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II ENCONTRO DE CORTES SUPREMAS DOS ESTADOS PARTES E ASSOCIADOS DO MERCOSUL ABERTURA (28/11/2004) O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) Senhoras e Senhores, muito boa-noite, dando início à solenidade de abertura do II Encontro de Cortes Supremas dos Estados-Partes e Associados do Mercosul, informamos que compõem a Mesa as seguintes autoridades: O Excelentíssimo Senhor Ministro Nelson Jobim, Presidente do Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo Senhor Embaixador Celso Amorim, Ministro de Estado das Relações Exteriores; o Excelentíssimo Dr. Álvaro Augusto Ribeiro Costa, Advogado-Geral da União, representando o Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva; a Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de Nolasco, representante da Corte Suprema de Justiça da Argentina; o Excelentíssimo Senhor Victor Manoel Núnez Rodrigues, Presidente da Corte Suprema de Justiça do

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II ENCONTRO DE CORTES SUPREMAS DOS ESTADOS PARTES E

ASSOCIADOS DO MERCOSUL

ABERTURA

(28/11/2004)

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Senhoras e Senhores, muito boa-noite, dando início à

solenidade de abertura do II Encontro de Cortes Supremas dos

Estados-Partes e Associados do Mercosul, informamos que

compõem a Mesa as seguintes autoridades: O Excelentíssimo

Senhor Ministro Nelson Jobim, Presidente do Supremo Tribunal

Federal; o Excelentíssimo Senhor Embaixador Celso Amorim,

Ministro de Estado das Relações Exteriores; o Excelentíssimo

Dr. Álvaro Augusto Ribeiro Costa, Advogado-Geral da União,

representando o Presidente da República Luiz Inácio Lula da

Silva; a Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de

Nolasco, representante da Corte Suprema de Justiça da

Argentina; o Excelentíssimo Senhor Victor Manoel Núnez

Rodrigues, Presidente da Corte Suprema de Justiça do

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Paraguai; o Excelentíssimo Senhor Leslie Van Rompaey

Servillo, Presidente da Suprema Corte de Justiça do Uruguai;

o Excelentíssimo Senhor Magistrado Eduardo Rodriguez Veltzé,

Presidente da Corte Suprema da Bolívia; o Excelentíssimo

Senhor Magistrado Marcos Libedinsky, Presidente da Corte

Suprema do Chile; o Excelentíssimo Senhor Magistrado Javier

Alva Orlandini, Presidente da Corte Constitucional do Peru; o

Excelentíssimo Senhor Magistrado Juan Colombo Campbell,

Presidente da Corte Constitucional do Chile; o Excelentíssimo

Senhor Walter Kaune Arteaga, Presidente do Tribunal de

Justiça da Comunidade Andina.

Senhoras e Senhores, neste momento ouviremos a

celebração do Hino Nacional.

(CELEBRAÇÃO DO HINO NACIONAL)

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) -

Neste II Encontro de Cortes Supremas dos Estados-Partes e

Associados do Mercosul, registramos e agradecemos a presença

das seguintes autoridades: Ministra Ellen Gracie, Vice-

Presidente do Supremo Tribunal Federal; Ministro José Júlio

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Pedrosa, Presidente do Superior Tribunal Militar; Ministro

José Raúl Torres Kirmser, Vice-Presidente da Corte Suprema de

Justiça do Paraguai; Dr. José Antônio Moreno Ruffinelli,

Presidente do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul; Dr.

Walter Kaune Arteaga, Presidente do Tribunal de Justiça da

Comunidade Andina; registramos, também, as presenças do Dr.

Moises Troconis, Tribunal de Justiça da Comunidade Andina

(futuro Presidente); Dr. Hélio Alberto Bellinyani Jr., Centro

de Estudos de Direito Internacional; Embaixador Juan Carlos

Olima, Representante Permanente junto ao Mercosul –

Argentina; Dr. Juan Enrique Vargas Viancos, Centro de Estudos

de Justicia de las Américas – CEJA; Embaixador Luiz Felipe de

Macedo Soares, Subsecretário-Geral para a América do Sul do

Ministério das Relações Exteriores e Coordenador Nacional das

Negociações do Mercosul; Embaixador Bernardo Pericás Neto,

Representante Permanente junto ao Mercosul – Brasil;

Embaixador Hugo Saguier Caballero, Representante Permanente

junto ao Mercosul – Paraguai; Embaixador Agustín Espinosa

Lloveras, Representante Permanente junto ao Mercosul –

Uruguai; Embaixador Reginaldo Arcuri, Diretor da Secretaria

do Mercosul; Ministro Ari Pargendler, Diretor do Centro de

Estudos da Justiça Federal e Coordenador-Geral da Justiça;

Ministro Carlos Alberto Marques Soares, Vice-Presidente

Superior Tribunal Militar; Ministro Milton de Moura França,

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Tribunal Superior do Trabalho; Ministro Fernando Neves,

Tribunal Superior Eleitoral; Desembargadora Federal Anna

Maria Pimentel, Presidente do TRF da 3ª Região; Desembargador

Federal Carlos Fernando Mathias, Diretor da Escola Judiciária

do TRF da 1ª Região; Desembargador Rubens Bergonzi Bossay,

Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do

Sul; Desembargadora Maria de Nazareth Brabo de Souza,

Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará;

Desembargador Jorge Mussi, Presidente do Tribunal de Justiça

do Estado de Santa Catarina; Desembargador Marco Antony

Steveson Villas Boas, Presidente do Tribunal de Justiça do

Estado do Tocantins; Dr. Roberto Antônio Busato, Presidente

Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil; Embaixador Diego

Ribadeneira Espinosa, Embaixador da República do Equador;

Embaixador José Coderch Planas, Embaixador do Reino da

Espanha; Embaixadora Cecília Soto Gonzáles, Embaixadora do

México; Embaixador Hermán Couturier Mariátegui, Embaixador da

República do Peru, acompanhado do Ministro-Conselheiro José

Betancourt; Embaixador Oswaldo Puccio Huidoro, Embaixador da

República do Chile; Cônsul Mariano Jodan, representando o

Senhor Juan Pablo Lohlé, Embaixador da República Argentina;

Conselheiro Apolimar Aguilar, representando o Senhor Edgar

Camacho Omiste, Embaixador da República da Bolívia; Ministra

Conselheira Edith Andrade Paez, representante da Embaixada da

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República da Colômbia; 1º Secretário Nicollas Croivzer,

representando o Senhor Jean de Gliniasty, Embaixador da

República Francesa; Senhor Luiz Gonzaléz Arias, Embaixada da

República do Paraguai; Nicolau Dino de Castro e Costa Neto,

Associação Nacional dos Procuradores da República; Ministra

Cristina Boldorini, Comissão de Representantes Permanentes do

Mercosul; e, também, registramos a presença do Desembargador

Guinter Spode, Presidente da Federação Latino-Americana de

Magistrados (FLAM)e Secretário-Geral da Associação dos

Magistrados Brasileiros (AMB); Professor Jaime César

Lipovetzky, Estúdios Jurídicos y Consultorias Integrados –

Argentina; Dra. Cláudia Maria de Freitas Chagas, Secretária

Nacional de Justiça; Professora Adriana Dreysin de Klor –

Argentina; Ministro Carlos Eduardo Caputo Bastos, Ministro do

Tribunal Superior Eleitoral e Presidente do Centro de Estudos

de Direito Internacional – CEDI; Senhor Eduardo Alberto

Duhalde Maldonado, Presidente da Comissão de Representantes

Permanentes do Mercosul; e Dr. José Antônio Toffoli, Sub-

Chefe da Casa Civil da Presidência da República.

Senhoras e Senhores, Magistrados,

Embaixadores, Advogados, Procuradores, Professores, neste

momento ouviremos, agora, a palavra do Excelentíssimo Senhor

Embaixador Celso Amorim, Ministro de Estado das Relações

Exteriores.

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O SENHOR EMBAIXADOR CELSO AMORIM (MINISTRO DE

ESTADO DAS RELAÇÕES EXTERIORES) – Senhor Ministro Nelson

Jobim, Presidente do Supremo Tribunal Federal; Senhor

Ministro Álvaro Ribeiro da Costa, Advogado-Geral da União;

Senhores Presidentes das Cortes Supremas dos Estados-membros

do Mercosul e dos Estados Associados; Senhora Ministra Ellen

Gracie e Senhor Ministro Caputo Bastos, que organizaram este

evento; Senhores Presidentes dos Tribunais de Justiça dos

Estados; altas autoridades do Poder Judiciário; Senhores

Parlamentares; Senhores Embaixadores.

É para mim um grande prazer estar na abertura

do II Encontro de Cortes Supremas do Mercosul.

A política externa do governo do Presidente

Luiz Inácio Lula da Silva tem como compromisso fundamental

aprofundar a integração entre os Países da América do Sul nos

mais diversos planos. A formação de um espaço econômico

unificado com base no livre comércio em projeto de infra-

estrutura vem servindo de base para incrementar o

relacionamento com os países da região nos mais diversos

níveis. Nesse sentido, o Mercosul constitui o pilar

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fundamental de todas as iniciativas do Brasil de avançar no

projeto de construir uma América do Sul politicamente

estável, socialmente justa e economicamente próspera.

Além de reafirmar a importância dos temas de

natureza econômico-comercial do Mercosul, tem sido necessário

fortalecer a estrutura institucional do nosso Bloco,

particularmente no que se refere aos seus contornos

jurídicos. Nesse sentido, o II Encontro de Cortes Supremas do

Mercosul é realizado em momento bastante oportuno, já que o

tratamento da temática institucional requer a participação

efetiva dos Poderes Judiciários, em particular das Cortes

Supremas dos Estados-Partes no processo de integração

regional.

É fundamental reconhecer que os processos de

integração de maior êxito tiveram como alicerce primordial o

fortalecimento do seu arcabouço jurídico e de suas

instituições. A experiência da União Européia é prova da

importância de se buscar harmonizar, em nível regional, o

conjunto de normas dos Estados-membros relativos ao processo

de integração.

Cabe sublinhar, também, que os aspectos

comerciais, sociais e jurídicos do Mercosul têm vocação de

regular direitos e obrigações com efeitos diretos na vida dos

cidadãos e que, portanto, são passíveis de questionamentos

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nos tribunais internos. Somente por essa razão, entre muitas

outras, que seria fundamental que os Poderes Judiciários dos

Estados-Partes estejam cada vez mais envolvidos com a

temática do Mercosul.

No que tange aos avanços institucionais

recentes que se relacionam com os Judiciários Nacionais, cabe

destacar, à guisa de exemplo, a importância da criação do

Tribunal Permanente de Revisão, cujo Presidente, o Embaixador

José Antônio Ruffinelli, está aqui entre nós, no âmbito do

Protocolo de Olivos, o qual, embora não seja efetivamente um

poder judiciário do Mercosul como tal, consiste em instância

de disponibilidade permanente para incumbir-se de resolver,

de forma definitiva, as controvérsias entre os Estados-

Partes.

Entre muitos outros exemplos, merece registro

pela sua relevância direta para a área judicial o acordo que

acaba de ser assinado há poucos dias sobre o combate à

pirataria no Mercosul. O instrumento contou com a adesão da

Bolívia, Chile e Peru, Estados já associados do Mercosul, e

representará um marco na colaboração entre esses Países para

reduzir atividades ilícitas.

Outro tema da ordem do dia no Mercosul e que

tem reflexos importantes na atuação do Judiciário é a

implementação da decisão do Conselho Mercado Comum nº

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22/2004, aprovado em julho passado, na Cúpula de Iguaçu, que

versa sobre a vigência e aplicação das normas emanadas dos

órgãos com capacidade decisória do Mercosul. Essa decisão

visa aprovação nos instrumentos normativos, que

possibilitarão acelerar a implementação nos ordenamentos

jurídicos dos Estados-Partes, de atos do Poder Executivo,

originados da normativa Mercosul que não requeiram aprovação

legislativa.

Cabe destacar que esse procedimento apresenta

solução apenas parcial: a questão mais ampla de efetiva

aplicação das normas do Mercosul ao ordenamento jurídico dos

Estados-Partes. No caso brasileiro seria, por exemplo,

interessante estudar de que forma se poderia conceder o

status diferenciado às normas emanadas do processo de

integração do Mercosul, tomando como base o dispositivo

programático presente no art. 4º da Constituição Federal.

Creio que o temário desta Reunião que trata,

entre outros temas, das Assimetrias Constitucionais, da

Cooperação Judiciária, também da Harmonização Legislativa e,

por fim, do Sistema de Solução de Controvérsias, encaixa-se,

perfeitamente, em alguns dos temas que têm sido preocupação

dos próprios Poderes Executivos e Legislativos dos Estados-

membros.

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Às vésperas da Reunião de Cúpula de Ouro

Preto, dez anos depois da assinatura do Protocolo, creio que

este Encontro é extremamente oportuno e, seguramente, espero

eu, possa constituir parte de um processo que resultará num

órgão permanente que reúna as Cortes Supremas dos Estados-

membros do Mercosul.

Muito obrigado.

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Senhoras e senhores, registramos também e agradecemos a

presença do Deputado Federal Sigmaringa Seixas, representando

a Câmara dos Deputados neste evento.

Neste momento, ouviremos a palavra do

Excelentíssimo Senhor Ministro Nelson Jobim, Presidente do

Supremo Tribunal Federal.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Excelentíssimo Senhor Chanceler

Celso Amorim, Ministro de Estado das Relações Exteriores;

Excelentíssimo Dr. Álvaro Augusto Ribeiro da Costa, Advogado-

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Geral da União, representando o Presidente Luiz Inácio Lula

da Silva; saúdo os integrantes desta mesa, os Srs. Ministros

dos Tribunais Superiores e Tribunal Constitucional, na pessoa

da Ministra Elena Highton de Nolasco, a quem saúdo

efusivamente; minhas senhoras, meus senhores; minha Colega

Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministra Ellen

Gracie.

Creio que o Ministro Celso Amorim colocou

claramente a nossa questão. Dois pontos de indagações surgem

em relação aos processos de integração, sendo o primeiro de

natureza política. Dentro da natureza política, decisão já

tomada, já existente de uma progressiva integração dos países

do Mercosul, inclusive da América Latina.

A busca da integração é exatamente a

possibilidade de termos capacidade competitiva não só interna

como externa, e, fundamentalmente, a redução de nossos custos

de transação para o enfrentamento do mundo moderno e a grande

disputa de espaços comerciais que possam assegurar o

desenvolvimento de cada uma de nossas Nações. Os Chefes das

Nações Latino-Americanas já decidiram a respeito dessa

temática, da necessidade do processo de integração. A

velocidade dessa integração também é uma decisão política,

que vai atendendo as circunstâncias geoeconômicas, inclusive,

das relações internacionais com diversos blocos do mundo.

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Se de um lado o aspecto político está sendo

enfrentado, há também o outro aspecto que é exatamente o

institucional; ou seja, os meios pelos quais possam essas

decisões ser efetivamente implantadas e gerirem condutas

sociais e econômicas dentro dos nossos países. A visão

institucional de que ela é condição para realização de fins

que sejam determinados pelos poderes políticos da Nação, que

representam, ao fim e ao cabo, a soberania popular.

Creio, Senhor Chanceler, que o convite feito

por Vossa Excelência, no final de sua manifestação, no

sentido de que as Cortes Latino-Americanas possam criar um

organismo permanente de discussão dos meios pelos quais os

nossos países venham, com as suas reformas necessárias,

simetricamente viabilizar, pela perspectiva da segurança

jurídica, os processos de integração, não nos compete, como

órgãos judiciários, decidirmos a política da integração; isso

compete sim, Senhor Chanceler, aos órgãos representativos do

Poder Executivo e do Poder Legislativo. Cabe a nós, isto sim,

no diálogo transparente e constante com esses organismos,

adverti-los, identificarmos os problemas jurídicos que

eventualmente as decisões políticas possam determinar no

sentido da sua implantação.

Não podemos ficar passivos no sentido de

deixarmos que os Poderes Executivos e os Governos avancem no

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processo de integração e nós, no final da linha, reservarmos

a eles uma surpresa de que o mecanismo por eles utilizados

acabou não tendo eficácia nas relações internas e nas

relações comerciais. Esta surpresa no final do túnel, que

pode estar reservada pelos Poderes Judiciários locais, pode

levar ao insucesso absoluto desta tentativa de integração,

que tem como objetivo nítido a busca do desenvolvimento e o

bem-estar paritário dos nossos povos.

Penso que a responsabilidade política do Poder

Judiciário é nítida nesta quadra. Precisamos, portanto, Srs.

Presidentes, Srª Presidenta, com absoluta transparência,

discutir e verificar se as nossas instituições jurídicas, tal

como estão desenhadas grande parte delas como a brasileira

neste ponto, ainda presa às concepções autonômicas do século

XIX, em que o tratado internacional tem um tratamento no

Brasil como norma de natureza ordinária, sujeita à

modificação, à revogação e à alteração por qualquer

legislação ordinária, sem qualquer audiência dos organismos

internacionais e dos países que foram co-participantes da

elaboração de um tratado de qualquer natureza: comercial,

civil, tributário.

E os problemas são imensos. Temos que resolver

questão de circulação de bens e de pessoas. E que possam

esses bens e pessoas, ao circularem, terem certeza de que os

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pactos que mantiveram, os acordos que estabeleceram, as

negociações que realizaram tenham segurança jurídica e

“enforcement” necessário para sua realização; senão,

estaremos nós traindo, claramente, a vontade dos nossos

povos, não só a vontade, mas também a necessidade já

reconhecida por essa vontade de caminharmos para um processo

de integração.

As discussões, Senhor Chanceler, que estão

postas nesta temática organizada para esta nossa reunião

mostram claramente que o problema está exatamente - de um

lado começa-se com a discussão das assimetrias para chegar ao

fim - na forma de solução de controvérsia. Enquanto não se

tiver, claramente, uma linha de solução de controvérsias e de

conflitos jurídicos que possa haver, quer os conflitos

jurídicos entre os Estados, quer o conflito jurídico, que

decorre de pessoas jurídicas e físicas de cada um dos Estados

que tenham pactuado ajustes com base nos acordos

internacionais, se não tivermos nós nenhum sinal de que isso

tenha a garantia da eficácia e da realização por decisões que

possam ser tomadas, quer por um organismo internacional, que

seja plasmado como um tribunal, quer pelos tribunais

internos, nós não avançaremos e ficaremos exclusivamente na

obstrução política e judiciária daquelas tentativas que somos

responsáveis.

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Creio, Srs. Presidentes, Srª Ministra, que

este é o nosso desafio.

A verdade seja dita, desde logo, que estamos

silentes já algum tempo, estamos silenciosos a algum tempo.

Por diversas vezes o Senhor Chanceler tocou em temas dessa

natureza e eu confesso aos senhoras e senhores que não tinha

como responder. Embora pessoalmente poderia ter dado e posso

dar a ele algumas respostas, ocorre que o Senhor Chanceler me

fez a pergunta não como o meu amigo Celso Amorim, mas fez a

pergunta, isto sim, como representante do País nas suas

relações internacionais, e eu não tinha condições, como

também agora ainda não tenho, de responder institucionalmente

à possibilidade do nosso compromisso político com o processo

de integração.

Creio, Srs. Presidentes, que este é um momento

importante para que possamos decidir entre nós, com

transparência, se o Poder Judiciário latino-americano tem ou

não tem compromisso com a integração de seus povos. Responde

ou não responde às necessidades políticas do desenvolvimento

do País, já que, ao fim e ao cabo, somos todos servos dos

nossos povos. Portanto, o bem dos nossos povos é exatamente o

nosso objetivo, o nosso serviço e a nossa dedicação.

Sejam bem-vindos. Vamos ao desafio.

Enfrentemos juntos com os Poderes Executivos e Legislativos

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nacionais esta temática importantíssima que é participar do

processo de criação de mecanismos que assegurem a integração

e a realização dos processos comerciais e de circulação,

absolutamente necessários, para que a América Latina deixe de

ser nominada como terceiro mundo ou como “downtown”.

Muito obrigado a todos e sejam bem-vindos.

***************

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SEGUNDO DIA

(29 de novembro de 2004)

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Informamos que compõem a Mesa as seguintes autoridades: o

Excelentíssimo Senhor Ministro Nelson Jobim, Presidente do

Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo Senhor Ministro

Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo

Senhor Victor Manuel Núnez Rodrigues, Presidente da Corte

Suprema de Justiça do Paraguai; a Excelentíssima Senhora

Ministra Elena Highton de Nolasco, representante da Corte

Suprema de Justiça da Argentina; o Excelentíssimo Senhor

Leslie Van Rompaey Servillo, Presidente da Corte Suprema de

Justiça do Uruguai; o Excelentíssimo Professor Jorge

Fontoura, Relator do Grupo I – Assimetrias Constitucionais; a

Excelentíssima Senhora Ellen Gracie, Vice-Presidente do

Supremo Tribunal Federal e Coordenadora Geral do Encontro.

Senhoras e senhores, com a palavra o

Excelentíssimo Senhor Ministro Nelson Jobim, Presidente do

Supremo Tribunal Federal, para conduzir os trabalhos desta

manhã.

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O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Minhas senhoras e meus senhores,

estamos numa reunião de trabalho; então, portanto, as

referências foram feitas pelo Mestre de Cerimônias, daí por

que serão dispensadas saudações individualizadas.

Saúdo a todos os membros da Mesa e os

integrantes deste trabalho.

Hoje pela manhã, daremos início a esse ciclo

de palestras e de debates com o tema Assimetrias

Constitucionais. Assim, tenho a honra de convidar a

Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de Nolasco,

representante da Corte Suprema de Justiça da Argentina, para

fazer uso da palavra.

Vossa Excelência dispõe de trinta minutos para

se manifestar sobre o tema proposto pelo roteiro.

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A SENHORA MINISTRA ELENA HIGHTON DE NOLASCO

(CORTE SUPREMA DA JUSTIÇA DA ARGENTINA) - Bom dia.

Eu gostaria de começar com o tema Assimetrias

Constitucionais e a Hierarquia das Normas nos Ordenamentos

Jurídicos Nacionais e no Mercosul.

É uma verdade conhecida no âmbito jurídico dos

Países-membros do Mercosul que a estrutura constitucional que

sustenta o processo de integração não é uniforme. Em nenhum

dos casos os tratados prevaleceram às constituições; e nos

casos em que os Estados tinham previsto nas normas

constitucionais a possibilidade de confirmar sistemas de

integração supranacional, as normas produzidas neste âmbito

eram superiores às leis nacionais, mas inferiores às

constituições.

A hierarquia normativa no Mercosul também é

discrepante em cada Estado-membro e, portanto, vemos uma

mesma questão de Direito e obrigações para os particulares de

cada Estado, fragmentando o princípio de igualdade e

conspirando contra a expansão contínua e equilibrada de um

mercado amplo que ofereça condições de acordo com aquelas que

devam ser regidas no espaço nacional. Portanto, vemos que um

argentino vê que a pirâmide do Mercosul é uma para um país e

outra para outro.

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Com relação ao ordenamento jurídico argentino,

a Constituição Nacional e a jurisprudência da Corte Suprema

de Justiça da Nação oferecem solução aos problemas de

integração das normas geradas no âmbito internacional no

Direito interno e a hierarquia entre as normas do Direito

internacional e as do Direito interno.

Em matéria de integração das normas que

obrigam o Estado argentino, estas estão incorporadas no

ordenamento interno. Foram tratados costumes aos princípios

gerais de Direito.

Com relação aos tratados, o art. 31 da Norma

Fundamental, ou seja, a Constituição, estabelece que existe

um bloco normativo constituído pela própria Constituição

nacional, as leis ditadas e os tratados feitos com as

potências estrangeiras - três processos de criação de norma

jurídica. Temos, então, a Lei Suprema da Nação, cujo art. 188

– quando se refere a Direito das pessoas - integra as normas

internacionais consuetudinárias do Estado argentino no

ordenamento interno.

Com relação aos tratados, é levado em

consideração que a possibilidade de aprová-los ou não -

conferida ao Congresso Nacional pela Constituição - não

implica a necessidade de contar com uma norma interna que

aplique a norma internacional. Dessa forma, com relação a

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isso, as leis aprovadas são leis no sentido formal, que não

convertem o tratado em uma lei interna.

No ordenamento argentino, o Direito

internacional é Direito interno a partir do momento em que o

Poder Executivo, em virtude da atribuição constitucional de

gerenciar as relações exteriores do país, manifesta

intencionalmente o consentimento em se obrigar, de acordo com

o tratado, a essa norma interna quando, no âmbito

internacional, entrar em vigor no país.

Portanto, de acordo com o princípio da

integração das normas internacionais, pelas quais o país está

vinculando o Direito interno, é necessário analisar o

problema da relação hierárquica entre ambos os tipos de

normas. De acordo com o art. 27 da Norma Fundamental, os

princípios de Direito Público estabelecidos na Constituição

Nacional têm uma hierarquia superior aos tratados

internacionais, a partir do momento em que todo o acordo do

qual fez parte a Argentina deve estar em concordância com

eles. Então, de uma forma implícita, essa hierarquia superior

também é aplicável às normas consuetudinárias e aos

princípios gerais de Direito.

Nesse sentido, com a reforma constitucional de

1994, foi incorporada uma distinção de acordo com a matéria

das regras internacionais. Dessa forma, tivemos como

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princípio geral a superioridade de todos os tratados

internacionais em vigência na Argentina com relação às leis

nacionais e aos ordenamentos estaduais – art. 75, XXII, da

Constituição.

Entretanto, temos a distinção entre os

instrumentos chamados – que devem ser integrados em nosso

Direito interno -, de acordo com o Direito Internacional dos

Direitos Humanos e de Direito da Integração.

Em primeiro lugar, o art. 75, XXII, parágrafo

2º, da Constituição nacional outorga hierarquia

constitucional a uma série de instrumentos internacionais

nomeados explicitamente, cujo âmbito de validade material são

os Direitos humanos. Dessa forma, quando temos as atribuições

do Congresso, esse artigo estabelece:

“Aprobar o desechar tratados concluidos con las demás naciones y con las organizaciones internacionales y los concordatos con la Santa Sede. Los tratados y concordatos tienen jerarquía superior a las leyes. La Declaración Americana de los Derechos y Deberes del Hombre; la Declaración Universal de Derechos Humanos; la Convención Americana sobre Derechos Humanos; el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales; el Pacto Internacional de Derechos Civiles y Políticos y su Protocolo Facultativo; la Convención sobre la Prevención y la Sanción del Delito de Genocidio; la Convención Internacional sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminacion Racial; la Convención sobre la Eliminación de todas las Formas de Discriminacion contra la Mujer; la

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Convención contra la Tortura y otros Tratos o Penas Crueles, Inhumanos o Degradantes; la Convención sobre los Derechos del Niño: en las condiciones de su vigencia, tienen jerarquía constitucional, no derogan artículo alguno de la primera parte de esta Constitución y deben entenderse complementarios de los derechos y garantías por ella reconocidos. Solo podrán ser denunciados, en su caso, por el Poder Ejecutivo nacional, previa aprobación de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara.

Los demás tratados y convenciones sobre derechos humanos, luego de ser aprobados por el Congreso, requerirán del voto de las dos terceras partes de la totalidad de los miembros de cada Cámara para gozar de la jerarquía constitucional.”

Então, o poder constituinte entendeu que o

conteúdo desses instrumentos não está na primeira parte da

Constituição e, portanto, devem ser entendidos como

complementares aos Direitos e garantias por ela reconhecidas.

Também tivemos a incorporação, mediante esse

processo, de outras convenções ao texto constitucional: a

Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento de Pessoas e

a Convenção sobre a Não-prescrição dos Crimes de Guerra e os

Crimes Contra a Humanidade, de 1997 e 2003, respectivamente.

Em segundo lugar, o art. 75, inciso XXIV,

adiciona outra precisão com relação à hierarquia, também

devido à matéria, estabelecendo a superioridade do Direito da

integração com relação às leis nacionais e o ordenamento

estadual. Neste caso, essa superioridade está condicionada à

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existência de reciprocidade nas relações entre os Estados-

membros do processo de integração e de igualdade entre as

pessoas físicas e jurídicas que têm a sede dos seus negócios

nesses Estados.

Na norma, temos o estabelecimento de uma

diferenciação entre aqueles tratados de integração,

celebrados com os Estados da América Latina e aqueles

celebrados com outros Estados, e a maioria necessária no

Congresso para a sua aprovação, mantendo, em ambos os casos,

a hierarquia superior com relação às leis nacionais e o

ordenamento estadual. Esse inciso prevê não somente a

delegação de poderes normativos executivos, mas, também,

habilita à seção de jurisdição atribuições jurisdicionais.

Parte da doutrina interpreta que isso indica que foi a

intenção do constituinte autorizar os acordos por meio dos

quais tenhamos um poder judicial supranacional, pelo qual

existiria a habilitação constitucional para a criação de um

tribunal de justiça para o Mercosul. Conseqüentemente, os

tratados em vigência na Argentina integram o Direito interno,

têm uma hierarquia inferior aos princípios do Direito Público

contidos na Constituição Nacional e superior às outras normas

do ordenamento nacional ou dos ordenamentos estaduais.

Por outro lado, temos que levar em

consideração que os tratados podem conter normas que sejam

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operacionais e normas que sejam programadas, de acordo com a

vontade das partes no momento dessa celebração. Então, no

primeiro caso, os Direitos e obrigações podem ser invocados

diretamente pelos indivíduos e aplicados pelos tribunais

nacionais sem a necessidade de medidas internas que os

regulem. No caso das normas programadas, em troca é

necessária a adoção dessas medidas com o objetivo de que as

suas disposições possam ser invocadas e aplicadas.

Portanto, é propício fazer uma menção com

relação à evolução que teve a jurisprudência na Corte Suprema

de Justiça da Nação com relação aos pronunciamentos sobre a

hierarquia dos tratados com relação à lei interna. Em termos

gerais, temos três etapas que não são rígidas. Mas numa

primeira etapa, no ordenamento jurídico argentino, a

jurisprudência da Corte de Justiça da Nação foi pacífica no

que se refere à aceitação imediata direta e sem necessidade

de uma aprovação específica em tudo o que se relaciona ao

Direito Internacional consuetudinário. Isso resulta,

facilitado pelo art. 118 da Constituição, com relação ao

Direito das pessoas ou à Lei das Nações. Nesse sentido, a

Corte Suprema de Justiça da Nação, tradicionalmente, deu

aplicação a esse Direito em assuntos relacionados à imunidade

jurisdicional, tanto dos Estados quanto dos diplomatas

estrangeiros, e solicitação de execução no território

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nacional de sentenças estrangeiras sentenciadas nos tribunais

do Estado. Não há, então, nenhum tratado de cooperação

judicial, costume internacional em termos como a imunidade de

execução dos Estados estrangeiros e a jurisprudência

internacional.

Só em 1940, a Corte expediu, a respeito de uma

convenção internacional aprovada pela lei do Congresso, se

era suscetível de modificar a legislação nacional anterior e

operar, com a sua força normativa, a inclusão referida, ou

se, ao contrário, configurava unicamente o compromisso

assumido pelo Estado de revisar o seu Direito com o objetivo

de chegar ao resultado buscado pela convenção e,

conseqüentemente, era necessário a sansão de uma nova lei.

Então, um trabalhador rural havia reclamado

indenização por um acidente, alegando que a Convenção Sobre

Acidentes na Agricultura da OIT, no seu art. nº 1, dizia que

todo o membro da organização internacional do trabalho que

ratifica a presente Convenção estava comprometido a estender

a todos os assalariados agrícolas o benefício das leis e

regulamentos que tenham como objetivo indenizar as vítimas de

acidentes na ocasião do trabalho.

Então, gostaria de pontuar que a legislação

Argentina vigente na matéria, no momento da sentença, excluía

explicitamente, no seu regime, os trabalhadores agrícolas.

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Neste caso, o Tribunal sustentou que a única

forma de ser efetiva a reparação dos acidentes de trabalho na

agricultura é por meio de uma lei que regule de forma clara e

concreta os Direitos e obrigações dos assalariados agrícolas.

Sem dúvida nenhuma, então, a Conferência de Genebra, quando

adotou o projeto de convenção, requereu que isso fosse feito

também pelos países soberanos que o ratificaram. Então, a

Justiça recusou a reclamação dizendo que a lei não amparava

os trabalhadores agrícolas e a Convenção de Genebra, do ano

21, não significou que a lei de acidentes de trabalho tinha

que ser modificada ipso facto, mas, simplesmente para a

República Argentina importou o compromisso de modificar tal

legislação.

Essa doutrina da Corte foi reiterada em falhas

posteriores nas quais, e atendo-se aos termos dos acordos

internacionais, disso se desprendia uma norma local para

internalizar os compromissos assumidos. Logo, o tribunal

estendeu a sua doutrina, convênio, a outros âmbitos,

demonstrando maior apego ao requisito de uma lei posterior

diferente da de aprovação que volte a ser aplicada. Então,

por isso, as convenções não podiam reger diretamente; apenas

fixavam pautas cujo indispensável complemento deveria ser

encontrado nos preceitos do legislador nacional.

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Na segunda etapa, temos uma tendência a se

distanciar desse âmbito. Então, tivemos outra orientação e

esta orientação enfatiza, principalmente, a interpretação do

tratado com o objetivo de estabelecer que as suas disposições

permitam uma aplicação judicial. Mas, precisamente nessas

falhas, não foi negada a vigência interna dos tratados a

partir da sua aprovação e ratificação, mas exigimos como

requisito adicional necessário para a sua aplicabilidade,

onde estava prescrito, pelo próprio acordo, a obrigação de o

Estado adaptar a sua legislação mediante o Congresso.

Essa orientação foi mantida com relação ao

Tratado de Direitos Humanos, no caso a Convenção Americana

Sobre Direitos Humanos ao Pacto de São José da Costa Rica. A

questão que tínhamos de decidir é se o Direito de retificação

ou resposta enunciado no art. 14, inciso I, do Tratado,

poderia ser aplicado judicialmente, não obstante a ausência

de normas internas que o regulassem. No caso, foi assinalado

que o Pacto, ratificado e aprovado, estava em vigência no

nosso País. E as suas cláusulas mostravam a hierarquia

suprema da Nação e que, além disso, esse acordo contemplava,

também, o Direito à intimidade no qual apoiava a reclamação

por uma disposição constitucional.

Do exame da jurisprudência da Corte sobre o

tema, nesse período, surge que a outorga do caráter

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operacional programático dos tratados internacionais dependeu

se o seu exercício tinha sido editado ou não com a adoção, no

caso concreto, de medidas legislativas por parte da ordem

jurídica interna do País contratante.

Assim, se as cláusulas dos tratados tivessem

sido incorporadas diretamente às legislações por virtude da

lei de aprovação, não seria necessário uma norma posterior

que votasse ou que fizesse com que ela fosse executada.

Então, recorremos a normas constitucionais, em particular ao

art. 31, declarado na Constituição das Leis Nacionais dos

Tratados, Lei Suprema da Nação.

É interessante destacar, nessa ordem de

idéias, um caso em que devia ter sido resolvido se o

cessionário do Direito de autor de uma obra literária era,

para a legislação Argentina, titular dos Direitos

contemplados na Convenção Universal de Genebra sobre os

Direitos Autorais. O tribunal declarou que o art. 3º dessa

Convenção foi incorporado ao ordenamento jurídico, com

alcance de lei suprema da Nação, designado pelo art. 31 da

Constituição. Essa incorporação surge de ter sido ratificada

a norma por uma lei sem que seja necessária uma lei especial

de adoção. O tribunal acrescentou que esse princípio responde

a um amplo sentido de solidariedade, baseado na manutenção da

palavra empenhada que está na hermenêutica jurídica.

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Posteriormente, foi destacado que, no Direito

argentino, cabe reconhecer o princípio de acordo com o qual

as normas do Direito nacional, aprovadas pelo Poder

Legislativo e devidamente ratificadas, incorporam-se como

regras ao Direito interno, sendo aplicáveis dentro do Estado

quando revisam o caráter de auto-execução ou auto-

suficiência. No caso em questão, o empregado de uma

organização internacional, intergovernamental, a comissão

técnica mista de Salto Grande a processou por ser despedido

sem causa. Então, a Câmara do Trabalho tinha declarado a

inconstitucionalidade do art. 4º do acordo celebrado entre o

Governo da República Argentina e a Comissão, aprovado pela

lei que estabeleceu esse procedimento. A Corte deveria

resolver o conflito entre a norma, que nesse tratado tinha

então essa imunidade e a garantia constitucional do Direito à

jurisdição, fazendo prevalecer o tratado.

Temos uma terceira etapa na jurisprudência:

essa orientação é identificada a partir do diferente

tratamento que o tribunal concede a convênios que, até esse

momento, eram qualificados como de conteúdo programático.

Nesse sentido, a Corte se referiu ao Direito à dupla

instância de sede penal, prevista no art. 8º da Convenção

Americana de Direitos Humanos, e a sua vigência interna deve

ser assegurada por meio de um recurso na Corte Suprema.

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Então, tínhamos que dar solução, já que esse

tratado declarava determinados Direitos que, com relação ao

Direito interno, precisavam de uma posterior materialização

legislativa. Nesse contexto, a Corte Argentina adotou uma

doutrina mediante a qual possibilitou a operacionalização de

uma cláusula contida no tratado internacional a que

considerou de hierarquia superior o Direito interno.

No caso em questão, a pessoa se sentia lesada

no seu sentimento religioso por expressões feitas em um canal

de televisão e, como temos no art. 14 do Pacto de São José da

Costa Rica, que fosse condenado a ler uma carta que tinha

enviado em resposta. Esse critério, formulado no ano de 1992

com relação à superioridade dos tratados, foi recebido na

reforma constitucional de 1994. Nesse pronunciamento também

destacamos que o não-cumprimento de um acordo internacional

pode acontecer por uma conduta positiva do Estado ou uma

omissão de estabelecer disposições que façam possíveis o seu

cumprimento.

Ambas as situações resultariam contraditórias

com a prévia ratificação internacional do tratado e

demonstrariam o seu não-cumprimento, como está no art. 27 da

Convenção de Viena, sobre o Direito dos Tratados. Portanto,

permite designar primazia a um tratado mediante um conflito

contra qualquer norma interna contrária ou com a omissão de

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ditar disposições que possam equivaler ao não-cumprimento de

tratado internacional nos termos ali estabelecidos.

No seguinte ano, o tribunal, no caso em que

foi assinado o acordo entre a Argentina e a Comissão Técnica

Mista de Salto Grande aprovado pela lei, volta a invocar a

Convenção de Viena para designar primazia aos tratados

mediante um conflito de qualquer norma interna contrária e

afirma que essa solução está de acordo com as presentes

exigências de cooperação, harmonização e integração

internacional que a República Argentina estabeleceu, e

elimina a responsabilidade do Estado pelos atos dos seus

órgãos internos.

As disposições constitucionais mencionadas e

a sua interpretação pela Corte Suprema de Justiça da Nação

demonstram o indicador da vontade política de integração da

Argentina no plano jurídico. Com tais premissas, resulta

pouco provável que o Estado argentino possa apelar para a

doutrina desenvolvida por autores europeus e que chama “o

paradoxo do não-cumprimento ou da não-cooperação”. Então,

este se configura quando um Estado, não obstante a sua

vontade expressa na assinatura de compromissos

internacionais, não completa a tarefa de integrar tais

decisões no ordenamento jurídico interno por várias razões,

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tais como questões burocráticas ou simples estratégia

comercial.

Então, transladar essa competência por parte

de análise da doutrina, foi dito que não significa renúncia,

mas inibe o Estado de exercer os atributos transmitidos para

que, daí por diante, uma nova entidade coloque em prática os

modelos avançados de integração conhecidos. Vemos que essa

integração para o fim determinado é a favor de uma

organização diferente do Estado que assume substituição, no

entendimento de que o ideal de todo o processo de integração

é aquele realizado a partir da transferência de poderes a um

órgão supranacional. A delegação de competências, ou seja, o

constituinte argentino habilita a delegação de competências e

jurisdição em organizações supra-estatais.

Essas atribuições devem ser feitas respeitando

as posições de igualdade e reciprocidade, exigências

intimamente relacionadas que, por um lado, garantem a

independência e soberania do país e, por outro lado, constrói

um sistema de integração baseado na justiça e na igualdade.

Ambos requisitos não se esgotam nos alcances das respectivas

delegações que as competências fornecem com o mesmo conteúdo,

mas sim será necessário, que os seus efeitos no Direito

interno sejam semelhantes.

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A imperatividade e a obrigatoriedade do

Direito que nasce dos tratados de integração não encontrariam

o seu fundamento na atitude dos demais Estados-membros e

órgãos regionais senão com esse objetivo da integração. Por

tal razão, o sentido do art. 2º do Tratado de Assunção

garante que a efetivação do Direito de integração constitua

um mandato que assume cada país com relação ao resto dos

Estados, o que gera, definitivamente, o dever de cumprir

fielmente com o ordenamento da integração no país obrigado e

o Direito dos outros de exigir tal cumprimento, através das

vias estabelecidas para este objetivo. Por exemplo, no

Tratado de Assunção e o seu Direito conseqüente, por meio do

mecanismo estabelecido no protocolo. Isso está corroborado

pelo art. 38 do Protocolo de Ouro Preto que anuncia, no marco

do esquema do Mercosul, o princípio de lealdade.

Da análise do já mencionado art. 75 da

Constituição Nacional, vemos dois conceitos fundamentais na

matéria: a aplicação direta e a supremacia dos tratados sobre

as leis. Princípios estes, como vimos, foram destacados e

consolidados pela jurisprudência do tribunal.

Acho relevante o que foi dito pelo grupo de

trabalho do Brasil com relação às assimetrias constitucionais

dos países que fazem parte do Mercosul, coordenado pelo

Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, no qual

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formula como sugestão a harmonização, na medida do possível,

dos textos constitucionais brasileiros e uruguaios, com as

reformas ocorridas no Paraguai, em 1992, e na Argentina, em

1994, de tal forma que isso permite, explicitamente, que os

países deleguem competências e jurisdições a órgãos

supranacionais com cláusulas de igualdade e reciprocidade.

Vê a definição hierárquica dos tratados por

meio das normas de primazia que estabeleçam concretamente a

solução de um potencial conflito entre o tratado e a lei

antecedente ou posterior e o estabelecimento de mecanismos

institucionais de interação e diálogo entre os Poderes

Executivo e Judiciário, quando exista a aprovação, no

Congresso, do tratado antes de efetuar o depósito do

instrumento ratificado, isso para prevenir questões de

controle de constitucionalidade. Não obstante, deveria ser

esclarecido que esse último aspecto, essa possibilidade não é

viável no sistema constitucional argentino atual, pelo menos

já que a Corte não emite opiniões de caráter geral.

Poderia assinalar a importância da norma

constitucional brasileira (parágrafo único do art. 4º), que

diz que a República Federativa do Brasil buscará integração

econômica, política-social e cultural dos povos da América

Latina, com o objetivo de formar uma comunidade latino-

americana de nações. Essa clara disposição constitucional

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assinala uma posição mais de acordo com os princípios do

Mercosul e poderia servir de referência frente às

dificuldades oferecidas pelo ordenamento interno no que se

refere à primazia dos acordos internacionais.

Outro parágrafo que fala a respeito dos

Direitos Humanos, na opinião sustentada por um jurista

brasileiro, incorpora obrigações de caráter objetivo que

transcendem os meros objetivos recíprocos entre as partes.

Então, o objetivo é salvaguardar os Direitos do ser humano e

não o Direito dos Estados. O Uruguai sustenta em seu

memorando que falar dos impedimentos constitucionais é um

modo de ocultar o verdadeiro obstáculo que é a falta de

vontade política. Nesse caminho, a proposta do Uruguai, no

art. 27 da Convenção e Viena sobre o Direito dos Tratados

para encontrar solução à falta constitucional do ordenamento

jurídico é um claro indicador de uma vontade política

orientada à integração. Então, o Uruguai sustenta, nesse

documento, que é improcedente invocar normas internas como

justificativa do não-cumprimento das obrigações

internacionais, adicionando que esse Estado ratificou os

Tratados de Assunção e a Convenção de Viena sobre o Direito

dos Tratados e que, no princípio de irreversibilidade dos

compromissos assumidos, não há retorno.

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A situação constitucional do Uruguai também

mereceu comentários que falam a respeito da necessidade da

sua adequação nos processos de integração.

De acordo com o que foi dito até aqui, o texto

constitucional argentino é um grande compromisso – e também o

paraguaio – em termos de invocação supranacional, porque

disponibiliza essa transferência de jurisdição e competência,

mas, na reciprocidade e igualdade de ambos incisos, reforça e

consagra, de uma forma definitiva, a doutrina que está sendo

desenvolvida pelo Tribunal da Nação.

As assimetrias surgem, e os obstáculos foram

reconhecidos pelas próprias Nações e pelos próprios países.

Isso foi discutido no Primeiro Encontro, na Carta de Ouro

Preto, e essa necessária adequação dos sistemas

constitucionais surge, também, ilustrada pelo que foi

assinalado no documento apresentado pelo Brasil.

Agora veremos como continua este Encontro. A

sorte já foi lançada.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL)– Gratíssimo, Senhora Ministra.

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Prosseguimos, desde logo, os trabalhos. Os

trinta minutos subseqüentes serão usados pelo Grupo nº 1,

composto pelos Senhores Ministros Gilmar Mendes e Caputo

Bastos, pelo Professor Jorge Fontoura e Luis Roberto Barroso.

Usará da palavra, em primeiro lugar, O

Ministro Gilmar Mendes e, depois o Relator, Professor Jorge

Fontoura e, por último, o Professor Luis Roberto Barroso.

Os senhores terão, ao todo, trinta minutos.

Controlarei o uso do tempo.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Senhores integrantes da Mesa, a

questão já foi devidamente explicitada na exposição

antecedente da nossa Relatora Argentina quanto às assimetrias

constitucionais que se colocam; e, certamente, muitas dessas

assimetrias, também como já demonstrado, vêm de uma cultura

que longe estava de dar importância aos valores da

supranacionalidade.

No relatório que será depois explicitado pelos

Professores Jorge Fontoura e Luis Roberto Barroso, nós

enfatizamos a jurisprudência tradicional do Supremo Tribunal

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Federal quanto à equivalência hierárquica entre leis e

tratados, questão que, a despeito das mudanças ocorridas com

a Constituição de 1988, subsistiu íntegra no nosso sistema

constitucional. Alguns autores, no Brasil, até dizem que o

Supremo Tribunal Federal continuou a interpretar a

Constituição à luz da velha jurisprudência. Não teria inovado

nesse passo.

Um foco de tensão entre nós, como se sabe, é a

própria interpretação do art. 5º, § 2º, da nossa

Constituição, quanto aos tratados de Direitos humanos, se

eles seriam recebidos como norma de hierarquia constitucional

ou, pelo menos, de hierarquia supralegal. O Supremo, todavia,

reafirmou aquela velha e tradicional jurisprudência,

especialmente em relação ao Pacto de São José, de que se

tratava de recepção também no plano da legislação ordinária.

Portanto, aplicando-se aqui o princípio da lex posterior

derogat priori, o princípio da lex specialis, a questão mais

sensível que ainda hoje se discute no Brasil e que está

reaberta no Plenário do Supremo diz respeito à prisão civil

por dívida do depositário infiel.

Entre nós há uma outra discussão que comporta

análise: a interpretação do art. 4º, parágrafo único. Se na

cláusula aqui constante haveria a possibilidade ou o

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reconhecimento explícito ou implícito de um Direito

supranacional.

Alguns eminentes Professores, como Celso

Ribeiro Bastos, chegaram a sustentar essa possibilidade de

que aqui já haveria uma cláusula no símile europeu de uma

transferência de soberania ou algo assemelhado. Sabemos todos

que não tem sido esse o entendimento do Supremo Tribunal

Federal, que continua também a exigir aqui – e há

manifestação expressa do Supremo Tribunal Federal nesse

sentido – uma adaptação pela via de uma emenda

constitucional. Daí a proposta clara feita no relatório.

Mas aqui já estamos a vislumbrar, portanto,

alguns espaços para discussão até no plano da eventual

revisão de orientação doutrinária e jurisprudencial.

Há uma outra questão sensível tocada em nosso

relatório, e já mencionada também no relatório antecedente da

Argentina, que diz respeito ao problema de controle de

legitimidade dos tratados. Entre nós tem-se entendido, com

grande naturalidade, o controle de constitucionalidade

incidental ou o controle de constitucionalidade concentrado,

pela via do controle abstrato, portanto, da ação direta de

inconstitucionalidade dos tratados, mesmo na perspectiva

chamada “a posteriori” ou “repressiva”. Sabemos todos que na

Europa, hoje, há um avanço significativo, em termos

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institucionais, a ponto de já, em alguns sistemas, não se

admitir mais o controle de tratados a não ser na forma

preventiva. Já está levantada, também na doutrina brasileira,

uma discussão sobre a possibilidade de - e talvez aqui

prescindíssemos até mesmo de uma reforma constitucional,

tendo em vista esse longo processo de aprovação e

internalização dos tratados no âmbito interno -, também aqui,

adotarmos essa perspectiva, sem qualquer modificação. De

qualquer forma, no relatório, como vai ficar explicitado,

chega a propor, até mesmo, um controle preventivo para os

tratados devidamente formulados.

Em relação, portanto, a essas questões, temos

tanto a possibilidade de reformas explícitas, de reformas

constitucionais, quanto à revisão da própria jurisprudência

do Supremo Tribunal Federal. Em relação àquela questão outra

já mencionada, do Tratado dos Direitos Humanos, o Congresso

Nacional acaba de aprovar uma emenda constitucional, a

chamada “Reforma do Poder Judiciário”, que altera, de certa

forma, esses tratados, um pouco na linha já realizada na

Argentina, e admite que os tratados de Direitos humanos,

aprovados nas duas casas na forma de uma emenda

constitucional - portanto, três quintos dos votos em dois

turnos de votação -, terão a força de uma emenda

constitucional. De qualquer sorte, esse tema, como tive

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oportunidade de ressaltar, também está afeta ao plenário do

Supremo Tribunal Federal, especialmente no que diz respeito

ao Pacto de São José, à questão do depositário infiel, à

prisão civil por dívida.

Portanto, aqui, nós temos um panorama básico

das questões, tendo em vista as assimetrias verificadas e

detectadas. Com isso, eu posso a palavra ao Professor Jorge

Fontoura.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Com a palavra o Dr. Jorge

Fontoura.

O SENHOR PROFESSOR JORGE FONTOURA – Bom dia.

Nós iremos nos reportar, diante da natureza do

evento, diretamente ao relatório feito pelo grupo brasileiro,

que diz respeito ao modelo de disciplina constitucional da

hierarquia dos tratados com prevalência do ordenamento

jurídico interno. Esse modelo corresponderia à expectativa

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da integração intergovernamental, que é o modelo brasileiro e

fundamentalmente o modelo uruguaio.

De fato, o ordenamento constitucional

brasileiro não prevê norma de prelação que regule confronto

entre lei federal e tratado antecedente ou posterior. A

leitura do texto constitucional brasileiro revela que,

paralelamente à referida ausência de normas, os tratados não

podem ser entendidos por intermédio de uma interpretação por,

eminentemente, analogia como possuidores de uma hierarquia

equiparada à lei federal - alínea “a” do inciso III do art.

105 -, sujeitos, portanto, ao controle de constitucionalidade

a que se referiu o Ministro Gilmar Mendes – alínea “b” do

inciso III do art. 102.

A pesquisa da jurisprudência do Supremo

Tribunal Brasileiro, relativa à questão da hierarquia dos

tratados, a hipótese da prevalência em situações de

confrontação entre lei e tratado, antecedente ou posterior,

revela, ao largo de sua história, sinais claros de que a

excelsa Corte entende, pelo menos em casos mais recentes, que

no caso do conflito prevalece a norma posterior. A falta de

regulamentação da disciplina hierárquica entre tratado e lei,

tomando-se por base, inclusive a Constituição de 1988 e das

anteriores, leva-nos a possibilidade de aplicação por

analogia e a compreensão de que o tratado se equipara à lei

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com o necessário entendimento que seria possível afirmar que

a resposta diante do conflito seria buscada, de legi lata, no

§ 1º do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil, que

continua em vigor, e que diz respeito, também, ao aforismo

lex posterior derogat priori, também já citado no relatório

do grupo brasileiro.

Por ocasião do julgamento do Recurso

Extraordinário nº 71.154, proveniente do Estado do Paraná,

começo dos anos 1970/1971, publicado no Diário da Justiça de

25 de agosto de 1971, de que foi Relator o Ministro Oswaldo

Trigueiro, tratou-se do tema da revogação da lei interna por

tratado posterior, mencionando o Ministro três precedentes de

primazia do tratado frente à lei anterior. Observe-se, com

relevância, para o tema sobre o qual agora nós refletimos,

que restava em aberto a possibilidade de que a lei posterior

também pudesse revogar um tratado anterior.

Posteriormente, por ocasião do julgamento

Recurso Extraordinário nº 80.004, proveniente do Estado de

Sergipe, 1977, publicado na Revista Trimestral de

Jurisprudência nº 83.809, de que foi Relator o Ministro Cunha

Peixoto, prevaleceu, por maioria, o critério de que a lei

posterior em conflito com o tratado prevalece sobre este, já

que não há um marco constitucional - preceito que determine

algum grau de hierarquia entre tratado e lei e vice e versa.

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Na justificação do voto majoritário que a

Corte proferiu, entende-se que a supremacia do tratado entre

lei posterior só se dá no campo tributário. É uma

particularidade do Direito brasileiro, extremamente curiosa e

pouco conhecida nos demais países da América Latina. Por

força do art. 98 do Código Tributário Nacional - trata-se de

uma norma específica e não de um princípio de ordem geral -,

existe a obrigatoriedade da observância da hierarquia maior

do tratado em relação às normas internas.

Retornando ao tema central da revogação do

Direito interno pelo tratado, no Recurso Extraordinário nº

80.004, a questão voltou a ser discutida e o Relator

designado, Ministro Cunha Peixoto, faz um raciocínio de

natureza Kelseniana, pensa em relação às fontes dos diversos

ordenamentos jurídicos e conclui da seguinte forma:

A lei proveniente do Congresso

só pode ter a sua vigência interrompida se

viola alguma disposição da Constituição e

naquela – na Constituição – não há qualquer

art. que declare irrevogável uma lei positiva

brasileira pelo fato de ter a sua origem no

tratado. Do contrário, teríamos, e isso sim

seria inconstitucional, uma lei que poderia

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ser revogada pelo Chefe do Poder Executivo,

através da denúncia do tratado.

A mesma linha de orientação seguiu o Ministro

Cordeiro Guerra, depois de observar que no próprio Direito

americano, onde se reconhece, ao tratar do caráter do

“supreme law of de land”, que não veda a posterior elaboração

legislativa contrário a ele.

Cumpre ainda citar, entre outros precedentes

relevantes do Supremo Tribunal Federal, que ao julgar o

Recurso Extraordinário nº 109.173, proveniente do Estado de

São Paulo, entendeu o Supremo Tribunal Federal que o tratado

não prevalece jamais sobre o texto constitucional. No voto

do Ministro-Relator, Ministro Carlos Madeira, lê-se o

seguinte:

Hierarquicamente o tratado e

lei se situam abaixo da Constituição Federal.

Aceitar que um tratado deve ser respeitado,

inclusive em sua possível confrontação como

texto constitucional é atribuí-lo, em uma

situação política, hierarquia superior à

própria Carta Política, a Constituição.

Conclui o Relator baseando-se em Carlos

Maxmiliano.

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A constituição é a lei suprema

do país, contra a sua letra e o espírito não

prevalecem resoluções dos poderes federais,

constituições, decretos, sentenças federais,

nem tratados ou qualquer outros atos

diplomáticos.

O grupo brasileiro formula algumas

considerações finais, a título de conclusão, sugerindo a

harmonização, na medida do possível, dos textos

constitucionais brasileiros e uruguaios de acordo com as

reformas ocorridas no Paraguai em 1992, na Argentina em 1994,

de forma a que tais reformas permitam, explicitamente, que os

países deleguem competência e mesmo jurisdição a órgãos

supranacionais, ainda que com cláusulas de igualdade e

reciprocidade.

2. A definição hierárquica dos

tratados, por intermédio de normas de

primazia, que estabeleçam corretamente a

solução de potencial conflito entre tratado e

lei antecedente posterior.

3. O estabelecimento de

mecanismos institucionais de interação,

diálogo e, fundamentalmente, comunicação entre

os Poderes Executivo e Judiciário, desde que

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haja possibilidade política e aprovação de

tratado que permita esse tipo de contato.

É importante destacar a possibilidade do

controle prévio de constitucionalidade para não permitir

antinomia entre tratado e constituição. É o procedimento

previsto na constituição portuguesa, em seu art. 278, ainda

que de observância facultativa. O mesmo ocorre na

constituição francesa, art. 54.

Essas idéias todas são importantes em função

das necessidades de modificações que devem ocorrer a partir

de um consenso da hegemonia das idéias sobre a mesma cultura

jurídica interna dos países.

Deixamos como mensagem final a idéia de que

não se faz integração sem se modificarem os livros e as

lições convencionais da escola primária. No sentido

jurídico, essas modificações sugeridas podem significar novos

livros para velhas escolas.

Por último, gostaria de fazer referência a uma

citação que tiramos de uma publicação, dos últimos anos 90,

dos Cadernos de Integração e Edições Técnicas do Senado

Federal, art. do Ministro Carlos Eduardo Caputo Bastos, que

faz a seguinte reflexão:

A consideração que se dá ao

tratado no ordenamento jurídico interno

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reflete uma profunda atitude de cultura

jurídica. Um art. de constituição não muda,

necessariamente, a cultura jurídica; só a

evolução cultural conduz ao efetivo

aperfeiçoamento institucional e

constitucional.

Era isso que eu tinha a dizer, Senhor

Presidente.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL) – Muito obrigado.

Professor Luiz Roberto Barroso.

O SENHOR PROFESSOR LUIZ ROBERTO BARROSO –

Excelentíssimo Senhor Presidente, srs. Participantes, penso

que a matéria já tenha sido substancialmente esgotada pela

apresentação do Ministro Gilmar Mendes e do Professor Jorge

Fontoura, de modo que vou apenas, e muito sumariamente,

tentar reduzir à proposições objetivas as idéias que foram

aqui expostas.

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Basicamente há uma fotografia do que é e uma

proposta para o que deve ser.

Na fotografia do que vem a ser o Direito

brasileiro hoje, as relações entre o Direito internacional e

o Direito interno se colocam, em termos de tratado e lei

ordinária, pela prevalência que se tem reconhecido ao

sistema de equiparação entre a lei ordinária e o tratado, de

forma tal que a lei ordinária posterior prevalece sobre o

tratado, e o tratado posterior prevalece sobre a lei

ordinária, salvo em matéria tributária e salvo em matéria de

transporte aéreo, terrestre e aquático. Portanto, há uma

situação, no Brasil, em que não se dá primazia ao Direito

internacional sobre a lei ordinária.

No tocante as relações entre o Direito

internacional e a Constituição, também se tem, por consenso

no Brasil, que prevalecem as normas constitucionais, sendo

inclusive admitido o controle incidental de

constitucionalidade sobre os tratados e, também, o controle

por ação direta sobre os tratados. Portanto, uma situação

que denota uma assimetria clara em relação a situações

vigentes na Argente e no Paraguai.

O Ministro Gilmar Mendes, ao tratar

inicialmente da questão da supranacionalidade, fez

referência à potencialidade oferecida pelo texto

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constitucional brasileiro atual, na redação que é dada ao

parágrafo único do art.4º, onde se lê:

“Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.”

É perfeitamente possível, com uma

interpretação criativa deste dispositivo, defender a

legitimidade constitucional do Brasil da criação de

instituições supranacionais. A verdade, todavia, é que o

dispositivo constitucional está longe de ser explícito e,

portanto, estaremos sujeitos, diante da criação de

instituições supranacionais, a questionamentos relativamente

às normas aprovadas por essa instituição, porque o art. 49

da Constituição brasileira exige a aprovação pelo Congresso

Nacional e, assim, teríamos uma dificuldade constitucional

que teria de ser dirimida relativamente à legitimidade de

atos normativos produzidos por instâncias supranacionais

quando internados à luz desse preceptivo constitucional do

art. 49.

E relativamente a instâncias judiciais ou

instâncias decisórias, no âmbito de instituições

supranacionais, também enfrentaremos, ou enfrentaríamos em

tese, a dificuldade da exigência constitucional no Brasil de

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homologação das sentenças estrangeiras hoje pelo Supremo,

possivelmente, logo adiante, pelo Superior Tribunal de

Justiça.

Em resumo, penso que a criação de instituições

supranacionais, ainda quando possa encontrar fundamento de

legitimidade no parágrafo único do art. 4º, possivelmente

enfrentaria objeções doutrinárias e, eventualmente,

jurisprudenciais, que melhor seriam sanadas, se por emenda à

Constituição, na linha do que já foi feito na Argentina e no

Paraguai, espantasse qualquer tipo de dúvida a cerca desta

matéria.

Assim, relativamente às instituições

supranacionais, há fundamento de Direito positivo apto a

procurar legitimá-las, mas, certamente, seria uma opção mais

segura a de se reformar a Constituição para, claramente, se

dar substrato de legitimidade para essa mudança; e, aí,

registrado o acréscimo feito no relatório do Professor Jorge

Fontoura, endossado pelo Ministro Gilmar Mendes, em que,

esta sim, seria uma inovação no Direito brasileiro e que,

talvez, se precisasse de uma emenda a Constituição, é a

possibilidade de controle prévio desses tratados e desses

atos internacionais de modo a não sujeitar a sua validade, a

posteriori, depois de sua vigência a pronunciamentos

jurisdicionais internos.

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Assim, Senhor Presidente, dito de forma

sumária, a Direito brasileiro hoje não consagra a primazia

do tratado internacional; o Direito brasileiro hoje coloca o

tratado internacional abaixo da Constituição; o Direito

brasileiro hoje fornece algum substrato, mas não suficiente,

para a criação de instituições supranacionais.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigado ao Grupo

Brasileiro, e farei uma observação antes do encerramento.

A experiência que tive, junto ao Congresso

Nacional, mostra que o problema no Brasil, no que diz

respeito à hierarquia dos tratados, está intimamente

vinculado à questão da manifestação da vontade internacional

do País. No nosso sistema, quiçá parecido com alguns dos

senhores, o tratado é gerenciado, exclusivamente como não

poderia deixar de ser, com o Poder Executivo. E ao levar ou

ser enviado os tratados, firmados pelo Poder Executivo, ao

Congresso Nacional, ele não pode emendar os tratados, porque

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a vontade internacional do País manifestou-se diretamente na

mesa de negociações internacionais. Com essa circunstância,

há uma exclusão do Poder Legislativo brasileiro na

manifestação da vontade internacional do País. Daí por que o

Congresso reage a qualquer tipo de prevalência do tratado à

lei ordinária, tendo em vista que na lei ordinária ele,

Congresso Nacional, tem participação absoluta, ao passo que

no tratado ele é relativamente excluído.

Esse é o grande problema político no Brasil.

Lembro-me que, em 1989, um dos maiores Embaixadores que já

conheci no Brasil, o Embaixador Paulo Nogueira Batista,

quando assessorava o Dr. Ulisses Guimarães na Presidência da

Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados,

havia sugerido uma fórmula pela qual pudesse haver uma

permeabilidade no sentido da participação dessa própria

Comissão na discussão da manifestação da vontade. Creio que,

se no Brasil não resolver o problema da relação Executivo-

Legislativo na formação da vontade internacional,

dificilmente o Congresso Nacional cederá espaços, porque

corresponderia a outorgar poderes ao Executivo,

independentemente da participação mais substancial do Poder

Legislativo a essa a questão política.

Em 1993, eu próprio propus, quando da revisão

constitucional, que os textos que fossem produzidos por

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organismos internacionais no qual o Brasil tivesse aderido

como tratado, que esses textos viessem a ter vigência

interna no Brasil, independentemente da participação do

Congresso Nacional. E o Congresso revisou, naquela época,

rejeitando, sendo que eu obtive somente sessenta votos dos

quatrocentos votos necessários.

Ou seja, é importante ter presente que a

questão não é exclusivamente jurídico-doutrinária, é uma

questão política de extraordinária relevância, tendo em

vista o tema básico do pluralismo democrático. Nós estamos

num Estado plural-democrático e, portanto, esta

circunstância bate junto ao Congresso Nacional.

Observem que agora se consegue, com aprovação

do Senado Federal e será promulgada no dia 08 de dezembro, a

reforma chamada Reforma Constitucional do Poder Judiciário.

Ela tem dois dispositivos, sendo que, num deles, resolve a

questão da discussão estabelecida sobre os tratados dos

Direitos humanos, na leitura do texto primitivo, no texto da

Constituição, § 3º, estabelecendo que esse texto, uma vez

aprovados os tratados em três quintos, ou seja, adotado, na

aprovação do tratado, o rito da lei da emenda

constitucional, ele ingressará no Brasil como emenda

constitucional. Agora, não aprovado por esse rito, entra

como lei ordinária; e somente a alteração constitucional é

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que poderia compor o problema da prevalência da lei

ordinária. Mas, para aprovar isso no Congresso, é necessário

rever-se paralelamente a forma, digamos, do acerto

internacional em relação aos tratados, ou seja, há que

estabelecer um entendimento do Poder Executivo com o Poder

Legislativo. O Poder Legislativo dificilmente concordará com

qualquer manifestação em que a formação da vontade do País

fique na mão exclusiva do Poder Executivo. Tenho longa

experiência disso, pelo menos durante os oito anos em que

integrei o Congresso Nacional.

Havia, meu caro Embaixador Pericás, uma reação

muito forte da burocracia do Itamaraty a qualquer

participação do Congresso Nacional. E Vossa Excelência sabe

que isso é, também, uma discussão de Poder, em relação à

possibilidade ou não da integração, nesta formação de

vontade, dos membros do Congresso Nacional.

Se não enfrentarmos esse assunto com clareza,

não há dúvida. E eu elogio, com transparência, a

manifestação do Grupo, quando disse que a conveniência

política, nos tratados, é que haja o controle prévio da

constitucionalidade e não o controle a posteriori da

constitucionalidade para efeitos de fazer com que,

efetivamente, a vontade do País se manifeste de forma

definitiva e independa de composições ou mutações de

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composição da Corte Suprema, sob pena de nós negociarmos

internacionalmente e, depois, dali a dez anos, alguém

resolve dizer que essa situação mudou porque a sua formação

jurídica se deu em outros pendores que não aquele do momento

do nascimento. E nós precisamos fugir a essa insegurança que

possa decorrer, digamos, do autonomismo e do voluntarismo da

doutrina na condução das questões nacionais e

internacionais.

Vamos suspender os trabalhos por quinze

minutos e, depois, retornaremos imediatamente.

(PAUSA PARA COFFEE BREAK)

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Estão reiniciados os trabalhos.

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Agora, ouviremos a exposição que será feita

pelo Senhor Vice-Presidente da Corte Suprema de Justiça do

Paraguai, Dr. José Raúl Torres Kirmser, que falará por quinze

minutos.

No prosseguimento do Grupo Paraguaio, falará o

Professor Dr. Roberto Ruiz Díaz Labrano.

Com a palavra Vossa Excelência.

O SENHOR MINISTRO JOSÉ RAÚL TORRES KIRMSER

(VICE-PRESIDENTE DA CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA DO PARAGUAI) -

Com justificada honra e muito prazer, assistimos a esse

Segundo Encontro de Cortes Supremas dos Estados-Partes e

Associados do Mercosul, realizado na capital da República

Federativa do Brasil, uma cidade que prova a fé, a imaginação

e a tenaz vontade empreendedora desse povo ativo,

protagonista, na América, do presente no qual vivemos e

promotor rigoroso da compreensão dos nossos sonhos e ideais

frente aos desafios do Século XIX.

Vou me referir ao tema das assimetrias

constitucionais. Segundo questionário que nos foi entregue,

são formuladas as seguintes considerações e perguntas: é

possível a criação de instituições supranacionais ou os

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modelos constitucionais só permitem a consecução do Tratado

de Assunção, limitado pela natureza intergovernamental do

bloco? É possível que prevaleçam as normas produzidas pelos

órgãos do Mercosul em confronto com os ordenamentos jurídicos

nacionais?

No nosso Grupo, somos dois. Vou me referir ao

primeiro questionamento e, depois, o Dr. Roberto Ruiz Díaz

Labrano continuará com a seguinte exposição.

Ou seja, reiterando, os problemas que podem

ser apresentados pelas assimetrias constitucionais dos

Estados-Partes são, na aplicação do Direito comunitário,

problemas de ordem de prelação e, na criação de órgãos

constitucionais, por razões de assimetria constitucional.

No primeiro ponto, a nossa Constituição

Nacional não oferece nenhum inconveniente. A norma do art.

137 da Constituição paraguaia estabelece taxativamente que a

lei suprema da República é a Constituição. Está nos tratados,

convênios internacionais, aprovados e ratificados, as leis

ditadas pelo Congresso e outras disposições jurídicas de

hierarquia inferior sancionadas e, como conseqüência,

integram o Direito positivo nacional na ordem de prelação

enunciada. Quem quiser mudar tal ordem, à margem dos

procedimentos previstos na Constituição, incorrerá nos

delitos que serão tipificados e penalizados através da lei.

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Esta Constituição não perderá a sua vigência nem deixará de

ser observada através de atos de força ou através de outros

meios diferentes daqueles que são dispostos através dela.

Carecem de validade todas as disposições ou atos de

autoridades opostos àquilo estabelecido pela Constituição. De

tal forma, essas normas são claras em relação à prelação, aos

tratados, em relação às leis nacionais, sempre que elas sejam

ratificadas e aprovadas através do Parlamento Nacional.

Em relação ao tema da criação de órgãos

supranacionais, trataremos um pouco da História e, de tal

forma, observaremos as disposições que foram sendo criadas

para o progresso, nos últimos anos, desde a assinatura do

Tratado de Assunção.

Os representantes das Cortes Supremas de

Justiça do Paraguai, Argentina e Uruguai assinaram no mês de

setembro de 1997 a Carta de Ouro Preto, na qual foi feita a

recomendação de que os Estados que fazem parte do Mercosul

constituíssem uma Corte de Justiça supranacional, para que

aplique, interprete e unifique a jurisprudência do Direito

Comunitário. Naquela oportunidade, foi dito que, se o Brasil

decidisse se juntar à idéia, o Governo teria que promover a

reforma constitucional através do voto majoritário do

Congresso.

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Os representantes das máximas instâncias

jurídicas do Paraguai, Argentina e Uruguai recomendaram um

tribunal supranacional, que decidiria, com caráter

vinculante, as controvérsias comerciais, diplomáticas e

fiscais.

No Quinto Encontro de Cortes Supremas do Cone

Sul, os representantes do Brasil, compreendendo as áreas

jurídica e administrativa, expressaram que prefeririam um

mecanismo de arbitragem para solucionar controvérsias nos

assuntos nos quais o Mercosul não necessitasse de um tribunal

supranacional. Então, o Ministro da Justiça deste País

renomado assinalou, nesse Encontro de Magistrados Judiciais,

que a decisão do Brasil sobre esse ponto não seria revisada,

por enquanto, pois considerava, todavia, muito prematuro

instaurar esse órgão supranacional.

Temos de lembrar que o Paraguai foi o primeiro

País do Mercosul que, na sua Constituição de 1992, consagrou

uma ordem jurídica supranacional. O art. 145 expressa essa

norma. A República do Paraguai, em condições de igualdade com

outros Estados, admite uma ordem jurídica supranacional, que

garanta a vigência dos Direitos humanos da paz, da justiça,

da cooperação e do desenvolvimento político, econômico,

social e cultural. Essas decisões somente poderão ser

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adotadas através de maioria absoluta de cada uma das Câmaras

do Congresso.

Depois, tomou o mesmo caminho a República

Argentina, através da reforma constitucional de 1994. Entre

as atribuições do Congresso foi incluído: aprovar tratado de

integração que delegue competências e jurisdições a

organizações supra-estatais, em condições de reciprocidade e

igualdade, que representem a ordem democrática e os Direitos

humanos. As normas ditadas em conseqüência disso possuem

hierarquia superior àquela das leis.

Abordando o tema das assimetrias em matéria

constitucional, devemos assinalar que a Carta Magna do Brasil

preceitua, no seu art. 1º, o seguinte:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de Direito e tem como fundamento:

I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e

da livre iniciativa; V - o pluralismo político.”

O art. 4º da Constituição deste País, em

vigoroso e promissor crescimento, estabelece o seguinte:

“Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

I - independência nacional;

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II - prevalência dos Direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao

racismo; IX - cooperação entre os povos para o

progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único – A República

Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.”

A Constituição Uruguaia, neste tema, consagra

no seu art. 6º:

“Art. 6. En los tratados internacionales que celebre la República propondrá la cláusula de que todas las diferencias que surgan entre las partes contratantes, serán decididas por el arbitraje u otros medios pacíficos.

La República procurará la integración social y económica de los Estados Latinoamericanos, especialmente en lo que se refiere a la defensa común de sus productos y materias primas. Asimismo, propenderá a la efectiva complementación de sus servicios públicos.”

Esse art. nos leva, necessariamente, à

seguinte pergunta: aceita ou não a superlei da nobre pátria o

princípio da supranacionalidade? Esse é um ponto que é muito

debatido neste País. Existem vários constitucionalistas

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respeitados que dão opinião sobre isso. Eles entendem que o

texto da Constituição deverá ser reformado para que este País

possa aceitar decisões provenientes de organismos

supranacionais.

O ilustre jurista Dr. Héctor Gros Espiel nos

explica o seguinte: em especial as questões referentes à

integração dos Estados Latino-americanos supõem uma

necessária relação internacional e, conseqüentemente, é

admissível que o respeito venha, em certos casos, das

decisões dos órgãos internacionais, criados em virtude de

tratados ou convenções regularmente ratificados, que tenham

aspecto erga omnes de forma direta.

O ex-Chanceler uruguaio adverte que, para que

seja possível a existência de órgãos internacionais não-

integrados por representantes uruguaios e cujas decisões

sejam obrigatórias em terras uruguaias, é necessário um

ajuste constitucional. Diz também: no meu conceito, o art.

6º, inciso II, da Constituição da República, habilita a

existência de um Direito constitucional, permitindo que os

órgãos públicos internos do Estado - o Poder Executivo que

tem competência de subscrever tratados e o Poder Legislativo

que tem o poder de ratificar os tratados - possam comprometer

o Uruguai como membro de um organismo supranacional, como

neste caso do Mercosul.

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Evocamos, depois disso, que a Carta de Ouro

Preto chegou às seguintes conclusões:

Em primeiro lugar, que o processo de

integração do Mercado Comum do Sul, assim como as demais

outras regiões, começou a partir de fatores econômicos e foi

orientado em direção à troca de bens e serviços para

conseguir também uma união entre as fronteiras, para que, com

isso, tenham uma forma de consolidar e regular os movimentos

da área cultural, social e econômica, a fim promover uma

integração cultural, e é nesse campo que é indispensável o

desenvolvimento do Direito comunitário.

As recomendações provenientes da Corte Suprema

de Justiça do Cone Sul, sem prejuízo do uso de meios

pacíficos de alta composição na resolução das controvérsias.

Esses foram os pontos em que houve uma coincidência entre os

participantes do Primeiro Congresso Internacional de Direito

Comunitário, através de uma iniciativa da Escola

Internacional da Magistratura do Brasil e do Instituto

Interamericano de Estudos Jurídicos sobre o Mercosul, levando

em consideração a necessidade de aprofundar a integração no

Mercosul, tendo em vista os bons resultados obtidos e, por

outra parte, as carências comprovadas e assinaladas em tal

Congresso.

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A Carta de Ouro Preto faz a seguinte

recomendação: adequação das normas constitucionais dos

Estados-membros com o objetivo de assegurar a supremacia do

Direito comunitário.

Depois disso, o professor Dr. Ruiz Díaz

continuará com a exposição.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Passo a palavra ao Professor

Roberto Ruiz Díaz Labrano.

O SENHOR PROFESSOR ROBERTO RUIZ DÍAZ LABRANO

– Vou continuar a exposição do Senhor Ministro, tentando

esclarecer alguns pontos.

Não só o Paraguai tem problemas de assimetrias

constitucionais, mas também, num enfoque de grande

apreciação, os conflitos que são gerados na interpretação das

normas constitucionais, segundo alguns, impedem o progresso

maior da integração entre os povos.

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O primeiro ponto que pensei depois de escutar

as exposições que ouvi é o fato de que evidentemente existe

uma percepção de obstáculo de ordem constitucional para o

progresso da integração. Existe a percepção de que algumas

constituições devem ser reformadas ou precisão de alguns

ajustes. Hoje, escutei um comentário importante, em que o

principal obstáculo para a superação do problema, que

significa essa questão da hierarquia na aplicação dos

tratados frente às leis na ordem jurídico-constitucional

brasileira, é um tema de caráter político. Acredito que isso

é muito relevante e deve ser muito levado em consideração

durante essas reuniões.

A evolução do Direito e a evolução do Direito

Constitucional necessariamente requerem também levar em conta

o que aconteceu com os povos em geral durante esses tempos em

que vivemos. Existe uma nova realidade, um constitucionalismo

novo, existe uma nova relação entre os povos que não admitem

interpretações dogmáticas, inclusive no Direito

Constitucional. Aquelas velhas regras estabelecidas em função

de outras realidades, onde a soberania dos povos era assumida

como critério absoluto, no sentido de que qualquer concessão,

mesmo que fosse parcial, de competência ou de funções,

implicava num atentado à soberania. Isso não existe mais. O

Brasil, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai participam de

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organizações internacionais. A Organização Internacional do

Comércio é uma realidade. O Mercado Mundial é uma realidade.

O constitucionalismo não pode ficar longe dessa realidade.

Essa integração é parte da nova realidade com a qual deve ser

olhado o constitucionalismo dos nossos povos.

Já foi dito aqui que, na região, temos duas

pirâmides – isso foi dito pela Ministra Argentina - que a

doutrina interpreta, mostrando o nível que ocupam os tratados

frente às leis nos respectivos ordenamentos políticos,

constitucionais de cada um dos povos da região. Alinhados na

impossibilidade da primazia, pelo menos numa interpretação

categórica dos tratados internacionais sobre as leis,

estariam a Argentina e também o Paraguai, no sentido de que,

para as nossas Constituições, através das modificações que

foram realizadas de 1994, na Constituição Argentina, no seu

art. 74, inciso XXIV, e complementada com o inciso XXII de

tal Constituição, o problema, que já tinha sido resolvido

pela jurisprudência, o da hierarquia superior e dos tratados

sobre as demais leis nacionais, não admitia discussão.

Na ordem jurídica do Paraguai, está

explicitado no art. 137 da Constituição Nacional, que a

prevalência desses tratados sobre as leis nacionais. A

dificuldade que vamos encontrar quando fazemos essa

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interpretação constitucional está centrada na Constituição

brasileira.

Aqui, chegamos a uma análise que deve ser

feita necessariamente. Para a interpretação da Constituição

brasileira, é possível pensar que ela ignora que as relações

internacionais, hoje em dia, estão absolutamente

privilegiadas no contexto das relações internacionais de

Estado? É claro que não. Como conseqüência disso, essa

opinião sobre o obstáculo político é o verdadeiro obstáculo

para o progresso no sentido da interpretação sobre a

prevalência dos tratados de ordem constitucional brasileiro,

segundo acredito. Basta observar alguns dos princípios que

devemos partir para interpretar qual é a posição desta

Constituição de 1988.

Essa Constituição de 1988, no seu art. 4º,

utiliza alguns princípios que não teriam explicação, ou não

teriam aplicação na sua integridade se não fosse observada

uma certa prevalência de uma ordem hierárquica em função dos

tratados em relação à ordem interna. Utiliza alguns

princípios tais como aqueles vinculados à cooperação, utiliza

princípios vinculados à igualdade entre os Estados. E como

poderia existir igualdade entre os Estados se o Estado

brasileiro não levasse em consideração a reciprocidade de

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igualdade daquele Estado que está diante dele? Esse tipo de

relação se modifica através dos tratados internacionais.

Outra coisa importante que impõe a

interpretação normativa constitucional é que existem dois

enfoques prioritários: o primeiro, que a norma posterior

derroga a norma anterior, aplicada a Constituição. Na ordem

jurídica constitucional brasileira teríamos que uma lei do

Poder Legislativo poderia derrogar eventualmente um tratado

internacional. Mas temos outro princípio no qual a lei

especial prevalece sobre a lei de caráter geral. Nesse ponto,

encontramos um sustento para a prevalência ou a interpretação

da prevalência da ordem jurídica emanada dos tratados frente

às leis nacionais. Por quê? Porque os tratados possuem um

conteúdo de natureza especial. São vinculados a relações

internacionais específicas. São vinculados a aspectos

contidos num tratado no qual a relação é claramente

específica. Que lei nacional poderia, sem afetar também a

ordem constitucional, introduzir-se nesse aspecto da relação

de caráter internacional?

Estou falando muito sobre a ordem

constitucional brasileira, mas estou fazendo isso numa

posição interpretativa. O que queremos dizer aqui é que

evidentemente um tratado internacional obedece a uma

categoria de natureza especial, que prevalece sobre qualquer

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norma de caráter geral, e é difícil encontrar, numa norma

interna, um equivalente ou uma norma interna que se refira a

aspectos especiais dos quais se ocupa o Direito

Internacional.

A questão da prevalência, como conseqüência,

pode evoluir através da interpretação das respectivas cortes

supremas de toda parte. É evidente que nos quatro Estados-

Partes a ordem hierárquica constitucional, evidentemente é

hierarquicamente superior aos tratados e às leis.

Foi dito aqui que o mais importante é a

vontade política, mas acredito que a vontade política e a

realidade na qual vivemos hoje refletem o mundo atual. É

realidade que necessitam o mundo ocidental, ou seja, a

Argentina, o Brasil, o Uruguai, o Paraguai, para se inserir

dentro do contexto das nações, a fim de poder agir nesse

mundo globalizado, requer uma interpretação constitucional

que obedeça a modificações, a transformações dos tempos

atuais.

Achamos que isso vai acontecer, como nós

pudemos observar no processo de integração do Mercosul. Esse

processo nos mostrou claramente como essa vontade política

foi cedendo no sentido de ampliar o contexto no qual se

poderia interpretar, que se poderia desenvolver o processo de

integração do ponto de vista normativo.

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Os princípios encontrados nas constituições

nacionais podem ser tratados a partir do seguinte: as

constituições nacionais falam de igualdade, geralmente com um

critério próprio, na Constituição argentina, na Constituição

paraguaia, na Constituição brasileira e também na uruguaia.

Como condição para que os tratados internacionais tenham

sustentabilidade.

Outro princípio introduzido na Constituição

argentina de 1994 é a reciprocidade.

E outro princípio contido na Constituição

paraguaia, explicitamente, é o de cooperação internacional.

Vimos também que os quatros Estados, quando se trata de

Direitos humanos, têm uma tendência às reformas

constitucionais ou a admitir, como interpretação normativa

constitucional, que esses tratados e convênios

internacionais, vinculados aos Direitos humanos, têm uma

hierarquia superior em relação às leis.

Outro elemento que aparece também para

sustentar a existência de um ordenamento jurídico de tipo

supranacional é o da integração, que aparece nas

Constituições dos quatros Estados, porém, aparece de forma

diferente. É notável a diferença que existe no modo em que

concebe a Constituição argentina ao se referir aos órgãos

supra-estatais. A Constituição paraguaia se refere a

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ordenamentos jurídicos supra-estatais. A Constituição

argentina, portanto, parte da criação do órgão que criará

aquele ordenamento jurídico, hierarquicamente superior ao

ordenamento interno. A Constituição paraguaia parte do

princípio que necessariamente reconhece a sua participação na

comunidade internacional, numa ordem de igualdade com outros

Estados. Em sua atuação internacional, reconhece uma ordem

jurídica supranacional. A partir disso se dá a possibilidade

de criação dos órgãos.

Nós não vemos nisso um obstáculo substancial

na Constituição uruguaia e, tampouco, na Constituição

brasileira. Existe um obstáculo político que deve ser

harmonizado e compreendido, porque, se não entendermos essa

realidade, dificilmente vamos superar esse obstáculo que

talvez esteja impedindo que a região se ajuste ao tempo que

necessita para o seu relacionamento internacional.

Muito obrigado.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – A partir desse

momento ouviremos a palavra do Ministro Leslie Van Rompaey

Servillo, Presidente da Corte Suprema do Uruguai.

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O SENHOR MINISTRO LESLIE VAN ROMPAEY SERVILLO

(PRESIDENTE DA CORTE SUPREMA DO URUGUAI) – Obrigado, Senhora

Vice-Presidente, estimados Colegas.

Na colocação desse problema, partimos da

premissa de que o Mercosul é um processo intergovernamental,

por decisão dos Estados-Partes. Se isto resolvesse - é um

passo grande no processo de integração -, então se acarretará

um problema para a divisão jurídica do Mercosul, que está

constituída precisamente pelas assimetrias constitucionais

dos Estados-Partes na hora da aplicação direta do Direito

comunitário ou a criação do órgão supranacional.

Estou sendo um pouco repetitivo. A

Constituição argentina é mais clara nesse sentido a partir de

1994, autorizando a delegação de competência e jurisdição a

organizações super-estatais em condições de reciprocidade e

de igualdade. Também é favorável a Constituição do Paraguai,

no art. 145, ao admitir uma ordem jurídica supranacional.

Os textos constitucionais da República do

Uruguai e do Brasil mostram enunciados genéricos e

pragmáticos; mas, no meu ponto de vista, de nenhuma forma,

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pelo menos no caso do Uruguai, obstaculizam o desenvolvimento

dos processos de integração.

Portanto, numa primeira observação da situação

dos quatro Países membros do Mercosul, sugere uma aparente

falta de harmonia entre os regimes constitucionais de cada um

deles, classificando-se em dois grupos: o primeiro, integrado

pelo Paraguai e Argentina, contempla, fundamentalmente, a

supremacia dos tratados, com suas leis nacionais, e, por

outro lado, tem posições especiais para facilitar os

processos de integração regional. Os regimes respectivos de

ambos os Países demonstram as mesmas modalidades.

O segundo grupo de Estados seria o Brasil e o

Uruguai. Países cujas Cartas Magnas não prevêem esse tema

constitucional mencionado, pelo menos expressamente para seus

dois sócios do Mercosul. O art. 4º da Constituição brasileira

determina que a República Federativa do Brasil buscará a

integração econômica, política, social e cultural dos povos

da América Latina, aprovando a formação de uma comunidade

latino-americana de nações. A Constituição, entretanto, não

prevê normas explícitas em matéria de integração que

facilitem esse tipo de processo. Está se modificando a ordem

de prelação das normas internas, dando a possibilidade a

órgãos internos para delegar faculdades ou estabelecendo um

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procedimento para aliviar a incorporação das normas

provenientes de decisões tomadas por uma estrutura regional.

No caso do Uruguai, a nova Constituição fala

do tema no art. 6º, que estabelece que a República procurará

a integração social e econômica dos Estados da América

Latina, especialmente no que se refere à defesa comum dos

seus produtos e matérias-primas que compreenderá a efetiva

complementação dos serviços públicos.

O art. 168 estabelece que compete ao Poder

Executivo a inscrição dos tratados, que faz acordo com o 85

da Assembléia Geral, que deverá aprovar os tratados

celebrados pelo Poder Executivo, e art. 139, quando se refere

às competências da Suprema Corte em questões relacionadas com

os tratados, pactos e convenções.

Nenhuma dessas normas constitucionais indica

como aplicar o Direito de origem internacional no Direito

interno nem com que hierarquia se incorpora no Direito

interno uruguaio.

A observação dos textos constitucionais de

ambos os países demonstra uma situação não muito favorável a

uma total integração nem da primazia dos tratados sobre o

texto constitucional. Então, o problema pode ser superado a

partir de uma interpretação dinâmica dos próprios textos

constitucionais e principalmente através da aplicação da

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Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, seguindo a

jurisprudência mais moderna da matéria.

As assimetrias constitucionais entre os países

do Mercosul não são, no nosso juízo, um obstáculo para o

processo de integração. No Paraguai e na Argentina, as

Constituições nacionais estabelecem a supremacia dos tratados

internacionais sobre a lei doméstica. No Brasil, ou pelo

menos, na minha opinião, claramente no Uruguai, pareceria que

os efeitos dos primeiros poderiam ser modificados como

conseqüência das sanções de leis nacionais.

De acordo com essa visão, mesmo sem ter uma

convergência de princípios constitucionais, seria muito

difícil avançar num processo de integração, especialmente no

processo da soberania.

Enfatizar esse caráter constitucional parece

uma intimidação se é feita uma reforma na norma

constitucional. A magnitude política do desafio parece

difícil. Gostaria de ressaltar que no Uruguai as reformas

constitucionais sempre estiveram vinculadas às questões de

índole eleitoral, ou urgentes necessidades políticas da

condução do governo e da administração do Estado. Seria muito

difícil, no Uruguai, conseguir uma reforma constitucional

dirigida especificamente para a possibilidade de criação de

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um organismo supranacional ou da aplicação direta da

normativa dos organismos comunitários.

Mas essa visão, entretanto, não esclarece a

questão. Existem mecanismos políticos e legais por meio dos

quais podemos adotar procedimentos que permitam a

excepcionalidade das normas se aplicar em casos particulares.

Em vários países europeus existe um conflito semelhante entre

as constituições nacionais e o processo de integração, com um

conteúdo muito mais supranacionais que no caso do Mercosul.

Aqueles que foram resolvidos como engenharia jurídica e

vontade política.

Os impedimentos constitucionais não podem ser

absolutos, mesmo que, ao ser apresentados, sirvam para

ocultar o verdadeiro aspecto quanto a isso. Ou seja, a falta

de vontade política para encontrar uma resposta adequada para

problemas como tais.

O mesmo critério poderia ser aplicado a outros

âmbitos, com relação as dificuldades de internalização da

normativa aprovado pelos órgãos do Mercosul. Nessa área, foi

sugerido que a adoção de mecanismo semelhante à via rápida

utilizada pelo Congresso norte-americano para autorizar

acordos internacionais poderia facilitar a tarefa de

internalização quando necessário um ato legislativo nacional.

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Eu fazia referência à contribuição da

jurisprudência da Suprema Corte da nação Argentina, mas não

vou reiterar porque já foi exposto pela nossa Colega.

Vou falar a respeito da evolução operada no

mundo, em matéria de integração de grandes espaços

econômicos, quando se trata do fenômeno que Capereti

considerou como a dimensão transnacional do Direito e da

Justiça. O Direito Internacional, na atualidade, tem valor

subentendido à primazia da ordem internacional sobre a

interna, pelo qual é improcedente invocar as internas como

justificativa do não-cumprimento dos tratados internacionais

(arts. 26 e 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos

Tratados).

De alguma forma, nas normas constitucionais

muitos países, como a Argentina, Chile, Paraguai e Colômbia,

reconhecem, no texto expresso, a supralegalidade e a

constitucionalidade dos tratados está inserida nessa linha.

As constituições que não prevêem essa questão, como a

uruguaia, isso é feito então na ratificação da Convenção de

Viena sobre o Direito dos Tratados. Esse critério que, em

princípio se refere apenas a tratados ratificados, fica

acentuado no âmbito dos Direitos humanos, com relação aos

quais sustenta a eficácia dos instrumentos nacionais

específicos inclusive com independência da sua ratificação.

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Temos exemplos na Declaração Universal dos Direitos Humanos

das Nações Unidas, de 1948, e na Declaração Americana de

Direitos e Deveres do Homem, do mesmo ano.

Os tratados são fontes de Direito

Internacional, de acordo com o que foi estabelecido no art.

38 do Estatuto da Corte Internacional de Justiça e, portanto,

devem ser respeitados pelos países que o ratificam, sejam

quais sejam os seus regimes constitucionais. Tanto o Brasil

quanto o Uruguai ratificaram o Tratado de Assunção, e a

Convenção de Viena sobre os Direitos dos Tratados foram

ratificados pelo Uruguai: e, no âmbito internacional, em

grande parte as suas normas são Direitos consuetudinários.

Esta última convenção dispõe os seus membros pelos princípios

do livre consentimento e da boa-fé, em um pacto onde estão

universalmente reconhecidos. Os art.s 26 e 27 estabelecem que

todo tratado em vigência obriga as partes, devendo ser

cumpridos de boa-fé; e que o Estado Parte, em um tratado, não

poderá invocar a disposição do seu Direito interno como

justificativa de não-cumprimento do tratado. Essas normas

demarcam o princípio da irreversibilidade do princípio

comunitário, significando que, juridicamente, não podemos

voltar atrás. Não está permitido colocar novamente os

compromissos que já foram assumidos e os setores que já

passaram pela autoridade da comunidade.

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Então, no momento em que se prepara para

ratificar os tratados, cada Estado deve resolver, então, os

problemas do tipo constitucional. Cada um é dono da solução,

mas, uma vez que foi aceito o compromisso nacional com toda

liberdade, existe aqui um fato histórico sobre o qual não é

possível mais voltar atrás. Opõe-se à boa-fé dos tratados

internacionais que um Estado-membro ou uma das suas

autoridades, por exemplo, na jurisdição, tenta colocar em

dúvida os compromissos aceitos, invocando obstáculos

constitucionais. Portanto, depois de ser ratificado o

instrumento internacional pelos Estados, existe uma ordem

jurídica supraconstitucional e supranacional que deve ser

cumprida também na ordem interna pelos juízes.

Como entendemos a respeito do Uruguai, nós

vimos que a Argentina e o Paraguai já resolveram o problema

nos seus textos constitucionais. Não é necessário reformar a

constituição, mas, sim, aplicar o Tratado de Assunção de

forma congruente com ele, harmonizando a interpretação e a

aplicação nos Direitos internos, de acordo com o que temos na

normativa internacional e na moderna jurisprudência e

doutrina com relação a esse tema.

Muito obrigado.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigada,

Ministro Leslie.

A partir de agora, senhoras e senhores,

iniciaremos uma faze de debates que tem início com

precedência para os próprios integrantes da Mesa. Na

seqüência, a preferência se dá aos nossos observadores.

Depois disso, então, aberto ao público em geral o

questionamento.

Portanto, passo a palavra, inicialmente, ao

Ministro Gilmar Mendes, para que encaminhe aos demais

integrantes da Mesa um primeiro questionamento.

O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Sem dúvida, nós vimos aqui as múltiplas

perspectivas que o tema suscita e os esforços que vêm sendo

feitos, no âmbito de todos os países, para encontrar as

adequadas soluções.

No que diz respeito ao grupo de trabalho

brasileiro, já manifestamos aqui a preocupação com avanços

institucionais. Foram apontados déficits claros e

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possibilidade de solução. Estamos, todavia, também

conscientes – e este é um outro ponto que ficou claro no

relatório brasileiro – de que ainda estamos distantes da

produção de um Direito supranacional, embora, em alguns

sistemas, especialmente no sistema argentino, já haja autores

que falam na existência de um Direito supranacional. Também

entre nós se identifica.

Esse ponto vai suscitar e há de suscitar –

isto já resultou na manifestação de alguns dos nossos Colegas

– uma outra discussão, que tem tido grande importância na

Europa, sobre a aplicação imediata do Direito Comunitário e o

seu eventual controle, como isso se administra nos sistemas

tradicionais das Cortes e se nós deveríamos caminhar – um

debate que também já teve maior ênfase, às vezes temos

avanços e retrocessos – para uma eventual Corte de Justiça do

Mercosul nessa relação de cooperação. Ficou claro também na

manifestação dos Colegas do Paraguai.

Então, essa é uma indagação que acredito fica

um pouco sobre todas essas nossas cogitações: de que Direito

supranacional se trata? Como vai se fazer a forma de

controle? Como hão de conviver os aparatos judiciais hoje

existentes em uma eventual corte de justiça?

Dr. Jorge.

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O SENHOR PROFESSOR JORGE FONTOURA– Bem,

teríamos três perguntas. A primeira delas diz respeito à

seguinte idéia:

É possível a criação de instituições

supranacionais ou os modelos constitucionais só permitem a

consecução do Tratado de Assunção limitado pela natureza

intergovernamental do bloco?

Pediria ao Professor Luiz Roberto Barroso que

abordasse este tema.

O SENHOR PROFESSOR LUIZ ROBERTO BARROSO –

Senhora Presidente, penso que esta questão foi, em alguma

medida, já inserida no debate preliminar aqui travado, que é

a de se reduzir a margem de risco na interpretação da

cláusula constitucional existente no Direito brasileiro.

A pergunta se resume essencialmente em saber

se a criação de instituições supranacionais no Brasil depende

ou não da edição de uma norma constitucional específica.

O Professor e Ministro Gilmar Mendes advoga a

tese de que é possível extrair do parágrafo único do art. 4º

a potencialidade para a legitimação dessas instituições

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supranacionais, pelo que entendi de uma conversa reservada

com ele, embora não tenha lido nenhum texto neste sentido.

Portanto, esta é a opinião autorizada de um Ministro do

Supremo Tribunal Federal.

Não obstante isso, é bem de se ver que o

parágrafo único do art. 1º, conquanto preconize a criação

desse tipo de mecanismo no âmbito do Mercosul, ele se

materializa em uma norma programática que não explicita

mecanismos para a realização desta integração. De modo que,

em tese, há o risco real de se questionar, no Direito

brasileiro, a falta de fundamento constitucional para essas

instituições supranacionais.

De modo, Senhora Presidente e Srs. Relatores,

que a posição da nossa comissão é no sentido de que é

possível uma interpretação construtiva do parágrafo único do

art. 4º para admitirem-se instituições supranacionais.

Portanto, nós não fechamos a porta diante do que já existe,

mas achamos que esta porta precisa ser talhada de uma forma

mais específica e que se possa, sem margem à contestação, dar

lugar à instituição desse tipo de organismos.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL)- Muito bem. Abrindo a

palavra, agora, aos nossos observadores, chamo o Professor

Ricardo Alonso, que gostaria de encaminhar alguns

questionamentos.

O SENHOR PROFESSOR RICARDO ALONSO GARCÍA -

Gostaria de fazer três breves reflexões no marco da

coordenação científica sobre o que foi dito aqui, pela manhã,

e que acho que pode dar espaço a equívocos importantes no

ponto de vista.

Em primeiro lugar, foi dito esta manhã e está

no relatório brasileiro, de que a possibilidade, talvez, de

um caminho para a solução esteja no tema do controle prévio.

Gostaria de ressaltar que o controle prévio não pode resolver

os problemas de uma norma. É impossível que, no marco de um

controle prévio e abstrato de uma norma, utilizemos essa

norma para a vida toda. O princípio do controle prévio

serviria para estabelecer bases de segurança jurídica, mas,

de nenhuma forma, no meu ponto de vista, pode excluir os

controles ex post, simplesmente porque a prática da aplicação

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de Direito é muito mais abrangente que as análises teóricas.

E, numa análise teórica, o que parece ser de acordo com o

Direito, na prática, pode ser diferente.

Em segundo lugar, estou preocupado com a visão

colocada ao longo desta manhã, de considerar, in totum, que

tudo o que foi adotado no marco do Mercosul são tratados

internacionais. Isso me preocupa enormemente.

Foi abordado que, a partir da perspectiva

brasileira, tudo que nasce do Mercosul para resolver uma

possível contradição com uma lei interna, tudo isso faria

parte de um tratado internacional. Então, isso está um pouco

longe da realidade. Evidentemente uma decisão da Comissão do

Comércio não é um tratado internacional; uma resolução do

grupo do Mercado Comum não é um tratado internacional. E

isso, portanto, tem conseqüência mais além do que as

palavras, porque, se abordamos as análises dessas decisões

dos órgãos do Mercosul em termos de tratado internacional, o

que vai provocar é um controle dessas decisões do ponto de

vista do Direito interno e não do ponto de vista do próprio

ordenamento jurídico do Mercosul, que está no contexto

mediante o qual deveria ser abordado.

E, finalmente, o tema chave hoje no Mercosul

foi apontado pelo Presidente Nelson Jobim. É um tema

fundamentalmente de controle político. Acho que todos nós

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concordamos que o que não pode ser feito no sistema de

integração é permitir que os governos façam aquilo que eles

não podem pela porta de entrada, pois são impedidos pela

Constituição, porque o Poder Legislativo deve abordar essas

questões. Então, o que não pode ser feito internamente pode

ser feito pela porta dos fundos no marco do sistema do

Mercosul.

Então, não podemos tirar o espaço do Poder

Legislativo e reservar exclusivamente ao Poder Executivo, ou

seja, a negociação e a aprovação de normas no Mercosul devam

prevalecer automaticamente sobre as decisões adotadas pelo

Poder Legislativo.

Mas, além de abordar isso em termos de

primazia, creio que o que resulta é incorporar os próprios

legisladores nessas normas que estão sendo negociadas no

marco do sistema de integração e que estão destinadas a

prevalecer, nos dias de amanhã, frente a normas

incompatíveis.

Então, para que isso seja viável do ponto de

vista democrático, acho evidente que todo o processo passe,

necessariamente, por algum tipo de controle, por algum tipo

de participação do Poder Legislativo, controlando o que vai

sendo negociado pelo Executivo no marco do Mercosul. Talvez,

o primeiro passo já tenha sido dado com o acordo inter-

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institucional, assinado em outubro do ano passado

precisamente pelo Conselho da Comissão Parlamentar em

conjunto, cuja pretensão é incorporar, através dessa

Comissão, os legisladores nacionais na negociação das normas

que vão sendo aprovadas no marco do Mercosul.

Muito obrigado.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL)- Também solicitou

intervenção o Dr. Wilfrido Fernández de Brix, árbitro titular

do Tribunal Permanente de Revisão do Tribunal de Assunção.

O SENHOR WILFRIDO FERNÁNDEZ DE BRIX (ÀRBITRO

TITULAR PERMANENTE DO TRIBUNAL DE ASSUNÇÃO) - Senhora

Presidente, queria fazer um comentário e uma proposta de

conclusão.

Em primeiro lugar, quanto à proposta de

conclusão do que seria a recomendação final deste grupo de

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trabalho, que fosse estipulado uma recomendação para a

harmonização constitucional dos nossos países, à luz da

postura argentina, uruguaia e brasileira; e, de acordo com o

que já foi esclarecido pelas Constituições paraguaia e

argentina em relação à prevalência do tratado sobre a Lei .1

e .2, e em relação à possibilidade da criação de uma entidade

supranacional com delegação de competências para tais

entidades.

Em segundo lugar, como parte da minha

proposta de conclusão deste grupo de trabalho, sugiro,

modestamente, que também fosse aceita a possibilidade de

exortar os nossos países que aprofundem um estudo sobre o

estabelecimento desse mecanismo institucional, o qual foi

referido brilhantemente pela doutora da Corte Suprema

argentina com relação aos Três Poderes.

Então, vemos que, de acordo com a realidade

paraguaia e de acordo com a realidade de todos os nossos

países, isso ainda não é possível; porque, como foi dito tão

corretamente, não existe em nosso esquema legislativo a

possibilidade de que os órgãos judiciais atuem como órgãos

consultores, somente podem fazer a sua expedição em causas.

Em terceiro lugar, eu modestamente gostaria

de contribuir para que se inclua, na conclusão deste grupo de

trabalho, a possibilidade de que, nas reformas

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constitucionais que estamos apoiando sobremaneira, fosse

possível a inclusão do estudo a exemplo da Constituição

venezuelana, que é a única na América do Sul, pelo menos que

eu tenha ciência, cuja norma expressa o texto enfatiza

claramente a aplicabilidade direta e imediata do Direito

Comunitário.

Gostaria de fazer um breve comentário - não

quero me exceder no uso da palavra – para pontuar, breve e

respeitosamente, a experiência histórica, porque ela

demonstra que os processos de integração não começaram em nem

se aprofundaram pelas vias das reformas constitucionais.

Assim nos ensinou a União Européia e assim nos ensinou a

experiência dos nossos irmãos andinos aqui presentes.

Darei um exemplo concreto. Na comunidade

andina, no começo da criação que foi o Acordo de Cartagena e

o Pacto Andino, a única Constituição dos cinco países que

possibilitava à delegação dos entes supranacionais, a criação

destes, era a Constituição colombiana que, um ano antes, como

um país que lida na comunidade andina, tinha feito uma

reforma legislativa.

Ainda hoje, depois de três décadas da criação

da comunidade andina, temos o exemplo da Constituição

boliviana, que não faz referência a nenhum esquema

programático de integração. Entretanto, na República da

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Bolívia, ninguém ousa colocar como obstáculo o projeto de

integração como suposto impedimento constitucional que

poderia existir ante tal carência.

As Constituições do Peru e do Equador não vão

muito mais além que a República da Bolívia. Apenas contêm

tímidas - e digo com o devido respeito - expressões com

relação a projeto de integração. Mas, em nenhum desses

países, nas três décadas de experiência da comunidade andina,

ninguém prevaleceu majoritariamente com escusa constitucional

como foi assinalado durante um mês pelo Presidente da Corte

Suprema do Uruguai e com “problemas constitucionais”,

impedindo o processo do avanço de integração.

Em resumo, gostaríamos de contribuir com esse

debate em que concordamos plenamente, apesar de não

aprofundarmos com essa conclusão da eliminação da assimetria

da reforma constitucional, mas com a clara observação de que

a experiência histórica nos ensina que primeiro vem a vontade

política e, depois, as reformas constitucionais.

Muito obrigado.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Continua a palavra

à disposição dos senhores observadores.

Pois não, tenha a bondade.

O SENHOR PROFESSOR JORGE LAVOPA – Muito

obrigado por me conceder a palavra.

Sou Jorge Lavopa, Diretor do Comitê de Estudos

de Assuntos Latino-americanos do Conselho Argentino para as

Relações Internacionais – CARI.

Estou assistindo este Congresso e quero

agradecer pelo convite e tentarei ser breve nos meus

comentários.

O ponto principal parece ser, como já foi dito

no painel anterior e depois ressaltado, o tema

constitucional. Pois acabamos de escutar que, tanto a

comunidade européia como a comunidade andina, não tiveram

problemas constitucionais para poderem avançar no processo de

integração.

Acho que se tivermos uma base política,

poderemos avançar nos processos de integração; e, se

quisermos, poderemos impulsionar no seu ordenamento para lhe

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dar mais precisão nas reformas correspondentes nas

constituições.

Aqui, estava me lembrando, vocês têm o exemplo

do chamado Protocolo nº 5, que criava a Empresa Binacional

Argentina-Brasileira, que esteve muito tempo detido em

função, precisamente, da Constituição brasileira e de

empresários de outros países. Não irei me aprofundar a

respeito disso, mas foi resolvido através do art. 4º da

Constituição brasileira, hoje, vigente, mesmo que não seja

utilizada, a Empresa Binacional Argentina-Brasileira.

Então, o que devemos fazer com isso é que

devemos avançar nessa luta política evidentemente, sem que

seja preciso que as constituições, que são vistas com uma

mentalidade e um conceito dos séculos XVIII e XIX, se

detenham em questões que estão sendo colocadas na nossa

região.

Esse era um dos temas que eu queria comentar.

Muito obrigado.

O SENHOR PROFESSOR RONALD HERBERT – Senhora

Presidente, meu nome Ronald Herbert, sou do Uruguai.

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Dá um pouco de medo falar a respeito deste

problema constitucional nessa questão. Mas, por essa mesma

razão, decidi falar.

Tenho medo de que se dê muita importância ao

fato de as Constituições do Uruguai e do Brasil não terem uma

norma expressa para habilitar a delegação de certos poderes

para criação de órgãos internacionais, e que isso se

constitui num grave problema quando, de repente, não é um

problema, seria um falso problema.

Não sou constituinte, e é um atrevimento de

minha parte, mas, de qualquer forma, sou advogado e a

Constituição é utilizada todos os dias. Então, se verifico o

art. 6 da Constituição Uruguaia, temos que há uma norma

dizendo que a República procurará a integração social e

econômica nos Estados da América Latina, especialmente no que

se refere à despesas com produtos e matérias-primas. Dessa

forma teremos a complementação dos serviços públicos.

Então, vemos que não podemos destacar uma

norma constitucional considerando toda sua problemática. Toda

norma constitucional deveria ser aplicada, de alguma forma,

às questões programadas.

Então, se seguíssemos, passo a passo, e

falássemos, por exemplo, das complementações dos serviços

públicos, ninguém ficaria surpreso se fosse criado um

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organismo internacional para administrar a energia da região

– ninguém ficaria surpreso. Quem se surpreenderia se

existisse um organismo, digamos, criado pela Argentina,

Brasil, Uruguai e Paraguai para regular a energia elétrica se

os sistemas estivessem conectados. De fato, temos a comissão,

por exemplo, de administração de Salto Grande e ninguém se

surpreenderia com esses recursos.

Muito bem, esse sistema é de matéria. Ninguém

está pensando que, neste momento, em um sistema de

integração, vai-se legislar sobre Direitos humanos, porque

aqui foi insistido que matérias de Direitos humanos seriam

aplicadas diretamente às normas, mas as constituições, como a

uruguaia, têm normas dizendo que a enumeração dos Direitos

(inaudível) não exclui outros que são inerentes à

personalidade humana ou proveniente do governo.

É claro que, em matéria de Direitos humanos,

têm normas constitucionais que permitem a aplicação de textos

ainda não aprovados pelo país, mas que se referem à dignidade

humana, aos Direitos humanos.

O art. 6º não se refere a todas as matérias,

refere-se à defesa comum dos seus produtos em matérias-primas

e à integração social e econômica. Portanto, é um tema

próprio da integração.

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Agora, o tema da integração não é um tema

estritamente de tratado, porque, por exemplo, os tratados, em

termos gerais, estão regulados na Convenção de Viena, que tem

sido considerado tratados autônomos e não incorporados a um

sistema progressivo dinâmico, como é o da integração. Em um

sistema de integração, por exemplo, alguns aspectos

relacionados com o Direito dos Tratados, com relação aos

contratos, com as medidas contraditórias, não fazem muito

sentido. Agora, tem sentido a interpretação contextual no

princípio de não contradição.

O tema da integração referidos aqui, claro,

numa constituição de 1966, ainda não estava na mesa, então

por isso existe uma norma mais específica. Mas não acho que

devamos nos adiantar em dizer que existe um grave problema em

uma questão em que não há uma norma específica com relação à

criação de uma normativa supranacional e órgãos

supranacionais. Então, isso, precisamente, depende da

interpretação dinâmica da norma constitucional, como já foi

dito.

Por essa razão, eu colocaria mais ênfase,

nesta Reunião, quanto à possibilidade de efetuar essa

interpretação dinâmica, do que em dar uma grande importância

à necessidade da existência de uma modificação nas

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constituições, para que possam desenvolver o sistema de

integração.

Acho que o primeiro caminho é o mais

importante, porque a norma constitucional que ordena que a

República, e aqui diz, exatamente, que procurará a integração

regional, essa norma precisa ser cumprida da alguma forma. E

não poderemos, então, dizer que essa norma não poderá ser

cumprida até que venha outra norma constitucional, quando

essa é uma norma constitucional, e diga: bom, para cumprir

com essa norma constitucional, autorizo a criação de órgãos

internacionais e que tenhamos, portanto, um sistema

internacional para a integração. Isso já está implícito na

norma; é a forma de fazer uma integração. Portanto, eu

colocaria mais ênfase nesse aspecto do que na questão

constitucional.

Obrigado.

A SENHORA ADRIANA DREYSIN DE KLOR (PREFESSORA)

- Bom dia. O meu nome é Adriana Dreysin e estou aqui pela

Universidade Nacional de Córdoba.

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Compartilho, em grande medida, com o que foi

exposto pelo Professor Ricardo Alonso García e o doutor

Ronald Herbert.

O que eu gostaria de dizer seriam os seguintes

aspectos: em primeiro lugar, não podemos deixar de reconhecer

que as assimetrias constitucionais são uma realidade que

estão nas constituições; em segundo lugar, partindo da

existência das assimetrias, devemos nos perguntar o que

queremos com relação ao Mercosul e o que temos nesse processo

para que possamos avançar. Sim, queremos avançar.

Nós estamos já há treze anos com este processo

e, de forma permanente, as vozes são favoráveis ao Mercosul.

Então, o que temos para poder avançar? Temos instrumentos

fundamentais que fazem com que hoje o Direito da Integração,

que não é esse Direito Internacional, possa ser considerado

como tal. Por que? Porque temos essa solução de controvérsia,

temos um grande passo que foi dado através da Constituição de

13 de agosto, no Tribunal Permanente de Revisão.

Então, se fizermos um acompanhamento sobre o

cumprimento, teremos que as diferenças constitucionais não

foram um obstáculo para utilizar como fonte, de ambos os

lados, o Direito à integração. E o que foi feito através

desses tribunais é também um controle do Direito do Mercosul,

que é o que importa.

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Portanto, na perspectiva constitucional,

teremos, acho, muitas esperanças de que, a partir da

implementação do novo Protocolo de Olivos e do mecanismo de

opiniões, possamos avançar na interpretação uniforme, que é

outro dos mecanismos dinâmicos necessários para o sistema de

integração.

Então, da perspectiva legislativa, como foi

assinalado pelo Professor Ricardo Alonso García, temos esse

primeiro acordo institucional, que leva o seu nome, porque

foi o autor da chamada Emenda Alonso, é bem verdade,

estabelecendo um firme compromisso por parte do mercado comum

e um firme compromisso por parte da Comissão Parlamentar

Conjunta. A natureza que traz consigo é a de ser considerada

“soft law”; e, na medida em que se cumpra com esse

compromisso, aí, sim, teremos outra ferramenta fundamental

para o esquema, que não pode deixar de ser aplicada para não

sofrer com as fraquezas que estão estabelecidas no relatório

da Secretaria Técnica, que cinqüenta por cento do acervo da

integração aprovado pelos órgãos decisivos não foram

internalizados dentro dos ordenamentos dos respectivos

sistemas. Ou seja, temos ferramentas, o fato seria, então,

utilizá-las. E é isso que eu gostaria de resgatar.

Muito obrigada.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) - Temos mais uma

pergunta no centro, depois lhe passo a palavra.

Por favor, peço que cada um dos interlocutores

se identifique para efeito de registro.

O SENHOR ALEJANDRO DANIEL PEROTTI (CONSULTOR

CLÍNICO DA SECRETARIA DO MERCOSUL) – Bom dia. Muito Obrigado,

Senhora Presidente.

Meu nome é Alejandro Perotti, Consultor

Clínico da Secretaria do Mercosul.

Acredito que, ao longo das exposições que

aconteceram hoje de manhã, sobressaem três temas diferentes:

Uma questão é a questão da delegação ou não de competências a

órgãos criados através de tratados de integração

supranacionais ou intergovernamentais, no caso de negativa de

delegação. Outra questão é a da prevalência ou hierarquia

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relacionadas ao Direito interno. E a outra é a aplicação

interna das normas dos Tratados Internos.

Vou começar pelo segundo tema: relação ou

hierarquia relacionadas às normas de Direito interno. Foi

muito citado o caso brasileiro sobre a relação: tratado e

lei. Aqui, vou fazer um pequeno comentário. Acho que foi

muito assinalado pelo Dr. García, quando distinguia que a

maioria das normas do Mercosul, setenta por cento, não é

tratada, mas, sim, normas derivadas de tratados adotados pelo

grupo, conselho ou comissão.

O que aconteceu na Argentina? Por que trago o

exemplo da Argentina? Porque é muito parecido com a história

jurídica brasileira. A etapa descrita pela Senhora Highton,

da Corte da Argentina, é dividida em três etapas. Até o ano

de 1940, a jurisprudência da Corte Argentina mantinha que

esses tratados estão acima das leis, anteriores ou

posteriores. Até 1992, mudou a jurisprudência, ou seja, para

nossa Corte Suprema, os tratados têm a mesma validade das

leis, ou seja, um tratado anterior a uma lei poderia ser

deixado sem efeito através da lei. Em 1992, a jurisprudência

da Corte Argentina mudou essa jurisprudência, que seria

citada posteriormente na Constituição.

A mudança em relação a esses tratados, nesse

momento, prevalece sobre as normas legais, ou seja,

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posteriores ou anteriores. Em primeiro lugar, em caso

contrário, o Estado seria responsável internacionalmente.

Esse princípio é aplicável não somente no Estado da Argentina

como também nos países que não têm isso inscrito na lei, ou

seja, no Brasil e no Uruguai.

A segunda base invocada pela Corte da

Argentina foi a Convenção de Viena - todos sabemos o texto do

art. 27. Essa base também é aplicável ao Brasil e ao Uruguai.

Por que ao Brasil? Porque todos sabemos que a Convenção de

Viena não foi ratificada pelo Estado brasileiro; porém, a

Convenção de Havana, que rege também o Brasil, no seu art. 10

expõe a mesma coisa que o art. 27 da Convenção de Viena; e,

no caso do Uruguai, ele ratificou as duas Convenções de

Viena, a de 1959 e a de 1986.

A terceira base dada pela Corte da Argentina

também é um pilar que pode ser estendido aos dois países, ou

seja, para o Uruguai e para o Brasil. O processo que dá

renascimento a um tratado internacional pode ser reconhecido

como um ato complexo federal. O que significa isso? Para que

nasça validamente um tratado, é preciso que haja a vontade

dos dois Poderes do Estado, ou seja, assinatura e ratificação

através do Executivo e a aprovação do Legislativo através de

uma lei, que é um ato unilateral. Agora, se deixo de aplicar

de imediato um acordo ou um tratado internacional em que

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participaram os dois Poderes, isso violaria o princípio de

jurisdição dos Poderes. Esse argumento poderia ser aplicado

aos dois países que não têm norma a respeito disso.

No que diz respeito à jurisprudência, por que

eu falaria que o caso Argentina é muito parecido com o

brasileiro? Porque, até o ano de 1977, a jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal do Brasil mantinha uma posição

diferente, sobretudo sob a influência do Ministro Filadelfo

Azevedo, da Corte Suprema do Brasil, em 1950, dizendo que os

tratados estariam acima das leis internas posteriores ou

anteriores.

Do ponto de vista comparativo com a

jurisprudência da Argentina, a jurisprudência brasileira

estaria na segunda fase, ou seja, faltaria a terceira fase

que foi cumprida pela Corte Argentina. E mais, não foi

unânime a jurisprudência do Tribunal Federal. Eu lhes lembro

o voto dissidente do Ministro Décio Miranda, numa extradição

solicitada pela Suíça, no ano de 1980, na qual, apesar do

Recurso Extraordinário nº 80.004, manteve que os tratados

prevalecem sobre as leis. Devo dizer que era uma posição

minoritária.

Eu tomei a jurisprudência dos tribunais

inferiores, Se somarmos a isso um elemento de Direito

comparado, se queremos analisar como nasceu o Direito de

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integração, obviamente deveremos recorrer à jurisprudência

européia, que foi o mentor dessas bases, desses pilares. Se

pegarmos um caso suposto do Tribunal de Justiça da Comunidade

Européia, que criaram o princípio da supremacia, vamos chegar

a mesma conclusão do Advogado-Geral da Itália, país onde um

tratado poderia ter um outro final. No Tribunal de Justiça,

apesar dessa situação constitucional, o Estado italiano

manteve que os tratados nasciam através de um processo de

integração comunitária européia e não poderiam ser invocados

contra as normas internas.

Em relação a transferência de competência e

aplicação da lei. Aqui se fala muito a respeito de

assimetria, como se fosse uma palavra negativa, e a

assimetria é a única que decide diferente. Assimetria não

significa obstáculo na integração, mas sim diferença na

regulamentação.

Se olharmos as quatro constituições dos países

do Mercosul, elas reconhecem o processo de integração. Nas

quatro constam cláusulas que se referem aos tratados de

integração. Essa é a primeira conclusão.

Obviamente, existem diferenças dos

regulamentos entre a Argentina e o Paraguai, e entre o

Uruguai e o Brasil. Mas essas diferenças são normas menos

específicas quanto ao significado da integração. Essas

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diferenças são compensadas em relação à localização. Se

olharmos a constituição da Argentina e Paraguaia, a questão

da integração está concretizada como uma norma procedimental,

dentro da competência dos Poderes Legislativos. No Brasil e

no Uruguai estão localizadas dentro dos princípios

constitucionais, ou seja, os tratados de integração influem

todo o ordenamento jurídico brasileiro e o mesmo acontece com

a Constituição Uruguaia.

A segunda conclusão em relação a isso é que

ambos constituintes do Uruguai e do Paraguai distinguem os

tratados de integração e dos tratados clássicos, e assim são

regulamentados por diferentes posições. Para o constituinte

dos dois países os tratados de integração se distinguem dos

tratados clássicos, a razão disso é que tem diferentes

efeitos. Um dos efeitos que deve ser reconhecido, porque esse

é um dos princípios basilares do princípio de integração, é a

aplicação do Direito das normas. Isso está reconhecido de

alguma forma. Vocês devem pensar, por exemplo, nos

protocolos adicionais, subscritos no âmbito da LAD, nenhum

dos quatro países geralmente passam através dos parlamentos.

Ou seja, as normas do Mercosul que estão protocolizadas pela

LAD como protocolos adicionais ao art. 18 são colocados em

vigência a nível interno, através dos poderes executivos.

Bom isso era o que queria colocar.

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Muito obrigada por ter me dado uso da palavra.

O SENHOR JOSÉ ANTONIO MORENO RUFFINELLI

(PRESIDENTE DO TRIBUNAL PERMANENTE DE REVISÃO DO MERCOSUL) –

Eu gostaria de fazer uso da palavra para reafirmar que as

assimetrias, as quais fazemos sempre referência, são mais de

palavras do que de conceitos, porque, conceitualmente, as

quatros Constituições estão de acordo que devemos levar

adiante o processo de integração. Inclusive, na Constituição

Brasileira se fala de processo de integração na comunidade

latino-americana de nações. O que está se concretizando,

brevemente, na Reunião de Cusco, daqui uns vinte dias. De

modo que, eu acredito que a assimetria, que foi

conceitualizada com uma diferença, está simplesmente colocada

nesse tipo de questão.

Outro tema que gostaria de tocar é o da

participação parlamentar que é muito delicado a ser

contemplado nesta situação. Os parlamentos, geralmente, não

participam nas negociações internacionais, elas são feitas

através das chancelarias, porque todas as constituições estão

de acordo e o presidente da república é aquele quem dirige as

relações internacionais de nosso país.

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Então, através de um mecanismo criado no

Mercosul, o da comunicação permanente entre o parlamento e o

conselho do Mercado Comum, a questão fica solucionada

grandemente. Porque, todavia, o parlamento tem outros

mecanismos para solicitar relatórios ou perguntas se eles não

forem devidamente informados ou não estiverem de acordo com

as decisões que são tomadas.

De tal forma, é necessário criar uma relação

que seja suficientemente harmônica, mas que não impeça os

avanço das negociações, porque sabemos que, em matéria de

negociações internacionais, as velocidades são muito

diferentes em relação àquelas que se têm através dos

parlamentos. Eles têm um ritmo diferente das negociações

internacionais, que devem ser levados em conta pela

necessidade e urgência que têm de tomar decisões em matéria

internacional.

Então, de acordo com os demais oradores no uso

da palavra, creio que devemos insistir que a interpretação de

nossas cortes supremas seja de acordo e uniforme no sentido

de dar um apoio substancial ao processo de integração.

Muito obrigado.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Mais uma pergunta?

Peço-lhe que se identifique.

O SENHOR PROFESSOR JAIME CÉSAR LIPOVETZKY– Bom

dia. Fui convidado a participar desse evento como observador,

mas gostaria de informar-lhes que sou presidente da Sociedade

Argentina de Direito Trabalhista e da Sociedade Latino-

Americana de Direito do Trabalho e Integração Internacional.

Gostaria de colocar de forma pessoal e

refletindo o pensamento das entidades as quais pertenço. Nós

estamos muito preocupados com esse processo de integração e,

na maioria dos processos que estão em desenvolvimento na

Argentina e em outros países, insistimos em estabelecer o

estudo desse ramo do Direito com o tema da integração

internacional, que nós consideramos indissolúveis.

Então, estamos dando grande importância à

necessidade de manter e levar adiante o processo de

integração do Mercosul e das propostas de um grupo da América

Latina. Temos uma grande preocupação com as idéias que giram

em torno desse tema. A nossa preocupação é comum com a de um

representante extraordinário do Direito brasileiro. Nós

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coincidimos com as idéias de harmonizar a legislação para

encontrar o uso de uma atividade comum que se contradiz com

as diferenças reconhecidas através da história de nosso país,

que são as diferenças culturais, históricas e tradicionais,

fundamentalmente nas condições de produção de diferentes

países, que são reconhecíveis e que têm a ver com a diferente

história por que passaram esses países, mas que não pode ser

um empecilho para integração regional.

Na doutrina dos quatro países existe uma

espécie de tentativa de harmonização. Esse conceito de

harmonização legislativa está silenciando as diferenças entre

os países, porém isso não é suficiente para que os outros,

através de normas superiores, constituam uma concessão que

supere o tema. É possível resolver esse problema da

integração, através de criação de ações normativas superiores

em comum nos quatro países e também através de criação de

órgãos jurídicos supranacionais.

Essas eram as idéias que queria colocar e

acredito que, de alguma forma, representam o pensamento da

maioria desse ramo do Direito, que na Argentina tem uma

grande importância.

Muito obrigado.

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A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Temos mais duas

perguntas. A professora Desy se manifestou inicialmente;

depois, passo a palavra à Ministra.

A SENHORA DAISY DE FREITAS LIMA VENTURA

(CONSULTORA JURÍDICA DA SECRETARIA JURÍDICA DO MERCOSUL) –

Obrigada, Senhora Presidente.

Gostaria apenas de apontar um elemento de

reflexão relativamente à interpretação do parágrafo único do

art. 4º da Constituição Brasileira. Um dispositivo

constitucional não pode criar um tribunal supranacional,

sequer pode instituir princípios que vinculem a outros

Estados. Portanto, o que pode fazer uma constituição é

permitir a participação do nosso Estado num tribunal ou a

subscrição desses princípios. Ora, isso se faz como em

técnica constitucional? Através de uma cláusula

programática. Essa cláusula programática já existe e se

refere à existência de uma comunidade de nações. O que

significaria, no Direito brasileiro, a expressão comunidade

de nações? Não há uma identidade própria desse conceito no

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nosso ordenamento pátrio; veríamos, no Direito comparado, o

que é uma comunidade de nações. Recorremos ao ordenamento

Andino, recorremos ao ordenamento Europeu e temos claro que

essa comunidade implica na criação de uma jurisdição

comunitária e na subscrição de certos princípios.

Por isso o elemento que eu traria como

questionamento é: querer detalhar a Constituição brasileira e

trazer explicitamente o permissivo de participação em dado

tribunal, ou a subscrição de certos princípios não seria

expressar uma visão sobre a Constituição que temos criticado

tão intensamente? A visão de que, na Constituição, tudo deve

estar detalhado. Com isso, neste mosaico imenso de normas,

que é a Constituição brasileira, não perderia uma parte de

sua força normativa.

Obrigada.

A SRS. MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-PRESIDENTE

DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigada.

Passo a palavra.

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A SENHORA MINISTRA MARIA CRISTINA BOLDORINI

(COMISSÃO DE REPRESENTANTES PERMANENTES DO MERCOSUL) – Muito

obrigada.

Gostaria de destacar que a Constituição do

Uruguai quando assinala a inconstância da interpretação

dinâmica dos textos constitucionais da Convenção de Viena.

Porque há dificuldades para se fazer uma reforma

constitucional. Acredito que esse é o princípio que deveria

abranger uma interpretação dinâmica, seja da Convenção de

Viena e dos textos constitucionais. Por exemplo, temos

resultados concretos nesse sentido. Primeiro, na Constituição

do Tribunal Permanente, se um Estado do Brasil dita uma lei

que seja contrária aos compromissos do Mercosul,

imediatamente será levada ao Tribunal de Solução de

Controvérsias, que irá dispor de uma lei ou um levantamento

da medida que é inconsistente com os compromissos do

Mercosul. Ou seja, foi feita uma interpretação dinâmica. Por

outro lado, creio a lei proposta pelo Brasil, será resolvida

com a Corte Constitucional, que irá resolver através de uma

comissão.

Assim, trabalhos numa linha para que,

realmente, exista poucas possibilidades para que um Estado,

através de uma lei, deixe de lado os compromissos firmados

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com o Mercosul. Em quatorze anos, isso nunca aconteceu; nunca

tivemos, realmente, esse tipo de problema.

Então, quais seriam os temas em que deveríamos

trabalhar? Justamente nas interpretações cada vez mais

dinâmicas, que nos permita avançar em determinados

compromissos, por exemplo, ir diretamente a uma aplicação de

uma norma, que não precise de tratamento parlamentar, e assim

ir eliminando as dificuldades que são enfrentadas, hoje em

dia, no Mercosul.

Em último lugar, gostaria de assinalar que

existem dois aspectos que, também, estão colaborando muito

nessa interpretação dinâmica: as opiniões construtivas, que

serão objeto de uma regulamentação imediata, que ajudará

muito aos tribunais com a colaboração do Tribunal Permanente.

O Mercosul conta com um sistema de solução de

controvérsias, com fortalecimento na parte legislativa quanto

às opiniões construtivas; e o que ficaria pendente seria um

foro das Cortes Supremas, institucionalizadas pelo Mercosul.

Esses Encontros são para cooperação, mas estão

fora do ordenamento do Mercosul.

Para completar, gostaria que esses Encontros

fossem realizados dentro de uma instituição do Mercosul, como

a Comissão de Corte, uma Reunião de Direito de Corte, para

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que tudo isso pudesse ser utilizado pelos tribunais nacionais

e organismos do Mercosul.

Muito obrigada.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigada,

Dra. Maria Cristina.

Mais alguma intervenção?

Passo a palavra ao Ministro Caputo Bastos.

O SENHOR MINISTRO CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS

(TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL) – Senhora Presidente, na

realidade, não vou fazer apenas uma observação também como

participante, mas necessariamente como membro da Coordenação

Científica.

Parece-me que, nesse tema das assimetrias

constitucionais, há uma significativa posição de que não

necessariamente se constitui um problema a eventual omissão,

tanto na Constituição brasileira quanto na Constituição

uruguaia, de que isso seja um obstáculo para que possamos

avançar. Desde a sua primeira colocação, Ministro Gilmar

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Mendes, Coordenador do nosso Grupo, Professor Luiz Roberto

Barroso também já havia comentado o tema, parece-me que,

dentro de uma perspectiva de interpretação construtiva, isso

seria possível que avançássemos no tema.

Eu me recordo que, também, em se tratando de

Poder Judiciário - exatamente, através dos órgãos de cúpula

do Poder Judiciário -, em momento algum, desde que os

americanos, através do famoso caso Marmory x Madison,

revelaram a Teoria dos Poderes Implícitos, nunca houve

necessidade, em constituição alguma que estivesse à

disposição, de os poderes judiciários nacionais fazer o

controle de constitucionalidade. Não havia, até aquela época,

nenhuma disposição, nenhuma norma de ordem constitucional que

permitisse ou facultasse aos poderes judiciários assim o

exercer. De maneira que m talvez esteja aí uma reflexão que a

Coordenação Científica devesse considerar com relação à

questão das assimetrias constitucionais.

Como disse também o Professor Alejandro

Perotti, - e isso está inclusive expresso quando a Ministra

Ellen e eu subscrevemos a sugestão de organização desse

evento ao Presidente Jobim -, não há nenhuma preocupação ou

nenhuma intenção de que os Estados venham a ter constituições

com o mesmo dispositivo. É evidente que cada País, dentro do

âmbito do seu território, irá revelar aquilo que é o anseio

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dos seus cidadãos. Agora, é certo - e isso também facilita um

pouco a atuação dos próprios poderes judiciários quando vão

aplicar essas normas - que isso esteja da maneira mais clara

possível, quer dizer, se for necessária uma reforma

constitucional, que se faça. Se essa reforma é difícil de ser

feita, então, quem sabe, aí, dentro da sensibilidade de cada

Corte, a gente possa avançar não só na interpretação

construtiva do que já existe no texto constitucional ou

valendo-se de outros também instrumentos de muita substância,

por exemplo, como é a convenção de Viena - embora o Brasil,

com relação a esse tópico, ainda esteja também omisso, porque

a convenção de Viena sobre Direitos e tratados ainda não

mereceu aprovação do Legislativo brasileiro.

Gostaria apenas de fazer uma outra observação,

que também foi objeto da manifestação do nosso querido

Professor Wilfrido Fernandes. Acho que estamos, também,

caminhando – e isso fica como reflexão para a Coordenação

Científica – no sentido da necessidade de, de alguma maneira,

criarmos um mecanismo institucional que coordene as ações do

Estado no plano internacional. Pelo que nós verificamos

quando fizemos o trabalho do Grupo 1, as constituições dos

quatro países - pelo menos que foram mais diretamente

observadas, da Argentina, Uruguai, Paraguai e brasileira -

têm disposições muito semelhantes com relação à competência

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do poder executivo para conduzir as relações internacionais,

à competência dos poderes legislativos para aprovar o fruto

dessas negociações e, em nenhuma delas praticamente, a não

ser naquilo que dispõe sobre o controle de

constitucionalidade, nenhum papel, em princípio, é atribuído

aos poderes judiciários.

Eu acho que se nós tivermos em consideração

que todas essas negociações, todos esses tratados,

representam um compromisso de Estado - e compromisso de

Estado envolve efetivamente os três poderes constituídos:

legislativo, judiciário e executivo -, nós deveríamos, pelo

menos, ainda que em uma visão prospectiva, imaginar que algum

instrumento de interação deveria haver entre esses três

poderes antes que nós tivéssemos um tratado concluído e que,

no futuro, esse tratado pudesse ser objeto de algum

questionamento.

Concordo também, de uma certa maneira, com o

Professor Ricardo Alonso, quando fala que talvez o controle

prévio não vá eliminar o controle posterior na aplicação

dessas normas, sem dúvida nenhuma. Quem examina o exemplo

europeu sabe que, não obstante você ter no Tribunal de

Justiça das Comunidades Européias, o órgão que normalmente dá

a interpretação que deveria ter uma aplicação uniforme em

todos os Estados-membros, na realidade, o juízo europeu, por

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excelência, é o juízo nacional. E é através do mecanismo de

procedimentos perante os tribunais nacionais que vamos ter ou

não a aplicação do Direito Comunitário Europeu.

Eram essas as observações que gostaria de

fazer.

Muito obrigado.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (VICE-

PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigada,

Ministro Caputo Bastos.

Creio que agora chegamos àquele momento em

que devemos encerrar os trabalhos deste primeiro Grupo.

Na seqüência, os seus integrantes haverão de,

sob a relatoria e coordenação do Ministro Gilmar Mendes,

tratar de compendiar tudo aquilo que foi discutido, foi

resultado das nossas reflexões desta manhã para, ao final,

apresentarem esse relatório parcial.

Nós devemos agora, em nome do Ministro Nelson

Jobim, agradecer a participação e atuação dos integrantes

desta mesa, que conseguiram algo que a mim me parecia muito

difícil, ou seja, em um tema já bastante discutido como este

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de assimetrias constitucionais, onde parecia que tudo o que

foi dito já havia sido publicado, conseguiram Suas

Excelências fazer avançar o tema com a participação brilhante

deste plenário.

Eu parabenizo os integrantes do Grupo e, antes

de encerrar, quero convidar a todos os presentes para o

almoço que será servido no restaurante do Supremo Tribunal

Federal.

Aguardamos o retorno de todos a esta mesma

sala às 14:30.

Está encerrada esta sessão.

Muito obrigada.

###

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Reiniciando os trabalhos deste primeiro dia do II Encontro de

Cortes Supremas dos Estados-Partes e Associados do Mercosul,

informamos que compõem a Mesa as seguintes autoridades:

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O Excelentíssimo Senhor Ministro Carlos Ayres

Britto, do Supremo Tribunal Federal; Excelentíssimo Senhor

Ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal;

Excelentíssimo Senhor Victor José Raúl Torres Kirmser, Vice-

Presidente da Corte Suprema de Justiça do Paraguai;

Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de Nolasco,

representante da Corte Suprema de Justiça da Argentina;

Excelentíssimo Senhor Leslie Van Rompaey Servillo, Presidente

da Corte Suprema do Uruguai; Excelentíssimo Dr. Antenor

Madruga, Relator do Grupo II, Cooperação Judiciária;

Excelentíssimo Senhor Ministro Ari Pargendler, do Superior

Tribunal de Justiça e Coordenador Científico do Encontro.

Senhoras e senhores, com a palavra o

Excelentíssimo Senhor Ministro Carlos Britto, do Supremo

Tribunal Federal, para conduzir os trabalhos desta tarde.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Boa tarde para todos.

É com muita alegria pessoal e muita honra

profissional e, porque não dizer, cívica, que presido os

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trabalhos desta nossa Sessão vespertina, melhor dizendo,

reiniciando os trabalhos ontem começados.

Antes de passar a palavra para o primeiro

expositor, o Ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal

Federal, permito-me dizer algumas brevíssimas palavras sobre

uma característica da Constituição brasileira de 1988, que,

desde o seu preâmbulo, já fala da sociedade brasileira como

voltada para a solução pacífica das controvérsias. Uma

sociedade, diz a nossa Constituição, pluralista, fraterna,

sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida,

assim na ordem interna como na ordem internacional, com a

solução pacífica das controvérsias.

Esse propósito, de pugnar por uma solução

pacífica dos conflitos, volta à preocupação do legislador

constituinte brasileiro, já sob a forma de princípio regente

das relações internacionais do Brasil. É exatamente o inciso

VII, do art. 4º da nossa Constituição, logo após falar a

nossa Lei Maior de defesa da paz e, em seguida, de cooperação

entre os povos para o progresso da humanidade.

Mas não ficou nisso a nossa Constituição,

nesse mesmo art. 4º - que consubstancia os princípios

regentes de todas as relações internacionais do Brasil -, no

seu parágrafo único, adota uma estratégia de ação, uma

espécie de metodologia de trabalho para que os princípios

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regentes de nossas relações internacionais sejam efetivados

com fidedignidade.

A nossa Constituição diz, literalmente, que:

“A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, - e arremata a nossa Constituição, dizendo qual é o objetivo dessa integração política, social, econômica e cultural dos povos da América Latina -, “visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.”

Vale dizer, a nossa Constituição pugna pela

formação permanente mais do que de uma associação, mas de uma

comunidade latino-americana de nações. Comunidade, todos

sabem, é uma palavra que significa comum unidade, ou comunhão

de vida, uma vida associativa, muito mais do que meramente

mecânica, linear, verdadeiramente orgânica, comprometida.

Então, a nossa Constituição faz, por exemplo,

do Mercosul, incorporando países que são partes do pacto e

países associados, uma obrigatória trilha, um obrigatório

caminho governamental a seguir. É um dos aspectos pelos quais

a nossa Constituição brasileira ganha o título de Dirigente,

porque ela se dispõe a dirigir o núcleo político do Poder. Em

outras palavras, é uma Constituição que pretende governar a

quem governa, dirigir a quem dirige, nessa perspectiva da

formação de uma comunidade latino-americana de nações; e, aí,

quem sabe, teremos associativamente, organicamente, a

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oportunidade de experimentar a reinvenção como um estilo de

vida, a nos possibilitar, a todos nós, irmãos Latino-

americanos, um renascer constante dentro de nós mesmos. O

instrumental brasileiro de que dispomos, temos como

excelente: é essa Constituição redentora de 1988.

Com estas breves palavras, saúdo,

carinhosamente, respeitosamente, todas as pessoas presentes e

dou seqüência à programação do Encontro, passando a palavra

ao meu eminente Colega de Supremo Tribunal Federal Ministro

Cezar Peluso, que falará por trinta minutos.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL)– Senhor Presidente, Srs. Ministros e demais

autoridades presentes. Não vou falar por trinta minutos, mas

vou falar por um minuto, simplesmente para avançar que o

Grupo suscitou aquelas que me pareceram ser as questões mais

importantes da temática da cooperação judiciária e que, até

por coincidência muito oportuna, no momento em que às

vésperas da promulgação da emenda constitucional que desloca

a competência para os exequatur do Supremo Tribunal Federal

para o Superior Tribunal de Justiça, vão desde a questão dos

fundamentos da cooperação judiciária, cujas respostas podem

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explicar certas soluções tidas por insatisfatórias, até à

questão da aturada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

sobre a não concessão de exequatur das cartas rogatórias de

caráter executório; depois até, um dos temas mais

importantes, da própria questão das medidas executórias de

caráter cautelares. Para isso, passo a palavra ao Professor

Antenor Madruga.

O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA – Obrigado

Ministro Peluso, Ministro Carlos Ayres.

Objetivamente o Grupo, em nome do Brasil,

analisou os problemas sob três pontos que são as perguntas

colocadas e distribuídas.

A primeira questão é se o conjunto normativo

atual é suficiente para promover ampla cooperação judiciária

entre os Estados-Partes e associados do Mercosul. A segunda

questão é, se na cooperação judiciária, no âmbito do

Mercosul, seria desejável que o exame prévio de ofensa à

ordem pública e à soberania para concessão de exequatur ou

homologação de sentença estrangeira fosse realizado de

maneira difusa. E a terceira questão, se diante das

constituições dos Estados-Partes do Mercosul, é possível

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homologar sentenças estrangeiras para efeitos penais como o

confisco, impedimento de bens ou aplicação de penas

restritivas de liberdade. Caminhando essas três questões,

ocorre-me, em primeiro lugar, demonstrar o que pensa o

Supremo Tribunal Federal sobre a questão da cooperação

jurídica internacional.

A leitura da decisão do Supremo Tribunal

Federal, na Carta Rogatória nº 10.484, que foi julgada há

pouco mais de 1 ano, em 23 de outubro de 2003, demonstra a

sua posição em relação a cartas rogatórias, que o próprio

Tribunal classifica como de efeitos executórios ou cartas

rogatórias executórias. No exemplo dessa carta rogatória

mencionada, a Suíça pedia cooperação ao Brasil para obter a

quebra de sigilo bancário e seqüestro de bens no Brasil, que

eram medidas indispensáveis para uma investigação que a Suíça

conduzia sobre o tráfico de mulheres do Brasil para a Suíça.

A posição do Supremo, neste caso, foi a seguinte: “As

diligências de seqüestro de bens e quebra de sigilo de dados,

além de atentar contra a ordem pública, possuem caráter

executório, o que inviabiliza a concessão do exequatur”. Ou

seja, essa não é uma decisão isolada do Supremo, é uma

aplicação reiterada da jurisprudência, em que o Supremo vem

negando cooperação internacional, tendo em vista o caráter

executório das decisões.

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Isso tem causado alguns problemas para o

Brasil porque a carta rogatória é também um meio pelo qual o

Brasil pede cooperação a vários outros Estados e há essa

jurisprudência do Supremo. Tem sido mais fácil obter, e é um

paradoxo, cooperação internacional do Brasil para extradição

de pessoas do que para quebra do seu sigilo bancário ou para

o seqüestro de bens.

Alguém poderia dizer que o Supremo não fecha

as portas da cooperação, apenas indica que essas medidas, de

caráter executório, deveriam tramitar pelo procedimento

específico de homologação de sentenças estrangeiras, previsto

no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Ocorre que

o Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, no que diz

respeito à homologação de sentença estrangeira, presta-se,

pelos seus próprios fundamentos, para homologação de

sentenças terminativas, não à homologação de decisões de

medidas cautelares, de decisões que dão início ao processo ou

de decisões interlocutórias. Por exemplo, o Regimento exige a

citação da parte contrária, o trânsito em julgado da decisão

a ser homologada, de forma que não se pode pensar que esse

procedimento seja utilizado para autorizar uma quebra de

sigilos bancários ou determinar uma medida cautelar.

Nessa seara há uma mudança em vista - como bem

lembrou o Ministro Cezar Pelluso - a partir do dia 08, quando

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há de ser promulgada a reforma do Poder Judiciário, na qual

essa competência passa a ser do Superior Tribunal de Justiça,

que vai receber não apenas a competência como também a

herança dessa jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Então, em relação ao primeiro ponto, o Brasil tem essa

dificuldade.

No que diz respeito ao Mercosul,

especificamente, o Supremo Tribunal Federal tem entendido

que, diante de acordos internacionais – a exemplo dos acordos

que pautam a cooperação no âmbito Mercosul, tanto em matéria

penal quanto em cível -, é possível haver medidas cautelares

ou cartas rogatórias que solicitem medidas cautelares de

efeito executório. Ou seja, no âmbito do Mercosul, esse

problema é diminuído.

Curiosamente, entretanto, essa jurisprudência

do Supremo Tribunal Federal contradiz a sua própria linha de

argumentação para negar a cooperação aos demais países. Por

quê? Se, de fato, a concessão de exequatur a cartas

rogatórias viola a ordem pública ou a soberania – como quer o

Supremo nos demais casos -, não poderia um acordo

internacional autorizar uma violação à ordem pública ou à

soberania.

De forma que, no tocante, ao Mercosul,

especificamente, no primeiro tema, a posição do Brasil, em

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relação aos países do Mercosul, é de certa maneira

confortável, porque, diferente dos demais países com os quais

o Brasil não tem acordo, permite-se que a decisão estrangeira

venha ao Brasil e seja válida e executada por meio de uma

carta rogatória ou de qualquer outro pedido – seja o nome que

for – de um juiz a outro.

Em relação à segunda pergunta: na cooperação

judiciária, no âmbito do Mercosul, seria desejável que o

exame prévio de ofensa à ordem pública ou à soberania, para a

concessão de exequatur ou homologação de sentença

estrangeira, fosse realizado de maneira difusa?

O grupo entendeu que a posição atual do Brasil

de concentrar esse juízo de delibação – hoje, no Supremo e,

amanha, no STJ - é um sistema que não encontra guarida na

maior parte dos países e que leva importantes tribunais, como

a nossa Corte Constitucional e o nosso Superior Tribunal de

Justiça, a terem que se preocupar com casos tais como:

homologação de sentenças de divórcio ou atos de mero

expediente.

O fato é que isso assim permanece, a despeito

de alguns tratados – inclusive no âmbito do Mercosul –

permitirem o envio direto, por exemplo, de cartas rogatórias

nas regiões de fronteiras, de juiz a juiz. O Supremo já

considerou isso inconstitucional, tendo em vista a regra do

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art. 102, “h”, que determina a competência do Supremo

Tribunal Federal para homologar cartas rogatórias. De forma

que, se um juiz na fronteira com o Brasil tem que mandar uma

carta e precisa ouvir uma testemunha ou citar alguém no outro

lado da fronteira, deve mandar essa carta rogatória para

Brasília; Brasília a manda para Montevidéu – no caso do

Uruguai -; dá-se o exequatur; e vai para a fronteira, para o

juiz do outro lado da rua. Isso tem acontecido e a idéia de

se transformar esse juízo de delibação concentrado em um de

delibação difuso não deve ser muito estranho, porque, por

exemplo, a Lei de Introdução, no seu art. 17, estabelece:

“Art. 17 - As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.”

No que diz respeito a atos e sentenças, isso

passa por um juízo de delibação concentrado, mas o juiz

brasileiro, todos os dias, aplica lei estrangeira fazendo

esse mesmo juízo de violação à ordem pública, à soberania e

aos bons costumes – como quer a lei – sem que isso seja de

maneira difusa, e o faz muito bem. Há, claro, pontos

positivos na concentração e há pontos positivos em tornar

esse juízo difuso, mas o consenso no Grupo é que o ideal

seria isso passar a ser exercido de maneira difusa.

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Por fim, a última pergunta, último ponto para

consideração: diante das constituições dos Estados-Partes do

Mercosul, é possível homologar sentenças estrangeiras para

efeitos penais, como confisco, impedimento de bens ou

aplicação de penas restritivas de liberdade?

Alguém já disse que aplicação de Direito

Público de outro Estado é um verdadeiro tabu. O Brasil

permite a homologação de sentenças penais estrangeiras

basicamente para aplicação de medida de segurança e por seus

efeitos cíveis. Portanto, não permite a homologação de

sentenças penais estrangeiras, o que não condiz, atualmente,

com a demanda que esse mundo globalizado, esse mundo veloz

exige para dar efetividade ao próprio poder jurisdicional de

cada um dos Estados.

No âmbito da União Européia já se faz a

homologação das sentenças penais estrangeiras, mais e mais a

questão do impedimento de bens, a homologação do efeito penal

de impedimento de bens é necessário como o combate ao crime

como a lavagem do dinheiro. De forma a pergunta que se coloca

é a seguinte: se diante das Constituições dos Estados-Partes

do Mercosul, é possível? No caso do Brasil, o que se

interpreta é que há uma disposição infraconstitucional,

apenas à disposição do Código Penal, mas não haveria nenhum

óbice, salvo melhor juízo, que um tratado possa permitir a

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homologação de sentenças penais estrangeiras para efeito como

confisco, impedimento de bens ou mesmo aplicação de penas

restritivas de liberdade.

Quando se vê, por exemplo, a transferência de

pessoas apenas – isso já é bastante comum -, nada mais é do

que o cumprimento no Brasil de uma sentença penal

estrangeira.

São essas, Senhor Presidente, as observações

que eu tinha a fazer em nome do Grupo.

Obrigado.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Como o Professor Madruga foi extremamente

rápido, a Professora Nádia de Araújo, Pontífice da

Universidade Católica do Rio Janeiro, vai ser mais. Por

favor.

A SENHORA NÁDIA DE ARAÚJO (PONTÍFICE DA

UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO DE JANEIRO) – Boa tarde a todos.

Senhor Presidente, procurarei ser breve, porque a idéia deste

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Encontro, na verdade, não são palestras, são apenas

colocações as mais diretas possíveis.

O Ministro Ayres Britto falou dessa comunidade

orgânica de nações e, justamente, essa organicidade gera

inúmeros problemas para os particulares. No dia-a-dia do

Mercosul e da solução de controvérsias há um enorme vácuo

para o dia-a-dia dos particulares. E com a intensidade da

integração, evidentemente, temos mais contratos, mais trocas

pela internet; na área de família, que é uma área muito

ativa, mais casamentos, mais separações e problemas relativos

a questões de alimentos, a menores e tantos outros.

No sistema da cooperação, muito pouco se

avançou. Esse Mercosul jurídico relativo à cooperação, na

verdade, é Mercosul que avançou, é o Mercosul que, eu diria,

funciona. Até quando se fala na morte do Mercosul, nas

dificuldades do Mercosul, relançamento do Mercosul, esquece-

se que, desde os anos 90, estão em vigor: Protocolo de Las

Leñas, utilizado, amiúde, pelo Supremo, o Protocolo de

Medidas Cautelares e o Protocolo de Buenos Aires sobre

jurisdição nacional, além de toda uma normativa harmonizada

do Direito Internacional Privado, proveniente da OEA, das

Convenções Interamericanas, que muitas vezes já estão

internalizadas nos quatro Países.

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Então, há muita uniformidade nessa área dos

problemas transnacionais no Mercosul e a cooperação jurídica

internacional assume um papel fundamental nesse dia-a-dia.

Ora, no Brasil há uma tradição extensa do papel do Supremo

Tribunal Federal na cooperação internacional. O Supremo

sempre teve o controle concentrado nas cartas rogatórias e

sentenças estrangeiras; e, talvez, para muito países, onde

faz parte de uma obrigação da primeira instância, receber uma

citação para um cidadão proveniente de um outro Estado, no

Brasil, no séc. XIX, já havia essa tradição e o exequatur foi

uma reação a enorme número de advogados portugueses e

ingleses, na época ainda da conservatória, que colocavam

debaixo dos braços as cartas rogatórias e vinham aqui citar,

cumprir medidas de caráter executório, etc. Essa reação, na

época, da administração e, depois, passando-se essa

competência para o Judiciário, a fim de se fazer um controle

prévio, foi uma reação, justamente, a uma atitude

desconhecida, mas não se pode dizer que o momento atual é o

mesmo do séc. XIX. O dia-a-dia de cooperação entre os Poderes

Judiciários é uma realidade e são necessários instrumentos

cada vez mais ágeis. Dizia-me um colega do Uruguai da

dificuldade de, num divórcio, citar-se uma pessoa no Brasil,

levando quatro, cinco meses. Tem-se que colocar uma carta

rogatória no Supremo Tribunal Federal, órgão que tem, em seus

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afazeres, uma enorme gama de ações e de problemas da maior

importância, e, afinal, aquela citação não pode ir adiante

sem esse momento prévio no Supremo.

Mas os casos de mero trâmite são relativamente

fáceis. Como bem acentuou o Professor Madruga, há duas

questões muito importantes de se apontar, principalmente

nesse momento de troca de competência, onde certamente o

Superior Tribunal de Justiça se valerá da experiência

cumulada pelo Supremo Tribunal Federal.

O primeiro é nas medidas de caráter

executório. Na Década de 1980, o Ministro Neder negou uma

carta rogatória com caráter executório, dizendo que aquilo

era uma maneira de se evitar a homologação. A homologação de

uma sentença estrangeira exige o trânsito em julgado, exige a

citação da pessoa, uma série de garantias. Portanto, a carta

rogatória, que é mais célere, não podia ter um efeito

dependente da sentença. Estava correto o Ministro naquele

caso concreto, e disse que aquilo era contra a nossa ordem

pública. Todavia, não se passou por uma generalização desse

conceito. É verdade que se diga: a Lei nº 221, ainda de 1894,

também dizia que não se devia dar exequatur às cartas

rogatórias de caráter executório; então, havia toda uma

história de utilização contra medidas desse caráter.

Continuou-se a utilizar a ordem pública quase como um carimbo

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vermelho contra tudo que viesse com esse caráter executório.

E não se fez uma análise de mérito, caso a caso, daquelas

hipóteses em que, de fato, a medida de urgência não depende

de sentença: o caso de alimentos provisionais, não há

sentença ainda; o caso de um arresto de bens; o caso de uma

medida garantidora do processo. Tantas são as hipóteses em

que a carta rogatória tem uma finalidade de reparar uma

situação de urgência, em que há uma situação a exigir uma

medida mais rápida. Há também os casos de quebra de sigilo

bancário, conforme ressaltado pelo Professor Antenor. Nesse

aspecto, a jurisprudência do Supremo não evoluiu por uma

análise caso a caso da ordem pública. Porque, afinal, o que é

ordem pública? Ela é o que diz o juiz, é a noção média de

justiça. Há sempre essa balança entre a ordem pública e a

aplicação da lei estrangeira. Manda a nossa lei de introdução

aplicarmos a lei estrangeira nos casos que ela indica. De

forma indireta, o Supremo Tribunal faz isso quando exerce

esse controle nas cartas rogatórias e sentenças estrangeiras.

Porém, há sempre também a válvula de escape da ordem pública,

mas, a meu entender, ela não deve ser vista como algo

negativo, apenas para impedir a aplicação da lei, senão como

algo positivo presente em todos os casos. Todas as vezes que

o Supremo Tribunal Federal e futuramente o STJ debruçam-se

sobre um caso enfocando a questão da ordem pública, ele está

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vendo se é contra ou a favor. Então, há um aspecto positivo,

e aplicar o Direito estrangeiro certamente é dar um efeito

positivo à ordem pública.

No caso das medidas cautelares, abrandou-se

aquela jurisprudência de total impossibilidade, com

existência dos tratados internacionais. Isso, de certa forma,

deixou de fazer sentido no sistema, porque, então, só por ser

tratado não é mais contra a ordem pública? Ficou essa

questão, a meu ver, mal resolvida e a merecer uma nova

posição, agora certamente do STJ.

Quero apontar também a questão de medidas

cautelares no curso da sentença estrangeira. Ora, esse caso

apareceu no Supremo. É muito raro, são seis ou sete apenas,

sendo que o primeiro é da década de 1980, em uma Sentença

Estrangeira nº 3.408, havia um pedido de homologação do

divórcio, havia um acordo sobre partilha de bens - que era

parte desse acordo -, e a parte requerente, no curso da

homologação - ela se estendeu, houve vários pareceres e foi

bastante demorada -, teve temor de os bens se dissiparem,

porque houve um inventário em São Paulo, o dinheiro estava

ali e, de repente, o inventário se aprontou. A parte pediu

arresto desses bens para garantir que, quando a sentença

fosse homologada, houvesse bens para o cumprimento. O Supremo

entendeu que a decisão estrangeira só tem eficácia depois da

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homologação e que era de todo impossível dar qualquer medida

antes desse momento. Essa decisão não levou em consideração

ser a sentença estrangeira uma ação; o processo de

homologação é uma ação, e, no curso desta, as questões

ligadas ao fumus boni juris e as emergenciais também podem

surgir. No entanto, houve poucos casos, e a questão restou um

pouco submergida, talvez, na extensa jurisprudência.

Mais recentemente, do Ministro Sepúlveda

Pertence, houve a Petição nº 849; no curso da Sentença

Estrangeira nº 4.951, a sentença canadense havia cassado o

Direito de visita à mãe. Esta teria vindo ao Brasil com as

crianças em descumprimento de uma ordem estrangeira, e havia

uma sentença cassando o seu Direito de visita e dizendo que

as crianças deveriam retornar ao Canadá. No curso do

processo, o pai requer já a volta das crianças, o Ministro

Sepúlveda indefere o pedido, mas dá um pedido alternativo,

porque impõe a outra parte o dever de não mudar de endereço

no curso do processo para não causar nenhum prejuízo. Ora,

aqui, diante dos elementos da necessidade da urgência, foi

dado algum tipo de efeito antes da homologação àquela

decisão, mostrando uma evolução na matéria, e os casos mais

recentes dizem respeito a essa questão relativa a menores,

numa certa corrida contra o tempo. São casos corriqueiros.

Hoje, os casais se casam em vários países e, se as coisas não

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dão certo, muitas vezes, a mulher volta para o Brasil com as

crianças. No País de origem, o marido obteve um tipo de

decisão de uma guarda compartilhada, que hoje é muito comum

nos Estados Unidos e no Canadá, enquanto, no Brasil, ainda

temos uma preferência pela mãe e, aqui, a guarda provisória é

dada em vinte e quatro horas. Todo mundo sabe que basta

chegar com o pedido de guarda na justiça estadual e, isso é

comum, rapidamente os juízes darem essa medida cautelar. Aí,

há esse choque entre a decisão estrangeira que foi anterior,

mas que não está homologada, e a decisão brasileira que foi

primeira em relação à homologação. E a Justiça tem oscilado

nesses casos, que são bastante graves e estão a demandar mais

cuidado na sua análise.

Então, eram esses os pontos que eu queria

dizer em relação às perguntas. Entendo que é desejável, como

disse o professor Antenor, que se passe a fazer o controle

difuso, não sei se o STJ está menos sobrecarregado que o

Supremo Tribunal Federal e está disposto a dar a esse assunto

a atenção que ao menos nós professores de Direito

Internacional Privado damos, temos muito carinho por esses

temas. São temas que, claro, não têm o teor do dia-a-dia como

questões do consumidor, não têm o volume, mas que afetam o

dia-a-dia de muitas pessoas e que, de certa maneira, se

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fossem resolvidos de forma mais rápida, dariam maior

transparência, maior contato entre os cidadãos do Mercosul.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDEERAL) – Eu só queria, para efeito de sintetizar,

me referir especificamente à questão das medidas executórias

propriamente ditas, isto é, aquelas resultantes da eficácia

de sentenças e, portanto, seria dificilmente sustentável que

tais medidas pudessem ser cumpridas independentemente do

controle do ajustamento ao ordenamento jurídico de cada país

da sentença cuja medida deva ser executada. Agora, a

professora pontuou, muito bem, que isso nada tem a ver com as

medidas ditas “executórias” e que, na verdade, são medidas

típicas da chamada jurisdição de urgência e cuja definição

tende exatamente a prevenir situações, tendentes a assegurar

a efetividade de uma futura sentença; e, evidentemente, o

cumprimento desses atos, dessas decisões de caráter urgente

não pode ficar na dependência ou não pode ser indeferido a

pretexto de que dependeriam do controle de um ato que ainda

não existe.

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Em terceiro lugar, a questão da ordem pública

- recordo-me da primeira vez em que a palavra ordem pública

foi usada, foi durante a revolução francesa, e quando se

referia à ordem pública, referia-se à ordem social pós-

revolucionária - passou a significar um conjunto quase

indefinível de conceitos para justificar uma série de

respostas, mas que esses chamados critérios de ordem pública

sejam critérios de ordem casuística, isto é, que cada caso

seja examinado à luz dos princípios fundamentais do

ordenamento jurídico, e não invocado de uma maneira genérica

e abstrata para negar o cumprimento de atos de cooperação

internacional.

Finalmente, a questão, que hoje estará mais

afeta ao Superior Tribunal de Justiça, da simplificação das

medidas de caráter instrutório como licitações, notificações,

inquirição de testemunhas, que parecem não poder ter o mesmo

tratamento, algo complexo, das cartas rogatórias que devam

chegar futuramente ao Superior Tribunal de Justiça.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Agradeço a coordenação do eminente

Ministro Cezar Peluso e a participação do Dr. Antenor

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Madruga, que é da Universidade Católica de Brasília, e da

Dra. Nádia de Araújo, do Rio de Janeiro.

A propósito desse conceito ainda impreciso de

ordem pública, realmente, o Ministro Peluso remete a solução

para o dia-a-dia, para a cotidianidade dos casos, porque

doutrina e jurisprudência, no Brasil, ainda não se

conciliaram em torno do que significa, do ponto de vista

jurídico, essa expressão ordem pública, de que a Constituição

faz uso por mais de uma vez. Entretanto, parece-me que em uma

passagem, o art. 144 da Constituição, a propósito de

segurança pública, é possível dizer que a segurança pública

se assenta em dois pilares: um é a incolumidade das pessoas e

do patrimônio; outro é exatamente essa tal de ordem pública

que nos atormenta do ponto de vista dogmático, do ponto de

vista da aplicação jurisdicional quanto ao seu real

significado. Eu, particularmente, estudo Direito

Constitucional e tenho muita tendência para tentar conceituar

cada qual dos institutos, cada qual das instituições de uso

constitucional, mas confesso que, em matéria de ordem

pública, também não tenho praticamente nada a acrescer,

apenas prometo seguir meditando sobre esse tema. Disse muito

bem o Ministro Cezar Peluso.

Neste momento, em seqüência, ouviremos a

palavra do excelentíssimo Senhor José Raúl Torres Kirmser,

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Vice-Presidente da Corte Suprema de Justiça do Paraguai.

Vossa excelência dispõe de 30 minutos também para se

manifestar sobre os temas do roteiro propositivo. Então,

falará seu coordenado, Roberto Ruiz Díaz Labrano.

Muito bem, professor, fique à vontade.

O SENHOR MINISTRO JOSÉ RAÚL TORRES KIRMSER

(VICE-PRESIDENTE DA CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA DO PARAGUAI) -

Respondendo à primeira pergunta que diz, se o conjunto

normativo atual é suficiente para promover a ampla cooperação

judiciária entre os Estados-Partes e associados do Mercosul.

Desde o século passado, deste mesmo século, nos países sul-

americanos, tivemos a assinatura de vários tratados de

cooperação jurídica. No âmbito do Mercosul, temos vários

protocolos assinados entre os Estados-Partes e, também, entre

os Estados-Partes e seus associados. Mas, respondendo a essa

pergunta, eu diria: poderia ser se os Estados-Partes e

associados chegassem a ratificar os protocolos assinados,

porque, aqui, tenho uma longa lista de protocolos que até

hoje ainda não foram ratificados pelos Estados-Partes,

principalmente no que se refere aos países associados. Nós

temos protocolos que não foram ratificados, em particular,

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por exemplo, temos acordos sobre benefícios de assistência

jurídica gratuita entre os Estados-Partes do Mercosul e as

Repúblicas do Chile e da Bolívia, e outros como o Protocolo

de Las Leñas, que ainda não foram ratificados. Mas gostaria

de me referir ao protocolo de cooperação e assistência

jurisdicional em matéria civil, comercial, trabalhista e

administrativa entre os Estados-Partes do Mercosul. Esse

mesmo protocolo, na República da Bolívia e na do Chile,

também não foi ratificado.

O Protocolo de Las Leñas sobre Cooperação e

Assistência Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial,

Trabalhista e Administrativa entre os Estados-Partes do

Mercosul foi aprovado por decisão do Conselho do Mercado

Comum nº 5, de 1992, ratificado pela República da Argentina,

em 03 de julho de 1996, pela República Federativa do Brasil,

em 16 de fevereiro de 1996, pela República do Paraguai, em 12

de setembro de 1995, e pela República Oriental do Uruguai, em

15 de junho de 1998. Atualmente, está vigente entre todos os

que assinaram o Tratado de Assunção.

Como foi assinalado a existência de

instrumentos internacionais sobre o tema, podemos mencionar

como fonte desse protocolo as Convenções Interamericanas do

Panamá, de 1965, sobre cartas rogatórias e recepção de provas

no estrangeiro; as Convenções de Montevidéu, de 1997, sobre a

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recepção de provas no Direito estrangeiro e cartas rogatórias

nos convênios uruguaio, brasileiro e argentino sobre

cooperação jurídica, no ano de 1991.

O que esse protocolo busca é uma adequada

cooperação jurídica entre os Estados-Partes do Tratado de

Assunção de acordo com a administração da justiça de cada um

deles, com o objetivo de coadjuvar o trato eqüitativo de seus

cidadãos e residentes permanentes e facilitar o livre acesso

à jurisdição, em tais Estados, para a defesa de seus Direitos

e interesses em alcançar a segurança jurídica.

Temos aqui, no preâmbulo, que se pretende

alcançar o fortalecimento do processo de integração e

promover e intensificar a cooperação jurídica em matéria

civil, comercial, trabalhista e administrativa, com o

objetivo de contribuir, dessa forma, ao desenvolvimento da

sua relação de integração, baseado nos princípios de respeito

à soberania nacional, à igualdade de Direitos e interesses

recíprocos e, dessa forma, alcançar os objetivos do Tratado

de Assunção.

Esse protocolo prevê a designação de uma

autoridade central, que será nomeada por cada Estado Parte, e

estará, então, encarregada de receber as solicitações de

assistência jurídica.

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Vários são os temas que estão nesse protocolo,

mas, por razões de tempo, mencionaremos apenas o impacto e a

aplicação prática de algumas de suas disposições.

Com relação à aplicação de ofício do Direito

estrangeiro, no Paraguai, o art. 22 do nosso Código Civil

consagra o princípio de que o Direito estrangeiro, sempre que

aplicável, seja incorporado ao nosso regime legal. Então, com

a sua incorporação, os juízes fazem a sua aplicação. Com essa

mudança, com a nossa nova legislação, modificou-se um sistema

totalmente adverso, contrário, onde somente era consagrado

que o Direito estrangeiro poderia ser aplicado a pedido das

partes e com ônus da prova de cada uma das partes. Então,

agora, o juiz deve aplicar o que está na norma vigente. Os

juízes e tribunais aplicarão, de ofício, as leis estrangeiras

sempre que não se oponham às instituições políticas, às leis

da ordem pública, à moral e aos bons costumes, sem prejuízo

das partes, provando a existência e o conteúdo das mesmas.

Esse Protocolo de Las Leñas, de acordo com o

art. 22 do Código Civil paraguaio, facilita a questão

legislando a respeito da informação do Direito estrangeiro.

Com relação ao procedimento para a obtenção de

tal informação, o art. 28 dispõe que as autoridades centrais

dos Estados-Partes fornecerão, em conceito de cooperação

jurídica e sempre que não se oponham às disposições da ordem

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pública, relatórios em matéria civil, comercial, trabalhista,

administrava e de Direito internacional privado, sem nenhum

gasto.

O art. 29 prevê a possibilidade de que a

informação jurídica referida no art. anterior possa ser

efetuada por meio das autoridades diplomáticas ou através do

consulado de cada Estado Parte.

Com relação ao alcance dos relatórios, o

Estado que os forneça não será responsável pela opinião

emitida. Nenhum Estado que os receba estará obrigado a

aplicar ou fazer aplicar o Direito estrangeiro de acordo com

o conteúdo da resposta recebida.

Essas disposições são muito úteis para os

países como o nosso, onde os juízes e os tribunais devem

aplicar, de ofício, as leis estrangeiras, pois elas são

incorporadas no pleno Direito do ordenamento jurídico

vigente.

Com relação à igualdade do trâmite processual

há norma relevante, principalmente no momento atual, pois a

troca comercial e o trânsito de pessoas aumentaram

consideravelmente desde a vigência do Tratado de Assunção. Os

cidadãos e os residentes permanentes de um dos Estados-Partes

gozarão das mesmas condições que os cidadãos e residentes

permanentes de outro Estado Parte de livre acesso à

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jurisdição em tal Estado para a defesa dos seus Direitos e

interesses. O parágrafo precedente, no art. 3º, se aplicará

às pessoas jurídicas constituídas, autorizadas ou registradas

de acordo com as leis de qualquer dos Estados-Partes. Essa

disposição consagra o princípio da igualdade, que no nosso

país tem figura constitucional, já que foi consagrado nos

art.s 46 e 47 da Constituição Nacional. O art. 46 estabelece

a igualdade das pessoas. Consagra o seguinte: Todos os

habitantes da República são iguais em dignidade e Direito.

Dito isto pelos paraguaios, então, não admitimos, portanto,

discriminações. O Estado resolverá os obstáculos e impedirá

os fatores que os propiciem ou os mantenham.

Conseqüentemente a essa igualdade de trâmite

processual, o art. 4º do protocolo consagra o princípio da

exclusão ou da necessidade das imposições das normas

processuais dos países signatários do tratado. Estabelece

essa disposição: nenhuma caução ou depósito, qualquer que

seja sua denominação, poderá ser imposta em razão da

qualidade ou residente de outro Estado Parte. O parágrafo

precedente será aplicado a pessoas jurídicas constituídas e

autorizadas ou registradas de acordo com as leis de qualquer

dos Estados-Partes. Entretanto, o nosso art. 225 do Código

Processual Civil consagra a exigência, mas esse art. 4º a

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derroga com relação aos cidadãos ou entidades jurídicas dos

países integrantes do Mercosul.

Também temos disposições com relação à

cooperação em atividades de trâmite probatórias e em relação

ao reconhecimento e à execução de sentença e de laudos

arbitrais.

É bem verdade que o nosso código processual

estabelece disposições que são quase as mesmas. Vemos aqui,

no art. 2120, que estabelece as exigências para que as

sentenças ou os laudos possam ter eficácia nos países

signatários do Mercosul, com o esclarecimento de que não se

contrariem os princípios de ordem pública do Estado no qual

foi solicitado o reconhecimento ou a execução.

Aqui temos disposições com relação à validade

dos instrumentos públicos realizados nos diferentes países do

Mercosul. O protocolo contempla que é possível fazer valer em

outro país, sem a necessidade de solicitar que os

instrumentos sejam legalizados nos outros países. Mas para

que isso seja viável, deve ser realizado o procedimento por

meio das autoridades centrais. Para nós, paraguaios, e acho

que também para os argentinos, essa norma é muito relevante,

porque ainda não chegamos ao Mercosul, mas o trânsito de

pessoas é intenso. De acordo com dados extra-oficiais, neste

momento, em Buenos Aires, acho que moram mais de quinhentos

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mil paraguaios, e, no Paraguai, centenas de argentinos filhos

de paraguaios, todos sem documentação. Temos, então, as

disposições desse protocolo e vemos que tudo poderia ser

resolvido com relação a documentações por meio de trâmites

das autoridades centrais.

Várias são as disposições e vários são os

tratados. Temos também o Protocolo de São Luis, de 1996/1998,

e outros, mas, por razões de tempo, mencionei apenas algumas

das disposições do Protocolo de Las Leñas.

Agora, passo a palavra para o Professor Dr.

Roberto Ruiz Dias Labrano.

O SENHOR MINISSTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Então, ouviremos o Dr. Roberto.

Obrigado.

O PAROFESSOR ROBERTO RUIZ DÍAZ LABRANO – Muito

obrigado.

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Tenho pouco tempo e terei que ser breve, e

assim facilita muito o trabalho e a tarefa.

Gostaria de agradecer ao Ministro, porque ele

já praticamente mencionou os temas das medidas cautelares.

Vamos ver se com esse pouco tempo eu poderei

falar um pouco das experiências do nosso país, em particular,

e da visão que temos da cooperação jurídica do Mercosul.

Digamos, em primeiro lugar, que a cooperação

jurídica no Mercosul, como foi dito em uma das disposições

anteriores, verdadeiramente é o âmbito dentro no qual tivemos

um progresso extraordinário no Mercosul. Essa aproximação dos

povos e dos Estados se manifestou no tema, particularmente no

da atividade dos Ministérios de Justiça dos Países-membros.

Por meio dos protocolos de cooperação, tivemos

a manifestação de uma das contribuições mais importantes para

aproximar os critérios jurídicos de aplicação e harmonização

legislativa em âmbitos tão importantes como o da cooperação

jurídica internacional.

Esses instrumentos, como vimos, já têm uma

aplicação prática. Entretanto, precisam ainda de certos

elementos, neste momento, de caráter prático que, então, os

Estados, as Cortes Supremas de Justiça dos Países-membros

podem adotar. Temos vários instrumentos jurídicos. Temos as

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dificuldades dos mecanismos de aplicação. Vimos, e falarei

rapidamente sobre algumas diferenças.

O pedido de cartas rogatórias nos Países-

membros, em termos gerais, na Argentina, Paraguai e acho que

no Uruguai também, são canalizadas atualmente por meio da

autoridade central, ou canalizadas por intermédio da Corte

Suprema de Justiça. Elas vão para o juizado de primeira

instância, local onde estão aqueles que examinam se reúnem

essas condições ou requisitos básicos para a sua

aplicabilidade ou viabilidade.

Nós, entretanto, observamos que essa tarefa,

há muito tempo permanece nas mãos do Supremo Tribunal

Federal, no Brasil. Agora, escutei – e acho fantástico – que

isso vai para o Superior Tribunal de Justiça. Há muita lógica

que assim o seja, porque não concebemos no Direito de não

termos uma dupla instância de revisão. É verdade que o

Supremo Tribunal Federal é a última instância, a instância

suprema, mas a garantia essencial de justiça é a dupla

verificação, a dupla instância.

Também temos algumas falhas na Corte Inter-

Americana de Justiça, que estão propugnando anular aquilo que

não obedece a uma dupla instância. Então, aplaudo esse passo

importante dado e vemos o desprendimento do Supremo Tribunal

Federal no que se refere a essa tarefa de revisão das

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rogatórias encaminhadas ao Brasil. Espero que, no futuro,

através dos organismos criados, esse tema seja ainda mais

ágil, inclusive para o controle de atributos essenciais para

os juízes de primeira instância, com a revisão das instâncias

superiores e da constitucionalidade, se assim for necessário.

Os aspectos práticos que se apresentam nessas

questões hoje em dia não são por falta de instrumentação. Os

instrumentos jurídicos estão presentes. Na região, temos

suficientes instrumentos jurídicos para alcançar a cooperação

jurídica, mas o problema é a implementação. Uma implementação

requer, no nosso ponto de vista – e eu já conversei com

algumas pessoas, especialmente com Perotti, a respeito -, de

alguns requisitos e oportunidades como essas, porque aqui

podemos dar saltos quantitativos, qualitativos com relação ao

que pode ser feito. Então, até esse momento, foram os

Ministérios da Justiça que propiciaram os instrumentos

jurídicos. Ainda falta uma instância ou um grupo de

funcionários que pertençam às cortes supremas de Justiça para

harmonizar o sistema de aplicação da cooperação judicial dos

quatro membros.

Acho muito importante que - e já está no Protocolo

de Las Leñas – podemos encontrar a base para a constituição

de um organismo dessa natureza, independente do Mercosul, sem

que os órgãos judiciários nacionais percam a sua competência.

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O que faremos, então, se o órgão é criado? Simplesmente

facilitaria o trabalho dos órgãos judiciais serviriam de

veículo para agilizar a aplicação absolutamente rápida dos

requerimentos e das cartas rogatórias. Então, seria uma

grande contribuição da Corte Suprema de Justiça, que ocuparia

o plano que corresponde atualmente. Assim, temos o sistema

normativo de cooperação jurídica e ainda falta o sistema de

viabilização e aplicação desses instrumentos por meio da

criação desse tipo de órgão. Na prática esse tipo de órgão

seria absolutamente importante. Vou mencionar rapidamente um

exemplo: nenhuma instituição garante contra a corrupção, a

delinqüência que esta exista e, às vezes, por meio dos

instrumentos que recebem os Estados e os órgãos jurídicos,

podemos ver a situação que vimos, na prática, entre Argentina

e o Paraguai no caso concreto. No caso concreto, foram

solicitados uma pensão alimentícia e o reconhecimento de

paternidade na Argentina, sendo que o afetado apresenta como

prova, para demonstrar que não era o pai e que não tinha

obrigação de pensão alimentícia, o certificado de nascimento

legalizado num país estrangeiro. Mediante essa prova,

instrumento público, proveniente de um órgão público

estrangeiro, devidamente legalizado, o juizado de primeira

instância na Argentina não teve alternativa, senão não

reconhecer o instrumento de paternidade por causa também do

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outro tema que mencionei da pensão alimentícia. Dessa forma,

mediante recursos e meios, porque se tratava de uma pessoa

com posses, a certidão de nascimento demonstrando que o pai

dessa criança era outro que vivia no exterior. Então, a

segunda instância confirma e chega ao Supremo Tribunal de

Justiça – e aí está a percepção do Poder Jurídico e do juiz

que deve, então, utilizar, não somente sua inteligência, mas

também não sair do marco legal – e o Ministro do Tribunal de

um dos Estados da Argentina percebeu o que estava por trás.

Percebeu que esse instrumento era falso, mas, como não podia

discutir a legalidade de um instrumento proveniente do

estrangeiro e legalizado e não podia anular este instrumento

sem ter nenhum elemento, portanto, pergunta simplesmente à

Corte Suprema de Justiça para que, por meio desse Tribunal

Supremo de Justiça, o órgão jurisdicional competente do

Paraguai verifique quais são os requisitos necessários na

legislação paraguaia para que um certificado, ou uma certidão

de nascimento seja válido. Assim, fez uma consulta técnica em

função da legislação aplicada e não quanto ao conteúdo. A

conseqüência desse pedido é que o pai não existia, a certidão

de nascimento era falsa e todos os elementos que tinham sido

publicamente apresentados eram falsos e provenientes de

notoriedade judicial do Estado estrangeiro, que tinha

emitido, em princípio, tal documento. Então, o Supremo

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Tribunal de Justiça desse Estado declarou que aquele

instrumento não servia como instrumento de prova, por essas

razões, e se reconheceu a paternidade e, ao mesmo tempo, a

pensão alimentícia.

O que demonstra esse caso? Demonstra que não

estamos isentos desse tipo de coisa, que o que precisamos é

de órgãos ágeis, capazes de detectar e de viabilizar

rapidamente a informação necessária para que os órgãos

judiciais dos nossos Estados, no âmbito de Mercosul e no

âmbito da aplicação da cooperação judicial internacional

sejam o suficientemente expeditivos, mas ágeis e, também,

confiáveis, por meio de órgãos, para que assim seja.

Temos experiências na Argentina de centros de

cooperação jurídica; implementos feitos em outros Estados, no

Paraguai, experiências muito importantes, por intermédio da

Secretaria formada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

É difícil dizer, simplesmente, como uma resposta

concreta para todos os temas possa oferecer cooperação

judiciária internacional.

Esse é o último comentário que falamos a respeito

da ordem pública. A maioria dos convênios e protocolos de

cooperação jurídica internacional fala das violações da ordem

pública, que são expressos de uma forma manifesta, ou seja,

que sejam percebidos de uma forma manifesta. Isso significa,

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em primeiro lugar, que há uma diferente entre a ordem pública

interna e a ordem pública internacional, e, também, há uma

diferença muito importante, que deve ser apreciada pelos

magistrados, com relação à qual ordem pública estamos

falando. Quando falamos de ordem pública internacional,

estamos falando daquilo que, frente ao que o Estado como tal

e a sua relação com outro Estado poderia considerar

verdadeiramente aberrante ou que é contrário à própria

estrutura do sistema jurídico de um Estado. Coisa que na

ordem interna é absolutamente diferente. Por isso as

expressões contidas nos protocolos de cooperação e nas

convenções interamericanas do Direito Internacional Privado

utilizam esta expressão: manifestamente atentem contra a

ordem pública, ou seja, não se trata de uma mera apreciação

de que estamos mediante uma possibilidade de que este

requerimento afete a ordem pública, mas deve ser de uma forma

palpável, de uma forma manifesta que deve despertar, então,

essa sensação, de que verdadeiramente isso é contrário à

ordem jurídica interna.

Penso que esta oportunidade é magnífica para a

proposta, que não é uma proposta da minha iniciativa, mas,

simplesmente, nasce do conteúdo dos próprios instrumentos do

Mercosul. Acho também que é uma magnífica oportunidade para

que o Supremo Tribunal de Justiça passe a observar os

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instrumentos emanados pelos ministérios de Justiça para que

seja, então, o protagonista da criação dos órgãos necessários

para a viabilização desses instrumentos e para que a

cooperação jurídica internacional reflita cada vez mais essa

sensação de justiça, que o que esperam todos os cidadãos.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL FFDERAL) – Agradeço ao Senhor Ministro da Suprema

Corte do Paraguai, José Raúl Torres Kirmser, assim como ao

Professor Doutor Roberto Ruiz Dias Labrano.

Deveríamos parar agora para o “coffee break”,

para um cafezinho, mas a direção me pediu para prosseguir na

exposição dos temas e o café fica para a parte final, antes

dos debates.

Dando seqüência, portanto, à programação,

convido o excelentíssimo Senhor Leslie Van Rompaey Servilllo,

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Presidente da Corte Suprema do Uruguai, para fazer uso da

palavra. Também, como já temos observado, Vossa Excelência

dispõe de 30 minutos para se manifestar sobre os temas do

roteiro propositivo, o que Vossa Excelência pode fazer,

também, dividindo com os seus coordenados.

O SENHOR MAGISTRADO LESLIE VAN ROMPAEY

SERVILLO (PRESIDENTE DA CORTE SUPREMA DO URUGUAI) – Muito

obrigado, Senhor Presidente, vou ser muito mais breve do que

isso.

Entendemos que a cooperação ou a assistência

judicial constitui um princípio de Direito processual

internacional. A ação jurisdicional deve chegar a onde seja

necessário através de atos ou instâncias do processo que por

diferentes circunstâncias precisam ser executadas ou

cumpridas em outros Estados, notificar no estrangeiro,

encontrar provas em outro país, cumprir uma medida cautelar

ou executar uma sentença fora da fronteira. A cooperação

judicial internacional é um mecanismo que permite que a

Justiça não se detenha na fronteira dos Estados.

O mundo moderno está sinalizado pela

internacionalização das relações humanas; parte delas são

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relações jurídicas, as que também apresentam grau crescente

de internacionalização. Assim, então, quando se desenvolve um

processo judicial num Estado, é freqüente que seja necessário

realizar algum ato processual no exterior através da

solicitação ao juiz desse país. Essa situação se dá em todas

as matérias jurídicas, desde as relações familiares, as

civis, as mercantis, empresariais, etc.

O fenômeno do Mercosul incrementou as relações

jurídicas-privadas entre os habitantes da região e,

conseqüentemente, de forma crescente, promovem-se processos

que precisam do auxílio judicial internacional. Na

atualidade, entre os quatro países que formam o bloco, existe

uma grande quantidade de tratados internacionais que têm por

objeto a cooperação judicial internacional, contribuindo para

o cumprimento do art. 1º do Tratado de Assunção. A situação

não é igual nas diferentes matérias civil e penal. Na

cooperação jurisdicional em matéria civil, devemos dizer que

os quatro países ratificaram as convenções da CIDIP sobre

cooperação. A convenção sobre cartas precatórias e cartas

rogatórias foi ratificada também por muitos outros Países

Americanos além dos Estados Unidos e Espanha e está em vigor

nos quatro Países. Há, também, a Convenção de Olivos,

cumprimento de mandatos judiciais e recepção de provas no

estrangeiro da convenção de medidas cautelares, da convenção

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de eficácia extraterritorial das sentenças e laudos arbitrais

estrangeiros. Essas quatro convenções cobrem adequadamente o

aspecto da cooperação civil internacional.

Existe, também, o Protocolo Las Leñas sobre

Cooperação e Assistência Jurisdicional em Matéria Civil,

Comercial, Trabalhista e Administrativa. Existe a convenção

de medidas cautelares, Protocolo de Ouro Preto (decisão nº

27, de 94, do CMC). Essas duas convenções completam a

regulamentação das cooperações internacionais. Essas normas

do Mercosul tomaram como modelo as convenções da CIDIP, mesmo

tendo algumas desvantagens em relação àquelas. Por exemplo,

se determina como uma única de transmissão das cartas

precatórias, a via da autoridade central. Quando, 20 anos

atrás, além destas existiam quatro vias clássicas: a

diplomática, a judicial, a autoridade central e via

particular. Além disso, à época em que foram relatadas as

convenções do Mercosul poderiam ser previstas as vias de

“fax” e “internet” para mais rápida transmissão dessas cartas

precatórias. Nada impede fazê-lo; seria possível em favor da

cooperação.

A cooperação internacional entre os países do

Mercosul parece ótima, mas não é assim. Existem problemas

práticos e burocráticos que tornam mais lentos os processos e

dificultam a cooperação. Seria conveniente que os maiores

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esforços se dedicassem a estudar e resolver os problemas

práticos existentes, pois o marco jurídico descrito é

adequado e suficiente. Isso não significa que esse marco não

possa ser complementado e melhorado, mas quem conhece de

perto esse funcionamento da cooperação judicial no Mercosul

sabe que os problemas reais que se enfrentam não têm a ver

com a falta de tratados e, sim, com outras intenções: a

lentidão, a má ou incorreta aplicação das normas vigentes por

parte dos encarregados de sua aplicação, a falta de

seguimento das cartas precatórias, etc. Estão ligados pelo

Protocolo de São Luiz, sobre as Assistência Jurídica e

Assuntos Mútuos em Assuntos Penais, de 25/06/96, (decisão

CMC, 02/96, e decisão CMC, 1201). Esse Tratado cobriu

aspectos da cooperação penal, que não eram convenientes e

modernamente regulamentados, pois faltava uma convenção sobre

os aspectos da chamada cooperação judicial internacional

penal de grau médio ou mínimo. Isso se refere à prova e às

medidas cautelares em matéria penal. Em matéria de extradição, subscreveram, no Rio

de Janeiro, os acordos de extradição, os seguintes Países

Partes: Bolívia e Chile. Em 1996, foi assinado esse acordo de

extradição; que também foi assinado, em 1995, na Argentina, e

no Uruguai, em 1999. Estimamos que existe um marco normativo

adequado, em matéria de cooperação judicial internacional,

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nos quatro países do Mercosul, seja para as convenções

continentais em vigência, seja para as próprias convenções

nascidas e aprovadas no âmbito da região. Esse marco

normativo é o mais completo em matéria penal. O problema é

que existe uma falta de seguimento dos pedidos, um

cumprimento dos atos de cooperação solicitados, etc. Isso se

deve a aspectos que estão mal implementados na prática a

temas burocráticos, a não-previsão e falta de utilização dos

meios tecnológicos atuais, como a falta de conhecimentos e

costumes dos operadores jurídicos dos tribunais,

funcionários, etc. Há certos prejuízos que são mantidos nos

Estados sobre a ordem ou pedidos judiciais provenientes do

exterior.

Em definitivo, é necessária a difusão do

conhecimento das ferramentas que existem entre os operadores

jurídicos, que são aqueles que executam os mecanismos que

precisam os particulares para a elucidação daqueles litígios

que necessitem transcender as fronteiras.

Muito obrigado.

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O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) - Agradeço a Sua Excelência Leslie Van

Rompaey Servillo, que é Presidente da Corte Suprema do

Uruguai.

Em seqüência, ouviremos a palavra da Senhora

Ministra Elena Highton de Nolasco, que representa a Corte

Suprema de Justiça da Argentina, e aviso a Vossa Excelência

que o tempo é o mesmo: 30 minutos,

A SENHORA MINISTRA ELENA HIGHTON DE NOLASCO

(CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA DA ARGENTINA) – Muito obrigada.

Vocês devem estar um pouco cansados, mas vamos

completar com o 4º tema sobre Cooperação Judicial.

A globalização e os processos de integração

que implicam na transação de capitais, investimentos e forças

de trabalho, assim como um veículo vivificante para a troca

de culturas, também levam para esse desafio de encontrar

instrumentos de cooperação jurídica, que permitam enfrentar a

internacionalização do delito ou da persecução dos

responsáveis por um delito feito na jurisdição doméstica

quando isso ultrapassa as fronteiras e, portanto, resulta

imprescindível encontrar mecanismos que levam em consideração

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os Poderes Judiciais dos Estados-Partes para terem esse

sentido de continuidade mais além das fronteiras.

No âmbito europeu, foi pioneiro o Convênio de

Shangai, que pautou as necessidades de cooperação tanto

judicial quanto policial, servindo, assim, como insumo

essencial no momento de chegar tal competência no âmbito

comunitário.

O desenvolvimento paulatino do Mercosul

produziu um aumento de interação jurídica entre os seus

habitantes, aumentando, assim, a quantidade de processos

promovidos que requerem um auxílio da administração de

Justiça. Dos antecedentes de cooperação judicial que veiculam

os Países-membros do Mercosul podemos estabelecer uma

diferenciação entre os instrumentos de caráter multilaterais

e os de caráter regional ou bilateral.

Entre os instrumentos multilaterais,

verificados em instância civil, temos a convenção de cartas

rogatórias e o seu protocolo adicional, a convenção sobre a

recepção de provas no estrangeiro e seu protocolo, a

convenção de medidas cautelares e a convenção sobre a

eficácia extraterritorial das sentenças e laudos arbitrais

estrangeiros.

Então, no âmbito do Mercosul, temos vigentes

os protocolos das leis sobre a cooperação e assistência

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jurídica em matéria civil, comercial e trabalho

administrativo e a convenção das medidas cautelares –

Protocolo de Ouro Preto.

Mais precisamente no nosso País, gostaria de

mencionar a recente sanção da Lei nº 25.935, mediante a qual

temos a aprovação do acordo de cooperação e assistência

jurídica em matéria civil, comercial, trabalhista e

administrativa, entre os Estados-Partes do Mercosul e as

Repúblicas do Chile e da Bolívia. Para isso, foi levado em

consideração o Protocolo de Cooperação e Assistência Jurídica

em tais matérias, aprovado em Lãs Lenhas, pela Decisão nº 592

do Conselho do Mercado Comum, vigente nos quatro Estados-

membros dos Acordos de Complementação Econômica nºs 35 e 36,

assinados pelo Mercosul e pelas Repúblicas do Chile e da

Bolívia, respectivamente, aprovados pelas decisões do

Conselho do Mercado Comum nºs 14/96 e 2/97.

Sancionando essas normas e afirmando a vontade

de ter resoluções jurídicas comuns, temos o propósito de

diversificar a cooperação jurídica em tais áreas, com o

objetivo de contribuir para o desenvolvimento das suas

relações de integração, baseando-se, então, no respeito da

soberania nacional, igualdade de Direitos e interesses

recíprocos.

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De outro lado, esse acordo também leva em

consideração os residentes e cidadãos e facilitará, portanto,

o livre acesso à jurisdição dos Estados-membros.

Por tudo isso, então, vemos que esse é um

passo importante no marco de um processo de integração na

medida em que temos a adoção de instrumentos comuns com o

objetivo de consolidar a segurança jurídica. Na realidade,

esse ocorreu justamente no mês passado e foi promulgado como

lei na Argentina.

Ainda faltando instrumentos multilaterais

sobre a cobrança jurídica internacional da matéria, o

Mercosul pode exibir o Protocolo de São Luís sobre

Assistência Jurídica Mútua e Assuntos Penais, desde o ano de

1996, completando o esquema com os acordos de extradição

entre os Países-membros, assinados no Rio de Janeiro, em

1998.

Todos os instrumentos enunciados devem ser

somados aos tradicionais convênios bilaterais que vinculam

nos Países do Mercosul entre si. Se tivermos essa cooperação

jurídico-internacional como gesto de cortesia, portanto

sujeito à arbitragem dos Estados, a globalização que

interconecta as situações de variados contextos,

protagonizadas por cidadãos de múltiplas origens, tornou

imprescindível a busca de uma eficaz cooperação jurídica como

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condição da própria necessidade do Estado, já que a

administração da justiça é um dos deveres indelegáveis. Disso

vemos, então, a necessidade de prestar cooperação a cada

Estado no concerto das nações.

A partir dessa perspectiva, coincidimos com a

postura exposta na minuta do Superior Tribunal Federal para o

grupo de trabalho de Cooperação Jurídica, mas não tem sentido

considerar as cartas rogatórias, que demandam medidas

executórias, como contrárias à ordem pública, à soberania

nacional, e só resultaria admissível a pretensão de

reciprocidade.

Portanto, resulta crucial este Encontro,

porque oferece a oportunidade de ter contato com a verdadeira

práxis dos acordos, revisando as dificuldades práticas, tais

como surgem também no Uruguai com o único âmbito de aproximar

os nossos povos na construção de um caminho comum. Por essa

razão, é preciso garantir a eficácia na tramitação de atos

processuais e jurisdicionais no âmbito internacional.

De certa forma, o obstáculo para isso é a

análise da jurisdição no Protocolo de Las Leñas, pois, com

relação à execução de sentença, temos a do juiz quando devia

ser a do requerente. Dessa forma, propusemos uma reforma.

Por outro lado, a experiência concreta do

Poder Judiciário, na Argentina, sobre alguns temas que

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requerem cooperação internacional em matéria jurisdicional,

surge de um trabalho realizado, pela Comissão do Mercosul, da

Associação de Magistrados e Funcionários da Justiça Nacional

na Argentina, o Grupo Ibero-Americano apresentado na União

Internacional de Magistrados. Isso merece especial atenção,

pois o tratamento de alguns temas reflete as conquistas

alcançadas no âmbito regional, assim como o que está pendente

como ponto de referência para a construção de uma cooperação

mais frutífera e fecunda. Nesse contexto, gostaria de

mencionar alguns temas, entre eles a restituição

internacional de menores, porque, em nenhum dos quatro

países, um dos pais não tem - individualmente, o cenho ou a

conduta do progenitor, sem a intervenção do juiz competente -

o Direito de fixar residência habitual da criança no país

estrangeiro. Esse tema mereceu regulação penal nos quatros

Estados-membros.

Sendo a restituição de menores um capítulo

fundamental na cooperação internacional destinada à proteção

da criança, gostaria de destacar que três dos Países que

fazem parte do Mercosul – Argentina, Paraguai e Uruguai – têm

uma longa história de cooperação jurídica através de

instrumentos elaborados no final do séc. IX. No Tratado de

Direito Civil Internacional de Montevidéo, há posteriormente

aprovação também a respeito dessa matéria, na convenção sobre

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a restituição de menores. Em 1992, recomendamos aos Estados-

Partes do Mercosul que a aprove, e, hoje em dia, felizmente,

esse convênio está vigente em todo o espaço integrado.

As carências e os desafios com relação a isso

ocorreram pelo aumento das relações entre as autoridades

centrais e as autoridades jurídicas dos quatros Estados-

membros, no que foi acordada e também acrescentada a reforma

introduzida pela emenda do Protocolo de Las Leñas, porque

amplia as opções para os juízes de fronteiras e para a via

diplomática organizar serviços jurídicos especializados que

estavam pendentes, melhorar o controle sobre as fronteiras

comuns com o objetivo de verificar de forma eficiente o

traslado dos menores com as devidas companhias e

autorizações, favorecendo a rápida localização de todo menor

perdido, ou deslocado ilicitamente, ou retido ou seqüestrado.

Em matéria de extradição, como conquista,

podemos dizer que, em 10 de setembro de 1998, celebramos o

acordo sobre extradição nos Estados-Partes do Mercosul,

tomando como base os instrumentos jurídicos do Tratado de

Assunção, do Protocolo de Ouro Preto, da Decisão nº 01/95 do

Conselho do Mercado Comum e o Acordo nº 13/98, da Reunião de

Ministros de Justiça no Mercosul. Então, os Estados-Partes se

comprometeram a harmonizar as suas legislações, chegar a

soluções jurídicas comuns, com o objetivo de fortalecer o

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processo de integração, fomentar a cooperação jurídica, e a

extradição com áreas de interesse comum, simplificar e

agilizar a cooperação internacional para possibilitar a

harmonização e a compatibilização das normas que regulam o

exercício das funções jurídicas. Mas, sem dúvida nenhuma, o

objetivo primordial é o da obrigação de conceder a extradição

recíproca, de acordo com as regras e condições estabelecidas

no acordo; da mesma forma, similar acordos penais com os

associados.

Vemos que a Argentina assinou o tratado de

extradição com o Brasil, Paraguai e Uruguai, além de outros

instrumentos para facilitar a cooperação e, também, o

traslado de condenados de cada um dos Estados-Partes. Depois, temos um tema interessante, como o

controle e fiscalização da fabricação e o tráfico de armas.

Em 1998, os Presidentes dos Estados-membros do Mercosul,

juntamente com os Estados associados – Bolívia e Chile -,

assinaram uma declaração para criar um mecanismo conjunto de

registro de compradores e vendedores de armas, munições,

explosivos e materiais conexos. Em 16 de outubro de 2003,

tivemos um memorando de entendimento para estabelecer um

mecanismo permanente de intercâmbio, de informação a respeito

da circulação do tráfico ilícito dos Governos da Argentina e

do Brasil, configurando o primeiro instrumento que veicula

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dois dos signatários do Tratado de Assunção com relação à

matéria.

As carências com relação a esse tema são o de

que poderiam ser adotados os princípios e critérios sobre o

Código de Conduta da União Européia, em matéria de exportação

de armas, para poder prevenir o tráfico ilícito de armas

pequenas e leves. E deveríamos ter mecanismos que permitissem

um controle no comércio de armas de fogo, munições,

explosivos e materiais relacionados com os sistemas de

informações regionais e colaboração jurídica na matéria.

Algumas observações aos mecanismos vigentes

consistem em que parece existir uma coincidência, já que o

marco normativo da cooperação jurídica no Mercosul é apto

para acompanhar esse processo de integração. Entretanto, a

implementação prática muitas vezes não é tão satisfatória.

Por isso, temos a intervenção de fatores de diferentes

índoles, desde a resistência burocrática, a ineficiência

variada, como erros na aplicação da normativa vigente, até

concepções de fundo enraizadas nos tópicos tradicionais de

jurisprudência, que insistem em serem aplicados sem efetuar o

exame pontual do tema à luz dos compromissos contra eles em

matéria de integração. Por isso, somamos as observações

efetuadas com relação à jurisdição e ao alcance da ordem

pública.

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Outra questão se refere à falta de

acompanhamento das cartas rogatórias por parte das nações

requerentes e o cumprimento por parte das nações requeridas.

Mas nos instrumentos vigentes, como o protocolo de medidas

cautelares do Mercosul, falta eficácia pela inclusão de

pautas que se referem a um sentido de soberania.

Então, chegamos a duas conclusões: aquelas que

estão vinculadas por razões de ordem fáticas e aquelas

questões conceituais. A primeira é o fato de que razões de

ineficiência também conspiram no momento de levar adiante a

gestão de medidas solicitadas através de cartas rogatórias.

Tal ineficácia é de índole bilateral, porque é originada em

obstáculos que operam tanto no país requerente como no

requerido.

Por essa razão, gostaria de destacar a

iniciativa que, oportunamente, teve a presidência da Corte

Suprema Argentina, cuja resolução propunha centralizar, numa

dependência própria, o seguimento das cartas rogatórias

enviadas ao exterior pelo juiz do Poder Judiciário da Nação,

assim como efetuar o acompanhamento da gestão dos mesmos.

Isso, à luz das propostas habituais que constam nos

documentos de trabalho que já circularam. O projeto que

oportunamente foi trabalhado, no âmbito da presidência e do

Tribunal, leva em consideração que era visto com preocupação

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que a gestão das medidas solicitadas pelos magistrados

argentinos, mediante a justiça de países membros do Mercosul,

nem sempre se ajustava ao que tinha sido acordado no marco

dos protocolos.

Em matéria de cooperação, o judiciário requer,

então, uma efetiva coordenação institucional com relação aos

Ministérios de Justiça e Relações Exteriores. Dessa mesma

forma, considero que, na falta de instituições específicas e

de um tribunal supranacional, que defenda o cumprimento

uniforme das normas negociadas em conjunto, a Corte Suprema

de Justiça da Nação adverte a necessidade de garantir, por

meio das instituições, o cumprimento efetivo da tramitação de

medidas de procedimentos no marco de causas judiciais, que

requerem intervenção da justiça de países membros do

Mercosul. Para isso propõe então criar uma área institucional

que, dependendo da sua presidência, desempenhará, como função

principal, o acompanhamento efetivo da gestão de medidas

mediante a justiça dos países membros do Mercosul, assim como

manter informados todos os juízes a respeito dos protocolos e

acordos vigentes em matéria de cooperação judicial na região,

como medida imediata para garantir o acesso efetivo à

justiça.

Então, das conclusões vinculadas a estas

questões conceituais, que conspiram num caminho livre para a

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integração, é preciso assinalar que o nosso país expediu

vários conflitos, aplicando a esses princípios jurídicos o

relatório emanado da Secretaria Técnica do Mercosul.

Temos também uma mudança que ocorreu neste

âmbito jurisdicional, e isso é uma esperança muito bem-vinda

no âmbito do Mercosul, criando concretos avanços para

satisfazer o acordado, mas não compartilhamos de alguns

aspectos contidos nesse instrumento.

Concordo com a interpretação de que a

concessão de exequatur, em qualquer carta rogatória, seja de

mero trâmite ou de caráter executório, não viola a ordem

pública nem a soberania nacional, muito pelo contrário, a

reafirma, pois o ato estrangeiro passou por um controle

concentrado, onde antes não tinha nenhuma eficácia; então,

isso surge dos documentos da Drª Nádia.

A reafirmação da soberania está numa

concepção moderna da mesma que caminha para esse processo de

integração regional que envolve o mundo.

Definitivamente, a Corte Suprema Argentina

pode exibir que, desde o começo, teve uma grande consciência

do mecanismo que a vincula a outros Estados no âmbito

internacional; assim expressou, num caso de 69, com relação à

execução de sentença estrangeira no território nacional,

ditada pelos tribunais de um Estado com o qual não tem nenhum

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tratado de cooperação jurídica. Isso mencionado por Perotti,

que está aqui presente.

Gostaria de acrescentar que, definitivamente,

poderia ser interessante, em matéria de cooperação, que

pudéssemos pensar em elaborar um convênio duplo, ou seja,

juntamente com o que é exigido para a circulação de

documentos devemos estabelecer qual é a jurisdição

internacionalmente competente, com o objetivo de evitar

algumas dificuldades que sabemos existir.

Portanto, votamos no sentido de um maior

compromisso em matéria de cooperação jurídica para que os

corpos colegiados aqui presentes saibam dar, como em outras

ocasiões, indícios claros e construtivos para todo o âmbito

da justiça nacional própria, atenta aos seus pronunciamentos,

tendo presente que os documentos devem ser interpretados de

acordo com o princípio de confiança que sustenta o Mercosul.

Para esse desafio, todos nós que integramos os tribunais

estamos preparados e, também, oferecemos os nossos

compromisso.

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O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (SUPREMO

TRIBUNAL DEFERAL) – Também agradeço a Ministra Elena Highton

de Nolasco, da Suprema Corte de Justiça da Argentina.

Como economizamos tempo, que terminou rendendo

nas mãos dos eminentes expositores, já podemos iniciar, de

imediato, a fase dos debates e discussões que serão travados

entre os membros da Mesa, porém com a participação de todos

os observadores, que poderão, querendo, usar da tribuna para

que os temas aqui versados sejam retomados.

Observei que a formação e a implementação do

Mercosul demandam efetivamente a solução de problemas

jurídicos de toda ordem e anotei os campos de manifestação ou

de expressão desses problemas: extradição, exequatur às

cartas rogatórias, homologação de sentenças estrangeiras,

combate às infrações penais, problemas relacionados a Direito

de família, sobretudo no campo dos menores; relações

mercantis, trânsito, turismo, etc. Temos, portanto, um

instrumental de trabalho desafiando a nossa inteligência para

que o Mercosul se torne uma realidade, sempre nessa

perspectiva da busca da integração como sinônimo de

cooperação para a pré-falada formação de uma comunidade

latino-americana de nações, evidente que sem nenhum prejuízo

da igualdade entre os Estados, da solução pacífica das

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controvérsias eventualmente surgidas, enfim, preservando-se a

soberania de cada país partícipe ou associado.

Os debates se iniciam agora, e a palavra está

franqueada.

Pois não, a senhora que levantou a mão pode

usar da palavra.

A SENHORA PROFESSORA ADRIANA DEYSIN DE KLOR -

(INÍCIO SEM TRADUÇÃO)

Então, eu tenho, quanto a isso, uma pergunta

nos âmbitos civis, comerciais, trabalhistas, administrativos,

especialmente no primeiro e segundo aspectos dessas áreas,

sobre se é adequada a cooperação ou a ajuda tendo como base

os instrumentos jurídicos disponíveis no Mercosul. Eu diria

que isso é muito relativo, porque, como foi bem assinalado

pela Ministra da Justiça da Argentina, mesmo contando com o

protocolo de Las Leñas e com o protocolo de medidas

cautelares, existem graves problemas marcados por três

aspectos: em primeiro lugar, pela forma em que é estabelecido

o jurisdicional; em segundo lugar, pelo alcance do Poder

Público - e quero destacar que nós, que trabalhamos como

particular, temos uma linguagem muito especializada, como foi

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dito pelo Colega do Paraguai, Dr. Roberto Ruiz Díaz Labrano -

, e, em terceiro lugar, o modo pelo qual são implementados

esses protocolos.

Quanto aos aspectos jurisdicionais, sendo o

juiz aquele a quem se pede o reconhecimento e execução de uma

sentença para verificar ou determinar se a jurisdição

internacional é realmente competente, ele está contando com

esse princípio de confiança sobre o qual é sustentado o

processo de integração regional. A contradição chega a tal

ponto que um dos Estados do Mercosul, Uruguai, por exemplo,

no Código do Processo - e acredito que acontece assim, não é

Professor Ronald -, estabelece que o controle se realize em

função das regras do juiz que dita a sentença. Então, o que

encontramos pela frente? Resulta, em benéfico, não ser parte

do Mercosul se o proposto é o reconhecimento de uma sentença

frente aos tribunais uruguaios, se parte, já que essa é a

resposta que dá o código desde a dimensão autônoma.

O alcance do órgão público internacional foi

muito bem definido pela Dr. Elena, e não estamos falando

sobre um conjunto de normas, não é uma questão que seja

contrária a nossa legislação, que esteja violando a

legislação. Temos que partir de um conceito axiológico.

Então, falar de princípios, falar de valores, falar sobre

aqueles princípios que são fundamentais, é falar dos

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princípios entre os quais os Estados têm uma total

coincidência. Então, amparar-se na ordem pública

internacional significa assumir uma posição que coloca

barreiras à livre circulação das sentenças.

Em relação às vias de transmissão, eu acredito

que é recomendável, pelo menos que deve ser sugerido, que os

Estados ratifiquem essa ementa, porque essa ementa foi

ampliada, como já foi assinalado em Las Leñas, dizendo que os

protocolos das leis seriam assinados pelas autoridades

centrais. Então, agora, encontramos neste Encontro, pessoas

muito mais voltadas em propor soluções mais satisfatórias que

o Convênio, pretendendo alcançar as quatro verdades

fundamentais.

Outra questão, que me parece seja importante

ser destacada, é em relação ao princípio favor-cooperação,

porque uma das cláusulas estabelecida pelo Protocolo de Las

Leñas, as chamadas cláusulas de compatibilidade, permitem que

possam ser aplicados outros convênios que tratem sobre a

mesma matéria, entre as mesmas pessoas numa mesma causa,

sempre que não sejam contraditórias em relação ao protocolo

de Las Leñas. Então, a pergunta é: quantas são

contraditórias? Na ementa, tem um esclarecimento que é muito

importante. O assinalado é que devem ser aplicados, entre os

convênios existentes, aqueles que sejam mais favoráveis à

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cooperação, ou seja, aquele que, na sentença, não encontre um

obstáculo para poder circular livremente no Estado integrado.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – A Senhora dirige sua palavra, em

particular, a algum dos quatro coordenadores de grupo ou fica

à vontade para cada qual responder?

A SENHORA PROFESSORA ADRIANA DREYSIN DE KLOR –

O que fiz foi assinalar as questões que acredito serem dignas

de serem trabalhadas porque facilitam a livre circulação.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Vossa Excelência não fez uma

pergunta específica, mas um comentário?

A SENHORA PROFESSORA ADRIANA DEYSIN DE KLOR –

Se é estabelecido esse tema do qual tanto se falou na mesa,

no qual as Cortes teriam a possibilidade de estabelecer

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mecanismos inter-jurisdicionais, poderiam propor também a

possibilidade de uma emenda em função de receber essa

sugestão, assim como também começar a instalar a idéia de

elaborar um convênio duplo, para que seja possível que no

mesmo convênio estejam presentes as jurisdições competentes e

que assim seja possível a não-obstaculização da circulação

dos documentos.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Então, Vossas Excelências estão

com a palavra. A Dra. Elena, que falou por último, gostaria

de se pronunciar?

A SENHORA MINISTRO ELENA HIGNTON DE NOLASCO

(REPRESENTANTE DA CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA ARGENTINA) – Eu

acho que a Dra. Adriana apoiou algumas das questões que foram

tratadas na mesa. Acho que não mereceria outros

esclarecimentos, pelo menos da minha parte, ela tratou alguns

dos temas que foram falados na mesa.

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O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA – A União

Européia chegou num momento, este ano, em que estabeleceu

praticamente o fim da extradição, firmando o mandato de

detenção europeu; e, também, na questão de produção de

provas, o mandado de produção de provas europeu. O que se

adiantou na Europa é um sistema único de Justiça, um espaço

único de Justiça. É possível que o Mercosul possa caminhar

nesse sentido, o que fez os protocolos atuais do Mercosul foi

avançar um pouco no sentido de eliminar a via diplomática,

passar para o modelo de autoridades centrais. É possível e

acho que é salutar que caminhemos no sentido de dispensar

autoridades centrais, que possa uma decisão de um País ser

válida automaticamente em outro País e vice-versa.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Autoridades centrais no plano do

Poder Executivo?

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O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA – Exato.

Atualmente, por exemplo, no caso do Brasil, a autoridade

central é o Ministério da Justiça. A vantagem do sistema de

autoridades centrais é que facilita acompanhar o andamento

desses pedidos, o que tem acontecido. Agora, é salutar que

demos um outro passo no sentido de estabelecer um espaço

comum de Justiça onde, efetivamente, possamos dispensar esses

mecanismos mais no futuro. Claro que depende de um

amadurecimento das relações entre os países. No momento,

estamos diante de um desafio de fazer funcionar bem esse

outro modelo. Um modelo onde a pluralidade de vias no passado

se mostrou extremamente complicado, porque não se tinha o

acompanhamento desses mecanismos.

Só para concluir, Senhor Presidente, parece-me

que a proposta da Dra. Adriana seria no sentido de emendarmos

esses protocolos para ampliarmos as vias de cooperação, mas o

que me parece melhor seria: ou caminharmos para um sistema

que é um espaço único de justiça - e que devemos caminhar

para isso -, ou mantermos a situação tal como está em um

singularidade de vil cooperação por autoridade central que

facilita, e muito, o acompanhamento dessa cooperação.

É claro que é preciso melhorar e, só dando um

exemplo das dificuldades: até pouco tempo atrás, no

Ministério da Justiça do Brasil tinha três pessoas para

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cuidar de cooperação da tramitação, atualmente, são quarenta

e cinco a partir de fevereiro deste ano em função das

demandas.

Então, foi só para fazer essa nota, Senhor

Presidente, em observação ao que disse a Dra. Adriana.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Em uma cooperação, claro, dos

três níveis: Legislativo, Executivo e Judiciário, sobretudo

do Judiciário que, me parece, está chegando por último.

O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA –

Curiosamente, Senhor Presidente, num caso que está

acontecendo atualmente - até para ilustrar a dificuldade de

cooperação, porque ainda temos muito a avançar nessa cultura

- numa CPI, uma comissão parlamentar de inquérito que, de

acordo com a Constituição, tem poderes iguais a uma

autoridade judicial, fez um pedido, à luz do protocolo de São

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Luís, que disciplina a cooperação em matéria penal, ao

Uruguai e a dúvida que se coloca é: uma CPI poderia acessar

os mecanismos de cooperação? E a resposta da autoridade

central uruguaia foi que não pode. Mas, do ponto de vista da

Constituição brasileira, a CPI é uma autoridade de natureza

judicial.

Então, há uma série de questões que ainda

estão abertas em nome da cooperação e que precisam ser

respondidas antes que encaminhemos para esse espaço de

cooperação de justiça comum.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Pois não, Vossa Excelência pode

usar da palavra.

DRA. BERTA FEDER (URUGUAI) - (INÍCIO SEM

TRADUÇÃO)

Boa tarde. Realmente não gostaria de falar

demais, mas apenas dar uma pequena contribuição à

qualificação de duas pequenas questões que foram tratadas à

Mesa.

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Em primeiro lugar, a minha felicitação ao

Grupo 2, porque essa temática da Cooperação Judicial engloba

dois setores e duas áreas completamente diferentes, mesmo que

estejam intimamente conectadas entre elas. Por outro lado, a

parte operativa da Cooperação Judicial é o tema das

autoridades judiciais e, de alguma forma, através das

Supremas Cortes de Justiça ou através dos juízes de

hierarquia inferior, essa cooperação judicial - e agora não

vou entrar nos acordos particulares que foram referidos por

todos aqueles que falaram - se faz ao nível de juiz, ou seja,

esse é um dos lados da questão. Mas as minhas felicitações

são porque o tema da Cooperação Judicial, do ponto de vista

conceitual e intelectual, pede emprEstado a outra disciplina

jurídica que geralmente não é tratada pelos juízes, que é o

Direito Internacional Privado, exatamente por isso, uma das

excelentes relatoras, a Drª. Araújo, nos forneceu visões e

conceitos que, no seu conjunto, completaram as exposições dos

Srs. Conferencistas.

Qual foi a participação do Poder Judiciário

nessa cooperação judicial internacional? Se essa cooperação

não se produz, poderá existir uma denegação da justiça,

poderá haver uma lentidão da justiça ou uma justiça que não

atua bem. Essa é a parte onde estão sem evolução os Poderes

Judiciais na cooperação judicial na cooperação judicial. Como

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estão sem evolução – e vou me referir a isso de forma muito

sintética, pois é simplesmente um esclarecimento -, existe um

outro aspecto que foi reiterado, foi muito repetido no dia de

hoje, é se, em virtude da ordem pública, eventualmente, pode

não ser dada essa cooperação judicial internacional. Em

virtude disso, gostaria de lembrar que os quatro Países

participantes do Mercosul e os Países associados são parte da

convenção de normas gerais, de Montevidéu de 1979, na qual

existe uma referência à ordem pública.

Gostaria de colocar à disposição de todos

vocês, pela internet, que o Uruguai, depois de firmar e

ratificar a convenção de normas gerais, realizou uma

declaração interna dirigida aos juízes internos uruguaios

que, acredito, contenha um conceito muito acertado sobre o

que significa ordem pública, que nada tem a ver com a ordem

pública no Direito Administrativo, no Direito Público, aquele

vinculado à tranqüilidade pública e a segurança pública

interna.

Finalizo, lendo dois parágrafos dessa

Declaração Uruguaia, que provavelmente vocês não lembrem

neste momento: a declaração significa, em referência à ordem

pública, na convenção de normas gerais, se refere à ordem

pública internacional, que, evidentemente, é diferente da

ordem pública interna - não vou entrar em mais detalhes sobre

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o tema -, como um instituto jurídico singular, não

identificável, necessariamente, com ordem pública interna de

cada Estado. Agora, acho que vamos chegar na parte mais

importante e que poderia ser aplicada conceitualmente à

posição sustentada pela ordem pública. Na República Oriental

do Uruguai a fórmula aprovada na Convenção de Normas Gerais

comporta uma autorização excepcional nos diferentes Estados-

Partes e é muito importante que se trate de uma autorização

excepcional. Isso quer dizer que uma ordem pública não pode

ser aplicada a todos os casos de forma automática, pois é

excepcional, nos diferentes Estados-Parte, de uma forma

detalhada e deve estar muita bem fundamentada em cada caso.

Que sejam declarados não aplicáveis os preceitos da lei

estrangeira – e nesse caso seria da lei estrangeira que

permite pedir a cooperação internacional -, quando eles

ofendam, de forma grave, normas e princípios essenciais da

ordem pública internacional e nos quais cada Estado assenta a

sua independência jurídica. Isso serve para destacar que o

sentido da ordem pública para não prestar cooperação pode ser

fundamentado de forma excepcional e, de maneira nenhuma,

poderia ser admitido de um ponto de vista internacional,

deixando de lado a pratica vinculada a exemplo de alguns

países, o de que não poderia ser admitido que isso fosse

realizado de forma regular.

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Essa foi a minha contribuição. Gostaria de

falar sobre muitos outros temas, mas não há tempo.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) - Como a Dra. Nádia de Araújo foi

expressamente referida, acho que seria oportuno, se você

Excelência entender, usar da palavra.

A SENHORA PROFESSORA NÁDIA ARAÚJO– Senhor

Presidente, muito obrigada. De fato, não houve tempo, porque

nesse pequeno espaço que tive na tribuna tentei dispor melhor

a questão da ordem pública.

Temos defendido, já em outras oportunidades,

que a ordem pública para o sentido do Direito Internacional

Privado deve ser vista como exceção muito limitada. Boa a

lembrança da Dra. Berta Feder da participação do Brasil na

Convenção da CEDIP II. A Convenção Interamericana de Regras

de Direito Internacional Privado está internalizada no

Brasil, portanto deveria servir também de parâmetro pára essa

assunção da ordem pública. No caso concreto, a utilização da

ordem pública deve ser feita de forma bastante limitada e

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adequada àquele caso e só pode ser informada não por uma

vontade do juiz, não de uma discricionariedade daquilo que

lhe desgosta, mas apenas daquilo que são os valores

constitucionais. Tem de estar informada pela Constituição,

porque a idéia da aplicação do Direito Internacional Privado,

da aplicação do Direito Estrangeiro, que a cooperação exige e

que, de forma indireta na cooperação, ou de forma direta,

quando o juiz brasileiro é obrigado de ofício a aplicar o

Direito estrangeiro, é a idéia da tolerância. Evidentemente

que os outros sistemas jurídicos são diferentes dos nossos e,

se tudo aquilo que é diferente nos fizesse mal, não haveria

Direito Internacional Privado, não haveria nunca aplicação de

nenhum Direito Estrangeiro. Portanto, se aceitamos a

cooperação, se temos uma tradição de cooperação, é preciso

usar a exceção da ordem pública com muita parcimônia e em

casos muito limitados.

Era só esse esclarecimento que eu queria prestar.

DR. WALFRIDO FERNÁNDEZ DE BRIX (PARAGUAI)– Senhor

Presidente, serei breve.

Eu gostaria de fazer duas contribuições: em

primeiro lugar, assinalar que acho que não tem nenhuma pessoa

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nesta sala que não esteja a favor da consolidação do processo

de colaboração judicial entre nossos países, mas é necessário

levar em conta que o conceito de cooperação judicial não é um

patrimônio exclusivo do Mercosul, como foi bem dito pela

Presidente da Corte do Uruguai. Fala-se em cooperação

internacional, então, aquilo que eu gostaria de sugerir é que

as autoridades do Mercosul, encarregadas de promover o

fortalecimento e desenvolvimento de todo esse tipo de

normativas relativas ao tema da cooperação judicial, em

especial em cooperação jurídica em geral, em primeiro lugar,

antes de realizar um informe sobre o Mercosul, sejam tratados

os três níveis: mundial, continental e regional.

Dou um exemplo muito concreto, reconhecimento de

sentenças estrangeiras e laudos arbitrais. Cito a Convenção

de Nova York, que é de caráter mundial. Existe mais de uma

convenção interamericana fruto das resoluções da CIDIP e

existe um protocolo sobre o mesmo tema do Mercosul. Então,

a conclusão à qual modestamente chego é que, na tentativa de

consolidar esse processo de cooperação jurisdicional e

judicial, não se deve incorrer naquilo que modestamente

chamaria de “convencionites”. O que é necessário ver é se a

convenção de Nova York corresponde aos nossos ideais, ou se

existe uma convenção interamericana e, se os nossos países do

Mercosul, já aderiram a essa tal convenção. Só em um caso

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negativo, aí, então, entra-se no campo da elaboração de

protocolos cem por cento no âmbito do Mercosul.

Gostaria de enfatizar a contribuição da Senhora,

Membro da Corte da Argentina, que falou muito bem que, hoje

em dia, a cooperação judicial e a jurídica e geral englobam

todos os povos e não passam pela adesão de instrumentos

normativos que não respondem mais a conceitos de soberania no

séc. XXI. Não podemos deixar de analisar, quando redigimos um

protocolo, ou quando decidimos aderir a um corpo normativo já

existente do tipo do Mercosul ou de caráter mundial, não

podemos esquecer a análise de que devemos aderir àqueles

protocolos, e aí está a sabedoria das autoridades, não só de

cooperação judicial, como de soberania. Não devem ser aceitos

aqueles que estão carregados de conceitos pertencentes a

outras épocas.

Muito obrigado.

O SENHOR PROFESSOR RONALD HEBERT (URUGUAI0) –

Senhor Presidente, a cooperação judicial internacional está

fundamentada no respeito devido ao processo. O controle do

devido processo passa pelos juízes de instância. Pelos Juízes

dos tribunais em geral. Todos os tribunais da região possuem

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um critério certamente unânime, consensual, e poderia dizer

sobre o que significa devido processo. Um avanço interessante

nesse marco do Mercosul, onde são conhecidos perfeitamente

esses conceitos básicos que fundam a cooperação judicial

internacional, seria o de que o juízo do exequater não fosse

de competência das Cortes Supremas, e sim de cada um dos

juízes de Instância, ou seja, que, no âmbito do Mercosul, a

cooperação pudesse ser levada a cabo de juiz para juiz,

porque ambos são as garantias em seu próprio procedimento, no

qual ditam as suas sentenças. Então, um está em condição de

solicitar a cooperação do outro; e o outro está em condições

de qualificar se foram cumpridas as condições do processo.

Uma coisa que facilitaria muito a cooperação

judicial dentro do âmbito do Mercosul seria, exatamente, que

esse pequeno juízo de qualificação da sentença no exterior

não fosse de competência exclusiva da Corte. Isso, de

qualquer forma, tem uma garantia extra e é a possibilidade de

que venha a existir uma dupla instância frente aos tribunais

de apelação. Nesse caso, não seria perdido o tempo que é

perdido hoje nos juizados exequatur.

Obrigado.

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O SENHOR ALEJANDRO DANIEL PEROTTI (CONSULTOR

JURÍDICO DO MERCOSUL) – Obrigado Presidente.

Uma pergunta e uma observação, que será dirigida ao

Dr. Madruga, que eu o parabenizo pela sua excelente

exposição. A sua intervenção levou-me à reflexão a respeito

do art. 18 do Protocolo de Las Lenãs. Está localizado no

capítulo V, dedicado ao reconhecimento e execução de

sentenças, que diz o seguinte:

“As disposições do presente Capítulo serão aplicáveis ao reconhecimento e à execução das sentenças e dos laudos arbitrais pronunciados nas jurisdições dos Estados partes em matéria civil, comercial, trabalhista e administrativa, e serão igualmente aplicáveis às sentenças em matéria de reparação de danos e restituição de bens pronunciadas na esfera penal. “

Eu gostaria de saber da compatibilidade desta

disposição com o ordenamento brasileiro e, também, o art. 19

do Protocolo de Las Leñas, que está na emenda do acordo de

Las Leñas. O art. 19 das medidas cautelares, corrigido na

emenda dos Protocolos de Las Leñas, dizendo que os juízes e

tribunais das zonas fronteiriças dos Estados-Partes poderão

transmitir de forma direta as Cartas Rogatórias previstas

neste protocolo sem necessidade de legalização. Relembrando

uma sentença do Supremo tribunal Federal, a Reclamação nº

717, que a minha querida Colega Daise Ventura chamou à

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atenção com grande maestria, esta Reclamação produziu a

subtração da cláusula de um juiz de Livramento, solicitada

cautelarmente através de um pedido proveniente de um juiz

vizinho, do juiz de Rivera. Para todos aqueles que conhecem a

fronteira entre Uruguai e Brasil, saberão que Rivera e

Livramento são uma única zona urbana separadas unicamente por

uma rua. E um comentário, levando em consideração a idéia do

Professor Roberto Labrano, com relação à necessidade de uma

reunião de representantes das Cortes Supremas no marco do

Mercosul. E por que estou dizendo isso? Porque essas

intervenções e também o relatório da secretaria demonstram

que há uma cooperação jurisdicional de fato. E aqui

exemplifico, no Protocolo vocês poderão encontrar um

relatório fornecido pela autoridade central do Uruguai, que

demonstra numericamente, à infinidade, centenas de

expedientes tramitados ano após ano nos tribunais dos Estados

- membros do Mercosul de cooperação jurisdicional, ou seja,

aplicação dos protocolos. Basta visitar o “site” do Supremo

Tribunal Federal, e somente digitando a palavra ”Mercosul”

você verá a infinita aplicação desse protocolo. No caso do

Paraguai, a aplicação de ofício da Corte Suprema dos

Protocolos Las Leñas ou medidas cautelares. Também a

aplicação recente da Corte Suprema Argentina, do Protocolo de

São Luís sobre a Assistência, ou seja, igualdade civil nos

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acidentes de trânsito. Mas, claro, que essa cooperação

jurisdicional de fato teve problemas: os protocolos foram

interpretados de forma divergente. Basta mencionar uma medida

cautelar no Supremo Tribunal Federal do Brasil, o qual

aplicou uma resolução a uma empresa requerente do Uruguai,

que queria residir aqui no Brasil. Então, essa cooperação

precisa ser canalizada por meio de um órgão que represente os

poderes de todos.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Obrigado a Vossa Excelência,

passo a palavra ao Dr. Antenor Madruga.

O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA – Senhor

Presidente, acho que a primeira parte da pergunta foi um

pouco distraída pela pergunta forte. Mas, se entendi bem a

posição do Dr. Perotti, que perguntava se havia

compatibilidade entre o Protocolo de São Luís,

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especificamente, e as posições que determinam impedimento de

bens. Foi isso ou não, do art. 17 do Protocolo de São Luís?

O DR. ALEJANDRO DANIEL PEROTTI – (INÍCIO

INAUDÍVEL) ... de bens em matéria penal e também ao art. 19

do Protocolo de Medidas Cautelares, que estabelece a

possibilidade de contatos diretos entre os juízes das zonas

fronteiriças.

O SENHOR PROFESSOR ANTENOR MADRUGA – Em

relação à segunda, o contato direto entre os juízes da zona

fronteiriça, o Senhor mesmo já deu a resposta da posição do

Supremo Tribunal Federal, considerando inconstitucional essa

disposição do Protocolo Las Leñas em medidas cautelares e

entendeu que deveria, sim, de acordo com a Constituição, no

dispositivo do art. 102, h, que impõe, necessariamente, o

juízo de delibação pelo Supremo Tribunal Federal. De forma,

que, realmente, quem conhece Rivera e quem conhece

Livramento, verifica que, na prática, isso levou a uma

cooperação à margem da lei, em vários aspectos, não só dos

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aspectos cíveis, como também dos aspectos penais. Por

exemplo: na questão de extradição, brinca-se que, na

fronteira, se estabelece a extradição por empurrão. Na

verdade, não se recorre à Brasília, mas apenas se entrega ou

se expulsa, ou chame como quiser, mas a questão é que existe

um fato jurídico na fronteira que demanda cooperação – por

ser fronteira e por ser tão próxima -, não porque os

protocolos não digam assim, mas por uma leitura, que deve ser

respeitada do Supremo Tribunal Federal, de que a

Constituição, tal como posta, impediria.

Como isso deve ficar agora com a mudança para

o STJ?

Na verdade, a mudança é muito sutil,

praticamente não há mudança no texto constitucional, apenas

passa-se a atribuir o mesmo que se atribuía ao STF para o

STJ. Há uma única ressalva, importante de lembrar: no art.

102, h, a Constituição Federal dá competência ao Supremo,

dizendo que pode ser delegado ao seu Presidente para

homologar as sentenças estrangeiras e conceder exequatur às

cartas rogatórias.

Ao passar essa competência para o STJ, a

reforma eliminou essa possibilidade, pelo menos, não disse

expressamente que ela poderia ser delegada ao seu Presidente.

Mas, como conversávamos antes, o que talvez a reforma tenha

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feito foi corrigir uma atecnia, na medida em que, de qualquer

forma, compete ao Regimento determinar a quem se distribui os

feitos internamente.

Em relação à pergunta da compatibilidade de

autorização e de medidas de seqüestro, de medidas de caráter

de proteção ou medidas que visem a garantir o processo, o

Supremo tem tido uma posição, no âmbito do Mercosul, muito

aberta, permitindo a aplicação dessas medidas em vários

casos. O primeiro caso era de apreensão de um automóvel, a

pedido da Argentina, e o Supremo reconheceu, entendendo que o

que Las Leñas fez, na verdade, foi estabelecer um mecanismo

de homologação de sentença estrangeira por meio de carta

rogatória.

Então, não sei se respondi às suas colocações,

mas espero que sim.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Bem, acho que podemos concluir.

Eu me permitiria dizer apenas o seguinte: um filósofo

brasileiro, mais de perto nascido no Nordeste do Brasil, lá

em Sergipe, que tinha o nome de Tobias Barreto, por volta do

ano de 1871, portanto, no século XIX, disse que o Direito não

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é um filho do céu; não é um presente dos deuses; o Direito

não cai de pára-quedas – numa linguagem bem coloquial -; mas

é produto da história; ele é fruto da experiência humana;

logo, é um objeto cultural e, por isso mesmo, experimenta

avanços e recuos, mas é dominado basicamente pelo signo da

mudança, está sempre em movimento, sempre mudando. E o

Direito muda assim no plano legislativo, como no plano da sua

interpretação.

Estamos aqui a discutir, há algum tempo, sobre

o conceito de ordem pública e não chegamos a um consenso,

porque parece mesmo um conceito aberto. O conteúdo, o recheio

desse conceito vai depender de ponderação de valores, a qual

se faz diante de um caso concreto.

O Direito, portanto, neste momento, em termos

de Mercosul, está se expandindo, evoluindo. Nós vivemos

todos, segundo o conceito tubiático, ou seja, de Tobias

Barreto, de reconceituações à medida que se expandem as

fronteiras da nossa inteligência, da nossa consciência,

porque não dizer da nossa sensibilidade. Isso não é ruim e

não adianta reclamar contra isso, porque é da ordem natural

das coisas, é o imperativo da vida. Hieráclito, o grego, já

dizia: tudo muda menos a mudança. Tudo é impermanente.

De sorte que o nosso desafio, agora, é o de

produzir uma legislação compatível com esse propósito firme

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de todos nós de levar a nossa cooperação para o plano da

institucionalização e fazer do Mercosul uma realidade

crescentemente aperfeiçoada; internalizando essa idéia de que

o Mercosul é tão necessário que é uma abençoada viagem sem

volta. Não adianta pensar em retorno, temos de avançar mais e

mais.

Eu iria concluir, dando um último aviso, mas

alguém quer falar e a palavra está concedida.

O SENHOR DESEMBARGADOR NESTOR ALVES DE MELO

FILHO - Senhor Ministro, lá na nossa pequenina e modesta

Paraíba, nos termos do convite que recebemos lá no nosso

Tribunal de Justiça, diz o seguinte: o evento traduz

empreendido pelos órgãos de cúpula do Poder Judiciário do

Brasil, da Argentina, do Paraguai e do Uruguai para o

aperfeiçoamento da instituição do Mercosul, sobretudo com

relação à sua normatividade e conseqüente segurança jurídica

dos cidadãos e dos Estados-Partes.

Senhor Ministro, com a devida vênia,

amenidades à parte, um problema que não podemos desconhecer,

porque vem preocupando a segurança pública interna deste

País, servindo de escândalo, quase que diário, pela grande

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imprensa nacional, é o atinente ao contrabando de automóveis

roubados do Brasil para alguns países do Mercosul; é o

tráfico de armas de alguns dos países do Mercosul para o

Brasil, comprometendo a segurança interna do país. Ninguém

pode desconhecer isso.

Então, gostaria de saber de Vossa Excelência e

dos demais membros da ilustre Mesa, se no Protocolo de Las

Leñas, tão decantado nesta Reunião em um possível órgão que

se pretende criar, talvez como produto desta Reunião, se essa

preocupação tem sido aventada, tem sido objeto de estudos a

respeito?

Era essa a minha observação, Senhor Ministro.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL)– A resposta é fácil, porque os

noticiários, no Brasil, a todo instante dão conta de que esse

problema se tornou um problema central. Ainda á poucos dias,

vimos nesse programa de tão grande audiência que é o

Fantástico, ou foi num outro programa específico, Linha

Direta, ou coisa assim, que é uma das preocupações centrais

do Governo brasileiro. Agora, me parece que, no plano destes

nossos debates, o tema não aflorou, especificamente não foi

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objeto nem de estudo, nem da conclusão de nenhum dos Grupos,

por isso me permito poupar os coordenadores do Grupo, porque

não constou da pauta de trabalho.

Mas, sem dúvida, que a preocupação de Vossa

Excelência é procedente e nos introduz na discussão de um

tema atual, extremamente preocupante e que se arrasta no

plano não digo do Poder Judiciário, mas do Poder Executivo,

sem uma solução satisfatória.

Com essas palavras, vou dar como encerrado os

trabalhos, agradecendo a presença de quantos participaram

desta tarde de discussão. De modo especial agradeço a

participação dos eminentes Ministros que se encontram aqui à

Mesa dos Trabalhos, do Dr. Antenor, do Dr. Roberto Ruiz Díaz

Labrano, da Dra. Nádia Araújo, enfim, de todos os que

contribuíram para tornar este nosso Encontro fecundo,

producente, a altura das espectativas geradas com a

convocação de todos.

O que me cabe, agora, é passar a palavra ao

Mestre de Cerimônias.

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Senhoras e senhores, encerramos os trabalhos deste primeiro

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dia do Segundo Encontro de Cortes Supremas dos Estados-Partes

e Associados do Mercosul, convidando os presentes a se

dirigirem ao Salão Branco desta Corte, onde haverá solenidade

de outorga de medalha da Secretaria do Mercosul aos

Presidentes das Cortes Supremas do Mercosul para a

Coordenação-Geral do Encontro.

Lembramos, ainda, que o início dos trabalhos

de amanhã será pontualmente às 9 horas, neste mesmo local.

E, agora, os senhores estão convidados para o

“coffe break”

Muito obrigado, uma boa-tarde.

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(TERCEIRO DIA)

(30 DE NOVEMBRO DE 2004)

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) -

Senhoras e Senhores, muito bom-dia.

Iniciando os trabalhos deste segundo dia, do

II Encontro de Cortes Supremas dos Estados-Partes e

Associados do Mercosul, informamos que compõem a Mesa as

seguintes autoridades: O Excelentísimo Senhor Ministro Ari

Pargendler, do Superior Tribunal de Justiça; o Excelentíssimo

Senhor Ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal; o

Excelentíssimo Senhor Victor José Raúl Torres Kirmser, Vice-

Presidente da Corte Suprema de Justiça do Paraguai; a

Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de Nolasco,

representante da Corte Suprema de Justiça da Argentina; o

Excelentíssimo Senhor Leslie Van Rompaey Servillo, Presidente

da Corte Suprema de Justiça do Uruguai; a Excelentíssima

Professora Estefânia Viveiros, Presidente da OAB do Distrito

Federal e Relatora do Grupo III (Harmonização Legislativa em

Direito Material e Processual) e a Excelentíssima Ministra

Ellen Gracie, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal e

Coordenadora do evento.

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Com a palavra o Excelentíssimo Senhor Ministro

Ari Pargendler, do Superior Tribunal de Justiça, para

conduzir os trabalhos desta manhã.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) – Bom-dia. Retomando os nossos

trabalhos, iniciamos a jornada de hoje com a exposição que

será feita, em nome do Vice-Presidente da Corte Suprema de

Justiça do Paraguai, pelo Profº Roberto Ruiz Díaz Labrano,

que está com a palavra.

O PROFESSOR ROBERTO RUÍZ DÍAS LABRANO –

(PARAGUAI) - Muito bom-dia. A tecnologia (sem tradução) se

não aperto o botão as idéias não aparecem, então deveríamos

insistir. Eu espero que essa apresentação seja realmente boa.

Solicitaram-me uma tarefa muito difícil. Nós falamos com os

Ministros do meu país e a abordagem da harmonização jurídica

no Mercosul é uma questão que aparentemente não tem muita

normativa de desenvolvimento, digo aparentemente, porque, na

medida em que formos analisando aquilo que foi feito em torno

do Mercosul e a evolução do Mercosul a partir do Tratado de

Assunção, assinalamos que, pelo contrário, embora não existam

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trabalhos concretos ou grupos trabalhando concretamente na

questão da harmonização legislativa, na prática, o que

aconteceu foi uma tarefa gigantesca de procura de

harmonização das legislações.

Esse processo de integração do Mercosul, que

nasce a partir do Tratado de Assunção, fortaleceu-se com o

Protocolo de Ouro Preto. Inicia-se a partir da idéia da

criação de um mercado comum. Isso é inconcebível, e o

desenvolvimento de um processo de integração não pode ser

concebido sem que esteja presente a idéia da harmonização das

legislações.

Se formos analisar o que é o mercado comum,

que foi o propósito inicial do Tratado de Assunção e continua

sendo o objetivo da nossa região, nós perceberemos que uma

das exigências básicas é justamente a coordenação de

políticas macroeconômicas, como aspectos gerais, além da

questão da liberdade e a harmonização legislativa. Mas o que

deve ser harmonizado? O que foi sendo harmonizado? Aqui,

descreveremos a idéia do que está sendo proposto pelo Tratado

de Assunção e o que fizemos em função daquilo que foi

assinado, no Tratado de Assunção, pelo Protocolo de Ouro

Preto.

A construção de um mercado implica em certas

questões necessárias que devem ser necessariamente

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harmonizadas. Questões que, na construção do mercado, se não

estiverem presentes, não poderemos falar de um mercado. Nós

utilizamos a expressão “mercado” no sentido de lugar onde se

trocam bens. Utilizamos a expressão “mercado” no sentido em

que é utilizada pelo Tratado de Mercosul, ou seja, criação de

um espaço integrado, onde regem as quatro liberdades

clássicas: livre circulação de bens e serviços e capital, e

outros dois fatores essenciais que são a coordenação de

políticas macroeconômicas e a harmonização legislativa.

Nessa construção de mercado devemos ter uma

idéia do que estamos construindo para saber o que já se

conseguiu e em qual direção vamos. Pretende-se a construção

de mercado, mas em que sentido? Pretende-se construir um

mercado em bases econômicas, avançando em direção a bases

políticas e sustentando as bases sociais. Por isso, a idéia

de mercado implica em certas disciplinas necessárias que, se

os Estados-Partes não harmonizassem - não estou falando de

unificar, mas de harmonizar -, essa idéia de mercado que

ficaria dissolvida, se perderia. Há algumas questões

concretas de harmonização para além da harmonização: questões

de legislação, de tarifas alfandegárias, além desses aspectos

que fazem parte de algumas disciplinas básicas na construção

de um mercado.

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Não há mercado se não houver um controle de

competência empresarial. Sem regras claras, regras

harmonizadas, no que diz respeito à maneira em que as

empresas e as indústrias participam do mercado criado,

dificilmente poder-se-ia pensar na concretização de um

mercado. A primeira tarefa, então, é harmonizar as regras e

normas para que sejam normas claras dentro dos Estados,

através de uma tarefa maior, que é a unificação dos critérios

comuns. Nesse aspecto da construção do mercado resulta

essencial a harmonização das regras de competência, porque a

competência no mercado implicará no desenvolvimento econômico

do Mercosul ou de qualquer processo de integração que tenha o

objetivo de ser bem-sucedido.

A grande tarefa da União Européia tem sido

estabelecer uma normativa sobre a competência ou a política

de concorrência, como chamam no Brasil. Se nós observamos

resoluções das sentenças dos Tribunais de Justiça da

Comunidade Européia, veremos que uma grande parte da

jurisprudência baseia-se na aplicação da regra de

concorrência, regras que tendem a estabelecer, em primeiro

lugar, o limite de atuação das empresas, isto é, não admitir

regras de monopólio, não admitir regras de distorção do

mercado, não admitir regras nas quais uma empresa ou uma

indústria exclua outra do jogo da livre concorrência - o

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fundamento básico do mercado é a livre concorrência. Não

podemos falar de um mercado único na Europa nem de um mercado

comum no Mercosul se não existir livre concorrência. Por

isso, é essencial não apenas que todos os Estados-Partes

tenham uma adequada legislação interna, no que diz respeito à

concorrência, mas que essa legislação exista, porque no caso

do Paraguai, por exemplo, no art. 107 da Constituição

Nacional, estão previstas regras. Há uma regra especial que

determina que não se admitirão os monopólios privados ou

públicos, mas, ainda hoje, não temos uma legislação

específica na questão da concorrência.

No Uruguai, as regras de concorrência

continuam sendo as relativas. Seria necessário aprofundar a

elaboração da legislação embora as regras existentes, hoje,

já estejam suficientemente desenvolvidas no âmbito do

Uruguai, como para que possa considerar-se que existem regras

de concorrência.

Na Argentina e no Brasil há uma experiência

mais ampla, mas, em matérias essenciais como essas, é

necessário colocar um foco no desenvolvimento de integração.

Há outra questão importante que diz respeito à harmonização -

estou falando aqui da harmonização com vistas ao futuro. A

primeira fase do desenvolvimento da manifestação

investigativa foi desenvolvida para estabelecer as tarifas

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alfandegárias comuns, estabelecer as pautas de

desenvolvimento do processo de integração do ponto de vista

econômico. Mas as grandes fases da harmonização estão

determinadas por essas disciplinas.

Há outra disciplina muito importante. Estou

observando alguém que é especialista nesta questão - a defesa

do consumidor -, que é a contraparte da defesa do direito da

concorrência, porque, da mesma maneira que o controle no

mercado se produz em matéria de defesa da livre concorrência,

através do controle recíproco que as empresas criam entre si,

estando as instituições governamentais a eliminar as

distorções, são as empresas que se controlam reciprocamente

através de regras estabelecidas de forma tal que não

aconteçam distorções no mercado, como seriam políticas

anticompetitivas, como políticas monopólicas, políticas de

distorção do mercado em grandes crimes.

No que diz respeito ao direito do consumidor,

dissemos que há contraparte da defesa da livre concorrência,

porque aí estaríamos falando do cidadão comum, o cidadão que

se encontra dentro de um espaço integrado denominado “mercado

comum”, ou a idéia de mercado comum, lembrando que o processo

de integração do Mercosul avança na direção de um mercado

comum, mas a fase na qual nós estamos é um processo integrado

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em que existe um mercado no qual o cidadão faz parte

essencial desse desenvolvimento.

O cidadão, como parte essencial do

desenvolvimento do MERCOSUL, tem sua participação através da

disciplina conhecida como Direito do Consumidor. No Direito

do Consumidor, pelas regras estabelecidas no âmbito estatal e

pelas regras que venham ser estabelecidas no âmbito

comunitário, o cidadão é quem controla de baixo para cima,

defendendo o seu próprio interesse, a atuação das empresas e

das indústrias. É um controle exercido pelo cidadão sobre a

atuação das empresas e indústrias no mercado.

A defesa da livre concorrência é a defesa do

consumidor, que é o controle do consumidor através da

exigência do cumprimento de regras estabelecidas para que o

consumidor não seja vítima do mercado, para que o consumidor

exerça uma atividade de controle da atuação das empresas no

mercado, sempre existindo a idéia de que a construção do

Estado deveria partir das instituições de caráter estatal.

Isso é relativamente verdadeiro. Por quê? É de competência

dos órgãos estatais, num processo de integração, criar as

bases para que o mercado se desenvolva, proporcionando as

condições para que as empresas, as indústrias e os

destinatários de um processo de construção, que são as

empresas, as indústrias, aqueles que desenvolvem a atividade

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econômica e os cidadãos que vivem e moram, desenvolvam a sua

atividade nesse espaço integrado. Conseqüentemente, emerge a

grande tarefa de harmonização, que nós percebemos no futuro,

de aperfeiçoar e harmonizar internamente as regras de

concorrência. Não é à toa que os países desenvolvidos, a

União Européia, desenvolveram e fizeram um grande esforço

para criar as regras de concorrência que garantam ao

consumidor a sua participação como agente ativo do processo

de integração na União Européia.

O mesmo aconteceu nos Estados Unidos: as

políticas antitrustes, as políticas desenvolvidas em função

do controle de mercado para evitar a distorção e,

conseqüentemente, permitindo que o desenvolvimento do livre

comércio não se veja obstaculizado, que não existam

empecilhos ao processo de integração.

Percebemos o Mercosul como uma construção não

apenas em função daquilo que desenvolvem os órgãos estaduais

do Estado, como parte de uma entidade intergovernamental, mas

como aqueles órgãos do Mercosul que devem propiciar as regras

de funcionamento próprias do mercado. E a atuação dos

particulares e das instituições privadas, por sua vez, está

condicionada a que essas regras funcionem efetivamente.

Que outros aspectos devem ser harmonizados? Se

nós observamos a tendência, em função da legislação do

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comércio internacional, perceberemos rapidamente quais são as

outras regras que devem ser harmonizadas como, por exemplo, a

regra do que chamamos de “Direito de Mercado” como criação de

juristas uruguaios que perceberam a necessidade de achar ou

de unificar as disciplinas encarregadas dessa questão no

desenvolvimento presente do movimento comercial internacional

e especialmente no processo de integração. Encontraremos ali

o Direito da Concorrência, o Direito do Consumidor e as

Regras da Organização Mundial de Comércio que condicionam o

funcionamento do mercado.

Então, tudo aquilo que possamos fazer – nós,

no sentido de região, no sentido de Paraguai, Brasil,

Argentina e Uruguai – está condicionado por regras na

organização mundial de comércio das quais fazemos parte, nas

quais nós também devemos harmonizar o modo de incorporação

desse tipo de legislação.

Outros desafios estão sendo abordados como a

harmonização de novos aspectos do Direito - e novos é uma

maneira de dizer, porque eles já foram desenvolvidos – como,

por exemplo, a questão do desenvolvimento intelectual, que é

uma questão da qual o Mercosul tem se ocupado recentemente. É

uma preocupação simplesmente porque da mesma maneira que a

troca de bens tangíveis, bens materiais tem sido, na fase do

desenvolvimento do comércio internacional, uma das questões

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mais importantes para o desenvolvimento do comércio

internacional, hoje o desenvolvimento da propriedade

intelectual passou a ser uma das questões mais importantes e

relevantes de preocupação de países desenvolvidos e não

desenvolvidos. Por quê? Porque está praticamente

condicionando à defesa da propriedade intelectual todo tipo

de acordo de caráter internacional assinado hoje em dia. Por

isso teremos as regras da organização mundial do comércio e a

harmonização no modo de incorporação dessas regras. Nós temos

as regras de defesa da concorrência, as regras do Direito do

Consumidor e temos o desenvolvimento próprio de um processo

integrado que se realiza através da tarifa externa comum,

através de uma constante harmonização legislativa para a

construção de um espaço aduaneiro alfandegário comum. Esses

são os grandes temas desenvolvidos em torno da harmonização

legislativa.

Outras áreas importantes de harmonização serão

os critérios com que os Estados-Partes, através das suas

respectivas legislações internas e, também, da legislação

comum do Mercosul, haverão, em face da realidade, no futuro,

de encontrar um espaço integrado confiável, como a possessão

comum, tendo em vista os investimentos estrangeiros, que

devem ter garantia, e onde há um balanço de interesses para

os países desenvolvidos, o interesse deve estar voltado à

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questão de que o investimento estrangeiro que se faz possa

voltar ao país de origem no momento em que o investidor assim

o desejar.

Para nós, como países da região, o nosso

interesse é que esses investimentos se estabeleçam em nossos

países e que o resultado desses investimentos seja

reinvestido durante um determinado tempo. Então, a

harmonização das políticas comuns em torno dessas questões

básicas para o desenvolvimento do Mercosul deve ser levada em

consideração pelos órgãos do Mercosul, dando-lhe um caráter

prioritário.

Outro aspecto do novo desenvolvimento do

comércio internacional e, particularmente, do desenvolvimento

do mercado regional e mundial, é a questão dos serviços;

estabelecer normas adequadas e comuns; harmonizar, no mínimo,

as legislações em função do acesso ao mercado de serviços de

caráter público na região.

Imaginem o que aconteceria se houvesse uma

falta de harmonização ou critérios políticos não acordados,

não consertados, relativos à questão tão essencial aos

serviços públicos, que são um objeto de desejo no processo de

liberalização do comércio mundial, pela sua importância

econômica, e, sobretudo, pelas condições de algumas empresas

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ou indústrias de participar em licitações de serviços

públicos.

Outra questão e outro desafio para o Mercosul:

as regras devem ser não apenas claras, no âmbito regional,

como no Mercosul, mas também devem ser harmonizadas com

caráter prioritário. Devemos harmonizar as legislações

relativas aos serviços e o acesso ao mercado como expressão

que abrange tudo aquilo que estamos dizendo. Finalmente, o

desenvolvimento do Mercosul não é outra coisa senão a

facilitação do acesso ao mercado de cidadãos da região;

condicionar o acesso ao mercado daqueles que não são cidadãos

da região, ou cidadãos, digamos, de outros países que não da

região. Condicionar no sentido de criar as condições para que

o propósito fundamental do Tratado de Assunção seja

alcançado, isto é, o desenvolvimento econômico da região.

Esses são os critérios relevantes que devem

ser o alvo dos órgãos do Mercosul no desenvolvimento futuro

desse processo de integração. Não devemos esquecer que não

são outra coisa que interesses econômicos, políticos e

sociais os que estão em jogo; e são esses interesses os que

condicionam o funcionamento do mercado que, se for eficiente,

o será na medida em que sejamos capazes de entender que o

Mercosul não é apenas um espaço de oportunidades internas

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dentro do espaço integrado, mas, também, uma oportunidade de

desenvolvimento regional, que é o mais importante.

Sem as condições legislativas adequadas e sem

a harmonização através de uma política legislativa consertada

entre os Estados-Partes, provavelmente esse tipo de discussão

– acesso ao mercado de serviços ou acesso à tecnologia

através da propriedade intelectual, ambos fundamentais para o

desenvolvimento de qualquer povo ou região -, nesse momento,

longe de produzir benefícios, poderia produzir graves danos.

Repetirei uma coisa, simplesmente porque sei

que a Ministra Ellen Gracie gostou do exemplo. Apresentei uma

questão semelhante e me lembrei de um filme, que todos nós

vimos e que se chama, em espanhol, “Uma Mente Brilhante”. Diz

respeito a uma pessoa que chegou a ser esquizofrênica, e que,

pelos seus trabalhos feitos, obteve o prêmio Nobel da

economia. Não se é oportuno, mas direi que, no filme, em

determinado momento, esse gênio, que ainda é jovem e está com

várias pessoas que entram num bar; estão sentados, como

jovens que são, distraídos, falando entre eles, e, nesse

momento, entram várias jovens, uma delas muito mais bonita do

que as outras, visivelmente mais bonita. Vocês poderão

imaginar facilmente que todos os olhares foram em direção à

mulher mais bonita, e, segundo o roteiro, esse homem escreve

aquilo que resultará no prêmio Nobel: uma oposição às teorias

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econômicas que predominavam naquele momento, porque todos

assinalavam quem seria o ganhador, quem teria a oportunidade

de poder paquerar aquela pessoa. Mas ele colocou o seguinte:

se todos nós procurássemos o objetivo comum em questão,

naquela reunião, todos perderiam. Acredito que o melhor seja

olhar as outras meninas. Todos dançaremos, todos estaremos

acompanhados e teremos nos divertido, teremos feito uma coisa

importante, sem provocar dano aos outros. Não é apenas o

melhor exemplo de como a economia, muitas vezes, demonstra

que há muitos aspectos de realidade prática, mas demonstra,

como disse na reunião do Uruguai, como devemos agir no

Mercosul. Às vezes, não é importante ter um olhar único sobre

o objetivo exclusivo e quase egoísta de conseguir o melhor,

mas não provocar danos aos outros, e que todos tenhamos o

melhor benefício do desenvolvimento econômico do Mercosul.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) - Agradeço ao

Professor Roberto Rui Díaz Labrano por sua participação.

Ouviremos, agora, como representante da Corte Suprema do

Uruguai, o Professor Ronald Herbert.

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DR. RONALD HERBERT (URUGUAI) - Senhor

Presidente, este é um tema muito amplo, e eu não posso senão

seguir a proposta do Professor Roberto Lavral.

Aqui, neste tema amplo, pode haver várias

aproximações, mas o termo geral é uma aproximação teórica e

há também uma aproximação pragmática.

O ideal seria quantificar verdadeiramente o

problema. De que estamos falando? E, depois, escolher as

ferramentas. Se adotarmos um critério pragmático, vamos

retirar o drama desta questão e este é o caminho seguido pelo

Professor Ruiz Diáz Labrano.

É verdade que é necessário harmonizar normas

num processo de integração. Mas devemos estar conscientes do

que consiste esse processo de integração e devemos ter

consciência de que o processo de integração é dinâmico e que

possui vários estágios. E a harmonização dessas normas ou o

quantum dessa harmonização depende do estágio em que se

encontra o processo de harmonização. De forma que, se

falarmos de integração de mercados, estamos falando em

aumentar o espaço geográfico do mercado. E, aqui, é claro,

teríamos que harmonizar as normas referentes ao tratamento

dos fatores relevantes no que diz respeito à configuração

desse mercado a que o Professor se refere.

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Trata-se de uma matéria em que realmente se

avançou muito nas últimas décadas, portanto, desenvolveram-se

critérios universais e, praticamente, uma linguagem

universal. Por exemplo, tudo o que diz respeito às normas de

alfândega, tributárias, sanitárias, migratórias, bancos

centralistas ou de proteção de mercado como acabou de falar o

Senhor Roberto Ruiz Díaz Labrano, que tem a ver com a

concorrência, com as fusões de empresas, os monopólios, o

abuso da posição dominante e as legislações que são muito

importantes, como a proteção do consumidor, a administração

dos recursos naturais e as normas sobre meio ambiente.

Destaco, aqui, algo que já foi dito e não

precisa ser repetido pelo Professor Labrano: as normas

laborais são as relacionadas ao principal fator de produção e

que estão entre a integração econômica e a social.

Esse é um tema muito importante no Mercado

Comum. O Direito trabalhista tem problemas próprios. Não há

avanço na integração – no meu conceito – se não tivermos uma

harmonização quanto à situação dessa matéria tão importante,

não só por se referir ao principal fator de produção, mas por

se referir aos habitantes de nossa região.

Neste estágio do Mercosul, essa é a legislação

própria do Mercosul. E aqui teremos de retirar o drama da

questão, porque estamos falando uma mesma linguagem mesmo que

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possamos ter ou se possa influir com interesses diversos. Mas

essas normas estão sendo negociadas pelos quatro países

integrantes do Mercosul, durante esse processo

intergovernamental. São aplicadas pelos juízes de todos os

Estados Partes que integram essa estrutura judicial do

Mercosul.

Obviamente, há elementos que permitem ver o

controle de uma interpretação harmônica, ao mesmo tempo, com

o recentemente criado Tribunal Permanente de Revisão,

sobretudo no que diz respeito às opiniões construtivas que

são uma espécie de recurso de prejudicialidade. É uma coisa

mais rudimentar, mas acredito que terá um grande futuro nas

atividades desse Tribunal.

Se continuarmos na observação dos campos que

devem ser harmonizados, há outra matéria, também muito

importante dentro do processo de integração, que diz respeito

à cooperação judicial internacional, tema de um dos painéis

que tivemos ontem. É claro, a facilitação da cooperação,

sobretudo neste vasto continente do Mercosul, é muito

importante, ou seja, tudo relacionado à facilitação da

matéria processual em ter os mesmos critérios na ocasião de

harmonizar as soluções, isso também é matéria própria da

harmonização atual dentro deste estágio do Mercosul. Bem,

isso fazia parte do que aconteceu nos Estados Unidos,

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considerando-se que os atos e as decisões judiciais de cada

Estado têm plena eficácia em outros Estados da União, os

Estados irmãos. Um exemplo do qual falávamos é sobre o caso

do exequatur. Não é tolerável que, para executar a resolução

do juiz de uma cidade fronteiriça, que implique em um ato de

coação sobre um cidadão que esteja em uma cidade próxima,

deva chegar-se até o Supremo Tribunal para realizar um juízo

exequatur. Isto poderia, perfeitamente, ser harmonizado,

porque os juízes cooperam diretamente com os juízes. Todo o

poder judicial do Mercosul são os juízes de cada um dos

Estados do Mercosul. Aqui, há uma área propícia para a

harmonização.

Outro campo propício para harmonização é uma

área que separo porque, tradicionalmente, foi considerada

jurisdição exclusiva de cada Estado, mas parece ser

necessário para o desenvolvimento do Mercosul, que é a

regulamentação de alguns registros da propriedade: registros

de garantias mobiliárias.

Aqui, temos temas jurídicos, técnicos que são

necessários de serem vistos pelo meio do Mercosul. No

entanto, quando falamos em harmonização de normas, é claro

que não falamos da maior parte do Direito Civil, nem de

famílias, de pessoas, nem dos bens. Estamos falando, na

verdade, de uma coisa que não tem porque ser objeto de

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harmonização. Tem que tirar o drama deste tema tratado em

termos teóricos. É verdade que há matérias a meio caminho,

por exemplo, matéria que diz respeito à contratação, mas não

esqueçamos que nesta matéria já há um caminho percorrido. Com

os princípios da contratação internacional, há algum tipo de

contrato que seria interessante harmonizar, cuja legislação

seria harmonizável, como, por exemplo, o transporte

internacional ou os seguros internacionais. Em outro plano da

responsabilidade de contratação, que é um tema que poderia

chegar a ser matéria de harmonização entre os países do

Mercosul.

Em resumo, a minha proposta é: em primeiro

lugar, não se pode tratar esse tema de maneira abstrata. E,

nesse sentido, coincido plenamente com o que diz o Professor

Roberto Labrano. Nem todas as matérias são relevantes aos

efeitos, para serem eficazes, para o estágio em que se

encontra o processo de integração. Apenas algumas dessas

matérias são importantes. A harmonização da legislação

referente a essas matérias eleitas como importantes para cada

um dos estágios da integração exige uma diferente metodologia

de harmonização que deveria ser determinada em cada um dos

casos.

Em segundo lugar, deve-se utilizar um critério

instrumental, deve-se localizar, a cada momento, as matérias

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que devem ser objeto de harmonização. Deve-se adotar uma

posição a respeito da metodologia de harmonização de cada uma

dessas matérias para cada Estado.

E, por último, quais são os meios ou

instrumentos para levar a cabo esse processo? Visualizo um,

que considero o mais adequado atualmente, que é a utilização

das possibilidades outorgadas pela Secretaria do Mercosul. A

Secretaria do Mercosul passou de uma secretaria meramente

administrativa para ser uma secretaria técnica.

Conforme comentei, em outras ocasiões, há uma

burocracia boa e uma ruim. Em qualquer sistema de integração

deve-se ter uma boa burocracia como base. O sistema de

integração deve especializar funcionários da maior hierarquia

para que possam atuar, pensar e refletir não apenas vestindo

a camiseta de cada Estado, mas carregando o nome do Mercosul,

porque é a única maneira de progredir dentro do Mercosul.

A Secretaria do Mercosul tem todas as

possibilidades de localizar as matérias em cada estágio desse

processo de integração sejam passíveis de harmonização. Em

segundo lugar, preparar, aconselhar sobre a metodologia de

integração que será feita pelos órgãos de cada Estado

correspondentemente. Essa é a minha proposta.

Muito obrigado.

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O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço a

participação do Professor Ronald Herbert e anuncio que

faremos agora uma pausa de quinze minutos.

(PAUSA PARA O COFFEE BREAK)

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O SR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Atenção, senhoras e

senhores, os trabalhos serão retomados.

Na seqüência ouviremos a Senhora Ministra

Elena Highton de Nolasco, representante da Corte Suprema de

Justiça da Argentina.

A SRA MINISTRA ELENA HIGHTON DE NOLASCO (CORTE

SUPREMA DE JUSTIÇA DA ARGENTINA) – Obrigada, Senhor

Presidente.

Bem, no que diz respeito à harmonização

legislativa, questão que estamos abordando hoje, todos

sabemos que Mercosul foi concebido, no início, a partir de

uma abordagem gradual. Começou sendo um acordo econômico que

foi se estendendo paulatinamente a outras áreas. Os

acontecimentos posteriores lideram uma transcendência que

superou, muito, àquela inicial concepção minimalista.

Em função do exposto no art. 1º, inciso IV,

relativo à harmonização legislativa nas áreas pertinentes,

considerou-se que deveria se dar prioridade a esse campo pela

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preocupação com as assimetrias econômicas e suas

conseqüências.

Atemo-nos à letra do Tratado de Assunção,

particularmente ao preâmbulo, que apresenta ambos os

objetivos entre eles a essa alegação do processo de

desenvolvimento econômico com justiça social, a melhora da

condição da situação de vida dos seus moradores, conseguindo

uma adequada inserção numericamente nacional. Observamos que

esses objetivos vão além de uma limitada concepção ao qual

nós nos referimos, porque esses assuntos não podem se esgotar

nas trocas econômicas, embora sejam processos gradativos, é

fundamental chegar-se a uma harmonização entre os Estados.

Cabe ressaltar que, nessa evolução, para se estabelecer, no

futuro, um legítimo sistema jurídico de integração do

direito, é preciso constituir um direito próprio com força

política de penetração na ordem interna dos Países membros, o

que deveria se revelar em três dos aspectos peculiares deste

direito: a. aplicabilidade imediata; b. efeito imediato das

normas; e c. a supremacia sobre os direitos nacionais. Em

síntese, o Direito esperado não constituiu um Direito

estrangeiro nem é Direito internacional, mas é,

principalmente, Direito de integração.

Essa questão foi abordada pela Comunidade

Européia para aproximar os sistemas legais através dos órgãos

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supranacionais. O Direito Comunitário Europeu é conduzido

pelas autoridades administrativas, legislativas e judiciais

de cada um dos Estados, em virtude do princípio de

aplicabilidade direta e da supremacia com um tribunal que

funciona como órgão que utiliza a interpretação, justamente

como meio de harmonização e unificação do Direito.

No âmbito do Mercosul, optou-se por um sistema

intergovernamental, sem poder imperativo nem autonomia. Isso

é um empecilho, no que diz respeito ao método adotado pela

harmonização legislativa nas áreas pertinentes. Isso sem

desconhecer a natureza mista da União Européia. Embora tenham

aspectos supranacional em matéria jurisdicional, deveríamos

encontrar formas solucionáveis para que os Estados possam

cumprir com os exigentes compromissos assumidos pelo Tratado.

Trata-se de um projeto que subordina certos interesses

nacionais à conquista de objetivos regionais e, portanto, sem

transferir poderes, tem, no mínimo nesse momento inicial, a

possibilidade normalmente reconhecida aos Estados soberanos e

que deveríamos, aqui, aprofundar isso numa fase de

integração. Nesse contexto apresentam-se dificuldades,

particularmente se levarmos em consideração que a

harmonização de Direito é uma ação prioritária a ser

desenvolvida para a proteção dos interesses econômicos

daqueles que poderiam ser prejudicados pela

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internacionalidade dos mercados. A regulação dessa

possibilidade tende a eliminar, mediante a correlação das

destinações dos Estados-membros, os inconvenientes que a

disparidade normativa existente em cada matéria incita no que

diz respeito ao funcionamento do mercado. Justifica-se a

necessidade de uma aproximação das efetivações dos Estados,

porém as diferenças poderiam afetar a livre circulação das

mercadorias e favorecer a existência de diversos graus de

protecionismo, que afetem aqueles que produzem e exercem o

comércio.

É necessário determinar a relação das normas

comuns do Tratado de Assunção e do ordenamento jurídico

derivado do Tratado com o ordenamento jurídico interno. Essa

questão é essencial para a Argentina, através de uma

jurisprudência da Suprema Corte de Justiça da Argentina, onde

eram exigidos direitos de importação relativos a café em

grão, originário do Brasil, baseada no Acordo nº 1 entre

Argentina e Brasil. Em 1993, o Tribunal afirmou que:

salvaguardados os Direitos Públicos Constitucionais,

corresponde atribuir prioridade aos tratados que estejam em

conflito com uma norma internacional contrária. Foi

assinalado que um critério diferente comportaria sustentar

que o legislador argentino produziria uma norma que

contradiria um acordo internacional, havendo incorrido numa

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transgressão a um tratado internacional. Quando não se tem

uma atribuição para modificar um tratado, faz-se uma lei,

embora pudesse elaborar uma norma diferente, seria impossível

esse ato de um órgão oficial, comportando numa transgressão

ao princípio de hierarquia das normas. Logo, a Reforma

Constitucional de 1994 deixou claramente estabelecida a

primazia do direito originado num acordo regional com o

Mercosul.

Essa questão, como já vista, é de maior

importância, mais ainda quando todos os integrantes

interpretam da mesma maneira. Devendo introduzir-se

gradualmente os elementos que estabelecem as atividades das

normas jurídicas do Mercosul. Pois isso redundará numa

supremacia e numa maior segurança jurídica, enquanto que,

numa posterior unidade de interpretação, poderia se

introduzir um mecanismo similar ao da Comunidade União

Européia para evitar uma disparidade desse tipo quanto à

integridade nacional, que possa por em perigo o princípio de

igualdade. Esse é o mecanismo já referido como questão

prejudicial. Adianto, mas só vou falar a esse respeito na

hora que eu mencionar as controvérsias que, no nosso

critério, é um passo, um instrumento indispensável para o

avanço na harmonização legislativa. Dessa forma, se supera,

de alguma uma maneira, a ausência de mecanismos para

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consolidar o compromisso assumido no Tratado de Assunção -

art. 1o, inciso IV - e para cumprir com o disposto no art. 42

do Protocolo de Ouro Preto, enquanto assinala que as fontes

jurídicas obrigatórias devem ser incorporadas aos

ordenamentos jurídicos nacionais, mediante procedimentos

previstos na legislação de cada país, norma que gerou

interpretações contraditórias.

Em razão do desenho outorgado, a

internacionalização de uma normativa outorgada, o Mercosul

não pode omitir a integração comercial e formal de cada

Estado, porque não existe, ainda, um órgão legiferante do

tipo supra-estatal. Essas dificuldades, que faço referência,

manifestam quando valorizamos a internalização da normativa,

segundo informe da Secretaria Técnica de julho deste ano,

conforme entendo; porque, conforme o que surgiu desse

relatório, a existência de dificuldade está clara, já que

aproximadamente cinqüenta por cento das normas dos órgãos não

foi incorporada aos ordenamentos jurídicos dos países, o que

suscita preocupação, sem levarmos em consideração de que se

trata de normas votadas, por consenso, pelos representantes

dos quatro Países e que se relacionam diretamente com o tema

da harmonização legislativa.

Essa carência, a partir das ditas resoluções,

sendo a última dessas, a CMC 2204, estabelece-se que, para a

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vigência e aplicação nos Estados-Partes das decisões,

resoluções e diretivas dos órgãos do Mercosul, com capacidade

decisória que não precisam de aprovação legislativa, será

adotado o procedimento contemplado. Tal sistema, com respeito

ao ordenamento jurídico interno, prevê a realização de

consultas e análises de consistência jurídica, já determinada

pela Decisão nº 2002.

Atualmente, a Secretaria do Mercosul não

recebeu informação dos Estados a respeito da incorporação da

Decisão 2204. Sobre esse tema, ontem a Ministra Cristina

Boldorini disse que estão tentando fazer uma reunião para

analisar a aplicabilidade dessa normativa, eventualmente

quando for o momento das contribuições pelos peritos. Talvez

a Ministra Boldorini possa esclarecer um pouco mais sobre

essa situação. Se bem que esse é um avanço no que diz

respeito à incorporação normativa, e somente é aplicável

àquelas normas adotadas pelo Mercosul, previstas em um artigo

de Ouro Preto, que não requer a inclusão de uma portaria

local, porquanto, o alcance, pelo que se pode observar, é

limitado. Não deixa de ser difícil tornar imperativa tal

decisão, já que requer toda uma série de consultas que são

necessárias nas diversas áreas dos governos nacionais, o que

conspira contra os prazos estabelecidos para a sua

concretização.

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Todas as considerações levam a uma reflexão

sobre outras vias possíveis para alcançar os objetivos

propostos. Além disso, que é notadamente jurisdicional, como

a via jurisdicional, temos que o cumprimento ao primeiro

acórdão institucional, conhecido como Emenda Henrique

Allonso, aprovado entre o CMC e a Comissão Parlamentar, da

qual também se falou nesta Reunião, é um mecanismo importante

para harmonizar as legislações.

Se a Comissão Parlamentar assume a faculdade

legiferante que é a reconhecida, podem-se determinar alguns

temas fundamentais que podem abranger o espaço integrado. Da

mesma forma, considero fundamental, como o que foi assinalado

pelo Professor Herbert, do Uruguai, que a Secretaria Técnica

cumpra um papel essencial no trabalho de harmonização

legislativa dentro do Mercosul.

O compromisso seria efetivado de maneira

satisfatória se incluirmos temas como a proteção ao

consumidor já mencionado, se bem que o Mercosul já decidiu e

não foi internalizado pelos Estados ainda. No âmbito interno

de cada país, durante os últimos anos, isso está

relativamente solucionado por meio de leis sobre a matéria

quanto à responsabilidade dos fabricantes, vendedores,

concessionárias, importadores. Existe todo tipo cláusulas que

confere responsabilidades ao sujeito; e seria importante,

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também, incluir a questão da garantia nos contratos, a

propriedade intelectual, licença de tecnologia, porque, ainda

que alguns desses aspectos tenham sido abordados, isso foi

feito sem nenhum sucesso.

A CMC aprovou, na Decisão 22, a defesa

comercial, estabelecendo disciplinas para os procedimentos e

regras para pesquisas “antidumping”. Apesar do tempo

transcorrido, a norma ainda não foi incorporada por nenhum

dos Estados-Parte. Acho que cabe assinalar que, embora não

seja uma questão de harmonização legislativa, sabemos que a

tarefa de oficializar os registros de propriedade imóvel -

cujos diretores se reúnem há mais de uma década no Comitê

Latino-Americano de Registros, com a tarefa de trocar

informações relativas a questões concretas de cada registro –

é o meio para se conduzir o serviço com legalidade e

transparência de nível técnico, adaptando-se às necessidades

da época. Por outro lado, o Colégio de Notários tem uma

tarefa que aborda o tratamento em reuniões periódicas das

leis da região no que diz respeito à atividade cartorial.

Esse tipo de iniciativa de trabalho conjunto poderia ser

adotado por especialistas em outras questões, por outras

associações de classe, porque um melhor conhecimento das

realidades jurídicas facilita a tarefa de articulação. Até

hoje, alguns aspectos de Direito internacional privado têm

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oferecido a solução dos casos com elementos estrangeiros

mediante uma norma conflituosa cujo ponto de conexão remetia

ao Direito encarregado da resolução do problema. Apesar

disso, a legislação conflituosa é insuficiente em algumas

questões, particularmente nas relações jurídicas efêmeras.

Ocorreram, assim, as principais normas do

Direito Internacional Privado, como, por exemplo, a da CIDIP.

Embora se a CIDIP for considerada como a fonte para elaborar

normas equivalentes, talvez só conseguiríamos desperdiçar

esforços, porque os Estados fazem parte do sistema

interamericano. Também, se se desejar estabelecer um Direito

uniforme no âmbito do Mercosul, a recepção normativa de uma

série de princípios de articulação é imprescindível. Mas há

questão sobre isso, também falaram as pessoas que me

precederam no anúncio da palavra. Poderíamos, também,

observar algumas questões com sentido amplo. Poderíamos

tentar a harmonização a partir de normas comuns que funcionem

como garantias mínimas ou de regras de procedimento para o

exercício de Direito privado: um exemplo é a declaração

sócio-trabalhista do Mercosul, entre outros.

No mesmo âmbito, poderíamos assinalar que a

possibilidade, sugerida na doutrina uruguaia, no sentido de

considerar a questão dos Direitos Humanos quanto à prestação

dos Direitos Trabalhistas, a partir de acordos internacionais

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obrigatórios, adotados homogeneamente pelos Países do

Mercosul, considerando que esses elementos são supranacionais

até para os países que não assinaram a Convenção de Viena.

Isso é mais claro para os países que, como a República

Argentina, assinaram essa Convenção, que no art. 27, ao qual

fizemos referência ontem, estabeleceram que os Estados Parte

não poderão invocar o Direito interno como justificativa para

o não-cumprimento de um tratado. A alternativa deriva de não

deixar de reconhecer a importância da ordem judiciária.

A evolução do Direito e a nova administração

do conjunto do segmento do território jurídico só serão

possíveis através de uma interpretação dinâmica e

teleológica, sem alterar o devido cumprimento da lei. Na área

interna do Mercosul, cada juiz será chamado, por exigência

das suas funções, a intervir em conflitos cuja solução

envolverá, cada vez mais, o conhecimento e a aplicação do

Direito do Mercosul já existente, ou elaborada por ele. A

realidade na qual deverá estar inserido determina que todo

juiz nacional deverá fazer um estudo jurídico daquela

matéria, porque deverá ser aplicado o direito do Mercosul, e

o seu avanço ou retrocesso será um elemento fundamental.

A experiência européia demonstrou que os

juízes nacionais são os verdadeiros juízes comunitários.

Dessa forma, nós magistrados enfrentamos o desafio de ser

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partícipes ativos nesse processo para a proteção dos

Direitos, e da efetiva tutela e garantia, fazendo parte da

delicada missão dos juízes e dá sentido a essa tarefa do

juiz.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) – Agradeço a participação da

Ministra Elena Highton de Nolasco e passo a palavra ao

Ministro Eros Grau do Supremo Tribunal Federal.

O SENHOR MINISTRO EROS GRAU (SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL) – Muito obrigado, Senhor Ministro.

A mim incumbe dizer duas pequenas palavras.

Nós vamos dividir o nosso tempo. Gostaria de dizer,

inicialmente, que foram extremamente substanciais,

extremamente ricas essas primeiras exposições.

Fica bem claro que o mercado - e agora falo do

mercado em geral - é uma instituição jurídica ao contrário do

que se pregou, durante muito tempo, quando se falou na mão

invisível do mercado. Não existe essa mão invisível; o

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mercado não é um lócus naturalis, é um lócus artificialis, na

verdade, formado, conformado, plasmado, construído pela mão

que coloca aquilo que já se chamou de mínimo normativo. Sem

um mínimo normativo – e isso ficou muito claro em todas as

disposições anteriores – essa instituição jurídica não é uma

instituição econômica. Por isso digo, às vezes, de

brincadeira, que para falar de moeda, de mercado, é preciso

chamar um jurista e impedir que os economistas falem

sozinhos, porque nós, que somos operadores do Direito,

efetivamente somos capazes de descrever o mercado, a moeda

etc. Esse mínimo normativo está naquele quadro normativo

periférico dos nossos protocolos quando pensamos em termos de

Mercosul, mas precisa ser reconstruído.

De certa forma, fugindo de Kelsen e passando

para o lado de Carl Smith - quando falamos num mercado como o

Mercosul, quando se fala também em Comunidade Européia, e aí

está o desafio da constituição européia - talvez falte o

nomos da terra de que falava Carl Smith. Isso precisa, então,

ser escalado. Precisa-se escalar e construir. O desafio

europeu, hoje, certamente, é muito mais difícil do que o

nosso, porque, se nos falta aqui o nomos da terra para essa

harmonização e uniformização, seguramente é “pars terrible”

quando se fala em uma constituição européia, por exemplo, sem

o nomos.

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Mas, de qualquer modo, essas eram as

observações, eu diria, otimistas, porque estamos melhores que

os europeus, neste momento. Gostaria de passar a palavra a

dois Colegas: primeiro, ao Professor Eduardo Gleber e,

depois, à Professora Stefania.

O PROFESSOR EDUARDO GLEBER (PUC-MG) – Muito

obrigado, Ministro Eros, Senhor Presidente.

O aprofundamento da integração econômica no

Mercosul tem como uma de suas condições de eficácia a

integração jurídica entre os Estados Partes naquelas matérias

capazes de influir na atividade econômica que nele se

desenvolve e que se deseja incrementar. Nessa categoria se

inserem, primordialmente, é claro, a norma que regem a

circulação de bens e serviços, especialmente aquelas que

estabelecem um tratamento tarifário e às que coíbem a

imposição de barreiras não tarifárias, barreiras técnicas,

barreiras fitossanitárias, que vedam a concessão de subsídios

e as praticas “antidumping”. Em torno dessas regras,

entretanto, que constituem a essência da normatividade da

integração econômica, orbitam normas jurídicas de outras

classes, que condicionam o funcionamento do comércio de bens

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e serviços no espaço integrado e mesmo as relações jurídicas

que se estabelecem a partir da aproximação dos indivíduos

conectados a diferentes ordenamentos jurídicos nacionais.

É inegável que um processo de integração

econômica, Senhor Presidente, sofre a influência dos

instrumentos legais destinados a conferir segurança às

relações jurídicas no plano internacional. A maior ou menor

eficácia desses instrumentos pode limitar o sucesso ou

determinar o fracasso da integração na medida em que deixe de

assegurar a proteção aos interesses legítimos das partes,

seja diante da omissão do quadro normativo do Direito

material, seja pela ineficácia da prestação jurisdicional

indispensável para vindicá-los.

Em face disso, avulta a necessidade de um

razoável grau de homogeneidade quanto às regras de Direito

concernentes, por exemplo: as obrigações contratuais, nelas

incluídos os aspectos da entrega, do pagamento da mora, das

garantias de qualidade; assim como, quanto ao Direito do

Consumidor, as regras da concorrência, ou competência, como

dizem os espanhóis, a propriedade intelectual, aí incluída a

proteção ao software e, até mesmo, a repressão penal, a

pirataria e a contrafação, dentre outras, cuja assimetria é

capaz de gerar obstáculos e distorções prejudiciais ao

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funcionamento do livre comércio entre os agentes econômicos

dos Estados-Partes.

Ao lado disso, é mister assegurar aos agentes

econômicos acesso desobstruído aos mecanismos jurisdicionais,

seja na justiça estatal, seja na instância arbitral, entendo-

se aí como tal, não somente o direito de postular como também

as condições necessárias para execução da sentença judicial

ou arbitral que se produzir no âmbito do procedimento

contencioso. Nesse sentido, normas processuais, homogêneas e

eficazes, são os objetivos a serem perseguidos. Sabemos que a

sua falta é, com impressionante freqüência, fonte de

frustração da efetividade da prestação jurisdicional e, por

conseguinte, da segurança jurídica indispensável para o

desenvolvimento da atividade econômica.

A relevância desse tema para o comércio

internacional encontra o seu melhor exemplo na conversão de

Bruxelas sobre jurisdição e execução, em matéria civil e

comercial, inicialmente concebida para viger apenas no âmbito

da Comunidade Econômica Européia, à qual, posteriormente,

entretanto, aderiram outros Estados europeus igualmente

interessados na eficácia da prestação jurisdicional,

transformando-se, em 1988, na Convenção de Bruxelas e Lugano,

com vigência em todo espaço europeu.

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Com esse pano de fundo, três questões foram

formuladas pela Coordenação Científica deste Encontro no

concernente à harmonização legislativa em Direito Material e

Processual: a primeira, no estágio atual, qual o caminho a

seguir para concretizar a expectativa de um ordenamento

jurídico no Mercosul, harmonização ou uniformização?

O exercício da harmonização legislativa

constitui um delicado mister, mediante o qual se busca

compatibilizar normas jurídicas que devem ser criadas, se

ainda inexistentes, ou que devem ser alteradas, se já

existentes e conflitantes entre si, de modo a se ajustarem a

um paradigma consensualmente estabelecido pelos Estados. Por

conter uma fase autóctone a geração de normas na ordem

jurídica interna, o processo de harmonização requer passagem

pelo processo legiferante de cada um dos Estados-Partes

interessados, submetendo-se aos respectivos Poderes

Legislativos Nacionais, de conformidade com os ritos de cada

um deles. Esse processo, conseqüentemente, é sujeito às

circunstâncias políticas próprias dos trâmites congressuais,

cuja característica inerente é a necessidade de realizar

concessões num processo de negociação, que não raramente

resulta em alterações nas regras submetidas à deliberação

parlamentar, por vezes, a ponto de desfigurá-las.

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A técnica de harmonização legislativa, por

conseguinte, embora compatível com os graus iniciais do

processo de integração, nos quais é possível conviver com

discrepâncias pontuais, não se mostra bem ajustada, a nosso

ver, a um processo de integração mais profundo, no qual a

homogeneidade buscada impõe a identidade entre os

dispositivos legais relevantes, pelo menos nas questões de

maior impacto sobre o funcionamento do bloco.

Com a uniformização legislativa que, por seu

turno, pretende estabelecer normas jurídicas efetivamente

homogêneas, que reflitam identidade normativa nos territórios

de todos os Estados Partes envolvidos, faz-se mediante a

celebração de tratados normativos, mediante os quais os

Estados Partes assumem, uns perante os outros, a obrigação de

internalizá-los em seus respectivos territórios, de modo que,

respeitadas as soberanias individuais, acabam todos os

convenentes por adotar um só texto, o que produz efeito

semelhante ao que se teria numa eventual norma supranacional,

porquanto vigente igualmente em todos os espaços territoriais

nacionais.

Em âmbito mundial, a uniformização tem sido

objetivo de diferentes instituições, dentre as quais

sobressaem a Conferência da Haia, Unidraw e a Uncitral como

modo de estabelecer normas comuns em diferentes ordenamentos

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jurídicos nacionais. Utiliza-se para tanto o método da lei

modelo, cujos exemplos mais conhecidos são a Lei Modelo sobre

Arbitragem Comercial e Internacional e a Lei Modelo sobre

Comércio Eletrônico ambas da Uncitral; ou o método dos

tratados, contendo normas especiais, do qual são exemplos a

Lei Uniforme sobre Venda Internacional de Mercadorias também

da Uncitral, de 1980; as Convenções de Genebra sobre notas

promissórias, letras de câmbio e sobre cheques, já antigas da

década de 30; e a Convenção de Nova Iorque sobre

Reconhecimento de Execução de Laudos Arbitrais Estrangeiros,

de 1958. Mas, também no âmbito do hemisfério americano, a

uniformização legislativa tem sido utilizada. As Conferências

Interamericanas de Direito Internacional Privado – CIDIP,

celebradas a partir de 1975, estabeleceram Direito uniforme

sobre os mais variados temas, tanto de natureza substantiva,

como adoção, alimentos, lei aplicável aos contratos

internacionais menores; como de natureza procedimental, como

a arbitragem, as cartas rogatórias citatórias, a competência

jurisdicional, procurações, prova de direito estrangeiro.

Embora nem todas essas convenções tenham sido

internalizadas por todos os países que as subscreveram, a

CIDIP se constitui num exemplo marcante da capacidade de

mobilização dos Estados do sul, centro e norte do continente

americano, em busca da uniformidade nos aspectos mais

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relevantes do Direito Civil, Comercial e Processual Civil,

notoriamente os que dizem mais de perto com a atividade

econômica.

No espaço regional do Mercosul, a

uniformização legislativa tem sido, Senhor Presidente,

particularmente importante, dela sendo exemplos vivos o

Protocolo de Las Leñas sobre Cooperação e Assistência

Jurisdicional, de 1992, o Protocolo de Buenos Aires sobre

Jurisdição Internacional e Matéria Contratual, de 1994, o

Protocolo de Ouro Preto sobre Medidas Cautelares, de 1994, e

o Protocolo de São Luis sobre Responsabilidade Civil em

Matéria de Acidentes de Trânsito, de 1996. Qualquer reparo

que se possa fazer à técnica ou a soluções adotadas pelo

legislador uniforme nesses instrumentos não anula os efeitos

positivos desses mesmos instrumentos no processo de

integração econômica regional. Mas é necessário fazer em

termos de uniformização legislativa, pois inúmeros temas

ainda estão a reclamar a abordagem homogênea pelos Estados-

Partes do Mercosul.

Questões como a propriedade intelectual e a

repressão à pirataria e contrafação não estão, ainda,

suficientemente resolvidas no espaço integrado. Pois, mesmo

que se considere que todos os Estados Partes sejam também

signatários do acordo tríplice, verifica-se a necessidade de

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instrumentos específicos que permitam a efetiva implementação

das regras mundiais.

Em síntese, opina-se no sentido de que a

continuidade do processo de uniformização legislativa

proporcionará a consolidação de um ordenamento jurídico do

Mercosul, absolutamente indispensável para o sucesso do

propósito integracionista.

A segunda questão proposta refere-se ao papel

que os respectivos Poderes Judiciários podem ou devem exercer

em prol da integração com base na premissa de que, como um

dos ramos do Estado a que pertencem, estão eles, Poderes

Judiciários, vinculados à vontade desses mesmos Estados na

escolha da integração regional como elemento de sua política

externa.

Em vários momentos deste Encontro, temos

ouvido e assistido manifestações de apoio e encômio ao

Processo de Integração Latino-americano, do qual o Mercosul é

o mais visível exemplo. Contudo, essas manifestações não têm

sido coincidentes com os pronunciamentos do Poder Judiciário

brasileiro no exercício de sua função judicante.

Realmente, a partir do julgamento do Recuso

Extraordinário nº 80.004, de 1977 – já se vão aí vinte e sete

anos -, a posição do Supremo Tribunal Federal brasileiro tem

sido invariavelmente no sentido de que a lei interna

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posterior prevalece sobre o tratado que lhe fora antecedente,

seja este ou não oriundo do Processo de Integração Latino-

americano. No entender da Corte Suprema brasileira, deve-se

assegurar a última palavra ao Congresso Nacional, ainda que

tal importe afronta a um compromisso internacional do País, o

que constituiria apenas um fato político e não jurídico.

Também, no que concerne à cooperação

jurisdicional no cumprimento de medidas cautelares de caráter

executório, não tem sido conferida pela nossa Corte Suprema,

ao Protocolo de Medidas Cautelares, celebrado no âmbito do

Mercosul, qualquer deferência especial que o excepcione das

regras de homologação da sentença estrangeira, fato já

repetidamente abordado neste Encontro.

Se por um lado se pode vislumbrar o escrúpulo

do Supremo Tribunal Federal, atento para não invadir a esfera

de competência do Poder Legislativo, assim como para observar

fielmente os ditames da Constituição da República; por outro

lado, é de esperar que a Corte Suprema, no exercício de sua

específica atribuição de interprete e de aplicadora da

Constituição, o faça de modo consentâneo com o princípio,

segundo o qual o fundamento da organização política

brasileira se assenta, entre outros valores, na formação da

Comunidade Latino-americana das Nações, na qual, repito, o

Mercosul é a expressão.

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Igual papel é de se esperar dos Poderes

Judiciários e dos demais Estados-Partes do Mercosul e dos

Estados Associados de modo que o projeto de integração

regional possa ser impulsionado pela convergência dos Poderes

dos Estados harmônicos entre si.

A terceira e última questão proposta,

concernente às Assimetrias das Organizações Judiciárias

Nacionais, como obstáculos ou potenciais contribuintes para

harmonização e uniformização legislativa, ficará a cargo dos

comentários da Professora Stefânia.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) – Agradeço a participação do

Professor Eduardo Gleber, e passo a palavra à Professora

Stefânia Viveiros.

A SENHORA PROFESSORA STEFÂNIA VIVEIROS (OAB–

DF) - Muito obrigada, Senhor Presidente, me compete analisar

a terceira questão que se refere às Assimetrias das

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Organizações Judiciárias Nacionais se são obstáculos ou podem

contribuir para a harmonização e uniformização legislativa.

Não vejo, inicialmente, que tais Assimetrias

das Organizações Judiciárias Nacionais sejam obstáculos para

harmonizar e uniformizar a parte legislativa. A título de

exemplo, podemos citar o próprio deslocamento de competência

do Supremo Tribunal Federal para o Superior Tribunal de

Justiça no tocante à homologação de sentenças estrangeiras e

a concessão de exequatur às cartas rogatórias. Essa

alteração, que já foi aprovada pelo Congresso na reforma do

Poder Judiciário, sairá do art. 102, alínea “h”, para o art.

105, alínea “i”, do Superior Tribunal de Justiça. Esse

deslocamento não constou lá de quem seria a competência para

proceder essa homologação e a concessão do exequatur como

consta na alínea “h”, do Supremo Tribunal Federal. Dessa

forma, verifico que competirá ao Regimento Interno do STJ

definir ou então distribuir a competência adequada para tais

atos.

Essa seria a primeira observação, deixando

claro que, no Regimento Interno do Supremo, está previsto, no

seu art. 215, o que compete ao Presidente do Supremo; e o STJ

irá fazer essa distribuição da competência, por meio do seu

Regimento, que poderá até concluir e achar mais adequado,

também, se essa análise competirá ao Presidente do Superior

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Tribunal de Justiça, do mesmo modo utilizando-se do controle

concentrado.

A segunda observação que faço está relacionada

ao Protocolo de Las Leñas, firmado em 1992. Lá está

registrado que o cumprimento da carta rogatória de mero

expediente – quando falo de mero expediente, leiam as

hipóteses de citação – competirá às autoridades das divisas.

Então, nesse aspecto, pelo menos numa linha teórica,

vislumbro, para se ter maior efetividade nessa prestação

jurisdicional, a possibilidade, teoricamente, de que essa

competência realmente deveria ser concedida aos juízes de

primeiro grau, tendo em vista, já que estamos diante de

países vizinhos, que teria muito mais efetividade. Então,

seria uma análise, buscando a questão de efetividade na

prestação jurisdicional, até porque vejo que não haveria

nenhum tipo de dificuldade para a análise de soberania

nacional e a ordem pública realizada pelo juiz de primeiro

grau, como também já acontece nas aplicações das leis

estrangeiras pelo próprio juiz brasileiro. Nesse aspecto,

vejo que teríamos uma efetividade com relação a essa

prestação jurisdicional no momento em que poderia ser

atribuída a esse juiz de primeiro grau a realização do

cumprimento dessa citação, conforme já consta no Protocolo de

Las Leñas. Com isso teria integração e uma rapidez nesse

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cumprimento dessas cartas rogatórias por meio dessas

citações.

Senhor Presidente, essas foram as

considerações relacionadas com a questão a que fui incumbida.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) – Agradeço a participação da

Professora Stefânia Viveiros.

Agora, iniciaremos os debates que estão

franqueados também aos observadores.

Pediria a todos que dissessem o nome e a

procedência.

A DRA. BERTA FERDER (URUGUAI) – Eu gostaria de

fazer referência a uma questão estritamente técnica, em

virtude de que a parte material da questão foi amplamente

esclarecida de maneira muito eficiente pelos palestrantes do

painel.

Minha intervenção, minha contribuição,

exclusivamente técnica, está na linha do orador Professor

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Eduardo Gleber, porque nós temos uma formação ius privatista,

o que nos dá, provavelmente, uma mesma abordagem da questão.

Gostaria de fazer referência, concretamente,

ao estabelecido pelo Tratado de Assunção sobre a obrigação da

harmonização. Isso está no primeiro capítulo do Tratado de

Assunção, no último parágrafo. E Faz referência ao

compromisso dos Estados-Partes em harmonizar suas legislações

nas áreas pertinentes para fortalecer o processo de

integração, isto é, há um compromisso específico dos Estados-

Partes: o compromisso de harmonizar as legislações. O único

que pode ser harmonizado, realmente, é o direito interno.

Esse esclarecimento é pertinente, porque, nos diversos

âmbitos de negociação do Mercosul, quando estão sendo

celebrados acordos, tratados, no sentido técnico, ou acordos

que deverão ser depois aprovados via administrativa, as

pessoas entendem que estão harmonizando quando, na verdade,

não estão harmonizando; o que elas estão fazendo é procurando

normas comuns, que é um processo diferente da harmonização e

que tende à uniformização e não à harmonização. Só podem ser

harmonizadas normas internas. O que quer dizer harmonizar?

Quer dizer compatibilizar as normas em algumas matérias

específicas que não sejam contraditórias entre si com a

finalidade de obter o processo de integração nos seus mais

amplos aspectos.

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O parágrafo anterior, do mesmo Capítulo I do

Tratado de Assunção, diz uma coisa que poderia ser

interpretada como semelhante, mas é completamente diferente.

O parágrafo anterior diz, porque o parágrafo denomina-se o

objetivo, os princípios e os instrumentos. Eu diria que o

último parágrafo refere-se a propósitos sem instrumentos,

isto é, a harmonização é um dos instrumentos, não é o

instrumento ideal, mas é o único viável, dadas as

circunstâncias e tem um objetivo, um propósito. Porém, o

parágrafo anterior, que fala sobre Coordenação de Políticas

Macroeconômicas, como nós sabemos, não se produziu, mas

alguns setoriais, sim, se concretizaram, refere-se aos três

elementos do título do Capítulo I do Tratado de Assunção,

porque diz: “oferecer aos princípios, aos instrumentos e aos

propósitos”. Isso, sim, pode ser realizado através de

tratados, porque a coordenação de políticas macroeconômicas e

setoriais pode ser feita por tratados e raramente poderá

realizar-se por um instrumento da harmonização apenas.

Harmonização significa ter normas nacionais que não sejam

incompatíveis entre si.

Também se falou aqui sobre uma questão que nos

afeta diretamente, porque funciona muito mal: o famoso tema

da incorporação, que, possivelmente, será modificado - pelo

menos espero que venha a ser modificado.

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Com relação a tudo isso, quero fazer um último

esclarecimento. Gostaria de fazer referência ao que está na

agenda, a reformulação eventual do Protocolo de Ouro Preto,

mas não do Tratado de Assunção. Isto é, que essa atualidade

de mecanismos de instrumentos que estão aqui, o último deles

no capítulo da harmonização já referido e o outro da

coordenação de políticas, feitas por meio de tratado,

permanecerá no sistema ainda que o Protocolo de Ouro Preto

venha ser reformado e que possa surgir um Protocolo de Ouro

Preto II, apenas se houver uma definição técnica dos

instrumentos que devem ser utilizados para alcançar os

diversos objetivos do Mercosul.

Essa é a contribuição que gostaria de fazer.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço a

contribuição da Doutora Berta Feder.

Passo a palavra ao Dr. Ricardo Alonso García.

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O PROFESSOR RICARDO ALONSO GARCÍA (ESPANHA) –

Obrigado, Senhor Presidente. A propósito do que a minha amiga

Berta Ferder dizia, não vou entrar numa discussão que é

realmente muito conceitual e técnica sobre como se harmoniza,

ou não, e o que se entende por organização. Na Europa,

utilizam-se conceitos claros. Uma coisa é a uniformização,

que significa haver uma única norma sobre o Direito nacional,

e outra é a harmonização que implica em admitir-se a

diversidade das legislações nacionais dentro de pautas

comuns. Essas pautas comuns, esses pontos comuns são marcados

por uma norma européia. Na Europa, está claro que, quando se

fala de harmonização, significa que estamos eliminando

disparidades nacionais, mas mantendo uma certa diversidade

dentro de pontos comuns que são recolhidos numa norma

européia.

Eu gostaria de sublinhar dois pontos

essenciais que (sem tradução) um pequeno câmbio, um mínimo

câmbio qualitativo que é uma maneira diferente de abordar o

tema da integração pelas altas instâncias políticas. Tenho a

impressão - uma impressão pessoal e uma impressão

fundamentada, porque trabalhei em relação nisso - que, às

vezes, as mais altas instâncias políticas abordam o tema da

Secretaria, em primeiro lugar, e corre-se o risco de que isso

aconteça também com o Tribunal Permanente de Revisão,

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recentemente criado. Essas instâncias são criadas e parece

que nelas se vê uma espécie de – não exagerando minhas

palavras – modelo de sistema. Cria-se a Secretaria, mas

depois surge o medo de verem o que a Secretaria pode fazer.

Acredito que a Secretaria alcançou um nível de maturidade

suficiente para começar a contribuir nessa fase na maneira de

como se legisla. Quando falamos na legislação, significa que

devemos ter técnicos preparados, trazidos com apoio de outros

órgãos internos ou externos preparados que dão uma visão,

vestindo a camiseta do Mercosul, uma posição que aglutine

todos os interesses individuais num único interesse comum

para começar a apresentar possíveis esboços. Insisto que isso

deve ficar claro para as altas instâncias políticas; isso não

significa, de jeito algum, tirar o poder político. Ao

contrário, a única coisa que essa atividade da Secretaria

poderá fazer é melhorar quem vai continuar conservando cem

por cento do poder decisório. Sensivelmente, isso vai

melhorar - por um lado. Acredito que é hora de que se

continue. Não temos que reformar nenhum tratado. Devemos

deixar o papel da Secretaria para apoiar. Insisto: não

estamos falando em tirar poder político nem melhorar a

capacidade de decisão de quem tem o poder de decisão.

Em segundo lugar, vamos destacar aqui também.

Para mim é chave, que quando falávamos nessas simetrias

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constitucionais ontem, tratávamos de um tema importante. Quem

harmoniza? Hoje em dia quem harmoniza são os Poderes

Executivos. Não podemos nos enganar em relação a isso: quem

harmoniza são os Executivos. E, harmonizando, é evidente que

estamos repetindo aqui a história vivida na Europa, há 50

anos. Isso implica que, antes da harmonização, quem estava

legislando nos Estados Partes eram os Parlamentos. Quando

começamos a harmonizar, esses Parlamentos ficaram fora do

jogo, porque quem harmoniza são os Poderes Executivos. E o

que aconteceu? Como os Parlamentos não foram associados a

essa fase de harmonização, quando chegou o momento de

internalizar, quando chegou a hora de fazer efetiva essa

harmonização, em face de uma realidade no Mercosul,

simplesmente os Parlamentos reclamaram - no meu ponto de

vista, legitimamente - o papel do qual eles foram despojados

na fase de negociação.

Ontem, destacava-se aqui – se não me engano

foi o Presidente quem disse isso – que isso tem uma certa

lógica, porque, em definitivo, em todos os países que

negociam, que detenham o monopólio de política exterior, são

os Poderes Executivos que harmonizam. Concordo com isso como

afirmação de princípio, mas não com as últimas conseqüências.

Em todos os países, efetivamente, os Poderes

Executivos têm o poder para desenvolver as políticas

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exteriores e plasmar aquilo em tratados, mas não para

harmonizar as legislações nacionais. Esse é um salto

qualitativo. Em outras palavras, esse poder onipresente do

Executivo tradicional, em termos de celebração de tratados,

não pode ser estendido na hora da negociação de algo que é

muito mais que um tratado: fazer esse processo operativo,

setor por setor, por meio do Legislativo. Essa é a realidade.

Que soluções podem ser oferecidas? Esse é o

ponto de vista do problema que está presente. E creio que as

soluções passam - isso foi destacado aqui também - por fazer

partícipes aos Parlamentos das negociações dessa harmonização

que está acontecendo no Mercosul. Dessa maneira se alcançam

duas coisas importantes: uma, implicar os Parlamentos

nacionais na fase ascendente de formação da norma comum e, ao

mesmo tempo, precisamente porque foram partícipes dessa

negociação; outra, implicar-lhes com seriedade na fase de

internacionalização. O primeiro passo foi realizado com a

assinatura do acordo institucional, em outubro do ano

passado. A segunda parte desse compromisso, que às vezes é

esquecida desse compromisso ainda tem que ser feita.

Lembro aqui que todo acordo institucional tem

duas partes: a primeira é consultar, e a segunda parte é que

a comissão parlamentar conjunta se fez responsável através

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desse acordo, desse tratado, de tentar agilizar a fase de

internacionalização das normas do Mercosul no âmbito interno.

Finalmente - vou concluir, Senhor Presidente,

porque este será um tema de debate intenso no painel de hoje

à tarde - , há o segundo aspecto da harmonização que, para

mim, é essencial: de nada nos serve negociar uma norma do

Mercosul, ficar durante anos esperando que essa norma se

internalize, até que o último dos Estados-membros dite a

norma legislativa correspondente para a sua

internacionalização, e, finalmente, quando tivermos essa

norma sobre o papel, percebermos que ela não se aplica de

maneira efetiva. E aqui resulta a chave – insisto, não vou me

estender porque vamos falar disso hoje à tarde e espero,

também, que não levem a mal as minhas palavras -: muito mais

essencial do que o trabalho do Tribunal Permanente de Revisão

é o trabalho que exercem todos e cada um dos juízes

nacionais, desde o juiz de primeira instância do povo do

interior até as Cortes Supremas, os Tribunais Supremos das

respectivas partes. Por quê? Porque não podemos esquecer que

quem aplica cotidianamente o Direito do Mercosul, quem aplica

diariamente o Direito do Mercosul não é o Tribunal Permanente

de Revisão. O Tribunal Permanente de Revisão serve para

outras coisas.

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Tive a honra de presidir o último Tribunal do

Mercosul - foi o nono. Em dez, onze anos foram feitos nove

laudos. Isso significa muito pouco; isso significa que não se

aplica ao Direito do Mercosul porque ele está sendo aplicado.

A Secretaria acaba de destacar um relatório excelente sobre

como se aplica, nos Poderes Judiciários nacionais e como se

faz operativo esse Direito do Mercosul. Isso acontece assim:

na Europa, e em todos os sistemas de integração que pretendam

ser sérios, quem aplica diariamente o Direito são os Poderes

nacionais. O Tribunal Permanente de Revisão servia, a

princípio, para outras coisas: para resolver questões,

controvérsias internas e estatais. A chave disso tudo vai ser

abordada hoje à tarde.

A querida Ministra argentina destacou também

esse ponto. Se isso acontece dessa maneira, resulta chave

manter uma uniformidade na aplicação dessa norma comum. Se

estivermos afirmando que quem aplica cotidianamente o Direito

do Mercosul são os milhares de juízes, em tribunais de

estados diferentes, corre-se o risco de que cada juiz, cada

Tribunal interprete de uma maneira diferente essa norma

comum. E ali temos o risco real, em termos práticos, de como

se pode quebrar essa harmonização. De nada serve essa

complexa fase de negociação com o consenso, e, depois, a fase

de internacionalização com todos os problemas que trazem os

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Parlamentos Nacionais à Justiça, se, no final, quisermos ter

uma norma comum. Mas, uma norma comum que não se aplique

comumente no território de todos os Estados-Partes, porque

isso não vai servir para nada. Definitivamente, a chave está

no fato de ter-se que manter essa harmonização por uma norma

comum, desde a fase de sua produção até a de sua efetiva

aplicabilidade aos cidadãos. Para isso, é chave o tema da

opinião consultiva. Acredito que essa será a questão-chave

nos próximos anos de Mercosul. Analisaremos hoje à tarde como

isso será abordado, como essa peça-chave será aplicada para

que o Tribunal Permanente de Revisão dê uma resposta não só

aos juízes concretos, mas que essa resposta seja uniforme

para todos os Tribunais de todos os Estados-membros.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) - Agradeço a

participação do Professor Ricardo Alonso García.

Peço ao próximo participante que indique seu o

nome e a sua procedência.

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A PROFESSORA ADRIANA DREYSIN DE KLOR

(UNIVERSIDADE DE CÓRDOBA) – Não tenho muito a agregar após

tão importantes apresentações aos temas assinalados pelo

Professor Ricardo Alonso García, porém, acredito que uma

questão tão importante como a que está sendo agora debatida

tenha a ver com outra questão que, aqui, deveria ser

desenvolvida pela Comissão Parlamentar Conjunta, ou, num

período mais ou menos próximo: a criação de um Parlamento.

Estamos aqui, numa reunião de juízes de

Tribunais Superiores, onde acho fundamental fazer-se chegar,

a todos os juízes e magistrados de cada um dos países, o

papel que devem assumir como juízes da integração, porque,

efetivamente, a opinião consultiva é um instrumento

fundamental para o futuro. Mas, pergunto-me: hoje, quantos

dos nossos juízes nacionais, de cada um dos nossos países,

sabem que é possível fazer uma consulta ao Tribunal

Permanente de Revisão, que tem o efeito tão importante de

contribuir para a interpretação uniforme do Direito do

Mercosul?

Eles sabem que existe uma regulamentação do

Protocolo de Olivos, então, no momento de se pensar nas

conclusões, não devemos esquecer que é necessário trabalhar

para a formação dos nossos juízes a fim de que eles conheçam,

pormenorizadamente, o instrumento que lhes ajudará na

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interpretação de um direito novo e de uma grande medida ainda

desconhecida deles.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço à

Professora Adriana Dreysin de Klor.

Passo a palavra à Professora Nadia de Araújo.

A PROFESSORA NADIA DE ARAÚJO (PUC/RJ) -

Gostaria de retomar as palavras do Professor Ricardo Alonso,

que apontou o problema de como se legisla, para falar de um

momento anterior a isso: como se prepara uma legislação.

É muito importante agregar, neste momento, o

trabalho dos acadêmicos em apoio a essas novas legislações.

Há necessidade de se utilizar os centros especializados para

que se faça um trabalho prévio, até de levantamento do status

quo da legislação de cada país, por área, por assunto. Uma

verdadeira integração dos que estudam essas questões e uma

valorização dos trabalhos dos especialistas e do Direito

Comparado.

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Queria aproveitar a oportunidade para

homenagear a Professora Ana Maria Vilela, a qual não tive a

felicidade de conhecer, mas pude aproveitar os seus

ensinamentos – ela tem um artigo da década de 80 sobre

unificação e uniformização da Revista de Informação

Legislativa, que, até hoje, é um marco nessa questão. O

estudo do Direito Comparado dará a base para que toda essa

nova legislação, ou mesmo, a pergunta sobre qual legislação

há de ser feita.

Aqui, há um grupo grande de jus privatista,

como disse a minha Colega Berta Feder, que sabe que, nas

convenções interamericanas, o sucesso ou não de uma das

convenções está intimamente ligado à qualidade do trabalho

dos especialistas e das reuniões preparatórias.

Também gostaria de fazer uma sugestão aos

tribunais, que têm o seu labor diário de julgar, mas têm-se

preocupado, cada vez mais, com a questão da formação dos

magistrados sobre essa maior integração da parte do Mercosul,

ligada à Secretaria Administrativa, que já existe um corpo

técnico.

O Ministro Ari Pargendler, do Conselho da

Justiça Federal, tem incentivado vários trabalhos e temos

participado deles. Queria, também, aproveitar para agradecer

o convite, na pessoa da Ministra Ellen e do Ministro Caputo

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Bastos, que tiveram a sensibilidade, na Comissão Técnica, de

ver o futuro, porque só com o trabalho de todos os

especialistas chegaremos a essa maior harmonização ou

unificação. A questão de saber se devemos harmonizar ou

unificar é tão profunda que deve ser vista caso a caso, por

área. No Direito Internacional Privado, a OEA tem promovido

as conferências interamericanas, desde de 1975, e continuamos

cheios de tema. Na prática, essa integração, essa mistura dos

diversos especialistas e das pessoas provenientes dos

diversos órgãos operadores do Direito já foi vista pela

Comissão Técnica, a qual fez o Plenário tão misto.

O MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUANAL DE JUSSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço a

participação da Professora Nadia Araújo.

Passo a palavra à Professora Cláudia Lima

Marques.

A PROFESSORA CLAUDIA LIMA MARQUES - Gostaria

também de retomar as palavras da Ministra Elena Highton de

Nolasco sobre a importância desse processo contínuo, como

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frisaram os Colegas neste belíssimo painel e nesse caminhar

para o fortalecimento do Mercosul, e de dar maior

credibilidade às normas oriundas dessa fonte nova de Direito,

como afirma a Professora Adriana Dreysin de Klor, que é o

Mercosul.

Nesse sentido, para caminhar um pouco nessa

credibilidade, talvez pudéssemos fazer uma reflexão, iniciada

pelo o Professor Ronald Herbert, no sentido de uma

determinação clara da metodologia utilizada pelo Mercosul.

A Ministra Elena Highton de Nolasco muito bem

frisou ao lembrar-nos que o preâmbulo do Tratado de Assunção,

isto é, a idéia teleológica que o orienta, é melhorar a

qualidade de vida dos povos da região. E nesse sentido, nas

críticas aqui realizadas, parece que o Mercosul talvez tenha

pensado muito na parte econômica e pouco na parte da

qualidade de vida dos seus cidadãos. Creio que isso daria

maior credibilidade para esse processo e maior profusão na

sociedade. E, pegando o exemplo aqui trazido pelo Professor

Roberto Ruiz Díaz Labrano, do Direito do Consumidor, o que se

viu foi uma harmonização um pouco atrapalhada que, começando

com pautas comuns, em 1997, optou por um tratado-lei. Esse é

um problema da falta de instrumentos jurídicos do Mercosul

para realizar, semelhante às diretivas, uma harmonização

verdadeira e tendendo, então, a uma uniformização.

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Esse processo levaria à destruição de algumas

barreiras, consideradas na época barreiras ao comércio ou

barreiras equivalentes, e, na verdade, levaria à revogação,

no caso concreto, de vinte e seis artigos do Código de Defesa

do Consumidor brasileiro, e alguns outros da lei Argentina,

na época as únicas existentes. Isso demonstrou bem - não

aconteceu, é claro - que o Mercosul deve, assim, inspirando-

se na metodologia usada quem sabe na Europa - nesse caso, o

grande legislador em prol do cidadão europeu, dessa

identidade européia de que hoje tanto se orgulham -, no

sentido de ser um legislador construtivo e não destrutivo. A

harmonização é uma chance para avançar e, com isso, ganhar

credibilidade e legitimação para proteger as pessoas, e não

só proteger o que, no momento, parece um objeto imediato, mas

um pensar em longo prazo.

Nesse sentido, parece-me muito importante a

conclusão desse painel para frisar a necessidade da evolução

do Mercosul. Que se desenvolvam instrumentos possíveis de

harmonização e de legitimação; que o Mercosul seja um

legislador, mesmo que oriundo do Executivo - quem sabe já

trabalhando com o Parlamento e com a Academia, como bem

frisou a Professora Nadia de Araújo, para construir um

Direito do qual possamos, assim como os europeus, nos

orgulhar.

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Gostaria de frisar a importante menção do

Ministro Eros Grau sobre os mercados, isto é, também há a

necessidade de valorizarmos as nossas diferenças. O mercado

brasileiro, obviamente, tem as suas idiossincrasias, mas é

diferente do mercado uruguaio - apenas como exemplo - e,

nesse sentido, as leis que regulam esse mercado, o Direito

econômico, tão mencionado, da concorrência e da defesa do

consumidor. Por isso, talvez pensando mais para o futuro,

creio que devemos nos visualizar como “standers”

internacionais, como mencionou a Ministra Elena Highton de

Nolasco. Para evoluir, não podemos baixar o nível de proteção

ou achar que a realidade de hoje será a mesma de daqui a dez,

vinte anos. Se pretendermos construir uma união aduaneira, um

Mercosul, realmente temos de evoluir respeitando as

diferenças culturais e do mercado de cada um desses países.

Por último, parece-me que, neste encontro,

como bem frisou a Professora Nadia de Araujo, há uma grande

chance de evolução, porque, também aqui, os expositores dos

painéis demonstraram que a maior evolução no Mercosul se deu

em matéria de processo civil internacional e por sugestão da

Reunião de Ministros, que era uma instituição sequer prevista

no início no Mercosul e que, depois, foi institucionalizada.

E, quem sabe, esse foro, que vai criar uma reunião de Cortes

Supremas que conhecem, pelos seus juízes, os problemas claros

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de aplicação, uniformização e eficácia da normativa do

Mercosul, no futuro, possa também propor, quem sabe com ajuda

da Secretaria do Mercosul, tratados internacionais de

cooperação judicial, ou do que for necessário na época, para

que essa normativa do Mercosul, realmente, chegue a esse

nível internacional e com essa identidade de respeito e de

construção de uma qualidade de vida melhor dos povos.

Seria essa a reflexão.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) - Agradeço à

Professora Claudia Lima Marques.

Passo a palavra ao Ministro Wilfrido Fernández

de Brix, do Tribunal do Mercosul.

O DR. WILFRIDO FERNÁNDEZ DE BRIX (PARAGUAI) –

Vou fazer dois esclarecimentos concretos. Primeiramente, como

disse o Professor Ricardo Alonso García, diferenciando os

conceitos entre harmonização e unificação. São dois conceitos

que têm um grau de evolução num processo de integração. O que

nos foi ensinado sobre harmonia, pela experiência do

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Mercosul? Uma experiência é afirmar que, se continuarmos

utilizando o princípio de intergovernabilidade, só será

possível fazer uma harmonização pela metade. No caso da

propriedade intelectual lhes darei um exemplo concreto: a

comunidade andina tem quinhentos e sessenta corpos normativos

relativos à propriedade intelectual. O Mercosul, em treze

anos de existência, tem dois protocolos que morreram no

caminho: um sobre marcas, que foi ratificado pelo Paraguai e

pelo Uruguai, e o outro sobre desenho industrial, que não foi

ratificado por nenhum dos países e nenhum deles sequer o

conhece. Então, no que diz respeito a continuar-se no caminho

da harmonização ou da unificação, faz-se necessário vincular

isso a uma reflexão séria sobre a conveniência de se

continuar sob a regência de um Mercosul interestadual ou se

seria melhor seguir pelo caminho da supranacionalidade, como

nos ensina a comunidade andina e os nossos irmãos europeus.

Em segundo lugar, o que poderia ser feito? O

que os Poderes Judiciários poderiam fazer no Mercosul? Não

repetirei o que foi dito ontem - o exemplo da comunidade

andina -, mas falarei, sim, da posição dos magistrados

andinos que, em dois países, Peru e Equador, contam apenas

com cláusulas programáticas de integração. Só isso. Na

Bolívia, não há sequer uma cláusula programática; há apenas

uma disposição tradicional que estava nas Constituições

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anteriores, e que diz que o Poder Executivo tem a faculdade

de fazer tratados que beneficiam a República. E ponto. Mas

devemos admirar a tarefa dos países andinos porque eles

tiveram a consciência de que o Direito Constitucional moderno

foi deixado de lado, apesar de que todos devem ser

regulamentados pela Constituição. É necessária apenas uma

cláusula programática de integração, que está em todos os

países do Mercosul, para estabelecer um direito comunitário.

Mas o maior mérito dos juízes andinos é o de ter consciência

de que aquela teoria restritiva que recusa eficácia prática

às cláusulas programáticas da Constituição, na história do

Direito, é uma herança não muito feliz do fascismo italiano.

Foram os juízes italianos nomeados por Mussolini que

permaneceram em suas funções, nessa Constituição, que se

recusaram a cumprir a Constituição italiana de 47, baseando-

se na questão de que a cláusula programática não tem nenhuma

utilidade. Os juízes andinos tiveram a consciência histórica

de reconhecer o que é uma herança proveitosa e uma herança

lamentável. Nós, cidadãos do Mercosul, deveríamos fazer essa

mesma reflexão e não copiá-los, mas pensar na atitude que

mencionei.

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O SENHOR MINISTRO ARI PARGENGLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço a

participação do Doutor Fernández de Brix.

A Senhora está com a palavra. Pediria que

dissesse o seu nome e a sua procedência.

A SENHORA MINISTRA MARIA CRISTINA BOLDORINI

(ARGENTINA) – Brevemente gostaria de fazer referência à

metodologia que utilizou o Mercosul no caminho para a

harmonização. Na verdade, quando se acenou para o Tratado de

Assunção, os países pensaram em como avançar na nossa

integração. Aprovamos o livre-comércio, mas a redução (sem

tradução) não era suficiente. Era necessário contar com

normas, comuns ou harmonizadas, que assegurassem o livre-

comércio. Então, a primeira tentativa de harmonização e

uniformização foi o famoso cronograma de Las Leñas, onde se

fez uma lista de todos os trabalhos para alcançar essa

unidade normativa.

Então, podemos falar de vários eixos. Houve um

eixo técnico que foi trabalhado com esses grupos e, hoje,

temos mais de mil normas que refletem esse trabalho técnico,

em que se uniformizaram critérios, princípios e disposições.

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Esse trabalho foi realizado pelos subgrupos III, VIII e XI.

Logo, temos um outro eixo que foi desenvolvido na Reunião de

Ministros e, como assinalou agora a Doutora, não foi um órgão

previsto no Tratado, mas no regulamento do Tratado do Mercado

Comum, e é uma tarefa muito importante desenvolvida no âmbito

da educação, da justiça e dos ministros de interior.

O outro eixo foi aquele feito pelos órgãos

decisórios na defesa de competência e de concorrência na

propriedade intelectual, mas foi o que apresentou mais

dificuldades para lograr uma norma de atividade comum.

Entre todos esses trabalhos, devo dizer que

temos um resultado muito positivo, porque, atualmente, o

grosso desse intercâmbio é desenvolvido com base nessas

atividades, mas há um âmbito em que temos uma dificuldade a

enfrentar, já assinalada aqui, que é a falta de incorporação

normativa. Como os países superaram essas dificuldades? Eles

tentaram fazer isso através de dois caminhos: o primeiro,

procurando um reconhecimento mútuo para o intercâmbio. É um

dos eixos em que se trabalha intensamente, também nesse

sistema, para ir a uma aplicação direta, normativa que não

requeira tratamento parlamentar.

Como assinalou a Ministra Elena Highton de

Nolasco, há um avanço no Mercosul, silencioso, mas muito

importante: a decisão aprovada no último Conselho que tende,

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por meio de um sistema que é mais uma harmonização do que uma

uniformização, porque se prevê que cada Estado Parte adote

uma normativa própria que permita ter esse regime da

aplicação direta normativa. Então, trabalha-se intensivamente

em cada uma das chancelarias dos países para ter-se essa

norma interna que permita essa aplicação direta até o final

do ano.

O MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Agradeço à Ministra

Maria Cristina Boldorini.

Passo a palavra ao Professor Jaime Lipovetzky.

O SENHOR PROFESSOR JAIME CÉSAR LIPOVETZKY

(ARGENTINA) - Gostaria de lhes dizer que continuo preocupado,

porque não estão sendo abordadas as questões trabalhistas. O

representante do Uruguai falou disso há pouco, mas essas

questões estão relacionadas com os objetivos de

desenvolvimento que o Mercosul se propõe a alcançar. Não é

uma questão alheia ao desenvolvimento econômico. Todos esses

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aspectos têm um papel na formação dos preços relativos e

absolutos das economias dos Países-membros, e certamente

influenciou a decisão do Supremo Tribunal argentino, quando

se estabeleceu uma relação entre a vigência do direito de

proteção de tarifas e o ordenamento supranacional, num artigo

que está na Constituição da Argentina.

Gostaria de mencionar também que, quando se

fala das questões econômicas aqui neste evento, se faz

referência a elas do ponto de vista do Direito privado, e não

com uma visão macro da economia. A verdade é que, nas

economias regionais tributárias, onde os investimentos

estrangeiros representam um refluxo de utilidades que acabam

endividando os nossos países, os salários dos nossos

trabalhadores têm um papel muito importante, porque são os

únicos que têm tarifas nos países respectivos.

Vocês sabem que os preços das mercadorias no

mercado internacional são, geralmente, determinados pelos

principais importadores ou exportadores. As tarifas salariais

são o único tipo de tarifa uniformemente determinada nos

mercados internacionais. E não se fala disso. É como se fosse

um filme argentino que diz: “Disso não falamos”. Mas seria

muito importante que abordássemos a questão num contexto que,

desde Santiago do Chile, de alguma maneira, vem ameaçando

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dois países do Mercosul, porque eles rejeitaram a criação de

uma área de livre-comércio norte-americano.

Aqui, parece, há necessidade de

desregulamentar o mercado de trabalho latino-americano. Tal

como foi reconhecido pela Corte argentina, esse direito está

reconhecido em todos os países latino-americanos e se

reconhece também uma proteção constitucional. Isso significa

que se o Projeto Alca continuasse avançando, tal como tem

sido colocado pelos norte-americanos, isso suporia a reforma

das Constituições de vinte e um países, mas não aconteceria

se os norte-americanos estivessem dispostos a revogar a

Constituição norte-americana, porque ela não reconhece o

aspecto dos contratos de trabalho dos nossos países, que é o

princípio de igualdade das partes, o que está sempre

estabelecido em todas as Constituições norte-americanas e

resolve o conflito entre trabalhador e patrão pela criação de

novos mecanismos de proteção.

Isso representa proteger os mais fracos,

implica dar garantias ao patrão, tal como foi feito em alguns

países latino-americanos, onde o argentino Dr. Frandinsing,

em nome do Supremo Tribunal argentino, mencionou as normas

derivadas do Direito do Trabalho. Não quero prejudicar o

andamento da nossa reunião, mas a questão da harmonização das

leis não satisfaz as exigências de desenvolvimento de uma

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norma geral na questão trabalhista. O Direito trabalhista dos

nossos países tem normas comuns, mas são suficientemente

diferentes para que se faça necessária uma abordagem num

âmbito superior. Talvez isso implique na elaboração de normas

e na convocatória de comissões paritárias à redação de

convênios coletivos para os quatro países e para aqueles que

venham a se incorporar, no futuro, no marco também do

Mercosul ampliado para que, de alguma maneira, possamos

começar a trabalhar com seriedade numa economia comum do

ponto de vista macro e não apenas micro; uma economia comum

que comece por resolver os problemas de dependência e da

tributação, que são os principais problemas da maioria dos

países da América Latina.

Muito obrigado.

O DR. JOSÉ ANTÔNIO MORENO RUFFINELLI

(PRESIDENTE DO TRIBUNAL PERMANENTE DE REVISÃO DO MERCOSUL) –

Senhor Presidente, gostaria de retomar o que foi dito pela

Professora Nadia Araújo, no que diz respeito às questões

relativas à harmonização do Estado de Direito.

Creio que, até agora, não ouvi dizer que em

julho, na última Cúpula de Foz do Iguaçu, foi criado o Centro

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de Promoção de Estado de Direito do Mercosul. O Centro de

Promoção do Estado de Direito do Mercosul tem duas vertentes

fundamentais: uma vertente pública que se ocupa das questões

da governabilidade democrática, da promoção da democracia e

de outras questões que se referem ao direito público; e outra

privada, que fala da harmonização das normas dos países do

Mercosul.

Para isso está-se trabalhando na implementação

de institutos acadêmicos que ofereçam o apoio necessário à

elaboração de uma legislação dentro do Mercosul.

Nesse sentido, foi criado um instituto de

consolidação institucional do Mercosul e outros que serão

criados no futuro, com o objetivo de ser um marco acadêmico

para a discussão de todas essas questões que nos preocupam

tão intensamente hoje.

Por isso, já contamos no Mercosul com um

instrumento válido, e uma das conclusões que poderíamos

extrair desse encontro é potencializar justamente esse centro

de promoção do Estado de Direito do Mercosul.

Muito obrigado.

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O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA) -Agradeço ao Presidente José

Antonio Moreno Ruffinelli.

O SENHOR PROFESSOR JORGE LAVOPA (CARI)-

Gostaria de fazer uma breve reflexão. Creio que estamos aqui

falando de harmonização legislativa. A minha pergunta é: a

harmonização legislativa, no sentido amplo, inclui apenas as

questões legislativas ou, como foi colocado pela Ministra

Cristina Boldorini, estamos também falando dos aspectos de

normas administrativas? Isto é, a vida de todos nós,

cidadãos, neste momento, é regida - por exemplo, quando vamos

ao supermercado - por regulamentos técnicos aplicados aos

alimentos e que devem ser cumpridos ou, caso contrário, não

poderiam ser vendidos no Mercosul. É interessante sublinhar

essa questão, pois o que está sendo trabalhado agora é a

possibilidade de que essas normas, que geralmente terão

caráter administrativo - porque serão aplicadas pelos poderes

executivos através de seus ministérios -, possam ser

aplicadas nos estados onde deverão ser harmonizadas com uma

legislação interna - como disse a Doutora Boldorini - para

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permitir que um procedimento administrativo possa

possibilitar a entrada no Mercosul.

Os problemas apresentados não estão no âmbito

administrativo, mas no legislativo, o que aparentemente seria

contraditório, uma vez que foram os próprios congressos que

autorizaram e delegaram ao Executivo um poder de negociação -

e, às vezes, foram além do autorizado -, quando agora é

necessário internalizar as normas. Esse próprio Poder

Executivo, através dos seus órgãos, geralmente Conselho de

Mercado Comum, apresenta resistência para essa internalização

das normas. Devemos abordar isso, porque senão estaremos, por

um lado, atacando o sistema republicano e, por outro,

estaremos querendo consolidá-lo.

Então, também queria que abordássemos a

questão administrativa para ver se podemos, efetivamente,

internalizar as normas legislativas e administrativas.

Muito obrigado.

A SENHORA PROFESSORA REBECA (BRASIL) - Senhor

Presidente, agradeço pelo uso da palavra.

Ontem, por diversas vezes, ouvi a utilização

do termo “Direito comunitário” referindo-se ao Mercosul. Isso

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me preocupou bastante. Preocupou-me porque, no âmbito do

Mercosul, não podemos considerar o que acontece conosco como

um Direito propriamente comunitário.

Vou lhes fazer uma pequena introdução: a

Comunidade Européia, quando foi criada, teve como objetivo a

instituição dos Estados Unidos da Europa, Estados que

renunciaram à parcela de sua soberania em favor da Comunidade

Européia, conferindo a estes poderes próprios e independentes

dos Estados-membros; conferindo a essa Comunidade competência

para promulgar atos equivalentes aos atos nacionais.

A construção da Comunidade Européia só foi

possível porque se baseou em princípios fundamentais que

todos os Estados-membros reconhecem como válidos e cuja

execução cabe aos órgãos executivos. Esses princípios

fundamentais, aos quais me referi, destacam-se pela

realização de uma paz duradoura – já dura 40 anos -, de uma

unidade, da igualdade entre os Estados, da liberdade, da

segurança, da solidariedade, da democracia do Estado de

Direito e prevê sérias medidas em caso de violação desses

princípios. A salvaguarda desses princípios fundamentais é

assegurada pelo Tribunal de Justiça das Comunidades

Européias, que fortalece a comunidade na medida em que firma

jurisprudência com base no primado do Direito Comunitário

sobre o Direito nacional, aplicabilidade direta do Direito

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Comunitário e autonomia da ordem jurídica comunitária, entre

outros princípios.

A União Européia hoje, como vimos, foi

implantada sobre três pilares: as comunidades européias, a

política externa e segurança comum e a cooperação em matéria

de justiça e assuntos internos, ou seja, o que estamos

exercitando nestes três dias são assuntos referentes ao

terceiro pilar. É aí onde quero chegar, pois não tenho

nenhuma pretensão de dar aulas para “experts” em Direito

Internacional.

Senhores, ontem e hoje fiquei muito preocupada

e lhes digo o porquê: estamos discutindo o terceiro pilar da

comunidade e, ontem, o Ministro Carlos Britto bem nos

relembrou o sentido da palavra “comunidade” como a unidade de

interesses comuns, sem ao menos termos o primeiro, o mínimo,

consolidado.

Explico: não temos um mercado interno comum,

uma vez que não temos livre circulação de mercadorias e

serviços, em sentido amplo. Não temos livre circulação de

capitais e pagamento, tampouco liberdade de estabelecimento,

em sentido amplo. É como se fosse uma reunião de condomínio

sem que esse condomínio tenha realmente se instituído; ou

seja, a discussão de assuntos referentes a um condomínio que

ainda não é uma realidade.

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Necessitamos não pensar como nacionais de

Estados-membros, preocupados em defender sua soberania de

Estados individualmente. Necessitamos nos despir destes

casacos de brasileiros, argentinos, paraguaios e uruguaios e

temos que vestir o casaco Mercosulense. Temos que raciocinar

como comunidade de interesses comuns. Só iremos sobreviver no

mundo se formos fortes, se pensarmos em comunidade, se os

objetivos a serem alcançados forem determinados em consenso.

Em certo momento, a comunidade teve que

verificar se seguiria adiante, se havia vontade política para

permanecer como um ideal de comunidade ou se cada um seguiria

seu caminho. Eles resolveram seguir adiante.

Vejo este momento de forma semelhante. Temos

que pensar se queremos ou não seguir adiante, hoje, no

Mercosul. Temos que nos conscientizar que não podemos pular

etapas, mas temos que vencê-las de forma sólida, caso

contrário, nós deixaremos um mercado comum inacabado, como a

zona de livre comércio imperfeita, e com pretensões de ser um

Bloco.

Somos quatro, não vinte e cinco. Não temos

diferenças culturais relevantes. Não temos catástrofes

ambientais, mas temos que ter vontade. Temos que realmente

nos comprometer por um ideal. Temos realmente que ceder uma

parcela da nossa soberania. Temos que ter nossas instituições

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Mercosulenses. Temos que ter a possibilidade de encaminhar

pedidos de decisão prejudicial. Temos que ter direito em ter

um direito supranacional. Temos que cumprir com os nossos

compromissos assumidos. Temos que ser uma comunidade de

Direito. Temos que garantir aplicação uniforme e prioritária

do Direito Mercosulense em todos os Estados-membros.

Muito obrigada.

O SENHOR MINISTRO ARI PARGENDLER (MINISTRO DO

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO BRASIL) – Neste momento,

daremos por encerrado este primeiro ciclo da nossa jornada de

hoje. Faremos, então, uma pausa e retornaremos às 14h. Temos

um convite para visitar o Plenário do Supremo Tribunal

Federal e, depois, retornaremos às 14 horas. O almoço será

servido no restaurante às 12h30.

Por último, quero agradecer aos organizadores

pelo Encontro, a honra que me conferiram de partilhar a Mesa

com o Ministro Eros Grau, do Supremo Tribunal Federal; o

Vice-Presidente da Corte Suprema do Paraguai, José Raul

Torres Kirmser; a Ministra Elena Highton de Nolasco, da Corte

Suprema de Justiça da Argentina; o Presidente da Corte

Suprema de Justiça do Uruguai, magistrado Leslie Van Rompaey

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Servillo; a professora Estefânia Viveiros; e o professor

Ricardo Allonso Garcia.

Muito obrigado.

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Apenas um aviso. O Senhor Ministro Gilmar Mendes convida os

presentes para a palestra que o Professor Ricardo Alonso

Garcia proferirá sobre Constituição Européia, no Instituto de

Direito Público, amanhã, quarta-feira, às sete horas da

noite, localizado na QL 12, Conj. 09, Casa 10, no Lago Sul.

************

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(SEGUNDA PARTE DO DIA 30/11/2004)

O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

Reiniciando os trabalhos no segundo dia do II Encontro de

Cortes Supremas dos Estados-Partes e Associados do Mercosul,

informamos que compõem a Mesa as seguintes autoridades: o

Excelentíssimo Senhor Ministro Joaquim Barbosa, do Supremo

Tribunal Federal; o Excelentíssimo Senhor Ministro Carlos

Velloso, do Supremo Tribunal Federal; o Excelentíssimo Doutor

José Antônio Moreno Ruffinelli, Presidente do Tribunal

Permanente de Revisão do Mercosul; a Excelentíssima Senhora

Ministra Elena Highton de Nolasco, representante da Corte

Suprema de Justiça da Argentina; o Excelentíssimo Senhor

Leslie Van Rompaey Servillo, Presidente da Corte Suprema de

Justiça do Uruguai; o Excelentíssimo Professor Márcio Garcia,

Relator do Grupo IV do Sistema de Soluções e Controvérsias; a

Excelentíssima Senhora Ministra Ellen Gracie, Vice-Presidente

do Supremo Tribunal Federal e Coordenadora-Geral do Encontro.

Com a palavra o Excelentíssimo Senhor Ministro

Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, para conduzir

os trabalhos desta tarde.

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O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Senhoras e Senhores, boa tarde.

Para darmos início ao ciclo de palestras desta

tarde, reservado ao Grupo IV – Sistema de Solução de

Controvérsias -, tenho a honra de convidar o Excelentíssimo

Senhor Ministro Carlos Velloso para fazer uso da palavra.

O SENHOR MINISTRO CARLOS VELLOSO (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Excelentíssimo Senhor Ministro

Joaquim Barbosa, que preside os nossos trabalhos,

Excelentíssimos Senhores integrantes da Mesa, meus

companheiros do grupo, Senhoras e Senhores.

Nosso grupo de trabalho subordina-se ao tema

Sistema de Solução de Controvérsias. Uma palavra a respeito

do nosso tema.

Em conferência que proferi, já há algum tempo,

sobre a integração de mercados no Poder Judiciário, comecei

por afirmar que foi nas comunidades européias que os países

latino-americanos, especialmente o nosso País, fomos buscar

inspiração na edificação do nosso Direito comunitário, ou,

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conforme é do gosto dos latino-americanos, do Direito da

integração.

A primeira experiência brasileira em termos de

Direito da integração deu-se com a assinatura do Tratado de

Montevidéu, em 18 de fevereiro de 1960, que criou a

Associação Latino-Americana de Livre Comércio – ALALC,

reunindo Argentina, Brasil, Chile, México, Paraguai, Peru e

Uruguai e, posteriormente, Colômbia, Equador, Venezuela e

Bolívia, que aderiram ao Tratado.

Se o objetivo era a criação de um Mercado

Comum, a partir de uma zona de livre comércio, em 1969,

Bolívia, Chile, Colômbia, Equador e Peru firmam o Tratado de

Cartagena, estabelecendo o Pacto Andino, ao qual Venezuela

aderiu em 1973. Do Pacto Andino retirou-se o Chile em 1976.

Em 12 de agosto de 1980, os onze países

signatários do Tratado de Montevidéu firmaram novo tratado

também em Montevidéu, visando aperfeiçoar a ALALC. Foi

criado, então, o segundo Tratado de Montevidéu, de 12 de

agosto de 1980, Associação Latino-Americana de

Desenvolvimento Industrial – ALADI. O segundo Tratado de

Montevidéu foi firmado pelos países integrantes da ALALC -

Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, México,

Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. A finalidade principal

da ALADI consistia em estabelecer, em longo prazo, de modo

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gradual e progressivo, um Mercado Comum Latino-americano,

visando promover o desenvolvimento econômico e social,

harmônico e equilibrado da região, respeitando os princípios

do pluralismo, da convergência, da flexibilidade e da

possibilidade de tratamento diferenciado.

Convém mencionar que, em dezembro de 1992, os

Estados Unidos, Canadá e México criaram o NAFTA, vigente a

partir de 1º de janeiro de 1994, o mais abrangente acordo

comercial, sem pretender colocar-se como Mercado Comum, e a

primeira zona de livre comércio bilateral negociada entre

parceiros comerciais - dois países desenvolvidos e um, em

vias de desenvolvimento -, estabelecendo significativos

compromissos em matéria de liberalização do comércio e

investimentos, com eliminações progressivas de barreiras

tarifárias, em período de dez a quinze anos, lembra o

Professor Francisco Amaral.

O Mercado Comum do Sul – Mercosul foi

instituído pelo Tratado de Assunção, de 26 de março de 1991,

firmado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, tendo

ficado estabelecido que até 31 de dezembro de 1994 seria

constituído o Mercado Comum. O Tratado de Assunção pretendeu,

em última análise, segundo seu artigo 1º, instituir uma união

aduaneira, caracterizada pela completa eliminação das

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barreiras alfandegárias entre os países-membros e por uma

política comercial comum em relação a outros mercados.

O Tratado de Assunção, de 1991, especialmente

o Protocolo de Ouro Preto, de 1994, atribuíram ao Mercosul

personalidade jurídica de direito internacional. Menciono, em

seguida, a sua estrutura.

Assim, os mecanismos – e aqui enfrento o nosso

tema específico – de solução de litígios, no Mercosul,

segundo especialmente o Protocolo de Brasília, derrogado pelo

Protocolo de Olivos, de 18 de fevereiro de 2002, vigente no

Brasil a partir de janeiro de 2004, o Mercosul é sobretudo

uma união aduaneira. Por isso mesmo, o Tratado de Assunção

privilegiou a via diplomática para a solução de

controvérsias, vale dizer, as negociações entre os Estados-

membros.

A Professora Nádia de Araújo, que está aqui

entre nós, escreveu interessante trabalho a respeito –

Mecanismos de Solução de Conflitos – está na agenda política

e institucional do Mercosul, Fundação Konrad Adenauer.

Registra esta eminente Professora que o Tratado de Assunção,

no seu anexo III, artigo 3º, acolhe o sistema arbitral para a

solução de controvérsias no âmbito do Mercosul. Todavia a

arbitragem somente será acionada após o esgotamento das

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negociações diretas mediante gestões do Grupo Mercado Comum –

GMC.

O Protocolo de Brasília, de 1991, disciplinou

o procedimento. Os órgãos do Mercosul que têm competência

decisória são o Conselho do Mercado Comum, o Grupo Mercado

Comum e a Comissão de Comércio do Mercosul. Podem ser

solucionadas nessa área controvérsias entre Estado-membro X

Estado-membro, Estado-membro X particulares e particulares X

particulares.

O Protocolo de Brasília, na linha do Tratado

de Assunção, privilegiou as negociações diretas entre as

partes, o que foi mantido pelo Protocolo de Ouro Preto. As

fases do procedimento eram assim indicadas:

Primeira fase – negociações diretas através de

consultas na CCM – Comissão de Comércio do Mercosul.

Segunda fase – intervenção do grupo executivo

do Mercosul com julgamento da Reclamação da GMC – Grupo

Mercado Comum.

Terceira fase - arbitral, com a instalação do

Tribunal Ad Hoc.

Em resumo, as controvérsias seriam

solucionadas, primeiro, pela via institucional do Mercosul,

mediante gestões do Grupo Mercado Comum, tendo competência

decisória os seguintes órgãos do Mercosul: o Conselho do

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Mercado Comum, CMC; o Grupo Mercado Comum GMC; e a Comissão

de Comércio do Mercosul, CCM. Falhando as negociações,

instalar-se-ia a arbitragem.

A solução de litígios pela via judicial nos

Estados-membros não poderia, entretanto, ser descartada.

Leciona - e invoco novamente o magistério da Professora Nádia

de Araújo - que qualquer controvérsia que envolva uma

situação a respeito da aplicação do Direito da integração

pode ser levada ao Poder Judiciário nacional para análise, já

que o acesso à justiça é irrestrito, e essas normas integram

o ordenamento jurídico interno, tendo sido, na maior das

vezes, integradas a este na forma devida. Certo que esta via

foi objeto de regulamentação pelo Mercosul, que não a

eliminou, substituiu pelo sistema do Protocolo de Brasília,

mas procurou criar instrumentos para a facilitação de sua

utilização através do Protocolo de Cooperação e Assistência

Jurisdicional em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e

Administrativa, que ainda foi recentemente ratificado e

promulgado pelo Decreto nº 2.067, de 1996. Estabelece o

citado Protocolo, denominado Protocolo de Las Leñas:

1º - a garantia do acesso à justiça (artigo

3º);

2º - a vedação ao estabelecimento de caução

pelos litigantes residentes em outro Estado (artigo 4º).

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É dizer: para os litigantes domiciliados nos

Estados-membros, não teria aplicação, disposto no art.835 do

Código de Processo Civil, a estabelecer que:

“Art. 835. O autor, nacional ou estrangeiro, que residir fora do Brasil ou dele se ausentar na pendência da demanda, prestará, nas ações que intentar, caução suficiente às custas e honorários de advogado da parte contrária, se não tiver no Brasil bens imóveis que lhes assegurem o pagamento.”

3º - o trâmite das cartas rogatórias, artigo

5o e seguintes;

4º - eficácia extraterritorial das sentenças e

laudos arbitrais dos Estados-membros, artigos 19 e 20; e,

finalmente,

5º - mecanismo de informação e consulta entre

as autoridades centrais, criadas para responder pelo trâmite

dos procedimentos, artigo 28 a 31.

Chegamos, senhores, ao Protocolo feito na

Cidade de Olivos, província de Buenos Aires, Argentina, em 18

de fevereiro de 2002.

O que se inovou? A grande inovação, registram

os especialistas, foi a criação do Tribunal Permanente de

Revisão do Mercosul. Registre-se, também, que a intervenção

do Grupo Mercado Comum tornou-se opcional. A criação do

Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul foi, na verdade, a

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grande inovação introduzida pelo Protocolo de Olivos.

Integrado por cinco árbitros, cada Estado Parte do Mercosul

designará um e seu suplente por um período de dois anos,

renovável por, no máximo, dois períodos consecutivos. O

quinto árbitro, designado por um período de três anos não

renovável, salvo acordo em contrário dos Estados-Partes, será

escolhido por unanimidade dos Estados-Partes. Não havendo

unanimidade, a designação far-se-á por sorteio.

Ao Tribunal Permanente de Revisão, as partes

poderão pedir a revisão do laudo do Tribunal Arbitral Ad Hoc,

art. 17, nº 1, do Protocolo de Olivos. Os Estados poderão,

também, submeter diretamente a controvérsia ao Tribunal

Permanente de Revisão, eliminando, assim, a submissão da

questão ao Tribunal Ad Hoc – Protocolo de Olivos, artigo 23.

É dizer: as partes terão acesso direto ao

tribunal, desde que assim acordarem.

Também é novidade a possibilidade de consulta

ao Tribunal Permanente, sobre o Direito da integração –

Protocolo de Olivos, artigo 3o. As inovações - verifica-se -

não são de monta. Na verdade, torna-se necessária a criação

do Tribunal de Justiça Supranacional, e esta, ao que me

parece, seria a grande decisão a ser tomada.

O exemplo do Tribunal de Justiça europeu de

Luxemburgo, cúpula do sistema judicial na Comunidade

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Européia, deveria inspirar os países signatários do Tratado

de Assunção, mas esta é uma medida de grande alcance.

Conhecendo como conhecemos a burocracia latina, discussões

inúmeras são travadas. Gerações e gerações participarão de

tais discussões e a grande solução virá só Deus sabe quando.

Ao fim e ao cabo, busco na lição de Welber

Barral, o internacionalista da Universidade Federal de Santa

Catarina, o resumo da matéria hoje: o Protocolo de Olivos não

traz alterações fundamentais na sistemática anteriormente

adotada, algumas características básicas foram mantidas:

a) a Resolução das Controvérsias continuará a

se operar por negociação e arbitragem, inexistindo uma

instância judicial supranacional;

b) os particulares continuarão dependendo dos

governos nacionais para apresentarem suas demandas – esta é,

aliás, a grande questão nesta área, a questão dos

particulares;

c) o sistema continua sendo provisório, e

deverá ser novamente modificado quando ocorrer o processo de

convergência da tarifa externa comum.

E assim, senhores, uma resenha do que

poderíamos dizer a respeito do sistema de solução de

controvérsias. Os debates prosseguirão, e, ao fim e ao cabo,

nosso grupo estará à disposição para responder a indagações

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e, mais, para realizar as conclusões finais deste debate que

ocorrerá daqui para frente.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL DO BRASIL) – Tenho a honra de convidar o

Excelentíssimo Senhor Leslie Van Rompaey Servillo, Presidente

da Corte Suprema do Uruguai a fazer uso da palavra. Vossa

Excelência tem trinta minutos.

O SENHOR MINISTRO LESLIE VAN ROMPAEY SERVILLO

(PRESIDENTRE DA CORTE SUPREMA DO URUGUAI) – Muito obrigado,

Senhor Presidente.

Numa reunião realizada recentemente, em

agosto, quando foi instalado em Assunção o Tribunal

Permanente de Revisão, alguns dos Colegas integrantes de

cortes supremas do Mercosul, entre eles, a Ministra Ellen

Gracie e a Dra. Elena Highton, surgiu a questão relativa à

natureza jurídica desse Tribunal e sua projeção no futuro: se

esse Tribunal poderia ser a semente, o embrião do futuro

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Tribunal de Justiça do Mercosul, ou a base de um edifício

jurídico do Mercosul. O tempo responderá essa questão. Ao que

chegamos foi a um acordo tácito, que reafirmamos agora, que

sustenta que os nossos judiciários não podem, de maneira

alguma, ser um obstáculo, um empecilho ao desenvolvimento

desse seu instituto. Nossa posição deverá ser de franca e

leal colaboração com as suas atividades futuras. Nesse

sentido, vai ser trabalho que assinala a posição do

judiciário uruguaio sobre os mecanismos consultivos.

No que diz respeito aos tribunais nacionais,

que poderão utilizar o mecanismo das opiniões consultivas, o

Protocolo de Olivos, para solução de controvérsias no

Mercosul, institucionaliza dois órgãos de arbitragem: o

Tribunal Permanente de Revisão, um deles.

Por outra parte, o regulamento do Protocolo de

Olivos oferece uma ferramenta para uniformizar a

interpretação do Direito do Mercosul, as chamadas opiniões

consultivas, que estão legitimados para solicitar opiniões

consultivas, os Estados-Partes, atuando, conjuntamente, os

órgãos com capacidade de decisão do Mercosul e os Tribunais

Superiores dos Estados-Partes, com jurisdição nacional,

segundo o artigo 2o.

As opiniões consultivas poderão ser relativas

a qualquer questão jurídica abrangida pelo Tratado de

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Assunção, Ouro Preto e todos os outros acordos celebrados no

marco do Tratado de Assunção; as resoluções de Grupo ao

Mercado Comum e a diretriz de comércio do Mercosul, no seu

artigo 3o.

As opiniões consultivas poderão ser

solicitadas, então, pelos Tribunais Superiores de Justiça dos

Estados-membros com jurisdição nacional. A norma não exclui

que a consulta endereçada a esses tribunais seja feita à

solicitação dos órgãos judiciários inferiores de primeira e

segunda instância. Nesse sentido, poderia interpretar o

fundamento do Protocolo de Olivos em duas perspectivas, como

aconteceu no meu país. Primeiramente, seria a possibilidade

de consulta apenas aos Tribunais Superiores, num marco de

causas judiciárias que estejam tramitando nelas.

A segunda perspectiva, mais ampla - eu diria,

qualquer juiz ou tribunal, à solicitação das partes,

independentemente da sua posição hierárquica na estrutura

judiciária -, qualquer tribunal que se encontre resolvendo um

caso afetado por exceções no âmbito do Mercosul poderia

enviar uma solicitação de opinião consultiva através da

Suprema Corte do seu Estado, e essa última deveria endereçar

a solicitação ao Tribunal Permanente de Revisão.

Entendemos que essa segunda tese é mais justa

e democrática, desde que a consulta seja filtrada pela

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Suprema Corte de Justiça, aos efeitos de constatar a

pertinência, admissibilidade, e também, muito importante,

evitar que a consulta seja endereçada com uma finalidade de

dilatória para adiar o processo.

Para enviar essas solicitações, tentaremos

fazer uma proposta segundo determina o artigo 4o, número 2o do

Protocolo de Olivos para a solução de controvérsias no

Mercosul. O procedimento para solicitação de opiniões

consultivas será regulamentado, uma vez consultados os

Tribunais Superiores de Justiça, os Estados-Partes. Sobre

essa questão, faremos uma proposta destinada a canalizar as

opiniões consultivas surgidas no marco do procedimento

judiciário, no marco da legislação uruguaia. Apoiamos a idéia

de que qualquer tribunal possa efetuar a consulta, desde que

ela seja endereçada primeiramente à Suprema Corte de Justiça

do Uruguai. A solicitação de uma opinião consultiva poderia

ser feita por qualquer juiz, ou pelas próprias partes em

litígio, em procedimentos, onde existam causas relativas à

normativo do Mercosul. A opinião deveria referir-se tanto à

interpretação jurídica da norma relativa ao Mercosul quanto a

sua validade. Dentro das determinações do marco originativo

do Mercosul, poder-se-ia suspender o procedimento, aguardando

a admissibilidade ou pertinência declarada pelo Tribunal. Se

a Suprema Corte de Justiça entendesse que é inadmissível a

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solicitação por qualquer motivo, ou a opinião consultiva

obedecesse a uma finalidade de adiar o processo, a consulta

seria devolvida a consulta, e o Tribunal apresentaria a

consulta junto ao Tribunal de Revisão para que ele emitisse

um parecer sobre ela. Uma vez elucidada a consulta, de que

essa posição será vinculante, mas não obrigatória, a Suprema

Corte enviaria a consulta ao juizado que lhe deu origem para

que este continuasse com os procedimentos. Cabe assinalar que

o pronunciamento do Tribunal, ao elucidar uma dúvida em

abstrato, não procura resolver o conflito originário. Esse

pronunciamento deveria ser de alcance geral e teria como

potenciais destinatários não apenas o que originou, mas todos

os juízes de todos e cada um dos Estados-Partes.

Essa é, em síntese, a proposta que

apresentamos.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (MINISTRO DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Tenho a honra de passar a palavra

ao Excelentíssimo Senhor Doutor José Antônio Moreno

Ruffinelli, Presidente do Tribunal Permanente de Revisão do

Mercosul. Vossa Excelência dispõe de trinta minutos.

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O SENHOR JOSÉ ANTÔNIO MORENO RUFFINELLI

(PRESIDENTE DO TRIBUNAL PERMANENTE DE REVISÃO DO MERCOSUL) –

Após muitos anos, após a assinatura do Acordo de Assunção, do

Tratado de Assunção, onde já se vislumbrava a necessidade da

criação de um sistema de solução de controvérsias, foi

possível chegar-se ao Protocolo de Olivos no ano de 2002.

Não foram poucas as dificuldades que os

Estados tiveram de superar para chegar a um sistema que,

ainda não sendo o ideal ou definitivo, oferecesse uma

possibilidade de transparência e segurança nas decisões do

Direito comunitário.

O Protocolo de Olivos está longe de ser um

ideal, que todos estamos procurando, para que seja possível

acontecer algo assim. O Protocolo de Olivos prevê uma série

de situações, as quais deveriam haver sido contempladas

anteriormente, mas, por circunstâncias de ordem política, não

foi possível serem concretizadas anteriormente. Porém,

sublinho, queremos que isso seja um passo a mais, mas não o

último para a decisão das controvérsias no Mercosul.

Eu disse, aqui, estar longe de ser a solução

definitiva. Queremos que exista uma justiça permanente de

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Mercosul e, nesse nível, como há na justiça andina, que não

seja simplesmente um Tribunal de arbitragem, o qual, ainda de

caráter permanente, sempre está ligado à figura da arbitragem

como ponta final, central, e não da justiça, como aconteceu

na Comunidade Andina das Nações ou a União Européia. Mas é um

passo adiante, muito importante. Por isso, devemos dizer que

tudo que fizermos de hoje em diante no Tribunal fará parte do

corpus juris comunitário. É o que todos desejamos ter.

No Tribunal, compreendemos que tínhamos a

faculdade de regulamentar ou estabelecer as regras de

procedimento para o funcionamento do Tribunal. Encontramos

dois instrumentos fundamentais: o Protocolo de Olivos e o seu

regulamento. Ao comparar esses instrumentos, vimos que o

regulamento tentava desenvolver as questões que, pela

urgência, não puderam ser resolvidas no Protocolo de Olivos.

Mas, ainda assim, observamos que muitas dessas questões

também não estavam suficientemente desenvolvidas ou tinham

algum problema de limitação das faculdades do Tribunal.

Pensávamos que, através de uma interpretação extensiva,

estaríamos dando muito mais força às decisões do Tribunal.

Isso é o que aconteceu, primeiramente, com a questão das

opiniões consultivas.

Como disse o nosso amigo Ricardo Alonso, em um

de seus livros, que ele teve a amabilidade de me enviar, as

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opiniões consultivas são a coluna vertebral do Direito

comunitário. Por isso, devemos prestar atenção às opiniões

consultivas, preferencialmente, para que delas possa surgir

uma interpretação comum de todo o direito de Mercosul. Se não

for assim, voltaríamos ao caos que tínhamos anteriormente

quando havia Tribunais Ad Hoc, os quais poderiam, sobre um

mesmo assunto, ter opiniões diferentes. É isso o que,

precisamente, queremos evitar com as opiniões consultivas.

O problema que encontramos é que, tanto o

Protocolo quanto o Regulamento, estabeleciam que as opiniões

consultivas deveriam ser efetuadas pelos Tribunais Superiores

dos Países-membros do Mercosul.

Fazendo um esforço interpretativo lógico,

pensamos que qualquer juiz de qualquer instância dos Estados-

Partes tem o direito de pedir uma opinião consultiva, porque,

em definitiva, são eles ou é a eles a quem se pede uma

decisão sobre uma questão conflitiva no momento determinado,

e são eles que estão enfrentando a dúvida de saber se aplica

o Direito nacional ou o Direito comunitário. Portanto, quem

melhor que eles está legitimado para solicitar, junto ao

Tribunal de Revisão, uma opinião que sirva como orientação na

adoção de uma decisão definitiva.

Sou Advogado, com muitos anos de exercício

profissional, e sei, também, que os advogados, às vezes,

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utilizam alguns artifícios para estender o prazo dos

processos. Logicamente, e sabemos, que esse poderia ser um

pedido formulado por um advogado para adiar a decisão de um

processo, e, portanto, estender quatro, cinco, seis meses ou

mais a decisão do juiz. É aí onde entra a função das Cortes

Supremas de Justiça dos países, como bem disse o Presidente

da Corte Suprema do Uruguai, as Cortes devem atuar como um

filtro, visando impedir que esse instrumento tão valioso de

Direito comunitário seja um artifício de tribunal, para adiar

indefinidamente a solução dos litígios. Pensamos que os

tribunais, as Cortes Superiores de Justiça deverão subscrever

no Tribunal Permanente de Revisão algum tipo de acordo –

porque assim é estabelecido pelo acordo que deverá ser

mediante o acordo das Cortes Supremas de Justiça dos países.

Nesse sentido, solicitei ao Secretário do Mercosul,

Embaixador Reginaldo Arcuri, que agendasse no início deste

Encontro uma reunião específica entre o Presidente do

Tribunal Permanente de Revisão e as Cortes para chegar a uma

definição sobre a questão. Lamentavelmente, o tempo impede

que estendamos, mas fica essa pendência. Acho que, por via

eletrônica, poderemos comunicar-nos para chegarmos a uma

solução que possibilite a implementação rápida das opiniões

consultivas.

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Também me preocupa o fato de que até hoje não

chegou nenhuma opinião consultiva ao Tribunal de Revisão. Um

Colega andino disse-me que um juiz da União Européia havia

dito-lhe que à primeira vez em que chegou uma opinião

consultiva eles abriram uma garrafa de champanhe, porque

haviam esperado tanto tempo pela chegada de alguma, que,

quando chegou, foi motivo de celebração para eles. Acho que,

em algum momento, também estaremos abrindo uma garrafa de

champanhe quando nos chegar a primeira opinião consultiva. O

fato é que o mecanismo existe, o instrumento existe, devemos

utilizá-lo da melhor maneira possível, para que ele seja um

instrumento, porque nesse caso o Tribunal Permanente de

Revisão atua como um verdadeiro tribunal de cassação dentro

do Mercosul, para uniformizar as interpretações que deverão

ser feitas pelo tribunal do Mercosul sobre o Direito

comunitário. A função será muito importante.

No que diz respeito aos outros temas, o

regulamento do Protocolo de Olivos foi suficientemente claro

e extenso. Porém, as regras de procedimento, adotadas pelo

Tribunal e que deverão ser aprovadas pelo Conselho de Mercado

Comum estabelecem algumas questões, tais como o

esclarecimento na fase de admissão de provas.

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Gostaria que falasse aqui o nosso Colega, do

Paraguai, Dr. Wilfrido Fernández, para não tomar todo o tempo

dos senhores aqui presentes.

Muito obrigado.

O DR. WILFRIDO FERNÁNDEZ DE BRIX (PARAGUAI)–

Vamos apresentar cada uma das perguntas do questionário sobre

controvérsias do Mercosul, e, se tivermos tempo suficiente,

faremos comentários adicionais.

A primeira pergunta é a seguinte: se a

desjudicialização dos conflitos, conforme disciplina o

Protocolo de Brasília (em treze anos) foi benéfica para a

implantação do Bloco.

Acredito que essa pergunta deve ser dividida

em duas respostas: em primeiro lugar, se a pergunta se refere

à desjudicialização de per se, a que os tribunais regionais

se referem, obviamente a resposta deve ser favorável, já que,

mencionado anteriormente, apenas para nós, dentro do

Mercosul, havia uma etapa intermediária, talvez, sem negar,

no entanto, que pode criar uma Corte, um tribunal judicial

interestadual, que é um conceito jurídico muito forçado, ou

um tribunal arbitrário interestadual, que é o criado pelo

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Protocolo de Olivos e está mais em conformidade com a atual

estrutura normativa do Mercosul.

Para dar uma resposta à segunda fase, o que

convém, a médio ou curto prazo, à arbitragem interestadual ou

eventual arbitragem supranacional é recorrer a outra

alternativa, como foi feito pela União Européia desde o

início, ou como foi feito pela Comunidade Andina desde o

início, como disse um estadista, apenas o tempo e a história

nos julgarão e nos darão a razão ou a falta de razão por ter

escolhido a via arbitrária.

Não obstante, dois documentários breves a

respeito disso: primeiro, na União Européia, quando os

franceses e alemães começaram a refletir se convinha eleger a

via arbitrária ou judicial, os franceses julgaram, mas os

alemães disseram não à via arbitrária. Acredito que, na

Europa, depois de cinco décadas de experiências, eles se

arrependeram por esse não. É óbvio que a União Européia, a

estruturação judicial supranacional serviu-lhes de remédio.

Enquanto da experiência da Comunidade Andina da também nasceu

a Corte de Justiça da Comunidade Andina como Tribunal

Judicial Supranacional. No entanto, pelo Protocolo de

Cochabamba, nunca foi implementado na prática. Adicionaram-se

funções arbitrais ao Tribunal de Justiça da Comunidade

Andina, mas de maneira peculiar. Digo respeitosamente

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peculiar porque aquelas funções arbitrais, de maneira alguma,

alteravam a função do Tribunal jurisdicional sobre o Direito

comunitário. Simplesmente, tentava-se, pela influência das

câmaras de comércio de alguns países da Comunidade Andina

inserir um segundo momento no Tribunal de Justiça da

Comunidade Andina para atuarem como juízes, inclusive, de

forma sui generis, conforme disposto no Direito Privado, em

disputas como as que poderiam surgir entre um particular e um

órgão do sistema andino, afetado ou embasado em um contrato.

Então, essa é a função arbitral que foi assinada,

historicamente, ao Tribunal de Justiça da Comunidade Andina.

Mais que os nossos irmãos andinos, peço-lhes que nos ajudem

sobre esse assunto ou ilustrem a experiência, sobretudo

porque nunca se implementou o Protocolo de Cochabamba. Então,

pensamos que a eleição da via arbitral é a única via apta

para a realidade normativa e fática do Mercosul.

A segunda pergunta: se o Protocolo de Olivos

contribuiu para a efetiva implantação de um Mercado Comum, a

nosso ver, a resposta também é favorável, pois simplesmente

porque é óbvio que o Protocolo de Olivos, com todas suas

virtudes e defeitos, constitui um grande avanço institucional

por ter estabelecido o procedimento de solução de

controvérsias no Mercosul.

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E por que um grande avanço? Em primeiro lugar,

por criarem um Tribunal Permanente, ainda que seja de revisão

ou arbitral - e, muitas vezes, de segunda instância arbitral,

já que é muito curioso que se tenha criado um arbitral com

duas instâncias -, mas é um avanço.

Em segundo lugar, é claro, apenas porque,

enunciando alguns dos avanços do corpo normativo, podemos

citar o procedimento meramente optativo ante o GMC, as

medidas provisionais, que são as cautelares, as quais,

analisando a fundo, o Protocolo de Olivos concedeu a um ente

arbitral, com a possibilidade de não ter de recorrer a um

ente judicial, por estarem - as medidas cautelares de per se

- em momento próprio.

Também podemos citar a criação do Tribunal

Permanente de Revisão, ao qual já me referi, porque tem uma

dupla função: o corpo normativo, o Protocolo de Olivos e toda

a regulamentação que dá ao Tribunal Arbitral do Mercosul,

especificamente, enquanto ao Tribunal Permanente de Revisão,

uma dupla função. Qual? Primeiramente, a possibilidade de

atuar como instância única no acordo de partes. Em segundo

lugar, atuando como recurso de revisão enquanto há questões

de Direito que, na verdade, era uma revisão em fase de

cassação, e não de apelação.

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Também está como avanço institucional do

Protocolo de Olivos as medidas institucionais de urgência,

que nos é uma figura muito apropriada para nossa realidade do

Mercosul e esperamos que tenha bastante aplicabilidade. É

claro que é um avanço, também, porque no Protocolo de Olivos,

já se aprofunda, com maior certeza, a questão das medidas

compensatórias, inclusive o questionamento das medidas

compensatórias que os Estados-Partes ou as partes afetadas,

em uma eventual disputa, possam suscitar.

Por isso tudo, o Protocolo de Olivos tem uma

resposta favorável enquanto a contribuição institucional,

enquanto a solução de controvérsias do Mercosul se refere.

Obviamente, ainda existem nas assinaturas pendentes.

Essas pendências, em primeiro lugar, seria o

acesso aos particulares. Atualmente é só olhar para o leste e

para o oeste, a começar a União Européia e a Comunidade

Andina.

A Comunidade Andina tem uma visão mais ampla

do acesso aos particulares à justiça comunitária. No entanto,

para minha surpresa, quando fomos a Luxemburgo, há dois

meses, percebemos, entre os próprios juízes da Europa, que na

Europa o conceito que a Comunidade Andina tem de maior

abertura no acesso aos particulares, diretamente à justiça

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comunitária, essa visão entra, lenta e progressivamente, no

continente europeu.

O medo que se tinha na Europa passou

fundamentalmente porque a Corte de Justiça da Europa tem uma

primeira instância que todos conhecem - o Tribunal de

Justiça. E já se concebeu, em princípio, segundo as

informações que eles me deram, a criação em duas áreas de um

tribunal que seria de primeira instância, na verdade, mas

que, em geral, toda a estrutura comunitária jurisdicional da

Corte de Justiça da Europa deveria ter três instâncias. Duas

cortes vão ter que ser criadas: uma referente à propriedade

intelectual e a outra para o que alguns chamam de Direito

trabalhista comunitário, mas que, para nós, parece mais

apropriado o nome de Direito Constitucional comunitário. Para

isso, seria uma terceira corte, de forma que a Corte Superior

de Justiça européia, exceto quando a causa, devido a algumas

circunstâncias, mereça ser abordada assim.

No que diz respeito às opiniões consultivas,

resulta óbvio que o regime presente das opiniões consultivas

é o fruto de uma intensa negociação. Temos consciência disso

e reconhecemos o avanço feito. Assim, como podemos dizer que

a criança já nasceu, a criança pode ser bonita ou feia;

geralmente uma criança é sempre muito bonita para a mãe. Mas

acho que a questão de opiniões consultivas, tal como está, é

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um avanço significativo. Devemos respeitar as normas como

estão. E qual é a pendência? Fazemos de tudo, mais reflexivo,

e não misturar conceitos, não confundir conceitos. A opinião

consultiva pode ser estudada no art. 46 da Carta das Nações

Unidas, pode ser estudada na Carta normativa da Corte

Interamericana de Direitos Humanos. E, per se, o que é a

opinião consultiva? Historicamente, é um mecanismo de

consulta sobre um tema não-litigioso que não tenha uma força

vinculante, como faz, por exemplo, a Assembléia das Nações

Unidas junto à Corte Internacional de Justiça, geralmente por

motivos políticos, mais do que jurídicos, a sentença é aceita

pela Assembléia das Nações Unidas. A opinião consultiva é

fazer com que alguém atue como advogado consultivo da maior

hierarquia. A interpretação prejudicial que algumas vezes

acontece e se prevê no Protocolo de Olivos é diferente. A

interpretação prejudicial é um mecanismo de cooperação entre

o juiz nacional e o tribunal comunitário, onde não há nenhuma

submissão de um ao outro. Não: é dado ao César o que é do

César e é dado ao rei aquilo que é do rei. Quando um juiz

nacional tende aplicar uma norma comunitária na Europa ou na

Comunidade Andina, o juiz tem a opção, não a obrigação, de

requerer a interpretação dessa norma comunitária. Mas, se o

Tribunal que agir em última instância - e esse é um conselho

importante: última instância não quer dizer a Corte Suprema

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de Justiça; última instância poderia ser um juiz de primeira

instância que, pela normativa de processo, funcione como

tribunal de última instância, em função de apelações que vêm

de outros juizados.

O tribunal de última instância é aquele que

deve requerer essa interpretação. Mas, seja “a” ou seja “b”,

se aquele juiz de instância inferior ou o juiz de última

instância assina a petição, essa interpretação solicitada

junto ao Tribunal comunitário deverá ser sempre vinculante,

como acontece na Comunidade Andina e na União Européia. Essa

é uma reflexão para o futuro. Vamos respeitar aquilo que

temos e criar as melhores armas possíveis para trabalhar com

a opinião consultiva. Por isso, não haveria uma segunda

interpretação da posição uruguaia, aquela que diz

concretamente - se entendi - que poderão exercer essa opção

os tribunais inferiores, tendo de utilizar como filtro a

Suprema Corte de Justiça do Uruguai ou de qualquer corte

suprema, para depois apresentar essa consulta junto ao

Tribunal Permanente de Revisão.

Não é a situação ideal, mas é uma solução

do Mercosul, mas vamos respeitar essa possibilidade e

utilizaremos essa ferramenta para trabalhar da melhor maneira

possível.

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Outra questão pendente: a sentença de

iniqüidade. O direito comunitário e o direito de integração

estão baseados numa ordem pública, que, conseqüentemente, não

pode haver sentença de iniqüidade. É um comentário que deixo

aqui para que num futuro nós possamos refletir mais

profundamente sobre essa questão.

Finalmente outra questão pendente: uma

tipificação mais detalhada, porque o direito comunitário,

ainda que no Mercosul, ele não existe. Há apenas um direito

de integração, não estamos numa aposta de supranacionalidade.

Há quatro ações pertinentes: uma: ação de nulidade; duas:

ação de cumprimento, três: ação de omissão e, finalmente, a

interpretação prejudicial. Mas como alguém dizia aqui o Profº

Moreno Rufinelli a interpretação prejudicial, com o devido

respeito, é a mais importante, porque é a essência da criação

de um tribunal, ainda que fosse supranacional visando um

direito comunitário do Mercosul.

Finalmente a terceira pergunta refere-se

especificamente a: se a competência permitir opiniões

consultivas deveria ser uma atribuição de um órgão de revisão

arbitral ou se deveria ser atribuída a um órgão de cooperação

composto por membros do poderes judiciários nacionais.

Senhoras e senhores, ninguém pode reinventar a

rosa nem histórias de direito, como o direito de integração e

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comunitário. Aqueles que prefiram a segunda alternativa,

porque essa função da opinião consultiva possa ser atribuída

a um órgão de cooperação integrada por membros do poderes

judiciários nacionais, simplesmente se opõem ao processo de

integração, não há uma outra resposta possível. Deveríamos

ter um conceito da ordem comunitária e a ordem comunitária

exige a criação de um tribunal supranacional ou um tribunal

arbitral desse tipo, mas não poderíamos ser como caranguejo

Optando pela segunda possibilidade, então, nós preferimos a

primeira alternativa: que não deveria ser um órgão de revisão

arbitral. Deveria ser um órgão de revisão, seja arbitral ou

judicial, pelos motivos aos quais me referi anteriormente.

Finalmente, com a autorização do presidente da

Mesa, faria uma sugestão que poderia ser incluída na Carta de

Brasília, como lado dissidente, que não acho que seja uma

sugestão apressada.

Em 09 de dezembro, será assinado em Ayacucho

um acordo, marco ou declaração de princípios para a futura

comunidade sul-americana. Far-se-á uma reunião de cúpula

presidencial. Pensamos que seria bom, com a nossa experiência

no Mercosul e contando com a colaboração de nossos irmãos

amigos, apresentar como recomendação uma respeitosa

recomendação aos plenipotenciários, que assinarão um acordo

para que nessa oportunidade seja incluída a constituição de

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um comitê jurídico misto, composto por integrantes do

Tribunal Permanente de Revisão, pelo Tribunal de Justiça

Andino e, também, pelos membros da Corte Suprema, nomeados

por cada país, para que eles elaborem um regime normativo

para a solução de disputas dentro do que será a comunidade

sul-americana, e que eventualmente, seja a semente de um

tribunal de justiça, arbitral ou judiciário.

Eu já entreguei a Dra. Ellen Gracie, hoje pela

manhã, essa proposta, mas gostaria de lê-la. Serei breve:

Projeto - condução: conclamar a cúpula de

presidentes Mercosulenses, a ser realizada no dia 09 de

dezembro deste ano para que contemplem no acordo - marco da

constituição na comunidade sul-americana que se formalizará

nesta oportunidade – a constituição de um comitê misto,

integrado por representantes de Tribunal Permanente de

revisão do Tribunal Arbitral do Mercosul, do Tribunal de

Justiça da Comunidade Andina e de membros da Corte Suprema de

Justiça dos Estados-Parte, encarregado de estabelecer as

bases e o regime normativo do mecanismo jurisdicional de

solução de controvérsia dessa entidade, e que se chegue à

criação de um tribunal de justiça da comunidade sul-

americana.

Finalmente, como uma homenagem aos nossos

irmãos andinos e chilenos que aqui estão, gostaria de lembrar

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as palavras de O´Higgins que disse, há mais de cem anos, que

o progresso de seu povo, o Chile, jamais seria possível se

não se atendesse o progresso dos países vizinhos. E as

palavras de O´Higgins, que foram pronunciadas cem anos antes

dos primeiros precursores da União Européia, começam a serem

chamadas de “união”. Jean Monet, cem anos depois, disse

também sabiamente que é muito importante na vida aprender que

nada é possível se fazer sem os homens e disse, finalmente,

que é muito mais importante ainda aprender que nada perdura

sem as instituições. Então, com a frase de O´Higgins e com a

de Jean Monet, conclamo todos os participantes deste evento a

que façam um esforço para redigir as conclusões para que um

dia possamos ver um Mercosul muito mais aprofundado e melhor

estruturado, e que o processo de integração continue adiante,

dentro e fora do processo de solução de controvérsias no

Mercosul per si.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) - Tenho a honra de passar a palavra a

Excelentíssima Senhora Ministra Elena Highton de Nolasco,

representante da Corte Suprema da Argentina.

Vossa Excelência dispõe de 30 minutos.

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A SENHORA MINISTRA ELENA HIGHTON DE NOLASCO

(CORTE SUPREMA DE JUSTIÇA DA ARGENTINA) – Vamos discutir

sobre as cortes supremas dos diferentes países. Vamos ver

qual o primeiro caso.

No tocante à solução de controvérsias, na

verdade, nossas cidades democráticas culturais admitem que o

conflito integra a normalidade das relações interpessoais e,

na última década, já não se observa como doença social, mas

como elemento indispensável para a evolução da humanidade.

Essa é uma visão positiva do conflito, na qual

se visualiza como motor para mudança capaz de gerar energia

criativa que pode melhorar as situações, uma oportunidade

definitiva para o crescimento e enriquecimento pessoal e de

grupo.

Não obstante, a quantidade de conflitos que

uma sociedade pode tolerar tem um limite que, se é

ultrapassado, conduz à perda de energia para afrontar e

desenvolver outras atividades.

Eu disse: transferível às vinculações geradas

a partir de um processo de integração. Daí que, para evitar

os efeitos perniciosos dos conflitos e evitar também a

multiplicação dos mesmos, retroalimentação, é importante,

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para isso, conter um sistema institucionalizado de soluções e

diferenças.

Este, como em outros aspectos, a evolução de

Mercosul é de lenta gradualidade.

Como experiência valiosa dentro desse processo

de integração, pode-se destacar o sistema instituído por meio

da adoção da carta sóciolaboral do Mercosul. Reconhece-se

como antecedente o núcleo das organizações sindicais na

coordenadora de 1976, o Conselho Vistorial do Mercosul, que

agrupa os nucleadores, em 1994, o Conselho de Câmara de

Comércio, em 1995, e a Confederação Agrícola, em 1997.

Entre esses sujeitos coletivos, deu-se um

diálogo que consta de vários Estados e se integra à noção de

tripartícipe Tangara a organização internacional do trabalho

cujo feito foi a declaração sociolaboral do Mercosul, adotada

pelos países membros no dia 10 de dezembro de 1998 e

publicado no Boletim do Mercosul em março de 1999.

No campo das negociações coletivas já havia um

antecedente na região. Trata-se do convênio coletivo de

trabalho, celebrado entre a empresa Wolkswagem e os

Sindicatos de Trabalhadores Metalúrgicos Automobilísticos do

Brasil e dos Mecânicos e afins do Transporte Automotor da

República da Argentina, que contém um primitivo sistema de

solução de conflitos entre as partes.

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Por outro lado, na Europa, existem inúmeros

antecedentes, medidas de ação direta com as indústrias

multinacionais e diretivas específicas nesse sentido.

A declaração sociolaboral do Mercosul, na

proclamação solene dos direitos sociais fundamentais

reconhecidos na região, contribui para atender o conjunto de

efeitos sociais que provoca a integração regional Cabe

destacar que nelas Estados-Partes se comprometem a

desenvolver as formas preventivas e alternativas de alta

composição nos conflitos individuais e coletivos do trabalho,

fomentando, assim, a utilização de procedimentos

independentes e imparciais de solução de controvérsias. Conta

também como a convenção sociolaboral tripartícipe auxiliar do

mercado comum de caráter promocional e não sancioratório com

o objetivo de fomentar e acompanhar a aplicação do

ensinamento.

A declaração sociolaboral do Mercosul foi,

entre outros, entre várias sentenças da Corte, há uma muito

recente, na qual participei, que foi mencionada agora por um

dos participantes e outros instrumentos de caráter

internacional de proteção dos direitos trabalhistas.

Nesta evolução, pode-se observar também, que

há outros processos de interação regional dos quais se podem

extrair algumas experiências para serem consideradas como

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possíveis alternativas motivos no aperfeiçoamento do desenho.

Efetivamente, aqui se mencionou, várias vezes, o grupo

andino. Podemos observar no âmbito da América do Sul o acordo

de interação sul regional andina, que tem a particularidade

de reconhecer os diferentes graus de desenvolvimentos

existentes. E nesse sentido obter dentro do sistema de

medidas concretas que dêem um tratamento diferenciado aos

países de menor desenvolvimento econômico e um mercado

suficiente para ter uma situação econômica harmônica e

equilibrada na região. A comunidade Argentina é integrada por

Bolívia, Colômbia, Equador. A Venezuela tem algumas

instituições que foram implementadas, a posteriori, entre

elas temos o Tribunal de Justiça, órgão principal para fazer

com que os compromissos derivados do acordo de Cartagena

prevejam entre as suas responsabilidades não só a resolução

de controvérsias, mas, também, o controle de legalidade e a

interpretação uniforme do Direito dentro do sistema de

integração da Comunidade Andina como órgão jurisdicional

permanente e independente em questões prejudiciais.

É importante sublinhar que essas jurisdições

obrigatórias para os Estados-membros da Argentina, em tudo

que se refere à aplicação das normas do seu ordenamento

jurídico, estão previstas no Tratado de Criação do Tribunal.

Essa obrigatoriedade é enfaticamente expressa enquanto os

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Estados-Partes se comprometem a não se meter em nenhuma

controvérsia que surja pelas normas do acordo, a nenhum

tribunal sistemas de arbitragem ou procedimento diferente dos

que estão contemplados no Tratado do órgão. Isto é, que a

jurisdição do tribunal é obrigatória para os Estados-Partes

e, além disso, é exclusivo, já que não se pode recorrer a

outros mecanismos. Tal obrigatoriedade se estenderá a todos

os países que façam parte do Acordo de Cartagena. Essa

estrutura está prevista pelo sistema da Comunidade Européia

enquanto as características de organização se constituem em

uma das mais completas, no que se refere ao sistema. Entendo,

portanto, que deve se levar em consideração na medida em que

esse modelo pode contribuir no futuro na consolidação do

recentemente criado Tribunal de Revisão do Mercosul. Outros

acordos de integração econômicas, tanto regionais quanto

inter-regionais, não contemplam o sistema de resolução de

diversas características tão avançadas.

No âmbito do Mercosul – e voltamos ao nosso

âmbito – o Protocolo de Olivas para a solução de

controvérsias se acorda reconhecendo que o processo de

integração requer um aperfeiçoamento e considerando que é

necessário garantir a correta interpretação, aplicação e

cumprimento dos instrumentos fundamentais e do conjunto

normativo do Mercosul de maneira consistente e sistemática.

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Sem dúvida, um dos aspectos mais inovadores do

protocolo é o de ter consagrado consentimento de revisão que

possibilita a qualquer uma das partes na controvérsia

apresentar um recurso ante o Tribunal Permanente de Revisão

contra o laudo do Tribunal Ad Hoc.

A criação desse Tribunal foi originada em uma

proposta argentina fundada no risco da existência de laudos

arbitrais contraditórios. Em razão do tribunal arbitral de

única instância previsto no protocolo de Brasília, que se

constitui em cada caso de controvérsia com o que podia estar

integrado em cada ocasião por diversos árbitros, que recebem

assim as críticas que tinham sido formuladas no sistema

anterior e que podiam tornar difícil contar com uma ajuda de

jurisprudência que pudesse ser considerada estável.

Efetivamente aconteceu assim.

Na 25ª Reunião do Mercosul, em 2003, aprovou-

se o regulamento do Protocolo de Olivas, cumprindo assim o

mandato estabelecido. Essa decisão não precisa ser

incorporada aos ordenamentos jurídicos nacionais por

regulamentar as peças de funcionamento do bloco.

Vou-me deter apenas em algumas dessas

descrições que considero relevante. No 55º artigo, o

regulamento aborda as matérias contempladas no protocolo,

mesmo que continuem sem resposta alguns aspectos importantes

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sobre os quais se dispõe a necessidade de aprovar um novo

documento. Esse tribunal deve entender, nos recursos que

foram decididos contra os laudos arbitrais, no entanto, as

partes têm a possibilidade de renunciar ao procedimento

arbitral e recorrer diretamente ao TPR com o qual o processo

seria abreviado.

A Declaração 3703 regulamenta, no seu primeiro

artigo, a opção do fórum. Esse tema é justamente diferente do

Pacto Andino. Na opção de fórum é feito o protocolo que

estabelece que o demandante ou as partes, de comum acordo,

pode optar por manterem a disputa ao sistema de instrução de

conflitos da Organização Mundial de Comércio ou a outros

temas a que pertençam os Estados individualmente. A única

exceção é que, quando o processo for iniciado perante um

fórum, não se pode recorrer a outro. A omissão do exercício

dessa opção gerou intensos debates, deixando a favor de uma e

outra estrutura como justificação diversos órgãos de razão. O

fato de que ao ser o demandante titular desse direito,

ninguém melhor do que ele conhece se o interesse legítimo

fica mais protegido pelo Protocolo de Olivos ou pelo

mecanismo que ele escolha.

Da mesma maneira, na opção a favor do sistema

as partes podem preferir esse sistema, pela natureza

obrigatória das decisões, a brevidade dos prazos, a

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automaticidade dos prazos no processo, tudo isso contribui a

resolução para acordos, tratados mútuos. Isso é dito por

Adriana Dreysin, justamente em contraposição à opinião de

Alejandro Perotti que, caso contrário, não é favorável a essa

cláusula com argumentos que sublinham as desvantagens desse

exercício, o enfraquecimento do sistema de integração e

também considera que admitir a opção é um erro imposto, seria

uma prática contrária ao Tratado de Assunção.

Nesse ponto cabe lembrar que o Pacto Andino,

ou a comunidade andina tem o foro exclusivo e excludente. De

qualquer forma, no sistema atual de evolução do Mercosul é

assim que está regulamentado e, mesmo quem se pronuncia a

favor da cláusula desse ponto do fórum, eles mantém que, no

seu núcleo, colocando em dúvida a confiança merecida pelo

sistema. O artigo 24 do documento aborda medidas excepcionais

e de urgência dizendo que poderão ser estabelecidos

procedimentos especiais para casos excepcionais e de urgência

que pudessem provocar danos irreparáveis às partes. Sobre

essas medidas, expressa o protocolo que será o CMC, o órgão

com faculdade para estabelecer os procedimentos especiais, o

que foi abordado pelo detrito CMC 2304, que ainda não foi

incorporado ao dos Estados-membros.

Outro aspecto inovador é o das opiniões

consultivas que foram mencionadas agora e se encontram

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contempladas pelo artigo 3. O CMC poderá estabelecer

mecanismos relativos a solicitações de opiniões consultivas

junto ao Tribunal Permanente de Revisão, definindo a

abrangência e procedimentos. O artigo 2 do Regulamento do

Protocolo determina que estão legitimados para solicitar não

apenas os Estados-Parte no seu conjunto dos órgãos com

capacidade decisória do sistema, mas que, com o critério

correto, foram incluídos os Tribunais Superiores dos países

membros com jurisdição nacional. O fato de que, no caso dos

Estados-Parte, a opinião deve ser solicitada por consenso não

é uma contribuição valiosa para o sistema. No que diz

respeito à possibilidade de que os particulares possam

requerer essas opiniões, houve critérios favoráveis e contra.

Isso pode provocar um adiar no tempo as decisões do Tribunal,

mas aqueles que assinalam que seria benéfico afirmam que esse

problema poderia ser resolvido através de uma adequada

regulamentação. Deveríamos saber tomar uma decisão, apesar de

não habilitados para participar da determinação da não-

legalidade do conjunto normativo. Aqui a questão é: as

opiniões conjuntivas têm quais características? Porque se

disse: são consultas “ex ant”, mas isso só quando são

requeridas pelos Estados-Partes ou pelos próprios órgãos do

Mercosul, antes que se produzam as circunstâncias, eventos ou

fatos, ou que sejam adotadas soluções porque nesse sentido

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elas são um mecanismo de solução de controvérsias que estão

orientados a evitar esses problemas, mas quando a Corte

Suprema solicita uma opinião, então já não é preventivo, não

é “ex ant”, porque estaremos diante de um conflito já

existente nos tribunais.

Sobre a solicitação dos tribunais superiores

de justiça, o art. 4º dispõe que o TPR poderá emitir opiniões

consultivas solicitadas pelo Superior Tribunal de Justiça dos

Estados-Partes com jurisdição nacional. Nesse caso, as

opiniões consultivas se deferirão e possivelmente a

interpretação jurídica na normativa do Mercosul, mencionada

no art. 3º, § 1º, do presente regulamento; questão jurídica

compreendida no Tratado de Assunção, Protocolo de Ouro Preto,

protocolo de acordos celebrados, um marco das decisões no

CMC, as resoluções do GMC, e havia diretrizes do CCM, sempre

que estejam vinculadas com causas em tramitação.

Temos, então, assim, causa em tramitação. Por

isso não é mais preventiva. O procedimento para solicitação

de opiniões consultivas junto ao TPR será regulamentado após

consulta a tribunal superior. Nesse sentido talvez seja

interessante fazer um primeiro regulamento que poderíamos

denominar “temporário”, “regulamento provisório”, porque

conseguir fazer um regulamento provisório, para ver como

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funciona e depois ter de mudá-lo, é uma espécie de fracasso o

regulamento.

Como nós estamos numa questão tão delicada, eu

sugeriria que fosse feita uma espécie de plano piloto, o

primeiro regulamento, e só numa segunda etapa, após ver o

funcionamento e tendo aprendido sobre na base de ensaio e

erro, fosse elaborado um regulamento definitivo. A

regulamentação está contemplada e como nós já ouvimos aqui,

para responder às perguntas, nós deveríamos falar de algumas

questões: a identificação dos tribunais superiores que

estariam habilitados para apresentar solicitações de opiniões

consultivas, para concentrar o encaminhamento das

solicitações; o árbitro paraguaio Willfrido propõe que seja

qualquer tribunal superior daquela causa, isso complica

muito. Há, ainda, um país como Uruguai, onde há uma única

Corte. nós teríamos a Corte Suprema do país e todas as cortes

dos tribunais superiores das províncias e, além disso, com o

conceito que foi dado por Willfrido, agora, teríamos, também

tribunais de primeira instância quando os passos não fossem

passíveis de apelação e, também, a princípio, todas as

câmaras de apelação, porque entre as Cortes superiores ou a

Corte superior, ainda mais elas não são uma terceira

instância ordinária, mas estão habilitadas para recursos

extraordinários, questões federais. Por isso, na verdade,

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coincidem com o Uruguai, ainda mais acho que seria caótica,

no nosso país, uma interpretação ampla a esse respeito. Acho

que deveria ser entendido somente como sendo o Superior

Tribunal de Justiça do país visitar sua Corte Suprema de

Justiça da nação para encaminhá-lo, uma coisa que todos os

juízes possam solicitar, de acordo com o caso, segundo as

partes, uma opinião consultiva e outra questão: por onde

endereçar essa opinião consultiva? Nós achamos que deveriam

ser encaminhadas pelo Superior Tribunal de Justiça do país,

para conseguir uma melhor ordem das consultas. Isso já vai

carregar os tribunais, porque isso propiciaria que a

diferença do Uruguai que fala de uma reforma de fundo seria

importante fazer um exame do tipo formal, sem fazer um

controle da pertinência das solicitações pelo menos num

primeiro momento, assim mesmo em função de que uma vez mais,

novamente, estaríamos diante de uma dificuldade provocada

pela diversidade de regulamentações sobre a pertinência das

solicitações apresentadas pelo tribunal, o que conspiraria

contra a unidade de que teve a desvalorização das

solicitações formuladas segundo o Estado correspondente. No

que diz respeito à possibilidade de serem identificadas

contas de contato nos supremos tribunais superiores dos

Estados-Parte, evidentemente facilitaria o procedimento e

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tudo deveria ser feito de acordo com o critério de cada

tribunal superior, segundo cada um consideraria apropriado.

Há uma questão importante que é a do custo

dessas consultas, que se chega a uma outra reflexão: não

deveríamos deixar de lado que possa isto ser incorporada a

custa do litígio, ou poderia ser cobrada no final, mas se

houver um pagamento prévio, seria muito difícil para um juiz

de primeira instância ou quem esteja fazendo isto. A questão

de como pagar os custos do processo, que é uma questão muito

importante porque a taxa de justiça no nosso país cobre todas

as despesas do julgamento. Deveríamos ver em que medida é

isso. Uma situação extraordinária no processo poderia ser, no

mínimo, adiantada. Estamos falando de montantes importantes

ou de montantes pequenos, mas, para poder abrir a primeira

garrafa de champanha, nós deveríamos tentar os custos; o

champanha deverá ser pago pelo colega.

No que diz respeito ao valor das opiniões

emitidas pelo TPR o texto de Olivos diz que não possuem

caráter vinculante nem obrigatório, mas apesar da clara

expressão os tribunais superiores poderiam entender de

maneira diferente esta posição, sustentando uma posição capaz

de deixar de lado as argumentações do tribunal permanente.

Deve-se assinalar que para nós é importante que, em caso de

que não se chegue a uma posição unânime, fossem aceitas as

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argumentações divergentes. Esse aqui não é o tribunal de

arbitragem, que funcionando como tribunal, mas esclarecendo

com uma opinião construtiva. Por isso, quanto mais

enriquecedora for, melhor será. A questão das opiniões

consultivas revela a importância de que, nas reuniões de

trabalho se chegue a uma interpretação uniforme das normas do

Mercosul e está baseado de que essa forma de abordar a

solução de litígio, as negociações, as arbitragens conspiram

contra o objetivo de se chegar a uma interpretação uniforme,

sem que os tribunais arbitrais cheguem a laudos anteriores. A

fundamentação e decisões, também em algumas ocasiões, isso

não foi assim, motivando diversos e contraditórias situações,

mas nós não podemos deixar de mencionar aqui as situações

particulares, que se pode apresentar ao tribunal, mas

continua sem ter um assessor direto a outras instâncias.

Gradualmente, à medida que cresce a interação na região,

estão se desenvolvendo as instituições. Aparentemente o

Mercosul já tem a preocupação de garantir a divisão de

poderes necessários para se chegar a um autêntico Mercado

Comum. Então, o Tribunal Permanente de Revisão poderia

representar, se for possível chegar a um adequado

funcionamento, a uma forma de fortalecer o processo de

integração, o que implicaria no fortalecimento da posição dos

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países integrantes do bloco; juntou ao continente e ao

conjunto dos países em geral.

Muito obrigado.

O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Tenho a honra de passar a palavra ao

Professor Márcio Garcia.

O SENHOR PROFESSOR MÁRCIO GARCIA – Muito

obrigado, Senhor Presidente.

O Ministro Carlos Velloso, que preside o

quarto grupo, teve de se ausentar momentaneamente tendo em

vista a dinâmica do tribunal - hoje tem sessão da Segunda

Turma. Então, ele pediu que desse notícia da razão de não

estar presente aqui, mas deve regressar. Como todos sabemos,

hoje é o último dia de trabalhos do mês e a pauta,

aparentemente, está muito extensa. Incumbiu-me, assim, a

professora Cláudia Lima Marques, de conduzir os trabalhos e,

conversando com a professora Cláudia, em atenção, sobretudo

ao adiantado da hora, decidimos fazer uma divisão dos

trabalhos, de modo que fizesse um rápido apanhado do que foi

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o relatório produzido pelo grupo e a Professora, após, então,

enfrentaria as questões colocadas para a apreciação de todos

que aqui se encontram.

Devo dizer que não quero fugir às minhas

obrigações. Conversei antes, de modo exaustivo, com a

Professora Cláudia, e estamos, enfim, de acordo e,

obviamente, fico mais tranqüilo, porque ela saberá, com muito

mais charme e conhecimento, conduzir as respostas às questões

lançadas.

Provavelmente, o tema, Solução de

Controvérsia, foi colocado por último dentro de uma leitura

que ia, mais ou menos, encadeando-se, das assimetrias, da

necessidade de incorporação da normativa Mercosul e, por

final, o sistema de solução de controvérsias à vista,

sobretudo, da existência de um novo mecanismo produzido por

Olivos. É o mecanismo de Solução de Controvérsia, que se

aproxima do seu primeiro ano de vida e, ainda, não foi

acionado.

Evidentemente, o grupo tem muito mais

questões, quer dizer, as interrogações são inúmeras, muito

mais ampliado do que as eventuais respostas. Nós observamos

aqui que alguns temas convidam, de modo mais próximo, a

atenção de todos. Nós preocupados com o avanço do sistema de

integração no Mercosul. Por exemplo, a questão das opiniões

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consultivas. Nesse sentido, o grupo produziu relatório, o

qual faz algumas considerações. Vou ler de modo bastante

resumido. Principia dizendo o seguinte:

O princípio de Solução de

Controvérsias internacionais goza, nos dias

atuais, de indiscutível autoridade. No plano

do direito da integração, o ideal de solução

pacífico de controvérsia encontra mais um

fundamento, que é exatamente a necessidade

imperiosa de entendimento e aplicação uniforme

do direito construído.

Dentro dessa ordem de idéias, o Mercado Comum

do Sul – CONESUL – contém, desde o seu nascimento, regras

que apontam para a necessidade de se estabelecer sistema

permanente de solução de divergência – Tratado de Assunção,

1991, item III do anexo 3 e Protocolo de Ouro Preto, 1994,

artigo 44.

Com essa preocupação, os Estados-Partes

aprovaram o Protocolo de Brasília para a Solução de

Controvérsias, em 1991 e, mais adiante, o seu substituto, o

Protocolo de Olivos, de 2002.

Ambos, no entanto, dão notícia de que ainda

não são permanentes, Brasília, artigo 34, Olivos, artigo 53.

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O novo protocolo representa algum avanço em

relação ao seu antecessor. A primeira impressão, no entanto,

é que ele ficou no meio termo possível. Adotou-se o justo

meio entre o que era e o que muitos almejavam: a existência

do sistema permanente de um lado, mas não de funcionamento

permanente.

Aqui uma observação, que me parece, desde

logo, importante, à vista do que já foi dito aqui e do muito

que já foi produzido sobre o Sistema de Olivos: nós ainda não

estamos diante de um tribunal de uma estrutura permanente.

Nós ainda não temos um modelo como o europeu, o qual tem um

tribunal supranacional. Isso, obviamente, demanda uma

reflexão no sentido de um avanço na linha, quem sabe, do

Saramago, que diz que devemos avançar sem pressa, mas sem

perder tempo. Se tivermos alguma pressa em avançar e nos

inspirarmos, de modo muito contundente, no modelo europeu -

sem dúvida, é o modelo a ser considerado -, poderemos perder

também os olhos da nossa realidade, do nosso dia-a-dia, no

plano aqui do Mercosul. Então, esse avanço, esse meio termo,

foi o meio termo político possível. Quer dizer, nós não

saímos da leitura de um tribunal arbitral, e o tribunal

permanente de revisão é um tribunal arbitral, criando uma

segunda instância, como foi mencionado aqui. É algo até

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bastante inovador no sentido, sobretudo, considerando tratar-

se da via arbitral de solução de controvérsia.

Mais adiante, observamos que o discurso

preambular de Olivos invoca a necessidade de se garantir a

correta interpretação, aplicação e cumprimento dos

instrumentos fundamentais do processo de integração e do

conjunto normativo do Mercosul, de forma consistente e

sistemática.

Nesse sentido, o documento produz avanço de

que pode ser exemplo o chamado Tribunal Permanente de

Revisão. E, aí, o grupo, como disse, levantou inúmeras

dúvidas. Aqui, quem sabe, inspirada em Francis Bacon, para

quem onde há muita luz, há muita sombra. Então, é preferível

começar em dúvida e tentar chegar a algum consenso. Muitas

dessas dúvidas já foram aqui abordadas, mas vou me permitir,

tendo em vista o material que o grupo recebeu, ler as

questões, enfim, suscitadas.

Primeiro, seria como resolver o problema do

acesso direto dos particulares ao Sistema de Solução de

Controvérsia. Nós não chegamos a isso. Olivos mantém o modelo

anterior de reclamação perante às sessões nacionais do GMC.

Tal como está, os protagonistas principais continuam sendo os

Estados. Resta, aos particulares, acesso às instâncias locais

com eventual prejuízo para interpretação uniforme ou, pelo

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menos, harmônica do ordenamento jurídico Mercosulino. Some-se

a isso aprovarem a necessidade - e aí vem em aspas - “de

lobby” junto ao respectivo GMC no sentido de fazer valer

determinada reclamação, o que deixa reclamações de menor

valor econômico ou que digam respeito a direitos humanos

individuais ou contra os interesses do próprio Estado,

praticamente sem chance. Pode-se invocar, ainda, a exigência

de transparência e democratização do sistema para permitir o

ingresso direto do particular.

Outro aspecto a ser considerado é o fato de o

particular contar com poucos recursos no caso de

descumprimento da decisão do tribunal ad hoc ou do tribunal

permanente, pois, nesses casos, a exigência de compensação ou

retaliação fica a cargo do Estado-Parte e não,

necessariamente, reverte em favor do particular prejudicado

pelas medidas restritivas consideradas ilegítimas.

Uma alternativa de solução seria franquear,

aos particulares, acesso às vias administrativas e judiciais

nacionais para reclamar os prejuízos causados pelo Estado que

não cumpriu laudo ou a decisão.

Outra saída possível seria a criação de um

fundo de compensação para os particulares lesados a ser

gerido pela secretaria do Mercosul em conjunto com as Cortes

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Superiores dos Estados-membros em que o valor do fundo

poderia ser reavido em processo no âmbito nacional.

Outra linha de dúvida, também bastante

discutida no grupo, é em relação ao mecanismo de consultas -

e aqui também tivemos algumas propostas concretas. Quais os

tribunais poderiam solicitar essa opinião consultiva? O

artigo 2º do Regulamento do Protocolo de Olivos indica que só

poderão solicitar opiniões consultivas os Estados-Partes,

atuando conjuntamente, os órgãos com capacidade decisória do

Mercosul e os tribunais superiores com jurisdição nacional

dos Estados-Partes. De um lado, as opiniões consultivas podem

ser um excelente meio para alcançar a interpretação uniforme

das normas do bloco, mas, de outro, a depender da natureza

vinculante ou não atribuída a essas opiniões frente ao Poder

Judiciário nacional, podem engessar a interpretação dos

tribunais nacionais, o que remete a dois problemas atualmente

existentes no sistema europeu: primeiro, o papel das Cortes

nacionais, quando a opinião consultiva fixa interpretação que

afeta temas de direitos humanos ou direitos fundamentais não

suficientemente protegidos no bloco, mas de aplicação

impositiva no sistema constitucional nacional; e o problema

da responsabilidade civil dos Estados-Partes por ato do seu

Judiciário e em descumprimento às normas emanadas pelo bloco

ou aos seus laudos e decisões interpretativas.

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Parece que aqui observamos inúmeras sugestões,

algumas convergentes, outras nem tanto, na linha de quem

poderia eventualmente solicitar essas opiniões consultivas.

Uma leitura tanto do Regulamento quanto do Protocolo fica, à

primeira vista, bastante claro, que seriam os tribunais

superiores com jurisdição nacional. Há um exercício, já em

gestação, de se avançar no sentido de que os juízes de

primeira instância poderiam fazer essa opinião consultiva,

obviamente, inspirados - e aí uma boa inspiração - no modelo

europeu em que os juízes de primeira instância foram, de

algum modo, os grandes condutores de toda a construção

jurídica, porque os tribunais superiores não conduziram, ou

pelo menos foi extremamente tímido, o número de opiniões

consultivas canalizadas no âmbito do modelo europeu.

A pergunta inicial é saber se nós estamos

ainda preparados para isso, se teríamos estrutura – basta

imaginar a dimensão do Brasil. Daí, provavelmente, a idéia,

na linha proposta pelo representante Uruguai, de um juiz de

admissibilidade por um colegiado das Cortes Constitucionais,

o que a mim, à primeira vista, e sem maiores reflexões,

parece simpático, mas também temo por essa possibilidade de o

juiz nacional, que demandaria evidentemente uma interpretação

- essa interpretação, a mim me parece que o texto está muito

claro. Na linha daquilo que dizíamos anteriormente, não

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estamos diante ainda de um sistema permanente, nem de um

tribunal supranacional.

Enfim, essa questão está em aberto. O texto

diz, o parecer, as opiniões consultivas não são nem

vinculantes, nem obrigatórias. Quer dizer, aqui, também,

parece-me que é muito razoável digerir isso, de modo a tornar

bem claro para que, eventualmente, a velocidade não possa

atropelar a realidade de um momento político em que o próprio

bloco se encontra.

Outra questão que o grupo levantou foi

atinente à questão do aperfeiçoamento da etapa pós-laudo ou

decisão. E aí não tivemos um enfrentamento dessa questão de

modo claro em Olivos, mas é uma questão que continua em

aberto.

No que diz respeito ao cumprimento dos laudos

e decisões e ao alcance das medidas compensatórias. Para

afastar problemas de interpretação, é necessário esclarecer e

delimitar da “obrigatoriedade do laudo” e da “decisão do

tribunal”.

De outro lado, parece importante a introdução

de sistema de acompanhamento do laudo e da decisão proferida

a fim de verificar sua aplicação e cumprimento.

Os laudos e decisões devem passar a ser

publicados tanto no diário oficial dos Estados-Partes quanto

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no Boletim Oficial do Mercosul, em um determinado prazo de

tempo. Aqui já são sugestões de fácil implementação – pelo

menos imagino - no tocante ao Brasil. Essa publicidade do

laudo é absolutamente importante. No Brasil, por exemplo, a

publicidade não se faz de modo – pelo menos a meu juízo –

como a Constituição determina. Nós deveríamos ter a

publicidade – penso - via publicação no Diário Oficial.

Depois, aparelhamento do sistema de solução de

controvérsias. Ele deve contar com pessoal técnico-

administrativo permanente, de modo a contribuir tanto para a

execução das atividades relativas aos casos em curso quanto

para a consolidação da cultura e da memória institucionais -

aqui, também, fazendo uma ressalva que temos que ter atenção

para a integração de países que têm limitação de recursos.

Obviamente não é a hipótese de se criar um grande aparato

burocrático, mas de se ter minimamente algo que possa dar

condições de trabalho a esse sistema de solução de

controvérsias.

Depois, também, o grupo levantou questão em

relação à opção de foro e, então, o estabelecimento de

normas, regras e procedimentos para que as partes delimitem

de forma oportuna, clara e determinada o objeto da

controvérsia.

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Às vezes, nós vemos nos nove laudos

produzidos, após 13 anos, que esse objeto não está claro. E,

aí, lançamos como sugestão, quer dizer, seguir um pouco o

modelo do “tramits of reference” da Organização Mundial do

Comércio. Em relação à opção do foro, contemplada no novo

Protocolo de Olivos, art. 1º, ponderamos que se pode optar

pela Organização Mundial de Comércio, se for o caso, ou

outros esquemas preferenciais de comércio. Esse procedimento

pode acarretar questionamento, como proceder, por exemplo, na

hipótese de a parte vencida submeter o caso ao sistema de

solução de controvérsia da OMC - à luz do Protocolo de

Olivos, parece absolutamente claro. Agora, caso ele se dirija

à Organização Mundial de Comércio e aciona o sistema de

solução de controvérsia - a Organização Mundial de Comércio,

à primeira vista, não está vinculada ao normativo do Mercosul

-, ela vai proceder, dar seguimento aos trabalhos do sistema

de solução de controvérsias. Nessa hipótese, qual seria a

solução do ponto de vista. Aqui, do bloco, parece-me claro,

mais em relação à OMC. Posteriormente, conversava com

Ricardo Alonso, ele lançou uma outra dúvida. Se, no âmbito

do bloco, dois estados “A” e “b” demandam e um resta vencido

e a normativa ou a interpretação que se deu é incompatível,

por exemplo, em relação ao que pensa o estado “c”, poderia o

estado “C”, em relação ao mesmo assunto, acionar a

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Organização Mundial do Comércio e não acionar o sistema de

solução de controvérsias nessa cláusula de opção de foro?

Também é uma questão que permanece em aberto. A organização

Mundial do Comércio acataria como preliminar o fato de ter

havido a opção pelo sistema de Olivos. O sistema pode dar

lugar ao “foro shopping”, que não convive bem em um processo

de integração. Quer dizer, então, aí, também, parece-me que

foi um avanço que, na realidade, não é bem um avanço, pode

até representar mais adiante, quem sabe, um retrocesso,

porque, dentro de uma leitura de um eventual foro shopping,

poderíamos ter decisões absolutamente antagônicas e isso

seria um problema, considerando o espírito de Olivos, que é

exatamente dar uma leitura, um rosto uniforme à normativa, ao

ordenamento jurídico do Mercosul.

Por fim, estudo da conveniência, da

oportunidade, da criação do um sistema de cooperação e

informação recíproca entre o tribunal permanente de revisão e

as cortes superiores, evitando situações limites, facilitando

a comunicação e conhecimento mútuo das decisões em lias de

interpretação, aproximando assim o sistema arbitral do

Mercosul das jurisdições nacionais. Penso que o escopo desse

segundo encontro é nessa linha de uma maior aproximação dos

poderes judiciários.

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Fico por aqui, Senhor Presidente, e penso que

a professora Cláudia Lima Marques poderia, então, enfrentar,

nesse tempo final, as questões que foram colocadas.

Muito obrigado.

A SENHORA PROFESSORA CLÁUDIA LIMA MARQUES –

Agradeço a palavra.

Parece-me que o relatório do professor Márcio

Garcia esgota já o problema. Gostaria, apenas, de colocar,

nesses cinco minutos que nos restam, dois pontos que também

preparamos, respondendo à primeira pergunta.

A desprocessualização e desjudicialização dos

conflitos, como disciplina, do Protocolo de Brasília - nove

laudos em treze anos – foi benéfica à implantação do bloco.

Pensamos em dois temas importantes: em

primeiro, a conquista dessa legitimação e a função que os

laudos poderiam ter exercido e que, talvez, o Protocolo de

Olivos e os seus novos instrumentos possam exercer; e, o

segundo tema, a crítica, essa falta de diálogo entre as

cortes supremas, ou poder judiciário nacional, e isso que

nasce, o gérmen que nasce de interpretação uniforme ou de

laudos do Mercosul.

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Então, quanto ao primeiro tema, o modelo claro

é o Tribunal de Justiça da União Européia, motor da

integração e, por isso, a procura dessa falta de

legitimidade, analisa os nove laudos e os seus efeitos.

Existem dois efeitos, normalmente, da jurisprudência, até

mesmo da jurisprudência arbitral como da OMC. Um efeito

pedagógico, mas existe um efeito mais interessante para se

analisado agora, ou debatido, que é o efeito chamado

projetivo “Wash back efect”, isto é, quando eu faço um lado,

demonstro como se devem conduzir as partes, quais são os

princípios que o Mercosul segue e quais são os valores que

ele prepondera em relação aos outros? Justamente no temário

do encontro, na primeira idéia das assimetrias

constitucionais - que poderia ser os direitos humanos,

poderia ser as constituições dos países, poderia ser a

simples integração à liberdade de circulação de bens e

produtos, e no segundo tema, poderia ser a cooperação

judicial -, procuramos caminhar juntos para alcançar alguma

coisa, ou poderia ser o novo, a normativa do Mercosul, a

harmonização legislativa, levando a uma conclusão.

Na análise dos nove laudos, o resultado foi o

seguinte: laudo nº 1, cinco dos nove laudos analisam os

aspectos processuais sobre o objeto da controvérsia; laudo nº

3, dos têxteis; laudo nº 2, sobre carne de porco ou cervo;

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laudo nº 4, sobre frango; e laudo nº 5, sobre pneus. Eles se

dividem em três diferentes grupos: o objeto é só no início, o

objeto é no contexto, o objeto é na resposta e, segundo o

laudo dos pneus, sequer as tratativas diplomáticas fixaram o

objeto, portanto, não há um efeito projetivo. Não se sabe,

exatamente para o Mercosul, até agora, qual é e como deve ser

a própria controvérsia para que ela chegue a um bom termo,

que é a harmonização da controvérsia. Tanto que, no caso

mais grave, no o laudo dos frangos, se recorreu à OMC para

haver uma resposta de mérito e não simplesmente processual.

Então, quanto à primeira pergunta, se há uma

desprocessualização, parece que não houve no caso concreto.

Segundo problema: da hierarquia entre os

tratados e a normativa do Mercosul, o Tratado da ALADI,

especialmente em seu art. 50, que faz as exceções, tem a

proteção dos Direitos Humanos, do meio ambiente, do Direito

do Consumidor, da saúde pública e vários laudos - três para

ser exato. O laudo nº 1, que utilizou o Tratado da ALADI como

exemplo, laudo fitosanitário; e o laudo dos pneus que não

utilizou o Tratado da ALADI. Sobre o aspecto da liberação

comercial, poderia ser a OMC e as suas normas; e o Laudo nº 1

utilizou as regras da OMC, inclusive o Pacto Assunção, o

Direito Internacional, boa-fé, um direito operacional, uma

interpretação finalista, teleológica, afim, circulação de

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bens e a criação de um direito novo, um direito talvez

comunitário. Já no Laudo nº 2, a decisão do Mercosul foi

interpretada conforme a OMC. No Laudo nº 3, dos testes, não

se utiliza as regras do OMC e chega-se à conclusão que a

legislação específica do Mercosul está acima da legislação da

OMC. No Laudo nº 4, dos frangos, se diz que não há, apesar de

haver legislação da OMC, regras para serem utilizadas pelo

Mercosul. E o regulamento comum da OMC não é utilizado. No

laudo dos pneus, mais uma vez se remete a essa dúvida, se o

Direito Internacional deve ser utilizado, se vai aos

princípios gerais do Direito Internacional, e não aos

tratados claros e se recorre, então, à Convenção de Viena,

enfim, há uma espécie de conflito. No Laudo nº 7, dos

fitosanitários, há o Tratado de Montevidéu, as resoluções não

teriam sido incorporadas e, portanto, a normativa do Mercosul

não teria chegado ao seu fim, não poderia proteger os

Direitos Humanos das pessoas na região. No Laudo nº 8,

cigarros, esse sim, houve prevalência da normativa do

Mercosul somente, porque havia efeitos discriminatórios da

legislação interna. No Laudo nº 9 voltou-se, então, a idéia

do incentivo à exportação e de uma interpretação teleológica

do Mercosul, mas se ponderou sobre a importância do Direito

Internacional, no caso do GAT. Chegamos à conclusão de que

não há esse efeito projetivo nem em relação à primazia

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interna. Se o Tratado da ALADI, do qual o Mercosul faz parte,

tem alguma primazia em relação às resoluções, sequer

decisões, às resoluções do Mercosul, e com a hierarquia entre

as resoluções, as decisões e os tratados marcos do próprio

Mercosul. Em relação ao OMC, não há certeza qual é a

primazia: se é da OMC, que é multilateral, ou se é a lei

específica, no caso, do próprio Mercosul, seja resoluções,

decisões ou tratados-bases, tratados quadros. Portanto,

talvez uma primeira opinião consultiva seria justamente de

criar essa hierarquia interna das próprias normas do

Mercosul.

Quanto ao segundo tema, a falta de diálogo

para conseguir esse efeito pedagógico, observa-se que o

grande sucesso na solução de controvérsias foi o da

diplomacia, que evitou muitas controvérsias. Os nove laudos e

a exclusão praticamente dos particulares desse acesso,

através da interposição de fases que dependem unilateralmente

do Estado nacional, levam à conclusão que houve uma grande

demanda reprimida de decisões, e se criticamos, de um lado, o

fato de as cortes nacionais não aplicarem o direito do

Mercosul, ou não sempre aplicarem o direito do Mercosul, se

observa que os laudos sequer utilizam ou citam as decisões

das cortes supremas. Vamos pegar como exemplo: existem dez

decisões do Supremo Tribunal Federal no caso dos pneus. Leio

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o Recurso Extraordinário de relatoria do Ministro Carlos

Velloso, nosso Presidente, de 25 de março de 1997,

considerando constitucional a proibição de importação de

produtos estrangeiros. “A importação de produtos

estrangeiros, sujeitos ao controle governamental,

inocorrência de ofensa ao princípio isonômico no fato de não

ter sido autorizado a importação de pneumáticos usados”.

Nenhuma dessas dez decisões da Corte Suprema brasileira foram

sequer mencionadas na decisão dos pneus, o Laudo nº 6

considerou contrária a normativa Mercosul a essa proibição.

Para terminar, nossas conclusões são no

sentido de que realmente se avançou muito pouco com essa

flexibilização, tão inicialmente homenageada pelos colegas

doutrinadores brasileiros. O Protocolo de Brasília teve

várias imperfeições que o Protocolo de Olivos tenta melhorar,

mas parece que é necessária uma mudança de mentalidade no

sentido de que estejamos todos seguros da necessidade desse

diálogo e de criar, no Mercosul, algo, um direito legítimo,

isto é, que tenha argumentos, mesmo que seja de “soft law”,

mesmo que seja com base na autoridade e que utilize então o

Direito Internacional, realmente, e que consiga uma certa

uniformização, pelo menos quanto às fontes do próprio

Mercosul e seus tratados, qual a hierarquia entre elas.

Muito obrigada!

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O SENHOR MINISTRO JOAQUIM BARBOSA (SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL) – Faremos, agora, uma pausa para café e

consolidação dos relatórios. Voltaremos dentro de quinze

minutos.

(PAUSA PARA O COFFEE BREAK)

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Senhores e senhoras, damos

início, então, à Sessão de encerramento do nosso II Encontro

de Cortes Supremas do Mercosul e, desde logo, passo a palavra

à Senhora Ministra Ellen Gracie.

A SENHORA MINISTRA ELLEN GRACIE (MINISTRA DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigada, Senhor

Presidente.

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Incumbe-me, na condição de Coordenadora deste

evento, fazer chegar aos Senhores um breve relatório

consolidado dos grupos de trabalho. Todos receberão cópia

deste material e dentro de, aproximadamente, quinze dias,

faremos chegar, também, uma gravação em vídeo de todas as

sessões do Encontro. De modo que cada um dos Senhores,

especialmente aqueles que atuam na área acadêmica, possam

utilizar-se desse material didático.

O Grupo nº 01, que tratou das Assimetrias

Constitucionais, chega às seguintes conclusões:

1º) As Constituições da Argentina e do

Paraguai reconhecem, expressamente, a possibilidade de

convalidação de instituições supranacionais, bem como possuem

norma específica sobre conflito entre a lei interna e os

tratados, o que não é previsto nas Constituições brasileira e

uruguaia;

2º) Seria conveniente que, sob a perspectiva

da segurança jurídica, os Estados brasileiro e uruguaio

promovessem reformas constitucionais aptas a afastar apontada

omissão;

3º) Não se verificam, ademais, fatores

impeditivos para que as Cortes Supremas do Brasil e do

Uruguai caminhem no sentido de viabilizar, juridicamente, a

vontade política conducente ao processo de integração;

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4º) Além dos instrumentos jurídicos

permissivos de interpretações construtivas, em particular, a

Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, de 23 de maio

de 1969, os Poderes Judiciários devem buscar soluções

internas que previnam a possibilidade de antinomia na

interpretação e efetiva aplicação das normativas Mercosul;

5º) Sem prejuízo das atribuições

constitucionais de cada Poder constituído, é desejável que se

estabeleça forma de diálogo interinstitucional com vista a

preservar os esforços resultantes das negociações voltadas ao

aprofundamento e à consolidação da integração regional em

prol do desenvolvimento e do bem-estar de nossos povos.

Essas as conclusões, Senhor Presidente, do

Grupo nº 01, Assimetrias Constitucionais.

Passo à leitura das conclusões do Grupo nº 02,

Cooperação Judiciária. Conclui o Grupo nº 02:

1º) Sem cooperação internacional, não

exercício pleno do Poder jurisdicional nem efetividade das

decisões judiciais;

2º) Anotou, também, a existência de

instrumentos normativos, no âmbito do Mercosul, em execução

assídua pelos órgãos judiciários dos Estados-Partes;

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3º) Recomendou a atenção para instrumentos

regionais sobre os mesmos temas, a exemplo das Convenções

interamericanas de Direito Internacional Privado;

4º) Demonstrou preocupação com jurisprudência

que aplique, desmedidamente, a exceção de ordem pública, como

limitação à cooperação judiciária internacional;

5º) Reconheceu ser desejável que o exame da

admissibilidade dos pedidos de cooperação judiciária,

especialmente no âmbito do Mercosul, não seja feito apenas de

forma concentrada, mas também diretamente pelo juízo de

primeiro grau competente para a execução da medida

solicitada;

6º) Parte do grupo concordou não haver

obstáculos constitucionais à elaboração de tratados

internacionais ou leis internas que autorizem a homologação

de sentenças estrangeiras para efeitos penais, como confisco

e perdimento de bens ou aplicação de penas restritivas de

liberdade.

Essas, Senhor Presidente, as conclusões do

Grupo nº 02.

O Grupo nº 03, que cuidou da Harmonização

Legislativa em Direito Material ou Processual alcançou as

seguintes conclusões:

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1º) Salientou a relevância da existência de

textos normativos coerentes com as finalidades do Mercosul,

em matéria de Direito do Consumidor, da concorrência, da

propriedade intelectual, da proteção de investimentos

estrangeiros e de responsabilidade civil, contratual e

extracontratutal, dentre outros;

2º) Apontou, igualmente, a necessidade de

aperfeiçoamento de normas processuais aptas a assegurar a

efetividade da prestação jurisdicional nos contenciosos

gerados em torno do comércio de bens e serviços do Mercosul;

3º) Registrou a conveniência da criação de

mecanismos que conduzam a uniformização dos critérios de

interpretação das normas oriundas do processo de integração

pelos diferentes Poderes Judiciários dos Estados-Partes e

associados;

4º) Recomendou que a Secretaria do Mercosul se

incumba de propor os temas que devam ser objeto de esforço,

de harmonização e/ou uniformização legislativa a partir do

exame de situações concretas e das necessidades verificadas;

5º) Propôs encorajarem-se os Poderes

Judiciários nacionais, no sentido de atender aos compromissos

dos seus respectivos estados, voltados à integração regional.

Essas são as conclusões do Grupo nº03.

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Finalmente, as conclusões do Grupo nº 04, que

cuidou da Solução de Controvérsias. E, neste ponto, Senhor

Presidente, permito-me informar à platéia que ficamos

frustrados da oportunidade de debate sobre um tema tão rico.

No entanto, a Coordenação se compromete a encaminhar aos

integrantes dos Grupos todos os questionamentos que nos

chegarem, bem como fazer com que estes questionamentos sejam

incluídos nos anais do Encontro.

Passo a ler as conclusões do Grupo nº 04.

1º) Concluiu-se que o Sistema de Solução de

Controvérsias do Mercosul, mediante o Protocolo de Olivos,

avançou, mas ainda demanda maior aperfeiçoamento;

2º) Ponderou-se que as opções do sistema de

controvérsias do Mercosul e a sua prática, com nove laudos,

com interpretações contraditórias sobre temas mais

processuais do que materiais, levando à conclusão que eles

não criaram uma interpretação comum sequer sobre a primazia

da normativa Mercosul e sua relação com o Tratado Macro de

ALADE;

3º) Observou-se a necessidade de se

desenvolver forma eficiente de garantir o acesso dos

particulares ao sistema de controvérsias do Mercosul, de modo

a não depender do exame unilateral do seu estado de

domicílio.

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4º) Sugeriu-se, concretamente, interpretar o

Protocolo de Olivos no sentido de que qualquer Tribunal

nacional poderá enviar um pedido de opinião consultiva ao

Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul, desde que passe

por juízo de admissibilidade da Corte Suprema do Estado-Parte

respectivo;

5º) Uma sugestão seria que os particulares,

uma vez que entrassem com ações, frente ao juiz nacional,

estes juízes e Tribunais Regionais tivessem a possibilidade

de enviar para a sua Corte Superior, ou ainda, para um órgão

a ser criado, que reúna as Cortes Supremas, um pedido de

opinião consultiva para o Tribunal Permanente do Mercosul

sobre este problema do particular que, depois, pudesse ser

usada pelo Poder Judiciário.

As opiniões consultivas são um germe de

supranacionalidade e uma chance para a interpretação uniforme

da normativa do Mercosul.

Essas são, Senhor Presidente, as conclusões

dos quatro grupos de trabalho.

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O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Muito obrigado, Ministra Ellen

Gracie.

Passo a palavra ao Dr. Walter Kaune Arteaga,

Magistrado do Tribunal de Justiça da Comunidade Andina de

Nações.

O SENHOR WALTER KAUNE ARTEAGA (PRESIDENTE DO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA COMUNIDADE ANDINA) - Excelentíssimo

Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, Srs.

Presidentes e Ministros das Cortes Supremas do Mercosul e do

Tribunal Constitucional, Srs. Assessores e Professores,

participantes deste importante evento, gostaria de

testemunhar o agradecimento do Tribunal de Justiça da

Comunidade Andina, agradecer a oportunidade de assistir a

este evento e felicitar e parabenizar pela maneira como foi

desenvolvido, pelas conclusões as quais chegamos que, com

certeza, se projetarão para o aperfeiçoamento deste processo

de integração do Mercosul.

Os sistemas adotados entre a Comunidade Andina

e as diferentes partes não são semelhantes, assim foi

reconhecido. No entanto, temos um grande interesse em

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participar e coordenar junto a vocês os trabalhos no que

concerne à parte de Solução de Controvérsias. No entanto,

levando em consideração que ambos os processos regionais

devem chegar a um processo regional, por meio da criação da

Comunidade Sul-americana que vai se subscrever no dia 09 de

dezembro deste ano.

Por essa razão, nossas experiências

conquistadas durante esses vinte e cinco anos de criação do

Tribunal, em que pudemos contribuir para o aperfeiçoamento

institucional da Comunidade Andina, por meio do exercício das

competências próprias do sistema de supranacionalidade, pelo

qual optou a Comunidade Andina no sentido de interpretar a

lei comunitária, no sentido de cuidar e garantir a legalidade

do ordenamento jurídico, o controle constitucional da ordem

jurídica comunitária, a admissão de conflitos suscitados na

aplicação da lei comunitária e outras competências que, sem

qualquer dúvidas, nos permitiram elaborar um conjunto de

princípios jurídicos comunitários que estão inseridos no

livro que chamamos de “Vinte e cinco anos de celebração,

testemunho comunitário”, que passamos para os presentes,

aqui, e esperamos que possa servir como contribuição das

nossas experiências.

E mais ainda: consideramos que o sistema de

interpretação prescricional, que é a coluna vertebral do

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sistema da supranacionalidade, que converte e torna os juízes

nacionais em juízes comunitários e que torna possível que os

habitantes dos Países-membros se tornem cidadãos comunitários

que possam receber benefícios e direitos. Talvez essa

atividade possa, no que corresponde dentro do Mercosul,

servir para se dirigir nesse sentido de aperfeiçoamento.

Sabemos que todo início é difícil e que todo processo é

diferente. Há diversos ritmos e tempos. Nesse sentido,

gostaria de confessar a vocês que celebramos, com muito

entusiasmo, o dia em que se instalou o Tribunal Permanente de

Revisão do Mercosul, porque consideramos ser este um passo

extremamente importante.

Desejo-lhes grande sucesso! Vocês têm, na

Comunidade Andina, o irmão gêmeo que, neste momento, tem que

caminhar junto à execução da integração dessa Comunidade Sul-

americana.

Compartilhamos o entusiasmo e a sugestão feita

pelo Senhor Magistrado do Tribunal Permanente de Revisão e

sugiro que, nessa cúpula de Presidentes, vá se formando um

comitê misto Mercosul com o comitê jurídico, para poder

assentar as bases, estabelecer os projetos, marcos do que

poderá ser esse futuro do Tribunal que, com o tempo,

administrará os direitos, os interesses e os problemas que

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possam emergir dessa nova realidade de integração que será a

Comunidade Sul-americana.

Obrigado.

O SENHOR MINISTRO NELSON JOBIM (PRESIDENTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL) – Obrigado, Dr.Walter.

Cabe-me, portanto, proceder ao encerramento

deste Encontro, mas, antes de fazê-lo, desejo formular alguns

agradecimentos especiais, inicialmente, ao Embaixador

Reginaldo Arcuri, Secretário-Geral do Mercosul, pela

presteza, dedicação e orientação que prestou ao nosso

Encontro, como também ao Centro de Estudos de Direito

Internacional (CEDI), que prestou importante apoio a nossa

comissão técnica e científica e que nos deu condição de um

trabalho amplo e organizado. O medo que se tinha foi vencido,

porque, às vezes, encontro dessa natureza, no mais das vezes,

permanecemos nas generalidades e não entramos nos problemas.

Exatamente aquela técnica de formular perguntas para os

grupos faz com que o foco do tema seja nas questões que

podemos contribuir no curto e médio prazo.

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Agradecemos, também, aos servidores do Supremo

Tribunal Federal, que nos deram toda essa infra-estrutura e

possibilitaram esses entendimentos.

Também agradeço, fundamentalmente, aos

participantes da Mesa e aos Senhores Presidentes das Cortes

Supremas do Mercosul, como também Presidentes das Cortes

participantes. Tudo isso mostra a nossa necessidade de

participarmos deste processo de integração.

Por último, agradeço a presença de todos,

senhores e senhoras, que nos ajudaram, fundamentalmente,

neste Encontro. Faço uma referência especial à Senhora

Ministra Ellen Gracie que, na verdade, ao fim e ao cabo, foi

a grande construtora deste Encontro. É a ela que convido a

todos para uma grande salva de palmas.

Declaro, portanto, encerrado o II Encontro. O

Senhor Chefe de cerimonial fará as referências finais sobre

os últimos eventos.

Muito obrigado a todos. Sejam felizes.

Passaremos, agora, para a assinatura da Carta do Mercosul,

que se dará no Salão Branco do Tribunal.

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O SENHOR WALTER LIMA (MESTRE DE CERIMÔNIAS) –

O Senhor Ministro Nelson Jobim está convidando os presentes a

se dirigirem ao Salão Branco desta Corte onde haverá a

solenidade de assinatura da Carta de Brasília, pelos

Excelentíssimos Senhores Presidentes das Cortes Supremas dos

Estados-Partes e associados do Mercosul e o encerramento do

Encontro.

O Senhor Ministro Gilmar Mendes convida os

presentes para a palestra que o Professor Ricardo Alonso

Garcia proferirá sobre Constituição Européia, no Instituto de

Direito Público, amanhã, quarta-feira, às sete horas da

noite, localizado na QL 12, Conj. 09, Casa 10, no Lago Sul.

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