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INSTITUTO AVANÇADO DE ENSINO SUPERIOR DE BARREIRAS – IAESB FACULDADE SÃO FRANCISCO DE BARREIRAS – FASB CURSO DE DIREITO ADERLAN MESSIAS DE OLIVEIRA INFLUÊNCIA E SIGNIFICADO DAS GÍRIAS DE DETENTOS NO INTERIOR DE UMA CADEIA DA CIDADE DE BARREIRAS NO OESTE DA BAHIA BARREIRAS-BA 2011

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INSTITUTO AVANÇADO DE ENSINO SUPERIOR DE BARREIRAS –

IAESB

FACULDADE SÃO FRANCISCO DE BARREIRAS – FASB

CURSO DE DIREITO

ADERLAN MESSIAS DE OLIVEIRA

INFLUÊNCIA E SIGNIFICADO DAS GÍRIAS DE DETENTOS NO INTERIOR DE UMA CADEIA DA CIDADE DE BARREIRAS NO

OESTE DA BAHIA

BARREIRAS-BA

2011

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ADERLAN MESSIAS DE OLIVEIRA

INFLUÊNCIA E SIGNIFICADO DAS GÍRIAS DE DETENTOS NO INTERIOR DE UMA CADEIA DA CIDADE DE BARREIRAS NO

OESTE DA BAHIA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais – Direito.

Orientador: Profº Ms. Luiz Antônio Fabro de

Almeida

BARREIRAS-BA

2011

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ADERLAN MESSIAS DE OLIVEIRA

INFLUÊNCIA E SIGNIFICADO DAS GÍRIAS DE DETENTOS NO

INTERIOR DE UMA CADEIA DA CIDADE DE BARREIRAS NO

OESTE DA BAHIA

Monografia avaliada e aprovada em _____/______/ 2011, pela comissão formada pelos

seguintes professores:

____________________________________________________

Professor Marcus Vinícius Aguiar Faria, Esp. em Direito Tributário Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB

______________________________________________________

Professora Rosângela Queiroz, Esp. em História Social

Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB

_____________________________________________________

Professor Luiz Antônio Fabro de Almeida Ms em Direito Penal

Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB

BARREIRAS-BA

2011

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Aos meus pais Messias e Vanilda e toda

minha família pelo apoio e compreensão

oferecidos de modo tão espontâneo durante a

elaboração deste trabalho, bem como ao longo

do árduo curso de Direito. Obrigado por me

fazer uma pessoa íntegra e batalhadora!

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo dom da vida e da sabedoria, por me fazer persistir em meus ideais, ainda

que cansado, não me deixou fraquejar.

Ao professor Luiz Antônio por sua dedicação e colaboração constantes na

apresentação de observações e nas orientações desta pesquisa. Graças a sua parceria pude

vivenciar minhas próprias etapas de leitura e escrita, durante o processo de pesquisa

acadêmica. Obrigado pelas sugestões, além da paciência e incentivo na confecção deste

trabalho monográfico.

A professora Rosângela Queiroz, cúmplice deste trabalho. Obrigado por suas

inferências e discussões! A professora da PUC/MG, Giovanna Meireles, que mesmo distante

deu imenso apoio para a produção deste trabalho científico. Obrigado pelas bibliografias.

Saudades...A professora Emília Pignata que revisou a minha monografia. Obrigado!

Agradecimento especial a Luana Fernandes, agente policial, por sempre atender

meus telefonemas e me receber muito bem na delegacia.

Agradeço ainda aos detentos de Barreiras que foram solícitos a esta pesquisa.

Obrigado pela significativa contribuição. Assim também agradeço ao delegado Dr. Joaquim

e aos policiais que também fizeram parte desta pesquisa. Este trabalho só pode ser realizado

porque vocês contribuíram com informações precisas. Obrigado mais uma vez!

A Faculdade São Francisco de Barreiras (FASB), na pessoa do professor Tadeu

Bergamo. Muito obrigado, professor, por fazer parte de minha vida profissional e acadêmica!

Sou muito grato a esta IES por oportunizar-me bolsa integral! Sem este apoio, talvez não

tivesse chegado a conclusão deste almejado curso. A André Bergamo que deu maior apoio

na elaboração dos gráficos e tradução do resumo em língua estrangeira.

A todos os meus familiares, amigos e colegas que contribuíram com palavras e

sorrisos nesta extremada fase de conclusão de curso, em especial Baliza, com quem sempre

desabafei minhas angústias, meu cansaço; Arlan , Márcio, Rogny, Cirlei , Nandinha e

Débora grandes incentivadores e parceiros de espetinhos após as aulas. Agradeço, ainda, ao

meu amigo-irmão, Filipe Sofiati por sempre ouvir minhas lamúrias.

Por fim, agradeço, também, a Elda Petreli, mãezona do curso. Obrigado pelos

conselhos, pelos puxões de orelha e, sobretudo, pelas inúmeras e glamourosas festas que

aconteceram em sua casa.

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Todos vocês ajudaram a escrever mais um capítulo de minha história. Obrigado!!!

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“a linguagem é um instrumento que serve para a intercomunicação”, “a linguagem é um sistema de signos”,

“a linguagem é uma função social”, “a linguagem é uma instituição social”,

“a linguagem é faculdade simbólica”, “a linguagem é uma atividade do espírito”,

“a linguagem é criação perpétua.” (Coseriu)

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RESUMO

Analisa a influência e o significado das gírias de detentos no interior de uma cadeia da cidade de Barreiras no oeste da Bahia. O estudo foi realizado no Complexo Policial de Barreiras com o delegado, policiais e detentos, que teve a finalidade de entender se a gíria criminal empregada no interior das cadeias implica na ação da polícia em combater o crime. A pesquisa objetivou identificar a dificuldade dos agentes prisionais em coibir práticas ilícitas quando não decodifica a linguagem dos criminosos; apontar o papel da mídia na disseminação das gírias criminais no cotidiano do cidadão comum, bem como a criação de um glossário com as principais gírias empregadas pelos apenados de Barreiras. O primeiro capítulo buscou traçar o histórico da gíria em alguns países, apontando a sua existência em alguns registros jurídicos até chegar no surgimento da gíria brasileira. O segundo capítulo analisou a gíria no contexto do Sistema Penitenciário Brasileiro, o processo de formação pela qual passou no grupo marginal, apontando a sua constituição nos níveis linguísticos fonético, lexical, morfossintático e semântico. Por último, o terceiro capítulo. Esse apresentou o resultado das discussões da pesquisa de campo desenvolvida no interior das cadeias da cidade de Barreiras. A pesquisa demonstrou que a linguagem criptológica dos apenados não implica na ação da polícia no combate ao crime, configurando-se em 90% das respostas dadas pelos policiais entrevistados, porém 70% desses afirmaram que ela é um mecanismo de defesa que impede os agentes policiais em decodificar a comunicação daqueles. Em outro questionamento, 70% responderam que a gíria tem implicância significativa apenas em escutas telefônicas e trabalho investigativo. Foi evidenciada na pesquisa que a implicância maior da gíria ocorre no contexto dos presídios, por reunir criminosos de alta periculosidade e por passar um largo tempo em regime fechado cumprindo a pena.

Palavras-chave: Linguagem. Gíria. Sistema Penal. Presos. Agentes Policiais.

OLIVEIRA, Aderlan Messias de. The influence and the meaning of the slang used by the prisoners inside the penitentiary in the City of Barreiras, in western Bahia. Monograph (Law Degree) Faculdade São Francisco de Barreiras, Barreiras-BA, 2011.

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ABSTRACT

Analyse the influence and the meaning of the slang used by the prisoners inside the penitentiary in the City of Barreiras, in western Bahia. The study was conducted at the Barreiras Police Complex by means of sampling with the deputy, cops and the prisoners, having by object to understand if the criminal slang used inside the penitentiary implies in the actions of the police to fight the crime. The research aimed to identify the difficulties of the prison guards in restrain illegal acts when they can´t decode the language used by this prisoners; show the role of the media in disseminating criminal slangs on the regular citizen daily, as well the creation of a vocabulary with the main slangs used by the prisoners of Barreiras. The first chapter has sought to trace the history of the slang in some countries, pointing their existence in some legal records until the emergence of the Brazilian slang. The second chapter has analyzed the slang on the context of the Brazilian Penitentiary System, the formation process that has occurred over marginalized groups, pointing it´s constitution in the linguistic phonetic levels, lexical, morphosyntactic and semantic. At last, the third chapter. This chapter presented the results of the discussions of the field research developed inside the penitentiary of the City of Barreiras. The research has shown that the cryptologic language of the prisoners doesn´t implies on the police actions to fight the crime, presenting in 90% of the answers that were given by the interviewed cops, however 70% said that it is a defense mechanism that prevents the police officers to decode their communication. On another question, 70% has answered that the slang only has a significant imply on wiretapping and investigative work. It was evidenced in the research that the biggest imply of the slang happens on the penitentiary context, for bringing criminals that are highly dangerous to spend a long time locked serving a prison sentence.

Keywords: Language. Slang. Penitentiary System. Prisoners. Prison Guards.

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1: A gíria no contexto das prisões ..............................................................................52

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Gráfico 2: Implicabilidade da gíria no trabalho dos agentes policiais .....................................53

Gráfico 3: Gíria: mecanismo de defesa dos presos ..................................................................54

Gráfico 4: Olhar do Sistema Penal na utilização da gíria no interior das cadeias e presídios do

país............................................................................................................................................55

Gráfico 5: Os empecilhos da gíria na atuação da polícia no combate ao crime........................55

Gráfico 6: A utilização de gírias e a ação da polícia no combate ao crime..............................56

Gráfico 7: Decodificação de gíria criminal ..............................................................................57

Gráfico 8: Preconceito linguístico em relação a gíria criminal ................................................57

LISTA DE DIAGRAMAS

Diagrama 1: amigo....................................................................................................................58

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Diagrama 2: aquele que transporta grande quantidade de droga .............................................59

Diagrama 3: banheiro ...............................................................................................................59

Diagrama 4: cama de cadeia ...................................................................................................60

Diagrama 5: camisinha.............................................................................................................61

Diagrama 6: policial .................................................................................................................61

Diagrama 7: marmitex ............................................................................................................62

Diagrama 8: túnel de fuga .......................................................................................................63

Diagrama 9: lugar frequentado por marginal...........................................................................63

Diagrama 10: celular................................................................................................................64

SUMÁRIO

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INTRODUÇÃO ......................................................................................................................11

CAPÍTULO I

1.0 CONTEXTO HISTÓRIO DA GÍRIA ............................................................................13

1.1 ORIGEM DA GÍRIA EM ALGUNS PAÍSES ..................................................................14

1.2 A GÍRIA DO SUBMUNDO NOS REGISTROS JURÍDICOS .........................................15

1.3 GÍRIA BRASILEIRA: ORIGEM E EVOLUÇÃO ............................................................16

1.3.1 Grupo marginal: linguagem marginal .....................................................................19

1.4 O CÓDIGO DAS CELAS ..................................................................................................20

1.4.1 Gíria de Grupo versus Gíria Comum ..........................................................................23

1.5 GÍRIA: DOS MARGINAIS ÀS CLASSES DE ELITE ....................................................25

1.5.1 A influência da mídia na propagação das gírias marginais ....................................26

CAPÍTULO II

2.0 GÍRIA: A LINGUAGEM NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRA SILEIRO...........30

2.1 PROCESSO DE FORMAÇÃO DA GÍRIA NOS GRUPOS MARGINAIS .....................32

2.1.1 Nível Fonético ................................................................................................................33

2.1.2 Nível Morfossintático ....................................................................................................34

2.1.2.1 Sufixação ......................................................................................................................34

2.1.2.2 Codificação ..................................................................................................................34

2.1.2.3 Invencionice ................................................................................................................35

2.1.2.4 Analogia .......................................................................................................................35

2.1.2.5 Construções verbais .....................................................................................................36

2.1.2.6 Perífrase .......................................................................................................................36

2.1.2.7 Hipérbole ......................................................................................................................37

2.1.2.8 Metáfora .......................................................................................................................37

2.1.3 Nível lexical ....................................................................................................................38

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2.1.3.1 Neologismo, estrangeirismo e empréstimo ..................................................................39

2.1.4 Nível semântico ..............................................................................................................40

2.1.4.1 Uso do nome próprio com sentido especial..................................................................40

2.2 A INFLUÊNCIA E O SIGNIFICADO DAS GÍRIAS NO INTERIOR DAS CADEIAS..41

2.2.1 Dificuldades dos agentes policiais no combate ao crime ..........................................43

2.2.2 Linguagem da malandragem: nova língua ou dialeto? .............................................45

CAPÍTULO III

3.0 ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA ......................................................................49

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE ...........................................................................49

3.2 APLICABILIDADE DO INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ..........................50

3.2.1 Ao delegado titular do Complexo Policial do Município Barreiras .........................50

3.2.2 Aos policiais ...................................................................................................................52

3.2.3 Aos detentos da cadeia de Barreiras ...........................................................................58

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................65

REFERÊNCIAS .....................................................................................................................67

GLOSSÁRIO ..........................................................................................................................71

APÊNDICES ...........................................................................................................................77

ANEXOS ...............................................................................................................................118

INTRODUÇÃO

Um dos desafios enfrentados pelo Sistema Penal no interior das cadeias e presídios do

país é lidar com a linguagem criptológica empregada entre os criminosos. Sabe-se que a

linguagem é capacidade que tem o ser humano de se comunicar e esta comunicação acontece

por meio de uma língua. É por meio da língua que o falante emprega os vocábulos adquiridos

no ambiente a qual está inserido.

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A linguagem criptológica dos detentos é denominada de gíria. Ela é um fenômeno

linguístico especial de um grupo, determinado pelos aspectos sociais, culturais e econômicos.

Neste sentido, o objeto de estudo desta monografia versa acerca da “Influência e significado

das gírias de detentos no interior de uma cadeia da cidade de Barreiras no oeste da Bahia” na

tentativa de identificar as marcas lexicais que formam a consciência desse grupo, sua

autoafirmação na sociedade, bem como a maneira dos agentes policiais lidarem com esse

vocabulário que é próprio dos presos.

O estudo da análise específica da linguagem carcerária de Barreiras possibilitará a

busca de respostas para a seguinte problemática: a gíria, por sua restrição, quando não

compreendida, dificulta a ação da polícia em combater o crime? Acredita-se que a linguagem

tem forte poder de persuasão em todos os âmbitos da sociedade. Quando utilizada como

código específico e que nem todos possam compreender, pode se configurar como um

mecanismo de defesa dos grupos que a detêm.

Nesse sentido, o primeiro capítulo dará atenção especial ao contexto histórico da gíria

em alguns países e, sobretudo no Brasil, apontando como ela tem influenciado no contexto

das prisões e nas implicações jurídicas. O estudo discorrerá, também, sobre o papel da mídia

na propagação da gíria marginal e como ela se ramifica em outras classes sociais.

O segundo capítulo abordará a gíria enquanto linguagem empregada no sistema

prisional brasileiro. Para isso será de grande relevância entender como se dá o processo de

formação da gíria nos grupos marginais. Este processo de formação perpassa exclusivamente

pelo sentido metafórico, figurativo, fugindo totalmente do sentido literal do que a palavra quer

dizer. Assim, a análise deste processo ocorrerá nos níveis fonético, morfossintático, lexical e

semântico.

O terceiro e último capítulo verificará se no interior das cadeias do Complexo Policial

de Barreiras a gíria tem influência negativa no trabalho dos policiais e demais agentes

prisionais. Será feita uma pesquisa de campo em que os sujeitos envolvidos na pesquisa serão:

o delegado, os detentos do referido complexo, como também os policiais que lidam

diretamente com criminosos.

Cumpre dizer que a pesquisa, segundo os objetivos, terá caráter exploratório e será

aplicada por amostragem, isto quer dizer que apenas alguns presos e policiais farão parte deste

estudo. E quanto a natureza dos dados, será quanti-qualitativa, posto trabalhar com

estatísticas e posterior análise destes números, com fundamento no procedimento

bibliográfico metodológico, sendo a literatura subsídio na credibilidade das informações.

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O método a ser aplicado é o indutivo, visto que o estudo proposto consistirá em

investigar um determinado fenômeno, neste caso, a gíria no interior das cadeias da cidade de

Barreiras, na tentativa de se chegar a uma verdade geral, fundamentada nas premissas em

estudo.

Esta pesquisa terá grande relevância para o meio acadêmico, especificamente para as

áreas de Direito e Linguagem, vez que ela trará discussões enriquecedoras tanto do aspecto

jurídico, quanto linguístico. Ao final, será elaborado um glossário com as principais gírias

empregadas pelos apenados de Barreiras, que servirá como fonte de pesquisa para esta e

outras áreas da ciência.

CAPÍTULO I

1.0 CONTEXTO HISTÓRICO DA GÍRIA

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A história da linguagem revela que o ato comunicativo entre as pessoas acontece

mediante o uso de uma língua. Sabe-se que a língua é um traço linguístico da identidade de

cada falante que está inserido em um contexto social, econômico e cultural (PRETI, 2000).

Assim, vendo que a língua é rica, mutável e variável, surge a gíria, fenômeno que nasce da

linguagem restrita de determinado grupo social.

Ao que se sabe, a gíria é oriunda de linguagens especiais, características das classes de

malfeitores. Textos do século XIII apontam alguns traços linguísticos secretos, mas apenas na

segunda metade do século XV que a torna numerosa identificando o sujeito que a fala. As

classes que mais usavam a gíria eram de mendigos, ladrões, assassinos. (CABELLO, 2002)

Cumpre ressaltar que apenas no século XV as classes de malfeitores foram

organizando grupos fora da sociedade e, consequentemente a isso, viviam em constantes

conflitos com ela. Estes grupos eram formados por camponeses que, em estado de miséria,

tornaram-se salteadores, soldados desertores ou saqueadores, criminosos foragidos,

preguiçosos, charlatões, saltimbancos, dentre outros, com necessidades exclusivas de se

comunicar por meio de códigos indecifráveis, na tentativa de não serem entendidos por

indivíduos de outras classes. (CABELLO, 2002)

Pode-se notar, neste contexto, que a gíria originou-se de grupos marginalizados, que,

diante de situações caóticas como a miséria e a exclusão social, foram formando lugarejos, e

com eles a língua restrita também foi se consolidando.

Preti (2000) aponta que em diversos países a gíria remete a linguagem marginal. Na

França, por exemplo, os primeiros vocabulários gírios documentados são oriundos desta

classe social, como também dos mascates e comerciantes.

Como se espalhou de uma língua para outra, a palavra “jargão” mudou de significado e passou a se referir principalmente à linguagem do submundo, um tipo de gíria (como dizemos hoje em dia) que ajudava a tornar a atividade de pedintes, ladrões e vigaristas incompreensível para o cidadão comum. Era uma “antilinguagem” de uma contracultura ou uma linguagem para marginais. (BURKE; PORTER,1997, p.8)

Observa-se que o termo “jargão”, para os autores em questão, tem basicamente o

mesmo sentido da gíria, posto que ela é uma linguagem restrita a um determinado grupo

social. Vale mencionar, ainda, que os estudiosos da gíria comungam de uma mesma ideia:

este falar provém da classe menos favorecida.

Como perceptível, destacam Burke e Poter (1997) que a gíria é decorrente do

submundo1. Entende-se por submundo a existência de grupos marginais como os ciganos e

1 Conhecida como flasc lingo [língua de marginais] ou the slang [a gíria] (o contexto original desse termo).

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judeus. Ressaltam que algumas pessoas, inclusive Lutero2, acreditavam que esta linguagem

derivava dos judeus.

1.1 ORIGEM DA GÍRIA EM ALGUNS PAÍSES

A gíria é um vocábulo característico de todas as épocas e povos, determinada como

linguagem especial, restrita e criptológica de um grupo social. Ela é tipicamente expressa via

oral, no entanto a literatura registra o seu aparecimento no decorrer da história e pontua a

contribuição desta para a formação lexical3 dos grupos sociais na pós-modernidade.

Com base nos estudos de Cabello (2002), a gíria se constitui como linguagem especial,

assim como também o jargão e o calão. Estas linguagens possuem características peculiares.

A gíria é sigilosa, quando de grupo; o calão é expressão de injúria, desabafo, palavrão; o

jargão denota status profissional. Todas elas possuem similaridades, vez que o falante

assume uma identidade grupal e se comunica mediante critérios do grupo a qual está inserido.

Na França, a gíria é conhecida como argot, definida como linguagem dos malfeitores,

ladrões e assassinos, dentre outros. Na Espanha recebe o nome de germanía, significando

‘confraria de ladrões’. Destaca-se, também, o calão, forma derivada do termo espanhol calo,

que significa ‘linguagem dos gitanos’;4 o furbesco, na Itália; a Inglaterra o cant; os Estados

Unidos o slang; a Argentina, o lunfardo; Portugal, o calão e; por fim, o Brasil, a gíria, objeto

de estudo deste trabalho nas suas especificidades. (CABELLO, 2002)

Conforme preleciona Burke e Porter (1997, p.23),

a linguagem dos mendigos, ladrões e outros não é só diferente, é particular, um meio de comunicação que o público, incluindo as possíveis vítimas e a polícia, poderiam ouvir por acaso mas seriam incapazes de decodificar.(grifo nosso) Uma formulação notável dessa teoria do jargão como mecanismo de defesa pode ser encontrada em um documento que afirma registrar o interrogatório de um certo Girolano, preso por mendicância em Roma em 1595, no qual o prisioneiro fala de uma assembleia geral de mendigos convocada para “mudar o jargão” (mutare il gergo del parlare) porque ele se tornara conhecido de um número expressivo de pessoas.

2 Monge que, em 1517, na Alemanha, inicia a Reforma Protestante traduzindo a bíblia para o alemão. 3 Entende por formação lexical a construção de palavras, neste caso, as gírias. 4 Ciganos ou malandros.

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Cumpre arguir que o jargão, para os distintos autores, tem a mesma característica que

a gíria. Vê-se que ela, independente do país e da nomenclatura recebida, tem a mesma

característica e originalidade, embora percorrer caminhos diferentes possui a mesma natureza

e surge através de grupos marginais: linguagem de mendigos e ladrões. Ao observar tais

arguições, constata-se esta verdade, como também ser ela um mecanismo de defesa destes

grupos sociais.

Outro fator relevante e que merece atenção é perceber que neste período a gíria já

tinha o papel de burlar os agentes policiais, no intuito de que não fosse compreendida, o que

dessa forma dificultava a ação da polícia no combate ao crime.

Há que se considerar, ainda, que ao se tornar conhecida, outros vocábulos eram

criados para que a identidade criptológica continuasse resguardada. A esse fenômeno, tem-se

a transformação da gíria de grupo para gíria comum5.

1.2 A GÍRIA DO SUBMUNDO NOS REGISTROS JURÍDICOS

Estudiosos como Beier (apud BURKE e PORTER, 1997) apontam que as gírias

criminais eram bastante perceptíveis nos interrogatórios jurídicos, vez que o réu, na sua fala,

revelava uma identidade linguística criptológica que dificultava a compreensão do ato

comunicativo.

A título de exemplificação, cita o teórico acima o caso de quatro andarilhos presos em

Ilford em 1580. Os detidos eram dois casais dos quais não possuíam documentação alguma e

que viviam fora da lei. Foi identificado que o vocabulário entre eles era restrito e indecifrável.

Vale mencionar que os registros jurídicos desta época mostram que o cant6 era usado

no submundo e apresentava observações gerais sobre o seu uso. Dentre elas, a gíria era um

vocabulário aprendido, ferramenta na atividade de ladrões e mendigos. (BEIER apud

BURKKE; PORTER, 1997)

Nesse contexto, destaca o autor mencionado que o cant possivelmente tenha sido uma

“antilinguagem” gerada por uma “antissociedade”. Halliday (apud BURKKE; PORTER,

5 Item a ser explorado no tópico Gíria de Grupo versus Gíria Comum.

6 Em inglês significa a gíria do submundo dos séculos XVI e XVII.

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1997) argumenta que a gíria do submundo constituía um dialeto social usado para fins

defensivos, forma também de demonstrar insatisfação com a ordem vigente.

Era esta linguagem dos séculos XVI e XVII que relatava o mundo dos criminosos

afastados da sociedade. Os criminosos faziam uso do cant mediante influência de inebriantes,

uma vez que o vocabulário se referia a álcool e tabaco. Registra Beier (apud BURKKE;

PORTER, 1997) que as palavras corriqueiras eram substantivos que aludiam a criminosos,

jogos desonestos, ferramentas para roubo e outros. Conforme o período avançava, a gíria

aumentava suas referências no Sistema Penal.

1.3 GÍRIA BRASILEIRA: ORIGEM E EVOLUÇÃO

A gíria brasileira surge no século XVI no período da colonização, quando chegam ao

Brasil os ciganos, grupos que os portugueses expulsaram por terem costumes próprios. Em

consequência a esta exclusão, os ciganos tiveram que vagar pelos mares, sem destino. Muitos

foram presos nas galés, outros conviveram com vagabundos e bandidos. (PRETI apud

SCHUBSKY, 2008)

Há que se notar que foi através deste contato entre cigano versus bandido que

eclodiram muitas confusões, pois o contato forçado entre eles contribuiu para o surgimento da

linguagem especial, secreta: o calão7.

A palavra “gíria” (argot, em Francês) foi relacionada em 1628 “à confraria dos indigentes, dos mendigos”. Mais tarde, seria definida por Charaudeu e Maingueneu [...] como a linguagem específica de um grupo social que a utiliza, até mesmo como forma de manutenção desse conjunto do qual faz parte. (SEGURA, 2010, p.35)

A gíria surge na classe menos favorecida, como visto historicamente. Foi através das

embarcações-prisões lusitanas que foram abandonados em praias brasileiras os ciganos, os

bandidos e as gírias.

Saraiva (1988) diz que a gíria recebe diversas formas de sinonímia: calão, jargão,

geringonça, astúcia, estratagema, manhas e outras como identidade de um grupo social

restrito.

7 Entende-se calão o mesmo que gíria. Hoje esta palavra é compreendida como palavrão. Por este motivo tem-se a expressão “de baixo-calão”.

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Foi mediante estudos intensos que o referido autor trabalhou com várias obras,

pesquisando enunciados, analisando textos, buscando significados para a linguagem vulgar.

Com base nesse estudo chegou-se ao conhecimento da gíria brasileira, por ela não pertencer

ao grupo de palavras convecionadas, dicionarizadas, conforme pretensão cultural.

Vale mencionar que na literatura há existência do uso da gíria. O clássico “Os

Lusíadas”, de Camões8, possuem, por exemplo, fragmentos que denotam a linguagem

marginal.

Leitores que somos das Obras de Camões, há anos, notávamos que muitos termos encontrados nas Redondilhas, Teatro, Cartas e Os Lusíadas, serviram de gírias, não somente na área dos marginais, mas, também, das elites, em forma despercebida, uma vez que muitas palavras hoje estão dicionarizadas em obras de autores desde o século passado, como Morais e Saraiva, seguindo-se lexicógrafos nessas últimas décadas.(SARAIVA, 1988, p.20)

A título de exemplificação, eis algumas palavras desta obra que registram a presença

da gíria: gostosa, olho do céu, fatal roda, brancas flores, procelosa, mesta, jucundo, dentre

outras.

Desse modo, Camões (apud SARAIVA, 1988) tornou-se um ícone à popularidade

brasileira. Alguns “termos clássicos” que ele usou nos poemas, tornaram-se gírias luminares,

não somente na vida dos marginais, como também do povo em geral.

Outras obras clássicas como a poesia satírica de Gregório de Matos Guerra, no século

XVII, registraram o uso de gírias. Adiante, pode-se citar, também, Aluísio de Azevedo, no

romance, “O Cortiço”, lançado no Rio de Janeiro, em 1890. (SARAIVA, 1988)

A referida obra deu sequência ao registro literário da gíria carioca. Dada a natureza do

seu tema, percorrendo algumas páginas do livro encontram-se facilmente as marcas

linguísticas que denotam a especificidade da gíria: “A Rita Baiana era muito aperreada pelos

homens, por causa de sua sensualidade”; “A intenção do malvado era dar cabo da pele”; “A

febre daquela inveja lhe estorricava os miolos (grifos nossos)”. (JORNAL da Gíria, 2004)

Outro meio de comunicação que teve papel fundamental no registro de gírias foram os

jornais como: A Gazeta de Notícias, O Jornal do Comércio, O País, O Jornal do Brasil e,

principalmente o Correio da Manhã. É no contexto histórico da impressa e em sua

modernização que surge uma série de tabloides de caráter obsceno, os quais tornaram-se

conhecidos pelo nome genérico de imprensa fescenina. (PRETI, 2000, grifo do autor)

8 A obra de Camões, “Os Lusíadas”, tem grande representatividade na consolidação da Língua Portuguesa no

Brasil.

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Nota-se que foi mediante esta linguagem livre que se incorporou a gíria, pelos

vocábulos dúbios, metafóricos e maliciosos. O Coió, que era jornal semanal surgido em 1901,

apontava narrativas de versos de motivos libertinos, comentários de fundo crítico humorístico,

piadas, charadas, e outros com teor linguístico restrito. Ao que se ver é a disseminação da

gíria de determinado grupo social, deixando ela de ser criptologia a comum.9 (PRETI, 2000)

Nesse diapasão é possível afirmar que a gíria brasileira passou a ser comprovada em

textos escritos do jornalismo popular.

Além da literatura, do jornalismo, a gíria teve seu apogeu, também, na música. Ela

aparece em meados da década de 30, com a figura sambista do morro, conforme apregoa Preti

(2000).

Noel Rosa (apud PRETI, 2000, p.62) foi o primeiro a valorizar esta variante

linguísitica:

A gíria que o morro criou Bem cedo a cidade aceitou

e usou. Essa gente hoje em dia

Que tem a mania de exibição Não se lembra que o samba

Não tem tradução no idioma francês. Tudo aquilo que o malandro pronuncia

Com voz macia É brasileiro,

Já passou de português (Noel Rosa, Não tem tradução, 1936)

Como perceptível, as canções poéticas corroboraram para um crescimento expressivo

no uso de gíria nas grandes metrópoles, como por exemplo, Rio de Janeiro. A partir da música

popular brasileira, outros meios foram contaminados por esse linguajar, como o cinema, o

teatro, a rádio, a televisão, a propaganda e o futebol.

No ramo jurídico, o vocabulário gírio tornou conhecido na primeira década do século

XX. O primeiro registro que se tem é do discurso de Rui Barbosa10, em que dizia; “o inquérito

não nos diz se lhe suspenderam, por cima ou por baixo, a figa do costume contra a

urucubaca.” 11(PRETI, 2000, p. 69, grifo nosso) Este termo, neste contexto, refere-se a azar.

9 Discussão dos próximos itens.

10 Um dos intelectuais e organizador da República e coautor da constituição da Primeira República juntamente com Prudente de Morais. Foi primeiro Ministro da Fazenda do novo regime, marcou sua breve e discutida gestão pelas reformas modernizadoras da economia. Destacou-se, também, como jornalista e advogado. 11 Urucu – fruto do qual os indígenas retiravam uma tinta vermelha; aca – malcheiroso; babaca.

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A expressão urucubaca, pelo nível semântico, apresenta mais de um significado: pode

se configurar na epidemia de gripe espanhola, como em grande azar. Assim, vê-se que as

gírias apresentam mais de um significado, a depender do grupo social e do contexto.

1.3.1 Grupo marginal: linguagem marginal

Como se vê, diversos são os grupos sociais presentes em uma sociedade. A existência

do grupo marginal como já apontado no contexto histórico, origina-se de pessoas excluídas da

sociedade, como também por pessoas que praticam atos ilícitos, a exemplos de roubos e

assassinatos.

Elias (apud OLIVEIRA, 2006, p.12) afirma que “o grupo marginal constitui um grupo

primário, pois nele se observa todo tipo de comportamento corporativo. A cada membro não

são executadas por um só indivíduo, mas pelo grupo e, desse modo, eles requerem uma

divisão de trabalho.”

Dentro de um grupo marginal, o que prevalece não é a vontade própria, mas sim o

interesse da coletividade.

No interior de um grupo, formam-se normas sobre aspectos da aparência física, como tatuagens pelo corpo, brincos, etc..., e do comportamento, como entonação de voz, modo agressivo de agir, cujo principal objetivo é identificar o indivíduo como membro do grupo. Elas ajudam, pois, a definir o grupo e a estabelecer status do indivíduo em uma sociedade maior. (ELIAS apud OLIVEIRA, 2006, p. 13)

O autor em questão deixa claro que o mundo destes indivíduos é bastante fechado e

que eles possuem leis próprias, dentre elas: a linguagem gíria.

Ao que se sabe, a gíria refere-se a atividades marginais, de baixo prestígio, ignorada pela

norma culta, no entanto, tida por seus falantes como mecanismo de defesa.

A gíria, signo de grupo restrito, além de marcada pelo estigma de origem, conduz a uma leitura do mundo específica do falante. Muitas vezes ela chega a estampar a miséria, a insegurança, a humilhação, a revolta contida, a insatisfação, o medo, a opressão, a rebeldia, o desprezo, a mágoa pelas injustiças sociais, enfim, um conflito de contrariedades, verdadeiro mecanismo social de defesa e também de agressão. (CABELLO, 2002,p. 178)

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Como perceptível, esse linguajar é carregado de agressões que marca denúncia e

oposição de valores. Sua principal característica é a metáfora, ou seja, a carga semântica da

palavra aponta outra conotação que não o seu sentido literal. Assim há uma substituição

consciente da denotação por um conteúdo de representação.

Na gíria do Sistema Penitenciário é comum encontrar vocábulos desta natureza, como

pipa (bilhete enviado ao juiz de Direito), macaca (metralhadora), jacaré (aquele que assalta

os próprios companheiros de cela), perereca (fogão de esquentar comida), passarinho

(informante), faculdade (penitenciária), amor de mãe (preso abusado na cadeia), cavala

(mulher bonita), cimento (cocaína), cabrito (veículo adulterado; detendo que é obrigado a

manter relações sexuais com outros presos). (SEGURA, 2010, grifos nossos)

Outro elemento que merece destaque na linguagem marginal é a transposição de

número para o preso, ou seja, empregam artigos do Código Penal para atribuir ao crime que o

apenado cometeu. Um dos mais famosos são um-sete-um, que classifica o estelionato e o

doze, identificação de traficante. (SEGURA, 2010, grifos nossos)

Dada estas colocações, pode-se chegar a algumas características da gíria brasileira:

linguagem altamente conotativa; emprego de termos com sentido especializado; depreciação de seres, valores e instituições advindos da sociedade dominante; gosto por formas ritmadas; predileção por palavras-eixo (bastante concretas) e por conceitos-eixo (relativos à prostituição, ao dinheiro, ao jogo, ao roubo, ao tóxico etc). (CABELLO, 1991, p.50)

Com isso, vê-se que a linguagem marginal é totalmente criptológica e funciona como

elemento de autoafirmação dos seus falantes, como também veículo de comunicação que os

defende e os preserva de outros grupos sociais.

1.4 O CÓDIGO DAS CELAS

Como perceptível, é no grupo que a linguagem, enquanto capacidade que o sujeito tem

de se comunicar por meio de uma língua, se consolida. A prisão é este espaço físico que

corrobora na consolidação da gíria, enquanto unidade linguística deste grupo social.

Para Preti (apud REMENCHE, s/a, p.1),

a língua é um elemento de interação entre o indivíduo e a sociedade, pois é um fato social que está a serviço da vida social. É viva, flexível e evolui junto com o homem. A sociedade tem o poder de aceitar ou repetir determinadas

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transformações por não ser apenas um instrumento de comunicação, mas também um elemento cultural revelador da visão do mundo de cada comunidade.

Assim é possível dizer que a linguagem dos presos está relacionada à influência do

ambiente físico e sócio-cultural, características imprescindíveis que marcam a linguagem

desse grupo que a sociedade ignora.

Assevera Preti (apud REMENCHE, s/a) que os membros de um determinado grupo

fechado fazem questão de se diferir dos demais, posto que a gíria, enquanto código linguístico

específico, torna-se um mecanismo de defesa.

Segundo Costa (2002), os agentes policiais e diretores de delegacias começam a se

preocupar com o grande vocabulário indecifrável dos presos. Afirma o referido autor que tal

linguagem é uma espécie de manobra para despistar os policiais e quando torna

compreensível, refaz outro vocabulário, atribuindo nova semântica às palavras e expressões.

Fica claro que esse linguajar é mal intencionado, pois visa a continuidade do crime mediante

uso de gírias.

Nesta preocupação, que o Sistema Penal tem arquivado cartas e bilhetes de presos

quando desconfiam da mensagem. Diante desta problemática alguns agentes policiais têm se

passado de presidiário na tentativa de identificar as especificidades das gírias para,

posteriormente, decodificá-las. (COSTA, 2002)

A título de exemplificação, basta observar a linguagem narrada no livro Estação

Carandiru, de Dráuzio Varela: “Quem por último chega, rói o pescoço. Não tem o que

perguntar, já vai se aninhando ao lado do boi. Só sai dali no dia que entrar mais um recruta.”

(VARELA, 1999, p. 40, grifo nosso)

Percebe-se no fragmento acima que o vocábulo “boi” é uma gíria específica do grupo

com outra carga semântica, ou seja, o sentido da palavra é metafórico, sem nenhuma relação

ao seu aspecto denotativo. Apenas por um estudo mais aprofundado para identificar que

“boi”, no contexto da gíria, se refere ao vaso sanitário, especificamente.

Em outra passagem tem-se: “uns poucos privilegiados penduravam redes no alto e

pairavam acima dos demais, conhecidos como morcegos”. (VARELA, 1999, p.161, grifo

nosso) Nesta sentença a palavra “morcego” já é conceituada pelo autor.

Para Segura (2010, p.35-36),

vários são os exemplos desse processo, mas destacam-se os ligados às drogas. Quanto à maconha, encontram-se “a boa” (de boa qualidade), “bagulho” (a de qualidade ruim, mas que pode também significar apenas a droga, por

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esvaziamento de sentido), “beque” (quando já vem no formato de cigarro), entre diversas formas como “fino”, “haxixe”, “lasca”, “pepita”, “tarugo”, “tablete”, “tijolo”, e outras. Em relação à cocaína não é diferente: “batizada”, “brilho”, “brizola”, “brize”, “farinha”, “poeira”, “sal”, “jesus”.

Percebe-se que muitos são os vocábulos criados pelos presos e que estes, em sua

maioria, estão ligados ao vício.

Para Lurdes (apud SEGURA, 2010), alguns desses processos são bastante curiosos,

como a construção de “branca”, analogia à cocaína e “brizola” por referir-se à filha de Brizola

que foi presa por portar cocaína.

Acerca da analogia pode-se observar o seguinte fragmento: “aí, ladrão, você na tranca

e ela lá fodendo com o Ricardão”. (VARELA, 1999, p. 163, grifo nosso) O vocábulo

“Ricardão” faz alusão ao homem que se relaciona com mulher casada, vocábulo que já faz

parte de outros grupos sociais, propagada por meio da mídia.

Para Preti (s/a, p. 2-3),

hoje, com a grande divulgação da informação, com a presença atual da mídia, a gíria se vulgariza muito rapidamente, assim como rapidamente se extingue e é substituída por novas formas. Essa efemeridade é uma das características mais presentes no vocabulário gírio e, de certa maneira, identifica-o com a grande mobilidade de costumes da época contemporânea. E, talvez, por esta constante dinâmica é que a gíria tornou-se tão utilizada em nossos tempos.

É visível que a mídia é a grande influenciadora na divulgação da gíria. A título de

exemplificação, têm-se os programas e filmes. “O volume dos gritos aumentou, e explodiu a

revolta das amigas e parentes de Osmar. – O senhor disse que era papo reto. – Não uso

vocabulário de traficante, rapaz! Cabo _ chamei _, leva o preso pra viatura. Vamos embora.”

(SOARES, 2010, p.252, grifo nosso)

O fragmento acima destaca como gíria o vocábulo “papo reto”, do livro “Elite da

Tropa 2”, que se tornou filme, pontuando claramente como os meios de comunicação de

massa têm disseminado este linguajar.

Na edição 2191 da revista Veja, de 17 de novembro de 2010, a matéria especial tinha

como título “Cabeça de Assassino” trazendo falas de 40 (quarenta) homicidas para saber por

que, e em que momento praticaram os mais absurdos crimes. Nas falas, é evidente a marca

linguística que caracteriza a gíria.

Coura (2010, p 97) traz a fala de Marcelo, 27 anos, condenado por latrocínio em Santa

Catarina:

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“Eu queria roubar o carro, mas o cara (grifo nosso) partiu para cima de mim. Então, matei. Eu estava monitorando aquela casa já fazia um tempo. Meu plano era entrar, pegar a chave do carro e ir embora. Mas ele me viu e partiu pra cima. Eu nem estava armado. Vi uma faca na cozinha, foi um instinto de defesa. Naquele momento de apavoro, de nervosismo, dei dez facadas (grifo do autor) no peito e no pescoço.”

É possível perceber na fala acima que a utilização do vocábulo “cara” tornou-se

comum em todas as camadas sociais. Assim, pode-se dizer que ela perdeu a sua marcação

diafásica12, uma vez que é empregada em diversas situações comunicativas.

Santos (2007, p. 7) diz:

É interessante pensar que esse estranhamento não ocorreria, ou pelo menos não de forma tão evidente, se o mesmo professor dissesse “este mês fiquei sem grana (grifo do autor)”. Ou ainda, dirigindo-se ao filho “Cara (grifo do autor), vem aqui agora.” Isso ocorre porque as ditas gírias comuns grana e cara (grifos do autor) parecem estar perdendo, inclusive, sua marcação diafásica, o que implicaria não serem mais gíria comum.

Vale arguir que a gíria comum é aquela em que o vocábulo deixa de ser específico de

um grupo, mediante a divulgação dos meios de comunicação de massa, bem como pelo uso

frequente desta. Em contrapartida, a gíria de grupo ainda é forte nos presídios, pois ela

continua a ser um mecanismo de defesa.

1.4.1 Gíria de Grupo versus Gíria Comum

A gíria está presente dentro de um dos fenômenos denominados sociolinguística. A

sociolinguística é a ramificação da linguística que se preocupa em estudar a língua e a

sociedade, ou seja, a fala do indivíduo é determinada pelo aspecto social em que está inserido.

(OLIVEIRA, 2006)

Sob esta ótica, Preti (apud SANTOS, 2007) aponta dois níveis cruciais que definem a

linguagem dos presos: a gíria de grupo e a gíria comum.

A primeira nasce dentro das celas, mediante grupos restritos, cujo comportamento se

afasta da maioria. Ela é tida como linguagem de identificação e de defesa, que, além de

12 Variação linguística situacional. Adequação da linguagem de acordo com o ambiente.

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manter a comunicação entre eles, protegem-se dos agentes policiais que não conseguem

decodificar este vocabulário e, consequentemente, não podem agir. Nos grupos marginais, as

atividades ilícitas estão quase sempre ligadas a drogas e violência por meio de um léxico

específico e indecifrável.

Para comprovar tais colocações, basta observar alguns vocábulos trazidos por Inellas

(2000), em seu dicionário de expressões criminais e linguagem policial. Só a palavra

maconha (grifo nosso) tem diversas gírias: baseado, fininho, bagulho, pacau. Assim, é

possível notar que a gíria também varia de lugar para lugar, pois cada grupo cria códigos

específicos de acordo com sua realidade.

Preti, (apud SANTOS, 2000) salienta, também, a gíria comum. Ela ocorre quando é

amplamente difundida pelos meios de comunicação de massa, deixando de ser específica de

um grupo.

É o caso de palavras encontradas diariamente na conversação, na mídia, até na imprensa escrita, perdida a própria consciência de sua origem gíria: legal, bárbaro, bronca, grana, etc. Em outras épocas elas estiveram ligadas ao vocabulário de grupos restritos e, hoje, vulgarizam-se, banalizam-se na linguagem espontânea do dia a dia. Tornaram-se o que poderíamos chamar de gíria comum. (PRETI apud SANTOS, 2000, p. 04)

A gíria comum, como vista, se populariza, tornando para especialistas no assunto a

criação de dicionários, por exemplo.

Preti (2000) alude que a organização de dicionários de gíria nem sempre é formulado

pelos linguistas e lexicógrafos13. É comum os autores serem pesquisadores como agentes

policiais, outros, apaixonados por sua linguagem. A contribuição maior para sua elaboração

decorre do trabalho de jornalistas que realizam matérias exclusivas. É dessa maneira que se

propaga, em grande maioria, os vocábulos das prisões.

Com isso, Guiraud (apud CABELLO, 2002) coloca que vulgarização do vocabulário

secreto dos criminosos extrapola o uso restrito para usuários comuns. Quando isso acontece,

os presos sentem necessidade de criar novas gírias. Ao que se vê a gíria é uma expressão que

envelhece e que é substituída por outra. Aquelas que foram difundidas em determinado

ambiente são propagadas na linguagem corrente, enriquecendo o léxico comum.

A gíria comum passa a ser comungada por outras pessoas de qualquer grupo social.

Como exemplo, vale observar alguns vocábulos como vazar, deu zebra, descascar abacaxi,

13 Entende-se lexicografia como a técnica de redação e feitura de dicionários.

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Ricardão, cara, grana, comer água, zuada, tá ligado, matraca, barão, na lama, e tantas

outras gírias. Elas já fazem parte do vocabulário das classes e grupos sociais distintos.

(LARIÚ, 2007, grifos nossos)

1.5 GÍRIA: DOS MARGINAIS ÀS CLASSES DE ELITE

Dentro das discussões, gíria de grupo versus gíria comum, é possível perceber que a

linguagem dos marginais é divulgada e proliferada pelos meios de comunicação de massa,

fazendo com que outros grupos sociais não só tenham conhecimento sobre esta linguagem

como também passam a fazer uso dela.

A sociedade moderna recebeu e divulgou esse vocabulário, aliás, advindo de marginais, mas, sem agressividade etimológica. O escritor Dino Preti, numa obra publicada sob os aspúcios da Universidade de São Paulo, informa que “é claro que essa agressividade expressa por certos vocábulos gírios, por uma natural evolução semântica, por uma limitação de contexto ou por um desgaste natural de linguagem pode perder-se ou transformar-se em elemento afetivo de carinho e intimidade entre falantes. (SARAIVA,1988, p.10)

Assim, vê-se que o vocabulário gírio sai das celas para dominar as ruas e mídias do

país. Vale ressaltar que todos os grupos sociais possuem linguagem específica, e boa parte

oriunda da classe marginal.

É claro que a expansão desses termos para a linguagem comum depende da mídia, responsável por eleger os termos que ultrapassarão fronteiras territoriais e se cristalizarão na linguagem das pessoas. Nem todas as gírias, entretanto, alcançam o público comum, e isso as torna, em geral, pouco valorizadas. Por serem ligadas a grupos marginais à sociedade passam a ser também a sua marca. E é nesse contexto que encontramos as gírias do crime. (SEGURA, 2010, p.35)

Para ilustrar a extensão da gíria a outros grupos sociais, tome-se como exemplo a

classe universitária. Pode-se mencionar a espontaneidade de universitários que utilizam

termos de gíria e de palavrão em enunciados como:

Nas férias, quero fazer uma puta viagem, onde o vocábulo “puta” tem sentido intensificador. Oh, merda, não encontrei a sala. “Merda” configura-se como forma de desabafo.O baterista é o maior fodão. “Fodão” carrega um sentido positivo, verdadeiro.(CABELLO,2002, p. 179)

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São com estas colocações que os jovens de todas as classes sociais se comunicam. Não

há diferenças hierárquicas que definam se este ou aquele linguajar é de determinada classe,

vez que ela já está culturalmente consolidada. O que se sabe é que a elite faz parte deste

contexto.

Não se pode esquecer que um arsenal midiático não promove apenas a gíria, mas

também os piores bandidos, a exemplo de Fernandinho Beira-Mar considerado a

personalidade importante do crime que a mídia fez questão de destacar.

É pertinente destacar que a gíria perpassa hoje por todos os meios de comunicação,

seja no cinema, teatro, televisão, rádio, propaganda, como em grandes esportes, futebol,

centros de diversão, como o “mundinho” noturno e as casas de danças criaram seu

vocabulário típico, às vezes códigos indecifráveis, que passam por constantes transformações,

na tentativa de manter a originalidade e preservar o signo identificador do grupo social.

(PRETI, 2000)

1.5.1 A influência da mídia na propagação das gírias marginais

A expansão da gíria marginal para a linguagem comum se deve ao fato de a mídia

selecionar os termos que ultrapassam os presídios, como também favelas, e se cristalizam na

fala dos cidadãos. Vale dizer que nem todos os vocábulos alcançam o público comum,

ficando restritos apenas ao grupo marginal enquanto marcador da sua identidade.

No entanto, é interessante dizer que atingir este nível não significa dizer que a gíria

atingiu seu prestígio, mas que ela se vulgarizou fazendo parte da vida das pessoas, num

contexto de ridicularizar um fato, bem como gerar efeito de humor.

Discussão polêmica é a inserção de algumas gírias da nova edição do dicionário

Aurélio. Os vocábulos “piriguete”, “Ricardão” e “balada”, por exemplo, foram recentemente

universalizados os conceitos e dicionarizadas.

Um dos termos mais curiosos que entraram nessa nova edição foi o termo 'periguete', muito utilizada na Bahia e que ganhou o Brasil, mas que teve origem na periferia de Salvador. A expressão 'periguete', que é mais usada na versão 'piriguete', é fruto da junção das palavras "perigosa" e "girl" (garota em inglês). Como a pronúncia ficaria um pouco estranha, passou a utilizar o guete e estava feita a adaptação. (GALVÃO, 2011, p.02)

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As expressões mencionadas, oriundas da classe marginalizada, favelas e prisões, são

propagadas pela mídia, a exemplo de “piriguete”, música da banda Pagod’Art, de

Salvador/BA, intitulada “As piriguetes chegaram”, que disseminam um linguajar pejorativo

que ridiculariza e orotiza a figura feminina. Eis um trecho que sintetiza o seu conceito:

Tem piriguete dizendo que não sabe o que é piriguete! Então, eu vou lhe dizer o que é: Primeiro, irmão, eu quero dizer que a gente do pagode não vive sem as piriguetes! Então, a gente fez uma música pra elas...A piriguete é o seguinte... A piriguete é aquela mulher que tem o fogo muito alto, sabe? Que toma o homem da amiga, o namorado da amiga... às vezes ela toma, né? E quanto mais homem pra elas melhor ...Essas são as piriguetes..." (PAGOD’ART apud GALVÃO, 2011, p. 03)

Pelo que se percebe, a gíria da marginalidade propagada por diversos meios de

comunicação de massa está dominando as ruas e a mídia, influenciando, desse modo, as

pessoas na sua utilização.

No que compete ao dicionário Aurélio (apud GALVÃO, 2011, p. 02), a expressão

piriguete significa “moça ou mulher que, não tendo namorado, demonstra interesse por

qualquer um”. Ao que se vê, este conceito é bastante harmonioso, pois na visão de cada

pessoa, vários são os significados, sobretudo para a classe masculina.

Nesta classe, a concepção tida é de mulher “gostosa”, que usa short curto, marquinha

de sol à mostra, que está em toda festa, sobretudo de pagode. Muitos, ironicamente brincam

ao afirmar que só saem com elas quando ninguém percebe que eles estão juntos, pois, no

senso comum é “queimação de filme”.

Além do termo “piriquete”, outro de destaque no dicionário é “Ricardão”. Termo

bastante utilizado nos filmes e obras como “Estação Carandiru”: “tu bateu no meu

reconhecimento, maluco. Descolei que você é o Ricardão da minha mulher. Agora vai

morrer!” (VARELLA, 1999, p. 61, grifo nosso)

Esta expressão torna-se comum no dia a dia das pessoas quando elas querem se referir

ao amante da mulher casada.

Já o termo 'Ricardão', retrata a figura do amante da mulher casada. Aquele cara que está à disposição da mulher a qualquer hora, em qualquer lugar; o rei dos carinhos, com paixão e entrega total; faz o tipo amante latino, capaz de passar noites em claro ardendo em fogo abrasador e inesgotável.Ele nunca mente para a mulher (a sua mulher), ao contrário, ele revela verdades convenientes e omite tudo o que você adora dizer nas intermináveis brigas de casal. (GALVÃO, 2011, p. 03)

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Nesse sentido, vale dizer que a expressão “Ricardão” deixa de ser gíria de grupo e

passa a ser gíria comum. Adiante, perde-se na história da língua a característica de gíria, vez

que ela dicionarizou-se.

Cumpre ressaltar que na consolidação destes conceitos, a mulher perde vantagem e o

homem a ganha. Analisando melhor tais vocábulos, percebe-se que o termo “piriguete”

sensualiza e denigre o sexo feminino, ao passo que “Ricardão” ficando com a mulher de

outro, tem a fama de galã, sedutor, ou, no senso comum “pegador, garanhão”, o que

caracteriza, na sociedade, como aspecto positivo.

Por último tem-se o vocábulo “balada”, entendendo-se como refúgio do jovem que

busca a felicidade em festas noturnas.

É na balada que os jovens descarregam os cansaços, desgostos, a falta de bom senso. É curtir os amigos, conhecer pessoas, esbarrar no amor, ser livre por um instante fazendo algo que agrade, deixar a música levar o corpo para um estágio de prazer. O que nunca pode faltar é alegria e responsabilidade. (GALVÃO, 2011, p. 04)

Na Bahia expressão dada para este contexto é “reggae”.

Após fazer uma breve análise das gírias dicionarizadas, é possível afirmar que outras,

mesmo não dicionarizadas são divulgadas e utilizadas em todas as classes sociais.

Na visão de Caradec (apud SANTOS, 2007), quando a gíria passa pela vulgarização e

é dicionarizada, deixa de ser gíria, pois no momento em que ela é propagada, os seus usuários

necessariamente substituirão por outra a fim de garantir os interesses do grupo que a utiliza.

Saraiva (1988) é extremamente categórico ao arguir que a gíria não está ligada apenas

aos marginais, bandidos, malandros, ladrões, como também às pessoas cultas e da elite, ou

seja, governadores, políticos, magistrados, escritores, professores espotistas e tantos outros

estão sujeitos à utilização de gírias, vez que ela está nitidamente exposta em todas as

atividades humanas quer cívica, patriótica, quer dentro de um sistema sócio-cultural e

financeiro.

Dessa forma, com a grande divulgação da informação e a presença massissa da mídia,

a gíria que se vulgariza rapidamente, também um dia cai em desuso e novas surgirão. É nessa

efemeridade do léxico que se caracteriza a gíria na sociedade.

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CAPÍTULO II

2.0 GÍRIA: A LINGUAGEM NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRA SILEIRO

Cada vez mais o discurso dos criminosos tem se disseminado no interior das cadeias

do país e dominado os apenados a fazer uso dela como linguagem obrigatória e decisiva na

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comunicação entre eles. Dessa maneira surgem as ideologias do crime, cujas ideias estão

pautadas em luta popular. Estas ideologias são mantidas por criminosos em seus grupos

restritos, organizados e dispostos a praticar a violência para alcançar seu objetivo.

O sistema policial tem ido “à caça” de vocábulos e expressões gírias no combate à

criminalidade, pois ela tem sido poderosa arma aos bandidos. Nesse sentido os agentes

policiais têm construído glossários e até dicionários com a linguagem dos presos.

Identificando o código das celas fica fácil a polícia combater a criminalidade.

Merece destaque também, o frequente uso de gírias referente ao Código Penal. Diz o art.

213 do referido código

Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos. § 1o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18 (dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos: Pena - reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos. § 2o Se da conduta resulta morte: Pena - reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos. (BRASIL, 2010, p. 532)

Neste artigo, pode-se ver que boa parte dos presos usa determinados vocábulos para

referir-se ao crime cometido. Neste, é comum o uso da palavra duquetreze para classificar o

estuprador. (REMENCHE, s/a, grifo nosso)

É comum no campo semântico14 a predominância de vocábulos nos sistemas

carcerários do país fazendo alusão a crimes, drogas, sexos, dentre outras.

Remenche (s/a, p. 2), em um estudo acerca da linguagem do Sistema Penitenciário, fez

a seguinte análise vocabular:

No campo semântico, preponderante na análise do vocabulário dos internos do Sistema Penitenciário, destaca-se o sexo numa alusão às praticas homossexuais em termos como franchão, franchone, puto, oco, mãe, maezona, maricona, piá, menina, mona, dormir no braço, além do duquecatorze (grifo do autor) (estuprador de homem) em franca alusão em duquetreze (grifo do autor), ou seja, o artigo 213 do Código Penal que classifica o estuprador. Além desses vocábulos registram-se outros que nomeiam relações sexuais tanto hétero como homossexuais: soca porva e traçar (grifo do autor).

Além destes vocábulos, como bem pontua o referido autor, outros levam à

preocupação dos agentes policiais, quando se referem à violência, por exemplo. Vê-se, desse

modo, que os vocabulários gírios desta natureza dominam as celas das cadeias do país. O que

14 Parte da gramática que se preocupa em estudar o sentido das palavras em uma língua.

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é pior para os profissionais responsáveis pela segurança é a variação linguística destas gírias,

pois cada lugar possui uma característica própria.

Os policiais precisam compreender, por exemplo, o significado das gírias referentes à

violência, como: berro, cano, draga, máquina, três-oitão (grifo do autor) (armas de fogo) e

bicuda, estoque, espin, lampiana, rita , chico doce (armas brancas). Para se referir à polícia

é gambé, mango, samango, porco, pé-de-porco, pé-preto, zalibã, funça, escravo, lousa,

além de grampo para algema, sapo para cadeado e vaca para sirene. (REMENCHE, s/a,

grifos do autor)

Se os policiais não tiverem certo conhecimento acerca deste vocabulário, não é

possível combater o crime, uma vez que a comunicação entre os apenados não é

compreensível a outros grupos sociais, o que facilita, desse modo, as organizações criminais.

Segundo Popó (2005) o dia a dia nos presídios tem se tornado tarefa muito difícil para

os profissionais, pois além de terem que conviver com a criminalidade, ainda convivem com

uma linguagem indecifrável que implica na ação da polícia. Ressalta o referido autor que em

Uberlândia, de cada 10 (dez) presos, acusados de crimes que vão de um simples estelionato ao

latrocínio, roubo seguido de morte, seis deles falam por meio de gírias, específico de um

vocabulário das favelas e periferias, como também das próprias prisões.

Para elucidar esta questão, Varella (1999, p.35) aponta em seu livro “Estação

Carandiru” a fala de um apenado: “é tudo cabeça-de-bagre, doutor. No meio de uma bagunça

daquelas, deixar os funças (grifo nosso) ir embora e ficar só os presos dentro do pavilhão é

pedir para a PM invadir.” O vocábulo funças refere-se a policial. Tal vocábulo, quando não

compreendido, possibilita aos presos, por exemplo, organizar rebeliões.

Agentes policiais têm se precavido dos atos linguísticos dos apenados. Como garantia

do trabalho, criam glossários que possibilitam interpretar a comunicação entre eles.

A linguagem do crime se proliferou de uma certa forma que, no Rio, um agente de polícia elaborou um dicionário só de palavras colhidas no meio da bandidagem.O autor do glossário é o delegado federal Lorenzo Pompílio da Hora. Professor de Direito Penal, o delegado prepara uma tese de doutorado sobre o tema para a cadeia de Educação da UFRJ. (POPÓ, 2005, p.1)

Estudar esta linguagem não é tarefa fácil. Exige do pesquisador muita cautela para que

tal pesquisa possa se realizar, pois os detentores têm nela um mecanismo de defesa.

Para Preti (apud ANDRIGUETTO, 2006, p. 19)

O uso de gírias por policiais nas delegacias deve-se, fundamentalmente, à exigência da lei. Ao tomar os depoimentos dos indiciados em inquéritos policiais, aqueles profissionais devem relatar os dados exatamente na língua

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falada. Desse modo, aprendem e começam a fazer uso dos mesmos vocábulos, em sua grande maioria as gírias empregadas pelos marginais. Naquele ambiente de delegacia, entre o atendimento às vítimas dos mais variados crimes e o contato com os prováveis culpados por esses crimes, os policiais acabam por compartilhar ora de uma linguagem convencional, reconhecida pela maioria dos falantes, ora de uma linguagem especial usada no mesmo contexto linguístico dos criminosos.

Esta é uma alternativa para os agentes policiais adquirirem uma formação acerca da

linguagem gíria e, assim, poderem criar seus glossários e intervirem em ações criminosas que

usam desta linguagem para cometerem outros crimes.

Argumenta Oliveira (2006) que é necessário o conhecimento amplo desta modalidade

comunicativa que é restrita aos apenados por questão de segurança. Aponta, ainda, que

rebeliões surgem mediante uso do código das celas, fazendo reféns.

Existem trabalhos realizados pelo Sistema Penal em coletar o maior número possível

de gírias empregadas pelos presos. Esta coleta possibilitou à publicação de um livreto

intitulado “Cartilha do Agente Prisional” e distribuída entre os funcionários. Aponta Costa

(2002) que esta publicação é usada em cursos dados aos agentes prisionais.

2.1 PROCESSO DE FORMAÇÃO DA GÍRIA NOS GRUPOS MARGINAIS

A gíria, como qualquer outra variação linguística, faz parte de um processo de

formação da qual utiliza a fonética, a morfossintaxe, o lexical e o semântico. A Língua

Portuguesa é formada por estes elementos que definem os sons das palavras; estrutura e

formação dos vocábulos, sua estrutura, flexão e classificação; a construção frasal que dispõe

de palavras que formam orações, períodos, parágrafos; bem como o significado da palavra no

contexto em que está inserida.

Neste universo da Língua Portuguesa, faz-se necessário entender o processo de

formação da gíria marginal e sua implicação no sistema prisional.

2.1.1 Nível fonético

Neste item a gíria é marcada pela oralidade, apresentando alterações fonéticas por

supressão, inserção e transposição de fonemas. (CABELLO, 1991)

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A supressão de fonemas ocorre quando o apenado suprime os sons, ora iniciais, ora

finais da palavra. Neste contexto, cita Cabello (1991, 20) os seguintes exemplos: “Guenta

(grifo nosso) aí, meu compadre, que a gente vai comer uma galinha mais logo”. Este

enunciado aponta diversos vocábulos gírios, mas a atenção a ser dada é “guenta”. Nela, vê-se

que o apenado fez uso da supressão inicial do som, ou seja, substituiu “aguentar” por

“guentar.” O termo “guenta” tem o significado de suportar.15

Vale arguir que a supressão fonética também ocorre no final da palavra. Como

exemplo pode-se citar “malas, vagal, justa e japa”. Cabello (1991, p.20-21) aponta os

seguintes exemplos que ilustram esta discussão:

a) Sabia dormir com percevejo por perto e foi ali que aprendi a conhecer os tipos de malas (grifo nosso); b) Baixou os olhos, um vagabundo era um vagal (grifo nosso) e só; c) Quando a justa, perua preta-e-branca dos homens da polícia roncava no asfalto, a verdade geral se punha na maioria dos olhos; d) Armaram e fizeram, no quieto, um furto, o tal alívio na pastelaria de um japa (grifo nosso).

Observa-se nos enunciados acima que os corpus16 possuem os seguintes significados:

malas por malandros; vagal por vagabundos; justa por justiça; e japa por japonês.

(CABELLO, 1991) Todos eles apresentam supressão fonética no final da palavra.17

No que diz respeito a inserção de fonemas, tem-se o seu acréscimo no meio do

vocábulo, apresentando intercalação vogal. Cabello (1991, p.21) cita como exemplo: “Com a

blitz malhando, fechando em cima do trottoir, começava a tomar chá-de-sumiço aquele

tipinho de cafetão, cafiolo, cafiola (grifos nossos) de uma mulher só.”

Vê-se no contexto que as expressões em destaque referem-se ao malandro que vive às

custas da mulher. No que compete à inserção de fonema, nota-se que o grupo consonantal ft

não se desfez, vez que não ocorre cafetinar, mas caftinar . (CABELLO, 1991, grifo do autor)

Outro elemento bastante comum na formação de gíria criminal é a trasnposição de

fonemas, ou seja, alterações fonéticas na mesma sílaba. Cabello (1991, p.21) traz os

exemplos: “a) Depois, tem ainda a groja dos otários; b) Maneirando aí na casa de uns grinfa

(grifos nossos), mas daqui um nada vou dar no pé pra Brasília.” Os corpus gorja refere-se a

gorjeta e grinfa a grã-fina.

15 É a supressão de um fonema ou de uma sílaba no início da palavra. 16 É um conjunto de dados linguísticos coletados criteriosamente para ser objeto de pesquisa linguística. 17 A este fenômeno, denomina-se de apócope, que é a perda de um ou mais fonemas no final da palavra.

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2.1.2 Nível morfossintático

Entende-se por morfossintaxe a junção da morfologia com a sintaxe, ou seja, trata-se

de classes de palavras, emprego de pronomes, concordância verbal e nominal, oração período,

dentre outros. (GARCIA, 1992)

Em outros termos “Morfo” significa forma, ou seja, formação das palavras, sendo elas

verbos, adjetivos, artigos, pronomes, advérbios. A sintaxe, por sua vez, refere-se aos termos

da oração, como sujeitos, predicados, adjuntos adnominais, objetos direto e indireto.

(GARCIA, 1992) Com isso, pode-se afirmar que a morfossintaxe é a união dos dois

elementos gramaticais.

Neste âmbito a gíria marginal é bastante presente, posto que sua utilização perpassa

pelas classes gramaticais de palavras na construção de frases.

2.1.2.1 Sufixação

A sufixação é parte da palavra que vem depois do seu radical que é a base mínima

portadora de significado.

Cabello (1991, p.22) diz que “a sufixação é patente na gíria, sem obedecer a critérios

determinados, mas com intenção expressiva e irônica. Daí aparecem formas inusitadas e/ou

semelhantes às da língua comum.”

A referida autora traça como exemplos “bocuncha” e “canuncha” que comprovam o

uso de sufixo – uncha. Estes termos equivalem a “boca” e “cana”. Vale ressaltar, também, que

o vocábulo “Ricardão” ganha o sufixo – ão.

2.1.2.2 Codificação

Como o próprio termo indica, é a deformação de uma palavra quando as circunstâncias

o obrigam. No interior das cadeias é corriqueiro o uso desta codificação.

Cabello (1991, p. 24) afirma que “tal codificação consiste na eleição de uma nova

chave ou fórmula (renovável, tão logo se vulgarize), a qual determina as letras que devem

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figurar no início e no final de cada palavra.” Cita o exemplo “l...é”, em “leudé” (2 francos);

“linvé” (20 centavos), etc. Esta forma designa expressão monetária.

2.1.2.3 Invencionice

Como sabedores, os termos gírios são criados sem nenhuma preocupação gramatical.

No que compete a gramática, por exemplo, o gênero masculino de cadela é cão.No contexto

da linguagem marginal, o corpus “cadela” é extendido para “cadelo”, significando o

masculino. Se “cadela” é um termo pejorativo para se referir à mulher, logo o masculino

“cadelo” tem a ideia de “filho da cadela”, construindo, assim, um xingamento. (CABELLO,

1991)

Ao que se vê, a inventividade faz parte da construção proposital da linguagem

marginal de acordo com os interesses do falante, seja para xingamento ou não. Outra palavra

corriqueira é “cavala”, já com um aspecto positivo, pois refere-se à mulher bonita. Supõe-se

que esse significado relacione à condição do preso, pois quando um deles recebe a visita da

esposa, todos os companheiros de cela devem recolher os olhares para baixo, sem, sequer,

direcionar o olhar à “cavala” do outro.

2.1.2.4 Analogia

A analogia constitui-se relação de semelhança da gíria com o “objeto, pessoa e/ou

contexto”. Os exemplos mais comuns são: capa-preta para se referir a juiz; cano, revólver;

doze, traficante; tatu, túnel de fuga; fechar o paletó, matar alguém; dentre outras. (CABELLO,

1991)

2.1.2.5 Construções verbais

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As construções verbais no campo da gíria é intensa. Cabello (1991, p.25) cita alguns

exemplos com o verbo dar (grifo nosso):

a) O que vai pintar de trouxa, espertinho, pé grande, muquira, bêbado amador, loque, cavalo-de-teta, zé mané dando (grifo nosso) bobeira, doutor de falsa fama, papagaio enfeitado, quiquiriquis, langanhos, paíbas, não será fácil; b) O bom menino, desmilinguido e de nada, tinha quase as qualidades para se tornar um homem de dar (grifo nosso) o serviço, um boca mole; c) E fique sabendo que essa de malandragem nunca deu (grifo nosso) camisa.

Observa-se nos exemplos acima que a construção sintática, ou seja, das orações, estão

imbuídas da morfologia, quando faz uso do verbo “dar”. Assim, nesta relação morfossintática,

pode-se notar que o emprego do verbo mencionado tem diferentes significados, mediante o

contexto de cada uma delas.

Na a) dando bandeira significa proceder de modo pouco discreto; na b) dar o serviço é

o mesmo que deletar; e na c) deu camisa é o mesmo que ser útil. (CABELLO, 1991)

Em um estudo mais aprofundado acerca da utilização de verbos como gíria, Oliveira

(2006) aponta uma característica interessante para seu uso: a polissemia. Entende por

polissemia os vários significados que uma única palavra pode ter.

Nesta afirmativa, podem-se observar alguns corpus polissêmicos empregados pelos

presos como: “estar de boa – não fazer nada; estar de lagarto – está cumprindo pena mesmo

sendo inocente; estar de louco ou touca – estar desinformado; estar bonado – ter muito

dinheiro; estar no pano – ter alguém para defesa pessoal.” (OLIVEIRA, 2006, p. 49)

O verbo fazer também é corriqueiro no linguajar dos presos. Ele apresenta polissemia:

“fazer um – parar de falar; fazer cinco – esperar um pouco; fazer um pião – dar uma volta;

fazer uma caibrada – dar uma surra; fazer um corre; tentar conseguir o que quer; fazer uma

cena – praticar um delito; fazer a ponte – passar alguma coisa para outra pessoa.”

(OLIVEIRA, 2006, p.50, grifo nosso)

Não apenas os verbos dar e fazer, mas tantos outros trazem uma carga polissêmica no

contexto da gíria.

2.1.2.6 Perífrase

Consiste em especificar determinadas características, mais ou menos objetivas, do

objeto que se quer nomear indiretamente. Uma das razões para a sua utilização é a não

repetição da mesma palavra em frases próximas ou na mesma frase.

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Segundo Cabello (1991, p. 28),

a perífrase é o emprego de uma frase para exprimir uma ideia que pode ser expressa por uma simples palavra. (...) a) Aí, o velho me chamou na chincha (grifo nosso), sacrifício tinha de ser de todos e mandou que me explicasse; b) Mas um cara altamente cabeça não corre a mão (grifo nosso) em duzentos mil do alheio.

Nestes exemplos, fica nítida a perífrase no campo das gírias. Os termos em destaques:

“chamou na chinca” tem o significado de repreender e “corre a mão”, de furto.

2.1.2.7 Hipérbole

É um vício de linguagem que consiste em expressões de exagero. Cabello (1991, p.

28) aponta dois exemplos: “a) As notas deram sossego e depois considerações e depois se

lamentaram os dois, que a roda de vida (grifo nosso) no Joana d’Arc poderia ter dado até dez

contos; b) Falando claro, até gosto que se pense assim: minha dissimulação é dos sete capetas

(grifo nosso).”

As expressões “roda de vida” significa dinheiro destinado às apostas de jogo; e “sete

capetas” deduz-se da junção ao termo maléfico capeta com o número sete, representando a

imaginação popular. (CABELLO, 1991)

Assim, vê-se que a gíria criminal apresenta, em seu contexto, expressões de exagero

que, em sentido literal, não é possível o seu significado.

2.1.2.7 Metáfora

A metáfora é outro elemento que se configura a gíria marginal. Ela é um dos processos

de formação vocabular que tem maior representatividade no inteior das cadeias do país.

De acordo com Cassirer (apud REMENCHE, s/a, p. 03) a metáfora consiste “no

sentido de que seu domínio abrange tão somente a substituição consciente da denotação por

um conteúdo de representação, mediante o nome de outro conteúdo, que se asssemelha ao

primeiro em algum traço, ou tenha com ele qualquer analogia indireta.” Isso quer dizer que, a

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metáfora deixa o seu contexto real, denotativo e passa a outro contexto, figurativo. Assim, as

palavras empregadas pelos presos possuem significados diferentes que só eles são capazes de

entender.

Argumenta Remenche (apud SEGURO, 2010, 37) que “a metaforização é, entre

tantos, um processo comum para o surgimento das gírias nas prisões. A partir de um elemento

“A”, transmite-se a carga semântica para “B”. “Beca”, inicialmente usada para designar

“calça”, passa a referir-se a “bunda.””

Vários são os exemplos desse processo. Muitos são ligados à drogas, outro a

violência.Quanto à droga, encontra se a maconha e suas metaforizações: “a boa”, “bagulho”,

“beque”, “fino”, “haxixe”, “lasca”, “pepita”, “tarugo”, “tablete”, “tijolo”, e tantas outras.

(SEGURO, 2010)

Ao observar hipérbole e metáfora, têm-se elas no mesmo contexto, pois ambas fazem

uso do sentido figurativo das palavras utilizadas como gíria.

2.1.3 Nível lexical

O nível lexical é determinado pelo conjunto de palavras com características comuns no

significado. Vale dizer que um vocábulo não pode ser definido por um único significado,

assim como o significado não pode ser determinado por uma única palavra.

Nesse viés, os vocábulos assumem significados de acordo com o seu contexto, logo, a

gíria marginal varia de acordo com o lugar em que o apenado está inserido. A gíria utilizada

de uma prisão não é exatamente a mesma de outra, mas tem característica comum: não ter a

linguagem conhecida por outros grupos sociais, a exemplo dos agentes penitenciários.

Afirma Oliveira (2006, p. 57) que “o campo lexical de uma palavra, portanto, pode

ser formado por uma rede associativa baseada em semelhanças, contiguidade, proximidade

ou, como já dissemos, por palavras sem qualquer relação aparente.”

É neste diapasão que a gíria se consolida na ambiência carcerária: pautada sempre em

um contexto.

Assim, basta observar o vocábulo espaço (grifo nosso) no contexto das cadeias, que os

seus vários significados são: barracão, barraco, casa, boi, gaiola, seguro, quieto, praia, x,

galeria e possivelmente outros. (OLIVEIRA, 2006)

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Observa-se que o vocábulo em questão possui diversos significados, estes

determinados pelo contexto de cada apenado.

No que se refere ao significado, este pode ter relação a diversos vocábulos gírios. Ao

ouvir, por exemplo, de um detento que ele utilizou o chico doce (grifo nosso) para bater em

suas vítimas, isso quer dizer que ele fez uso de um pedaço de madeira enrolado em tecido,

como forma de arma. (OLIVEIRA, 2006)

A inferência que se pode fazer ao adjetivo “doce” porque não machuca muito quem

apanha, posto que o tecido suaviza o impacto. Por outro lado, a madeira causa estrago maior,

uma vez que a vítima sente o impacto da pancada.

Na situação em tela, tem-se que o significado pode assumir diversos vocábulos como

arma de madeira improvisada, tortura ou apelido de um detento. (OLIVEIRA, 2006, grifos

nossos)

Dada as constatações sobre a linguagem marginal não poder ser definida como um

único significado, como também o significado não ser determinado por uma única palavra,

tome-se o vocábulo no nível lexical configurado em neologismo, estrangeirismo e

empréstimo.

2.1.3.1 Neologismo, estrangeirismo e empréstimo

O neologismo no interior das cadeias tem a produção de novas palavras, criadas para

dar relação a uma outra palavra já existente.

Apregoa Cabello (1991, p. 30) que o neologismo “é o termo, a criação vocabular

nova, incorporada à língua”. Como exemplo, tem-se o número 24 (grifo nosso). A associação

que se faz a ele tem característica negativa, pois refere-se ao homossexual. Como se sabe, 24

se refere ao número do veado no jogo do bicho.

Assim também são os termos grilado, para se referir a preocupação; joia, para dizer

que está tudo legal; borocoxô, para tristeza; bulhufas, para dizer que nada entendeu; bicho,

para amigo; e boa pinta, para homem elegante (CABELLO, 1991, grifos nossos).

A gíria marginal decorrente do estrangeirimo é bastante comum no interior das celas,

como também em outros grupos sociais.

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Cabello (1991) afirma que o estrangeirimo é resultado, também, do neologismo a

partir do momemto em que o seu uso torna-se frequente, sendo considerado um empréstimo,

quando já definitivamente incorporado à língua e dicionarizado. Eis alguns exemplos:

dancing – casa de danças; trottoir – passeio de meretriz em busca de fregueses; blitz – batida

policial rápida.

2.1.4 Nível semântico

Compete a semântica dar significado às palavras, sejam elas em sentido figurado ou

não. Cabello (1991) refere-se a estes elementos como conotativo e não-conotativo. O

conotativo tem caráter polissêmico que possibilita o sentido não-literal, figurativo. O não-

conotativo está no plano denotativo, em que o significado da palavra tem relação direta e real

com o vocábulo.

A gíria criminal é uma linguagem conotativa que possibilita ao apenado utilizá-la

como manutenção do sigilo da comunicação e da autenticidade do grupo prisional. Cabello

(1991) cita o exemplo do vocábulo caroço (grifo nosso). Em seu sentido literal, denota o

núcleo muito duro dos frutos. Mas ao estendê-la para o sentido figurativo, pode ter diversos

significados como dinheiro, tarefa árdua, tarefa pouco rendosa.

2.1.4.1 Uso de nome próprio com sentido especial

É bastante comum no interior das celas o emprego de gírias para referir-se a pessoa.

Estes termos são utilizados pelo grupo marginal que muitas vezes carrega um sentido

depreciativo. Cabello (1991, p. 36) cita, por exemplo, dona Maria para se referir à polícia:

“Cheguei à favela com o pessoal de dona Maria (grifos do autor) e já dentro do camburão

tive de desempenhar como macho”.

Ao analisar a literatura “Estação Carandiru”, tem-se o nome dos presos por meio de

gírias:

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“Caçapa (grifo nosso), um ladrão que cumpre cinco anos nos seis, ganhou 25 mil dólares num assalto a banco.” [...] “Sem-Chance, ladrão escolado, fala da esperteza do Ricardão, nome atribuído ao amante da mulher de quem está na cadeia.” [...] “Coça-coça , que ganhou o apelido por causa de um amigo que o surpreendeu na zona pedindo para a prostituta passar as unhas em suas costas, descrevia assim esse delírio.” [...] “Gambé, filho da puta! Era a senha para um crescendo infernal de impropérios: - PM, corno do caralho! Vou contar pra tua irmã na visita de domingo! Já comi tua mulher de quatro! Vai buscar tua mãe na zona, Gambé!” (VARELLA,1999, p.30; 62; 67; 163, grifos nossos)

Cumpre registrar que estas falas configuram-se no depoimento de cada preso ao

médico Dráuzio Varella, que atendia no interior do presídio Carandiru, em São Paulo, quando

esse existia. Tais falas apontam nitidamente que os apenados tinham apelidos e cada um deles

possuía um significado por alguma razão vivida fora ou dentro do presídio.

2.2 A INFLUÊNCIA E O SIGNIFICADO DAS GÍRIAS NO INTERIOR DAS CADEIAS

Todo processo linguístico emerge num grupo social. Na ambiência prisional não é

diferente. Acontece que, na maioria das vezes, o condenado leva consigo as gírias que

construiu e adquiriu no seu grupo quando estava em liberdade. Ao adentrar na cela, o

criminoso é submetido pelos companheiros a uma espécie de sabatina para verificar se ele

está apto ou não a fazer parte do grupo.

Sob a ótica de Oliveira (2006), o apenado é submetido a um interrogatório feito pelos

companheiros de cela para identificar se ele tem perfil ou não para fazer parte do grupo. Caso

não revele as condições necessárias, há a intervenção do monitor que a coloca em cela

separada. Este monitor geralmente é um carcereiro ou agente policial.

Esta realidade não se aplica em todo lugar, pois o que se vê é a superlotação do

sistema prisional. Presos em celas separadas, apenas estupradores, pedófilos ou

homossexuais, vez que não são aceitos pelos apenados este tipo de conduta. Colocados juntos

pode ocasionar a morte desses.

Andriguetto (2006) ressalta que o processo linguístico, que é metafórico, existe no

repertório não só dos criminosos como dos próprios policiais, justificado pela convivência

com a classe marginal. Mesmo fazendo parte de realidades sociais diferentes, os policiais e

criminosos fazer parte do mesmo contexto linguístico, destinados a efetivar a comunicação

que em algum momento terão que promover. Este fato é justificável porque a própria lei

obriga que os depoimentos tomados em uma delegacia sejam transcritos como são falados, o

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que passa o policial e demais agentes prisionais a conhecer e até fazer uso dos termos. Com

isso surge a similaridade da gíria policial com a gíria dos criminosos.

A obra “Elite da Tropa 2” expressa claramente o uso de gíria por policiais resultado do

contato com bandidos:

O colega da delegacia local respondeu à minha cordata ponderação com os vastos recursos de seu vocabulário: - Já é. Agradeci. Ele completou: - É nós. Desliguei. As expressões já é e é nós (grifos do autor), celebradas por traficantes, são expressadas para aprovação ou concordância, a primeira, e afirmação triunfal de que somos unidos e fortes, a segunda.[...] Virei o pescoço até onde meu renitente torcicolo permitiu e compartilhei com os colegas sentados no banco de trás da viatura a resposta do colega. – “Já é”. O cara me disse “já é” e “é nós”. Tonico insurgiu contra meu elitismo: - Tu queria o quê? Uma citação de Camões? (SOARES et al., 2010, p. 85-86)

A colocação acima reflete como os policiais e demais profissionais que têm contato

com criminosos são influenciados na utilização de gírias. Mesmo que alguns agem com

preconceitos, é muito difícil não fazer parte deste contexto linguístico. Vale dizer que hoje a

expressão “é nós” é usada por bandidos e policiais como “é nóis”, e que aos poucos está

disseminando para outros grupos sociais, fazendo dela gíria comum.

Remenche (apud ANDRIGUETTO, 2006) elucida que a linguagem marginal está

impregnada no vocabulário dos policiais, e que esta relação traz ponto positivo, pois contribui

e facilita o trabalho da justiça no combate ao crime. Tal afirmação é perceptível nas

delegacias quando os agentes policiais, por meio da linguagem utilizada, sente mais próximo

dos criminosos, aquele a quem deseja ver atrás das grades. Esta atitude revela sentimentos de

autoridade constituída perante a sociedade em geral, que é necessitada de proteção e

segurança.

Nota-se que não é vantagem para o criminoso o entendimento dos policiais na

linguagem que utilizam, pois enfraquece o poder do grupo marginal. Nesse sentido Sabbá

(apud COSTA, 2002, p. 1) relata que

os presos, quando percebem que um agente prisional, por exemplo, começa a decifrar a linguagem que usam no processo comunicativo próprio, refazem o vocabulário, abrindo novo sentido semântico às palavras e expressões. Vê-se, portanto, que é uma criatividade mal intencionada, que prefiro definir como esperteza mesmo.

A dificuldade em combater a criminalidade é imensa, principalmente quando não se

decodifica a linguagem que os bandidos utilizam, e ao decodificá-las, reinventam outras.

Oliveira (2006) afirma categoricamente que é necessário o conhecimento profundo dos

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agentes prisionais acerca da gíria e sua utilização no interior das cadeias, pois entendê-la é

uma questão de segurança, vez que ela é usada na organização de rebeliões.

2.2.1 Dificuldades dos agentes policiais no combate ao crime

Entende-se por agentes policiais os profissionais que lidam diariamente com o sistema

prisional na tentativa de manter a ordem e a segurança das pessoas e bens, mediante

aplicabilidade da lei. Ao que se vê o trabalho destes profissionais é perigoso e, ao mesmo

tempo, estressante.

É comum observar no dia a dia das delegacias e presídios o desafio que a polícia

enfrenta para combater o crime, pois além da criminalidade, atrelada a ela vem a gíria.

Popó (2005) cita que em Uberlândia os agentes policiais têm se desdobrado para

compreender a linguagem utilizada pelos presos. Diz que de 10 (dez) presos, acusados por

crimes que vão de um simples estelionato ao latrocínio, seis destes que se sentam à frente do

delegado, se expressam com um vocabulário criptológico oriundo das ruas e prisões.

O que se observa é a bandidagem usando muita gíria e os policiais, diante das

circunstâncias, necessitam compreender este linguajar para manter a ordem e paz na

sociedade, já que ela tem caráter de manipular os agentes e continuar na prática de crimes.

Afirma Popó (2005) que é muito comum ouvir frases do tipo o Stive (policial) me

levou pro porão (cadeia), mas agora estou na Disney (condicional), ou arrumei uma farinha

(cocaína) e a pus no cafofo (esconderijo), mas deu uma zica (encrenca) (grifos nossos). Estas

expressões são comuns de se ouvir nos corredores e celas de delegacias do país.

Na tentativa de combater o crime mediante utilização de gírias, os agentes policiais

têm criado glossários, cursos de formação para profissionais que lidam constantemente com

presos. Outros têm construídos dicionários de gírias que auxiliem os profissionais nas

atividades carcerárias.

A organização dos dicionários de gíria nem sempre está na mão de linguistas e lexicógrafos. Se o vocabulário se limita a uma linguagem de um grupo social determinado, como os marginais ou agentes de polícia, por exemplo, é comum os autores serem pesquisadores, curiosos da linguagem ligados às áreas estudadas que de repente, se tornaram autores dos dicionários ou de simples relações de vocabulários técnicos relativos à atividade descrita. Mas, ainda, mais comuns são as contribuições de jornalistas que realizam matéria sobre os grupos sociais e

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acrescentam o vocabulário típico usado por eles. Dessa maneira se divulgou a grande maioria dos vocabulários das prisões, das bandas jovens, dos estudantes, dos meninos de rua, dos ambientes urbanos da noite, dos toxicômanos etc. (PRETI, 2000, p10)

É com esta prática que os agentes têm conseguido bons resultados, pois recolhem

vocábulos desconhecidos e neologismos que possuem referência com os atos ilícitos

praticados.

Alguns policiais têm se infiltrado nas celas para tentar conseguir identificar a gíria

utilizada pelos apenados e o que eles têm planejado.

Rocha (2003, p.44) assim assevera: “O policial que está investigando um caso precisa,

às vezes, penetrar em determinadas instalações sem que sua identidade e missão sejam

conhecidas”. Em alguns locais pode ser fácil, mas em outros ele precisa agir com esperteza e

naturalidade.

Este é um risco que muitos têm corrido, pois penetrar no interior das cadeias a fim de

obter informações precisas sobre o que os presos fazem ou pretendem fazer é extremamente

perigoso para o investigador, se eles descobrirem que não passa de uma farsa.

No contexto da gíria policial, esta prática se configura numa campana (grifo nosso)

que é observação discreta ou vigilância simulada do que faz cada preso.

Afirma Rocha (2003, p.51) que a

campana é um trabalho cansativo, que requer presença de espírito, paciência e habilidade. É sempre conveniente que o agente trabalhe com um ou dois companheiros. A cobertura dada por eles deve ser feita de uma certa distância, combinando-se o lugar de encontro.

Vale ressaltar que a campana acontece, também, fora da cadeia. Basta que o agente

policial queira investigar determinado sujeito buscando saber onde mora, o que faz, com

quem anda, lugares que frequenta, etc.

Na campana, o uso do disfarce precisa ser eficaz para despistar o sujeito que está

sendo investigado. Assim é preciso ter coragem, presença de espírito e formação profissional

especializada para agir com habilidade e garantir a sua segurança, bem como não

comprometer a missão.

Cumpre dizer, ainda, que a investigação policial é a atividade que busca a prevenção

do crime, a apuração de infração penal, a busca e apreensão de armas relacionadas ao crime,

dentre outras.

Na concepção de Popó (2005, p. 01-02)

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no meio policial, aprender gíria e compreender o que o bandido contumaz está falando é tão importante quanto saber investigar. Mesmo assim tem investigadores que precisam do auxílio de colegas mais experientes para traduzir o que o criminoso quer expressar. É que sempre surgem palavras novas, trazidas por pessoas de fora que são detidas em Uberlândia.

Não basta apenas saber investigar. É necessário que se tenha conhecimento das gírias

marginais para poder intervir no contexto do apenado.

2.2.2 Linguagem da malandragem: nova língua ou dialeto?

Para os especialistas na ciência da Linguagem, a gíria se configura numa variação

linguística, ou dialeto, por ser uma espécie de fala “defeituosa”, que não condiz ao falar

estabelecido pelas normas gramaticais. Ela é determinada pelo meio social, cultural e

econômico em que o sujeito está inserido. Assim, o falar dos presos do Sistema Penal

configura-se nesta variação.

Cumpre ressaltar que variação linguística refere-se à mutabilidade da língua, isso quer

dizer que uma língua possui diversos falares, caracterizados pelas relações sociais que

integram pessoas e grupos. É nesta situação do dia a dia que as ações comunicativas se

consolidam.

Para o linguista Chomsky (apud SÁ, 2010, p.56),

ao nascer, o indivíduo é inserido num contexto socioeconômico cultural pré-existente e, à medida que cresce, participa de um processo de socialização que o transforma num falante de uma determinada variedade da língua, sob influência do meio social em que vive.

Isso prova que a língua é um traço da identidade do sujeito, construída nas relações

grupais. Por isso dizer que a gíria também faz parte deste processo. e por ser uma linguagem

diferente da convencional18 é alvo do preconceito linguístico.

Neste sentido, corrobora Preti (apud SCHUBSKY, 2008, p.s/p.) que

no país do “seu” doutor, do bacharel, a gíria, tadinha, carrega a pecha de ser a própria encarnação da baixaria. Filha bastarda da língua, irmã gêmea do palavrão, a desgraçada já foi tachada de tudo o que é nome feio. Não é para

18 Norma culta da língua portuguesa.

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menos. A linguagem é um organismo social tradicional. E boa parte da gíria promove a modificação do significado das palavras.

Por isso que a gíria tem sido alvo do preconceito linguístico. Não faz parte da língua

estabelecida como “correta” – a norma culta. Para Uchoa (apud SCHUBSKY , 2008, p. s/p)

“nós não devemos passar a ideia de que a gíria é uma linguagem pobre, empobrecedora. Ela

tem um papel de renovação da língua”.

Vê-se que para os especialistas em Linguística, a gíria revela a capacidade criativa,

digna de elogio e respeito, não sendo alvo de comentários pejorativos. Nesta linha de

pensamento Cardoso (apud COSTA, 2002) explica que todo indivíduo tem a capacidade de

inovar e renovar códigos comunicativos. Os presos, por sua condição natural, são livres para

esta inovação, posto que a maioria não fez parte de uma educação escolarizada.

Em contrapartida, este pensamento não é comungado pelo Sistema Prisional. Os

agentes policiais afirmam que a criação desta linguagem nada mais é do que agir com

esperteza para burlar o sistema penitenciário e continuar a prática de crimes. Afirmam eles

que este falar configura-se numa nova língua, ao passo que para os linguistas, apenas uma

variação linguística.

No dilema de ser a gíria marginal língua ou dialeto, cumpre, a princípio, conceituar

cada termo.

No entendimento de Bizocchi (2006), a língua conquista prestígio na sociedade,

produzida pela literatura, ou seja, é o conjunto de signos aceitos pela norma culta da língua

portuguesa.

Com isso, percebe-se que a gíria por ser restrita a um determinado grupo, e não ser

registrada pela literatura, é considerada um dialeto.

Bizocchi (2006) costuma chamar hoje dialeto de qualquer expressão linguística que

não é reconhecida como língua oficial de um país. Assim, um dialeto pode ser tanto uma

variedade linguística regional do idioma oficial quanto uma língua sem qualquer parentesco

com ele.

Denota-se que a linguagem da malandragem, na concepção da ciência linguística, não

é uma nova língua, mas sim um dialeto dentro da língua oficial, pois ela não é autêntica e é

ausente dos registros da tradição literária19, não sendo reconhecida pelo Estado. Assim, dizer

19

Entende-se como registro literário a dicionarização dos vocábulos. Palavras não dicionarizadas não gozam de prestígio social, logo, faz parte apenas de um dialeto.

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que o falar dos presos se configura numa nova linguagem, é entrar em contradição com a

ciência.

Para Campos (apud POPÓ, 2005, p. 1) “hoje o bandido só se expressa por meio de

muita gíria. Nós policiais compreendemos o que eles falam porque já estamos habituados.

Porém, sempre aparece alguém falando alguma palavra nova, trazida de outras regiões. Pode-

se perceber que a gíria varia muito, pois a cada lugar criam-se códigos próprios.

Alerta Popó (2005) que os policiais necessitam compreender a especificidade desta

linguagem tanto quanto saber investigar. Diz que muitos investigadores recorrem a colegas

mais experientes para traduzir a mensagem do criminoso. Os escrivães de polícia são os que

mais têm dificuldade em traduzir esse linguajar que é peculiar ao crime, pois são estes

profissionais que têm que digitar o interrogatório.

Para exemplificação, Preti (apud SCHUBSKY, 2008, s/p) cita um texto publicado no

jornal Correio da Manhã, de 5/4/1959 o seguinte caso:

"Seu doutor, o patuá é o seguinte: depois de um gelo da coitadinha, resolvi esquiar e caçar outra cabrocha. Plantado como um poste na quebrada da rua, veio uma pára-queda se abrindo. Eu dei a dica, ela bolou...chutei. Ela bronquiou, mas foi na despista, porque, vivaldina, tinha se adernado e visto que o cargueiro estava lhe comboiando. Morando na jogada, o Zezinho aqui ficou ao largo. Procurei engrupir o pagante, mas recebi um cataplum. Aí, dei-lhe um bico com o pisante na altura da dobradiça. Ele se coçou, sacou a máquina e queimou duas espoletas. Papai, rápido, virou pulga e fez Dunquerque."

Observa-se que o texto possui uma linguagem bastante específica, praticamente

impossível de decifrá-la, levando-se em consideração que fora publicado na década de 50.

Apenas um profissional especialista no assunto para tentar traduzir a fala do sujeito.

Preti (apud SCHUBSKY, 2008, p. s/p), traz a seguinte tradução:

"Seu doutor, a conversa é a seguinte: depois que fui abandonado por minha companheira, resolvi procurar uma outra. Parado na esquina, aproximou-se uma morena faceira. Eu a olhei, ela correspondeu...eu insisti. Ela achou ruim, mas foi para disfarçar, porque, muito esperta, havia olhado de lado e vira que o seu companheiro a estava seguindo. Percebendo tudo, fiquei de longe. Procurei enganar o malandro, mas, inesperadamente, fui agredido. Aí, dei-lhe um chute na altura do joelho. Ele procurou a arma, sacou-a e deu dois tiros. Eu, rápido, pulei e fugi."

A linguagem usada neste fragmento é compreensível para todo leitor, haja vista que

ela não está carregada de gíria.

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Diante destas discussões, percebem-se dois pontos cruciais que merecem atenção: os

linguistas que defendem a variação linguística como riqueza e mutabilidade da língua,

respeitando desse modo, os falares dos presos; de outro lado o Sistema Penal que afirma ser

uma nova linguagem cujo objetivo é agir com esperteza para não serem compreendidos e

continuarem na prática de crimes.

Dado o exposto, pode-se afirmar que a gíria é uma variante linguística que faz parte de

um dialeto, e, por ser restrita, serve de manobra para despistar o Sistema Prisional.

CAPÍTULO III

3.0 ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE

O Complexo Policial do Município de Barreiras/BA, 11ª COORPIN, está situado na

rua Júlio César, nº 500, Aratu, sob a direção do Doutor José Resende de Morais Neto,

Coordenador Regional de Polícia e Doutor Joaquim Rodrigues de Oliveira, delegado titular.

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Diante da falta de um presídio nesta região, os presos vivem em celas superlotadas.

Consequentemente a isso, existe a extensão deste complexo na antiga cadeia de Barreiras,

localizada na rua Hermenegildo Fé, S/N, Centro, que conta com presos de menor

periculosidade.

Este instituto conta hoje com 118 (cento e dezoito) presos distribuídos em apenas 8

(oito) celas que têm a capacidade para 4 (quatro) detentos, cada. Uma delas é especial, atende

aos criminosos que possuem nível superior. No entanto, diante da carência de espaço, ficam

nesta cela estupradores, pois se ficarem juntos com os demais, poderão ser agredidos ou

assassinados, dado o grau do crime cometido. (VARELLA, 1999) Assim, segundo

informações dos agentes policiais, há aproximadamente 15 (quinze) presos por cela.

Conforme reza a Lei de Execução Penal nº 7.210/84, em seu art. 88 “o condenado será

alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório”. (BRASIL,

2010) Vê-se que, na prática, isso não acontece. Sabe-se que a cadeia pública é destinada ao

recolhimento de presos provisórios, assim como as penitenciárias. No entanto, pela ausência

de investimento por parte dos governantes, estes institutos ficam amarrotados de presos, o que

implica na sua ressocialização e, consequentemente, na construção dos códigos de cela.

Os crimes cometidos pelos apenados do Complexo Policial de Barreiras são diversos,

a exemplo de roubo, homicídio, latrocínio, estupro, dentre outros. A faixa etária, em média,

varia de 22 a 40 anos, sendo a maioria deles analfabetos funcionais, ou seja, apenas decodifica

palavras, mas não as interpreta. Isso não significa que não exista preso com 50 ou 60 anos. O

sistema carcerário conta com 5 (cinco) investigadores de polícia que, diante da necessidade,

exercem também o papel de carcereiro.

A pesquisa intitulada “Influência e significado das gírias de detentos no interior de

uma cadeia da cidade de Barreiras no oeste da Bahia” aconteceu na antiga delegacia de

polícia, extensão do Complexo Policial de Barreiras, visto que os apenados são de menor

periculosidade, não oferecendo riscos ao pesquisador.

Este espaço dispõe de 6 (seis) celas para o sexo masculino e 3 (três) celas para o

feminino. Esta extensão conta hoje com aproximadamente 28 (vinte e oito) detentos, em

média 4 (quatro) a 5 (cinco) por cela e 12 (doze) detentas, 4 (quatro por cela). Vale dizer que

a aplicabilidade do questionário deu-se apenas ao sexo masculino.

3.2 APLICABILIDADE DO INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS

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A entrevista fora aplicada ao delegado titular, a 10 (dez) policiais e a 10 (dez)

detentos. O projeto de pesquisa determinava um número maior de sujeitos envolvidos, porém,

diante das circunstâncias, a amostra foi reduzida.

3.2.1 Ao delegado titular do Complexo Policial do Município Barreiras

Conforme colocações do entrevistado, delegado titular do Complexo Policial do

Município de Barreiras, afirma que a gíria, no contexto das prisões, é absolutamente normal.

Vê-se nesta colocação que a gíria está impregnada na fala dos apenados devido ao meio ao

qual está inserido.

Segundo Remenche (s/a, p.01) “a linguagem específica da população carcerária está

relacionada ao ambiente físico e sócio-cultural.” Logo, entende-se que ela é normal por fazer

parte do contexto em que o apenado está inserido.

Ao ser entrevistado acerca de se recordar de algum fato em que o uso da gíria tenha

dificultado o trabalho da polícia, bem como dizer se ela é um mecanismo de defesa dos

presos, a resposta foi “não”. Observa-se que a realidade local de Barreiras, por não possuir

presídio e não se referir a uma cidade-capital, a gíria não tem tanta força na condução e

organização do crime. Logo, afirma ainda o entrevistado que a gíria não interfere na ação da

polícia.

Em contrapartida, as cidades-capitais têm enfrentado desafios no combate à

criminalidade e a grande arma tida pelos criminosos é a gíria. Ela, sob a ótica de alguns

teóricos, a exemplo de Popó (2005), tem causado grandes transtornos para os agentes

policiais, pois a usam como mecanismo de defesa.

Ao ser questionado se o Sistema Penal possuía alguma preocupação frente a utilização

de gírias no interior das cadeias e presídios do país, a colocação foi “não”. Ao que parece, o

código dos marginais, como definido pela literatura, não tem nenhuma aplicabilidade na área

penal. Controverso a esta informação, o Sistema Penal tem se preocupado e muito com este

tipo de comunicação dos presos.

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Costa (2002) é bastante categórico ao dizer que a gíria é outra preocupação dos

agentes policiais, pois a primeira é o crime. Como ações, são criadas Cartilha do Agente

Prisional, dicionário de gírias, e como se não bastasse, curso de gíria para estes profissionais.

Para Oliveira (2006) é necessário que os agentes policiais conheçam com

profundidade o vocabulário do grupo, principalmente por uma questão de segurança, pois

através da utilização de gírias começa-se rebelião.20

Quando questionado se a gíria se configura em uma variação linguística, a resposta foi

sim: “sim, em todos os presídios existem esse tipo de comunicação entre os presos.” Popó

(2005, p.01) afirma que “realmente, hoje o bandido só se expressa por meio de muita gíria.”

Tais colocações só ratificam que esta modalidade da fala constitui-se em uma variação da

língua, por ser ela rica e mutável.

O entrevistado, diante da questão que aponta se os policiais decodificam as gírias dos

presos, respondeu que sim: “pelo fato de estarmos sempre em contato com os mesmos.”

Nesse prisma, vale dizer que o ambiente que os agentes policiais se deparam corroboram na

aquisição deste linguajar.

Popó (2005, p.01) tem a mesma ideia. “Nós policiais compreendemos o que eles falam

porque já estamos habituados”, ou seja, a relação existente entre estes profissionais e os

apenados é fator desencadeante para o conhecimento de novos vocábulos.

Foi colocado pelo entrevistado que os agentes policiais não agem com preconceito

linguístico. No entanto, a sociedade tem repugnado esta modalidade da fala, pois não faz

parte da linguagem elitizada, gramaticalizada.

No que se refere à criação e utilização de glossários/dicionários por agentes policiais,

o entrevistado respondeu que não há elaboração de materiais desta natureza, até porque,

segundo ele, a gíria não interfere na ação da polícia, ao menos para o contexto de Barreiras.

Assim, diz também não arquivar cartas e/ou bilhetes contendo gírias por acreditar que não

interfere no trabalho da polícia.

Dada as colocações do entrevistado, percebe-se que a gíria dos apenados não tem

poder persuasivo sobre o sistema penitenciário em Barreiras/BA. Ela configura-se apenas em

uma variação linguística como qualquer outra. O fato discriminatório a esta classe ocorre por

sua própria condição social.

20 O autor desenvolveu uma pesquisa de mestrado na FEBEM de São Paulo e identificou que o emprego da gíria tem contribuído para a prática de crimes.

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3.2.2 Aos policiais

Os dez policiais entrevistados têm, em média, de 3 (três) a 15 (quinze) anos de

experiência. Ao serem questionados acerca da linguagem prisional, muitas respostas foram

obtidas, as quais foram analisadas minuciosamente.

Para facilitar a compreensão dos dados coletados, serão utilizados gráficos que melhor

expõem as falas dos entrevistados, bem como, a utilização de algumas falas, identificadas

como policial 1, policial 2, assim por diante.

No primeiro momento os entrevistados foram questionados como a gíria é vista por

eles no contexto das prisões.

Gráfico 1: A gíria no contexto das prisões.

Diante dos dados acima, constata-se que a gíria é vista pela maioria dos policiais como

um mecanismo de defesa dos apenados. A título de exemplificação, eis a fala de um dos

entrevistados:“A gíria é um linguajar vulgar utilizada (sic) principalmente por detentos, no

intuito de não ser compreendido por parte dos agentes estatais, na tentativa de ludibriá-los e

continuar cometendo crimes.” (policial 1) Com isso o policial se vê obrigado a entender o

vocabulário dos presos para agir em prol da segurança pública e a manutenção da ordem e paz

social.

Ao serem questionados se recordam de algum fato em que o uso da gíria tenha

dificultado no trabalho da polícia, tem-se o seguinte:

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Gráfico 2: Implicabilidade da gíria no trabalho dos agentes policiais.

O gráfico 02 expõe que 80% não se recordam de nenhuma situação que tenha

implicado no trabalho dos agentes policiais; 10% dizem existir muitas situações, mas no

momento não se recordam; e outro 10% afirmaram lembrar.

“Sim! Houve um plano de fuga na carceragem e eles falavam em códigos, colocavam músicas altas e cantorias de músicas de hep (sic)em gírias, quando arrombaram a parede e cerraram a grade e fugiram, muitos colegas que chegaram antes de mim na função não entenderam nada e não se preocuparam com a movimentação. É bom o policial ou carcereiro entender algumas gírias para evitar fugas.” (policial 10)

Este fato comprova que o policial necessita interar-se com o código linguístico dos

presos para que movimentos como este sejam evitados.

Perguntados se a gíria é um mecanismo de defesa dos presos, responderam:

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Gráfico 3: Gíria: mecanismo de defesa dos presos.

Conforme colocações expostas no gráfico 03, vê-se que a maioria respondeu que a

gíria dificulta no trabalho da polícia.

O policial 3 diz o seguinte: “Tanto de defesa quanto de ataque, pois a partir do

momento que se cria um novo dialeto para desviar o sentido de quem legalmente tem o poder

coercitivo de ações, a intenção é exclusivamente manter seus atos na obscuridade e,

consequentemente na impunidade”

Segundo Costa (2002), a linguagem dos presos é uma tática para despistar a polícia

acerca do que fazem ou pretendem fazer. Ratifica ainda que é uma criatividade mal

intencionada e que age na esperteza.

No que compete ao questionamento de como o Sistema Penal vê a utilização da gíria

no interior das cadeias e presídios do país, responderam:

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58

Gráfico 4: Olhar do Sistema Penal na utilização da gíria no interior das cadeias e presídios do país.

As respostas ilustradas no gráfico quatro sinalizam que o Sistema Penal não tem

preocupação com os termos empregados pelos apenados no interior das cadeias.

Em contrapartida, nas grandes capitais em que existem presídios, o pensamento destes

profissionais é outro: “O Sistema Penal já conseguiu reunir parte do vocabulário usado pelos

presos. Parte da coleta das informações já foi publicada num livreto intitulado Cartilha do

Agente Prisional. Denota-se, então, que este sistema tem preocupado com os vocábulos dos

criminosos.” (COSTA, 2002, p.01, grifo do autor)

Os entrevistados, questionados se a gíria dificulta a ação da polícia no combate ao

crime, responderam:

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59

Gráfico 5: Os empecilhos da gíria na atuação da polícia no combate ao crime.

Constatam-se nos dados expostos que a gíria implica no trabalho policial, sobretudo

no que diz respeito a questões investigativas e escutas telefônicas.

Sob essa ótica, Popó (2005, p. 01) diz que

no meio policial, aprender a gíria e compreender o que o bandido contumaz está falando é tão importante quanto saber investigar. Mesmo assim, tem investigadores que precisam do auxílio de colegas mais experientes para traduzir o que o criminoso quer expressar.

Seja na investigação policial ou em uma escuta telefônica, os agentes policiais têm

dificuldades em decodificar a fala dos criminosos, recorrendo, muitas vezes a colegas que

possam decifrar a linguagem criptológica destes falantes.

Os entrevistados foram questionados de que forma os policiais decodificam o linguajar

dos detentos, e as colocações foram as seguintes:

Gráfico 6: A utilização de gírias e a ação da polícia no combate ao crime.

Várias foram as respostas dadas para a decodificação da gíria dos criminosos pelos

agentes policiais, conforme ilustra o gráfico. Isso prova que cada profissional tem uma

técnica própria que auxilia na compreensão da comunicação dos detentos.

Os entrevistados foram questionados se a gíria também é utilizada por agentes

policiais, e as respostam foram:

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Gráfico 7: Decodificação de gíria criminal

As colocações foram bastante divididas. Mais da metade diz que os agentes policiais

utilizam a gíria para se comunicar; a outra parte respondeu que não, os policiais não fazem jus

desta linguagem.

Andriguetto ( 2006) afirma que os agentes policiais fazem uso de gíria decorrente do

contato que o profissional tem com os presos. Aponta, ainda, que todo processo

linguístico/metafórico existente na linguagem policial decorre da relação entre os policiais e

os criminosos, visto que ambos fazem parte do mesmo contexto linguístico.

Questionou-se, também, se os agentes policiais agiam com preconceito linguístico.

Gráfico 8: Preconceito linguístico em relação a gíria criminal.

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Tem-se na fala acima que o preconceito linguístico existe em relação aos vocábulos

empregados pelos apenados. Cardoso (apud COSTA, 2002, p.01) diz que “o vocabulário

próprio dos presos do Sistema Penal nada mais é do que uma variação linguística [...] O fato

revela uma extraordinária capacidade criativa, digna de elogio e respeito, e não cabe nenhum

tipo de comentário negativo.”

Esse discurso provém da linguística que tem a linguagem como seu objeto de estudo.

Ela é rica e mutável. Sua característica principal está nos fatores sociolinguísticos, ou seja, o

meio determina a condição de o falante empregar a sua própria língua.

3.2.3 Aos detentos da cadeia de Barreiras

A entrevista envolveu dez detentos do Complexo Policial de Barreiras. A princípio,

tinha-se pensado em entrevistar metade dos presos existentes nesta delegacia, equivalente a

59 (cinquenta e nove). No entanto, a orientação recebida pelos profissionais deste órgão é de

que o pesquisador não tivesse aproximação com os detentos, na tentativa de evitar riscos à sua

própria vida.

O instrumento aplicado a estes detentos teve como objetivo reunir algumas das

principais gírias utilizadas por eles no interior das cadeias e saber se tais gírias implicam no

trabalho dos agentes policiais.

Foram selecionadas dez palavras das mais de setenta e três coletadas, para um estudo

mais específico. As demais encontram-se no glossário deste trabalho.

As palavras analisadas fazem parte do campo lexical dos detentos que assumem

significados de acordo com o seu contexto. Para a compreensão lexical, necessária se faz a

aplicabilidade de diagrama que possibilita mostrar a variedade da formação das gírias.

amigo

chegado parceiro

amigo

parceiro broder (sic) chegado mano

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Diagrama 1: Pesquisa de campo (2011).

Observa-se o vocábulo “amigo” que diversas são as giras para denominá-lo. Esta

diversidade é possível porque os detentos já trazem consigo um linguajar consolidado,

construído no grupo a qual fazia parte. Ao ser inserido nas cadeias, este vocabulário agrega-se

a outro - da cadeia - formando, desse modo, a gíria criminal.

Preleciona Oliveira (2006) que uma palavra não pode ser conceituada por um único

significado. Isso posto, parceiro, broder (sic), chegado e mano (grifos nossos) estabelecem

uma relação semântica com o vocábulo “amigo”.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 2: Pesquisa de campo (2011).

Este diagrama também estabelece uma relação de similaridade com o anterior. O ato

de transportar droga caracteriza-se na linguagem criminal o sentido metafórico de mula,

avião, vapor, cavalo.

Para Andriguetto (2006) os vocábulos vapor e avião, por exemplo, tratam-se de uma

metáfora que faz analogia a um navio por máquina de vapor transportar cargas, assim como o

avião, neste caso, transporte de drogas.

Esta mesma análise serve para os termos “mula” e “cavalo”, pois ambos são animais

quadrúpedes e servem como meio de transporte.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 3: Pesquisa de campo (2011).

aquele que transporta grande quantidade de droga

mula avião vapor cavalo

banheiro

boi

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Boi é a gíria que caracteriza banheiro. Ela é bastante conhecida não só nas cadeias

como nos presídios do país. O espaço da cadeia geralmente possui apenas um único vaso

sanitário sem pia e não há torneira que possibilite qualquer tipo de higienização. Não tem

porta que possa manter a intimidade do usuário. No lugar desta usa-se lençol improvisado que

dê o direito do preso fazer as necessidades fisiológicas sem muito constrangimento.

A Lei de Execução Penal nº 7.210/84, no seu art. 88, parágrafo único, alíneas a) e b) é

bastante clara quando se refere ao ambiente: “salubridade do ambiente pela concorrência dos

fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; b)

área mínima de 6 (seis) metros quadrados”. (BRASIL, 2010, p.1228)

Em consequência da fala de espaço os apenados começam elaborar os códigos

linguísticos. No que compete ao vocábulo mencionado, Stella (apud OLIVEIRA, 2006, p.60)

aponta que ele existe há muito tempo e em qualquer tipo de estabelecimento penitenciário.

Vale mencionar, também, que a própria literatura traz exemplos que ilustram esta

afirmativa: “Jaquelina, empertigada, com as mãos na cintura, garantia que o boi de seu xadrez

era mais limpinho do que a cama em que dormiam aqueles vagabundos sem classe.”

(VARELLA, 1999, p. 42, grifo nosso)

Esta fala ilustra que o “boi” sempre foi lugar desprezado pelos detentos. Assim, fica

evidente que este espaço serve de punição para aqueles que descumprem as ordens dadas no

interior da cadeia.(VARELLA, 1999)

amigo

chegado parceiro

Diagrama 4: Pesquisa de campo (2011)

É comum na fala dos detentos de Barreiras denominar a cama em que dormem de jega.

Associa-se este vocábulo ao animal quadrúpede bastante utilizado pelo homem simples do

campo como meio de transporte. Possui o couro cabeludo e duro. Este sentido tem relação

com a cama dura da cadeia.

cama de cadeia

jega

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amigo

chegado parceiro

Diagrama 5: Pesquisa de campo (2011).

Diagrama 5: Pesquisa de campo (2011)

Um dos grandes problemas que a polícia tem enfrentado no Complexo Policial de

Barreiras é lidar com as mulheres que, em dia sagrado, inserem capacete no morcego

portando um raidinho (sic) para o preso. Estas gírias foram declaradas na pesquisa pelos

sujeitos participantes que têm a seguinte interpretação: as mulheres, em dia de visita, inserem

uma camisinha portando celular na vagina para entregar ao preso.

Segundo relatos de uma agente prisional, foi com esta prática que, no mês de

novembro dezenas de presos fugiram desta delegacia. Nem mesmo a revista feita por uma

agente policial é capaz de diagnosticar o que tem dentro da vagina de uma mulher em dia de

visita.

Nota-se que os vocábulos capacete e balão têm relação analógica com camisinha,

posto que no primeiro apresenta ideia de segurança, proteção; no segundo ideia de bexiga,

associando o ar que fica preso ao sêmen retido na camisinha.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 6: Pesquisa de campo (2011).

camisinha

capacete balão

policial

gambé pé de bota macaco

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As gírias apresentadas pelos entrevistados denotam o tom de ironia que estes têm em

relação aos policiais.

Sabe-se que “os policiais são encarregados da preservação da ordem pública e da

investigação de delitos, bem como previne e reprime crimes.” (MEIRELES, 2007, p. 84) Por

esse motivo, sentem-se os criminosos coagidos e impedidos de realizar atos ilícitos sem que

sejam punidos.

Dessa forma observa-se a ironia e o desprezo presente nas gírias gambé, pé de bota e

macaco em relação a estes profissionais.

Segundo Oliveira (2006), em todo o país cadeias e presídios têm apelidado o policial,

homem da lei, como coxinha, mão branca e rato cinza. (grifos do autor) Diz que coxinha

tem relação com o contexto do policial, ou seja, leva a vida desregrada, sem horário para as

refeições, alimentando-se de qualquer alimento comprado em estabelecimento. Por esta razão

leva o nome de coxinha.

Stella (apud OLIVEIRA, 2006) ressalta que o vocábulo coxinha (grifo nosso) é

utilizado em presídios da cidade e do interior do Estado de São Paulo. Já mão branca e rato

cinza representam uma metonímia21, por se configurar a parte pelo todo, ou seja, policiais

que, em ocasiões solenes, utilizam uniformes cinza e luvas brancas. O rato cinza, por sua vez,

refere-se ao animal que é desprezível, assim também desprezível é o policial.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 7: Pesquisa de campo (2011).

Ao serem questionados quanto a gíria que determina o vocábulo marmitex, os

apenados apresentaram três tipos analógicos de gírias: a primeira gíria é a blindada,

relacionado ao papel laminado, metal com que é produzida a marmita; a segunda, quentinha

21 Figura de linguagem que consiste no emprego de um termo por outro, dada a relação de semelhança ou a possibilidade de associação entre eles.

marmitex

blindada quentinha xepa

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por se referir a alimentação no horário de almoço, em embalagens descartáveis; e por último,

xepa caracterizada por comida malfeita.

Além destas gírias, Oliveira (2006) apresenta outras como: “grude, gororoba e

dendai.” (grifos do autor) Grude e a gororoba revelam uma alimentação balanceada, malfeita,

sem higiene, tempero ou sabor. Dendai é o desprezo dos presos com a comida que recebe no

interior das cadeias e presídios do país.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 8: Pesquisa de campo (2011).

Verifica-se que a expressão “túnel de fuga” tem relação metafórica com os termos tatu

e moço. (grifos nossos) “Tatu”, por exemplo, caracteriza-se por ser um animal que, diante de

sua condição natural, consegue abrir buraco na terra para fugir das garras do predador. Esta

relação pode ser vista, também, com os presos. Eles conseguem abrir buracos em paredes e

chão de cadeias para fugir.

A interpretação que se pode fazer com o termo “moço” deve-se ao fato de que um

preso jovem tem mais habilidade e força para abrir buracos no interior das cadeias do que um

adulto.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 9: Pesquisa de campo (2011).

Diagrama 9: Pesquisa de campo (2011).

Historicamente o termo “marginal” se refere à condição social marginalizada,

inferiorizada, em que se encontra o indivíduo. É a marginalização que separa este sujeito –

túnel de fuga

tatu moço

lugar frequentado por marginal

boca quebrada boca de fumo

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delinquente, bandido, assaltante, criminoso, mendigo - do resto da sociedade. (BURKE e

PORTER, 1997)

Nesse sentido, as gírias apontadas pelos sujeitos da pesquisa foram boca, quebrada,

boca de fumo (grifos nosso) Estes vocábulos apresentam a ideia de lugar perigoso e que nem

todo sujeito pode frenquentar, competindo apenas a bandidos e traficantes.

amigo

chegado parceiro

Diagrama 10: Pesquisa de campo (2011).

O último diagrama apresenta o vocábulo “celular” e as gírias: raidinho (sic) e rádio

que estão no mesmo campo semântico.

Vê-se que a analogia feita pelos detentos de Barreiras é de que o rádio, por ser um

meio de comunicação de massa, objetiva informar aos ouvintes o que acontece na sociedade.

O celular, configurado nas referidas gírias tem o papel também de informar, porém esta

comunicação é restrita apenas aos presos.

A maior dificuldade que os agentes policiais do Complexo Policial de Barreiras tem é

impedir que visitas – mulheres- entrem com celulares entronizados na vagina. A revista

acontece, porém não é suficiente para que detecte o objeto no corpo da visita. É por meio

deste instrumento que muitos conseguem se comunicar com o mundo exterior e por meio dele

continua a organizar o crime.

celular

raidinho (sic) rádio

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A gíria marginal, historicamente, surgiu nos grupos sociais excluídos da sociedade:

favelados, bandidos, ciganos, assaltantes, criminosos e outros. Ela revela a identidade

linguístico-cultural de cada falante que, por meio da expressão oral, revela desejos,

inquietações, anseios, ideias.

Viu-se no decorrer desta pesquisa monográfica que a linguagem criptológica do

sistema carcerário é dinâmica, metafórica em sua essência, que traz em seu contexto o

comportamento social dos apenados do Complexo Policial de Barreiras, oeste da Bahia.

A literatura, atrelada a pesquisa de campo demonstrou que a gíria marginal é um

mecanismo de defesa dos criminosos, pois quando empregada confunde aqueles que dela não

fazem parte, a exemplo de sivirina (viatura), saco de areia (travesseiro), pinote (fuga), passa o

cerol (vai morrer), cospe fogo (revólver), celular (raidinho) e capacete (camisinha).

Vocábulos como estes, utilizados de forma disfarçada, podem resultar em fugas, rebeliões,

e/ou outras ações que prejudicam o Sistema Penal e o trabalho da polícia em manter a paz e a

ordem social.

Em contrapartida, mesmo sendo a linguagem carcerária um empecilho para o Sistema

Penal, foi evidenciada na pesquisa que ela não tem poder de interferência no trabalho dos

agentes policiais de Barreiras. Isso ficou claro na entrevista com o delegado do complexo

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policial da cidade, como também dos policiais que corroboraram para o resultado deste

estudo.

Os policiais, sujeitos da pesquisa, responderam que não vê a gíria como ameaça dentro

das cadeias, o que configuraram 90% das respostas dadas, porém 70% afirmaram que a

comunicação por meio da gíria é um meio de defesa, mas nem por isso implica no trabalho

dos agentes policiais de Barreiras.

Em outro questionamento, 70% responderam que a gíria tem confundido os policiais e,

por isso recorrem a manuais de gíria como, principalmente, fazem analogia do termo

empregado, na tentativa de entender a linguagem empregada pelos apenados. No entanto,

70% responderam que a gíria tem implicância significativa apenas em escutas telefônicas e

trabalho investigativo.

Como perceptível, pode-se ver que a linguagem, mesmo sendo rica, mutável e variável

de acordo com o nível do contexto do falante, tem sido alvo de grande preconceito, posto que

ela não é culta e que vai contra aos preceitos gramaticais. Por outro viés, parece contraditória

esta afirmativa, pois esse linguajar não se restringe apenas a criminosos. A mídia tem

propagado veemente a gíria e, por conta disso, tem disseminado para os outros grupos sociais.

A pesquisa deixou visível que mesmo sendo disseminada para outras classes sociais, ainda

assim é oriunda da classe marginalizada e, por isso, é alvo de preconceito.

Esta pesquisa comprovou o que a literatura já trazia: os policiais, pela convivência

com os bandidos e presos, fazem uso de gírias para se comunicar. A pesquisa revelou que

55% dos policiais entrevistados falam por meio de gírias, logo estes 55% afirmaram não ter

preconceito algum com o falar criptológico dos presos. Contudo 45% afirmaram que não tem

o hábito de expressar-se por este linguajar.

Dadas as colocações, verificou-se que a linguagem dos presos analisada pelo viés

fonético, morfossintático, lexical e semântico no interior das cadeias do Complexo Policial de

Barreiras não influencia no trabalho policial, contudo é um mecanismo de defesa e, por isso,

faz necessário o conhecimento dos agentes policiais sobre a gíria marginal.

Nesse sentido, constatou-se que a implicância maior desta linguagem está nos

presídios, por aglomerar bandidos de alta periculosidade e de diversas regiões do país, como

também no largo tempo de cumprimento da pena destes sujeitos.

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ROCHA, Luiz Carlos. Investigação Policial: teoria e prática. São Paulo: EDIPRO, 2 ed. rev. ampl., 2003.

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SÁ, José Edimilson. Lingua e Sociedade: as condições sociais influenciam no modo de falar dos indivíduos, gerando certas variações na maneira de empregar uma mesma linguagem. Conhecimento Prático da Língua Portuguesa. São Paulo: Escala Educacional, 2010.

SARAIVA, Gumercindo. A gíria brasileira: dos marginais às classes de elite. Belo Horizonte: Itatiaia Limitada, 1988.

SANTOS, Cézar Augusto dos. Perspectivas de delimitação da gíria no português brasileiro e sua marcação nos dicionários. Disponível no site http://www.nead.uncnet.br/2009/revistas/letras/6/63.pdf Universidade do Contestado, 2007. Acesso em 27 de fev. de 2011.

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SOARES, Luiz Eduardo. [et al.] Elite da Tropa 2. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010.

SCHUBSKY, Cássio. Essa gíria é da hora. Superinteressante. 18 de junho de 2008 Disponível no site http://super.abril.com.br/superarquivo/1996/conteudo_32146.shtml Acesso em 20 de fev. de 2011.

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GLOSSÁRIO

A casa caiu – dar tudo errado

Água do joelho – mijar

Aranha – carro

Avião – aquele que transporta grande quantidade de droga

Aviso – sirene

B.O – depoimento

Banheiro – boi

Baratinha – carro

Barca - viatura

Barraco – casa

Barrigudo – delegado

Baseado – maconha

Bebel – prostituta

Bek (sic) – cigarro

Bicha – homossexual

Bituca – ponta de cigarro

Boca do dragão – revólver

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Boia – alimento que os familiares levam aos presos

Bonde – transferência

Bonequinha – homossexual

Branca – cocaína

Broder (sic) - amigo

Bumerangue – seringa

Camburão - viatura

Caminhão - aquele que transporta grande quantidade de droga

Camisa branca – cocaína

Cana – policial

Cano – metralhadora

Careta – cigarro

Carreta – carro

Cassete (sic) – pênis

Catatau – carta

Caveira – matador

Caxanga – casa

Chefe – traficante

Chegado – amigo

Cherife (sic) – delegado

Chunxo – faca improvisada

Chupa a porra – revólver

Coca – farinha

Coio (sic)– cela

Considerado – traficante

Corte – faca

Cospe fogo – revólver

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Curuja (sic)– cueca

Dá barril – deu tudo errado

Dar ideia – conversar

Dedo duro – pessoa influenciada por outra

Depô – depoimento

Derrubar – matar

Dia sagrado – dia de visita

Discuidista – aquele que pratica furto

É nóis (sic)– conversar

Empanada da jega –redes penduradas

Etilico – aquele que toma uma bebida

Farinha – cocaína

Fechar – matar

Fera - alimento que os familiares levam aos presos

Ferro – revólver

Filé – mulher bonita

Fofada – relação sexual

Frutinha – homossexual

Fumo – maconha

Gata – esposa

Gente boa – traficante

Giz - cigarro

Gratina – relação sexual

Greve – rebelião

Indez – ovo

Já foi – vai morrer

Jacaré – seringa

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Jaula - cela

Jega - cama de cadeia

Jek (sic) – estupro

Lanceiro – roubar carteira ou dinheiro

Larica - fome

Lero – conversar

Macaquinha – metralhadora

Madeirar – relação sexual

Mana – mulher bonita

Mano – amigo

Marrocos – pão

Menino mal - viatura

Moca – café

Mocô – esconder

Mucego (sic) – vagina

Mula - aquele que transporta grande quantidade de droga

Mula – traficante

Nega – esposa

Noiado – viciado

Novo nas drogas - noviço

Oreba – sujeira

Pagar mijão – urinar

Pardal – policial

Passa o cerol – vai morrer

Pastorão – padre

Pé inchado - aquele que toma uma bebida

Penitência – padre

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Pessoa influenciada por outra – robô

Pinote – fuga

Pisica – usuário de droga

Pó – cocaína

Pó sujo – batizado

Pode crer – conversar

Pongar – roubar carteira ou dinheiro

Presta serviço – depoimento

Pretinho – café

Priquito (sic)- vagina

Quentinha – marmitex

Raidinho (sic) – celular

Rádio – celular

Rainha – esposa

Rango – alimento que os familiares levam aos presos

Rato – aquele que pratica furto

Rato cinza – viatura

Recepa – janela ou porta de cadeia

Saco de areia – travesseiro

Sacrista – padre

Saída – fuga

Sair do flagra – fugir do local

Sete um – estelionato

Sistema – delegacia

Sivirina – viatura

Sujar – deu tudo errado

Sujeira – delinqüente

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Sula – pênis

Tá barril – situação complicada

Tá ligado – conversar

Tatu – túnel de fuga

Tela – televisão

Tenda – cortina

Tereza – redes penduradas

Tira – policial

Tocador – viciado

Tranca – entrada em uma cela

Treita – acerto de contas

Trinta e três – traficante

Urso – travesseiro

Vaca – prostituta

Vapor – aquele que transporta grande quantidade de droga

Vara – pênis

X 9 – informante

Xoxota – vagina

Xuxo – faca improvisada

Zoi – ovo

Zoiudo – ovo

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APÊNDICE A

ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA22

Tema: A influência e o significado das gírias de detentos no interior de uma cadeia da cidade de Barreiras, Oeste da Bahia

Prezado entrevistado,

Esta pesquisa tem como objetivo identificar algumas gírias utilizadas pelos detentos de Barreiras, bem como analisar a influência e o significado destas gírias no trabalho dos Agentes Policiais no combate à criminalidade.

Informo que esta pesquisa não implica em riscos para os seus participantes. Não há necessidade de identificação.

Obrigado por contribuir!

Atenciosamente,

Aderlan Messias

Acadêmico 10º sem de Direito da FASB

1. Caracterização do pesquisado:

1.1 Formação profissional: __________________________________________________

22

Entrevista desenvolvida com o delegado responsável pelo Complexo Policial de Barreiras e com os policiais da cidade.

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1.2 Tempo de atuação na profissão: ___________________________________________

1.3 Tempo de atuação nesta instituição: ________________________________________

2. Questões:

a) A literatura mostra que os detentos, de modo geral, por sua condição social, econômica e cultural, se comunicam através de uma linguagem bastante peculiar, denominada gíria. Como o senhor vê a gíria no contexto das prisões?

_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

b) O senhor se recorda de algum fato em que o uso de gíria tenha dificultado o trabalho da polícia? Em caso positivo, relate-o!

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

c) O senhor acredita que a gíria seja um mecanismo de defesa dos presos? Justifique?

_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

d) Na sua concepção, há uma preocupação do Sistema Penal com a utilização de gírias no interior das cadeias e presídios do país? Que ações o Sistema Penal vem desenvolvendo em relação a essa questão?

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_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

e) O senhor entende que a gíria, por ser uma linguagem própria de um determinado grupo social, neste caso dos detentos de Barreiras, é apenas uma variação linguística ou um novo dialeto? Por quê?

__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

f) A utilização de gírias dificulta a ação da polícia no combate ao crime? Por quê?

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

g) Os agentes policiais, além de lidarem diariamente com crimes, convivem com uma

nova forma de falar dos detentos: a gíria. Como eles policiais decodificam esse linguajar?

_____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

h) Os agentes policiais comunicam-se por meio de gírias? Em caso positivo, quais as mais comuns?

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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______________________________________________________________________________________________________________________________________________________

i) Existe preconceito linguístico por parte dos agentes policiais em relação à linguagem utilizada pelos presos?

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________

j) Os agentes policiais costumam criar glossários/dicionários com as gírias dos presos? Em caso positivo, por quê?

___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

k) O senhor costuma arquivar cartas e bilhetes escritos (em forma de gíria) quando desconfia da mensagem? Por quê?

____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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APÊNDICE B

ENTREVISTA ESTRUTURADA

Prezado pesquisado,

Esta pesquisa tem o objetivo de reunir algumas gírias usadas pelos detentos de Barreiras e mostrar que cada sujeito se comunica de acordo com o meio social em que vive.

Informo que você não será prejudicado ao participar desta pesquisa. Não há necessidade de se identificar. Solicito apenas que responda ao que se pede.

Obrigado por contribuir com a pesquisa!

Atenciosamente,

Aderlan Messias

Estudante de Direito

GÍRIA DOS DETENTOS DE BARREIRAS

1. Caracterização do Pesquisado:

1.1 Idade: _________

1.2 Naturalidade: ___________________

1.3 Estado civil: ( ) casado ( ) solteiro ( ) outro. Qual? ___________________

1.4 Há quanto tempo está detido/preso? ______________________

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1.5 Até que série você estudou? _______________________

2 Que gíria você costuma utilizar para as expressões abaixo?

Exemplo: corda feita de lençol significa TERESA.

1) Acerto de contas _______________________________________________________

2) Alimento que os familiares levam aos presos _________________________________

3) Amigo _______________________________________________________________

4) Aquele que pratica furto _________________________________________________

5) Aquele que toma uma bebida/cachaça ______________________________________

6) Aquele que transporta grande quantidade de droga ____________________________

7) Banheiro _____________________________________________________________

8) Café _________________________________________________________________

9) Cama da cadeia ________________________________________________________

10) Camisinha ____________________________________________________________

11) Carro ________________________________________________________________

12) Carta ________________________________________________________________

13) Casa _________________________________________________________________

14) Cela _________________________________________________________________

15) Celular _______________________________________________________________

16) Cigarro _______________________________________________________________

17) Cocaína ______________________________________________________________

18) Comida de cadeia ______________________________________________________

19) Conversar ____________________________________________________________

20) Cueca _______________________________________________________________

21) Dar tudo errado ________________________________________________________

22) Delegacia ____________________________________________________________

23) Delegado _____________________________________________________________

24) Delinqüente __________________________________________________________

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25) Depoimento ___________________________________________________________

26) Dia de visita ___________________________________________________________

27) Entrada em uma cela ___________________________________________________

28) Esconder _____________________________________________________________

29) Esposa _______________________________________________________________

30) Estelionatário _________________________________________________________

31) Estupro ______________________________________________________________

32) Faca ________________________________________________________________

33) Faca improvisada _______________________________________________________

34) Farinha ______________________________________________________________

35) Fuga _________________________________________________________________

36) Fugir do local do crime__________________________________________________

37) Homossexual __________________________________________________________

38) Informante ___________________________________________________________

39) Janela ou porta da cadeia _________________________________________________

40) Juiz _________________________________________________________________

41) Local freqüentado por marginais ___________________________________________

42) Maconha _____________________________________________________________

43) Marmitex ____________________________________________________________

44) Matar _______________________________________________________________

45) Metralhadora __________________________________________________________

46) Mulher bonita _________________________________________________________

47) Ovo _________________________________________________________________

48) Padre ________________________________________________________________

49) Pão __________________________________________________________________

50) Pênis ________________________________________________________________

51) Pessoa influenciada por outra _____________________________________________

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52) Policial _______________________________________________________________

53) Ponta de cigarro ________________________________________________________

54) Prostituta _____________________________________________________________

55) Rebelião _____________________________________________________________

56) Redes penduradas ______________________________________________________

57) Relação sexual ________________________________________________________

58) Revólver _____________________________________________________________

59) Roubar carteira ou dinheiro_______________________________________________

60) Seringa _______________________________________________________________

61) Serra ________________________________________________________________

62) Sirene ________________________________________________________________

63) Situação grave, complicada _______________________________________________

64) Televisão _____________________________________________________________

65) Traficante ____________________________________________________________

66) Travesseiro ___________________________________________________________

67) Túnel de fuga __________________________________________________________

68) Urinar _______________________________________________________________

69) Usuário de droga _______________________________________________________

70) Vagina ______________________________________________________________

71) Vai morrer ____________________________________________________________

72) Viatura _______________________________________________________________

73) Viciado ______________________________________________________________

3. Além das expressões anteriores, você costuma utilizar outras gírias? Quais?

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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