18
EDITORIAL EDITORIAL O presente INFOTEJO regista os dois anos de actividade da ARH do Tejo I.P.. Como ressalta do artigo de fundo deste número, muito já foi feito mas muitíssimo mais há ainda para fazer. O desafio a que nos propusemos só é possível num espírito de franca parceria, ideia chave destes dois anos de actividade. Por muito que se escreva, o património do Tejo é um tema que não se esgota em palavras. Eis pois a edição de Outubro do INFOTEJO dedicado, uma vez mais, ao vasto património do Tejo. Páginas, como sempre, enriquecidas com contributos de ilustres personalidades. Assim, Álvaro Domingues guia-nos através da evolução do conceito de património, do sentido prático a um sentido simbólico. Identifica o património como produtor de identidade e a patrimonialização como processo de criação de valor. Galopim de Carvalho aborda as diversas dinâmicas que, ao longo dos anos, deram ao Estuário a morfologia que hoje o caracteriza e Carlos Blazquez Herrero desvenda outros patrimónios relacionados com o Tejo. Elementos geológicos, arqueológicos, botânicos, faunísticos, arquitectónicos, documentais e a própria infraestrutura turística, contribuem para a riqueza de um rio: o Tejo, que se espera vir a ser considerado “Paisagem Cultural da Humanidade”. Damos notícia da qualidade da água das praias da Rainha, da Conceição e da Duquesa que voltou, em 2010, a ser compatível com a prática balnear em resultado de uma parceria entre o Município de Cascais, a ARH do Tejo e as empresas Águas de Cascais e SANEST. Destaque ainda para a sessão de debate sobre o Património do Tejo, e para mais duas sessões de esclarecimento, no âmbito do projecto de limpeza e conservação de linhas de água. O surf também marca presença nesta edição, nomeadamente o Rip Curl Pro Portugal, em Peniche, e a candidatura da Ericeira a Reserva Mundial de Surf. A concretizar-se, Portugal poderá ser o primeiro país da Europa, e o segundo a nível mundial, com uma reserva mundial de surf. Constância é o município presente neste oitavo número do INFOTEJO. História e projectos, como a implantação de um percurso ribeirinho e a requalificação do actual Jardim-Horto, são abordados no espaço municípios. Seja pois muito bem-vindo ao Tejo. Manuel Lacerda Presidente da ARH do Tejo Nº 08 | OUTUBRO 2010 www.arhtejo.pt >>> Pág. 11 A Administração da Região Hidrográfica do Tejo, I.P. (ARH do Tejo, I.P.) completou dois anos de actividade no passado dia 1 de Outubro, assim nesta edição do Infotejo procuramos fazer uma síntese das actividades desenvolvidas. Vale a pena recordar que as ARH são autoridades que têm como principal objectivo a promoção, a gestão e a valorização dos recursos hídricos da sua área de actuação. A sua criação, preconizada há vários anos e reclamada pela comunidade técnica e científica por mais de 3 décadas, implicou uma reorganização administrativa com a afectação de competências exercidas anteriormente por outros organismos do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território. 2 ANOS DE ARH DO TEJO, I.P. OPINIÃO Carlos Blazques O conceito de Património >>> Pág. 2-4 Galopim de Carvalho A história antiga do estuário do Tejo >>> Pág. 5-7 ENTREVISTA Alvaro António Gomes Domingues Tejo, o valor do Parimónio >>> Pág. 8-10 Rip Curl Pro Search Portugal - Peniche >>> Pág. 14 Ericeira candidata a Reserva Mundial de Surf >>> Pág. 15 MUNICÍPIO Constância Fruição dos rios >>> Pág. 16-17 Portas de Ródão Tejo, Lezíria Tejo, da Torre de Belém ao Padrão dos Descobrimentos Flamingos, estuário do Tejo

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EDITORIALEDITORIALO presente INFOTEJO regista os dois anos de actividade da ARH do Tejo I.P.. Como ressalta do artigo de fundo deste número, muito já foi feito mas muitíssimo mais há ainda para fazer. O desafio a que nos propusemos só é possível num espírito de franca parceria, ideia chave destes dois anos de actividade. Por muito que se escreva, o património do Tejo é um tema que não se esgota em palavras. Eis pois a edição de Outubro do INFOTEJO dedicado, uma vez mais, ao vasto património do Tejo. Páginas, como sempre, enriquecidas com contributos de ilustres personalidades. Assim, Álvaro Domingues guia-nos através da evolução do conceito de património, do sentido prático a um sentido simbólico. Identifica o património como produtor de identidade e a patrimonialização como processo de criação de valor. Galopim de Carvalho aborda as diversas dinâmicas que, ao longo dos anos, deram ao Estuário a morfologia que hoje o caracteriza e Carlos Blazquez Herrero desvenda outros patrimónios relacionados com o Tejo. Elementos geológicos, arqueológicos, botânicos, faunísticos, arquitectónicos, documentais e a própria infraestrutura turística, contribuem para a riqueza de um rio: o Tejo, que se espera vir a ser considerado “Paisagem Cultural da Humanidade”. Damos notícia da qualidade da água das praias da Rainha, da Conceição e da Duquesa que voltou, em 2010, a ser compatível com a prática balnear em resultado de uma parceria entre o Município de Cascais, a ARH do Tejo e as empresas Águas de Cascais e SANEST. Destaque ainda para a sessão de debate sobre o Património do Tejo, e para mais duas sessões de esclarecimento, no âmbito do projecto de limpeza e conservação de linhas de água. O surf também marca presença nesta edição, nomeadamente o Rip Curl Pro Portugal, em Peniche, e a candidatura da Ericeira a Reserva Mundial de Surf. A concretizar-se, Portugal poderá ser o primeiro país da Europa, e o segundo a nível mundial, com uma reserva mundial de surf.Constância é o município presente neste oitavo número do INFOTEJO. História e projectos, como a implantação de um percurso ribeirinho e a requalificação do actual Jardim-Horto, são abordados no espaço municípios. Seja pois muito bem-vindo ao Tejo.

Manuel LacerdaPresidente da ARH do Tejo

Nº 08 | OUTUBRO 2010 www.arhtejo.pt

>>> Pág. 11

A Administração da Região Hidrográfica do Tejo, I.P. (ARH do Tejo, I.P.) completou dois anos de actividade no passado dia 1 de Outubro, assim nesta edição do Infotejo procuramos fazer uma síntese das actividades desenvolvidas.Vale a pena recordar que as ARH são autoridades que têm como principal objectivo a promoção, a gestão e a valorização dos recursos hídricos da sua

área de actuação. A sua criação, preconizada há vários anos e reclamada pela comunidade técnica e científica por mais de 3 décadas, implicou uma reorganização administrativa com a afectação de competências exercidas anteriormente por outros organismos do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território.

2 ANOS DE ARH DO TEJO, I.P.

OPINIÃOCarlos Blazques O conceito de Património >>> Pág. 2-4

Galopim de CarvalhoA história antiga do estuário do Tejo>>> Pág. 5-7

ENTREVISTAAlvaro António Gomes Domingues Tejo, o valor do Parimónio >>> Pág. 8-10

Rip Curl Pro Search Portugal - Peniche>>> Pág. 14

Ericeira candidata a Reserva Mundial de Surf>>> Pág. 15

MUNICÍPIOConstância Fruição dos rios >>> Pág. 16-17

Portas de Ródão Tejo, Lezíria

Tejo, da Torre de Belém ao Padrão dos DescobrimentosFlamingos, estuário do Tejo

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03

O CONCEITO DE PATRIMÓNIO

02

para a sua divulgação. Um bom exemplo é ode José Saramago e a sua aldeia natal –Azinhaga.

Mas o património abarca muitos outrosaspectos, começando pelo que parte doconceito de rio e da sua estrutura, como é ogeológico. Através dele, podemos conhecermelhor a história da Terra e compreendercomo é que a água de um pequeno lugarcomo Fonte García pode chegar ao estuáriode Lisboa, ou a importância do carso para ahidrologia da bacia.

O passado também se conhece através dapaleontologia, muito presente na bacia doTejo. Os depósitos no Alto Tejo (com oMuseu de Molina de Aragón), e osriquíssimos depósitos portugueses, comoo da Pedra da Mua (no Cabo Espichel) e oVale de Meios em Santarém, são bonsexemplos disso.

O património arqueológico guia-nos pelo rioatravés da história, donde se destacam aspinturas rupestres da zona entre Vila Velha deRodão, Nisa e Mação, formando o maiorcomplexo de arte rupestre da Península Ibérica.As suas cerca de 40 000 pinturas rupestresdatam desde o Neolítico antigo até à primeiraIdade do Bronze.

O património romano do Tejo é notável,tanto aquele que é visível, como o que seencontra sob as cidades de Lisboa eToledo, entre outras, passando ainda pelas

dezenas de importantes monumentos aolongo do seu curso.

Do período visigodo importa-nosespecialmente Recópolis, a cidade fundadajunto ao rio pelo Rei Leovigildo, quando aEspanha visigoda tinha a capital em Toledoe compreendia, entre muitas outras, as baciascompletas do Tejo e do Guadiana.

Não é necessário mencionar o passadomuçulmano e medieval cristão, cujos vestígiossão tão abundantes nesta bacia.

O património botânico e faunístico é, apesarde tudo, um dos grandes temas. Tanto a floraendémica, como os peixes, aves, mamíferos,anfíbios, répteis e toda a classe deinvertebrados pontuam o curso do rio.

Um rio seria menos rio sem o seupatrimónio hidráulico. Destaque parapontes como a de Auñón, Toledo, a Puentedel Arzobispo, Talavera de la Reina, Pueblade Montalbán, bem como a ponterenascentista de Albalat em Almaraz, asromanas de Alcónetar, Alcántara e Seguraou as de Abrantes, Constancia, Belver eSantarém, e as mais modernas, SalgueiroMaia em Santarém, Vasco de Gama e 25de Abril em Lisboa.

Os moinhos são outro valor importante desterio, mais pela sua qualidade do que pelaquantidade. Neste sentido, destacam-se osmoinhos de Toledo e, muito especialmente,o conjunto formado pelos moinhos de ElPuente del Arzobispo e El Torrico, um dosmais notáveis de toda a península, emboraem grave risco de desaparecimento.Associados aos moinhos estão os açudes,pesadelo dos engenheiros que quiseram tornaro Tejo navegável, agora em grande partedestruídos. Os reservatórios são um patrimóniomenos valorizado, em muitos casosincompatível com outros elementospatrimoniais, mas que, no entanto, tambémfazem parte da paisagem fluvial.

Poderíamos continuar a enumerar outrosaspectos do património hidráulico, como asfontes, lavadouros, salinas, cais, etc., maspara já basta enunciá-los.

O património arquitectónico vai desdeconstruções populares como corrais, pocilgas,quadras, etc., até aos palácios maissumptuosos, passando por vivendas, castelos,igrejas e casas de campo. Em conjunto ouseparados fazem parte do rio que os une.

Os documentos que tratam directa ouindirectamente do rio também são património.Entre os muitos documentos acerca do rio,citarei apenas os planos referentes ànavegação, como o magnífico projecto deCarducci ou as centenas de mapasfronteiriços que os engenheiros de ambosos lados da fronteira se encarregaram dedesenhar, ano após ano. Não podemosesquecer as fotografias históricas e postaisantigos, ou a literatura sobre o rio, de autorescomo Alexandre O’Neill, Ángel Sanpedro ouJosé Saramago. Também o cinema, de ficção

OPINIÃO

O conceito geral sobre o património dorio Tejo está limitado aos locais da suabacia que já são classificados como"Património Mundial", como as cidadeshistóricas de Cáceres e Toledo, omosteiro El Escorial em Madrid, apaisagem cultural de Aranjuez, oConvento de Cristo em Tomar, o Mosteirodos Jerónimos e a Torre de Belém, emLisboa.

Fazendo uma pesquisa sabe-se daexistência de uma lista de candidaturasrelacionadas com a bacia do rio Tejo,que pretendem juntar-se ao grupoanter ior . Trata-se de P lasencia ,Monfragüe e Trujillo; as fortificaçõesfronteiriças; a "Vía de la Plata"; e a viatransumante “de la Mesta”; a estradaromana e as rotas do Império Romano;o Parque Natural da Arrábida; o centrohistórico de Santarém; as pegadas dosdinossauros e a Baixa Pombalina.

A bacia do Tejo tem oito locaisc o n s i d e r a d o s " P a t r i m ó n i o d aHumanidade", dos quais quatro estãonas suas margens e os restantes a uma

distância de 15 a 50 km do rio. Há outrosdez locais nesta "lista de propostas" emque praticamente todos se situam nosafluentes do Tejo.Para além destas, existem outrascandidaturas em fase de preparação,como a Ponte de Alcántara, uma dasobras mais representativas da engenhariaromana na Península, e o Fado, tãocaracterístico de Lisboa.

Por último, a cidade de Alcalá de Henares,cidade natal de Miguel de Cervantes. Háainda outras candidaturas em preparaçãorelacionadas com o Tejo: o Aqueduto dasÁguas Livres, e uma outra, que pretendeque o transporte de madeira pelos rioseuropeus, como aconteceu no Tejo,seja declarada "Património Imaterial daHumanidade".O património natural também estáexcelentemente representado, já que oprimeiro troço do rio tem o galardão de"Parque Natural do Alto Tejo" e é ladeadopor outro parque natural, onde nasce orio Cuervo, um dos afluentes do Tejo, cujanascente tem categoria de "MonumentoNatural". A jusante, na sua passagem por

Aranjuez, corre junto ao “Parque Regionaldel Sureste de Madrid”, e na suaconfluência com o rio Tiétar atravessa oParque Nacional de Monfragüe.

A referência seguinte compreende o Tejoentre a foz dos rios Erges e Ponsul. Trata-se do "Parque Natural do Tejo Internacional",ao qual se seguem as reservas naturais doPaul de Boquilobo e do Estuário do Tejo.

OUTROSPATRIMÓNIOSO património de um rio não é compostoapenas por grandes monumentos e áreasprotegidas. A soma do seu património menorpode ser tão ou mais importante, uma vezque é da união de pequenos elementos quenasce esse grande mosaico que é o Tejo. Enão só o património material é importante, jáque é o imaterial que confere coesão a estevalor, reunindo contributos que - sem seremestritamente parte do seu património - ajudam

* Carlos Blazques está incumbido pelo Centro UNESCO de Aragón para direcção doprojecto de candidatura “Tajo Patrimonio de la Humanidad”. É director da Acualis,S.L., membro da WASA-GN (Water Asessment & Advisory Global Network) e especialistana área de “História e arte da água”. É ainda membro do Conselho Consultivo daFundação Juanelo Turriano de Madrid e do Conselho do Centro Unesco Aragón. É co-fundador e vice-director da empresa Idenayr (www.idenayr.es), dedicada àimplementação de culturas industriais e energéticas. Entre 2002 e 2008 foi directorda empresa Acualis (www.acualis.es), dedicada exclusivamente à realização de obrasrelacionadas com o património, em especial no domínio da água e obras hidráulicas.É co-fundador da empresa Alquitara de Estudios e foi, entre 2001 e 2002 administradorúnico da mesma. Neste âmbito, um dos projectos desenvolvidos foi a “RevitalizaçãoTurística da Comunidade de Calatayud”. Membro de várias associações nacionais einternacionais relacionadas com a história da arte, da conservação do patrimónioindustrial e história dos moinhos de água, recebeu prémios por diversas publicaçõese colaboração em diferentes projectos, todos relacionados com as questões da água.É autor e editor de publicações como “Agua Ibérica”, “Agua y Tierra. Cincuenta añosdel Canal de Bardenas”, “Zaragoza dos milenios de agua”, "El Agua y Aragón" e aindado DVD interactivo “Caminos de agua”.

Carlos Blazques*

O Tejo é um riomuito especial, peloque se pretendeque venha a sero primeiro rio cujocurso inteiro sejaconsiderado“Paisagem Culturalda Humanidade”

OPINIÃO

Lisboa - Belém

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O CONCEITO DE PATRIMÓNIO

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para a sua divulgação. Um bom exemplo é ode José Saramago e a sua aldeia natal –Azinhaga.

Mas o património abarca muitos outrosaspectos, começando pelo que parte doconceito de rio e da sua estrutura, como é ogeológico. Através dele, podemos conhecermelhor a história da Terra e compreendercomo é que a água de um pequeno lugarcomo Fonte García pode chegar ao estuáriode Lisboa, ou a importância do carso para ahidrologia da bacia.

O passado também se conhece através dapaleontologia, muito presente na bacia doTejo. Os depósitos no Alto Tejo (com oMuseu de Molina de Aragón), e osriquíssimos depósitos portugueses, comoo da Pedra da Mua (no Cabo Espichel) e oVale de Meios em Santarém, são bonsexemplos disso.

O património arqueológico guia-nos pelo rioatravés da história, donde se destacam aspinturas rupestres da zona entre Vila Velha deRodão, Nisa e Mação, formando o maiorcomplexo de arte rupestre da Península Ibérica.As suas cerca de 40 000 pinturas rupestresdatam desde o Neolítico antigo até à primeiraIdade do Bronze.

O património romano do Tejo é notável,tanto aquele que é visível, como o que seencontra sob as cidades de Lisboa eToledo, entre outras, passando ainda pelas

dezenas de importantes monumentos aolongo do seu curso.

Do período visigodo importa-nosespecialmente Recópolis, a cidade fundadajunto ao rio pelo Rei Leovigildo, quando aEspanha visigoda tinha a capital em Toledoe compreendia, entre muitas outras, as baciascompletas do Tejo e do Guadiana.

Não é necessário mencionar o passadomuçulmano e medieval cristão, cujos vestígiossão tão abundantes nesta bacia.

O património botânico e faunístico é, apesarde tudo, um dos grandes temas. Tanto a floraendémica, como os peixes, aves, mamíferos,anfíbios, répteis e toda a classe deinvertebrados pontuam o curso do rio.

Um rio seria menos rio sem o seupatrimónio hidráulico. Destaque parapontes como a de Auñón, Toledo, a Puentedel Arzobispo, Talavera de la Reina, Pueblade Montalbán, bem como a ponterenascentista de Albalat em Almaraz, asromanas de Alcónetar, Alcántara e Seguraou as de Abrantes, Constancia, Belver eSantarém, e as mais modernas, SalgueiroMaia em Santarém, Vasco de Gama e 25de Abril em Lisboa.

Os moinhos são outro valor importante desterio, mais pela sua qualidade do que pelaquantidade. Neste sentido, destacam-se osmoinhos de Toledo e, muito especialmente,o conjunto formado pelos moinhos de ElPuente del Arzobispo e El Torrico, um dosmais notáveis de toda a península, emboraem grave risco de desaparecimento.Associados aos moinhos estão os açudes,pesadelo dos engenheiros que quiseram tornaro Tejo navegável, agora em grande partedestruídos. Os reservatórios são um patrimóniomenos valorizado, em muitos casosincompatível com outros elementospatrimoniais, mas que, no entanto, tambémfazem parte da paisagem fluvial.

Poderíamos continuar a enumerar outrosaspectos do património hidráulico, como asfontes, lavadouros, salinas, cais, etc., maspara já basta enunciá-los.

O património arquitectónico vai desdeconstruções populares como corrais, pocilgas,quadras, etc., até aos palácios maissumptuosos, passando por vivendas, castelos,igrejas e casas de campo. Em conjunto ouseparados fazem parte do rio que os une.

Os documentos que tratam directa ouindirectamente do rio também são património.Entre os muitos documentos acerca do rio,citarei apenas os planos referentes ànavegação, como o magnífico projecto deCarducci ou as centenas de mapasfronteiriços que os engenheiros de ambosos lados da fronteira se encarregaram dedesenhar, ano após ano. Não podemosesquecer as fotografias históricas e postaisantigos, ou a literatura sobre o rio, de autorescomo Alexandre O’Neill, Ángel Sanpedro ouJosé Saramago. Também o cinema, de ficção

OPINIÃO

O conceito geral sobre o património dorio Tejo está limitado aos locais da suabacia que já são classificados como"Património Mundial", como as cidadeshistóricas de Cáceres e Toledo, omosteiro El Escorial em Madrid, apaisagem cultural de Aranjuez, oConvento de Cristo em Tomar, o Mosteirodos Jerónimos e a Torre de Belém, emLisboa.

Fazendo uma pesquisa sabe-se daexistência de uma lista de candidaturasrelacionadas com a bacia do rio Tejo,que pretendem juntar-se ao grupoanter ior . Trata-se de P lasencia ,Monfragüe e Trujillo; as fortificaçõesfronteiriças; a "Vía de la Plata"; e a viatransumante “de la Mesta”; a estradaromana e as rotas do Império Romano;o Parque Natural da Arrábida; o centrohistórico de Santarém; as pegadas dosdinossauros e a Baixa Pombalina.

A bacia do Tejo tem oito locaisc o n s i d e r a d o s " P a t r i m ó n i o d aHumanidade", dos quais quatro estãonas suas margens e os restantes a uma

distância de 15 a 50 km do rio. Há outrosdez locais nesta "lista de propostas" emque praticamente todos se situam nosafluentes do Tejo.Para além destas, existem outrascandidaturas em fase de preparação,como a Ponte de Alcántara, uma dasobras mais representativas da engenhariaromana na Península, e o Fado, tãocaracterístico de Lisboa.

Por último, a cidade de Alcalá de Henares,cidade natal de Miguel de Cervantes. Háainda outras candidaturas em preparaçãorelacionadas com o Tejo: o Aqueduto dasÁguas Livres, e uma outra, que pretendeque o transporte de madeira pelos rioseuropeus, como aconteceu no Tejo,seja declarada "Património Imaterial daHumanidade".O património natural também estáexcelentemente representado, já que oprimeiro troço do rio tem o galardão de"Parque Natural do Alto Tejo" e é ladeadopor outro parque natural, onde nasce orio Cuervo, um dos afluentes do Tejo, cujanascente tem categoria de "MonumentoNatural". A jusante, na sua passagem por

Aranjuez, corre junto ao “Parque Regionaldel Sureste de Madrid”, e na suaconfluência com o rio Tiétar atravessa oParque Nacional de Monfragüe.

A referência seguinte compreende o Tejoentre a foz dos rios Erges e Ponsul. Trata-se do "Parque Natural do Tejo Internacional",ao qual se seguem as reservas naturais doPaul de Boquilobo e do Estuário do Tejo.

OUTROSPATRIMÓNIOSO património de um rio não é compostoapenas por grandes monumentos e áreasprotegidas. A soma do seu património menorpode ser tão ou mais importante, uma vezque é da união de pequenos elementos quenasce esse grande mosaico que é o Tejo. Enão só o património material é importante, jáque é o imaterial que confere coesão a estevalor, reunindo contributos que - sem seremestritamente parte do seu património - ajudam

*

Carlos Blazques*

O Tejo é um riomuito especial, peloque se pretendeque venha a sero primeiro rio cujocurso inteiro sejaconsiderado“Paisagem Culturalda Humanidade”

OPINIÃO

Lisboa - Belém

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OPINIÃO

0504

OPINIÃOe documental deve ser acrescentado aoacervo do rio.

Do património imaterial destacaremos o quese relaciona com ofícios e tradições ligadosao Tejo e à sua bacia: o folclore espanhol eportuguês, a tradição oral e a tradição artesanalviva ou perdida da bacia do Tejo.

A tradição e o presente gastronómico eenológico do Tejo, juntamente com as festaspopulares são outro aspecto patrimonial, bemcomo a tradição industrial e as novas empresasque surgiram no âmbito das actividadesrelacionadas com o rio, tais como o turismode aventura e os guias turísticos, ou referentesao desporto, como seja a caça, a pesca oua navegação fluvial.

Neste contexto, também não podemosesquecer que a infraestrutura turística (hotéise restaurantes) são uma parte importante dopatrimónio de um rio, fundamentais para odisfrute da sua paisagem.

As vias de comunicação ao largo do rio, sejamrodoviárias, ferroviárias, aéreas, rotas pedestrese ciclovias, ou para veículos na modalidade

slow drive, também são activos a ter em conta.Valores quiçá menos directos do que outrosmencionados, mas de grande importânciapelo efeito multiplicador sobre os demais.

Finalmente, existe o património formado portodo o tipo de colecções, peças individuaise originais associadas ao rio, que não fazemparte dos outros sectores e sãoocasionalmente difíceis de detectar, mas quetêm muitas vezes um grande valor emocionale testemunhal.

Como se pode verificar, o Tejo é um rio muitoespecial, pelo que se pretende que venha aser o primeiro rio cujo curso inteiro sejaconsiderado “Paisagem Cultural daHumanidade”. Uma tarefa árdua parademonstrar o seu valor e para conseguir queas zonas que ainda não estão à altura destegalardão o mereçam em breve. Isto não querdizer que devemos voltar ao Tejo de há milharesde anos; simplesmente há que chegar a umponto de equilíbrio, em que o uso das águase o disfrute do rio possam ser compatíveis, eos seus mil quilómetros se convertam numgrande parque linear, que sirva como lugar deencontro entre espanhóis e portugueses.

Um dos maiores da Europa, o estuário do Tejo,visto como um ambiente de transição entre osdomínios continental e marinho, penetra parao interior até Vila Franca de Xira, troço ondeainda se faz sentir a contaminação salina daágua do mar. Este pequeno “mar interior” nãoé o resultado das dinâmicas marinha e fluvial,cujo confronto, em geral, lhes determina ascaracterísticas morfológicas e sedimentares.Resultou, sim, de um conjunto de acções, comparticular relevância para as de naturezatectónica, decorrentes de um quadro estruturalbem definido.

Neste estuário distingue-se um canal deembocadura, estreito e profundo, comorientação sensivelmente E-W, a que sesegue, para montante de Cacilhas, umalargamento dissimétrico alongado para NNE,de que faz parte o Mar da Palha.

Mais conhecido por “gargalo do Tejo”, o canal

de embocadura representa a actual aberturado grande rio ao mar, abertura essa causadanum passado recente (entre um a dois milhõesde anos) por um sistema de falhas subparalelasà referida orientação1.

A parte interior do estuário, a mais alargada epouco profunda, situa-se no prolongamentodo vale inferior do Tejo, a jusante de Vila Novada Barquinha, também ele coincidente comuma directriz de ruptura da crosta, bemconhecida entre os geólogos por “falha do valeinferior do Tejo”, que se cruza obliquamente,na região de Cacilhas, com o já referidosistema de falhas do gargalo do Tejo.

Este enquadramento tectónico e a presença,em profundidade, de uma estrutura diapírica2

conduziram ao afundamento de uma áreacentrada a NE do Barreiro. Esta subsidência,iniciada há cerca de 1,6 milhões de anos, eainda activa, explica o citado alargamento

dissimétrico do estuário (o Mar da Palha) e asterras baixas e aplanadas do seu bordo SEonde nasceram e cresceram Alcochete,Montijo, Moita e Barreiro.

Com os recuos do mar está relacionado oaprofundamento do gargalo, hoje em parteassoreado, mas que atinge o substrato rochoso(a base das aluviões) à cota - 40m. Com a fasetransgressiva que se seguiu ao máximo daglaciação Würm, relacionam-se as vastaslezírias3 e também os mouchões que podemosequiparar, no seu conjunto, a um deltadominado pela maré, no interior do estuário,acumulado no troço do rio onde as suas águas,

A HISTÓRIA ANTIGA DO ESTUÁRIO DO TEJOA. M. Galopim de Carvalho*

1 - Em relação com este sistema de falhas, o compartimento a Sul soergueu-se (à medida que se acentuava o sinclinal de Albufeira, na península de Setúbal), sendo dissotestemunho a arriba entre Cacilhas e a Trafaria, de morfologia muito jovem, com vales suspensos. 2 - Estrutura relacionada com a existência, em profundidade, de camadassedimentares evaporíticas (gesso e/ou sal-gema do início do Jurássico), materiais que, pelas suas fraca densidade e grande plasticidade, induzem deformações nassequências sedimentares que se lhes sobrepõem, num estilo dinâmico, muito particular, referido por haloquinese ou halocinese, do grego halos, sal, e kineo, movimento.3 - Terreno plano, aluvial, muito recente, situado nas margens do rio, alagado nos episódios de enchente (em condições naturais). A construção de barragens altera estaúltima característica. Lezíria, do árabe al jaz_râ, pode ser também sinónimo de mouchão. Todavia, este implica a condição de ser rodeado por canais que podem estarausentes na lezíria. 4 - Neste caso, a carga sólida é essencialmente formada por areias. As partículas mais finas ou sedimentam em vaseiras intertidais nas margens do

Este pequeno “mar interior” não é o resultado das dinâmicas marinha e fluvial

As oscilações glácio-eustáticas,ao longo do Quaternário, ou, poroutras palavras, as variaçõesdo nível das águas oceânicas,resultantes da alternância deperíodos de arrefecimentoglobal (glaciários) e deaquecimento (interglaciários),adicionaram-se às acções quederam ao estuário do Tejoa morfologia que o distingueentre os demais e,consequentemente, também,as suas características comoambiente de sedimentação.

O patrimóniode um rio não écomposto apenaspor grandesmonumentos eáreas protegidas.A soma do seupatrimónio menorpode ser tão oumais importante.

Ponte romana de Alcántara (Espanha)

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OPINIÃO

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OPINIÃOe documental deve ser acrescentado aoacervo do rio.

Do património imaterial destacaremos o quese relaciona com ofícios e tradições ligadosao Tejo e à sua bacia: o folclore espanhol eportuguês, a tradição oral e a tradição artesanalviva ou perdida da bacia do Tejo.

A tradição e o presente gastronómico eenológico do Tejo, juntamente com as festaspopulares são outro aspecto patrimonial, bemcomo a tradição industrial e as novas empresasque surgiram no âmbito das actividadesrelacionadas com o rio, tais como o turismode aventura e os guias turísticos, ou referentesao desporto, como seja a caça, a pesca oua navegação fluvial.

Neste contexto, também não podemosesquecer que a infraestrutura turística (hotéise restaurantes) são uma parte importante dopatrimónio de um rio, fundamentais para odisfrute da sua paisagem.

As vias de comunicação ao largo do rio, sejamrodoviárias, ferroviárias, aéreas, rotas pedestrese ciclovias, ou para veículos na modalidade

slow drive, também são activos a ter em conta.Valores quiçá menos directos do que outrosmencionados, mas de grande importânciapelo efeito multiplicador sobre os demais.

Finalmente, existe o património formado portodo o tipo de colecções, peças individuaise originais associadas ao rio, que não fazemparte dos outros sectores e sãoocasionalmente difíceis de detectar, mas quetêm muitas vezes um grande valor emocionale testemunhal.

Como se pode verificar, o Tejo é um rio muitoespecial, pelo que se pretende que venha aser o primeiro rio cujo curso inteiro sejaconsiderado “Paisagem Cultural daHumanidade”. Uma tarefa árdua parademonstrar o seu valor e para conseguir queas zonas que ainda não estão à altura destegalardão o mereçam em breve. Isto não querdizer que devemos voltar ao Tejo de há milharesde anos; simplesmente há que chegar a umponto de equilíbrio, em que o uso das águase o disfrute do rio possam ser compatíveis, eos seus mil quilómetros se convertam numgrande parque linear, que sirva como lugar deencontro entre espanhóis e portugueses.

Um dos maiores da Europa, o estuário do Tejo,visto como um ambiente de transição entre osdomínios continental e marinho, penetra parao interior até Vila Franca de Xira, troço ondeainda se faz sentir a contaminação salina daágua do mar. Este pequeno “mar interior” nãoé o resultado das dinâmicas marinha e fluvial,cujo confronto, em geral, lhes determina ascaracterísticas morfológicas e sedimentares.Resultou, sim, de um conjunto de acções, comparticular relevância para as de naturezatectónica, decorrentes de um quadro estruturalbem definido.

Neste estuário distingue-se um canal deembocadura, estreito e profundo, comorientação sensivelmente E-W, a que sesegue, para montante de Cacilhas, umalargamento dissimétrico alongado para NNE,de que faz parte o Mar da Palha.

Mais conhecido por “gargalo do Tejo”, o canal

de embocadura representa a actual aberturado grande rio ao mar, abertura essa causadanum passado recente (entre um a dois milhõesde anos) por um sistema de falhas subparalelasà referida orientação1.

A parte interior do estuário, a mais alargada epouco profunda, situa-se no prolongamentodo vale inferior do Tejo, a jusante de Vila Novada Barquinha, também ele coincidente comuma directriz de ruptura da crosta, bemconhecida entre os geólogos por “falha do valeinferior do Tejo”, que se cruza obliquamente,na região de Cacilhas, com o já referidosistema de falhas do gargalo do Tejo.

Este enquadramento tectónico e a presença,em profundidade, de uma estrutura diapírica2

conduziram ao afundamento de uma áreacentrada a NE do Barreiro. Esta subsidência,iniciada há cerca de 1,6 milhões de anos, eainda activa, explica o citado alargamento

dissimétrico do estuário (o Mar da Palha) e asterras baixas e aplanadas do seu bordo SEonde nasceram e cresceram Alcochete,Montijo, Moita e Barreiro.

Com os recuos do mar está relacionado oaprofundamento do gargalo, hoje em parteassoreado, mas que atinge o substrato rochoso(a base das aluviões) à cota - 40m. Com a fasetransgressiva que se seguiu ao máximo daglaciação Würm, relacionam-se as vastaslezírias3 e também os mouchões que podemosequiparar, no seu conjunto, a um deltadominado pela maré, no interior do estuário,acumulado no troço do rio onde as suas águas,

A HISTÓRIA ANTIGA DO ESTUÁRIO DO TEJOA. M. Galopim de Carvalho*

1 - Em relação com este sistema de falhas, o compartimento a Sul soergueu-se (à medida que se acentuava o sinclinal de Albufeira, na península de Setúbal), sendo dissotestemunho a arriba entre Cacilhas e a Trafaria, de morfologia muito jovem, com vales suspensos. 2 - Estrutura relacionada com a existência, em profundidade, de camadassedimentares evaporíticas (gesso e/ou sal-gema do início do Jurássico), materiais que, pelas suas fraca densidade e grande plasticidade, induzem deformações nassequências sedimentares que se lhes sobrepõem, num estilo dinâmico, muito particular, referido por haloquinese ou halocinese, do grego halos, sal, e kineo, movimento.3 - Terreno plano, aluvial, muito recente, situado nas margens do rio, alagado nos episódios de enchente (em condições naturais). A construção de barragens altera estaúltima característica. Lezíria, do árabe al jaz_râ, pode ser também sinónimo de mouchão. Todavia, este implica a condição de ser rodeado por canais que podem estarausentes na lezíria. 4 - Neste caso, a carga sólida é essencialmente formada por areias. As partículas mais finas ou sedimentam em vaseiras intertidais nas margens do

Este pequeno “mar interior” não é o resultado das dinâmicas marinha e fluvial

As oscilações glácio-eustáticas,ao longo do Quaternário, ou, poroutras palavras, as variaçõesdo nível das águas oceânicas,resultantes da alternância deperíodos de arrefecimentoglobal (glaciários) e deaquecimento (interglaciários),adicionaram-se às acções quederam ao estuário do Tejoa morfologia que o distingueentre os demais e,consequentemente, também,as suas características comoambiente de sedimentação.

O patrimóniode um rio não écomposto apenaspor grandesmonumentos eáreas protegidas.A soma do seupatrimónio menorpode ser tão oumais importante.

Ponte romana de Alcántara (Espanha)

Bugio, estuário do Tejo

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A margem esquerda do Mar da Palha écaracterizada pelo grande desenvolvimento desapais7 com reentrâncias na desembocadurade algumas ribeiras, nomeadamente, no Montijo,no Barreiro e no Seixal, onde se verifica intensasedimentação de vasas finas, silto--argilosa. A flutuação, por vezesabundante,mantém um canal principal devazante, central, conhecido por Canal da BarraSul ou Canal Grande, e dois canais de enchente,laterais, o Canal da Barra Norte e a Golada(entre a Cova do Vapor e o Bugio). Marginandoo canal de vazante, verifica-se deposiçãoaluvionar de areia, dando origem às barrasCabeço do Pato e Cachopo do Sul, e a umabarra de rebentação, o Banco do Bugio,correspondente a uma “macroduna” submersa.

Nos canais de maré depositam-se areiase areias vasosas. Nas margens, nas áreas

intertidais e supratidais, dominam ossedimentos vasosos e vaso-arenosos. Noentanto, na margem esquerda, entre Alcochetee Cacilhas, há praias de areia a que se seguem,para o lado de terra, extensos sapais e rasosde maré. A margem direita do estuário foiintensamente modificada com aterros eparedões decorrentes da exigência dasactividades portuárias. Da fisiografia naturaldeste lado do rio, restam hoje as praias ealguns troços de arriba para jusante de Algés.Devido à posição, à orientação e à poucalargura da embocadura do Tejo, a ondulaçãogeral oceânica que atinge o litoral ocidentaldo país não se faz sentir no interior do estuário.Todavia, dada a sua extensão, esta toalhade água permite a existência de ondulação degeração local, ondulação que, associada àscorrentes de maré, concorre para aredistribuição dos sedimentos no interior do

estuário. É esta ondulação, sobretudo aresultante dos ventos dos quadrantes N e NW8,a responsável pelas praias e restingas de areiaque marginam o mar da Palha, a que atrás sefez alusão.

O estuário do Tejo está sujeito a um regimede maré semidiurno (cerca de 12 h e 21 m).Classificado como mesotidal, suporta umaamplitude de 3,2 m em maré viva e 1,5 mem maré morta (na embocadura), valoresque aumentam para montante9. Em Alverca,a 40 km da foz, esta amplitude é de 4,8 m,nas marés vivas, anulando-se em Muge, a80 km da foz. As correntes de maré, naregião interior do estuário, podem atingirvalores máximos, à superfície, na ordem de1,2 m/s e 1,0 m/s no fundo. No corredor dadesembocadura, estes valores sobem para2 m/s, à superfície, e 1,3 m/s no fundo.

No interior do estuário a salinidade varia entre0,5 % e 2,5 % (5 e 25 mg/l), o que determinavariações de densidade e de viscosidade, cominfluência na formação e migração de materialem suspensão. A salinidade interfere tambémnos fenómenos de floculação das partículasargilosas, modificando-lhes o comportamentohidráulico.

A instalação de centros de actividadepiscatória, salinas (marinhas de sal), moinhosde maré, extracção de areias, áreas agrícolase industriais, urbanizações, aterros, etc., sãofactores com influência visível na dinâmicado estuário. Outros factores, actuando àdistância como barragens10, diques parafins agrícolas, etc., também têm influênciasensível.

Estuário do Tejo

OPINIÃO

0706

OPINIÃO

por perda de competência, depositam grandeparte4 da sua carga sólida.

O estuário do Tejo, como hoje se nosapresenta, sucedeu a uma situação anterior(no Pliocénico) definida como um sistemamúltiplo de canais anastomosados, com uma

embocadura principal abrangendo osterrenos a norte e a sul da laguna de Albufeira.Este sistema pode mesmo ter tido umadivergência para Sul da cadeia da Arrábida,espraiando-se também na planura que é hojeocupada pelo estuário do Sado. Nestaeventualidade, muito provável, a Arrábida

terá sido como que uma ilha a dividir e aseparar a drenagem do pré-Tejo5, em doisramos divergentes: um, a norte, entre estajovem montanha e as colinas de Lisboa, eoutro, a Sul, para o qual convergia adrenagem da região não muito diferente daque é hoje a bacia do Sado.

Entre Muge (a 80 km da foz), limite da subidadas marés, e Vila Franca de Xira (a 40 kmda foz) situa-se uma unidade dita flúvio-marinha, mas com água doce. Entre VilaFranca de Xira e Cacilhas alarga-se umasegunda unidade dita interior, de águasalgada, com cerca de 35 km decomprimento por cerca de 15 km de larguramáxima (entre Olivais e Alcochete) e 0,5 kmde largura mínima (em Vila Franca de Xira).Para jusante desta localidade, até Alhandra,há, actualmente, um único canal activo6,com largura média de 0,5 km, até Alverca,onde se inicia um delta interior, com váriosmouchões, alongados na direcção do rio,separados por esteiros, canais de maré oucalas, dos quais se distinguem, por maisimportantes, os das Barcas, de Samora ede Cabo Ruivo.

estuário interior, ou percorrem o estuário em suspensão, saindo para o mar sob a forma de plumas túrbidas e aí se dispersam e decantam. 5 - Com uma grande baciapara nordeste. A designação pré-Tejo foi introduzida, em 1935, por Orlando Ribeiro. 6 - Existiram outros no período histórico. 7 - Áreas muito planas, sujeitas à penetraçãodas marés - rasos de maré - funcionando como vaseiros, isto é, com sedimentação vasosa (lodosa), e vegetação herbácea tolerante ao sal e, daí, a designação de salgados,também usada localmente. Brejos é, aqui, outro termo usado para referir este tipo de terrenos alagadiços ou pantanosos. Sapal do Alfeite, Salgado de Corroios e Brejosde Azeitão são exemplos da toponímia local influenciada por estes aspectos da fisiografia do rio. Com o mesmo sentido conheciam-se, ainda, os termos sapa, sapeira etremedal. 8 - No entanto, em ocasiões de vento do quadrante sul, a agitação é máxima. 9 - O aumento da amplitude da maré, para montante, é devido à diminuição dasecção do leito do rio. 10 - As barragens reduziram drasticamente o abastecimento de sedimentos.

No domínio de investigação científica, trabalhou,sobretudo, no binómio Geomorfologia eSedimentologia das Bacias Cenozóicas.Como Director do Museu Nacional de História Natural- MNHN criou, albergou e desenvolveu, a partir de1988 até 2000, em colaboração com o ProfessorJoão Alveirinho Dias, o grupo de trabalho “DinâmicaSedimentar da Plataforma Continental Portuguesa”– DISEPLA, constituindo, assim, o primeiro núcleo deGeologia Marinha nacional, com mais de uma dezenade doutoramentos concluídos e mais de uma centenade artigos publicados.Ainda na qualidade de Director do MNHN deu início,a partir de 1990, a sucessivos Projectos deInvestigação na área da Paleontologia dosDinossáurios de que foi e continua a ser o responsávelcientífico. Desta actividade, em ligação com diversosinvestigadores, universidades e museus doestrangeiro resultaram várias dezenas de artigoscientíficos e de comunicações em congressosinternacionais.Leccionou em múltiplas acções de Formação e deActualização de Conhecimentos, quer no espaço doMuseu, quer em Escolas, por todo o país e em Macau.Foi o responsável científico pela Exposição deDinossáurios-Robots (1992), com o recorde de 360mil visitantes em apenas 11 semanas, caso ímpar

na museologia portuguesa. Esta exposição repetiu-se no Porto (1994) e em Macau (1994). Foi igualmenteresponsável pelas exposições, no espaço do MuseuNacional de História Natural, “Dinossáurios da China”(1995-1996), “Carnívoros” (2002), “Dinossáurios daMongólia” (2003) e “Plumas e Dinossáurios” (2004-2005), “Dinossauriomania”, no Museu do Brinquedo,em Sintra, 2005 e “O Calcário na Ciência, na Tecnologiae na Arte”, no Museu da Pedra, Cantanhede, 2005.Na última década proferiu conferências, participouem colóquios e orientou debates, num número queronda a centena e meia, por todo o país (nasuniversidades, em escolas, bibliotecas municipais,associações várias) e no estrangeiro, em Luanda,Madrid, Paris, Londres, Bruxelas, Hannover, Torontoe Drumheller (Canadá), Macau e Rio de Janeiro.Nos últimos dezassete anos tem desenvolvidoactividade no sentido da salvaguarda e valorizaçãodo Património Geológico e Paleontológico Nacional,de cujas acções acabaram por ser salvas as grandesjazidas de Icnofósseis de Dinossáurios de Pego Longo(Carenque), da Serra d’Aire e do cabo Espichel (Pedrada Mua e Lagosteiros) e, entre outros, osgeomonumentos de Pedra Furada (Setúbal), de S.Bento (Évora) e do Monte de Santa Luzia – Museu doQuartzo, em Viseu (Prémio Nacional do Ambiente1997).

* Devido à posição,à orientação e àpouca largura daembocadura do Tejo,a ondulação geraloceânica que atingeo litoral ocidentaldo país não se fazsentir no interiordo estuário.

Ponte 25 de Abril

Torre de Belém Torre de Belém - Vista para o Tejo

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A margem esquerda do Mar da Palha écaracterizada pelo grande desenvolvimento desapais7 com reentrâncias na desembocadurade algumas ribeiras, nomeadamente, no Montijo,no Barreiro e no Seixal, onde se verifica intensasedimentação de vasas finas, silto--argilosa. A flutuação, por vezesabundante,mantém um canal principal devazante, central, conhecido por Canal da BarraSul ou Canal Grande, e dois canais de enchente,laterais, o Canal da Barra Norte e a Golada(entre a Cova do Vapor e o Bugio). Marginandoo canal de vazante, verifica-se deposiçãoaluvionar de areia, dando origem às barrasCabeço do Pato e Cachopo do Sul, e a umabarra de rebentação, o Banco do Bugio,correspondente a uma “macroduna” submersa.

Nos canais de maré depositam-se areiase areias vasosas. Nas margens, nas áreas

intertidais e supratidais, dominam ossedimentos vasosos e vaso-arenosos. Noentanto, na margem esquerda, entre Alcochetee Cacilhas, há praias de areia a que se seguem,para o lado de terra, extensos sapais e rasosde maré. A margem direita do estuário foiintensamente modificada com aterros eparedões decorrentes da exigência dasactividades portuárias. Da fisiografia naturaldeste lado do rio, restam hoje as praias ealguns troços de arriba para jusante de Algés.Devido à posição, à orientação e à poucalargura da embocadura do Tejo, a ondulaçãogeral oceânica que atinge o litoral ocidentaldo país não se faz sentir no interior do estuário.Todavia, dada a sua extensão, esta toalhade água permite a existência de ondulação degeração local, ondulação que, associada àscorrentes de maré, concorre para aredistribuição dos sedimentos no interior do

estuário. É esta ondulação, sobretudo aresultante dos ventos dos quadrantes N e NW8,a responsável pelas praias e restingas de areiaque marginam o mar da Palha, a que atrás sefez alusão.

O estuário do Tejo está sujeito a um regimede maré semidiurno (cerca de 12 h e 21 m).Classificado como mesotidal, suporta umaamplitude de 3,2 m em maré viva e 1,5 mem maré morta (na embocadura), valoresque aumentam para montante9. Em Alverca,a 40 km da foz, esta amplitude é de 4,8 m,nas marés vivas, anulando-se em Muge, a80 km da foz. As correntes de maré, naregião interior do estuário, podem atingirvalores máximos, à superfície, na ordem de1,2 m/s e 1,0 m/s no fundo. No corredor dadesembocadura, estes valores sobem para2 m/s, à superfície, e 1,3 m/s no fundo.

No interior do estuário a salinidade varia entre0,5 % e 2,5 % (5 e 25 mg/l), o que determinavariações de densidade e de viscosidade, cominfluência na formação e migração de materialem suspensão. A salinidade interfere tambémnos fenómenos de floculação das partículasargilosas, modificando-lhes o comportamentohidráulico.

A instalação de centros de actividadepiscatória, salinas (marinhas de sal), moinhosde maré, extracção de areias, áreas agrícolase industriais, urbanizações, aterros, etc., sãofactores com influência visível na dinâmicado estuário. Outros factores, actuando àdistância como barragens10, diques parafins agrícolas, etc., também têm influênciasensível.

Estuário do Tejo - Barreiro

OPINIÃO

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OPINIÃO

por perda de competência, depositam grandeparte4 da sua carga sólida.

O estuário do Tejo, como hoje se nosapresenta, sucedeu a uma situação anterior(no Pliocénico) definida como um sistemamúltiplo de canais anastomosados, com uma

embocadura principal abrangendo osterrenos a norte e a sul da laguna de Albufeira.Este sistema pode mesmo ter tido umadivergência para Sul da cadeia da Arrábida,espraiando-se também na planura que é hojeocupada pelo estuário do Sado. Nestaeventualidade, muito provável, a Arrábida

terá sido como que uma ilha a dividir e aseparar a drenagem do pré-Tejo5, em doisramos divergentes: um, a norte, entre estajovem montanha e as colinas de Lisboa, eoutro, a Sul, para o qual convergia adrenagem da região não muito diferente daque é hoje a bacia do Sado.

Entre Muge (a 80 km da foz), limite da subidadas marés, e Vila Franca de Xira (a 40 kmda foz) situa-se uma unidade dita flúvio-marinha, mas com água doce. Entre VilaFranca de Xira e Cacilhas alarga-se umasegunda unidade dita interior, de águasalgada, com cerca de 35 km decomprimento por cerca de 15 km de larguramáxima (entre Olivais e Alcochete) e 0,5 kmde largura mínima (em Vila Franca de Xira).Para jusante desta localidade, até Alhandra,há, actualmente, um único canal activo6,com largura média de 0,5 km, até Alverca,onde se inicia um delta interior, com váriosmouchões, alongados na direcção do rio,separados por esteiros, canais de maré oucalas, dos quais se distinguem, por maisimportantes, os das Barcas, de Samora ede Cabo Ruivo.

estuário interior, ou percorrem o estuário em suspensão, saindo para o mar sob a forma de plumas túrbidas e aí se dispersam e decantam. 5 - Com uma grande baciapara nordeste. A designação pré-Tejo foi introduzida, em 1935, por Orlando Ribeiro. 6 - Existiram outros no período histórico. 7 - Áreas muito planas, sujeitas à penetraçãodas marés - rasos de maré - funcionando como vaseiros, isto é, com sedimentação vasosa (lodosa), e vegetação herbácea tolerante ao sal e, daí, a designação de salgados,também usada localmente. Brejos é, aqui, outro termo usado para referir este tipo de terrenos alagadiços ou pantanosos. Sapal do Alfeite, Salgado de Corroios e Brejosde Azeitão são exemplos da toponímia local influenciada por estes aspectos da fisiografia do rio. Com o mesmo sentido conheciam-se, ainda, os termos sapa, sapeira etremedal. 8 - No entanto, em ocasiões de vento do quadrante sul, a agitação é máxima. 9 - O aumento da amplitude da maré, para montante, é devido à diminuição dasecção do leito do rio. 10 - As barragens reduziram drasticamente o abastecimento de sedimentos.

No domínio de investigação científica, trabalhou,sobretudo, no binómio Geomorfologia eSedimentologia das Bacias Cenozóicas.Como Director do Museu Nacional de História Natural- MNHN criou, albergou e desenvolveu, a partir de1988 até 2000, em colaboração com o ProfessorJoão Alveirinho Dias, o grupo de trabalho “DinâmicaSedimentar da Plataforma Continental Portuguesa”– DISEPLA, constituindo, assim, o primeiro núcleo deGeologia Marinha nacional, com mais de uma dezenade doutoramentos concluídos e mais de uma centenade artigos publicados.Ainda na qualidade de Director do MNHN deu início,a partir de 1990, a sucessivos Projectos deInvestigação na área da Paleontologia dosDinossáurios de que foi e continua a ser o responsávelcientífico. Desta actividade, em ligação com diversosinvestigadores, universidades e museus doestrangeiro resultaram várias dezenas de artigoscientíficos e de comunicações em congressosinternacionais.Leccionou em múltiplas acções de Formação e deActualização de Conhecimentos, quer no espaço doMuseu, quer em Escolas, por todo o país e em Macau.Foi o responsável científico pela Exposição deDinossáurios-Robots (1992), com o recorde de 360mil visitantes em apenas 11 semanas, caso ímpar

na museologia portuguesa. Esta exposição repetiu-se no Porto (1994) e em Macau (1994). Foi igualmenteresponsável pelas exposições, no espaço do MuseuNacional de História Natural, “Dinossáurios da China”(1995-1996), “Carnívoros” (2002), “Dinossáurios daMongólia” (2003) e “Plumas e Dinossáurios” (2004-2005), “Dinossauriomania”, no Museu do Brinquedo,em Sintra, 2005 e “O Calcário na Ciência, na Tecnologiae na Arte”, no Museu da Pedra, Cantanhede, 2005.Na última década proferiu conferências, participouem colóquios e orientou debates, num número queronda a centena e meia, por todo o país (nasuniversidades, em escolas, bibliotecas municipais,associações várias) e no estrangeiro, em Luanda,Madrid, Paris, Londres, Bruxelas, Hannover, Torontoe Drumheller (Canadá), Macau e Rio de Janeiro.Nos últimos dezassete anos tem desenvolvidoactividade no sentido da salvaguarda e valorizaçãodo Património Geológico e Paleontológico Nacional,de cujas acções acabaram por ser salvas as grandesjazidas de Icnofósseis de Dinossáurios de Pego Longo(Carenque), da Serra d’Aire e do cabo Espichel (Pedrada Mua e Lagosteiros) e, entre outros, osgeomonumentos de Pedra Furada (Setúbal), de S.Bento (Évora) e do Monte de Santa Luzia – Museu doQuartzo, em Viseu (Prémio Nacional do Ambiente1997).

* Devido à posição,à orientação e àpouca largura daembocadura do Tejo,a ondulação geraloceânica que atingeo litoral ocidentaldo país não se fazsentir no interiordo estuário.

Ponte 25 de Abril

Torre de Belém Torre de Belém - Vista para o Tejo

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ENTREVISTA

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ENTREVISTA

Álvaro António Gomes Domingues (1959) é geógrafo, Professor Associado da Faculdade de Arquitecturada Universidade do Porto e investigador de CEAU-FAUP. Para além da actividade como docente e investigador,publica regularmente sobre temas de geografia urbana, paisagem, urbanismo e política urbana Publicações recentes: (2010), A Rua da Estrada, Ed. Dafne, Porto(2010), “Paisagem: à beira de um ataque de nervos” in COSTA, Pedro C.; LOURO, N., Duas Linhas – Two Lines,ed. Autor, Lisboa.(2009), “The Extensive Urbanisation”, in ALFAYA, M. MUÑIZ, P. (ed), The City , global again, CITUR, ColégioOficial de Arquitectos de Galicia, Santiago de Compostela(2009), Douro a la Carte, Ed. De Risco, Porto (co-autoria com SOTTOMAYOR, JP)(2008), “ Paisagens Transgénicas” in Arquitectura em Lugares Comuns, ed. Dafne, Porto(2007), Portugal Visto do Céu, Ed. Argumentum, Lisboa (Introdução e cap. Entre-Douro-e-Minho) (com JORGE,Filipe et al)(2006), Cidade e Democracia, 30 anos de transformação urbana em Portugal, Ed. Argumentum, Lisboa(2005), "As Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto", in Geografia de Portugal, II Vol., Círculo de Leitores,Lisboa(2004), Políticas Urbanas, Fundação Calouste Gulbenkian (com Nuno Portas e João Cabral)

*

TEJO, O VALOR DOPATRIMÓNIO

Álvaro António Gomes Domingues*

O tema Património parece estar na moda. Éassim, ou estamos antes na assumpção deum recurso que é o Património?

O conceito de Património foi durante muitotempo associado ao direito privado e aosbens que um indivíduo ou uma família legavaaos seus herdeiros. Por razões de merasobrevivência (os campos e a casa que sedeixavam aos filhos…) ou de estatuto, poderou notoriedade social (títulos, palácios,quintas, morgadios,…), o património seriaum conjunto de bens mais ou menos reaisou simbólicos, largamente entendidos portodos da mesma maneira, e que o direito ea jurisprudência regulavam de forma clara(o que não significa que fosse justa). Adelapidação do património era um actomoralmente condenável; ao contrário, amanutenção e a acumulação seriamdesejáveis e bem vistas.

Hoje quando falamos de património referimo-nos a bens colectivos (da humanidade, nolimite!) e talvez esteja aqui uma das principaisrazões que explica a polémica da questão.

É muito diferente dizer que este e aqueleedifício, obra de arte, infraestrutura, etc. é“património do Estado” – o que em linguagemcomum designa apenas que é da posse doEstado -, o que é muito diferente de saberse isso tudo está igualmente protegido ouvalorado da mesma forma e se, invocandotambém o interesse do Estado, se pode ounão alienar. A onda liberal que vivemoshabituou-nos até a pensar que muito do queé do Estado é uma espécie de “lastro” queconvém vender a privados para que sejasocialmente (mais) útil.

Entretanto, o “património” e o seu significadocolectivo expandiram-se e desdobraram-se:existe o património material e imaterial, opatr imónio natural, o patr imónioarquitectónico, o património paisagístico,etc. Vamo-nos dando conta de um verdadeiroprocesso de “patrimonialização” que, nolimite, corresponde ao que se costumadesignar como “complexo de Noé” e quemuito linearmente se pode definir assim: faceao medo do futuro e à sensação de que opresente está a devorar o passado e amemória…, meta-se tudo numa arca, num

armário e guarde-se para o legado daspróximas gerações. Neste cenário, o papeldo Dilúvio é desempenhado pela voracidadeda globalização, da massificação, dainovação tecnológica, da precariedade dosvalores e das causas políticas.

O património, como escreve FrançoiseChoay é uma alegoria: nunca é aquilo queé (por isso não é absoluto e imutável) massim o que representa colectivamente. Paraos nossos antepassados, uma muralha erauma muralha. Servia para a defesa do burgo.Se a guerra terminasse ou se organizassede outro modo e noutra geografia, a muralhapassava a ser apenas uma pedreira parareciclar. Este era um sentido prático muitomais importante que o simbólico. Hoje aequação está invertida: independentementedos sentidos práticos (podemos guardaristo e aquilo?, é possível?, quanto custa?,para quê?, quem guarda?, etc.), queremosguardar, preservar, legar às futuras gerações.Por vezes porque, simplesmente, estamosem crise de identidade e o passado é umamina de identidade. Somos nós que temoso problema e não as tais futuras gerações.

Excesso de patrimonialização é mau sinal.Em psiquiatria é uma espécie de mau lutopela perda ou pela sensação da perda dealgo ou de alguém. A não superação dotrauma da perda tanto pode originar o delíriocomo a apatia total.

Um país como Portugal, como pode aproveitare valorizar o seu Património? Como o estamosa fazer? Qual o caminho a seguir?

Portugal é uma velha nação comexcesso de patr imónio. Não pelaquantidade ou pela qualidade, mas pelofacto de que todas as mitologias queconstruíram a identidade e a auto-estimados portugueses estão invariavelmenteconjugadas num passado mais queperfeito: o Viriato, os fundadores, osconquistadores, os navegantes…Quando em 1998 se organizou umaExposição Mundial, lá veio outra vez o paísdos navegantes; quando a economia nãofunciona, voltemo-nos para o oceano, etc.Quando tudo falha, resta o futebol. Outrasvezes, a ideia de património desloca-se parao território, para os monumentos e centroshistóricos…, para a paisagem; coisassupostamente míticas e primordiais outravez e coisas que a patrimonialização podeconservar e canibalizar ao mesmo tempo.Coisas também por vezes altamentecontraditórias como o caso da paisagem.A paisagem é um registo do modo como asociedade constrói um território; se asociedade muda, mudará a paisagem. Apaisagem não é um parque temático com

horário de abertura e fecho, eventos eatracções e visitas programadas.

Do tempo do “orgulhosamente sós” ficarammuitos monumentos cujo restauro seconfundia com trabalho de cenário (comono séc. XIX, altura em que a história e osseus testemunhos materiais eram a fonteprimordial para construir identidadesnacionais e a sua galeria de ícones e heróis),“limpando” edifícios que tinham sido“descaracterizados” como aquela catedralgótica que ficou sem a talha dourada do interiore o portal barroco de setecentos; inventandooutros edifícios quase de raiz. A polémica entreprofissionais e eruditos do ramo seguia emparalelo com a construção dos novos íconesverdadeiros/falsos. Limpavam-se as catedraisdos edifícios envolventes que as “tapavam”,inventavam-se largos e praças e, sobretudo,iluminava-se pela noite. Era um espectáculono próprio sentido da palavra.

O caminho a seguir deve evitar a excessivaestetização do património e a sua cristalizaçãonum passado incerto. A redução dopatrimónio a imagens e cenários – coisamuito de hoje… – pode ser bom para festivais,novelas e concursos televisivos. No entanto,é completamente estéril quando as políticasde patrimonialização instituem um legado ea estratégia para o valorizar, “descolando”esse legado do seu passado e do seu futuro,das suas contradições, heroísmos e misérias.

De que modo o Património, por si só, se podeconstituir num produto que crie riqueza?

A patrimonialização é em si mesma umprocesso de criação de valor. Como todosos valores, também o valor simbólico temos seus mercados - como a arte -, e nãofaltará quem use o tal “recurso/património”como uma arma de arremesso. Veja-seeste edifício em ruínas; lamentável, dirãouns; não serve para nada, dirão outros.Ponha-se então uma placa a dizer que épatrimónio e logo valerá o que nunca valeu.É assim o património.

O turismo é o negócio que melhor revelaesta relação ambivalente com o património.Reciclado em “produto turístico”, o patrimóniopode adquirir rapidamente o mesmo estatutode um parque de diversões ou de um circo.As coisas – edifícios, conjuntos edificados,paisagens -, como que saem da suaexistência comum e entram numa vertigemde cenário e de opereta. A ilusão, o simulacro,o espectáculo, o verdadeiro e o falsoconfundem-se. Os mapas enchem-se dealfinetes e as estradas e ruas de sinaléticaassinalando os “pontos quentes” do territóriopatrimonializado e os meios de comunicaçãode massas – da televisão à internet – vãoalimentando esta fome de patrimónioconstruindo imagens e narrativas como noPortugal dos Pequenitos ou nas 7 Maravilhasde um mundo qualquer.

A primeira riqueza que o património produzé a identidade, o sentido do colectivo e dosvalores e causas que aí se inscrevem. Opatrimónio torna-se coisa pública e tambémalegoria de causas públicas. Talvez por aí acoisa caminhe mais segura, mas para isso

A patrimonialização é em si mesma um processo de criação devalor. Como todos os valores, também o valor simbólico temos seus mercados - como a arte -, e não faltará quem use o tal“recurso/património” como uma arma de arremesso. Veja-seeste edifício em ruínas; lamentável, dirão uns; não serve paranada, dirão outros. Ponha-se então uma placa a dizer que épatrimónio e logo valerá o que nunca valeu.

É assim o património.

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ENTREVISTA

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ENTREVISTA

Alvaro António Gomes Domingues (1959) é geógrafo, Professor Associado da Faculdade de Arquitecturada Universidade do Porto e investigador de CEAU-FAUP. Para além da actividade como docente e investigador,publica regularmente sobre temas de geografia urbana, paisagem, urbanismo e política urbana Publicações recentes: (2010), A Rua da Estrada, Ed. Dafne, Porto(2010), “Paisagem: à beira de um ataque de nervos” in COSTA, Pedro C.; LOURO, N., Duas Linhas – Two Lines,ed. Autor, Lisboa.(2009), “The Extensive Urbanisation”, in ALFAYA, M. MUÑIZ, P. (ed), The City , global again, CITUR, ColégioOficial de Arquitectos de Galicia, Santiago de Compostela(2009), Douro a la Carte, Ed. De Risco, Porto (co-autoria com SOTTOMAYOR, JP)(2008), “ Paisagens Transgénicas” in Arquitectura em Lugares Comuns, ed. Dafne, Porto(2007), Portugal Visto do Céu, Ed. Argumentum, Lisboa (Introdução e cap. Entre-Douro-e-Minho) (com JORGE,Filipe et al)(2006), Cidade e Democracia, 30 anos de transformação urbana em Portugal, Ed. Argumentum, Lisboa(2005), "As Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto", in Geografia de Portugal, II Vol., Círculo de Leitores,Lisboa(2004), Políticas Urbanas, Fundação Calouste Gulbenkian (com Nuno Portas e João Cabral)

*

TEJO, O VALOR DOPATRIMÓNIO

Alvaro António Gomes Domingues*

O tema Património parece estar na moda. Éassim, ou estamos antes na assumpção deum recurso que é o Património?

O conceito de Património foi durante muitotempo associado ao direito privado e aosbens que um indivíduo ou uma família legavaaos seus herdeiros. Por razões de merasobrevivência (os campos e a casa que sedeixavam aos filhos…) ou de estatuto, poderou notoriedade social (títulos, palácios,quintas, morgadios,…), o património seriaum conjunto de bens mais ou menos reaisou simbólicos, largamente entendidos portodos da mesma maneira, e que o direito ea jurisprudência regulavam de forma clara(o que não significa que fosse justa). Adelapidação do património era um actomoralmente condenável; ao contrário, amanutenção e a acumulação seriamdesejáveis e bem vistas.

Hoje quando falamos de património referimo-nos a bens colectivos (da humanidade, nolimite!) e talvez esteja aqui uma das principaisrazões que explica a polémica da questão.

É muito diferente dizer que este e aqueleedifício, obra de arte, infraestrutura, etc. é“património do Estado” – o que em linguagemcomum designa apenas que é da posse doEstado -, o que é muito diferente de saberse isso tudo está igualmente protegido ouvalorado da mesma forma e se, invocandotambém o interesse do Estado, se pode ounão alienar. A onda liberal que vivemoshabituou-nos até a pensar que muito do queé do Estado é uma espécie de “lastro” queconvém vender a privados para que sejasocialmente (mais) útil.

Entretanto, o “património” e o seu significadocolectivo expandiram-se e desdobraram-se:existe o património material e imaterial, opatr imónio natural, o patr imónioarquitectónico, o património paisagístico,etc. Vamo-nos dando conta de um verdadeiroprocesso de “patrimonialização” que, nolimite, corresponde ao que se costumadesignar como “complexo de Noé” e quemuito linearmente se pode definir assim: faceao medo do futuro e à sensação de que opresente está a devorar o passado e amemória…, meta-se tudo numa arca, num

armário e guarde-se para o legado daspróximas gerações. Neste cenário, o papeldo Dilúvio é desempenhado pela voracidadeda globalização, da massificação, dainovação tecnológica, da precariedade dosvalores e das causas políticas.

O património, como escreve FrançoiseChoay é uma alegoria: nunca é aquilo queé (por isso não é absoluto e imutável) massim o que representa colectivamente. Paraos nossos antepassados, uma muralha erauma muralha. Servia para a defesa do burgo.Se a guerra terminasse ou se organizassede outro modo e noutra geografia, a muralhapassava a ser apenas uma pedreira parareciclar. Este era um sentido prático muitomais importante que o simbólico. Hoje aequação está invertida: independentementedos sentidos práticos (podemos guardaristo e aquilo?, é possível?, quanto custa?,para quê?, quem guarda?, etc.), queremosguardar, preservar, legar às futuras gerações.Por vezes porque, simplesmente, estamosem crise de identidade e o passado é umamina de identidade. Somos nós que temoso problema e não as tais futuras gerações.

Excesso de patrimonialização é mau sinal.Em psiquiatria é uma espécie de mau lutopela perda ou pela sensação da perda dealgo ou de alguém. A não superação dotrauma da perda tanto pode originar o delíriocomo a apatia total.

Um país como Portugal, como pode aproveitare valorizar o seu Património? Como o estamosa fazer? Qual o caminho a seguir?

Portugal é uma velha nação comexcesso de patr imónio. Não pelaquantidade ou pela qualidade, mas pelofacto de que todas as mitologias queconstruíram a identidade e a auto-estimados portugueses estão invariavelmenteconjugadas num passado mais queperfeito: o Viriato, os fundadores, osconquistadores, os navegantes…Quando em 1998 se organizou umaExposição Mundial, lá veio outra vez o paísdos navegantes; quando a economia nãofunciona, voltemo-nos para o oceano, etc.Quando tudo falha, resta o futebol. Outrasvezes, a ideia de património desloca-se parao território, para os monumentos e centroshistóricos…, para a paisagem; coisassupostamente míticas e primordiais outravez e coisas que a patrimonialização podeconservar e canibalizar ao mesmo tempo.Coisas também por vezes altamentecontraditórias como o caso da paisagem.A paisagem é um registo do modo como asociedade constrói um território; se asociedade muda, mudará a paisagem. Apaisagem não é um parque temático com

horário de abertura e fecho, eventos eatracções e visitas programadas.

Do tempo do “orgulhosamente sós” ficarammuitos monumentos cujo restauro seconfundia com trabalho de cenário (comono séc. XIX, altura em que a história e osseus testemunhos materiais eram a fonteprimordial para construir identidadesnacionais e a sua galeria de ícones e heróis),“limpando” edifícios que tinham sido“descaracterizados” como aquela catedralgótica que ficou sem a talha dourada do interiore o portal barroco de setecentos; inventandooutros edifícios quase de raiz. A polémica entreprofissionais e eruditos do ramo seguia emparalelo com a construção dos novos íconesverdadeiros/falsos. Limpavam-se as catedraisdos edifícios envolventes que as “tapavam”,inventavam-se largos e praças e, sobretudo,iluminava-se pela noite. Era um espectáculono próprio sentido da palavra.

O caminho a seguir deve evitar a excessivaestetização do património e a sua cristalizaçãonum passado incerto. A redução dopatrimónio a imagens e cenários – coisamuito de hoje… – pode ser bom para festivais,novelas e concursos televisivos. No entanto,é completamente estéril quando as políticasde patrimonialização instituem um legado ea estratégia para o valorizar, “descolando”esse legado do seu passado e do seu futuro,das suas contradições, heroísmos e misérias.

De que modo o Património, por si só, se podeconstituir num produto que crie riqueza?

A patrimonialização é em si mesma umprocesso de criação de valor. Como todosos valores, também o valor simbólico temos seus mercados - como a arte -, e nãofaltará quem use o tal “recurso/património”como uma arma de arremesso. Veja-seeste edifício em ruínas; lamentável, dirãouns; não serve para nada, dirão outros.Ponha-se então uma placa a dizer que épatrimónio e logo valerá o que nunca valeu.É assim o património.

O turismo é o negócio que melhor revelaesta relação ambivalente com o património.Reciclado em “produto turístico”, o patrimóniopode adquirir rapidamente o mesmo estatutode um parque de diversões ou de um circo.As coisas – edifícios, conjuntos edificados,paisagens -, como que saem da suaexistência comum e entram numa vertigemde cenário e de opereta. A ilusão, o simulacro,o espectáculo, o verdadeiro e o falsoconfundem-se. Os mapas enchem-se dealfinetes e as estradas e ruas de sinaléticaassinalando os “pontos quentes” do territóriopatrimonializado e os meios de comunicaçãode massas – da televisão à internet – vãoalimentando esta fome de patrimónioconstruindo imagens e narrativas como noPortugal dos Pequenitos ou nas 7 Maravilhasde um mundo qualquer.

A primeira riqueza que o património produzé a identidade, o sentido do colectivo e dosvalores e causas que aí se inscrevem. Opatrimónio torna-se coisa pública e tambémalegoria de causas públicas. Talvez por aí acoisa caminhe mais segura, mas para isso

A patrimonialização é em si mesma um processo de criação devalor. Como todos os valores, também o valor simbólico temos seus mercados - como a arte -, e não faltará quem use o tal“recurso/património” como uma arma de arremesso. Veja-seeste edifício em ruínas; lamentável, dirão uns; não serve paranada, dirão outros. Ponha-se então uma placa a dizer que épatrimónio e logo valerá o que nunca valeu.

É assim o património.

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ENTREVISTA

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o discurso e a prática sobre o património ea patrimonialização devam escavar maisfundo, e não apenas à superfície e um pouco

erraticamente.

Como entende o Património associado a umrio, neste caso o Tejo? Como o podemos vivere valorizar?

“O Tejo não é o rio da minha aldeia(…)/Maspoucos sabem qual é o rio da minha aldeia/Epara onde ele vai/E donde ele vem./E por isso,porque pertence a menos gente,/É mais livree maior o rio da minha aldeia”, etc., escreviaAlberto Caeiro.

Enferrujada que está a mitologia das naus emudados os heróis do mar para as pranchasdo surf, já não se sabe o que seja o Tejo paraalém de retalhos pontuais: o espelho de águaao longo do estuário, o mar ao longe e o farol,o vai e vem dos cacilheiros, as pontes e aágua a passar pelos vidros do automóvel, aTorre de Belém encalhada, os navios decruzeiro como prédios flutuantes, os legosdos contentores…, tudo isso é hoje umaespécie de hipertexto de múltiplas bifurcaçõese sentidos e nunca um só. O Tejo já não é aestrada de água que trazia quase tudo o queLisboa consumia e o lugar de onde se teciauma relação com o mundo.

Ficou-lhe a poética das naus; mas hojenavega-se na internet e as margens do Tejosão boas para passeios de bicicleta edeambulações mais ou menos higiénicas ouboémias. Cada um tem o seu Tejo: o dascausas ambientais da água que lhe falta e daque corre pouco límpida, o dos que pensamque ainda existem Tágides e sereias, o dosfadistas a quem o rio dá sempre tema, o dosque se enervam se lhes aparece um naviocarregado de contentores, o dos que secontentam com um banco e uma sombra àborda d’água, o dos que rejubilam com cifrõesquando apanham uma nesga de vista para orio, e por aí fora com muito ou pouco sensoe consenso.

A questão está por isso em saber de quealdeia é este rio, porque hoje já não há aldeiase mesmo a aldeia global está a ficar umaselva. No tempo das aldeias e dos rios quelá corriam, quando havia alguma questão,reunia-se o povo e logo se sabia o que fazerao rio. Se pusermos demasiadas coisas juntoao Tejo, serão outras tantas que faltarão aoconforto de quem vive em lugares onde nãohá Tejo. É que o Tejo é um rio que corre àfrente do Terreiro do Paço e não um daquelesmuitos rios que em vez de estar na frente está

nas traseiras e para lá se despeja o lixo todo.Deixe-se o rio correr que é da sua condição- mais livre e maior, como dizia o poeta.

Sabemos que em muitas matérias temosmemória curta, o Patr imónio é,inequivocamente, um desses temas em quenos esquecemos do muito que os nossosantepassados sabiam. É assim? Comopodemos recuperar esse saber?

Não podemos estar constantemente a fazerromagens nostálgicas aos antepassados. Onosso problema, para lá das urgências deum presente que tende a mobilizar-nos emexclusivo, é o futuro. Somos de um país emque a cultura erudita passava o mesmotempo a inaugurar estátuas de navegantese a denegrir os milhões de emigrantes quepartiam de um país que não lhes asseguravaquase nada. Quando voltavam, criticava-seas casas que faziam e a sua estética tãolongínqua das pedras velhas e da cal frescadas casas pobres (mas tão típicas egenuínas…, coitadas).

Curiosamente, o saber alimenta-se hoje deuma voragem tecno-científica própria damitologia do iluminismo, do racional, domoderno, da ideia do sentido linear eirreversível da civilização. Longe dassociedades estáveis, já não é a experiência,a tradição e o saber dos anciãos que noshabilita para o mundo. Para esses ficamapenas uns rituais de Sibila, consultada paralegitimar qualquer coisa de que já se está àespera ou para o enunciado de uma utopiapor realizar; instantes depois regressam astais urgências do presente, e por isso adificuldade de vislumbrar o futuro tambémnão ajuda nada às viagens pelo passado epelas suas ficções em retrospectiva que oraacendem ora apagam momentos claros ousinistras obscuridades. Quero dizer que nãovale a pena fazer a arqueologia do saber dopassado sem uma futurologia sobre opresente; não saberíamos o que fazer comessa arqueologia a não ser museus.

“Vida no Campo” é o seu próximo livro. Fale-nosum pouco desse livro que nos transporta a umaruralidade a que virámos as costas.

Depois do livro “A Rua da Estrada”, ficou-me um vício de geógrafo andarilho em buscado país real e do que nele muda. Cansei-me das mitologias bipolares da “cidadehistórica” e das “aldeias típicas”, por tudoo resto que não deixam ver, pelo excessode atenção que absorvem e pela profunda

amnésia que se vai alargando entre elas. Averdade é que o Produto Interno Bruto daAgricultura se reduziu a pouco mais de 3%.Ora “rural” designa de facto uma conjugaçãoentre a economia agrícola como suporte dariqueza e da mobilização do solo, e umacerta cultura e visões do mundo centradasna tradição, no fechamento sobre si, nocontrário do cosmopolitismo. Não é possívelmanter muito mais tempo esta conjugaçãode sentidos. O país desruralizou--se e aoposição cidade/campo tornou-se numasimplificação sem grande sentido exceptopara aqueles que pensam que o campo éo sítio onde se passam férias e fins-de-semana.

A agricultura que funciona e que temexpressão económica, é uma actividadeempresarial tão sofisticada como outraqualquer e já nem sequer é líquido queprecise de solo, campos ou pastagens. NoDouro Vinhateiro nem sequer há solo, háxisto de onde as videiras brotam; numaestufa podem-se cultivar plantas queenraízam em solo artificial regado por umcaldo químico de água, nutrientes efitossanitários; uma exploração leiteira éum somatório de vacas geneticamentetransformadas, tomando hormonas eantibióticos para não desistirem dos quasetrinta litros de leite que têm que processarnum dia…, “agricultura biológica” (toda aagricultura é biológica) é um branding quefuncionará se o mercado (global tambémpara a agricultura) o viabilizar, etc.

Quanto à cultura, já há muito que as conversasà volta da lareira e no largo da igreja semudaram de lugar e se centram mais nasnovelas, nas séries da FOX, ou nas notíciasda TV, do que nos mexericos da terra ou nageada que queimou as árvores. Em muitasterras já nem sequer há conversas. Saíramtodos. Noutras, a metamorfose do rural éintensa e profundamente internacional egenérica como no Algarve.

“Vida no Campo” é sobre isto: mitologias doúltimo país rural da Europa que persiste eminscrever no imaginário colectivo e ao mesmotempo, as imagens bucólicas e os destroçosdesse mundo perdido, variando entrecalamidades e incêndios, resorts para todosos gostos com muita relva e “espaço verde”,turismo rural, desertificação ou, ao contrário,casas e estradas por todo o lado como noNO de Portugal. Se 97% da economia não érural, o país, a sociedade e o território, sãourbanos (por defeito e enquanto não se conseguirsair desta dicotomia). Parece desconcertante,mas para escrever um livro é quanto basta.

ACTUAIDADE

Para além de um novo modelo institucional,o novo quadro legal dos recursos hídricos,consubstanciado pela Lei da Água de 2005(aprovada na Assembleia da Republica comos votos favoráveis do PS, PSD e CDS) erespectiva regulamentação, apresenta umconjunto de disposições que constituem umanova abordagem de gestão dos recursoshídricos, mais abrangente e multi einterdisciplinar. Face a estas novas obrigações,e tendo em conta a realidade da gestão dosrecursos hídricos, foi possível, desde logo,constatar que a nova autoridade competenteteria que apostar no desenvolvimento eaplicação de ferramentas de recolha,tratamento e análise de dados, modelos esistemas de apoio à decisão, na capacitaçãodos seus técnicos e na estruturação de umaentidade que preste um serviço orientadapara o cliente e baseada na excelência nodesempenho das suas competências.A ARH do Tejo entende que os factores desucesso da sua actividade residem emassumir, integralmente, e desde a primeirahora, (i) a ambição de pretender, para ainstituição e para a região hidrográfica, o quejá hoje dispõem, em matéria de gestão dosrecursos hídricos, as regiões mais avançadasda Europa, e, (ii) uma visão de longo prazo,por forma a assegurar que as decisões iniciaisnão comprometem nem condicionam, antespotenciam, as acções e empreendimentosfuturos. Nesta óptica, foram traçados osobjectivos que esta entidade pretende cumprir,que se traduzem, entre outros, naconcretização de uma real gestão integradados recursos hídricos devidamente suportadapelo conhecimento e pela informação e peloenvolvimento de todas as entidades ligadasao sector e cidadãos em geral, assentes numaperspectiva de parceria, sustentabilidade esubsidiariedade.Para uma área que corresponde a cerca de1/3 do território continental, abrangendo 107municípios uma população de 3.800.000habitantes e uma faixa litoral com umaextensão de 261km, em que as matériasrelativas aos recursos hídricos eram tratadaspor três Comissões de Coordenação eDesenvolvimento Regional, o desenvolvimentode um sistema de informação que integretoda a informação desta unidade territorial édecisivamente um pilar fundamental para umaefectiva gestão integrada da água, quer emtermos da escala espacial, quer em termosdas várias temáticas que devem serconsideradas.O universo de utilizações e utilizadores é vasto

e a diversidade ao longo da região hidrográficaé uma realidade, por isso o acto de comunicare informar também obriga a um trabalhoespecífico e especializado por parte do serviço,no sentido de envolver cada vez mais ocidadão num espírito que se pretende queseja cada vez mais de partilha deresponsabilidades e vivências próprias dosrios. Comunicar e informar com conteúdo éum dos nossos propósitos. O INFOTEJO é,mensalmente, um bom exemplo disso e,nestes dois anos, publicámos 8 volumes, detemas diversificados da colecção Tágides.Ainda em matéria de comunicação, mas nãosó, podemos incluir as variadas e ricas Sessõesde Debate que organizámos que contaramcom a participação de centenas de parceirose assistentes. Litoral, ordenamento, águassubterrâneas e património foram alguns dostemas tratados.

Neste período de dois anos, importaigualmente destacar a simultaneidade temporalda entrada em funcionamento da ARH comos prazos associados ao cumprimento de umconjunto de obrigações resultantes no novoquadro legal em matéria de recursos hídricos,em que se destaca o período excepcional deregularização das utilizações dos recursoshídricos existentes, a aplicação, pela primeiravez, do diploma do regime económico efinanceiro e o desenvolvimento do processode planeamento e ordenamento dos recursoshídricos.O período de regularização das utilizaçõesdos recursos hídricos aumentouexponencialmente as solicitações, já por sinumerosas, à ARH. Quem não se recorda dapopularmente designada lei dos furos, charcase afins? Para dar uma resposta pronta, tendoem conta que estão em causa dezenas de

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ÁREA DE ACTUAÇÃO DA ARH DO TEJO, I.P.

Sede

LEGENDA:

Limite de ConcelhoBacia Hidrográfica das Ribeiras do Oeste

Região Hidrográfica do Tejo Sede de Concelho Rios

Albufeiras Delegações

Polos

ARH do Tejo, I.P.

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o discurso e a prática sobre o património ea patrimonialização devam escavar maisfundo, e não apenas à superfície e um pouco

erraticamente.

Como entende o Património associado a umrio, neste caso o Tejo? Como o podemos vivere valorizar?

“O Tejo não é o rio da minha aldeia(…)/Maspoucos sabem qual é o rio da minha aldeia/Epara onde ele vai/E donde ele vem./E por isso,porque pertence a menos gente,/É mais livree maior o rio da minha aldeia”, etc., escreviaAlberto Caeiro.

Enferrujada que está a mitologia das naus emudados os heróis do mar para as pranchasdo surf, já não se sabe o que seja o Tejo paraalém de retalhos pontuais: o espelho de águaao longo do estuário, o mar ao longe e o farol,o vai e vem dos cacilheiros, as pontes e aágua a passar pelos vidros do automóvel, aTorre de Belém encalhada, os navios decruzeiro como prédios flutuantes, os legosdos contentores…, tudo isso é hoje umaespécie de hipertexto de múltiplas bifurcaçõese sentidos e nunca um só. O Tejo já não é aestrada de água que trazia quase tudo o queLisboa consumia e o lugar de onde se teciauma relação com o mundo.

Ficou-lhe a poética das naus; mas hojenavega-se na internet e as margens do Tejosão boas para passeios de bicicleta edeambulações mais ou menos higiénicas ouboémias. Cada um tem o seu Tejo: o dascausas ambientais da água que lhe falta e daque corre pouco límpida, o dos que pensamque ainda existem Tágides e sereias, o dosfadistas a quem o rio dá sempre tema, o dosque se enervam se lhes aparece um naviocarregado de contentores, o dos que secontentam com um banco e uma sombra àborda d’água, o dos que rejubilam com cifrõesquando apanham uma nesga de vista para orio, e por aí fora com muito ou pouco sensoe consenso.

A questão está por isso em saber de quealdeia é este rio, porque hoje já não há aldeiase mesmo a aldeia global está a ficar umaselva. No tempo das aldeias e dos rios quelá corriam, quando havia alguma questão,reunia-se o povo e logo se sabia o que fazerao rio. Se pusermos demasiadas coisas juntoao Tejo, serão outras tantas que faltarão aoconforto de quem vive em lugares onde nãohá Tejo. É que o Tejo é um rio que corre àfrente do Terreiro do Paço e não um daquelesmuitos rios que em vez de estar na frente está

nas traseiras e para lá se despeja o lixo todo.Deixe-se o rio correr que é da sua condição- mais livre e maior, como dizia o poeta.

Sabemos que em muitas matérias temosmemória curta, o Património é,inequivocamente, um desses temas em quenos esquecemos do muito que os nossosantepassados sabiam. É assim? Comopodemos recuperar esse saber?

Não podemos estar constantemente a fazerromagens nostálgicas aos antepassados. Onosso problema, para lá das urgências deum presente que tende a mobilizar-nos emexclusivo, é o futuro. Somos de um país emque a cultura erudita passava o mesmotempo a inaugurar estátuas de navegantese a denegrir os milhões de emigrantes quepartiam de um país que não lhes asseguravaquase nada. Quando voltavam, criticava-seas casas que faziam e a sua estética tãolongínqua das pedras velhas e da cal frescadas casas pobres (mas tão típicas egenuínas…, coitadas).

Curiosamente, o saber alimenta-se hoje deuma voragem tecno-científica própria damitologia do iluminismo, do racional, domoderno, da ideia do sentido linear eirreversível da civilização. Longe dassociedades estáveis, já não é a experiência,a tradição e o saber dos anciãos que noshabilita para o mundo. Para esses ficamapenas uns rituais de Sibila, consultada paralegitimar qualquer coisa de que já se está àespera ou para o enunciado de uma utopiapor realizar; instantes depois regressam astais urgências do presente, e por isso adificuldade de vislumbrar o futuro tambémnão ajuda nada às viagens pelo passado epelas suas ficções em retrospectiva que oraacendem ora apagam momentos claros ousinistras obscuridades. Quero dizer que nãovale a pena fazer a arqueologia do saber dopassado sem uma futurologia sobre opresente; não saberíamos o que fazer comessa arqueologia a não ser museus.

“Vida no Campo” é o seu próximo livro. Fale-nosum pouco desse livro que nos transporta a umaruralidade a que virámos as costas.

Depois do livro “A Rua da Estrada”, ficou-me um vício de geógrafo andarilho em buscado país real e do que nele muda. Cansei-me das mitologias bipolares da “cidadehistórica” e das “aldeias típicas”, por tudoo resto que não deixam ver, pelo excessode atenção que absorvem e pela profunda

amnésia que se vai alargando entre elas. Averdade é que o Produto Interno Bruto daAgricultura se reduziu a pouco mais de 3%.Ora “rural” designa de facto uma conjugaçãoentre a economia agrícola como suporte dariqueza e da mobilização do solo, e umacerta cultura e visões do mundo centradasna tradição, no fechamento sobre si, nocontrário do cosmopolitismo. Não é possívelmanter muito mais tempo esta conjugaçãode sentidos. O país desruralizou--se e aoposição cidade/campo tornou-se numasimplificação sem grande sentido exceptopara aqueles que pensam que o campo éo sítio onde se passam férias e fins-de-semana.

A agricultura que funciona e que temexpressão económica, é uma actividadeempresarial tão sofisticada como outraqualquer e já nem sequer é líquido queprecise de solo, campos ou pastagens. NoDouro Vinhateiro nem sequer há solo, háxisto de onde as videiras brotam; numaestufa podem-se cultivar plantas queenraízam em solo artificial regado por umcaldo químico de água, nutrientes efitossanitários; uma exploração leiteira éum somatório de vacas geneticamentetransformadas, tomando hormonas eantibióticos para não desistirem dos quasetrinta litros de leite que têm que processarnum dia…, “agricultura biológica” (toda aagricultura é biológica) é um branding quefuncionará se o mercado (global tambémpara a agricultura) o viabilizar, etc.

Quanto à cultura, já há muito que as conversasà volta da lareira e no largo da igreja semudaram de lugar e se centram mais nasnovelas, nas séries da FOX, ou nas notíciasda TV, do que nos mexericos da terra ou nageada que queimou as árvores. Em muitasterras já nem sequer há conversas. Saíramtodos. Noutras, a metamorfose do rural éintensa e profundamente internacional egenérica como no Algarve.

“Vida no Campo” é sobre isto: mitologias doúltimo país rural da Europa que persiste eminscrever no imaginário colectivo e ao mesmotempo, as imagens bucólicas e os destroçosdesse mundo perdido, variando entrecalamidades e incêndios, resorts para todosos gostos com muita relva e “espaço verde”,turismo rural, desertificação ou, ao contrário,casas e estradas por todo o lado como noNO de Portugal. Se 97% da economia não érural, o país, a sociedade e o território, sãourbanos (por defeito e enquanto não se conseguirsair desta dicotomia). Parece desconcertante,mas para escrever um livro é quanto basta.

ACTUALIDADE

Para além de um novo modelo institucional, oregime jurídico dos recursos hídricos,consubstanciado pela Lei da Água de 2005(aprovada na Assembleia da República comos votos favoráveis do PS, PSD e CDS/PP) erespectiva regulamentação, apresenta umconjunto de disposições que constituem umanova abordagem de gestão dos recursoshídricos, mais abrangente e multi einterdisciplinar. Face a estas novas obrigações,e tendo em conta a realidade da gestão dosrecursos hídricos, foi possível, desde logo,constatar que a nova autoridade competenteteria que apostar no desenvolvimento eaplicação de ferramentas de recolha, tratamentoe análise de dados, modelos e sistemas deapoio à decisão, na capacitação dos seustécnicos e na estruturação de uma entidadeque preste um serviço orientado para o clientee baseada na excelência no desempenho dassuas competências.A ARH do Tejo entende que os factores desucesso da sua actividade residem em assumir,integralmente, e desde a primeira hora, (i) aambição de pretender, para a instituição e paraa região hidrográfica, o que já hoje dispõem,em matéria de gestão dos recursos hídricos,as regiões mais avançadas da Europa, e, (ii)uma visão de longo prazo, por forma aassegurar que as decisões iniciais nãocomprometem nem condicionam, antespotenciam, as acções e empreendimentosfuturos. Nesta óptica, foram traçados osobjectivos que esta entidade pretende cumprir,que se traduzem, entre outros, na concretizaçãode uma real gestão integrada dos recursoshídricos, devidamente suportada peloconhecimento e pela informação, e peloenvolvimento de todas as entidades ligadasao sector e cidadãos em geral. Tudo istoassente numa perspectiva de parceria,sustentabilidade e subsidiariedade.Para uma área que corresponde a cerca de1/3 do território continental, abrangendo 107municípios uma população de 3.800.000habitantes e uma faixa litoral com uma extensãode 261 km, em que as matérias relativas aosrecursos hídricos eram tratadas por trêscomissões de coordenação e desenvolvimentoregional, o desenvolvimento de um sistema deinformação que integre todos os dados destaunidade territorial é decisivamente um pilarfundamental para uma efectiva gestão integradada água, quer em termos da escala espacial,quer em termos das várias temáticas que

devem ser consideradas.O universo de utilizações e utilizadores é vastoe a diversidade ao longo da região hidrográficaé uma realidade, por isso o acto de comunicare informar também obriga a um trabalhoespecífico e especializado por parte do serviço,no sentido de envolver cada vez mais o cidadãonum espírito que se pretende que seja cadavez mais de partilha de responsabilidades evivências próprias dos rios. Comunicar einformar com conteúdo é um dos nossospropósitos. O INFOTEJO é, mensalmente, umbom exemplo disso e, nestes dois anos,publicámos 8 volumes, de temas diversificadosda colecção Tágides. Ainda em matéria decomunicação, mas não só, podemos incluir asvariadas e ricas sessões de debate queorganizámos e que contaram com aparticipação de centenas de parceiros eassistentes. Litoral, ordenamento, planeamento,águas subterrâneas e património foram algunsdos temas tratados.Neste período de dois anos, importa igualmentedestacar a simultaneidade temporal da entradaem funcionamento da ARH com os prazosassociados ao cumprimento de um conjuntode obrigações resultantes no novo quadro legalem matéria de recursos hídricos, em que sedestaca o período excepcional de regularizaçãodas utilizações dos recursos hídricos existentes,a aplicação, pela primeira vez, do diploma doregime económico e financeiro e odesenvolvimento do processo de planeamentoe ordenamento dos recursos hídricos.O período de regularização das utilizações dosrecursos hídricos aumentou exponencialmenteas solicitações, já por si numerosas, à ARH.Quem não se recorda da popularmentedesignada lei dos furos, charcas e afins? Paradar uma resposta pronta, tendo em conta queestão em causa dezenas de milhar de

utilizações distribuídas por uma área de cercade 30.000 km2, foi necessário estabelecerparcerias com associações, câmaras municipaise freguesias, no sentido de minimizar asdeslocações e fornecer um esclarecimentomais adequado aos cidadãos. Para além disso,foi desenvolvida uma aplicação informáticaprontamente disponibilizada aos parceiros,tendo sido realizadas acções de sensibilizaçãoe formação para simplificar todo oprocedimento, incluindo a possibilidade deenvio dos requerimentos pela internet e pelocorreio e entrega nos serviços da ARH.A aplicação da taxa de recursos hídricos, pelaprimeira vez, a um universo alargado deutilizações, obrigou a um esforço simultâneode organização e tratamento da informação eprestação de esclarecimentos, sempre com apreocupação de não aumentar o esforço dosutilizadores no carregamento de dados. Assim,esta ARH disponibilizou, ainda no ano de 2008,uma aplicação com todos os dados existentespré-carregados para um universo inicial de 100entidades gestoras, com o pedido de verificaçãoe completamento dos dados em falta. Emrelação aos restantes utilizadores coubeigualmente à ARH o carregamento da respectivainformação. Os desafios também passarampela necessidade de harmonizar procedimentosentre ARH e compatibilizar os dados com aaplicação informática de emissão de notas deliquidação.No que se refere ao planeamento, destaca-sea elaboração dos Planos de Gestão de RegiãoHidrográfica, disposição prevista na Directiva-Quadro da Água, tendo sido necessário lançaros procedimentos concursais e estabeleceruma estrutura própria para o desenvolvimentodo projecto em causa. No caso específico doTejo, por ser uma região hidrográficainternacional, foi igualmente necessário

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2 ANOS DE ARH DO TEJO, I.P.

Tejo, flamingos ao pôr do sol

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estabelecer os devidos contactos com asautoridades competentes de Espanha. Noprimeiro semestre de 2009 foram realizadasvárias sessões públicas para análise dasquestões significativas para a gestão da águana região hidrográfica do Tejo e da baciahidrográfica das ribeiras do Oeste, incluindoduas sessões conjuntas com Espanha.Quanto ao ordenamento dos recursos hídricos,destaque para o processo de elaboração doPlano de Ordenamento do Estuário do Tejo,actualmente em curso, e que visa constituir-se como um instrumento promotor demudança, com o objectivo de conciliar oordenamento referentes a usos e ocupaçõesdo território e os espaços de coordenação,colaboração e mediação institucional. Deve-se igualmente referir os trabalhos desenvolvidospara a avaliação dos quatro Planos deOrdenamento da Orla Costeira em vigor, nosentido de alavancar o processo de revisãodestes instrumentos numa base participativae adaptada às novas exigências e expectativasdos cidadão e assente nos princípios desustentabilidade das iniciativas e propostasadoptadas. Outra aposta no sentido de agilizarprocessos e promover sinergias entres os váriosactores, para uma melhor valorização dos rioscomo espaço de desenvolvimento, é o projectoPolis Rios, em que o Tejo constitui o primeirocaso de aplicação.Com efeito, nestes dois anos muitas foram asacções e os projectos desenvolvidos, tendosempre subjacente a obrigação da ARH exercerem pleno todas as suas competências,nomeadamente o planeamento, olicenciamento, a monitorização e a fiscalização,e o compromisso de fazê-lo de forma simples,transparente, pró-activa e orientada para servirmelhor os utilizadores. O desenvolvimento deferramentas, em que se pode destacar olicenciamento online, constitui um dos pilaresestruturante de um serviço moderno, assenteem novas tecnologias de armazenamento etratamento de dados e na desmaterializaçãodos processos. A formação dos técnicos daARH, uma aposta desde os primeiros dias deactividade, constitui igualmente um factor damaior importância para o acréscimo real daeficiência e eficácia no tratamento dassolicitações feitas à ARH.No período em análise, a ARH do Tejo apostouna preparação e apresentação de candidaturasao QREN, no sentido de potenciar osinvestimentos na sua área de actuação atravésde financiamento comunitário, que se traduziuem 19 candidaturas, perfazendo um montantecontratual de cerca de 16.000.000,00€. Estas

candidaturas abrangem essencialmente acçõesno litoral, monitorização e gestão do risco,resolução de passivos ambientais e elaboraçãodos instrumentos de planeamento eordenamento dos recursos hídricos.A implementação dos programas demonitorização das componentes físico-químicas e ecológicas das águas de superfíciee subterrâneas resultou na realização de cercade 78500 análises. Em relação à monitorizaçãopara acompanhamento da evolução dossistemas costeiros e do risco associado à suautilização foi criado um sistema de sinalética,delimitou-se fisicamente zonas de risco elevado,procedeu-se à interdição de sectores de praiae arribas e realizaram-se operações desaneamento de blocos instáveis ereperfilamento de perfis de arribas. Todo estetrabalho em plena coordenação com osmunicípios e as autoridades marítimas e deprotecção civil.No que se refere à fiscalização, refira-se otrabalho de base realizado no sentido de tornarestas acções mais eficazes e consistentes doponto de vista técnico e jurídico. Neste contexto,foi desenvolvido um trabalho de fundo baseadona sistematização e tipificação dasdisfuncionalidades do processo contra-ordenacional, com uma forte aposta naformação teórica e prática dos agentes comresponsabilidades nesta área, e que culminoucom a elaboração do Manual de Formaçãosobre o Regime Jurídico de Utilização dosRecursos Hídricos na Perspectiva Contra-ordenacional.

Destaca-se também a celebração de váriasparcerias e protocolos institucionais, sobretudono âmbito do licenciamento e fiscalização, amaioria com as câmaras municipais, mastambém com a GNR/SEPNA e váriasassociações ligadas ao sector. Foramigualmente promovidas várias acções dedivulgação sobre a utilização de recursoshídricos e a sua gestão e um conjunto deacções de formação orientadas para o cidadãoe determinados sectores, como por exemploa agricultura.Há a consciência que muito há para serfeito, mas não podemos deixar de referira prática da ARH do Tejo em procurardesenvolver conjuntamente com osutilizadores, nomeadamente os municípios,as soluções mais adaptadas às realidadesem causa para os problemas existentes.O processo de certificação da qualidadeda entidade, em desenvolvimento, visacontribuir para a concretização dodesígnio de prestar um serviço deexcelência, devidamente suportado emsistemas de informação e novastecnologias, em que o cidadão poderáinstruir o seu pedido de licenciamentoatravés da internet, bem como cumprircom as inerentes obr igações decomunicação e envio de autocontrolo.Desta forma, procuramos simplificarprocessos e eliminar procedimentosredundantes, em que o conjunto de regrasa seguir resultam do estrito cumprimentoda legislação em vigor.

ACTUALIDADE

Tejo, Lisboa - Oceanário

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

SESSÃO DE DEBATEPATRIMÓNIO DO TEJOPromovida pela ARH do Tejo e pela Sociedade de Geografia de Lisboa

LIMPEZA E DESOBSTRUÇÃODE LINHAS DE ÁGUASESSÕES EM VILA NOVA DA BARQUINHAE BENAVENTE COM LARGA PARTICIPAÇÃOVila Nova da Barquinha e Benaventereceberam, nos passados dia 21 e 22 deSetembro, mais duas sessões deesclarecimento sobre Limpeza eDesobstrução de Linhas de Água, promovidaspela ARH do Tejo em conjunto com asrespectivas Câmaras Municipais. As sessõesreuniram uma ampla participação dapopulação local, com cerca de 40 pessoas

em cada sessão. À semelhança das ediçõesanteriores, foi feita uma curta apresentaçãosobre as boas práticas a implementar, à qualse seguiu um período debate, onde houveoportunidade para abordar os problemassentidos pela população e pensar possíveissoluções.Ainda neste âmbito, a ARH esteve presenteno Seminário Distrital 2010/2010 Água e

Desenvolvimento, organizado pela RotaryClub de Rio Maior, no Centro de Estágios eFormação Desportiva em Rio Maior, ondeapresentou uma comunicação sobre estemesmo tema, enquadrando-o na Directiva-Quadro da Água. Uma sessão também muitoparticipada, que contou com a presença daSra Presidente da Câmara de Rio Maior,Isaura Morais.

No passado dia 24 de Setembro, a ARHdo Tejo realizou, em conjunto com aSociedade de Geografia de Lisboa, umasessão de debate dedicada ao Patrimóniodo Tejo. O evento, que teve lugar noAuditório da Sociedade de Geografia deLisboa, contou com a participação de umleque variado de convidados que, ao longodo dia, deram a conhecer os aspectosculturais associados ao rio Tejo, bem comoa importância das diversas actividadeseconómicas para sua sustentabilidade.A sessão iniciou-se com as intervençõesdo Presidente da Sociedade de Geografiade Lisboa, Luís Aires-Barros, e doPresidente da ARH do Tejo, ManuelLacerda. A conferência de abertura estevea cargo de Margarida Cardoso da Silva,que apresentou uma comunicação intitulada“O rio Tejo. Olhar o passado com olhos dofuturo”. Com a apresentação de Luís Ribeiro “ouviu-se” o Tejo, “desde o fado à ópera”e a intervenção de Fernando Gomes daSilva focou a importância da agricultura nabacia hidrográfica do Tejo. A parte damanhã terminou com a temática da pescano rio, apresentada por Carlos Sousa Reis,uma intervenção à qual se seguiu o primeiro

período de debate.Os trabalhos prosseguiram durante a tarde,com a apresentação de Fernando Bouzada Costa, que abordou os principaisaspectos das aldeias avieiras e, emconcreto, o projecto de reconstrução daaldeia da Palhota. As embarcações típicasdo Tejo foram o tema da comunicação deFernando Carvalho Rodrigues, seguindo-se António Carmona Rodrigues com aapresentação intitulada “Sáveis econtentores. Ambiente e energia. Navegaré preciso”. O conjunto de intervençõesterminou com as comunicações de CarlosCupeto e Luís Mota Figueira, quepartilharam com a audiência aspectos eideias para o turismo associado ao rio Tejo.Terminadas as apresentações teve lugar

um novo período de debate, onde osinteressados puderam contribuir comquestões e preocupações relacionadascom o rio.Este foi o segundo debate sobre oPatrimónio do Tejo, no seguimento de umaprimeira edição que decorreu, em Vila Velhade Ródão, onde foram apresentadosaspectos relativos ao património natural ehistórico. Com estas acções, esperamosmobilizar a sociedade e promover o debate.A dimensão patrimonial do rio Tejo éinquestionável: é por isso fundamental asua protecção e valorização.

Nota: As várias apresentações estão disponíveisem www.arhtejo.pt

Mesa de abertura Participantes da sessão de debate

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

Rip Curl Pro Search PortugalPelo segundo ano consecutivo em PenicheGrande evento desportivo, com máxima preocupação ambiental

ERICEIRACANDIDATA A RESERVA MUNDIAL DE SURFPortugal poderá ser o primeiro país da Europa com uma Reserva Mundial de Surf

Portugal será o primeiro país da Europa e osegundo do mundo a possuir uma reservamundial de surf com a aprovação dacandidatura da Ericeira enquanto destino deeleição para a prática desta modalidade.A faixa costeira candidata a Reserva Mundialde Surf estende-se desde a Praia da Empa,na Freguesia da Ericeira, à Praia de S.Lourenço, na Freguesia de Santo Isidro,Concelho de Mafra. A aprovação dacandidatura será feita pela Save the Waves,organização norte-americana promotora da

classificação que aprovou recentemente aprimeira Reserva Mundial de Surf: a praia deMalibu, no estado norte-americano daCalifórnia.A qualidade e a consistência das ondas, ascaracterísticas ambientais e o apoio dacomunidade local são critérios determinantesimpostos pela organização para aceitação doprocesso. Neste sentido, a costa atlântica doConcelho de Mafra, especialmente a zonacosteira a norte da Ericeira, é um dos poucoslocais, a nível mundial, que consegue reunir

um elevado número de ondas de reconhecidaqualidade.A candidatura da Ericeira a Reserva Mundialde Surf reúne o apoio de entidades públicase privadas nacionais e pretende servir comomeio de promoção e reforço do seureconhecimento, nacional e internacional, aonível desportivo, histórico, cultural e turístico.Saliente-se que Portugal é, cada vez mais, umdestino de eleição para a prática do surf,integrando já o calendário internacional degrandes eventos da modalidade.

Pelo segundo ano consecut ivo aCâmara Municipal de Peniche trouxea Portugal o magnífico Rip Curl Pro,q u e s e r e a l i z o u n a p r a i a d eS u p e r t u b o s , e m P e n i c h e . Acompetição, uma das 10 etapas doCircuito Mundial ASP, aconteceu entre7 e 18 de Outubro. O evento reuniu aelite mundial de surf: nomes comoKelly Slater (nove vezes campeão do

mundo), Jordy Smith, Taj Burrow,Dane Reyno lds e Mick Fann ing .Este ano a organização decid iuconcentrar o evento nas praias deSupertubos e Belgas, sendo a primeirafamosa pelas suas ondas tubularesperfeitas e reconhecida, pela revistaSurfer, como tendo das melhores ondasdo mundo. Em competição estiveram os35 melhores surfistas masculinos e as 17

melhores surfistas femininas do mundo.Kelly Slater ganhou a final masculina e ahavaiana Carissa Moore venceu o RipCurl Women's Pro. O surfista portuguêsTiago Pires foi afastado pelo norte-americano Brett Simpson, na segundaeliminatória da prova.

Como é apanágio do Surf, a organizaçãodo evento demonstrou preocupaçõesambientais e todos os trabalhospreparativos, ao nível da instalação deestruturas nas praias, foram alvo deacompanhamento por parte de técnicosda ARH do Tejo. A escolha dos locais,bem como o tipo de estruturas ainstaladar foram definidas de modo agerar o menor impacto possível do litoral,compatibilizando assim o usufruto, aconservação e a exploração sustentáveldo maior recurso nacional, o mar. Dereferir que o Rip Curl Pro 2010, foiigualmente um evento Carbono Zero,através da compensação à emissão degases de efeito estufa.

Medidas de sensiblização e protecção do ambiente

Praia de Supertubos, último dia da competição

A qualidade da água das praias da Rainha, daConceição e da Duquesa voltou a ser compatívelcom a prática balnear, na época finda, em resultadode um conjunto de intervenções decorrentes deuma parceria entre o Município de Cascais, a ARHdo Tejo, a empresa responsável pela gestão eexploração do sistema multimunicipal desaneamento da Costa do Estoril (SANEST) e as¡guas de Cascais.No cerne do problema estava a má qualidade daágua da ribeira das Vinhas, provocada pelaexistência de descargas indevidas de águasresiduais domésticas.O impacte nas praias próximas da foz da ribeira,resultante da má qualidade da água daquela linhade água era, até à construção do edifício CASCAISVILLA, reduzido ou mesmo nulo durante o Verão,devido à colocação, antes da época balnear, deuma comporta, a montante de um açude existentepróximo da foz. O caudal retido era entãobombeado para o sistema de drenagem existentenas proximidades. Esta solução, embora não

definitiva, resolvia o problema da influência dadescarga da ribeira das Vinhas na qualidade daspraias da Rainha, da Conceição e da Duquesa,durante a época balnear.No entanto, aquando da construção do CASCAISVILLA, as escavações provocaram o surgimentode um volume de água subterrânea significativo,que passou a ser recolhido em tanquesconstruídos nas caves do centro comercial edescarregado na ribeira das Vinhas. Comoconsequência, a solução usada até à data tornou-se insuficiente, uma vez que o açude erapermanentemente galgado pelo caudal acrescidoda ribeira.De modo a não comprometer o uso balnear dasreferidas praias em futuras épocas balneares,tendo em conta o enquadramento legal previstono Decreto-Lei n.∫ 135/2009, de 3 de Junho, aCâmara de Cascais e a ARH do Tejo propuseram-se intervir no local. Assim, em Abril de 2010 e emapenas três semanas, foi construído um sistemade desvio do excesso de caudal proveniente do

centro comercial para um novo colector, quesegue no caneiro da ribeira das Vinhas e quetermina a jusante do açude. Desta forma, permitiu-se viabilizar soluções anteriormente usadas naépoca balnear, sendo o caudal proveniente doedifício do CASCAIS VILLA descarregado semcontacto directo com o caudal da ribeira.Os resultados obtidos foram excelentes, nuncatendo sido ultrapassados os valores limite paraavaliação de amostras únicas da qualidade daságuas balneares, de acordo com a decisão daComissão Técnica de Acompanhamento doDecreto- Lei n∫ 135/2009, de 3 de Junho, tal comose verifica no quadro abaixo.Para o acompanhamento desta intervenção foiconstituído um grupo de trabalho composto porrepresentantes da Câmara Municipal de Cascais, ARH do Tejo, ¡guas de Cascais e SANEST, cujoobjectivo, inicialmente centrado na intervenção naribeira das Vinhas, foi estendido à tentativa deresolução de outros problemas detectados noutrasribeiras e praias da costa do Estoril.

CM DE CASCAIS, ARH DO TEJO, SANEST E ÁGUAS DE CASCAISRESOLVEM PROBLEMAS DE QUALIDADE DA ÁGUA

Praias da Rainha, da Conceição e da Duquesa

Maio Junho Julho Agost o S etembro

Conceição4 15 6 4 23 3 35 7 25 20 4 19 5 3 7 4 0 9 1 350

23 10 22 6 3 4 2 14 65 6 20 70 200 18 10 11 13 2 0 1200

Duquesa4 12 5 3 7 7 2 1 7 42 0 46 2 3 1 1 1 1 0 350

14 8 9 0 3 10 1 3 15 20 0 46 6 9 2 0 3 4 2 1200

Rainha9 330 80 10 14 80 6 13 7 4 36 0 8 5 4 5 5 25 5 350

45 52 40 2 9 90 5 10 62 9 25 2 290 5 7 15 18 80 5 1200

ValorLimi te

Enterococos Intestinais(UFC/100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Enterococos Intestinais(UFC /100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Enterococos Intestinais(UFC /100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Valores limite para avaliação de amostras únicas da qualidade das águas balneares, de acordo com a decisão da Comissão Técnica de Acompanhamento do Decreto-Leinº 135/2009, de 3 de Junho, relativo à gestão das águas balneares, aprovado em 12 de Fevereiro de 2010.

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Rip Curl Pro Search PortugalPelo segundo ano consecutivo em PenicheGrande evento desportivo, com máxima preocupação ambiental

ERICEIRACANDIDATA A RESERVA MUNDIAL DE SURFPortugal poderá ser o primeiro país da Europa com uma Reserva Mundial de Surf

Portugal será o primeiro país da Europa e osegundo do mundo a possuir uma reservamundial de surf com a aprovação dacandidatura da Ericeira enquanto destino deeleição para a prática desta modalidade.A faixa costeira candidata a Reserva Mundialde Surf estende-se desde a Praia da Empa,na Freguesia da Ericeira, à Praia de S.Lourenço, na Freguesia de Santo Isidro,Concelho de Mafra. A aprovação dacandidatura será feita pela Save the Waves,organização norte-americana promotora da

classificação, que aprovou recentemente aprimeira Reserva Mundial de Surf: a praia deMalibu, no estado norte-americano daCalifórnia.A qualidade e a consistência das ondas, ascaracterísticas ambientais e o apoio dacomunidade local são critérios determinantesimpostos pela organização para aceitação doprocesso. Neste sentido, a costa atlântica doConcelho de Mafra, especialmente a zonacosteira a norte da Ericeira, é um dos poucoslocais, a nível mundial, que consegue reunir

um elevado número de ondas de reconhecidaqualidade.A candidatura da Ericeira a Reserva Mundialde Surf reúne o apoio de entidades públicase privadas nacionais e pretende servir comomeio de promoção e reforço do seureconhecimento, nacional e internacional, aonível desportivo, histórico, cultural e turístico.Saliente-se que Portugal é, cada vez mais, umdestino de eleição para a prática do surf,integrando já o calendário internacional degrandes eventos da modalidade.

Pelo segundo ano consecut ivo aCâmara Municipal de Peniche trouxea Portugal o magnífico Rip Curl Pro,q u e s e r e a l i z o u n a p r a i a d eS u p e r t u b o s , e m P e n i c h e . Acompetição, uma das 10 etapas doCircuito Mundial ASP, aconteceu entre7 e 18 de Outubro. O evento reuniu aelite mundial de surf: nomes comoKelly Slater (nove vezes campeão do

mundo), Jordy Smith, Taj Burrow,Dane Reyno lds e Mick Fann ing .Este ano a organização decid iuconcentrar o evento nas praias deSupertubos e Belgas, sendo a primeirafamosa pelas suas ondas tubularesperfeitas e reconhecida, pela revistaSurfer, como tendo das melhores ondasdo mundo. Em competição estiveram os35 melhores surfistas masculinos e as 17

melhores surfistas femininas do mundo.Kelly Slater ganhou a final masculina e ahavaiana Carissa Moore venceu o RipCurl Women's Pro. O surfista portuguêsTiago Pires foi afastado pelo norte-americano Brett Simpson, na segundaeliminatória da prova.

Como é apanágio do Surf, a organizaçãodo evento demonstrou preocupaçõesambientais e todos os trabalhospreparativos, ao nível da instalação deestruturas nas praias, foram alvo deacompanhamento por parte de técnicosda ARH do Tejo. A escolha dos locais,bem como o tipo de estruturas ainstaladar foram definidas de modo agerar o menor impacto possível do litoral,compatibilizando assim o usufruto, aconservação e a exploração sustentáveldo maior recurso nacional, o mar. Dereferir que o Rip Curl Pro 2010, foiigualmente um evento Carbono Zero,através da compensação à emissão degases de efeito estufa.

Medidas de sensiblização e protecção do ambiente

Praia de Supertubos, último dia da competição

A qualidade da água das praias da Rainha, daConceição e da Duquesa voltou a ser compatívelcom a prática balnear, na época finda, emresultado de um conjunto de intervençõesdecorrentes de uma parceria entre o Municípiode Cascais, a ARH do Tejo, a empresaresponsável pela gestão e exploração do sistemamultimunicipal de saneamento da Costa do Estoril(SANEST) e as águas de Cascais.No cerne do problema estava a má qualidadeda água da ribeira das Vinhas, provocada pelaexistência de descargas indevidas de águasresiduais domésticas.O impacte nas praias próximas da foz da ribeira,resultante da má qualidade da água daquela linhade água era, até à construção do edifício CASCAISVILLA, reduzido ou mesmo nulo durante o Verão,devido à colocação, antes da época balnear, deuma comporta, a montante de um açude existentepróximo da foz. O caudal retido era entãobombeado para o sistema de drenagem existentenas proximidades. Esta solução, embora nãodefinitiva, resolvia o problema da influência da

descarga da ribeira das Vinhas na qualidade daspraias da Rainha, da Conceição e da Duquesa,durante a época balnear.No entanto, aquando da construção doCASCAIS VILLA, as escavações provocaram osurgimento de um volume de água subterrâneasignificativo, que passou a ser recolhido emtanques construídos nas caves do centrocomercial e descarregado na ribeira das Vinhas.Como consequência, a solução usada até àdata tornou-se insuficiente, uma vez que o açudeera permanentemente galgado pelo caudalacrescido da ribeira.De modo a não comprometer o uso balneardas referidas praias em futuras épocas balneares,tendo em conta o enquadramento legal previstono Decreto-Lei nº 135/2009, de 3 de Junho, aCâmara Municipal de Cascais e a ARH do Tejopropuseram-se intervir no local. Assim, em Abrilde 2010 e em apenas três semanas, foiconstruído um sistema de desvio do excessode caudal proveniente do centro comercial paraum novo colector, que segue no caneiro da

ribeira das Vinhas e que termina a jusante doaçude. Desta forma, permitiu-se viabilizar soluçõesanteriormente usadas na época balnear, sendoo caudal proveniente do edifício do CASCAISVILLA descarregado sem contacto directo como caudal da ribeira.Os resultados obtidos foram excelentes, tendosido sempre significativamente inferiores aosvalores limite estabelecidos para a avaliação deamostras únicas da qualidade das águasbalneares, de acordo com a decisão da ComissãoTécnica de Acompanhamento do Decreto- Leinº 135/2009, de 3 de Junho, tal como se verificano quadro abaixo.Para o acompanhamento desta intervençãofoi constituído um grupo de trabalhocomposto por representantes da CâmaraMunicipal de Cascais, ARH do Tejo, águasde Cascais e SANEST, cujo objectivo,inicialmente centrado na intervenção na ribeiradas Vinhas, foi estendido à tentativa deresolução de outros problemas detectadosnoutras ribeiras e praias da costa do Estoril.

CM DE CASCAIS, ARH DO TEJO, SANEST E ÁGUAS DE CASCAISRESOLVEM PROBLEMAS DE QUALIDADE DA ÁGUA

Praias da Rainha, da Conceição e da Duquesa

Maio Junho Julho Agost o S etembro

Conceição4 15 6 4 23 3 35 7 25 20 4 19 5 3 7 4 0 9 1 350

23 10 22 6 3 4 2 14 65 6 20 70 200 18 10 11 13 2 0 1200

Duquesa4 12 5 3 7 7 2 1 7 42 0 46 2 3 1 1 1 1 0 350

14 8 9 0 3 10 1 3 15 20 0 46 6 9 2 0 3 4 2 1200

Rainha9 330 80 10 14 80 6 13 7 4 36 0 8 5 4 5 5 25 5 350

45 52 40 2 9 90 5 10 62 9 25 2 290 5 7 15 18 80 5 1200

ValorLimi te

Enterococos Intestinais(UFC/100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Enterococos Intestinais(UFC /100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Enterococos Intestinais(UFC /100 ml)

Escherichia C oli(UFC /100 ml)

Valores-limite para avaliação de amostras únicas da qualidade das águas balneares, de acordo com a decisão da Comissão Técnica de Acompanhamento do Decreto-Leinº 135/2009, de 3 de Junho, relativo à gestão das águas balneares, aprovada em 12 de Fevereiro de 2010.

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MUNICÍPIOS

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MUNICÍPIOS

IMPLEMENTAÇÃO DEPERCURSO RIBEIRINHO

Num projecto conjunto com os vizinhosconcelhos de Abrantes e Vila Nova da Barquinhaestá em fase de candidatura o estabelecimentode um percurso (pedestre e cicloviário) que,

desenvolvido quase exclusivamente pelamargem direita do Tejo, proporcionará atravessia dos três concelhos, ao encontro depatrimónios em que, para além do natural, seincluem vestígios da presença romana na região.Algum mobiliário com informação sobreaspectos patrimoniais, locais de descanso e,

eventualmente, pontos de acesso a produtosde artesanato e gastronomia locais, virão aconstituir importante recurso mobilizador dehabitantes e forasteiros para a fruição dopatrimónio natural e construído, bem como daspaisagens naturais pelas quais o circuito sedesenvolve.A “Cidade da Escora” sugere um mistérioromano na ligação entre as duas margens doTejo unindo a Chã da Bica (margem direita) àsruínas de Alcolobre, na margem esquerda,permitindo supor uma vasta área de ocupaçãocom indústrias de extracção e purificação demetais, casas senhoriais, balneários e outrosespaços comuns. Cerca de quatro quilómetrosdepois, prosseguindo com o Tejo à vista,alcança-se a “Quinta das Almas”, espaço emruínas mas com vestígios claros de nichos onde- diz-se - eram colocadas as velas quealumiavam o percurso de quem se preparavapara entrar na vila, garantindo o afastamentode almas que importunassem peregrinos eoutros forasteiros. O Tejo acompanha agora,de muito perto, os viajantes que, à sombra deum salgueiro, poderão recordar algumas daslendas sobre a “almas” que importunarammentes menos sólidas ou mesmo deliciar-secom o prazer - se for o caso - de ocupar umpesqueiro e ensaiar a arte da pesca.Umas centenas de metros mais à frente, oscais que recordam tempos idos de intensaactividade “marítima” e, logo a seguir, a Casa-Memória assente sobre antigas rochas queterão pertencido à casa onde viveu Camõesnos idos anos de 1545 e 1546. Logo a seguir,o porto da Cova onde, em tempos, varinos eoutros barcos carregavam ou descarregavamprodutos do intercâmbio com Lisboa.O percurso levará ao espaço onde esteve, atémeados do século passado, o que restava datorre da residência do alcaide da vila, cuja filhaencantou Camões durante a sua permanênciaem Constância. O viajante ver-se-á então entreo Tejo e o “espaço Camões”, um projecto queampliará o agora “Jardim-Horto” onde a flora“cantada” pelo poeta se dispõe ao longo decanteiros enfeitados com versos, numa íntimarelação entre poesia e natureza.

A designação mais antiga que se conhecedo local onde hoje se situa Constância ter-lhe-á sido atribuída pelos Romanos, numaclara referência à luta do Tejo (Pugna - Tage)com as águas do Zêzere que com ele aquise juntam. Quando os árabes a tomaram,no século XVIII, ter-lhe-ão chamadoAlmorolan, nome que passou para o vizinhocastelo de Almourol.Em 1150, Gonçalo Mendes da Maiaconquistou-a aos mouros e devolveu-lhea designação primitiva, já entãoaportuguesada sob a forma de Pugnete ouPunhete. Admite-se que, cerca de 25 anosantes do desterro de Camões (1546-1547),D. Sebastião aqui se tenha refugiado parafugir à peste de 1569, tendo elevado Punheteà categoria de vila, em 1571.Diz-se que D. Maria II, também encantadacom a beleza da localidade e as paisagensenvolventes, não consideraria estético oseu nome, razão por que não lhe terácustado - por insistência dos liberais (emparticular Passos Manuel que aqui tambémviveu por alguns períodos) e pedido daCâmara Municipal - mudar o nome paraum outro que traduzia a “constância” doapoio de Punhete à causa liberal.Punhete sempre teve - e Constânciacontinuou - a vida intimamente ligada aosdois rios sobre os quais se debruça. PeloZêzere eram escoados (até ao início daconstrução da barragem de Castelo doBode, em 1945), produtos de grande parteda Beira Interior, com particular destaquepara as madeiras do Pinhal. Pelo Tejo

desciam os produtos do Alentejo e doRibatejo Norte, as cortiças, as madeiras,palha, frutos e cereais. De Lisboa chegavamo sal, produtos de artesanato e … as notícias.Numa e outra margem do Tejo, a montanteda vila (mas ainda nos limites do seuterritório), a agricultura ocupava quase todaa população e da terra saía o sustento dosque a trabalhavam, dos senhores, e aindados que, na capital, consumiam grandeparte da produção.Os marítimos - como eram designados osmembros das tripulações dos barcos(varinos, barcos-de-água-acima e outrostipos) que estabeleciam a ligação comLisboa - passavam boa parte da vida emviagens ao longo do Tejo, algumas vezesenfrentando temporais e outras dificuldadesque venciam com esforço e fé na sua santaprotectora, a Senhora da Boa Viagem. Naparte baixa da vila situavam-se as lojas eos armazéns de produtos com destino aLisboa (ou daqueles de lá trazidos), a igrejaonde rezavam antes da partida ou asmulheres imploravam a protecção divinapara os seus homens.Na margem do Zêzere reparavam econstruíam barcos e realizavam convívios,em particular os grandes piqueniques daSegunda-Feira a seguir à Páscoa, datadedicada à Senhora da Boa Viagem.A circulação ferroviária, primeiro e,posteriormente, o desenvolvimento de viasrodoviárias, alteraram os tempos e a vidade muitas localidades, evolução a queConstância não escapou. Os rios perderama importância de outrora, o açoreamentodos seus leitos dificultou progressivamentea navegação, gerações de marítimosextinguiram-se, a agricultura degradou-see a sobrevivência da região passou a basear--se em pequenos pólos industriais e nosserviços. As dificuldades dos temposmodernos exigem sacrifícios e esforçosextremos para enfrentar o futuro com algumoptimismo. No entanto, a história impôsaos constanciences a têmpera que lhespermitirá seguir o lema de que “o difícil, faz--se já, e o impossível … vamos tentar”.

Máximo de Jesus Afonso FerreiraPresidente da Câmara Municipal de

Constância

ESPAÇO CAMÕESE MUSEU DOS RIOS

O actual Jardim-Horto - concebido peloArquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Teles- apresenta um conteúdo delicioso reveladordo profundo conhecimento de Camões emáreas tão diversas como literatura, mitologia,geografia, botânica e astronomia. Instaladonuma pequena área esmeradamente mantidae tratada, confina com um espaço mais amplo,onde existem ruínas (parcialmenterecuperáveis) de dois prédios quase contíguos,um dos quais incorpora o suposto valorhistórico de ter sido sede dos Paços doConcelho, no século XIX.Está em fase de candidatura a fundoscomunitários o projecto de requalificação deedifícios e espaço envolvente - todo ele voltadopara o Tejo - instalando ali um centrointerpretativo do Jardim-Horto bem como oMuseu dos Rios e das Artes Marítimas. Este,possuidor de um interessante espóliodemonstrativo de artes e profissões de temposidos, encontra-se agora na parte alta da vila,num espaço exíguo e pouco acessível e longedo seu ambiente próprio, ou seja, do rio. Asua transferência para o Espaço Camõesproporcionará a acumulação de conteúdosculturais e turísticos, em contexto paisagísticomais adequado, com a consequenteoptimização de recursos físicos e humanosna rentabilização dos investimentos que vierema ser concretizados. O projecto prevê que oacervo do Museu dos Rios e das ArtesMarítimas seja ampliado com uma museografiade ar livre que incorporará objectos comobarcos típicos e respectivos acessórios dasfunções a que se dedicavam.

FRUIÇÃO DOS RIOS

Toda a parte baixa da vila mantém um contactodirecto com os rios que convidam àcontemplação do seu aspecto presente e - compequenas ajudas - facilmente evocam opassado. A foz do Zêzere - onde as águasturbulentas fustigavam e lutavam com o Tejo e,nas rochas da margem oposta, provocavam“um ruído que se ouvia a algumas léguas” - eraa sede dos estaleiros de construção e reparaçãonaval e, em ocasiões festivas, o local das festase convívios. Aí acediam os varinos do maiorporte que podiam arribar o Tejo, então muitomenos açoreado do que habitualmente. Agora,é uma pequena praia fluvial de onde se avistaum moderno Centro Náutico construído na outramargem e cujo acesso obriga a uma longa voltapela ponte rodoviária sobre o rio Zêzere.A poucos metros ficava o palácio do alcaide,junto ao qual se sitia o Porto da Cova, local detrabalhos intensos namovimentação decargas com destino aLisboa. Tendo em contao facto de se localizar na“linha” do “PercursoRibeirinho” e estandoeste em fase decandidatura, admite-seque a implementação doprograma Polis dos Riosvenha a permitir acriação de conteúdosque encaixem noreferido percurso, comoque peças que vãocompletando um puzzleprogressivamente mais

coerente: uma ponte pedonal ligando a regiãodos estaleiros (na foz do Zêzere) ao CentroNáutico, faria deste um equipamento maisacessível, utilizável e auto sustentável, para alémda beleza que emprestaria à paisagem global.Desportos náuticos - em que se destacam asdescidas, em canoa, do Zêzere e parte do Tejo,frequentemente até ao castelo de Almourol -são já uma realidade, podendo sercomplementados com qualidade e recursosmais variados e evoluídos.Simultaneamente, a aquisição e colocação emfuncionamento adequado de um barco típicodo início do século passado (por exemplo, umvarino de porte médio ou pequeno), constituiriamemória desses tempos e práticas, bem comoserviria a fins turísticos, proporcionando passeiosnas regiões navegáveis, da foz do Zêzere e dasecção do Tejo que atravessa o concelho,podendo, eventualmente, estender-se aos doisconcelhos vizinhos.

Constância em 1924. Os barcos varinos ainda navegavam nesta região

Localizado no encontro do rio Zêzere como Tejo, Constância É um município depequenas dimensões, geográficas edemográficas, constituído por trêsfreguesias: Constância, Montalvo e SantaMargarida da Coutada. Possui uma área de80,04 Km2 e cerca de 3815 habitantes ,mais de metade dos quais (52,2%) habitaem lugares e povoações de pequenadimensão (500 a 999 habitantes).

Percurso ribeirinho, junto à Casa-Memória de Camões

Descida do Zêzere, em canoa. Uma actividadedesportiva de importante impacte turístico

Barco típico em estaleiro de construção naval(Museu dos Rios e das Artes Marítimas)

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MUNICÍPIOS

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MUNICÍPIOS

IMPLEMENTAÇÃO DEPERCURSO RIBEIRINHO

Num projecto conjunto com os vizinhosconcelhos de Abrantes e Vila Nova da Barquinhaestá em fase de candidatura o estabelecimentode um percurso (pedestre e cicloviário) que,

desenvolvido quase exclusivamente pelamargem direita do Tejo, proporcionará atravessia dos três concelhos, ao encontro depatrimónios em que, para além do natural, seincluem vestígios da presença romana na região.Algum mobiliário com informação sobreaspectos patrimoniais, locais de descanso e,

eventualmente, pontos de acesso a produtosde artesanato e gastronomia locais, virão aconstituir importante recurso mobilizador dehabitantes e forasteiros para a fruição dopatrimónio natural e construído, bem como daspaisagens naturais pelas quais o circuito sedesenvolve.A “Cidade da Escora” sugere um mistérioromano na ligação entre as duas margens doTejo unindo a Chã da Bica (margem direita) àsruínas de Alcolobre, na margem esquerda,permitindo supor uma vasta área de ocupaçãocom indústrias de extracção e purificação demetais, casas senhoriais, balneários e outrosespaços comuns. Cerca de quatro quilómetrosdepois, prosseguindo com o Tejo à vista,alcança-se a “Quinta das Almas”, espaço emruínas mas com vestígios claros de nichos onde- diz-se - eram colocadas as velas quealumiavam o percurso de quem se preparavapara entrar na vila, garantindo o afastamentode almas que importunassem peregrinos eoutros forasteiros. O Tejo acompanha agora,de muito perto, os viajantes que, à sombra deum salgueiro, poderão recordar algumas daslendas sobre a “almas” que importunarammentes menos sólidas ou mesmo deliciar-secom o prazer - se for o caso - de ocupar umpesqueiro e ensaiar a arte da pesca.Umas centenas de metros mais à frente, oscais que recordam tempos idos de intensaactividade “marítima” e, logo a seguir, a Casa-Memória assente sobre antigas rochas queterão pertencido à casa onde viveu Camõesnos idos anos de 1545 e 1546. Logo a seguir,o porto da Cova onde, em tempos, varinos eoutros barcos carregavam ou descarregavamprodutos do intercâmbio com Lisboa.O percurso levará ao espaço onde esteve, atémeados do século passado, o que restava datorre da residência do alcaide da vila, cuja filhaencantou Camões durante a sua permanênciaem Constância. O viajante ver-se-á então entreo Tejo e o “espaço Camões”, um projecto queampliará o agora “Jardim-Horto” onde a flora“cantada” pelo poeta se dispõe ao longo decanteiros enfeitados com versos, numa íntimarelação entre poesia e natureza.

A designação mais antiga que se conhecedo local onde hoje se situa Constância ter-lhe-á sido atribuída pelos Romanos, numaclara referência à luta do Tejo (Pugna - Tage)com as águas do Zêzere que com ele aquise juntam. Quando os árabes a tomaram,no século XVIII, ter-lhe-ão chamadoAlmorolan, nome que passou para o vizinhocastelo de Almourol.Em 1150, Gonçalo Mendes da Maiaconquistou-a aos mouros e devolveu-lhea designação primitiva, já entãoaportuguesada sob a forma de Pugnete ouPunhete. Admite-se que, cerca de 25 anosantes do desterro de Camões (1546-1547),D. Sebastião aqui se tenha refugiado parafugir à peste de 1569, tendo elevado Punheteà categoria de vila, em 1571.Diz-se que D. Maria II, também encantadacom a beleza da localidade e as paisagensenvolventes, não consideraria estético oseu nome, razão por que não lhe terácustado - por insistência dos liberais (emparticular Passos Manuel que aqui tambémviveu por alguns períodos) e pedido daCâmara Municipal - mudar o nome paraum outro que traduzia a “constância” doapoio de Punhete à causa liberal.Punhete sempre teve - e Constânciacontinuou - a vida intimamente ligada aosdois rios sobre os quais se debruça. PeloZêzere eram escoados (até ao início daconstrução da barragem de Castelo doBode, em 1945), produtos de grande parteda Beira Interior, com particular destaquepara as madeiras do Pinhal. Pelo Tejo

desciam os produtos do Alentejo e doRibatejo Norte, as cortiças, as madeiras,palha, frutos e cereais. De Lisboa chegavamo sal, produtos de artesanato e … as notícias.Numa e outra margem do Tejo, a montanteda vila (mas ainda nos limites do seuterritório), a agricultura ocupava quase todaa população e da terra saía o sustento dosque a trabalhavam, dos senhores, e aindados que, na capital, consumiam grandeparte da produção.Os marítimos - como eram designados osmembros das tripulações dos barcos(varinos, barcos-de-água-acima e outrostipos) que estabeleciam a ligação comLisboa - passavam boa parte da vida emviagens ao longo do Tejo, algumas vezesenfrentando temporais e outras dificuldadesque venciam com esforço e fé na sua santaprotectora, a Senhora da Boa Viagem. Naparte baixa da vila situavam-se as lojas eos armazéns de produtos com destino aLisboa (ou daqueles de lá trazidos), a igrejaonde rezavam antes da partida ou asmulheres imploravam a protecção divinapara os seus homens.Na margem do Zêzere reparavam econstruíam barcos e realizavam convívios,em particular os grandes piqueniques daSegunda-Feira a seguir à Páscoa, datadedicada à Senhora da Boa Viagem.A circulação ferroviária, primeiro e,posteriormente, o desenvolvimento de viasrodoviárias, alteraram os tempos e a vidade muitas localidades, evolução a queConstância não escapou. Os rios perderama importância de outrora, o açoreamentodos seus leitos dificultou progressivamentea navegação, gerações de marítimosextinguiram-se, a agricultura degradou-see a sobrevivência da região passou a basear--se em pequenos pólos industriais e nosserviços. As dificuldades dos temposmodernos exigem sacrifícios e esforçosextremos para enfrentar o futuro com algumoptimismo. No entanto, a história impôsaos constanciences a têmpera que lhespermitirá seguir o lema de que “o difícil, faz--se já, e o impossível … vamos tentar”.

Máximo de Jesus Afonso FerreiraPresidente da Câmara Municipal de

Constância

ESPAÇO CAMÕESE MUSEU DOS RIOS

O actual Jardim-Horto - concebido peloArquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Teles- apresenta um conteúdo delicioso reveladordo profundo conhecimento de Camões emáreas tão diversas como literatura, mitologia,geografia, botânica e astronomia. Instaladonuma pequena área esmeradamente mantidae tratada, confina com um espaço mais amplo,onde existem ruínas (parcialmenterecuperáveis) de dois prédios quase contíguos,um dos quais incorpora o suposto valorhistórico de ter sido sede dos Paços doConcelho, no século XIX.Está em fase de candidatura a fundoscomunitários o projecto de requalificação deedifícios e espaço envolvente - todo ele voltadopara o Tejo - instalando ali um centrointerpretativo do Jardim-Horto bem como oMuseu dos Rios e das Artes Marítimas. Este,possuidor de um interessante espóliodemonstrativo de artes e profissões de temposidos, encontra-se agora na parte alta da vila,num espaço exíguo e pouco acessível e longedo seu ambiente próprio, ou seja, do rio. Asua transferência para o Espaço Camõesproporcionará a acumulação de conteúdosculturais e turísticos, em contexto paisagísticomais adequado, com a consequenteoptimização de recursos físicos e humanosna rentabilização dos investimentos que vierema ser concretizados. O projecto prevê que oacervo do Museu dos Rios e das ArtesMarítimas seja ampliado com uma museografiade ar livre que incorporará objectos comobarcos típicos e respectivos acessórios dasfunções a que se dedicavam.

FRUIÇÃO DOS RIOS

Toda a parte baixa da vila mantém um contactodirecto com os rios que convidam àcontemplação do seu aspecto presente e - compequenas ajudas - facilmente evocam opassado. A foz do Zêzere - onde as águasturbulentas fustigavam e lutavam com o Tejo e,nas rochas da margem oposta, provocavam“um ruído que se ouvia a algumas léguas” - eraa sede dos estaleiros de construção e reparaçãonaval e, em ocasiões festivas, o local das festase convívios. Aí acediam os varinos do maiorporte que podiam arribar o Tejo, então muitomenos açoreado do que habitualmente. Agora,é uma pequena praia fluvial de onde se avistaum moderno Centro Náutico construído na outramargem e cujo acesso obriga a uma longa voltapela ponte rodoviária sobre o rio Zêzere.A poucos metros ficava o palácio do alcaide,junto ao qual se sitia o Porto da Cova, local detrabalhos intensos namovimentação decargas com destino aLisboa. Tendo em contao facto de se localizar na“linha” do “PercursoRibeirinho” e estandoeste em fase decandidatura, admite-seque a implementação doprograma Polis dos Riosvenha a permitir acriação de conteúdosque encaixem noreferido percurso, comoque peças que vãocompletando um puzzleprogressivamente mais

coerente: uma ponte pedonal ligando a regiãodos estaleiros (na foz do Zêzere) ao CentroNáutico, faria deste um equipamento maisacessível, utilizável e auto sustentável, para alémda beleza que emprestaria à paisagem global.Desportos náuticos - em que se destacam asdescidas, em canoa, do Zêzere e parte do Tejo,frequentemente até ao castelo de Almourol -são já uma realidade, podendo sercomplementados com qualidade e recursosmais variados e evoluídos.Simultaneamente, a aquisição e colocação emfuncionamento adequado de um barco típicodo início do século passado (por exemplo, umvarino de porte médio ou pequeno), constituiriamemória desses tempos e práticas, bem comoserviria a fins turísticos, proporcionando passeiosnas regiões navegáveis, da foz do Zêzere e dasecção do Tejo que atravessa o concelho,podendo, eventualmente, estender-se aos doisconcelhos vizinhos.

Constância em 1924. Os barcos varinos ainda navegavam nesta região

Localizado no encontro do rio Zêzere como Tejo, Constância É um município depequenas dimensões, geográficas edemográficas, constituído por trêsfreguesias: Constância, Montalvo e SantaMargarida da Coutada. Possui uma área de80,04 Km2 e cerca de 3815 habitantes ,mais de metade dos quais (52,2%) habitaem lugares e povoações de pequenadimensão (500 a 999 habitantes).

Percurso ribeirinho, junto à Casa-Memória de Camões

Descida do Zêzere, em canoa. Uma actividadedesportiva de importante impacte turístico

Barco típico em estaleiro de construção naval(Museu dos Rios e das Artes Marítimas)

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AGENDA

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CONTACTOS

SEDEAdministração da Região Hidrográfica do Tejo, I. P.Rua Braamcamp, 7 1250-048 LISBOATel.: 211 554 800Fax: 211 554 809

Gabinete Sub-Regional do Oeste(GOE)Av. Engº. Luís Paiva e Sousa, 62500-329 CALDAS DA RAINHATel.: 262 100 630Fax: 262 100 631

Gabinete Sub-Regional do Médio e Alto Tejo (GMAT)Praça Visconde Serra do Pilar, 4, 1º2000-093 SANTARÉMTel.: 243 109 600/1

Pólo de AbrantesRua D. João IV, 332200-397 ABRANTESTel.: 241 100 050

Pólo de PortalegreBairro da Fontedeira, Bloco 1 Cave7300-076 PORTALEGRETel.: 245 100 560Fax 245 100 561

Pólo de Castelo BrancoRua da Fonte Nova, 1Quinta da Fonte Nova6000 -167 CASTELO BRANCOTel.: 272 100 510Fax 272 100 511

Pólo da GuardaGaveto das Ruas Pedro Álvares Cabral e Almirante Gago Coutinho6300-517 GUARDATel.: 271 100 584

FICHA TÉCNICAPropriedade: ARH do Tejo, I.P.Director: Manuel LacerdaEdição: ARH do Tejo, I.P.Design: GPI

0O U T U B R O

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5.ª REUNIÃO DO CONSELHO DE REGIÃO HIDROGRÁFICA

28 de Outubro Auditório da Galeria Municipal do Montijo

Realiza-se já no próximo dia 28 de Outubro, no Montijo, a 5.ª Reunião do Conselho de Região Hidrográfica, órgão consultivo da ARH do Tejo. A reunião contará com a participação da Presidenta da Confederación Hidrográfica del Tajo, Mercedes Gómes. Será apresentada ao Conselho uma comunicação sobre o processo de planeamento desenvolvido em Espanha.

Também será apresentado o ponto de situação do processo de elaboração do Plano de Gestão da Região Hidrográfica do Tejo e do Plano de Bacia Hidrográfica das Ribeiras do Oeste. No âmbito deste processo será apresentada uma proposta de cenarização prospectiva, integrando os diferentes sectores utilizadores dos recursos hídricos. Será ainda apresentado o modelo de participação pública associado ao processo de planeamento. Por último, no âmbito das competências do CRH, serão apresentadas as bases para o Plano de Actividades de 2011 da ARH do Tejo.

QUIKSILVER PRO PORTUGAL - ASP MEN’S 6 STAR EVENT

De 19 a 24 de Outubro Ericeira

Após uma pausa de um ano, a Quiksilver reabre a Ericeira, um dos míticos surf breaks da Europa, para o calendário internacional da World Qualifying Series (WQS). Com o novo formato da Association of Surfing Professionals (ASP), as etapas da WQS ganharam redobrada importância na qualificação dos surfistas para os rankings de elite.

O evento vai reunir os melhores surfistas europeus, como Marc Lacomare, Charles Martin, Patrick Beven, Romain Cloître, Dimitri Ouvré, Miky Picon e Vasco Ribeiro, bem como os grandes nomes do circuito de elite da ASP, como Jeremy Flores e o português Tiago Pires.

14.º EnaSB - SILUBESA

De 26 a 29 de OutubroFundação Dr. António Cupertino Miranda, Porto

Realiza-se de 26 a 29 de Outubro, no Porto, o 14.º Encontro Nacional de Saneamento Básico (EnaSB), em simultâneo com 14.º Simpósio Luso-Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental (SILUBESA), promovidos pela APESB (Associação Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental).

Um evento que tem como objectivo promover a discussão sobre a adaptação e sustentabilidade de serviços de abastecimento de água e águas residuais, apresentar e discutir os conhecimentos e desenvolvimentos científicos nesta área e, finalmente, promover o intercâmbio entre os profissionais do sector.

SESSÃO DE DEBATE SOBRE NAVEGABILIDADE NO RIO TEJO

25 de Novembro de 2010Grande Auditório do LNEC - Lisboa

A ARH do Tejo, em colaboração com a Associação Portuguesa de Recursos Hidrícos (APRH), vai promover uma sessão de debate sobre a Navegabilidade no Rio Tejo, que contará com o contributo de diversos especialistas com larga experiência no sector dos recursos hídricos. Na Sessão pretende-se enquadrar o tema da navegabilidade no contexto histórico e de desenvolvimento, bem como discutir o potencial de utilização do rio como uma via navegável para diversas finalidades. Planeamento de recursos hídricos e navegabilidade, contexto histórico e de desenvolvimento, comptetitividade e condições de sustentabilidade são as grandes temáticas a abordar na sessão de debate que terá lugar no dia 25 de Novembro, no Grande Auditório do LNEC em Lisboa.

SESSÃO DE DEBATE SOBRE ÁGUAE AGRICULTURA

18 de NovembroCentro Nacional de Exposições(pequeno auditório), Santarém

No âmbito do Conselho de Região Hidrográfica, e tendo em conta o processo de elaboração dos planos, a ARH do Tejo em parceria com a Direcção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR), a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) e a Federação Nacional de Regantes (FENAREG) promove o Seminário Água e Agricultura.

A Administração dos recursos hídricos e agricultura, economia da água, e agricultura e ambiente são as principais áreas em debate no seminário que tem lugar, no dia 18 de Novembro, no Pequeno Auditório do Centro Nacional de Exposições em Santarém. Nesta Sessão serão debatidas as expectativas e perspectivas de desenvolvimento do sector e a sua articulação com a gestão dos recursos hídricos.