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Revista Portuguesa de Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Cirurgia II Série N.° 5 Junho 2008 irurgia ISSN 1646-6918 Revista Portuguesa de Cirurgia II Série N.° 5 Junho 2008

II Série N.°5 Junho2008repositorio.chlc.min-saude.pt/bitstream/10400.17/258/1/Rev Port Cir 2008 49.pdf · à VBP. Não esquecer também que, para a fase de uti-lização de suturas,

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Revista Portuguesade

Órgão Oficial da Sociedade Portuguesa de Cirurgia

II Série • N.° 5 • Junho 2008

i r u r g i a

ISSN 1646-6918

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COLANGIOGRAFIA PEROPERATÓRIA

O que é:

É uma técnica de diagnóstico por imagem, comopacificação da árvore biliar, executada pelo cirurgiãoe complementar da cirurgia biliar, que permite umavisão da disposição anatómica das vias biliares, das suasdimensões, da sua dinâmica, da eventual existência deanomalias ou de conteúdos anómalos e da localizaçãodos mesmos.

Para conseguir tudo isto, o exame tem de ser efec-tuado com equipamento de imagem que permita“fluoroscopia”, com a visão em movimento das váriasetapas da sua execução.

Os equipamentos mais indicados para este efeito sãoos “intensificadores de imagem” que não só permitema visualização com o movimento em ecrã vídeo, mastambém a gravação de todo ou parte do exame em for-mato vídeo ou, hoje mais frequentemente, em formatodigital, permitindo também a obtenção de imagensfixas, em película ou por impressão. Não há indicaçãoactual para os exames serem efectuados com equipa-mento de RX que permita apenas a obtenção de ima-gens fixas em película, conseguidas de forma “cega”.

Os movimentos conjugados do intensificador deimagem e da marquesa operatória vão permitir melho-rar a visão da área que se quer estudar. Estes movi-mentos, obliquando ou perpendicularizando o planode observação, vão permitir que as estruturas (como acoluna vertebral e as vias biliares) deixem de se sobre-por e possam ser vistas de forma desimpedida e ana-tomicamente individualizada (Fig.1, Fig.1a, Fig. 2 eFig. 2a).

Do mesmo modo, a observação em diferentes pla-nos permitirá clarificar imagens que de outra maneirapoderiam induzir o observador em erro (Fig. 3 e 3a)

Exemplo de situação em que, mesmo com visão dazona a estudar, sem rotação do plano de observação sefica com ideia errada da anatomia local da inserção docístico na Via Biliar Principal

Indicações:

Há duas opções de utilização:1) Sistemática – aplicada por alguns grupos que exe-

cutam sempre colangiografia intra-operatória, emqualquer cirurgia da vesícula ou das vias biliares.

2) Selectiva – opção de outros grupos, que apenas

Revista Portuguesa de Cirurgia (2008) (5):49-54

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PASSOS TÉCNICOS

Colangiografia peroperatóriaJ. M. Schiappa1, Francisco de Oliveira Martins2

1 Hospital CUF Infante Santo2 Hospital de Santo António dos Capuchos, Serviço 6, Cirurgia Geral

Nota: Na secção “Passos Técnicos” não são tomadas posições relativamente à preferência por uma de opções alter-nativas mas apenas a descrição, passo-a-passo da sua execução.

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J. M. Schiappa, Francisco de Oliveira Martins

Sem movimento do intensificador ou da marquesa.Obervação na perpendicular

Fig. 1 Fig. 1a

Movimento da marquesa. Obervação das duas estruturas

Movimento do intensificador. Obervação das duas estruturas

Fig. 2 Fig. 2a

Fig. 3aFig. 3

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executam a colangiografia intra-operatória se existiremdeterminadas condições que se podem resumir em:

a) Antecedentes de icterícia, colangite ou pancrea-tite.

b) Provas funcionais hepáticas alteradas, nomeada-mente com elevação da fosfatase alcalina e bili-rubinas.

c) VBP dilatada (Ø >10 / 12 mm.) na ecografia préoperatória ou demonstração de cálculos aí locali-zados.

d) Cístico dilatado ou com diâmetro superior ao docálculo vesicular mais pequeno (se > 5 mm.).

e) História e evidência de cólica biliar e/ou cálculosna ecografia pré operatória sem que, na interven-ção, se encontrem cálculos na vesícula.

f ) Vesícula com cálculo multifacetado, único.g) Cálculos palpáveis na VBP durante a interven-

ção.h) Colecistite aguda (?).i) Suspeita de lesão das vias biliares ou para defini-

ção clara da anatomia (?).

COMO EFECTUAR (PASSOS TÉCNICOS)

Material e equipamento necessário:

Intensificador de imagem Respectivos sistemas de cobertura com material

plástico ou de pano, esterilizados (especiais ou impro-visados)

Marquesa operatória de tampo móvel e não opacoaos RX

Contraste liposolúvelSoro fisiológicoSeringas de 20 ou 50 cc.Torneiras de 3 viasSistemas de prolongamento para conexão das serin-

gas (e torneira de 3 vias) à agulha ou material de pun-ção

Agulha, catéter ou outro dispositivo de punçãoMaterial para fixação do dispositivo de punção à via

biliar (fio de sutura, clips ou pinça de colangiografia)

Técnica, passo a passo:

A abordagem preferencial é a feita pelo cístico(colangiografia trans-cística), sempre antes de laquearou cortar qualquer estrutura mas tendo procuradoidentificar a anatomia, em especial a artéria cística,para além do próprio canal cístico, como é evidente;em determinadas situações (não consideradas nestenúmero) pode ser necessário efectuar a colangiografiapela própria vesícula (colecisto-colangiografia) oudirectamente por punção da VBP. A colangiografiadeverá validar a identificação anatómica efectuada.

Muitos dos passos são comuns à abordagem “aberta”ou laparoscópica.

POSICIONAMENTO DA MARQUESA

Confirmação da colocação do doente com a área aestudar (abdómen superior e base do tórax) sobre azona “transparente” da marquesa.

INCISÃO / POSICIONAMENTO DOS TROCARTES

A incisão preferencial, se se estiver a efectuar “cirur-gia aberta”, é a sub-costal de Kocher, com boa exposi-ção da região sub-hepática: Valva(s) de Leriche e/oupreensão do ligamento redondo para elevar o fígado,abrindo o ângulo diedro; colocação de “rolo” de cam-pos operatórios molhados para baixar o duodeno,expondo assim de forma clara toda a área de trabalho.

Na contingência de se antever necessária (por opçãosistemática ou por situação selectiva) a execução deuma colangiografia intraoperatória, é totalmente deproscrever a abordagem por “Mini-lap”.

Os trocartes podem manter o seu posicionamentohabitual para a colecistectomia por via laparoscópica,apenas com a ressalva de que, se for de considerar, porsuspeita pré operatória, a execução da abordagem lapa-roscópica da VBP, o trocarte principal de trabalho temde estar mais “central” do que o habitual e a óptica ausar deve ser de 30º, ficando mais de face em relação

Colangiografia peroperatória

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à VBP. Não esquecer também que, para a fase de uti-lização de suturas, os instrumentos a usar se devemposicionar um em relação ao outro, o mais perto pos-sível dos 90º pelo que haverá que posicionar os tro-cartes em conformidade.

(Ver Figs. 4 e 5)

PREPARAÇÃO DO SISTEMA DE INJECÇÃO

DO CONTRASTE

Encher duas seringas com 20 cc., uma de contrastediluído a 25%, outra de soro.

Ligá-las a dois dos ramos da torneira de 3 vias e ligarum prolongamento de sistema ao outro ramo.

Ligar a extremidade do prolongamento à agulha decolangiografia.

Expurgar todo o sistema, não deixando que fique arem algum dos componentes.

Com a torneira de 3 vias, fechar o conjunto.

PREPARAÇÃO DA ZONA DE TRABALHO

OPERATÓRIA

Identificar o cístico, após dissecção do triângulo deCalot.

Colocar o cístico sob tensão moderada por tracçãoefectuada por uma pinça colocada junto à vesícula eque oblitera o seu lume, após dissecção cuidada emalguns milímetros de extensão.

Eventualmente, colocação de pequena compressaum pouco abaixo da zona de trabalho para absorver abílis, pequenos cálculos ou “lamas” que venham a sairdo cístico.

Pequena incisão na parede anterior do cístico, efec-tuada com tesoura delicada ou com lâmina de bisturi.

Observação das características do conteúdo que saido cístico. No caso de não haver saída imediata debílis, pode-se “massajar” um pouco o canal cístico, nadirecção da vesícula para, eventualmente, expulsarpequenos cálculos ou lamas que tenham sido movi-mentados pelo catéter.

No caso da cirurgia laparoscópica:Baixar um pouco a pressão de CO2 (para cerca de 8

a 10 mm.Hg).Escolher, por pressão digital na parede abdominal,

qual o local mais apropriado para a punção da parede(o ponto que permita uma abordagem o mais “emlinha” possível com o cístico.

Colocação da extremidade do catéter de colangio-

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Fig. 5

Fig. 4

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grafia dentro do cístico, dirigida por outra pinça (nocaso da cirurgia laparoscópica, colocada através do tro-carte sub-costal), através da incisão efectuada e pro-gressão da mesma. Os movimentos feitos em relaçãoao canal cístico deverão procurar “verticalizá-lo” e ocatéter deverá, previamente, ter sido expurgado de ar.

Se se tiver decidido fixar a pinça com fio, este deveser passado em redor do cístico, sem atar, antes daintrodução do catéter (no caso de cirurgia laparoscó-pica).

Fixar o catéter ao cístico (por clip não completa-mente encerrado – o mais aconselhado em cirurgialaparoscópica), ou atando um fio em redor do cístico,fixando o catéter sem o fazer colapsar. (ver Figs. 6 e 7)

Puxar o catéter com cuidado até a sua zona de fixa-ção (em geral, um ponto pouco afastado da extremi-dade, com maior diâmetro que o restante).

Aspirar um pouco através de todo o catéter que con-tem o contraste diluído.

Iniciar a injecção devagar observando a progressãodo contraste e avaliando se a diluição é correcta (se per-mite boa visualização, sem opacificar demasiado even-tualmente “escondendo” defeitos de preenchimento);

se não for a diluição correcta preparar outra seringacom diluição que poderá ir até aos 50%, sem nuncapermitir a entrada de ar no sistema.

Continuar a injectar, sempre pouco volume de cadavez e com pouca pressão.

Controlar todo o exame pela visão e usar a mobili-dade do intensificador para se fazer observações emvários planos.

Verificar a integridade da anatomia, a sua disposi-ção, a não existência de defeitos de preenchimento e apassagem franca do contraste para o duodeno.

No caso de haver passagem franca do contraste parao duodeno (papila “complacente”) poderá ser necessá-rio, com uma pinça atraumática (ou com a mão emcirurgia aberta), obliterar o lume da VBP abaixo dainserção do cístico, afim de se obter visualização daárvore biliar superior.

No caso oposto, de não passagem de contraste parao duodeno, pode-se estar em presença de uma situaçãode espasmo fisiológico da papila de Vater e a utilizaçãode nitrito de amilo ou de Glucagon®, aliviará o refe-rido espasmo permitindo a passagem do contraste, nãohavendo obstáculo de outro tipo.

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Fig. 6 Fig. 7

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Terminado o exame, aspirar o contraste até começarnovamente a ser bílis o aspirado, rodar a torneira efazer uma lavagem suave com soro fisiológico pelaoutra seringa.

Tirar o clip ou cortar o fio e retirar a agulha. (verFig.8)

Clipar ou laquear o cístico acima e abaixo da inci-são efectuada (no caso de não se efectuar maisnenhuma abordagem por esse ponto – exploraçãotranscística da via biliar).

Retirar a compressa eventualmente colocada.Prosseguir a cirurgia.O exame é considerado “Positivo”, com indicação

para exploração da Via Biliar Principal se:A VBP tem um diâmetro superior a 12 mm.Se encontram defeitos de preenchimento interpre-

táveis como cálculos ou outros que não sejam bolhasde ar (erro técnico na execução do exame).

Não há visualização da porção terminal da Via BiliarPrincipal.

Não se observa a passagem de contraste para o duo-deno.

O exame é possível em cerca de 85 a 90% dos casose tem elevada sensibilidade (95%) em relação à litiaseda via biliar principal.

As suas dificuldades de execução podem estar rela-cionadas com:

Cístico fino e/ou com válvulas no seu lume (podeser cuidadosamente dilatado ou aberto um pouco maisabaixo, afastado da válvula impeditiva da canulação)

Cálculo encravado no próprio cístico (a “palpação”com observação cuidada pode dar o diagnóstico; umaabertura sobre o próprio cálculo pode permitir a suaremoção e o prosseguimento do exame)

A colecistite aguda e a pediculite, sobretudo comum cístico inflamado podem ser fonte de grandes difi-culdades (as dúvidas e a consideração de necessidadede colangiografia e exploração nestas condições podemobrigar a conversão para cirurgia aberta).

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Fig. 8