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Informativo Oigalê www.oigale.com.br Ano 3 | Edição 6 | 2º semestre de 2011 Porto Alegre/RS | Distribuição Gratuita desde 1999 P ara a Oigalê, a tomada do espaço público é extrema- mente importante e neces- sária como política cultu- ral pública. Apropriar-se desse lugar para dar acesso a todo cidadão independente de raça, condição financeira, cren- ça ideológica ou religiosa. O projeto ‘Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampia- no’ patrocinado pela Petrobras aprofundou a pesquisa desen- volvida desde 1999: o trabalho do ator de teatro de rua, mam- bembe, mesclado ao contador de causos, lendas, histórias e contos da região pampiana, buscando uma linguagem e dra- maturgia própria deste bioma. No decorrer de agosto a dezembro de 2010, a Oigalê executou pesquisa de campo, permanecendo, em média, quatro dias em cada cidade visitada, realizando levanta- mento de material, buscando entrevistas, livros, textos, gra- vuras, novas histórias, lendas, contos, causos, CDs, encon- tros com grupos artísticos e de manifestações populares, registrando e catalogando es- te material. A intenção foi realizar uma troca: apresentação em 13 cida- des de um espetáculo do grupo pela busca, junto à comunida- de, de informações das mais diferentes manifestações locais. As cidades próximas dos países vizinhos também foram visitadas, em mais de 5.000 km percorridos pela região pam- piana: Itacurubi, Garruchos (Garruchos/AR), São Borja (São Thomé/AR), Itaqui, Ma- çambará, Quaraí (Artigas/UR), Barra do Quaraí (Bela Unión/ UR), Uruguaiana (Passo de Los Libres/AR), Alegrete, Santana do Livramento (Rivera/UR), Dom Pedrito, Bagé e Aceguá (Aceguá/UR). A recepção foi muito boa em todos os lugares. Perce- bemos a imensa carência de eventos culturais e, ao mesmo tempo, a disponibilidade das comunidades em contribuir com a pesquisa. Percorremos os mais remo- tos pontos do pampa gaúcho, fronteiriços com Argentina e Uruguai. Apresentamos teatro de rua para aqueles que nun- ca haviam assistido nenhuma apresentação de teatro em suas vidas. Um público ávido e se- dento por algo tão fora de sua realidade do dia-a-dia. O silêncio do público às ve- zes era impressionante, sendo possível ouvir os pássaros. Mo- mentos lindos de comunhão entre público e os atores. Registramos tudo ou quase tudo que presenciamos basica- mente em vídeos, escritos e fo- tos. Ouvimos tantas histórias que se colocássemos todas juntas, em um livro, teríamos em mãos um dos maiores registros do pampa “gaúcho”: o ABC dos Pampas. Tivemos as mais variadas temperaturas, tanto no inver- no com apresentações sendo realizadas a 3ºC, quanto na primavera onde o termôme- tro bateu os 30ºC. Nessa trajetória de mais de 5.000 km de estradas, conta- -se 50 dias de viagem divididos em três circuitos, 13 cidades do pampa gaúcho, 7 cidades da Argentina e Uruguai, 280 entrevistados. Concluímos essa etapa do projeto satisfeitos com os re- sultados, tanto com relação às apresentações quanto à pesquisa de campo realizada. De volta para casa, com um total de 70 horas de gravação de vídeo, em torno de 9.200 fotos, cerca de 80 livros e 12 CDs de música, iniciamos a catalogação de todo esse ma- terial, com o objetivo de trans- formá-lo em elemento cênico, em uma linguagem para o te- atro de rua. Nessa 6ª edição, prepara- mos para dividir com o nos- so público um resumo do re- sultado da pesquisa realizada em 2010, com patrocínio da Petrobras, chamada ‘Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampiano’. Ser gaúcho é um estado de espírito? Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampiano

Informativo Oigalê - 06

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Jornal sobre a Oigalê - Cooperativa de Artistas Teatrais que aborda sobre o Teatro de Rua, Ocupação Cênica, Políticas Públicas para a Cultura entre outros. Projeto gráfico e diagramação de Carlos Tiburski.

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Informativo Oigalêwww.oigale.com.br

Ano 3 | Edição 6 | 2º semestre de 2011 Porto Alegre/RS | Distribuição Gratuita

desde 1999

Para a Oigalê, a tomada do espaço público é extrema-mente importante e neces-sária como política cultu-ral pública. Apropriar-se

desse lugar para dar acesso a todo cidadão independente de raça, condição financeira, cren-ça ideológica ou religiosa.

O projeto ‘Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampia-no’ patrocinado pela Petrobras aprofundou a pesquisa desen-volvida desde 1999: o trabalho do ator de teatro de rua, mam-bembe, mesclado ao contador de causos, lendas, histórias e contos da região pampiana, buscando uma linguagem e dra-maturgia própria deste bioma.

No decorrer de agosto a dezembro de 2010, a Oigalê executou pesquisa de campo, permanecendo, em média,

quatro dias em cada cidade visitada, realizando levanta-mento de material, buscando entrevistas, livros, textos, gra-vuras, novas histórias, lendas, contos, causos, CDs, encon-tros com grupos artísticos e de manifestações populares, registrando e catalogando es-te material.

A intenção foi realizar uma troca: apresentação em 13 cida-des de um espetáculo do grupo pela busca, junto à comunida-de, de informações das mais diferentes manifestações locais.

As cidades próximas dos países vizinhos também foram visitadas, em mais de 5.000 km percorridos pela região pam-piana: Itacurubi, Garruchos (Garruchos/AR), São Borja (São Thomé/AR), Itaqui, Ma-çambará, Quaraí (Artigas/UR),

Barra do Quaraí (Bela Unión/UR), Uruguaiana (Passo de Los Libres/AR), Alegrete, Santana do Livramento (Rivera/UR), Dom Pedrito, Bagé e Aceguá (Aceguá/UR).

A recepção foi muito boa em todos os lugares. Perce-bemos a imensa carência de eventos culturais e, ao mesmo tempo, a disponibilidade das comunidades em contribuir com a pesquisa.

Percorremos os mais remo-tos pontos do pampa gaúcho, fronteiriços com Argentina e Uruguai. Apresentamos teatro de rua para aqueles que nun-ca haviam assistido nenhuma apresentação de teatro em suas vidas. Um público ávido e se-dento por algo tão fora de sua realidade do dia-a-dia.

O silêncio do público às ve-

zes era impressionante, sendo possível ouvir os pássaros. Mo-mentos lindos de comunhão entre público e os atores.

Registramos tudo ou quase tudo que presenciamos basica-mente em vídeos, escritos e fo-tos. Ouvimos tantas histórias que se colocássemos todas juntas, em um livro, teríamos em mãos um dos maiores registros do pampa “gaúcho”: o ABC dos Pampas.

Tivemos as mais variadas temperaturas, tanto no inver-no com apresentações sendo realizadas a 3ºC, quanto na primavera onde o termôme-tro bateu os 30ºC.

Nessa trajetória de mais de 5.000 km de estradas, conta--se 50 dias de viagem divididos em três circuitos, 13 cidades do pampa gaúcho, 7 cidades da Argentina e Uruguai, 280

entrevistados. Concluímos essa etapa do

projeto satisfeitos com os re-sultados, tanto com relação às apresentações quanto à pesquisa de campo realizada.

De volta para casa, com um total de 70 horas de gravação de vídeo, em torno de 9.200 fotos, cerca de 80 livros e 12 CDs de música, iniciamos a catalogação de todo esse ma-terial, com o objetivo de trans-formá-lo em elemento cênico, em uma linguagem para o te-atro de rua.

Nessa 6ª edição, prepara-mos para dividir com o nos-so público um resumo do re-sultado da pesquisa realizada em 2010, com patrocínio da Petrobras, chamada ‘Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampiano’.

Ser gaúcho é um estado de espírito?Oigalê – a Busca de um Teatro de Rua Pampiano

ItacurubiA chegada na Pousada da dona Teresinha

em Itacurubi foi marcante depois de 9 horas de estrada. Fomos recepcionados com um bom mate e rosquinha quentinha feita na hora, algo que mostra a hospitalidade do gaúcho.

Entrevistamos pessoas como o Sr. Oli, que nos afirmou que “gaúcho não acredita em assombração” contrário do Seu Lili que se vangloria de possuir uma faca de prata “capaz de tirar o couro de lobisomem”.

O jantar de confraternização, oferecido pela prefeitura, foi um momento coletivo com a comunidade de Itacurubi, onde ouvimos contos, causos e mú-sicas locais.

No mês de agosto, tivemos a presença de uma característica marcante do RS: as baixas temperaturas de inverno, chegando a marcar 3°C em praça pública, durante os espetáculos. A água mineral servida aos atores congelou, e mesmo depois de permanecer algumas horas ao sol, a água continuava congelada.

Foi a primeira vez que a cidade recebeu teatro de rua.

GarruchosNa cidade de Garruchos, a travessia do rio

Uruguai, em uma pequena chalana para cinco pessoas, foi algo que mostrou um pouco do comércio e deslocamento das pessoas entre Brasil e Argentina nesta região.

O prefeito nos apresentou o panorama geral do município e suas dificuldades pela distância com o asfalto, e contou que nunca havia recebido um espetáculo de teatro de rua. Além disso, relatou sua preocupação com a futura instalação de uma barragem no Rio Uru-

guai próximo à cidade. Conversamos, entre tantos outros nativos, com Seu Adão, que é autor do hino da cidade.

Tivemos o segundo jantar coletivo com a comunidade, organizado pela pre-feitura de Garruchos. Aqui fomos acolhidos em torno da churrasqueira, sendo servidos de uma maneira simples e verdadeira, pelo próprio assador.

São BorjaNa chegada a São Borja, visitamos o Museu

Aparício Silva Rillo (conceituado escritor e po-eta da cidade). Nesse dia, deu-se o primeiro contato do grupo com as obras relacionadas ao período jesuítico dos sete povos das missões.

A visita aos museus dos ex-presidentes João Goulart e Getúlio Vargas nos mostrou um pouco da história política da cidade. Também em São Borja, visitamos o Museu Ergológico situado junto ao Centro Cultural do Grupo Artístico Angüe-ra, museu este que guarda vários instrumentos de trabalho da vida do homem do pampa. Também saboreamos um belo jantar oferecido pelo grupo citado.

ItaquiEm Itaqui, vivenciamos a solenidade da

“Chama Crioula”, marcada por uma homena-gem ao chamado Grupo dos Oito, reconheci-do como os fundadores do tradicionalismo. A chama do Candeeiro foi acesa pela primeira vez em 1947, retirada de uma centelha da Pira da Pátria, e desde então distribu-ída para as 30 regiões tradicionalistas do RS.

e x p e d i e n t eJornalista Responsável: Carlos Ismael Moreira - MTB 15.021 • Coordenação do Informativo: Vera Parenza • Projeto Gráfico e Diagramação: Carlos Tiburski Revisão: Paola Opptiz • Colaboradores da Edição: Di Machado, Giancarlo Carlomagno, Hamilton Leite, Ilson Fonseca, Paulo Brasil, Thiago Alves e Vera Parenza • Impressão: Jornal Pioneiro • Tiragem: 10.000

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Porto Alegre 2011 | Distribuição Gratuita 2Visitamos Zeca do Bigode, personagem folclórico que

mantém um museu ergológico em sua casa. Mostrou um pouco dos instrumentos de trabalho da lida pampiana que ele recolheu nas últimas décadas.

Visitamos as ruínas do “Saladeiro de São Felipe de Itaqui”, local onde era abatido o gado para ser transfor-mado em charque. Diferente do restante do estado, as “charqueadas” aqui são denominadas “saladeiros”, bem como na Argentina.

Em entrevistas no Teatro Prezewodowski, tivemos o prazer de conhecer o poeta e compositor João Sampaio, grande conhecedor e pesquisador da cultura pampiana e guaranítica.

MaçambaráAqui também nos

encontramos com um pouco do folclore gau-chesco: a chegada da centelha da chama criou-la distribuída a partir de Itaqui. Um dia de festa na cidade.

QuaraíFomos recepciona-

dos pelo poeta e histo-riador Dagoberto Men-des em seu escritório particular, localizado em sua própria casa da maneira mais tradicional, olho no olho, aperto de mão e nome completo. Seu Dagoberto serviu um bom mate e nos apresentou Quaraí através de seu olhar poético. Destacamos sua versão para a lenda do “Cerro do Jarau”, bem como a música típica da região, “Piazito Carreteiro” de Luiz Menezes.

Deslocamento de 30 km em chão batido para uma trilha ecoló-gica no Cerro do Jarau, guiada pelo historiador Ricardo Murilo. Neste

cerro, tivemos o privilégio de, passo a passo, ouvir o de-senrolar da lenda a partir da contação do guia. A Salaman-ca do Jarau é uma lagartixa que se transforma em Prince-sa Moura.

O cerro é uma formação montanhosa, resultado de um asteróide que rasgou a terra há milhões de anos, des-configurando a planície característica do bioma pampiano. Acredita-se que o cerro tem um protetor, sempre zeloso, para preservar o local e a história: o Guardião do Cerro.

Esse diferencial ge-ográfico deu origem à lenda que já faz parte do imaginário do povo gaúcho. O cerro é bas-tante visitado por sua fama de local encantado. Ao encontrar uma lagartixa, pode-se estar em frente à Princesa Moura.

Mais uma grande surpresa da pesquisa foi conhecer pessoas muito especiais. Nádia Boelter, poetisa, que nos indicou o Coordenador da “Casa de Los Sueños” de Ar-tigas/UR, Juan da Rosa. Neste espaço, o Maestro desen-volve um trabalho artístico, cultural e social com foco na infância e juventude.

Cruzamos a fronteira e, ao encontrá-lo, nos depara-mos com um senhor carismático, que conversava conos-co afirmando que já nos conhecia “há mais de mil años, só não tínhamos nos encontrado”. Ele nos apresentou sua cidade.

Barra do Quaraí

Conhecemos Arge-miro Rocha, integrante da ONG Atelier Salade-ro, que nos apresentou as ruínas do saladeiro da cidade de Quaraí, local onde se abatiam animais bovinos para produção de charque, que se constituiu no mais im-portante fenômeno econômico em toda a região no final do século XIX e inicio do século XX. Constatamos a depre-ciação do patrimônio histórico da região, pois os antigos prédios do complexo do saladeiro encontram-se em ruínas.

Visitamos de barco a Ilha Brasileira, local conhecido como o marco mais a oeste do Rio Grande Sul, o Marco das Três Fronteiras. Trata-se de uma Ilha localizada na foz do Rio Quaraí, que na década de 1930 passou a ser obje-to de diversos litígios entre o governo brasileiro e uru-guaio. Na ilha, conhecemos a antiga residência do Seu Zeca, que morou mais de quarenta anos naquele local.

Conhecemos o museu particular do comerciante e es-critor João Albino Rosa, personagem folclórico desta pe-quena cidade da fronteira. Na sua própria casa, ele montou um Museu “ergológico” com os mais diversos materiais, inclusive pedaços de madeiras que se petrificaram com o passar dos anos (efeito natural e muito comum nesta região).

UruguaianaC o n h e c e m o s a

“Confraria do Funcho”, um bolicho (bar) típico da região, onde escrito-res, poetas, músicos e historiadores se encontram para beber, comer, cantar, declamar e conversar. Ouvimos histórias, poesias cam-peiras e muita música de compositores locais.

Ao cruzarmos a fronteira mais uma vez, fizemos uma visita à Diretora Cultural de Passo de Los Libres, Mirta Bertonni, que nos contou a história do “Gauchito Gil”, santo popular que possui uma grande procissão no dia 08 de janeiro. Conhecido como o “Robin Wood” dos Pam-pas, arrasta milhares de pessoas que desejam retribuir ao “santo” milagreiro as preces atendidas.

AlegreteNo Museu do Gaú-

cho, Flávio Alfeu Poite-vin, historiador e atual diretor, nos conduziu em uma visita direcio-nada. Ali, pudemos presenciar a evolução do povo gaúcho do início do século XV até os atuais, reafirmando questões importantes da história e da construção do “gaúcho”.

Seguimos para a antiga estação férrea da cidade onde fica o CEPAL – Centro de Pesquisa e Documentação de Alegrete, onde encontramos Danilo Assumpção dos San-tos, historiador e presidente desta instituição que nos deu uma aula de história e sobre a importância dos mu-nicípios de fronteira para as revoluções e guerras que aconteceram no estado do Rio Grande do Sul.

Aprendemos a origem da palavra “contrabando”, uma prática forte na fronteira, muito mais intensa na chamada fronteira seca do Uruguai e Rio Grande do Sul. O Reino de Portugal e a colônia, aqui no Brasil, emitiam um docu-mento para comercialização para quem pagava o impos-to chamado “bando”. Quem se opunha à cobrança de impostos e fazia o comércio sem autorização ficou co-nhecido como “contra o bando ou contrabando”.

A viagem ItacurubiGarruchos

São Borja

ItaquiMaçambará

Quaraí

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Porto Alegre 2011 | Distribuição Gratuita 3Santana do Livramento

A primeira impres-são de nossa chegada a Santana do Livramento/Rivera foi uma das ca-racterísticas dessa fron-teira, mais conhecida como fronteira da Paz. Um parque que metade é Brasil, metade é Uruguai. Uma divisa ima-ginária. As cidades de Livramento e Rivera não têm divisas, são a mesma cidade. Fala-se português e espanhol e todos se entendem perfeitamente, ou seja, “portunhol”.

Dom Pedrito

No dia seguinte a nossa chegada, visitamos o Museu Paulo Firpo, on-de fomos recebidos por Adilson Nunes de Oliveira, historiador, professor e dire-tor do museu. Para ele, o gaúcho traz em si coragem e honestidade.

Visitamos a casa do Sr. Nelson (...), funcionário públi-co, tradicionalista e historiador autodidata. Em sua opinião, o gaúcho é um homem de mistura, rude e do pampa. Ele relata o fim do “chacreiro” no pampa, homem e sua fa-mília de pequena propriedade que trabalhava nas estân-cias, que acabou deixando o campo e indo para a cidade. Ele relata que todos os ciclos revolucionários têm passa-gem em Dom Pedrito (Guerra Farroupilha, Cisplatina, Guerra do Paraguai e revolução de 1893 e 1923).

Também ouvimos depoimentos de pessoas que fala-vam sobre os arrozeiros, vistos como agressores do meio ambiente, em especial dos rios.

Depois de 40 km em estrada de chão batido, chegamos ao local onde se encontra o monumento “Obelisco da Paz”. Ao lado, um bolicho de parede de barro, telhado de palha e um galpão para festas. Localizado no distrito de Poncho Verde, nome que leva o acordo de paz entre far-roupilhas e imperiais depois de 10 anos de guerra civil.

BagéA visita à Vila de

Santa Tereza foi uma grata surpresa em nos-sa estada em Bagé. No final do século XIX e início do século XX, o Sr. Visconde de Maga-lhães chega e se instala próximo à estação fér-rea. Ele dedicou este nome à sua esposa Tereza Pimentel de Magalhães, e San-

ta Tereza D’Ávila, uma carmelita descalça, escritora e po-eta, dita santa dos artistas. Hoje a Vila está parcialmente restaurada e foi transformada em centro histórico.

Quem nos recebeu e fez uma visita guiada foi Eliane Simões Pa-checo, Coordenadora do Centro.

O Visconde visio-nário monta sua casa, uma igreja, um teatro, alojamento para os funcionários e uma charqueada. Trabalhava com o gado, mas também diversificava seus investimentos em

diversas fábricas, produzia vinhos, adubo, ração, tinha restaurante, padaria, além de uma usina independente de energia elétrica, sapataria, barbearia, alfaiataria, ca-pela e teatro.

A Vila de Santa Tereza foi o segundo local a ter ener-gia elétrica no Brasil.

A Charqueada também tinha um grupo teatral e uma banda, a Lira de Santa Tereza.

AceguáHospedamo-nos

em Aceguá no lado uru-guaio. Encontramos com Mara, assessora de cultura do município, no posto aduaneiro uruguaio, pois necessitávamos informar a nossa perma-nência no país por alguns dias em função da hospedagem e da pesquisa em si. Visto autorizado, seguimos para hos-pedagem.

Seguimos por 10 km de estrada de chão batido aonde, no meio da estrada, vimos marcos fronteiriços que se mis-turavam. De um lado, campos uruguaios, do outro, campos brasileiros. Diferença? Nenhuma. Seguimos até a pousada cercados do mais típico bioma do pampa “gaucho”.

A pousada da Dona Mirta, local que nos hospedou em Aceguá, UR, é com certeza um dos momentos signi-ficativos da nossa pesquisa. Uma fazenda, com todas as maravilhas de uma casa de campo, associada ao carinho dispensado no atendimento. Café da manhã campeiro, jantar tradicional de carreteiro de charque com feijão, bolo frito, torradas e café da tarde, foram alguns dos mi-mos recebidos.

A décima terceira e última apresentação do espetá-culo “O Negrinho do Pastoreio” foi realizada na Praça Internacional. Uma praça simples, sem muitas árvores, dividindo dois países. De um lado Brasil, do outro Uru-guai. Nossa percepção frente a essa divisão territorial é de que ela é somente geográfica, pois no dia a dia, ob-servando o movimento das cidades vizinhas, essa sepa-ração inexiste.

Vera Parenza“Depois de muito viajar pelo Brasil, pela primeira vez tivemos oportunidade de revelar o

interior de nosso Estado de origem. Somos urbanos, e nos propomos a desvendar os caminhos de outras paisagens. É uma oportunidade ímpar, enquanto artistas e cidadãos, de reconhecer nesses lugares distantes, parte da nossa história.”

“Aqui todas as casas têm lareira, e a madeira queimando e soltando fagulhas é que traz o aconchego nessas terras onde sopra o vento Minuano.” “Ao sair na rua já estávamos pes-quisando, tudo se amplia aos olhos atentos de quem quer a tudo captar. Tudo pode resul-tar em uma história!”

“Na casa do Seu Zeca (92 anos) e da Dona Maria (88 anos), comemos bolo de aniver-sário da Dona Maria. Ao receber em mãos nosso jornalzinho, Dona Maria disse: “Eu não sei ler!” Dissemos: “Não tem problema, é para olhar também. Tem mapa, fotos...” Seu Zeca também não sabe ler. E os dois, juntos, guardam anos de história da sua região. Esse jornal também é para todos os Zecas e Marias desse nosso imenso país.”

Paulo Brasil | Pérolas de um diário“... acho que foi por aqui que comecei a me dar conta da importância da nossa apresen-

tação naquela cidade. Ao passar o carro de som anunciando o espetáculo, dava pra ver nos rostos curiosos a ansiedade que se havia gerado na comunidade com algo tão diferen-te como uma apresentação de teatro de rua.”

“Uma coisa me chamou a atenção, 80% dos homens usam bota e bombacha.” “Como foi lindo de ver um causo que levava a outro, sempre começando por - mas bah, me lembrei doutro pra contar...”. “Sem demora apareceu um gaiteiro, um violão e um pandeiro e a cantoria tomou conta do galpão.” “... essa é uma daquelas horas que o gaúcho fraqueja e a lágrima vence, correndo solta feito potro sem dono sobre meu rosto...”. “Fomos chamados pra jantar, mas o gaiteiro não parou. Não sei até hoje se o gaiteiro comeu naquela noite.”

“De todas as experiências que passamos nesta pesquisa de campo, a que sinto mais falta de fazer é andar a cavalo. Amanhã talvez dê. Tomara.” “Estamos no fim da pesquisa de campo e, quanto mais nos aproximamos da cultura pampiana, mais me encontro e mais me encanto.”

Hamilton Leite “... Quando estávamos na altura de Eldorado do Sul, na saída de Porto Alegre, ouvimos

um barulho. Paramos a van, olhamos o reboque arriado. Bem em frente, pudemos fazer o reparo, pois havia uma mecânica especializada em molas de caminhão e solda. Que sorte!”

Sobre as origensNo Museu do Gaúcho ficamos sabendo que o povo pampiano, assim denominado

(Minuanos e Charruas) usava o quéchua como idioma, o mesmo que povos do Peru e Bo-lívia. Descobrimos que xarqui é a origem da palavra Charque. No ponto de vista cultural e histórico, tivemos a certeza que esta população era caçadora de animais, que já existia algum tipo de cavalo baixo, mas chegou à sua extinção nesta região antes da introdução do cava-lo pelos espanhóis no ano de 1607, e que a introdução do gado se dá em 1634.

Geralmente, só ouvimos falar da formação do gaúcho ou do povo pampiano, ou na transformação dessas tribos em uma nova e talvez única forma de existência em todo o planeta, que monta a cavalo e vive do gado xucro, solto no campo, posterior ao abandono das Reduções Jesuíticas.

Os Charruas e Minuanos eram o genuíno povo pampiano, pois viviam neste bioma. Os Guaranis viviam na faixa central do estado do RS conhecida como depressão central, já os Botocudos, Pinarés e Gê eram povoados do planalto, serra e campos de cima da serra.

Os Charruas e Minuanos eram povos que não tinham grandes afetividades, mas que se uniam em lutas contra outros, pois eram guerreiros e caçadores. Sua valentia e destreza com o cavalo é simplesmente ímpar no Brasil. O homem montava a pelo, sem cela nem nada ini-cialmente, e existem fatos que mostram que montava na lateral do cavalo, enganando assim o homem branco conquistador.

Os últimos charruas foram enviados para Paris como “animais raros”, em 1833, morren-do em pouco tempo de desgosto e depressão. Neste mergulho profundo em nossas origens e tradições que nos propusemos a realizar, certamente ao descobrir nosso passado nos reencontramos com o nosso presente. Quem somos? Quem são os Gaúchos? Somos Gaú-chos ou Rio-grandenses? Quais as nossas origens?

diários

ItaquiMaçambará

Quaraí

Barra do Quaraí

UruguaianaAlegrete

Santana do Livramento

Bagé

AceguáDom Pedrito

Barra do Quaraí, ilha brasileira

O que a Oigalê fez em 2011

Além de trabalhar na pesquisa “A busca de um teatro de rua pampiano” e planejar o próximo espetáculo que terá patrocínio da Petrobras, a Oigalê, no período de aniversário, fez uma circulação pela grande Porto Alegre com apoio da Funarte – Ministério da Cultura.

Realizou oficinas de teatro de rua:• A busca de um teatro de rua pampiano (patrocínio Petrobras)• Oficina de PrimaveraE participou dos eventos:• Semana do Teatro no Maranhão - São Luís/MA• Circuito SESC de Artes 2011 - interior SP• Amazônia Encena - Porto Velho/RO• Festival de Teatro da Amazônia – Manaus/AM• Litoral Encena – Caraguatatuba/SP

• Projeto Revoada - Pombas Urbanas - São Paulo/SP

Em novembro e dezembro de 2011, a Oigalê encerra o ano comemorando “Uma Dúzia de Teatro de Rua” com uma progra-mação na grande Porto Alegre que tem o patrocínio da Sulgás e Petrobras. O pro-jeto acontece de forma mambembe em locais públicos e de grande circulação de pessoas, e apresenta o espetáculo

“O Negrinho do Pastoreio”.

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Porto Alegre 2011 | Distribuição Gratuita 4

Conhecemos a história do Ivo, figura típica, dono de um Cabaré, que desfilava travestido de mulher. Seu estabelecimento era freqüentado pela alta sociedade e conhecido em toda fronteira oeste. Costumava des-filar com suas “meninas” em sua charrete pelas ruas

centrais da cidade de Uruguaiana. Se algum “cliente” inco-modava, Ivo Rodrigues restabelecia a ordem no local com seu facão. Um de seus “causos” mais conhecidos relata que certa vez um delegado novo na cidade mandou prendê-lo, e uma passeata saiu pela cidade pedindo sua liberdade.

O Baile dos Anastácio é mais uma das incríveis histórias que ouvimos. Acontecido no final do século XIX, o Baile dos Anastácio foi considerado um fato inédito na região de Dom Pedrito. Durando 30 dias, sendo que pela manhã se descan-sava, à tarde se cozinhava e limpava e à noite o baile reco-meçava. Relatam que uma das filhas faleceu durante o baile de pneumonia e que no final dos 30 dias o Sr. Anastácio teve de dar seu rebanho de gado para o dono do armazém, como pagamento pela alimentação e bebidas fornecidas.

Citam-nos também uma figura popular da cidade de Dom Pedrito, Fermina Pedrosa, que saía a passear pintada e arruma-da. Segundo o historiador o povo se divertia com ela e ela com o povo. Várias histórias orais existem em torno desta mulher.

Uma vez convenceram Fermina que ela tinha um pre-tendente, o Tenente Felipe, que a esperava na Igreja. Ela se arrumou, como de praxe, e se dirigiu à cerimônia. Chegando, lá estava Felipe no altar. Ela entra na Igreja emocionada e, quando vai falar com o Tenente Felipe, entram dois guardas e levam o pretendente preso. Mais uma brincadeira da po-pulação com Fermina, que fica chorando no altar. Dizem que ficou ainda alguns meses lembrando-se de seu amado.

Em São Borja se conta que há túneis subterrâneos que saem de sob a igreja matriz e atravessam a cidade até as barrancas do Rio Uruguai, percorrendo 6,5 km. Servia como rota de fuga e esconderijo.

Uma história conhecida em São Borja é a de Maria do Carmo Fagundes, morta antes dos 30 anos, de longos cabelos escuros e natural de Bagé. Conforme relatos, tinha vida “airada”, tendo vários amantes. Ajudava as pessoas humildes. Conta-se que seu último amante a assassinou esquartejando seus mem-bros. Atualmente no seu túmulo, acontecem atos de veneração.

Logo na entrada do Cemitério Jardim da Paz está outro túmulo, que surgiu da noite para o dia, com uma escultura de anjo barroco em cima, e com a única inscrição: 1922. Dizem que a criança era filha de moça importante, sendo o pai o autor do sacrifício. Até hoje o túmulo do Anjinho é local de devoção, permanecendo enfeitado com brinquedos.

Em Itaqui, conta-se que em 1862, o padre Silvestre Gonzales procura um lugar mais seguro para guardar o tesouro missioneiro. Enterra o tesouro, desenha um mapa da localização, mas é assal-tado e, desde então, de tempos em tempos, alguém planeja ex-plorações ao local. Fica conhecido como o Tesouro dos Barbozas.

Coleção Mitos e Lendas de Itaqui – Jesus Pahim

- O ginete, até a morte (...) Segundo a lenda, um dia Alá ordenou ao vento que

se materializasse, e assim criou o cavalo. As crinas e a cauda são ainda restos desse vento em metamorfose. Há um pro-vérbio árabe que diz: O paraíso está entre o lombo de um cavalo e as páginas de um livro!(...)

- O Peão e o Patrão(...) Tinha como regras os ensinamentos do gaúcho seu

pai: respeitar para ser respeitado; não negar ajuda aos outros; cumprimentar a todos falando alto e claro; olhar nos olhos quando falar com alguém; tirar o chapéu diante das damas, mesmo crianças, e quando entrar em casa; cumprir, a qual-quer custo, com a palavra empenhada; não se gabar do que sabe; ser cauteloso com o desconhecido e generoso com que lhe ganha a confiança; respeitar a Deus, aos pais e aos velhos;

ser atencioso com as crianças e nunca maltratar os animais; cuidar das árvores e das sombras; viver em liberdade, não aceitando humilhação de qualquer natureza.(...)

Mytos, leyendas y tradicio-nes de la Banda Oriental – Gonzalo Abella (Las três Marías)

Para los charruas, como para todos los pueblos de pam-pa, pradera y serrania, el Cielo nocturno com sus constela-ciones estaba poblado de memórias e profecía.

Las estrellas que llamamos “Tres Marías” eran para ellos el signo de uma historia aún inconclusa. Según esta historia, los três astros alineados son las piedras pulidas que compo-nen un arma arrojadiza: uma boleadora “de tres” que habían levantado vuelo.

João Sampaio Reinterpreta – I volume – Rincão da Cruz

Natalino Gaiteiro

Acordeona de doze baixosTres hileiras, alemãEle ganhou domando potrosNa costa do Icamaquã

Uma cordeona só pra eleÍndio bagual sem costeioQue tocava como poucosSempre em instrumento alheio

Andava por todo o pagoO Natalino GaiteiroEspichando a gaita uma braçaE lidando com caborteiro.

Conheceu Maria LuizaNum baile aonde foi tocarE nessa noite a sua gaitaPor Deus! Só faltou falar!

Quando ela foi pra cidadeEm busca de melhor vidaA gaita falou por eleNa hora da despedida

Enquanto a carreta sumiaEle um crioulo RomeuNuma toada de tristezaCo’a gaita lhe dava adeus...

Envelheceu solteirãoAmasiado co’a rebeldiaE a gaita era a única chinaQue lhe amava e lhe entendia.

Já velhusco, melena mouraNunca deixou de domarMas rodou galopeando um baioE quebrou o braço em “dois lugar”!

Os doutores da cidadeLidaram e não teve jeitoCortaram o braço do pobreBem rente ao ombro direito!

E ali está o velho gaiteiroSolito com seus tormentosA cordeona num saco de estopaEmbaixo do catre de tentos...

“ É mais fácil agaucharem-se os gringos do que agringarem-se os gaúchos.”

OCUPAÇÃO CÊNICA APOIO

NovembroDia 27 18h Parque da Redenção Porto Alegre/RSDia 30 10h30 Calçadão - Centro Canoas/RS

DezembroDia 04 18h Praça 20 de Setembro São Leopoldo/RSDia 10 18h Parcão Gravataí/RSDia 11 18h Calçadão Guaíba/RS Dia 17 10h30 Praça do Imigrante Novo Hamburgo/RS Dia 18 18h Parcão Cachoeirinha/RS

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ouça-me!

Causos, contos, lendas... Tantas histórias...Foram selecionadas algumas, conhecidas ou não

PATROCÍNIO REALIZAÇÃO

Semana do Teatro no Maranhão - São Luís/MA