brasil, possibilitando a irradiação não só de igrejas, mas de escolas, para outras regiões. Pela grande extensão territorial, em 1896, a Missão Brasil dividiu-se em Missão do Sul do Brasil, compreendendo inicialmente Rio de Janeiro, São Paulo e, posteriormente, Paraná e Santa Catarina. Já a Missão Central do Brasil, com sede em Salvador, ficou responsável pela Bahia, Sergipe, norte de Minas Gerais e, posteriormente, Mato Grosso e Goiás (Matos, 2003). Durante cem anos - 1871 a 1971 - os missionários da Missão Central do Brasil, partindo da Bahia, organizaram igrejas, escolas e hospitais em sua área de jurisdição. Verificando a realidade do hinterland brasileiro, William Alfred Waddell propôs um novo tipo de instituição educacional, distinta do modelo do Mackenzie College, de São Paulo: uma escola secundária rural, que ofereceria os cursos normal, preparatório de pastores, auxiliar de enfermagem e técnico agrícola. O sucesso daquele novo modelo concretizado em Wagner, na Bahia, levou a Junta de Nova Iorque, em 1923, a implementar um projeto denominado “Escolas Ponte Nova”, vinculando religião, educação e saúde. Em 1926, existiam escolas presbiterianas rurais em Buriti e Cáceres - Mato Grosso (Chapada dos Guimarães), Jataí e Planaltina - Goiás (Chapada dos Veadeiros). Anos depois, nesta última cidade, foi construído um hospital. Em Rio Verde, Goiás, foram organizados uma escola de enfermagem e um hospital. Em Araguaia, Mato Grosso, foi construído um hospital e em Anápolis, Goiás, além da escola, um hospital. No período de atuação, a Missão Central do Brasil contou com toda a infra-estrutura necessária para implementar seus projetos. Possuía fazendas, gado, água potável, energia elétrica, tipografia, telefone, avião, veículos e serraria (na qual eram feitos os móveis de suas instituições). Numa perspectiva historiográfica, utilizando principalmente a documentação levantada nos arquivos confessionais presbiterianos, pretendo abordar a ação daquela organização no hinterland brasileiro, levando em consideração que suas instituições são objetos privilegiados de análise do padrão pedagógico presbiteriano norte-americano.

ESTADO E POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA NOS ANOS 1990

Ester Senna e Mônica de Carvalho Magalhães Kassar, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Este estudo objetiva analisar como a política educacional do estado de Mato Grosso do Sul interage com as demandas da classe média por escola pública, privilegiando a atuação do Estado no tocante ao ensino fundamental. A escolha desse estado visa criar possibilidades de aprofundamento de estudos históricos sobre a educação pública sul-mato-grossense. As categorias de análise que orientam a investigação estão assim constituídas: Estado; política educacional e classe média. Procura-se, num primeiro momento, fazer uma reflexão sobre a trajetória histórica da classe média brasileira, tendo em vista indicar como a nova classe surge como ator político e discute-se como atua nos anos 1990, intermediando as relações entre Estado e sociedade. Recorrendo a fontes primárias, destacando-se documentos da Secretaria de Educação sobre matrícula, movimento e rendimento escolar, por município, assim como documentos de arquivos de escolas públicas e particulares sobre transferência de alunos, o trabalho abrange o período de 1994 a 1998, no qual o governo central e o Estado local operam no sentido da “modernização” da gestão educacional, baseando-se nos critérios de eficiência, eficácia e efetividade social. Ao mesmo tempo, no que se refere à política social, o governo pauta-se no princípio da focalização que aponta para o caráter estrito e emergencial da política educacional. Tais medidas entram em confronto com a demanda por vagas dos “novos clientes” do estado - as camadas médias. Ao realizar as articulações entre Estado central e Estado

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local procura-se expressar o contraponto singular e universal, por meio do qual pode-se elucidar a realidade, em seus nexos e tendências.

POSITIVISMO E GÊNERO: UM MODELO PARA A EDUCAÇÃO FEMININA NO SUL DO BRASIL, NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX

Etelvina Maria de Castro Trindade, Universidade Federal do Paraná/ Universidade Tuiuti do Paraná

Em 1852, era publicado o Catecismo Positivista, obra em que Augusto Comte lançava as bases de uma Religião Universal. O texto, desenvolvido em forma de diálogo, apresenta dois personagens: um masculino, O Sacerdote, e um feminino, A Mulher. No decorrer da obra, o sacerdote doutrina a mulher que o interroga longamente, tratando-se por meu pai e minha filha. Essa aparente submissão da mulher divulgada no Catecismo não é, porém, a expressão cabal das idéias comteanas sobre as relações de gênero.

Muito mais sutil, o modelo de sociedade proposto por Comte, visava o que ele considerava um aperfeiçoamento das formas de governo e a substituição dos dogmas católicos pela sua Religião da Humanidade. Nessa nova formação social, os papéis masculinos e femininos eram vistos sob formas distintas. Para as mulheres, sobretudo após a morte de sua musa Clotilde de Vaux, Comte atribuía importante posição no que chamava a evolução da sociedade, como representantes da própria Humanidade. Segundo ele, caberia ao gênero feminino redimir a espécie humana, utilizando seus dotes naturais, como o altruísmo, a abnegação, a sensibilidade e a delicadeza. As concepções comteanas, de uma forma geral, e sua visão idealizada das mulheres, influenciaram o pensamento de sua época, através da filosofia e da literatura e repercutiram muito significativamente nas propostas educacionais.

No Brasil, a entrada do Positivismo se deu de maneira explícita, na ação dos seguidores da sua Religião da Humanidade. Mas também implícita na medida em que ele permeou as idéias de muitos intelectuais do final do século XIX e início do século XX. Ao sul do país, no Estado do Paraná, uma grande parte dos estudiosos ligados à educação produziu textos, pronunciou discursos e implementou normas que revelam uma apropriação da filosofia comteana no ensino, com base nas diferenças de gênero.

Analisar, de forma crítica, as formas dessa apropriação educacional no Paraná do início do século XX, é o objetivo da comunicação proposta.

NO LABIRINTO DA EDUCAÇÃO: FOTOGRAFIA E MEMÓRIA

Eugênia Maria Dantas, Universidade Federal do Rio Grande do Norte

A memória fotográfica é uma fonte para os estudos da educação e da cultura. Mais do que um registro material do acontecimento, ela se insere na dinâmica das diversas formas de expressão e conduta que caracterizam os valores, as crenças, os desejos de uma época. A educação como uma forma de expressão da condição humana se revela nesse registro pela pose, pelo olhar, pelo ambiente que, em conjunto, orquestram o sentido da vida em suas múltiplas formas. A partir das idéias de autores como Edgar Morin, Roland Barthes e Michel Foucault fundamentamos teórico-metodologicamente este trabalho, que faz parte da pesquisa “fotografia e complexidade: itinerários norte-rio-riograndeses”, um levantamento e estudo sobre a fotografia no Rio Grande do Norte, no período compreendido entre o final do século XIX até os anos 60 do século XX. As informações e acervos, bem como a história da fotografia e dos fotógrafos permitem construir uma arqueologia do sentido da educação cultural do homem na região do Seridó, localizada na porção centro-meridional do estado. Tal escolha recai no fato de já termos realizado um estudo, em nível de doutorado, a partir do registro fotográfico de José Ezelino da Costa, primeiro fotógrafo caicoense que viveu entre 1889 e 1952. Essa pesquisa é uma ampliação no sentido de incorporar outras imagens e histórias a respeito

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deste tema, ainda pouco exploradas pelos trabalhos acadêmicos. Ao tratar a fotografia no âmbito da ciência, problematizamos a memória da educação como um campo aberto que se alimenta de fontes diversas, instiga leituras e práticas educativas transdisciplinares e informa, simultaneamente, sobre o tempo, o espaço, a memória e o imaginário social da condição humana, da cultura, da educação.

IMPRESSÕES DO ATHENEU SERGIPENSE PELAS PALAVRAS DOS VISITANTES

Eva Maria Siqueira Alves, Departamento de Educação - Universidade Federal de Sergipe, Brasil, Doutoranda / Pontifícia Universidade Católica de São Paulo / Brasil

Criado em 1870, o Atheneu Sergipense (Sergipe, Brasil) oferecia os cursos de Humanidades, em quatro anos e o curso Normal, com dois anos de duração.

Não poucos foram os que expressaram as evidências de ser aquela uma instituição que “histórica e tradicional já se tornou no conceito da instrução pública nacional, tais as distintas e gloriosas gerações de intelectuais que têm por (ali) passado”. As palavras do Barão Homem de Melo em 1917 somam-se às do General Amnibal Amorim, que, em 1929, evidencia o Atheneu Sergipense como uma instituição “onde foram educados muitos jovens que mais tarde se tornaram homens notáveis na vida pública”.

Este trabalho objetiva examinar o Atheneu Sergipense a partir das impressões dos seus visitantes. Em 1916, o então Diretor Dr. Aristides da Silveira Fontes abriu o “Livro de Visitas”, com 88 páginas manuscritas e 117 registros do período de 1916 a 1951. O primeiro a assinar o livro foi o Secretário da Instrução Pública, Sr. Raimundo Ribeiro.

Os visitantes não se esquivavam de consignar suas impressões, quer de forma direta, escrevendo suas declarações, quer de forma indireta, quando subscreviam declarações de outros. Tais impressões podem ser tomadas como avaliações daquela instituição.

Visitar o Atheneu Sergipense era um roteiro indispensável para aqueles que pelas terras sergipanas passavam. Para exemplificar, pelo reconhecimento público de alguns deles, declino os nomes de: Hermes Fontes, Rodrigues Dórea, Rocha Pombo e Dom Helder Câmara. Os visitantes compunham-se de autoridades políticas, membros do clero, intelectuais, ex-alunos, ex-professores, desembargadores, delegados, militares, grupos de estudantes, cônsules e inspetores escolares.

Os registros, a palavra escrita, constituem elementos relevantes da cultura do Atheneu e da formação do imaginário que o envolve como grande centro de formação da intelectualidade do Estado. Nas declarações dos visitantes, vários são os aspectos que falam da escola: a estrutura (prédio, instalações, limpeza), o processo pedagógico (pois aos visitantes era proporcionado assistirem algumas aulas regulares), o papel educativo, focalizando dessa forma as práticas e o quotidiano escolar.

Destaque-se, ainda, a relevância conferida ao “Livro de Visitas” o fato de as impressões dos visitantes nele registradas serem publicadas no Diário Oficial do Estado de Sergipe e na imprensa local. Por esse meio, imortalizavam o Atheneu Sergipense, a si mesmos e suas impressões.

MATRIZES DO PENSAMENTO ILUSTRADO E LIBERAL NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

EvaWaisros Pereira, Universidade de Brasília

O presente estudo objetiva identificar, selecionar e analisar documentos relacionados às idéias ilustradas e liberais, oriundas da França, que apresentam vinculação teórica com correntes do pensamento pedagógico e com políticas educacionais propostas no Brasil. O período que nos interessa diz respeito, particularmente, aos séculos XVIII e XIX, em que se deu a apropriação e o uso desse ideário por letrados e intelectuais brasileiros, assim como a sua difusão oral entre pessoas de outros segmentos sociais. Este texto reporta-se à primeira etapa da pesquisa, na qual procedeu-se ao levantamento e análise preliminar das fontes, destacadamente: obras literárias, leis, relatórios oficiais, discursos, panfletos, correspondências pessoais, entre outras. A França, no século XVIII, como centro irradiador das idéias iluministas, difunde esse ideário por toda Europa e, que, por via de

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consequência, chega a penetrar nos países colonizados. É o século de Montesquieu, Diderot, Voltaire, Rousseau, Condillac, D’Alembert, Condorcet e tantos outros intelectuais e filósofos proeminentes, que repensam o conhecimento e formulam nova concepção de mundo e de homem, projetando transformações profundas na vida social. Na difusão das idéias articulam-se formas variadas, que vão dos ensaios, escritos filosóficos e dicionários aos romances, obras teatrais e poemas. São obras filosóficas, jurídicas, políticas, históricas e estéticas, sobre as quais existe uma produção significativa de livros e artigos escritos por criticos da época e por leitores e interprétes contemporâneos. O panorama traçado pelos Lumiéres - de denúncia das arbitrariedades e abuso de poder, contra os privilégios e preconceitos, em pról da tolerância, do uso da razão e do progresso -, é apresentado com matizes e enfoques diferenciados pelos autores clássicos da literatura francesa. No bojo da extensa temática, a educação é tema recorrente. Para destacar algumas importantes contribuições nesse campo, evidenciamos Montesquieu, que, na sua obra fundamental Do Espírito das Leis, aborda a educação na perspectiva político-filosófica, vinculando princípios educacionais à natureza do Estado. D’Alembert preocupa-se com a educação da juventude e, opondo-se ao escolaticismo, propõe um novo plano de estudos para os colégios. La Chalotais, no seu Ensaio da Educação Nacional, aprofunda esse tema e afirma o princípio da educação pública, administrada pelo Estado. Por último, focalizamos Condorcet, que escreveu cinco memoriais sobre a instrução pública. Esses memoriais se constituem em autêntico tratado sobre educação e tiveram importância fundamental, durante a Revolução Francesa, nas decisões do Comitê de Instrução Pública, que resultaram na laicização dos processos educativos.

EDUCAÇÃO SUPERIOR: POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DO PROFESSOR NA DÉCADA DE 90

Evelcy Monteiro Machado; Universidade Tuiuti do Paraná

Este estudo pretende discutir as políticas de Educação Superior referentes à formação do professor implementadas no Brasil na década de 90 do século XX relacionadas à questão da formação do pedagogo. O trabalho faz parte da pesquisa em desenvolvimento intitulada: “O Curso de Pedagogia após a LDB de 1996: políticas e perspectivas”. Trabalha-se com o pressuposto de que as políticas educacionais no Brasil, na década de 90, pelo comprometimento com as políticas globais, não priorizaram a qualidade na formação do professor. Desta forma, para desenvolver o estudo tornou-se necessário ampliar a compreensão das políticas globais que intervieram na Educação Superior e de suas implicações nas políticas nacionais: discutir encaminhamentos da Educação Superior no país, frente à redução da participação do Estado e a opção de diversificação de fontes financiadoras e de diferenciação dos modelos educacionais para situar a formação do professor e a “Pedagogia” no contexto de diversificação, diferenciação, expansão e privatização. São analisados aspectos das políticas educacionais da década de 90, expressos por organismos internacionais, especialmente a UNESCO, em relação à Educação Superior e formação do educador e os documentos oficiais produzidos desde a Reforma de 1996 (Leis, Decretos, Pareceres, resoluções...) situando o debate em torno da formação do professor. Os resultados evidenciam a ingerência das políticas externas, globais, que resultam em contradições em questões referentes a: formação do professor em programas da Pedagogia e na Escola Normal Superior; a formação em Faculdades de Educação e/ou nos Institutos Superiores de Educação; exigência de qualificação dos docentes formadores para ensino e/ou pesquisa: autonomia de processos avaliativos e/ou avaliação genérica externa; modelos formadores ou diferenciação de programas e instituições formadoras; expansão da rede privada dos cursos noturnos além da indefinição de políticas norteadoras para a formação do professor voltada à qualidade da educação.

SILABÁRIOS E CATECISMOS: LIVROS ADOTADOS NO ENSINO PÚBLICO ELEMENTAR CATARINENSE DO SÉCULO XIX (1)

Fábia Liliã Luciano, UNESC

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O texto apresenta informações que possibilitam a produção da memória da educação, com base no contexto histórico da instrução pública catarinense do século XIX, tomando os silabários e os catecismos como objeto de análise, atualmente, reconhecidos pela Pedagogia como livros didáticos. Para realizar este estudo foi necessário se reportar às fontes primárias que se encontram localizadas no Arquivo Público do Estado de Santa Catarina. Destes documentos foi possível rastrear os materiais pedagógicos adotados nas escolas do Império, chamados de utensis. Para o tratamento destas fontes, tomou-se os sillabarios e os cathecismos como indicativos para a compreensão do ensino da leitura, escrita e da prática religiosa cristã da escola elementar daquele período. O material didático empregado por professores e utilizado por alunos fazia parte do aparato provincial destinado às escolas públicas. Entre esses estavam além dos silabários e catecismos, papel, penas e tinta. Esse material era distribuído às escolas sem prévia seleção, análise dos seus conteúdos e definição de uma concepção teórico-metodológica adotada pela Província. A distribuição desse material era realizada de forma gratuita pelo governo provincial, embora muitas vezes fosse em número insuficiente para o auxílio da docência. Enquanto que, para os professores o material didático utilizado era fornecido, para os alunos este era de responsabilidade dos pais, com exceção dos casos de comprovada carência, para que pudessem receber um auxílio, chamado naqueles dias de socorro. Com a utilização desses materiais didáticos havia uma explícita intenção de uniformizar o ensino, facilitando desta forma, a aprendizagem de conteúdos considerados imprescindíveis para a instrução civil e religiosa das crianças. Com esta análise pretende-se contribuir para ampliar os domínios historiográficos acerca do ensino, da escola e do magistério do passado, com vistas ao entendimento do processo e das práticas educativas do presente, imbuído do cuidado de discutir, refletir e avaliar para que em um futuro próximo, o passado não se repita como um conjunto de práticas escolares conhecidas, analisadas, avaliadas e avalizadas como reproduzidas.

Esta investigação se constitui em uma das atividades científica voltada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação - no nível de Mestrado. A linha de pesquisa que abriga esta temática é Educação, Linguagem e Memória, cujo projeto encontra-se em andamento, com financiamento da própria Universidade, desde o mês de março deste ano e com previsão de encerramento para fevereiro de 2004.

O PESSIMISMO NEOLIBERAL E A ESCOLA ANTI-DEMOCRÁTICA, SEPARATISTA E REPRODUTIVISTA SUBMERSA NESSE SENTIMENTO

Fabiana Andrea Barbosa, Universidade Tuiuti do Paraná

Há muito a educação e a cultura assumiram um papel elitista na sociedade. Acredita-se que a educação seja a mola propulsora das modificações sociais que tanto almejamos. Para a formação de um novo Estado faz-se necessário que a educação desenvolva, junto aos grupos populares, condições de participação política, de acesso ao conhecimento e de despertar para negação da passividade diante do projeto político dominante. Por ser uma representação do modo de vida de uma determinada sociedade, a educação necessita desempenhar certos papéis sociais e demonstrar sua força, negando uma posição passiva diante do quadro social que se encontra além do limite de seus muros. Segundo PINTO, (1979, p. 4) “Para um país que precisa libertar-se política, econômica e culturalmente das peias do atraso e da servidão, a apropriação da ciência, a possibilidade de fazê-la não apenas por si mas para si, é condição vital para a superação da etapa da cultura reflexa, vegetativa, emprestada, imitativa, e a entrada em nova fase histórica que se caracterizará exatamente pela capacidade, adquirida pelo homem, de tirar de si idéias de que necessita para se compreender a si próprio tal como é e para explorar o mundo que lhe pertence, em benefício fundamentalmente de si mesmo.” Pensar acerca da Educação propõe-nos uma conclusão: não educa realmente aquele que ignora o momento presente, que ignora os conflitos que o cercam e, conseqüentemente, julga-se capaz de assumir um posicionamento de neutralidade diante da realidade. Urge que o professor e a escola retomem para si a tarefa de propiciar aos discentes o emergir no mundo real do conhecimento - entenda-se aqui não somente o conhecimento livresco, mas todo aquele capaz de promover uma melhoria nas bases sociais nas quais os educandos encontram-se submersos. Para GADOTTI (1984, p. 75) “Não é possível ao educador permanecer neutro: ou educa a favor dos privilégios da classe dominante ou

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contra eles, ou a favor das classes dominadas ou contra elas. Aquele que se diz neutro estará apenas servindo aos interesses dos mais fortes, isto é, à classe dominante. No centro, portanto, da questão pedagógica, situa-se a questão do poder (...)”A educação é a mola propulsora das modificações sociais que tanto almejamos. Para a formação de um novo Estado faz-se necessário que a educação desenvolva, junto aos grupos populares, condições de participação política, de acesso ao conhecimento e de despertar para negação da passividade diante do projeto político dominante.

AS NOVAS PROPOSTAS E TENDÊNCIAS EM GESTÃO E PLANEJAMENTO EDUCACIONAIS: UM ESTUDO SOBRE O CONGRESO INTERNACIONAL “PLANEAMIENTO Y GESTIÓN DEL DESARROLLO DE LA EDUCACIÓN”

Fabiana Silva Fernandes

O presente trabalho fundamenta-se na tese de doutoramento desenvolvida pela autora. O projeto de tese consiste na análise de documentos elaborados no âmbito das atividades do Congreso Internacional “Planeamiento y Gestión del Desarrollo de la Educación”, realizado no México, em 1990, pela iniciativa da UNESCO. Considerando-se que o evento foi um marco histórico nos estudos sobre o Planejamento e Gestão Educacional, pretende-se, nessa Comunicação, primeiramente, situar o Congreso Internacional , no âmbito das mudanças históricas, políticas e sociais que se descortinavam na América Latina na década de 80 e que incentivaram a realização de eventos internacionais como este, tendo em vista a necessidade de se redefinir os rumos da educação em seus princípios, objetivos, estrutura e organização, em nível mundial. Em seguida, pretende-se elencar alguns dados importantes do evento, como sua estrutura, os objetivos do Congresso, as organizações que o incentivaram, os intelectuais que participaram e os temas desenvolvidos. Apresentar-se-á também o levantamento de algumas conclusões que já foram obtidas a partir da análise prévia do informe final do Congresso. É importante salientar que o Congresso estava encarregado de efetuar um balanço da evolução da planificação e gestão da educação e de determinar quais as novas propostas e tendências nesse campo. A relevância da reflexão sobre o tema proposto está relacionada com os rumos tomados pelas reformas educacionais na década de 90, tendo em vista o impasse das políticas públicas com a crise do Estado Desenvolvimentista nos países latino-americanos. Esse evento internacional está situado no momento de discussão sobre as mudanças necessárias no âmbito educacional, de questionamento da subordinação dos planos educacionais aos planos nacionais de desenvolvimento econômico e de avaliação do papel dos organismos de planificação, na medida em que a atuação dos planejadores transformou-se, nesse contexto, em um campo obscuro na gestão de políticas sociais. Portanto, o Congresso é um episódio importante para a revisão dos marcos teórico-conceituais do planejamento educacional e significou um lance de reflexão sobre as orientações das políticas em educação até então adotadas.

UM ESTUDO SOBRE TRAJETÓRIAS ESCOLARES DE FAMÍLIAS NEGRAS EM PERNAMBUCO (1950 - 1970)

Fabiana Cristina da Silva, Universidade Federal de Pernambuco

O estudo, que se encontra em andamento, tem como objetivo principal identificar as estratégias utilizadas por pais de uma família negra com baixo ou nenhum grau de escolaridade para que seus filhos alcançassem uma certa longevidade escolar, em Pernambuco, no período de 1950 - 1970. Nesse sentido, busca-se compreender como filhos de pais analfabetos ou semi-alfabetizados conseguiam superar as expectativas das gerações anteriores chegando ao ensino médio e/ou superior. Busca-se também identificar como ocorreu a transmissão dessas estratégias aos demais membros do grupo familiar. Além disso, buscamos analisar os fatores e condições que possibilitaram diversas formas de participação e inserção desses sujeitos na cultura escrita. A opção pelo estudo, de um lado, das estratégias escolares dos membros da família e, de outro, dos seus níveis de inserção na cultura escrita, decorre do presuposto de que nem sempre graus de escolarização correspondem a níveis de

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letramento. O período estudado corresponde ao momento do processo de escolarização dos filhos. Nesse período, eram ainda muito baixas as taxas de escolarização dos níveis secundário e superior, particularmente em Pernambuco. Além disso, essa inserção na escola se dava de maneira diferenciada em relação ao pertencimento social, étnico e de gênero dos sujeitos. Neste sentido o estudo focalizará famílias negras pertencentes a camadas populares. A pesquisa tem-se baseado em estudos já realizados pela Sociologia da Educação e pela História da Leitura e da Escrita, que detacavam algumas estratégias e fatores que contribuem para uma maior intimidade com a escola, a leitura e a escrita de indivíduos e famílias não "herdeiras": o permanente acompanhamento da família; o envolvimento ou pertencimento a um movimento social, como igreja, sindicatos, associações; o tempo diário específico para o estudo, ou seja, uma rotina bem definida e dividida entre atividades lúdicas e escolares; a inserção na cultura urbana, ou ocupação profissional. Algumas famílias com as características propostas neste estudo já foram localizadas para que possamos reconstituir as trajetórias familiares e, desse modo, identificar as estratégias utilizadas por elas para resultar em uma longevidade escolar de seus filhos. A história oral será o método principal para se obter informações sobre a história de vida dos indivíduos dessas famílias. Essa utilização se deve ao fato da história oral trazer várias e importantes reflexões teóricas e metodológicas necessárias à realização da pesquisa como, por exemplo, as relações entre história e memória, entre trajetórias de vidas e construção de identidades, entre a tradição oral e a tradição escrita, além de outros aspectos que indicam a riqueza e o potencial dessa metodologia.

UMA ANÁLISE HISTÓRICO-JURÍDICA DAS LEGISLAÇÕES EDUCACIONAIS BRASILEIRAS: UMA APROXIMAÇÃO COM A EDUCAÇÃO ESPECIAL

Fabiany de Cássia Tavares Silva, Maurinice Evaristo Wenceslau

A história da educação brasileira tem evidenciado que a educação foi foco de atenção apenas nos períodos em que dela sentiram necessidade os segmentos dominantes da sociedade. Esse modelo de interpretação nos dá elementos significativos para o entendimento da história da educação especial, isto é, sua caracterização ao longo da história da educação brasileira, como organização com maior dificuldade de interlocução com a educação geral, talvez decorrente de sua constituição como o lugar da diferença. Entretanto, figura no cenário da política educacional brasileira desde o final da década de 50, ainda que, com uma presença marcada pela condição de apêndice da educação dos “normais” e, principalmente, fundamentada no preceito do assistencialismo. Este texto, portanto, apresenta algumas reflexões oriundas de um projeto conjunto de pesquisa, o qual dedicou-se ao estudo das relações entre o direito e a educação escolar, com ênfase na educação especial, pretendendo contribuir para o desenvolvimento do direito educacional. Atualmente, verifica-se que a preocupação com a educação inclusiva pode constituir-se em uma re-definição e abrangência do direito educacional, ao circunscrever acentuadamente os direitos de escolarização “comum” aos sujeitos com necessidades especiais. Ainda que preliminarmente, nossa incursão pela trajetória histórica do ordenamento jurídico está fundamentando uma visão tridimensional do direito, por meio da busca pelo caráter valorativo das normas educacionais. O ordenamento jurídico nos parece, o melhor indicador para analisar a incorporação das expectativas sociais que supostamente definem os critérios educacionais, que são de “base científica”, ao assegurar ganhos e direitos. A definição de direito educacional está, nesse sentido, profundamente condicionada pela conveniência do conjunto de normas e valores que a sociedade estabelece em determinado momento histórico.

INFLUÊNCIA DE CASTILHO NO CENTRO PROMOTOR DE INSTRUÇÃO DE LEIRIA.(1853) - (CONTRIBUTO PARA MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO EM PORTUGAL)

Fátima Salgueiro, Museu Escolar de Marrazes

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A instrução pública da população portuguesa é tarefa a que o estado se propôs, há relativamente pouco tempo.

Foi durante o séc. XIX que, progressivamente, se foi instalando na mente das pessoas mais esclarecidas, a obrigação de instruir o povo. Não foi tarefa fácil.

Muitos decretos se fizeram, mas por falta de meios, quer do estado quer das Câmaras, Juntas de Paróquia ou Irmandades, facilmente caíam no esquecimento.Pelo Censo de 1852, o Distrito de Leiria, com 108 freguesias, dispunha apenas de 41 lugares criados. Isto quer dizer que a cada lugar, correspondia um professor. Não quer dizer porém, que eles estivessem sempre todos preenchidos.

O Concelho de Leiria, formado por 24 freguesias, apenas dispunha de 4 lugares. Além disso, quem lê as notícias da época, pode constatar a má preparação dos mestres.

Neste contexto, surge em Leiria no ano de 1853, um grupo de cinco personalidades, que se dispuseram a tentar contrariar este número estatístico no Distrito de Leiria. Diminuir o analfabetismo. Destes cinco, destacam-se dois: D. António da Costa de Souza Macedo, que em 1870 foi Ministro da Instrução apenas por 60 dias, promulgando reformas que por vários motivos nunca saíram do papel e dizia que (...) Sem a intelligencia nacional não poderia haver verdadeira soberania, e para a intelligencia nacional tornava-se indispensavel a instrucção popular.(...) O outro, foi o Dr. António Xavier Rodrigues Cordeiro, natural das Cortes, freguesia do Concelho de Leiria, que na altura desempenhava as funções de Administrador do mesmo Concelho. Era pessoa muito influente no meio e dizia que nas aldeias dificilmente se encontraria uma pessoa que soubesse ler..

Para atingirem os seus objectivos, que era principalmente fazer chegar a instrução às classes mais desfavorecidas, decidiram fundar uma associação, a que chamaram Centro Promotor de Instrução. Numa das cláusulas do regulamento comprometiam-se a não receber qualquer gratificação, pelos serviços prestados.

Este Centro, além de promover a Instrução Pública e espalhá-la por todas as freguesias rurais, pretendia desenvolver actividades culturais como: sessões literárias, saraus artísticos, abertura de uma biblioteca e disseminar os livros de Instrução Elementar, distribuindo-os à população.

Os dois primeiros membros da comissão fundadora do Centro, anteriormente citados, eram amigos pessoais do pedagogo António Feliciano de Castilho, que se tinha acabado de dar a conhecer como o inventor de um novo método de aprendizagem da leitura Foi no Centro Promotor de Instrução em Leiria que depois de Lisboa, Castilho ensinou professores pelo seu método. Estes disseminaram-se pelo Distrito e a pedido de Castilho relataram as suas experiências com os alunos.

Estas experiências além de se encontrarem arquivadas, foram publicadas em “O Leiriense,” jornal feito pelos fundadores do Centro, propositadamente para publicação das actividades que se iam desenrolando no Centro Promotor de Leiria.

Foi este um momento alto da alfabetização dos mais desfavorecidos do Concelho, em meados do Séc. XIX.

Este método foi rapidamente esquecido. O Museu Escolar de Marrazes tem no seu acervo algumas referências sobre ele.

ENSINO DE ENFERMAGEM: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

Felismina Mendes

Nesta comunicação apresentam-se as principais linhas estruturantes da evolução histórica do ensino da enfermagem, em Portugal, desde o surgimento dos primeiros "cursos" de enfermagem, em finais do século XIX, até à actualidade, em que se deu a sua integração no sistema de ensino superior.

Durante este longo trajecto nem sempre será fácil separar o ensino de enfermagem da sua prática porque, desde a criação da primeira escola de enfermagem há mais de um século, sempre se interligaram e se influenciaram mutuamente.

Destaca-se ainda, nesta evolução histórica (muito da qual está por fazer, vivendo actualmente de dados parcelares e dispersos), a subordinação do ensino de enfermagem ao modelo médico hospitalocêntrico, que sempre dominou o próprio sistema global de prestação de cuidados de saúde.

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Por fim, apresenta-se o lento percurso da conquista de autonomia, do ensino de enfermagem, que se iniciou nos anos cinquenta do século XX, com a autonomia técnica e administrativa, e que só terminou com a conquista da autonomia científica já no final da década de oitenta, quando se deu a sua integração no ensino superior politécnico.

DIANTE DAS LUZES: ROUSSEAU, UM PERSONAGEM CONTROVERSO NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA

Fernanda Barros Müller, USP

Neste trabalho pretendo analisar a força de divulgação das idéias iluministas em um processo de mudanças sociais e políticas. Para isso, elaborei um plano de trabalho, a partir da identificação do tema “Iluminismo” e, mais especialmente, no pensamento de Rousseau, encontrado em livros didáticos de História do Ensino Fundamental, das décadas de 80 e 90, século XX, no Brasil. A pesquisa reuniu dezenove títulos diferentes que tratam da História Moderna e Contemporânea, e que foram publicados por diversas editoras, principalmente de São Paulo e Rio de Janeiro.

Partindo das características comuns presentes nos livros didáticos, descritos por Gabriela Ossenbach e Miguel Somoza em “Los Manuales escolares como fuente para la História de la Educación em América Latina” destaquei, em especial, a intencionalidade por parte do autor e ou editor no sentido de que tais publicações são destinadas ao uso escolar; a forma como são expostos os conteúdos e a sua adequação ao trabalho pedagógico.

A partir do momento em que a escola moderna se organiza e no seu esteio cria modelços, métodos e conteúdos universais espera-se que o livro didático cumpra o papel de, uniformemente, servir como instrumento de educação para as massas. Vê-se que, por exemplo, nos livros de História analisados, a seleção dos conteúdos à respeito do Iluminismo enfatizam de forma peculiar as teorias políticas, ou mais exatamente, a transposição das idéias racionalistas para a política.

Da mesma forma, quando pensamos na importância delegada à Educação no período da Revolução Francesa, confrontamos com a citação de Alain Chopin¹ “Lakanal declara ante la Convención el trece de junio de 1793: ‘las columnas que deben sostener el edifício de la educación son los libros elementales’. Segundo o autor, não faltam argumentos para isso: “necessidad de extender el patriotismo, difundir los derechos humanos e propagar lãs nuevas ideas, igualar la instrucción Del pueblo, consolidar la unificación lingüística del território, transmitir princípios de higiene y salubridad pública, garantizar la formación de enseñantes, luchar contra la influencia de la iglesia...” Um embate já anunciado na Reforma e na Contra Reforma e que culmina com a crença na razão, como fonte do conhecimento humano.

Há, portanto, uma relação estreita entre os conteúdos selecionados (para que sejam universalizados), e a concepção de homem que se deseja formar. Então quais seriam as semelhanças e as diferenças encontradas entre os ideais iluministas e a seleção destes, concebida diversamente, entre os autores de livros didáticos? É possível perceber uma adequação das idéias ao momento político? Quais apropriações foram feitas, no sentido de aproximar os ideais iluministas à democracia, ao liberalismo e ao socialismo?

¹ CHOPIN, Alain. Los Manuales Escolares de Ayer a Hoy: El Ejemplo de Francia. In: Historia de la Educación. Ed. Universidad de Salamanca, 2000.

O PAPEL DA IGREJA CATÓLICA NA EDUCAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA CEARENSE DA DÉCADA DE 1930

Fernando Sales Júnior, U. Estadual do Ceará

No período que vai da primeira Guerra Mundial a superação da Crise de 1929 o Brasil tem uma explosão em seu processo de industrialização. Antes de 1914 havia no País 7572 indústrias. Ao final da década de 1930 este número salta para 62930. No movimento operário, a influência da

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Revolução de 1917 e fundação do PCB em 1922 fazem com que o movimento sindical brasileiro ganhe maior organização em sua atuação em defesa de interesses cada vez mais politicamente definidos, impulsionando a formação da consciência de classe.

Assim, a década de 1930 é de polarização ideológica. Liberalismo e Socialismo disputavam entre si a hegemonia do pensamento político e a possibilidade de construção de suas sociedades ideais.

Mas na década de 1930 ainda havia, no Brasil, resistência à esta nova dinâmica social consolidada com o desenvolvimento das forças produtivas e acumulação de capital. Dentre os atores sociais mais conservadores e reacionários destacamos a Igreja Católica, que a partir das encíclicas Rerum Novarum (1891) e Quadragesimun Annum (1931), entra no debate sobre a sociedade capitalista e sua dinâmica.

Com um discurso de condenação aos abusos do capitalismo, mas de rejeição absoluta ao comunismo, a Igreja vai buscar na Idade Média os valores da sociedade que tenta construir no século XX.

A força destes agentes conservadores é mais forte nos lugares onde o processo de industrialização e formação do operariado é mais atrasado, como no Ceará. Aqui, a experiência da Legião Cearense do Trabalho (LCT) e dos Círculos Operários Católicos (COC) são a tentativa, da Igreja associada ao Integralismo fascista, de organizar a sociedade em torno de valores como lealdade, a obediência, hierarquia, etc.

Isto posto, nossa pesquisa tem o objetivo de estudar as Escolas lecistas (da LCT) e os COC como espaços onde, através da educação, a Igreja está formando a juventude cristã que interpreta o mundo sob a ótica das encíclicas de 1891 e 1931. Compreender como se estruturava e efetivava este processo educativo é fundamental, uma vez que, é nos COC que se formará a classe dirigente do Ceará dos anos 30 a 40 e nas escolas lecistas que se forjará a juventude fascista que adere a Ação Integralista Brasileira, que em seu corpo tinha como integrantes padres como Dom Hélder Câmara e o bispo de sobral D. José Tupinambá da Frota.

NEM IGREJA, NEM ESTADO: EDUCAÇÃO ANARQUISTA EM SÃO PAULO NA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1930)

Fernando Antonio Peres, U. S. Paulo

Os grupos de militantes anarquistas que atuaram em São Paulo na Primeira República dedicaram-se, no dizer de um contemporâneo, sobretudo à tarefa de “despertar as consciências, e destruir os preconceitos e preparar os rebeldes”. Nestas tarefas, dirigiram-se sempre a toda a humanidade, numa busca por esclarecê-la dos males provocados pelo capital, pela religião e pelo Estado. Os trabalhadores eram considerados os mais afetados pela exploração e pela opressão, razão pela qual foram escolhidos como alvo privilegiado da propaganda anarquista. Os libertários pretendiam a radical transformação da sociedade existente, através da destruição de todos os instrumentos de compressão social: o capital e a propriedade privada; o poder clerical e o poder estatal; a ignorância e as superstições; a divisão da sociedade em classes sociais; toda forma de autoridade. Para atingir tais objetivos, os anarquistas desenvolveram diversas estratégias de luta e enfrentamento das condições adversas: mobilizações, greves, campanhas, comícios, conferências e uma miríade de atividades culturais.

A propaganda era considerada um ato educativo em si, motivo pelo qual os grupos anarquistas promoveram uma intensa atividade editorial, com a produção de livros, jornais, folhetos e opúsculos. Esta atividade era subsidiada pela importação e tradução de obras literárias, pela criação de cursos, bibliotecas, gabinetes e círculos de leitura. Desta forma, as estratégias educacionais tornaram-se extremamente importantes para os grupos, ao disseminar práticas de estímulo à auto formação. Esta ocorria sobretudo através da prática da leitura e da escrita, concretizando-se tanto nos círculos de leitura quanto nos centros de cultura operária. Como resultado, era comum encontrarmos muitos autodidatas entre os anarquistas.

Além disso, os grupos de militantes anarquistas desenvolveram estratégias no campo da educação formal escolar, através do estímulo à criação de escolas. Estas, qualificadas como “livres”,

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“modernas”, “racionalistas” ou “libertárias”, afirmavam-se como propostas alternativas de educação. Desta forma, rejeitava-se tanto a educação religiosa (cujo paradigma pode ser encontrado nos projetos escolares promovidos pela Igreja católica) quanto a educação cívica (desenvolvida nas instituições educacionais públicas sob controle estatal). As escolas de orientação anarquista organizaram-se através de uma “rede de iniciativas” e centraram-se na educação laica e na primazia do conhecimento científico no currículo escolar. Houve diversas experiências em São Paulo na Primeira República, assim como em outras regiões do Brasil, geralmente locais de forte presença imigrante e operária. A historiografia considera a Escola Libertária Germinal, criada na cidade de São Paulo em 1902, como a experiência pioneira no campo educacional de orientação anarquista. Nos congressos operários realizados no princípio do século XX (1906, 1908 e 1913), discutiu-se também a temática educacional, que resultou numa orientação para a criação de escolas para os trabalhadores sob o controle dos mesmos. E, sem dúvida, o fuzilamento do educador espanhol Francisco Ferrer (em 1909) muito contribuiu para a difusão de idéias pedagógicas libertárias em São Paulo, concretizadas através de iniciativas escolares. Em 1912, criou-se a Escola Moderna N.º 1, no bairro paulistano do Belenzinho. Nos anos seguintes, outras escolas foram criadas em São Paulo.

A existência de tais iniciativas escolares representavam a concretização de um projeto autônomo do campo educacional, capaz de transformar-se numa ameaça - sobretudo simbólica - à hegemonia do Estado e da Igreja. Em razão disto, as escolas anarquistas sofreram todo o tipo de represálias das instituições estatais e religiosas: além de serem combatidas pela imprensa católica, não raro, foram fechadas ou destruídas pelas autoridades policiais. Em 1919, o fechamento das Escolas Modernas de São Paulo por ato do poder público estadual representou o fim das experiências educacionais escolares naquela cidade. De qualquer forma, o resgate de tais experiências constitui-se em importante elemento para a compreensão da história da educação no Brasil republicano.

O estudo de outras instâncias promotoras de ensino, além da Igreja e do Estado, em muito contribuirá para o entendimento do período, assim como dos embates - já na década de 1930 - que se processaram entre os que defendiam e os que rejeitavam o ensino religioso nas escolas públicas brasileiras.

ESCOLAS DO SUL: ARQUIVO E MEMÓRIA

Fernando Luís Gameiro, U. de Évora (CIDEHUS)

A partir do início da década de setenta do século XX os estudos sobre as origens sociais e a mobilidade conheceram um incremento significativo que se traduziu na ampliação do conhecimento sobre os processos de ascensão social das elites europeias.Estes estudos mostram a importância da educação formal nos processos de mobilidade, ao mesmo tempo que evidenciam a necessidade efectuar estudos de caso mais contextualizados que atenuem a omnipresente análise quantitativa.

Nas últimas duas décadas em Portugal o interesse pelas questões da educação em perspectiva histórica produziu contributos relevantes para a caracterização dos sistemas educativos e dos seus agentes. Porém, do ponto de vista da preservação dos fundos documentais das instituições educativas - que em última instância suportam aqueles trabalhos -, ainda há um longo caminho a percorrer. Só nos últimos anos se iniciou um lento processo de sensibilização para o espólio que muitas das instituições de ensino possuem, mas que ainda não tratam nem organizam.Grande parte desta documentação é imprescindível no estudo dos mecanismos sociais ligados à educação e o risco de tais documentos se perderem em definitivo é imenso. O problema abrange vários subsistemas de ensino e tem, portanto, a dimensão do país.

Com base na organização de dois destes arquivos esta comunicação articula as possibilidades de exploração destes fundos, com os processos de organização levados a efeito para permitir a sua preservação e posterior consulta.

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A BOTÂNICA NO ENSINO DAS CIÊNCIAS DA NATUREZA NOS ENSINOS ELEMENTAR E BÁSICO (1º CICLO). UMA PRIMEIRA ANÁLISE DE MANUAIS ESCOLARES DO SÉCULO XX EM PORTUGAL

Fernando Guimarães, Universidade do Minho e Nelson Lima, Universidade do Minho; Justino Magalhães, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação U.L

Do manual enciclopédico, o livro escolar mais utilizado no século XIX, aos mais recentes manuais escolares, nos quais se destaca a centralidade do conhecimento sobre as coisas, a Botânica tem ocupado um espaço privilegiado. Se nos primeiros livros a Botânica se traduzia em longas listas de classificações sobre as plantas, mais recentemente as referências à relação entre o Homem e a Natureza ocupam um espaço dominante. Apoiadas em textos apelativos e em inúmeras figuras nas quais predomina a cor verde, estas alterações na forma como o texto está organizado poderiam levar-nos a pensar na existência de mudanças fundamentais na abordagem da Botânica no 1º Ciclo.

Tendo por base o trabalho de doutoramento que estamos a desenvolver, procuramos compreender as relações que se estabeleceram entre a problemática referida, as reformas educativas, os programas e os manuais escolares, ao longo do último século, interpretando a evolução dos conceitos de Botânica, os conteúdos a as abordagens metodológicas contidas nos compêndios e o modo como estes influenciaram e influenciam o ensino das Ciências da Natureza nos Ensinos Elementar e Básico (1º Ciclo) em Portugal.

Esta comunicação assenta numa análise de manuais escolares de Ciências da Natureza dos Ensinos Elementar e Básico (1º Ciclo) recolhidos ao longo do primeiro ano de Dispensa de serviço docente. Esta abordagem metodológica de natureza qualitativa, assente na análise de conteúdo, contribui para confrontar as fontes quanto aos conteúdos que incluem, as orientações pedagógicas e didácticas que traduzem, as recomendações de política educativa, assim como os valores educativos e científicos que sugerem.

Os resultados indiciam que estas mudanças relacionam-se com alterações de abordagem dos conteúdos. Estes, porém, estão aquém das nossas expectativas iniciais. A título de exemplo, gostaríamos de referir que os manuais mais antigos que encontramos acentuam a dimensão estética das plantas e a importância destas para a existência de uma ética e de uma moral nas quais Deus ocupa um espaço determinante. Nos livros escolares das décadas de 40 e 50, e para além de todo o quadro ideológico que suporta o ensino no Estado Novo, registamos a ênfase na relação entre o ser humano e a Natureza, baseada na criação de uma ordem mental e na utilização de métodos pedagógicos activos. Nos manuais do Ensino Básico (1º Ciclo) que actualmente podemos encontrar, detectamos uma certa mitificação do meio ambiente e o apelo a um empolgado combate à preservação da diversidade das espécies. Se no passado a Moral e a Natureza se encontravam no centro deste discurso científico, hoje em dia o ambiente e a sua defesa intransigente ocupam o mesmo espaço, utilizando-se para tal abordagens pedagógicas e didácticas que não são, em nosso entender e numa primeira análise, estruturalmente distintas.

HISTÓRIAS DE LEITURA: A VOZ DOCENTE

Filomena Maria Formaggio, UNIMEP-SP

A presente comunicação visa dar a conhecer os resultados a partir dos estudos de doutorado nos quais as histórias de leitura de sujeitos formadores de professores foram objeto de maior interesse. Para tanto, partimos da premissa que para se formar um profissional qualitativamente/autonomamente diferenciado, é preciso que se forme antes um leitor.

Assim, registramos a história de seis docentes em entrevistas. De acordo com nossos critérios, tais docentes são formadores de professores de distintas regiões do país e declaram valorizar a leitura no curso da formação docente.

Os relatos orais possibilitaram-nos uma recuperação da trajetória de leitura dos sujeitos e, a partir das suas experiências de leitura, entender a relação apontada entre leitura, conhecimento e vida. Ao considerarmos o percurso e a experiência de leitura dos sujeitos buscamos desvelar as

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relações existentes entre a história de vida e a leitura e, ao recuperarmos suas trajetórias de leitura, encontramos algumas semelhanças e diferenças que explicitamos para análise e discussão.

Nosso olhar incidiu sobre a questão inicialmente configurada e que constitui objeto de constante preocupação. Afinal, qual o papel que a leitura representou na formação desses sujeitos formadores de professores? Qual o significado que eles atribuem à leitura? Como, o que e por que leram no curso de suas vidas?

As narrativas enfocam (a) lembranças de leitura: destacamos inicialmente os relatos sobre os primeiros contatos com leitura, antes da alfabetização. Neste período, os relatos destacam a influência do contexto familiar sobre interesses de leitura. Subseqüentemente, destacamos (b) lembranças do período escolar, desde o ensino fundamental até o ensino médio - um período - segundo os relatos - marcado pela falta de incentivo à leitura na escola. Na seqüência, trazemos (c) lembranças de leitura na universidade. Nesse período os sujeitos apontam o descompasso entre as expectativas anteriores à formação - e aquilo que a universidade lhes proporcionou - inclusive e, principalmente, em relação à leitura. Em seguida, discutimos (d) o período de profissionalização dos sujeitos, após a Graduação e as lembranças de leituras em períodos nos quais não puderam freqüentar a escola. Nessa fase os entrevistados reconhecem ‘modelos’ educativos que deixaram de capacitá-los para desenvolver, por sua vez, um trabalho seguro quer em relação às ações pedagógicas quer em relação ao conhecimento adquirido. Por outro lado, nos períodos em que não freqüentaram a escola, há evidências claras de que foram períodos marcados por intensa atividade de leitura.Ao final, re-pensamos o presente trabalho em termos explicativos e nos orientamos para a formação de professores entendendo que a leitura deve ocupar um lugar de destaque na formação docente, de forma tal que possamos assumir um novo/outro modelo epistemológico/pedagógico que considere a dimensão da prática da leitura como dimensão do ensino e da aprendizagem de sujeitos, já que vida e aprendência são, no fundo, a mesma coisa.

A DISCIPLINA/INDISCIPLINA NO ENSINO PRIMÁRIO NA VIGÊNCIA DO ESTADO NOVO

Filomena Maria Moreira da Silva, Associação de Jardins Escolas João de Deus

O termo disciplina tem origem latina. No dicionário além de significar um ramo do conhecimento ou matéria de estudo, ao longo dos tempos teve diferentes significações: direcção moral, regra de conduta; obediência a essa regra.

Hoje quando se fala de disciplina, tendemos a evocar as regras assim como as sanções ligadas aos desvios e consequentemente sofrimento que elas provocam. Segundo Teresa Estrela: “O conceito de indisciplina relaciona-se intimamente com o da disciplina e tende normalmente a ser definido pela sua negação, privação, ou pela desordem proveniente da quebra de regras estabelecidas ” (1992).

O tipo de regras e obediência relativas à disciplina, dizem respeito a uma determinada colectividade, ao tempo histórico e aos corpos sociais existentes.

Assim, podemos citar a disciplina familiar, religiosa, militar, desportiva, escolar… embora cada tipo de disciplina seja específico, todas elas tendem para uma harmonia social. Não podemos falar de disciplina ou indisciplina esquecendo-nos do contexto sócio-histórico em que esta ocorre.

Pretendemos com o presente trabalho e através de uma análise do periódico Escola Portuguesa, privilegiar a abordagem do tema disciplina/indisciplina no Ensino Primário, durante a vigência do Estado Novo, regime que se autodefine, como disciplinador da vida pública em Portugal, podendo ainda salientar, a título de exemplo, que nos anos trinta, Salazar e os responsáveis do regime se assumem como moralizadores da vida política. Este regime cria assim uma imagem que acaba por ser transmitida de uma forma muito explícita, referindo que o problema nacional deriva fundamentalmente de:

1-Um problema educativo;2-Este problema educativo é uma das bases onde assenta a reforma e a regeneração nacional.

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FEMININO DE GESTÃO DE ESCOLAS PARTICULARES NO INÍCIO DO SÉCULO XX, RIO GRANDE DO SUL, BRASIL

Flávia Obino Corrêa Werle, Universidade do Vale do Rio dos Sinos São Leopoldo, Rio Grande do Sul

Esta comunicação tem por base o trabalho desenvolvido no âmbito do projeto ESCOLA COMPLEMENTAR: PRÁTICAS E INSTITUIÇÕES e seu desdobramento no projeto HISTORIA DAS INSTITUIÇÕES ESCOLARES: ESCOLAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES, que têm dentre seus objetivos principais desenvolver uma proposta teórica e metodológica para a abordagem da história das instituições escolares, analisar o papel exercido por congregações religiosas no segundo surto missionário ocorrido no Brasil no final do século XIX e início do século XX, fortalecido pela implantação de colégios católicos e disponibilizar para a comunidade acadêmica documentos de instituições escolares na forma digitalizada. A dimensão de análise focalizada centralmente neste artigo é a referente a estratégias de gestão adotadas em colégios femininos decongregações religiosas femininas católicas. O trabalho implica na consideração da diversidade de fontes que compõem os arquivos institucionais escolares - artigos jornalísticos acerca do estabelecimento de ensino, seus professores, alunos, formaturas, inaugurações; livros diários da vida da congregação, mapas, fotografias, livros de termos e de registros escolares, cópias de contratos de trabalho de professores, sumários da história da instituição, convênios e documentos oficiais de integração com outras instituições, dossiers de correspondências, livros inventário, atas, regulamentos, relatórios - bem como entrevistas com ex-alunas, ex-professoras e depoimentos escritos que tenham sido preservados. O objetivo é inferir elementos referentes à gestão e delinear um paradigma feminino de gestão de escolas particulares do Rio Grande do Sul, as quais se caracterizaram, no período, como femininas em seu público e em seu corpo docente e administrativo. Os dados permitem delinear, preliminarmente, tal paradigma com algumas características: (a) freiras/gestoras constituídas fundamentalmente pela formação religiosa a qual operava, a um só tempo, como formação para a congregação, para o magistério e para o exercício da gestão, (b) a identidade e presença da figura feminina fundacional da instituição, (c) a identidade entre missão religiosa e atuação como gestora a qual também estava muito relacionada à identidade entre os espaços físicos e os funcionamentos da escola e os da residência da congregação, (d) enfrentamento de riscos e atendimento à demandas da época momentos em que possivelmente operava o carisma da congregação, (e) apoio à formação da mulher pela formação da professora, (f) representação oficial amalgamando escola e congregação, (g) continuidade de proposta e da instituição.

SETOR DE DOCUMENTAÇÃO E MEMÓRIA DO CENTRO DE ALFABETIZAÇÃO, LEITURA E ESCRITA: ESPAÇO DE PESQUISA E SOCIALIZAÇÃO

Francisca Izabel Pereira Maciel , FAE/UFMG

Esta comunicação tem como objetivo apresentar uma reflexão sobre a constituição e os usos acadêmicos de acervos documentais por parte dos pesquisadores da área da Educação. Um dos problemas enfrentados pelos pesquisadores em história da educação é a dificuldade de acesso a fontes documentais, condição indispensável à reconstituição do nosso passado educacional. Essas dificuldades vêm sendo apontadas pelos especialistas como um dos mais sérios entraves ao avanço da historiografia educacional. Este fato determinou o surgimento, no Brasil, de iniciativas visando o mapeamento de fontes. Graças a este investimento, dispomos, atualmente, de alguns acervos e vários repertórios, guias, etc. Tomados na sua especificidade, como é o do CEALE, os acervos documentais referem-se, pois, a uma ação que se insere num contexto, e evolui num determinado sentido, compreendendo materialidade e formas de apropriação diferenciadas. O Setor de Documentação e Memória do CEALE vem se constituindo, desde a sua criação (1990) diversas coleções, entre elas destacamos a de programas oficiais de ensino de português; de manuais escolares - cartilhas e livros de leitura; de cadernos de alunos e professores; cartazes e jogos de apoio à aprendizagem da leitura,

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de teses e dissertações sobre alfabetização de crianças. Em que pese a singularidade em torno da temática alfabetização, leitura e escrita, o acervo do CEALE têm em comum a preocupação de preparar o terreno para os pesquisadores, o que lhe confere importante papel no desenvolvimento da história da educação, em especial a história da alfabetização e o ensino da leitura pois, como afirmam Nunes e Carvalho, mapear fontes é “preparar o terreno para uma crítica empírica vigorosa”, possibilitando, desta forma, a emergência de novos problemas, novos objetos e novas abordagens. Apesar de sua reconhecida importância para o desenvolvimento da pesquisa, os estudos sobre o papel que os museus e acervos desempenham nesta área, são ainda incipientes. Isto justifica a proposta dessa comunicação, cujo objetivo é discutir o lugar que os acervos documentais vêm ocupando no desenvolvimento da produção acadêmica no campo da educação. Baseando-se “num saber de experiência feito”, resultado do trabalho desenvolvido pelos pesquisadores do CEALE, o Setor de Documentação e Memória do Centro de Alfabetização e Escrita da Universidade Federal de Minas Gerais (CEALE) traduz olhares diferentes acervos e coleções. A partir de um enfoque historicizado, apresentamos uma reflexão sobre as relações entre acervos documentais, pesquisadores e produção de conhecimento, realçando seu potencial como fonte para a produção de pesquisa e saberes no campo da história da educação, as ações empreendidas com este objetivo e os resultados alcançados, e que estes se transformem num instrumento de conhecimento.

AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E A VALORIZAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO NO ESTADO DO CEARÁ NAS DÉCADAS DE 1940 E 1950

Francisco das Chagas de Loiola Sousa, UFC/UFCG

O presente trabalho tem como objetivo construir algumas respostas a respeito do que, de fato, aconteceu com o magistério público cearense em um período da nossa história no qual se considera que o trabalho docente viveu o seu “período de ouro” no País (Therrien, 1998). Para tanto, tomamos para análise as pesquisas desenvolvidas por Américo Barreira (1949), nos anos de 1940, e Joaquim Moreira de Sousa (1961), nos ano de 1950. Além disso, as informações colhidas em jornais cearenses, especialmente sobre a década de 1950, foram bastante úteis para contrabalançar as dúvidas que, por ventura, pudesse existir quanto à confiabilidade das diversas fontes utilizadas na pesquisa (cf. Le Goff, 2002). As análises, ainda provisórias, indicam que esse período de glória do trabalho docente teria sido vivido por um número reduzido de docentes das escolas públicas secundárias cearenses, as quais apresentavam um padrão de excelência no ensino. Nesta perspectiva, as pesquisas que procuram enxergar apenas o funcionamento das escolas de excelência e camuflar a realidade das escolas primárias tomaram, em geral, apenas o status econômico e social diferenciado de parte dos/as professores/as e generalizaram para todo o corpo docente (cf. Dutra Júnior, 2000). No que diz respeito à remuneração dos professores, o valor diferenciado dos salários para trabalhadores da capital e do interior, bem como entre aqueles que atuavam na educação primária e secundária, demonstra que havia uma valorização desigual no magistério público, o que reflete, também, a existência de uma hierarquia entre os diferentes profissionais da educação. A diversidade na formação profissional dos professores da rede pública secundária permite recompor e explicar, em parte, a imagem da docência como atividade socialmente valorizada, até os anos de 1950. Como sacerdotes, médicos, agrônomos, diplomados por Faculdade de Filosofia, contadores, dentistas, advogados, militares de carreira e bacharéis em Ciências Econômicas (cf. Sousa, 1961), os professores da rede de ensino secundária, grosso modo, exerciam o magistério como atividade que lhe proporcionava uma renda complementar. Assim, não era a atividade docente em si que garantia um padrão de vida confortável a alguns professores, mas a outra profissão que o docente exercia paralelamente ao magistério.

IDOSOS: GUARDIÕES DA MEMÓRIA COLETIVA

Francisco de Assis Azevedo dos Santos, Universidade Federal da Paraíba

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A família, a escola, a comunidade e a Igreja são ambientes formativos no desenvolvimento integral das pessoas e, por isso, devem atuar em interdependência. Pois, são nesses ambientes, que as pessoas podem cultivar princípios universais que governam as atividades humanas, como também, os valores éticos, ou seja, respeito, imparcialidade, integridade, honestidade, fidelidade, defesa da dignidade humana, solidariedade, fraternidade e comunhão. E são nessas instituições formais e informais que o idoso e à sociedade, podem conviver em harmonia. Encontrando ai, espaço para a valorização dos talentos da terceira idade.

Essas evidências impulsionaram a realização desta pesquisa com os idosos que freqüentam a pastoral do idoso da Igreja São Pedro Gonçalves, Varadouro, João Pessoa, Estado da Paraíba.

O método adotado para esta pesquisa cientifica foi a da história oral, partindo do pressuposto que os idosos detém um saber avassalador acumulados nas experiências de vida. Para tanto, adotei o referencial proposto por MEIHY (1998. p. 13), onde afirma que a história oral de vida caracterizar-se pela maneira pessoal e particular de registro de experiência. Sem ser simplesmente informativo, nem se propor a revelar totalmente a identidade de um grupo, a história oral de vida se realiza através do dever de se prestar atenção, à sua versão de experiência pessoal.

A delimitação do campo da pesquisa em questão foi dada pela área que o autor da referida pesquisa atua como Assistente Espiritual da Pastoral do Idoso da Igreja São Pedro Gonçalves. O grupo é constituído de 42 idosos com a faixa etária entre 60 a 80 anos. 7 membros são do sexo masculino (16,67%) e 35 do sexo feminino (83,33%). Quanto ao estado civil, 10 são solteiros (23,81%), Casados 17 (40,48%), separados e divorciados 3 (7,14%) respectivamente. A situação econômica dos idosos apontou que 13 idosos recebe menos de 1 salário mínimo (30,95%), 20 recebe entre 1 a 2 salários mínimos (47,62%); 1 entre 2 a 3 salários mínimos (2,38%), 1 idoso recebe entre 3 a 4 salários mínimos (2,38%) e 7 não declarou (16,6%).

As narrativas mostraram que para a maioria dos colaboradores desta pesquisa, a lembrança da infância e a adolescência são marcantes; há um forte teor de religiosidade e as questões sociais, como o desemprego à educação e a saúde marcaram o passado na maioria dos entrevistados e uma boa parte vive o presente com uma forte recordação do passado.

AS REFORMAS POMBALINAS DO ENSINO E A LITERACIA POPULAR: O EXEMPLO DA ESCOLA RÉGIA DE BEJA

Francisco Vaz, Universidade de Évora

A instrução do povo foi um dos factores do nacionalismo dos Estados Europeus, sobretudo a partir de finais de setecentos, embora as suas raízes remontem à invenção da imprensa, que tornou possível o proselitismo protestante e católico do século XVI e seguintes ( Hermet: 1996). Em Portugal, a primeira questão que nos parece pertinente, e que animava o debate entre os pedagogos portugueses, era a de saber se o povo devia aprender a ler. O debate, que se prolonga até à segunda metade do século XIX, pode ser resumido com as conhecidas posições de Verney e Ribeiro Sanches. Enquanto para Luís António Verney, não havia qualquer dúvida sobre a necessidade e urgência de todo o povo, ou pelo menos todos os que usavam "camisa lavada", receberem uma instrução elementar, e portanto aprender a ler e escrever; já para Ribeiro Sanches, o filho do camponês e pastor devia continuar o oficio do pai, considerando os livros e a leitura um elemento perturbador, ou mesmo instigador para abandono do trabalho produtivo. Com esta comunicação procuramos compreender como é que a questão da instrução popular foi encarada nas reformas pombalinas, nomeadamente, como é que a criação das escolas régias se aproximou dos objectivos dos pedagogos e constituiu um primeiro impulso para a literacia popular. Para isso, tomamos como base a relação dos alunos da Escola Régia de Beja, nos anos de 1774-1776, na tentativa de traçar o perfil social dos aluno, bem como de encontrar respostas para algumas das questões levantadas.

CURRÍCULO E DISCIPLINA NO COLÉGIO NOSSA SENHORA DAS DORES: UBERABA 1940-1960

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Geraldo Inácio Filho e Geovana Ferreira Melo Moura, Universidade Federal de Uberlândia

O Objetivo deste estudo foi enfatizar as disciplinas trabalhadas no Colégio Nossa Senhora das Dores, a metodologia de ensino, o valor dos exames e a importância dos conteúdos curriculares na constituição do modelo feminino desejado, de acordo com os objetivos do projeto educacional das Irmãs Dominicanas. O conjunto de documentos (fontes) que consultamos a respeito dos conteúdos curriculares, composto dos Relatórios de Inspeção Permanente, Fichas de Classificação, livros de ata, jornal das alunas, retrata o ambiente cultural vivenciado no Colégio Nossa Senhora das Dores, durante os anos 1940 a 1960. A partir da análise de documentos (metodologia) que configuraram o currículo no Colégio Nossa Senhora das Dores, foi possível observar a intencionalidade dos processos de formação, explicitados em consonância com o “modelo” de aluna que se quis formar naquele determinado contexto, naquela época. Resultados: Apesar da utilização de vários recursos didáticos citados nos relatos, como mapas, painéis, visita aos laboratórios, excursões, as práticas pedagógicas centravam-se na figura do professor, delineando, assim, os contornos de uma pedagogia tradicional, com ênfase na memorização dos conteúdos, predominante naqueles tempos. As avaliações eram realizadas sempre ao final de cada etapa das disciplinas. Havia a prova escrita e a prova oral, além das notas que eram atribuídas às tarefas e, principalmente, ao comportamento. Os exames eram muito temidos pelas alunas, talvez por sua ritualização, pelo caráter formal que se propunha capaz de comprovar sua competência ou sua incapacidade das. As que conseguiam notas melhores detinham certo poder sobre as demais que tiravam médias mais baixas, pois além dos elogios, as “melhores” discípulas eram convidadas a ajudar suas mestras em atividades como: recolher cadernos, distribuir materiais em sala de aula, apagar a lousa, vigilância da turma, dentre outras atribuições. As alunas deveriam dominar o conhecimento, para obterem bons nas avaliações. Aquelas que conseguiam boas notas eram agraciadas com fartos elogios e recebiam medalha de honra. Verificamos que os rigores da disciplina, os conteúdos curriculares intencionalmente organizados, o ritual dos exames, enfim, todos esses atos contribuíram para a formação da mulher preparada para as “doçuras” do lar. Entretanto, essas práticas foram incorporadas de maneiras diversas por cada uma das alunas.

ATRAVÉS DO PERIÓDICO “A PALAVRA” ASPECTOS SOBRE A IGREJA CATÓLICA E A EDUCAÇÃO EM PELOTAS

Giana Lange do Amaral, Universidade Federal de Pelotas

No final do século XIX e primeiros anos do século XX consolidam-se os movimentos anticlericais no Brasil e a Igreja Católica, por sua vez, liberta de uma relação de subserviência ao Estado (advinda do processo de Proclamação da República), realiza reformas internas que ajudam a melhorar sua imagem. Em Pelotas, acompanhando uma tendência organizacional do catolicismo no país, nas primeiras décadas da instalação da diocese (que ocorreu em 1911), houve uma maior preocupação com as atividades clericais e com as atividades voltadas para a educação e para a organização das forças católicas no terreno político. Nesse sentido, foram fundamentais as campanhas ligadas à propagação da “boa imprensa”, à oposição ao ensino laico - com a criação de estabelecimentos de ensino que atendessem várias camadas da sociedade - assim como a criação de organizações político-religiosas como a União dos Moços Católicos (UMC), o Círculo Operário Pelotense (COP), a Liga Eleitoral Católica (LEC) e a Associação Católica de Professores de Cultura Social (ACPCS)

Utilizando-me o periódico católico “A Palavra”, que circulou na diocese de Pelotas de 1912 a 1959, abordo alguns aspectos dessas questões, buscando enfatizar as diretrizes extremamente coercitivas e autoritárias da Igreja aos seus fiéis em relação ao que consideravam a verdadeira “educação cristã”. Especificamente no que tange à educação escolar, obrigava-os a enviar seus filhos a escolas católicas e era categoricamente contrária ao ensino ministrado em escolas de ensino laico ou sob orientação de outras religiões.

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CONGREGAÇÕES RELIGIOSAS FEMININAS E SUAS INICIATIVAS EDUCACIONAIS CIRCUNSCRITAS NA REGIÃO CARBONÍFERA -SC/BRASIL

Giani Rabelo

A pesquisa investiga a atuação das congregações religiosas femininas católicas na educação de crianças, no sul do estado de Santa Catarina, Brasil, mais precisamente na Região Carbonífera, a partir dos anos de 1930. A região é assim conhecida pelo fato de ter na exploração do carvão mineral a origem de seu desenvolvimento econômico. Engloba os seguintes municípios: Criciúma, Içara, Cocal do Sul, Urussanga, Morro da Fumaça, Siderópolis, Treviso, Forquilhinha, Nova Veneza e Lauro Muller. Entre as congregações femininas que atuaram na região no campo da educação e da assistência e saúde, destacam-se as seguintes: a primeira congregação a chegar foi a das Irmãs Escolares de Nossa Senhora (1935); a segunda foi das Irmãs Beneditinas da Divina Providência (1936); a terceira foi a das Pequenas Irmãs da Divina Providência (1955); a quarta foi a das Pequenas Irmãs Missionárias da Caridade (1956); a quinta foi a das irmãs do Instituto Coração de Jesus (1956), a sexta foi das Irmãs Filhas do Divino Zelo (1959) e por último foi a das irmãs do Instituto das Apóstolas do Sagrado Coração de Jesus (1996), único que não atuou na educação, ficando com a responsabilidade de administrar um hospital. Dentre as que atuaram na educação, as primeiras congregações foram convidadas para auxiliarem no processo de colonização, por isso vieram a convite do núcleo de imigrantes italianos e alemães, chegando nos anos de 1930. As que chegaram nos anos de 1950 foram convidadas pelo Serviço Social da Indústria -SESI, que as mantinha e atuavam junto às Vilas Operárias organizadas no entorno das minas de carvão. Pretende-se investigar, a partir das memórias, o processo de implantação das atividades educacionais, abordando os seus significados para aqueles que foram sujeitos na construção dessas experiências, principalmente das religiosas. Também se investigará as concepções pedagógicas que norteavam os trabalhos desenvolvidos. O estudo será realizado na perspectiva da História Cultural, a partir dos fundamentos teóricos trazidos por Certeau, Chartier, Le Goff. A questão da Memória será trabalhada com base em autores como Ecléa Bosi, Adélia Bezerra de Meneses, Dominique Borne e outros. Em relação às atividades educacionais desenvolvidas pelas Congregações Religiosas Femininas no espaço circunscrito nas Cidades, buscar-se-á elementos nos trabalhos de Maria José Rosado Nunes, Eliane Marta Teixeira Lopes, Richard Sennett, Milton Santos entre outros. As questões metodológicas serão desenvolvidas à luz das reflexões de autores como Gaston Bachelard, Carlo Ginzburg, Maria Helena Câmara Bastos, Marta Chagas de Carvalho e outros.

MUDANÇAS DA DINÂMICA SOCIAL BRASILEIRA E SEUS REFLEXOS NO COTIDIANO EDUCACIONAL NO PERÍODO DE 1880-1901

Gilson Ruy Monteiro Teixeira, UESB

A criação do Imperial Colégio de Pedro Segundo no Município da Corte, em 1836, representa o início, no Brasil, de um processo de criação do ensino secundário oficial que começou a dar, efetivamente, os seus primeiros passos nas últimas décadas do século XIX. Na base dessa experiência estavam o ensino secundário francês e o ideal educacional jesuítico. A similaridade idearia entre secundário francês, Ratio Studiorum e Imperial Colégio de Pedro Segundo, à luz dos estudos de Basil Bernstein, tem como raiz histórica a herança medieval da divisão dos estudos em trivium (estudo da palavra - pessoa) e quadrivium (estudo do mundo - social), o que transforma os estudos em um movimento pendular entre o interior e o exterior, facilitando o controle simbólico do cristianismo católico medieval, que assim mantêm a sua hegemonia baseada na presença onipresente de Deus em todos os aspectos da vida da pessoa e da sociedade. Leonel de Franca, no estudo introdutório à publicação da versão brasileira da Ratio Studiorum da Companhia de Jesus, apresenta uma série de semelhanças entre a Ratio e o ensino secundário francês nascente. O autor explica que tamanha semelhança deve-se a um ponto em comum: a experiência educacional dos Irmãos da Vida em Comum, o que também é reforçado pelo estudo de David Hamilton sobre a origem dos termos classe e disciplina. Uma breve análise da tábua das matérias do Colégio de Pedro Segundo e da disposição destas ao longo dos anos e das classes, facil

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mente comprova tal estrutura. Uma questão emerge ao se tomar essa realidade como elemento balizador do sistema educacional nascente: qual a influência da estrutura de ensino medieval-católica sobre o ensino nacional no século XIX? É fato que essa influência é quase nula, porém existe. Aliada a essa problemática uma outra se faz presente. No final do século XIX inicia-se no Brasil uma série de acontecimentos que irão promover transformações significativas na vida nacional. Tais fatos acabam por favorecer o surgimento de uma pungente e intensa vida nas cidades, dando origem a um lento processo de urbanização da vida brasileira. Se se considerar que a divisão do ensino inspirada na dinâmica medieval-católica tem sua origem e se serve mais a uma sociedade rural, então a nova realidade nascente exigirá mudanças na estrutura de ensino proposta pelo e para o Colégio de Pedro Segundo no final do século XIX. Portanto, a partir de pesquisas sobre o Colégio de Pedro Segundo, o objetivo desta comunicação é apresentar resultados preliminares sobre as mudanças da dinâmica social brasileira e seus reflexos no cotidiano educacional daquela instuição

OS COMPÊNDIOS E A INSTRUÇÃO PÚBLICA: LIÇÕES PARA CIVILIZAR NA CORTE IMPERIAL (1854 A 1877)

Giselle Baptista Teixeira, IC/ FAPERJ/ UERJ

O presente trabalho tem como objetivo refletir acerca do papel desempenhado por livros didáticos que eram utilizados nas escolas primárias da Corte Imperial. Busco investigar quais modelos de formação de alunos que se desejava construir no processo de criação e consolidação do Estado Nacional brasileiro e também de institucionalização da ordem escolar. Trabalho com a hipótese de que os livros funcionavam como um dos principais instrumentos para concretização dos projetos educacionais existentes, sendo utilizados tanto pelos professores, como uma espécie de “guia” no ensino dos saberes escolarizados, como pelos alunos em suas práticas ordinárias. Para cumprir tal função, havia um forte controle sobre esta literatura, o que fica evidenciado no Regulamento de 17 de fevereiro de 1854, que regia a instrução primária e secundária da Corte, pelo qual só poderiam ser admitidas nas escolas públicas e particulares obras autorizadas pelo Conselho Superior de Instrução.

O Estado Imperial procurava deixar claro a direção pretendida nas leis e discursos formulados, cujo interesse era o de modelar cidadãos, corrigindo os supostos “defeitos” das diferentes culturas existentes, tentando produzir uma aculturação da população, funcionando o livro, então, como um dos principais veículos de transmissão dos valores e da moral desejada. A regulação dos “livros escolares” passava igualmente pelo governo que dava incentivo a sua criação ao garantir prêmios a quem os compusessem, na medida em que fossem condizentes com os programas estabelecidos, estímulo estendido aos que melhor traduzissem os publicados em língua estrangeira, fato que provavelmente contribuiu para a expressiva produção destas obras no século XIX.

A ampla circulação destes livros é apontada na significativa massa documental da Série Instrução Pública do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro dentre os quais, há variados exemplos da sujeição ao regulamento vigente como: um conjunto de cartas de autores oferecendo suas obras para adoção nas escolas, contendo algumas, permissão para alterações consideradas necessárias à aprovação; pareceres, positivos e negativos, referentes à aceitação destas, emitidos a pedido do Conselho Superior de Instrução; ofícios de professores e delegados de províncias solicitando determinados livros autorizados para uso nas escolas, indicando assim, quais eram os mais requeridos em um dado momento, bem como as modificações ocorridas. É possível também verificar nesses materiais relevantes dados como o amplo oferecimento e pedidos de livros traduzidos, como uma escassa, mas presente produção de compêndios elaborados por mulheres ao lado da existência de autores com mais de uma produção, sinalizando assim para uma necessária investigação das condições que produziram essa situação.

Por meio de um cruzamento destes múltiplos documentos, juntamente com os textos normativos e os discursos presentes nos manuais, podemos melhor compreender o movimento e a importância das “lições para civilizar” na configuração de uma determinada sociedade e cultura escolar.

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MULHER NEGRA E EDUCAÇÃO. UM ESTUDO DE ARQUETÍPOS DO FEMININO NEGRO

Gislene Aparecida dos Santos, UNESP

Nesse trabalho discuto a constituição de um modelo feminino negro. Investigo como esse feminino seria vivido em uma sociedade em que o negro é tomado como signo do negativo. E pergunto como poderíamos pensar em formas de educação da mulher negra que garantiriam a construção de personalidades autônomas e apaziguadas com sua auto-estima, capazes do amor de si.

Inicio considerando que a sociedade brasileira produz uma forma de racismo que pode ser tomada como mascarado. Ou seja, um amontoado de fatos e sentidos que, ao serem recobertos, impediriam de compreender o funcionamento da sociedade como se uma máscara fosse colasse a face de todos (brancos ou negros) impondo o desejo de ser um: de ser o branco. A brancura aqui entendida não somente como 'cor' de pele, mas como símbolo hegemônico da cultura, da beleza, da razão, da felicidade, do ser.

Os valores racistas em relação aos negros são os da negação, da criação de estereótipos, da violência fisica e psíquica. O negro mascarado, perpetua a negação, a violência, a estereotipia contra si e contra os outros. Isso nos remete ao mais cruel de todos os conflitos que é quando o negro se toma incapaz de amar a outro negro e vive a dor de não poder amar sequer a si próprio.

Diante das várias possibilidades de relacionamento entre indivíduos negros e não-negros, optei, por tratar especificamente da relação da mulher negra para com o homem branco visando a compreender os componentes psíquicos presentes em um relacionamento em que uma das partes é identificada (social, cultural e psiquicamente) com os valores positivos e outra com os valores negativos. Meu foco não é o casal, mas os sentimentos de uma determinada categoria de mulheres negras em relação ao homem branco. Mulheres que portam a máscara do racismo e, por isso, padecem por não poderem se reconhecer, olhar, por serem defensivas, identificadas com os valores do branco, não poderem amar a si mesmas e por isso projetarem sua salvação t1sica, psíquica e social em uma possível união com o branco. Destaco as diferenças entre gênero e raça, afirmando suas especificidades.

Concluo considerando que, para impedir a descaracterização do feminino negro, seria necessário uma educação que enfocasse as características das mulheres negras e à cultura africana e afro-brasileira de modo a que, desde a mais tenra infância, se pudesse valorizar as qualidades das mulheres negras como referências positivas para a construção de uma imagem positiva de si.

O COLÉGIO NOSSA SENHORA DO AMPARO E O PROJETO SIQUEIRANO DE EDUCAÇÃO FEMININA

Gislene Taveira de Almeida Neves, Universidade Federal de Uberlândia

“Educar o homem não é outra coisa mais do que conduzí-lo pelo caminho do amor[...]. Portanto, a matéria da educação é a direção do amor. Da boa direção do amor, isto é, da educação, pendem a paz e a felicidade do gênero humano.” (Pe. Siqueira)

O objetivo primordial desta pesquisa é promover a problematização da história do Colégio Nossa Senhora do Amparo, fundado na cidade de Monte Carmelo (MG), pelas Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora do Amparo, no ano de 1939, período em que o Brasil se encontra sob a ditadura do Estado Novo Getulista.

Tem sido nossa diretriz na busca da compreensão deste universo escolar, as proposições teóricas da Nova História Cultural, particularmente sob a ótica das abordagens propostas por Roger Chartier, entendendo como possível pensar a história sob o ponto de vista das representações sociais, que se articularm enquanto mecanismos forjados no interior de relações permeadas pelo embate, na

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prática de sujeitos históricos que se manifestam na aceitação/reelaboração e/ou rejeição/resistência aos papéis que lhes são, de diversas formas, “impostos” ou “oferecidos” como adequados ou convenientes.

É sob esta perspectiva que temos analisado a construção histórica da instituição escolar apontada, tentando apreendê-la enquanto processo intimamente ligado ao projeto que lhe deu origem - o projeto educativo criado pelo Padre João Francisco Siqueira de Andrade, em fins do século XIX, para a educação de “meninas órfãs e desvalidas”, na cidade de Petrópolis (RJ).

Ressaltamos sob este contexto, uma das questões relevantes deste trabalho de pesquisa: a identidade desta Congregação religiosa católica, com data oficial de criação em 22 de Março de 1886, enquanto congregação exclusivamente brasileira, idealizada por um padre brasileiro, especificamente para conduzir um projeto educativo, tendo entre suas principais preocupações, preparar meninas pobres para o mundo do trabalho, incluindo aí a formação de professoras, “nacionais”. Acreditamos ser este fato significativo, em vista da presença marcante de congregações religiosas de origem estrangeira no país, em fins do século XIX, e sendo igualmente expressivo o número de escolas aqui fundadas por estas, num momento em que a Igreja Católica, sob linha de conduta de um projeto reformista, se empenhava em reafirmar sua presença no cenário brasileiro através de inciativas no campo da educação.

É ainda proposta deste trabalho abordar a vivência de mulheres-freiras enquanto sujeitos sociais com grande autonomia em seus espaços de viver-educar, bem como abordar a formação feminina para o magistério enquanto alternativa possível na busca por afirmação profissional, num universo social marcadamente masculino.

Enfim, o que se propõe é trazer a público a análise histórica de uma instituição escolar confessional católica, considerando-a, entretanto, em suas particularidades, enquanto um fio a mais na tessitura da história da educação brasileira. Assim, micro e macro se interpenetram, se interpelam, se imiscuem em frestas de uma história que se constrói entre sinais e leituras de um passado que provocam sempre um novo olhar, um novo percurso pelos caminhos da pesquisa histórica.

REFORMAS EDUCACIONAIS, MÉTODOS DE ENSINO E CIVILIDADE REPUBLICANA NO PARANÁ: OS MÉTODOS NO ENSINO INFANTIL E NA ESCOLA PRIMÁRIA NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Gizele de Souza, UFPR

Este trabalho é fruto parcial das pesquisas realizadas para a construção da Tese de Doutoramento que discute a cultura escolar dos jardins da infância e da escola primária no estado do Paraná, nas duas primeiras décadas do século XX, vinculada ao curso de Pós-Graduação em Educação: História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O texto em questão trata das propostas de reformas educacionais implementadas no estado do Paraná voltadas à instrução pública nas duas primeiras décadas do novecentos e os métodos de ensino divulgados, aplicados e propagados para o ensino infantil e escola primária. O objetivo deste é examinar os métodos de ensino destinados à educação infantil, em especial, aos jardins da infância e às escolas primárias no limiar do século XX como parte das reformas educacionais propostas para a instrução pública paranaense e como expressão de um modelo de civilidade republicana. O texto percorre a vários momentos político-pedagógicos da instrução pública paranaense, como a constituição dos jardins da infância e dos grupos escolares nos primeiros anos do novecentos, a defesa do método intuitivo para a educação da primeira infância (ênfase na proposta froebeliana) e para o trabalho na escola primária, a implementação da seriação do ensino nos anos 10, a construção de grupo escolar modelo e a aplicação do método analítico, campanhas contra o analfabetismo nos anos 20 e defesa do método analítico para a instrução primária, substituição do método froebeliano para o método montessoriano na educação infantil. As fontes consultadas são fundamentalmente primárias, de natureza governamental, como os Regulamentos da Instrução Pública Paranaense e Códigos de Ensino publicados nas primeiras décadas do século XX, Relatórios da Secretaria dos Negócios do Interior, Justiça e Instrução Pública, bem como da Diretoria Geral do Ensino e instâncias correlatas. Outra fonte contemplada no trabalho é referente a matérias da imprensa local. As referências

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conceituais sobre os métodos de ensino são tomadas por dicionários e tratados de Pedagogia e pela produção específica da historiografia educacional.

POSSIBILIDADES E DESAFIOS PARA MUSEUS UNIVERSITÁRIOS: UM MUSEU JURÍDICO

Glacyra Lazzari Leite, Faculdades Integradas de Guarulhos - FIG - Guarulhos - SP.

A gradual transformação que vem sofrendo o conceito de museu, está relacionada às mudanças de compreensão da sociedade sobre os fenômenos culturais. Um museu auxilia a preservação da memória, privilegiando objetos tridimensionais O acervo museulógico se constrói dentro de uma realidade histórica e sua individualização (pelo controle de acervos de natureza diversa) delineia o perfil da instituição que o acolhe, bem como, a inserção desta na comunidade mais ampla. Muitas vezes, o recebimento de coleções é o que impulsiona o surgimento de museus Museus universitários são instituições científicas, com responsabilidades culturais e sociais junto à comunidade que lhes proporciona apoio, matéria-prima e desafios constantes. Nesse sentido as coleções, enquanto suportes de informações, são instrumentos notáveis de integração, de interdisciplinaridade e transdisciplinaridade, prestando-se a um trabalho de pesquisa, de ensino e de extensão. em diferentes áreas do conhecimento que transcendem às estruturas curriculares.. O "Museu Jurídico Desembargador Dirceu de Melo" foi criado em 1998 junto ao Curso de Direito das Faculdades Integradas de Guarulhos - FIG - Guarulhos - SP. A sua criação teve por objetivo auxiliar a pesquisa e a preservação da memória da cidade de Guarulhos, da Comarca, das Faculdades Integradas de Guarulhos e do curso de Direito. O seu acervo engloba coleções voltadas para a memória dessas instituições. O presente projeto em andamento intitulado "Possibilidades e desafios para museus universitários, visa recuperar, reorganizar, divulgar e pôr à disposição da investigação científica o acervo do Museu Jurídico Desembargador Dirceu de Melo. Na reorganização das coleções propõe-se privilegiar uma linha de pesquisa temático/cronológica assim distribuída: Cidade de Guarulhos - Comarca de Guarulhos - Faculdades Integradas de Guarulhos - Curso de Direito.A concretização dos objetivos deverá se desdobrar em etapas com vistas à estruturação das linhas de pesquisa, desenvolvimento de projetos que serão facilitados pela organização do arquivo eletrônico e a concretização de exposições segundo a proposta temático/cronológica.O trabalho permitirá um entendimento das diretrizes que motivaram a criação do Museu Jurídico Dirceu de Melo, do empenho no seu desenvolvimento e das possibilidades a serem perseguidas como móvel de desenvolvimento da pesquisa.

BIBLIOGRAFIA

ANAIS I SEMANA DOS MUSEUS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, São Paulo, USP, 18/22 de maio de 1997, 1999.. (passim)CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO 25 DE ABRIL Portugal, Universidade de Coimbra (http://www.uc.pt/cd25a/25ahome.html) CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO DA UNESP - CEDEM - São Paulo, UNESP.

REFORMA ORESTES GUIMARÃES: 1911-1930: APOSTA DO ESTADO DE SANTA CATARINA NA FORMAÇÃO DO CIDADÃO REPUBLICANO

Gladys Mary Teive Auras, UDESC

Esta pesquisa investiga a reforma curricular empreendida na Escola Normal Catarinense pelo professor paulista Orestes Guimarães, especialmente contratado pelo governador Vidal Ramos, no ano de 1910, para modernizar a instrução pública, adequando-a ao projeto modernizador republicano. A citada reforma teve como carro-chefe os pressupostos do chamado método de ensino intuitivo ou lições de coisas. Como este método foi incorporado ao novo traçado curricular é a preocupação

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central deste trabalho, o qual, alicerçado no entendimento de currículo como todas as ações e relações existentes na escola, as quais irão assegurar o nexo íntimo entre educação e identidade social, entre escolarização e subjetividade e no conceito de habitus, de Pierre Bourdieu, busca compreender como, através da inclusão de novos saberes e de novas práticas pedagógicas, pretendeu-se incutir nas/os modernas/os professoras/es, um corpo comum de categorias de pensamento e de ação, necessárias à “missão” que os republicanos lhes outorgaram: a de instaurar nos recém criados grupos escolares, uma nova cultura escolar, capaz de produzir o novo homem, para uma nova era, “do progresso e da ordem”, não qualquer homem, mas uma espécie muito particular: o cidadão republicano. Para tal análise, são privilegiados os documentos produzidos pelo professor Orestes Guimarães; leis, decretos, mensagens, sinopses, relatórios, programas e regimentos produzidos por autoridades governamentais, bem como os livros didáticos adotados, manuais escolares, cadernos, fotografias, jornais, revistas, e também depoimentos de normalistas egressos/as da Escola Normal Catarinense (1911-1930). Quanto a pesquisa bibliográfica foram privilegiadas as obras que analisam a escola normal no Brasil e em Santa Catarina; o contexto sócio-político-cultural e econômico da primeira República; obras sobre o método intuitivo ou lições de coisas, além, evidentemente, das obras dos autores-base da análise/investigação: Bourdieu, Lahire, Vincent, Chapoulie, dentre outros.

PÚBLICO E POPULAR NA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO. INVESTIGANDO PROJETOS DE EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL/RS, NOS ANOS 80

Gomercindo Ghiggi, U. Federal de Pelotas /RS; Jussemar Gonçalves, Fundaçăo Universidade de Rio Grande/RS

Este estudo problematiza a pesquisa em educação popular; faz um breve levantamento da construção do povo-popular na tradição brasileira e articula tais variáveis a uma proposta de pesquisa. Historiar e reconstruir práticas de educação popular no RS (Cachoeirinha e Pelotas/anos/80); elaborar categorias para investigar a Historia da Educação Popular/RS; investigar, através de análise documental e entrevistas, avanços obtidos, interferências políticas que surgiam entre as secretarias de educação (SMEs), com práticas populares, e sistemas de poder municipal; investigar a relação público/popular a partir de institucionalização na década de 80; examinar a presença/ausência do popular nas políticas públicas de educação; inquirir as razões pelas quais, embora em condições favoráveis, o popular não foi institucionalizado suficientemente; e pôr em diálogo práticas sociais e investigativas para compreender a ausência/presença do popular nas políticas públicas estatais de educação, são objetivos que nos orientam.

O que diferencia Cachoeirinha de Pelotas é que a primeira experiência esteve voltada para o trabalho político e pedagógico da SME. Em Pelotas, grupos de militantes dos movimentos sociais e das CEBS ingressaram na SME com a finalidade de implantar projeto de educação popular. Em 1983, na instalação do governo municipal, o grupo da SME participou ativamente na elaboração de um projeto de ação administrativa municipal para viabilizar a participação popular: foi o Programa de elaboração do Orçamento Participativo, Todo o Poder Emana do Povo. Boa parte dos investimentos político-pedagógicos da SME (1983/1985) buscaram viabilizar um programa de participação e educação popular em nível geral no Município de Pelotas.

O estágio atual da investigação - entrevistas com sujeitos que participaram da experiência, professores e diretores de escolas municipais etc, além de análise documental - possibilita concluir que o grupo da SME aceitou o desafio (de maneira pura, cristã e civilizatória) de interferir no quadro geral da participação popular. Dados preliminares indicam os acertos político-metodológicos que se revelaram na primeira fase do projeto: a população reconheceu o Todo o Poder Emana do Povo como uma alternativa de participação no exercício do poder, particularmente na feitura do orçamento municipal. A ruptura (1985) dá-se quando a SME procura manter a radicalidade do projeto, da expressão e da presença do popular nas políticas públicas municipais e no exercício do poder, enquanto o centro do poder adere à tese de que nem tudo precisa ser decidido pela população.

O PENSAMENTO PEDAGÓGICO DE JOÃO DE DEUS RAMOS

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Graziela Barreto, Fac. de Cięncias da U. de Lisboa

Nasce em Lisboa, a 26 de Abril de 1878, filho do grande poeta João de Deus e de D.Guilhermina Battaglia Ramos. Em 1902, tão logo conclui o curso de Direito na Universidade de Coimbra, dedica-se à propaganda do ensino popular e em especial à expansão da Cartilha Maternal, método de ensino da leitura da autoria de seu pai.

Nesta época, em que fervilhavam as ideias das "Escolas Novas", desloca-se ao estrangeiro em companhia do amigo João de Barros. Nessas longas e demoradas viagens de estudo e após observação cuidada de vários métodos e processos de ensino, João de Deus Ramos formula uma conclusão: a de que a cada povo deve corresponder um método próprio, específico, e que o método português era o que o seu pai havia criado. Condena "a cópia servil do que se faz lá fora, do que se faz no estrangeiro", preferindo guiar-se por "ideias próprias". Defende que a escola infantil é "o desdobramento da escola primária popular, como qualquer outra que vise a ensinar e educar gente portuguesa". (Ramos, 1940, pp. 18-19).

Defende a criação de uma estrutura própria, bem portuguesa, onde se enquadrassem os nossos métodos, ou seja, onde fosse possível a melhor aprendizagem da leitura e da escrita tal como a preconizara João de Deus. A orientação pedagógica entroncava na escola popular de Pestalozzi e no Kindergarten de Fröbel, princípios pedagógicos tomados universais, os mesmos "princípios que também haviam orientado o autor da Cartilha Maternal" (Ramos, 1938, p. 3).

Ao defender a preservação da identidade cultural e os valores nacionais, Ramos (1918, p. 416) idealiza um modelo de escola diferenciadamente portuguesa, com o objectivo primeiro de "iniciar uma corrente nacional e nacionalizadora do ensino, ao mesmo tempo que se definisse bem o lugar e o valor do método João de Deus na escola portuguesa". Funda então "uma escola tipo, uma escola modelo", como lhe chamou João de Barros (s/d, p. 83), a que foi dado o nome de Jardim-Escola João de Deus.

Diz João de Deus Ramos: "O nosso sistema é mais apropriado ao meio português. Parti da Cartilha Maternal e tratei de organizar e sistematizar um método adequado às crianças dos quatro aos oito anos. Sem renegar o que é adoptável ou adaptável da experiência universal, procurei sobretudo criar um sistema nacional." (Primeiro de Janeiro, 1951, Junho, 1)

Desde a arquitectura à decoração tudo foi pensado e estudado. Adoptou o traçado da casa portuguesa da classe média, sendo a arquitectura dos Jardins-Escola da autoria de Raul Lino. Ramos (1938, Abril, 23) defendia que "a sensação do ambiente -higiénico, confortável e de bom gosto - é tão útil à saúde do corpo como à saúde do espírito".

Acreditava que a criança aceitaria melhor a escola se a fisionomia arquitectura lhe lembrasse a sua casa. O edifício escolar deveria ser cercado por um grande jardim, onde houvesse flores e árvores e um espaço onde se pudesse cultivar legumes e flores. O vestuário também não foi descurado; como o jardim-escola era frequentado por crianças de todas as classes sociais, estas deveriam usar bibes, azuis às riscas para os rapazes e vermelhos também riscados com uma gola branca, para as meninas. Como calçado, todos usavam alpergatas cinzentas.

Os jardins-escola eram frequentados por crianças dos quatro aos oito anos, divididas em três secções, conforme a idade. A primeira secção, ou dos "Viveiros", era a dos mais pequeninos, dos 4 aos 5 anos; a segunda secção, dos 6 aos 7 anos e, finalmente, a terceira secção, dos mais velhinhos, dos 7 aos 8 anos. Para cada grupo etário havia um programa especializado.

João de Deus Ramos propugnava a necessidade de educar moralmente a criança antes de a instruir, assumindo que a finalidade do ensino infantil é o desenvolvimento integral da criança, do ponto de vista fisico, intelectual e moral. A Educação, afirma Ramos (1939, p. 8), "principia logo que os sentidos se apontam para ver, ouvir, e tocar o mundo exterior".

O desenvolvimento intelectual realiza-se através da educação dos sentidos, da habilidade manual e da cultura mental. Nos "Viveiros", a educação dos sentidos faz-se por intermédio de jogos organizados para esse fim, os chamados "dons de Fröbel", jogos que a criança pratica com entusiasmo, como que brincando, mas cujos princípios lhe vão gradualmente fornecendo os estímulos necessários ao progresso intelectual. As canções, as danças, a expressão gestual, os contos, as marchas, o desenho, os trabalhos manuais, são outras tantas actividades de que a criança usufrui.

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Na "segunda secção" as actividades intensificam-se, tornando-se mais específicas, e as crianças adquirem hábitos de trabalho. Para além das lições de coisas, dos trabalhos manuais, da modelagem, do desenho e da ginástica, iniciam a aprendizagem da leitura pela Cartilha Maternal, da escrita das letras e dos algarismos, sempre em cadernos especiais, sendo ainda iniciadas na aritmética e no cálculo. Aos oito anos, a prática destas actividades é ainda mais intensificada.

João de Deus Ramos (1938, Abril, 23) condena a disciplina autoritária. É contra prémios e castigos e defende a "obediência activa", segundo a qual "a criança deve obedecer porque respeita e não porque teme".Criou e inaugurou onze Jardins-Escola João de Deus: Coimbra (1911), Figueira da Foz e Alcobaça(1914), Lisboa (1915), Alhadas (1927), Leiria e Castelo Branco (1936), Viseu (1943), Mortágua e Chaves (1948), Porto (1951).

Para dar forma ao seu sistema educativo reconhece que é indispensável haver professoras especializadas nos jardins-escola. Em 1943, Ramos cria o primeiro curso de educadoras de infância em Portugal, o "Curso de Didáctica Pré-Primária pelo Método João de Deus", com o objectivo primeiro de abranger a doutrina educativa, teórica e aplicada dos jardins-escola, visando à expansão e aperfeiçoamento dos processos adoptados ou a adoptar designadamente no que diz respeito ao método de leitura e escrita de João de Deus.

Em 1928, João de Deus Ramos cria "O Bairro Escolar do Estoril", projecto inspirado na "École des Roches". Aqui, procuraria mais uma vez fomentar a identidade nacional, desde logo na concepção arquitectónica inspirada no modelo da "casa portuguesa", a cargo do arquitecto Raul Lino, tal como acontecera já com os jardins-escola.

POLÍTICA EDUCACIONAL: A INTERMEDIAÇÃO DE INTERESSES E OS CONSTRANGIMENTOS INSTITUCIONAIS - O CASO DE SERGIPE

Helcimara de Souza Telles, Universidade Federal de Sergipe

Nos projetos gestados pelo Estado brasileiro, historicamente a educação emergiu como instrumento da modernização econômica e política, e se destacou como variável determinante do processo de racionalização da ordem pública. Mas, este modelo educacional redundou em ações políticas díspares e, em que pese a agenda de implementação desses princípios normativos, o Estado funcionou mais como o "fundador de escolas" do que como o impulsionador de um "projeto educacional civilizatório". Esta tensão pode ser explicada a partir dos aspectos político-institucionais que nortearam a incorporação política dos atores emergentes e pelas formas predominantes de articulação entre o Estado e a sociedade civil. A herança corporativa brasileira, baseada na setorização dos interesses e no predomínio de perspectivas de curto prazo, conformaram uma estrutura estatal permeável ao clientelismo e ao corporativismo e vulnerável aos interesses empresariais, o que resultou em redução da capacidade do Estado para executar políticas universais e reformistas.

O ambiente em que as políticas públicas foram elaboradas se modificou e, no processo de redemocratização da sociedade brasileira, emergiram novos atores que reforçaram as pressões pela universalização dos direitos à educação e questionaram as políticas promovidas pelas arenas institucionais. Mas ainda persiste o potencial para o uso clientelista dos recursos alocados para a educação, pois há elementos estruturais e institucionais no Brasil que limitam estratégias redistributivistas e universalistas. Em função da persistência destes elementos, na formulação de políticas públicas, os representantes políticos tendem a agir por conta de incentivos específicos, desconsiderando os "bens públicos". Ainda que apoiem projetos educacionais "modernizantes", os representantes não necessariamente agem no sentido de viabilizá-los, e as propostas educacionais "modernizadoras" somente são incrementadas se estiverem em conformidade com os interesses pessoais dos parlamentares.

Com a análise da política educacional incrementada pelo executivo de Sergipe, na década dos 90, pretende-se demonstrar : (i) a permanência do conflito acerca das premissas normativas que devem nortear um projeto educacional; (ii) ainda que as áreas de discussão tenham sido ampliadas, o processo decisório ocorre em arenas restritas; (iii) as demandas particularistas se sobrepõem ao "bem público", pois persiste a dicotomia entre de um lado a elaboração de um projeto educacional

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"modernizador e universal", e de outro os conflitos de interesses envolvendo os representantes na Assembléia Estadual; (iv) a distribuição dos recursos alocadas para a educação, em conexão com os interesses eleitorais dos representantes.

A IMPORTÂNCIA DO ESPAÇO ARQUITECTÓNICO NAS PRÁTICAS E QUOTIDIANOS ESCOLARES

Helena Ferra, Fac. de Psicologia e Cięncias da ED.- VP

Nesta comunicação pretende-se olhar e problematizar o ensino superior de uma forma que, não sendo totalmente inovadora, não é muito visível na maioria dos debates que sobre ele decorrem.O tema sobre o qual incide esta reflexão relaciona-se com a organização do espaço arquitectónico escolar, aqui encarado como um das dimensões fundamentais e potencialmente condicionadoras das práticas e quotidiano escolares.

Qualquer contexto que enforma uma qualquer realidade educativa tem sempre dois vectores que nem sempre têm merecido a mesma atenção, por parte da comunidade cientifica. Isto porque o vector tempo é sempre mais valorizado nas análises do que o vector espaço - os tempos de “mudança” são sempre mais valorizados que os espaços de “permanências” . Nesta pequena reflexão pretende-se dar um maior realce ao espaço arquitectónico interior das instituições de ensino superior, não descurando contudo o diálogo que se estabelece entre esse mesmo espaço e o espaço circunvizinho.

A preocupação de olhar para o espaço interior, e para a forma como ele se organiza, advém do facto de considerarmos ser este um dos aspectos fulcrais que condiciona não só as práticas pedagógicas como também o próprio quotidiano das instituições escolares.

Este condicionamento será enquadrado num duplo eixo. Num primeiro momento procuraremos fazer um quadro histórico do arranjo dos espaços escolares ao longo dos tempos, tentando com isso responder à questão da possibilidade de classificar os espaços escolares; num segundo momento atentaremos às repercussões que espaço escolar tem quer na forma como se ensina e aprende, quer na qualidade das relações sociais entre os vários actores da comunidade escolar

A CONTRIBUIÇÃO DE ARMANDA ÁLVARO ALBERTO À EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL

Helena Ibiapina Lima, Universidade Católica de Petrópolis PROEDES/UFRJ

A comunicação objetiva analisar vida e obra de Armanda Álvaro Alberto, destacando realizações e a forma como divulgou seu pensamento. O trabalho amparou-se em fotografias, fontes documentais e textuais que se encontram no PROEDES/UFRJ. Armanda nasceu no Rio de Janeiro, em 1892, falecendo na mesma cidade em 1974. Pertencia a uma família de classe média alta. Aos 36 anos casou-se com Edgar Süssekind de Mendonça, não adotando o sobrenome do marido para ser coerente com posição defendida pelo movimento feminista brasileiro. Era uma mulher culta, com espírito criador e independência intelectual. Em 1932, assinou o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, cujo objetivo era propor diretrizes para a educação nacional. Em 1919, iniciou-se como educadora, em Angra dos Reis (Rio de Janeiro), instalando provisoriamente uma escola baseada em idías montessorianas, que buscava criar condições de aprendizagem para a criança agir, trabalhar, experimentar e descobrir. Armanda se projetou definitivamente no cenário educacional brasileiro em 1921, através da criação de uma escola na zona rural do Rio de Janeiro - voltada para uma população de vida extremamente precária - que recebeu o nome de Escola Regional de Meriti, cuja orientação geral podia ser resumida em quatros princípios: saúde, alegria, trabalho e solidariedade. Embora não existam registros de sua vinculação a partidos políticos, em 1931, a imprensa nacional a identificou como subversiva e comunista, por sua atuação no 2º Congresso Internacional Feminista (Rio de Janeiro). Os problemas se agravaram e, em 1935, as acusações resultaram em sua prisão, na Casa de Detenção. A obra de Armanda sofreu influências oriundas: da

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família, inspirada no espírito humanitário de seu pai e na abertura a novos desafios de sua mãe; do contato íntimo com questões sociais brasileiras e do interesse pelas ciências naturais. Entendeu, desde os primórdios da Escola, que era impossível cuidar da educação das crianças, ignorando o contexto social no qual a escola se inseria. Assim sendo, organizou o Circulo de Mães que permitia estabelecer contato com as famílias, oferecendo cursos sobre saúde, educação familiar e economia doméstica. Nessa linha, Armanda realiza no Brasil a reforma que Montessori conseguiu na Itália, com uma diferença: a educadora brasileira contava apenas com seu esforço e com a participação dos sócios da Fundação Álvaro Alberto.

A instituição sofreu transformações durante quatros décadas de funcionamento, permanecendo fiel ao propósito inicial de servir à população. Após enfrentar sérios problemas financeiros, foi absorvida em 1971 pelo Instituto Central do Povo.

O PROJECTO DE VIDA DA CRIANA: ONDE NASCE?

Helena Carvalhão e Isabel Aragão, Academia de Cooperaçăo - Leiria

1. Vamos procurar Rousseau que consideramos um estilo a referir. Escreveu ele no segundo livro do seu Emílio: “Amai a infância; favorecei os seus jogos, os seus prazeres, o seu amável instinto. Quem de vós um dia não teve saudades desta idade, em que o sorriso está sempre nos lábios e a alma sempre em paz? Porque quereis tirar a estes pequenos inocentes o fruir dum tempo tão curto que lhes foge, e dum bem tão precioso de que não seriam capazes de abusar? Porque quereis encher de amargura e de dor estes primeiros anos tão rápidos, que não voltarão mais para eles como não podem também voltar para nós?”

Está aqui bem clara a importância com que se deve olhar a infância na problemática da educação, o respeito que por ela se deve ter.

Impor-se à criança os valores adultos será adulterar a própria criança em si. Apesar de todas as contradições que se possam encontrar ao longo da obra de Jean-Jacques, não há dúvida que ele abriu caminho a todas as diversas teorias e práticas educacionais, não directivas nem opressivas, mas “activas”, libertadoras de todas as pressões disciplinares, como o fará Maria Montessori e outros.

2 . A família entendia como relação afectiva, educando para a sensibilidade criativa. Se educar significa promover o auto-desenvolvimento harmónico, a construção responsável da personalidade, a família não pode formar conformistas, antes deve batalhar para que os filhos, os netos, sejam capazes de autocrítica, crítica e actividade construtiva. Nos tempos livres, em casa ou nas instituições, predomina o imposto, o passivamente aceite, em detrimento do inventado, gerado em raízes sedentas de procura, assumindo a diferença. Pigmalião insuflando vida em estátuas que se auto-constroem, se auto-desenvolvem. Dinâmicas, não passivas. Já estátuas não são, mas pessoas capazes de se adaptar ás mutações deste mundo instável e de o tentar modificar. Não podemos educar para a passividade mas para a responsabilidade, a autenticidade, para saber agir, intervir, construir. É de famílias assim que precisamos, é de escolas assim que precisamos, é da interacção, nestes moldes, entre família-escola-sociedade, que precisamos.

Mostraremos, pois, a interacção família, escola, sociedade; a sua importância na realização do projecto de vida de cada criança a devir para jovem. Mas esta criança, personagem preferencial na construção do seu projecto, também desejo apoio, compreensão, dádiva da família, da escola, do psicólogo que actuará nesta equipa, dentro ou fora da escola, mas sempre interagindo.

3 . Escolheremos aleatoriamente algumas famílias reais e faremos reflexões a propósito.

DIFUSÃO DA CULTURA E PROMOÇÃO DA VIDA: UMA ESCOLA NO CENTRO DE UM BAIRRO POBRE NA LISBOA DO SÉCULO XIX

Helena Ribeiro de Castro, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

Em Janeiro de 1867, nascia no Largo das Portas da Cruz, em Lisboa, em pleno bairro de Alfama, o Asilo de S. José. O antigo palácio em que ficou instalado, foi arrendado pela Associação

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Protectora de Meninas Pobres para promover a educação das raparigas carenciadas do bairro, um dos mais pobres da capital; mas albergou ainda, ao mesmo tempo, uma aula para rapazes pobres sustentada pela Associação Protectora de Escolas-Asilos para Rapazes Pobres e um pensionato para filhos de famílias mais abastadas - rapazes e raparigas - e foi o berço da Congregação das Irmãs Dominicanas Portuguesas.

Conhecida como Colégio de S. José das Portas da Cruz ou, simplesmente, Colégio das Portas da Cruz, esta escola teve um papel importante no desenvolvimento do bairro e, particularmente, na vida das centenas de crianças pobres que nele encontraram uma alternativa à vida de miséria a que a condição do nascimento as destinava. Ao cuidado com a educação das crianças, de que se destaca a criação de uma aula nocturna para as meninas operárias da Fábrica de Botões, acrescia a atenção dispensada pela escola às suas famílias, em ocasiões de carência económica ou em situações de doença, através, sobretudo, da acção directa das Irmãs, das mestras e das Presidentes das duas Associações, respectivamente Teresa de Saldanha e a sua cunhada, a Marquesa de Rio Maior.

Os diversos documentos que pudemos encontrar, nomeadamente os relatórios anuais e as actas da Associação Protectora de Meninas Pobres e as cartas trocadas entre a sua Presidente e a secretária, Maria Augusta Campos, bem como outras cartas dirigidas ou escritas por familiares de pensionistas e, ainda, os relatórios oficiais de inspecção das escolas particulares de 1875, permitem conhecer as áreas disciplinares tratadas, os métodos utilizados, o material didáctico disponível, a dimensão dos espaços físicos, a relação interpessoal estabelecida, deixando entrever, subjacente à vida da escola, um modelo pedagógico consistente e inovador.

Também os registos de matrícula e as cartas nos fornecem os nomes dos alunos, permitindo, por vezes, recolher testemunhos posteriores da sua passagem pela escola - em cartas ou livros publicados - ou conhecer o percurso de vida que seguiram. Interessam-nos, especialmente, alguns casos de alunas que se tornaram mestras e outros de personalidades que se distinguiram na vida nacional, como João de Azevedo Coutinho, vice-almirante, que foi Ministro da Marinha e Ultramar.

A GINÁSTICA E A REBELIÃO DAS NORMALISTAS: UMA DISCIPLINA NOVA E TURBULENTA NO SÉCULO XIX

Heloisa Villela, UFF

O Decreto Provincial de 1873 e a posterior Reforma de 1874 trouxeram como maior novidade a introdução da ginástica no currículo da Escola Normal e das escolas anexas masculina e feminina da Província do Rio de Janeiro. Entretanto, este novo componente curricular não foi assimilado sem que ocorressem choques de opiniões que mobilizaram tanto a comunidade fluminense como o interior da própria escola, sobretudo a sua seção feminina. Como entender a súbita valorização da ginástica na província fluminense a ponto de, por determinação legal, ser introduzida quase à força na Escola Normal? Que representações políticos, legisladores, professores, alunos, famílias teriam da disciplina? Que benefícios - ou malefícios - lhe atribuíam? A que finalidade servia? Quem estaria apto a lecioná-la? E com que programa?

A introdução da ginástica nas escolas primárias da Província fluminense, e conseqüentemente no currículo da Escola Normal de Niterói, para ser bem entendida precisa ser relacionada ao contexto de idéias, valores, interesses que a justificavam naquele momento histórico. Políticos, especialistas e legisladores debateram o assunto nas instâncias específicas e concluíram pela necessidade do novo componente curricular, convencidos pela autoridade do discurso médico higienista da época e pelos exemplos de experiências pedagógicas levadas a cabo com sucesso em países europeus e nos Estados Unidos da América.

Entretanto, dos discursos e prescrições à pratica cotidiana é preciso levar em conta as contradições, mediações e negociações. Como convencer os professores e a comunidade da necessidade deste novo componente curricular? Que barreiras tais idéias ainda precisavam transpor até que se concretizassem em práticas dentro do espaço escolar?

O trabalho analisa como tanto nos “países adiantados”, como no Brasil, para que a ginástica se constituísse numa disciplina escolar um complexo processo cheio de contradições esteve em curso. Desvendar um pouco desse processo nos permitiu compreender como e porque, em nossa civilização

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ocidental, práticas do âmbito privado como as práticas corporais passaram ao domínio público através de uma versão escolarizada. A partir desse referencial foram analisados os discursos e práticas que cercaram a introdução da ginástica na Escola Normal da Província do Rio de Janeiro, tornando-se, então, possível entender o impacto e a turbulência que cercou a introdução dessa nova disciplina no decorrer década de 1870.

HIGIENISMO E ESCOLARIZAÇÃO: A ESCOLA E A CRIANÇA SOB VIGILÂNCIA MÉDICA

Heloísa Helena Pimenta Rocha, UNICAMP

Produzir um espaço próprio para as práticas pedagógicas, segmentar o tempo, adequar os materiais escolares às dimensões do corpo infantil, conformar os métodos de ensino aos padrões higiênicos, de modo a garantir a perfeita salubridade do meio escolar, são alguns dos itens que compuseram a agenda dos médicos-higienistas brasileiros, em sintonia com o movimento higienista que ganhava corpo internacionalmente, entre a segunda metade do século XIX e as décadas iniciais do século XX, como se pode observar ao analisar as iniciativas que redundaram na criação da Inspeção Médica Escolar (IME) em São Paulo.

Procurando dar visibilidade às estratégias que visaram produzir uma nova configuração para a escola e, ao mesmo tempo, novos dispositivos de organização do trabalho pedagógico, este trabalho examina a influência das idéias higienistas na produção da cultura escolar. Para tanto, constitui como fontes dois livros de autoria do Dr. Balthazar Vieira de Mello, produzidos em diferentes momentos da atuação profissional desse médico-higienista, na sua militância pela institucionalização da inspeção médica das escolas paulistas.

Trata-se dos livros A hygiene na escola (1902) e Hygiene escolar e Pedagogica (1917). O primeiro, produzido em um momento em que Vieira de Mello atuava como inspetor sanitário, vinculado ao Serviço Sanitário de São Paulo, acumulando já uma significativa experiência no combate às epidemias que grassavam no interior do Estado; o segundo, elaborado quando da transferência da IME para a Diretoria Geral da Instrução Pública. Produzidos em circunstâncias distintas, esses dois livros tinham como objetivo redesenhar a organização escolar, em seus mais diversos aspectos, submetendo-a aos cânones da higiene.

Instituindo um conjunto de normas que deveriam orientar as práticas escolares, produzindo todo um conjunto de dispositivos voltados para o disciplinamento da infância e, ao mesmo tempo, constituindo um novo corpo profissional encarregado de pôr em prática esses dispositivos pedagógicos, os dois livros produzidos por Vieira de Mello inserem-se no contexto das estratégias acionadas pelos médicos-higienistas, com vistas a configurar a escola em espaço de higienização e moralização da população. Estratégias essas que não podem ser lidas sem se ter em conta o amplo projeto de reforma social e moral em que se inserem.

Medindo e pesando as crianças, elaborando fichas e boletins nos quais eram registrados os resultados dessas mensurações, utilizados no estabelecimento de parâmetros de normalidade, a IME exerceu um papel fundamental na produção de um conhecimento científico sobre a infância, participando, de forma decisiva, na constituição de um tipo higienicamente e eugenicamente normal e na elaboração de dispositivos de normalização. Na inflexão que desloca a atenção do edifício escolar e do mobiliário para o corpo e a inteligência da criança, emergem aspectos significativos para a compreensão da produção social da escola, como espaço de socialização e disciplinamento da infância.

TRABALHO NEGRO, TRANSIÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO E HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

Henrique Antunes Cunha Júnior, Universidade Federal do Ceara e Lídia Nunes Cunha, Universidade Federal de Pernambuco

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O sistema de produção escravista criminoso esta na gênese da criação do Brasil. Esta herança escravista é determinante para a constituição das relações sociais, econômicas e política, para a formação do povo e da nação, da cultura e da história nacional. As representações sociais dos cotidianos do presente são influenciadas pelas representações sociais, ou concepções sobre o período de 1850 a 1950 da história nacional. As idéias sobre modernização e desenvolvimento nacional do último período do escravismo foram calcadas nas representações sobre o escravizado e o trabalhador não escravizado, denominados de trabalhador nacional e trabalhador imigrante. As idéias do período republicano, ou seja, pós-escravista, sofrem dos mesmos problemas de concepção. A compreensão da história da educação, sobretudo das populações de descendentes de africanos, dependem de um aprofundamento do conhecimento destas representações em curso.

No Brasil império, última fase do escravismo criminoso, a organização real do trabalho, a sua complexidade, transcendem as idéias geralmente em curso sobre a relação entre escravizados e escravizadores. Na abordagem destas relações pouco se tem considerado a base técnica dos africanos e descendentes, mesmo também sobre as aquisições de capital social destes. Nesta redução da percepção das relações sociais pouco se tem discutido sobre a educação destes. Esta educação é tida como inexistente sendo que releituras da realidade baseadas na composição técnicas da mão de obra apontam e demonstram esta existência.

O LUGAR DA MULHER-PROFESSORA NA ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DO PROFESSORADO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO: IDENTIDADES EM CONSTRUÇÃO

Ilíada Pires da Silva, UNESP

Este estudo pretende discutir o lugar contraditório reservado à mulher-professora na Associação Beneficente do Professorado Público do Estado de São Paulo, na primeira década do século XX. Pretende examinar as estratégias utilizadas por um grupo de profissionais da educação, vinculado à entidade e ao seu periódico, na redefinição da identidade sócio-profissional docente. Nesse momento ocorria uma tendência a feminização do magistério enquanto se consolidava a masculinização das funções hierárquicas na Instrução Pública paulista. Observa-se, na agremiação docente, a existência de uma distinção de gênero na forma como os lugares são destinados ao professor e a professora. De um lado, a total ausência das docentes nos quadros de direção da agremiação e do corpo editorial de seu periódico, de outro, a sua presença marcante no campo assistencial. Tal situação, semelhante ao da Inspetoria Geral do Ensino Público do estado de São Paulo, mais do que uma simples demarcação de papéis de gênero denota a existência de disputas por recursos simbólicos e materiais da sociedade que podem ser associados à (re)definição de uma certa identidade para a categoria docente. Esse processo de produção de diferenciação envolve relações de poder que mantém estreita relação com as operações de classificação e hierarquização dos sujeitos instituindo normas, distinções e exclusões. Sob esta perspectiva é possível discutir como este grupo profissional, inserido no projeto republicano de conformação do social a uma nova moral atribuem a mulher uma qualificação especifica em termos de vocação e moral para o exercício do magistério e assistencial.

ALENCAR, VARNHAGEN E A FORMAÇÃO DOS BRASILEIROS: UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA NA "EXPANSÃO PARA DENTRO" DO IMPÉRIO DO BRASIL

Ilmar Rohloff de Mattos, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Publicados em meados do século XIX, "O Guarani" de José de Alencar e a "História Geral do Brasil" de Francisco Adolfo de Varnhagen se distinguiriam, no conjunto de trabalhos literários, historiográficos, geográficos e etnográficos de fundo romântico, por pintar de modo original para os súditos-cidadãos do Estado imperial o quadro também original de formação do Brasil e dos próprios

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brasileiros. Propondo a leitores e ledores da boa sociedade uma postura mais de observadores do que de participantes de uma trama que era recuperada por meio da palavra escrita e impressa, aquelas obras não deixavam de expressar também o momento de consolidação do Estado imperial, caracterizado tanto pelo refluxo da atividade política da Rua para o Governo do Estado quanto pelo reconhecimento da legitimidade da autoridade imperial pelos diferentes governantes das Casas dispersos pelo vasto território, contíguo e integrado. Recorrendo a imagens, valores e formas de expressão a um só tempo comuns e diversos, os textos de Alencar e Varnhagen se apresentam não apenas como índices da construção e expansão de uma identidade; eles se apresentam sobretudo como elementos constitutivos de uma identidade original, por serem eles também instrumentos de uma pedagogia que, no fundamental, possibilitava a atribuição de um novo significado a brasileiro, por meio de um deslocamento - brasileiro não deveria ser mais apenas aquele que aderira a uma "causa política", por ocasião da emancipação política em 1822; brasileiro se tornava o designativo de uma nacionalidade nova, que tanto se sobrepunha às diferentes identidades forjadas pelo processo de colonização nas diversas regiões do país, quanto se constituía ao lado e por oposição às demais "nações de cor", africanas ou não, com as quais convivia de modo forçado e necessário. E ao fazê-lo aqueles textos nos permitem compreender, ainda uma vez, o processo de "expansão para dentro", distintivo da experiência histórica do Império do Brasil, e que buscava tornar viva a fórmula um Império = um Estado = uma Nação.

O “ENSINO PÚBLICO”: PRÁTICA E DISCURSO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O SÉCULO XIX

Inára Garcia, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

O estudo tem como objetivo examinar o livro “O Ensino Público” de Antonio de Almeida Oliveira (1874), fazendo um contraponto com fontes que também tratam de educação no mesmo período. Confrontar dois corpus documentais supõe um esforço de compreendê-los em seus lugares de aparecimento e, desta forma, perceber aproximações e afastamentos entre o que pode ser entendido como representação das práticas sobre a educação, no caso, a obra Oliveira e a expressão destas práticas, sinais possíveis de serem observados em documentos como relatórios da Inspetoria Geral de Instrução Pública Primária e Secundária, atas e provas de concursos para professores públicos do Estado Imperial realizados por esta instituição.

O “Ensino Público” consta de nove partes com temas que, segundo o autor, esclarecem as condições em que se encontravam a instrução da população, detectando como “causa” de todos os problemas, a ignorância que, para ele, deveria ser combatida por intermédio das “soluções” trazidas pelo livro. Assim, estas prescrições formam um conjunto de condições, igualmente pensadas para o desenvolvimento do bom professor, do bom magistério, da boa escola, terminando com o capítulo “Esperança”, sentimento “natural” de que tudo pode melhorar com a República.

Desta forma, da epígrafe à conclusão, o autor, mais que esclarecer a situação do ensino público na Corte Imperial, deseja ser ouvido e tem a intenção de convencer o seu leitor, utilizando, dentre outros aspectos, da pretensa “neutralidade” das estatísticas e dos exemplos de práticas escolares bem sucedidas nos países desenvolvidos. Com isto, vai definindo o papel do professor ideal, prescrevendo medidas para a educação, ao mesmo tempo que critica a monarquia e, como conseqüência, produz a idéia da República como o único caminho para a transformação do quadro lastimável em que se encontrava a educação no Brasil:

Este estudo, ao contrapor “O Ensino Público” com documentos que sinalizam práticas educacionais, constata que Eusébio de Queirós, Inspetor Geral no período de 1855-1863, em seus relatórios, ao defender os princípios da reforma do ensino primário e secundário de 1854 tratava, entre outros aspectos, do monopólio sobre a instrução, da obrigatoriedade do ensino elementar, da necessidade de formação da carreira do professor, da educação feminina e da capacitação de professores por intermédio dos concursos. Desta forma, os princípios da Educação Pública que Antonio Oliveira vai prescrever em 1874, mantém uma certa semelhança com a orientação da reforma de 54. O autor, portanto, ao propor transformações no cenário educacional, acaba por reproduzir antigos valores, perpetuando práticas, produzindo continuidades, historicamente mantidas

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e reapropriadas, à cada época, ao mesmo tempo em que contribui para o fortalecimento de idéias que, aos poucos, vão se concretizando, uma vez que a lista de prioridades nas propostas destes dois políticos se afinam, mesmo sendo Oliveira, republicano fervoroso, e Queirós, legítimo conservador, como eles mesmos se definem.

A ARQUITETURA ESCOLAR MODERNA NA CIDADE DE SÃO PAULO E SUA PROPOSTA PARA PENSAR O QUOTIDIANO ESCOLAR DE 1949 A 1959

Ingrid Hotte Ambrogi, USP

Este trabalho se propõe, em uma perspectiva histórica, a expor as relações entre a concepção arquitetônica escolar moderna paulistana e suas possibilidades de realização das práticas escolares. Esta concepção foi desenvolvida entre 1949 e 1959 pelo Convênio Escolar da cidade de São Paulo, tendo como principal articulador Hélio Duarte.

Este arquiteto instaurou a reflexão sobre o espaço escolar do ponto de vista de educadores como Anísio Teixeira, que defendia os métodos da pedagogia ativa. Portanto, ao compor o espaço arquitetônico, Hélio Duarte levou em conta necessidades específicas para a prática escolar. Um dos conceitos relevantes para ele vinha de correntes americanas, como por exemplo, o sistema platoon.Hélio Duarte tratou questões da questão do aumento do número de vagas, geradas na escola primária pública naquele período, buscando uma solução para o rápido crescimento da cidade, então com seus dois milhões de habitantes.

Abordaremos, assim, questões relativas às características arquitetônicas da época, como o despojamento de adornos, linhas retas e, sobretudo, a adequação dos espaços, os quais previam novas diretrizes educacionais, além das diretrizes higiênicas, tão presentes, na organização das cidades brasileiras.

Proporemos a idéia de que o Convênio Escolar manifestava claramente as tendências modernas, buscando integrar a arquitetura a um novo conceito de escola. As questões levantadas refletem de que forma o ensino deveria ser realizado nos grupos escolares, qual o ambiente físico mais propício para a integração do psiquismo infantil, entre outros questionamentos.Pretendemos reforçar, ainda, que Hélio Duarte, seguia na verdade, os princípios de outro grande arquiteto brasileiro, Vilanova Artigas, o qual sustentava o conceito de que a arquitetura era um instrumento de emancipação política e ideológica para a sociedade.

EDUCANDO PARA A SUBMISSÃO: O ESCOTEIRISMO, A MILITARIZAÇÃO DA INFÂNCIA E A CONSTRUÇÃO DA PÁTRIA/FAMÍLIA BEM COMPORTADA (1930-1945)

Iranilson Buriti, Universidade Federal do Rio G. do Norte

Que projetos político-educacionais escrever para um país ainda agrícola, rural, com alta taxa de analfabetismo, mas com sede de escolarização, urbanização e industrialização? É com essas interrogações que esta pesquisa procura compreender a emergência, no contexto político varguista, de uma série de programas de governo que visam a “formação das almas” patriotas e soerguer moral e politicamente o Brasil, conforme expressão de José Murilo de Carvalho. Reeducar os cidadãos e inseri-los num programa educacional que englobasse o “pequeno cidadão” era uma das tônicas varguistas, que conclamava a família para atuar como uma “miniatura da nação” e colaborar na elaboração de uma infância bem-comportada, condicionada a uma disciplina moral e social. Nesse “espírito nacionalista”, a prática inglesa do escoteirismo ganha visibilidade no cenário nacional brasileiro como uma escola de boas maneiras, catequizando os seus integrantes (desde a fase lobinho) a dar a sua vida pela pátria - a grande família -, derramando seu sangue, quando preciso, para a salvação do corpo nacional. Os escoteiros surgiram, na opinião de seus idealizadores, como o exemplo dos bons filhos que cuidam da família, da religião e do patriotismo. É, dessa forma, um modelo social de educação disciplinadora e coordenadora, baseado na modelização atlética do corpo e na obediência inquestionável às autoridades. Some-se a isso, que a prática escoteira atendia a uma

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gama de novidades que estavam surgindo à época, para sanear a nação brasileira e limpá-la de sua “sujeira” colonial e imperial, a fim de passar para os demais países a imagem de uma República higienizada, educada, inteligente e desenvolvida.

DO RELIGIOSO AO LEIGO: A FUNDAÇÃO DA ESCOLA BRASILEIRA ISRAELITA CHAIM NACHMAN BIALIK

Irene Maria Gonçalves Pereira

Este trabalho situa-se no campo da investigação da História Educacional, particularmente a que se dedica as relações entre etnia/religião e minorias nacionais. O objeto de análise centra-se na trajetória da Escola Brasileira Israelita Bialik.

O ponto de partida desta reflexão concentra-se no período de sua fundação, no bairro de Pinheiros, na cidade de São Paulo, em 1943, junto a sinagoga Beth Jacob. Essa instituição foi fruto do esforço de um grupo de imigrantes da Europa Oriental e de ascendência judaica, tendo por objetivo proporcionar à comunidade uma opção consciente de educação com os valores, tradição e ética judaicos.

Ao homenagearem Chaim Nachman Bialik, desejavam reverenciar o poeta e humanista, nascido em 1875, em uma pequena aldeia perto de Jitomir, na Rússia. Descendente de família religiosa e frente as constantes perseguições, Bialik integrou-se o movimento iluminismo judaico interessando-se pelo destino de seu povo. Foi influenciado pelo sionismo espiritual de Ahad Haam e, a partir de 1924, emigrou para Tel Aviv, fundando a primeira editora de Israel. A partir deste quadro é importante sublinhar que a comunidade judaica brasileira na verdade é plural, e oriunda-se de diversas ondas imigratórias durante o final do século XIX e a primeira metade do século XX. Esses grupos de imigrantes eram provenientes de diferentes regiões da Europa, Norte da África e parte do Oriente Médio, e possuíam uma característica marcante: não dispunham, até 1948, de um Estado Nacional.

Neste sentido, uma especial característica destes fluxos migratórios da primeira metade do século XX precisa ser destacada: eram, em sua grande maioria, compostos por grupos originários da Europa do centro e do leste. São Paulo foi o estado que recebeu o maior fluxo migratório. Na década de 1950, acolheu a 28 mil, concentrando na cidade cerca de 80% destes (Decol: 1997: 170).Para desenvolver esta pesquisa tenho como fonte privilegiada os arquivos escolares de cunho administrativo, como também a coleta de depoimentos contemporâneos utilizando a metodologia da História oral. Com base nesta documentação pretende-se encontrar indícios e/ou traços que permitam visualizar a multiplicidade da trajetória deste grupo. O ponto de investigação gira em torno da relação escolar/sinagoga que marcou a fundação da instituição.

Torna-se oportuno, portanto, vincular o percurso institucional e o processo histórico educacional e político do país. Assim, há a preocupação nesta reflexão de perceber o alinhamento do sistema educacional com as formas de pensar e agir de parte da comunidade judaica européia em uma outra terra. Como também, compreender os agentes envolvidos no processo de formação e desenvolvimento econômico e social de parcela da comunidade no Brasil. Busca-se, todavia, ressaltar o papel da educação escolar como responsável por acionar, mediar e igualmente conformar as práticas escolares. Contribuindo, assim, para a construção do sentimento de pertencimento a um grupo afetivo determinado e gerando a construção de um processo identitários singular.

IGREJA EVANGÉLICA ALEMÃ E A ORGANIZAÇÃO DE ESCOLAS PRIVADAS NO RIO GRANDE DO SUL/BRASIL

Isabel Cristina Arendt, UNISINOS

A partir de 1864, a condução de um processo escolar entre os imigrantes alemães evangélicos e seus descendentes é realizada por lideranças evangélico-luteranas, que organizam uma rede de

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instituições que cercam esse segmento da população do Rio Grande do Sul/Brasil. Estas lideranças são enviadas por e/ou mantêm contato com instituições ou entidades sediadas na Alemanha, criadas especialmente a partir de 1870/1, época em que se fortifica o nacionalismo alemão étnico, e se pretende o fomento da germanidade inclusive no exterior. Este objetivo intensifica-se a partir da década de 1890, com a saída de Bismarck do governo alemão.

Na presente comunicação, abordaremos a relação entre a organização escolar vigente entre a população mencionada, a Igreja Evangélica Alemã e o Sínodo Riograndense, no período pré-sinodal (1864-1886) e sinodal (a partir de 1886). Para tanto, tratamos do tema valendo-nos de fontes produzidas pelos principais dirigentes deste processo, pastores ligados ao Sínodo Riograndense, dentre eles, Dr. Hermann Borchard, Dr. Wilhelm Rotermund, Friedrich Pechmann e Herrmann Dohms, atuantes respectivamente nos anos de 1863-1870, 1874-1918, 1896-1918 e 1914-1956. A comunicação centra-se nos discursos produzidos por esses dirigentes e suas concepções a respeito da relação escola e Igreja, com base em fontes impressas em que publicam e discutem o tema, indicando alguns pressupostos para uma parcela do modelo escolar privado instituído no Rio Grande do Sul naquele período, qual seja a escola comunitária evangélico-luterana. A análise encerra em 1938, quando é interrompido este processo mediante a instituição de uma campanha nacionalizadora destas escolas, mediante decretos-lei, na vigência do Estado Novo, o que não será objeto desta comunicação.

A EDUCAÇÃO NOS GRUPOS DE CAPOEIRA EM SALVADOR-BA: O PAPEL HISTÓRICO DA ACADEMIA DE JOÃO PEQUENO DE PASTINHA-CENTRO ESPORTIVO DE CAPOEIRA ANGOLA NA CONSTRUÇÃO/AFIRMAÇÃO DA IDENTIDADE ÉTNICA NEGRA

Isabele Pires Santos, Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia

Este trabalho objetiva discutir o papel histórico da Academia de João Pequeno de Pastinha-Centro Esportivo de Capoeira Angola para a construção/afirmação da identidade étnica negra no fazer pedagógico da capoeira.

A capoeira se constitui num elemento da cultura corporal de origem africana que se apresenta ambiguamente como jogo, luta, dança. A dinâmica histórica da capoeira, produzida numa ambiência de marginalidade; perseguição e criminalização; aliança com o poder político; estreita ligação com a classe trabalhadora e vínculos com negros escravos e libertos produziu uma série de discursos sobre a mesma que vêm interferindo no olhar que se tem sobre esta e nas identidades assumidas pelos capoeiristas.

No decorrer do século XX, a capoeira deixa de ser uma prática ilegal; torna-se aceita e praticada pelas classes médias; é assumida por alguns segmentos como esporte; passa a integrar currículos escolares; ocupa espaço na mídia; vira mercadoria em pacotes turísticos...

Se tal processo contribuiu para uma legitimação social da capoeira, colaborou para um certo esvaziamento de princípios fundamentais que a sustentam. A capoeira abrange uma totalidade de elementos que expressam um olhar sobre o mundo e a humanidade a partir de um construto histórico dos negros e negras africanos/as e afro-descendentes no Brasil, especialmente em Salvador, cidade que desde o começo do século XIX já tinha sua população majoritariamente negra e mestiça. Os grupos de capoeira são espaços de vivência e (re)elaboração desse processo que resulta na formação de uma identidade. Além disso, o grupo de capoeira constitui-se num espaço educativo com procedimentos específicos herdados da herança africana como, por exemplo, a oralidade e possui um projeto de educação que reflete uma concepção de identidade étnica.

A Academia de João Pequeno de Pastinha tendo como mestre João Pequeno - João Pereira dos Santos - discípulo do Mestre Pastinha foi criada no início dos anos oitenta no bojo de um movimento pela reafirmação de valores, procedimentos e de uma ética que recuperasse uma tradição específica - a capoeira angola - contribuindo para o processo de afirmação da identidade étnica em Salvador. Ao longo do tempo, a Academia de João Pequeno tornou-se referência nacional e internacional para os estudos sobre capoeira e como modelo de resistência cultural e política.

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Utilizando como referencial para o estudo da identidade étnica as idéias de Stuart Hall e através de entrevistas e observação participante, buscamos entender como vem se construindo a dinâmica da identidade étnica no grupo e como ela tem perpassado a práxis pedagógica do mesmo.

A AGITAÇÃO DA IGREJA EM PORTUGAL A PARTIR DE 1833

J. Moreirinhas Pinheiro

Na agitada época da História de Portugal designada por Liberalismo, há dois momentos dignos de referência:1º - A publicação do decreto de extinção das ordens religiosas (28 de Maio de 1834).2º - A Regência do Reino por D. Pedro em nome de sua filha D. Maria da Glória (31 de Agosto de 1834).

Os liberais, de 1820 a 1834, seguiram de perto os ideais políticos da Revolução Francesa e, por isso mesmo, passaram a combater sem tréguas o pensamento e a acção da Igreja Católica em Portugal.

A publicação do decreto de 28 de Maio de 1834, da autoria de Joaquim António de Aguiar, constituiu o rastilho que incendiou a opinião pública portuguesa e que tornou irreconciliáveis as duas facções partidárias que se degladiavam em território nacional. Tratava-se de uma lei polémica que atentava contra a liberdade religiosa e que era lesiva dos direitos da Igreja.

Na primeira linha da defesa dos direitos da Igreja e da liberdade religiosa em Portugal, encontravam-se o Papa Gregório XVI e o bispo de Viseu, D. Francisco Alexandre Lobo. O Papa Gregório escreveu e divulgou três notáveis alocuções que causaram grande perturbação popular e o Bispo de Viseu divulgou vários textos quase todos remetidos do seu exílio em Paris.

D. Francisco, bispo de Viseu, foi discípulo de Frei Manuel do Cenáculo. Escritor de mérito, foi nomeado em 23 de Agosto de 1828, «reformador geral dos estudos e escolas do reino e seus domínios». Atendendo à obra educativa que realizou podemos situá-lo entre os principais educadores portugueses da primeira metade do século XIX. Mas outros religiosos, contemporâneos do Bispo de Viseu, deixaram também o seu nome vinculado a problemas de Educação e do Ensino.

A EDUCAÇÃO DOS ESCRAVOS, LIBERTOS, INGÊNUOS e LIVRES NO BRASIL

Jaci Maria Ferraz de Menezes, Universidade do Estado da Bahia

A sociedade brasileira bem discutindo cada vez mais fortemente a desigualdade de acesso aos seus bens e serviços pelos diferentes segmentos étnicos da sua população. Na área da educação, a constatação desta desigualdade de acesso, nos diversos níveis de ensino, vem sendo secundada por estudos para a sua explicação, vez que já não se pode credita-la a simples herança de um passado colonial. A Comunicação tem como objetivo discutir os meandros da constituição de um direito à educação no Brasil, tendo como foco o acesso à escola pelos negros. Pretende apresentar uma releitura da discussão sobre textos legais brasileiros sobre o tema, procurando examinar em que medida esse acesso era vedado ou restringido, no período final da colonização e no período pós-independência, no largo período de tempo em que, de forma parcelada, lenta e gradual, e sob as pressões dos movimentos sociais, das rebeliões e das pressões internacionais, se extinguiu a escravidão. O texto a ser apresentado é resultante da análise de documentação jurídica sobre o negro no Brasil e no Estado da Bahia bem como dos textos legais e proposições sobre o final da escravidão coligidos por Perdigão Malheiro e aponta na direção de uma exclusão total do negro escravo da escolarização e de uma precária organização de um sistema escolar que, não obrigatório, não se prepara nem para atender os meninos ingênuos nascidos após a Lei do Ventre Livre nem para incluir massivamente à cidadania os contingentes que saem da escravidão. Quer discutir esse modo de inclusão lenta e gradual à escolarização dos negros ex-escravos como projeto civilizatório, como instrumento de constituição de uma determinada nacionalidade brasileira, em especial a partir das proposições de José Bonifácio e de Rui Barbosa, seja nos anos 1820 (Bonifácio) seja a partir dos anos

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1880 (Rui). É nossa intenção discutir também iniciativas dos negros por educar-se no final do século XIX, as sociedades que organizam e a importância que dão à educação e o modo como o projeto civilizatório via escola se torna hegemônico na sociedade brasileira e ganha o apoio dos próprios contingentes negros que ajuda a excluir.

ESCOLAS DE SÃO GONÇALO: VOZES, MEMÓRIAS E HISTÓRIAS EM DIÁLOGO

Jacqueline de Fátima dos Santos Morais, Sônia Câmara, Inês Ferreira de Souza Bragança, Mairce da Silva Araújo, Maria Tereza G. Tavares; U. do Estado do Rio de Janeiro

O Núcleo de Pesquisa e Extensão “Vozes da Educação, Memória e História das Escolas de São Gonçalo”, criado em 1997 na Faculdade de Formação de Professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, tem como o objetivo promover o resgate da memória e da história da educação de São Gonçalo, um município do Rio de Janeiro, no Brasil. O projeto atua especialmente na organização de núcleos de memória nas escolas, envolvendo os seus sujeitos (professores/as, aluno/as e comunidade) no levantamento da história da educação pública contida nas fontes documentais existentes nas escolas próprias, bem como no registro de relatos orais. A possibilidade de recuperação dos diferentes registros que compõem parte da memória da educação do município de São Gonçalo, permite não só o resgate das memórias institucionais e cotidianas de nossas escolas, bem como o estabelecimento de elos articuladores que historicizam e problematizam propostas e projetos de educação em vigor nos dias atuais. Desejamos com nosso trabalho possibilitar um movimento de reflexão dos professores acerca de sua própria história com vistas a garantir a sistematização e organização dos registros dessa memória. Pretendemos, nesse trabalho, apresentar um pouco de nossas investigações realizadas ao longo de seis anos de existência do Projeto. As vozes da escola contam suas memórias e histórias, e ao contá-las, Universidade e escola ressignificam seus saberes e organizam projetos de futuro. Neste movimento vislumbramos a revitalização da formação e da ação docente.

ESTADO & IGREJA NA IMPLANTAÇÃO DA REPÚBLICA GAÚCHA: A EDUCAÇÃO COMO BASE DE UM ACORDO DE APOIO MÚTUO

Jaime Giolo, Universidade de Passo Fundo

O presente texto discute a implantação da República no Rio Grande do Sul, sob o ponto de vista de suas realizações educacionais e do entrelaçamento de interesses que possibilitou o acordo de apoio mútuo entre o Estado Republicano e a Igreja Católica.

Partindo da constatação de que houve, com a República, um salto quantitativo e qualitativo no sistema educacional gaúcho e de que esse salto deveu-se, sobretudo, à ação articulada do Estado e da Igreja Católica, as investigações orientam-se no sentido de mostrar os determinantes conjunturais e estruturais que possibilitaram essa parceria entre o poder político-administrativo, declaradamente orientado pela filosofia política de Augusto Comte, e a Igreja Católica, no momento, profundamente engajada no combate às teses laicizantes e aos movimentos seculares. Há, pois, um processo paradoxal que precisa ser explicado: como duas instituições de tamanha envergadura, orientadas por ideais autoritários (quase intolerantes) e filosoficamente opostos, articulam e coordenam suas ações de forma que suas diferenças ficam completamente eclipsadas em função de uma extraordinária cumplicidade pragmática? Premências históricas e afinidades ideológicas para esse comportamento não faltaram.

A plena implantação das relações de produção capitalistas dividiu a classe dominante do Estado em dois grupos que permaneceriam 40 anos (1889-1930) em posições de disputa política (às vezes, armada, como foram os casos das revoluções de 1893-1895 e de 1923), sem possibilidades de conciliação. De um lado, os coronéis da Campanha, ligados à pecuária extensiva e exportadora; de outro, a nova elite, formada por comerciantes, industriais, banqueiros, agricultores bem-sucedidos e

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fazendeiros do centro-norte do Estado. O Partido Republicano Rio-Grandense, representando os ideais da nova elite, para consolidar seu domínio e manter afastada a elite tradicional, necessitou, conjunturalmente, do apoio da Igreja Católica a quem fez relevantes concessões. Por seu turno, a Igreja Católica, com a Proclamação da República (1889), estava passando por um teste decisivo de credibilidade e legitimidade. Não poderia deixar de buscar os favores do Estado Republicano.

Havia, entretanto, também razões estruturais que favoreceram a aliança entre a Igreja e o Estado, como, principalmente, a mesma perspectiva de classe. Tanto o positivismo quanto o catolicismo do final do século passado constituíram formas de racionalização da estrutura social capitalista. Embora, filosoficamente, catolicismo e positivismo sejam radicalmente opostos, a formulação sociológica e moral de um e de outro chegam a se confundir. A complementaridade, em termos práticos, foi, portanto, relativamente fácil de ser operada.

Em termos educacionais, a ação conjugada do Estado e da Igreja produziu o efeito típico da sociedade de classes: duas redes de ensino. A pública, exclusivamente primária, voltada para as classes populares, formando trabalhadores; a particular, indo do primário ao nível superior, destinada às elites, formando os quadros do poder.

REPRESENTAÇÕES ICONOGRÁFICAS EM LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA

João Batista Gonçalves Bueno, Apoio Escola- ATICA

O pesquisador ao realizar uma análise superficial sobre os formatos editoriais de livros didáticos, pode ser conduzido a interpretações que vêem como “natural” o trabalho com representações iconográficas nos livros e nas práticas de sala de aula. Os usos de representações iconográficas no ensino de história, entretanto, apresentam permanências e rupturas, que se prolongam desde o século XIX, e sua historicidade em grande parte das vezes é escamoteada no processo de produção dos novos livros didáticos, na editoração das iconografias e nas práticas de leituras utilizadas em salas de aula. Por isso, no processo de formatação das iconografias e textos escritos, os autores dos livros, muitas vezes reproduzem as formas de apresentação gráfica de livros editados anteriormente. Este processo de produção é justificado a partir das formas gráficas que prevalecem como padrões de editoração, são impostas pelo mercado e permanecem na maioria dos livros didáticos atuais. Os manuais abordam a história, e apesar de não mostrarem a sua própria historicidade, é possível aproximarmo-nos destes documentos, analisando suas relações sócio-culturais, as relações de mercado, os seus formatos gráficos, as suas divisões em capítulos, os exercícios, os conceitos privilegiados em seus textos escritos e as imagens iconográficas, dentre outros indícios que cada um destes objetos pode apresentar. O campo de investigação desta pesquisa constitui-se nas relações existentes entre as reproduções de imagens de pinturas, de fotografias e de desenhos brasileiros, que são impressos nos livros didáticos de História do Brasil, e as práticas de ensino de história do ensino fundamental. Restringi o âmbito do campo de investigação e comparação aos manuais de história do Brasil, que foram utilizados em grande escala pelas escolas do estado de São Paulo. Parti da constatação de que esse estado é, atualmente, o lugar de maior concentração de editoras, de pessoal especializado e, portanto, o lugar de irradiação dos padrões de editoração para as diversas regiões do Brasil. Sob tais perspectivas, esta pesquisa procura dar visibilidade à intrincada e complexa rede de questões inerentes à utilização de fontes iconográficas no ensino de História. Para tanto, foram priorizadas as seguintes fontes primárias: livros didáticos, jornais, revistas, documentos editoriais, tabelas de consumo de livros, documentos oficiais ligados ao Estado (referentes aos livros didáticos) e entrevistas com produtores dos livros.

CAMÕES E A COSMOGONIA

João da Mata Costa, DFTE- UFRN

Os Lusíadas, escrito por Luis de Camões em 1572, é um poema épico renascentista e a visão Cosmogônica do autor é apresentada, principalmente, no último canto do poema, quando Tétis mostra

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ao Gama a Máquina do Mundo. A Cosmogonia de Camões neste poema reflete uma visão de uma época de transição, que ainda não incorporou os elementos da revolução Copernicana. É uma visão Grego- Ptolomaica e também medieval. O poeta guia-se pela tradução e notas feita por Pedro Nunes, inventor do Nonio, do Tratado da Esfera "De Sphaera" do Astrônomo Inglês John Holywood, mais conhecido pelo nome latinizado de Johannes Sacrobosco. Outra provável fonte de Camões, de acordo com Luciano Antonio Pereira da Silva em Astronomia de os Lusíadas, é o "Theoricae novae Planetarum" (1460) do astrólogo Alemão Jorge Purbáquio (1423 - 1461). A Astronomia de Os Lusíadas representa a ciência do tempo de Camões. Camões nunca emprega a palavra constelação e seu catálogo é bastante completo. A Máquina do Mundo tem a Terra no centro. Em redor, em círculos concêntricos, a lua (Diana), Mercúrio, Vênus, o Sol (Febo), Marte, Júpiter e Saturno. Envolvendo estes astros tem o firmamento seguido pelo "Céu Áqueo" ou cristalino, depois o 1o Móbil, esfera que arrasta todas as outras consigo. Neste trabalho também analisamos o desaguar do canto molhado na poesia brasileira do século XX. O objetivo deste trabalho é ensinar tanto aos alunos da Física como os das Ciências Humanas, a concepção de mundo do renascimento de uma forma poética em versos clássicos. Este trabalho também ajuda na apreciação do maior clássico da língua portuguesa e mostra como as Ciências e as artes, em geral, estão correlacionadas e refletem a visão de mundo da época em que foi produzida.

INFÂNCIA E CULTURA INFANTIL NA OBRA DE AQUILINO RIBEIRO

João Amado, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa

A criança é um mundo na bruma do amanhecer (1) Aquilino Ribeiro (1885-1963), insigne escritor português da primeira metade do Séc. XX,

legou-nos uma imensa obra dos mais variados géneros literários. Há no entanto, nestas seis dezenas de livros, versando um conjunto enciclopédico de temáticas, uma presença constante: a criança. De facto, Aquilino, que sempre esteve atento aos modos de viver das gentes simples, «no trânsito desde o berço à tumba(2)», revela uma grande predilecção pelas etapas iniciais e fundamentais deste peregrinar humano. Ao virar da página e sob um qualquer pretexto, deparamos sempre com o mundo e modos de ser da infância e da juventude, ora constituindo tema central de romance ou novela, ora trazido à ribalta em contraponto à vida adulta, ora como «quadros pequeninos» de uma paisagem natural e humana, por vezes agreste, por vezes de «buliçosa poesia», para não falar, também, dos apontamentos e reflexões históricas, sociológicas, etnográficas e pedagógicas (3). Logo na sua primeira obra, Jardim das Tormentas, contos editados em 1913, havemos de deparar com os «vivos demónios» dos filhos do Isidoro, castigados «sem dó nem piedade» pela mãe (p. 176) e com aquela «alcateia de garotos» que tanto desembocava «no largo que ali havia, de baraço e pião para jogar as nicas» (p. 195), como corria «à lapada» um cavalo velho e lazarento dos Cletos (p. 215). Hão-de ser também os pequenos esfomeados desta familagem de jornaleiros «à mercê do tempo e das estações», os Cletos, que havemos de ir encontrar «à sombra quente das medas» jogando «com bugalhos e maçãs-cucas» (p. 237) enquanto seus pais e empregadores zurravam os manguais pelas eiras ensoalheiradas.

Encontram-se, pois, já aqui nesta primeira obra, elementos que despertam a curiosidade suficiente para nos pôr em marcha no sentido de traçar uma visão global das diferentes facetas pelas quais o mestre, ao longo de toda a sua obra, vai construir uma representação da infância (e da juventude), nos mais diversos aspectos da sua vida quotidiana. A pesquisa que está na base desta comunicação e temos vindo a desenvolver no âmbito do «Projecto CAPES/GRICES, A Infância e a sua Educação (1820-1950): materiais, práticas e representações», tem, pois, como corpus documental, as «obras completas» do escritor. Sucessivas leituras levaram-nos à construção de uma grelha de análise, algo complexa mas que se traduz, nas suas linhas gerais, nos seguintes aspectos: condições de vida da infância, aspectos da educação familiar, a vivência escolar, as primeiras vivências do trabalho, a actividade lúdica - jogos e brinquedos. De cada um destes aspectos faremos uma breve síntese sempre ilustrada com textos do autor.

Aldeia: Terra, Gente e Bichos (1946), 1995, pág. 48

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2 Abóboras no Telhado (1955), 1963, pág.733Almeida, H. (2003: 16), um dos maiores especialistas da Obra de Aquilino, considera que a grande novidade desta obra «passou em grande parte, pelo tratamento artístico de matérias-primas referentes a mundos até então arredados das páginas dessa literatura. Referimo-nos por um lado, à temática da infância e da adolescência evocada num mundo rural e, por outro, ao tratamento literário da álacre e agreste têmpera do povo beirão».

AS POLÍTICAS EDUCATIVAS PARA O ENSINO SUPERIOR E O DESENVOLVIMENTO LOCAL

João Reboredo, Universidade Federal do Maranhão

Como ponto de partida para esta reflexão temos um caso concreto: a instalação, no distrito de Bragança, no concelho de Macedo de Cavaleiros, de uma instituição de ensino superior privado (IESP), a saber, o “Instituto Piaget”, em 1988.

Este é um exemplo, seguramente não único, da criação de uma instituição de ensino privado em Portugal, contudo nele estão projectadas um conjunto de questões que, embora susceptíveis de serem estendidas às outras instituições congéneres, constitui para nós um exemplo precioso e um caso de estudo.

Deste modo, e num primeiro momento, procuraremos detectar se esta criação de uma IESP, constitui uma resposta efectiva a uma genuína vontade política por parte do estado, em contribuir para uma descentralização do ensino superior e para o desenvolvimento regional e local; ou, pelo contrário a componente legislativa tem uma influência mínima por contraponto à vocação de empresa que, o Instituto Piaget, como entidade privada, encerra.Num segundo momento, e uma vez que o papel de estado não pode ser aqui negligenciado, procuraremos averiguar o modo como este mesmo estado se movimenta.

O CONCEITO DE DIÁLOGO EM PAULO FREIRE E O MOVIMENTO DA ESCOLA NOVA

Joaquim Jorge Silva, Fac. de Psicologia e Cięncias da ED.- VP

Paulo Freire tem suscitado, em Portugal, principalmente a partir dos finais do século passado um interesse redobrado, visível nos inúmeros encontros que a pretexto de Paulo Freire se têm efectuado.

Esta reflexão sendo testemunho desse interesse, pretende simultaneamente contribuir, ainda que de forma modesta, para o enriquecimento desse mesmo debate, de acordo com aquilo que pensamos ser uma das características fundamentais da obra de Freire: uma obra sempre aberta ao debate .

Ora, o pano de fundo que sustenta esta reflexão assenta em dois vectores fundamentais, a saber:

Um primeiro vector relacionado com a emergência do movimento da Escola Nova; e um segundo vector incidindo no conceito de diálogo, presente nas propostas e modelo pedagógico de Paulo Freire.

É nosso objectivo efectuar uma aproximação entre estes dois aspectos com o intuito de avaliar, em primeiro lugar, a influência que o movimento da escola nova exerceu em Paulo Freire, nomeadamente na construção operativa do conceito de diálogo; e em segundo lugar, tentar averiguar e questionar se Paulo Freire, eventualmente conseguirá superar as ideias do movimento da Escola Nova, senão no todo, pelo menos em parte.

A INFÂNCIA NO PAPEL: LEGISLAÇÕES E POLÍTICAS PARA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL

Jodete Bayer Gomes Füllgraf

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Este estudo toma como tema central o direito da criança de zero a seis anos à educação infantil em instituições públicas, tendo em vista que o novo ordenamento legal iniciado pela Constituição Federativa do Brasil de 1988 consolida a importância social e o caráter educativo das instituições que atuam com as crianças de zero a seis anos e ainda proclama para o Estado o dever em oferecer esta modalidade de ensino. Embora os artigos proclamados na Constituição reconheçam, entre outros, o direito à educação da criança pequena, inédito na legislação brasileira, e reconheçam o dever do Estado e do sistema público de garantir o atendimento em creches e pré-escolas para as crianças de zero a seis anos, situando estas instituições no capítulo da Educação, as políticas de financiamento não asseguram efetivas condições aos municípios brasileiros de priorizar esse nível de ensino. Concomitante às discussões da Constituinte, após a promulgação da Constituição de 1988, que consagra o direito de todos os brasileiros à Educação Básica, com a introdução do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, surge a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96, que em linhas gerais vem reordenar os sistemas educativos, além de definir competências, indicar a formação de professores, entre outras questões. Ao desvelar as contradições em torno do projeto da LDBN para a educação infantil, pode-se constatar que o projeto neoliberal de educação foi se delineando e se explicitando competentemente através de uma política de conveniamento desenvolvida e regulamentada pelas áreas de assistência do governo, nas diversas instâncias – federal, estadual e municipal. Ao vivenciarmos políticas sociais pautadas na assistência, percebeu-se que a persistência das redes conveniadas reforçam e definem uma sintonia com a tendência política apontada nos documentos internacionais. Conseqüentemente, a falta de recursos específicos, bem como políticas públicas restritivas para esse segmento comprometem e impedem o funcionamento adequado deste nível de educação, evidenciando a marginalização em que foi jogada a educação infantil. Nesse antagonismo entre direitos e deveres esta pesquisa procurou investigar, frente a insuficiência de creches e pré-escolas públicas para as crianças de 0 a 6 anos quais as condições de acesso às instituições públicas da rede de educação infantil do município de Florianópolis – SC – Brasil e quais as alternativas encontradas pelas famílias para garantir acesso à educação para as crianças pequenas.

IMPRESSOS, EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE NA DITADURA MILITAR : A CONSTRUÇÃO E A REPRODUÇÃO DE REPRESENTAÇÕES (1969 A 1974)

Joelcio Fernandes Pinto, UFMG

O propósito deste trabalho foi investigar a Política Educacional do Governo Militar Brasileiro, no período de 1969 a 1974, procurando analisar as representações de Esporte e de Educação Física presentes na mesma. Para tanto, fontes privilegiadas são os dispositivos elaborados nesse período, principalmente a revista de Histórias em Quadrinhos DEDINHO, publicada e distribuída nacionalmente, de 1971 a 1978, pelo Departamento de Educação Física e Desporto (DED) do MEC. Todos os dispositivos foram tratados como fontes documentais de estudo e essa revista foi tomada também como objeto central de investigação, apoiando-se no que Roger Chartier chama de “arqueologia dos objetos, pois suas peculiares características indicam uma intenção de fazer circular no âmbito escolar as representações de esporte presentes no ideário oficial, configurando uma tentativa de conformar práticas pedagógicas.

As primeiras análises nos permitem perceber que o Governo Federal incentivou a prática esportiva em toda sociedade brasileira, por meio de sua vinculação com a Educação. Observa-se que o Estado afirmou e legitimou, concomitantemente, dois movimentos distintos, porém interligados entre si: o de esportivização do social e o de escolarização do Esporte. Para tanto, foi necessário reformular de maneira radical a estrutura administrativa, política, financeira e legal, provocando, dessa maneira, uma ruptura com o passado “inoperante”.

A política educacional para a Educação Física e para o Esporte neste período, esteve assentada nos propósitos da “ordem” e do “progresso” e centrada nos princípios da tecnificação, da seleção de talentos, da classificação e da performance. Utilizou-se sobretudo os meios de comunicação para divulgar e legitimar tais entendimentos. Observa-se o uso variado dos mecanismos

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de comunicação de massa, tais como: a televisão, o rádio e os impressos. Neles veicularam de maneira direta e de forma “subliminar” representações múltiplas do Esporte. Foram adotados mecanismos inéditos de circulação da mensagem, tal como a literatura de História em Quadrinhos, que ao misturar códigos de diferentes natureza, tais como, a mensagem escrita e as imagens, construíram significados e sentidos diferenciados, aumentando as possibilidades de leitura e qualificando visualmente a recepção das mensagens. Além disso, foram distribuídas gratuitamente nas escolas nove milhões de revistas. Assim, as representações de esporte presentes nesse impresso circularam com expressiva facilidade nos espaços sociais podendo ser amplamente disseminadas.

O volume de dispositivos elaborados, 11.600.000 (onze milhões e seiscentas mil peças gráficas) e a inédita forma de divulgar e incentivar a prática esportiva, por meio de Histórias em Quadrinhos, faz desse momento histórico um marco na História da Educação Física e do Esporte brasileiro.

A FORMAÇÃO MORAL, INTELECTUAL E FÍSICA DOS MENINOS ABANDONADOS: O ENSINO AGRÍCOLA NO PATRONATO SÃO MAURÍCIO (1924-1934)

Jorge Carvalho do Nascimento, Universidade Federal de Sergipe

A Escola Agrícola Benjamin Constant teve sua origem no Patronato São Maurício, em 1924. Oferecia curso de aprendizes e artífices a crianças e adolescentes com problemas de ajustamento social e emocional. Único estabelecimento escolar do Estado de Sergipe a oferecer cursos de nível médio para a formação de técnicos para o setor primário da economia, a Escola Agrícola adotou, desde o ano de 1924, o regime de internato, uma vez que situa-se na zona rural do município de São Cristóvão (antiga capital do Estado de Sergipe), distante 16 quilômetros da cidade de Aracaju, a capital desde 1855. Assim, o ensino das noções de agricultura era tido como uma alternativa interessante para a formação moral, intelectual e física para os menores desajustados. Ao ser implantado, o Patronato São Maurício tinha capacidade para atender 200 alunos e a responsabilidade pela sua organização coube a Juvenal Canário, um técnico indicado pelo Diretor do Serviço de Povoamento do Ministério da Agricultura, a pedido do presidente do Estado, Maurício Graccho Cardoso. Quando se encerrou a gestão do presidente Graccho Cardoso, em 1926, o Patronato contava com 80 alunos matriculados. O regime disciplinar da instituição era bastante rígido, inspirado em corporações militares e adotava práticas, como a de identificar os seus alunos através de números que lhes eram atribuídos e não pelos nomes civis. O ensino agrícola foi visto como uma boa alternativa para a regeneração de menores abandonados desde o início do século XIX. Os primeiros registros acerca desse tipo de projeto em Sergipe remetem para o ano de 1836. Discutindo o ensino profissional, o presidente em exercício da Província, Manuel Joaquim Fernandes de Barros, propôs que se incentivasse, em estabelecimentos modestos, o modelo de educação para meninos que vinha contribuindo para o desenvolvimento da agricultura em países como a Alemanha e a Suíça, ao lado de um estabelecimento de ensino para mulheres que cumprisse idênticos objetivos. A proposta afirmava que seria este um bom caminho para ajudar as mulheres pobres, uma vez que estas aprenderiam a “coser, lavar, engomar, fazer flores, cuidar de hortas e da educação dos animais domésticos”, criando o que ele chamou de “um viveiro, onde os camponeses achassem mulheres, filhas de pessoas pobres ou órfãs, que lhes trouxessem em dote os ricos tesouros que se obtém com a ciência prática da economia”.

CIÊNCIA, EDUCAÇÃO E ESTÉTICA: A INTERVENÇÃO SOCIAL DO PADRE JOSÉ JOAQUIM SENA FREITAS NA SUA SEGUNDA ESTADIA NO BRASIL (1886-92)

Jorge Croce Rivera, Universidade de Évora

Racapitulando os diferentes aspectos da presença de Sena Freitas no Brasil, ter-se-á em consideração a influência nos debates estéticas - literários, arquitectónicos e urbanísticos em São Paulo, Jundiaí e Rio de Janeiro, a sua acção pedagógico coma criação da Colégio Sena Freitas e da

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escola 13 de Maio, tomando por consideração os supostos de uma coordenação da doutrina da Igreja com a Ciência Moderna.

O “ASSALTO” DOS CATÓLICOS NACIONALISTAS AO APARELHO ESCOLAR PORTUGUÊS, 1930-1942

Jorge de Sousa Rodrigues, Instituto de Ciências Sociais – Universidade de Lisboa

Com a reentrada de Gustavo Cordeiro Ramos para a pasta da Instrução Pública, em Janeiro de 1930, iniciou-se uma transformação total do sistema de ensino em Portugal. Todavia, e apesar das profundas alterações que introduziu no aparelho escolar durante a sua permanência no Governo, até Julho de 1933, esta acção foi totalmente ineficaz no que diz respeito à produção de programas e aprovação de manuais que se identificassem com a ideologia do Estado Novo. Sob o comando de Salazar, ainda foram lançados alguns princípios gerais no sentido de se definirem valores a incluir nos livros (frases-chave), do mesmo modo que se definiu qual a interpretação da História que ao regime convinha. Mas o ministro foi completamente incapaz de avançar com a produção concreta dos respectivos conteúdos.

O período seguinte, entre 1933 e 1935, seria igualmente improfícuo nestes aspectos, apesar de ter sido caracterizado pelo exacerbamento da exaltação nacionalista e colonialista. A coexistência de católicos nacionalistas, conservadores republicanos, monárquicos de vários matizes e ex-nacionais sindicalistas, nas estruturas do ministério, e até no topo da hierarquia, se por um lado permitia o reforço daquela exaltação nacionalista, por outro não criava as condições para o estabelecimento de um plano eficaz que definisse formas concretas de criação de novos modos de sociabilização da juventude escolar: o nacionalismo e o colonialismo eram comuns às várias correntes, mas os valores a estabelecer, os públicos a atingir, e os modos de transmissão, constituíam divergências quase insuperáveis.

As discussões sobre o ensino na Assembleia Nacional, no ano de 1935, e nos primeiros meses de 1936, os pareceres dados nos concursos de livros, os discursos públicos e entrevistas em publicações periódicas, forneceram a Salazar os dados necessários à criação de um grupo suficientemente coeso para que fosse possível uma acção mais concreta na criação de uma escola modelada aos interesses do regime. Em Abril de 1936 foi completamente remodelado o ministério, sendo de realçar a criação de novas estruturas para a condução da ofensiva do Estado Novo no aparelho escolar, o Conselho Permanente da Acção Educativa e Junta Nacional da Educação. Neles tinham lugares de destaque algumas das principais figuras do movimento católico nacionalista, em conjunto com homens do aparelho escolar que se mostravam disponíveis para a acção que se pretendia. Os anos seguintes foram ainda de tensão entre os católicos nacionalistas e outros elementos de uma direita radical difusa, mas com presença visível nas várias instituições ligadas à formação da juventude. Após um processo complexo de depuração destas influências, nomeadamente na Organização Nacional da Mocidade Portuguesa e na Mocidade Portuguesa Feminina, a estas organizações, já perfeitamente integradas no ideal do nacionalismo católico, foi entregue o controlo das associações juvenis (1942).

Consequentemente, os católicos nacionalistas conseguiam o domínio de todas as sociabilidades da juventude, complementando a acção das organizações juvenis da Igreja, de modo a levar avante o seu projecto de formação de uma elite capaz de suceder aos obreiros do Estado Novo, ao mesmo tempo que tentavam enquadrar e formar a infância em idade escolar, num sentido ruralista, nacionalista e religioso.

COTIDIANO ESCOLAR: PRÁTICA SOCIAL E PESQUISA

Jorge Luis Cammarano González - Universidade de Sorocaba

Os estudos sobre o cotidiano na Instituição Escolar têm assumido presença marcante no âmbito da pesquisa em Educação, tanto no Brasil como no exterior. Investigar o cotidiano da

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Instituição Escolar como instância de sociabilidade requer a apropriação de múltiplas relações, conhecimentos, representações, desafios e alternativas que os sujeitos da ação educativa produzem e tensionam diariamente e singularmente. O universo de procedimentos e análises propostos para a apropriação, sistematização e problematização das relações entre política educacional, trabalho e formação na instituição escolar, requer pesquisar, refletir e problematizar o cotidiano escolar como instância de sociabilidade. O trabalho apresentado, deriva da Linha de pesquisa “Instituição Escolar: políticas e práticas” desenvolvida pelo Programa de Mestrado em Educação da UNISO; e problematiza as concepções e os procedimentos investigativos propostos para a análise do cotidiano escolar, circunscritos a uma vertente teórica derivada da denominada crise de paradigmas nas ciências humanas parcialmente nucleada na crítica ao referente teórico - metodológico cartesiano e na superação das denominadas metanarrativas. A partir dessa perspectiva busca-se, preliminarmente, explicitar os supostos que subsidiam a pesquisa do cotidiano escolar concebido como invenção, objeto complexo, singular, constituinte, incerto, caótico, espaço de táticas e estratégias. A seguir trata-se de problematizar a concepção de cotidiano escolar derivada desses supostos analisando os procedimentos investigativos que assinalam a ação de uma metodologia vinculada ao estudo da lógica de produção de ações de sujeitos reais em contra-partida aos condicionantes da lógica estrutural. Metodologia a partir da qual apreendemos do cotidiano o que nele introduzimos, reativando a suposta superação da identidade entre Sujeito-Objeto; que considera a verdade como relativa ao sujeito e, portanto, múltipla. Uma proposta metodológica que incorpora o caráter de efêmera e referencia suas incursões no campo investigativo do cotidiano escolar potencializando por meio dos princípios da particularidade e da constitucionalidade a possibilidade de superar as denominadas concepções tradicionais de conceber cientificamente o real. Aqui esta vertente adota como nova forma de compreender a sociedade o modelo de cultura, entendida como fazer, como processo de construção humana. Uma última observação pertinente a esta proposta metodológica para a pesquisa do cotidiano escolar revela a impossibilidade de uma interpretação objetiva da realidade por entende-la como construção teórica.

EDUCAÇÃO, PROGRESSO E DISCIPLINA NA SALVADOR REPUBLICANA: PROPOSTAS PARA A INFÂNCIA.

José Augusto Ramos da Luz, UEFS e UNIME

A educação na Bahia republicana (1924-1928) é o objeto do presente estudo. Um dos seus principais objetivos é analisar como os discursos, fundamentados numa ideologia do Progresso, veiculados pelas elites durante a Primeira República (1889-1930), tentaram instituir uma visão de mundo que pretendia promover a socialização da criança através da educação.

Os republicanos viram o analfabetismo, a falta de escolas e a existência de um povo inculto como as principais causas do atraso do país. A educação foi pensada como um meio de possibilitar a construção de uma nação civilizada e a escola pensada como principal instrumento da utopia republicana de civilização para o progresso. Foi comum se acreditar que as posturas idealistas que caracterizaram as ações de uma elite de políticos e intelectuais brasileiros decorriam da falta de percepção diante das necessidades da sociedade brasileira ou da admiração ingênua na adoção de leis, costumes, idéias e hábitos de outros povos. Elas não eram vistas como um projeto excludente de implantação dos ideais de civilização e progresso que tentaram efetivar um processo de exclusão e controle do povo, principalmente dos segmentos considerados ameaçadores, que deveria ser tutelado pelas elites.

Regenerar este povo doentio, disciplinar e moralizar a sua existência era um projeto que deveria ser iniciado com uma educação voltada para a criança. Acreditava-se que a socialização da criança através da escola seria a garantia de um adulto cônscio do seu papel de cidadão, mantenedor da ordem republicana. Essa deveria ser a primeira lição internalizada pelas crianças. Também era preciso que percebessem a escola como uma instituição que trataria de seus vícios e moldaria os seus instintos. A percepção que as crianças teriam dos seus “erros” e “defeitos” possibilitaria que entendessem como a educação havia promovido nelas mudanças, completado um tratamento. Neste momento, a obediência a regras e a autoridades passava a ser substituída pela obediência a princípios

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morais. Operava-se a transposição da moral pública para a dimensão privada. A inscrição dos princípios de ordem nas consciências infantis, era a principal garantia de que o controle dos desejos e paixões da infância asseguraria a existência de uma vida adulta em consonância com os ideais republicanos. Ao mesmo tempo atestava o poder da educação como uma das principais representantes dos ideais de progresso e do desenvolvimento social, onde a disciplina mostrava ser capaz de controlar os instintos de desordem nocivos à sociedade, promovendo a conformação das crianças à sociedade vigente.

AS AULAS RÉGIAS NA CIDADE DO SALVADOR, SEGUNDO AS IDÉIAS DO PROFESSOR LUIS DOS SANTOS VILHENA (1795 -1800)

José Carlos de Araujo Silva, UFRN

Este trabalho de caráter histórico tem como objeto de estudo as reformas educacionais, empreendidas por D. Sebastião José de Carvalho e Melo - o marquês de Pombal - e comumente apresentadas pela historiografia como um dos símbolos do iluminismo português. Tendo como ponto de partida o alvará de 28 de junho de 1759, objetiva-se realizar uma discussão das idéias sobre o cotidiano das instituições escolares e dos agentes históricos das escolas, formuladas pelo professor de língua grega Luis dos Santos Vilhena, autor das “Recopilações Soteropolitanas”. Cronologicamente datado entre 1795 e 1800, período de efetivo magistério de Vilhena, e limitado geograficamente ‘a cidade do São Salvador, grande centro urbano do vasto império colonial português, um grande “corredor” de circulação de idéias, por vezes consideradas sediciosas pelas cortes portuguesas e que fermentavam corações e mentes dos indivíduos de variadas realidades econômicas e sociais da colônia. Tal circulação de idéias nos remeteu a pensar nas formas de apropriação desse ideário iluminista, que foi adotado em parte no império português e que teve na instrução pública e no temporário afastamento dos jesuítas, elementos significativos de suas práticas. O estudo utiliza-se das concepções teóricas relativas à uma história social das idéias, como entendida por Robert Darnton, consciente que as idéias estabelecem impactos diferenciados sobre os indivíduos e que estes leem, as reinterpretam e as “filtram”, assevera a segura possibilidade de contribuição para novas análises, por seus múltiplos graus de intensidade, impostos aos indivíduos, que de várias formas se apropriam entram em contato com essas idéias, assim, não só o próprio Vilhena, mas outros professores régios fizeram suas releituras desse ideário. As fontes utilizadas para essa nossa pesquisa, além das já citadas cartas do próprio Vilhena, figuram também documentos relativo às Cartas Régias e a documentação das Câmaras Municipais das Vilas, Provisões reais e Alvarás e Portarias, visando através desses esparsos relatos de experiências vividas, conhecer um pouco do cotidiano dos professores dessa província colonial, problema apresentado na produção do professor Vilhena, através de posições por vezes veladamente indignadas das condições de vida dos professores em particular, e da maioria da população em geral.

O INQUÉRITO SOBRE O PROBLEMA EDUCATIVO PROMOVIDO PELA RENASCENÇA PORTUGUESA

José Carlos de Oliveira Casulo, Universidade do Minho

No âmbito da vertente pedagógica do seu programa de acção, o movimento da Renascença Portuguesa promoveu, entre 1913 e 1914, o Inquérito sobre o Problema Educativo, cuja formulação esteve a cargo de Leonardo Coimbra.

É deste Inquérito, das questões nele colocadas e das respostas (poucas, aliás) que teve que se dá conta na comunicação.

FONTES PARA O ESTUDO DA INSPECÇÃO DO ENSINO LICEAL (1836-1947)

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José Carlos Morais da Cruz, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Desde as reformas de Passos Manuel e até à sua institucionalização definitiva em 1947, com a reforma do ensino liceal de Pires de Lima, a inspecção esteve a cargo de várias instituições. Os trabalhos sobre as funções e práticas da inspecção enquanto organismo de controlo e de avaliação do sistema de ensino são escassos. Afirmou-se quase até à exaustão que “a história se faz com documentos”. Não basta reunir, seleccionar e classificar documentos para se fazer a história. Apesar do positivismo histórico ter sido praticamente abandonado, a procura de fontes continua a ser indispensável no trabalho do historiador. Nesta comunicação pretende-se fazer o levantamento de as fontes que permitam o estudo da inspecção do ensino liceal, no período compreendido entre 1836 e 1947. As fontes serão divididas em directas e indirectas. Nas primeiras serão incluídas todas as que estão imediatamente relacionadas com a inspecção: legislação, actas, relatórios, ofícios…e nas outras, os textos de escritores, de pedagogos, artigos da imprensa nacional e regional, debates parlamentares e outras.

A EDUCAÇÃO COMO IRRADIAÇÃO DO PROGRESSO NA PRIMEIRA REPÚBLICA NO BRASIL

José Carlos Souza Araújo, Universidade Federal de Uberlândia

A idéia de progresso, numa perspectiva histórica, triunfa no século XVIII, quando na verdade ela é assumida numa perspectiva mais plenamente secularizada. Os esforços anteriores, sobretudo os vinculados ao período da modernidade, deixam antever o percurso de tal concepção triunfante. Embora a partir do século XVIII possam ser visualizadas várias perspectivas em torno da idéia de progresso, esta adquire uma conotação bem singular no interior da concepção iluminista: a aposta na perfectibilidade do ser humano, seja no âmbito da educação intelectual, seja no âmbito da educação moral. A utopia educacional se estrutura em torno da construção de um homem ilustrado, contando, para isso, com as qualidades naturais que ele guarda consigo, independentemente de quaisquer outras forças. Tal ideário iluminista, amalgamado às posturas positivista, evolucionista, cientificista e liberal, que lhe servem de suporte ao final do século XIX, dão andamento e energia à veiculação da postura em torno do progresso e da ilustração. Tais parâmetros que situam o progresso como um objetivo a ser alcançado pelo movimento histórico, acabam por situar a educação como um suporte que permitirá realizar tal busca. Esta comunicação busca explicitar - através das atas da Câmara Municipal e de jornais locais que circularam em Uberlândia-MG, Triângulo Mineiro, Brasil, no período compreendido por Primeira República - as idéias educacionais vinculadas ao horizonte do progresso e da ilustração. Em tais documentos primários, tanto a escola pública como a particular são assumidas em diferentes momentos no período em pauta, como capazes de alavancar o progresso. Medidas de caráter legislativo discutidas e aprovadas pela Câmara Municipal também carregam em seu bojo um caráter finalístico em torno do progresso. Em fins do século XIX, estando o município em dificuldade relativa ao financiamento da iluminação pública, metaforicamente se decide pela supressão das luzes materiais para permitir acender as luzes intelectuais da juventude. Mesmo em medidas de caráter orçamentário, analisadas e votadas no interior da Câmara, a idéia de progresso é perseguida, apesar das parcas verbas municipais para a educação. Ao final da segunda década do século XX e nos anos seguintes, na Câmara Municipal se ocupam também com a Sociedade Progresso de Uberabinha, devotada à causa da construção de uma escola privada: verificam-se aí subvenções municipais, bem como apoio público municipal em auxiliar tal empreitada do ponto de vista operacional. A idéia de progresso expressa localmente, também estabelece elos com o Estado de Minas Gerais, considerando-se a necessidade de persegui-la. Localmente, os vínculos com o progresso acabem permitindo a irmanação em torno de uma utopia que se revelou nacional no campo brasileiro, desde as últimas décadas do século XIX até a década de 40, quando tal horizonte utópico e formalístico é substituído pela idéia de desenvolvimento.

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O TESTAMENTO PEDAGÓGICO DO PE. SENA FREITAS (1840-1913): PROPOSTAS DE REFORMA DA EDUCAÇÃO ECLESIÁSTICA

José Eduardo Franco, Centro de Estudos sobre a Mulher Faces de Eva da FCSH-UNL

As fortes transformações políticas, sociais e culturais de que a sociedade portuguesa foi alvo durante o período do liberalismo puseram em causa os velhos modelos de formação do clero e agudizaram a consciência da necessidade de reforma dos curricula dos seminários. Uma melhor preparação dos padres para responderem aos desafios da sociedade moderna era o objectivo da urgência dessa revisão curricular.

O Pe. José Joaquim de Sena Freitas foi um dos mais interessantes pedagogos católicos que repensou a educação eclesiástica do seu tempo. Este escritor de origem açoriana teceu uma dura crítica ao sistema de ensino e de educação em vigor nos seminários da época e propôs uma reforma profunda da formação sacerdotal clássica no sentido de abri-la às ciências modernas e ao contacto com as novas corrente filosóficas e científicas.

Sendo assim, a nossa comunicação pretende analisar a situação da educação eclesiástica e as mais inovadoras propostas para a sua reforma no período do liberalismo a partir da obra pedagógica de Sena Freitas, nomeadamente com base no seu livro intitulado “A alta educação do Padre”.

ESCOLA AMÉRICA E A REFORMA EDUCACIONAL DE 1911 EM SANTA CATARINA

José Eliachim Barros Tapia, U. do Estado de Sta Catarina

Este trabalho apresenta um estudo sobre a Escola Americana de Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, no período compreendido entre 1903 e 1911 durante a denominada República Velha Oligárquica. O principal objetivo da Escola era construir sujeitos que atendessem às necessidades da Igreja Presbiteriana do Brasil quanto à sua inserção e permanência em solo catarinense e, por outro lado, desconstruir a prática hegemônica da Igreja Católica na sociedade, a despeito de ser o Brasil desde a proclamação da República um estado laico e pluralista. A preocupação inicial deste estudo foi a de perceber e elucidar as reais motivações ou razões que induziram esta instituição - Igreja Presbiteriana - a promoverem a fundação deste estabelecimento educacional na capital do estado. A seguir aponto e analiso o método pedagógico utilizado - o intuitivo - referido à época como inovador, portanto diferenciado daqueles utilizados por outras entidades educacionais públicas ou privadas, pois organizava um novo sistema espacial, pedagógico, programático e administrativo. Tinha como fundamento a observação e o trabalho apropriados e afinados com a proposta ética do calvinismo, sustentação do presbiterianismo, o qual se prestava para o jogo de poder e dos interesses da incipiente instituição fundadora, isto é, produzir um sujeito que atentasse para a ideologia capitalista de construir um indivíduo produtor. Finalmente procurou-se evidenciar até que ponto este estabelecimento trouxe contribuições para a educação catarinense, num momento em que esta e a sociedade almejavam por modelos escolares mais condizentes com a época inaugurada - a República. As contribuições detectadas são apenas indiretas, pois a Escola Americana de Florianópolis foi pioneira na cidade na inserção e aplicação do método intuitivo, do qual mais tarde se serviria e se apoiaria o gestor e irradiador deste sistema pedagógico na região através da implantação da Reforma Educativa de 1911 no Estado catarinense, por coincidência ou por ironia do destino o mesmo ano em que a Escola Americana de Florianópolis fecha definitivamente suas portas. Apesar disso constata-se a formação de um pequeno grupo de filhos da elite catarinense, como mais uma estratégia de promoção e de formação de uma classe que garantisse no futuro a continuação do empreendimento religioso e educacional.Pode-se afirmar que este trabalho aponta para a intrincada luta pela inovação e introdução em solo catarinense de uma nova maneira de pensar e fazer educação.

OS MILITARES E A EDUCAÇÃO NACIONAL NA REVISTA A DEFESA NACIONAL (1946-1964)

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José Silvério Baia Horta, Maria Cecília de Paula Silva

O presente artigo pretende divulgar parte dos resultados da pesquisa ‘Os militares e a Educação no Brasil, no período de 1946 a 1964’. O objetivo foi estudar a relação ente educação e ordem política autoritária, buscando verificar até que ponto uma diferença de grau na dimensão autoritária implicaria em formas diferentes de utilização do sistema educacional como instrumento de legitimação do autoritarismo. A pesquisa histórica com fontes primárias, principalmente, foi realizada nos arquivos do Exército, Arquivo Nacional. Biblioteca Nacional, Biblioteca do Exército e CPDOC. O periódico analisado constituí-se em um periódico de opinião (órgão oficial de determinada Instituição Estatal - Militar), dedicado a público restrito. Além disso, os periódicos constituem exemplares da instituição mais dinâmica da sociedade civil - a imprensa em geral (Gramsci) por abranger, como a escola, o domínio total da ideologia. Neste artigo, procuramos investigar os determinantes da educação militar e verificar pontos considerados básicos para a educação militar, a partir de temas recorrentes como a educação moral, física, intelectual e religiosa do soldado e do oficial. Os regimes políticos que se instalaram a partir do processo de industrialização brasileira recorreram à militarização e a politização do Estado, na ‘colonização’ da maioria das estruturas estatais e para-estatais, na fusão total ou parcial entre os aparatos repressivos e os demais aparatos do sistema de dominação política. Esta militarização tomou a forma explicita do regime militar e formas mediatizadas, mais ‘subterrâneas’, ocupando algumas estruturas estatais: administração de regiões “vitais”, extensão ilimitada da justiça militar, educação de base militar. Com o fim da segunda Grande Guerra, os rumos político-militares e o investimento dos militares na educação nacional se modificaram. Este período, situado entre dois períodos autoritários, costuma ser compreendido como “momento único” da nossa história política recente, inaugurada sob o signo da ruptura. A educação militar que se fazia presente nas linhas dos textos analisados seguia a doutrina do Exército Americano e sua ideologia de intervenção política - “liberal” ou “cristã” - intimamente ligada ao mundo ocidental e a seu destino político e econômico. Esta corrente entendia que o Brasil deveria permanecer fiel à cooperação com os Estados Unidos, profissionalizando as Forças Armadas no modelo americano, aumentando seus efetivos e preparando-os para uma guerra eminente, Estas ações nos remetem a evolução do conceito de segurança nacional e a formação de uma doutrina de segurança nacional.

EM BUSCA DAS RAÍZES CULTURAIS DO POVO BRASILEIRO (AS AFINIDADES ROMÂNTICAS DA EDUCAÇÃO POPULAR)

José Willington Germano, UFRN

No contexto de intensas mobilizações sociais reformistas e de “Guerra Fria” que caracterizou o Brasil dos anos 60 do século XX, surgiram muitos movimentos de educação e cultura popular, com o propósito de conscientizar o povo e contribuir para a transformação estrutural da sociedade brasileira. Malgrado as especificidades, constata-se a existência de afinidades românticas como componente essencial do ideário político dos vários movimentos da época. O romantismo político é geralmente caracterizado pelos seguintes traços constitutivos: recusa da realidade social presente, sensação de perda, nostalgia e busca do que foi perdido, visando instaurar um futuro diferente do presente. A associação da educação com a cultura popular, constitui o substrato dessas afinidades. A educação popular se constituiria, assim, conforme o ideário em apreço, uma parte integrante da cultura popular. Nessa perspectiva, observa-se nesses movimentos, uma recusa da realidade social presente que se caracterizava pelo predomínio de relações de desigualdade social, no plano interno do país, e de dependência e dominação em relação às potências do capitalismo, notadamente dos EUA. Constata-se, em todos eles, a sensação de perda da cultura brasileira, em particular da cultura popular, e, ao mesmo tempo, observa-se a busca do que foi perdido, isto é, as raízes culturais do povo brasileiro, como forma de resistir à dominação, através da luta antiimperialista, visando instaurar um futuro novo, uma nova sociedade. A recorrência à cultura popular, por parte desses movimentos de educação, decorria da visão que a encarava como espaço de resistência à dominação e como instrumento de luta pela libertação do povo e do país. Fazendo uso de fontes documentais escritas, a presente pesquisa procura delinear o ideário e as afinidades românticas de quatro dos principais

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movimentos de educação e cultura popular no Brasil dos anos 60: o Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC/UNE); Movimento da Educação de Base (MEB); Movimento de Cultura Popular (MCP); Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler. O sentido geral da análise tem como propósito identificar nesses movimentos educacionais as variações em torno do mesmo tema: a busca das raízes culturais do povo brasileiro.

BIBLIOTECA INFANTIL MONTEIRO LOBATO: UMA HISTÓRIA DE EDUCAÇÃO (1)

Joseania Miranda Freitas, Universidade Federal da Bahia.

Este texto refere-se a uma pesquisa histórico-documental em uma instituição educacional não-escolar, a Biblioteca Infantil Monteiro Lobato (BIML), inscrevendo-a no campo da História da Educação. A pesquisa teve como objetivo desvendar a dimensão do projeto da professora Denise Tavares para a criação de uma biblioteca infantil na Bahia nos anos 1950 e o seu desdobramento na sua gestão de 1950 a 1974. Nessa perspectiva, procedeu-se a uma investigação sistemática das fontes documentais convencionais da instituição, desenvolvendo-se um diálogo com a bibliografia técnico-científica, que se constituiu em referencial para a coleta de informações nas fontes de história oral. Denise Tavares, com o seu vanguardismo, defendia os direitos da infância numa época em que não se falava de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. No novo espaço, biblioteca infantil, diferenciado da escola, privilegiava-se a participação cidadã. Neste sentido, o lazer e o entretenimento estavam associados a atividades culturais e formativas. Para elaboração da pesquisa, fez-se necessário entrelaçar histórias individuais à da instituição, tendo como principal ferramenta a memória, tanto a registrada nos documentos de arquivo, quanto a das pessoas envolvidas. Os depoimentos foram coletados através de entrevistas convencionais e nas Sessões Especiais de Hora do Conto, técnica organizada de maneira interativa e coletiva, a partir do diálogo entre a produção teórica e empírica. A pesquisa foi desenvolvida, buscando desvendar os elementos essenciais que caracterizam a BIML como uma instituição educacional. O período de administração de Denise Tavares marcou a BIML como um ponto de encontro de crianças de diversas classes sociais, um centro de aprendizagem no qual as crianças e jovens podiam desfrutar de um espaço de participação como base para o exercício de sua cidadania, aprendendo a conhecer e defender seus direitos. Ela, de maneira interdisciplinar, unia esforços para oferecer educação de qualidade, numa perspectiva de futuro, buscando, junto com sua equipe, compreender e atender às necessidades do seu público. O trabalho pioneiro, realizado por Denise Tavares e sua equipe, apontava para a necessidade da sociedade perceber a importância da infância no presente e não somente como um projeto de futuro, e destacou-se como um momento de luta pela defesa dos direitos da criança.

1. Este texto tem como base a nossa tese de Doutorado em Educação, realizada sob a orientação do Prof. Dr. Luís Henrique Dias Tavares: A história da Biblioteca Infantil Monteiro Lobato: entrelaçamento de personagens e instituição. (Universidade Federal da Bahia, 2001).

AS REFORMAS DO ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL NAS DÉCADAS DE 1960 E 1970: A AÇÃO DE INSTITUIÇÕES NACIONAIS E ESTRANGEIRAS NA IMPLEMENTAÇÃO DE UM PARADIGMA EDUCACIONAL ALTERNATIVO

Karl M. Lorenz, Ed.D. Education Department Sacred Heart University Fairfield

O objetivo deste trabalho é descrever e discutir o movimento reformista ocorrido nas décadas de 1960 e 1970 que teve por objetivo redirecionar o método de ensino de Ciências nas escolas primarias e secundárias brasileiras. O movimento foi caracterizado pela adoção de um paradigma que considerou o desenvolvimento das habilidades relacionadas ao processo de investigação científica como a meta principal do ensino de Ciências. Esta concepção vinha de encontro à prática, até então prevalecente, que enfatizava apenas a transmissão de conteúdos das disciplinas científicas. Este

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trabalho argumenta que o paradigma teve origem fora do Brasil, principalmente nos Estados Unidos, onde foi articulado em resposta ao lançamento, em 1957, do satélite Sputnik pela União Soviética. Preocupado com a possível supremacia tecnológica e científica da União Soviética, o governo norte-americano reagiu e apoiou a implementação de uma política que visava a melhoria do ensino de Ciências nas escolas secundárias do país. Financiados por instituições particulares e governamentais, grandes projetos criaram e disseminaram, na década de 1960, livros textos e materiais suplementares que pretendiam desenvolver nos alunos a habilidade de realizar investigações científicas em sala de aula, tais como: Biological Science Curriculum Study (BSCS), Physical Science Curriculum Study (PSSC), Project Harvard Physics, e Chemical Bond Approach (CBA). Paralelamente, na Inglaterra, a -2- Fundação Nuffield produziu materiais didáticos com finalidades semelhantes. A concepção de ensino de Ciências em que foram baseados estes materiais foi transplantada para o Brasil por iniciativa de instituições nacionais, tais como o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ciências (FUNBEC), e o Projeto Nacional para a Melhoria do Ensino de Ciências (PREMEN); e instituições internacionais como a UNESCO, a USAID e as Fundações Ford e Rockfeller. Nos anos 60, a colaboração entre estas instituições visava re-direcionar o ensino de Ciências no Brasil pelo financiamento, tradução, adaptação e disseminação dos materiais curriculares secundários desenvolvidos nos Estados Unidos, bem como, o treinamento de professores brasileiros para o seu uso. Nos anos 70, as instituições brasileiras assumiram a responsabilidade para o desenvolvimento e divulgação de materiais didáticos nacionais. Muito embora, agora, independentes do apoio externo, os materiais mantinham-se fiéis ao paradigma adotado na década anterior. Ó trabalho é concluido apresentando uma avaliaçào do movimento durante as duas décadas.

OS PROGRAMAS DE 1931 E A CONSTRUÇÃO DO CÓDIGO DISCIPLINAR DA HISTÓRIA NO BRASIL

Katia Maria Abud, Universidade de São Paulo

O conceito de código disciplinar, utilizado por Raimundo Cuestas Fernandez, ao estudar a sociogênese da História como disciplina escolar é útil para se compreender a distinção entre a História como conhecimento acadêmico e a disciplina escolar. Ele será o conceito que norteará este trabalho sobre a constituição do código disciplinar da História no Brasil.

A História acadêmica e a História escolar surgiram no interior de um mesmo movimento, qual seja o da formação do Estado Nacional e do estabelecimento da identidade brasileira. Duas instituições criadas no mesmo ano de 1838, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Colégio D. Pedro II, ambos localizados na capital do Império, tinham como atribuição a construção de conhecimento sobre as origens da nação brasileira. Nesse primeiro momento da construção do conhecimento histórico no Brasil, quase não são perceptíveis os lindes entre as duas formas do conhecimento. Os cruzamentos são comuns entre o IHGB e a escola secundária: sócios de um são os professores do outro, a organização do conhecimento nos programas da instituição escolar seguem os paradigmas do conhecimento histórico da academia.

A escola secundária se estruturava pela eliminação de créditos por alunos que se preparavam em escolas que não forneciam os certificados de conclusão do curso secundário. Apesar de algumas tentativas reformistas, no início do século XX, somente em 1931, depois da ascensão de Vargas, processou-se uma reforma estrutural da educação no Brasil, conhecida como a Reforma Francisco Campos, que implantou a seriação obrigatória e permitiu que as outras escolas emitissem os certificados de conclusão de curso secundário. O próprio Ministério se responsabilizaria pelos programas, de caráter nacional, redigidos por comissões de especialistas, para cada uma das disciplinas do quadro curricular definido, as cinco séries do curso ginasial.

Nesse contexto é possível perceber a elaboração clara do código disciplinar da História: constam dos programas a listagem de conteúdos, acompanhadas de orientações metodológicas. Estas continham sugestões de métodos e técnicas de trabalho inspirados nas idéias da Escola Nova e com orientações específicas que se refere às abordagens da História que, como disciplina escolar, tinha novos objetivos, que não mais se confundiam com os do conhecimento histórico acadêmico.

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“CRIANÇA CALÇADA, CRIANÇA SADIA!”: OS UNIFORMES ESCOLARES E A EXPANSÃO DO SISTEMA DE ENSINO PAULISTA (1950-1970)

Katiene Nogueira da Silva, Universidade de São Paulo

O presente trabalho visa a analisar as transformações que caracterizaram o uso dos uniformes escolares na escola pública paulista entre os anos de 1950 a 1970, quando ocorreu a democratização das oportunidades de educação pública. Trata-se de procurar identificar como o uso do referido traje se configurou diante desta perspectiva: a expansão do ensino. Tal proposta integra a pesquisa de mestrado, intitulada Práticas da Vida Escolar: O Uso dos Uniformes nas Instituições de Ensino Paulistas entre os anos de 1950 a 1970, que dá continuidade ao projeto desenvolvido em nível de Iniciação Científica, com o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Esta pesquisa procura fornecer elementos para que se processe um mapeamento cultural da escola, mediante a pesquisa de objetos e práticas escolares, utilizando como fontes privilegiadas as revistas pedagógicas, os manuais do ensino de didática e metodologia, os jornais escolares, as fotografias e a legislação escolar vigente no período. A fundamentação teórica da investigação é dada pelos autores que enfatizam o estudo das práticas escolares e dos saberes do campo social e educacional (Chartier, Bourdieu, Nóvoa e outros). Nessa perspectiva, os uniformes são analisados como uma prática social e uma categoria estratégica para o estudo do vestuário, que permite apreender as regras de um discurso não verbal. Assim, neste trabalho, pretende-se analisar as transformações pelas quais passou o uso do uniforme escolar durante o período de expansão da rede pública de ensino do estado de São Paulo a partir do exame da campanha lançada, através da Revista do Professor (1934-1965) - publicação do Centro do Professorado Paulista (CPP) -, pela Alpargatas S.A. em 1958, com vistas a difundir o uso de calçados entre os habitantes das zonas rurais e suburbanas. O produto anunciado era o calçado Conga que, por ter um preço muito mais acessível que o convencional sapato de couro, pretendia resolver o problema da criança que não podia freqüentar a escola pela falta de calçados, assim como melhorar a saúde e o padrão de vida da população. Com esse intuito foram distribuídos às escolas cerca de 20.000 cartazes e 500.000 folhetos explicativos e um filme foi exibido em 200 cidades do interior. A campanha, que coincidiu com a época de expansão da escola pública, durou cerca de três anos e fez uso de muita propaganda nas escolas para a difusão do novo calçado que pretendia instituir a homogeneidade entre os estudantes e um novo padrão de higiene, como sugere o slogan publicitário: “Criança Saudável, Criança Sadia!”.

A CONSTRUÇÃO DE UM MANUAL DE HISTÓRIA DO BRASIL PARA PROFESSORES: O LIVRO DE AMERICO JACOBINA LACOMBE, ENCOMENDADO PELA CAMPANHA DO LIVRO DIDÁTICO E MANUAIS DE ENSINO (CALDEME), EM 1953

Kazumi Munakata, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

A Campanha do Livro Didático e Manuais de Ensino (CALDEME) foi instituída em 1953 a fim de executar as diretrizes sobre livros didáticos traçadas por Anísio Teixeira ao assumir, em 1952, a direção do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), um importante órgão do Ministério da Educação, que integra o governo brasileiro. Eesse ambicioso plano compreendia a produção de diversos materiais escolares, desde os livros didáticos, para alunos, até manuais para professores. Seus resultados, no entanto, foram muito modestos e, na década seguinte, já sob a ditadura militar, instaurada em 1964, o programa foi sendo sobrepujado por outros, até extinguir-se. A presente comunicação acompanha o processo de elaboração de um manual para professores, no caso de História do Brasil, encomendado a Americo Jacobina Lacombe, valendo-se da análise de documentos internos da própria CALDEME e da correspondência, ativa e passiva, que ela mantinha com o autor e consultores. O interesse desta pesquisa consiste não apenas na elucidação dos procedimentos editoriais efetivados pela CALDEME, mas também no acompanhamento das discussões sobre a História do Brasil e seu ensino que foram sendo suscitadas à medida que a obra era escrita.

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DOIS OLHARES SOBRE A FORMAÇÃO DE AGENTES DE EDUCAÇÃO RURAL NA ESCOLA D. LUÍS DE CASTRO, EM BRAGA, PORTUGAL (1957-1977)

Laerthe de Moraes Abreu Junior, Universidade São Francico; Maria Judite Rodrigues Costa , Conservatório de Música Calouste Gulbenkian

Este trabalho promove um diálogo entre duas pesquisas de origens diferentes, um pós-doutorado feito por um brasileiro, e um mestrado feito por uma portuguesa, mas ambos situados na Universidade do Minho, em Braga, sob a orientação do Prof. Dr. Justino Magalhães e com um objeto de estudo comum: a formação de mulheres, na Escola D. Luís de Castro, em Braga, para atuar como agentes de educação familiar rural em meios rurais portugueses num período que abarca as duas últimas décadas do salazarismo, de 1957 a 1977. Este trabalho busca discutir e compreender um contexto complexo que engloba: 1) Uma determinada visão sobre a educação da mulher, com seus estereótipos e preconceitos, que apregoa uma fragilidade feminina e uma diferenciação por incapacidade de interesses e de objetivos em relação à educação do homem. 2) Um modelo pedagógico caracterizado por uma formação educacional bem peculiar, qual seja, de ensino preparatório, com dois anos de duração e seis meses de estágio, um curso voltado exclusivamente para mulheres, ministrado em regime de internato, numa região rural, economicamente atrasada, com um grande número de mulheres analfabetas e que, surpreendentemente apresenta um currículo bastante diferenciado do usual, pois se estudam disciplinas convencionais, como Puericultura ou Psicologia, outras bastante conservadoras como Cultura Religiosa e Formação Familiar e, ao mesmo tempo, encontram-se disciplinas bem incomuns e, até certo ponto, inovadoras pois estão fortemente integradas à cultura regional como as disciplinas de Bordados, Danças e Confecções e Culinária. É um currículo pesado e contraditório, se fôssemos acreditar na tal “fragilidade e incapacidade feminina” pois chegou a ter no biênio, 1963/1964, 34 disciplinas. 3) Um sistema político repressor, caracterizado por décadas de censura e rígido controle social personificado na figura de Salazar, um ditador cruel, mas com uma imagem social de cunho paternalista: a de protetor da família e defensor das tradições nacionais. 4) Finalmente, a participação das próprias mulheres, alunas da Escola D. Luís de Castro, neste contexto, vistas como sujeitos históricos que não se submetem com docilidade a imagens impostas pelo projeto político-pedagógico vigente na época, e muito menos se representam como seres frágeis e incapazes intelectualmente, pois adquiriram uma autonomia que pode ser percebida através do acompanhamento dos percursos de vida das ex-alunas. A partir dessas duas visões diferentes, pretende-se dialogar criticamente sobre a pretensa finalidade do projeto, pois pode-se verificar ao longo das duas pesquisas que objetivo do curso - de formar mulheres para serem “boas donas-de-casa” - não só não foi atingido, como paradoxalmente propiciou, também, a formação de mulheres independentes e críticas que não se coadunam com imagens simplistas, nem hegemônicas.

MARCAS DE UMA FORMACAO ESCOLAR: AS REGRAS DE COMPOSICAO RETORICA NO MEMORIAL ORGANICO DE FRANCISCO ADOLFO DE VARNHAGEN

Laura Nogueira Oliveira, Doutoranda em literatura comparada - Faculdade de Letras UFMG – Belo Horizonte – Brasil.

Em 1852, Francisco Adolfo de Varnhagen apresentava os requisitos que considerava imprescindíveis à redação de uma obra de história. Destacava entao que a primeira missão do historiador era resgatar dos arquivos os documentos capazes de fornecerem as informações fundamentais para a construção da narrativa histórica. Um historiador que se pautasse por semelhante método, afirmava, poderia erigir um conhecimento historico verídico. Sem nenhuma dúvida, Varnhagen foi um homem do historicismo preocupado com a idéia de que “(...) a utilidade das teorias estava na razão direta de seu apoio empírico”. O historiador historicista arrola fatos e testemunhas e

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neles acreditava encontrar/desvendar a história como uma “(...) realidade preexistente imutável, aguardando sua correta identificação pelo sujeito”.

Contudo, Varnhagen afirmava que aos “áridos estudos” o historiador deveria somar uma preocupação com o “estilo”. O historiador deveria seguir o “estylo dos oradores de tribuna” pois “todo escrito histórico depende da narração”. Por mais que o historiador houvesse levantado e colecionado documentos era preciso bem manejar a língua. Varnhagen atrelava a verdade histórica à linguagem e prescrevia: o bem falar do advogado ou jurista “deveria” ser o modelo seguido por aqueles que pretendessem narrar o passado. Considera-se aqui que a maneira prescritiva de falar é um verdadeiro distintivo léxico nos discursos de retórica-poética.

Ao longo do século XIX, o estudo da retórica foi parte constituinte da formação intelectual da juventude brasileira e portuguesa, o que explicaria a existência de um significativo movimento editorial de livros de retórica que tinham como público certo, mas não exclusivo, os alunos das escolas. Nos colégios, os alunos tinham acesso a uma educação retórica que lhes facultava o acesso a um repertório de recursos técnicos; mas mais do que um conjunto de técnicas, mais do que um tema aprendido, transforma-se no próprio ambiente cultural.

Provavelmente Varnhagen, assim como seus contemporâneos, fez uso de recursos da retorica. Em outubro/novembro de 1851, nas páginas da revista Guanabara, Varnhagen publicava um texto intitulado Memorial Orgânico. Este texto, acredito, traz marcas construtivas de um discurso retórico e a análise de sua estrutura discursiva provavelmente denuncie as marcas da formacao colegial de Varnhagen, realizada no Colegio Militar da Luz, em Lisboa.

VARNHAGEN, F. A. Como se deve entender a nacionalidade na História do Brasil. In: Anuário do Museu Imperial de Petrópolis, 1948. WELHING, Arno. Estado, história, memória: Varnhagen e a construção da identidade nacional. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000, p. 131. Idem. p. 153. Ver o estudo realizado por SOUZA, Roberto Acízelo de. O Império da eloqüência: retórica e poética no Brasil oitocentista. Rio de Janeiro: Ed. UERJ/EdUFF, 1999. p. 70. VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. Memorial Orgânico. Guanabara, revista mensal, artístico, científico e literária, Rio de Janeiro: Tipografia de Paula Brito, p. 356-370, 384-402, out/nov 1851.

EDUCAÇÃO E RELIGIÃO DURANTE O ESTADO NOVO EM PERNAMBUCO

Lêda Rejane Accioly Sellaro, Universidade Federal de Pernambuco

Este estudo busca aprofundar a compreensão das relações entre Estado e Igreja em Pernambuco, durante a ditadura do Estado Novo (1937-1945), pela contextualização e análise das mudanças impostas à estrutura organizacional e ao funcionamento do seu Sistema Público de Ensino, pelo interventor federal Agamenon Magalhães, com a participação efetiva da Congregação Mariana, na qual recrutou seus principais colaboradores. A educação, então em franca expansão, com base no modelo da Escola Nova - definida pelos católicos como materialista, no plano psicológico e didático-, foi radicalmente mudada. O ideário escolanovista foi duramente reprimido, as lideranças do movimento renovador da educação foram substituídas e suas instituições foram abandonadas até serem extintas. Agamenon valeu-se da religião para doutrinar as massas, alegando a necessidade de desenvolver a responsabilidade social e combater o comunismo. Ao mesmo tempo, possibilitou à Igreja a reconquista da hegemonia, atingida pelas medidas constitucionais que haviam acabado com o padroado, em 1891. Opondo-se ao Estado liberal, a Igreja já promovera uma reviravolta, na década de 20, para apostar na República contra o poder latente das massas, que tentava mobilizar pelos congressos, como forma de retomar o poder. Para os liberais renovadores, muitos dos problemas relacionados com o atraso do país e da educação podiam ser atribuídos à tutela religiosa. Nesse sentido, moviam-se também os positivistas - o saber substituindo o dogma e o desenvolvimento industrial favorecendo a modernização da sociedade. Assim, o sentido que foi dado à educação já era conhecido, por ser defendido por grupos católicos tradicionalistas, que atuavam, sobretudo a partir de 30, sob a liderança do jesuíta português, Antônio Paulo Ciríaco Fernandes, diretor espiritual da

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Congregação Mariana, logo transformado na segunda pessoa do governo. Na mesma direção agiam A União de Moços Católicos e o Centro D. Vital, congregando os católicos mais letrados, escritores, jornalistas, etc.; e, no meio estudantil, a Ação Universitária Católica - AUC - integrada por jovens acadêmicos. A reconquista do espaço educacional pela Igreja, com seu projeto catequético, foi marcada, sobretudo, pelo re-introdução do ensino religioso no currículo escolar, com programas, horários e professores especializados e em maior número que os professores de letras. A retomada dos espaços físicos culminava com entronização do crucifixo nas paredes das escolas, então benzidas pelos sacerdotes católicos. Por estas e outras formas, a educação e a religião foram novamente utilizadas pelo Estado e pela Igreja, como meios de fortalecimento mútuo e, ao mesmo tempo, de consolidação da ditadura do Estado Novo.

OS SIGNIFICADOS E SENTIDOS ATRIBUÍDOS A ESCOLA NORMAL E A PROFISSÃO DOCENTE INCORPORADOS NOS DISCURSOS DE FORMATURA DE PROFESSORAS E PARANINFOS ENTRE OS ANOS DE 1940 E 1960

Leila de Alvarenga Mafra, PUC/MG

Este estudo analisa um conjunto de documentos (discursos de formatura) coletados ao longo de uma pesquisa mais ampla, financiada pelo FIP/PUC/MG e pela FAPEMIG, e que teve como objetivo examinar as continuidades e mudanças na trajetória do Instituto de Educação/MG, e no percurso profissional de professoras ali formadas, entre os anos de 1940-1990. Identifico e analiso nestes discursos, os significados e as imagens construídas sobre a Escola Normal, e sobre a profissão docente, tomando-os como um sistema de referências simbólicas. Parto do pressuposto que este sistema constitui um instrumento de conhecimento e de construção do mundo, e se impõe como um poder simbólico, e como um saber ativo, na formação das professoras. Procuro apreender a função social deste campo simbólico na formação dessas professoras, seja enquanto definidor de um “conformismo lógico” e de um “consensus’’ sobre o mundo social e sobre o lugar ocupado neste, pela professora, (Durkheim, 1987), seja enquanto gerador de formas de comunicação e de sobrevivência (Elias,1994) deste grupo profissional. Estas referências simbólicas são também analisadas como um poder arbitrário e reconhecido, que segundo Bourdieu, (1989) possui a força“de fazer crer e fazer ver, de confirmar ou de transformar a visão de mundo e a ação sobre o mundo.”Tomo para análise, 20 discursos de alunas-oradoras, e de paraninfos, apresentados em cerimônias de formatura entre os anos 1940 e 1960, no Instituto de Educação de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Estes discursos foram localizados nos Livros de Recortes e no Livro Memorial encontrados no arquivo do Instituto de Educação, nos Jornais da época, em especial, o Diário de Minas, Diário da Tarde e o Minas Gerais, onde alguns desses discursos foram publicados.

ESPAÇO, CONHECIMENTO E CURRÍCULO

Leila Lourenço e Giani Rabelo, UNESC 

O artigo Espaço, conhecimento e currículo é fruto do projeto de pesquisa Escolas, professores, currículo:a Secretaria de Educação Municipal na história da educação(Criciúma/SC/Brasil/1925 a 2001), projeto realizado com a parceria entre Secretaria Municipal de Educação de Criciúma e Universidade do Extremo Sul Catarinense-UNESC. Este artigo compõe a publicação do primeiro caderno das histórias das escolas da rede municipal de educação de Criciúma, intitulado:.A escola na colina:Grupo Escolar Núcleo Hercílio Luz,publicação que conta como as autoras Giani Rabelo, Marli de Oliveira Costa e Leila Lourenço.Neste artigo procuramos dar visibilidade às experiências educacionais referentes ao espaço (arquitetura), conhecimento e currículo de alunos/as, professores/ras, secretarias de educação materializadas na unidade de ensino municipal chamada Grupo Escolar Núcleo Hercílio Luz, no bairro Morro Estevão da cidade de Criciúma, no período acima citado. A escola apresenta uma característica relevante, é pertencente à zona rural da cidade.É formada, ainda, predominantemente, por habitantes descendentes de

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imigrantes europeus, mais precisamente de italianos Utilizamos como fontes de pesquisa os registros escolares que existiam nesta unidade de ensino como livros de atas de reuniões dos vários seguimentos que compõem a comunidade escolar,livro de matrículas, levantamos as reportagens dos jornais da cidade de grande parte do período pesquisado, realizamos entrevistas com ex-professoras, ex-alunos/alunas, coletamos fotografias de época. Fundamentamo-nos teoricamente em autores que trabalham a categoria memória, gênero,as relações de poder, a questão de história da educação, o currículo, infância.O artigo reflete sobre idéias, doutrinas e modelos pedagógicos perceptíveis, ao longo do tempo, no cotidiano da escola, possibilitando compreender como a escola, de ensino elementar (1a a 4a série), no Brasil, foi se tornando pública, qual era a principal finalidade desse ensino, qual a concepção de ensino e aprendizagem e que tipo de conhecimento, metodologia e avaliação eram utilizadas. Consegue-se perceber, como resultado da investigação, que o ensino da língua oficial , o português, foi fortemente uma política pública de educação, sendo que em comunidades descendentes de imigrantes a língua de origem era vista como algo feio, errado, como vício e para tanto foi instituído a criação da liga pró-língua nacional, formada por crianças com acompanhamento de professora titular. Havia a instituição de um programa de ensino oficial e sua aplicação era acompanhada, fiscalizada pelos inspetores de ensino. Durante as primeiras décadas do século XX, havia os exames de final de ano, sendo que para tanto se formava uma banca de exames, a reprovação escolar desses alunos/as era muito alta.

MEMÓRIA DA FORMAÇÃO MÉDICA: LEMBRANÇAS DE ALUNOS EGRESSOS DO CURSO DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE (NATAL/BRASIL)

Lenina Lopes Soares Silva e Vânia de Vasconcelos Gico, UFRN

Discute-se as lembranças dos alunos egressos do Curso de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Natal/Brasil), no período de 1960 a 2003, tendo a memória como referencial empírico, por sua capacidade de recursividade dialógica, objetivando-se analisar a mediação pedagógica da formação médica, visando-se promover o diálogo entre a história social e a memória educacional de professores e alunos, mediante os registros e a preservação dos dados coletados nos depoimentos dos sujeitos, no sentido de revelar a memória sócio-educativa daqueles que contribuíram com suas ações para existência do saber e do fazer da educação médica num dado momento e espaço histórico-social.

LEVANTAMENTO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE EJA NO RS ENTRE OS ANOS DE 1985 A 2002.

Lenira Weil Ferreira, Ana Maria Tramunt Ibaños e Sandra Maria Baldin, BIC/FAPERGS

O presente trabalho visa a um levantamento documental da produção de dissertações e teses acadêmicas que tenham como foco principal à educação de jovens e adultos (EJA), no estado do Rio Grande do Sul.O objetivo é o de se obter uma maior compreensão do que norteia a identidade das concepções e práticas pedagógicas (metodológicas e lingüísticas) acerca da EJA, no período de 1985-2003. Esta pesquisa sustenta-se na abordagem histórica qualitativa, onde a produção acadêmica dos cursos de pós-graduação compreende fontes primárias.A primeira etapa consistiu numa análise das produções realizadas na PUCRS, UFRGS e UNISINOS. A segunda etapa abrangeu o Estado como um todo.A análise dos dados levantados, levou-nos à definição das seguintes categorias:(a) Alfabetização e Pós-Alfabetização(b) Formação de professores de EJA(c) Educação e Trabalho(d) Questões Curriculares

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que se enquadram nas linhas de pesquisa:(1) Educação Brasileira(2) Desenvolvimento da pessoa(3) Políticas de Educação(4) Conhecimento, subjetividade e práticas educacionais(5) Políticas de Formação

Da totalidade (vinte e dois) trabalhos analisados, sobressaem-se estudos que focalizam as linhas (4) e (3) respectivamente. A concepção mais evidenciada nos trabalhos é a progressista libertadora dialógica. O que chama a atenção, no entanto, é a ausência de alguns teóricos utilizados na formação de professos de EJA como: Celso de Rui Beisiegel, Luis Eduardo Wanderlei, Jorge Nagle, Marília Sposito, Pedro Demo, Célia Carvalho, Carlos R. Brandão, Rosa Maria Torres, Sérgio Haddad, Gaetana di Rocco, conforme ressaltados pelo INEP. Da mesma forma há significativa falta de estudos historiográficos em EJA. Outro problema que se apresenta é a falta de uma interação entre práticas pedagógicas e os estudos lingüísticos sobre a alfabetização. Essa quase total dissociação entre as duas áreas e, conseqüentemente, o não aproveitamento dos estudos sistemáticos realizados pela Lingüística em termos de aquisição da língua escrita, empobrece, ainda mais, os estudos que contemplam a educação de jovens e adultos. Ressalta-se, também, que o aporte teórico no campo da EJA é considerado secundário, sendo visto como de educação compensatória e supletiva.

DOS EMBATES POLÍTICO-IDEOLÓGICOS À SALA DE AULA: O ENSINO DA HISTÓRIA DO BRASIL COMO FORMADOR DE IDENTIDADE

Leonardo Machado Palhares, FAE/UFMG

Este trabalho utiliza os aportes teóricos-metodológicos da História Cultural, tendo como referenciais os estudos sobre imaginário e representações políticas durante o Governo Vargas.

A compreensão das apropriações feitas do ensino de História do Brasil, durante a primeira fase da Era Vargas – especificamente entre a publicação da Reforma Francisco Campos (Decreto 19.890/31), em 1931 e o início do Estado Novo em 1937 – é o que motiva este estudo, pois, compreendemos que um dos principais embates político-ideológicos neste momento é sobre os rumos da educação. O ensino da História do Brasil é um dos motivadores dos debates educacionais que preocupavam-se com a apropriação e divulgação do passado brasileiro com vistas à construção de imaginários coletivos.

Os discursos de profissionais da educação e de políticos sobre o ensino destacavam a importância da disciplina História como formadora da identidade dos brasileiros. Entre propostas laicizantes e religiosas estabeleceu-se um programa de caráter centralizador que promoveu a justaposição da História da América e do Brasil à História da Civilização Ocidental.

A implementação deste programa não se deu de forma tranqüila, o confronto entre defensores da História da Civilização e defensores da separação entre a História Geral e a História do Brasil prosseguiu durante todo período em estudo.

Compreender o embate e seu desenrolar no âmbito federal é o que tem motivado vários estudos, com a predominância de trabalhos sobre os programas e os manuais de ensino. Contudo, os estudos sobre a recepção destes programas e o uso dos manuais no âmbito dos estados da federação ainda são poucos, principalmente os que vislumbram as possibilidades de identificação da implementação do programa na prática escolar.

Propomos a realização de estudo sobre a apropriação das representações construídas pelo ensino de História, com ênfase na História do Brasil, tendo como objetivo a identificação do ensino desta disciplina como formadora de identidade e fortalecedora de determinados valores nos alunos de escolas do estado de Minas Gerais.

Para realizarmos o estudo utilizamos como fontes o decreto 19.890/31 e os programas para o ensino de História de 1931 (ensino fundamental) e o de 1936 (ensino complementar), as redações feitas por alunos de escolas mineiras, ganhadoras de concursos literários com temas que versavam

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sobre a História do Brasil, publicados no suplemento infantil do jornal Estado de Minas, e os manuais didáticos adotados no período. Buscamos confrontar as orientações fornecidas pelos programas com os textos produzidos pelos alunos, tendo os manuais didáticos como mediadores neste processo de apropriação do conhecimento.

ESTUDO DO ENSINO DE ODONTOLOGIA NO PIAUÍ - UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

Leonardo Borges Ferro, UFPI

O presente trabalho é parte de um estudo sobre a história do ensino da Odontologia no Estado do Piauí. Está inserido num projeto mais amplo que objetiva resgatar a história da Universidade Federal deste Estado. A pesquisa objetiva produzir dissertações de mestrado em educação, Para tanto estão sendo considerados fontes como, registros oficiais (documentos), artigos de jornais e depoimentos orais de professores alunos e funcionários. A história do curso de odontologia coloca-se de maneira relevante, como um dos cursos precursores da UFPI, desde a formação do “Movimento pró-Faculdade de Odontologia do Piauí” nos idos de 1947, passando por todas as movimentações, e articulações para que no ano de 1961 fosse iniciado o primeiro curso da área da saúde no Piauí. É importante ressaltar também a árdua batalha para o reconhecimento do curso perante o Ministério da Educação, o processo de estadualização da faculdade. Todos estes fatos são parte da memória não só do ensino odontológico, mas também da própria Universidade Federal do Piauí que nasceu fruto do sucesso e da aglutinação das faculdades preexistentes. A instalação da faculdade de Odontologia do Piauí foi cercada por diversas peculiaridades, fundada como uma instituição particular, depois de mais de uma década de articulações e planejamento para sua concretização, mas pelo grande aporte de recurso necessário para a criação, funcionamento, e principalmente para o reconhecimento do curso perante o ministério da Educação, o governo estadual, reconhecendo a importância e a necessidade do ensino superior para os moradores do Piauí assume a responsabilidade pelo funcionamento do curso, e o estadualiza, providenciando a estrutura para que o curso seja então reconhecido oficialmente, o que só ocorre alguns anos após a conclusão da primeira turma. No final dos anos 60 a então faculdade estadual de Odontologia do Piauí juntamente com outras quatro faculdades existentes, Direito, Filosofia, Medicina, e Administração, se aglutinam para juntas formarem no ano de 1971 a Universidade Federal do Piauí, a primeira Universidade a se instalar em terras Piauienses. Trata-se de um estudo historiográfico fundamentado na História Cultural, através de autores como Roger Chartier. A análise do cotidiano do ensino, da cultura escolar e das memórias de professores e alunos recebe influencia dos estudos de Michel de Certeau, Vinão Frago, Antônio Novoa, Cecília Corteze, e estende-se de 1947 a 2003.

O ENSINO DA ESCRITA NOS MANUAIS DE APRENDER A LER, ESCREVER E CONTAR PORTUGUESES DO SÉCULO XVIII

Leonor Calvão Borges, Arquivo Histórico Parlamentar

Com base em onze manuais ou pautas portugueses de aprender a ler, escrever e contar setecentistas, numa trajectória que vai da Nova Escola para aprender a escrever, ler e contar de Manuel Andrade de Figueiredo (1722) à Escola Popular das primeiras letras de Jerónimo Soares Barbosa (1796), passando por Prendas da adolescencia, ou adolescencia prendada com as prendas, artes, e curiosidades mais uteis, deliciosas e estimadas em todo o mundo de José Lopes Baptista de Almada (1749), Instrução de Principiantes e novo Método de se aprenderem as primeiras letras para uso das Escolas da Congregação do Oratório (1750), Escola nova cristã e política de Leonor Tomázia de Sousa e Silva (1756), Escola Portuguesa de Valentim Coelho de Mendonça (1773), Instrução metódica e especulativa de Leonardo José Pimenta (1774), Método que se deve praticar nas nossas escolas, segundo o que se observava no tempo do Senhor Manuel Domingues de Teodoro de Almeida (1779), Escola Fundamental ou Methodo facil para a prender a ler, escrever e contar (1779) Arte de Escrever Perfeitamente (1784), Nova Escola de Meninos de Manuel Dias de Sousa

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(1784), Nova arte de escrever de António Jacinto de Araújo (1794) com relevo para a história da escrita em Portugal, procuram identificar-se as teorias sobre a escrita existentes em Portugal, num século que profundamente marcado pela evolução e aproximação às teorias e práticas europeias.Através deles, e comparando-os com a produção de manuais europeus sobre o mesmo tema, serão analisados os seus autores, situando-os na época e nas suas ligações ao ensino da escrita.

Cada manual será analisado de acordo com os parâmetros de modernidade ou não das respectivas propostas de ensino da escrita, nomeadamente influências teóricas externas e controvérsias internas; tipo de ensino da escrita proposto (manual ou através de impressos); tipo de alfabetos ensinados e teorias da escrita e práticas apresentadas.

Simultaneamente serão analisados os tipos de escrita existentes à época e a sua ligação às crescentes necessidades de modernização da escrita tendo em vista a crescente complexidade administrativa estatal.

QUANDO A IMPRENSA DIÁRIA É IMPRENSA PEDAGÓGICA. SÃO PAULO, 1918

Liane Maria Bertucci-Martins, Universidade Federal do Paraná

Desde o final do século XIX que noções médico-científicas espraiavam-se entre os moradores da cidade de São Paulo (Brasil), em grande parte devido a divulgação deste conhecimento feita pelos chamados dicionários de medicina, como o Chernoviz e o Langgaard; e através da imprensa diária da cidade, que veiculava informes médicos sobre questões de saúde/doença e possíveis tratamentos para os achaques que mais afligiam os paulistanos. Era uma educação quase invisível mas constante.

Nos primeiros dias de outubro de 1918, os mais de 528.000 moradores da cidade, capital do estado de São Paulo, estavam atormentados. Desde junho, notícias sobre uma nova epidemia pontuavam na imprensa mas, a partir de setembro, informações sobre a enfermidade, que chamavam gripe espanhola ou influenza espanhola, eram cada vez mais assustadoras: a moléstia já estaria fazendo as pessoas adoecerem no Brasil. Em poucos dias, o Serviço Sanitário do Estado de São Paulo (principal órgão governamental encarregado das questões de saúde) confirmava a existência da doença na cidade e a educação surgiu como arma fundamental para debelar a moléstia epidêmica.

As primeiras considerações oficiais sobre a enfermidade foram elaboradas pelos médicos do Serviço Sanitário dia 14 de outubro e publicadas pela maioria dos jornais de São Paulo no dia seguinte. Com o intuito de esclarecer os moradores da cidade sobre a moléstia, suas características e algumas formas de combate, esses pareceres foram reeditados pela imprensa visando educar a população: buscavam estimular atitudes, redefinir hábitos e criar novas formas de ação. A função pedagógica da imprensa diária de São Paulo aparecia, assim, de forma explícita durante o momento crítico da epidemia de 1918.

Ao longo das semanas os pareceres ganharam diferentes nuanças, combinados com outras instruções médicas - destaque para o apelo à higiene pessoal e ao cuidado com os contatos sociais. Nesse contexto, educar de maneira privilegiada a população mais pobre (operária e imigrante), da capital foi preocupação constante de médicos e de autoridades governamentais. O papel dos jornais foi então decisivo, culminando com a sugestão para que instruções médicas fossem escritas em português e italiano e distribuídas, de porta em porta, pelos bairros operários da cidade.

Dessa forma, resgatar esse período da história de São Paulo, onde a imprensa exerceu papel singular, procurando educar a população na tentativa de acabar com a epidemia de 1918, é o objetivo deste texto. Partindo do pressuposto que os caminhos da educação e de seus processos pedagógicos, como os do saber médico-científico, são feitos e refeitos na sociedade pela ação constante dos homens (veja P.Burke, R.Chartier; E.P.Thompson), é possível perceber que a imprensa diária é, também, imprensa pedagógica, especialmente em alguns momentos históricos.

PADRÕES DE FUNCIONAMENTO DA ESCOLA ELEMENTAR E MÉDIA BRASILEIRAS NAS DÉCADAS DE 1950-1960

Libânia Nacif Xavier, UFRJ

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O objetivo central deste trabalho é analisar a contribuição teórica e prática de dois educadores que ocuparam postos no segundo escalão da administração educacional: João Roberto Moreira e Jayme Abreu. Ambos são autores de um amplo conjunto de estudos e publicações sobre a educação brasileira em geral e sobre o ensino elementar e médio em particular. Tais estudos não foram suficientemente explorados em seu conjunto, apesar de serem reconhecidos como contribuições relevantes para o conhecimento da história da educação brasileira.

Pretendemos dar continuidade ao trabalho que começamos a desenvolver em março de 2000, por meio do qual se buscou promover a organização dos arquivos pessoais de João Roberto Moreira e de Jayme Abreu. Em meio ao conjunto de estudos manuscritos, publicações e relatórios produzidos pelos dois educadores, sobressaem os estudos relacionados às observações sobre a escola elementar e média brasileira. Estes resultaram da análise de dados provenientes dos levantamentos e inquéritos mobilizados pela Campanha de Inquéritos e Levantamentos do Ensino Médio e Elementar (CILEME), instituída pela Portaria Ministerial nº 160 de 26 de março de 1953.

O conhecimento acumulado com a organização desse acervo documental ensejou a elaboração de um balanço interpretativo da contribuição de suas obras para o conhecimento dos padrões de organização e, também, para a identificação dos problemas da escola elementar e média brasileira, tal como eles a descreveram nos estudos realizados durante as décadas de 1950-60.

Por sua vez, o estudo da contribuição destes profissionais da educação nos permitiu reconstituir, em linhas gerais, as perspectivas e os problemas estruturais que acompanharam o processo de generalização da escola de massas, particularmente da escola primária e secundária brasileira, assim como evidenciou a contribuição destes dois educadores para o desenvolvimento da pesquisa educacional e a consolidação de instituições educacionais brasileira tais como o Ministério da Educação e Cultura (MEC).

O DOCUMENTO FOTOGRÁFICO: FONTE PARA O CONHECIMENTO DA PRESENÇA NEGRA NA ESCOLA PÚBLICA BRASILEIRA

Lídia Nunes Cunha, NEPHEP – UFPE - ISEA

O alargamento teórico e prático das possibilidades de fontes documentais no campo da pesquisa histórica, tem resultado no alargamento das compreensões a respeito da presença de novos atores sociais, oriundos de setores que se encontram nos espaços pouco privilegiado da hierarquia social.

Partindo dessa perspectiva particularmente ampliada com o recurso a outras fontes que não somente o documento escrito, torna-se importante reconstruir essas presenças históricas nos espaços educacionais públicos, a exemplo da presença negra, tornando-se a fotografia, um recurso a mais a que recorremos com a intenção de trazer à superfície informações até então soterradas e escondidas. Para isto, realizamos estudos a respeito do uso desta fonte documental, percebendo a partir daí os limites, as possibilidades e os avanços que pode trazer para os pesquisadores da história da educação, e especialmente àqueles que desejam reconstruir a história da presença negra na educação pública brasileira.

Alguns cuidados são imprescindíveis a atenção do pesquisador. Primeiro, uma leitura e releitura quase interminável da fonte. Segundo, disposição para se desprender de conclusões animadoras que o contato com este suporte documental, pelo seu fascínio, nos proporciona. No que concerne a pesquisa em história da educação, esta é uma fonte que ainda precisa ser vista e lida para além do caráter de mera ilustração e meio de comprovação da fonte escrita.

A partir do acervo iconográfico (fotografias) do Arquivo Público Estadual do Estado de Pernambuco - Brasil, nosso trabalho tentou compreender e identificar a presença da população negra na educação escolar no período entre fins da década de 1920 até 1936. Para isto, levamos em consideração o contexto ideológico do período no que diz respeito à temática da raça, da civilização e do progresso como alicerces para a construção de uma identidade nacional e o papel que a educação assume ao lado dos saberes médico e jurídico na condução deste projeto.

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Revisando o conceito de exclusão à luz dos discursos elaborados nos fins do século passado e pondo-o frente às imagens, foi possível constatar que se de fato a população negra não possui as mesmas condições e oportunidades para, enquanto grupo, melhorar a sua posição na hierarquia social, sua inserção nos espaços sociais em matéria de oportunidades, existiu de forma limitada. A heterogeneidade não sustentou um discurso e uma prática evidente de exclusão, porém, antes desta característica significar uma certa brandura das relações étnico-raciais no país, ela nos fornece a pista para a constatação daquilo que chamamos de semi-exclusão que resulta numa semi-inclusão dos grupos subalternos no qual se encontra a maioria da população negra.

PARA SER CATEDRÁTICO NA ESCOLA NORMAL: OS CONCURSOS DO MAGISTÉRIO

Liéte Oliveira Accácio, FEITA

Um governo que se proclama fundamentalmente educador busca expandir, no Rio de Janeiro, Brasil, nos anos vinte do século XX, o movimento de transformação da educação, numa campanha educacional que objetiva um programa de intervenção política. Os agentes do Estado na direção da educação municipal, na capital federal, desenvolvem ações delineando a organização escolar em um sistema de educação pública. Concebem uma obra orgânica, sistematizando o pensamento moderno, com consciência das necessidades nacionais. Buscam a legitimidade pela imposição e aceitação de normas como ponto base na organização. A reorganização do ensino, proposta por meio de reforma profunda, tem um dos seus pólos nos trabalhos de reorganização do corpo docente da Escola Normal do Distrito Federal. O lugar privilegiado conferido à normalização dos procedimentos em educação aparece nos critérios particulares dos concursos para catedrático da Escola Normal. Os intelectuais que ocupam os vários lugares - candidatos, membros das bancas, docentes que serão substituídos por catedráticos - partilham bancos escolares, cumplicidade familiar, filiação política e lealdades regionais, contando com o capital das relações sociais e trunfos escolares e culturais, estabelecendo redes de relações. Os candidatos aos concursos, oriundos de várias esferas de atuação profissional, mas participantes de cultura humanista comum, procuram ocupação no magistério, na busca de cargos no âmbito do Estado que disponham de vencimento condigno, prestígio e garantias. Os concursos vão funcionar como forma de credenciamento, suporte legal para o exercício da atividade docente, licença para ensinar que confere o estatuto profissional da possessão de um conjunto de conhecimentos especializados, permitindo a realização de trabalho de importância social. As teses exigidas como prova de concurso explicam o Brasil, em coerência com o debate na sociedade da época. Situadas no eixo do pensamento dos intelectuais, criticam as oligarquias, formas de governo, reconhecem a existência de um Brasil urbano que se afasta de suas raízes agrárias, buscam formas de integração no organismo social, preocupam-se com as determinações raciais na formação da sociedade e do homem brasileiro. Ordenam o campo da educação em ampla busca do novo. Certa impaciência e intolerância caracterizam defesas extremas; aparece, em muitas, um sentido de missão, sonho, objetivo de vida; outras elegem-se defensoras de mudanças e guardiães de um nova ordem no campo educacional, conscientes da indissociabilidade dos planos cultural e político. Está em jogo a organização do ensino das diversas disciplinas, com a aprovação ou não das diversas teses apresentadas nos concursos indicando a linha a ser seguida em seu ensino.

DO AUTOR AO LEITOR - AS SELECTAS LITERÁRIAS DO ENSINO SECUNDÁRIO (1895-1948)

Lígia Penim, FPCE da Universidade de Lisboa

Esta é uma investigação integrada no meu projecto de doutoramento. Nela tratarei do papel das selectas literárias no ensino da língua portuguesa nos liceus e escolas técnicas entre 1895 e 1948. Dividi este trabalho em dois tempos:

1. Procuro as condições de funcionamento discursivo das selectas literárias. Viso aquilo que determinou as formas como foi produzida e que permitiu a sua circulação como instrumento para

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o ensino da língua. Por isso, parto das normas instituídas curricularmente mas, para além delas, os factores implícitos à sua aprovação e à legitimação dos seus autores. Considero as autorias das selectas literárias como mecanismos agregadores dos vários textos que incluíam. As selectas são compostas por uma diversidade de excertos textuais, geralmente de carácter literário. Essa enorme fragmentação enunciativa adquire unidade pela função pedagógica de facilitar a aprendizagem dos alunos de modelos de boa escrita. A função pedagógica de promoção da leitura e da escri1a são garantidas por um dispositivo autoral. O dispositivo destas autorias comportou toda uma engenharia construtiva por referência a textos que trazem consigo a autoridade canónica dos autores da literatura. Os «autores» das selectas coligiram, coleccionaram, compilaram, titularam e sequenciaram textos de outros autores e, nessas operações aumentaram a sua legitimidade. Mas, que estatuto tinham esses autores para poderem organizar os saberes da língua materna?

2. Foco as formas como se dispuseram os textos para proporcionar leituras. Os conteúdos para o ensino da língua portuguesa foram montados através do recorte e colagem de textos de diversa origem. Importa, por isso, compreender que critérios estiveram na base da selecção e organização desses textos para corresponderem a objectivos de formação dos alunos. A que regras de enunciação obedeceram, a que tempos de apreensão do sentido, a que recursos estilísticos, a que rituais de aprendizagem estiveram ligados os textos que compuseram as selectas literárias. Com estas formas de operacionalização da língua portuguesa procurou-se fomentar a leitura. Mas, a leitura não é uma categoria universal. Não lemos de forma idêntica textos diferentes. Por isso, a escolha de determinados textos em detrimento de outros será igualmente a escolha na formação de determinadas leituras e leitores.

Desta forma, existe um elo entre as condições de construção históricas das selectas literárias e os sentidos que elas possibilitam nas leituras que os alunos a partir delas fizeram. E essa conexão entre a produção e a interpretação das selectas literárias do final do século XIX até às reformas liceais e técnicas de 1948, que eu pesquiso.

O MARXISMO NO DISCURSO EDUCACIONAL BRASILEIRO: CONSIDERAÇÕES ACERCA DA PRÁXIS – 1968-1988.

Lígia Regina Klein, Professora-pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná.

A categoria marxista que apreende a unidade teoria-e-prática – práxis – é de importância evidente nas formulações teóricas no campo da educação. Esta categoria mostra-se recorrente no debate educacional de orientação marxista, sempre articulada à crítica da ruptura – decorrente da divisão social do trabalho sob o modo capitalista de produção – entre teoria e prática. A afirmação dessa ruptura, entretanto, quando não desenvolvida rigorosamente em seus fundamentos, apresenta-se problemática sob, pelo menos, dois aspectos: i) contrasta com o pressuposto de que o trabalho, por mais simples que seja a atividade desenvolvida, necessariamente estabelece relação teórico-prática; ii) supõe a possibilidade de que a teoria se realize de forma emancipada da prática. O presente trabalho, fruto da tentativa de enfrentamento do caráter problemático dessa afirmação, pretende apresentar os resultados de um estudo crítico sobre a apropriação, pelo discurso educacional brasileiro, da categoria marxista da práxis, no período de 1968 a 1988. O recorte histórico tem como referência o período de enfrentamento da ditadura militar, período este no qual a recorrência ao pensamento marxista foi especialmente marcante entre os intelectuais brasileiros que se opunham ao regime ditatorial. Como fonte, esta pesquisa apoiou-se nas produções teóricas dos educadores mais expressivos do período. Entre os resultados mais relevantes destaca-se a utilização dessa categoria à margem da dialética entre “trabalhador coletivo” e “trabalhador individual”. A análise desta questão específica constitui o conteúdo do presente trabalho.

A ATUAÇÃO DA IGREJA CATÓLICA EM PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO POPULAR NO BRASIL ENTRE 1960 E 1990

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Lilian M. P. C. Ramos

Partindo do Concílio Ecumênico Vaticano II e estendendo-se até a década de 90, esta comunicação analisa a atuação e a influência da Igreja Católica nos movimentos de educação popular no Brasil. O novo modelo adotado pela Igreja no Brasil de opção pelos pobres - na verdade uma continuação de ações realizadas na década de 50 - favoreceu o desenvolvimento de programas de educação e valorização da cultura popular, como o SAR, o RENEC e o MEB. Paulo Freire, figura de maior destaque no período, foi por sua vez fortemente influenciado pelo existencialismo cristão. Essa época de efervescência política e cultural congregou liberais, esquerdas marxistas e esquerdas cristãs em diferentes projetos educacionais até a Revolução de 1964. A ditadura provocou a interrupção de quase todos os projetos e iniciou um período de perseguição política a todos os envolvidos com grupos sociais progressistas. Após a abertura política nos anos 70, a Igreja muda sua forma de atuação e passa a apoiar o fortalecimento da sociedade civil através dos movimentos e organizações populares. As recém surgidas Comunidades Eclesiais de Base e Organizações Não Governamentais (ONGs) dedicam-se a trabalhos de base com a colaboração de padres, freiras e leigos, marcando a preeminência da Teologia da Libertação. A partir de 1986 uma tendência conservadora começa a dominar o pensamento católico, desacelerando a participação de membros da Igreja nos movimentos populares. Por outro lado, as ONGs vão se fortalecendo e adquirindo um perfil mais visível, dedicando-se a projetos voltados para os excluídos da sociedade. Mas isso só foi possível por que essas organizações puderam contar com o apoio das Pastorais Sociais e da infraestrutura física e organizacional proporcionada pela Igreja Católica.

IGREJA E EDUCAÇÃO: O COLÉGIO SANTA TERESA- ITUIUTABA, MINAS GERAIS, BRASIL 1939-1942

Lúcia Helena M.de M. Oliveira , UFU e UEMG

Esta comunicação é o resultado final do estudo sobre o Colégio Santa Teresa, de Ituiutaba, Triângulo Mineiro, Minas Gerais, Brasil. A pesquisa objetivou compreender seu processo de criação e desenvolvimento, observando, sobretudo, a infra-estrutura, os discentes, os docentes, a prática pedagógica e os saberes construídos. Buscou-se também apreender os elementos mais significativos do processo de constituição e desenvolvimento da Congregação das Irmãs Carlistas Scalabrinianas e de seu projeto educativo. A abrangência do período estudado é de 1939 - criação do Colégio - a 1942 - conclusão do 4º ano primário pela primeira turma. A bibliografia consultada sobre o assunto, o arquivo de documentos, o acervo iconográfico do Colégio, jornais da época e depoimentos colhidos junto a ex-alunos e professores constituíram-se em fontes importantes para desvelar o sentido histórico do Colégio e possibilitar a interpretação de suas implicações e transformações e a observação de sua singularidade, sem perder de vista seus aspectos mais abrangentes. Os resultados alcançados demonstram que a criação do Colégio fazia parte de um projeto mais amplo da Igreja Católica no Brasil. Além disso, apreendeu-se que o motivo da fundação do Colégio não foi a questão migratória, mas a necessidade de se atender às famílias católicas e tradicionais da cidade e região, como referência educacional para a formação de moças, futuras mães e professoras. Por outro lado, entendeu-se que o Colégio desenvolveu seu projeto educativo norteado pelos princípios religiosos. Além da Língua, matemática, Geografia, História e das Ciências, os ensinamentos católicos e seus rituais eram obrigatórios. Nessa perspectiva, o trabalho com o carisma scalabriniano impulsionou ação pastoral em função das famílias menos abastadas e dos enfermos, envolvendo alunos e suas respectivas famílias. Notou-se que o Colégio, imbuído desses princípios, conseguiu despertar confiabilidade e credibilidade e passou a exercer autoridade educacional e religiosa sobre a sociedade.

ASSOCIAÇÃO DE EDUCAÇÃO CATÓLICA: CATÓLICOS E A ESCOLA PÚBLICA. NOVA POSIÇÃO?

Lucia Maria da Franca Rocha, Universidade Federal da Bahia

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A presente comunicação objetiva analisar a posição da AEC com relação à escola pública, questão que ficou explicita quando a associação católica apresentou à Assembléia Nacional Constituinte( 1987-1988) sua proposta educacional, bem como durante a elaboração e tramitação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional , cujo início ocorreu logo após a promulgação da Carta Constitucional de 5 de outubro de 1988.A AEC partia do entendimento de que as escolas confessionais são instituições públicas não estatais , o que levou o grupo católico a desvincular público de estatal. Nesse momento, a Igreja assume o discurso que não vai na direção da acumulação e reprodução do capital de suas instituições educacionais. A “educação libertadora” (Medellín,1968) e a “ opção preferencial pelos pobres” ( Puebla,1978) entram em conflito com a lógica empresarial capitalista. No momento de fundação da associação católica, em 1945, a AEC estava voltada para a educação das elites e objetivava ampliar e fortalecer seu poder no campo da educacional. A Igreja necessitava dispor de um organismo que fosse capaz de orientar a política educacional no Brasil, tanto em termos ideológicos quanto em termos de diretrizes, na linha da encíclica “ Divini Illius Magistri Nos anos setenta, os bispos reunidos em Puebla reconheceram a crise da escola católica e começaram a questioná-la, dada sua vinculação com a classe dominante. O momento era de abrir o campo educacional para os setores pobres, aqueles que sofriam processo de marginalidade material e cultural. A AEC, ao orientar a educação católica a partir da “opção preferencial pelos pobres”, inseria-se no campo da educação pública com a preocupação de conceber a escola católica como instituição pública.. Para realizar nossa análise, consultamos vários arquivos, da AEC, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, da Câmara dos Deputados. Essa documentação nos possibilitou apresentar diversos posicionamentos entre os defensores da escola pública e os da escola privada. A escolha do período decorreu do objeto de estudo.O marco inicial foi o ano de 1978 , porque a AEC estava envolvida com preparação da Conferência de Puebla, considerados um dos momentos importantes da sua caminhada.Colocamos como marco final os anos de 1990, porque a partir desse ano a questão da escola pública não estatal deixou de ser prioridade no âmbito da AEC.

O PAPEL DA IGREJA NOS PRIMÓRDIOS DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS

Lucia Reily, Unicamp e Puc-Campinas

Pesquisadores que investigam a história da educação dos surdos constatam uma grande fragmentação na narrativa dos textos de acadêmicos e estudantes que abordam essa temática. Listam-se evidências históricas desconexas, como por exemplo: a) no período medieval, surgiu a língua de sinais nos mosteiros, como forma de driblar o voto do silêncio; b) no século XVI, o frade espanhol Pedro Ponce de Leon foi pioneiro na educação dos surdos da nobreza, baseado na oralização e no ensino da escrita; c) em 1620, Juan Pablo Bonet, outro espanhol, publicou o primeiro livro de educação de surdos, com o alfabeto manual; d) na França, o abade Michel Charles de l´Épée foi pioneiro na valorização da língua de sinais na educação dos surdos e aprendeu a língua de sinais com grupos de surdos que vagavam pelas ruas de Paris, trabalhando com surdos de 1760 até sua morte em 1789. Este presente estudo se propõe a compreender as inter-relações dos eventos históricos acima citados e articular o papel de religiosos e da prática dos sinais monásticos medievais e do alfabeto manual nos primeiros ensaios de educação de surdos registrados a partir do século XVI. Os primeiros professores dos surdos foram primordialmente figuras do clero (beneditinos), diferentemente do que ocorreu na educação dos deficientes mentais, que tem sua origem no campo da medicina, com Itard, professor do menino selvagem de Aveyron. Diante desta constatação, este trabalho também se propõe a discutir, com base nos registros existentes, as implicações educacionais do viés religioso na educação desse grupo, em contraposição à abordagem médica que influenciou as experiências pioneiras na educação de pessoas com deficiência mental. Ao apresentar as diversas estratégias

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criadas em várias partes da Europa para tornar a linguagem oral visível para o surdo, este estudo discute as concepções lingüísticas subjacentes que circulavam no período do iluminismo, como fundamentos de práticas educacionais com pessoas surdas. O trabalho conclui com uma reflexão ética envolvendo a divulgação das propostas educacionais para os surdos, já que o processo de registro, publicação e divulgação das metodologias especializadas de pioneiros como o abade de l’Épée, bem como do abade Sicard, levou à disseminação deste trabalho, chegando, inclusive ao Brasil em meados do século XIX, ao contrário do que ocorreu com a metodologia de outros especialistas como Heinecke (Alemanha), Pereira (França, originalmente de Portugal) e Braidwood (Escócia), que mantiveram segredo sobre seus achados.

ENTRE A FÉ A E LEI: O MOVIMENTO EDUCATIVO-RELIGIOSO NA PRIMEIRA REPÚBLICA DO BRASIL (1889-1930)

Lucília de Almeida Neves Delgado e Mauro Passos, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

A relação entre educação e catolicismo atravessa a história e a cultura brasileira. Historicamente a influência do pensamento católico foi marcante, desde sua implantação, com o regime do padroado. Num primeiro momento - período colonial até à proclamação da República, a pedagogia catequética compunha-se com o quadro social. Com o advento do regime republicano, houve a laicização da educação e, ainda, a exclusão do ensino religioso da rede pública de ensino. A República Brasileira, nos seus primeiros anos, foi marcadamente influenciada pelo pensamento positivista de Comte. A disseminação do pensamento positivista, no início da república difundiu as seguintes idéias e práticas: racionalismo (marcado por crítica a idéias e religiões de crença transcendental), modernização baseada na proposta de ordem e progresso, valorização e disciplinarização do trabalho e do trabalhador, concepção de república como bem público, valorização da educação leiga como instrução do espírito. Os debates gerados por isso, se inscrevem num quadro mais amplo. Um conjunto de situações, problemas e desafios envolvem, de um lado, o Estado com a ideologia da modernização da sociedade e, por outro, a nova situação do catolicismo frente a esse processo modernizante. No imaginário religioso, eles transcendem o cenário escolar, entrecruzando-se com outros valores, normas e imagens. Uma série de documentos coletivos e pessoais do episcopado brasileiro revelam uma postura militante contra os princípios do positivismo. Os documentos emanados do Vaticano fazem eco a essa empresa, impulsionando os diversos setores católicos para se movimentarem, em prol de uma educação católica. A hierarquia católica reagiu com firmeza, visando preservar sua orientação no setor educacional. Dessa forma, continuaria a influenciar no processo de formação das novas gerações e da sociedade brasileira. Vários acordos, negociações e apelos foram feitos junto às autoridades e ao poder político. A presente comunicação pretende analisar os pressupostos que compunham a educação católica e sua extensão num movimento mais amplo - o movimento educativo-religioso. O elemento religioso desempenha um papel significativo no horizonte das pessoas e nas diversas camadas sociais. A base teórico-metodológica está circunscrita na análise de fontes primárias e no estudo das iniciativas e articulações que foram sendo construídas nas dioceses, nas paróquias, nos seminários e na criação de associações para a infância e a juventude. A relação entre educação e religião católica atravessou a história brasileira e se ancorou em diversos portos. Memória de rotas, derrotas e possibilidades.

SOU UMA RAPARIGA DO LICEU: O MARIA AMÁLIA DE 1968 A 1975

Lucilia Valente, Universidade de Évora

A comunicação tomará a forma de uma narrativa baseada na vivência pessoal da autora como aluna do Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho entre 1968 e 1975 Metodologicamente recorrer-se-à a uma adaptação da ego história e apelando às memórias da autora será feita referência a aspectos como:

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1.A descrição do liceu a sala de aula, a biblioteca, o auditório (salão), o ginásio, o gabinete médico, a capela .2. As colegas: ser caloira das mais velhas, os afectos, os jogos , as brincadeiras.3. Os Professores: como ensinavam, como avaliavam, como mantinham a disciplina. A senhora Reitora.4. As rotinas escolares: como era organizado o horário, a utilização dos laboratórios, do ginásio, dos espaços desportivos exteriores.5. As actividades circum-escolares: o coro (O Pequeno Grupo), as artes plásticas, a culinária.6. Acontecimentos escolares: visitas de estudo, concertos na escola, entrega de prémios às alunas do quadro de honra. Na descrição far-se-á ainda referência à transformação operada na vivência do liceu com a revolução de 25 de Abril. A comunicação pretende constituir um contributo para um entendimento de práticas e quotidiano escolar numa época em que a investigação sobre esta temática nos liceus portugueses era escassa ou inexistente.

A OPERACIONALIZAÇÃO DO QUOTIDIANO ESCOLAR SOB O OLHAR (IN)FORMAL DO CORPO DOCENTE. O CASO DOS LICEUS DE BRAGA E DE LAMEGO (1895/1947)

Lucinda Monteiro da Silva e Rodrigo Azevedo, Universidade do Minho

As abordagens em torno da temática do Ensino Liceal têm vindo a adquirir muita relevância, enquanto objecto de estudo, no campo da História da Educação. Dentro desta temática, a exploração das séries documentais existentes nos arquivos escolares consubstancia instrumentos de análise inovadores propiciando (re)interpretações múltiplas e enriquecedoras. Neste contexto, o investigador deve procurar nessa potencial variedade interpretativa perscrutar os “olhares” dos que, se posicionando como actores da dinâmica institucional, permitiram a assimilação e reprodução de um certo modus operandi.

A análise das Séries Actas do Conselho Escolar e Actas do Conselho Pedagógico e Disciplinar propicia o acesso a um conjunto de práticas do quotidiano liceal, que procuraremos integrar em categorias, de modo a facilitar o conhecimento das suas lógicas e dimensões de implantação e reprodução e da sua articulação com a Sociedade e as Instituições.

Do ponto de vista metodológico, a postura investigativa centra-se na análise qualitativa conducente à operacionalização das respectivas categorias tendo em atenção ritmos de interiorização, pressão ou reacção do corpo docente, enquanto olhar (in)formal.

O estudo comparativo das referidas séries é realizado a partir de dois liceus significativamente diferentes: sendo o bracarense um dos mais frequentados a nível nacional, considerado sempre como de 1ª categoria e marcado por fortes diferendos institucionais e o de Lamego, primeiro liceu implantado fora de uma capital de distrito, mas sede diocesana, estabelecimento que foi assumindo uma crescente frequência, e caracterizado por uma diminuta conflitualidade, expressa numa adesão ao modelo institucional.

A temporalidade situar-se-á entre o ano de 1895, marcado pelo início da implantação da Reforma Jaime Moniz e o ano de 1947, caracterizado pela entrada em vigor da Reforma Pires de Lima. Esta temporalidade, que se alonga por três regimes políticos, caracterizou-se por linhas de força muito marcantes, tais como: o lento, mas firme, crescimento da frequência; o eclodir da frequência feminina e da questão de género; o aumento do corpo docente; a implantação do regime de classe e regularização do sistema de exames; a consolidação das suas finalidades dentro do Sistema Educativo.

DESVELANDO O SIMBÓLICO: ESCOLA DE ENGENHARIA DE UBERLÂNDIA

Lucinete Marlúcia Vitor Araújo, Centro Universitário do Triângulo - UNIT

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Este trabalho dedica-se ao estudo do processo de gênese da Escola de Engenharia de Uberlândia, no campo da História da Educação, especificamente na temática da História das Instituições Educacionais. O objetivo é apreender as representações sociais constituídas durante o processo de criação dessa Escola. A abrangência temporal da pesquisa está demarcada entre o ano de 1961 - ano do nascimento legal da Escola de Engenharia Química e Mecânica - até 1969 -, quando se forma a primeira turma. Sendo também importante o ano de 1968, quando ela passa de Escola para Faculdade Federal de Engenharia, incorporando-se à Universidade de Uberlândia, passando a chamar-se Faculdade Federal de Engenharia de Uberlândia. No tocante às fontes, têm-se os documentos específicos da Escola de Engenharia, tais como: Livros de Atas, correspondências com o Ministério da Educação e representantes políticos da região; fotos de época, dentre elas, as que retratam a primeira turma e o prédio onde começou a funcionar a Escola de Engenharia; jornais de época, a saber: O Correio de Uberlândia e O Repórter; Atas da Câmara Municipal de Uberlândia; bibliografias referentes à História das Instituições Educacionais, da História da Educação Brasileira e as que retratam o Brasil no recorte temporal da pesquisa. A metodologia que se propõe insere-se no campo da História Oral, das Representações Sociais discutidas na História Cultural por Roger Chartier e da História das Instituições Educativas embasadas em Justino Magalhães. Para compreender a História da Educação, a História das Instituições Educacionais abre-se como campo fecundo, porque a universidade brasileira, se comparada às universidades européias, é bastante recente, e, sendo assim, há muito o que fazer nesse campo historiográfico. Desde modo, cria-se uma abertura epistêmica que justifica o estudo da Escola de Engenharia de Uberlândia, pois, se ainda não foi dita a última palavra sobre as grandes instituições educativas do Brasil, pouco se disse sobre as Faculdades que se encontram no interior do país. Fazer a história das Instituições de Ensino Superior é, antes de tudo, buscar sua inserção num quadro de representações que integram no local, nacional e mundial, no entanto é sabido que as representações que os sujeitos fazem de si mesmo, se sobrepõem e/ou justapõem. O resultado da pesquisa aponta que a gênese dessa escola pertence a um momento próprio da História do Brasil - a industrialização e o crescimento urbano-, incrementados pela política desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek e pelo fomento de faculdades de engenharia. Por conseguinte, as fontes indicam que a Faculdade de Engenharia instalada em Uberlândia, Minas Gerais, coaduna-se ao contexto de formação de pessoal técnico para atuar, se não imediato, pelo menos a curto prazo, no projeto de composição de infraestrutura necessária para atender a expansão urbano-industrial, e resulta de esforços de representantes políticos da região, das elites locais e dos jovens que almejam uma formação universitária.

IGREJA CATÓLICA E PROCESSO ESCOLAR ENTRE IMIGRANTES NO SUL DO BRASIL, 1870-1938

Lúcio Kreutz, UNISINOS - RS

Nas primeiras quatro décadas de Império, no Brasil, Governo e Igreja (católica) estavam profundamente intervinculados (padroado e placet), sendo que nenhuma das duas instituições dava especial atenção ao processo escolar. Com o movimento de Restauração Católica, a partir de 1864/70, esta conjugação entre Estado e Igreja foi se tornando problemática. O embate foi crescente, levando ambas as instituições a investir no processo escolar como instância privilegiada de ação para a defesa e difusão de seu ideário. Na reação católica contra o ideário liberal, especialmente contra o avanço do Estado laico na condução do processo educacional, a igreja católica reivindicava seu suposto direito divino nesta matéria e começava a promover intensa campanha em favor da escola comunitária, sob sua estreita coordenação e supervisão. Proponho apresentar resultados de pesquisa relacionada com as iniciativas da Igreja Católica, no Rio Grande do Sul, em relação às escolas étnicas, comunitárias, da imigração alemã, de 1860 a 1938, salientando a forte presença da Igreja na escola, neste contexto marcado pelos embates entre Estado liberal laico e Igreja da Restauração. A ação da Igreja junto aos imigrantes teve acentuado vigor e dinamismo. Diversas congregações religiosas, masculinas e femininas, expulsas e/ou hostilizadas em países europeus no contexto da disputa entre Estado liberal e Igreja da Restauração, instalaram-se nas regiões de imigração no Brasil, voltando suas atividades especialmente ao meio rural, organizando escolas para filhos/as de imigrantes, e abrindo seminários para a formação de seus agentes. Muitos egressos destas casas de formação tornaram-se professores

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comunitários. A partir de 1920 a colonização alemã, italiana e polonesa já foi considerada um verdadeiro celeiro de vocações sacerdotais e religiosas. As lideranças da Igreja procuravam integrar as dimensões da vida social, cultural e econômica no projeto de Restauração Católica, colocando tudo sob a primazia do espiritual. Além de levar as paróquias a funcionarem de modo mais eficiente, também se animava a ação pastoral através da imprensa, sindicatos, organizações patronais, hospitais, cooperativas, partido político e, especialmente, professores e escolas. A ação da Igreja da Restauração junto aos imigrantes apoiou-se especialmente em três núcleos de ação, isto é, na acentuada difusão da imprensa, em ampla rede de organizações e associações religiosas e culturais e, principalmente, na escola e na formação de professores. Na década de 1930 havia acima de 1500 escolas étnicas, comunitárias, entre imigrantes alemães no Brasil, sendo que a maioria destas escolas funcionava em intervinculação direta com a respectiva igreja. Neste processo alcançou-se elevado índice de alfabetização entre os imigrantes. Restringi a pesquisa à ação da Igreja Católica junto aos imigrantes alemães católicos, no Rio Grande do Sul, Brasil, de 1870 a 1938, ano em que as escolas étnicas foram proibidas pelas medidas de nacionalização compulsória. A pesquisa foi realizada com o apoio teórico-metodológico de autores da história cultural, especialmente Chartier, procurando entender a partir de quais interlocuções e representações e com que objetivos a Igreja Católica investiu tão profundamente no processo escolar entre imigrantes no Brasil.

NAS ‘REDES DA ESCRITA’: CONSTRUÇÃO, USOS E SIGNIFICADOS DOS CADERNOS DE PERGUNTAS NO COTIDIANO ESCOLAR DE JOVENS

Luis Carlos Ferreira, UERJ

O presente trabalho apresenta um estudo sobre os ‘Cadernos de Perguntas’, mostrando os diferentes usos desta escrita produzida por jovens no espaço escolar.

Assim, a discussão visa aprofundar os significados desta cultura impressa, sobretudo, por se tratar de uma prática que permite contar algo de si, à medida que permite ao ‘escrevente’ (Viñao Frago,2001) respostas pessoais às perguntas feitas, como por ser registro de intimidades, através de perguntas/respostas acerca da vida de cada um, sobre o que pensam e o que gostariam de saber.

Ao mesmo tempo, o Caderno de Perguntas, também se caracteriza como um instrumento coletivo da escrita ao puxar fios para o entrelaçamento das respostas, em que um começa e o outro vai dando continuidade e assim por diante, possibilitando a formação de redes coletivas de conhecimentos em que a palavra ganha liberdade e criatividade.

Este texto, servirá para interpretar aspectos da realidade em que vivem e sobre o que pensam, já que o reconhecimento do texto ou do registro escrito, equivale a uma marca, uma autenticação, um selo que não está simplesmente na decodificação de letras ou palavras, sobretudo, porque assim estaríamos limitando, enquadrando o domínio da escrita.

Nesta relação de escrita de jovens de formas tão variadas, utilizarei o Caderno de Perguntas produzido por jovens alunos/alunas de uma escola da rede pública estadual do Rio de Janeiro, onde a elaboração do conjunto de interrogações deste material há 35 (trinta e cinco) perguntas que circulação para os/as alunos/as dos turnos da manhã e da tarde. Perguntas estas, que versam sobre questões como família, escola, relacionamento, religiosidade, sexo, trabalho, música, esportes e o cotidiano em geral.A compreensão crítica do conhecimento apresentado em cada folha, referente então a cada pergunta feita, exige a possibilidade de atribuição de múltiplos sentidos com que os jovens tentam explicar e interpretar a realidade. Para entendermos suas respostas, o mais interessante é considerarmos que diferentes ‘redes de subjetividades’ (Santos, 1995) vão sendo tecidas pelo simples fato de que o homem vê o mundo através de sua cultura de diferentes modos, com variadas tendências, sem que deva se instituir uma única expressão, ou um mesmo olhar ou então, uma única identidade fixa, imóvel. |

O ENSINO LICEAL PÚBLICO E PARTICULAR SEGUNDO O LICEU NACIONAL DO PORTO (1840-1900)

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Luís Grosso Correia, Universidade do Porto

Abordaremos a problemática da relação entre o ensino liceal público e o ensino liceal particular a partir do caso específico do Liceu Nacional do Porto, balizando-a entre a fundação do Liceu e o final de oitocentos. Tomaremos como eixo estruturador do presente trabalho o processo de construção da identidade pedagógica e escolar do Liceu, articulando-o com a grande oferta de ensino particular existente na cidade do Porto e com a estrutura da rede pública de liceus em Portugal no período analisado.

O presente trabalho foi construído a partir da análise de conteúdo de documentos produzidos pelo Liceu Nacional do Porto e da análise estatística realizada sobre os registos de matrícula e frequência dos alunos internos, os candidatos a exames oriundos dos ensinos público e particular e os respectivos resultados.

A HISTORIOGRAFIA DIDÁTICA SOBRE O “GOLPE DE 1964”

Luís Reznik, UERJ e da PUC-RIO

Este trabalho pretende caracterizar memórias, inscritas em manuais didáticos, sobre o golpe militar de 1964. Ao analisarmos estes discursos, estaremos identificando as diferentes narrativas, relacionando-as aos seus contextos de elaboração.

“1964”, isto é, a deposição do Presidente João Goulart, em março/abril daquele ano, através de um movimento armado, é considerado na historiografia brasileira um “acontecimento inaugurador” pelo impacto causado na trajetória de vida dos mais diversos indivíduos e grupos. Os seus desdobramentos mudaram a paisagem histórica da sociedade e da nação brasileira. Trata-se de um marco político institucional que inaugurou o governo, por 21 anos, das Forças Armadas, combinando momentos de intensa coação e repressão e períodos de liberalização e distensão política.

Nos últimos quarenta anos, o país cresceu, urbanizou-se, industrializou-se, capitalizou-se, reestruturou-se ocupacionalmente, educou-se, reordenou-se, tornando-se complexo, metropolizado, enfim constituindo-se como uma “sociedade de massas”.

O campo educacional adquiriu distintas configurações, relacionadas, entre outros aspectos, às políticas estatais, à estruturação dos sistemas escolares e à formação dos profissionais. Ressaltamos, exemplarmente, a reforma do ensino primário e secundário, de 1971, e a Lei de Diretrizes e Bases, de 1996, que implicaram em novos arranjos curriculares e em normas específicas para a circulação dos manuais didáticos. A indústria editorial, por sua vez, sofisticou-se, de modo a tornar o livro didático um produto especializado. Autores e editores profissionalizaram-se, criando equipes de trabalho na elaboração de materiais capazes de atingir milhões de leitores em todo o território nacional.

A historiografia tornou-se também um campo mais especializado. A criação e multiplicação dos programas de pós graduação, a partir de meados dos anos 60, propiciou o aparecimento de uma leva de historiadores e narrativas de História que se pauta por cânones acadêmicos internacionais, por um refinamento teórico e metodológico e pela maior diversidade e abrangência temática. Autores de manuais didáticos e professores do ensino básico nas grandes cidades brasileiras dialogam obrigatoriamente com essas condições profissionais.

Sabemos que toda narrativa supõe eleições temáticas e analíticas, monumentalizando um viés explicativo e compreensivo em detrimento de outras perspectivas. Caracterizar memórias sobre 1964, portanto, é enfrentar o desafio de penetrar nesses mais variados contextos políticos, educacionais e acadêmicos, da história recente brasileira. A nossa hipótese é que constituíram-se narrativas distintas, em três temporalidades (1- anos 60 até meados dos anos 70; 2 - fins dos anos 70, percorrendo anos 80; 3 - os últimos quinze anos), as quais desenvolveremos no trabalho.

MUSEUS DE ESCOLALuísa Janeirinho, Universidade de Évora

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Esta comunicação tem como objectivo deixar o testemunho de um trabalho de investigação que se concretizou no projecto Museu da escola - um património comunitário e posteriormente na dissertação de mestrado: Dar Voz aos Objectos –contributos dos documentos de vida na construção de um museu de escola.

Este trabalho teve como principal objectivo fazer uma abordagem ao Sistema Escolar através da sua cultura material, os objectos, e da informação de que são portadores, pois que consubstanciam diferentes densidades - de uso e simbólicas. Mas porque este passado tangível não tem, por si só, vida própria, necessita de ser ampliado com relatos que traduzem pensamentos, sentimentos e acções…aqui a sua substância: serem guias para a recolha de depoimentos – história oral - e resgate do passado educativo/escolar, privilegiando práticas quotidianas pessoais e colectivas.

A urgência deste projecto - consubstanciado num museu - emergiu da necessidade de preservação deste património, rico em objectos e simbologias: se a recolha dos primeiros se revestiu de grande significado pois que eles representam o que a História e a memória têm de tangível, a recolha e a preservação dos bens imateriais inaugurou uma concepção mais abrangente de património porquanto os reconhece como parcelas estruturantes da identidade e da memória colectiva. Neste contexto se inscreve a recente lei 107/2001, Lei de Bases da Política e do Regime da Protecção do Património Escolar que, mais abrangente, considera e cabimenta, bens materiais, imateriais e contextuais. Esta lei reflecte o desafio proposto pela actualidade, em que o valor do bem patrimonial não se circunscreve ao objecto pela sua função, raridade, beleza ou utilidade, mas inclui a necessidade de preservação de parcelas estruturantes da memória colectiva constitutivas de um património a preservar.

CONSELHOS TUTELARES: IMPASSES PARA IMPLANTAÇÃO DE UMA POLÍTICA PÚBLICA

Luiz Cavalieri Bazilio, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Um novo personagem, há pouco mais de dez anos, passou a ocupar espaço e ter voz nas cidades brasileiras. Fortemente amparado e tendo funções claramente definidas nos termos da lei 8069 de 1990, (Estatuto da Criança e do Adolescente) este novo ator chegava para se instalar na pólis reivindicando legitimidade: estamos falando do Conselheiro Tutelar e de ações de defesa dos direitos de crianças e dos adolescentes.

O desafio que nos é colocado é o de devolver à implantação dos Conselhos Tutelares sua historicidade. O que se busca é a desnaturalização deste novo personagem e das ações que, em nome da defesa de direitos ou de medidas protetivas, são realizadas. Há de se destacar que o espaço político e de intervenção dos Conselheiros de forma alguma se encontra pronto, pelo contrário, enfrenta resistências por parte dos demais atores que trabalham na área de garantia de direitos e outras instituições públicas ou privadas.

A pesquisa recupera o conceito de “desjudicialização”, idéia chave para a substituição da Doutrina da Situação Irregular por outra que busca compreender crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Tal transformação doutrinária - que os redatores pretenderam apresentar como uma verdadeira revolução no entendimento da infância - iria determinar a elaboração de um texto de lei que enfatizasse protagonismo infantil e juvenil.

Mas, afinal, quais seriam os principais problemas enfrentados pela população que recorre à ação dos Conselhos Tutelares? Nosso grupo de pesquisa investigando esta temática arrolou uma série de indicadores que podem dar uma idéia da qualidade da ação que é desenvolvida:

1. Falta de estrutura para atender à real demanda das violações de direitos. Essa questão é tão grave que, se um determinado Município fizer uma pequena campanha de esclarecimento e divulgar endereços dos Conselhos, a superlotação de suas instalações impedirá qualquer atendimento. 2. Ausência de capacitação e qualidade dos treinamentos oferecidos. A forma como é realizada capacitação para a função de Conselheiro usualmente não o habilita ao serviço. 3. Questões relativas à representação política do Conselheiro. O(a) Conselheiro(a) Tutelar é cidadão(ã) eleito(a). Verificamos baixa participação da população no processo de escolha. 4. Falta de estrutura de apoio. O Conselheiro Tutelar não tem para onde encaminhar criança ou adolescente. A chamada “rede de

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proteção” é obra de ficção. 5. Excesso de solicitações de demanda direta prejudicam funções de fiscalização e supervisão dos abrigos e demais entidades.

A REFORMA EDUCACIONAL DA ESCOLA TÉCNICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, À LUZ DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO (PERÍODO DE 1968 A 1995).

Luzimar Barbalho da Silva.CEFET-RN-Brasil e Ulisséia Ávila Pereira. CEFET-RN-Brasil.

O trabalho trata de um estudo acerca das idéias educacionais que orientaram as reformas do ensino profissionalizante na Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte (ETFRN), atual Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte (CEFET-RN), situado na cidade do Natal, no período de 1968 a 1995. Nesse período, a ETFRN substituiu o modelo escolar profissionalizante independente organizado em cursos isolados com ênfase nos conteúdos profissionalizantes, por um modelo estruturado a partir de áreas de conhecimento, integrando os conteúdos propedêuticos e os profissionalizantes. Com o desenvolvimento da indústria no Brasil, essa Escola fez mudanças no seu fazer pedagógico, objetivando oferecer uma educação para todos que acreditavam no Brasil e no ensino profissionalizante como meio de ascensão social. Subjacentes às idéias institucionais encontra-se a teoria do capital humano, imbricada no papel dessa Escola: oportunizar capacitação às pessoas para atingirem seus objetivos de auto-promoção. Com a política educacional brasileira, neste período marcada pela internalização da economia, a ETFRN adequou o seu modelo escolar, mais uma vez estruturou cursos técnicos isolados com ênfase no desenvolvimento de habilidades profissionais. Com os avanços científicos e tecnológicos na produção, inicia-se a reestruturação do processo produtivo fundamentado numa concepção de produção flexível, exigindo um novo perfil de trabalhador. Essas transformações na produção contribuíram para mudanças no setor educacional, especificamente na ETFRN, a partir da década de 90, quando foi implementado o seu projeto pedagógico em 1995, organizando os cursos por áreas de conhecimento e competências, tendo por base os pressupostos básicos: concepção de educação como instrumento básico de conhecimento, flexibilidade curricular, superação da dicotomia teoria/prática, universalidade da ciência, percepção das relações entre sociedade-trabalho-escola, buscando a formação do técnico cidadão. Diante disso, o objeto de estudo deste trabalho é o modelo escolar adotado na ETFRN e sua relação com o mercado de trabalho vigente. Objetiva-se, a partir das fontes documentais: projetos, regimentos, revistas, portarias do Ministério da Educação e do Desporto, compreender em que medida a teoria do capital humano fundamentou a implantação desse modelo escolar de ensino profissionalizante estruturado por áreas de conhecimento. Assim, tendo como base a noção de modelo escolar, a idéia é chamar atenção para os pressupostos teóricos embasadores da reforma de ensino posta em prática por essa Instituição.

A REFORMA UNIVERSITÁRIA NA DÉCADA DE 1960 E A CRIAÇÃO DAS FACULDADES DE EDUCAÇÃO

Macioniro Celeste Filho, PUC-SP

Este trabalho abordará a Reforma Universitária e a criação das Faculdades de Educação como temas de longa duração nos debates educacionais brasileiros da década de 1960. O destino das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras ocupou papel privilegiado na discussão sobre a Reforma Universitária; muitas vezes confundindo-se mesmo com ela. Além do Conselho Federal de Educação, deve-se atentar a outros fóruns de debate sobre a Reforma Universitária. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência desempenhou papel de destaque nos embates que definiram a configuração universitária no final da década de 1960, sendo que algumas áreas científicas exerceram papel centrífugo no desmembramento das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras. Embora tais cientistas privilegiassem uma visão da universidade como formadora de pesquisadores e promotora das ciências, não desejavam abrir mão da possibilidade de carreira docente no ensino médio. As Faculdades de Educação foram desmembradas das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras para

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fornecer aos graduados do que sobrou desta faculdade a formação necessária ao magistério. Além, é claro, de prosseguir na graduação específica em Pedagogia, o que já faziam como departamentos das FFCL. O texto ressalta a necessidade de relacionar os acontecimentos específicos de cada instituição de ensino superior com o debate mais amplo da Reforma Universitária nacional para compreender satisfatoriamente a configuração universitária brasileira do final da década de 1960.

HIERARQUIA DAS LEGITIMIDADES NO ENSINO SECUNDÁRIO: GINÁSIO NACIONAL E GINÁSIO PARANAENSE NO PROCESSO DE EQUIPARAÇÃO PELAS LEIS REPUBLICANAS

Maclovia Corrêa da Silva, PPGTE/CEFET/PR e Serlei Maria Fischer Ranzi, UFPR

Este artigo discute a implantação do ensino secundário e das estratégias de legitimação de um campo pedagógico, levando-se em conta as tentativas de equiparação do Ginásio Paranaense com o estabelecimento federal - Colégio D. Pedro II, que foi instituído, com a República, padrão nacional de referência. O regime de equiparação, com estudos seriados regulares, estendido para os estabelecimentos estaduais, introduziu a concepção de ensino secundário educativo integral. Entre 1891 e 1930 ocorreram diversos ajustes na legislação sobre a questão da equiparação. Essa inconstância legislativa repercutiu de forma diferenciada nos diversos estados brasileiros. Nesse sentido, pretendemos analisar como o Paraná acompanhou esse processo através dos dirigentes, da comunidade escolar e não escolar e de que forma refletiu no Ginásio e na sua estruturação. As questões republicanas voltadas para a formação de uma mentalidade culta para o homem, dando profundidade ao estudo das matérias, vão se opor às práticas advindas do Império que propiciava uma formação aligeirada, restrita, fragmentada com a preocupação exclusiva de ofertar um ensino secundário de caráter preparatório para as escolas de nível superior. Os exames preparatórios eram mais rápidos e mais superficiais se comparados aos estudos seriados, já que o principal objetivo estava direcionado com exclusividade para a entrada nos cursos superiores. Na República, as idéias e os projetos do governo visavam a formação de uma cultura intelectual para os alunos do ensino secundário.Requisito indispensável para a matrícula nos cursos superiores, o ensino secundário passaria a ser visto como um preparo fundamental e geral para a vida, independente da profissão escolhida pelos alunos. Inicialmente, poucas foram as inovações na organização do ensino secundário, a principal medida foi a obrigatoriedade do ensino seriado. Mais tarde, sucessivas reformas vão alternar as diretrizes políticas propostas para a educação.

Entre a Monarquia e a República, o discurso científico, presente na vida intelectual e nas práticas políticas, demarcou situações históricas onde a discordância predominou sobre a conformidade. A variabilidade de conduta e a visão de mundo de monarquistas e republicanos estão marcadas pelas diferentes etapas de organização da vida política e social. Nela, as questões educacionais ordenadas no pensamento dos dirigentes brasileiros guardavam relações com as posições dos grupos a que pertenciam. “Frente a esta luta no campo ideológico entre conservadores monarquistas e progressistas republicanos [situa-se] também a presença da intelectualidade cientificista da época” (OLIVEIRA LIPPI (1990, p.24). Somente na República pensar-se-á em um sistema nacional de educação pública marcado pela divisão de competências, cabendo ao Congresso Federal legislar e criar instituições de ensino secundário e superior e aos Estados organizar a instrução primária. O projeto republicano, como qualquer outro projeto político de mudança social, estava imbuído de redefinições da identidade coletiva que visavam justificar o novo regime.

PROCESSOS DE NORMALIZAÇÃO NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL DE SURDOS

Madalena Klein, Centro Universitário FEEVALE

Este artigo procura localizar as políticas educacionais de formação profissional, especificamente dos sujeitos surdos. Dirijo o olhar para dois diferentes recortes temporais: o final do

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século XIX e início do século XX, momento da emergência da educação de surdos no Brasil, e as décadas finais desse mesmo século e os anos 2000 - 2001, período que compreende o que poderíamos chamar de instalação de uma nova mentalidade para conceber e colocar em funcionamento a formação profissional no país, atendendo às demandas de um projeto de desenvolvimento sustentável. Apresento fragmentos dos caminhos percorridos pelas escolas e movimentos surdos na implementação e execução de programas de formação profissional. Procuro explicitar alguns desdobramentos e ações que se destinam às pessoas denominadas portadoras de deficiência, onde, nas Políticas Públicas, vemos serem lembrados os indivíduos e grupos surdos. A educação profissional vem sendo pensada e articulada a partir de jogos de saber-poder, constituindo efeitos de verdades sobre um sujeito que deve ser preparado, capacitado, qualificado para desempenhar um papel dentro do sistema produtivo. Vem, assim, respondendo a uma urgência de constituir práticas de governamento de si e dos outros, uma vez que estabelece regras de conduta, modos de ser, formas de saber dentro de jogos de poder sócio-econômico-políticos contemporâneos. A formação profissional, vem conformando/normalizando as condutas dos indivíduos, constituindo subjetividades trabalhadoras cidadãs. Essa normalização atende a uma racionalidade de governamento que foi se constituindo na modernidade, conduzindo de forma refletida, articulada, metódica as condutas de si e dos outros, tendo como referência sujeitos trabalhadores ideais aos processos de produção historicamente constituídos. Essa racionalidade política vem engendrando um conjunto de procedimentos, de saberes e de poderes considerados desejáveis e úteis para a conformação de sujeitos que saibam dirigir suas condutas. O governamento é uma questão de intervenção: envolve tentativas de traduzir o pensamento para o campo da realidade, de instrumentalizar e tornar factível a ação sobre aquilo que se sonha e se esquematiza. O governamento tem uma espécie de forma tecnológica. A leitura de documentos que apresentam os diferentes programas de formação profissional para surdos, dos relatórios de acompanhamento de cada projeto desenvolvido, bem como de textos produzidos pelos experts envolvidos nos programas, possibilitou perceber algumas regularidades nas argumentações e proposições sobre os procedimentos desejáveis para a conformação de um trabalhador adequado às necessidades contemporâneas.

MONTEIRO DA ROCHA E O ENSINO DA MATEMÁTICA NA UNIVERSIDADE DE COIMBRA (1772-1777)

Mafalda Neves Pedroso; Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa

José Monteiro da Rocha nasceu em 1734, em Amarante, tendo ido jovem para a Bahia, onde frequentou o Colégio de Santo Ignácio, como aluno e posteriormente como professor.

Conhecedor do prestígio de Monteiro da Rocha, Pombal, quando procedeu à Reforma da Universidade de Coimbra (1770-1772), de que resultaram os Estatutos de 22 de Setembro de 1772, haveria de o encarregar de organizar e redigir a parte destes referente às Ciências Naturais e à Matemática (Livro III dos Estatutos da Universidade de Coimbra que contém os Cursos das Sciencias Naturaes e Filosóficas). Esta reforma permitiu uma profunda remodelação científico - pedagógica, alterando currículos e métodos, o que por si só constituiu uma das principais marcas da modernização cientifico - cultural portuguesa, poderosa alavanca do agiornamento lusitano à Europa Ilustrada. Os novos Estatutos propuseram um novo olhar para a ciência revelado, entre outros aspectos, na preocupação de aproximar saber e fazer.

O objectivo deste trabalho consiste justamente, na análise do III Livro dos Estatutos da Universidade de Coimbra (1772), mais propriamente no que respeita à Matemática, considerada pela Junta de Providência Literária (criada em 1770, para examinar as causas da decadência da Universidade) como o saber mais puro e rigoroso. A Matemática aparecia, assim, pela primeira vez autonomizada, deixando de significar apenas uma cadeira propedêutica de outros cursos, vindo mesmo a institucionalizar-se como uma das Faculdades da Academia renovada, à semelhança da Filosofia. De acordo com os novos Estatutos a Universidade portuguesa abrir-se às ciências exactas e experimentais, funcionando a educação como motor da “nova ciência”.

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Que consequências trouxeram estas novas propostas no ensino da Matemática? Acreditamos que o estudo deste documento fundador permitirá estabelecer laços de compreensibilidade entre o passado e o presente desta ciência em Portugal.

O ENSINO DE ENGENHARIA NO PIAUÍ: ASPECTOS HISTÓRICOS

Magnaldo de Sá Cardoso, UFPI

O presente trabalho é parte de um estudo sobre a história do ensino da engenharia no Estado do Piauí. Está inserido num projeto mais amplo que objetiva resgatar a história da Universidade Federal deste Estado. A pesquisa objetiva fornecer subsídios para dissertação de mestrado em educação. Para tanto, estão serão consideradas fontes como registros oficiais (documentos), artigos de jornais, atas de reuniões, depoimentos orais de profissionais da engenharia. Engenharia, que chega ao Piauí somente 165 anos após a criação no Brasil, por D. João VI, em 1810, e vinculado à Academia Militar do Rio de Janeiro. Desvinculação esta, que se dá em 1874, quando o ensino da engenharia passou a ser realizado em estabelecimentos não militares e voltado para objetivos não bélicos. Em dezembro de 1933, o então Presidente Getulio Vargas, promulga o Decreto Federal n.o 23.569, regulamentando as profissões liberais de Engenheiros, Arquitetos e Agrimensores e instituindo os Conselhos Federal (Confea) e Regional (Crea). A atuação do Crea-PI juntamente com o Clube de Engenharia do Piauí em defesa da classe e regulamentação da profissão de engenheiros, arquitetos e agrimensores, contribuíram decisivamente na criação do primeiro curso de engenharia no referido Estado. Com a criação da Universidade Federal do Piauí, em 1971, resultado da aglutinação de cinco faculdades já existentes, Odontologia, Direito, Filosofia, Medicina e Administração, abrem-se novos horizontes para o ensino superior. Implanta-se o Centro de Tecnologia da Universidade Federal do Piauí, através da Resolução n.o 38, do Conselho Diretor em 25 de agosto de 1975, inicialmente constituído pelas coordenações de Ciências Agrárias e de Tecnologia. Esta última abrigava os cursos de Engenharia Civil e de Engenharia de Agrimensura. Trata-se de um estudo historiográfico fundamentado na História Cultural, através de autores como Roger Chartier. A análise do cotidiano do ensino, da cultura escolar e das memórias de profissionais da engenharia e arquitetura, professores e alunos e recebe influência dos estudos de Michel de Certeau, Vinão Frago, Antônio Novoa, Cecília Corteze e estende-se de 1970 a 2003.

UMA HISTÓRIA DO BRASIL: O MANUAL DIDÁTICO DE OCTÁVIO TARQUÍNIO DE SOUSA E SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA

Márcia de Almeida Gonçalves, Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Em 1944, a José Olympio Editora lançava, pela Coleção Livro Escolar Brasileiro, o manual “História do Brasil”, assinado por Octávio Tarquínio de Sousa e Sérgio Buarque de Holanda, destinado, nos termos da época, à 3ª série do curso secundário, ciclo ginasial. Nosso objetivo nesse trabalho é analisar o referido texto, inserindo-o nas trajetórias intelectuais de seus respectivos autores e, em especial, caracterizando o uso de determinados conceitos - miscigenação, ruralismo e nativismo -, na forma como esses vieram a ser apresentados e relacionados, no livro em questão.

Naquele ano, Octávio Tarquínio de Sousa, aos 55 anos de idade, ainda um dos ministros do Tribunal de Contas da União, era o diretor da Coleção Documentos Brasileiros, editada pela José Olympio, e autor de biografias históricas de estadistas do Império - Bernardo Pereira de Vasconcelos, Evaristo da Veiga, Diogo Antônio Feijó -, consagradas, em larga medida, pela crítica. Sérgio Buarque de Holanda, aos 42 anos, era, entre outras atividades, crítico literário e o autor de “Raízes do Brasil” e de “Cobra de Vidro”.

No alvorecer da década de 1940, Octávio Tarquínio e Sérgio Buarque já haviam se tornado, por caminhos distintos, dois letrados renomados entre aqueles empenhados em reinventar a escrita da história do Brasil, nos termos suscitados pelas inquietações modernistas e pelos questionamentos

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acerca da brasilidade. Partilharam, nesse sentido, algumas sociabilidades intelectuais, entre as quais cabe destacar, a atuação, como membros fundadores, na Associação Brasileira de Escritores, criada em 1942, e, em especial, a presença entre os colaboradores, na parte referente à história, do Manual Bibliográfico de Estudos Brasileiros, gestado entre 1939 e 1949.

Na produção de texto para a divulgação escolar, Sérgio Buarque e Octávio Tarquínio firmaram um encontro e uma parceria, uma amizade cara para ambos. O manual, na sua síntese didática e nas suas proposições pedagógicas, traduzia temáticas e escolhas conceituais articuladas à perspectiva de interpretar a formação da sociedade e, numa certa ênfase, da cultura brasileira, como a querer decifrar seu caráter e sua fisionomia. O uso e a significação de determinados conceitos - miscigenação, ruralismo e nativismo -, no texto em questão, se mesclaram na materialização de um estilo particular de contar a história do povo, do território, do Estado e da própria nação que veio a ser denominada de Brasil.

MANUAIS PORTUGUESES NO BRASIL DO SÉCULO XIX

Marcia de Paula Gregorio Razzini, FE-USP

Nos últimos vinte anos, sob o influxo da história do livro e da leitura, o manual escolar (e sua história) vem ganhando espaço em pesquisas e publicações coletivas importantes (Histoire de l’édition française, 1986; Historia ilustrada del libro español, 1996; Les mutations du livre et de l’édition dans le monde du XVIIIe siècle à l’an 2000, 2001), e hoje se constitui fonte privilegiada da história da educação, da história das disciplinas escolares e da história do currículo.

A organização de bases de dados e a preservação de acervos têm reunido pesquisadores em projetos amplos, com o objetivo de estudar e constituir a história do livro escolar em seus respectivos países, como o projeto francês EMMANUELLE, lançado em 1980 pelo Institut National de Recherche Pédagogique; o projeto espanhol (e latino-americano) MANES, constituído em 1992 pela Universidad Nacional de Educación a Distancia; o projeto canadense MSQ, inaugurado em 1997 pela Université Laval de Quebec; e o projeto brasileiro LIVRES, desenvolvido na Universidade de São Paulo com financiamento da Fapesp (2003).

A presente comunicação focaliza alguns manuais escolares portugueses adotados nas aulas de língua e literatura nacional do Colégio Pedro II do Rio de Janeiro, mantido pelo Estado, instituição modelo de ensino secundário leigo, talvez equivalente ao Liceu Nacional de Lisboa (depois denominado Liceu Passos Manuel).

Inserido no projeto LIVRES com o objetivo de mapear os manuais de Língua Portuguesa de 1808 a 1930, esse trabalho retoma parte da tese de doutorado (2000), defendida na área de Letras, agora sob o ponto de vista da história da educação e do livro escolar.

Até a década de 1880, vinha de Portugal a maior parte dos livros usados nas aulas de língua e literatura nacional do Colégio Pedro II, destacando-se os manuais de José Inácio Roquette, Borges de Figueiredo, Francisco Freire de Carvalho, Caldas Aulete, os irmãos Antonio e José Feliciano de Castilho, e Teófilo Braga. A nacionalização da produção (e da autoria) do livro didático brasileiro só aconteceria de fato no final do século XIX, junto com a nacionalização do livro infantil.

A longa hegemonia dos compêndios portugueses (ou de autoria portuguesa) na escola secundária brasileira cristalizou uma tradição vernácula e literária de extração lusitana, que acabou dificultando o processo de identificação entre nação e língua/literatura, atrasando o processo de constituição de um cânone literário escolar de textos brasileiros.

DOM ORIONE, A EDUCAÇÃO E OS POBRES: ASSISTENCIA ORIONITA NO “LAR DOS MENINOS”

Marco Antônio de Souza, Centro Universitário Newton Paiva-M.G

“A Caridade deve ser o nosso ímpeto, o nosso ardor, a nossa vida”. Com esse pensamento, Dom Orione, fundador da Pequena Obra da Divina Providência, resume o que deveria ser a grande

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meta dos seus seguidores. Na realidade, a caridade não é apenas a virtude cristã que melhor representa a concepção de misericórdia; ela é o instrumento poderoso de aproximação social e de socialização da doutrina cristã-católica, que promoveu e ainda promove intensa ação sobre indivíduos empobrecidos e desamparados dos mais diversos lugares do planeta e nas mais diferentes circunstâncias.

Desde o período medieval, as ordens religiosas se ocuparam com os pobres. Nas formações urbanas, no aparecimento das cidades medievais européias, a atuação dos clérigos, com as organizações religiosas, foi parte ativa da reformulação econômica e política que estava começando a acontecer naquelas sociedades.

Do século XVI em diante, o trabalho de aproximação dos pobres continuou se intensificando. As grandes transformações do cristianismo, com a Reforma Protestante, aliadas ao avanço da urbanização e migração dos camponeses para as cidades, foram sérias ameaças à Igreja Católica, acostumada a lidar com os fiéis nos campos, sem grandes ameaças de cismas, combatendo as heresias com a eficácia de suas forças políticas e inquisitoriais. Entre as medidas tomadas pelo Concílio de Trento (1545-1563), houve uma que ratificou a necessidade de se manter a evangelização, uma catequese intensiva e extensiva entre os pobres, cabendo especialmente à ordem jesuítica, a tarefa de executar os planos de combate direto às novas idéias, atuando junto à população.

Durante o século XIX, a situação estava nitidamente mudada. A Igreja tentava reorganizar-se e juntar suas forças com o objetivo de, mais uma vez, aproximar-se dos pobres. Dessa vez, a sociedade urbano-industrial constituía-se no grande desafio. Educar e evangelizar os trabalhadores empobrecidos pela avareza dos patrões, e ensinar a estes que o reino de Deus estava aberto aos ricos misericordiosos, e não aos que apenas acumulavam riqueza sem se incomodarem com aqueles que a produziam; era uma meta importante dos novos missionários, entre eles, os orionitas, ordem que apareceu durante esses embates, fundada por Luiz Orione que, seguindo essa tendência, propôs a criação de uma instituição de caráter catequético-missionário.

Todos os autores que apresentam a obra de Luís Orione, enfatizam a sua aproximação com Dom Bosco. Para um deles, Dom Bosco pode ser considerado o grande Mestre de Orione. Com 15 anos, teria mantido contato com os textos da pedagogia nova, enquanto aluno de Dom Bosco e mesmo após sua morte, o discípulo continuaria a seguir fielmente suas idéias ao construir a própria Congregação.

Os seguidores de Dom Orione chegaram ao Brasil no início do século XX e a partir de 1948 passaram a administrar o Lar do Meninos. Fundado em 1944, pertencente de início à Prefeitura da cidade de Belo Horizonte, essa obra assistencial foi entregue à administração da Pequena Obra da Divina Providência, e chegou a ter 300 internos em suas dependências.A assistência aos menores objetivava, de acordo com os orionitas, imprimir no espírito e no coração através da oração, o aprendizado escolar e a “iniciação profissional, nas oficinas mecânicas, gráficas, cerâmica ou sapataria e ainda no amanho da terra.” Esperava-se que, aqueles que saíssem do Lar dos Meninos, fossem “cidadãos prestantes, pais de família, cristãos de invulgar dedicação ao lar, atentos cumpridores dos seus deveres para com Deus, para com a Pátria, respeitando-lhes as leis e ouvindo-lhes os chamados.”

O Lar dos Meninos, que junto às outras instituições congêneres abrigava a infância pobre, não fugindo à regra, estava localizado em área afastada da zona urbana, lugar ideal, segundo as concepções assistenciais, para educar esse contingente de crianças e jovens mal preparados para viver em sociedade. Nesse local, durante mais de 50 anos, diversas práticas ritualizadas no cotidiano de assistidos e assistentes prepararam a infância e juventude pobres para o mundo do trabalho, disciplinando-as e moralizando-as.

Luiz Orione (1872-1940), fundador da Pequena Obra da Divina Providência, nasceu em Pontecurone, Itália. Travou contato com os franciscanos em Voghera (1885-1889) e com Dom Bosco em Turim (1886-1889). Sua experiência religiosa o levou ao contato com as colônias agrícolas, as escolas profissionais, os artesãos, as casas de caridade, os pequenos cottolengos. Sua obra se estende aos Eremitas da Divina Providência (1898), às Pequenas Irmãs Missionárias da Caridade (1915), às Irmãs Sacramentinas Cegas Adoradoras (1927). Esteve na América do Sul, incluisve no Brasil (1921 em São Paulo e 1937 no Rio de Janeiro) , visitando suas obras missionárias, entre 1921-22 e 1934-37. Em São Paulo, destacam-se as obras orionitas da paróquia de Nossa Senhora da Achiropita, localizada na Bela Vista (Bixiga), com o Centro Educacional Dom Orione, que atende crianças de 7 a 15 anos. Dom Orione foi beatificado, em 1980, pelo Papa João Paulo II. Na obra ORIONE, Luiz. Dom Orione aos seus Religiosos. São Paulo: Editora Pequena Obra da Divina Providência: 1987, o próprio Dom Orione assinala: “Há os religiosos beneditinos, que têm a sua finalidade. Há os franciscanos que tem sua finalidade. Há

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os dominicanos, que tem a sua finalidade. Há os jesuítas que têm a sua finalidade toda particular. Nós também temos uma finalidade toda nossa (...), uma natureza, uma nota que nos deve diferenciar de todas as outras congregações. E se me perguntas qual é essa nota, (...) eu vos digo que é a dinamite da caridade.” Em, PATTARELLO, Padre Valdástico. Perfil de Dom Orione. 4ª edição. São Paulo: Editora Loyola, 1986, encontram-se informações detalhadas sobre a vida religiosa de Luiz Orione.2 Ver a este respeito LE GOFF, Jacques. Por Amor às Cidades. São Paulo: Unesp, 1998. Este autor menciona, principalmente, as ordens mendicantes como responsáveis pelo contato com os pobres e por mudanças importantes no espaço urbano no final da Idade Média. Outro autor, MOLLAT, Michel. Os Pobres na Idade Média. Rio de Janeiro: Campus, 1989, chega a afirmar que havia uma “Política dos Pobres”, a partir do século XIV.3 A interessante obra de CHÂTELLIER, Louis. A Religião dos Pobres. Lisboa: Estampa, 1995, que investiga a atuação das ordens religiosas no trabalho de catequese entre os séculos XVI e XIX, salienta a importância do trabalho missionário dos jesuítas, e de outras ordens, na formação de uma nova etapa do cristianismo adequado às grandes transformações sociais por que passava a Europa naquela fase. 4 PATARELLO, Padre Valdástico. op. cit. , 1986, p. 77-78.5 Cf. JUBILEU DE PRATA DO LAR DOS MENINOS DOM ORIONE, Belo Horizonte, 1969.6 Foram recortadas algumas passagens do JUBILEU DE PRATA, op. cit., 1969, que certamente denotam a opinião dos líderes orionitas.7 Entre os nossos marcos teóricos encontram-se FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder.4ª edição. Rio de Janeiro: Graal, 1984 e BOURDIEU, Pierre, O Poder Simbólico. Lisboa/Rio de Janeiro: DIFEL/Bertrand Brasil, 1989.

AS ESTATÍSTICAS ESCOLARES COMO FORMA DE PLANEJAMENTO EDUCACIONAL: O RECENSEAMENTO ESCOLAR DE SAMPAIO DÓRIA (1920) NO ESTADO DE SÃO PAULO (BRASIL)

Marco Antonio Rodrigues Paulo e Valéria Moreira Rezende, U. Católica de S. Paulo

A historiografia da educação brasileira tem se utilizado das estatísticas escolares como fonte privilegiada em seus estudos. No entanto, não se dá a devida atenção à veracidade dos dados produzidos, tampouco a base constituída para a coleta, análise e divulgação desses dados.

Este trabalho pretende pensar o lugar e o papel das estatísticas escolares no processo de (re)organização e modernização escolar proposta pela Reforma Sampaio Dória no Estado de São Paulo em 1920. Esta reforma objetivava combater o analfabetismo, assim a falta de dados estatísticos confiáveis torna indispensável o levantamento do número de analfabetos em idade escolar.

A utilização da estatística é um dos instrumentos indispensáveis para o conhecimento da realidade educacional, o cotejo e a interpretação dos dados numéricos são um importante subsídio para o conveniente estudo do desenvolvimento e (re)organização dos serviços da educação. Assim, torna-se imperativo que os órgãos ligados à educação se utilizem de uma consistente base numérica.

Os anos 20 apresentam ambiente propício para o processo de renovação da educação brasileira. Inicialmente seu palco são os estados, que procedem, a exemplo do que ocorrera em São Paulo, a reformulação de sua educação. Nesse instante, destaca-se a implantação de instrumentos de planejamento, como o uso do recenseamento escolar, nesse contexto pode-se citar além da reforma Sampaio Doria, a Reforma Lourenço Filho no Ceará (1923) e a Reforma de Anísio Teixeira (1925) na Bahia, entre outros.

Desta forma, este estudo pretende apresentar e analisar o recenseamento escolar de 1920, que precede a reforma proposta por Sampaio Doria, então diretor da instrução publica paulista. Cabe salientar que trata-se do primeiro recenseamento realizado no Brasil. Esse levantamento representa um momento especial para a historiográfica paulista e brasileira, pois estabelece um novo patamar na utilização das estatísticas escolares em âmbito nacional; de simples instrumento de exposição dos números da educação, passa a instrumento de planejamento e intervenção do estado, que por seu intermédio racionaliza e moderniza o controle de sua educação.

Assim, a partir da análise dessa técnica produzida e administrada pelo governo, pode-se compreender como o estado pensado pelo movimento da escola renovada, utilizou-se das estatísticas ao propor políticas para aperfeiçoar e modernizar seu controle sobre o campo educacional.

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A ESCOLARIZAÇÃO DAS PRÁTICAS CORPORAIS NO ESTADO DO PARANÁ (1846 - 1920): PERSCRUTANDO O ACERVO DE PERIÓDICOS DA BIBLIOTECA PÚBLICA DO PARANÁ

Marcus Aurélio Taborda de Oliveira, Melina Cavalcanti de Albuquerque Vicentine, Lausane Corrêa Pykosz; Universidade Federal do Paraná

Este trabalho surge como fruto de um projeto de pesquisa que vem localizando e catalogando fontes para o estudo histórico das práticas corporais escolares no estado do Paraná, Brasil, compreendendo o período de 1846 a 1920. Embora esteja no horizonte do projeto a exploração de vários acervos e documentos de natureza diversa, optamos por intervir prioritariamente no Arquivo Público do Paraná e na Biblioteca Pública do Paraná. Este último acervo nos despertou grande interesse por possuir diferentes opções de periódicos, muitos abordando temas relacionados à temática da instrução pública. Após o levantamento dos periódicos, iniciamos o mapeamento dos conteúdos referentes à Instrução Pública em geral, e à temática central do projeto, em particular. Entendemos que os periódicos representam uma considerável possibilidade no âmbito da história da educação, seja como fonte, seja como objeto, por apresentarem-se como veículos de fácil manuseio, ricos em conteúdo, que facilitam a reflexão acerca das questões referentes à educação, contribuindo de maneira significativa para a pesquisa histórica da escolarização. No que se refere especificamente aos periódicos educacionais, eles se constituem em uma fecunda possibilidade de compreender historicamente as tensões entre o aparato normativo-legal, a teoria educacional e a realidade escolar, pois tematizam, entre outras coisas, o cotidiano dos diferentes agentes escolares, mostrando como se davam as relações no interior da instituição escolar. Possibilitam ainda trazer à tona discussões a respeito da prática docente e das lutas de representação que conformaram os ambientes da escolarização, todos esses aspectos já assentes no plano da pesquisa histórica em educação na comunidade lusófona, porém pouco explorados no Estado do Paraná. Contemplamos até aqui o período de 1881 a 1915, no qual foram localizados oitenta periódicos, sendo que apenas um trata especificamente das coisas da escolarização, a revista A Escola. Entretanto, mesmo aqueles veículos que não têm na instrução pública o seu foco principal permitem que sigamos pistas que indiquem como era pensada a escolarização dos corpos nos anos aqui contemplados. O trabalho na Biblioteca Pública do Paraná tem aberto inúmeras novas possibilidades para a história da escolarização no Paraná. Como síntese do trabalho com essas e outras fontes temos produzido um catálogo contendo os documentos de interesse do projeto, sistematizado por três entradas: geográfica, cronológica e temática, esta de acordo com um conjunto temático indicado por algumas palavras-chave de caráter provisório. Entre elas destacamos: gênero, castigos corporais, esporte na escola, formação de professores, disciplinas e saberes escolares, métodos de ensino, civilização/racionalidade/modernidade, higiene escolar e disciplina corporal.

FESTIVIDADES E DESFILES PATRIÓTICOS: A FOTOGRAFIA COMO REGISTRO HISTÓRICO DAS PRÁTICAS E DO COTIDIANO ESCOLAR (1927-1970)

Marcus Levy Albino Bencostta, Universidade Federal do Paraná

Esta comunicação refere-se à pesquisa que atualmente desenvolvo como bolsista produtividade do CNPq acerca da contribuição da fotografia escolar enquanto fonte de análise para os estudos históricos. Nos últimos anos percebe-se um nascente amadurecimento e renovação das investigações que utilizam informações imagéticas em estudos que procuram interpretar como a cultura é construída e manifestada em diferentes ambientes escolares, quer sejam públicos, privados, rurais, urbanos, confessionais ou laicos. Ao perceber a peculiaridade da fotografia e sua relação com a história da educação, podemos afirmar que ela pode ser entendida como uma representação que se relaciona com os sujeitos históricos e seus sucessivos discursos culturais e simbólicos. Logo, podemos afirmar ser a imagem fotográfica um documento que necessita da análise crítica enquanto monumento. Neste sentido, destaca-se a relação da fotografia com a memória individual e coletiva

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explicada nos moldes de Jacques Le Goff que nos conduz ao entendimento que todo documento é monumento na medida do resultado do esforço das sociedades em querer impor ao futuro (voluntária ou involuntariamente) imagens de si próprias. É nesta interseção entre história e memória que podemos considerar a fotografia como monumento/documento nos termos indicados por esse historiador, qual seja, como resquícios, testemunhos do passado e fonte de informação para a pesquisa histórica. Para esta fala, escolhi o ambiente histórico cultural do univérsus scholáris dos Grupos Escolares de Curitiba (Paraná-Brasil), entre os anos de 1927-1970. A opção por este período é por ele assinalar espaços de tempo de curta duração que registram permanências na manifestação do imaginário festivo cívico, religioso e laico dos Grupos Escolares. Nossa intenção é discutir como estas festividades, inclusos os desfiles dos estudantes nas datas comemorativas que enalteciam eventos da história política brasileira, foram festas construídas e planejadas enquanto práticas culturais que deveriam explicitar um certo modo da escola se olhar e deixar-se ver pela sociedade. Nesse sentido, estas festas são entendidas como resultado da ação coletiva em um tempo e um lugar previamente definido, sendo o simbolismo expresso nos seus momentos de comemoração um tipo de viver social implantado no cotidiano escolar como forma de desenhar uma identidade de cidadania aos seus estudantes.

A CONGREGAÇÃO DOS SAGRADOS CORAÇÕES E A EDUCAÇAO NO TRIANGULO MINEIRO NO BRASIL REPÚBLICA

Marcus Vinicius Maciel, U. Federal de Uberlândia

Pesquisa sobre a educação católica masculina, no município de Patrocínio, no período de fundação dos Colégios Católicos, especificamente “Ginásio Dom Lustosa” no período correspondente à administração pela Congregação dos Sagrados Corações. Religiosos holandeses e Religiosas belgas, se dedicam à formação clássica, européia, cristã, civilizatória em contraposição à ameça liberal, protestante, leiga, maçom, atéia. a ao Brasil: Primeira República com suas reformas liberal-positivistas. O século XX, republicano, amanhece sob um projeto de neo-cristandade numa sociedade conservadora. O catolicismo não é a religião oficial do Estado. É a religião oficial do povo. O risco do liberalismo, do laicismo e também do protestantismo ameaçam a identidade da ordem cristã: um “nacionalismo católico”. Neste contexto, a escola católica dirigida por religiosos europeus é um garante espetacular da romanização brasileira. Mais que conversão e cidadania é preciso civilização. A expansão da burguesia agrária encontra pois, na escola católica, um aliado extraordinário para construir uma sociedade protegida com princípios cristãos e civilizados. Internatos, línguas, humanidades, clássicos, disciplina, apologética, música erudita, coro polifônico, história européia ... Em Patrocínio um entroncamento da história. Uma pequena burguesia agrária em desenvolvimento. O estabelecimento de uma comunidade e escola presbiterianas. A maçonaria presente também. O Bispo de Uberaba precisa conter a heresia. Santuários e missões para as massas. Escolas Católicas para cristianizar as elites. Confia à Congregação dos Sagrados Corações o Santuário de Nossa Senhora d’Abadia (1 925) em Água Suja, convergência e irradiação do catolicismo popular, com o “Colégio D.Eduardo”(1926), e os Ginásios “Regina Pacis” (Araguari, 1926) e “D. Lustosa” (Patrocínio, 1927).

Logo chegará uma leva de religiosos de hábito branco como a própria pele e se ocuparão da educação dos meninos e da cristianização (civilização). Religiosas belgas do Coração de Maria de Berlaar darão início aos Colégios femininos.

E daí, se constrói uma grande escola “na cidade de Patrocínio, n´um dos lugares mais pittorescos e saudáveis, onde os alumnos podem viver com recato e bem estar por offerecer aos educandos todas as vantagens higiênicas, dispondo de linda chácara e quintal para recreio, amplos arejados salões para estudos e aulas, (...) espaçoso terreno para exercícios de gymnastica e instrucção militar. O fim do Gymnásio é proporcionar à juventude uma esmerada educação religiosa, a par de uma sólida formação literária, scientífica, moral e cívica.” Portanto, este trabalho apresenta bases e fontes de pesquisa para a História da Educação, da Congregação e da Igreja e da Comunidade Alto Paranaíba e Triangulo Mineiro.

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CULTURA MATERIAL, EDUCAÇÃO E MUSEOLOGIA

Margarida Louro Felgueiras, Universidade do Porto

A comunicação parte da análise do conceito de “cultura material” para salientar a importância de um conjunto de artefactos produzidos pela e para a escola, quer relativos a professores quer a crianças, na situação de alunos ou nos espaços de lazer, como fontes imprescindíveis para a história da educação.

O conjunto variado de artefactos quer ainda os espaços escolares e o seu arranjo interior e exterior constituem os signos de uma actividade de ensino-aprendizagem, que ao longo do tempo as sociedades foram produzindo e que é necessário conhecer e interpretar. Contudo, se todas as fontes estão ameaçadas, estes vestígios correm ainda mais riscos pois são socialmente desvalorizados pelos próprios que as produzem e pelas instâncias que os deviam seleccionar e guardar. Se foi a etnologia a primeira a valorizar o mobiliário escolar e os brinquedos é à museologia que cabe o papel fundamental de recolha, guarda e exposição da cultura material da escola como forma de partilhar uma herança educativa comum. A museologia escolar, que constitui a nível europeu um campo de pesquisa desenvolvido, tem merecido pouca atenção dos poderes públicos e dos próprios historiadores, que tem centrado a sua atenção mais no livro e no impresso, valorizando sobretudo bibliotecas e arquivos. Reconhecendo a importância destes e a necessidade urgente de os conservar e tratar tecnicamente, para os tornar visitáveis, consideramos que é igualmente necessário musealizar outros objectos que permitam dar uma percepção mais global e precisa da actividade escolar e da sociedade em que ela se insere. Só através do museu, estrutura cultural e educativa, com amplo escopo de actuação social, e no compromisso com equipas de investigação multidisciplinares se poderá produzir um conhecimento que seja simultaneamente factor de identidade e de reconhecimento da diversidade. Procuraremos dar conta de alguns trabalhos de recolha e preservação da materialidade da escola e de como eles nos permitem questionar as imagens que construímos da educação, nelas incluindo as ideias correntes sobre a origem do parque escolar e dos agentes interessados no alargamento da instrução popular.

PROGRAMAS SÓCIO-EDUCATIVOS PARA JOVENS NEGROS E/OU POBRES EM SITUAÇÃO DE RISCO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO/BRASIL

Maria Alice Resende Gonçalves, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Nos anos oitenta do século XX, se intensifica a violência nos bairros populares e favelas da cidade do Rio de Janeiro/Brasil advinda da expansão do tráfico de drogas. Bombardeados pelas novidades produzidas pela cultura juvenil globalizada (música, moda, lazer e entretenimento) e assediados pelo crime organizado, os jovens pobres e/ou negros se encontram em situação de intensa vulnerabilidade. Despreparados para enfrentar o futuro, com poucas possibilidades de se integrarem satisfatoriamente ao mercado de trabalho, sem escolarização adequada, sem recursos financeiros para o consumo dos itens da cultura juvenil, expostos à violência e à sedução do crime organizado, nossos jovens carecem de políticas sociais que atendam suas demandas sociais.

Esta mesma década marca a emergência de novos atores no cenário das políticas sociais da cidade: as entidades comunitárias - organizações não governamentais, religiosas e de entretenimento. Todas buscam promover formas alternativas de inclusão, ou seja, programas que sejam antídotos à violência e a situação de risco impostas às populações pobres e/ou negras. Favorecidas e incentivadas pelas políticas sociais focais propostas pelo governo federal, as escolas de samba estendem suas atividades para além do carnaval. Reconhecidas como entidades representativas e promotoras de ações sociais voltadas para o combate da pobreza, desigualdades e exclusão social, desenvolvem projetos no campo social e educativo que atendem a diversas faixas etárias, entre elas a juvenil. Para a manutenção de seus programas, buscam parcerias com o poder público, empresas privadas e organismos internacionais.

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Esta comunicação tem como objetivo apresentar as conclusões do estudo de caso realizado no programa esportivo Vila Olímpica da Mangueira desenvolvido pelo Grêmio Recreativo Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira/RJ/Brasil. Centrado no esporte, este projeto esportivo tem desempenhado funções educativa, de lazer, de entretenimento, profissionalizante e, principalmente, civilizadora, unindo bairros populares e favela em extensas redes de solidariedade e reciprocidade. Nesta urdidura, onde se entrelaçam efeitos da redução do poder do Estado, em virtude das restrições impostas pelos acordos internacionais, e do desmonte das políticas de bem-estar, a Vila Olímpica surge como um projeto local que reivindica a ampliação das oportunidades para os jovens moradores da favela da Mangueira e dos bairros circunvizinhos. Apesar dos limites das ações focais, este projeto tem como perspectiva a integração desses jovens à comunidade e à sociedade nacional. Em luta pelo reconhecimento da cidadania plena dos jovens, este projeto tem procurado conjugar reivindicações locais com uma perspectiva universalista de justiça social.

A GEOMETRIA PRESENTE EM LIVROS DIDÁTICOS DO PERÍODO DE IMPLANTAÇÃO DO MOVIMENTO DA MATEMÁTICA MODERNA NO BRASIL

Maria Ângela Miorim, UNICAMP

A paisagem da matemática escolar brasileira, em meados da década de 1960, começou a passar por significativas transformações. Neste momento, seria iniciado o processo de introdução de uma proposta de modernização dessa disciplina nas escolas brasileiras, proposta esta fortemente influenciada por uma série de reformas ocorridas em outros países, particularmente nos Estados Unidos e na Europa. O Brasil insere-se, dessa forma, no que ficaria conhecido como o “Movimento da Matemática Moderna”. Tendo como argumento principal a importância para aquele momento histórico de se desenvolver uma matemática escolar mais próxima dos últimos desenvolvimentos da matemática dita científica, o movimento buscaria seus elementos centrais nos trabalhos realizados, a partir do final da década de 1930, por um grupo de matemáticos, na maioria franceses, que utilizavam o nome fictício “Nicolas Bourbaki”. A teoria dos conjuntos, as estruturas matemáticas, a precisão da linguagem matemática passariam a integrar a nova paisagem da matemática escolar. A geometria, por outro lado, que deveria ser tratada segundo uma nova abordagem, diferente daquela apresentada por Euclides, começa a desaparecer da matemática escolar. No processo de implantação da matemática moderna nas escolas brasileiras, os livros didáticos desempenhariam um papel de fundamental importância. Na ausência de uma determinação oficial acerca dos programas disciplinares, incentivados pela política desenvolvimentista vigente e pela grande divulgação dada ao Movimento da Matemática Moderna, os editores se apressavam em colocar no mercado editorial livros que estivessem de acordo com essa nova tendência. O professor Osvaldo Sangiorgi, membro do Grupo de Estudos do Ensino de Matemática - GEEM -, fundado em 1961 por professores do Estado de São Paulo, teria os primeiros volumes de sua coleção Curso Moderno de Matemática publicados ainda durante a primeira metade da década de 1960. Muitas outras coleções de livros didáticos, trazendo em seu título referência ao Moderno, foram tomando as prateleiras das livrarias naqueles anos finais da década de 1960 e durante toda a década de 1970. Para a geometria, na maior parte das vezes, esses livros dedicariam apenas alguns capítulos finais. Este trabalho tem como objetivo analisar algumas abordagens da geometria apresentadas em livros didáticos brasileiros desse período, buscando as relações que tais produções estabeleceram com a geometria pelas transformações, com as transformações lineares e com os espaços vetoriais.

IMPRENSA E INFÂNCIA NO BRASIL UMA LEITURA DE ABC - JORNAL DAS CRIANÇAS E PETIZ JORNAL (1912)

Maria Angélica Alves, Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Nos primeiros anos do século XX, a imprensa brasileira passava por um processo de transformações aceleradas e o mercado de consumidores culturais ampliava-se consideravelmente,

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apesar de o país apresentar índices elevados de analfabetismo: em 1920, somente cerca de 24% da população era alfabetizada.

A investigação das publicações de periódicos destinados ao público infantil brasileiro, no começo do século passado, articula-se, nesse trabalho, com o estudo da história das práticas de leitura legitimadas ou não pela instituição escolar. Os conceitos de história cultural e, mais especificamente, de leitura como prática cultural, formulados por Roger Chartier, Pierre Bourdieu e demais teóricos, em diferentes perspectivas, orientou, basicamente, o estudo em questão. Objetivamos identificar e analisar as representações das imagens da infância e da leitura, ao longo dos anos, particularmente no período inicial da República, no Brasil.

Utilizando como fonte documental o periódico ABC- Jornal das Crianças, cujo primeiro número foi publicado em 27 de abril de 1912, analisamos as estratégias de comunicação com os leitores sugeridas diretamente por seus idealizadores nos textos de apresentação do jornal, ou manifestadas, indiretamente, através da seleção do conteúdo dos seus diferentes artigos. Segundo sua definição, o Jornal das Crianças tratava-se de uma “Revista saudável”, constituída de histórias em quadrinhos e contos morais, narrativas fragmentadas em capítulos, charges, textos informativos, pequenas crônicas, jogos e concursos. O ABC dedicava-se a servir à mocidade brasileira, considerando suas graves e inquestionáveis virtudes: “o idealismo e o amor pelas cousas sãs”. Investia-se, também, no jornal, em outros elementos persuasivos, a fim de se obter a aprovação dos leitores: curiosidade, simplicidade, amor pelo belo e por tudo o que era moralmente aceitável. No encarte especial do ABC, intitulado Petiz Jornal, seus editores publicavam, dentre outras, uma seção especial de correspondência entre seus leitores, procedimento este considerado, naquele período, inédito entre os periódicos infantis brasileiros.

O estudo da imprensa - jornais e revistas ilustradas - destinada às crianças possibilita a compreensão de sua inegável importância como meio de prolongamento da formação dos cidadãos brasileiros, de acordo com os modelos culturais vigentes à época em questão.

ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO: A CULTURA ESCOLAR CATÓLICA FEMININA, NO INÍCIO DO SÉCULO XX.

Maria Aparecida Junqueira Veiga Gaeta, Centro Universitário Moura Lacerda-CUML, Ribeirão Preto-SP -Brasil

A comunicação analisa, historicamente, aspectos da cultura escolar produzida por instituições católicas femininas, brasileiras, no início do século XX. Nos rastros deixados por jornais, documentos escolares e memórias de alunas, cruzando seus múltiplos fios, foram estabelecidos tempos e espaços escolares, entendidos como construções sociais e históricas e, por isso, inventados, (re) inventados e transformados.

Ressalta que os colégios femininos constituiram-se como partes integrantes das novas paisagens urbanas, tornando-se ícones do progresso e da modernização nas localidades por onde se instalavam, projetando a sua dimensão educativa para toda a sociedade.

Evidencia que nessas escolas se uniam a tradição católica de formar mães e esposas “extremosas” e a modernização pedagógica emblematizada na cultura escrita e que, nessa simbiose, foi se tecendo uma história da educação escolar que possuía como vitrine o acesso feminino à esfera pública, por meio da escolarização e da profissionalização para o magistério.

Enfatiza que práticas cotidianas escolares desenvolvidas pelas instituições foram produtoras de cultura e que, teias educacionais e religiosas nelas se enredaram. Destaca que essa formação escolar oferecida, perpassada pelos princípios ultramontanos da ordem e da tradição, produzia nas mulheres identidades religiosas, morais e cívicas, habitus peculiares, que propiciaram a inserção das mulheres na esfera pública.

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A INVENÇÃO DO ALUNO: A IMPLANTAÇÃO DO PRIMEIRO GYMNASIO DA CAPITAL, EM SÃO PAULO (1894-1917)

Maria Aparecida da Silva Cabral, PUC-SP

Esse trabalho é parte de uma pequena discussão sobre Rituais Escolares apresentada na minha dissertação de Mestrado, e tem por objetivo discutir a constituição e trajetória do aluno, no processo de implantação do Primeiro Gymnasio da Capital, em São Paulo - primeira instituição pública de ensino secundário nessa cidade - no período de 1894 a 1917. Cabe ressaltar que nesse período ocorreu uma expressiva expansão do ensino em São Paulo, cenário esse que transformou a escola pública num poderoso instrumento da ação dos governantes paulistas para a realização e concretização de suas propostas.

Assim como a escola constituiu-se como um palco privilegiado para a atuação desses governantes os seus sujeitos também foram objeto de intervenção. Isto significa, que ao entender o espaço escolar como lugar de resistências, transgressões, adaptações e conformações de pensamentos e práticas pedagógicas propõe-se dar visibilidade as diversas estratégias construídas pelos alunos no cotidiano da escola em relação ao prescrito (normativo) das regras escolares.

Medidas administrativas e pedagógicas como: a expulsão de alunos por falta de comportamento adequado no espaço escolar, seja na sala de aula, seja no corredores; a perda do ano por motivo de faltas; o desrespeito com os professores ou demais funcionários da escola; reprovações; aprovações; são práticas que podem ser consideradas como cenas comuns do cotidiano escolar. Mas que se forem desnaturalizadas revelam, sobretudo, as finalidades pedagógicas que vão dando corpo e significado a cada instituição escolar. Sendo assim documentos como relatórios de inspetores, atas da congregação do gymnasio, ofícios enviados aos pais dos alunos, livros de controle de freqüência de alunos, provas escolares, boletins de notas constituíram-se como peças fundamentais na compreensão dessas práticas escolares, ou seja, a partir dessa perspectiva verificou-se como esse personagem singular foi construído e inventariado diariamente pela escola.

ESCOLA E INFÂNCIA: A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA ESFERA PÚBLICA

Maria Apparecida Franco Pereira, UNISANTOS

Esta pesquisa visa recuperar e refletir sobre as atividades de mulheres na organização do Liceu Feminino Santista, escola de formação de professoras com suas escolas maternais para crianças pobres, no início do século XX (1902). Santos, cidade escoadora da riqueza do café paulista, à época era grande centro econômico desses negócios. A cidade portuária era também grande receptáculo de imigrantes portugueses e, secundariamente, de espanhóis e italianos, que se dirigiam à atividades de construção do cais de pedra do porto, ao comércio do café e à construção civil, no grande surto de urbanização da cidade que acabava de se recuperar das grandes epidemias.

A problemática orientadora da pesquisa é a análise do estrato social do grupo feminino, mostrando que essas mulheres são oriundas de famílias não fundamentalmente ligadas ao alto comércio cafeeiro, mas de uma elite formada por profissionais liberais - médicos, advogados, engenheiros e funcionários da alta administração local - que atuam na cidade.

O apelo à participação na filantropia e na educação era a oportunidade das mulheres agirem no espaço público, oriundas que eram de uma elite que têm o espírito militante, batizado pela vitória nas lutas pela emancipação do escravo e pelo advento da República, pela recuperação das epidemias, pelo sangue novo do imigrante.

E o que vemos observando é que muitas vezes a presença atuante dessas mulheres da mantenedora Associação Feminina Santista tem, na retaguarda, seus pais ou seus maridos, profissionais liberais, imbuídos de uma filosofia liberal-positivista, propugnadora da inovação e do progresso.

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ISABEL GONDIM E SOPHIA LYRA: MEMÓRIAS QUE TECEM A HISTÓRIA

Maria Arisnete Câmara de Morais/UFRN/BRASIL

As escritoras de quem vou tratar são brasileiras de duas gerações distintas, que se inscrevem entre o século XIX e início do século XX. Uma já morreu e chama-se Isabel Gondim. A outra, Sophia Lyra, mora no Rio de Janeiro: completará 100 anos no próximo mês de Novembro. O objetivo é analisar suas contribuições à história da educação no que diz respeito à conduta que se esperava da mulher no século XIX e início do século XX. Isabel Gondim nasceu em Papari (atual município de Nísia Floresta), em 1839, no Rio Grande do Norte e morreu em 10 de Junho de 1933 a menos de um mês dos 94 anos. Intelectual múltipla, com produção em diversas áreas do conhecimento como a História, a Educação, a literatura, a Dramaturgia. Quero deter-me na análise do seu livro Reflexões às minhas alunas, um dos mais importantes livros da escritora, publicado pela primeira vez em 1874; teve uma segunda edição em 1879, com uma tiragem de cinco mil exemplares, ambas publicadas no Rio de Janeiro. A terceira edição é de 1910, em Natal. Livro destinado à educação nas escolas primárias do sexo feminino, oferecido ao governo dos Estados Unidos do Brasil, para o qual a autora pede a atenção dos senhores pais de família. A outra escritora, Sophia Lyra, nasceu no Rio de Janeiro a 11 de Novembro de 1903, de raízes nordestinas, pois é filha de Tavares de Lyra, político e historiador importante no contexto norte-rio-grandense. Destaco para este momento o seu livro Vida íntima das moças de ontem, novela ambientada no Rio de Janeiro, na década de 1930. Através desse livro, a escritora constrói uma configuração evidenciando os mecanismos que enunciam e representam os papéis da mulher na sociedade, fazendo sua própria história. Quis reunir essas duas escritoras, porque através de suas memórias vêm à baila problemas sociais que dizem respeito à convivência entre os sexos e especificamente ao momento em que a mulher buscava novas conquistas para além da busca da leitora pela através dos jornais.

O ESTADO E A CONSTRUÇAO DO CÓDIGO DISCIPLINAR DA HISTÓRIA: PROFESSORES PRODUZINDO MANUAIS DE DIDÁTICA E METODOLOGIA DO ENSINO NO BRASIL (1960-1970)

Maria Auxiliadora Schmidt, Universidade Federal do Paraná

Esta pesquisa insere-se no âmbito do projeto “Ensinar a Ensinar: estudo e análise de manuais destinados à formação de professores no Brasil”, desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná em convênio com o Projeto Manes-Espanha . Uma parte deste projeto tem procurado identificar e analisar manuais de Didática e/ou Metodologia do Ensino de História, produzidos por professores e destinados a professores, publicados no Brasil entre 1917-1990 (Schmidt,2003 a;2003b; 2002;2000). O presente trabalho apresenta resultados de pesquisa realizada em manuais produzidos por professores, no período de 1950/1960, editados e publicados pelo Ministério da Educação e Cultura brasileiro, particularmente por meio de dois órgãos: o INEP - Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos e o CADES - Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário. Tomando como referência o campo de estudo das disciplinas escolares (Juliá,2002; Chervel,1990) e da construção do código disciplinar da história (Fernandez Cuesta, 1997;1998), o objetivo foi estudar estes manuais em sua especificidade (Chopin,1998), procurando recuperar elementos teórico-metodológicos relacionados com a construção de um certo “saber-fazer” do professor de história, considerado pelo Estado como relevante em determinado contexto social, econômico e político, no sentido de adequação da educação às necessidades do desenvolvimento econômico nacional (Cardoso,1978; Nunes,1979). Resultados parciais indicam dois tipos diferentes de publicações: um tipo de manual destinado a professores da antiga escola primária, onde o conteúdo de História aparece integrado ao de Geografia, com o nome de Estudos Sociais; outro manual específico de História, destinado a professores da escola secundária. Ademais, pode-se

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identificar a presença de autores de manuais em cursos e seminários organizados pelos órgãos do Ministério da Educação e Cultura, bem como uma forte ênfase em concepções, conteúdos e métodos de ensino da História considerados, pelos próprios autores, como renovadores e adequados ao desenvolvimento do país.

NOTAS PARA A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA: ESTUDO EM UMA COMUNIDADE DE MAIORIA AFRODESCENDENTE EM SERGIPE - BRASIL

Maria Batista Lima, PUC-RJ; Sônia Maria dos Santos Marques , UFRGS e UNIOESTE

Este trabalho trata da inserção da população afrodescendente do município de Laranjeiras, em Sergipe - Brasil, no sistema formal de Educação, focalizando as experiências dessa presença tanto no âmbito discente quanto docente, partindo de algumas experiências educacionais de cunho privado assistencial ocorridas no início do século XX como abertura para a escolarização no âmbito público. Focaliza-se do final do século XIX até os dias atuais, refletimos sobre o lugar dos (as) afrodescendentes na educação local. Objetiva evidenciar a especificidade afrodescendente na história da educação brasileira e sergipana, considerando as particularidades que marcam a presença dessa população na história da sociedade. A educação escolar tem sido, desde os seus primórdios, cerceada à população afrodescendente, seja através da proibição de acesso às escolas, no século XIX, seja com a desqualificação contínua da escola pública e crescente dicotomização do tipo de escola ofertada. Aos pobres (predominantemente afrodescendentes) uma escola de pobres e aos ricos da elite (brancocêntrica e eurocêntrica) uma escola de privilegiados, sendo esta dicotomização sustentada na educação básica com o fortalecimento do ensino privado, que tem, historicamente, mantido uma reserva quase absoluta de vagas para esta elite nas universidades públicas. O trabalho se situa no campo das afrodescendências, aqui entendida como reconhecimento de uma ancestralidade africana, comum na sua origem continental, mas de existência múltipla, semelhante nos percalços de sua diáspora e plural nas suas nações de origem e em suas recriações atuais. A partir dessa concepção, os sujeitos deste trabalho são definidos como afrodescendentes, categoria se refere a um conjunto de denominações atribuídas aos descendentes de africanas e africanos, pelos referenciais sócio-históricos e político-culturais comuns, construídos na trajetória histórica na sociedade brasileira, a partir da relação com a África e com os ancestrais africanos. Corresponde ao que o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), classifica como pardos e pretos. No campo da história da educação recorre-se à bibliografia local (Nunes, 1984; 1989) sobre o tema, localizando a especificidade afrodescendente nesta história, bem obras sobre a história sergipana (Figueiredo,1977, 1986) sobre a história da educação brasileira, buscando situar o lugar do afrodescendente nessas produções (Mattos, 2001; Silva, 2000; Duarte, 1997). Metodologicamente, além de utilizarmos as fontes bibliográficas, recorremos á fala dos sujeitos pesquisados como fonte de informações. Para tal nos subsidiamos principalmente em Vansina (1982) e Aguessy (1980), sendo que esta oralidade tem sido apreendida através de relatos, depoimentos e entrevistas com professores e pessoas de diferentes faixas etárias da comunidade. O trabalho partiu de questões suscitadas durante pesquisa de Mestrado em Educação (2000-2001) de uma das autoras, quando a questão da participação afrodescendente na história despontou como foco instigador para o entendimento das relações étnicas locais, se ampliou durante a pesquisa ‘Repertórios Culturais e Educação nos Territórios de Predominância Afrodescendente Sergipanos’, realizada em 2001/2002, para o II Concurso Negro e Educação, promovido pela ANPEd e Ação Educativa com financiamento da Fundação Ford e se consolidou em 2003 com a análise dos dados referentes a este tema, realizada pelas autoras do presente trabalho.

SABERES CONSENTIDOS CONHECIMENTOS NEGADOS: O ACESSO DA MULHER À INSTRUÇÃO EM PERNAMBUCO NO INÍCIO DO SÉCULO XIX

Maria Beatriz Guimarães, UFPE

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O trabalho tem como ponto central de análise os discursos sobre o acesso das mulheres à instrução formal em Pernambuco, enfocando historicamente as diferentes modalidades de representações sociais construídas nos atos discursivos, de homens e mulheres, utilizando gênero como categoria de análise. A utilização da categoria gênero, caracterizada como um conjunto de práticas, símbolos, representações, normas e valores sociais que homens e mulheres constroem em relação, possibilita esclarecer, como instrumento conceitual, a partir da análise crítica de documentos históricos e das dinâmicas dos discursos, permanências e transformações das variadas formas de dominação simbólica presentificadas nos espaços em que a educação era exercida e comentada.

Na pesquisa realizo uma aproximação das discussões sobre a produção do saber histórico com as especificidades do objeto em estudo e a reflexão sobre idéias e conceitos chaves do quadro teórico-analítico da pesquisa, como: conhecimento, discurso e gênero, estabelecendo uma contextualização sócio-histórica da inserção da mulher no universo do saber formal em Pernambuco no início do século XIX. Buscando dar cor, forma e sentido à análise do material - Anais do Legislativo, Leis provinciais, relatórios de presidentes da província de Pernambuco, quadro geral da Instrução pública, jornais e manuscritos avulsos - coletado nos arquivos públicos da cidade do Recife, Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro e Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa, somado aos livros contemporâneos e de época, dissertações e teses; elaboro uma narrativa que associa as abordagens e categorias analíticas presentes nas reflexões sobre o saber/fazer histórico a partir da História Nova com as teorizações e práticas construídas pela Análise do Discurso.

Levanto tópicos que abrem portas para questionarmos de forma inter-relacionada como as representações sociais presentes nos discursos que tratavam do acesso à educação feminina em Pernambuco no início do século XIX contribuíram para consentir e negar os tipos de conhecimento passíveis de serem acessados por ambos os sexos, o que permite visualizar as desigualdades manifestas entre homens e mulheres quando ponderamos sobre os saberes e a forma como eles foram e são distribuídos. Ao nos voltarmos para o conteúdo das representações, podemos trazer vestígios de quais saberes são aplicados para legitimar as assertivas que consideram os homens mais capazes de conhecer do que as mulheres e podemos também constatar a permanência de representações cruzando o tempo e o espaço rumo a outras épocas e lugares.

A EDUCAÇÃO INFANTIL NA SOCIEDADE BRASILEIRA: ASPECTOS HISTÓRICOS

Maria Beike Waquim Figueiredo , UFPI

Este estudo discute a concepção que a família, a escola e a sociedade brasileira têm sobre a infância e mais especificamente sobre a importância dada à criança na idade pré-escolar, a função social da família e da escola e as responsabilidades das políticas públicas sobre a educação infantil no Brasil. Problematiza-se a inserção da criança na educação infantil. Faz-se uma apropriação de diferentes olhares lançados sobre o contexto histórico da criança desde o século XVI. Utilizou-se como procedimento metodológico a pesquisa bibliográfica, e está fundamentada na construção de conhecimentos, partindo das contribuições de Ariès (1981), Azevedo (1976), Kramer (1984, 1996), Lopes (1989, 2001) e outros. Essa investigação chegou aos seguintes resultados: que não são fartos os dados, fontes e documentos a respeito da história da criança e a ausência de traços legados principalmente pelas crianças deve ser tributada à representação que cada sociedade faz dessas crianças; na medida que passa a considera-las sujeitos, é que será levada em conta e preservará a sua produção e seus documentos; a dinâmica atual da educação que a família e a escola passam para a criança assume um papel distinto daquela estabelecida na sociedade moderna; o avanço tecnológico também, supõe-se veio a contribuir para essa mudança. A pedagogia elabora uma representação básica da infância a partir das noções pedagógicas de natureza e de cultura que, ao serem aplicadas à infância, assumem um caráter temporal. Como a infância precede a idade adulta, o fator “tempo” é introduzido na conceituação de infância, gerando uma interpretação dúbia. Por um lado, o desenvolvimento fisiológico da criança provoca uma certa confusão entre “natureza humana” no sentido biológico do termo; por outro lado, o aspecto temporal confunde a infância, origem individual do homem, com a origem da humanidade: infância corresponderia ao estágio originário da humanidade e como tal expressaria os traços essenciais da natureza humana. Essa idéia de infância

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está imbuída de significações ideológicas, não na relação da criança com a família, com o adulto, mas também ao nível da relação da criança com a sociedade. A criança na idade pré-escolar precisa apropriar-se da educação infantil, é um direito constitucional e agora a Lei de Diretrizes e Bases Nacional nº 9394/96 veio reafirmar esse seu direito dentro das políticas públicas do Brasil.

CALIBAN CHEGA ANTES DE TIO SAM: AMERICANISMO E VILIRIZAÇÃO DA NAÇÃO

Maria Bernardete Ramos – UFSC/Brasil

Num campo amplo de investigação, da cultura de raça do século XX imbricada ao nacionalismo e à modernização, pela criação do homem novo, o texto aborda o debate em torno de dois modelos culturais, no Brasil, no contexto da República Velha: o hispanismo, espiritualizante, e o americanismo, racionalizante, com ênfase neste último.

O primeiro, tendo por mote a obra do Uruguaio José Henrique Rodó, Ariel, no qual os Estados Unidos aparecem como o materialista calibanesco, os defensores da nossa tradição ibérica viram na vida moderna, americanista, os perigos destruidores da nossa cultura e da identidade falocêntrica. Tanto a identidade masculina como a feminina deveriam ser re-afirmadas, em prol da função política, regeneradora da raça. Para Plínio Salgado, por exemplo, virilizar significava centrar as mulheres numa feminilidade bem definida para que os homens pudessem recompor a masculinidade. A restauração viria com o culto de Maria Santíssima e da mãe heroína, geradora e educadora da prole perfeita para a nação, por um lado, e, por outro, com a recuperação do papel tradicional do homem provedor da família.

Sob a outra tendência, ao se cotejarem as obras de intelectuais que se debateram pela educação do homem brasileiro, tais como Monteiro Lobato (O Presidente Negro ou o choque das raças, 1926; América, 1932), Anísio Teixeira (Anotações de viagem ao Estados Unidos, 1927; Aspectos americanos de educação, 1928) e Mário Pinto Serva (Pátria Nova, 1922; A virilização da raça, 1923), percebe-se como o ideário americano, expresso numa cultura viril – progresso, ciência, tecnologia, abundância, racionalidade, eficiência, gerenciamento científico e mais a democracia associada ao herói, à idéia de liberdade, de direitos individuais e de independência - despertara simpatias e adesões. O americanismo, associado ao racionalismo e à capacidade criativa do homem, transformou-se no paradigma para a saída de nosso passado de atraso e ignorância. Na herança ibérica, sinônimo de atraso e anacronismo por oposição à herança protestante nórdica, estariam os fundamentos da nossa impossibilidade de atingir o uso da razão.

A cultura viril, moderna, americana, era vista como o meio para superar o passado, a tradição, a sociedade fragmentária, posicionada na órbita das nações. Um povo não-viril estava associado à tradição, ao deperecimento da raça, à literatura de ficção, ao intelectualismo puramente literário, ao discurso à moda francesa, às populações analfabetas e doentes, ao Jeca-Tatu de Monteiro Lobato. Uma cultura viril faria o Brasil moderno e um povo forte, belo e saudável.

A INSERÇÃO DA ARTE NO CURRÍCULO ESCOLAR (PERNAMBUCO, 1950-1980)

Maria Betânia e Silva, Universidade Federal de Pernambuco

Este trabalho teve como objetivo central compreender o processo de inserção da arte como disciplina no currículo escolar, especialmente no estado de Pernambuco, no período de 1950 a 1980. Para alcançar esse objetivo utilizei como fontes principais: documentos oficiais (resoluções, legislação, pareceres, propostas curriculares, programas de ensino) jornais e depoimentos orais de profissionais ligados diretamente a instituições e aos movimentos estudados na pesquisa. Como referencial teórico-metodológico utilizei a História das Disciplinas Escolares e a História Oral. A pesquisa constatou que embora se encontrem indícios da presença da arte no sistema educacional brasileiro, desde o século XIX, ela somente se configura como disciplina curricular obrigatória a partir da reforma educacional do ensino de 1º e 2º graus de 1971. Este estudo constatou também que, nesse momento, houve uma participação coletiva dos profissionais de educação de norte a sul do

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Brasil na elaboração dos currículos escolares e dos próprios programas das diversas disciplinas. Nesse processo, ao longo do século XX, algumas instâncias e movimentos exerceram um papel fundamental para o fortalecimento dos profissionais da área de artes, para dar visibilidade à arte na sociedade e na escola e para gestar novas concepções de arte-educação. Entre esses movimentos, contemplo, na presente pesquisa, a Escola de Belas Artes de Pernambuco, a Divisão de Extensão Cultural e Artística (DECA) da Secretaria de Educação do Estado, o Movimento de Cultura Popular (MCP) e o Movimento Escolinhas de Arte (MEA).

LEITURAS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORAS PRIMÁRIAS

Maria Catarina Cury, FAFE/USP

Em pesquisa realizada no doutorado em Educação recuperamos memórias de leitura de professoras primárias paulistas cujas histórias de vida indicaram o exercício de suas funções a partir da terceira década do século XX. O presente trabalho faz parte de um contínuo à pesquisa anterior e parte do pressuposto de que uma história da leitura, com ênfase na história cultural, coincide com a emancipação do leitor, como uma performance do processo de modernização da sociedade brasileira pós-colonizada.- na pesquisa em pauta uma leitora específica, a professora primária. Tal pressuposto está associado ao processo de “libertação” do qual se originou a moderna sociedade brasileira ou à formação da identidade nacional. Historicamente essa ruptura aconteceu a partir do século XIX com a independência política do país e também, a partir da história da literatura com o alargamento de uma consciência com maior autonomia cultural. A nossa hipótese é que a apropriação dos bens culturais, por parte das professoras do antigo ensino primário foi desigual, e, o lastro identitário dessa categoria profissional a partir de uma autonomia cultural ainda está por se realizar, dessa maneira, a formação específica da professora insere-se no desenvolvimento das raízes culturais brasileiras. Um dos objetivos do trabalho é situar historicamente as questões da formação cultural da professora primária paulista portanto a pesquisa documental tem sido o ponto para as possíveis respostas em busca de uma identidade cultural que se inicia com os primórdios da Instrução Pública. De acordo com Bourdieu (1999) a leis da transmissão cultural faz com que o capital cultural retorne às mãos do capital cultural e, destarte reproduz-se a estrutura de distribuição do capital cultutural entre as classes sociais, ou seja, a distribuição dos instrumentos de apropriação dos bens simbólicos que um determinado conjunto social seleciona como desejados ou desejáveis. Ele observa ainda que se repete a mesma estrutura sempre que se buscam medidas às práticas culturais em particular aquelas que exigem uma disposição cultivada, como a leitura, a frequência ao teatro, aos concertos, ao cinema de arte ou a museus. No tempo histórico pretende-se re-constituir um conjunto de idéias sobre a ordem educacional a partir da dialética que operava a polaridade dependência/emancipação do processo educacional brasileiro em seus inícios até as décadas de 30/40.

HISTORIOGRAFIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS TRABALHADORES PELA IMAGEM FOTOGRÁFICA - UMA ANÁLISE COMPARATIVA

Maria Ciavatta, Universidade Federal Fluminense

Este texto tem dois objetivos principais: a reconstrução da memória do trabalho e dos trabalhadores nas três primeiras décadas do século passado (1900-1930) através das fotografias existentes em arquivos públicos e privados das cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Bologna (Itália) e a discussão dos estudos comparados. O estudo surge da necessidade de investigar a relação trabalho e educação com fontes alternativas em história da educação; da urgência de preservar e revelar a memória de um mundo em que o trabalho se transforma aceleradamente; e compreender em que sentido pode ocorrer a comparação na produção do conhecimento nas ciências histórico-sociais e na educação.

Os estudos comparados têm uma tradição longa na história da educação. A história factual sempre contemplou a dimensão comparativa na medida em que as experiências de diferentes países, o

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desenvolvimento dos sistemas educativos,projetos e idéias serviram de modelo para outros países e para outros lugares.

O uso da imagem é um dos desafios mais inquietantes para a pesquisa em educação. Como fonte documental, como forma de conhecimento do mundo, guardiã da memória e elo de coesão de identidades, como representação da realidade, como elemento fundamental das artes visuais ou como produção cultural advinda do trabalho humano, a imagem participa de um universo sedutor e ambíguo de onde podem ser depreendidos múltiplos significados.

Conceitual e metodologicamente, buscamos historicizar as categorias analíticas e realizar o processo comparativo respeitando a totalidade histórica de cada um dos quatro acervos selecionados que tem uma história institucional, finalidades específicas da produção, preservação e apropriação diferenciada das fotografias. Comparamos: (i) a “memória oficial” sobre trabalho e trabalhadores em arquivos públicos e privados no Rio de Janeiro do início do século, na cidade que se modernizava; (ii) a memória do movimento operário em São Paulo preservada pelo Arquivo Edgar Leuenroth, onde a memória legada retrata e educa para as diversas formas de luta. (iii) A palavra impressa e a memória fotográfica preservada pelos trabalhadores nos jornais operários de São Paulo e do Rio de Janeiro que denunciavam as más condições de vida, de trabalho e a perseguição política. (iv) A memória recuperada pelos trabalhadores no arquivo da CGIL em Bologna, onde os trabalhadores se reconhecem não apenas como classes subalternas, mas como sujeitos sociais conscientes de sua história e de sua organização, das raízes profundas do trabalho no tecido social e na construção coletiva da história e da democracia.

OS PROJETOS DE REFORMA DA ESCOLA PÚBLICA NO BRASIL PROPOSTOS ENTRE 1870 E 1886: A ÊNFASE NA FORMAÇÃO MORAL DO CIDADÃO

Maria Cristina Gomes Machado, Universidade Estadual de Maringá

As duas últimas décadas do Império brasileiro marcaram a emergência de um debate em torno da necessidade de organização de um sistema nacional de ensino sob a tutela do Estado. Neste período, vários projetos de reforma da educação pública foram apresentados à Câmara dos Deputados com o objetivo de reformar o ensino primário destinado às classes populares no Município da Corte e servir de exemplo às províncias que compunham o reino. Com base nesta constatação, este texto analisa os projetos de reformas propostos entre 1870 e 1886 destacando a ênfase dada à educação como meio de moralizar o homem - cidadão. Através de um aditamento organizado na secretaria da Câmara dos Deputados, contendo os projetos relativos à instrução pública e seus respectivos andamentos, pode-se levantar o projeto de Paulino José Soares de Souza (1870), o de Antonio Candido Cunha Leitão (1873), o de João Alfredo Corrêa de Oliveira (1874), o Decreto n. 7.247 de Leôncio de Carvalho (1879), o parecer/projeto de Rui Barbosa (1882-1883), o de Almeida de Oliveira (1882) e o de Barão de Mamoré (1886). Estes projetos evidenciam a compreensão da importância que os políticos proponentes atribuíam à educação como fundamental para a sociedade brasileira. Foram propostas sete reformas em menos de duas décadas sem que houvesse divergência no que se referia a urgência de implementação de seus respectivos projetos pelo Estado brasileiro, este deveria assumir os encargos financeiros para a oferta da instrução pública. De forma geral, esses projetos defendiam a gratuidade do ensino expressa na Constituição outorgada em 1824 e pelo Decreto de 15 de outubro de 1827. Durante todo o Império brasileiro, apesar da insistência de alguns parlamentares, não havia uma oferta significativa de escolas para as classes populares, assim a instrução primária permaneceu como uma tarefa da família, entretanto crescia a demanda por escolas e a sociedade mobilizava-se para mudanças no processo produtivo com a eminente necessidade de abolir a escravidão e a de se construir uma unidade nacional no país. Assim, o trabalho livre, a imigração, a urbanização, o questionamento do regime político exigiam que o povo fosse instruído. Daí decorre a preocupação com a expansão do número de escolas e fundamentalmente com o conteúdo a ser ensinado por elas, evidencia-se a preocupação com conteúdos que garantissem a formação moral do cidadão, fosse esta laica ou secular. Nos projetos citados anteriormente, perspassava a idéia de que o ensino público seria o primeiro elemento de moralização.

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EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Maria da Glória Carvalho Moura, Universidade Federal do Piauí, UFRN

Neste estudo apresentamos em linhas gerais a preocupação de como a Educação de Jovens e Adultos – EJA é referendada nas constituições, leis, decretos-lei e outros dispositivos legais, no Brasil, buscando informações desde os primórdios da educação brasileira, para que pudéssemos analisar o descaso como esta área foi tratada nos momentos considerados de redefinição das políticas de educação pública no país. Buscamos, ainda, situar a educação básica de jovens e adultos no contexto da educação brasileira, considerando sua inserção nos momentos históricos, políticos e sociais. Refletindo sobre o que dizem os documentos legais, percebemos que o processo de valorização da EJA, referente às políticas públicas no Brasil, não se deve ao fato de ter sido considerada nas leis como um direito de todos os cidadãos, independente de idade, como fator preponderante para o crescimento do país e dos estados. Exemplificando, podemos citar a questão do analfabetismo visto como um entrave, quando impede o desenvolvimento de um projeto econômico e não como uma das principais condições básicas para o ser humano exercer a sua cidadania. Desta forma, as grandes campanhas de combate ao analfabetismo e os planos emergenciais terminaram por não obter o êxito esperado, devido à não incorporação das propostas pelos sistemas de ensino e sua inadequação às demandas específicas próprias de cada região brasileira. As dificuldades enfrentadas, no atendimento às reais necessidades dos educandos, faz-se sentir no decorrer deste estudo, na análise sobre a visão histórica da trajetória da educação básica de jovens e adultos no Brasil, desde o período Colonial até a fase de redemocratização da República, mostrando que em diferentes épocas, mesmo os governos comprometendo-se com o interesse do povo e fomentando discussões que resultaram no surgimento de movimentos com a participação de diversos setores da sociedade, estes foram considerados em alguns momentos específicos da nossa história, como subversivos, nocivos às idéias do governo e, por esta razão, foram extintos. Entretanto, uma visão histórica mais abrangente do tema, mostra-nos que essas características estão se modificando, embora de forma lenta, apontando para uma educação escolarizada de jovens e adultos com caráter de continuidade. É um estudo cujo embasamento teórico metodológico considerou aspectos culturais e historiográficos da educação brasileira.

JORNAL DAS MOÇAS - ESPAÇO INFORMAL DE EDUCAÇÃO FEMININA

Maria da Graça Santiago Barbuto, U. Do Estado do Rio de Janeiro

A década de 30 do século XX foi marcada por significativas transformações nas esferas político-econômico-sociais da sociedade brasileira, dentre as quais a educação. Neste sentido, o propósito inicial deste trabalho consistia em pesquisar de que maneira a educação escolar estava presente e influenciando a família, na década de 1930, de modo que fosse satisfeito o modelo de cidadão que a sociedade brasileira buscava formar; já que a escola era, naquele momento, o lugar por excelência que viabilizaria tal processo de construção da nação. Complementando este propósito estava o de perceber qual o lugar da família na educação dos filhos em meio a tais movimentos de reorganização educacional. Nesta perspectiva, desejamos usar como fonte de investigação revistas femininas em circulação na época. Nossas pesquisas concentraram-se no setor de periódicos da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, onde encontramos o Jornal das moças - semanário dirigido à mulher que circulou desde as primeiras décadas até por volta dos anos sessenta do século XX. Para nossa surpresa não encontramos, pelo menos no período investigado - 1929 a 1933, matéria suficiente que nos permitisse refletir e desenvolver tal questão de forma substancial. Assim, fomos impelidos a mudar o foco inicial para as questões que se descortinavam diante de nossos olhos enquanto “folheávamos” suas páginas, procurando perceber a dimensão de educação feminina presente nas entrelinhas dos artigos, colunas sociais, propagandas, contos, contidos na referida publicação. Os artigos coletados retratam o cotidiano da mulher, os valores sociais, a postura dela esperada em tudo o que lhe dizia respeito. Muito embora diversos artigos apontassem para o movimento que a mulher brasileira vinha fazendo em direção à conquista do espaço público, fora dos limites do lar, o ideal de

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mulher era o de esposa e mãe e, sua participação era tida como indispensável no processo de formação da criança dentro do projeto de construção da nação, via educação, que estava em curso naquele momento. Conquanto não tenhamos encontrado senão um único artigo que fazia referência exclusivamente à escola enquanto instância formadora por excelência, o Jornal das moças, por meio de suas publicações, apresentava-se como importante veículo de difusão das idéias que orientavam o programa de renovação educacional que se pretendia estabelecer e, para o qual, o concurso da família era indispensável. Ao mesmo tempo, deixava claro o lugar que à mulher estava destinado - o lar. Jornal das moças constituía-se, então, em veículo educativo atendendo, assim, a determinados propósitos e interesses.

MAGISTÉRIO DO PADRE FRANCISCO DE BRITO GUERRA NA CADEIRA DE GRAMÁTICA LATINA DE CAICÓ (1810 a 1830)

Maria das Dores Medeiros, UFRN

A criação da Cadeira de Gramática Latina na Vila Nova do Príncipe (hoje Caicó), no interior da Capitania do Rio Grande, no contexto do Brasil Colônia, levou-nos a investigar o plano de estudo estabelecido pelo Padre Guerra para a Cadeira de Gramática Latina de Caicó, durante os anos de 1810 a 1830, abrangendo o ano da criação e o afastamento do Padre Guerra para a Câmara Federal do Império. Apesar da reforma geral dos Estudos Menores e Maiores, decretada especialmente em 1772, pelo Ministro de Dom José I, Sebastião José de Carvalho e Melo - Marquês de Pombal, a Igreja Católica no Brasil, naquele princípio de século XIX, continuava investindo na tarefa de propagação estrita da educação escolar. O objeto de análise do presente trabalho é o plano de estudo da Cadeira Gramática Latina de Caicó, cujo objetivo é examinar a associação entre o plano da Cadeira de Gramática Latina de Caicó e o do Seminário Episcopal de Nossa Senhora da Graça de Olinda, fundado pelo Bispo Diocesano de Pernambuco, José Joaquim da Cunha Azeredo Coutinho, em 1798 e instalado solenemente a 16 de fevereiro de 1800. Aluno-seminarista da primeira turma desse estabelecimento católico de ensino, Francisco de Brito Guerra ali estudou de 1800 a 1802, e talvez, tenha sido o noviço mais afeiçoado do Bispo Azeredo Coutinho. Por um lado, a documentação relativa à pesquisa compreende os escritos literários, diocesanos e os projetos educacionais do Padre Francisco de Brito Guerra escritos como aluno-seminarista no Seminário de Olinda, Visitador Apostólico e Delegado do Crisma nas Províncias do Rio Grande do Norte, Pernambuco e Paraíba e ainda como Deputado Geral na Câmara Federal do Império (1831-1833 e 1834-1837), Deputado Provincial (1835) e Senador Imperial pela Província do Rio Grande do Norte (1837-1845). Por outro, a produção concernente à vida do padre e político Francisco de Brito Guerra e também ao Seminário de Olinda de conformidade com Augusto (1980), Melquíadas (1987) e Alves (1993). Por fim, a análise histórica baseia-se na noção de pedagogia cultural por ela permitir descortinar os investimentos educacionais da Igreja Católica no Brasil e especialmente em Caicó-RN.

IGREJA, ESTADO NOVO E EDUCAÇÃO: PORTUGAL E BRASIL, A ESCOLA À SERVIÇO DA PÁTRIA

Maria das Graças Ataíde de Almeida, Universidade Federal Rural de Pernambuco e Universidade Federal de Pernambuco

Este trabalho faz parte de uma pesquisa maior que desenvolvemos como bolsista da CAPES, no ano de 2001/2002, na Universidade de Coimbra-Portugal, a nível de pós-doutoramento, sob a orientação do Prof. Dr. Luis Reis Torgal (Faculdade de Letras & CEIS 20/Univ. Coimbra) onde realizamos uma análise comparativa acerca das relações entre Estado e Igreja no Estado Novo português e brasileiro, procurando ver suas similitudes e diferenças. Nesta comunicação trabalharemos o discurso da Igreja e do Estado em relação à instrumentalidade da educação nos dois regimes autoritários. Em Portugal, a Revolução de maio de 1926 representa a gênese da

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implantação do regime autoritário em detrimento da democracia. A subida de Salazar ao palco político quando da implantação do Estado Novo português, acata os ideais da chamada " democracia autoritária". Também no Brasil, a Revolução de 1930 vai construindo a base para a deflagração do autoritarismo a partir de 1937, com a emergência do Estado Novo Varguista. Nos dois países, ordem é o conceito reificado. A ordem é apontada como conceito máximo para a contenção dos problemas sociais, num momento em que a classe operária se manifesta e luta por melhores condições de vida. A igreja católica, ressentida pela perda do poder e ávida de recuperar o espaço perdido com a laicização do Estado, quando do advento da República -em 1889 no Brasil e em 1910 em Portugal- oferecerá ao Estado o seu discurso profético, e assim, poder político e poder religioso se articulam, utilizando ambos, a educação como instrumentalidade política. Utilizamos como fonte para a pesquisa em Portugal, os discursos de Salazar; os Anais dos Congressos Eucarísticos realizados no período; e a imprensa laica e religiosa, nomeadamente as revistas Estudos(Coimbra), Brotéria(Lisboa), Brasília (Coimbra) e Atlântico(Lisboa/RJ). No Brasil, a pesquisa se volta para o projeto político pedagógico implantado pela Interventoria Agamenom Magalhães no estado de Pernambuco, a partir do acervo do Arquivo Agamenom Magalhães, no CPDOC/FGV. Os Anais do Congresso Eucarístico Nacional de 1939; as revistas Ordem (RJ), Para o Alto (Recife), Maria (Recife) e os jornais A Nota (RJ), Folha da Manhã(Recife), A Tribuna(Recife), A Gazeta (Recife) representam o acervo da imprensa laica e religiosa pesquisado.

LIÇÕES DE PEDAGOGIA CRISTÃ EM CORRESPONDÊNCIAS DO PADRE IBIAPINA (1863 -1876)

Maria das Graças de Loiola Madeira, Faculdade de Educação - UFC

Este estudo examina cartas manuscritas enviadas pelo padre cearense José Antônio de Maria Ibiapina, entre 1863 a 1876, às superioras de instituições, criadas por ele no sertão do Nordeste brasileiro, nomeadas de “Casas de Caridade”. Localizadas em museu da cidade de Areia (PB), as correspondências se apresentavam como um recurso de correção e modelagem femininas para manter a organização daquelas instituições quanto ao aspecto moral, pedagógico e financeiro. As cartas continham orientações pedagógicas nas recomendações, nos elogios, nas permissões, repreensões, proibições, na indicação de leituras de obras sacras - correspondentes à biografia de santas, jornais e obras clássicas da teologia cristã - na exigência para o cumprimento das regras do Estatuto das “Casas de Caridade”, além de terem se transformado em objeto de avaliação de apropriação da escrita, uma vez que algumas delas eram redigidas, a seu pedido, por meninas educadas naqueles estabelecimentos. Em geral, nas correspondências padre Ibiapina recomendava às superioras ações previdentes, pragmáticas, busca pela perfeição cristã, intolerância com as faltas ou com aqueles que não seguiam suas convicções, além da manutenção de ações generosas sem paternalismo, visto que todas deveriam trabalhar para comer ou fazer por onde merecer vida favorável, contudo, cuidando para que as “Casas” não acumulassem bens. O trabalho, neste sentido, significava um recurso pedagógico importante para purificação do corpo e da alma, tendo em vista a santificação. Padre Ibiapina carregara consigo traços de uma milenar tradição cristã que percorreu e percorre a história do Ocidente desde o Apóstolo Paulo, depois seguida por Santo Agostinho, São Bento, mais tarde, por Tomás de Aquino e Santo Inácio de Loyola.

A REFORMA DA UNIVERSIDADE BRASILEIRA: NOVOS DISCURSOS, VELHAS PROPOSTAS

Maria das Graças M. Ribeiro, UFV

As políticas formuladas pelas autoridades governamentais para a educação superior brasileira, nos anos 1990, apontaram para a necessidade de uma gestão mais racional das universidades públicas, pondo ênfase na eficiência e na flexibilidade. Estas políticas nortearam a implementação de uma reforma universitária que introduziu a avaliação do desempenho docente, flexibilizou os currículos e

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estimulou o aparecimento de novas formas de organização acadêmica, além de incentivar as instituições a buscar fontes adicionais de recursos.

Promovida no contexto de uma grave crise econômica, esta reforma, cujo início coincidiu com a chamada “Reforma do Estado”, geralmente tem sido explicada como resultado de exigências das agências financeiras internacionais que regulam o sistema de crédito no mercado mundial.

O presente trabalho teve como objetivo a busca das raízes históricas das diretrizes que nortearam a formulação daquelas políticas, mostrando que, já nos anos 1960, eficiência e flexibilidade formavam um binômio que constituía o eixo de um projeto para a educação superior, formulado pelos segmentos mais conservadores da sociedade brasileira. A despeito da ascensão destes segmentos ao poder com o golpe militar de 1964, o modelo de universidade adotado pelo regime autoritário não teve como referência aquele projeto, o qual seria resgatado a partir de meados dos anos 1980, no bojo do debate que se desenrolou em torno da chamada “transição à democracia”. A partir de então, sua defesa foi se revestindo de atualidade e de uma sofisticação acadêmica que foram lhe conferindo legitimidade.

Para a realização desta investigação, foram examinados, primeiramente, estudos e relatórios produzidos para o Ministério da Educação, a partir dos anos 1980, assim como planos e programas deste Ministério e, ainda, a legislação voltada para a educação superior no mesmo período. Posteriormente, foram levantados documentos da mesma natureza, produzidos nos anos 1960, procedendo-se então ao cruzamento deste material e à sua análise à luz da literatura sobre a história da educação superior brasileira.

O DIREITO À EDUCAÇÃO NA ASSEMBLÉIA CONSTITUINTE DO ESTADO DO AMAZONAS - 1935

Maria das Graças Sá Peixoto Pinheiro, U. Federal do Amazonas

O trabalho investiga o tema do direito à educação no processo histórico de constitucionalização do Estado do Amazonas de 1935. Analisa o debate e a formulação da matéria do direito à educação na Assembléia Constituinte Amazonense de 1935, articulando com as exigências pelo direito à educação nos programas das organizações e dos partidos políticos amazonenses. Confronta a reafirmação e a proteção do direito à educação na Constituição Amazonense de 1935 com os princípios da educação nacional instituídos em 1934. Os fundamentos teórico-metodológicos da pesquisa histórica (Le Goff, e Cardoso, Ciro F.) auxiliam a seleção de fontes e análise documental. A pesquisa privilegia as fontes primárias: documentos oficiais, em especial os anais constituintes, e jornais e periódicos editados em Manaus. O referencial teórico tem por base as obras de Bobbio, Chauí, Coutinho, C. N., Przeworski, Sieyès e concepções respaldas em Canotilho, Castro Gomes, Cury, Horta e Pontes de Miranda, dentre outros. O trabalho demonstra que as instituições políticas divulgavam pela imprensa propostas para a educação amazonense. O Partido Trabalhista Amazonense reivindicava a garantia do direito à educação em todos os níveis de ensino, como dever exclusivo do Estado. Na Constituinte, o deputado trabalhista Vivaldo Lima defendeu o direito à educação. A Constituição do Amazonas de 1935 reafirma o direito à educação para toda a população, como responsabilidade da família e do poder público. O trabalho confirma a contradição entre a proteção do direito à educação e sua garantia determinada até o ensino primário público gratuito e obrigatório. Ressalta os preceitos singulares diante das características da região amazônica: a colaboração recíproca entre o Estado e as missões religiosas na tarefa pública educacional em prol do interesse coletivo, o combate ao analfabetismo e a organização do ensino rural adequado à respectiva área. Evidencia a ampliação da garantia do direito à educação através da gratuidade escolar do ensino público para alunos de comprovada carência de recursos. Demonstra a colaboração das missões religiosas, sobretudo na oferta do ensino primário público na zona rural, viabilizando o direito à educação para a população ribeirinha. Destaca que as diretrizes de aculturação indígena, com auxílio das missões religiosas, não favoreciam o direito à educação aos índios e sinaliza à exclusão social dos povos indígenas. A presença estatal acenava avanços para a política educacional, instituída em 1935, para o cumprimento do dever de oferecer o ensino e para o exercício do direito à educação pública amazonense.

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POLÍTICA PÚBLICA DE INTERIORIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO EM GOIÁS NAS DÉCADAS DE 1930 E 1940

Maria de Araújo Nepomuceno e Maria Teresa Canesin, Universidade Católica de Goiás

Pedro Ludovico Teixeira governou “provisoriamente” o estado de Goiás de 1930 a 1937. Nesta última data foi nomeado Interventor, função que ocupou até 1945. Sintonizado com as diretrizes emanadas do Governo Central desde o início de sua gestão, Ludovico Teixeira se dispôs a “renovar” Goiás em todas as suas dimensões, buscando intensificar suas relações com o Centro-Sul do País, fazendo da política de interiorização da educação um instrumento privilegiado dessa “renovação”, já que praticamente quase tudo ainda estava por ser feito em matéria de educação quando Ludovico chegou ao poder. Os documentos oficiais (relatórios, mensagens, leis, decretos, periódicos) foram as principais (não as únicas) fontes investigadas para construir este trabalho. Cabe dizer que não se traçou um quadro teórico a priori como instrumento de análise dos dados encontrados. Afirmar isso, não significa desconsiderar as categorias teóricas já estruturadas e o saber histórico já construído que deveriam, conforme ocorreu, iluminar os passos da pesquisa, mas apenas realçar que a verdade histórica não pode estar sujeita a imposições previamente traçadas pela pesquisa. Esse juízo se assenta no pressuposto de que há relação intrínseca e imbricada entre teoria e base empírica. A exposição dos resultados dessa pesquisa se deu, como ação e pensamento, o mais rente possível dos dados, sempre e a partir das indagações a eles feitas. Este trabalho expõe, pois, os resultados dessa pesquisa, que visou reconstituir e analisar de modo crítico a política de interiorização da educação do governo de Goiás nos anos trinta e quarenta do século XX, buscando explicitar a natureza das relações que se fortaleciam entre o Estado e a sociedade daquele tempo.

IDENTIDADE, GÊNERO E COTIDIANO ESCOLAR: PRÁTICAS EDUCATIVAS E (DES)ORDEM URBANA (SÃO PAULO:1930-1934)

Maria de Fátima Salum Moreira, Universidade Estadual Paulista

Pretende-se discutir os processos de escolarização, envolvidos na constituição de identidades de gênero das mulheres que estudaram no colégio católico “Madre Cabrine”, na cidade de São Paulo (Brasil), nos anos iniciais da década de 1930. As práticas e relações pedagógicas e interpessoais que compuseram o cotidiano daquela escola são analisadas a partir de: textos escritos pelas alunas, conferências proferidas pelas autoridades religiosas, fotos das alunas e professoras, descrições da arquitetura e uso dos diversos espaços do colégio, normas, regulamentos e premiações escolares. Todos esses registros foram publicados na revista anual “Ecchos do Colegio Madre Cabrini”, sendo que os números referentes aos anos 1930-1934, estão encadernados e organizados sob a forma de livro. Através de narrativas que remetem aos rituais, simbolismos, ensinamentos e relações sociais ali vivenciadas, pretende-se encaminhar algumas análises que relacionem escrituras, práticas de leitura e processos sociais de identificação social e de gênero. Esta comunicação é resultado da pesquisa desenvolvida junto a instituição universitária em que trabalho e dá continuidade às investigações realizadas, durante o doutorado, em que se analisou, no mesmo período, em São Paulo, o projeto católico de educação da “vida íntima” dos sujeitos, de seus sentimentos e sexualidade. Tal ação visava atingir um ordenamento social e regulação política, que se concretizou sob diversas formas, em um momento de intensas transformações e contradições nos espaços urbanos, inclusive, nas práticas culturais e formas de sociabilidade. Se, na pesquisa concluída, foi possível interpretar um núcleo documental fundamentalmente constituído por processos de nulidade de casamento e pela literatura católica que versava sobre os temas do casamento, do amor e da vida sexual, buscou-se, agora, investigar outra instância de formação, educação e de investimento na produção da “identidade feminina”: os processos educativos escolares.

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PASCHOAL LEMME: MEMÓRIAS DE UM EDUCADOR

Maria de Lourdes de Albuquerque Fávero, Universidade Católica de Petrópolis e Universidade Federal do Rio de Janeiro

Esta comunicação detém-se na memória do educador Paschoal Lemme, dando destaque aos seus escritos referentes à sua trajetória pessoal e profissional, de 1904 a 1997. Trabalha fontes documentais que se encontram em seu Arquivo no PROEDES- Programa de Estudos e Documentação Educação e Sociedade da UFRJ. Em busca do desvelamento da memória desse educador através de seus escritos - livros, anotações em folhas de papel e cadernos, correspondência - pretende-se levantar e oferecer informações sobre seu itinerário, idéias e projetos diante de situações concretas por ele vivenciadas. Nessas fontes documentais guardadas pelo educador, encontramos subsídios, que podem contribuir para outra leitura do movimento de renovação educacional, no Brasil, a partir dos anos de 1920 e 1930, trazendo à cena outros personagens que vivenciaram o período. Nessa linha percebe-se que os escritos de Paschoal Lemme, a exemplo de outros arquivos pessoais de educadores ajudam a reconstruir o significado de sua vida, de sua atuação profissional e do contexto vivido. Com tais preocupações e entendendo que a memória deve ser analisada não apenas como uma fonte de pesquisa, mas também como objeto de estudos, trabalha-se a memória de Paschoal Lemme - um dos signatários do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 -, no ano que se comemora o centenário de seu nascimento, reexaminando seus escritos. Na tentativa de compreender sua trajetória, a primeira hipótese é que, em seu itinerário, as idéias estão em primeiro plano. Embora sem realizações marcantes como administrador ou político da educação, pois não exerceu nenhum cargo de maior relevância na gestão pública de ensino, como outros representantes do movimento da Escola Nova, ao analisar seus escritos e apontamentos é possível identificá-lo como um homem de pensamento, de idéias que foram sendo construídas gradativamente ao longo de sua trajetória. Enfim, a comunicação revela que uma análise desses escritos de Paschoal Lemme, sobretudo a partir da década de 20 do século passado, oferecem informações, que possibilitam identificá-lo como um educador comprometido com a res publica, cujo pensamento sempre se apoiou numa premissa básica que orienta suas reflexões e propostas em relação à política educacional :educação democrática somente numa sociedade democrática.

VISÃO LIBERAL DA SOCIEDADE E GLOBALIZAÇAO: O PAPEL DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO SISTEMA ECONÔMICO CAPITALISTA - 1970-2001

Maria de Lourdes Pinto de Almeida, UTP/UNICAMP

Na medida em que as idéias de Estado centralizado e planejador vão “enfraquecendo”, ou seja, que os princípios liberais vão se impondo, o conhecimento tende a ganhar essa caráter ou de político estratégico - emancipador - ou de “mercadoria” no sentido de se fazer valer os interesses econômicos dos capitalistas. O poder “emancipatório”, em sua capacidade de incrementar o diálogo e as possibilidades de ação das coletividades, passaria pela idéia de que ao mesmo tempo em que a ciência deve romper com o “senso comum” no sentido de se desenvolver analítica e formalmente, deve retomar ao senso comum enquanto disponibilidade e acessibilidade, ainda que seu registro formal deva ser traduzido para uma linguagem mais “funcional”. Quando se pergunta onde deve ser produzido o “conhecimento”, quem deve produzi-lo e quem deve financiá-lo e ainda quem deve decidir o que vai ser pesquisado nessa perspectiva da funcionabilidade, podemos automaticamente e intuitivamente dizer que essas questões nos permitem, num processo socrático, isto é, maiêutico, “captar” os pontos de vista e as contradições do processo histórico vigente. A prática científica insere-se em tal “contexto” de luta de classes. Consideramos, a partir dessas posições teóricas - marxismo e as fragmentárias correntes acomodadas no termo pós-moderno - duas perspectivas contrastantes que buscam uma hegemonia no sentido de fundamentar um dissenso ou consenso em torno da atividade científica. Num primeiro prisma, estariam as visões “fragmentaristas”, no outro as visões “integradoras”. Onde uma vê ruptura e “esgarçamento” contínuo e irremediável da realidade, a outra vê continuidade e totalização se constituindo. Do ponto de vista político, a primeira não acredita na

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possibilidade de uma ação centralizada, tal como propõem os defensores do planejamento estatal. A outra perspectiva, pelo contrário nega a possibilidade de uma “autocoordenação” espontânea de uma multidão de agentes atuando conforme seus fins particulares. A retórica liberal tenta opor essas tendências como extremos irreconciliáveis. Como propõe Milton Friedman (1970, p. 21), em seu livro Capitalismo e Liberdade, fundamentalmente só haveria dois meios de coordenar a atividade econômica de milhões. Um deles é a direção central utilizando a coerção - a técnica do Exército e do Estado totalitário moderno. O outro seria a cooperação voluntária dos indivíduos - a técnica do mercado”i. É dentro desses dois quadros gerais ou panos de fundo que se desenvolvem as controvérsias em torno do papel da Educação na sociedade globalizada do sistema econômico capitalista – 1970- 2001

FRIEDMAN, M. Capitalismo e Liberdade. R.J. Ed. Artenova, 1970, p. 21

ESCOLA NA LITERATURA BRASlLEIRA: UMA VISÃO HISTORIOGRÁFICA

Maria do Amparo Borges Ferro - Universidade Federal do Piauí -Brasil

Este trabalho apresenta parte de um estudo de pesquisa mais amplo sobre história e memória da educação brasileira, iniciado há alguns anos durante o curso de doutorado na Universidade de São Paulo (USP), e posteriormente retomado sobre a temática específica da história da escola sob a óptica literária. A historiografia dos processos educacionais nas relações entre Igreja, Estado e Sociedade Civil tem sido enfocada a partir de fontes diversas. No presente caso, a ênfase se dá nas fontes impressas e materiais pedagógicos, mais precisamente, em fontes literárias. O objetivo é resgatar a visão de escola apresentada por escritores brasileiros como Viriato Corrêa em Cazuza, Machado de Assis em Conto de Escola, José Lins do Rêgo em Doidinho e Menino de Engenho e Raul Pompéia em O Ateneu, entre a segunda metade do século XIX e a primeira metade do século XX.

O estudo está ancorado teoricamente na História Cultural por encontrar aí a abordagem adequada à análise da cultura escolar através dos processos culturais que se processam no seu cotidiano, bem como dos agentes sociais (professores, alunos, etc...) e dos papéis sociais que exerciam no universo escolar no período estudado. Autores como Roger Chartier, Michel de Certeau, Michel Foucault, Humberto Eco, Roland Barthes e Antonio Nóvoa, entre outros, deram suporte para a análise dos processos culturais escolares na literatura. A análise destas obras literárias - a maioria de caráter memorialístico - reforça a literatura como um campo bastante fértil para ser utilizado como fonte privilegiada do passado escolar dos literatos e, por extensão, dos estudantes seus contemporâneos.

A seleção destas fontes foi feita tomando como critério o fato de seus autores serem escritores reconhecidos como grandes literatos tanto pela crítica literária como pela importância destes livros, que tiveram grandes tiragens e foram largamente usados como obras didáticas e algumas até como leituras obrigatórias em escolas brasileiras, além de abordarem o tema da escola no recorte temporal da pesquisa. O estudo realizado mostrou que é possível observar que há aspectos comuns nas várias obras estudadas. A expectativa e ansiedade das crianças diante de sua entrada na escola, como um rito de iniciação às vezes traumático e doloroso, a impressão sobre os professores e suas posturas no relacionamento com os alunos e os processos de controle de disciplina utilizados são alguns destes aspectos verificados. Ao final, é possível reafirmar a importância das fontes literárias para a análise da história dos processos educacionais nas várias instâncias promotoras de ensino: Igreja, Estado e Sociedade Civil, enfim, na História da Educação em geral.

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GÊNERO NA DOCÊNCIA E NO MOVIMENTO DE PROFESSORAS E PROFESSORES DO PIAUÍ (1986-1998)

Maria do Carmo Alves do Bomfim, Universidade Federal do Piauí

A temática gênero, pelo avanço do conhecimento científico e tecnológico somado ao crescimento dos movimentos de mulheres, nas sociedades contemporâneas, transformou-se num imperativo de investigação para pesquisadoras(es) que buscam entender as relações sociais em todos os espaços de socialização, por tratar-se de uma questão de Direitos Humanos. Em resposta a este desafio, realizou-se uma pesquisa sobre as relações de gênero na prática de mulheres e homens dirigentes, militantes e não militantes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Básica Pública do Piauí, objetivando conhecer: a) o conceito de gênero expresso nas representações de professoras e professores construído nas suas práticas docente e sindical; o grau de satisfação destes docentes nas relações que estabelecem no espaço sindical e escolar e c) as práticas político-educativas para cultivo de relações de gênero não-sexistas. Como parte de um estudo mais amplo, esta pesquisa resgatou a memória do movimento docente piauiense, no período de 1986 a 1998, particularizando as diferenças de gênero, numa perspectiva analítica. Utilizou-se como procedimentos metodológicos a consulta a fontes documentais (atas de assembléias e relatórios de encontros), observação em eventos promovidos pelos docentes em movimento (atos de protesto, plenárias, congressos em nível estadual e nacional desse segmento profissional, dois pleitos eleitorais para escolha dos dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Piauí), aplicação de questionário durante o VII Congresso Estadual do SINTE/PI e a realização de entrevistas com professoras e professores, recursos que contribuíram para evidenciar não somente aspectos visíveis mas, também, dimensões não visíveis. Assim, foi possível perceber que as representações de gênero diferiam entre mulheres e homens docentes, dependendo da posição que ocupavam no movimento sindical como: dirigente sindical, militante, ex-dirigente e não militante. Dentre os resultados, foi possível conhecer que dirigentes homens tendem a dizer que esta organização vem trabalhando a questão de gênero criando secretarias sindicais de gênero, em nível estadual e nacional, enquanto as mulheres que ocupam cargo na mesma instância sindical, militante ou apenas participante de manifestações, têm opiniões próximas, evidenciando que muitos professores discriminam as professoras e apenas uma mulher chegou a ser presidente do sindicato, mesmo assim foi deposta pelos colegas homens. Na realidade, tanto no espaço escolar quanto no sindical, o trabalho político-pedagógico de superação da visão sexista é incipiente e a maioria demonstrou-se insatisfeita.

OS DESAFIOS PARA A ORGANIZAÇÃO DO CENTRO DE MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DA UNICAMP, OU DE COMO CONSTITUIR COLETIVAMENTE UM “LUGAR DE MEMÓRIA”

Maria do Carmo Martins, Faculdade de Educação da UNICAMP

Em um livro chamado “Os arquivos imperfeitos”, Colombo (1991) afirma: “Como convém a um século que conheceu duas grandes catástrofes bélicas e vive no terror de um próximo e irreversível declínio, nossa era parece estar dominada pela obsessão da memória. ( p. 17). Nele procura redefinir os significados dos arquivos na contemporaneidade, focalizando, sobretudo, aqueles que armazenam seus documentos em discos rígidos dos computadores e aponta a fragilidade do conceito de memória, que predomina na “era da informação e da tecnologia”, a despeito das transformações havidas nas concepções de “arquivos labirintos” e de documentos como “tesouros”. Ainda prevalece o caráter elitista do arquivo, o acesso limitado às fontes, ambiguamente articulado à existência de uma busca pela memória associada a um direito assegurado a todos os sujeitos históricos, à constituição de identidades.

Segundo HUYSSEN (2000), nossa sedução pela memória ocorre de maneira paradoxal. De um lado, a obsessão pela memória e passado, como tentativa de manter acesa a lembrança dos traumas, o esforço para que a alteridade seja constituinte das relações sociais em mundos massificados. É a anamnese como cultura. De outro lado, acusa-se a cultura contemporânea de

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amnésia, embotamento ou apatia, porque vivemos época em que a informação nos assoberba e entramos no consumo delas, de produtos que se tornam obsoletos instantaneamente, deixando-nos cada vez mais à mercê dos esquecimentos provocados pela ausência de vínculos com objetos, a produção, a informação. As memórias comercializadas e o aumento explosivo do esquecimento são parte de um mesmo processo, que Freud já atentara quando: “(...) nos ensinou que a memória e o esquecimento estão indissolúvel e mutuamente ligados; que a memória é apenas uma outra forma de esquecimento e que o esquecimento é uma forma de memória escondida.” (p. 18). Nessa sociedade de valorização da memória, os arquivos, as bibliotecas, os museus ocupam lugar de destaque porque por eles é possível promover ações educativas que possam repercutir, reproduzir, debater tal cultura da anamnese/amnésia.

Nesta comunicação, procuro problematizar a criação do Centro de Memória da Educação, na UNICAMP, dando destaque às dificuldades para tal organização e os embates científicos e/ou acadêmicos que envolvem a criação de um centro de apoio à pesquisa em educação, a configuração dos acervos, como espaço de articulação entre diferentes sujeitos intelectuais e políticos.

A PESQUISA EDUCACIONAL EM MINAS GERAIS: UM PERCURSO PELA EXPERIÊNCIA DO CENTRO REGIONAL DE PESQUISAS EDUCACIONAIS (CRPE - 19551965)

Maria do Carmo Xavier, U. Federal de Minas Gerais

Entre os anos de 1955 e 1965, período que antecede a implantação dos cursos de pós-graduação no Brasil, desenvolveu-se em Minas Gerais uma importante experiência de produção da pesquisa educacional através do Centro Regional de Pesquisas Educacionais de Minas Gerais (CRPE). A instituição fazia parte do projeto do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) e integrava a rede de centros regionais instalados em Belo Horizonte, São Paulo, Recife, Porto Alegre, Salvador. Vinculado ao Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), o empreendimento deveria, na concepção daqueles que o instituiram, funcionar como verdadeiro laboratório de pesquisa no campo das ciências sociais e na preparação de pesquisadores e quadros profissionais para o sistema público escolar, funcionando como ponte entre os escalões decisores do Estado, os intelectuais, os administradores escolares e os professores. No seu curto período de existência o CBPE procurou abordar os problemas educacionais enquanto processos sociais conferindo-lhes tratamento científico que pudesse fundamentar as políticas públicas de educação e renovar as práticas institucionais dos professores de todo o Brasil.

Nesse trabalho busca-se recuperar o percurso e a memória do Centro Mineiro dentro do arcabouço do Centro Brasileiro, problematizando o elenco de temas e pesquisas produzidas em Minas e o lugar ocupado pelo CRPE no debate sobre o desenvolvimento e a mudança social desejada para o país naquele momento. O estudo faz um mapeamento da realidade cultural e educacional do estado apontando as conexões entre a produção do CRPE e a tradição intervencionista da elite mineira na condução das questões educacionais. Além do uso de fontes impressas e arquivísticas - que como qualquer outra são, lacunares parcelares, residuais - a pesquisa tem constituído um acervo de fontes orais composta de depoimentos de ex-pesquisadores, técnicos, pessoal administrativo e ex-alunos(as) do PABAEE - Programa de Assistência Brasileiro Americano a Educação Elementar e do ISER - Instituto Superior de Estudos Rurais que passaram a integrar a estrutura do CRPE.

Enfrentando os desafios da recuperação da memória e da preservação de acervos documentais, o estudo destaca o extenso programa de investigação desenvolvido em Minas Gerais nos anos 50-60, envolvendo temáticas da pedagogia, sociologia, antropologia, psicologia e a história da educação. Em especial o trabalho de Paulo Krüger Mourão sobre o ensino em Minas Gerais no Império e na República (1889-1930), a pesquisa sociológica desenvolvida por Hiroshi Watanabe (et.al) sobre a Várzea do Pantana, além dos inúmeros estudos no campo da linguagem, da matemática e da educação rural. Na produção do CRPE também se destacam a publicação de revistas, boletins informativos e obras de autores mineiros, a organização de cursos para aperfeiçoamento de professores e inspetores regionais, a compilação de leis do ensino, tradução de textos e um amplo programa de distribuição de livros e publicações para bibliotecas em todo o estado.

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O MANUAL: DESEMPENHOS ESCOLARES E DESTINOS PROFISSIONAIS -A ESCOLA REAL DE MAFRA (anos de 1867 a 1885)

Maria do Céu Garcia dos Reis Loureiro Alves

Tendo desenvolvido um estudo de mestrado que versa o Processo de Escolarização no Concelho de Mafra (1772 a 1896), da sua vertente multidimensional emergiram três dimensões: uma de materialidade (espaço escolar, utensílios e mobília); uma pedagógica que circundou os modos de transmissão dos saberes, assente no manual escolar, práticas e recepção, e uma terceira - a social -, em que se indagaram as resultantes da escolarização.

Com suporte numa panóplia de fontes primárias e impressas, entre as quais os livros escolares, que proporcionaram um outro significado aos estudos desenvolvidos. Possibilitam ainda a visualização da apropriação ao ensino que, pela sua diversidade, se entende destinados aos discípulos que frequentaram os dois graus de Ensino Primário (1867 a 1885). Pela biblioteca popular, emergiu a oferta de informação especializada com conhecimentos mais úteis, ligados ao saber fazer.

Neste estudo assoma uma instituição escolar - a Escola Régia de D. Pedro V (1855 a 1908), onde a ergonomia dos espaços se harmonizava com as ideias pedagógicas do século XIX, no que concerne ao funcionamento de uma classe-modelo. Quer fosse através dos utensílios e da mobília, quer nos diversos manuais, torna-se visível a aplicação das Reformas de Ensino em Portugal (de 1844 a 1878).

Para além de se pretender apresentar o repertório de compêndios existentes, diligencia-se ainda, anunciar os modos de transmissão dos saberes, práticas e recepção (da mensagem pedagógica), que se estribam na terceira dimensão - a social.

Com a colaboração da Câmara Municipal de Mafra pretende-se dar a conhecer o espólio da Escola Real de Mafra que consta no Arquivo Histórico da Biblioteca Municipal, dando a possibilidade de divulgação através de uma Exposição ao público deste Congresso.

REPRESENTAÇÕES DA MULHER ALFABETIZADA / ANALFABETA EM “A CAMPANHA” (1953-1956)

Maria do Pilar Mansos, Escola Secundária de Camões

No pós-guerra, reconhecendo que o país se encontra numa posição de desprestigio, face aos demais países europeus, no que concerne à taxa de alfabetização, expressa em relatórios da UNESCO, em 1950, e ainda, aliando aquela, ao fraco desenvolvimento económico do País, o Estado Novo promulga, por decreto, em Outubro de 1952, o Plano de Educação Popular, de que é mentor Veiga de Macedo, subsecretário de Estado da Educação Nacional.

O Plano, visa desenvolver no povo o interesse pela instrução e tornar efectiva a escolaridade obrigatória, tendo como objectivo a extinção do analfabetismo, uma vez que uma mão-de-obra sem um mínimo de preparação cultural, se constitui como um forte obstáculo ao desenvolvimento das actividades industriais de que o país necessita.

Inseridos no Plano de Educação Popular, são criados os Cursos de Adultos e a Campanha Nacional de Educação de Adultos, destinada prioritariamente aos analfabetos das zonas rurais -- onde os cursos não são obrigatórios -- e a indivíduos de idades compreendidas entre os catorze e os trinta e cinco anos. Esta Campanha, programada inicialmente para decorrer entre 1953 e 1954, só terminará em 1956. È ainda de referir, que em 1953, dos quase três milhões de analfabetos existentes em Portugal, dois milhões têm mais de trinta e cinco anos, entrevendo-se que a solução para a extinção do analfabetismo, se faça em grande parte, através da recuperação dos adultos iletrados.

Os programas a ministrar, tanto no regime de Campanha, como nos Cursos de Adultos, são os do ensino elementar, com ligeiras alterações: pede-se aos agentes de ensino, que para além do ler, escrever e contar, ministrem também noções sobre: educação moral e cívica; higiene e defesa da saúde; organização corporativa; situação geográfica de Portugal; factos dominantes da história pátria;

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forma de governo vigente; economia doméstica; previdência social; segurança no trabalho; agricultura e pecuária. Realça-se ainda, que as últimas quatro noções deverão ser ministradas “quando o indicar o sexo, a profissão ou o meio social dos educandos”. Deste modo, para além da simples alfabetização, existe uma vertente cultural, que é objectivo da Campanha e que depende do género e do meio sócio-profissional dos analfabetos.

Para que se desenvolva esta vertente educativa e cultural, são realizadas missões culturais, criadas bibliotecas e editado um jornal de parede, A Campanha em Marcha, assim como um jornal mensal, A Campanha, destinado aos educadores de adultos e aos seus alunos que, em regime de Campanha ou frequentando os Cursos de Adultos, já saibam ler razoavelmente. O primeiro número do jornal sai a 27 de Outubro de 1953 e é distribuído gratuitamente a 50.000 leitores. Com o presente trabalho pretendemos, através de um levantamento exaustivo do jornal “A Campanha”, reflectir sobre as representações do conceito de alfabetização/analfabetismo, no feminino, nele insertas.

AS ORIGENS DO CURSO DE PEDAGOGIA: UM CAPÍTULO DO ENSINO SUPERIOR EM UBERLÂNDIA – MG (1957-1963)

Maria Dolores Sanches Fernandes

Este trabalho tem como objeto de estudo o Curso de Pedagogia em Uberlândia durante seus anos iniciais (1960-1963), quando funcionava no interior da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Uberlândia (FAFI). Para sua realização, foram analisados documentos da instituição, depoimentos de ex-alunas, professores e personagens políticas do período, além de bibliografia atinente à história de Uberlândia. Primeiramente, buscou-se relacionar a criação da faculdade e do próprio curso com o contexto da cidade no período e, posteriormente, traçar um perfil da instituição e da graduação em Pedagogia. Durante a década de 1950, a elite uberlandense começou a empreender esforços para mudar o perfil econômico da cidade, marcado pela característica de entreposto comercial, com vista ao desenvolvimento industrial. Entre as iniciativas, esteve a melhoria da oferta educacional, especialmente no tocante às escolas superiores, inexistentes no município. Apesar de não ser uma opção prioritária, a criação da FAFI, que teve um grupo de religiosos e educadores como precursores do processo, contou com o apoio dessa elite por estar em consonância com seus interesses e iniciou as atividades em março de 1960, oferecendo os cursos de Pedagogia e de Letras. Sob a direção da Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado até 1978, a faculdade teve uma marcante orientação católica, que se fez notar na formação oferecida a seus alunos. No curso de Pedagogia, isso foi mais perceptível no corpo docente, na grade curricular e nos conteúdos programáticos, objetivando uma formação não apenas intelectual, mas também moral aos egressos do curso.

AS ORIGENS DO CURSO DE PEDAGOGIA: UM CAPÍTULO DO ENSINO SUPERIOR EM UBERLÂNDIA - MG (1957-1965)

Maria Dolores Sanches Fernandes, Centro Universitário do Triângulo - UNIT/ Prefeitura Municipal de Uberlândia - PMU

Este trabalho tem como objeto de estudo o Curso de Pedagogia em Uberlândia durante seus anos iniciais (1960-1963), quando funcionava no interior da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Uberlândia (FAFI). Para sua realização, foram analisados documentos da instituição, depoimentos de ex-alunas, professores e personagens políticas do período, além de bibliografia atinente à história de Uberlândia. Primeiramente, buscou-se relacionar a criação da faculdade e do próprio curso com o contexto da cidade no período e, posteriormente, traçar um perfil da instituição e da graduação em Pedagogia. Durante a década de 1950, a elite uberlandense começou a empreender esforços para mudar o perfil econômico da cidade, marcado pela característica de entreposto comercial, com vista ao desenvolvimento industrial. Entre as iniciativas, esteve a melhoria da oferta educacional, especialmente no tocante às escolas superiores, inexistentes no município. Apesar de não ser uma

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opção prioritária, a criação da FAFI, que teve um grupo de religiosos e educadores como precursores do processo, contou com o apoio dessa elite por estar em consonância com seus interesses e iniciou as atividades em março de 1960, oferecendo os cursos de Pedagogia e de Letras. Sob a direção da Congregação das Irmãs Missionárias de Jesus Crucificado até 1978, a faculdade teve uma marcante orientação católica, que se fez notar na formação oferecida a seus alunos. No curso de Pedagogia, isso foi mais perceptível no corpo docente, na grade curricular e nos conteúdos programáticos, objetivando uma formação não apenas intelectual, mas também moral aos egressos do curso.

A INFLUÊNCIA DO MODELO ESCOLÁSTICO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Maria Elisabeth Blanck Miguel e Alboni Marisa Dudeque Pianovski Vieira, Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Estudos anteriormente desenvolvidos pelas autoras a respeito dos docentes que atuaram nos cursos de Pedagogia da Universidade Federal do Paraná e da Universidade Católica do Paraná, nas décadas de 40 a 80, permitiram distribuí-los em três categorias: os de influência acentuadamente religiosa, católica, do sexo masculino; os que possuíam em sua origem formação no magistério primário; e aqueles com formação diversificada, cuja ênfase estava na fundamentação científica dos conhecimentos trabalhados. Foi possível constatar, ainda, que a maioria desses professores atuava nas duas universidades, nas quais desenvolviam disciplinas e conteúdos programáticos semelhantes. Dada a predominância da primeira das categorias (católica), surgiram as questões de pesquisa que originaram este trabalho: Qual a influência do modelo escolástico na formação de professores nas décadas de 40 a 80, no Paraná? Teria a Escolástica contribuído para a manutenção do caráter conservador, em grande parte responsável pela instalação do tecnicismo na educação brasileira, nas décadas de 70 a 80? Quais os efeitos, na sociedade brasileira, dessa difusão do pensamento “escolástico”, alheio à dinâmica das sociedades e desvinculado dos seus problemas sociais e educacionais? Efetuado o levantamento das fontes, foram catalogadas 302 fichas do Curso de Pedagogia: 214 da Universidade Católica e 88 da Universidade Federal do Paraná. Salientaram-se os dados relativos ao currículo, aos conteúdos programáticos, à bibliografia indicada e à listagem de pontos para provas bimestrais e finais nas modalidades escrita e oral. Os nomes dos professores catedráticos acompanhavam tais listagens. Analisadas essas fontes, percebeu-se nelas a presença constante do humanismo tradicional, isto é, da escolástica. A interpretação dos dados foi realizada em função do problema que se buscou esclarecer. Para que fosse ultrapassado o conteúdo manifesto dos documentos, adentrando-se no seu significado latente, as pesquisadoras se valeram da análise de conteúdo, no sentido que lhe atribui Bardin (1977). Objeto dessa análise foram, com destaque, os textos utilizados pela disciplina Introdução à Filosofia, que era ministrada no 1.º ano do curso de Pedagogia, pelo mesmo docente, em ambas instituições. Por último, recorreu-se a entrevistas com os professores que trabalharam nos cursos de Pedagogia das duas instituições, no intuito não somente de compreender o silêncio dos documentos, mas de entender as semelhanças encontradas entre eles e poder aprofundar a contextualização dos mesmos por outra via que não a dos registros oficiais. Os resultados obtidos permitiram responder às questões embasadoras, aprofundando o estudo sobre as influências do modelo escolástico na formação de professores no Estado do Paraná.

GESTORES E PRÁTICAS EDUCATIVAS: MEMÓRIAS DE VIDA PROFISSIONAL (1970 - 1990)

Maria Elizete Guimarães Carvalho, UFRN

Refletir sobre a prática da gestão educacional a partir das memórias e saberes de educadores que vivenciaram experiências profissionais nesta área do conhecimento contribui para o desvelamento de um conjunto de representações próprias da administração da educação e das práticas que permeiam o cotidiano escolar. Para tanto, este trabalho reconstitui as memórias de gestores que atuaram (ou atuam) no ensino fundamental das Redes Pública e Particular do Estado do Rio Grande do

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Norte/Brasil, de 1970 a 1990, (re)significando as aquisições intelectuais e experiências vivenciadas na trajetória profissional, durante o processo de construção e reconstrução de ser educador. Que lembranças guardam os gestores de sua prática pedagógica? O que essa experiência significa em suas vidas? Por que a escolha da administração escolar? Que saberes esses gestores mobilizam (ou mobilizaram) no seu cotidiano escolar? Quais as representações da gestão educacional? Foram essas e outras questões que motivaram o presente trabalho, fornecendo um material mnemônico rico em símbolos e representações e que permitiu um olhar reflexivo sobre o exercício da gestão educacional. Através do trabalho da memória, os educadores reorganizaram saberes e experiências significativos referentes à prática pedagógica da gestão escolar, multiplicando-se imagens, significados, signos, símbolos, mas principalmente, trazendo à luz as representações de uma prática educativa que pretende inserir-se no contexto da contemporaneidade, apostando na construção de um novo projeto pedagógico. Esse projeto diz respeito ao papel que a escola vai assumir, a partir das profundas modificações que têm ocorrido no mundo do trabalho e que trazem novos desafios para a educação (Kuenzer, 2000). A pesquisa aponta para a desestabilização do paradigma educacional apoiado no taylorismo/fordismo, indicando práticas administrativas fundamentadas na autonomia, na cooperação e no respeito. O acesso ao modo como cada pessoa se forma, como sua subjetividade é produzida permite conhecer a singularidade da sua história de vida, o modo como age, reage e interage com os seus contextos (Oliveira, 1999). A história de vida profissional permitiu a cada pesquisado o debate com seus contextos e subjetividades, a atualização do passado no presente, a construção de uma representação da gestão educacional e uma reflexão sobre essa prática no cotidiano escolar. A elaboração deste trabalho foi possível pela utilização do conjunto de procedimentos metodológicos da História Oral, sendo empregadas predominantemente as fontes orais, e subsidiariamente alguns documentos referentes à pratica da gestão educacional.

MANUAIS DIDÁTICOS COMO FONTE PARA A HISTÓRIA DO ENSINO DE PORTUGUÊS NO BRASIL (1870-1950)

Maria Emília Borges Daniel, Eurize Caldas Pessanha e Maria Adélia Menegazzo – UFMS

Manuais didáticos constituem importantes fontes para analisar a história das práticas pedagógicas, isso porque eram eles que, paralelamente aos programas oficiais, orientavam os mestres sobre a função do ensino de uma determinada disciplina, ou seja, para que ela deveria ser ensinada. Por outro lado, a característica mais significativa do livro didático é que ele pode revelar quais eram, numa determinada época, as propostas curriculares estabelecidas oficialmente para uma dada disciplina, uma vez que além de constituir-se no suporte por meio do qual os conteúdos disciplinares são explicitados, a participação do seu autor, embora fundamental, é também limitada. Este artigo tem por finalidade apresentar uma análise, de cinco manuais didáticos concebidos como fontes privilegiadas para a investigação de objetivos, conteúdos e metodologia de ensino da disciplina Português, no período compreendido entre as décadas de 1870 e 1950. Essa periodização tem como marcos de referência a introdução de Português nos Exames Preparatórios, em 1870, e a década de 1950, quando, segundo Magda Soares (2002) ocorre a primeira real modificação no ensino de Português no Brasil. Os manuais analisados foram: 1) Gramática Expositiva. Curso Superior, de Eduardo Carlos Pereira; 2) Lições de Português, de Otoniel Mota; 3) O Meu Idioma, de Otoniel Mota.; 4) O Exame de Português, de Júlio Nogueira; 5) Antologia Nacional, de Fausto Barreto e Carlos de Laet. O foco do estudo centrou-se na análise dos prefácios das obras estudadas. Os resultados da análise evidenciaram um aspecto que unifica os objetivos relacionados aos conteúdos dos cinco manuais didáticos analisados: a preocupação com o domínio das regras gramaticais da norma culta, na modalidade escrita, e com o conhecimento do passado da língua, a partir de textos concebidos como modelos tanto de língua quanto de comportamento. A própria estrutura dessas obras, exceto a Gramática Expositiva, sugere tal preocupação: a primeira parte, de teoria gramatical, e a segunda, de textos anotados e comentados de forma a demonstrar a aplicação prática da teoria estudada.

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MEMÓRIAS, RELATOS E PERCURSOS DE FORMAÇÃO: CONSTITUIÇÃO DE PROFESSORAS DO ENSINO SUPERIOR

Maria Emilia Ganzarolli, Universidade do Estado de Santa Catarina

A presente comunicação é o resumo de minha dissertação de Mestrado em Educação e Cultura, cujo objetivo central é investigar o processo de formação do docente da área de Biblioteconomia, tentando perceber como esse profissional vai se constituindo professor, com o objetivo específico de compreender a relação entre o processo de formação e a constituição docente na área. A idéia foi trazer para a área da Biblioteconomia um estudo sobre relatos de vidas de professores, similar a estudos feitos na área da Educação, com base nos trabalhos de Nóvoa (1995), Catani (2000), Moita (1995), Bueno (2000), Sousa et al. (1996), que tratam do assunto e mostram como os relatos autobiográficos proporcionam ao professor reflexões sobre o seu próprio processo de formação. A pesquisa apresenta características qualitativas, utilizando a técnica de História oral de vida complementada/entrecruzada com fontes documentais. Os relatos são construídos a partir da memória, considerada uma representação do vivido e do lembrado. Foram feitas entrevistas semi-estruturadas com quatro professoras do Curso de Biblioteconomia, sendo uma aposentada, com vinte e quatro anos de atuação no curso, outra quase completando vinte e cinco anos de experiência e mais duas entre seis e sete anos de atuação na carreira docente, com enfoque na trajetória escolar e profissional das mesmas. A pretensão deste estudo foi buscar a voz do professor, juntar cada momento, cada pedaço vivido e tentar, como num quebra-cabeça, montar um todo, uma história de vida e de formação possíveis. Para a compreensão do processo de formação dos professores, é preciso identificar os cenários das suas narrativas, as estruturas sociais e culturais presentes, as relações entre os sujeitos e os sujeitos e contexto. Com base nessa compreensão, o trabalho não é exclusivamente focado na figura do professor, mas também, no que gira em torno dele, no que compõe o seu mundo.Apresenta indicativos que apontam para uma possível profissionalização continuada para os professores da área de Biblioteconomia, abrindo perspectivas para um início de passagem do bibliotecário ao professor, colocando o docente como sujeito ativo e participante das mudanças no exercício da docência no Ensino Superior. O trabalho deixa o registro na História da Educação e da Biblioteconomia Brasileira e Catarinense as vozes de professoras que possivelmente irão ecoar por muitos espaços diferentes promovendo talvez o aparecimento de estudos voltados para a docência no Ensino Superior tanto na Biblioteconomia, como nas outras áreas do conhecimento.

CORPORATIVISMO CATÓLICO E EDUCAÇÃO NO BRASIL

Maria Evelyna Pompeu do Nascimento, U. Estadual de Campinas

Analisa-se a evolução da política educacional brasileira privilegiando a forma como os interesses de uma corporação - a Igreja Católica - foram contemplados nas diversas Constituições da República. Nosso interesse particular repousa sobre a Assembléia Nacional Constituinte (ANC), reunida em 1987 e 1988, na medida em que se trata de um momento de ordenamento jurídico em relação ao qual os atores políticos mobilizam recursos e estratégias com o objetivo de obterem a legitimação dos seus interesses particulares enquanto interesses públicos. Porque representa a possibilidade das vontades políticas se traduzirem em Direito, a ANC configura um campo especial de luta política, onde se confrontam atores e tendências político-ideológicas. Nosso objetivo é captar a dinâmica pela qual a corporação católica fez valer seus interesses, dinâmica empreendida através de “empreendedores das elites” (THOENIG, J.-C., 1985: p. 22), bem como através de representantes dos movimentos sociais. Trata-se de uma estratégia que perpassa as classes sociais, a administração pública, os partidos políticos, a polarização esquerda/direita e até mesmo as diferenças religiosa.

O modelo de análise corporativista possibilita priorizar a forma como este ator opera seus interesses em relação a uma determinada política. E ainda acompanhar e desnudar as iniciativas e as orientações dos representantes (os atores) da corporação e a autonomia relativa desta última. Trata-se de um corporativismo polissêmico como sugere Jobert:(1990), dotado de diversas formas e sentidos, não se restringe à preservação de uma profissão fechada, de formação e parâmetros específicos. Neste

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caso, referimo-nos à articulação de interesses de uma organização - dirigidas por tais profissionais da fé - cujos interesses e identidade atravessam a sociedade brasileira, sendo particularmente difícil isolar o público do privado, o econômico do social e o espiritual (ou sagrado) da política.

Ademais, é impossível analisar a dinâmica dos grupos corporativistas sem referência às suas relações específicas com o Estado; é esta a orientação que ser procura imprimir ao trabalho. No Brasil, a Igreja Católica jamais deixou de ser parceira privilegiada do Estado. A Igreja tem motivos para atuar no campo da educação, em particular, a reprodução de sua então condição de religião hegemônica; de outro lado, o Estado lhe reconhece a condição de parceira no acesso da população ao saber letrado. A ANC poderia, em tese, ter iniciado um processo gradual de ruptura dessa parceira, não o fez. A pesquisa examina os fatores que influenciaram a não ruptura bem como as estratégias e mecanismos de pressão que a corporação utilizou para transmutar seus interesses específicos em interesses da vontade nacional.

A FILANTROPIA NORTE-AMERICANA NO BRASIL. A FUNDAÇÃO ROCKEFELLER, O ENSINO SUPERIOR E A PESQUISA CIENTÍFICA EM SÃO PAULO (1916-1954)

Maria Gabriela S.M.C. Marinho, Universidade São Francisco

A presença norte-americana no ensino superior brasileiro, através de acordos, consultorias, intercâmbios ou patrocínios tem sido um tema insuficientemente analisado pela historiografia brasileira. Em São Paulo, essa presença tem se revelado particularmente constante e efetiva, desde o final do século XIX, como demonstram os exemplos analisados a seguir, porém a análise mais consistente sobre as implicações dessa presença permanece por ser feita. A comunicação pretende apontar alguns elementos pertinentes a esta temática, em especial no que se refere a implantação de modelos institucionais introduzidos pela filantropia norte-americana sob o patrocínio da Fundação Rockefeller.

A literatura especializada tem apontado a Escola de Engenharia Mackenzie como a primeira ação e norte-americanos no Brasil no campo do ensino superior. Criada em 1896, a escola esteve até 1927 formalmente vinculada à Universidade do Estado de Nova York, responsável, até aquela data, pela emissão de certificados e diplomas dos cursos ministrados em São Paulo. Especificamente em relação à Fundação Rockefeller (FR), em 1915, desembarcou em São Paulo a primeira Comissão de Estudos com o objetivo de identificar centros de ensino médico que pudessem ser patrocinados como loci de excelência científica. Em 1916, foram assinados os primeiros acordos para a transformação da recém-criada Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo (FMCSP) numa Rockefeller’s School, a exemplo de congêneres espalhadas pelo mundo e estruturadas segundo o modelo da Faculdade de Medicina da Johns Hopkins University.

Mais tarde, com a criação da Universidade de São Paulo (USP) em 1934, a aproximação entre as duas instituições continuará intensa no apoio a implantação de laboratórios e grupos de pesquisa, nos campos da Genética e da Física. Na década de 1950, novos acordos foram firmados para a criação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, além de patrocinar a constituição do Instituto de Oceanografia e a introdução da medicina nuclear no Brasil, com o financiamento do Laboratório de Isótopos na Faculdade de Medicina de São Paulo. No mesmo período, financiou a pesquisa na Escola Paulista de Medicina (EPM), atual Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

A atuação da Fundação revestiu-se de um forte caráter modelador no campo biomédico e foi decisiva na introdução de novas práticas e procedimentos no ensino médico do país. Promoveu forte deslocamento da tradição francesa vigente no país para o modelo norte-americano, fundamentado em procedimentos laboratoriais, mediado por infra-estrutura sofisticada de equipamentos e análises clínicas de base quantitativa e padrão mais efetivamente intervencionista.

PRÁTICAS INCENTIVADORAS E CONTROLE DE APRENDIZAGEM NA ALFABETIZAÇÃO

Maria Iolanda Monteiro, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e FAPESP

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O trabalho consiste na investigação da variedade de ações educativas de professora alfabetizadora e as suas relações com o rendimento escolar dos alunos, visando compreender as práticas, sem perder de vista elementos que fazem parte da escola e do seu contexto. Para alcançar os objetivos, utilizaram-se entrevistas, observação participante e problematizações de ensino com discussões e análises a respeito da natureza do trabalho docente e a sua repercussão no desempenho da turma de alunos. A análise do cotidiano da sala de aula envolveu o estudo das práticas incentivadoras para identificar as relações que contribuíram para o controle de aprendizagem na alfabetização. Nessa perspectiva, organizaram-se outras classes de dados para se estudar esse controle, como a natureza da atividade, natureza de participação da professora e dos alunos, práticas avaliativas e situações de (re)ensino. Os resultados permitiram identificar que as práticas pedagógicas apresentam caráter contraditório, porque foram organizadas para facilitar a compreensão, eliminar as dificuldades, dúvidas e para desenvolver certas habilidades, mas não ofereceram muitas situações de desenvolvimento, de tal modo que o aluno pudesse ultrapassar os padrões estabelecidos pela educadora e apresentar diferentes resultados. Concluiu-se que as características do desempenho escolar apresentaram uma dependência significativa das práticas da educadora. Percebeu-se ainda, ao se analisar a configuração do cotidiano escolar, que continua fazendo parte da realidade das práticas pedagógicas nas escolas a preocupação em homogeneizar e classificar o desempenho, disseminando assim um controle que encaminha os alunos a reagirem de determinadas maneiras. Os professores, em qualquer nível de ensino, estruturam o trabalho docente com seus pares profissionais, concretizando práticas de controle por meio da escolha de atividades e materiais didáticos, da definição de regras cotidianas iguais e de diretrizes pedagógicas em que configuram as práticas veiculadas no ambiente escolar, ao mesmo tempo beneficiando alguns e prejudicando outros. A investigação da variedade de ações educativas evidencia a importância de um desenvolvimento profissional docente, cujo processo de profissionalização abrangesse o investimento na identidade de professora alfabetizadora. Cabe ressaltar, assim, a necessidade de existir um comprometimento explícito com a construção dessa identidade pelas instâncias promotoras de ensino, incluindo os cursos de formação inicial e continuada.

A COMPASSO DOS PRELADOS BRACARENSES SETECENTISTAS

Maria Ivone da Paz Soares, Conservatório de Música Calouste Gulbenkian

Os Arcebispos de Braga, se não penetraram até ao âmago na construção vital das suas ovelhas, foram guias normativos que impuseram um certo ritmo no quotidiano.

D. José de Bragança instruído douta e prudentemente pela Companhia de Jesus, na Universidade de Évora, fundamentou o seu pastoreio nas máximas dos seus mestres. Pela leitura do relatório Ad Limina Apostolorum deste arcebispo, depreendemos que os Jesuítas frequentemente se ocupão nos ministerios de pregar; confessar; instruir na doutrina cristã o povo e dirigiam ainda os Estudos Públicos. Até que foram despedidos do Paço, em Novembro de 1754.

As medidas levadas a cabo por D. José de Bragança vão retomar todo um processo regenerativo dos costumes, crenças, fé, princípios que tiveram a mola propulsora no Concílio de Trento e se foram inculcando ao longo dos tempos pelas pastorais, constituições, decretos, avisos, editais, visitas, exortações, aconselhamentos.

Os costumes e as leis controlavam, vinculavam, submetiam as vontades, os sonhos, as acções, os pensamentos. Os costumes vestiam-se de leis e estas normalizavam aqueles, fundindo-se numa apertada teia de controle e pauta de uma sinfonia-vida de acordes binários de pecado/virtude.

As leis reais, os usos e costumes das Paróquias, as Pastorais dos Arcebispos e as normas saídas dos confessionários moldavam o dia-a-dia, na trilha de perfeição e santidade. E outras interferências normativas pesavam: livros pios e moralistas, catecismos, acção dos visitadores, olheiros do pároco e das confrarias/irmandades, da vizinhança/sociedade e, sobretudo, o medo, como Delumeau denuncia.

A ignorância dos Mistérios e doutrina centrava-se na falta de formação dos orientadores que os três últimos arcebispos tentaram combater com a frequência anual de estudos, exercícios

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espirituais e com leituras que cimentavam a fé. Por sua vez, os sacerdotes eram obrigados a ensinar a crianças e adultos antes, durante ou depois da missa, através dos conselhos inacianos ou de catecismos. Relevamos da máxima importância uma pedagogia pela instrução e não pelo medo e costume, assim como pelas reciclagens aos conhecimentos do clero mentor que ia contrapor às secas imposições.

D. José de Bragança, para consolidar os frutos deixados pelos missionários, mandou traduzir do espanhol e imprimir a expensas suas para benefício dos seus súbditos, as célebres Doutrinas Practicas, que costuma explicar nas suas Missoens o Padre Pedro de Calatayud e ainda o Compendio Doutrinal muy util, e necessario para explicar a Doutrina Christã, do padre italiano Pedro de Pinamonti, aumentado por Calatayud. Foi adoptado na catequese e instrução religiosa das crianças.

A catequese, as procissões, os sermões, as festas, a assistência, os avisos, as missões populares compunham o poderoso aparelho de enquadramento de massas, para além das visitas pastorais, Inquisição, confissão, penitências, rituais fúnebres e do próprio sino.

AS MULHERES E A CIDADE: EDUCAÇÃO E PROGRESSO: SÃO PAULO 1880-1920

Maria Izilda S. de Matos PUC-SP

A expansão urbana de São Paulo esteve vinculada diretamente aos avanços e/ou dificuldades da economia cafeeira; aos poucos a capital paulista consolidava-se como centro capitalista, integrador regional, mercado distribuidor e receptor de produtos e serviços, fatores vinculados ao crescimento da produção do "ouro verde".

O processo de expansão urbana em São Paulo, em parte coincidiu com a emergência do regime republicano, cujo programa, dada a influência da doutrina positivista, concentrou suas atenções no binômio família/cidade, base da proposta de estruturação do Estado, em que o conceito de pátria se baseava na família. Esta era vista mais do que nunca como o sustentáculo de um projeto normatizador cujo desenvolvimento reequacionou seu papel e sua inserção social, já que a nova família foi estimulada a desenvolver práticas sociais que se adaptassem à modernidade, ao "civilizado".

A educação feminina torna-se um ponto-chave, pois através dela pretendia-se o aperfeiçoamento físico e moral da mulher, da mãe, da família e das futuras gerações do país. A "nova mulher" além de se constituir num agente familiar, deveria tornar-se o baluarte da moral da sociedade, e dessa forma as normas deveriam ser transmitidas pelas mães as suas filhas a partir da adolescência e puberdade. Dessa forma, a luta pela educação feminina se expande envolvendo diferentes agentes e tornando-se explicita na imprensa.

Essa investigação se propõe a recuperar as propostas, questões e sentidos das lutas e campanhas pela educação feminina em São Paulo-Brasil, no período de 1880-1920, a partir dos jornais e periódicos. Esse era o momento considerado fundamental que as mulheres permanecessem à frente na educação das crianças em casa, nas salas de aula e dirigindo as escolas. Trabalhar nas instituições de ensino era considerado tarefa honrada, motivo de satisfação e de cumprimento dos deveres sociais.

ESTADO MODERNO E FORMAS DE INSTRUÇÃO DO CORPO SOCIAL - DISCURSOS, MANIFESTAÇÕES, DEBATES NO SÉCULO XVI

Maria Leonor García da Cruz, FLUL/CHUL

Numa sociedade em plena transformação como é a sociedade europeia e a portuguesa renascentista, visível se torna a reacção de corpos sociais tradicionais à mudança sobretudo quando esta se evidencia pela ascensão e consolidação de determinados gupos em funções ao serviço do Estado, quando a distribuição de privilégios supõe o cumprimento de serviços mais do que a origem /sangue, quando largas camadas procuram em novas actividades abertas pela Expansão ultramarina no Reino ou fora dele, a oportunidade que o próprio Estado lhes garante de promoção.

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As manifestações e as razões das transformações da sociedade procuram-se na crónica do quotidiano, no epistolário, no relato de eventos. Não basta. Daí obtem-se um testemunho circunstancial, por vezes demasiado comprometido, quantas vezes apaixonado, quase sempre veiculado por camadas instruídas e, no tempo que nos interessa observar, instrutoras e moralizadoras. Os autores, na maioria das vezes palacianos, são, eles mesmos, mestres e orientadores de um discurso do poder reinante, de uma ideologia de legitimação de valores e de comportamentos.

A composição social dos novos órgãos do poder e a adaptação contínua dessa composição às vicissitudes dos tempos, através de novas disposições legislativas, novos regimentos e cláusulas, pelo afinamento de critérios na escolha dos indivíduos para determinadas funções, pela reavaliação destas e pela mudança do perfil do seu possuidor, pode introduzir o investigador numa outra dimensão, mais profunda, dada a longa duração dessas organizações sociais que são as instituições. Nelas se registam tensões internas e pressões externas, revelando os seus debates e combates pela sobrevivência, muito dos da própria sociedade.

A profissionalização de certas funções, a exigência de puridade ou de confiança política, o carácter público, entre outros fenómenos ligados intimamente à génese do Estado Moderno, exige um aprofundamento do papel da instrução que se sobrevaloriza como fundamental para o bom desempenho do futuro responsável político ou administrativo.

ESCOLA E DISSEMINAÇÃO DE ESTEREÓTIPOS NO BRASIL: A INSERÇÃO ESCOLAR DO NEGRO NA PRIMEIRA REPÚBLICA

Maria Lúcia Rodrigues Muller, Universidade Federal de Mato Grosso

A proposta deste trabalho é discutir as formas de inserção escolar do negro no Brasil, durante a Primeira República. Entende-se aqui o termo negro como sinônimo de preto, pardo, escuro, não-branco, dado a peculiar classificação racial brasileira que será mais explicitamente apresentada no trabalho completo. Pretende-se realizar essa discussão a partir da interlocução com os debates postos, principalmente, por três grupos de atores: o pensamento social brasileiro; os intelectuais da educação (incluindo-se aí os processos de modernização e racionalização da instrução pública formulados e implementados por alguns desse intelectuais) e setores ligados à Igreja Católica. Pretende-se demonstrar que no primeiro período republicano, desde diferentes espaços, foi gestado um projeto de nação e de Estado que não comportava um lugar para os diferentes. A Abolição da escravatura trouxe a igualdade jurídica, formal, para pretos e pardos, mas não a igualdade de fato. Apesar de que à época da Abolição o contingente de escravos correspondia apenas a 5% (aproximadamente setecentas mil pessoas) da população ‘de cor’, ainda permanece na memória social brasileira a idéia de que preto é sinônimo de escravo, acrescido de todos os correspondentes estereótipos e preconceitos que contribuem para a manutenção das enormes desigualdades raciais ainda existentes no país. Em parte, pode-se creditar à intelectualidade brasileira o crédito pela disseminação das teorias racistas, produzidas na Europa e nos Estados Unidos, e re-apropriadas no Brasil de maneira a contemplar e hierarquizar a heterogeneidade étnica da população brasileira, chegando-se à solução consensual da “ideologia do branqueamento” que propugnava a importação de trabalhadores estrangeiros, brancos, europeus, para que no fim de algumas gerações a população do país fosse branqueada através da miscigenação com os imigrantes. É a partir desse quadro que, de diferentes maneiras, foram criados mecanismos institucionais e simbólicos que contribuíram para colocar pretos e pardos em situação de inferioridade social. Entretanto, a escola pública constituiu-se em um espaço privilegiado para a inserção negativa desses segmentos. Na Primeira República a escola foi uma agência poderosa de disseminação e manutenção de imagens e estereótipos depreciativos sobre os negros brasileiros.

PROJETO MINERVA: UMA PROPOSTA DEMOCRATICA DE EDUCAÇÃO?

Maria Luisa Furlan Costa, Universidade Estadual de Maringá

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O presente trabalho é parte de uma pesquisa institucional em que procuramos analisar criticamente os principais programas e projetos de educação a distância desenvolvidos no Brasil. Neste momento, pretendemos realizar uma breve reflexão sobre o Projeto Minerva que nasceu no Serviço de Radiodifusão do Ministério da Educação e Cultura, no inicio da década de setenta do século XX. O programa implementado pelo governo federal pretendia utilizar o rádio para atingir o homem onde ele estivesse, ajudando-o a desenvolver suas potencialidades, tanto como ser humano, quanto como cidadão participativo e integrante da sociedade. É impossível negar o fato de que milhares de pessoas realizaram seus estudos básicos por meio desta iniciativa do governo militar brasileiro, mas é importante ressaltar que o projeto foi idealizado como uma tentativa de solucionar em curto prazo, e com baixo custo, os problemas educacionais do período conhecido como “milagre brasileiro”. A intenção que se tem, neste trabalho, é analisar os aspectos legais do referido projeto e as criticas apontadas pela historiografia brasileira, mas sem perder de vista a contribuição que o Projeto Minerva trouxe para a renovação e o desenvolvimento do sistema educacional brasileiro, abrindo a perspectiva de se utilizar os meios de comunicação para complementação do trabalho desenvolvido pelo sistema regular de ensino. O intuito do projeto era proporcionar a interiorização da educação básica, buscando suprir as deficiências que existiam na educação formal em regiões onde o número de escolas e de professores era insuficiente. Mais do que isto, o projeto consistia numa tentativa governamental de enfrentar o alto índice de analfabetismo nacional evidenciado pelo censo de 1970, que deixava exposta uma acentuada desigualdade regional no que se refere a taxa de escolarização. Enquanto o estado da Guanabara apresentava uma taxa de 91,8%, o Acre tinha uma taxa de 34,5%. É nesta mesma perspectiva, inclusive, que Roquette-Pinto, em 1923, apresentou um plano sistemático de utilização educacional da radiodifusão como forma de ampliar o acesso à educação no país. Da mesma forma, se as criticas apontam, de um lado, o fracasso do projeto, de outro não conseguem negar a contribuição que o mesmo trouxe para uma parcela significativa da população que por motivos sociais, econômicos e/ou políticos não tinham acesso ao sistema regular de ensino.

ECOS DO POPULISMO EDUCACIONAL DO LESTE EUROPEU NO BRASIL NA VIVÊNCIA DE IMIGRANTES UCRANIANOS (1895-1922)

Maria Luiza Andreazza, U. Federal do Paraná

A comunicação proposta ocupa-se em analisar conflitos que ocorreram num processo específico de inserção de imigrantes no sul do Brasil, entre a ‘sociedade civil’ e religiosos no que tange aos fins da educação. O fio condutor do estudo é o acompanhamento de um contingente de ucranianos que, egresso da Galícia Oriental, foi assentado em área rural do sul do Estado do Paraná (BR). Inicialmente, o estudo retrocede ao período anterior à emigração, apontando as ambigüidades da formação social da Galícia Oriental, destacando haver aí a coexistência de dinâmicas sociais diferenciadas: uma, conservadora, ocupada em manter o campesinato em sua submissão tradicional e outra, progressista, sintetizada na ação do Movimento Prosvita. Dada este panorama, teve-se como pressuposto que deixar a Galícia implicaria ruptura radical na vida e na natureza das relações sociais dos integrantes deste grupo. Isto porque, a transferência para o Brasil implicaria o abandono da relação cotidiana com o ambiente social e natural que dava sentido à sua linguagem cultural favorecendo uma efetiva renovação de suas bases socioculturais. Ademais, a capilaridade do programa dos populistas junto ao campesinato daquela região, permite o pressuposto de o contingente imigrante estaria permeado por entusiastas da Prosvita. Movimento nacional-populista muito ativo nos campos da Galícia, a Prosvita preocupava-se em editar jornais e pequenos livretos, crescentemente destinados aos camponeses, dirigindo suas atividades fundamentalmente para a promoção da educação entre as massas camponesas e acabou por ramificar-se na forma de clubes de leitura. As tchetálhnia (salas de leitura), complementavam a educação recebida nas escolas, muitas vezes, no entanto, partindo da própria alfabetização dos camponeses. Destacou-se no movimento a participação ativa de parte do clero uniata e dele partiu a formulação de uma ideologia concebendo o movimento nacional como uma luta dicotômica: da virtude contra o vício, da iluminação contra a ignorância, da sobriedade contra a embriaguês, da diligência contra a indolência e da frugalidade contra a prodigalidade. Estavam dadas, assim, as bases de uma nova ética social. Tendo em vista a

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presença de entusiastas da Prosvita dentre os contingentes emigrados, a comunicação que está sendo proposta se dedicará a analisar, no âmbito das iniciativas educacionais dos imigrantes, os conflitos decorrentes das tentativas dos segmentos ‘Prosvita’ e dos segmentos ‘clericais’ de se assenhorearem da competência de ensinar as novas gerações.

TRAJETÓRIAS SÓCIO-PROFISSIONAIS DE DOCENTES DE DIDÁTICA NA UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA: OLHARES SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM NÍVEL SUPERIOR ENTRE 1940 E 1990

Maria Manuela Alves Garcia, FAPERGS

A comunicação tem o objetivo de relatar o trabalho de organização para consulta e pesquisa, de um conjunto de sete depoimentos orais, de natureza biográfica, de professores e professoras das disciplinas de Didática e Prática de Ensino em cursos de Licenciatura de diferentes Instituições Federais de Ensino Superior, no Brasil, depoimentos esses coletados entre os meses de dezembro de 1992 e abril de 1993 que recobrem um período da história da formação de professores e dos cursos de Licenciatura no Brasil entre 1940 e 1990, aproximadamente. Originalmente coletados com o objetivo de fazer uma análise sócio-histórica da Didática nos cursos de formação de professores no ensino superior, esses depoimentos recuam algumas décadas indo às antigas Faculdades de Filosofia, instituições em cujo interior a Didática e a formação docente ganhou assento no ensino superior sob a égide do escolanovismo. As entrevistas passam pelo movimento das classes experimentais da década de 1960, pela tecnologia educacional da década de 1970 e pelo movimento da teoria educacional crítica das décadas de 1980 e 1990. A importância e a utilidade do material organizado são várias. Que mais não seja, para aqueles e aquelas que têm algum gosto pelas reminiscências, pelas memórias e singularidades dos pontos de vista; para os/as que de algum modo se sintam atraídos/as pela tarefa de comparar e confrontar versões acerca de determinados acontecimentos, datados no tempo e no espaço da história recente da formação docente nas universidades públicas brasileiras, mais especialmente nos últimos 50 anos da educação brasileira do século XX. Como fonte de consulta para pesquisadores, como material de apoio didático nas salas de aula dos cursos de formação docente, o conjunto desses depoimentos tem muito a dizer, a provocar, a sugerir ou, simplesmente, a reiterar e confirmar. E isso provavelmente pode ser descoberto na sua leitura atenta e na condição de não atribuírmos a esses discursos tarefas ou qualidades em demasia, entendendo-os como a expressão da “verdadeira” história dos cursos de Licenciatura no Brasil ou se, por outro lado, os subestimarmos em seu valor como documento, pois, afinal, argumenta-se, são discursos cuja subjetividade deve suscitar a desconfiança do analista social. O trabalho valeu-se muito da experiência do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil) no processamento e arquivamento de documentos orais. As transcrições foram organizadas por ordem cronológica do nascimento das entrevistadas, iniciando pela entrevista da mais idosa, a professora Alaíde Lisboa de Oliveira, nascida em 1909, e concluindo com o mais jovem, professor Luís Carlos de Freitas, nascido em 1947. Precede cada uma das entrevistas uma pequena biografia do/a entrevistado/a, uma ficha técnica relativa à entrevista e ao seu processamento escrito, e um sumário que facilita ao pesquisador e à pesquisadora o conhecimento mais imediato e rápido dos assuntos e conteúdos tratados em cada um dos depoimentos.

A GÉNESE DO LIVRO ÚNICO DE HISTÓRIA NO ESTADO NOVO (ENSINO LICEAL)

Maria Manuela Carvalho, Escola Secundária Padre António Vieira

Os valores afirmados pelo Estado Novo não passaram de imediato nem para os programas nem para os conteúdos dos manuais de história do ensino liceal, mesmo quando foram emitidas orientações expressas nesse sentido. Quer isto dizer que muitos agentes educativos - autores de programas, autores de compêndios e relatores de compêndios - apresentaram resistências à mudança de orientação política. Os manuais de história que foram editados e elaborados no início dos anos

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trinta reproduziam maioritariamente uma visão do mundo que não era sustentada pelos valores do regime. Como assinalava um dos revisores oficiais dos livros de história em 1936, assistia-se aoparadoxo do ensino da história continuar a "servir-se de compêndios elaborados em obediência a doutrinas cuja bondade o Estado não reconhece".

Nessa data, foi então levada a cabo uma ofensiva em relação à educação em geral e à história em particular. Como se sabe, foram promulgadas várias medidas legislativas, da lei de Bases aos programas, que reorganizaram o ensino submetendo imperativamente a informação à formação. No caso do ensino da história, para o sujeitar aos princípios definidos pelo regime foi necessário estabelecer o livro único. Mas para que o livro único transmitisse os ideais pretendidos foi necessária a intervenção enérgica do Ministro da Educação, Carneiro Pacheco, concertada com a acção "pedagógica" dos revisores/censores dos livros escolares sobre os autores dos compêndios. Será esta acção, que decorreu entre 1936 e 1940, o objecto da comunicação.

MÉTODOS E PROCESSOS DE ENSINO EM SERGIPE (1ª METADE DO SÉCULO XX)

Maria Neide Sobral da Silva, Universidade Federal De Sergipe

Este estudo analisa os métodos e processos pedagógicos instituídos pela Instrução Pública de Sergipe, na primeira metade do século XX. Destacamos dois momentos: no governo Rodrigues Dórea (1908-1911), quando trouxe de São Paulo um especialista em educação, Carlos Silveira, responsável pela difusão do método intuitivo no Estado, e no governo do interventor federal Augusto Maynard (1930-1935), que indicou o professor José Augusto da Rocha Lima, catedrático da Escola Normal, para ir para São Paulo estudar os métodos e processos pedagógicos pautados no ideário escolanovista e adaptá-los a realidade educacional sergipana. Destacamos, principalmente a aliança que foi se presentificando nas orientações pedagógicas da Instrução Pública entre a Pedagogia Moderna (Herbart) e a Pedagogia Renovada (Escola Nova), especialmente os ecos pedagógicos do modelo paulista de educação nas referidas reformas. Trata-se de uma abordagem historiográfica, focada nos métodos e processos pedagógicos levantados nos documentos oficiais: regulamentos, circulares, ofícios, termos de visitas e produções didático-pedagógicos. Na luta pela normalização, inicialmente do método intuitivo e, nos anos 30 do século XX, do Sistema de Decroly como modelos de ensino oficial, evidenciamos que houve um grande esforço de se implementar inovações pedagógicas, dentro dos preceitos da pedagogia moderna, numa mestiçagem didática entre o que era o novo (pedagogia herbatiana) e o mais nova (Escola Nova) na construção de uma cultura escolar circunstanciada pela busca constante dos acertos de caráter psico-pedagógico. Marcada pela distância entre a intenção e as dificuldades concretas visíveis num sistema escolar esparso, com um corpo de professores despreparados e alheios aos ecos dessas inovações, estas, no entanto, iam se materializando lentamente nos discursos oficias e foram se difundindo nas escolas pelos inspetores escolas, em breves demonstrações práticas e orientações pedagógicas. Desconsideravam, contudo, os limites espaciais e temporais do tempo de formação destes professores, a enorme carência de material didático e a falta de qualificação dos mesmos para o exercício do novo modo de ensinar.

O DESPONTAR DA CIDADANIA NO PORTUGAL OITOCENTISTA

Maria Neves Leal Gonçalves, Universidade de Évora / Observatório de Políticas da Educação e de Contextos Educativos/Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

Nesta comunicação pretendemos traçar uma análise relativamente à emergência da cidadania no Portugal de Oitocentos.

Num primeiro momento, iremos proceder a uma abordagem genérica da evolução da cidadania - conceito que percorreu toda a modernidade - e à reconfiguração dos seus diversos sentidos. Focaremos a dicotomia inclusão/exclusão patente na cidadania da sociedade do séc. XIX assim como o dualismo presente na relação entre indivíduo e comunidade uma vez que, na cidadania liberal, o bem comum se sobrepõe aos interesses individuais.

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Num segundo momento, pretendemos fazer referência aos conteúdos cívicos dos catecismos constitucionais que surgiram, entre nós, no vintismo, com o movimento liberal. A par de registos ficcionais, emergentes no teatro e no drama, assistimos à expansão de uma categoria de textos políticos (Cartilhas, Catecismos constitucionais, Manuais políticos,…) que visam intervir no debate público de ideias sobre a organização da sociedade e do próprio poder político. A publicação deste tipo de obras é reveladora dos motivos de interesse de produtores e receptores de mensagens de cariz político e jurídico, do desejo de formar o cidadão e de se constituir um governo justo (que proceda a alterações sociais, políticas e educacionais).

Por último, destacaremos a persistência da consciência cívica na sociedade oitocentista. As obras, objecto de estudo, são um indicador do ambiente cultural em que foram produzidas evidenciando quer os valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade quer as concepções político-liberais dos seus autores. É essencialmente uma literatura que tem como objectivos implícitos uma expansão e mobilização do público (se bem que esse público seja um universo limitado devido à elevada taxa de analfabetismo do país). É também uma literatura que está em conexão com os debates políticos da época pretendendo contribuir para a consciencialização e interiorização dos ideais e valores inerentes à construção de um Estado liberal.

A PRESENÇA DE NEGROS PROFESSORES NAS UNIVERSIDADES DIMINUIU NAS ULTIMAS DÉCADAS

Maria Solange Pereira Ribeiro, Universidade Estadual de Campinas

O presente resumo faz parte de um trabalho que visa dar continuidade pesquisa realizada no doutorado, quando se buscou identificar nas Universidades Públicas do Estado de São Paulo os professores negros, sem muito êxito no que se refere ao quantitativo de forma oficial. Já se passaram cinco anos, estamos retornando as mesmas Universidades com o objetivo de identificar, localizar e dar transparências, sobre a presença do negro professor na USP, UNICAMP, UFSCar e UNESP. Na pesquisa do doutorado verificou-se que muitos professores haviam ingressado na docência nos anos oitenta, fato esse que apontava para um congelamento no acesso do negro como professor universitário após essa década. A nossa hipótese é que hoje a presença do negro professor é menor do que cinco anos atrás, pois a maioria deles já tinha mais de vinte anos de docência e se contarmos os incentivos do governo, aposentadoria compulsória, reforma da previdência e a precariedade da escola pública secundária de onde vêm a maioria dos negros, poderemos encontrar um número ainda mais reduzido. O objetivo da pesquisa é encontrar os dados relativos ao possível congelamento de ascensão dos professores negros à docência em Universidades Públicas Paulistas contatando os grupos que trabalham com a questão do negro, que já é uma realidade em quase todas as Universidades, ligados ou não a movimentos negro, bem como a rede de influência que existe entre os pares além do envio de correspondências ao Departamento de Recursos Humanos das Universidades em questão.

A EDUCAÇÃO NA IMPRENSA REGIONAL EBORENSE EXISTENTE NA BIBLIOTECA PÚBLICA DE ÉVORA (1884-1974)

Maria Teresa C. S. Gonçalves dos Santos, Raquel Bom, Dora da Mata, Linda Caeiro, Ana Afonso, Marco Delgado, Ana Eusébio, Márcia Oliveira, Susana Pinto; Universidade de Évora

A presente comunicação permite, parcialmente, dar conta do trabalho de investigação que se está a desenvolver no CIDEHUSe que foi realizado no âmbito da disciplina de História da Pedagogia e da Educação. Não se trata de analisar criticamente o conteúdo dos jornais escolares nem se circunscreve-se a estes, antes visa dar visibilidade à educação como notícia jornalística nos periódicos regionais dos distritos de Évora, Beja e Portalegre, guardados na Biblioteca Pública de Évora e com data anterior a 1974. Neste sentido, impõem-se o levantamento e a consulta dos jornais existentes na

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Biblioteca Pública de Évora para se proceder ao registo de toda a informação em função de várias secções temáticas, como por exemplo, doutrinas e questões pedagógicas, instituições, educação feminina, educação infantil, educação primária, educação secundária, educação técnico-profissional, polémicas educativas, biografias, espaços educativos, publicidade e notícias escolares e quotidiano escolar.

A investigação desenvolvida e a apresentar tem dois níveis justificativos:1.º - Construir uma base de dados serve para disponíbilizar informação tematicamente organizada e, deste modo, facilitar a realização de trabalhos com espessura reflexiva.2.º - Recolher informação escrita na imprensa regional, tendo por tema de pesquisa a educação e local de consulta a Biblioteca Pública de Évora, permite estimar o impacte que as grandes problemáticas educativas tiveram na província e, não menos importante, serve para recuperar interesses e preocupações educativas bastante circunscritas, mas expressivas do estado da questão. Dir-se-á mais: face à degradação dos periódicos e à dificuldade em melhorar as condições de conservação, uma urgência sempre adiada, esta investigação impôs-se como inadiável.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA NAS ESCOLAS DO ENSINO MÚTUO, NO PORTUGAL DE OITOCENTOS

Maria Teresa S. Barros Conde, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias

O quotidiano das escolas de primeiras letras, em Portugal, a partir do decénio de 1820 e até aos anos de 1850, está formalmente ligado à prática do ensino mútuo.

Este “novo” modo de ensino, trazido da Índia para Inglaterra por Andrew Bell e divulgado nas escolas inglesas por Joseph Lancaster, no início de Oitocentos, depressa foi adoptado por numerosos países, tanto na Europa, incluindo Portugal, como no resto do mundo, sobretudo por razões economicistas e de celeridade na aprendizagem.

O modo de ensino mútuo consiste “na comunicação recíproca da instrução por meio do ensino dos discípulos que sabem mais aos que sabem menos, debaixo da direcção e inspecção do Professor”. A sua aplicação, tem um cariz militar, orientando-se pela precisão das tarefas, pelo rigor dos horários e pela disciplina dos comportamentos, adoptando como lema “um lugar para cada coisa e cada coisa no seu lugar”.

Os alunos são distribuídos de acordo com os seus conhecimentos e ritmos individuais de compreensão e aquisição, sem atender à idade e sem um número limite para cada classe. A cadência das aprendizagens varia consoante o aluno e a disciplina. O professor deixa de ser o agente educativo por excelência, como acontecia até então, investindo desta função alguns dos alunos mais velhos e melhor preparados. Todo o ensino se baseia na emulação e num sistema contínuo de recompensas e punições imediatas, em função do desempenho pessoal e ocupando um lugar de destaque no quotidiano escolar. Há prémios e louvores para os discípulos que são considerados um modelo a seguir mas, também há castigos e admoestações para os preguiçosos e os indolentes.

As matérias a ministrar estão baseadas em programas precisos e codificados, divididos, normalmente, em oito etapas progressivas a que é dado o nome de “classes”. É utilizado equipamento e material didáctico inovadores, como a mesa de areia, os tabelários, as tabelas, as ardósias e o quadro negro.

Com esta comunicação, elaborada a partir do trabalho em fontes primárias originais, pretende-se analisar a prática pedagógica baseada no modo de ensino mútuo, o qual, entre nós, não passou de uma tímida experiência; contudo, este ensino provocou um debate de ideias alargado impulsionando, de forma inquestionável, a pedagogia do século XIX.

CRIANÇA, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE: ECOS DO MODERNISMO NA CRIAÇÃO DOS PARQUES INFANTIS

Maria Walburga dos Santos, Universidade de São Paulo

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Na década de trinta do século passado são recorrentes no Brasil temas como modernidade e urbanização. São Paulo, cidade pioneira sob esse aspecto, expande seu parque industrial com grandes fábricas e oficinas, que trarão em seu encalço bairros operários como Brás, Mooca e Bom Retiro. Simultaneamente, a cidade verticaliza-se, o comércio sofistica-se e o teatro começa a ocupar espaços. Tudo acontece ao mesmo tempo - antropofagicamente - relembrando um termo utilizado pelos modernistas da Semana de Arte Moderna de 1922.

Desse movimento intenso, atrelado a questões internacionais como a queda da Bolsa de Valores em 1929 e, no Brasil, à "revolução de 1930" em que Getúlio Vargas toma o poder, além da intensificação da produção industrial, surge uma sociedade com novas necessidades, que precisam ser ajustadas e dar compasso e ritmo ao fator modernidade. Para suprir uma dessas necessidades - abrigar e educar os filhos dos operários - é criado o "Serviço de Parques Infantis", sob a intervenção do dirigente do Departamento de Cultura da cidade, o escritor Mário de Andrade.A criação dos "Parques Infantis" foi influenciada pelo movimento escolanovista: IV Conferência Nacional de Educação (1931); Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). No Código de Educação de 1932, elaborado por Fernando Azevedo, abre-se espaço para a educação infantil, colocando-a na base do sistema escolar. Tendo essa referência, proponho como objeto de estudo de minha pesquisa a fundação dos "Parques Infantis", origem das atuais Escolas de Educação Infantil (EMEIs).

Sugiro trabalhar a formação dos Parques Infantis relacionando-a ao movimento de construção do conceito de infância, bem como a construção do papel de educador, no tocante ao gênero e à função desempenhada. Para tanto, elegi a formação desses educadores como eixo principal do trabalho.

Entre meus objetivos, destacam-se:Pensar a História e Historiografia da Educação, em um processo de entender a problemática

das representações e construções sociais que ultrapassem a fronteira entre fato e memória. Possibilitar uma reflexão que vá além da análise de leis e decretos e destaque as ações

concretas de pessoas, sujeitos do processo histórico da educação: as educadoras (chamadas então de "jardineiras"), as crianças e suas famílias ou ainda o próprio Mário de Andrade, desenvolvendo seu papel no Departamento de Cultura.

REFLEXÕES ACERCA DA ESCOLARIZAÇÃO DOS “DESVALIDOS” NO SÉCULO XIX

Maria Zélia Maia de Souza, U. Estado do Rio de Janeiro

Este estudo busca compreender aspectos do processo educativo brasileiro, a partir dos movimentos que as autoridades fizeram para a implantação da escola pública em nosso país que, tendo como centro motivador, os ideais iluministas de liberdade, progresso, indivíduo e felicidade, trabalhavam com a idéia de que “dar instrução” às classes inferiores, seria uma boa forma de lhes proporcionar felicidade, ordem e bom procedimento. Sendo assim, desenvolvo uma refleção acerca da educação popular no Brasil, entre os anos 1870 a 1889, com o foco voltado principalmente para a Corte Imperial, em virtude da massa documental efetivamente consultada na série “Instrução Pública” do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. Da documentação consultada, considerei, para efeito de análise, as correspondências dos professores(as), ofícios de diferentes autoridades envolvidas com o processo educacional em questão, além de mapas de freqüência, programas de ensino, entre outros. Para entender o processo de inclusão das crianças representadas como desvalidas no espaço escolar, detive-me no exame de alguns debates relativos a essa questão, desenvolvidos por vários sujeitos interessados no processo educacional em nosso país, especialmente os que ocorriam de forma mais intensa na Corte, um dos mais populosos complexo urbano, centro político, cultural do Império, tido também como centro irradiador, que as autoridades constituídas desejavam que servisse de exemplo para o resto do Brasil, onde reiteradamente, proclamava-se a necessidade de disciplinar e moralizar a população pobre da cidade.

Nessa linha, o reflexo de algumas ações merecem destaque, como por exemplo, a criação da Associação Protetora da Infância Desvalida, mantida pela Câmara Municipal voltada para o atendimento das crianças desamparadas, fornecendo às mesmas, vestuário, material didático e

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assistência médica gratuita. Os asilos também compareceram como uma das formas pensadas para o atendimento à criança pobre no Brasil Imperial. Neste estudo foram analisadas três propostas asilares, sendo que, nestas instituições, a educação voltada para uma atividade manual, artesanal, isto é, mão-de-obra braçal, figurou entre seus objetivos, preparando os chamados infelizes da sorte, para a inserção nas recentes indústrias e na vida urbana.

Com base nesse estudo procurei responder algumas questões, a saber: que modelo de educação atenderia aqueles ideais? Como o Estado organizou-se para atingir tal objetivo? Qual o papel do professor no desenvolvimento dessa proposta apresentada como civilizadora?

Ao responder esse questionário, foi possível perceber nos casos examinados que o modelo educativo voltado para a população pobre conjugava instrução elementar e preparo para o trabalho, preferencialmente em internatos, instituições asilares, nos quais, submetida a uma espécie de “confinamento” seria mais eficaz manter a moral do trabalho e da submissão da criança pobre.

GÊNERO E EDUCAÇÃO: O CURSO DE PEDAGOGIA NA UCGI / HISTÓRIA E MEMÓRIA.

Maria Zeneide C. M. Almeda, UCG

A pesquisa busca resgatar os debates em tomo dos cursos de formação de professores, principalmente do curso de Pedagogia, que completou 50 anos de existência em 1999, quando iniciamos esse estudo. O curso de Pedagogia criado em 1949, por iniciativa dos padres Jesuítas, foi reconhecido em 1952, e, passou a ser oferecido pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras, indispensável para se fundar uma Universidade, segundo a legislação na época, concebidas como núcleo inicial -"pedra angular" das Universidades e oferecia a formação de professores. Sendo assim, o projeto de estudo têm como objetivo, recuperar a história da Faculdade de Filosofia e Letras e do curso de Pedagogia da Universidade Católica de Goiás nos últimos 50 anos, bem como reconstruir a história dos professores e professoras em Goiás.O estudo propõe também, em suas análises buscar responder às indagações sobre o magistério como espaço do feminino, num contexto em que "as escolas de formação docente enchem-se de moças, e esses cursos passam a constituir seus currículos, normas e práticas de acordo com as concepções hegemônicas de feminino".(LOURO, 1998:97).Cabe ressaltar, que o conceito de gênero aqui entendido privilegia aquele ligado à produção de identidades múltiplas e plurais, de homens e mulheres enquanto uma construção social que "produzem as formas como as instituições sociais são organizadas e produzidas". (LOURO, 1997:77).A metodologia utilizada é a da documentação e história oral, bem como fontes escritas, periódicas, revistas e fotografias, dando destaque às relações entre memória e trajetória, buscando contribuir para a produção do conhecimento sobre as instituições do Centro -Oeste e de Goiás.

ESCOLA DE ENGENHARIA DE PORTO ALEGRE (1896 - 1934) : HEGEMONIA POLÍTICA NA CONSTRUÇÃO DA UNIVERSIDADE

Marília Costa Morosini; ULBRA/UFRGS e Maria Estela Dal Pai Franco; Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Esta comunicação estuda a Escola de Engenharia de Porto Alegre (E.E.) em seus primórdios - 1896-1922 - e como Universidade Técnica (U.T.) - 1922-1934. A Escola congregava características incomuns para o ensino superior brasileiro à época dominado pelas escolas de formação de bacharéis, inspiradas no modelo francês-napoleônico de faculdades voltadas ao eruditismo e a profissionalização A análise qualifica a E.E. como uma instituição científica ímpar para a época pela sua hegemonia com o Estado do Rio Grande do Sul e pela sua face universitária com aproximações à idéia de universidade moderna, cujas funções privilegiam a pesquisa. Situa a Escola como o pilar do ensino superior no Estado e gênese da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Aponta suas características incomuns para o ensino superior brasileiro à época, identificadas pela interligação entre os diferentes graus de ensino, pela descentralização de suas atividades no estado, pelas funções

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de ensino, pesquisa e extensão, com a divulgação do conhecimento produzido. Destaca os princípios de universidades alemãs e americanas inspiradores da instituição bem como a participação de militares, com concepção positivista Comteana, no período de sua criação. Conclui pela caracterização da Escola de Engenharia de Porto Alegre como instituição construtora da hegemonia do grupo dirigente estatal, apoiado no PRR - Partido Republicano Riograndense, e pela identificação da concordância doutrinária que torna a EE parte instrumental do Estado RS, onde a produção de conhecimento voltada às necessidades da comunidade constituía-se em fator primordial. Esta comunicação é resultante de um projeto apoiado pelo CNPq e pela FAPERGS – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul. Foram utilizados princípios de análise de conteúdo sobre fontes de informação primária (normativas - Estatutos, regulamentos, constituição do Estado, decretos estaduais sobre Ensino Superior, e Reformas Federais de Ensino; e de ocorrências (Relatórios do Diretor, dos Representantes dos Instituto, do Conselho Universitário, do Conselho de Administração, do Conselho de Instrução e da Congregação, Atas do Conselho Escolar, dos Conselhos de Administração, do Conselho Universitário e da Congregação da E.E e Anais da Assembléia dos Representantes) e fontes secundárias (livros, revistas e jornais).

EDUCANDO FIÉIS, MORALIZANDO UM POVO: HISTÓRIA DA AÇÃO EDUCATIVA DE LUTERANOS E CATÓLICOS EM BRUSQUE - SANTA CATARINA

Maria Werner Zen, U. Do Estado de Santa Catarina

Brusque - Santa Catarina - é uma cidade de aproximadamente 80 mil habitantes e 143 anos de fundação. Colonizada por europeus, principalmente por alemães, italianos e poloneses, a cidade cresceu sob o olhar atento das religiões Luterana e Católica. Um olhar não apenas no sentido figurado, mas também no literal, pois as Igrejas fizeram uso da topografia da cidade firmando suas instalações sobre morros no centro da cidade. Cada uma fixou-se em um, ambas com ampla vista da cidade e conseqüentemente de seus moradores. Elas também providenciaram educação à população, ou melhor, aos seus fiéis, abrindo e mantendo escolas confessionais. Os Luteranos iniciaram suas atividades educacionais em 1872, dentro da casa do Pastor, o qual ministrava as aulas para meninos e meninas filhos de imigrantes alemães. Os Católicos, em 1903, fundaram sua Escola Paroquial contando com o auxílio das Irmãs da Divina Providência. Hoje, as duas escolas ainda compõem o cenário educacional da cidade, mantendo o caráter confessional e particular adotados desde a fundação. Focalizar essas duas instituições de ensino ligadas às Igrejas Luterana e Católica e reconstituir a história do processo educativo assumido por essas comunidades, analisando a naturalização de princípios morais, constituem-se nos principais objetos desta investigação. Nos primeiros estudos sobre esses educandários constatou-se quatro princípios morais que estão sendo pesquisados dentro das escolas citadas: os princípios religiosos, políticos, sociais e os voltados ao trabalho. Isto está sendo feito sob uma análise criteriosa de extratos (discursos solenes, hinos, lemas, convites de formatura, regimentos internos, jornais das escolas...) que dêem conta não só de demonstrar uma prática, mas de apresentar o tipo de sujeito que se encontrava e se produzia dentro da escola Luterana e da Católica no decorrer da história de cada uma. Como essas escolas subsidiadas por Igrejas, a partir de seus modos educativos, regulamentaram a religiosidade, a cidadania e o trabalho dentro da cidade de Brusque - Santa Catarina - é a questão a ser analisada. Sendo assim, o objetivo principal deste estudo é reconstituir a memória da moral dessas duas escolas confessionais, fazendo uso de documentos que trazem, implícita ou explicitamente, os princípios religiosos, políticos, sociais e os voltados ao trabalho. Princípios que, de certo modo, formam a trama do discurso e da prática das pessoas dessas comunidades escolares e da cidade. Sujeitos que, em sua maioria, não dão mais conta de saber como princípios morais que veiculam seus meios chegaram a ser aceitos como são.

A EDUCAÇÃO MINEIRA ANOS 60/70

Marilza Abrahão Pires Rezende, Centro Universitário do Triângulo - UNIT/MG

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O tema desta pesquisa situa-se na área da História da Educação e tem como objeto de estudo a análise da política educacional mineira no período de implantação, em nível nacional, das Reformas de Ensino dos anos de 1968 (Reforma do Ensino Superior) e 1971 (Reforma do Ensino Fundamental e Médio - 1º e 2º graus). A análise realizada centrou-se na investigação do contexto histórico no qual emergiu o Planejamento enquanto pretensa forma de direção da História e sua repercussão no processo educacional mineiro das décadas de sessenta e setenta.

Tendo como pressuposto básico que o processo educacional, enquanto prática social deve ser apreendido dentro de cada contexto histórico em que é produzido, procurou-se investigar a problemática educacional mineira presente nas décadas de sessenta e setenta, no contexto mais amplo das transformações pelas quais o Brasil estava passando e que se caracterizou pela emergência do capitalismo monopolista.

Para isto, foi feita uma análise da documentação oficial produzida pela administração estadual mineira e do município de Uberlândia Constituiu-se como pano de fundo desta análise a constatação de que nesse período o Estado brasileiro adotou uma nova concepção de Educação não mais inspirada na qualidade, autonomia, aspirações individuais e na cultura geral, mas em uma concepção cuja ênfase está na quantidade, na eficiência e na produtividade.

O florescimento da Tecnologia Educacional, característica dessa fase, deveu-se principalmente, ao fato de que a redefinição das relações do capitalismo brasileiro com o capitalismo internacional colocou em questão o processo educacional do país.

Com base nesses pressupostos é que se buscou recuperar o processo educacional brasileiro a partir da experiência empreendida pelo Estado de Minas Gerais.

“EDUCAÇÃO ELEVADA À POTÊNCIA” - UM ESTUDO SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO SÉCULO XIX NA CORTE IMPERIAL (1854-1880)

Marina Natsume Uekane, IC/PIBIC/Universidade do Estado do Rio de Janeiro

O objetivo deste estudo é investigar a relação entre a preocupação com a formação de professores e o aparecimento da Escola Normal da Corte, fundada na década de 70 do século XIX. Até este momento a formação de profissionais capazes para atuar no magistério de primeiras letras se fazia por meio da prática, no âmbito da própria escola. Este modelo se assemelhava às antigas oficinas, nas quais os mestres ensinavam o ofício aos aprendizes que, neste caso, eram os chamados professores adjuntos. Vê-se que este possuía um caráter mais artesanal se comparado com o que era proposto pelas escolas normais, pois estas buscavam imprimir à essa formação um caráter mais teórico, isto é, científico.

É importante destacar que esse modelo de formação “escolar”, não foi aceito facilmente pelas instituições ou mesmo pelos sujeitos que antes eram responsáveis pelo preparo docente. Destacar esta tensão nos faz indagar o porquê de uma prática ter sido preferida em favor de outra, refletindo, assim, acerca dos fatores e jogos de relações que permitiram tal aparecimento e urdiram a legitimidade da “escolarização dos professores”. Para tanto, utilizei fontes manuscritas encontradas no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro e um conjunto de leis que normatizavam a Instrução Primária e Secundária, particularmente a escola normal. Entre elas, o Regulamento de 1854, as Instruções para a Escola Normal do Município da Corte de 1874, o decreto nº 6.379 de 1876, o Regulamento de 1879 e o de 1880.

O exame desses documentos evidencia uma tensão existente sobre as melhores estratégias e o modelo mais adequado para formar professores primários, questão presente desde a década de 1830 com a criação da primeira escola normal, instalada na Província do Rio de Janeiro. Na década de 70 vemos algumas ações que demonstram o maior nível de institucionalização deste modelo “escolar” de formação. Em 1874, uma escola normal particular é aberta na Corte e, em 1876, um decreto cria duas escolas normais, uma para cada sexo. Uma correspondência entre as instruções para a escola particular de 74 e o regulamento de 80 pode ser feita, sendo encontradas homologias e diferenças entre esses instrumentos normativos. No que se refere às semelhanças, ambos prevêem: o ensino gratuito para os alunos, sendo a primeira subvencionada pelo governo e a segunda pública; a criação

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de duas escolas anexas para as aulas práticas na parte da manhã, sendo as outras ministradas à noite e a presença de uma Congregação formada pelos professores da escola, que deliberariam sobre os assuntos referentes a ela. Algumas diferenças dizem respeito ao nível de especificidade, pois o segundo regulamento mais extenso e detalhado, incide sobre as normas de funcionamento e currículo da escola, definindo com mais nitidez o padrão desejado de professor.

PROPAGANDA REPUBLICANA E HISTÓRIA EDUCACIONAL PAULISTANA 1875 - 1889

Mário Ferreira de Castro, GT/FE UNICAMP/FIMI

O objetivo deste trabalho é entender como os Republicanos Paulistas fizeram uso da imprensa, manifestando-se em relação à Educação com o objetivo de propagar as idéias republicanas e transformação das bases em que se assentava o regime Imperial, encampando ampla manifestação pela derrubada do Império e pela implantação e consolidação da República no Brasil entre os anos de 1875 e 1889. Através dela a Educação foi concebida como o mais eficiente meio de incorporar e adaptar o indivíduo e sociedade brasileira à sociedade moderna e ao progresso, portanto, através da mesma os Republicanos, no período de transição do Império para a República no Brasil (1870-1889), assumem a defesa da Educação e esta foi objeto de amplos e profundos debates e discursos. Eles discutiam as bases do Movimento Republicano na Província de São Paulo e eram na sua maioria fazendeiros, profissionais liberais e beneficiários dos negócios da grande lavoura cafeeira, representantes da nova classe em ascenção dentro da elite paulista e nacional. Esse grupo representava as novas necessidades e os novos princípios econômicos, políticos, sociais e, inclusive, educacionais. A partir daí, sua atuação e os artigos ao longo do período estudado, abordavam assuntos educacionais que se apresentavam como de interesse nacional e, principalmente, paulista, entre seus autores estavam políticos, intelectuais, homens públicos e educadores. Nesses, geralmente expressavam críticas, identificavam problemas, faziam reivindicações e apontavam sugestões de solução, como por exemplo, os elevados índices de analfabetismo na Província e a necessidade de combatê-la e erradica-lá. A organização e a administração do ensino foram objeto de análise dos mesmos por meio da imprensa ao longo do período em destaque, procurando mostrar, a triste situação em que se encontrava a Instrução Pública. Os artigos noticiados foram capazes de discutir, debater, informar e formar opiniões sobre os principais aspectos que envolveram a problemática educacional nesse período e conclui-se que os Republicanos, no período estudado, apontam a Educação como a única força e instrumento capaz de imprimir civilização ao povo, e ao país. As reflexões aqui desenvolvidas são resultado de nossa experiência de identificação e localização de fontes documentais para o estudo da história da educação brasileira, em particular em São Paulo. Essa preocupação surgiu da própria prática de pesquisa, de estudos (mestrado e doutoramento) e das análises sobre Educação e Imprensa, particularmente entre os anos de 1870 e 1889 no grupo HISTEDBR (FE-Unicamp). Os dados relativos à Educação no Brasil ou vêm se perdendo, pela pouca preocupação com a preservação de nossa memória, ou acham-se de tal maneira dispersos que o acesso às fontes, torna-se extremamente difícil.

O “LIVRO DE CHAMADA” COMO FONTE DE PESQUISA SOBRE A EDUCAÇÃO E A INFÂNCIA EM CRICIÚMA- SC- 1945-1946

Marli de Oliveira Costa, UNESC

Essa comunicação é um dos resultados de um trabalho de pesquisa sobre a história da educação escolar do município de Criciúma, no Estado de Santa Catarina, Brasil. Esse Trabalho de pesquisa é desenvolvido por meio de uma parceria entre a Secretaria Municipal de Educação e a Universidade do Extremo Sul Catarinense-UNESC. A emergência da Educação escolar em Criciúma no início do Século XX até sua metade apresenta duas peculiaridades: a iniciativa dos imigrantes italianos e poloneses em construírem escolas comunitárias para seus filhos/as e as iniciativas das empresas carboníferas da cidade, também na construção de educandários. Esse artigo mostra alguns

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aspectos da educação e da infância em um dos bairros de Criciúma, o Bairro Mina União, por meio de um registro escolar do ano de 1945, pertencente à Escola Reunida Engenheiro Fiúza da Rocha, relacionado com outras fontes. A escola foi construída em uma parceria entre a mineradora estabelecida nesse lugar e alguns “colonos”. Foi mantida pela mesma mineradora em parceria com a Prefeitura Municipal. Durante os trabalhos de coleta de dados encontramos a primeira professora da escola e com ela, guardados em sua residência, vários documentos, livros, fotografias e cadernos de todo o tempo em que fora professora. Entre os documentos O livro de registro diário da freqüência e da avaliação dos alunos e alunas, comumente designado como “livro de chamada”, apresenta-se como um armazenador de informações, um arquivo e como um evocador de lembranças quando tocado e manuseado pela professora que escreveu, em suas páginas, os registros escolares de meninos e meninas que foram seus alunos. O livro e a memória da professora mostram a experiência pedagógica da educadora, a política educacional daquele tempo e as intervenções das Atividades Carboníferas na educação das crianças, filhos e filhas de operários mineiros.

A PARTICIPAÇÃO DA INTELECTUALIDADE CATÓLICA BRASILEIRA NA CONSTITUIÇÃO DA MODERNIDADE EDUCACIONAL DOS ANOS DE 1920

Marlos Bessa Mendes de Rocha, U. Federal de Juíz de Fora

Pretende-se resgatar sentidos da ação político-cultural de pensadores católicos, especialmente Jackson de Figueiredo e Jônathas Serrano, situando-os como protagonistas de eventos que os fazem participar, de forma diferente, de uma geração de críticos republicanos que se antagonizaram com o modelo republicano em vigor na década de 1920 no Brasil. Foi essa geração que constituiu, através de reformas institucionais de educação e de uma produção conceitual, o que se poderia chamar de uma modernidade educacional, bem assim como de novos paradigmas de reflexão sobre o Brasil. Diferentemente de uma historiografia estabelecida que caracteriza o pensamento católico àquele tempo na matriz comum do ultra-reacionário, buscar-se-á entendê-los em sua inserção no contexto crítico republicano, ainda que com matizes diferenciadas, segundo os seus diversos formuladores. As conseqüências dessa matização do pensamento católico não são pequenas, pois leva à percepção de sentidos de ação político-cultural-educacional muito diversos nascidos no seio da catolicidade: do regramento moral que conduz a uma ação educacional tutorial sobre o povo, como ficou patenteado na ação católica no seio da Associação Brasileira de Educação (ABE), até a colaboração católica na reforma educacional do Distrito Federal, na gestão de Fernando de Azevedo (1927-30), que inaugura uma filosofia da educação moderna e inovadora para os parâmetros culturais da época.

A AÇÃO MISSIONARIA E/OU PEDAGÓGICA DA IGREJA CATÓLICA NO NORDESTE D0 BRASIL (ANOS 40/60)

Marlúcia Paiva, DEPED/UFRN/BRASIL

Nesta pesquisa, estudamos programas e projetos educativos desenvolvidos pela Igreja Católica, no Nordeste do Brasil, no período que se estende do final dos anos 40, ao início dos anos 60, período em que ocorreu importante renovação em suas práticas evangelizadora/educativas, com a introdução de novas formas de atuação: de um lado, saindo de "dentro das sacristias", deslocando sua atuação para o meio social, e, de outro, dando maior ênfase ao papel do laicato, que passou a assumir tarefas antes exclusivas ao clero. Estudamos particularmente as nuances de trabalho da Ação Católica, núcleo central da efetivação dessa ação laica inovadora. Estudamos, em particular, raízes comuns entre práticas da Igreja católica francesa e o trabalho desenvolvido pela Ação Católica Brasileira (ACB), quando fica demonstrada uma certa unidade de ação que vinha se delineando em parcela significativa da Igreja Católica em nível mundial. Para fundamentar a primeira etapa de nosso trabalho, pesquisamos em arquivos e bibliotecas de Paris os antecedentes históricos dessa renovação e as possíveis ligações com movimentos renovadores da Igreja Católica francesa, em particular os denominados "prêtres ouvriers", a Mission de France, a Mission de Paris e os movimentos

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especializados da Action Catholique (ACO, JFC, JOC, etc). Também realizamos entrevistas com integrantes do movimento dos "prêtres ouvriers" nos anos 60, em Paris, que ainda exercem as atividades pastorais da Igreja Católica. Por último, observamos, a preocupação comum entre os dois movimentos - no Brasil e na França - com o progressivo distanciamento das classes trabalhadoras das práticas religiosas e a tentativa de superação desse distanciamento com proposições alternativas de enfrentamento ao mundo pós-guerra, dividido entre um "comunismo ateu" e um "capitalismo selvagem".

PROFESSORAS PRIMÁRIAS E PROFISSÃO DOCENTE: PIAUÍ 1960/1970

Marly Macêdo,UFPI

Este trabalho está vinculado a um projeto mais amplo intitulado MEMÓRIAS DE PROFESSORAS PRIMÁRIAS NO COTIDIANO ESCOLAR. O estudo tem como sujeitos professoras primárias que estavam em exercício de sala de aula nas décadas de 60 e 70 do século XX na cidade de Teresina, capital do Piauí, estado da região nordeste do Brasil. O nosso objetivo é discutir o “ser professora”, o ingresso na profissão e sua formação, utilizando suas histórias de vida no contexto escolar.. Assim daremos vez e voz à essas professoras que através de suas memórias expressarão suas experiências e práticas pedagógicas vivenciadas. No entrelaçamento do passado com o presente construiremos um “novo”, com personagens que serão atores e autores da sua própria história. É uma pesquisa de natureza histórica, fundamentada na História Cultural, através de autores como Roger Chartier, Jacques Le Goff, Peter Burke. Ao analisarmos o cotidiano e a cultura escolar, as memórias de professoras, formação, suas práticas pedagógicas, recebemos influências de estudiosos como, Agnes Heller, Michel de Certeau, Denice Catani, Antonio Nóvoa, Dominicé, Cecília Cortez, Amparo Ferro. Enfatizamos, também, Hanna Arendt no intuito de compreendermos o passado, não como uma tradição dogmática, mas num sentido clássico, que transcendeu o seu próprio contexto histórico, portanto rico de informações vivas e reais. Em estudos bibliográficos identificamos a importância da professora primária para o desenvolvimento do país, e sua contribuição para a história da educação brasileira,, bem como a desvalorização dessas profissionais nessa mesma sociedade.. Situações como, ingresso na profissão mais por conveniência do que por consciência, profissão exclusivamente apropriada para mulheres, o que influenciará nos baixos salários, pois, por não ser a provedora da família, não precisa ganhar bem, e muitos outros fatores, contribuíram e ainda contribuem para um quadro degradante do magistério primário da nossa sociedade brasileira. Observamos que, apesar da desvalorização dessa profissão, era a única que oferecia à mulher um destaque especial na sociedade, bem como a sua independência social e econômica. Através desse estudo proporcionaremos oportunidades às professoras de construírem sua própria história através de experiências pessoais e profissionais. Identificaremos também, mudanças ocorridas nos anos 60 e 70 em relação ao contexto escolar atual. Num processo de interação entre pesquisador e pesquisado construiremos uma “nova história”, pois é no fazer histórico, acompanhado de imprevisibilidades, que os sujeitos se tornam os verdadeiros heróis de suas próprias histórias.

TEMPLO DE ATENAS, CASA DE MINERVA, ASSIM NASCEU O COLÉGIO ATHENEU DE NATAL, RN (1832 a 1850)

Marta Maria de Araújo e Eva Cristini Arruda Câmara Barros - UFRN

Substituto do modelo de aulas avulsas de Humanidades pelas residências de professores, alternativo ao modelo dos colégios-seminários, os colégios secundários criados pelos Presidentes de Província, a partir da política de descentralização do Império estabelecida pelo Ato Adicional de 1834, representou, acima de tudo, uma iniciativa destinada a formar uma elite intelectual e dirigente ilustrada. Regido por um modelo escolar de colégio centrado na dimensão cognitiva e formativa das novas geração intelectuais dirigentes, o Atheneu da cidade de Natal, foi inaugurado a 03 fevereiro de 1834 e instalado nas dependências do Quartel Militar, cabendo ao Presidente Basílio Quaresma

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Torreão, um liberal ilustrado, estudioso da História, o cargo de Diretor, que mandou pintar na arcada do Quartel o dístico, o qual dizia: “De Guerreiro Assento Fui Outrora, Hoje D’Aquilo Que Minerva Adora”. O objeto de estudo, o modelo de ensino secundário do Atheneu de Natal, no período de 1834 a 1852, quando da prevalência do primeiro modelo escolar ali adotado, objetiva com base numa variedade de fontes documentais e bibliográficas como estatutos, falas de Presidentes de Províncias, estatísticas e obras referentes ao assunto, refletir sobre as idéias pedagógicas e as práticas escolares inerentes ao modelo de colégio secundário do Atheneu, destinado à formação de uma elite intelectual dirigente no seio provincial. O pressuposto teórico que referencia o estudo é que com a modernidade, e mediante os progressivos avanços das teorizações referentes à educação escolar, os modelos educativos em supremacia nesse começo de século XIX, basicamente estavam referenciados e regulamentados por um tempo, horário, classes, espaço e saberes escolares específicos, donde, como alude Magalhães (1996), a dimensão cognitiva da formação da pessoa humana, tendia a sobrepor-se, reforçando a cultura erudita como principal conhecimento formativo.

TEODORO DE ALMEIDA E A DIVULGAÇÃO DA FILOSOFIA MODERNA - UMA ANÁLISE DA RECREAÇÃO FILOSÓFICA

Marta Mendonça, FCSH- U. Nova de Lisboa

Tanto pela sua dimensão em dez volumes como pelo tempo que demorou em ser integralmente publicada, a Recreação Filosófica de Teodoro de Almeida ocupa um lugar de destaque no panorama filosófico português da segunda metade do século XVIII. A prová-lo está o número de edições que a obra conheceu em vida do autor. Ao mesmo tempo, se outras razões não houvesse, a distância de cerca de cinquenta anos que medeia entre a publicação do primeiro e do último volume, faz desta obra o texto de referência do oratoriano português, que amadureceu o projecto pedagógico que inspira a Recreação Filosófica ao longo de meio século.

Nesta obra - destinada à “instrução de pessoas curiosas que não frequentaram as aulas” - Teodoro de Almeida, além de fazer uma longuíssima apologia da filosofia moderna, enuncia de passagem o elenco de resistências institucionais e pedagógicas que a seu ver se opõem à sua aceitação e difusão em Portugal. A opção pelo estilo dialógico, no qual intervêm um médico, professor e frequentador das aulas da Universidade, defensor dos Antigos, e um Moderno, cujo percurso académico é desconhecido, mas que não teve ou se libertou das influências académicas, e ainda um homem “curioso” que não frequentou a Universidade, é a estratégia escolhida para testar e comparar experimentalmente, por assim dizer, as virtualidades pedagógicas e didácticas dos métodos de uns e de outros.

A obra de Teodoro de Almeida tem sido objecto de atenção crescente e são já relativamente numerosos os estudos consagrados à Recreação Filosófica. Menos atenção tem merecido, como reconhece R. de Carvalho na sua História do Ensino em Portugal, a dimensão pedagógica da reflexão por ele desenvolvida. A presente comunicação visa, por um lado, explicitar o projecto pedagógico que inspira a Recreação Filosófica - a arquitectura do saber filosófico, a sua ordem expositiva, o método de pesquisa e de exposição defendido por ele - e, por outro, identificar as resistências que na opinião do oratoriano impedem a adopção do novo modelo, resistências de que só estão defendidos os que “não frequentam as aulas”.

PRÁTICAS E COTIDIANO ESCOLAR: DAS NORMAS AO APRENDIZADO DA RESISTÊNCIA

Matilde Araki Crudo, FMT

O objetivo desta comunicação é analisar as práticas disciplinares e o cotidiano no interior de uma instituição militar, que funcionou durante a segunda metade do século XIX, em Cuiabá, capital da província de Mato Grosso.

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Trata-se da Companhia de Aprendizes Artífices, criada no Arsenal de Guerra de Mato Grosso, em 1842, pelo governo imperial, com o objetivo de recolher meninos pobres e órfãos para dar-lhes a instrução básica e ensinar-lhes um ofício.

Esta comunicação pretende demonstrar que, além da inserção no processo de trabalho e da educação formal, os menores foram submetidos a outros esquemas de disciplinarização entre os quais a prática de internação, controle do tempo, vigilância, controle dos corpos e castigos físicos.

No entanto, observando-se o cotidiano da instituição, percebe-se que a análise das normas disciplinares acaba por revelar o seu contrário: a prática da resistência.

Assim examino inicialmente os instrumentos legais de disciplinarização, ou seja, os regulamentos que regiam o cotidiano do Arsenal, tendo claro, como afirma Michele Perrot, que a análise do regulamento não é suficiente para dar conta da vida cotidiana da fábrica ou da oficina. Parto do pressuposto de que normas e práticas de controle devem ser compreendidos como tentativas das autoridades de prevenir ou conter atos latentes ou explícitos de resistência de crianças e trabalhadores à disciplinarização - contrária a seus modos de vida.

Demonstro que a análise dos regulamentos e de outras disposições formais para disciplinar a população livre não é suficiente para compreender o cotidiano do Arsenal de Guerra. Trabalhadores, livres e escravos, adultos e infantis, resistem à imposição da disciplina de diversos modos, provocando novos e mais sofisticados mecanismos de controle, que por sua vez geram novas formas de resistência, num processo dinâmico difícil de ser traduzido em categorias formais.

A inserção direta dos meninos no processo de trabalho permitiu-lhes a aprendizagem das habilidades, atitudes e comportamentos necessários ao trabalhador disciplinado, mas possibilitou-lhes, por outro lado, a observação e assimilação de procedimentos considerados negativos pelas autoridades.

As fontes utilizadas nesta pesquisa são os relatórios do Ministério da Guerra e a correspondência avulsa entre o Arsenal de guerra e a Presidência da Província. Embora oficial, a documentação permite captar o rico cotidiano da instituição militar e o que está subjacente ao discurso da autoridade: por exemplo, na reclamação contra um funcionário, uma divergência de ordem partidária; na denúncia de indolência contra os trabalhadores, as atitudes de resistência à disciplina.

A ACADEMIA NORTE-RIO-GRANDENSE DE LETRAS COMO OBJETO DE ESTUDO E ACERVO DOCUMENTAL

Marlene da Silva Mariz, UFRN

As Academias de Letras ao lado dos Institutos Históricos e Geográficos congregam em seus quadros intelectuais voltados à preservação da história e da memória social local e nacional. Desde o século XVIII, no Brasil, existe um movimento para aglutinar intelectuais em torno de instituições culturais, espécie de canais abertos à difusão literária de suas produções e de trocas culturais. Assim ocorreu na Bahia em 1724 quando da criação da “Academia Brasílica dos Esquecidos” e no Rio de Janeiro em 1786 com a fundação da “Sociedade Literária do Rio de Janeiro”. No século XIX, na Bahia, era implantada em 1818 a “Real Sociedade Bahiense dos Homens de Letras” e no Rio de Janeiro em 1838 o “Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro”. E em 1896 era erguida a Academia Brasileira de Letras também no Rio de Janeiro. No Rio Grande do Norte, a Academia Norte-Riograndense de Letras foi fundada em Natal, capital do Estado Rio Grande do Norte, a 14 de novembro 1936, por iniciativa de Luis da Câmara Cascudo, Henrique Castriciano e Aderbal de França, formada então por 25 patronos.

Portadora a Academia Norte-Riograndense de Letras de um notável acervo documental e bibliográfico, constituído pela própria Revista da Academia, por arquivos particulares como o de Manoel Rodrigues de Melo, Presidente dessa “Casa de Cultura” (1955 a 1976), Revistas das demais Academias de Letras do Brasil, publicações de seus acadêmicos, obras raras de história, geografia, literatura, política, economia, direito, documentos manuscritos, dentre outros, reverteu-se no interesse dos pesquisadores integrantes da Base de Pesquisa Estudos Histórico-Educacionais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, de torná-lo objeto de pesquisa histórica e acervo documental para a história da educação e da cultura brasileira e do Rio Grande do Norte. O objetivo da pesquisa

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compreende por um lado, reescrever a história da Academia Norte-Riograndense de Letras entre 1936 a 2003, por outro, divulgar por meio de novas tecnologias digitais, com o critério temático-cronológico, o conjunto da documentação e bibliografia nela existente, com fins de auxiliar na investigação da história da educação e da cultura brasileira. Do ponto de vista metodológico adotou-se o vetor sugerido por Boto (2002), o qual cabe ao historiador agir pelo “encontro de seu repertório temático, teórico e metodológico com a apropriação de um outro repertório, que corresponde à narrativa do próprio objeto investigado; objeto que inevitavelmente revela o filtro de um determinado olhar, de um modo de observar, de uma certa forma de ver: singularidades apreensíveis por ângulos coletivos, em alguma medida, mas também por lentes singulares e pessoais”. Desses encontros viabilizam-se outros encontros entre pesquisadores e fontes documentais.

INSTRUÇÃO PÚBLICA EM MATO GROSSO: A CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO DE NAÇÃO

Marlene Flores Souza – UFMT, XAVIER, Ana Paula da SIlva - UFMT

Para elaboração da discussão proposta nesta comunicação, recortou-se uma temática que faz parte do projeto de pesquisa que está sendo desenvolvido no interior do Grupo de Pesquisa em História da Educação na Universidade Federal de Mato Grosso, Pós-graduação em Educação, tem como tema central o estudo e análise dos discursos proferidos pelos Presidentes da Província de Mato Grosso, nos Relatórios à Assembléia Legislativa Provincial na parte relativa a Instrução Pública (1835- 1860). Para o presente trabalho analisoou-se a idéia de Nação construída pelo discurso da instrução pública através do Presidente da Província de Mato Grosso, Antônio Pedro de Alencastro, no ano de 1836. Nesse discurso verificou-se a significação dos movimentos dos sentidos de felicidade, construindo o imaginário de nação pela instrução pública. A partir dessa afirmativa levantou-se a seguinte questão que nortea a discussão proposta: quais os significados produzidos no discurso do Presidente da Província de Mato Grosso sobre a relação instrução pública e nação? Para ancorar a discussão utilizou-se do campo histórico, que fundamentou o contexto histórico e o modo pelo qual se construíram os sentidos de nação no século XIX, junto a essa perspectiva histórica instaurou-se um lugar teórico para a discussão, que teve como suporte metodológico a Análise de Discurso francesa, cuja filiação teórica principal se inicia nos anos 60 com Michel Pêcheux, ocupando-se da questão dos significados discursivos, que toma como objeto de estudo o discurso.

A análise desse discurso mostrou um movimento de sentidos que se opõe entre o termo público/privado, cidadão/Estado , são significações que se sobrepõem e limitam o sentido de individual descrito no discurso, felicidade individual, que é apagada para dar lugar ao Estado. Felicidade cultivada e inculcada no/pelo discurso da instrução pública, assim os sentidos de unidade e homogeneidade vão configurando o discurso de nação. Concluiu-se que os sentidos de nação no Brasil se constituíram no século XIX, a partir, de uma suposta institucionalização de unidade moral, legal e cívica construída num lugar de significação, a escola. Foram processos educacionais como o de educar; com sentidos de construir novos hábitos, adquirir princípios éticos e morais e instruir; princípios mais científicos de ensinar com propósitos mais livrescos (uso de manuais didáticos) que permearam a noção de nação no século estudado.

AS MULHERES QUE O CORONEL TEMIA.

Marlene Gonçalves, Universidade Federal de Mato Grosso.

Esta comunicação faz parte do nosso projeto de pesquisa de doutorado: Coronelismo e Educação em Santo Antônio de Leverger 1900 – 1950. Santo Antônio de Leverger é uma pequena cidade próxima de Cuiabá, a capital do Estado de Mato Grosso. A história da referida cidade esta ligada a história das usinas dos engenhos de açúcar, transformados em usinas a partir da última década do século XIX,

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funcionando até 1950. Os proprietários dessas usinas eram os coronéis, que comandavam suas usinas, como um território independente do poder Judiciário do Estado, com suas leis próprias instituídas pelo proprietário – coronel, a quem cabia julgar e punir aqueles que as infligisse. Cada usina tinha seu armazém onde os trabalhadores eram obrigados a comprar os produtos de primeira necessidade. O coronel era temido pelos trabalhadores devido a aplicabilidade de sua lei: os castigos que as vezes levava a morte. Em uma dessas usinas, conforme nos mostra os depoimentos, o coronel jamais castigou, ele mesmo, ou deu ordem para o encarregado castigar duas mulheres: uma que “sabia umas oração braba” e a outra uma boliviana com menos de um metro e meio de altura, que andava com um canivete no bolso do vestido (era proibido usar qualquer tipo de arma em todas as usinas), bebia aguardente, trabalhava na cozinha da Casa- Grande, residência do coronel. Essas duas mulheres nunca foram levadas, a força quando por ventura faltavam ao trabalho, as demais mulheres quando estavam doentes o encarregado entrava em suas casas e as levava puxando-as pelos cabelos para o trabalho. Os depoentes dizem que o “coronel dizia que se arrepiava quando chegava perto dessas duas mulheres”.

CORPOS DÓCEIS: A EDUCAÇÃO FÍSICA E A CULTURA CÍVICA DO ESTADO NOVO BRASILEIRO (1937-1945)

Mauricio Barreto Alvarez Parada, PUC-Rio

A década de 1930 representou uma mudança nas concepções sobre o corpo e nas práticas corporais como até então eram concebidas no Brasil. Apesar dos freqüentes debates promovidos por médicos e pedagogos, não havia uma política pública direcionada para a questão. Com o advento do Estado Novo, em 1937, multiplicaram-se as intervenções sobre o corpo do “homem brasileiro” e o Ministério da Educação e Saúde foi uma das instituições mais ativas na produção de projetos nesse campo. Esse trabalho faz uma análise dessas transformações a partir da introdução do ensino da Educação Física nas escolas brasileiras e da organização da Divisão de Educação Física subordinada ao Ministério da Educação e Saúde.

Em 1931, a Reforma Francisco Campos introduziu a obrigatoriedade da prática de exercícios físicos em todas as classes do ensino secundário; em janeiro de 1937, a reforma do Ministério da Educação e Saúde fez surgir a Divisão de Educação Física, subordinada ao Departamento Nacional de Educação. Com a Constituição de 1937, a educação física - incluindo a formação desportiva - tornou-se obrigatória em todas as escolas primárias, normais e secundárias. Para a realização deste atributo constitucional a DEF passou a ser um dos principais órgãos federais a produzir diretrizes políticas para a prática desportiva na escola.

Médicos higienistas e pedagogos escolanovistas, entusiasmados com a capacidade civilizadora da prática escolar, encontraram na reflexão sobre a educação física um ponto comum nos seus projetos de regeneração da “raça”. As perspectivas civilizacionais oferecidas pela educação física fascinaram alguns médicos e educadores desde início de século XX, produzindo uma versão científica e civil para a abordagem da disciplina, na qual a psicologia infantil, a sociologia, além da pedagogia e das ciências médicas cruzavam-se, criando um fértil campo de saberes. Os técnicos que formaram os primeiros quadros da Divisão de Educação Física do MES emergiram desta configuração específica do campo.

Assim sendo, a preocupação com a formação do homem nacional, presente nos principais debates da época, foi transposta através da prática desportiva e da educação física para a sala de aula tornando-se um fator importante na construção dos corpos dóceis necessários ao projeto autoritário do Estado Novo.

CADERNO DE PESQUISA DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA DA CIDADE DE CRICIÚMA PARA AS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL

Maurício Ruiz Câmara, Mestre em Geografia, professor nos cursos de graduação em Geografia e em Pedagogia da Universidade do Extremo Sul Catarinense–UNESC, Santa Catarina, Brasil.

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Marli de Oliveira Costa, Mestre em História, professora nos cursos de graduação em História e em Pedagogia da Universidade do Extremo Sul Catarinense–UNESC, Santa Catarina, Brasil.

Essa comunicação mostra o desenvolvimento de um projeto solicitado pela Secretaria Municipal de Educação de Criciúma, Santa Catarina-Brasil que tem por objetivo pesquisar, produzir, publicar e socializar um material pedagógico que leve a construção dos conhecimentos histórico e geográfico sobre a cidade de Criciúma para serem utilizados pelos professores nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. A partir das fontes empíricas coletadas nos arquivos pesquisados e cotejadas com as discussões teórico-metodológicas da Geografia Crítica e da Nova História, foram definidos e desenvolvidos os temas e as atividades de pesquisa. Para produzir o material foram pesquisados os arquivos públicos do Sul do Estado de Santa Catarina e de Florianópolis, bem como alguns arquivos particulares de pessoas da cidade. Foram realizados levantamentos bibliográficos sobre o município em bibliotecas universitárias e órgãos públicos. Ao organizarmos os eixos de discussão do caderno criamos temas que evocam alguns problemas particulares de Criciúma como, por exemplo: os lugares da cidade, a cidade e a vida cotidiana, o trabalho das pessoas na produção da cidade, as atividades econômicas na organização do espaço, os desafios da cidade, entre outros. Os temas serão problematizados e historicizados, bem como devem encaminhar a pesquisas e a construção de conceitos nas respectivas áreas do conhecimento. As atividades propostas estarão embasadas em pesquisas científicas e por objetivos, respeitando os níveis que se destinam. O Caderno de pesquisa pretende: incentivar a pesquisa; capacitar o/a professor/a para abordar fontes de pesquisa; reconhecer uma fonte histórica; reconhecer uma fonte geográfica; oportunizar momentos de reflexão aos professores sobre as categorias usadas pelas disciplinas de Geografia e História e trabalhar de forma interdisciplinar, envolvendo outras áreas do conhecimento.

O DESENVOLVIMENTISMO DE JK, A CONSTRUÇÃO DE BRASÍLIA, A IGREJA E A CRIAÇÃO DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

Maurides Macêdo, UCG/UFG

A mais antiga Universidade do Centro Oeste é a Universidade Católica de Goiás, criada em 17 de outubro de 1959, pelo Decreto Presidencial no. 47.041, como Universidade de Goiás que pelo Decreto .68.917 transformou-a em Universidade Católica de Goiás.

Como várias outras universidades brasileiras, a UCG constituiu-se a partir da reunião de Institutos e Faculdades isolados. Mais precisamente, nasceu do agrupamento de seis faculdades: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras; Escola de Enfermeiras do Hospital de São Vicente de Paulo; Faculdade de Ciências Econômicas; Faculdade de Serviço Social; Escola de Belas Artes, a partir da qual criou-se o curso de Arquitetura; Faculdade de Direito da Sociedade Goiana de Cultura.

Sua fundação deu-se, todavia, dentro de uma estratégia política da Igreja Católica de Goiás, de consolidação e ampliação de influência política, de sacralização da sociedade e do estabelecimento de um novo pacto com o Estado mediante uma NeoCristandade. Foi concebida a partir do projeto idealizado pelo Estado e Igreja Católica de uma Universidade do Brasil Central que seria composta por instituições de ensino superior federais, estaduais e particulares. Como tal universidade não vingou, a Arquidiocese de Goiânia partiu para a fundação de sua própria universidade, a Universidade de Goiás.

Nosso estudo procura mostrar a criação da Universidade Católica de Goiás inserida dentro de um processo maior: O Desenvolvimentismo de JK e a construção de Brasília. Com relação a metodologia, trabalhamos com a história oral, tendo como suporte a memória de alguns sujeitos dentre os muitos que construíram a UCG. Utilizamos também vários tipos ou espécies de documentos, tais como: atas das faculdades, anuários, boletins informativos, relatórios documentos da secretaria geral, estatutos, consulta de periódicos (jornais, revistas); Leis, Resoluções, Portarias.

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IMPRENSA PEDAGÓGICA: A PROPAGANDA COMO ESTRATÉGIA DE IMPLANTAÇÃO DE UMA ESCOLA NOVA EM MINAS GERAIS (1929-1932)

Maurilane de Souza Biccas, P/SP

Analisar a produção de um discurso pedagógico para professores e diretores a partir de uma revista requer considerar determinadas relações de sua própria produção e confecção; condicionadores, por exemplo, da proposta editorial. O fato da Revista do Ensino ser um impresso pedagógico oficial pressupõe que traços das políticas educacionais mineiras estarão sempre presentes em suas páginas, por meio de estratégias e mecanismos que poderiam ser considerados periféricos, mas que, neste caso, são fundamentais para perceber a composição e transmissão de mensagens que se pretende divulgar e inculcar.

O objetivo deste artigo será analisar como os anúncios publicitários, enquanto textos que compõem o suporte material do impresso pedagógico mais importante de Minas Gerais, constituíram-se como elementos fundamentais de difusão e disseminação dos novos princípios, diretrizes e mudanças que se pretendiam impor às escolas públicas mineiras no período de 1929-1932.

O VII CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO: DISPUTAS DE PODER E SOLUÇÕES NEGOCIADAS NA PRODUÇÃO DE UM MODELO PEDAGÓGICO PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA

Meily Assbú Linhales, UFMG

A cidade do Rio de Janeiro acolheu, no período de 23 de junho a 07 de julho de 1935, o sétimo e último congresso realizado pela Associação Brasileira de Educação-ABE, cujo tema central foi a Educação Física. A importância de analisar este evento reside na possibilidade de conhecer e compreender os diferentes projetos que, na época, se expressaram para a educação física brasileira. Planejado a partir de uma trama política que envolveu o governo federal, o governo do Distrito Federal, os educadores agregados à ABE, as instituições esportivas e os militares, este certame apresentou-se como um campo de lutas de representações. Tanto os processos que redundaram na sua organização que incluiu grandes paradas cívicas e esportivas, demonstrações de ginástica, sessões de canto orfeônico e visitas a escolas da cidade como as teses defendidas durante as duas semanas de atividades, podem revelar diferentes doutrinas e projetos pedagógicos para a educação do corpo, tanto na escola como fora dela. Os modelos e métodos de ensino de Educação Física que circularam no evento e os projetos socializadores neles subjacentes, provocaram debates e disputas de poder. Há neles indícios de diferentes dispositivos escolares para a educação do corpo e do movimento, que merecem investigação. O Regulamento n. 07, também denominado Método Francês, já vigorava desde 1931 como método oficial de ensino da Educação Física, e como expressão do que os militares denominavam de sua unidade de doutrina. Sua imposição produzia resistências e propostas alternativas entre educadores civis que afirmavam ser o caráter militar da educação física um grande erro...um desvirtuamento dos fins educacionais. Os Anais do VII Congresso, as correspondências emitidas e recebidas pelos dirigentes da ABE durante o período de preparação do evento, as informações que circularam na Revista de Educação Física (Órgão oficial de divulgação de Escola de Educação Física do Exército) e os jornais que na cidade do Rio de Janeiro notificaram as repercussões do evento, constituem as fontes deste trabalho. Analisadas em uma relação de complementaridade, podem expressar a complexidade dos arranjos que tentaram negociar soluções e acomodar interesses frente às circunstâncias de distribuição hierárquica e desigual de poder, no governo da chamada Revolução de 1932 que prepara a trama política e institucional do Estado Novo. Este estudo, em andamento, é parte de minha pesquisa de doutoramento que, ao investigar a constituição de uma forma escolar para o esporte no Brasil, parte da hipótese de que esta teria sido uma produção negociada por diferentes atores e grupos de interesse, em especial os educadores, os esportistas e os militares, que realizaram suas escolhas e acomodaram seus modelos pedagógicos às contingências políticas e culturais de seu tempo.

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O PAPEL DO COLÉGIO NOSSA SENHORA DE LOURDES NA FORMAÇÃO DA ELITE FEMININA

Miguel André Berger, U. Federal de Sergipe

O presente estudo visou resgatar a trajetória e atuação do Colégio Nossa Senhora de Lourdes, mantido pela Ordem das Irmãs Sacramentinas, um dos principais redutos da Educação da elite feminina em Sergipe. O sistema educacional brasileiro, além do caráter seletivo e excludente, restringiu durante muito tempo o acesso da mulher à educação. A aprendizagem da leitura e da escrita eram suficientes, havendo estabelecimentos e currículos diferenciados para homens e mulheres. Essa educação diferenciada decorria dos papéis definidos para cada sexo e dos preceitos católicos, muito influentes na sociedade brasileira. Para evitar a influência das idéias protestantes, que vinham ganhando terreno no Brasil e em Sergipe, bem como contribuir para a formação dos jovens das classes dominantes, a igreja católica procurava via do ensino, moldar consciências e retomar o poder. Contrária às escolas mistas, várias ordens religiosas vão criando colégios, muitos dos quais funcionando como internato, onde além de instruir, tinham oportunidade de exercer uma influência maior sobre o caráter do educando, reforçando a educação recebida no seio da família (REICH, 1989). Além das normas e regras impostas para a inibição dos instintos, a modelagem de formas de agir e adoção de uma atitude de submissão, as instituições também utilizam vários mecanismos de poder, com o intuito de vigiar o comportamento cotidiano das pessoas, sua identidade, seus gestos e atitudes (FOUCAULT, 1987). Baseando-se nessas colocações, centramos nosso estudo no Colégio Nossa Senhora de Lourdes, fundado em 1904, que passa a oferecer o Curso Normal, a partir de 1932. Este estudo teve como finalidades: 1) caracterizar os objetivos e princípios morais e pedagógicos defendidos pela Ordem das Sacramentinas; 2) reconstruir a trajetória histórica do Curso Normal mantido pelo Colégio, e, 3) analisar o funcionamento e a prática pedagógica, visando a formação do caráter. As informações foram obtidas através do uso das técnicas de análise documental e entrevistas, privilegiando também as fontes iconográficas. O estudo revelou o desenvolvimento de uma prática pedagógica e avaliativa pautada nos moldes do ensino tradicional, a participação das alunas nas atividades didáticas, nas festas religiosas e cívicas bem como suas formas de resistência ao sistema de controle a que estavam submetidas para preservação do ideário católico conservador.

A EXPANSÃO DAS INSTITUIÇÕES CATÓLICAS, O ENSINO SUPERIOR EM GOIÁS E O DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS: HISTÓRIA E MEMÓRIA

                  Miguel Rosa dos Santos, Universidade Católica de Goiás

Trata-se de uma dissertação de Mestrado em Educação, defendida e aprovada na Universidade Católica de Goiás (UCG), em novembro/2003. Resumidamente, o conteúdo da dissertação aborda a introdução do ensino superior no Brasil, desde a contribuição dos Jesuítas a partir de 1550. Ao lado da iniciativa do Estado, evidencia-se o ensino superior católico no Brasil. Destaca-se a criação e trajetória do Curso de Ciências Econômicas. O surgimento das primeiras Faculdades/Universidades e a criação da Faculdade de Ciências Econômicas de Goiás em 1950, à qual, ao lado de mais 06 Faculdades, irão formar a Universidade Católica de Goiás, em 1959 (sendo que a UCG é a primeira universidade criada no Centro-Oeste brasileiro). Utilizando fontes orais, foram entrevistados 15 (quinze) pessoas ligadas direta e indiretamentemente à Faculdade, onde buscou-se refletir questões vivenciadas pela mesma nesses mais de 50 anos de existência, como: a importância do Curso de Ciências Econômicas da UCG; a qualidade de ensino; a importância da pesquisa; os reflexos da Lei nº5.540/68 e a departamentalização; o papel das avaliações interna e externa; o fechamento do turno matutino do Curso e, por último, a demanda pelo Curso.

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CONHECIMENTO PEDAGÓGICO E ESCOLA: UM EXAME A PARTIR DA REVISTA BRASILEIRA DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS

Milena Colazingari da Silva, U. S. Paulo

Compreendida enquanto instância privilegiada para estudos acerca da profissão docente e dos diferentes momentos de organização do campo educativo - enquanto espaço de lutas - a imprensa periódica educacional possibilita que se verifique, por meio da análise do discurso veiculado pelos diferentes atores educativos - professores, alunos, Estado ou instituições (sindicatos, Igreja, etc.) - que a produz, diferentes práticas e saberes relacionados à vida escolar.

Inserida no campo historiográfico da História Cultural dos saberes pedagógicos, interessa observar os processos de produção, circulação e apropriação desses saberes. Essa modalidade de história cultural toma o impresso como objeto de investigação, interessando-se pelas práticas que o produzem e pelos usos que são feitos dele. Empregando Michel de Certeau e seu conceito de apropriação, pode-se evidenciar a complexidade da relação entre os modelos pedagógicos e seus usos, sendo esta passagem o ponto central de interesse analítico de uma história cultural dos saberes pedagógicos.

Nessa perspectiva, tomando como fonte nuclear da investigação a Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, o presente estudo objetiva caracterizar a produção e difusão do conhecimento pedagógico por meio do exame dos artigos que veiculam conhecimento científico sobre educação, em busca dos fundamentos teóricos que estabeleceram as bases do modelo da escola de massas (escola obrigatória, escola para todos, etc.) no Brasil. Pretende-se compreender a maneira pela qual o conjunto dos discursos científicos difundidos pelos especialistas (pedagogos, técnicos de organizações internacionais, etc.), mediante a elaboração de um saber especializado, estiveram historicamente ligados à produção de políticas e reformas do ensino.

Por meio de leituras dos artigos do periódico em questão, nota-se que a reforma educativa é marcadamente pensada diante da comparação da estrutura do ensino nacional em relação às experiências pedagógicas estrangeiras. Assim, no quadro de uma sócio-história do conhecimento pedagógico especializado, a pesquisa observa a construção do discurso especializado a partir da articulação de fatores internos e externos ao território educativo, uma vez que desejamos equacionar as relações de preferência e de afinidade com outras comunidades científicas disciplinares, isto é, a forma como os grupos nacionais se confrontam com as modelizações mundiais.

No caso brasileiro, podemos destacar os acordos MEC - USAID que evidenciam o papel das agências internacionais , por meio de guias de desenvolvimento educativo, como autoridades de um conhecimento científico atuando sobre os modos de pensar e agir em educação; determinando práticas e políticas reformadoras relativas à expansão do ensino.

POLÍTICAS PÚBLICAS, MÚLTIPLOS INTERESSES: ORMAÇÃO PROFISSIONAL DE TÉCNICOS AGRÍCOLAS (BRASIL, 1950-1980)

Milton Ramon Pires de Oliveira,Universidade Federal Viçosa

O artigo enfoca a trajetória de uma instituição de ensino voltada para a formação de técnicos agrícolas de nível médio. Inscreve o Colégio, desde a sua criação na década de 1950, entre as demandas estimuladas pela implementação de políticas públicas voltadas para a agropecuária, destacando aspectos que ganharam expressões na instituição e que tinham suporte nas condições que subsidiavam a execução das políticas públicas. A inserção do colégio num campo composto por várias instituições, responsáveis pelo gerenciamento e realização das políticas públicas, propiciou que à instituição educacional fossem agregados recursos vários, os quais viabilizavam a formação de técnicos. Os profissionais de nível superior, com presença marcante nas instituições desse campo, tinham no colégio um espaço de reprodução e de consagração do saber científico voltado para a agropecuária, bem como de disputa entre projetos fundados em perspectivas diferentes: a

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monocultura e a diversificação agrícola. Tal disputa ganhava expressão e materialidade em vários momentos da trajetória institucional.

No início da década de 1970, uma reforma educacional levou a modificações na vinculação do Colégio ao governo estadual, ocorrendo a transferência da instituição da secretaria de agricultura para a secretaria de educação. Este processo trouxe a alteração da posição do Colégio no campo de forças sociais no qual estava inserido, ao acarretar a entrada de novos agentes, a exclusão e a reordenação na posição de outros tantos já situados como mediadores.

O fato de tomar um colégio para percepção da relação desta instituição com a sociedade envolvente, propicia-me deslocar o debate para uma análise mais geral deste campo de relações e perceber a ação objetiva dos agentes sociais responsáveis pelo processo de criação e constituição do referido educandário. E mais, por esta perspectiva, valorizar as visões de mundo, as representações, os projetos sociais, os acordos e confrontos em torno de várias frentes de disputa por reconhecimento e obtenção de recursos, para se entender os desdobramentos verificados na prática social do referido colégio. Em resumo, pensar a relação entre escola e sociedade através de campos sociais específicos em torno dos quais gravita a existência de uma instituição ou de jogos de força que dão sustentação à criação e manutenção do colégio.

ALTERIDADE, PODER E RESISTÊNCIA: AS REPRESENTAÇÕES DE PRÁTICAS DEMOCRÁTICAS NOS COLÉGIOS DE APLICAÇÃO

Miriam Abduche Kaiuca, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Os Colégios de Aplicação criados no Brasil a partir do Decreto-Lei 9053 de 12/03/1946, são instituições públicas de educação básica ligadas às universidades. Esta pesquisa teve como objeto de estudo as representações que os professores do Ensino Fundamental dos Colégios de Aplicação (CAps) constróem sobre a escola pública. Adotou-se como campo de investigação os Colégios de Aplicação da Universidade Federal do Rio de janeiro -UFRJ, criado em 1948 e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro -UERJ, criado em 1957. Historicamente, estes colégios ficaram conhecidos como “escolas diferentes” e como “escolas de qualidade” dentro da rede pública de ensino. O objetivo desta investigação foi não só o de apreender a dinâmica de construção das representações de uma escola democrática, procurando verificar suas motivações históricas, as ideologias que as sustentam e as mudanças que sofreram ao longo do tempo, como também pretendeu provocar a reflexão frente à democratização do ensino e das escolas. Atualmente, o processo seletivo por sorteio público dos alunos das classes de alfabetização, em ambos os colégios, aboliu o recrutamento que era apoiado em provas intelectuais. Esta decisão foi assumida como mecanismo de rompimento com o caráter elitista dos Colégios de Aplicação. Utilizou-se como dispositivo teórico os conceitos de democracia contemporânea, democracia escolar e cidadania, com base nas contribuições de Sartori, Tourraine, Bobbio, Forquim, Bourdieu, Benevides; como dispositivo analítico, a teoria da análise do discurso (AD), apoiado em Orlandi; como condição de produção do discurso da escola democrática, o panorama histórico e sócio-educacional dos colégios, representado por um segmento dos atores educacionais: os professores. No cruzamento dos discursos surgiram as categorias norteadoras para análise dos resultados: alteridade, poder e resistência. As representações docentes sobre a escola democrática articularam-se ao projeto de educação que está em curso dentro dos CAps ou já foi implantado em cada conjuntura histórica, projeto esse que corresponde ao referencial de escola pública, democrática e de qualidade. Conclui-se que a educação democratizante não pode basear-se em qualquer noção a-histórcia e transcendente da verdade ou autoridade, sendo um lugar de tensão informado pelas concepções ideológicas de poder, política e comunidade. Foram encontradas três representações significativas: um grupo de professores que pretende conservar o adquirido, mantendo as raízes de uma escola elitista na sua forma excludente; um outro que se apoia no pensamento de nem todos os alunos podem e precisam ter a mesma instrução e um terceiro grupo de professores que apresenta uma representação de que é possível implantar um projeto educacional que avance para o reconhecimento do outro e de sua integração na vida escolar e social.

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ESTRATÉGIAS PARA ENDEREÇAR... POR UMA POLÍTICA DE CAPACITAÇÃO DE PROFESSORES – OU OS SEDUTORES ESTÍMULOS E RECOMPENSAS PARA QUE PROFESSORES ASSUMAM POSIÇÕES DE GÊNERO, STATUS SOCIAL, ATITUDE, ESTILO, GOSTO...PARA DEPOIS ENSINAR.

Mirian Dolores Baldo Dazzi

Nesse estudo problematizo as pedagogias empregadas pelo Estado para capacitar professores em relação à temática sexualidade/HIV/AIDS, a partir do campo dos Estudos Culturais, principalmente aqueles que se aproximam da perspectiva pós-estruturalista e que incorporam algumas contribuições de Michel Foucault acerca do discurso e da constituição do sujeito. O corpus de estudo foi uma série de vídeos educativos produzidos, editados e veiculados pelo Governo, Coordenação Nacional de DST/AIDS- Ministério da Saúde em parceria com o Ministério da Educação do Brasil, que constituem o Programa Prevenir é sempre melhor, com o objetivo da capacitação de professores. Este trabalho trata dos movimentos que empreendi, especialmente, em encontrar respostas para a pergunta: para quem foram produzidos os vídeos que integram a série Prevenir é sempre melhor que tratam da AIDS? Essa pergunta é semelhante à que foi enunciada por Ellsworth (2001) para discutir como as “educadoras podem ser educadas” pela noção dos modos de endereçamento utilizada nos estudos de cinema. Penso ser possível dizer que, através desses programas e projetos como esse que estudei, o Governo exerce ações de governamento dos corpos, utilizando-se desse espaço-tempo para ensinar. A produção desses dispositivos pedagógicos é uma das formas escolhidas pelo Governo para legitimar alguns saberes, bem como para dar destaque a algumas formas de proceder relativamente à saúde, valendo-se de artefatos de massa configurados como mais produtivos para o alcance mais rápido e econômico de seus propósitos.

A instância cultural em que empreendi este estudo mostra-se desafiadora exatamente por constituir-se ora como um "recurso técnico" de Governo em relação à capacitação dos/das professores/as prevendo à distância, ora como "recurso pedagógico" para dar sustentação ao debate com os/as professores/as ora, ainda, como "possibilidade" de a família/comunidade "entreter-se e aprender".

A importância crescente dada à formação contínua de professores/as está marcada em muito outros documentos oficiais que destacam a criação de programas do Governo que se utilizam de dispositivos tecnológicos principalmente nas últimas décadas. Isso reforça o mito de que a atualização de conhecimentos e das competências dos/das docentes é necessária para atender às novas e ágeis demandas que se percebem nos espaços educativos. A formação continuada passa, a ser, então, a tônica do discurso oficial, que busca “mudar” a educação e, ao mesmo tempo, atender às demandas de formação e de atualização, sendo estas definidas como importantes ações para “mudar” a educação – e, neste caso, para mudar também as práticas relativas a saúde.

UMA ESCOLA DE APRENDIZES ARTÍFICES PARA MATO GROSSO

Nádia Cuiabano Kunze, UFMT/CEFETMT

Este trabalho é parte da pesquisa de mestrado, no campo da História das Instituições Escolares, integrada ao Programa de Pós-graduação do IE/UFMT, cujo objeto de estudo é a Escola de Aprendizes Artífices de Mato Grosso – EAAMT, de 1909 a 1937, período de sua existência. Nesta comunicação, buscou-se compreender o processo de sua implantação em 1909/1910. Foram consultadas fontes documentais (legislação, regulamento, editais, relatórios, correspondências, notícias de jornais, elementos iconográficos e registros em geral) e bibliográficas localizadas em arquivos, bibliotecas e sites nacionais e internacionais da internet. A análise partiu da consideração de que a instituição esteve integrada a um sistema educativo e envolvida no quadro de evolução de determinada comunidade, região (MAGALHÃES, 1996), de que foi local de projetos arquitetados e fomentados a partir de aspectos culturais contextuais e próprios (JULIA, 2001). Com esses

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procedimentos verificou-se que em 23/09/1909 o governo federal expediu o Decreto n.º 7.566 instituindo uma rede de escolas de aprendizes artífices, uma para cada estado, com a finalidade de ministrar o ensino de ofícios, preferencialmente aos filhos dos considerados “desvalidos da fortuna”, com vistas à formação de uma futura classe de operários e contramestres para as indústrias nascentes no país. Mato Grosso dispunha de indústrias somente de produção agrícola, mas na capital o processo de urbanização se acelerava e o comércio em desenvolvimento logo demandaria serviços de ofícios artesanais e manufatureiros. A 1º de janeiro de 1910 a EAAMT instalou-se na capital, Cuiabá, oferecendo o curso primário, de desenho e profissional com oficina de alfaiataria, carpintaria, ferraria, selaria e sapataria, com quadro de funcionários composto por diretor, escriturário, professor primário, de desenho, mestres de ofícios e porteiro. Iniciou suas atividades em março daquele ano atendendo 47 educandos de parcos recursos, num edifício inadequado, com corpo docente sem experiência de ensino profissional e com poucas mobílias, materiais didáticos e máquinas. Entende-se que a sua implantação, fruto de um projeto nacional de educação profissional regido por legislação única à rede de escolas, ocorreu precariamente devido às insuficiências de ordem pedagógica, material e financeira dos governos federal e local, mesmo assim dinamizou as relações educacionais, sociais e econômicas da cidade ao oportunizar a instrução profissional, trabalho aos docentes e mestres, produção de artefatos por encomenda e para comercialização, entre outros.

HIPERMÍDIA E PESQUISA EM EDUCAÇÃO – AMBIENTE DIGITAL PARA ESTUDOS COMPARADOS ENTRE PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA

 Nadia Hage Fialho, UNEB

Este trabalho representa um importante suporte na modalidade de um ambiente hipermídia – que envolve o design e o desenvolvimento de sistemas de hiperbases (textos, imagens, sons) em condições de articulação com conexões diversas (links) e de fácil acesso a professores e estudantes – voltado para a abertura, ampliação e manutenção de rede de pesquisadores. Visa assegurar condições básicas de pesquisa e disponibilizar arquivos, obras e textos de grandes educadores, promover a articulação com outros países, notadamente de língua portuguesa, de forma a propiciar o intercâmbio entre pesquisadores a respeito de questões relativas à educação (a exemplo de referências bibliográficas, memória iconográfica da escola, guia de fontes de história da educação, estatísticas educacionais, etc.), estudos comparativos entre diferentes sistemas, histórias, processos, culturas, e apoio ao desenvolvimento de pesquisas em parceria, etc. Pode contribuir significativamente com a comunidade luso-brasileira de investigadores em História da Educação, favorecendo a difusão dos estudos, o debate a respeito de temáticas de interesse comuns. Tem sua origem no Projeto e Implantação do Banco de Dados Hipermídia e integra um projeto de maior amplitude – Projeto Memória da Educação na Bahia - convênio UNEB e CNPq que tem por objetivo (a) organizar informações sobre a educação e a sua história e (b) apoiar pesquisadores interessados no estudo isolado da educação ou na sua articulação com outros estudos da área econômica e social. Experiências similares destacam o Centro de Memória da Educação_CME da USP; o Centro de Memória-CMU da UNICAMP; e o Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional-NDIHR da UFPB. No caso da Bahia/Brasil, este Projeto vem suprir a inexistência de um acervo qualitativo e quantitativo em educação, cujas iniciativas esparsas de construção de bancos de dados não se concretizaram (Ex: a iniciativa do ex-Centro de Planejamento da Bahia-CEPLAB – anos 70–, buscando articular as ações da SEPLANTEC e da SEC, partindo do embrião existente na SEC; ou do Plano de Educação/Navarro de Brito (quando Secretário da SÉC) visando a formação de um acervo de informações; ou a criação do Instituto Anísio Teixeira – IAT/SEC (anos 80) gerou grandes expectativas similares), além de que muitas das informações existentes encontram-se irremediavelmente perdidas ou dispersamente armazenadas em locais de difícil acesso. Por seu caráter inovador, permitirá abrir na comunidade científica em geral o acesso a informações qualificadas sobre a educação, resultados de pesquisa, dados estatísticos, etc. podendo construir, amplamente, um centro de referência da educação e pesquisa.

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O DISCURSO SOBRE EDUCAÇÃO NA REVISTA DO IBGE: A ARGUMENTAÇÃO NUMÉRICA EM DEFESA DA ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR NO PAÍS

Natália Gil, USP

O texto aqui apresentado propõem-se a explicitar as características dos discursos sobre educação divulgados nos espaços de produção das estatísticas nacionais. Para tanto, procedeu-se à investigação dos modos pelos quais estes discursos foram construídos e postos a circular na Revista Brasileira de Estatística, editada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desde 1940. Destacando-se as permanências e mudanças nos argumentos que se utilizam de dados quantitativos para justificar as ações políticas no âmbito educacional, o estudo intentou contribuir na elucidação do período em que, no Brasil, consolida-se a autoridade explicativa dos números como instrumentos de condução das questões relacionadas à administração educacional.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística foi criado em 1936 com o intuito de produzir e analisar as estatísticas nacionais. A partir de 1940 este órgão passa a publicar trimestralmente a Revista Brasileira de Estatística que acaba por se constituir num espaço privilegiado de discussões acerca das questões relativas à estatística e à demografia. As medidas centralizadoras empreendidas no governo Getúlio Vargas, a partir de 1930, tinham determinado a organização de órgãos centrais ligados à União com o que se pretendia traçar diretrizes gerais para todo o país. Dessas ações decorreu, entre outras conseqüências, um significativo avanço na organização de um complexo aparato estatal voltado para a produção das estatísticas brasileiras. Afirmava-se, naquele período, que sem estatísticas produzidas adequadamente – e, portanto, confiáveis, - não seria possível a condução acertada das ações de governo.

Semelhante aspecto pode ser identificado também no que se refere ao campo educacional. A análise dos artigos publicados na revista do IBGE evidenciou uma notável preocupação com a criação e consolidação de um sistema escolar tendencialmente acessível a todos, presente sobretudo nos primeiros anos de ciculação do periódico. Observando-se a autoria dos textos percebe-se a circulação de alguns intelectuais e funcionários do Estado entre o IBGE e órgãos vinculados ao Ministério da Educação. Cabe destacar que neste período a especialização profissional estava apenas se delineando, de modo que era freqüente que os mesmos indivíduos respondessem por decisões políticas em diferentes áreas. A partir do final da década de 1940, tornam-se cada vez mais raros os artigos concernentes às questões escolares seja pela maior especialização dos profissionais – o que faz com que eles se detenham em um ou outro assunto no qual se especializam –, seja pelo fato de que os órgãos de governo criados no início da década de 1930 tenham consolidado sua estrutura e definido suas especificidades.

O IDIOMA PORTUGUÊS NAS ESCOLAS ELEMENTARES DO BRASIL NA DÉCADA DE 1940: A ASSOCIAÇÃO ESCOLAR LIGA PRÓ-LÍNGUA NACIONAL

Neide Almeida Fiori, U. do Sul de Santa Catarina

Esta proposta de comunicação refere-se ao Brasil, mais especificamente à região Sul, em áreas que a partir de 1818 foram povoadas por imigrantes estrangeiros. Um número expressivo de mais de 5 milhões de imigrantes chegou ao país antes do fim da Segunda Guerra Mundial, trazendo sua cultura, seus costumes e o idioma da terra de origem. Em virtude do isolamento das regiões rurais nas quais foram instalados e da carência de escolas públicas que disseminassem a língua portuguesa, os imigrantes cultivavam as formas de comunicação dos locais de origem, consideradas no Brasil dos tempos do Estado Novo como “idiomas étnicos”.

A partir desse panorama histórico geral, pretende-se enfocar as práticas que foram introduzidas na escola elementar pública para combater o idioma étnico e, ao mesmo tempo, difundir a língua portuguesa. Essas práticas tinham na associação escolar denominada Liga Pró-Língua Nacional o seu espaço privilegiado e se desenvolviam visando, de um lado, conseguir que os alunos “esquecessem” o idioma étnico e, de outro lado, aprendessem a língua portuguesa. Não se desejava apenas o domínio técnico do idioma; junto com a questão lingüística, as escolas públicas destinadas

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aos descendentes de imigrantes, como instituição de caráter obrigatório e expressão de controle do governo federal sobre a questão idiomática, disseminavam um forte sentimento nacional dirigido à pátria de adoção – o Brasil. Assim, a difusão do idioma era acompanhada de uma formação de caráter ideológico que, ao tratar da nacionalidade brasileira, valorizava a vertente lusa – a cultura e o idioma português.

A comunicação analisará as práticas escolares levadas a efeito pela Liga Pró-Língua Nacional e a inserção desta associação no cotidiano da vida escolar. Do ponto de vista teórico, ocupar-se-á com a teoria das instituições a partir das contribuições como de Émile Durkheim e Anthony Giddens, por sua vez a questão idiomática será relacionada com a contribuição do pensamento de Pierre Bourdieu. A investigação apóia-se em pesquisa bibliográfica, em entrevistas e em resultados de pesquisa efetuada em documentação escolar, expressiva maioria integrada por documentação de alunos - atas de reuniões e relatórios da Liga Pró-Língua Nacional.

ANTIJESUITISMO E LAICIZAÇÃO DA ESCOLA: O CASO DO COLÉGIO DE S. FIEL, EM LOURIÇAL DO CAMPO

Nelson Veríssimo, Universidade da Madeira

Os jesuítas reinstalaram-se em Portugal a partir de 1858. Em 1880, erigia-se a província portuguesa da Companhia de Jesus.

Nesta década, sucederam-se várias manifestações de protesto contra a presença dos inacianos no nosso País, designadamente comícios, conferências e publicações diversas, principalmente no decurso das comemorações do primeiro centenário da morte do Marquês de Pombal. Na imprensa e na Câmara dos deputados o assunto foi também largamente debatido.

Motivo de controvérsia era o Colégio de S. Fiel em Louriçal do Campo, do distrito de Castelo Branco, na posse dos jesuítas desde 1873. O tipo de ensino aqui ministrado gerou sérias desconfianças e críticas na opinião pública.Em Novembro de 1880 e em Março de 1901, o governou português ordenou sindicâncias a este Colégio.

Nesta comunicação, analisar-se-á a polémica sobre o estabelecimento de ensino jesuíta que, em 1902, iniciou a publicação da Brotéria: revista de Ciências Naturais do Colégio de S. Fiel.

LAICATO CATÓLICO: O PAPEL DOS INTELECTUAIS NO PROCESSO DE ORGANIZAÇÃO DO PROJETO FORMATIVO DA IGREJA CATÓLICA NO PARANÁ (1926-1938)

Névio de Campos, Universidade Federal do Paraná, Curitba

Este trabalho analisa a trajetória, os debates e os projetos dos intelectuais católicos leigos em torno da temática educativa à luz do contexto histórico paranaense, do período de estudo que está circunscrito entre 1926 e 1938, discutindo o processo de constituição do grupo, as suas interlocuções com as vertentes teóricas e filosóficas em geral, as suas idéias e intervenções culturais, bem como suas relações com o Estado e com os grupos políticos no cenário paranaense desse período. Discorre sobre as contribuições do laicato católico ao projeto romanizador da Igreja Católica e enfatiza que o papel deste grupo foi criar instituições culturais no contexto paranaense, sem esquecer o contexto político-cultural do Brasil e da Europa como pano de fundo de criação do laicato católico. Apóia-se nos periódicos escritos e dirigidos pelo grupo, os quais nos possibilitaram conhecer que a elite intelectual católica leiga estabeleceu instituições culturais onde congregaram os principais intelectuais e lideranças políticas do Estado e da capital que se colocaram a serviço do projeto romanizador da Igreja Católica.

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O PROGRAMA TWI E A DIFUSÃO DO SISTEMA TAYLOR DE ADMINISTRAÇÃO NA ESCOLA E NA INDÚSTRIA BRASILEIRAS

Newton Antonio Paciulli Bryan, Universidade Estadual de Campinas

O paradigma taylorista de administração manteve-se como hegemônico durante três quartos de século. Concebido no início do séc. XX pelo engenheiro americano F. W. Taylor para a administração das grandes empresas monopolistas que se desenvolviam nos Estados Unidos, esse sistema de administração foi adotado também na esfera pública e rapidamente difundiu-se em escala mundial com o título de “administração científica” ou de “administração racional”-

No Brasil, a difusão do taylorismo ocorreu em duas etapas: nos anos 30 e 40 na organização do ensino profissional (Escolas Ferroviárias e SENAI) e a partir dos anos 50 através de um programa denominado TWI – Training Within Industry.

Concebido nos Estados Unidos para treinar rapidamente supervisores da indústria no período da 2ª Guerra Mundial, o TWI foi utilizado amplamente no pós-guerra como instrumento de formação de supervisores nos programas financiados pelo Plano Marshall na Europa e Japão e pelo Programa Ponto IV na América Latina.

O presente trabalho faz uma análise do conteúdo dos vários módulos do TWI (Ensino correto de um trabalho, Relações humanas no trabalho e Métodos no trabalho) e da sua utilização para a difusão do sistema Taylor na indústria brasileira e na administração pública (nas instituições escolares, em especial).

Foram utilizados como fontes de dados para a análise, materiais didáticos, dados estatísticos das instituições que treinaram supervisores industriais e escolares, boletins técnicos e estudos comparativos com outros países.

CONSTITUIÇÃO DO SISTEMA DE INSTRUÇÃO EM MATO GROSSO - ÍNTEGRA

Nicanor Palhares Sá; Universidade Federal de Mato Grosso

Esta comunicação se refere ao processo de constituição do sistema de instrução na Província de Mato Grosso. A reforma realizada pela Lei n° 08, de 05 de maio de 1837, foi um dos momentos iniciais de constituição do espaço estatal ou parte do estado/nação, do ângulo provincial, alterando as relações entre o privado e o público. Pretende-se compreender o processo de afirmação da sociedade política, no momento da constituição do sistema de instrução provincial, ou o modo pelo qual a sociedade política se constituiu, incorporando funções sociais tradicionalmente de competência da sociedade civil ou, principalmente, da família. Os dados utilizados são resultados de uma das primeiras pesquisas realizadas pelo Grupo de Pesquisa em História da Educação em Mato Grosso, “Educação e memória”, financiada pelo CNPq, que estudou a educação no império mato-grossense. As fontes utilizadas foram: legislação imperial e provincial, os relatórios de presidente de província e relatórios de inspeção, que, na época, eram produzidos pelas câmaras municipais. A Lei Provincial de 05 de maio de 1837 regulou o estabelecimento e a supressão de escolas primárias, o vencimento dos professores públicos, o modo de inspeção sobre as escolas, a habilitação, o concurso, preferência, provimento, remoção e demissão dos professores públicos. Ela tratava também dos exames gerais que deveriam ser anuais, não fixando uma época do ano para isso; eram exames públicos. O título sexto fixava a obrigação dos pais de família em relação à instrução primária de seus filhos, que poderia ser na própria casa. A obrigatoriedade se situava entre os oito e dezesseis anos. A punição seria a multa de seis mil réis por ano e por filho, durante os oito anos de obrigatoriedade, o que não era excessivo para a época.

As províncias do Império deram início à organização da instrução provincial a partir do Ato Adicional de 12 de agosto de 1834. Especialmente, o parágrafo 2º, do Artigo 10, da Lei nº 16, que modificou a Constituição do Império:

Art. 10.  Compete às mesmas assembléias legislar:215

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2o  Sobre instrução pública e estabelecimento próprio a promovê-la, não compreendendo as faculdades de Medicina, os cursos jurídicos, academias atualmente existentes e outros quaisquer estabelecimentos de instrução que, para o futuro, forem criados por lei geral.

Após essa descentralização de competência, foram produzidas as primeiras medidas no sentido de estabelecer alguma organização da instrução pública na Província de Mato Grosso. A ênfase inicial foi na criação de uma estrutura de fiscalização. Essa necessidade de controle nasceu, por um lado, da contradição de competência entre o pater poder e a estruturação do poder de estado e, por outro lado, da fiscalização dos professores.

Ninguém duvida que o Estado de nada necessita mais do que de bons cidadãos; e porque não é a natureza quem os faz, mas sim a boa educação; e por mais engenho que tenha uma pessoa, não pode sem aplicação ser excelente em coisa alguma: confesso, Srs., o quanto me é sensível a lenta instrução primária, e pelo que tenho podido alcançar na generalidade das escolas estabelecidas, que não apresentam todo o aproveitamento. Estou certo que não dimana em tudo esta falta dos professores, é muito essencialmente dos pais por não obrigarem aos filhos a freqüência das aulas; e os mestres pelo os não aplicar como devem aos estudos. (MATO GROSSO, Relatório 1835, p. 4-5).

Esse diagnóstico, realizado pelo Presidente da Província Antônio Pedro de Alencastro, revela os seguintes aspectos: o papel civilizador ou socializador da educação na produção do cidadão, já revelando também um certo caráter disciplinador da educação para o bom cidadão “[...] por mais engenho que tenha uma pessoa, não pode sem aplicação ser excelente em coisa alguma [...]”; critica a lentidão do desenvolvimento e o pouco aproveitamento da maioria das escolas; revela a contradição entre o estado e o pater poder; responsabiliza os mestres por não exigirem maior aplicação de seus alunos. Na seqüência, expõe a verdadeira finalidade do relatório: “Talvez, Srs., que a criação de um Inspetor das Aulas para este intuito correspondesse ao fim das nossas esperanças, pois não é possível que o Presidente da Província possa presidir a exames, fiscalizar escolas, descer a outras minuciosidades”.

Antes do Ato Adicional, portanto, da descentralização da instrução pública primária e secundária, a inspeção foi realizada, conforme a lei de 1827, pelos presidentes de província e pelas câmaras municipais. Em Mato Grosso, já em 1835, reclamava o Presidente da Província da impossibilidade de ele realizar tal tarefa e propunha alguém especializado para isso.

Estes foram os argumentos que deram início, no ano seguinte, à criação da organização da instrução pública na Província de Mato Grosso, a título de exercício da descentralização prevista pelo Ato adicional de 1834. Antes mesmo de estruturar o sistema de escolas ou de cadeiras isoladas, deram os primeiros passos na criação de sistema de fiscalização. Até então, a fiscalização era competência do Presidente da Província e das câmaras municipais. A partir de 1836, criou-se o cargo honorífico de inspetor em cada paróquia da Província; esses inspetores não eram remunerados, mas poderiam receber algum benefício da Província. Após quatro anos, poderiam vir a receber remuneração.

Em 1836, o Presidente de Província Antônio José da Silva fez um discurso muito semelhante ao de seu predecessor, com a diferença de que parecia estar menos informado sobre a situação do ensino da Província. Todavia, o seu discurso serve para evidenciar concepções dominantes no Império sobre a educação.

Inicia sua fala afirmando que “A Instrução Pública tão necessária para a felicidade individual dos cidadãos e prosperidade geral da sociedade [...]” e, na seqüência, critica os “mestres inábeis” por não tirarem todas as conseqüências da instrução convencendo a juventude da necessidade de sujeição

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à ordem, às autoridades. Seu discurso manifesta a crença de que a instrução seja uma forma de retirar a juventude da ociosidade, que seria a causa do vício.

A Constituição não pode existir, como convém, sem lançar suas raízes na alma de todos os cidadãos, e sem imprimir novos sentimentos, novos costumes e novos hábitos; e é da ação diária e sempre crescente da Instrução Pública, que se podem alcançar, tais mudanças, porque ela os põe em todo o seu valor, tanto para si, como para seus semelhantes: ensina-lhes a gozar plenamente de seus direitos, a respeitar e cumprir facilmente todos os seus deveres e, em uma palavra, viver feliz. (PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1836, p. 4-5).

Revela claramente o processo de incorporação individual dos mecanismos de controle, a instrução cumprindo um papel psico-social de vigilância para que deixe de ser um sistema de coação externa para tornar-se interna, de auto-regulação. O relatório vai mais longe, ao mostrar também que a instrução pública pode cumprir um papel civilizatório, típico da modernidade ocidental:

Os estudos bem dirigidos, senhores, secundam os progressos das Ciências, das Letras e das Artes; animam os esforços, recompensam os sucessos, engrandecem no espírito humano as faculdades de sentir e de conhecer; suscitam por toda a parte o poder da emulação deste sentimento generoso, o mais puro princípio da atividade humana. Assim é que se pode multiplicar, e disseminar os recursos. (PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1836, p. 4-5).

É óbvio que o saber comunal estaria excluído desse “sentimento generoso” e seria uma atividade humana impura, pois não corresponderia ao paradigma da modernidade. No ano de 1836, nasceu o sistema de controle, antecedendo a criação do sistema de instrução pública. É verdade que já existiam algumas escolas. De todo modo, nasceu primeiro um sistema hierárquico de fiscalização e controle, antes mesmo do conjunto das normas que regulariam as escolas existentes. Em 1836, foi criado o cargo em lei, como Inspetor dos Estudos Públicos de Cuiabá, podendo atender também às Vilas, Freguesias e Aulas particulares.

A lei que teve como objetivo organizar um sistema provincial de instrução pública foi a Lei Provincial nº 08, de 05 de maio de 1837 (SÁ; SIQUEIRA, 2000, p. 11-18), dividida em sete títulos. Em “Estabelecimento e supressão das escolas de instrução primária” fixa o conteúdo, os dois graus da escola primária, destinação de gênero, as formas de criação da instrução pública e privada. Permite completa liberdade da iniciativa privada, propondo controlar apenas a qualificação do docente. Recomenda também a criação da escola normal.

O “Vencimento dos professores públicos” estabelece os limites de vencimento anual dos professores, por grau e número de alunos – deveriam variar entre 200 (duzentos) e 300 (trezentos) mil réis e o segundo grau, entre trezentos e quinhentos. Os elementos fundamentais de uma carreira são estabelecidos, inclusive, para aposentadoria. Esta ocorreria após vinte e um anos de trabalho, com direito a salários integrais, e havia também um estímulo financeiro 1/20 (para cada ano adicional) ao adiamento da aposentadoria.

Em “Da habilitação, do concurso, preferência e provimento dos professores” são estabelecidos os requisitos, que consistiam em idade mínima de dezoito anos e domínio dos conhecimentos e matérias previstas para a instrução primária. A demonstração dos conhecimentos far-se-ia através de concursos públicos, que já eram divulgados através de editais. Os brasileiros e os candidatos que haviam freqüentado a escola Normal tinham preferência. O Art. 22 afirma que os títulos de provimento realizados segundo a lei seriam vitalícios.

“Da suspensão, remoção e demissão dos professores públicos” apresenta o conjunto das formas de punição dos professores públicos. A facilidade com que um professor podia ser demitido põe em questão o Art. 22. Os motivos de demissão: concorrência de escola particular com mais alunos na localidade, moralidade, desobediência, incapacidade, “moléstias que os tornem inábeis para continuar no magistério” etc. Seriam vitalícios, portanto, todos aqueles que o governo não tivesse interesse em dispensar.

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“Inspeção sobre as escolas, e exames dos alunos” regula as atividades do inspetor especial. Este era o responsável local pela vigilância aos professores e aos alunos das escolas públicas e inspeção das escolas privadas. O título trata também dos exames gerais, que deveriam ser anuais, e não fixam uma época do ano para isso. Eram exames públicos, pois os pais dos alunos eram convidados.

O título sexto, “Obrigação dos pais de família acerca da instrução primária”, torna obrigatório que os pais ofereçam aos seus filhos instrução primária, que poderia ser na própria casa. A obrigatoriedade era entre os oito e dezesseis anos. A punição seria a multa de seis mil réis por ano e por filho, durante os oito anos de obrigatoriedade, o que não era muito para a época.

Finalmente, em “Disposições gerais”, a Lei de 1837 trata de aspectos gerais e transitórios, como a competência do governo provincial para nomear, suprimir remover e demitir professores; restringe o acesso às pessoas livres; o contrato de substituto e promete regulamentar esta lei em termos de dias de estudo, as horas de cada lição, férias, o tempo e o método dos exames públicos, regime e polícia das escolas e concurso.

Alguns mecanismos gerais foram fixados para o funcionamento do sistema escolar. A maior parte da Lei visava regular o trabalho docente; todavia, os dados, particularmente, os relatórios de presidente de província, revelavam a existência de conflitos entre o poder da família e o da sociedade política, seja nos temas simples, como a obrigatoriedade, ou no combate aos valores comunais que entravam em conflito com o objeto de instrução e de educação.

A instrução primária, este importante elemento de civilização, oferece ainda, com pouca modificação, a mesma face apresentada no último relatório do Governo. [...] Conquanto tal seja por ora o estado da instrução elementar, é, todavia fora de dúvida que a Lei Provincial n.º 8, de 5 de maio de 1837, há de melhorá-la muito. (PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1838.

Os avanços conseguidos por essa lei, sem dúvida, foram substantivos no sentido de se criar um mínimo de unidade no sistema. As heterogeneidades das formas e processos organizativos ou didático-pedagógicos foram substituídas por um maior grau de homogeneidade. É verdade que a Lei se centrou muito mais nos processos de trabalho. A regulamentação deveria incidir, sobretudo, sobre a vigilância e sobre os tempos do trabalho docente.

Sem dúvida, o problema de fundo que estava sendo enfrentado era a quantificação do tempo sobre o trabalho pedagógico. A unificação das estruturas e procedimentos contribuiria para adotar uma nova temporalidade. A vida na Província era ainda regulada pelo tempo natural, em boa medida. Todavia, gradualmente, era colocada a necessidade de distribuição das atividades por unidades de tempo.

Em suma, pode-se afirmar que a primeira reforma da instrução provincial foi marcada pela necessidade de criação de um sistema de controle sobre o trabalho docente e ação sobre a família, compartilhando com ela da competência para educar, como forma de superação da “barbárie” e estabelecimento dos paradigmas ocidentais do saber e conhecer a natureza e a sociedade. Ou seja, a obrigatoriedade do envio dos filhos à escola, entre os oito e dezesseis anos, não resultou do direito universal à educação, mas na necessidade da sociedade política de construção de seu próprio espaço de poder, em oposição ao espaço privado da família.

Referências bibliográficas

PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1835. Discurso recitado pelo Vice-Presidente da Província de Mato Grosso, Antônio José da Silva, na abertura da primeira sessão ordinária Legislativa Provincial. Cuiabá, 2 de março de 1835. NDIHR – Microfilme – rolo Relatório de Presidentes da Província, 1835–1864.

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PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1835. Discurso recitado pelo Presidente da Província de Mato Grosso, Antônio Pedro de Alencastro, na abertura da primeira sessão ordinária Legislativa Provincial. Cuiabá, 3 de julho de 1835. NDIHR – Microfilme – rolo Relatório de Presidentes da Província, 1835–1836.

PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1837. Discurso recitado pelo Presidente da Província de Mato Grosso, José Antônio Pimenta Bueno, na abertura da terceira sessão ordinária da Assembléia Legislativa Provincial. Cuiabá, 1º março de 1837. NDIHR – Microfilme – rolo 1 – Relatório de Presidentes da Província, 1835 – 1864.

PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1838. Discurso recitado pelo Presidente da Província de Mato Grosso, José Antônio Pimenta Bueno, na abertura da primeira sessão da segunda Legislatura da Assembléia Provincial. Cuiabá, 1.º de Março de 1838. NDIHR – Microfilme – rolo 1, 1835 – 1864.

PRESIDÊNCIA DA PROVÍNCIA (Mato Grosso), Relatório 1839. Discurso com que o Presidente da Província de Mato Grosso, Estevão Ribeiro de Resende, fez a abertura da segunda sessão ordinária da segunda Legislatura da Assembléia Provincial. Cuiabá, 2 de março de 1839. NDIHR – Microfilme rolo 1 (R.P.P) 1864

SÁ, N. P. e SIQUEIRA, E. M. (org). Leis de Regulamentos da Instrução Pública do Império em Mato Grosso. Campinas, Editores Associados/SBHE/INEP, 2000.

IGREJA, ESTADO, SOCIEDADE CIVIL. INSTÂNCIAS PROMOTORAS DE ENSINO

Nilo Bidone Kolling; Grupo de Pesquisa em História da Educação na FaE – UFPel - a/c. Profa. Dra. Eliane Peres, Universidade Federal de Pelotas – Rio Grande do Sul - Brasil

Tema: Comunidades Escolares sonham com uma nova realidade: Pomeranismo, Luteranismo e Independentismo concebem uma Sociedade Civil diferenciada em pleno Império Brasileiro

A região colonial de Pelotas – colonizada por descendentes alemães em grande parte por pomeranos a partir de 1858 em São Lourenço do Sul, buscou uma auto-afirmação através da escola comunitária criada e mantida pelas Sociedades Escolares e Religiosas das próprias colônias. O processo imigratório europeu com grupos colonizadores iniciou em 1822 para Nova Friburgo no RJ e organizadamente para São Leopoldo no RS a partir de 25 de julho de 1824.Estas escolas foram um adendo ao processo do padroado português na medida em que não eram “católicas-romanas”, o que até a Proclamação da República – 15.11.1889 nem sequer como religião permitida e ou tolerada se propunha em admitir o diferente, já que a grande maioria dos imigrantes descendiam de protestantes europeus herdeiros da Reforma Luterana , justo o diálogo oposto das propostas jesuíticas.A investigação é a continuidade da pesquisa a nível de mestrado realizada em 1999 e busca traçar as características do gênesis deste modelo escolar trazido pelos imigrantes pomeranos. Busca verificar sua forma de desenvolvimento e seu ápice enquanto projeto, bem como historiograficamente compreender sua crise de modelo a partir da década de 50 e 60 do Século passado. Busca ainda compreender sua intersecção com o modelo municipal/estadual a partir da “entrega” do projeto escolar a estes sistemas. Verifica ainda as concepções desta entrega e de que forma permanece/u vínculos com uma proposta societária de sociedade civil que continua a sonhar com sua autonomia e ou não.Fica ainda mais evidente a concepção de Sociedade Civil que os imigrantes pomeranos trouxeram ao Sul do Brasil, justo quando não acompanhados pelo Estado e ou Igreja constituída no Brasil, já que em número reduzido e aí criaram o conceito de Sociedade Religiosa e Escolar autóctone, autônomo de Comunidades Independentes e Protestantes – as Comunidades Livres – Freigemeinden.A pesquisa realizada na região geográfica da Paróquia Evangélica de Santa Maria do Sul – 5.º Distrito de Pelotas, filiada a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil caracteriza a influência étnica, religiosa, antropológica do grupo de colonizadores pomeranos e sua contribuição para com a história

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da educação na região sul do Estado.

DA HISTÓRIA SAGRADA À HISTÓRIA PÁTRIA

Sônia Maria Leite Nikitiuk, Universidade Federal Fluminense; Nicolas Alexandria Pinheiro, Universidade Estadual de Campinas

Este trabalho, fruto de recorte da pesquisa: "O Ensino de História a partir de currículos, práticas pedagógicas e livros didáticos", em realização no Laboratório de Ensino de História (LEH) na Universidade Federal Fluminense, parte da história institucional do Colégio Pedro II na Cidade do Rio de Janeiro e objetiva refletir sobre o ensino de História no Brasil. Destacamos, nesta comunicação, a figura do Cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro (1825-1876), jesuíta, que lecionando História Sagrada e Doutrina Cristã no Colégio Pedro II revela em seus diversos escritos a preocupação de garantir através do ensino os objetivos pedagógicos e morais da Doutrina Cristã, compondo assim os interesses do Estado no Brasil.

O Cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro foi catedrático de Retórica e Poética no Colégio Pedro II e pesquisador do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). Seus escritos fazem relação entre fatos da História do Brasil e a História Sagrada criando uma lógica entre as mesmas. Assim o descobrimento do Brasil era visto como conseqüência da expansão da fé cristã; a colonização representava a missão dos portugueses de levar a verdadeira fé à Terra de Santa Cruz; as invasões francesas e holandesas estavam inseridas no movimento da Contra-Reforma; o poder temporal da monarquia era apresentado através do exercício político-administrativo, predestinado pelo poder divino.

Suas memórias foram publicadas pela Editora Garnier no Rio de Janeiro em 1876, em dois volumes intitulados: "Estudos Históricos". Em geral, seus livros foram adotados tanto no Colégio Pedro II, nas décadas de 1860 e 1870, como nas escolas confessionais. O "Catecismo Constitucional", livro religioso com formato e apresentação didática, foi ainda recomendado, pela Associação Católica do Rio de Janeiro, para adoção em todas as escolas municipais, e o compêndio: "Episódios da história pátria contados à infância" foi adotado nas escolas primárias da Corte e de outras províncias.Sendo o Colégio Pedro II, laico e considerado colégio padrão para o ensino secundário no Brasil, a incursão sobre as obras e histórias de vida dos seus catedráticos ,e sobretudo os religiosos, torna-se significativa para elucidação da relação entre Igreja e Educação. Perceber as permanências e rupturas que a religião católica deixa no seu projeto de ensino, em especial no ensino de História é importante para a escrita da História da Educação no Brasil, lugar onde os jesuítas, em especial, deixaram marcas que vão muito além do período colonial e das referências catequéticas.

MEMÓRIAS DE PROFESSORAS SOBRE TELEVISÃO E O VÍDEO: NARRATIVAS, IMAGENS E SONS (*)

Nilda Alves, UERJ

Os projetos que dão origem ao texto a ser apresentado têm uma abordagem teórico-epistemológico-metodológica organizada em torno das seguintes idéias, noções e relações: tessitura de conhecimentos no cotidiano e valores; formação continuada de professora (1) e uso da tecnologia; autoria, memória e narrativa; imagem e som.

Adotamos, assim, um referencial epistemológico que permitisse captar as múltiplas redes de saberes tecidas pelos sujeitos sociais ao longo de suas vidas, e que orientam suas ações. Esses sujeitos, vistos como “praticantes”, são professoras que trabalham na educação básica.Nos projetos desenvolvidos, buscamos entender de que maneira, através de suas ações e de suas narrativas sobre as mesmas, essas praticantes tecem sua vivências cotidianas, em processos vários de formação de valores e em contato permanente com múltiplas tecnologias.

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No estudo dos processos que se dão permanentemente nos diversos espaços/tempos das escolas, entendemos estar contribuindo para contar uma outra história da escola, diferente daquela oficial ou, pelo menos, daquela que utiliza como fonte, unicamente, os documentos de origem oficial.No trabalho desenvolvido, entendemos o espectador comum na necessidade que tem de articular a imagem como narrativa (p. 15), nas pesquisas desenvolvidas temos entrelaçado as redes que ligam, necessariamente, imagem (som) e narrativa, no cotidiano escolar (Alves, 2000), através da memória de professoras sobre televisão e vídeo.

Assumimos que para compreender os processos de tessitura de conhecimentos nos cotidianos das escolas é preciso contá-los. Isto significa que entendemos ser necessário ouvir o que seus praticantes têm a dizer sobre as tantas e tão diferentes histórias vividas nas artes de fazer dos processos pedagógicos diários. Nas narrativas ditas e ouvidas, a praticante docente vive e conta tanto sobre esses processos, nos quais está/esteve envolvida, quanto das idéias que os formam e os sustentam, como incorporam imagens (sons) sobre os mesmos, dando pistas valiosas sobre o que aconteceu/acontece no cotidiano das escolas em que trabalha e trabalhou. Podemos, com isso, afirmar que uma imagem [um som] dá origem a uma história que, por sua vez, dá origem a uma imagem [lembra um som]

Entendemos ser, assim, importante buscar entender as memórias de professoras sobre o meio televisão/vídeo incorporando não só a leitura de imagens (sons) como buscando com elas praticar as condições e possibilidades dessa tecnologia como necessidade para o surgimento e a acumulação de memórias do cotidiano da escola.

* O texto tem origem na pesquisa “Memórias de professoras sobre televisão: o cotidiano escolar e a televisão na reprodução, transmissão e criação de valores” (concluída) e na pesquisa “O uso da tecnologia, de imagens e de sons por professoras de jovens e adultos e a tessitura de conhecimentos (valores) no cotidiano: a ética e a estética que nos fazem professoras” (financiamento CNPq e UERJ/FAPERJ, de 2003 a 2006, bolsas). O uso deste termo no feminino tem a ver com uma posição político-acadêmica assumida há algum tempo que entende ser importante admitir o majoritário contingente de mulheres que existe nesta profissão (?). Isto tem, a nosso ver, importância no modo como o campo se desenvolve e precisa ser pesquisado.

ESCOLA NORMAL DE TERESINA: ENTRE PRÁTICAS E REPRESENTAÇÕES – 1920 A 1970

Norma Patricya Lopes Soares, UFPI/BR

A Escola Normal de Teresina, criada em 1864, extinta sucessivas vezes e recriada sem mais retrocessos em 1909, consolidou-se, adquiriu prestígio social e vem fazendo parte do cotidiano escolar do Estado do Piauí. A atuação da Escola Normal é algo que aguça a curiosidade e o desejo de investigá-la, por isso estou reconstituindo a história da principal instituição de formação de professores no referido Estado. Este artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla que ora desenvolvo como atividade no Mestrado em Educação da Universidade Federal do Piauí. Para retratar suas práticas e seu cotidiano fundamentei-me em autores da História Cultural como Peter Burke e Roger Chartier, além do Olga Vom Simson, Antonio Nóvoa e Justino Magalhães para subsidiar a produção da história oral daquela instituição. Assim, venho coletando depoimentos de ex-alunas e professores com o objetivo de reconstituir a trajetória da Escola Normal de Teresina. Dentre os dados coletados aponto algumas considerações: para a normalista Ana Rosa de Lima Brito, concludente de 1923, é a sabatina, espécie de avaliação oral que auxiliava as provas finais e a afetividade Firmina Sobreira, sua professora e madrinha o que mais lhe aflora à mente quando fala na Normal; a professora Palmira Luzia Soares, formanda de 1944, ilustra bem o cotidiano daquela escola, pois disse ser o calor humano e o próprio conteúdo trabalhado diariamente na Escola Normal fatores que despertaram a solidariedade, o respeito e o humanismo nas estudantes, não só para com os alunos, mas para a vida; a disciplina, a rigorosa orientação pedagógica, o pioneirismo nos desfiles cívicos ou religiosos e as glamorosas festas de formatura são práticas marcantes na vida de Escola e principalmente na memória de Maria Sousa, normalista que se formou em 1955. Desta forma, a Escola Normal hoje denominada Instituto de Educação Antonino Freire, vem perpetuando práticas, visto serem estas

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transportadas para as escolas onde atuam seus egressos, e fazendo parte da história da educação teresinense.

A IDEIA DE REFORMA: EM TORNO DO(S) DISCURSO(S) REFORMISTA(S) DO CAMPO EDUCATIVO NO PRIMEIRO TERÇO DO SÉCULO XX EM PORTUGAL

Nuno Peres, Escola B2 do Montijo

Ao longo do século XX assistimos, apesar das várias formas de pensar a educação, inscritas nos vários regimes que se foram sucedendo, a uma ligação estrutural e estruturante entre instrução / educação e progresso. Estrutural entendida como inevitabilidade de acompanhar o passo das outras nações, ditas desenvolvidas, a que queríamos pertencer, apesar do fosso que já então nos separava, e, estruturante enquanto conformadora de uma nova ordem social assente no liberalismo e no crescente papel da burguesia capitalista, senhora da indústria e dos capitais.

Portugal, para além de rural é um país de analfabetos. 75% dos seus habitantes não sabem ler nem escrever. Enquanto os republicanos atribuem as causas do “mal nacional” ao regime monárquico e à sua política obscurantista, à educação jesuítica e ao estado caótico em que se encontra o nosso sistema escolar, outros entrevêem no sistema escolar fortemente centralizado, na falta de escolas primárias, na inexistência de uma classe média cultivada ou na pobreza do país, as causas primeiras.

A fuga à escola radica-se em razões profundas, ligadas ao desenvolvimento nacional. Ela nunca foi sentida como uma necessidade, nem paradoxalmente, como um factor de progresso. Pelo contrário, o facto de se impor a escola, é muitas vezes entendido como uma violência, na medida em que impede as crianças de cumprirem os trabalhos agrícolas, situação que não agrada às famílias dos meios rurais. A escola, como veículo de promoção social, slogan de que os republicanos fazem uso, no último quartel de oitocentos, apenas faz algum sentido, entre os grupos da pequena burguesia, sobretudo urbana, sustentáculo, em larga medida da I República.

Apoiada nas forças mais conservadoras da sociedade, sob um pano de crise económica e, com a chegada de Salazar ao Ministério das Finanças, em 1928, num quadro de forte contenção orçamental, a Ditadura irá desenvolver uma política educativa, apostada na destruição da escola republicana, ainda que por vezes pontuada por avanços e recuos estratégicos, e que será a base dos princípios fundadores da escola do Estado Novo.

Com o presente trabalho, pretendemos dar voz a vários discursos produzidos em torno das questões educativas, através da análise de textos de cariz reformista, produzidos por indivíduos representativos de vários sectores da sociedade portuguesa -- assumindo-se o conceito de reforma, não nos seus aspectos normativos, mas numa perspectiva atitudinal e filosófica. Assim, socorremo-nos de conferências, ensaios, obras de maior dimensão, tal como de artigos de opinião e depoimentos insertos em publicações especializadas ou não, nomeadamente a Educação Nacional e o Diário de Notícias, tendo-se procurado diversificar por um lado o tipo de fontes, e por outro o estatuto e função social dos intervenientes.

MEB – MOVIMENTO DE EDUCAÇÃO DE BASE – 1961/1966

Osmar Fávero, Universidade Federal Fluminense

No início dos anos 1960, no auge do populismo e no bojo de uma crise de hegemonia política e desaceleração do desenvolvimento econômico, surgiram os movimentos mais expressivos de cultura e educação popular da história da educação brasileira. Esses movimentos operaram um salto qualitativo em relação às campanhas anteriores de combate ao analfabetismo; com propostas radicalmente diferentes, pelo compromisso explicitamente assumido em favor das classes populares, assim como pela orientação política.

Entre eles encontra-se MEB, criado em 1961 pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e apoiado pelo Estado, mediante decreto presidencial. Embora oficialmente separada do

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Estado, desde a proclamação da República, a Igreja católica sempre foi sua aliada. Essa aliança foi forte no governo nacional-desenvolvimentista dos anos 1950, por iniciativa dos bispos progressistas do Nordeste brasileiro. Região com elevados índices de mortalidade infantil, desnutrição e analfabetismo, na conjuntura da Guerra Fria, era como “barril de pólvora”, temendo-se nela se repetisse a Revolução Cubana.

Visando atuar prioritariamente nessa região, o MEB objetivava inicialmente desenvolver um programa de educação de base, conforme definida pela Unesco, através de milhares de escolas radiofônicas, instaladas a partir de emissoras católicas. Após dois anos de funcionamento, o MEB reviu esse objetivo. Alinhando-se aos outros movimentos de cultura popular e valendo-se da proposta de alfabetização de Paulo Freire, passou a entender a educação de base como processo de “conscientização” das camadas populares, para a valorização plena do homem e consciência crítica da realidade, para sua transformação. Mudou também seu modo de atuação e o conteúdo de suas aulas radiofônicas, mudança retratada no Conjunto Didático “Viver é Lutar” para recém-alfabetizados que, apreendido por forças da direita, foi pedra-de-toque da repressão após o golpe militar de 1964.

Pela cobertura da Igreja, foi o único movimento de educação popular que sobreviveu ao golpe. Apesar do estrangulamento provocado pela suspensão do apoio governamental, novamente se redefiniu, em 1965, elaborando o conceito de “animação popular”, baseado nas experiências de formação de líderança para o sindicalismo rural. Essa perspectiva permitiu-lhe original prática de participação popular, interrompida pelo endurecimento da ditadura, após 1968.

Neste trabalho, pretendo analisar a criação e as redefinições ocorridas na fase mais rica da história do MEB – que existe até hoje, desfigurado -, no momento em que o Governo brasileiro lança nova campanha de “erradicação do analfabetismo”, retomando propostas há muito superadas.

O BRASIL SERÁ FORTE! O TICO TICO E A EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA BRASILEIRA PARA SER E FAZER O “PAÍS DO FUTURO” (1905-1920)

Patricia Santos Hansen, U. S. Paulo

A comunicação terá como objetivo analisar a transformação de um certo segmento da população infantil do Brasil nas duas primeiras décadas da República em representação do país visto pelas lentes da chamada “ideologia do país novo” que, apesar de embasada na constatação de um atraso no presente, levava uma parte da intelectualidade a ver com otimismo nacionalista as possibilidades de realização de um destino brilhante atribuído ao país dotado de tão grande território e tantas riquezas naturais.

Somou-se à disseminação desta ideologia na passagem do século XIX para o XX, o surgimento de um “sentimento da infância” no Brasil, o qual se expressou, entre outros aspectos, na produção de uma literatura infantil até então inexistente entre nós.

Este “sentimento” veio acompanhado da mudança do modelo familiar e ao mesmo tempo por uma multiplicação de imagens do país que, após a instauração do regime republicano, para representá-lo como “país novo” utilizavam-se muitas vezes de imagens de crianças pequenas.

Paralelamente à transformação da família que expressava uma gradual substituição dos valores ligados à sociedades patriarcais, tradicionais, por outros mais de acordo com a sociedade burguesa moderna, portanto, operava-se uma transformação simbólica desencadeada pela proclamação da República, a qual colocava em evidência o contraste entre a figura envelhecida de D. Pedro II - “desertor da meninice” segundo Gilberto Freyre -, associada à monarquia, e a utilização das imagens da infância nas representações da República.

Estas imagens, quando utilizadas com objetivo de promover valores cívicos e patrióticos, associavam o país aos significados de “novo”, de “potencialidade”, de “expectativa”, de “esperança”, de “futuro” e, finalmente, de “progresso”. Em contrapartida, a difusão da “ideologia do país novo” iria conferir novo status à criança como ser social. A criança, em particular aquela das cidades, da família em processo de aburguesamento, tornava-se ao mesmo tempo imagem e sujeito da “regeneração” do país pelo novo regime. Pois a sua importância maior não se dava no âmbito

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privado, como centro da família, a criança era transformada também em representação do futuro da nação.

Nesse contexto surgem publicações dirigidas especificamente ao público infantil entre as quais destaca-se a revista O Tico Tico, primeiro periódico para crianças no Brasil, publicado a partir de 1905 e nossa principal fonte, com caráter fundamentalmente pedagógico e tendo como finalidade desenvolver as potencialidades desejáveis desses “brasileirinhos” para, por meio deles, realizar as projeções otimistas que se faziam para a nação brasileira.

A ESCOLA DOMÉSTICA POPULAR DARCI VARGAS CRIADAS PELO BISPO DOM JOSÉ DE MEDEIROS DELGADO (1944-1951)

Paula Sônia de Brito, UFRN

O trabalho é parte da Dissertação de Mestrado intitulada "A Luta de Dom José de Medeiros Delgado -Escola Para Todos", que venho desenvolvendo no Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Inserido no eixo temático "Igreja e Educação", tem como objeto de estudo a cultura escolar de cunho profissionalizante da Escola Doméstica Darci Vargas, que foi criada pelo primeiro Bispo da Diocese de Caicó, Dom José de Medeiros Delgado, em 15 de oumbro de 1943, instalada nas dependências do Educandário Santa Terezinha pertencente à Congregação das Filhas do Amor Divino.. Organizada pela Diocese de Caicó conjuntamente com a Legião Brasileira de Assistência Social (LBA) e com o Serviço de Reeducação e Assistência Social (SERAS), voltava-se à educação doméstica de moças das camadas populares. Objetiva-se, portanto, examinar os aspectos profissionalizantes e relígiosos da culmra escolar adotada por essa instimição feminina católica de ensino profissionalizante de 1944 a 1951, a partir de fontes documentais como regimento, atas, Livro de Tombo da Diocese, e textos de Dom Delgado. Para a compreensão da cultura escolar adotou-se o referencial analítico de Carvalho (1998), Faria Filho (1999), Camargo (2000), Bencostta (2000), Dominique Julia (2001) e Souza (2002), por permitirem evidenciar a Escola Doméstica Darci Vargas, estruturada pelos moldes das "Escolas Domésticas Populares" francesas, como sendo uma instimição católica que regulamentava a educação profissional ministrada, articuladamente com as exigências de um "mercado de trabalho urbano", em devir, ou seja, de babás, empregadas domésticas, mães- e esposas.

UMA MENTALIDADE MAIS CRISTÃ NO PROFESSORADO: CATOLICISMO E MOVIMENTO DOCENTE NO BRASIL (1919-1964)

Paula Perin Vicentini; Universidade de São Paulo (USP)/Universidade Bandeirante de São Paulo (UNIBAN)

Busca-se aqui analisar aqui a atuação da Liga do Professorado Católico de São Paulo (LPC-SP) – fundada em 1919 e ainda hoje em funcionamento, embora com um número reduzido de associados – no âmbito do movimento docente paulista e da tentativa de arregimentação deste segmento da categoria em nível nacional, articulada por Everardo Backheuser (presidente da Associação dos Professores Católicos do Distrito Federal) e que, em 1933, resultou na criação da Confederação Católica Brasileira de Educação (CCBE). Segundo Carolina Ribeiro – membro bastante atuante da LPC-SP desde os anos 1930 e uma figura de grande projeção no campo educacional paulista –, a entidade visava a “formar uma mentalidade mais cristã no professorado a neutralizar em parte os efeitos da laicização do ensino”. Assim, a Liga engajou-se na luta travada entre educadores católicos e escolanovistas nos anos 1930, bem como atuou junto à Associação de Escolas Populares, cujas atividades se encerraram no final da década de 1950. Neste período, a Liga também participou do Movimento de Arregimentação Feminina (MAF) que realizou uma “Campanha de Moralização e Valorização Educativa nos Meios de Divulgação” e, em 1964, da “Marcha com Deus pela Liberdade”. Tendo sido a única entidade representativa da categoria até 1930, quando

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surgiu o Centro do Professorado Paulista (CPP) que congregava sobretudo professores primários das escolas públicas, a Liga editou a revista Anchieta (1934), cuja publicação foi interrompida devido ao lançamento da Revista Brasileira de Pedagogia (1934-1936), da CCBE, mediante a qual as associações representativas dos professores católicos dos diversos estados do Brasil teriam voz. Desse modo, pretende-se caracterizar a trajetória da LPC-SP e sua participação no movimento de arregimentação do magistério católico brasileiro, com base no conteúdo destas publicações, utilizando-se, ainda, das informações divulgadas na grande imprensa carioca e paulista acerca destas entidades e da documentação sobre a LPC-SP, localizada durante a pesquisa levada a efeito em nível de doutorado, com o financiamento da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Nesse sentido, busca-se, também, analisar o discurso veiculado nos periódicos mencionados acima, com vistas a identificar as especificidades das representações (na concepção de R. Chartier) difundidas acerca do trabalho docente e do movimento da categoria pela melhoria de seu estatuto profissional e a maneira pela qual tais questões se articulavam à luta pela disseminação do catolicismo no professoradoAZEVEDO, Fernando A Transmissão da Cultura: 3° parte da obra A Cultura Brasileira. Brasília/São Paulo, INL/Melhoramentos, 1976, espec. Cap.

AS FONTES DA FONTE: CONTRIBUIÇÃO PARA O ESTUDO DA PROBLEMATIZAÇÃO DAS FONTES NA HISTORIOGRAFIA EDUCACIONAL BRASILEIRA

Paulo Edyr Bueno de Camargo, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

No dia 19 de setembro de 1984, Adérito Augusto de Moraes Calado, é empossado como Sócio Titular do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Fundado em 1984, o Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo (IHGSP) é uma referência nos estudos de história dos paulistas. O lugar está repleto de documentos exclusivos e de grande importância, muitos, inclusive, mal foram manuseados, permanecendo inéditos até para os pesquisadores que freqüentam o local. No momento da posse, como é de praxe, pronuncia um discurso em homenagem ao seu patrono, o educador paulista João Augusto de Toledo. Esse discurso foi publicado dois anos depois, em 1986, com o título: João Augusto de Toledo – Uma vida consagrada à instrução pública. Os discursos realizados em homenagem as pessoas ilustres, os chamados textos de celebração, veiculados em momentos solenes como a posse de um novo membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, são compostos, na grande maioria dos casos, de elocubrações grandiloquentes e, sobretudo, carentes de problematização.

Adérito Augusto de Moraes Calado, por exemplo, para escrever o discurso de homenagem a seu patrono, utilizou como uma das suas fontes fragmentos do artigo de Fernando de Azevedo a respeito do educador paulista João Augusto de Toledo, intitulado Literatura Pedagógica, presente no livro Máscaras e retratos. No entanto a leitura integral do artigo, demonstra paradoxalmente uma visão negativa a respeito da obra de João Augusto de Toledo. Torna-se, portanto, fundamental a problematização dos documentos utilizados como fontes primárias na historiografia da educação brasileira. No caso em pauta, o conhecimento integral das fontes utilizadas pelos autores que, por sua vez, utilizamos como fonte em nossas pesquisas.

Além disso, a problematização das fontes também deve atentar para o fato de que a escolha deste ou daquele fragmento depende, em última instância, de diferentes perspectivas e finalidades da educação. Para a concepção de educação de Adérito Augusto de Moraes Calado, influenciado pelo pensamento católico, o fim da obra educacional é a perfeição integral do ser humano, com o único objetivo: a glória de Deus. A profissão de professor, nesse sentido, passa a ser considerada como um dom natural ou uma “graça divina”. Fernando de Azevedo, redator do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932), por outro lado, é totalmente contrário à concepção de dom natural do professor para o exercício do magistério. Ele considera de suma importância a formação profissional do educador.

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A CARTINHA PARA ENSINAR OS MENINOS A LER E A ESCREVER DE D. DIOGO ORTIZ DE VILHEGAS: INCUNÁBULO OU NÃO? SUBSÍDIOS PARA O INÍCIO OU FIM DE UMA POLÉMICA

Paulo Lopes, Escola Superior de Educação de Viseu

É ou não é a "Cartinha para Ensinar os Meninos a Ler e a Escrever de D. Diogo Ortiz de Vilhegas um incunábulo? Os poucos autores que, marginalmente ou não se dedicaram ao tema não tem uma posição clara sobre o assunto. A leitura dos mesmos deixou adivinhar que aqueles não se consultaram uns aos outros. O cruzamento de informação entre os diversos artigos consultados junto com algumas novas pistas entretanto descobertas conduz, neste artigo, a indícios para a resposta à questão sobre a natureza incunabular ou não do livrinho do prelado.

DISCURSO RACISTA NO FASCISMO ITALIANO

Paulo Vinicius Baptista da Silva, PUC-SP, CAPES/PICDT e UFPR

A comunicação é fruto da realização de estágio PDEE/CAPES na Universitá degli Studi di Milano. A partir de levantamento bibliográfico sobre discurso racista na Itália foram analisadas as fontes bibliográficas que discutem estratégias discursivas racistas durante o período fascista. A difusão de discurso racista na Itália utilizou-se de meios diversos para a sua difusão: literatura, revistas e jornais, publicações “científicas”, programas radiofônicos, sátiras e caricaturas, histórias em quadrinhos, cartões postais. Neste período foram racializados dois grupos, os judeus, e também os negros africanos, muito em função da guerra na Etiópia e dos problemas com as colônias italianas na África. Uma prática discursiva utilizada exclusivamente na racialização dos negros foram as fotografias “antropológicas”. Especial atenção é voltada para a literatura infanto-juvenil e para o investimento fascista na estruturação e difusão da “biblioteca-tipo”, com vistas a formar os indivíduos com base no pensamento único de estado. As práticas discursivas eram muito diretas, sendo a estratégia de “expurgo do outro” a mais comum utilizada. Tais estratégias contrastam com as práticas discursivas do “novo racismo”, que utiliza-se de subterfúgios diversos para a racialização de grupos sociais determinados, buscando não apresentar-se como discurso racializado.

REPRESENTAÇÕES DA ESCOLA E DAS PRÁTICAS ESCOLARES NA LITERATURA BRASILEIRA DO FINAL DO SÉCULO XIX

Pedro da Cunha Pinto Neto, Unicamp

A literatura brasileira do final do século XIX apresenta uma riqueza de temas e situações, que a configuram enquanto uma produção privilegiada para a compreensão dos processos de constituição de um imaginário sobre as práticas escolares, na medida em que, além de colocar em circulação um conjunto de idéias e de propalar modelos de atuação pedagógica, pôs em cena uma discussão sobre a modernidade pedagógica. Modernidade esta que aparece associada às reformas políticas pelas quais se clamava naquele momento, mas também, de novas práticas pedagógicas, as quais não podiam prescindir de um conjunto de novos dispositivos.

No presente trabalho, examinam-se imagens literárias que descrevem espaços e objetos de uso escolar, destacadas dos romances “O Ateneu”, obra do escritor brasileiro Raul Pompéia (1863-1895), publicada em 1888, e “A Normalista”, escrito por Adolfo Caminha (1867-1897) e publicada pela primeira vez em 1893. Clássicos da literatura brasileira, estas duas obras são exemplares enquanto produções que fizeram da escola e da educação escolar seu tema de fabulação. O conjunto das descrições dos diversos dispositivos destinados ao trabalho nas diferentes disciplinas, assim como dos ornamentos que compõem o espaço escolar, remetem-nos à constituição de um imaginário sobre um

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determinado modelo de escola, e de suas práticas, que não necessariamente, correspondiam à realidade das escolas daquele momento.

Na obra “O Ateneu”, encontramos representado um colégio interno particular, que procura disponibilizar aos seus alunos, filhos da elite, os mais modernos recursos instrucionais, procurando se apresentar enquanto símbolo da modernidade pedagógica. Já em “A Normalista”, nos deparamos como uma escola normal pública, onde o abandono dos instrumentos destinados às aulas de ciências e a ausência de recursos para a disciplina geografia figuram como testemunhos da incompatibilidade entre os métodos adotados nesta escola e os preceitos de uma pedagogia moderna.

EDUCAÇÃO ARTÍSTICA NO ESTADO NOVO: AS MISSÕES ESTÉTICAS DE FÉRIAS E A DOUTRINAÇÃO DAS ELITES ARTÍSTICAS

Pedro Manuel da Cruz Nunes do Amaral Xavier

Durante o Estado Novo, os padrões de ensino eram determinados por uma política educacional autoritária e conservadora. A partir de 1936, com o Ministro Carneiro Pacheco, a inculcação de um modelo de sociedade nas elites que acediam ao liceu e ao ensino superior torna-se mais visível nos currículos (na acepção lata do termo) e em toda a organização escolar.

Na sequência da reforma do ensino das Belas Artes, da remodelação do Ministério da Instrução Pública e da criação da Junta Nacional de Educação, instituíram-se as Missões Estéticas de Férias. As Missões Estéticas de Férias constituem uma modalidade de acção educadora criada durante o Estado Novo como complemento de formação da cultura técnica e ideológica dos jovens artistas portugueses. As componentes dessa cultura técnica prendiam-se, essencialmente, como teremos oportunidade de verificar, com a História da Arte e o estudo do património natural e cultural.

Em torno de um castelo, ou de um outro monumento artístico de vulto, ligado aos momentos míticos da nacionalidade, as Missões Estéticas de Férias, constituídas como autênticos estágios e orientadas por um ou mais académicos de História da Arte, privilegiavam uma perspectiva tradicional, conservadora e decorativista da Arte em território nacional.

Citando o diploma legal que fundou as Missões Estéticas de Férias, com esta modalidade educativa, o Estado pretendia “dotar a formação dos artistas e estudantes portugueses de artes plásticas com o conhecimento do património estético da Nação, nos seus valores naturais e monumentais, de que são tam [sic] ricas as nossa províncias, ao mesmo tempo que se contribuirá para a realização do respectivo cadastro, inventário e classificação...”2 .

Para levar a bom termo tão subtil tarefa, o Estado contou com o apoio empenhado de alguns dos mais ilustres eruditos de História da Arte de então, socialmente promovidos com a jovem Academia Nacional de Belas Artes, criada em 1932, através do seu envolvimento na concepção, organização, orientação e avaliação das Missões Estéticas de Férias. Nesta comunicação, procuraremos analisar os objectivos camuflados de uma política que, recorrendo ao valor educativo da História e do Património, procurava, em última instância, inculcar um conceito de arte e um modelo de sociedade nas elites estudantis, pretendendo assim prevenir os ataques políticos do vanguardismo plástico.

POLÍTICA EDUCACIONAL CATÓLICA NO BRASIL, DE 1870 A 1930

Peri Mesquida, Universidade Católica do Paraná

No Brasil, a Encíclica e o Syllabus, de 8 de dezembro de 1864, impulsionaram a Igreja a dar início ao que se convencionou chamar de “romanização”, isto é, um movimento de volta da Igreja brasileira à ortodoxia católica e ao Vaticano. A romanização acentuou-se após a “questão religiosa” (1872 a 1874) e recrudesceu depois da Proclamação da República, com o Decreto de dezembro de 1889 que separou a Igreja do Estado. A Pastoral Coletiva dos Bispos do Brasil, de 1890, reflete

2 Decreto-Lei Nº26957, de 28 de Agosto de 1936, D.G. Nº202, I Série.227

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sentimentos ambíguos e, até, uma certa perplexidade de alguns prelados brasileiros diante do acontecido. Para uns, tratava-se de uma situação de orfandade, para outros, a Igreja, finalmente, havia conseguido a liberdade há muito almejada. Se o processo de romanização da Igreja Católica no Brasil ser realizava por meio da clericalização e de uma ação essencialmente pedagógica, englobando a catequese e a educação relgiosa e secular, a separação das duas instituições, a secular e a religiosa, no final de 1889, acentuou a busca da Igreja por uma forma de se fazer positivamente presente na sociedade brasileira. O caminho a seguir ficará claro somente nos anos de 1915 e 1916, quando: a) a cúpula da Igreja publica a Pastoral Collectiva dos Senhores Arcebispos e Bispos; b) Dom Sebastião Leme, Arcebispo de Olinda, lança a sua Carta Pastoral. A estratégia para reassumir a hegemonia político-religiosa estremecida com a separação e para efetivar a romanização, seria o apelo à intelectualidade católica e a todos os católicos brasileiros que tivessem alguma projeção política no sentido de se fazerem presentes no sistema escolar do país, seja auxiliando a Igreja na instalação de escolas paróquiais, seja cooperando com a instituição eclesiástica na fundação de escolas de ensino primário e secundário. Mas, também, assumindo nas escolas públicas, disciplinas, tanto as denominadas “científicas” quanto a disciplina educação religiosa. Dessa forma, a educação tornava-se uma arma preferencial no caminho que levava a Igreja Católica no Brasil na direção da retomada do exercício da hegemonia religiosa e da parceria política com o Estado Republicano. Na Pastoral Collectiva, a educação como estratégia aparece em dois capítulos, enquanto na Carta Pastoral de D. Leme, a educação do povo, seja a escolar, seja a para-escolar, por meio da criação de instituições dirigidas por leigos, mais tarde materializadas no Centro D. Vital, no Jornal A Ordem e em diversos organismos de presença junto à juventude e aos operários, é um instrumento privilegiado, pois trata-se de “dissipar a ignorância” dos brasileiros, causa do seu afastamento da Igreja e da “pouca influência” desta sobre a sociedade civil e a sociedade política.

MULHERES-PROFESSORAS E A MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO NA REGIÃO DO GRANDE ABC. A EXPERIÊNCIA DO PROJETO MEMÓRIAS DO ABC

Priscila Ferreira Perazzo, Centro Universitário de S. Caetano do Sul

Tendo a temática da memória como um importante objeto de reflexão de pesquisadores do século XX, o Projeto Memórias do ABC do IMES-Centro Universitário de São Caetano do Sul (SP) registra o depoimento de professores como sujeitos históricos que, por meio da sua própria experiência de vida, geram interpretações dos acontecimentos por eles vivenciados no tempo e no espaço. Considerando suas lembranças pessoais na constituição de imaginários sociais que, ao serem estudados, revelam-se como fontes de pesquisa, essa comunicação pretende apresentar o acervo de memória e história oral que vem se constituindo sobre a história da Educação na região do Grande ABC, no Estado de São Paulo. Além de divulgar o acervo de História Oral disponível em fitas de vídeo, o Banco de Dados e Imagens Informatizado sobre a história da educação na região do Grande ABC, disponível à consulta pública tanto na instituição quanto on-line, e, ainda, um acervo documental recuperado, catalogado e disponível pelo Centro de Documentação e Memória da instituição, pretende-se também demonstrar como “pesquisamos memória para construir história”, analisando o discurso de professoras que relataram suas experiências profissionais inseridas na trajetória de suas vidas tanto profissionais, como na condição de mulheres, mães, donas de casa e cidadãs desde a década de 1950 até a atualidade, no sentido de que as lembranças das depoentes - que têm “suas modalidades específicas de imaginar, reproduzir e renovar o imaginário”, bem como suas formas específicas de sentir e pensar uma dada realidade – recompõem a história educacional da região, dos antigos estabelecimentos e, sobretudo, do perfil profissional e das condições de trabalho de professores da segunda metade do século XX.

A FOTOGRAFIA ALÉM DA ILUSTRAÇÃO: MALTA E NICOLAS CONSTRUINDO IMAGENS DA REFORMA FERNANDO DE AZEVEDO NO DISTRITO FEDERAL (1927-1930)

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Rachel Duarte Abdala, Universidade de São Paulo

Esta pesquisa, que foi desenvolvida na Pós-Graduação como Dissertação de Mestrado, teve como objetivo analisar a forma pela qual, a partir de representações fotográficas foi sendo construída uma imagem da reforma educacional, realizada por Fernando de Azevedo entre 1927 e 1930, no Distrito Federal. Percebendo e analisando a fotografia como fonte documental e como objeto, esta pesquisa, buscou lançar outro olhar sobre a reforma azevediana, fundamentando seu referencial teórico na nova história cultural. Ao analisar as imagens fotográficas geradas durante a reforma procurou-se perceber o modo como a renovação escolar foi representada pela produção dos dois fotógrafos responsáveis por registrar o empreendimento – Augusto Malta e Nicolas Alagemovits. Fundamentalmente, o objeto desta pesquisa foi a alteridade de expressão entre esses dois olhares e a forma como suas produções fotográficas foram apropriadas. Expressa em novas edificações e em práticas educacionais, a renovação escolar foi fundamentada pelos princípios escolanovistas, entre os quais o incentivo à observação. A fotografia foi utilizada como do recurso para imprimir maior visibilidade ás realizações renovadoras. Apesar do objetivo comum de documentar a reforma Malta e Nicolas diferenciavam-se em função da autoria, da expressão e da temática. Malta, fotógrafo oficial contratado da prefeitura, acompanhou toda a reforma educacional, registrava principalmente eventos, como a visita de autoridades às escolas e aspectos das práticas escolares. Enquanto os registros que Nicolas, fotógrafo autônomo e prestigiado no meio artístico, restringiram-se às novas edificações escolares. Considerando que a produção de imagens fotográficas engendra determinada percepção constituída pelo olhar do fotógrafo, pelo desejo do contratante e por fatores técnicos e históricos, esta pesquisa investigou os motivos da contratação, pela Diretoria Geral de Instrução Pública, de outro fotógrafo para registrar a renovação dos prédios escolares, além de já ter à disposição o fotógrafo da prefeitura. Admitindo a linguagem fotográfica como produtora de um discurso específico, é possível perceber sua vinculação à linguagem verbal e à propagação de ambas no intuito de construir uma imagem positiva da reforma, seja nos jornais ou em publicações especializadas. Desse modo, procurou-se investigar a produção de discursos pela prática fotográfica e pela apropriação das imagens fotográficas, por Fernando de Azevedo e pela imprensa.

A "PRINCESA DO SERTÃO" NA MODERNIDADE PAULISTA: IMPRENSA E EDUCAÇÃO NA RIO PRETO DOS ANOS 1920

Raquel Discini Campos, Unesp-Araraquara

O presente trabalho foi elaborado com base no estudo dos jornais A Noticia (1924-1930) e O Municipio (1926-1929), matutinos editados na cidade de São José do Rio Preto, interior do Estado de São Paulo – Brasil. Tais fontes permitiram a elaboração de um panorama da cultura letrada de uma época e de uma região, já que os referidos jornais eram monopolizados pelos homens – e algumas mulheres – que durante a década de 1920 viveram numa localidade que passava por rápidas transformações, de malfadada “boca do sertão” a cidade recentemente urbanizada.

A Noticia e O Municipio constituíam um mosaico das aspirações, desejos, medos e frustrações dos primeiros jornalistas da jovem cidade que crescia juntamente com seus órgãos de imprensa, bem como de ícones da elite ilustrada nacional, que tinham seus artigos transcritos em ambos os jornais.(5) A cidade e a imprensa rio-pretense desenvolveram-se num momento singular da história nacional, quando a preocupação dos privilegiados grupos letrados traduzia-se em marcada ênfase na educação dos brasileiros em geral, e rio-pretenses em particular, fenômeno integrado ao espírito de modernização do país.

Naquele contexto, a educação assumia vários significados, desde a esfera estrita da escolarização até o âmbito dos costumes e valores morais. Os cronistas escreviam sobre medicina, doenças, literatura, raça, costumes, folclore, cultura e vários outros assuntos, dentre os quais se destacava a temática escolar, sempre voltada para a normatização de espaços e pessoas postas sob seu raio de ação, prenunciando assim a eclosão do movimento educacional renovador que se generalizou na década de 1930.

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ASPECTOS DA ADMINISTRAÇÃO DO ENSINO NO ESTADO DE SÃO PAULO (1930-1935)

Raquel Pereira Chainho Gandini, U. Metodista de Piracicaba

A Diretoria do Ensino do Estado de São Paulo teve sete titulares durante o período de 1930 a 1935: M. B. Lourenço Filho (27/10/1930 a 23/11/1931), Sud Menucci (24/11/1931 a 26/05/1932), João Toledo (27/05/1932), Fernando de Azevedo (28/12/1932 a 25/07/1933, Sud Mennuci (07/08/1933 a 23/08/1933), Francisco Azzi (24/08/1933), Luiz da Motta Mercier (15/09/1934 a 25/09/1935) e Antonio de Almeida Júnior (26/09/1935). Este último permaneceu no cargo no período de setembro de 1935 a abril de 1938 e publicou dois anuários (1935-36 e 1936-37). No primeiro incluiu como anexo os relatos de seus antecessores, por ele solicitados, pois de 1929 a 1935 não haviam sido publicados os anuários. Os relatos constituem importantes documentos sobre as dificuldades e disputas políticas em torno da educação, que ocorreram no período imediatamente posterior à Revolução de 1930.

O objetivo do presente trabalho é analisar os relatórios, que são bastante sintéticos em sua maioria, procurando verificar os problemas que foram enfrentados por Lourenço Filho e Fernando de Azevedo. Ambos promoveram reformas na burocracia do Estado que culminaram com a expedição do decreto no. 5.884 de 21 de abril de 1933, conhecido por estabelecer o Código de Educação de 1933. Esse decreto foi modificado parcialmente durante as administrações dos seus sucessores sendo que as alterações diziam respeito a concepções diferentes a propósito do controle de escolas particulares, da realização de concursos públicos e à definição das prioridades que deveriam orientar as ações dos dirigentes e da própria máquina do Estado.

A análise desses relatórios indica a presença de um “projeto” de reforma por parte de Lourenço Filho, Fernando de Azevedo e Almeida Júnior, cujo eixo principal teria sido estabelecido pelo Código de Educação de 1933. A palavra projeto está entre aspas porque, embora não estivesse formalmente estabelecido, projeto está sendo entendido como orientação comum e afinidade de princípios e de propósitos: lutavam pela implantação de critérios técnicos, científicos e objetivos, no funcionamento do aparato administrativo como também e principalmente no que dizia respeito à contratação de professores e à carreira do magistério. As administrações que se intercalaram, com exceção talvez de João Toledo, procuraram fazer reverter esses critérios e procuravam sustentar concepções ruralistas, nacionalistas e patrimonialistas tanto no que dizia respeito ao funcionamento da máquina administrativa quanto ao funcionamento de escolas particulares e à realização de concursos e critérios para promoção na carreira do magistério.

A ESCOLA NORMAL PEDRO CELESTINO: ESPAÇO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO PROFISSIONAL DE DOCENTES MATO-GROSSENSES

Regina Aparecida Versoza Simião, CAPES e Universidade Federal de Mato Grosso

A criação das escolas normais marcou uma nova fase no processo de profissionalização que foi denominada por Nóvoa, como instucionalização da profissão docente. As escolas normais representam uma conquista importante no processo da profissionalização da docência, tendo em vista que é a partir daí que vão se tornando maiores as exigências de entrada; prolongamento e adequação do currículo, que vão sendo estruturados especificamente para formação de professores primários.

A profissionalização docente conforme Catani, está diretamente relacionada aos objetivos de formação dos Estados. Esses movimentos de organização profissional foram se configurando de 1870 a 1930, ocorrendo uma transformação na escola primária e esta transformação acaba também por atingir à reorganização da Escola Normal.

O grande marco histórico da Escola Normal em Mato Grosso, foi sem dúvida, sua criação no ano de 1911, pelo então Presidente de Estado Pedro Celestino. Assim como ocorreu com várias escolas normais brasileiras, foi remodelada nos seus velhos fundamentos, com o auxílio de professores contratados da capital paulista.

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Até 1922 não se evidenciaram no sistema de ensino mato-grossense, fatos relevantes na sua organização. Somente a partir deste ano com o início do segundo governo de Pedro Celestino, (demonstrando que esse era um visionário no tocante as ações educacionais) novas diretrizes foram impostas, sendo elas: 1. fiscalização das escolas por meio de inspetor remunerado; 2. simplificação do programa da Escola Normal, extinguindo os exames anuais, substituídos pela média das notas obtidas em provas mensais; 3. equiparação da escola Modelo aos demais grupos escolares; 4. criação do curso complementar em dois anos, possibilitando a transição do ensino primário para o secundário.

A partir da revolução de 30 a característica descentralizadora que vinha sendo implementada na escola primária e sob responsabilidade apenas dos estados sofre um redirecionamento centralizador onde a administração nacional passa a intervir de forma mais direta. Agora não era só uma questão de alfabetizar o individuo, era necessário antes de tudo educá-lo nos moldes da escola nova integrando-o no meio social. Para que se pudesse atingir estes objetivos a escola primária deveria se tornar mais concreta e eficiente.

Pretende-se nesta comunicação demonstrar como foi ocorrendo esse processo em Mato Grosso principalmente a partir do novo regulamento para Escola Normal decretado no ano de 1933 quando se define um novo conteúdo de preparo técnico-pedagógico, principalmente pela inclusão, no plano de estudos, de disciplinas como pedagogia, história da educação e especialmente psicologia, dando uma ênfase especial à didática que passou a ser intensificado no último ano, com vistas à preparação prática profissional.

A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE HISTÓRIA NA UFRN-CERES 1974 A 1988

Regina Coelli Gomes Nascimento, Universidade Federal de Pernambuco

Nesta pesquisa analisamos as condições que favoreceram para a instituição dos cursos de Estudos Sociais e História da Universidade Federal do Rio Grande do Norte na cidade de Caicó no Rio Grande do Norte-Brasil na década de setenta. A proposta esta relacionada à construção de um discurso sobre o saber histórico produzido nos cursos de Estudos Sociais e História, buscando analisar como as novas abordagens e procedimentos da historiografia vão sendo incorporados as reformas curriculares implantadas no curso, procurando entender à articulação entre o campo do conhecimento da história e o do ensino da história, a relação entre a produção e a transmissão da história e como o curso pensou e ensinou a história no período citado. Os documentos pesquisados estão relacionados às Atas das Reuniões do Departamento e do Conselho Departamental, Decretos, Resoluções, Regimento do Centro Regional de Ensino Superior do Seridó - CERES, entrevistas, etc. Também utilizaremos para fundamentar nossas reflexões a bibliografia referente à metodologia, teoria e ensino de História como também sobre a História da Cidade de Caicó-RN. Em nossas reflexões os conceitos de discurso e formação discusiva propostos pelo filósofo Michael Foucault serão necessários para a construção do nosso objeto. Desse modo, a escolha do tema “A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE HISTÓRIA NA UFRN-CERES 1974 A 1988” se justifica por considerá-lo relevante do ponto de vista histórico, sobretudo quando nossa proposta é alargar os estudos e conhecimentos a respeito da formação do professor de História no Brasil.

PELA VIRGEM MARIA E PELA PÁTRIA: O COLÉGIO DO CARMO E A FORMAÇÃO DE MULHERES CAPIXABAS NAS DÉCADAS DE 1930 E 1940

Regina Helena Silva Simões; PPGE/UFES; Sebastião Pimentel Franco; PPGHIS/UFES

Em 2003, iniciamos a elaboração de um catálogo de fontes sobre a história da educação no Estado do Espírito Santo, Brasil. Durante o trabalho de pesquisa realizado no Arquivo Público Estadual, identificamos um conjunto de documentos provenientes da Secretaria de Educação do Estado do Espírito Santo, precariamente armazenados em um galpão que funciona como “anexo” ao referido Arquivo. Juntamente com funcionários daquele órgão, propusemo-nos a identificar e catalogar, como fizemos com o acervo da sede, os documentos encontrados no “anexo”, relacionados

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à educação no Espírito Santo. Dentre os documentos encontrados, que ainda não haviam recebido qualquer tratamento técnico, destacamos um processo referente ao Colégio Nossa Senhora Auxiliadora (mais conhecido como Colégio do Carmo), instituição criada em 1900, em Vitória, capital do Estado do Espírito Santo, pela Igreja Católica e destinada à educação feminina. Trata-se de um corpo documental (inclusive material iconográfico) repleto de informações sobre a organização e o funcionamento do Colégio, exatamente no momento (de 1934 até 1956) em que o mesmo se encontrava submetido aos procedimentos de “verificação” instituídos pelo recém criado Ministério da Educação e Saúde. Aquele Ministério, criado em 1930 no início do primeiro governo de Getúlio Vargas, centralizou o controle e a avaliação das instituições de ensino brasileiras. Romanelli (2001) destaca como grande virtude da reforma educacional proposta pelo ministro Francisco Campos a estrutura orgânica imprimida ao ensino secundário, comercial e superior. Evidencia também o caráter pioneiro da “ação objetiva” (p. 131) desencadeada pelo Estado, que impôs nacionalmente o modelo proposto pela reforma. Abrangendo esse importante momento da organização do ensino no Brasil, quando “molde nacional e fôrma cívica” (Carvalho, 1998) impõem-se não só à educação mas à nação brasileira como um todo, os registros contidos no processo sobre o Colégio do Carmo (regimentos, regulamentos, organização e publicações estudantis, planta física, acervo bibliográfico, recursos didáticos, organização curricular, etc.), em cruzamento com informações garimpadas em outros documentos pertencentes ao acervo do Arquivo Público do Espírito Santo e com depoimentos de ex-alunas, permitem-nos historiar a trajetória do Colégio do Carmo nas década de 1930 e 1940, com o objetivo de melhor compreender, no contexto acima explicitado, as relações estabelecidas entre a Igreja Católica e o Estado no disputado espaço da esfera educacional no Brasil, evidenciando as suas repercussões no Espírito Santo.

PARA ALÉM DOS PADRÕES DE NORMALIDADE

Reinaldo Matias Fleuri, Universidade Federal de Santa Catarina

A construção da identidade é determinada pelas relações geracionais, étnicas e, de modo determinante, pelas relações de gênero. Joan Scott (1990, p. 15 explica que “gênero é um elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos. O gênero é um primeiro modo de dar significado às relações de poder”. Propor uma educação intercultural sem considerar o gênero como uma categoria primordial para se explicar as relações sociais que mantemos e estabelecemos, é esquecer que a primeira distinção social é feita através do sexo dos indivíduos. O sexo é construído socialmente através das relações motivadas por contextos manifestos e expostos à diferença sexual. No entanto, o gênero não é necessariamente o que visivelmente percebemos como masculino e feminino, mas o que construímos, sentimos e conquistamos durante as relações sociais. Então, é na problematização do sexo que começam os problemas relativos a essa temática, pois o gênero se constrói na relação com a diferença; e essa não necessariamente deverá ser biológicas. Por isso, compreendemos o conceito gênero como plural, dinâmico e constitutivo das relações sociais significadas por jogos de poder.

UM MANUAL DE ENSINO DO DESENHO NO BRASIL DE PRINCÍPIOS DO SÉCULO XIX: HERANÇAS DE UM PROJETO ILUMINISTA PORTUGUÊS

Renato Palumbo Dória, Universidade de São Paulo

Em 1917 o português Roberto Ferreira da Silva - engenheiro militar e pintor decorativo - publicava pela Impressão do Régia do Rio de Janeiro (onde seria professor na Academia Militar) o primeiro manual de ensino do desenho impresso no Brasil: o ELEMENTOS DE DESENHO E PINTURA, e regras geraes de Perspectiva, dedicado à D. João VI. Obra aparentemente isolada, ela dava continuidade contudo a um projeto editorial específico, voltado para a melhoria dos conhecimentos técnicos e artísticos em Portugal e levado a cabo através da ‘Typographia

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Chalcographica, Typoplastica, e Litteraria do Arco do Cego’, que a partir de fins do século XVIII edita em Lisboa uma série de obras de caráter didático, muitas delas traduzidas do francês.

No caso específico do desenho, tais publicações eram decorrência da idéia - então disseminada pela Europa - de que era preciso ‘vulgarizar’ os conhecimentos relativos a ele, tornando-o uma espécie de ‘língua universal’. Idéia que atingiria seu máximo amadurecimento no século XIX. Estes livros viriam assim à luz em meio a um conjunto de eventos relativos à propagação do ensino do desenho, como o estabelecimento de ‘aulas públicas’, de academias e do desenho nos currículos escolares. Contemporânea à publicação do livro de Ferreira da Silva foi à chegada ao Rio de Janeiro, em 1916, da denominada ‘Missão Artística Francesa’ - pequeno grupo de emigrados destinado a implementar uma escola de artes e ofícios no Brasil e embrião da ‘Academia Imperial das Bellas Artes do Rio de Janeiro’ (que duraria até o advento da República, em 1889, quando transforma-se em Escola Nacional de Belas Artes). Estes dois eventos concomitantes - a publicação de Ferreira da Silva e a chegada da Missão Francesa - nunca foram analisados porém em conjunto, dentro do quadro mais amplo das transformações culturais com as quais defrontava-se então o império português.

Tomando os manuais didáticos e escolares como documentos essenciais de análise para a História da Educação pretendemos evidenciar - sobretudo através do ELEMENTOS DE DESENHO E PINTURA de Roberto Ferreira da Silva - como no Brasil de princípios do XIX sobreviveriam as heranças de um projeto iluminista português de desenvolvimento das artes e ciências.

DOS LIVROS DIDÁTICOS AOS LÁBIOS DAS FREIRAS: A PRODUÇÃO DE SOCIABILIDADES E IDENTIDADES DIFERENCIADAS PARA O SERIDÓ – O INTERNATO CATÓLICO SANTA TERESINHA DO MENINO JESUS (CAICÓ, 1937 A 1945)

Ricky Sammy Lunardello Casado, U. Federal do Rio Grande do Norte

Que jeitos e trejeitos a História ensinada possui? Como seu saber pode ser modelado e manipulado por conjunturas específicas, como no contexto da II Grande Guerra? Partindo das seguintes proposições, direcionamos a pesquisa para a compreensão do processo de escolarização e internalização no interior da Ordem das Filhas do Amor Divino quanto à educação feminina do internato católico Santa Teresinha, na cidade de Caicó, no qual buscamos compreender a homogeneização de práticas, posturas e papéis diferenciados segundo o gênero, bem como a formação de uma rede de poderes e saberes “tatuados” nos corpos e mentes das internas para a formação de seu perfil social diferenciado. A partir de uma análise pós-estruturalista, cujo referencial teórico ancora-se em Foucault, Guattari e Chartier investigamos como o discurso histórico torna-se silente, a-critico, punitivo, escatológico e diferenciador do “bem” e do “mal”, a chave para a porta da pedagogia do “bom-mocismo” católico. Pudemos vizualizar pelas crônicas do internato e seu material didático, o quanto o corpo deve ser negado e como as discentes e docentes devem canalizar o mal, a sexualidade, vícios e costumes para fora de seus corpos puros, dóceis e educados. Pudemos, ainda, desvendar imagens e representações dos conceitos de gênero diluídos sutilmente na doutrina religiosa, preceitos educacionais e práticas construtivas de um cotidiano femininanente “normal”.

A REFORMA FRANCISCO CAMPOS E AS MUDANÇAS NO ENSINO PÚBLICO DE MINAS GERAIS

Rita de Cássia de Souza, USP

Este artigo tem por objetivo discutir uma das mais importantes reformas ocorridas no Estado de Minas Gerais que teve repercussão em todo o país e até mesmo no exterior. A Reforma, de cunho escolanovista, remodelou o ensino primário e Normal, além de criar um curso de aperfeiçoamento para formação de técnicos do ensino. O principal objetto de Francisco Campos, então Secretário do Interior, consistia na preparação de educadores para o exercício de sua função, utilizando os mais modernos conhecimentos científicos e técnicas de ensino na época. Para a realização desse intento,

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não poupou esforços. Contratou eminentes educadores na Europa como Helena Antipoff e Leon Walter e enviou quatro professoras para prepararem-se na Universidade de Colúmbia, nos Estados Unidos. Entre suas estratégias para promoção da Reforma, organizou um Congresso de Educação e reformulou a Revista do Ensino que comunicava as mudanças ocorridas e as novas expectativas quanto à educação aos professores dos mais recônditos lugarejos do Estado. Nos anos vinte do século passado as questões educacionais faziam parte de um projeto nacional de desenvolvimento e modernização. Neste contexto, a perspectiva disciplinar é indiscutível. O progresso, simbolizado pelas conquistas científicas e industriais, consistia em um ideal. A organização das fábricas, o controle do tempo e do espaço torna-se modelo para a sociedade como um todo. A tentativa de disciplinar a sociedade brasileira começava pelos bancos escolares. O exame, o esquadrinhamento dos espaços, a organização dos corpos, a estruturação de um corpo de conhecimentos sobre os sujeitos, todas essas técnicas disciplinares descritas por Foucault faziam parte de uma série de reformas escolares ocorridas em alguns estados brasileiros do período. Nesse contexto, a Reforma Francisco Campos destacou-se e seu idealizador e foi convidado para inaugurar o então criado Ministério da Educação e Saúde no governo Getúlio Vargas nos anos trinta. Nesse momento, a educação mineira passou por um retrocesso nos investimentos que resultou no fechamento de escolas primárias e normais e rebaixamento de salários, o que conseqüentemente impediu e dificultou a renovação do ensino pretendida pela Reforma. No entanto, não havia uma intenção de desconstruir o modelo anterior, que, apesar dos obstáculos e resistências, contava também com apoio e prestígio nacional e internacional. Houve, portanto, uma permanência dos ideais anteriores sem investimentos econômicos correspondentes. De qualquer forma, pode-se dizer que os ideais e influências da Reforma iniciada em 1927 tiveram importantes repercussões no ensino mineiro que se estenderam até os dias atuais.

ORDENAR, DISCIPLINAR, MANTER A ATENÇÃO: O CONTROLE DO TEMPO, UM ALIADO PARA FABRICAR “CORPOS DÓCEIS”

Rita de Cassia Gallego, Universidade de São Paulo

Os grupos escolares (escolas graduadas), instituídos em São Paulo em 1893, introduziram e ajudaram a introduzir uma série de modificações e inovações no ensino primário, produziram uma nova cultura escolar, que repercutiu na cultura da sociedade mais ampla, de modo especial em relação às vivências concernentes ao tempo. O aspecto temporal ganhou relevância no contexto da constituição da nova forma escolar, uma vez que consistia em um aliado para uniformizar, organizar e controlar o sistema de ensino paulista. Para tanto, seguir o calendário da escola, fragmentar o tempo das atividades, estipular o período exato a ser dedicado a cada tarefa, manter a ordem, a atenção e a disciplina passaram a integrar as prescrições dirigidas aos professores. Tendo em vista as várias dimensões do tempo escolar, será explorada neste trabalho sua dimensão disciplinar.

No contexto de organização dos grupos escolares, o mestre devia solicitar incessantemente os olhares das crianças ficando à frente da sala, local mais fácil de exercer obediência aos seus menores sinais, insistindo sobre o silêncio e a atenção, sendo atribuído ao professor um papel singular na “disciplinarização” dos corpos. Num espaço fechado e totalmente ordenado para a realização de cada um de seus deveres, o tempo devia ser cuidadosamente regrado, de modo a não deixar a marcha dos estudos ao acaso. Assim, refinados mecanismos disciplinares são integrados à cultura escolar, muitos deles inscritos em práticas simbólicas. Segundo Foucault (1987), “a disciplina fabrica corpos submissos e exercitados, corpos “dóceis”, aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência). Portanto, “a coerção disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e uma dominação acentuada” (Foucault, 1987, p. 119). As regras difundidas obedeciam a uma dupla racionalidade didático-pedagógica: a condição para se realizar o ensino simultâneo e os meios para alcançar as mais elevadas finalidades da escola primária – civilizar e moralizar o povo.

A proposta aqui apresentada é parte da dissertação de mestrado intitulada Usos do tempo: a organização das atividades de professores e alunos nas escolas primárias paulistas (1890-1929), cujo objetivo foi investigar o processo de construção da arquitetura temporal das escolas públicas

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primárias paulistas no que concerne à configuração do calendário e dos quadros horários a serem seguidos na organização das atividades dos professores e alunos notando-se permanências, rupturas e ressignificações. Numa tentativa de apreender a dinâmica da construção da arquitetura temporal das escolas públicas primárias, o corpus documental foi composto por fontes da legislação educacional concernentes ao estado de São Paulo, textos de quatro revistas pedagógicas e relatórios de inspetores.

PROVAS E EXAMES COMO FONTES PARA ESCRITA DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NO BRASIL

Rita de Cássia Gomes Machado, PUC-SP

Este estudo intenta contribuir com a história da Educação Matemática no Brasil, no período 1920 - 1960, a partir da análise das provas de Matemática dos exames de admissão ao ensino secundário.

Atualmente o ensino secundário seria o grau de ensino entre o primário e o superior, ou seja, os alunos deveriam ter no mínimo 11 anos de idade para ingressarem neste novo grau de ensino.O exame de admissão compreendia as provas realizadas pelos alunos para o ingresso no ensino secundário. Esse exame tornou-se de caráter nacional a partir de 1931, com a Reforma Francisco Campos. Assim, todo o candidato à matrícula na 1a série desse ensino, prestaria um exame de admissão, o qual continha provas escritas de Português (ditado e redação) e outra de Aritmética (cálculo elementar) e de provas orais sobre elementos dessas disciplinas e mais sobre rudimentos de Geografia, História do Brasil e Ciências Naturais.

As fontes primárias utilizadas são os exames de admissão de Matemática do Ginásio da Capital em São Paulo, e do Colégio Pedro II no Rio de Janeiro.

Considerando como referencial teórico-metodológico estudos sobre a história das disciplinas escolares, a pesquisa procurou mostrar que os exames de admissão constituíram entrave à proposta de modernização do ensino de Matemática no Brasil. Essa proposta refletia no país, o ideário do primeiro movimento de internacionalização da Matemática escolar.

“UM LUGAR DE HONRA NA GRANDE OBRA DE REGENERAÇÃO E PREVENÇÃO.” A ESCOLA PREMUNITÓRIA 15 DE NOVEMBRO DURANTE A GESTÃO DE FRANCO VAZ (1903-1912).

Rodrigo Mota Narcizo

A frase que constitui a primeira parte do título deste trabalho, de autoria de Braulio Goulart (1912), destaca a importância da Escola Premunitória, na gestão de Franco Vaz (1903-1912), no trabalho de regeneração dos menores que eram acolhidos na instituição evitando que eles se tornassem elementos nocivos. A questão-chave que me levou a pesquisar sobre a instituição deriva justamente desta afirmação: qual foi o papel efetivamente desempenhado pela Escola Premunitória, sob o comando de Franco Vaz, em relação ao atendimento e ao modelo pedagógico adotado na educação dos menores abandonados?

A Escola 15 de Novembro, fundada em 03 /12/1899, tinha como objetivo principal servir de internato para os menores recolhidos na rua pela polícia do Rio de Janeiro. Pouco tempo depois, foi acrescido o termo “correcional” ao nome da instituição, reforçando o seu caráter punitivo. Em 02/03/1903 foi sancionado o decreto 4.780 que regulamentou o funcionamento da escola e, no mesmo ano, Franco Vaz, crítico ferrenho das instituições de caráter correcional destinadas aos menores, assumiu a direção da Escola 15 de Novembro. Suas idéias partiam do pressuposto que o melhor tratamento aos menores que ainda não haviam cometido delitos, mas que se encontravam moralmente abandonados, seria investir-lhes uma educação adequada, em uma instituição, antes que eles sejam corrompidos pela criminalidade. Dessa forma, o vocábulo “correcional” foi substituído por “premunitória”, constituindo assim o novo nome da Escola 15 de Novembro. A instituição funcionou até

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1907 na rua São Cristóvão, na área urbana do Rio de Janeiro, quando foi transferida para a Fazenda da Bica, constituindo-se como uma Colônia Agrícola.

A educação, utilizada como meio regenerador, era algo muito valorizado na escola. A estrutura curricular era dividida em três segmentos. Nos cursos elementar e complementar o aluno aprendia aritmética, língua portuguesa, francês e higiene (clara influência dos preceitos higienistas), enquanto no especial eram ministradas aulas de desenho, música e pintura. Um ponto fundamental da proposta pedagógica da Escola 15 de Novembro é a importância dada ao ensino prático profissional. O trabalho era utilizado como ferramenta educacional e disciplinar, tendo como objetivo formar cidadãos qualificados, moralmente capazes e conscientes para a importância do trabalho (internalizando e naturalizando na mente dos menores toda uma lógica de organização trabalhista). Existiam diversas oficinas e parte da produção realizada pelos internos era comercializada, sendo parte da renda apurada revertida para a manutenção da instituição. As idéias defendidas por Franco Vaz marcaram a Escola Premunitória em toda a sua gestão à frente da instituição e o modelo focado na prevenção, ao invés da correção, sinaliza para um diferencial no tratamento aos menores abandonados, cuja proliferação passou a demandar a preocupação não só do Estado, mas também de diversos segmentos da sociedade (notoriamente, médicos e juristas) na busca de soluções para um problema que despertava grandes preocupações, uma vez que os menores moralmente degenerados, tomados pelo vício e adeptos da criminalidade poderiam se constituir em ameaça a sociedade e à nação.

MEMÓRIA E EXPERIÊNCIA : UM ESTUDO DE RELATOS DE EDUCADORAS ( 1940- 1950 )

Rita de Cássia Monteiro, USP

O presente trabalho tem como foco central um estudo sobre a memória e a experiência de professoras da Escola Caetano de Campos nas décadas de 40 e 50. É importante enfatizar que por muitas décadas a Escola Caetano de Campos, que foi fundada em 1846 , foi um marco de referência para a Educação no Brasil. Os sujeitos da pesquisa, ao todo sete, têm entre 70 e 87 anos ----, sendo que uma foi diretora, uma professora de metodologia do Curso Normal e as demais, professoras do antigo ensino primário. Inclusive três foram alunas da própria instituição. Por ser um estudo com fontes orais diversos planos se cruzam : a realidade de uma época , ou de um âmbito social, cultural ou sexual, na qual é vivida a experiência individual. Assim, o contexto social, histórico e as fontes tradicionais foram incorporadas na leitura das narrativas, permitindo uma compreensão de quais sâo as bases de uma representação simbólica da realidade, uma vez que o simbólico e o imaginário se apoiam numa experiência de vida dentro de um contexto social específico. Em sendo um trabalho que privilegia as narrativas orais como recurso metodológico, a pesquisa evidencia os valores de uma geração de mulheres, como também atualiza algumas particularidades inerentes à memória feminina, no que diz respeito a sua atividade profissional e a sua vida privada. Além desses aspectos , contribui para a recuperação da memória da Escola Caetano de Campos, e de outro, por ser um estudo com história oral , apresenta-nos os bastidores e o cotidiano da escola, oferecendo-nos dados novos sobre a instituição. E por fim, a pesquisa também desemboca numa série de representações sobre o ofício do educador e concepções sobre o ato de educar. Isto posto, a intenção nesta apresentação é selecionar 2 eixos centrais:

1-Como que a partir do presente, as narradoras se relacionam com o passado, no que tange aos aspectos mais gerais da sua vida . Trazendo à tona representações sobre um ideal de educação, e um paralelo entre a educação de outrora com a educação atual.

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2- Colocar em evidência o discurso normatizador, das décadas de 30 e 40, sobre o papel da mulher no seu contexto mais geral, e as influências do discurso higienista no interior da escola e na formação das educadoras.

SUZANA RODRIGUES E O CLUB INFANTIL DE ARTE: UMA EXPERIÊNCIA DE ARTE E EDUCAÇÃO MODERNAS NO MUSEU DE ARTE DE SÃO PAULO

Rita Bredariolli, ECA/USP

Seguindo a concepção de museu moderno norte-americana, o Museu de Arte de São Paulo reservou, desde sua inauguração, um amplo espaço às atividades educativas.

Uma das primeiras iniciativas promovidas pelo museu no campo educacional, foi a realização do Club Infantil de Arte, criado, organizado e dirigido por Suzana Rodrigues, “uma das mais entusiastas divulgadoras do teatro de fantoche no... Brasil”, como afirmava o jornal O Diário de São Paulo do dia 28/04/1948.

As atividades do Club Infantil de Arte voltavam-se para a produção de teatros de fantoches, ampliando-se pouco a pouco para as “aulas de desenho, de aquarela, de pintura, de modelagem, de cerâmica”, como descrito por Lina Bardi em artigo do primeiro número da Revista Habitat, veículo de divulgação do Museu de Arte de São Paulo, editado pela própria Lina.

Suzana justificou o trabalho com o teatro de bonecos por considerá-lo uma atividade que atende aos critérios da educação moderna, que, de acordo com sua afirmação no Diário de São Paulo do dia 25 de abril de 1948, “é a de se guiar a criança para a sociedade, colocando-a em grupos onde cada uma contribua com as possibilidades de que a natureza a dotou, criando alguma coisa para ser desfrutada pela coletividade”.

Esta afirmação de Suzana Rodrigues denota a tendência norteadora de todo o seu trabalho educacional, calcado no discurso difundido pelo movimento Escola Nova, cujas raízes ideológicas são encontradas no pensamento de Jean Jacques Rousseau. Envolvida por este ideário, Suzana Rodrigues implantou no Club Infantil de Arte do MASP um sistema de ensino que, na época, era uma novidade. Fundamentada na valorização e no respeito à livre- expressão infantil, transformou o Club Infantil de Arte do MASP em uma experiência “pioneira” de ensino da arte, na São Paulo de 1948. “...criar interesse para gerar situações onde as crianças se manifestassem livremente”, era, segundo suas palavras, o jogo metodológico diretor de seu trabalho.

Pietro Maria Bardi confirma esta orientação em uma carta à Mme. Germaine Cart (presidente do ICOM, International Council of Museums). Esta carta era uma resposta à um convite feito ao Club Infantil de Arte do MASP para integrar uma mostra de trabalhos em uma seção designada Musées d’enfants de l’ICOM, durante a segunda conferência bienal do ICOM realizada em Londres, no ano de 1950. Nela, Bardi descreve o Club Infantil de Arte, deixando explícito e reiterado o interesse pela preservação da liberdade expressiva da criança, pautada na falta de obrigatoriedade de temas que pudessem dirigir a produção infantil, a fim de “fazer com que as crianças” tivessem “ total liberdade”.

O início da valorização da expressão livre do universo infantil, teve como um dos seus propulsores os estudos na área de psicologia, que desde o final do século XIX e início do XX, transformaram-se em incentivo do interesse pela produção plástica da criança e influência para pesquisas em educação .

MOVIMENTOS INDÍGENAS COMO SUJEITOS SOCIOCULTURAIS: A LUTA POR EDUCAÇÃO

Rogério Cunha Campos, UFMG

Este trabalho procura pensar os movimentos indígenas como um dos importantes sujeitos na construção da experiência democrática recente, de contornos inéditos na história brasileira,

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constituída por uma gama muito variada de atores sociais. Nesse âmbito, o meu trabalho pretende compreender as relações entre os movimentos indígenas, seus sujeitos e os novos movimentos sociais, surgidos no Brasil no quadro histórico que corresponde à longa agonia da Ditadura Militar. De modo mais específico, procura dar elementos para reconstituir a história recente dos movimentos indígenas por educação escolar, focando especialmente os direitos à educação diferenciada, de caráter intercultural e bilíngüe, tal como foram inscritos na Constituição Federal de 1988. De forma inédita na história brasileira, uma constituição reconheceu a possibilidade de os distintos grupos étnicos que coabitam o território brasileiro, cultivarem na escola suas línguas maternas, suas culturas, em diálogo intercultural com os conteúdos da tradição moderna, que constituem a escola comum no Brasil, em tese a escola a que têm acesso os brasileiros.

Para realizar essa discussão, apresento as linhas centrais dos direitos estabelecidos na Constituição (1988), na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, (1996) e no documento do MEC “Diretrizes para a Política Nacional de Educação Indígena” (1993), considerando-os como os textos que delineiam as bases para a concretização da educação indígena entre nós. Tento discutir as conseqüências das concepções aí presentes, já que seus princípios orientam os programas de implantação de escolas e os cursos de formação de professores indígenas, que se seguiram, em diversos estados da federação.

As ações indígenas por educação conduzem à suposição de que os movimentos indígenas, tal como se configuram a partir do final da década de 1970, no Brasil, podem ser pensados como um entre os novos sujeitos que constituem os movimentos sociais, que sua presença na sociedade brasileira, a incidência de suas ações e as questões singulares, de natureza político-cultural e histórica, de que são portadores, os tornam interlocutores decisivos para a compreensão do presente e para desenvolvimento futuro das relações entre a sociedade brasileira e esses grupos humanos.

EDUCAÇÃO PELA MEMÓRIA: POSSIBILIDADES DE TRABALHOS EDUCACIONAIS EM CENTROS DE DOCUMENTAÇÃO.

Rogério Xavier Neves; Mestrando da Faculdade de Educação da Unicamp.

No Brasil, os centros de documentação foram marcados por uma trajetória de resistência e vanguarda a partir da metade do século XX, devido as questões políticas enfrentadas nessa época, especificamente nos anos 60, década de repressão e ditadura. Num momento em que as publicações poderiam ser consideradas subversivas e panfletárias, segmentos da sociedade, operários, intelectuais, políticos e estudantes iniciavam um movimento de preservação da memória, mesmo que, de maneira amadora e clandestina nos porões de algumas casas. Após esse período, entre as décadas de 70 e 80, iniciam-se discussões que apontam para uma democracia de direitos, definitivamente começava um movimento solidificado em alguns setores para resgatar uma história que não poderia ficar na clandestinidade, mas que deveria ser apresentada á população. No Estado de São Paulo, alguns professores da Universidade Estadual Paulista-Unesp, queriam recuperar a memória da universidade e iniciaram um programa de historia oral. Sentiram a necessidade de consultar os arquivos da instituição, quando identificaram problemas organizacionais em seus arquivos. Nesse momento, surge a necessidade de criar-se um centro a partir de um projeto de memória da universidade. Com o desenvolvimento desse trabalho, instituições que já acumulavam arquivos, quiseram transferir para a custodia da Unesp seus materiais. Ao receber os documentos do arquivo histórico do movimento operário brasileiro, inicia-se a linha de trabalho do Centro de Documentação e Memória da Unesp, hoje com um acervo de memória política tendo sob sua custodia importantes documentos sobre a história contemporânea brasileira. Como pensar então, numa educação pela memória? O primeiro passo será ampliar as discussões referentes a construção histórica de determinadas comunidades, pelo desenvolvimento do trabalho técnico, aliado ao universo simbólico criador e (re)criador de escrever a própria história, tornando esses espaços da memória, em lugares mais representativos e significativos para a sociedade. Ao considerar que, o aprendizado é um processo de trocas culturais promovido pelo diálogo entre os sujeitos envolvidos e os espaços disponíveis no ato de ensinar, esta pesquisa refere-se ao trabalho educacional nessas instituições considerando, a sua organização estrutural e documental, sua relação com um mundo construído historicamente, como esses lugares da memória estão ligados

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aos temas da educação e como essas idéias ampliam as discussões voltadas aos temas referentes ao patrimônio histórico e cultural. Portanto, conceber uma educação pela memória, implica em: refletir sobre cidadania; incorporar ao cotidiano da comunidade as experiências da história da vida social guardadas nesses espaços e inseri-las aos fóruns e debates educacionais.

TECNOLOGIAS DE NORMATIZAÇÃO DA CULTURA ESCOLAR: UM EXAME DAS ORIENTAÇÕES CURRICULARES PARA O ENSINO PRIMÁRIO PAULISTA (1892-1968)

Rosa Fátima de Souza, UNESP

Esta comunicação refere-se a pesquisa sobre a história do currículo da escola primária no estado de São Paulo - Brasil, no período de 1892 a 1968 (Projeto intitulado As Lições da Escola Primária: um estudo sobre a cultura escolar paulista apoiado pelo CNPq). No Brasil, desde 1870, a discussão sobre as matérias que deveriam compor os programas do ensino primário esteve em debate juntamente com outras questões políticas acerca da educação popular. Os liberais republicanos defendiam uma escola pública cuja formação do cidadão se pautasse por um currículo moderno e enciclopédico.

No elenco das matérias que passaram a compor o programa do ensino primário no Estado de São Paulo, a partir da primeira reforma republicana da instrução pública realizada entre 1892-1896, encontram-se diversos conteúdos culturais, habilidades básicas, normas e condutas de natureza moral e cívica.

Entre 1892 e 1968, os programas do ensino primário das escolas urbanas foram reformulados várias vezes no Estado de São Paulo: em 1892, 1894, 1905, 1918, 1921, 1925, 1935, 1949-50, 1968. Muitas dessas reformas buscaram adequar a seleção cultural do currículo às finalidades políticas e sociais atribuídas ao ensino elementar a cada momento histórico.

Neste estudo, os programas de ensino foram analisados considerando os conteúdos das matérias e a configuração textual do currículo. Enquanto se verifica uma estabilidade dos conteúdos de ensino, são notáveis as transformações no campo das práticas discursivas. Principalmente a partir da década de 1930, os programas passam a se constituírem em objetos culturais de transmissão de saberes. Trata-se, portanto, de dispositivos pedagógicos que buscam instituir um discurso educacional e informar a prática. Influenciados pelo movimento Escolanovista, esses materiais de orientação curricular adquirem novas configurações textuais e novas finalidades. Eles passam a oferecer aos professores uma fundamentação pedagógica seguida de orientações metodológicas detalhadas, discriminação de objetivos e sugestões de atividades. Dessa maneira, passam a compreender dispositivos de normatização da cultura escolar.

O estudo buscou ainda, compreender as condições de produção, circulação e uso desses textos tendo em vista a sua natureza institucional. De fato, eles foram produzidos pelo Estado e funcionaram como dispositivos de intervenção estatal sobre a prática docente e como estratégia de formação indireta de professores. De natureza prescritiva, instituem um discurso político-pedagógico. Assim, constituem-se, a um só tempo, objetos culturais e educacionais, material de circulação de modelos pedagógicos, teorias educacionais e de práticas educativas.

ESCOLA PRIMÁRIA NO ESTADO DO PARANÁ: AS ESCOLAS PROMÍSCUAS

Rosa Lydia Teixeira Corrêa, PUC/PR

Integra uma pesquisa sobre a escola primária no Estado do Paraná, Brasil, no período compreendido entre 1890 e 1930, pesquisa que se acha em fase inicial de desenvolvimento. Entretanto, pudemos constatar que existem diferentes tipos de denominações dadas para esse nível de escola nesse Estado. Por isso, este trabalho trata especificamente das denominadas Escolas Primárias Promíscuas, cujos primeiros vestígios remontam a abril de 1874, ano de criação de uma escola, sendo que os últimos registros datam de 1912. Daquela data até esta foram criadas inúmeras cadeiras e

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escolas primárias promíscuas, levando em conta legislação específica. Tem como objetivo analisar os significados do termo promíscuo em seus sentidos etimológico, sociológico e filosófico como elementos fundamentais para a compreensão desse tipo de organização e funcionamento de ensino, principalmente em razão de tratar-se de uma escola primária diferenciada. Essa diferenciação é percebida na própria legislação instituinte, justamente por meio do termo promíscua. Finalmente analisa também atas de resultados de exames realizados entre 1904 e 1912, período especificamente relacionado ao do projeto de pesquisa em andamento, bem como os materiais pedagógicos utilizados nessas escolas. Entende-os sob a perspectiva do conceito de cultura escolar no sentido que lhe atribui Julià (1993). Neste particular enfoca suas organizações, as práticas e os materiais escolares nelas utilizados, que se destinaram a finalidades específicas, quais sejam, a transmissão de saberes e a formação de condutas dos alunos, levando em conta a formação social que se desejava construir na época histórica em estudo. Por outro lado, os professores são considerados nesta abordagem, como agentes importantes na dinâmica da cultura desse tipo de escola, uma vez que foram eles os responsáveis pelo efetivo cumprimento da finalidade desse tipo de instituição educativa. Destaca ainda, a longa duração desse formato de escola que é organizada durante o período imperial e permanece por boa parte da Primeira República, tendo funcionado tanto em municípios como em povoados, e na própria capital, Curitiba. O que permite pressupor sobre sua importância e significado para um Estado que, diante dos dados obtidos até agora, parecia pretender suprir sua população em termos de escolarização haja vista o significativo número de escolas primárias criadas, mesmo durante o Império.

PARTICIPAÇÃO E CONSTRUÇÃO COLETIVA: O PROJETO PEDAGÓGICO DA ENFERMAGEM NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE/BRASIL

Rosalba Pessoa de Souza Timoteo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Trata do estudo acerca da construção coletiva do Projeto Político Pedagógico do Curso de Enfermagem da UFRN/Brasil. Tomando a categoria participação, na concepção rousseauniana, visa analisar a elaboração e consolidação do referido projeto, as estratégias e incorporação dos seus princípios pelos atores do processo, buscando resgatar sua interrelação com o contexto histórico. A intenção é articular dois pontos de tensão: um externo – no qual são privilegiadas as macrorrelações econômicas, sociais e políticas em nível nacional e local – e um interno – cuja compreensão toma o primeiro movimento como referência, para em seguida, analisar as elaborações teóricas (pressupostos, concepções e referenciais) que fundamentaram a proposta curricular. Dessa forma, firma-se na perspectiva de que embora resulte do esforço coletivo de uma categoria profissional, incorpora os princípios encontrados nos movimentos sociais brasileiros da década de 80, destacando-se o Movimento da Reforma Sanitária (Escorel, 1988, Fleury, 1997), e, na Enfermagem, o Movimento Participação (Oliveira,1990), os quais contemplavam, embora tardiamente, os princípios do bem-estar social, essencialmente os de bases socialistas, tais como a universalização do direito, a equidade, a participação e o controle popular. A pesquisa, foi realizada em três momentos, na qual priorizou-se a revisão bibliográfica acerca da conjuntura sócio-econômica e sanitária do Brasil, nos anos 80 e 90; a análise dos documentos referentes à Carta Constitucional Brasileira, à Reforma Sanitária e os movimentos na Enfermagem; e, o estudo da realidade local, especialmente, no que concerne à construção do Projeto Pedagógico para o Curso de Enfermagem da UFRN. Neste sentido, tratou de evidenciá-lo numa perspectiva ampliada, como conexão e produto das macrorrelações existentes na sociedade, para registrá-lo historicamente como um processo que ocorreu diferentemente das reformulações curriculares efetivadas até então, tendo em vista a participação, a reflexão crítica, os embates, os consensos e contradições derivados dos processos até então vivenciados, mas ao mesmo tempo, impulsionadores/efetivadores das mudanças esperadas na formação e na prática profissional.

TRAJETÓRIA DE PROFESSORAS NORMALISTAS DA DÉCADA DE 50 NA REGIÃO DOS CAMPOS GERAIS- PR

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Rosana Nadal de Arruda Moura e Silvana Maura Batista de Carvalho, UEPG

O artigo em questão relata a vivência de professoras normalistas, formadas e atuantes em instituições de ensino da Região dos Campos Gerais, no estado do Paraná, no contexto histórico-educacional da década de 1950. Esse recorte histórico deve-se à relevância do processo de industrialização e urbanização da sociedade brasileira, decorrentes das atividades econômicas, políticas e culturais e a exigência de expansão da educação escolar, atinja a uma parcela cada vez maior da população. Nesse contexto, procura-se mostrar como se deu a formação docente em nível de ensino médio, de acordo com a legislação educacional vigente, a atuação docente em espaços sociais diferentes, ou seja, escolas da zona urbana e/ou rural, contemplando assim algumas faces da realidade educacional da época. Os diferentes olhares dentro de um mesmo contexto constituem a riqueza dos dados levantados, pois buscou-se na memória dessas docentes, através da história oral, aspectos de sua formação na Escola Normal, bem como, da iniciação e atuação desses sujeitos em suas trajetórias profissionais.

REVELAÇÕES DO ZELO PELO PUERIL: RETRATOS DA INFÂNCIA NOS ANOS 30 E 40

Rosângela Ferreira de Souza, Universidade de São Paulo

O presente texto propõe-se a caracterizar a infância no período de 1930 a 1940 sob a ótica dos cuidados dispensados à criança pela puericultura no âmbito médico e educacional, sendo parte integrante da dissertação de mestrado intitulada “Vínculos do Feminino: Gênero e Puericultura”.

No ser humano, o período de crescimento que vai do nascimento à infância foi objeto, de uma perspectiva histórica, dos mais diferentes estudos, principalmente no século XIX, momento no qual a criança passa de adulto em miniatura a sujeito com características próprias, necessitando de cuidados especiais para o seu desenvolvimento. Nesse período, no Brasil, havia a preocupação com os altos índices de mortalidade infantil:

No início do século XX foram retomadas essas inquietações com a consolidação de iniciativas de proteção e assistência à infância. Em 1919, o Departamento da Criança no Brasil, fundado por Moncorvo Filho no final do século XIX, passou a organizar um serviço de informações acerca de instituições públicas e privadas que prestavam assistência direta ou indireta à infância. No âmbito da puericultura, as instituições foram classificadas em “puericultura intra-uterina (maternidades e serviços domiciliares de assistência ao parto), puericultura extra-uterina (gotas de leite, consulta de lactentes, creches, serviços de exames e treinamento de amas de leite)” (Kuhlmann, 2000, p. 480).

A partir da década de 30, o governo brasileiro consolida todas as leis existentes a respeito da assistência e proteção à infância A legislação vigente foi produto de décadas de lutas, sempre mais intensas, para proteger as crianças pobres de doenças, das precárias condições de sobrevivência e daquilo que alguns acreditavam ser a ignorância e superstição de suas mães. À medida que higienistas e eugenistas elevavam a ciência da saúde física e moral a um novo patamar de urgência, uma multidão de especialistas em medicina e educadores sanitários al propunha-se instruir as mães nos princípios básicos de saúde e higiene.

Essas preocupações acentuaram-se, pois as crianças, principalmente as das classes populares, eram consideradas como matéria-prima fundamental no projeto de nação que se forjava. Segundo as elites econômicas, políticas e sociais, as famílias pobres constituíam-se em núcleos incapaz de fornecer à criança um desenvolvimento físico e mental adequado, devendo o governo assumir todo o conjunto de cuidados e assistência a essas crianças.

Multiplicaram-se no período as comemorações da infância como festas cívicas, como concursos de robustez, nas quais eram reforçadas as políticas sociais da infância, com a divulgação de práticas higienistas como campanhas de vacinação e combate a doenças, a elaboração de regulamentos sanitários e serviços de inspeção sanitária escolar.

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Com esse estudo buscar-se-á traçar um panorama histórico dos avanços e recuos da puericultura e suas contribuições para a construção de uma infância de acordo com as perspectivas de saúde e higiene vigentes à época estudada.

PROFESSORAS NO MASCULINO: RELAÇÕES DE GÊNERO E MOVIMENTO ASSOCIATIVO

Rosario S. Genta Lugli, Universidade Bandeirante de São Paulo

Pretende-se neste trabalho analisar de que forma os aspectos relativos às questões de gênero se expressam no movimento associativo das professoras primárias no Brasil, nas décadas de 1950 e 1960. Tomam-se como fontes a documentação e os periódicos de associações docentes de cinco estados (São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia e Pernambuco), que constituem as mais atuantes no período, organizando inclusive Congressos Nacionais de Professores Primários. Tal amostra é significativa pelos seus contrastes: o mais visível é entre a associação de São Paulo (Centro do Professorado Paulista), que era dirigida por homens, e as demais, que o eram por mulheres, porém existem outros fatores diferenciadores, relativos a uma maior ou menor combatividade por salário, ao pertencimento a sociedades mais tradicionais, aos vínculos com instituições de formação e pesquisa. Estes elementos, todos eles de alguma forma ligados ao fator de gênero, permitem explicar diferenciações notáveis nas representações da docência que são veiculadas, embora haja um fundo comum que permanece.

Pretende-se aqui analisar formulações sobre o trabalho docente, tanto as relativas aos valores exemplares como às práticas cotidianas, procurando visualizar como a condição feminina (ou masculina) afeta sua construção. Tendo-se em conta a natureza dos discursos dos periódicos das associações, que visavam principalmente a conquistar e manter o grupo de professoras primárias associadas, pode-se também considerar que os “valores docentes” apresentados constituem uma via de acesso ao “habitus professoral” – hipótese que ganha força uma vez que se observam as relações entre esse discurso e as estratégias de reivindicação que estas professoras efetivamente levaram a cabo.

A “expressão do feminino” no movimento docente a que faço referência é aquela identificada por Michelle Perrot com a domesticidade, que tradicionalmente tem sido o espaço da mulher: o cuidado da intimidade, a preservação da memória familiar, a constituição do espaço do lar. A amplitude desta caracterização permite apreender tanto os aspectos mais sutis, que indiretamente se vinculam ao feminino na estrutura associativa docente, como as imagens mais explicitamente vinculadas à condição feminina. Utilizo também como instrumental teórico a teoria dos campos de Pierre Bourdieu, bem como sua análise relativa ao conceito de gênero.

TRAJETÓRIA HISTÓRICA DA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO DIFUNDIDA NOS PERIÓDICOS DA ÁREA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL: 1930-2000

Roseane Patrícia de Souza e Silva e Lana Ferreira de Lima, Universidade Federal de Goiás

Recuperar a memória da produção do conhecimento da área da Educação Física, veiculada pelos periódicos brasileiros, foi o objetivo central deste estudo. Com esse intuito foram analisados os diversos números de 36 periódicos da área da Educação Física, publicados no período de 1930-2000. Como fonte principal de coleta de dados, foi utilizado o Catálogo de Periódicos de Educação Física, publicado pela PROTEORIA, com o apoio do CNPq. Também foram consultadas outras fontes bibliográficas e documentais voltadas para o estudo de periódicos brasileiros. A partir da organização cronológica de cada número publicado, os periódicos foram organizados em três grupos: dos anos 30 aos anos 60; dos anos 70 aos anos 80; dos anos 90 a 2000. Foram analisados os seguintes aspectos: problemas relativos à periodicidade; região geográfica de publicação e autores com maior índice de publicação. Os resultados do estudo permitiram explicitar que: 1) apesar de a produção científica da área da Educação Física ter se intensificado no Brasil a partir dos anos 80, com a criação dos cursos

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de pós-graduação estrito-senso, desde os anos 30, do século XX, se expressa o interesse da comunidade da área de difundir de forma sistemática os conhecimentos produzidos; 2) O problema da garantia da periodicidade tem acompanhado esse veículo de informação e divulgação científica desde as suas primeiras investidas na tentativa de difusão do conhecimento produzido pelos profissionais da área. Importantes periódicos não conseguiram superar as dificuldades e barreiras que ainda hoje comprometem a socialização do conhecimento científico brasileiro; 3) Dos anos trinta do século passado, aos dias atuais, as regiões Sul e Sudeste, especialmente o eixo Rio - São Paulo, vêm centralizando as publicações dos periódicos da área. Além disso, os autores com maior índice de publicação, também são oriundos de instituições dessas regiões geográficas. De modo geral, o estudo permitiu resgatar a forte presença dos periódicos na área da Educação Física no País. Acreditamos que estudá-los com maior profundidade, em futuras investigações, nos permitirá, cada vez mais, resgatar uma importante via de consolidação da área e da construção dos caminhos e vertentes de sua produção científica.

A REFORMA DA FORMAÇÃO INICIAL DOS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA NO BRASIL – UMA ANÁLISE DAS PROPOSIÇÕES GOVERNAMENTAIS.

Roselane Fátima Campos, Faculdade de Educação e de Psicologia de Joinville.

Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa acerca da reforma da formação inicial de professores da educação básica, implementada pelo Estado brasileiro desde os anos de 1990. Tomando como referência os documentos oficiais, analisamos as proposições apresentadas pelo governo com o intuito de identificar as bases epistemológicas, os princípios, as normas e indicações que dão coesão às proposições apresentadas. Os documentos foram selecionados e analisados seguindo as orientações do método de análise de discurso textualmente orientada. Pudemos constatar que a proposta governamental, embora circunscrita à formação inicial, traz imiscuído um projeto de profissionalização que visa, por um lado, a construção de uma profissionalidade docente pautada em referências como responsabilização por resultados, eficácia na ação pedagógica e capacidade gestionária; por outro, pretende criar condições para a implementação de novas formas de gestão da função docente. Nesse sentido, a adoção da noção de competências como central no modelo proposto atende bem a essa intenção, na medida em que possibilita desenhos curriculares “enxutos” e pragmáticos, ao mesmo tempo em que se apresenta como uma ferramenta privilegiada de gestão e controle do coletivo de professores. Aos aspectos pragmáticos próprios da formação baseada em competências, somaram-se também outros fatores como duração do tempo da formação, constituição de instituições especificamente voltadas para esse fim – os Institutos Superiores de Educação, refutação da formação considerada excessivamente acadêmica, entre outros; esses elementos configuram um modelo de formação referenciado, principalmente, em uma perspectiva técnico-instrumental. Medidas dessa natureza acrescidas dos dispositivos legais fornecidos pelo governo possibilitam a construção, no campo do magistério, de uma nova institucionalidade, com repercussões na remuneração, carreira e formação continuada. Concluímos que, ao implementar tal reforma, o governo não visa apenas habilitar maior quantidade de professores. Seu objetivo é construir um novo tipo de professor, com capacidades subjetivas consoantes aquelas demandadas pelo mercado e pelas novas formas de sociabilidade que caracterizam as sociedades capitalistas contemporâneas. Deste modo, a reforma ainda que pretenda assimilar reivindicações do movimento docente, acaba por impossibilitar sua realização na medida em que os condicionantes que a determinam são impeditivos de uma formação voltada para as reais necessidades de uma educação de qualidade e democrática.

REFLEXÕES SOBRE MODELOS PEDAGÓGICOS E EDUCAÇÃO CATÓLICA EM COLÉGIOS MASCULINOS

Roseli Boschilia, Universidade Tuiuti do Paraná

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A comunicação tem como objetivo refletir sobre os modelos educacionais, no âmbito das escolas masculinas católicas, a partir da problematização das idéias e conceitos que embasaram as propostas formuladas para atender um segmento específico da população.

A análise desses modelos exige um recuo ao início dos tempos modernos, uma vez que a partir do Concílio de Trento a juventude desponta como a camada social capaz de viabilizar o projeto reformista e a educação passa a constituir um mecanismo eficiente para frear os avanços da modernidade.

A partir do século XVI, as idéias tridentinas ganham fôlego com a expansão da Companhia de Jesus por diferentes continentes. Atenta às transformações ocasionadas pelo contexto de consolidação do Estado Moderno, a Igreja, assim como o Estado, procurava acompanhar o processo de mudanças bastante visíveis que estavam ocorrendo no espaço cultural e social e cujos reflexos tinham desdobramentos na estrutura escolar, nas práticas de sociabilidade e, sobretudo, no papel ocupado pelo jovem na sociedade moderna.

Assim, desde o final do século XVII, a necessidade de transmitir códigos de boa conduta para as camadas mais pobres, como forma de garantir a ordem e a moralidade pública e preparar trabalhadores produtivos para a nova sociedade que se instituía, passou a fazer parte das preocupações de diversos pensadores. Dentre esses, destaca-se São João Batista de La Salle, que fundou, em 1682, o Instituto dos Frades das Escolas Cristãs, criado especialmente para atender às camadas populares.As reflexões sobre educação, elaboradas por esse pensador, foram sistematizadas em três obras: Devoirs du chrétien; A conduite des écoles chrétiennes e Les Règles de la bienséance et de la civilité chrétienne, escritas no início do século XVIII.

Nessas obras, La Salle procurou formular um modelo pedagógico voltado para um segmento particular, oferecendo, a um só tempo, educação formal e códigos boa conduta, transmitidos dentro do espírito da moral cristã. Dessa forma, o seu projeto educacional distinguia-se tanto do modelo jesuítico, mais direcionado à educação das elites, quanto do célebre manual de civilidade escrito por Erasmo de Roterdão, voltado para a sociedade em geral.

Sendo assim, esse estudo pretende discutir as rupturas e permanências presentes nesse modelo e as apropriações que dele foram feitas por outras congregações masculinas, ao longo do tempo.

CONTRIBUIÇÃO DO NUTESES NA PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA DA PRODUÇÃO CIENTÍFICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL

Rossana Valéria de Souza e Silva, Universidade Federal de Uberlândia

O resgate da memória da produção científica de uma área pode contribuir com a melhoria da qualidade da pesquisa, com os avanços da ciência e, principalmente, auxiliar no diagnóstico do impacto dessa produção no âmbito social de sua criação. O objetivo central desta investigação é analisar a trajetória histórica da produção científica em Educação Física no Brasil, dos anos 70 aos dias atuais, a partir das dissertações e teses produzidas nos mestrados e doutorados da área e de áreas afins. Trata-se de uma pesquisa longitudinal, cuja fonte principal de consulta foi o NUTESES - Núcleo Brasileiro de Dissertações e Teses em Educação Física e Educação Especial, localizado na Universidade Federal de Uberlândia – UFU. A primeira etapa do estudo consistiu na coleta e organização das dissertações e teses, que encontravam-se dispersas nos diferentes programas de pós-graduação do País. Inicialmente, foram catalogadas 505 dissertações, quase 99% do total da produção. A segunda, voltou-se para a disponibilização on-line dos resumos, dados bibliográficos e complementares, de todas as dissertações adquiridas. Foi, ainda, criado um sistema de atendimento ao usuário, possibilitando a recuperação dos textos completos dos trabalhos. As etapas que se sucederam procuraram garantir a ampliação e manutenção atualizada do acervo, bem como o desenvolvimento de pesquisas sobre as teses e dissertações em Educação Física. Esses procedimentos possibilitaram o desenvolvimento deste estudo a partir da análise de quase duas mil pesquisas. As fontes complementares de coleta de dados foram obtidas, na CAPES e nos próprios programas de pós-graduação. Os principais resultados ressaltam os fatos mais relevantes que marcaram a história dos

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vinte e seis anos de existência da pós-graduação estrito-senso em Educação Física, situando-a no contexto da pós-graduação brasileira. Destacamos dentre eles, o crescimento do número de mestrados, a criação dos doutorados e o aumento do número de teses e dissertações. Demonstram, ainda, que apesar dos avanços alcançados a pós-graduação da área ainda não se consolidou e enfrenta graves problemas como a concentração geográfica nas regiões Sul e Sudeste e o descredenciamento de programas desenvolvidos em instituições pioneiras. Em relação às teses e dissertações o estudo explicita que apesar do crescimento da produção e das mudanças no perfil epistemológico das pesquisas, a partir de meados dos anos 80, muitos estudos carecem de rigor científico e comprometem a meta máxima da pós-graduação brasileira de formação de pesquisadores. As conclusões apontam para a necessidade reflexões e redefinições de rumos, sobre o papel que os pesquisadores da área da Educação Física têm assumido enquanto partícipes da história da construção da ciência contemporânea.

MEMÓRIA DE EX-ALUNOS/AS: RECOMPONDO TEMPOS E LUGARES DA EDUCAÇÃO

Saionara Goulart Dalpiaz, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Esta comunicação apresenta resultados parciais da pesquisa de mestrado intitulada Memória de alunos/as: Recompondo Tempos e Lugares da Educação, desenvolvida na UFRGS, Brasil. A investigação busca contribuir à compreensão das especificidades que cercam a História da Educação no Rio Grande do Sul, ao longo da própria história brasileira. Concebendo a memória como construção humana, permeada pelos movimentos singulares e sócio-culturais que a constituem, e a história oral como metodologia inscrita na História Cultural, investigam-se as memórias de ex-alunos/as, especificamente, alunos/as que não se tornaram educadores, tomando como principal evocador o prédio da antiga Estação Experimental da Escola de Engenharia de Porto Alegre, hoje conhecido pela comunidade pelo codinome "Casarão", situado na localidade rural do município de Viamão. Mais do que um possível "lugar de memórias" o prédio foi pólo gerador de pesquisas e multiplicador de novas tecnologias no campo agropecuário no início do século XX. A pesquisa realizada em documentos, relatórios e revistas da época, revela que os estudos do solo, do clima e da água, junto às várias raças bovinas, sementes e mudas, que decoraram parte da paisagem rural-urbana Republicana Rio-grandense, tiveram como porta de entrada e de utilização posterior, os estudos em seus laboratórios. Os dados evidenciam que o motivo de sua criação foi o de oportunizar aos cursos superiores de Veterinária e Agronomia da Escola de Engenharia de Porto Alegre, uma formação teórico-prática através de estágios, experimentação de instrumentos e técnicas diversas. Concomitantemente, nas décadas de 1920-1930, em nível elementar e médio, foram implementados no prédio um internato de meninos do Patronato Agrícola, o Curso de Capatazia Rural e o Ensino Ambulante. Posteriormente, no período de 1940-1957, este acomodou os alunos/as do Grupo Rural Dr. João Dutra, perdendo algumas especificidades de origem. No ano de 1957, o governo estadual torna-se tutor do prédio criando a Escola de Mestria Canadá, atualmente Escola Estadual Agrícola Canadá. Aliada ao corpus empírico de pesquisa encontram-se as narrativas de ex-alunos/as e as entrevistas como técnica. A metodologia da história oral ancora-se na multiplicidade temporal das permanências e rupturas identitárias ocorridas ao longo da história deste prédio. Considera os diferentes momentos vividos enquanto instituição educativa, as especificidades de cada época e o quotidiano reorganizado como possibilidades de análise às memórias evocadas. Assim, a pesquisa busca problematizar a constituição do depoimento em documento, as questões identitárias, a produção dos esquecimentos, e de como o rememorar se constitui no trabalho da memória individual e coletiva.

O COLLOQUIUM HEPTAPLOMERES JEAN BODIN - CAMINHOS DA TOLERÂNCIA E EDUCAÇÃO NO SÉCULO XVI

Sandra Aparecida Riscal, Universidade Federal de São Carlos

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O objetivo do presente trabalho é apresentar algumas reflexões a respeito da articulação entre educação, tolerância e processo civilizador nas obras de Jean Bodin, pensador francês do século XVI, que se tornou conhecido pelo estabelecimento do conceito moderno de soberania. Bodin foi um dos primeiros pensadores a conceber a educação como instituição pública e malgrado sua importância para a compreensão da gênese do espaço público moderno, suas obras vem sendo ignoradas pelos estudiosos da educação. Neste estudo trataremos do livro Colloquium Heptaplomeres (1596) ou Colloque entre sept scavans qui sont de differens sentimens des secrets cachez des choses. Trata-se de uma obra impar, mesmo para o século XVI, em virtude da inédita defesa da tolerância religiosa em um momento no qual o confronto entre católicos e protestantes atingira seu auge. O terror promovido pelo flagelo das guerras religiosas levou Bodin a considerar a tolerância e a educação pública laica como centrais para a constituição do poder soberano estatal. O Colloque, obra eminentemente pedagógica, apresenta-se como a representação do espaço público, no qual homens de diferentes credos, católicos, hebreus, calvinistas, maometanos ou mesmo seguidores de uma religião natural encontram a atmosfera propicia para o livre e franco debate. Última obra de Jean Bodin, o Colloque não chegou a ser publicado e por isso não chegou a ser incluído no Index Librorum Prohibitorum, como seus demais livros. Todavia centenas de cópias clandestinas circularam pela Europa ao longo dos séculos, até sua primeira publicação no século XX. No presente trabalho utilizamos a versão publicada e estabelecida por François Berriot a partir do manuscrito da. Bibliothèque Nationale de Paris.

O SLOYD EDUCACIONAL NA ESCOLA PROFISSIONAL MASCULINA DE SÃO PAULO (BRASIL), 1911-1934

Sandra Machado Lunardi Marques, PUCSP

A Escola Profissional Masculina da Capital, fundada em 1911, é uma das iniciativas pioneiras do ensino profissional público brasileiro, que a historiografia tem ignorado. Nela, foi adotado o sloyd educacional ou trabalho manual educativo em madeira, cuja origem reporta a Froebel, Kerscheinsteiner, Coegnus e Salomon.

Dirigindo a Escola Normal de Näas (Suécia), O. Salomon consagrou a prática de que o manuseio da madeira é intrinsecamente educativo por desenvolver força, vigor, habilidade técnica, coordenação do lado direito e esquerdo do celebro, ambidestralidade, precisão, formação do juízo, iniciativa, posturas corretas de trabalho, disciplina, senso estético e utilitário.

Em 1888, o sloyd educacional foi introduzido nos Estados Unidos pelo sueco Gustaf Larson, ex-aluno de Otto Salomon, em uma região de imigrantes pobres de Boston. Largamente aceito naquele país, o sloyd iniciava crianças de ambos os sexos, da escola elementar e secundária, e jovens do Curso Normal, a manusearem madeira, uma matéria-prima abundante, de largo emprego na economia deste país. O sloyd educacional possibilitava a continuidade das práticas froebelianas iniciadas no jardim da infância, assim como se insurgia contra a tendência técnica, de origem russa, criada por Victor Della Vos, da Escola Técnica Imperial de Moscou, e difundida nos cursos superiores e nas escolas profissionais norte-americanas.

Ao abolir de início a divisão do trabalho, o emprego de máquinas, ferramentas, pregos e colas, o sloyd educacional estimulou o desenho à mão livre, exercitando o senso de formas e proporções, pela vista e pelo toque. Por seu caráter disciplinar, o trabalho manual educativo em madeira possibilitava segundo William James, a formação de cidadãos habilidosos, práticos e auto-suficientes.

É possível que o normalista brasileiro Aprígio Gonzaga, um dos criadores da Escola Profissional Masculina da Capital tenha freqüentado um destes cursos, como a Introdução do seu livro o sloyd (1916) registra. Dessa e de outras experiências, a serem detalhadas neste paper, resultaram a criação da Escola Profissional Masculina de São Paulo e de congêneres em um contexto de reorganização do trabalho livre, como alternativa ao emprego de mestres de ofícios estrangeiros. Portanto, tratava-se de iniciativa distinta das instituições de benemerência voltadas aos órfãos e desvalidos.

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Em contraposição aos Estados Unidos, onde o sloyd educacional penetrou na rede comum de escolas públicas, o “sloyd paulista” foi introduzido para qualificar e nacionalizar “operários completos”, isto é, responsáveis pela divisão, supervisão e acabamento do trabalho nas fábricas e canteiros de obras, assim como pela disciplina interna das oficinas. Em curto prazo eles substituíram os mestres de ofícios imigrantes, de tendência anarquista; traço que singulariza o “sloyd paulista” pelo seu caráter de enfrentamento, uma vez que a Escola Profissional Masculina da Capital situava-se em um bairro de migrantes e imigrantes hostis ao Estado. Os desdobramentos deste antagonismo político do ponto de vista pedagógico serão objetos deste paper.

O VERMELHO E O NEGRO: O DEBATE IDEOLÓGICO-PEDAGÓGICO EM TORNO DO COMPÊNDIO HISTÓRICO (1771) *

Sara Marques Pereira - Universidade de Évora; José Eduardo Franco - FCT

O Compêndio Histórico do Estado da Universidade de Coimbra é uma das obras mais emblemáticas que foram produzidas no âmbito da concepção e execução política das reformas educativas do consulado pombalino. Esta obra, publicada primeiramente em 1771 e reimpressa em 1772 como relatório propedêutico da reforma universitária coimbrã, contribuiu para estabelecer, no seu tempo, uma visão oficial da história da educação portuguesa, e teve depois uma significativa influência nas leituras históricas que se fizeram nos séculos seguintes, quer das reformas pombalinas quer da apreciação global da história pedagógica portuguesa, especialmente na sua relação com o papel desempenhado pelos Jesuítas neste domínio.

* Este trabalho está integrado no Projecto Compêndio Histórico da Universidde de Coimbra (1771) – A Reforma Pombalina da Universidade e o impacte na Cultura Luso-Brasileira, financiado pela Fundação Calouste Gulbenkian e apoiado pela Reitoria da Universidade de Évora.

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ENSINO SECUNDÁRIO. O LICEU PROVINCIAL BAIANO 1836-1890 

Sara Martha Dick, U. Federal da Bahia/ Faculdade de Educaçăo 

Com este trabalho pretendemos apresentar resultados obtidos com análises efetuadas para a elaboração de tese de doutoramento em Educação, objetivando o estudo de desenvolvimento das políticas públicas para o ensino secundário Baiano. Para tanto, nossas análises partiram do Liceu Provincial Baiano , fundado em 1836 – que em 1890 passou a chamar-se Instituto Oficial de Ensino Secundário, em 1895 Ginásio da Bahia e, em 1942 Colégio da Bahia _Central -, instituição que expressava as políticas desenvolvidas para o ensino secundário, pois, até o início da República foi a única instituição pública para esta modalidade de ensino.

 Não pretendemos analisar a história do Liceu Provincial, mas compreende-lo como referencial para o entendimento das políticas públicas para o ensino secundário ali ministrado, dentro da visão que no Liceu estava contida toda expressão das ações desenvolvidas pelos poderes públicos sobre o ensino secundário.  A origem das políticas públicas para o ensino secundário é produto de desdobramento de ações decorrentes do Ato Adicional de 1834 que colocava nas mãos das províncias a legislação sobre tal modalidade de ensino. Na Bahia, este Ato possibilitou a criação do Liceu Provincial, bem como da Escola Normal, todos no ano de 1836.

 A criação do Liceu baiano pretendia concentrar as chamadas “aulas maiores” – resquício das Reformas Pombalinas –, em uma única instituição, na capital , com 13 cadeiras. Tais aulas, existentes nas vilas e cidades eram isoladas, não possuindo qualquer orientação geral, seja de conteúdo, método ou extensão e intensidade de programas. A única divisão que podia ser vislumbrada era entre o “gosto pelas Letras e Ciências” e profissional, sendo que no Liceu baiano somente comportou aquelas ligadas às Ciências e Letras.

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Da análise das políticas públicas para o ensino secundário,pudemos constatar a existência de três momentos distintos.1.      até 1850 – período de formação do Estado Brasileiro e origem das políticas públicas para o ensino secundário ;2.      anos 60 (séc.XIX) – tentativa de sistematização;3.      anos 70/80 – decadência do império, crise econômica e instabilidade nas políticas públicas.   desenvolvimento das políticas públicas  para esta modalidade de ensino é que pretendemos discutir neste trabalho, tendo em vistas os períodos mencionados.

TRATO MERCANTIL E EXPLICAÇÕES DO BRASIL           

Selma Rinaldi de Mattos, PUC-RJ

Na escritura da História do Brasil proposta pelo IHGB responsáveis, em escala considerável, pelas, um papel significativo era atribuído ao comércio e às relações mercantis. classificações e imagens que contrapõem litoral e sertão, civilização e barbárie, cosmopolitismo e provincianismo, economia mercantil e economia natural, progresso e atraso, entre outras, as relações mercantis não apenas sugeriam imagens e forjavam representações do Brasil para aqueles que eram apresentados aos textos historiográficos na condição de leitores; elas constituíam-se  também em elemento teórico fundamental na montagem de esquemas explicativos diversos por meio dos papéis, lugares, sinais e valores atribuídos à atividade mercantil e aos agentes sociais nelas envolvidos, os quais possibilitam quer estabelecer filiações e relações entre a formação brasileira e a constituição da modernidade ocidental quer distinguir entre a "tese do suave comércio" e a "tese da autodestruição", nos termos propostos por Albert Hirschman. Em Suavidade, poder e fraqueza da sociedade de mercado. As relações mercantis permitiam, de uma parte, estabelecer uma gênese e uma filiação por meio do acontecimento Descobrimento do Brasil, que ao relacionar a origem do Brasil à expansão mercantil dos povos ocidentais não apenas permitia reivindicar um lugar para o Império do Brasil no conjunto das "Nações civilizadas", como também dissociava as origens da História do Brasil daquelas de uma História Sagrada. De outra parte, eram as relações mercantis que teriam propiciado, desde os passos iniciais da colonização, a transformação de um imenso sertão - isto é, um espaço vazio de significações - em América portuguesa, por meio de diversas práticas civilizatórias. O reconhecimento do valor do comércio aproximava  tanto os manuais didáticos de História do Brasil publicados em meados do século XIX Compêndio de História do Brasil de José Inácio de Abreu e Lima e Lições de História do Brasil de Joaquim Manuel de Macedo  quanto a obra fundadora da historiografia brasileira - História Geral do Brasil  de Adolfo  Varnhagen. No entanto, importa observar que produzia-se um afastamento no momento em que esses  autores elegiam  agentes sociais, símbolos, signos, valores e imagens com significados diversos. Assim sendo, nessa comunicação pretendo analisar o tratamento dispensado a dois temas por Abreu e Lima e por Macedo em seus respectivos manuais didáticos: o descobrimento do Brasil e  os Indígenas a  partir do papel significativo  atribuído ao comércio e às relações mercantis.

PROGRAMAS NACIONAIS DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL: DO PIPMO AO PLANFOR

Simone Valdete dos Santos, UFRGS

O PIPMO (Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra) foi concebido pelo governo do presidente João Goulart em 1963 e executado durante a ditadura militar até sua extinção em 1982. Correspondia a cursos, que ocorriam em todo o país, para trabalhadores pouco escolarizados, com encaminhamento para o emprego, durante o idiossincrático Estado de bem-estar social brasileiro, uma caricatura em relação ao formato genérico do “Welfare State” da Europa Ocidental. O PLANFOR (Plano Nacional de Formação Profissional) ocorreu durante os governos do então presidente Fernando Henrique Cardoso, na lógica da empregabilidade em função do desemprego estrutural. As

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Secretarias Estaduais do Trabalho, realizavam o planejamento e a execução dos cursos de forma descentralizada, com financiamento do Ministério do Trabalho, no PLANFOR em conformidade às deliberações das comissões tripartites compostas por empresários, trabalhadores e governo, nas instâncias municipal, estadual e nacional. A origem do PIPMO foi no Ministério da Educação, transferido em 1975 para o Ministério do Trabalho, dualidade ainda presente, pois as políticas de Educação Profissional para os trabalhadores pouco escolarizados ocorrem através do Ministério do Trabalho, desvinculadas da atuação do Ministério da Educação. A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS), durante os anos de 2001-2002, correspondendo ao levantamento de dados sobre o PIPMO no arquivo da Fundação Gaúcha do Trabalho, junto aos relatórios oficiais do programa, realizadas entrevistas com dois de seus coordenadores estaduais. A coleta de dados sobre o PLANFOR, consistiu em um estudo de caso na cidade de Pelotas, localizada no Estado do Rio Grande do Sul, com aplicação de questionários em alunos dos cursos, constituição de uma amostra de alunos, para abordagem etnográfica, sendo realizadas visitas em suas casas, acompanhamento de atividades dos cursos e também entrevistas com os coordenadores locais do programa. Os resultados da pesquisa cotejaram semelhanças e diferenças entre os dois planos de Educação Profissional, de caráter nacional, voltados para os trabalhadores sem Ensino Fundamental completo, cuja a execução dos cursos ficava sob a responsabilidade de organizações não-governamentais, universidades, sindicatos, desarticulada do sistema de ensino. O PIPMO possuía oferta contínua de cursos, na observância do calendário agrícola. A freqüência dos cursos constitui uma deficiência do PLANFOR, ocorrendo nos últimos meses desde 1997, sem considerar as especificidades do meio rural, do trabalho sazonal. Tais políticas vêm favorecendo a descontinuidade e o desprestígio da Educação Profissional para trabalhadores adultos, pouco escolarizados, segmento social numericamente representativo no país.

LOURENÇO FILHO NO CEARÁ: UM SOPRO DE REFORMA

Sofia Lerche Vieira; Universidade Estadual do Ceará (UECE)

O trabalho procede a um balanço de documentos legais produzidos depois da virada do século XIX no Ceará, unidade federada do Brasil. Toma como pressuposto a idéia de que a análise da legislação constitui-se elemento fértil para o conhecimento da política educacional e aprofundamento das diferentes estratégias de reforma. Situando o debate a partir de uma breve discussão acerca das iniciativas educacionais desenvolvidas durante a Primeira República no Ceará, destaca-se a passagem de Lourenço Filho por este Estado que, como São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco, constitui um dos laboratórios das reformas da década de 1920. O estudo apresenta argumentos no sentido de relativizar a importância das iniciativas capitaneadas pelo educador paulista no Ceará. A análise dos textos do período permite constatar que algumas das idéias da Reforma de 1922 já se mostravam presentes em documentos de política educacional da década anterior, mais especificamente no Regulamento de 1905 e no Regimento de 1915. A estratégia metodológica adotada revela-se como recurso de forte teor explicativo na compreensão da política educacional numa determinada realidade, podendo ser replicável a outros contextos.

NEED: ESPAÇO DE PRODUÇÃO DA MEMÓRIA E PESQUISA EM EDUCAÇÃO

Sofia Lerche Vieira e Isabel Maria Sabino de Farias; Universidade Estadual do Ceará (UECE)

O trabalho registra a experiência do Núcleo de Estudos, Documentação e Difusão em Educação (NEED), localizado no Centro de Educação da Universidade Estadual do Ceará (UECE), Brasil. Esta iniciativa, desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa Política Educacional, Docência e Memória desta universidade, recebe apoio do CNPq (Edital Universal 01/2001) através do Projeto Integrado Política Educacional, Escola e Professores (PEEP). O NEED é um ambiente institucional

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destinado a estudos, documentação e difusão de resultados de informações sobre política educacional, escola e professores. Este núcleo tem o objetivo de difundir as iniciativas de investigação, divulgando as produções científicas desenvolvidas pela comunidade acadêmica, sobretudo aquelas produzidas pelo grupo de pesquisa antes mencionado. Trata-se de uma ação voltada para a criação de condições institucionais que incentivem o desenvolvimento de uma cultura de preservação da memória e pesquisa no campo educacional na UECE. O acervo agrega materiais diversos como livros, periódicos, monografias, dissertações, teses, bancos de dados, relatórios de pesquisa e clippings educacionais (matérias jornalísticas), os quais são organizados por categorias temáticas. Boa parte do material do NEED, sobretudo os bancos de dados, relatórios de pesquisa e clippings educacionais, deve ser disponibilizado em uma base de dados informatizada (ACCESS), facilitando o acesso dos usuários. A difusão dos materiais do NEED, em especial aqueles resultantes das investigações empreendidas pelo grupo de pesquisa, são divulgados através de cd-roms e folders. Ao se propor socializar resultados de investigação na área de humanidades, particularmente no campo da educação, o NEED tem como intenção explícita superar uma das grandes dificuldades para a consolidação de grupos de pesquisa em educação nas universidades públicas cearenses: a ausência de condições institucionais para efetivar esta prática.

OS MESTRES NO COTIDIANO: MEMÓRIAS DA ESCOLA PÚBLICA PAULISTA (1930 – 1950)

Sonia Aparecida Ignacio Silva, U. Católica de Santos

Este trabalho resulta de pesquisa sobre a história da vida cotidiana na escola, a partir de depoimentos orais de educadores que se formaram e atuaram profissionalmente no ensino público paulista, na primeira metade do século XX. Num primeiro momento, os depoimentos foram explorados buscando-se perceber como os depoentes, enquanto alunos da Escola Pública, foram compondo suas captações e avaliações sobre a formação ali recebida. Num segundo momento, procurou-se retomar o fio condutor da experiência na escola em outra perspectiva: privilegiando-se a atuação profissional dos entrevistados, continuando a enfocar a vida na escola e as relações que aí vão se constituindo e manifestando. Os entrevistados são aqui considerados como sujeitos-agentes de determinados modos de vida (e de luta, em certo sentido) que foram se organizando, historicamente, no seio da escola em São Paulo. Trilhou-se, portanto, o caminho que nos conduziu às experiências particulares (mas também coletivas) desses Mestres no cotidiano da Escola, concebendo-se esses homens e mulheres, como seres totais que participam na vida cotidiana com todos os aspectos de sua individualidade; tecendo a rede de suas vivências particulares e profissionais, através da ação conjugada de todos os seus sentidos, capacidades intelectuais, habilidades manipulativas, sentimentos, paixões, idéias, ideologias, valores e valorações. Tomando como referência o conceito de cotidiano em Agnes Heller (1985), procurou-se evidenciar as manifestações particulares e heterogêneas, as hierarquias e relações presentes no relato dos depoentes sobre sua vida profissional. Acredita-se que a individualidade e a singularidade podem oferecer indicações preciosas sobre as relações sociais, a institucionalização de normas e costumes, as valorações efetivadas (nem sempre suficientemente explicitadas), que caracterizam o modo de vida na escola, com suas práticas e teorizações fundamentais, tal como foram se organizando e concretizando. Considera-se que estes relatos sobre o cotidiano escolar nos anos 30, 40 e 50 do século XX, poderão abrir perspectivas de análise e melhor compreensão do processo educativo-cultural que ocorria na escola pública nesse período, ajudando-nos, também, a melhor entender os impasses da educação brasileira no momento atual. O objetivo desta reflexão é levar-nos à condição de sujeitos dessa aventura coletiva que é a construção da Educação e da Cultura na vida cotidiana da história brasileira.

A CONSTITUIÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES DE INFÂNCIA NOS DISCURSOS EDUCACIONAIS E JURÍDICOS NO DISTRITO FEDERAL DE 1927 A 1940

Sônia Câmara Rangel, U. De S. Paulo

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Durante as décadas de 20 a 40, a intelligentsia brasileira, particularmente, os intelectuais

educadores objetivaram formular concepções e implementar estratégias de organização da cultura e da educação, tendo como epicentro de suas intenções a questão da modernização econômica e cultural do país. Para isto, buscaram justificar seus projetos a partir da construção de um discurso científico identificado com o planejamento e a produção sistematizada de diagnósticos sobre a realidade social brasileira eivada de grandes mazelas sociais associadas ao analfabetismo e à doença, estigmas do “atraso” brasileiro a ser superado. A preocupação em fomentar projetos que conseguissem extirpar do cenário nacional os males do seu atraso significava a possibilidade do Estado brasileiro estabelecer as novas bases para promover o ajustamento e a inserção do país à ordem capitalista internacional, fomentando e potencializando, assim, o surgimento de progressos técnicos e científicos na edificação de uma nova imagem associada à concepção do Brasil civilizado. Para este intento identificaram na escolarização oferecida à população o elemento imprescindível para a superação dos nossos males e constituição da identidade e fortalecimento da idéia de unidade nacional a ser assimilada pelas novas gerações. A incorporação da criança ao mundo escolar exigia a redefinição do espaço-escola como locus de construção do “mundo da ordem” em oposição ao “mundo da desordem”, representado pelo contingente de prostitutas, malandros e crianças pobres e abandonadas que freqüentavam as ruas da cidade. Podemos dizer que cabia a escola para além de instruir, conduzir a infância em suas práticas, seus modos de vida, seus hábitos, mas também intervir na forma como pensavam e significavam o espaço escolar e o seu papel, fomentando, assim, a materialização de um projeto de escolarização do povo que ao promover o ideal de “educação para todos” procurou apagar diferenças, desvios e desigualdades sociais, adaptando a criança as novas regras e valores identificados com a modernidade e a urbanidade que se pretendia construir na capital do país. Neste sentido, com esta pesquisa pretendo compreender como os discursos educacionais expressos nas iniciativas reformistas encaminhados pelas Diretorias de Instrução Pública do Distrito Federal e os discursos jurídicos materializados na elaboração do Código de Menores de 1927 constituíram representações acerca da infância e concretizaram iniciativas, objetivando promover intervenções sociais via propostas assistencialistas, punitivas e educativas da infância pobre da e na cidade do Rio de Janeiro, buscando perceber a materialização desses discursos em ações mediadas pelo Estado na organização da sociedade e na redefinição dos papéis sociais a serem desempenhados pelas crianças/menores na constituição da idéia de “infância civilizada” e “útil” ao meio escolar e social.

IGREJA, ESTADO E EDUCAÇÃO NO PRIMEIRO GOVERNO VARGAS (1930-45): O DEBATE SOBRE ENSINO RELIGIOSO NA REVISTA DE ESTUDOS POLÍTICOS HIERARCHIA

Sonia Maria de Castro Nogueira Lopes, PUC - Rio

A instabilidade gerada pela Revolução de 1930 transformou a Igreja Católica numa força social absolutamente indispensável para legitimar o regime político que então se estabelecia no Brasil. Nesse contexto, o Cardeal D. Sebastião Leme, com grande habilidade, conduziu a Igreja à reintegração com o Estado durante os quinze anos em que permaneceu como cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, primaz do Brasil, e que coincidiram com o regime do presidente Getúlio Vargas (1930-45). Essa conjugação de interesses será analisada através de artigos que discutiam a inserção do ensino religioso nas escolas da rede pública publicados na Revista de Estudos Políticos Hierarquia, editada no Rio de Janeiro em 1930-31, sob a direção de Lourival Fontes, advogado e jornalista, chefe de gabinete do interventor do Distrito Federal, Pedro Ernesto, e que mais tarde seria conhecido por dirigir o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), órgão repressor responsável pela censura no período do Estado Novo. A interseção entre os campos político e educacional configura-se pelo estabelecimento de uma rede de sociabilidade e interesses representada, de um lado, pelos educadores aglutinados em torno do movimento renovador – os Pioneiros da Educação Nova – e, de outro, pelos educadores católicos, representantes da intelectualidade que defendiam os interesses da Igreja. O palco desses embates, a Associação Brasileira de Educação (ABE), era o órgão representativo desses profissionais, que para além de sua “competência técnica”, formalmente

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admitida, desenvolviam estratégias, lutas e alianças políticas convenientes ao momento político pelo qual passava o país. Através deste artigo, procura-se demonstrar que nesse momento, os campos político e educacional encontravam-se profundamente imbricados, revelando a presença de projetos distintos para a sociedade e para a nação brasileira. Nossa argumentação baseia-se na acolhida e repercussão daqueles acontecimentos não apenas na imprensa informativa de um modo geral, mas num impresso especializado - uma revista de estudos políticos com características marcadamente autoritárias, como se depreende pelo título da mesma - na qual se abriu espaço para o debate acirrado em torno da questão da obrigatoriedade do ensino religioso, pouco mais tarde contemplado pela Constituição de 1934, ainda que em caráter facultativo.

EMPRÉSTIMO DA LITERATURA PORTUGUESA PARA A DRAMATURGIA NORTE-RIO-GRANDENSE DE JOAQUIM FAGUNDES (DÉCADA 1870)

Sônia Maria de Oliveira Othon, UFRN

Este trabalho parte das idéias literárias dos escritores portugueses Antero Tarquínio de Quental e Camilo Castelo Branco tomadas de empréstimo por Joaquim Peregrino da Rocha Fagundes (1856-1877), dramaturgo e poeta nascido no Rio Grande do Norte, para a criação de sua obra dramática. Sabe-se que em meados do século XIX e até as primeiras décadas do século XX ainda era expressivo o peso lusitano nas letras brasileiras, gerando uma literatura espelhada nos moldes lusos. É objeto do trabalho as idéias de Antero de Quental e Camilo Castelo Branco tomadas de empréstimo por Joaquim Fagundes para compor suas peças "A Mão de Deus", "A Queda de um Anjo" e "Vieira de Castro". O período abordado é a década de 1870, quando Joaquim Fagundes escreveu e representou seus dramas. Para proceder a análise das idéias literárias dos autores portugueses foram consultadas as obras "A Mão de Deus", de Antero de Quental, "A Queda dum Anjo" e "O Condenado", de Camilo Castelo Branco. Utilizou-se a noção de empréstimos culturais, como entendida por Peter Burke (1997 e 2000), no sentido de interações culturais entre grupos com afinidades. Ou mesmo como aflm1ou Edward Said, segundo Burke, para quem a história da vida cultural humana é a história dos empréstimos culturais. Por meio de empréstimos das idéias literárias desses autores portugueses, o dramaturgo Joaquim Fagundes escreveu suas peças apostando pedagogicamente na discussão e difusão de temas da cultura de língua portuguesa para despertar o povo da ignorância, da indolência e da subserviência aos poderes políticos, ministrando ensinamento aos conterrâneos pela via da diversão artística teatral. A partir da leitura das obras portuguesas, se entrevê na dramaturgia fagundiana uma busca pela alteridade do cotidiano de Natal, capital do Rio Grande do Norte, e pela mudança de mentalidade do povo potiguar naquele final de século XIX. Nisso consistia a sua causa pedagógica e educativa.

HISTÓRIAS E MEMÓRIAS: NARRATIVAS SOBRE A CONSTITUIÇÃO DA ESCOLA EM UMA COMUNIDADE REMANESCENTE DE QUILOMBO

Sônia Maria dos Santos Marques, UFRGS e UNIOESTE ; Maria Batista Lima PUC-RJ, Projeto Diálogo entre Povos

Este trabalho se propõe a refletir sobre o processo de surgimento de uma escola em comunidade remanescente de quilombo a partir da palavra/memória dos moradores negros. Apresentamos as narrativas sobre o processo de constituição da escola em uma comunidade remanescente de quilombo, trazendo a voz dos sujeitos negros que viveram e que vivificam esses acontecimentos, provocando movimentos em que evocação/criação- emaranhadas diluem as linhas de um tempo linear, trazendo a memória- tecido frágil, esgarçado, urdido com fios que se articulam de diferentes maneiras, compondo os mais variados desenhos...As categorias de análise foram elaboradas a partir de entrevistas semi-estruturadas realizadas com pessoas com mais de quarenta anos que viveram o processo de constituição da escola na comunidade remanescente de quilombo de São Miguel, ou São

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Miguel dos negros, localizada no município de Restinga Seca, na região da Depressão Central no estado do Rio Grande do Sul-Brasil. Os dados coletados foram trabalhados por meio da análise de conteúdo, como indica Olabuenaga (1996). A problematização focaliza as seguintes questões:como foi o acesso à escola dos moradores negros? Como surgiu a escola nessa comunidade? Como os moradores negros de São Miguel viveram e rememoram esse processo? Este trabalho partiu de pesquisa “São Miguel: educação e Identidade” na qual se verificou a centralidade da escola na vida comunitária, pois nessa instituição, os moradores realizavam bailes, festas, reuniões para discutir questões raciais e até mesmo velavam seus mortos. As narrativas apresentam as dificuldades de acesso à escola vivida por essa população, ao mesmo tempo em que anunciam o desejo de ingresso no mundo letrado. Entendemos, como Errante, que o “interesse na narração em primeira pessoa parece provir de nossas questões éticas e epistemológicas no que diz respeito à representação e à voz” (2000, p. 142) e que essas constituem “narrativas de identidade” em que estão em jogo as formas como as pessoas se representam e se vêem representadas pelos outros. O material pesquisado foi estudado e analisado nos agrupamentos: Aqui tudo é parente-o espaço narrado: lócus de memórias e histórias e Nós fizemos isso aqui: narrativas sobre o processo de constituição da escola.

PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO: O “CBA” NA ESCOLA MUNICIPAL JOSÉ PEDRO NOVAES ROSAS EM CARAMBEÍ, PARANÁ - BRASIL. 1980-1998

Sônia Valdete Aparecida Lima Cordeiro, Secretaria da Educação e Cultura de Carambeí - PR

Na linha de pesquisa sobre a educação da Região dos Campos Gerais (LUPORINI, 1998) buscou-se resgatar o quotidiano das práticas de ensino da Escola “José Pedro Novaes Rosas” com base na técnica de entrevista oral e fotográfica (MAUAD, 2001) centrada no estudo quantitativo (GAMBOA, 1995) sobre o Ciclo Básico de Alfabetização, que permite no ensino-aprendizagem um tempo maior para alfabetizar o aluno, ou seja, o educando deve ser alfabetizado durante as 1ªs e 2ªs séries do ensino fundamental. Baseado na Lei Federal 7044/82, que propôs institucionalizar a educação como processo de transformação da sociedade, o Governo do Paraná determinou a implantação do “CBA”, através do Decreto Estadual nº 2545/88, objetivando redefinir a qualidade do ensino público do Estado, pois lutar contra o analfabetismo e o insucesso escolar significou a compreensão da realidade educacional e da vida da criança de forma mais ampla e precisa do que apenas ensinar a “ler escrever” (GADOTTI, 1987). A metodologia dos conteúdos é a alfabetização entendida como a “apropriação do código escrito enquanto veículo de significação” (ROSAS, 1997). O método preconiza conhecer o sentido da palavra propiciando ao aluno o processo de interação entre a linguagem oral e a escrita. A alfabetização gira em torno do registro do alfabeto, utilizando o alfabeto móvel; dos textos por meio da expressão oral formalizada pelo professor e, posteriormente, reproduzido verbalmente pelo educando; do reconhecimento do prenome da criança; e dos textos produzidos pela mesma. Estes procedimentos envolvem leitura intuitiva, ilustração, reprodução oral e escrita no sentido de tornar o aluno capaz de vivenciar a própria vida, e ao mesmo tempo, ser alfabetizado. Essas práticas, no quotidiano da Escola Novaes Rosas, apresentam um conteúdo que visa a socialização da criança, fundamentado nos conceitos da Sociologia e da Psicologia, pois, “um dos maiores danos que se pode fazer a uma criança é levá-la a perder a confiança em sua própria capacidade de pensar” (FERREIRO, 1988). Esta escola de Carambeí __ Município considerado um dos mais novos do Estado do Paraná, segundo a Lei Estadual n º 11.225/95 __ foi a primeira instituição educacional, que adotou o CBA objetivando minimizar a evasão e a repetência dos alunos nas séries iniciais de ensino fundamental. Neste estudo, no que se refere a qualidade de ensino-aprendizagem o “CBA” não interferiu no resultado de aprovação do aluno, pois o quadro de avaliação em dez anos da análise permaneceu inalterado.

ENTRE PALAVRAS E LETRAS – A DISTINÇÃO ENTRE A ESCRITA FEMININA E MASCULINA NA REVISTA DO PROFESSOR (1934-1965)

Soraia Cristina Balduíno, Universidade de São Paulo

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Este trabalho tem o propósito de relatar a questão das diferenças entre a escrita masculina e feminina no periódico Revista do Professor, sendo parte integrante da dissertação de mestrado “Sombras de Mulheres – Um estudo sobre a representação feminina e a categoria docente na Revista do Professor (1934-1965)” com apoio da FAPESP, que apreendeu as características dos discursos que veiculam representações e prescrições sobre educação expressos nas diversas seções que compõem este periódico. A revista aqui destacada tinha o objetivo de estabelecer-se como a porta-voz para fortalecer o Centro do Professorado Paulista, como principal representante da classe docente, dividindo espaço com textos voltados para a orientação didático-pedagógica, cabendo-lhes também, a função de ser um veículo de notícias. Logo, não era dirigida especificamente ao público feminino, no entanto, a grande massa leitora era composta por mulheres, já que eram a maioria no magistério primário no Brasil.

Um aspecto relevante neste estudo observa a formação do conselho editorial, que era majoritariamente composto pelos membros da diretoria do CPP, e as poucas mulheres que participavam ativamente em alguns níveis da instituição, notoriamente não trabalhavam na elaboração e no conselho de edição da revista. Pondera-se nesses fatos que a revista dirigida por homens indicava a escassa participação das mulheres, que colaboravam com textos e artigos que, em geral, seguiam um padrão simplista, pouco opinativo e representativo no periódico, ao passo que os conceitos e imagens destacados, reforçavam a ideologia e os valores de uma dominação masculina e também política.

Os artigos escritos por homens dirigidos às mulheres podem ser divididos em três grupos: homenagens e dissertações sobre as mulheres públicas; artigos que destacam as características da feminilidade, por meio de homenagens, notícias e poesias que procuram ressaltar a idéia de vocação e sacrifício; e, por fim, textos que contêm homenagens particulares, que possuem mais o propósito de promover o autor, principalmente homenagens às mães e às antigas professoras. Os artigos escritos por mulheres podem também ser divididos em dois grupos: o primeiro, constituído por textos que se referem aos saberes e práticas docentes, com conteúdos sobre turismo, geografia e homenagens a professores e líderes da categoria; o segundo grupo constitui-se de poesias, forma mais presente na escrita feminina, algumas apenas com propósito de divulgar sua produção. O estudo aqui delineado tem por objetivo contribuir para o enriquecimento de fontes documentais, amparando-se também em documentos e investigações já realizadas sobre as relações sociais de gênero, educação feminina e a imprensa periódica educacional.

A ATUAÇÃO INSPETORA DA PROFESSORA CLAUDEONÔRA NOBLAT DOS SANTOS BRASIL NA ESCOLA NORMAL JUVINO OLIVEIRA DA CIDADE DE ITAPETINGA, BA (1957-1960)

Soraya Mendes Rodrigues Adorno, UFRN

O estudo de natureza histórica tem como objeto a atuação da professora Claudeonôra Noblat dos Santos Brasil, inspetora de ensino da Secretaria de Educação da Bahia, designada para inspecionar o cotidiano escolar do Curso Normal Juvino Oliveira, pertencente ao Ginásio Alfredo Dutra da cidade de Itapetinga (BA). O objetivo é de analisar especificamente as recomendações presentes nos relatórios da professora Claudeonôra Noblat dos Santos Brasil quanto aos saberes veiculados nas disciplinas relativas à preparação pedagógica das normalistas e nas atividades escolares. Os relatórios da citada professora serviram, então, de suporte para interpretar os saberes do processo educativo no interior do Curso Normal Juvino Oliveira. O período coberto pelo estudo compreende 1957 a 1960, que corresponde à permanência desta professora como inspetora da referida Escola Normal. As fontes documentais consultadas são basicamente os relatórios e os boletins mensais confeccionados por essa inspetora, segundo indicações oficias da Secretaria de Educação da Bahia. A discussão realizada sobre saberes escolares e pedagógicos está ancorada teoricamente nas reflexões de: Catani (1994), para quem os saberes são caracterizados como normas e práticas específicas da situação escolar de formação de professores, constituindo-se parte da cultura escolar; Carvalho (1998) que enfatiza a importância de investigar-se os materiais da produção, circulação e

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apropriação dos saberes pedagógicos enquanto suporte de uma história cultural dos saberes; partindo de Camargo (2000) os relatórios foram analisados como resíduos das práticas pedagógicas; e, Menezes (2001) possibilita interpretar os boletins e relatórios, fontes dessa pesquisa, como reveladores de um conjunto de saberes associados às práticas escolares e prescritores de caminhos a serem seguidos. Percebe-se nos relatórios da professora Claodeonôra Noblat dos Santos Brasil vestígios de uma atuação pedagógica pautada nos preceitos da Escola Nova.

BOLETINS ESCOLARES: MONUMENTOS DA AVALIAÇÃO ESCOLAR MODERNA

Susana Beatriz Fernandes, UBEA/PUCRS e UNILASALLE/RS

Este texto apresenta uma análise acerca dos boletins escolares utilizados como suporte para o registro da avaliação nas escolas primárias brasileiras, hoje denominadas de escolas de Ensino Fundamental. Eles se constituem num instrumento de escrituração escolar e estão envolvidos na produção de um tipo específico de sujeito, o aluno, o sujeito aprendiz. Uma das características mais relevantes deste documento, está no fato de que nele a escrita é conservada, funcionando assim, como memória. Na perspectiva de análise utilizada, sob a base de uma série de ferramentas conceituais inspiradas em Michel Foucault, é possível dizer que ele não se constituí num mero documento, mas num monumento, onde os escolares são descritos, produzidos, sentenciados e distribuídos. O objetivo deste trabalho é descrever as transformações que se produziram neste documento. Para isso foram analisados um conjunto de boletins escolares, oriundos de escolas públicas e particulares do Estado Rio Grande do Sul e Santa Catarina, produzidos entre 1940 e 2000. Os boletins são descritos como uma tecnologia de poder que produz e fixa saberes e verdades sobre os alunos, a escola, o currículo, a avaliação e o rendimento escolar. No cenário da emergência da escolarização formal e do desenvolvimento do discurso da Pedagogia, surgem inúmeros artefatos para examinar, normalizar e classificar os estudantes, os quais se consolidaram como práticas pedagógicas, durante os novecentos. Através do desenvolvimento de uma pedagogia avaliativa, de estratégias e de técnicas de observação e exame dos estudantes e do registro de seus comportamentos cognitivos e morais, têm-se não apenas uma prática que confere ao saber dos docentes o poder de controle e produção do indivíduo escolar, mas o desenvolvimento de técnicas de classificação, distribuição e normalização destes sujeitos. Os boletins são descritos por décadas e níveis de ensino, onde a partir de aproximações, procura-se mostrar os principais deslocamentos, rupturas e continuidades produzidas na estrutura, nos tipos de quadros, nas formas dos registros dos resultados das avaliações, no tempo destes acontecimentos, na emergência e desaparecimento de disciplinas, nas formas como os estudantes são descritos, analisados e classificados, bem como são apresentadas algumas mudanças produzidas no vocabulário pedagógico. É possível concluir neste trabalho que o boletim escolar não é, como poderíamos pensar, um documento “inocente”, apenas um suporte textual, mas sim um dispositivo privilegiado na conformação, produção e normalização dos sujeitos escolares.

“O PROFESSOR DO ENSINO LICEAL NO ESTADO NOVO: QUESTÕES E PROBLEMAS”

Tânia Filipa Galeão, Faculdade de Cięncias da U. De Lisboa

No âmbito da minha tese de mestrado, a realizar sob a orientação do Professor Doutor Joaquim Pintassilgo, sobre o temática do Professor do Ensino Liceal no período final do Estado Novo (anos 60-70), venho propor a apresentação de uma comunicação direccionada para as preocupações desta fase, intitulada: “O Professor do Ensino Liceal no Estado Novo: questões e problemas”. Com efeito, farei um levantamento das mais frequentes e pertinentes questões apresentadas num período em que as dissenções relativas à profissionalização do corpo docente dos liceus se revelam inadequadas ao sistema educativo existente. Aludindo às palavras de Grácio (1995-96), “um novo tipo de professor, um novo estilo de acção e relação educativa são exigidos por novos contextos culturais, por novos interesses e atitudes juvenis” (p.185).

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Limitados por um apertado controlo exercido pelo poder político da época, e representado a nível micro pelo reitor do liceu, os professores do ensino liceal exprimiam o seu mal-estar em artigos de opinião publicados numa revista não oficial do sector. Dinamizada entre 1926 e 1973, com um período de interrupção entre 1931 e 1932, e entre 1940 e 1951, e partindo do principio de que as suas páginas contribuíram para a difusão de um conjunto de ideias e práticas associadas a um bom desempenho profissional (Pintassilgo), a Revista Labor será, assim, o foco de análise para esta comunicação a partir da década de 60, período em que se começaram a concretizar importantes mudanças estruturais no sistema educativo português do Estado Novo.

REVISTA “A ESCOLA” (1906-1910): PLANOS E PROGRAMAS DA ESCOLA MODERNA NO PARANÁ (BRASIL)

Tânia Maria F. Braga Garcia, Universidade Federal do Paraná

Na primeira década do século XX, o Grêmio dos Professores Públicos do Paraná, de forma semelhante ao que ocorreu em outros estados brasileiros (CATANI, s/d), publicou uma revista voltada à divulgação de conhecimentos para a formação de professores, denominada “A Escola”. O editorial do primeiro número, em 1906, convocava todos os professores a lutar pela instrução pública no Estado, afirmando que “a República e a ignorância são incompatíveis”. Na direção da revista durante o primeiro ano, e como editor a partir de agosto de 1907 até 1910, Dario Vellozo anuncia no periódico a criação da Escola Moderna no Paraná, apresentando ao longo desse período seus projetos e programas para essa escola. A primeira constituição republicana, ao estabelecer a obrigatoriedade da organização dos sistemas estaduais de ensino, desencadeou um período que é identificado por NAGLE (1974; 1978) como de intensos debates e de grandes realizações. A expansão da rede escolar e o aumento do número de professores caracteriza um período de desenvolvimento, na última década do século XIX, que reafirmava a crença de que a Educação, na Escola, seria o instrumento mais forte para o estabelecimento de uma nova ordem, pela constituição de uma nova geração de brasileiros. O início do século XX , contudo, revelava a permanência de alguns problemas educacionais e o agravamento de outros, conseqüência inclusive da própria expansão das redes escolares. Particularmente em Curitiba (PR), o campo educacional nesse período se constituiu em torno do embate entre educadores católicos e os defensores do ensino laico. Do ponto de vista mais amplo, pensadores ligados à maçonaria e aos neo-pitagóricos ocupavam espaços culturais importantes na capital do estado. O presente trabalho relata resultados de pesquisa desenvolvida com o objetivo de analisar características da proposta de Escola Moderna formulada por Dario Vellozo para o Estado do Paraná, buscando identificar a originalidade de sua concepção de escola, em especial no que se refere a elementos do método didático. A revista “A Escola” é tomada como fonte para a investigação, na perspectiva dos trabalhos que apontam as potencialidades dos estudos sobre a imprensa periódica educacional no sentido de fornecer “elementos extremamente úteis para a compreensão histórica do sistema de ensino e colocar novas questões acerca da `cultura escolar brasileira’”. (CATANI, s/d).

O PODER DO CANTO OU O CANTO DO PODER?

Tânia Regina da Rocha Unglaub

Este trabalho constitui parte integrante de uma pesquisa em andamento que focaliza o período do Estado Novo durante os anos 1937-1945 como sendo o momento histórico de maior valorização da música no ambiente educacional em todo o território nacional, e que se apresenta como um rico filão, apropriado para várias nuances analíticas e interpretações sociológicas, políticas e históricas.

Esta valorização se materializou através do uso do canto orfeônico em caráter obrigatório em toda a rede escolar, mas não afetou somente o ambiente acadêmico, pois se desdobrou e ampliou-se nas grandes manifestações cívicas que mobilizaram a população em geral sob as vistas coniventes e

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até mesmo interessadas da elite intelectual da nação. O que se apresentará neste artigo é justamente a estratégia utilizada para que os objetivos nacionalistas e ufanistas do regime dominante de então, se tornassem realidade, ao valer-se do poder notório da música, representada pelo canto orfeônico nas escolas, tornando-o o canto do poder.

A linha de argumentação passa ainda pelos conceitos de nacionalismo e espíritonacionalista buscados pelo regime e incorpora a discussão de poder, sustentadas pelo pensamento de Foucault, Bourdieu, e Balandier, e a estrutura legal utilizada para obrigar a um envolvimento massivo, mas que mascarasse o caráter arbitrário das medidas, levando a massa trabalhadora a sentir-se parte de um grande movimento progressista, e não apenas espectadores passivos.

Considerando a participação da elite intelectual em um movimento ditatorial, vale lembrar que o regime Vargas cooptou essa importante força pelo oferecimento de algumas vantagens que os tornaram em certo sentido parceiros na busca de uma identidade nacional.

O papel do canto orfeônico foi fundamental nesse processo nacionalista denotadopelo esforço do Estado Novo em estabelecer um bem elaborado sistema de ensino deste tipo de música, capitaneado por Villa-Lobos, inspirado fortemente no modelo europeu, notadamente do húngaro Kodaly, tornando-o fator de civismo e disciplina coletiva. Este objetivo foi conseguido a partir do envolvimento escolar tornado obrigatório por um conjunto de leis e regulamentos, mas que irradiou-se a partir daí para a população em geral tornando-se um movimento coeso e sólido na praça pública, nas grandes manifestações cívicas. Tais mobilizações populares induziram a um sentimento, produzido pela manipulação das emoções através da música cantada por milhares de vozes, de pertencer a um todo grandioso, dando à massa trabalhadora uma satisfação e um sentimento de realização pessoal que suplantava desilusões e frustrações individuais.

ENRAIZAMENTO DA GINÁSTICA NA CULTURA ESCOLAR DE MINAS GERAIS (1906–1940): O MUNICÍPIO DE SABARÁ

Tarcísio Mauro Vago, UFMG

Este trabalho problematiza a inserção da Ginástica na cultura escolar mineira que se afirma na primeira metade do século XX, ampliando incursões já realizadas em pesquisas anteriores.

Desde a Reforma do Ensino Primário e Normal promovida em 1906, desencadeou-se em Minas Gerais um movimento de afirmação social da escola que se estende pela primeira metade do século XX, alastrando-se da Capital, Belo Horizonte, para todo o Estado. Inaugurou-se com ela um novo modelo escolar, condensado no aparecimento dos Grupos Escolares, o que permitiu a produção de uma nova cultura escolar, com a mobilização de práticas e representações inéditas sobre o lugar da escola nas práticas sociais.

Nesse movimento pretende-se continuar acompanhando o enraizamento da “Gymnastica”, perguntando pelos motivos que autorizaram sua presença nas práticas escolares. Análises realizadas em documentos dos Grupos Escolares da Capital, mostram que nas duas primeiras décadas do século XX, ela foi produzida como prática ortopédica, orientada pelo primado da correção e constituição dos corpos das crianças. Na década de 1920, os primeiros estudos apontam para uma rearticulação de seu primado orientador, que teria se deslocado da correção dos corpos para a eficiência dos gestos, para atender às novas exigências da “vida moderna”.

Ampliando-se o trabalho, focaliza-se agora o município de Sabará pretendendo investigar as características que a Ginástica assumiu nas circunstâncias culturais próprias desta cidade, destacando o Grupo Escolar Paula Rocha (criado em 1907), a Escola Normal Delfim Moreira e as Escolas Isoladas existentes nos distritos e na zona rural.

Fontes para a pesquisa são diversas. Entre os documentos produzidos pelo Grupo encontram-se livros de registro das solenidades de início e encerramento dos anos letivos; atas de reuniões; livro de assinatura de ponto de professores, estagiários e funcionários; livro de registro de visitas; livro de notas; livro de registro de atividades escolares; livro de atas de provas. Sobre a Escola Normal, encontram-se atas de provas; ponto diário de professores; registro de alunas por disciplina; registros de estágios. No arquivo da Casa de Borba Gato encontram-se documentos de Professoras e Inspetores

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Escolares que atuavam em Escolas Isoladas em distritos e na zona rural da cidade. O Arquivo Público Mineiro guarda a legislação relativa ao ensino primário e normal e os relatórios produzidos pelos Secretários do Interior, Diretores do Grupo e da Escola Normal de Sabará e Inspetores Escolares.Nestes documentos pretende-se encontrar vestígios que permitam acompanhar e analisar o movimento de inserção da Ginástica na cultura escolar do município de Sabará, no período de 1906 a 1940.

(RE)PENSAR A INTERACÇÃO ESCOLA-FAMÍLIA

Teresa Sarmento, Universidade do Minho

A família, em Portugal, é vivenciada como um valor central, a quem sempre foi entregue a responsabilidade quase exclusiva da educação das crianças pequenas. O desenvolvimento sócio-económico-cultural, com as múltiplas alterações que produziu, mormente a nível das estruturas familiares e das perspectivas educativas, introduziu a problemática da educação como acção pública, a ser promovida por diversos agentes educativos. Esta passagem da educação desenvolvida no mundo privado para o mundo público, tem sido processada com avanços e recuos, nas dificuldades de posicionamento de cada um dos grupos e no questionamento sobre as vantagens da continuidade educativa para as crianças, para os pais e para os professores.

Assim, a importância da interacção escola-família tem vindo a ganhar espaço quer em termos de experiências educativas, quer em termos legislativos, quer em termos de investigação e credibilidade científica.

Na comunicação que se propõe, parte-se de uma breve análise histórica dos fundamentos desta interacção, focalizando-se, progressivamente, em algumas questões actuais desta problemática, tais como, a gestão de poder entre elementos que se definem como parceiros, o desenvolvimento da institucionalização e a participação das crianças nos processos colaborativos. Nesta perspectiva, a partir da análise sobre a investigação desenvolvida pelo IEC - Universidade do Minho, situada no campo da educação de infância e do ensino básico – 1º ciclo, procurar-se-ão apresentar algumas linhas condutoras encontradas e, a partir destas, despoletar novas questões geradoras da reflexão e acção em torno desta área.

A IGREJA CATÓLICA E A EDUCAÇÃO NA IDADE MÉDIA

Terezinha Oliveira, Universidade Estadual de Maringá

Ao estudarmos a História da Educação na Idade Média devemos considerar o papel fundamental desempenhado pela Igreja na conservação e na difusão da cultura e, por conseguinte, na educação desse período. Podemos perceber isso pela grande quantidade de teóricos/teólogos cristãos que produziram obras que tinham por objetivo a conservação e a transmissão do saber. Destacam-se, entre esses autores, Santo Agostinho, Alcuíno, Santo Anselmo, Roger Bacon, Tomás de Aquino. Esses grandes pensadores, legítimos representantes da Igreja e da religião cristã, foram, antes de tudo, grandes mestres que lutaram tenazmente em prol da preservação da cultura no Ocidente europeu medieval. Assim, as obras medievais, caso lidas pelo olhar histórico e não pelo iluminista, mostram-nos, de forma eloqüente, como a cultura antiga foi conservada pelo filtro do cristianismo. Os autores cristãos conservaram em suas obras grande parte do conhecimento greco-romano. É possível afirmar, inclusive, que Agostinho foi o grande leitor e divulgador do pensamento platônico no Ocidente. Podemos dizer o mesmo de Tomás de Aquino acerca da retomada do pensamento aristotélico na Europa medieva. Assim, o objetivo dessa comunicação é indicar que a Igreja católica foi, ao longo dos diferentes momentos do mundo medieval, a grande guardiã do saber e da cultura. Pretendemos, desse modo, mostrar que, ao mesmo tempo em que a Igreja conseguiu conservar a cultura, ela assimilou esse saber aos seus interesses, imprimindo à sociedade uma característica própria, de acordo com os homens e suas necessidades de então. Para tanto, destacaremos nesse trabalho dois momentos significativos da atuação da Igreja na preservação da cultura e na difusão de um modo de

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vida novo. O primeiro, por ocasião das invasões bárbaras e dissolução do Império romano, quando a Igreja toma para si, na figura de seus padres e monges, a tarefa de conservar a vida social, criando Igrejas e monastérios para proteger a população e seus ideais. O segundo, quando os teóricos da Igreja lutaram pela conservação dos valores cristãos em concomitância com o novo modo de vida dos homens medievais por ocasião do renascimento do comércio e da criação das Universidades. Esses dois momentos são, a nosso ver, importantes para o mundo medievo e para a Igreja cristã, pois o primeiro revela o seu surgimento e o segundo o início da dissolução do mundo que ela ajudara a estruturar. Expressam esses momentos dois dos maiores autores do medievo: Agostinho e Tomás de Aquino.

CENTRALIZAÇÃO X DESCENTRALIZAÇÃO NA EDUCAÇÃO PÚBLICA DO MUNICÍPIO NEUTRO NOS ANOS 30 E 40 DO SÉCULO XIX

Tereza Fachada Levy Cardoso, CEFET-RJ

Este trabalho investiga como as reformas educacionais introduzidas com o Ato Adicional em 1834 e com a centralização administrativa pretendida com a maioridade de Dom Pedro II em 1840, refletiram a conjuntura de centralização x descentralização nos anos 30 e 40 do século XIX, através da disputa, dentro dos limites do Estado, entre as instâncias responsáveis pela educação no Município Neutro, ou seja, a Câmara Municipal, e o governo imperial.

Com a promulgação do Ato Adicional à Constituição de 1824, em 12 de agosto de 1834, as províncias adquiriram uma maior autonomia, como ficou consignado em seu Art. 1º, que substituía os Conselhos Gerais pelas Câmaras dos Distritos e pelas Assembléias, com o título de Assembléia Legislativa Provincial, exceto na Corte e em seu Município.

O Ato Adicional assinala, por outro lado, a extinção do sistema de ensino implantado com as Aulas Régias em 1759 na América portuguesa e que se manteve, sob o nome de Aulas Públicas, mesmo após o Brasil se tornar nação independente, em 1822, constituindo-se em Estado Imperial e Constitucional. Após 1834, apesar de mantida a escola pública e leiga, o sistema educacional se revestiu de um caráter descentralizador, no momento em que se transferia aos governos provinciais as iniciativas e encargos concernentes ao ensino médio e das primeiras letras, de acordo com o seu Art. 10º. Dessa forma, o poder central limitava-se a promover a educação superior e a educação no Município Neutro.

A conjuntura política brasileira desse período regencial é fortemente marcada pelas disputas entre os partidários da descentralização e os que defendiam a centralização política. Em 1840, em nome da garantia da preservação do Estado imperial, ocorre a antecipação da Maioridade do imperador, que assumiu o trono como D. Pedro II, simbolizando a autoridade que asseguraria a permanência e a unidade do Estado imperial brasileiro. A centralização do poder envolvia a definição de todas as questões da administração civil e militar e a aplicação da justiça, aliada à concentração das rendas públicas.

Embora o ensino do Município Neutro estivesse a cargo do governo imperial, na prática era a Câmara Municipal que o implementava. Entretanto, todo o expediente relativo à aprovação das posturas da Câmara Municipal da Corte pertencia à Secretaria dos Negócios do Império, resultando numa dupla interferência na educação.

Neste estudo enfatizamos a documentação encontrada no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro e no Arquivo Nacional, tais como leis, requerimentos, relatórios de fiscais do ensino, entre outros, objetivando pesquisar a disputa na educação do Município Neutro, entre partidários da centralização e da descentralização política.

EDUCAÇÃO NA AMÉRICA PORTUGUESA: ESTRATÉGIAS EDUCATIVAS NUMA SOCIEDADE MESTIÇA (MINAS GERAIS, SÉCULO XVIII)

Thais Nivia de Lima e Fonseca, Universidade Federal de Minas Gerais

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Nos últimos trinta anos a historiografia da educação no Brasil tem dado pouca atenção ao período colonial, ao contrário do que ocorre em relação ao Império e à República. A maior parte dos estudos, fundamentada numa perspectiva historiográfica tradicional, concentrou sua atenção na atuação da Companhia de Jesus e em sua ação catequética, e no período pombalino, no qual foram realizadas reformas no âmbito educacional português e que atingiram os domínios lusos na América. A leitura mais verticalizada de fontes já conhecidas pela historiografia brasileira e a exploração de fontes ainda praticamente inéditas, permite o desvendamento de faces pouco conhecidas acerca da educação na América portuguesa, para além dos temas tradicionalmente estudados, como os mencionados acima. Nesta comunicação pretendo explorar essas possibilidades de ampliação do conhecimento sobre a educação no Brasil daquele período, analisando as estratégias de famílias e de indivíduos nas Minas Gerais do século XVIII, por meio das quais procurava-se orientar a educação das crianças, seja no sentido de uma formação elementar (ler, escrever, contar), muitas vezes ampliada para permitir o ingresso na Universidade de Coimbra, seja no sentido de uma educação profissional, que garantisse a formação de um ofício e de condições de sustento material. Crianças brancas, mestiças e negras – inclusive escravas – eram deixadas aos cuidados de professores de primeiras letras e de artes e também de mestres de ofícios mecânicos, com os quais eles e suas famílias construíam relações que iam da confiança pessoal aos conflitos só resolvidos judicialmente. Pretendo, por meio da exploração de fontes como testamentos e inventários, correspondências, processos de natureza jurídica (petições, requerimentos, justificações, execuções, avaliações) acompanhar algumas trajetórias que envolveram os professores, as crianças e suas famílias, e suas estratégias de construção de processos educativos, escolares ou não. O trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla que vem sendo desenvolvida no âmbito do Grupo de Estudos e Pesquisas em História da Educação (GEPHE) da Universidade Federal de Minas Gerais, e que envolve a organização de um repertório de fontes de interesse para a História da Educação na América portuguesa, com o foco centrado na então Capitania de Minas Gerais. Os aportes teórico-metodológicos são os da História Cultural, especialmente na vertente orientada pelos conceitos de representações e apropriações (inspirados pelas proposições de Roger Chartier) e de mediadores culturais (presentes, sobretudo, nas idéias desenvolvidas por Serge Gruzinski).

A IGREJA E O ENSINO NO DISTRITO DA GUARDA

Urbana Cordeiro et al.

Neste artigo discute-se o contributo institucional, programático e ontológico da Igreja para o ensino em Portugal. Reflectimos sobre o «antes» e o «depois» da Reforma Pombalina e, em particular, queremos apresentar um pequeno contributo para o levantamento da acção da Igreja no Distrito da Guarda, no que ao ensino diz respeito. Tanto em relação às valências, como à fundação de centros e, quando possível, aos métodos que se foram desenvolvendo.

IGREJA E INDÍGENAS DO ALTO RIO NEGRO: DOS INTERNATOS À ESCOLA BILÍNGUE

Valéria Augusta Weigel, UFAM

Os missionários salesianos, no início do século XX, estavam convencidos do atraso cultural dos povos indígenas do Alto Rio Negro, região do noroeste do estado do Amazonas. Por isso, aquiesceram à solicitação do Estado brasileiro, interessado em controlar política e economicamente a região, fundando, com apoio e respaldo do poder público, internatos para os índios e empreendendo um vasto trabalho missionário na área, com vistas a civilizar os indígenas. Depois de quase um século de atividades educacionais, os missionários salesianos continuam na região, à frente de cinco grandes escolas, quatro das quais reconhecidas como escolas indígenas bilíngües, porque incluem uma língua indígena no currículo. Este texto aborda a trajetória e as transformações operadas no pensamento

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educacional dos missionários, as suas relações com os indígenas, bem como as estratégias sociopolíticas e pedagógicas engendradas pelo controle das escolas, ora em disputa com as lideranças indígenas politizadas. Nas interpretações sobre a presença católica na região, tem sido enfatizado em suas ações educacionais o caráter de instrumento de imposição da cultura ocidental, mediando pela força das idéias e da pedagogia, a destruição da identidade étnica e a assimilação dos indígenas à sociedade nacional. Este texto discute, nas situações de diferentes contextos históricos, o significado e as implicações dessa educação salesiana, buscando apreender as formas como os missionários e os indígenas estão inseridos nestas situações, considerando as características próprias de situações interculturais. A análise da experiência educacional salesiana no Alto Rio Negro parte da perspectiva teórica que toma a escola como espaço de confronto e conflito cultural e político, possibilitando aos atores sociais envolvidos uma constante negociação pela definição de projetos e pelo seu controle. A discussão construída baseia-se em pesquisa, na qual foram utilizados fontes documentais e procedimentos de história oral, em que foram ouvidos velhos, mulheres e professores indígenas; bem como foram realizadas observações de eventos e entrevistas com missionários salesianos que trabalham na área.

MODELO PEDAGÓGICO JAPONÊS SOB OCUPAÇÃO - UM ESTUDO CONFRONTADO 

Valéria Maria Sampaio Mello, UECE 

Este texto tem a intenção de trazer uma reflexão acerca do modelo pedagógico implantado no Japão, pelos norte-americanos, no pós-Segunda Guerra, e objetiva mostrar o caminho que a educação nipônica percorreu sob ocupação, ao mesmo tempo em que tenta confrontá-la com a educação brasileira no mesmo recorte histórico. O Brasil, Aliado estadunidense e mais especificamente Fortaleza, capital do Ceará, entrará como pano de fundo através de uma abordagem comparada. De um lado o Japão, caracterizado por seu rigor hierárquico e por maneiras coletivas de produzir, de educar e até mesmo de sentir, onde as ações individualizadas eram evitadas - contrapondo-se à sociedade moderna ocidental, representada pelos Estados Unidos e seguido pelo Brasil, ou seja, onde a autonomia de cada indivíduo, no processo evolutivo pessoal era altamente estimulada. O pós-Segunda Guerra, através da ocupação norte-americana, trouxe ao Japão rendido, modificações revolucionárias. Durante o período do conflito, a educação militarista e ultranacionalista, no Japão, teve seu auge. Após a guerra, os Estados Unidos enviaram à essa nação, missões educacionais a fim de reformar o sistema educativo. Quando o Japão reconheceu sua derrota na Guerra, o cenário encontrado era de total destruição. Três mil escolas tinham desaparecido e a Nação teve que reunir forças e reerguer as escolas debaixo de um forte inverno. Nesse período, o sistema educacional japonês descentralizou-se e recebeu novas influências “democráticas”. A educação militarista foi abolida e substituída pelo ensino da paz e da “democracia”, baseada em princípios escolanovistas. A filosofia adotada foi a da “igualdade”, o que propiciou o surgimento de um espaço ideal para atender às necessidades de industrialização do país. Em Fortaleza, apesar de não ter havido destruições, o cenário era de sacrifícios e de “sujeição”,ou seja, influência e dependência econômica em relação aos Estados Unidos. O final da guerra produziu e inspirou mudanças de comportamento e no cotidiano de Fortaleza, através do incentivo ao consumo de produtos industrializados que chegavam dos Estados Unidos e representavam para o povo o “desejo de modernização”.

Quando pensamos no Japão e no Brasil no pós-1945, pensamos, por conseguinte, nos Estados Unidos da América, uma vez que, embora aquelas nações tenham ficado, conceitualmente, em lados diferentes, rendidos e aliados, respectivamente, o objetivo por parte dos Aliados estava traçado: implantar, tanto no Japão, quanto no Brasil, uma cultura favorável à aceitação de estratégias de influência sócio-cultural.

 EDUCAÇÃO NO ESPAÇO PÚBLICO. SÉCULO XIX, CAMPINAS (BRASIL)

Valter Martins, Universidade Católica do Paraná

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A cidade de Campinas (estado de São Paulo, Brasil) durante a segunda metade do século XIX passou por muitas transformações em seu espaço urbano, conseqüência direta da riqueza acumulada com o desenvolvimento da economia cafeeira. Nesse contexto, as intervenções do poder municipal não se restringiram somente no que dizia respeito ao traçado das ruas, circulação de veículos, regulamentação do abastecimento de gêneros alimentícios, construção de casas e edifícios variados. Nos lugares públicos: ruas, praças e largos, as autoridades municipais buscavam educar, controlar e moldar as atitudes de indivíduos e famílias das classes populares. Leis municipais e, principalmente, a contínua ação da polícia foram instrumentos de uma pedagogia social que, pouco a pouco, transformou a vida de muitos campineiros; como foi possível verificar através da imprensa.

Entre as praças e largos existentes na cidade, o chamado Largo do Jurumbeval era um importante espaço público de trabalho, diversão, reunião e moradia popular, palco de uma efervescente vida social. A convivência cotidiana de escravos, libertos, imigrantes e nacionais pobres naquele local incomodava vários moradores da cidade e vereadores da câmara municipal, que consideravam seu comportamento imoral e escandaloso, inadequado a uma sociedade que se aburguesava e se desejava moderna. Assim, o Largo do Jurumbeval passou a ser um dos espaços públicos mais visados pela “ação pedagógica” da polícia campineira ao reprimir hábitos, atitudes e palavras durante muito tempo tidas como comuns mas que passaram a ferir sensibilidades. Junto aos chafarizes, lavadeiras, crianças, aguadeiros, gente em busca de um gole d’água ou de uma simples conversa, viviam um dia-a-dia bastante agitado e barulhento. Muitos campineiros, orgulhosos de sua rica e bela cidade, viam com preocupação aquela situação. Naquele momento de passagem do trabalho escravo para o livre, esperava-se cada vez mais uma cidade educada e higienizada, em seu espaço físico e nas atitudes e comportamentos de seus habitantes, especialmente os mais pobres, potenciais ameaças à ordem burguesa. Diante disso, a polícia deveria não apenas cuidar do patrimônio dos cidadãos e manter a ordem mas exercer também uma função educadora das classes populares ao ditar regras de convivência e coibir atos considerados impróprios. Homens de carne e osso, os agentes da lei não poucas vezes representavam um papel ambíguo ao praticarem alguns dos atos que deveriam reprimir.

Desta forma, o objetivo deste trabalho é recuperar uma faceta singular da educação das pessoas pobres (e assim de suas famílias), aquela que acontecia no espaço público de Campinas, algo possível se tivermos como pressuposto idéias como as de Roger Chartier sobre a riqueza e complexidade das relações sociais: culturais, e também educacionais.

MINHA ESCOLA, MINHA CLASSE, MEUS ALUNOS: SENTIDOS DA PROFISSÃO DOCENTE DO ENSINO PRIMÁRIO

Vera Lucia Gaspar da Silva, Faed/Udesc e USP

Nascida de pesquisa mais ampla, que abarca estudo comparado acerca de sentidos da profissão docente do ensino primário envolvendo dois estados brasileiros (Santa Catarina e São Paulo) e Portugal da virada do século XIX para o século XX, nesta comunicação apresentam-se “sentidos” atribuídos a e esta profissão por seus docentes e pelos estados. Os docentes foram “consultados” através de testemunhos localizados em diferentes acervos. Já a voz dos estados se faz presente através da legislação da época que normatizou o ensino normal, a escola primária e a profissão docente deste nível do ensino. A despeito de diferenças quanto à origem, à inserção social, à filiação política, o professorado do ensino primário incorporou e se apropriou de um discurso, ao mesmo tempo em que o construiu, que estabelece certa unidade de sentidos à profissão docente, e é nesta perspectiva que se apresenta neste estudo à idéia de sentidos: uma apropriação que os professores e professoras do ensino primário fizeram do discurso acerca desta profissão e da escola e da sua configuração pelos Estados e por outros segmentos sociais. Não é uma apropriação pura e simples, submissa, ela se dá num jogo de aceitação, recusa e resignificação. Amparado no argumento da lei e da ordem, o Estado, que nos finais do século XIX e primeiros anos do século XX busca se fortalecer sob esta bandeira, estabelece uma espécie de aliança com o funcionalismo público e, por extensão, com os professores primários, que não deve ser desprezada. Nesta relação são construídos sentidos, sentidos estes que não estão dados à priori, são construídos numa base cultural, num

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conjunto de valores e representações, em situações de interação e relação. Se os Estados, considerando um conjunto de valores e ideais, atribuíram sentidos para a profissão docente, o professorado, com seu conjunto de experiências, crenças e valores, interagiu com estes, numa relação que favoreceu o destaque de alguns atributos em detrimento de outros. Professoras e professores conheciam a imagem a qual deveriam corresponder e, mesmo quando não correspondiam a esta no cotidiano escolar, tinham as matrizes do discurso oficial incorporadas em seu próprio discurso.

A ATUAÇÃO DO DIRETOR SEGUNDO AS DIRETRIZES DO ESTADO NA PRIMEIRA REPÚBLICA

Vera Lucia Martiniak, Universidade Estadual de Ponta Grossa

O trabalho tem como objeto de estudo a atuação do diretor da Escola Normal na Primeira República, examinando-se a conjuntura histórica no início do século XX. Nesse período, no Estado do Paraná, foram elaborados diversos regulamentos e decretos, dentre os quais, dada a sua importância para essa pesquisa, selecionaram-se o Código de Ensino de 1917 e o Regulamento das Escolas Normais Primárias de 1924. Para a análise, contextualizou-se o período delimitado, na tentativa de se compreender as diretrizes emanadas do poder central e as suas implicações na área do ensino – inclusive no que concerne à imigração européia - devido às contribuições por elas deixadas no aspecto educacional. O trabalho também aponta a institucionalização da Escola Normal no Estado do Paraná, sem deixar de mencionar as imbricações que deram origens à primeira Escola Normal do Brasil, como fator primordial para justificar a formação de professores no país. Sobre a atuação do diretor na Escola Normal dos Campos Gerais - PR, buscou-se reconstruir uma parte da atuação dos primeiros diretores no período republicano, com base numa concepção dialético-materialista, para que assim o estudo possa contribuir na compreensão desse processo de construção da escola pública e, em especial, da Escola Normal nos Campos Gerais. Na investigação sobre a atuação do diretor, observadas as diretrizes legais que legitimaram sua função, percebe-se o caráter manipulatório na reprodução dos ideais nacionalistas. Nessa perspectiva, o diretor atuou como agente fiscalizador dos interesses da classe dominante. A sua atuação é entendida a partir da compreensão da instituição escolar como um local de transmissão de conhecimento que se encontra inserido dentro de uma realidade social, sendo resultante da participação de um determinado grupo social ou dos agentes que atuam no seu interior de maneira prática, envolvendo-se com as questões diretamente ligadas á prática educativa ou á forma de administração. Essa pesquisa, também integra o projeto nacional “História, Sociedade e Educação no Brasil”, sediado na Faculdade de Educação da Unicamp e, insere-se no Grupo de Pesquisa da Universidade Estadual de Ponta Grossa, GT – Campos Gerais, a qual visa fornecer elementos para o desenvolvimento de pesquisas e ampliação do acervo educacional da região.

CADERNOS ESCOLARES: UM DISPOSITIVO DE MUITAS FACES

Vera Mendes dos Santos, Universidade do Estado de Santa Catarina

Esta pesquisa tem por objetivo colocar em relevo os cadernos escolares desprendendo-os do cotidiano da sala de aula, onde se encontram extraordinariamente incorporados como material pedagógico natural e permanente. Para enfrentar tal desafio e produzir as rupturas e brechas necessárias a essa (des)construção e estranhamento, utilizamos como fundamento teórico, entre outros autores, o pensamento de Michel Foucault, tomando de sua obra, como referências chaves na orientação desse estudo, os conceitos de genealogia, e dispositivo.O método genealógico ao ser aplicado sobre os cadernos escolares, colocará em relevo a montagem híbrida e compassada de uma história própria. A genealogia dos cadernos revela os colégios jesuítas, criados na Europa a partir do século XVI e a pedagogia das escolas cristãs utilizada na França por João Batista de La Salle, no século XVII, peças-chave para a composição dos mesmos. Assim, jesuítas e lassalistas fazem emergir uma pedagogia em que a escrita ocupará a centralidade da rotina dessas instituições e ao ajustar os

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corpos dos alunos e professores, às suas rigorosas exigências, produzirá uma disciplina, feita de silêncio, atividade, prêmios e punições, em absoluta estreiteza entre tempo e espaço, configurando, dessa forma os principais cenários e fluxos para a invenção dos cadernos. Enquanto a genealogia revela os cadernos como produto de quebras, continuidades e cruzamentos, entre diferentes espaços, saberes e tempos, o conceito de dispositivo nos auxilia na visualização e compreensão dos micros e sutis mecanismos que os estruturam e os colocam em movimento como prática escolar. Estudá-lo como um dispositivo remete-nos a segunda parte dessa pesquisa, onde procuramos acompanhá-los em seu ‘habitat natural’, o espaço de uma primeira série, tendo a análise documental como caminho metodológico.Como resultados podemos dizer que essa pesquisa (re)apresenta os anônimos e opacos cadernos escolares, como um objeto escolar, tecido no interior da maquinaria pedagógica inventada pelos jesuítas, reimplementada por La Salle. A escola, escrita e cadernos, criados sob os mesmos discursos e práticas, entrelaçam-se complexamente para servirem, também, como ferramentas especializadas a esculpir, via infância, o sujeito moderno. Conforme pudemos observar na sala de aula em estudo, os cadernos conservam ainda hoje, quase que de forma intacta o poder de governar os tempos e as práticas escolares mais minuciosas, alcançando, efeitos subjetivos que explicitam-se em sala de aula, de forma contundente como: a imobilidade, a obediência, o silêncio e trabalho. Tal revelação, talvez possa auxiliar-nos na desnaturalização de outras práticas escolares.

HISTÓRIAS DA EDUCAÇÃO PELO TRABALHO: INFANTES PARANAENSES NO NOVECENTOS

Vera Regina Beltrão Marques- UFPR

O trabalho infantil é proibido no país. Assim reza a Constituição Brasileira em vigor desde 1988. Organismos internacionais, tais como Organização Inernacional do Trabalho (OIT) e Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), amparam e pressionam as nações a erradicar as ocupações laborais dos pequenos. Todavia o Brasil apresenta altos índices de crianças empenhadas no ganho do pão de cada dia. E mesmo havendo campanhas e incentivos para reverter a dura realidade traduzida pelos dados do PNAD 99, continuamos nos destacando: ocupamos posição muito incômoda no “ranking” dos países que sacrificam seus cidadãos do futuro.

Se hoje parece haver consenso na condenação do trabalho dos infantes, nem sempre foi assim.

Nos inícios do século passado, homens de ciência acreditavam que o trabalho se constituiria em antídoto aos perigos decorrentes do ócio e vício que “rondavam” crianças pobres desocupadas.

Sim, pois na cruzada civilizatória a que se atiraram médicos, pedagogos, filantropos, juízes, delegados de polícia, empresários, dentre outros, tratava-se de constituir cidadãos afinados com os novos símbolos da modernidade. A indústria, a cidade, o progresso, a tecnologia e a ciência estavam na ordem do dia. Fazia-se mister construir a sociedade do trabalho.

Segundo os higienistas, crianças desprovidas, vagando pelas ruas redundariam em adultos de “índole indefinida, mentalidade inconstante, vícios políticos e sociais” prontas a qualificar-se nas denominadas “classes perigosas”. Nunca seriam os futuros trabalhadores educados, ordeiros, disciplinados, demandados pelo capital.

Assim o ensino de ofícios às crianças pobres foi defendido como proposta política de criação do espírito da ordem e cumprimento do dever, em várias instituições, no intuito exercer o papel que “pais desagregados, desonestos, alcoolizados e em constantes desavenças domésticas” não pareciam capazes de desempenhar.

Qual teria sido o contributo das propostas higienizadoras na permanência de uma cultura do trabalho infantil?

Embora muitas sejam as causas da manutenção da ocupação laboral de crianças na sociedade atual, delimitou-se como intento abordar os desdobramentos das normas higienizadoras no que tange a faina dos infantes. Para tal investigaram-se as notícias estampadas nas páginas diárias das gazetas paranaenses, ao longo dos anos da década de 1990. Números, imagens, análises que tratavam de trazer ao leitor a crueza do mundo do trabalho enfrentado por esta petizada foram aproximadas aos discursos dos homens da ciência da higiene, dos começos do século XX.

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A cultura do trabalho “salvacionista” preconizada pelo discurso médico-higienista permanece amalgamada nos corações e mentes dos filhos das classes desprovidas às avessas do atual discurso que preconiza a erradicação do trabalho infantil. E, se isso não bastasse, essas crianças dizem preferir o trabalho à escola.

A CENTRALIDADE DO MÉTODO DE ENSINO NA EDUCAÇÃO MODERNA

Vera Teresa Valdemarin, UNESP

O presente artigo focaliza a centralidade que o método de ensino adquiriu na educação moderna, mediando a relação entre quem ensina (o professor), o que ensina (o conteúdo) e quem aprende (o aluno). A fim dar à questão sobre como ensinar a problematização que ela merece, dada sua centralidade no processo de ensinar e aprender, é preciso assumir a busca da genealogia dessa afirmação, retrocedendo a séculos anteriores, valendo-nos de textos e autores que trataram dessa questão de modo significativo, a fim de compreende-la em sua complexidade.

Tomamos para análise dessa temática, duas obras doutrinárias inaugurais da pedagogia moderna: a Didactica Magna, de J. A. Comenius e o Emílio ou da Educação, de J. J. Rousseau. Nessas obras, a partir de pressupostos sociais e políticos diferenciados, os autores apresentam modelos teóricos sobre como ensinar que, aplicados, garantiriam a aprendizagem dos alunos, a especificidade da arte de educar e a eleição da experiência como atividade desencadeadora do conhecimento.

Adotando a mesma teoria sobre o conhecimento humano, qual seja, que as idéias são produzidas por meio das percepções dos sentidos acerca dos objetos exteriores, educadores como Pestalozzi e Fröebel realizaram experiências pedagógicas, também centradas na elaboração de situações educativas por meio das quais as atividades desenvolvidas pelos alunos proporcionariam conhecimento claro e certo. Esses autores apresentam ainda um dado novo e fundamental para a reflexão: a institucionalização do método de ensino, isto é, o processo de ensinar em escolas e não mais com a apresentação de modelos sobre uma clientela escolar hipotética.É no século XIX, no entanto, que as proposições teóricas sobre o conhecimento humano e as prescrições metodológicas de aprendizagem pela atividade encontram sua formulação mais acurada para uso na escola elementar, então em processo de difusão na Europa: as lições de coisas e o método de ensino intuitivo.

Nessa proposição didática, o método de ensino entrelaçado ao conteúdo a ser ensinado é o principal elemento pedagógico para promover a aquisição do conhecimento nos jovens alunos, bem como a melhor caracterização trabalho docente. Fazendo uso de objetos didáticos e de prescrições metodológicas bastante demarcadas, o método de ensino é considerado elemento pedagógico capaz de promover inovações tidas como necessárias ao sistema educacional, colocar a formação de professores num patamar de especialização e garantir a aprendizagem disciplinada das crianças. Assim sendo, tendo como fontes tratados pedagógicos e manuais didáticos para uso de alunos e professores, pretendemos caracterizar o processo por meio do qual o método de ensino é elevado à categoria de instrumento pedagógico imprescindível, bem como indagar sobre seu declínio quando confrontado com as novas concepções da aprendizagem provenientes da psicologia.

PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES SOBRE OS PROJETOS EDUCACIONAIS E CULTURAIS DO GOVERNO ALUÍZIO ALVES NO RIO GRANDE DO NORTE (1961)

Vicente Vitoriano Marques Carvalho, UFRN

A presente comunicação é o resultado do esforço em registrar as primeiras aproximações da pesquisa denominada “Políticas Para a Educação e a Cultura do Governo Aluízio Alves no Rio Grande do Norte, 1961/1964”. O estudo de caráter histórico, recorre a Pierre Bourdieu (1998) como referencial teórico para problematizar as relações entre “campos de poder” manifestados em torno das políticas públicas para a educação e a cultura e das idéias pedagógicas vigentes. Utiliza-se de fontes

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documentais como o Diário Oficial do Estado do Rio Grande do Norte, planos governamentais, discursos e Mensagem dirigida à Assembléia Legislativa, além de fontes bibliográficas relativas às idéias pedagógicas, especialmente a produção de Francisco Falcon (1997), Dermeval Saviani (1999 e 2001) e Afonso C. Scocuglia (1999). Procura-se analisar o ideário educacional adotado para a implementação de projetos educacionais e culturais, em particular aqueles relacionados ao ensino da arte e ao emprego da arte e do patrimônio cultural, em suas relações com as intenções social-desenvolvimentistas do Governo Aluízio Alves. Observa-se que as idéias sobre educação e sobre cultura referente ao primeiro ano do Governo Aluízio Alves, o ano de 1961, acham-se na forma de projetos não formalizados, mas já evidenciando campos definidos para atuação do poder político estatal. Contudo, observam-se em tais projetos afirmações sobre a contigüidade entre escolarização e formação profissional, essencial para o modelo de industrialização em implantação em substituição ao modelo agrário até então dominante, o que combina com o programa social-desenvolvimentista daquele Governo. A comunicação também se detém sobre as sugestões do Governador Aluísio Alves para o “Plano Cultural do Governo”, bem como sobre suas providências em assessorar missão oficial do Serviço do Patrimônio Histórico do Ministério da Educação e Cultura, que integram o objeto desse estudo, ou sejam as políticas educacional e cultural daquele governo.

LEITURAS PARA PROFESSORES: APROPRIAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE SABERES NOS MANUAIS PEDAGÓGICOS BRASILEIROS ESCRITOS PELOS “CATÓLICOS” (1868-1971)

Vivian Batista da Silva, FEUSP

A presente comunicação integra um estudo sócio-histórico-comparado acerca de leituras para professores em Portugal e no Brasil. Trata-se de uma pesquisa sobre livros usados em cursos de formação de professores para promoverem um primeiro contato com as questões de ensino, são os chamados manuais pedagógicos. Nosso interesse principal é saber como esses textos participam da produção e circulação de saberes que, em nível intra e inter-nacional, estruturam o trabalho docente, desde o ano de edição do título mais antigo que pudermos encontrar (1881, no caso brasileiro, e 1868, no caso português) até o início da década de 1971, quando fatores como a modernização do setor editorial e reestruturações das escolas normais favorecem significativas transformações nesse tipo de publicação.

A natureza comparativa dessa investigação justifica-se pelo fato de a disseminação de saberes nos manuais ser parte integrante da difusão mundial da escola de massas, cujo modelo começa a se consolidar em várias nações e momentos diferenciados desde o século XIX, graças a uma rede comunicacional de idéias estabelecida entre diferentes autores, lugares e instituições. Ao atentarmos para o espaço Brasil-Portugal, estamos considerando as conexões lingüísticas e culturais entre esses dois países e que, historicamente, têm promovido relações de vizinhança e de distância. Interrogamo-nos sobre como o modelo de escola e de professor tem sido apropriado nesse circuito através de leituras, citações e apreciações de determinados conhecimentos, tal como esses são dados a ver nos manuais.

Desse modo, enquanto parte de empreendimentos mais amplos, atualmente por mim desenvolvidos em nível de doutorado e no âmbito de uma parceria entre a Universidade de Lisboa e a Universidade de São Paulo (projeto Estudos comparados sobre a escola: Brasil e Portugal, séculos XIX e XX – CAPES-ICCTI), a comunicação aqui proposta destaca que os manuais pedagógicos resultam de iniciativas do Estado quando, por exemplo, professores de escolas normais e inspetores de ensino assinam títulos dessa natureza (ver casos como os de Lourenço Filho e João Toledo) e também de iniciativas da Igreja, quando padres e membros do laicato católico escrevem esse tipo de texto (ver casos como os do Monsenhor Pedro Anísio e Everardo Backheuser).

O exame dos manuais (cerca de 30 títulos portugueses e 70 brasileiros) tem evidenciado semelhanças e diferenças nos modos como cada autor elabora suas proposições acerca do magistério e isso decorre, dentre outras questões, dos interesses e capitais específicos dos grupos que produzem tais títulos. Para mostrar os mecanismos dessa lógica, o texto a ser apresentado irá discutir características dos livros assinados por autores católicos brasileiros: qual bibliografia esses escritores

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usam para fazer seus textos e que tipo de argumento constróem a partir desse universo de referências? Tal análise nos permitirá saber quais são as especificidades desses manuais no conjunto dos livros estudados, bem como as proximidades notáveis nesse corpus de análise e referentes aos modos de conceber o magistério.

O 4º CONGRESSO BRASILEIRO DE INSTRUÇÃO SUPERIOR E SECUNDÁRIA E OS PRIMEIROS DEBATES SOBRE A CRIAÇÃO DA DISCIPLINA MATEMÁTICA

Wagner Rodrigues Valente, PUC-SP

A disciplina Matemática foi criada oficial e nacionalmente através da chamada Reforma Francisco Campos. Será através do Decreto no. 19.890 de 18 de abril de 1931 que o ensino secundário brasileiro passará a não mais contar com programas separados de Aritmética, Álgebra e Geometria, substituídos por um único, que buscava a integração dessas três disciplinas, até então, autônomas. Levando em consideração elementos teórico-metodológicos do campo da história das disciplinas escolares, o trabalho tem por finalidade contribuir para a história da disciplina Matemática no Brasil. Analisando os debates do 4º Congresso Brasileiro de Instrução Superior e Secundária, ocorrido no Rio de Janeiro, em 1922; utilizando o APER- Arquivo Pessoal Euclides Roxo, acervo que reúne documentos daquele que elaborou, a pedido de Francisco Campos, a proposta de criação em nível nacional, da nova disciplina Matemática; e lançando mão de jornais e revistas da época, a comunicação pretende demonstrar que esse congresso foi o palco para o início dos debates sobre a fusão da Aritmética, Álgebra e Geometria, fruto, como também buscar-se-á mostrar, da apropriação de novas propostas de ensino para a matemática escolar vindas dos EUA e da Europa, elaboradas no início do século XX.

ALCEU AMOROSO LIMA , UM EDUCADOR CATÓLICO

Waldir Cauvilla, Universidade de São Paulo

Nesta comunicação, destacarei a figura do líder católico brasileiro Alceu Amoroso Lima (também conhecido como Tristão de Ataíde, nome que adotou ao abraçar a crítica literária em 1919 ).Alceu, que nasceu no Rio de Janeiro, em 11 de dezembro de 1893, "converteu-se" ao catolicismo em 1928.Logo após, assumiu a direção do Centro D. Vital e de sua revista oficial A Ordem. A partir daí, passa a ser o principal líder católico leigo do país, verdadeiro "braço direito" do Cardeal D. Leme, no projeto de constituição de uma vanguarda católica. É nessa condição --- ocupando ,também, a Secretaria Geral da Liga Eleitoral Católica e a presidência da Ação Católica Brasileira ___ que Alceu participará do embate entre católicos e liberais nos anos 30 do século passado, um dos principais períodos da História da Educação brasileira.

Nesse período, Alceu também fez parte do Conselho Nacional de Educação e da Academia Brasileira de Letras. Exerceu durante alguns meses a Reitoria da Universidade do Distrito Federal , que havia sido criada por iniciativa de Anísio Teixeira, um dos mais importantes educadores liberais do Brasil.

Podemos ver todos esses posicionamentos de Amoroso Lima como parte do processo de criação da primeira universidade católica no Brasil, em que também se destacou o Pe. Leonel Franca, da ordem dos jesuítas, e que foi fundada em 1946, tornando-se pontifícia em 1947.Nessa época, a ação política de Alceu A. Lima tem um caráter autoritário, que chegou a incluir simpatias pelo movimento integralista, e apoio ao Estado Novo, governado por Getúlio Vargas.Procuraremos esclarecer o tipo de autoritarismo exercido por Alceu, caracterizando sua especificidade diante de outros políticos autoritários do mesmo período ( Francisco Campos, Plínio salgado, Oliveira Viana e Azevedo Amaral ).

Porém, como, a partir de 1947, quando publica o livro Problema do Trabalho e assina o Manifesto de Montevideu, criando a Democracia cristã na América Latina, Alceu A . Lima passa a ter um posicionamento democrático, anti-autoritário, culminando com sua pronta e firme crítica ao

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governo ( e ditadura ) militar implantado em1964, levaremos nossa considerações até o ano de 1983, data de sua morte.Nesta sua "segunda fase", Alceu não estava vinculado a nenhuma instituição, mesmo leiga, da Igreja Católica, mas podemos ver ainda sua liderança se exercendo, principalmente , através de seus artigos em jornais, que ,para nós, desempenhavam uma verdadeira função educativa, como procuramos mostrar em nossa tese de doutoramento, Alceu Amoroso Lima e a democracia: em busca da proporção.

GÊNESE E IMPLANTAÇÃO DO COLÉGIO MARISTA DIOCESANO DE UBERABA (1903-1916)

Washington Abadio da Silva, U. Federal de Uberlândia

No final do século XIX, em 1897, os Irmãos Maristas, religiosos católicos, chegaram ao Brasil e iniciaram sua obra educativa. Pouco tempo depois, em dezembro de 1902, após várias tentativas do bispo Dom Eduardo Duarte Silva, assumiram o “Colégio Diocesano de Uberaba”. A origem da “obra marista” se deu na França, com a intuição do Padre Marcelino José Bento Champagnat (1789-1840), num ambiente pós-Revolução em que escolas religiosas eram perseguidas e fechadas; as governamentais, insuficientes e péssimas; os professores, despreparados e, não raras vezes, desequilibrados. Fundando uma congregação dedicada à educação de crianças e jovens, Champagnat fez da confessionalidade um traço característico de seu trabalho: para ele, as disciplinas “profanas” seriam como que “isca” para se falar de Deus, para realizar um ensino a partir dos valores do Evangelho. A ele se atribui o lema que marca a educação marista em quase 80 países: “formar bons cristãos e virtuosos cidadãos”. Eis a proposta de junção entre educação confessional e formação para a cidadania que tem dado às escolas maristas o reconhecimento pela qualidade e seriedade de seus conteúdos e métodos de ensino. Na “Princesa do Sertão” não se deu de forma diferente, pois também ali esse modelo educacional tornou-se um marco importantíssimo em sua história. Sendo pólo agregador das culturas mineira, goiana e paulista, além de liderar a conjugação das forças políticas, econômicas e religiosas da região, Uberaba teve períodos de apogeu, quando atraía as atenções de São Paulo, Rio de Janeiro e Santos. O estabelecimento da escola marista nessa cidade e a relevância deste estudo, então, podem ser entendidos a partir da confluência de vários fatores: investimento da Igreja Católica na educação, num contexto de longo confronto com as idéias positivistas da República nascente (1889), expressa na Reforma Benjamin Constant (1890), baseada nos princípios da liberdade e da laicidade no ensino, e defensora de uma escola primária gratuita; processo de modernização das relações econômicas e sociais, gerador de enfrentamento de forças políticas – inclua-se a Igreja, as quais propuseram várias reformas educacionais como meio de perpetuarem sua hegemonia; no período compreendido entre 1910 e 1920, segundo Janete Azevedo, “imprimiu-se à educação o caráter de uma questão nacional”. Para a realização deste trabalho, uma pesquisa bibliográfica, buscamos o embasamento teórico na História das Instituições Educacionais. Tendência recente da historiografia, tem-nos ajudado a examinar com seriedade epistemológica e tematizar uma singularidade social que, se feita a partir de precipitadas análises de conjunto, poderia não ser captada em seu sentido mais profundo. O contato com documentos originais do período, tanto da congregação marista, quanto da arquidiocese de Uberaba e outras fontes, permitiu-nos perceber a marcante influência da filosofia educacional marista na cidade e na região.

A CONFORMAÇÃO DA EDUCAÇÃO MINEIRA NO FINAL DO SÉCULO XIX: ANÁLISE COMPARADA DE REGULAMENTOS DE ENSINO DO ESTADO E DE UBERABINHA (1892-1893)

Wenceslau Gonçalves Neto, Universidade Federal de Uberlândia

(INTRODUÇÃO) O trabalho contribui para o estudo da História da Educação do estado de Minas Gerais, Brasil, a partir do município de Uberabinha (Uberlândia desde 1929), na última década

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do século XIX, quando se inicia, após sua autonomia em 1888, a organização político-administrativa e também educacional da cidade. Este também é o momento da implantação do sistema republicano no Brasil, demandando reconfiguração do espaço social e a elaboração de nova constituição. O texto resulta da pesquisa "Organização do ensino público e representações de educação e civilização em Minas Gerais: Uberabinha, 1888-1930", financiada pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

(FONTES/METODOLOGIA) Foram consultados os livros de atas da Câmara Municipal de Uberabinha e o primeiro livro de "'"Leis, Decretos e Regulamentos", também da Câmara, além da legislação educacional do Estado de Minas Gerais. Foi feita a transcrição das discussões que ocorrem na Câmara e do texto das leis voltadas para a educação (no ano de 1992 são 4). Incorporou-se a literatura sobre a legislação pública no Brasil e Minas Gerais e procedeu-se a uma análise comparativa dos regulamentos da instrução de Minas Gerais e de Uberabinha.

(RESULTADOS) Apesar de se esperar que o regulamento do estado orientasse as discussões do município, foi observado que o regulamento de Uberabinha (1892) antecede ao do Estado (1893). Contudo, existem muitas aproximações, demonstrando que o debate sobre a educação pública no período esteve ao alcance da elite uberabinhense. Temáticas como fiscalização e contrôle do ensino; cuidado com livros e condenação de literaturas específicas; disciplina e moral; penas para infrações; trabalho docente; infra-estrutura escolar; higiene; explicação da nova Constituição, aparecem em ambos os regulamentos. Em número menor, ocorrem divergências, envolvendo liberdade de ensino e ensino de religião; financiamento da educação; restrições a mulheres separadas para a prática docente; conselhos escolares; entre outras.

(CONCLUSÕES) Recupera-se noções das representações de educação, ordem, progresso, civismo, republicanismo, presentes na legislação educacional mineira, uberabinhense e nos debates da Câmara Municipal. Identifica-se na discussão local, elementos do debate nacional e estadual, demonstrando que a crença no poder transformador/regenerador da educação espraiava-se por pequenos lugarejos do interior do Brasil, como a Uberabinha de então. Entende- se que estes estudos municipais contribuirão para a compreensão do processo de difusão da educação pública no Brasil, interligando o local e o nacional, possibilitando obras de síntese sobre a História da Educação Brasileira.

A INSTRUÇÃO PÚBLICA EM SOROCABA -1860/1870.

Wilson Sandano -Universidade de Sorocaba, UNISO

O trabalho apresentado investiga o processo de formação do espaço escolar de Sorocaba e vincula-se à linha de pesquisa Instituição Escolar: políticas e práticas, do Mestrado em Educação da Universidade de Sorocaba. Sua prática investigativa articula-se à pesquisa, análise e sistematização de fontes documentais contributivas da história da educação com prioridade para Sorocaba e região. Os dados registrados derivam da pesquisa: Fontes para a história da educação escolar em Sorocaba, circunscrito ao período de 1850 a 1920, que referencia no âmbito da produção historiográfica correspondente à história de Sorocaba e região, a decadência do tropeirismo e o auge da industrialização. Diante da riqueza e da complexidade do tema-objeto proposto com base na caracterização do tratamento teórico metodológico dedicado ao processo de formação de Sorocaba e dos processos de escolarização correspondentes, procuramos infonnações que contextualizam o período correspondente às fontes documentais: 1860 -1870; concentrando nossa atenção, por exemplo, na formação do espaço histórico de Sorocaba; nas práticas produtivas correspondentes a esse período; nas relações entre Estado, política educacional e sistema escolar e nas práticas formativas dos professores e institutores.A apropriação do tema- objeto proposto busca responder à necessidade de superar o caráter lacunar da história da educação escolar, especificamente em Sorocaba e região, com base na leitura e a sistematização do acervo documental de Educação em Sorocaba, pertinente ao período de 1860 a 1870; e concentra seus esforços em elaborar um guia

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preliminar de fontes. A caracterização da natureza do acervo investigado circunscreve-se a documentação textual escrita num universo constituído por oficios, cartas, memorandos, livros de registros, estatutos, regimentos, relatórios, etc. A documentação foi obtida por meio de xerocópia dos originais. A problematização norteadora da investigação proposta é a que segue: quais os processos que originam, constituem e viabilizam a educação escolar em Sorocaba e região, no período de 1860 a 1870, considerando como agentes desses processos os Professores e Inspetores da denominada Instrução Pública? A pesquisa aqui proposta propicia duas dimensões essenciais: (1) De levantamento e sistematização de fontes documentais. (2) De tratamento teórico-metodológico das referidas fontes. E isto considerando que a história local expressa um campo investigativo específico que não pode ser reduzido a mero reflexo dos processos históricos mais amplos embora seja constituinte dos mesmos.

O SEMINÁRIO CATÓLICO COMO LOCAL DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES

Wojciech Andrzej Kulesza, Universidade Federal da Paraíba

Desde os tempos coloniais, os Seminários religiosos assumiram um papel fundamental na formação de professores no Brasil. Como cursos superiores, precursores dos estudos nas Faculdades, os Seminários forneceram docentes para as diversas cadeiras do ensino secundário, notadamente latim e filosofia. Firmou-se assim a tradição dos padres-mestres na cultura brasileira. Com a notável exceção do Seminário Episcopal de Olinda, de inspiração pombalina, esses educandários eram Seminários pios, destinados originalmente à formação de religiosos, regulares ou seculares. A separação entre a Igreja Católica e o Estado, advinda com a República, num contexto de romanização crescente das instituições eclesiásticas, provocou a proliferação de Seminários Diocesanos, geralmente associados a colégios secundários católicos, multiplicando assim o magistério docente de padres e ex-seminaristas. No melhor espírito tridentino, ao mesmo tempo em que a Igreja cuidava da adequada preparação do clero, estendia sua influência sobre a sociedade civil através da formação das elites masculinas dominantes nas escolas católicas. Das aulas de catecismo nas escolas primárias, passando pela formação das professoras nas escolas normais católicas, até as aulas de filosofia nas Faculdades, foi constante e determinante a presença docente dos sacerdotes na sociedade brasileira no período republicano. Neste trabalho, analisa-se a influência do Seminário Diocesano, criado em 1894 na Paraíba por D. Adauto Aurélio de Miranda Henriques, na educação paraibana e brasileira, através do levantamento da atuação de seus egressos, ordenados padres ou não. Como resultado, sobressai o papel basilar que esses ex-seminaristas tiveram no desenvolvimento da educação, tanto ao nível local como nacional, uma vez que eles eram destacados pela Igreja para as mais diversas dioceses e funções. Atuando num espaço de formação que deveria ser ocupado pelo Estado laico, a Igreja estabeleceu, na primeira metade do século passado, sua hegemonia na educação brasileira, especialmente no que se refere ao ensino secundário. Mirando-se no caso da Paraíba, avulta o papel desempenhado nesse processo pelas instituições formadoras do clero católico no Brasil. Seja como fundadores de escolas, como dirigentes de ensino (tanto na esfera privada, como na pública), como autores de manuais didáticos ou como professores das mais variadas matérias de ensino, os ex-alunos dos Seminários acabaram por constituir uma cultura escolar católica no Brasil moderno, com fortes reflexos na educação brasileira contemporânea.

ESCOLA PÚBLICA FLUMINENSE: O FROUXO MOVIMENTO PENDULAR DAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO

Yolanda Lima Lobo (UENF) e Lia Faria (UERJ)

Produto da investigação sobre “O Empreendimento Educativo-Cultural da Fusão: Memórias de Secretários de Educação”, este texto analisa as mudanças ocorridas na política do novo Estado do Rio de Janeiro, que surge com a fusão dos Estados da Guanabara e antigo Rio de Janeiro em 1975. O processo de transição democrática que se inicia no Brasil na década de setenta encontra ressonância

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no ambiente político desses Estados, estabelecendo um campo de tensões e transformações no redesenho da correlação de forças do novo Estado, que nasce como uma imposição do regime de exceção vigente no Brasil desde 1964, em momento marcado pela sua fase final (Motta, 2001). No entanto, passados quase trinta anos, apesar de seu caráter aparentemente irreversível, a fusão permanece como um dos temas em torno do qual se travam conflitos na busca da definição dessa nova identidade política, que já nasce excludente, na medida que nega “fluminenses” e “cariocas” (Freire, 2001). O interesse do estudo em tela está focalizado nos impasses e conflitos advindos para a Escola Pública Fluminense, em meio ao cenário político conturbado e fragmentado, pela perda daquelas identidades historicamente construídas. Os embates entre tendências opostas evidenciam-se na constante substituição dos titulares da pasta da Educação e no frouxo movimento pendular das políticas educacionais. Cortejada por partidos políticos, a Secretaria de Educação foi ocupada por dezessete titulares, nos sete governos após a fusão. Para compreender esse movimento, buscamos redesenhar a trajetória vivencial dos quatro primeiros Secretários de Educação, responsáveis pela formulação e implementação de propostas pedagógicas e políticas educacionais do Estado do Rio de Janeiro. A metodologia da história oral (Thonsom, 1997) empregada nas entrevistas realizadas com esses titulares foi enriquecida com a pesquisa documental o que permitiu esclarecer ligações com o tempo presente. O exame da problemática nos permitiu reconstituir o caminho que terminou por se constituir no desmonte da Secretaria de Educação. De fato, a estrutura organizacional dessa Secretaria compreendia órgãos colegiados, de planejamento, apoio técnico, administrativo-financeiro, de contabilidade e fundações, porquanto orientada pelo princípio racional da divisão do trabalho e a distribuição de funções pelo princípio da meritocracia. Nos últimos 25 anos a Secretaria perdeu seus principais órgãos, dada sua pendulação para o clientelismo. A Cultura separa-se da Educação, constituindo-se em uma nova secretaria; cria-se a de Assuntos Extraordinários, encarregada de implantar os Centros Integrais de Educação Popular; transfere-se para a Secretaria de Ciência e Tecnologia as Escolas Técnicas e o Instituto de Educação do Rio de Janeiro.

IMIGRAÇÃO, FAMÍLIA E EDUCAÇÃO: A INFÂNCIA DE IMIGRANTES PORTUGUESES

Zeila de Brito Fabri Demartini, UMESP e CERU/USP

Nesta comunicação tratamos de um tema que analisamos em estudo recente sobre a imigração portuguesa: as relações entre a educação familiar e a educação escolar vivenciadas por pequenos imigrantes em terras portuguesas e/ou em terras brasileiras. Abordamos nessa pesquisa famílias que vieram para a região metropolitana de São Paulo durante a Primeira República (1889-1930), procurando conhecer as vivências e estratégias desenvolvidas por esse grupo no contexto desta cidade que passava por rápidas e profundas transformações tanto em sua composição demográfica, como nas atividades econômicas, sociais e culturais. Para tanto, entrevistamos pessoas de diferentes gerações dessas famílias, constituindo os relatos orais fonte indispensável e privilegiada do estudo. Para essa comunicação, focalizamos as memórias sobre a educação familiar e escolar da geração mais velha, dos que realizaram a travessia entre o contexto português e o paulista ainda quando pequenos, ou que nasceram em São Paulo; isto é, trabalhamos com as memórias daqueles que vivenciaram o processo de inserção no contexto paulista, enquanto eram crianças, embora tenham sito entrevistados já com idade avançada. Para tanto, optamos por trabalhar com imigrantes portugueses de diferentes origens, assim como com a categoria gênero.

A análise da educação veiculada pelas famílias mostrou-se fundamental para a compreensão do processo de inserção dos mesmos em São Paulo e para o entendimento das vivências de seus filhos no campo da educação escolar. Focalizamos os temas: as relações entre os membros da família, os projetos e/os valores veiculados no meio familiar, os castigos, as brincadeiras, o mundo do trabalho, as amizades fora de casa, a escola, as vivências da cultura local, as trocas interétnicas, entre outros. Constatamos que é impossível falar de uma infância padronizada entre esses pequenos imigrantes portugueses: as memórias remetem a diferentes infâncias. Tomamos como exemplos para esta análise os relatos de entrevistados que são representativos dessas diferenças no tocante às vivências familiar e escolar em Portugal e/ou em São Paulo: os que passaram a infância em famílias com grande capital

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econômico, escolar, social e cultural; famílias de pequeno capital econômico e pouca escolaridade, em atividades rurais ou pequenos serviços urbanos; os relatos sobre a infância em famílias de operários ou trabalhadores em serviços urbanos especializados, com capital econômico mediano.

Os diferentes processos de socialização das crianças nessas famílias parecem evidenciar novos aspectos do processo de inserção de imigrantes nas sociedades de adoção. (CNPq)

A ESCOLA NORMAL NO ESTADO DE SANTA CATARINA - BRASIL

Zenir Maria Koch, UDESC

Esta pesquisa buscou investigar os novos saberes e as novas práticas escolares introduzidas na Escola Normal Catharinense, localizada em Florianópolis, Santa Catarina - Brasil, no período da vigência da Reforma Orestes Guimarães, entre os anos 1911 a 1930 do Regime político Republicano. O início da primeira República no Brasil foi marcado no contexto catarinense, mais especificamente em Florianópolis, pelo movimento de reajustamento social da população aos imperativos burgueses de organização social. Vivenciou-se uma verdadeira cruzada saneadora e remodeladora de modo a ajustar-se a nova ordem burguesa que se instaurava. Neste cenário, a formação dos professores passou a ter papel-chave, transformando-se em projeto político do Estado. A reforma empreendida definiu o currículo da Escola Normal que, assentada nos “modernos métodos e processos pedagógicos”, buscava assegurar a formação de professores e professoras em conformidade com os conhecimentos exigidos pelo novo contexto político republicano. A análise de como estas mudanças foram consolidadas através da legislação para a formação dos/as modernos/as professores/as pela Escola Normal renovada – cujo alunado compunha-se, principalmente, pelas moças oriundas da classe média – que, a partir de então, passaram a ter seu trabalho socialmente valorizado, contribui para uma maior compreensão acerca da Escola Normal e de seu importante papel na formação dos profissionais do magistério, durante o período de consolidação do regime republicano e no momento atual.

Ao dirigir nosso olhar para a formação dos(as) professores(as) normalistas das décadas passadas, detivemo-nos na contextura da Escola Normal catarinense, na tentativa de situar os referenciais que determinaram a construção do conhecimento escolar e a sua relação com o poder político vigente. Para interpretação desses processos, mergulhamos no exame dos discursos educativos que moviam a construção de saberes e práticas curriculares na Escola Normal naquele momento histórico, na perspectiva de entender o surgimento dos chamados Institutos Superiores de Educação no Brasil, hoje. A política de formação para o magistério imposta pelo atual governo, através da recriação dos Institutos Superiores de Educação, remete-nos para o passado na perspectiva de buscar na gênese da Escola Normal elementos que nos auxiliem na compreensão de determinadas categorias conceituais que se fazem presentes com outros aparentes significados. Indiscutivelmente, retomar a história do ensino normal e a tessitura curricular imersas na conjuntura sócio política brasileira e catarinense é de fundamental importância para o debate sobre a formação de professores no contexto da universidade.

* Texto elaborado com base na pesquisa desenvolvida por Denise Soares Miguel, Gladys Mary Teive e Zenir Maria Koch, professoras da Faculdade de Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina, com a participação da acadêmica Tamylle Ourique Torquatto do Curso de Pedagogia.

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COMUNICANTES:

Adir da Luz AlmeidaAida Rotava Paim

Aires Antunes Diniz

Albérico Afonso Costa Alho

Alberto A. Gomes

Alberto Costa Lopes

Alberto Manoel Lopes

Alboni Marisa Dudeque Pianovski Vieira

Alessandra Arce

Alessandra Cristina Furtado

Alice de Oliveira Viana

Américo Óscar Guichard Freire

Amy A. F. AlvesAna Clara Bortoleto Nery

Ana Laura Godinho Lima

Ana Luisa Fernandes Paz

Ana M. V. Melo

Ana Maria Bandeira de Mello Magaldi

Ana Maria Casasanta PeixotoAna Maria de Oliveira Galvão

Ana Maria Melo NegrãoAna Maria Severiano de Paiva

Ana Maria Tomé Parracho Brito

Ana Maria Tramunt IbañosAna Maria Tramunt Ibaños

Ana Raquel Lucato Cianflone

Ana Sofia AntónioAna Teresa de Sousa e Castro da Purificação

Ana Waleska Pollo Campos MendonçaAnamaria Gonçalves Bueno de Freitas

André Chaves de Melo Silva

Andréa Borges de Medeiros

Andréa Carla Agnes e Silva

Andréa Gabriel Francelino Rodrigues

Andrea Soares CarusoAndréia Mucio Jeronymo

Ângela Bonifácio Vítor

Angélica BorgesAntonia Simone Coelho Gomes

Antónia Terra de Calazans Fernandes

Antonio Augusto Gomes Baptista

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António Carlos Correia

Antonio Carlos Ferreira Pinheiro

António Carlos Moraes

António Gomes Ferreira

António José Gonçalves Barroso

António Manuel Matoso Martinho

António Manuel S. P. Silva

António Marques do Vale

Aparecida de Fátima Soane Lomônaco

Aparecida Rodrigues Silva Duarte

Argos Gumbowsky

Ariclê Vechia

Arlette Medeiros Gasparello

Armando Martins de Barros

Arnaldo Romero

Artur Cesár Isaia

Artur Manso

Aúrea Adão

Áurea Maria Guimarães

Beatriz Daudt Fischer

Berenice CorsettiBerenice Lagos Guedes de Bem

Carla Simone Chamon

Carlos Alberto da Silva Beato

Carlos Alberto Lucena

Carlos Augusto de Amorim Cardoso

Carlos Bresciani

Carlos Eduardo Carvalho de Santana

Carlos Eduardo Vieira

Carlos Henrique de Carvalho

Carlos Roberto Jamil Cury

Carlota Boto

Carmen Lúcia Fornari Diez

Carmen Maria Aguiar

Carmen Sylvia Vidigal Moraes

Casimiro Amado

Cecília Hanna Mate

Célia Cristina de Figueiredo Cassiano

Célia Maria Benedicto Giglio

Célia Maria de Castro AlmeidaCélia Maria Fernandes Nunes

Célia Regina Otranto

Célia Rosângela Dantas Dórea

Celso João Carminati

César Augusto Castro

Christianni Cardoso Morais

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Page 275: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Circe Maria Fernandes Bittencourt

Cirlei Francisca Gomes Carneiro

Claudemir de Quadros

Claudia Alves

Claudia Engler Cury

Claudinei Magno Magre Mendes

Cristiana Moreira Lins de Medeiros

Cristiane dos Santos Souza

Cynthia Greive Veiga

Cynthia Machado Campos

Cynthia Pereira de Sousa

Dagmar Junqueira

Dalcy da Silva Cruz

Dalva Carolina de Menezes Yazbeck

Daniel Augusto Melo Rosa

Daniel Cavalcanti de Albuquerque Lemos

Daniel Ferraz Chiozzini

Daniel Melo

Daniel Rosa

Daniela Cristina Lopes de Abreu

Décio Gatti Júnior

Denice Catani

Denilson Santos de Azevedo

Denise Guilherme da Silva

Dermeval Saviani

Diana Gonçalves Vidal

Diana Valdez

Diomar das Graças Motta

Dione Dantas do Amaral

Dirce Maria Falcone Garcia

Domingos Leite Lima FilhoDoris Helena de Souza

Dulce Maria Viana Mindlin

Ediógenes Aragão Santos

Edison Luiz SaturninoElaine Cristina Carvalho Moura

Elenice de Souza Lodron Zuin

Elio Cantalício SerpaElison Antonio Paim

Elizabete Figueiredo de Sá Poubel e Silva

Elizabeth Menezes Teixeira Leher

Ellen Scopel Cometti

Eloisa da Silva Gomes de Oliveira

Elomar Tambara

Emilene Fontes de Oliveira Xavier

Eneida Oto Shiroma

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Page 276: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Eneida Ramos Figueiredo

Ernesto Candeias Martins

Ester Fraga Villas-Bôas Carvalho do Nascimento

Ester Senna

Etelvina Maria de Castro Trindade

Eugénia Maria Dantas

Eurize Caldas Pessanha

Eva Cristini Arruda Câmara BarrosEva Maria Siqueira Alves

Eva Waisros PereiraEvelcy Monteiro Machado

Fábia Lilia Luciano

Fabiana Cristina da Silva

Fernanda Barros Muller

Fernando Antônio Castelo Branco Sales Júnior

Fernando António Peres

Fernando Luís Gameiro

Fernando Manuel Seixas Guimarăes

Filomena Maria Formaggio

Filomena Maria Moreira da Silva

Filomena Otávia Fernandes Lume

Flávia Obino Correa Werle

Flávia Obino Corrêa Werle

Flávia Silvia Rodrigues

Francisca Isabel Pereira Maciel

Francisco das Chagas de Loiola Sousa

Francisco de Assis Azevedo dos Santos

Geovana Ferreira Melo MouraGeraldo Inácio Filho

Giana Lange do AmaralGiani Rabelo

Gilson Ruy Monteiro Teixeira

Giselle Baptista Teixeira

Gislene Aparecida dos Santos

Gislene Taveira de Almeida Neves

Gizele de SouzaGlacyra Lazzari Leite

Gladys Mary Teive Auras

Gomercindo Ghiggi

Graça Aparecida Cicillini

Graziela Maria Lopes de Brito Saraiva Barreto

Helcimara de Souza TellesHelena Ibiapina LimaHelena Ribeiro de Castro

Heloísa de Oliveira Santos Villela

Heloísa Helena Pimenta Rocha

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Page 277: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Henrique Antunes Cunha Júnior

Ilíada Pires da Silva

Ilmar Rohloff de Mattos

Inára de Almeida Garcia Pinto

Inês Ferreira de Souza Bragança

Iranilson Buriti de Oliveira

Irene Maria Gonçalves Pereira

Irlen António Gonçalves

Isabel Cristina ArendtIsabel Maria Sabino de Farias

Isabel Pires Santos

Ivan Aparecido Manoel

Jaci Maria Ferraz de Menezes

Jacqueline de Fátima dos Santos Morais

Jaime Giolo

João Batista Gonçalves Bueno

João da Mata Costa

Joăo da Silva Amado

Joaquim Emmanuel Pinto

Joaquim Jorge Silva

Joaquim PintassilgoJodete Bayer Gomes Füllgraf

Joelcio Fernandes Pinto

Jorge Carvalho do Nascimento

Jorge Croce Rivera

Jorge de Sousa Rodrigues

Jorge Luís Cammarano Gonzáleze

Jorge Ramos do Ó

José António M.M. Afonso

José Augusto Ramos da Luz

José B. Duarte

José Carlos de Araújo Silva

José Carlos de Oliveira Casulo

José Carlos Moraes da Cruz

José Carlos Souza Araújo

José Claudinei Lombardi

José Eduardo Franco

José Eliachim Barros Tapia

José G. Gondra

José Mateus do Nascimento

José Willington Germano

Joseana Miranda FreitasJoseania Miranda Freitas

Jussemar Gonçalves

Karl M. Lorenz, Ed.D

Katia Maria Abud

277

Page 278: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Katiene Nogueira da Silva

Kazumi Munakata

Laerthe de Moraes Abreu Junior

Lana Ferreira de Lima

Laura Nogueira Oliveira

Lausane Corrêa Pykosz

Lêda Regane Accioly Sellaro

Leila de Alvarenga Mafra

Leila Lourenço

Lenina Lopes Soares Silva

Lenira Weil FerreiraLenira Weil Ferreira

Leonardo Borges Ferro

Leonor Calvăo BorgesLia Faria

Liane Maria Bertucci-Martins

Libânia Nacif Xavier

Lídia Nunes Cunha

Liéte de Oliveira Accácio

Lígia PenimLígia Regina Klein

Luana de Souza Siqueira

Lúcia Helena Moreira Medeiros Oliveira

Lucia Maria da Franca Rocha

Lucia Reily

Luciana Beatriz de Oliveira Bar Carvalho

Luciano Mendes de Faria Filho

Lucília de Almeida Neves Delgado

Lucinda Monteiro da Silva

Lucinete Marlúcia Vitor Araújo

Lúcio Kreutz

Luís Carlos Barreira

Luís Carlos Ferreira

Luís Reznik

Luíz Cavalieri Bazilio

Luzimar Barbalho da Silva

Macioniro Celeste Filho

Maclovia Corrêa da Silva

Madalena Klein

Mafalda Sofia das Neves Pedroso

Magnaldo de Sá Cardoso

Mairce da Silva Araújo

Manuela Rodrigues

Marcia de Almeida Gonçalves

Marcia de Paula Gregório Razzini

278

Page 279: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Márcia Souto Maior Mourão Sá

Marco Antônio de Souza

Marco Antonio Rodrigues Paulo

Marcus Aurélio Taborda de Oliveira

Marcus Levy Albino Bencostta

Marcus Vinicius Maciel

Margarida Mª Pereira dos Santos Louro de Felgueiras

Maria Bernardete Ramos

Maria Adélia Menegazzo

Maria Alice Rezende Gonçalves

Maria Ângela Miorim

Maria Angélica AlvesMaria Aparecida Junqueira Veiga Gaeta

Maria Aparecida da Silva Cabral

Maria Arisnete Câmara de Morais

Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt

Maria Batista Lima

Maria Beatriz Monteiro Guimarães

Maria Beike Waquim Figueiredo

Maria Betânia e Silva

Maria Catarina Cury

Maria Celi Chaves Vasconcelos

Maria CiavattaMaria Cristina Gomes Machado

Maria Cristina Menezes

Maria Cristina Soares de Gouvea

Maria da Conceição Passeggi

Maria da Glória Carvalho Moura

Maria da Graça Santiago Barbuto

Maria das Dores Medeiros

Maria das Graças Ataide de Almeida

Maria das Graças de Loiola Madeira

Maria das Graças M. Ribeiro

Maria das Graças Sá Peixoto Pinheiro

Maria de Araújo Nepomuceno

Maria de Fátima Pinheiro Carrilho

Maria de Fátima Salum Moreira

Maria de Lourdes de Albuquerque FáveroMaria de Lourdes Pinto de Almeida

Maria do Amparo Borges FerroMaria do Carmo Alves do Bomfim

Maria do Carmo Martins

Maria do Carmo Xavier

Maria do Pilar Mansos

Maria Dolores Sanches Fernandes

279

Page 280: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Maria Elisabeth Blanck Miguel

Maria Elizete Guimaraes Carvalho

Maria Emilia Borges Daniel

Maria Emília GanzarolliMaria Emília Valente Neves

Maria Estela Dal Pai Franco

Maria Evelyna Pompeu do Nascimento

Maria Gabriela S. M. C. Marinho

Maria Helena Bittencourt Granjo

Maria Helena Câmara Bastos

Maria Helena Santana Cruz

Maria Iolanda MonteiroMaria Izilda S. de Matos

Maria Izilda Santos de Matos

Maria Joăo Mogarro

Maria José Medeiros Dantas de Melo

Maria José RemédiosMaria Judite Rodrigues Costa

Maria Leonor Garcia da Cruz

Maria Luiza Andreazza

Maria Manuela Alves GarciaMaria Manuela Carvalho

Maria Neves Leal Gonçalves

Maria Rita de Almeida Toledo

Maria Rosa Rodrigues Martins de Camargo

Maria Solange Pereira Ribeiro

Maria Stephanou

Maria Teres Santos

Maria Teresa Canesin

Maria Teresa Goudard Tavares

Maria Teresa Salgado de Barros Conde

Maria Teresa Santos Cunha

Maria Walburga dos Santos

Maria Zélia Maia de Souza

Maria Zeneide C.M. de Almeida

Mariane Werner Zen

Marília Costa Morosini

Marilza Abrahão Pires Rezende

Marina Natsume Uekane

Mário Ferreira de Castro

Marlene da Silva Mariz

Marlene Flores de SouzaMarlene Gonçalves

Marli de Oliveira CostaMarli de Oliveira Costa

Marlos Bessa Mendes da Rocha

280

Page 281: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Marta Maria Chagas Araújo

Marta Maria Chagas de Carvalho

Marta Maria de AraújoMarta Mendonça

Matilde Araki Crudo

Mauricio Barreto Alvarez ParadaMaurício Ruiz Câmara

Maurides Macedo

Maurilane de Souza Biccas

Mauro Passos

Melina Cavalcanti de Albuquerque Vicentine

Miguel André Berger

Miguel Rosa dos Santos

Milena Colazingari da Silva

Milton Ramon Pires de Oliveira

Miriam Abduche Kaiuca

Mirian Dolores Baldo Dazzi

Mônica de Carvalho Magalhães Kassar

Moysés Kuhlmann Jr

Nádia Cuiabano Kunze

Nádia Hage Fialho

Natália Gil

Neide Almeida Fiori

Nelson Veríssimo

Névio de Campos

Newton Antonio Paciulli Bryan

Nicanor Palhares Sá

Nicolas Alexandria Pinheiro

Nilda G. Alves

Nilo Bidone Kolling

Norberto Dallabrida

Norma Patricya Lopes Soares

Nuno Fernando Bastos Martins Peres

Olinda Evangelista

Osmar Fávero

Patrícia Lúcia da CostaPatrícia Santos HansenPaula Perin Vicentini

Paula Sônia de BritoPaulo Rômulo Frota

Paulo Vinicius Baptista da Silva

Pedro da Cunha Pinto Neto

Pedro Manuel da Cruz Nunes do Amaral Xavier

Pedro Manuel da Cruz Nunes do Amaral Xavier

Peri Mesquida

Priscila Ferreira Perazzo

281

Page 282: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Rachel Duarte Abdala

Raquel Discini de Campos

Raquel Pereira Chainho Gandini

Regina Aparecida Versoza Simião

Regina Coelli Gomes Nascimento

Regina Helena Silva SimõesReinaldo Matias Fleuri

Ricky Sammy Lunardello Casado

Rita de Cássia Gallego

Rita de Cássia Monteiro

Rita Luciana Berti Bredariolli

Rodrigo Mello de Moraes

Rodrigo Mota NarcizoRodrigo Mota Narcizo

Rogério Cunha Campos

Rogério Fernandes

Rogério Xavier Neves

Rosa Fátima de Souza

Rosa Lydia Teixeira Corrêa

Rosa Serradas Duarte

Rosalba Pessoa de Souza Timóteo

Rosângela Ferreira de Souza

Rosário S. Genta Lugli

Roseane Patrícia de Souza e SilvaRoselane Fátima Campos

Roseli Boschilia

Rossana Valéria de Souza e Silva

Rui Afonso Costa

Saionara Goulart Dalpiaz

Sandra Aparecida Riscal

Sandra Maria BaldinSandra Maria Baldin

Sara Marques Pereira

Sara Martha Dick

Sebastião Pimentel Franco

Selma Rinaldi de Mattos

Sérgio Campos MatosSerlei Maria Fischer Ranzi

Silvestre Almeida Lacerda

Simone Valdete dos SantosSofia Lerche Vieira

Sonia Aparecida Ignacio Silva

Sonia Câmara Rangel

Sonia Câmara Rangel

Sonia Maria de Castro Nogueira Lopes

Sônia Maria de Oliveira Othon

282

Page 283: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Sônia Maria dos Santos Marques

Sônia Maria Leite Nikitiuk

Soraia Cristina Balduíno

Stela Borges de Almeida

Susana Beatriz Fernandes

Tânia Filipa Borges Correia Galeăo

Tânia Maria Figueiredo Braga Garcia

Tânia Regina da Rocha UnglaubTatyana Mabel Barbosa

Teresa Sarmento

Tereza Fachada Levy Cardoso

Terezinha Oliveira

Thais Nivia de Lima e Fonseca

Ulisséia Ávila Pereira

Urbana Cordeiro

Valéria Augusta Cerqueira de Medeiros Weigel

Valéria Maria Sampaio Mello

Valéria Moreire Rezende

Valter Martins

Vânia de Vasconcelos Gico

Vera Mendes dos Santos

Vera Regina Beltrão Marques

Vera Teresa Valdemarin

Vicente Vitoriano Marques CarvalhoVivian Batista da Silva

Wagner Rodrigues Valente.

Waldir Cauvilla

Washington Abadio da Silva

Wilson Sandano

Wojciech Andrzej KuleszaYolanda Lima Lobo

Yolanda Lima Lôbo

Yoshie Ferrari Leite

Zeila de Brito Fabri DemartiniZenir Maria Koch

283

Page 284: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

INSTITUIÇÕES:

Apoio Escola- ŔTICAArquivo Distrital do PortoArquivo Histórico Parlamentar Associaçăo de Jardins Escolas Joăo de DeusCentro de Estudos sobre a Mulher Faces de Eva da FCSH-UNLCentro de História da Cultura da U. Nova de LisboaCentro de Investigaçăo em Educaçăo da Faculdade de Cięncias da Universidade de Lisboa/ Fundaçăo para a Cięncia e a TecnologiaCentro Federal de Educaçăo Tecnologica de Mato Grosso- CEFETMTCentro Federal de Educaçăo Tecnológica do Rio Grande do NorteCentro Universitário Assunçăo - UNIFAICentro Universitário de Barra Mansa (UBM)- RJCentro Universitário do Triângulo - UNIT/ Prefeitura Municipal de Uberlândia - PMU

Centro Universitário Feevale(FEEVALE) e Universidade Luterana do Brasil (ULBRA)

Centro Universitário Fundaçăo Santo André - SP Brasil

CO CESUC/UNIPAM

Colégio Antônio Vieira

Colégio de Aplicaçăo da U. Federal do Rio de Janeiro

Colégio Pedro II - Unidade Centro - Rio de Janeiro

Conservatória de Música Calouste Gulbenkian - Braga

Conservatório de Música Calouste GulbenkianDepartamento da Inspecçăo Regional de Educaçăo - secretaria Regional de educaçăo

DHI/UNESP/C. De Assis/SP

DSS/U. Federal da Paraíba

E. Estadual de Ponta Grossa

Escola D. Afonso HenriquesEscola EB 2 do Montijo

Escola EB 23 de Viana do Castelo

Escola Municipal José Calil Ahouagi

Escola Sec. José AfonsoEscola Secudária Lima Freitas e FPCE U. De Lisboa

Escola Secundária Avelar Brotero

Escola Secundária Cacilhas Tejo

Escola Secundária de Camőes

Escola Secundária Padre António Vieira

Escola Superior de Educaçăo de Portalegre

ESE Setúbal

Fac. De Cięncias da U. De Lisboa

Fac. De Letras da Univ. de Coimbra

Fac. De Psicologia e Cięncias da ED.- VP

Fac. Ed. Uni. Fexderal da Bahia

Fac. Educaçăo (USP)

Faculdade de Cięncias da U. De Lisboa

Faculdade de Cięncias e Tecnologia, Campus da UNESP de presidente Prudente

284

Page 285: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

Faculdade de Educaçăo - U. De S. Paulo (USP)Faculdade de Educaçăo da Fundaçăo Educacional ItaboraíFaculdade de educaçăo da UFMGFaculdade de Educaçăo da Universidade de S. PauloFaculdade de Educaçăo e de Psicologia de JoinvilleFaculdade de Formaçăo de Professores da UERJ e U. Estácio de SáFaculdade de Letras da Universidade de Lisboa Faculdade de Letras U. Do PortoFaculdade de Psicologia e de Cięncias da EducaçăoFaculdade de Psicologia e de Cięncias da Educaçăo. U. De LisboaFaculdades Integradas de Palmas - FACIPALFaculdades Integradas de Rondonópolis - FAIR/UNIRFaculdades Unidas do Norte de Minas - FUNORTEFCSH- U. Nova de LisboaFE- UNICAMP/ Faculdades Integradas Maria Imaculada FIMI / PMC Perfeitura Municipal de CampinasFIG- Gaculdades Integradas de GuarulhosFundaçăo Getúlio VargasFundaçăo Universidade de Rio Grande/RSI.E.C. - Univ. do MinhoICS- Univ. de LisboaIMES - Centro Universitário de S. Caetano do Sul INCISOH/CEIVAInstituto de Cięncias Sociais da Universidade de LisboaInstituto Politécnico de Castelo BrancoInstituto Superior de Educaçăo Măe de DeusInstituto Superior de Humanidades e TecnologiasNúcleo em políticas Educacionais para Surdos- Universidade Federal do Rio Grande do Sul/ RSP.U. Católica de S. PauloP.U. Católica do ParanáPontifícia Universidade CatólicaPUC- CampinasPUC- MinasPUC ParanáPUC- Rio PUC S. PauloU. Federal de Sta CatarinaSacred Heart University, Fairfield CT, U.S.ASecretaria da Educaçăo e Cultura de CarambeíSecretaria de Educaçăo do Estado do Rio Grande do SulSecretaria Municipal da Educaçăo de Curitiba - Dep. De Ensino FundamentalTUIUTI do ParanáU do Vale do ItajaíU. Bandeirante de S. Paulo - UNIBANU. Católica de GoiásU. Católica de Minas GeraisU. Católica de PetrópolisU. Católica de S. PauloU. Católica de SantosU. Católica do ParanáU. Católica do Rio de JaneiroU. Católica do Rio Grande do SulU. Católica Dom BoscoU. Da MadeiraU. De Barra Mansa e U. Lusófona de Humanidades e Tecnologias

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Page 286: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

U. De BrasíliaU. de Caxias do Sul e UFRGSU. De ÉvoraU. De Évora (CIDEHUS)U. De LisboaU. De Lisboa Faculdade de Psicologia e de Cięncias da EducaçăoU. de Passo Fundo - Faculdade de Educaçăo U. De S. FranciscoU. De S. PauloU. De Santa Catarina - UDESCU. de Santa Cruz do SulU. De SorocabaU. Do Contestado - UnC- ConcórdiaU. Do Desenvolvimento do Estado de Sta Catarina - UDESC U. Do Estado da BahíaU. Do Estado de Santa CatarinaU. Do Estado do Rio de JaneiroU. Do Extremo Sul Catarinense U. do MinhoU. Do Sul de Santa CatarinaU. Do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOSU. Do Vale do SapucaíU. Estado do Rio de JaneiroU. Estadual da Ponte GrossaU. Estadual de CampinasU. Estadual de Feira de SantanaU. Estadual de Londrina - UELU. Estadual de Maringá (PR)U. Estadual de Ponta GrossaU. Estadual do CearáU. Estadual do Norte Fluminense U. Estadual do Oeste da ParanáU. Estadual do Sudoeste da BahíaU. Estadual PaulistaU. Estremo Sul Catarinese (UNESC)U. Federal da BahiaU. Federal da ParaíbaU. Federal de GoiásU. Federal de Juíz de ForaU. Federal de Mato GrossoU. Federal de Minas Gerais - UFMGU. Federal de Ouro Preto - UFOPU. Federal de PelotasU. Federal de PernambucoU. Federal de S. Carlos - UFSCarU. Federal de Santa CatarinaU. Federal de Santa MariaU. Federal de Sergipe (UFS)U. Federal de ViçosaU. Federal do AmazonasU. Federal do CearáU. Federal do Espirito SantoU. Federal do MaranhăoU. Federal do Mato Grosso do Sul

286

Page 287: História da Educação - V Congresso Luso-Brasileiro (2004)

U. Federal do ParanáU. Federal do PiauíU. Federal do Rio de Janeiro U. Federal do Rio Grande do NorteU. Federal do Rio Grande do Norte - Campus de CaicóU. Federal do Rio Grande do Norte - Natal/RNU. Federal do Rio Grande do Norte - UFRN U. Federal do Rio Grande do Sul U. Federal Fluminense U. Federal Rural de PernambucoU. Fereral de SergipeU. Fereral do Paraná - UFPRU. Lusíada U. LusófonaU. Metodista de PiracicabaU. Metodista de S. PauloU. Nova de Lisboa - FSCHU. Potiguar/UNPU. S. Francisco U. S. PauloU. Tuiuti do ParanáU. UberabaU.Estado do Rio de JaneiroU.Estadual de Maringá/PRUBEA/PUC/RS - UNILASALLE/RSU-BrasíliaUC-SantosUFMaranhăoUIB- Observatório... ULHTUNESP/U. Júlio de Mesquita Filho/Campus de Franca-SPUnesp-AraraquaraUNICAMP e USP- Ribeirăo PretoUNIOESTE- Univ. Est. Do Oeste do Paraná

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