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Direito Romano Três períodos abrangeram a história do processo civil romano, compreendendo cada um seu sistema processual típico: 1º. processo das ações da lei (legis actiones); 2º. processo formulário (per formulas); 3º. processo extraordinário (cognitio extraordinária). Essa delimitação é apenas convencional, pois apesar das três fases específicas e distintas, em momentos de mudança, coexistiram dois sistemas processuais diferentes até que o mais antigo caísse em desuso. Em nosso estudo abordaremos o sistema das ações da lei, utilizado no direito pré-clássico. Porém, antes disso, a fim de um melhor entendimento da matéria, faz-se necessário o conhecimento de alguns conceitos e da evolução histórica do processo civil romano. PROCESSO CIVIL ROMANO O Processo civil romano (Jus actionum) era o conjunto de regras que o cidadão romano deveria seguir para realizar seu direito. Para os romanos o vocábulo Jus encerrava, também, o sentido que os modernos emprestam a direito subjetivo, ou seja, faculdade ou poder permitido e garantido pelo direito positivo. O direito subjetivo é tutelado pela ação (actio) que, no sentido restrito que ainda hoje lhe atribuem, nada mais é do que atividade processual mediante a qual o particular procura concretizar a defesa dos direitos, pondo em movimento o aparelho judiciário do Estado. Para isso executa uma série de atos jurídicos ordenados, o processo. Direito e ação eram conceitos estritamente conexos no sistema jurídico romano. O romano concebia e enunciava o direito mais sob o aspecto processual que material. Durante toda a época clássica, o direito romano era mais um sistema de actiones e de meios processuais do que de direitos subjetivos. Hoje, temos um conceito genérico de ação; em Roma, a cada direito correspondia uma ação específica. PASSAGEM DA JUSTIÇA PRIVADA PARA JUSTIÇA PÚBLICA

história do processo civil romano

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história do processo civil romano.

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Direito Romano

Trs perodos abrangeram a histria do processo civil romano, compreendendo cada um seu sistema processual tpico:

1. processo das aes da lei (legis actiones);

2. processo formulrio (per formulas);

3. processo extraordinrio (cognitio extraordinria).

Essa delimitao apenas convencional, pois apesar das trs fases especficas e distintas, em momentos de mudana, coexistiram dois sistemas processuais diferentes at que o mais antigo casse em desuso.

Em nosso estudo abordaremos o sistema das aes da lei, utilizado no direito pr-clssico. Porm, antes disso, a fim de um melhor entendimento da matria, faz-se necessrio o conhecimento de alguns conceitos e da evoluo histrica do processo civil romano.

PROCESSO CIVIL ROMANO

O Processo civil romano (Jus actionum) era o conjunto de regras que o cidado romano deveria seguir para realizar seu direito. Para os romanos o vocbulo Jus encerrava, tambm, o sentido que os modernos emprestam a direito subjetivo, ou seja, faculdade ou poder permitido e garantido pelo direito positivo. O direito subjetivo tutelado pela ao (actio) que, no sentido restrito que ainda hoje lhe atribuem, nada mais do que atividade processual mediante a qual o particular procura concretizar a defesa dos direitos, pondo em movimento o aparelho judicirio do Estado. Para isso executa uma srie de atos jurdicos ordenados, o processo.

Direito e ao eram conceitos estritamente conexos no sistema jurdico romano. O romano concebia e enunciava o direito mais sob o aspecto processual que material. Durante toda a poca clssica, o direito romano era mais um sistema de actiones e de meios processuais do que de direitos subjetivos. Hoje, temos um conceito genrico de ao; em Roma, a cada direito correspondia uma ao especfica.

PASSAGEM DA JUSTIA PRIVADA PARA JUSTIA PBLICA

No incio, os primitivos romanos, como inmeros outros povos, faziam justia com as prprias mos, defendendo o direito pela fora. S muito mais tarde, e em decorrncia de longa evoluo, que houve a passagem da justia privada para a justia pblica. Conjectura-se que essa evoluo se fez em quatro etapas:

1. fase da vingana privada, onde predominava a lei de Talio: olho por olho dente por dente, estabelecida ainda na Lei das XII Tbuas;

2. fase do arbitramento facultativo que perdurou por toda a evoluo do direito romano, pois sempre se admitiu que os conflitos individuais fossem resolvidos por rbitros escolhidos, sem a interferncia do Estado, pelos litigantes;

3. fase do arbitramento obrigatrio que compreendeu o sistema de aes da lei e o processo formulrio, onde o Estado passou a obrigar o litigante a escolher rbitro que determinasse a indenizao a ser paga pelo ofensor, e tambm, passou a assegurar a execuo da sentena se, porventura, o ru no quisesse cumpri-la. Por esse motivo, vigorou o ordo indiciorum priuatorum (ordem dos processos civis), onde a instncia se dividia em duas fases sucessivas: 1, a in iure (que se desenrolava no tribunal do magistrado); e 2, a apud iudicem (que se processava diante do iudex, que era um particular escolhido pelos litigantes para julgar o processo). H controvrsias sobre a data em que surgiu, em Roma, essa diviso. A maioria dos autores entende que ela data da repblica, uma vez que, na realeza, o processo se desenrolava apenas diante do rei, que julgava as divergncias entre particulares, as lides (lites);

4. fase da justia pbica que compreendeu o processo extraordinrio, onde a instncia se desenrolava inteiramente diante de um juiz que era o funcionrio do Estado, como sucede em nossos dias.

Permaneceram, ainda, no direito romano das pocas posteriores, vrios resqucios da possibilidade de defesa dos direitos com as prprias mos, como, por exemplo, a legtima defesa (fundada no princpio uim ui repellere licet = lcito repelir a fora pela fora) e a autodefesa privada ativa, na qual o proprietrio poderia expulsar de seu imvel animais alheios ou pessoas que nele tivessem ingressado oculta ou

violentamente; ou, ento, poderia retomar, fora, coisa sua que algum, sem direito, detivesse.

EVOLUO DA MAGISTRATURA ROMANA

No perodo da realeza, em Roma, tudo se concentrava nas mos do rei, chefe supremo e vitalcio, o nico depositrio da potestas publica, reunindo por fora de seu imperium, alm dos poderes militares e religiosos, poderes civis, legitimando-o a julgar em primeira e ltima instncia. Esse fato explica porque a estrutura jurdica do mais antigo sistema processual romano - legis actiones - era por demais formalista. A casta de sacerdotes, auxiliando o rei, ditava o comportamento dos cidados. Depreendendo-se da, que nesta conjuntura havia um ntimo relacionamento entre direito (ius) e religio (fas).

Na repblica, primeiro, a magistratura foi posta nas mos de dois cnsules, que a exerciam alternadamente: um num ms e, o outro, no seguinte. Mas a partir de 367 a.C., os cnsules se limitaram a exercer a jurisdio graciosa, passando a jurisdio contenciosa a ser exercida pelo pretor; e as questes de venda de animais e escravos eram julgadas pelos edis curuis.

No incio, a jurisdio do pretor se estendia a todos os territrios submetidos a Roma. Posteriormente, em certas ciuitates, os magistrados locais (duumuiri iure dicundo) passaram a exerc-la; e em determinadas regies da Itlia o pretor delegava poderes aos praefecti iure dicundo.

A grande afluncia de estrangeiros em Roma levou a criao do pretor peregrino, incumbido de julgar os litgios entre cidados estrangeiros ou entre estes e romanos. Com o aparecimento das provncias (territrios conquistados fora da Itlia), quem nelas exercia a jurisdio eram os governadores e seus questores, que a desempenhavam as mesmas funes que, em Roma, eram atribudas aos edis curuis.

No principado, com a concesso da cidadania romana a todos os habitantes da Itlia, no sculo I a.C., desapareceram os praefecti iure dicundo. Assim, quanto aos litgios de menor importncia ocorridos na Itlia, processavam-se eles diante dos magistrados municipais; quanto aos de maior importncia, a jurisdio era do pretor, devendo, em conseqncia, as partes se deslocarem para Roma. Mas, no tempo dos imperadores Marco Aurlio e Lcio Vero, surgriram, para a Itlia, os iuridici, magistrados com jurisdio civil em determinadas circunscries.

Ainda no principado, com relao as provncias, preciso distinguir: as senatoriais, cuja jurisdio era exercida por um legatus (legado) que atuava como mandatrio do governador (o procnsul), e por um questor que tinha a mesma funo dos edis curuis em Roma; e as imperiais, cuja jurisdio era delegada pelo Imperador aos legati iuridici, ou aos prprios governadores delas (os propretores), que a exerciam com a assistncia dos assessores.

No dominato, com o processo extraordinrio, a justia passa a ser competncia dos juzes, funcionrios do Estado. Surge, nesse perodo, a hierarquizao dos juzes, classificando-os em:

inferiores, que julgavam, normalmente, em primeira instncia e se denominavam iudices ordinari, e eram:

em Roma e Constantinopla, o praefectus urbi (que substituiu o pretor urbano, nessa funes, a partir do sculo II d.C.);

nas provncias, os litgios mais importantes se processavam diante do governador (praeses, rector), ou dos iudices pedanei, por ordem do governador; os litgios menos importantes (os de valor inferior, a princpio, a 50 solidi - moedas de ouro - e depois, a 300) se desenrolavam diante de funcionrios municipais, os duumuiri iure dicundo, e nos fins do dominato, o defensor ciuitatis.

superiores, em cujo cimo da escala hierrquica encontravam-se os Imperadores do Oriente e Ocidente; abaixo deles, os praefecti praetorio, que representavam os imperadores (razo porque suas decises eram irrecorrveis para aqueles); e mais baixo, os uicarii, de cujas decises podia-se recorrer ao imperador.

Ainda no dominato, Constantino reconheceu que os bispos tinham jurisdio quando um dos litigantes, durante o processo, pedisse a suspenso deste, a fim de que passasse a correr diante de um bispo, cuja sentena, nesse caso, teria fora executria. Mas essa jurisdio foi revogada nos fins do sculo IV, ou durante o sculo V d.C..

Roma no conheceu o princpio da separao dos poderes executivo, legislativo e judicirio. Por isso, os magistrados judicirios romanos, alm da funo de distribuir justia, desempenhavam tambm atribuies administrativas, e, muitas vezes, militares.

Todo magistrado judicirio estava investido do poder denominado iurisdictio (jurisdio) que, segundo o Digesto, se dividia em:

a) uoluntaria (graciosa) para realizao de negcio jurdico, querido pelas partes, por meio de um processo fictcio;

b) contentiosa (contenciosa) para a soluo de litgios atravs do emprego das seguintes palavras: do (termo usado pelo magistrado para ratificar a escolha pelas partes do juiz popular que ir julgar a lide); dico (palavra empregada pelo magistrado quando atribui a um dos litigantes a posse provisria da coisa litigiosa); e addico (vocbulo utilizado pelo magistrado para adjudicar ao autor a coisa litigiosa ou mesmo o prprio ru, quanto este no se defende convenientemente).

Alm disso, em certos casos, o magistrado poderia denegare iurisdictionem, isto , recusar aos litigantes o direito de iniciar um processo diante dele.

A iurisdictio contentiosa no se exercia livremente pelo magistrado. Ao contrrio, ela era limitada pela competncia que pode ser conceituada como a faculdade de exercer a jurisdio num caso determinado. Esta competncia dividia-se em dois tipos:

a) competncia dos magistrados, que era determinada em funo de vrios fatores: territrio, natureza e valor das causas, condio das pessoas, grau hierrquico de jurisdio;

b) competncia do foro (lugar onde a ao deve ser intentada) que, em regra, era determinada pelo domiclio do ru (actor sequitor forum rei = o autor segue o foro do ru), mas esse princpio comportava algumas excees.

O AGERE NOS PERODOS LEGIS ACTIONES, PER FORMULAS E COGNITIO EXTRAORDINARIA

No direito romano o processo no era autnomo, e estava relacionado ao conceito que os juristas faziam com respeito ao direito subjetivo material e a ao judiciria (actio). As normas de carter processual eram baseadas na experincia jurdica romana unida num carter substancial, sendo que o direito subjetivo no era entendido pelo aspecto do seu contedo substancial, mas pela tica da ao, a qual o titular podia tutelar contra possveis ofensas. O titular da actio era aquele que realmente apresentasse uma situao de direito material existente.

No perodo clssico, o jurista Celso conceitua a actio como o direito de algum reclamar aquilo que lhe devido atravs de um processo (iudicio). J Pugliese afirma que a actio refere-se apenas a quem tinha razo, de modo que o fato de ter ao indicava a titulariedade do direito. Nesta poca o agere correspondia a uma ao material, a uma atitude, um agir perante o magistrado. Ento, no procedimento, o demandado era praticamente obrigado a comparecer perante o rex ou magistrado aps a sua citao sob pena de ser levado fora.

O agere, no incio, fazia uso da fora a fim de recuperar ou obter alguma coisa de outrem. Com o tempo este passa a constituir uma rplica justificada. Tinham que definir as causas que permitiam algum agir contra outros, e era a causa que legitimava o agere da parte.

Com a Lex Aebutia, frmulas escritas da lei, as regras de procedimento j no so to rgidas e so mais adaptadas as reclamaes da comunidade. Os inflexveis esquemas das aes da lei so substitudos pelo processo per formulas.

A frmula correspondia ao esquema abstrato contido no edito do pretor, no qual eram feitos os ajustes necessrios e era redigido um documento (iudicium) pelo magistrado fixando o objeto da demanda que devia ser julgada pelo iudex popular.

No processo privado, o mais importante foi a unificao das instncias. Com a interveno da cognitio extraordinaria, o procedimento passou a desenvolver-se diante do magistrado-funcionrio, (autoridade estatal). O processo passou a ser todo estatal, onde o parecer do magistrado no mais correspondia apenas a um parecer jurdico (sententia), mas estava ligado a um rgo estatal. A sentena, no processo privado romano, era consolidada na atuao da autoridade do Estado (ex auctoritate principis), no mais se baseando apenas em carter arbitral ou num ato restrito do cidado. Com isso o processo tornou-se totalmente pblico, e, ao lado da jurisdio ordinria, pouco a pouco, formou-se um novo sistema processual.

CARACTERSTICAS DAS AES DA LEI

O mais antigo dos sistemas de processo civil romano o das aes da lei (legis actiones), do qual a maior parte das informaes provm das Institutas de Gaio.

As aes da lei eram instrumentos processuais exclusivos dos cidados romanos tendo em vista a guarda de seus direitos subjetivos previsto no ius quiritarium, e este sistema processual possua uma estrutura individualizada para situaes expressamente reconhecidas. O processo nesta poca histrica era marcado pela extrema rigidez de seus atos, onde as aes tomavam a forma da prpria lei, conservando-se imutveis como esta.

Durante este perodo, o direito em Roma vinha de hbitos, costumes, e o conhecimento das regras jurdicas era monoplio dos sacerdotes, que detinham o conhecimento do calendrio e das normas jurdicas. Conjugavam-se o ius e o faz, ou seja, o elemento laico e o elemento religioso. Cercada de formalismo, solenidade e oralidade, com um ritual de gesto e palavras pr-estabelecidas.

A justia romana passa por um processo de secularizao, provocada por alguns aspectos como:

a) pela Lei das XII tbuas, consolidando o direito consuetudinrio antigo;

b) pela bipartio do procedimento;

c) pela criao do pretor urbano em 367 a.C.;

d) por dois personagens: Appio Cludio, o Cego (cnsul em 307 e 296 a.C.) e seu escriba Gneo Flavio, que tornou pblico aos cidados o formulrio das aes da lei, antes detidos pelos pontfices e pelo rex, nicos conhecedores das palavras sacramentais de cada actio.

RGOS JUDICANTES E O PROCEDIMENTO

Originariamente, quem era responsvel por julgar e conhecer pessoalmente as controvrsias, era o rex, chefe religioso e poltico da poca. Depois com a introduo da legis actio per iudicis arbitrive postulationem, esta incumbncia passada para os juiz e o rbitro laicos, que eram escolhidos entre patrcios senadores e mais tarde entre pebleus. Com a criao do pretor urbano e com a bipartio do processo estendida a legis actio sacramento.

Para se iniciar o procedimento da legis actiones era necessrio a citao do ru (in ius vocatio). Nesse perodo, o processo apresentava trs etapas:

a) introduo da instncia (in ius vocatio) que constitua-se em chegar a presena do magistrado as duas partes em questo (autor e ru).

importante ressaltar que no procedimento da in ius vocatio, todos os atos eram realizados oralmente e esta s podia efetivar-se em lugar pblico (termas e teatros, como tambm qualquer lugar da rua, at na porta domiciliar do demandado).

Ficava a cargo do autor, que, de acordo com os preceitos contidos na Lei das XII Tbuas, ao encontrar, na rua, o ru, devia cham-lo a Juzo, empregando termos solenes (uerba certa). Se o ru se recusasse a atender, a Lei das XII Tbuas determinava que o autor tomasse testemunhas e conduzisse o ru presena do magistrado, ainda que tivesse de empregar a fora.

b) instncia diante do magistrado ou pretor (in iure), estes davam ou no o direito de ao;

Conduzido o ru pelo autor presena do magistrado competente, iniciava-se a fase in iure. As partes recitavam as frmulas solenes e faziam os gestos rituais prprios de cada uma das aes da lei.

Feita a citao, e negando o ru as acusaes, aps 30 dias era escolhido um juiz, pela vontade de ambas as partes, ou por indicao do magistrado, ou at por sorteio. Tudo era realizado diante de testemunhas. Quando no era possvel estabelecer os limites das demandas no mesmo dia, o ru tinha que prometer que voltaria, fornecendo, inclusive, fiadores (vades) ao autor.

c) instncia diante do juiz popular (apud iudicem), caso a ao fosse concedida.

O magistrado dava a frmula de soluo do conflito e oferecia uma lista de juzes (album indicum) para que as partes escolhessem um dentre eles. As pessoas integrantes desta lista variaram no decorrer da histria de Roma em virtude de questes polticas. Essa fase se desenvolvia diante de um particular, que apurava a veracidade dos fatos alegados pelas partes litigantes, baseando-se para decretar a sentena. Nessa fase encontramos o iudex privatus, ou em certos processos os tribunais permanentes.

As aes no podiam ser julgadas a revelia, necessitava a presena do pretor e do adversrio. Tambm, no se permitia a representao em juzo, ou seja, era vedado a algum agir em nome de outrem.

Com a nomeao do iudex, as partes deviam comparecer presena dele trs dias depois. Se alguma das partes no comparecesse esperava-se at o meio dia, aps o qual julgava-se favoravelmente ao litigante que havia comparecido. Ambos, autor e ru, expunham sumariamente a demanda (causae coniectio), depois disso davam as razes (causae perovatio), seguidas pela produo das provas. O juramento, a confisso e o testemunho eram considerado meios de prova. Produzidas as provas, o iudex dava a sentena (sententiam dicere), podendo condenar o ru, atravs de pagamento, ou restituio ou prestao de um ato; ou o absolvendo. Qualquer que fosse a sentena, era impossvel ao ru recorrer a uma nova legis actio sobre a mesma questo.

ESTRUTURA E FINALIDADE DAS AES DA LEI

Segundo as Institutas de Gaio, eram em nmero de cinco as primitivas aes da lei e subdividiam-se em aes de declarao - aquelas que levavam nomeao de um juz popular que deveria determinar a existncia ou no do direito pleiteado; e em executrias - aquelas que executavam a sentena obtida. Eram elas:

Actio Sacramenti;

Iudicis Postulatio;

Condictio;

Manus Iniectio;

Pignoris Capio.

AS AES DE DECLARAO

ACTIO SACRAMENTI

A legis actio per sacramentum constituiu a primeira forma de processo institucionalizado. Era uma actio generalis, o que corresponde no direito processual atual a uma ao ordinria, de carter geral, que era utilizada toda vez que a lei no estabelecesse para o caso ao especial. Era tambm uma ao abstrata pois o autor no precisava justificar o direito pleiteado.

Sua denominao provm do vocbulo sacramentum, espcie de pena pecuniria imposta ao litigante que no demonstrasse na fase apud iudicem (do juiz popular) o direito que afirmara diante do magistrado (instncia in iure).

O sacramentum variava conforme o valor do objeto da lide e consubstanciava-se em uma aposta jurada acerca da procedncia da causa da vindicao.

A actio sacramenti podia ser in rem, quando o objeto da lide dissesse respeito a um direito real ou ao poder do pater familias, ou in personam, quando se tratasse de direito de crdito.

Na actio sacramenti in rem, embora no fosse necessrio o chamamento a juzo, bastando que o autor portasse perante o magistrado (in ius) a coisa ou algo que a simbolizasse. Com o passar do tempo este tipo de ao incorporou a citao do ru para o incio do processo reivindicatrio.

O seu rito era formal e cerimonioso, onde ambos os litigantes, diante do pretor, vindicavam a coisa, simbolizando tal inteno tocando-a com uma varinha (festuca), at que se desafiassem num sacramentum, estabelecendo assim o contraditrio.

As partes, no entanto, no depositavam o sacramentum, mas se comprometiam solenemente com o magistrado a pag-lo, no caso de derrota dando como garantia as praedes sacramenti (pessoas que recolheriam o valor prometido ao Estado, caso o vencido no o fizesse). A parte possuidora da coisa deveria ainda apresentar fiadores que garantissem, caso perdesse o litgio, a restituio daquela ao outro litigante (praedes litis et vindiciarum).

importante frisar que o contraditrio estabelecido entre as partes no tinha como escopo principal a propriedade do bem, mas sim a causa em que se fundava a vindicao.

Desta forma, o julgador, na instncia do juiz popular (apud iudicem), deveria verificar a legitimidade da causa, que justificasse a alegao de propriedade declarando qual dos dois sacramentos lhe parecia justo.

A legis actio sacramenti in personam, tambm se caracterizava por rito solene e simblico, diferenciando-se apenas no seu objeto, que era a cobrana de crdito, e nas asseres e frmulas desenroladas durante a audincia. Diferenciava-se tambm pelo fato de ser uma legis actiones no abstrata, pois deveria indicar a causa da qual se afirmava derivar a obrigao (oportere).

Basicamente, a audincia da actio sacramenti in personam consistia na afirmao pelo autor (intentio) que a outra parte lhe devia determinada obrigao. Diante de tal assero, o ru poderia no comparecer perante o juiz (iudex) ou confessar a dvida, hipteses que o equiparavam situao do vencido (iudicatus). Caso o ru contestasse a intentio, o autor pronunciava o desafio do sacramentum.

Faz-se mister esclarecer que na actio sacramenti in rem a posio jurdica do autor era definida somente em relao coisa vindicada, tornando-se indiferente a pessoa do ru, enquanto que na actio sacramenti in personam, a precisa individuao da pessoa do ru na declarao inicial do autor era fundamental para fazer sentido a sua pretenso.

Apesar de em ambas as espcies, in rem e in personam, a sentena ter natureza de provimento meramente declaratrio, trazia na prtica diferentes conseqncias nas duas aes.

Na ao real (in rem), quando o juiz declarava o sacramentum do possuidor provisrio da coisa ilegtima (iustum), este a conserva definitivamente e o valor do sacramentum devia ser recolhido ao Estado pelo sucumbente. Se declarado iniustum, alm do recolhimento da promessa feita, deveria restituir a coisa ao vencedor. Se no o fizesse, os praedes sacramenti sujeitar-se-io aos efeitos da ao executria (manus iniectio).

Na ao pessoal (in personam), cuja finalidade era a cobrana de crdito, declarado justo o sacramentum do demandante, no sendo cumprida a obrigao pelo devedor, poderia aquele proceder citao do mesmo em juzo, instaurando-se assim o processo executrio.

IUDICIS POSTULATIO

A tambm denominada actio iudicis arbitrive postulatio era uma ao declaratria, especial e no abstrata pois o autor tinha que indicar o fundamento da revindicao. Era utilizada para a diviso de herana (actio familiae erciscundae) e para cobrana de crdito decorrente de sponcio (espcie de processo relativo coisa vindicada, onde o ru possuidor prometia indenizar o autor caso ficasse provado que o bem no era seu) e para diviso de bens comuns (actio comuni dividundo).

No estabelecia pena para o litigante temerrio e o iudex ao contrrio das outras aes, era nomeado imediatamente e no no prazo de trinta dias de acordo com a Lei Pinaria.

LEGIS ACTIO PER CONDICTIONEM

Introduzido por duas leis: lex silio, para os crditos de certa pecnia, e lex colpurnia, para os crditos de qualquer outra certa res (que no fosse dinheiro).

Ao mais simples e rpida, a condictio era utilizada para tutelar crditos que o eram anteriormente tutelados pela actio sacramenti in personam e pela iudicis postulatio e, diferentemente desta ltima , o iudex era designado ao fim de trinta dias como determinava a Lei Pinaria. Tratava-se de ao abstrata, pois o autor no precisava de declarar o fundamento (causa) do crdito.

AS AES EXECUTRIAS

LEGIS ACTIO PER MANUS INIECTIONEM

Era destinada a fazer valer sentena obtida em ao de declarao. considerada uma das mais antigas legis actiones.

Acredita-se que era utilizada em duas hipteses:

contra o iudi catus, aquele que numa ao de declarao fora condenado a pagar certa importncia.

contra o confessus, aquele que na fase in iure confessou que o autor tinha razo.

S podia ser utilizada para execusso de quantia certa, por isso, atravs de um proceso pouco conhecido, o arbitrium lite aestimandae, as condenaes imprecisas eram reduzidas ao pagamento de quantias certas para que se aplica-se a manus iniectio.

A manus iniectio na Lei das XII Tbuas:

Nesta poca era uma lei primitiva e rude que determinava a morte ao devedor caso no sanasse a dvida ele prprio ou algum em seu lugar. Este algum era o uindex, um parente ou amigo que contestasse a legitimidade do pedido do autor sabendo que se perdesse seria obrigado a pagar o dobro da dvida inicial.

A manus iniectio depois da Lei das XII Tbuas:

Nesta fase ela passa a abranger uma quantidade maior de casos e tem seus efeitos abrandados.

Passou a ser mais abrangente devido a leis posteriores s das XII Tbuas, que determinaram sua utilizao em casos sem julgamento nem confessio in iure, em que se pretendia cobrar crditos previstos por lei.

A Lei Publilia concedia ao sponsor (fiador) que tivesse pago a dvida, manus iniectio contra o devedor que no o reembolsasse em seis meses.

A Lei Furia de sponsu dava ao fiador a manus iniectio contra o credor que o cobrasse indevidamente.

Quando no havia julgamento a manus iniectio era chamada pro iudicato (como se tivesse sido julgada) ao passo que aquela que se empregava na poca da Lei das XII Tbuas era chamada manus iniectio indicati

Algumas leis admitiam que se aplicasse a manus iniectio pura, isto , aquela que no exigia que tivesse havido julgamento mas que exigia ao autor que declarasse a natureza do direito pleiteado.

Com a implantao das manus iniectiones purae ocorreu uma inovao: o ru podia prescindir do uindex e defender-se a si prprio. Posteriormente todas as manus iniectiones se tornaram purae, a excesso do iudicatus, do confessus (previstos na Lei das XII Tbuas) e do sponsor (previsto na Lei Publilia).

Por fim, ao final da Repblica o ru que no pagasse o dbito no poderia ser morto nem vendido como escravo pelo seu credor, que s poderia lev-lo para sua casa e mant-lo preso at que pagasse sua dvida com trabalho.

LEGIS ACTIO PER PIGNORIS CAPIONEM

Distingue-se das demais legis actiones de tal maneira que algumas jurisconsultos romanos no a consideravam uma legis actio.

Esta singular legis actio no se desenrolava diante do magistrado e no requeria a presena do adversrio podendo ainda realizar-se nos dias nefastos Tratava-se de meio de tutela que se realizava extra judicialmente, colocando o credor, desde logo, em situao de vantagem perante o devedor.

Somente podia ser utilizada em relao a certas dvidas, que em alguns casos eram estipuladas por costumes e em outros por lei.

So passveis de pignoris capio:

a dvida do tribunus aerarii em relao ao soldo (stipendium) do soldado; a dvida das pessoas responsveis para contribuir com a compra e manuteno do cavalo para com o soldado de cavalaria; a dvida do comprador de animal para com o vendedor a dvida do locatrio de um animal de carga em relao ao locador desde que este animal estivesse destinado a sacrifcio religioso; a dvida do contribuinte para com o publicano no tocante aos impostos.

O apossamento extra judicial dos bens do devedor no conferia direito de uso da coisa ao credor, mas somente de mant-la em seu poder at que fosse honrada a dvida.

BIBLIOGRAFIA

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TRICI, J. R. C.; AZEVEDO, L.C. - Lies de Histria do Processo Civil Romano; Ed. Revista dos Tribunais, c. 3,4 e 5.

Jnior, J. Cretella - Curso de Direito Romano; 19 edio; Ed. Forense; Rio, 1995.