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Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste ISSN: 1517-3852 [email protected] Universidade Federal do Ceará Brasil Moura de Araújo, Márcio Flávio; Pinheiro Beserra, Eveline; Moura de Araújo, Thiago; Soares Chaves, Emilia Obesidade infantil: uma reflexão sobre dinâmica familiar numa visão etnográfica Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, vol. 7, núm. 1, enero-abril, 2006, pp. 103-108 Universidade Federal do Ceará Fortaleza, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=324027953014 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

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Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste

ISSN: 1517-3852

[email protected]

Universidade Federal do Ceará

Brasil

Moura de Araújo, Márcio Flávio; Pinheiro Beserra, Eveline; Moura de Araújo, Thiago; Soares Chaves,

Emilia

Obesidade infantil: uma reflexão sobre dinâmica familiar numa visão etnográfica

Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, vol. 7, núm. 1, enero-abril, 2006, pp. 103-108

Universidade Federal do Ceará

Fortaleza, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=324027953014

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Reflexiio

OBESIDADE INFANTIL: UMA REFLExAO SOBRE DINÁMICA FAMILIAR NUMAVISAO ETNOGRÁFICA

CHILDHOOD OBESITY: A KEFLECTION ABOUT FAMILIAR DYMAMICS TIIROUGHAN ETIINOGRAPIIIC POINT OF VIElV

OBESIDAD INFANTIL: UNA REFLEXIÓN A CER CA DE LA DINÁMICA FAMILIARDESDE UN PUNTO DE VISTA ETNOGRÁPICO

M ,\R CIO F L\\'IO MOURA DE A RAÚJ0 1

E VELlNE PINIIEIRO B ESERRA2

TIIIAGO MOURA DE ARAÚJ0 3

El\IIUA SOARES CIIAVES4

Bstudo reflexioo que tem como objetivo enfocara contribuicdoda Etnografia para o cuidado de Enfermagem relacionadoaobesidade infantil numa dinámicafamiliar inadequada. O presente artigo aborda a ascensiio da obesidade /10 Brasil,particularmente na populacdo infantil e tenta compreender de que maneira esta doenca pode estar vinculada acaracterísticas familiares como: sedentarismo, biperfagia, desmame precoce e padráes culturais prejudiciais asa úde. Areflexiio ressalta que, nessa cotnpreensdo, o enfermeiro pode utilizar a Btnografia, afim de entender o simbolismo queexerce o alimento na familia e suas repercussiies na educaciio alimentar infantil. Conclui-se que a Etnograjia agu[a apercepcáo do enfermeiro, podendo facilitar a implantacdo da educaciio e111 satide nessasfamilias onde a adiposidadeinfantil surge devido tima conjectura propicia para a sua g énese. Dessa forma, a Bnfermagem contribui para umamelboria da qualidade de vida dos obesos e para reducdo da morbi-mortalidade de patologias associadas el obesidade.

PAUVRAS-CILWE: Obesidade; Etnografia; Enfermagem; Críanca.-=...;;:z.:::::::..;.-==~::....:::==::::.==~~

Tbis is a reflexiue study iobicb aims to focus on Etbnograpbic contribution totoards nursing care concerning infantileobesity in an inadequate familiar dynamics. The present study approacbes the ascension ofobesity in Brasil, particularlyin the infantilepopulation and it tries to understandboto sucb illness can be related to familiar cbaracteristics sucb as:sedentarism, byperfagia, early toeaning and cultural standards iobicb may be barmful to bealtb. The rejlection stands outtbat, in suchperception tbe nurse can malse use ofEtbnograpby, in arder to understandtbe symbolism represented by thefood in tbefamity and its repercussions in tbe eating babits of tbe cbild. It is concluded tbat Btbnograpby sbarpens theperception of tbe nurse, iobicb may, possibly facilitate tbe implantation of bealtb education in these fa milies tobereinfantile adiposity appears, due lo propitious conjecturefor its genesis. Tbus, Nursing contributes lo an improoement oftbe quality oflije oftbe obese andfor tbe reduction of tbe morbi-mortality ofdiseases associated toitb obesity.

KEYWORDS: Obcsity' Ethnograph ,. Nursing; C=.h::il::d.=-. .:-::...=== ==

Estudio reflexivoconelfin de enfocar la contribución de laEtnografia parael cuidado de Enfermería relacionado a laobesidadinfantilen una dinámica familiar inadecuada. Este artículo plantea elaumentode laobesidad en Brasil, particularmente entrela población infantil e intenta comprender cómo esta enfermedad puede estarvinculada a características familiares como:sedentarismo, biperfagia, desteteprecoz y moldes culturalesperjudiciales parala salud. Lareflexión resalta que, apartirdeestacomprensión, elenfermero puedeutilizarlaEtnografía, conel'fin deentender el simbolismoque ejerce el alimentoen fafamiliay sus repercusiones en la educación alimenticia infantil. Se concluye que la Etnografía aguza la percepción del enfermero,pudiendofacilitarla implantación de la educación en la salud en estas[amiliasdonde la adiposidadinfantil surge debido auna conjeturapropicia a su génesis. De estaforma, la Enfermería contribuyeparamejorar la calidad de vida de los obesos y lareducción de/morbo mortalidad de laspatologías asociadasa la obesidad.

PAUBRAS CUVE: Obesidad; Etnografía; Enfermería; Niño.

1 Acad émico de Enfermagem do 5"semestre da Universidade Federal do Ceará. E-mail: [email protected] Acad émicade Enfermagem do 5°semestre da Universidade Federal do Ceará. E-mail: [email protected] Académico de Enfermagem do 7°semestre da UniversidadeFederal do Ceará. Bolsista da Fundacño Cearense de Apoio aPesquisa. E-mail:

thlagomouraenfwyahoo.cnm.br.4 Enfermeira. Doutorando docursode Pós-graduacño ernEnfermagemda UFC. Professora substitutado Departamento deEnfermagcmda UFC. E­

mail:[email protected].

Rev. RENE. Fortaleza, v. 7, n, 1, p. 103-108, janJabril.2006

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Reflexao

INTRODU(:AO

oestilo de vida humana globalizado, com caracte­rísticas como consumismo, sedcntarísmo e alímentacáo in­dustrializada, construiu um ambiente desfavor ável a saúde,além de intensificar a prevalencia de uma antiga patología

humana: a obesidade. Atualrnente, ela é considerada urnimportante problema desaúdepública empaíses desenvol­vidos e subdesenvolvidos, alcancando patarnares de epide­mia global l.

Conceitualmente, a obesidadecaracteriza-se peloacúmulo de tecido adiposo, regionalizado ou generali­zado no tecido subcutáneo corpóreo. Pode ser causadapor doencas endócrino-metabólicas (obesidadeendógena) ou alteracóes nutricionais (obesidade

exógena), sendo, esta última, a mais prevalente. Aobe­sídadeestádíretamente relacionadaa problemasde saú­

de, a saber: hípertensáo arterial, diabetes mellitus, algunstipos decáncerese doencas cardiovasculares, constituin­

do-se um Iator de risco importante'.Recentes estudos realizados pelo Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE), juntamente com o Minis­térío da Saúde, sobrea composícáo da dieta alimentar e do

estado nutricional, com 95,5 milhñes de brasileiros, acimade vinte anos, de todo o país, revelaram: a taxa de 40,6%(cerca de 38,8 milh6es) de pessoas com sobrepeso, sendoquedestas, 11 % (cercade 10,5 milhóes) apresentararn obe­sidade. Isso contra 4% (cerca de 3,8 rnilhñes) de pessoasqueapresentaram déficit de peso. Logo, a freqüéncía de ex­

cesso de peso napopulacáo brasíleira adulta supera ern dez

vezes aqueja que apresenta déficit de peso'.Na populacáo infantil, estudos estimarn que, no

Brasil, haja cerca de tres rnilhóes de críancas, com ídade

inferior a 1°anos de idade, apresentando excesso de peso.Destes casos, 95% estariam relacionados a rná alimenta­~ao, enquanto, apenas, 5% seriam decorrentes de fato resendógenos'.

Todos esscs estudos epidemiológicos revelam queapopulacáo brasileira, num contexto geral, nao está maísexposta a ascendencia dadesnutricáo , mas sim da obesída­

de, especialmente, a populacáo infantil. Porconseguinte, aliteratura científica acumula dados, comprovando que aobesídade adulta, multas vezes, comeca na infancia.

Rev. RENE. Fortaleza, v. 7, n, 1, p. 103-108, lanJabril.Z006

Aadiposidade na infancia, em sua grande maioria,nao está díretamente ligada ao consumo excessívo de ali­mentos, mas sim a íngestáo de alimentos hipercalóricos

atrelados, tarnbém, a hábitos de vida sedentarios, princi­palmente, nas populacóes urbanas. Cooperam, ainda, como

intermediarios, os aspectos gestacionais e sócio-culturais.

Esses sao processos que, de lima forma direta ou lndireta,tém sua génese veiculada a distúrbios psicodinámicos fa­

miliares" .Ressalta-se a significativa coruríbuícño, no que se

refere a aspectos teóricos e práticos, da disciplina "Enfer­magem no Processo de Cuidar 1 (enanca e adolescente)"parao desenvolvírnento do presente estudo. Essa, ministra­da noquarto semestre do cursodegraduacáo ern Enferma­gem da Universidade Federal do Ceará, prornoveu, alérn do

suporte intelectual e metodológico, urna ferrarnenta de

pesquisa: o intcresse pelaproblemática da adiposidade in­fantil num contexto familiar alterado. Rotineiramente, no

decorrer da disciplina, deparen-se com casos de excessode peso infantil, relacionado ao cuidado inadequado coma alímentacáo da enanca pela familia, combinado a um

contexto familiar prejudicial aodesenvolvimento nutricional

sadio e, conscqiientementc, asaúde da clientela infantilcomo: sedentarísmo familiar, desmame precoce e alimen­

ta~ao hipercalórica.Dessa forma, rcalízou-se um estudo reflexivo , numa

perspectiva teórico-explicativa, o qual objetivou analisarcriticamente a dinámica familiar na obesídadc infantil e

identificar os cuidados de enfermagem cabfveís nesse pro­cesso, a partir de uma visan etnográfica.

METODOLOGIA

o caminho metodológico adorado para o presenteestudo foi a pesquisa bibliográfica. Apesquisa bibliográfi­ca está assocíada a urna revísño de literatura parafacilitar a

delimitacño do tema. Esse tipo de pesquisa é construído apartir da selecño de vários estudos que pesquísam o mes­1110 fen ómeno. Oque permite a formulacáo de colocacñcsatrav és do método dcdut ívo".

Oacervo bibliográfico do presente artigo constau delivros, capítulos de livros, artígos e teses pertinentes, relaci­onados ás tem áticas: obesídade infantil, familia, cuidados de

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cnlermagem pedí átrícos e teorías de enfermagem, publica­

dosno período de 1995 a 2004. Elegeu-se esse cspaco tem­poral porseconcordar com a literatura preconizada e com aOrganizacáo Mundial de Sa úde (OMS) que afirruam ser a

obesídade urna epidemia mundial do final do século XX etambém uma das prov áveís patologías maís prevalentcs du­

rante o século XXIG• A partir da pesquisa bibliográfica, foirealizado um estudo reflexivo sobre a temática.

Obanco de dados consultado para a busca ativa depublícacóes foi a biblioteca eletrónica Scíclo, dispon ívcl

ern: btljJ://wwl/!.scielo.bJ; utilizando os unitermos: obcsí­

dade infantil , familia e etnografía corno critério para a in­clusño do(s) artigo(s) na amostra. A busca de livros

didáticos e artigos naodísponíveís na biblioteca Scielo que

abordassem a temática supracítada, tamb ém, foi urn recur­

so paraa elaboracao desta reflexáo. Al érn disso, colaborou

nodesenvolvimento deste artigo a Pesquisa de Orcamentos

Familiares (POF) 2002-2003 , executada pelo IBGE e Mi­nistériodaSaúde. Essa pesquisa de basepopulacional cons­

tava de capítulos referentes a dieta alimentar e estadonutricional de seuspesquisados, tendo sido Ionte de gran­

de destaque e pol émica na sociedade brasileira devido a

seus resultados sobre o padráo alimentar brasileiro. Essa

busca culrninou num acervo de 18 trabalhos, todavía fo­

ram excluidos (3) aqucles publicados ern um período an­

teriora 1995, o que finalmente resultou em 15 referencias

bibliográficas.Sornado a estas se utilizou tarnbém, para a análise

da contribuicáo do enfermeiro como agente cuidador da

famflía ern todas as suas esferas e, em especial , naquelascom o componente daobesídadc infantil, refcrencíalmcnte,

o método etnográfico proposto por Madeleine Leininger: a

Etnoenfermagcm. Dcssa forma , destacando a Etnografía

corno um instrumento no processo do cuidado de enfer­

magem.Os passos para a análise dos artigos, trabalhos e

textos afins Ioram:

• Criteriosa e demasiada leitura dos textos.• Elaboracáo deIichamentos, resumos ecomentarios

parafraseados, a partirde citacóes dosautores.

• Discussñes pertinentes, acerca da temática, en­

tre os articuladores do estudo.

Reflexiio

• Orecorte dasconstrucóes mais significativas parao propósito da pesquisa.

• Atribuicáo das seguintes categorías temáticascomo pontos de reflexáo: Dinámica Familiarversus Obesídade Infantil e Identíñcacáo dos

Cuidados de Enfermagem.

• Explanacáo ern torno dessas categorias , tendocomo suporteteórico os textos selecíonados para

o estudo.

DlNi\MICA FAl\tIUAR VHlSUS 08ESIDADE INFANTIL

Família: UIll referencial infantil

No presente estudo, conceítuou-se a família como

o núcleo de Ulll ambiente sócío-cultural constítuído pela

figura dos país e do(s) filho (s)7. 1I01lve a concordancia de

que a família , semelhantcmente a um "núcleo celular",possui características próprias, mas, tarnbém, herdadas de

geracóes anteriores. Analogtcamcnte, ascélulas transferemínformacóes aosseusdescendentes nosprocessos de repro­

dueño celular, todavía, essas ínforrnacócs celulares trans­

mitidas as células descendentes podem ser benéficas oumaléficas para o seu devido receptor. Igualmente, as Iamí­lias podern transferir, ás suas futuras geracóes, comporta­mentos, tradícñes ou padrees maléficos asaúde.

Essa capacídade das famílias perpctuarem para as

geracóes seguintes legados de cunho genético, sócío-cultu­ral, psicológico e espiritual contribui para a formulacáo da

personalidade e comportamento humano, podendo, tam­bém, interferir diretaou indiretamente no processo desaú­

dc-doenca, da mesma forma, como as experiencias

extra-familiares.

Aliteratura científica acumula evidencias de queuma dinámica familiar ínadcquada favorece a génese da

adiposidade infantil. A familia possuí um papel funda­

mental na forrnacáo inicial clos hábitos alimentares da

críanca, sendo os país, o referencial inicial de padráoalimentar para os Iílhos", Os hábitos alimentares defi­

nern-se gradativamcnte nos prirneiros anos de vida e, du­

rante esse período , o estabelecímento de urna dieta

desequilibrada ou hiperfágica pode repercutir nurn ex­

cesso de peso.

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Reflexdo

o binomio máe-filho

Algumas correntes de pensamento afinnam quea di­nárníca fisiol ógica e emocional da enanca obesa origina-se novínculo inicial entre rnáe e filho. Nesse binomio, alguns fato­respodem desencadear patologías nutrícíonaís como a obesi­dade, sao eles: o desmame precoce, a alírnentacáo excessíva edesnecessáría a qualquer alarme infantil, a ansíedade e imatu­rídade materna no cuidado e alímentacño do fílho'',

Quando a puérpera realiza o desmame precoce einicia uma alímentacáo artificial, se nao o fizer correta­mente ou se ofertar esses alimentos a críanca, indiscri­minadamente, como forma de recompensa, devido suaírnaturídade maternal , poderáfavorecer o acúmulo depesodessa enanca. já que, essaa~ao é um fator que fortalece,

no inconsciente infantil, a ídéiado alimento como "socor­

ro" e "prazer", proporcionando uma hiperfagia e, conse­qüentemente, excesso de peso. O futuro obeso, comendoexcessivamente, tenta recuperar ou permanecer ligado .10

primitivo prazer oral da infancia, dificultando, dessa for­ma, a descoberta de novos prazeres e sua interacáo social

com outros indivíduos.Outra problemática no binomio rnáe-Iílho, na ques­

tao da adiposidade infantil, é o fato de que, em nossa cul­tura, o bebe ou crianca que come e engorda, valoriza aimagem da rnáe no contexto familiar e social num momen­to em que é vital para ela sentir-se perfeita. A partir desseprisma, percebemos que muitas máes, inconscientemente,associam o papel e amor maternal somente como umaquestño de nutricio.

Todavia, nao se restringe somente amáe a contri­buícáo para o excesso de peso infantil. O pai e outros

cuidadores podem tamb érn influenciar. Esrudos sugeremque a ornissáo dos cuidados paternos durante a infanciaaumenta o risco para o sobrepeso pediátrico, sendo, prati­camente, nulo esse risco ern enancas que vivem num larondea presenca paterna é atuante e harmoníosa'".

Apercepcño dos pais sobre o estado nutritivo de

seu filho

Apercepcño inadequada dos genitores sobre o esta­do nutricional de seus filhos, alérn de impedir o éxíto na

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descoberta e terap éutica doexcesso depeso infantil, revela afalta deconhecimento dos país sobrea condícáo de aúde deseufilho e a doenca obesídade. Isso, rnuitas vezes,deve-: e .10

padráo sócio-cuítural estereotipado dacrianca "gorda"comobela e sadía em relacáo as demais em algumas ocíedades,Nessa perspectiva a aflrrnacáo de que a familia exerce umpapel de referencia nutricional paraosseus filhos ganha re­levancia quando trabalhos mostram que até os 10 ano deídade osprincipais fato resquecontribuern paraoexces odepeso saoosambíentaís e,dentre esses, um dos mais freqü en­

tes é ter pais com sobrepeso ou obesidade!'.Outros fato res ligados a transtormacóes no contexto

socíal também contribuem parao acúmulo de peso dafami­

lia em geral, como, por exemplo, a adocáo de comporta­mentos sedentáríos.Anteriormente, nao havia grandes perígosemsaíras masparacaminhar, passear ou praticar esportes,Atualmcnte, porém, a ascensáo daviolencia emnossa socie­dade, somada aos atratívos de recursos como a televísño, ocomputador ejogos eletrónícos estimulam oenclausuramentodasfamílias nos lares e, conseqüenternente, o sedentarisrnoquefavorece o acúmulo de peso.

Todas essas situacñes, no contexto da familia, atre­ladas ao agravante da escassez de programas governamen­taísquecombatam a obesidade adulta ou infantil favorecemsua ascensáo aepidemia.

IDENTIFICA(:AO DOS (;UIDADOS DE ENFERl\1AGEl\1

o método etnográfico na comprecnsáo da

obesidade infantil

De urnamaneíra sintética, compreendeu-se, a partirdas idéias dos autores analisados, ser a etnografia limametodología de pesquisa qualitativa que tem a finalidadede desvendar a realídadc humana, partindo de urna pers­pectivacultural 12. 13.

O método etnográfico, na busca de desvendar as"couracas culturaís" para compreender a sígníflcáncía de

símbolos, comportarnentos e acóes humanas respalda-seno conhecimento empírico, nas experiencias e na lingua­gem explícita e implícita do indivíduo. Nessa perspectiva, aetnografia é um instrumento de pesquisa aplíc ável acien­

cia Enfermagem, pois prima, como pilar funcional , porurna visao holística e pela valorizacáo da cultura grupal.

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Reiterando, deforma maís incisiva, o relacíonamen­to intrínseco existente entreEnfermagem e Etnografía, valeressaltar, o pensamento queMadeleine Leininger propóe: a

Etnoenfermagem. Essa é descrita pela enfermeira, em suaTeoria do cuidado cultural, como um estudo sistemáticoda Enfermagem sobreas crencas do cuidado, os valores epráticas percebidas cognitivamente por uma cultura desig­nada atrav és dasua linguagem local, experiencias, crencase sistemas devalores. Ométodo emEtnocnfcrmagem exigequeo enfermeíro pesquísador deduza o conhecímento e as

percepcñes culturais sobreascrencas, práticas evalores deum determinado individuo ou grupo 14,1 5.

Durante a análise da bibliografía consultada sobreEtnografia, observou-se a predominancia de abordagcnssobre a família , tendo cm vista que muitos mitos, valores ecomportamentos exteriorizados no ámbito social tém suas

bases na história familiar, senda, multas vezes, esselegadocultural familia r prejudicial asaúde de seusdescendentes ,por exernplo, a hiperfagia familiar.

Apartir de uma visao etnográííca, o enfermeíro pode

perceber que,especialmente nas culturas deorígem latinacomoanossa,asreíetcóes híperfágicas ocorrern constantemente nosmomentos de íntegracáo e Iestívidade familiar; Iortalecendo,no inconsciente infantil , a simbolízacáo do alimento comofonte dealegría e poder. Isso, em suagrande rnaioria, deve-seamatriarca que mesrno vivendo ern uma socíedade patriarcal,no momento das refeícócs, Incorpora um papel ilustre: o deincentivar a alímentacáo, Todavía, cmgeral, háurn demasiado

incentivo, já que a pouca íngestáo alimentar da farnílía ou de

convidados pode significar, paraa matríarca, um sinal de re­provacño como rnáe, administradora do lare mulher.

Logo, noaspecto dos distúrbios nutricionals infantis,aquí representado pela obes ídade, acrcdíta-se serfundamen­tal, nocuidado de Enfermagem, a compreensáo do contextocultural no qual a enanca obesa e sua familia estáo inseri­dos. Dessaf0l111a, o enfcrmeiro busca fato res determinantesde risco para a génese da adíposidade infantil.

Educacño cm saúde: um cuidado de Enfermagem

Oenfermeiro, cnquanto vigilante nutricional e edu­cador em saúde,aose apropríarda Etnografia paraa práti­ca do seu cuidado cm rclacáo aobcsídade infantil munaconjectura familiar inadequada, conscguc, além de urna

Reflexáo

aval íacáo nutricional familiar etetiva, identificar compor­tamentos de risco para o excesso de peso infantil como:sedentarísmo,alímentacáo hipercalórica excessíva, desma­

meprecoce, mápreparacáo dosalimentos, superprotecáo

dos filhos ou crises familiares . Isto acontece porque esteprofissional passa a cornpreender a sígntñcáncía ou

simbolizacáo que esses cornportamentos tém na vida dafamilia em questáo ou da própria enanca obesa.

Acontemplacáo etnográfica sobre a conjuntura fa­

miliar, noquediz respeíto ao excesso de peso infantil, podefacilitar a ínsercño da educacáo em saúde e a promocáo da

rnesma na família. Entendc-se ser educacáo em saúde um

processo crítico e transformador, no qual o profissionalhabilitado é o agente promotor de um tipo de comunica­c;ao - aprendizagem que visa nurna perspectiva individual

ou coletiva, urna mudanca de cornportamento, antes desía­vor ável e de vulnerabílídade asaúde 16,17.

É notável o papel do enfermeiro como educadorem saúde e como sanador de umproblema que,aínda hoje,o modelo biomédico naoconseguiu transpor na terapéuu­ca da adiposidade infantil: a percepcño incorreta dos país

acerca do estado nutritivo de seus filhos. Porrneio da con­sulta de enfermagem, sejano ambulatório ou no domicíliodo cliente, o enfermeiro esclarece aos pais suas íuncóes

como educadores e eternos vigilantes nutricionais. Outrafuncño importante, se naofora mais importante, realizadapelo enfermeiro junto aos país de enancasobesas é adver­

ti -los sobre a perspectiva que os compromete enquantoreferencial bíopsícossocíal naconstrucáo dapersonalídade

infantil, especialmente no caso que nos ocupa: o padráoalimentar. Dessa forma , o enferrneiro, tarnb érn , incentiva aadocáo de um estilo de vida que inclua urna alnnentacáosaudável, práticas físicas cotidianas, amamentacáo eficaz,

alimentos mais naturais e formas de lazer alternativas.Amando desse modo, o enfermeiro, após realizar a

educacáo emsaúde, fortalece no inconsciente infantil , por

meio do exemplo prestado pelos país, que existem outrasformas de prazer e satísfacáo alérn da alímentacáo.

Estcs cuidados de Eníermagem contribuem, de f0l111asubstancial, no campo da saúde pública, pois ao reduzír ahípcríagía dapopulacáo iníantil e, conseqiientemente,a gcne­sedoexcesso depeso nessa, a Eníermagem atua naprevencáodaobesídade adulta e devarias outras patologías associadas a

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Reflexiio

ela que, anualmente, onerarn os cofres públicos com gastosem tratarnentos e ínternacóesdecorrentes dedoencas queapre­

sentarn como urn dos fato res de risco a obesidade. Todavía,emnossa concepcáo, a principal contr íbuícáo quea enferma­

gern traz com osseus cuidados as enancas ouadultos obesos easfamiliasdestes é a promocáo deurna qual ídade devida que,

emsuagrande maioria, anteriormente, naoexistía.

CONSIDERA~ÓES FINAIS

Concluindo esse cxercícío reflexivo, pode-se desta­car a familia como urn grupo que possuí rclacñes sociaís

dinámicas e que durante todo o seu processo de descnvol­

vimento pode influenciar vários aspectos da vida de seusmernbros, entre eles, a nutrícáo. País ou patentes detento­

res de um estilo de vida que propícíern o seu acumulo de

peso estño, multas vezes inconscientemente, construindo,

no intelecto infantil, urn padráo alimentar e de vida quecondicionao surgimento da adíposídade,

O eníermeíro, ao se utilizar do método etnográfico

como recurso de cuidado, pode compreender e perceber agénese daobesidade ínfanül numa dinámica familiar prej udicial

asaúde,jáqueeste método aguca suapercepcáo paracompor­

tamentos queestimularn a hiperfagia e osobrepeso pedi átrícono ambiente familiar; Por causa disso, o cníermeí ro pode re­

conhecer ospontos devulnerabilidade asaúdc desses d íentese, adequadameme, implantar o processo de cducacáo cmsaú­

de. Em suma, o cnfcrmeiro pode conscientizar seus clientes

paraa adodío de um estilo de vida maís saudável, assírn, csse

profissional estará cumprindo sua rnissño enquanto agentedííercncíador nacolaboracáo da saúde pública no Brasil.

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H Ef.EIIIIlO: 21/09/05

ACEITO: 09/01/06